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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE ARQUITETURA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO LUIZ FERNANDO MACARRÃO O PARQUE PÚBLICO NA CIDADE DE SÃO PAULO 1989-2008 Salvador 2009

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE ARQUITETURA

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ARQUITETURA E URBANISMO

LUIZ FERNANDO MACARRÃO

O PARQUE PÚBLICO NA CIDADE DE SÃO PAULO 1989-2008

Salvador 2009

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LUIZ FERNANDO MACARRÃO

O PARQUE PÚBLICO NA CIDADE DE SÃO PAULO 1989 – 2008

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal da Bahia, como requisito parcial para a obtenção do grau de Mestre em Arquitetura e Urbanismo, na área de concentração de Urbanismo. Orientadora: Profª. Drª. Ana Fernandes

Salvador

2009

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Macarrão, Luiz Fernando.

M115 O parque público na cidade de São Paulo: 1989 – 2008./Luiz Fernando

Macarrão. – Salvador: L.F. Macarrão, 2009.

206 f. : il.

Orientadora: Profª Drª Ana Fernandes.

Mestrado (dissertação) – Universidade Federal da Bahia. Programa de Pós-

Graduação em Arquitetura e Urbanismo da Faculdade de Arquitetura, 2009.

1. Parques urbanos – São Paulo, SP. 2. Política urbana. 3. Política

ambiental. 4. Planejamento urbano – São Paulo, SP – Legislação. I. Título.

CDU: 712(815.6)

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TERMO DE APROVAÇÃO

LUIZ FERNANDO MACARRÃO

O PARQUE PÚBLICO NA CIDADE DE SÃO PAULO

1989 – 2008

Dissertação aprovada como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Arquitetura

e Urbanismo, Universidade Federal da Bahia, pela seguinte banca examinadora:

______________________________________ Profª. Drª. Ana Fernandes (UFBA) ______________________________________ Prof. Dr. Antonio Heliodorio Lima Sampaio (UFBA) ______________________________________ Prof. Dr. Nabil Georges Bonduki (USP)

Salvador, 07 de agosto de 2009.

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À Neusa.

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AGRADECIMENTOS

Meus mais sinceros agradecimentos a todos os que contribuíram, de alguma forma, para a

realização desta dissertação na UFBA.

À Profª. Ana Fernandes, minha orientadora, pelo acompanhamento preciso e rigoroso na

produção deste trabalho.

Ao Profº. Heliodorio Sampaio, pelas aulas, debates e contribuições nas qualificações.

Ao Profº Nabil Bonduki, cujo importante trabalho me serve de exemplo, pelas críticas nas

qualificações.

Ao Programa de Pós-Graduação em Arquitetura e Urbanismo (PPGAU-UFBA) e à

Silvandira, secretária do Programa, pela atenção e amizade.

Aos meus amigos de Salvador e de São Paulo que, cada um de sua maneira e em momentos

distintos, deram força e contribuíram com sugestões e debates para o desenvolvimento deste

trabalho.

Aos colegas da Secretaria do Verde e do Meio Ambiente (SVMA), da Prefeitura de São

Paulo, que colaboraram e dedicaram preciosos momentos de discussão, especialmente, Célia

Kawai, Lígia Elena, Márcia Nazar e Regina Fátima.

Aos funcionários das bibliotecas das Secretarias Municipais de São Paulo, da UFBA, da

PUC-SP e da FAU-USP.

Às amigas Ana Carolina Bierrenbach e Yolanda Pamplona.

Aos meus familiares pelo apoio e compreensão, em especial, ao meu pai pelo seu exemplo de

vida e que deixa saudade.

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RESUMO Este trabalho apresenta e analisa as ações de implantação de parques públicos na cidade de São Paulo, no período de 1989 a 2008, inseridas no âmbito dos estudos da política urbana municipal. O parque público é, na atualidade, um elemento típico da grande cidade e está em constante processo de recodificação. Historicamente, é criado com funções ligadas à higiene urbana, à ordem estética, ao lazer e recreação pública. Ao longo das últimas décadas, novas funções são introduzidas no conceito de parque, que passa a atender a ampla diversidade de novas solicitações de lazer, tanto esportivas como culturais. Incorpora ainda a conservação e preservação de recursos naturais associados à qualidade do meio ambiente urbano. A análise se dá a partir de 1989, por considerar marco para a gestão das cidades a promulgação da Constituição Federal de 1988, que introduz o capítulo de política urbana como elemento norteador da ação do Estado no processo de desenvolvimento urbano e enfatiza a competência municipal, nas ações relativas às matérias urbanística e ambiental. Há de se considerar, ainda, que a Constituição de 1988 consagra o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado como um direito social de todos, num contexto de politização da questão ambiental e de sua maior articulação com a política urbana. A regulamentação do capítulo de política urbana com a aprovação do Estatuto da Cidade em 2001, num processo de construção política, coloca à disposição dos municípios um conjunto de instrumentos que propicia novos caminhos de intervenção e gestão das cidades. A partir do cenário nacional, é analisada a política urbana estabelecida para a cidade de São Paulo ao longo do período. Desta forma, no estudo das ações de implantação de parques públicos, são considerados os programas de governo, os planos de desenvolvimento e estruturação urbana, a legislação e instrumentos urbanísticos, os recursos financeiros entre outros elementos constitutivos da política urbano-ambiental, para cada uma das gestões administrativas da cidade de São Paulo do período 1989-2008. Assim, com a análise das ações de implantação de parques públicos na cidade de São Paulo, procura-se identificar a tendência dessas ações no tempo e sua(s) lógica(s) em relação à política urbano-ambiental. Palavras-chave: Parque Público; Política Urbana; Política Ambiental; Estatuto da Cidade; Instrumentos Urbanísticos.

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ABSTRACT

This work aims at analyzing the actions for the implantation of public parks in the city of São Paulo in the period from 1989 to 2008, based on the studies about urban policy. A public park is, recently, a relevant element in big cities and it is in a constant process of recodification. Historically, it was created to provide esthetic order, urban hygiene and areas for the leisure and recreation of the population. But, in the last decades, new functions were included in the concept of public park. It is also expected to enhance the population’s life by offering programs and services that encourage recreational activities, leisure services and cultural experiences. All these new possibilities for the public park also include the importance of preservation and conservation of natural resources permeated by the concept of a better quality for the urban environment. This work focuses on the period after 1989, considering the 1988 Federal Constitution a landmark for the management of the city that introduces the chapter of urban policy as the element that conducts the governmental action to the process of urban development and emphasizes the responsibilities of the municipal government to urban and environmental interests. It must be taken into consideration that the 1988 Constitution defends the right to an ecological well-balanced environment as a social right to the population, so the environmental issues are seen in the light of a political view and as attempts to articulate this subject to urban policy. The urban uses regulation policy, based on the 2001 Statute of the City, in a process of political construction, provides the municipalities with tools to open new possibilities of governance. Based on this national scenery, this work analyses the urban policy approved to the city of São Paulo. So that, in the study of actions to implement public parks, governmental programs, urban structure planning, urban instruments and laws, financial resources, among other constitutive elements of the urban-environment policy must be taken into consideration by each administration of the city of São Paulo from 1989 to 2008. So that, the analysis of the actions to implement public parks in the city of São Paulo is an attempt to identify the tendencies of these actions in time and their logic relation to the urban environmental policy. Key words: public parks; urban policy; environmental policy; Statute of the City, urban instruments.

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1: Macrozoneamento do PDE-2002 de São Paulo. 83

Figura 2: Macroáreas do PDE-2002 de São Paulo. 84

Figura 3: Parques públicos e parques lineares previstos no PDE-2002 de São Paulo. 90

Figura 4: Áreas sujeitas à incidência do Direito Preempção constantes PDE-2002/SP. 93

Figura 5: Mapa do município de São Paulo inserido na Região Metropolitana. 112

Figura 6: Áreas de vegetação nativa por distrito, em São Paulo. 115

Figura 7: Avenida Paulista em 1902. 116

Figura 8: Parque da Aclimação em 2008. 119

Figura 9: Parque Ibirapuera em 2008. 120

Figura 10: Domingo no Parque Ibirapuera em 2008. 125

Figura 11: Parques públicos e lineares existentes em São Paulo até 2008. 183

Figura 12: Origem das áreas dos parques implantados no período 1989-2008. 185

Figura 13: Evolução das despesas realizadas pela PMSP, segundo Balanços Orçamentários,

entre 1989-2008. 186

Figura 14: Evolução das despesas realizadas pela PMSP com Depave-Parques entre 1989 -

2008. 187

Figura 15: Percentual das despesas realizadas pela PMSP com Depave-Parques entre 1989-

2008. 187

Figura 16: Origem dos recursos empregados na implantação de parques públicos em São

Paulo, no período 1989-2008. 188

Figura 17: Parques públicos e lineares implantados em São Paulo entre 1989 e 2008, sobre as

macroáreas. 190

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LISTA DE QUADROS

Quadro 1: Programa de parques públicos previsto no PDE-2002 para 2006 e 2012. 88

Quadro 2: Parques lineares previstos no PDE-2002 para 2006 e 2012. 89

Quadro 3: Parques públicos propostos nos PREs de São Paulo para 2006. 101

Quadro 4: Parques públicos propostos nos PREs de São Paulo para 2012. 102

Quadro 5: Parques lineares propostos nos PREs de São Paulo para 2006. 102

Quadro 6: Parques lineares propostos nos PREs de São Paulo para 2012. 104

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LISTA DE TABELAS

Tabela 1: Parques públicos municipais implantados em São Paulo até 1988. 124

Tabela 2: Origem das áreas dos 21 parques públicos implantados em São Paulo até 1988. 125

Tabela 3: Prefeitos de São Paulo entre 1989 e 2008. 127

Tabela 4: Parques públicos implantados em São Paulo entre 1989 e 2008. 127

Tabela 5: Parques lineares implantados em São Paulo até 2008. 128

Tabela 6: Execução Orçamentária a partir dos Balanços da PMSP – 1989-1992. 133

Tabela 7: Orçamento e execução orçamentária relativos à implantação de parques públicos

em São Paulo, entre 1989-1992. 134

Tabela 8: Parques públicos implantados em São Paulo entre 1989 e 1992. 138

Tabela 9: Execução Orçamentária a partir dos Balanços da PMSP – 1993-1996. 142

Tabela 10: Orçamento e execução orçamentária relativos à implantação de parques públicos

em São Paulo, entre 1993 e 1996. 144

Tabela 11: Parques públicos implantados em São Paulo entre 1993 e 1996. 145

Tabela 12: Execução Orçamentária a partir dos Balanços da PMSP – 1997-2000. 150

Tabela 13: Orçamento e execução orçamentária relativos à implantação de parques públicos

em São Paulo, entre 1997-2000. 151

Tabela 14: Execução Orçamentária a partir dos Balanços da PMSP – 2001-2004. 158

Tabela 15: Orçamento e execução orçamentária relativos à implantação de parques públicos

em São Paulo, entre 2001-2004. 159

Tabela 16: Parque público implantado em São Paulo entre 2001 e 2004. 160

Tabela 17: Parques públicos em implantação em São Paulo, em dezembro de 2004. 161

Tabela 18: Execução Orçamentária a partir dos Balanços da PMSP – 2005-2008. 165

Tabela 19: Orçamento e execução orçamentária relativos à implantação de parques públicos

em São Paulo, entre 2005-2008. 166

Tabela 20: Participação do FEMA e do Fundurb/SVMA nas despesas municipais de SP. 167

Tabela 21: Participação dos recursos orçamentários previstos para a SVMA em relação ao

orçamento da PMSP (em %), no período 2005 e 2008. 167

Tabela 22: Parques públicos implantados em São Paulo entre 2005 e 2008. 173

Tabela 23: Parques públicos em implantação em São Paulo, em dezembro de 2008. 175

Tabela 24: Parques lineares implantados em São Paulo entre 2005 e 2008. 178

Tabela 25: Parques lineares em implantação em São Paulo, em dezembro de 2008. 179

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Tabela 26: Parques públicos implantados em São Paulo entre 1989 e 2008: dados

consolidados. 182

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LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

BID: Banco Interamericano de Desenvolvimento

BNDES: Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social

CADES: Conselho Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável

CDT/SVMA: Centro de Documentação Técnica da Secretaria do Verde e do Meio Ambiente

COPLAN: Coordenadoria de Planejamento Ambiental

Depave: Departamento de Parques e Áreas Verdes

EC: Estatuto da Cidade

ECO – 92: Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento

FEMA: Fundo Especial do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável

FHC: Fernando Henrique Cardoso – Presidente da República – 1995/2001

FMI: Fundo Monetário Internacional

Fundurb: Fundo de Desenvolvimento Urbano

GEGRAN: Grupo Executivo da Grande São Paulo

IPCA: Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo

IFI: Instituições Financeiras Internacionais

LDO: Lei de Diretrizes Orçamentárias

LOA: Lei Orçamentária Anual

LOM: Lei Orgânica Municipal

PD – 85: Plano Diretor de 1985

PD – 88: Plano Diretor de 1988

PD – 91: Projeto de Lei (Plano Diretor) 02/91

PDDI: Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado

PDE-2002: Plano Diretor Estratégico de São Paulo de 2002

PMDI: Plano Metropolitano de Desenvolvimento Integrado

PMSP: Prefeitura do Município de São Paulo

PPA: Plano Plurianual

PRE: Plano Regional Estratégico

PUB: Plano Urbanístico Básico

ONG: Organização Não Governamental

SAGMACS: Sociedade para Análise Gráfica e Mecanográfica Aplicada aos Complexos

Sociais

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Sempla: Secretaria Municipal de Planejamento

SERFHAU: Serviço Federal de Habitação e Urbanismo

SSO: Secretaria de Serviços e Obras

SVMA: Secretaria do Verde e do Meio Ambiente

TAC: Termo de Ajustamento de Conduta

TCA: Termo de Compensação Ambiental

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 15

1. AS POLÍTICAS URBANA E AMBIENTAL NO CONTEXTO NACIONAL 26

1.1 A POLÍTICA URBANA 26

1.1.1 A política urbana – uma revisão conceitual 26

1.1.2 A política urbana e os padrões de planejamento urbano 28

1.1.3 Questões contemporâneas da política urbana 37

1.1.3.1 O Estatuto da Cidade 43

1.1.3.2 O plano diretor e os demais instrumentos da política urbana 45

1.2 A POLÍTICA AMBIENTAL 51

1.2.1 Considerações sobre a temática ambiental 51

1.2.2 Marcos e características da política ambiental brasileira 53

1.2.3 Questões contemporâneas da política ambiental 57

1.3 CONFLUÊNCIA DAS POLÍTICAS URBANA E AMBIENTAL 59

2. A POLÍTICA URBANO-AMBIENTAL DA CIDADE DE SÃO PAULO - 1989 A

2008 62

2.1 ANTECEDENTES 63

2.2 A FORMATAÇÃO DA POLÍTICA URBANO-AMBIENTAL (1989 a 2001) 66

2.2.1 A Lei Orgânica Municipal 74

2.2.2 A Agenda 21 Local 76

2.3 A POLÍTICA URBANO-AMBIENTAL DE SÃO PAULO A PARTIR DO

ESTATUTO DA CIDADE 78

2.3.1 O Plano Urbanístico-Ambiental do PDE-2002 79

2.3.1.1 Uso e Ocupação do Solo 79

2.3.1.2 Os elementos estruturadores e integradores 86

2.3.1.3 Instrumentos de gestão urbana e ambiental 91

2.3.2 Legislação complementar ao PDE-2002 98

2.4 CONSIDERAÇÕES SOBRE A POLÍTICA URBANO-AMBIENTAL DE SÃO

PAULO DESENVOLVIDA ENTRE 1989 E 2008 106

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3. A CIDADE DE SÃO PAULO E O PARQUE PÚBLICO 111

3.1 UM PANORAMA DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO 112

3.2 A DINÂMICA URBANA E A IMPLANTAÇÃO DE PARQUES PÚBLICOS 115

3.3 OS PARQUES PÚBLICOS DA CIDADE DE SÃO PAULO IMPLANTADOS ATÉ

1988 123

4. AS AÇÕES DA MUNICIPALIDADE DE SÃO PAULO E A PROVISÃO DE

PARQUES PÚBLICOS ENTRE 1989 E 2008 126

4.1 SOB A NOVA CONSTITUIÇÃO (GESTÃO ERUNDINA: 1989 a 1992) 128

4.2 CRIADA A SVMA (GESTÃO MALUF: 1993 A 1996) 139

4.3 CONTINUIDADE! (GESTÃO PITTA: 1997 a 2000) 146

4.4 AGORA TEM O ESTATUTO DA CIDADE (GESTÃO MARTA: 2001 a 2004) 152

4.5 CONTINUIDADE? (GESTÃO SERRA/KASSAB: 2005 a 2008) 161

4.6 IMPLANTAÇÃO DE PARQUES ENTRE 1989 E 2008: CONSOLIDAÇÃO DOS

DADOS 182

CONSIDERAÇÕES FINAIS 191

REFERÊNCIAS 198

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INTRODUÇÃO

O presente trabalho se insere no campo do estudo das políticas urbano-ambientais,

em nível municipal, a partir do marco institucional estabelecido pela Constituição Federal de

1988 e do debate mundial sobre as questões ambientais que ganham relevância nas últimas

décadas.

No âmbito da política urbano-ambiental no município de São Paulo, como objeto

de pesquisa, é escolhida a ação de implantação de parques públicos pela administração

pública municipal, no período compreendido entre 1989 e 2008.

Nas ações da municipalidade, entendidas como políticas, programas, planos e

projetos, associadas à implantação de parques públicos urbanos, procura-se identificar a(s)

lógica(s) que nelas prevaleceram. A lógica será investigada a partir das proposições,

inflexões, inovações, (des)continuidades e contradições presentes nessas ações, considerados

os programas de governo, os planos de desenvolvimento e estruturação urbana, a legislação

urbanística e os recursos e a execução orçamentários, dentre outros elementos constitutivos da

política urbano-ambiental do município, tendo por base o referencial teórico construído no

presente trabalho.

A análise se dá a partir de 1989 por este ano representar marco importante para a

gestão das cidades brasileiras, pois, sob a égide da nova Constituição Federal promulgada em

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outubro de 1988, tem-se o fim das controvérsias jurídicas acerca da possibilidade de

intervenção estatal no domínio dos direitos individuais de propriedade e da competência dos

municípios, nas ações relativas a matérias urbanísticas e ambientais. Assim, a Constituição

define o princípio da função social da propriedade como sendo o fator fundamental para a

determinação dos direitos de propriedade imobiliária urbana. A Constituição também é

elemento norteador da ação do Estado na efetivação do processo de desenvolvimento urbano e

na distribuição das competências legislativas e enfatiza a competência municipal no que se

refere às matérias urbanística e ambiental (FERNANDES, 2000).

A Constituição de 1988 reserva um capítulo dedicado à Política Urbana,

constituído pelos artigos 182 e 183, cujo foco central está na instituição da função social da

cidade em proveito de seus habitantes e, para tanto, prevê mecanismos de promoção de

aproveitamento adequado do solo urbano. A primazia na condução da política urbana,

concedida pela Carta Magna aos municípios, foi regulamentada com a aprovação do Estatuto

da Cidade (Lei Federal n. 10.257, de 10 de julho de 2001) e da Medida Provisória n. 2 200, de

4 de setembro de 2001 (DALLARI e FERRAZ, 2002; MUKAI, 2002).

No capítulo sobre Política Urbana, o aumento das competências dos municípios

nesta matéria, dentro de um rearranjo tributário, ampliou os seus recursos, propiciando-lhes

maior capacidade de investimento, embora insuficientes frente às demandas postas nas

cidades, e disponibilizou instrumentos de política urbana.

A Constituição de 1988 consagra, ainda, o direito ao meio ambiente

ecologicamente equilibrado como um direito social de todos (artigo 225 e parágrafos), num

contexto de politização da questão ambiental que, naquele momento, correspondia a:

penetração do ideário ambientalista na pauta de discussões da sociedade brasileira; sintonia

entre as demandas postas por grupos que militam no movimento ambientalista e as políticas

públicas ambientais; identificação, pelos grupos sociais das classes populares, da conexão de

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seus problemas específicos com os problemas ambientais; constituição do Partido Verde;

sistematização de um projeto de reforma do modelo de desenvolvimento (ANCONA, 2002).

Ainda consoante à questão ambiental, a realização da Conferência das Nações

Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a ECO-92, em junho de 1992, na cidade do

Rio de Janeiro, é considerada evento histórico, pois “foi um divisor de águas para a

formulação e implementação de políticas públicas ambientais” (PAGNOCCHESCHI e

BERNARDO, 2006, p.112). Conforme esses autores, a partir do encontro no Rio, novas

percepções, discursos, formas de atuar e parcerias implicam importantes mudanças nas

relações entre os poderes públicos e setores da sociedade que dialogam nesse momento, como

as Organizações Não Governamentais – ONGs – ambientalistas e de assessoria, os sindicatos,

os movimentos - negro, feminista, indígena, entre outros. Configura-se nova correlação de

forças que passa a direcionar as políticas ambientais e a influenciar as políticas urbanas.

Desta forma, a maior autonomia dada pela Constituição aos municípios, associada

à repercussão dos acontecimentos políticos internacionais e nacionais de temática ambiental,

configura uma nova composição das políticas públicas urbanas que, de alguma maneira, passa

a integrar a agenda dos governos municipais, tornando os anos subseqüentes ricos e

significativos para o nosso estudo. Assim sendo, são analisadas as cinco gestões

administrativas da cidade de São Paulo, no período entre 1989 e 2008: Luiza Erundina (1989-

1992), Paulo Maluf (1993-1996), Celso Pitta (1997-2000), Marta Suplicy (2001-2004), e José

Serra/Gilberto Kassab (2005-2008).

Neste contexto, torna-se importante a análise das ações da administração

municipal que inserem o parque público no ambiente urbano contemporâneo com

particularidades distintas de momentos anteriores.

De acordo com Bartalini (1999), a preocupação com a criação de parques e áreas

verdes sempre apareceu no planejamento e nos planos urbanísticos propostos para a cidade de

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São Paulo, por motivos vários, quer ligados às questões de higiene urbana, ao lazer e

recreação pública, à ordem estética, quer à carência de áreas verdes, à preservação e

conservação de remanescentes de vegetação, de recursos hídricos, dentre outros.

No município de São Paulo, a provisão de parques públicos é competência, no

período analisado (1989 a 2008), do Departamento de Parques e Áreas Verdes – Depave,

vinculado até 1993 à Secretaria de Serviços e Obras (SSO) e a partir de outubro de 1993 à

Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente (SVMA).

Foi a experiência profissional do autor nestas duas secretarias municipais, um dos

componentes da motivação para a pesquisa, considerando observações e inquietações relativas

às questões urbanas, associadas às transformações da cidade de São Paulo e às possibilidades

vislumbradas com a aprovação do Estatuto da Cidade em 2001.

O parque público: uma revisão conceitual

O parque público surge no final do século XVIII, na Inglaterra, como fato urbano

de relevância. O processo da criação dos primeiros parques ingleses ocorre com a abertura ao

público e incorporação à estrutura urbana dos grandes espaços correspondentes aos jardins

dos palácios da Corte, como o Saint James Park, Hide Park e Kensington Gardens, em

Londres, ou com a execução de empreendimentos imobiliários pela iniciativa privada, como o

Regent’s Park, o Buxton Pavilion Gardens e o Birkenhead Park (KLIASS, 1993).

Entretanto, a inserção do parque na estrutura urbana ganha destaque a partir da

segunda metade do século XIX, com as significativas transformações urbanísticas que

ocorrem nas cidades européias. Em Paris, por exemplo, Haussmann idealizou um plano de

reformulação urbana que contou com um sistema de parques urbanos constituído por áreas

verdes em diversas escalas interligadas às grandes avenidas. Enquanto isso, nos Estados

Unidos, a instauração do Movimento Parques Americanos, liderado por Olmsted, cria parques

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em grande número de cidades americanas, influenciando sobremaneira o desenho das cidades,

a partir da utilização do potencial paisagístico. Neste momento, o parque urbano é

considerado o equipamento que atenderá às demandas de recreação e lazer decorrentes da

expansão urbana e do novo ritmo de vida da cidade industrial, em contraposição ao modo de

vida rural. O parque, equipamento de uso público, também atenderá “à necessidade de criação

de espaços amenizadores das estruturas urbanas, compensando as massas edificadas.”

(KLIASS, 1993, p.19-20). Estas funções constaram na justificativa de Olmsted para o projeto

do Central Park em Nova York, em 1858, conforme Kliass (1993).

Os primeiros parques urbanos, influenciados pelo modelo paisagístico dos jardins

ingleses, caracterizam-se por possuir um desenho orgânico de linhas curvas, relevo com

suaves colinas, rios, lagos, amplos gramados e árvores agrupadas que sugerem as formas da

natureza num espaço primordialmente contemplativo. Esta concepção de parque perdura até o

início do século XX, sofrendo transformações mais expressivas após a Primeira Guerra

Mundial, quando modelos urbanísticos caracterizados pela Art Déco e, posteriormente, pela

Carta de Atenas, impõem novas linguagens e dão maior importância aos parques urbanos. Ao

longo do século XX, especialmente nas últimas décadas, novas concepções marcaram a

presença e deram origem à criação de parques urbanos com funções esportivas, culturais e de

conservação de recursos naturais (KLIASS, 1993; MACEDO e SAKATA, 2002).

No Brasil, com a execução do Passeio Público, no Rio de Janeiro, entre 1779 e

1783, implanta-se o primeiro espaço preparado para o uso público, com característica de área

verde autônoma. O passeio e o jardim público passam a ser sinônimos e caracterizam-se por

possuir determinada extensão, serem cercados, bem arborizados, ajardinados e, em alguns

casos, com a presença de esculturas, bares, quiosques, pequenos lagos, aves, pequenos

mamíferos, entre outros (BARTALINI, 1999).

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Ao contrário dos parques urbanos europeus, implantados a partir da necessidade

de atender às populações urbanas, o parque urbano no Brasil é inserido como um elemento

complementar do modo de vida urbana das elites que aqui despontavam e miravam-se nos

modelos de vida europeu, especialmente, dos ingleses e franceses (MACEDO e SAKATA,

2002). As principais cidades brasileiras no século XIX, como o Rio de Janeiro, Recife e

Salvador e, mais tarde, São Paulo, Belém e Porto Alegre foram palcos de rápidas e urgentes

transformações urbanas. Algumas dessas transformações urbanas decorrem de momentos

históricos importantes como a vinda da família real portuguesa, em 1808, a Proclamação da

Independência, em 1822, e a conseqüente importância assumida pela cidade do Rio de

Janeiro, capital da nova nação. Neste período, são criados no Rio de Janeiro, os primeiros

parques com características morfológicas e funcionais que permanecem nos atuais parques

públicos: o Passeio Público, o Campo de Santana, ambos no centro da cidade, e o Jardim

Botânico, junto a Lagoa Rodrigo de Freitas (MACEDO e SAKATA, 2002).

As cidades brasileiras se expandem, e especialmente, a partir da primeira metade

do século XX, de modo descontínuo, configurando imensos vazios urbanos. Aos vazios

urbanos incorporam-se as várzeas dos rios, áreas que funcionam como antecessoras das áreas

de lazer urbanas, por contarem com campos de futebol e áreas para a prática de esportes

aquáticos (MACEDO e SAKATA, 2002; JORGE, 2006).

Ao longo do século XX, sob o efeito da expansão urbana, estes vazios diminuem

ou desaparecem, ao mesmo tempo em que aumenta a massa de trabalhadores vivendo sob

condições precárias. Esta situação aparece para a elite, governantes, religiosos e capitalistas,

como séria ameaça à ordem pública. Neste contexto, o parque público é apresentado como

uma necessidade social, destinado ao lazer de massa (BARTALINI, 1999).

Ao longo das últimas décadas, novas funções são introduzidas no conceito de

parque, que passa a atender a uma ampla diversidade de solicitações de lazer, tanto esportivas

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como culturais, incorporando ainda, a conservação e preservação de recursos naturais

associados à qualidade ambiental do meio ambiente urbano. O parque público é, na

atualidade, um elemento típico da grande cidade e está em constante processo de

recodificação. Seu papel é diverso e abrangente, implicando uma definição de seu conceito

nem sempre precisa.

Considerando estes elementos, neste trabalho, assume-se o parque público como

um equipamento urbano ambiental, constituído por um espaço de uso público, com foco na

recreação da população e capaz de incorporar outras intenções, como a de conservação,

preservação, educação ambiental e mesmo atividades culturais. Esta definição tem por base os

estudos de Kliass (1993), Bartalini (1999), Macedo (1999) e Macedo e Sakata (2002) na

construção do referencial teórico, e leva em conta a temática de requalificação dos espaços

urbanos, a necessidade de espaços de lazer e recreação urbanos e a dimensão ambiental, cada

vez mais presente nas agendas das grandes cidades.

Desta forma, a partir do conceito de parque público adotado, da relevância política

do tema urbano-ambiental e ainda considerando o aparato jurídico-institucional instituído que

amplia os recursos de gestão do município, objetiva-se identificar e analisar como se dá o

processo de provisão de parques públicos na cidade de São Paulo, entre 1989 e 2008. Para

tanto, colocam-se como questões que orientam esta pesquisa:

Existe correlação entre os programas e planos de governos propostos e as ações de

implantação de parques públicos realizadas?

Os instrumentos urbanísticos existentes se vinculam à implementação de parques

públicos?

Qual(Quais) a(s) lógica(s) que prevalece(prevalecem) nas ações de provisão de

parques públicos na cidade de São Paulo ao longo do período e sua relação com a política

urbano-ambiental?

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Procedimentos metodológicos

Os procedimentos metodológicos utilizados na realização deste estudo

correspondem às pesquisas bibliográfica e documental. As fontes bibliográficas estão focadas

nos seguintes elementos de análise: políticas públicas, política urbana, política ambiental e

parques públicos.

Na construção dos elementos de análise do objeto de estudo, parte-se da

elaboração do referencial teórico acerca da política urbana e ambiental no contexto nacional,

possibilitando uma leitura macro, suporte para o entendimento dos componentes da política

urbano-ambiental no nível local. Na delimitação temporal desta política, considera-se a

aprovação do Estatuto da Cidade marco divisor, destacando-se dois momentos no período

analisado – de 1989 a 2001 e a partir de 2002.

São elementos de análise: os planos diretores, principal instrumento da política

urbana, a Lei Orgânica Municipal e a Agenda 21 Local, além dos instrumentos jurídicos,

tributários, urbanísticos e ambientais disponibilizados e que apresentam potencialidade para a

provisão de parques públicos.

Em relação aos parques públicos implantados na cidade de São Paulo durante o

período de estudo – 1989 a 2008, são pesquisados os seguintes elementos norteadores da

análise: a sua localização e as respectivas áreas; os instrumentos urbanísticos empregados

tanto na destinação da terra, como na implantação do parque; e ainda, a identificação dos

recursos financeiros previstos no orçamento e a sua execução.

Na pesquisa, além dos parques públicos implantados, são incluídos também os

parques em implantação, em 2008. O parque é considerado implantado quando as obras estão

concluídas e/ou o equipamento está dotado de condições que possibilitem sua

disponibilização ao uso público. O parque em implantação é aquele que se encontra na fase de

execução das obras ou de elaboração de projeto.

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São apresentados ainda os parques lineares implantados e em implantação no

período. Conforme o Plano Diretor vigente em São Paulo, os parques lineares se inserem

como elemento de recuperação da rede hídrica estrutural da cidade e por constituírem-se

importante ação estratégica da política urbano-ambiental, são levantados nesta pesquisa.

Entretanto, por sua natureza, não são objeto central do estudo, ainda que alguns deles possam

eventualmente incorporar algumas funções assumidas pelo parque público.

Para contextualizar a questão dos parques públicos, para cada uma das gestões da

administração municipal do período em estudo, são pesquisados: os programas e planos de

governo, relatórios de propostas e de análise de gestão, balanços de gestão, programas

emergenciais, legislação de criação dos parques, processos administrativos de implantação

dos parques, documentos e relatórios técnicos, publicações oficiais da Prefeitura Municipal de

São Paulo, entre outros.

A pesquisa documental foi realizada nos arquivos do Centro de Documentação

Técnica da Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente – CDT/SVMA, nos arquivos

digitais da SVMA1 e junto às bibliotecas das Secretarias Municipais de Governo, das

Finanças, de Planejamento, da Procuradoria Geral do Município e da Câmara Municipal de

São Paulo, além dos escritórios dos partidos políticos que administraram a cidade de São

Paulo no período estudado.

Na pesquisa realizada foi elemento dificultador a constatação de divergência de

informações e mesmo a ausência de dados. Pode-se supor que tal dificuldade decorra da

concomitância entre o período definido para estudo – até 2008 – e a realização das ações

estudadas, sem ainda sua sistematização. As divergências encontradas foram compatibilizadas

de forma que pudessem dar consistência à análise, sem comprometer a fidedignidade.

1 Arquivos digitais da SVMA correspondem aos relatórios técnicos, programas de trabalho, entre outros elementos, elaborados pelo Departamento de Parques e Áreas Verdes – Depave – e pela Coordenadoria de Planejamento Ambiental – COPLAN – e encontram-se disponibilizados na rede interna de computadores da Secretaria do Verde e do Meio Ambiente – SVMA.

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Estas divergências são mais significativas quando relacionadas ao programa de

implantação de parques divulgado pela Administração Municipal2, em 2008, nos seguintes

casos: na determinação dos parques efetivamente implantados; na fase da implantação do

parque – obra, projeto ou apenas área com potencialidade para transformar-se em parque; na

definição de suas dimensões, denominação e localização; e na indicação dos instrumentos

urbanísticos utilizados, entre outros. A solução para estes casos deu-se a partir da

compatibilização dos elementos constantes nas publicações oficiais da SVMA, no Programa

de criação de parques e, especialmente, na pesquisa3 junto aos processos existentes na SVMA

relativos à questão.

Por fim, na pesquisa são levantados e analisados os Orçamentos e os Balanços

Orçamentários (Execução Orçamentária) do Município de São Paulo de todo o período4. São

tratados os resultados dos balanços referentes à Prefeitura do Município de São Paulo

(PMSP), à Secretaria do Verde e do Meio Ambiente (SVMA) e ao Departamento de Parques e

Áreas Verdes (Depave). São destacados na análise os valores orçados e as despesas realizadas

relativas aos Programas de Trabalho da administração municipal relacionados à implantação

de parques, que nestes documentos são denominados em geral, por: cadastramento e aquisição

de áreas verdes; implantação de áreas verdes e parques; e instalação, ampliação e reforma de

parques. A partir dos dados extraídos destes Programas de Trabalho, nomeados neste estudo

de “Depave – Parques”, busca-se analisar, sobretudo, os recursos financeiros destinados e

utilizados na implantação de parques públicos.

2 Programa 100 Parques para São Paulo. 3 A pesquisa consistiu no levantamento das informações contidas nos processos administrativos de implantação dos parques, nos processos expropriatórios, em relatórios e dados constantes na intranet da Secretaria do Verde e do Meio Ambiente e do Depave, e-mail da Assessoria de Comunicação/SVMA e junto aos os técnicos envolvidos nesses processos. 4 São analisados as Leis Orçamentárias Anuais e os Balanços de Execução Orçamentária do Município de São Paulo, entre 1989 e 2008.

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A dissertação está estruturada da seguinte forma: o capítulo 1 busca esclarecer a

confluência das políticas urbana e ambiental no contexto nacional, por meio de uma revisão

bibliográfica; o capítulo 2, complementando a elaboração do referencial teórico, aborda a

política urbano-ambiental da cidade de São Paulo, que compreende os planos diretores e

demais instrumentos urbanísticos e jurídicos e suas interfaces com a legislação e as questões

ambientais; o capítulo 3 apresenta um panorama do município de São Paulo, contextualizando

a implantação de parques públicos na dinâmica do desenvolvimento urbano; o capítulo 4 trata

da analise das ações da municipalidade de São Paulo relativas à implantação de parques

públicos, em cada uma das cinco gestões administrativas do período.

A partir dos conteúdos apresentados e analisados em cada gestão, desenvolvem-se

as considerações finais, no esforço de ponderar acerca da tendência dessas ações no tempo e

identificar, nos termos aqui propostos a(s) lógica(s) que nela(s) prevaleceu (prevaleceram).

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Capítulo 1

As Políticas Urbana e Ambiental no contexto nacional

1.1 A política urbana

1.1.1 A política urbana – uma revisão conceitual

Para efeito do presente estudo, a política urbana insere-se no conjunto das

políticas públicas, entendidas como ação do Estado, orientada por objetivos que refletem ou

traduzem um jogo de interesses. É multideterminada e produto de um momento histórico. Por

sua vez, um programa ou projeto de governo, consiste em uma ação do Estado de menor

abrangência, decorrente de uma política pública, no nosso caso de uma política urbana

(FARAH, 2004).

A análise da política urbana – da sua formulação, conteúdos e forma de

implantação – assim como das demais políticas setoriais, necessita do entendimento de fatores

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econômicos, políticos, sociais, entre outros, determinantes da atuação do Estado no campo das

políticas públicas (BORJA, 2004).

Segundo Farret (2004), a política urbana historicamente é identificada com a

oferta de bens e serviços urbanos. A partir dessa abordagem, o autor discute duas visões

predominantes: a primeira, a define como “conjunto de ações de planejamento, investimentos

e orçamento em infra-estrutura urbana”, e a segunda, como “conjunto de normas técnicas,

jurídicas, institucionais e financeiras que, de forma articulada, buscam ampliar o acesso da

população aos serviços urbanos”. Nessa discussão, o autor indica que essas visões

desconsideram o alcance que a política urbana tem na vida econômica e social, pois as ações

que objetivam melhorar o ambiente urbano extrapolam os seus limites territoriais e, à medida

que são percebidas e apropriadas pelo mercado, geram novas configurações no processo de

desenvolvimento. A política urbana visa, de acordo com Farret:

[...] contribuir, no que lhe compete, para a realização dos grandes objetivos nacionais [...] se identifica com a inserção competitiva do Brasil no mercado global, o combate à pobreza e à exclusão social, a redução dos desequilíbrios regionais de renda e qualidade de vida, a integração nacional e o fortalecimento do poder local e da cidadania. (FARRET, 2004, p.57).

Assim, por tratar-se de uma política setorial de governo, como as de saúde,

ambiental, social, industrial, externa, e tantas outras, a política urbana contribui, dentro de sua

competência, para a realização dos objetivos nacionais e não está desvinculada de uma agenda

geral de ação do governo central.

Considerada esta análise, o entendimento que se tem, neste trabalho, sobre a

política urbana vai além da sua identificação como oferta de bens e serviços urbanos, seja no

seu enfoque de ações de investimento em infra-estrutura, seja no conjunto de normas

vinculadas à ampliação do acesso da população aos serviços urbanos, isto é, influi no

processo de desenvolvimento.

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Uma perspectiva abrangente corresponde ao explicitado na Constituição Federal

de 88, e detalhada no Estatuto da Cidade de 2001, ou seja, de compreensão de política urbana

como ações do Estado direcionadas ao ordenamento das funções sociais da cidade e garantia

do bem estar de seus cidadãos e expressa como garantia do direito a cidades sustentáveis.

1.1.2 A política urbana e os padrões de planejamento urbano

Diferentes projetos de nação e agendas de governos correspondem a diferentes

padrões de planejamento urbano, nos quais cabe considerar não apenas a lógica interna do

próprio planejamento ou do pensamento do urbanismo, mas também, sua análise frente a

outros fatores como, por exemplo, a questão social.

De acordo com Ribeiro e Cardoso (1996, p. 53), um padrão de planejamento

corresponde ao “conjunto dos princípios que orientam o ‘diagnóstico da realidade urbana’,

bem como a definição da forma, objeto e objetivos da intervenção proposta”. Assim, em cada

padrão é possível compreender o conjunto de representações que categorizam a realidade

social e determinam técnicas de ação. Diferentes padrões de planejamento urbano

correspondem a diferentes propostas de desenvolvimento urbano ou de gestão das cidades.

Para o estudo da política urbana e dos padrões de planejamento urbano no Brasil,

parte-se da periodização apresentada por Ribeiro e Cardoso (1996): Primeira República

(1880-1930), Período Vargas (1930-1950) e Era do Desenvolvimentismo (1950-...).

Considerando o período de estudo desta pesquisa, foi incluído o Período de Democratização

dos anos 80 e seus desdobros.

No Brasil, conforme Ribeiro e Cardoso (1996), no pensamento e na prática do

urbanismo ou do planejamento urbano, um aspecto recorrente é a “importação” de modelos

formulados na Europa e nos Estados Unidos. Isto está presente desde o início do século XX,

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quando da ocorrência do sanitarismo/higienismo, até o padrão adotado no planejamento da

década de 70.

Entretanto, enquanto na Europa e nos Estados Unidos nestes modelos a “questão

social” é tratada como “eixo e objetivo do conhecimento e da intervenção”, fazendo com que

a questão urbana ou o pensamento urbanístico aparecesse associado à transformação da

questão social, no Brasil isto não acontece. O ideal reformador contido nos modelos

importados é adaptado à modernização, ao desenvolvimento e à construção da nacionalidade,

estando ausente a questão social (RIBEIRO e CARDOSO, 1996, p. 54).

Na Primeira República (1880-1930), quando as elites brasileiras objetivavam a

construção da nação, prevalece o entendimento de que as cidades expressam o atraso

nacional, se comparadas às metrópoles internacionais. As cidades emergem como espaço

privilegiado de atuação comercial e política, dado o incremento do comércio internacional da

economia cafeeira. (RIBEIRO e CARDOSO, 1996).

As intervenções urbanas são localizadas e não tratam da questão social que se

colocava pela urbanização da época. O padrão de intervenção urbana implantado trazia a

aceitação tácita da exclusão e consequentemente da não universalidade. Calcado na

modernização, negava o passado colonial e tem por ideal as metrópoles internacionais.

Este período, que vai até a década de 1930, é marcado pelos planos de

melhoramentos e embelezamento, vindos principalmente da França, herdeiros da forma

urbana monumental, da ênfase da beleza e da exaltação da burguesia. Estas intervenções

acabaram por destruir, em muitos casos, a forma urbana colonial vigente no Brasil. Esta

concepção apresenta-se de forma hegemônica e integra os diferentes discursos de então, como

por exemplo, o slogan “O Rio civiliza-se”, referente à reforma de Pereira Passos5 para o Rio

de Janeiro, citado por Villaça (2004, p 197-198). Outro exemplo é a expressão das idéias

5 Pereira Passos foi prefeito do Rio de Janeiro entre 1902 e 1906.

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sobre remodelação urbana e sobre lucro especulativo, publicadas pelo Senador Francisco

Belisário Soares de Sousa, em defesa da obra de execução de avenida, também no Rio:

Um bairro inteiro de casebres feios, insalubres, ruins, foi todo comprado por uma poderosa companhia, arrasado, e no local construído um bairro elegante, bonito, confortável em todos os sentidos, realizando a companhia excelente negócio do ponto de vista financeiro. Uma cidade da Europa [...] não suportaria no seu centro uma rua da vala, do senhor dos Passos, de São Jorge e [...] que sei eu mais. (BENCHIMOL, 1992, p. 197, apud VILLAÇA, 2004, p. 198).

Entretanto, esse discurso vai perdendo força, ao longo das primeiras décadas do

século XX. Isso se deve não a fatores isolados, mas à concomitância de acontecimentos

urbanos, sociais, políticos e econômicos.

Villaça (2004, p. 198-199) aponta o prenúncio desta alteração de discurso, no

relatório relativo ao biênio 1912-1913, do prefeito Raymundo Duprat, de São Paulo, o qual

menciona a falta de recursos para a execução de monumentos, plano tipicamente

embelezador, e ressalta a importância de se dar à cidade uma “disposição harmônica”. Neste

relatório já aparecem as idéias que prevalecerão nas décadas posteriores, manifestas através

da insinuação da falta de planejamento, do “caos urbano” e da falta de propostas para os

graves problemas das cidades. Villaça observa o movimento de mudança do discurso com

enfoque embelezador para a priorização de intervenções urbanas, com ênfase para as obras de

infra-estrutura, caracterizando o advento do urbanismo e do plano diretor (VILLAÇA, 2004).

A partir da Revolução de 30, há um fortalecimento do setor urbano ou da

economia urbana e manufatureira que produzia para o mercado interno, que passa a oferecer

melhores condições de investimento comparadas às do setor primário exportador, até então

primordialmente o cafeeiro. Os investimentos no mercado interno começam a ter maior

participação no processo de formação do capital nacional, resultando na emergência da

burguesia industrial/comercial e no crescimento do mercado urbano de bens e serviços

(LODDER, 1978).

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O domínio da sociedade brasileira passa gradativamente à burguesia urbano-

industrial ao longo das décadas seguintes, e o discurso franco, sem rodeios das elites agrário-

exportadoras, caracterizador da Primeira República, começa a se alterar.

No Período Vargas (1930-1950), associado às transformações econômicas e

políticas, tem-se a construção de um projeto nacional, que buscava aumentar a capacidade

produtiva do país. Quanto à questão social, a pobreza deixa de ser entendida como inevitável

e útil e passa a ser colocada como obstáculo à modernização e à constituição da

nacionalidade. O entendimento que se tem, é que seu enfrentamento deve ser realizado pelo

Estado, por meio de uma política de valorização do trabalho como forma de ascensão social e

de construção da cidadania. Neste contexto a noção de justiça social é tratada como uma

questão nacional e não como questão operária.

Assim, encontra-se a formulação de uma nova concepção do Estado, que

contempla a questão social, através da intervenção na previdência e assistência social e nas

condições de vida dos trabalhadores, na perspectiva de recuperar e manter a sua capacidade

produtiva (RIBEIRO e CARDOSO, 1996).

O sentido estratégico do desenvolvimento das políticas setoriais, dado pelas elites

deste momento, faz com que a questão urbana seja tematizada na ótica das exigências do seu

projeto nacional. Desta forma as intervenções urbanas incorporam o controle social como um

elemento da modernização e da construção da nacionalidade, estas sim as reais finalidades das

ações de urbanização (RIBEIRO e CARDOSO, 1996).

Assim, as intervenções urbanas são organizadas em planos urbanísticos que

correspondem à possibilidade de modernização pretendida, constituindo-se um padrão de

planejamento urbano. Os planos urbanísticos passam a contemplar a cidade como um todo e

deveriam influir sobre as condições de vida das camadas populares, porém, eles não são

capazes de efetivar uma regulação pública. Conforme Ribeiro e Cardoso (1996, p. 64): “Os

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planos produzem normas destinadas a não serem cumpridas, criando assim um abismo entre a

‘cidade real’ e a ‘cidade legal’”. Desta maneira, os planos resultantes desse padrão de

urbanismo caracterizam-se por criar áreas reguladas por lei que convivem com espaços

urbanos exteriores a essa regulação. Em decorrência configura-se um pacto sobre o território

da cidade que a impossibilita crescer sem desigualdades na distribuição de seus recursos.

É desse período a implantação do Plano de Avenidas de Prestes Maia para São

Paulo, o plano diretor para o Rio de Janeiro elaborado por Agache, cuja vinda ao Brasil

influenciou, ainda, planos de outras cidades. Nesta época é realizada também a Semana de

Urbanismo de Salvador, em 1935; a implantação do EPUCS – Escritório do Plano de

Urbanismo da cidade de Salvador, em 1943; o plano diretor de Recife, Porto Alegre, Curitiba,

entre outros (RIBEIRO e CARDOSO, 1996; VILLAÇA, 2004; LEME, 2005b).

A industrialização e a urbanização brasileira avançam. O Produto Interno Bruto

(PIB) vinha crescendo, desde a década de 1940, alcançando índices superiores a 7% ao ano,

um dos maiores do mundo. Embora toda essa riqueza permaneça concentrada, esse alto grau

de crescimento econômico influi na qualidade de vida da população, particularmente, daquela

que abandonara o campo buscando melhores condições de vida nas cidades. Assim, as cidades

brasileiras passam a ocupar o centro de uma política destinada a mudar seu padrão de

produção (RIBEIRO, 1997; MARICATO, 2001).

Na Era do Desenvolvimentismo, a partir da década de 1950, o processo de

urbanização passa a ser um dos elementos fundamentais da modernização e o urbanismo

desponta como instrumento de elaboração de diagnósticos dos problemas urbanos.

Em 1964, com a instituição do Governo Militar, a perspectiva oficial é de que o

desenvolvimento e o crescimento sejam sempre positivos e a intervenção nas cidades pela

União, centralizadora do poder de forma autoritária, é a melhor maneira de resolver os

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problemas urbanos. Constitui-se claramente a formulação de uma política urbana na história

do país sob o padrão técnico-burocrático desenvolvimentista (RIBEIRO e CARDOSO, 1996).

Neste padrão, o urbano é entendido como um problema do desenvolvimento

econômico, estando presente, na elaboração do diagnóstico sobre o urbano, a concepção

desenvolvimentista e, nas propostas de intervenção, a racionalização administrativa. A

modernização e a centralização são os objetivos da política urbana traduzidas na idéia do

plano - um sistema nacional de planejamento – e evidentes na atuação dos órgãos federais,

como o Serviço Federal de Habitação e Urbanismo – SERFHAU6 - e o Conselho Nacional de

Desenvolvimento Urbano – CNDU.

Neste período o planejamento urbano obtém grande prestígio, com proliferação de

planos diretores pelo Brasil. Entretanto, estes planos deixam à margem grande parte da

população urbana ao ignorar suas condições de assentamento e necessidades, reforçando a

ilegalidade e a clandestinidade na ocupação do solo, aumentando o encortiçamento e

abandonando as áreas centrais (BRASIL, 2006).

É marco deste momento da política urbana a criação do Banco Nacional da

Habitação - BNH, integrado ao Sistema Financeiro da Habitação – SFH. A proposta do BNH

visa oferecer acesso à casa própria aos trabalhadores e, de acordo com a perspectiva

ideológica do regime militar, estabelece-se, desta forma, um compromisso social com o

desenvolvimento (CHAFFUN, 1996).

Este sistema integrado BNH/SFH, alimentado, entre outros, pelo Fundo de

Garantia por Tempo de Serviço – FGTS – e pela poupança privada, é responsável, segundo

Maricato (2001), pelo maior movimento e investimento de construção nas cidades ocorrido no

Brasil. Ocasiona a mudança do perfil das grandes cidades, com a verticalização promovida

6 O SERFHAU, Serviço Federal de Habitação e Urbanismo, criado pela Lei n. 4.380 de 21/08/1964, possui atribuições ligadas à habitação e o papel de atuar no planejamento urbano, dando diretrizes e assessoria aos municípios. A partir de então se define uma política nacional de planejamento urbano e se estabelece uma metodologia para a execução dos planos municipais, centralizado pelo governo federal (LEME, 2005a).

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pelos edifícios de apartamentos. Entretanto, o financiamento imobiliário, patrocinado por este

sistema, não propicia a democratização do acesso à terra por meio da instituição da função

social da propriedade, já preconizada em 1963, no Seminário de Habitação e Reforma

Urbana7. A atividade produtiva imobiliária fideliza-se às atividades especulativas, priorizando

as classes média e alta – menos de 20% dos financiamentos destinam-se às populações de

baixa renda. Por outro lado, as atividades de iniciativa pública – os conjuntos habitacionais

populares – também não enfrentam a questão fundiária urbana, bastando observar a

localização dos mesmos, sempre afastados do centro e alimentadores dos vazios urbanos com

infra-estrutura, tornando estes vazios, terras propícias à especulação imobiliária. Esse sistema

financia ainda as grandes obras de saneamento, particularmente a extensão das redes de água

(CHAFFUN, 1996; MARICATO, 2001; BRASIL, 2006).

Sob o autoritarismo militar, este padrão de planejamento urbano produz

tratamento excessivamente técnico das questões urbanas, com conseqüente “despolitização”

na discussão do enfrentamento da questão social (RIBEIRO e CARDOSO, 1996, p. 68-69).

Resultado deste processo é a emergência de uma classe média urbana e a

manutenção de enorme parcela da população sem acesso a direitos sociais básicos. Outra não

poderia ser a resposta senão a manifestação dos movimentos reivindicatórios por melhores

condições de vida e por ampliação de direitos sociais, ao lado dos movimentos de oposição

política que lutam pela democratização e pelo fim do regime militar.

Além disso, o crescimento econômico não se mantém nos mesmos níveis. A crise

econômica mundial, de 1979, causa altas taxas de inflação, recessão e desemprego, marcando

as décadas de 1980 e 1990, conhecidas como as “décadas perdidas” (MARICATO, 2001).

7 O Seminário de Habitação e Reforma Urbana, promovido pelo Instituto de Arquitetos do Brasil, em 1963, corresponde ao marco do programa das “reformas de base”, em cujo temário o padrão da intervenção pública apresenta-se como forma de enfrentamento das questões sociais, condicionando-se a reforma urbana sob uma ótica desenvolvimentista, porém modernizadora, mais progressistas. Essas idéias foram interrompidas com o golpe militar de 1964. (RIBEIRO, 2004)

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Esta crise, no Brasil, causa forte impacto social e ambiental e com ela se amplia a

concentração da pobreza e da exclusão social no meio urbano8.

Ao longo da década de 1980, associam-se à oposição ao regime militar, as críticas

às políticas urbanas do modelo centralizador e desenvolvimentista. Essas críticas focam,

especialmente: a centralização de sua formulação pelo Estado, com ausência da participação

popular; a deterioração e o desrespeito ao meio ambiente e ao patrimônio cultural,

predominando o mito da “modernidade” como sinônimo de transformação urbana; a

desarticulação das políticas setoriais; a opção pela execução de grandes obras que exigem

grande parcela dos recursos públicos, absorvidos pelas empreiteiras, com as ações sociais

colocadas em segundo plano; a opção pelo transporte individual; os financiamentos

habitacionais facilitados prioritariamente para as parcelas da população com maior renda; a

prática segregacionista e a ineficácia da legislação e do planejamento urbano (BONDUKI,

2000).

No Período de Democratização dos anos 80 o processo vivido tem impacto tanto

nas políticas urbanas, quanto no conjunto das políticas públicas brasileiras, levando à

constituição de uma agenda de reformas (MARTINS, 2006). Neste quadro, retoma-se e

legitima-se a proposta de reforma social, com a qual se procura estabelecer um sistema de

proteção social redistributivo e universalista (RIBEIRO, 1997). Destaca-se, então, o projeto

de reforma urbana9, com a sistematização e atualização dos ideais do início dos anos 1960,

correspondentes às reformas urbana e agrária, com conseqüente melhoria nas condições de

vida da população e aumento do mercado interno.

8 Conforme Maricato (2001), o crescimento urbano sempre se deu com exclusão social, pois ele remonta a formação da sociedade brasileira, marcadamente com o fim da escravidão, quando o trabalho livre dá outra dimensão às cidades brasileiras. 9 O projeto de reforma urbana foi articulado pelo Fórum Nacional da Reforma Urbana, constituído por representativos setores de pesquisa sobre essa temática, como a ANPUR, o Sindicato dos Arquitetos do Estado de São Paulo, a ANSUR, o POLIS e a FAUUSP (RIBEIRO, 1997).

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Objetiva-se, com a reforma urbana, instituir um novo padrão de política pública,

consubstanciado na Emenda Popular pela Reforma Urbana, a partir das seguintes orientações,

apontadas por Maricato (1997) e Ribeiro (2004):

a) instituição da gestão democrática da cidade, de modo a ampliar o exercício da

cidadania e aumentar a eficiência e eficácia das ações estatais, através de

conselhos democráticos, audiências públicas, referendo popular, iniciativa

legislativa e veto às propostas do legislativo;

b) fortalecimento da regulação pública do uso do solo urbano com a introdução de

novos instrumentos de política fundiária – solo criado, IPTU progressivo,

usucapião especial urbano, etc. – visando à: regularização de áreas ocupadas;

captação da valorização imobiliária; aplicação da função social da propriedade;

proteção urbanística, ambiental e cultural;

c) inversão das prioridades dos investimentos públicos de forma a favorecer as

necessidades coletivas das camadas populares, com programas de políticas

habitacionais com finalidade social, aluguel e prestação da casa própria

proporcional à renda da família, transportes e serviços públicos subsidiados

com reajustes de tarifas proporcionais aos salariais.

Esse ideário de reforma urbana é incorporado parcialmente pela Constituição

Federal de 88, devido aos vários interesses que se articulam na ocasião da sua aprovação,

responsáveis pela postergação da aplicabilidade dos seus aspectos mais transformadores e até

pelo seu esvaziamento ao longo do tempo (MARTINS, 2006).

No entanto, a Constituição de 88, consagra o princípio da função social da cidade

e, quanto ao desenvolvimento urbano, delimita com maior clareza as competências dos entes

da federação, conferindo maior autonomia e responsabilidade aos municípios.

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No embate dos interesses, na elaboração da Constituição, prevalece o padrão de

planejamento urbano controlado pelo Estado, sendo o Plano Diretor seu principal instrumento

de implantação, que deverá responder ao almejado cumprimento da função social da cidade.

Conforme Rolnik (1997b), não se conseguiu superar uma visão conservadora do

regime jurídico, no tocante à manutenção da propriedade do solo urbano, devido à atuação

dos incorporadores imobiliários que há décadas se favorecem da dinâmica de ocupação do

espaço urbano, e ainda, à natureza tecnocrata marcante da administração pública.

1.1.3 Questões contemporâneas da política urbana

Para as considerações sobre a política urbana contemporânea brasileira, deve-se

situar o conjunto de elementos postos pelos impactos causados pela crise econômica mundial,

particularmente no Brasil, e pelos desdobramentos do processo de democratização, em

especial, à luta pela regulamentação do capítulo sobre a política urbana, artigos 182 e 183, da

Constituição de 88.

A crise econômica do final dos anos 70, no Brasil, assume a forma de crise fiscal,

caracterizada pelo endividamento público, situação comum às economias ocidentais. Na

perspectiva de Moraes (1997), essa crise tem caráter estrutural, não está ligada à forma de

gestão dos recursos pelo Estado, mas “resulta do fato de que as contradições inerentes ao

capitalismo requerem estruturalmente que o Estado sempre gaste mais do que arrecada”

(MORAES, 1997, p. 142).

No foco de análise de Daniel (1997), embora a questão do Estado seja “apenas”

um dos componentes da crise, entendida como crise do modelo de desenvolvimento, ela

remete a uma reformulação radical do Estado Nacional e abre espaço para redefinições nos

diferentes níveis de governo.

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Em socorro desta crise fiscal que ameaça a estabilização dos sistemas monetários

impõe-se uma nova forma de liberalismo da economia de mercado – o neoliberalismo –

estratégia que passa a ser hegemônica10 (SINGER, 1997).

A tese dessa estratégia global orienta os países, que querem promover seu

desenvolvimento, a integrar suas economias ao mercado mundial, com a produção voltada

para a exportação e geração de divisas, determinando assim, um afastamento das necessidades

da população. Essa estratégia vem acompanhada das seguintes recomendações: equilíbrio do

orçamento e da balança de pagamentos; preços mais reais; redução de salários;

reconhecimento das exigências de rentabilidade e competitividade; redução e racionalização

dos gastos públicos; privatizações; descentralização, dentre outras (SINGER, 1997). Em

síntese, as medidas correspondem à redução do Estado e liberalização do mercado.

No Brasil, o governo FHC (1994-2001) cumpriu religiosamente o receituário

neoliberal, estabelecido pelo Consenso de Washington11. Relativamente às privatizações, ao

se analisar as fontes de financiamento envolvidas nesse processo, observa-se distorção da

função pública do Estado, com a utilização de recursos públicos para o financiamento destas

operações (BORJA, 2004). De acordo com a autora, o BNDES – Banco Nacional de

Desenvolvimento Econômico e Social – que, antes tinha o papel de fomentar o

desenvolvimento, no governo FHC, passou a financiar empresas privadas.

10 Paul Singer apresenta duas hipóteses que não são mutuamente excludentes para explicar o porquê da hegemonia dos ideais neoliberais. A primeira atribui à crise política do Estado Keynesiano e do Bem-Estar – do estado não liberal. A segunda diz respeito às transformações de base na economia capitalista com o avanço das telecomunicações e da informática que implicam tendências descentralizadoras e mudanças profundas nas relações de produção, ao contrário das revoluções industriais anteriores (considerado este processo como a terceira revolução industrial) (SINGER, 1997). 11 O Consenso de Washington – CW – decorre de reunião realizada em 1989, da qual participaram representantes das organizações financeiras internacionais (FMI, BID, Banco Mundial etc.), do governo norte americano e dos países “emergentes”. As dez regras universais estabelecidas no encontro, que acabaram por tornar-se receituário imposto pelas agências internacionais para a concessão de créditos, são: 1) disciplina fiscal; 2) focalização dos gastos públicos; 3) reforma tributária que amplie a base de incidência da carga tributária; 4) liberalização financeira; 5) taxa de câmbio competitiva; 6) liberalização do comércio exterior; 7) eliminação de restrição ao investimento estrangeiro; 8) privatização; 9) desregulação no processo econômico e nas relações trabalhistas; 10) propriedade intelectual. O CW faz parte de um conjunto de reformas neoliberais que apesar de possuir práticas distintas nos diversos países está centrado doutrinariamente na desregulamentação dos mercados, abertura comercial e financeira e redução do tamanho e papel do Estado. (NEGRÃO, 1998).

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No Brasil, o esforço que se observa para o sucesso das privatizações objetiva

atender à lógica neoliberal de redução do Estado, no campo das políticas públicas, e ampliar

as perspectivas de mercado para o capital internacional, tendo como protagonistas o Fundo

Monetário Internacional – FMI, o Banco Interamericano de Desenvolvimento – BID – e o

Banco Mundial. Neste período, ainda conforme Borja (2004), o Brasil é um dos maiores

tomadores de empréstimo do Banco Mundial e o maior do BID.

Entre 1990 e 2002, o Brasil transfere dois bilhões de dólares para as Instituições

Financeiras Internacionais – IFI. Isso quer dizer que “o país exportou 2 bilhões de dólares

para essas instituições e, além disso, cumpriu fielmente o receituário de ajustes estruturais,

provocando o desmonte da política social, acirrando os níveis de pobreza e exclusão social.”

(BORJA, 2004, p.103). Os setores mais beneficiados neste período são: transporte rodoviário,

reforma do Estado e saneamento ambiental. Isto, de acordo com a autora, evidencia e

confirma as políticas das IFI para o Brasil.

Do ponto de vista político, em síntese, este processo corresponde à redefinição do

papel do Estado Nacional, com a redução do seu tamanho e do seu protagonismo; e à

descentralização política, com a delegação de competência aos governos locais, como bem

aponta Rolnik (1997b).

Neste movimento, na agenda de Reforma do Estado, os mecanismos de

descentralização “servem”, ao mesmo tempo, tanto ao discurso neoliberal de redução do

aparato estatal, quanto às demandas por gestão democrática. Por um lado, descentralizar tem

uma dimensão de organizar estruturas menores ou, ainda, transferir atividades para o mercado

e a sociedade buscando eficiência, eficácia e efetividade na ação pública. Por outro lado,

descentralizar coloca-se como possibilidade de consolidar o processo democrático, situando o

usuário de serviços públicos como interlocutor na formulação e no acompanhamento das

políticas públicas, fortalecendo, assim, as instâncias locais de governo (FARAH, 2004).

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Simultaneamente, as propostas de política urbana, vinculadas à idéia da Emenda

da Reforma Urbana, que procuram delinear caminhos fundados no princípio da cidadania,

continuam na luta pela sua regulamentação, mesmo após a inclusão do capítulo constitucional

da política urbana. Por outro lado, nos anos 90, nos Fóruns Nacionais de Reforma Urbana, as

iniciativas e propostas vinculadas à Reforma Urbana tomam uma direção particularmente

técnica e jurídica e o detalhamento de suas propostas se distanciam das lutas urbanas

(MARICATO, 1997). Constitui-se um embate de projetos, numa correlação de forças

desfavorável à regulação do capítulo da política urbana na perspectiva dos pressupostos

definidos na Emenda da Reforma Urbana.

Dentre as orientações que se identificam com as propostas da Emenda da Reforma

Urbana, destacam-se:

a) necessidade de inversão na política de gasto público local, priorizando os

serviços públicos básicos; regulação pública do solo urbano vinculada aos

princípios da função social da propriedade; iniciativas de desenvolvimento

econômico local com vistas à geração de emprego e renda (DANIEL, 1997);

b) autonomia da gestão local, com a municipalização dos direitos e deveres, entre

os quais a política urbana, com fortalecimento da capacidade de intervenção

na regulação do mercado imobiliário, produzindo equilíbrio sócio-ambiental

através de “pactos territorial e político” (ROLNIK,1997b);

c) capacitação de servidores públicos, trabalhadores e técnicos em torno das

propostas da reforma urbana; reforma administrativa capaz de adequar a

administração municipal à participação democrática; reforma tributária,

especialmente, para propiciar a efetivação de instrumentos de justiça social

(MARICATO, 1997);

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d) gestão e planejamento urbano democrático e participativo, com maior

transparência e eficácia; instituição de uma política de gerenciamento urbano a

partir de instrumentos legais que combinem projetos específicos, acordos

democráticos e transparentes; a inserção da população urbana, em condições

de exclusão social, por meio de um projeto eficaz de reforma urbana

articulado a um projeto político nacional tendo em vista a dimensão global dos

processos econômicos que estão redefinindo a questão urbana; necessidade de

reflexão sobre a relação entre privatização e a focalização da política urbana,

tendo em vista o papel estatal de cumprir os objetivos da justiça social

(RIBEIRO, 1997).

Algumas destas orientações e expectativas, durante a década de 90, são

implementadas, com intensidade e formas distintas, em administrações municipais brasileiras

identificadas com a democracia e consideradas progressistas12. Estas experiências

administrativas colaboram para a configuração de nova formatação da política urbana e para a

regulamentação constitucional.

É relevante, ainda, a realização da Conferência Mundial das Nações Unidas pelos

Assentamentos Humanos13, o Habitat II, em 1996, em Istambul, que incorpora temas urbanos,

como a irregularidade e precariedade dos assentamentos populares, da infra-estrutura de

serviços, dos transportes, do saneamento, poluição e degradação ambiental (ROLNIK e

SAULE JUNIOR, 1996). A agenda estabelecida no Habitat II estava voltada para programas e

projetos urbanos, numa maior interlocução com as cidades, de forma a promover o

fortalecimento da gestão municipal e do desenvolvimento local.

12 Exemplos significativos são a elaboração do Orçamento Participativo, em Porto Alegre, e os programas de habitação popular em São Paulo, no início da década de 90. 13 É interessante notar que a primeira Conferência – o Habitat I, em 1976 – que colocava na agenda a moradia como direito, ocorreu antes da crise econômica que resultou na prescrição de medidas neoliberais para as economias ocidentais e a segunda Conferência, realizada só em 1996, quando já é questionada a eficiência do receituário do Consenso de Washington.

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No que concerne à mobilização pela regulamentação de aspectos relevantes do

capítulo constitucional da política urbana, a agenda urbana incorpora demandas dos setores

imobiliário e popular. O setor imobiliário objetiva a instituição de espaços urbanos

diferenciados e qualificados para o exercício de seu trabalho, busca regulamentações

urbanísticas que atendam aos seus interesses, ou seja, a constituição de espaços urbanos

comerciáveis sob a sua ótica. O setor popular, por sua vez, busca sua inserção no espaço

urbano, através do acesso à urbanização, da regularização fundiária, entre outras medidas

(MARTINS, 2006).

Neste embate, constituiu-se o Estatuto da Cidade, Lei Federal n. 10.257, de 10 de

julho de 2001, que regulamenta os artigos 182 e 183 sobre a política urbana da Constituição

Federal, e a Medida Provisória n. 2.200, que dispõe sobre a concessão de uso especial, tratada

no §1º, do art. 183, e cria o Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano – CNDU. Esta

legislação estabelece as diretrizes gerais da política urbana, apresentando instrumentos que

atendem às diferentes demandas, tais como, a operação urbana consorciada, a ampliação do

potencial construtivo, em atenção às reivindicações do setor imobiliário, e as zonas especiais

de interesse social (ZEIS), a usucapião especial urbana, a concessão de uso especial para fins

de moradia, atendendo ao setor popular.

Em síntese, pode-se considerar como marcos fundamentais da formulação da

política urbana contemporânea (BONDUKI, 2007):

a) a emenda de iniciativa popular pela reforma urbana contribui para a introdução,

na Constituição Federal de 1988, do capítulo inédito sobre política urbana,

baseado nos princípios da função social da propriedade e da cidade;

b) as experiências das administrações municipais, que implantam práticas como o

orçamento participativo, os planos diretores participativos, programas de

regularização fundiária, urbanização de favelas, audiências públicas, relatórios

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de impacto ambiental, IPTU progressivo e criação de ZEIS – zonas especiais

de interesse social;

c) a aprovação do Estatuto da Cidade e a própria articulação e mobilização que se

estende por treze anos em torno de sua aprovação pelo Congresso Nacional; e

d) a criação do Ministério das Cidades, em 2003, com a função de coordenar a

formulação da política urbana e das políticas setoriais de saneamento

ambiental, mobilidade e transporte urbano e habitação, tendo em vista as

competências constitucionais estabelecidas.

No que diz respeito à política urbana contemporânea, torna-se imperioso analisar

seus principais elementos constitutivos, como o Estatuto da Cidade, os instrumentos

urbanísticos, políticos, financeiros e tributários, dentre os quais se destaca o plano diretor,

além da interface da questão ambiental na ordem urbanística.

1.1.3.1 O Estatuto da Cidade

O Estatuto da Cidade regulamenta o capítulo da política urbana com a

disponibilização de instrumentos de natureza urbanística que, não apenas normatizam,

induzem as formas de uso e ocupação do solo, na perspectiva do desenvolvimento urbano,

com a propositura de instrumentos jurídicos para a regularização fundiária e com o

estabelecimento de estratégia de gestão democrática que incorpora a participação direta da

população.

Com o Estatuto tem-se uma regulação federal para a política urbana que

possibilita uma concepção de intervenção no território, distante do padrão tecnocrático dos

Planos Diretores de Desenvolvimento Integrado, que tudo prometiam e pouco ou nada

regulamentavam.

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Ficou atribuída aos municípios, por meio da reforma da ordem jurídico-

urbanística, a competência de desenvolver o processo de planejamento urbano, colocando o

governo municipal como sujeito político privilegiado na compatibilização dos interesses

individuais dos proprietários de terras e dos construtores urbanos, com os interesses sociais,

ambientais, culturais de outros grupos, na interação dos vários sujeitos que vivem,

transformam, participam e alimentam as cidades (BRASIL, 2001).

A dimensão do interesse público, contida no Estatuto, identificada no artigo 1º da

Lei, é regulala pelo uso da propriedade urbana em prol do bem coletivo, da segurança, do bem

estar dos cidadãos e do equilíbrio ambiental.

A função social da cidade e da propriedade está assegurada no artigo 2º da Lei,

mediante diretrizes gerais, dentre as quais pode-se destacar:

a) garantia do direito a cidades sustentáveis, entendido como bens e serviços do

ambiente urbano;

b) planejamento do desenvolvimento das cidades, considerada a espacialização da

população, das atividades econômicas e do território;

c) justiça na distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de

urbanização;

d) recuperação dos investimentos públicos que resultem em valorização de

imóveis urbanos;

e) regularização fundiária e urbanização de áreas ocupadas por população de baixa

renda, mediante normas especiais que compatibilizem as questões ambientais e

as socioeconomicas da população;

f) simplificação da legislação de parcelamento, uso e ocupação do solo e das

normas edilícias, com vistas a redução de custos e aumento de unidades

habitacionais.

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O Estatuto da Cidade é marco para a possibilidade de construção de um novo

padrão de planejamento urbano no Brasil e os instrumentos por ele disponibilizados podem

proporcionar a intervenção no mercado de terras e nos mecanismos de produção da exclusão

social. O desafio posto pelo Estatuto pode ser expresso pelo rumo do desenvolvimento da

democracia, no que diz respeito à participação direta dos cidadãos nos processos decisórios e

na ampliação do espaço de exercício da cidadania no processo de tomada de decisão sobre o

destino urbanístico da cidade.

1.1.3.2 O plano diretor e os demais instrumentos da política

urbana

Se o Plano Diretor for implementado de acordo com os critérios estabelecidos na

legislação urbanística pode ser um instrumento importante de transformação da cidade. O

Plano Diretor deve considerar a cidade que se tem e explicitar a cidade que se quer.

O Plano Diretor é instrumento básico e norteador da aplicação da maioria dos

demais instrumentos da política urbana, devendo estar afinado com as diretrizes do Estatuto

da Cidade. Desta forma, deve estabelecer diretrizes e normas que redirecionem os recursos

para toda a cidade, condicionem o uso da propriedade em prol do bem comum e, ainda,

assegurem a participação dos diferentes grupos sociais.

Os instrumentos da Política Urbana estão estabelecidos no artigo 4º do Estatuto da

Cidade. Dentre eles, alguns instrumentos de intervenção são realmente originais, enquanto

outros já estavam previstos no Código Civil, havendo, ainda, no seu texto, a consideração da

possibilidade de incorporação de instrumentos ainda não previstos. A aplicação desses

instrumentos deve ser coerente com a política urbana definida e com a concepção de cidade

pretendida e indicada no Plano Diretor.

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O controle social na aplicação dos instrumentos de política urbana é previsto no

Estatuto (artigo 4, §3º), nos casos em que haja dispêndio de recursos financeiros, além dos

controles institucionais, garantindo-se a participação de comunidades, movimentos e

entidades da sociedade civil. O controle social já estava implícito na Constituição Federal de

88, ao afirmar a necessidade de cooperação das associações representativas no planejamento

municipal (artigo 1, § único e artigo 29, inciso XII).

Os instrumentos de política urbana, previstos no artigo 4 do Estatuto da Cidade,

podem ser classificados, de acordo com suas características e funções, em: a) instrumentos de

planejamento, b) tributários e financeiros, c) jurídicos e políticos e d) ambientais.

a) Instrumentos de Planejamento

Os instrumentos de planejamento levam em conta a espacialidade e referem-se

"aos planos nacionais, regionais e estaduais de ordenação do território e de desenvolvimento

econômico e social"; ao "planejamento das regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e

microrregiões"; e ao "planejamento municipal em especial".

O planejamento municipal comporta instrumentos mais específicos, sejam eles

planos físicos que objetivam disciplinar espaços urbanos, como o plano diretor, a disciplina

do parcelamento, do uso e da ocupação do solo, e o zoneamento ambiental, sejam planos de

natureza econômica, que se destinam a regular o uso dos recursos municipais, como o plano

plurianual, as diretrizes orçamentárias e orçamento anual, e a gestão orçamentária

participativa, que também é um instrumento de gestão democrática.

São, ainda, instrumentos de planejamento os planos, programas e projetos

setoriais e os planos de desenvolvimento econômico e social.

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b) Institutos Tributários e Financeiros

Dentre os institutos, instrumentos e tributos de política financeira previstos no

Estatuto, merecem destaque o IPTU e a Contribuição de Melhoria, o primeiro por ser o

principal instrumento de arrecadação tributária do município, e o segundo, por ser um tributo

cuja potencialidade de utilização está longe de ser esgotada.

A Constituição Federal atribui ao IPTU flexibilidade, no tocante à fixação do

valor a ser cobrado do contribuinte, decorrendo daí o IPTU progressivo no tempo,

instrumento aplicado ao imóvel urbano não edificado, subutilizado ou não utilizado, previsto

no artigo 7º do Estatuto. Este instrumento consiste no aumento progressivo da alíquota do

imposto sobre a propriedade predial e territorial, por até cinco anos, podendo dobrar de ano

para ano, até atingir o teto de quinze por cento do valor venal do imóvel. Desta forma, pode se

transformar em importante instrumento de urbanismo ao induzir a utilização da infra-estrutura

instalada, restringindo os vazios urbanos e a especulação imobiliária.

Quanto à Contribuição de Melhoria, prevista na Constituição Federal (artigo 145,

inciso III), ela tem como base a valorização trazida ao imóvel em decorrência da execução de

obra pública. Possui perfeita adequação à diretriz geral de política urbana constante no

Estatuto: “justa distribuição dos benefícios e ônus decorrentes do processo de urbanização”

(artigo 2º, inciso IX).

O Estatuto da Cidade destaca, ainda, como instrumento tributário ou financeiro de

política urbana os "incentivos e benefícios fiscais e financeiros" (art.4, IV, c). Assim sendo,

temos que, tanto o aumento como a diminuição da carga tributária podem ser instrumentos de

atuação urbanística.

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c) Institutos Jurídicos e Políticos

Os instrumentos jurídicos e políticos previstos são: a) desapropriação; b) servidão

administrativa; c) limitações administrativas; d) tombamento de imóveis ou de mobiliário

urbano; e) instituição de unidades de conservação; f) instituição de zonas especiais de

interesse social; g) concessão de direito real de uso; h) concessão de uso especial para fins de

moradia; i) parcelamento, edificação ou utilização compulsórios; j) usucapião especial de

imóvel urbano; l) direito de superfície; m) direito de preempção; n) outorga onerosa do direito

de construir e de alteração de uso; o) transferência do direito de construir; p) operações

urbanas consorciadas; q) regularização fundiária; r) assistência técnica e jurídica gratuita para

as comunidades e grupos sociais menos favorecidos; s) referendo popular e plebiscito.

Dentre estes instrumentos temos alguns já muito conhecidos e largamente

utilizados como, por exemplo, a desapropriação, a instituição da servidão administrativa, as

limitações administrativas e o tombamento. Outros são introduzidos no sistema jurídico

vigente pela CF de 1988 ou pelo próprio Estatuto, como: o parcelamento, edificação ou

utilização compulsórios (art. 5 e 6), o usucapião especial de imóvel urbano (art. 9 a 14), o

direito de superfície ( art. 21 a 24), o direito de preempção (art. 25 a 27), a outorga onerosa do

direito de construir e de alteração de uso (art. 28 a 31), as operações urbanas consorciadas

(art. 32 a 34) e a transferência do direito de construir (art. 35). A concessão de uso especial

para fins de moradia, vetada no Estatuto, é matéria tratada pela Medida Provisória n. 2.200 de

2001.

Alguns dos institutos jurídicos e políticos são claramente instrumentos que

promovem a regularização fundiária, como a usucapião especial urbano (art. 9 ao 12), que

trata da regularização da posse de terrenos privados, só se aplicando para imóveis até 250 m².

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No entanto, a regularização fundiária pressupõe a identificação de situações que

estão desconformes com a legalidade urbana e civil. Neste caso, objetiva-se possibilitar

segurança jurídica aos adquirentes de boa – fé.

Por fim, o referendo popular e o plebiscito, previstos no Estatuto, possibilitam a

concretização do princípio constitucional da participação popular14.

Com a entrada em vigor do Estatuto da Cidade mesmo os instrumentos que já

constavam no texto constitucional, ao serem aplicados, podem criar situações conflituosas na

esfera jurídica, administrativa e política, com implicações concretas nas diretrizes do

planejamento urbano, uma vez que o conceito de direito de propriedade deve ser

reexaminado, a partir do conceito da função social da propriedade.

Não se pode perder o enfoque do papel social que a propriedade deve ter, até

porque a função social da propriedade já constava da Constituição de 1969.

Sobre o princípio da função social da propriedade, nos ensina o jurista Adilson

Abreu Dallari:

De acordo com a formulação constitucional, o sistema jurídico brasileiro somente consagra, comporta e ampara o direito de propriedade enquanto e na medida em que ele estiver cumprindo uma função social. Essa concepção do direito de propriedade abre imensas possibilidades para a Administração Pública no tocante a uma atuação eficiente em matéria de disciplina do uso e ocupação do solo urbano (DALLARI, 1982, p. 37).

Bom será que muitos embates administrativos, jurídicos e políticos ocorram, pois

sinalizará que a lei está sendo aplicada e só assim aperfeiçoar-se-á a conquista e plenitude dos

direitos.

14 O referendo significa a coleta de opinião acerca da aprovação ou reprovação de alguma decisão já adotada por algum órgão do governo, enquanto o plebiscito refere-se a uma consulta popular prévia, antes da tomada de decisão quer pelo Legislativo, quer pelo Executivo.

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d) Instrumentos Ambientais

Têm-se dois instrumentos que procuram assegurar a preservação do meio

ambiente: o Estudo Prévio de Impacto Ambiental – EIA – e o Estudo Prévio de Impacto de

Vizinhança – EIV. O EIA já é previsto na legislação ambiental, enquanto o EIV foi

introduzido pelo Estatuto.

O EIA é instrumento indicado para regular de forma geral as questões ambientais,

enquanto que, com o EIV, tem-se um estudo ambiental especificamente voltado para o

ambiente urbano. Sua exigência, procedimentos e conteúdo decorrem de legislação municipal.

Conforme o artigo 37 do Estatuto da Cidade “o EIV será executado de forma a contemplar os

efeitos positivos e negativos do empreendimento ou atividade quanto à qualidade de vida da

população residente na área e suas proximidades”, devendo incluir, no mínimo, a análise dos

impactos em relação ao adensamento populacional, aos equipamentos urbanos e comunitários,

ao uso e ocupação do solo, à valorização imobiliária, à geração de tráfego e demanda por

transporte público, à ventilação e iluminação, à paisagem urbana e ao patrimônio natural e

cultural.

O EIV está previsto como instrumento de mediação entre os interesses privados

dos empreendedores e o direito à qualidade de vida urbana e até, quando couber, avaliar a

repercussão desse impacto na cidade como um todo, pois o critério a ser adotado é o da

extensão do impacto e não o da localização do empreendimento.

O EIV pode possibilitar a democratização da decisão sobre grandes

empreendimentos e atividades a serem realizados na cidade, tanto pelo setor privado quanto

pelo público, ao prever publicidade de seu conteúdo, disponibilizando-os para consulta pela

sociedade (artigo 37, § único). Dessa forma, pode-se consagrar o direito de vizinhança como

parte integrante da política urbana, condicionando o direito de propriedade.

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1.2 A Política Ambiental

1.2.1 Considerações sobre a temática ambiental

A clássica obra de Engels, A situação da classe trabalhadora na Inglaterra, de

1845, já indicava a água contaminada, o excessivo e contínuo barulho, os precários cortiços

insalubres, entre outros, como fatores de degradação do meio ambiente que atingiam os

bairros operários ingleses à época (COUTINHO, 2004)15. Neste contexto, a temática

ambiental aparece associada à questão urbana e social, já no século XIX.

Nas últimas décadas do século XX, com o reconhecimento da “crise ambiental”,

que atinge também os interesses de significativa parcela das elites, esta questão ganha espaço

de discussão na academia, nos meios de comunicação e na própria opinião pública, gerando

grande produção literária. Inúmeras associações e organizações procuram ampliar o debate

sobre as questões ambientais e assumem estratégias políticas na luta contra o declínio da

“qualidade de vida no planeta”, consolidando-se “o projeto de institucionalização da

problemática ambiental” (COUTINHO, 2004, p. 21).

No processo de conscientização sobre a temática ambiental, é um marco a

publicação dos relatórios de preparação para a Conferência de Estocolmo, em 1972, que, em

síntese, representam a valorização política do meio ambiente. A institucionalização da questão

ambiental se consubstancia, em 1987, com a elaboração e divulgação do Nosso Futuro

Comum (o Relatório Brundtland)16 nome pelo qual ficou conhecido o relatório da Comissão

15 Observa Coutinho (2004, p. 21), que “como o proletariado foi durante muito tempo a exclusiva vítima da degradação ambiental, essa questão foi acobertada pelo silêncio histórico”. Deve-se apenas ressaltar que o proletariado foi sim exclusiva vítima direta da degradação, porém indiretamente ela atingia a todos. 16 O Relatório Brundtland faz parte de uma série de iniciativas que reafirmam uma visão critica do modelo de desenvolvimento adotado pelos países industrializados e reproduzido pelos em desenvolvimento (COMISSÃO, 1988).

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Mundial sobre Meio Ambiente, criada pela Assembléia Geral da ONU, que propõe estratégias

de longo prazo para alcançar um desenvolvimento sustentável.

No Relatório Brundtland, desenvolvimento sustentável é concebido como o

“desenvolvimento que satisfaz as necessidades presentes sem comprometer a capacidade das

gerações futuras de suprir suas próprias necessidades” (COMISSÃO, 1988, p. 9). No

Relatório se reconhece as limitações deste conceito impostas pelo estágio da tecnologia e da

organização social, e pela capacidade da biosfera de absorver os efeitos da atividade humana.

Os objetivos estratégicos do conceito de desenvolvimento sustentável, enunciados

no Relatório, implicam:

[...] duas etapas estratégicas em vista da institucionalização buscada: elevar a problemática ambiental ao primeiro plano da agenda política internacional e fazer com que as preocupações ambientais penetrem a formulação e implementação de políticas públicas em todos os níveis nos Estados nacionais e nos órgãos multilaterais e de caráter supranacional. (NOBRE, 1999, p.137, apud COUTINHO, 2004, p. 22).

No Brasil, no final da década de 80, inúmeros outros acontecimentos corroboram

a ampliação das discussões acerca da temática ambiental, como o fim do regime militar, a

abertura política, a criação de novos partidos políticos, entre eles o Partido Verde, que

incorporam essa nova temática, bem como o assassinato do líder seringueiro Chico Mendes,

em 1988. Este último fato, de grande repercussão nacional e internacional, deu visibilidade à

situação da Amazônia, seu acelerado desmatamento com a ampliação das fronteiras agrícolas

e o tráfico internacional de madeiras, patrocinado por “elites” nacionais e estrangeiras. Como

contrapartida, apresenta-se a situação das comunidades extrativistas locais, primeiras vítimas

desse processo em que prevalece o lucro imediato (COUTINHO e ROCCO, 2004).

A Constituição Federal de 1988 foi a primeira a tratar especificamente dessa

questão, com a inclusão do capítulo sobre o Meio Ambiente. A inserção dessa temática, da

mesma forma que a questão urbana, também se desenvolve num cenário marcado por

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desigualdade socioeconômica em que se desenham conflitos e arranjos na definição dos

interesses envolvidos nas questões relacionadas ao meio ambiente (ANCONA, 2002).

A partir de meados da década de 1980, o processo de formulação e

implementação da política de cunho ambiental passa a ser entendido, cada vez mais, como

resultado da interação entre idéias, valores e estratégias de ação dos diversos sujeitos sociais,

alterando o papel centralizador exercido pela União na condução dessa política (CUNHA e

COELHO, 2007).

1.2.2. Marcos e característica da política ambiental brasileira

A elaboração e implementação de políticas públicas com viés mais

marcadamente ambiental, surgem no Brasil, somente no século XX e intensificam-se a partir

dos anos 1970, em decorrência da maior percepção da depredação e degradação do planeta e

da preocupação com o esgotamento de recursos naturais.

Cunha e Coelho (2007) propõem uma periodização da política ambiental

brasileira, em função das características relacionadas aos seus processos de elaboração e

implementação, identificando três momentos: a) o primeiro, dos anos 1930 até 1971, é

marcado pela definição de parâmetros e construção de legislação reguladora dos usos dos

recursos naturais; b) o segundo, de 1972 a 1987, sob a égide do regime ditatorial, é marcado

pela grande ação intervencionista do Estado; e c) o terceiro tem como marco a Constituição

Federal de 88, com inclusão na Carta Magna do capítulo sobre o meio ambiente e a

incorporação da concepção de desenvolvimento sustentável no caput do artigo 225.

No primeiro período (1930-1971) as políticas públicas são destinadas à proteção

do ambiente e de seus recursos naturais, e implicam a intervenção direta do poder público na

proteção do meio ambiente. Ações de regulação estão associadas à elaboração de legislação

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específica que objetiva criar normas e regras de uso e acesso ao ambiente natural e aos seus

recursos, além de condições institucionais que garantam o cumprimento da lei. Entre os

mecanismos legais criados, destacam-se os códigos: florestais, de 1934 e 1965, das águas, de

1934, e de minas, de 1939 e 1969.

Medida importante, ainda, foi a criação das unidades de conservação para

proteger, especialmente, as áreas que, na época, já eram consideradas manchas verdes

remanescentes de Mata Atlântica. O desmatamento reflete o processo de urbanização

acelerado, com crescimento populacional desordenado e concentrado na faixa do litoral

brasileiro.

Nesse primeiro momento, são enfatizadas as questões de relevo nacional da

problemática ambiental e as ações concentram-se nas regiões Sudeste e Sul, onde

predominam os processos de industrialização e de urbanização.

O segundo período (1972-1987) é influenciado pela repercussão do Clube de

Roma, The Limits of Growth, divulgado em 1971 e, principalmente, pela Conferência das

Nações Unidas sobre Meio Ambiente, realizada em Estocolmo, em 1972. Ainda nessa época,

a crise do petróleo amplia os debates acerca da escassez dos recursos naturais. Essa

conjuntura internacional funciona como respaldo ao movimento ambientalista que, junto com

organismos financeiros internacionais, passa a exercer pressão contra o ritmo acelerado da

degradação ambiental que ocorre no Brasil, possuidor de grande patrimônio ambiental. As

políticas modernizadoras e desenvolvimentistas de integração nacional do período militar

refletem-se na construção de estradas, barragens, usinas hidroelétricas, linhas de transmissão,

atividades de mineração, entre outras, que, devido a suas peculiaridades, entram em conflito

com a política ambiental (CUNHA e COELHO, 2007).

Em função desses conflitos, são cobrados estudos dos impactos ambientais

decorrentes dessas obras e a adoção de medidas mitigadoras desses impactos.

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Este período caracteriza-se pela constituição de uma estrutura institucional para

tratar da questão ambiental, como a criação da Secretaria Especial do Meio Ambiente –

SEMA, em 1973, no âmbito do Ministério do Interior; da Companhia de Desenvolvimento do

Vale do São Francisco – CODEVASF, em 1974; e do Ministério do Desenvolvimento,

Urbanização e Meio Ambiente, em 1985; e ainda a formulação das resoluções que instituíam

a obrigatoriedade da elaboração do Estudo de Impacto Ambiental – EIA – e do Relatório do

Impacto Ambiental, em 1986 (PAGNOCCHESCHI e BERNARDO, 2006; CUNHA e

COELHO, 2007).

Devido ao aumento da preocupação com a proteção das áreas naturais, cresce o

número de unidades de conservação – são criadas pelo governo federal 76, contra 26 no

período de 1930 a 1971, além da criação de parques nacionais, florestas nacionais, reservas

biológicas, estações ecológicas, áreas de proteção ambiental, reservas ecológicas e áreas de

relevante interesse ecológico (CUNHA e COELHO, 2007). Observam-se muitas vezes, nesse

período, na trajetória das políticas ambientais, contradições em relação às estratégias de

desenvolvimento econômico.

O terceiro período, a partir de 1988, incorpora a valorização política do meio

ambiente assumindo-se na Constituição Federal, entre outros elementos, o conceito de

desenvolvimento sustentável, divulgado no Relatório Brundtland no ano anterior

(COUTINHO, 2004). São declarados patrimônio nacional a Mata Atlântica, a Floresta

Amazônica e o Pantanal.

O processo de descentralização do Estado brasileiro, de acordo com a

Constituição, estabelece a redistribuição de competências entre os entes da federação com a

divisão de responsabilidades e a complementaridade das ações na formulação das políticas

públicas, e aumento do protagonismo dos municípios. Entretanto, no caso das políticas

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ambientais, particularmente nos anos 90, ocorre sua progressiva estruturação em nível federal

e a ampliação das responsabilidades das estruturas centrais (KAWAI, 1997).

Entre 1988 e 2001, são criadas 119 unidades de conservação, devido a pressões

nacionais e internacionais. É efetivada a criação de unidades com status de uso direto, como

as reservas extrativistas, e a adequação de unidades ao modelo de reserva de desenvolvimento

sustentável, no intuito de conciliar proteção da natureza com os modos de vida tradicionais,

como parques nacionais, florestas nacionais e áreas de proteção ambiental, dentre outros. O

antigo Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal – IBDF – passa a ser denominado

Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis – IBAMA. Suas

atribuições são ampliadas, incluindo-se a responsabilidade pela administração das unidades de

conservação. O governo federal passa a coordenar o projeto de Zoneamento Econômico e

Ecológico para a Amazônia – ZEE, em resposta às críticas ao desmatamento dessa região, e

conta com apoio financeiro e técnico do Programa Piloto para a Conservação das Florestas,

lançado em 1990 pelo G7, cúpula dos sete países mais ricos do mundo (CUNHA e COELHO,

2007).

As mudanças na estratégia econômica brasileira, a partir do início da década de

90, repercutem na política tradicional de defesa de recursos naturais. A privatização dos

setores energéticos e minerais resulta na transferência de responsabilidade na condução da

gestão ambiental, para alguns seguimentos empresariais (CUNHA e COELHO, 2007).

Paralelamente, consolidam-se políticas de caráter indutor, aquelas cujas ações

objetivam influenciar o comportamento dos indivíduos ou grupos sociais. Essas políticas são

normalmente identificadas com a noção de desenvolvimento sustentável e implementadas por

meio de linhas especiais de financiamento ou de políticas fiscais e tributárias. O Estado,

através de alocação de recursos e emprego de instrumentos econômicos, passa a promover

práticas ecológicas, na tentativa de inviabilizar comportamentos predatórios. Promove ações

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que estimulam novas formas de manejo dos recursos naturais e incentiva parceria entre poder

público e sociedade civil, ampliando a construção das formas de gestão ambiental

participativa (CUNHA e COELHO, 2007).

1.2.3. Questões contemporâneas da política ambiental

A Constituição Federal de 88, da mesma forma que trouxe avanços no que diz

respeito à afirmação dos direitos fundamentais da cidadania, de direitos sociais, da função

social da propriedade, também inova nas matérias relacionadas ao meio ambiente

ecologicamente equilibrado, que passou a ser tratado como bem de uso comum do povo e

essencial à sadia qualidade de vida, cuja defesa e preservação para gerações presentes e

futuras é dever tanto do poder público como da comunidade. Não se deve desconsiderar,

também, as bases disponibilizadas pela Política Nacional do Meio Ambiente, instituída pela

Lei 6.938/81, que estabelece uma série de instrumentos para assegurar a proteção ao meio

ambiente e, por meio deles, garantir a todos um ambiente ecologicamente equilibrado, nos

termos posteriormente definidos pela Constituição Federal de 88. Dentre os instrumentos

regulados pela lei de 81, salientam-se o licenciamento ambiental, o zoneamento ambiental, a

criação das unidades de conservação, o estabelecimento de padrões de qualidade ambiental, as

penalidades disciplinares ou compensatórias pelo descumprimento das normas de proteção

ambiental.

Relativamente à utilização destes instrumentos, Rocco (2004) observa que os mais

empregados são aqueles que “possuem características de comando e controle”, ou seja, são

aqueles que asseguram o exercício de poder de polícia administrativa para o condicionamento

de atividades causadoras de alterações na qualidade do meio ambiente.

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O contexto brasileiro de democratização, no final da década de 80, contribui para

que o país seja escolhido para sediar a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente,

realizada no Rio de Janeiro, em 1992, fato que tem como um de seus principais resultados a

assinatura da Agenda 21 Global. Esta Agenda constitui-se em um plano de ação para alcançar

o desenvolvimento sustentável a médio e longo prazo, estabelece princípios e ações de gestão

ambiental para o século XXI e propõe que cada cidade realize a sua agenda local (SÃO

PAULO, 1997).

A Conferência trouxe maior visibilidade para a questão ambiental e ampliou o

debate sobre a construção de novo modelo de desenvolvimento, compatível com a

manutenção de padrões ambientais satisfatórios em todo o planeta, além de propiciar o

surgimento de novas organizações voltadas à defesa do meio ambiente. (COUTINHO e

ROCCO, 2004).

A Agenda 21 Global recomenda a criação, pelos municípios, da Agenda 21 Local,

documento que visa instrumentalizar o poder público municipal no sentido de compatibilizar

desenvolvimento econômico, proteção ao meio ambiente e justiça social, por meio de uma

metodologia que envolve uma série de atividades, ferramentas e abordagens colocadas à

disposição das autoridades locais e de seus parceiros de acordo com as circunstâncias e

prioridades locais (SÃO PAULO, 1997).

Apesar dos avanços, a eficácia das políticas ambientais disponibilizadas foi

relativa, visto que se observam ainda inúmeras ações degradadoras da qualidade ambiental

por todo o país. Consideram Cunha e Coelho (2007) que o Estado continua a patrocinar

políticas antagônicas que levam à aceleração da devastação de recursos naturais: de um lado,

normas e regras de controle ambiental; de outro, incentivos e créditos fiscais, ou reservas

legais em propriedades privadas. Ainda, a globalização e a reestruturação produtiva também

reorganizam a lógica e a dinâmica da produção dos espaços das cidades, visto que estas

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passam a integrar o circuito da acumulação financeira, alterando-se escalas, mecanismos e

velocidade da valorização imobiliária (RIBEIRO, 1997).

Observa-se que o Estado ainda permanece como espaço central de articulação dos

projetos de política ambiental e a desarticulação das políticas setoriais não foi superada, em

especial, no que concerne à política ambiental. Ao mesmo tempo, as idéias de

desenvolvimento sustentável, de manejo de recursos naturais e a democratização e

descentralização das decisões tornam-se cada vez mais influentes e os organismos

internacionais, ONGs e corporações vão ganhando maior destaque na elaboração e

implementação de políticas ambientais (CUNHA e COELHO, 2007).

1.3. Confluência das políticas urbana e ambiental

As questões associadas às temáticas urbana e ambiental estão presentes na agenda

política brasileira ao longo do século XX. Contudo participam dessa agenda com intensidades

e objetivos distintos. Enquanto a política urbana apresenta-se formulada especialmente a

partir de planos e ações que procuram enfrentar o acelerado crescimento das grandes cidades

brasileiras, a política ambiental, ao longo desse período, está vinculada à proteção do meio

ambiente e dos recursos naturais, através da constituição de legislação específica (Códigos) de

regulação do ambiente natural, no nível federal. O esforço para maior confluência destas duas

temáticas, no âmbito de formulação de políticas públicas, é percebido, particularmente, a

partir da Constituição Federal de 1988, com a introdução dos capítulos de Política Urbana e

de Meio Ambiente, e a possibilidade de sua gestão articulada com a aprovação do Estatuto da

Cidade.

O processo de mudança pode ser percebido a partir dos anos 70, num cenário

marcado pela participação do movimento ambientalista, com a presença do conflito entre o

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avanço da preocupação com a preservação dos recursos naturais e a implantação de

intervenções públicas de caráter desenvolvimentista, centrada no discurso de modernização e

pilotada pelo governo central. Observa-se contradição entre criação das unidades de

conservação, ao lado da implantação das grandes obras rodoviárias, de produção de energia,

entre outras, que dizimam os recursos naturais.

A partir dos anos 80, com o processo de democratização do país, um movimento

para a confluência das políticas urbana e ambiental aparece através das propostas da Emenda

Popular pela Reforma Urbana, com orientações que indicam, por exemplo, maior autonomia

da gestão local, com fortalecimento da sua capacidade de intervenção de modo a produzir

equilíbrio sócio-ambiental, a construção de um pacto territorial e político, com regulação

pública do uso do solo urbano, e a introdução de instrumentos que visam, entre outras

medidas, a proteção urbanística e ambiental.

A política ambiental, por sua vez, neste momento, caracteriza-se por constituir

uma estrutura institucional na esfera nacional, como com a criação do Ministério do

Desenvolvimento, Urbanização e Meio Ambiente e a obrigatoriedade dos Estudos de Impacto

Ambiental, num contexto de valorização política do meio ambiente.

As lutas dos movimentos a elas articulados, no processo de democratização do

Brasil, levaram a inclusão dos capítulos da política urbana e do meio ambiente na CF de 88.

Consagram-se o princípio da função social da propriedade e da cidade e o direito ao meio

ambiente ecologicamente equilibrado.

Ao longo dos anos 90, as políticas ambientais continuam com maior estruturação

em nível federal e com ampliação de suas responsabilidades, ao mesmo tempo em que,

ganham relevância, os processos de descentralização da gestão pública e o conceito de

desenvolvimento sustentável.

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A aprovação do Estatuto da Cidade proporciona maior capacidade de gestão dos

municípios, ao dispor de um conjunto de instrumentos de planejamento, urbanísticos e

ambientais, que representam a possibilidade de se estabelecer um projeto urbano que

incorpore a questão ambiental. Porém, a compatibilização destas políticas não é tranqüila. Há

inúmeros conflitos17, tanto entre os interesses locais, como entre aqueles que extrapolam o

território municipal, devido à amplitude dos impactos provocados por estas políticas.

Conforme Martins (2006), as questões ambientais e urbanas, a princípio, não são

antagônicas. Entretanto, observa-se certa tensão na articulação dessas questões: por um lado,

por envolverem processos e motivações nem sempre compatíveis e por outro, pela atuação de

organizações sociais com histórias e práticas políticas distintas. Esta tensão se expressa tanto

na aproximação das duas políticas, quanto nos embates presentes na formatação de cada uma.

17 Para uma aproximação dos embates existentes entre as esferas das políticas urbana e ambiental, ver Anais do Seminário APP’s Urbanas - Seminário Nacional sobre o Tratamento de Áreas de Preservação Permanente em Meio Urbano e Restrições Ambientais ao Parcelamento do Solo - realizado entre 4 e 6 de setembro de 2007, na FAU/USP.

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Capítulo 2

A política urbano-ambiental na cidade de São Paulo - 1989 a 2008

Considerada a constituição das políticas urbana e ambiental no Brasil, tem-se por

objetivo a análise de sua expressão na cidade de São Paulo, particularmente a partir da

Constituição de 88, tendo em vista o período definido para a pesquisa – 1989 a 2008.

A Constituição de 88, seus desdobramentos, no que diz respeito às questões

urbanas e ambientais, e sua regulamentação pelo Estatuto da Cidade de 2001, delimitam a

formatação da política urbano-ambiental das cidades no período em análise. Sendo assim, na

organização deste capítulo destacam-se dois momentos: a sua configuração entre 1989 e 2001

e após o Estatuto da Cidade. É privilegiado, na elaboração do capítulo, o plano diretor, por ser

o principal instrumento de sua aplicação.

Na formatação da política urbano-ambiental, prioriza-se a perspectiva que articula

as duas questões – a urbana e a ambiental, tendo em vista, este enfoque ganhar relevância nas

propostas e ações a partir da década de 80 e a definição de parque público, objeto da pesquisa,

como equipamento urbano-ambiental.

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2.1 Antecedentes

Na cidade de São Paulo, durante o século XX, as propostas de intervenções

urbanas e ambientais seguem a mesma tendência do conjunto das principais cidades

brasileiras, sendo a periodização construída no primeiro capítulo, recurso também para a

análise da política urbana na cidade.

Em São Paulo, a política urbana se expressa, durante a Primeira República, por

meio dos planos de melhoramentos e embelezamento, em inúmeras intervenções urbanas

localizadas, que refletem o ideal das metrópoles internacionais. A obra mais representativa do

urbanismo embelezador em São Paulo, segundo Villaça (2004, p. 192), é o conjunto

monumental representado pelo Museu Paulista, também conhecido por Museu do Ipiranga –

prédio de 1890, jardins de 1909 e o monumento à Independência de 1922, complementado

pela perspectiva visual proporcionada pela Avenida Dom Pedro II.

Na legislação urbanística da cidade, já em 1923, a lei municipal n. 2.611, é o

primeiro instrumento legal que prevê a criação de áreas verdes. A lei proíbe a abertura de

novas vias sem a aprovação da prefeitura e o loteador é obrigado, nas áreas iguais ou

superiores a 40 000 m², a doar 20% para as vias de circulação e reservar espaços livres de

domínio público – praças, jardins, squares, etc. - correspondentes a no mínimo 5% da área

total na zona urbana, a 7% na zona suburbana e a 10% na zona rural (BARTALINI, 1999).

Em 1934, o Ato n. 663, que consolida o Código de Obras Arthur Saboya 18,

ratifica as porcentagens estabelecidas pela Lei n. 2.611 e, dentre outras normas, traz a

possibilidade de regularização dos arruamentos já executados. As porcentagens das áreas

destinadas a espaços livres mantiveram-se até 1972, quando foi aprovada a Lei de

18 O Código Arthur Saboya, criado pela lei n. 3.247 de 19 de novembro de 1929, induz a verticalização na zona central e, por conseguinte, à valorização desses terrenos da cidade ao introduzir um zoneamento no qual seria compulsória a construção de edifícios com mais de três pavimentos na região central (ROLNIK, 1997a).

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Zoneamento19. Nesse período, quase 70% da área do município já é urbanizada. (PERRONE,

1984 apud BARTALINI, 1999). A Lei de Zoneamento, de 1972, majorou para 15% da gleba

a porcentagem de áreas verdes a serem doadas nos novos parcelamentos.

No Período Vargas, em São Paulo, elaboram-se planos urbanísticos que

correspondem à possibilidade de modernização pretendida. O destaque é para o Plano de

Avenidas que orienta uma remodelação e extensão do sistema viário, configurando-o como

um sistema articulado de vias radiais e perimetrais na cidade, e consolidando o padrão

periférico de expansão da cidade.

As obras viárias executada nas décadas de 1930 e 1940 seguem as diretrizes desse

Plano. As avenidas marginais – Tietê e Pinheiros – são implantadas acompanhando o traçado

retificado do leito dos rios, priorizando a drenagem e a possibilidade de se urbanizar as

grandes áreas inundáveis. Abandona-se o traçado dos estudos e projetos anteriores que

contemplam o aproveitamento e tratamento das margens com parques e lagos (LEME,

2005b).

O Plano de Avenidas conta com um apêndice que trata da implantação de grandes

parques, que estabeleceriam relações estéticas e de circulação com as vias arteriais, e parques

médios, com caráter localizado expressos por meio de jardins e espaços de lazer. Entretanto,

os únicos parques que se consolidam são aqueles cujo processo de criação já havia se

iniciado, como o Parque do Estado e o da Cantareira, ambos sob responsabilidade do governo

do Estado, e o parque do Ibirapuera (KLIASS, 1993).

Na Era Desenvolvimentista, de grande valorização do planejamento técnico

burocrático na formulação da política urbana, intensifica-se a realização de estudos, projetos,

propostas e planos urbanísticos, cuja influência se estende até os anos 90, visando subsidiar as

intervenções do poder público no espaço urbano. Dentre estes destacam-se: o Programa de

19 A lei n. 7.805 de 1972, denominada Lei Geral de Zoneamento.

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Melhoramentos Públicos para São Paulo, coordenado por Robert Moses e conhecido como

Relatório Moses, em 1950; o Plano Regional de São Paulo - Uma contribuição da

Universidade para o Estudo de um Código de Ocupação Lícita do Solo, elaborado por Luiz

Inácio de Anhaia Mello, em 1954; o Anteprojeto de um Sistema de Transporte Rápido

Metropolitano, elaborado pela Comissão do Metropolitano e presidida por Prestes Maia, em

1956; o Estudo da Estrutura Urbana da Aglomeração Paulistana, coordenado pelo Padre

Lebret e desenvolvido pela Sociedade para Análise Gráfica e Mecanográfica Aplicada aos

Complexos Sociais – SAGMACS, em 1957; além de publicações do Departamento de

Urbanismo da Prefeitura, em 1951 e 1961 (FELDMAN, 2005).

Todos estes estudos, planos e projetos, de alguma forma, referem-se à importância

da necessidade de prever, criar ou preservar áreas verdes e parques. Por exemplo, o Relatório

Moses apresenta uma declaração de intenções e recomendações sobre parques e praças de

recreio, em nível de diretrizes, e constata ser insuficiente a destinação máxima de 10% das

glebas a serem loteadas, para espaços livres/áreas verdes, além da localização desses espaços,

em geral fragmentados, em pequenas áreas e mal localizados. O plano diretor elaborado a

partir de estudos do SAGMACS, apenas reconhece e reforça o potencial ainda existente para

manutenção e criação de áreas livres (KLIASS, 1993, SÃO PAULO, 2004b).

Na década de 60, destacam-se as propostas do Plano do Vale do Tietê, elaboradas

por Jorge Wilheim, e os estudos que resultam no Plano de Áreas Verdes de Recreação20. Este

último plano identifica a extrema carência de espaços verdes e a associa à especulação

imobiliária e à incapacidade dos governos municipais em implantar uma política efetiva de

criação desses espaços. O estudo ainda critica a permanência da prática do poder público

20 Este Plano é resultado dos seguintes estudos coordenados por Rosa Kliass e Miranda Magnoli: 1) Áreas Verdes e Recreação. Município de São Paulo. São Paulo: PMSP, 1967; 2) Levantamentos: Características urbanas de 5 zonas de aproximadamente 25 km². São Paulo: PMSP, 1969 - Relatório Interno (SÃO PAULO, 2004b).

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municipal de locar equipamentos públicos (creches, escolas, etc.) em áreas originariamente

destinadas às áreas verdes (SÃO PAULO, 2004b).

Nova inflexão da política tem-se com o processo de democratização dos anos 80,

que se articula a um projeto de reforma urbana com regulação pública do uso do solo para a

garantia da função social da propriedade e da cidade e gestão democrática.

A Constituição de 88 consagra o direito ao meio ambiente ecologicamente

equilibrado como um direito social de todos, trazendo para o âmbito dos municípios maiores

atribuições no tratamento das questões ambientais.

Em São Paulo, os princípios constitucionais orientam a elaboração de planos

diretores além de outras medidas, cuja aplicação fica sujeita aos embates políticos nas

diferentes conjunturas, isto é, dependentes do projeto de governo dos diversos prefeitos e da

maior ou menor influência das organizações internacionais e nacionais na formação da agenda

da administração municipal.

2.2 A formatação da política urbano-ambiental (1989 a 2001)

Para análise da política urbano-ambiental deste período, retomam-se os planos

urbanísticos a partir da década de 60, pelo fato de terem, mais do que influenciado, norteado o

planejamento urbano da década de 90.

O Plano Urbanístico Básico – PUB - foi o primeiro dos grandes planos diretores

desenvolvidos para a cidade de São Paulo. Elaborado em 1968 por um consórcio de empresas,

baseia-se em sofisticada metodologia de planejamento da época, resultado de exaustivas

pesquisas, abrangendo todos os aspectos da vida urbana e estendendo-se à região

metropolitana. Aspecto relevante do PUB consiste no fato de ser o primeiro plano elaborado

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para São Paulo que incorpora uma legislação de zoneamento21. Seu amplo diagnóstico embasa

recomendações relativas à melhoria da qualidade ambiental e suas propostas possuem como

horizonte o ano de 1990 (KAWAI, 1997; FELDMAN, 2005).

Em seqüência, entre 1969 e 1970, é elaborado o Plano Metropolitano de

Desenvolvimento Integrado – PMDI, também, realizado por um consórcio de empresas,

nacionais e americanas, contratado pelo GEGRAN22 – Grupo Executivo da Grande São Paulo

e financiado pelo SERFHAU, tendo como horizonte também o ano de 1990. Baseia-se em

estudos, levantamentos, bases cartográficas e diagnósticos elaborados pelo GEGRAN e nos

diagnósticos e propostas do PUB (KAWAI, 1997; FELDMAN, 2005).

O PUB e o PMDI não são aprovados. Entretanto, são importantes na formulação

dos diagnósticos e propostas do Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado – PDDI,

aprovado23 pela Câmara Municipal em 1971. O PDDI-71, elaborado pela própria prefeitura,

na gestão Figueiredo Ferraz, apresenta metas de curto, médio e longo prazo e estabelece como

horizonte o ano de 1981.

O PDDI-71 define como objetivo geral a criação e manutenção de um ambiente

urbano favorável às funções de habitar, circular, trabalhar e recrear mediante propostas de

preservação do meio ambiente, controle da poluição e destinação de áreas adequadas a cada

uso do solo urbano.

Quanto ao meio ambiente, define normas, regulamenta as proibições e trata do

controle da poluição como um conjunto de fatores que engloba o ar, o solo, a água e o som.

21 No PUB, o zoneamento aparece como um dos elementos da lei do plano diretor, que os autores apontam como a “lei fundamental que irá disciplinar o desenvolvimento da Metrópole em todos os seus aspectos”, “ou ainda”, o documento básico de orientação das atividades públicas e particulares, visando atingir os objetivos da comunidade nos próximos vinte anos (PUB, vol.6: 384 e vol.2: 208, apud, FELDMAN, 2005). 22 O GEGRAN - Grupo Executivo da Grande São Paulo - criado em 1967, como órgão subordinado à Secretaria de Economia e Planejamento do Estado de São Paulo, com o objetivo de planejar o desenvolvimento metropolitano, coordenar os investimentos estaduais nessa área e propor a implantação de entidade que assumisse os problemas metropolitanos (KAWAI, 1997). 23 O PDDI-71 foi aprovado pela Lei Municipal n. 7.688, de 30 de dezembro de 1971.

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Dentre as propostas referentes ao meio ambiente24, as associadas às áreas verdes e parques

estão definidas no capítulo Sistema de Áreas Verdes (art.41 a 48) e, em linhas gerais:

a) criam o sistema de áreas verdes com classificação de tipologias de áreas

públicas e privadas estabelecendo incentivo à manutenção de áreas verdes

privadas;

b) estabelecem índices máximos de aproveitamento e ocupação para algumas

áreas classificadas no sistema (parques de vizinhança, praças públicas, clubes

esportivos e clubes de campo);

c) estimulam a arborização urbana e a preservação por particulares.

Neste plano, as áreas verdes são tratadas como um sistema com a finalidade de

assegurar condições ambientais e paisagísticas para a população. Esse sistema engloba: áreas

públicas, que obedecem a diferentes escalas, desde áreas de recreação infantil à reserva

natural; áreas privadas, que encampam desde os clubes às áreas arborizadas particulares. O

PDDI-71 detalha tipologia e índices de aproveitamento e associa o desenvolvimento social à

ampliação de espaços arborizados e ajardinados.

O PDDI-71 não apresenta a delimitação territorial de suas zonas de uso, falta-lhe

uma territorialidade objetiva25, assim, sua aplicação depende de legislação complementar.

Esta concepção adota o princípio de agrupar os vários aspectos da legislação de planejamento

e os remete a regulamentações independentes, como no caso da delimitação das zonas de uso

24 As demais propostas referentes ao meio ambiente no PDDI-71, são: proibir o lançamento de poluentes nos rios e atmosfera; controlar poluição sonora estabelecendo parâmetros de intensidade, bem como normas para medição, controle e penalidades; estabelecer parâmetros para controle de poluição de água e ar, bem como de fiscalização e penalidades; estabelecer normas para tratamento de resíduos, padrões de emissão e de qualidade do ar. 25 Esta é uma das colaborações mais efetivas da lei do PUB para o planejamento em São Paulo, denominado por Villaça (1995: 26) “o plano sem mapa”. Este modelo passa a ser referência para um novo formato de plano, ao qual o PDDI-71 se filia (FELDMAN, 2005).

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que, no PDDI-71, se dá com a aprovação da Lei Geral de Zoneamento26, em 1972, que vigora

até 2004.

A legislação de zoneamento assume crescente e gradativa importância e, em

conseqüência, incorporam-se à Lei de Zoneamento, leis posteriores que procuram regular e

adequar o uso e a ocupação do solo ao contexto que vai se configurando. Ocorre uma

“evolução” da lei de zoneamento, na qual se salienta, entre outras:

- a Lei 8.328/75 que trata de zonas industriais e de zonas especiais de preservação,

na área de mananciais e na zona rural, e cria a zona especial sobre imóveis de excepcional

valor histórico, cultural e paisagístico destinados à preservação;

- a Lei 8.769/78 que define zonas de uso com o objetivo de proteger as regiões

contíguas aos mananciais das represas Billings e Guarapiranga;

- a Lei 8.974/79 que dispõe sobre a obrigatoriedade de reserva de áreas verdes nos

parcelamentos das glebas e lotes;

- as Leis 9.300/81 e 9.412/81 que reorientam a ocupação do solo nas zonas rurais,

regulando a transição entre urbano e rural e têm por objetivo estimular atividades que não

prejudiquem as reservas naturais ao norte do município e os mananciais ao sul.

As leis de 79 e de 81 procuram compatibilizar a legislação municipal à lei federal

de parcelamento do solo - (Lei 6.766/79 – Lei Lehmann) - que permitiu o controle do

parcelamento do solo através da atuação conjunta das prefeituras municipais e do registro de

imóveis, estabelecendo penalidades civis para os loteamentos clandestinos. A legislação

municipal, ao regular o parcelamento do solo, adotando critérios que privilegiam o meio

ambiente, como topografia e vegetação existente, cria a possibilidade de implantação de

loteamentos populares com exigências reduzidas de infra-estrutura e geotécnicas, sob o

26 Lei n. 7.805, de 01 de novembro de 1972.

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argumento da diminuição de custos e, por conseguinte, favorecendo a aquisição dos lotes pela

população de baixa renda (SÃO PAULO, 1988; KAWAI, 1997).

A partir da década de 70, podem ser citados como relevantes os seguintes estudos

e levantamentos sobre essa temática: a Política do Verde para a cidade de São Paulo,

elaborada pela Secretaria de Serviços Municipais; e o Relatório Preliminar de Implantação do

Programa de Áreas Verdes, elaborado em 1975, pela Coordenadoria Geral de Planejamento

(SÃO PAULO, 2004b).

Somente houve a elaboração de um novo plano diretor em 1985 – o PD-85 –

durante a gestão de Mario Covas, produzido pela equipe da Secretaria de Planejamento do

município. Este plano continha amplo diagnóstico de aspectos físicos, sociais e econômicos e

da qualidade ambiental do município e apresenta como horizonte o ano de 2000, entretanto,

não foi apreciado pelo legislativo (KAWAI, 1997).

Em 1988 foi elaborado outro plano diretor – o PD-8827, na administração Jânio

Quadros, e aprovado por “decurso de prazo”, artifício legal vigente na época. A conjuntura

política de elaboração da Constituição de 88, num clima de construção de um projeto nacional

influencia os objetivos e as diretrizes estabelecidas no PD-88, que propõem: a articulação

intersecretarial; a descentralização do planejamento urbano, orçamentário e setorial; a

participação da sociedade organizada, em caráter consultivo. Estas proposições são

apresentadas junto com o discurso de melhoria da qualidade ambiental (SÃO PAULO, 1988).

O PD-88 prevê a implantação de um processo permanente e contínuo de revisão

do próprio plano28, garantido pelo aperfeiçoamento do sistema de planejamento e alimentado

pela atualização dos diagnósticos, que tiveram por base os elaborados para o PD-85. Esta

27 O PD-88 foi aprovado pela Lei Municipal n. 10.676, de 07 de novembro de 1988. 28 A indicação da necessidade desse processo de revisão do plano consta no Anexo 3 (Síntese de Estudos Básicos) da lei que o criou (SÃO PAULO, 1988).

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concepção de projeto permanente supera o padrão dos planos anteriores que se remetiam a um

horizonte de tempo definido.

A questão do meio ambiente urbano foi incorporada no PD-88 com o

entendimento de que a preservação ambiental deve ser abordada junto com a questão urbana,

focando os problemas identificados como mais graves naquele momento, como a erosão de

encostas, as enchentes e a qualidade do ar.

No PD-88 o sistema de áreas verdes engloba os parques municipais e é tratado de

maneira genérica nos artigos 34 a 41. O que deve ser ressaltado é o Anexo que acompanha a

Lei, no qual se admite a indisponibilidade de dados de quantificação e padrão de qualidade

dessas áreas.

Além disso, identifica o processo de parcelamento do solo como o principal

instrumento utilizado pela administração municipal para a reserva de espaços para áreas

verdes da cidade. Segundo a lei de parcelamento deve-se destinar 15% da gleba a ser loteada à

implantação de áreas verdes. Entretanto, este processo é avaliado como precário, por ser

restrito ao critério quantitativo e desconsiderar a localização das áreas loteadas, sua densidade

populacional ou volume de edificações previsto, mesmo com a possibilidade de a prefeitura

determinar, por lei29, a localização de metade dessa área na gleba loteada.

No Anexo referido, outro aspecto avaliado sobre a lei do parcelamento é o fato de

a maioria dos loteamentos existentes não ter sido aprovada, mas posteriormente regularizada,

sem a reserva de espaços para áreas verdes, definida na legislação. Esta situação se agrava

pelo fato de boa parte dessas áreas verdes terem sido utilizadas pelo poder público, com a

implantação de equipamentos urbanos, ou serem ocupadas irregularmente com fim

habitacional. Aponta a “falta de recursos da Prefeitura para urbanizar, conservar e fiscalizar

esses espaços públicos” (SÃO PAULO, 1988, p. 26). Reconhece ainda, que “a destinação de

29 Lei n. 4.913 de 1981.

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áreas maiores para parques tem sido esporádica e casuística”, situação que exige o

estabelecimento de nova política para a provisão de áreas com dimensões significativas para a

implantação de parques (SÃO PAULO, 1988, p. 26).

Apesar da sua concepção inovadora em alguns aspectos – articulação

intersecretarial, descentralização, participação social e relevância da questão ambiental – os

efeitos do PD-88 foram praticamente nulos. Por se constituir como um plano físico territorial

indicativo, dependia de leis especificas complementares para sua efetividade, como as

destinadas ao zoneamento, que não foram elaboradas. Na prática continua vigorando o

zoneamento e toda a legislação de uso e ocupação do solo existente desde o PDDI de 1971,

legislação identificada com o padrão tecnocrático distante do atendimento das demandas do

conjunto da cidade.

Cabe destacar a publicação em 1988 de levantamento de toda vegetação arbórea

considerada significativa no município, realizado em 1984 e 1985, pela Secretaria Municipal

de Planejamento Urbano – Sempla (SÃO PAULO, 2004b). Em 1989, esta vegetação é

declarada patrimônio ambiental do município, tornando-se imune ao corte. Entretanto, nos

anos seguintes, muitas áreas e exemplares arbóreos são suprimidos por autorização ou pela

via ilegal30.

Em 1991, é elaborado e apresentado ao legislativo municipal o plano diretor - PD-

9131, na administração de Luiza Erundina. O PD-91, construído em consonância com o

projeto de governo de democracia popular deste momento, tem por concepção o rompimento

com o planejamento tecnocrático, repudiando o plano como modelo de cidade ideal. Procura

propor um pacto territorial a partir de propostas negociadas com os vários agentes

30 Apesar do Decreto Estadual n. 30.443/89 ter declarado a vegetação levantada nesse programa patrimônio ambiental do município, constata-se a supressão de várias áreas com essa vegetação. Foi realizada a atualização desse levantamento para uma pequena área (Bacia do Córrego Cabuçu de Baixo) na Zona Norte, entretanto, ressalta-se a necessidade de atualização do levantamento para todas as áreas da cidade (SÃO PAULO, 2004b). 31 Projeto de Lei 02/91, indicado como PD-91.

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intervenientes na construção da cidade real e do estabelecimento de espaços de interlocução

com a sociedade na elaboração de políticas urbanas, produzindo legislação urbanística com

regras simples e claras, com o objetivo de serem mais acessíveis ao cidadão comum (SÃO

PAULO, 1991b).

Os estudos realizados pela Secretaria Municipal de Planejamento (Sempla)32, que

subsidiam a elaboração do Plano Diretor de 1991, indicam que do total de 31,3 km² de áreas

verdes da cidade (originadas a partir dos loteamentos), somente cerca de 10,6 km² estão

ocupadas com esse uso (praças e canteiros, devido as pequenas dimensões). Nos 20,7 km²

restantes tem-se aproximadamente: 5 km² vazios e 15 km² ocupados por outros usos (sendo

10 km² por favelas). A partir destes dados, isto é, com cerca de um terço das áreas verdes

ocupadas por favelas, torna-se evidente como se processa o desenvolvimento urbano de São

Paulo. Constata-se, ainda, ausência de fiscalização e abandono dessas áreas pelas

administrações municipais.

O PD-91 compatibiliza-se com a Lei Orgânica do Município, aprovada no ano

anterior, no que diz respeito à existência de estreito relacionamento entre política de

desenvolvimento urbano e condições para a melhoria da qualidade ambiental. Dentre as

premissas do PD-91 constam: superar os instrumentos legais de preservação que sejam de

caráter punitivo ou restritivo; incorporar características do meio físico na legislação de uso e

ocupação do solo; retirar da zona rural o caráter de zona de expansão urbana e valorizar seu

potencial como cinturão verde e área estratégica para proteção de mananciais (SÃO PAULO,

1991). Apesar de sua construção ser amplamente discutida, o Projeto de Lei do PD-91 não foi

aprovado.

32 Este estudo realizado por Sempla/Deplano (Coordenadoria de Política Fundiária e Ambiental) encontra-se sistematizado no artigo de Silva (1993, p.434).

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2.2.1 A Lei Orgânica Municipal

A Lei Orgânica Municipal (LOM) equivale à Constituição Municipal. Sua

elaboração passa a ser atribuição de cada município a partir da Constituição Federal de 1988.

A LOM é aprovada em 1990, num contexto em que se reconhece a necessidade de integração

entre políticas ambientais e políticas de desenvolvimento. A LOM consolida vários princípios

dessa integração e pode ser considerada um avanço na formulação de objetivos e diretrizes

para a gestão urbana (SÃO PAULO, 1993).

Sua missão consiste em organizar a estrutura e as ações dos Poderes Municipais:

Executivo e Legislativo. Quanto ao orçamento, a LOM determina que leis do Poder Executivo

estabeleçam o plano plurianual, as diretrizes orçamentárias e os orçamentos anuais. O Plano

Plurianual – PPA – estabelece, de forma regionalizada, as diretrizes, objetivos e metas da

administração pública municipal para as despesas de capital e de programas de duração

continuada, relativas a um período de quatro anos. A Lei de Diretrizes Orçamentárias – LDO

– compreende as metas e prioridades da administração, incluindo as despesas para o exercício

financeiro subseqüente, orientando a lei orçamentária anual e possíveis alterações na

legislação tributária. A Lei Orçamentária Anual – LOA – refere-se ao orçamento fiscal e aos

investimentos da administração e de seus órgãos e empresas (art.137 da LOM).

A LOM estabelece que a administração e o exercício das atividades do município

devem se basear num processo de planejamento de caráter permanente, descentralizado e

participativo, como instrumento de democratização de gestão da cidade. Pela LOM, integram

o processo de planejamento do município: o plano diretor, o plano plurianual e os planos

setoriais, regionais, locais e específicos (art. 144).

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A Emenda de n. 30 à LOM de São Paulo, aprovada em fevereiro de 2008, institui

a obrigatoriedade de elaboração e cumprimento do Programa de Metas33 pelo Prefeito eleito

ou reeleito. Este instrumento de planejamento obriga o prefeito eleito a se comprometer, por

escrito, com seu próprio programa de governo, que deve ser elaborado em conformidade com

a lei do plano diretor. A Emenda n. 30 representa a possibilidade das propostas políticas

eleitorais serem constituídas em conformidade com os instrumentos de planejamento, os

recursos e sob controle social, e, por conseguinte, a minimização dos devaneios e desserviços

que marcam muitas das campanhas eleitorais.

De acordo com a LOM, da mesma forma que a Constituição de 88, a política

urbana do município tem por objetivo ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais

da cidade, propiciar a realização da função social da propriedade e garantir o bem estar de

seus cidadãos (art. 148) e, para tanto, estabelece que o plano diretor consiste em instrumento

global e estratégico da política de desenvolvimento urbano e de orientação de todos os

agentes públicos e privados que atuam na cidade (art. 150).

Em relação ao meio ambiente, a LOM estabelece que o Município, em cooperação

com a União e o Estado, promoverá a preservação, conservação, recuperação e melhoria do

meio ambiente. Especificamente quanto aos parques municipais, estabelece que estes

constituem espaços especialmente protegidos, assim como outras regiões ambientalmente

significativas no município, como a Serra da Cantareira, o Pico do Jaraguá, as represas e os

demais mananciais e os rios e suas margens. A implantação, preservação e ampliação de áreas

verdes deve ser política do município associada à promoção, recuperação e ao aumento de

áreas públicas (art. 185 e 186).

33 A Emenda n. 30 acrescenta o artigo 69-A à LOM, pelo qual o Prefeito, eleito ou reeleito, deverá apresentar o Programa de Metas de sua gestão, até noventa dias após sua posse, que conterá as ações estratégicas, os indicadores e metas quantitativas da administração, observando, no mínimo, as diretrizes de sua campanha eleitoral e os objetivos, as diretrizes, as ações estratégicas e demais normas do Plano Diretor Estratégico. A Emenda ainda prevê: ampla divulgação e controle social do Programa de Metas; a incorporação de suas prioridade e ações estratégicas às leis orçamentárias; a incorporação de suas diretrizes ao projeto de lei do PPA.

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Na LOM observam-se dois aspectos que derivam do contexto vigente no

momento de sua elaboração – virada da década de 80 para 90 – quais sejam: a referência a

ainda um menor número de instrumentos passíveis de serem aplicados e, quanto à política

ambiental, maior dependência dos demais órgãos públicos nacionais, configurando a vigência

de maior centralização na elaboração de tal política.

2.2.2 A Agenda 21 Local

A Agenda 21 decorre da ECO-92, um marco na política ambiental brasileira. Seu

reflexo na esfera municipal corresponde à elaboração da Agenda 21 Local. Em atenção a essa

demanda, São Paulo conta, num primeiro momento, ainda em 1992, último ano da gestão de

Luiza Erundina, com a formação de um grupo de trabalho, composto por entidades civis e

pelo poder público, que elabora diagnósticos e propostas de ação em diversas áreas. Este

documento é considerado, na ocasião, a primeira proposta de política ambiental de longo

prazo para cidade (SÃO PAULO, 1997).

Somente a partir de 1994, a administração municipal retoma a Agenda 21 Local,

obtendo sua aprovação pelo Conselho Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento

Sustentável – CADES34 - em 1996 (SÃO PAULO, 1997). A Agenda 21 Local de São Paulo, a

partir de um diagnóstico, contextualiza o município de São Paulo no panorama mundial da

globalização e suas repercussões no desenvolvimento da cidade. Adota a estrutura de proposta

de intervenções para os problemas urbanos, dividindo-se em quatro grandes blocos:

34 O CADES é um órgão deliberativo e consultivo em questões referentes à preservação, conservação, defesa, recuperação e melhoria do meio ambiente natural, construído e do trabalhado, em todo o território do município de São Paulo. Foi instituído nos termos da Lei n. 11.426 de 18/10/1993, que também criou a Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente – SVMA, e regulamentado pelo Decreto n. 33.804, de 17/11/1993. O CADES é presidido pelo secretário da SVMA e composto por 30 membros: 15 de órgãos da administração municipal, 2 de órgãos do governo estadual e 1 do federal, 3 representações unitárias das Universidades sediadas no município, do Ministério Público Estadual e da Câmara Municipal, além de 9 representantes da sociedade organizada. Disponível em: <htpp://portal.prefeitura.sp.gov.br> Acesso em março de 2007.

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desenvolvimento urbano, desenvolvimento social, qualidade ambiental e estrutura econômica

e administrativa.

No diagnóstico da qualidade ambiental, a Agenda 21 Local aponta que políticas

públicas equivocadas de uso e ocupação do solo, aliadas aos mecanismos de especulação

imobiliária e a deterioração gradual das condições sociais, levam o município a uma

degradação ambiental, caracterizada por carência de áreas verdes, impermeabilização

excessiva do solo, ocupação das encostas e aumento generalizado das formas de poluição.

A Agenda 21 Local, no que se refere às áreas verdes, prevê a melhora de seu

manejo, a ampliação dos canais de comunicação com os usuários, o incremento dessas áreas

através da preservação, e a incorporação de áreas com valor ambiental e daquelas sujeitas à

ocupação imobiliária. Reconhece que nas regiões periféricas da cidade a situação se agrava

em função da ausência, inadequação e insuficiência de áreas verdes. Este quadro se completa

pela ação do mercado imobiliário, em duas situações: na ilegalidade da ocupação do solo,

especialmente nas áreas de mananciais, e na pressão do setor imobiliário sobre áreas

particulares que abrigam porções significativas de vegetação.

Assinala, ainda, a ausência de planejamento na gestão de áreas verdes públicas e a

desarticulação das políticas setoriais do município. A interface entre as questões relativas às

áreas verdes, regularizações fundiárias e sociais não podem ser resolvidas sem a intervenção

do poder público. Estabelece objetivos, ações e meios de implementação de propostas que

buscam alterar esse quadro (SÃO PAULO, 1997).

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2.3 A política urbano-ambiental de São Paulo a partir do Estatuto

da Cidade

Com a aprovação do Estatuto da Cidade em 2001, inicia-se nova fase dos planos

diretores que conta com três importantes aspectos que a diferencia da anterior, quais sejam

(BONDUKI, 2007):

1) a possibilidade de fazer valer a função social da propriedade e da cidade, de

propiciar uma contrapartida adequada ao aumento da potencialidade do uso do

solo e a efetivação da regularização fundiária, com a utilização dos novos

instrumentos criados pelo Estatuto da Cidade;

2) a possibilidade de uma efetiva participação popular e de suas entidades

representativas no planejamento urbano;

3) a possibilidade de se alterar o tratamento desarticulado e pontual que sempre se

dedicou às cidades, a partir da gestão urbana integrada de políticas setoriais.

Neste contexto é que deve ser inserido o processo de elaboração e aprovação do

Plano Diretor Estratégico de São Paulo35, o PDE-2002, comprometido com o cumprimento da

função social da propriedade e a aplicação dos instrumentos urbanísticos previstos no Estatuto

da Cidade, no segundo ano da administração de Marta Suplicy.

Conforme o artigo 2º, o PDE-2002 “é instrumento global e estratégico da política

de desenvolvimento urbano” e, como parte integrante do processo de planejamento, suas

diretrizes e prioridades devem estar incorporadas no Plano Plurianual, nas Diretrizes

Orçamentárias e no Orçamento Municipal.

O Plano determina o ano de 2006 como prazo “para o desenvolvimento das ações

estratégicas previstas, proposição de ações para o próximo período e inclusão de novas áreas

35 O PDE-2002 foi aprovado pela Lei Municipal n. 13.430, de 13 de setembro de 2002.

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passíveis de aplicação dos instrumentos do Estatuto da Cidade”; o ano de 2012 é prazo “para

o cumprimento das diretrizes propostas” (art. 5º do PDE-2002).

No PDE-2002 a questão ambiental é considerada como central para o

desenvolvimento urbano e não mera atividade setorial. As políticas ambientais e de

desenvolvimento urbano estão dispostas de forma integrada e estabelecem os princípios que

definem o Plano Urbanístico-Ambiental (art.101 a 259).

2.3.1 O Plano Urbanístico-Ambiental do PDE-2002

O Plano Urbanístico-Ambiental define: I) as normas de uso e ocupação do solo;

II) o conjunto dos elementos estruturadores e integradores da urbanização do território e; III)

os instrumentos de gestão urbana e ambiental para o controle, gestão e promoção do

desenvolvimento urbano.

2.3.1.1.Uso e ocupação do solo

O PDE-2002 indica o destino que se quer dar a cada uma das regiões

administrativas do município36, e prevê a elaboração dos Planos Regionais Estratégicos por

Subprefeitura (art.6), conforme diretriz do Estatuto da Cidade. Desta forma, a metodologia

adotada foi a divisão do território em áreas com características urbanas e sociais homogêneas.

Abandona-se a divisão em zona rural e urbana e estabelecem-se duas macrozonas: a de

proteção ambiental e a de estruturação urbana. Prevalece a criação de um referencial espacial

para a proposta de uso e ocupação do solo em consonância com a política urbana,

36 O território do município de São Paulo está dividido em 31 regiões administrativas denominadas de Subprefeitura, que substituem as Administrações Regionais. Dentre as atribuições das Subprefeituras consta planejar, controlar e executar os sistemas locais, obedecendo as políticas, diretrizes e programas fixados pela instância central (Lei n. 13.399 de 01/08/2002).

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possibilitando a aplicação adequada de seus instrumentos frente à estratégia urbana

estabelecida.

Na Macrozona de Proteção Ambiental, os núcleos urbanizados, as edificações e

os demais usos e suas intensidades, subordinam-se à necessidade de manter e restaurar a

qualidade do ambiente natural (art. 148). Em função dos diferentes graus de proteção, divide-

se em três macroáreas (artigos 150 a 153 do PDE):

1) Macroáreas de Proteção Integral: englobam as reservas florestais, os parques

estaduais, os parques naturais municipais, as reservas biológicas e outras unidades de

conservação que tenham por objetivo a proteção da natureza, sendo admitidos apenas usos

que não envolvam coleta, consumo, dano ou destruição dos recursos naturais;

2) Macroáreas de Uso Sustentável: abrange as Áreas de Proteção Ambiental -

APAs, as Reservas Particulares do Patrimônio Natural – RPPNs, e demais áreas cuja função

seja compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável dos recursos naturais,

sendo permitido usos econômicos como agricultura, turismo, lazer e parcelamento;

3) Macroáreas de Conservação e Recuperação: são áreas impróprias à ocupação

urbana, por motivo geotécnico ou por apresentar vegetação significativa e as áreas que

integram os mananciais de abastecimento, onde a ocupação urbana já ocorreu de forma

ambientalmente inadequada, sendo o objetivo principal qualificar os assentamentos existentes

e minimizar os impactos.

A aplicação dos instrumentos ambientais, urbanísticos e jurídicos nessas

macroáreas apresenta medidas restritivas de acordo com o grau de proteção pretendida para a

sua preservação (art. 150 do PDE).

A Macrozona de Estruturação e Qualificação Urbana apresenta diferentes graus

de consolidação e qualificação. Para orientar o desenvolvimento urbano e a aplicação dos

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instrumentos urbanísticos e jurídicos divide-se em quatro macroáreas (artigos 154 a 158 do

PDE):

1) Macroárea de Reestruturação e Requalificação Urbana: são áreas urbanizadas e

consolidadas, há mais de meio século, como o centro metropolitano, a orla ferroviária, os

antigos distritos industriais e o entorno das marginais e que, atualmente, sofrem processos de

esvaziamento populacional e desocupação de imóveis, mas possuem infra-estrutura,

acessibilidade e oferta de emprego;

2) Macroárea de Urbanização Consolidada: formada pelos bairros estritamente

residenciais, classe alta e média alta, e por áreas que têm sofrido forte processo de

verticalização e adensamento construtivo, e, embora conte com boa urbanização e altas taxas

de emprego, apresentam esvaziamento populacional e saturação da malha viária. Nestas áreas

o plano diretor desestimula o adensamento com aplicação de fator mais alto no cálculo da

outorga onerosa do direito de construir;

3) Macroárea de Urbanização em Consolidação: é área que possui grau básico de

urbanização, mas requer qualificação urbanística, pode atrair investimentos imobiliários e

apresenta taxa de emprego e condições socioeconômicas intermediárias em relação às

macroáreas de urbanização consolidada e a de urbanização e qualificação. Aqui se procura

estimular a ocupação do território, ampliando a urbanização e as oportunidades de emprego

por meio do estímulo à produção imobiliária à população de baixa e média renda, e ampliação

da infra-estrutura, em especial o transporte público de massa;

4) Macroárea de Urbanização e Qualificação: é a ocupada pela população de baixa

renda, com forte concentração de favelas e loteamentos irregulares, apresenta infra-estrutura

básica incompleta, faltam equipamentos urbanos e pequena taxa de emprego. Objetiva-se,

para estas áreas, promover a urbanização, a regularização fundiária, estimular a construção de

habitação de interesse social - HIS, qualificá-las urbanisticamente com a criação de novas

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centralidades e espaços públicos, equipamentos, serviços, transporte público e estrutura viária,

com estímulo à criação de empregos por meio de localização de indústrias e serviços.

A seguir, constam as Figuras 1 e 2, indicando, respectivamente, o

macrozoneamento e as macroáreas estabelecidos no PDE-2002.

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Fonte: Plano Diretor Estratégico de São Paulo – 2002

Figura 1: Macrozoneamento do PDE-2002 de São Paulo

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Fonte: Plano Diretor Estratégico de São Paulo – 2002.

Figura 2: Macroáreas do PDE-2002 de São Paulo.

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No PDE-2002, a utilização dos instrumentos na Macrozona de Estruturação e

Qualificação Urbana coloca-se de maneira a atender, prioritariamente, aos objetivos propostos

em cada macroárea. Instrumentos como Áreas de Intervenção Urbana e o Direito de

Preempção, que serão detalhados adiante, e que estão no PDE-2002 diretamente associados à

provisão de parques públicos, são previstos para as áreas que demandam maior qualificação

urbana, ou seja, a de Urbanização em Consolidação (art. 157, § 3º) e a de Urbanização e

Qualificação (art. 158, § 3º), sendo que esta última contempla, ainda, a implantação de

parques lineares.

O PDE-2002 define os Coeficientes de Aproveitamento (CA)37 básico, mínimo e

máximo do solo urbano para as macroáreas delimitadas. O CA básico define o potencial

construtivo gratuito. A passagem do coeficiente básico para o máximo fica condicionada a

três instrumentos, conforme dispõe o Estatuto da Cidade: a outorga onerosa do direito de

construir, a operação urbana consorciada e a transferência do direito de construir38. O CA

mínimo, por sua vez, deve submeter ao parcelamento, edificação ou utilização compulsórios.

No estabelecimento das macroáreas tem especial importância o coeficiente de

aproveitamento básico, que funciona como instrumento de incentivo ou desestímulo ao

adensamento, conforme a definição dos valores a serem pagos com a outorga onerosa do

direito de construir. Estes valores crescem à medida que se pretende utilizar o instrumento em

áreas mais urbanizadas e qualificadas (BONDUKI, 2007).

37 A constituição de um coeficiente único para o solo urbano e a possibilidade de ultrapassá-lo onde a conveniência urbanística expressa na lei permitir, mediante o pagamento de contrapartida destinada a fins específicos, busca resolver a contradição na legislação tradicional de zoneamento, objeto de inúmeras críticas. Uma das críticas que se faz a esse tipo de legislação, que determina coeficientes de aproveitamento diferenciados para as diversas zonas em que o solo urbano foi dividido, num mercado imobiliário dinâmico, é que ela estabelece diferenciais de valor para os terrenos, conforme a maior ou menor possibilidade de construção, sempre que haja mercado para os produtos finais (SÃO PAULO, 2004c). 38 Quanto aos embates, interesses envolvidos e estratégia empregada para a determinação dos coeficientes de aproveitamento no processo de aprovação do PDE-2002, ver BONDUKI, 2007.

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2.3.1.2 Os elementos estruturadores e os integradores

Os elementos estruturadores e os integradores organizam a urbanização do

território da cidade. No Plano Urbanístico e Ambiental os elementos estruturadores – as redes

estruturais hídrica, viária, de transportes e eixos e pólos de centralidade – constituem o

arcabouço permanente da cidade e procuram compatibilizar o tecido urbano ao sítio natural.

Por sua vez, os elementos integradores – as áreas verdes, os espaços públicos, os

equipamentos sociais, a habitação e os espaços de comércio, serviço e indústria –, constituem

o tecido urbano que permeia os eixos estruturadores e abriga as atividades dos cidadãos (art.

101).

O Plano Urbanístico-Ambiental, para o tratamento da rede estrutural hídrica,

institui o Programa de Recuperação Ambiental de Cursos D’Água e Fundos de Vale, que visa

promover transformações urbanísticas e a valorização e a melhoria da qualidade ambiental da

cidade, com a implantação de Parques Lineares e Caminhos Verdes. Com os Parques

Lineares, elemento de recuperação da rede hídrica estrutural, objetiva recuperar o sítio natural

e ampliar as áreas verdes, e com os Caminhos Verdes pretende interligar os parques da cidade

e os parques lineares a serem implantados, mediante requalificação paisagística com maior

arborização, e permeabilidade das calçadas (art. 106). A implantação de parques lineares

dotados de equipamentos comunitários de lazer, como forma de uso dos fundos de vale,

corresponde a uma ação estratégica da política ambiental (art. 57 do PDE-2002).

Em 2002, com o Plano Diretor Estratégico (PDE), amplia-se o conceito do

Sistema de Áreas Verdes. Antes de caráter essencialmente urbanístico passa ao de

preservação e recuperação. Os principais destaques na formulação do Sistema de Áreas

Verdes, dado pelo PDE-2002, são: a adoção dos conceitos estabelecidos no Sistema Nacional

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de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC)39 e o seu emprego como um dos elementos

integradores da urbanização. O Sistema de Áreas Verdes “é constituído pelo conjunto de

espaços significativos ajardinados e arborizados, de propriedade pública ou privada,

necessários à manutenção da qualidade ambiental urbana tendo por objetivo a preservação,

proteção, recuperação e ampliação desses espaços” (art. 131 do PDE-2002).

O parque integra o Sistema de Áreas Verdes, e é classificado como “parque

público” quando corresponde a Área Verde de Propriedade Pública. De acordo com o nível de

interesse de preservação e proteção, é denominado “parque” quando associado à Área Verde

Pública de Proteção Integral e como “parque urbano” quando se trata de Áreas Verdes

públicas ou privadas de Uso Sustentável (artigos 132 e 133).

A implementação do Sistema de Áreas Verdes no Plano Urbanístico-Ambiental,

atende aos objetivos da Política Ambiental estabelecidos no PDE-2002 (art. 55),

correspondentes à proteção e recuperação do meio ambiente e da paisagem urbana, e à

ampliação de áreas integrantes do Sistema de Áreas Verdes.

O Sistema de Áreas Verdes atende, ainda, ao estabelecido na Política de Áreas

Verdes, do PDE (artigos 58 a 60), que indica como objetivos: ampliar as áreas verdes

melhorando a relação de área verde por habitante, e assegurar usos compatíveis com a

preservação e proteção ambiental nas áreas integrantes do Sistema de Áreas Verdes; e assinala

que são diretrizes, entre outras: o adequado tratamento da vegetação enquanto elemento

integrador da paisagem urbana; a gestão compartilhada das áreas verdes públicas; a criação de

39 O Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza – SNUC – foi instituído pela Lei Federal n. 9985, de 18 de julho de 2000, que também regulamenta o artigo 225, parágrafo 1º e incisos I, II, III e VII, da Constituição Federal (BRASIL, 2007). O SNUC define Unidades de Conservação como “espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração, ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção” (artigo 2º, inciso I, da Lei 9985/2000). O conceito das Unidades de Conservação no Brasil evoluiu do enfoque estético e recreativo para o de proteção da biodiversidade. Atualmente, os principais objetivos do estabelecimento de áreas protegidas são: preservar sítios naturais e culturais; resguardar e regular o suprimento de recursos de alto valor; manter as características e a diversidade paisagística (SÃO PAULO, 2004b).

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instrumentos legais destinados a estimular a parceria entre setor público e privado na

implantação e manutenção de áreas verdes; a recuperação de áreas verdes degradadas.

Dentre as ações estratégicas da política de Áreas Verdes, voltadas ao atendimento

destes objetivos destacam-se: a implantação de áreas verdes em cabeceiras de drenagem e o

estabelecimento de programas de recuperação dessas áreas; a interligação entre as áreas

verdes no intuito de estabelecer ligações de importância ambiental regional; criação de

programas para implantar áreas verdes em conjuntos habitacionais e loteamentos; implantação

de praças e parques em áreas remanescentes de desapropriação; e elaboração de mapa de

áreas verdes do município identificando as áreas integrantes do Sistema de Áreas Verdes.

De acordo com as diretrizes e as ações estratégicas estabelecidas para o Sistema

de Áreas Verdes, particularmente as relativas à implantação de parques, o PDE-2002

estabelece metas para 2006 e 2012 (Quadro n.5 e Mapa n. 1, integrantes da lei do PDE-2002).

Quadro 1: Programa de Parques Públicos previstos no PDE de SP, para 2006 e 2012.

Nº Subprefeituras Parques 2006

1 Perus Rodoanel Oeste 2 Pirituba Pinheirinho D’Água 3 M’Boi Mirim Jardim Herculano 4 Cidade Ademar Darci Silva 5 Socorro Rodoanel Sul 6 Socorro Jardim Shangrilá 7 Socorro Guanhembu 8 Sé Parque Dom Pedro 9 Pinheiros Sumidouro 10 Butantã Colina de São Francisco 11 Itaim Paulista Cidade Kemel 12 São Miguel Chácara das Flores 13 Guaianases Vila do Rodeio

Subprefeituras Parques 2012

14 Cidade Ademar Itatinga 15 Socorro Cratera de Colônia 16 Perus/Pirituba Recuperação de aterro sanitário 17 Tremembé/Jaçanã Recuperação de aterro sanitário 18 Ermelino Matarazzo Jardim Primavera 19 São Mateus Recuperação de aterro sanitário 20 Itaquera Recuperação de aterro sanitário 21 Itaquera Ecológico do Carmo

Fonte: Secretaria Municipal do Meio Ambiente, 2002. Elaboração Sempla. Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo. Quadro 5, anexo à Lei n. 13.430/2002. Parques 2006 e 2012 apud SÃO PAULO, (2004c).

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Como ação estratégica do PDE-2002, tem-se também o Programa de Recuperação

Ambiental de Cursos D’água e Fundos de Vale, com o estabelecimento de metas para a

implantação de Parques Lineares, apresentadas no Quadro 2, a seguir:

Quadro 2: Parques Lineares previstos no PDE de SP, para 2006 e 2012

Nº Subprefeituras Parques Lineares 2006

1 Freguesia do Ó/Brasilândia Córrego Corumbé-Bananal-Itaguaçu 2 Santana/Tucuruvi Córrego Guaraú 3 Perus Córrego Pirituba 4 Perus Córrego Areião 5 M’Boi Mirim Córrego Capão Redondo 6 Pirituba Ribeirão dos Perus 7 Butantã Afluentes do rio Jaguaré e do rib. Pirajussara 8 Penha Córrego Franquinho 9 Ipiranga Córrego dos Meninos 10 Penha Córrego Tiquatira 11 Itaim Paulista/Guaianazes Ribeirão Lageado/ córrego Água Limpa 12 Itaquera Rio Verde 13 Itaquera Rio Jacu 14 Itaquera Rio Aricanduva 15 São Mateus Córrego Mombaça

Subprefeituras Parques Lineares 2012

1 Tremenbé/Jaçanã Córrego Cabuçu/ ribeirão Piracema 2 Tremenbé/Jaçanã Ribeirão Engordador 3 Tremenbé/Jaçanã Rio Piqueri/ Córrego Cassununga 4 Tremenbé/Jaçanã Córrego Cantareira 5 Tremenbé/Jaçanã Córrego Tremembé 6 Santana/Tucucruvi Av. Sezefredo Fagundes (trecho rio Piqueri) 7 Perus Córrego Santa Fé 8 Perus Córrego Antonio Inocêncio de Souza 9 Santana/Tucuruvi–Tremenbé/Jaçanã Córrego Tremembé (avenida Dr. A. M. Laet) 10 Cidade Ademar Córrego Pedreiras 11 Pirituba Córrego Água ou Vargem Grande 12 Butantã Córrego Itaim 13 Butantã Rio Jaguaré 14 Pirituba Córrego Parque Cidade de Toronto 15 Guaianases Ribeirão Guaratiba/córrego Itaquera 16 São Mateus/Guaianazes Rio Aricanduva 17 São Mateus Córrego do Limoeiro 18 São Mateus Córrego Caguaçu 19 Sapopemba/V. Prudente-São Mateus Ribeirão do Oratório 20 Guainases Rio Itaquera Mirim 21 Ipiranga Córrego Ourives 22 Itaim Paulista Ribeirão Três Pontes/Parque Santa Amélia

Fonte: Plano Diretor Estratégico do Município de São Paulo. Quadro 4, anexo à Lei n. 13.430/2002. Parques Lineares 2006 e 2012 apud SÃO PAULO (2004c).

A seguir, na Figura 3, apresenta-se a localização dos parques públicos e parques

lineares propostos no PDE-2002.

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Fonte: Plano Diretor Estratégico de São Paulo – 2002. Figura 3: Parques públicos e lineares propostos no PDE-2002 de São Paulo.

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2.3.1.3 Instrumentos de gestão urbana e ambiental

A divisão do território em áreas territoriais com características urbanas e sociais

homogêneas (as macroáreas) estabelece um referencial espacial de desenvolvimento urbano.

Os instrumentos urbanísticos identificados com essa proposta de uso e ocupação, quando

aplicados, podem conduzir as ações ao atendimento dos objetivos e diretrizes do plano diretor.

Dentre os instrumentos adotados pelo PDE-2002, são comentados a seguir alguns

dos que apresentam potencialidade na provisão de parque público, tais como: transferência do

direito de construir, direito de preempção, operações urbanas consorciadas, áreas de

intervenção urbana, concessão urbanística, fundo de desenvolvimento urbano, licenciamento

ambiental e instrumentos de gestão ambiental: termo de compensação ambiental, termo de

ajustamento de conduta, zoneamento ambiental, programa de intervenções ambientais e

avaliação ambiental estratégica.

Transferência do Direito de Construir

O Executivo poderá autorizar o proprietário de imóvel privado ou público a

exercer o direito de construir em outro local passível de receber o potencial construtivo. Essa

transferência pode se dar para a implantação de equipamentos urbanos e comunitários

(incluindo parques, praças e equipamentos de esporte, cultura e lazer) e para fins de

preservação, quando o imóvel é considerado de interesse histórico, ambiental, paisagístico,

social ou cultural (art. 217). A aplicação do instrumento é regulada para imóveis, lotes ou

glebas localizados na Macrozona de Proteção Ambiental ou em propriedade particular,

enquadrada no Sistema de Áreas Verdes, e para imóveis situados nas faixas aluviais dos

parques lineares (art. 219). Sobre este aspecto, a Lei de Uso e Ocupação do Solo – LUOS,

aprovada em 2004, e adiante tratada, estabelece que na Macrozona de Proteção Ambiental não

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é possível ultrapassar o potencial construtivo básico e não se aplica a outorga onerosa. O

potencial construtivo virtual dos imóveis desta área somente poderá ser transferido para as

áreas passíveis de recepção da transferência do direito de construir definidas no PDE-2002 e

na LUOS, localizadas na Macrozona de Estruturação e Qualificação Urbana (art. 106 da

LUOS).

Direito de Preempção

O Direito de Preempção é um instituto jurídico que visa conferir ao Poder Público

preferência para adquirir imóvel urbano numa relação comercial entre particulares. Essa

limitação no direito de livre disponibilização do imóvel urbano se fundamenta na função

social da propriedade e na atribuição do Poder Público de condicionar o exercício desse

direito à política urbana. Em razão do interesse público, a finalidade do instrumento é

constituir um banco de áreas públicas e controlar os preços dos imóveis, especialmente,

naquelas áreas em que os preços são mais sujeitos a elevação, em função da especulação

imobiliária (BRASIL, 2001).

Nos termos do Estatuto da Cidade, o Poder Público exercerá o direito de

preempção quando necessitar de áreas para regularização fundiária, execução de programas e

projetos sociais de interesse social, constituição de reserva fundiária, ordenamento e

direcionamento da expansão urbana, implantação de equipamentos urbanos e comunitários,

criação de espaços públicos de lazer e área verdes, criação de áreas de proteção e conservação

ambiental e proteção de áreas de interesse histórico, cultural ou paisagístico.

O PDE-2002 determina quais áreas estão sujeitas ao direito de preempção, apesar

de não haver essa previsão no Estatuto da Cidade, associando-as à provisão de parques

públicos (artigos 204 e 208) e de reservatórios, conhecidos como piscinões. A Figura 4, a

seguir, apresenta a distribuição destas áreas no município.

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1. Área junto à Marginal do rio Tietê com via Anhanguera 2. Rua João Ramalho nº 1321 – Sumaré 3. Área junto à av. Águia de Haia com rua Nelson Tartuce, rua Majorie e av. Ben Gurion - Artur Alvim 4. Rua Fernão de Castanheira nº 20 5. Avenida Dr. Francisco Ranieri nº 25 6. Parque do Povo - avenida Cidade Jardim 7. Esquina da avenida Paulista com alameda Ministro Rocha Azevedo e alameda Santos 8. Rua Maestro Arthur de Angelis - Chácara Inglesa 9. Esquina da rua Augusta com rua Caio Prado – Consolação 10. Área na rua Cândido Mota Filho com a estrada das Cachoeiras – Butantã 11. Área em frente ao Shopping Anália Franco 12. Área junto à rua Santa Cruz com rua Capitão Rosendo 13. Reserv. RPI-10 – Estr de Campo Limpo com estr. velha de Itapecirica da Serra - Bacia do Pirajussara 14. Reservatório RM-07 - Via Anchieta - Ribeirão Jaboticabal - Bacia do Tamanduateí 15. Reservatório MO-04 - Ribeirão da Mooca - Bacia do Tamanduateí 16. Reservatório IP-01 - Córrego Ipiranga - Bacia do Tamanduateí 17. Reservatório do Piqueri - Bacia do Tremembé 18. Reservatório Córrego Tremembé - Bacia do Tremembé 19. Área na avenida Vereador Ângelo Bortolo - Bacia do Tremembé 20. Reservatório Córrego Esmaga Sapo - Bacia do Tremembé 21. Reserv. Córrego Tremembé, entre a rua Vicente Orifice e avenida P. do Vale - Bacia do Tremembé 22. Reservatório Córrego Rio Piqueri, na rua Francisco Antonelo - Bacia do Tremembé Fonte: http://sempla.prefeitura.sp.gov.br/urb_pde_mapas_preempcao.php

Figura 4: Áreas sujeitas à incidência do Direito de Preempção constantes no PDE-2002 / SP.

Operações Urbanas Consorciadas

Sua finalidade é promover intervenções urbanísticas estruturais em determinados

setores da cidade, coordenadas pelo poder público com a participação de proprietários,

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moradores e setor privado. Caracteriza-se pela reconstrução e redesenho do tecido urbano,

econômico e social em consonância com a política urbana, combinando investimentos

públicos e privados e novas relações quanto à estrutura fundiária às formas e as regras de uso

e ocupação do solo. O PDE-2002 delimita áreas para Operações Urbanas e indica que novas

poderão se r criadas por lei ou definidas nas Áreas de Intervenção Urbana (art.225)

A finalidade redistributiva do instrumento fica comprometida quando não se

articula a Operação urbana com processos que levem a apropriação coletiva da valorização

imobiliária.

Áreas de Intervenção Urbana

A Área de Intervenção Urbana (AIU), figura criada pelo PDE-2002, corresponde à

porção do território de especial interesse para o desenvolvimento urbano e projetos

urbanísticos específicos, na qual podem ser aplicados os instrumentos previstos no Estatuto

(art. 146). É criada para contornar as dificuldades de definição de perímetros específicos para

cada um dos instrumentos de política urbana.

A criação de AIU dependerá de lei que disciplinará a aplicação de instrumentos

urbanísticos no âmbito de seu perímetro, especialmente a outorga onerosa de potencial

construtivo e a recepção da transferência do direito de construir, além do estabelecimento de

coeficientes de aproveitamento máximo específicos (art. 221).

As AIUs, quando associadas ao interesse ambiental, estão relacionadas ao

Programa de Recuperação Ambiental de Cursos DÁgua e Fundos de Vale que correspondem

as áreas de implantação de parques lineares e as áreas envoltórias do Rodoanel Metropolitano

(art. 221).

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Concessão Urbanística

A Concessão Urbanística permite a realização de obras de urbanização e de

reurbanização de regiões da cidade com o intuito de implementar as diretrizes do PDE-2002,

por meio de delegação do Poder Executivo, mediante licitação, à empresa ou conjunto de

empresas – concessionária. A remuneração da concessionária é obtida com a exploração dos

terrenos e edificações de usos privados e da renda de exploração dos espaços públicos,

resultantes da obra, nos termos do edital e contrato de concessão (art. 239 do PDE-2002), ou

mediante o recebimento de certidão de outorga onerosa de potencial construtivo (art. 39 da

Lei 13.885/2004).

A Concessão Urbanística pode ser um instrumento de interesse ambiental,

especialmente para o caso da implantação de parques urbanos e equipamentos de esporte e

lazer, integrados ao Sistema de Áreas Verdes, atendendo às finalidades da política ambiental.

Fundo de Desenvolvimento Urbano

O Fundo de Desenvolvimento Urbano – Fundurb – criado pelo PDE-2002, tem a

finalidade de dar suporte financeiro à implementação dos objetivos, diretrizes, planos,

programas e projetos urbanísticos e ambientais integrantes ou decorrentes do PDE. Dentre

eles destacam-se: “implantação de equipamentos urbanos e comunitários, espaços públicos de

lazer e áreas verdes”; “criação de unidades de conservação ou proteção de outras áreas de

interesse ambiental” (artigo 238, incisos IV e VI).

Os recursos que constituem o Fundurb são provenientes, além de dotação

orçamentária, de créditos adicionais e repasses de outros entes da federação, da aplicação dos

instrumentos urbanísticos como a outorga onerosa, a contribuição de melhoria, a concessão

urbanística e a transferência do direito de construir e das penalidades aplicadas em razão do

descumprimento de normas (art.236).

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Conforme o PDE-2002, o Fundurb será administrado por um Conselho Gestor e

seus recursos financeiros depositados em conta especial, destacados, desta forma, no

orçamento municipal. O plano de aplicação dos recursos financeiros, que é repartido entre as

várias Secretarias Municipais, em função da necessidade de correção das distorções sociais e

regionais, deverá ser encaminhado anualmente, anexo à lei orçamentária, para aprovação da

Câmara Municipal.

Licenciamento Ambiental

O PDE-2002 estabelece que depende de prévio licenciamento ambiental a

localização, construção, instalação, ampliação, modificação e operação de empreendimentos e

atividades utilizadores de recursos ambientais, potencial ou efetivamente poluidores, ou ainda,

capazes de causar degradação ambiental.

A avaliação do Estudo do Impacto Ambiental (EIA) e o respectivo Relatório de

Impacto sobre o Meio Ambiente (RIMA) são condições para a obtenção da licença ambiental,

emitida pelo órgão ambiental municipal competente, conforme dispõe a Política Nacional do

Meio Ambiente, sem prejuízo das demais licenças legalmente exigíveis40.

Quando o impacto ambiental corresponder a alterações das características urbanas

do entorno, os empreendimentos ou atividades especificados em lei ficam dispensados do

EIA, mas sujeitos ao Estudo do Impacto de Vizinhança (EIV) e ao respectivo Relatório de

Impacto de Vizinhança (RIV), nos mesmos termos estabelecidos na Lei Orgânica do

Município e no Estatuto da Cidade (art. 257).

40 O licenciamento ambiental é necessário para empreendimentos ou atividades capazes, sob qualquer forma, de causar significativa degradação ambiental, nos termos da Resolução CONAMA n. 001/86.

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Instrumentos de Gestão Ambiental

No PDE-2002, são considerados instrumentos de gestão ambiental: termo de

compensação ambiental, termo de ajustamento de conduta, zoneamento ambiental, programa

de intervenções ambientais e avaliação ambiental estratégica (art. 248 a 255).

O Termo de Compromisso Ambiental – TCA, instituído pelo PDE-2002,

constitui-se como documento a ser firmado entre o Poder Público e pessoas jurídicas ou

físicas, decorrente de acordo de contrapartida quando da autorização prévia para supressão de

espécies arbóreas. A aplicação do TCA é regulamentada por meio de Portaria da Secretaria

Municipal do Verde e do Meio Ambiente – SVMA, que estabelece a forma que se deve dar a

compensação ambiental.

O PDE autoriza o órgão municipal competente a celebrar Termo de Ajustamento

de Conduta Ambiental – TAC. Trata-se de documento com força de título executivo

extrajudicial, firmado pela municipalidade com os responsáveis por empreendimento ou

atividade utilizadores de recursos naturais, considerados efetiva ou potencialmente poluidores,

com o objetivo de fixar obrigações e condicionantes técnicos para a recuperação do meio

ambiente degradado.

Os recursos financeiros advindos da aplicação de penalidades tanto do TCA

quanto do TAC constituem receita que integra o FEMA – Fundo Especial do Meio Ambiente

e Desenvolvimento Sustentável. O FEMA41 destina-se a dar suporte financeiro aos planos,

programas e projetos que visem ao uso racional e sustentável de recursos naturais, ao

41 O FEMA – Fundo Especial do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, criado pela Lei Municipal n. 13.155, de 29 de junho de 2001, que também criou o CONFEMA – Conselho do Fundo Especial do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, está regulamentado pelo Decreto n. 41.713, de 25 de fevereiro de 2002 e pela Resolução n. 02/CONFEMA/2002. O CONFEMA, instância de decisão do FEMA, é regido pelo disposto na Resolução n. 01/CONFEMA/2002 e é composto por representantes da Administração Municipal, do Conselho Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (CADES) e de Organizações Não Governamentais. (<htpp://portal.prefeitura.sp.gov.br secretarias/ meio ambiente/confema/0001>).

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controle, à fiscalização, defesa e recuperação do meio ambiente e às ações de educação

ambiental.

A gestão ambiental pode contar ainda com o Zoneamento Ambiental, a ser

instituído por lei posterior, instrumento que define as ações e medidas de promoção, proteção

e recuperação da qualidade ambiental do espaço físico-territorial, segundo suas características

ambientais, e que deverá ser observado na legislação de uso e ocupação do solo.

Institui ainda o Programa de Intervenções Ambientais que compreende um

conjunto de ações voltadas prioritariamente à proteção, recuperação e melhoria da qualidade

ambiental do município, como a ampliação das áreas integrantes do Sistema de Áreas Verdes,

aumento de áreas permeáveis do solo, controle de inundações, recuperação de nascentes e

despoluição de cursos d’água, recuperação de áreas degradas, identificação de novos usos de

áreas contaminadas, controle da poluição do ar e emissões de ruído e radiações, preservação

das Áreas de Proteção aos Mananciais. Dentre as áreas prioritárias para implantação deste

Programa de Intervenções Ambientais constam as integrantes do Sistema de Áreas Verdes. Na

sua implantação poderão ser utilizados os instrumentos previstos no Estatuto da Cidade, o

TCA e o TAC (artigos 253 e 254).

Por fim, consta a Avaliação Ambiental Estratégica, instrumento de uso prioritário

para a avaliação das políticas, planos e programas públicos com o intuito de compatibilizá-los

com os padrões ambientais e reduzir seus impactos negativos no ambiente. O instrumento de

Avaliação Ambiental Estratégica deverá ser regulamentado pelo Executivo.

2.3.2 Legislação complementar ao PDE-2002

Após intensos debates com a participação da população e negociação, como a

ocorrida no processo de aprovação do PDE-2002, é aprovada em 2004 a lei que: institui os