maria helena damasceno e silva megale her- e silva megale

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di- rei- to Maria Helena Damasceno e Silva Megale Maurilio Casas Maia ORGANIZADORES COORDENADORES Adriana Goulart Sena Orsini Alfredo Emanuel Farias de Oliveira Paula Vilaça Bastos Tereza Cristina Sorice Baracho Thibau her- me- nêu- tica, e disruptividade na era tecnológica

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ISBN 978-65-5589-345-8

Quando tivermos tempo para refletirmos sobre cientismo, tecnicismo, informaticismo e seus resultados, os quais nos afogam, perceberemos quão danosa é a “[...] complexidade pervertida por muitos apetites” traiçoeiros (MERTON, 2005, p. 216). Essa nos impede de constatar a distância que separa ciência, técnica e informação autênticas do conjunto triádico de “ismos” que nos ofuscam a aptidão para identificá-los e separá-los do que é válido para o mundo em se tratando de ciência, técnica e informação.

Se o debate crescente em torno da ciência e da técnica conclui pelos benefícios daí resultantes em favor de melhores condições do modo de viver, nele (debate), por outro lado, permanecem críticas às consequências negativas do cientismo e do tecnicismo. [...]

A deturpada transformação provocada pela trindade – cientismo, tecnicismo, informaticismo – inquieta a autêntica vocação inventiva, criadora, descortinadora e comunicadora dos seres humanos dedicados à ciência, à técnica e à informação.

1. Por uma analítica fenomenológica dos preconceitos na sociedade tecnológicaMaria Helena Damasceno e Silva Megale

2. Tecnologia e direitos fundamentaisLeonardo Scofano Damasceno Peixoto

3. O isolamento social e o papel do Supremo Tribunal Federal no enfrentamento ao coronavírus (SARS Covid-19)Valéria Cássia Dell’Isola Alberto Rezende Medeiros

4. Compliance em tempos de tecnicismo: desafios e perspectivas a partir de uma analítica fenomenológicaPaula Vilaça Bastos

5. Hermenêutica jurídica e a datificação do sujeito: reflexos da ciência de dados na aplicação do direito e na interpretação da vontadeThiago Dias de Matos Diniz

6. Novas tecnologias e disruptividade: pressupostos teóricos para um novo olhar sobre a responsabilidade civilPedro Carvalho Mitre Chaves Alfredo Emanuel Farias de Oliveira

7. Princípios podem suster rupturas legais para se alcançar a justiçaLiciane Faria Traverso Gonçalves João Luiz Traverso Gonçalves

8. A aplicabilidade da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei nº 13.709/2018) às pessoas jurídicasFelippe Borring Rocha Pedro Dalese

9. Inovação disruptiva: da mediação presencial para a modalidade on-lineBeatriz Aguiar Bovendorp Veloso Patricia Gazire De Marco

10. Jurimetria e predição: notas sobre uso dos algoritmos e o poder judiciárioAdriana Goulart de Sena Orsini

11. Defensoria Pública, vulnerabilidade e sexta onda renovatória de acesso à justiça na era da disruptividadeMaurilio Casas Maia

12. Direitos humanos e educação em direitos: pressupostos para a efetiva proteção, por meio da Defensoria Pública, no contexto do Big DataAlfredo Emanuel Farias de Oliveira

13. O papel da Defensoria Pública na implementação de inteligência artificial no sistema de justiçaBruno Freire

14. A defesa dos consumidores virtuais pela Defensoria Pública e a disruptura entre os modelos de tutela processual individual e coletivaAna Clara Carneiro da Silva Tereza Cristina Sorice Baracho Thibau

15. Tecnologia, gestão e usuário do serviço da Defensoria Pública em tempos de 4ª Revolução IndustrialAdolfo Filgueiras Etienne

16. Inteligência artificial aplicada à Defensoria Pública: uma discussão sobre potenciais e cautelasThales Alessandro Dias Pereira

17. A autonomia administrativa da Defensoria Pública para regulamentar o teletrabalho visando a observância do Princípio da EficiênciaAdriane da Silveira Seixas

18. Notas sobre o problema da litigância contidaCirilo Augusto Vargas

di-rei- to

Maria Helena Damasceno e Silva Megale

Maurilio Casas Maia

ORGANIZADORES

COORDENADORES

Adriana Goulart Sena OrsiniAlfredo Emanuel Farias de Oliveira

Paula Vilaça BastosTereza Cristina Sorice Baracho Thibau

her-me-nêu-tica,

e disruptividade na era tecnológica

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Plácido Arraes

Tales Leon de Marco

Bárbara Rodrigues

Nathália Torres(Imagem via Rawpixel)

Letícia Robini

Nilo Pinheiro de OliveiraPedro Carvalho Mitre ChavesEduardo Brandão Gomes

Editor Chefe

Editor

Produtora Editorial

Capa, projeto gráfico

Diagramação

Revisão

Todos os direitos reservados.

Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida, por quaisquer meios, sem a autorização prévia do Grupo D’Plácido.

W W W . E D I T O R A D P L A C I D O . C O M . B R

Belo HorizonteAv. Brasil, 1843,

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CEP 30140-007

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Copyright © 2021, D’Plácido Editora.Copyright © 2021, Os Autores.

Catalogação na Publicação (CIP)

Bibliotecária responsável: Fernanda Gomes de Souza CRB-6/2472

H553 Hermenêutica, direito e disruptividade na era tecnológica / coordenadores Maria Helena Damasceno e Silva Megale, Maurilio Casas Maia ; organizadores Adriana Goulart Sena Orsini... [et al.]. - 1. ed. - Belo Horizonte, São Paulo : D’Plácido, 2021.

452 p.

Organizadores: Adriana Goulart Sena Orsini, Alfredo Emanuel Farias de Oliveira, Paula Vilaça Bastos, Tereza Cristina Sorice Baracho Thibau.ISBN 978-65-5589-345-8

1. Direito. 2. Direito Público. 3. Direito Privado. I. Megale, Maria Helena Damasceno e Silva. II. Maia, Maurilio Casas. III. Orsini, Adriana Goulart Sena. IV. Oliveira, Alfredo Emanuel Farias de. V. Bastos, Paula Vilaça. VI. Thibau Tereza Cristina S. Baracho (Tereza Cristina Sorice Baracho). VII. Título.

CDD: 341

452 p.

CDDir: 341

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S u m á r i o

Prefácio 9Alexandre Morais da Rosa

Prólogo 13Maria Helena Damasceno e Silva Megale

1. Por uma analítica fenomenológica dos preconceitos na sociedade tecnológica 21Maria Helena Damasceno e Silva Megale

2. Tecnologia e direitos fundamentais 37Leonardo Scofano Damasceno Peixoto

3. O isolamento social e o papel do Supremo Tribunal Federal no enfrentamento ao coronavírus (SARS Covid-19) 69Valéria Cássia Dell’IsolaAlberto Rezende Medeiros

4. Compliance em tempos de tecnicismo: desafios e perspectivas a partir de uma analítica fenomenológica 93Paula Vilaça Bastos

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5. Hermenêutica jurídica e a datificação do sujeito: reflexos da ciência de dados na aplicação do direito e na interpretação da vontade 115Thiago Dias de Matos Diniz

6. Novas tecnologias e disruptividade: pressupostos teóricos para um novo olhar sobre a responsabilidade civil 133Pedro Carvalho Mitre ChavesAlfredo Emanuel Farias de Oliveira

7. Princípios podem suster rupturas legais para se alcançar a justiça 159Liciane Faria Traverso GonçalvesJoão Luiz Traverso Gonçalves

8. A aplicabilidade da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei nº 13.709/2018) às pessoas jurídicas 175Felippe Borring RochaPedro Dalese

9. Inovação disruptiva: da mediação presencial para a modalidade on-line 207Beatriz Aguiar Bovendorp VelosoPatricia Gazire De Marco

10. Jurimetria e predição: notas sobre uso dos algoritmos e o poder judiciário 239Adriana Goulart de Sena Orsini

11. Defensoria Pública, vulnerabilidade e sexta onda renovatória de acesso à justiça na era da disruptividade 259Maurilio Casas Maia

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12. Direitos humanos e educação em direitos: pressupostos para a efetiva proteção, por meio da Defensoria Pública, no contexto do Big Data 275Alfredo Emanuel Farias de Oliveira

13. O papel da Defensoria Pública na implementação de inteligência artificial no sistema de justiça 303Bruno Freire

14. A defesa dos consumidores virtuais pela Defensoria Pública e a disruptura entre os modelos de tutela processual individual e coletiva 325Ana Clara Carneiro da SilvaTereza Cristina Sorice Baracho Thibau

15. Tecnologia, gestão e usuário do serviço da Defensoria Pública em tempos de 4ª Revolução Industrial 355Adolfo Filgueiras Etienne

16. Inteligência artificial aplicada à Defensoria Pública: uma discussão sobre potenciais e cautelas 381Thales Alessandro Dias Pereira

17. A autonomia administrativa da Defensoria Pública para regulamentar o teletrabalho visando a observância do Princípio da Eficiência 401Adriane da Silveira Seixas

18. Notas sobre o problema da litigância contida 417Cirilo Augusto Vargas

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Posfácio 443Rafael Menezes

Coordenadores 447

Organizadores 449

Autores 451

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P re f á c i o

Alex andre M ora i s da Rosa 1

Recebi, com alegria, o convite para apresentar o livro “Herme-nêutica, Direito e Disruptividade na Era Tecnológica”, orga-nizado pela Professora Maria Helena Damasceno e Silva Megale e o Professor Maurilio Casas Maia, juntamente com os Professores Adriana Goulart Sena Orsini, Alfredo Emanuel Farias de Oliveira, Paula Vilaça bastos e Tereza Cristina Sorice Baracho Thibau.

O conjunto do livro procura situar os agentes jurídicos entre o movimento de ruptura e continuidade tecnológica. O modelo de Di-reito em que fomos ensinados coloca ordem aparente ao caos, por meio de simplificações pressupostas: a) normas definidas; b) agentes racio-nais; c) raciocínio e interpretação jurídica; e d) silogismo das decisões. Sabemos que todo modelo, dentre eles o jurídico, é uma redução de complexidade, fundado conforme o paradigma científico prevalecente. Por isso, em grande medida, o nosso modo de pensar ainda se baseia (e funciona parcialmente), em grande medida, a partir dos axiomas meca-nicistas. A arquitetura formal do Direito é a de um Sistema Fechado e Linear, em que as atribuições, funções e lugares devem ser desem-penhadas para obtenção de estabilidade e previsibilidade das relações humanas e jurídicas. A redução da complexidade é justificada porque se pretende estabilidade, além de ser estruturada a partir da lógica causa e efeito (mecanicista). O que acontece é que no funcionamento efetivo, o Direito deixa de ser um Sistema Fechado e Linear para assumir a complexidade de um Sistema Aberto e Não-Linear, impedindo a compreensão adequada do seu “real” funcionamento a partir das

1 Doutor em Direito. Professor da UNIVALI. Juiz de Direito.

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categorias tradicionais que, apesar de ainda “operarem”, precisam de adaptação dinâmica às emergências e contingências do contexto, em que um detalhe pode alterar o padrão do resultado, ainda mais com a inserção dos avanços tecnológicos.

Para podermos assumir o Direito como Dispositivo (funciona-mento Não Linear, em rede), precisamos acolher a noção de Sistema Aberto Não-Linear e, por via de consequência, da Complexidade (para além do equilíbrio linear), em que novas variáreis transplantadas de outros campos do saber (ciências da computação, estatística, física, economia, psicologia, sociologia etc.) exigem acomodação funcional. A adoção da Complexidade decorre do comparecimento/emergência de fatores de Risco e de Incerteza, não definidos previamente ou mesmo subestimados na arquitetura do modelo (causalidade implícita: interações, inferências subjetivas, heurísticas, vieses, falácias, oportunis-mo etc.), capazes de mudar os rumos do resultado, pela emergência de eventos de causalidade não linear (supera a lógica de causa-efeito). Ao mesmo tempo em que não podemos confundir a complexidade com a “anarquia generalizada” (ou sorte aleatória) e, tão somente, com um modo diferente de abordagem, provido de leis e mecanismos capazes de nos autorizar maior aderência à realidade.

É nesse sentido que o livro pretende situar o leitos nos mais diversos campos do Direito, desde o impacto da COVID no modo como nos relacionamos, a implementação de novas modalidades de relacionamento, o impacto da Inteligência Artificial, dentre outros temas que comparecem no decorrer do livro. O momento gera um certo desconforto em quem acredita no Direito como fenômeno exclusivo de causa-efeito, porque será preciso atualização. Ilya Prigogine afirma: “Ao longo das últimas décadas, um conceito novo tem conhecido um êxito cada vez maior: a noção de instabilidade dinâmica associada à de ‘caos’. Esse último sugere desordem, imprevisibilidade, mas veremos que não é assim”. Associar o Risco (tangível, mensurável) e a Incerteza (intangível e não mensurável), aos modelos aplicados ao Direito, passa pelo uso de máquinas. Eis o que temos procurado realizar nas pesqui-sas do nosso grupo de pesquisa SpinLawLab (UNIVALI-CNPQ). O futuro depende da ampliação do horizonte de compreensão, para além da Lógica Clássica, sem desprezar o seu funcionamento em questões situadas, para obtermos maior eficácia de entendimento e de ação. O livro, ademais, preocupa-se com o atendimento dos vulneráveis, via Defensoria Pública, por meio da integração tecnológica, algo que conta

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com o meu entusiasmo. Entre ruptura e continuidade, devemos manter o desafio constante de manter o humano no centro de nossas reflexões.

Sou grato aos autores e ao amigo e parceiro MaurIlio Casas Maia, cujo incansável trabalho, dedicação e paciência, promove encontros felizes. Espero que gostem do livro, assim como eu gostei.

Alexandre Morais da Rosa.

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P ró l o g o

Ma r i a He l e n a D amasc eno e S i l v a M ega le 2

Para muitos, o surgimento do acesso aos meios virtuais de comu-nicação foi recebido com assombro. Semelhantemente, a notícia do primeiro bebê de proveta, a do pouso inaugural de uma nave terrestre na Lua, e a de tantos outros avanços tecnológicos.3

Eventos dessa natureza vêm sendo recebidos como sintomas do fenômeno conhecido como disruptividade. Eles extrapolam o espa-ço dos laboratórios para alcançarem o modo de viver nos diversos ângulos da cotidianidade.

Pode-se afirmar que, a partir, principalmente, da década de sessenta, muitas têm sido as razões para assombros diante das inovações nas áreas das ciências, da técnica e da comunicação, com influências nos hábitos globalizados. Propositadamente, deixamos de mencionar o cientismo exterminador praticado em Auschwitz, Hiroshima, Nagasaki. Cientismo que se repete insanamente com consequências mortais, intencional-mente ou negligentemente provocadas.

O certo é que o mundo nunca esteve pronto. Antes de tudo, cabe lem-brar que também nós não somos seres acabados. O nosso mister é ter de ser.

2 Professora Titular de Filosofia do Direito da Faculdade de Direito da Universi-dade Federal de Minas Gerais (UFMG). Doutora em Filosofia do Direito pelo Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Coordenadora do Instituto de Hermenêutica, Teoria e Argumentação Jurídica (IHTAJ).

3 Sobre aspectos atuais na área da Medicina, decorrentes do avanço científico-tec-nológico e suas repercussões no campo do Direito, cf. a tese de doutoramento de Patricia Gazire De Marco, intitulada Sequenciamento genético à luz do direito: da digitalização da vida à identidade autêntica, defendida, em 2019, perante banca cons-tituída pelo Programa de Pós-graduação da Faculdade de Direito da UFMG.

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Supomos que a respeito dessa constatação não haja divergências. Heidegger tem razão, como repetidamente lembramos em nossos textos, ao afirmar que o ser-aí corresponde a um poder-ser-si-mesmo. Desse entendimento, não se deduz a ideia de um avançar linear ao modo de um infatigável progresso, contra o qual opomos nossas ressalvas.

Existimos como projetos que se vêm concretizando como obra aberta, no percurso de nosso sendo, na incerteza da finitude exaustiva do consumar-se de nossa existência. Conscientes de que no nosso estar sendo no mundo permeia passado, presente, futuro, e de que nossos passos nem sempre apontam para frente. Podemos ser levados por pau-sas ou retrocessos. Acompanha-nos a história de um passado remoto, refletindo no presente, ao virar a página para o futuro indefinido.

Nas linhas de um magnífico conto da literatura universal, Os mortos, James Joyce põe no discurso de um dos personagens da ficção, Gabriel, por ocasião de um encontro em família, vivido sob atmosfera de profundo afeto, o que se pode chamar de dicção autêntica de saudade. Fazem parte do romântico pronunciamento essas palavras:

[...] vivemos em tempos céticos e, se posso usar esta expressão, assolados por ideias: e por vezes temo que esta nova geração, educada ou hipereducada como seja, não terá aquelas quali-dades de humanidade, de hospitalidade, de um humor gentil que pertenciam a uma era mais antiga.4

O orador, ao recobrar o seu presente, observa que, se acaso vivessem a lamentar o que passou, não encontrariam ânimo para seguir brava-mente na vida entre os vivos.5 Assim, revestido de sua temporalidade, não se deteve no passado.

Por vezes, os movimentos do mundo, por diversas razões, segundo a captação de cada olhar, fogem à compreensão.

Sob o modo de sua descrição ou aparição, mesmo quando simples, exatamente talvez por isso, não compreendamos tais movimentos. Em geral, fenômenos que carregam em si elevado nível de singularidade são menos visíveis. O que se deve possivelmente ao fato da raridade de olhares atraídos.

4 JOYCE, James. Os mortos. In: JOYCE, James. Os mortos. Tradução de Caetano W. Galindo. São Paulo: Penguin Classics; Companhia das Letras, 2013. p. 7-58, p. 36.

5 Ibidem, p. 37.

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Observa-se relevante traço nesses tipos de fenômenos: são eles quase sempre desprovidos de valoração econômica. Compreendê-los demanda refinada depuração do modo de conduzirmo-nos no devir existencial.

Nem sempre somos capazes de alcançar o sentido das transforma-ções em nosso viver, mesmo porque desconhecemos que elas podem ter contado com nosso agir. Supomos, geralmente, que elas vieram de fora. Portanto, de nossa parte, nenhum comprometimento.

Ao percebê-las, comportamo-nos como se tivessem sido implan-tadas por outrem. Vemo-nos, muitas vezes, incapazes de adaptarmo-nos ao que elas trazem de inovador. Bem ou mal, somos responsáveis por transformações em nós e no mundo.

Recordamos, ao assim falarmos, do dizer de Thomas Merton em seu livro A montanha dos sete patamares.6 A natureza do contexto em que se achava, aparentemente, era bem outra, distante da nossa atualidade, assim como as palavras de Joyce. Ele descrevia a sensação pela qual fora tomado ao ler pela primeira vez um texto escrito por São João da Cruz. A impactação hoje, diante do novo, pode ser comparada àquela experi-mentada pelo jovem leitor num momento especial de sua caminhada.

Thomas Merton contava vinte e poucos anos de idade e estava confirmando uma vocação: a de tornar-se monge. Seu esforço foi demasiadamente grande para compreender a escritura de um santo, pensada há alguns séculos, com tamanha profundidade, embora simples, como ele próprio relata.

Merton declara que o assombro e a fascinação diante das palavras de São João da Cruz deviam-se ao fato de elas serem simples demais para a sua compreensão. Ele as reconheceu palavras “[...] muito cruas, muito despidas de qualquer duplicidade e meio termo [...]”, diante, como res-saltou, de “[...] sua então complexidade pervertida por muitos apetites”.7

Como nos sentimos diante do poder inventivo e transformador do mundo proporcionado pela ciência e pela técnica?8 Sabemos que a questão posta continua demandando debates e teses, especialmente nos campos científico, filosófico e teológico.

6 MERTON, Thomas. A montanha dos sete patamares. Tradução de Edgar Orth. Pe-trópolis: Vozes, 2005.

7 Ibidem, p. 216.8 A propósito da temática da técnica, remeto os leitores à tese de doutoramento de

Paula Vilaça Bastos, intitulada Por uma fenomenologia analítica no (e)laborar jurídico do meio ambiente, defendida, em 2017, perante banca constituída pelo Programa de Pós-graduação da Faculdade de Direito da UFMG.

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Nos tempos atuais, assistimos ao crescimento das discussões voltadas para a ciência, a técnica e a informação. A história, a filosofia e as artes revelam quão decididamente persiste a inteligência humana voltada para esses campos intercomunicantes de saberes.

A ciência, a técnica e a informação pertencem a um conjunto de temáticas sempre em pauta, especialmente em virtude da incidência de sua produção em diversos setores de nosso viver. A pesquisa, o co-nhecimento, a intercambiência, a produção, a interpretação, aplicação e divulgação do Direito dependem da técnica e da informação. Assim como os demais celeiros ofertantes de aportes científicos e práticos exigidos pela existência, provenientes de múltiplas fontes.

A partir da segunda metade do século XX, nota-se acelerada expansão da pesquisa nas áreas da ciência, da técnica e da informação. Consequente-mente, constata-se avanço crescente da produção correspectiva nesses campos.

A informação veiculada virtualmente mediante diversos formatos e programas eletrônicos, twitter, facebook, google glass, entre outros, quebra barreiras de distância sem, contudo, diminuir a pobreza para a maioria da população mundial. Talvez, uma das causas de tamanha desigualdade esteja na ilusão de muitos países, entre os pobres, em investirem no processo de convergência, na mira do crescimento econômico, tendo como parâmetro a economia de países ricos e poderosos.

Sem preparo e dependentes, países pobres caem nesse conhecido processo de catch up.9 Alguns poucos alcançam bons resultados, notada-mente os não atingidos pela corrupção e que investem na educação e na saúde como prioridades para o desenvolvimento. Grande parte da população dos países pobres não desfruta dos bons resultados da ciência, da técnica e da informação. Faltam, antes, nesses países, as essencialidades para o viver: alimentação, saúde, educação, moradia, acesso à justiça.

No Brasil, apesar de significativa parcela da população subsistir em grau elevado de pobreza, há algumas décadas, portas essenciais se abriram favorecendo o acesso à justiça. Uma dessas é a Defensoria Pública. Essa instituição, comprometida com o dever democrático de realizar a justiça de modo equitativo, vem contribuindo para a redução das dificuldades de acesso ao Poder Judiciário a crescente parcela da população.10 O próprio

9 Sobre o tema, cf. ALBUQUERQUE, Eduardo da Motta (Org.). Metamorfoses do capitalismo e processos de catch up. Belo Horizonte: UFMG, 2017.

10 Sobre Defensoria Pública, cf. OLIVEIRA, Alfredo Emanuel Farias de. O que é Defensoria Pública? Qual é a sua identidade? Concepções tangenciais da her-

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Poder Judiciário vem investindo em iniciativas inovadoras, entre as quais a mediação, com o objetivo de minimizar as desigualdades existenciais de um país pobre, apesar de potencialmente rico.

Neste livro identifica-se, nas diversas temáticas que o compõem, o olhar auscultador dos estudiosos que sobre estas refletiram, atentos à ciência, à técnica, à informação e ao direito voltados ao bem comum. Na diversidade de suas inspirações, um mesmo aglutinador prima como bem para todos: o valor chamado justiça.

Se o debate crescente em torno da ciência e da técnica conclui pelos benefícios daí resultantes em favor de melhores condições do modo de viver, nele (debate), por outro lado, permanecem críticas às consequências negativas do cientismo e do tecnicismo, especialmente para os países pobres. Acrescente-se a essa a crítica ao informacionis-mo ou informaticismo, exponencialmente avolumado pelos sistemas computadorizados, dotados de memória digital.11

A deturpada transformação provocada pela trindade – cientismo, tecnicismo, informaticismo – inquieta a autêntica vocação inventiva, criadora, descortinadora e comunicadora dos seres humanos dedicados à ciência, à técnica e à informação.

Quando tivermos tempo para refletirmos sobre cientismo, tecnicis-mo, informaticismo e seus resultados, os quais nos afogam, perceberemos quão danosa é a “[...] complexidade pervertida por muitos apetites” traiçoeiros. Essa nos impede de constatar a distância que separa ciência, técnica e informação autênticas do conjunto triádico de “ismos” que nos ofuscam a aptidão para identificá-los e separá-los do que é válido para o mundo em se tratando de ciência, técnica e informação.

A ausência do agir nesses citados campos reforça-se quando os resultados do “fazer” alinham-se conforme exigências de organização, que marcam a contemporaneidade, notadamente como fenômeno herdado e disseminado de modo irrefletido.12

Há muito tempo, Heidegger invocava nosso olhar para a perdição da ciência e da técnica. Fazia-o devido aos fundamentos postos no século

menêutica fenomenológica. In: MAIA, Maurílio Casas (Org.). Defensoria Pública, democracia e processo. Florianópolis: Empório do Direito, 2017. p. 15-32.

11 Sobre informação em tempo de disruptividade, cf. HAN, Byung-Chul. No enxame: perspectivas do digital. Tradução de Lucas Machado. Petrópolis: Vozes, 2018.

12 Sobre esse tema e outros atuais, cf. COURTINE-DENAMY, Sylvie. O cuidado com o mundo – Diálogo entre Hannah Arendt e alguns de seus contemporâneos. Tradução de Maria Juliana Gambogi Teixeira. Belo Horizonte: UFMG, 2004.

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passado para legitimar a liberação de energia atômica adornada como segurança da humanidade. Mostrava a relevância do papel exercido pela informação, tida como palavra-guia para as nossas tomadas de atitude, de acordo com a direção indicada pelo veículo informativo.

Na sua denunciante analítica do fenômeno que põe em risco a habitabilidade mundial, Heidegger destaca o papel da “information”, assim revestido o termo com o propósito de desvela-lo originariamen-te poderoso. Heidegger ressalta que esse caráter de origem da palavra “information” garante o peso do sentido comunicado, pois ele parte de um núcleo de poder informador de progresso, para muitos, irresistível, sob pena de exclusão do “mais” oferecido pelo tecnicismo.13

Os veículos de informação digital constam como conquistas proporcionadas pela pesquisa aplicada no campo da ciência e da tec-nologia. A própria informação constitui matéria de uma ciência: a Ciência da Informação. A crítica heideggeriana tanto quanto a nossa voltam-se não para esses campos de estudo, de descobertas e inova-ções. Elas dirigem-se ao cientismo, ao tecnicismo e ao informaticismo, formas pejorativas da inventividade e do desvelamento, assim como depreciativas da existência.

Eis neste livro um conjunto de temáticas nascidas da reflexão sobre o Direito nesses tempos considerados disruptivos. Foi sob a diversidade de olhares de grande e profundo alcance que nasceu esta obra, a qual temos a honra de anunciar.

Com alegria, assumimos o cuidado de coordená-la, ao lado do Doutor Maurilio Casas Maia, jurista comprometido com o Direito, no exercício do magistério universitário e na advocacia, ambas atividades exercidas em instituições públicas do Estado do Amazonas, na Univer-sidade Federal e na Defensoria Pública do Estado.

O labor na tessitura desta produção contou com a participação personalíssima de um seleto grupo de estudiosos. Cumprimentamos com carinho cada um de vocês, em cuja companhia permanecemos. Agradecemos a todos que tornaram viável esta criação coletiva nas pessoas dos integrantes da Comissão Organizadora: Doutora Adriana Goulart de Sena Orsini, Doutor Alfredo Emanuel Farias

13 MEGALE, Maria Helena Damasceno e Silva. Introdução à ontologia heideggeriana e ao meio ambiente: abertura do ser para o infinito da existência com o outro. Revista Brasileira de Estudos Políticos, Belo Horizonte, n. 99-B, p. 209-228, jul./dez. 2009, p. 221.

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de Oliveira, Doutora Paula Vilaça Bastos e Doutora Tereza Cristina Sorice Baracho Thibau.

Belo Horizonte, 21 de agosto de 2020.

Maria Helena Damasceno e Silva Megale.

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ISBN 978-65-5589-345-8

Quando tivermos tempo para refletirmos sobre cientismo, tecnicismo, informaticismo e seus resultados, os quais nos afogam, perceberemos quão danosa é a “[...] complexidade pervertida por muitos apetites” traiçoeiros (MERTON, 2005, p. 216). Essa nos impede de constatar a distância que separa ciência, técnica e informação autênticas do conjunto triádico de “ismos” que nos ofuscam a aptidão para identificá-los e separá-los do que é válido para o mundo em se tratando de ciência, técnica e informação.

Se o debate crescente em torno da ciência e da técnica conclui pelos benefícios daí resultantes em favor de melhores condições do modo de viver, nele (debate), por outro lado, permanecem críticas às consequências negativas do cientismo e do tecnicismo. [...]

A deturpada transformação provocada pela trindade – cientismo, tecnicismo, informaticismo – inquieta a autêntica vocação inventiva, criadora, descortinadora e comunicadora dos seres humanos dedicados à ciência, à técnica e à informação.

1. Por uma analítica fenomenológica dos preconceitos na sociedade tecnológicaMaria Helena Damasceno e Silva Megale

2. Tecnologia e direitos fundamentaisLeonardo Scofano Damasceno Peixoto

3. O isolamento social e o papel do Supremo Tribunal Federal no enfrentamento ao coronavírus (SARS Covid-19)Valéria Cássia Dell’Isola Alberto Rezende Medeiros

4. Compliance em tempos de tecnicismo: desafios e perspectivas a partir de uma analítica fenomenológicaPaula Vilaça Bastos

5. Hermenêutica jurídica e a datificação do sujeito: reflexos da ciência de dados na aplicação do direito e na interpretação da vontadeThiago Dias de Matos Diniz

6. Novas tecnologias e disruptividade: pressupostos teóricos para um novo olhar sobre a responsabilidade civilPedro Carvalho Mitre Chaves Alfredo Emanuel Farias de Oliveira

7. Princípios podem suster rupturas legais para se alcançar a justiçaLiciane Faria Traverso Gonçalves João Luiz Traverso Gonçalves

8. A aplicabilidade da Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei nº 13.709/2018) às pessoas jurídicasFelippe Borring Rocha Pedro Dalese

9. Inovação disruptiva: da mediação presencial para a modalidade on-lineBeatriz Aguiar Bovendorp Veloso Patricia Gazire De Marco

10. Jurimetria e predição: notas sobre uso dos algoritmos e o poder judiciárioAdriana Goulart de Sena Orsini

11. Defensoria Pública, vulnerabilidade e sexta onda renovatória de acesso à justiça na era da disruptividadeMaurilio Casas Maia

12. Direitos humanos e educação em direitos: pressupostos para a efetiva proteção, por meio da Defensoria Pública, no contexto do Big DataAlfredo Emanuel Farias de Oliveira

13. O papel da Defensoria Pública na implementação de inteligência artificial no sistema de justiçaBruno Freire

14. A defesa dos consumidores virtuais pela Defensoria Pública e a disruptura entre os modelos de tutela processual individual e coletivaAna Clara Carneiro da Silva Tereza Cristina Sorice Baracho Thibau

15. Tecnologia, gestão e usuário do serviço da Defensoria Pública em tempos de 4ª Revolução IndustrialAdolfo Filgueiras Etienne

16. Inteligência artificial aplicada à Defensoria Pública: uma discussão sobre potenciais e cautelasThales Alessandro Dias Pereira

17. A autonomia administrativa da Defensoria Pública para regulamentar o teletrabalho visando a observância do Princípio da EficiênciaAdriane da Silveira Seixas

18. Notas sobre o problema da litigância contidaCirilo Augusto Vargas

di-rei- to

Maria Helena Damasceno e Silva Megale

Maurilio Casas Maia

ORGANIZADORES

COORDENADORES

Adriana Goulart Sena OrsiniAlfredo Emanuel Farias de Oliveira

Paula Vilaça BastosTereza Cristina Sorice Baracho Thibau

her-me-nêu-tica,

e disruptividade na era tecnológica