o stf no egito: greve e história do direito no recurso ... · no dia 27 de outubro de 2016, o...

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Rev. Direito Práx., Rio de Janeiro, Vol. 10, N. 02, 2019, p. 1016-1045. Gustavo S. Siqueira DOI: 10.1590/2179-8966/2019/39637| ISSN: 2179-8966 1016 O STF no Egito: Greve e História do Direito no Recurso Extraordinário n.º 693.456/RJ The Brazilian Supreme Court in Egypt: Strike and Legal History in the Special Appeal n.º 693.456/RJ Gustavo S. Siqueira¹ ¹ Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: [email protected]. ORCID: https://orcid.org/0000-0003-1968-5639. Artigo recebido em 23/01/2019 e aceito em 20/02/2019 This work is licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 International License.

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Page 1: O STF no Egito: Greve e História do Direito no Recurso ... · No dia 27 de outubro de 2016, o ministro Dias Toffoli, atual presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), a mais alta

Rev.DireitoPráx.,RiodeJaneiro,Vol.10,N.02,2019,p.1016-1045.GustavoS.SiqueiraDOI:10.1590/2179-8966/2019/39637|ISSN:2179-8966

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O STF no Egito: Greve e História do Direito no RecursoExtraordinárion.º693.456/RJThe Brazilian Supreme Court in Egypt: Strike and Legal History in the SpecialAppealn.º693.456/RJGustavoS.Siqueira¹

¹UniversidadedoEstadodoRiodeJaneiro,RiodeJaneiro,RiodeJaneiro,Brasil.E-mail:[email protected]:https://orcid.org/0000-0003-1968-5639.Artigorecebidoem23/01/2019eaceitoem20/02/2019

ThisworkislicensedunderaCreativeCommonsAttribution4.0InternationalLicense.

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Resumo

Nodia27deoutubrode2016,oministroDiasToffoliproferiuovoto,comorelator,no

recursoextraordinárion.º693.456/RJ,definindonovasdiretivassobreodireitodegreve

no Brasil. O objetivo do presente artigo é discutir os usos da História do Direito na

referidadecisão, analisandoos argumentose as fonteshistóricasutilizadaspara fazer

umahistóriadodireitodegreve.

Palavras-chave:SupremoTribunalFederal(STF);HistóriadoDireito;Direitodegreve.

Abstract

OnOctober27,2016,MinisterDiasToffolivoted,asarapporteur,onthespecialappeal

n.º693.456/RJ,settingnewdirectivesontherighttostrikeinBrazil.Thepurposeofthis

paper is to discuss the applications of Legal History in this decision, examining the

argumentsandhistoricalsourcesusedtotraceahistoryoftherighttostrike.

Keywords:BrazilianSupremeCourt;LegalHistory;Righttostrike.

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Introdução1

EssaéamisturadoBrasilcomoEgitoTemquetercharmepradançarbonito

BetoJamaica/Dito/PaulinhoLevi/W.Rangel

No dia 27 de outubro de 2016, oministro Dias Toffoli, atual presidente do Supremo

TribunalFederal(STF),amaisaltaCortejudiciáriadopaís,proferiuovotocomorelator

no recurso extraordinário n.º 693.456, proveniente do Rio de Janeiro.2O voto do

ministro foi o vencedor, e o STF definiu novas diretivas sobre o direito de greve no

Brasil.

OprocessoquelevouaorecursoextraordinárioteveinícionacidadedoRiode

Janeiro, quando professores da rede pública estadual ingressaram com mandado de

segurançaparaimpedirodescontosalarialreferenteaosdiasemqueestavamdegreve.

Osprofessores,queeramfuncionáriospúblicosdaFundaçãodeApoioàEscolaTécnica

(FAETEC),declararamgreve,solicitandomelhoriasnascondiçõesdetrabalho.Estafoia

segunda greve dos professores da FAETEC em 2016, sendo que, na primeira, o tema

central de reivindicação eram os atrasos nos pagamentos de salários. A decisão de

primeirograunegouopedidodosservidores,queentãoapelaramaoTribunaldeJustiça

doEstadodoRiodeJaneiro,cujadecisãoreconheceuodireito.OProcurador-Geraldo

Estado do Rio de Janeiro apresentou recurso à decisão reformada, endereçando o

recurso extraordinário ao STF, o que demandou a tomada de decisão dirigida pelo

ministroDiasToffoli.

Tendoessecontextoemvista,oobjetivodopresenteartigoéanalisarousoda

HistóriadoDireitonovotodoministro,afimdeanalisarcomoestaécitadaeconstruída

na decisão. Indiretamente, pretendo compreender, a partir de um caso importante,

quaissãoasreferênciasdosvotosdoJudiciáriobrasileiroquandoseconstróiahistória

de um direito. Sendo assim, não entrarei em detalhes a respeito das discussões

1Agradeçooscomentáriosecríticas,anterioresaoprocessodepublicação,feitosporJoãoAndradeNeto,CarolinaVestenaeSuellenMoura.2 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso extraordinário n.º 693.456 Rio de Janeiro. Recorrente:Fundação de Apoio à Escola Técnica (FAETEC). Recorridos: Renato Barroso Bernabe e outros. Relator:ministro Dias Toffoli. Disponível em:<http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/RE693456.pdf>. Acesso em: 17 dez. 2017. Ovotodoministroéanexodopresenteartigo;oacórdãocompletofoipublicadoem19deoutubrode2017,eovotodorelatorestáentreaspáginas49e80.Ahistóriadovotoquediscutireiaquicomeçanapágina52do acórdão, ou página 4 do voto do relator. Vide BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Disponível em:<http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incidente=4255687&numeroProcesso=693456&classeProcesso=RE&numeroTema=531>.Acessoem:17dez.2017.

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processuais. Abordarei fundamentalmente os argumentos usados pelo ministro Dias

Toffoliparafazerumahistóriadodireitodegreve.Dessaforma,nãodiscutireidiversas

decisõesqueusamounãoaHistóriadoDireito,mastomareicomobaseumadecisãoda

principalCortedopaíspara,emalgumamedida, fazerumraciocínio indutivosobreas

sentençasbrasileiraseaHistóriadoDireito.

Como disciplina “jovem” nas Faculdades de Direito do Brasil,3a História do

DireitoaindaéconfundidacomaFilosofiadoDireitooucomumaerudiçãosobrefatos

históricos que pouco contribui para as discussões jurídicas no Brasil. 4 Discutir a

importânciaeosusosdaHistóriadoDireitocolocaemquestãoaindispensávelrelação

entre teoria e prática e mostra como a História do Direito pode contribuir, além da

formaçãodeprofissionais,paraapráticacotidianadodireito.

Para tanto, o trabalho foi dividido em tópicos, os quais seguem o raciocínio

argumentativodo votodoministroDias Toffoli.Ademais, aprofundei adensidadedos

períodostratadosnovotodeacordocomaargumentaçãotrazidanele,istoé,quandoo

voto citava fontes, investiguei tais fontes; quando apenas reproduzia a lei, tratei de

descrevê-la,alémdetrazerseuscontextosesuasaplicações.Damesmaforma,utilizei

metodologiasdaHistória, comoaHistóriadosConceitoseosensinamentosdaEscola

dosAnnales,parapesquisarostemaseosfundamentosutilizados.

1Ovotoeseusargumentos

1.1DoEgitoàFrança

A greve, talvez um dos assuntos jurídicosmais controversos desde o final do

século XIX,5viveu a tensão entre direito e crime6em muitos momentos da história

brasileira.

3A disciplina passou a ser obrigatória nas Faculdade deDireito apenas em2004, vide FONSECA, RicardoMarcelo. “O deserto e o vulcão: reflexões e avaliações sobre a História do Direito no Brasil”. ForumHistoriaeIuris,v.1,pp.1-16,2012.4VideFONSECA,RicardoMarcelo.IntroduçãoteóricaàHistóriadoDireito.1aed.Curitiba:Juruá,2009;eSIQUEIRA,GustavoS.“ObservaçõessobrecomooDireitoensinaerradoaHistóriadoDireito”.Passagens,Niterói,v.10,n.1,pp.93-103,jan./abr.2018.5SIQUEIRA, Gustavo S.História do direito de greve no Brasil (1890-1946). Rio de Janeiro: Lumen Juris,2017.6VideSIQUEIRA,GustavoS.;RODRIGUES,JuliadaSilva;AZEVEDO,FatimaGabrielaSoaresde.“OdireitodegrevenosdebatesdaAssembleiaNacionalConstituintede1933-1934”.Passagens:RevistaInternacionalde

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OministroDiasToffoli,no seuvoto,apóso relatório, reconheceua relevância

do tema com as seguintes palavras: “Passo a um breve resgate histórico, em face da

importância do objeto da demanda. A greve é uma dasmanifestações coletivasmais

antigasecomplexasproduzidaspelasociedade.”7Continuaoministro:

Sua primeira referência histórica, como se extrai dos livros, remonta aoEgito, no reinado de Ramsés III, no século XII a.C., no episódio conhecidocomo“pernascruzadas”,quandoostrabalhadores,pornãoteremrecebidooqueforaprometidopelofaraó,aissoseopuseramcruzandoaspernas.8

Entenderaexistênciadagrevemilharesdeanosantesdaexistênciadopróprio

conceitodegrevepodepareceranacronismo.Aimpressãoédequeopassadoéolhado

comoumsimplesreflexodopresente,semquesecompreendamsuaspeculiaridadese

suas lógicas. Nesse sentido, analisando o trecho histórico retomado pelo ministro,

diversasperguntaspodemserlevantadas.AgrevesurgiuantesdaRevoluçãoIndustrial?

Antes dos sindicatos ou associações de trabalhadores? Antes mesmo das noções de

Constituição,Estado,empregado,empregador?Apalavra“greve”jáexistianoEgito?

OrecursodecitaroEgitocomooberçodagreveexigiriadamaisaltaCortedo

país, nomínimo, uma pesquisa complexa para justificar uma citação do período, que

abrangesse livros especializados, trabalhos de egiptólogos, linguistas, historiadores,

entreoutrospesquisadores.

A referência da decisão é, no entanto, o trabalho de Luciana Fabel9– uma

dissertação de mestrado profissional em Administração de Empresas defendida em

2009 na Faculdade de Estudos Administrativos deMinas Gerais (FEAD). Em parte da

dissertação, a autora discute a administração pública brasileira, os princípios

constitucionais,omandadodeinjunçãoeagreve.Todaa“evolução”dodireitodegreve

no Brasil é tratada em quatro páginas. Nesse sentido, Fabel sinaliza: “A primeira

referênciahistóricaacercadotemaocorreunoEgito,noreinado[...]Naquelaépoca,os

HistóriaPolíticaeCulturaJurídica,Niterói,v.6,n.2,pp.312-327,maio/ago.2014;eSIQUEIRA,GustavoS.“ExperiênciasdegrevenoEstadoNovo”.DireitoePráxis,RiodeJaneiro,v.6,n.11,pp.226-253,2015.7BRASIL.SupremoTribunalFederal,op.cit.,p.3.8BRASIL.SupremoTribunalFederal,op.cit.,p.4.9FABEL,LucianaMachadoTeixeira.Releituraconceitualeproblematizadadodireitodegrevenoserviçopúblico federal e as possíveis contribuições para a reflexão do gestor público em relação ao corte deponto. Dissertação (mestrado profissional). Centro de Gestão Empreendedora da Faculdade de EstudosAdministrativosdeMinasGerais.BeloHorizonte,2009.

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trabalhadoresserecusaramatrabalhar ‘cruzandoaspernas’,porquenãoreceberamo

queforaprometidopeloFaraó.”10

Primeiramente, é importante destacar que o regime de trabalho era baseado

emuma sociedade escravocrata; chamá-los de trabalhadores talvez seja umpequeno

anacronismo, uma vez que o conceito de trabalhador, como existe hoje, é uma

construção de séculos posteriores. Outro ponto que deve ser sinalizado sobre as

formulações de Luciana Fabel é que as informações sobre a greve no Egito não são

originárias de uma pesquisa aprofundada sobre o tema. A autora cita como fonte o

trabalhodeMilaGuimarãesCarmoeDanielMarceloAlvesCasella11–publicadonosite

http://www.webartigos.com–,que fazemumahistóriadodireitodegreveapartirdo

Egito, no reino de Ramsés III. Nessa publicação, observei que as informações citadas

foram retiradas de Amauri Mascaro Nascimento,12em seu livro Curso de Direito do

Trabalho.

AmauriMascaroNascimentomepareceserafonteoriginal,ouseja,a“primeira

referência” sobreagrevenoEgito.Emsuaobra,dirigidaaosalunosdegraduaçãoem

Direito–ouàquelesqueiniciamodebatedealgumtema,comotodomanual–,quando

escreve sobre os antecedentes históricos da greve, apesar de confundir greve com

revoltasereinvindicações,oautorcitaagrevenoreinodeRamsésIIIeoutrasgrevesem

Roma e na IdadeMédia. Entretanto, Nascimento não apresenta nenhuma referência

bibliográfica, não cita documentos, estudos, livros, pesquisas, nada. Ele simplesmente

faz afirmações e interpretações sobre fatos históricos sem evidente fundamentação

bibliográficaouempírica.

É preciso sublinhar, evidentemente, que os manuais têm função didática e,

muitasvezes,nãoreúnemoscuidadosacadêmicoseprofissionaisqueumadissertação

ouuma sentençadevem ter.Contudo, émotivodepreocupaçãoqueumadecisãoda

maior Corte do país cite fontes não especializadas, que, por sua vez, têm como

referência um manual para alunos do primeiro ano de Direito do Trabalho nas

Faculdades de Direito. Nascimento escreve, Carmo e Casella citam, Fabel cita e um

ministrodoSTFrepeteacitação.Percebo,então,queainformaçãocitadapeloministro

10Ibid.,p.39.11CARMO, Mila Guimarães; CASELLA, Daniel Marcelo Alves. “O direito de greve do servidor público”.Webartigos.com,11dez.2007.Disponívelem:<http://www.webartigos.com/artigos/o-direito-de-greve-do-servidor-publico/3031>.Acessoem:17dez.2017.12NASCIMENTO,AmauriMascaro.CursodeDireitodoTrabalho.26aed.SãoPaulo:Saraiva,2001,p.1.363.

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doSTFnãoénemsequerdefontesecundária;éumautorquecitaoutro,quecitaoutro,

eassimpordiante–e,aparentemente,semorigordequeotemanecessita.

Diantedisso,outraquestãoseimpõe:qualéaqualidadedadoutrinautilizada

pelo STF? Para uma questão tão importante quanto a greve, que merece até um

históriconavisãodoministro,nãoseriamaisadequadaumapesquisaumpoucomais

complexa?QualéomotivodecitaroEgito?Nãoseriamelhordiscutirexemplosmais

próximose“conectados”comodebatebrasileiro?

1.2DaFrançaaoBrasil

Noparágrafoseguinte,ovotofazumsaltohistóricode3milanos,doséculoXII

a.C. para o século XVIII d.C. Aqui se repete um problema muito comum em alguns

trabalhosjurídicos:comojustificartamanhosaltohistórico?Em3milanosdecivilização,

quantas experiências jurídicas podem ter acontecido e terem sido simplesmente

ignoradas?

Paracompreendermelhoressesegundopassoargumentativo,citootrechodo

voto:

Já o surgimento da greve, nos moldes em que se apresenta atualmente,decorreoregimedetrabalhoassalariado,frutodaRevoluçãoIndustrialedaconsolidaçãodomodelocapitalista. Seumarco sedeuemParis,no séculoXVIII,comareuniãodetrabalhadoresna“PlacedeGrèvre”[...]Aexpressão“greve”inicialmenterepresentavaoatodepermanênciadedesempregadosno local, à procura de trabalho, mas, com o tempo, passou a significar aunião dos operários que se insurgiam contra as condições de trabalhoimpostaspelosempregadores.13

AcitaçãodovotonessetrechoéretiradadolivroGreve:fatosesignificados,de

PedroCastro, publicadoem1986naColeçãoPrincípios, da EditoraÁtica.A afirmação

confirma um fato já consagrado por vários historiadores: o surgimento da palavra

“greve”emParis.Masoqueéprecisoesclarecer,naesteiradateoriadeKoselleck,14é

que uma mesma palavra, um mesmo vocábulo pode ter, em diversos tempos e em

diversos lugares, conceitos diferentes. Ou seja, o fato de a palavra “greve” existir na

França no século XVIII não implica que a palavra “greve” significa a mesma coisa no

13BRASIL.SupremoTribunalFederal,op.cit.,p.4.14KOSELLECK, Reinhart. Futuro passado: contribuição à semântica dos tempos históricos. Tradução deWilmaPatríciaMaaseCarlosAlmeidaPereira.RiodeJaneiro:Contraponto/EditoraPUC-Rio,2006.

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BrasildoséculoXXI.Assim,cabeaospesquisadoreseaosjuristasentenderasmudanças

easmanutençõesdesignificado.

A obra citada pelo voto é um livro de bolso de 62 páginas, aparentemente

dirigidoaalunosdeensinomédio.Elenãotemnotasderodapé–citagrevenoEgito,

mastambémemTebas,2.100anosantesdeCristo–ereiterauma informação játida

como senso comum entre os historiadores da greve: o surgimento da palavra após a

RevoluçãoIndustrialnaFrança,relacionadaaumapraçaquesechamouGrève.

1.3DoImpérioàConstituiçãode1946

OsdicionáriosquecirculavamnoBrasilnoiníciodoséculoXXtambémcitavama

praçafrancesaparaexplicaraorigemdotermo,usandoatémesmooacentofrancês15–

“grève”. Comamesma grafia reproduzida peloministro em seu voto, escreveu sobre

greveoex-ministrodoSTFViveirosdeCastro,que,em1912,defendiaquesetratavade

umdireitodocidadão.16Essa importantedoutrinadaépocasobreotema,noentanto,

nãoconstounasfontesutilizadasnadecisão.

TemosomesmovocábulodesdeoséculoXVIIIouXIX,masissonãosignificaque

a greve naquele período tinha osmesmosmoldes que no século XXI.O vocábulo é o

mesmo, mas o conceito que dá sentido a ele se alterou. A greve no século XXI está

ligadaaumasériedenoções:direitostrabalhistas,direitossociais,justiçadotrabalhoe

sindicatos,instituiçõesqueeramimpensadasnoséculoXVIIIouXIX,ouqueaindaeram

motivodelutassociais.Damesmaforma,osvocábulos“strike”,eminglês,“huelga”,em

espanhole“sciopero”,emitaliano,mostramqueoquesechamagrevenoBrasilpode

tersidodiferenteemmuitospaíses.Aorigemdediferentestermosemdiferentespaíses

indicaqueestestiveramnoçõeseconceitosdiferentesdagreveemdiferentestempos,

e quiçá não seja possível fazer uma história do direito de greve tão simétrica

internacionalmente.

DaFrança,ovotofazumoutrosalto,paraoBrasildoséculoXIX:

Nodireitobrasileiro,o institutosurgiu formalmenteemmeadosdoséculoXIX, a partir da massificação do trabalho assalariado. Segundo Marcelo

15VideFIGUEIREDO,Cândidode.Novodiccionárioda línguaportuguesa. Lisboa:LivrariaClássicaEditora,1913;eNASCENTES,Antenor.Dicionárioetimológicodalínguaportuguesa.RiodeJaneiro:FranciscoAlves,1932.16 VIVEIROS DE CASTRO, Augusto. “O direito de grève e suas limitações”. Revista de Direito Civil,CommercialeCriminal,RiodeJaneiro,v.XXIV,abr.1912.

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RibeiroUchôa,aprimeiragrevedopaísocorreuem1858,noRiodeJaneiro,“quandoostipógrafosdacapital imperialderam-seàsmãosparaprotestarpormelhoriasalarial”(Agrevenoserviçopúblicobrasileiro.In:OSupremoTribunalFederaleoscasosdifíceis.Florianópolis:Conceito,2012.p.250).17

Acitaçãodovoto refere-seaoartigodeMarceloRibeiroUchôa,publicadoem

2012.Uchôacitaagrevedostipógrafos,masnãotraznenhumareferênciaounotade

rodapé. Tambémnão faz umadiferenciaçãoentre “parede” – termousadoduranteo

séculoXIX–e“greve”–termousadonoBrasilsomentenofinaldoséculoXIX.18

Para averiguar o termo, pesquisei nos dicionários que circulavamno Brasil no

séculoXIXousodovocábulo“greve”everifiqueiqueestesóaparecenofinaldoséculo

XIX. Cândido de Figueiredo escrevia sobre o significado de “greve” em 1899.19Além

disso,dicionáriospublicadosanteriormente,comooescritoporEduardoFaria,de1868,

nãodescrevemapalavra“greve”,esim“parede”.20Nodecreto-lein.º2.827,de15de

marçode187921,porexemplo,épossível lerapalavra“parede”.22Apalavra“greve”é

usada no final do século XIX, e o conceito “parede”, com as diferenças que tem em

relaçãoàgreve–easimplesleituradodecreton.º2827podemostrarisso–,éomais

utilizado.Ouseja,ébempossívelque“greve”,noséculoXIX,tivesseumconceitobem

diferentedoquenoiníciodoséculoXXI.Imagine-se,então,naFrançadoséculoXVIII,ou

aindamilharesdeanosantesdeCristo.

Tal questão traz à tona a importância da história dos conceitos 23 para a

discussão.Entenderoquesignificamosconceitosemtemposeespaçosdiferentesdos

nossoséfundamentalparaentenderosseussignificados–e,nestecaso,entenderaté

mesmo o que era o direito. O uso da mesma palavra em momentos diferentes da

histórianãogarantequeela tenhaomesmosignificadodeantes,poisosconceitosse

17BRASIL.SupremoTribunalFederal,op.cit.,p.5.18UCHÔA,MarceloRibeiro.“Agrevenoserviçopúblicobrasileiro”. In:MARIANO,CynaraMonteiro;LIMA,MartonioMont’Alverne (orgs.).O Supremo Tribunal Federal e os casos difíceis. Florianópolis: ConceitoEditorial,2012.19FIGUEIREDO,op.cit.20FARIA,Eduardo.Novodiccionariodalinguaportugueza.Lisboa:EditorFranciscoArthurdaSilva,1868.21 BRASIL. Decreto n.º 2.827, de 15 de março de 1879. Disponível em:<http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1824-1899/decreto-2827-15-marco-1879-547285-publicacaooriginal-62001-pl.html>.Acessoem:15dez.2017.22“Art. 78. Os locadores, que, para fazer paredes, ameaçarem ou violentarem a outros locadores, serãopresoseremettidosáautoridadepolicial,afimdeprovar-se,medianteacçãopublica,asuapunição,comoincursosnoart.180doCodigoCriminal.Art.79.Seeffectuaremaparede,epormeiodellacommetteremameaçaseviolencias,serãopunidospeloscrimespraticados.”23KOSELLECK,op.cit.

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alteramnotempoenoespaço.

Continuaorelator:

As Constituições de 1824, de 1891 e de 1934 não trouxeram sequer aprevisãodo instituto,sendoeleconsideradoapenasfatosocial.Aprimeiraleibrasileiraque tratoudagreve foioCódigoPenalde1890, tipificandooinstituto como crime e punindo o infrator com pena de detenção (MELO.RaimundoSimãode.AgrevenoDireitoBrasileiro.SãoPaulo:LTR,2003,p.23).24

ÉverdadequeasConstituiçõesde1824,1891e1934nãotrouxeramaprevisão

doinstitutodagreve.PensarqueaConstituiçãode1824positivariaumconceitoouum

crime que ainda não existiam no país é um anacronismo. Já a Constituição de 1891

silenciava sobre a greve,mas a doutrina25e a jurisprudência do STF26a consideravam

umdireito.A constitucionalizaçãododireitode reuniãoe associaçãoera interpretada

comogarantiaaostrabalhadores.27

Por outro lado, é necessário destacar que o Código Penal de 1890 não

criminalizouodireitodegreve.Aredaçãooriginal,aindanotempodevacatiolegis,foi

alterada,transformandoemcrimeapenasagreveviolenta,eemdireitoagrevepacífica.

EsseeraoposicionamentodadoutrinadaépocaedajurisprudênciadoSTF.Comefeito,

pormaisqueosgovernantesaindatratassemodireitodegrevecomoumcrime,agreve

era um direito criminalizado na prática.28Veja-se que o termo “greve” não entra no

sistema jurídicobrasileiroem“meadosdoséculoXIX”,masapenasno finaldoséculo,

comoCódigoPenalde1890.

A fonte utilizada na parte supracitada do voto foi o livro A greve no direito

brasileiro,deRaimundoSimãodeMello:“Aprimeira leibrasileiraque tratoudagreve

foioCódigoPenalde1890,queconsideravacrimeoseuexercício,punindooautorcom

pena de 1 a 3 meses de detenção.”29O livro de Melo, no entanto, comete um erro

24BRASIL.SupremoTribunalFederal,op.cit.,p.5.25VIVEIROSDECASTRO,op.cit.;MORAES,Evaristo.“Odireitodegrève:suaextensão,seuslimites”.RevistadeDireitoCivil,CommercialeCriminal,RiodeJaneiro,v.XLVI,p.261,out.,1917.;eSIQUEIRA,GustavoS.HistóriadodireitodegrevenoBrasil(1890-1946).RiodeJaneiro:LumenJuris,2017.26Revista do Supremo Tribunal Federal, Rio de Janeiro, fasc. 1, v. XXV, pp. 149-150, out. 1920. (HC no5.910).27 SIQUEIRA, Gustavo S. História do Direito pelos movimentos sociais: cidadania, experiências eantropofagiajurídicanasestradasdeferro(Brasil,1906).RiodeJaneiro:LumenJuris,2014.28SIQUEIRA,Gustavo S.História do direito de greve no Brasil (1890-1946). Rio de Janeiro: Lumen Juris,2017.29MELO,RaimundoSimãode.Agrevenodireitobrasileiro.SãoPaulo:LTr,2009,p.22.

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histórico:agreveeraumdireito,eapenasaameaça,aviolênciaeoconstrangimento

parafazergreveseramcrimes.

Parademonstraressaafirmação,começotranscrevendoosartigos205e206do

CódigoPenal,alteradosantesdavigência:

OChefedoGovernoProvisóriodaRepublicadosEstadosUnidosdoBrazil,considerandoquearedacçãodosarts.205e206doCodigoCriminalpodena execução dar logar a duvidas e interpretações erroneas e paraestabeleceraclarezaindispensavel,sobretudonasleispenaes,decreta:Art.1.ºOsarts.205e206doCodigoPenaleseusparagraphosficamassimredigidos:Art. 205. Desviar operarios e trabalhadores dos estabelecimentos em queforemempregados,pormeiodeameaçaseconstrangimento:Penas – de prisão cellular por um a tres mezes e de multa de 200$ a500$000.30Art.206.Causarouprovocarcessaçãooususpensãode trabalhopormeiode ameaçasou violencias, para impôr aosoperariosoupatrões augmentooudiminuiçãodeserviçoousalario:Penas–prizãocellularporumatrezmezes.

Contudo,amaiorcríticaquepossofazeréàausênciadereferênciaàdecisãodo

STF de 1922, na qual a greve foi considerada um direito pelo STF. Uma decisão

determinanteparaoseusentidoeaplicaçãofoiexcluídadohistóricodesseimportante

instituto. Veja-se que era uma decisão que justamente garantia aos trabalhadores

brasileirosodireitodegreve:

Considerando que a gréve pacifica é um direito que póde ser livrementeexercido pelo operario, e que o exercicio de um direito em qualquer paizlivreepoliciadonãoconstituedelicto,nemcollocaoseutitularemsituaçãode ser considerando um elemento pernicioso á sociedade ecompromettedordatranquillidadepublica;Considerandoquedosdocumentosofferecidosseprova,áevidencia,queopaciente,intervindonagrévedaMogyanacomintuitodeacalmarosanimosexaltadosdosgrévistas,nemumactopraticou,isoladamentecontrapessoase cousas, definidopela Lei penal, e nemqualquer outramanifestaçãoporpalavras, ou factos teve como indicativo de ser elle um “elementopernicioso á sociedada”, na qual vive há vinte e quatro annos, e em cujomeioprestaassitenciaa7filhosbrasileiros.Considerandoqueopacienteébrasileiro,porquanto,temfilhosbrasileiros,epossueumimmovelurbanoemCampinas,utdocumentodefls.27,peloque é contribuinte dos cofres municipaes por impostos devidos pelapropriedadepredial.Considerandoque, nessa situação, a Constituição da Republica, no art. 96parágrafo 5, considera o extrangeiro naturalizado brasileiro para todos oseffeitoslegaes,equealeideexpulsãoinvocadanãoseapplicaabrasileiros.

30 BRASIL. Decreto n.º 1.162, de 12 de dezembro de 1890. Disponível em:<http://legis.senado.leg.br/legislacao/ListaTextoSigen.action?norma=391335&id=14442752&idBinario=15630016&mime=application/rtf>.Acessoem:17dez.2017.

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OSupremoTribunalFederalDÁ PROVIMENTO ao recurso interposto, para que césse todo e qualquerconstrangimentocontraopaciente,oriundodaportariadeexpulsão.Custas“ex-causa”.SupremoTribunalFederal,14de Junhode1920.–PedroMibielli,Relator:ainda que extrangeiro fôsse o paciente, provado que é residente, euconcederia o “habeas-corpus”, no termos do art. 72 da Constituição daRepublica.–PedroLessa.–LeoniRamos.–PedrodosSantos.–ViveirosdeCastro – Godofredo Cunha. – Sebastião de Lacerda. – Muniz Barreto. –GermenegildodeBarros–JoãoMendes.31

PedroLessaeViveirosdeCastroeram,entreoutros,osmaisimportantesjuízes

do STF no período e participaram no julgamento. Viveiros de Castro, que escreveu

importanteartigo32em1912,comocitadoacima,nãoestápresentenovotodoministro

DiasToffoli.Asperguntasqueseimpõemsão:qualéosentidodaomissão?Porqueo

voto exclui do seu histórico dois momentos em que a greve foi considera direito no

Brasil?

Não é possível responder a essas perguntas, mas, sabendo-se que oministro

votariapelarestriçãododireitodegreve,talvezsepossaconcluir,comoveremosnofim

do trabalho, queo histórico apresentadono voto acabapor confirmar a decisão final

deste. Ou seja, o histórico é coerente com a decisão e, talvez por isso, utilizado não

como produto de uma pesquisa, mas como argumento para sustentar o sentido da

decisão.

Voltando a discutir as Constituições brasileiras, aqui em contraponto ao voto,

vale lembrarque,naConstituiçãode1934,odireitodegreveeraprevistoemumdos

projetospreliminaresdotextoefoiexcluídodaredaçãofinalpor99votosa82.33Apesar

denão ter sidopositivadonaConstituiçãode1934,a constitucionalizaçãodagreve já

eraumhorizontenaqueleperíodohistórico.

Emsequência,oministroalega:

[...]em1930,foicriadooMinistériodoTrabalho,IndústriaeComérciocoma função de efetivar a política trabalhista do governo. No entanto, osavanços foram poucos na proteção dos direitos trabalhistas e a Lei no38/32, que dispunha sobre segurança nacional, proibiu o exercício dagreve.34

31Revista do Supremo Tribunal Federal, Rio de Janeiro, fasc. 1, v. XXV, pp. 149-150, out. 1920. (HC no5.910).32VIVEIROSDECASTRO,op.cit.33SIQUEIRA;RODRIGUES;AZEVEDO,op.cit.34BRASIL.SupremoTribunalFederal,op.cit.,p.5.

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OMinistério do Trabalho, Indústria e Comércio foi o principal articulador das

políticas trabalhistasdogoverno.35Foinesseministérioquegrandeparteda legislação

trabalhista foi pensadae,posteriormente, encaminhadaparapromulgação.Ou seja, a

afirmaçãocontidanovotodequeoministériocitadoavançoutimidamentenotocante

aosdireitosdostrabalhadorestambémnãoencontrarespaldonaexperiênciabrasileira

de1930.

Ovotorecorreàlein.º38/1932,“quedispunhasobreasegurançanacional”.É

provávelquetenhaocorridoumerrodedigitação,poisaLeideSegurançaNacionaldo

períodoéalein.º38/1935.Eissofazmuitadiferença.Énoanode1935queogoverno

constitucionaldopresidenteGetúlioVargas–eleitoindiretamentepelaConstituintede

1934 – inicia um processo de restrições aos direitos políticos, acompanhado de uma

expansãodosdireitostrabalhistasparaostrabalhadoresurbanos,queculminoucoma

sua consolidaçãoem1943.Mas,diferentementedoque foi alegadonovoto, a lei n.º

38/1935 não proibiu simplesmente a greve; ela criminalizou a incitação à greve nos

serviçospúblicoseagreveporsolidariedade,istoé,agrevepormotivos“estranhos”ao

trabalho:

Art. 7º Incitar funccionarios publicos ou servidores do Estado á cessaçãocollectiva,totalouparcial,dosserviçosameucargo.Pena-De1a3annosdeprisãocellular.Art. 8º Cessarem coletivamente funccionarios publicos, contra a lei ouregulamento,osserviçosaseucargo.Pena-Perdadocargo.[...]Art. 18. Instigar ou preparar a paralysação de serviços publicos, ou deabastecimentodapopulação.Pena-De1a3annosdeprisãocellular.Paragraphounico.Não se applicará a sancçãodeste artigo ao assalariado,no respectivo serviço, desde que tenha agido exclusivamente pormotivospertinentesáscondiçõesdeseutrabalho.

Ésóem1935queocorreaprimeiracriminalizaçãodagrevepacíficanoBrasil.

Posteriormente,oministroDiasToffolicitaavedaçãodaConstituiçãode1937,a

criminalização da greve na lei que institui a Justiça do Trabalho e os crimes de greve35ARÊAS,LucianaBarbosa.Consentimentoeresistência:umestudosobreasrelaçõesentretrabalhadoreseestado no Rio de Janeiro (1930-1945). Tese (doutorado). Instituto de Filosofia e Ciências Humanas daUniversidade Estadual de Campinas. Campinas, 2000; SOUZA, Samuel Fernando de. “Coagidos ousubornados”: trabalhadores, sindicatos, Estado e as leis do trabalho nos anos 1930. Tese (doutorado).Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas. Campinas, 2007; eBIAVASCHI,MagdaBarros.OdireitodotrabalhonoBrasil–1930/1942:aconstruçãodossujeitosdedireitostrabalhistas. Tese (doutorado). Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual deCampinas.Campinas,2007.

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previstos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). O voto descreve as práticas de

criminalização da greve, mas não esclarece que essas vedações ocorreram durante a

ditaduradoEstadoNovo.Nãoédesurpreender,umavezqueessaéumaposturatípica

daditadura:criminalizarodireitodegreve.

1.4.Dodireitoconstitucionalem1946àDitaduraMilitar?

SobreoperíodoposterioraGetúlioVargas,iniciaorelator:

Nasequência,aConstituiçãoFederalde1946,emseuartigo158,consignouser“reconhecidoodireitodegreve,cujoexercícioaleiregulará”.Foinessecontexto que o Decreto-Lei no 9.070/46 garantiu o reconhecimento dodireitodegrevenoBrasil,nãoextensívelàsatividadesfundamentais.36

A Constituição de 1946 foi a primeira Constituição brasileira que

constitucionalizouodireitodegreve.Masé importantedestacarqueodecreto-lein.º

9.070/1946,quetrouxerestriçõesaodireitodegreve,éanterioràConstituiçãode1946

e foi promulgado ainda sob a regência da Constituição de 1937 – portanto, sob o

aparato legaldoEstadoNovo.Nãoépossívelesquecer, todavia,que,mesmoantesda

Constituição de 1946, diversas greves aconteceram no país. Muitas delas tiveram

intervenção do Governo Federal, como a greve no Porto de Santos,37na Leopoldina

RailwayCompanyLimited,38nasminasdeSão JerônimoeemButiá,noRioGrandedo

Sul.39Oanode1946foiumanodeebuliçãodegreveedelegislaçõessobregreve.

Aconstitucionalidadedodecreto-lein.º9.070/1946foiquestionadanadoutrina

e no próprio STF à época. Em 11 de agosto de 1959, decidiu o STF, no agravo de

instrumento n.º 21.314-SP, que o referido diploma havia sido recepcionado pela

36BRASIL.SupremoTribunalFederal,op.cit.,p.6.37 BRASIL. Decreto-lei n.º 9.306, de 27 de maio de 1946. Disponível em:<http://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1940-1949/decreto-lei-9306-27-maio-1946-417562-publicacaooriginal-1-pe.html>Acessoem:17dez.2017.38 BRASIL. Decreto-lei n.º 9.265-A, de 18 de maio de 1946. Disponível em:<http://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1940-1949/decreto-lei-9265-a-18-maio-1946-417073-publicacaooriginal-1-pe.html>.Acessoem:17dez.2017.39 BRASIL. Decreto-lei n.º 8.985, de 14 de fevereiro de 1946. Disponível em:<http://www2.camara.leg.br/legin/fed/declei/1940-1949/decreto-lei-8985-14-fevereiro-1946-416845-publicacaooriginal-1-pe.html>.Acessoem:17dez.2017.

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Constituiçãode1946: “EMENTA–o decreto lei n. 9070, de 1946, é compatível coma

atualConstituiçãoFederal.AgravodeInstrumentodesprovido”.40

Adoutrinadaépoca,mesmoaqueentendiaqueodireitodegrevenãodeveria

serumdireitoconstitucional,questionavaadecisãodoSTF:

O argumento de inconstitucionalidade do decreto-lei 9.070, parece-nosirrefutável,emfacedaConstituiçãode1937,pois,emborapeloartigo180daquela Constituição, tivesse o Poder Executivo competência para baixardecreto-lei, é inegável que não poderia baixar leis que infringissem,frontalmente, dispositivo expresso da Constituição, a ponto de regular epermitiroqueestavaproibido.41

O decreto utiliza o termo “cessação coletiva de trabalho” em substituição ao

termo“greve”.Obrigavaacessaçãocoletivadetrabalhoaumasériederequisitospara

ser considerada legal eproibia a cessaçãoemserviços “fundamentais”.42As restrições

eram tamanhas que era difícil imaginar serviços cujos trabalhadores poderiam fazer

greves. Ademais, a lei outorgada pelo presidente Eurico Gaspar Dutra com base na

Constituição do Estado Novo criava novos tipos penais para as atividades de greve e

possibilitavaaprisãopreventivanoscrimescontraaorganizaçãodotrabalho.

Por outro lado, o decreto é anterior ao texto Constitucional de 1946, e os

próprios constituintes decidiramnão impor as restrições ao direito de greve no texto

constitucional. Pedro Vergara, do Partido Social Democrático (PSD), defendia que “A

greveeolocautepacíficoserãopermitidoscomomedidastendentesafazercumpriras

decisões da Justiça do Trabalho”.43Para o parlamentar, era “absurdo que se admita o

direitodegreve,puraesimplesmente,comoestánoprojeto,numpaíscomoonosso,em

que existe uma justiça especializada, para diminuir os conflitos entre o capital e o

trabalho”.44EloyRocha(PSD)declarou:

40BRASIL.SupremoTribunalFederal.Agravodeinstrumenton.º21.314-SP.Agravante:JoséLinodosSantoseoutros.Agravado:FábricaConfiançadeLadrilhoseTubosLtda.Relator:ministroHenriqueD’Avila.RiodeJaneiro,11deagostode1959.41VARELLARIBEIRO,A.Oproblemadagreve.RiodeJaneiro:Guanabara,1959,p.29.42BRASIL.PresidênciadaRepública.Decreto-lein.º9.070,de15demarçode1946.“Art.3ºSãoconsideradasfundamentais,paraos finsdesta lei,asatividadesprofissionaisdesempenhadasnosserviçosdeágua,energia,fontesdeenergia,iluminação,gás,esgotos,comunicações,transportes,cargaedescarga;nosestabelecimentosdevendadeutilidadeougênerosessenciaisàvidadaspopulações;nosmatadouros; na lavoura e na pecuária; nos colégios, escolas, bancos, farmácias, drogarias, hospitais eserviçosfunerários;nasindústriasbásicasouessenciaisàdefesanacional.”43BRASIL. Anais da Assembleia Nacional Constituinte de 1946. Rio de Janeiro, 1946, p. 449. v. XIII.Disponívelem:<http/imagem.camara.gov.br/publicações>.Acessoem:12dez.2017.44Ibid.,p.449.

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[...]hoje,oDecreto-leinº9.070,de15demarçode1946,quedispõesobreasuspensãoouabandonocoletivodotrabalhoesboça,emboraincompletaou imperfeitamente, os princípios da tentativa de conciliação prévia e dadeliberaçãodagrevepelamaioriadostrabalhadores.45

Joaquim Sampaio Vidal (PSD) pediu a exclusão do direito de greve da

Constituição.46

No entanto, a oposição do Partido Comunista Brasileiro (PCB), com João

Amazonas, Alcedo Coutinho, Luís Carlos Prestes, Maurício Grabois, Alcides Sabença,

GregórioBezerraeCarlosMarighella,propôsumsingelotexto:“Éreconhecidoodireito

degreve.”Ajustificativaexplicaarelaçãodavisãodopartidocomodireitodegrevee

comodecreto-lein.º9.070/1946:

[...]odireitodegreveéumdosdireitosfundamentaisdohomemeporissonãopodeadmitir limitaçõesquenapráticapossam torná-lo insubsistente.Não se pode admitir as restrições do Projeto pois levariam fatalmente àeliminaçãododireitodegreve.Porquecondicionarêssedireitoàs“limitaçõesimpostaspelobempúblico”Qualojuizdessaslimitações?Apolícia,oMinistrodoTrabalho,odaJustiça,oPresidentedaRepública?

Justamente baseado em conceitos semelhantes existe hoje a lei queregulamentaodireitodegreveequenadamaisésenãoapróprianegaçãodêssedireito.Obempúblicoé constituídopelas liberdades indispensáveisaohomemnasualutapeloprogressoepelobemestarsocial,entreelas,agreve.Esealgumarestriçãoaobempúblicopodeexistiremassuntocomoêsse,deve serode limitaçõesaosabusosque cometemosempregadoresnegando-seaatenderjustasehumanasreivindicaçõesdosquelhesfazemafortuna.47

Apósalgumasdiscussões,odireitodegrevefoiconsolidadonaConstituiçãode

1946emdoisartigos:

Art158-Éreconhecidoodireitodegreve,cujoexercícioaleiregulará.(ADCT) Art 28 - É concedida anistia a todos os cidadãos consideradosinsubmissos ou desertores até a data da promulgação deste Ato eigualmente aos trabalhadores que tenham sofrido penas disciplinares, emconseqüênciadegrevesoudissídiosdotrabalho.

45BRASIL. Anais da Assembleia Nacional Constituinte de 1946. Rio de Janeiro, 1946, p. 129. v. XVI.Disponívelem:<http/imagem.camara.gov.br/publicações>.Acessoem:12dez.2017.46BRASIL. Anais da Assembleia Nacional Constituinte de 1946. Rio de Janeiro, 1946, p. 448. v. XIII.Disponívelem:<http/imagem.camara.gov.br/publicações>.Acessoem:12dez.2017.47BRASIL.AnaisdaAssembleiaNacionalConstituintede1946.RiodeJaneiro,1946,p.72.v.XVI.Disponívelem:<http/imagem.camara.gov.br/publicações>.Acessoem:12dez.2017.

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A Constituição reconhecia um direito que já existia, o direito de greve, da

mesmaformaqueanistiavaosgrevistasquehaviamsofridopuniçõesdisciplinaresatéa

datadapromulgaçãodaConstituição,em18desetembrode1946.

Após a promulgação, uma série de discussões sobre o direito de greve

acontecemnopaís,ereduzi-lasapoucaslinhasédefatoignoraracomplexahistóriada

grevenoBrasil.Osquestionamentose interpretaçõesdaConstituiçãoeda leiestavam

nadoutrinaenopróprioSTF,comodemonstroaseguir.

Para citar apenas algumas questões legais, destaco o decreto legislativo n.º

18/1961, que concede anistia aos condenados por motivo de greve, e uma série de

normativasfederaisquediscutiramodireitodegreveentre1946e1964.48

Adoutrinatambémmuitodiscutiaotema:NogueiradeSá,49EmilioGuimarães,50

Pontes de Miranda, 51 Paulo Garcia, 52 Paulino Jacques,53 Themistocles Cavalcanti 54 e

CarlosMaximiliano55escrevem sobre o direito de greve. Assim, a greve era um tema

cujacomplexidadeeraconstantementedebatidanadoutrinanacional.

No finaldosanos1950eno iníciodosanos1960, foramdiversasasvezesem

queoSTFdeliberou sobreodireitodegreve. Em10de setembrode1959,discutiua

greve ilegal como faltagrave56;em14deagostode1961,adispensaporparticipação

em greve57; em 26 de novembro de 1961, os pagamentos da greve legal.58Destaco

também uma decisão de 8 de junho de 1960, na qual o STF julgou o recurso

48BRASIL.SenadoFederal.DecretoLegislativon.º18,de15dedezembrode1961.DiárioOficialdaUnião,Brasília, DF, 18 dez. 1961. Seção 1, p. 11.117. Disponível em:<http://legis.senado.leg.br/legislacao/PublicacaoSigen.action?id=535604&tipoDocumento=DLG&tipoTexto=PUB>.Acessoem:17dez.2017;BRASIL.SenadoFederal.DecretoLegislativon.º7,de20dejulhode1961.Diário Oficial da União, Brasília, DF, 22 jul. 1961. Seção 1, p. 6.642. Disponível em:<http://www2.camara.leg.br/legin/fed/decret/1960-1969/decreto-51009-22-julho-1961-390635-publicacaooriginal-1-pe.html>. Acesso em: 17 dez. 2017. Existiam legislações municipais sobre a grevetambém–porexemplo,aLein.º661,de1ºdesetembrode1958,dacidadedeJundiaí,criavaumauxílioaos grevistas demitidos. Disponível em:<http://sapl.jundiai.sp.leg.br/sapl_documentos/norma_juridica/653_texto_integral.pdf>. Acesso em: 17dez.2017.49NOGUEIRADESÁ,A.Docontroleadministrativosobreasautarquias.SãoPaulo:Leia,1962.50GUIMARÃES,Emilio.Dicionáriojurídico-trabalhista.RiodeJaneiro:FreitasBastos,1951.51PONTES DE MIRANDA, Francisco Cavalcanti. Comentários à Constituição de 1946. São Paulo: MaxLimonad,1953.v.V.ValeapenafrisarquePontesdeMirandaéoúnicoautorquenãoreconheceodireitodegreveemnenhummomentonahistóriadoBrasilantesde1946(pp.86-87).52GARCIA,Paulo.Direitodegreve.RiodeJaneiro:EdiçõesTrabalhistas,1961.53JACQUES,Paulino.AConstituiçãoFederalexplicada.RiodeJaneiro:Forense,1958.54CAVALCANTI, Themistocles Brandão.A Constituição Federal Comentada. Rio de Janeiro: José KonfinoEditor,1949.v.IV.55MAXIMILIANO,Carlos.ComentáriosàConstituiçãobrasileira.RiodeJaneiro:FreitasBastos,1948.v.III.56BRASIL.SupremoTribunalFederal.Recursoextraordinárion.º42.916-SP.Relator:CândidoMotaFilho.57BRASIL.SupremoTribunalFederal.Recursoextraordinárion.º32.269-GB.Relator:CândidoMotaFilho.58BRASIL.SupremoTribunalFederal.Agravodeinstrumenton.º25.93-PE.Relator:AryFranco.

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extraordinário n.º 44.334-SP. O reclamante foi demitido da fábrica de produtos

alimentíciosVigorporparticipar“porumdiadegrevepacífica”.OSTFrepetiuateseque

eradefendidapeloTribunalSuperiordoTrabalho(TST)naépoca:

A simples participação em greve ilícita, qual seja a que se verificou ematividadefundamentalconstituifaltagrave.[...]AempresadistribuileitenaCapital do Estado, isto é, desempenha serviço substancial e inadiável, aexigir amáximapontualidadedos seusauxiliares.O reclamantenãopodiaignorar que o seu não comparecimento, por um impulso de solidariedadeaos companheiros, mas em detrimento das multidões necessitadas, tinhacaráter excessivamente grave. Para esse não podia mesmo haverindulgência.59

Veja-sequeas restriçõesdodecreto-lei9.070/1946–umdecretopromulgado

sem a participação do Congresso Nacional e ainda sob a vigência da Constituição da

ditaduradoEstadoNovo–eaaceitaçãodaconstitucionalizaçãodessa leipeloSTF,de

certaforma,parecemterinviabilizadoodireitodegreveconstitucionalizadoem1946.A

interpretaçãoerepristinaçãodaleilevadaacabopeloSTF,diferentementedosdebates

parlamentares–quereconheceramodireitonaConstituição–,tornaramoexercíciodo

direitopraticamenteilegal.

Sublinho tambémumadecisãodoplenodo STF em1961naqual o Tribunal

reconhece o direito de greve previsto na Constituição, mas também aceita como

constitucionalodecretoquepraticamenteinviabilizaagrevelegal:

A greve é umdireito, reconhecido e proclamado pela Constituição. Ele secaracteriza pela cessação coletiva do trabalho, em frente aodesentendimentoentrepatrõeseoperarios.Porém,êssedireitoadvemdeum estado de necessidade, explicável na fase atual do direito social. Nãohavendooutromeio,elasejustifica.Nãosetratadotemasoberanodagreverevolucionária.Maspelagrevepelajustiçaqueosmeioscomunsnãopodemproporcionar.Ora,oEstadodeDireitoqueprocurasolucionartodososconflitos,noplanojurídico, procura oferecer os meios e remédios para que a solução nãochegueaoremédioextremo.NoBrasil,oremédioéaJustiçadoTrabalho.EfoiporissoqueaConstituiçãoproclamouqueaordemeconomicadeveserorganizadaconformeosprincípiosdeJustiçasocial,conciliandoaliberdadedeiniciativacomavalorizaçãodotrabalhohumano,oqueseconsubstancianaunidadeorgânicadodireitodotrabalho.Scella,emseu famoso livrosôbre“Legislação Industrial”pg.287,mostraaposiçãodo juiznesteproblemaparaobtera fórmulade justiça social,queestánodireitobrasileiro.SeaConstituiçãobrasileiraart.158,consagraodireitodegreve,deacordocom o que se proclamou na Conferencia de Chapultepec em 1945, essedireito resulta portanto da falha de todos os outros remédios antes

59BRASIL.SupremoTribunalFederal.Recursoextraordinárion.º44.334-SP.Relator:VilasBoas.

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oferecidospelaconstituiçãoque,oferecendoospreceitosqueabastecemadefesasocialdotrabalhador,estabelece,noart.123quecompeteaJustiçado Trabalho conciliar e julgar os dissídios individuais e coletivos, entreempregados e empregadores e as demais controvérsias oriundas dasrelaçõesdetrabalho,regidasporlegislaçãoespecial.Portanto, a regra é a justiça, o prestigio da mesma, a garantia que elaoferece,comosdadosqueajustiçasocialproporciona.Agreveéaexceção,oúltimolance,oreconhecimentoderradeirodequeaJustiçanãoconseguiuefetuaroseuimpério.Ecomoéagreveumasituaçãodefato,umatojustificado,aleideve,comoproclamaaConstituição,regularoseuexercício.O decreto lei 9.070 de 1946 que disciplina o direito de greve, art. 10,prestigia, emprimeiramãoadecisãoda Justiça. Seooperário a elanãoconfia que vai a greve, ele proclama a invalidade a priori da Justiçatrabalhista,avirtudedosmeiossuasórios.Assim,odecreto9.070estádeacordocomaslinhasconstitucionais.Bemsabemosqueagreveenvolveostímidos,sacrificaos inocentesedámotivo a reação excessiva dos patrões. Deve-se portanto aspirar umamelhoria legislativa nesse sentido. Porém, não é possível, no plano dateoria e de praticar o direito, deixar de aplicar o decreto 9.070 (grifosmeus).60

VoltandoaovotodoministroDiasToffoli,valedestacaroseguintetrecho:

Noentanto,somenteem1964,apósogolpemilitar61,odireitodegrevefoiregulamentado,comaediçãodaLein.4.330,denominada“LeidaGreve”,que,apesardepreverpossibilidadedegrevesnasatividadesnormais,maisrestringia do que possibilitava a paralisação (UCHÔA.Marcelo Ribeiro. op.cit.,p.251).62

Observa-se, pela discussão acima, como o decreto-lei n.º 9.070/1946 foi

utilizado comoo regulamentododireito de greve até 1946.OCongressoNacional, já

sobintervençãodogovernomilitar,aprovaalein.º4.330,de1ºdejunhode1964.Não

édesurpreenderque,doismesesdepoisdogolpemilitar,umaleirestringindoodireito

de greve fosse publicada. O presidente Humberto Castelo Branco, Arnaldo Süssekind,

entãoministro do Trabalho e Previdência Social, eMilton Campos, entãoministro da

Justiça,assinamaleimencionada.

A lei proibia a greve dos servidores públicos nos serviços fundamentais e60BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso extraordinário n.º 32.269-GB. Relator: ministro CândidoMottaFilho.61Em 2018, proferindo conferência sobre os trinta anos da Constituição de 1988, oministro Dias Toffolimudouoseudiscursoemrelaçãoaogolpemilitar:“Hoje,nãomerefironemmaisagolpenemarevolução.Me refiroamovimentode1964.”Disponível em:<https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/10/toffoli-diz-que-hoje-prefere-chamar-ditadura-militar-de-movimento-de-1964.shtml>.Acessoem:11dez.2018.62 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso extraordinário n.º 693.456 Rio de Janeiro. Recorrente:Fundação de Apoio à Escola Técnica (FAETEC). Recorridos: Renato Barroso Bernabe e outros. Relator:ministro Dias Toffoli. p. 5. Disponível em:<http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/RE693456.pdf>.Acessoem:17dez.2017.

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estabelecia uma série de procedimentos burocráticos para o exercício legal da greve.

Mas também trazia as “garantias dos grevistas”, como “proibição de despedida de

empregadoquetenhaparticipadopacificamentedemovimentosgrevistas”,aimposição

de penalidade por “participação pacífica” e a “proibição, ao empregador, de admitir

empregadosemsubstituiçãoaosgrevistas”.63

Aquestãoquese impunhaeraacircunstânciadagreve legal.Seagreve fosse

consideradalegal,oempregadopossuíaumasériededireitosegarantias.Adificuldade

eraconseguiradeclaraçãodegrevelegal.Agreveilegal,segundooartigo22dalei,era

aquela que não “atendia os prazos e condições” estabelecidas por ela, que tivesse as

“reivindicaçõesjulgadasimprocedentespelaJustiçadoTrabalho”,quefosse“deflagrada

pormotivos políticos, partidários, religiosos, sociais, de apoio ou solidariedade” e que

tivessepor fim “alterar condições constantedeacordo sindical, convenção coletivade

trabalhooudecisãonormativadaJustiçadoTrabalhoemvigor”.Ademais,aleitambém

trazia novos tipos penais “contra a organização do trabalho” e proibia a restrição ao

exercício“legítimodagreve”.Nessesentido,aditaduraburocratizouodireitodegreve.

Nélio Reis64é um dos autores que, após o golpe militar de 1964, discutia o

direitodegrevenoBrasilecomentavaalein.º4.330/1964.Veja-sequeadiscussãoda

greve,mesmonaDitaduraMilitar, continuavaa serdebatidanadoutrina.Osconflitos

entre trabalhadores e empresas não deixaram de ser estudados mesmo durante o

regime, comodemonstramos trabalhos de LeôncioMartins Rodrigues65e José Álvaro

Moisés.66

ContinuandonoPeríodoMilitar,ovotodispõe:

A Constituição Federal de 1967 assegurou o direito de greve dostrabalhadoresdo setorprivadoemseuart.158, incisoXXI, vedando-oaosservidorespúblicos,conformeoart.157,§7o:“[n]ãoserápermitidagrevenos serviços públicos e atividades essenciais, definidas em lei”. A EmendaConstitucional no 1/69 restringiu-se a repetir a disposição constitucionalanterior.67

63 BRASIL. Lei n.º 4.330, de 1º de junho de 1964. Lei de Greve (1964). Disponível em:<http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1960-1969/lei-4330-1-junho-1964-376623-publicacaooriginal-1-pl.html>.Acessoem:17dez.2017.64REIS,Nélio.Problemassociológicosdotrabalho.RiodeJaneiro:FreitasBastos,1964.65RODRIGUES,Leóncio.Conflito industrial e sindicalismonoBrasil.SãoPaulo:DifusãoEuropeiadoLivro,1966.66MOISÉS,JoséAlvaro.Grevedemassaecrisepolítica:estudodaGrevedos300milemSãoPaulo–1953-54.RiodeJaneiro:Polis,1978.67PauloEmíliodeVilhenafazumainteressantediscussãosobreostermos“essencial”e“fundamental”nosdecretos e leis que regulam a greve. VILHENA, Paulo Emílio Ribeiro de. “Greve e atividade essencial

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AConstituiçãode1967foi impostapeloAto Institucionaln.º4.CasteloBranco

convocouoCongressoNacionalparasereunir,extraordinariamente,de12dedezembro

de1966a24dejaneirode1967,paradiscussão,votaçãoepromulgaçãodoprojetode

Constituiçãoapresentadoporele.68

OprocessodeelaboraçãodaConstituiçãofoisingular:opresidentedoSenado

Federaldeverianomearumacomissãomista (dedeputadose senadores),que,em72

horas, deveria emitir parecer sobre o projeto de Constituição. Apenas 72 horas. Esse

parecer seria votado em quatro dias pelo CongressoNacional e, após sua aprovação,

deveriavoltaràcomissão.Asemendasseriamapresentadasàcomissãoesubmetidasa

umparecerdestaantesdavotaçãopeloplenáriodoCongresso.

Os crimes “decorrentes de greve” passaram para a competência da Justiça

Federal, e a greve foi proibida nos serviços públicos e nas atividades essenciais.

Teoricamente,erapossível imaginarumagreve legalemalgunsserviçosprivados,não

essenciais.Masécertoquealein.º4.330eaConstituiçãode1967tornaramimprovável

aexistênciadegrevelegaisduranteaDitaduraMilitar.

Outras restrições ao direito de greve, já bem restrito, seriam incluídas nesse

período.Em26defevereirode1969,odecreto-lein.º477,outorgadoporCostaeSilva,

em conjunto com Luís Antônio daGama e Silva e Tarso Dutra, descrevia as infrações

disciplinares praticadas por professores, alunos, funcionários e empregados de

estabelecimentodeensinopúblicoeparticulares.Aprimeirainfração,descritanoinciso

I,doartigo1º,eraoaliciamento,participaçãoouincitaçãoàmovimentodeparalisação

de atividade escolar e punia praticante com demissão ou desligamento no caso de

estudantes.Jáalein.º6.185,de11dedezembrode1974,dispunhasobreosservidores

públicos civis da Administração Federal e a contratação de servidores sem direito de

greveesemdireitodesindicalização.

1.5Ofinaldadécadade1970eoiníciodofimdaDitaduraMilitar

ContinuaovotodoMinistroDiasToffoli:

(evoluçãoconceitual)”.RevistadeInformaçãoLegislativa,Brasília,DF,ano19,n.73,pp.203-212,jan./mar.1982.68 BRASIL. Ato Institucional n.º 4, de 7 de dezembro de 1966. Disponível em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/AIT/ait-04-66.htm>.Acessoem:17dez.2017.

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ODecreto-Leinº1.632/78eaLeinº6.620/78 (LeideSegurançaNacional)também proibiram a greve nos serviços públicos essenciais. A partir de1979, eclodirammovimentos grevistas. Como tempo, após amplo debatena sociedade, diante de um vetusto confronto entre capital e trabalho,houveumreconhecimentoformalnosentidodequeagreveconsistiriaemforma legítima de manifestação dos interesses sociais da classetrabalhadora.69

Odecreto-lein.º1.632/1978ealein.º6.620/1978tornaraminviáveis,comoas

normativasanterioresàDitadura,agrevenosserviçospúblicoseatividadesessenciais.

Erapraticamenteimpossívelencontrarumaatividadeemquefossepossívelfazergreve,

tamanhaarestriçãolegal.Aqui,destacoocrimede“Impediroudificultarfuncionamento

de serviços essências, administrados pelo Estado ou executados mediante concessão,

autorizaçãooupermissão”,cujapena,previstanoartigo27dalein.º6.620/1978,erade

reclusãode2a12anos.Sim,apenaporpraticar“greve”poderiachegara12anosna

DitaduraMilitar,pena igual àde sequestro, rouboou terrorismo,previstosnamesma

lei.

Posso sinalizar que, antes de 1979, váriosmovimentos grevistas eclodiram no

Brasil.FizumapesquisanositedaHemerotecaDigitaldaBibliotecaNacionalnodia22

de outubro de 2017, procurando a palavra “greve” entre 1960 e 1979. Foram

encontradas quase 15 mil registros nos jornais que circulavam no Brasil no período.

Eram noticiadas greves que aconteciam no Brasil e fora do país, e eram publicados

artigosdeopiniãosobreotema.OCorreiodaManhã,porexemplo,entre1960e1969,

utilizou a palavra “greve” 9.554 vezes; já o Jornal do Brasil teve 9.161 registros.70

Percebe-seque,antesde1979,onúmerodegrevesenotíciassobreasgrevesfoimuito

alto.

Por sua vez, as referências bibliográficas atuais (Ricardo Antunes e Marcelo

Ridente71discutemasgrevesoperáriasemSãoPauloeMinasGeraisem1968e1969,da

mesma forma queMarco Aurélio Santana72eMarta Gouveia de Oliveira Rovai73), e a

69BRASIL.SupremoTribunalFederal,op.cit.,p.5.70Apenasparainformação,entre1960e1969secitoumaisotermo“greve”queentre1940e1949eentre1950e1959.Nosanos1960,odebatesobregreve,mesmonaDitadura,nãodeixoudeexistir.71ANTUNES,Ricardo;RIDENTI,Marcelo.“Operárioseestudantescontraaditadura:1968noBrasil”.RevistaMediações,Londrina,v.12,n.2,pp.78-89,jul./dez.2007.72SANTANA, Marco Aurélio. “DitaduraMilitar e resistência operária: o movimento sindical brasileiro dogolpeàtransiçãodemocrática”.Política&Sociedade,Florianópolis,v.7,n.13,pp.279-309,out.2008.73ROVAI,MartaGouveiadeOliveira.“Amemórianalutacontraotrauma:significadosdagrevedeOsascoem 1968 nas narrativas de trabalhadores”.Mundos do Trabalho, Florianópolis, v. 6, n. 11, pp. 41-56,jan./jun.2014.

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quantidadedelegislaçãosobregreveproduzidapelaDitaduradeixaclaroquerestringir

essedireitosemprefoiumapreocupaçãocentraldosmilitares.

A lei n.º 6.833, de 28 de agosto de 1979, por exemplo, também anistiou os

grevistas,ficandoconhecidacomoLeidaAnistia:

Art.7ºÉconcedidaanistiaaosempregadosdasempresasprivadasque,pormotivo de participação em greve ou em quaisquer movimentosreivindicatóriosoudereclamaçãodedireitosregidospela legislaçãosocial,hajamsidodespedidosdotrabalho,oudestituídosdecargosadministrativosouderepresentaçãosindical.

Ouseja,sefoiprecisoanistiá-los,ficaclaroqueentre1961e1979osgrevistas

também foram perseguidos pela Ditadura. As notas taquigráficas do Congresso

Nacional,particularmenteentre1961e1968,deixamclarotambémcomoessesdebates

chegavam ao Parlamento. Especialmente entre 1967 e 1968, ocorrem centenas de

intervenções parlamentares discutindo o direito de greve. Mas, no final de 1968, o

Congressofoifechadopeloregimemilitar,ecentenasdepolíticostiveramseusdireitos

caçadospelaDitadura.

Nãoconsigoperceberqueoreconhecimentododireitodegreveveioapósum

“amplo debate na sociedade”, como escrito no voto, mas sim após um grande

movimento de resistência dos operários contra aDitadura. Talvez exista no Brasil um

debatecentenáriodostrabalhadorespelodireitodegreve.Poroutrolado,seodebate

foi a Constituinte, os funcionários públicos ainda não têm uma lei que a própria

Constituiçãopedepararegulamentar.

Ao que parece, o amplo debate sobre o direito de greve, já reconhecido em

vários momentos da história brasileira, deve acontecer novamente, mas com uma

consciênciahistóricaesociológicadasventurasedesventurasqueodireitodegrevejá

sofreunoBrasil.Seumadasprimeirasaçõesdeumaditadura–comomostraanossa

história – é limitar ou criminalizar a greve, precisamos estar cientes de que tipo de

discussãoeprojetosdesejamosparaopaísedaspráticasqueoJudiciárioeosautores

deDireitotomamemrelaçãoaodireitodegreve.

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Conclusões

OqueémaisimportanteparadiscutirmosodireitodegrevenoBrasil:adecisãodoSTF

em1922,asdecisõesdosanos1950e1960ouagrevenoEgito?

AHistóriaéumargumentoimportanteparaoDireito.Olharasexperiênciasdo

passado nos ajuda a projetar horizontes para o futuro e a problematizar o presente.

Contudo, o uso da História deve ser rigoroso. Não se pode utilizá-la como simples

retóricaouerudição.AHistória temcritérios,métodosemetodologiasquedevemser

levadosemconta.Nessesentido,acreditoqueasdecisõesdeumtribunaldevemfazer

uso da história de forma criteriosa ou simplesmente não fazê-lo. Omissões

descontextualizamaHistóriadoDireito,e,considerandoqueodireitosóexistedentro

de uma sociedade, com suas vivências, experiências e preconceitos, não podemos

estudá-lodeformaisoladaesemmétodosrigorososecríticos.

Dessa forma, outras questões se impõem: qual é a qualidade dos votos dos

ministrosdoSTFquandofalamosdeHistóriadoDireito?Oqueelescitam?Ocasoem

questão nos ajuda a pensar na relação entre o histórico dos votos e o resultado da

decisão.QuandooministrocitaoEgito,fazumsaltoparaaFrança,nãocontextualizao

direitodegrevenaPrimeiraRepública,omiteaDitaduraVargasbemcomoasdiversas

discussõessobreodireitodegrevenasdécadasde1940,1950e1960e,aofinal,pouco

citaalutadostrabalhadorespelodireito,suadecisãoprecisaserproblematizada.

Ao que parece, o histórico foi usado como um argumento para legitimar a

limitação do direito de greve, omitindo os momentos e as decisões em que o STF

defendeu o direito e greve e omitindo que as principais restrições foram típicas de

regimesautoritários.Ou seja,dá-sea impressãodequeodireitodegreve sempre foi

limitado,cabendoaoSTFatual,damesmaforma,limitá-loumavezmais,“poissempre

foi assim”. Ocorre que uma história mais crítica e complexa do direito de greve

demonstrariauma“outrahistória”,naqualodireitodegrevefoireconhecidodiversas

vezes e restringido apenas nosmomentos de ditadura e autoritarismo. Demonstraria

uma históriamais complexa, com idas e vindas, tropeços, discussões emudanças de

sentido.Nessestermos,umahistóriacurta,comsaltosepoucocomplexa,comoafeita

norecursoextraordinárion.º693.456,nãocontribuiparaoentendimentodagreveno

Brasil.

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Senasditaduras,porexemplo,asgrevessãocriminalizadas,qualquerproblema

delimitaçãodagreveemuma“democracia”deveserpensandocriticamente.OSTF,em

2016,atuoucomolegisladorpositivoaorestringirodireitodegreve,inclusivedeforma

mais restritiva que em 1922. Considerando que as duas ditaduras brasileiras

restringiramodireitodegreveatravésde leisdesegurançanacional, criminalizarama

greveeposteriormenteassistiramaosgrevistas seremanistiados,épossível consignar

emquaiscontextosepercepçõesosdireitosdostrabalhadoressãolimitados.

Oobjetivodoartigo,nessesentido,foidemonstrarqueohistóricodovototem

umacoerênciacomadecisãoqueaCortepretendiatomar,enãoumacoerênciacomos

fatoshistóricoseaspesquisassobreodireitodegrevenoBrasil.Evidentemente,uma

análise mais cautelosa sobre o tema, com o devido cuidado metodológico, oferece

substratos sólidos que contradizem os fundamentos da decisão. Nessa direção,

sustendo a necessidade de se construir uma História do Direito feita com técnicas,

critérios,metodologiasemétodoshistóricos,enãocomosimplesargumento.

Um voto não precisa ter um histórico, mas, caso o tenha, este deve ser

construído com as técnicas e metodologias da História. Não como beleza, não como

retórica,mascomoumaparte importantedahistóriadopaís.Nãoprecisaterhistória,

masprecisa“tercharmeparadançarbonito”.

Referênciasbibliográficas

ANTUNES,Ricardo;RIDENTI,Marcelo.“OperárioseestudantescontraaDitadura:1968noBrasil”.RevistaMediações,Londrina,v.12,n.2,pp.78-89,jul./dez.2007.ARÊAS, Luciana Barbosa. Consentimento e resistência: um estudo sobre as relaçõesentre trabalhadores e estado no Rio de Janeiro (1930-1945). 2000. Tese (doutorado).Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Estadual de Campinas.Campinas,2000.BIAVASCHI,MagdaBarros.OdireitodotrabalhonoBrasil–1930/1942:aconstruçãodossujeitos de direitos trabalhistas. Tese (doutorado). Instituto de Filosofia e CiênciasHumanasdaUniversidadeEstadualdeCampinas.Campinas,2007.BRASIL.AnaisdaAssembleiaNacionalConstituintede1946.RiodeJaneiro,1946.v.XVI.Disponívelem:<http/imagem.camara.gov.br/publicações>.Acessoem:12dez.2017.

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SobreoautorGustavoS.SiqueiraProfessor Associado de História do Direito da Universidade do Estado do Rio deJaneiro(UERJ).E-mail:[email protected]:https://orcid.org/0000-0003-1968-5639Oautoréoúnicoresponsávelpelaredaçãodoartigo.