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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Helenice Staff
O ensino superior e o mercado de trabalho: Reflexão sobre os cursos de administração de empresas da PUC/SP e da
universidade mercantil de massa
DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
SÃO PAULO
2008
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
Helenice Staff
O ensino superior e o mercado de trabalho: Reflexão sobre os cursos de administração de empresas da PUC/SP e da
universidade mercantil de massa
DOUTORADO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
Tese apresentada à Banca Examinadora como exigência parcial para obtenção do título de Doutor em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sob a orientação da Prof.ª Doutora Noêmia Lazzareschi.
SÃO PAULO
2008
Banca Examinadora
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À memória de meus pais, pois – tenho certeza – onde quer que estejam estão vibrando e exultantes porque concretizei o sonho deles de ter uma filha "doutora". Às sobrinhas do coração Márcia, Meire e Marisa para que este trabalho sirva de incentivo e exemplo. Aos manos Ercílio, Elcio e Henriqueta pelo orgulho que sentem de mim. À Aline filhinha do coração. Enfim, a todos os amigos, professores e colegas que estavam torcendo para eu terminar este trabalho.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus, que me deu inteligência e saúde para elaborar este trabalho.
A minha orientadora, Prof.ª Doutora Noêmia Lazzareschi, pela paciência da espera,
por acreditar em minha capacidade, pela sabedoria das orientações, por não medir esforços em
mostrar os caminhos acadêmicos.
Ao Prof. Dagoberto Schmidt, amigo incansável, pelas tentativas iniciais – tão elevadas
e filosóficas – e por fazer o elo entre os parágrafos, dando sentido e vida ao texto.
A Lia Mara, pela paciência, pelo envolvimento, pela competência e pela prontidão.
Sou grata a Adeilton – “Dê” – meu marido, companheiro, conselheiro, pela
compreensão das minhas ausências, pelo incentivo e pela força.
À Prof.ª Adriana, pela seriedade e eficiência na revisão final.
Agradeço ainda à CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível
Superior), pela Bolsa Parcial de Pesquisa.
RESUMO
Esta tese faz uma análise do mercado de trabalho frente à formação profissional dos
administradores de empresas de duas instituições educacionais de ensino superior da cidade
de São Paulo: A PUC/SP, considerada “top de linha” e a UNIVERSIDADE 2, considerada
“mercantil de massa”. Teremos como referência a Lei 9394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da
Educação Brasileira) e a Lei 5540 da Reforma Universitária, que constituíram o princípio
norteador dos estudos teóricos e da pesquisa de campo que fundamentam esta tese, cujo
objetivo foi o de mapear a inserção profissional dos estudantes do curso de Administração de
Empresas que concluíram o curso há dois anos, por meio de uma visão tridimensional do
alunado: a formação escolar do aluno, a partir de seu ingresso na universidade; suas opções de
atuação profissional e sua prontidão para a inserção no mercado de trabalho, atendendo às
exigências existentes. Procuramos conhecer como esses dois tipos de instituições de ensino
superior estão formando seus alunos. O estudo tem como ponto de partida o crescimento
exagerado das instituições particulares de ensino superior, investigando se, como muitos
dados sugerem, esse crescimento provocou a queda da qualidade do ensino, e,
conseqüentemente, a falta de preparo dos egressos para atuarem no mercado de trabalho. Os
resultados foram obtidos por meio de entrevistas com os egressos, a fim de levantar
dificuldades e facilidades encontradas para a sua inserção no mundo do trabalho, no que se
refere às necessidades e aos interesses do mercado, bem como no que se refere ao
procedimento gestor, aos resultados perseguidos e às competências e habilidades exigidas
pelas empresas. A estrutura da tese registra os principais tópicos que interessaram a esta
pesquisa, em especial: o ensino superior, o mercado de trabalho, o perfil do profissional
exigido pelo atual mundo globalizado, suas qualificações e competências; discutindo, por fim,
as implicações do ensino para a questão da empregabilidade.
Palavras-chave: Ensino superior. Mercado de trabalho. Perfil profissional. Competências.
Empregabilidade.
ABSTRACT
This work analyses the administrator’s work market dynamics facing his professional
education at two Superior Institutes of Education in the city of São Paulo: PUC/SP,
considered as ”a high quality” school and UNIVERSITY 2, considered as “a mass
commercial” school. We will use the law 9394/96 (National Education Directives and Bases
Law) and the law 5540 (University Reformation) as reference. Those two laws were the
guiding principle of the theoretical studies of this field research that justify this thesis, of
which objective was to map the professional insertion of students who concluded their
Administration degree two years ago through a three-dimensional vision of the students
themselves: the educational formation of the students, since they enter the university; their
professional performance options and their readiness to enter the market, answering the
existing demands. We want to know how these Superior Institutes of Education are
instructing their students. The starting point of this study is the exaggerated growth of private
Superior Institutes of Education, believing at first, that the serious consequence of this growth
is the low quality of the education, and, automatically, the lack of proper learning for the
students to be able to enter the work market. The results will be obtained through interviews
with egressed students in order to raise difficulties and facilities found during their entrance in
the market, not only related to the market necessities and interests, but also concerning the
administrating procedure, and the pursuing results, competences and skills required by the
companies. The research deals with the main topics which, in different moments, labeled this
study, especially: the Superior Institutes, the work market, the professional profile required by
the globalised world, qualifications and competences, discussing, at last, its implications for
the chances of employment.
Keywords: Superior Institutes. Work market. Professional profile. Abilities. Chances of
employment.
No trajeto da mitologia à logistica o pensamento perde o elemento da reflexão sobre si mesmo e hoje a maquinaria mutila os homens mesmo quando os alimenta.
Adorno e Horkheimer
SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO ................................................................................................................... 9
Objetivos da pesquisa......................................................................................................... 11
Hipótese ............................................................................................................................... 13
Metodologia......................................................................................................................... 17
Estrutura da tese................................................................................................................. 21
1 O ENSINO SUPERIOR BRASILEIRO............................................................................ 23
1.1 Trabalho dos docentes no ensino superior ................................................................. 70
2 SITUAÇÃO ATUAL DO MERCADO DE TRABALHO ............................................... 86
3 EDUCAÇÃO E TRABALHO VS. COMPETÊNCIAS E HABILIDADES................. 116
3.1 Perfil do profissional no atual mercado de trabalho............................................... 132
4 APRESENTAÇÃO DAS UNIVERSIDADES PESQUISADAS.................................... 140
4.1 Plano de curso ............................................................................................................. 140
4.1.1 Curso de Administração de Empresas da PUC/SP .......................................... 140
4.1.1.1 O profissional formado na PUC/SP ............................................................ 142
4.1.1.2 Organização curricular do curso de Administração de Empresas .......... 144
4.1.2 Curso de Administração de Empresas da UNIVERSIDADE 2 ...................... 148
4.1.2.1 O profissional formado na UNIVERSIDADE 2 ........................................ 148
4.1.2.2 Organização curricular do curso de Administração de Empresas .......... 150
4.2 Entrevistas................................................................................................................... 155
4.2.1 Entrevistas com profissionais de recursos humanos (RH) .............................. 155
4.2.2 Entrevistas com professores da PUC/SP ........................................................... 159
4.2.3Entrevistas com professores da UNIVERSIDADE 2 ........................................ 160
4.2.4 Entrevistas com alunos da PUC/SP ................................................................... 164
4.2.5 Entrevistas com alunos da UNIVERSIDADE 2 ............................................... 170
5 EXIGÊNCIAS DO MERCADO DE TRABALHO E ENSINO SUPERIOR............... 174
CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................................... 186
REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 196
ANEXOS ............................................................................................................................... 205
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APRESENTAÇÃO
Esta tese é um estudo sobre o ensino superior brasileiro – especificamente, um estudo
dos cursos de graduação em Administração de Empresas – visando a conhecer as
competências e habilidades neles obtidas para o ingresso no mercado de trabalho. Para tanto,
teremos como referência a Lei 9394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira),
que considera o ensino superior capaz de estimular a criação cultural, o desenvolvimento do
espírito científico e do pensamento reflexivo, produzindo diplomados, nas diferentes áreas do
conhecimento, aptos à inserção profissional e à participação no desenvolvimento da sociedade
brasileira por meio de pesquisa e investigação científica. Nesse sentido, os cursos superiores
devem, segundo a Lei, incentivar o desenvolvimento da ciência, da tecnologia e da criação e
difusão da cultura, e, desse modo, desenvolver o entendimento do homem e do meio em que
vive. (LDB. Cap.IV, art.43-I-II). Portanto, a organização universitária, como qualquer outra
esfera da educação formal, está sendo convocada a assumir seu triplo papel, o de ensinar –
que se distingue da mera instrução – o de pesquisar e o de preparar profissionais para atender
às novas demandas do mercado de trabalho.
A LDB 9394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira) e a Lei 5540 da
Reforma Universitária constituíram o princípio norteador dos estudos teóricos e da pesquisa
de campo que fundamentam esta tese, cujo objetivo foi mapear a inserção profissional dos
estudantes do curso de Administração de Empresas que concluíram o curso há dois anos
através de uma visão tridimensional do alunado, que considera: a formação escolar do aluno a
partir de seu ingresso na universidade; suas opções de atuação profissional; sua prontidão para
o mercado de trabalho, atendendo às exigências existentes. Com isso, pretendeu-se reunir
informações que permitissem conhecer o perfil demandado no mercado de trabalho para um
profissional de formação superior na área administrativa.
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Balizados por estes pressupostos, pretendemos investigar a dinâmica do mercado de
trabalho do administrador de empresas, correlacionando-a à formação acadêmica. Serão
analisadas duas instituições educacionais de ensino superior, uma que denominamos
“mercantil de massa” e outra, “top de linha”. Numa primeira aproximação, para elucidar os
termos antagônicos representados pela taxonomia proposta, buscamos apoio na obra de
Pimenta Garrido acerca das diferentes faces do atual quadro da docência superior no Brasil.
Para a autora, podemos dividi-la, num primeiro momento, em dois grandes grupos, usando
como antípodas os profissionais filiados às instituições particulares e os vinculados às
instituições públicas de ensino superior. Para a autora:
No caso das instituições públicas, verifica-se que o ingresso se dá sempre por concurso, mesmo para contratação do professor substituto, cujo número tem aumentado em decorrência da contenção de despesas a que vêm sendo submetidas. No concurso para efetivos, o professor passa por um período de ‘estágio probatório’, ao final do qual sua efetivação será confirmada ou não, mediante um processo de avaliação, realizado por seus pares no departamento (Pimenta Garrido, 2002, p. 119).
Pesquisas preliminares por nós realizadas indicam que, no que tange às universidades
particulares confessionais, tal procedimento de admissão de docentes é semelhante e que,
portanto, podemos nos pautar nesta concepção de universidade para reconhecer o objeto que
passamos a denominar de universidades “top de linha”. Opondo-se a este pólo de nossa
classificação, estaria alocada a instituição privada de ensino superior, que, em parte, tem sido
transformada
[...] em organização administrativa baseada na racionalidade técnica, contrária à dimensão social característica dessa instituição [...] desvincula-se a docência da necessária articulação a um projeto educacional regido por projeto pedagógico institucional, e a instituição, por sua vez, desobriga-se de processos de profissionalização continuada (ibidem).
Será esse tipo de universidade que passaremos a denominar “mercantil de massa”.
Podemos verificar a discrepância entre essas duas concepções de universidade tomando como
11
referência primeira os resultados auferidos pelos alunos egressos nos últimos exames de
avaliação propostos pelo Ministério da Educação. Tais resultados nos dão pistas de como os
alunos estão sendo preparados para ingressar no mercado de trabalho. Temos a intenção de
analisar o grau de excelência propiciado pelos dois pólos citados ou, em outros termos,
verificar se os egressos concluem a graduação em condições de atender às exigências do
capitalismo global, as conseqüentes transformações da sociedade mundial, ou, contrariamente,
se terminam o terceiro grau sem a mínima condição acadêmica, e/ou profissional, para atender
essas demandas do atual mundo do trabalho. Neste segundo caso, graduam-se sem a mínima
condição para o enfrentamento dos obstáculos apresentados pelo mundo do trabalho, suas
exigências e normalizações, e mantêm-se, de certo modo, em situação muito semelhante a que
ocupavam antes do ingresso na universidade, com o agravante, muitas vezes, de terem
contraído dívidas a serem pagas posteriormente, contribuindo para engrossar a fileira dos
desempregados ou dos subempregados. Nesses termos, nosso problema pode ser resumido na
seguinte questão: Qual a dinâmica do mercado de trabalho para o administrador conforme sua
formação profissional em dois tipos de instituições de ensino superior, mercantil de massa e
top de linha?
Objetivos da pesquisa
O objetivo geral desta pesquisa é uma análise do mercado de trabalho frente à
formação profissional dos administradores de empresas nos dois tipos de instituição
educacional de ensino superior anteriormente citados.
Dessa forma, serão analisados, visando a atingir objetivos específicos, os cursos de
graduação em Administração de Empresas dos dois grupos de universidades. Tomaremos
como objeto pertencente ao primeiro grupo uma universidade considerada de alto padrão, a
12
PUC/SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), e, ao segundo, uma universidade
particular - mercantil de massa - do município de São Paulo que denominaremos
“UNIVERSIDADE 2”. A partir da análise apurada dos dois objetos, queremos conhecer como
esses diferentes grupos de instituições de ensino superior estão formando seus alunos.
O estudo tem como ponto de partida o crescimento exagerado das instituições
particulares de ensino superior, acreditando-se, num primeiro momento, que esse crescimento
trouxe como grave conseqüência a queda da qualidade do ensino, e, automaticamente, a falta
de preparo adequado dos educandos para atuarem no mercado de trabalho.
Os resultados encontrados serão confrontados com a dinâmica do mercado de trabalho,
sendo tal investigação levada a cabo através de documentos bibliográficos e de entrevistas
com os egressos, a fim de levantar dificuldades e facilidades encontradas para a sua inserção
no mundo do trabalho, no que se refere às necessidades e interesses do mercado, bem como
no que se refere ao procedimento gestor, aos resultados perseguidos e às competências e
habilidades exigidas pelas empresas.
Em termos específicos, esperamos alcançar os seguintes objetivos:
– Contextualizar as mudanças no mundo do trabalho decorrentes da nova face do
modo de produção capitalista, para conhecer quais as atuais exigências do mercado
de trabalho e os critérios exigidos dos candidatos a uma vaga de emprego.
– Analisar os cursos presenciais de graduação em Administração de Empresas das
universidades escolhidas, tendo por base os referenciais de qualidade de seu plano
acadêmico.
– Analisar o trabalho dos professores nessas universidades para refletir sobre as
condições didático-pedagógicas nas quais desenvolvem seu trabalho.
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Hipótese
A nossa hipótese de trabalho pode ser assim formulada: os cursos de Administração de
Empresas oferecidos pelas universidades mercantis de massa não preparam adequadamente os
universitários para o enfrentamento do mercado de trabalho, segundo os padrões de
excelência.
Esta hipótese se fundamenta:
a) No crescimento desenfreado das universidades, principalmente das particulares não
confessionais. Acredita-se que a grande maioria dessas instituições se tornou uma verdadeira
indústria de diplomas, deixando de lado a qualidade do ensino e a preparação adequada para o
mercado de trabalho, de acordo com os padrões de exigência do mundo globalizado.
A partir de 1990, houve mudanças na educação superior que, no entanto, não
possibilitaram a reestruturação das práticas didático-metodológicas de ensino, segundo os
padrões de excelência, prevalecendo nas faculdades e universidades particulares, salvo raras
exceções, o sistema de produção em massa de diplomados, sem as competências exigidas pelo
mercado de trabalho.
Não houve mudança que permitisse uma adaptação das práticas e conteúdos escolares
às exigências do mercado nas universidades. No entanto, os alunos das universidades públicas
e confessionais gozam de alguns espaços alternativos para reflexão e desenvolvimento, seja
como pesquisadores, seja como candidatos a um emprego de qualidade na empresa privada
e/ou pública.
Em contrapartida, os alunos das universidades privadas, em geral, sobretudo aquelas
que não priorizam a produção científica, ficam à mercê de trabalhos de menor remuneração,
e/ou desqualificados, demonstrando que existe essa dualidade no que tange o perfil do egresso
do ensino em nível superior.
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Oriundos de escolas públicas de ensino fundamental e médio situadas na periferia do
município de São Paulo, de famílias humildes, intelectual e economicamente, os alunos das
universidades mercantis de massa são obrigados a estudar à noite e a trabalhar durante o dia,
não só para o pagamento da mensalidade de seu curso, mas para a complementação da renda
familiar. Não dispõem de tempo para leituras e pesquisas, de dinheiro para aquisição de
livros, e, portanto, limitam-se a fotocopiar os textos dos diferentes componentes curriculares,
selecionados pelos professores. Desse modo, estão em condições absolutamente desfavoráveis
para competir com os egressos das universidades públicas e/ou confessionais, cujo perfil é
muito distinto, findando por mergulhar no mudo do subemprego ou amargando, anos a fio, a
condição de desempregados.
Em contrapartida, os alunos que estudam em universidades com o segundo perfil
descrito acima, afeito ao modo administrativo/educacional da PUC, são geralmente oriundos
das melhores escolas particulares de ensino médio, escolas respeitadas por seu padrão de
qualidade de ensino, e, como não trabalham, podem dedicar-se unicamente ao ofício de
estudar. Têm, portanto, condições de comprar livros e tempo para as respectivas leituras. São
de famílias intelectual e economicamente privilegiadas, que incentivam e proporcionam meios
necessários para os filhos acompanharem bem o curso de graduação escolhido.
É interessante observar que, no Brasil, o ensino superior teve um crescimento
exagerado nos anos compreendidos entre a segunda metade da década de 60 e os anos 80 do
século passado, crescimento que se fez sob a égide de um modelo fordista, qual seja, um
modelo de produção em massa. Nesse período, o número de matrículas passou de 150 mil a
um milhão e meio. A expansão acompanhou uma tendência internacional de ampliação
progressiva do acesso ao ensino superior, com comprometimento da qualidade do ensino e da
aprendizagem.
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Essa ampliação da base do ensino superior pode ser considerada um avanço para a
educação superior em nosso país, porém, conforme afirma Schwartzman (1989, p. 29):
Isto não significa, naturalmente, que o ensino superior no Brasil não tenha problemas, dramatizados pela explosão das matrículas entre 1965 e 1980 -- de 150 mil a um milhão e meio de estudantes em quinze anos, que coincidiu, no Brasil, com um regime militar que sempre desconfiou e agiu contra estudantes, professores e cientistas. Reformular o ensino superior foi um dos compromissos inscritos no discurso inaugural da Presidência da Nova República que Tancredo Neves nunca chegou a ler, mas que foi lido e assumido por seu sucessor, José Sarney. Para este fim, o governo instalou, com toda a solenidade, uma Comissão Nacional que deveria apontar os caminhos do futuro. Rever como trabalhou esta Comissão e o destino do trabalho é uma excelente porta para o entendimento mais aprofundado de nosso ensino superior, e, porque não, da própria natureza do primeiro governo da Nova República.
Se seguirmos o conselho do autor, posteriormente a esta revisão, veremos que grande
parte das universidades particulares não confessionais ainda está formando profissionais para
obedecerem a ordens superiores da gerência científica, não preparados para atender às
exigências atuais do mercado. Ainda formam o aluno de modo muito semelhante ao
trabalhador das empresas com regime fordista de produção em massa, de repetição, de
automatismo, já abandonado nas grandes empresas que exigem um novo perfil de trabalhador.
O mercado espera do candidato a um emprego habilidades básicas na comunicação escrita.
Espera que saiba escrever propostas, relatórios, e-mails, que saiba expressar-se em público,
expor idéias, participar de reuniões, que tenha vencido a timidez natural, que tenha
criatividade para inovar sempre, para criar projetos e conceitos originais, que consiga um
relacionamento interpessoal à altura de seu posto a fim de se relacionar com todos os níveis
hierárquicos da empresa; que possua inteligência e equilíbrio emocional, racional e social para
saber controlar os impulsos, ser motivado; que apresente intimidade com a tecnologia para
usar programas de computação, softwares e outros aparelhos eletrônicos; que saiba trabalhar
em equipe e ouvir os colegas de trabalho para agregar conhecimento ao grupo e que saiba o
momento certo de ceder ou insistir em alguma idéia.
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Essas exigências, muitas vezes, impedem alunos provindos das universidades
mercantis de massa de ingressarem no mercado de trabalho pela dificuldade encontrada já nas
etapas iniciais do processo de seleção, pois algumas grandes empresas têm como requisito
para admissão que sejam formados pela USP, PUC, Mackenzie, Unicamp, entre outras
universidades de excelência. A origem do diploma já os exclui.
O número das instituições particulares de massa tem se multiplicado e a qualidade do
ensino nos cursos de graduação tem caído. Donde reafirmamos a hipótese acima assinalada: a
ineficiência na formação dos alunos dificulta o seu ingresso no mercado de trabalho.
Outro argumento de fundamentação da nossa hipótese é o reconhecimento das
dificuldades enfrentadas pelos professores na realização de seu trabalho nessas instituições,
uma vez que elas não oferecem o mínimo da infra-estrutura necessária ao atendimento de uma
população com graves deficiências na formação escolar básica. Os alunos são aprovados para
o ensino superior através de um processo de seleção não rigoroso. Essas universidades não
reprovam, fazem avaliações simples e sem critérios sérios para ingresso. Dessa forma, os
professores, principalmente os dos primeiros semestres, precisariam de tempo para iniciar os
alunos no curso superior, orientando-os sobre como ler com compreensão, como fazer
resumos, resenhas, enfim, como estudar e conseguir acompanhar as aulas. Faltam bibliotecas,
laboratórios, recursos audiovisuais como retroprojetores, DVDs, computadores, data show. As
salas de aula são superlotadas, com números que ultrapassam cem alunos. Isso dificulta o bom
desempenho didático de qualquer educador.
Professores e alunos encontram-se num contexto institucional de concorrência acirrada
entre as inúmeras universidades mercantis de massa. Trata-se de uma verdadeira “guerra”
para se ganhar clientela. As instituições particulares não confessionais utilizam os mais
variados meios para conseguir mais e mais alunos. A única meta a atingir é a ampliação dos
lucros, que se obtém pelo aumento da oferta de vagas.
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Utilizam muita propaganda, através das mais variadas mídias: televisão, jornais, rádio,
folhetos, folders, out-doors. Chegam até a fazer jogadas ilícitas, oferecendo vantagens e
descontos especiais para o aluno que se transferir de uma instituição para outra, trazendo
vários amigos. Descobrem estratégias para colocar o preço mais baixo nas mensalidades.
Excluem o pagamento da matrícula para alunos que indicarem outros. As escolas que cobram
menos são as mais procuradas. Não fazem vestibulares e sim processo seletivo através de
entrevistas, notas do ENEM, redação, análise dos documentos, ou provas simples de múltipla
escolha. É maior o número de vagas que o de candidatos. As instituições que facilitam o
ingresso e fazem maiores descontos são, logicamente, as mais procuradas.
Enfim, o processo seletivo possibilita a entrada de todos os candidatos. A seleção nas
universidades mercantis de massa praticamente não existe, ao contrário dos alunos que se
submetem ao vestibular rigoroso das instituições de renome como USP, PUC, Unicamp,
UNESP e Mackenzie, nas quais o número de candidatos por vaga é bastante elevado.
Metodologia
Optou-se neste trabalho por uma análise comparativa do mesmo curso (Administração
de Empresas) em universidades distintas, cujos dados serão coletados por meio de entrevistas
semi-estruturadas e leitura e interpretação de pesquisa bibliográfica.
As fontes empíricas para este trabalho serão duas instituições de Ensino Superior
privadas, sendo uma confessional (PUC/SP) e a outra uma universidade mercantil de massa
(UNIVERSIDADE 2).
O objeto de análise será o curso de Administração de Empresas por estar difundido em
grande parte das universidades, principalmente nas particulares, não exigindo estruturas e
laboratórios, nem grandes investimentos por parte dos mantenedores.
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Foram compostos cinco grupos heterogêneos, com cinco participantes cada. Dois
destes, formados por alunos egressos há dois anos do curso de Administração de Empresas;
um da PUC/SP e outro da UNIVERSIDADE 2. Serão entrevistados cinco alunos e cinco
professores por instituição, totalizando dez alunos egressos e dez professores e, ainda, cinco
gerentes de recursos humanos, a fim de relacionarmos as facilidades e dificuldades dos alunos
no mercado de trabalho às ações gestoras por eles realizadas e suas respectivas repercussões
na produtividade da empresa onde trabalham; relacionar habilidades e competências
trabalhadas e adquiridas na sua formação acadêmica, com o sucesso ou fracasso nos primeiros
anos de atividade profissional, bem como com o perfil esperado e desejado pelos
empregadores.
Recorreu-se a entrevistas semi-estruturadas, pois, assim, o informante teria também a
possibilidade de discorrer sobre o tema proposto. As questões foram previamente definidas e
tomou-se o cuidado de fazê-las em um contexto muito semelhante ao de uma conversa
informal. Durante as entrevistas, a pesquisadora estava muito atenta para dirigir a discussão
para o assunto da pesquisa, fazendo perguntas adicionais para elucidar alguns aspectos que
não estivessem claros, o que não possibilitou ao entrevistado fugir do tema. Segundo Selltiz et
alii, 1987:
[...] a entrevista tem um índice de repostas bem mais abrangente, uma vez que é mais comum as pessoas aceitarem falar sobre determinados assuntos. Outra vantagem diz respeito à dificuldade que muitas pessoas têm de responder por escrito.
Quanto às desvantagens da entrevista semi-estruturada, dizem respeito muito mais às
limitações do próprio entrevistador, como por exemplo, a escassez de recursos financeiros e o
dispêndio de tempo. Por parte do entrevistado há insegurança em relação ao seu anonimato e,
por isso, muitas vezes o entrevistado retém informações importantes. Essas questões são,
ainda assim, melhor apreendidas pela entrevista semi-estruturada. “A arte do entrevistador
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consiste em criar uma situação onde as respostas do informante sejam fidedignas e válidas”
(ibidem, p. 644).
Na visão de Bourdieu (1999), o sociólogo deve fazer as vezes do parteiro, na maneira
como ele ajuda o pesquisado a dar seu depoimento, deixar o pesquisado se livrar da sua
verdade. Este autor considera que a entrevista é um exercício espiritual, é uma forma de o
pesquisador acolher os problemas do pesquisado como se fossem seus. É olhar o outro e se
colocar no lugar do outro. Portanto, o sociólogo deve ser rigoroso quanto ao seu ponto de
vista, que não deixa de ser um ponto de vista de um outro ponto de vista, o do entrevistado.
A entrevista deve proporcionar ao pesquisado bem-estar para que ele possa falar sem
constrangimento de sua vida e de seus problemas e, quando isso ocorre, surgem discursos
extraordinários. Bourdieu (ibidem) menciona que os pesquisados mais carentes geralmente
aproveitam essa situação para se fazerem ouvir, levar para os outros sua experiência e, muitas
vezes, é até uma ocasião para se explicarem, isto é, construírem seu ponto de vista sobre si
mesmos e sobre o mundo. Por vezes, esses discursos são densos, intensos e dolorosos e dão
certo alívio ao pesquisado. Alívio por falar e, ao mesmo tempo, refletir sobre um assunto que
talvez os reprima. Nesse caso, pode-se até dizer que seja uma auto-análise provocada e
acompanhada.
Neste trabalho, as sessões de entrevistas variaram de 40 minutos a duas horas, foram
gravadas em videocassete e transcritas para posterior análise. Os participantes foram
escolhidos por meio dos seguintes procedimentos: contacto com a secretaria do curso para
solicitação de listagem de alunos egressos há dois anos das universidades, com respectivos
telefones; visitas às instituições para entrevistar os professores do curso de Administração de
Empresas; contato com os coordenadores do curso para obtenção do projeto pedagógico,
grade curricular, ementas, manual de estágio e informações sobre funcionamento e
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aplicabilidade de empresa júnior; indicação de diretores de recursos humanos das grandes
empresas, feita pelos professores entrevistados.
A pesquisa teve como fonte documental nas duas faculdades: Projeto Pedagógico,
Manual de estágio, Planejamento do curso de ADM (com as respectivas ementas), Matriz
curricular, Histórico e caracterização da clientela de ambas as instituições. Da PUC/SP,
obtivemos também o manual de orientação do TCC (trabalho de conclusão de curso), o
manual da PUC Júnior, além do contato com a Associação dos Ex-alunos.
Os dados secundários foram coletados de pesquisas realizadas pelos institutos oficiais:
INEP, IPEA, IBGE, CAPES, CNPQ.
Das instituições Superiores de ensino esperamos, por meio da análise do Projeto
Político Pedagógico e de outros documentos, conhecer o currículo, o planejamento, as
ementas e a bibliografia dos cursos de Administração de Empresas; investigar se desenvolvem
pesquisas, estágio supervisionado, trabalho de conclusão de curso e ou iniciação científica,
para tornar evidente se as faculdades de administração estão preparando adequadamente os
alunos para ingressarem no mercado de trabalho.
De posse dos dados primários e secundários das grandes empresas e/ou corporações,
esperamos conhecer as exigências do mercado de trabalho no mundo globalizado e o tipo de
profissionais que o mercado está absorvendo Dos alunos egressos esperamos saber qual sua
posição no mercado de trabalho e quais as dificuldades enfrentadas para a obtenção do
emprego; dos professores queremos informações sobre suas reais condições de trabalho para o
cumprimento das exigências das instituições de ensino superior propostas em seus projetos
pedagógicos.
Cabe ressaltar, portanto, que, neste trabalho, pretende-se reunir os dados para análise e
avaliação nas diversas etapas da pesquisa utilizando-se, para tanto, múltiplas fontes:
21
a) documentos – serão analisados: LDB, projeto político pedagógico, plano de carreira
dos professores, missão das universidades, metas, objetivos, currículos, estágios
supervisionados, avaliações, horários, carga horária, sistema de notas e faltas, dentre outros;
b) entrevistas – as entrevistas serão de natureza semi-estruturada, realizadas com
alunos egressos, professores, e chefes de recursos humanos.
Assim, procuramos condições para comprovar ou não a hipótese central desta tese,
qual seja, os cursos de Administração de Empresas oferecidos pelas universidades mercantis
de massa não preparam adequadamente os universitários para o enfrentamento do mercado de
trabalho segundo os padrões de excelência.
Estrutura da tese
O 1º capítulo apresenta o panorama do ensino superior brasileiro oferecido pelas
universidades públicas e particulares, decorrentes das condições de sua expansão e das
condições de trabalho dos professores. Será analisado o trabalho dos professores nas
universidades consideradas de alto padrão educacional e dos que atuam nas universidades
particulares do tipo mercantil de massa.
O 2º capitulo propõe-se a analisar a dinâmica do mercado de trabalho, que tipo de
profissionais se necessita para o enfrentamento da acirrada competição nos mercados
internacionais.
No 3º capítulo, discute-se a relação entre trabalho e educação, sobretudo no que se
refere à participação da educação, avaliada em termos de habilidades e competências, na
qualificação dos trabalhadores.
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No 4º capitulo serão feitas análises das instituições, objetos da pesquisa, pretendendo-
se mostrar que tipo de profissionais essas instituições estão preparando para o mercado de
trabalho (objeto de nosso estudo).
No 5º capitulo apresenta-se a análise dos dados da pesquisa.
23
1 O ENSINO SUPERIOR BRASILEIRO
Não se pretende aqui reconstituir a história da universidade brasileira, mas apenas
apresentar alguns fatos que parecem ser fundamentais para subsidiar nossas reflexões,
delineando alguns eixos para a compreensão da situação atual das escolas de ensino superior
do país. Pretende-se demonstrar que, em grande parte, as universidades particulares
brasileiras, que deveriam buscar a excelência no que tange ao tripé ensino, pesquisa e
extensão, e o conseqüente preparo para o mundo do trabalho, vêm se tornando espécies de
“vendedoras de diplomas” sem a mínima preocupação com os futuros profissionais por elas
formados. Luiz Antonio Cunha, em seus vários estudos, costuma ressaltar que a universidade
brasileira pouco conhece de si mesma, pouco exerce sua capacidade de pesquisa e de crítica
sobre si: “é compreensível que assim seja, mas não é aceitável, tratando-se de uma instituição
que historicamente se define como uma instituição crítica” (1988, p. 120).
Recorre-se ao percurso feito pelo autor supracitado, percurso de fundamental
importância para a compreensão do descalabro atual da educação superior particular no
Brasil, pois urge explicitar algumas das características constitutivas da concepção de
universidade: uma instituição histórico-crítica, e não uma ilha, que deve refletir as virtudes e
vicissitudes da sociedade em que está inserida e, assim, em permanente tensão entre o
fortalecimento de sua autonomia, condição da qualidade acadêmica de suas práticas, e a busca
incessante de pertinência ou relevância social, fonte de sua legitimação e justificativa de seu
financiamento.
Historicamente, a universidade foi "instituída" por volta do século XII na Europa para
atender a determinadas necessidades, entre elas, formar quadros para o exercício de atividades
na Igreja, no direito e na medicina, e, posteriormente, em outras artes liberais. Instituição
social e histórica, ela assumiu, paulatinamente, diversas facetas, buscando estar em sintonia
24
com a sociedade (sua instituidora), e, ao mesmo tempo, dela se distanciou para exercer sua
capacidade crítica. Se durante os primeiros séculos suas práticas estavam predominantemente
voltadas para a formação (o ensino), posteriormente, passou a desenvolver a pesquisa
científica, filosófica e artístico-cultural, e, mais recentemente, a participar mais diretamente
do desenvolvimento econômico e social.
Durante muito tempo o conhecimento foi produzido fora dela, e, ainda hoje, boa parte
dele o é. Todavia, permanece sua marca de "lócus privilegiado" do exercício da razão e da
crítica, sem coerção limitante. Permanece como espaço ímpar de processamento crítico,
analítico, de sistematização e integração da ciência e da cultura produzida tanto por ela, como
fora dela.
Instituição social e histórica, a universidade está hoje desafiada a exercer sua
capacidade de pesquisa e de crítica num contexto de profundas mudanças em seu entorno
econômico/sócio/cultural sem, contudo, romper com princípios e diretrizes construído
historicamente, tais como: a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão; a autonomia
universitária; o financiamento pelo setor público; a gestão colegiada e democrática, o padrão
unitário de qualidade.
O desafio é, pois, estar aberta às demandas da sociedade, a suas expectativas, à
negociação com o estado e com os órgãos diversos de fomento à pesquisa, sem abrir mão dos
princípios já referidos, buscando construir um equilíbrio sutil entre as exigências da qualidade
acadêmica e a necessária pertinência/relevância social em todas as atividades que desenvolve,
inclusive, nas propriamente administrativas.
Importa, portanto, dentro desta perspectiva, oferecer um ensino de qualidade, isto é,
direcionar as atividades de ensino-aprendizagem para formar o profissional com pleno
domínio dos fundamentos de sua profissão, com capacidade de apropriar-se criticamente das
inovações em sua área e de participar ativamente da construção de uma sociedade mais justa e
25
mais democrática. Isso exige, entre outras coisas, identificar e promover as condições que
contribuam para superar qualquer forma de superficialidade da formação em nível de
graduação e de pós-graduação.
Para tanto, deveriam impor-se como metas:
a) o fortalecimento das atividades de pesquisa, quer como procedimento formativo
(com maior ênfase na pós-graduação), quer como exercício de criação do conhecimento,
preferencialmente, em temáticas suscetíveis de possíveis desdobramentos de aplicação para o
desenvolvimento econômico, social e cultural – da região onde está inserida a universidade e
do país;
b) o desenvolvimento de políticas de extensão como uma dimensão do ensino e da
pesquisa, isto é, como uma atividade de formação acadêmica, científica e cultural de seu
corpo discente, e não como vitrine da sua legitimação, nem prioritariamente como fonte
diversificada de recursos, o que a aprisionaria na armadilha da lógica mercantil.
O marco da universidade no Brasil deu-se, mais precisamente, com a transferência da
corte portuguesa e a interrupção das comunicações com a Europa. A transferência da família
real para o Brasil transformou o país em sede da coroa portuguesa. Essa mudança
impulsionou a implantação de medidas administrativas, econômicas e culturais para o
estabelecimento da infra-estrutura necessária ao funcionamento do Império. Surgiu, portanto,
a necessidade da formação de profissionais que atendessem a essa nova situação. A criação
dos primeiros estabelecimentos de ensino superior buscava formar quadros para os serviços
públicos voltados à administração do país. As áreas privilegiadas eram medicina, engenharia e
direito.
Em 1808, foram criados os primeiros estabelecimentos de ensino médico-cirúrgico de
Salvador e do Rio de Janeiro. O Rio de Janeiro foi cenário de outras iniciativas culturais e
26
científicas, como a criação da Imprensa Régia, da Biblioteca Nacional e dos primeiros
periódicos científicos.
Antes desse período, os brasileiros interessados em cursar universidades iam para
Portugal ou outros países da Europa. Havia grande preocupação da coroa em relação à
formação intelectual e política da elite brasileira, pois ela procurava de todas as formas manter
o Brasil como colônia, evitando quaisquer possibilidades de desenvolvimento de ideais de
independência.
Na década de 1820, criaram-se as primeiras Escolas Régias Superiores no Brasil. Entre
elas, podemos citar: a de direito em Olinda, Pernambuco; a de medicina em Salvador, Bahia;
e a de engenharia, no Rio de Janeiro. Outros cursos foram criados posteriormente, como os de
agronomia, química, desenho técnico, economia política e arquitetura.
A criação de universidades foi amplamente discutida por grupos sociais diversos no
país, apenas no século XX, porém, surge a primeira universidade brasileira. Apesar das
controvérsias históricas, parece ser consensual entre os historiadores que a primeira
universidade criada pelo governo federal brasileiro foi a do Rio de Janeiro, em 1920, que
aglutinou as escolas politécnica, de medicina e de direito, já existentes.
Reunir escolas e/ou faculdades já fundadas tornou-se uma marca do desenvolvimento
do sistema de ensino universitário brasileiro. Baseadas na Universidade do Rio de Janeiro
foram criadas as universidades federais nos estados. A presença de oligarquias na sua criação
e os diversos acordos realizados entre o poder federativo e os estados são apontados como
intimamente relacionados aos diversos caminhos trilhados pelas universidades brasileiras.
Para grande parte dos historiadores, a instauração de muitas universidades significou o desvio
de recursos financeiros para os estados, local de prestígio político e de emprego para os filhos
das elites.
27
É interessante observar que, no Brasil, o ensino superior teve um crescimento
exagerado nos anos de 65 a 80 do século passado. O crescimento exagerado provocou
problemas e a crise se agravou ainda mais na medida em que coincidiu com o regime militar,
que muitas vezes agiu contra estudantes, professores e cientistas. Segundo afirma
Schwartzman:
[...] o ensino superior no Brasil teve a explosão das matrículas entre 1965 e 1980 -- de 150 mil a um milhão e meio de estudantes em quinze anos. Esta expansão acompanhou uma tendência internacional de ampliação progressiva do acesso ao ensino superior, e coincidiu, no Brasil, com um regime militar: num período de quinze anos, o número de matrículas passou de 150 mil a um milhão e meio de estudantes no Ensino Superior (Schwartzman, 1988, p. 29).
Em 1968, teve início a grande reforma universitária que implantou o sistema
atualmente vigente, impulsionada pelo regime militar.
Em muitos sentidos, pareceria que o ensino superior no Brasil poderia escapar da
síndrome de massificação, politização, burocratização e má qualidade, que afetou a maioria
das instituições universitárias latino-americanas.
Ao contrário dos demais países da América Latina, que, diante da demanda de
democratização do ensino, acabaram massificando as universidades públicas, o regime militar
optou por investir na formação de uma universidade pública de elite, voltada para a pesquisa.
Isso acarretou a implantação de programas de pós-graduação, institucionalização da pesquisa
acadêmica, criação de estímulos para o desenvolvimento de pesquisas e para obtenção de
graus acadêmicos, e, por fim, a manutenção de um número estável e restrito de alunos,
impedindo, desta forma, sua massificação.
Paralelamente, optou por incentivar a criação de um sistema de ensino superior de
massa que atendesse à elevada demanda social, por meio de uma rede de estabelecimentos
isolados sob a iniciativa privada, dedicada basicamente à transmissão de conhecimentos em
grande escala.
28
O ensino universitário brasileiro era muito diferenciado, com dois importantes
sistemas públicos (o federal e o estadual) e um amplo e diversificado setor privado. Está,
portanto, dividido entre universidades públicas financiadas pelo estado (aproximadamente 31
universidades) e universidades privadas de caráter confessional. O chamado setor privado era
composto por aproximadamente 11 universidades de inspiração católica e uma universidade
presbiteriana, a Mackenzie.
“Universidade particular” era sinônimo de “universidade confessional”. Essas
universidades, embora particulares, pela própria missão educacional das instituições
religiosas, tinham certa preocupação com a qualidade do ensino e, em maior ou menor grau,
ao longo dos anos, algumas delas se enquadraram no modelo de universidade impulsionado
pelo governo militar, voltado para a pesquisa e com programas de pós-graduação. Nesse
período, a universidade ou era gratuita ou era paga, mas a instituição que cobrava pelos
serviços educacionais não tinha e nem poderia ter fins lucrativos.
O regime militar de 64 implantou uma política de modernização e reestruturação do sistema universitário impulsionada a partir da Lei no 5.540 de novembro de 1968, incluindo importantes bandeiras do movimento estudantil e de docentes das décadas de 50 e 60, tais como: a abolição da cátedra; a criação do departamento como unidade de ensino e pesquisa; a organização do currículo em duas etapas: a básica e a de formação profissionalizante; a adoção do sistema de crédito e da semestralidade; a institucionalização da pesquisa (Sampaio, 1998, p. 44).
A reforma universitária de 1968 aboliu, portanto, o antigo sistema de cátedra que
emperra o funcionamento das universidades na maioria dos países latinos, e abriu espaço para
a criação de programas de pós-graduação, pesquisa científica e para a contratação de
professores em regime de tempo integral. Segundo Schwartzman (1988, p. 100):
A reforma de 1968, conjugada com a preocupação de certos setores governamentais com as questões de desenvolvimento científico e tecnológico, permitiu que o Brasil desenvolvesse o maior sistema de pós-graduação e pesquisa científica entre os países do terceiro mundo. Ainda que a participação política tenha estado sempre presente em nossas universidades ela normalmente não conduziu à polarizações partidárias radicais e insuperáveis.
29
E até hoje tem sido possível evitar os problemas da admissão em massa de estudantes
sem um mínimo de qualificação, o que tem permitido a manutenção e mesmo melhoria da
qualidade do ensino em muitas instituições e cursos.
Além dessas medidas, a reforma universitária reconheceu no plano legal a autonomia
didático-científica, disciplinar, administrativa e financeira da universidade, limitada,
entretanto, pelo Ato Institucional nº 5, de 13 de dezembro de 1968, e pelo Decreto-Lei nº 477,
de fevereiro de 1969. Sobre isso, Fávero (1998, p. 198) afirma:
[...] durante o regime militar, a gravidade do que acontecia em relação à universidade não estava expressa nos dispositivos legais, mas ocorria fora dessas normas: a universidade, como a sociedade, foi submetida a um regime de terror e de silêncio. A criação e a manutenção das Assessorias de Segurança dentro das universidades, a fim de impedir que mecanismos democráticos, mesmo quando previstos em lei, chegassem a ser efetivamente usados ou implementados, exemplificam muito bem essa realidade.
A reforma universitária instituída pela Lei 5.540/681 originou-se, segundo Cunha (in: Lopes,
2000, p. 176), como forma de neutralizar “o poder das cúpulas dirigentes da universidade”, a
partir da organização estudantil pela redemocratização do ensino e autonomia institucional.
Segundo o mesmo autor:
[...] podemos destacar como aspectos positivos a extensão do regime de cátedras e as mudanças na organização administrativa e acadêmica nas instituições federais. A reforma teria princípios de um ensino público de qualidade e com eqüidade, de valorização profissional docente, criação de institutos de pesquisa e autonomia das universidades. No entanto, paralelamente aos movimentos estudantis que ganhavam força pelas mudanças que se faziam iminentes, a reforma assumiu uma feição predominantemente organizacional, com clara inspiração taylorista e economicista (ibidem, p.180).
A estrutura social militarista que tomou forma com o Golpe Militar de 1964 colaborou
veementemente para redirecionamento das idéias e dos ideais da reforma universitária através
1 Lei 5540/68 – Lei da Reforma Universitária. Essa Lei se tornou referência para a reestruturação do ensino
superior brasileiro tendo como pressupostos a privatização do ensino.
30
de um consenso de que o ensino superior brasileiro precisava ser reformado, mesmo que
ocorresse por motivos distintos.
Sob a perspectiva controladora militarista, foram firmados vários acordos com
instituições estrangeiras para o financiamento educacional brasileiro, como o USAID2. Planos
de ação foram lançados e vários projetos desenvolvidos no intuito de reformular a educação
superior segundo a ideologia de um governo ditatorial e repressivo.
A Lei 5.540/68 tornou-se a referência para a reestruturação do ensino superior
brasileiro, tendo como pressupostos: a privatização do ensino em detrimento das instituições
públicas, o financiamento das instituições privadas e a orientação da formação universitária
para o mercado de trabalho.
Desde então, é perceptível que a reforma universitária de 1968, a partir da
desvalorização docente, do distanciamento entre formação intelectual e mundo do trabalho, da
multiplicação de instituições privadas com baixa qualidade, da redução de instituições
públicas, contribuiu, de maneira decisiva, para o nosso descalabro atual, tal como
pretendemos mostrar ao longo deste trabalho.
A política educacional existente no período do regime militar influenciou
significativamente a educação. Para Saviani (1996, p. 80), a lei 5.540 é um
[...] típico produto do regime instaurado no país em 1964, e seus resultados não poderiam ser outros que não o da empulhação e do consentimento com relação ao governo vigente em detrimento de uma reforma universitária que firmasse a vocação da liberdade, da igualdade e da independência do povo brasileiro.
Ainda hoje, passados 39 anos da reforma universitária pela Lei 5540/68, percebemos o
indício de um consenso privatizante no ensino superior brasileiro. Presenciamos cada vez
2 MEC/USAID- Acordo feito entre o MEC Ministério da Educação e Cultura e USAID(United States Agency for
International Development –, com a finalidade de reformular a educação superior segundo a ideologia de um governo controlador e repressivo.
31
mais a desobrigação do estado em relação à educação e o incentivo às instituições privadas,
sem nenhuma exigência do comprometimento com uma séria relação entre ensino/pesquisa e
formação superior.
Apesar de vivermos um contexto social diferenciado da ditadura, imposta pelo regime
militar em 1964, notamos que a estrutura capitalista das sociedades atuais e o processo
mundial de globalização reforçam a visão de uma educação elitista. Esta visão favorece a
criação de instituições de ensino de baixa qualidade e silencia a população através de cotas,
exames nacionais e outras “facilidades” que colaboram com um possível ingresso dos
educandos das classes menos favorecidas nas instituições públicas de maior qualidade. E, ao
mesmo tempo, políticas federais de inclusão na educação básica da rede pública de ensino são
realizadas de acordo com as políticas educacionais mundiais financiadas, entre outros, pelo
Banco mundial e pelo BIRD (Banco Interamericano de Desenvolvimento). Como exemplo
que atinge diretamente as universidades, temos o PROUNI (Programa Universidade para
Todos).
Muitos autores afirmam que as universidades brasileiras foram copiadas da França,
porém, a verdade é que no Brasil nunca se entendeu com clareza, nem se pretendeu imitar de
forma explícita, a dualidade que é o aspecto mais saliente do ensino superior francês, ou seja,
um conjunto de "grandes écoles" altamente elitizadas, orientadas para a formação de quadros
de alto nível e as universidades propriamente ditas, abertas para o grande público.
Segundo Schwartzmann (1988, p. 127):
O que copiamos, certamente, foi a centralização administrativa e a burocratização. As primeiras escolas profissionais, criadas com D. João VI, eram controladas em todos seus detalhes pelo governo central, que regulava, em lei, os currículos, o conteúdo dos programas, os horários, as taxas que os estudantes deveriam pagar e tudo o mais. A nomeação de professores, como não poderia deixar de ser, era controlada pelo governo, e não pelas escolas.
32
Deve-se lembrar que, na década de 1960, a pressão social por vagas no ensino
universitário era muito grande, continuamente havia manifestações e mobilizações dos alunos
que tinham conseguido entrar na universidade, mas não estudavam, pois não havia vagas, os
famosos "excedentes". Em 1960, eram aproximadamente 28.728 alunos excedentes; em 1968,
início da reforma universitária, esse número saltou para 125.414 alunos; em 1971, esse
número chegou a 161.176 alunos. Como afirma Martins (1981, p. 94):
O problema dos excedentes foi contornado através de uma avalanche de autorizações para abertura de novas escolas e, ao mesmo tempo, a permissão para as instituições já existentes aumentarem suas vagas sem atender a grandes exigências burocráticas.
Com o avanço e o desenvolvimento do capitalismo no Brasil, a necessidade de mão-
de-obra qualificada ampliou-se juntamente com a necessidade de expansão da educação
escolar.
No que tange ao ensino superior, “expandiu-se, principalmente, o de caráter privado
que recebeu considerável incentivo do governo, até mesmo através de verbas públicas; em
1973, chegaram a receber 39% dos recursos públicos do ensino superior” (Cunha, 1988,
p.74). O ensino superior também se tornou uma relevante estratégia para a reprodução e
ampliação da chamada classe média, considerada de suma importância para o mercado
consumidor no modelo de desenvolvimento econômico da época. E, desse modo, “era
necessário despolitizar o campo acadêmico, neutralizar as ações de contestação do movimento
estudantil, ligado a organizações populares, e mantê-lo sob rígido controle” (Germano, 1993,
p.104).
As instituições de ensino superior no Brasil sofreram profundas fragmentações em sua
organização interna; as universidades passaram a ser um problema constante, os militares
partiram para a ação direta de intervenção e, para isso, foi promulgado o Decreto nº 62.024,
em 1967, que instituía uma comissão especial para sanar esses problemas.
33
O Relatório Meira Mattos, resultado dessa comissão, levou três meses para ficar
pronto e apresentou as seguintes medidas:
a) determinou que o Presidente da República escolhesse os reitores e os diretores das
universidades e faculdades federais, que deveriam se responsabilizar pela disciplina nesses
estabelecimentos – pretendia-se, com isso, retirar do movimento esquerdista a participação
estudantil;
b) sugeriu e possibilitou a contratação de professores pela legislação trabalhista
(Consolidação das Leis do Trabalho);
c) instituiu o sistema de promoção por créditos, que, se não teve como objetivo a
desmobilização estudantil, teve sobre ela considerável conseqüência, porque com os
estudantes dispersos, é mais difícil a organização de movimentos.
Nesse período, o ensino superior sofreu várias influências norte-americanas; o governo
da época acreditava que, para modernizar o ensino superior brasileiro, tinha de se basear no
modelo norte-americano de universidade. Para isso, foram fornecidas 3.800 bolsas de estudos
nos EUA para brasileiros, só no período de 1965/70 (todas concedidas somente pela United
States Agency for International Development – USAID). Vários acordos para o ensino
superior firmaram-se entre a USAID e o Ministério da Educação e Cultura (MEC), sendo os
cursos de pós-graduação, criados na época, os maiores “beneficiados”. Mas o principal
acordo, que foi feito em junho de 1965 e ficou conhecido como “convênio MEC-USAID”,
visava organizar uma equipe de assessoria ao planejamento do ensino superior, reunindo
técnicos brasileiros e norte-americanos.
Durante as décadas de 60 e 70, o acordo firmado entre MEC e USAID ocorreu de
forma organizacional, com o objetivo de criar uma nova linha política para o ensino superior
no Brasil. O primeiro acordo MEC-USAID previa a criação da EPES (Equipe de
Planejamento do Ensino Superior) que, segundo Cunha (op. cit., p. 117), seria responsável
34
pela implantação de um sistema ideal de ensino superior para o Brasil como também por fazer
sugestões em toda organização técnica, curricular e no provimento de pessoal docente,
administrativo e de pesquisa. As medidas impostas pelo acordo MEC-USAID visavam atingir
principalmente o ensino superior, pois este tinha um papel estratégico na formação dos
quadros técnico-profissionais brasileiros, alinhados com a política norte-americana.
Na década de 1990, o financiamento e a intervenção internacional na educação
brasileira têm um “novo” protagonista: o Banco Mundial. Com a Declaração de Jontien,
órgãos como UNICEF, UNESCO e o próprio Banco Mundial estabelecem as diretrizes de
uma “Educação para Todos”, considerando como prioridade a ampliação da oferta de ensino e
a estruturação da educação básica.
O Banco Mundial ampliou suas funções para além da assistência técnica e financeira
propriamente ditas, passando a elaborar políticas para os setores a serem financiados, entre
eles, a educação.
Segundo Vieira ([s.d.], p.75):
[...] a importância crescente do Banco Mundial no mundo é decorrente de seu destaque como principal organismo de financiamento de projetos de desenvolvimento no cenário internacional e seu papel estratégico no reordenamento da ordem mundial através do incentivo às políticas de ajuste estrutural nos países em desenvolvimento.
Nota-se que os acordos internacionais firmados entre MEC-USAID e Banco Mundial
tiveram interesses diferenciados, no entanto, se complementaram para a instituição do modelo
econômico liberalista a partir da educação. Nas décadas de 60/70, a USAID enviou técnicos
americanos com o objetivo de elaborar e estabelecer uma educação voltada para interesses
políticos ideológicos americanos, utilizando-se, para isso, da reestruturação do ensino
superior, em que concentrava seus esforços e preocupações. Já na década de 90, o Banco
Mundial prestou assessoria econômica na forma de cooperação para garantir os projetos da
“Educação para Todos”, no entanto, essa política de financiamento exclui as universidades e
35
determina a política mínima de intervenção estatal nas instituições de ensino superior da rede
pública. Mais uma vez, presenciamos a sobreposição do privado ao público, que corrobora a
versão neoliberal do mercado capitalista.
Segundo Oliveira (2000, p. 105):
[...] as políticas de reforma educacional passaram a ser justificadas pela necessidade de respostas e soluções para os problemas de insuficiência no atendimento, por parte do poder público, da universalização da educação básica e, conseqüentemente, das novas demandas econômicas no contexto da reestruturação capitalista.
Talvez a melhor forma de abordar os acordos que interferiram significativamente na
educação brasileira seja trazer à tona discussões que apontem como as aspirações individuais
pelo conhecimento vêm sendo negligenciadas por esse modelo educacional, que determina, a
priori, a formação que o indivíduo deve ter.
Desenvolver o pensamento de que a cidadania se faz a partir da transparência e da
defesa de interesses coletivos e defender a idéia de que a cooperação não se desenvolve pela
ótica ideológica de massificação do indivíduo, e sim pela extensão de direitos e igualdade
social, exigem uma nova postura perante a missão central do ensino superior. Exercer a
função docente em uma universidade, atualmente, demanda, por parte do educador, a
aquisição de um conhecimento construído, consistente e uma visão global do processo
educativo.
A “USAID encarava o ensino superior como elemento da formação de recursos
humanos e estes como meios para o aumento da produção industrial e da produção agrícola”
(Cunha, 1988. p.168). Também era importante estar no controle deste nível de ensino, pois era
nele que se formava a maioria dos dirigentes do país.
Para a transformação do modelo universitário vigente, era necessário modificar a
legislação que regulava o setor. Então, em 2 de julho de 1968, é baixado um decreto
presidencial que instituía um Grupo de Trabalho no MEC, cujos 11 componentes foram
36
designados pelo presidente-general Artur da Costa e Silva, que estabeleceu um prazo de 30
dias para que o GT apresentasse seu projeto de reforma universitária. O grupo iniciou
trabalhos baseando-se nos estudos produzidos pelo convênio MEC-USAID e pelo Relatório
Meira Mattos.
É importante relatar que a reforma universitária era uma luta de estudantes e alguns
professores, que não tiveram suas propostas atendidas. O governo, sob pressões de tendências
desenvolvimentistas de âmbito nacional e internacional, resolveu tomar a liderança, até
mesmo para assegurar o controle e a ordem; assim, ele poderia modernizar o ensino superior,
como diz Romanelli (1986): “[...] sem romper com antigas tradições, nem ferir interesses
conservadores, e, mais uma vez em nossa história política, o interesse social era substituído
pela decisão de poucos”.
É preciso dizer que o governo militar não considerou necessário editar uma nova lei de
diretrizes e bases por completo, por isso modificou somente o ensino universitário através da
Lei 5.540/68, e, mais tarde, o ensino primário e secundário através da Lei 5.692/71.
Com a promulgação da Lei 5.540, em 28 de novembro de 1968, profundas mudanças
aconteceram no ensino superior. A lei exigia que o ensino superior acontecesse somente em
universidades (baseadas no tripé ensino-pesquisa-extensão), sendo ministrado em
estabelecimentos isolados (como faculdades) somente em casos excepcionais. Sabemos que
não foi isso o que aconteceu de fato; na verdade, foram as universidades que se tornaram
excepcionais, como podemos verificar na tabela abaixo.
37
Tabela 1 - Instituições de ensino superior, segundo sua natureza organizacional Anos Universidades Estabelecimentos Isolados Total 1971 64 555 619 1972 65 636 701 1973 57 800 857 1974 57 773 830 1975 57 803 860
Fonte: Anuários Estatísticos do Brasil (v. 33-39) - 1972/1978 - IBGE
Nas universidades, baseadas no ensino, pesquisa e extensão, deveriam ser criados
cursos de graduação (de curta ou longa duração), pós-graduação, extensão, aperfeiçoamento,
especialização e pesquisa. Mas, a estrutura organizacional desse tipo de ensino superior é
muito dispendiosa, o que acarretou a criação de várias faculdades (estabelecimentos isolados
ou instituições similares), principalmente na esfera privada, já que essa estrutura é menos
dispendiosa do que a organização em universidade. A maior parte do setor privado optou por
esse último tipo de estabelecimento de ensino superior, o que lhe possibilitou torná-lo uma
empresa altamente lucrativa.
As instituições privadas foram amplamente favorecidas por esse governo, expandindo-
se muitíssimo no período, como se pode ver na tabela seguinte. O fenômeno foi considerado
por Cunha como uma expansão fragmentadora do ensino superior, já que essas instituições
muitas vezes eram abertas sem as menores condições de proporcionar ensino de boa
qualidade, pois tinham bibliotecas e laboratórios de péssima qualidade, bem como professores
que não possuíam boa formação. Essas empresas de ensino visavam somente ao lucro, não se
importando com a qualidade do ensino ou com a formação de seus alunos enquanto sujeitos
críticos e competentes para o mercado de trabalho.
38
Tabela 2 - Instituições de ensino superior segundo sua natureza administrativa Anos Federal Estadual Municipal Particular Total 1971 53 80 51 435 619 1972 55 74 52 520 701 1973 56 85 85 631 857 1974 47 78 77 628 830 1975 46 82 87 645 860
Fonte: Anuários Estatísticos do Brasil (v. 33-39). 1972/1978. IBGE
É importante lembrar, também, que a maioria dessas instituições de ensino superior
privadas era composta por estabelecimentos isolados; por exemplo, no ano de 1975, das 645
instituições privadas, 625 eram estabelecimentos isolados de ensino superior (Anuário
estatístico do Brasil, 1977, v.38/IBGE).
Segundo o último censo do ensino Superior (2006), o total de universidades, centros
universitários e faculdades isoladas no Brasil era 2270, sendo que somente 248 deste total
eram instituições públicas (conforme tabela 3).
Tabela 3 - Universidades, Centro Universitários, Faculdades Isoladas Total Capital Interior
BRASIL 270 811 1.459 Pública 248 82 166 Federal 105 55 50
Estadual 83 27 56 Municipal 60 - 60
Privada 2.022 729 1.293 Particular 1.583 77 1.006
Comun/Confes/Filant 439 152 287 Fonte: censo do ensino superior 2006
Em São Paulo, predominam as universidades privadas. São 30, sendo 15 particulares e
15 confessionais, contra apenas oito públicas.
39
Outro fator de extrema importância para a expansão do ensino superior privado foi o
Relatório Atcon3, cujo autor foi contratado pelo MEC, no período de 1965/68, para planejar
mudanças no ensino superior brasileiro. Baseando-se nos modelos norte-americanos, o
professor Rudolph P. Atcon disseminou muito bem a idéia de privatização deste nível de
ensino. Para ele, a universidade deveria ter autonomia acadêmica, científica, e,
principalmente, financeira, livre da interferência estatal, devendo funcionar como se fosse
uma empresa privada. O Relatório Atcon também teve importante influência na proposta de
reforma universitária feita pelo GT.
Com a expansão desenfreada do ensino superior privado, o número de graduados
aumentou e o título acadêmico perdeu a importância que possuía anteriormente, agora existia
um “exército de reserva” diplomado sem emprego e que começava a questionar a qualidade
do ensino recebido, pressionando o governo para envolver-se nessa discussão.
O Brasil vive um raro momento em que o ensino superior estatal é criticado em nome
da justiça social. As universidades públicas são ocupadas, gratuitamente, pelos filhos das
classes média e alta; nas universidades particulares ficam os demais.
A injustiça da universidade pública não reside no fato de que nela só entram os filhos
dos ricos — isso é injustiça social. A injustiça da universidade está em que todos aqueles que
dela saem trabalhem apenas para os ricos, em decorrência da estrutura, do currículo e dos
métodos de trabalho. “Formar e ser elite intelectual não é erro, é obrigação. Errado é só servir
à elite econômica e social” (Buarque, 1994, p.117).
O sistema universitário brasileiro, segundo Calderón (2002, p. 54):
[...] começou a vivenciar a partir do início da década de 1990 uma grande revolução no que diz respeito às opções para os cidadãos clientes-consumidores no campo acadêmico-universitário. O cenário das universidades paulistanas, até então
3 Relatório Atcon. Feito pelo professor Rudolph P. Atcon, contratado pelo MEC, no período de 1965 a 1968 para
planejar mudanças no ensino superior brasileiro, que disseminou a idéia de privatização do ensino superior.
40
dominado pelas universidades públicas e pelas de cunho confessional, viu-se significativamente alterado com a entrada de um novo ator: as universidades particulares com explícitos fins lucrativos, geridas enquanto empresas educacionais, oferecendo produtos e serviços de acordo com a demanda do mercado, instituições estas que denominaremos universidades mercantilistas.
São essas universidades que estão dinamizando o mercado de ensino superior, um
mercado que não era visto enquanto tal, mas que está se revelando muito grande, bastante
lucrativo e competitivo, ampliando assim a prateleira de opções para os diversos perfis do
consumidor4.
Essa realidade traz para as Ciências Sociais verdadeiros desafios teóricos ao revelar a
multiplicidade de análises com implícitas opções político-ideológicas, bem como uma grande
polarização teórica.
No meio acadêmico, ainda existem autores que se prendem a modelos interpretativos
que impossibilitam aceitar a existência de universidades com diversos perfis. Insiste-se em
falar em “universidade brasileira”, como sinônimo de “universidade pública gratuita”,
supostamente equacionadora do ensino, da pesquisa e da extensão. Nesse sentido, torna-se
difícil aceitar afirmações categóricas, idealizadoras da universidade enquanto instituição
social, adotadas por muitos autores que se fixam no paradigma social-universalista, fruto do
estado social emergente no pós-guerra, defensores da universidade pública e do ensino
universitário como direito social, atividade não-lucrativa, e sua conseqüente provisão estatal.
4 Podemos esquematizar a existência de três tipos de cidadania que não se excluem mas, separadas, não se
realizam plenamente. A primeira seria a cidadania com valor econômico: o cidadão cliente, a segunda,o cidadão como um indivíduo conhecedor de seus direitos e deveres.e a terceira aquela em que o cidadão deve se articular com a posse efetiva dos bens materiais, simbólicos e sociais de seu tempo e para tal deve poder usufruir destes como consumidor consciente e crítico, possuidor de informações e conhecimentos afins. Existe, portanto, no momento, uma relação contraditória entre o cidadão cliente e cidadão como participante da economia e do estado. Isto é fruto da ausência de políticas distributivistas, produtoras de indivíduos aptos não só a coletar informações mas, principalmente, a produzir conhecimento de acordo com as necessidade pessoais e coletivas. Cf. MARTINS, Marcos Francisco. Uma “catarsis” no conceito de cidadania como eminentemente ética e política.
41
O estudo das novas universidades revela a utilização de novos termos e categorias há
pouco impossíveis de serem aplicados à abordagem do ensino superior. Podemos citar dois
deles, aos quais já recorremos neste trabalho: mercado de ensino e cliente-consumidor. É
interessante verificar a rejeição de amplos setores acadêmicos à possibilidade de se
compreender o aluno universitário como um cliente-consumidor, a aversão de se considerar o
ensino universitário como um produto/serviço comercializado. São questões cujo caráter
polêmico se evidencia nos estudos e pesquisas produzidos sobre o ensino superior privado.
Como aponta Sampaio (1998, p. 167-168), boa parte da literatura acadêmica sobre a
expansão do ensino superior no país traz consigo uma visão negativa do ensino privado e, em
geral, esses estudos
[...] partem do princípio que o estado deve universalizar o ensino superior público e gratuito e que, portanto, a oferta privada é um desvio indesejado do sistema. Consideram que somente instituições públicas, mantidas com recursos exclusivos do estado, podem corresponder à missão da universidade: formar profissionais críticos, desenvolver o conhecimento e transformar a sociedade (…). A oferta privada de ensino superior é um mal que se propagou no sistema em virtude da política de favorecimento à iniciativa privada que vigorou durante o regime militar no país.
A autora afirma ainda que, em tempos de democracia, “a conspiração dos governos
militares que promoveu a expansão do ensino privado é substituída pela conspiração
neoliberal orientada por organismos internacionais”. Nessas análises, “o ensino superior
privado tem objetivos fundamentalmente mercantis (…), operando, em geral, como uma
fábrica de diplomas”.
Os empresários da educação optaram por investir na criação de estabelecimentos
isolados de pequeno porte e poucas foram as universidades mercantis criadas entre 1968 e
finais dos anos 80; elas proliferaram somente no início da década de 90. Para se ter uma
noção da rápida expansão dessas instituições de ensino após o início da reforma de 68, pode-
se dizer que, em 1971, havia 463 estabelecimentos isolados, e entre 1971 e 1975, foram
criados mais 162 instituições desse tipo.
42
Foram precisamente esses estabelecimentos isolados que posteriormente, na década de
80, se transformaram em federação de escolas ou escolas integradas, e muitas delas adotaram
o status de universidade. Convém mencionar que essas transformações estão vinculadas
estritamente ao aumento de vantagens competitivas de mercado.
Aquelas novas universidades, que em suas origens foram estabelecimentos isolados ou
faculdades integradas, já tinham, desde aquela época, o caráter de instituição mercantil
enraizado. A respeito dessas instituições, Martins (1981, p. 80) havia apontado que
[...] a esmagadora maioria dessas instituições privadas que surgiram após o ano de 1968 se constituíram como empresas privadas capitalistas; ou seja, estavam voltadas para a procura de rentabilidade, utilizando a área educacional como um campo fértil para investimentos […] com a finalidade de obtenção de lucro e de acumulação de capital.
Ao longo das décadas de 70 e 80, quando da hegemonia das universidades públicas e
das universidades confessionais, dificilmente se poderia falar da existência de um mercado de
ensino universitário: existiam poucas universidades que o dinamizassem e possibilitassem o
princípio da concorrência. Essa época pode ser considerada um período de mercado restrito
ou de baixa concorrência. Se nos distanciarmos do mundo das universidades, poderíamos
afirmar que no mesmo período existia um grande mercado de ensino superior composto pelos
estabelecimentos isolados e faculdades integradas, havendo entre elas algumas diferenças.
Embora existissem poucas instituições de elite, a maioria delas era composta por faculdades
caracterizadas pela mera transmissão de conhecimentos e pela questionável qualidade,
formando um mercado fértil no qual concorriam instituições de ensino de segunda e terceira
divisões.
Tomando como referência o município de São Paulo, pode-se dizer que, em termos de
instituições de elite, até o final da década de 80, os cidadãos paulistanos tinham poucas
opções. Dentro da cidade, podiam tentar estudar na PUC/SP, USP, ou Mackenzie. Entre os
estabelecimentos isolados de elite de caráter público, existia a Escola Paulista de Medicina, e
43
dentre os de caráter privado destacavam-se a Fundação Getúlio Vargas e a Escola Superior de
Propaganda e Marketing. Fora do município de São Paulo, a opção era migrar para outras
cidades e estudar nos campi da UNESP, UNICAMP, UFSCAR, PUCAMP.
No âmbito do ensino de massa, existiam os estabelecimentos isolados, os mesmos que
em sua maioria não eram valorizados pela elite acadêmica, pela mídia e pelas famílias de
classes média e alta. Estes estabelecimentos ofereciam duvidosa qualidade de ensino, não
possuindo nem status, nem prestígio, se comparados com as universidades e os
estabelecimentos isolados de elite citados. No entanto, diante da dificuldade de ingresso nas
universidades, essas instituições tornaram-se opção de estudo superior para um número de
alunos bastante elevado; por exemplo, a FMU tinha, em 1977, aproximadamente 20 mil
alunos, distribuídos em 16 prédios localizados na região sudeste, oeste, sul e centro da cidade
de São Paulo; no vestibular de 1979, ofereceram 6.700 vagas, algumas centenas de vagas a
mais se comparadas com as 6.240 vagas oferecidas pela USP.
Em municípios próximos de São Paulo foram criadas algumas universidades que,
respeitando as regras do jogo (ensino gratuito ou pago, mas sem fins lucrativos), se
autodenominavam entidades sem fins lucrativos. Eram universidades que tiraram o
monopólio confessional do ensino privado, tinham proprietários, eram de qualidade
questionável se comparadas com as universidades de elite, não eram valorizadas pelas elites
acadêmicas e sociais paulistanas, mas muito valorizadas em seus entornos territoriais. Elas
surgiram para atender à grande demanda regional por ensino superior da população, pois o
estado não podia suprir setores populacionais com recursos financeiros para pagar uma
universidade, mas sem condições de conseguir uma vaga em universidades de elite, seja pela
localização, seja pelas poucas e concorridas vagas oferecidas.
Em outras palavras, eram as primeiras novas universidades criadas para conquistar
uma fatia do mercado, liberando, dessa forma, pontos de tensão existentes em um sistema
44
elitista que não conseguia atender às demandas de segmentos populacionais que almejavam a
inclusão no sistema universitário. Em 1973, foi criada a Universidade de Mogi das Cruzes;
em 1985, a Universidade Brás Cubas e, em 1986, a Universidade Guarulhos. Foi na segunda
metade da década de 80 que surgiu também uma nova universidade confessional católica, a
Universidade São Francisco, que recém começava a se expandir.
O surgimento dessas universidades ainda não tornava explícito o princípio da
concorrência entre as universidades na cidade de São Paulo, pois as universidades de elite não
encontravam concorrência e não havia alteração na oferta de serviços, porque as opções ainda
eram reduzidas se comparadas com o acirramento da competitividade do mercado na década
de 90.
Essas novas “universidades mercantis”, como alguns autores as chamam, (Almeida,
1997) surgiram de forma marcante a partir do final da década de 80. No município de São
Paulo, foram criadas no espaço de nove anos, entre 1988 e 1997, dez universidades mercantis
(Quadro 1) e uma universidade pública (a Escola Paulista de Medicina transformou-se na
Universidade Federal de São Paulo).
Quadro 1 - Universidades credenciadas ou criadas – município de São Paulo – 1988-1997
45
Se considerarmos que até 1988 existiam em São Paulo somente quatro universidades
(uma universidade pública, a USP, e três confessionais comunitárias, PUC/SP, Mackenzie e a
nova Universidade São Francisco), até 1997 houve um crescimento de 250% (Gráfico 1),
totalizando 15 universidades.
Gráfico 1 - Universidades segundo o tipo – município de São Paulo, 1980-1999
Tendo-se em conta que os centros universitários, para concorrer no “mercado de
ensino superior”, apresentam-se ao consumidor com o prefixo “uni” antecedendo seus nomes
– de modo a ressaltar seu caráter universitário –, pode-se afirmar que, entre 1990 e 1999, o
setor ampliou-se a tal ponto que, no final do período, o ensino superior passou a ser oferecido
por 20 instituições: duas universidades públicas, três universidades confessionais e 15
instituições mercantis (dez universidades e cinco centros universitários). Assim, em 2000
havia um total de dez universidades mercantis e cinco centros universitários, com o mesmo
caráter mercantil desse modelo de universidade emergente (Uninove, Unibero, Uni
Sant'Anna, Uni-FMU, São Camilo).
Obviamente, a situação do município de São Paulo é um reflexo do que vem
acontecendo no Brasil. No início da reforma universitária de 68, o ensino privado era restrito
46
a 11 universidades católicas e uma presbiteriana e, até 1985, não havia mais de 20
universidades particulares em todo o Brasil. O crescimento expressivo deu-se de 1985 a 1990,
e nesse período de cinco anos houve um crescimento de 100%, com a criação de mais 20
universidades particulares. Entre 1990 e 1998, foram criadas mais 36 universidades
particulares, ou seja, entre 1985 e 1998 totalizaram-se 56 universidades privadas, um salto
quantitativo de 280%.
Se antes eram apenas três universidades para toda a cidade de São Paulo, concentradas
na região centro-oeste, em 2000, passaram a ser 15, distribuídas por todas as regiões da
cidade, para atender a 10 milhões de habitantes. Zoneou-se o mercado: as universidades
concorrem por “clientes” em potencial na zona leste, na zona norte, no centro e na zona sul.
Essa descentralização geográfica facilitou o acesso às universidades, reduzindo o tempo de
locomoção, fator importante em uma cidade caracterizada pelas grandes distâncias,
quilômetros de trânsito e congestionamento.
Uma pesquisa recente registra que a localização da universidade é um fator
fundamental, quase determinante, para a escolha do aluno. Dos 250 alunos pesquisados da
Universidade Ibirapuera, 87% responderam que estudam nessa instituição pela sua boa
localização, porque é próxima do trabalho ou de casa; dos 377 alunos pesquisados da
Universidade Cruzeiro do Sul, 83% a escolheram pelo mesmo motivo. Os índices também se
mantêm altos em outras instituições: na Unicastelo, 73% dos alunos pesquisados apontaram a
localização como fator determinante na escolha da universidade; na Unicid, 65%; na Uniban,
68%, na Universidade São Judas, 58% (Jardilino e Santos, 1999).
Desta forma, podemos concluir preliminarmente que um dos principais motivos para
determinar o surgimento das novas universidades foi o estabelecimento das "vantagens
competitivas" pela Constituição de 1988, posteriormente regulamentado pela LDB-(Lei de
Diretrizes e Bases da Educação), de 1996, concedido à instituição universidade por meio do
47
princípio da autonomia didático-científica. Por esse princípio, as instituições não precisariam
mais se submeter aos entraves burocráticos do extinto Conselho Federal da Educação, seja
para a abertura de determinados cursos, seja para a ampliação ou redução do número de vagas
para atender à demanda.
A legislação estabelece autonomia para as universidades criarem, organizarem ou
extinguirem, em suas sedes, cursos e programas de educação superior previstos na lei. As
universidades também podem fixar o número de vagas a serem oferecidas ao mercado de
acordo com a capacidade institucional, podendo ampliar e diminuir vagas dentro de seus
recursos orçamentários disponíveis. Como aponta Sampaio (1998, p.67), tudo isso
[...] na prática significa fechar cursos menos procurados, abrir outros com maior capacidade de atrair clientela, alterar o número de vagas oferecidas de acordo com as oscilações das matrículas e da evasão, entre outras providências; decisões como essas de ajuste ao mercado podem ser implementadas sem serem submetidas à tramitação burocrática pela qual passam os pleitos de autorização de cursos encaminhados pelas instituições não-universitárias.
Com a chegada das universidades mercantis, pode-se afirmar que se institucionalizou
o mercado de ensino universitário. A institucionalização desse mercado na década de 90 deu-
se de forma acelerada e num curto espaço de tempo, revelando uma concorrência
extremamente acirrada, descrita por alguns autores como caso de "verdadeiro canibalismo
explícito". Explicando melhor, cada universidade mercantil tenta ganhar mais espaço e
conquistar uma fatia maior do mercado, valendo-se para isso de todos os recursos disponíveis
na área de publicidade e marketing. Para se ter uma dimensão da importância da publicidade,
um levantamento feito em 1998 mostrou que entre os 15 maiores anunciantes de outdoor
encontravam-se cinco instituições de ensino privadas.
O acirramento da competição no mercado de ensino universitário, na primeira metade
da década de 90, revelou a profissionalização e a agressividade das propagandas utilizadas
pelas universidades mercantis para conquistar o consumidor. Poder-se-ia dizer que, em termos
48
de propaganda, a diferença entre o produto oferecido por essas universidades e qualquer outro
produto direcionado para o público jovem era quase inexistente.
Em contraste com a década de 1980, período em que também havia propagandas, mas
sem tamanha profissionalização, mercantilização e agressividade decorrente da acirrada
concorrência,
a década de 1990 apresentou uma guerra pelo consumidor, na qual, longe de mostrar compromisso com a excelência acadêmica, as universidades utilizaram-se de estratégias de sedução do cliente em potencial: os jovens egressos do ensino médio. Assim, criaram-se grandes campanhas veiculadas pelos principais meios de comunicação, com artistas de TV, modelos jovens dentro de um mundo de ilusão, mostrando que estudar em uma Universidade não é uma coisa chata, pelo contrário, é prazerosa e divertida, como estar em um clube de férias (ibidem).
No final da década de 1990, a agressividade caracterizou também o preenchimento das
vagas remanescentes dos vestibulares, com descontos nas matrículas e nas anuidades caso os
alunos deixassem outras universidades e para matricular-se na instituição que estava fazendo
a promoção. Diante do excesso de vagas ofertadas no mercado, as universidades faziam, após
o vestibular, o número de chamadas necessário para preenchê-las, bem como faziam mais de
um vestibular para um mesmo semestre.
Considerando as diferenças entre universidades, Almeida (1997, p. 99) assinala que as
universidades históricas e tradicionais geralmente restringem suas estratégias de marketing ao
que Theodore Levitt (1985, p. 86) chama de produto genérico, isto é, ao produto em si: os
cursos que estão sendo oferecidos ao mercado. Já essas novas universidades, na sua estratégia
mercadológica, tendem a mostrar outros elementos ou qualidades distantes do produto em si,
sendo que os mesmos, muitas vezes, ganham maior destaque que o principal produto
oferecido pela universidade: o próprio curso. São aspectos que procuram seduzir o
consumidor e tornar atraente o produto genérico. Almeida (1997, p. 75) aponta que, na guerra
pelo consumidor, elementos como piscina, sala de musculação, localização próxima ao metrô,
salão de beleza, sala de informática, convênios com "grandes" empresas, escola de motorista,
49
instituto de idiomas, praça de alimentação, ganham ênfase muitas vezes maior que o curso
ofertado pela universidade.
Nesse sentido, as universidades mercantis acabam enfatizando outros aspectos, que
Levitt denomina “produtos esperados pelo cliente” (engana-se quem acredita que todo cliente
procura somente ensino de qualidade); “produtos aumentados”, isto é, estratégias que
ampliam o produto além do que é solicitado ou esperado pelo cliente; “produtos potenciais”,
isto é, o que se pode acrescentar de novo ao produto.
A guerra entre universidades explicitada na primeira metade da década de 90 ganhou
novos contornos após determinadas exigências legais ocorridas com a LDB, especificamente
com a Portaria nº 971 de 22 de agosto de 1997, que determinou que as universidades
deveriam tornar públicas, através de catálogo a ser enviado à Secretaria de Educação Superior
do MEC (Ministério de Educação e do Desporto), as condições de oferta de cursos, fazendo
constar uma longa e minuciosa lista de informações sobre os dirigentes da universidade e os
coordenadores dos cursos, os valores das mensalidades, a infra-estrutura, os resultados das
avaliações do MEC etc.
Sampaio (op. cit., p. 353) registra três mudanças significativas na propaganda escrita,
a partir da introdução dessas exigências legais:
1 - as duas folhas dobradas típicas de folders passaram a ter 20 ou 30 páginas,
organizadas e diagramadas como revistas;
2 - as atividades escolares e as instalações físicas passaram a ser o foco das atividades,
os alunos estudando ou usando a infra-estrutura acadêmica tornaram-se
coadjuvantes dessas instalações;
3 - os catálogos dão a impressão de não se destinarem ao vestibulando, mas ao MEC.
50
Essa interferência legal possibilitou que as estratégias de marketing e publicidade
deixassem de enfocar os produtos ofertados pelas universidades mercantis como mais uma
mercadoria para o público jovem. Revelou o surgimento de um estado preocupado com a
garantia de informações minimamente necessárias para que o consumidor tenha maiores
condições de discernir sobre a escolha do produto que se adapte a suas necessidades e
condições financeiras.
Com a institucionalização do princípio da concorrência, constata-se a passagem de um
"mercado de demanda" para uma estrutura mais seletiva de "mercado de oferta" (Calleja,
1990).
Com o monopólio da PUC/SP e Mackenzie no campo universitário privado, do
município de São Paulo, predominava o mercado de demanda, para o qual qualquer produto
oferecido por essas universidades encontrava um número elevado de consumidores, pois
havia uma grande demanda por todos eles.
Naquela época, se essas instituições houvessem ampliado a oferta de cursos por meio
da criação de uma estrutura multicampi, sem dúvida alguma teriam obtido, facilmente,
consumidores para seus produtos, e, com isso, gerado lucros que teriam sido utilizados de
acordo com suas diretrizes institucionais.
Com o elevado número de universidades, assiste-se ao surgimento de um "mercado de
oferta", no qual se deve produzir o que o mercado cobra, exigências que podem ser reais ou
fictícias, e, principalmente, o que os consumidores querem, dentro de um contexto de acirrada
concorrência por clientes em potencial, e, principalmente, de excesso de produtos para um
número de consumidores que, embora crescente, não consome todas as vagas e serviços
oferecidos pelas universidades particulares no estado de São Paulo. Assim, o "mercado de
oferta" é resultado da junção de vários elementos: de um cenário de grande concorrência, do
51
excesso de produtos em relação ao número de consumidores em potencial e das novas
exigências do mercado, predominantemente voltado para a prestação de serviços.
No panorama nacional constatou-se, nos últimos anos, certa estagnação do número de
matrículas nas IES (Instituições de Ensino Superior) privadas (categoria que engloba
universidades, federações de escolas, faculdades integradas e estabelecimentos isolados), com
um ligeiro crescimento em 1998 (Schwartzman, 1999), enquanto no estado de São Paulo o
mercado apresentou uma demanda que crescentemente veio sendo atendida pelas
universidades particulares. Em 1995, as IES privadas representavam 75,9% do total das
matrículas do estado, crescendo para 77,7% em 1996, 79,1%, em 1997, chegando a 80,6%,
em 1998.
Se, por um lado, o número de matrículas aumentou, por outro, deve-se destacar que,
em 1998, 14,4% das vagas oferecidas não foram preenchidas. Isso quer dizer que existiam
12.341 vagas à disposição dos consumidores. A necessidade de preencher essas vagas foi um
dos motivos que contribuiu para a acirrada competição no mercado de ensino universitário.
A institucionalização do mercado deixa explícita uma diversificação de produtos e
serviços educacionais sem precedentes, bem como uma acentuada diferenciação entre as
universidades que interagem no mercado de ensino. É precisamente essa grande
diversificação de produtos e serviços, colocados no mercado por universidades com os mais
variados perfis e missões institucionais, que caracteriza o chamado "mercado de oferta" em
contraposição ao "mercado de demanda".
Deixando de lado a USP, que possui financiamento estatal, a PUC/SP e a
Universidade Mackenzie são instituições tradicionais vinculadas à qualidade de ensino e
excelência acadêmica – seja na graduação, como a Mackenzie, ou na graduação e pós-
graduação, como a PUC – que, na cidade de São Paulo, podem ser consideradas “top-
universidades”.
52
Essas universidades caracterizam-se por possuírem prestígio obtido em tempos de
mercado restrito ou de baixa concorrência. Nesse novo cenário de acirrada concorrência, as
top-universidades vêm adaptando-se aos novos tempos, pois elas, tanto quanto as
universidades mercantis, também dependem das mensalidades pagas pelos alunos para
garantir seus financiamentos. Como assinalam Tachizawa e Andrade (1999, p. 22),
nessa nova era de competição, nenhuma universidade pode sentir-se excessivamente confiante com as fatias de mercado e as posições competitivas conquistadas [...]. Com mercados e seus protagonistas em constante modificação, a possibilidade de que as IES possam estabelecer vantagem competitiva duradoura não existe mais. Nenhuma instituição de ensino superior, enfim, pode se dar ao luxo de descansar sobre seus louros; cada qual tem de inovar incessantemente para poder competir e sobreviver.
O "mercado de oferta" exige que as top-universidades, além de profissionalizar as
propagandas publicitárias, estejam atentas às novas demandas do mercado, criando novos
produtos e aprimorando aqueles que já oferecem. No caso da PUC/SP, verificou-se, em 1999,
o oferecimento de novos cursos no âmbito da graduação, como Turismo, Comunicação e
Artes do Corpo, Tecnologias de Mídias Digitais e Comunicação em Multimeios. Aliás, o
curso de Turismo, geralmente considerado um curso técnico, tem sobre si um olhar de
menosprezo acadêmico.
O aprimoramento permanente dos produtos é uma decorrência não somente da
competição do mercado, mas também do surgimento de uma série de medidas governamentais
que estabelecem parâmetros para medir a qualidade dos cursos oferecidos pelas
universidades, instrumentos que podem ser considerados como um auxílio ao consumidor no
momento da escolha dos produtos universitários.
No mercado do ensino universitário não há espaço para instituições que queiram se
valer da fama conquistada com a boa "imagem de marca"; mecanismos de avaliação de
cursos, tais como o Exame Nacional de Cursos e a avaliação anual das condições de oferta
(contemplando três itens: qualificação dos professores, organização didático-pedagógica e
53
instalações da faculdade), impulsionados pelo estado, obrigam as universidades de excelência
a rever constantemente seus produtos. Isso pode ser exemplificado com o que aconteceu após
a divulgação das avaliações do MEC, correspondentes aos anos de 1998 e 1999. Em 1999, o
MEC apresentou uma lista com 101 cursos de graduação que teriam de ser reavaliados ou
correriam risco de perder a autorização para funcionar. Nessa lista estava incluído o curso de
Direito da Universidade Mackenzie. Os alunos tiveram muito bom desempenho no provão de
1996, 1997 e 1998, ao obterem conceito A, B, A, respectivamente; mas devido aos itens
instalações e organização didático-pedagógica, os cursos foram considerados insuficientes.
Em 2000, o MEC divulgou uma lista de 94 universidades sob risco de perder o
credenciamento, incluindo o curso de Jornalismo da PUC, cuja qualificação docente e de
infra-estrutura foram avaliadas como insuficientes. Em ambos os casos, as reitorias,
coordenadores, professores e alunos posicionaram-se e questionaram os métodos utilizados
pelo MEC. No caso da Universidade Mackenzie, os próprios alunos declararam à imprensa a
ocorrência de mudanças e melhorias no curso. No caso da PUC, o fato ainda é muito recente
para verificarem-se as mudanças que provavelmente ocorrerão ao curso de Jornalismo.
Admite-se que os estatutos eram freqüentemente mal-aplicados; os programas, estudados de maneira incompleta; as durações obrigatórias dos estudos, não respeitadas, mesmo os exames algumas vezes eram fraudados; negligência e fraude grassavam amplamente […] O acesso rápido e a baixo custo do diploma constituía o objetivo confesso de muitos estudantes (Charle; Verger, 1996, p. 29).
Se se afirmasse que o texto acima foi extraído de uma pesquisa sobre as universidades
paulistas da década de 80, seriam imediatamente evocadas universidades que tinham fama de
comercializar títulos, de formar maus bacharéis, de fazer vistas grossas no controle da
freqüência às aulas. Pois bem, o texto acima foi retirado de um livro no qual se descreve a
situação de muitas universidades provincianas no final da Idade Média. O seguinte trecho
pode ser ainda mais elucidativo:
54
[...] a partir do século XVII [...] Na França, se as principais universidades em Paris, Toulouse ou Montpellier preservavam um determinado nível de exigência, pequenas universidades provincianas Avignon, Orange, Orléans, Nantes, Caen, Reims especializaram-se vergonhosamente na venda de graus a preços de liquidação e sem exame sério. A fraude revestia-se de múltiplas formas: teses redigidas por autores profissionais, envio de substituto em lugar do verdadeiro candidato, inscrições prévias feitas por correspondência, etc. É impossível avaliar a importância dessas práticas, mas elas eram amplamente difundidas [...] (Charle; Verger, 1996, p.60).
Os textos citados sugerem que a diferenciação entre as universidades sempre fez parte
dos sistemas universitários. No Brasil, sempre houve diferenças; mas, com a entrada em cena
das universidades mercantis, na década de 90, elas podem ser constatadas por meio de
múltiplas variáveis, como qualidade, missão, preço, localização etc.
Além disso, a existência de mecanismos públicos de avaliação possibilita a
hierarquização das universidades, pois estabelece indicadores para colocá-las em escala
segundo critérios de avaliação de qualidade instituídos pelo estado. Assim, as universidades
tradicionais terão de se esforçar para justificar a fama e o prestígio adquiridos em tempos de
mercado restrito; por sua vez, as universidades mercantis terão a possibilidade de ganhar
relevância em seu nicho de mercado.
Eunice Durham e Helena Sampaio (1996), referindo os trabalhos de Geiger (1986),
afirmam que
la educación superior privada en Brasil se encuadraría dentro de lo que el define como mass private sector, que cumplen esencialmente el papel de acomodar el grueso de la demanda popular por educación superior.
Sob essa perspectiva, o mass private sector se caracterizaria por:
- complementar os setores públicos que são relativamente pequenos, mais seletivos e
fortemente voltados para as carreiras de elite;
- rápido poder de expansão mobilizando recursos privados, com o propósito de
absorver e adaptar-se à demanda;
55
- atender à demanda em grande escala, de forma rentável, comprometendo a qualidade
dos produtos.
Diante da grande diversificação institucional que vem ocorrendo no mercado de
ensino universitário, pode-se afirmar que a categoria universidade mercantil é muito mais
ampla e rica do que as restrições do mass private sector (setor privado massificado). Deve-se
ter claro que, no Brasil, as universidades mercantis nasceram, sim, para atender às demandas
de massa, mas isso não significa que não possam existir universidades mercantis que sejam
“centros de excelência”, como em outros países, onde a maioria desses centros está vinculada
à iniciativa privada. Nesse sentido, é fundamental distinguir as universidades mercantis de
massa e as universidades mercantis de elite.
Sem dúvida alguma, as universidades mercantis surgiram no Brasil como parte do
mass private sector, na contramão do ensino público voltado para a instrução da elite. Embora
seja difícil desvincular as universidades mercantis do mass private sector e de um ensino de
qualidade questionável, o surgimento de universidades mercantis de elite é uma possibilidade
aberta. A questão é definir sua missão e investir para competir dentro do nicho de mercado
escolhido. A emergência de instituições mercantis com qualidade está começando a ser
realidade ou a se expandir, como exemplo pode-se citar a Ibmec, faculdade com 60% de
docentes com o título de doutor, comandada pelos ex-banqueiros Paulo Guedes, do ex-
Pactual, e Claudio Haddad, do Banco Garantia. Este último declarou à imprensa acreditar que
a educação privada pode dar dinheiro e oferecer qualidade. Na mesma perspectiva, cita-se a
nova Faculdade Trevisan, resultado da sociedade entre o empresário Antoninho Trevisan e o
Banco Fator, que planeja investir 18 milhões de reais nos próximos quatro anos. Nela, os
alunos trabalham com laptops fornecidos pela faculdade (Folha de S. Paulo, 28/12/98).
As universidades mercantis caracterizam-se pela predominância da lógica empresarial,
da procura do lucro. Falamos de negócios e, sob essa perspectiva, as universidades mercantis
56
investem onde percebem que há demanda, e, portanto, podem obter lucro. Ao tomar como
referência o Brasil, verifica-se que 84,2% do total de universidades particulares estão
localizadas na região Sudeste e Sul, enquanto 18% estão distribuídas entre a região Norte
(uma universidade), Nordeste (seis universidades) e Centro-Oeste (cinco universidades).
Somente no estado de São Paulo, encontram-se 30 universidades particulares.
Além do investimento em regiões onde há potencial clientela com poder aquisitivo
para adquirir produtos educacionais, verifica-se que se dá prioridade aos cursos que
apresentam farta demanda e baixo custo de implantação. No estado de São Paulo, em 1998, os
cinco primeiros cursos em número de alunos matriculados em universidades particulares são
aqueles que implicam baixo investimento por parte das mantenedoras. Em primeiro lugar está
o curso de Direito, com 73.580 alunos matriculados; em segundo, Administração, com 44.343
alunos; em terceiro, Engenharia, com 24.565 alunos; em quarto, Comunicação Social, com
19.769 alunos; e em quinto, Psicologia com 15.719 alunos.
Como já se registrou anteriormente, universidades mercantis, voltadas para o ensino
de massa5, apresentam como característica a procura do lucro nos nichos de competitividade
escolhidos. Em decorrência disso, pode-se verificar a implantação de ações voltadas para a
redução dos, digamos, custos de produção, o que certamente influi na qualidade do produto
ofertado. Aliás, a questão da má qualidade dos produtos oferecidos pelas universidades
mercantis de massa tem sido, talvez, um dos pontos consensuais entre analistas e
pesquisadores do ensino superior.
Nossa experiência mostra que a maioria das universidades mercantis de massa contrata
professores pelo regime de trabalho hora/aula. Sem dúvida alguma, se o objetivo é reduzir
5 Segundo Adorno, o conceito de Indústria Cultural mistifica a consciência possível das massas, uma vez que a
própria indústria toma o trabalho das capacidades mentais do sujeito com um planejamento antecipado, uma classificação prévia dos dados apresentados. O trabalho poupado impõe o esquematismo da produção e contribui para a passividade e a estagnação da capacidade crítica do sujeito.
57
custos, o pagamento hora/aula é o mais indicado, pois o professor recebe pela aula ministrada.
Mas, esse sistema é o pior que existe, uma vez que o professor somente se interessa em
chegar, ministrar sua aula e ir embora, não havendo a possibilidade de ficar auxiliando o
aluno após a aula ou ficar mais alguns minutos fora dela, esclarecendo dúvidas e respondendo
questões que os alunos trazem de casa. Essas atividades fundamentais estão fora de cogitação.
O professor não é estimulado pela universidade e, portanto, ela não pode exigir
maiores compromissos, nem apelar para a função social do docente, pois ele precisa trabalhar
em duas, três, quiçá quatro universidades para garantir um salário minimamente decente. Esse
sistema, além de não criar vínculos entre a universidade e o professor e não possibilitar a
existência de um espírito de “comunidade universitária”, faz com que a universidade se torne
um espaço de produção "fordista" de diplomas6.
Se tomarmos como referência os dados existentes em 1998 (tabela 4), poderemos
constatar que metade das “universidades mercantis” paulistanas mantém um índice muito
elevado do seu corpo docente sob o regime horista, acima de 70%, e duas delas mantêm mais
de 60% de seu corpo docente sob esse mesmo regime de trabalho.
6 O procedimento da Indústria Cultural se reproduz dentro do sistema e no caso dos trabalhadores professores
chega-se a um ponto que todos aqueles que trabalham nas universidades mercantis de massa não sabem fazer de outra forma, como se esse modo de trabalhar fosse “natural” e não historicamente datado.Mesmo participando da produção estão reproduzindo a sociedade. Quanto aos alunos, os consumidores, não aceitarão uma mercadoria diferente, tornando-se, portanto cliente e empregado da Indústria Cultural. (Duarte, Rodrigo. Teoria Crítica e Indústria Cultural.Belo Horizonte:Editora UFMG, 2003).
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Tabela 4 – Regime de trabalho dos professores das Universidade Criadas após 1988
Segundo o Censo da Educação Superior de 2006, dados publicados também pelo
jornal Folha de S. Paulo de 12/05/2008, as universidades privadas não têm professor
exclusivo. Só 37 das 86 universidades privadas cumprem a exigência do MEC, 57% delas não
cumprem cota. A Lei obriga a manter 1/3 dos docentes em regime integral. Da lista de
universidades públicas e privadas que não atingem a cota, 18 estão localizadas em São Paulo.
Entre elas, está a universidade mercantil de massa, alvo de nossa pesquisa, possuindo apenas
06 docentes em período integral.
O curso de Administração de Empresas da PUC/SP foi avaliado no provão com
conceito A, de 1996 a 2003, enquanto que esse mesmo curso da UNIVERSIDADE 2, obteve
conceitos D nos anos de 1998, 2000, 2001, conceito C, 1999 e 2002, e um conceito E em
2003 (fonte INEP/MEC).
Aos dados citados, deve-se acrescentar ainda outro problema: o grau de titulação do
corpo docente. Sem dúvida, contratar professores com baixa titulação é uma forma de reduzir
custos. No entanto, deve-se considerar que, em alguns casos, se dá mais importância à
experiência profissional do professor para a formação do aluno do que ao título de mestre ou
doutor, e existem profissões e regiões do país que dificilmente possuem mestres e doutores no
59
mercado. Resta, assim, a dúvida: será que há reserva de mestres e doutores suficientes para
atender à grande demanda do mercado universitário? Embora polêmico, o grau de formação
constitui-se em um indicador da qualidade do corpo docente, como apontam Silva Jr. e
Sguissardi (1999, p. 52), segundo os quais os resultados do provão
demonstraram inquestionavelmente que o conceito A está diretamente relacionado às IES que possuem alto percentual (mais de 50%) de seu corpo docente com titulação de mestrado e doutorado e o mesmo percentual de docentes contratados em regime de trabalho superior a 20 horas semanais.
Em 1995, do total de professores das universidades privadas citadas, 61,8% tinham
apenas o título de bacharel ou de especialista; 38,2% eram mestres ou doutores. Os dados de
1998 revelam um pequeno aumento do número de mestres e doutores para 42%. O número de
professores que têm somente graduação ou título de especialista ainda é elevado, 58%.
Os percentuais variam de universidade para universidade, mas, em linhas gerais, pode-
se dizer que essas instituições procuram ater-se ao limite exigido pelo estado para manter o
status de Universidade, isto é, um terço do corpo docente com titulação de mestre ou doutor.
Os elevados índices de professores bacharéis ou especialistas levam a concluir que os gastos
com força de trabalho mais especializada, ou com investimento em programas de qualificação
docente, bem como com encargos sociais/trabalhistas, são elementos que pesam no momento
de optar pela ampliação do quadro de docentes titulados, tudo isso, é claro, para reduzir os
“custos de produção” e maximizar os lucros.
Em relação à qualidade dos cursos, até a instauração do Exame Nacional de Cursos,
em 1996, não existiam indicadores sobre a qualidade dos cursos oferecidos pelas
universidades mercantis de massa, o indicador que se generalizava era a percepção de que os
cursos das universidades mercantis eram ruins ou de qualidade muito questionável.
60
Tabela 5 – Regime de Trabalho dos Professores das Universidades Criadas após 1988
Se forem considerados os conceitos obtidos na primeira avaliação realizada nos cursos
das dez universidades analisadas, pode-se constatar a frágil formação recebida pelos alunos
que nelas estudavam, corroborando-se a idéia generalizada da má qualidade dessas
universidades. Poucas se destacaram em algum curso específico. Em geral, os resultados
refletiram a precária qualidade do ensino ministrado. Dos 49 cursos avaliados, 57,1%
obtiveram C (28 cursos), 18,4%, D (nove cursos), 4,1%, E (dois cursos). Somente 4,1%,
equivalente a dois cursos, obtiveram A, e 16,3%, equivalente a oito cursos, obtiveram B.
Dentre as dez universidades, somente uma delas, a Universidade São Judas Tadeu, teve
desempenho francamente positivo: dos sete cursos avaliados, dois receberam A, quatro, B, e
apenas um, C.
A institucionalização do mercado é uma realidade no cenário universitário que não
pode ser ignorada. Os contextos mudaram e, para analisar as universidades brasileiras, deve-
se considerar não somente o mercado universitário como elemento impulsionador de
mudanças, mas também a passagem de um cenário marcado pela baixa concorrência para um
mercado pautado pela acirrada concorrência, propiciando o surgimento do mercado de oferta.
A concorrência entre universidades pela ampliação e conquista de novos mercados
chegou a tal magnitude que, no início de 2000, colocou em crise o Conselho Nacional da
61
Educação, o mesmo que surgira como substituto ao tão mal-falado e desgastado Conselho
Federal da Educação, envolvido em sérias acusações de irregularidades. Atrás de todo o
escândalo, existia a pugna de interesses financeiros, interesses de mercado. Duas grandes
universidades mercantis paulistanas, Unip e Uniban, estão se enfrentando em diversas arenas
de luta: no plano legal e no confronto direto pelos clientes-consumidores de produtos
educacionais, oferecendo promoções aos que adquirem seus produtos. Uma amostra disso é a
propaganda da Uniban, amplamente veiculada na imprensa paulistana, segundo a qual os
universitários de 2° e 3° anos de Osasco, Alphaville e Barueri que se transferissem para ela
teriam 50% de desconto na anuidade. O pagamento efetuado em outra instituição (leia-se, na
Unip) seria integralmente descontado da anuidade na Uniban. Bastaria apresentar o
comprovante de matrícula.
Apesar das sérias críticas que podem ser feitas, as universidades mercantis de massa
possuem o grande mérito de atender à demanda por ensino superior que o estado não
consegue prover. O princípio de ensino universal público e gratuito constitui-se numa
importante bandeira que não conseguiu se concretizar de fato. Sem dúvida alguma, ouvir uma
afirmação categórica como “as universidades mercantis estão democratizando o acesso ao
ensino superior” deve ser frustrante para todos aqueles que sonhavam que algum dia esta
democratização ocorresse pela ampliação do serviço educativo público e gratuito fornecido
pelo estado. No entanto, a realidade é outra: foram as universidades mercantis que
possibilitaram a democratização do ensino superior e foi a partir da presença delas que um
maior número de pessoas pôde ter acesso à universidade.
A questão da qualidade de ensino é muito séria e delicada e a intervenção do estado é
necessária, mas deve ser redimensionada, não devendo limitar e coibir a iniciativa dos
empresários na área do ensino superior, mas principalmente garantir espaços e instrumentos
que possibilitem a defesa dos direitos dos cidadãos-consumidores. Nesse sentido, os
62
mecanismos de avaliação de qualidade, principalmente sua ampla divulgação e publicização,
podem contribuir para a construção de uma sociedade de consumidores conscientes e
responsáveis. Em tempos de “mercados de oferta”, existe uma grande diversidade de produtos
dirigidos para clientes com os mais variados perfis, e o importante é os consumidores
escolherem conscientemente os produtos e serviços que irão adquirir, avaliando qualidade,
expectativas individuais e condições financeiras.
Acredita-se que a esfera do mercado e do consumo de bens educacionais possibilita a
percepção de novos espaços do exercício da cidadania. Como afirma Canclini (1995, p. 57), o
processo de consumo está sendo visto como algo mais complexo do que uma simples relação
entre meios manipuladores e uma massa de consumidores dóceis. Nesse sentido,
cuando se reconoce que al consumir también se piensa, se elige y reelabora el sentido social hay que analizar cómo interviene esta área de apropriación de bienes y signos en formas más activas de participación que las que habitualmente se ubican bajo el rótulo de consumo. En outros términos, debemos preguntarnos si al consumir no estamos haciendo algo que sustenta, nutre y hasta cierto punto constituye un nuevo modo de ser ciudadanos (1995, p. 43).
A década de 1990, plena de transformações provocadas pelo impacto do
desenvolvimento científico e tecnológico, pela globalização, pela modernização e
urbanização, funcionou como um período marcado por desafios a partir dos quais a sociedade
passaria, no início do século XXI, a ter de refletir sobre as funções que a educação superior
deveria exercer.
Muitas discussões foram geradas em torno deste tema por agências internacionais, por
bancos e pela UNESCO, contendo temas como: financiamento, autonomia, avaliação,
sociedade do conhecimento, a universidade e o mundo do trabalho etc. De todos esses debates
emergiram outras discussões e reuniões, como a realizada em Paris, em 1988. O reflexo para
o Brasil dessa reunião foi a publicação pelo Conselho de Reitores e algumas universidades
dos resultados obtidos nas discussões. Outros documentos vieram, em seguida, de
63
responsabilidade do Banco Mundial e do Banco Interamericano de Desenvolvimento, tendo
como alvo a educação superior na América Latina e no Caribe, e foram vítimas de grandes
críticas.
No meio acadêmico, grande insatisfação se deu por causa da classificação como “bens
e serviços” por parte da Organização Mundial do Comércio.
Charlot, ao explicitar o grande desafio da educação mundial perante a globalização,
resume sua preocupação no âmbito da passagem da sabedoria para a informação, que está se
transformando em mercadoria:
São dois os problemas: o da globalização e o da modernização. No aspecto da modernização, tenho medo de que não estejamos entrando em uma sociedade do saber, pelo contrário, talvez estejamos saindo da sociedade do saber quando nos deparamos com a sociedade da informação. Informação é saber? Não é a mesma coisa, a informação se torna um saber quando traz consigo um sentido, quando estabelece um sentido de relação com o mundo, de relação com os outros, de relação consigo mesmo [...]. Receio que estejamos saindo da questão do saber. O outro aspecto se refere ao fato de que o saber está se transformando em uma mercadoria, fenômeno da globalização. No mercado do “saber”, essa evolução para uma mercadoria do saber vai tornar ainda mais dura a desigualdade frente à educação. Creio que sejam dois os desafios maiores para o futuro, e já para o presente, o saber ainda tem sentido e já é uma mercadoria. Assim, ao mesmo tempo, o saber existe para se ter um bom emprego mais tarde e conserva seu valor de uso para entender o mundo sob enfoque da diversidade (2005, p. 31).
Em 2003, a UNESCO organizou uma segunda reunião sobre a educação superior com
o nome de Paris+5.
Em 2003, Lula, ao tomar posse, por meio de seu Ministro da Educação, traçou como
meta a escola pública com qualidade, diminuição do analfabetismo, nova trajetória para a
universidade no Brasil, especial atenção para os excluídos do processo educativo nacional,
principalmente o afro-descendente e a população de baixa renda. Na educação superior, o
MEC (Ministério de Educação e Cultura) organizou práticas mais participativas, como mais
reuniões e encontros com reitores, mantenedores, representações sindicais de professores e
funcionários, estudantes, entidades científicas e profissionais. Encontros nacionais e
internacionais discutiram uma nova reforma universitária brasileira.
64
Logo no início de 2004, Tarso Genro ficou responsável pela pasta do MEC, pela mão
de Lula. Houve mudanças no estilo e nas prioridades, mas as metas continuaram. Em maio do
mesmo ano, Tarso Genro e sua equipe organizaram o XVI Fórum Nacional do Instituto de
Altos Estudos com um painel sobre Economia do Conhecimento, Crescimento Sustentado e
Inclusão Social. Segundo o Ministro, o MEC traçaria a sua meta de ação a partir de quatro
eixos principais:
a) prioridade para o estabelecimento de um pacto de qualidade para o ensino básico associado à uma redefinição de seu financiamento;
b) a articulação entre a inclusão educacional e alfabetização define uma abordagem prioritária de superação do elevado passivo histórico em termos de desigualdade educacional;
c) a educação profissional e tecnológica assume um novo papel diante dos parâmetros da sociedade do conhecimento;
d) a reforma do ensino superior apresenta-se como re-ordenadora dos campos de produção do saber e definição dos marcos de um processo de desenvolvimento sustentável.
O MEC articula esses quatro eixos de ação. A educação precisa ser vista como um sistema, tanto no caminho individual como nos diferentes níveis (Genro, 2004, págs. 40-41).
A atual política pública do ensino superior está amparada no tripé: expansão,
qualidade e inclusão social; porém, podemos perceber certa dificuldade na questão da
expansão, na questão da qualidade diminuída do provão, nos alunos provenientes do ensino
médio que estão excluídos da educação superior e no estado que não consegue avaliar e
supervisionar as dificuldades existentes nas IES públicas e privadas.
O governo, dentro deste quadro, tem como objetivo, a partir do referencial da LDB e
do Plano Nacional de Educação, traçar até 2011 a oferta de educação superior para pelo
menos 30% da faixa etária entre 18 a 24 anos.
Analisando a faixa etária de 18 a 24 anos, o número de matriculados no ensino
superior em 2000 é de 11,5%, em 2003 subiu para 15,7% e a tabela 6, retirada do Censo de
2004, registra um percentual de 17,29% (tabela 6).
65
Tabela 6 - Distribuição das matrículas e população de 18 a 24 anos por região do Brasil 2004 Região Matrículas % Pop. de 18 a 24 anos % Brasil 4.163.733 100 24.072.318 100 Norte 250.676 6,0 2.073.628 8,6
Nordeste 680.029 16,3 7.173.409 29,8 Sudeste 2.055.200 49,4 9.871.632 41,0
Sul 793.298 19,1 3.214.581 13,4 Centro-Oeste 384.530 9,2 1.739.068 7,2
Fonte: Deaes/Inep/Mec; Ibope/Pnad 2004
Na região Nordeste, a desigualdade de matrículas é grande; percebe-se um grande
desequilíbrio representado por 16,3% das matrículas, contra 29,8% da população na faixa
apropriada. A região Norte mostra 6% de matrículas, contra 8,6% da população na faixa etária
em destaque. É importante analisar os dados, pois, se a taxa de crescimento registrada de 2000
a 2004 se mantiver nos próximos anos, a meta do PNE será atingida em 2011. Mas até 2004,
as informações se direcionam para o lado contrário, pois nota-se redução no ritmo de
crescimento das matrículas no ensino superior (tabela 7).
Tabela 7 - Matrículas na graduação e taxa de crescimento Ano Total Crescimento em % 2000 2.694.245 2001 3.030.754 12% 2002 3.479.913 15% 2003 3.885.164 12% 2004 4.163.733 7%
Fonte: MEC/Inep
66
Os 7% de matrículas representam o menor percentual desde 1998 no ensino superior,
278.569 de matriculas é número pequeno e pode ser notado em todas as regiões. Este ritmo
parece confirmar-se para os anos subseqüentes (tabela 8).
Tabela 8 - Redução do ritmo de crescimento das matrículas – Brasil 2003-2004 Regiões De (%) Para (%) Brasil 11,7 7,0 Norte 21,2 8,9
Nordeste 15,3 8,7 Sudeste 9,8 7,2
Sul 10,0 6,5 Centro-Oeste 14,0 4,2
Fonte: MEC/Inep/Deaes
Os programas de expansão, como PROUNI e IFES, não interferem nesses dados, pois
os seus efeitos só serão notados no censo de 2005. Esses programas têm como objetivo
oferecer bolsas integrais ou parciais a estudantes de cursos de graduação e de formação
específicas em instituições privadas, que – em contrapartida às bolsas, recebem isenção
tributária.
Em 2005, o PROUNI ofereceu 112.275 bolsas e, em 2006, 91609 bolsas para quase
600.000 inscritos. Os alunos precisam comprovar renda familiar per capita de um salário
mínimo e meio para bolsa integral e três para bolsa de 50%.
Com o PROUNI, exige-se que sejam disponibilizadas vagas em todos os cursos da IES
que aderirem ao programa. Evidenciou-se um grave problema, referente ao acesso de
estudantes de baixa renda e seu interesse nos cursos de alta procura. A distribuição de renda
dos alunos de cursos de alta procura de boas universidades privadas é a mesma de
universidades públicas. Os cursos de alta procura de qualquer universidade brasileira
continuaram não sendo acessíveis ao estudante pobre.
67
O Censo da Educação Superior de 2004 apresenta algumas conclusões que merecem
análise cuidadosa:
- o crescimento médio do número de instituições, no ano, foi de 8,3%, bem inferior
aos percentuais observados nos últimos três anos – 17,9%, 17,7% e 13,6%,
respectivamente.
- nos últimos quatro anos vem ocorrendo uma gradual e constante diminuição no
ritmo de crescimento no setor privado (MEC/INEP, Censo da Educação Superior,
2004).
O atual Ministro da Educação, Fernando Haddad, em entrevista ao Correio Brasiliense
(22/12/05), reconheceu a impossibilidade de aprovação da Lei do Ensino Superior e de
dissidências no âmbito do próprio governo, acerca da proposta de financiamento das IFES
(Instituições Federais de Ensino Superior).
Contudo, o fracasso na tramitação da Lei do Ensino Superior não autoriza afiançar que
o governo Lula tenha abandonado o propósito de implantar modificações decisivas para
melhorar o sistema de ensino superior brasileiro. Por mais que se possa gracejar da
reconhecida incompetência técnica e política dos atuais quadros dirigentes do MEC
(burocratas arrivistas, pescados em uma experiência de militância política rebaixada, carentes
de qualquer experiência em ensino superior), enganam-se aqueles que afirmam, por isso, que
o governo Lula seja desprovido de um projeto.
Que projeto é este? Rigorosamente, com nesgas de diferenças em relação ao governo
anterior (FHC) – talvez mais explícito em suas intenções –, o núcleo do projeto governista é
mercantil e privatista, dando seguimento ao status quo ante a política universitária brasileira.
As instituições de educação superior do país têm 3,9 milhões de estudantes em cursos
de graduação, segundo dados consolidados de 2003. Houve um aumento de 11,7% da
68
matrícula em relação ao último ano, sendo que, no setor privado, que conta com 2.750.652
estudantes, o crescimento foi de 13,3%, e, no setor público, de 8,1%.
A revista Veja publicou (outubro/2005) uma estimativa do INEP, já com números de
2005. É fato que a gestão atual reprimiu a autorização de abertura de novas instituições de
ensino superior, essencialmente privado, – 1º governo FHC: 76; 2º governo FHC: 580;
governo Lula: 548 –, havendo uma queda nas autorizações de faculdades na ordem de 5%;
contudo, por outro lado, expandiram-se em 20% as autorizações de abertura de novos cursos
(1º governo FHC: 1.397; 2º governo: 5.464; governo Lula: 6.535). Dessa maneira, pode-se
concluir que continua estável a expansão do ensino privado, porém com um agravante, bem
detectado, nos índices do INEP – o elevado percentual de vagas ociosas no setor privado
(42,2%).
No bojo mesmo da questão das vagas ociosas, atua a principal expressão do projeto
privatista do governo, o conhecido PROUNI – um programa de isenção fiscal de quatro
tributos (CSLL, IRPJ, PIS e CONFINS) aos empresários de ensino, mediante o provimento de
vagas escolares “ociosas” da rede privada.
Trata-se de um programa em franca expansão, um consenso que abarca inclusive o
apoio do PSDB7. Segundo informa o MEC no portal do PROUNI (http://prouni-
inscricao.mec.gov.br/prouni/Oprograma.shtm.), “o programa já conta com 1.080 instituições
de ensino credenciadas e, em 2006, os impostos não-arrecadados pelo governo permitirão
‘comprar’ novas 130 mil bolsas” (integrais e parciais), um acréscimo de 18 mil bolsas em
relação à primeira edição (2005).
7 Podemos ler no sítio do PSDB, por exemplo, a reprodução de uma entrevista ao Estado de S. Paulo (07/01/06)
de Maria Helena Castro, Secretária-Adjunto do MEC na gestão Paulo Renato, uma das principais formuladoras das políticas universitárias dos tucanos, para quem “o PROUNI foi uma idéia muito interessante, inteligente, de democratização do acesso ao ensino superior para alunos de baixa renda”.
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O marketing do PROUNI na televisão mistura uma marcha de Geraldo Vandré, Pra
não dizer que não falei das flores, com atores trajados de hippies, como se estivessem
encenando o musical Hair. Os emblemas contestatórios de 1968 visam a um insípido suporte
de uma campanha de mercado. A propaganda busca esconder o essencial: o MEC alardeia o
número das vagas privadas que compra, mas esconde o mais que pode o preço da compra, isto
é, os números da isenção fiscal, estimada na ordem de 3 bilhões de reais em 2006, uma
dinheirama utilizada para prover os jovens mais pobres de ensino desqualificado, oferecido
por faculdades de péssimo desempenho nas próprias avaliações do MEC. Em 2005, repercutiu
uma denúncia veiculada pelo jornal O Globo (08/01/05), dando aviso do credenciamento no
programa de 87 cursos jamais aprovados no provão ou no ENADE.
Na realidade, o MEC sofisma: proclama uma falsa retórica de inclusão social, mas
vende isenção fiscal. Daqui a alguns anos, quando formos avaliar os resultados do PROUNI,
constataremos que o programa contribuiu para a histórica dualidade perversa do sistema
universitário brasileiro, no qual os estudantes de baixa renda recebem ensino de pior
qualidade e os remediados estão matriculados nos melhores cursos oferecidos pelas
universidades públicas.
Qual é, afinal de contas, a lógica conceitual e estratégica do PROUNI e das políticas
do MEC? Do nosso ponto de vista, esse programa é a expressão maior de uma concepção
privatista da esfera pública, que pretende criar no Brasil uma esfera de serviços sociais e
educacionais competitivos, conforme as regras do mercado. O papel do estado seria regular a
concorrência, além de prover o sistema privado de recursos públicos que são desviados da
esfera estatal (este o sentido da isenção fiscal do PROUNI).
Vale observar que a equipe do MEC define o conceito de “público” pelo sentido (o
importante é a finalidade do serviço, qualquer que seja a forma de propriedade) e não pela
materialidade (forma de propriedade pública). Ainda há mais: definir o público pelo sentido
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resulta em configurar, no âmbito da esfera do aparelho de estado, uma “zona de sombras”,
vantajosa aos “negócios” escusos, entre a alta burocracia estatal e os interesses setoriais do
âmbito privado. Ou seja, a corrupção sistêmica aumenta.
1.1 Trabalho dos docentes no ensino superior
Os três pontos fundamentais que os estudantes do ensino superior esperam encontrar
no trabalho de seus professores são: dedicação, conhecimento e experiência; porém, talvez
não seja esse o perfil de corpo docente que muitas universidades possuem atualmente. Por
falta de investimentos, algumas instituições enfrentam problemas com os seus professores,
insatisfeitos por não serem mais valorizados no seu dia-a-dia de trabalho.
No ensino público, as queixas principais são a falta de recursos governamentais, a infra-estrutura precária e as greves constantes, solução encontrada para reivindicar melhorias salariais e condições de trabalho. Mas apesar de tantos percalços, esta situação não é vista totalmente como prejudicial. Para a professora Marina Barbosa, presidente do Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-Sindicato), as lutas do servidor público servem para ter uma mão-de-obra mais qualificada (Folha Dirigida de 23/05/2006).
Segundo consta na Indicação do CEE Nº 02/98 - CES -, aprovada em 11/03/98:
O professor das instituições de educação superior, especialmente das universidades, exerce quatro funções básicas: a docência, a pesquisa, a extensão e a administração. As diferentes vocações institucionais e os diferenciados talentos e preferências docentes refletirão as características peculiares de cada projeto institucional. Algumas instituições universitárias são preferentemente docentes, enquanto outras são prioritariamente de pesquisa. Esta opção institucional terá impacto decisivo na carga e distribuição do tempo de trabalho de seus professores.
Ainda, nesta mesma indicação:
As universidades públicas têm feito pelo menos formalmente a opção preferencial pela função de pesquisa, o legislador da nova LDB (Lei 9394/96, artigo 57) decidiu definir um parâmetro mínimo de envolvimento semanal do docente universitário com o ensino propriamente dito. No entanto, é importante lembrar que os docentes das universidades têm uma dupla tarefa docente: uma formal, na sala de aula, e uma
71
informal fora da sala de aula. A formal consiste em ministrar aulas regulares para turmas de alunos, e, em geral, está explicitamente definida em suas normas e em seus critérios de avaliação da atuação docente. A tarefa docente informal, fora da sala de aula, é constituída pelas atividades de orientação acadêmica para estudantes de graduação ou de pós-graduação, de orientação e supervisão de trabalhos monográficos de conclusão de curso de graduação ou de especialização (pós-graduação lato sensu), de orientação e supervisão de dissertações de mestrado ou teses de doutorado, de orientação e supervisão de estagiários docentes e atendimento a estudantes de graduação através de plantões regulares. Todas estas atividades docentes, fora da sala de aula, podem ser realizadas de forma individualizada ou em pequenos grupos. Como orientador acadêmico, o docente fornece aos estudantes informações para subsidiá-los na escolha de disciplinas e de habilitações ou áreas de concentração de estudos. Como orientador para a carreira, o docente ajuda os estudantes a explorarem as opções de carreira e as oportunidades de estudos e formação pós-graduada. Em suma, formalmente ou não, cada professor é também um orientador e os estudantes esperam beneficiar-se desta segunda função docente. Além do mais, pesquisas têm mostrado que a orientação acadêmica é uma atividade de ensino-aprendizagem que exerce uma influência positiva no sucesso acadêmico do estudante. Os professores que interagem com os estudantes, fora da sala de aula, têm uma percepção mais aguda de suas capacidades intelectuais e uma expectativa mais elevada de seu desempenho. A freqüência da interação informal, fora da sala de aula, entre estudantes e professores é um instrumento poderoso de predição da retenção do estudante, de sua satisfação, de seu desempenho e de seu envolvimento na vida acadêmica universitária.
A orientação acadêmica de estudantes de graduação é problemática porque poucos
professores têm uma concepção da natureza do curso de graduação. O problema do estudante
de graduação refere-se à escolha de uma habilitação e à seleção de disciplinas para atender
aos requisitos de educação geral, básica e profissional. O orientador que tiver interesse em
aconselhar precisa adquirir conhecimento atualizado e adequado da universidade, de sua
oferta de cursos, de seus regulamentos, de tal modo que possa fornecer informação acurada e
útil ao estudante.
Se membros do corpo docente devem aceitar a orientação acadêmica como uma
função importante, precisam também ter tempo para empreendê-la:
Se o corpo docente não está interessado em orientação ou se seu tempo é muito caro para que se possa alocá-lo para esta atividade, outros métodos devem ser estabelecidos para ajudar os graduandos no planejamento de seus programas (Indicação do CEE 02/98).
Em síntese, essa indicação oferece subsídios para a compreensão da importância da
organização do tempo acadêmico nas instituições de educação superior, tendo em vista sua
72
máxima otimização e o entendimento da atividade docente fora da sala de aula, bem como sua
valorização como importante instrumento da melhoria da qualidade da educação superior e do
desempenho acadêmico do estudante universitário.
Num mundo em que a produção social da vida depende cada vez mais do
conhecimento, nenhum país poderá alcançar alto grau de desenvolvimento humano sem
maciço investimento em educação e produção de conhecimento e sem a devida valorização do
trabalho docente, e não é bem isso que vem ocorrendo no Brasil.
O controle econômico exercido, de maneira não democrática, pela maior parte dos
empresários da educação tem repercussões importantes sobre a qualidade da formação dos
futuros diplomados. A falta de estabilidade do profissional em educação, atrelada a uma
gestão que visa unicamente ao lucro, deixam o profissional à mercê dos educandos, que,
movidos por interesses imediatistas, vinculados à uma visão hedonista do mundo, própria de
sua faixa etária, impedem a boa formação do futuro profissional.
Partindo-se da idéia de que o principal objetivo da universidade é formar o
profissional para o mercado de trabalho, apoiada no tripé ensino, pesquisa e extensão, ou seja,
preparando-o também para desenvolver pesquisa científica e tecnológica; constata-se que a
maioria das escolas em nível superior está longe de alcançar essa meta, uma vez que não
possui estrutura física adequada, nem laboratórios, nem bibliotecas, nem profissionais
competentes. Muito menos, poderiam estabelecer paralelos entre criticidade, reflexão e
atuação de um profissional capacitado para compreender seu papel de indivíduo atuante na
sociedade. Pelo contrário, o que percebemos é que o ensino superior contribui para a
formação de uma massa incompetente profissionalmente e ingênua criticamente.
Há democratização do ensino. Todos, com a maior facilidade, entram na faculdade.
Chegam com um sonho de que ao término vão conseguir trabalho e ganhar dinheiro com a
profissão em que se formaram. São, podemos até dizer, “enganados”, pois não se exige nem
73
se oferece quase nada na faculdade, porém o mercado de trabalho é extremamente exigente e
é lá que o aluno vai ser testado. As empresas, fundadas numa nova lógica organizacional, têm
reduzido postos de trabalho e exigido novas competências profissionais dos trabalhadores
remanescentes e dos candidatos a empregos. O processo de seleção ao qual são submetidos os
trabalhadores é extremamente exigente e complexo. Normalmente, a seleção já começa pelo
diploma. As grandes empresas escolhem candidatos diplomados nas grandes universidades,
como USP, PUC, UNICAMP, UNESP etc.
Classes lotadas, o mínimo de estrutura física, professores com jornadas triplas de
trabalho e remuneração irrisória, sem tempo de preparar aulas adequadamente. Em tais
condições, como é possível haver ensino de qualidade?
Segundo Mata (2005):
A atual Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, de nº 9.394/96, é uma lei minimalista, flexível, genérica e contraditória por possuir duas tendências totalmente distintas e oscilar entre elas. Por um lado, há uma tendência centralizadora, e, por outro, existe uma tendência descentralizadora. Logo em seu artigo 2º, a lei transfere a responsabilidade de prover a educação em primeiro momento para a família, deixando esse dever em segundo plano para o estado, o que, de certa forma, contradiz a Constituição Federal que responsabiliza primeiramente o estado. Assim, a LDB dá uma base legal para que uma futura série de reformas seja fundamentada de acordo com os princípios defendidos pelos organismos multilaterais, como o Banco Mundial.
Então, os organismos multilaterais sugerem a distinção entre a universidade de ensino
e a de pesquisa, acreditando que a segunda deveria ser minoritária, o que possibilitaria,
portanto, a reafirmação da estrutura dual no ensino.
Essa proposta de criação de dois modelos distintos de universidade é para adequar
ainda mais o ensino superior às exigências do mercado. As “universidades de ensino”, meras
“repassadoras” de conhecimento, ficariam voltadas somente para o ensino e destinadas para a
maioria da população, já que o mercado exige mão-de-obra cada vez mais qualificada em
menor prazo. Para esse tipo de ensino, a LDB criou os cursos seqüenciais de nível pós-médio
74
e de curta duração (com dois anos de duração aproximadamente), encontrando-se, não por
acaso, a maioria deles nas IES privadas.
As “universidades de ensino” passam, então, mais uma vez, a atender a lógica do
mercado capitalista e não ao trabalhador, pois este, com sua especialização fragmentada,
oriunda desse sistema de ensino que não o prepara para mantê-lo no mercado, acaba por
encontrar-se, em certo momento, com a certeza de que sua preparação profissional está
obsoleta frente à avançada tecnologia. Transforma-se, assim, em mais um desempregado a
compor o “exército de reserva”, tão necessário para o aumento do lucro das empresas
capitalistas.
Enquanto isso, as “universidades de pesquisa”, destinadas a pequena parcela da
população, estariam desempenhando a função de promover o ensino, a pesquisa e a extensão,
em suma, estariam produzindo o conhecimento. Esse tipo de ensino, sim, seria ministrado nas
universidades que até hoje são pouquíssimas, como podemos ver no gráfico 2.
Gráfico 2 – Distribuição do Número de Instituições por Natureza – Brasil – 1988 e 1998
Devido a sua flexibilidade, a LDB, no artigo 45, possibilita a diversificação das
instituições superiores com seus variados graus de abrangência ou especialização. Com o
Decreto 3.860/2001, esse aspecto é comprovado, pois se estabelece a classificação das
instituições superiores que conhecemos atualmente: universidade; centro universitário;
75
faculdades integradas, faculdade isolada, instituto ou escola superior. Esse decreto agrupou o
último tipo em uma só classe, sem autonomia, obrigado a pedir autorização ao MEC a cada
curso que abrir. Porém, o contrário aconteceu com os centros universitários, que, de acordo
com o mesmo Decreto (art. 11), adquirem a mesma autonomia das universidades para criar,
organizar e extinguir, em sua sede, cursos e programas de educação superior, assim como
remanejar ou ampliar vagas nos cursos existentes. Mas, apesar dos centros universitários
possuírem os mesmos direitos das universidades, não têm os mesmos deveres, como
promover a pesquisa.
Além das instituições superiores citadas acima, ainda existem os Centros de Educação
Tecnológica (CTEs) e os Centros Federais de Educação Tecnológica (CEFETs) que podem
oferecer cursos de nível superior na área tecnológica, tendo como objetivo a formação de
profissionais e especialistas dessas áreas (denominados de Cursos Superiores de Tecnologia –
CST).
Outro fator de suma importância diz respeito ao investimento governamental no
ensino superior público8, que vem sendo reduzido consideravelmente9. Na atual LDB não há
nada sobre a União ou outro poder público ter responsabilidade de criar novas instituições de
ensino superior, o que acaba resultando na estagnação e na diminuição da sua expansão. A Lei
só trata, no artigo 55, do fato de que a União deve manter as instituições de ensino por ela
criadas.
No entanto, o contrário está acontecendo com as IES privadas, que se expandem e
aumentam a lucratividade devido aos inúmeros benefícios concedidos pelo estado, como a
8 5. O ensino superior público é composto pelo conjunto de IES formados pelo Poder Federal, Estadual e/ou
Municipal. 9 O investimento da União para a educação vem sendo cada vez mais reduzido, em 1985 investia-se 6% do
orçamento da União, e em 1995 somente 2,7% desse orçamento (Jornal do Brasil, 15/3/03/1995. Fontes do IBGE e relatórios do Banco Central).
76
isenção de impostos, a isenção do salário-educação, e a isenção da contribuição previdenciária
patronal das instituições filantrópicas10.
No gráfico a seguir, podemos verificar a expansão dessas instituições privadas em
contraponto com o número de instituições públicas.
Gráfico 3 - Distribuição do número de instituições por natureza administrativa e organizacional (2001)
A liberdade de ação e a tentação do lucro fácil estão gerando, no setor particular de
ensino superior, um quadro marcado pela inexistência das condições mínimas de trabalho,
pesquisa e ensino, tornando as universidades privadas “Mc Donald’s” do ensino, que abrem
seus cursos sem controle de qualidade pelo poder público (nesse caso, o MEC).
O crescimento quantitativo dessas instituições não tem sido acompanhado pelo
crescimento qualitativo. Apesar da relevante expansão dessas IES privadas, podemos observar
que normalmente a maioria delas está dissociada da tríplice função da universidade: o ensino,
10 Para uma discussão aprofundada sobre essas isenções, ver Empresariamento da Educação (Davies, 2002).
77
a pesquisa e a extensão. Essas instituições se sujeitam às leis do mercado como qualquer
grande empresa, o aluno é o cliente, o responsável pela instituição é o dono do capital.
Sob a lógica mercantilista neoliberal, o ensino, principalmente o superior, tem se
tornado uma importante mercadoria da nova burguesia de serviços11, que o redireciona de
acordo com a racionalidade capitalista.
O ensino superior virou território de caça dos empresários do ensino, que vêm
procurando adequar a universidade ao padrão de acumulação capitalista consagrado pelas
classes dominantes, com base num modelo econômico internacionalizado, concentrador e
excludente.
Podemos constatar que o quadro atual, referente à condição do trabalho e do salário
dos professores do ensino superior privado, é caracterizado por uma crescente e progressiva
desvalorização salarial aliada ao aumento de tarefas e trabalhos burocráticos, características
da administração fordista das relações de trabalho.
No caso dos trabalhos burocráticos, temos desde a preparação de questões isoladas,
que constituem “bancos de questões” para provas posteriormente montadas por outros
docentes, até papéis – documentos de secretaria, portifólios pessoais, registros de notas, faltas,
trabalhos avulsos para alunos especiais (doenças contagiosas, licença maternidade, entre
outros direitos dos clientes/alunos), provas substitutivas, aplicação e correção de provas
dependência.
Somam-se a isso os “trabalhos acadêmicos”, muitas vezes organizados e investidos
burocraticamente, dado o número excessivo de alunos por professor em relação ao tempo e ao
valor financeiro deste tempo pago pela faculdade ao professor, como o caso de orientação de
TCC (Trabalho de Conclusão de Curso), estágios supervisionados e atividades
11 Para um melhor aprofundamento sobre a nova burguesia de serviços, ver Boito Jr. (1999).
78
complementares, nas quais os alunos dependem das orientações do professor para buscar
atividades científicas e culturais fora da sala de aula.
Dessa forma, o professor torna-se não um educador, mas um agente mal remunerado
da burocracia acadêmica, fazedor de muitas tarefas, destinadas anteriormente à secretaria,
coordenação e até mesmo a áreas administrativas. Tarefas que são solicitadas como se fossem
para o crescimento da democracia interna e da criatividade do fazer universitário, mas que
acabam por servir e para aumentar a produtividade do empregador através da ampliação da
jornada de trabalho, (mais-valia absoluta) e da intensificação do trabalho, pois o rendimento
das tarefas é ampliado por ferramentas como sistemas de computação e internet (mais-valia
relativa).
Quanto às relações de trabalho, dominadas pelo fordismo, podemos atestar o controle
do professor que ocorre por todas as vias e por todos os locais. São vigiados não só pela
direção e coordenação, mas pelos olheiros – vigias (sob o disfarce de bedéis) que se instalam,
a título de garantir a segurança, com seus walktalkies pelos corredores e escadarias
estratégicas das universidades; alunos no final da cada semestre avaliam o trabalho do
professor em formulários digitais elaborados pela mantenedora, possuindo desta forma um
poder subjetivo sobre a permanência do docente na instituição. Algumas salas de aula,
inclusive, possuem portas de vidro facilitando o controle e muitas vezes impedindo a
autonomia do trabalho docente que, neste contexto, na grande maioria das vezes ocorre com
salas superlotadas, mais uma das formas de ampliar o lucro. Pouca ou mesmo nenhuma
autonomia existe no trabalho docente, uma vez que o professor é feito marionete, escravo do
relógio, cumpridor de metas elaboradas burocraticamente pelos mantenedores.
É justamente nesse ponto que vamos destacar a desvalorização salarial que se processa
progressivamente, e de variadas formas, no ensino superior brasileiro.
79
Desde a década de 70, com o crescimento das faculdades privadas e o conseqüente
aumento de vagas, houve um processo, no início lento, e, a partir de meados da década de 90,
acelerado, de perdas salariais e degradação da atividade docente.
No que tange às perdas salariais, podemos destacar algumas ações formuladas e
executadas por mantenedores, que serviram para construir o quadro atual. Dentre elas:
a) a diminuição da carga horária do professor, como produto da superlotação das
turmas de alunos. Isso lhe impede a dedicação a só uma escola. Para assegurar sua
sobrevivência, o professor acaba por se envolver em duas, três faculdades com propostas e
atividades distintas, o que dificulta ou mesmo inviabiliza sua participação em reuniões
acadêmicas e projetos científicos.
b) a diminuição do valor hora-aula, no caso dos professores contratados pelo regime
da CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), facilitada por um amplo mercado de reserva
constituído por professores especialistas e mestres, muitos vindos das próprias universidades
mercantis de massas, que possibilita demissões de antigos e experientes docentes “caros” à
universidade para contratação de recém-titulados ou remanescentes de demissões de
universidades concorrentes, ou até mesmo da própria universidade contratante, por salários
cada vez menores.
c) a instituição do “regime” de professores cooperados, a quem não se pagam o 13º,
férias e nenhuma outra garantia trabalhista, libertando o empresário do ônus representado
pelos direitos legítimos dos professores. Nesse caso, há a terceirização da gestão da mão-de-
obra, podendo o mantenedor demitir ou contratar a mão-de-obra a seu bel prazer. O professor
passa a ser um profissional autônomo vendendo serviços, conhecimento e educação, sem
vínculo empregatício, sem projeto pedagógico, sem dedicação exclusiva, indo de encontro
com a idéia de que a educação é uma atividade-fim e por isso, não cabe sua terceirização.
80
Nas universidades públicas percebe-se também a degradação do trabalho docente,
principalmente nas recentes condições de contratação, que criaram a figura do “professor
substituto” e do “professor visitante”. O contrato de trabalho para atendimento da necessidade
temporária de excepcional interesse público é aquele celebrado por uma pessoa física, que, de
forma pessoal, não-eventual e subordinada, aliena sua força de trabalho, em caráter precário e
oneroso, a ente da Administração Pública Direta, Autarquia ou Fundação Pública.
De acordo com Mata (2005):
[...] eis aqui uma entre as múltiplas definições jurídicas para o chamado Contrato Precário de Trabalho, que se encontra previsto na Constituição Federal de 1988, em seu Artigo 37, Inciso IX, cuja regulamentação se deu pela Lei nº 8.745, de 09/12/1993. Esta, no Artigo 3º, reza que o recrutamento do pessoal a ser contratado, nos termos desta Lei, será feito mediante processo seletivo simplificado sujeito a ampla divulgação, inclusive através do Diário Oficial da União, prescindindo de concurso público. No caso da contratação de professores substitutos, visitantes e pesquisadores visitantes estrangeiros, a Lei nº 9.849, de 26/10/1999, abre exceção ao processo seletivo simplificado, prevendo que a contratação poderá ser efetivada mediante apenas da análise do curriculum vitae.
Nas universidades Públicas, sejam elas federais ou estaduais, há muito que o Contrato Precário de Trabalho (CPT) foi integrado às rotinas administrativas, pactuado em diversas áreas da instituição de ensino, sobretudo no âmbito da docência. Professores, alcunhados de substitutos (aqueles que atuarão em cursos de graduação) e visitantes (aqueles que atuarão em programas de pós-graduação), são freqüentemente contratados para suprir demandas eventuais resultantes. Podemos citar, por exemplo, a seção de colegas efetivos para outras unidades da própria universidade ou de outras esferas governamentais, de licenças médicas e congêneres, ou, no caso dos cursos de pós-graduação, para o atendimento, por exemplo, de necessidades pontuais relativas a determinadas linhas ou projetos de pesquisa, a intercâmbios, entre outros.
Não obstante essas circunstâncias, o CPT vem contribuindo para a degradação do
ensino superior público brasileiro em virtude das disfunções e abusos que marcam sua adoção
institucional: de solução, mesmo que paliativa, para déficits conjunturais, o CPT se transmuta
em instrumento dedicado à manutenção e cimentação de déficits estruturais.
Na última década, as universidades federais do país sofreram profundos impactos
estruturais, gerados por políticas governamentais a elas desfavoráveis, desenvolvidas em fins
dos anos 80. Destaca-se, aqui, a promoção de programas de incentivo à aposentadoria, e, a um
só tempo, a imposição de limitações de ordem legal e financeira à realização de novos
81
concursos. Tais políticas, evidentemente asfixiantes, resultaram na subtração de parte
expressiva do corpo docente dessas instituições, especialmente aqueles de maior experiência
acadêmica (muitos dos quais, hoje, conferem status a certas instituições de ensino superior
particular), não tendo ocorrido medidas efetivas que compensassem os efeitos traumáticos
dessa evasão. Em vez delas, o incentivo às aposentadorias se deu em paralelo à restrição de
novas contratações, entre outros aspectos, por força de Lei, em 1995, e pela
retração/minoração de recursos da União destinados a este fim.
Todavia, tal panorama não se configura exclusivo às instituições de ensino superior
federais, mas, em distintas proporções, abarca as universidades estaduais. Nessas, assiste-se,
igualmente, à progressiva erosão do volume de recursos públicos destinados ao
financiamento, gerando, entre inúmeros efeitos danosos, o minguar de verbas dirigidas à
contratação de novos docentes. Esses novos docentes seriam contratados quer para o
atendimento minimamente adequado ao crescimento quantitativo e qualitativo de cursos e
alunos, quer para a reposição paritária das vagas geradas por aposentadorias, óbitos,
desligamentos voluntários, e, especialmente, em conseqüência da seção de docentes para
outros órgãos do estado, por tempo indeterminado. Trata-se daqueles que vão, nunca
retornam, tampouco dão notícias e ainda continuam a figurar no quadro da instituição,
aprofundando o déficit docente estrutural real, que não é raro.
No cenário em questão, os prejuízos ao ensino superior público brasileiro seriam
incalculáveis. Conforme Donaldo Bello de Souza, vamos centrar, por ora, em apenas dois
aspectos básicos: a debilitação da qualidade dos cursos e a proletarização involuntária
docente.
No primeiro caso, de antemão cumpre destacar que a qualidade dos cursos ministrados
pelas instituições superiores públicas, que hoje, significativamente, operam com docentes
temporários, torna-se débil. A contratação de professores substitutos não prevê seu
82
envolvimento em espaços voltados à pesquisa e extensão, tampouco em atividades
administrativas e pedagógicas, dimensões estas que marcam a excelência do trabalho docente
e o caráter acadêmico atinente ao papel jurídico-social das universidades públicas brasileiras.
Nestes termos, o universitário é qualificável não apenas a partir do cotidiano
circunscrito à sala de aula, mas também por aquele em que se desenvolve o espírito
investigativo através do qual se pesquisa e, ainda, na própria objetivação destes saberes,
quando no estreitar dos vínculos entre a instituição universitária e a sociedade como um todo,
ou seja, pela via das atividades de extensão. Conjugados, ensino, pesquisa e extensão
constituem esferas de elevado potencial pedagógico, rico em possibilidades de
desenvolvimento humano e social, mesmo que, em alguns momentos, se verifiquem entraves
que dificultam a integração desejada ou a efetividade de uma ou de outra dessas esferas.
Noutras palavras, há forte interdependência nos três pilares da universidade, a tal ponto que
sua dissociação coloca em risco a identidade social e mesmo legal dessas instituições.
São justamente os espaços aludidos acima que servem, por exemplo, à realimentação
das aulas e cursos, aprimorando-os e atualizando-os, beneficiando, em particular, professores
e alunos, e, de modo geral, a sociedade. Além disso, a contratação se dá por um prazo de seis
meses, renováveis em até um ou mais anos, dependendo da instituição. Encerra-se, de um
modo ou de outro, justo quando o docente logra aperfeiçoar o curso que vinha ministrando, a
melhor interagir com a cultura da instituição, a estreitar laços de amizade, a consolidar seus
horários, enfim, a sentir-se parte integrante de um trabalho coletivo. Vale ainda destacar que,
após o término do contrato, o docente está condenado a não mais poder voltar a prestar
serviços àquela instituição, sob a alegação de que tal fato pode vir a caracterizar vínculo
empregatício.
Desses docentes, muitos são imediatamente absorvidos pelas entidades do ensino
superior particulares, que se beneficiam da experiência adquirida e do prestígio da instituição
83
de ensino superior pública em que seu contratado atuou como substituto. Sob esse aspecto, a
universidade pública padece da privação de usufruir do aprimoramento e da maturidade
atingidos por esse professor, transferindo para as entidades particulares tal privilégio, o que
sugere que a instituição pública se encontra, em certa medida, a serviço da preparação de
recursos humanos para o setor privado da educação, como um grande centro de treinamento
docente. A propósito do setor privado, há de se reiterar que o quadro acima lhe é de extrema
conveniência.
Cerca de 20 anos atrás, o ensino dito de terceiro grau público respondia a
aproximadamente 60% das matrículas, enquanto o setor privado, a não mais de 40%. No
quadro atual, este último chega a atender cerca de 70%, enquanto as instituições públicas
federais e estaduais, em meio aos impactos da política governamental a elas desfavorável,
respondem aos 30% das matrículas restantes. Assim, a propalada expansão do ensino superior
brasileiro (veja-se que, entre 1994 e 1999, se constata um aumento de 42% das matrículas em
cursos de graduação) ocorre, de um lado, pela debilitação das instituições públicas, pelo
minguar progressivo e lento de seus recursos e prestígio social, e, de outro, pela oxigenação
das instâncias privadas, que, salvo raras exceções, em especial as confessionais, pouco
contribuem para o desenvolvimento científico do país, “coisificando” a educação, uma vez
que a tratam como mercadoria a ser concebida, gerida e comercializada de acordo com as leis
do mercado.
No segundo caso, ocorre o que aqui denominamos proletarização involuntária docente.
A contratação permanente, abusiva e desbaratada de professores substitutos nas universidades
públicas acaba por segmentar a classe no interior das instituições, subscrevendo um outro
grupo de profissionais da educação que se situa à margem das prerrogativas, direitos e
possibilidades de desenvolvimento profissional concernentes aos docentes estatutários.
84
Com efeito, o Contrato Precário de Trabalho assume caráter poupador de contratações
de efetivos, portando-se como instrumento legal de terceirização do trabalho docente. A bem
da verdade, o professor temporário entra na universidade, ministra sua aula e vai embora, já
que não há espaços efetivos para o seu engajamento, envolvimento ou comprometimento com
o projeto político-pedagógico da instituição, a não ser o da sala de aula propriamente dita.
O docente se vê desamparado, sem os mesmos direitos de seus pares, pois a
jurisprudência entende esse tipo de contratação como um terceiro gênero, ou seja, não a
configura estatutária, tampouco empregatícia. Os direitos e obrigações dos substitutos são
previstos em lei específica (Lei nº 8.745/93), não se aplicando a legislação social (CLT) nem
o estatuto dos servidores públicos (Lei nº 8.112/90).
Mutuamente imbricados, a debilitação da qualidade dos cursos e a proletarização
involuntária docente tornam-se fonte de esterilização do ensino superior público,
desfigurando-o, tornando-o infecundo, exilando-o de sua tradição, vocação e responsabilidade
social, degradando-o histórica e socialmente. Acaba por assolar, de um lado, a excelência do
ensino que promove, e, de outro, as conquistas históricas resultantes da luta dos profissionais
de educação por melhores condições de vida e de trabalho.
Assim, o enfrentamento e a superação do cenário acima descrito devem dar-se com
base na implantação de programas federais e estaduais emergenciais de revitalização das
universidades públicas, por meio dos quais se objetive restabelecer, entre outras dimensões, a
capacidade de estas instituições promoverem concursos públicos que visem à contratação
imediata de novos docentes. Além da contratação, remunerá-los condignamente, respeitando,
ainda, a data de pagamento de seus vencimentos e bolsas, assim como o cumprimento
honroso dos demais direitos estatutários.
Diante do quadro dos professores das instituições particulares e públicas, vamos
analisar o mercado de trabalho para situar o aluno egresso, tanto da PUC, quanto da
85
universidade mercantil de massa, com o objetivo de investigar como se dá sua inserção no
campo profissional.
86
2 SITUAÇÃO ATUAL DO MERCADO DE TRABALHO
O mundo do trabalho tem sofrido modificações, desde o fim do século passado, em
escala global. Ainda que não exista homogeneidade nas mudanças processadas neste âmbito
das relações humanas nos diferentes países, algumas tendências gerais podem ser registradas,
tais como: a introdução da microeletrônica, da robótica e da informática nos processos
produtivos, como estratégia para obter o aumento da produtividade, num mercado cada vez
mais competitivo.
A sociedade do trabalho formada por volta do séc. XVIII, gerada pela revolução
industrial, centraliza as atividades humanas na produção dos bens materiais que garantem a
sobrevivência dos indivíduos. É o momento no qual a ética do trabalho se estabelece como
norma disciplinar das condutas dos homens.
Com profundas mudanças no conhecimento, novos descobrimentos científicos e
invenções, como a energia elétrica, a indústria automobilística, a indústria química, no final
do século XIX e início do XX, inicia-se a chamada segunda revolução industrial e
tecnológica. Esta, aprofundando a ética do trabalho, gera ao mesmo tempo uma situação de
abundância de bens e uma necessidade crescente de manter produtivos os trabalhadores. O
trabalho é gerado muitas vezes pelo próprio estado. É o momento do surgimento da grande
empresa capitalista e da participação ativa do estado na manutenção dos níveis de emprego e,
ao mesmo tempo, no atendimento às demandas crescentes dos trabalhadores quanto a sua
condição social. Essa situação manteve-se até as duas últimas décadas do século XX, quando
problemas estruturais da economia capitalista, gerados por um aumento progressivo de
tecnologia e informações, reordenaram as políticas econômicas de países líderes, como a
Inglaterra e os EUA.
87
Ocorre, então, a terceira revolução industrial e tecnológica, momento que contém,
segundo Pochmann (1999, p. 14-15), sinais de “regressão social”, causados pela ausência de
empregos para todos, em uma sociedade tecnologicamente avançada e de uma economia não
somente internacionalizada (trocas comerciais entre países), mas globalizada (regras
comerciais para produção, contratos e transações financeiras globais – mercado global).
Podemos compreender melhor o quadro presente da conjuntura econômica mundial a partir da
seguinte descrição do chamado modelo internacionalizado da produção:
No contexto criado pela globalização, com a internacionalização da produção e da economia, observa-se o fortalecimento do grande capital especulativo e das grandes organizações em detrimento do controle governamental, ou seja, observa-se significativa transferência de poder do governo para outras instituições que têm sua influência político-econômica acrescida. Assim, acaba-se por fortalecer também o poder de dominação dessas organizações, aumentando a dependência dos empregados à empresa, visto que ficam cada vez mais à mercê das políticas, inclusive as sociais, traçadas pelas grandes corporações (Pimenta, 2001, p.36).
Podemos notar esse fenômeno, inclusive, no que diz respeito aos trabalhadores ligados
diretamente às relações de ensino/aprendizagem. Os grandes conglomerados educacionais,
parte deles financiada pelo capital estrangeiro, reservam ao trabalhador um lugar muito pouco
honroso para a realização de seu mister. Os cursos são mutilados pela instituição, para que
fiquem mais palatáveis ao cliente que adentra os bancos universitários sem requisitos
elementares, e resta ao educador acatar essa afronta se deseja manter o já escasso lugar no
mundo do trabalho que conseguiu obter.
A volatilidade das relações de trabalho empurra massas de trabalhadores para os
chamados setores de serviço, dentre os quais, o setor educativo, que agora, dominado pelos
grandes interesses financeiros e associado à incrível velocidade da produção, vincula o
profissional da educação, como todo trabalhador, a uma “sociedade tecnologicamente mais
avançada”, cujo interesse é produzir sempre mais, pois essa é uma das necessidades para a
afirmação do capitalismo dito global, inclusive, no que se refere à questão educacional.
88
Muitas matrículas significam maior lucro, e não necessariamente mais sabedoria social,
conhecimento partilhado e melhoria socioambiental. Ao mesmo tempo, maior número de
profissionais da educação já não significa mais interesse e diversidade de idéias, mas, quase
sempre, profissionais com muitos alunos por sala de aula, sem acesso a meios e instrumentos
de pesquisa, mal remunerados e com pouca qualificação.
No setor secundário da economia, conforme aumenta a produtividade nas indústrias,
reduz-se o número de trabalhadores. Tal antinomia liga-se ao fato de que tecnologias mais
sofisticadas e maior exigência de qualificação dos trabalhadores aumentam o lucro dos
capitalistas e reduzem ainda mais os empregos, concentrando-os nas áreas que exigem maior
conhecimento tecnológico. Como conseqüência lógica deste processo, colhemos o
denominado “desemprego real”, possibilitado pelo avanço da tecnologia.
Retornemos, porém, à análise do desenvolvimento histórico que produziu o quadro
atual, para que possamos avançar um pouco mais nossos conceitos. A intensificação do
processo de internacionalização das economias capitalistas (com regras globais) ocorre a
partir década de 80, tendo como característica distintiva a integração dos mercados
financeiros mundiais, viabilizada pelo movimento de queda generalizada de barreiras
protecionistas e pela crescente presença de empresas transnacionais.
Esse mecanismo econômico implica, por sua vez, mudanças profundas na geração de
empregos e na condução e/ou negação de políticas sociais realizadas pelos países agora
envolvidos pela chamada globalização. Dos anos 80 até meados da primeira década do século
XXI, o tom da globalização se fazia entender pelo chamado neoliberalismo, privilegiando
sempre um estado fraco no que se refere à ação no campo social.
No que tange ao Brasil, se observarmos a evolução recente da economia,
especialmente a partir do início da década de 90, é possível destacar um rol de importantes
transições econômicas, sociais, demográficas e tecnológicas, com profundas implicações para
89
a evolução do mercado de trabalho e para as mudanças nas relações de emprego. Essas
transições devem ser entendidas, segundo Chahad (2003c), como indo muito além de sua
influência sobre o nível das principais variáveis que compõem o mercado de trabalho,
afetando-lhe também a dinâmica e as estruturas regional, setorial e ocupacional.
Tais transições produzem certamente efeitos em praticamente todas as regiões e
estados brasileiros, principalmente nas áreas onde se concentram os pólos mais dinâmicos da
economia brasileira, no caso, os grandes centros metropolitanos.
No que diz respeito à estratégia econômica, a primeira transição, e talvez a mais
importante, refere-se à passagem de uma economia inflacionária para outra, na qual se
convive com a estabilidade de preços. O controle dos altos níveis de inflação, que adveio do
Plano Real, trouxe consigo o fim do "imposto inflacionário", com implicações positivas para a
diminuição dos índices de pobreza. Em contrapartida, o controle da inflação, por meio da
política monetária – altas taxas de juros, e controle do déficit fiscal restringindo o crescimento
econômico –, originou taxas de desemprego aberto maiores, assim como um aumento do
trabalho informal. A passagem de um regime de altas taxas inflacionárias para outro de
estabilidade de preços acarretou, na sociedade brasileira, outros impactos sobre o mercado de
trabalho além da elevação do desemprego e da informalidade. O fim da inflação melhorou a
distribuição de renda em direção ao maior consumo de bens e serviços das classes mais
pobres. Certamente um novo perfil de consumidor conduz a um novo perfil de produção, que,
embora não seja radicalmente diferente, determina o surgimento e desaparecimento de postos
de trabalho específicos, com implicações para a estrutura empregatícia.
A segunda transição, no âmbito econômico, diz respeito à passagem de uma economia
fechada para uma economia aberta. O processo de abertura comercial teve impactos setoriais
bastante nítidos. Por exemplo, o setor industrial passou por uma forte reestruturação produtiva
e organizacional, que levou à perda de dinamismo da economia e à diminuição sensível da
90
mão-de-obra absorvida pelos seus diferentes ramos industriais, implicando profundas
transformações na geração de empregos, em sua qualidade e nas relações de trabalho. Neste
último caso, podemos ressaltar, como faz Lafetá (apud Pimenta, 2001, p. 57-59), a atualidade
da análise de Foucault acerca dos chamados “corpos dóceis”, que reaparecem com toda força
e não por um mero acaso. Segundo a autora, o moldar desses corpos dá-se através de um
duplo poder:
O poder condigno obtém submissão pela capacidade de impor às preferências do indivíduo ou grupo uma alternativa, suficientemente desagradável ou dolorosa para fazê-lo abandonar suas preferências. Esse tipo de poder se expressa através de ameaça física ou psicológica. O poder compensatório, por contraste, conquista a submissão através de recompensa positiva – ganhos, recompensas, elogios, dinheiro etc.
Devido ao reduzido número de postos de trabalho, qualquer tipo de reconhecimento
por parte do empregador, ainda que baseado em pífios elogios, produz uma cisão no grupo de
trabalhadores que se torna, por este motivo, muito mais vulnerável aos controles de produção
das chefias. Numa instituição escolar de ensino superior, por exemplo, ao congratular-se com
os professores da Pedagogia por terem lançado, todos, dentro do prazo as notas no sistema, o
coordenador de Instituto da universidade cria um falso clima de alteridade, alocando todos os
demais professores num segundo grupo em relação ao primeiro. Esse tipo de migalha
oferecida pela chefia finda por ser um lenitivo para um grupo de trabalhadores que vêem seu
cargo constantemente à mercê das fluídas políticas de promoção que perpassam as instituições
de ensino superior.
Prosseguindo ainda nossa análise mais ampla das relações entre o mercado e o
trabalho, podemos notar que a liberalização da economia vem acompanhada de um conjunto
de características que afetam também, de forma indireta, esse mesmo mercado. A maior
abertura provoca um aumento na elasticidade-preço da demanda dos bens, assim como os
avanços tecnológicos vindos do exterior são fortemente poupadores de mão-de-obra. Esses
91
são fatores que afetam o mercado de trabalho com conseqüências sobre o mercado de bens e
serviços.
A terceira transição refere-se ao surgimento e proliferação de formas atípicas de
ocupação e de novos contratos de trabalho, requerendo mudanças institucionais em todos os
campos da vida econômica, originando um extenso e profundo processo de informalidade que
tem contribuído para a flexibilização das relações de trabalho. Uma das razões para tal
informalidade, além das pressões advindas das mudanças tecnológicas, diz respeito ao fato de
a reforma trabalhista, a tributária e as previdenciárias não terem se completado na última
década no Brasil. As dificuldades políticas, devidas ao conflito de interesses entre
empregadores, trabalhadores e governo, resultaram em uma modificação parcial das leis
trabalhistas. As alterações efetuadas, muitas inicialmente por meio de Medidas Provisórias do
Poder Executivo, trataram dos principais componentes do contrato de trabalho, horas e
remuneração, introduzindo ou ampliando a adoção de contratos alternativos ao “contrato
padrão”. O avanço das práticas de flexibilização no mercado de trabalho, sem a participação
ativa dos sindicatos, tem limitado a padronização das novas regras e a ressonância dos seus
“efeitos positivos”, além de cooperar para o aprofundamento do processo de informalidade,
causando ainda uma diminuição das receitas do sistema de seguridade social público. No caso
específico da educação superior, a flexibilidade tem se manifestado através da mudança da
forma de contratação dos profissionais da educação, do regime celetista para o de cooperados,
caracterizando uma terceirização de atividade fim. Há, também, a prática do marketing
pessoal e da “comercialização” de intelectuais, em projetos de cursos ou palestras cujo
profissional educador é um self-empreendedor e, ainda, a implementação de cursos
modulares, nos quais o professor é chamado a ministrar algumas horas isoladas, sem nenhum
contrato ou segurança trabalhista.
92
A quarta transição diz respeito à lenta modificação do papel do estado na sociedade,
antes marcado por fortes estímulos à promoção direta da produção, tanto no setor público
quanto no setor privado, e agora orientado principalmente para a fiscalização e regulação da
economia. Em particular, o processo de privatizações promoveu ajustes no estoque de mão-
de-obra das empresas privatizadas, com implicações ainda incertas para o mercado de
trabalho, quando observado numa perspectiva de médio e longo prazo. Existem ainda os
efeitos indiretos decorrentes dessa transição, pois, na medida em que ocorre a redefinição da
atuação do estado, limita-se a capacidade de formação de poupança interna, comprometendo,
conseqüentemente, a capacidade de investimentos do país, com efeitos danosos para a
absorção de mão-de-obra.
No caso do ensino superior, o estado tem se mantido como mero controlador de suas
pretensas políticas educacionais para o setor através de ações fiscalizadoras, com o PROVÃO
e o SINAES (Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior). Amplia sua participação
promovendo vagas, através de políticas de isenção fiscal a faculdades, universidades e/ou
institutos isolados particulares que aloquem estudantes bolsistas em suas dependências
educacionais.
No que diz respeito à educação superior, a desregulamentação do setor, o crescimento
do investimento de capitais estrangeiros e a venda de ações nas bolsas de valores são, hoje,
fatos extremamente preocupantes.
A rapidez com que as negociações de compra e venda de instituições de ensino
superior acontecem no Brasil é incrível. Além das fusões, que têm formado gigantes da
educação, as “empresas de ensino” agora abrem o capital na bolsa de valores com promessa
de expansão ainda mais intensa e incontrolável.
Da parte do governo, nenhuma ação sinaliza a regulamentação do setor. Embora as
declarações do Ministro da Educação Fernando Haddad e sua equipe critiquem a
93
mercantilização do ensino e defendam a educação como um bem público, o MEC ainda não
agiu efetivamente.
E a situação só tem piorado. De março de 2007 para cá, quando a Anhanguera
Educacional S.A tornou-se a primeira instituição de ensino superior da América Latina a abrir
capital na bolsa de valores, mais três instituições seguiram o mesmo caminho. No primeiro
dia de operações, em 12 de março, as ações da Anhanguera tiveram alta de 21,39%. A
instituição colocou 28% de seu capital à venda, tendo obtido uma valorização de 70% nas
ações, passados seis meses de operações. Com a captação de 512 milhões de reais no período,
comprou as Faculdades Integradas da Zona Oeste, em São Paulo, e as Faculdades Atlântico
Sul, no Rio Grande do Sul. Seu número de alunos saltou de 24 mil, em dezembro de 2006,
para 53 mil, em julho de 2007. A participação de fundos e a entrada na Bovespa valorizaram o
patrimônio do grupo, que foi de 1,7 bilhão para 3 bilhões de reais.
Os lucros exorbitantes e a atratividade no mercado de ações, entretanto, não têm
nenhuma relação com a qualidade de ensino. Prova disso pode ser constatada nos resultados
do último exame da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Segundo divulgado em
reportagem na revista Carta Capital (“O ensino vai à Bolsa”, 17 de outubro de 2007), menos
de 10% dos formados no curso de direito do Centro Universitário Ibero-Americano, em São
Paulo, e da Faculdade Comunitária, de Campinas, ambas da rede Anhanguera, foram
aprovados.
As outras instituições que seguiram seu caminho não ficam para trás. A Kroton
Educacional, da Rede Pitágoras, de Minas Gerais, que tem como sócio o Ministro Walfrido
dos Mares Guia, já captou R$478,8 milhões de reais. Segundo a revista patronal Ensino
Superior (agosto de 2007), o site da Kroton informava que mais de 50% do capital da
instituição poderia ser vendido e que, portanto, os acionistas poderiam “interferir igualmente
na organização e decisões da empresa”.
94
Na mesma linha, a Estácio Participações, controladora da Universidade Estácio de Sá,
do Rio de Janeiro, faturou 447 milhões até o momento. Sem mencionar a rede COC, que, com
a estréia na Bovespa, passa a se chamar Sistema Educacional Brasileiro. Para a COC, um de
seus “trunfos” é apostar no ensino a distância, que reduz drasticamente os “custos do negócio”
e chega a ter montagem 30% mais barata que a do curso presencial. Segundo informou
reportagem do jornal DCI (Diário do Comércio e Indústria) a rede pretende expandir de mil
para 22 mil o número de estudantes que utilizam esse sistema de ensino.
A expansão não parece estar no fim. Pelo contrário. Em 1996, o País tinha 922
instituições de ensino superior, sendo 711 delas particulares. Atualmente, segundo o Inep
(Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira), são 2.398 instituições privadas,
que reúnem 4,4 milhões de estudantes, contra apenas 257 instituições públicas, com 1,4
milhões de matriculados. Isso porque apenas 10% da população brasileira entre 18 e 24 anos
está matriculada no ensino superior. Mesmo com o percentual baixo frente ao potencial do
país, as faculdades e universidades brasileiras movimentam aproximadamente 15 bilhões de
reais por ano.
Os representantes do patronato não se esforçam para disfarçar suas intenções, e as
afirmam categoricamente, como fez o presidente do SEMESP (Sindicato das Entidades
Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior do Estado de São Paulo), Hermes
Figueiredo, em artigo publicado na Revista Ensino Superior. Para ele, o ensino não é um bem
público e, sim, um “serviço público, quando prestado pelo poder público e atividade
econômica quando prestado pela iniciativa privada”.
É preciso que o governo tome ações concretas, por meio de medidas emergenciais, que
limitem a participação do capital estrangeiro, regulamentem o ensino privado e combatam a
mercantilização da educação no Brasil.
95
A quinta transição refere-se ao processo de inovação tecnológica implementado no
Brasil desde o início da década de 90, nos primórdios da abertura comercial, como
instrumento de resposta às crescentes pressões por maior competitividade e mais
produtividade das empresas, decorrentes da globalização dos mercados. Por se tratar de um
dos principais fatores determinantes do grau de competitividade entre países, setores e
organizações empresariais, essas inovações tornaram-se condição indispensável ao
desenvolvimento econômico-social, sendo processadas em níveis cada vez mais intensos. Isso
levou as empresas a repensar o modo de organização do processo produtivo e as formas de
gestão da produção, causando impacto no emprego, na estrutura ocupacional, no conteúdo do
trabalho e nas relações de emprego. Outro ponto que merece destaque na análise dos reflexos
das novas tecnologias sobre a dinâmica do emprego refere-se à capacitação dos trabalhadores,
cujo nível de exigência de qualidade, pelas empresas, torna-se cada vez mais intenso. Os
trabalhadores com pouca escolaridade vão sendo excluídos do mercado de trabalho e
substituídos pelos mais capacitados, com maior gama de competências.
Neste sentido, as universidades privadas oferecem curso de capacitação aos docentes
para adequar o profissional às exigências do mercado educativo: preparar para produzir aulas
em massa, para o grande público e, ao mesmo tempo, servir como demonstrativo para o MEC
(Ministério da Educação e Cultura) do interesse da empresa privada na promoção das políticas
para o setor.
A sexta transição refere-se ao elemento demográfico. Embora o crescimento
populacional venha diminuindo sensivelmente há várias décadas, a pressão demográfica
herdada do passado ainda foi muito forte na década de 90, e continuará sendo até o final da
primeira década do terceiro milênio, pelo menos nos grandes centros urbanos, quando os
demógrafos afirmam que se encerrará a atual transição demográfica brasileira.
96
O ainda forte crescimento da PEA (população economicamente ativa) brasileira, na
última década, continuou trazendo dificuldades para a absorção de mão-de-obra pelo setor
formal, com impactos no mercado de trabalho. O primeiro deles refere-se à contribuição
demográfica para a ocorrência de altas das taxas de desemprego, notadamente nas áreas
urbanas do país onde se concentra grande parte das ocupações brasileiras. O segundo refere-se
ao surgimento da chamada "onda jovem", decorrente do nascimento, em décadas passadas, de
um grande número de pessoas que agora afluem à força de trabalho. Nesse contexto, na
ausência de um sistema de proteção social adequado aos desempregados, pressionam-se,
simultaneamente, o desemprego e a informalidade.
Esse conjunto de transições, segundo Chahad (2003a, b, c) tem seu principal reflexo
na evolução da atividade econômica, tanto em âmbito nacional como regional, inclusive em
estados e municípios. Em qualquer caso, a evolução do PIB (Produto Interno Bruto)
condiciona a evolução do mercado de trabalho, afetando seu comportamento e suas
modificações ao longo do período em consideração.
De acordo com Dupas (1986), o conjunto de transições acima transcrito demonstra que
houve uma forte correlação entre emprego e crescimento econômico e que havia evidências
de uma tendência estrutural para o aumento do desemprego a partir dos anos 80, período que
corresponde justamente ao acirramento do processo de globalização observado para alguns
países, inclusive no Brasil.
Como conseqüência da forte instabilidade econômica e das mudanças acentuadas de
paradigma na economia brasileira a partir dos anos 80, os ajustes de emprego (gráfico 4)
foram mediados por diversos e sucessivos Planos Econômicos, Cruzado (1986), Bresser
(1987), Verão (1989), Collor (1990) e Real (1994).
O Brasil passou, nesse período, por duas ondas de ajustes estruturais: a primeira, a
partir de 1980, com o já enfraquecido regime militar tendo que optar pela via da recessão e
97
obtenção de superávits comerciais. Foi um momento de forte recessão, com o PIB caindo 3%,
quando o desemprego bateu, então, o recorde do período (8% pelo IBGE), que voltaria a ser
igualado apenas no segundo semestre de 1998.
Após esse período de forte contração, o desempenho exportador levou à relativa
recuperação do PIB. O desemprego caiu drasticamente para o patamar de 4%, no qual
permaneceu até 1990, apesar de ter ocorrido nova dramática queda do PIB, o que foi possível
porque a variável de ajuste foi a queda no rendimento real dos salários. Nessa época, a
indústria local ainda se modernizava defensivamente e os cortes de mão-de-obra eram
cautelosos por haver expectativa de uma rápida recuperação. São desse período várias
tentativas de estabilização: os Planos Cruzado, Bresser e Verão.
Gráfico 4 - Taxas de crescimento do BIP e do desemprego metropolitano - Brasil 1982-1998 Fonte: IBGE
A segunda onda de ajustes estruturais, afirma Dupas (1993), baseado em Pomeranz &
Nunes Ferreira (1996), aconteceu a partir de 1990 com o Plano Collor. A radical abertura
comercial, concomitante às taxas negativas do PIB, forçou o nível de desemprego a novo
patamar (6%). A necessidade imperiosa de competir obrigou o setor produtivo a uma
98
profunda e contínua reestruturação preventiva, com automação radical e terceirizações, além
de redução de níveis hierárquicos e estruturas administrativas e procedimentos orientados para
maior flexibilidade, com inevitáveis conseqüências sobre o emprego.
As transformações na esfera da produção afetaram a qualidade do trabalho, ou seja, o
nível e a estabilidade de suas rendas e os esquemas de proteção social.
O exame do gráfico 4 revela-nos algumas surpresas. Tentativas de estabilização desse
conturbado período da nossa história econômica tiveram, num primeiro momento, efeito
positivo sobre as rendas reais médias dos indivíduos, especialmente o Plano Cruzado, em
1986, e o Plano Collor, em 1990. O último foi seguido por grande queda das rendas em
função da pior recessão da década (1992), somada ao forte arrocho salarial. A partir daí,
houve contínua recuperação seguida do paulatino crescimento do PIB, que se manteve em
ascensão após o Plano Real, gerando boas notícias: a renda média do setor informal,
especialmente na categoria “conta própria”, sempre liderou os saltos de renda; até o Plano
Real, os ganhos de renda eram rapidamente perdidos; a partir de 1994, mantiveram-se e
cresceram, alterando o perfil da massa salarial a favor do setor informal.
Gráfico 5 - Brasil Regiões Metropolitanas – Rendimento médio real por posição na ocupação Fonte: IBGE
99
A análise do gráfico 5, que apresenta o rendimento real médio por posição na
ocupação, revela informações muito importantes. Observa-se durante todo o período
analisado (1985-1996) que o rendimento real médio dos trabalhadores sem carteira manteve-
se significativamente inferior (aproximadamente 30% a 40%) ao rendimento dos
trabalhadores com carteira (incluídos na remuneração os ganhos proporcionais de férias e 13º
salários). Embora essa diferença tenha se estreitado um pouco em função da maior
recuperação de renda após o Real, já relatada, ainda se mantém significativa. O mesmo
acontece com relação aos trabalhadores por conta própria, sempre com renda inferior àqueles
com carteira, apesar de seus ganhos relativos após o Real terem sido bem maiores,
diminuindo em cerca de metade essa diferença quando comparados aos trabalhadores com
carteira. No entanto, se consideradas as médias, quando os trabalhadores perderam suas
funções no mercado formal e mergulharam no informal sua renda sofreu uma queda
expressiva, somada a uma nova e forte insegurança com relação ao futuro e à proteção social.
A partir dessa rememoração de nossa evolução econômica recente, vamos analisar
suas conseqüências sobre o desemprego no Brasil, seguindo as análises desenvolvidas por
Dupas (1999).
No gráfico 6 é demonstrada a dinâmica dos empregos nas metrópoles a partir de 1985.
Pode-se verificar tendência geral de crescimento do desemprego em dois períodos distintos:
até 1990, nos setores indústria, serviços e construção civil houve aumento de 20% no número
de empregos, destacando-se a construção civil (28%); a partir de 1990, os empregos no setor
industrial desabam (-34%), na construção civil diminuem 8% e só nos serviços crescem um
pouco. Em seis anos (1991-1997), o Brasil metropolitano perdeu 4% dos seus empregos,
quando havia ganhado 20% nos cinco anos anteriores.
100
Gráfico 6 - Brasil Metropolitano – Porcentagem de empregos gerados/perdidos por setor de atividade 1986-1997
No total do período, a grande alteração foi a dramática queda dos empregos industriais
e o forte crescimento do emprego em serviços, setor no qual a informalidade é típica. Como
resultado, a evolução da distribuição das pessoas empregadas nas metrópoles sofreu
importante transformação com o aumento no setor de serviços e a queda na indústria, o que
pode ser visualizado no gráfico 7.
101
Gráfico 7 - Brasil Metropolitano – Número absoluto e distribuição relativa dos ocupados por setor de atividade 1985-1997 Fonte: IBGE
Ainda segundo Dupas, um corte fundamental para o entendimento da mudança do
emprego no Brasil é a análise da evolução do tipo de ocupação, evidenciada pela explosão do
trabalho informal nas metrópoles brasileiras.
O autor nos mostra, no gráfico 7, ter ocorrido um comportamento muito diferente após
1990 – ano que mais se caracterizou como um momento de ruptura com o antigo paradigma
do mercado de trabalho local. O número de empregos gerados com carteira assinada desaba
de um crescimento de 23% (1986-1990) para 28% negativos (1991-1997); os trabalhadores
sem carteira, de um modesto crescimento de 5% (1986-1990) vão para 27% (1991-1997). Já o
chamado "informal por conta própria" obteve nível recorde de crescimento nos dois períodos,
sempre em aceleração. No total, durante o período analisado, os trabalhadores com carteira
perderam 5% dos postos, os sem carteira ganharam 32% e os por conta própria saltaram 70%
acima de seu nível em 1985 (Dupas, 1999).
102
Gráfico 8 - Brasil Metropolitano – Porcentagem de empregos gerados/perdidos por posição na ocupação 1986-1997 Fonte: IBGE
A partir do exposto até o momento, podemos ter como evidente que o quadro geral do
emprego no Brasil não se encontra satisfatório ou, como afirma Mattoso, “levando-se em
consideração os indicadores de desemprego, a década de 90 destacou-se por registrar a mais
grave crise do emprego na história brasileira” (Mattoso, 2000, p.11). Além do desemprego
historicamente sem paralelo, o mercado de trabalho brasileiro enfrentou uma redução de
empregos formais, uma insegurança nas condições de relações de trabalho, cada vez mais
precárias, e o aumento de trabalhos terceirizados, de forma crescente. Torna-se patente a
desestruturação das condições de trabalho-emprego, com o trabalhador cada vez mais distante
da “rede de proteção social”. Muitas vezes, o ex-empregado não consegue mais ser
recolocado no emprego formal e é empurrado para a informalidade. Como afirma Mattoso:
“Em uma economia incapaz de manter e gerar novos empregos, a informalidade é uma
estratégia para garantir a sobrevivência” (Mattoso, 2000, p.11).
103
Quadro 2 – Número de empregos gerados (perdidos) segundo posição na ocupação no trabalho principal nas regiões metropolitanas brasileiras
Continuando nossa análise quantitativa, por meio das diversas representações gráficas
que vimos trabalhando até este ponto de nossa argumentação podemos notar o grande avanço
da categoria “conta própria”, que foi a principal geradora de postos de trabalho, 1,7 milhões
de ocupações desde 1986. Categoria esta que deve ter absorvido boa parte dos trabalhadores
com carteira que mudaram de ocupação, o que precisa ser investigado com mais critério. Nela
estão incluídos, por exemplo, cabeleireiros, taxistas, ambulantes; mas também consultores
(onde encontramos um número grande de administradores) e profissionais liberais.
Conseqüentemente, a disparidade de renda tende a ser muito grande, convivendo a acentuada
precariedade com razoável estabilidade. Já os trabalhadores sem carteira parecem ter perfil
mais homogêneo. Na categoria incluem-se empregados domésticos e trabalhadores da
pequena indústria e do setor de serviços, dentre eles, serviços requeridos e executados por
administradores.
Como conseqüência da forte tendência de flexibilização introduzida na economia
brasileira pela abertura econômica acelerada, o mercado de trabalho transformou-se
104
profundamente com conseqüentes alterações de natureza psicossocial, alteração ilustrada pelo
gráfico 9 e pelo quadro 2, supracitado. Pode-se observar que, após vários anos em patamar
razoavelmente estável, a partir de 1990, as curvas relativas aos setores formal e informal se
invertem rapidamente. Após pequena alteração logo em seguida ao Plano Real, a tendência é
retomada nos anos mais recentes, com o setor informal tendendo a representar mais de 55%
da mão-de-obra metropolitana brasileira.
Gráfico 9 - Brasil Metropolitano – Distribuição relativa dos ocupados segundo posição na ocupação no trabalho principal 1985-1997 Fonte: IBGE
Em apenas uma década é alterada a referência do mercado de trabalho, que deixa de
ser o formal, isto é, com carteira assinada e com direitos adquiridos. A possibilidade de obter
uma colocação passa a ser maior no setor informal, mas a referência social continua a ser, no
inconsciente coletivo, estar empregado no setor formal.
105
Dupas comenta a contradição e a discrepância na medição dos níveis de desemprego
entre os índices do IBGE e do SEADE, fruto de a primeira instituição considerar qualquer
trabalhador precário como empregado e o SEADE ser mais sensível ao significado da
necessidade do trabalho precário, também dentro do chamado setor informal. Defende a idéia
de que é necessário captar a atual realidade brasileira em sua dinâmica, observando-se os dois
índices paralelamente
porque, se a precariedade – que vem junto com a informalização – aumenta, é preciso captá-la com maior sensibilidade. Não parece razoável usar a mesma metodologia para países com 5% ou 55% dos trabalhadores concentrados no setor informal (Dupas, 1999).
Dando continuidade a nossa análise quantitativa, notamos, observando as legendas do
gráfico 10, a explicação das diferenças de critério que conduzem a resultados tão diversos. O
IBGE, escudado em metodologia internacional – que, diga-se de passagem, permite variações
– considera qualquer trabalhador precário como empregado.
Gráfico 10 - Critérios para os índices de desemprego – SEADE versus IBGE
106
Cabe atenção a um fator que permite atenuar, em parte, os índices de emprego no
Brasil. Trata-se da forte incorporação de mulheres ao mercado de trabalho a partir de 1990, o
que, juntamente com o eventual aumento do número de jovens que se dispôs a trabalhar, fez o
crescimento da PEA (População Economicamente Ativa) aumentar neste segmento numa
velocidade maior do que nos demais. Conforme pode ser observado, trata-se de um fenômeno
mundial que soma razões de natureza econômica (obtenção de renda mínima familiar) e de
natureza psicossocial (mudança de status da mulher na sociedade). No Brasil ele significa um
crescimento da PEA feminina – em relação à masculina – de 32,5% no período 1985-1996.
Pesquisas recentes (junho/2006) sobre renda e desemprego no Brasil, elaboradas pelo
IBGE, demonstram que “o número de desocupados (pessoas à procura de emprego) nas seis
regiões metropolitanas chegou a 2,34 milhões, com aumento de 289 mil desempregados em
relação a junho de 2005, tendo crescido 14,1%” (Lazzareschi, 2007, p. 45).
Desde 1980, o desemprego no Brasil foi crescente, somente em 2007 houve
diminuição do índice. De dois dígitos passou a um, mais exatamente a 8,9%, segundo o IBGE
(desemprego aberto).
É significativo ressaltar que recentemente tem aumentado o número de carteiras
assinadas e, consequentemente, do regime formal de trabalho para os setores que exigem
baixa qualificação e remuneração (Folha de S. Paulo, Estado de S. Paulo –jan. 2008).
A Pesquisa de Emprego e Desemprego do Dieese (Departamento Intersindical de
Estatísticas e Estudos Socioeconômicos) e do SEADE (Fundação Sistema Estadual de Análise
de Dados) afirma que o número de vagas tende a crescer ainda mais em 2008. Segundo o
coordenador de pesquisa na Fundação SEADE, Alexandre Loloian, o comportamento do
mercado mostra que os trabalhadores mais requisitados têm sido aqueles que recebem salários
mais baixos. Mas a tendência, ele garante, é de que isso se reverta no próximo ano (Portal do
Administrador, acesso em 28/12/2007).
107
Estudos recentes apontam a redução do desemprego no país. O último dado disponível
na pesquisa sobre mercado de trabalho do Dieese mostra que a taxa de desemprego na região
metropolitana de São Paulo foi a menor desde novembro de 1996, ficando em torno de 14,1%
para a população economicamente ativa, que representa a força de trabalho, envolvendo
pessoas ocupadas e desocupadas (Jornal Correio do Brasil 28/12/2007)
O ano de 2007 foi aquecido quanto à criação de postos de trabalho. Segundo dados do
IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a taxa de desemprego fechou em 7,2%.
Isso significa que 709 mil pessoas ingressaram no mercado formal e a população desocupada
caiu abaixo dos 2 milhões de trabalhadores, o melhor resultado em cinco anos (Portal do
Administrador, acesso em 28/12/2007).
Ainda que tímido, o pequeno aquecimento da economia brasileira em 2007 e a
conseqüente geração de novos postos de trabalho tornam-se significativos para a análise da
inserção do profissional no mercado de trabalho atual e sua possível inclusão social uma vez
que, segundo Lazzareschi (2007):
[...] a desestruturação dos mercados de trabalho desestrutura vidas e famílias inteiras, excluindo-as do mercado formal de trabalho e das possibilidades de obtenção de renda. Os problemas sociais que aí advêm são de extrema gravidade (pobreza, miséria, violência) e enredam os governos em quebra-cabeças de difícil solução a curto e médio prazo.
Taxas elevadas de desemprego significam taxas elevadas de pobreza, segundo
Lazzareschi (2007). A autora cita o relatório anual sobre tendências mundiais do trabalho da
Organização Internacional do Trabalho (OIT),
[...] que são 500 milhões de pobres no mundo e, destes, apenas 14,5 milhões ganham mais de um dólar americano por dia. A definição de pobreza foi elaborada pelo Banco Mundial e pelo Fundo Monetário Internacional, cuja função mais significativa é a promoção do desenvolvimento dos países pobres. Segundo esses organismos internacionais é pobre quem não tem renda pessoal de pelo menos 1 ou 2 dólares americanos por dia. Os jovens dos 15 aos 24 anos constituem a metade de todos os desempregados do mundo. Os pobres brasileiros constituem uma população de mais de 30 milhões e destes 14 milhões sofrem de insuficiência alimentar (2007, p.40).
108
A sensação de que a exclusão social estaria aumentando por uma série de razões, que
mereceriam melhor análise, começa a se generalizar – tanto em países centrais como nos
menos desenvolvidos. No entanto, apesar de seu uso amplamente disseminado e de sua
influência no discurso político, o termo exclusão social ainda não foi devidamente definido.
Dupas (1996) informa que, na Europa,
[...] a discussão sobre exclusão social apareceu na esteira do crescimento dos sem-teto e da pobreza urbana, da falta de perspectiva decorrente de desemprego de longo prazo, da falta de acesso a empregos e rendas por parte de minorias étnicas e imigrantes, da natureza crescentemente precária dos empregos disponíveis e da dificuldade que os jovens passaram a ter para ingressar no mercado de trabalho;
enquanto Wolfe (1995) associa a preocupação com exclusão social à ameaça que
grupos, até recentemente integrados ao padrão de desenvolvimento vigente, têm sofrido de
serem marginalizados, concretizada em muitos casos, criando uma classe de novos excluídos.
Rogers (1995) aborda a questão da exclusão social em sua essência multidimensional,
incluindo não só a falta de acesso a bens e serviços, mas também à segurança, à justiça, à
cidadania, ou seja, relacionando-a às desigualdades econômicas, políticas, culturais e étnicas.
Neste sentido, pode-se estar excluindo do mercado de trabalho (desemprego de longo prazo),
do trabalho regular – part-time e precário –, do acesso a moradias decentes e a serviços
comunitários, do acesso a bens e serviços, inclusive públicos. A exclusão ainda pode vir,
acrescenta esse autor, de dentro do mercado de trabalho, com empregos ruins e instáveis,
gerando renda insuficiente para garantir padrão de vida mínimo, como a falta de acesso à
terra, à segurança e aos direitos humanos.
O conceito de exclusão social – bem como os de pobreza e desemprego – é uma
resposta à necessidade de lidar com algumas características sócio-econômicas surgidas
recentemente, observa Silver (1995). O autor enumera, assim, mais de 20 categorias de
excluídos, entre eles os sem-habilidades (skill-less), os analfabetos, os fora-da-escola, os
viciados, os delinqüentes, as crianças que sofreram abuso.
109
É, pois, tarefa enormemente complexa tentar distinguir sentimento de exclusão de uma
situação objetiva de exclusão, efetiva. Pois a noção de exclusão é saturada de significados,
não-significados e contra-significados. Pode-se fazer quase qualquer coisa com o termo, já
que ele exprime o ressentimento daqueles que não podem obter aquilo que reivindicam.
Importa deixar claro que este trabalho não pretende ater-se longamente às questões da
exclusão social, mas é sensível às observações que elas sugerem, uma vez que implica no
objeto central de nossa discussão que é o mercado de trabalho para os recém formados em
administração. Inserir-se no mercado de trabalho implica inclusão social num mundo
globalizado.
Ao gerarem uma massa de pessoas supérfluas ao sistema, as recentes transformações
sócio-econômicas redirecionaram o foco das discussões sobre problemas sociais. Desde o ano
2000, discutem-se as novas necessidades sociais do capitalismo global. As organizações
internacionais, como o BIRD (Banco Interamericano de Desenvolvimento) e o FMI (Fundo
Monetário Internacional), começam a colocar em seus discursos a necessidade de possibilitar
condições de participação cidadã às populações dos diversos países integrantes ou em
processo de integração ao sistema mundial de mercado – entre essas ações cidadãs incluem-se
as relacionadas ao setor educativo.
Em países como o Brasil, o processo de internacionalização da economia local – com
contínuas aquisições de empresas nacionais por transnacionais e com a velocidade das
privatizações – torna muita rápida a incorporação de padrões de produtividade global,
afetando fortemente a lógica dos empregos locais. Impostos, regras de investimento e
políticas econômicas têm de responder às normas da economia globalizada. O
desenvolvimento econômico e social sustentável mostra-se, pois, impossível sem um estado
ativo. Um estado atuante – e não um estado mínimo – é central ao desenvolvimento
econômico e social, ainda que como parceiro e facilitador. O próprio Banco Mundial, desde o
110
final dos anos 90, está assumindo posições flexíveis a respeito do papel do estado. Portanto, a
ação do governo tem crescido e não diminuído. Com Dupas afirmamos que “[...] a
globalização requer grandes e não pequenos governos".
Ao estado provedor de serviços sociais e regulador de mercado dos anos 60, mediador
das relações e dos conflitos sociais, contrapõe-se o atual, aquele que percebe como o novo
modelo global de produção agrava a exclusão social, após um período de imposição de
políticas econômicas pautadas pela idéia de um estado mínimo. Há, no início do século XXI,
um aumento da sensibilidade dos estados nacionais neoliberais, os quais vêm promovendo a
retomada de políticas públicas eficazes na área social e re-introduzindo a dúvida sobre a quem
cabe gerar empregos na economia globalizada.
Os programas sociais tendem, no início do século, a envolver estruturas ágeis e amplo
comprometimento da sociedade civil e dos movimentos sociais na gestão de projetos. Nesse
sentido, temas e ações voltados para a descentralização, autonomia e responsabilidade pessoal
e social são dominantes nas políticas públicas do novo milênio. Estão também presentes nas
propostas de gestão de grandes e médias empresas envolvidas no modelo de cadeias
produtivas, o que acaba por infligir aos trabalhadores mais responsabilidades, horas reais de
trabalho, sem uma efetiva e justa participação nos lucros da empresa.
O processo de reestruturação produtiva, nos últimos anos, tem sido abordado de
distintas formas na literatura. Enquanto alguns anunciam suas virtudes, outros denunciam
suas mazelas. Fala-se no advento de novos padrões produtivos com a introdução das
inovações tecnológicas e organizacionais. Registra-se a mudança no mercado de trabalho,
com diminuição do número de trabalhadores em regime formal e eliminação dos postos de
trabalho, acarretando a precarização. Contudo, a existência da relação entre a modernização
tecnológica e o desemprego ainda não foi satisfatoriamente esclarecida.
111
As tendências atuais de renda e mercado são avaliadas de formas diversificadas por
especialistas da área. Entre eles, Reich (1993) e Rifkin (1995) são pessimistas quanto ao
futuro do emprego e renda. Reich classifica a atual estrutura do trabalho em três categorias:
serviços rotineiros de produção (tarefas simples e repetitivas que ainda exigem a participação
humana em maior escala); serviços prestados "em pessoa" (garçonetes, enfermeiras,
vendedores em geral) e serviços simbólico-analíticos exercidos por especialistas em imagens
abstratas (pesquisadores, engenheiros, executivos etc.) Para o autor, os serviços rotineiros de
produção e simbólico-analíticos podem ser prestados globalmente, competindo, assim, com os
estrangeiros.
Rifkin, por sua vez, considera que a articulação da automação e a reengenharia
provocam o fim do emprego e que, socialmente, a tecnologia traz maiores desvantagens do
que vantagens, pois seu impacto no tecido social é expulsar setores do sistema diferentes
daqueles que estão sendo incorporados pelo novo modelo. Haveria declínio da força de
trabalho global, polarização social crescente (os blue collar estão perdendo poder de compra),
declínio da classe média norte-americana, profunda desintegração social e violência. As
poucas alternativas disponíveis seriam a reengenharia da semana de trabalho, o fortalecimento
do terceiro setor e a globalização da economia social por meio das ONGs (Organizações não
Governamentais).
Já para Castells (1998), a nova economia informacional não tem como conseqüência o
aumento do desemprego. Os postos de trabalho nas indústrias mais tradicionais terão o
mesmo destino dos agrícolas; por outro lado, serão criados trabalhos novos na indústria de
alta tecnologia e no setor de serviços. O autor acredita que níveis tecnológicos mais elevados
se relacionariam a taxas de desemprego menores. No entanto, Castells concorda que o
endurecimento da lógica capitalista desde a década de 1980 tem fomentado a polarização
social, apesar da melhoria ocupacional, e que a flexibilidade dos mercados e dos processos
112
cria as bases para um novo tipo de trabalhador: o trabalhador flexível. Há mais postos de
trabalho e maior proporção de “pessoas em idade de trabalhar empregadas” que em nenhum
outro momento da história. Afirma ainda que a difusão das tecnologias de informação não tem
resultado em desemprego massivo.
No caso brasileiro, percebemos pelas mudanças no sistema financeiro bem como pela
introdução de novas tecnologias e automação – que resultaram em modificações no processo
de trabalho e na diversificação dos serviços oferecidos – o aumento do número de
equipamentos de auto-atendimento, e, consequentemente, a diminuição do número de
funcionários, também no setor de serviços. Assim, aparentemente, o desemprego estaria
relacionado à introdução das novas tecnologias.
[...] o desemprego apresenta-se sob diferentes formas e tem diferentes causas. As formas mais persistentes de desemprego podem ser assim identificadas: estrutural, tecnológico, conjuntural, friccional e temporário (Lazzareschi, 2007, p.42-43).
Segundo Lazzareschi, o desemprego estrutural é típico dos países subdesenvolvidos e
dependentes, conseqüência de investimentos produtivos fracos e ausências de mecanismos
institucionais de distribuição de renda; já o tecnológico é próprio de países mais
desenvolvidos e provocado pelo desenvolvimento de tecnologias coligadas a novas formas de
organização do processo de trabalho; o conjuntural é conseqüência da queda temporária dos
investimentos produtivos, em determinadas conjunturas econômicas, financeiras e/ou
políticas, nacionais, e/ou internacionais; o friccional é provocado pela mudança de emprego
ou atividade dos indivíduos; o temporário é fruto da sazonalidade de algumas atividades
econômicas como as agrícolas e o turismo.
Em todas essas formas, o trabalhador passa por situações difíceis, podendo chegar ao
subemprego, enfrentando a precarização das relações de trabalho.
113
As profundas transformações no mundo do trabalho, manifestadas através da invenção
da máquina, do ponto de vista tecnológico – apontadas por Márcio Pochmann partindo do
referencial das transformações provocadas pelas revoluções industriais – são analisadas
também por Paul Singer. Este autor afirma que o futuro do trabalho reflete, do ponto de vista
social, uma situação desesperadora, com suas conseqüências recaindo sobre o trabalhador,
que tem de se adequar às exigências do mercado para não ser excluído do mundo do trabalho.
Todas as revoluções industriais acarretaram acentuado aumento da produtividade do
trabalho e, em conseqüência, causaram desemprego tecnológico.
Os deslocamentos foram grandes, milhões de trabalhadores perderam suas qualificações à medida que máquinas e aparelhos permitiram obter, com menores custos, os resultados produtivos que antes exigiam a intervenção direta da mão humana (Singer, 1998, p.16).
Diante da assustadora e crescente transferência de atividades exercidas, até então,
pelas mãos dos trabalhadores para serem executadas por equipamentos de automação, torna-
se cada vez maior o número de desempregados. Isso nos leva a indagar sobre quem irá
trabalhar no futuro.
Assim, nesse ponto de vista, o emprego estável só será assegurado a um núcleo de trabalhadores de difícil substituição em função de suas qualificações, de suas experiências e de suas responsabilidades. Ao redor deste núcleo estável gravitará um núcleo variável de trabalhadores periféricos, engajados por um prazo limitados, pouco qualificados e, portanto, substituíveis. (ibidem, p. 25-26).
Por emprego estável, Singer entende a vaga ocupada por um trabalhador que
conseguiu qualificação para operar a máquina, diferentemente do emprego instável, ocupado
pelo trabalhador desprovido de acesso à qualificação, que é, na verdade, um desempregado
em potencial. Acrescenta ainda o autor que, se o emprego já está precarizado, no cerne dessa
crise se engrossam as fileiras do exército de reserva, pois “a precarização do trabalho inclui
tanto a exclusão de uma crescente massa de trabalhadores do gozo de seus direitos legais
114
como a consolidação de um ponderável exército de reserva e o agravamento de suas
condições” (Singer, 1998, p. 29). Na esteira da relação entre mudança tecnológica e
desemprego tecnológico, Singer define a terceira revolução industrial, aquela da digitalização,
da computação, da biotecnologia, da engenharia genética: é uma revolução industrial
“enviesada” para produzir desemprego tecnológico (Singer, 1999, p. 36); também no Brasil,
segundo Lazzareschi:
[...] consolidou - se a terceirização, o contrato temporário de trabalho, a jornada parcial de trabalho, o banco de horas, o trabalho em domicílio, ou seja, a precarização das relações de trabalho, uma vez que por essa reestruturação produtiva há o impedimento do pleno acesso dos trabalhadores à todos os benefícios previstos na legislação trabalhista - CLT Consolidação das leis de trabalho - e/ou àqueles benefícios concedidos pelas grandes empresas para reforçar sempre mais a colaboração de seus trabalhadores (2007, p. 48).
Na fase de transição do século XX para o século XXI, várias mutações vêm ocorrendo
como resposta do capital à sua crise estrutural. A classe trabalhadora, “os trabalhadores do
mundo na virada do século”, é mais explorada, mais fragmentada, mais heterogênea, mais
complexificada; os trabalhadores são desprovidos de direitos, o seu trabalho é desprovido de
sentido, intensificando-se os níveis de exploração (Antunes, 1999, p. 205).
Para Ricardo Antunes, as transformações no processo produtivo trazidas pelo avanço
tecnológico foram uma tentativa de responder à crise do capital ocorrida a partir da década de
1970. Transformações que acarretaram
[...] enorme expansão dos assalariados médios, especialmente no setor de serviços que, ampliado em larga escala no início da década de 70, vem presenciando também níveis de desemprego tecnológico, agravando assim o desemprego estrutural. Pois, junto com o trabalho precarizado, o desemprego na área de serviços, atinge cerca de 1 bilhão de trabalhadores, o que corresponde a aproximadamente um terço da força humana mundial que trabalha (Antunes, 1999, p. 190-191).
Como imperativo da globalização dos mercados, o Brasil tem experimentado várias
transições. Entre elas, a abertura comercial, a reforma do papel do estado, a estabilidade de
preços, o avanço tecnológico, a integração em blocos econômicos, o surgimento de formas
115
atípicas de contrato de trabalho, o avanço da negociação coletiva, a busca da flexibilidade nas
relações de emprego, as quais, entre outras, têm afetado significativamente o mercado de
trabalho.
Nos países periféricos, a incapacidade de renda própria para satisfazer às necessidades
básicas deve ser o centro das novas preocupações e ações sociais do estado.
Há várias implicações institucionais na definição de formas de participar do
suprimento destas necessidades, dentre elas, os critérios para ajuda (ou subsídios) do estado e
a propensão dos não-pobres em transferir renda para os pobres. Inclusive o que vem ao
encontro deste trabalho, novas diretrizes da política educacional como o PROUNI, que cria
vagas subsidiadas pelo estado em até 100% nas universidades privadas.
Há ainda a criação recente do PAC- 2007-2010 - Programa de Aceleração do
Crescimento, visando promover desenvolvimento econômico, aumento do emprego e
melhoria das condições de vida da população brasileira, contando com a participação do
Executivo, Legislativo, dos trabalhadores e dos empresários. O PAC consiste num conjunto
de medidas destinadas a incentivar o investimento privado e no aumento do investimento
público em infra-estrutura, por meio da remoção de obstáculos ao crescimento de ordem
burocrática, administrativa, normativa, jurídica e legislativa.
116
3 EDUCAÇÃO E TRABALHO VS. COMPETÊNCIAS E HABILIDADES
O tema educação e trabalho, segundo Saviani (1994), pode ser entendido a partir de
duas perspectivas: a primeira afirma a inexistência da relação entre os dois termos e a segunda
estreita os laços entre eles, em decorrência do reconhecimento da educação no processo de
desenvolvimento econômico, sobretudo no que se refere a sua participação na qualificação
dos trabalhadores.
A primeira perspectiva encontra justificativa histórica na Antigüidade com o
surgimento da propriedade privada, que permitiu a ascensão de uma classe ociosa que, ao ter
seu sustento garantido pelo trabalho alheio, passou a dispor de um tipo de educação que
visava mais a formação de lideranças políticas e militares do que a preparação para a inserção
no sistema produtivo. A escola tem aí sua origem, sendo reservada àqueles mais abastados
que dispunham de tempo e recursos para usufruir de seus benefícios. Alheio a isso, o povo
continuava se educando pelo trabalho cotidiano.
A partir do surgimento das cidades modernas, como também das transformações
científicas, tecnológicas e econômicas que nelas constantemente se processam, a escola passa
a ter novas, crescentes e diferenciadas funções – a de formar cidadãos cientes de seus direitos
e deveres, bem como a de fornecer requisitos para o exercício do trabalho na sociedade
industrial, como as operações básicas de matemática e algum nível de letramento. Mas, até a
década de 1970 do século XX, embora a escola fosse necessária a todos, como garantia do
direito à cidadania, só uma pequena porção de trabalhadores precisava de escola
especializada, a gerência científica, para capacitá-la a tarefas propriamente produtivas ou de
serviços.
As transformações que ocorreriam mais tarde – e contribuiriam para o reconhecimento
de que os trabalhadores que dispusessem de mais escolarização estariam mais habilitados
117
intelectualmente a lidar com a complexidade crescente do sistema produtivo – configuraram a
sociedade pós-industrial, ou sociedade da informação, que envolve várias esferas: a política,
orientada pelo neoliberalismo; a econômica, sustentada pela globalização e pelo crescimento
do setor de serviços;
[...] a cultural, apoiada por uma visão de mundo que redefine os valores temporais, estéticos e morais; a das relações entre ciência e tecnologia, testemunhada pela diminuição da distância entre o desenvolvimento científico e sua aplicabilidade prática e, por último, a ocupacional, baseada na flexibilização e nos novos modos de gerenciamento e organização do trabalho (Gondim, 1998).
Defendendo um ponto de vista semelhante, Fogaça (1998) afirma que
[...] a educação geral e a educação profissional começaram a ser vistas como bastante inter-relacionadas, principalmente, por dois processos: a globalização, definida como uma multiplicidade de mudanças surgidas a partir de 1970, que instituiu novas relações internacionais nos planos econômico, social, cultural, político e tecnológico, e a emergência de um sistema de produção sustentado na automação flexível.
Neste sentido, o ensino fundamental, o ensino técnico de nível médio e o ensino
superior passam a ser colocados em pauta quando o tema é o da reestruturação produtiva e sua
relação com o mercado de trabalho, tornando quase impossível ignorar a confluência entre as
organizações educacionais, as empresas e a comunidade (Dowbor, 1996).
Constata-se com facilidade que as transformações na produção estão levando as
organizações formais a se reestruturarem o que, inevitavelmente, repercute no delineamento
de um perfil profissional mais compatível com a nova realidade. O desenvolvimento científico
e tecnológico, suporte fundamental da globalização, aumenta a complexidade do mundo e
passa a exigir um profissional com competência para lidar com um número expressivo de
fatores. O perfil profissional desejável está alicerçado em três grandes grupos de habilidades:
118
1) as cognitivas, comumente obtidas no processo de educação formal (raciocínio
lógico e abstrato, resolução de problemas, criatividade, capacidade de compreensão,
julgamento crítico e conhecimento geral);
2) as técnicas especializadas (informática, língua estrangeira, operação de
equipamentos e processos de trabalho);
3) as comportamentais e atitudinais: cooperação, iniciativa, empreendedorismo (como
traço psicológico e como a habilidade pessoal de gerar rendas alternativas que não as
oferecidas pelo mercado formal de trabalho), motivação, responsabilidade, participação,
disciplina, ética e a atitude permanente de aprender a aprender12.
As barreiras para a composição deste perfil é que dão significativa importância aos problemas da qualificação e requalificação profissional, haja vista que a competitividade no mercado local, regional e mundial passou a depender cada vez mais da capacidade de a empresa produzir e incorporar inovações, o que põe em jogo a formação de seus recursos humanos (Carvalho, 2000)13.
As recentes mudanças provocadas pela globalização dos mercados fazem com que
inconscientemente se corra atrás do tempo, na busca de informações e metodologias úteis para
nos sentirmos mais seguros profissionalmente.
“Fazer” faculdade, “pegar” o diploma, “arrumar” um bom emprego, trabalhar por
algumas décadas, aposentar-se e “curtir” a vida. Esse era o percurso de um trabalhador
qualificado há menos meio século. Muitas coisas mudaram e continuam em vertiginosa
revolução.
O diploma do curso superior já foi garantia de emprego, até meados da década de 70;
hoje não é mais.
12 Vide: Assis (1994), Giglio (2000), Silva Filho (1994) e Whitaker (1997). 13 Vide, também: Bruno (1996), Cattani (1996), Hirata, (1994), Fogaça & Salm (1995); Saviani (1994).
119
Diplomas não mais expressam a real aquisição da capacidade de efetivar conhecimentos na solução de problemas, porque o processo de avaliação dos candidatos a um emprego é cada vez mais determinado pela capacidade de resolução de problemas simulados do que pela apresentação de um currículo vitae pontuado de títulos formalmente adquiridos (Lazzareschi, 2007, p. 81).
Continuando, a autora acrescenta que “não basta qualificação profissional, o que
interessa é a competência, pois há a substituição do conceito de qualificação profissional pelo
conceito de competência”.
Em conformidade com essa afirmação, podemos citar o resultado da pesquisa
empreendida por Carlos Martins, na década de oitenta, acerca do ensino superior pago.
Usando como metáfora o dia da entrega do diploma, o autor dizia:
[...] este clima festivo ocorrido por ocasião da entrega do certificado de conclusão do curso não consegue eliminar as dificuldades de promoção que estes formandos enfrentam, uma vez terminada a sua fase de formação profissional (Martins, 1981, p.190-191).
A função central da educação profissional, segundo a LDB 9394/96, é preparar as
pessoas para o exercício da cidadania e para o trabalho, em condições de influenciá-lo e
modificá-lo, de modo a desenvolver um trabalho profissional competente.
A competência tem sido usada como parâmetro para as empresas definirem e
avaliarem a capacidade de seus funcionários na obtenção dos resultados. Isso significa
estimular o envolvimento e o desenvolvimento das pessoas na organização. Está relacionada
com a transformação de dados em informações, e estas, uma vez aplicadas na obtenção de
resultados, leva a adquirir conhecimento. Pode-se então afirmar: conhecimento = informação
+ prática.
Observa-se que pessoas com os mesmos conhecimentos produzem resultados
diferentes. Aqui entra uma outra variável importante: a habilidade. A habilidade de adquirir os
dados e de transformá-los em informação. Habilidade de transformar a informação em
120
conhecimento. Assim, podemos afirmar que, para desenvolver determinada competência,
precisamos ter a habilidade específica requerida pela competência.
Seja do ponto de vista educacional, material, e, principalmente, motivacional, estamos
sempre inseridos num processo que irá permitir ou não o desenvolvimento de determinada
habilidade. É bastante visível essa condição nos esportes, principalmente naqueles em que
para o desenvolvimento da habilidade, como, por exemplo, o iatismo ou o automobilismo, são
necessários aportes financeiros e de relacionamento disponíveis apenas para um grupo ínfimo
da sociedade. Ou seja, inúmeras pessoas têm habilidades dentro de si que jamais serão
percebidas ou desenvolvidas.
Neste ponto, acredita-se ser possível concluir, de uma forma bastante clara e aceita
pela maioria dos estudiosos na área de gestão de pessoas, que competência é igual a
conhecimento mais habilidade.
Segundo Reis (2003, p. 12), numa pesquisa realizada pela Gazeta Mercantil, em 04 de
janeiro de 2000, as competências mais procuradas pelas empresas são: influência,
desenvolvimento de pessoas, autoconfiança, habilidade para gerenciar mudanças, liderança de
pessoas e perseverança.
Ao identificar competências e habilidades técnico-operacionais, pessoais e gerenciais
para todos os cargos, em mais ou menos quinze empresas, Resende (2000) concluiu que é
muito importante fazer gestão de competências dos cargos. Chegou a essa conclusão por ver
que, nos processos de seleção, treinamento, remuneração, administração de talentos, carreira,
sucessão e avaliação de desempenho é necessário considerar as competências dos cargos.
A seleção por competências é fundamentada em fatos reais e mensuráveis como as
capacidades, os atributos e as qualidades comportamentais. É preciso analisar suas limitações
nos aspectos que envolvem número de candidatos, tempo para preenchimento da vaga, perfil
do cargo, estrutura da empresa selecionadora e capacidade técnica do avaliador.
121
De acordo com o parecer CNE/CEB nº. 16/99, pode-se dizer que alguém tem
competência profissional quando constitui, articula e mobiliza valores, conhecimentos,
habilidades e atitudes para a resolução de problemas não só rotineiros, mas também inusitados
em seu campo de atuação profissional. Assim, age eficazmente diante do inesperado e do não
habitual, superando a experiência acumulada transformada em hábito e liberando o
profissional para a criatividade e a atuação transformadora.
Como explicita Perrenoud (1999),
[...] não existe uma noção clara e partilhada das competências. Mais do que definir, convém conceituar por diferentes ângulos. Poderíamos dizer que uma competência permite mobilizar conhecimentos a fim de se enfrentar uma determinada situação. Destacamos aqui o termo mobilizar. A competência não é o uso estático de regrinhas aprendidas, mas uma capacidade de lançar mão dos mais variados recursos, de forma criativa e inovadora, no momento e do modo necessário.
A competência abarca, portanto, um conjunto de coisas. Perrenoud refere-se a
esquemas, em um sentido muito próprio. Seguindo a concepção piagetiana, o esquema é uma
estrutura invariante de uma operação ou de uma ação. Não está, entretanto, condenado à
repetição idêntica, mas pode sofrer acomodações, dependendo da circunstância. A título de
exemplo, quando uma pessoa começa a aprender a dirigir, parece-lhe quase impossível
controlar tudo ao mesmo tempo: o acelerador, a direção, o câmbio e a embreagem, o carro da
frente, a guia, os espelhos. Depois de algum tempo, tudo isso lhe sai tão naturalmente que
ainda é capaz de falar com o passageiro ao lado, tomar conta do filho no banco traseiro e,
infringindo as regras de trânsito, comer um sanduíche. Adquiriu esquemas que lhe
permitiram, de certo modo, “automatizar” suas atividades.
Por outro lado, as situações que se lhe apresentam no trânsito nunca são iguais. A cada
momento terá de enfrentar ocasiões novas e algumas delas podem ser complexas. Atuar
adequadamente em algumas delas pode ser a diferença entre morrer ou continuar vivo. A
122
competência implica mobilização dos conhecimentos e esquemas que se possuem, com o fito
de desenvolver respostas inéditas, criativas, eficazes para problemas novos.
Diz Perrenoud que “uma competência orquestra um conjunto de esquemas. Envolve
diversos esquemas de percepção, pensamento, avaliação e ação” (ibidem).
O conceito de habilidade é também instável e varia consideravelmente de autor para
autor. Em geral, habilidades são consideradas como algo mais específico do que
competências. Assim, uma competência estaria constituída por diversas habilidades; porém
certa habilidade não pertenceria a determinada competência, uma vez que pode compor
competências diferentes.
Uma pessoa, por exemplo, que tenha uma boa expressão verbal (considerando que isso
seja uma habilidade) pode se utilizar dela para ser um bom professor, um radialista, um
advogado, ou mesmo um demagogo. Em cada caso, a mesma habilidade estará contribuindo
para competências diferentes.
As condições de produtividade nas empresas mudaram muito no último meio século.
Estão esgotados os recursos da racionalização extrema das rotinas e das virtudes de uma
produção de massa planificada.
O que se requer agora, dados os novos meios, é a disposição para inventar
permanentemente, explorando outras virtudes, as da instabilidade e dos eventos. A invenção
já não se confina nas salas de pesquisa e desenvolvimento – irriga toda a organização, a
empresa inteira. No modelo do posto de trabalho ainda dominante há uma precedência do
trabalho sobre quem o exerce. No modelo da competência, o trabalho segue o sujeito, toma-se
a expressão direta da potência de seu pensamento e de sua atuação. A distância subjetiva entre
o trabalhador e as tarefas que lhe são impostas, típica do taylorismo, é eliminada por esse
modelo, que faculta ao indivíduo “implicar-se subjetivamente em seu trabalho” (Zarifian,
p.116).
123
Nessa direção, o modelo da competência emerge trazendo o trabalho de volta ao
sujeito, tornando-se, assim, a expressão direta da potência de seu pensamento e atuação. Não
basta aprender a fazer, adquirindo todos os automatismos inerentes a um dado exercício
profissional. Quem aprendeu a fazer, deve saber por que está fazendo dessa maneira, e não de
outra, e aprender que existem outras tantas formas para esse mesmo fazer.
O modelo das competências, no âmbito das instituições que atuam no campo da
educação profissional, favorece uma articulação do mundo do trabalho com as diversas
questões presentes na sociedade.
O desafio é educar o trabalhador para atuar de modo participativo e ativo dentro e fora
do mundo do trabalho, como profissional, e, também, na condição de cidadão consciente de
seus direitos e responsabilidades e dos valores humanos que devem reger a vida em
sociedade.
Pensar que, após o término da faculdade, se está “livre” do estudo é simplesmente
decretar a morte da carreira profissional. Hoje é necessário estudar sempre, sempre se
atualizar. Esta é a “era da informação, da velocidade e da orientação para resultados”. Muitas
vezes, fica-se atônito com a rapidez com que as mudanças acontecem. Já não basta ser
especialista numa única área: Engenharia, Administração, Economia, Direito etc. É preciso
conhecer todos os aspectos relacionados com o ramo da empresa onde se trabalha, para que se
saiba aplicar conhecimentos em benefício da empresa ou, noutras palavras, gerar resultados.
Muitos consultores e autores bem-sucedidos de livros de negócios e carreira dizem que
se vive a era dos multi-especialistas. Há de se versar em muitos assuntos: administração,
finanças, informática, idiomas, pessoas (esta talvez seja a aptidão mais importante e mais
difícil), e a única maneira de dominá-los é por meio do estudo e aprendizado contínuos e do
desenvolvimento dos aspectos humanos que fazem com que um profissional possa sobressair-
se. O mercado está muito seletivo, não existe mais lugar para enganadores. De nada adianta
124
ter ótimos conhecimentos sem ser capaz de traduzi-los em resultados para a empresa. Não se
recebe para ficar oito horas na empresa, recebe-se para gerar soluções adequadas.
Existem conhecimentos que são fundamentais, independentemente da área de atuação.
Conhecimentos de informática, saber utilizar o editor de textos, a planilha eletrônica e,
principalmente, os recursos disponibilizados pela Internet. O conhecimento de idiomas
também é necessário, do inglês, principalmente, mas também do espanhol, e a terceira língua
estrangeira pode fazer a diferença.
Habilidade na comunicação seja para escrever, falar ou fazer apresentações orais é
fundamental. Independentemente da função, o profissional deve dominar técnicas de redação,
com bom vocabulário e razoável conhecimento da gramática normativa do português padrão.
Desde a elaboração de relatórios, projetos e memorandos, até a elaboração de “e-mails”, o
domínio das técnicas de redação é um predicado importante, que pode ajudar na busca por
melhores posições dentro da empresa. Além de saber colocar as idéias no papel, é importante
que se saiba apresentá-las para os colegas e superiores.
É fundamental que se saiba trabalhar em equipe, pois somente o trabalho em equipe é
capaz de obter os resultados exigidos atualmente, supondo que todos se integram na busca de
objetivos comuns. Na medida em que se vai ocupando cargos com características mais
gerenciais do que operacionais, a delegação de tarefas torna-se indispensável.
O mercado de trabalho não é mais o mesmo. Num cenário em que há mais candidatos
do que vagas disponíveis, ele foi dominado pelo darwinismo econômico em sua expressão
mais avançada. Competição é o mandamento principal desse processo. O mais ágil engole o
mais lento. Há a concorrência internacional, propiciada pela abertura econômica, as empresas
brasileiras modernizam-se para sobreviver à invasão de produtos asiáticos, americanos,
argentinos. Precisam também competir no mercado internacional. Faz parte desse esforço de
125
sobrevivência exigir mais, muito mais, da mão-de-obra. Querem que até o operário tenha no
mínimo o ensino médio.
A virada é radical e ninguém escapa. Para os cargos mais qualificados, já não bastam
os quinze anos de estudo que dão acesso ao título de bacharel, nem as horas gastas em aulas
de inglês. Além desses conhecimentos, transformados em requisitos triviais, as companhias
querem gente bem informada, que tenha flexibilidade para trabalhar em mais de uma área e
saiba resolver problemas antes mesmo de eles despertarem as atenções do chefe. O perfil
desejado é o do sujeito ambicioso, crítico, criativo, que faz com que todos orbitem a sua volta.
Esse profissional de nariz empinado não deixa que a empresa envelheça. Por essa razão ele é
cobiçado. Para os cargos bem remunerados, as companhias só contratam gente que esteja em
constante evolução.
Desde o último decênio do século passado, pessoas com boa coleção de qualidades
passam com mais facilidade pelo funil da seleção. O profissional que termina a faculdade
deve saber que esse funil de acesso às boas colocações ficou tremendamente estreito. Pode-se
citar, por exemplo, que o Unibanco fez, em 1996, segundo reportagem da revista Veja
(dez/1996), um concurso para escolher trinta estagiários. Candidataram-se 1500 jovens. Na
Brink’s, multinacional que atua na área de segurança, havia dezesseis vagas para recém-
formados. Apresentaram-se 4000 pessoas - 250 por vaga. Isso faz pensar na velocidade da
mudança. Há não muito tempo, o jovem sentia-se ameaçado pelo ritual do exame vestibular,
de que dependia um bom desenvolvimento profissional e uma carreira promissora. Agora é o
departamento de RH (recursos humanos), ou a empresa encarregada de contratar, que o
amedronta.
O velho hábito de procurar a empresa munido do currículo está morto. Há um novo
ritual de contrato na praça. Uma das novas práticas é reunir os candidatos numa sala e
126
promover uma sessão de debates entre eles. Quando ela termina, escolhe-se aquele que foi
mais claro na discussão, mais rápido nas respostas.
Os mais velhos estão sentindo a mudança numa escala crescente. Em vários sentidos,
perceberam que o seu treinamento ficou obsoleto do dia para a noite e que seu trabalho não
serve mais para empresas que se modernizaram muito.
Há 20 anos, exigia-se da secretária prática de datilografia, taquigrafia, bons modos e
obediência. Para a profissional que encerrou a formação nesse passado ameno, a porta dos
bons empregos já está trancada. E uma demissão, neste momento, pode significar um corte
definitivo na carreira.
Comparado ao estágio atual, o passado recente foi mesmo um paraíso. Formar-se em
engenharia significava emprego para toda a vida. Contar muitos anos de trabalho na mesma
função era sinal de estabilidade e experiência, um bom sinal. Hoje isso se vê como
acomodação, um defeito.
Há cerca de 20 anos - época em que começou a abertura da economia - poucas
empresas recusavam um operário só porque ele não tinha o ensino médio completo. Hoje, o
McDonald’s, famosa cadeia de lanchonetes, exige o ensino médio da garotada que contrata.
Até para fritar batata é necessário, pelo menos, 11 anos de escolaridade. A empresa explica o
porquê da exigência.
Uma loja do McDonald’s pode ser vista como uma fábrica de lanches, já que seve até
30.000 refeições por dia, quantidade impensável para a velha lanchonete da esquina. Os
jovens são treinados em todas as tarefas, fritar batatas e hamburguer, operar o caixa e o drive-
through. Têm de fazer os lanches numa velocidade tal que o sanduíche não passe mais de dez
minutos esfriando, e também não podem deixar o cliente esperando no caixa. No McDonald’s
uma operação depende da outra e é preciso entender essa sincronização.
127
A mudança nos padrões de emprego que ocorre no Brasil foi abrupta. Até a posse de
Fernando Collor de Mello, em 1990, a economia era fechada. Os empresários não se
preocupavam com o aumento da produtividade porque não havia concorrência. Não sofriam
pressões para reduzir custos ou implementar novas técnicas de gerência e de produção.
Quando se rompeu a bolha protetora, apareceu toda a ineficiência de suas empresas e os
brasileiros passaram a experimentar modificações que os trabalhadores de outros países -
como os americanos - já vinham sofrendo há muito tempo.
O empresário aprendeu a cortar o excesso de intermediários entre o diretor e o
operário. Essa classe de retransmissores de ordens - os gerentes – foi praticamente decapitada.
Na reviravolta brasileira, o passo seguinte foi a modernização das máquinas. Antes de 1990,
não se podia importar computador ou equipamento que tivesse componentes
computadorizados. Alegava-se que o Brasil produzia essas coisas muito bem. Produzia
algumas, é verdade, mas muito caras. Tudo parecia bem porque até então ninguém se
preocupava em reformar a fábrica. Após dois anos de abertura econômica, as indústrias já
usavam equipamentos computadorizados em larga escala. Em 1996, a automação industrial
dominava 80% das grandes empresas, e metade das companhias de médio porte. Exigindo, no
fim do século, operários mais preparados e integrados com novas tecnologias.
O mecânico à moda antiga, aquele homem que usava força bruta, intuição e prática
para consertar motores em oficinas encardidas, está perdendo terreno para um novo
profissional.
A virada rápida provoca em muita gente sensação de angústia. É difícil entender por
que surgiram tantas exigências para conseguir trabalho. Muitos dos que foram apanhados no
início desse processo perderam o emprego ou foram forçados a aceitar um salário mais baixo
e tendem a enxergá-lo como um movimento cruel. O desemprego é uma das coisas mais
128
dramáticas que pode acontecer na vida de uma pessoa. Ele interfere nas relações familiares,
na auto-estima do demitido e até em sua saúde.
Nenhuma palavra sobre globalização ou megatendências econômicas serve de consolo
para quem é mandado embora da firma. Para quem conservou o emprego ou está à procura de
um, a reviravolta das normas do trabalho deve servir de aviso. O processo veio para ficar e
deve tornar-se mais acelerado nos próximos anos. O grupo dos que oferecem os melhores
empregos é formado pelas 8.500 empresas multinacionais e pela metade das médias e grandes
empresas brasileiras com administração familiar. Por enquanto, foi esse núcleo que elevou o
grau de exigência. Ele emprega 11 milhões de pessoas, que ganham mais de 1.200 reais por
mês, e responde por cerca de 50% do produto interno bruto.
Há outra parcela do território econômico que ainda funciona de acordo com os padrões
do passado. É formada por cerca de 4 milhões de pequenas empresas e microempresas e pela
outra metade de companhias comandadas por famílias. Alojam-se nela 33 milhões de
trabalhadores, que ganham menos de dois salários mínimos. Empresas atrasadas em termos de
tecnologia e mão-de-obra podem ter dois destinos. Ou fecham as portas ou se modernizam. O
que é impossível, de acordo com os economistas, é que a parte velha consiga sobreviver do
lado da parte que se atualiza. “A pequena lanchonete terá de melhorar o seu sanduíche e sua
eficiência se quiser sobreviver na vizinhança de uma rede moderna de fast-food”, alerta o
economista Gilberto Dupas.
O impulso pela modernização jogou luz sobre um problema que não está sendo
discutido a sério no Brasil, a saber, seus padrões educacionais. A educação está melhorando,
se comparada ao que era há algumas décadas. Nunca houve tantos estudantes matriculados em
cursos de ensino médio ou em universidades. O número de analfabetos cai ano a ano:
Em 1980, eles representavam 25% da população. Dez anos depois, a taxa havia caído para 18%. Ocorre que, em contraste com vários outros países, no início deste século, a mão-de-obra brasileira está muito mal posicionada. Apenas 23% dos jovens brasileiros com idade entre 15 e 19 anos estão matriculados no ensino médio.
129
Na Coréia do Sul, eles são 94%. Em Taiwan, o índice é de 91%. O México também está na frente, com 55%. A análise de outros números preocupa ainda mais. O Brasil tem uma população com idade de trabalhar estimada em 71 milhões de pessoa. Dessas massas, apenas 5 milhões têm curso superior. Somente 20 milhões completaram o ensino médio. Sobram 46 milhões de pessoas com educação precária, incapazes de operar eficientemente em economias modernas. Incluem-se nesse contingente cerca de 19 milhões de analfabetos (Nascimento; Ferreira, 1996).
O que fazer com essa gente, em termos de qualificação para o trabalho, é uma questão
para a qual não há solução à vista. Na empresa moderna, que está exigindo do operário o
ensino médio, esses trabalhadores não têm lugar. Os pedagogos dizem que uma pessoa que
não tenha concluído o ensino médio não é capaz de sintetizar informações, de perceber o
conjunto das coisas, de elaborar raciocínios complexos. O ensino médio capacita o cidadão a
separar os fatos importantes dos irrelevantes, a estabelecer relações entre idéias diferentes e
tirar conclusões.
Está apresentado, para a sociedade brasileira, um macroproblema que não era levado
em conta até pouco tempo. O Brasil precisa crescer à taxa de 5% ao ano. Isso não é ambição,
é necessidade. É preciso enriquecer para aumentar a renda da população, melhorar a saúde e
ampliar a expectativa de vida. Para crescer, terá de competir com economias que estão no
mesmo patamar, como a mexicana ou a coreana. Fatores críticos para o crescimento vão
sendo solucionados. Indústrias e empresas de serviço estão adquirindo máquinas num ritmo
nunca visto. Só em 2007, as compras de bens de produção foram da ordem de 12 bilhões de
dólares. A defasagem tecnológica, provocada por anos de fechamento econômico, desfaz-se
rapidamente. Há uma chuva de acordos entre multinacionais e empresas brasileiras para o
aprimoramento técnico dos produtos. Mas nem máquinas nem tecnologia funcionam bem com
braços – na verdade, cérebros – mal preparados. Educação, percebe-se agora, é o grande
gargalo da economia. “A educação passou a ser um fator decisivo para o desenvolvimento.
Qualquer grande empresa analisa em detalhes os indicadores de educação de um local antes
130
de fazer investimento”, diz o economista Cláudio de Moura Castro, especialista em educação
(apud Nascimento; Ferreira, 1996).
Enquanto o governo não se mexe, as empresas instituem programas de treinamento de
funcionários. Em 1991, a Caraíbas Metais promoveu um censo para avaliar o nível de
escolaridade de seus 1.400 funcionários. Descobriu que 30% não estavam qualificados para as
funções que exerciam. Esses trabalhadores assistem agora a aulas de ensino fundamental e
médio. Recebem instruções até nos ônibus da empresa, em telas de vídeo. A Mercedes-Benz
tem uma escola com 1.100 alunos, a Fiat montou um curso de pós-graduação em engenharia
automotiva.
Problemas com qualificação de mão-de-obra e nível de emprego não se restringem ao
Brasil. A revolução tecnológica que transformou a economia mundial nas duas últimas
décadas criou um problema para trabalhadores e empregadores. No ano passado, a empresa
telefônica de Nova York submeteu 23.000 jovens a um exame simples para trabalhos de nível
inicial. Foram reprovados 84% dos candidatos. De acordo com dados recentes do Ministério
da Educação americano, mais de dois terços dos alunos de 1º grau não são leitores hábeis e
apenas 9% dos estudantes do último ano do ensino secundário conseguem resolver problemas
de matemática não-elementares.
Até no Japão já faltam trabalhadores qualificados. Uma agência de planejamento do
governo japonês estimou que no ano 2000 haveria escassez de cerca de 3 milhões de técnicos
e de 600.000 trabalhadores em escritórios. Isso tudo não significa que, de uma hora para
outra, os estudantes pararam de aprender. O que acontece é que continuam aprendendo mais
ou menos a mesma coisa. Constatação geral: a educação não acompanhou a corrida
tecnológica. “As escolas boas estão com dez anos de atraso”, diz Alain Stempfer, diretor do
curso de administração da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo.
131
Outra questão que entrou para a agenda mundial refere-se ao desemprego. Os números
citados pelos estudiosos são preocupantes. Há 34 milhões de desempregados nos países
industrializados, vítimas da modernização tecnológica dos meios de produção. No Brasil, o
problema do desemprego tem características diferentes. Enquanto na Europa a taxa de
desempregados sobe, no Brasil ela está na faixa moderada. Mas os empregos no Brasil são
muito piores, pessimamente remunerados. É pouco provável que, em longo prazo, haja um
problema sério de desemprego no Brasil, porque o país cresceu pouco nos anos 1980 e sua
infra-estrutura toda desmantelada vai exigir o recrutamento de milhões de trabalhadores se o
país continuar crescendo como de dois ou três anos para cá. O problema é que, no ritmo em
que a economia tende a se modernizar, os empregos bons só serão acessíveis aos que
estiverem bem preparados. Para os outros ficarão os empregos de terceira classe, com renda
de quarta. Do ponto de vista do país, há um impasse. Crescer significa modernizar a produção,
mas sem melhorar a educação do povo, isso é impossível. Chegou a hora de enfrentar o
desafio. Fala-se muito em investimentos na educação, de dinheiro como de idéias. A hora de
falar já passou. Está na hora de fazer.
Conclui-se que acabou a época do profissional dedicado a uma atividade específica.
As empresas preferem pessoas multifuncionais. O engenheiro precisa ter conhecimento de
marketing e o advogado deve entender alguma coisa de finanças.
Os melhores empregos vão para aqueles que têm pós-graduação e viveram algum
tempo no exterior. Jantares com amigos de outras empresas, conversas no clube e até reuniões
para o futebol e o carteado são uma oportunidade para saber o que os outros já estão sabendo.
Ler jornais, ter informações gerais, é algo muito valorizado hoje em dia. É bom saber às
quantas andam a economia européia, as mudanças na China e as guerras tribais na África.
No ritmo em que andam as coisas, é fácil ficar desatualizado. Não dá para deixar mais
a universidade. Há necessidade de ser estudante permanente. O profissional mudo, que não dá
132
palpite, não faz perguntas ou críticas, é candidato ao bilhete vermelho. A curiosidade a
respeito de outros departamentos da empresa é essencial. Mudar de área dentro da mesma
empresa é recomendável. Experiência vale mais do que tempo de serviço.
Se for a empresa que está defasada, é bom procurar emprego logo numa mais
moderna. Cada ano trabalhado numa companhia ultrapassada é um ônus a mais no currículo.
A atitude perante o trabalho é mais importante que o diploma. Empresas modernas
gostam até de um pouco de arrogância no funcionário. Pode ser um sinal de que está em
condições de liderar. Deve-se cuidar, inclusive, da aparência pessoal. Resta-nos, então,
estabelecer o perfil deste novo trabalhador exigido pelo mundo do trabalho.
3.1 Perfil do profissional no atual mercado de trabalho
No mundo globalizado do século XXI, o trabalhador não pode mais ter uma só
profissão. Segundo Jordão (2007), é primordial ter uma profissão e também outra, pois em
cinco ou dez anos, para fechar um negócio fora do país, não será suficiente o diploma de
administração de empresas. Além da habilidade em outros idiomas, o administrador precisará
de familiaridade com a cultura e a história do povo com que negocia para alcançar bons
resultados na negociação, ou seja, precisará aliar conhecimento antropológico aos
conhecimentos administrativos.
O que se pode perceber é que, além do disputado diploma universitário, o
administrador necessita ter perfil para administrar. Caso contrário, ficará sujeito a funções
subalternas e alternativas dentro das organizações, mesmo portando o diploma. O
administrador não é mais o profissional formado nas salas de aula, com as melhores notas
entre os colegas. O recém-formado precisa apresentar de fato uma “personalidade
administrativa”, um perfil de administrador.
133
Segundo o Conselho Federal de Administração (CFA), em 2007, a maioria dos
administradores é do sexo masculino, casado e sem dependentes; está na faixa etária de até 30
anos; é egresso de universidades particulares; concluiu o curso de Administração entre 2000 e
2005; possui especialização em alguma área de Administração; trabalha nos setores de
serviços, da indústria e em órgãos públicos; atua nas áreas de Administração geral e finanças;
ocupa cargos de gerência.
O perfil adequado para o administrador nos próximos anos exige deste uma razoável
capacidade de comunicação e uma dose de liderança, essencial para quem quer assumir o
comando.
Um administrador precisará equilibrar criatividade com a perspicácia para encontrar
soluções apropriadas à empresa sob sua administração. É imprescindível ter visão globalizada
para entender que a empresa se situa em um conjunto de outros players, ou seja, é parte de um
meio caracterizado por mudanças contínuas, pela competitividade e vulnerabilidade às forças
externas. É essencial construir credibilidade, adquirir poder de persuasão e convencimento
para driblar as objeções e adversidades, como também ter habilidade para relacionar-se com
pessoas.
O administrador moderno necessita de rapidez para adaptar-se às mudanças e reagir
positivamente a elas. É importante que tenha senso de responsabilidade social, ou seja, deve
ter consciência de que todos os atos da empresa administrada por ele gerarão algum tipo de
impacto positivo ou negativo à sociedade. Além da visão tradicional de lucros, é necessário
investir em ações que promovam maior qualidade de vida para a sociedade envolvente,
práticas inteligentes de destinação de dejetos das indústrias, ações sociais que visem a algum
benefício para a saúde, a segurança, a cultura e o lazer da comunidade e também de seus
funcionários. Muitas dessas ações podem e devem ser geradas pelas empresas privadas. Nos
últimos anos, os consumidores têm valorizado empresas que adotaram tais posturas,
134
comprando seus produtos e serviços em detrimento de produtos e serviços de outras que não
adotaram políticas sociais responsáveis.
O administrador precisa estar atento às oportunidades de mercado e manter-se alerta
aos acontecimentos a sua volta. Alguns mercados prometem oportunidades de curto prazo
para os administradores, como o mercado do entretenimento, a gestão do bem estar, o
agronegócio, a gestão ambiental, a tecnologia da informação, as consultorias e o trabalho
autônomo em sistema flexível (flex time).
Nos últimos anos, houve aumento na busca pelo entretenimento e a diversão passou a
ser considerada um filão extraordinário para os negócios. O mercado vem se
profissionalizando e os consumidores buscam produtos de qualidade. Cresce a procura pelos
serviços em turismo e cultura. Em 2006, o turismo setor gerou 604 milhões de empregos
formais e informais. Ainda há espaço para negócios que explorem oportunidades voltadas à
terceira idade, conhecida como “melhor idade”.
Ainda no ramo do entretenimento, como oportunidades de atuação para os
administradores com perfil empreendedor, desponta a área de design de games e animação.
Somente 35 empresas atuam no setor e há espaço para investidores na área de jogos para
celular. A área de eventos também representa oportunidades para administradores.
Outro mercado que surge como um celeiro de oportunidades, nos próximos anos, é o
setor de qualidade de vida ou o denominado mercado do bem estar. Segundo dados do
International Stress Management Association (ISMA), 70% da população brasileira é
acometida pelo stress. Os consumidores têm apreciado a qualidade de vida, a saúde física e a
saúde mental. O setor abarca perfumaria, cosméticos, higiene pessoal e serviços voltados para
o bem estar, a vaidade. Cresce a procura pelos spas e clínicas de estética e medicina
preventiva.
135
A área de logística crescerá substancialmente em virtude do agronegócio. O setor
continua representando oportunidades de especialização e atuação para os administradores do
futuro, pois o Brasil é um país diferenciado em condições de geração e sustentabilidade de
energia. Possui hidrelétricas e investimento em agroenergia, considerando combustíveis
alternativos como o biodiesel e o etanol. Nos próximos anos, serão necessários profissionais
de logística para o planejamento do escoamento e transporte dos produtos do agronegócio.
Com a sensibilização ecológica e o espírito de conservação da vida, cresce a demanda
por profissionais voltados ao meio ambiente. Administradores ambientais, administradores
rurais e profissionais da administração com ênfase em comércio exterior e/ou com
especialização ambiental já são procurados para viabilização de projetos voltados à
exportação de móveis de madeira certificada para países desenvolvidos, produção de artigos
dentro de especificações e exigências sócio-ambientais. Profissionais responsáveis pela gestão
sustentável e planejamentos desenvolvimentistas e de sustentabilidade de empresas e regiões,
articulação de acordos comerciais, viabilização de negócios globalizados envolvendo
diversidade de culturas serão cada vez mais valorizados.
Utilizando-se da contribuição de Tachizawa (2005), a responsabilidade social vem
assumindo um posicionamento privilegiado por parte das empresas, bem como tem sido
considerada um referencial de excelência para as organizações contemporâneas. O
administrador moderno necessita desenvolver uma leitura das modificações que ocorrem nas
organizações contemporâneas e nos padrões de consumo, tanto de produtos como de serviços.
Na visão do autor, a nova realidade político-econômica vem transformando as
empresas contemporâneas em sistemas abertos, exigindo dos administradores mais
flexibilidade para implementar seus processos e uma boa interação com o mercado de
trabalho e o mercado consumidor. As ações dos administradores do futuro serão direcionadas
pelas ações do mercado consumidor. O preço e a qualidade dos serviços abrirão espaço para o
136
comportamento social das empresas fabricantes desses produtos e/ou serviços. Os
administradores serão exigidos a adotar um posicionamento ético e responsável em termos
sociais e ambientais no relacionamento com consumidores, comunidades nacional e
internacional.
A tecnologia da informação e da comunicação é uma área que envolve todas as demais
possibilidades de trabalho no mundo moderno. Os administradores do futuro terão espaço em
empresas de desenvolvimento tecnológico, produção de softwares, hardwares e soluções
empresariais. Todos estes empreendimentos necessitarão de estratégias aplicadas às empresas
e produção de metodologias de serviços, capacitação e consultoria para o crescimento
sustentável dos negócios.
Pode-se afirmar que o trabalho com carteira assinada está chegando ao fim. Cada vez
mais, os profissionais de outras áreas e, sobretudo da administração, precisarão trabalhar de
forma autônoma e flexibilizada em termos de horário. Cada administrador passará a agir
como um vendedor de conhecimento aplicado às necessidades das organizações modernas que
esperam resultados. Nesse sentido, o caminho da consultoria é uma realidade. O profissional
consultor é aquele que apóia as empresas desenvolvendo com elas relacionamentos
duradouros para conduzi-las ao caminho da mudança, melhoria contínua através da
proposição e implementação de metodologias aplicadas à realidade e necessidade dos
negócios.
Vale ressaltar que todas as atividades descritas até aqui se aplicam ao perfil do
administrador. Todas exigem capacidade de planejamento, organização, promoção e
divulgação de produtos e serviços, políticas de qualidade, relacionamento e posicionamento
estratégico.
É importante o entendimento de que o administrador nunca é um profissional acabado.
Deve-se ter a consciência de que investir na educação continuada é condição essencial para
137
manter-se atualizado e apto a ocupar cargos de decisão nas empresas modernas. A
administração de empresas é cada vez mais dinâmica e essa característica exige
aperfeiçoamento contínuo dos administradores.
Outro atributo importante para o administrador moderno é a ambição, mas não se deve
confundir atitude ambiciosa com ganância. A grande diferença entre as duas é que a atitude
ambiciosa impulsiona a empresa positivamente. Os ambiciosos são inquietos por natureza e
estão sempre buscando mais. A ambição empreendedora é salutar quando conduz o
administrador à investigação e ao estudo de novas possibilidades e estratégias apropriadas a
cada caso. É importante o líder trabalhar com ambição e compartilhar dessa postura com a sua
equipe. Já o administrador ganancioso é aquele que transcende os limites da ambição positiva
e pode anular o sucesso dos outros, em causa própria, o que é perigoso e antiético.
O administrador moderno precisa ser um articulador. É essencial desenvolver a
habilidade de comunicar-se com clientes e concorrentes, interagir de alguma forma com a
sociedade, com o governo e demais atores envolvidos. Para tanto, é necessária uma postura de
flexibilidade e negociação.
Acredita-se que o administrador é um candidato natural a empreendedor. Porém,
independentemente da abertura de empresa própria, um dos pontos mais valorizados no
profissional administrador é o senso do empreendedorismo corporativo, uma visão mais
ampla e inteligente em termos da sustentabilidade do cargo ou da profissão. Administrar uma
empresa, segundo Idelberto Chiavenato (1993), envolve mais do que conceitos abstratos,
como boa vontade ou esforço pessoal. Envolve o concreto, a produção de resultados.
Desta forma, entendemos que os cursos superiores estão no epicentro desse debate,
pois, se, antes de 1990, o conhecimento que se adquiria em uma faculdade era combustível
suficiente para os próximos 20 anos de trabalho, hoje, o curso de graduação tem de ser visto
138
como apenas um iniciador da caminhada. Quem termina a graduação, precisa ter em mente
qual o próximo curso a ser feito, sob pena de se desatualizar.
Não é por outra razão que crescem pelo país os cursos de MBA (Master in Business
Administration). Sua característica é a agilidade; podem ser criados e modificados com mais
rapidez que os cursos universitários, para, assim, acompanhar as mudanças do mercado de
trabalho. Segundo Ricardo Spinelli, diretor da FGV Management, “o que está acontecendo é
que hoje é preciso voltar a estudar a cada dois ou três anos para estar em sintonia com o
mercado, e os cursos de lato sensu, no caso os MBA, têm mais flexibilidade que as
universidades” (apud folheto promocional do MBA/FGV).
A universidade, que papel cumpre? “Ela precisa ser encarada como um lugar para se
aprender metodologia e pesquisa” (ibidem), mas no atual contexto as escolas privadas, que
são as que mais crescem, vêem a educação como grande negócio, a ponto de terem aberto seu
capital nas bolsas de valores.
Concluímos, portanto, a partir do que vimos desenvolvendo até aqui, pesquisando o
mercado de trabalho, conhecendo as competências e habilidades exigidas do profissional,
principalmente dos Administradores de Empresa, alvo de nossa pesquisa, e, ainda, por meio
de algumas reflexões, estruturadas em categorias de análises, que grande parte das
universidades de massa não atende às demandas feitas pelo mundo do trabalho. Estudamos os
dados obtidos nas entrevistas e pudemos comprovar a hipótese sugerida no início deste
trabalho, a saber, que realmente as chamadas “universidades mercantis de massa” não têm
preparando adequadamente os alunos para o exercício da profissão.
Nosso propósito é alertar o professorado e os futuros discentes em Administração para
o quadro de total descalabro que representa a defasagem entre os cursos oferecidos por grande
parte das universidades mercantis de massa e as reais demandas do mundo da produção. A
139
relevância de nossa discussão está em propiciar às futuras gerações elementos para que
possam com enfrentar com maior eficácia os desafios impostos por tal defasagem.
140
4 APRESENTAÇÃO DAS UNIVERSIDADES PESQUISADAS
4.1 Plano de curso
4.1.1 Curso de Administração de Empresas da PUC/SP
O curso de Administração de Empresas da PUC/SP é oferecido nos campi Monte
Alegre, Barueri e Santana.
O curso teve início em 1971, sendo que a primeira reforma curricular ocorreu em
1975, com a adoção do ciclo básico. Em 1981, a fim de adaptar o curso às demandas
emergentes da realidade econômica e social, pós crescimento econômico e déficit social, foi
implantado um novo currículo.
A matriz curricular resultante dessa reforma completou a formação básica exigida pelo
currículo mínimo do CFE (Conselho Federal de Educação) com disciplinas de marketing,
finanças, organização, recursos humanos e produção, ficando essas áreas delineadas e
diferenciadas como campo de ensino e pesquisa. O curso, então, encerrava-se em 8 semestres,
com aulas aos sábados.
Por volta de 1985, o mercado mais competitivo e o surgimento de novas tecnologias
aliadas às mudanças políticas no país impuseram um novo desafio ao bacharel em
Administração. A PUC/SP respondeu, no final da década, com a formação de um grupo de
estudos para reavaliar e propor mudanças curriculares. O que resultou foi a configuração atual
do curso, implementado em 1990, para fornecer ao administrador conhecimento amplo de seu
meio, mas também conhecimento especializado nas áreas que compõem o imenso espectro de
estudo e pesquisa da administração.
141
A principal inovação do período foi a criação do quinto ano composto apenas por
disciplinas optativas das cinco áreas funcionais. O curso passou a ter 10 semestres, sem aulas
aos sábados, e foi eliminada a estrutura do ciclo básico, tendo sido mantida apenas a
disciplina de Teologia, comum a todos os cursos de graduação da PUC/SP. A última reforma
concretizou-se em 2007, realizada por uma comissão composta em fins de 2005.
Atualmente, o curso de Administração de Empresas funciona com 2 matrizes
curriculares paralelas. Uma, com 5 anos de duração, objeto de averiguação desta tese; outra,
implantada em 2007, com duração de 4 anos para o período matutino e 4 anos e meio para o
período noturno.
As alterações curriculares de 2007, embora apresentem dados interessantes, como, por
exemplo, a denominação das áreas até então chamadas “profissionais” como
“epistemológicas”, não são objeto específico deste trabalho, uma vez que nossa proposta é
captar a inserção do aluno de administração no mercado de trabalho, melhor observada se se
investigar a vida profissional de alunos egressos há pelo menos 2 anos. Portanto, o projeto
pedagógico em questão não é o atual, mas o anterior. Este currículo se encerrará no 2º
semestre de 2010, no campus Monte Alegre, e no 1º semestre de 2011, no campus Santana. É
importante ressaltar, pois isso será objeto de investigação, que as 10 matérias optativas
oferecidas na antiga base curricular continuam a ser oferecidas, até o final de 2010, no
campus Monte Alegre e, até 2011, em Santana.
O principal objetivo do curso é desenvolver a capacitação crítica, fundamentada em
bases teóricas e práticas, amparada por ações didáticas e pedagógicas de vanguarda,
essenciais ao ensino e à pesquisa, adequadas à realidade brasileira e dentro dos princípios
humanísticos que norteiam as práticas administrativas.
O curso está voltado permanentemente à geração de conhecimento e aprendizado, de
forma a ser reconhecido como um espaço dinâmico de criatividade e inovação.
142
A formação dos alunos permite que dominem as várias áreas da administração de
negócios, abrangendo o universo da administração em organizações de todos os portes e
natureza.
O curso está sustentado sobre três pilares: conhecimentos humanísticos, de
fundamentação e técnicos. Com eles, o administrador formado pela PUC/SP tem uma
formação cidadã e de profundo conhecimento da realidade social, aliados ao forte conteúdo de
fundamentação para dar suporte às técnicas específicas da administração. Isto se traduziu num
curso com cinco anos de duração, sendo que nos quatro primeiros anos o aluno tem uma
formação ampla e abrangente. No último, ele vai escolher, dentre as disciplinas optativas,
aquelas que mais lhe interessam nas áreas de marketing, recursos humanos, finanças,
produção e gestão.
4.1.1.1 O profissional formado na PUC/SP
Segundo o catálogo do curso de Administração de Empresas da PUC/SP, no quesito
perfil adequado para o administrador, a PUC/SP pretende formar profissionais dotados de
visão estratégica, com sólida formação básica em todas as áreas, capazes de identificar e
definir problemas e desenhar soluções de forma sistêmica. Esse profissional deve ter
capacidade empreendedora e inovadora, abertura a mudanças, e dever ser dotado de iniciativa
e capacidade de liderança, pois dele partirão decisões que influenciarão o ambiente onde atua.
Precisa ter gosto por aprender continuamente.
Deve dispor de raciocínio abstrato, sociabilidade, capacidade de expressão e
comunicação, aptidão analítica e numérica, comportamento equilibrado e desembaraçado,
além de elevado senso ético.
143
Sua visão técnico-científica e empresarial deve estar aliada à postura de um cidadão
que, com responsabilidade social, busca preservar os valores éticos baseados na concepção
cristã e humanística. Deve ser capaz de mobilizar conhecimentos no ambiente e promover
uma ação reflexiva e atualizada.
Com conhecimento amplo nas diversas áreas do campo administrativo, deve, no
entanto, concentrar-se em uma área específica de acordo com sua vocação e seu interesse.
Esse pressuposto fundamenta-se na necessidade do profissional também dispor de sólidos
conhecimentos em uma área específica do conhecimento administrativo para ter acesso ao
mercado de trabalho, uma vez que a forma de ingresso predominante dos administradores se
processa através de funções especializadas da organização. Deve-se ressaltar que, ao ser
reforçada a formação especializada do administrador, não se pretende que o Curso de
Administração perca sua identidade enquanto curso de formação generalista superior,
buscando-se o desenvolvimento de competências de longo prazo, construídas sobre uma
educação geral, que qualifiquem os egressos para uma profissão e não apenas para um cargo.
De acordo com o projeto pedagógico e o plano de curso, a PUC/SP forma
profissionais em Administração:
a) capazes de dominar os fundamentos da administração, adaptando-se rapidamente à
dinâmica do mercado;
b) capazes de compreender as questões científicas, técnicas, sociais e econômicas que
constituem o ambiente das organizações;
c) capazes de vislumbrar, com espírito empreendedor, novas oportunidades ou
negócios ainda não explorados, podendo, inclusive, direcionar essa qualidade para
a criação de empreendimentos próprios;
d) capazes de se adaptar às diversas estruturas e culturas organizacionais e de se
desenvolverem no espaço ocupacional desde o nível operacional até o estratégico;
144
e) orientados para a vocação ética e humanística, de respeito à sociedade e à
comunidade, tendo consciência da complexidade e amplitude global da sociedade
para avaliar os impactos de suas ações ao longo do tempo.
4.1.1.2 Organização curricular do curso de Administração de Empresas
O projeto pedagógico do curso da PUC/SP representa o modo como são articulados
conhecimentos e conteúdos nas disciplinas, articulação feita de forma a manter o curso
atualizado e, ao mesmo tempo, flexível. Adequações periódicas na estrutura curricular
adaptam o programa às solicitações do mercado de trabalho.
O curso está estruturado em função de cinco áreas profissionalizantes: administração
geral, administração de recursos humanos, administração financeira, administração da
produção e operações, administração de marketing; e desenvolve-se segundo três grandes
eixos:
1 – A visão humanística, importante para a formação do administrador, que terá nas
organizações a fonte de formação e desenvolvimento de riquezas, para a construção de uma
sociedade moderna e mais eqüitativa; essa formação é garantida pelas disciplinas de
sociologia, psicologia, filosofia e ética, ofertadas nos primeiros semestres dos cursos;
2 – A visão generalista, para o conhecimento amplo de todas as áreas que compõem o
universo do administrador, nas organizações lucrativas ou não, facilitando o engajamento de
pessoas no conjunto formado pelas organizações, o mercado e a comunidade. Esse eixo é
representado, ainda no primeiro e segundo semestres, pela disciplina de TGA (Teoria Geral da
Administração), complementada com teoria econômica e matemática, do terceiro até o sexto
semestre;
145
3 – A visão especialista, que é a capacidade de se aprofundar em áreas específicas por
meio do estudo e da pesquisa, e de integrá-las no todo que representa o universo da
administração, terá início no quinto semestre e se constituirá no plano central do curso,
permitindo ao aluno aprofundar conhecimentos nas áreas funcionais da administração: geral,
finanças, marketing, recursos humanos e produção.
Disciplinas optativas
Durante os primeiros oito semestres, o aluno deverá cumprir todas as disciplinas
obrigatórias das áreas profissionalizantes e, a partir do nono semestre, optar por uma das
cinco áreas, que deverá ser compatível a suas ambições, habilidades e perfis pessoais.
O aluno deverá escolher 10 disciplinas optativas para cursar no 5º e último ano, sendo
obrigatório cumprimento de pelo menos uma disciplina de cada área funcional (adm. geral,
financeira, marketing, RH e Produção de materiais). A escolha das cinco disciplinas restantes
fica a critério do aluno, de acordo com sua opção de especialização.
Estágio obrigatório
O estágio supervisionado é obrigatório e tem a sua realização orientada por uma
disciplina específica. O curso mantém convênios com empresas para acolher os estágios
profissionais do alunado. No 1º e 2º anos, o aluno também pode se candidatar ao trabalho na
PUC-Júnior da FEA. A empresa júnior conta, inclusive, com uma área de recursos humanos
que tem o objetivo de viabilizar estágios por meio de contatos com diversas empresas.
A disciplina Orientação de Estágio é subdividida em Orientação de estágio I, no 9º
semestre; e orientação de estágio II/TCC, no 10º semestre, totalizando 360 horas.
146
Ambas as disciplinas tem orientação de um professor da área de concentração na qual
o aluno realize o trabalho de aplicação (estágio supervisionado e TCC). Não há
obrigatoriedade de que o estágio e o TCC vinculem-se a mesma área.
PUC-Júnior
Através da Empresa Júnior, o estudante pode colocar em prática não só os
ensinamentos obtidos na universidade, como também treinar, concomitantemente à formação
acadêmica, habilidades fundamentais para o seu sucesso profissional, como trabalho em
equipe, disciplina profissional, liderança, comunicação interpessoal e negociação. Ao mesmo
tempo em que aproxima os estudantes da realidade do mundo corporativo, essa iniciativa
propicia a capacitação profissional mais sólida.
Uma empresa júnior é um tipo de organização que funciona como uma associação
civil, sem fins lucrativos, constituída por alunos de graduação de instituições de ensino
superior. Presta serviços e desenvolve projetos para empresas, entidades e sociedade em geral.
Por outro lado, a empresa júnior atua como uma empresa real, com personalidade jurídica
própria, diretoria executiva, conselho administrativo, estatuto social e regimentos próprios,
além de gestão autônoma em relação à instituição que a suporta, centros acadêmicos ou
qualquer outra entidade acadêmica. A empresa júnior obriga-se, com isso, a competir no
mercado por projetos e serviços para que possa exercer suas atividades e proporcionar a seus
integrantes as oportunidades necessárias para alcançar os seus objetivos empresariais.
Para que tudo isso funcione, são necessários a supervisão e o suporte de professores e
profissionais especializados. De fato, tanto os estudantes quanto os profissionais de recursos
humanos, e até mesmo as empresas, só têm a ganhar com essa troca de experiências. Do ponto
de vista dos estudantes, além da experiência prática adquirida, o contato com profissionais
gabaritados ajuda na conquista de melhor capacitação profissional.
147
A PUC Júnior Consultoria – integrada e administrada por alunos da FEA PUC/SP
(Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Ciências Atuarias da Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo) – visa a proporcionar ao estudante a aplicação prática de
conhecimentos teóricos, relativos à área de formação profissional específica.
Quanto ao interesse desta pesquisa (a capacitação dos alunos para uma inserção feliz
no mercado de trabalho), o desempenho da empresa júnior é francamente positivo: intensifica
o relacionamento empresa/escola, valorizando a instituição de ensino como um todo, e facilita
o ingresso de futuros profissionais no mercado de trabalho, colocando-os em contato direto
com o seu métier. As consultorias são realizadas mediante orientação e treinamento de
profissionais e professores da PUC/SP, com experiência e especialização nas áreas de: gestão
empresarial (planejamento financeiro, fluxo de caixa, linhas de crédito, controle de estoque,
formação de preços e custos, arquitetura organizacional); desenvolvimento social (captação de
recursos); marketing (plano de marketing, pesquisa de mercado, pesquisa de mercado
quantitativa, pesquisa de mercado qualitativa); recursos humanos (recrutamento e seleção,
clima organizacional).
TCC – PUC/SP
É uma atividade obrigatória a todos os alunos do curso, enquadrada na disciplina
Orientação de estágio II/TCC, oferecida no 10º semestre. O TCC não se configura como um
trabalho monográfico, mais se assemelha a um relatório de estágio, mas pode-se pautar em
pesquisa empírica. Voltado para a investigação, o TCC é, ao lado dos projetos de iniciação
científica, uma oportunidade para os alunos exercitarem a busca por novas propostas e idéias,
sendo também uma possibilidade de inserção para quem quer adentrar a carreira acadêmica.
148
4.1.2 Curso de Administração de Empresas da UNIVERSIDADE 2
O curso de Administração de Empresas da UNIVERSIDADE 2 foi concebido de
forma a fornecer aos alunos os principais instrumentos para a tomada de decisões nas
empresas, conforme princípios técnico e humanísticos, com responsabilidade social.
O curso teve início em 1988, quando ocorreu a unificação das faculdades em uma
"federação" de escolas, por um ato do Conselho Federal de Educação. Em dezembro de 1993,
o Conselho Federal de Educação reconheceu e, em janeiro de 1994, o Ministério da Educação
e Desporto homologou a criação da UNIVERSIDADE 2 em São Paulo. O curso de ADM
iniciou-se em 1993, vinculado à área de concentração de Ciências Sociais Aplicadas, de
acordo com a Portaria MEC nº. 898 de 24/06/1992, publicada no DOU em 25/06/1993.
4.1.2.1 O profissional formado na UNIVERSIDADE 2
O curso tem como objetivo formar um Administrador de Empresas:
a) capaz de planejar, organizar, coordenar, controlar e desenvolver projetos e
empreendimentos;
b) apto a desenvolver habilidades de comunicação interpessoal e intercultural;
c) hábil no raciocínio lógico, crítico e analítico;
d) com conhecimento das áreas de finanças, recursos humanos, comércio exterior e
produção, entre outras (deseja-se uma visão generalista, como recomendado pela
comissão de especialistas de Ensino de Administração – CEEAD/SESU/MEC);
e) capaz de atuar como agente de mudança e gerir os mais diferentes sistemas
organizacionais com espírito empreendedor.
149
Quanto ao perfil do egresso, segundo o catálogo do curso, deve-se formar um
profissional que reconheça:
a) sua área de saber como sendo fundamentalmente uma área das ciências sociais
aplicadas, mas que deverá solicitar sistematicamente conhecimentos de outras
áreas para entender e gerir com eficácia as organizações;
b) o saber administrativo como um saber vinculado à razão instrumental e que a
racionalidade instrumental, cada vez mais, se torna insuficiente para equacionar
com qualidade os problemas da organização, da humanidade e do ecossistema;
c) que a ação humana é fundada em pressupostos éticos e ideológicos, e que a ética e
os pressupostos ideológicos das elites administrativas e empresariais brasileiras
foram e ainda continuam sendo cúmplices dos gestores públicos do estado
cartorial e de seu apartheid social;
d) que administrar é a arte e a ciência de dar resultados para a coalizão do poder
dominante, mas que a heterogestão é uma forma transitória de poder como foram
as demais;
e) que na solução de problemas é possível e desejável que a administração mude seu
enfoque de reprodutor das forças produtivas e das relações sociais para promotor
de novas relações produtivas e sociais;
f) que a organização não é um fenômeno claro e simples de gestão, composta por um
conjunto de informações, capital, mão-de-obra, procedimentos padronizados e
amarrados organicamente, mas um campo de forças para se buscar eficácia e, ao
mesmo tempo, um campo de ambigüidades, paradoxos e conflitos;
g) que os objetivos e metas organizacionais não são imanentes à natureza da
organização, nem simplesmente dados, mas necessitam ser construídos e
150
negociados dentro de um contexto contraditório de interesses, tanto em nível
interno como externo, ou ambiental.
4.1.2.2 Organização curricular do curso de Administração de Empresas
A atual matriz curricular possui três eixos: formação básica, profissional e a chamada
“teórico-prática”. São componentes curriculares da formação básica: contabilidade geral,
matemática, direito empresarial, análises estatísticas, economia, direito tributário e social e
economia brasileira. Da formação profissional fazem parte teorias e modelos de gestão,
liderança e motivação, comércio e relações internacionais, tópicos avançados de marketing, as
administrações de produção e operações, mercadológica, financeira, de recursos humanos e de
materiais. Da formação teórico-prática fazem parte os seguintes componentes curriculares:
mercado financeiro e de capitais, controladoria, administração estratégica, administração de
custos e estágio. Todos os componentes curriculares possuem carga de 132 horas-aula, com
exceção do estágio curricular, que é de 400 horas (conforme matriz curricular aprovada em
23/11/2004.)
Objetivo geral
A missão do curso é formar profissionais empreendedores na mais ampla acepção do
termo, o que inclui empresários, dirigentes, executivos e empregados capacitados e aptos a
gerir organizações e/ou suas unidades, com ética, responsabilidade social, empresarial e
ambiental, pensando e agindo por conta própria, com criatividade, liderança e visão de futuro,
para inovar e ocupar espaços no mercado, satisfazendo, inclusive, seus anseios pessoais de
realização. Isso pressupõe enfatizar o “saber-ser” para, ao lado do tradicional “saber-fazer”,
desenvolver todo o potencial do ser humano.
151
Nesse sentido, procura-se buscar permanentes padrões de excelência do processo de
ensino de administração, sem confundi-lo com um curso de treinamento, fundamentando tal
busca nos princípios acadêmicos e, não exclusivamente nos pressupostos de eficiência e de
eficácia exigidos pela lógica do mercado; bem como assegurar que o processo de ensino, na
sua dimensão particular, enquanto processo de produção e socialização do saber,
contextualizado em sua historicidade, contemporaneidade e relevância, visando a formação de
profissionais qualificados que sejam capazes de materializar os objetivos e a missão das
organizações que administram com qualidade de vida e responsabilidade social.
Objetivos específicos
Desenvolver os fundamentos de gestão que ensinam o aluno a pensar, a questionar, a
interagir no social, a ser atuante, participativo e crítico. Principalmente:
1 – Desenvolver habilidades de gestão e postura:
a) espírito empreendedor, capacidade de antecipar mudanças e ter iniciativas de ação
e de decisão;
b) competência contextual, capacidade de compreender o meio social, político,
econômico, cultural no qual o administrador está inserido;
c) competência conceitual, capacidade de integrar teoria e prática;
d) ética profissional, conhecer os princípios éticos da profissão e aplicá-los de
maneira ampla, visando à construção da cidadania enquanto patrimônio coletivo da
sociedade civil;
e) postura para educação continuada, atualização e aperfeiçoamento profissional;
f) comunicação interpessoal, capacidade de comunicação escrita e oral;
g) capacidade de atuar de forma multidisciplinar;
h) capacidade de atuar como parte de uma equipe;
152
2 – Desenvolver habilidades “técnicas” ou específicas da racionalidade gerencial:
a) dos processos e das metodologias administrativas;
b) de sistemas, métodos e instrumentos de análise de intervenção organizacional;
c) da estratégia, estrutura organizacional e racionalidade administrativa;
d) da gestão dos subsistemas e recursos mercadológicos, financeiros, produtivos,
materiais e de informações;
e) da gestão de recursos humanos e formas de participação;
f) da rede de relações com o meio ambiente e dos condicionantes de natureza
econômica, política, jurídica, tecnológica e sociocultural.
3 – Incentivar a formação de administradores e empreendedores capazes de alinhar
metas organizacionais com qualidade de vida e responsabilidade social.
4 – Trabalhar criticamente e competentemente a racionalidade instrumental, para
possibilitar ao profissional formado em Administração buscar soluções e alianças na
sociedade, voltadas para dimensão ética valorativa da construção da cidadania enquanto
patrimônio coletivo da sociedade civil.
5 – Incrementar atividades extraclasse que aperfeiçoem o processo de ensino e estejam
de acordo com a missão e os objetivos do curso de Administração.
O curso de Administração da UNIVERSIDADE 2, apoiado na resolução CES nº.
1/2004 de 2 de fevereiro de 2004, deverá oferecer:
Atividades complementares
Entre elas, segundo o documento catálogo do curso:
a) atividades direcionadas pela coordenação e com apoio institucional, tais como:
seminários, palestras e fóruns internos, incluindo os previstos na semana de estudos do curso,
153
iniciação científica, monitoria, visitas técnicas, atividades comunitárias, inclusive da Empresa
Júnior, cursos internos de extensão.
b) atividades de livre escolha dos alunos, coerentes com o plano didático do curso,
como: participação em feiras relacionadas à administração, participação em atividades de
treinamento empresarial ou comunitário, participação externa em seminários, simpósios e
congressos, cursos externos de extensão, competições relacionadas ao curso, como por
exemplo, jogos de empresas.
Estágio curricular
O estágio é uma atividade curricular obrigatória e indispensável para a formação
acadêmica. Foi instituído pela lei 6.494/77, regulamentada pelo Decreto 87.497/82 e previsto
na LDB 9394/96, artigo 82. Estão previstos nas matrizes curriculares da UNIVERSIDADE 2,
desde a primeira série, em todos os cursos. O aluno matriculado recebe um manual de estágio
cujas normas deverá seguir, tendo o direito de fazer livremente a opção das áreas de estágio
que sejam relacionadas ao seu curso.
O total da carga horária de estágios é de 400 horas, sendo l00 horas em cada série, do
primeiro ao quarto ano. O estágio é obrigatório em todas as séries; no caso de não serem
cumpridas as 100 horas pertinentes à série, o aluno será retido.
Para o seu acompanhamento e documentação, foi instituído o Passaporte Universitário,
onde se anotam as horas de estágio e as atividades complementares cumpridas durante cada
ano. Será o portfolio do aluno e servirá como documento comprobatório das experiências
vivenciadas.
Para o estudante, o estágio representa a possibilidade de entrar em contato com as
oportunidades e dificuldades do cenário real, proporcionando-lhe amadurecimento e
154
preparação para enfrentar as exigências do mercado de trabalho. Além disso, visa a facilitar o
ingresso no mercado de trabalho.
Os estágios poderão ser realizados em instituições públicas ou privadas que tenham
setores das mais diversas áreas de Contabilidade e Administração, por exemplo, departamento
financeiro, de custos, fiscal, comercial, contábil, departamento de patrimônio, auditoria,
controladoria e outros.
O aluno pode realizar o estágio na própria organização em que trabalha, desde que o
faça em áreas compatíveis, ou seja, contábil-administrativas (equivalência profissional). O
tempo de estágio é variável, dependendo da duração das atividades envolvidas, mas não pode
exceder 8 (oito) horas diárias ou 44 horas semanais, conforme determina a CLT
(Confederação das Leis do Trabalho).
Verifica-se que ambos os cursos são bem elaborados. Sua fundamentação teórica
preenche os requisitos exigidos pelo MEC e suas propostas de aplicação prática dos
conhecimentos desenvolvidos vêm ao encontro das necessidades impostas pelo mercado de
trabalho.
A implementação dos cursos, porém, encontra entraves de vária ordem e os projetos
pedagógicos acabam por ser adaptado para atender à realidade de cada uma das instituições de
ensino.
Outro recurso utilizado neste trabalho foram entrevistas com gerentes de recursos
humanos atuantes no mercado de trabalho e com professores e alunos egressos das duas
universidades.
155
4.2 Entrevistas
4.2.1 Entrevistas com profissionais de recursos humanos (RH)
A análise dos projetos pedagógicos orientou a entrevista com os profissionais de
recursos humanos. Essas entrevistas revelam a prática da contratação do profissional
administrativo e o respectivo perfil atual exigido no mercado de trabalho.
As empresas pesquisadas14 selecionam seus candidatos à contratação pelos seguintes
expedientes: respostas a anúncios de vagas, currículos recebidos via internet e indicações.
Quando o fazem por indicação, a escola em que o candidato se formou é o item de maior
relevância, ainda que não defina a contratação. A origem universitária não é fator
eliminatório, pois há um levantamento e avaliação do perfil do candidato a partir do qual ele
poderá ou não, continuar o processo de seleção para o ingresso na empresa.
“Conta-se muito a respeito da origem do diploma, porém tudo depende do processo de
seleção. Nem sempre a universidade é fator definitivo no desenvolvimento do candidato. Já
no perfil é avaliado esse requisito: origem universitária (empresa 4).”
Ou ainda,
“A diferenciação se dá entre as pessoas e suas competências, não entre faculdades ou
outras identificações de origem (empresa 1).”
O candidato é avaliado por seu conhecimento técnico e comportamental, muitas vezes
através de entrevistas ou de dinâmicas de grupo. Habilidades de comunicação e autonomia
são itens integrantes e fundamentais na construção do perfil geral desejado para o novo
14 As entrevistas foram realizadas com os gerentes de recursos humanos das empresas Avon Cosméticos, Aldan
Assessoria e Participações Ltda, Accor Brasil Hotelaria e Serviços, Nestlé Brasil,GE.Morrey. Essas empresas foram escolhidas por terem sido indicadas pelos professores entrevistados.
156
profissional. Algumas empresas deixaram claro que a capacidade de trabalhar sob pressão é
um fator necessário no perfil desejado.
“[...] habilidades duráveis, tais como relacionamento humano, trabalho em equipe,
flexibilidade, tolerância a pressão e frustrações são observadas no processo seletivo (empresa
5).”
Esses testemunhos apontam a prevalência das capacidades atitudinais e
comportamentais sobre as competências técnicas. Boas universidades implicam um bom
cartão de visitas, mas não garantem o emprego.
“Jovens recém formados, dinâmicos, com perspectiva de crescimento, com
experiências vivenciadas em outros países são desejados nesta empresa (empresa 4).”
Entre as habilidades atitudinais, foram espontaneamente lembradas a comunicação
objetiva e clara, relacionamento humano, saber trabalhar em equipe, flexibilidade, tolerância a
frustrações e pressões, habilidades para falar em público, conhecimento de mercado e energia.
Energia refere-se ao brilho, ao entusiasmo, vitalidade, ação e dinamismo. Mentir é o que mais
desqualifica o candidato.
“No processo de seleção, se percebemos que o candidato não tem segurança das
qualificações que estão presentes no currículo e/ou se contradiz algumas vezes, supomos
haver uma certa inveracidade nos dados, esse candidato é desconsiderado imediatamente
(empresa 3).”
Isso indica que a competência “integridade” (humildade em “reconhecer-se”,
consciente de si, a fim de um aprimoramento pessoal) vem assumindo um papel relevante.
Quanto às exigências de experiência profissional, algumas empresas afirmam que isso
depende muito da posição requerida e da área de atuação, o que indica que alunos egressos
podem ter boas chances de mercado, sobretudo se tiverem no currículo (entendido como vida)
técnicas e atitudes comportamentais afins à empresa em questão.
157
“O perfil que buscamos é de um jovem com perspectivas de crescimento, quando
possível com experiências vivenciadas em outros países (empresa 1).”
Esse dado nos leva a afirmar que alunos de classe social elevada, com bom preparo
universitário (estágios, TCC, cursos extracurriculares) aliado a boa formação geral (curso de
línguas, informática, cultura geral), mas sem experiência profissional, poderão ser aceitos por
sua competência adquirida na vida, isto é, com viagens nacionais e internacionais, e
principalmente na universidade.
Os defeitos mais comuns encontrados nos candidatos são: imaturidade emocional,
ansiedade, dificuldade para lidar com frustrações e limites, nervosismo e insegurança.
“Os defeitos que desqualificam o candidato são, nervosismo, insegurança, ansiedade e
falsidade (empresa, 1).”
“Dificuldade para lidar com frustrações e limites, imaturidade emocional, ansiedade
(empresa 2).”
“Desânimo, falta de iniciativa, dissimulação (empresa 3).”
Segundo as entrevistas, constatou-se que atualmente a seleção por competências vem
ganhando espaço nas organizações porque minora as possibilidades de a seleção malograr,
dada a averiguação das habilidades que os candidatos possuem e/ou desenvolveram para um
bom desempenho no cargo.
Os questionários demonstram que, nas seleções para contratações, se valorizam mais
as características pessoais do indivíduo do que as técnicas. As pessoas mais procuradas são
aquelas com habilidades técnicas, políticas e comportamentais que atinjam resultados,
compartilhem valores, planejem, liderem, organizem, controlem e satisfaçam os requisitos na
execução de seu papel na empresa.
Com o acirramento da competição nacional e internacional, as empresas passaram a
exigir mais de seus funcionários, sendo fundamental que se adaptem ao cargo, produzam e se
158
relacionem bem. Por isso a importância de pessoas qualificadas com habilidades correlatas ao
conhecimento produzido e exigido pela empresa a fim de aumentar sua produtividade. Nos
dias de hoje, quem não tem competência está fora do mercado de trabalho. A “competência”,
entendida como a soma de habilidades e conhecimento (informação aliada à prática), tornou-
se o requisito fundamental para se conseguir um emprego, pois permite identificar a pessoa
certa, para o lugar certo, no momento certo.
Nas entrevistas realizadas percebe-se que, quando o foco em competências
comportamentais é a meta da seleção, procura-se no desempenho pretérito do candidato o
indicador do desempenho futuro. As competências para a realização das tarefas são definidas
a partir das atribuições do cargo.
A competência é instalada quando há conhecimento, habilidades e atitudes interagindo
de forma dinâmica nas diversas ocasiões vivenciadas pelo indivíduo. Depois de reunir as
informações sobre o cargo a ser preenchido, escolhem-se as técnicas de seleção para conhecer
e indicar os candidatos adequados. As técnicas de seleção utilizadas são: entrevista, prova de
conhecimento ou capacidade, testes psicométricos, testes de personalidade e técnicas de
simulação.
Geralmente, escolhe-se mais de uma técnica de seleção. Para os cargos simples,
aplicam-se entrevistas de triagem, provas de conhecimento e provas de capacidade. Para os
cargos complexos, aplicam-se provas de conhecimento, testes psicométricos e de
personalidade, técnicas de simulação e entrevistas.
Cabe a cada organização determinar os processos e os procedimentos de seleção mais
adequados e capazes de proporcionar os melhores resultados. Todo o processo seletivo precisa
ser eficiente e eficaz para atingir os objetivos propostos.
159
4.2.2 Entrevistas com professores da PUC/SP
As entrevistas com os professores da PUC/SP apontam como diferencial educacional
do curso nesta instituição a formação humanística e crítica.
“Já dei aulas em cursos de adminstração de outras universidades, mas não encontrei
em nenhuma delas uma atuação condizente com princípios de uma educação humanística,
como encontro aqui, com aulas de sociologia, filosofia, projetos de pesquisa integrados;
percebo isso nas reuniões de planejamento (professor 3).”
Outros apontam como diferencial do curso PUC:
“a qualidade da formação dos professores (professor 1)” bem como o fato de alguns
professores prestarem serviço de assessoria aos alunos através da empresa júnior, na qual os
alunos vivenciam a prática do dia-a-dia de uma empresa.
“[...] costumo prestar serviço de assessoria aos garotos, é uma opção que, embora não
obrigatória, consagra a formação do aluno (Professor 5).”
Apontam também o nome da instituição como um dado relevante para o êxito de seus
alunos no mercado de trabalho, mas têm claro que a qualidade da formação dos professores e
a seriedade na condução do curso são os grandes responsáveis por esse fato. Apontam ainda a
facilidade de material pedagógico, humano e físico como fatores de facilitação da relação
ensino-aprendizagem.
“A minha disciplina é optativa, na área de marketing, apresentando como ocorre a
gerência de produtos e marca em uma empresa. Nessa disciplina, os alunos obtêm
conhecimento da prática do dia-a-dia de um gerente de produto (professor 2).”
160
Ou ainda:
“Os alunos são estimulados a desenvolver projetos práticos através da utilização de
aplicativos do office da microsoft, fornecendo ao futuro administrador subsídios para a
tomada de decisão administrativa (professor 4).”
O estágio, quando integrado ao TCC e em consonância com as disciplinas optativas,
orienta o aluno recém-egresso para uma das áreas de especialização. Esse caminho deverá
levar ao encontro do conhecimento com as habilidades, facilitando a entrada no mercado de
trabalho.
“O estágio é a transposição de todo o arcabouço teórico na prática, é uma atividade
que integra o aluno ao seu futuro profissional, e geralmente está relacionado ao TCC
(professor 2).”
“O estágio é muito importante, pois o aluno começa a vivenciar o dia-a-dia de uma
empresa (professor 4).”
As disciplinas optativas oferecem capacidade de reciclagem para os alunos,
possibilitando conhecimento atual, relevante e de ponta, o que, num mercado em constante
mutação, implica um outro grande diferencial.
“O curso oferece uma formação completa em várias áreas epistemológicas e práticas
que circularão o seu futuro (professor 5).”
4.2.3Entrevistas com professores da UNIVERSIDADE 2
As entrevistas com os professores da UNIVERSIDADE 2, em sua maioria, pontuam
problemas conjunturais para a situação na qual se encontra o curso de administração
atualmente. Um professor, funcionário desde 1992, afirma que:
161
“Há alguns anos havia uma boa integração das disciplinas ao projeto pedagógico e a
empresa júnior realizava junto à comunidade trabalhos de consultoria, atingindo bons
resultados. Nessa época, a reitoria insistia em ter um curso de administração de empresas com
a excelência do curso da GV, mas hoje a realidade (limitação da carga horária, ofertas de
disciplinas, concorrência por alunos e satisfação dos clientes) impõe uma outra postura à
direção (professor 1).”
De maneira geral, os professores fazem uma avaliação positiva da faculdade, dando
ênfase aos profissionais de ensino e ao esforço pessoal dos alunos quando perguntados sobre
o que melhor ajuda o aluno a se qualificar, deixando claro o caráter individualista da
formação oferecida.
“Desde que o aluno tenha boa vontade e a mente aberta para aprender, a grande
contribuição é o conhecimento teórico, que certamente contribuirá e muito para a inserção do
aluno no mercado de trabalho, especialmente em estágio (professor 3).”
“A instituição possui um corpo docente experiente e preparado, mas a inserção do
aluno no mercado de trabalho vai depender do seu empenho e esforço pessoal (professor 4).”
Percebe-se, também, nas respostas certo receio em revelar alguns fatos e/ou ações que
demonstrariam negligência ou ausência de ações educativas da instituição, tais como atitudes
relacionadas, sobretudo, ao conhecimento e participação no projeto pedagógico do curso.
Quando interrogados se conheciam o projeto pedagógico do curso, obtivemos como respostas:
“Nunca me foi apresentado, só conheço o plano de aula da minha disciplina (professor
5).”
“Só conheço o programa do curso (professor 3).”
“Infelizmente, não tive oportunidade de conhecer o projeto político do curso
(professor 2).”
162
“Não posso responder a essa questão, pois ainda não tenho grande afinidade com o
projeto curricular do curso (professor 4).”
Há pouca clareza sobre o projeto pedagógico do curso de ADM, embora alguns digam
conhecê-lo. Isso poderia estar coligado ao fato de que a maioria dos docentes, embora tenha
outro emprego, geralmente em empresas, muitas vezes terceirizadas, depende em parte das
aulas dadas no regime da CLT, tendo, em média, para professores horistas, uma quantidade
razoável de aulas na mesma instituição, em torno 16 h/a.
Percebe-se também certo apreço pela instituição, uma vez que a maioria está nela
empregada há mais 3 anos e alguns há mais de 10 anos, o que facilita a integração, o vínculo e
a defesa de suas posturas diante do mercado.
Os professores compreendem a batalha enfrentada pela instituição na captação de
clientes, o que, por sua vez, envolve muitas vezes reformulação de matrizes curriculares,
reorganização de estágios e alternativas para contratação nem sempre favoráveis ao
especificamente pedagógico.
“No afã de reduzir o curso para torná-lo mais competitivo no mercado, reduziram o
número de aulas de 4 para 3 por noite, eliminando-se assim as matérias de conteúdo
generalista, tais como filosofia, sociologia etc... que permitiam um lastro cultural maior para o
futuro administrador (professor 5).”
Quanto ao estágio, este é apontado como o grande diferencial para colocar o aluno no
mercado, embora nem todos o cumpram como deveriam. Os alunos não precisam entregar
relatório de estágio. Há apenas o passaporte onde se anota o número de horas cumpridas nas
empresas, e que é submetido ao controle de um professor não remunerado para esse fim. Fica
a critério de cada aluno levar a sério ou não o estágio, pois basta a assinatura do empresário
no passaporte para “atestar” a realização do estágio.
163
“O estágio cumpre as regras exigidas pelo MEC. Ele contribui para a inserção do
aluno no mercado de trabalho, porém as suas possibilidades serão de acordo com o empenho
de cada um (professor 1).”
Quando perguntados sobre suas disciplinas no projeto maior do curso, todos os
professores afirmam estarem integradas ao projeto, mas não são capazes de esclarecer quais
capacidades e habilidades promovem, como aprimoram ou participam do trabalho realizado
nessas disciplinas.
Uma das professoras entrevistadas disse que existem linhas de pesquisa
implementadas na instituição (desenvolvimento do mercado varejista, gestão de pessoas e
comportamento organizacional, estratégias gerais de marketing, gestão logística, gestão de
qualidade e melhoria contínua no ensino superior). Isso, porém, é totalmente desconhecido
dos demais professores entrevistados, talvez pelo fato do TCC não ser obrigatório.
Quando indagados sobre a recomendação do curso, a maioria dos professores responde
de forma negativa:
“Não recomendo esse curso, pois não é um curso de primeira linha (professor 2).”
“Só recomendaria para aqueles que não têm alternativas, em virtude de sua condição
financeira, facilidade de acesso etc (professor 4).”
A maioria dos professores avalia o curso na relação custo-benefício como satisfatório,
revelando coerente a média 3, na escala de zero a cinco, quanto à nota dada ao curso. Essa
nota, no entanto, é dada com ressalvas, dentre as quais o preço, a localização dos campi,
facilidade de ingresso e o nível de exigência condizente com o tempo disponível do aluno.
Porém, um professor respondeu:
“É um curso para os que querem ingressar no mercado de trabalho qualificado, mas
sem grandes pretensões salariais, o que não impede para muitos desses alunos a garantia e a
164
sobrevivência na sociedade do conhecimento e muitas vezes uma mobilidade social
ascendente (professor 2).”
Sobre as dificuldades e/ou as facilidades encontradas pelos alunos para se inserirem no
mercado de trabalho, afirmam que a principal dificuldade é a pessoa insistir em fazer um
curso de 4 anos sem conseguir se empenhar nem se dedicar. A dificuldade maior citada pela
maioria dos professores é que os alunos chegam à universidade com pouca bagagem cultural,
ou mesmo com dificuldade para ler e entender. Não fazem vestibulares, mas passam por um
processo seletivo que não consegue selecionar, pois há sempre um número maior de vagas do
que de candidatos e, assim, todos são facilmente aceitos, independentemente de seu nível de
formação.
“A maior dificuldade é que os alunos ingressam na universidade sem saber escrever e
também não querem ler (professor 3).”
“Má formação, o aluno ingressa com uma péssima formação e pouco se pode fazer
devido essa falha inicial e devido ao sistema de avaliação que, em grande parte, foge da mão
do professor (professor 4).”
Os egressos encontram no mercado uma alta concorrência, falta de experiência e baixo
nível de aprendizagem. O planejamento unificado aula a aula, que deve ser aplicado por cada
um dos professores em cada um dos os campi, amarra o desenvolvimento do curso e impede
responder às demandas especiais do alunado.
4.2.4 Entrevistas com alunos da PUC/SP
As entrevistas com alunos egressos da PUC/SP indicam que eles escolheram o curso
de ADM pelo fato de abrir um leque amplo de possibilidades no mercado de trabalho,
sobretudo, segundo a percepção dos alunos, se o diploma for desta instituição. Abrem-se,
165
então, as maiores e melhores opções de trabalho. Alguns destes alunos afirmam que, se
tivessem entrado na USP, teriam se matriculado na instituição apenas pelo fato de ser pública,
mas que, em relação a FGV e Fecap, preferem a PUC “pelo fato de ter uma visão de
conhecimento e formação acadêmcia mais aberta (aluno 3).”
Os alunos entrevistados decidiram fazer ADM por opção, não porque precisavam de
um diploma para continuar no trabalho ou porque a empresa os tenha obrigado.
“Eu gostaria de algo que juntasse uma parte de exatas com humanas, além de eu gostar
de Finanças e Bancos já naquela época (aluno 3).”
Quanto aos motivos que os levaram a escolher a PUC, foram quase unânimes em
responder que o ideal seria a USP, mas:
“Pelo nome da faculdade. Tive a opção entre Mackenzie e ESPM, preferi a PUC
devido a sua reputação, mas o ideal seria a USP (aluno 1).”
“A PUC estava na minha segunda opção, como não entrei na USP fiz PUC, por achar
que é a melhor faculdade dentro de minhas expectativas e anseios (aluno 3).”
“Pelo curso ser considerado um dos melhores do país” (aluno 4).”
Todos os alunos entrevistados fizeram cursinho preparatório ao vestibular, alguns
chegaram a cursar mais de dois anos. Fizeram ensino médio nas escolas particulares: São
Luiz, Objetivo, Dante Alighieri, Santa Maria. Percebe-se que estes universitários têm
formação e informação cultural suficiente para acompanharem as aulas no início do curso,
tendo vindo de escolas particulares consideradas de boa qualidade. Não há, portanto,
necessidade de nivelamento.
Perguntados sobre como entraram e como saíram do curso, quanto a suas
características pessoais, conhecimentos, habilidades, atitudes e valores, responderam:
“Eu acredito que a faculdade me deu uma visão única e rica, culturalmente. Acredito
que nunca cresci tanto, e talvez nunca crescerei tanto quanto no tempo que estive na PUC,
166
acredito que eu aproveitei ao máximo os recursos que ela podia me dar, extraí desses cinco
anos o suficiente para me tornar um bom profissional e seguir com a minha carreira da melhor
forma possível (aluno 3).”
“A faculdade potencializou os meus valores e habilidades, saí da PUC uma pessoa
bem melhor (aluno 4).”
Quando interrogados sobre como foi o curso de ADM da PUC, em que medida
contribuiu para o desenvolvimento das competências e habilidades para o crescimento
profissional e pessoal, responderam:
“Apesar de ser um curso bom, o curso de ADM da PUC possui seus defeitos, claro que
está entre os maiores e melhores cursos do país, mas o esforço do aluno para extrair o máximo
do curso deve ser maior do que em outras faculdades do mesmo nível. Essa é uma das razões
que explicam o porquê do aluno da PUC ser tão comprometido e motivado em qualquer posto
de trabalho (aluno 3).”
Os alunos disseram que aprenderam muita teoria, difícil de aplicar na prática.
Acharam o curso “fraco” quanto a competências técnicas e funcionais, porém na competência
humana percebem seu grande diferencial:
“A PUC tem um lado sociológico muito bom, por esse lado as pessoas são
revolucionárias, possuem liberdade de expressão, tem os centros acadêmicos, a PUC Júnior,
essa liberdade de entrar e sair, tudo isso acredito que se destaque das demais faculdades
(aluno 1).”
Alguns alunos participaram de atividades complementares, da Atlética da FEA/PUC
ou da PUC-Júnior, e é claro que tudo isso contribui para o crescimento do profissional em
sentido global.
167
“Meu TCC foi na área de gerenciamento de riscos, com a prof.ª Marly, sobre clauster
de calçados de Franca. Trouxe uma visão diferente, de enxergarmos nossos concorrentes
como parceiros (aluno 4).”
No entanto, depois de formados, os alunos reconhecem que carecem de maior
especialização:
“O último ano da PUC é muito intenso, o trabalho de TCC toma muito tempo e não
pude me dedicar como queria aos estágios (aluno 5).”
“Preferi optar por matérias mais “light” e não realmente as que queria fazer, para não
me sufocar com muito trabalho teórico (aluno 1).”
Sobretudo aqueles que não participaram da PUC-Júnior, e/ou fizeram estágios em
áreas diferentes do núcleo central de matérias optativas.
Quanto a essas optativas, já referimos que os alunos ingressantes até 2007 devem, no
5º ano, escolher eles mesmos as 9 disciplinas de sua grade horária. Essas disciplinas se
classificam segundo 5 áreas do conhecimento administrativo: finanças, marketing, recursos
humanos, geral e produção. Das 9 disciplinas a serem escolhidas, é obrigatório cursar uma de
cada área, ficando a escolha das 4 restantes a critério e interesse do aluno. Quando esse
critério não leva em conta a área de concentração do estágio, realizado no 9º semestre e
paralelamente às disciplinas optativas, há maior descompasso entre teoria e prática.
No 10º semestre, os alunos devem apresentar um relatório de estágio, e, ao mesmo
tempo em que estão cursando outras disciplinas optativas, produzir o Trabalho de Conclusão
de Curso. Isso sugere que o excesso de atividades dos alunos no último ano leva alguns deles
a optar pelas matérias, estágios e temas que possuam maior possibilidade de finalização, o que
nem sempre coincide com os interesses e capacidades do aluno, prejudicando, muitas vezes,
as competências e habilidades agregadas e ampliadas nos primeiros quatro anos de curso.
168
Entre o estágio, o TCC (obrigatórios) e a participação na empresa júnior (opcional), a
maioria dos alunos respondeu ser o estágio o que mais os aproxima do mercado de trabalho.
Elogiam o modo como o estágio é planejado e orientado pela instituição e o fato de se ter um
controle rígido sobre seus resultados.
“Tive oportunidade de ter o contato com a prática da empresa onde estagiei e isso
facilitou minha entrada no mercado de trabalho, pois na minha primeira entrevista, me senti
bastante seguro (aluno 4).”
Há um contrato com a empresa oferecedora do estágio, após o qual os alunos devem
fazer um plano de atividades. Este deverá ser aprovado pelo coordenador de estágios e
realizado durante todo o 9º semestre. No início do 10º semestre, entrega-se um relatório sobre
as atividades realizadas, desenvolvidas, finalizadas e/ou em andamento. Somente depois de
analisado o relatório pelo coordenador, o aluno consegue computar no histórico escolar os
créditos do estágio.
“Quando temos que elaborar o plano de atividades a ser realizado durante o estágio, no
início não simpatizei com a idéia, ia dar muito trabalho, o negócio era pegar na prática, mas
agora, depois de finalizado o relatório percebo que esse relatório me ajudou a definir qual era
minha área de interesse dentro da administração (Aluno 2).”
E ainda:
“Sim, eu estagiei em dois bancos e foram de suma importância para o meu trabalho
hoje. O relatório de estágio é uma forma de apresentar o seu trabalho de estágio e seu dia-a-
dia no trabalho. Um estágio é a linha tênue entre um aluno e um profissional, é quando se
coloca em prática o que se aprendeu na teoria, com certeza é muito importante para o egresso
no mercado de trabalho (aluno3).”
169
A formação geral e humanística também ocorre por meio da participação ativa em
eventos acadêmicos, palestras, seminários, colóquios, assim como da equipe de voluntariado
que atua em projetos sociais.
“Aqui na PUC, sempre somos chamados para ouvir pessoas falar, aqui palestras fora
da sala de aula são comuns, e sempre sabemos o que rola, mesmo se não participamos delas
(aluno 3).”
É significativo apontar que os ex-alunos demonstram afeto à universidade e ao curso,
expresso que se expressa, por exemplo, por meio da participação nos eventos comemorativos
do Centro de Ex-alunos.
Os que participaram da empresa júnior a consideram muito eficaz e afirmam que
contribuiu para o conhecimento do terceiro setor.
“Foi bom para o currículo; mas nas aulas não contribui em nada, ajudou também a
aprimorar meus conhecimentos sobre o terceiro setor, onde participei com eventos (aluno1).”
Os alunos afirmam que há coerência entre a teoria e a prática, algumas matérias são de
aplicação mais imediata, outras, menos; mas, em sua maioria, até teorias consideradas difíceis
na faculdade terão aplicabilidade no dia-a-dia do trabalho.
“De certa forma há coerência entre a teoria e a prática. O aluno precisa perceber que a
alta carga de teoria pouco tem de parecido com a prática, serve como uma grande base
cultural e pessoal preparatória para a prática (aluno3).”
A PUC possui assessoria de relações institucionais e internacionais, inclusive
intercâmbio com a Universidade de Compostela, da Espanha. De maneira geral, os alunos
disseram que isso é muito pouco divulgado, portanto um número pequeno de alunos participa
do intercâmbio:
170
“Eu cheguei a procurar, mas quando fui, meu grau de estudo já não valia mais para
fazer esse tipo de intercâmbio. Acho que isso deveria ser mais difundido pela faculdade, pois
poucos alunos sabem disso. Me mostraram a universidade espanhola, na época (aluno 1).”
De uma forma geral, os alunos enxergam a PUC como responsável por seus êxitos no
mercado, mas afirmam também que grande parte das qualidades requeridas hoje é inerente à
pessoa.
“O curso é bom, porém possui seus defeitos; mas para um aluno comprometido e
responsável, isso não é problema. A faculdade proporciona o conhecimento teórico, mas o
aprendizado, a aceitação e aplicação diária do conteúdo programático, vem da gente, de
nossas características pessoais, habilidades, esperteza (aluno 5).”
4.2.5 Entrevistas com alunos da UNIVERSIDADE 2
Dos alunos egressos da universidade de massa, quando interrogados sobre o motivo
que os levou a escolher Administração de Empresas, a maioria respondeu que já trabalhava na
área administrativa e que também optou pelo curso devido a sua abrangência.
“[...] pra dizer a verdade, queria a área da saúde, mas não tinha condições de pagar
uma faculdade de medicina, por exemplo. E, como já trabalhava na empresa em área
administrativa, resolvi optar por ADM (aluno 2).”
Outro aluno disse:
“Fiz porque o curso de Administração de Empresas está em alta no mercado e abrange
muitas áreas, então achei que seria mais fácil conseguir emprego depois da faculdade,
ganhando mais (aluno 3).”
A maioria dos alunos inicia o curso por necessidade de um diploma de nível superior,
porque já trabalha em empresas que lhes fazem tal exigência. Os funcionários dessas
171
empresas procuram, dentre as universidades, aquelas que oferecem melhores condições de
pagamento e localização, a fim de não perder, pelo menos imediatamente, o emprego.
Portanto, antes de conhecimentos e aprimoramento de habilidades, os alunos da
UNIVERSIDADE 2 buscam o diploma, sem o que não podem permanecer na empresa.
“Precisei entrar na universidade, porque, se não viesse fazer um curso superior, seria
despedido de meu emprego. Eles me deram um prazo para trazer o diploma da faculdade
(aluno 1).”
É interessante ressaltar que, quando respondeu sobre o porquê de ter escolhido a
UNIVERSIDADE 2 para cursar ADM, a maioria dos alunos disse que não “escolheu”, mas
teve de cursar ali dada sua condição financeira, pelo PROUNI, e até porque o vestibular era
de graça para quem tivesse feito o ENEM.
“Não escolhi, fui escolhido. Fiz o ENEM e não precisei pagar a inscrição ao processo
seletivo (aluno 3).”
Outro disse que escolheu pelo preço da mensalidade:
“Foi a mais barata na época e era o único preço que eu podia pagar (aluno 4).”
A maioria estava ciente de que não conseguiria entrar em outras universidades, pois
não passaria em outro vestibular.
“Na UNIVERSIDADE 2 qualquer aluno que faz inscrição já passa, nem é vestibular, é
processo seletivo, isso é mais fácil, é só não zerar que a gente entra (aluno 4).”
Alguns alunos também demonstraram necessidades de aprimoramento técnico, indo,
sempre que possível, fazer complementações e cursos de línguas.
“Encontrei uma dificuldade muito grande porque não sabia falar inglês, e nunca havia
morado fora do país, então tive que pagar um curso por fora para continuar no meu trabalho
(aluno 2).”
172
A definição do perfil profissional exigido no mercado de trabalho, levantado pelas
entrevistas realizadas com gerentes de recursos humanos das empresas pesquisadas, está
distante daquele adquirido pelos egressos pesquisados, o que dificulta preencher todos os
requisitos esperados.
Constata-se que há falta de habilidades cognitivas e técnicas:
“Acho que o curso foi pobre, no geral, em termos de conhecimento, de professores, de
infra-estrutura da universidade. Saímos sem embasamento teórico suficiente para dar
sustentação para enfrentarmos um processo seletivo de ingresso no mercado de trabalho
(aluno 1).”
Constata-se pelas entrevistas que todos os alunos são provenientes de ensino médio
das escolas públicas estaduais.
“Fiz o ensino médio em escola estadual. Saí com pouca bagagem cultural. Quase não
tinha aula. Não levei a sério como devia quando estava estudando e na faculdade me fez muita
falta (aluno 5).”
É exigência do MEC que a instituição ofereça aulas extras para “nivelar” os alunos, ou
seja, para que tenham melhores condições de acompanhar as aulas dos diferentes
componentes curriculares. São oferecidas aulas de português, matemática e informática.
Essas, sob a alcunha de “nivelamento”, a universidade tem por obrigação disponibilizar
gratuitamente, em horários extras, alternativos aos das aulas curriculares. O nivelamento não é
obrigatório e é feito a critério e disponibilidade do aluno, que se beneficia de cursos paralelos.
Constata-se que essas aulas na realidade não acontecem, só existem no papel, por ser uma
exigência legal.
“Aulas de nivelamento são oferecidas pela universidade aos sábados e nas pré-aulas.
Já saio do trabalho em cima da hora e nunca consegui chegar em tempo de participar delas
(aluno 3).”
173
Quando indagados sobre a proporção teoria/prática, oferecida pelo curso, afirmaram:
“O curso ficou muito distante da prática, pois o conteúdo das matérias é extremamente
teórico e não tivemos na universidade a empresa júnior nem estágio feito realmente, com
relatórios (aluno 2).”
174
5 EXIGÊNCIAS DO MERCADO DE TRABALHO E ENSINO SUPERIOR
Esta pesquisa procurou fazer a verificação do projeto pedagógico das instituições a
partir da observação de preocupações com habilidades cognitivas, técnicas, atitudinais e
comportamentais, em que se encontram incluídas as habilidades interpessoais (Assis, 1994,
Gílio 2000; Silva Filho, 1994; Whitaker, 1997), nos diferentes componentes curriculares, bem
como a partir de relatos das experiências docente e discente nas instituições. Na identificação
das experiências docentes e discentes, por intermédio das entrevistas realizadas, a enumeração
de habilidades e competências supostamente atingidas foi levada em consideração, bem como
a participação destas no possível ingresso ao mercado de trabalho. A questão das exigências
do mercado de trabalho, da diversificação do saber e da interdisciplinaridade do conhecimento
também foi levada em consideração quando da análise dos resultados de ambas as
instituições.
Tem-se assistido nos últimos anos a um movimento de busca de novos mercados
(Werbel, 2000) em cada campo profissional e isso trouxe à tona um problema que envolve a
seguinte pergunta: que grade curricular é capaz de incluir todas as atividades e competências
profissionais que se pretende abarcar?
É necessário analisar comentários dos egressos em relação à preparação para o
mercado de trabalho, no que se refere a formação teórica, prática e complementar (humana e
geral).
A crescente dificuldade enfrentada pelos responsáveis por recrutamento de
profissionais habilitados a ocuparem as vagas disponíveis coloca em discussão a eficiência no
processo de formação e qualificação. A proporção candidato/vaga tem crescido
substancialmente, reafirmando a condição de que poucos conseguem preencher os requisitos
exigidos pelo mercado.
175
A ênfase na formação generalista e a ampliação das possibilidades de experiência
prática durante o curso superior são avaliadas pelas instituições como alternativas para
atender a exigência de um perfil multiprofissional e proporcionar a maturidade pessoal e a
identidade profissional necessárias para agir em situação de imprevisibilidade, realidade a que
estão sujeitas as organizações atuais. No entanto, essa ênfase, muitas vezes, consta nos
projetos pedagógicos, sobretudo nos da UNIVERSIDADE 2, mas não tem expressão na
realidade vivida pelos alunos que chegam ao mercado deficientes desses requisitos. Os
professores da UNIVERSIDADE 2 enfrentam o problema de se deparar com pouca
autonomia na preparação e aplicação de suas disciplinas, pois são obrigados a seguir um
planejamento comum a todos as unidades e a aplicar avaliações que, em grande parte, não são
preparadas por eles, o que os impede de responder às demandas especiais do alunado, muitas
vezes despreparado para questões básicas que demandam informações e conhecimento
relacional sobre épocas históricas, mentalidades, cultura geral, assim como desprovidos de
habilidades medianas de escrita e compreensão de textos jornalísticos.
Percebe-se, pela análise das entrevistas, um despreparo profissional dos alunos da
UNIVERSIDADE 2, relacionado aos seguintes fatores:
a) dissociação entre teoria e prática;
b) baixa qualidade dos estágios curriculares, insuficientes e inadequados;
c) “adaptações” simplificadoras feitas ao projeto pedagógico do curso;
d) infra-estrutura insuficiente, que carece de empresa júnior, laboratório de
informática e biblioteca condizentes com as necessidades do curso.
Essas falhas comprometem o perfil profissional do egresso e diminuem suas
possibilidades de sucesso num mercado de trabalho tão competitivo como o atual.
Todos os alunos entrevistados estudaram nas escolas públicas estaduais e não fizeram
cursinho preparatório para ingresso no ensino superior. O despreparo dos universitários ao
176
iniciarem o curso impõe a necessidade de um “nivelamento”, um processo de capacitação ao
curso superior; mas a UNIVERSIDADE 2 não fornece efetivamente as aulas de capacitação.
Os alunos da UNIVERSIDADE 2 entrevistados não têm domínio de línguas
estrangeiras. Como não cursaram o ensino médio em escolas particulares, consideradas de
alto nível, tampouco fizeram cursos de língua fora da escola e também não tiveram a
experiência de morar fora do país, realmente não dominam outro idioma. Sabe-se que o
conhecimento de inglês e espanhol não é mais uma qualificação diferencial. Há necessidade
de se conhecer uma terceira ou quarta língua. Assim, os alunos da UNIVERSIDADE 2
somam obstáculos, e não requisitos, para a inserção no mercado de trabalho.
Quando procuramos os egressos dessa instituição para agendar entrevistas, soubemos
que alguns deles estavam fora do país. Deixaram de trabalhar para se aventurar no exterior,
adquirir uma língua estrangeira, esperando obter progresso na volta ao Brasil.
A definição do perfil profissional exigido no mercado de trabalho é condizente com
aquele adquirido pelos egressos pesquisados da PUC/SP, uma vez que saem possuidores de
competências e habilidades exigidas pelo mercado, tais como criatividade, autonomia,
iniciativa e tranqüilidade para conviver e resolver problemas.
O TCC obrigatório contribuiu para os alunos iniciarem-se na pesquisa científica com a
orientação dos professores e para ampliar seus conhecimentos, pois exige muita leitura e rigor
metodológico, ainda que não tenha de ser defendido perante uma banca de professores.
Outro fator relevante é a universidade dispor de empresa júnior, a PUC-Júnior, por
intermédio da qual os alunos podem entrar em contato com o mercado e as exigências do
trabalho no mundo contemporâneo; muitos deles, inclusive, tomam conhecimento das práticas
e ações do terceiro setor a partir da participação em instituições parceiras da universidade. Um
dos egressos da PUC que entrevistamos está cursando pós-graduação na fundação Getúlio
177
Vargas, outro faz a segunda graduação, agora em Psicologia, outros já fizeram cursos de
especialização e um tem certificado de proficiência em língua estrangeira.
Percebe-se que o curso de ADM da PUC/SP possui não um, mas muitos diferenciais.
A flexibilidade, os professores, a matriz curricular, o curso generalista. Esse somatório se
resume no nome da instituição, quando da hora de os egressos procurarem espaço no mercado
de trabalho. Isso se confirma quando observamos o atual locus de trabalho dos egressos da
PUC/SP. Eles estão exercendo, hoje, funções de gerência das áreas de negócios empresariais.
São gestores de marketing, gestores de produtos, gerentes de RH. Trabalham no setor
bancário, empresarial e também no terceiro setor. Um dos entrevistados é presidente de uma
organização não governamental. Todos declararam que não tiveram dificuldade para
encontrar emprego depois de formados.
São unânimes em dizer que o mercado de trabalho onde alunos da PUC estão inseridos
exige profissionais altamente qualificados. São grandes empresas internacionais e nacionais,
que exigem do profissional uma variada gama de qualidades.
Tendo como ponto de partida a Lei de Diretrizes e Bases 9394/96, colocada como um
dos pressupostos teóricos desta pesquisa, mais precisamente o cap. IV, art.43, constatam-se
discrepâncias no que diz respeito:
a) à formação de diplomados aptos para a inserção em setores profissionais;
b) ao incentivo à pesquisa e investigação científica.
É evidente que, das duas universidades analisadas, a chamada mercantil de massa não
prepara adequadamente o profissional para se inserir no mercado de trabalho, conforme ficou
constatado, por vários motivos, dentre eles a falta de estrutura física adequada. Dizer que falta
estrutura física parece até incoerência, pois os prédios são muito amplos, vistosos, bonitos,
bem localizados, modernos; mas isso é uma artimanha para confundir o aluno, que fica
encantado pela aparência das instalações. São verdadeiros Shopping Centers, com área de
178
alimentação, lojas de conveniência, salas de exposições; porém, o que há de mais necessário
para o ensino de qualidade e, conseqüentemente, para o bom desempenho do aluno, como:
laboratórios, bibliotecas, salas ambiente com recursos audiovisuais e empresa júnior, essa
universidade não possui.
Percebe-se que há um hiato entre os objetivos propostos pelo curso de ADM da
UNIVERSIDADE 2 e a realidade, pois os alunos não têm atividades laboratoriais
obrigatórias, não há empresa júnior e, no estágio, não se exige planejamento nem relatório:
basta entregar um “passaporte” com a assinatura do responsável pelo estágio na empresa.
A PUC/SP, ao contrário, dispõe de toda a infra-estrutura necessária: biblioteca
adequada, salas ambiente e empresa júnior, que funciona como verdadeiro laboratório para os
alunos diminuírem a distância existente entre a teoria e a prática. Há ainda que se considerar a
qualidade do material humano (professores preparados e orientados para um saber
investigativo) o que, somado a uma grade curricular flexível, favorece a formação criativa e
cidadã, possibilitando o incentivo à pesquisa e investigação científica.
A PUC/SP possui linhas definidas de pesquisas e, é filosofia da instituição, incentiva a
pesquisa nos diversos cursos de graduação e pós-graduação. O aluno inicia a atividade
científica ainda na graduação, pois é obrigatória a elaboração do TCC (Trabalho de Conclusão
de Curso).
Na UNIVERSIDADE 2 não há linhas de pesquisas e o aluno não tem necessidade de
apresentar um TCC ao término do curso.
A forma pela qual ocorreu a coleta de materiais que permitiram a análise do projeto
pedagógico do curso nas duas universidades revela, em si mesma, a familiaridade e
importância dadas à pesquisa e seus desdobramentos no caso da PUC/SP, e certa insegurança
e até descaso no caso da UNIVERSIDADE 2.
179
Na PUC/SP, conseguimos, sem burocracia nem interpelações, com a coordenadora de
ADM o projeto pedagógico atual, em vigência desde 2007, e o anterior (objeto de estudo
deste trabalho, pois analisamos o curso de alunos que o concluíram há dois anos, para
conhecer como se deu seu ingresso no mercado de trabalho). Foi fácil coletar material para
análise, pois as pessoas contatadas ofereciam com muita transparência o manual de estágio, o
manual de TCC, o catálogo do curso, a matriz curricular e as respectivas ementas. Marcamos
horários com a coordenadora, que nos apresentou os professores para as entrevistas, bem
como esclareceu pormenores do curso e tirou dúvidas sempre que necessário. A associação
dos ex-alunos mostrou prontidão para fornecer dados, orientações e contatos com os egressos
e não mediu esforços para colaborar, havia pré-disposição em ajudar. Os ex-alunos foram
solícitos e de uma disponibilidade ímpar. Estão acostumados a pesquisar e sabem o quanto é
importante e valioso fornecer dados para análise e reflexão.
Em contrapartida, foi extremamente difícil conseguir material para análise da
UNIVERSIDADE 2. Foram inúmeros os e-mails, as horas marcadas em vão, a insistência
para obter informações e as visitas perdidas. Não conseguimos ter em mãos o projeto
pedagógico do curso. Tivemos de recorrer a um coordenador de outra área que, percebendo
nossa dificuldade e conhecedor da necessidade de obter tais informações, solicitou como se
fosse para seu próprio uso e disponibilizou para consulta, na própria universidade, sem a
possibilidade de a consulente levá-lo para casa ou fazer fotocópia. Não houve transparência,
ao contrário, houve verdadeira resistência para disponibilizar material, como se as coisas
fossem feitas às escondidas. Isso demonstra, por parte dos gerenciadores do curso da
UNIVERSIDADE 2, o desconhecimento dos frutos de uma pesquisa acadêmica, no que se
refere ao fornecimento de dados para novas orientações e a utilização política de seus
resultados.
180
O encontro com o coordenador do curso de Administração de Empresas foi
impossível. Não tivemos a possibilidade de conversar pessoalmente, apenas por telefone,
quando por descuido atendia minha ligação, ou por e-mail, quando respondia. Conseguimos
contato com os ex-alunos por meio da secretária, que nos forneceu nomes e telefones para
marcar as entrevistas. Mesmo com os egressos não foi fácil a comunicação, pois eles não têm
hábito de pesquisa e sentiram-se acuados pelas perguntas. Os professores demonstraram
constrangimento e até mesmo certo temor de participar da entrevista. Insistiam muito que não
queriam que fosse citado seu nome em nenhum momento. Precisamos até, em alguns casos,
assinar termo de consentimento e responsabilidade, comprometendo-nos a não citar o nome
deles de forma alguma.
Constata-se que os documentos existem apenas para o cumprimento da exigência do
MEC e não ficam disponíveis para consulta dos professores, alunos e outros envolvidos no
processo de ensino/aprendizagem. Não há clareza quanto aos objetivos, nem quanto ao que foi
planejado para o curso como um todo, o que dificulta a possibilidade de integração entre as
disciplinas e metas comuns aos diferentes colaboradores do curso.
Pela análise comparativa, feita através dos dados levantados em entrevistas semi-
estruturadas, conclui-se que tanto a UNIVERSIDADE 2 quanto a PUC/SP têm como objetivo
estar em sintonia com o mercado de trabalho. Os alunos de uma, como os da outra, terminam
o curso com sonhos de ingressar numa carreira promissora, às vezes se esquecendo de que as
empresas estão exigindo conhecimentos além dos fornecidos pela universidade.
Os egressos da PUC/SP terminam o curso já empregados. A maioria é contratada na
mesma empresa em que fez o estágio, outros abrem sua própria empresa e muitos vão atuar na
empresa dos pais.
Os alunos da UNIVERSIDADE 2 terminam o curso para conseguir permanecer no
mesmo emprego que os obrigou a fazer faculdade. Estão ali para permanecer no mesmo lugar
181
e, se houver grandes modificações, eles caem. Dessa forma, conclui-se que quando o aluno
entra por coação na faculdade, jamais vai cursar de maneira adequada, estudando apenas para
passar de ano e atingir o objetivo que é receber o diploma.
Os que ainda não estão trabalhando sentem dificuldades para obter o primeiro
emprego e vêem-se obrigados a voltar à universidade para cursos de pós-graduação com a
finalidade de adquirir mais conhecimentos e qualificações para se tornarem aptos a enfrentar
os processos de seleção das empresas. Assim, a universidade tem a garantia de candidatos
para preencher as vagas de seus inúmeros cursos de pós-graduação.
Vale considerar a data de início dos cursos: o curso de ADM da PUC/SP teve início
em 1971 e o da UNIVERSIDADE 2, em 1993. São 22 anos de diferença. Tempo suficiente
para que o curso da PUC/SP tenha tradição maior e muitos anos a mais de experiência. Tempo
em que o currículo passou por várias reformas, com inovações significativas e implantadas
gradualmente, de modo a adaptar o curso às mudanças do mercado, cada vez mais
competitivo, que exige novos conhecimentos e atitudes em face das novas tecnologias
incorporadas de forma definitiva no contexto dos negócios contemporâneos.
Uma das maiores inovações no projeto pedagógico da PUC/SP foi a criação do quinto
ano composto apenas por disciplinas optativas das cinco áreas funcionais. Essa alteração
permitiu notável flexibilização ao currículo, mantendo-o atualizado, uma vez que as optativas
são oferecidas de acordo com o contexto atual do ambiente de negócios.
O curso da UNIVERSIDADE 2 também passou e passa por alterações. A última
mudança, inclusive, serviu para “enxugar” as disciplinas da matriz curricular, oportunidade
em que a duração do curso foi reduzida de cinco para quatro anos. A “condensação” ocorreu
para que o curso continuasse competitivo no mercado, pois na maioria das universidades a
duração de ADM é de quatro anos. Foram retiradas da matriz disciplinas de formação
humanística, as quais ensinam o aluno a pensar, a questionar, a interagir no mundo social, a
182
ser atuante, participativo e crítico, tais como: Sociologia, Psicologia, Filosofia e Ética. Restou
um curso sem a prática da reflexão, formando alunos cumpridores de ordem, sem capacidade
de criar e sem o espírito crítico tão necessário para preencher as atuais exigências do mercado
de trabalho.
Podemos apontar, portanto, que ambas as universidades vêm sofrendo mudanças
constantes em seu projeto pedagógico. A UNIVERSIDADE 2, no sentido de tornar o curso
mais acessível financeiramente aos alunos, e a PUC/SP, sem desconsiderar esse quesito, no
sentido de garantir sua marca, ou seja, fazer jus a sua preocupação histórica com a formação
humanista e, hoje também, generalista.
Quanto aos objetivos formalmente prescritos do curso, ambas estão de acordo com as
diretrizes exigidas pelo MEC (Ministério de Educação e Cultura), ambas possuem equipes
formadas por bons professores, com experiência profissional no mercado, mesmo assim a
PUC possui um número maior de mestres e doutores, enquanto 70% dos professores de
Administração de Empresas da Universidade 2 são especialistas e apenas 15% são mestres e
15% são doutores.
A Lei obriga as universidades a manter 1/3 dos docentes em regime integral, porém a
UNIVERSIDADE 2 não cumpre essa exigência. Apenas 6% dos professores trabalham em
regime integral, contrastando com os 94% que são contratados como horistas. Esse dado
consta do mais recente Censo da Educação Superior, de 2006, e foi divulgado pelo jornal
Folha de S. Paulo, de 12 de maio de 200815.
Segundo o ranking publicado na Folha de S. Paulo, referente às universidade públicas
e particulares, no dia 18 de maio de 2008, cuja fonte é o Inep/Mec, a relação de alunos por
15 Apenas 37 das 86 universidades privadas do país cumprem a exigência legal de ter um terço dos docentes
trabalhando em regime integral, aponta o Censo da Educação Superior 2006 (mais recente), publicado em reportagem de Antônio Gois e Fábio Takahashi, na Folha de 12/05/08.
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docente na UNIVERSIDADE 2 é de 49 para um, o maior índice entre as universidades
tabuladas. “Uma turma muito grande dificulta o ensino. O professor não sabe as dificuldades
de cada estudante, não sabe o que estão lendo”, afirma José Faro, diretor do Sinpro SP
(sindicato dos professores das escolas particulares).
O MEC preceitua que as universidades se apóiem no tripé: ensino, pesquisa e
extensão. Para tanto, é fundamental a presença de professores em regime de dedicação
exclusiva, porque podem estimular o investimento em pesquisa e melhorar a condição de
ensino. O regime integral também dá ao docente maior disponibilidade para preparar aulas,
corrigir provas e trabalhos, atender aos alunos e desenvolver pesquisas de iniciação científica
conjuntamente com os educandos, bem como desenvolver pesquisas próprias de interesse da
comunidade acadêmica. Possibilita, ainda, trabalhos de orientação a alunos interessados na
extensão universitária, facilitando a formação cidadã.
O professor da UNIVERSIDADE 2 não possui autonomia, e sequer pode almejar ao
controle do processo de ensino-aprendizagem, pois o conteúdo programático é pré-
estabelecido pela instituição. Os professores recebem não só as ementas, mas também a
bibliografia e os textos a serem aplicados no curso, prontos. Os professores da PUC/SP têm
liberdade de cátedra que lhes garante autonomia na condução do processo de
ensino/aprendizagem, sem o constrangimento de cobranças de responsabilidades próprias a
seu desempenho profissional. Os professores da UNIVERSIDADE 2 reclamaram de serem
vigiados até pelos seguranças, antigos bedéis, que ficam nos corredores para manter a ordem e
disciplina dos alunos, controlando também horários de entrada e saída do professor. Há vidros
instalados nas portas das salas de aula para facilitar a fiscalização das ações do professor em
sala de aula. Os professores não têm liberdade de dispensar o aluno mais cedo se terminaram
a programação prevista para o dia, tampouco pode passar mais tempo com o aluno ao final do
período de aulas, pois, neste último caso, a mantenedora receia ter de pagar hora-extra.
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O reconhecimento que o curso de Administração de Empresas da PUC conquistou
abre as portas do mercado para o aluno, antes mesmo de sua formatura. Dito de outro modo, o
curso de graduação da PUC/SP oferece condições de inserção rápida no mercado de trabalho,
enquanto que os egressos da UNIVERSIDADE 2, se possuem somente o curso de graduação,
têm dificuldades de atender as condições e os requisitos do perfil profissional demandado pelo
mercado. Para eles, a complementação profissional deve ser obtida fora da universidade,
tendo em vista as reconhecidas deficiências do processo de formação de nível superior.
No caso da Administração, por exemplo, inúmeras áreas de especialidades foram
criadas para atender às novas demandas do mercado. Isso torna cada vez mais difícil a
inserção no mercado de alunos provenientes de instituições que não oferecem diversificação
curricular, quer através de cargas elevadas de estágios e/ou matérias optativas, quer através do
trânsito por uma grade curricular renovada e diversificada, como a existente no projeto
pedagógico da PUC/SP.
Entre os alunos da UNIVERSIDADE 2 poucos afirmaram ter uma prática ampla de
administração experimentada na universidade. Os argumentos mais comuns caminhavam na
direção de reafirmarem a necessidade de buscar fora dela a capacitação para o mercado,
especialmente no caso de formação tecnológica.
Já os alunos da PUC/SP, por meio do estágio supervisionado, da empresa júnior, da
freqüência a palestras e visitas monitoradas a empresas teriam conseguido aproximar-se mais
da prática e do dia-a-dia do trabalho do administrador.
Não se pode negar que os egressos de ambas as universidades demonstraram
reconhecer que há necessidade permanente de qualificação para se manter no mercado, mas o
motivo principal que está levando boa parte dos formados pela UNIVERSIDADE 2 à pós-
graduação é o despreparo, enquanto os egressos da PUC/SP são levados por uma constante
necessidade de atualização profissional.
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As maiores dificuldades enfrentadas pelos alunos da UNIVERSIDADE 2, segundo as
entrevistas, foram: a desarticulação entre a teoria e prática – já justificada acima pela ausência
de TCC, estágio supervisionado e empresa júnior –; a distância entre a formação universitária
e as exigências do mercado; o despreparo no momento de ingresso no curso; a desarticulação
entre as disciplinas da grade curricular; a desarticulação entre a universidade e a comunidade
empresarial; a falta de atualização e reciclagem dos professores, e, por fim, a falta de estímulo
à produção científica dos discentes.
As empresas juniores apresentam-se como uma estratégia promissora por duas razões:
primeiro, por viabilizarem a integração entre o aprendizado teórico e a prática, permitindo
refletir sobre o substrato teórico que dá sustentação ao curso; segundo, por garantirem que a
experiência profissional possa ser vivenciada ainda no processo de formação. É justamente
nesse aspecto que os alunos egressos da PUC/SP se destacam, em detrimento dos alunos da
UNIVERSIDADE 2, uma vez que podem participar da PUC Júnior, que lhes dá o elo entre a
teoria e a prática.
Esse elo é necessário ao contexto gestor que vivenciamos no mundo globalizado. O
novo desafio da Administração é o de contribuir para inserir e ajustar as organizações nesse
novo cenário globalizado, competitivo e de mudanças rápidas. Isso se faz com a busca
incessante de novos aspectos conceituais e metodológicos, necessários à formulação de
estratégias associadas a métodos de gestão adequados, ao planejamento e desenvolvimento, à
organização da produção, à criação da competência para administrar a mudança.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Até a última década do século passado, não havia necessidade de estudo para
conseguir emprego não qualificado, aqueles conhecidos como “chão de fábrica”. O diploma
era exigência para a gerência científica. Porém, desde as últimas décadas do século XX, as
coisas mudaram. O administrador – gestor, capaz de antever necessidades e soluções – é
aquele profissional que toda empresa procura; é o especialista em marketing, produção,
logística, finanças, RH, informática.
O mundo está mudando com rapidez jamais vista e a velocidade da mudança impacta
as organizações de maneira muito forte. As empresas precisam adaptar-se a essas mudanças e
criar ferramentas para continuar competitivas. Precisam de alguém para administrar as
pessoas, para gerar as mudanças necessárias.
O administrador está percorrendo, de modo cada vez mais veloz, uma estrada que
conhecemos cada vez menos. Por isso mesmo, é necessário antecipar os cenários dos
próximos anos, o que será um atributo não teórico, mas ligado ao verdadeiro diferencial
competitivo das organizações – uma verdadeira odisséia em recursos humanos.
Uma das mudanças mais importantes que ocorreram no ambiente de negócios nestes
últimos dez anos foi, sem dúvida, a absoluta ruptura nos padrões tradicionais de estruturação
da carreira profissional nas empresas e organizações: o emprego vitalício passou a ser mera
ficção.
Existem programas de aglutinação, ou seja, a formação de equipes multidisciplinares e
sistemas colaborativos. O homem de visão vai resolver os problemas considerando outras
empresas não mais como concorrentes, mas como parceiras, para crescerem juntas, unindo
forças no mercado e garantindo a sobrevivência das organizações. As empresas modernas
contratam consultores. O consultor orienta a implantação de sistemas intra e inter empresas,
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de planejamento avançado, de cadeias de suprimento, de planejamento colaborativo de
previsão e reposição, de gerenciamento do relacionamento com fornecedores e com clientes.
Os alunos da PUC/SP serão esses homens de visão, serão os consultores, serão os que
pensam e criam, pois têm uma formação diferenciada. Os alunos da UNIVERSIDADE 2
serão agentes operacionais, como os antigos office-boys, mas agora “enaltecidos” pelo
diploma do curso superior, serão cumpridores de ordens, os que se formam para servir.
Assim que se formam, têm de fazer especializações, MBA, cursos de língua
estrangeira, para alcançarem uma visão geral dos negócios. Somente depois de cinco ou dez
anos (conforme as aptidões de cada indivíduo) a situação começará melhorar.
As empresas estão cada vez mais competitivas, reduzindo custos e utilizando recursos
de maneira racional. Nesse cenário, o Administrador é o ator essencial, pois é o principal
agente de um processo de mudança na forma de pensar, agir e decidir os rumos da
organização. É preciso aprender a aprender, ter domínio da linguagem, ter boa dose de
inteligência emocional, ou seja, saber lidar com situações de pressão, trabalhar em equipe e
ter jogo de cintura. É fundamental estar permanentemente adquirindo cultura e conhecimentos
científico, artístico e ético.
Diante de tantas exigências, podemos afirmar que a hipótese desta pesquisa se
comprova, pois as universidades em geral, e, principalmente, as universidades mercantis de
massa não estão preparando adequadamente o aluno para o mercado de trabalho. Todos os
egressos sentem a necessidade de fazer novos cursos para complementar a formação
acadêmica, mas os da mercantil de massa precisam, além de complementá-la, suprir as falhas
de seus projetos pedagógicos. Os cursos “massificados”, ainda que supostamente bem
planejados, deparam-se com grandes dificuldades práticas de realização, como as falhas
fundamentais de formação que seus alunos apresentam quando ingressantes, as quais a
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universidade não tem condições de sanar; por exemplo: o desconhecimento de línguas
estrangeiras, de informática, de técnicas de redação e oratória. Para agravar esse quadro, a
estrutura curricular muito estanque e compartimentada de cursos como o da
UNIVERSIDADE 2 impede uma compreensão maior do caráter geral e humano que a
sociedade contemporânea exige do mercado e de seus agentes.
Tudo isso associado à dificuldade de maior clareza das áreas de atuação do gestor
contemporâneo e à necessária e adequada especialização, inviabiliza aos egressos da
UNIVERSIDADE 2 a atuação como gestores de grandes empresas e afasta seu sonho de se
tornarem profissionais administradores por excelência.
Os egressos da PUC/SP, embora também sintam necessidade de aperfeiçoamento
quando saem da universidade, são capazes de se inserir no mercado como gestores.
Constantemente sentem a necessidades de aperfeiçoamento e aquisição de novos
conhecimentos, pois é inerente ao profissional de hoje ser estudante permanente.
Necessidades que são facilmente vencidas uma vez que aprenderam a aprender.
Cabe ressaltar que esse “aprender a aprender” é facilitado pelo fato de os alunos,
quando ingressantes, possuírem requisitos fundamentais ao bom desenvolvimento acadêmico
(facilidade de leitura, noções e, muitas vezes, fluência em línguas estrangeiras) e encontram
no curso uma estrutura adequada, com orientação de estágios e pesquisa, matérias
humanísticas e específicas que facilitam e aprimoram suas habilidades cognitivas, ampliando
seus conhecimentos e suas possibilidades de inserção no mercado de trabalho.
Se entendermos que cidadania não é simplesmente o conhecimento de direitos e
deveres e muito menos uma relação particular do indivíduo que consome serviços do estado,
ou, no caso, serviços educacionais privados; teremos que afirmá-la como posse efetiva dos
bens que os direitos representam abstratamente (conteúdos, competências e habilidades
desenvolvidas por uma matriz curricular específica). Assim, os direitos garantidores da
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liberdade individual, juntamente com aqueles que asseguram ao indivíduo o acesso ao poder e
também ao bem-estar social - respectivamente chamados direitos civis, políticos e sociais -,
devem articular-se com a posse efetiva dos bens materiais, simbólicos e sociais. Logo, a
educação de qualidade é aquela capaz de formar, além de informar, de capacitar, além de
diplomar: é a educação cidadã.
O cidadão, portanto, para além do cliente e do conhecedor de seus direitos e deveres,
será aquele com um papel ético-político definido, qual seja, o de superar a sua condição de
indivíduo para se projetar criativamente na sociedade e no mercado global, visando ampliar
sua participação na construção de um mundo mais humano, mais justo e menos desigual. As
condições necessárias para essa formação (flexibilidade curricular, orientação, união prática-
teoria) encontram-se, paradoxalmente, nas universidades cujos clientes já são os mais
favorecidos econômica e culturalmente, em oposição aos alunos das universidades mercantis
de massas, os quais se tornam, com muito custo, cidadãos clientes de um produto que não
contém o amálgama necessário para lançá-los nas novas condições de trabalho do mundo
globalizado, tornando-se, portanto, cidadãos consumidores de segunda classe.
Os de primeira classe, embora consumidores, compram produtos de acordo com as
necessidades contemporâneas. Isso leva a concluir que a forma como o ensino superior
brasileiro vem se desenvolvendo em São Paulo, tendo como exemplo o curso de
Administração, mais do que manter a desigualdade, vem ampliando, através do disfarce
cidadão, a margem que separa um profissional moderno, criativo e inovador do de um
profissional diplomado cumpridor de tarefas.
Os resultados aqui apresentados e analisados apontam a necessidade de mais diálogo
entre os setores da universidade. Há de se discutir não só a melhoria da integração entre
formação científica e profissional, que diz respeito à responsabilidade institucional, mas
também a necessidade de reformulação curricular. O objetivo é otimizar o aproveitamento dos
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recursos acadêmicos em prol da adequação ao mercado de trabalho e da diminuição da
desigualdade de competências e conhecimentos entre os egressos da universidade, o que, por
sua vez, teria conseqüências positivas na diminuição do exército de reserva dos setores
produtivo e de serviços.
Iniciativas como as de controle de qualidade das instituições universitárias (provão e
ENADE) são cada vez mais necessárias para identificarmos e corrigirmos as deficiências do
ensino superior, já admitidas pelo governo brasileiro. Assim, a educação superior, responsável
e eficiente, estaria participando da melhoria de condições salariais para a população
economicamente ativa, diminuindo, inclusive, o número de ocupações precárias e informais;
em contrapartida, possibilitaria maior arrecadação de impostos que poderiam retornar à tão
necessária educação pública.
Temos plena convicção de que a educação pode definir o futuro do país. É de infinita
importância, por exemplo, para a superação da desigualdade social crônica que caracteriza o
Brasil. É por meio dela, também, que evoluiríamos em qualidade de vida e bem-estar social.
Entretanto, notamos que falta muito para que a educação seja satisfatória e possibilite a
satisfação desses objetivos. Hoje, não atende às necessidades imediatas e futuras da nossa
sociedade, provocando o atraso de sua inserção no mundo globalizado.
Houve a democratização do ensino, a universidade abriu-se para todos: pobres, negros,
índios. O escopo dessa democratização era diminuir ou acabar com a desigualdade social, mas
ela revelou um quadro perverso: todos os alunos ingressaram na universidade, e, como
conseqüência, passou a haver duas universidades. Uma prepara para a gestão dos negócios,
pessoas e coisas; outra, para a execução dos projetos e planos visionários dos gestores
criadores. A democratização da escola não é fator de redução da desigualdade social porque
há desigualdade no ensino.
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Os alunos da PUC/SP vêm de famílias da classe dominate, com escolaridade de nível
superior, que viajam dentro e fora do país, que têm renda per capita alta, que podem comprar
livros e manter seus filhos nos melhores e mais caros colégios particulares, que podem, enfim,
garantir-lhes condições bastantes para estudar, pesquisar e destacar-se numa profissão de
prestígio.
Por outro lado, os alunos da universidade mercantil de massa são filhos de pais sem
formação escolar, com dificuldades financeiras, sem emprego qualificado, que precisam da
ajuda dos filhos para compor a renda familiar. Esses alunos sempre estudaram à noite, porque
trabalhavam e não dispunham de ócio para dedicar aos estudos. Não puderam pagar cursos de
língua estrangeira, nem de informática, ou qualquer outra habilitação complementar.
Tampouco aprenderam a ser exigentes e cobrar da universidade por infraestrutura, ensino de
qualidade, professores competentes e dedicados. Sentem-se realizados pelo simples fato de
cursarem o ensino superior. São os primeiros da família a obter o grau universitário. Isso é
motivo de orgulho, e conformam-se com o pouco que a universidade lhes oferece. São
enganados, iludidos, mas não se dão conta, pois não têm tradição escolar e a falta de
parâmetros lhes prejudica o julgamento.
Curso universitário não é elevador social. Dadas as enormes exigências, a empresa
quer um trabalhador ativo, inteligente, criativo, que pense e que tenha competência para
resolver problemas.
O estágio avançado do mercado em Administração de Empresas no Brasil e as novas
exigências para uma crescente profissionalização impulsionarão a universidade a valorizar e
criar mais espaços para a pesquisa e para o ensino de qualidade. A nova conjuntura política do
país e o fortalecimento e consolidação das instituições democráticas são fatores que cada vez
mais contribuirão para o florescimento e a expansão da administração organizacional das
empresas.
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A nova postura das organizações frente à sociedade e à opinião pública exigirá bases
conceituais mais sólidas para a prática profissional. A globalização, a revolução tecnológica e
a complexidade contemporânea exigirão cada vez mais que as universidades pensem e
planejem estrategicamente seu projeto pedagógico, não podendo prescindir da pesquisa
científica.
Espera-se que o presente trabalho contribua para a reflexão sobre a situação atual dos
cursos superiores, principalmente da área de Administração de Empresas, e sirva de referência
para novos estudos e questionamentos. Acredita-se que a tendência seja melhorar a qualidade
da pesquisa científica e, com isso, se consiga uma identidade mais agressiva do campo, tanto
no âmbito acadêmico quanto no mercado profissional.
Leituras afins, paralelas, feitas durante a realização desta pesquisa, sugerem que o
mesmo que ocorre ao curso de Administração de Empresas repete-se nas demais carreiras
universitárias. A dupla concepção de universidade, no interior da educação superior brasileira,
insiste em se repetir nos vários domínios do conhecimento; também, na formação de
tecnólogos e bacharéis.
Os resultados desta pesquisa demonstram que os alunos da PUC/SP encontram-se,
hoje, em posições importantes no mundo dos negócios, são proprietários, diretores de
planejamento, superintendentes. Esses, ao contrário dos alunos da UNIVERSIDADE 2,
chegaram a seus postos de trabalho após se submeterem a concursos, exames de admissão,
testes, seleções rigorosas. Na verdade, os dados da presente pesquisa sugerem que estamos
diante de instituições que se diferenciam não só em função do capital cultural disponível a seu
público, mas também em função do grau de exigência que solicitam quanto à manipulação
desse capital. Também estamos diante de instituições que possibilitam a seus egressos
carreiras e papéis diferentes.
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Vivemos um processo acelerado de desnacionalização da educação brasileira, com o
fortalecimento e expansão das instituições de ensino superior privadas que, por meio de
fusões e incorporações, vêm ampliando suas atividades ao adquirir outras instituições de
menor porte. Os investidores estrangeiros deparam-se com um ambiente perfeito para a
atividade e o lucro, pois no país não há regulamentação para a atividade. A educação superior
torna-se, cada vez mais, uma mercadoria de fácil aquisição, mas seus consumidores não
recebem todos a mesma qualidade.
Aquele que pode mais, ou seja, que possui poder econômico para pagar universidades
privadas não mercantis e/ou cursar escolas de ensino fundamental e médio de primeira linha,
que possibilitem aprovação nos vestibulares públicos, fica com os melhores produtos – sejam
eles públicos ou privados. Aquele com maior dificuldade financeira, em contrapartida, acaba
adquirindo mercadorias educacionais de segunda linha. Assim perpetua-se a desigualdade
social, em níveis diferenciados de status e poder, na sociedade como um todo.
Sabemos que a educação é um reflexo sintomático do modelo de desenvolvimento de
uma nação, uma vez que tal modelo está diretamente ligado à capacidade de produção de
conhecimento, seja por meio de pesquisas em ciência e tecnologia, seja para a capacitação de
trabalhadores qualificados.
No Brasil, essa responsabilidade é do ensino superior público e de poucas
universidades privadas, muitas delas confessionais, como a PUC/SP, que, apesar de muitas
adversidades, conservam-se como pólos de produção intelectual.
A situação é preocupante, ainda mais se atentarmos à recente formação de
conglomerados educacionais no campo do ensino superior, que nos colocam em risco – ainda
maior – a autonomia de pesquisa e a qualidade de ensino.
Se investidores internacionais e agentes de especulação financeira da bolsa de valores
estão tão interessados em nosso ensino superior privado é porque vislumbram um caminho
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promissor para a obtenção do lucro. Todos esses conglomerados estão encampando grandes
universidades mercantis de massa. Mas sob que critérios? Servindo a que interesses? A
resposta é, sem dúvida, sob o critério do lucro e no interesse do lucro.
Importa destacar que a preocupação das entidades ligadas à educação com essa
questão não é de hoje. O projeto de reforma universitária, engavetado no Congresso Nacional,
fruto de um amplo e democrático debate, já propunha a limitação de até no máximo 30% de
capital estrangeiro nas IES. Afinal, a ingerência do capital internacional em nossa educação é
inaceitável. E cabe ao estado brasileiro, em prol do desenvolvimento nacional, garantir
qualidade de ensino, acesso democrático, valorização do trabalho em educação. A CONTEE16
(Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino) lançou a
campanha “Educação não é mercadoria” e afirmou:
Conceber a educação a partir de uma estrita lógica de mercado compromete os destinos das novas e futuras gerações. O que está em jogo é o futuro do país, que necessita de um sistema de educação superior comprometido com o desenvolvimento democrático e soberano (Publicado em 10/04/07).
Enfim, gostaríamos de deixar declarado que o subdesenvolvimento do Brasil jamais
será superado sem investimentos maciços em educação de qualidade. Há necessidade de se
subsidiarem discussões sobre a função da universidade brasileira, seu compromisso com a
produção científica e seu papel na questão da formação humana. É preciso promover o debate
sobre a qualidade da educação e a necessidade urgente de uma regulamentação da educação
superior; é preciso criar condições para a qualificação do trabalho docente em todas as
universidades, públicas ou privadas, mercantis ou confessionais; é preciso valorizar e
estimular a construção de instâncias democráticas de formulação e decisão pelo coletivo dos
16 A Contee (Confederação Nacional dos Trabalhadores em Estabelecimentos de Ensino) lançou a campanha
"Educação não é mercadoria", iniciativa que vai desencadear uma série de manifestações em todo o país contra a desnacionalização do ensino superior. O ato será realizado na cerimônia de abertura do 13º Consind (Conselho Sindical da Contee), no Rio de Janeiro. Da redação. Portal da Contee, 10/04/2007.
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docentes, estudantes e corpo técnico-administrativo das instituições de ensino responsáveis
pelo destino e autonomia deste país no mundo globalizado.
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205
ANEXOS
ANEXO A - ENTREVISTA COM PROFESSORES DA PUC/SP (PONTIFÍCIA
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO)
Dados Pessoais
Nome: Data de Nascimento: E-mail: Telefones:
Endereço Residencial
Rua/Av.: Cidade: Estado: CEP:
FORMAÇÃO ACADÊMICA
Titulação: (especialista, mestre, doutor) Área da titulação: Graduação:
Instituição: ano de conclusão:
Questões
1-É funcionário da instituição desde quando? 2-Qual seu regime de trabalho? (Quantas horas:parcial, total) 3-Quais as disciplinas que leciona nesta instituição? E no curso de ADM.? Leciona em outras instituições também? 4-Trabalha em outra empresa na área de administração? 5-Vc. trabalha na área de Negócios Empresariais, ou na área de Ambiente Social, ou 3º setor.(p.4 )especifique. 6-Como vc. vê seu espaço ocupacional; Vc. se enquadra como: gestor, analista, trabalho em equipe e/ou consultor. 7-Há quanto tempo atua como docente do ensino superior na administração de empresas? 8-Vc. vê algum diferencial no curso de ADM. Nesta instituição? Qual? 9-De que forma sua disciplina contribui para formar as competências desejadas (conhecimentos, habilidades, atitudes e valores) para um administrador no mundo contemporâneo 10-Vc. conhece o Projeto Pedagógico do curso? 11-Vc. tem reuniões periódicas para discussão do curso? 12-Participa ou participou de algum comitê de avaliação para melhoria do curso? 13-De que forma vc. acha que o curso em geral contribui para o desenvolvimento das competências necessárias para o administrador? Comente e avalie de zero a 5 14-Atividades Complementares. 15-TCC Existem linhas de pesquisa? Quais? Vc. é orientador de pesquisas de iniciação científica? 16-Estágio. Como é realizado? Na sua opinião como ele contribui para a inserção do aluno no mercado de trabalho. Está relacionado com o TCC?
206
17-Vc. conhece a Empresa Junior – Puc Jr. Existe integração de sua disciplina com ela? Como? 18-Como vc. percebe a integração de sua disciplina ao projeto curricular do curso? 19-O que é Central de estudo de caso? Vc. se utiliza dessa Central, como? 20-Já ouviu falar da Cátedra de Gestão de Negócio?De que forma sua disciplina participaria desta? 21-Quais as vantagens e desvantagens de trabalhar com sua disciplina nesta instituição? 22-O que acha do curso de ADM. desta universidade? 23-Quais as exigências do Mercado de Trabalho para o administrador de empresa? Esta Universidade contribui para o aluno atingir essas exigências? Como? Aspectos profissionais 24-O que mais do Curso contribui para que seus alunos consigam se inserir no mercado de forma satisfatória? (Tcc, Estágio, Puc Jr,. Nome da Instituição..) 25-Quais são as dificuldades e/ou facilidades encontradas pelos alunos para sua inserção no mercado de trabalho, após a graduação? Aspectos acadêmicos 26-Participou ou está participando de algum curso de Especialização, Mestrado ou Doutorado? Se a resposta for sim, em qual Instituição? 27-Você publicou algum trabalho relacionado à sua área de formação nos dois últimos anos? Se a resposta for sim, informe Título, local e data de publicação: Aspectos individuais 28-Você recomenda (ou recomendou) o Curso a outras pessoas? Por quê?
207
ANEXO B - ENTREVISTA COM PROFESSORES DA UNIVERSIDADE 2
Dados Pessoais
Nome: Data de Nascimento: E-mail: Telefones:
Endereço Residencial
Rua/Av.: Cidade: Estado: CEP:
FORMAÇÃO ACADÊMICA
Titulação: (especialista, mestre, doutor) Área da titulação:
Graduação:
Instituição: ano de conclusão:
Questões
1-É funcionário da instituição desde quando? 2-Qual seu regime de trabalho? ( Quantas horas:parcial, total) 3-Quais as disciplinas que leciona nesta instituição? E em outras? Desenvolve pesquisa? 4-Trabalha em outra empresa na área de administração? 5-Vc. trabalha na área de Negócios Empresariais, ou na área de Ambiente Social, ou 3º setor?.Especifique. 6- Como vc. vê seu espaço ocupacional; Vc. se enquadra como: gestor, analista, trabalho em equipe e/ou consultor. 7-Há quanto tempo atua como docente do ensino superior na administração de empresas? 8-Vc. vê algum diferencial no curso de ADM. Nesta instituição? Qual? 9-De que forma sua disciplina contribui para formar as competências desejadas (conhecimentos, habilidades, atitudes e valores) para um administrador no mundo contemporâneo. 10-Vc. conhece o Projeto Pedagógico do curso? 11-Vc. tem reuniões periódicas para discussão do curso? 12-Participa ou participou de algum comitê de avaliação para melhoria do curso? 13-De que forma vc. acha que o curso em geral contribui para o desenvolvimento das competências necessárias para o administrador? Sobre o curso de ADM., avalie de zero a 5 e comente 14-Atividades Complementares. 15-TCC Existem linhas de pesquisa? Quais? Vc. é orientador de pesquisas de iniciação científica? 16-Estágio. Como é realizado? Na sua opinião como ele contribui para a inserção do aluno no mercado de trabalho. Está realacionado com o TCC. 17-Vc. conhece a empresa Junior desta instituição? Existe integração de sua disciplina com ela? Como? 18-Como vc. percebe a integração de sua disciplina ao projeto curricular do curso?
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Aspectos profissionais 19-O que mais do Curso contribui para que seus alunos consigam se inserir no mercado de forma satisfatória? (Tcc, Estágio, Empresa Jr, Nome da Instituição...) 20-Quais são as dificuldades e/ou facilidades encontradas pelos alunos para sua inserção no mercado de trabalho após a graduação? Aspectos acadêmicos 21-Participou ou está participando de algum curso de Especialização, Mestrado ou Doutorado? Se a resposta for sim, em qual Instituição? 22-Você publicou algum trabalho relacionado à sua área de formação nos dois últimos anos? Se a resposta for sim, informe Título, local e data de publicação: Aspectos individuais 23-Você recomenda (ou recomendou) o Curso a outras pessoas? Por quê?
209
ANEXO C - ENTREVISTA COM EGRESSOS DA PUC/SP
Dados Pessoais
Nome: Data de Nascimento: E-mail: Telefones:
Endereço Residencial: Rua/Av.: Cidade: Estado: CEP:
Formado no ano:___________
Questões
1-Por que vc. escolheu o curso de Administração de Empresas, quando ingressou no curso superior? Quais os motivos? 2-Quais os motivos que o levaram a escolher este curso e a PUC/SP, quando entrou no curso superior? 3-Vc. fez cursinho? Qual? Quantos anos? Prestou outros vestibulares? Quais? 4-Onde fez o Ensino Médio? Entrou logo em seguida na Universidade? 5-Como vc. se vê depois de formado no que se refere às suas características pessoais (conhecimentos, habilidades, atitudes e valores, ou seja como entrou e como saiu da Universidade)? 6-De que forma vc. acha que o curso de ADM da PUC contribuiu para o desenvolvimento dessas características ? 7-Que competência vc. adquiriu no curso dentro das áreas: técnicas, humana e funcional prescritas no projeto pedagógico de seu curso? Sobre seu curso, avalie de zero a 5 e comente 8-Atividades Complementares.Quantas horas? Onde foram feitas? Contribuiu para seu crescimento cultural, como? 9-TCC. Qual a linha de pesquisa que seguiu? Por quem foi orientado? Como foi a apresentação do trabalho? O que contribuiu para seu desempenho profissional? 10-Estágio. Foi relacionado com sua atividade prática? Estava relacionado com o TCC? Ajudou seu ingresso no mercado de trabalho?E o orientador colaborou para tirar suas dúvidas? E o relatório de estágios?Qual a importância do estágio? 11-Além do estágio curricular, vc. fez também ,estágio extra-curricular? 12-Sobre a Empresa Junior – Puc Jr.- Contribuiu para desenvolver suas competências? Ajudou na inserção do Mercado de trabalho?Ajudou no acompanhamento das aulas? 13-De que forma as discussões sobre diversidades étnico-raciais influenciam sua atuação profissional? 14-Como vc. percebia a integração curricular de seu curso? Houve? Como? 15-Participou da assessoria de relações institucionais e internacionais da PUC/SP? Já ouviu falar da Universidade de Compostela da Espanha? 16-Vc. utilizou durante o curso a orientação psico-pedagógica do Puc? Como funciona? 17-O que é Central de estudo de caso? Em que disciplina ela estava presente? 18-Já ouviu falar da Cátedra de Gestão de Negócio? 19-Cite um diferencial de seu curso que o ajudou na sua inserção no Mercado de trabalho. 21-Houve coerência entre a teoria e a prática ensinadas no curso que vc. fez de ADM?
210
Aspectos profissionais 22-Quanto ao vínculo profissional: é autônomo, funcionário público, empregado na empresa, ou outros? Seu trabalho é relacionado à área do curso? 23-Vc. trabalha na área de Negócios Empresariais, ou na área de Ambiente Social, ou 3º setor.(p.4 )especifique. 24-Como vc. vê seu espaço ocupacional; Vc. se enquadra como: gestor, analista, trabalho em equipe e/ou consultor. Justifique. P.8 25-O que mais contribuiu do Curso de ADM. para que você conseguisse seu emprego atual? (Nome da faculdade, Tcc, Estágio, Puc Jr, Um prof. específico, etc, uma disciplina...) 26-Quais foram as dificuldades encontradas para sua inserção no mercado de trabalho, durante e após a graduação? 27-Há coerência entre a teoria e a prática ensinadas no curso que vc. fez de ADM? 28-Qual o perfil do profissional exigido no Mercado de trabalho atual? Sua Universidade contribuiu para vc. adquirir o perfil desejado? Como? Aspectos acadêmicos 29-Participou ou está participando de algum curso de Especialização, Mestrado ou Doutorado? Em qual Instituição? 30-Você publicou algum trabalho relacionado à sua área de formação nos dois últimos anos? Se a resposta for sim, informe Título, local e data de publicação: 31-Como o Curso contribuiu para o seu crescimento pessoal? Dê uma nota de 1 a 5 e justifique. 32-Você recomendaria (ou recomendou) o Curso a outras pessoas? Por quê?
211
ANEXO D - ENTREVISTA COM EGRESOS DA UNIVERSIDADE 2
Dados Pessoais
Nome: Data de Nascimento: E-mail: Telefones:
Endereço Residencial: Rua/Av.: Cidade: Estado: CEP:
Formado no ano: _________
Questões
1-Por que vc. escolheu o curso de Administração de Empresas, quando ingressou na Universidade? Quais os motivos? 2-Quais os motivos que o levaram a escolher este curso e a Uniban, para fazer o curso superior? 3-VC.precisou fazer cursinho? Qual? Quantos anos? 4-Onde fez o Ensino Médio? Entrou logo em seguida na Universidade? 5-Como vc. se vê depois de formado no que se refere às suas características pessoais (conhecimentos, habilidades, atitudes e valores, ou seja como entrou e como saiu da Universidade)? 6-De que forma vc. acha que o Curso de ADM. da UNIBAN, contribuiu para o desenvolvimento dessas características ? 7-Que competências adquiriu no curso dentro das áreas: técnicas, humana e funcional? Sobre seu curso avalie de zero a 5 e comente 8-Atividades Complementares. Quantas horas? Onde foram feitas? Contribuiu para seu crescimento cultural, como? 9-TCC. Qual a linha de pesquisa que seguiu? Por quem foi orientado? Como foi a apresentação do trabalho? O que contribuiu para seu desempenho profissional? 10-Estágio. Foi relacionado com sua atividade prática? Estava relacionado com o TCC.? Ajudou seu ingresso no mercado de trabalho?E o orientador colaborou para tirar suas dúvidas? E o relatório de estágios?Qual a importância do estágio curricular? 11-Além do estágio curricular, vc. fez também, estágio extra-curricular? Qual a diferença entre eles? 12-Vc. participou da empresa Junior da Uniban?. Contribuiu para desenvolver suas competência. Ajudou na inserção do mercado de trabalho? Ajudou no acompanhamento das aulas? De que forma? Explique. 13-Existiram discussões sobre diversidades étnico-raciais no seu curso e até que ponto influenciam sua atuação profissional? 14-Como vc. percebia a integração curricular de seu curso? Houve? Como? 15-Houve coerência entre a teoria e a prática ensinadas no curso que vc. fez de ADM? 16-Cite um diferencial de seu curso que o ajudou na sua inserção no mercado de trabalho. 17-Qual o perfil do profissional exigido no mercado de trabalho atual? Aspectos profissionais
212
18-Quanto ao vínculo profissional: é autônomo, funcionário público, empregado na empresa, ou outros? Seu trabalho é relacionado à área do curso? 19-Vc. trabalha na área de Negócios Empresariais, ou na área de Ambiente Social, ou 3º setor.(p.4 )especifique. 20-Como vc. vê seu espaço ocupacional; Vc. se enquadra como: gestor, analista, trabalho em equipe e/ou consultor. Justifique. P.8 21-O que mais contribuiu do Curso de ADM. para que você conseguisse seu emprego atual? (Nome da faculdade, Tcc, Estágio, Puc Jr, Um prof. específico, etc, uma disciplina...) 22-Quais foram as dificuldades encontradas para sua inserção no mercado de trabalho, durante e após a graduação? 23-Há coerência entre a teoria e a prática ensinadas no curso que vc. fez de ADM? 24-Qual o perfil do profissional exigido no Mercado de trabalho atual? Sua Universidade contribuiu para vc. adquirir o perfil desejado? Como? Aspectos acadêmicos 25-Participou ou está participando de algum curso de Especialização, Mestrado ou Doutorado? Se a resposta for sim, em qual Instituição? 26-Você publicou algum trabalho relacionado à sua área de formação nos dois últimos anos? Se a resposta for sim, informe Título, local e data de publicação: Aspectos individuais 27-Como o Curso contribuiu para o seu crescimento pessoal? Dê uma nota de 1 a 5 e justifique. 28-Você recomendaria (ou recomendou) o Curso a outras pessoas? Por quê?
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ANEXO E - ENTREVISTA COM GERENTES DE RH
Identificação da Empresa
Nome da Empresa
Endereço: Rua Bairro CEP. TEL:
Atividade Principal da Empresa:
È empresa nacional, ou multinacional?
Informações Pessoais do Gerente de RH
Nome:
Endereço Tel:
e-mail:
Formação Acadêmica
Fez faculdade de:
Nome da Faculdade em que se formou:
Fez ou faz algum curso de especialização, mestrado, ou doutorado? Qual, onde?
Questões
1-Há quanto tempo trabalha nesta instituição como chefe de RH? 2-Quais as principais atividades de um chefe de RH? 3-Quando precisam de funcionários, qual é o procedimento( fazem anúncios, indicações, agências de emprego, internet.., etc....). 4-Como se dá a inserção do profissional na sua empresa? 5-Quais as exigências para admitir funcionários de Administração de Empresas? 6-Qual o critério de seleção usados na sua empresa, para admitir funcionários administrativos? 7-Como é feito o processo seletivo na sua empresa? 9-Qual o perfil do profissional exigido pelo mercado de trabalho de hoje? 10-Qual o perfil que sua empresa exige, e qual faculdade oferece profissionais com esse perfil? 11-Na sua empresa é levado em consideração o nome da faculdade em que o profissional a ser admitido se formou? 12-Vc. vê diferenças nos profissionais da PUC e USP, ou outras consideradas Top de linha? 13-Vcs. Exigem experiência profissional do candidato? 14-Enumere qualidades e defeitos mais comuns que os candidatos apresentam quando chegam para serem selecionados. 15-Qual a faixa salarial paga para Administradores de Empresa nesta instituição? 16-Tem algo mais que gostaria de completar que não foi perguntado?