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SECRETARIA DE ESTADO DA EDUCAÇÃO SUPERINTENDÊNCIA DA EDUCAÇÃO
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARINGÁ PROGRAMA DE DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL
HEIDY SILVA PINTO DONADIO
O JOGO: POSSIBILIDADE DE DESENVOLVIMENTO DA IDENTIDADE SOCIAL NO AMBIENTE ESCOLAR.
MARINGÁ 2008
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O JOGO: POSSIBILIDADE DE DESENVOLVIMENTO DA IDENTIDADE SOCIAL NO AMBIENTE ESCOLAR.
Heidy S. Pinto Donadio 1
Deiva Mara Delfini Batista Ribeiro 2
RESUMO: Este estudo objetivou analisar o jogo, na perspectiva crítico-superadora,
e sua contribuição na construção da identidade social e na apreensão crítica e
reflexiva desse conteúdo em alunos da 5ª série do ensino fundamental. Para
responder aos objetivos propostos, adotamos como referencial metodológico a
pesquisa qualitativa do tipo pesquisa-ação, e da análise interpretativa do processo.
Esta abordagem visa descrever, analisar e interpretar as ações atitudinais dos
alunos, nas aulas de Educação Física, em uma escola estadual do município de
Maringá, Pr. A pesquisa constituiu-se de quatro etapas: compreensão do jogo como
objeto de estudo da cultura corporal na perspectiva crítico-superadora;
sistematização da intervenção pedagógica do conteúdo jogo, com ênfase na cultura
popular brasileira; intervenção realizada em 27 aulas; e identificação por meio da
análise interpretativa das intervenções pedagógicas. O estudo indica a viabilidade de
trabalhar o conteúdo jogo em uma perspectiva crítico-superadora em Educação
Física Escolar, como forma de desenvolver a identidade social e a apreensão crítica
e reflexiva do aluno. A forma espiralada, dialética de organizar o pensamento do
aluno remete a uma organização e sistematização dos conteúdos de ensino pelo
professor, para que, por meio de sua mediação, o aluno se perceba enquanto sujeito
histórico e crítico. Consideramos que trabalhar os jogos e brincadeiras na
perspectiva crítico-superadora, é possível e contribui na construção da identidade
social do aluno; torna o conteúdo significativo para ele, incorporando-o ao seu
mundo vivencial, ajudando assim a compreender sua realidade e podendo nela
interferir de modo crítico.
Palavras-chave: crítico-superadora. Cultura corporal. Jogo. Crítico.
ABSTRACT: This study had as objective analysis the game, in overcome-critical
1 Docente da SEED - Pr. Participante do Programa de Desenvolvimento Educacional/PDE - Maringá - Pr.
2 Mestre em Educação pela Universidade Estadual de Maringá. Professora do Departamento de EF da UEM.
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perspective, and its contribution in the construction of identity and critical social
concern and unreflective that content in students series core. To meet the objectives
proposed, as we have adopted the methodological referential qualitative type search-
action, and interpretative analysis process. This approach aims to describe, analyze
and interpret the actions of atitudinais students, in physical education classes, in a
state school of the municipality of Maringá, PR. The search has four phases:
understanding of the game as object of study of culture body in overcome-critical
perspective; systematic intervention pedagogical content game, with emphasis on
brazilian popular culture intervention during 27 classes; and identification by
analyzing interpretative interventions pedagogy. The study indicates the feasibility of
work the game content in a overcome-critical perspective in physical education
school as means to develop social identity and the seizure and unreflective. The
spiral form, dialectic to organize the student refers to an organization and
systemisation of the content of education by Professor, so that, through its mediation,
the student if note while subject history and critical. We believe that work and play
games in overcome-critical perspective, you can contribute in the construction of
identity social student; makes the content significant for it, incorporating it to your
world vivencial, thereby helping to understand their reality and can it interfere
critically.
Keywords: overcome-critical. Culture. Game. Critical.
1. INTRODUÇÃO
Nas tendências críticas que surgiram no Brasil na década de 80, a realidade é
concebida como dinâmica e o sujeito como agente capaz de transformar sua
realidade. Como ressaltam o caráter político da educação, o professor passa a ser
entendido como um educador que deve contribuir para o desenvolvimento do senso
crítico de seus alunos.
No entanto, observa-se que os currículos das escolas de graduação
continuam fundamentados na racionalidade técnica (CARVALHO, 1992;
MARTINELI, 2001; RIBEIRO, 2003; PIROLO, 2004), que se caracteriza pela
dicotomia entre teoria e prática, pela concepção de que o professor é um ser que
possui e transmite saberes produzidos por outros, ou seja, que mantém uma relação
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linear e hierárquica entre conhecimento teórico e prático. Este modelo orientou e, na
maior parte dos casos, continua orientando as práticas pedagógicas nos cursos de
formação de professores e nas escolas.
O profissional que é formado com base nessa dicotomia não consegue
encontrar respostas às dificuldades que emergem no cotidiano escolar, muitas das
quais não são contempladas nos conhecimentos científicos e, portanto, as respostas
técnicas para elas ainda não estão formuladas (PIMENTA, 2005).
Nas novas formas que, ainda de forma incipiente, vêem sendo adotadas em
algumas escolas, a superação da dicotomia entre teoria e prática, a sólida formação
teórica e interdisciplinar, o compromisso social do profissional da educação na busca
de uma sociedade mais humana e solidária, o trabalho coletivo e interdisciplinar
como processo de reflexão, entre outros, apresentam-se como indicadores a serem
buscados na formação dos professores, como apontam Scheibe e Bazzo (apud
RIBEIRO, 2003).
As tendências progressistas pedem um professor crítico, que considere, como
afirma Frigotto (1998), que educar é humanizar, caminhar para a emancipação, para
a autonomia responsável, para a subjetividade moral e ética. Pedem um professor
que considere as relações entre trabalho, educação, humanização e emancipação.
Um professor que questione: o que é educar pessoas; como elas se humanizam;
como a escola contribui para essa formação?
A teoria pedagógica que dá sustentação à preocupação com essas questões
é dirigida pelo trabalho, pelo movimentos sociais e pela cultura. Sua base é que os
seres humanos não nascem prontos, de acordo com um projeto da natureza. Neste
caso, a humanização como uma meta de toda ação pedagógica externa ou interna à
escola e a idéia de que os processos de formação humana devem ser articulados
com a nossa realidade são parâmetros a serem considerados pelo educador.
O professor crítico, para Duarte (2006, p.96), “não pode rejeitar em bloco a
ciência, a cultura burguesa clássica e a educação escolar também em sua forma
clássica”, só quando se apropria dessa riqueza intelectual é que ele pode atuar no
sentido da transformação e emancipação humana.
Para subsidiar essa formação, é necessário compreender que a educação
escolar responde a uma necessidade histórica e que o desenvolvimento do
conhecimento humano e da vida em geral coloca a apropriação do saber
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historicamente acumulado como parâmetro, para que o indivíduo tenha uma visão
crítica e dialética de sua sociedade e possa nela interferir (SAVIANI, 1988).
A Educação Física, como prática social e pedagógica, também se situa nesse
contexto e tem buscado subsídios para implementar na escola uma educação física
que promova o ser humano em sua totalidade.
A prática pedagógica da Educação Física surge de necessidades sociais
concretas, identificadas em diferentes momentos históricos. Isso, segundo Soares
(1993), dá origem a diferentes entendimentos dessa área.
Na década de 80, com o fim da ditadura militar no Brasil e com a retomada da
redemocratização, uma nova concepção de Educação Física começa a ser
construída, dando origem a propostas explicitamente relacionadas às tendências
educacionais progressistas críticas, como a crítico-emancipatória e a crítico-
superadora (KUNZ, 1991; SOARES et al. 1993).
As proposições teóricas e metodológicas progressistas citadas têm em
comum o anseio de superar a relação linear e mecânica entre o conhecimento
técnico-científico que colabora para a reprodução social e a prática da sala de aula
que o reproduz.
A tentativa de superação aponta para um caminho metodológico que
possibilita a formação de cidadãos autônomos, caminho esse oferecido pela teoria
crítica.
No contexto da Educação Física, a pedagogia crítico-superadora,
sistematizada por Soares, Bracht, Castellani Filho, Varjal, Taffarel e Escobar no livro
Metodologia do Ensino da Educação Física, de 1992, fundamenta-se na Pedagogia
Histórico-crítica (SAVIANI,1988) que, por sua vez, está pautada no materialismo
histórico dialético, ou seja, na compreensão histórica das condições materiais da
existência humana.
Essa pedagogia tem como objetivo a apropriação crítica da cultura corporal
historicamente produzida pela humanidade: “Os temas da cultura corporal, tratados
na escola, expressam um sentido/significado onde se interpenetram, dialeticamente,
a intencionalidade/objetivos do homem e as intenções/objetivos da sociedade”
(SOARES, 1993, p. 62). Portanto, é a que melhor responde aos anseios por se fazer
uma reflexão sobre a realidade social do aluno da escola pública, interpretando-a,
explicitando-a e promovendo a compreensão e a apreensão da prática social como
expressão dos interesses de classe social e, assim, tornando-o um cidadão crítico.
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Seu objeto de estudo é a cultura corporal, que sistematiza o conhecimento da
educação física em quatro ciclos, cujos conteúdos são esporte, ginástica, jogos e
brincadeiras, lutas, dança, entre outros (BRACHT, 1999). Os conteúdos são
percebidos como resultado de uma construção histórica do homem, de sua relação
dialética com a natureza em busca da manutenção da vida, sob o comando dos
interesses específicos de classes sociais (ALBUQUERQUE et al, 2007).
Nessa concepção de educação física, o objetivo é que o educando se
aproprie criticamente da cultura corporal historicamente produzida pela humanidade.
Por isso, a formação do professor deve estar vinculada com a educação, com a
sociedade, com o currículo, com o projeto político pedagógico, com as novas
necessidades inerentes à proposta pedagógica crítica (ALVES, 2003).
É com base nesta perspectiva que tomamos o jogo como objeto de estudo. A
proposta é compreendê-lo em sua diversidade, não como parte de uma realidade
fragmentada, mas [...] “a partir do princípio da simultaneidade, explicando a relação
que [os conteúdos] mantêm entre si para desenvolver a compreensão de que são
dados da realidade que não podem ser pensados nem explicados isoladamente”
(SOARES, 1993, p. 32).
Assim, espera-se que o aluno vá ampliando seu conhecimento
dialeticamente, não por etapas, mas construindo o pensamento de forma espiralada.
Essa forma de organizar o pensamento remete à organização e à
sistematização dos conteúdos de ensino e ao rompimento com a idéia de
terminalidade, o que implica desenvolver a noção de historicidade, para que este
aluno se perceba como sujeito histórico e crítico. Portanto, como a escolha do
caminho metodológico nas aulas de educação física escolar será decisiva para a
formação que se pretende dar ao aluno, evita-se tratar os jogos e brincadeiras
apenas na dimensão técnica, mas se procuram meios de desenvolver este conteúdo
como um saber da educação física escolar.
Nesse sentido, o objetivo deste estudo é o de analisar o jogo com base na
perspectiva crítico-superadora, e sua contribuição na construção da identidade
social e na apreensão crítica e reflexiva desse conteúdo em alunos da 5ª série do
ensino fundamental.
Fundamentados no que foi exposto, lançamos a seguinte questão norteadora:
Qual a contribuição do jogo, na perspectiva crítico-superadora, para o
desenvolvimento da identidade social e apreensão crítica e reflexiva de alunos da 5ª
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série do ensino fundamental?
2. O ENSINO DOS JOGOS NA EDUCAÇÃO FÍSICA ESCOLAR.
Para responder à questão norteadora deste estudo e aos objetivos propostos,
adotamos como referencial metodológico a pesquisa qualitativa do tipo pesquisa-
ação e da análise interpretativa do processo, com o pesquisador atuando como
professor. Essa abordagem visa descrever, analisar e interpretar as ações
atitudinais dos alunos nas aulas de Educação Física de uma escola estadual do
município de Maringá, Estado do Paraná. Para Minayo (1994, p. 22), esse tipo de
pesquisa aprofunda-se no mundo dos significados das ações e relações humanas,
um lado não perceptível na estatística da pesquisa positivista.
Adotou-se como critério de escolha a escola pública onde a pesquisadora
trabalha, como determina o programa do PDE, dada a facilidade de acesso à
instituição.
Participaram do estudo indivíduos de ambos os sexos, que freqüentam uma
5ª série do período vespertino. No Colégio, nesse turno, estudava uma média de
450 alunos de 5ª a 8ª séries.
A escolha pela 5ª série deve-se ao fato de que apresenta uma resistência
menor à prática lúdica que se distancia da esportiva, em razão da cultura escolar
estabelecida.
Os alunos foram informados da pesquisa e levaram para casa um
questionário a ser respondido pelos pais ou responsáveis, referente aos dados
sócio-econômicos proposto pelo Critério de Classificação Econômica do Brasil
(Associação Nacional de Empresas de Pesquisa, 2004). Juntamente receberam o
termo de consentimento que foi respondido e assinado pelo pai ou responsável.
A intervenção ocorreu na própria escola, com alunos da pesquisadora, no
período de dois meses e meio, em um total de 27 h/a distribuídas em três aulas
semanais. Foram trabalhados jogos e brinquedos envolvendo as seguintes
temáticas: jogos, brinquedos e brincadeiras tradicionais; diferentes manifestações e
tipos de jogos; jogos e brincadeiras de origem indígena; cultura e jogos indígenas;
oficina de construção da peteca; construção coletiva do jogo de peteca e regras;
diferenças entre jogo e esporte.
A intervenção foi registrada em um diário, com anotações de cada aula, a
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respeito dos métodos, acontecimentos e reflexões dos alunos e da professora,
especialmente as ações e os comentários ou descrições realizados pelos alunos
sobre o conhecimento que tinham sobre os jogos. Procuramos identificar as
dificuldades e possibilidades no processo de ensino e aprendizagem dos jogos. Um
questionário investigando o conhecimento dos alunos a respeito dos temas a serem
trabalhados foi distribuído e respondido no início e no final da intervenção.
As aulas foram realizadas na perspectiva crítico-superadora, motivo pelo qual
procuramos seguir os cinco passos da pedagogia histórico-crítica, descritos por
Saviani (1988) e sistematizados na propostas didáticas de Gasparin (2005).
O primeiro passo é a prática social inicial do conteúdo. Nessa etapa,
nomeada como nível de desenvolvimento atual, parte-se do conhecimento que os
alunos já possuem sobre o conteúdo. A problematização, segundo passo,
corresponde ao trabalho com o conteúdo sistematizado e aos questionamentos: é a
transição entre prática e teoria. No terceiro passo, da instrumentalização,
educandos e educador agem juntos na elaboração da aprendizagem: ocorre a
apresentação sistemática do conteúdo pelo professor e a ação intencional por parte
dos alunos para se apropriar desse conhecimento. O conhecimento científico é
analisado e cotejado com o conhecimento cotidiano. A aprendizagem na perspectiva
histórico-cultural ocorre para resolver, mesmo que teoricamente, as questões sociais
que surgem com o conteúdo.
A catarse é o quarto passo, significando que o aluno aprendeu o conteúdo,
constituindo para si uma nova visão da realidade. Percebe que se apropriou de um
conteúdo transmitido pelo professor e também que ele é resultante de uma
construção social com base em necessidades criadas pelo homem. Reconhece que
esse novo conteúdo tem utilidade e significado para a sua vida, o que exige dele o
compromisso de atuar na sociedade em que vive.
O quinto passo, prática social final do conteúdo, é a confirmação de que o
educando já consegue realizar sozinho atividades que, antes, só realizava com
ajuda. Aplicando esse novo conhecimento, ele expressa o que aprendeu e de qual
conteúdo se apropriou.
Os cinco passos descritos devem estar presentes quando trabalhamos os
conteúdos nas aulas.
Optamos pela pedagogia histórico-crítica porque ela corresponde a uma
teoria pedagógica que vai além das teorias de reprodução e que apresenta o
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conhecimento como resultado do trabalho humano no processo histórico de
transformação do mundo e da sociedade (GASPARIN, 2005). Seguimos, neste
caso, a perspectiva dialética do conhecimento, segundo a qual o processo educativo
escolar obedece a três passos: 1- partir da prática; 2- teorizar sobre a prática social
e 3- retornar à prática para transformá-la.
A intervenção pedagógica foi realizada por temáticas, como segue:
Tema 1- Jogos, brinquedos e brincadeiras tradicionais (1ª, 2ª e 3ª aulas). O
objetivo desta parte foi oportunizar o conhecimento dos jogos, brinquedos e
brincadeiras tradicionais, por meio de pesquisa, registrando suas características e
identificando os jogos e as brincadeiras indígenas entre eles.
Na prática social inicial, a professora utilizou questões norteadoras para
identificar o conhecimento que os alunos já possuíam e o uso que faziam dele na
prática social cotidiana. Observou-se, na maioria das respostas, que os jogos e
brincadeiras tradicionais caíram no esquecimento. Os meios de comunicação, como
a televisão, divulgam os jogos e os brinquedos industrializados do momento, criando
e disseminando, com base neles, uma nova representação de infância, que altera o
imaginário dessa população. A cultura transmitida de forma oral entre as gerações
foi se perdendo com a televisão e outros recursos tecnológicos, seguindo modelos
da indústria cultural (GOMES, 2000).
A instrumentalização ocorreu por meio de entrevista individual realizada
pelos alunos com adultos acima de 50 anos. As questões, referentes a jogos e
brincadeiras na infância, foram formuladas em sala de aula, no grande grupo. No
momento da apresentação dos jogos que eles descobriram na entrevista, pôde-se
observar o interesse e a motivação em socializar com os colegas as novas
brincadeiras e os jogos de origem indígena que identificaram.
A catarse aconteceu durante as discussões e reflexões, quando alguns
alunos perceberam as mudanças ocorridas nos jogos e brincadeiras ao longo da
história das gerações (dos avós, dos pais, e dele). Esses estudantes conseguiram
fazer uma relação dos conteúdos trabalhados com o seu cotidiano ao relatar “eu
conhecia a peteca, mas não sabia que era de origem indígena”, o mesmo
comentário ocorreu com o estilingue. A prática social final deu-se no momento em
que, brincando livremente, os alunos criaram brincadeiras com a peteca, estilingue e
bola de gude e a brincadeira se estendeu pelo intervalo, estendendo-se aos alunos
de outras séries.
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Tema 2- Diferentes manifestações e tipos de jogos (4ª,5ª, 6ª aulas).
O objetivo foi oportunizar o conhecimento e a vivência dos jogos em
diferentes culturas e épocas. Na prática social inicial, os alunos mostraram sua
vivência cotidiana do tema. O primeiro momento se deu por meio de diálogo para a
identificação das diferentes culturas presentes nos jogos. A professora levou-os a
refletir sobre as mudanças dos jogos no decorrer do tempo. A instrumentalização
ocorreu com a divisão da quadra em brincadeiras tradicionais e contemporâneas.
Depois de vivenciada, houve troca das brincadeiras e a professora questionou como
seria esta troca e quem explicaria à outra equipe como jogar. Todos vivenciaram as
brincadeiras tradicionais e contemporâneas. A catarse ocorreu ao refletir sobre a rua
como espaço de brincadeira e a brincadeira indígena; a perda deste espaço e os
fatores que contribuem para esta realidade: a industrialização dos brinquedos, a
urbanização, a violência, e as mudanças do modo de vida em geral.
O momento da prática social final deu-se ao refletir sobre a rua como espaço de
brincadeira e a brincadeira indígena; a perda deste espaço e os fatores que
contribuem para esta realidade. A discussão evidenciou a diferença entre as
brincadeiras atuais e as tradicionais e indígenas. Formou-se um quadro com as
relações das brincadeiras tradicionais e contemporâneas.
Tema 3- Jogos e brincadeiras de origem indígena (7ª, 8ª, 9ª, 10ªaulas).
O objetivo deste tema foi perceber e analisar as diferenças entre os jogos e
brincadeiras indígenas e os regionais. Na prática social inicial, os alunos mostraram
sua vivência cotidiana do tema. A problematização incidiu sobre as diferenças entre
os jogos e brincadeiras que realizam e os jogos indígenas, discutindo-se quais
seriam elas e que dimensões teriam. Na instrumentalização, os jogos indígenas,
como cabo de guerra, ronkrã, tihimore, zarabatana e peteca, foram distribuídos pela
professora para serem vivenciados e relacionados com os jogos de conhecimento
da equipe. O material foi distribuído e as equipes foram formadas de acordo com a
brincadeira escolhida. A brincadeira escolhida deveria dar oportunidade para que
todos os alunos participassem e a equipe, com o auxilio do professor, tinha a função
de explicar, organizar e efetivar a brincadeira. Os jogos foram vivenciados e
socializados em estações, ficando um aluno de cada equipe responsável por
explicar o jogo para os demais. A catarse ocorreu por meio da reflexão sobre a aula,
momento em que se verificou que a grande maioria dos alunos não conhecia os
jogos e os motivos da adaptação dos materiais utilizados. O quadro do tema 2 foi
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ampliado com mais brincadeiras indígenas. A prática social final consistiu na leitura
e reflexão sobre a relação dos jogos vivenciados, de forma que, ao final, os alunos
se perceberam como herdeiros de saberes que enriquecem nossa cultura popular.
Tema 4- Cultura e jogos indígenas (11ª, 12ª aulas).
O objetivo deste tema foi oferecer aos alunos a oportunidade de conhecer e se
perceber como herdeiros da cultura indígena, por meio de entrevista com uma
família indígena.
Quando se problematizou se a cultura indígena está presente na nossa cultura, a
grande maioria dos alunos não soube responder. A instrumentalização ocorreu por
meio de questionamentos da professora sobre a vida indígena no passado e nos
dias de hoje e os alunos respondiam baseados no que vivenciaram sobre jogos e
brincadeiras. Eles elaboraram quatorze questões sobre o cotidiano do índio hoje e
no passado e, espontaneamente, as distribuíram. Foi motivador o interesse, a
atenção e a participação dos alunos durante a entrevista: “C”: “legal ouvir o índio
falar a sua língua”. A catarse ocorreu por meio de discussões e reflexões, nas quais
muitos alunos conseguiram relacionar os conteúdos abordados com seu cotidiano,
fazendo uma síntese mental do tema. Na prática social final, muitos alunos
comentaram que, conhecendo melhor o índio, iriam respeitá-lo.
Tema 5- Cultura indígena (13ª,14ª,15ª,16ª,17ª,18ª aulas)
O objetivo nestas aulas foi analisar a cultura indígena em seus aspectos sociais,
econômicos, religiosos e políticos. Na prática social inicial, os alunos disseram o que
conheciam da cultura indígena. A professora colocou a seguinte questão
problematizadora: qual a influência do índio em nossa cultura? Com base nela,
foram discutidos vários fatores da vida indígena. Os temas alimentação, crença,
trabalho, dança e música, jogos e brinquedos, cultura corporal e linguagem foram
distribuídos entre sete equipes. Crença, trabalho e linguagem foram trabalhados nas
aulas de história e de língua portuguesa, respectivamente. O material para pesquisa
foi distribuído às equipes, para que fosse lido e esclarecido pelos colegas e pela
professora. O momento da instrumentalização ocorreu com a apresentação das
equipes em sala de aula, fazendo uso do power point. A catarse aconteceu com a
discussão de dois temas por aula, fazendo a relação das duas culturas. A prática
social final dos sete subtemas foi feita em grande círculo, no qual, após abordarem a
presença da cultura indígena em seu cotidiano, os alunos se dispuseram a
pesquisar e conhecer mais a situação indígena no Paraná e a compreender a
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situação do índio hoje. Eles continuam sendo agredidos? As pessoas respeitam a
cultura indígena ou a consideram inferior? A história dos adolescentes de Brasília
que incendiaram um índio que dormia na rua foi abordada como exemplo nas
discussões.
Tema 6- Brinquedo artesanal e industrial (19ª, 20ª, aulas).
Este tema teve como objetivo oportunizar o conhecimento e a vivência com o
brinquedo industrial e com o artesanal. A problematização foi levantada pela
professora, após os alunos descreverem suas vivências cotidianas a respeito desses
brinquedos. Na instrumentalização, questionamentos e comentários sobre os
materiais utilizados na indústria e pelos índios para a confecção da peteca foram
feitos, nomeados pelos alunos e anotados no quadro dividido em duas partes:
Industrial e Artesanal. Figuras de brinquedos, petecas e outros brinquedos
artesanais e industriais foram trazidos pela professora e pelos alunos, para serem
vivenciados em sala. A catarse ocorreu quando, em meio aos diálogos sobre a
vivência com os brinquedos, surgiram comentários, como3: “C” “[...[os brinquedos
artesanais são bem legais também”; “F” “[...] eu sei brincar com o bilboquê, meu pai
me ensinou [...]”. A prática social final caracterizou-se pelo levantamento das
possibilidades de construção de um brinquedo, criadas em grupo.
Tema 7- Oficina de construção de brinquedos (21ª, 22ª, 23ª aulas)
O objetivo deste tema foi levar os alunos a construir e manipular coletivamente a
peteca. Na instrumentalização, se deu a confecção da peteca com materiais
disponíveis e adaptados, trazidos pelos alunos. A aula seguinte foi designada para a
exploração da peteca: eles a manipularam livremente. Houve a demonstração de
algumas possibilidades de manipulação do material e, em seguida, por meio de
questões norteadoras, a professora solicitou diferentes formas de manipulação que
não haviam sido feitas. Observou-se um grande estímulo para a criatividade,
facilitada pela confecção e manipulação de um novo material. A catarse ocorreu por
meio de discussões e reflexões sobre as aulas, quando muitos comentaram que
esse foi o primeiro brinquedo que construíram e “T”: “nunca tinha brincado com isso
antes e gostei muito”. A prática social final aconteceu por meio de uma pesquisa
com os pais sobre outros tipos de peteca. Em círculo, os alunos fizeram uma relação
da pesquisa com os pais e sua vivência.
3 Na descrição das falas retiradas do diário de campo, cada aluno será identificado pela inicial do nome, para
preservar sua identidade.
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Tema 8- O jogo e o esporte. (24ª, 25ª, 26ª,27ª)
O objetivo do tema foi compreender a diferença entre o jogo e o esporte. Na prática
social inicial, orientados por questões da professora, os alunos manifestaram seu
entendimento de jogo e esporte. Na instrumentalização, foram criados exercícios
com referência nos gestos motores do vôlei, com a finalidade de construir uma
seqüência metodológica voltada para o ensino da peteca. Os movimentos foram
coletivamente construídos com base nas dificuldades encontradas, sem privilegiar o
desenvolvimento de gestos, técnicas e táticas. Na aula seguinte, houve exposição a
respeito das atividades de vôlei e peteca como esporte institucionalizado e de vôlei e
peteca como jogo escolar. Explicou-se que os jogos esportivos são aqueles que se
aproximam do esporte, mas que não são esporte. Os alunos fizeram a discussão em
pequenos grupos e, logo após, o grande grupo, mediado pela professora, montou
no quadro as características do esporte e do jogo.
Foi também realizado um jogo na quadra, cujo objetivo era que os alunos
passassem a peteca sobre a rede. A professora os orientou a vivenciar o jogo
esportivo e verificar de qual esporte ele se aproximava. Foram formados quatro
grupos: enquanto dois jogavam, dois observavam. Ocorreram várias trocas e, após
um tempo de jogo, em círculo, eles apresentaram seus comentários, surgindo desse
debate propostas de mudanças de regras. As novas regras foram utilizadas nos
jogos entre as duas quintas séries. A catarse ocorreu quando os alunos foram
incentivados pela professora a apresentar comentários, entre os quais surgiram
elementos que identificaram aquele jogo com a peteca oficial. A professora observou
que aquele jogo não era a peteca oficial, mas trazia elementos dela. O jogo que
criaram não era a peteca oficial, logo, não é esporte. As equipes foram organizadas
e os jogos realizados. Na prática social final, os alunos reconheceram as diferenças
entre o jogo popular de seu cotidiano e o esporte, bem como entre esporte e jogo
esportivo, que, embora pareça, não é esporte.
3. ANÁLISES DA INTERVENÇÃO
Conforme proposto por Minayo (1994), a análise prevê a categorização dos
dados obtidos no processo. Esses dados foram obtidos por meio de um
questionário, que foi aplicado antes e também depois da intervenção. As categorias
foram retiradas dos objetivos do projeto, ficando assim definidas: 1- o jogo e a
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brincadeira na perspectiva crítica-superadora; 2 – o jogo e a brincadeira na cultura
indígena; 3- o jogo, a identidade social e a apreensão crítica dos alunos.
Na primeira categoria, o jogo e a brincadeira na perspectiva crítico-
superadora, foram analisadas cinco questões. A primeira questão: os jogos e
brincadeiras que seus pais e avós brincavam são os mesmos que você brinca? Cite
uma brincadeira que seus pais ou avôs brincavam e uma que você brinca. Os
resultados obtidos no tema 1: jogos, brinquedos e brincadeiras tradicionais serão
incorporados na análise desta categoria.
Observou-se nas respostas do questionário inicial, entregue na segunda aula
da intervenção, anterior ao trabalho, que grande parte dos alunos não conhecia as
brincadeiras de seus pais. Isto se deve, segundo Silva, Garcia e Ferrari (1989), à
perda do enraizamento cultural, da memória como suporte da identidade, da
participação no coletivo, sem vínculo com a tradição. Em razão da modernização e
da tendência à racionalização, o brincar, jogar e o brinquedo sofreram grandes
mudanças e, perdendo os valores e sentidos culturais familiares, tornaram-se
objetos com fim em si mesmo.
A importância de resgatar as brincadeiras e brinquedos está na consciência
histórica das mudanças ocorridas, por meio da qual se descobre gosto e prazer nas
brincadeiras e brinquedos simples de outras épocas. É o que mostram as falas dos
alunos ao brincar, “C”: “é muito gostoso brincar de cabra cega [...]”; “D”: “vou brincar
na minha casa de bola de gude, é legal”. Assim, eles dão outro sentido a essas
brincadeiras.
A descoberta e vivência das brincadeiras e brinquedos dos pais foi uma
experiência positiva, que trouxe à discussão o conteúdo em diferentes tempos
históricos e deu oportunidade a todos de conhecer as brincadeiras dos pais, como
mostrou o questionário final. Essa forma de conduzir o conteúdo torna possível um
saber vinculado ao vivido e uma atuação inserida na prática social, concedendo ao
aluno a percepção de sua atuação sobre sua vida e da interferência do meio em
suas ações.
O jogo na perspectiva crítico-superadora dá a possibilidade da recuperação
da memória como suporte da identidade, do enraizamento cultural, da participação
no coletivo e da reflexão. Os jogos abrangem situações da cultura, que deve ser
vista na perspectiva dialética, favorecendo a formação do sujeito histórico,
permitindo compreender como o conhecimento foi produzido historicamente pela
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humanidade e o seu papel na história dessa produção e proporcionando ao aluno a
oportunidade da construção de uma visão de totalidade (SOARES, 1993). Segundo
Cararo (2008, p. 132), mesmo que o conhecimento seja de forma sincrética e
incipiente, “[...] possibilita ao aluno perceber-se como ser histórico e perceber que o
conhecimento também tem história é um importantíssimo requisito para uma
Pedagogia Histórica e Crítica.”
No questionário inicial, ao serem questionados sobre a construção de
brinquedos, somente três alunos disseram não os terem construído. Quanto aos
demais, seis construíram avião de papel e outros construíram telefone de lata, roupa
para boneca, carrinho de rolimã. No questionário final todos responderam
afirmativamente, já que haviam vivenciado a construção da peteca. Com a
industrialização do brinquedo, segundo Benjamin (1984), este se torna cada vez
mais estranho às crianças e à família, afastando-se da sua origem. A importância da
construção do brinquedo está nos valores e sentidos culturais adquiridos por quem o
constrói, na recuperação do sentido dado ao brinquedo. A pedagogia histórico-crítica
implica a vinculação entre educação e transformação da sociedade, o que acontece
quando o saber escolar não se restringe a si mesmo, mas é tratado como meio para
o crescimento do aluno, que aprende o processo de sua produção e as tendências
de sua transformação (SAVIANI, 2003, p. 9). Isto justifica o trabalho de recolhimento
dos materiais, construção e exploração da peteca e sua importância na
transformação da consciência do aluno.
Nas questões 3, 4 e 5, aborda-se a controvertida prática pedagógica no
trato com o jogo e o esporte: Existe o respeito mútuo durante os jogos e brincadeiras
na escola e na comunidade? Qual a diferença entre jogo e esporte? As regras dos
jogos e brincadeiras que você conhece podem ser mudadas se for necessário para
jogar ou brincar na escola?
A professora da disciplina enfrenta sempre os questionamentos: “C”: “[...] hoje
nós vamos joga bola, né?[...]” 4(Diário de campo, 2008). LUCENA (SOUZA JUNIOR,
2005) e Cararo (2008) comentam essa constante pressão sobre o professor por
parte dos alunos que têm grande interesse pelo esporte, em especial o futsal. O
professor que não intenciona fazer da escola um espaço de seleção e treinamento
4 O diário de campo é o registro dos dados da intervenção, realizado pela professora/pesquisadora durante o
primeiro semestre de 2008, no Colégio Estadual Silvio Magalhães Barros, onde ela coloca suas percepções,
angústias, questionamentos e informações.
16
sente-se oprimido por esta situação. O fato de a Educação Física ser uma disciplina
vista e praticada historicamente de modo prático e técnico dentro e fora da escola é
um fator de tensão para o professor em suas aulas. Quando se compreende a
escola como espaço possível de superação das desigualdades e de formação
humana, essa forma técnica da educação física não cabe mais em seu interior. A
professora, no momento do questionamento do aluno, deixou explícitos os motivos
“do não jogar bola“, orientando-se pelo objetivo de deixar compreensível sua postura
e dar ao aluno outra visão da disciplina.
Nas respostas da questão 3, tanto as anteriores como as posteriores à
intervenção, a grande maioria afirmou que há respeito mútuo durante os jogos e
brincadeiras. A criança, quando joga, procura satisfazer sua necessidade de ação.
Segundo Soares (1993), ao jogar, ela age com o significado de suas ações,
desenvolvendo sua vontade e tornando-se consciente das suas escolhas e
decisões. São nestes momentos de escolhas e decisões que o professor incentiva o
debate, questionando as situações que surgem no decorrer do jogo e de todo o
trabalho, levando os alunos a exercitar as falas e argumentações, construindo o
diálogo que, aliado ao conhecimento, forma o cidadão crítico, como descreve Cararo
(2008), ao expor os princípios do exercício da cidadania:
o primeiro é que não é possível exercer uma cidadania plena sem conhecimento, visto ser ele que nos fornece as argumentações necessárias à compreensão da realidade que nos cerca; o segundo é a mobilização, ou seja, conhecimento sem atitude não é cidadania. Daí que, o ato educativo deve primar pelo ensino do diálogo. Sim, o diálogo solicita sua prática para que seja incorporado como forma de ação no mundo. Mobilizar e exercitar as falas, argumentações e contradições, de modo a produzir o habitus à criticidade. Não vazia, mas profícua, que seja capaz de indagar a aparência das relações, numa procura incessante pela essência. O diálogo, como forma de convivência humana, confere aos sujeitos que o praticam a possibilidade de se perceber, de se descobrir, percebendo e descobrindo o outro (p.135).
Isto mostra também que a problematização esteve sempre presente na
intervenção e que se procurou refletir e aprofundar o conhecimento do conteúdo
trabalhado. O aluno, ao jogar de forma criativa e simbólica, encontra no jogo um
modo de compreender sua realidade e se apropriar dela; ele não procura no jogo a
violência e o desrespeito e sim a oportunidade de compreensão desses fatores.
Nas respostas da questão 4, observou-se um avanço no entendimento das
diferenças entre jogo e esporte. As respostas do questionário inicial foram confusas,
17
a exemplo de: “D”: “[...] jogo é sentado esporte em pé”; “C”: “[...] jogo não tem regra e
esporte tem”; “B”: “[...] esporte é correr, nadar”; “D”: “[...] jogo é jogar bola”; “L”: “[...]
jogo jogamos, no esporte competimos”. No final, após o trabalho do tema 8: o jogo e
o esporte, as respostas demonstram entendimento maior dessas atividades: “B”: “[...]
o esporte é jogo institucionalizado, o jogo você faz a regra”; “C”: “[...] no jogo você
pode mudar as regras pra adaptar, esporte as regra são oficiais”; “A”: “[...] jogo nós
que inventa regra, esporte tem regras próprias”; “L”: “[...] jogo aprendemos na
escola, esporte é profissional em campeonato”; “P”: “[...] jogo jogamos com nossas
regras, o esporte as regras oficiais são do juiz”.
Essa mudança na qualidade das respostas é resultante do trabalho de
discussão a respeito da diferença entre o esporte e o jogo, das observações, da
orientação para a criação e adaptação de regras como solução de problemas, da
tarefa coletiva, da justificativa de por que “não só jogar bola”, da ênfase no diálogo,
facilitando o jogo, e da participação de todos os alunos. Deve haver uma
preocupação do professor para que os alunos explorem, experimentem e vivenciem
os conteúdos trabalhados, não se submetendo apenas ao jogo tradicional com
abordagem técnica e tática que significou a aplicação da racionalidade técnica, típica
do sistema de produção capitalista. Quando o objetivo da Educação Física na escola
é a compreensão de nossa realidade histórica e social, deixar de lado este aspecto
de nossa cultura, conforme afirma Silveira e Pinto (2001), é algo impensável.
Com o trabalho do professor nesta perspectiva, é possível despertar no aluno
um sentimento crítico, como mostra Ribeiro (2006, p. 139)
[...]. a reflexão-sobre-a-reflexão-na-ação adquiriu, a meu ver, um caráter crítico, pois, ao serem utilizados os questionamentos sistemáticos, o diálogo reflexivo, conjunto e homólogo, pautado em teorias que explicitassem os problemas oriundos do cotidiano, novas formas de conceber a reflexão foram evidenciadas, ou seja, o conteúdo e a qualidade da reflexão foram se ampliando de tal forma que já não eram aceitas explicações reducionistas a respeito de qualquer problema das práticas pedagógicas da professora.
A autora esclarece que isto evidencia o papel do professor como mediador no
processo de ensino e que a mediação requer um referencial que desvele as
contradições sociais. Daí a importância de discutir as contradições do jogo e do
esporte, tão presentes na escola.
A questão 5 refere-se às regras dos jogos e brincadeiras que o aluno
conhece, se podem ser mudadas, se são necessárias para jogar ou brincar na
18
escola. No questionário inicial, oito alunos disseram não poder mudar as regras do
jogo, no final todos afirmaram que as regras poderiam ser mudadas. A diferença nas
respostas deve-se aos debates sobre esporte e jogo e à construção coletiva das
regras do jogo de peteca. Os alunos sentiram a possibilidade de mudar ou criar
regras para facilitar a execução do jogo e a participação de todos. Refletiram sobre
seu significado, contextualizando-os e relacionando-os ao cotidiano. Durante a
vivência, mediando a reflexão conduzida por questionamentos, a professora
salientou a importância da cooperação e do diálogo.
Os alunos determinaram que o jogo de peteca deveria ser realizado por
equipes de seis alunos, porém, como a proposta era de duas equipes jogando e
duas observando, com seis alunos por equipe, quatro estariam excluídos. Para
resolver esta questão, eles decidiram em grupo mudar a regra, ficando duas equipes
de oito alunos e duas com nove. A reformulação da regra abriu a possibilidade de os
alunos reavaliarem a situação e identificarem a problemática que envolvia sua
decisão, permitindo também a previsão do problema da exclusão e a reclamação
dos excluídos. Esta situação mostrou a capacidade dos alunos de reavaliar a
situação e de formular novas soluções para os problemas, dando ocasião ao
aprendizado por tentativa e erro. É esse tipo de procedimento que vai fundamentar o
desenvolvimento do indivíduo e muni-lo de maior número de experiências para
enfrentar situações futuras (VIGOTSKI, 2003).
O trabalho na perspectiva crítica-superadora, mediado pelo professor, procura
novas resoluções diante de problemas. Isso mostra a importância da atitude do
professor, de sua disposição em colocar o conteúdo para discussão, questionando e
oferecendo condições para que os alunos o assimilem e recriem, transformando-o
em instrumento de construção pessoal.
Na visão de Huizinga (2001, p. 220), como, no século XX, o jogo se tornou
sério e se afastou da cultura, perdeu seu fator lúdico. Por este motivo, muitas vezes,
seu significado social nem sempre coincide com a expectativa do aluno. Quando
joga, o aluno tenta atingir algo para si mesmo, como prazer e auto-estima, fazendo
uma relação do jogo com a realidade de sua vida. Por isso, é importante, segundo
Soares (1993), trabalhar o jogo, dar-lhe um significado que interpenetra
dialeticamente a intenção do homem e a da sociedade.
Na escola, esse trabalho é favorecido pela teoria progressista, como a
histórico-crítica, que enfatiza um saber vinculado ao vivido, voltado à compreensão
19
das práticas sociais nas quais o homem está inserido. Essa teoria, em que o
conteúdo e a maneira de ensinar não se separam da realidade concreta vivida,
possibilita ao aluno entender a realidade social, interpretando-a e viabilizando a
leitura da realidade.
Hoje, não cabe na escola trabalhar o jogo com base em uma abordagem
técnica e tática, mas, sim, como profere Aranha (1996, p. 216), fazê-lo com base na
pedagogia histórico-crítica, de forma a, partindo da compreensão de nossa realidade
histórica e social, tornar possível o papel mediador da educação no processo de
transformação social. Esta teoria tem como suporte a lógica dialética que possibilita
uma visão dinâmica e contraditória da realidade, que, segundo Albuquerque et all
(2007, p. 127), demonstra condição
para uma prática pedagógica que compreenda e construa um homem sujeito histórico, inserido numa realidade dinâmica, o qual seu corpo e seus movimentos sejam vistos não apenas limitados à dimensão fisiológica e mecânica, mas também articulados à dimensão sociocultural.
Julgamos ser possível que esta forma de conduzir os conteúdos gere nos
alunos a formação do pensamento científico, ultrapassando o senso comum.
Na segunda categoria, situam-se as questões a respeito do jogo e da
brincadeira na cultura indígena. Ao trabalhar o tema 5: cultura indígena, o aluno teve
a oportunidade de pesquisar e conhecer melhor a cultura indígena, discutindo
porque os índios sentem-se desvalorizados, a negação da sua cultura pelos não
indígenas, a falta de recursos para poderem desenvolver sua cultura e o fato de que,
para sobreviver, eles dependem dos órgãos competentes. O interesse pelo povo
indígena e sua valorização aumentavam no decorrer das apresentações e
discussões dos trabalhos. É o que se pode observar pelos relatos de alguns alunos:
“P”: “eles são brasileiros de verdade”, “C”: “os índios que são donos do Brasil, e
ficaram quase sem lugar pra vive”, “D”: “eles descobriram um monte de remédio de
plantas”. A valorização também foi notada pela manifestação da descendência
indígena por parte de alguns alunos, que não haviam se declarado até aquele
momento. Isto despertou o interesse pelo tema, além de mostrar a influência da
cultura indígena na nossa cultura.
Este tema foi trabalhado paralelamente com as disciplinas de português e
história. No questionário inicial, em resposta à questão 7 (Você conhece
20
brincadeiras e jogos inventados pelos índios? Cite alguns.), 36 alunos citaram a
peteca, pois, na prática social inicial do conteúdo, a professora tinha mencionado
que iriam trabalhar com os jogos indígenas, especificando esse jogo. No
questionário final, eles acrescentaram arco e flecha, cabo de guerra, peão, cama de
gato, perna de pau, tihimore, estilingue, zarabatana, bola de gude de coquinho. Um
jogo descrito pelo índio durante a entrevista, pega-pega na árvore, foi lembrado por
dois alunos, pela curiosidade que despertou.
Observa-se, pelo avanço das respostas do segundo questionário, que houve
transmissão e assimilação de conhecimentos. Enfatizamos a interação dos
indivíduos entre si para se apossar do conteúdo em suas múltiplas interfaces. Essa
interação foi notada e apreendida pelos alunos, o que é possível de ser observado
também em seus comentários: “G”: “eu nunca tinha andado de perna de pau, queria
andar mais, é legal”; “C”: “achei estes jogos muito legal, não sabia que era inventada
pelo índio”; “L”: “meu pai também brincou de pião.” Percebe-se que já não se trata
do jogo pelo jogo, mas os alunos, auxiliados pelo professor, efetivam um processo
dialético de construção do conhecimento escolar, que vai do conhecimento vivido no
cotidiano do aluno ao concreto, vivenciado no ambiente escolar, mediado pelo
abstrato. Nesse processo, impulsionados pelos debates em grupo, eles realizam as
operações mentais de analisar, criticar, comparar, deduzir, explicar (GASPARIN,
2005). É possível verificar, pela linguagem oral e escrita do aluno, o domínio e a
tomada de consciência em relação ao conteúdo.
Trabalhar com jogos indígenas é importante porque aproxima a cultura
indígena da sociedade, promove sua assimilação e valorização, além de revelar que
esses conhecimentos são produzidos historicamente e se encontram objetivados na
sociedade em que o aluno vive, como mostra a fala acima.
Ao serem questionados sobre a presença da cultura indígena na nossa
cultura, inicialmente dois alunos responderam que não e vinte disseram não saber.
No questionário final, todos afirmaram que a cultura indígena está presente na nossa
cultura e que sua influência está na linguagem, nas brincadeiras e jogos, dos quais a
peteca e o peão foram os mais mencionados, seguidos da perna de pau e cama de
gato. A comida, o artesanato, como cesto e vasos de cerâmica, e a rede também
foram lembrados por muitos.
O homem se faz mediado pela cultura, segundo Aranha (1996), pois a
criança, ao nascer, encontra um mundo de valores dados, em que se situa. Os
21
alunos tiveram essa consciência ao conhecer melhor a cultura indígena e perceber
sua influência em nossa cultura: “V”: “se não fosse o índio o nome do estado ia ser
diferente?”; “M”: “é, não ia existir a rede também”; “G”: “a gente não ia brincar de
pião”.
A problematização foi realizada em todos os momentos das aulas,
proporcionando uma reflexão cooperativa, explorando as diferentes dimensões da
cultura indígena. O Brasil foi descoberto ou invadido? Os índios viviam na mata, não
tinham escrita, os europeus invadiram terras indígenas, mataram e escravizaram,
para enriquecer, quem era mais civilizado? Entre as respostas a essas perguntas,
encontramos comentários, como: “B”: “o índio, é ele já morava aqui”; “W”: “é, ele não
fez ninguém de escravo.” Quando questionados sobre a existência de vantagem na
influência de culturas, as respostas foram: “nós aprendemos mais coisas”. A
professora continuou questionando e os alunos responderam: “L”: “um ensina o que
sabe pro outro, ué”; “C”: “eles aprenderam a fazer casa de tijolo”; “B”: “eles
ensinaram a fazer farinha de mandioca”; “W”: “pirão também”; “L”: “a gente toma
banho todo dia.”
Observa-se, nas falas dos alunos, que eles estão construindo seu
conhecimento de forma mais elaborada. Relacionado ao cotidiano do aluno e, de
acordo com uma evolução espiralada, ou seja, com a ampliação e o aprofundamento
dos conhecimentos, o conteúdo cultural indígena foi entendido como uma
construção social histórica, produzida pelos homens em determinado tempo e lugar.
Dessa forma, o aluno começa a deter o conhecimento, não como informações
fragmentadas, mas com um significado objetivo e social. Por exemplo, ele consegue
relacionar o jogo da peteca com a cultura indígena, com a infância de seus pais ou
avós. Essa percepção da construção histórica do tema contribui para um
entendimento maior da sua realidade.
Os alunos responderam também às seguintes questões. Como os índios
viviam no Brasil quando os portugueses chegaram aqui no ano 1500? Os índios têm
sua própria língua? Os índios acreditavam em Deus? Quais eram os Deuses em que
eles acreditavam? Como era o trabalho dos índios? Eles recebiam salário pelo
trabalho? Tinham seu próprio dinheiro? Quais hábitos ou costumes que herdamos
dos índios? A cultura indígena está presente na nossa cultura? Cite um exemplo.
22
Nos debates, observou-se que o aluno atingiu a consciência e o domínio dos
conceitos relativos a esses temas, quanto às crenças e a influência da cultura
indígena, já que, no questionário inicial, as respostas foram muito vagas.
Podemos observar, nas respostas do questionário inicial e na fala dos alunos,
que o conhecimento sobre o indígena estava relacionado ao tempo da chegada dos
portugueses ao Brasil: “F”: “viviam na mata”; “G”: “da caça e pesca”; “L”: “viviam em
cabanas”.
Os resultados da entrevista realizada com o casal indígena e da discussão a
respeito dos problemas indígenas nos dias atuais revelam que os alunos se
apropriaram dos conceitos científicos com base nas questões de seu cotidiano. Esta
nova síntese, mais elaborada, leva a uma nova consciência e valorização da
realidade, a uma aceitação das diferenças culturais, como mostra a fala dos alunos:
“A”: ”a gente conhece costumes de pessoas diferentes”; “C”: ”diminui o racismo.”
Este novo olhar para a vida evita o etnocentrismo, que é uma maneira conservadora
e limitada de enxergar a realidade, de julgar outros padrões morais, políticos,
religiosos a partir de valores do próprio grupo. Evitando o etnocentrismo, evita-se a
violência.
O jogo, a identidade social e a apreensão crítica dos alunos formam a terceira
categoria, que é composta de quatro questões: 1- Supondo que um colega de sala
não consiga realizar as atividades propostas pelo grupo na aula de educação física,
que atitude você tomaria com este colega? 2-O que você entende por cultura, a
nossa cultura? 3-Como você entende a cultura corporal? 4-Que conteúdos você
considera que fazem parte da cultura corporal?
As respostas da primeira questão mostraram que o sentimento de empatia e
solidariedade se manifestou desde o primeiro questionário, porém, podemos
perceber que, ao final da intervenção, houve uma alteração na maneira de resolver a
questão pela grande maioria dos alunos: “pedir pra professora para mudar a regra
pra ela jogar” e “eu ajudaria” foram as respostas mais observadas. No início, as
respostas foram “K”: “...respeitar muito o colega”; “T”: “pedir pra ele prestar mais
atenção”; “G”: “falar pra esforçar mais”; “L”: “mudar de atividade pra poder jogar”;
“W”: “trocar de jogo”; “B”: “ajudar a animá-lo”. Nota-se que, no início, os alunos viam
a solução na atitude individual do colega, sendo comuns as expressões: mais
atenção, esforço, ânimo, mudar de jogo. Ao final, eles procuraram uma solução
coletiva para a inclusão.
23
Esta diferente visão de um mesmo tema, de uma solução como resultado de
uma atitude individual e, após a intervenção, como coletiva, mostra que as
interações sociais e as experiências que elas proporcionam em seu meio social vão
constituir as funções psicológicas superiores do indivíduo. A interação social revela-
se então um processo de mútua constituição do sujeito e do ambiente social, que
modifica o meio e promove, simultaneamente, o desenvolvimento do indivíduo.
Assim o desenvolvimento humano é impulsionado pela aprendizagem que se dá no
ambiente social e pela interação entre sujeitos. (VIGOTSKI apud ROCHA, 2007, p.
19).
A experiência vivida na construção de regras para o jogo de peteca passou
pelo processo de repetição e imitação para resolver o problema do colega excluído.
Com base nesse princípio, justifica-se a imitação como processo pedagógico
significativo na construção do conhecimento. O aluno imitando, repetindo, no ritual
das relações sociais cotidianas, aprende a dizer o que quer e a entender o outro
pelo gesto, o que reforça a idéia de que a imitação pode contribuir para o
aprendizado social (ROCHA, 2007).
Uma experiência vivida é um exemplo do que estamos tratando. Uma aluna
ficou fora do jogo de peteca porque estava com o pé machucado. Uma de suas
amigas, que parecia incomodada com sua exclusão, questionou a professora sobre
a possibilidade de sua participação. O questionamento foi dirigido ao grupo, que deu
a ela um local fixo, de forma que poderia participar sem se deslocar. Esse caso
mostra que a empatia esteve presente nos alunos.
Esta forma de interação manifesta a capacidade de o indivíduo perceber-se
no lugar do outro, compreendendo e internalizando o meio social através do outro
(VIGOTSKI, 2003). Por meio da empatia, os alunos são capazes de decodificar
mensagens subjetivas nos gestos e falas no seu convívio social. Estas interações
são importantes para que não aconteça na escola o jogo pelo jogo, mas que este
seja realizado como meio de compreensão da realidade, para atingir a consciência
crítica a respeito das práticas sociais.
Em relação às respostas às questões relativas à cultura e cultura corporal, no
início, a maioria não respondeu e alguns que o fizeram colocaram: “L”: “nós que
fazemos ela”, “W”: “a língua”, “L”: “é a pintura e dança”. Após a intervenção, as
respostas foram: “L”: “são hábitos do povo, o modo de agir, se vestir, seus hábitos”;
“G” “resultado do esforço de um povo para construir sua própria sobrevivência”, “L”:
24
“resultado da construção da existência de um povo, modo de vestir, a comida, o
ambiente em que vive”. A diferença na respostas foi grande. Por se tratar de um
conceito abstrato, ao final, foi permitido que eles elaborassem a resposta por meio
de consulta aos textos trabalhados.
Como a cultura corporal foi mencionada e discutida nas aulas, por meio de
recurso áudio visual, as respostas foram baseadas nesses momentos. As respostas
mais freqüentes foram: “é o modo da pessoa relacionar com o outro, como carinho,
vestir, jogar, tudo que usamos o corpo”; “modo que relacionamos com outras
pessoas”; ”modo de relacionar com outros, como carinho, brincar, através do corpo”;
“movimento do corpo na aula”; “todo movimento que fazemos, pra jogar, brincar,
andar.”
A cultura é uma criação humana, que revela as formas do homem estabelecer
relações entre si e com a natureza. Ao se relacionar para produzir sua própria
existência, por meio do trabalho, o homem desenvolve condutas sociais, instaura
relações sociais, produz modelos de comportamento, instituições e saberes. Cria,
desse modo, seu mundo cultural, cujo sistema de significados é estabelecido pelo
grupo, como é o caso dos valores, língua, maneira de se alimentar, andar, jogar,
brincar, tudo que está estabelecido em convenções. No entanto, a permanência
dessas atividades só é possível pela transmissão dos conhecimentos adquiridos e é
a educação que dá condições para a sua sobrevivência material e espiritual.
Portanto, como o homem se faz mediado pela cultura, a educação é fundamental
para sua socialização e humanização (ARANHA, 1996).
Podemos ver, na fala e nas respostas dos alunos, que, vivenciando os jogos
tradicionais dos índios, dialogando e debatendo, conhecendo a cultura indígena e a
identificando no seu cotidiano, eles tiveram um entendimento da sua cultura.
Compreenderam a cultura corporal, própria da Educação Física, como a cultura feita
pelo corpo, como “tudo que a gente faz movimentando o corpo”, a exemplo do que
definiu um aluno. Compreenderam que ela está presente na ginástica e jogos,
atividades mais mencionadas em suas respostas, provavelmente por se tratar dos
conteúdos trabalhados dentro desta metodologia, quando abordadas paralelamente
à cultura.
Essa prática possibilitou ao aluno atuar ativamente nas decisões durante o
processo de ensino, permitindo se localizar como sujeito histórico, que constrói e
transforma sua realidade.
25
3. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Com base em uma nova concepção de Educação Física, a professora
pesquisadora considera que não cabe mais na escola o conteúdo ensinado de forma
técnica, já que, assim, limitam-se as possibilidades educativas. Por isso, buscando
mudar suas aulas, realizou este estudo, cujo objetivo é compreender o trabalho na
perspectiva crítica-superadora.
O processo exigiu inúmeras leituras, reflexões e debates com os colegas e a
professora orientadora, na tentativa de facilitar a compreensão e a tomada de
decisão quanto ao planejamento e às ações de intervenção.
Faz-se necessário que o professor defina o seu projeto político pedagógico
com base nessa nova concepção, que oriente sua prática na escola, sabendo da
importância do seu papel como educador, tendo consciência de que a educação em
uma perspectiva crítica e dialética deve possibilitar ao aluno a compreensão da
realidade histórica e social e colocando a educação como mediadora no processo de
transformação social.
Baseada na Pedagogia Histórico-Crítica, o desafio da professora foi enfatizar
os jogos indígenas como parte importante do conteúdo de jogos e brincadeiras nas
aulas de Educação Física, com duas turmas de 5ª séries de uma escola pública .
Enfim, ao trabalhar os jogos, brinquedos e as diferentes culturas, é possível
perceber a importância da interação dos indivíduos entre si, para que na escola não
se pratique o jogo pelo jogo, mas que ele seja um meio de compreensão da
realidade, de formação da consciência crítica a respeito das práticas sociais. O
papel do professor é decisivo no processo dialético de construção do conhecimento
escolar, introduzindo discussões, confrontações e diálogos.
Foi possível detectar a importância do trabalho com a cultura indígena, não
como informação fragmentada, mas associada aos jogos tradicionais, à cultura do
aluno, percebendo os jogos como uma produção histórica e social, ou seja, como
produzidos coletivamente no decorrer do tempo.
Conhecemos, com este estudo, a importância da formação do professor e de
sua consciência a respeito da educação como prática social transformadora, aliando
26
a competência técnica e o compromisso político, para não sucumbir, nem ceder às
pressões, diante das dificuldades, que não são poucas e são constantes nas
escolas.
É interessante destacar que, adotando esta concepção, não se prega que os
alunos façam o que eles querem, mas que dialoguem e argumentem com o grupo e,
mediados pelo professor, procurem o que melhor pode ser feito nas muitas
situações das aulas.
Também foi proveitosa, neste trabalho, a experiência de planejamento das
aulas por temas. Os objetivos se tornaram mais coerentes, menos fragmentados, e a
professora conseguiu acompanhar o salto qualitativo do aluno em relação ao
conteúdo.
Conclui-se que é possível trabalhar os jogos e brincadeiras na perspectiva
crítico-superadora, uma vez que ela oferece a possibilidade de se contribuir para a
construção da identidade social do aluno, tornando o conteúdo significativo para ele,
de forma que ele possa incorporá-lo ao seu mundo vivencial e, assim, ajudando-o a
compreender sua realidade e a encontrar meios para nela interferir de modo crítico.
AGRADECIMENTOS
A minha orientadora, Deiva Mara Delfini Batista Ribeiro, por ter me ensinado a
conhecer e a agir.
Aos professores do Departamento de Educação Física da Universidade Estadual de
Maringá pelos diálogos, leituras e ensinamentos.
À Escola Estadual Silvio Magalhães Barros, seus professores, funcionários, alunos e
comunidade, que ao longo do trabalho, me apoiaram.
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