narcisismo e vínculos na atualidade

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Narcisismo e vínculos na atualidade Lucía Barbero Fuks Nas relações interpessoais atuais, a possibilidade de dialogar cede espaço à imagem, a palavra perde relevância como suporte da subjetividade e do vínculo. A propensão à violência nos casais resulta, em grande parte, dessa situação. Oindivíduo protagonista da modernidade procurava dotar a vida de consistência e sentido, dando lugar preponderante aos sen- timentos como fundamento e suporte de vínculos e instituições. Portador de um sentido prospectivo de sua própria existência, concedia-lhe o caráter de uma luta por libertar-se de poderes e discursos unívocos e cristalizados que poderiam vir a ameaçar a conquista de um futuro melhor. O homem tinha parceiros nesses confrontos, e as lutas assumiam formas coletivas. O vínculo amoroso se fazia presente ao longo do percurso, acompanhado freqüentemente de uma carga de exaltação e dramaticidade. Principalmente nas tramas amorosas dos romances, mas um pouco também na vida real, podia-se chegar a morrer de amor. A contemporaneidade abre espaço para um posicionamento que um primeiro olhar nos mostra como de menor compromisso frente à vida: surge um sujeito mais indiferente em matéria de afetos, com uma modalidade menos densa, sem paixões intensas, o que o conduz a uma existência que “não comporta tragédias”. Vive exatamente o oposto à tragédia: um ar leve, carente de dramaticidade. Falta-lhe uma disposição de passagem para o estabelecimento de projetos individuais ou coletivos, inclusive em se tratando da família. Nas relações interpessoais, a possibilidade de dialogar cede espaço à imagem, e a palavra perde relevância como suporte do pensamento e da subjetividade, e também como suporte da intersubjetividade e dovínculo. Fala-se em um neonarcisismo próprio desta época, que instaura um culto pelos corpos cuidados e uniformizados num mesmo padrão de beleza. Há prevalência da aparência, em detrimento de qualquer profundidade. Talvez haja, também, mais

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Narcisismo e vnculos na atualidadeLuca Barbero FuksNas relaes interpessoais atuais, a possibilidade de dialogar cede espao imagem, a palavra perde relevncia como suporte da subjetividade e do vnculo. A propenso violncia nos casais resulta, em grande parte, dessa situao.Oindivduo protagonista da modernidade procurava dotar a vida de consistncia e sentido, dando lugar preponderante aos sentimentos como !undamento e suporte de vnculos e instituies. "ortador de um sentido prospectivo de sua pr#pria e$istncia, concedial%e o car&ter de uma luta por libertarse de poderes e discursos unvocos e cristali'ados (ue poderiam vir a ameaar a con(uista de um !uturo mel%or. O %omem tin%a parceiros nesses con!rontos, e as lutas assumiam !ormas coletivas. O vnculo amoroso se !a'ia presente ao longo do percurso, acompan%ado !re()entemente de uma carga de e$altao e dramaticidade. "rincipalmente nas tramas amorosas dos romances, mas um pouco tamb*m na vida real,podiase c%egar a morrer de amor.A contemporaneidade abre espao para um posicionamento (ue um primeiro ol%ar nos mostra como de menor compromisso !rente vida+ surge um sujeito mais indi!erente emmat*ria de a!etos, com uma modalidade menos densa, sem pai$es intensas, o (ue o condu' a uma e$istncia (ue ,no comporta trag*dias-. .ive e$atamente o oposto trag*dia+ um ar leve, carente de dramaticidade. /altal%e uma disposio de passagem para o estabelecimento de projetos individuais ou coletivos, inclusive em se tratando da !amlia.Nas relaes interpessoais, a possibilidade de dialogar cede espao imagem, e a palavra perde relevncia como suporte do pensamento e da subjetividade, e tamb*m como suporte da intersubjetividade e dovnculo. /alase em um neonarcisismo pr#prio desta *poca, (ue instaura um culto pelos corpos cuidados e uni!ormi'ados num mesmo padro de bele'a. 0& prevalncia da aparncia, em detrimento de (ual(uer pro!undidade. 1alve' %aja, tamb*m, mais intercmbio de imagens (ue de pensamentos, emoes e palavras.O risco disso reside na convergncia entre o narcisismo e a pulso de morte. Narciso morre ao entregarse !ascinado a seu pr#prio re!le$o+ a pretenso narcisista da coincidncia absoluta com o ideal implica a morte do sujeito desejante. 2uando isso ad(uire uma intensidade maior, pode virar patol#gico, levandoo ao va'io da e$istncia, talve' a um sentimento, insuport&vel j&, de no e$istir mais.1anto a vivncia de si como o sentimento de continuidade no transcurso temporal tm seu apoio no sentido de pertinncia ao conjunto de relaes %umanas, em cujo conte$to a singularidade da vida individual gan%a signi!icao. O sentimento de va'io * a mani!estao da retrao narcsica concomitante ao desinvestimento global da realidade..ivese uma vida marcada pelo isolamento, pela solido, pelo desassossego cr3nico, pelo embotamento e pelo t*dio.4evemos pensar esse desinvestimento como uma 5desligao5 67ntbindung8 da relao com o outro 6objeto8, desunio do conjunto, o (ue re!ora o voltarse sobre o ego e principalmente sobre o corpo como objeto narcsico prim&rio. 9esmo (ue, como vimos,o corpo se insira numa rede de signi!icaes socialmente valori'adas : moda, bele'a, sa;de, etc. :, essa rede no c%ega a encobrir a intensidade das vivncias %ipocondracas resultantes. As drogas legais ou proibidas, assim como o recurso a especialistas de todo tipo, podem ser buscados como paliativos. 9as tamb*m a pr#pria relao com o outro pode so!rer esse destino."ode acontecer (ue o outro seja trans!ormado em objeto narcsico : (ue a identidade !i(ue ligada a ele prioritariamente :, ou seja, objeto ideali'ado de cuja apropriao depender& o todo do ser. A l#gica da pai$o pode incluir um modelo de relao dual absoluta< por outro lado, todo enamoramento implica ideali'ao e dependncia. 9as asrelaes narcsicas atuais, envolvendo uma se$ualidade desligada do amor, tendem a impregnarse de caractersticas adictivas, empobrecedoras (uanto ao interjogo de pra'ere recon%ecimento.Os c%amados ,transtornos narcsicos da personalidade- podem ser compreendidos comoe$presso da tenso e$istente entre o ideal de indivduo dotado de autonomia, valori'ado atualmente, e as e$igncias (ue l%e impem uma realidade cada ve' mais imprevisvel, tornandoo vulner&vel e capa' de des!alecimentos inesperados. A relao com as outras pessoas, em geral, pode ser sentida como %ostil para o e(uilbrio ps(uico,gerando uma resposta de %ostilidade e retraimento de!ensivo.O determinante nessas perturbaes do narcisismo * a presso da realidade atual, com a comple$idade e as contradies (ue a caracteri'am. =sso no impede (ue possam vir a se sobrepor a sintomas e traos neur#ticos pree$istentes (ue so resultantes, como sabemos, das vicissitudes da %ist#ria in!antil dos sujeitos.0&, !inalmente, um terceiro !ator (ue impe uma e$igncia de plasticidade a esse ego tensionado no limite da e$asperao. >eside na tare!a di!cil de recompor a es!era dos valores e de reelaborar um projeto identi!icat#rio no campo da identidade se$ual. A di!iculdade se origina no contraste entre a con!igurao do ideal de ego construdo a partir do et%os 6sistemas de valores8 !amiliar, grupal e cultural das geraes anteriores e os pap*is e identidades se$uais ou de gnero promovidos pelas mudanas contemporneas nas relaes entre %omens e mul%eres.?onsiderar esse !ator * !a'er entrar em cena um personagem !undamental+ o poder. Os vnculos entre %omens e mul%eres so permeados por relaes de poder (ue devem ser analisadas desde perspectivas simb#licas e materiais. ?ada sociedade elabora um sistema de regras para tentar repartir o poder e o pra'er. Nos pases ocidentais, por e$emplo, os judeus, os cristos e os muulmanos prescreveram, cada um a seu modo, a mul%er e o erotismo.1alve' especulando um pouco, alguns antrop#logos e psicanalistas se perguntam, inclusive, se no e$istiria uma articulao entre o poder, o se$o e a morte, encontrandose isso presente em todas as produes culturais. ?%egam a perguntarse se a !inalidade do poder no seria, em ;ltima instncia, a de dominar o indomin&vel, precisamente esse indomin&vel (ue o se$o e a morte implicam.,1ratandose do campo da morte : di' "aul .er%aeg%e : isso * evidente. No tem poder mais absoluto do (ue o (ue d& acesso imortalidade. No (ue concerne ao campo da se$ualidade, as relaes com o poder so menos evidentes e, por outro lado, mais di!ceis de admitir. Na verdade, a se$ualidade no est& ligada ao poder de !orma simples. 7ssa ligao constitui, mais bem, um cru'amento em (ue poder e morte se encontram, como meio para sobrepassar esta ;ltima- 6.er%aeg%e, @AAB, p. B@. 1raduo livre8.Nas sociedades ocidentais consideradas : voltando para a dimenso %ist#rica :, essa distribuio de poder se caracteri'a por uma dominao masculina (ue se e$erce por meio de uma ,l#gica- pr#pria de todo sistema de dominao+ tratase de um ,princpio simb#lico-B, (ue * recon%ecido tanto pelo dominante como pelo dominado. /a'se presente na linguagem, no estilo de vida, na !orma de !alar e de se comunicar.O !ato de, aos poucos, tanto a mul%er (uanto o erotismo se libertarem dessa proscrio tem suas conse()ncias. A primeira * a con!uso entre os %omens. As mudanas produ'em d;vidas e animosidade acrescentadas de tentativas de retornar aos ,mel%ores tempos-.As alteraes da relao de !oras, resultantes de trans!ormaes protagoni'adas pelas pr#prias mul%eres, signi!icou uma (uebra na trama simb#lica (ue sustentava os lugares respectivos. O !ato de as mul%eres terem sido o ,sujeito social- dessa trans!ormao noas isentou do custo subjetivo desse processo. No podemos es(uecer (ue a maior parte das mul%eres at* agora !oi educada em !amlias mais ou menos tradicionais, nas (uais ascoordenadas edpicas da identidade remetem o essencial dos valores e signi!icados do !eminino ao modelo matrimonial e reprodutivo burgus.A maternidade !oi entendida, em conse()ncia, como ,natural- da condio de reali'ao da mul%er, assim como a posio passiva !rente ao desejo se$ual e con(uista do %omem. ?omo reali'ao social, a mul%er podia desejar casarse e ter !il%os, o (ue tamb*m tra'ia proteo e segurana, sendo (ue o papel masculino tradicional compreendia o sustento da !amlia, trabal%ando !ora do lar, e a tomada de decises importantes no conte$to e$terno.7miliano Calende denomina ,!ratura subjetiva-@ um processo de ruptura de signi!icadose valores (ue eram os (ue organi'avam e sustentavam sua identidade subjetiva de se$o e seus comportamentos pr&ticos. 7la tamb*m a!eta os %omens. As mudanas atuais da relao %omemmul%er alteram os valores de sua identidade e os levam a sensaes de !ragilidade antes descon%ecidas. ?%egamos assim a esse !ator de vulnerabilidade, (ue seacrescenta ao (ue disse anteriormente.Os %omens parecem perple$os, desorientados, em boa medida descon!iados, perguntandose o (ue se espera deles. "erguntamse (ual ser& o lugar (ue l%es corresponde junto a essas !iguras nunca antes imaginadas a partir do modelo de suas mes. >esultal%es di!cil entender o (ue mudou entre as e$pectativas ,con%ecidas- ou tradicionais e uma atualidade (ue inclui as con(uistas !emininas do ;ltimo s*culo.=nstauramse verdadeiras con!uses de lnguas. O !antasma, ou a representao, ou ainda a encenao, so, sem d;vida, uma das partes constitutivas do erotismo. /alase bastante da impossibilidade de coincidncia ou ,encontro complementar- entre as !antasias pr#prias dos %omens e das mul%eres, (ue presidem e organi'am a apro$imaoer#ticoamorosa de cada um deles. O predomnio : ou a (uase ae$clusividade : da atividade genital no imagin&rio masculino tem sido caracteri'ado como algo de car&ter !etic%ista< a !antasia de cativar uma !igura to relevante (uanto !ora do alcance * vista como erotomanaca. D& %& (uem interprete nessa lin%a a !ormulao enigm&tica de Eacan, de (ue ,a relao se$ual no e$iste-F por(ue cada (ual se relacionaria com seu pr#prio !antasma.9as o (ue se pode pensar como essencial ou estrutural da relao se$ual, parece entrecru'arse com as vicissitudes da %ist#ria. Nessa con!igurao do modelo de mul%eratual : aut3noma, dona de si e se$ualmente livre : resulta di!cil ao %omem recon%ecer e aceitar uma dimenso de !ragilidade (ue possa depender, ainda, de uma resposta de sentimento, compreenso, cuidado, recon%ecimento e amor."or outro lado, sabemos (ue as (uestes de poder tm uma !orte in*rcia. "arece (ue a igualdade nas liberdades se$uais e nas %ierar(uias no tm se revertido em maior igualdade emocional a!etiva. 9as isso tamb*m poderia ser e$plicado por uma nova represso ou recalcamento no %omem, (ue se impe agora mais sobre a emoo e sobre os a!etos do (ue sobre o se$o.7 isso se junta com tudo o (ue !oi dito anteriormente. O se$o se trans!orma em per!ormance (ue tem como alvo uma e!ic&cia e uma e!icincia+ tem (ue dar certo. 7 isso se agrega ao car&ter de desa!io (ue vai tomando a interao do casal em todas as !rentes. A e$altao do individualismo, somada competio acirrada (ue impera no espao social global, in!iltra tamb*m as relaes pessoais, mesmo as de casal, impregnando as iniciativas (ue buscam re!ormular a distribuio de espaos e pap*is de um car&ter belicoso e competitivo entre marido e mul%er. /inalmente, tendese a estabelecer uma competio sem !im e sem sada baseada no princpio de (ue o %omem no pode desistir de ,provar- sua masculinidade, a partir da (ual prope saciar o desejo de sua compan%eira, e a mul%er nunca * su!icientemente mul%er para saciar o desejo dele. "redomina, assim, um con!ronto especular de semel%antes competidores sem uma intersubjetividade (ue sustente um jogo de di!erenas, de mati'es e de enigmas, de visibilidade e velamento, com espao para o desenvolvimento do %umor e da ironia."odemos postular, seguindo "aul .er%aeg%eG, (ue o con!ronto especular apontado corresponde ao predomnio de uma relao dual narcsica, sendo (ue o vnculo intersubjetivo s# se tornar& possvel medida (ue se passe a uma con!igurao triangular, constituda pelo eu, pelo outro e pela !alta. A !alta * impossvel de ser preenc%ida. No modo dual, o eu se v compelido a suprir a !alta no outro de !orma total,absoluta e concebida a partir de um saber no sujeito a d;vida, apoiado em ideais preestabelecidos e supostamente compartil%ados..emos (ue a se$ualidade atual mostra uma !ace menos ntima, menos condicionada pelos valores burgueses do privado, do recato ou da represso. 9as a liberali'ao da vida se$ual no parece %aver condu'ido a seu pr#prio enri(uecimento, ao aumento da satis!ao pulsional, libertao do desejo e e$panso das possibilidades de pra'er. O se$o se desenvolve, assim, al%eio s signi!icaes e aos jogos do amor, da ternura, e at* do #dio, sendo aliado a uma ampli!icao tecnol#gica do pra'er, (ue condu' menos a uma reali'ao da meta almejada do (ue a um colapso progressivo do desejo.As tenses presentes na sociedade como conse()ncia de uma crise (ue envolve ideais inacessveis, unidas a uma !rustrao e a uma impotncia crescentes, derivadas da reduo do espao de participao, descarregamse no interior das relaes com o outro,do casal e da !amlia, como uma tentativa de conseguir protagonismo na gesto da pr#pria vida< como (uerendo compensar, com isso, o va'io crescente (ue a!eta o pr#priosentido da e$istncia. H tamb*m por esse camin%o (ue a agressividade se !a' presente no cotidiano dessas relaes.A agressividade inerente ao narcisismo tem sido amplamente trabal%ada na psican&lise, principalmente a sua presena na relao dual especular. H no seio dessa relao (ue se instala um en!rentamento mort!ero tomando a !orma de uma disjuntiva radical, ,ou eu ou o outro-, no %avendo lugar para a di!erena, a mediao, a possibilidade de lugares para cada um dos dois.O (ue procuro remarcar a(ui * o papel (ue cabe !ragili'ao e ruptura dos laos sociais na preparao e no desencadeamento dessas situaes. "ara /reudI 6BJFA8, tratase do resultado da liberao da pulso de morte como conse()ncia do desintrincamentopulsional, a!irmando a importncia da ligao libidinal. =sso se tornar& evidente nas condutas autoagressivas das crianas abandonadas, em certos ,lutos- (ue assumem caractersticas melanc#licas, mas tamb*m no entorno autoe$igente e punitivo (ue rodeia o %omem e a mul%er da atualidade.A re!le$o psicanaltica em torno da se$ualidade e do erotismo tem apresentado a violncia como inerente a esse campo da e$perincia %umana a partir das pulses s&dicas, da analidade, do impulso de apreenso muscular e do apoderamento do objeto. =sto no deve ser encarado como uma a!irmao absoluta. Km ndice da comple$idade da (uesto est& dado justamente pela necessidade (ue teve /reud de re!ormular sua teoria das pulses. 7la deu um passo rumo a !ormulaes e a re!ormulaes (ue incluram a !uno de ligadura da pulso de morte pelas pulses er#ticas, suporte da agressividade na luta pela vida, assim como os e!eitos de desintrincamento 67ntmisc%ung8 pulsional nas situaes de perda e ruptura de vnculos (ue apontamos.?onsidero (uestion&vel, acompan%ando a posio de 7. Calende a esse respeito, toda id*ia re!erente a uma essncia agressiva e dominadora da se$ualidade masculina. "osies !eministas recol%idas e discutidas por esse autor a!irmam a e$istncia de muita%ipocrisia ou de uma !ormao reativa nas condutas de gentile'a, de cuidado e de proteo do se$o !eminino. 7speculandose, tamb*m, sobre o (uanto isso pode servir para no se tomar conscincia de (ue, na verdade, ou em essncia, a !ragilidade e a !altade de!esa da mul%er podem !uncionar como !ator de ,e$citao- e como princpio de ra'o para proceder apropriao e dominao desse objeto. 7ssas posies essencialistas redu'em e simpli!icam as vicissitudes do processo de se$uao tal como ele !oi teori'ado pela psican&lise, descon%ecendo tamb*m a dimenso %ist#rica do problema.As dimenses de go'o, no sentido (ue est& sendo en!ati'ado no pensamento psicanaltico contemporneo : isto *, di!erenciandoo da signi!icao do pra'er ou do desejo : inseremse nessa problem&tica. 1omando como ponto de partida a assimetria absoluta (ue preside a relao dual narcsica entre a me e a criana, as con!iguraes ulteriores tero um car&ter de reedio, mas s# medida (ue se articulem com relaes de dominao %istoricamente constitudas.O (ue estou privilegiando como ponto de vista * a %istoricidade das relaes entre se$o e poder, no conte$to das relaes sociais globais. A violncia * sempre relativa relaode um sujeito com outro+ s# * possvel pens&la nessa relao intersubjetiva e, por isso mesmo, s# * possvel capt&la (uando relacionada a um sentido. 7la emergir& sempre (ue se pretenda impedir o !luir do recon%ecimento, do jogo das di!erenas, sobretudo se para isso se apele, como * de costume, ao princpio de autoridade. A violncia * vivenciada como tal por (uem a padece, ao ser negado como sujeito, seja como desejante ou como e$istente. O (ue nos provoca violncia * o sentimento de no e$istir, de no ter sido levado em conta como sujeito e ser tratado como objeto no sentido comum da e$presso.Kma %ip#tese !orte na (ual coincidem muitos trabal%os (ue abarcam tanto observaes clnicas como constataes epidemiol#gicas ou elaboraes mais te#ricas * a seguinte+ o(ue vive o sujeito (ue padece a violncia est& relacionado com o (ue vive a(uele (ue impe essa violncia, o (ue tem como origem diversas causas+ s ve'es situaes idnticas vividas passivamente no passado, mas sempre com um e!eito de ameaa sobre sua pr#pria identidade. A atuao da violncia * sempre uma tentativa de se recuperar o domnio sobre algo (ue se tem a sensao de padecer.A violncia do %omem sobre a mul%er pode ser entendida como causada pelos e!eitos, em sua subjetividade, de uma vivncia de perda de poder (ue pe em crise sua identidade, associada serie de determinaes descrita, ou como uma tentativa de recuper&r o poder. "or isso seu e$erccio * acompan%ado to !re()entemente por a!irmaes e$altadas de masculinidade. Aparece no interior da relao de um casal (uando a mul%er d& sinais para o parceiro de uma ruptura da cumplicidade com sua submisso ao %omem.A resoluo dessas situaes depender& das !oras libidinais e de di!erenciao (ue se possam mobili'ar a partir da entrada de alguma !igura e$terna relao (ue assuma a posio de instncia terceira, possibilitando o restabelecimento do lao social e a retomada do processo de recon%ecimento intersubjetivo.O epis#dio agressivo, nessas condies, em ve' de instituirse como sintoma repetitivo, (ue * o destino de muitas situaes (ue no desembocam na dissoluo do vnculo, pode vir a constituirse num ,acontecimento resigni!icante-. 7sse acontecimento vem operar como ponto de partida para a elaborao retroativa da %ist#ria (ue inclua uma tomada de conscincia dos pontos de incidncia singulares do sistema de determinaes (ue apontei.0& v&rias d*cadas vemse estudando e discutindo sobre essas problem&ticas, no campo da psican&lise e no espao mais amplo das cincias sociais. Assim como em outros momentos essas (uestes !oram impulsionadas por diversos movimentos sociais sensibili'ados por elas, %oje em dia gan%am nova importncia dos estudos sobre a subjetividade contempornea e de sua presena como problema recon%ecido mediante a mdia e a demanda assistencial. "oder con%ecer e !a'er interagir as diversas metodologias, lin%as te#ricas e pontos de vista possibilitaria avanar no con%ecimento dos problemas e construir possibilidades de interveno com uma viso mais ampla e l;cida de sua comple$idade. "oder reunirse para desenvolver esse trabal%o, poder !a'lo em conjunto parece importante em vista da(uilo (ue o pr#prio problema, lido como um sintoma, vem mostrando.?omentando o artigo O mal estar na civili'ao, CalendeL a!irma (ue o %omem s# tem duas possibilidades em relao ao outro+ ,ou se liga libidinalmente, identi!icandose com ele para constituir alguma !orma de lao social, abolindo assim o domnio do pai primitivo, ou, desprendido dos membros da !ratria, entregase ao domnio absoluto desse outro interior (ue * o superego-.NotasB. ". Mourdieu, La domination masculine, "aris, Neuil, BJJO.@. 7. Calende, Sexo y amor, Muenos Aires, "aid#s, @AAB.F. No %aP relaci#n se$ual P la mujer no e$iste. Nemin&rio dado por Eacan, em FA de outubro de BJOL, no Audit#rio Nigmund /reud de Muenos Aires, a convite da psicanalista 1eresa Qavalia 6c!. DoRl 4or SBJOTU Estrutura e perverses, "orto Alegre, Artes 9*dicas, BJJB< p.BIG8.G. ". .er%aeg%e, El amor em los tiempos de la soledad, Muenos Aires, "aid#s, @AAB.I. N. /reud 6BJFA8 ,7l malestar en la cultura-, Obras completas, Muenos Aires+ Amorrortu, BJJL, v. @B.L. 7. Calende, ,.iolencia, psicosis P alienaci#n-, in Teoria y clinica de las confiuraciones vinculares. Muenos Aires, Associaci#n Argentina de "sicologa P "sicoterapia de Crupo, BJJB, v. B< p.TG.WordShark Advertisement