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6b866b28-1c7b-428d-9ba0-02312487d833 Os direitos de propriedade intelectual de todos os conteúdos do Público – Comunicação Social S.A. são pertença do Público. Os conteúdos disponibilizados ao Utilizador assinante não poderão ser copiados, alterados ou distribuídos salvo com autorização expressa do Público – Comunicação Social, S.A. Sri Lanka A vida de Buda cabe dentro de um triângulo FUGAS | Público N.º 10.143 | Sábado 27 Janeiro 2018 Club Med Samoëns 265 quilómetros de neve para esquiar nos Alpes Protagonista Rui Moura Alves, o senhor vinagre

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Page 1: nstituto de lta erormance - Accenture€¦ · fato de o Brasil ainda se comportar como uma economia relativamente fechada. Embora o país tenha se aberto ao longo das duas últimas

Connections with Leading ThinkersO especialista em inovação Lourenço Bustani analisa as dificuldades que travam a inovação na economia brasileira e discute possíveis soluções.

Instituto de Alta Performance

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Lourenço Bustani é co-fundador e sócio da Mandalah, consultoria de inovação que ajuda seus clientes a aumentar tanto sua rentabilidade quanto sua contribuição para as pessoas e o planeta. Fundada no Brasil, hoje a Mandalah tem escritórios em cinco países, em quatro continentes. Em 2012, a Fast Company apontou Bustani como uma das 100 pessoas mais criativas do mundo dos negócios. Eduardo Plastino, do Instituto de Alta Performance da Accenture, o entrevistou como parte de uma pesquisa sobre inovação na economia brasileira.

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IAPA: Você observa as dificuldades que as empresas brasileiras enfrentam para inovar. Considerando o tamanho da economia do Brasil, por que é tão desafiador inovar aqui?

BUSTANI: A razão fundamental é o nosso déficit educacional. Esse é o nosso calcanhar de Aquiles. E não estamos falando apenas de nossas escolas públicas, mas de todos os níveis, inclusive do ensino superior. O resultado é uma escassez significativa de talentos. Por conseguinte, temos relativamente poucas iniciativas verdadeiramente disruptivas e vencedoras, seja nas grandes empresas ou em start-ups – e estas são fundamentais para fomentar a inovação no país.

IAPA: Que outros fatores contribuem para este cenário?

BUSTANI: Muitos deles estão ligados ao fato de o Brasil ainda se comportar como uma economia relativamente fechada. Embora o país tenha se aberto ao longo das duas últimas décadas, as empresas ainda não sentem o peso de ter de se diferenciar, como é evidente em mercados mais maduros no mundo todo. Nossa estrutura econômica ainda reflete esse legado de muitas formas. O governo adota políticas que, embora talvez sejam bem intencionadas, não são as ideais. Estas políticas perpetuam a mentalidade de uma economia fechada.

IAPA: Você pode dizer mais sobre como a estrutura econômica brasileira reflete esse legado de isolacionismo?

BUSTANI: Do lado das políticas públicas, não há muito apoio do governo para a inovação. As iniciativas são principalmente periféricas — nada remotamente parecido ao que se vê em muitas economias avançadas. Do lado corporativo, as empresas públicas e familiares continuam a desempenhar um grande papel na economia do Brasil. Muitas só recentemente começaram a migrar do que poderíamos chamar de um estilo de gestão centrado na família para um estilo mais profissionalizado. Assim, vários líderes empresariais ainda estão jogando de acordo com as regras de um jogo que se tornou obsoleto. Além disso, muitos se focam excessivamente no curto prazo. E, em alguns setores, ainda há semi-monopólios ou oligopólios, com relativamente poucos players. Isso prejudica ainda mais a inovação. Além disso, historicamente, os cidadãos brasileiros nunca pressionaram muito as empresas a inovar, pois de toda forma havia poucas opções disponíveis para eles. Agora eles estão se tornando mais sofisticados em seus desejos e mais informados sobre sua maior gama de opções, mas as empresas ainda não se adaptaram a isso. Quando você considera a enorme complexidade do nosso sistema tributário, que obriga as empresas a dedicar ao processo de pagar impostos tempo, energia e dinheiro que poderiam ser mais bem utilizados em esforços mais valiosos, você chega a um cenário que não é muito propício à inovação.

IAPA: Ainda assim, existem algumas empresas extremamente inovadoras no Brasil. Como elas conseguiram chegar a esse ponto?

BUSTANI: Mesmo nossas empresas mais inovadoras ainda não são totalmente inovadoras. Muitas pessoas no Brasil tendem a apresentar essas empresas como extremamente inovadoras e vê-las como referências globais. Não quero negar seus muitos méritos, é claro, mas acho perigoso olharmos para uma empresa como fonte de inspiração para a inovação quando a maioria de seus produtos e serviços não tem a qualidade que deveria ou poderia ter, seus processos são arcaicos, suas estruturas são hierárquicas e sua cultura, em geral, nada inspiradora.

“No Brasil, poucos líderes empresariais parecem dispostos a ser aqueles que vão mudar o jogo”

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IAPA: Mesmo com todos esses desafios, acreditamos que as empresas brasileiras poderiam aumentar a sua capacidade de inovação se adotassem uma abordagem mais aberta e colaborativa. No entanto, há pouca colaboração aqui no Brasil — por exemplo, entre grandes e pequenas empresas. O que você acredita que está por trás disso?

BUSTANI: Grandes e pequenas empresas são tão diferentes entre si que muitas nem sequer enxergam a possibilidade da cooperação. Profissionais de grandes empresas geralmente têm uma formação acadêmica, carreira e até mesmo visão de mundo muito diferentes daquelas comuns para quem trabalha em empresas pequenas. A assimetria de poder também é um fator. É muito difícil colaborar quando um lado tem muito mais a ganhar ou perder do que o outro. No Brasil, muitos empresários e donos de pequenas empresas se sentem impotentes ao lado de uma grande corporação.

IAPA: Mas a necessidade de proteger e aumentar sua parcela de mercado não deveria motivar as empresas a explorar todas as alternativas possíveis para inovar?

BUSTANI: Isso acontece em mercados onde as empresas enfrentam necessidade constante de se reinventar por causa da concorrência intensa e das cada vez mais frequentes rupturas provocadas pela tecnologia. Nesses mercados, a inovação torna-se uma questão de sobrevivência. Vemos isso em nossas operações nos mercados dos Estados Unidos e Japão, por exemplo. No Brasil, porém, a maioria das empresas não parece sentir esse tipo de pressão. Como resultado, poucos líderes parecem dispostos a ser aqueles que vão mudar o jogo.

IAPA: No caso de empresas que têm essa disposição, quais as competências que os colaboradores precisam ter para torná-las mais inovadoras?

BUSTANI: Os colaboradores dessas empresas precisam de um repertório diversificado de competências. Estas incluem a capacidade de ver o negócio de suas empresas como parte de um ecossistema mais amplo e de entender as complexas políticas públicas que podem afetar o crescimento futuro do negócio. Os colaboradores também precisam entender as vulnerabilidades do Brasil, porque estas muitas vezes escondem as maiores oportunidades de negócios. Finalmente, eles precisam ter uma atitude equilibrada em relação ao risco. Não podem ser ousados demais, para não tornar sua empresa vulnerável. Mas também não podem ser conservadores demais, porque isso deixaria a empresa estagnada.

IAPA: Qual é a importância das competências técnicas (hard skills) tradicionais, como a compreensão dos sistemas de propriedade intelectual, para a capacidade de inovação de uma empresa?

BUSTANI: Entender como a propriedade intelectual funciona é importante, mas o seu departamento jurídico pode resolver isso. O principal problema em termos de competências ligadas à inovação no Brasil é que as pessoas saem da universidade incapazes de pensar criticamente, expressar suas ideias claramente por escrito ou oralmente, exercer liderança e trabalhar em equipe ou em diferentes funções nas organizações. A falta dessas competências pessoais (soft skills) torna a inovação muito difícil para as empresas. Tendo dito isso, é claro que você precisa tanto de competências técnicas quanto de competências pessoais para inovar. Se você não consegue se expressar claramente, não importa o quanto você entende de propriedade intelectual, tecnologia ou qualquer outra área técnica, porque as pessoas não vão ouvi-lo.

IAPA: Quais são as características de uma empresa verdadeiramente inovadora?

BUSTANI: Ela deve ter um propósito claro que toda a equipe abraça. É meritocrática, favorecendo o verdadeiro talento, independentemente da idade e do tempo de serviço. Adota uma abordagem multidisciplinar em relação ao trabalho, promovendo a interação entre os departamentos para que as pessoas troquem conhecimentos com colegas com os quais normalmente não se relacionariam. A empresa recebe de braços abertos as contribuições que os colaboradores trazem de sua vida fora do escritório, pois todas as experiências podem inspirar inovações. Esta atitude centrada no ser humano permeia a organização.

“Você precisa tanto de competências técnicas quanto de competências pessoais para inovar”

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IAPA: Você acredita que exista um papel para os processos padronizados na inovação? Caso haja, qual seria?

BUSTANI: Você não pode se livrar de todos esses processos em um ambiente corporativo, mas deve tentar ter a menor quantidade possível, mantendo apenas aqueles essenciais para que o trabalho seja bem feito. A inovação sempre vem com risco e erro, então as empresas devem dar aos profissionais autonomia para cometer erros. Processos, por sua vez, existem para minimizar os erros. Portanto, ter processos demais atrapalha a inovação.

É claro que as empresas não podem se dar ao luxo de cometer um número excessivo de erros. Elas precisam encontrar o equilíbrio certo entre a eficiência de suas operações existentes e sua capacidade de inovar. Se você quer abraçar a inovação, tem de estar preparado para assumir alguns riscos. Isso deve se refletir em suas políticas. Um bom exemplo são as políticas de remuneração. A maioria das empresas tem políticas de remuneração que recompensam atitudes excessivamente conservadoras. Pense em alguém que está em uma empresa há vinte anos, atualmente no cargo de diretor. Muita gente nessa posição tem família e contas altas para pagar. Essas pessoas podem identificar uma oportunidade de inovação, mas temer que ela não funcione. Um fracasso poderia lhes custar o bônus, a promoção ou até mesmo o emprego. Então, elas não vão arriscar. Consequentemente, sua empresa não vai inovar.

IAPA: O que acontece com os colaboradores mais jovens nas empresas brasileiras? Eles são igualmente conservadores?

BUSTANI: Muitos querem mudar o mundo, a começar pelas empresas em que trabalham. Esses jovens têm uma visão de mundo diferente, e as corporações precisam se adaptar a isso. Na verdade, estamos vendo um choque entre dois paradigmas de negócios. O velho paradigma é baseado em práticas de mercado predatórias. As empresas são vistas como entidades fechadas, e a concorrência, como a única forma possível de atuação no mercado. Nesta mentalidade, o mundo dos negócios é um jogo de soma zero. Alguém tem que perder para que outro possa ganhar. O conhecimento é proprietário. Mas os jovens hoje vivem em um mundo open source, informado pela ideia de que a inteligência coletiva beneficia todos. Neste novo paradigma, o pressuposto fundamental é de que nós não apenas podemos coexistir, como também de que cada um pode reforçar o potencial dos demais. Quando você olha para o mercado com essa ótica, a concorrência é substituída pela cooperação integrada e a criação de valor compartilhado. Para inovar, as empresas precisam se adaptar a essa nova mentalidade.

IAPA: Muito obrigado. Nossa conversa foi extremamente interessante.

BUSTANI: Foi um prazer.

“Uma atitude centrada no ser humano deve permear a organização”

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Accenture, seu logotipo eHigh Performance Delivered são marcas registradas da Accenture.

Como parte da missão do Instituto de Alta Performance da Accenture de desenvolver ideias e insights de ponta, seus pesquisadores conversam com frequência com líderes acadêmicos, executivos de empresas e analistas setoriais. A série Connections with Leading Thinkers inclui algumas dessas entrevistas, mostrando os bastidores das interações entre os pesquisadores e alguns dos experts mais renomados do mundo.

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Sobre a Accenture

A Accenture é uma empresa líder global em serviços profissionais, com ampla atuação e oferta de soluções em estratégia de negócios, consultoria, digital, tecnologia e operações. Combinando experiência ímpar e competências especializadas em mais de 40 indústrias e todas as funções corporativas - e fortalecida pela maior rede de prestação de serviços no mundo -, a Accenture trabalha na interseção de negócio e tecnologia para ajudar companhias a melhorar seu desempenho e criar valor sustentável para seus stakeholders. Com mais de 358.000 profissionais atendendo a clientes em mais de 120 países, a Accenture impulsiona a inovação para aprimorar a maneira como o mundo vive e trabalha. Visite www.accenture.com.br.

Sobre o Instituto de Alta Performance da Accenture

O Instituto de Alta Performance da Accenture desenvolve insights estratégicos acerca de questões essenciais de gestão e tendências macroeconômicas e políticas por meio de pesquisa e análise originais. Seus pesquisadores conjugam reputação global com a vasta experiência da Accenture em consultoria, tecnologia e outsourcing para produzir pesquisas e análises inovadoras sobre como as empresas alcançam e mantêm o alto desempenho. Visite-nos em www.accenture.com/institute