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Instituto Brasileiro do Concreto - 44º Congresso Brasileiro O fenômeno do lascamento (“spalling”) nas estruturas de concreto armado submetidas a incêndio – uma revisão crítica Carla Neves Costa (1) ; Antônio Domingues de Figueiredo (2) ; Valdir Pignatta e Silva (3) (1) Mestranda, Departamento de Engenharia de Estruturas e Fundações Escola Politécnica, Universidade de São Paulo e-mail: [email protected] (2) Professor Doutor, Departamento de Engenharia de Construção Civil Escola Politécnica, Universidade de São Paulo e-mail: [email protected] (3) Professor Doutor, Departamento de Engenharia de Estruturas e Fundações Escola Politécnica, Universidade de São Paulo e-mail: [email protected] Av. Prof. Almeida Prado, Trav. 2, n° 271, Ed. Paula Souza [Eng. Civil], Depto. Eng. Estruturas e Fundações. CEP: 05508-900, Cidade Universitária, São Paulo – S.P. Brasil. Fax: +55 +11 3091- 5181. Tels.: +55 +11 3091-5165 / 5542 / 5562 Palavras Chaves: incêndio, altas temperatura, lascamento (“spalling”), tensões térmicas, concreto, segurança estrutural. Resumo A ação térmica devida ao incêndio aumenta a temperatura dos elementos estruturais, causando alterações na micro e na macroestrutura do concreto; conseqüentemente, há redução de resistência e rigidez e o aparecimento de esforços adicionais nas estruturas hiperestáticas devido às deformações térmicas. Esses efeitos podem levar ao colapso estrutural. As alterações físico-químicas no concreto superaquecido promovem a degeneração progressiva do material das peças estruturais e os carregamentos aplicados aceleram a desagregação, manifestada por meio de fissuras, esfarinhamentos e lascamentos, sendo esses últimos amplamente divulgados pela literatura técnica internacional como “spalling”. Os concretos de alta resistência apresentam maior tendência ao lascamento instantâneo se comparados aos concretos usuais. A estrutura compacta de baixa porosidade dificulta o transporte de vapores formados na matriz durante o aquecimento. A pressão desses vapores aumenta excessivamente nas camadas próximas à superfície do concreto, podendo ocorrer o estilhaçamento violento da região periférica do elemento estrutural. O concreto de menor resistência permite o transporte do vapor mais facilmente, por sua maior porosidade; entretanto, se a concentração de umidade for muito elevada, este também poderá sofrer descamações profundas (ou “sloughing”) e prematuras, destacando o cobrimento das armaduras. Neste trabalho serão descritas as principais causas e medidas de qualidade do material que reduzem o risco do lascamento (ou “spalling”) ocorrer nos primeiros minutos do incêndio.

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Instituto Brasileiro do Concreto - 44º Congresso Brasileiro

OO ffeennôômmeennoo ddoo llaassccaammeennttoo ((““ssppaalllliinngg””)) nnaass eessttrruuttuurraass ddee ccoonnccrreettooaarrmmaaddoo ssuubbmmeettiiddaass aa iinnccêênnddiioo –– uummaa rreevviissããoo ccrrííttiiccaa

Carla Neves Costa(1); Antônio Domingues de Figueiredo(2);Valdir Pignatta e Silva(3)

(1) Mestranda, Departamento de Engenharia de Estruturas e FundaçõesEscola Politécnica, Universidade de São Paulo

e-mail: [email protected]

(2) Professor Doutor, Departamento de Engenharia de Construção CivilEscola Politécnica, Universidade de São Paulo

e-mail: [email protected]

(3) Professor Doutor, Departamento de Engenharia de Estruturas e FundaçõesEscola Politécnica, Universidade de São Paulo

e-mail: [email protected]

Av. Prof. Almeida Prado, Trav. 2, n° 271, Ed. Paula Souza [Eng. Civil], Depto. Eng. Estruturas eFundações. CEP: 05508-900, Cidade Universitária, São Paulo – S.P. Brasil. Fax: +55 +11 3091-

5181. Tels.: +55 +11 3091-5165 / 5542 / 5562

Palavras Chaves: incêndio, altas temperatura, lascamento (“spalling”), tensões térmicas,concreto, segurança estrutural.

Resumo

A ação térmica devida ao incêndio aumenta a temperatura dos elementosestruturais, causando alterações na micro e na macroestrutura do concreto;conseqüentemente, há redução de resistência e rigidez e o aparecimento deesforços adicionais nas estruturas hiperestáticas devido às deformações térmicas.Esses efeitos podem levar ao colapso estrutural. As alterações físico-químicas noconcreto superaquecido promovem a degeneração progressiva do material daspeças estruturais e os carregamentos aplicados aceleram a desagregação,manifestada por meio de fissuras, esfarinhamentos e lascamentos, sendo essesúltimos amplamente divulgados pela literatura técnica internacional como “spalling”.Os concretos de alta resistência apresentam maior tendência ao lascamentoinstantâneo se comparados aos concretos usuais. A estrutura compacta de baixaporosidade dificulta o transporte de vapores formados na matriz durante oaquecimento. A pressão desses vapores aumenta excessivamente nas camadaspróximas à superfície do concreto, podendo ocorrer o estilhaçamento violento daregião periférica do elemento estrutural. O concreto de menor resistência permite otransporte do vapor mais facilmente, por sua maior porosidade; entretanto, se aconcentração de umidade for muito elevada, este também poderá sofrerdescamações profundas (ou “sloughing”) e prematuras, destacando o cobrimentodas armaduras.Neste trabalho serão descritas as principais causas e medidas de qualidade domaterial que reduzem o risco do lascamento (ou “spalling”) ocorrer nos primeirosminutos do incêndio.

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1 IntroduçãoO lascamento é um fenômeno natural nas estruturas de concreto, quando elas sãoexpostas à altas temperaturas. Dentro da matriz de concreto, desenvolvem-setensões de origem térmica, que influem na desintegração das regiões superficiaisdos elementos estruturais (PURKISS (1996)).

Não há ainda um controle total confiável sobre a ocorrência de lascamentos, poreles serem função de uma série de fatores que levam, freqüentemente, a umcomportamento imprevisível. Em alguns casos o lascamento é conseqüência danatureza mineralógica do agregado, ou da concentração tensões térmicasdesenvolvidas durante o aquecimento e que confluem para as camadas próximasaos cantos do elemento. Algumas pesquisas mostram que a esbeltez dos elementosestruturais e elevadas tensões de compressão na seção transversal de concretodurante o período de incêndio, também aumentam a probabilidade dos lascamentosocorrerem (BUCHANAN (2001)).

Na maioria das vezes, os lascamentos explosivos são relacionados aocomportamento da pasta de cimento, geralmente devido à ação combinada dapressão nos poros e das tensões térmicas internas induzidas por gradientestérmicos (BUCHANAN (2001); TENCHEV & PURKISS (2001)). Por isso, nosconcretos menos permeáveis, como os concretos de alta resistência, a matrizcompacta impede a liberação dos vapores formados durante o aquecimento. Hádesenvolvimento de pressão interna elevada, o que pode induzir a lascamentospotencialmente explosivos.

Na década de 90, grandes estruturas experimentaram os efeitos destrutivos doincêndio por meio de lascamentos térmicos prematuros e explosivos, cujoselementos estruturais sofreram grandes avarias comprometendo a segurançaestrutural:

v Storebælt Tunnel (Great Belt Tunnel) – Dinamarca (1994)1 (Figura 1.1);

v Düsseldorf Airport – Alemanha (1996)2;

v Channel Tunnel (Eurotunnel) – França-Inglaterra (1996)3 (Figuras 1.2 e 1.3);

v Aeroporto Santos Dumont – Brasil (1998)4;

v Mont Blanc Tunnel – França-Itália (1999)5 (Figura 1.4);

v Tauern Road Tunnel – Áustria (1999)6; 1 Junho de 1994: lascamentos prematuro reduziu a espessura das estruturas em concreto de alta resistência dotúnel ao longo de 36 m de extensão, restando apenas 25% da dimensão original (TENCHEV & PURKISS(2001)).2 16 de abril de 1996: lascamentos explosivos destruíram partes das estruturas de concreto de fck = 25 MPanum incêndio cuja temperatura atingiu 1000 °C (AÏTCIN (1997)). Aos 120 minutos de duração, a profundidadedos lascamentos variaram entre 5 e 40 mm (HAAK (1999)).3 18 de novembro de 1996: lascamentos instantâneos destruíram o cobrimento das armaduras e deixaram o soloexposto (BREHM (1999), CE–Magazine (1999), TENCHEV & PURKISS (2001)).4 13 de fevereiro de 1998: o incêndio no Aeroporto Santos Dumont (Rio de Janeiro) com duração de 8 horaschegou a temperatura aproximada de 900 °C, comprometendo vários pilares curtos por meio do “spalling”(BATTISTA et al. (2000)).5 24 de março de 1999: a temperatura ultrapassou os 1000 °C num incêndio com duração de 2 dias; o “spalling”instantâneo comprometeu a resistência do concreto de alto desempenho (BREHM (1999), CE–Magazine(1999)).6 29 de maio de 1999: uma colisão causou uma série de explosões em aproximadamente 600 m de extensão dotúnel sito a oeste da Áustria (BBC News (1999)).

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v Sankt-Gotthard Basel Tunnel (Gotthard Tunnel) – Suíça (2001)7 (Figura 1.5).

Figura 1.1 - Armaduraexposta do StorebæltTunnel (Great Belt Tunnel)por lascamentosinstantâneos por ocasião doincêndio em 1994(GALSKJÆR (2001)).

Figura 1.2 - Anéis deconcreto (lajes) do ChannelTunnel destruídos porlascamentos térmicosexplosivos nos primeirosminutos do incêndio, expondoa armadura à ação direta dofogo (ULM (2000)).

Figura 1.4 - Cavidades visíveis nos anéis deconcreto do Mont Blanc Tunnel porlascamentos instantâneos e progressivos(ULM (2000)).

7 24 de outubro de 2001: em Airolo (Suíça), uma colisão entre dois caminhões provocou um incêndio envolvendovários outros veículos e expôs a estrutura interna de concreto a uma superior aos 1800 °F (982 °C) , levandovárias seções do túnel ao colapso (BROGGI (2001)).

Figura 1.3 - Armadura exposta pormeio de lascamentos explosivosnos diversos segmentos doChannel Tunnel ao longo de 35 kmde extensão (ULM (2000)).

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Figura 1.5 – Colapso estruturalde partes dos anéis de concretodo Gotthard Tunnel induzidopor lascamentos térmicosexplosivos e instantâneos.

2 Degradação da macroestrutura do concreto endurecidoAs formas de desagregação do concreto, quando submetido a temperaturaselevadas são: esfarelamento da superfície calcinada, separação parcial depequenas camadas superficiais do material ao longo do incêndio – delaminação elascamentos explosivos (KORDINA & MEYER-OTTENS (1981), DOUGILL (1983)apud HARMATHY (1993)). O primeiro, característico da exposição constante dascamadas superficiais do material à ação térmica, enfraquece o concreto e reduz emmuito a resistência a abrasão levando ao esfarelamento da superfície das peças deconcreto. O segundo e o terceiro são, segundo PURKISS (1996), as duas formas demanifestação do lascamento:

v delaminação gradual (ou “sloughing”) que é o desprendimento de uma porçãoconsiderável de concreto e de grande extensão da superfície do elemento (perdageral do material), de efeito progressivo, pois deixa novas camadas do concretoendurecido à exposição das chamas conduzindo a novos descascamentossucessivos, a perda de aderência entre o cobrimento da armadura e a própriaarmadura (FERREIRA (1988); MELHADO (1988));

v lascamento explosivo (“explosive spalling”), cuja perda do material é parcial,instantânea e violenta com grande liberação de energia, formando grandescavidades nos primeiros 30 minutos do incêndio.

A velocidade de aquecimento, o teor de umidade, a porosidade, os tipos deagregados do concreto e o detalhamento das armaduras influem no aparecimentodo lascamento (BICKLEY & MITCHELL (2001)).

É sabido que a maior incidência dos lascamentos instantâneos ocorrem entre 250 °Ce 400 °C, temperaturas facilmente alcançadas em situação de incêndio (KALIFA etal. (2000)). Na maioria dos casos a pressão de vapor é o fator mais importante(ANDERBERG (1997); BUCHANAN (2001); KALIFA et al. (2000)).

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3 Possíveis causas3.1 Alta densidade

A matriz muito densa das peças de concreto impede a liberação da pressão devapor d’água com o aumento da temperatura, aumentando a pressão interna(AÏTCIN (2000)). As tensões de tração assim originadas, somadas às tensõestérmicas e estáticas podem superar a tensão de tração resistente do material,levando-o ao colapso (vide item 3.2).

Os lascamentos explosivos normalmente ocorrem nos primeiros 30 minutos doincêndio nas peças estruturais sob temperaturas mais baixas, entre 240 °C e 280 °C(ANDERBERG (1997)). Nessa faixa de temperatura a água quimicamentecombinada é liberada do concreto, indicando que os lascamentos explosivos nosconcretos de alto desempenho estão diretamente relacionados às pressões internasgeradas durante a “tentativa” da água quimicamente ligada escapar.

A umidade livre poderia apresentar efeitos benéficos na resistência do concreto emaltas temperaturas, exceto pela possibilidade de lascamentos prematuros. Aabsorção de calor associada à água “retardaria” o aumento da temperatura da peçaestrutural e portanto, adiaria o desenvolvimento de pressões de vapor d’água quepudesse levar ao colapso o elemento de concreto (NOUMOWE et al. (1996)).

3.2 Taxa de aquecimento

Taxas de aquecimento maiores, induzem a gradientes térmicos maiores devido abaixa condutividade do concreto. A elevação de temperatura da superfície doelemento estrutural, conduz a grandes diferenças de temperaturas entre asuperfície aquecida e o interior frio do concreto (gradientes térmicos elevados) emmenor tempo. Em conseqüência, tensões térmicas de grande magnitude surgemrapidamente, aumentando consideravelmente o risco de lascamentos instantâneos.Essa pode ser a causa de concretos leves serem susceptíveis à lascamentosprecoces quando submetidos à incêndios de hidrocarbonetos (LINDGÅRD &HAMMER (1999)).

Quando o concreto é aquecido lentamente não são desenvolvidos grandesgradientes térmicos e, portanto, não há degradação imediata do material comofissuração e “sloughing”. Mas a ausência de fissuras pode impedir a liberação daágua do interior da massa de concreto, havendo possibilidade de ocorrer lascamentoexplosivo. Lascamentos nessas condições foram verificados nas experiências deSAAD et al. (1996) apud KALIFA et al. (2000), onde corpos-de-prova de concreto(cilindros com 16 cm de diâmetro) foram aquecidos a 1 °C/min. Por outro lado, altastaxas de aquecimento podem gerar macrofissuras nas peças de concreto liberandoa pressão de vapor do seu interior sem reduzir muito a resistência do concreto.Nesse caso, os danos poderiam ajudar no aumento da permeabilidade na liberaçãodessas pressões internas nos poros (KALIFA et al. (2000)).

3.3 Distribuição não-uniforme de temperatura nas peças

Elementos estruturais posicionados num compartimento em chamas, de tal formaque apenas uma ou duas faces são aquecidas, estão sujeitos a gradientes térmicosassimétricos e elevados, tanto ao longo da seção transversal como do comprimento

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da peça.

Bem próximo à superfície exposta ao fogo, aparecem tensões térmicas decompressão que podem ser elevadas, decorrentes da distribuição irregular detemperatura nos elementos de concreto. Essas tensões podem submeter o interiorda peça estrutural a fissurações extensas ou mesmo, causar lascamentosexplosivos (SAITO (1966) apud HARMATHY (1993)). Além disso, as barras dasarmaduras podem atuar como descontinuidades térmica e mecânica, causandolascamentos prematuros também (KALIFA et al. (2000)).

3.4 Seções transversais delgadas

O uso crescente de concretos com resistência à compressão cada vez maiorespermitiram a construção de estruturas mais esbeltas, de menor largura, parasuportar os mesmos carregamentos. As peças estruturais perderam massa evolume, alterando o fator de massividade8 comum aos elementos de construção. Ocalor se propaga mais rápido para o interior das peças, fazendo com que atemperatura se eleve mais no centro da massa de concreto. Como conseqüência, aperda de resistência e rigidez é maior. Por essa razão, as lajes, elementos depequena espessura (alto fator de massividade), sofrem os efeitos mais danosos doincêndio, onde freqüentemente são observadas flechas excessivas (NEVILLE(1997)). O efeito dos lascamentos, de certa forma, também é maior nas secçõesfinas porque os estilhaços podem ser inversamente proporcionais em relação àsdimensões do elemento (PURKISS (1996)).

3.5 Altas concentrações de armadura

As armaduras podem influenciar o fenômeno do “spalling” como fator secundário,sobretudo em pilares. Diversos ensaios realizados (ALDEA et al. (1997);FRANSSEN (2000)) parecem concluir que pilares, cuja armadura principal éconstituída de barras de grande diâmetro, estão mais sujeitos aos lascamentos doque aqueles cujas barras possuem diâmetro menor, mesmo em concretos de baixaresistência.

Os pilares de concreto de alta resistência apresentam “sloughing” antecipado einstantâneo principalmente nos cantos vivos ao longo do comprimento. Asarmaduras se aquecem prematuramente nos locais onde a seção transversal foireduzida em face dos lascamentos. A flambagem das barras da armadura principal éseguida do colapso do pilar por esmagamento do concreto (ALDEA et al. (1997)).

Pilares cujo diâmetro das barras é da ordem de 25 mm apresentam tempos deresistência ao fogo bem menor que aqueles estimados por métodos normatizados.Quando barras de diâmetros φ � 16 mm são usadas como armadura principal, oslascamentos nos pilares são raramente observados (FRANSSEN (2000)).

3.6 Carregamento nos elementos comprimidos

Segundo demonstram alguns ensaios e evidências observadas em incêndio reais, o

8 O fator de massividade é característica geométrica definida pela relação entre área superficial exposta ao fogodo elemento estrutural e o seu volume total (SILVA (2001)).

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lascamento parece ser crítico nas áreas em que a seção transversal de concreto émais comprimida, tais como pilares e regiões de momentos negativos em lajes evigas (PURKISS (1996)).

Tensões de compressão adicionais podem aparecer em elementos estruturaisdurante o aquecimento por restrição à dilatação térmica do concreto confinado.Quando essas tensões de compressão excedem à resistência à compressão domaterial, os lascamentos podem aparecer (LIE (1972); BA�ANT (1997) apud ULM etal. (1999a)). Pedaços consideráveis da espessura se desprendem, por exemplo, delajes maciças contínuas nas duas ou quatro bordas, de vigas contínuas comrestrição à deslocamentos nos apoios, das flanges de vigas “I” impedidas de sedilatarem pelos apoios rígidos e vigas protendidas (LIE (1972)).

Alguns pesquisadores (BA�ANT (1997) apud ULM et al. (1999a); TENCHEV &KHALAFALLAH (2000)) consideram a influência da pressão interna de vapor nolascamento, de efeito secundário nos elementos comprimidos. Os lascamentostérmicos são essencialmente produzidos por tensões biaxiais de compressão,seguida das tensões uniaxiais, induzidas pelas restrições impostas à dilataçãotérmica, descritas anteriormente. Tais suposições são sustentadas pelos resultadosde incêndios reais: a ausência de danos visíveis ao redor das juntas entre osdiversos segmentos do Channel Tunnel, onde a forma cilíndrica permitiu a dilataçãotérmica livre (ULM et al. (1999b)). A hipótese considera que ruptura frágil(lascamento) é uma forma de liberação das tensões elevadas de compressão queatuam no material enfraquecido pela temperatura. Quando a velocidade depropagação das fissuras é maior que a velocidade de liberação do vapor, a pressãointerna nos poros tende a diminuir; se isso não ocorrer, o gradiente de pressãoapenas “acelera” o desenvolvimento das fissuras na forma violenta (lascamentosexplosivos) (ULM et al. (1999a)).

Nos elementos estruturais comprimidos, a esbeltez tem um papel muito importantena eventualidade do lascamento e o aumento do carregamento do pilar reduzconsideravelmente a resistência ao fogo. Essas podem ser as causas doaparecimento de lascamentos instantâneos no ensaio de pilares circulares deconcreto armado, pois os pilares de seção circular apresentam normalmente umaresistência satisfatória em incêndios (DOTREPPE et al. (2001)).

O Eurocode 2 (2001) considera, dentre outros, os parâmetros de esbeltez e nível decompressão do carregamento aplicado, no dimensionamento de pilares em incêndio,para um tempo de resistência requerido.

3.7 Pressão de vapor

O concreto é um material poroso, cujos poros estão preenchidos com água e ar.Quando aquecido, as propriedades materiais do concreto são afetadas, bem como otransporte de umidade interna. Durante o incêndio, o calor absorvido pelo concretopromove a evaporação da umidade livre presente na pasta de cimento (TENCHEV &PURKISS (2001)). As massas de ar e água se movem do interior à superfície doconcreto para serem liberados. O vapor e o ar podem ainda migrar no sentidoinverso, isto é, para o centro do elemento estrutural, onde o vapor d’água secondensa novamente até que as condições termodinâmicas estejam satisfeitas (LIE(1972); KALIFA et al. (2000)).

A transferência das massas de ar, água na forma líquida e vapor através da rede de

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poros na macroestrutura do concreto promove o desenvolvimento de elevadosgradientes de pressão, pois quando a velocidade de evaporação d’água é maior quea velocidade de liberação do vapor, as pressões nos poros aumentam sobremaneira(TENCHEV & PURKISS (2001)). A dilatação térmica da água também estáexpressivamente envolvida nesse processo (KALIFA et al. (2000)).

O aumento imediato dos gradientes de pressão de vapor numa pequena rede deporos constitui um dos processos térmicos internos desenvolvidos na microestruturado concreto, descrito como processo hidrotérmico (KALIFA et al. (2000)). O outroprocesso térmico interno é apresentado no item 3.9.

A baixa permeabilidade do concreto funciona como uma obstrução à umidadeinterna, impedindo a sua saída com facilidade. Como resultado, as pressões egradientes de pressões muito elevados produzem lascamento explosivo comviolenta liberação de energia. Essa é a principal razão dos concretos de altaresistência CAD9 ou CAR serem muito mais sujeitos a lascamentos explosivosquando aquecidos, do que os concretos usuais (KALIFA et al. (2000)). Obviamente,os gradientes de pressão nos concretos usuais são muito mais baixos devido amaior porosidade que esses concretos possuem.

Os concretos usuais podem experimentar o lascamento explosivo, quandoapresentam grandes teores de umidade livre (HARMATHY (1965a) apudHARMATHY (1993)). Nesse caso, o processo hidrotérmico não decorre damicroestrutura densa e impermeável (falta de poros), mas devido ao excesso deumidade.

Elementos estruturais saturados e com ambas as faces expostas ao fogo, podemruir se a difusividade do concreto for grande o suficiente. Os concretos saturadostendem a apresentar lascamentos, desde escoriações superficiais, destacamento decobrimentos, e gretas até mesmo explosões, principalmente em concretos de baixapermeabilidade (NEVILLE (1997)). O aumento da pressão de vapor da água livrepróximo à superfície pode ultrapassar a resistência à tração do material, levando aoaparecimento de trincas (ANDERBERG (1997)).

O lascamento precoce também pode ser observado para baixos teores de umidadelivre, pois a quantidade de água quimicamente combinada liberada, é muito maior secomparada àquela necessária para saturar as camadas periféricas de concretoformadas durante o processo de secagem (KALIFA et al. (2000)).

3.8 Transformações mineralógicas dos agregados

Os concretos contendo agregados silicosos, como o granito apresentampipocamentos (“pop outs”) e lascamentos acima dos 500 °C, em virtude doestilhaçamento dos agregados (LIN et al. (1996)). Esses lascamentos são mais“suaves” – os “sloughing” – se comparados àqueles típicos em concretos de altadensidade (MALHOTRA (1982)).

A razão fundamental do “sloughing” é o aumento do volume dos agregados dentroda massa de concreto, quando estes sofrem alterações na sua estrutura cristalina. Acomposição mineralógica dos agregados governa a dilatação térmica diferencial

9 O termo concreto de alto desempenho (“high performance concrete”) foi inicialmente designado aos concretosde alta resistência (“high strength concrete”) por apresentarem alta compacidade e, conseqüentemente, ter bomdesempenho de durabilidade em relação à penetração de agentes corrosivos como por exemplo, os íons-cloreto.

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entre a pasta e os agregados e conseqüentemente, a resistência última da zona detransição (METHA & MONTEIRO (1994)).

Alguns agregados leves podem causar lascamentos explosivos, nos quais, astensões térmicas podem contribuir no processo, embora lascamentos dessenatureza não sejam comuns em concretos leves de resistências usuais, a menosque o teor de umidade da estrutura seja muito elevado (HARMATHY (1993)).Quando os concretos leves são susceptíveis aos lascamentos explosivos, oEurocode 2 (2001) indica o uso de resultados de ensaios na determinação dasdimensões mínimas do elemento estrutural e nas medidas de segurançanecessárias.

3.9 Tensões térmicas

As tensões térmicas surgem dentro da massa de concreto induzidas por gradientesde temperatura e de dilatação térmica. Os gradientes térmicos e de deformaçãoconduzem ao outro processo térmico interno desenvolvido na microestrutura doconcreto, descrito como processo termo-mecânico (vide item 3.7).

Os gradientes de dilatação térmica são decorrentes das diversas transformaçõesnas diversas fases da matriz de concreto, as quais promovem deformaçõesdiferenciais na microestrutura do concreto: enquanto os agregados se dilatam com oaumento da temperatura até as suas transformações químicas, a pasta de cimentose contrai em virtude da perda d’água livre (secagem) e quimicamente combinada(desidratação). Conseqüentemente, aparecem tensões térmicas perpendiculares àsuperfície de concreto que está sendo aquecida (KALIFA et al. (2000)). Essastensões podem assumir valores magnitudes que o material é incapaz de resistir. Porexemplo, enquanto a resistência à tração de um concreto de 50 MPa (altaresistência) é da ordem de 5 MPa, aos 300 °C as tensões térmicas podem ser de 8MPa e, a 350 °C, 17 MPa (KÜTZING (1999)). Cabe ressaltar que acima dos 100 °C10

o concreto sofre uma perda progressiva de resistência, aumentando ainda mais adistância entre o esforço solicitante e o esforço resistente do material.

As tensões térmicas de tração aparecem quando as tensões térmicas decompressão são desenvolvidas na microestrutura da face aquecida da peça deconcreto e se propagam pela macroestrutura, confluindo para os cantos vivos dapeça (ANDERBERG (1997)), conforme Figura 3.1.

As tensões térmicas podem atuar sozinhas ou superpostas à pressão de vapor narede de poros do concreto, causando o lascamento. Normalmente ocorre a açãocombinada dos gradientes de pressão (pressão de vapor nos poros) e gradientestérmicos (tensões térmicas) (BUCHANAN (2001); TENCHEV & PURKISS (2001)).Nas experiências de ANDERBERG (1997), esses lascamentos apresentaram 20 mma 40 mm de profundidade.

Não se espera a ocorrência de lascamentos em pilares de seção circular submetidosà incêndios, devido à própria forma da seção. Nessa seção não ocorre acúmulo detensões térmicas nos cantos vivos, induzindo o desprendimento do cobrimento daarmadura nessas regiões. Entretanto, nas investigações de DOTREPPE et al.

10 O concreto tem sua resistência reduzida a partir dos 100 °C, quando surgem as primeiras fissuras devido acontração da própria pasta. A pasta começar a perder a estabilidade entre 100 °C e 200 °C por causa daevaporação da água contida no sistema de poros (COSTA, FIGUEIREDO & SILVA (2002)). Contudo, considera-se a desestruturação química efetiva da pasta de cimento a partir dos 180 °C (KALIFA et al. (2000)).

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(2001), lascamentos instantâneos levaram pilares circulares (bi-rotulados)submetidos ao incêndio-padrão, ao colapso prematuro, possivelmente influenciadospelo carregamento.

açã

o

térm

ica

ação térmica

tensões de tração

tensões de compressão

tensões de compressão

ruptura por tração

ten

sões

térm

icas

tensões térmicas

ação térmica

Figura 3.1 - Propagação das tensões térmicas em superfícies contendo cantos vivos e em superfíciesconvexas (ANDERBERG (1997)).

Esses resultados podem ser mais um subsídio para sustentação da hipótese deBA�ANT (1997) apud ULM et al. (1999a) sobre a tensões de compressão comocausa primária do lascamento imediato, enunciada no item 3.6.

4 Soluções para retardar ou minimizar os efeitos do lascamentoprematuroO lascamento é um fenômeno normal de degradação do concreto e deve serconsiderado nos projetos de edificações de concreto sujeitas a incêndio, a fim deassegurar a resistência dos elementos estruturais durante um período de tempo pré-determinado. Retardar o desprendimento prematuro do cobrimento das armadurasimpede a exposição antecipada das barras de aço à ação térmica.

Para concretos de resistência usual, o Eurocode 2 (2001) apresenta uma dassoluções que reduzem a probabilidade do lascamento prematuro ocorrer. Para cadatipo de elemento estrutural, são fornecidas diversas tabelas contendo as dimensõesmínimas consideradas seguras, em função do tempo de resistência requerido aofogo (vide, por exemplo, as tabelas 4.1, 4.2 e 4.3). Nessas tabelas, os valores de “a”correspondem à distância entre o eixo da armadura e a face exposta ao fogo. Alémdessas dimensões mínimas normatizadas, o teor de umidade livre do concreto deveser limitado a 3% em massa; acima desse limite é necessário avaliar com maisprecisão a influência da umidade, tipo de agregado, permeabilidade do concreto e ataxa de aquecimento.

Os elementos estruturais de concreto que, por outras razões de projeto apresentemcobrimento das armaduras maiores que 70 mm, devem ser testados a fim de estimaro desempenho em incêndio. Caso contrário, é necessário adotar uma armadura depele com barras de diâmetro φ � 4 mm e espaçamento # � 100 mm (Eurocode 2

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(2001)).

Agregados calcáreos reduzem o risco de lascamentos antecipados, porque são maisestáveis que os silicosos, quando expostos a altas temperaturas. Apresentam menorexpansão térmica, podendo inibir “sloughing” por dilatação térmica diferencial damatriz (METHA & MONTEIRO (1994); NEVILLE (1997)).

Casos em que os concretos leves sejam susceptíveis de lascamentos explosivos, oEurocode 2 (2001) recomenda estimativas por meio de testes na determinação dasdimensões mínimas do elemento estrutural e nas medidas de segurança a seremadotadas.

laje de concreto

isolamento acústico

revestimento (não combustível) revestimento (não combustível)h2

h1

h2

h1

h1 + h2 = hs, como apresentado na tabela abaixo.

Figura 4.1 - Laje de concreto com acabamento de piso (Eurocode 2 (2001)). Determinação daespessura a ser considerada segundo a tabela 4.1.

Dimensões mínimas (mm)distância do eixo “a”

apoiada em duas direçõesResistência ao

incêndio-padrão (min) espessura da laje hs

(mm) apoiada em umadireção � y / � x ≤≤ 1,5 1,5 < � y / � x ≤≤ 2

1 2 3 4 5TRRF 60 80 20 10* 15*TRRF 90 100 30 15* 20TRRF 120 120 40 20 25� y e � x são os comprimentos dos lados de uma laje retangular apoiada em duas direções, onde � y é ocomprimento do lado maior.A distância axial “a” nas colunas 4 e 5 para lajes armadas em duas direções refere-se às lajes apoiadas nasquatro bordas. Para os demais casos, elas deveriam ser tratadas como lajes apoiadas em uma direção.*Geralmente, o cobrimento recomendado em situação normal é suficiente.

Tabela 4.1 - Dimensões e distâncias mínimas entre o centro de geométrico das armaduras e a faceexposta para lajes de concreto simplesmente apoiadas, armadas em uma ou duas direções(Eurocode 2 (2001)).

Distâncias mínimas em mmResistência ao

incêndio-padrão (min)

Possíveis combinações de “a” e “bmín” onde “a” é a distância média e“bmín” é a largura da viga.

largura daalma bw

2 3 4 51 bmín a bmín a bmín a bmín a

6

TRRF 60 120 40 160 35 200 30 300 25 100TRRF 90 150 55 200 45 300 40 400 35 110

TRRF 120 200 65 240 60 300 55 500 50 130asd é a distância da face da viga até a geratriz da barra (cabos ou fios) de vigas com apenas uma camada dearmadura. Para valores de bmín superiores ao apresentado na coluna 4, não é necessário aumentar o valor de“a”.* Geralmente, o cobrimento recomendado em situação normal é suficiente.

Tabela 4.2 - Dimensões mínimas para vigas contínuas de concreto armado e protendido (Eurocode 2 (2001)).

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Dimensões mínimas (mm) largura do pilar “bmin” e distância “a” do eixoda armadura

ηη = 0,15 ηη = 0,3 ηη = 0,5 ηη = 0,7

Resistência ao

incêndio-padrão(min)

s yd

c cd

A f (20 C)

A f (20 C)

⋅ °=

⋅ °ωω

bmin a bmin a bmin a bmin a

0,1 150200

3025*

200300

4025*

300500

4025*

500 25*

0,5 150 25* 150200

3525*

250350

3525

350550

4025*

TRRF 60

1,0 150 25* 150200

3025*

250400

4025*

300600

5030

0,1 200250

4025*

300400

4025*

500550

5025*

550600

4025*

0,5 150200

3525*

200300

4525*

300550

4525*

550600

5040

TRRF 90

1,0 200 25* 200300

4025*

250550

4025*

500600

5045

0,1 250350

5025*

400550

5025*

550 25* 550600

6045*

0,5 200300

4525*

300550

4525*

450600

5025

500600

6050

TRRF 120

1,0 200250

4025*

250400

5025*

450600

4530

600 60

* Normalmente o cobrimento recomendado em situação normal é suficiente.

0,

(20 ) (20 )=

⋅ ° + ⋅ °

Ed

c cd s yd

N

A f C A f Cηη , onde N0,Ed é o carregamento de 1ª ordem aplicado ao pilar.

Tabela 4.3 - Tabela com as mínimas dimensões para pilares curtos de seção circular e retangularcom as respectivas distâncias entre a face exposta e o eixo da armadura (Eurocode 2 (2001)).

É possível uma redistribuição aceitável de tensões sem perda da estabilidade, nosprocedimentos de verificação de elementos estruturais cuja densidade dasarmaduras seja alta o suficiente, tais como: lajes contínuas com as barrasuniformemente distribuídas e vigas de largura maior que 40 cm, contendo mais de 8barras na região tracionada (Eurocode 2, 2001). As estruturas de concreto sãomonolíticas e o arranjo estrutural pode oferecer resistência ao incêndio porredistribuição de esforços em face da plastificação do concreto.

O lascamento explosivo prematuro é comum nos concretos de alta densidade eportanto, os CAR9 podem não ser capazes de resistir a altas temperaturas porlongos períodos. As baixas relações a/c � 0,3 deixam a matriz muito compacta,ainda que o CAR possua pouca umidade livre (KÜTZING (1999)). Mesmo emconcretos com a/c = 0,4 e agregados termicamente estáveis entre 100 e 300 °C, oslascamentos explosivos manifestam-se em freqüência bem maior do quem emconcretos usuais, pois a razão principal está no teor de partículas ativas ultra-finas(sílica ativa, escória de alto-forno, cinzas volantes e outras) adicionadas à pasta decimento Portland (SAAD et al. (1996)).

A adição de produtos químicos que induzem a formação de capilares (mais poros)na mistura de concreto podem também reduzir significativamente o risco delascamentos (TÓMASSON (1998)).

Malhas finas do tipo tela armada, usadas como armadura de pele reduzem olascamento, sobretudo em peças cujos cobrimentos de armadura são superiores a40 mm, por outras exigências de projeto. Essa solução ainda é discutível (LAWSON(1985) apud PURKISS (1996)) e pode ser impraticável e cara. A melhor soluçãoeconômica parece ser a adição de fibras de polipropileno à pasta de cimento que

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contém as micropartículas ativas (BUCHANAN (2001)).

As fibras11 começam a derreter a 170 °C (KALIFA et al. (2001)), enquanto o risco delascamentos potencialmente explosivos incide a partir de 190 °C. Quando o concretoé aquecido, as fibras plásticas se fundem criando sulcos interligados que permitem aliberação do vapor d’água nos concretos de alta densidade (WALRAVEN (2000);(DIETRICH et al. (1993), BREITENBÜCKER (1996), JENSEN & AARUP (1996) apudAÏTCIN (2000); KODUR (1997) apud BUCHANAN (2001)).

As fibras de aço não inibem, com eficiência, lascamentos de 20 mm de profundidadeem lajes, mas podem melhorar um pouco o comportamento de concretos de altaresistência contendo agregados calcáreos (SHUTTLEWORTH (1997)). O “coquetelde fibras” – fibras poliméricas associadas às de aço na mistura é mais indicado noscasos em que a adição de fibras de aço é necessária por outras razões. A dosagemdas fibras depende da resistência e da capacidade de deformação desejadas(KÜTZING (1999)).

Atualmente, a literatura técnica sobre o assunto cita apenas um edifício “arranha-céu”, o Japan Centre em Frankfurt (Alemanha), em concreto de alto desempenhocom fibras12 de polipropileno – teor de 2 kg/m³ (KALIFA et al. (2001)). Outrasconstruções, sobretudo nos Estados Unidos e Japão têm adotado essa solução(KALIFA et al. (2001); WALRAVEN (2000)). Na Europa, grandes túneis como:Channel Tunnel Rail Link (França-Inglaterra), Heathrow Airport Express Tunnel(Inglaterra), Dublin Port Tunnel (Irlanda), North Downs Tunnel (Inglaterra), foramexecutados em CAR9 com essas fibras incorporadas (MARTIN (2001)).

A otimização do projeto estrutural pode ser outra solução para tornar adequado ouso do concreto de alta-resistência. Por exemplo, a aplicação do CAR em áreas demenor risco de incêndio e adoção de meios de proteção externa do material. Éprovável que o concreto de alta-resistência com ar incorporado também melhore odesempenho das estruturas em altas temperaturas, em face das propriedadestérmicas que a porosidade maior com os vazios preenchidos pelo ar oferece(COSTA, FIGUEIREDO & SILVA (2002)).

Cabe ressaltar que a redução da resistência e da rigidez, devida à ação térmica,deve ser também levada em conta no dimensionamento das estruturas de concreto(usual ou CAR) em situação de incêndio. Informações adicionais sobre o incêndio ea ação térmica nas estruturas podem ser encontradas em COSTA & SILVA (2002) eSILVA (2001).

5 ConclusõesO lascamento (“spalling”) é um fenômeno comum de desagregação do concretoquando submetido a altas temperaturas. O lascamento pode se manifestar na formade desprendimentos do cobrimento (“sloughing”) ou estilhaçamento violento(“explosive spalling”). Concretos de densidade normal podem experimentarlascamentos prematuros. Esse fenômeno é mais presente nos concretos de altaresistência9.

A elevação da temperatura nas estruturas de concreto conduz à redução deresistência e rigidez do material. 11 Fibras mais grossas não formam tanto canais quanto as fibras bem finas (MARTIN (2001)).12 fck = 105 MPa; fibras de cobrimento médio � fibra = 12 mm e diâmetro variável entre 100 �m � φ � 200 �m.

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Neste trabalho foram apresentadas as principais causas dos lascamentos doconcreto armado e as soluções para melhorar o desempenho do concreto emincêndio. O arranjo estrutural influi na resistência das estruturas de concreto.

As incertezas que ainda restam sobre o uso generalizado dos concretos de altadensidade contendo partículas ultra-finas ativas, sob o ponto de vista do incêndio,não devem ser considerados como fator depreciativo na decisão de usá-los nasconstruções correntes. Ao contrário, é preciso fazer das imperfeições, umamotivação para estudos e descobertas de novas soluções que minimizem ouneutralizem os problemas decorrentes das altas temperaturas.

6 AgradecimentosÀ FAPESP – Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Proc. N°00/12147-6), pelo apoio financeiro a esta pesquisa.

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