microfones vintage
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REPORTAGEM
MICROFONESMICROFONES
microfone é o “ouvido” de um sistema de áudio. Se ele
for bom e a pessoa que o estiver usando souber traba-
lhar, a probabilidade da qualidade da gravação ser boa é
grande. Por conta da importância na qualidade do áudio e
sua influência no timbre, o microfone acaba causando um
certo fascínio em quem gosta de áudio.
Há vários que marcaram época desde os primeiros que funcio-
navam a carvão, evoluindo para os condensadores - problemá-
ticos no seu início – e os de bobina móvel (microfones dinâmi-
cos). A partir daí, foram pou-
cas as mudanças que ocorre-
ram, mas, no decorrer desse
tempo, algumas marcas e mo-
delos fizeram época, se torna-
ram cobiçados e ganharam o
rótulo “vintage”. Eles atraem a
atenção seja pela importância
histórica, qualidade sonora ou
timbre diferenciado. É sobre
esses microfones que Clement Zular, Flávia Calabi, Maurício
Gargel e Roldão nos falam nesta reportagem.
FAZENDO HISTÓRIAPor trás da expressão “vintage”, no entanto, podem se es-
conder algumas armadilhas. Ela pode tanto ser aplicada a
Miguel Sá[email protected]
Oum equipamento clássico como a outro que é apenas velho.
“Aplicar essa terminologia a equipamentos de áudio é peri-
goso. Às vezes, ‘velho’ seria a melhor palavra para definir o
estado de um equipamento. Não é porque um microfone
tem válvulas velhas e está enferrujado que ele é bom”, ex-
plica Maurício Gargel, técnico de áudio e professor do Ins-
tituto de Áudio e Vídeo (IAV).
Entre os vintage que marcaram a história do áudio estão os
microfones “garrafa”, como o “Neumann Bottle” CMV3,
por exemplo. Projetado em
1927, este microfone marca
a transição definitiva dos
antigos microfones a carvão
e de fita para os condensa-
dores, como explica Flávia
Calabi. “Dentro dele tem uma
válvula enorme e as cápsulas
são cambiáveis conforme o
diagrama polar desejado. Ou-
vi uma gravação (CD “Das Mikrofon” do selo TACET
Vol.1) feita em 1996 com esse microfone do museu da
Neumann. Ela é tão boa que tira meu fôlego a cada vez que
a ouço. A alemã Schoeps também tem seu microfone ‘gar-
rafa’ só que fabricado bem depois, em 1949, o CMV 50/2
com 2 válvulas dentro”.
Qualidade, personalidade, importância histórica... Por que os microfonesantigos provocam tanto fascínio? Clement Zular, Flávia Calabi, MaurícioGargel e Roldão desvendam o que está por trás da mágica dos chamadosmicrofones vintage
vintageo fascínio que a qualidade traz
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O CLÁSSICO
O equipamento que ganha o
status de clássico é usado mes-
mo que já tenha saído de linha
ou que haja outros com mais
recursos. “Como o bom vinho,
é o microfone de uma safra es-
pecial”, diz Flávia Calabi. “Sua
qualidade excepcional é subli-
nhada por uma conjunção de
fatores objetivos, técnicos -
como a perfeição de seu projeto
e construção, a fidelidade com
que capta a realidade sonora - e fato-
res subjetivos, como o momento
emocional, a história de bons servi-
ços prestados, a pátina do tempo que
lhe conferiu o título de ‘antigo’, o
design quase sempre volumoso que
denota um passado que já se foi”,
conclui a técnica de som.
Um exemplo de microfone clássico
bastante citado é o Neumann U-47.
Um dos motivos para isto são suas
válvulas. As originais, modelo VF14,
não são mais fabricadas e são, segun-
do Maurício Gargel, fundamentais na
sonoridade do equipamento.
O técnico de som e empresário Rol-
dão se lembra de como ficou fascina-
do ao ouvir, pela primeira vez, no iní-
cio de sua carreira, no final da década
de 60, um destes funcionando. “Na-
quela época ele ainda não era o vin-
tage. Hoje, as pessoas o usam no estú-
dio não por falta de opção, mas por
querer aquele som”, ressalta o técnico
de som e empresário. O U-47 chegou a
ser usado por artistas como os Beatles
e Frank Sinatra. Como outro exem-
plo têm-se os Coles, microfones de
fita feitos originalmente para a BBC,
da Inglaterra.
PERSONALIDADE
A característica sonora do microfone
também pode ser um fator deter-
minante para que ele se torne um clás-
sico. Mais uma vez o Neumann U-47 é
citado como exemplo. “Até hoje ele é
uma referência”, comenta Clement. Já
os microfones de fita – dos quais os
RCA 44BX e 77DX são exemplos –
têm como característica um
agudo mais suave que o de mi-
crofones condensadores. Na
época em que foram mais usa-
dos, na primeira metade do sé-
culo passado, os equipamen-
tos de reprodução sonora ti-
nham um range de freqüênci-
as mais estreito. Enquanto
microfones condensadores
mais atuais podem reproduzir
até 20 kHz, os de fita, depois
de 15 kHz, têm uma resposta
menos intensa, o que daria um agudo
mais “natural” que, de acordo com
Maurício Gargel, pode agradar bas-
tante como overall em uma bateria de
jazz, por exemplo.
Flávia Calabi tem vários microfones
vintage que utiliza em seus trabalhos.
“Uso frequentemente meus Neumann
KM-84 da década de 40 nos violinos,
violas e violoncelos de orquestras sin-
fônicas. Que diferença de qualidade se
comparados aos atuais KM-184! Um
Microfones são os transdutores que con-
vertem a energia acústica em energia
elétrica. Os mais usados hoje são os di-
nâmicos e os condensadores.
Microfones dinâmicos (bobina mó-
vel) – São usados principalmente em
shows por conta de sua robustez e custo
menor. Um exemplo deste tipo de micro-
fone é o SM-58. Neste tipo de microfone,
o diafragma é fixado em uma bobina en-
rolada com um fio condutor de eletrici-
dade. Este conjunto de peças fica em
volta de outra peça magnetizada. Quan-
do a fonte sonora emite o som no micro-
fone, o diafragma se movimenta e faz
com que a bobina deslize pelo campo
magnético. A variação de voltagem
provocada por este movimento é trans-
mitida pelo condutor enrolado na bobi-
Microfones dinâmicos e condensadores
na e corresponde à pressão sonora apli-
cada pela fonte. O microfone de fita fun-
ciona seguindo o mesmo princípio, só
que ao invés da bobina, usa uma fita
metálica bem fina.
Microfones condensadores – Eles
têm um funcionamento mais complexo.
Ele não é tão resistente quanto os micro-
fones dinâmicos. Um exemplo deste tipo
de microfone é o Neumann U-47.
O difragma deste tipo de microfone é
ligado a um capacitor variável que pre-
cisa ser carregado por phantom power
ou bateria para funcionar. A fonte sono-
ra age no diafragma que provoca a cir-
culação de corrente no capacitor. Esta
circulação de corrente é correspon-
dente à energia acústica que age sobre
o diafragma.
Flávia Calabi na câmara anecóica da Neumann em Berlim
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outro microfone que gosto de usar é o
Neumann SM-69. Trata-se de um mi-
crofone à válvula, estéreo, excelente
para captar o geral de orquestra em
grandes ambientes”.
Há também microfones bem específi-
cos como os Shot Gun Sennheiser da
década de 60 (modelos MKH 805/
815/816). Clement já os havia usado
e procurava um “shot gun” que soasse
musical como eles. Depois de testar
inúmeros modelos atuais e não achar
a sonoridade que queria, ele comprou
três destes modelos
da Sennheiser.
Há ainda vários ou-
tros modelos cobiça-
dos, mais ou menos
raros, fabricados até
hoje ou não, como os
Telefunken Ela M 250
e 251, os Neumann KM
83 e KM84, os AKG C-
12 , os Bruel & Kjaer 4003
e o Schoeps CMC5 MK2.
O SOM DO VINTAGE
Antes das válvulas, o uso dos con-
densadores era praticamente im-
possível em função de sua alta im-
pedância e baixo volume de saída.
“O uso de válvulas para amplificar
o sinal resolveu esse tipo de limita-
ção”, explica Gargel. Mas, desde a
década de 60, a válvula vem sendo
substituída pelos transistores, que
são componentes bem menores,
menos frágeis e mais estáveis. No
entanto, as válvulas têm caracte-
rísticas sonoras específicas que po-
dem ser interessantes em diversos
trabalhos. Flávia Calabi gosta de-
les e explica algumas das caracte-
rísticas dos microfones valvulados.
“Alguns microfones à válvula têm
realmente uma sonoridade fiel à
realidade. Não é só a resposta de
freqüência, completa de 20Hz a
20KHz plana, sem distorções, sem
variações. O que é chocante é a ve-
locidade da resposta”.
Flávia conta que, uma vez, pergun-
tou ao técnico em eletrônica Mil-
ton Lange, especialista em eletrô-
nica para áudio, o porquê desta ca-
racterística nos microfones mais
antigos, que não têm circuito hí-
brido. Ele explicou a ela as diferen-
ças entre eles – que usam apenas
válvula - e alguns microfones val-
vulados mais recentes, com circui-
tos híbridos. “Os que são puramen-
te à válvula não possuem nenhum
outro elemento ativo além da vál-
vula. São mecânicos, de construção
muito simples e por estes motivos
permitem alta dinâmica, isto é,
muita velocidade sem distorção.
Não existe componente mais rápi-
Dependendo do que o usuário quer
captar, ele vai precisar de uma capta-
ção mais aberta ou fechada. A grosso
modo, estas são as duas principais for-
mas de captação.
Omnidirecional – Para captar o
ambiente o ideal é usar um padrão de
captação omnidirecional. Ou seja, o mi-
crofone vai captar todo o som à sua vol-
ta, em todas as direções.
Unidirecional – Neste formato, o
microfone capta um campo acústico
mais restrito em apenas uma direção.
Há quatro padrões de captação unidi-
recional: cardióide, cardióide aberto,
Tipos de captação
supercardióide, hipercardióide e
hipercardióide de longo alcance, apeli-
dado de shot gun. Este último é o que
capta o som em uma direção mais res-
trita e distante, sendo usado para cap-
tar diálogos em som direto de cinema,
por exemplo.
Bidirecional
Alguns microfones permitem uma
captação “figura 8”. Para gravar um
backing vocal com duas pessoas, por
exemplo, ou para entrevistas, a capta-
ção se dá em uma área que parece um
8. A cápsula do microfone está no meio
deste 8.
Maurício Gargel
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do que a válvula, o que permite a
melhor ‘slew rate’, ou seja, a me-
lhor taxa de velocidade x tensão. Já
os microfones à válvula mais re-
centes são mais complexos em sua
construção, usam circuitos híbri-
dos com FETs e outros componen-
tes ativos além da válvula. Os FETs
produzem uma compressão inicial
que modifica o envelope do som,
indefine o ataque do sinal, fazendo
com que o microfone perca a defi-
nição dos diversos timbres, além
Flávia Calabi e Maurício Gargel indi-
caram alguns sites em que é possível
conseguir mais informações sobre mi-
crofones vintage:
http://www.coutant.org/12mics/index.html
Neste site, uma seleção de 12 microfo-
nes que marcaram a história do áudio.
Nele estão presentes do RCA 44 ao
ELAM 250 e 251
http://www.neumann.com/
?lang=en&id=about_us_overview
A partir desta página, o internauta
tem acesso a toda a história da empresa
http://www.neumann.com/
?id=hist_microphones&lang=en
Na webpage da Neumann, vários
modelos clássicos da marca. Clássicos
da Neumann, aliás, é o que não falta
Para saber mais
http://www.coutant.org/u47/index.html
Para saber mais sobre o Neumann U-
47, é só acessar esta webpage
http://www.schoepsclassics.de/1948.htm
Nesta página, o primeiro protótipo de micro-
fone shoeps. Esta é a primeira página de
clássicos da marca
http://mixguides.com/microphones/
vintage_products/ Nesta página da
Mix Magazine, o internauta encontra
material escrito original de vários mode-
los vintage, inclusive com informações
técnicas
http://www.coutant.org/ku2a/index.html
Aqui é possível conhecer mais sobre o
modelo vintage RCA-Ku2A
http://www.coutant.org/ku3a/index.html
Nesta página, o modelo RCA-Ku3A
de perder a veloci-
dade de resposta aos
estímulos da dinâ-
mica musical. Por
outro lado os cir-
cuitos híbridos per-
mitem projetar vo-
luntariamente modi-
ficações na resposta de
freqüência, de maneira
a privilegiar agudos ou
graves”, comenta.
SIMULAÇÕES E REEDIÇÕESToda essa procura por sons clássicos
gerou dois fenômenos no mercado:
as reedições de microfones e os si-
muladores digitais de mics vintage.
Quanto aos últimos, Maurício Gar-
gel não tem meias palavras: “isso é
piada”. Já Clement acha que eles
podem ter o seu lugar. “Eles são in-
teressantes, mas é como o nome diz,
são simuladores. Em gravação de
música erudita, no qual é importan-
te ter o timbre específico daquele
instrumento e da sala onde aconte-
ce a gravação, não dá para usar. Já
em música pop dá para conseguir
efeitos bem legais usando-os como
uma ferramenta dentro do processo
criativo”, explica.
Na procura pelo som clássico, tanto
as reedições quanto os microfones
que substituem os modelos vintage
tradicionais podem ser muito bons.
Clement considera o AKG D-112,
baseado no antigo AKG D-12, um
ótimo microfone. Para Gargel, os
substitutos de modelos tradicio-
nais que as fábricas fazem também
podem ser ótimos. “Um M49 – mo-
delo clássico da Neumann – possui
uma magia.
Mas o seu substituto, o M149, é novo
e sinceramente um dos melhores
microfones que eu já usei. É impres-
sionante! Um outro exemplo de
produto novo muito interessante é
o Josephnson C42. Muitos recla-
mam que a Neumann nunca mais
Os microfones à válvula mais recentes são maiscomplexos em sua construção, usam circuitos
híbridos com FETs e outros componentes ativos alémda válvula. Os FETs produzem uma compressão inicial
que modifica o envelope do som
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conseguiu fazer um microfone parecido com o KM84 ape-
sar de seu substituto KM184. Pequenas alterações na aber-
tura lateral da cápsula proporcionam um leve aumento en-
tre 8 e 10KHz e o fato de os novos serem transformerless lhes
confere uma resposta neutra de graves. De certa forma isso
explica o “som magro” dos novos KM184. O C42, mesmo
sendo um microfone novo, é, para mim, um microfone
com sonoridade mais agradável do que o Km184. Não é
exatamente uma reedição mas uma ótima opção”, comen-
ta o técnico.
MICROFONE: UMA PARTE DA GRAVAÇÃODepois dos microfones, ainda há outros fatores impor-
tantes, como a qualidade dos cabos, do pré-amplifica-
dor e, principalmente, em tempos de digital, da con-
versão A/D.
“Acho que importante é, antes de gravar, já saber o timbre
que se quer. Se quiser o timbre específico de um microfone
valvulado, use um. O som da gravação não é só o microfo-
ne, é como você o usa. E há outros equipamentos também.
Você pode testar outro modelo de cabo, um pré diferente,
usar um microfone a mais diferente para ter opção. Não há
regras”, expõe Clement.
Nunca é demais lembrar que um bomáudio depende de mais coisas que
apenas um microfone. Para começar, éimportante que a fonte sonora tenha
boa qualidade