marcia juliana d’angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/marcia...

231
Universidade Presbiteriana Mackenzie Centro de Ciências Sociais e Aplicadas Programa de Pós-Graduação em Administração de Empresas Aprendizagem social para a sustentabilidade: um estudo sobre negócios sustentáveis em contextos de múltiplos atores sociais, relações e interesses Marcia Juliana d’Angelo São Paulo 2013

Upload: vodien

Post on 16-Sep-2018

267 views

Category:

Documents


2 download

TRANSCRIPT

Page 1: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

Universidade Presbiteriana Mackenzie

Centro de Ciências Sociais e Aplicadas

Programa de Pós-Graduação em Administração de Empresas

Aprendizagem social para a sustentabilidade: um estudo sobre negócios

sustentáveis em contextos de múltiplos atores sociais, relações e interesses

Marcia Juliana d’Angelo

São Paulo

2013

Page 2: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

Marcia Juliana d’Angelo

Aprendizagem social para a sustentabilidade: um estudo sobre negócios

sustentáveis em contextos de múltiplos atores sociais, relações e interesses

Tese apresentada ao Programa de Pós-graduação

em Administração de Empresas da Universidade

Presbiteriana Mackenzie para a obtenção do título

de Doutorado em Administração de Empresas

Orientadora: Professora Dra. Janette Brunstein

São Paulo

2013

Page 3: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

D186a D'Angelo, Marcia Juliana

Aprendizagem social para a sustentabilidade : um estudo

sobre negócios sustentáveis em contextos de múltiplos atores

sociais, relações e interesses / Marcia Juliana d'Angelo - 2013.

230f. : il., 30 cm

Tese (Doutorado em Administração de Empresas) –

Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo, 2013.

Orientação: Profª. Drª. Janette Brunstein

Bibliografia: f. 223-230

1. Aprendizagem social para sustentabilidade. 2. Negócios

sustentáveis. 3. Múltiplos atores. 4. Antenarrativas. I. Título.

CDD 658.408

Page 4: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

Reitor da Universidade Presbiteriana Mackenzie

Professor Dr. Benedito Guimarães Aguiar Neto

Decano de Pesquisa e Pós-Graduação

Professora Dr. Moises Ari Zilber

Diretor do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas

Professor Dr. Sérgio Lex

Coordenadora do Programa em Administração de Empresas

Professora Dra. Darcy Mitiko Mori Hanashiro

Page 5: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

À minha mãe Maria Cândida d’Angelo e ao meu

irmão Sergio Anibal d’Angelo (in memorian)

Page 6: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

Agradecimentos

Ao longo da jornada deste doutorado agradeço imensamente:

ao Romildo Sasso, ex-funcionário da Basf, que abriu as portas para o meu projeto de

pesquisa junto à Fundação Espaço Eco;

à Flavia Renata Tozatto, Gerente de Sustentabilidade da Basf por ter atendido aos

meus muitos emails de solicitação de apoio ao meu doutorado;

à Ana Viana, pelo apoio durante a etapa do pré-teste do roteiro de entrevistas;

às pessoas que aceitaram compartilhar suas experiências com meu projeto de pesquisa

e dedicaram uma boa parte do tempo para me conceder as entrevistas:

o os funcionários da Fundação Espaço Eco, em particular, Fernando Feitosa,

Roberto Araujo, Emerson Coutinho, Juliana Furlaneto e Caio Granzotto;

o o funcionário da Basf Agro, Alessandro Costa;

o ao proprietário da Fazenda Santa Julia em Bebedouro – SP, Roberto Zero e o

seu gerente, o João Paulo;

o os funcionários ex-funcionários da COOPERCITRUS,SICOOB

CREDICITRUS e Estação Experimental de Citrocultura de Bebedouro- SP, em

particular,Agostinho Boggio, Adalardo Martins, Sheila Raszl, Renato, Antônio

Paixão e Cassilda Mendes;

o os professores e à coordenadora pedagógica das oficinas da Escola EMEF

Yolanda Carolina Giglio Villela de Bebedouro – SP, Elizabeth de Araújo e Rosa

Pires;

o as professoras da Escola Municipal Profª Dirce da Silva Dias de Pitangueiras –

SP;

o os servidores públicos do Departamento municipal de Educação e Cultura

(DEMEC) de Bebedouro – SP, em particular, Daniela Nery e Maria Cristina

Rangel.

à Ana Cristina d’Angelo pelas revisões dos textos;

ao Programa Pro-Administração da CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de

Pessoal de Nível Superior) e à Universidade Presbiteriana Mackenzie pelo apoio

financeiro;

à Andréia Regina Arantes, secretária da PPGA - Pós-Graduação em Administração de

Empresas, pela resolução de inúmeras questões ao longo do doutorado;

aos colegas e professores do curso de doutorado pelo apoio espetacular e pelo convívio

prazeroso;

à minha maravilhosa orientadora, Janette Brunstein, minha profunda gratidão pelo

apoio espetacular ao longo do doutorado.

Page 7: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

RESUMO

Um processo de busca de soluções para as complexas questões ambientais, econômicas e

sociais nas organizações depende da ação coordenada entre diversos atores sociais envolvidos

na teia do desenvolvimento sustentável e exige que estas reaprendam uma nova maneira de

fazer negócios. Neste cenário que envolve múltiplos atores sociais, relações, contextos e

interesses, a aprendizagem social tem emergido como uma abordagem híbrida para a resolução

de problemas ambientais e sociais complexos. Trata-se de uma realidade diferente para as

organizações cujo foco não é somente apoiar a resolução de problemas socioambientais, mas

também a transformação de crises em oportunidades de geração de produtos e serviços

sustentáveis. Assim, este estudo discutiu como uma organização de grande porte do setor

químico está socialmente aprendendo a lidar com a dialética entre a busca pelo retorno sobre os

investimentos para os acionistas e pelos benefícios para os seus outros públicos de interesse.

Para tanto, foi conduzida uma pesquisa qualitativa orientada pela proposta de análise de

narrativas de Boje. Assume a pesquisa, desta forma, uma abordagem pós-moderna, suportada

pelos pressupostos do construtivismo social. Os dados, construídos por meio de entrevistas,

conversas informais, documentos textuais e audiovisuais, e observação não participante, foram

analisados seguindo a orientação da análise de antenarrativas. Os resultados descrevem como o

processo de aprendizagem social para sustentabilidade (no caso, para uma agricultura

sustentável) em uma organização com fins lucrativos contempla uma estratégia com base em

competências desenvolvidas pela organização, um modelo de implementação e gestão

sistêmico, parcerias estratégicas robustas; e uma grande capacidade de articulação para

gerenciar os múltiplos atores sociais, interesses, contextos, espaços de aprendizagem,

parceiros, conflitos e relações de poder. Por fim, a tese discute o significado do conceito de

aprendizagem social para sustentabilidade em organizações com fins lucrativos.

Palavras-chave: aprendizagem social para sustentabilidade, negócios sustentáveis, múltiplos

atores, antenarrativas.

Page 8: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

ABSTRACT

The search for solutions for environment, economic and social complex issues in organizations

rely on coordinated actions among several social actors involved in the sustainable

development web and demand they learn a new way to do business. In this scenario which

involves multiple social actors, relations, contexts and interests, the social learning has emerged

as a hybrid approach to environment and social complex problem solving. It is a different

situation for organizations whose focus is not only support such problem solving, but

transforming crisis into opportunity to generate sustainable products and services. Therefore,

this study discussed how a large organization on chemical segment is socially learning to deal

with the dialectic between the return on investments for your shareholders and the benefits for

the others stakeholders. It was conducted a qualitative research on Boje’s antenarrative analysis

orientated. The research assumed, therefore, a postmodern approach, supported by social

constructivism assumptions. The data, built on through interviews, informal conversations,

textual and audiovisual and documents, and non-participant observation, were analyzed

according to antenarrative analysis. The results describe how the social learning process for

sustainability (in this case, for a sustainable agriculture) in a for-profit organization encompass

a strategy based on developed competencies by the organization; systemic management and

implementation model; strong and strategic partnerships; a huge articulation capability to

manage multiple social actors, interests, contexts, learning spaces, partners, conflicts and power

relations. Finally, the thesis discuss the concept meaning of social learning process for

sustainability in a for-profit organization.

Key words: social learning for sustainability, sustainable business, multiple actors,

antenarratives.

Page 9: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

Sumário

INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 16

2. O CAMINHAR EPISTEMOLÓGICO DA PESQUISA ........................................ 22

2.1 Era Moderna: os movimentos da transformação das relações entre o

homem e o seu meio...........................................................................................22

2.2 Pós-modernidade e a busca do desenvolvimento sustentável .......................... 27

2.3 A abordagem pós-moderna para a aprendizagem social para

sustentabilidade nas organizações .................................................................. 30

3 EM BUSCA DE PROCESSO DE APRENDIZAGEM SOCIAL PARA A

SUSTENTABILIDADE NA GESTÃO DOS NEGÓCIOS ..................................... 33

3.1 A proposta original da teoria de aprendizagem social – eixo I ......................... 35

3.2 A aprendizagem social nas organizações – eixo II .......................................... 39

3.3 Aprendizagem social para a sustentabilidade – eixo III ................................... 41

3.4 Aprendizagem social para a sustentabilidade nas organizações:

explorando o conceito no campo organizacional – eixo IV ............................. 57

4. METODOLOGIA DA PESQUISA .......................................................................... 63

4.1 A natureza da pesquisa ..................................................................................... 63

4.2 Visão geral do Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental .. 64

4.3 A estratégia metodológica da pesquisa ........................................................... 66

4.4 A construção dos dados ................................................................................... 72

4.5 A análise dos dados .......................................................................................... 76

5 O COMEÇO DE TUDO... A RELAÇÃO ENTRE A EXPERIÊNCIA DO

COMPLEXO INDUSTRIAL DA BASF EM GUARATINGUETÁ NA

RECUPERAÇÃO DE MATAS CILIARES E O PROGRAMA MATA VIVA

DE ADEQUAÇÃO E EDUCAÇÃO AMBIENTAL ................................................ 87

Page 10: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

5.1 Entendendo o problema, seu entorno, suas causas e consequências –

elemento 1 do processo de aprendizagem social para uma agricultura

sustentável no Programa Mata Viva de Adequação e Educação

Ambiental da Basf ........................................................................................... 88

5.1.1 As razões da devastação das matas ciliares no Vale do Paraíba .......... 89

5.1.2 Reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma

agricultura sustentável na história das causas da devastação das

matas ciliares ....................................................................................... 94

5.2 Definindo um conjunto de regras e instrumentos de gestão ambiental –

elemento 2 do processo de aprendizagem social para uma agricultura

sustentável no Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental

da Basf .............................................................................................................. 96

5.2.1 O que diz a legislação ambiental brasileira sobre a proteção de mata

nativa? A relação entre o governo e o Programa Mata Viva de

Adequação e Educação Ambiental ....................................................... 97

5.2.1.1 O primeiro Código Florestal Brasileiro e as florestas

protetoras .............................................................................. 97

5.2.1.2 O segundo Código Florestal Brasileiro e as Áreas de

Preservação Permanente ..................................................... 101

5.2.1.3 A força da Política Nacional do Meio Ambiente ............... 104

5.2.1.3.1 Princípios da Política Nacional do Meio

Ambiente ........................................................ 104

5.2.1.3.2 Instrumentos da Política Nacional do Meio

Ambiente ......................................................... 106

5.2.1.3.3 O sistema nacional do meio ambiente ............. 108

5.2.2 Reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura

sustentável na história da relação entre o governo e o Programa Mata

Viva de Adequação e Educação Ambiental ....................................... 110

5.3 Desenvolvendo competências de recuperação de matas ciliares – elemento 3 do

processo de aprendizagem social para uma agricultura sustentável no Programa

Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental da Basf ....................................... 113

5.3.1 A recuperação das matas ciliares no Vale do Paraíba ...................... 113

Page 11: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

5.3.2 Reflexões sobre as ações de aprendizagem social para

uma agricultura ustentável na história de recuperação das matas

ciliares no Vale do Paraíba .................................................................118

6 A CONTRIBUIÇÃO DA BASF PARA A SUSTENTABILIDADE NA

AGRICULTURA – AS RELAÇÕES ENTRE A UNIDADE DE PROTEÇÃO DE

CULTIVOS DA BASF AGRO E O PROGRAMA MATA VIVA DE

ADEQUAÇÃO E EDUCAÇÃO AMBIENTAL .................................................... 122

6.1 O significado atribuído pela Unidade de Proteção de Cultivos da

Basf Agro à sustentabilidade ......................................................................... 123

6.2 Definindo uma estratégia de desenvolvimento de negócios sustentáveis ..... 126

6.3 Reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura

sustentável na narrativa das relações entre a Unidade de Proteção

de Cultivos da Basf Agro e o Programa Mata Viva de Adequação e

Educação Ambiental ...................................................................................... 128

7 AS RELAÇÕES ENTRE A FUNDAÇÃO ESPAÇO ECO E O PROGRAMA

MATA VIVA DE ADEQUAÇÃO E EDUCAÇÃO AMBIENTAL ..................... 131

7.1 Estruturação de um modelo sistêmico de implementação e gestão e

formação de parcerias – elementos 4 e 5 do processo de aprendizagem social

para uma agricultura sustentável no Programa Mata Viva de Adequação e

Educação Ambiental da Basf .......................................................................... 132

7.1.1 As razões da Fundação Espaço Eco ................................................... 132

7.1.2 Foco de atuação da Fundação Espaço Eco ........................................ 138

7.1.3 A cooperação técnica entre Brasil e Alemanha ................................. 144

7.2 Reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura

sustentável na narrativa das relações entre a Fundação Espaço Eco e o

Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental ........................ 146

8 A EXPERIÊNCIA DA CIDADE DE BEBEDOURO – SP COM O

PROGRAMAMATA VIVA DE ADEQUAÇÃO E EDUCAÇÃO

AMBIENTAL ......................................................................................................... 150

8.1 Primeiro, a experiência de Bebedouro na vertente de adequação ambiental. 150

8.1.1 Etapa 1 da metodologia de adequação ambiental – Diagnóstico da

propriedade rural ............................................................................... 158

Page 12: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

8.1.2 Etapa 2 da metodologia de adequação ambiental – Elaboração do

projeto étnico ..................................................................................... 160

8.1.3 Etapa 3 da metodologia de adequação ambiental – Implantação

(plantio das mudas) ............................................................................ 163

8.1.4 Etapa 4 da metodologia de adequação ambiental – manutenção e

monitoramento ................................................................................... 165

8.2 Reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura

sustentável na narrativa de Bebedouro na vertente de adequação ambiental 167

8.3 Agora, a história da experiência de Bebedouro na vertente de educação

ambiental ........................................................................................................ 173

8.3.1 A história da estruturação da atividade da Trilha Ecológica Mata

Viva na cidade de Bebedouro – SP ..................................................... 175

8.3.1.1 As crianças, os professores e as atividades ao longo da

Trilha Ecológica Mata Viva ............................................... 179

8.3.2 Reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura

sustentável na narrativa de Bebedouro na vertente de educação

ambiental – Trilha Ecológica Mata Viva ...... .....................................181

8.3.3 A história da atividade do Atlas Ambiental na cidade de Bebedouro

– SP .................................................................................................... 185

8.3.4 Reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura

sustentável na história de Bebedouro na vertente de educação ambiental

– Atlas Ambiental ............................................................................... 193

8.3.5 A história da atividade do Teatro Mata Viva na cidade de

Bebedouro –SP ................................................................................... 197

8.3.6 Reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma

agricultura sustentável na narrativa de Bebedouro na vertente de

educação ambiental – Teatro Mata Viva ............................................ 199

9 DISCUSSÃO ............................................................................................................ 202

CONCLUSÃO ..................................................................................................................... 218

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .............................................................................. 223

Page 13: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

Lista de figuras

Figura 1: Teia do paradigma desenvolvimento sustentável ............................................. 30

Figura 2: Relações do conceito de aprendizagem social com outros constructos ............ 34

Figura 3: Processo de aprendizagem de Dewey ............................................................... 37

Figura 4: Representações simplificadas do desenvolvimento sustentável ....................... 47

Figura 5: Teia da aprendizagem social na gestão ambiental ............................................ 49

Figura 6: Estrutura de elementos críticos da aprendizagem social para resolução de

problemas ambientais complexos ..................................................................... 51

Figura 7: Ciclo de aprendizagem social no Projeto HARMONICOP .............................. 54

Figura 8: Ciclo de aprendizagem social por meio da colaboração entre múltiplos atores

sociais em projetos de recursos naturais .......................................................... 58

Figura 9: Indicadores do Programa Mata Viva de Adequação e Educação ambiental ... 66

Figura 10: Dinâmica da construção de sentido de histórias e narrativas ........................... 67

Figura 11: Tamara do Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental ......... 71

Figura 12: Dário de Campo da Pesquisadora .................................................................... 75

Figura 13: Mapa da rede de histórias do Programa Mata Viva de Adequação e

Educação Ambiental ........................................................................................ 79

Figura 14: Artigos 1º e 2º do Decreto no 23.793 (1934) .................................................... 97

Figura 15: Área recuperada pelo Programa de recomposição da mata ciliar do Rio

Paraíba do Sul – Guaratinguetá – SP .............................................................. 117

Figura 16: Movimento de engajamento das empresas brasileiras ao Pacto Global das

Organizações das Nações Unidas ................................................................... 135

Figura 17: Fundação Espaço Eco .................................................................................... 137

Figura 18: Placa da parceria entre a fazenda Santa Julia e os parceiros do Programa .... 157

Figura 19: Mapa de Adequação Ambiental da fazenda Santa Julia em Bebedouro ( SP) 159

Page 14: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

Figura 20: Relatório de Adequação Ambiental da fazenda Santa Julia em

Bebedouro – SP .............................................................................................. 162

Figura 21: Árvores plantadas para recuperar a área de preservação permanente

da fazenda Santa Julia em Bebedouro – SP .................................................... 164

Figura 22 Elementos do processo de aprendizagem social para uma agricultura

sustentável em uma organização com fins lucrativos ..................................... 217

Page 15: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

Lista de quadros

Quadro 1: Características do paradigma de gestão dos negócios tradicional ..................... 25

Quadro 2: Características das dimensões das posições de pesquisa em estudos

Organizacionais ............................................................................................... 31

Quadro 3: Roteiro de entrevistas ....................................................................................... 74

Quadro 4: Tipos de análises de antenarrativas utilizadas na contação das narrativas e

histórias do Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental na

cidade de Bebedouro – SP .............................................................................. 76

Quadro 5: Relações entre os diversos atores que compõem a Tamara do Programa

Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental na cidade de

Bebedouro – SP ................................................................................................ 80

Quadro 6: Entendimento do problema, seu entorno, suas causas e suas consequências ... 95

Quadro 7: Resumo das reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma

agricultura sustentável na história das causas da devastação das matas

ciliares .............................................................................................................. 95

Quadro 8: Instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente ................................... 107

Quadro 9: Estrutura do Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA) .................. 109

Quadro 10: Resumo das reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma

agricultura sustentável na história da relação entre o Programa Mata Viva

de Adequação e Educação Ambiental e o governo ......................................... 111

Quadro 11: Objetivos específicos do Programa de recomposição da mata ciliar do Rio

Paraíba do Sul ................................................................................................ 114

Quadro 12: Atribuições dos parceiros do Programa de recomposição da mata ciliar do Rio

Paraíba do Sul ................................................................................................. 115

Quadro 13: Atividades da etapa de plantio do Programa de recomposição da mata ciliar do

Rio Paraíba do Sul .......................................................................................... 116

Quadro 14: Resumo das reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma

agricultura sustentável na história da recuperação das matas ciliares no

Vale do Paraíba .............................................................................................. 119

Page 16: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

Quadro 15: Resumo das reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma

agricultura sustentável na narrativa da relação entre a experiência do

complexo industrial da Basf em Guaratinguetá na recuperação de matas

ciliares e o Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental ..... 120

Quadro 16: Resumo das reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma

agricultura sustentável na narrativa das relações entre a Unidade de

Proteção de Cultivos da Basf Agro e o Programa Mata Viva de Adequação e

Educação Ambiental ...................................................................................... 129

Quadro 17: Princípios do Pacto Global das Organizações das Nações Unidas (ONU) .... 134

Quadro 18: Síntese das razões da criação da Fundação Espaço Eco ................................ 136

Quadro 19: Resumo das reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma

agricultura sustentável na narrativa das relações entre o Programa Mata

Viva de Adequação e Educação Ambiental e a Fundação Espaço Eco .......... 148

Quadro 20: Resumo das reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma

agricultura sustentável na narrativa de Bebedouro na vertente de adequação

ambiental ........................................................................................................ 172

Quadro 21: Resumo das reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma

agricultura sustentável na narrativa de Bebedouro na vertente de

educação ambiental – atividade Trilha Ecológica Mata Viva ........................ 184

Quadro 22: Resumo das reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma

agricultura sustentável na narrativa de Bebedouro na vertente de educação

ambiental – atividade Atlas Ambiental .......................................................... 196

Quadro 23: Resumo das reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma

agricultura sustentável na narrativa de Bebedouro na vertente de educação

ambiental – atividade Teatro Mata Viva ........................................................ 201

Quadro 24: Atores sociais envolvidos no Programa Mata Viva de Adequação

e Educação Ambiental ................................................................................... 210

Page 17: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

INTRODUÇÃO

Na sabedoria milenar chinesa, a palavra “crise” é escrita com dois ideogramas: um

significa perigo; o outro, oportunidade.

“As últimas duas décadas de nosso século vêm registrando um estado de profunda

crise mundial. É uma crise complexa, multidimensional, cujas facetas afetam todos os

aspectos de nossa vida – a saúde e o modo de vida, a qualidade do meio ambiente e das

relações sociais, da economia, tecnologia e política. É uma crise de dimensões

intelectuais, morais e espirituais; uma crise de escala e premência sem precedentes em

toda a história da humanidade. Pela primeira vez, temos que nos defrontar com a real

ameaça de extinção da raça humana e de toda a vida no planeta”. (CAPRA, 1982, p.

19)

Quase 30 anos após essa observação de Fritjof Capra, o mundo, infelizmente, ainda

continua enfrentando crises políticas, econômicas, sociais, ambientais, étnicas e culturais,

como consequência dos comportamentos insustentáveis do homem, mesmo após o advento do

paradigma desenvolvimento sustentável.

Contudo, mudar comportamentos moldados ao longo de vários séculos exige que todos os

atores sociais envolvidos na teia do desenvolvimento sustentável reaprendam uma nova

maneira de compartilhar seus interesses para criar sociedades sustentáveis. São eles: sociedade

(famílias, estudantes, trabalhadores, incluindo os que não sabem ler e escrever, organizações

não-governamentais, instituições de ensino, imprensa); governos (municipal, estadual e

federal); organizações (funcionários, consumidores diretos/indiretos, fornecedores,

comunidades, parceiros públicos/privados); e o meio ambiente.

Para conduzir esse processo de transformação que envolve múltiplas relações, contextos e

interesses, a aprendizagem social tem emergido como uma abordagem híbrida para a resolução

de problemas ambientais e sociais complexos. Trata-se de uma realidade diferente para as

organizações cujo foco não é somente apoiar a resolução de problemas, mas também a

transformação dessas crises em oportunidades de geração de produtos e serviços sustentáveis,

ou seja, que sejam viáveis economicamente e consoantes com as demandas da sustentabilidade.

Perigo

Crise

Oportunidade

Page 18: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

17

Por isso, o tema central desta pesquisa é discutir como as organizações estão

socialmente aprendendo a lidar com a dialética entre a busca pelo retorno sobre os

investimentos para os acionistas e pelos benefícios para os seus outros públicos de interesse.

Gerar produtos e serviços sustentáveis significa mudar o paradigma de gestão

tradicional dos negócios cujo significado, segundo Shrivastava (1995) e Ashley (2005, p. 57), é

a “busca da maximização racional da riqueza dos acionistas, por meio da mercantilização das

relações sociais, de uma competição como conduta primária para as relações de produção e

consumo e da relação de apropriação da natureza pelo ser humano”.

Nesse paradigma, sob o ponto de vista da relação das organizações com os seus

stakeholders (públicos de interesse), isto é, com “qualquer grupo ou indivíduo que pode

impactar ou ser impactado pelo cumprimento dos objetivos da organização” (FREEMAN,

1984, p. 46), prevalece a visão econômica clássica de Friedman (1984): “A única

responsabilidade social da empresa é gerar emprego para a sociedade e lucro para os

acionistas”. Ou seja, trata-se de um conjunto de relações desconectado e independente, no qual

prevalecem apenas os interesses dos acionistas.

Por isso, um processo de busca de soluções para as complexas questões políticas,

econômicas, sociais, ambientais, étnicas e culturais depende da ação coordenada entre

sociedade, governo, organizações e meio ambiente, bem como do compartilhamento e da

integração de diversos pontos de vista e fontes de informações entre tais grupos de interesse. Os

diferentes atores envolvidos nesta teia da sustentabilidade precisam se unir para aprender a lidar

com as questões complexas de incerteza acerca desse novo paradigma.

Se quisermos que os efeitos e impactos das mudanças sejam duradouros, é necessário

enfocarmos os aspectos alienadores dos vários modos de pensamento e ação que têm

caracterizado a vida nas sociedades pós-industriais. Em outras palavras, precisamos reaprender.

Essa é também um das principais conclusões dos participantes do workshop “Social Learning

and Sustainability: Exploring Critical Issues in Relation to Environmental Change and

Governance”, realizado pelo Instituto do Meio Ambiente de Estocolmo, que reconhecem os

desafios do paradigma desenvolvimento sustentável como globais e complexos, demandando

um repensar e um reaprender acerca dessas mudanças (PROJECT REPORT, 2011). Autores

como Pahl-Wostl et al. (2007), Bouwen e Taillieu (2004), Keen, Brown e Dyball (2005), Capra

(2007), Glasser (2007) e Kilvington (2007; 2010) acreditam que essa aprendizagem é

socialmente construída.

Page 19: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

18

Glasser (2007, p. 56) reconhece que “não há ainda uma interpretação completamente

coerente, clara e aceita de aprendizagem social”. Como também admite que “não há

aprendizagem social para o paradigma sustentabilidade bem desenvolvida, lúcida”. Os

participantes do workshop do Instituto do Meio Ambiente de Estocolmo concordam que

aprendizagem social é definida de diversas maneiras e reconhecem que, ao mesmo tempo em

que ter uma única definição pode ser problemático, é igualmente uma meta desafiadora para os

estudiosos dessas temáticas a aderência a uma definição consensual de aprendizagem social

(PROJECT REPORT, 2011). Outra reflexão desse workshop é que o uso do termo

aprendizagem social de forma sinônima com outros termos ou campos de pesquisa é

igualmente questionável. Os participantes defendem que, “se aprendizagem social significa

tudo, perde sua significância”. Acrescentam: “Empenhar-se por uma especificidade

terminológica e clareza conceitual é uma meta que vale a pena, desde que se tenham termos que

sejam acessíveis para que os indivíduos possam trabalhar em diversos campos” (IBIDEM, p.

11).

Além da complexidade de definição desse constructo, nesse mesmo workshop, foram

identificadas mais três questões relevantes e emergentes para o debate sobre aprendizagem

social. A primeira refere-se à criação de processos e de espaços sociais que fomentem

interações para potencializar diálogos acerca das relações entre aprendizagem e variáveis como

confiança, comunicação e capital social, e também das relações entre aprendizagem e processos

colaborativos e participativos.

A segunda questão refere-se à comparabilidade dos casos investigados nos estudos

sobre aprendizagem social tornando-se um grande desafio para os estudiosos por conta da

grande variedade de pesquisas: é possível ter comparações robustas e significativas? Os

resultados podem ser agregados ao longo de casos na ausência de métodos e epistemologias

similares?

O último tópico enfatiza a necessidade de se aprofundar os estudos para aprimorar o

discernimento conceitual de aprendizagem social.

Apesar dessas dificuldades, os pesquisadores presentes nesse workshop reconhecem a

importância de se fortalecer a conexão entre aprendizagem social e sustentabilidade, uma vez

que, para alcançar trajetórias sustentáveis, é necessário aprender rápido e aprender a evitar

comportamentos insustentáveis:

Page 20: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

19

Nós precisamos aprimorar o nosso entendimento dos caminhos pelos quais a

aprendizagem pode beneficiar a sociedade e o meio ambiente. Que tipos de

aprendizagem ajudariam indivíduos, grupos, organizações e sociedade a alcançarem

resultados melhores? A aprendizagem é central para adaptação quando as ações são

mudadas em reposta ao feedback. A aprendizagem também tem um papel central nas

transformações, onde as trajetórias dos sistemas precisam ser questionadas de forma

crítica e possivelmente alteradas. Isto frequentemente exige tomadas de decisões

difíceis na arena das ‘políticas duras’. Que compensações são críticas para a

sustentabilidade? O precedente leva a aprendizagem para o domínio da mudança

social, onde estabelecer valores e criar instituições inovadoras são ações necessárias

para a sustentabilidade. (PROJECT REPORT, 2011, p. 11)

Contudo, os estudos sobre aprendizagem social para a sustentabilidade estão mais

voltados para a gestão dos ecossistemas, gestão dos recursos naturais, resolução de problemas,

mudanças climáticas e educação ambiental. São poucos os estudos, tanto no Brasil como na

literatura internacional, dedicados à discussão da aprendizagem social para sustentabilidade nas

organizações com fins lucrativos. É nesta lacuna que esta pesquisa pretende dar sua

contribuição.

O foco da aprendizagem social para sustentabilidade nas organizações não pode se

reduzir à resolução de problemas. Trata-se também da transformação das crises em

oportunidades de geração de produtos e serviços sustentáveis em contextos de múltiplos atores

sociais, relações e interesses. Um estudo global feito pela consultoria McKinsey revela que,

para 59% dos executivos entrevistados, a biodiversidade é vista como oportunidade de negócio

e não como risco (FALEIROS; ADEODATO, 2011).

Por exemplo, organizações das indústrias químicas, farmacêuticas e de cosméticos

veem o capital natural da biodiversidade brasileira como insumos para suas linhas de produtos.

Ou seja, querem contribuir para conservar a biodiversidade e aproveitar de forma sustentável

seus recursos, transformando-os em produtos com valor agregado para o seu mercado. Nesse

caso, as cadeias produtivas da biodiversidade diferenciam-se dos segmentos tradicionais da

economia. Especialmente, porque a oferta depende dos ciclos da natureza e da capacidade de

acesso às zonas produtivas. Os fornecedores são dispersos, não há economias de escopo ou rede

consolidada de prestadores de serviços e assistência técnica e científica que gerem sinergias

(ENRIQUEZ, 2009). Em outras palavras, o sucesso dos negócios envolvendo biodiversidade,

cuja dinâmica e timing são característicos, exige adaptação tanto dos produtores quanto das

organizações e a preocupação como o tripé preservação-sustentabilidade-social (MEIRELLES,

2011).

Page 21: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

20

Além disso, de acordo com abordagem baseada em recursos naturais

(Natural-Resource-Based View), a escassez de recursos naturais será inevitável e limitadora da

atividade econômica (HART, 1995). Daí, a importância de uma gestão sustentável da cadeia de

suprimentos. Nesse contexto, o Brasil é o país que “mais facilmente pode chegar a uma

economia verde, em função da sua rica biodiversidade, solo abundante e matriz energética

limpa”, segundo o estudo Vision 2050, feito pelo Conselho Empresarial Brasileiro para o

Desenvolvimento Sustentável (COHEN, 2010, p. 31).

Dado esse cenário, este estudo se propõe a investigar a seguinte problemática: como o

processo de aprendizagem social para sustentabilidade em uma organização com fins lucrativos

favorece as ações de negociação entre múltiplos atores, visando o equilíbrio de interesses e a

minimização de assimetrias de poder?

Tem como objetivo discutir as experiências que envolvem o processo de aprendizagem

social para sustentabilidade em uma organização de grande porte, com a intenção de analisar

como os múltiplos atores sociais se engajam no discurso e na ação, tendo em vista a necessidade

de realizar negócios sustentáveis. Pretende-se, ao final, apresentar as implicações desse

processo para o avanço da compreensão do significado de aprendizagem social em uma

organização com fins lucrativos.

Os objetivos específicos são:

1. Identificar e mapear os elementos de aprendizagem social para

sustentabilidade presentes em um projeto de desenvolvimento de negócios

sustentáveis de uma organização com fins lucrativos de grande porte;

2. Analisar as narrativas e histórias dos múltiplos atores sociais envolvidos

no processo de negociação, evidenciando conflitos de interesses e

possibilidades de acordos;

3. Descrever e analisar os espaços ou ambientes organizacionais que

favorecem a aprendizagem social;

4. Discutir o conceito de aprendizagem social para sustentabilidade nas

organizações.

Page 22: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

21

Para cumprir esses objetivos, foi conduzido um estudo qualitativo, de natureza

exploratória-descritiva, mediante uma abordagem pós-moderna, dado que a problemática deste

estudo requereu estudos dialógicos entre os múltiplos atores sociais, relações e contextos. A

pesquisa adotou o paradigma do construtivismo social cuja reinvindicação principal é a de que a

realidade seja construída socialmente. O objeto de estudo foi um dos programas de negócios

sustentáveis de uma organização multinacional de grande porte.

Além desta introdução, esta tese está organizada em cinco capítulos. No arcabouço

teórico são discutidas as abordagens que mostram a necessidade de reaprender por parte dos

atores sociais e as bases da opção epistemológica deste estudo, bem como as abordagens que

tratam das relações entre aprendizagem social, sustentabilidade e organizações.

No capítulo 3 são mostradas as razões pela escolha da estratégia metodológica de

contação de narrativas e histórias, bem como o detalhamento da construção e análise dos dados.

Os capítulos 4 ao 8 contemplam a análise e interpretação dos resultados por meio das

narrativas e histórias do Programa, objeto de estudo desta tese, que é complementado pelo

capítulo 9, que apresenta uma discussão para responder ao problema de pesquisa colocado neste

estudo.

Por último, o capítulo 10 apresenta a conclusão, contribuições e sugestões para

pesquisas futuras.

Page 23: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

22

2. O CAMINHAR EPISTEMOLÓGICO DA PESQUISA

“Não podemos resolver os problemas de hoje com o mesmo pensamento que os

criou”. (ALBERT EINSTEIN)

O objetivo deste arcabouço teórico, por meio de uma breve revisão do contexto

histórico acerca dos impactos da era moderna e o advindo da era pós-moderna, é mostrar a

nossa opção epistemológica para esse estudo.

2.1 Era Moderna: os movimentos da transformação das relações entre o homem e o

seu meio

Ao referenciar os padrões culturais descritos por Arnold Toynbee1 em sua obra “A Study

of History”, relativos à ascensão e queda de civilizações, Capra (1982, p. 27) reconheceu, em

particular, três transições que podiam “abalar os alicerces de nossas vidas e afetar

profundamente o nosso sistema social, econômico e político”.

A primeira transição diz respeito ao inevitável declínio do patriarcado. Segundo esse

pesquisador (IBIDEM):

O que sabemos é que, nestes últimos três mil anos, a civilização ocidental e suas

precursoras, assim como a grande maioria das outras culturas, basearam-se em

sistemas filosóficos, sociais e políticos “em que os homens – pela força, pressão

direta, ou através do ritual, da tradição, lei e linguagem, costumes, etiqueta, educação

e divisão do trabalho – determinam que papel as mulheres devem ou não

desempenhar, e no qual a fêmea está em toda parte submetida ao macho.

Hoje, as sociedades, antes homogêneas, são heterogêneas e essa tendência é irreversível

(MOR BARAK, 2005), especialmente no tocante à força de trabalho no mundo. Além da

dimensão gênero – a mudança da participação da mulher no mercado de trabalho, nos diferentes

movimentos sociais ou na vida política –, a diversidade abrange variações em etnia,

nacionalidade, orientação sexual, habilidades físicas, classe social, idade e outras categorias

socialmente significativas (FERDMAN, 1995).

1 Apesar da grande aceitação da obra, Toynbee foi criticado por fazer generalizações arbitrárias, cometer erros

fatuais e enfatizar em demasia a força da religião

Page 24: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

23

A segunda transição trata do declínio da era do combustível fóssil – recursos naturais

não renováveis, como o carvão natural, petróleo e gás natural – as principais fontes de energia

da era moderna industrial, responsáveis pela liberação do CO2 (gás carbônico ou dióxido de

carbono), o grande causador do efeito estufa.

Hoje, os biocombustíveis (álcool, biodiesel, biogás etc.) já são alternativas para os

combustíveis fósseis, visto que são energias renováveis. São produzidos a partir de óleos

vegetais como mamona, girassol, milho, cana-de-açúcar, dentre outros. Mas, como qualquer

outro combustível, também vai liberar CO2, que é reabsorvido pelos vegetais. Por isso, apesar

de os biocombustíveis não serem totalmente "limpos", são mais "ecologicamente corretos" que

os combustíveis fósseis. Também há a energia solar, que, após a sua captação, é transformada

em alguma forma utilizável pelo homem, seja diretamente para aquecimento de água, seja

como energia elétrica ou mecânica.

A terceira transição diz respeito a uma mudança profunda no pensamento, percepção e

valores que formam uma determinada visão da realidade nos mesmos moldes sugeridos por

Kuhn (2003). Ou seja, seria necessário mudar o paradigma que tem dominado nossa cultura

durante muitas centenas de anos, modelando nossa moderna sociedade ocidental e

influenciando significativamente o resto do mundo. Segundo Capra (1982, p. 28):

Esse paradigma compreende certo número de idéias e valores que diferem nitidamente

dos da Idade Média; valores que estiveram associados a várias correntes da cultura

ocidental, entre eles a revolução científica, o Iluminismo e a revolução industrial.

Incluem a crença de que o método científico é a única abordagem válida do

conhecimento; a concepção do universo como um sistema mecânico composto de

unidades materiais elementares; a concepção da vida em sociedade como uma luta

competitiva pela existência; e a crença do progresso material ilimitado, a ser alcançado

através do crescimento econômico e tecnológico. Nas décadas mais recentes,

concluiu-se que todas essas idéias e esses valores estão seriamente limitados e

necessitam de uma revisão radical.

No cerne desse paradigma, está a mudança nas nossas relações com a natureza que, até a

Idade Média aproximadamente, era orgânica, pois as pessoas viviam em comunidades

pequenas e coesas, e as relações com a natureza eram caracterizadas pela interdependência dos

fenômenos espirituais e materiais e pela subordinação das necessidades individuais às da

comunidade. A partir do século XVI, a noção de um universo orgânico foi substituída pela do

mundo como se fosse uma máquina, que mais tarde fora convertida em metáfora dominante das

eras moderna e contemporânea. Trata-se de um paradigma de tradição modernista.

Page 25: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

24

Hoje, desenvolvimento sustentável surge como um novo paradigma na concepção

kuhniana de padrão normativo, referência comum entre os autores que se dedicam ao estudo da

inter-relação entre sociedade e meio ambiente. Sua proposição básica de eficiência econômica

com eficácia social e ambiental, ou seja, melhoria da qualidade de vida das populações atuais

sem comprometer as possibilidades das próximas, constitui-se em normas ou padrões de

comportamento almejado pelas sociedades. Na ciência e na política social, é capaz de abarcar a

“essência dos complexos fenômenos sociais da atualidade, em resposta à crise paradigmática da

ciência até então estabelecida, cujas teorias não respondem à tal complexidade”.

(MONTIBELLER, 2000, p. 45).

O desenvolvimento histórico da modernidade sugere que o paradigma que tem

modelado nossa moderna sociedade ocidental e influenciado significativamente o resto do

mundo, conforme sugerido por Capra (1982), na realidade, trata-se de um paradigma

antropocêntrico. Segundo Shrivastava (1995, p. 126):

Antropocentrismo é uma ideologia que defende o separatismo, a supremacia e a

superioridade da espécie humana. Esse conceito legitima o bem-estar humano como a

proposta central das instituições societais. Consequentemente, a natureza é

reconsiderada como um recurso que pode ser usado ou gasto por motivos de interesses

humanos. Assim, os humanos têm um direito de explorar a natureza sem qualquer

preocupação real em manter sua integridade. A preservação da natureza é

significativa somente como uma condição do auto interesse humano. Portanto, a

natureza pode ser protegida e conservada para que os humanos possam usá-la ao

máximo, tanto no presente quanto no futuro. De acordo com as premissas

antropocêntricas os seres humanos não têm a obrigação moral de minimizar os

impactos na natureza.

Ou se trata de um paradigma de gestão dos negócios tradicional, segundo Shrivastava

(1995) e Ashley (2005, p. 57), que “busca da maximização racional da riqueza dos acionistas,

por meio da mercantilização das relações sociais, de uma competição como conduta primária

para as relações de produção e consumo e da relação de apropriação da natureza pelo ser

humano”. Mais detalhes podem ser conferidos no Quadro 1.

Page 26: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

25

Quadro 1: Características do paradigma de gestão dos negócios tradicional

Objetivos

Crescimento econômico e lucros

Riqueza dos acionistas

Valores

Antropocêntrico

Conhecimento racional e empacotado

Valores patriarcais

Produtos Projetados para a função, estilo e preço

Desperdício de embalagens

Sistema de

produção

Intensivo em recursos e energia

Eficiência técnica

Organização

Estrutura hierárquica

Tomada de decisão autoritária (top-down)

Autoridade centralizada

Diferenciais de renda

Ambiente

Dominação sobre a natureza

Ambiente gerido como recurso

Poluição e desperdícios como exterioridades

Funções de

negócios

Marketing para o aumento do consumo

Finanças para a maximização de lucros no curto prazo

Contabilidade com foco nos custos convencionais

Gestão de recursos humanos para o aumento da produtividade do trabalho

Fonte: SHRIVASTAVA (1995, p. 131)

Nesse paradigma, sob o ponto de vista da relação das organizações com os seus

stakeholders (públicos de interesse), prevalece a visão econômica clássica: “a única

responsabilidade social da empresa é gerar emprego para a sociedade e lucro para os acionistas”

(FRIEDMAN, 1984). Ou seja, aparentemente, apenas dois stakeholders (públicos de interesse)

são impactados pelos cumprimentos dos objetivos das organizações: os acionistas e os

funcionários.

Contudo, a natureza também é significativamente afetada pelos cumprimentos dos

objetivos das organizações dentro desse paradigma tradicional de gestão dos negócios. Isso não

significa que não há outros stakeholders (públicos de interesse) envolvidos. Pelo contrário,

também há compradores/consumidores (diretos e indiretos); trabalhadores; fornecedores

(diretos e indiretos); ambientes (local/regional/global); governos (federal/estadual/municipal);

parceiros (privados/estatais); organizações não-governamentais e até mesmo os concorrentes.

Esse modelo de negócios originou-se na Era Moderna, cujo período é uma questão

discutível, não havendo acordo sobre datas nem consenso sobre o que deve ser datado, segundo

Page 27: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

26

Bauman (1999). Berman (1986), por exemplo, divide a modernidade em três fases: a primeira

vai do início do século XVI até o fim do século XVIII – as pessoas ainda não tinham

consciência dessa nova experiência de vida moderna; a segunda fase teria início com a

Revolução Francesa, em 1789 e o surgimento do público moderno que teria vivido a

ambiguidade de ainda não estar inteiramente em um mundo moderno; e a terceira fase teria

iniciado no século XX, com o triunfo do modernismo nas artes e no pensamento. Esse autor

desdobra o conceito de modernidade em modernização e modernismo. O primeiro é utilizado

quando se trata de temas econômicos, políticos e sociais; já o termo modernismo está vinculado

à arte, cultura e sensibilidade.

Para Beck (1986, p. 12), “houve uma ruptura no interior da modernidade que a afastou

da sociedade industrial clássica” semelhante à ruptura causada pela sociedade industrial à

sociedade agrária do século XIX. Para esse autor:

Assim como no século XIX a modernização dissolveu a esclerosada sociedade agrária

estamental e, ao depurá-la, extraiu a imagem estrutural da sociedade industrial, hoje a

modernização dissolve os contornos da sociedade industrial e, na continuidade da

modernidade, surge outra configuração social.

Essa configuração assume uma nova forma denominada “sociedade industrial de risco”.

Ou seja, a sociedade industrial confrontou a sociedade agrária (modernização da tradição ou

modernização simples), e a sociedade de risco confrontou a sociedade industrial (modernização

da sociedade industrial ou modernização reflexiva).

Apesar de muito criticado na era contemporânea por não ter cumprido suas promessas, o

paradigma moderno foi um marco na história da humanidade, pois além de se opor aos dogmas

e às regras rígidas da igreja, cujo poderio era evidente na Idade Média, provocou profundas

perturbações econômicas, sociais e políticas. Esse paradigma introduziu, de forma sistemática,

os estudos científicos – a evolução das idéias é marcada por uma transformação da

representação do mundo, uma mudança da natureza do conhecimento científico e modificação

da relação com o tempo e com a ação (HOTTOIS, 2002). O programa de Comenius — ensinar

tudo a todos de todas as formas — em conjunto com o pensamento de Rousseau, constituem os

alicerces da educação contemporânea. A Revolução Industrial na Inglaterra transformou a

estrutura social, sendo referência na produção, distribuição e consumo de bens. A Revolução

Francesa abriu as portas para o estabelecimento da democracia, fraternidade, igualdade, justiça

social e dos direitos humanos (LAMPERT et al., 2005).

Page 28: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

27

2.2 Pós-modernidade e a busca do desenvolvimento sustentável

Enquanto o período que vai da Revolução Industrial até meados do século XX é

denominado a era da modernização industrial, caracterizada pelos avanços científicos e

tecnológicos na agricultura, medicina, comunicações, transporte, energia, química, eletrônicos,

dentre outros, o período de modernização pós-industrial representa a maior parte da segunda

metade do século XX. Tinha como características políticas, econômicas e sociais: a produção

econômica derivando principalmente dos setores de serviços e alta tecnologia; aumento da

globalização na produção, finanças, mão-de-obra e nos mercados; crescimento econômico

confrontado com os limites ecológicos; movimentos em direção à democratização de mercados

e políticas (SHRIVASTAVA, 1995). Foi nessa época que o progresso científico assumiu, pela

primeira vez, formas ameaçadoras, produzindo ferramentas mais sofisticadas e poderosas de

destruição. Percebeu-se também uma mudança paradigmática na ciência, cujo objetivo, até

então, era romper com o mundo das trevas. A ciência passou ser encarada sob o prisma de valor

de uso (LAMPERT et al., 2005).

Esse período, o pós-industrialismo, já tem um vínculo com a pós-modernidade, que

surgiu como ruptura e/ou continuidade do período moderno e cuja conceituação não é fácil.

Não se sabe se representa um novo período na civilização, uma mudança paradigmática, um

movimento cultural ou uma reavaliação crítica do pensamento moderno, questionando as

dicotomias rígidas entre realidade objetivo/subjetiva, fato/imaginação, secular/sagrado,

público/privado, científico/vulgar (LAMPERT et al., 2005).

Em sua definição de pós-modernidade, Eagleton (1998, p. 7) esclarece quais seriam as

principais críticas ao projeto moderno:

Pós-modernidade é uma linha de pensamento que questiona as noções clássicas de

verdade, razão, identidade e objetividade: a idéia de progresso ou emancipação

universal, os sistemas únicos, as grandes narrativas ou os fundamentos definitivos de

explicação. Contrariando essas normas do Iluminismo, vê o mundo como

contingente, gratuito, diverso, instável, imprevisível, um conjunto de culturas ou

interpretações desunificadas gerando um certo grau de ceticismo em relação à

objetividade da verdade, da história e das normas, em relação às idiossincrasias e à

coerência de identidades [...].

Coincidentemente, nessa era considerada por autores como Lyotard (1979), Eagleton

(1998), Hottois (2002), como pós-moderna, em resposta à proliferação de crises e riscos

ambientais e tecnológicos emanados das atividades industriais corporativas, surge um novo

Page 29: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

28

paradigma denominado desenvolvimento sustentável cuja principal preocupação é “atender às

necessidades do presente sem comprometer a capacidade das gerações futuras de atenderem as

suas próprias necessidades” (COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E

DESENVOLVIMENTO, 1987, p. 46). Trata-se de um paradigma sistêmico, que apesar das

muitas críticas e da difícil operacionalização, abrange diversas dimensões – políticas,

econômicas, sociais, ambientais, étnicas, culturais – e é endereçado a todos – sociedade,

governos, organizações e meio ambiente.

A origem do paradigma desenvolvimento sustentável remonta ao surgimento do

conceito de ecodesenvolvimento, oriundo da preocupação com a preservação do meio ambiente

conjugada com a melhoria das condições socioeconômicas da população. A construção desse

novo conceito faz parte da crítica à visão economicista e ao desenvolvimentismo, responsáveis

pelo reducionismo econômico e pela geração dos problemas sociais e ambientais

(MONTIBELLER, 2004), explicitados acima.

Em 1987, a divulgação do Relatório "Nosso Futuro Comum”, pela Comissão Mundial

sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento das Nações Unidas, popularizou o termo

desenvolvimento sustentável, tornando sua definição a mais aceita até hoje e a que mais

aproxima do consenso oficial. Nesse Relatório (1987, p. 54), desenvolvimento sustentável é

definido como “aquele que atende às necessidades do presente sem comprometer a capacidade

das gerações futuras de atenderem as suas próprias necessidades”.

Esse relatório parte de uma visão crítica ao modelo de desenvolvimento adotado pelos

países industrializados e reproduzido pelas nações em desenvolvimento, ressaltando que um

progresso econômico e social cada vez maior não poderá se basear na exploração

indiscriminada e devastadora da natureza (MONTIBELLER, 2004). Ou seja, uma das

premissas fundamentais da noção de desenvolvimento sustentável é o reconhecimento da

insustentabilidade ou da inadequação econômica, social e ambiental do padrão de

desenvolvimento das sociedades contemporâneas (BECKER et al., 2002).

O documento aborda as preocupações comuns (ameaças, o papel da economia

internacional); os desafios comuns (população e recursos humanos, segurança alimentar,

espécies e ecossistemas, energia, indústria e o urbanismo); e os esforços comuns (administração

das áreas comuns, paz, segurança, desenvolvimento e o meio ambiente e propostas de mudança

institucional).

Os principais objetivos das políticas ambientais e desenvolvimentistas derivadas desse

conceito de desenvolvimento sustentável são: retomar o crescimento como condição necessária

Page 30: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

29

para erradicar a pobreza; alterar a qualidade do crescimento para torná-lo mais justo, eqüitativo

e menos intensivo em matérias-primas e energia; atender às necessidades humanas essenciais

de emprego, de alimentação, de energia, de água e saneamento; manter um nível populacional

sustentável; conservar e melhorar a base de recursos; reorientar a tecnologia e administrar o

risco; e incluir o meio ambiente e a economia no processo decisório.

Uma leitura mais aprofundada do Relatório Nosso Futuro Comum conduz ao

entendimento de que o desenvolvimento sustentável é um modelo de crescimento

socioeconômico, com justiça social e em harmonia com o ecossistema. Ou seja, é o

desenvolvimento econômico, social, científico, cultural e educacional das sociedades

garantindo mais saúde, conforto e conhecimento, sem exaurir os recursos naturais do planeta.

Isso porque se observa nesse relatório não somente a preocupação com o atendimento às

necessidades básicas de todos, com a extensão para todos das oportunidades para satisfazer suas

aspirações para uma vida melhor, como também a preocupação com o atendimento às

necessidades humanas essenciais de emprego.

Por isso, um processo de busca de soluções para as complexas questões ambientais,

econômicas e sociais depende da ação coordenada entre sociedade civil, governo e

organizações, bem como do compartilhamento e da integração de diversos pontos de vista e

fontes de informações entre tais grupos de interesse. Os diferentes atores envolvidos nessa teia

da sustentabilidade, mostrados na Figura 1, precisam se unir para aprender e tomar decisões

sobre as mais diversas questões complexas de incerteza acerca desse novo paradigma.

Essas características – complexidade, incerteza e perspectivas sociais múltiplas – do

paradigma desenvolvimento sustentável podem ser denominadas de “águas permanentemente

agitadas” (whitewater) de contextos incertos, dinâmicos e pouco familiares. Isto é, com eventos

surpreendentes, novos, confusos, dispendiosos e inevitáveis, conforme Vaill (1997). E essas

águas agitadas colocam os indivíduos na posição de realizar coisas nas quais eles têm pouca ou

nenhuma experiência. “Isto quer dizer que, além de todas as novas qualificações e atitudes

exigidas pelas águas turbulentas, as pessoas precisam ser (ou se tornar) aprendizes

extremamente eficazes.” (IBIDEM, p. 33).

Page 31: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

30

Figura 1: Teia do paradigma desenvolvimento sustentável

Fonte: Elaboração da pesquisadora

Esse reaprender significa mostrar que o desenvolvimento moderno progressivo e

instrumental discutido acima, está gradualmente eclipsando uma sociedade tradicional, com

ganhos claramente vantajosos, mas também com grandes custos. Esse é o grande argumento do

pós-modernismo (ALVESSON; DEETZ, 1997).

2.3 A abordagem pós-moderna para a aprendizagem social para sustentabilidade nas

organizações

“O ataque à tradição modernista é central para os estudos

pós-modernos”. (ALVESSON; DEETZ, 1997, p. 228)

Nesse estudo, a abordagem adotada é a pós-moderna relacionada com as dimensões

propostas por Alvesson e Deetz (1997), que tentam mostrar o que é e o que não é negociável na

prática de pesquisa, como são organizados os relatórios de pesquisa e o resultado político

antecipado da atividade de pesquisa (a direção a qual aponta, se tem ou não efeito prático).

Mais detalhes no Quadro 2.

Page 32: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

31

Quadro 2: Características das dimensões das posições de pesquisa em estudos organizacionais

Fonte: ALVESSON; DEETZ (1997, p. 233)

A dimensão consenso-dissenso ou conformidade/divergência olha a relação entre as

práticas de pesquisas e os discursos sociais hegemônicos ou de um discurso dominante

coerente. No dissenso, dimensão também de um estudo pós-moderno, processos políticos de

determinação, que frequentemente demonstram dominação, poderiam e deveriam ser

contestáveis. Nesse tipo de estudo, “o homem (o sujeito humanista como entidade coerente com

direitos naturais e autonomia potencial) é declarado morto e em seu lugar aparece o sujeito

fragmentado, descentrado, com um gênero e uma classe social” (IBIDEM, p. 233).

Consenso Dissenso

Confiança

Ordem hegemônica como estado natural

Naturalização do presente

Integração e harmonia são possíveis

Pesquisa enfoca a representação

Espelho (refletindo) a metáfora dominante

Validade como preocupação central

Teoria como abstração

Ciência unificada e triangulação

Ciência é neutra

Vida é descoberta

Pesquisador anônimo, sem tempo e espaço

Agente livre/autônomo

Suspeita

Conflitos sobre ordem como estado natural

Ordem presente interessada na história e na política

Ordem indica dominação e conflitos suprimidos

Pesquisa enfoca desfio e reconsideração

(re-presentação)

Lente (vendo/lendo) a metáfora dominante

Intuição e práxis como preocupação central

Teoria como abertura

Complementaridade posicional

Ciência é política

Vida é luta e criação

O pesquisador tem nome e posiciona-se

Agente socialmente situado

Elite / a priori Local/emergente

Comunidade privilegiada

Jogo fixo de linguagem

Universalista

Fundamentado na filosofia sistemática

Teoria dirigida

Determinismo metodológico

Fundamental

Grandes narrativas de progresso e emancipação

Racionalidade e verdade como preocupações

centrais

Conhecimento teórico generalizável

Tende a ser masculino em atitude

Vê o familiar

Procede de si própria

Itens epistemológicos e procedimentos acima de

suposições substantivas

Comunidades comparativas

Múltiplos jogos de linguagem

Particularista

Filosofia sistemática é vista como etnocêntrica

Não teórico

Determinismo situacional ou estrutural

Não fundamental

Narrativas locais

Sensualidade e significado como preocupações

centrais

Conhecimento prático

Tende a ser feminino em atitude

Vê o estranho

Procede do outro

Ontologia de distinção acima do método

Page 33: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

32

Postula a regulação dos conflitos por meio da discussão e da negociação (HOTTOIS,

2002). Há um resgate de conflitos suprimidos e de grupos marginalizados (ALVESSON;

DEETZ, 1997). Nesse sentido, o foco da pesquisa foi entender como funcionam as múltiplas

relações em distintos contextos e como os interesses divergentes são conciliados. Além disso, o

pesquisador tem nome e posiciona-se.

A dimensão local/emergente-elite/a priori enfoca a origem dos conceitos e dos

problemas a serem formulados como parte constitutiva nesta tese. Nos estudos pós-modernos,

as narrativas são locais. Ou seja, as grandes narrativas de teoria e história são substituídas por

narrativas locais disjuntas e fragmentadas, potencialmente articuladas e costuradas. Lembrando

que a grande função dessas metanarrativas “é a legitimação das práticas morais, sociais e

principalmente políticas” (HOTTOIS, 2002, p. 584). Neste estudo foram investigadas as

práticas de cada ator social envolvido, como por exemplo, dos proprietários rurais , em

Bebedouro – SP.

Em resumo, o foco de uma abordagem pós-moderna para estudos organizacionais são os

estudos dialógicos. Nesses, o objetivo básico é recuperar o conflito e a esperança é reclamar

espaço para vozes esquecidas. Dirigem-se a problemas de marginalização e supressão de

conflitos. O estilo narrativo é irônico e ambivalente, o clima é brincalhão e os benefícios

organizacionais são a diversidade e a criatividade (ALVESSON; DEETZ, 1997).

Neste estudo, a pesquisa adotou o paradigma do construtivismo social que “faz das

concepções socialmente construídas da realidade a única e própria realidade, afastando-se

assim dos limites da Sociologia do Conhecimento tradicional, indo na direção do relativismo

pós-moderno” (CASTANÕN, 2005). Rejeita a demarcação entre ciência e não-ciência,

rejeitando o objetivismo.

No paradigma do construtivismo social, o lócus de aprendizagem está nas relações

sociais e não somente na mente das pessoas. Ou seja, o conhecimento e a realidade são

construídos socialmente. O conhecimento enquanto participação é gerado em função da

interação entre os diferentes atores sociais envolvidos em algum projeto orientado às ações

coletivas (BOUWEN; TAILLIEU, 2004). A criação, o desenvolvimento e o compartilhamento

de conhecimento são considerados nessa perspectiva como processos essencialmente

relacionais. “O conhecimento enquanto participação é gerado em função da interação entre os

diferentes atores sociais envolvidos no projeto” (GERGEN, 1983; 1994; SHOTTER, 1993

apud BOUWEN; TAILLIEU, 2004, p.147).

.

Page 34: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

33

3 EM BUSCA DE UM PROCESSO DE APRENDIZAGEM SOCIAL PARA A

SUSTENTABILIDADE NA GESTÃO DOS NEGÓCIOS

Como mudar um modelo mental moldado há séculos, conforme discutido no capítulo

anterior? Como fazer com que os stakeholders envolvidos na teia do desenvolvimento

sustentável, em particular as organizações, reaprendam uma nova maneira de compartilhar seus

interesses?

Para responder a essas questões, a teoria de aprendizagem social está ganhando

proeminência como uma abordagem de pesquisa crítica para estudar a gestão de ecossistemas,

governança, mudanças climáticas e educação ambiental. Tem emergido como uma abordagem

híbrida para a resolução de problemas ambientais complexos na forma de metaestrutura

(meta-framework) do processo de engajamento, aprendizagem e suporte institucional para

resolver tais problemas (KILVINGTON, 2007; 2010). Ou seja, uma estrutura analítica e

facilitadora para apoiar a tomada de decisão e ações coletivas em um cenário de gestão de

recursos complexos.

Trata-se de um conceito em construção para colocar em pauta os meios pelos quais os

diferentes atores sociais envolvidos na teia do desenvolvimento sustentável, mostrada na Figura

1, podem se unir para aprender e tomar decisões sobre as mais diversas questões complexas e

incertas acerca dessa temática (Keen, Brown e Dyball (2005); PAHL-WOSTL, 2007;

KILVINGTON, 2007; 2010, dentre outros).

A concepção dessa teoria, originalmente, não foi para lidar com a gestão de

ecossistemas, governança, mudanças climáticas e educação ambiental. Foi concebida para

discutir e entender a aprendizagem individual em contextos sociais. Mas, desde a primeira

proposta, o conceito de aprendizagem social vem assumindo uma grande diversidade de

perspectivas, segundo Parson e Clark (1995, p. 429):

Os pesquisadores que descrevem o fenômeno examinado como ‘aprendizagem social’

não necessariamente indicam uma perspectiva teórica, uma herança disciplinar ou

mesmo uma linguagem comum. Pelo contrário, as contribuições empregam a

linguagem, os conceitos e métodos de pesquisa de uma meia dúzia das principais

disciplinas; eles dão foco aos indivíduos, grupos, organizações formais, comunidades

profissionais, ou sociedades inteiras; eles usam definições diferentes para

aprendizagem, para o que significa uma aprendizagem ser ‘social’ e para teorias. A

diferença mais profunda é que para alguns, aprendizagem social significa

aprendizagem pelos indivíduos que acontece em configurações sociais e/ou é

socialmente condicionada; para outros significa aprendizagem por meio da agregação

social.

Page 35: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

34

Algumas aplicações do conceito de aprendizagem social são citadas por Glasser (2007),

por exemplo, na transmissão de cultura (BOYD; RICHERSON, 1985); em problemas de

comportamento humano e psicológico (GARDNER; STERN, 1996; ROSENTHAL;

ZIMMERMAN, 1978; BANDURA, 1977); em pesquisa política e de planejamento

(ROBINSON, 2003; FRIEDMANN; ABONYI, 1976; HECLO, 1974); na teoria de gestão e

mudança organizacional (WEGNER, 1999; MCKENZIE-MOHR; SMITH, 1999; ARGYRIS;

SCHÖN, 1996); no provisionamento de serviços humanos (GOLDSTEIN, 1981); na política

ambiental (FIORINO, 2001; WEBLER et al., 1995); na teoria de identidade de grupos

estratégicos (PETERAF; SHANLEY, 1997); e, atualmente, na gestão ambiental e de recursos

(LEE, 1995; LEEUWIS; PYBURN, 2002; KEEN et al., 2005). Nessa última aplicação, nós

acrescentamos os autores Tabara (2002), Waddell (2002), Pahl-Wostl (2002; 2007) e

Kilvington (2007; 2010).

Nessa ampla diversidade de aplicações, o que interessa é o traslado do conceito original

da teoria de aprendizagem social para o campo da sustentabilidade nas organizações. Para

tanto, além da proposta original dessa teoria, foi investigado mais três eixos de relações entre

esses constructos, conforme mostrado na Figura 2.

Figura 2: Relações do conceito de aprendizagem social com outros constructos

Fonte: Elaboração da pesquisadora

Por isso, a seguir, discute-se cada um desses eixos e mostrar a relação de cada um deles

com a proposta original de Bandura (1977). O quarto eixo, em particular, vai fundamentar a

discussão da problemática apresentada nessa tese acerca do processo de aprendizagem social

para a sustentabilidade nas organizações em contextos de múltiplos atores sociais, relações e

interesses.

Eixo I

Proposta original de aprendizagem social

Eixo II

A relação entre aprendizagem social e

aprendizagem organizacional

Eixo III

A relação entre aprendizagem social e

sustentabilidade

Eixo IV

A relação entre aprendizagem social,

sustentabilidade e organizações

Page 36: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

35

3.1 A proposta original da teoria de aprendizagem social – eixo I

A teoria de aprendizagem social foi inicialmente desenvolvida nos anos 70 por Albert

Bandura, um sociobehaviorista, para descrever como os indivíduos aprendem e alteram os seus

comportamentos em um contexto social. Combina elementos das teorias comportamentalistas e

cognitivistas, sugerindo que a aprendizagem observacional e as interações recíprocas entre os

fatores ambientais, comportamentais e cognitivos impactam a tomada de decisão individual.

Postula que os atores sociais modelam seus comportamentos a partir das referências de outrem,

para que possam aprender de forma vicarial sobre ambientes incertos. Aprender de forma

vicarial significa que, ao assistir outros indivíduos realizando uma tarefa, as expectativas sobre

as suas próprias capacidades aumentam. Nesse processo, um indivíduo aprende um

comportamento por meio da observação do comportamento de outros indivíduos (BANDURA,

1977).

Uma modelagem comportamental bem-sucedida, segundo esse autor, é composta por

quatro ações, a saber:

i) Atenção – um comportamento “modelo” deve capturar a observação de um

aprendiz em potencial;

ii) Retenção – o aprendiz deve se lembrar do comportamento observado;

iii) Reprodução – o aprendiz deve ser capaz de replicar o comportamento observado;

iv) Motivação – o ambiente deve oferecer uma consequência (reforço ou punição) que

aumente a probabilidade para que o aprendiz demonstre o que aprendeu.

Bandura (1977) defende que as consequências ditam em boa escala o comportamento

dos indivíduos. As ações que geram consequências positivas tendem a manter-se, enquanto as

que geram negativas tendem a desaparecer. Na teoria de aprendizagem social, as consequências

têm o objetivo de fortalecer o comportamento; são fontes de informação e de motivação,

orientando as pessoas acerca da conveniência da sua ação a ser imitada. Ou seja, as

consequências experimentadas (recompensas ou castigos) pelos modelos transmitem

informação aos observadores sobre a efetividade das ações.

Page 37: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

36

Mais tarde, esse estudo foi considerado como uma teoria sociocognitiva de

aprendizagem individual. Cognição social consiste em uma abordagem para a compreensão do

comportamento social humano que envolve a investigação do processo mental dos indivíduos

em interação com outros (GODOI, FREITAS, 2008). Tenta entender como os aspectos do

conhecimento social afetam as atitudes e comportamentos dos indivíduos nas diversas

situações sociais e como propiciam mudanças em seus conhecimentos (TENBRUNSEL et al.,

2004).

Em resumo, para Bandura (1977), o comportamento humano é explicado por meio das

influências das estruturas comportamentais, cognitivas e ambientais. Ou seja, o lócus da

aprendizagem são as interações sociais entre indivíduos e ambiente.

Importante ressaltar que, além da teoria sociocognitiva de Bandura (1977), outras

teorias de aprendizagem transpassam pelo contexto social, como as contribuições de Kurt

Lewin e de John Dewey, conforme revisão da literatura conduzida por Godoi e Freitas (2008).

A importância do contexto social, isto é, a inter-relação de circunstâncias que

acompanham o comportamento dos indivíduos em diversos ambientes sociais, foi constatada

por Kurt Lewin, psicologista, ainda na década de 40, por meio das pesquisas sobre a dinâmica

dos grupos. Seus estudos mostraram que a conduta dos indivíduos em grupo é determinada pelo

contexto e percepção do indivíduo sobre o mesmo, resultante de uma dinâmica gerada

independentemente das vontades individuais. Como a interdependência entre o indivíduo e o

meio social é fundamental, a percepção da realidade é, em grande parte, determinada pelo que é

socialmente aceito como realidade pelo grupo (GODOI, FREITAS, 2008).

Este grupo tem grande influência sobre o indivíduo, orientando seu curso de vida,

aspirações, objetivos, percepções, ações, sentimentos, caráter e ações, a tal ponto que a

transformação dos indivíduos inseridos em um contexto social só é possível pela mudança do

grupo (contexto). Segundo essas autoras, a maioria dos indivíduos tende a manter seus padrões

de comportamento bem próximo dos padrões do grupo, tanto pela necessidade de pertencer,

quanto pelas pressões internas que impedem seus membros de divergir significativamente dos

padrões estabelecidos. Por isso, Lewin cunha a noção de campo social como sendo um “espaço

onde as pessoas, os objetos, as instituições, os grupos e os acontecimentos sociais são

elementos das situações sociais, que mantêm entre si relações dinâmicas” (IBIDEM, p. 44).

Para John Dewey, um dos principais representantes do pragmatismo, que se originou no

final do século XIX e se desenvolveu ao longo do século XX, principalmente nos Estados

Page 38: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

37

Unidos, a aprendizagem é um processo cujo lócus também está na interação social (GODOI,

FREITAS, 2008).

Para Dewey (apud ELKJAER, 2001, p.112), a aprendizagem deve ser entendida “como

contínua reorganização e reconstrução da experiência”, que ocorre “todo o tempo e em todas as

situações em que as pessoas agem e interagem – refletem e pensam”. Trata-se de uma

experiência reflexiva originada em uma situação-problema que leva o indivíduo a parar e

pensar, conforme mostrado na Figura 3. A resultante desse processo contínuo de aprendizagem

é o crescimento, ou melhor, um processo de crescimento, como parte do desenvolvimento da

vida.

Figura 3: Processo de aprendizagem de Dewey

Fonte: ELKJAER (2001); elaboração da pesquisadora

Ou seja, o indivíduo aprende por meio da reorganização e reconstrução da sua

experiência. Essa experiência está baseada em mudanças que impliquem reflexão sobre ações

anteriores para se antecipar às consequências futuras. O indivíduo aprende “somente quando é

capaz de refletir sobre suas ações e reorganizar e reconstruir sua experiência por meio de um

processo contínuo de reflexão – pensamento – como um meio de atuação”. Neste sentido,

“refletir e pensar constituem-se em esforços intencionais que buscam descobrir conexões

específicas entre nossas ações e as consequências resultantes, de modo que os dois elementos

tornam-se contínuos”. Ou seja, a aprendizagem inicia-se por meio do pensamento (já que o

Nova

situação

Situação

Problema Indagação

Reflexão

Page 39: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

38

indivíduo age com um propósito, com um objetivo em vista) e resulta em pensamento

adicional, capacitando o indivíduo a buscar novos objetivos. Portanto, “a ação é uma condição

necessária para o pensamento, embora não seja uma condição suficiente” (ELKJAER, 2001, p.

113).

Em resumo, a abordagem de Dewey tem quatro componentes (KILVINGHTON, 2007):

i) os aprendizes são diversos e únicos, atuam independentemente e transformam

as estruturas, experiências e construções individuais em conhecimento;

ii) a aprendizagem é ativa, causando priorização e reorganização (por isso, a

informação recebida não é equivalente ao conhecimento gerado);

iii) a aprendizagem é altamente influenciada pelo contexto e pela experiência;

iv) a aprendizagem é inerentemente um processo social, isto é, construir

significado, feedback e exploração mútua são críticos para o ato de

interpretação de informação e contextualização, enriquecendo ainda mais o

processo de aprendizagem.

Dado que parte da discussão central desta tese é a aprendizagem social no contexto

organizacional, é possível fazer o traslado das três contribuições sociocognitivas da

aprendizagem discutidas acima – Lewin, Dewey e Bandura – para a esfera organizacional,

conforme os autores que consideram a perspectiva sociocognitiva na aprendizagem

organizacional, como Antonacopoulou e Chiva (2007), Elkjaer (2001; 2003), Gherardi e

Nicolini (2003) e Defillippi e Ornstein (2003), partem das seguintes constatações, segundo

Godoi e Freitas (2008). Para esses autores:

i. a aprendizagem dos indivíduos ocorre por meio da interação social dentro de um

contexto sociocultural;

ii. o reconhecimento do contexto organizacional no processo de aprendizagem nas

organizações;

Page 40: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

39

iii. o conhecimento é gerado a partir das relações interpessoais e das interpretações

desenvolvidas durante as práticas diárias organizacionais.

3.2 A aprendizagem social nas organizações – eixo II

Ao discutir aprendizagem social nas organizações, alguns autores partem dos estudos de

Lewin e de sua influência sobre Dewey, como Elkjaer (2001; 2003) e outros partem dos estudos

de Bandura, como Peteraf e Shanley (1997).

Elkjaer (2003) entende que a aprendizagem individual – ponto de partida de muitos

estudos em aprendizagem organizacional – não é suficiente para explicar o processo de

aprendizagem organizacional. Isso porque o lócus de aprendizagem está nos processos mentais

de aquisição de conhecimento, ou seja, na forma como os indivíduos começam a conhecer, a

familiarizarem-se com algo novo, dando ênfase somente ao caráter epistemológico.

Assim, essa autora prefere partir da teoria social para mostrar que a aprendizagem é

decorrente da experiência da vida cotidiana e, por isso, a aprendizagem organizacional pode se

basear na teoria de aprendizagem social. Essa conexão é possível porque, na corrente da teoria

de aprendizagem social considerada por essa autora, tanto o caráter ontológico quanto o

epistemológico da aprendizagem são considerados como processos inseparáveis. A ontologia

considera o desenvolvimento do indivíduo que aprende por meio da sua participação nos

processos sociais. Já a epistemologia considera o conhecimento adquirido pelo indivíduo sobre

si mesmo e sobre o que significa ser parte do mundo e da história. Em particular nas

organizações, o contexto é chave “na aprendizagem, socialização e desenvolvimento dos

membros organizacionais” (IBIDEM, p. 39).

Nesse contexto, a teoria da aprendizagem social tem recebido várias denominações

como aprendizagem situada (BROWN; DUGUID, 1991; RICHTER, 1998 apud ELKJAER,

2003); SMITH (1999 apud KILVINGTON, 2010); aprendizagem baseada na prática

(GHERARDI, 2000 apud ELKJAER, 2003), dentre outras.

Em particular, a proposta de aprendizagem organizacional de Elkjaer (2003), cujos

pressupostos estão fundamentados principalmente nos estudos de Dewey, está ancorada em

uma estrutura de três elementos:

Page 41: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

40

i) conteúdo da aprendizagem organizacional;

ii) método da aprendizagem organizacional e,

iii) relação entre o indivíduo e a organização.

O elemento conteúdo diz respeito ao esforço do indivíduo em se tornar um profissional

habilidoso (practitioner) em alguma atividade, área ou temática, porque a aprendizagem é uma

forma de estar e se tornar parte dos mundos sociais de uma organização. O conteúdo também

está relacionado ao processo de formação ou desenvolvimento de identidade, porque o foco é a

prática e a experiência vivida. O conhecimento torna-se um processo de saber ativo ou familiar

com o caminho para participar ou interagir nas organizações. Nessa teoria, saber, conhecer

significa ser capaz de participar com a competência necessária na complexa teia de relações

entre pessoas e atividades.

Já o método para aprender está, necessariamente, atrelado à participação e à interação

dos indivíduos nos processos sociais que ocorrem no interior da organização. Assim, o

“aprender” está presente em todos os lugares e em todas as práticas diárias na organização.

Contudo, relembrando Dewey (ELKJAER, 2001), a simples participação em práticas

diárias organizacionais não cria aprendizagem, porque o indivíduo aprende por meio da

reorganização e reconstrução da sua experiência. Essa experiência, por sua vez, está baseada

em mudanças que impliquem reflexão sobre ações anteriores para se antecipar às

consequências futuras.

Para reorganizar e reconstruir sua experiência, o indivíduo precisa de uma linguagem

que permitirá a comunicação da mensagem por meio de sinais, palavras e conceitos para si

mesmo e para os outros. Elkjaer (2003, p. 44) entende que a linguagem é um “elemento central

em qualquer processo de aprendizagem desde que tem sido concebida como o principal meio de

agir nas organizações contemporâneas”. Não se trata de um mero elemento de transmissão de

conhecimento e, sim, um meio de cultura que, como tal, “constitui um elemento crucial no

processo de aprendizagem, quando este processo é resultante da interação entre indivíduos em

uma cultura organizacional e ocupacional específica” (IBIDEM).

Pode-se então afirmar que o terceiro elemento da sua proposta, a relação entre o

indivíduo e a organização, deriva da participação e da interação dos indivíduos nos processos

organizacionais. Os indivíduos são parte da prática organizacional e essa relação é tecida em

conjunto e leva em consideração o contexto. Há dois entendimentos de contexto: i) indivíduo e

Page 42: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

41

contexto são produzidos historicamente; ii) o contexto é construído à medida que os indivíduos

interagem nos processos sociais da organização.

Em suma, para essa autora, a aprendizagem é ubíqua e leva em conta diversos elementos:

o contexto, a interação, as atividades, a prática, a informalidade, a improvisação, a conversação,

as ações coletivas e a construção dos significados. As rotinas organizacionais permitem a

identificação do “o que”, “quando” e “como” as atividades serão feitas e, nesse sentido, o

conteúdo da aprendizagem é específico ao contexto organizacional existente. Para a autora, a

aprendizagem nas organizações não deve ser tratada apenas como um assunto particular,

individual, “uma vez que ocorre dentro do campo das ações e interações humanas coletivas”

(ELKJAER, 2001, p. 101). O aprender constitui-se em uma parte inevitável da prática cotidiana

presente no trabalho e na vida organizacional. Envolve participação e acontece entre e por meio

das interações entre as pessoas, ou seja, constitui-se em uma atividade relacional. A

aprendizagem vista enquanto participação em processos sociais enfatiza as ações de conhecer,

ser e tornar-se, o que a torna inseparável do próprio desenvolvimento (ELKJAER, 2003).

Outros autores também consideram a perspectiva sociocognitiva na aprendizagem

organizacional. Mas, isso se dá a partir dos estudos de Bandura (1977) para explicar o traslado

da teoria de aprendizagem social para a esfera da sustentabilidade, parte da discussão central

desta tese. Essa conexão também é possível, porque, embora a teoria de aprendizagem social

desse autor tenha sido desenvolvida para explicar o comportamento individual, também pode

ser aplicada a coletivos (GLASSER, 2007).

3.3 Aprendizagem social para a sustentabilidade – eixo III

Segundo Capra (2007, p. 13), “criar comunidades e sociedades que sejam

ecologicamente sustentáveis é o grande desafio do nosso tempo”. E questiona: “Qual é o lócus

da aprendizagem nas comunidades sustentáveis? Como tal aprendizagem pode ser organizada e

facilitada? Quais são os seus princípios subjacentes?” E junto com outros estudiosos, como

Pahl-Wostl (2002; 2007), Bouwen e Taillieu (2004), Keen, Brown e Dyball (2005) e Kilvington

(2007; 2010), acredita que essa aprendizagem é socialmente construída. Trata-se de “enfatizar a

importância das relações, da aprendizagem colaborativa e os papéis da diversidade e da

flexibilidade na resposta aos desafios e às turbulências” (IBIDEM, p. 15)

Page 43: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

42

Na maioria das abordagens de aprendizagem social para um mundo mais sustentável, o

lócus de aprendizagem são os ambientes nos quais estão presentes elementos como: interesses,

normas, valores e construções de realidades divergentes; múltiplos atores, múltiplos contextos,

diferentes níveis de autodeterminação, de responsabilidade, poder e autonomia; conflitos sobre

como organizar, consumir e produzir de maneira responsável; e, múltiplos níveis de

aprendizagem – individual, grupal, organizacional e no nível de redes de atores e stakeholders

(WALS; VAN DER LEIJ, 2007).

Em particular no nível de redes de atores e stakeholders, o fio condutor dessas

abordagens são as interações recíprocas entre os fatores ambientais, comportamentais e

cognitivos desses atores e stakeholders que podem impactar a tomada de decisão coletiva. E é

exatamente esse fio condutor um dos denominadores comuns com a proposta original de

aprendizagem social, além da estrutura de modelagem comportamental, conforme proposto por

Bandura (1977).

De acordo com Glasser (2007), pode haver dois tipos de aprendizagem: aprendizagem

social passiva e aprendizagem social ativa.

A aprendizagem social passiva depende da aprendizagem de outrem. Pode envolver

interações e observações de práticas como também nenhuma forma de comunicação ou

interação. Nesse caso, inclui a aprendizagem derivada de leitura de jornais, assistir filmes, ouvir

programas de rádios, participar de sessões de leitura, pesquisas na internet ou mesmo seguir

alguma receita culinária.

Glasser (2007) acredita que, no mundo contemporâneo, tanto na aprendizagem

individual quanto na coletiva, predomina a aprendizagem social passiva porque há confiança na

sabedoria dos outros, contribuindo para a propagação de comportamentos que favorecem, por

vezes, interesses mesquinhos em detrimento de um bem comum. Alguns exemplos desses

comportamentos são instituições, crenças ou práticas tradicionais que prejudicam a saúde ou

bem-estar das pessoas. Que são ineficientes em atender as demandas ambientais e ameaçam a

viabilidade da sociedade (EDGERTON, 1992 apud GLASSER, 2007). Outros exemplos

podem ser corrupção, consumo excessivo, desperdícios desregrados, uso exorbitante de energia

pelos países ricos e crescimento da população em países em desvantagem econômica.

Contudo, esse autor reconhece que comportamentos sustentáveis ecoculturalmente têm

pouco apelo não atraindo a nossa atenção. Como são pouco familiares, há pouca chance de

serem retidos. Também são comportamentos mais complexos, isto é, são diferentes das práticas

diárias, dificultando a replicação do comportamento observado. Por último, são

Page 44: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

43

comportamentos percebidos como “inconvenientes, custosos, demorados, pouco divertidos,

inseguros” (IBIDEM, p. 50), com menor probabilidade de se ter alguma motivação para

demonstrar o que foi aprendido. Duas razões contribuem para essa falta de motivação: i)

publicidade muito forte das organizações com modelos de pessoas desfrutando de

comportamentos insustentáveis; ii) os efeitos negativos de tais comportamentos não são

facilmente visíveis para as pessoas.

A aprendizagem social ativa, por outro lado, “é construída sobre uma comunicação e

interação conscientes entre pelo menos dois seres vivos” (IBIDEM, p. 51). Possui três

categorias em função das habilidades e valores dos indivíduos nas relações coletivas e de poder:

i) Hierárquica, baseada em relações pré-determinadas e inflexíveis entre professores

e aprendizes ou entre chefes e subordinados;

ii) Não-hierárquica: baseada em uma aprendizagem de mão dupla, na qual cada

indivíduo como especialista em uma determinada área compartilha conhecimento e

experiência;

iii) Co-aprendizagem: baseada nas relações não-hierárquicas, pressupondo

colaboração, confiança, participação efetiva e investigação compartilhada.

Glasser (2007) argumenta que as duas primeiras categorias são amplamente aplicadas

para facilitar a compreensão do conhecimento já existente, enquanto que a co-aprendizagem

suporta a geração de novo conhecimento e novas estratégias para tratar os problemas do mundo

real. Isso porque a co-aprendizagem requer formação de equipes (team building), engajamento

total, aprendizagem na prática (learning-by-doing) e responsabilidade pelos resultados

(accountability).

Esse autor entende que a aprendizagem ativa pode ocorrer em contextos de conversas,

cursos que utilizam método socrático2, danças com parceiros e até mesmo por meio de uma

vídeoconferência pela internet. Por conta desse engajamento direto com outros atores, a

aprendizagem ativa é capaz de promover processos de aprendizagem mais competentes, abertos

e equitativos.

E esse engajamento propicia o recebimento de feedback direto de outros atores de

nossos comportamentos insustentáveis, permitindo que a aprendizagem social desafie os

2O Método Socrático é uma abordagem utilizada por Sócrates, o grande filósofo grego, para geração e validação de ideias e

conceitos baseada em perguntas, respostas e mais perguntas. Também conhecido como maiêutica, método que consiste em

gerar idéias complexas a partir de perguntas simples e articuladas dentro de um contexto.

Page 45: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

44

pressupostos, valores e princípios subjacentes e tomados como certos – por exemplo, a noção

ortodoxa de progresso do paradigma antropocêntrico – que guiam comportamentos individuais,

práticas e políticas insustentáveis.

Glasser (2007) defende que, como a aprendizagem social ativa envolve múltiplos

atores, por vezes, com interesses e valores conflitivos, as formas mais bem-sucedidas dessa

aprendizagem resultam das relações não-coercivas que dependem da construção de uma

linguagem comum, transparência, tolerância, confiança mútua, colaboração, interesses

compartilhados e preocupação pelo bem comum. Explica que “tais formas de aprendizagem

social ativa podem empregar conflito em uma forma positiva ao desafiar a complacência e

encorajar o pensamento ‘fora da caixa’ (out ofthebox)”. (IBIDEM, p. 53).

Em segundo lugar, o sucesso da aprendizagem social ativa depende do desenvolvimento

de capacidade (capacity building). Trata-se do processo de desenvolver as habilidades dos

indivíduos, instituições e sociedades para desempenhar funções, solucionar problemas,

estabelecer e alcançar objetivos de forma sustentável (UNDP, 2011). Ou seja, o sucesso

depende tanto da prontidão, competências, sinceridade e maturidade dos indivíduos engajados,

quanto das regras que orientam a aprendizagem organizacional, a participação pública ou os

processos de tomada de decisão.

Assim, com o intuito fortalecer a conexão entre aprendizagem social ativa e

sustentabilidade – conforme as reflexões dos participantes do workshop “Social Learning and

Sustainability: Exploring Critical Issues in Relation to Environmental Change and

Governance” (PROJECT REPORT, 2011) –, alguns pesquisadores compartilham o interesse

em abordar aprendizagem social como um meio para se alcançar um fim (KILVINGTON,

2010). O fim é um futuro sustentável (Keen, Brown e Dyball (2005); é “endereçar problemas

complexos resistentes a soluções que requerem a presença de disciplinas e perspectivas

múltiplas e uma mudança fundamental nos obstáculos institucionais e sociais” (DALE, 1989

apud KILVINGTON, 2010, p. 40).

Nesse contexto, para Keen, Brown e Dyball (2005), a aprendizagem social na gestão

ambiental refere-se essencialmente à gestão de mudanças. Trata-se de “processos que nos

permitem compartilhar nossos entendimentos e negociar melhor a mudança social de tal forma

que os diversos pontos de vistas sejam levados em consideração”. Ou seja, “quanto mais

construímos nossa matriz de conhecimento por meio do compartilhamento de entendimentos,

mais insights nós podemos ganhar” (p. 262). Aprendizagem social para esses autores é:

Page 46: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

45

A ação e reflexão coletivas que ocorrem entre diferentes grupos e indivíduos à medida

que trabalham para aprimorar a gestão das inter-relações humanas e ambientais.

Aprendizagem social para o aprimoramento dessas inter-relações deve incluir todos

nós, porque somos parte do mesmo sistema e cada um de nós inevitavelmente

experimentaremos as consequências destes processos de mudança. (IBIDEM, p. 4)

Esses autores defendem que esse novo paradigma – desenvolvimento sustentável –

requer a integração de nossos pensamentos transversalmente a várias disciplinas, setores e

grupos de conhecimento. Baseiam-se principalmente em três agendas para apoiar a ação

coletiva necessária à gestão ambiental:

i) nas inter-relações e nas parcerias equitativas de aprendizagem (learning

partnerships) entre as competências combinadas do governo, profissionais e

comunidades;

ii) nas plataformas de aprendizagem (learning platforms) para possibilitar a

interdependência entre grupos e indivíduos preocupados com as questões comuns

voltadas à sustentabilidade, principalmente na resolução de conflitos, na

aprendizagem colaborativa e na tomada de decisões coletiva;

iii) na aprendizagem de valores e ética (learning values and ethics), já que a mudança

social demanda por uma transformação em nossa maneira de pensar e nos valores e

na ética que sustentam esses processos de aprendizagem.

Assim, para criar parcerias de aprendizagem social, construir plataformas para apoiar a

sustentabilidade ao longo de múltiplas escalas e disciplinas e fomentar a ética social de proteção

ambiental, sugerem uma abordagem transdisciplinar que abrange desde as abordagens

participativas, integrativas e colaborativas até as abordagens para a gestão ambiental que são

importantes para a aprendizagem social.

Essa leitura transdisciplinar é composta por cinco elementos que se entrelaçam e

formam a base da aprendizagem social: reflexão; orientação sistêmica, integração; negociação

e participação.

O primeiro elemento diz respeito à reflexão e reflexividade. Os autores entendem que a

aprendizagem social é um processo de reflexão iterativo, isto é, repetido, reiterado, feito mais

de uma vez e frequente, que ocorre sempre que compartilhamos nossas experiências, ideias e

ambientes com outras pessoas. Esses autores baseiam-se principalmente nos estudos de Kolb et

Page 47: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

46

al. (2005) e Brown et al. (2003) para mostrar que o processo de reflexão pode ser representado

por uma série de ciclos de aprendizagem como parte das atividades diárias. Tais ciclos formam

uma estrutura para uma contínua reflexão sobre nossas ações e idéias e sobre as relações entre

nosso conhecimento, comportamento e valores. Por isso, a reflexividade – refletir sobre a

aprendizagem conduz a uma nova aprendizagem. Trata-se de uma alavanca importante para a

mudança social porque pode revelar como os contextos políticos, institucionais, culturais e

teóricos podem afetar nossos valores, ações e processos reflexivos de aprendizagem. Os autores

alegam que precisamos de um catalisador para nos ajudar a ver algo que esteja invisível.

Tais processos manifestam-se em quatro níveis:

i) o pessoal, por meio do estabelecimento de metas e do acompanhamento crítico

desses processos e seus resultados (inputs);

ii) o interpessoal, por meio das instruções dadas e das lições aprendidas dentro

dos grupos;

iii) o comunitário, por meio da criação de uma visão comum, da identificação de

prioridades e de indicadores de desempenho; e

iv) o social, por meio da avaliação e auditoria de impactos das leis e dos

mercados.

O segundo elemento abrange a orientação e o pensamento sistêmicos. A exemplo da

proposta de concepção sistêmica da vida de Capra (1982), Keen, Brown e Dyball (2005)

também entendem que a teoria geral de sistemas apresenta meios para refletir sobre as conexões

entre os seres humanos e seus ecossistemas e um discernimento dos processos de mudança que

emergem dessas interações.

O pensamento sistêmico diz respeito ao estado das variáveis que compreendem o

sistema e como os processos prestam conta da mudança nos valores dessas variáveis ao longo

do tempo. Favorece as soluções que são auto-sustentáveis, principalmente porque somos

compelidos a olhar padrões e não eventos, a olhar para processos e não para o fim.

Uma aprendizagem sistêmica considera as inter-relações e interdependências entre os

sistemas ecológicos e sociais e é essencial para se alcançar o progresso em direção à

sustentabilidade.

Page 48: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

47

Integração é o terceiro elemento. A busca por um futuro sustentável requer estruturas

holísticas e integradas para investigar o mundo e não dividir os estudos em elementos seletivos.

Trata-se de uma busca por uma tecelagem rica de diversas ideias para revelar a natureza da

complexidade de estruturas que representam os padrões de conexões entre os diversos atores

sociais, seus papéis e suas relações. Na gestão ambiental tem que haver a conexão entre os

diversos processos capazes de integrar novas idéias oriundas de fontes e disciplinas distintas.

Keen, Brown e Dyball (2005) entendem que o modelo de sustentabilidade no qual os

três sistemas – econômico ambiental e social – estão sobrepostos passa a impressão de que só é

possível lidar com a sustentabilidade nos pontos de intersecção, conforme mostrado na Figura

4. Por isso, propõem um novo diagrama no qual esses sistemas estão embutidos um no outro,

isto é, construídos ou incluídos como partes integrantes e, por vezes, inseparáveis, mostrando

claramente a interdependência entre essas dimensões.

Sistemas sobrepostos Sistemas embutidos

Figura 4: Representações simplificadas do desenvolvimento sustentável

Fonte: KEEN; BROWN; DYBALL (2005, p. 13)

O quarto elemento envolve a negociação e a colaboração. Apesar dos benefícios dos

elementos reflexão e reflexividade, orientação e pensamento sistêmicos e integração, a

negociação é necessária para as interfaces envolvendo conflitos das partes envolvidas. É errado

partir do pressuposto que todos se articularão facilmente. Contudo, a aprendizagem pode se

originar a partir desses conflitos. Portanto, o conflito é:

Sistema social

Ecossistema

Sistema econômico Sistema social

Ecossistema

Sistema econômico

Page 49: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

48

i. parte da mudança e não um sinal de fracasso das pessoas ou do sistema;

ii. um passo em direção à solução e não um sinal para desistência;

iii. compartilhado e não responsabilidade de uma única pessoa ou grupo;

iv. parte do processo e não um produto (output), barreira ou desculpa;

v. tema para negociação.

Por último, o quinto elemento que diz respeito à participação e engajamento. Os autores

classificam seis tipos de participação dos atores sociais na gestão ambiental com base nas

relações de poder:

i. coerção – imposição de um grupo sobre outros grupos;

ii. informativa – informações seguem um fluxo de mão única;

iii. consultiva – diversos grupos buscam informações, mas somente um decide o

melhor curso a ser tomado;

iv. atrativa – os grupos associam-se dadas as prioridades, mas um grupo mantém o

poder atraindo outros grupos por meio de incentivos;

v. co-criativa – os participantes compartilham o conhecimento para criar novos

entendimentos e definir papéis e responsabilidades dentro das restrições sociais

e institucionais;

vi. co-ativa – todos os participantes estabelecem a própria agenda e negociam

meios para agirem de forma colaborativa; o poder tende a mudar entre os

participantes em função das ações negociadas.

A partir da perspectiva da aprendizagem social, o processo de participação e

engajamento pode ser referenciado como uma aprendizagem de laço múltiplo, que engloba a

aprendizagem de laço simples, duplo e triplo:

a. Laço simples: desenvolvimento de habilidades, práticas e ações;

b. Laço duplo: facilitação do exame das premissas subjacentes e dos modelos que

orientam ações e comportamentos;

Page 50: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

49

c. Laço triplo: reflexão e mudança dos valores e das normas que são os

fundamentos para operacionalizar premissas e ações.

d. Laço múltiplo: proposição de um entendimento mais profundo dos contextos,

das dinâmicas de poder e dos valores que impactam a gestão ambiental.

Esses autores acreditam que a aprendizagem social diz respeito à “sustentação dos

processos de mudança social por meio da transformação de organizações, instituições e

identidades individuais e grupais para aumentar a gestão ambiental sustentável”. Acrescentam:

“A aprendizagem social promove uma cultura que respeita e valoriza a diversidade, a

transparência e a prestação de contas (accountability) em direção a futuro sustentável”. (KEEN;

BROWN; DYBALL, 2007, p. 192). Importante ressaltar que, para esses autores, a gestão

ambiental sustentável abrange também as causas socioeconômicas, políticas e culturais, além

das questões ambientais do desenvolvimento sustentável. Por isso, propõem a teia da

aprendizagem social, conforme mostrado na Figura 5.

Figura 5: Teia da aprendizagem social na gestão ambiental

Fonte: (KEEN; BROWN; DYBALL, 2005, p. 264)

A aprendizagem social também é um meio para um futuro sustentável nos estudos de

Kilvington (2010, p. 54), sugerindo que “na arena da gestão ambiental e desenvolvimento

Page 51: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

50

social, a aprendizagem social tem emergido como uma abordagem para a resolução de

problemas similares e com elementos comuns à gestão adaptativa e colaborativa”. Ou seja, o

conceito de aprendizagem social surge como uma conexão entre os conceitos de gestão

adaptativa e aprendizagem colaborativa e que ambos requerem uma abordagem holística.

Na gestão adaptativa, há o reconhecimento de que qualquer problema e seu entorno

como as fronteiras e influências (problem system) estão sempre incompletos e que é necessária

uma abordagem baseada na tomada de decisão e aprendizagens experimentais e incrementais

para endereçá-los. Já a aprendizagem colaborativa enfatiza a participação dos múltiplos

stakeholders e os processos utilizados para endereçar, de forma coletiva, o problema e seu

entorno, com base na interpretação dos diversos conhecimentos desses stakeholders, para

selecionar as ações futuras (IBIDEM).

Os princípios, pensamento sistêmico e experimentação são as pedras angulares da

gestão adaptativa (LEE; 1993; GUNDERSON 1999 apud KILVINGTON, 2010) e a

racionalidade comunicativa e suas implicações construtivistas são a base da teoria de

aprendizagem e gestão colaborativas. Contudo, Kilvington (2010, p. 42) pondera:

Sugerir que aprendizagem social foi desenvolvida como um tipo de metateoria das

abordagens modernas de gestão ambiental seria incorreto. A relativa novidade do

campo, e o fato que muitos autores estão contribuindo sob uma perspectiva

pragmática e não teórica, significa que os conceitos como aprendizagem colaborativa

e aprendizagem social são usados de forma sinônima ou mesmo como subconjuntos

um do outro.

Assim, a sua tese intitulada “Building Capacity for Social Learning in Environmental

Management” foi desenvolvida “por um caminho no qual ciência e cientistas abordam seus

papeis enquanto decifradores e ‘buscadores da verdade’ em um mundo pós-moderno”. Mais

especificamente, o seu interesse são os conceitos emergentes que compartilham qualidades da

“ciência da sustentabilidade e da ciência pós-normal” (IBIDEM, 54).

A autora explica que essa ciência está baseada nos princípios de Lowe (2001) de

integração, das formas cíclicas de investigação, aprendizagem social, do papel crucial dos

stakeholders como parte interdependente do sistema. Funtowicz e Ravetz (1993), ao

argumentarem sobre a necessidade de uma nova ciência, por eles denominada como Ciência

Pós-Normal, as metas do novo conhecimento científico já não mais residiriam na busca de

verdades instrumentais e na conquista da natureza, mas, sim, na necessidade de uma relação

harmoniosa entre a humanidade e a natureza.

Page 52: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

51

Assim, Kilvington (2010) propõe uma estrutura (vide Figura 6 para mais detalhes)

ancorada em quatro elementos inter-relacionados para desenvolver a prática de resolução de

problemas complexos, a saber:

i. Como gerir a interação e participação dos grupos?

ii. Como trabalhar e aprimorar as condições institucionais e sociais para a

resolução de problemas complexos?

iii. Como aprimorar a aprendizagem dos indivíduos, grupos e organizações?

iv. Como desenvolver o pensamento sistêmico e a integração de informações

diferentes?

Figura 6: Estrutura de elementos críticos da aprendizagem social para resolução de problemas

ambientais complexos

Fonte: KILVINGTON (2010, p. 68)

Page 53: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

52

Sua proposta, com base nos mesmos elementos da abordagem de Keen, Brown e Dyball

(2005), reserva uma posição única e central para o papel da reflexão. A diferença é que, nos

elementos de aprendizagem, considera até a aprendizagem de laço duplo, conforme proposto

por Argyris e Schön (1978), ao passo que esses autores consideram também a aprendizagem de

laço triplo e múltiplo, conforme discutido acima. Outra diferença diz respeito aos elementos

institucionais e sociais, nos quais fica clara a importância dos contextos de gestão da tomada de

decisão e político que, na proposta de Keen, Brown e Dyball (2005), está subjacente.

Assim, Kilvington (2010, p. 300) conclui que:

É importante entender aprendizagem social não como um modelo para ‘como as

coisas deveriam ser feitas’, mas sim como um conjunto de premissas ou condições. A

gestão dessas condições impacta a habilidade dos grupos de stakeholders de encontrar

seus próprios caminhos ao longo dos problemas complexos, nos quais é possível

compartilhar conhecimento e agir. As idéias que formam a aprendizagem social são

fundamentalmente sobre melhorar as bases para aprendizagem e adaptação. Não há

passos definidos a ser seguidos, nem prescrição de pontos de partida. Pelo contrário,

essas idéias podem ser aplicadas para aprimorar a situação atual ‘onde você está

agora’.

Na busca por um mecanismo que poderia ser usado para orientar a prática da

investigação sobre a essência da aprendizagem social e inseri-lo nos programas de gestão

ambiental, Kilvington (2010) investigou o campo de avaliação de desenvolvimento

participativo (participatory developmental evaluation – P & D evaluation), cujas

características são:

i. formalização das práticas de reflexão e monitoramento;

ii. influência nos arranjos institucionais e convenções sociais necessários aos

programas de intervenção para tratar as questões ambientais que circunscrevem

situações de resoluções de problemas;

iii. a proposição da meta desafiadora do desenvolvimento de capacidade para

entender como apoiar aprendizagem e como engajar as pessoas e torná-las

aptas, habilitadas.

Como resultado da interseção entre os elementos de aprendizagem social mostrados na

Figura 6 acima e o mecanismo da área de avaliação de desenvolvimento participativo

Page 54: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

53

(participatory developmental evaluation – P & D evaluation), Kilvignton (2010) propõe quatro

arenas de atuação:

i. definição do escopo da gestão ambiental da situação problema, reconhecendo

que a análise SWOT (Strength; Weakness; Opportunities; Threats) é muito útil

para isolar desafios específicos da aprendizagem social em determinadas

situações;

i. sustentação da capacidade dos múltiplos atores sociais para investigar e resolver

problemas;

ii. sustentação da gestão de programas e intervenções na situação problema;

iii. pesquisa e desenvolvimento que facilitam o crescimento do conhecimento

prático e teórico sobre as tratativas de situações de gestão ambiental complexas.

A aprendizagem social também está sendo utilizada como um meio, um processo e

como um fim (output) para alcançar os resultados sustentáveis esperados no projeto de

cooperação HarmoniCOP – Harmonizing Collaborative Planning, que envolve diversos atores

sociais para gerir as bacias hidrográficas em diversas regiões da Europa.

O início (input) é o contexto (o sistema de governança e o sistema físico ou ambiente

natural). As atividades são executadas por meio de práticas relacionais (envolvimento social e

gestão do conteúdo) e o fim são os resultados (outcomes), são as qualidades técnicas e

relacionais, conforme mostrado na Figura 7.

Nesse projeto, a abordagem com base na aprendizagem social traz à tona, além do

conhecimento incremental, a melhoria no entendimento dos problemas inter-relacionados da

gestão complexa do fornecimento de água. Proporciona aos atores envolvidos o entendimento

das percepções dos problemas de cada parte envolvida, o que pode, eventualmente, colaborar

para a melhoria dessas relações e proporcionar a base para a colaboração e uma rede de

relacionamentos sustentáveis (HARMONISING COLLABORATIVE PLANNING,

HARMONICOP, 2005). Também diz respeito à capacidade crescente das entidades sociais em

desempenharem tarefas comuns na gestão das bacias hidrográficas (River Basin Management –

RBM). Pode ser tanto um processo como um produto. Ou seja, é importante conhecer tanto o

contexto quanto os resultados gerados pela aprendizagem social que podem impactar esse

contexto. A sintonia entre os atores que fazem parte do sistema físico e ecológico é a essência

desse processo (HARMONICOP WP2 REFERENCE DOCUMENT, 2003).

Page 55: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

54

Figura 7: Ciclo de aprendizagem social no Projeto HARMONICOP

Fonte: HARMONICOP WP2 REFERENCE DOCUMENT( 2003, p. 8)

A aprendizagem social é justificada de forma ideológica, isto é, baseada nos objetivos

de uma sociedade democrática que permite a participação de todos os cidadãos nas discussões

sociais, políticas e econômicas. A aprendizagem social esclarece como a participação pública

pode contribuir para a qualidade democrática dessas sociedades, que é requerida especialmente

quando a sustentabilidade dos recursos naturais está em risco. Entende-se por participação

pública todos os indivíduos, organizações e associações que não desempenham funções

governamentais oficiais. Na forma operacional, aprendizagem social mostra a complexidade e

a incerteza das realidades das bacias hidrográficas, que exigem novas formas de governança,

onde os sistemas hierárquicos tradicionais são substituídos pela participação entre múltiplos

atores sociais.

Assim, aprendizagem social é conceituada pelo Projeto HarmoniCop como “aprender

juntos para administrar juntos”, já que nem todos os atores sociais envolvidos possuem os

recursos necessários para fazer de forma satisfatória por sua própria conta. Aprendizagem

social significa que todos os stakeholders aprendem para gerir as questões nas quais eles têm

interesse (HARMONISING COLLABORATIVE PLANNING, HARMONICOP, 2005). Está

baseada no diálogo e contém os seguintes elementos:

Page 56: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

55

i) reconhecimento da interdependências entre os stakeholders;

ii) interação entre os stakeholders;

iii) um mínimo de sinceridade e confiança;

iv) autorreflexão crítica por todos os participantes a respeito das suas metas e

interesses; de seus pressupostos acerca do sistema a ser gerido; e de como suas

ações pode afetar os demais participantes;

v) desenvolvimento de uma percepção compartilhada dos problemas;

vi) desenvolvimento e avaliação crítica de soluções;

vii) tomada de decisão conjunta baseada na reciprocidade e no comprometimento;

viii) arranjos para promover a implementação das ações.

Esse conjunto de elementos pode ser categorizado como cognições, atitudes,

habilidades e ações conjuntas:

i. Cognições – são mais do que competências técnicas. Incluem também o

conhecimento do processo social e englobam os aspectos cognitivos segundo

Webleret al. (1995 apud (HARMONICOP WP2 REFERENCE DOCUMENT,

2003, p. 8-9):

aprender sobre o estado de um problema;

aprender sobre possíveis soluções e consequências;

aprender sobre os próprios interesses e também dos outros atores

sociais;

aprender ferramentas, métodos e estratégias para comunicar e

alcançar acordo;

pensamento integrativo e holístico;

ii. Atitudes – vontade de aceitar as diferenças e colaborar. Pode incluir também

aspectos de desenvolvimento de um senso de responsabilidade para si mesmo e

Page 57: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

56

para os outros e o desenvolvimento de um senso de solidariedade de grupo

(IBIDEM);

iii. Habilidades – tanto as técnicas para gerir as bacias hidrográficas quanto as

relacionais para lidar com diferentes visões, interesses, conhecimentos,

perspectiva de forma construtiva. Nesse caso, as habilidades podem ser uma

condição necessária para a aprendizagem social e também um resultado

desejável, tornando-se uma dinâmica de autorreforço nesse processo;

iv. Ações conjuntas – incluem as ações em linha com a abordagem experimental

proposta por Kolb (1984 apud HARMONICOP WP2 REFERENCE

DOCUMENT, 2003).

Em comum, as propostas discutidas acima têm elementos de participação de múltiplos

atores sociais, colaboração, pensamento sistêmico, integração. Nessas, a aprendizagem social

tem sido considerada tanto como meio como fim para se alcançar comportamentos

sustentáveis. Segundo Kilvington (2010, p.65):

Enquanto em alguns exemplos a aprendizagem social é considerada como ‘estado

final’ (p.ex. a aprendizagem aperfeiçoada pelos coletivos), tem sido mais comum na

gestão ambiental e na literatura de desenvolvimento sustentável a aprendizagem

social ser considerada como ‘um meio para se atingir os fins’, por exemplo, uma

estrutura de idéias que, de forma coletiva, contribui para a capacidade das agências,

stakeholders e comunidades de discutir os problemas ambientais.

As discussões empreendidas acima mostram como é possível fazer o traslado entre

aprendizagem social e sustentabilidade. Aliás, de forma geral, todas as propostas têm elementos

em comum, variando conforme o foco dado pelos pesquisadores. Há conexão com a proposta

original de Bandura (1977) no que diz respeito às interações recíprocas entre os fatores

ambientais, comportamentais e cognitivos que impactam o comportamento coletivo, e não

somente o individual, como na concepção original. E há também modelagem comportamental,

gerando dois tipos de aprendizagem: aprendizagem social passiva e aprendizagem social ativa,

conforme apontado por Glasser (2007).

Contudo, nota-se nessas propostas um foco na resolução de problemas. No Projeto

HarmoniCOP diz respeito à melhoria no entendimento dos problemas inter-relacionados da

Page 58: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

57

gestão complexa do fornecimento de água. Para Kilvington (2010), o foco é claramente o

desenvolvimento da prática de resolução de problemas complexos.

Negócios sustentáveis, por outro lado, significam gerar produtos e serviços que sejam

viáveis do ponto de vista econômico e consoantes com as demandas do paradigma

desenvolvimento sustentável.

Por isso, o nosso interesse é abordar a aprendizagem social nas organizações que

convivem cotidianamente com a dialética de conciliar as metas dos seus negócios com os

desafios do paradigma desenvolvimento sustentável no tocante às dimensões políticas,

econômicas, sociais, ambientais, étnicas e culturais. Significa conciliar as metas, por exemplo,

com as peculiaridades dos recursos naturais como a biodiversidade, água, energia e também

com as necessidades e expectativas dos diversos atores sociais envolvido e também com o

impacto social positivo nas comunidades em que as organizações atuam.

3.4 Aprendizagem social para a sustentabilidade nas organizações: explorando o

conceito no campo organizacional – eixo IV

Uma proposta que vai em direção ao que foi discutido acima é a estrutura para

colaboração de múltiplos atores de Bouwen e Taillieu (2004), que entendem a aprendizagem

social estando estreitamente conectada com a aprendizagem organizacional em projetos de

colaboração relacionados às questões de recursos naturais que envolvem múltiplos atores.

Segundo esses autores:

Na nossa definição de aprendizagem social, nós queremos incluir também a

aprendizagem organizacional social que ocorre no nível cultural e sistêmico durante

as práticas e experiências conjuntas quando os stakeholders se encontram em

conversas e ações comuns nos diferentes níveis de atividades. Pode ser considerado

aprendizagem como participar e aprender e como se envolver com os outros

stakeholders para obter resultados desejáveis em termos de projeto conjunto ou

desenvolvimento de atitudes comuns. Os esforços de participação objetiva

principalmente o compartilhamento de poder; aprendizagem social em processos de

múltiplos atores sociais ancora formas de interações e padrões comportamentais que

podem suportar as ‘pequenas vitórias’ sustentáveis. (IBIDEM, p. 141)

Page 59: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

58

Essa proposta tem por objetivo teorizar e intervir em projetos de colaboração

envolvendo recursos naturais e múltiplos atores. Trata-se de uma estrutura composta por sete

elementos, mostrada na Figura 8 e baseada no paradigma do construtivismo social cujo lócus de

aprendizagem está nas relações sociais e não somente na mente das pessoas. Ou seja, o

conhecimento e a realidade são construídos socialmente.

Figura 8: Ciclo de aprendizagem social por meio da colaboração entre múltiplos atores sociais em

projetos de recursos naturais

Fonte: BOUWEN; TAILLIEU (2004, p. 149)

Essa proposta assemelha-se bastante à do Projeto HarmoniCOP. Aliás, TharsiTaillieu

faz parte do time desse projeto. A diferença é que o conceito de aprendizagem social no Projeto

HarmoniCOP é baseado em correntes interpretativistas nas ciências sociais, mais afinado com

ciência moderna e tem um foco intensivo da participação pública, isto, de todos os indivíduos,

organizações e associações que não desempenham funções governamentais oficiais. Já a

proposta de Bouwen e Taillieu (2004) é baseada no paradigma do construtivismo social, que faz

das concepções socialmente construídas da realidade a única e própria realidade, entrando no

terreno do pós-modernismo (CASTANÕN, 2005).

Page 60: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

59

O primeiro elemento considera o contexto, que é interorganizacional e conta com a

colaboração de múltiplos atores, envolvendo um processo de tomada de decisão conjunta entre

os stakeholdersprincipais sobre um determinado problema. Essa colaboração, em um

continuum, vai desde um estado suborganizado, no qual os stakeholders agem de forma

individual e independente, até o estado de relações completamente organizadas, em que há uma

tomada de decisão conjunta.

O segundo elemento é a participação que é vista como filosofia de gestão e uma forma

significativa de envolver os interessados nas decisões (CHISHOLM; VANSINA, 1993 apud

BOUWEN; TAILLIEU, 2004). Para tanto, é necessário que:

i. as pessoas experimentem a participação em questões exequíveis e concretas;

ii. os limites da autoridade das pessoas envolvidas e o escopo da tomada de

decisão sejam claramente definidos e mutuamente aceitos;

iii. a participação prospere somente em clima de confiança e sinceridade.

O resultado desse envolvimento é principalmente o compartilhamento de

responsabilidade que abrange:

i) troca de informações – que proporciona a base cognitiva para intensificar o

intercâmbio entre o conhecimento especializado e o conhecimento

experimental;

ii) construção compartilhada da realidade – que emerge das experiências

compartilhadas e possibilita a coordenação informal e formal de padrões de

comportamento;

iii) autorização (empowerment) – que proporciona a oportunidade para que os

membros organizacionais possam usar competências para cumprir as metas e

ganhar autoconfiança e se engajar na copropriedade dos projetos.

O terceiro elemento são os processos de aprendizagem social em diferentes níveis de

atividades se ancora em dois conceitos:

Page 61: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

60

i. de aprendizagem organizacional de laços simples e duplo de Argyris e Schön

(1978), a exemplo do quinto elemento – participação e engajamento – da

abordagem transdisciplinar de Keen, Brown e Dyball (2005) e do elemento de

aprendizagem de Kilvinghton (2010);

ii. de momentos de aprendizagem em que ocorrem pequenas vitórias de Weick

(1995).

Por isso, segundo Wildemeerschet al. (1998 apud BOUWEN; TAILLIEU, 2004), o

conceito de aprendizagem se aplica às configurações sociais inter-organizacionais em um

contexto de colaboração com múltiplos atores. Especialmente, porque, além da aprendizagem

social estar sendo utilizada como meio (processo), conforme discutido nos capítulos anteriores,

também é vista como fim (output). Trata-se de aprendizagem para cidadania, envolvimento

ativo e participação pública em torno de questões ecológicas e societais.

Em projetos que envolvem recursos naturais, o conhecimento experimental, local e

contextual dos agricultores rurais, por exemplo, se conecta com o conhecimento científico dos

pesquisadores agrônomos, que muitas vezes está descontextualizado. Por isso, os autores

alegam que é importante criar diálogos ou práticas comuns nos quais é possível facilitar um

entendimento compartilhado entre as partes envolvidas. Para tanto, Bouwen e Taillieu (2004,

p.143) sugerem as comunidades de práticas baseadas na proposta de Wenger (1998), para fazer

a ponte entre os grupos de trabalho e os diferentes níveis de atividade e estender o conceito de

aprendizagem social. Para esses autores: “Comunidades de prática engajam atividades

conjuntas formando um entendimento comum do problema e uma experiência comum de

algumas identidades de grupo”.

O quarto elemento são as práticas relacionais, que, segundo Bouwen (2001apud

BOUWEN; TAILLIEU, 2004, p. 144), “é qualquer projeto interativo ou troca entre pelo menos

dois atores sociais” e que “tem consequências para o relacionamento e alguns resultados

(outcome) perceptíveis”. Alguns exemplos são: visita de campo conjunta, treinamentos,

eventos de lançamento de projetos, momentos de celebrações espontâneos, entrevistas abertas

ou mesmo uma boa conversa. De uma maneira geral, as práticas relacionais são

“essencialmente ações orientadas a tarefas com qualidades relacionais de reciprocidade e

algum tipo de reflexividade” (IBIDEM). Podem ocorrer em diferentes contextos e fases dos

projetos e em diferentes níveis de atividades (local, intermediário e nacional). Boas práticas

relacionais significam propriedade compartilhada da tarefa ou do projeto; comunicação

Page 62: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

61

pessoal, concreta e sincera; atividade mutuamente energizadora e recompensável; condições

para a aprendizagem profunda similar à aprendizagem de laço duplo de Argyris e Schön (1978).

O quinto elemento abrange o reconhecimento das identidades sociais, isso porque,

embora os atores envolvidos analisem os mesmos elementos, cada um tem um ponto de vista e

acredita que essa visão é a que deve prevalecer sobre as demais. O importante é que as

diferenças nas competências, interesses e relações de poder têm que ser acomodadas em um

projeto dessa natureza. Todas as identidades sociais – pesquisadores, agricultores rurais,

servidores públicos, por exemplo – precisam encontrar uma forma de serem reconhecidas em

suas especificidades e terem suas contribuições reconhecidas no cumprimento das metas dos

projetos. Para tanto, segundo Hosking e Morley (1991apud BOUWEN; TAILLIEU, 2004, p.

145), “o paradigma construtivismo social sugere uma formulação dinâmica e interativa da

organização em formação”. Nesse modelo, “os problemas não são dados como fatos para serem

descobertos e manuseados. Pelo contrário, são construídos por meio das interações entre os

múltiplos atores” (GERGEN, 1983 apud BOUWEN; TAILLIEU, 2004, p. 145).

O sexto elemento e ponto central dessa estrutura é a interdependência entre os

stakeholders, que permite compartilhar o problema e também lidar com os diferentes tipos de

conhecimento, competências e interesses, gerando a co-construção do processo de

aprendizagem social em uma comunidade de prática emergente. Esses autores entendem que

para se alcançar um resultado viável e sustentável, os stakeholders precisam passar por um

processo de descoberta e de aprendizagem das interdependências e desenvolver projetos

criativos comuns. Pois, além do engajamento nesses projetos, é preciso reconhecer as

diferenças sociais e ecológicas de forma adequada. Essas diferenças são equivalentes ao

segundo elemento – pensamento sistêmico – da abordagem transdisciplinar de Keen, Brown e

Dyball (2005), no qual a aprendizagem sistêmica considera as inter-relações e

interdependências entre os sistemas ecológicos e sociais que são essenciais para se alcançar o

progresso em direção à sustentabilidade.

O sétimo elemento é o conhecimento gerado em projetos de múltiplos atores sociais,

referindo-se à transição deste saber enquanto substância para aquele enquanto participação. O

conhecimento enquanto substância o considera como conteúdo, algo que possa ser transferido

de uma mente para outra. O conhecimento enquanto participação é gerado em função da

interação entre os diferentes atores sociais envolvidos no projeto. É exatamente esse o

movimento dos autores do construtivismo social como Gergen (1983; 994; Shotter, 1993 apud

BOUWEN; TAILLIEU, 2004):

Page 63: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

62

A criação, o desenvolvimento e o compartilhamento de conhecimento são

considerados nessa perspectiva como processos essencialmente relacionais. As

pessoas criam conhecimento por meio do engajamento em ações conjuntas como

forma de participação em uma comunidade de prática (Wenger, 1998). Isto leva

também a um conceito bem diferente de aprendizagem. Compartilhar conhecimento

em projetos de recursos naturais é sempre situado em um contexto de profissionais

habilidosos (practitioners), que usam seus conhecimentos em suas atividades e

interações. Seguindo essa visão de conhecimento, um profissional, um cientista ou um

gestor está aprendendo por meio da participação de criação e recriação contínua de

uma comunidade de prática específica. (BOUWEN; TAILLIEU, 2004, p.147)

Diante do exposto, para investigar como o processo de aprendizagem social para

sustentabilidade nas organizações favorece as ações de negociação entre múltiplos atores,

visando o equilíbrio de interesses e assimetrias de poder, é importante o uso de uma estratégia

metodológica que permita o contato direto com os múltiplos públicos de interesse de uma

organização.

Page 64: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

63

4 METODOLOGIA DA PESQUISA

4.1 A natureza da pesquisa

Relembrando, o objetivo nesta tese é discutir as experiências que envolvem o processo de

aprendizagem social para sustentabilidade em uma organização, com a intenção de analisar como

múltiplos atores se engajam no discurso e na ação, tendo em vista a necessidade de realizar negócios

sustentáveis.

Para tanto, em parceria com a Fundação Espaço Eco e a Basf, foi escolhido o Programa

Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental implementado na cidade de Bebedouro, no

estado de São Paulo, como objeto de estudo. A Basf é uma das maiores empresas do setor químico no

mundo, que emprega mais de 113 mil colaboradores, cujas vendas totalizaram cerca de € 78,7

bilhões, em 2012. Na América do Sul, as vendas alcançaram, no ano passado, aproximadamente €

6,46 bilhões de euros ou 8% do total do grupo, com um quadro de 7.073 colaboradores. Seu portfólio

de produtos abrange desde plásticos, poliuretanos, químicos industriais, produtos de performance e

tintas, para agricultura e química fina, até óleo cru e gás natural (BASF IMPRENSA, 2013). Esse

Programa faz parte da Matriz de Sustentabilidade na categoria de negócios sustentáveis e foi

selecionado, porque a sua implementação, principalmente na cidade de Bebedouro, é mais

abrangente, além de contemplar múltiplos elementos necessários para cumprir os objetivos e a

problemática desta tese.

Esse Programa destina-se a atender não somente os clientes, mas também a comunidade de

entorno da Unidade de Cultivos da Basf Agro, uma das empresas líderes em soluções para

agricultura como defensivos agrícolas e uma forte parceira no fornecimento de fungicidas,

inseticidas e herbicidas inovadores. Seus principais clientes são os produtores rurais, embora seus

produtos também sejam utilizados em saúde pública, no controle de pragas estruturais e urbanas,

plantas ornamentais e gramados, no controle de vegetação e na silvicultura. Em 2012, suas vendas

totalizaram € 4,7 bilhões de euros (IBIDEM).

Além dos produtores rurais e da Unidade de Proteção de Cultivos, fazem parte da rede de

relacionamentos desse Programa outros atores sociais, como as cooperativas, uma fundação,

Page 65: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

64

técnicos agrícolas, uma universidade, governos (municipal e federal), organizações

não-governamentais, agentes financiadores, professores, alunos, entre outros. Todos envolvidos em

uma teia de múltiplos interesses e contextos.

Para compreender as experiências nesse Programa, foi conduzida uma pesquisa de natureza

qualitativa, porque o foco foi compreender esses fenômenos a partir das perspectivas dos atores

sociais envolvidos nessa rede de relacionamentos (GODOY, 1995a). Trata-se de uma pesquisa

exploratória cuja função, entre outras, é aumentar o conhecimento acerca do fenômeno que deseja

investigar e esclarecer conceitos (SELLTIZ; WRIGHTSMAN; COOK, 1974) sobre a aprendizagem

social para sustentabilidade nas organizações. É também uma pesquisa descritiva, porque se trata de

um relato detalhado com uma rica descrição do fenômeno social, envolvendo sua configuração,

estrutura, atividades, mudanças no tempo e relacionamento com outros fenômenos que ilustrem a

complexidade da situação. Estudos descritivos apresentam informações sobre fenômenos poucos

estudados e geram uma base de dados para futuros estudos comparativos e de formulação de teoria

(GODOY, 1995b).

A abordagem paradigmática adotada nesta pesquisa se alinha à concepção pós-moderna

voltada para a compreensão das narrativas locais, disjuntas e fragmentadas. O interesse foi conhecer

as histórias desses atores sociais e analisar como a realidade está sendo construída e percebida por

eles, quando interagem em seus mundos sociais. Como se trata de uma ampla rede de

relacionamentos com múltiplos elementos, tais como interesses, contextos e relações de poder etc.,

foram seguidos os pressupostos do construtivismo social, cuja reinvindicação principal é a de que a

realidade é construída socialmente e o lócus de aprendizagem está nas relações sociais e não somente

na mente das pessoas. Ou seja, depende das interações e dos diálogos entre os múltiplos atores

sociais envolvidos no Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental.

4.2 Visão geral do Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental

Criado há 26 anos, o Programa Mata Viva surgiu com o objetivo de promover a

recomposição de mata ciliar às margens do Rio Paraíba do Sul, em Guaratinguetá-SP, e evoluiu

Page 66: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

65

naturalmente com a inclusão de ações de educação ambiental e consultoria para o desenvolvimento

agrícola sustentável. Foi vivenciado, inicialmente, pela própria BASF, com a restauração de 128

hectares de Mata Atlântica em um trecho de quatro quilômetros da margem direita do Rio Paraíba do

Sul, na sua unidade de negócios de Guaratinguetá, no estado de São Paulo.

Hoje, é Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental e tem dois vetores de

atuação. A frente de adequação ambiental orienta e apoia os produtores rurais na recuperação e

restauração de áreas de preservação permanente (APP). De acordo com o gerente de Stewardship da

Unidade de Proteção de Cultivos (BASF AGRO), Vinícius Ferreira Carvalho (BASF IMPRENSA,

2011, p. 1):

A BASF e a FEE (Fundação Espaço Eco) atuam para auxiliar os produtores na adequação

ambiental de acordo com a legislação. As cooperativas agrícolas se destacam no empenho em

participar do Programa Mata Viva, no que se refere ao reflorestamento, e para posicionar o

Brasil como um país forte na agricultura e preocupado com o meio ambiente.

Já as ações de educação ambiental – que incluem atividades em escolas públicas,

capacitação de professores e conscientização de jovens –, por meio do Atlas Ambiental, Trilha

Ecológica Mata Viva e o Teatro Mata Viva, têm por objetivo "levar conhecimento” e despertar

alunos e professores do ensino médio e fundamental para a “importância da sustentabilidade”.

(RESUMO DE ATIVIDADES DA FUNDAÇÃO ESPAÇO ECO, 2011, p. 12). Ainda, segundo

Carvalho (BASF IMPRENSA, 2011, p. 2):

As atividades são uma forma de despertar nas crianças a consciência ambiental, para que elas

tenham uma postura ativa diante das questões ligadas ao tema. Elas são como pequenos

agentes multiplicadores e podem tomar, desde cedo, decisões mais responsáveis e promover a

sustentabilidade.

De acordo com a BASF, juntas, essas duas frentes contribuem para a sustentabilidade na

agricultura no Brasil (BASF IMPRENSA, 2011, p. 1), beneficiando além dos produtores agrícolas,

professores, alunos e pais, conforme mostrado na Figura 9.

Page 67: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

66

Figura 9: Indicadores do Programa Mata Viva de Adequação e Educação ambiental Fonte: Resumo de atividades da Fundação Espaço Eco (2011, p. 13)

4.3 A estratégia metodológica da pesquisa

Para atender todos os requisitos acima, optou-se por mostrar as narrativas e histórias que

compõem o Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental da Basf. Segundo Boje

(2008, p. 1), organizações que contam histórias ou storytelling organizations são definidas como um

“sistema coletivo de contação de histórias no qual o desempenho destas é uma parte chave da

construção de sentido dos seus membros e um meio para permiti-los a complementar as memórias

individuais com a memória institucional”. Ou seja, como as pessoas e as organizações constroem

sentido do mundo via uma narrativa ou uma história. Para ele, “qualquer lugar, escola, órgão

público, ou mesmo um grupo religioso, é uma organização que conta história” (IBIDEM).

Boje (2008) prefere o termo “storying” a “storytelling”, uma vez que “telling”, ou seja

“contar” histórias fica limitado à oralidade. E a sua contribuição está exatamente nas inter-relações

Page 68: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

67

dos processos de narrar e contar (“storying”) ao justapor vários modos de expressão: oralidade,

textualidade, visualidade, arquitetônico e gestual.

Para esse autor, “as narrativas moldam eventos passados em experiências por meio da

coerência para torná-los verossímeis. Já as histórias estão mais para uma dispersão de eventos no

presente ou eventos antecipados para que sejam realizáveis no futuro” (IBIDEM, p. 4). A interação

entre esses dois processos – coerência narrativa e dispersão de histórias – ocorre para que haja não

somente mudança de significado entre as pessoas, como também para que seus eventos, identidades

e estratégias sejam reordenados em cada reunião, publicação ou drama (IBIDEM).

Boje (2008) propõe oito tipos de construção de sentido (sensemaking) de histórias e

narrativas, mostrados na Figura 10.

Figura 10: Dinâmica da construção de sentido de histórias e narrativas Fonte: BOJE (2008, p. 6)

Page 69: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

68

Para o autor, essa proposta é um avanço em relação a de sensemaking de Weick (1995), que

limitou a construção de sentido à retrospecção e à percepção de cinco sentidos: audição, olfato,

paladar, tato e visão. Boje (2008) acrescenta a emoção como o sexto sentido e analisa como as

múltiplas maneiras de construção de sentido se interagem nas relações entre os diversos modos de

contar histórias e narrativas e os diversos tipos de histórias e narrativas. Ao caráter retrospectivo de

construção de sentido, ele acrescenta o caráter “aqui e agora” e o prospectivo.

Para esse autor, narrativa é uma contação ou narração completa, com uma sequência linear de

começo, meio e fim. Pode ter um olhar retrospectivo, a partir do presente, através do passado,

selecionando personagens, diálogos, temas etc. em uma trama, mas, também, pode ter um olhar

prospectivo, orientado ao futuro, como as antenarrativas. Boje (2008, p. 1) diz que o caráter

prospectivo de construção de sentido é “relativamente ignorado nos estudos organizacionais”. A

história, por sua vez, é mais dispersiva e tem o caráter do “aqui e agora” (nows), o transcendental

(baseado em oito tipos de dialogismo) e de reflexividade (baseado em sete tipos de dialéticas). A

história é também uma relação de eventos e incidentes, mas a narrativa vem depois e adiciona trama

e coerência ao story line. (BOJE, 2001).

Nesta tese, as inter-relações entre histórias e narrativas foram discutidas por meio dos

fragmentos (antenarrativas) que formam a Tamara do Programa Mata Viva de Adequação e

Educação Ambiental. Para entender antenarrativas e Tamara, são discutidos brevemente três tipos de

construção de sentido (sensemaking) de histórias e narrativas.

Narrativas retrospectivas do tipo BME (Beginning, Middle, End) são construídas para

terem coerência narrativa linear. São baseadas nas tradicionais narrativas aristotélicas que têm uma

estrutura de trama de começo, meio e fim, que são quase lineares e completas, imortalizadas nos seis

elementos da Poética de Aristóteles: enredo, personagem, diálogo, tema, ritmo e espetáculo. Boje

(2008) alega que esses elementos são importantes para os negócios. Por exemplo, o ritmo nos ajuda

a entender os processos de complexidade em uma organização. Os diálogos entre os stakeholders

constituem uma questão fronteiriça para a estratégia.

Boje (2008) também alega que há um enorme desafio para a pesquisa metodológica: como

investigar as interações entre os múltiplos enredos, personagens, diálogos, temas, ritmos e

espetáculos. Assim, para as narrativas de fundação de organizações de cultura forte do tipo BME,

por exemplo, propõe um foco nos aspectos cambiáveis, adaptativos e não nas qualidades mais

estáveis ou petrificadas, propostas por Czarnizwska (2004). Essa autora alega que essa abordagem

Page 70: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

69

de petrificação leva em consideração que tais narrativas são imutáveis, assumindo que já emergem

formadas totalmente, e os acréscimos são apenas anéis concêntricos, ou seja, tendem para o mesmo

interesse. Boje (2008), por meio dos estudos sobre o grupo Wal-Mart, justifica que a abordagem de

construção de sentido para narrativas retrospectivas do tipo BME pode ser altamente adaptativas às

circunstâncias e momentos de mudança da organização.

Entretanto, esse tipo de construção de sentido (sensemaking) de histórias e narrativas é pouco

comum nas organizações. As narrativas retrospectivas fragmentadas ou fragmentos concisos,

compactos, são mais frequentes. Boje (2008) diz que as retrospecções fragmentadas, são tão

codificadas, ou seja, há um sistema de sinais, palavras, regras tão bem entendido pelos participantes,

que uma palavra, um foto pode implicar momentos narrativos completos. “É tão codificado que, para

um observador iniciante, pode passar despercebido” (IBIDEM, p. 11). Tais fragmentos são

distribuídos para diferentes atores, reuniões, textos, vídeos e parecem mais com um quebra-cabeças,

cuja foto, com a figura completa, foi perdida. Ou seja, alguns funcionários têm uma parte das peças,

mas as demais estão perdidas.

Para esse autor, antenarrativas são mais comuns nos negócios e podem transformar as

relações nas organizações. “Antenarrativa é uma aposta (bet) prospectiva, orientada ao futuro que

vem antes da história” (BOJE, 2008, p. 13). “Ante” se refere a uma aposta (bet), antes de. Ou seja,

“antenarrativa é uma aposta no futuro e vem antes da coesão narrativa fossilizar o passado” (BOJE,

2011, p.1). “É uma especulação pré-narrativa, sem trama, coletiva, incoerente, não-linear,

fragmentada” (BOJE, 2001, p. 1). Antenarrativa procura responder: o que está acontecendo aqui?

Direciona a atenção para o fluxo da história, como uma construção de sentido à experiência vivida

antes dos requisitos da narrativa de colocar começo, meio e fim. Ou seja, os fragmentos formam a

história, que, por sua vez, vem antes da narrativa. A antenarrativa representa uma memória coletiva

antes de ser concretizada em uma narrativa consensual, única (IBIDEM).

A aposta da pesquisadora para esta tese é de que as narrativas e histórias envolveriam um

processo de aprendizagem social para sustentabilidade nas organizações.

Para Boje (2001), Tamara é uma forma de descrever como a contação de histórias enquanto

antenarrativa acontece nas organizações complexas. Tamara é baseado no estudo da Disney (BOJE,

1995) e significa histórias simultâneas acontecendo em diferentes salas, com uma rede de atores

construindo sentido dos diversos arranjos. O presente muda o tempo todo, mas, como não é possível

estar em todas as salas imediatamente, a interação com os demais atores é feita por meio de vários

Page 71: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

70

caminhos para construir um sentido para todos. Boje (1995) inspirou-se na peça chamada Tamara de

John Kriznac, na qual os personagens desenvolviam as histórias em muitas salas de uma grande

mansão, diante de uma audiência que caminhava ou, muitas vezes, até corria, perseguindo, ou seja,

escolhendo a cada momento (in-the-now), os personagens de sala em sala, em atos de construção de

sentido (Boje, 2008).

Em organizações complexas, como Disney e Basf, como construir sentido de contação de

histórias em muitas salas, áreas, funções organizacionais, ao redor do mundo, se é possível estar em

apenas um lugar de cada vez? Por isso, o ato de narrar histórias é compartilhado, co-construído com

o leitor ou ouvinte em diversos contextos dialógicos e dialéticos. Ou seja, o significado atribuído

pelos funcionários em determinada sala depende da trajetória feita, das salas em que eles estiveram

antes (IBIDEM).

A Tamara do Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental mostrada na Figura

11 tem múltiplos elementos, como atores (como proprietários rurais, cooperativas, professores,

universidade), lugares (matas, palcos, propriedades), relações etc., que serão discutidos ao longo

desta tese.

Diante disso, qual história seguir? A história da implementação do Programa na cidade de

Castro, no Paraná? Ou a história dos proprietários rurais? Ou que tal a história da Trilha Ecológica

Mata Viva?

A pesquisadora optou por seguir a trajetória do Programa Mata Viva de Adequação e

Educação Ambiental na cidade de Bebedouro – SP.

Page 72: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

71

Figura 11: Tamara do Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental Fonte: Elaboração da pesquisadora

Page 73: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

72

4.4 A construção dos dados

Segundo Boje (2008), há uma pluralidade de modos de expressão de histórias e narrativas:

oral, textual, visual, gestual e arquitetônica, por isso, foram utilizados para o desenvolvimento desta

tese várias fontes de evidências. O ponto de partida foram as entrevistas em profundidade e

semi-estruturadas que estimularam os entrevistados a contar suas histórias, que foram gravadas e

transcritas na íntegra. A maioria das entrevistas durou, em média, duas horas; algumas consumiram

mais de três horas e foram feitas em vários momentos e em vários lugares. Todas as entrevistas

foram realizadas nos locais de trabalho dos entrevistados; as mais longas foram complementadas no

hotel, na casa do entrevistado, no carro, ao longo do deslocamento. Eu passei uma semana na cidade

de Bebedouro, onde tive a oportunidade de ver in loco os atores sociais em ação.

Para facilitar o trabalho de campo, no Quadro 3, elaborei um roteiro de entrevistas na

tentativa de articular e buscar coerência entre os objetivos propostos para esta pesquisa e a

metodologia.

Eis a relação dos entrevistados:

Basf:

― Diretor-presidente da Fundação Espaço Eco, que, até meados de 2012,

ocupava o cargo de gerente de comunicação de marketing para a América

Latina na Unidade de Proteção de Cultivos;

― Vice-presidente de educação para a sustentabilidade da Fundação Espaço

Eco;

― Coordenador da área de restauração ambiental da Fundação Espaço Eco;

― Consultor de contas especiais da Unidade de Proteção de Cultivos da Basf

Agro;

Page 74: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

73

Clientes:

― Gerente do departamento técnico agropecuário da Coopercitrus;

― Consultor da COOPERCITRUS e SICOOB CREDICITRUS;

― Proprietário rural da Fazenda Santa Julia, na cidade de Bebedouro – SP;

― Técnico agrícola (gerente) da Fazenda Santa Julia, na cidade de

Bebedouro – SP;

― Coordenadora da Trilha Ecológica Mata Viva na cidade de Bebedouro –

SP;

― Ex-funcionário da Estação Experimental de Citricultura de Bebedouro –

SP;

― Coordenador ambiental da Estação Experimental de Citricultura de

Bebedouro – SP;

― Estagiária da Estação Experimental de Citricultura de Bebedouro – SP;

Comunidade:

― Professora do 5º ano da Escola EMEF Yolanda Carolina Giglio Villela de

Bebedouro – SP;

― Coordenadora pedagógica das oficinas da Escola EMEF Yolanda

Carolina Giglio Villela de Bebedouro – SP;

― Professoras da Escola Municipal Profª Dirce da Silva Dias de

Pitangueiras – SP;

Governo:

― Diretora do Departamento municipal de Educação e Cultura (DEMEC)

de Bebedouro – SP;

― Coordenadora de projetos socioambientais do Departamento municipal

de Educação e Cultura (DEMEC) de Bebedouro – SP;

Page 75: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

74

Parceiros:

― Coordenadora da área de educação ambiental da Fundação Espaço Eco.

Quadro 3: Roteiro de entrevistas

Objetivos

Perguntas Para atender as demandas

do problema de pesquisa Para atender as demandas da

metodologia

Conhecer o entrevistado

Quem são os narradores das

estórias (antenarrativas)? Quem são os personagens

principais?

Nome, idade, organização em que atua,

cargo, tempo de atuação na organização,

formação acadêmica

Conhecer o histórico dos

atores sociais no

Programa Mata Viva

Conhecer as

experiênciasdos atores

sociais no fluxo do

Programa Mata Viva

Conhecer as

ambiguidades / estórias

locais de sensemaking no

fluxo da experiência no

Programa Mata Viva

Entender o que acontece no

Programa Mata Viva: o Onde a história

acontece3? o Quando a história

acontece? o Qual é a principal idéia

da história? o Quais são os principais

eventos? o Quais são as grandes

narrativas? o Quais são as estórias

locais?

1. Por gentileza, me apresente, me conte o

que é o Programa Mata Viva

2. Como começou o seu envolvimento e

da organização em que atua

(cooperativa, da Secretaria Municipal

de Educação etc.) com o projeto Mata

Vida?

3. Como está esse envolvimento

atualmente?

4. O que está acontecendo atualmente no

Programa Mata Viva?

Conhecer os diálogos

dos atores sociais no

fluxo do Programa Mata

Viva

Conhecer como ocorrem

as relações de equilíbrio

e assimetrias de poder

Com quem? Como são esses diálogos? Qual o conteúdo? Qual o significado desses

diálogos? Quais são as ações de

negociações desses atores

sociais? Há equilíbrio de poder? Há limitadores/facilitadores?

5. Quais e como são as ações de

diálogos/interação com os demais

atores do Programa Mata Viva?

6. Como é o relacionamento (da sua

cooperativa, da Secretaria Municipal de

Educação etc.) com a Basf e os demais

atores no Projeto Mata Viva?

7. Esses relacionamentos, as ações,

mudaram ao longo do tempo? De que

forma?

Conhecer as ações de

aprendizagem

O que os atores sociais do

Programa Mata Viva estão

aprendendo? O que eles estão fazendo com

estas experiências? Quais ações têm sido

desencadeadas?

8. Para o sr/sra. e/ou para a organização

em que atua, quais têm sido as ações de

aprendizagem os resultados

/benefícios (positivos ou negativos) do

Programa Mata Viva?

9. O que o sr./sra.e/ou a organização em

que atua tem feito com esses

resultados?

10. Quais oportunidades de melhorias você

sugere para o Programa Mata Viva?

Fonte: Elaboração da pesquisadora

Page 76: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

75

Também atuei como observadora não-participante ao acompanhar a atividade da Trilha

Ecológica Mata Viva, realizada com as professoras e alunos da Escola Municipal Profª Dirce da

Silva Dias de Pitangueiras – SP, na Estação Experimental de Bebedouro, e a atividade de aplicação

do Atlas Ambiental na aula de história sobre a cidade de Bebedouro, com a professora e alunos do 5º

ano da Escola EMEF Yolanda Carolina Giglio Villela de Bebedouro – SP. Além disso, visitei a

Fazenda Santa Julia, acompanhada do proprietário e do gerente. Em todos esses momentos de

inserção, pude observar como esses atores sociais se engajam no discurso e nas ações diárias. As

observações foram registradas em forma de notas de campo em um caderno, Figura 12, que recebi de

presente na primeira entrevista com o vice-presidente de Educação para a Sustentabilidade da

Fundação Espaço Eco, o qual eu o denominei “Dário de Campo da Pesquisadora”.

Figura 12: Dário de Campo da Pesquisadora

As entrevistas e a observação não-participante foram complementadas com conversas

informais com a maioria dos entrevistados nos meus momentos de inserção no campo, com a

intenção de extrair informações complementares de forma mais natural, fora do contexto formal de

entrevistas. Todas as informações foram devidamente anotadas no Dário de Campo Mata Viva.

Por último, mas exaustivamente utilizados, foram os documentos, como relatórios,

legislação, políticas, livros, apresentações internas e externas, sites, noticias veiculadas na mídia,

fotografias, vídeos etc., para buscar e apoiar no aprofundamento das antenarrativas obtidas por meio

das fontes de evidências citadas acima. Todos esses documentos são citados ao longo da discussão

dos resultados e estão relacionados nas referências.

Page 77: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

76

4.5 A análise dos dados

Para interpretar e discutir os dados coletados foi utilizado o método pós-moderno de análise

de antenarrativas de Boje (2001, p.6), que propõe oito tipos de análises para trabalhar com a

“contação de histórias polifônica e fragmentada em organizações complexas”, a saber:

1. Análise de desconstrução

2. Análise de grandes narrativas

3. Análise de micro histórias

4. Análise de rede de histórias

5. Análise de intextualidade

6. Análise de causalidade

7. Análise de trama, enredo

8. Análise de temas

Nesta tese, foi utilizada uma combinação dessas análises, que, ao longo da contação de

narrativas e histórias, foram justapostas para a obtenção dos resultados, mostradas no Quadro 4.

Quadro 4: Tipos de análises de antenarrativas utilizadas na contação das narrativas e histórias do Programa

Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental na cidade de Bebedouro – SP

Narrativas / histórias Tipo de análise Fonte de evidências

A relação entre a experiência do complexo industrial da Basf

em Guaratinguetá na recuperação de matas ciliares e o

Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental:

Análise de causalidade

Documentos +

entrevistas

As razões da devastação das matas ciliares no Vale do

Paraíba Análise de causalidade

O que diz a legislação ambiental brasileira sobre a

proteção de mata nativa? Análise de temas

A recuperação das matas ciliares no Vale do Paraíba Análise de temas

Fonte: Elaboração da pesquisadora

Page 78: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

77

Quadro 4: Tipos de análises de antenarrativas utilizadas na contação das narrativas e histórias do Programa

Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental na cidade de Bebedouro – SP (continuação)

Narrativas / histórias Tipo de análise Fonte de evidências

A contribuição da Basf para a sustentabilidade na agricultura

– as relações entre a Unidade de Proteção de Cultivos da Basf

agro e o Programa Mata Viva de Adequação e Educação

Ambiental:

Análise de causalidade

Documentos + entrevistas

O significado atribuído pela Unidade de Proteção de

Cultivos da Basf Agro à sustentabilidade Análise de temas

A estratégia de desenvolvimento de negócios

sustentáveis Análise de temas

As relações entre a Fundação Espaço Eco e o Programa Mata

Viva de Adequação e Educação Ambiental: Análise de causalidade

As razões da Fundação Espaço Eco Análise de causalidade

Foco de atuação da Fundação Espaço Eco Análise de temas

A cooperação técnica entre Brasil e Alemanha Análise de temas Documentos

A experiência da cidade de Bebedouro – SP com o Programa

Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental

Análise de trama, enredo Entrevistas + documentos

+ observação

não-participante

Primeiro, a experiência de Bebedouro na vertente de

adequação ambiental

Segundo, a experiência de Bebedouro na vertente de

educação ambiental:

o Trilha Ecológica Mata Viva

o Atlas Ambiental

o Teatro Mata Viva Análise de temas Documentos + entrevistas

Fonte: Elaboração da pesquisadora

Page 79: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

78

O ponto de partida foi a análise da rede de histórias ou antenarrativas, em que cada

história é compreendida como nódulos, que podem ser pessoas, organizações, lugares, grupos,

histórias, categorias etc., e as conexões podem ser analíticas ou virtuais, podendo representar a

intensidade das relações por meio de várias linhas. Uma análise de antenarrativas investiga o

comportamento das histórias na situação organizada, que é vista como um sistema de contação de

histórias, buscando pelos movimentos das relações e dinâmicas complexas entre os nódulos

identificados. Não olha o mapa em si, já que o território de antenarrativas é mais desorganizado do

que o próprio mapa.

Nesta tese, as histórias, inicialmente, foram vistas como conexões ligadas pelas linhas que

mostram a direção e o sentido de cada relação. A Figura 13 ilustra o mapa da rede de histórias do

Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental na cidade de Bebedouro – SP, onde

foram identificados 25 nódulos, que representam os principais atores sociais, lugares, organizações e

legislação desse Programa, conectados por meio de 20 relações, diretas e indiretas.

As histórias também foram vistas como contextos. É o caso da Experiência de Guaratinguetá,

cujo contexto histórico dá a largada para as narrativas. Há histórias consideradas como nódulos

organizados em cinco grupos – a organização (Basf), os clientes, os parceiros, a comunidade de

Bebedouro e o governo –, como o caso das da Fundação Espaço Eco com os clientes e parceiros. Por

último, as histórias foram conectadas temporalmente com outras.

Page 80: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

79

Figura 13: Mapa da rede de histórias do Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental Fonte: Elaboração da pesquisadora

Page 81: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

80

Em resumo, esse mapa da rede de histórias do Programa Mata Viva de Adequação e

Educação Ambiental contempla 20 relações envolvendo 23 atores sociais, em dez histórias que

formam quatro narrativas. O Quadro 5 mostra as narrativas e histórias onde foram contadas as

múltiplas relações entre os diversos atores que compõem a Tamara do Programa Mata Viva de

Adequação e Educação Ambiental na cidade de Bebedouro – SP.

Quadro 5: Relações entre os diversos atores que compõem a Tamara do Programa Mata Viva de

Adequação e Educação Ambiental na cidade de Bebedouro – SP

Número da

relação

Atores sociais

principais

Sentido da

relação Narrativa / História contempladas

R.1

Experiência de

Guaratinguetá e a

história econômica de

Guaratinguetá

Direta

O começo de tudo... A relação entre a experiência do

complexo industrial da Basf em Guaratinguetá na

recuperação de matas ciliares e o Programa Mata Viva de

Adequação e Educação Ambiental

As razões da devastação das matas ciliares no Vale

do Paraíba

R.2

Experiência de

Guaratinguetá e a

legislação ambiental

brasileira (Código

Florestal e a Política de

Meio Ambiente)

Direta

O começo de tudo... A relação entre a experiência do

complexo industrial da Basf em Guaratinguetá na

recuperação de matas ciliares e o Programa Mata Viva de

Adequação e Educação Ambiental

O que diz a legislação ambiental brasileira sobre a

proteção de mata nativa? A relação entre o governo e

o Programa Mata Viva de Adequação e Educação

Ambiental

R.3

Experiência de

Guaratinguetá e a

Prefeitura Municipal de

Guaratinguetá

Direta O começo de tudo... A relação entre a experiência do

complexo industrial da Basf em Guaratinguetá na

recuperação de matas ciliares e o Programa Mata Viva de

Adequação e Educação Ambiental

A recuperação das matas ciliares no Vale do Paraíba R.4

Experiência de

Guaratinguetá e o

IBAMA

Direta

R.5

Propriedades rurais e a

Unidade de Proteção de

Cultivos

Direta

A contribuição da Basf para a sustentabilidade na agricultura

– a relação entre a Unidade de Proteção de Cultivos da Basf

Agro e o Programa Mata Viva de Adequação e Educação

Ambiental

O significado atribuído pela Unidade de Proteção de

Cultivos da Basf Agro à sustentabilidade

A estratégia de desenvolvimento de negócios

sustentáveis

R.6

Experiência de

Guaratinguetá e

a Unidade de Proteção

de Cultivos

Direta

R.7

Coopercitrus e a

Unidade de Proteção de

Cultivos

Direta

R.8 Unidade de Proteção de

Cultivos e a ONU/FAO Indireta

Fonte: Elaboração da pesquisadora

Page 82: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

81

Quadro 5: Relações entre os diversos atores que compõem a Tamara do Programa Mata Viva de

Adequação e Educação Ambiental na cidade de Bebedouro – SP (continuação)

Número da

relação

Atores sociais

principais

Sentido da

relação Narrativa / História contempladas

R.9

Fundação Espaço Eco e

clientes da Unidade de

Proteção de Cultivos

Direta

A relação entre a Fundação Espaço Eco e o Programa

Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental

A experiência da cidade de Bebedouro – SP com o

Programa Mata Viva de Adequação e Educação

Ambiental

R.10 Fundação Espaço Eco e

propriedades rurais Direta

R.11 Fundação Espaço Eco e

parceiros Direta

R.12

Coopercitrus e os

Proprietários e técnicos

rurais

Direta

A experiência da cidade de Bebedouro – SP com o

Programa Mata Viva na vertente de Adequação

Ambiental

A relação entre a Fundação Espaço Eco e o Programa

Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental

R.13 Coopercitrus,

Geodinâmica Indireta

A experiência da cidade de Bebedouro – SP com o

Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental

– atividade do Atlas Ambiental

R.14 Coopercitrus,

Instituto Romã Indireta

A experiência da cidade de Bebedouro – SP com o

Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental

– atividade da Trilha Ecológica Mata Viva

R.15

Coopercitrus,

Departamento municipal

de Educação e Cultura

(DEMEC)

Direta

A experiência da cidade de Bebedouro – SP com o

Programa Mata Viva na vertente de Educação Ambiental –

atividades do Atlas Ambiental, da Trilha Ecológica Mata

Viva e do Teatro Mata Viva

R.16 Estação Experimental,

Alunos Direta

A experiência da cidade de Bebedouro – SP com o

Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental

– atividade da Trilha Ecológica Mata Viva

R.17 Estação Experimental,

Professores Direta

A experiência da cidade de Bebedouro – SP com o

Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental

– atividade da Trilha Ecológica Mata Viva

R.18

Departamento municipal

de Educação e Cultura

(DEMEC),

Professores

Direta

A experiência da cidade de Bebedouro – SP com o

Programa Mata Viva na vertente de Educação Ambiental –

atividades do Atlas Ambiental e da Trilha Ecológica Mata

Viva

R.19 Lei Rouanet

Bellini Cultural Direta

A experiência da cidade de Bebedouro – SP com o

Programa Mata Viva na vertente de Educação Ambiental –

atividade do Teatro Mata Viva

R.20

Experiência de

Guaratinguetá,

Comunidade de

Bebedouro

Indireta

A experiência da cidade de Bebedouro – SP com o

Programa Mata Viva na vertente de Educação Ambiental –

atividades do Teatro Mata Viva e Atlas Ambiental

Fonte: Elaboração da pesquisadora

Page 83: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

82

Em função do mapa da rede de histórias do Programa Mata Viva de Adequação e

Educação Ambiental na cidade de Bebedouro – SP, foi utilizada a análise de antenarrativas de

desconstrução. Esse tipo de análise é a antenarrativa em ação, uma vez que narrativa não é fixa

e nem neutra ideologicamente, mas se move e flui ao longo das redes de significados dos

contextos das múltiplas histórias. Esse tipo de análise permite desafiar as idéias, a linearidade, a

sequência, as vozes envolvidas, a trama.

Descontruir, em parte, o que foi contado, porque nas entrevistas quando solicitado aos

entrevistados para apresentar o Programa, eles, antes de mais nada, apresentavam ou a

Fundação Espaço Eco, ou como tudo começou a partir do ponto em que se encontram os atores

sociais. Por exemplo, a Cooperativa começava a contar a história a partir dos primeiros

encontros de negociação para implementar o Programa na região. Os professores, a partir do

momento em que foram convocados para participar do Atlas Ambiental. Somente nas

antenarrativas escritas são feitas conexões à experiência de Guaratinguetá e à Unidade de

Proteção de Cultivos.

Assim, para contar a narrativa da aprendizagem social para sustentabilidade (voltada

para uma agricultura sustentável) na Basf, por meio do Programa Mata Viva de Adequação e

Educação Ambiental na cidade de Bebedouro – SP, primeiro buscou-se conhecer as diferenças

entre as muitas oposições binárias desse Programa, como organização/demais atores sociais

envolvidos; organização/legislação ambiental brasileira; começo/fim do Programa. Em

seguida, foi feita a reinterpretação da relação hierárquica dessas dualidades para entender o que

realmente acontece. Buscou-se também mostrar todas as vozes, ou seja, todos os atores sociais

envolvidos no Programa, conhecendo a posição, interesses e conflitos de cada um. Ao longo da

análise dos resultados, o foco foi o entendimento daquilo que está entrelinhas, ideias, intenções

que não estão explícitas ou diretamente expressas numa mensagem. Por fim, a narrativa foi

resituada, começando pelo começo. A ordem da resituação está no Quadro 4 acima.

Para conhecer as assertivas causais nas narrativas e histórias – da deflagração do

Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental; da decisão de estendê-lo aos

clientes da Unidade de Proteção de Cultivos; e da transferência da sua gestão estratégica para a

Fundação Espaço Eco –, foi conduzida uma análise de antenarrativa do tipo causal generativa,

na qual uma “causa gera seus efeitos desde que causa e efeito tenham uma conexão real e

mecânica” (BOJE, 2001, p. 96). A causa generativa pode ser classificada em vários tipos, sendo

que as quatro primeiras causas estão baseadas na obra “A Política”, de Aristóteles:

Page 84: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

83

1. Causa material: analisa do que alguma coisa é feita; por exemplo, o mármore é a

causa material de uma estátua;

2. Causal formal: é o agente que trabalha com o material, dando-lhe uma forma;

por exemplo, o escultor trabalhando o mármore para dar forma à estátua, ou em

uma organização, onde o CEO é a causa formal pela implementação da

estratégia;

3. Causa eficiente: é a ação imediata para produzir o trabalho ou forma desejados;

por exemplo, o trabalho manual do escultor ou a decisão do CEO de

implementar a estratégia;

4. Causa final: o motivo que levou à determinada ação; por exemplo, o escultor

homenagear alguém ou o CEO cumprir os objetivos propostos para a sua

organização;

5. Causa necessária: deve estar presente para o efeito ocorrer, mas por si mesma

não produz o efeito esperado;

6. Causa contributiva: pode gerar ou contribuir para um efeito ocorrer, mas por si

só não pode produzi-lo;

7. Causa suficiente: pode por si mesma produzir o efeito esperado, não dependendo

de outras causas;

8. Causa remota: está distante do efeito, mas, por meio de outras conexões, pode

contribuir ou não para o efeito;

9. Causa próxima: está próxima ao efeito, mas sem ser uma causa suficiente ou

contributiva.

Além da causa generativa, Boje (2001) ainda cita a causalidade de sucessão, na qual as

razões não são reais, mas são uma sucessão de eventos que estão entre a ficção e a coincidência

de ocorrências. Esse autor acredita que esse tipo de causalidade é um meio termo entre a

causalidade generativa e a psicológica. Por último, cita a causa do tipo caos e causalidade, na

Page 85: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

84

qual uma determinada causa pode ter vários efeitos, mas sem qualquer previsão de qual poderia

ocorrer.

Ao conduzir uma análise antenarrativa de causalidade do tipo generativa, o objetivo,

além de construir as assertivas causais, foi também recuperar as circunstâncias na quais as

histórias foram contadas, procurando também por relações causais entre as macro e

micro-histórias, para conhecer possíveis contradições, incoerências e rupturas. Por isso, a

análise focalizou nas três assertivas causais mencionadas acima e as classificou em uma

taxonomia de estruturas temáticas: quais foram as causas material, formal ou necessária ou

suficiente etc.? Para tanto, foi identificada uma linguagem temporal mais linear para essa

narrativa, uma vez que o intuito foi entender como tudo começou e desencadeou na formatação

atual do Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental.

A análise de temas foi justaposta ao longo da análise de causalidade para discutir não o

tema em si das histórias, e, sim, o que está nas entrelinhas, ou seja, quais as ideias, intenções

que não estão explícita ou diretamente expressas na mensagem desses temas. Por exemplo, na

história da relação entre o governo e o Programa Mata Viva de Adequação e Educação

Ambiental, o objetivo foi compreender o que está subjacente, o que está além dos limites, ou

mesmo em excesso ou em falta quanto às exigências da legislação ambiental brasileira. Já na

narrativa sobre as relações entre a Unidade de Proteção de Cultivos da Basf agro e o Programa

Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental, o objetivo foi entender como essa Unidade

conseguiu conectar o seu significado de sustentabilidade com a experiência bem-sucedida de

recuperação de matas ciliares no município de Guaratinguetá e, consequentemente, estendê-la

aos seus clientes.

A análise de trama (plot analysis), por meio da Mimise II de Ricoeur, foi utilizado para

identificar e conhecer as relações pertinentes entre diversos eventos ouvidos e lidos da

experiência da cidade de Bebedouro – SP com o Programa Mata Viva de Adequação e

Educação Ambiental. Esse método não é apenas uma cronologia de eventos, mas sobre o que

conecta esses eventos em uma estrutura narrativa.

Boje (2001) sugere três formas para conduzir a análise de trama com base na tríplice

Mimese da obra “Tempo e Narrativa” de Paul Ricoeur: Mimise I, Mimese II e Mimese III.

Na Mimese I, a dialética entre tempo e narrativa depende de elementos pré-narrados,

como objetivos, motivos, agentes. Questiona: o que? Por que? Quem? Como? Com quem?

Contra quem? Também depende das mediações simbólicas como o conhecimento e o

entendimento práticos de processos e recursos simbólicos de cultura, sinais, regras e normas. E,

Page 86: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

85

por último, depende da narração temporal, ou seja, do pré-entendimento do tempo e da

temporalidade (do estado do que é provisório, temporário).

Na Mimese II, utilizada nesta tese, ocorre o emplotment, ou seja, estruturar uma série de

eventos históricos em uma narrativa com trama, com enredo em uma sucessão de

acontecimentos e episódios. É constituída pela mediação entre eventos e histórias, fatores

heterogêneos e heterogeneidade.

Assim, sugere a mediação entre os eventos individuais e a história como um todo, uma

vez que o evento só tem significado em relação aos outros eventos e incidentes no

desenvolvimento de uma trama cheia de significado de uma história completa. Por exemplo, no

caso da história da experiência da cidade de Bebedouro-SP com o Programa Mata Viva, na

vertente de adequação ambiental, foram reunidos os eventos individuais como a experiência da

Fazenda Santa Julia ou a negociação com a Cooperativa para exemplificar como foi, desde o

início, a implementação de cada fase desse Programa nesse município.

Também é sugerida a mediação entre os fatores heterogêneos como os agentes,

objetivos, meios, interações, circunstâncias, resultados inesperados. Nessa mesma história,

procurou contar os papéis dos diversos atores sociais envolvidos, os espaços onde ocorreram as

interações, quais foram os aprendizados.

Por último, foi feita a mediação para permitir a síntese da heterogeneidade, ou seja, as

dimensões dos eventos foram cronológicas, ao passo que o tempo da narrativa não foi. Em

outras palavras, buscou-se contar essa mesma história seguindo as fases de implementação e

não quando elas foram implementadas. As fases contam a história e não o tempo.

A Mímese III é a própria temporalidade e sugere responder quatro perguntas: os três

estágios da tríplice Mimese representam um progresso à medida que eles conectam o tempo e a

narrativa? Como as tramas modelam dinamicamente a experiência? Quais são as dificuldades

de referenciais na ordem narrativa? Quanto de ajuda pode um tempo narrado

hermeneuticamente esperar desde a fenomenologia de tempo?

Para suportar os tipos de análise de antenarrativas citados acima, também foi utilizada a

análise de micro-histórias, ou seja, das histórias e conhecimento locais, ao traçar os cargos dos

atores sociais locais e suas relações sociais nos contextos considerados. Por exemplo, a história

da experiência da cidade de Bebedouro – SP com o Programa Mata Viva na vertente de

educação ambiental mostrou como os professores locais estão usando o Atlas Ambiental, a

despeito das orientações recebidas. Por isso, também é feita uma análise das grandes

narrativas oficiais e feita a inter-relação com as micro-histórias com o objetivo de mostrar as

Page 87: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

86

outras vozes e os outros significados. Por último, em todas as análises é conduzida a

intertextualidade entre os textos, dados os múltiplos materiais disponíveis acerca da temática

tratada nessa tese.

Sumarizando, a narrativa do Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental

é considerada, nesta tese, como uma grande narrativa (grand narrative) da preocupação da

BASF com uma produção agrícola sustentável ou sustentabilidade na agricultura ou, ainda,

agricultura sustentável, no mundo. Isto porque a BASF tem outros programas, outras grandes

histórias, como “The Rawcliffe Bridge Project – Coexistence in practice”, no Reino Unido ou

“The French Bee Biodiversity Network”, na França, dentre outras, que têm como objetivo

contribuir para a sustentabilidade na agricultura, no Brasil e no mundo.

Entretanto, esse Programa não surgiu com essa formatação atual. E nenhuma das fontes

das histórias ouvidas ou consultadas – orais, textuais, visuais, gestuais ou arquitetônicas – conta

essa grande história na abrangência e detalhes desta tese.

Para conhecê-la e entender o processo de aprendizagem social para sustentabilidade da

Basf por meio desse Programa, foram reunidos os fragmentos das histórias e dos aprendizados

das múltiplas relações entre os diversos atores que compõem a Tamara do Programa Mata Viva

de Adequação e Educação Ambiental, conforme mostrado na Figura 11.

Eis as narrativas e histórias da aprendizagem social para sustentabilidade (voltada para

uma agricultura sustentável) na Basf.

Page 88: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

87

5 O COMEÇO DE TUDO... A RELAÇÃO ENTRE A EXPERIÊNCIA DO

COMPLEXO INDUSTRIAL DA BASF EM GUARATINGUETÁ NA

RECUPERAÇÃO DE MATAS CILIARES E O PROGRAMA MATA VIVA DE

ADEQUAÇÃO E EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Em todas as antenarrativas encontradas, seja nas oficiais – como no site da empresa, no

resumo de atividades da Fundação Espaço Eco e nas informações para imprensa –; seja nas

entrevistas, aparecem fragmentos sobre a origem do Programa Mata Viva de Adequação e

Educação Ambiental como: “Iniciado com a readequação ambiental do trecho da mata ciliar no

Rio Paraíba do Sul, às margens do complexo químico da Basf em Guaratinguetá [...]”; ou

“Iniciado em 1984, no complexo químico de Guaratinguetá”; ou ainda: “Criado há 26 anos, o

Mata Viva surgiu com o objetivo de promover a recomposição de mata ciliar às margens do Rio

Paraíba do Sul, em Guaratinguetá” (RESUMO DE ATIVIDADES, 2011; BASF, 2012).

Por isso, a narrativa da experiência desse complexo industrial da Basf na recuperação de

matas ciliares é a primeira a ser contada. Trata-se de uma narrativa a respeito de uma

experiência iniciada para resolver um problema ambiental – a devastação das matas ciliares na

cidade de Guaratinguetá. Matas ciliares são florestas ou outros tipos de cobertura vegetal

nativa, que ficam às margens de rios, igarapés, lagos, olhos d´água e represas. O nome “mata

ciliar” vem do fato de serem tão importantes para a proteção de rios e dos lagos como são os

cílios para os nossos olhos (WWF BRASIL, 2012).

Essa narrativa é composta por três histórias. A primeira conta como surgiu esse

problema ambiental no município de Guaratinguetá. A segunda relata o que levou a Basf a

implementar essa iniciativa e a terceira conta como foi feita a recuperação das matas ciliares às

margens do Rio Paraíba do Sul. Cada uma dessas histórias apresenta elementos do processo de

aprendizagem social para uma agricultura sustentável no Programa Mata Viva de Adequação e

Educação Ambiental da Basf.

Page 89: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

88

5.1 Entendendo o problema, seu entorno, suas causas e consequências – elemento 1 do

processo de aprendizagem social para uma agricultura sustentável no Programa

Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental da Basf

Atores sociais envolvidos: a natureza e os produtores rurais

Essa primeira história, ao relatar brevemente as razões da devastação das matas ciliares

no Vale do Paraíba, apresenta o primeiro elemento do processo de aprendizagem social para

uma agricultura sustentável no Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental da

Basf: o entendimento do problema, seu entorno, suas causas e consequências.

Para conhecê-la, eu faço uma avaliação da inter-relação das circunstâncias que

acompanham a situação onde se encontra o problema e o seu entorno, por meio da revisitação

da história econômica de Guaratinguetá. Ou seja, as antenarrativas dessa história – extraídas de

fragmentos de livros, informações para imprensa e alguns estudos, cujas fontes são citadas ao

longo dessa história – abordam o conhecimento das causas e consequências do crescimento

econômico desse município, as quais eu considero como razões necessárias para o surgimento

de um Programa como o Mata Viva. São necessárias porque devem estar presentes para o efeito

ocorrer (BOJE, 2001), porque, apesar de terem causado a depredação das matas ciliares, por si

só, não produziram o efeito esperado, ou seja, a deflagração do Programa Mata Viva.

Ao revisitar a história econômica de Guaratinguetá, é possível conhecer seus eventos

passados e o conjunto de conhecimentos relativos à situação onde o problema se apresentava,

bem como a sua evolução ao longo de um dado período, para posterior deflagração da solução.

Segundo Hobsbawm (1994, p. 13), “a destruição do passado – ou melhor, dos mecanismos

sociais que vinculam nossa experiência pessoal à das gerações passadas – foi um dos

fenômenos mais característicos e lúgubres do final do século XX”. Por isso, precisamos da

história e, obviamente, dos historiadores para nos lembrar do que esquecemos (IBIDEM).

Eis a primeira história.

Page 90: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

89

5.1.1 As razões da devastação das matas ciliares no Vale do Paraíba

O município de Guaratinguetá está localizado na região do Vale do Paraíba, no estado

de São Paulo e no bioma da mata atlântica. Ocupando uma área de aproximadamente 753 km2 e

com uma população de 112.000 habitantes (IBGE, 2010), esse município abriga a Basf,

considerado o maior complexo químico da América Latina. As antenarrativas dos fatos

históricos econômicos foram extraídas principalmente do livro de comemoração de 50 anos da

Basf no Brasil intitulado “BASF Guaratinguetá – 50 anos transformando a química da vida”

(2009).

A fundação desse município é atribuída a Jacques Félix, o Moço, fundador de Taubaté,

após a construção da capela de Santo Antônio, em 1630, ao redor da qual viria crescer o

povoamento desse município.

Dada à sua localização, ao longo dos anos, tornou-se caminho e passagem obrigatórios

nas viagens entre São Paulo e Rio de Janeiro. Por conta disso, no início, a economia não era

desenvolvida e estava voltada para o comércio de beira de estrada e para a subsistência. Ainda

na segunda metade do século XVII, as vilas do Vale do Paraíba passaram a abastecer a região

de Cataguases, em Minas Gerais, após a descoberta das minas de ouro, com suprimentos

agrícolas e mão-de-obra.

A partir de 1775, tem início o ciclo da cana-de-açúcar na região, já dentro do modelo de

agricultura de exploração comercial, visando o abastecimento de mercados e a acumulação de

capitais. Com os canaviais e os engenhos, chegaram à região a mão-de-obra escrava, fazendo

surgir as casas grandes e o patriarcalismo rural. Por isso, ainda havia a lavoura de subsistência

para suprir as necessidades da terra e da população da vila. A população começa a crescer

também.

Esse ciclo durou até o princípio do século XIX, quando a produção açucareira do

Nordeste do Brasil sufocou totalmente a da região Sudeste. Começa, então, o segundo ciclo da

cultura do café. Ao contrário da cultura da cana-de-açúcar, que fora cultivada desde o início nas

grandes propriedades, o café fora introduzido pelos pequenos proprietários, gerando grande

prosperidade à região:

A prosperidade trazida pelo café intensifica a entrada de imigrantes vindos de outros

pontos do país e mesmo da Europa. Expande-se a cidade e acentua-se o povoamento

das áreas rurais, em decorrência de novas e concorridas ocupações da terra, com

Page 91: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

90

lavouras se desenvolvendo ao longo de todos os caminhos que saem da cidade.

(IBIDEM, p. 16)

Em função desse grande crescimento, a cafeicultura ocupou os morros, grande parte da

topografia do Vale do Paraíba, substituindo toda a vegetação nativa. Esse ciclo durou

aproximadamente 100 anos e as principais razões para o seu declínio, segundo Lima (2003, p.

35), são a utilização de técnicas inadequadas de plantio e cultivo e o mau uso da terra:

Dentre as técnicas inadequadas, destacou-se o plantio do café em linha reta, de cima

para baixo, e não em curvas de nível. Com isso, o cafeeiro tinha suas raízes capilares

lavadas e expostas ao ar e ao sol pelas águas das chuvas, o que diminuía

consideravelmente a sua produtividade e o seu tempo de vida útil. Além disso, a

enxurrada removia a camada fértil do solo que era depositada nas várzeas ou levada

pelas águas dos rios da região. A inevitável erosão tornava as encostas

imprestáveis e o desmatamento intensivo e as queimadas traziam alterações

climáticas, influenciando na regularidade do regime de chuvas, que toda a

serra anteriormente ostentava e de que o café tanto necessitava. Nenhuma técnica de adubação era empregada, até porque a existência de terras

virgens não estimulava esse esforço. A despeito de já se conhecerem técnicas mais

evoluídas de cultivo e de algumas poucas vozes alertarem, com vigor, sobre esse

conjunto de problemas e as consequências que dele adviriam, a terra era e

continuava sendo explorada sem arte ou ciência.

Este fragmento de antenarrativa mostra bem as consequências do desrespeito à natureza

por parte dos produtores rurais desse período. E se percebe o surgimento dos primeiros

conflitos entre esses dois atores sociais. Nesse período, alguns fazendeiros nem procuraram

entender o problema nem encontrar caminhos para ações de equilíbrio de interesses entre eles e

a natureza. Por exemplo, “a simples manutenção da cobertura vegetal no alto dos morros, por

exemplo, teria ajudado a diminuir esses impactos” (LIMA, 2003). Esses fazendeiros, ao longo

de quase cem anos, vivenciaram um processo de aprendizagem social passiva (GLASSER,

2007), no qual o único interesse que prevaleceu foi o crescimento da economia cafeeira no Vale

do Paraíba, sem levar em conta os impactos na natureza.

Pelo contrário, para a maioria deles, outros fatores contribuíram para o declínio desse

ciclo, conforme os fragmentos de antenarrativas de transcritos do Congresso Agrícola de 1878

(apud LIMA, 2003, p. 36). Poucas vozes entendiam que a natureza é que estava impondo o seu

poder perante os homens, após anos de utilização de técnicas inadequadas de plantio e cultivo e

de mau uso da terra:

Alguns culpavam (pelos tempos difíceis que estavam vivendo) a escassez de mão-de

obra escrava; outros, a incapacidade de utilização de modernos equipamentos de

processamento de café; e outros, ainda, a falta de crédito agrícola a juros baixos. Em

Page 92: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

91

meio às lágrimas, que variavam da autocrítica ao desespero, apenas algumas vozes

chamaram a atenção dos fazendeiros de Vassouras, assim como dos municípios

vizinhos, sobre o estado decadente das terras e dos cafezais.

É um erro imensamente grave supor que nossa baixa produção se origine somente da

falta de trabalho escravo e de crédito. Apenas aqueles que não pensam nem

estudam, apenas aqueles que não seguem nem examinam atenta e intimamente

nosso sistema de explorar a terra sem arte ou ciência, o curso de nossa

agricultura, ciclos meteorológicos e mudanças climáticas por que passou o Brasil

nos últimos 25 anos, apenas esses podem grosseiramente adotar tal posição.

(CONGRESSO AGRÍCOLA, 1878 APUD LIMA, 2003, P. 36).

Segundo o site da WWF Brasil (2012), o desmatamento é uma das causas da degradação

das matas ciliares. O aumento das populações rurais e a prática de sistemas de produção que não

são adaptados às condições locais de clima e solo têm sido fatores responsáveis pela destruição

de vastas extensões de florestas nativas. Alguns produtores também desmatam para que os

igarapés aumentem a produção de água no período de estiagem. Essa realidade deve-se ao fato

de as árvores deixarem de “bombear” água usada na transpiração das plantas. Contudo,

pesquisas mostram que essa prática, com o tempo, tem efeito contrário, pois, com a ausência da

mata ciliar, ocorre um rebaixamento do nível do lençol freático (de água). Outra causa são as

queimadas utilizadas como prática agropecuária para renovação de pastagens ou limpeza da

terra, acarretando o empobrecimento progressivo do solo.

Alguns fazendeiros desse período da história chegavam a dizer: “... fiz as coisas dessa

maneira, deixe que a próxima geração faça como lhe agradar” (STEIN, 1985, apud LIMA,

2003, p.35). Passaram-se 106 anos até que uma nova geração vem reaprendendo uma nova

maneira de compartilhar os interesses entre os proprietários de terras e a natureza e deflagrar

iniciativas, tais como o Programa Mata Viva de recomposição da mata nativa no município de

Guaratinguetá!

Em função desses acontecimentos, a partir de 1880, o contexto social-econômico muda

na região. Ainda na primeira metade do século XX, com a chegada de famílias mineiras

procedentes da Mantiqueira, as velhas propriedades rurais se transformaram em fazendas de

criação. Começa a prática da agropecuária extensiva no município, e em poucas décadas,

Guaratinguetá se torna uma das maiores bacias leiteiras do Brasil. Também se inicia uma fase

de policultura, com a plantação de arroz, milho, feijão, tabaco, cana e, principalmente, cria-se

gado, o que vai determinar a transformação de grande parte dos cafezais em áreas de pastagens.

Infelizmente, as pastagens, que são a vegetação ou o terreno onde animais criados

encontram alimento, também são causas da degradação das matas ciliares, Os proprietários

Page 93: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

92

rurais recorrem a essa opção simples porque a grande umidade das várzeas e da beira de rios

permite melhor desenvolvimento de pastagens na estação da seca (WWF BRASIL, 2012),

Em 1914, a cidade começou seu processo de industrialização, com a fundação da

Fábrica de Cobertores e Companhia de Fiação e Tecidos de Guaratinguetá. Seis anos depois, foi

fundada a União dos Operários Católicos e a Sociedade Operária de Guaratinguetá. A partir da

década de 1950, a atividade industrial cresceu em Guaratinguetá com a abertura da Rodovia

Presidente Dutra. Além das indústrias químicas, destacam-se no município as indústrias dos

setores têxtil, alimentício, de laticínios e de metal-mecânico (BASF GUARATINGUETÁ,

2009; IBGE, 2012).

Em particular, a Basf passa a fazer parte da história desse município quando se instalou

em Guaratinguetá, em 1959, como parte do seu plano de expansão na América Latina, sob a

razão social de Idrongal que, em 1969, é alterada para BASF Brasileira S/A. Segundo Heinz

Mayer, um antigo conselheiro da empresa, essa escolha se baseou em matemática simples: “O

município estava situado a um terço da distância de São Paulo e dos terços do Rio de Janeiro,

polos que formavam o eixo industrial que iria consumir a produção da futura fábrica, a uma

razão de dois terços para São Paulo e um terço para o Rio de Janeiro”. Para tanto, foram

adquiridos terrenos que, até 1980, totalizaram 1,6 milhão de m2 (BASF GUARATINGUETÁ,

2009, p. 31).

Como o abastecimento de água era vital para uma indústria química, esse fato foi

decisivo para que se optasse pelo terreno de Guaratinguetá. Daí, a escolha por terrenos ao longo

dos rios ou de qualquer curso d'água (BASF GUARATINGUETÁ, 2009, p. 31):

Apesar de estreito, nesse trecho, o rio Paraíba oferecia um volume de água suficiente,

resolvendo os problemas de abastecimento e despejo. Para a obtenção de água

potável, seriam perfurados três poços profundos. O terreno maior era o mais

conveniente, porém, não chegava até a margem do rio. Conduziram, então, as

negociações para a compra de uma faixa de 10,6 mil m2 do terreno maior.

Já nos anos 80, com o objetivo de construir a Estação de Tratamento Biológico para

atender ao seu plano de expansão, a Basf adquiriu áreas circunvizinhas, antigas fazendas,

resultando daí, a aquisição de 1 milhão de m2 anexos ao terreno da fábrica. Outras aquisições de

terras ocorreram em 1998 e 2000 (IBIDEM).

Importante ressaltar que se tratavam dos mesmos terrenos fortemente impactados

ambientalmente, conforme discutido acima, por onde passaram as lavouras da cana-de-açúcar,

do café, da policultura e da agropecuária.

Page 94: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

93

Para finalizar a revisitação da história econômica de Guaratinguetá, segundo o

pesquisador Antonio Carlos Pries Devide, um dos organizadores do II Mutirão Agroflorestal:

tecnologias para conciliar agricultura e recuperação ambiental de 2012, o Vale do Paraíba do

Sul é uma das regiões com solos mais desgastados do Brasil, por onde passou o ciclo do café.

Consequentemente, as terras da Floresta Atlântica estão exauridas e fragmentadas, além de

terem sido convertidas em pastagens extensivas ocupando áreas ciliares, morros e encostas

íngremes. Devide explica que, como a Mata Atlântica é a matriz florestal, a situação ganha tons

de desastre ambiental devido à importância desse bioma para o planeta. "Trata-se de uma das

cinco regiões mais ricas em biodiversidade, principalmente para a fauna e a população que

dependem das águas do rio Paraíba do Sul, atualmente assoreado, com diversas ocupações

irregulares e a extração de areia ao longo de sua calha”. (SECRETARIA DE AGRICULTURA

E ABASTECIMENTO, 2012).

A própria Basf reconhece todas as consequências da história econômica de

Guaratinguetá em um dos seus relatórios (RELATÓRIO MATA VIVA, 2005, p. 7) sobre o

histórico do programa de recomposição da mata ciliar do rio Paraíba do Sul:

A região do Vale do Paraíba, em especial as áreas próximas à Serra do Mar e Serra da

Mantiqueira, foram demasiadamente exploradas pelo cultivo da cana-de-açúcar e do

café e, por último, pela pecuária leiteira que, além de adentrarem as áreas com alta

declividade, avançaram até as regiões ribeirinhas, destruindo, com alta velocidade os

recursos naturais renováveis. Dessa forma, hoje, restam poucas áreas de matas

primárias e o meio ambiente se mostra totalmente desequilibrado, retratado

atualmente pelas enormes enchentes, queimadas, erosões, falta d’água, elevadas

temperaturas e alterações nas estações do ano.

Page 95: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

94

5.1.2 Reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura sustentável na

história das causas da devastação das matas ciliares

Esse primeiro elemento de aprendizagem social para uma agricultura sustentável –

entendimento do problema, seu entorno, suas causas e consequências traz à tona a

necessidade dos atores sociais envolvidos nessa primeira história discutir o que querem

aprender, ou seja, como interromper a perda da biodiversidade em uma determinada região.

Aprendizagem essa, cuja importância poucas vozes, conforme discutido acima, conseguiram

compreender, em particular, ao longo do período do ciclo do café.

Em segundo lugar, esse elemento de aprendizagem social para uma agricultura

sustentável envolve a construção de um diálogo inicial da Basf com a realidade local – a

comunidade de fundo do Vale do Paraíba; o restante da comunidade de Guaratinguetá; a

prefeitura municipal de Guaratinguetá; as áreas impactadas ambientalmente de sua

propriedade; as águas do Rio Paraíba – para entender a “dinâmica da floresta natural local, seu

nível de devastação, e definir a priorização das espécies que mais se desenvolvem em condições

de campo”. (RELATÓRIO MATA VIVA (2005, p. 5). O Quadro 6 resume a abordagem da

Basf para entender esse problema ambiental.

Por meio desse elemento, é possível compreender e explicar que o modelo de negócios

dos responsáveis pelas terras, que incorporavam as matas ciliares da região, se valia de práticas

de lavouras e de pecuária executadas de modo extensivo, com mínima técnica e com nenhum

respeito ou preocupação pelo meio ambiente. O impacto ambiental decorrente desse tipo de

modelo de negócios contribuiu para promover a retirada da cobertura vegetal natural e a

exposição do solo aos efeitos das fortes chuvas tropicais. Esse impacto tem por consequência

perdas de solo e de água. A erosão hídrica, processo natural que acontece em escala de tempo

geológica, tende a ser acelerada pela atividade antrópica, a ponto de tornar seus efeitos visíveis

pela formação de ravinas e voçorocas e pelo assoreamento e eutrofização de riachos, rios e

lagos (SBPC; ABC, 2011).

Esse elemento é o ponto de partida para a aprendizagem social para uma agricultura

sustentável na Basf, tanto que, na metodologia da Fundação Espaço Eco para a vertente de

Page 96: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

95

adequação ambiental, que será discutida na experiência na cidade de Bebedouro, a primeira

fase é o diagnóstico da propriedade rural.

Quadro 6: Entendimento do problema, seu entorno, suas causas e suas consequências

Problema

identificado

Problema ambiental envolvendo a devastação das matas ciliares às margens do rio Paraíba

do Sul

Entorno do

problema

Clima: tipo CWA mesotérmico de inverso seco, com verão chuvoso, subtropical úmido,

temperatura média de 22º C no mês mais quente e abaixo de 7º C no mês mais frio(

conforme classificação de Koeppen)

Vegetação: há formação de floresta tropical latifoliada (plantas com folhas grandes), com

baixa densidade de remanescentes da Mata Atlântica, aluviões quaternários e solos aluviais

com baixa saturação de base e alta saturação de alumínio

Causas do

problema

A região do Vale do Paraíba, em especial as áreas próximas à Serra do Mar e à Serra da

Mantiqueira, foram demasiadamente exploradas pelo cultivo da cana-de-açúcar e do café

e, por último, pela pecuária leiteira que, além de adentrarem as áreas com alta declividade,

avançaram até as regiões ribeirinhas, destruindo, com alta velocidade, os recursos naturais

renováveis.

Consequências

Hoje, restam poucas áreas de matas primárias, e o meio ambiente se mostra totalmente

desequilibrado, retratado atualmente pelas enormes enchentes, queimadas, erosões,

falta d’água, elevadas temperaturas e alterações nas estações do ano.

A análise para elaboração do Programa detectou que a área proposta se encontrava

degradada, revegetada por espécies do tipo gramíneas em alguns pontos e espécies

nativas arbóreas isoladas, além de algumas espécies identificadoras de solos altamente

acidificados como sapé, barba de bode e brachiárias.

Fonte: RELATÓRIO MATA VIVA (2005, p. 7); elaboração da pesquisadora

O Quadro 7 mostra um resumo dessas reflexões.

Quadro 7: Resumo das reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura

sustentável na história das causas da devastação das matas ciliares

Vozes

participantes O que foi aprendido? Como aprendeu?

Objetivos do elemento de

aprendizagem social

identificado

A natureza, os

proprietários de

terras (a Basf) e a

comunidade de

Guaratinguetá

Como identificar as causas e

consequências de um

problema ambiental

Como começar a construir

um diálogo com a realidade

local impactada pelo

problema ambiental

A necessidade e importância

de se interromper a perda da

biodiversidade

Entendendo o

problema, seu

entorno, suas

causas e

consequências

Iniciar um diálogo com a

realidade local

Propor soluções viáveis

Reaprender uma nova

maneira de conciliar os

interesses entre natureza e

proprietários de terras

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

Page 97: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

96

5.2 Definindo um conjunto de regras e instrumentos de gestão ambiental – elemento 2 do

processo de aprendizagem social para uma agricultura sustentável no Programa

Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental da Basf

Atores sociais envolvidos: o governo e os produtores de terras em geral

As razões discutidas na primeira história, apesar de necessárias, não foram suficientes para

acarretar o surgimento de um Programa como o Mata Viva. Entre a instalação da Basf em

Guaratinguetá e o início do Programa, passaram-se 25 anos. Por que este hiato de tempo?

Nas antenarrativas ouvidas nas entrevistas, apareceu o fragmento de que o Programa Mata

Viva de Adequação e Educação Ambiental surgiu também para “atender à legislação ambiental

brasileira, na ocasião, o antigo Código Florestal”. Assim, justapondo às razões levantadas ao longo

da história econômica de Guaratinguetá, aparece uma causa que teria força suficiente para obrigar a

Basf a cuidar das matas ciliares do Rio Paraíba do Sul: as leis ambientais brasileiras. Contudo,

nessa narrativa, considera-se essa causa como necessária e não como suficiente, até o início dos

anos 80, isto é, teve que estar presente para o efeito ocorrer, porém, as por si só, também não foi

suficiente para gerar o efeito desejado (BOJE, 2001) – o surgimento de um programa como o Mata

Viva, conforme será discutido a seguir.

Aliás, a legislação brasileira tem uma relação direta e muito forte com o Programa Mata

Viva, que será mostrada ao longo da narrativa dessa grande história da Basf no Brasil. Porque

cumprir com o Código Florestal Brasileiro é um dos grandes objetivos desse Programa hoje. Por

isso, para continuar a narrativa da experiência de Guaratinguetá na recuperação de matas ciliares,

essa segunda história, ao relatar como é a relação entre o Programa Mata Viva de Adequação e

Educação Ambiental e o governo, mostra o segundo elemento do processo de aprendizagem social

para uma agricultura sustentável da Basf: definição de um conjunto de regras e instrumentos de

adoção e gestão de práticas ambientais seguras e com resultados duradouros.

Para contá-la com mais detalhes, conduziu-se uma análise temática das antenarrativas das

leis que instituíram, em particular, o Código Florestal e a Política Nacional do Meio Ambiente,

com o intuito de entender o que está subjacente, além dos limites do tema legislação, ou mesmo em

excesso ou em falta quanto às exigências dessa legislação sobre recuperação e preservação de

matas nativas.

Page 98: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

97

5.2.1 O que diz a legislação ambiental brasileira sobre a proteção de mata nativa? A

relação entre o governo e o Programa Mata Viva de Adequação e Educação

Ambiental

5.2.1.1 O primeiro Código Florestal Brasileiro e as florestas protetoras

Na primeira versão do Código Florestal, instituída pelo Decreto nº 23.793, de 23 de janeiro

de 1934, no art. 1º, as florestas tinham um conceito muito abrangente – incluíam todo tipo de

vegetação – e já eram consideradas naquela época “bens de interesse comum a todos os habitantes

do país”. A Figura 14, em português da época, mostra os dois primeiros artigos.

CAPITULO I

DISPOSIÇÕES GERAES

Art. 1º As florestas existentes no territorio nacional, consideradas em conjuncto, constituem bem de interesse

commum a todos os habitantes, do paiz, exercendo-se os direitos de propriedade com as limitações que as leis em geral, e especialmente este codigo, estabelecem.

Art. 2º Applicam-se os dispositivos deste codigo assim ás florestas como ás demais formas de vegetação,

reconhecidas de utilidade ás terras que revestem.

Figura 14: Artigos 1º e 2º do Decreto no 23.793 (1934)

Nessa versão, os verbos preservar e recuperar e o substantivo preservação não são

utilizados. No lugar deles, está o verbo conservar ou o substantivo conservação. Aparecem 11

vezes. É no artigo 8º, em português da época, que está mais explícita a preocupação com a

conservação das florestas protetoras e as remanescentes: “Consideram-se de conservação perenne,

e são inalienáveis, salvo se o adquirente se obrigar, por si, seus herdeiros e successores, a mantel-as

sob o regimen legal respectivo, as florestas protectoras e as remanescentes”. Em outras palavras, o

foco era proteger e não recuperar áreas já degradadas.

O conceito de florestas protetoras, embora semelhante ao conceito das Áreas de

Preservação Permanente (APPs) do Código atual, não previa as distâncias mínimas para a proteção

dessas áreas. Apesar disso, esse conceito já demonstrara preocupação com o impacto ambiental

Page 99: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

98

decorrente do uso das terras para fins econômicos dentro de propriedades privadas. Além de

protetoras, esse Código classificava as florestas em mais três tipos, a saber:

i) Protetoras: florestas “que, por sua localização, servirem conjunta ou

separadamente para qualquer dos fins seguintes: conservar o regime das aguas;

evitar a erosão das terras pela ação dos agentes naturais; fixar dunas; auxiliar a

defesa das fronteiras, de modo julgado necessário pelas autoridades militares;

assegurar condições de salubridade publica; proteger sítios que por sua beleza

mereçam ser conservados; asilar espécies raras de fauna indígena”.

ii) Remanescentes: florestas que “formarem os parques nacionais, estaduais ou

municipais; florestas em que abundarem ou se cultivarem espécies preciosas,

cuja conservação se considerar necessária por motivo de interesse biológico ou

estético; florestas que o poder público reservar para pequenos parques ou

bosques, de gozo público”.

iii) Modelo: florestas “artificiais, constituídas apenas por uma, ou por limitado

número de essências florestais, indígenas e exóticas, cuja disseminação

convenha fazer-se na região”.

iv) De rendimento: demais florestas não contempladas nas classificações acima,

legalmente destinadas a fins econômicos, sujeitas apenas às restrições de

exploração do próprio Código.

Nessa versão, não havia ainda o conceito de reserva legal (RL). O que mais se aproxima

disso é o que está disposto no art. 23, em português da época: “Nenhum proprietario de terras

cobertas de mattas poderá abater mais de tres quartas partes da vegetação existente, salvo o

disposto nos arts. 24, 31 e 52”. Em outras palavras, 25% das terras estavam destinadas à proteção

ambiental – da fauna e da flora.

Esse Código já atribuía ao governo a responsabilidade pelo controle e fiscalização das áreas

consideradas protetoras, não deixando a cargo dos proprietários privados agirem por conta própria.

Page 100: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

99

Em outras palavras, os proprietários não tinham permissão para agir como lhe conviessem com a

vegetação nativa encontrada em suas propriedades (SOS FLORESTAS, 2012).

Por isso, uma das críticas a esse Código diz respeito ao caráter intervencionista estatal,

mesmo em propriedades privadas, uma vez que eram consideradas “bens de interesse comum a

todos os habitantes do país” (ART. 1º), conforme mostrado nos artigos abaixo, em português da

época:

Art. 11. As florestas de propriedade privada, nos casos do art. 4º, poderão ser, no todo ou

em parte, declaradas protectoras, por decreto do governo federal, em virtude de

representação da repartição competente, ou do conselho florestal, ficando, desde logo,

sujeitas ao regimen deste codigo e á observancia das determinações das autoridades

competentes, especialmente quanto ao replantio, á extensão, á oportunidade e á

intensidade da exploração.

Paragrapho unico. Caberá ao proprietario, em taes casos, a indemnização das perdas e

damnos comprovados, decorrentes do regimen especial a que ficar subordinado.

Art. 12. Desde que reconheça a necessidade ou conveniencia, de considerar floresta

remanescente, nos termos deste codigo, qualquer floresta de propriedade privada,

procederá o governo federal ou local, á sua desapropriação, saIvo se o proprietario

respectivo se obrigar, por si, seus herdeiros e successores, a mantel-a sob o regimen legal

correspondente.

Art. 13. As terras de propriedade privada, cujo florestamento, total ou parcial,

attendendo á sua situação topographica, for julgado necessario pela autoridade florestal,

ouvido o conselho respectivo, poderão ser desapropriadas para esse fim, se o proprietario

não consentir que tal serviço se execute por conta da fazenda publica, ou se o não

realizar elle proprio, de accôrdo com as instrucções da mesma autoridade.

§ 1º Caso o proprietario faça o florestamento, terá direito ás compensações autorizadas

pelas leis vigentes.

§ 2º Em se tratando de terras inexploradas ou inaproveitadas para fins economicos, o

poder publico poderá fazer o florestamento sem desaproprial-as, ficando a floresta

resultante sob o regimen decorrente dos dispositivos deste codigo.

Problemas e dificuldades para operacionalizar e fazer cumprir esse decreto à parte, quando

a Basf iniciou suas operações no Brasil em 1959, os terrenos adquiridos para a construção e

montagem das suas instalações já estavam sob o regime desse Código. Então, por que uma empresa

alemã não se atentara para a recomposição da mata ciliar ainda nos primórdios da inauguração da

sua fábrica no Brasil?

Page 101: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

100

Vale lembrar que esse Código ainda era muito genérico, não estabelecendo, por exemplo, as

distâncias mínimas para a proteção das áreas adquiridas. Além disso, por ocasião da sua chegada ao

Brasil, no final dos anos 50, a Basf era proprietária de um pequeno trecho ao longo da margem

direita do Rio Paraíba do Sul. Outra dificuldade: aparentemente, esse Código foi pouco respeitado

tanto pelo poder público como pela sociedade, apesar do capítulo IV ser dedicado à polícia

florestal, responsável pela fiscalização quanto ao cumprimento da lei, conforme descrito abaixo,

em português da época:

Art. 56. A repartição federal de florestas, coordenará, estimulará e orientará a actividade

dos poderes estadoaes e municipaes, de accôrdo com os conselhos florestaes e as

autoridades locaes competentes, no sentido da fiel observancia deste codigo.

§ 1º A execução das medidas de policia e conservação das florestas, constantes deste

codigo, será mantida em todo o territorio nacional, por delegados, guardas, ou

vigias, do governo da União, nomeados, ou designados, especialmente para esse fim.

§ 2º A guarda dos parques nacionaes e sua conservação e regeneração das florestas

protectoras ou remanescentes, para os effeitos do trato cultural mais adequado, tendo em

vista as necessidades de cada reserva natural ficam especialmente, a cargo, ou sob a

vigilancia da repartição geral de florestas, ou, em casos especiaes, de outros serviços

technicos (Serviço de aguas, Jardim Botanico, museus, escolas agricolas, etc...), e

mesmo, de instituições particulares.

§ 3º Os governos dos Estados e municipios, organizarão os serviços de fiscalização e

guarda das florestas dos seus territorios, na conformidade dos dispositivos

deste codigo e das instrucções geraes das autoridades da União, e cooperação com estas

no sentido de assegurar a fiel observancia das leis florestaes.

§ 4º A fiscalização e a guarda das florestas poderão ficar, exclusivamente a cargo do

Estado, ou do municipio, mediante accôrdo com o governo federal.

Art. 57. As autoridades florestaes procurarão, sempre, obter o auxilio dos serviços

technicos, de instrucções idoneas, do magisterio publico e particular, e mais pessoas

competentes ou aptas a cooperarem na realização dos abjectivos indicados.

Art. 58. O governo federal deverá estabelecer delegacias regionaes nas varias zonas

caracteristicas do paiz, e, pelo menos, uma delegacia em cada municipio.

O relator desta versão do Código Florestal, Luciano Pereira Silva (SWIOKLO, 1990,

p.55), expôs sua indignação:

[...] a inércia, por displicência, das autoridades estaduais e municipais, quando não

resistência passiva e deliberada, encontra sua explicação na mentalidade dominante no

Page 102: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

101

país, incapaz de compreender até hoje que a deflorestação das terras é um mal de

terríveis consequências para as regiões onde é praticado.

Por isso, pode-se conjecturar que essa versão do Código Florestal não fora, por si só,

suficiente para explicar o lançamento de um programa como o Mata Viva, fosse por vontade

própria ou por força da fiscalização.

5.2.1.2 O segundo Código Florestal Brasileiro e as Áreas de Preservação Permanente

O Código Florestal de 1934 foi revogado pela Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965, que

estabeleceu o Código Florestal vigente, que, por sua vez, sofreu diversas alterações pela Lei nº

7.803, de 18 de julho de 1989, após as enchentes do Vale do Itajaí, no estado de Santa Catarina.

Essa nova versão do Código Florestal regulamenta a forma como a terra pode ser explorada,

estabelecendo onde a vegetação nativa tem de ser mantida e onde pode haver diferentes tipos de

produção rural. As florestas existentes no território nacional e as demais formas de vegetação

continuam sendo bens de interesse comum a todos os habitantes do País.

Ao contrário da versão anterior, o verbo conservar não é utilizado e o substantivo

conservação aparece apenas uma vez. Em compensação, o verbo preservar ou o substantivo

preservação são utilizados 16 vezes. A exemplo da versão anterior, aqui o foco ainda não está na

recuperação das áreas degradadas, mas sim na proteção. Tanto que foram estabelecidos

principalmente os conceitos de Reserva Legal (RL) e das Áreas de Preservação Permanente

(APPs), que englobam o conceito de florestas protetoras do Código anterior, bem como as

distâncias mínimas para a proteção dessas áreas. Atualmente, tais pontos são motivos de grandes

discussões por diversos atores sociais, principalmente governos, ONGs, empresas, e produtores

rurais.

Áreas de Preservação Permanente (APPs) são as florestas e demais formas de vegetação

natural cobertas ou não por vegetação nativa, que não podem ser desmatadas, e tem a função

ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade

e o solo, além de assegurar o bem-estar da população, conforme estabelecido no art. 3o:

Page 103: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

102

Art. 3º Consideram-se, ainda, de preservação permanente, quando assim declaradas por

ato do Poder Público, as florestas e demais formas de vegetação natural destinadas: a)

a atenuar a erosão das terras; b) a fixar as dunas; c) a formar faixas de proteção ao

longo de rodovias e ferrovias; d) a auxiliar a defesa do território nacional a critério das

autoridades militares; e) a proteger sítios de excepcional beleza ou de valor científico ou

histórico; f) a asilar exemplares da fauna ou flora ameaçados de extinção; g) a manter o

ambiente necessário à vida das populações silvícolas; h) a assegurar condições de bem-

estar público.

§ 1° A supressão total ou parcial de florestas de preservação permanente só será

admitida com prévia autorização do Poder Executivo Federal, quando for necessária à

execução de obras, planos, atividades ou projetos de utilidade pública ou interesse social.

Tais áreas estão situadas (Art. 2º), já com redação dada Lei nº 7.803, de 18.7.1989:

a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d'água desde o seu nível mais alto em

faixa marginal cujas larguras mínimas variam de 30 (trinta) metros para os

cursos d'água de menos de 10 (dez) metros de largura até 500 (quinhentos)

metros para os cursos d'água que tenham largura superior a 600 (seiscentos)

metros;

b) ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d'água naturais ou artificiais;

c) nas nascentes, ainda que intermitentes e nos chamados "olhos d'água",

qualquer que seja a sua situação topográfica, num raio mínimo de 50

(cinquenta) metros de largura;

d) no topo de morros, montes, montanhas e serras;

e) nas encostas ou partes destas, com declividade superior a 45°, equivalente a

100% na linha de maior declive;

f) nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;

g) nas bordas dos tabuleiros ou chapadas, a partir da linha de ruptura do relevo,

em faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projeções horizontais;

Page 104: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

103

h) em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, qualquer que seja a

vegetação;

i) nas áreas metropolitanas definidas em lei.

No caso da Basf, é importante ressaltar que as ações de preservação deveriam estar

voltadas para os terrenos adquiridos ao longo dos rios ou de qualquer curso d'água – alínea a do

artigo 2º, conforme já discutido acima.

Já reserva legal (RL) refere-se à área de mata nativa que deve ser preservada dentro da

propriedade necessária à proteção da fauna e flora, sendo permitido o manejo sustentável nessas

áreas. Atualmente, deverão ser preservadas 80% da terra em áreas de floresta na região da

Amazônia Legal; 35% em áreas de cerrado; e 20% nos demais biomas.

A fiscalização, de novo, fica a cargo da União, conforme o artigo 22, também alterado pela

Lei nº 7.803, de 18.7.1989: “A União, diretamente, através do órgão executivo específico, ou em

convênio com os Estados e Municípios, fiscalizará a aplicação das normas deste Código, podendo,

para tanto, criar os serviços indispensáveis”.

Em resumo, apesar de essa nova versão do Código Florestal esclarecer melhor os

procedimentos que os proprietários de terras deveriam seguir, aparentemente, não foi suficiente

para que os proprietários a cumprissem. No caso da Basf, passaram-se 18 anos desde a sanção da

Lei nº 4.771, de 15 de setembro de 1965, até a iniciativa de recompor as matas ciliares da margem

direita do Rio Paraíba do Sul.

Hoje, a terceira versão do Código Florestal ainda está em discussão. As principais

diferenças entre o novo Código Florestal e o que está em vigor estão relacionadas à área de terra em

que será permitido o desmate, ao reflorestamento dessa área e à punição para quem já desmatou.

Conforme o novo texto, as propriedades que utilizam topos de morros e encostas, terrenos

conhecidos como Áreas de Preservação Permanente (APPs) – para plantio de maçã, café e uva, por

exemplo, além de pastoreio extensivo –, continuam onde estão localizadas, sem serem

consideradas irregulares. Outras exceções de ocupação de Áreas de Preservação Permanente

(APPs) seriam tratadas em decreto presidencial regulamentando o código após sua aprovação.

Outro ponto que é bastante discutido no novo texto diz respeito às plantações em margens de rios.

Page 105: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

104

Essa discussão está longe de ser finalizada. Infelizmente, ela contribui para postergar, por parte dos

proprietários rurais, a recuperação, melhoria e proteção das áreas degradadas.

Voltando ao Programa Mata Viva, o que talvez possa ter contribuído para o surgimento de

vez dessa iniciativa foi a promulgação de outras leis de proteção ambiental no Brasil mais

rigorosas, como a Política Nacional do Meio Ambiente pela Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981.

Essa causa também considera-se como necessária, isto é, teve que estar presente para que uma

iniciativa como o Programa Mata viva fosse deflagrada. Mas, a exemplo, do Código Florestal, por

si só também não geraria tal iniciativa.

5.2.1.3 A força da Política Nacional do Meio Ambiente

A Lei nº 6.938/81é considerada um marco legal para todas as políticas públicas de meio

ambiente e institui o Sistema Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formação e

aplicação. Mas, ao contrário do Código Florestal, estabelece mecanismos de gestão tanto para os

proprietários de terras como para o poder público.

As principais características dessa política é a instituição de um conjunto de mecanismos de

gestão e controle formado pelos princípios, os instrumentos de aplicação e controle e o sistema

nacional do meio ambiente.

5.2.1.3.1 Princípios da Política Nacional do Meio Ambiente

O objetivo principal dessa lei é compatibilizar o desenvolvimento socioeconômico com a

utilização racional dos recursos ambientais e o respeito ao bem estar da população. Está dividido

em preservação, melhoramento e recuperação do meio ambiente (OLIVEIRA, 2007).

Page 106: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

105

Preservar é procurar manter o estado natural dos recursos naturais impedindo a intervenção

dos seres humanos. Significa perenizar, perpetuar, deixar intocados os recursos ambientais.

Melhorar é fazer com que a qualidade ambiental se torne progressivamente melhor por

meio da intervenção humana, realizando o manejo adequado das espécies animais e vegetais e dos

outros recursos ambientais. É a atribuição ao meio ambiente de condições melhores do que ele

apresenta.

Recuperar é buscar a situação anterior à degradação da área por meio da intervenção

humana, a fim de fazer com que ela volte a ter as características ambientais de antes. A recuperação

é o objetivo mais difícil, em alguns casos até impossível, de ser alcançado, tendo em vista as

características próprias do dano ambiental. Por isso, mais importante do que a punição de um

degradador é a imposição da recuperação do que foi degradado quando isso for possível.

Mas, para isso acontecer, os princípios, ou seja, os objetivos específicos precisam ser

cumpridos. O artigo 2º da Lei 6.938/81 detalha o seu objetivo principal e também os específicos:

Art 2º - A Política Nacional do Meio Ambiente tem por objetivo a preservação, melhoria

e recuperação da qualidade ambiental propícia à vida, visando assegurar, no País,

condições ao desenvolvimento sócio-econômico, aos interesses da segurança nacional e

à proteção da dignidade da vida humana, atendidos os seguintes princípios:

I - ação governamental na manutenção do equilíbrio ecológico, considerando o meio

ambiente como um patrimônio público a ser necessariamente assegurado e protegido,

tendo em vista o uso coletivo;

II - racionalização do uso do solo, do subsolo, da água e do ar;

Ill - planejamento e fiscalização do uso dos recursos ambientais;

IV - proteção dos ecossistemas, com a preservação de áreas representativas;

V - controle e zoneamento das atividades potencial ou efetivamente poluidoras;

VI - incentivos ao estudo e à pesquisa de tecnologias orientadas para o uso racional e a

proteção dos recursos ambientais;

VII - acompanhamento do estado da qualidade ambiental;

VIII - recuperação de áreas degradadas;

IX - proteção de áreas ameaçadas de degradação;

X - educação ambiental a todos os níveis de ensino, inclusive a educação da

comunidade, objetivando capacitá-la para participação ativa na defesa do meio ambiente.

Page 107: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

106

A iniciativa da Basf para recompor as matas ciliares localizadas à margem direita do Rio

Paraíba do Sul atende a vários dispositivos acima. Primeiro, recupera as áreas degradadas em

função do impacto ambiental decorrente do uso dessas terras para fins agrícola e pecuário para

posterior proteção e monitoramento, que inclui implantar melhorias (incisos VIII, IX, IV e VII).

Segundo, procura organizar a atividade econômica da empresa de forma racional, a fim de

obter o máximo de rendimento com um mínimo de impacto ambiental (inciso II). O princípio da

educação ambiental só seria atendido mais tarde, com a evolução da iniciativa. Os demais

princípios ficam por conta do poder público.

5.2.1.3.2 Instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente

A Política Nacional do Meio Ambiente tem 12 instrumentos ou mecanismos de formação e

aplicação para cumprir com os objetivos acima, estabelecidos no artigo 9º, já com alterações feitas

pela Lei nº 7.804, de 1989); Lei nº 11.284, de 2006, e Lei nº 12.651, de 2012, alocados em três

grupos distintos, segundo Silva (1995), mostrados no Quadro 8.

Antunes (2000) acrescenta o Fundo Nacional de Meio Ambiente, criado pela Lei nº

7.797/89, como outro instrumento à Política Nacional do Meio Ambiente, embora não esteja

elencado pela Lei nº 6.938/81, por se tratar de um agente financiador de projetos ambientais.

Para implantar a iniciativa de recompor as matas ciliares localizadas à margem direita do

Rio Paraíba do Sul e evitar as penalidades previstas, a Basf atuou em conjunto com outros atores do

governo para buscar apoio e conhecimento especializados como o IBAMA (Instituto Brasileiro de

Meio Ambiente) e a Prefeitura de Guaratinguetá (IMPRENSA, BASF, 2006). O objetivo foi

desenvolver práticas corretas para restaurar a área degradada e, simultaneamente, atender à

legislação ambiental brasileira dada a complexidade do manejo florestal, segundo o presidente da

Fundação Espaço Eco:

O Brasil é um país que tem uma biodiversidade muito grande. Então, existe uma

forma correta para se fazer restauração. Tem uma tecnologia correta para, vamos

dizer assim, brincar de Deus, de restaurar a natureza. E se isso não for feito da

Page 108: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

107

maneira correta, essa restauração não vai ser perfeita, ela vai ter problemas, ela pode ter

um período de crescimento e depois vai entrar em declínio.

Quadro 8: Instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente

Instrumentos da política nacional do meio ambiente Classificação

do instrumento Descrição

Estabelecimento de padrões de qualidade ambiental

Zoneamento ambiental

Avaliação de impactos ambientais

Licenciamento e a revisão de atividades efetiva ou

potencialmente poluidoras

Incentivos à produção e instalação de equipamentos e a

criação ou absorção de tecnologia, voltados para a melhoria

da qualidade ambiental

Criação de espaços territoriais especialmente protegidos

pelo poder público federal, estadual e municipal, tais como

áreas de proteção ambiental, de relevante interesse

ecológico e reservas extrativistas

Intervenção

ambiental

Mecanismos condicionadores

das condutas e atividades

relacionadas ao meio ambiente

(incisos I, II, III, IV e VI)

Sistema nacional de informações sobre o meio ambiente

Cadastro técnico federal de atividades e instrumento de

defesa ambiental

Penalidades disciplinares ou compensatórias ao não

cumprimento das medidas necessárias à preservação ou

correção da degradação ambiental

Instituição do relatório de qualidade do meio ambiente, a

ser divulgado anualmente pelo Instituto Brasileiro do Meio

Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis –IBAMA

Controle

ambiental

Medidas tomadas pelo poder

público no sentido de verificar se

pessoas públicas ou particulares

se adequaram às normas e

padrões de qualidade ambiental e

que podem ser anteriores,

simultâneas ou posteriores à

ação em questão (incisos VII,

VIII, X e IV)

Penalidades disciplinares ou compensatórias ao não

cumprimento das medidas necessárias à preservação ou

correção da degradação ambiental

Controle

repressivo

Medidas sancionatórias

aplicáveis à pessoa física ou

jurídica (inciso IX).

Instituição do relatório de qualidade do meio ambiente, a

ser divulgado anualmente pelo Instituto Brasileiro do Meio

Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA

Garantia da prestação de informações relativas ao meio

ambiente, obrigando-se o poder público a produzi-las,

quando inexistentes

Cadastro técnico federal de atividades potencialmente

poluidoras e/ou utilizadoras dos recursos ambientais.

Instrumentos econômicos, como concessão florestal,

servidão ambiental, seguro ambiental e outros

Gestão

ambiental

Gestão das ações referentes ao

Meio Ambiente (incisos X, XI e

XII e XIII)

Fonte: Lei nº 7.804 (1989); Lei nº 11.284 (2006) e Lei nº 12.651 (2012); SILVA (1995)

Elaborado e adaptado pela pesquisadora

Page 109: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

108

5.2.1.3.3 O sistema nacional do meio ambiente (SISNAMA)

Além dos princípios e dos instrumentos de formação e aplicação, a Política Nacional do

Meio Ambiente instituiu o Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA), um programa

administrativo de coordenação de políticas públicas de meio ambiente, envolvendo os três níveis

da federação, que tem como objetivo dar concretude à Política Nacional do Meio Ambiente

(FARIAS, 2008).

É constituído pelos órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos

Territórios e dos Municípios, bem como as fundações instituídas pelo Poder Público, responsáveis

pela proteção e melhoria da qualidade ambiental. Esse sistema baseia-se na ideia de

responsabilidades compartilhadas entre os entes das três esferas públicas, além da relação desses

com os diversos setores da sociedade para proteção do meio ambiente.

Pelo menos na lei foram criados espaços de diálogos entre os órgãos e entidades ambientais

dos Municípios, dos Estados, do Distrito Federal e da União. O Quadro 9 mostra a estrutura do

SISNAMA, já com redação dada pela Lei nº 8.028, de 1990).

O objetivo dessa estrutura de implementação da Política Nacional do Meio Ambiente é

operacionalizar e dar efetividade à proteção ambiental. São duas as suas principais funções:

i. implementar a Política Nacional do Meio Ambiente;

ii. estabelecer um conjunto articulado de órgãos, entidades, regras e práticas

responsáveis pela proteção e pela melhoria da qualidade ambiental, garantido a

descentralização da gestão ambiental por meio do compartilhamento entre os

entes federados (União, Estados e Municípios).

Page 110: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

109

Quadro 9: Estrutura do Sistema Nacional do Meio Ambiente (SISNAMA)

Órgãos Participantes Atribuições

Superior Conselho de Governo

Assessorar o Presidente da

República na formulação da política nacional e nas

diretrizes governamentais para o meio ambiente e os

recursos ambientais.

Consultivo e

deliberativo

Conselho Nacional do Meio

Ambiente (CONAMA)

Assessorar, estudar e propor ao Conselho de Governo

diretrizes de políticas governamentais para o meio

ambiente e os recursos naturais.

Deliberar, no âmbito de sua competência, sobre

normas e padrões compatíveis com o meio ambiente

equilibrado e essencial à qualidade de vida.

Reúne diferentes setores da sociedade e tem o caráter

normativo dos instrumentos da política ambiental.

O plenário do CONAMA engloba todos os setores do

governo federal, dos governos Estaduais,

representantes de governos municipais e da

sociedade, incluindo setor produtivo, empresarial, de

trabalhadores e ONGs.

Central

Secretaria Especial do Meio

Ambiente (SEMA) do

Ministério do Interior

Formular, planejar, coordenar, supervisionar e controlar a

política nacional e as diretrizes governamentais para o

meio ambiente.

Executor

Instituto Brasileiro do Meio

Ambiente e dos Recursos

Naturais Renováveis

(IBAMA)

Executar e fazer executar as políticas e diretrizes

governamentais definidas para o meio ambiente

Seccionais

Os órgãos ou entidades

estaduais responsáveis cujas

atividades estejam associadas à

proteção da qualidade

ambiental ou as de

disciplinamento do uso dos

recursos

Elaborar normas supletivas e complementares e

padrões relacionados com o meio ambiente,

observados os que forem estabelecidos pelo

CONAMA

Executar programas, projetos

Controlar e fiscalizar atividades capazes de provocar

a degradação ambiental.

Locais

Órgãos ou entidades

municipais cujas atividades

estejam associadas à proteção

da qualidade ambiental ou as

de disciplinamento do uso dos

recursos

Elaborar normas supletivas e complementares e

padrões relacionados com o meio ambiente,

observadas as normas e os padrões federais e

estaduais

Fonte: Lei nº 6.938/81, elaborado pela pesquisadora

Page 111: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

110

5.2.2 Reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura sustentável na

história da relação entre o governo e o Programa Mata Viva de Adequação e Educação

Ambiental

Conforme discutido acima, as leis ambientais brasileiras, em particular o Código Florestal e

a Política Nacional do Meio Ambiente, formam um conjunto de instrumentos de comando e

controle, também conhecidos como instrumentos regulatórios, pelos quais o poder público

estabelece os padrões e monitora a qualidade ambiental, regulando as atividades e aplicando

sanções e penalidades, via legislação e normas (LEAL, 1997). A principal característica dessa

política de comando e controle é não dar chance de escolha ao responsável pela devastação das

florestas e demais vegetações: ele tem que obedecer a regra imposta, caso contrário, se sujeita a

penalidades em processos judiciais ou administrativos. Ele não tem liberdade para selecionar e

promover os ajustes no tempo que lhe convier.

Assim, aqui está o segundo elemento do processo de aprendizagem social para

sustentabilidade identificado no Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental da

Basf: a definição de um conjunto de regras e instrumentos de gestão ambiental que possa

direcionar e padronizar a adoção de práticas ambientais seguras e com resultados duradouros.

Diante disso, a relação de poder com os proprietários rurais é de coerção – imposição do

governo sobre outros grupos, mesmo que haja ampla discussão do documento final, como ocorreu

com a terceira versão do Código Florestal. O Estado brasileiro tem meios para fazer valer o direito

e coibir práticas que possam degradar o meio ambiente.

Críticas e, novamente, dificuldades e problemas para implementar tais leis à parte, o Brasil

tem princípios constitucionais e infraconstitucionais que assimilam os conceitos de

desenvolvimento ambientalmente sustentável, cabendo às empresas também conhecer e zelar pela

efetividade dos mesmos. Além disso, a Constituição brasileira garante a todos o direito ao meio

ambiente ecologicamente equilibrado e essencial à qualidade de vida. A sua proteção e o combate

a qualquer forma de agressão à natureza, como poluição, desmatamento ou destruição, estão

expressamente estabelecidos como princípios da República brasileira.

O Quadro 10 mostra uma síntese dessas reflexões.

Page 112: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

111

Quadro 10: Resumo das reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura sustentável na

história da relação entre o Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental e o governo

Vozes participantes O que foi aprendido? Como aprendeu?

Objetivos do elemento de

aprendizagem social

identificado

A natureza, os

proprietários de terras

(Basf) e o governo

Os procedimentos

necessários de

preservação do meio

ambiente

De forma coerciva, por

meio de um conjunto de

instrumentos de comando

e controle

Direcionar e padronizar a

adoção de práticas

ambientais seguras e com

resultados duradouros

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

Em resumo, as razões e consequências do crescimento econômico de Guaratinguetá,

somadas às exigências do Código Florestal Brasileiro e da Politica Nacional do Meio Ambiente,

são as causas necessárias para que a iniciativa de recompor as matas ciliares à margem direita do

Rio Paraíba do Sul fosse deflagrada.

Por último, acrescentam-se as contribuições do movimento ambientalista que começou a

ganhar força, principalmente, a partir da década de 50 e se fortaleceu na década de 80 com a

proposição do conceito de ecodesenvolvimento, oriundo da preocupação com a preservação do

meio ambiente, conjugada com a melhoria das condições socioeconômicas da população

(MONTIBELLER, 2004). Além disso, em 1972, ocorreu a Primeira Conferência Mundial sobre o

Homem e o Meio Ambiente, em Estocolmo, Suécia, na qual foram instituídos o Programa das

Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) e a data de 5 de junho como o Dia Mundial do

Meio Ambiente. Em 1972, também foi divulgado o documento intitulado “Os Limites do

Crescimento”, do Clube de Roma – uma associação informal de personalidades da política,

negócios e ciência. Seu conteúdo trata de questões para o desenvolvimento e o futuro da

humanidade, tais como energia, poluição, saneamento, saúde, ambiente, tecnologia e crescimento

populacional (Globo Ecologia, 2012).

Somadas, essas causas levaram à Basf a iniciar a recuperação das matas ciliares em suas

propriedades no município de Guaratinguetá, em 1984, conforme uma das antenarrativas lidas em

um dos relatórios da organização (RELATÓRIO MATA VIVA, 2005, p.7): “Em função da

crescente conscientização sobre a importância da preservação ambiental e do avanço das leis que

disciplinam a ação humana nas florestas, um alto interesse foi despertado na sociedade para a

adoção de projetos de revegetação em áreas degradadas”.

Page 113: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

112

Até aqui, foram contadas as histórias das razões da devastação das matas ciliares no Vale do

Paraíba e da relação entre o governo (o que diz o Código Florestal Brasileiro sobre a proteção de

mata nativa) e o Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental.

Passemos agora à história da recuperação das matas ciliares no Vale do Paraíba.

Page 114: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

113

5.3 Desenvolvendo competências de recuperação de matas ciliares – elemento 3 do

processo de aprendizagem social para uma agricultura sustentável no Programa

Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental da Basf

Atores sociais envolvidos: a natureza (o ambiente natural), a Basf (proprietária das terras)

e o governo – a Prefeitura Municipal de Guaratinguetá, na esfera municipal, e o IBAMA

(Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), na esfera

federal

Essa terceira história, ao relatar como foi feita a recuperação das matas ciliares na região do

Vale do Paraíba, mostra também o terceiro elemento do processo de aprendizagem social para uma

agricultura sustentável no Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental da Basf:

desenvolvimento de competências de recuperação de matas ciliares.

Para contá-la, é conduzida uma análise de trama, de enredo a partir da identificação de

relações pertinentes entre as diversas antenarrativas fragmentadas ouvidas e lidas de vários eventos

ocorridos para recompor as matas ciliares às margens do Rio Paraíba.

5.3.1 A recuperação das matas ciliares no Vale do Paraíba

Entendido o problema, conforme discutido acima, em 1984, a Basf deflagrou a iniciativa

denominada Programa de recomposição da mata ciliar do Rio Paraíba do Sul. Esse objetivo

geral é desdobrado em cinco específicos (vide Quadro 11), que vão desde a recuperação da

vegetação, propriamente dita, até a contribuição para uma maior consciência ambiental por parte

de alunos da rede de ensino. Ao analisar esses propósitos, é possível dizer que os objetivos (1) e (2)

estão voltados ao desenvolvimento de conhecimento e habilidades de restauração de mata nativa,

enquanto os objetivos (3), (4) e (5) estão mais orientados à mudança de atitude por parte da

comunidade em geral.

Page 115: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

114

Quadro 11: Objetivos específicos do Programa de recomposição da mata ciliar do Rio Paraíba do Sul

Objetivo geral Recompor a mata ciliar do Rio Paraíba do Sul

Objetivos

específicos

1. Reflorestar, gradativamente, 128 hectares de mata até dezembro de 2003

2. Formar uma área demonstrativa, como modelo de plantio, para recuperação de matas

ciliares

3. Incentivar o desenvolvimento de modelos de reflorestamento e motivar a execução de

iniciativas semelhantes, utilizando espécies de fácil disseminação e repovoamento da área

4. Servir de exemplo para a sensibilização da população quanto à importância e eficácia do uso

de espécies florestais para recomposição de matas ciliares

5. Contribuir para a conscientização ambiental por meio de visitas à área, por estudantes de

diversos níveis escolares

Fonte: RELATÓRIO MATA VIVA (2005, p. 6)

Para esses objetivos serem cumpridos, essa iniciativa foi deflagrada em conjunto com a

Prefeitura Municipal de Guaratinguetá, em particular com a Secretaria Municipal de Serviços

Urbanos e Agricultura. Posteriormente, passou a contar também com a colaboração do IBAMA.

Assim, a abrangência do Programa foi ampliada para propriedades públicas em Guaratinguetá e

para as propriedades situadas nas cidades do Vale do Paraíba atendidas pelo IBAMA de Lorena

(RELATÓRIO MATA VIVA, 2005). O objetivo da formação dessa parceria foi desenvolver

práticas corretas para restaurar a área degradada e, simultaneamente, atender à legislação ambiental

brasileira, dada a complexidade do manejo florestal.

Esses parceiros disponibilizaram assessoria técnica e mão-de-obra para a produção de

mudas, enquanto a Basf forneceu todos os insumos e materiais necessários à implementação das

ações previstas. O Quadro 12 mostra as atribuições de cada parceiro nessa iniciativa.

Metade da produção de mudas foi destinada ao reflorestamento da propriedade da Basf às

margens do Rio Paraíba e a outra metade distribuída à comunidade de Guaratinguetá pela

Prefeitura Municipal. O IBAMA assumiu a produção de mudas em setembro de 2002 e, como

contrapartida, fica com a metade das mudas produzidas para distribuição à comunidade do fundo

do Vale do Paraíba (RELATÓRIO MATA VIVA, 2005).

Page 116: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

115

Quadro 12: Atribuições dos parceiros do Programa de recomposição da mata ciliar do Rio Paraíba do Sul

BASF PREFEITURA MUNICIPAL DE

GUARATINGUETÁ IBAMA

Disponibilizar a área para o

reflorestamento

Fornecer:

― os insumos para cultivo de

mudas

― o transporte das mudas do

viveiro para a área de

plantio

― mão-de-obra para a

produção (a partir da 3ª

fase do Programa), plantio

e manutenção das mudas

Elaborar o programa técnico de

recomposição da mata ciliar

Orientar e fazer o acompanhamento

técnico na implantação e manutenção

do Programa em todas as fases

Prover assessoria técnica

Fornecer:

― mão-de-obra para a produção de

mudas na 2ª fase do Programa

― local (o viveiro) para a produção e

acondicionamento das mudas na

2ª fase do Programa

Planejar e gerenciar todo o

processo de produção de

mudas na 3ª fase do

Programa

Fornecer o local (Viveiro da

Flona de Lorena) para

produção e

acondicionamento das

mudas

Fonte: RELATÓRIO MATA VIVA (2005, p. 12); adaptação da pesquisadora

Além do diagnóstico, o Programa tem mais três etapas: a elaboração do programa técnico, o

plantio das mudas e a manutenção e o monitoramento da área restaurada. A etapa do plantio, em

particular, contempla 13 atividades, mostradas no Quadro 13.

Por conta disso, o cronograma físico, obrigatoriamente, teve que ser diretamente correlacionado

com as épocas propícias à execução das atividades para que “essas técnicas não entrassem em

choque com a legislação em vigor, nem fossem comprometidas pela existência de condições

adversas” (IBIDEM, p. 8). A etapa do plantio foi dividida em três fases, totalizando o plantio de

186 mil mudas, a saber:

1ª fase: plantio de cerca de 100 mil mudas até 2000

2ª fase: plantio de cerca de 43 mil mudas até 2001

3ª fase: plantio de cerca de 43 mil mudas até 2003

O plantio das mudas foi realizado com cerca de 100 espécies diferentes, formando uma área

heterogênea, onde são observados o desenvolvimento, comportamento e a atratividade da flora e da

fauna. Aroeira vermelha, bico de pato, crindiúva, capixinguí, cedro rosa, embaúba, figueira branca

e ingá comum são exemplos de espécies de árvores típicas da mata brasileira que foram replantadas

(IMPRENSA, BASF, 2006). A Basf explica por que optou por esse modelo de plantio:

Page 117: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

116

As espécies escolhidas ocorrem no interior da floresta primária e apresentam caráter

pioneiro e secundário quanto ao crescimento. Diante do exposto e com base em

pesquisas junto às universidades, optou-se pelo plantio de espécies regionais pioneiras

(70%) e secundárias iniciais e tardias (305), aplicando a técnica da introdução das

clímax, após o desenvolvimento dessas ou regeneração natural, em consequência dos

maciços vegetais próximos. (RELATÓRIO MATA VIVA, 2005, p. 13).

Quadro 13: Atividades da etapa de plantio do Programa de recomposição da mata ciliar do Rio Paraíba do

Sul

1. Isolamento da área.

2. Roçada mecanizada prévia: poupando qualquer tipo de vegetação arbórea em desenvolvimento e deixando no

local os restos da vegetação roçada como cobertura morta.

3. Observação e combate às formigas cortadeiras: com a aplicação de formicidas de preferência granulados,

operação que deve ser repetida sempre que for notada a presença desses insetos no local.

4. Sulcamento mecanizado: a abertura deve ser feita em nível por processo mecanizado, com profundidade

aproximada de 50 cm distanciados a cada 3 metros.

5. Alinhamento de marcação: a marcação deve obedecer ao espaçamento de 3m x 2m no sistema de quincôncio

(plantação de espécies dispostas em xadrez, uma em cada canto e uma ao centro), obedecendo às curvas de nível,

o que representa aproximadamente 1.666 mudas por hectare. A marcação pode ser feita com a colocação de 50g

de calcário sobre o local que será o berço para as mudas dentro dos sulcos de plantio.

6. Adubação de plantio: deposição de adubo mineral na proporção de 150 gramas por cova, conforme as

necessidades demonstradas nas análises de solo, pouco antes ou simultaneamente, de forma que não haja contato

direto com a raiz do plantio.

7. Distribuição de mudas e plantio: operação que consiste em transportar as mudas, depositá-las nas bordas dos

berços, previamente preparados, e plantá-las. Após a distribuição, o plantio é feito retirando-se o recipiente (que

deve ser deslocado com pequenas batidas na borda do tubete) até o desprendimento da muda, procurando evitar o

desmoronamento.

8. Coroamento: deve ser realizado em 30 e 40 dias após o plantio, removendo a vegetação existente ao redor das

mudas num diâmetro de 0,80m. Esta operação deve ser realizada com a utilização de enxadas. No caso de

infestação de ervas de porte alto, pode ser necessária a execução de uma nova roçada de conservação.

9. Adubação de cobertura: decorridos de 90 a 180 dias depois do plantio, é necessária a aplicação de fertilizante

químico ao redor de cada muda, cujo sulco deve ser aberto com profundidade de 0,1metros, para que haja melhor

aproveitamento do adubo lançado.

10. Replantio: reposição das mudas que morreram por outras de mesma espécie.

11. Novo combate às formigas cortadeiras: a cada 3 meses, durante os dois primeiros anos e a cada 6 meses nos

próximos anos.

12. Coroamento de conservação: a cada 6 meses, nos dois primeiros anos, removendo a vegetação existente ao

redor das mudas, cobrindo um diâmetro de 1 metro.

13. Roçada mecanizada de conservação: a cada 6 meses nos dois primeiros anos, poupando qualquer tipo de

vegetação arbórea em desenvolvimento.

Fonte: RELATÓRIO MATA VIVA (2005, p. 14-16)

Passados 29 anos, além da recomposição total da área degradada, já é possível identificar

também o aumento de diversas espécies de animais, que encontraram na mata um ambiente

Page 118: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

117

adequado para a vida e procriação, como o repovoamento da área por répteis, aves e mamíferos de

pequeno porte, além da manutenção do hábitat das garças brancas, aves-símbolo do município

(BASF GUARATINGUETÁ, 2009). A Figura 15 mostra uma parte da área recuperada por essa

iniciativa. De maneira geral, nenhum problema grave foi detectado nas técnicas de plantio ou

durante o processo de crescimento (RELATÓRIO MATA VIVA, 2005).

Figura 15: Área recuperada pelo Programa de recomposição da mata ciliar do Rio Paraíba do Sul

– Guaratinguetá – SP

Fonte: Fonte: Relatório Anual Basf (2007)

A BASF conta que foi além da exigência legal, recuperando em média 300 metros de mata

ciliar do Rio Paraíba do Sul. Lembrando que o Código Florestal (Lei Federal 4.771, de 1965) exige

que os proprietários rurais façam a recomposição da mata ciliar em suas propriedades com uma

largura mínima de 50 metros para cursos d'água que tenham de 10 a 50 metros de largura de mata e

de 100 metros para aqueles que tenham de 50 a 200 metros de largura de mata. “O nosso sonho, ao

longo dos anos, tem sido o de construir aqui uma floresta. E estamos conseguindo. Agora, as

futuras gerações terão a oportunidade de aprender cada vez mais com a natureza”, comemora o

responsável pelo Mata Viva no município de Guaratinguetá, (IMPRENSA, BASF, 2006).

Page 119: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

118

5.3.2 Reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura sustentável na

história de recuperação das matas ciliares no Vale do Paraíba

Os resultados discutidos acima mostram que a Basf, por meio dessa iniciativa, atende às

recomendações técnicas da legislação ambiental brasileira; promove a recuperação ambiental

abrangendo solo, fauna, flora, sistema hídrico etc.; aumenta o percentual de floresta nativa na área

urbana; recompõe áreas degradadas suscetíveis à erosão; estabiliza as encostas, evitando erosões e

deslizamentos, diminuindo a ocorrência de assoreamento e o comprometimento dos recursos

hídricos; aumenta a extensão e a qualidade das áreas reflorestadas (RELATÓRIO MATA VIVA,

2005). Além disso, a área da mata ciliar recuperada foi transformada em sala de aula e, desde 2004,

passou a receber estudantes e professores. E, em 2005, essa iniciativa foi decisiva para a criação do

Programa Semente do Amanhã, que inseriu a educação ambiental no currículo escolar da rede

municipal de ensino de Guaratinguetá (SP). Para tanto, foram capacitados de cerca de 500

educadores/ano, beneficiando cerca de 7 mil estudantes nas primeiras séries do ensino fundamental

(IMPRENSA, BASF, 2006). Outro resultado importante, é que a metade das mudas, previstas

inicialmente para serem distribuídas à comunidade local, “foi enviada às propriedades rurais para a

recuperação das áreas degradadas, matas ciliares e nascentes beneficiando cerca de 160 produtores

rurais em Guaratinguetá”. (RELATÓRIO MATA VIVA, 2005, p. 19).

Por conseguinte, um aprendizado oriundo dessa iniciativa foi o desenvolvimento de um

corpo de conhecimento, de habilidades e de atitudes, ou seja, de competências de restauração

de matas ciliares pelos funcionários da Basf, que permitiu a transformação de uma realidade

local, antes degradada, agora reintegrada à paisagem urbana da região. Os resultados de inserção

do Programa no curriculum escolar e o envolvimento de proprietários rurais da região mostram que

os objetivos específicos mostrados no Quadro 11, foram cumpridos. Em outras palavras, o

Programa serviu como exemplo para motivar a execução de iniciativas semelhantes, utilizando

espécies de fácil disseminação, e sensibilizar a comunidade de Guaratinguetá, além de recuperar

uma área devastada pela ação do homem.

Contudo, esse aprendizado só foi possível em função de outro elemento de aprendizagem

social: a formação de parcerias estratégicas e robustas que, nessa história, assumem o papel de

provedoras de metodologias e ferramentas na aprendizagem social para uma agricultura

Page 120: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

119

sustentável. Nessa narrativa, elas conseguem agregar valor ao ambiente natural ao fornecer novas

técnicas e metodologias aos funcionários da Basf, por meio da transferência de conhecimento

especializado. Nesse Programa, esse papel cabe aos órgãos públicos por conta da especialização

em determinada prática, como a Prefeitura Municipal de Guaratinguetá e o IBAMA, cuja expertise

é a restauração vegetal.

O Quadro 14 mostra um resumo dessas reflexões.

Quadro 14: Resumo das reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura sustentável na

história da recuperação das matas ciliares no Vale do Paraíba

Vozes participantes O que foi aprendido? Como aprendeu?

Objetivos do elemento de

aprendizagem social

identificado

A natureza, os

proprietários de terras

(Basf) e o governo

(Prefeitura Municipal de

Guaratinguetá, IBAMA)

Como atender as

exigências da legislação

ambiental brasileira

Como recuperar matas

ciliares em áreas

degradadas

Como incentivar o

desenvolvimento de

modelos de

reflorestamento e

motivar a execução de

iniciativas semelhantes,

utilizando espécies de

fácil disseminação e

repovoamento da área

Desenvolvendo

competências –

conhecimento,

habilidades e atitudes

Formando parcerias

estratégicas e robustas

Resolver um problema

ambiental

Ter acesso ao

conhecimento

especializado

Compartilhar o

conhecimento gerado

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

Sumarizando, até aqui, contei a narrativa da experiência do complexo industrial da Basf em

Guaratinguetá na recuperação de matas ciliares. Essa narrativa é composta por três histórias. A

primeira relatou como surgiu esse problema ambiental nesse município. A segunda contou o

que levou a Basf a implementar essa iniciativa e a terceira, como foi feita a recuperação das matas

ciliares às margens do Rio Paraíba do Sul. Cada uma dessas histórias apresentou elementos do

processo de aprendizagem social para uma agricultura sustentável no Programa Mata Viva de

Adequação e Educação Ambiental da Basf, cujo resumo está mostrado no Quadro 15 abaixo.

Page 121: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

120

Quadro 15: Resumo das reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura sustentável na narrativa da

relação entre a experiência do complexo industrial da Basf em Guaratinguetá na recuperação de matas ciliares e o Programa

Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental

História contada Vozes participantes O que foi aprendido? Como aprendeu?

Objetivos do elemento de

aprendizagem social

identificado

As razões da devastação das

matas ciliares no Vale do

Paraíba

A natureza, os

proprietários de terras

(a Basf) e a comunidade

de Guaratinguetá

Como identificar as causas e

consequências de um problema

ambiental

Como começar a construir um

diálogo com a realidade local

impactada pelo problema ambiental

A necessidade e importância de se

interromper a perda da

biodiversidade

Entendendo o problema,

seu entorno, suas causas e

suas consequências

Iniciar um diálogo com a

realidade local

Propor soluções viáveis

Reaprender uma nova

maneira de conciliar os

interesses entre natureza e

proprietários de terras

O que diz o Código Florestal

Brasileiro sobre a proteção

de mata nativa? A relação

entre o Programa Mata Viva

de Adequação e Educação

Ambiental e o governo

A natureza, Os

proprietários de terras

(Basf) e o governo

federal

Os procedimentos necessários de

preservação do meio ambiente

De forma coerciva, por

meio de um conjunto de

instrumentos de comando e

controle

Direcionar e padronizar a

adoção de práticas ambientais

seguras e com resultados

duradouros

A recuperação das matas

ciliares no Vale do Paraíba

A natureza, os

proprietários de terras

(Basf) e o governo –

Federal e municipal –

(Prefeitura Municipal

de Guaratinguetá,

IBAMA)

Como atender as exigências da

legislação ambiental brasileira

Como recuperar matas ciliares em

áreas degradadas

Como incentivar o desenvolvimento

de modelos de reflorestamento e

motivar a execução de iniciativas

semelhantes, utilizando espécies de

fácil disseminação e repovoamento

da área

Desenvolvendo

competências –

conhecimento,

habilidades e atitudes

Formando parcerias

estratégicas e robustas

Resolver um problema

ambiental

Ter acesso ao conhecimento

especializado

Compartilhar o conhecimento

gerado

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

Page 122: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

121

Mais tarde, em 2007, a Basf decidiu expandir essa iniciativa bem-sucedida para além dos

limites de Guaratinguetá e estendê-la aos clientes da Unidade de Proteção de Cultivos.

O que levou a Basf a essa decisão? Eis a história das relações entre Unidade de Proteção de

Cultivos da Basf Agro e o Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental.

Page 123: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

122

6 A CONTRIBUIÇÃO DA BASF PARA A SUSTENTABILIDADE NA

AGRICULTURA – AS RELAÇÕES ENTRE A UNIDADE DE PROTEÇÃO DE

CULTIVOS DA BASF AGRO E O PROGRAMA MATA VIVA DE ADEQUAÇÃO

E EDUCAÇÃO AMBIENTAL

A sustentabilidade já é uma exigência nas produções agrícolas voltadas para exportação.

No mercado nacional ela também passa a ser condição de sucesso e por isso torna-se

cada vez mais importante assegurar a disponibilidade de alimentos para a população

buscando minimizar impactos ao meio ambiente. Esse é o grande desafio da agricultura

moderna e um dos objetivos do Programa de Adequação Ambiental, uma extensão do

Programa Compromisso Cooperar, de relacionamento da BASF com algumas

cooperativas do setor agrícola [...]. (BASF IMPRENSA, 2007)

A antenarrativa acima é oficial e é divulgada e contada de forma diferenciada em diversos

meios de comunicação da Basf, além de estar presente nas falas dos seus funcionários e clientes da

vertente de adequação ambiental do Programa. Por isso, é importante contar a narrativa das

relações entre a Unidade de Proteção de Cultivos da Basf Agro e o Programa Mata Viva de

Adequação e Educação Ambiental.

Essa narrativa é composta por duas histórias que mostram como a Unidade de Proteção de

Cultivos da Basf Agro conseguiu lidar com a dialética entre a busca pelo retorno sobre os

investimentos para os acionistas e a busca pelos benefícios para os seus outros públicos de

interesse. Essas histórias também apresentam mais um elemento do processo de aprendizagem

social para uma agricultura sustentável no Programa Mata Viva de Adequação e Educação

Ambiental da Basf: a definição de uma estratégia de desenvolvimento de negócios

sustentáveis.

Para contá-las, é conduzida uma análise temática para identificar o que está subjacente nas

antenarrativas lidas e ouvidas acerca do significado que essa Unidade de Negócios atribui à

sustentabilidade e da estratégia de desenvolvimento de negócios sustentáveis elaborada por essa

Unidade. O objetivo é entender como essa Unidade conseguiu conectar esse significado com a

experiência bem-sucedida de recuperação de matas ciliares no município de Guaratinguetá e,

consequentemente, estendê-la aos seus clientes.

Eis as histórias.

Page 124: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

123

6.1 O significado atribuído pela Unidade de Proteção de Cultivos da Basf Agro à

sustentabilidade

Atores sociais envolvidos: a natureza (o ambiente natural), a Unidade de Proteção de

Cultivos da Basf Agro, a Organização das Nações Unidas, a Organização das Nações

Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) e as cooperativas

Relembrando, a Unidade de Proteção de Cultivos – Basf Agro é uma das líderes em

soluções para agricultura como defensivos agrícolas e uma forte parceira no fornecimento de

fungicidas, inseticidas e herbicidas inovadores. Seus principais clientes são os produtores rurais,

embora seus produtos também sejam utilizados em saúde pública, controle de pragas estruturais e

urbanas, plantas ornamentais e gramados, controle de vegetação e silvicultura. Em 2011, suas

vendas totalizaram 4,1 bilhões de euros (BASF IMPRENSA, 2012) e um dos seus objetivos “é

atender as necessidades dos agricultores brasileiros ajudando-os a produzir mais e melhor” (BASF

AGRO, 2012).

Como o maior temor dos agricultores rurais é o acometimento em suas propriedades por

pragas e doenças, é interessante notar, ao olhar para as experiências passadas, que a Unidade de

Proteção de Cultivos, sempre esteve voltada para a pesquisa e desenvolvimento de inovações

tecnológicas de modo a minimizar as perdas e aumentar o rendimento das colheitas. Em outras

palavras, essa Unidade sempre esteve comprometida com a terra, contribuindo para mantê-la

saudável (BASF AGRO, 2012). Esse é e sempre foi o core business dessa Unidade de Negócios.

Desta feita, para essa Unidade, o significado de sustentabilidade consiste em dar alguma

definição para parte da sua cadeia de valor no sentido do cliente final (sentido jusante ou

downstream), baseando a construção da sua identidade de sustentabilidade na agregação de valor

para a colheita do produtor rural.

Assim, essa Unidade entende que uma produção agrícola sustentável ou sustentabilidade na

agricultura significa "maior valor para a colheita", ou seja, (AgBALANCE BASF, 2012):

Ter ganhos de produtividade sem danificar o meio ambiente – impacto

ambiental;

Page 125: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

124

Ter eficiência em custos e rentabilidade – impacto econômico;

Ter alinhamento com a sociedade – impacto social.

Logo, para essa Unidade a essência da agricultura sustentável é: “equilibrar o impacto

social, econômico e ambiental garantindo uma maior contribuição para a humanidade e para o

ecossistema hoje e no futuro”. (IBIDEM). Mas, como operacionalizar esses três intentos de

sustentabilidade na agricultura?

Para valorizar o agricultor rural, seu principal cliente, essa Unidade lançou mão das

referências (ou pistas) extraídas do seu ambiente para conectar as informações sobre agricultor e

sustentabilidade. O intuito dessa ação foi aproximar agricultor e sociedade e esclarecer a

contribuição do agronegócio para o desenvolvimento socioeconômico do Brasil.

A principal referência utilizada pela Basf Agro foram as preocupações da Organização das

Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO) com a redução da fome e a promoção de

uma produção agrícola sustentável. Criada em 1945, reúne 191 países membros, além da

Comunidade Europeia para negociar acordos, debater políticas e impulsionar iniciativas

estratégicas referentes aos esforços internacionais de erradicação da fome e da insegurança

alimentar.

Seu compromisso é: “combater a fome e a pobreza, promover o desenvolvimento agrícola,

a melhoria da nutrição, a busca da segurança alimentar e o acesso de todas as pessoas, em todos os

momentos, aos alimentos necessários para uma vida saudável”. Para tanto, trabalha para “reforçar a

agricultura e o desenvolvimento sustentável, como estratégia de longo prazo, para aumentar a

produção e o acesso de todos aos alimentos, ao mesmo tempo em que preserva os recursos

naturais”. Também “ajuda os países a aperfeiçoar e modernizar suas atividades agrícolas, florestais

e pesqueiras, para assegurar uma boa nutrição a todos e o desenvolvimento agrícola e rural

sustentável”. (FAO, 2009).

Tomando como referências os dados de que até 2050 a população global deverá aumentar

cerca de 70%, de acordo com as estimativas das Nações Unidas (WBCSD, 2009) e que alimentar 9

bilhões de pessoas em 2050 de forma sustentável ainda é um desafio, a empresa se propõe a

enfrentar o desafio de equilibrar a demanda e a produção sustentável (AgBALANCE, BASF).

Contudo, a expansão de terras disponíveis para cultivo tem limites e é pequena em

comparação com o crescimento da população. Sem contar, que há restrições para tal. Desertos não

Page 126: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

125

são apropriados para o cultivo e outras áreas são utilizadas pelo homem na construção de

infraestrutura, como estradas.

Uma das respostas encontrada e, que se tornou um dos objetivos estratégicos da Basf Agro,

é a busca pelo equilíbrio entre a produção e a biodiversidade (AGRO BASF, 2012). De fato, um

dos maiores desafios enfrentados pela agricultura hoje é como equilibrar o aumento da demanda

por alimentos com a necessidade de manter a diversidade, agora e no futuro. (RELATÓRIO BASF

– BIODIVERSITY AND AGRICULTURE, 2010).

Biodiversidade (biodiversity) ou diversidade biológica (biological diversity) é a

variabilidade e a variedade entre os organismos vivos de todas as origens, incluindo, entre outras

coisas, ecossistemas aquáticos, terrestres e marítimos e os complexos ecológicos dos quais eles

fazem parte: isso inclui diversidade com espécies, entre espécies e dos ecossistemas. Ou seja,

refere-se a todos os aspectos do mundo vivo na natureza: genes, espécies e ecossistemas (UNCED,

1992).

De uma maneira geral, agricultura e biodiversidade estão conectadas em três áreas. A

primeira é a biodiversidade funcional, que é a contribuição dos organismos do solo, insetos,

bactérias, plantas e fungos para a agricultura. Juntos, eles fornecem fertilidade ao solo e impedem a

perda orgânica. E uma vegetação forte é defesa contra a erosão, insetos predatórios. A segunda área

é a agrobiodiversidade ou biodiversidade na agricultura que inclui todos os componentes

relevantes da diversidade biológica para a alimentação e agricultura e do agroecosistema:

variedade e variabilidade de animais, plantas e micro organismos nos níveis de ecossistema,

espécies e genéticos. A terceira área envolve as questões e ações de conservação da natureza de

maneira geral, entre elas, o Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental da Basf

(RELATÓRIO BASF – BIODIVERSITY AND AGRICULTURE, 2010).

De acordo com o site da Basf Agro em inglês (2012): os proprietários agrícolas que

trabalham na linha de frente com a natureza e com o meio ambiente estão mais do que atentos que

a proteção dos ecossistemas trará benefícios não somente para eles, mas para todos, no longo prazo.

Por isso, interromper a perda de biodiversidade é uma das suas tarefas mais importantes.

Diante do exposto, o significado de agricultura sustentável atribuído pela Unidade de

Proteção de Cultivos à sustentabilidade é considerado como uma causa necessária para a tomada de

decisão de estender o Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental aos clientes da

Unidade de Proteção de Cultivos. É necessária porque deve estar presente para o efeito ocorrer

Page 127: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

126

(BOJE, 2001), porque, apesar de ter conseguido conectar essa Unidade de Negócios à

sustentabilidade, por si só, não produziu o efeito esperado, ou seja, a extensão desse Programa aos

clientes.

6.2 Definindo uma estratégia de desenvolvimento de negócios sustentáveis

Atores sociais envolvidos: a natureza (o ambiente natural), a Unidade de Proteção de

Cultivos da Basf Agro e as cooperativas

Dado o significado de agricultura sustentável atribuído pela Unidade de Proteção de

Cultivos da Basf Agro à sustentabilidade, somado à experiência in-house bem-sucedida na

recuperação de matas ciliares, o Programa de recomposição da mata ciliar do Rio Paraíba do Sul

passou a integrar o projeto Compromisso Cooperar – Programa de Relacionamento de Gestão de

Clientes – dessa Unidade de Negócios. Esse projeto é direcionado às cooperativas que estão

alinhadas às diretrizes da empresa e visa beneficiar agricultores do Brasil com apoio e orientação

de restauração de matas ciliares em propriedades agrícolas (BASF IMPRENSA, 2010).

Com essa decisão, a Unidade de Proteção de Cultivos da Basf Agro caminha para conciliar

os interesses dos seus negócios – fidelizar os grandes clientes, como as Cooperativas – e apoiá-las

no desenvolvimento de negócios sustentáveis, ou seja, viáveis economicamente e consoantes

principalmente com as demandas ambientais e sociais da sustentabilidade. “A BASF fez sua lição

de casa e o objetivo agora é levar este conhecimento e experiência adquiridos dentro da empresa

para as cooperativas”, conta o gerente de vendas de Produtos para Agricultura da BASF (BASF

IMPRENSA, 2007). Essa iniciativa faz parte da “Matriz de Sustentabilidade” da Basf na América

do Sul, na categoria de negócios sustentáveis (BASF IMPRENSA, 2009)

Os recursos financeiros são oriundos do projeto Compromisso Cooperar Programa de

Relacionamento de Gestão de Clientes, que por sua vez, se fundamenta na reciprocidade entre a

Unidade de Proteção de Cultivos e seus clientes. Quanto maior a participação do cliente nos

negócios da Basf Agro, maior a disponibilização de recursos para o Programa Mata Viva de

Page 128: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

127

Adequação e Educação Ambiental. E vice-versa, ou seja, conta o gerente de departamento técnico

agropecuário da Cooperativa: “Se a Cooperativa se afastar da Basf, se comprar menos produtos

Basf, vai ter menos recursos nesse projeto Cooperar e o projeto vai ter que ser reduzido. Então, é

uma rua de mão dupla”.

Por isso, a exemplo da primeira história dessa narrativa, a definição de uma estratégia de

desenvolvimento de negócios sustentáveis é também considerada como uma causa necessária para

a tomada de decisão de estender o Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental aos

clientes da Unidade de Proteção de Cultivos. É necessária porque deve estar presente para o efeito

ocorrer (BOJE, 2001), porque, apesar de ter conseguido lidar com a dialética entre a busca pelo

retorno sobre os investimentos para os acionistas e a busca pelos benefícios para os seus outros

públicos de interesse, por si só, não produziu o efeito esperado, ou seja, a extensão desse Programa

aos clientes.

Page 129: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

128

6.3 Reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura sustentável na

narrativa das relações entre a Unidade de Proteção de Cultivos da Basf Agro e o Programa Mata

Viva de Adequação e Educação Ambiental

A narrativa acima apresenta um elemento necessário para que a aprendizagem social para

sustentabilidade (voltada para uma agricultura sustentável) aconteça na Basf:

Definição de uma estratégia de desenvolvimento de negócios sustentáveis

A narrativa acima mostra que uma organização com fins lucrativos não apoia somente a

resolução de problemas ambientais e sociais complexos, mas também os transformam em

oportunidades de geração de produtos e serviços sustentáveis, ou seja, economicamente viáveis e

consoantes com as demandas da sustentabilidade.

Para tanto, a Unidade de Proteção de Cultivos construiu um novo significado para o seu

core business, baseando a construção da sua identidade de sustentabilidade na agregação de valor

para a colheita do produtor rural.

Essa Unidade de Negócios tomou a decisão de apoiar o desenvolvimento de negócios

sustentáveis em parte da sua cadeia de valor, mais especificamente, nas atividades primárias de

marketing e vendas, e definiu uma estratégia de negócios sustentáveis com base em competências

desenvolvidas pela organização de recuperação de matas ciliares.

Caso contrário, seria apenas mais uma ação socioambiental para a organização, sem retorno

para os seus negócios.

O Quadro 16 apresenta o resumo das reflexões dessa narrativa das relações entre a Unidade

de Proteção de Cultivos da Basf Agro e o Programa Mata Viva de Adequação e Educação

Ambiental.

Page 130: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

129

Quadro 16: Resumo das reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura sustentável na narrativa das

relações entre a Unidade de Proteção de Cultivos da Basf Agro e o Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental

História contada

Objetivos do elemento de

aprendizagem social

identificado

Vozes participantes O que foi aprendido? Como aprendeu?

O significado atribuído pela

Unidade de Proteção de

Cultivos da Basf Agro à

sustentabilidade Aprender a lidar com a

dialética entre a busca pelo

retorno sobre os

investimentos para os

acionistas e a busca pelos

benefícios para os seus

outros públicos de

interesse.

A natureza (o ambiente natural),

a Unidade de Proteção de

Cultivos da Basf Agro, a

Organização das Nações Unidas,

a Organização das Nações

Unidas para Alimentação e

Agricultura (FAO) e as

cooperativas

Como conectar o core

business de uma Unidade de

Negócios à sustentabilidade

Atribuindo significado à

sustentabilidade

A estratégia de

desenvolvimento de

negócios sustentáveis

A natureza (o ambiente natural),

a Unidade de Proteção de

Cultivos da Basf Agro e as

cooperativas

Como transformar crises

ambientais em oportunidades

de geração de produtos e

serviços sustentáveis

Definindo uma estratégia de

desenvolvimento de negócios

sustentáveis

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

Page 131: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

130

Para operacionalizar essa estratégia de negócios, algumas ações foram tomadas pelos

gestores da Basf:

Transferência da gestão do Programa Mata Viva para a Fundação Espaço

Eco;

Ampliação do Programa Mata Viva para a educação ambiental;

Renomeação do nome de Programa de recomposição da mata ciliar do

Rio Paraíba do Sul para Programa Mata Viva de Adequação e

Educação Ambiental.

O que motivou a transferência da gestão desse Programa para a Fundação Espaço? Por

que esse Programa foi ampliado para a educação ambiental?

A próxima narrativa conta as relações entre a Fundação Espaço Eco e o Programa Mata

Viva de Adequação e Educação Ambiental.

Page 132: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

131

7 AS RELAÇÕES ENTRE A FUNDAÇÃO ESPAÇO ECO E O PROGRAMA MATA

VIVA DE ADEQUAÇÃO E EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Como a Fundação Espaço ECO é responsável pela gestão estratégica do Programa Mata

Viva de Adequação e Educação Ambiental, desde 2007, é importante contar a narrativa das

relações desse Programa com essa instituição para mostrar como o projeto original de

recomposição de mata ciliar do rio Paraíba do Sul foi ampliado e estendido para os clientes da

Unidade de Proteção de Cultivos da Basf Agro.

Essa narrativa é composta por três histórias. A primeira história conta as origens da criação

da Fundação Espaço Eco. A segunda aborda o seu foco de atuação e a terceira relata a força da

parceria entre Brasil e Alemanha. Juntas, essas histórias também apresentam mais elementos do

processo de aprendizagem social para uma agricultura sustentável no Programa Mata Viva de

Adequação e Educação Ambiental da Basf: a estruturação de um modelo sistêmico de

implementação e gestão e formação de parcerias estratégicas robustas.

Para contar a primeira história, são reunidas diversas antenarrativas por meio de análise de

causalidade. Ou seja, as antenarrativas dessa história abordam as razões da criação da Fundação

Espaço Eco ao conduzir a intertextualidade entre as micro-histórias e macro-histórias ouvidas e

lidas. Já para contar a segunda e a terceira histórias, conduziu-se uma análise temática das

antenarrativas sobre o foco de atuação da Fundação e das parcerias com instituições alemãs para

entender quais as ideias, intenções que não estão explícita ou diretamente expressas na mensagem

desses temas.

Page 133: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

132

7.1 Estruturação de um modelo sistêmico de implementação e gestão e formação de

parcerias – elementos 4 e 5 do processo de aprendizagem social para uma agricultura

sustentável no Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental da Basf

Atores sociais envolvidos: Fundação Espaço Eco, Organização das Nações Unidas

7.1.1 As razões da Fundação Espaço Eco

Ao conhecer a história da Fundação Espaço Eco no seu site, é possível deparar com duas

antenarrativas acerca das origens da sua criação. Um vídeo institucional, uma macro-história,

relata que uma das razões é a preocupação com o futuro da humanidade e que a solução é a

sustentabilidade. Segundo um dos seus trechos (FUNDAÇÃO ESPACO ECO, VIDEO

INSTITUCIONAL, 2012):

O que devemos fazer unidos para assegurar o nosso futuro? Futuro com qualidade é o maior

desafio a ser enfrentado por cada indivíduo. Sustentabilidade é a solução! E foi a busca pela

transformação dos indivíduos para a sustentabilidade que motivou a Basf e a GTZ, agência

de cooperação técnica do governo alemão a instituírem a Fundação Espaço Eco.

O relato no site mostra uma segunda razão, outra macro-história, para a sua criação: a

aquisição de uma área de cerca de 300 mil m² – considerada Reserva da Biosfera do Cinturão

Verde do Estado de São Paulo pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a

Cultura (UNESCO) –, seguida da sugestão de um funcionário da Basf de transformar esse espaço

em um centro de educação ambiental para os colaboradores da organização (FUNDAÇÃO

ESPACO ECO, 2012).

A primeira razão é entendida como uma causa necessária, ou seja, deve estar presente para

o efeito ocorrer e a segunda, como uma causa contributiva, que pode promover um efeito. Contudo,

apesar de terem conseguido reforçar a visão da Basf para iniciativas de tal natureza, por si só não

foram suficientes para gerar o efeito desejado (BOJE, 2001), ou seja, a criação dessa instituição.

Page 134: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

133

Justapondo a essas razões, nas conversas com seus dirigentes, é identificada uma

micro-história, como a preconização do Pacto Global das Organizações das Nações Unidas (ONU)

anunciado na reunião de 31 de janeiro de 1999, no Fórum Econômico Mundial (Fórum de Davos),

de que as empresas são atores importantes na busca por um desenvolvimento sustentável. Seu

lançamento oficial ocorreu em 26 de julho de 2000, no escritório da ONU em Nova York. Nessa

mesma data, a Basf tornou-se signatária deste Pacto (UN GLOBAL COMPACT; PACTO

GLOBAL REDE BRASILEIRA, 2012).

Importante ressaltar que essa foi uma iniciativa voluntária da Basf. E é exatamente esta a

atitude esperada pela ONU por parte das organizações, uma vez que o Pacto Global “não é um

instrumento regulatório, um código de conduta obrigatório ou um fórum para policiar as políticas e

práticas gerenciais”. Pelo contrário, apenas estabelece algumas diretrizes para que as organizações

possam participar e apoiar o crescimento sustentável e a cidadania (PACTO GLOBAL REDE

BRASILEIRA, 2012).

Essa, sim, pode ser considerada uma causa suficiente, ou seja, por si só produz o efeito

esperado, segundo Boje (2001), isto é, a criação dessa Fundação. Nas palavras do

diretor-presidente dessa instituição:

Então, a Fundação já foi uma visão da Basf com base no Pacto Global da ONU, de

tangibilizar o esforço da organização para contribuir com o desenvolvimento sustentável.

Então, o pacto global da ONU, ele, por si, já é uma proposta para encorajar as empresas a

adotarem políticas de responsabilidade social corporativa e promoverem a

sustentabilidade.

Já para o vice-presidente de educação para a sustentabilidade:

A Fundação Espaço ECO é um centro de excelência em gestão e educação para

sustentabilidade. Ela nasceu como uma iniciativa da Basf, dentro do seu conjunto de

iniciativas para alinhamento ao Pacto Global da ONU. Está muito conectado com a

origem da Fundação. Ele assume que o segmento empresarial, a iniciativa privada, as

empresas são protagonistas fundamentais na maior força de desenvolvimento. Ou melhor,

da maior força do possível desenvolvimento sustentável presente nas nações. Então, a

Fundação, ela já nasce com essa orientação, com essa opção, de trabalhar junto ao

segmento empresarial.

O objetivo do Pacto é “mobilizar a comunidade empresarial internacional para a adoção, em

suas práticas de negócios, de valores fundamentais e internacionalmente aceitos nas áreas de

Page 135: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

134

direitos humanos, relações de trabalho, meio ambiente e combate à corrupção”. (IBIDEM). Para

tanto, está fundamentado em dez princípios universais, mostrados no Quadro 17.

Quadro 17: Princípios do Pacto Global das Organizações das Nações Unidas (ONU)

Áreas Descrição dos princípios

Direitos humanos (derivados da

Declaração Universal de Direitos

Humanos)

1. Apoio e respeito à proteção de direitos humanos reconhecidos

internacionalmente

2. Asseguração da não-violação de direitos humanos

reconhecidos internacionalmente

Direitos do trabalho (extraídos

da Declaração da Organização

Internacional do Trabalho sobre

Princípios e Direitos

Fundamentais no Trabalho)

3. Apoio à liberdade de associação e o reconhecimento efetivo do

direito à negociação coletiva

4. Eliminação de todas as formas de trabalho forçado ou

compulsório

5. Abolição efetiva do trabalho infantil

6. Eliminação da discriminação no emprego

Proteção do meio ambiente (a

partir da Declaração do Rio sobre

Meio Ambiente e

Desenvolvimento)

7. Apoio à uma abordagem preventiva aos desafios ambientais

8. Desenvolvimento de iniciativas para promover maior

responsabilidade ambiental

9. Incentivo ao desenvolvimento e difusão de tecnologias

ambientalmente amigáveis

Combate à corrupção (a partir da

Convenção das Nações Unidas

Contra a Corrupção)

10. Combate à corrupção em todas as suas formas, inclusive

extorsão e propina

Fonte: PACTO GLOBAL REDE BRASILEIRA (2012); adaptado pela pesquisadora

Além das razões descritas acima, vejo ainda uma causa material, segundo a estrutura da

realização de Aristóteles (BOJE, 2001), que também pode ser considerada uma causa suficiente

para promover a criação de um espaço como a Fundação Espaço Eco. Nesse caso, trata-se do

desenvolvimento de um tipo de método que determina um dos focos principais de atuação da

Fundação, a ecoeficiência.

A Basf na Alemanha, desde 1996, já vinha desenvolvendo ferramentas e metodologias

aplicadas à ecoeficiência. O método de análise de ecoeficiência, como foi batizado, foi validado

por dois órgãos: a TÜV Rheinland (organização de certificação e inspeção técnica alemã) e pela

NSF (National Sanitation Fundation), dos Estados Unidos.

Seu objetivo é mensurar os impactos sociais, econômicos e ambientais de produtos e

processos produtivos, contribuindo para a tomada de decisões estratégicas baseadas em critérios

socioambientais (BASF, ECO-EFFICIENCY ANALYSIS, 2012). Como resultado de tais

Page 136: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

135

pesquisas, a Basf abriu dois centros de ecoeficiência no mundo: na Alemanha, em 1998, e nos

Estados Unidos, em 2002 (APRESENTAÇÃO ESPAÇO ECO).

Também é importante destacar que sua criação aconteceu em meio ao grande movimento

de engajamento das empresas brasileiras a esse projeto proposto pelas Nações Unidas, que já vinha

sendo conduzido pelo Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social, desde 2000 (SITE

REDE BRASILEIRA, 2012). No caso, esse movimento refere-se à outra causa contributiva,

segundo Boje (2001), podendo ter colaborado para efetivar a Fundação, cujos principais eventos

estão na Figura 16 abaixo.

Figura 16: Movimento de engajamento das empresas brasileiras ao Pacto Global das Organizações das

Nações Unidas

Fonte: (SITE REDE BRASILEIRA, 2012)

A Fundação Espaço Eco foi, assim, instituída em junho de 2005, como uma organização do

terceiro setor – uma Organização da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP). Com este ato,

foi dado um destino condizente com o status da área adquirida – Reserva da Biosfera do Cinturão

Verde do Estado de São Paulo. Também tornou realidade a sugestão dada por um dos

colaboradores da Basf, atendeu aos clamores do desenvolvimento sustentável e do Pacto Global e,

Page 137: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

136

ainda, abriu um centro de ecoeficiência aplicada na América Latina. Sua missão é promover o

desenvolvimento sustentável por meio do compartilhamento de conhecimento e tecnologias

aplicadas em ecoeficiência, educação para a sustentabilidade (FUNDAÇÃO ESPAÇO ECO,

2012).

O Quadro 18 resume as razões da criação da Fundação Espaço Eco.

Quadro 18: Síntese das razões da criação da Fundação Espaço Eco

Tipo de causa Conceito Descrição da causa

Necessária

Deve estar presente para o efeito

ocorrer, mas por si só não pode

produzir o efeito.

Contribuição com a sustentabilidade

Contributiva

Pode promover um efeito, mas

por si só não pode produzi-lo por

si mesma.

Aquisição de uma área de cerca de 300 mil m²

Sugestão de um funcionário da Basf de transformar

esse espaço em um centro de educação ambiental

para os colaboradores da organização

Grande movimento de engajamento das empresas

brasileiras ao Pacto Global desde 2000

Suficiente Por si só produz o efeito

esperado

Preconização do Pacto Global das Organizações das

Nações Unidas (ONU)

Suficiente Por si só produz o efeito

esperado Desenvolvimento de um tipo de método que

determina um dos focos principais de atuação da

Fundação, a ecoeficiência. Material Do que a coisa é feita?

Fonte: Entrevistas, vídeos, documentos; elaboração da pesquisadora

A Fundação está localizada em São Bernardo do Campo (SP) em um espaço mais afastado,

calmo, tranquilo, cujo entorno é mata nativa, apesar de estar “nos fundos” da fábrica de tintas

Suvinil, braço da Basf. A arquitetura não lembra uma organização convencional e se encaixa muito

bem nesse ambiente, conforme mostrado na Figura 17.

Page 138: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

137

Figura 17: Fundação Espaço Eco

Fonte: Relatório Anual Basf (2007)

Page 139: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

138

7.1.2 Foco de atuação da Fundação Espaço Eco

Atores sociais envolvidos: Fundação Espaço Eco, Organização das Nações Unidas

Já para contar a segunda e a terceira histórias, conduziu-se uma análise temática das

antenarrativas sobre o foco de atuação da Fundação e das parcerias com instituições alemãs para

entender quais as ideias, intenções que não estão explícita ou diretamente expressas na mensagem

desses temas.

A Fundação tem forte viés ambiental, embora o foco de atuação da Fundação abranja as

principais dimensões do paradigma desenvolvimento sustentável – econômico, social e ambiental.

Em particular, o Pacto Global é atendido principalmente no tocante aos três princípios de proteção

ao meio ambiente: apoio à uma abordagem preventiva aos desafios ambientais; desenvolvimento

de iniciativas para promover maior responsabilidade ambiental; e incentivo ao desenvolvimento e

difusão de tecnologias ambientalmente amigáveis. Já em 2006, um ano após a sua instituição, com

o apoio da matriz da Basf na Alemanha, começou a expansão da sua atuação para educação

ambiental e restauração vegetal de matas nativas.

Esse viés é explicado pelo vice-presidente de educação para a sustentabilidade da

Fundação, quando ele remete à Conferência das Nações Unidas sobre o Meio Ambiente e o

Desenvolvimento (Rio 92) ou Cúpula da Terra, conhecida como a mais importante conferência

sobre meio ambiente da história, para explicar a atuação da Fundação na área de ecoeficiência:

A missão da Fundação é promover este desenvolvimento sustentável, apoiar, ajudar no

desenvolvimento sustentável na sociedade, transferindo conhecimento e tecnologia, em

soluções aplicadas em ecoeficiência. O que significa? Ecoeficiência é um conceito, é uma

ciência, é uma metodologia, ela chega a ser uma cultura, mas a Fundação, ela não

transmite esse conhecimento meramente. Ela transmite esse conhecimento diante de

situações onde ela vê que este conhecimento vai ser aplicado, que vai ser transformado

numa ação efetiva, que vai trazer uma contribuição concreta. Então, essa é a missão da

Fundação. Na verdade, a Basf se aprofundou nesse tema de ecoeficiência. Em 92, na Eco

92, no Rio de Janeiro, havia um clamor muito grande a respeito de preservação ambiental.

Então, quando se falava em sustentabilidade, apesar de já existir o conceito em tripé da

sustentabilidade, a dimensão econômico-financeiro, ambiental e social, naquele momento,

o maior clamor, o maior apelo, era em cima da preservação ambiental. A grande questão da

Rio 92 foi: “em que medida o segmento de empresas pode abrir mão de resultados

financeiros em favor da preservação ambiental?” Colocar isso numa mesma equação

Page 140: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

139

significa ecoeficiência, como é que essas duas variáveis se equilibram. Este é o conceito de

ecoeficiência, foi um ponto bastante alto lá. Em 92, a Basf deu um mergulho neste

conhecimento. A Basf, inclusive, desenvolveu o primeiro centro de ecoeficiência no

mundo, que foi na própria Basf, na Alemanha, creio no ano de 1995 para 1996. O segundo

foi no ano de 2002, nos Estados Unidos, e 2005, foi aqui, na América Latina. Mas o único

centro de excelência da Basf, que foi aberto para a sociedade e transformado em uma

Fundação, foi na Fundação Espaço ECO. Então, não existe esse modelo nas outras regiões

do mundo.

Essa área de ecoeficiência atua para “auxiliar as empresas a compreender, enriquecer e

gerenciar produtos e processos produtivos” para reduzir o impacto ambiental (FUNDAÇÃO

ESPAÇO ECO, 2012). Nesse caso, trabalham com o conceito da World Business Council for

Sustainable Development (WBCSC):

Ecoeficiência é alcançada mediante o fornecimento de bens e serviços a preços

competitivos, que satisfaçam as necessidades humanas e tragam qualidade de vida ao

mesmo tempo em que se reduz progressivamente, o impacto ambiental e o consumo de

recursos ao longo do ciclo da vida a um nível, no mínimo equivalente à capacidade de

sustentação estimada do planeta Terra. (RESUMO DAS ATIVIDADES, 2011, p. 6).

A segunda área de atuação é a educação para sustentabilidade, com o objetivo de

“promover mudança de comportamento e instigar um olhar mais crítico da sociedade em relação à

educação socioambiental” (FUNDAÇÃO ESPAÇO ECO, 2012). O lema dessa segunda área é: “O

conhecimento é o único recurso que cresce quando a gente compartilha”, reforça o vice-presidente

de educação para a sustentabilidade da Fundação. Ele acrescenta: “Nessa área, produzimos

conhecimento, disseminamos conhecimento, porém, o mais importante é que todo este

conhecimento está orientado para a transformação de realidades”. E para que essa transformação

ocorra, um dos principais diálogos recorrentes ao longo da história do Programa Mata Viva de

Adequação e Educação Ambiental é com a realidade social local, onde ele é implantado. Realidade

social pautada por uma grande trama de relações e correlações de forças, conforme será discutido

ao longo desta tese. Como disse o vice-presidente de educação para a sustentabilidade da

Fundação: “Não adianta eu chegar numa área só com um protocolo de serviços ou com uma

determinada metodologia e tentar colocar ou implementar isso, abre aspas, goela abaixo?”

A área de educação para sustentabilidade tem três eixos de atuação: educação

socioambiental, no qual faz parte o Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental,

Page 141: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

140

objeto de análise desta tese, gestão básica em ecoeficiência e restauração ambiental (RESUMO

DAS ATIVIDADES, 2011, p. 10).

Com a transferência da gestão estratégica desse Programa para a Fundação, a Unidade de

Proteção de Cultivos não perde o seu foco em desenvolver novos negócios e vender e tem a

Fundação como uma forte aliada, uma extensão da própria unidade para implantar esse Programa

junto aos clientes. Para tanto, estruturou um meio do modelo sistêmico de implementação e gestão

elaborado exatamente para conduzir esse diálogo com a realidade local.

Para implantar uma iniciativa da magnitude desse Programa, que necessita de muitos

recursos – humanos, financeiros, tecnológicos (principalmente de desenvolvimento de técnicas de

recuperação de áreas degradadas), informacionais –, principalmente financeiros, são oriundos do

projeto Compromisso Cooperar, que, por sua vez, se fundamenta na reciprocidade entre a Basf

Agro e seus clientes. Quanto maior a participação do cliente nos negócios da Basf Agro, maior a

disponibilização de recursos para o Programa Mata Viva.

Uma vez definidos os recursos, a Fundação se apoia em dois tipos de diálogos: com a

realidade social local e com os agentes ou atores sociais. O diálogo com a primeira é iniciado

durante a análise de atratividade dessa realidade para conhecer as suas necessidades, seus recursos,

as oportunidades para implantar o Programa, facilitadores ou barreiras para sua implementação,

alinhamento dessas informações com a missão da Fundação Espaço Eco e com o compromisso

com o desenvolvimento sustentável etc.

O objetivo dessa etapa é definir o caminho a ser seguido na região selecionada: se inicia o

projeto pela adequação ambiental ou pela educação. Por exemplo, há regiões nas quais a vertente

da adequação ambiental é mais prioritária do que a de educação ambiental, ou vice-versa. Ou ainda,

a região demanda pela implantação das duas ações, quase que simultaneamente.

O vice-presidente de educação para sustentabilidade da Fundação Espaço Eco exemplifica:

Quando você pega, por exemplo, a questão da adequação ambiental, é um projeto

que pode demorar cinco anos, desde o diagnóstico, elaboração do plano, plantio, a

manutenção, até o monitoramento, onde a gente pode falar: “o fragmento está entregue e

ele, daqui pra frente, com o apoio deste entorno, vai sozinho. O Atlas Ambiental,

pensando no ciclo de dois anos e mais o período para implementação, é um projeto de

três anos. Então, é todo um exercício mesmo dessa análise de atratividade, de

planejamento, para que possamos fazer a distribuição adequada dos recursos, atendendo

as necessidades locais e os objetivos do programa.

Page 142: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

141

Feita essa análise, são definidas as prioridades e o planejamento das ações nas localidades

selecionadas e iniciado o diálogo com os agentes ou atores sociais, os parceiros locais do

Programa.

O lançamento da fase piloto foi com a plantação das primeiras mudas na Cooperativa dos

Agricultores da Região de Orlândia (CAROL) na Fazenda São José, em maio de 2008, em

Nuporanga, interior de São Paulo. Além dessa cooperativa, fizeram parte dessa fase mais duas

cooperativas: a COOPERCITRUS – Cooperativa de Produtores Rurais – e a CAMDA –

Cooperativa Agrícola Mista de Adamantina.

Por que é mais fácil para a Fundação Espaço Eco atuar num município ou, pelo menos, na

maioria deles, por meio das cooperativas? O vice-presidente de educação para sustentabilidade da

Fundação esclarece, por meio da passagem abaixo, a força e a capacidade de uma cooperativa

reunir diversos atores sociais em um mesmo espaço social:

Pesquisadora: O sr. falou: [...] diálogo com os agentes desse sistema [...]

Vice-presidente da Fundação: Porque uma cooperativa é uma entidade aglutinadora.

Ela, pela própria razão de existir dela, de cooperação mútua, de colaboração, está

concentrando esse público para nós. Isso facilita a nossa interação. É essa parceria que vai

ficar estabelecida. Então, eu tenho, por exemplo, capacitação dos técnicos da cooperativa.

Tenho capacitação de técnicos que trabalham nas propriedades dos cooperados. Tenho, às

vezes, uma palestra, um dia de campo, onde vão ser mostradas essas práticas, esses

conceitos, para um público mais difuso, vamos chamar assim.

Pesquisadora: Por exemplo?

Vice-presidente da Fundação Às vezes, uma prática de dia de campo é aberta pra

visitação de escolas, das pessoas de propriedades rurais. Tenho um exemplo muito

engraçado, uma pessoa que diz: “No dia que foi lançado o atlas ou programado para

apresentar o Mata Viva na cidade e tal, o PIB da cidade estava embaixo da tenda”.

Pesquisadora: Muito bom.

Vice-presidente da Fundação Claro, porque é uma interação daquele sistema,

para algumas coisas, às vezes, são práticas mais restritas, menos fechadas. Quando

você pega uma trilha pedagógica, ela está ambientada pra atender público escolar,

então, tem um público definido. Algumas práticas são mais abertas. Mas, onde que

um lançamento do Atlas é um diálogo educativo? É óbvio que a gente aproveita de

todas as oportunidades para falar do conceito, do propósito, para chamar a atenção para

o tema, para sensibilizar, a importância desse tema no contexto coletivo.

Ao conseguir reunir o “PIB da cidade” sob a mesma tenda, a cooperativa contribui para

favorecer um processo de aprendizagem social para sustentabilidade coletivo, baseado nos

seguintes elementos propostos pelo projeto HarmoniCOP: reconhecimento da interdependência e

interação entre os atores sociais envolvidos; desenvolvimento de uma percepção compartilhada

dos problemas não somente da região, mas da importância da agricultura sustentável; tomada de

Page 143: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

142

decisão de decisão conjunta baseada na reciprocidade e no comprometimento; e definição de

arranjos necessários para promover e facilitar a implementação das ações (HARMONICOP WP2

REFERENCE DOCUMENT, 2003).

Na vertente de adequação ambiental, a Fundação passa a oferecer apoio técnico aos

profissionais do setor agrícola e orientação aos produtores rurais sobre recuperação e mapeamento

de APPs – Áreas de Preservação Permanente e de reserva legal. Esse suporte é dado por meio da

elaboração do diagnóstico das propriedades, apresentação de metodologias para as soluções

econômicas de manejo florestal e na restauração efetiva das áreas degradadas, em consonância com

as leis ambientais brasileiras, discutidas acima. “Aqui o protocolo é mesmo de restauração, ou seja,

de levar aquele fragmento de floresta de volta à sua condição nativa. Não é o reflorestar por

reflorestar ou simplesmente pra alcançar um determinado número de árvores plantadas”, esclarece

o vice-presidente de educação para a sustentabilidade da Fundação.

Para o vice-presidente da Unidade de Proteção de Cultivos para a América Latina da Basf

Agro, "não é apenas reflorestamento de árvores; existe por trás um conceito mais importante que é

agricultura sustentável", diz (AGÊNCIA ENVOLVERDE, 2008). Ele acrescenta (IMPRENSA,

BASF, 2008):

Estamos contribuindo para o sucesso de nossos clientes, da empresa e da sociedade. A

sustentabilidade já é uma exigência nas produções agrícolas voltadas para exportação.

No mercado nacional, ela também passa a ser condição de sucesso para o produtor rural.

É cada vez mais importante assegurar a produção econômica de alimentos saudáveis

para a população, minimizando os impactos ambientais.

Nessa vertente, para transformar determinada realidade social local, é necessário pensar

sistemicamente e analisar a situação por todos os prismas, e o diálogo com essa realidade envolve

interações com diversos atores sociais locais. Um exemplo é dado pelo vice-presidente de

educação para a sustentabilidade da Fundação:

Nós fazemos para transformar uma determinada realidade. Quando falo em visão

sistêmica, eu tenho que pensar em todas as consequências, e, para eu pensar em todas as

consequências, tenho que analisar todas as interações. Então, dependendo do trecho onde

está havendo essa restauração, eu tenho a vizinhança, a produção agrícola próxima,

técnicos agrícolas trabalhando naquela área ou em função daquela área. Tenho interação

com o governo. Exemplo mais prático, por exemplo, são as questões de fiscalização, o

como que isso se interage com os outros meios produtivos relacionados. Se aquilo está

dentro de uma propriedade agrícola, aquela propriedade agrícola, ela produz. Se ela

Page 144: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

143

produz, para onde vai essa produção? Como é que isso está dentro do contexto de

município ou pelo menos daquela microrregião onde essa propriedade que está sofrendo a

restauração está inserida? Como é, por exemplo, que se conversa com os planos de

desenvolvimento daquele local? Então, é levado em consideração todas essas variáveis,

para que possa ser estabelecido não só o diagnóstico, mas um plano de adequação que faça

sentido.

Ele cita a fiscalização, ou seja, o governo, um ator social que tem em mãos um conjunto de

instrumentos de comando e controle formado pelas leis ambientais brasileiras, cuja relação de

poder com os proprietários rurais é de coerção. O Estado brasileiro tem meios para fazer valer o

direito e coibir práticas que possam degradar o meio ambiente, conforme discutido acima.

Contudo, ao ler um fragmento de antenarrativa do proprietário da Fazenda Alvorada,

localizada no município de Tanabi, em São Paulo (COOPERCITRUS REVISTA

AGROPECUÁRIA, 2009), é possível conjecturar que os proprietários rurais gostariam que essa

relação de poder avançasse para o final do continuum, ou seja, de coerciva passasse a ser mais

co-criativa. Nessa relação, os participantes compartilham o conhecimento para criar novos

entendimentos e definir papéis e responsabilidades dentro das restrições das suas realidades sociais

e institucionais (KEEN; BROWN; DYBALL, 2005). Declarou o proprietário da Fazenda

Alvorada:

Essa é uma iniciativa grandiosa, sinto-me honrado e satisfeito por fazer parte disso e

espero que outros projetos semelhantes sejam colocados em prática, para o bem de nosso

planeta. Acredito que a recuperação das matas nativas nas propriedades rurais é um fator

importante não só para a preservação do meio ambiente, mas também para a economia

da agricultura. São necessários muitos esforços, tanto da parte dos agricultores como do

governo. A lei tem que ser cumprida, mas precisa-se de financiamentos a longo prazo.

Ainda acho que o governo deveria promover mais esclarecimentos aos agricultores, a

maioria deles está sem orientação e multas não vão resolver. Haverá apenas muitos

protestos e muitas ações na justiça. Renovar em pouco tempo um processo que vem se

arrastando por décadas não é fácil. O bem-estar geral vai depender da boa vontade de

todos e sua colaboração. Plante uma árvore, e o futuro agradecerá.

Já a vertente de educação ambiental leva conhecimento sobre a sustentabilidade,

estimulando a mudança de comportamento e a motivação para que valores socioambientais sejam

inseridos no dia-a-dia das pessoas (RESUMO DAS ATIVIDADES, 2011). O vice-presidente de

educação para a sustentabilidade da Fundação explica os motivos:

Page 145: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

144

Não faz o menor sentido promovermos um esforço, uma intervenção dessa natureza, se

não se pensar sistemicamente, entender e dialogar com todos os agentes desse

sistema, para que esses próprios agentes apoiem o desenvolvimento desse fragmento

restaurado. E, popularmente, a gente já falou: “Não adianta fazer e vir o outro e

desfazer”. Então, eu tenho que ter uma abordagem mais integral. Por isso, a gente

entra com a dimensão da educação socioambiental.

Suas principais atividades são: o Atlas Ambiental, material didático personalizado para

cada cidade, no qual os alunos das escolas públicas aprendem as características ambientais da

região em que vivem; o Teatro Mata Viva, que além das peças de teatro, tem atividades lúdicas e

palestras sobre sustentabilidade; e a Trilha Ecológica Mata Viva, que consiste em atividades

pedagógicas em uma trilha natural.

Por último, é importante ressaltar que a Fundação tem outras iniciativas, além do Programa

Viva de Adequação e Educação Ambiental. Mais detalhes, no Resumo das Atividades (2011).

7.1.3 A cooperação técnica entre Brasil e Alemanha

Atores sociais envolvidos: Fundação Espaço Eco, GIZ (Deutsche Gesellschaft für

Internationale Zusammenarbeit) – agência de cooperação técnica internacional do governo

alemão e DEG (Deutsche Investitions – und Entwicklungusgesellschaft mbH ) – banco de

investimentos alemão

Para instituir a Fundação, a Basf contou com o apoio da GIZ (Deutsche Gesellschaft für

Internationale Zusammenarbeit) – agência de cooperação técnica internacional do governo alemão

– cujo know-how contribuiu para a integração dos conhecimentos de educação para a

sustentabilidade à Fundação (FUNDAÇÃO ESPACO ECO, 2012). Já o Programa Mata Viva

conta, em algumas ações de recuperação de florestas, com os recursos financeiros do DEG

(Deutsche Investitions – und Entwicklungusgesellschaft mbH ) – banco de investimentos alemão.

Trata-se de novos atores nessa rede de histórias que compõem a Tamara do Programa

Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental, conforme mostrado na Figura 13(p. 79)

acima.

Page 146: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

145

Brasil e Alemanha são parceiros há quase 50 anos. A GIZ está há 30 anos em Brasília com

cerca de 150 profissionais entre próprios, terceiros e consultores. A GIZ foi instituída em janeiro de

2011 e é resultado de uma fusão ocorrida entre três agências da cooperação técnica da Alemanha: a

Agência Alemã de Cooperação Técnica (GTZ), criada em 1974; o Serviço Alemão de Cooperação

Técnica e Social (DED), fundado em 1963; e a Sociedade Alemã para Capacitação Internacional

(InWEnt), criada em 2002. Tem aproximadamente 19.000 funcionários atuando em 130 países e

um faturamento aproximado de 2 bilhões de euros por ano.

Já a DEG, durante 40 anos de atuação, estrutura e financia investimentos de empresas

privadas nos países em desenvolvimento. Investe em projetos rentáveis, sustentáveis ecológica e

socialmente, em todos os setores econômicos: do setor agrário, passando pelos serviços, até a

indústria de transformação e a infraestrutura. A sua missão é, conforme explicitado em seu site:

Até hoje, cooperamos com mais de 1.050 empresas. Através de financiamentos de mais

de 5 bilhões de Euros, realizamos um volume total de investimentos de aprox. 34 bilhões

de Euros. A nossa meta é o estabelecimento e a ampliação de estruturas de economia

privada nos países em desenvolvimento. Com isso, queremos criar a base para um

crescimento económico sustentável e um melhoramento duradouro da qualidade de vida

da população local.

A relação de poder entre esses parceiros e a Fundação Espaço Eco é uma relação co-ativa,

ou seja, esses atores sociais estabelecem a própria agenda (por exemplo, o DEG investe em

projetos rentáveis, sustentáveis ecológica e socialmente; a GIZ fornece o know-how para a

integração dos conhecimentos de educação para a sustentabilidade) e negociam meios para agirem

de forma colaborativa (KEEN; BROWN; DYBALL, 2005).

Passa-se agora às reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura

sustentável nessa narrativa.

Page 147: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

146

7.2 Reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura sustentável na

narrativa das relações entre a Fundação Espaço Eco e o Programa Mata Viva de Adequação e

Educação Ambiental

A narrativa acima apresenta dois elementos de aprendizagem social para uma agricultura

sustentável, a fim de que uma iniciativa dessa natureza possa ser aceita, implementada e

monitorada, e os resultados duradouros sejam alcançados, a saber:

Diálogo com a realidade local a partir de um modelo sistêmico de implementação e gestão

Não pode ser esquecido que o Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental é

um projeto da Basf, uma organização com fins lucrativos, que visa apoiar os seus clientes a

desenvolverem negócios sustentáveis. E negócios sustentáveis significam não somente gerar

produtos e serviços consoantes com as demandas ambientais e sociais do paradigma

desenvolvimento sustentável, mas também que sejam economicamente viáveis.

Assim, a Unidade de Proteção de Cultivos da Basf Agro transferiu a gestão estratégica

desse Programa para a Fundação Espaço Eco, uma organização do terceiro setor – Organização da

Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP) – que já estava estruturada e atuando para promover

o desenvolvimento sustentável por meio do compartilhamento de conhecimento e tecnologias

aplicadas em ecoeficiência. Com essa decisão, essa Unidade de Negócios pôde continuar a dedicar

ao seu core business, enquanto a Fundação se dedica a apoiá-la na implementação da estratégia de

negócios.

Dessa forma, considerando todas as antenarrativas ouvidas e lidas, é possível dizer que para

implementar e gerir esse Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental, a Fundação

Espaço Eco estruturou um modelo sistêmico de implementação e gestão para dialogar com as

realidades locais. Para tanto, é constituído de duas vertentes: a adequação e educação ambiental –

Page 148: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

147

ambas procuram favorecer soluções autossustentáveis e considerar as inter-relações e

interdependências entre sistemas ecológicos e sociais.

Em segundo lugar, é um modelo baseado no compartilhamento de recursos humanos,

tecnológicos, financeiros e informacionais, uma vez que a Fundação não está estruturada para

cobrir todas as necessidades de implementação do Programa, por isso, precisa formar parcerias

estratégicas robustas que assumem diferentes papéis e responsabilidades ao longo da

implementação do Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental. No caso dessa

narrativa sobre as relações desse Programa com a Fundação, as parcerias assumem três papéis.

O primeiro é quando atuam como normalizadoras do processo de aprendizagem social

para uma agricultura sustentável, não no sentido de criar códigos ou políticas obrigatórios e

rigorosos, mas de estabelecer diretrizes e princípios norteadores das ações das organizações. Nesse

Programa, esse papel cabe ao Pacto Global, no qual a Basf tornou-se signatária em 2000, que atua

para estabelecer algumas diretrizes e dez princípios, mostrados no Quadro 17, para que as

organizações possam participar e apoiar o crescimento sustentável e a cidadania.

Essas parcerias também atuam como provedoras de recursos financeiros nessa

aprendizagem social para uma agricultura sustentável. Como tais iniciativas têm alto custo de

implantação, buscar recursos financeiros a custo baixo torna-se obrigatório nesses projetos. Nesse

Programa, esse papel cabe ao DEG (Deutsche Investitions – und Entwicklungusgesellschaft mbH)),

banco de investimentos alemão, cuja experiência de cerca de 40 anos de atuação, estrutura e

financia investimentos de empresas privadas nos países em desenvolvimento.

E elas têm ainda um terceiro papel de provedoras de metodologias e ferramentas. Nesse

Programa, ele cabe à GIZ (Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit) – agência de

cooperação técnica internacional do governo alemão – cujo know-how contribuiu para a integração

dos conhecimentos de educação para a sustentabilidade à Fundação, que serão discutidos com mais

detalhes na história que relata a experiência na vertente de educação ambiental vivenciada,

principalmente, pelos alunos e professores da rede municipal de Bebedouro.

Novas parcerias e novos elementos serão adicionadas a esse modelo ao longo da discussão

da experiência da cidade de Bebedouro (SP) com o Programa Mata Viva de Adequação e Educação

Ambiental.

Page 149: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

148

Quadro 19: Resumo das reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura sustentável na narrativa das

relações entre o Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental e a Fundação Espaço Eco

História contada Vozes participantes O que foi aprendido? Como aprendeu? Objetivos do elemento de

aprendizagem social identificado

As razões da

Fundação Espaço Eco

Pacto Global e

Fundação Espaço Eco

Como apoiar os clientes a

desenvolverem negócios

sustentáveis

Dialogando com a realidade

local a partir de um modelo

sistêmico de implementação e

gestão

Formando parcerias estratégicas

robustas:

Preparar de forma apropriada

para a implementação para

evitar gastos desnecessários e

assegurar a implementação no

prazo esperado

Buscar e compartilhar os

recursos necessários por meio de

parcerias estratégicas;

Foco de atuação da

Fundação Espaço Eco Fundação Espaço Eco

A cooperação técnica

entre Brasil e

Alemanha

GIZ, agência de

cooperação técnica

internacional do

governo alemão e

DEG, banco de

investimentos alemão

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

Page 150: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

149

8 A EXPERIÊNCIA DA CIDADE DE BEBEDOURO – SP COM O PROGRAMA

MATA VIVA DE ADEQUAÇÃO E EDUCAÇÃO AMBIENTAL

Essa narrativa relata como a cidade de Bebedouro, localizada no estado de São Paulo e no

bioma da mata atlântica, está implantando e, portanto, vivenciando o Programa Mata Viva de

Adequação e Educação Ambiental. É composta por duas histórias: a primeira conta a experiência

na vertente de adequação ambiental vivenciada principalmente pelos produtores rurais, clientes da

Unidade de Proteção de Cultivos, e como eles estão contribuindo para uma agricultura sustentável.

A segunda história relata a experiência na vertente de educação ambiental vivenciada

principalmente pelos alunos e professores da rede municipal de Bebedouro e também como está

conectada com a agricultura sustentável.

Para contá-las, eu conduzo uma análise de trama ou de enredo a partir da identificação de

relações pertinentes entre diversos eventos ouvidos e lidos que foram reunidos nas duas histórias

narradas a seguir. E em cada uma dessas histórias são apresentados e discutidos diversos elementos

do processo de aprendizagem social para uma agricultura sustentável no Programa Mata Viva de

Adequação e Educação Ambiental da Basf.

Até aqui as histórias contadas abrangem seis atores sociais comuns à maioria das histórias

do Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental: a experiência de Guaratinguetá

na recuperação de matas ciliares; o governo, a Basf Agro (Unidade de Proteção de Cultivos), a

Fundação Espaço Eco, a agência de cooperação técnica internacional do governo alemão e o banco

de investimentos alemão.

A partir de agora, serão conhecidos novos atores sociais que fazem parte da experiência

desse Programa na cidade de Bebedouro:

Vertente de adequação ambiental:

1. A Cooperativa de Produtores Rurais (COOPERCITRUS);

2. A Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ/USP);

Page 151: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

150

3. A Fazenda Santa Julia (ambiente natural), seu proprietário rural e o técnico

agrícola (gerente da fazenda);

Vertente de educação ambiental:

4. A Estação Experimental de Citricultura de Bebedouro – SP;

5. A Cooperativa de Crédito Credicitrus (SICOOB CREDICITRUS);

6. A coordenadora da Trilha Ecológica Mata Viva na cidade de Bebedouro –SP;

7. O Departamento Municipal de Educação e Cultura (DEMEC) de Bebedouro –

SP;

8. Os professores e alunos da Escola EMEF Yolanda Carolina Giglio Villela de

Bebedouro – SP;

9. A Geodinâmica – organização de empreendedorismo social sustentável;

10. O Instituto Romã – organização de processos educativos de vivências com a

natureza;

11. A Bellini Cultural – organização de projetos culturais.

8.1 Primeiro, a experiência de Bebedouro na vertente de adequação ambiental

Nessa vertente, a iniciativa partiu da Fundação Espaço Eco quando selecionou, ainda em

2007, a Cooperativa de Produtores Rurais (COOPERCITRUS) como uma das parceiras para

implantar esse Programa em várias cidades do estado de São Paulo. A COOPERCITRUS é

considerada uma das maiores clientes da Basf Agro e a sua história mostra o tamanho da sua força

junto, não somente aos produtores rurais, mas também às comunidades nas quais atua.

Page 152: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

151

A COOPERCITRUS foi fundada há 37 anos, em 14 de maio de 1976, resultante da fusão de

duas cooperativas já existentes: a CAPEZOBE (Cooperativa Agropecuária da Zona de

Bebedouro), de Bebedouro (SP), e a CAPDO (Cooperativa Agrária dos Cafeicultores D’Oeste de

São Paulo), de Monte Azul Paulista (SP). Possui uma carteira com mais de 20 mil produtores rurais

associados abrangendo mais de 500 municípios dos Estados de São Paulo e Minas Gerais, tendo

faturado em 2011 cerca de R$ 1,2 bilhão. As principais atividades agrícolas dos cooperados são:

cana-de-açúcar, citros, café, soja, milho, algodão, feijão, sorgo, manga, arroz, seringueira,

amendoim, batata, banana, tomate, goiaba, cebola, abacaxi e pecuária (SITE COOPERCITRUS,

2012). Em 2009, foi eleita pela Revista Carta Capital como uma das empresas mais admiradas do

setor do agronegócio (REVISTA CARTA CAPITAL, 2009).

Os primeiros diálogos aconteceram na primeira reunião para apresentação desse Programa

na sede da Cooperativa em Bebedouro, segundo o gerente de departamento técnico agropecuário

da Cooperativa:

A Basf nos procurou em termos de ter de recuperação de áreas de preservação permanente.

Havia um trabalho que já estava sendo feito com a escola de Piracicaba. Foi ideia da Basf,

mais especificamente, da Fundação Espaço ECO [...]. E escolheram a COOPERCITRUS

como uma parceira nesse Programa. Então, nos procuraram, fizeram uma reunião

conosco, com a diretoria, mostraram o porquê do projeto, qual a finalidade. O projeto

nos pareceu muito interessante, então, resolvemos participar [...] exatamente por

considerarmos que a ideia do projeto tinha uma afinidade bastante grande com a cultura da

Cooperativa.

Na sua fala, transparece a idéia de que a proposta do Programa estava consoante, pelo

menos no discurso oficial da missão dessa Cooperativa, com as questões que permeiam o

paradigma desenvolvimento sustentável: contribuir efetivamente para o desenvolvimento das

atividades agropecuárias (preservar a biodiversidade e os ecossistemas naturais), num ambiente

que fomente o espírito de cooperação e responsabilidade socioambiental (SITE DA

COOPERCITRUS; COOPERCITRUS 35 ANOS, 2011, p. 61). Entretanto, tanto a Cooperativa

como os proprietários rurais não sabiam como operacionalizar tais ações nas propriedades rurais,

como conta o gerente da instituição:

Nós entendemos como um modelo de preservação das áreas de preservação permanente.

Até o produtor entende isso. Nós percebemos que existe um questionamento do produtor

quando se fala em reserva legal. Mas, quando se fala em área de preservação permanente,

Page 153: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

152

o produtor aceita muito bem a ideia e concorda com ela. Só que existe muita dificuldade

em termos de o produtor saber e nós também de como agirmos. Então, esse projeto é uma

oportunidade de nós aprendermos quais são os caminhos para fazer a recomposição de

áreas de preservação permanente.

Nenhum dos entrevistados relatou diálogos conflituosos entre a Fundação Espaço Eco e a

Cooperativa nas negociações para fechar essa parceria. Isso em parte pode ser explicado pela

consonância de interesses: oportunidade para o corpo técnico da Cooperativa e os proprietários

rurais aprenderem como recuperar áreas de preservação permanente e proteger áreas de reserva

legal; atendimento aos requisitos da legislação ambiental brasileira; contribuição com a agricultura

sustentável; e investimento financiado pela Basf, Fundação Espaço Eco e DEG (banco de

investimentos alemão).

Contudo, conforme dito anteriormente, os recursos financeiros são oriundos do projeto

Compromisso Cooperar, que, por sua vez, se fundamenta na reciprocidade entre a Basf Agro e seus

clientes. Quanto maior a participação do cliente nos negócios da Basf Agro, maior a

disponibilização de recursos para o Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental. E

vice-versa, conta o gerente de departamento técnico agropecuário da Cooperativa: “Se a

Cooperativa se afastar da Basf, se comprar menos produtos Basf, vai ter menos recursos nesse

projeto Cooperar, e o projeto vai ter que ser reduzido. Então, é uma rua de mão dupla”.

Finda essa etapa, foi feita a capacitação do corpo técnico da Cooperativa na sede da própria

COOPERCITRUS. A Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ/USP) foi

responsável por essa capacitação que trará informações sobre as metodologias de recuperação

ambiental e implementação de áreas de preservação permanente. O programa consistiu em três

módulos contemplando a parte teórica com conceitos básicos sobre conservação ambiental, aulas

práticas com checagem em campos e a elaboração de situações reais de restauração. Nesses

treinamentos, os técnicos passam a conhecer e se aproximar mais de temas, como: conceitos de

ecologia; legislação ambiental; como ocorre um processo de degradação das vegetações e do solo;

como fazer um processo de restauração florestal; razões da alta diversidade técnica e da

importância de se seguir um modelo de plantio; metodologia do projeto; e suas atribuições no

projeto. O objetivo é prepará-los para fazer interlocuções efetivas com os produtores rurais, no

momento de esclarecer dúvidas ou mesmo durante as etapas de implantação da metodologia do

Programa. Em outras palavras, prepará-los para que saibam agir com a competência necessária

Page 154: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

153

nessa teia relativamente complexa de relações entre diversos atores sociais, para que seja praticada

uma agricultura sustentável no universo dos proprietários rurais.

Em seguida, em conjunto com a Fundação Espaço Eco, foram selecionados alguns

cooperados estratégicos na região que pudessem iniciar o Programa e torná-lo bem-sucedido, ao

mesmo tempo, tornando-se influenciadores e dando o exemplo para os demais produtores, relatam

o gerente de departamento técnico agropecuário da Cooperativa e o consultor de contas especial da

Unidade de Proteção de Cultivos:

Essa escolha foi feita em conjunto com a equipe da Basf na região, de forma que nós

associássemos essa liderança do produtor em termos de região, em termos de poder, de

ser exemplo, e também que fosse cooperado da Cooperativa e também cliente Basf. Então,

procuramos juntar todos esses elos na escolha do produtor. Porque a ideia é fazer com que

esse aprendizado sobre a recomposição ambiental seja propagada para todos os nossos

cooperados. É um sonho, mas, enfim...

A gente senta junto com o corpo técnico aqui da cooperativa e define alguns nomes de

cooperados que a gente acha, num primeiro momento, estratégicos para o negócio da

Coopercitrus, são pessoas influenciadoras, são promotores de ações sustentáveis.

Inicialmente, foram selecionados aproximadamente 16 produtores e 25 propriedades nas

cidades de Bebedouro, São José do Rio Preto, Araraquara, Vinhedo e Limeira. Em Bebedouro,

foram escolhidas três propriedades rurais.

Os primeiros diálogos diretos com os produtores rurais selecionados foram feitos por meio

do convite inicial, com uma breve explicação do Programa, progredindo para a primeira reunião de

apresentação formal com todos os convidados, também na sede da COOPERCITRUS, em

Bebedouro (SP), conduzida pela Fundação. Nessa apresentação, foi contada a primeira e bem

sucedida experiência do complexo industrial da Basf em Guaratinguetá na recuperação de matas

ciliares. Também foram apresentados os benefícios dessa iniciativa para a agricultura sustentável e

para a sustentabilidade, a metodologia de implantação ou protocolo de intervenção do Programa,

bem como o seu status em outras cidades, conta o consultor de contas especial da Unidade de

Proteção de Cultivos. Segundo ele, a forma como esses diálogos são conduzidos pela Fundação

Espaço Eco podem levar à aceitação ou não do Programa pelos proprietários rurais, lembrando que

a aceitação é livre, não acarretando retaliações por parte da Basf ou COOPERCITRUS ao produtor

rural. Ele conta:

Page 155: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

154

Primeiro é feita uma reunião com eles. Todo mundo fica preocupado, ainda mais com a

questão do Código Florestal. Então, às vezes, dependendo da forma como você levar, a

pessoa fala: “Ah, eu vou fazer esse projeto da Basf, depois eles vão levar isso para dentro

de órgão fiscalizador e eu vou receber fiscalização”. Então, dependendo da forma que se

explicar, você tem uma recusa do produtor. Então, esclarecemos que, em princípio,

faremos o diagnóstico da propriedade dele: as áreas que ele precisa implementar como

reserva de APP. Fazemos então uma reunião falando desde quando a Basf começou, com a

recuperação em Guaratinguetá, tudo até agora. A gente entrega esse diagnóstico para eles

e alguns decidem, por interesse próprio, fazer a recuperação da área por conta ou, então,

decidimos, internamente, também ajudá-lo.

Por isso, no início, houve relutância por parte de alguns produtores em aceitar o projeto, não

em termos de não considerá-lo válido, mas por conta de eventuais implicações, por exemplo,

chamar a atenção da fiscalização, ou seja, do governo. Aqui, mais uma vez, é reforçado o poder do

governo sobre os produtores, mostrando como essa relação é coerciva – quando um grupo se impõe

sobre outros grupos, conforme já discutido acima. O temor deles era que, ao começarem a

implantar o projeto, passassem a ter problemas com a fiscalização em suas propriedades.

Nesse ponto, a Fundação teve um papel fundamental ao esclarecer as dúvidas deles e que

cada projeto seria específico e personalizado para cada propriedade, sendo que um dos benefícios

seria exatamente o cumprimento das exigências das leis ambientais brasileiras. O engenheiro

agrônomo da Cooperativa narra essa passagem ao longo da implantação do Programa na região, em

que realmente um dos proprietários envolvidos no projeto recebeu a visita dos fiscais:

Foi interessante até que houve alguns casos de ter uma fiscalização e, na hora que se

apresentava a qualidade do projeto, o fiscal fala: “Não, tudo bem, vai em frente,

qualquer coisa tem respaldo”. Então foi interessante nesse sentido. Mas, de início, teve

alguma relutância do pessoal em termos de: “Vamos aderir, não vamos aderir? O que

vai acontecer? O que não vai acontecer?” Mas, felizmente, não tivemos problema

algum com os projetos. E o pessoal gosta. Na hora que vê a qualidade do projeto, se

entusiasma.

Outra passagem, contada pelo vice-presidente de educação para sustentabilidade da

Fundação Espaço Eco, ilustra que não é somente o temor pela fiscalização que pode resultar na

negativa por parte dos produtores rurais em participar do Programa e como é importante manter

diálogos contínuos e muitas interações para mostrar como o Programa será benéfico para eles.

Pesam na hora de tomar a decisão motivos como esperar pela finalização da discussão da nova

versão do Código Florestal ou mesmo pendências familiares:

Page 156: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

155

Pesquisadora: Até os srs. fecharem o plano de implementação daquela realidade, por

exemplo, de Bebedouro, como foram essas interações, como foram esses diálogos com

as partes envolvidas? As pessoas aceitaram bem, colocaram condições, foram restritivas,

como foi...

Vice-presidente da educação para sustentabilidade da Fundação: Essa pergunta é

bem interessante. Não existe uma realidade única, então, você imagina, por exemplo,

que vai interagir com um produtor rural e você vai falar “Olha, tem um determinado

fragmento ou um determinado pedaço da sua propriedade que ele precisa ser restaurado.

Então, eu vou vir aqui, com o apoio da cooperativa, com o apoio da Basf, uma iniciativa

dentro do programa, e eu vou fazer isso tudo para você”. Como é que você imagina que

seria a reação dessa pessoa? “O que você acha que ela responderia?

Pesquisadora: Sim.

Vice-presidente da educação para sustentabilidade da Fundação: Nem sempre. É

mesmo o diálogo. E são realidades assim muito distintas, não tem uma tônica para tudo,

então, você encontra, por exemplo, proprietários que já têm essa consciência, já têm esta

orientação, de que essa é uma contribuição que ele pode oferecer. Você encontra

proprietários que falam assim: “Não, ok, vou fazer, porque a legislação diz que eu preciso

manter essa área aqui”. E tem proprietários que falam assim: -“Ah, não sei, estou meio

desconfiado...” Ou assim: “Ó, vou esperar o novo Código Floresta”. Até situações do

tipo: “Quero, preciso, concordo, porque é o seguinte, essa propriedade é uma sociedade

de cinco irmãos. A gente vai precisar se entender”. Então, é uma interação, de conversa

mesmo, vai e volta, visita novamente.

O coordenador da Fundação de adequação ambiental também conta outros temores dos

proprietários, normalmente menos instruídos, quanto às manifestações de organizações

não-governamentais (ONGs) nas portas das suas fazendas. Eles questionam: “Vai ter um

Greenpeace aqui para fazer arruaça”. Para o coordenador, quando eles conhecem a robustez do

projeto – metodologia, parceiros envolvidos, benefícios, histórias de sucesso, sem custos – eles já

se sentem um pouco mais confortáveis.

E aqui, novamente, o papel da Cooperativa é importante, parceiro chave nessa iniciativa.

Ela precisa estar junto nas principais interações porque os proprietários confiam muito nessas

cooperativas, que têm o papel de facilitar o trabalho a ser executado pela Fundação e pelas

empresas contratadas. “Na companhia dos técnicos da Cooperativa, os proprietários se sentem

valorizados, por que eles têm orgulho de mostrar a propriedade, mesmo que, às vezes, eles ficam

com um pouco de vergonha, porque sabem que há alguma área irregular”, conta o coordenador de

adequação ambiental da Fundação.

Considerando o elemento de participação e engajamento de Keen, Brown e Dyball (2005),

a relação de poder entre as Cooperativas e os proprietários rurais, seus clientes, pela própria

natureza (trata-se de uma sociedade de pessoas com objetivos econômicos e sociais em comum) é

Page 157: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

156

co-ativa, ou seja, estabelecem uma agenda e negociam meios para agirem de forma colaborativa.

Também pode se dizer que é uma relação de poder atrativa, uma vez que o grupo dos proprietários

rurais se associa (dadas as premissas e prioridades do Programa Mata Viva de Adequação e

Educação Ambiental), atraído pelo grupo da Cooperativa, que utiliza os incentivos do projeto

Compromisso Cooperar – Programa de Relacionamento de Gestão de Clientes da unidade de

Proteção de Cultivos (Basf Agro) (KEEN; BROWN; DYBALL, 2005).

Aqui se observa que o espaço utilizado para começar a desenvolver e favorecer a

aprendizagem social para a agricultura sustentável desses técnicos ainda está limitado às salas de

reunião ou de treinamento da COOPERCITRUS, sem ações práticas.

A Fazenda Santa Julia, que cultiva a lavoura de cana-de-açúcar, foi uma das selecionadas

para participar do Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental, em Bebedouro (SP).

A sua história vai ser contada ao longo da experiência do Programa nessa cidade.

São vários os motivos que levaram ao convite por parte da Cooperativa como também à

aceitação do proprietário dessa fazenda em tomar parte nesse Programa, cuja proposta veio ao

encontro das necessidades e aspirações de ambas as partes.

Em primeiro lugar, por iniciativa própria, o proprietário já vinha desenvolvendo ações de

preservação de áreas permanentes. Importante ressaltar que se trata de um produtor rural que é

engenheiro de produção por formação, com pós-graduação de empresas em finanças e que está

nesse negócio há 30 anos. Assim, trata-se de um empreendedor esclarecido e bem informado

quanto à importância da preservação do meio ambiente para a continuidade dos seus negócios. Para

ele: “O nosso ganha-pão depende do meio ambiente. Não existe, é impossível conceber uma

produção agrícola sem um meio ambiente minimamente equilibrado”.

Em segundo lugar, ele sabe que o produto oriundo da cana-de-açúcar, o etanol, é voltado

para exportação. Assim, acredita que os consumidores dos países mais desenvolvidos vão passar a

exigir produtos certificados ambientalmente e, por isso, a sobrevivência do agronegócio brasileiro

vai depender fortemente de produtos oriundos de práticas de agricultura sustentável.

Em terceiro lugar, trata-se de um desejo pessoal. Para ele, é gratificante acompanhar a

recomposição da mata nativa, uma vez que sempre se considerou amante da natureza,

independentemente de trazer benefícios para os seus negócios.

Em quarto lugar, até então, esse proprietário já tinha deflagrado tal iniciativa, porém, sem o

devido acompanhamento técnico. As informações eram obtidas por meio de conversas informais

Page 158: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

157

com outros engenheiros agrônomos ou com o técnico agrícola da fazenda. Finalmente, todos os

custos eram de sua responsabilidade, inclusive a compra de mudas.

A Figura 18 mostra a placa da parceria entre a Fazenda Santa Julia e os principais parceiros

do Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental na entrada da fazenda: Basf,

Fundação Espaço Eco, COOPERCITRUS e DEG (banco de investimentos alemão).

Figura 18: Placa da parceria entre a fazenda Santa Julia e os parceiros do Programa

Fonte: Dados da pesquisa de campo in loco

Na vertente de adequação ambiental, a metodologia deste Programa tem quatro grandes

etapas: i) diagnóstico; ii) elaboração do plano diretor ou projeto técnico ou relatório de adequação

ambiental; iii) implementação; iv) manutenção e monitoramento. Segundo o vice-presidente de

educação para sustentabilidade da Fundação, a metodologia consegue superar os requerimentos da

legislação ambiental brasileira. Ele exemplifica:

A nossa metodologia, o nosso protocolo de intervenção, não só obedece aos requisitos

mínimos legais, como vai um pouco além. Ele ainda é um pouco mais especializado, um

pouco mais específico e observa alguns cuidados. Então, por exemplo, não adianta a lei

dizer que, dentro daquele fragmento, tem que haver, no mínimo, 85 espécies. No nosso

protocolo é: tem que ter 85 espécies, mas não são quaisquer espécies.

Page 159: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

158

Seu discurso deixa claro que a realidade local de cada propriedade rural tem suas

características próprias – relevo, solo, problemas de degradação, lavoura cultivada etc. –,

demandando também espécies específicas. O que atende determinada propriedade não

necessariamente vai servir para as demais. Essa análise é feita durante a etapa do diagnóstico.

8.1.1 Etapa 1 da metodologia de adequação ambiental – Diagnóstico da propriedade rural

Concluída esta etapa introdutória, é iniciada a de diagnóstico ou de mapeamento da área dos

produtores rurais selecionados. Aqui começa o diálogo com a realidade local de cada proprietário

rural e que vai se estreitando ao longo da implantação do Programa. O pré-mapeamento

normalmente é feito no Laboratório de Ecologia e Restauração Florestal da Escola Superior de

Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ/USP) com base nas informações dos limites territoriais e na

imagem de satélite das propriedades agrícolas e verificado após visita in loco às propriedades.

Todas as propriedades são fotografadas, sempre dialogando com algum representante da

propriedade que normalmente conhece todo o seu histórico. Nessa etapa, às vezes, acontece de

algum proprietário rural questionar o mapeamento da área. O coordenador pela implantação das

ações de adequação ambiental da Fundação conta uma passagem muito pitoresca sobre esse tipo de

situação:

Proprietário rural: “Viu, mas não tem nascente aqui, esse ponto aqui é uma estrada,

passa por lá há muitos anos, não sei...”.

Coordenador da Fundação: “Ó, tem, porque estava lá, assim, assado...”.

Proprietário rural: “Mas como?

Coordenador da Fundação: Eu falo: “Então, vamos fazer assim: eu peço ao técnico

que visitou, ele manda o ponto de GPS, manda a foto”. O rapaz que fez o projeto

chegou a filmar que brotava água lá do chão e tinham girininhos nadando na água. E

ele nunca tira fotos só do ponto. Tira sempre mostrando o ambiente em volta, para ter

pontos de referência, para mostrar que aquele é o lugar. Então, eles sempre estão tirando

foto duma sequência do entorno do mesmo lugar, mostrando o que é o ponto ali que quer

mostrar. E para esse ponto, ele viu que tinha um ninho, mostrando girinos... Um monte de

girinos nadando naquela água que brotava, aí mandei para o produtor: “Ó, realmente,

mesmo confirmando, é uma nascente a área. Taí brotando a água com abundância, é uma

água que está escorrendo da chuva, tem inclusive girino nadando. Pode ser que no período

de estiagem, ela seque totalmente, o que no Código Florestal a gente chama de nascente

intermitente, porque ela tem água durante um período do ano só. Mas ela também é

protegida, é uma nascente também”.

Page 160: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

159

Essa fase é realizada por empresas especializadas e contratadas para este fim, no caso a

ESALQ/USP. Cabe à Fundação a contratação, negociação de contratos, acompanhamento da

execução, liberação de pagamentos.

O Mapa de Adequação Ambiental da fazenda Santa Julia, mostrado na Figura 19, revelou

que a área de preservação permanente total (tom de laranja mais claro) é de 68,5 hectares ou

11,35% da propriedade. Desse total ainda faltam cerca de 70% ou 48,42 hectares de área a ser

restaurada para cumprir os requerimentos da legislação ambiental brasileira. Esse mapa é resultado

de uma visita de dois dias da equipe da ESALQ/USP formada por biólogo, geólogo, engenheiro

agrônomo.

Figura 19: Mapa de Adequação Ambiental da fazenda Santa Julia em Bebedouro – SP

Fonte: Dados da pesquisa de campo in loco

Como o proprietário já vinha desenvolvendo ações de recuperação da área degradada por

conta própria, sem apoio técnico formal, algumas delas tiveram que ser readequadas para atender o

Programa. Aqui se observa que o espaço utilizado para desenvolver e favorecer um processo de

aprendizagem social para a sustentabilidade, não somente para esses técnicos das fazendas como

Page 161: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

160

também para os técnicos das Cooperativas, é expandido das salas de reuniões das Cooperativas

para as interações com os outros atores do Programa, nesse caso, as visitas nas propriedades.

8.1.2 Etapa 2 da metodologia de adequação ambiental – Elaboração do projeto técnico

Em seguida, é elaborado o plano diretor, ou seja, um projeto técnico para a propriedade

onde são detalhadas as ações de recuperação, sempre começando por eliminar o fator de

degradação, como gado, fogo, pastagem. O coordenador da Fundação de adequação ambiental diz

que são dadas todas as indicações pra recuperação, inclusive para evitar multas por parte da

fiscalização, até quando é necessário ter plantio, não havendo possibilidade de regeneração:

Tem gado entrando? A gente tem que tirar o gado, vai ter que cercar essa área. É o primeiro

passo, às vezes, você não resolve se não isolar a área. Ou: Está entrando fogo? É cana, é

manejada com fogo ainda? Entra fogo na área? Tem que eliminar a possibilidade de fogo...

Ou mesmo até uma área que era pasto e que entra fogo porque vem do vizinho. “Ó, a gente

vai ter que proteger a sua área pra que não entre mais fogo”. Enfim, vai tomando todas as

ações para recuperação da área. Às vezes, tem área com vegetação, mas a área do lado era

um pasto. Muitas vezes, eles nem usam, está lá o pasto, tem uma ou duas vaquinhas lá que

não servem para nada e, às vezes, o cara precisa ser autuado, toma uma multa por conta de

0,5% da área da propriedade dele, porque tem duas vaquinhas, que é de um funcionário que

às vezes mora lá. Muitas vezes, o proprietário nem precisa fazer o plantio, a vegetação

que tem em volta vai possibilitar a regeneração natural da área e ela vai se recuperar. Então,

por isso que a gente fala: “Cerca, dá uma controlada no capim, e aí dá...”.

Segundo esse coordenador da Fundação, muitas vezes, o proprietário se surpreende ao

receber o projeto técnico que relata a inexistência de problema de impacto ambiental em suas

propriedades. Às vezes, a única recomendação é de manter as áreas isoladas. Ele conta, com base

na sua experiência, que, normalmente, a média no estado de São Paulo das Áreas de Preservação

Permanente nas propriedades é de 10%. Contudo, tem muita propriedade que, às vezes, por conta

de 0,3% ou 3% da área, torna-se um problema ambiental. Por conta disso, a propriedade pode ser

autuada e passar por um processo no Ministério Público. Esse coordenador conta outra passagem

curiosa:

Page 162: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

161

Eles (os proprietários) querem fazer quando mostramos o plano, pois é pequeno perto do

tamanho da propriedade. Eu brinco com eles: “Será que não dá para a gente melhorar

um pouquinho o manejo agrícola, para compensar esse 1% com problemas?”

Será que ele não consegue? É 1% de produtividade. Eles dão risada, brincam:

“Ah!”.

Há casos em que o proprietário vai além dos requerimentos da legislação ambiental

brasileira. Por exemplo, quando ele mantém a recuperação de alguma área que foi abandonada já

há algum tempo. Ou, trata-se de um declive de relevo, não sendo possível mecanizar para colher

cana ou de uma propriedade cuja água usada para lavar o café vem de uma nascente dentro da

propriedade. Por iniciativa própria, os proprietários deixaram uma área enorme acima da cabeceira

da nascente. Nesse último exemplo, foi uma junção de fatores que contribuíram para tal iniciativa:

as exigências do Código Florestal e a importância e os benefícios da geração de água dentro da

própria fazenda.

No caso da Fazenda Santa Julia, o plano diretor (mostrado na Figura 20) levou em

consideração o que já estava sendo feito, as culturas que já existiam, a necessidade de esperar por

um ciclo de renovação do canavial etc. O proprietário justifica essas condições alegando que

precisa levar em conta o estágio da plantação para evitar prejuízos de ordem econômica:

Não vou sacrificar um canavial novo, que acabou de ser plantado, para fazer o

plantio agora. Já erramos por cem anos, andamos errado por cem anos, não é por causa

de um ano que eu vou levar prejuízo também, um ano ou dois. Então a gente espera a

renovação do canavial para plantar as árvores.

Page 163: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

162

Figura 20: Relatório de Adequação Ambiental da fazenda Santa Julia em Bebedouro – SP

Fonte: Dados da pesquisa de campo in loco

Ele faz questão de ressaltar que, ao contrário do setor industrial onde tudo acontece de

forma rápida, na agricultura o ritmo é outro: “Na agricultura é demorado, é lento, principalmente,

para quem está acostumado com o ambiente de indústria onde as implementações são rápidas. Na

agricultura tudo tem que esperar um devido tempo. A natureza é lenta”.

Esse relatório é bem detalhado e precisa ser protocolado junto à Companhia de Tecnologia

de Saneamento Ambiental (CETESB) que analisa os pedidos de autorização de supressão ou

manejo de vegetação natural e as intervenções em áreas de preservação permanente. O

coordenador de adequação ambiental da Fundação Espaço Eco conta que uma vez não conseguiu

protocolar um relatório nesse órgão porque o técnico pediu para enviar um resumo de três páginas,

já que era muito material para ele ler.

Esta etapa é executada com pouca ou nenhuma interação com os produtores rurais. Somente

após o protocolo junto à CETESB é que pode ser colocada em prática.

Page 164: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

163

8.1.3 Etapa 3 da metodologia de adequação ambiental – Implantação (plantio das mudas)

Nesta etapa, coloca-se em prática o plano diretor. No caso de plantio, as atividades de

preparação do solo, plantação das mudas, adubação e regar as mudas são feitas por empresas de

reflorestamentos, também contratadas para esse fim. Nessa etapa, os técnicos agrícolas,

proprietários rurais e outros funcionários também são capacitados para realizar o plantio. As mudas

são doadas com o apoio da SOS Mata Atlântica ou pela própria Cooperativa.

Na Fazenda Santa Julia, a equipe contratada e munida de equipamentos próprios, como

trator, broca e pulverizador, limpou, roçou e passou o herbicida. As áreas que tinham mato, brejo,

colonião e braquiara ficaram limpas e preparadas para receber o plantio das mudas.

A Figura 21 abaixo mostra que, nas áreas já restauradas, há árvores com 1,5 metros de

altura e outras com 30 centímetros. Nesse processo, tanto o proprietário quanto o técnico

aprenderam que há árvores cujo crescimento é mais lento e de outras, mais rápido. O motivo para

misturar as espécies é porque as que avançam mais rápido vão proteger e dar sombra para as que

crescem de forma mais lenta e também impedir que nasça muito mato ao redor da área.

Aprenderam também que a longevidade de uma árvore é inversamente proporcional à velocidade

do seu crescimento. As que se desenvolvem mais rapidamente morrerão mais cedo e já as mais

lentas viverão mais tempo.

Page 165: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

164

Figura 21: Árvores plantadas para recuperar a área de preservação permanente da fazenda Santa Julia em

Bebedouro – SP

Fonte: Dados da pesquisa de campo in loco

Page 166: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

165

8.1.4 Etapa 4 da metodologia de adequação ambiental – manutenção e monitoramento

Na etapa 4, a manutenção é responsabilidade dos proprietários enquanto que o

monitoramento fica a cargo da Fundação Espaço Eco. A manutenção é fundamental,

principalmente no início do plantio. As mudas são muito pequenas, em torno de 10, 15 ou 20

centímetros de altura, demandando cuidados especiais. Do contrário, podem ser cobertas pelo

mato, podendo morrer naturalmente. Também é preciso protegê-las das pragas invasoras, das ervas

daninhas etc. Por isso, a área tem que ser tratada, roçada, provavelmente adubada até as plantas

brotarem e atingirem um tamanho que possam desenvolver naturalmente, atingindo, portanto, a

autossuficiência. Depois, elas seguem o seu curso normal, exigindo menor atenção e intervenção.

Daí, a importância também do monitoramento. Há casos em que, por motivos como

descuido e falta de mão-de-obra, houve perdas de mudas. “Alguns vão levando meio na galega”,

disse o engenheiro agrônomo da Cooperativa. E aí, ocorre o replantio, ou seja, retrabalho e mais

custos para o Programa. Por outro lado, há proprietários que levam a sério essa etapa e a executam

de forma adequada e esperada.

Na Fazenda Santa Julia, houve casos de perdas de mudas porque receberam água demais,

por ter sido um período muito chuvoso, deixando as áreas alagadas, parecendo um pântano. Uma

situação inesperada que pegou tanto a equipe da ESALQ/USP como a da fazenda de surpresa. E

essa situação revela que a equipe especializada também aprende com as eventualidades que vão

ocorrendo ao longo da implantação do Programa.

Apesar disso, as mudas que sobreviveram foram mantidas, sendo cuidadas para evitar o

ataque de ervas invasoras. Exigirão mais tempo para que floresçam, e as árvores serão mais ralas

ou mais baixas. Mas é o que a natureza tem a oferecer nesse momento.

Nessa etapa, os proprietários rurais podem passar a ter custos extras com a mão-de-obra

para fazer a manutenção das áreas restauradas.

O proprietário da Fazenda Santa Júlia resume, em uma entrevista, a sua satisfação em tomar

parte desse Programa e os resultados obtidos como a recuperação de parte da área degradada, como

mostrar à sociedade que o etanol brasileiro pode, sim, ser oriundo de processos de negócios

sustentáveis, além da geração de novos postos de trabalho:

Page 167: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

166

Trata-se de um programa que atende aos anseios de parte da sociedade, que está preocupada

com o meio ambiente. Os agricultores integram essa parcela da sociedade, uma vez que

interagimos diretamente com a natureza. Não resta dúvida de que a reconstituição das

matas ciliares e das florestas nativas nas demais áreas, legalmente denominadas de

áreas de preservação permanente, são uma enorme contribuição para o meio ambiente e o

equilíbrio ecológico. Infelizmente, há muita Campanha difamatória contra o etanol

brasileiro, principalmente no exterior. A grande oportunidade para a Fazenda é poder

mostrar para a sociedade que os produtores de cana estão comprometidos com o meio

ambiente. Precisamos mostrar ao mundo que a cana-de-açúcar e o álcool são

produtos sustentáveis. Em outro aspecto, foram criados novos postos de trabalho na

Fazenda para a manutenção das mudas plantadas. O grande auxílio do programa foi a

de oferecer uma assistência do mais alto nível, que possibilitou o plantio das árvores de

forma mais técnica e, portanto, mais eficiente. Como resultado final, temos espécies mais

bem adaptadas ao solo e clima locais, o que propicia um crescimento mais rápido das

árvores plantadas. (BASF, 2009)

Page 168: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

167

8.2 Reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura sustentável na

narrativa de Bebedouro na vertente de adequação ambiental

A narrativa da experiência de Bebedouro (SP) na vertente de adequação ambiental do

Programa Mata Viva apresenta diversos elementos de aprendizagem social para uma agricultura

sustentável, a saber:

Experiência e vivência dos atores sociais

Esse programa mostra principalmente que os atores sociais – equipe da COOPERCITRUS,

produtores rurais, técnicos agrícolas – aprendem principalmente por meio da vivência. Ao sentirem

in loco e diariamente os resultados, pouco a pouco, eles aprendem que, com o uso de técnicas

adequadas, os objetivos são alcançados. O gerente da Fazenda Santa Julia expressa bem esses

sentimentos:

Do início, o pessoal da ESALQ esteve aqui, caminhou com GPS, marcando e fazendo

pequenas escavações para diagnosticar o tipo de solo. E então percebemos que não estava

totalmente certo. Não que a gente estivesse totalmente errado. Pelo menos, agora eu sei

onde pode não ter umidade aparente, mas, se cavar o solo, percebemos que aquilo era

escuro, era um tipo diferente de solo. Aprendi bastante com isso. Depois o pessoal veio

plantar, depois de ter preparado a área, fazer descida, um subsolador, alguma coisa assim.

Eles trouxeram as mudas em tubetes pequenininhos, minúsculos. Eu até não acreditava que

esse tipo de muda se desenvolveria bem. Porque até então a gente utilizava muda nos

saquinhos plásticos, mudas aí com 40, 50 centímetros de parte aérea. E eu não acreditava

que aquilo tivesse sucesso. Mas, foi, surpresa, porque elas acabaram crescendo mais do que

a nossa. Isso dá pra perceber.

Formação de parcerias estratégicas robustas

Novamente, esse Programa mostra a importância de se ter parceiros fortes e robustos – cada

um agrega valor de forma diferenciada – para que uma iniciativa dessa natureza possa ser aceita,

implementada e monitorada, e os resultados duradouros sejam alcançados.

Page 169: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

168

Nessa narrativa, as parcerias desse Programa também assumem diferentes papéis e

responsabilidades. Primeiro, elas atuam como facilitadoras do processo de aprendizagem social

para uma agricultura sustentável. Facilitar é tornar ou fazer fácil ou executável determinada ação,

por isso, o facilitador atua como um mediador, uma parte imparcial visando a obtenção dos

resultados esperados ou mesmo a resolução de conflitos.

No caso, esse papel cabe à Cooperativa COOPERCITRUS que atua para apoiar a sua

implantação em sua região, colocando-se à disposição dele para estabelecer os diálogos e o

entendimento entre os envolvidos; para encorajar a participação dos produtores rurais,

convencendo-os a tomar parte na empreitada; para passar confiança e segurança aos produtores

desconfiados e receosos de possíveis consequências desagradáveis do Programa (chamar a atenção

da fiscalização, por exemplo); e, ainda, para assegurar o equilíbrio entre as necessidades dos

produtores e os requerimentos do Programa.

Em segundo lugar, essas parcerias atuam também como lideranças influenciadoras nessa

aprendizagem social para uma agricultura sustentável. São influenciadoras no sentido de ter uma

ascendência sobre (alguém ou algo). Nesse Programa, esse papel cabe aos produtores rurais

selecionados estrategicamente e que estejam dispostos a colaborar com a temática da

sustentabilidade. Suas responsabilidades incluem implementá-lo de forma satisfatória para que se

tornem exemplos em suas regiões e possam atrair mais produtores rurais para ele.

Em terceiro lugar, essas parcerias também têm o papel de provedoras de metodologias e

ferramentas de aprendizagem social para uma agricultura sustentável. Nessa narrativa, fica

explícito como conseguem agregar valor ao ambiente natural, ou seja, às propriedades rurais; e

como integram novas técnicas e metodologias ao dia-a-dia dos proprietários e dos funcionários (os

gerentes e técnicos agrícolas) por meio da transferência de conhecimento especializado, que

alavanca a melhoria contínua e o aperfeiçoamento dos processos de restauração e manejo florestal.

Nesse Programa, esse papel cabe às instituições contratadas por sua especialização em

determinada prática, como a ESALQ/USP, cuja expertise é a restauração vegetal, às empresas

especializadas no plantio de mudas. Cabe também à equipe da Fundação Espaço Eco, responsável

pela metodologia do Programa, pela documentação de uma boa parte desse conhecimento no

Relatório de Adequação Ambiental e pela realização de treinamentos tanto do corpo técnico da

Cooperativa como dos técnicos rurais que trabalham nas fazendas.

Page 170: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

169

Essas parcerias se aproximam do conceito de parcerias equitativas de aprendizagem

(learning partnerships), ou seja, parcerias que respeitam os direitos de todos, para combinar as

competências entre os diversos atores sociais, de Keen, Brown e Dyball (2005). Os papéis acima

identificados para as parcerias desse Programa também mostram uma combinação de

competências de cada um dos atores sociais citados – facilitação, liderança influenciadora e

geração de conhecimento.

Interações como espaços para capacitação e favorecimento de aprendizagem social para uma

agricultura sustentável.

Nesse Programa, o ambiente organizacional da COOPERCITRUS, suas salas de reunião ou

de treinamento, também é utilizado para capacitação, mas sem ações práticas ou experienciais,

inibindo um pouco o potencial de aprendizagem. O espaço que mais favorece a aprendizagem

social para uma agricultura sustentável são as diversas interações com os outros atores sociais do

Programa, rompendo as barreiras físicas de organizações como Fundação Espaço Eco e

Coopercitrus. Essas interações ocorrem em variados contextos, fases do Programa e em diversas

atividades:

a) Durante os muitos diálogos feitos ao longo de toda a implantação do Programa: interações

durante as reuniões formais de apresentação e de negociação junto às Cooperativas e os

proprietários rurais; diálogos diretamente na realidade que está sendo transformada por

meio desse processo de aprendizagem social para uma agricultura sustentável, no caso, nas

propriedades rurais, nos momentos de plantio de mudas ou de discussão sobre o Relatório

de Adequação Ambiental; nas conversas por telefone com os técnicos das Cooperativas;

diálogos que ocorrem nas fases de manutenção e monitoramento, principalmente com a

equipe da Fundação Espaço Eco etc.;

b) Nas visitas às propriedades rurais, diretamente nas áreas que estão sendo recompostas;

Page 171: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

170

c) Nas interlocuções entre o corpo técnico das Cooperativas e os produtores rurais e seus

funcionários;

d) Nos eventos de lançamentos das novas fases do Programa;

e) Nas entrevistas concedidas pelos proprietários rurais;

f) Nos treinamentos de capacitação do corpo técnico das Cooperativas. Aqui acontece o que

Keen, Brown e Dyball (2005) chamam de reflexividade, ou seja, os técnicos das

Cooperativas acabam refletindo sobre o que aprenderam nesses treinamentos, o que os

conduz a uma nova aprendizagem – fazer interlocuções efetivas com os produtores rurais e

seus funcionários.

Interações essas que privilegiam a troca de conhecimento especializado e de experiências

bem-sucedidas, outras nem tanto, entre as partes. Vale lembrar que até a equipe da ESALQ/USP

que possui o expertise em restauração florestal também aprende, principalmente diante dos fatos

inesperados, uma vez que cada realidade é diferente e possui nuances próprias, não

necessariamente aplicadas em outras realidades. Experiências essas que permitem aos envolvidos

chegarem a um consenso quanto às necessidades de cada um, sem atropelos, e, por isso, pode se

dizer baseadas em dois tipos de relações de poder: i) co-criativa, na qual os participantes

compartilham esse conhecimento especializado para criar novos entendimentos, definir papéis e

responsabilidades, dentro de suas restrições sociais e institucionais; e ii) co-ativa, na qual todos os

envolvidos negociam para agirem de forma colaborativa (KEEN; BROWN; DYBALL, 2005).

Bouwen e Taillieu (2004) chamam essas interações de práticas relacionais, porque há troca

entre pelo menos dois atores sociais com consequências para o relacionamento em si e alguns

resultados perceptíveis. E, sem dúvida, um desses resultados é o conhecimento gerado e apropriado

por todos os envolvidos no projeto.

Page 172: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

171

Geração de conhecimento especializado para uma agricultura sustentável

Uma das derivadas dos elementos de aprendizagem social para uma agricultura sustentável

discutidos acima é a geração de conhecimento especializado. Em maior ou menor escala, que pode

variar conforme a capacidade cognitiva de cada um dos envolvidos, ao longo de todas as interações

que ocorrem nesse Programa, os participantes passam a conhecer diagnósticos e metodologias de

restauração ecológica de áreas degradadas, produção de sementes e mudas e legislação ambiental

brasileira. Eles aprendem como elaborar diagnósticos das propriedades; mapear áreas de

preservação permanente e reserva legal afetadas; implantar soluções econômicas de manejo

florestal e implantar melhorias efetivas nas propriedades.

Por isso, a aprendizagem nesse Programa pode ser considerada de laço duplo, porque há o

exame de algumas premissas subjacentes e dos modelos que orientam as ações e comportamentos

dos proprietários rurais e dos seus funcionários, uma vez que eles aceitam tomar parte no Programa

e se engajam para implantá-lo, conforme o esperado. A Fazenda Santa Julia é um exemplo desse

tipo de aprendizagem. O Programa não foi imposto, pelo contrário, o proprietário tem o direito de

recusá-lo, mesmo tendo o respaldo de um parceiro forte, como as Cooperativas. Mas, uma vez

aceito e concluída a implantação de toda a metodologia, em todos os relatos ouvidos e lidos, os

entrevistados deixam transparecer um tom emocional de satisfação.

A experiência compartilhada gera novos papéis e responsabilidades para todos os

envolvidos: os técnicos das Cooperativas ao serem responsáveis por fazer interlocuções efetivas

com os produtores rurais; os profissionais contratados em transmitir o conhecimento especializado

em práticas de agricultura sustentável; e os técnicos e os proprietários das fazendas, além de se

apropriar de todo esse aprendizado, passam a ser responsáveis em manter as práticas sustentáveis

de agricultura, multiplicar e influenciar outros proprietários sobre a utilização de tais práticas.

Page 173: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

172

Quadro 20: Resumo das reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura sustentável

na narrativa de Bebedouro na vertente de adequação ambiental

Vozes participantes

Objetivos do elemento de

aprendizagem social

identificado

O que foi aprendido? Como aprendeu?

Proprietários de

terras, técnicos

agrícolas, clientes,

parceiros contratados,

governo

Engajar e assegurar a

participação e o

compromisso dos atores

sociais com os resultados

esperados

Ter parceiros com diferentes

papéis e responsabilidades

para agregarem valor aos

atores sociais

Compartilhar, multiplicar,

influenciar outros atores

sociais

Gerar e aprender novos

conhecimentos acerca da

recuperação de áreas nativas

Como tornar os negócios

sustentáveis

Novos conhecimentos e

técnicas de recuperação

de áreas nativas

Como transformar uma

realidade social local –

ou seja, as propriedades

rurais impactadas

ambientalmente

Vivenciando e

experimentando as

novas técnicas de

recuperação de matas

nativas

Formando parcerias

estratégicas

Utilizando as interações

como espaços sociais

para capacitação por

meio de diálogos,

treinamentos,

interlocuções diárias,

eventos de lançamentos,

entrevistas

Gerando conhecimento

especializado

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

Passa-se, agora, à história da experiência de Bebedouro - SP na vertente de educação

ambiental.

Page 174: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

173

8.3 Agora, a história da experiência de Bebedouro na vertente de educação ambiental

A vertente da educação ambiental cobre principalmente a dimensão social, contribuindo

para a formação dos alunos e professores quanto à preservação dos recursos naturais. Ao

contrário da vertente de adequação ambiental, que tem foco na realização de negócios

sustentáveis viáveis do ponto de vista econômico, ou seja, cuidando da saúde da terra como

garantia de terras produtivas e de colheitas saudáveis, ao contribuir com a redução da perda da

biodiversidade na região. E ambas as vertentes são consoantes com a dimensão ambiental, uma

vez que um dos objetivos do Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental é a

agricultura sustentável.

Pode-se dizer que, enquanto o processo de aprendizagem social para uma agricultura

sustentável na vertente de educação ambiental foi originado a partir de uma experiência

in-house da Basf (da experiência de Guaratinguetá), na vertente de educação ambiental, foi

iniciado de acordo com cada realidade social em que atuam. Por isso, foi estabelecido um

protocolo e um plano de ações. Segundo o vice-presidente de educação para a sustentabilidade

da Fundação Espaço Eco:

A educação socioambiental acontece diferente, de maneira diferente para cada

uma das unidades ou para cada uma das regiões ou municípios ou fragmentos.

Então, é o caso mesmo de avaliação da realidade local para definir um

protocolo de intervenção.

Conforme dito anteriormente, as principais atividades dessa vertente são: o Atlas

Ambiental, material didático personalizado para cada cidade, no qual os alunos das escolas

públicas aprendem as características ambientais da região em que vivem; o Teatro Mata Viva,

que, além das peças de teatro, tem atividades lúdicas e palestras sobre sustentabilidade; e a

Trilha Ecológica Mata Viva, que consiste em atividades pedagógicas em uma trilha natural

onde os alunos desenvolvem a sensibilização e conscientização sobre reflorestamento e meio

ambiente, colaborando com a aproximação das crianças com a natureza.

No caso de Bebedouro, a história de cada atividade é relatada separadamente, mas antes

de começar a contá-las, é preciso apresentar brevemente outros atores sociais: a Estação

Experimental de Citricultura de Bebedouro, a Cooperativa de Crédito Credicitrus (SICOOB

CREDICITRUS) e o Fundo de Investimento Social e Cultural Coopercitrus/Credicitrus (FISC).

Page 175: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

174

Antes, ainda, é importante dizer que a COOPERCITRUS, apresentada brevemente na

história anterior, oferece diversos serviços para os seus cooperados, tais como: lojas de insumos

agrícolas, concessionárias da marca Valtra, centros de distribuição, armazéns graneleiros,

beneficiamento de sementes, recebimento, armazenamento e beneficiamento de café, postos de

combustíveis, centro automotivo, entrega de óleo diesel, centrais de recebimento de

embalagens vazias de agrotóxicos, feira de agronegócios (FEACOOP), revista agropecuária,

cooperativa de crédito e a parceria com a Estação Experimental de Citricultura de Bebedouro

(COOPERCITRUS, 35 ANOS, 2011). Para a história da experiência de Bebedouro na vertente

de educação ambiental, interessam apenas a Estação Experimental de Citricultura de

Bebedouro e a Cooperativa de Crédito Credicitrus (SICOOB CREDICITRUS).

A Estação Experimental de Citricultura de Bebedouro substituiu a Fundação de

Pesquisas Agroindustriais de Bebedouro (FUPAB), instituída em 11 de julho de 1978, por

vários citricultores de renome da região, inclusive membros da COOPERCITRUS. Essa nova

razão jurídica foi instituída formalmente em 18 de outubro de 1982 com a finalidade de: i)

desenvolver projetos de pesquisa em citricultura; ii) desenvolver projetos de culturas

alternativas a citricultura regional, nas áreas de agricultura e fruticultura; iii) prestar serviços de

assistência técnica a citricultura regional, com base nas pesquisas nela desenvolvidas ou

transferidas de outras áreas; iv) distribuir material genético de qualidade comprovada pelos

padrões em vigor; e v) sediar eventos, tais como: reuniões técnicas, simpósios, dias de campo,

visando a melhoria tecnológica da citricultura, agricultura e fruticultura regionais.

Já a SICOOB CREDICITRUS foi fundada em 14 de setembro de 1983 com o objetivo

inicial de atuar como braço financeiro da COOPERCITRUS. A sigla SICOOB CREDICITRUS

denota sua vinculação ao Sistema de Cooperativas de Crédito do Brasil. Sua carteira tem mais

de 50 mil cooperados e 49 filiais no estado de São Paulo e no Triângulo Mineiro. Além dos

produtores rurais, seus cooperados tradicionais, atende outros segmentos de pessoas físicas e

jurídicas como: engenheiros agrônomos, veterinários e zootécnicos; médicos e demais

profissionais da saúde; e micro e pequenas empresas. De acordo com dados do exercício

encerrado em 31 de dezembro de 2011, seus ativos totais somam R$ 2,73 bilhões, seu

patrimônio líquido é de aproximadamente R$ 700 milhões e suas operações de crédito

totalizaram R$ 1,44 bilhão no ano (SITE SICOOB CREDICITRUS, 2012).

Juntas, COOPERCITRUS e SICOOB CREDICITRUS “recebiam muitos pedidos de

entidades sociais, mas como o dinheiro não é da cooperativa e sim do cooperado, não podia

dispor dele de qualquer maneira”, diz um consultor das duas instituições. Desta forma, ele

Page 176: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

175

acrescenta: “Foi criado um fundo, não para fazer doações, mas sim, financiamento de projetos

nas áreas de atuação das duas cooperativas”. Dessa forma, em 2005, foi criado o Fundo de

Investimento Social e Cultural Coopercitrus/Credicitrus (FISC) para apoiar projetos específicos

das entidades sociais que atuam no terceiro setor, nas regiões de atuação da COOPERCITRUS

e SICOOB CREDICITRUS.

Agora, eis as histórias de cada uma das atividades da vertente de educação ambiental na

cidade de Bebedouro (SP). A primeira a ser contada será a da Trilha Ecológica Mata Viva,

porque foi a primeira a ser implantada em Bebedouro nessa vertente.

8.3.1 A história da estruturação da atividade da Trilha Ecológica Mata Viva na cidade

de Bebedouro – SP

“Com a disponibilização de recursos do Fundo FISC, o diretor-gerente da Estação

Experimental lançou a idéia de se criar um projeto de educação ambiental. No início, a gente

pensou só em criar um viveiro e fazer palestras sobre educação ambiental naquele espaço”,

disse o consultor da COOPERCITRUS e SICOOB CREDICITRUS. Assim, foi providenciada

a infraestrutura para atender as escolas, como a criação do viveiro, a construção dos banheiros

etc.

Ele conta que, tão logo tomou ciência dessa iniciativa, a Fundação Espaço Eco se

ofereceu para ser uma parceira, por meio da agregação de conhecimento especializado. Ou seja,

a Fundação Espaço Eco avaliou a realidade local da região: i) a disposição dos atores sociais

para empreender uma iniciativa em consonância com as diretrizes da sua área de atuação em

educação para sustentabilidade – disseminar conhecimento para transformar a realidade local a

partir dos pressupostos da agricultura sustentável da vertente de adequação ambiental; e ii) a

disponibilidade de um espaço com infraestrutura apropriada que favoreça a aprendizagem para

uma agricultura sustentável, no caso, a Estação Experimental.

Em seguida, a Fundação propôs um protocolo e um plano de ações, como a contratação

de uma empresa com especialização em processos de aprendizagem com a natureza; a criação

da trilha em uma das matas na Estação Experimental; a definição das cidades que tomariam

Page 177: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

176

parte nas atividades da Trilha Ecológica Mata Viva; e a elaboração de material pedagógico,

treinamentos da equipe e dos professores etc.

Essa atividade da Trilha Ecológica Mata Viva é apoiada pela metodologia de

vivências com a natureza do educador naturalista americano Joseph Cornell, por meio de uma

parceria com o Instituto Romã. Esse Instituto foi contratado pela Fundação Espaço Eco para:

fornecer apoio pedagógico aos professores de terceira e quarta séries do Ensino Fundamental –

ciclo I para o trabalho do tema transversal de Meio Ambiente; desenvolver material didático e

capacitar os professores para a utilização deste material; e oferecer atividades extraclasses com

alunos e professores na Estação Experimental de Citricultura de Bebedouro (SITE INSTITUTO

ROMÃ, 2012).

A proposta desse plano de ações foi fechada, inclusive o compartilhamento dos

recursos, entre Basf, COOPERCITRUS e SICOOB CREDICITRUS (por meio do Fundo

FISC), e foi um diálogo com tranquilidade e rapidez porque o consultor da COOPERCITRUS e

SICOOB CREDICITRUS tinha um papel chave na administração pública de Bebedouro. Ele

explica: “Nesse momento, eu era secretário de Educação e Cultura e ficou facilitado o caminho,

tanto para as cooperativas quanto pra Basf, porque eu estava num lugar estratégico naquele

momento”.

Também foi necessária a presença de um coordenador para essa atividade na região, e,

assim, entra a arquiteta com especialização em paisagismo, um novo ator social nesse

Programa, ainda na fase inicial de implantação do projeto. Suas primeiras tarefas foram definir

as cidades que tomariam parte nas atividades da Trilha Ecológica Mata Viva e ajudar na

abertura da trilha na mata da Estação Experimental.

A abertura da trilha foi feita pela coordenadora do projeto na região de Bebedouro e

pelos funcionários da Fundação Espaço Eco, do Instituto Romã e da Estação Experimental.

Segundo a coordenadora, essa tarefa levou alguns dias, porque o desenho pedia uma trilha bem

sinuosa, com algumas clareiras pequenas destinadas às paradas e às conversas e reflexões com

as crianças. Também houve mudanças na saída da mata cuja direção deveria ser para um lugar

mais bonito. Essa trilha foi planejada para cerca de três horas de atividades.

Quanto à seleção das cidades participantes, a coordenadora conta que a CREDICITRUS

pediu que a atividade Trilha Ecológica Mata Viva também visasse outros municípios

atendidos pela cooperativa, além de Bebedouro. Dessa forma, utilizaram o critério da distância

entre Bebedouro, onde fica a Estação Experimental, e os demais municípios, para não

atrapalhar a rotina das crianças e dos seus familiares:

Page 178: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

177

Nós fizemos um estudo: qual seria a distância que a gente poderia aguardar essas

crianças chegarem de viagem, ter tempo suficiente pra fazer o atendimento e depois

poder fazer a viagem de volta. Então, elas chegariam à escola no horário e sairiam

no horário de sempre. Para não atrapalhar, porque muitas vezes os familiares que

buscam as crianças na escola têm um horário. É tudo certinho para poder chegar,

pegar a criança, deixar em algum lugar, ir para o trabalho. Então, a gente não queria

avançar e atrapalhar.

Assim, inicialmente, foram selecionados os municípios que fazem divisa com

Bebedouro e os primeiros diálogos foram visitas, em conjunto com a Fundação Espaço Eco, aos

secretários de educação ou diretores. A coordenadora lembra que algumas cidades são muito

pequenas, com apenas uma escola e quem responde pela educação do município é o próprio

diretor, como Taiaçu, Taquaral e Jaborandi.

Ao longo dessas visitas de apresentação e de convite formal para participar da atividade

Trilha Ecológica Mata Viva, foi elaborado pela coordenadora da atividade um documento

denominado “mapeamento dos stakeholders” com as seguintes informações sobre a realidade

dos municípios: infraestrutura, programas ambientais em vigor, principais problemas

ambientais, necessidades do município para elaboração da apostila, definição do ano letivo (4º

ou 5º ano do ensino fundamental) a ser atendido pela atividade etc.

Esses primeiros diálogos foram tranquilos de serem feitos por conta da força política do

consultor da COOPERCITRUS e SICOOB CREDICITRUS que tinha contatos diretos com os

secretários dos demais municípios, facilitando a adesão desses municípios ao Programa. O

consultor explica:

A COOPERCITRUS e a CREDICITRUS já têm um nome muito forte aqui. Então,

quando outros municípios ouvem falar que é um projeto da COOPERCITRUS,

então, automaticamente a adesão já é facilitada. Eu, nesse papel, ficou mais fácil

ainda, porque muitos municípios já me conheciam por causa do meu trabalho na

área de educação. Então, tudo isso facilitou a adesão de outros municípios ao

projeto.

O segundo encontro com os secretários e diretores de escola foi realizado em

Bebedouro, na sede da CREDICITRUS, onde foi feita a apresentação formal da Trilha

Ecológica Mata Viva, e realizada uma dinâmica com os participantes voltada para o trabalho

de educação ambiental em sala de aula.

O terceiro encontro foi para apresentar a Estação Experimental, mas não a trilha, e

também integrar os professores, em que foram discutidos aspectos da educação ambiental nas

Page 179: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

178

cidades de origem, nas salas de aula, na sociedade. Também foi feita uma dinâmica para debater

como tornar o material didático amigável para os professores.

O quarto encontro foi de capacitação para os professores realizado na Estação

Experimental. Além de terem participado da trilha, conheceram e foram treinados para utilizar

a apostila de apoio ao ensino em sala de aula, que foi elaborada pelo Instituto Romã, como

resultado dos diálogos acima. Segundo a coordenadora, “trata-se de um material didático bem

detalhado, prático, criativo, boa qualidade de impressão, próximo da realidade, objetivo, com

informações sobre legislação, jogos multipedagógicos, ilustrações etc.” Ela explica que:

Essa primeira capacitação fazemos em período integral. Então, primeiro

fizemos a trilha com eles. Que eles não conheciam, nunca tinham feito. Fizeram a

trilha de manhã, depois almoçamos juntos e, à tarde, fizemos um encontro para

capacitar o professor a utilizar esse material e envolvê-lo no Programa Mata Viva,

além de estimular o desenvolvimento dessas atividades com os seus estudantes.

Em paralelo a essas atividades, a equipe da Trilha Ecológica Mata Viva foi capacitada

na metodologia de vivências com a natureza pelo Instituto Romã. Esse treinamento durou

quatro dias, imerso dentro da Jureia, uma mata fechada, e depois na Fundação Espaço ECO.

Na cidade de Bebedouro, hoje, participam dessa atividade oito municípios, atendendo

alunos do 4º ano do ensino fundamental. O programa também inclui a produção de mudas de

espécies nativas para serem plantadas em áreas de preservação permanente dos produtores

rurais

Em 2009, houve interrupção da Trilha Ecológica Mata Viva, porque uma nova equipe

assumiu a administração da cidade. O secretário de Educação e Cultura da gestão anterior conta

que essa nova gestão optou por deixar a cargo da escola a opção de participar ou não da

atividade, não fazendo mais parte do Plano Político Pedagógico (PPP) do município. Ele pontua

esse momento:

Eles optaram assim. É uma questão política deles, desse Brasil que a gente nunca

entende. Sai uma gestão, a outra acha que tem que desfazer tudo que foi feito

anteriormente. Então, a continuidade das políticas públicas é sempre complicada

[...]. Primeira surpresa, quando nós deixamos o departamento de Educação, tudo foi

desmontado.

Contudo, essa interrupção ocorreu no primeiro ano da nova gestão e a parceria foi

retomada após acerto com a Coopercitrus, conta a Diretora do Departamento municipal de

Educação e Cultura (DEMEC) de Bebedouro:

Page 180: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

179

O departamento se fortaleceu quando veio o ensino fundamental. E a gente sempre

procurou ter parcerias com outras instituições [...]. Não é porque mudou uma gestão

que a gente para com os projetos, damos continuidade. Então, logicamente,

quando assumimos aqui, houve, sim, a conversa com a Coopercitrus. Foram

pontuadas quais seriam as melhores séries a serem trabalhadas por parte da

educação. E, a partir daí, então, nós não tivemos, assim, mais problemas.

8.3.1.1 As crianças, os professores e as atividades ao longo da Trilha Ecológica Mata Viva

A experiência mostrada a seguir se passou com 23 alunos da Escola Municipal Profª

Dirce da Silva Dias, “uma escola de periferia, em que a questão do respeito, principalmente

com o meio ambiente, é carente, muito carente”, disse a professoras Miriam, que acompanhou

as crianças nessa atividade. Como eu tomei parte nessas atividades como observadora

não-participante, as antenarrativas discutidas a seguir estão também baseadas nas minhas

anotações no diário de campo.

A atividade Trilha Ecológica Mata Viva está dividida em quatro fases. A primeira é

denominada “o despertar do entusiasmo” e é feita antes das crianças entrarem na trilha. Como

elas chegam muito ansiosas, é necessário acalmá-las para que elas possam dar atenção à mata,

objetivo principal da atividade. É o momento de relaxar, esquecer os problemas de casa e de

integrar as crianças com a equipe da Trilha Ecológica Mata Viva. A equipe aproveita para

sentir o grupo, se é muito agitado ou tranquilo, até para saber qual a melhor maneira de

conduzi-lo.

Nessa atividade, é feita uma roda, onde cada criança se apresenta e, em seguida, são

feitos alguns exercícios de alongamento. Caso seja uma turma muito grande, a equipe da Trilha

Ecológica divide em grupos menores. Realiza-se uma brincadeira “que animal sou eu”, cujo

objetivo é descobrir qual a foto do animal que está nas costas de cada criança. Para tanto, as

crianças fazem perguntas e as respostas se limitam a sim, não ou talvez. A próxima atividade,

em geral, é a “corujas e corvos”, uma corrida para aquecer as crianças. Contudo, foi suspensa

por conta do período de seca na região. Assim, passaram para a atividade três, também com o

objetivo de acalmar as crianças, chamada “mariposas e morcegos. As professoras comentaram

que repetirão essa atividade na escola. Durante essa atividade, apareceu um macaquinho,

deixando todos encantados com a sua presença.

Page 181: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

180

A segunda fase é a de observação da natureza. A primeira atividade é o bingo da

natureza para trabalhar os sentidos. Para tanto, cada criança recebe uma cartela com vários

desenhos, para marcar o que é visto ao longo da trilha. É feita em silêncio. Após a conclusão,

em uma das clareiras da trilha, é discutido o que cada criança viu. Houve criança que viu até a

casa do Tarzan. Olha quanta imaginação!

A próxima atividade dessa fase é a trilha da surpresa, cujo objetivo é identificar objetos

que não têm relação com a natureza, como latas enferrujadas, pentes, vasilhas de plástico etc. É

feito em duplas. A equipe da Trilha Ecológica Mata Viva Mata Viva disponibilizou cerca de

20 objetos diferentes na mata. Normalmente, a média de descoberta das crianças é em torno de

15 elementos.

A terceira fase é a experiência direta com a natureza, cujas atividades são: a idade das

árvores, na qual as crianças abraçam as árvores; a trilha da lagarta, onde as crianças andam de

olhos vendados e, aos poucos, vão se aglutinando para demonstrar o encapsulamento da lagarta

e posterior transformação em borboleta; busca de cores e sons na mata, para identificar quantas

cores há na mata; mata fotográfica para fotografar momentos interessantes na mata.

Por último, a fase de compartilhar sentimentos, na qual cada criança diz qual o seu

sentimento em relação à natureza, naquele momento, ao término da Trilha Ecológica Mata

Viva. Eu ouvi as seguintes expressões: amor, carinho, paz, legal, emocionante, respeito, paixão,

muito bom, encantamento, entrosamento, harmonia e feliz.

Segundo as professores, após essa atividade, o olhar do aluno muda, porque ele passa a

ficar mais atento ao som dos pássaros e a observar com mais cuidado o ambiente em que ele

vive. Elas consideram essa dinâmica o ponto de partida para a mudança de comportamento dos

alunos do 4º aluno, complementada pelas atividades sugeridas pela apostila.

Os conflitos se evidenciam quando há solicitação pelas escolas de extensão dessa

atividade para os outros anos. Contudo, dado o tamanho da rede de municípios da região, há

restrições de recursos financeiros, humanos, e transporte.

Page 182: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

181

8.3.2 Reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura sustentável na

narrativa de Bebedouro na vertente de educação ambiental – Trilha Ecológica Mata Viva

A narrativa da experiência de Bebedouro na vertente de educação ambiental do

Programa Mata Viva na atividade da Trilha Ecológica apresenta os seguintes elementos de

aprendizagem social para uma agricultura sustentável, a saber:

Sensibilização e vivência dos atores sociais

Essa história da Trilha Ecológica Mata Viva mostra principalmente como os atores

sociais – alunos do ensino fundamental, professores e a equipe de apoio – aprendem: por meio

da experimentação, da vivência e sensibilização.

Segundo um dos membros da equipe da Trilha Ecológica Mata Viva:

No primeiro momento, ele sensibiliza, traz essa realidade para a pessoa, criança,

adulto, idoso, todo mundo que passou por lá. Então, ele faz com que primeiro a

gente se sensibilize, se sinta parte da natureza, do ambiente, pra depois nós

cuidarmos. Quando nós já estamos dentro, quando a gente se sente parte integrada

do ambiente, nós temos a preocupação de cuidar.

Esse membro que trabalhou por cerca de dois anos nessa atividade é biólogo, formado

em Ciências Biológicas, e também professor da rede municipal de Bebedouro. Em seu trabalho

de conclusão do curso, ele procurou saber quais eram as implicações da Trilha Ecológica Mata

Viva na vida das crianças e fez uma comparação entre os 3º e 4º anos de escolas particular e

pública. Para isso, ele solicitou às crianças, antes de participarem da atividade Trilha Ecológica

Mata Viva, que fizessem um desenho e respondessem um pequeno questionário sobre o que

representava o meio ambiente para elas. Essas atividades foram repetidas após a realização da

Trilha Ecológica.

Page 183: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

182

As conclusões são animadoras. Primeiro, os resultados mostraram que o método é eficaz

e eficiente nas faixas etárias de idade pesquisadas, mas, principalmente, nos menores de idade,

do 4º ano do ensino fundamental, porque essas crianças estão mais abertas e dispostas a

aprender. Segundo, o método é mais impactante para os menores da zona rural, porque até

então, não tinham feito passeios dessa magnitude. Ele conta que tinha criança que chegava à

mata achando que era uma mata amazônica, e dizia: “Nossa, eu nunca entrei numa mata! Olha,

é muito bonito”. Ele conta que a criança da escola particular, no início, não se deslumbra muito,

mas aos poucos, por meio do método, da experiência, vai se sensibilizando, se envolvendo.

A professora da Escola EMEF Yolanda Carolina Giglio Villela de Bebedouro, que

também participou da Trilha Ecológica, comenta:

Então, quando o Projeto Mata Viva chegou todo apostilado, com texto excelente e

tal, falei assim: “-Nossa! Que legal!” E quando cheguei lá, eu me lembro da

primeira trilha que eu fiz. É algo, assim, que é inesquecível, inesquecível. Então,

foi uma experiência muito enriquecedora, tanto para o professor quanto para o

aluno.

Uso de ambientes organizacionais e da mata como espaço para vivência e aprendizagem

social para uma agricultura sustentável

Nessa história, o ambiente organizacional da Estação Experimental favoreceu a

aprendizagem social para uma agricultura sustentável, porque se trata de um espaço localizado

em área de mata, cujas edificações foram construídas de modo a propiciar também as atividades

ao ar livre. A abertura da trilha nesse espaço comprova isso. Nesse caso, a mata passa a ser um

espaço social de convívio direto com a natureza. O único inconveniente desse espaço para essa

atividade são os períodos de chuvas e, em menor escala, o período do inverno.

Também no espaço da Estação Experimental acontecem a sensibilização e capacitação

dos professores onde aprendem a utilizar a planilha de apoio ao ensino em sala de aula.

Page 184: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

183

Formação de parcerias estratégicas robustas

Novamente, parceiros fortes são a chave desse Programa para que resultados como os

relatados acima sejam duradouros. Nessa história, essas parcerias também têm o papel de

provedoras de metodologias e ferramentas nessa aprendizagem social para uma agricultura

sustentável. Nessa história, esse papel cabe ao Instituto Romã e à Estação Experimental que

conseguem criar um espaço que favorece essa aprendizagem permeado por um método que

inspira, instiga, sensibiliza e faz com que os atores sociais vivenciem uma experiência de

respeito e proteção ao meio ambiente, em linha com a realidade local da região, que é o

agrobusiness.

Em segundo lugar, as parcerias atuam como disseminadoras para propagar e difundir

outras atividades de vivência e respeito à natureza. Nessa história, esse papel cabe aos

professores que aplicam o conteúdo da apostila recebida, no dia a dia da sala de aula junto aos

alunos.

Diálogos frequentes na rede de municípios

Além dos contatos anuais para agendamento de novas turmas feitos diretamente com as

escolas, a equipe da Trilha Ecológica Mata Viva está sempre em contato com os professores

ao longo da execução das atividades, ouvindo experiências sobre o uso da apostila, os

resultados obtidos, inclusive ouvindo melhorias, como, por exemplo, adaptar a trilha para

crianças com deficiências.

Esses diálogos são facilitados porque a atividade da Trilha Ecológica Mata Viva é um

dos projetos mais bem avaliado pelas escolas da região. Segundo a coordenadora da atividade:

Temos tido resultados muito positivos aqui. O Projeto Mata Viva é um dos

projetos mais bem avaliados em todas as escolas. Todo ano, todo início de ano,

entramos em contato com os secretários de Educação, para falar da continuidade

do projeto e todos concorram: “Vai continuar, porque todos os professores gostam

muito do projeto e os alunos, também.”

Page 185: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

184

Quadro 21: Resumo das reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura sustentável

na narrativa de Bebedouro na vertente de educação ambiental – atividade Trilha Ecológica Mata Viva

Vozes participantes

Objetivos do

elemento de

aprendizagem social

identificado

O que foi aprendido? Como aprendeu?

Fundação Espaço Eco,

Coopercitrus,

Estação Experimental,

alunos e professores

Alcançar resultados

como mudança de

comportamento e

conduta dos alunos e

professores

Como estruturar um

instrumento de

integração e vivência

com a natureza

Sensibilizando e permitindo a

experimentação pelos atores

sociais

Utilizando ambientes

organizacionais, como a

Coopercitrus e a mata como

espaço para vivência

Formando parcerias

estratégicas

Dialogando com frequencia

na rede de municípios

Como integrar alunos e

professores com a

natureza

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

Passemos, agora, à história da experiência de Bebedouro na vertente de educação

ambiental no Atlas Ambiental.

Page 186: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

185

8.3.3 A história da atividade do Atlas Ambiental na cidade de Bebedouro – SP

Atores sociais envolvidos: Departamento Municipal de Educação e Cultura;

professores e alunos da Escola EMEF Yolanda Carolina Giglio Villela; Geodinâmica,

Coopercitrus e Credicitrus

Para contar essa história, eu novamente conduzo uma análise de trama ou de enredo a

partir da identificação de relações pertinentes entre as diversas antenarrativas ouvidas e lidas de

vários eventos ocorridos para discutir o processo de aprendizagem social na atividade do Atlas

Ambiental na vertente de educação ambiental do Programa Mata Viva. E é o coordenador de

stewardship da unidade de Proteção de Cultivos da Basf Agro que começa a contar como surgiu

a idéia de desenvolver um material didático para as escolas exclusivamente voltado para a

cidade de Bebedouro:

A idéia surgiu no ano passado, a partir da iniciativa da unidade de proteção de

cultivos da Basf e da Fundação Espaço ECO. Começamos a discutir internamente

sobre a possibilidade de criarmos uma ferramenta de educação ambiental em

Bebedouro, em parceria com a Coopercitrus, principalmente porque já vínhamos

desenvolvendo juntos outros projetos de muito sucesso na parte de educação

ambiental, dentro do Programa Mata Viva, e também junto a cooperados em termos

de restauração de áreas degradadas de propriedades rurais. (REVISTA

COOPERCITRUS, 2008)

Os projetos os quais o coordenador se refere são a recuperação e restauração de áreas de

preservação permanente, por meio do plantio de mudas de espécies nativas, nas propriedades

rurais da vertente de adequação ambiental e o Trilha Ecológica Mata Viva. Ele continua a

contar:

Então nós encontramos uma empresa que fornecia ferramentas de imagens por

satélite e surgiu a idéia do Atlas, voltado para questões de preservação ambiental.

Chamamos de Atlas, mas é um conceito totalmente diferente e inovador, é um

material inédito, não existe nada parecido no Brasil.

(REVISTA COOPERCITRUS, 2008)

Page 187: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

186

A empresa contratada como parceira nessa vertente foi a Geodinâmica, organização

especializada na implantação de políticas públicas, que elaborou a metodologia MAPA do

Atlas Ambiental, baseada em imagens espaciais via satélite, que revelam informações sobre as

matas, os oceanos, os animais, a urbanidade, o clima, a cultura, a sociedade, a história e a

política do Brasil e do mundo. Segundo o site dessa empresa, a palavra MAPA – Mundo,

Ambiente, Pertencimento e Ação – sintetiza:

A imagem da representação cartográfica, fundamental para o desenvolvimento de

raciocínios espaciais requeridos para pensar o Mundo contemporâneo, enfrentando

as questões relativas ao meio Ambiente natural e construído não de maneira genérica

e abstrata, mas sob o prisma do Pertencimento ao lugar, o que permite a professores

e alunos desenvolver uma Ação consequente e concreta a partir de sua realidade.

(SITE GEODINAMICA, 2013).

Ou seja, o processo de aprendizagem social para uma agricultura sustentável na

atividade do Atlas Ambiental começa com a formação de parcerias estratégicas – conta com a

presença de um parceiro, a Geodinâmica – com competências para prover ferramentas de

imagens por satélite e metodologia de ensino.

Para operacionalizar essa ferramenta de educação ambiental em Bebedouro, no caso o

conteúdo pedagógico do material, a cidade de Bebedouro foi estudada em profundidade, disse a

coordenadora editorial da Geodinâmica:

Fizemos um verdadeiro raio-x de Bebedouro, uma investigação muito profunda

sobre a cidade. Nossa preocupação foi mostrar as conexões entre o global e o local,

que a criança mora em Bebedouro, mas que o mundo não é só o que ela vê na

televisão, que Bebedouro está inserido em um Estado, em um país, em um

continente e em um planeta. O Atlas faz essa ligação do global para o local, local

para o global. Foi um trabalho minucioso. (REVISTA COOPERCITRUS, 2008)

O resultado do investimento de mais de 200 horas de entrevistas com 56 especialistas de

conceituadas instituições de ensino do país, ao longo de quatro meses, é um livro com cerca de:

90 páginas, 40 temas, 19 imagens exclusivas via satélite e 27 mapas sobre temas ligados a

ciências, geografia, história, meio ambiente, sustentabilidade, questões socioambientais, além

de aspectos sobre a cidade de Bebedouro, como sociedade, cultura, costumes e outros

(REVISTA COOPERCITRUS, 2008). Como disse o diretor do Departamento de

Page 188: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

187

Desenvolvimento Sustentável da Secretaria de Meio Ambiente “este material derruba aquela

forma de discussão das questões ambientais fora da realidade local” (IBIDEM).

Essas antenarrativas mostram que a aprendizagem social para uma agricultura

sustentável na atividade do Atlas Ambiental continua com o diálogo com a realidade local:

entendimento profundo da cidade de Bebedouro para identificar os parâmetros entre global e

local, macro e micro. O coordenador de stewardship da unidade de Proteção de Cultivos da

Basf Agro complementa:

Por meio deste material os estudantes conseguem sair da escala do município de

Bebedouro e ver qual a importância do município, em termos de meio ambiente, para

o Estado de São Paulo, do Estado para o Brasil e do Brasil para o planeta terra como

um todo. E, nesse contexto amplo, vão começar a entender que pequenas atitudes que

eles têm no dia-a-dia podem contribuir de maneira positiva ou negativa para tudo isso

que a gente escuta na mídia, que está acontecendo com o planeta. E nossa maior

expectativa é que esse tipo de educação não se perca na hora em que eles se tornarem

adultos, para que tenham essa conscientização pelo resto da vida. (REVISTA

COOPERCITRUS, 2008).

Isso se torna possível porque, segundo a coordenadora de conteúdo em Geografia da

USP, uma das especialistas consultadas para o desenvolvimento do Atlas:

O material tem um entrelaçamento de diferentes áreas do conhecimento que são

trabalhadas na escola. Com os materiais gráficos, o aluno tem a possibilidade de

fazer uma leitura em diferentes escalas de um mesmo fato. (IBIDEM).

Uma das professoras do 5º ano de uma das escolas de Bebedouro dá mais exemplos de

como utilizar o Atlas Ambiental para atividades em sala de aula e conectá-lo com a realidade

social local:

Dentro do nosso planejamento, vamos supor, eu estou falando de sustentabilidade,

tem pranchas dentro do atlas que falam sobre sustentabilidade. Há um projeto do Ler

e Escrever, que é o Universo ao meu Redor, então, a gente pega o atlas ambiental

porque as pranchas são muito interessantes. Então, complementa o assunto. Hoje,

por exemplo, eu vou dar uma aula pra eles de História que conta a história do

município, a localização, tudo. Então, não vou usar o livro didático deles, mas

o conteúdo via atlas ambiental.

Então, a primeira impressão é de encanto. Aí você fala assim: “Espera aí, tudo bem,

por fora é muito lindo. E por dentro? O que ele tem também por dentro?” E aí que

nós começamos a estudar, ver o que tinha, o que a gente deveria estar usando.

Foi aí que veio a ideia do primeiro memorial da escola. Folheando o mapa, nós

vimos um senhor que tem uma coleção de rádios antigos. Eu falei assim: “Olha, eu

moro aqui tanto tempo, eu nem sabia disso.” Via atlas ambiental, nós o convidamos,

Page 189: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

188

ele veio aqui, fez uma exposição que fez parte do nosso memorial e tudo. Então,

assim saem ideias também, quando começa a folhear o atlas. Você está

folheando, de repente, vê alguma coisa e fala assim: “Nossa, olha, que legal, eu

não pensei nisso. Vamos utilizar essa ideia aqui pra trabalhar esse conteúdo aqui”.

Antes da utilização na sala de aula, os professores foram capacitados sobre o novo

material didático pelos profissionais da Geodinâmica. O livro do professor fornece orientações

didáticas voltadas para a prática reflexiva dos educadores em sala de aula. O material apresenta

fundamentação teórica e didática; sugestões de atividades; textos, fotos, mapas, tabelas e outros

materiais complementares. O material do aluno é o próprio Atlas Ambiental de Bebedouro,

mostrado acima (SITE GEODINAMICA, 2013).

No caso de Bebedouro, os professores participaram da estruturação do Atlas Ambiental,

ou seja, eles não foram capacitados diretamente no material didático porque ainda estava sendo

elaborado pela Geodinâmica, conta a coordenadora pedagógica das oficinas da Escola EMEF

Yolanda Carolina Giglio Villela:

Na primeira formação, foram convocados o coordenador, os professores de História,

Geografia e Ciências. Como todas as formações, como todas as reuniões que

chegam, é por meio de uma convocação. O primeiro momento: “Ah, mais uma.”

Porque a gente sempre pensa assim: “Mais um projeto. Ah, mais uma coisa pra

gente fazer. Nós temos tanta coisa na escola.” O primeiro momento foi esse. Nós

fomos pra formação. [...] E essa formação foi durante um ano, era uma vez por mês.

Então, quando nos apresentaram, na verdade, nem tinha ainda o livro. Eles estavam

iniciando a forma... Começando com esse atlas. Primeiro, veio a ideia de se inserir

esse atlas ambiental de Bebedouro. Então, quando nós conhecemos o material, num

primeiro momento, a gente gostou: “Isso aí é um atlas que vai falar sobre

Bebedouro”. E assim continuaram as formações.

Ao longo dessas formações, também foram trabalhadas as sequências didáticas,

planejamento de aulas a partir das pranchas do livro, desenvolvimento de práticas didáticas com

metodologias de leituras, entre outras, mesmo ainda não tendo o material em mão, continua

contando a coordenadora pedagógica das oficinas da Escola EMEF Yolanda Carolina Giglio

Villela:

Nós conhecemos o Atlas Ambiental lá, no primeiro encontro de capacitação, através

do data show, porque ele ainda não estava pronto. Nós desenvolvemos alguns planos

de aula: como poderia trabalhar, de forma interdisciplinar, História, Geografia e

Ciências. E para nós também era uma surpresa. Como trabalhar isso. Então, essa

formação foi para isso. Durante um ano, foi isso. Até que conhecemos depois, veio um

modelinho lá do Atlas. Até aquele momento, existia muita coisa ainda para refazer, os

professores falavam assim: “Ah, mas isso aqui é assim, não é bem desse jeito”. E foi

passando essas informações para a Geodinâmica.

Page 190: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

189

A participação e o engajamento dos professores foram cruciais para a elaboração de um

material didático que é considerado excelente por alunos, pais, professores e comunidade em

geral. Nesse caso, a relação de poder entre os idealizadores do Atlas Ambiental (unidade de

Proteção de Cultivos da Basf Agro, Fundação Espaço Eco, Coopercitrus, Credicitrus,

Geodinâmica) e os professores e coordenadores das escolas foi consultiva (KEEN; BROWN;

DYBALL, 2005). Mesmo que os professores tenham sido convocados para tomar parte neste

Programa. Em outras palavras, esses dois grupos trocaram informações, mas somente um

decidiu o melhor curso a ser tomado, no caso a Geodinâmica, que é a responsável pela

metodologia MAPA do Atlas Ambiental. Essa relação de poder entre esses dois grupos pode

dizer que também foi co-criativa, na qual os participantes compartilham conhecimento para

criar novos entendimentos e responsabilidades (IBIDEM).

Foram feitos vários treinamentos para os demais professores após a finalização do Atlas

Ambiental, tendo o último ciclo de formação se encerrado em maio de 2012: “Com essa

formação atingimos quase 100% dos professores da nossa rede, portanto, interessa-nos

formações de reciclagem para que o Atlas não perca a sua utilização nas unidades escolares.”,

conta a coordenadora de projetos socioambientais do Departamento municipal de Educação e

Cultura (DEMEC).

Além disso, há uma comunidade de prática para compartilhar conhecimento,

experiências, esclarecimento de dúvidas, suporte entre a rede de professores que utilizam o

Atlas Ambiental e a Geodinâmica no Google. Essa comunidade de prática permite o

engajamento de atividades conjuntas, o entendimento comum de algum problema e a

experiência comum de algumas identidades de grupo, segundo Bouwen e Taillieu (2004). Para

tanto, basta ter uma senha do Google e acessar a qualquer momento as discussões e materiais

disponíveis nessa comunidade. No site da Geodinâmica, na aba “Professor”, também estão

disponíveis outros materiais para apoiar o educador, como outros livros do professor,

legislação, sequencias didáticas etc.

Assim, o próximo passo na aprendizagem social para uma agricultura sustentável na

atividade do Atlas Ambiental pode ser considerada a capacitação e sensibilização dos

professores, que também assumem o papel de parceiros estratégicos para influenciar outros

docentes e agirem como multiplicadores na rede de municípios da região. A capacitação e

sensibilização ocorrem por meio desses treinamentos, em que também são disseminadas

ferramentas de aprofundamento e sistematização de trabalho com o Atlas Ambiental. Por isso,

o espaço que favorece a aprendizagem do uso adequado do Atlas Ambiental são as múltiplas

Page 191: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

190

interações entre os professores e os formadores da Geodinâmica, que ocorrem nesses

treinamentos e na comunidade virtual do Google.

O lançamento do Atlas Ambiental de Bebedouro foi em 12 de novembro de 2008 na

Estação Experimental de Citricultura, beneficiando cerca de 5 mil alunos de 15 escolas da rede

pública do ciclo II (a partir do 6º ano) do ensino fundamental (REVISTA COOPERCITRUS,

2008). Dessa forma, o Atlas Ambiental dá continuidade às atividades da Trilha Ecológica Mata

Viva, destinadas aos alunos do 4º ano do ensino fundamental.

Contudo, na Escola EMEF Yolanda Carolina Giglio Villela, o Atlas Ambiental fica

guardado no armário da escola e é de uso coletivo para todos os professores e alunos, inclusive

do 1o ao 5

o ano. Isso foi possível porque uma das professoras do 5º ano conseguiu ver valor no

material para os primeiros anos escolares. Ela explica:

Quando chegou o atlas na escola [...] e na hora que eu peguei um livro do aluno na

mão, eu falei assim: “Que coisa mais linda!” Porque a primeira coisa que você vê é

o visual dele. “O que é isso?” Depois que eu fui me apropriando do que tinha lá

dentro, mesmo porque eu não tinha tido formação, porque a formação não era

voltada de 1º ao 5º ano, era 6º ano em diante.

E aí, quando nós começamos a usar, eu falei: “Não, isso é para o 5º ano também”.

“Não, espera aí, mas esse conteúdo aqui é meu. Então, eu falei: “A gente pode usar,

sim”. E aí as experiências com os anos anteriores também provam isso, que você

pode usar. Falam assim: “Ah, mas tem trechos que são complicados”, “Não, mas

tem a história de Bebedouro, a gente trabalha isso. Tem curiosidades, há os

mapas”. Então, eu acho que é um material muito democrático. Aqui na escola,

nós usamos o atlas desde o 1º ano.

A coordenadora pedagógica das oficinas da escola complementa a explicação dos

motivos da extensão do material para todos os anos:

Nós temos um memorial para contar a história dos bairros, a história da escola e [...]

nós decidimos no ano do memorial contar a história do município e depois a dos

bairros e da escola, onde nós conseguimos utilizar o atlas ambiental também, de

1º ao 5º ano. [...] Nós vimos a importância desse material de também ser utilizado

pelas crianças de 1º ano. Mas como por uma criança de 1° ano que não sabe ler e

escrever? Mas, ler através das figuras. No 1º ano, o professor vai trabalhar em

Geografia a localização dele no bairro e na escola. E a facilidade que essas crianças

tiveram em utilizar esse material. Ele é riquíssimo, tanto nas figuras como nas cores.

E as crianças começaram a se sentir pertencendo àquele bairro.

Com essa atitude, tudo indica que todos saíram ganhando: os professores e alunos do 1º

ao 5º ano e a comunidade de Bebedouro, conta a coordenadora de projetos socioambientais do

Departamento municipal de Educação e Cultura (DEMEC):

Page 192: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

191

O Atlas Ambiental era direcionado para o fundamental II. Mas, uma professora

começou a trabalhar no 5º ano e isso foi muito bem aceito. Foi aí que nós

implantamos depois para o 5º ano também. E isso foi um ganho aqui para cidade,

porque, na verdade, a gente estava com este projeto direcionado totalmente para

o fundamental II.

Essas antenarrativas mostram que, por meio da vivência e da experimentação, é possível

intervir com o propósito de transformação de uma realidade local. Como resultado, o Atlas

Ambiental faz parte do Plano Político Pedagógico (PPP) de Bebedouro e do projeto

institucional da Escola EMEF Yolanda Carolina Giglio Villela, que faz a articulação com todas

as disciplinas e com todos os anos de ensino. Como disse a coordenadora de projetos

socioambientais do Departamento municipal de Educação e Cultura (DEMEC): “Agora, o atlas

já está, eu acho, mais embutido dentro da realidade, do trabalho do dia a dia dos professores”.

Contudo, há resistência por parte de alguns professores em utilizar o Atlas Ambiental,

explica uma das professoras da Escola EMEF Yolanda Carolina Giglio Villela:

Como todo novo material, há professores que são resistentes, não vamos que falar

que não, porque, infelizmente, isso acontece. Mas, eu vejo assim, que o

material, quando ele é bem recebido, com formações, porque não adianta você jogar

um material sem ter nenhum tipo de formação. Mesmo achando lindo e maravilhoso,

o material é diferente de quando eu tive a primeira formação. Eu já vi o Atlas com

outros olhos. E é assim a casa nova formação. Então, generalizar, falar que ele foi

aceito por todos, que todos acham lindo e maravilhoso, não podemos nunca dizer

isso. Mas, que foi um material de fácil aceitação, foi. Mesmo porque eu acho que

trabalhar com algo exclusivo na sua cidade não tem preço.

Essa resistência pode ser explicada, em parte, pela falta de confiança de alguns

professores, principalmente daqueles que participaram de apenas um treinamento, conta a

coordenadora pedagógica das oficinas da Escola EMEF Yolanda Carolina Giglio Villela:

Nós ouvimos assim no depoimento de alguns professores: “Ah, mas eu vou não

saber como lidar, trabalhar com esse material”; “Ah, meus alunos não têm

condições de utilizar esse material”. Então, o que nós demos como resposta pra

eles (os outros professores): “Por ser uma escola que já está praticamente quase há

quatro anos com o Atlas, pode utilizar tranquilamente, porque os alunos têm

condições, sim. Nós temos essa experiência na escola”. Mas eu acho que é mais

uma questão de insegurança, porque estava sendo apresentado pela primeira vez

para os quintos anos.

Ela complementa:

Page 193: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

192

O que nós sabemos de notícias de outros colegas é que alguns professores ainda têm

dificuldade pra utilizar. Mas somente por isso. Justamente por isso que a gente vê a

importância dessa formação, para que eles tenham essa segurança. Mas, pelo que a

gente sabe, a maioria das escolas já está usando, sim.

Diante do que foi discutido acima, é possível dizer que a participação das escolas,

professores e alunos variam de um continuum de relação de poder desde a coerção – imposição

do Atlas Ambiental porque faz parte do Plano Político Pedagógico (PPP) do Departamento

municipal de Educação e Cultura (DEMEC) de Bebedouro – até relação de poder co-ativa, em

que todos estabelecem a própria agenda e negociam meios para agirem de forma colaborativa

(KEEN; BROWN; DYBALL, 2005).

Outro conflito evidenciado pela diretora do Departamento municipal de Educação e

Cultura (DEMEC) de Bebedouro é a pouca visibilidade desse departamento nos meios de

comunicação, quando há menção sobre o Programa Mata Viva de Adequação e Educação

Ambiental: “O único senão que eu vejo, sendo bastante sincera, é essa questão da pouca

visibilidade nos meios de comunicação em relação à questão do papel do setor educacional de

Bebedouro, que desempenha nessa parceria”.

A investigação não tem elementos para mostrar se há alguma relutância por parte

dos outros atores sociais quanto à essa questão colocada pela diretora do Departamento

municipal de Educação e Cultura (DEMEC). Assim, esse conflito pode ser considerado como

parte do processo e tema para negociação (KEEN; BROWN; DYBALL, 2005) entre

Coopercitrus, Credicitrus e Fundação Espaço Eco. Ou ainda, como a aprendizagem social para

a agricultura sustentável nesse Programa está baseada no paradigma do construtivismo social,

até mesmo esses tipos de “problemas não são dados como fatos para serem descobertos e

manuseados. Pelo contrário, são construídos por meio das interações entre os múltiplos atores”

(GERGEN, 1983 apud BOUWEN; TAILLIEU, 2004, p. 145).

Passa-se, agora, às reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma

agricultura sustentável nessa história.

Page 194: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

193

8.3.4 Reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura

sustentável na história de Bebedouro na vertente de educação ambiental – Atlas Ambiental

A história da experiência de Bebedouro na vertente de educação ambiental do Programa

Mata Viva na atividade do Atlas Ambiental apresenta os seguintes elementos de aprendizagem

social para uma agricultura sustentável, a saber:

Formação de parcerias estratégicas robustas

Nessa história, as parcerias da atividade do Atlas Ambiental assumem diferentes papéis

e responsabilidades. Primeiro, elas atuam como provedoras de metodologias e ferramentas.

Nesse Programa, esse papel cabe à Geodinâmica que atuou para gerar o Atlas Ambiental, um

instrumento interdisciplinar de ensino de fácil manuseio e compreensão tanto pelos professores

como para os alunos de todos os anos e que permite a conexão rápida com a realidade social

local. Como disse uma das professoras do 5º ano da Escola EMEF Yolanda Carolina Giglio

Villela: “O Projeto Mata Viva foi uma solução para as aulas de campo, porque é difícil ter uma

proposta interessante para estruturar uma aula. Foi um complemento das salas de aula”.

Em segundo lugar, as parcerias atuam como disseminadoras para propagar e difundir o

Atlas Ambiental. Nessa história, esse papel cabe aos professores que aplicam esse instrumento

interdisciplinar na prática, no dia a dia da sala de aula junto aos alunos.

Em terceiro lugar, as parcerias atuam como multiplicadores do conhecimento e

experiências vividas ao longo da estruturação e utilização do Atlas Ambiental. Nesse Programa,

esse papel também cabe aos professores que passam a ter a missão de formar outros professores

e capacitá-los para ação, ou seja, para a utilização do material didático em sala de aula.

Page 195: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

194

Sensibilização e capacitação dos atores sociais

Nessa história, atrair os professores para o Programa Mata Viva de Adequação e

Educação Ambiental e proporcionar-lhes instrumentos amigáveis são fundamentais para obter

os resultados esperados, uma vez que lhes cabem os papéis de disseminadores e

multiplicadores. Assim, a sensibilização e a capacitação ocorreram ao longo dos diálogos entre

os professores e os profissionais da Geodinâmica, para entender a realidade local da região e

buscar informações suficientes para gerar um instrumento interdisciplinar que permita a

conexão rápida com a realidade social local.

Em outras palavras, a Geodinâmica, os professores, a Fundação Espaço Eco e o

Departamento municipal de Educação e Cultura (DEMEC) participaram de um processo de

construção social do Atlas Ambiental, cujo lócus de aprendizagem aconteceu ao longo das

interações e relações ocorridas ao longo dessas formações.

A sensibilização dos professores é necessária porque os resultados podem não ser

alcançados de outra forma, conta a coordenadora de projetos socioambientais do Departamento

municipal de Educação e Cultura (DEMEC):

Porque, se não houver o comprometimento dos professores, você pode ter o projeto

mais lindo que for, mas se não conseguir atingir o professor... eu acho que esse é

o forte desses projetos, tanto da Trilha Mata Viva, quanto do Atlas, porque eles

conseguem mudar o professor, sensibilizá-lo. A gente entende muita coisa quando

vemos o professor lá vivenciando as atividades.

Como resultado, “os professores ganham muito com essas formações, porque hoje em

dia é muito difícil ter, sem custo, um projeto que colabore tanto assim para formação dos

professores”, conta essa coordenadora.

Interações como espaços que favorecem a capacitação e aprendizagem social para uma

agricultura sustentável.

As múltiplas interações entre os professores e os formadores da Geodinâmica, que

ocorreram ao longo das formações e que acontecem na comunidade virtual do Google, e

Page 196: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

195

também as interações entre professores e alunos ao longo da utilização do Atlas Ambiental em

sala de aula são os espaços que mais favorecem a aprendizagem social para uma agricultura

sustentável.

Vivência e experimentação

Essa história do Atlas Ambiental também mostra que a aprendizagem social para uma

agricultura sustentável ocorre por meio da experiência e da vivência tanto dos parceiros

estratégicos como dos professores e alunos no instrumento interdisciplinar de transformação de

realidade. Essa vivência se refere às diversas atividades que são executadas em salas de aula

entre alunos e professores com a utilização do Atlas Ambiental e também às experiências

vividas pelos professores ao longo das formações.

Page 197: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

196

Quadro 22: Resumo das reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura sustentável na

narrativa de Bebedouro na vertente de educação ambiental – atividade Atlas Ambiental

Vozes

participantes

Objetivos do elemento de

aprendizagem social

identificado

O que foi aprendido? Como aprendeu?

Parceiros

estratégicos,

professores,

governo,

Coopercitrus,

Crediciturs

Desenvolver competências –

conhecimento, habilidades e

atitudes – que permitam a

conexão rápida com a

realidade social local

Como estruturar um

instrumento

interdisciplinar de

transformação de

realidade, no caso de

educação ambiental

Formando parcerias

estratégicas

Conduzindo diálogos com

a realidade local

Parceiros

estratégicos,

professores,

governo e alunos

Assegurar a participação e

engajamento dos atores

sociais, principalmente

daqueles que têm o papel de

disseminar e multiplicar

conhecimento e experiências

Alcançar os resultados como

mudança de comportamento

e conduta

Conciliar os interesses de

todos os atores sociais

envolvidos

Como transformar uma

realidade social local

Sensibilizando e

capacitando os atores

sociais

Vivenciando e

experimentando o

instrumento

interdisciplinar de

educação ambiental

Interações como espaços

sociais para sensibilização

e capacitação

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

Page 198: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

197

8.3.5 A história da atividade do Teatro Mata Viva na cidade de Bebedouro – SP

Atores sociais envolvidos: Estação Experimental de Citricultura de Bebedouro,

COOPERCITRUS, Bellini Cultural – organização de projetos culturais, comunidade em geral de

Bebedouro (SP)

O Teatro Mata Viva é uma ação itinerante do Programa, criado para “despertar nas crianças

a consciência ambiental, para que elas tenham uma postura ativa diante das questões ligadas ao

tema. Elas são como pequenos agentes multiplicadores e podem tomar, desde cedo, decisões mais

responsáveis e promover a sustentabilidade”, conta o gerente de Stewardship da Unidade de

Proteção de Cultivos da Basf Agro (BASF IMPRENSA, 2011).

Lançado em 2008, essa iniciativa é resultado da parceria entre a Fundação Espaço Eco e a

Bellini Cultural, uma organização de processos educativos de vivências com a natureza, com

aprovação do Ministério da Cultura, por meio da Lei Rouanet de Incentivo à Cultura. Tem como

propósito levar conhecimento sobre sustentabilidade, meio ambiente por meio de peça de teatro e

atividades lúdicas às crianças do 4º ano e do 5º ano do ensino fundamental. A programação inclui

também palestras para os adultos (IBIDEM).

O coordenador da Fundação de adequação ambiental, ao contar a sua experiência com o

Teatro Mata Viva, revela como ocorrem as interações entre os arte-educadores e as crianças e quais

recursos são utilizados para sensibilizá-los para as questões de preservação do meio ambiente,

como a própria encenação da peça, vários figurinos, interações constantes com as crianças,

incluindo-as no espetáculo:

As peças, às vezes, mudam um pouquinho de um ano para outro, mas, por exemplo, a

última que rodou era a história da Manuela, que era uma menininha de uma escola, onde

a professora dava aula e falava sobre sustentabilidade e meio ambiente. E quando

termina a aula, ela fala o que quer para próxima aula, marca uma data e todos os

alunos têm que fazer um trabalho sobre sustentabilidade. A Manu está sentada na

plateia, junto com as crianças, e sai correndo: “Pro, pro, pro, pro!! Eu não entendi nada,

o que é isso?!” Aí, a professora vai embora. A menina fica e começa: “Ai, é sustent...

mesmo? Tem que sustentar, mas eu não entendi nada, o que que é sustentatividade?”

Então, ela começa a falar um monte de palavra errada: “Sem???” Um personagem entra,

para, congela a apresentação e fala para a criançada: “Vocês viram, a Manu não

consegue falar sus-ten-ta-bi-li-da-de. Vamos ajuda-la a falar?” E a criançada:

Page 199: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

198

“Vaaaamos!”, “Então, ó, quando eu aparecer fazendo gesto por trás do teatro, todo

mundo grita comigo SUSTENTABILIDADE! Devagarzinho”.

Acho que havia quase 200 crianças no teatro. Então, o personagem descongela a

menininha: “Não, tenho que fazer esse trabalho com sustentasização”. O personagem

passa atrás e a criançada: “SUS-TEN-TA-BI-LI-DA-DE!” Foram três quarteirões de

distância [risos]. Elas passam por tudo: questão da água, da reciclagem. Levam o conceito

da sustentabilidade de forma lúdica para as crianças. O espetáculo tem muito recurso

audiovisual, há troca de figurinos várias vezes. A história é muito bacana: ela vai para

casa, encontra amiguinho no caminho e conversa e fala que não entende nada, e a mãe dela

fala: “Mas, filha, vai pesquisar na internet”. Ela vai como se fosse para o quarto para

entrar na internet e o computador explode, e ela cai dentro da internet, então, encontra o

navegador, que é um personagem lúdico, que vai ajudá-la a navegar pela internet para

entender o que é sustentabilidade. Então, dá ideia de poluição ambiental, problema das

grandes cidades...

O coordenador também conta que, por meio dessas interações, os arte-educadores fazem

com que as crianças relatem suas próprias histórias sobre as ações de envolvimento com as

questões do meio ambiente, que acontecem em suas casas:

A criançada fala com propriedade sobre o assunto, dizendo que o pai dele fez isso uma

vez, que deu uma bronca no pai dele, que a mãe dele junta o plástico e o papelão e dá para

o seu Zé, que passa uma vez por semana. E aí tem uns que se mostram engajadinhos,

sabem, fazendo discurso. É um barato!

Além dos recursos já citados, os arte-educadores também utilizam músicas para sensibilizar

as crianças, acrescenta o coordenador da Fundação de adequação ambiental, ao contar a

experiência com os filhos:

É sensacional. As crianças ficam maravilhadas. Em Piracicaba, teve a encenação, eu

morava lá e levei os meus filhos para assistir. Ficaram doidos. Até hoje, eles cantam as

musiquinhas do teatro... Tinha uma musiquinha lá, quando eles tomavam banho, que era

para economizar água. Eles faziam uma encenaçãozinha e dançavam e, então, já punham

todo mundo para dançar. Estava o pessoal da cooperativa. Falei: “Põe todo mundo para

dançar e fazer a coreografiazinha lá”. E eles gravaram. Tem uma musiquinha que não me

sai da cabeça, que era: “Sustentabilidade, sustentabilidade...” Eles cantavam uma hora, e

a gente chegou em casa cantando junto, eu e o meu filho mais velho. Até hoje, cantam, e

perguntam: “Ah, pai, quando vai ter de novo: sustentabilidade, sustentabilidade”. É

muito bom. É sensacional.

Page 200: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

199

8.3.6 Reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura sustentável na

narrativa de Bebedouro na vertente de educação ambiental – Teatro Mata Viva

A narrativa da experiência de Bebedouro na vertente de educação ambiental do Programa

Mata Viva na atividade do Teatro Mata Viva apresenta os seguintes elementos de aprendizagem

social para uma agricultura sustentável:

Sensibilização dos atores sociais

A comunidade de Bebedouro, em particular, as crianças aprendem por meio da

sensibilização ao tomarem parte nas peças encenadas pelos arte-educadores e dominarem

rapidamente as músicas dessas peças. Consequentemente, os arte-educadores conseguem atrair a

atenção das crianças e adultos e impressioná-los vivamente para a importância das questões

referentes à preservação do meio ambiente.

Interações e utilização de palcos como espaços que favorecem a capacitação e aprendizagem

social para uma agricultura sustentável

As múltiplas interações entre os arte-educadores e as crianças no palco ao longo da

performance da arte cênica contribuem para favorecer a aprendizagem social para uma agricultura

sustentável. Nesses momentos, os arte-educadores conseguem ganhar a confiança delas a ponto de

fazê-las contar suas histórias familiares referentes a comportamentos e conduta diante de situações

envolvendo o meio ambiente.

Segundo o coordenador da Fundação de adequação ambiental, os professores reconhecem a

eficiência desse instrumento de reflexão sobre a preservação do meio ambiente, que tem o

potencial para provocar mudança de comportamento e conduta das crianças, ou pelo menos,

instiga-los a refletir sobre seu papel em relação à preservação do meio ambiente.

Page 201: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

200

Temos depoimento de professor que chegou e falou: “Coisa mais linda que vocês

trouxeram! A gente fazia esse trabalho o ano inteiro, para tentar passar um conceito para

essas crianças, vocês conseguem com um teatrinho, para as crianças e elas entenderem”.

E depois das apresentações, os atores, os arte-educadores promovem um bate-papo com as

crianças, toda uma interação com elas. As crianças chegam sempre meio tímidas, um

pouso assim retraídas: “Ah, o professor tá olhando ali”. Então, eles têm aquele receio de

tomar bronca do professor. Ao longo do espetáculo, se solta. E os atores interagem

bastante com as crianças, ao longo do espetáculo.

Formação de parcerias estratégicas robustas

Nessa história, a parceria firmada com Bellini Cultural atua como provedora de

metodologias e ferramentas, ao criar um espaço que favorece a aprendizagem social para uma

agricultura sustentável, permeado por um método baseado na arte-educação que inspira, instiga,

sensibiliza e faz com que os atores sociais vivenciem uma experiência de respeito e proteção ao

meio ambiente, em linha com a realidade local da região, que é o agrobusiness.

Já a parceria com o governo assume o papel de provedora de recursos financeiros, ou

seja, por meio do mecanismo de incentivo fiscal da Lei Rouanet de Incentivo à Cultura, a Fundação

Espaço Eco expande as atividades de educação ambiental para a comunidade, porque todos os

cidadãos podem tomar parte dessa atividade, seja assistindo a peça teatral, seja assistindo as

palestras.

O Quadro 23 apresenta a síntese desta breve discussão.

Page 202: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

201

Quadro 23: Resumo das reflexões sobre as ações de aprendizagem social para uma agricultura

sustentável na narrativa de Bebedouro na vertente de educação ambiental – atividade Teatro Mata

Viva

Vozes participantes

Objetivos do elemento de

aprendizagem social

identificado

O que foi aprendido? Como aprendeu?

Fundação Espaço Eco,

Coopercitrus,

Estação Experimental,

Alunos, professores,

pais, comunidade em

geral

Alcançar resultados como

a mudança de

comportamento e conduta

das crianças

Estimular os jovens a

refletir sobre seu papel em

relação à preservação do

meio ambiente

Contribuir para o fomento

da cultura e da

conscientização ambiental

das crianças

Como estruturar um

instrumento de reflexão

sobre a preservação do meio

ambiente Sensibilizando os

atores sociais

Utilizando ambientes

como o palco itinerante

como espaço de

aprendizagem

Formando parcerias

estratégicas robustas

Como sensibilizar alunos e

professores para as questões

referentes ao meio ambiente

Fonte: Elaborado pela pesquisadora

Contadas as narrativas e histórias, passa-se agora à discussão de como os elementos de

aprendizagem social para sustentabilidade em uma organização com fins lucrativos favorece as

ações de negociação entre múltiplos atores, visando o equilíbrio de interesses e a minimização de

assimetrias de poder.

Page 203: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

202

9 DISCUSSÃO

A discussão retoma a problemática que orientou esta tese: como o processo de

aprendizagem social para sustentabilidade em uma organização com fins lucrativos favorece as

ações de negociação entre múltiplos atores, visando o equilíbrio de interesses e a minimização

de assimetrias de poder?

As narrativas e histórias contadas nesta tese mapeiam o processo de aprendizagem

social para sustentabilidade voltado para uma agricultura sustentável. Para tanto, estudou-se o

Programa Mata Viva de Adequação e Educação ambiental da Basf que se originou da

necessidade de resolver um problema ambiental complexo: a devastação das matas ciliares às

margens do Rio Paraíba, no município de Guaratinguetá – SP. Por isso, é importante ressaltar

que, até esse momento, ainda era aprendizagem social para sustentabilidade e não

aprendizagem social para uma agricultura sustentável.

Nessa primeira fase do Programa Mata Viva, a aprendizagem social manifesta-se tanto

como um meio (processo) quanto como um fim para cumprir um resultado sustentável. Jacobi

(2006) afirma que os processos de aprendizagem social “implicam reconhecimento e

explicitação dos conflitos originários das questões ambientais e entendimento do meio

ambiente como bem público”.

No caso das terras adquiridas pela Basf, esses conflitos de interesses diziam respeito à

exploração da terra sem ciência pelos proprietários rurais a partir do século XVIII (proprietários

de terras x natureza nessa região); ao descumprimento da legislação ambiental no tocante às

áreas de proteção permanente e de reserva legal pelos proprietários de terras (governo x

proprietários de terras); às consequências para a comunidade de Guaratinguetá, em particular

para a comunidade de fundo do Vale do Paraíba, como enchentes, queimadas, erosões, falta

d’água, elevadas temperaturas e alterações nas estações do ano, além de área degradada

revegetada por espécies do tipo gramíneas em alguns pontos e espécies nativas arbóreas

isoladas e também por algumas espécies identificadoras de solos altamente acidificados, como

sapé, barba de bode e brachiárias (comunidade x proprietários de terras).

Além dos conflitos de interesses acima, a experiência de recomposição de matas ciliares

da Basf envolveu sete atores sociais com interesses distintos:

a natureza (o ambiente natural): ser recuperada ambientalmente no

tocante à fauna, flora, solo, sistema hídrico etc.;

Page 204: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

203

o complexo químico da Basf (proprietária das terras) em Guaratinguetá:

cumprir a legislação ambiental;

o governo, na esfera municipal (Prefeitura Municipal de Guaratinguetá) e

na esfera federal (IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos

Recursos Naturais Renováveis): assegurar o cumprimento da legislação

ambiental;

O governo novamente por meio da legislação ambiental, o Código

Florestal e a Política do Meio Ambiente: fornecer as diretrizes para

padronização de práticas ambientais seguras e com resultados duradouros;

a comunidade de fundo do Vale do Paraíba e o restante da

comunidade de Guaratinguetá: aumentar o percentual de floresta nativa

na área urbana; recompor as áreas degradadas suscetíveis à erosão;

estabilizar as encostas, evitando erosões e deslizamentos, diminuindo a

ocorrência de assoreamento e o comprometimento dos recursos hídricos;

aumentar a extensão e a qualidade das áreas reflorestadas.

Estes três elementos – problema ambiental, conflitos de interesses e multiplicidade de

atores – mostram que essa experiência de Guaratinguetá de recuperação das matas ciliares

pressupõe um processo de aprendizagem social tal como o proposto pelo projeto HarmoniCOP

(2005), cujo conceito é “de aprender juntos para administrar juntos”. Esse conceito se refere ao

envolvimento e colaboração de diversos atores sociais (stakeholders) para propor soluções

viáveis para um problema comum, incluindo a resolução de conflitos, o consenso quanto à

solução técnica e financeiramente fácil de ser implementada, porém, não menos trabalhosa.

Esses elementos também envolvem o alinhamento com a proposta de aprendizagem social por

meio da colaboração entre múltiplos atores sociais em projetos de recursos naturais, como

discutido por Bowen e Taillieu (2004). Em ambas as propostas, a aprendizagem social é

considerada como um meio (um processo) e como um fim (output) para alcançar os resultados

sustentáveis esperados. O início (input) é o contexto (o sistema de governança formado por

atores e regulamentação e o sistema físico ou ambiente natural). As atividades são executas por

meio de mecanismos de facilitação, as práticas relacionais (envolvimento/relacionamento

Page 205: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

204

social e gestão do conteúdo/problemas) e o fim são os resultados (outcomes), são as qualidades

técnicas e relacionais.

Juntos, os atores sociais nessa experiência, em particular, a Basf e a equipe da Secretaria

Municipal de Serviços Urbanos e Agricultura e, mais tarde, o IBAMA, empreenderam ações

para encontrar uma solução viável para o problema ambiental da devastação das matas ciliares.

Primeiro, com o intuito de reaprenderem uma nova maneira de conciliar os interesses entre os

proprietários de terras e demais stakeholders citados acima, procuraram entender o entorno,

as causas e as consequências desse problema ambiental. Ou seja, houve o desenvolvimento

de uma percepção compartilhada do problema e de quais práticas ambientais e procedimentos

deveriam ser seguidos. Em seguida, propuseram e implementaram um plano factível de

recuperação das matas ciliares – houve o desenvolvimento e avaliação crítica de soluções. A

tomada de decisão foi conjunta baseada na reciprocidade e no comprometimento e, também, em

arranjos para promover a implementação das ações (cada um desses parceiros tinha atribuições

bem definidas, conforme discutido anteriormente). Em outras palavras, aprenderam fazendo,

vivenciando, experienciando.

Por isso, além dos elementos citados acima, o conhecimento e as habilidades das

equipes da Secretaria Municipal de Serviços Urbanos e Agricultura de Guaratinguetá e do

IBAMA são uma condição necessária para a aprendizagem social para que ações em prol da

sustentabilidade possam ocorrer, uma vez que o papel desses parceiros é de prover

metodologias e ferramentas de recuperação de matas ciliares. Assim, a formação de parceiros

estratégicos e robustos foi um dos elementos necessários para que a aprendizagem social para

a sustentabilidade – recuperação das matas ciliares – ocorresse na Basf, enquanto processo.

Outro elemento que contribuiu para essa aprendizagem social foi a definição de um

conjunto de regras e instrumentos de gestão ambiental para direcionar e padronizar a

adoção de práticas ambientais seguras e com resultados duradouros pelo governo, aqui

representado pela legislação ambiental, mais especificamente, pelo Código Florestal e pela

Política de Meio Ambiente. Embora a relação de poder com os proprietários rurais seja de

coerção – imposição do governo sobre outros grupos – mesmo que haja ampla discussão do

documento final, em particular da terceira versão do Código Florestal, o Estado brasileiro tem

meios para fazer valer o direito e coibir práticas que possam degradar o meio ambiente.

Conforme dito no projeto HamoniCOP (2005), o governo não precisa deixar de lado o

seu poder e sempre terá um papel especial e recursos únicos, como o poder regulatório, não

podendo e não tendo que abandonar as suas responsabilidades, uma vez que, por meio da

Page 206: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

205

aprendizagem social, o governo cumpre suas responsabilidades de forma mais efetiva. E quanto

mais compartilha responsabilidades mais aumenta sua efetividade – e também aumenta o seu

poder. No Programa Mata Viva de Adequação e Educação ambiental, por meio desse conjunto

de instrumentos de comando e controle, também conhecidos como instrumentos regulatórios, o

governo orienta os produtores rurais quanto aos procedimentos necessários para a preservação

do meio ambiente, em particular, das áreas de proteção permanente e de reserva legal.

Enquanto aprendizagem social para sustentabilidade como fim (output) para alcançar

os resultados sustentáveis esperados, a experiência de Guaratinguetá mostra que um resultado

desse processo de aprendizagem social para sustentabilidade foi o desenvolvimento de um

corpo de conhecimento, habilidades e atitudes acerca de: como recuperar matas ciliares em

áreas degradadas e como interromper a perda de diversidade na região; como atender às

exigências da legislação ambiental brasileira; e como incentivar o desenvolvimento de modelos

de reflorestamento e motivar a execução de iniciativas semelhantes, utilizando espécies de fácil

disseminação e repovoamento da área. Nesse caso, esse corpo de conhecimento, habilidades e

atitudes são também um resultado desejável, tornando-se uma dinâmica de autorreforço na

aprendizagem social para sustentabilidade na Basf, conforme propõe o projeto HarmoniCOP

(2005). Assim, o desenvolvimento de competências de recuperação de matas ciliares dentro

da própria organização, ou seja, nas terras de sua propriedade, é resultado da aprendizagem

social para sustentabilidade na Basf.

O conhecimento gerado na experiência de Guaratinguetá está em linha com a proposta

de Bouwen e Taillieu (2004), na qual o conhecimento enquanto saber circula entre os sujeitos

envolvidos em um processo participativo, isto é, da interação entre os diferentes atores sociais

envolvidos no projeto. Por isso, a aprendizagem social para uma agricultura sustentável do

Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental da Basf pode ser compreendida na

perspectiva do construtivismo social. Segundo Bouwen e Taillieu (2004), a criação, o

desenvolvimento e o compartilhamento de conhecimento são considerados nessa perspectiva

como processos essencialmente relacionais.

Essa experiência da Basf em Guaratinguetá poderia ter ficado limitada à região tendo

como único fruto a iniciativa do Programa Semente do Amanhã, que inseriu a educação

ambiental no currículo escolar da rede municipal de ensino desse município e transformou a

área recuperada em sala de aula a céu aberto. Porém, essa trajetória mudou de rumo quando a

Unidade de Proteção de Cultivos da Basf Agro, ao construir a sua identidade de

sustentabilidade baseada na agregação de valor para a colheita do produtor rural, atribuiu à

Page 207: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

206

sustentabilidade o significado de uma produção agrícola sustentável ou sustentabilidade na

agricultura. E, dentre as alternativas que há para se ter uma agricultura sustentável, essa

Unidade optou pela busca do equilíbrio entre a produção e a biodiversidade, ou seja,

interromper a perda da biodiversidade e assegurar boas colheitas para os produtores rurais.

Ao refletirem sobre a aprendizagem na experiência de recuperação de matas ciliares, os

gestores da Unidade de Proteção de Cultivos foram conduzidos a uma nova aprendizagem:

replicar essa experiência para os seus clientes e contribuir para a agricultura sustentável. Esse

processo é denominado reflexividade, segundo Keen, Brown e Dyball (2005) e conduz às

mudanças sociais.

Assim, essa unidade tomou a decisão estratégica de apoiar seus clientes a

desenvolverem negócios sustentáveis, ou seja, economicamente viáveis e consoantes com as

demandas sociais e ambientais do paradigma desenvolvimento sustentável, como parte da sua

estratégia de negócios de fidelizar os grandes clientes. Assim, com base na experiência

bem-sucedida de Guaratinguetá, a Unidade de Proteção de Cultivos da Basf Agro passa a

beneficiar os agricultores, com apoio e orientação de restauração de matas ciliares em suas

propriedades rurais, ao integrar o projeto Compromisso Cooperar – Programa de

Relacionamento de Gestão de Clientes – direcionado às cooperativas alinhadas às diretrizes da

Basf Agro. Apesar de não ter custos para o produtor agrícola, a disponibilização dos recursos

financeiros para esse projeto se fundamenta na reciprocidade entre a Basf Agro e seus clientes.

Quanto maior a participação do cliente nos negócios dessa Unidade, maior a disponibilização

de recursos para o Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental.

Assim, a definição de uma estratégia de negócios sustentáveis, isto é,

economicamente viáveis e consoantes com as demandas sociais e ambientais da

sustentabilidade, é um elemento necessário para que a aprendizagem social para uma

agricultura sustentável aconteça nessa organização.

Para apoiar a Unidade de Proteção de Cultivos na implementação da estratégia de

negócios, a Fundação Espaço Eco estruturou um modelo de implementação e gestão porque

negócios sustentáveis significam não somente gerar produtos e serviços consoantes com as

demandas ambientais e sociais do paradigma desenvolvimento sustentável, mas também que

sejam economicamente viáveis.

Em primeiro lugar, trata-se de um modelo de implementação e gestão baseado na

orientação e pensamento sistêmicos, em que foram reunidas duas vertentes: a adequação

ambiental, destinada a oferecer apoio técnico aos profissionais do setor agrícola e orientação

Page 208: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

207

aos produtores rurais sobre recuperação e mapeamento de áreas de preservação permanente e

de reserva legal; e a educação ambiental, que leva conhecimento sobre a sustentabilidade,

estimulando a mudança de comportamento e de conduta e a motivação para que valores

socioambientais sejam incorporados ao dia-a-dia das pessoas que convivem na mesma região

que os produtores rurais.

Ambas as vertentes, após o encerramento de todo o ciclo de implementação, são

autossustentáveis, nas quais cada um dos beneficiados como produtores rurais, professores e

alunos, podem continuar por conta própria, não somente a execução das atividades, mas

também a multiplicar, influenciar e facilitar a entrada de novos atores sociais, potencializando

ações assertivas. Orientação e pensamento sistêmicos são elementos da abordagem

transdisciplinar de Keen, Brown e Dyball (2005), no qual a aprendizagem sistêmica considera

as inter-relações e interdependências entre os sistemas ecológicos e sociais que são essenciais

para se alcançar o progresso em direção à sustentabilidade.

Em segundo lugar, é um modelo de implementação e gestão baseado no

compartilhamento de recursos humanos, tecnológicos, financeiros e informacionais, uma vez

que a Fundação não está estruturada para cobrir todas as necessidades de implementação do

Programa. Por isso, precisa formar parcerias estratégicas robustas – multiprofissionais e

multisetoriais – que, ao longo da implementação do Programa Mata Viva de Adequação e

Educação Ambiental, assumem diferentes papéis e responsabilidades, a saber:

1. Provedoras de metodologias e ferramentas;

2. Facilitadoras;

3. Lideranças influenciadoras;

4. Disseminadoras;

5. Multiplicadoras;

6. Normalizadoras;

7. Provedoras de recursos financeiros;

8. Geradoras de conhecimento.

Em terceiro lugar, esse modelo de implementação e gestão é baseado na capacitação

tanto para sensibilizar quanto para habilitar os atores sociais, como os técnicos das

Page 209: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

208

Cooperativas e das fazendas, os produtores rurais, e os professores. Trata-se dos atores que têm

a missão de aplicar as metodologias e ferramentas, desenvolvidas em conjunto pela Fundação

Espaço Eco e parceiros, nas propriedades rurais e nas salas de aulas.

A sensibilização é necessária para atrair a atenção desses atores e impressioná-los

vivamente com as atividades, para que possam disseminar e multiplicar conhecimento e

práticas ambientais sustentáveis. Sensibilizar para despertar interesse e convencê-los que os

resultados sustentáveis são factíveis, desde que haja a aplicação e uso corretos dos métodos e

ferramentas.

A habilitação significa preparar esses atores sociais a aplicar as metodologias e

ferramentas desenvolvidas e mostrar que são instrumentos amigáveis e fáceis de serem

utilizados no dia-a-dia. Habilitar para assegurar a aplicação e uso corretos dos métodos e

ferramentas, e dar segurança no dia-a-dia da implementação das ações do Programa Mata Viva

de Adequação e Educação Ambiental.

Em quarto lugar, esse modelo de implementação e gestão está orientado à experiência e

à vivência para completar o ciclo da capacitação discutido acima. Por exemplo, os atores

sociais da vertente de adequação ambiental – equipe da COOPERCITRUS, produtores rurais e

seus técnicos – aprendem ao perceberem e sentirem in loco os resultados. Aos poucos, eles

percebem e aprendem que com o uso de técnicas adequadas, os objetivos são alcançados e

podem ser duradouros e, portanto, uma realidade local pode ser transformada para melhor,

conforme os relatos dos entrevistados ao longo dessa tese. Essa experiência e essa vivência

duram aproximadamente cinco anos, quando o ciclo da implementação está concluído.

Na vertente educacional, alunos e professores aprendem por meio da execução das

diversas atividades executadas em salas de aula com o Atlas Ambiental e com a apostila da

Trilha Ecológica; ao longo da travessia da mata na Trilha Ecológica; e nos palcos com o Teatro

Mata Viva. Aqui também é percebido ao longo do ciclo de duração da implementação dessa

vertente que dura aproximadamente três anos. Como resultado, há uma mudança de

comportamento e conduta da comunidade envolvida no Programa em relação à preservação do

meio ambiente, como se relacionar com a natureza de forma sustentável.

Em outras palavras, o modelo de implementação e gestão não está fundamentado em

metodologias e ferramentas do tipo “aplique você mesmo na sua realidade local”. O apoio e

orientações acontecem ao longo de um ciclo, que vai desde os diálogos iniciais com a realidade

a ser transformada até a fase de monitoramento, para que os resultados possam ser sentidos

Page 210: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

209

pelos atores sociais envolvidos no processo de aprendizagem social para uma agricultura

sustentável.

Esse ciclo de capacitação – sensibilização – habilitação – experiência – vivência –

ocorre em diversos espaços, a saber:

Interações com os outros atores sociais ao longo da implementação do

Programa que ocorrem em variados contextos, fases do Programa e em

diversas atividades: diálogos, visitas, interlocuções, eventos de

lançamentos, entrevistas, treinamentos;

Espaços organizacionais da Fundação Espaço Eco e da

COOPERCITRUS;

Palcos itinerantes;

Matas;

Escolas e salas de aulas;

Fazendas.

Por isso, esse modelo de implementação e gestão está baseado na utilização de

diversos espaços que favorecem a aprendizagem social para uma agricultura sustentável,

estando em linha com as práticas relacionais da proposta de Bouwen e Taillieu (2004, p. 144):

“Qualquer projeto interativo ou troca entre pelo menos dois atores sociais” e que “tem

consequências para o relacionamento e alguns resultados (outcomes) perceptíveis”. Ainda,

segundo esses autores, boas práticas relacionais significam propriedade compartilhada da tarefa

ou do projeto; comunicação pessoal, concreta e sincera; atividade mutuamente energizadora e

recompensável; condições para a aprendizagem profunda similar à aprendizagem de laço duplo

de Argyris e Schön (1978).

Em resumo, a estruturação de um modelo de implementação e gestão para que a

aprendizagem social para a agricultura sustentável ocorra tem os seguintes fundamentos:

1. Orientação e pensamento sistêmicos;

Page 211: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

210

2. Formação de parcerias estratégicas robustas – multiprofissionais e

multisetoriais;

3. Capacitação tanto para sensibilizar quanto para habilitar os atores sociais;

4. Orientação à experiência e à vivência para completar o ciclo da capacitação;

5. Utilização de diversos espaços que favorecem a aprendizagem social para uma

agricultura sustentável.

As narrativas e histórias contadas nesta tese também mostram que a operacionalização

desse modelo de gestão e implementação na cidade de Bebedouro foi relativamente complexa,

envolvendo diversos elementos nessa Tamara do Programa Mata Viva de Adequação e

Educação Ambiental. Por isso, foi necessária uma grande capacidade de articulação,

principalmente da Fundação Espaço Eco, responsável pela gestão estratégica do Programa

Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental.

Em primeiro lugar, há múltiplos atores sociais envolvidos, mostrados no Quadro 24.

Esses atores permeiam 20 relações narradas em quatro narrativas e dez histórias, mostradas na

no Quadro 5 (p. 80) e na Figura 13 (p. 79).

Quadro 24: Atores sociais envolvidos no Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental

Organização

(Basf)

(3)

1. Unidade de Proteção de Cultivos da Basf Agro

2. Fundação Espaço Eco

3. Área de sustentabilidade do complexo químico de Guaratinguetá

Clientes

(4)

4. COOPERCITRUS – Cooperativa de Produtores Rurais

5. Cooperativa de Crédito Credicitrus (SICOOB CREDICITRUS)

6. Proprietário rural e o técnico agrícola (gerente) da fazenda Santa Julia, em Bebedouro

– SP

7. Estação Experimental de Citricultura de Bebedouro – SP

Comunidade

(4)

8. Professores da Escola EMEF Yolanda Carolina Giglio Villela de Bebedouro – SP;

9. Alunos da Escola EMEF Yolanda Carolina Giglio Villela de Bebedouro – SP;

10. Pais e comunidade em geral de Bebedouro – SP

11. Fazenda Santa Julia em Bebedouro – SP (o ambiente natural)

Fonte: Os diversos fragmentos de histórias ouvidos, lidos e interpretados; elaboração da pesquisadora

Page 212: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

211

Quadro 24: Atores sociais envolvidos no Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental

(continuação)

Parceiros

(9)

1. Coordenadora da Trilha Ecológica Mata Viva na cidade de Bebedouro –SP

2. Organização das Nações Unidas (ONU)

3. Organização das Nações Unidas para Alimentação e Agricultura (FAO)

4. GIZ (Deutsche Gesellschaft für Internationale Zusammenarbeit) – agência de

cooperação técnica internacional do governo alemão

5. DEG (Deutsche Investitions – und Entwicklungusgesellschaft mbH) – banco de

investimentos alemão

6. Geodinâmica – organização de empreendedorismo social sustentável

7. Instituto Romã – organização de processos educativos de vivências com a natureza

8. Bellini Cultural – organização de projetos culturais

9. Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ/USP)

Governo

(6)

10. No âmbito federal:

10.1. Código Florestal

10.2. Política do Meio Ambiente

10.3. Servidores públicos do Ministério da Cultura (Lei Rouanet)

10.4. Servidores públicos do IBAMA – Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e

dos Recursos Naturais Renováveis

11. No âmbito estadual:

11.1. Servidores públicos da Secretaria Municipal de Serviços Urbanos e

Agricultura

11.2. Servidores públicos do Departamento municipal de Educação e Cultura

(DEMEC) de Bebedouro – SP

Fonte: Os diversos fragmentos de histórias ouvidos, lidos e interpretados; elaboração da pesquisadora

Em segundo lugar, esses atores sociais têm múltiplos interesses, a saber:

Interesses da organização (Basf): cumprir os objetivos da estratégia de

negócios de fidelizar os grandes clientes, apoiando-os no desenvolvimento de

negócios sustentáveis;

Interesses dos clientes:

Page 213: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

212

o COOPERCITRUS: apoiar o produtor rural, seu cooperado, no

desenvolvimento de negócios sustentáveis;

o SICOOB CREDICITRUS: apoiar financeiramente os instrumentos de

responsabilidade socioambiental na região em que atua;

o Estação Experimental de Citricultura de Bebedouro – SP: apoiar os

outros clientes e a comunidade com infraestrutura adequada na

implantação das ações de negócios sustentáveis;

o Proprietários rurais: ter uma produção agrícola sustentável, cumprir a

legislação ambiental a baixo custo, ou preferencialmente, sem custo;

Interesses dos parceiros: principalmente prover metodologias e ferramentas de

processos educativos sustentáveis;

Interesses da comunidade:

o Propriedades rurais (a Fazenda Santa Julia): ser recuperada ambientalmente

abrangendo solo, fauna, flora, sistema hídrico etc.;

o Professores: ter instrumentos interdisciplinares e serem devidamente

capacitados para sensibilizar, estimular a reflexão e a mudança de

comportamento e conduta dos alunos em relação à preservação do meio

ambiente;

Interesses do governo: principalmente assegurar o cumprimento da legislação

ambiental.

Em terceiro lugar, há diversos contextos – inter-relações de circunstâncias que

acompanham a Tamara do Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental, a saber:

Uma empresa (Unidade de Proteção de Cultivos), onde os negócios são planejados e

executados;

Uma organização não-governamental (Fundação Espaço Eco), onde o Programa

Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental é gerido;

Page 214: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

213

Uma cooperativa (COOPERCITRUS), com uma carteira com mais de 20 mil

produtores rurais associados abrangendo mais de 500 municípios dos Estados de São

Paulo e Minas Gerais;

Órgãos públicos (IBAMA, DEMEC, PREFEITURA MUNICIPAL DE

GUARATINGUETÁ) responsáveis pelo aspecto regulatório;

Uma escola (Escola EMEF Yolanda Carolina Giglio Villela), estabelecimento público

destinado a ensino coletivo;

Uma propriedade rural (Fazenda Santa Julia), onde é feita a recuperação de área de

proteção permanente e de reserva legal;

As matas (da Estação Experimental de Citricultura de Bebedouro – SP e da Jureia),

onde são feitos treinamentos do Trilha Ecológica Mata Viva;

Um palco (teatro e ônibus itinerantes do Teatro Mata Viva), onde é transmitido

conhecimento socioeducacional para a comunidade de Bebedouro – SP;

Uma universidade (Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (ESALQ/USP),

responsável pela capacitação sobre as metodologias de recuperação ambiental e pela

elaboração do Mapa de Adequação Ambiental das propriedades rurais.

Em quarto lugar, há várias relações de poder permeando a participação e o

engajamento dos 22 atores sociais desse Programa. Eis as principais:

Relação coerciva: Proprietários rurais e de forma metafórica, a própria natureza;

proprietários rurais e governo; escolas, professores, alunos e Departamento municipal

de Educação e Cultura (DEMEC);

Relação consultiva: Basf, Prefeitura Municipal de Guaratinguetá e IBAMA;

idealizadores do Atlas Ambiental (unidade de Proteção de Cultivos da Basf Agro,

Fundação Espaço Eco, Coopercitrus, Credicitrus, Geodinâmica) e os professores;

Page 215: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

214

Relação co-criativa: Basf, Prefeitura Municipal de Guaratinguetá e IBAMA;

idealizadores do Atlas Ambiental (unidade de Proteção de Cultivos da Basf Agro,

Fundação Espaço Eco, Coopercitrus, Credicitrus, Geodinâmica) e os professores;

Relação co-ativa: Fundação Espaço Eco, GIZ (agência de cooperação técnica

internacional do governo alemão e o DEG (banco de investimentos alemão);

Cooperativas e os proprietários rurais; escolas, professores, alunos e Departamento

municipal de Educação e Cultura (DEMEC);

Relação atrativa: Cooperativas e os proprietários rurais.

Assim, há a necessidade de saber articular para organizar e gerenciar múltiplos atores

sociais (23 stakeholders), múltiplos interesses (elencados dez interesses de alto nível),

múltiplos contextos (listados oito inter-relações circunstanciais), múltiplas relações de poder

(cinco predominantes); múltiplos parceiros (oito multiprofissionais/multisetoriais com nove

papéis distintos); múltiplos espaços de aprendizagem social (seis espaços, incluindo

organizacionais); e conflitos de interesses.

A força do Programa está na sua capacidade de articular, estabelecer relações com todos

esses atores sociais e com os demais elementos citados acima, unindo-os para que os objetivos

do Programa Mata Viva de Adequação e Educação Ambiental sejam cumpridos. Isso significa

articular para assegurar o engajamento, a participação, a colaboração e a negociação (KEEN;

BROWN; DYBALL, 2005) entre os múltiplos atores sociais, visando o equilíbrio dos diversos

interesses e a minimização das assimetrias de poder, mostrados acima e discutidos ao longo das

narrativas e histórias nesta tese. Articular para reconhecer as identidades sociais (esses

múltiplos atores sociais) e acomodar as diferenças nas competências, interesses e relações de

poder no cumprimento dos objetivos desse Programa (BOUWEN; TAILLIEU, 2004).

Para tanto, é necessário ter uma ótima capacidade de articulação para implementar um

Programa com orientação e pensamento sistêmicos, bem como integrado (KEEN; BROWN;

DYBALL, 2005), para unir as dimensões sociais (educação ambiental em uma região cuja

renda vem produção agrícola); ambiental (adequação ambiental para os produtores rurais); e

econômica (recursos humanos, financeiros, tecnológicos e informacionais compartilhados

entre os diversos parceiros, porém, sem custos adicionais para o produtor rural, e sem custo

para alunos e professores).

Page 216: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

215

É necessário, ainda, ter uma ótima capacidade de articulação para construir um nível de

confiança seguro entre os diferentes atores sociais, desenvolver uma visão comum dos

objetivos, dos problemas e dos assuntos de controvérsia do Programa. Articulação para resolver

conflitos e chegar às soluções que são tecnicamente implementadas, como as ações de

adequação e educação ambiental (HARMONICOP, 2005).

Em resumo, a aprendizagem social para uma agricultura sustentável enquanto processo

depende da capacidade de articulação por parte da Fundação Espaço Eco, sendo, portanto, um

dos elementos dessa aprendizagem social. Está alinhado com o elemento de contexto

interorganizacional de Bouwen e Taillieu (2004), que conta com a colaboração de múltiplos

atores, envolvendo um processo de tomada de decisão conjunta entre os stakeholders principais

sobre um determinado problema. Nesse caso, o Programa Mata Viva de Adequação e Educação

Ambiental está bem organizado.

Ao final desse processo de aprendizagem social para uma agricultura sustentável, há

geração de conhecimento especializado, principalmente por parte dos produtores rurais,

técnicos das Cooperativas e das propriedades agrícolas. Eles aprendem a recuperar áreas

degradadas ambientalmente. Por isso, a aprendizagem nesse Programa pode ser considerada de

laço duplo, porque há o exame de algumas premissas subjacentes e dos modelos que orientam

as ações e comportamentos dos proprietários rurais e dos seus funcionários.

Diante do que foi discutido, considera-se que “uma aprendizagem social para

sustentabilidade (no caso, para uma agricultura sustentável) em uma organização com fins

lucrativos significa: implementar ações coletivas para apoiar o desenvolvimento de negócios

sustentáveis ao longo ou em parte da sua cadeia de valor, a partir de uma estratégia com base

em competências desenvolvidas pela organização e ancorada por um modelo de

implementação e gestão sistêmico; parcerias estratégicas robustas; e uma grande capacidade

de articulação para gerenciar os múltiplos atores sociais, interesses, contextos, espaços de

aprendizagem, parceiros, conflitos e as relações de poder”.

A Figura 22 resume todos os elementos discutidos para aprendizagem social para uma

agricultura sustentável em uma organização com fins lucrativos que assume a forma de

sistemas embutidos (nested systems), seguindo a recomendação de Keen, Brown e Dyball

(2005), mostrando que todos os elementos, a exemplo das dimensões da sustentabilidade, são

construídos em conjunto, são partes integrantes, e, por vezes, inseparáveis, mostrando

claramente a interdependência entre os elementos.

Page 217: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

216

Posto isso, uma última discussão: há riscos desse processo de aprendizagem social para

uma agricultura sustentável na Basf ser interrompido na cidade de Bebedouro – SP?

Se a COOPERCITRUS, por quaisquer motivos, começar a comprar produtos dos

concorrentes da Unidade de Proteção de Cultivos da Basf Agro e deixar de ser um grande

cliente dessa carteira, sim, o Programa pode ser interrompido, ou pelo menos em parte. Porque

a estratégia de negócios foi formulada com base na reciprocidade entre clientes e Basf Agro, ou

seja, quanto maior essa correspondência mútua, maior a disponibilização de recursos,

principalmente financeiros. Além disso, a Fundação Espaço Eco foi responsável pela formação

das parcerias estratégicas. Sem contar que a COOPERCITRUS é peça-chave na implementação

desse Programa na região, dada a sua força junto aos produtores rurais e à comunidade em

geral. A COOPERCITRUS poderia continuar esse trabalho na região, mas, para isso, teria que

aumentar o Fundo de Investimento Social e Cultural Coopercitrus/Credicitrus (FISC).

Se houver uma ruptura por motivos políticos ou mudança na gestão municipal, também

poderá haver ruptura na implementação do Programa.

Page 218: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

217

Figura 23: Elementos do processo de aprendizagem social para uma agricultura sustentável em uma organização com fins lucrativos

Fonte: Elaboração da pesquisadora

Page 219: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

218

CONCLUSÃO

O objetivo desta tese foi discutir como uma organização está socialmente aprendendo a

lidar com a dialética entre a busca pelo retorno sobre os investimentos para os acionistas e pelos

benefícios para os seus outros públicos de interesse. No esforço de compreender o processo de

aprendizagem social para a sustentabilidade na gestão dos negócios, essa discussão recorreu a

uma revisão teórica que reflete uma apropriação do conceito da psicologia de aprendizagem

social no nível individual para o campo da aprendizagem coletiva de sustentabilidade nas

organizações.

Para tanto, foram discutidos quatro eixos de relações entre esses constructos. O eixo I

discutiu a proposta original de Bandura (1977) de aprendizagem social, considerada uma teoria

sociocognitiva, que explica como o comportamento individual é influenciado pelas estruturas

comportamentais, cognitivas e ambientais. Ou seja, o lócus da aprendizagem está nas

interações sociais entre indivíduos e o ambiente.

O eixo II mostrou como foi feito o translado da teoria de aprendizagem social para a

esfera da aprendizagem organizacional, na qual os autores que consideram a perspectiva

sociocognitiva na aprendizagem organizacional, como Antonacopoulou e Chiva (2007),

Elkjaer (2001; 2003), Gherardi e Nicolini (2003) e Defillippi e Ornstein (2003), partem de

concepções de que: a aprendizagem dos indivíduos ocorre por meio da interação social dentro

de um contexto sociocultural; há o reconhecimento do contexto organizacional no processo de

aprendizagem nas organizações; o conhecimento é gerado a partir das relações interpessoais e

das interpretações desenvolvidas durante as práticas diárias organizacionais.

O eixo III analisou que é possível fazer o traslado da teoria de aprendizagem social para

o campo da sustentabilidade. Foram discutidas as contribuições da abordagem transdisciplinar

de Keen, Brown e Dyball (2005) composta por cinco elementos que se entrelaçam e formam a

base da aprendizagem social: reflexão; orientação sistêmica, integração; negociação e

participação. Essa abordagem também está baseada em três agendas para apoiar a ação coletiva

necessária à gestão ambiental: nas inter-relações e nas parcerias equitativas de aprendizagem

(learning partnerships); nas plataformas de aprendizagem (learning platforms); e na

aprendizagem de valores e ética (learning values and ethics. Também foi discutida as

contribuições do projeto de cooperação HarmoniCOP – Harmonizing Collaborative Planning,

que envolve diversos atores sociais para gerir as bacias hidrográficas em diversas regiões da

Page 220: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

219

Europa. Essa abordagem traz à tona, além do conhecimento incremental, a melhoria no

entendimento dos problemas inter-relacionados da gestão complexa do fornecimento de água.

E, por último, foram apresentados os resultados da tese de Kilvington (2010), cuja principal

contribuição diz respeito ao desafio de construir capacidade para a aprendizagem social em

situações de gestão ambiental complexa. Nessas propostas há um foco na resolução de

problemas. No Projeto HarmoniCOP, este diz respeito à melhoria no entendimento dos

problemas inter-relacionados à gestão complexa do fornecimento de água. Para Kilvington

(2010), o foco é claramente o desenvolvimento da prática de resolução de problemas

complexos.

O eixo IV dessa revisão teórica abordou a aprendizagem social nas organizações que

convivem cotidianamente com a dialética de conciliar as metas dos seus negócios com os

desafios do paradigma desenvolvimento sustentável no tocante às dimensões políticas,

econômicas, sociais, ambientais, étnicas e culturais. Trata-se de um campo ainda em construção

e que partiu da proposta de colaboração de múltiplos atores de Bouwen e Taillieu (2004), que

entendem a aprendizagem social estando estreitamente conectada com a aprendizagem

organizacional em projetos de colaboração relacionados às questões de recursos naturais que

envolvem múltiplos atores. Essa proposta contempla sete elementos – contexto, participação,

processos de aprendizagem social, práticas relacionais, reconhecimento das identidades sociais,

interdependência entre os stakeholders, e conhecimento gerado – baseada no paradigma do

construtivismo social cujo lócus de aprendizagem está nas relações sociais e não somente na

mente das pessoas. Ou seja, o conhecimento e a realidade são construídos por meios das

interações sociais.

Para contribuir com o eixo IV – estudos dedicados à discussão da aprendizagem social

para sustentabilidade nas organizações com fins lucrativos – esta tese, por meio da contação de

narrativas e histórias, identificou e mapeou os elementos do processo de aprendizagem social

para sustentabilidade voltado para uma agricultura sustentável, ao estudar o Programa Mata

Viva de Adequação e Educação Ambiental da Basf. Trata-se de uma das maiores empresas do

mundo do setor químico.

O contexto – aqui considerado como a inter-relação de circunstâncias que acompanham

um fato ou uma situação, no caso o Programa Mata Viva – é o mesmo das propostas discutidas

no referencial teórico: múltiplos atores sociais, interesses, contextos, espaços de aprendizagem

social, parceiros, conflitos de interesses e as múltiplas relações de poder. Elementos como

Page 221: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

220

engajamento, participação, colaboração, negociação, reconhecimento de identidades sociais

etc., estão subjacentes nesse contexto relativamente complexo e de múltiplos elementos.

Os resultados desta tese vão mais além e mostram como uma organização com fins

lucrativos não somente apoia a resolução de problemas ambientais e sociais complexos, mas

também os transformam em oportunidades de geração de produtos e serviços sustentáveis. A

Basf soube como aproveitar as vantagens de uma crise ambiental em uma das regiões na qual

está instalada e transformá-la em uma oportunidade de desenvolvimento de negócios

sustentáveis. Para tanto, em primeiro lugar, elaborou uma estratégia de negócios baseada na

fidelização de grandes clientes dentro do projeto Compromisso Cooperar – Programa de

Relacionamento de Gestão de Clientes da Unidade de Proteção de Cultivos. Essa estratégia só

foi possível ser implementada porque a Basf ao longo de 23 anos (1984 – 2007) desenvolveu

competências – conhecimento (saber), habilidades (saber fazer) e atitudes (saber ser/agir) – de

recuperação de matas ciliares, e mais tarde, em 2007, conseguiu transpor tais competências para

os clientes da Unidade de Proteção de Cultivos.

Contudo, uma organização com fins lucrativos, que precisa prestar contas sobre o

retorno sobre os investimentos para os acionistas, também precisa de um bom plano de

implementação dessa estratégia de negócios. Assim, em segundo lugar, essa organização

precisa se ancorar em um modelo de implementação e gestão robusto, ou seja, bem elaborado,

fundamentado para que os resultados sejam duradouros. A Basf se apoiou na sua Fundação, que

por sua vez, elaborou um modelo sistêmico de implementação e gestão para o Programa Mata

Viva de Adequação e Educação Ambiental contemplando: formação de parcerias estratégicas e

robustas – multiprofissionais e multisetoriais; capacitação tanto para sensibilizar quanto para

habilitar os atores sociais; orientação à experiência e à vivência para completar o ciclo da

capacitação; e utilização de diversos espaços que favorecem a aprendizagem social para uma

agricultura sustentável.

Por último, para operacionalizar esse modelo de implementação e gestão, a Fundação,

responsável pela gestão estratégica desse Programa, precisou de uma grande capacidade de

articulação para gerenciar e favorecer as ações de negociação e de aprendizagem e equilibrar os

seus múltiplos elementos – atores sociais, interesses, contextos, espaços de aprendizagem

social, parceiros, conflitos de interesses – e minimizar as assimetrias de poder.

Diante do exposto, a aprendizagem social para sustentabilidade em uma organização

com fins lucrativos é tanto um processo (um meio) como um fim. Enquanto processo para

dialogar com uma realidade e transformá-la, precisa de estratégia de negócios, modelo

Page 222: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

221

sistêmico de implementação e gestão e capacidade de articulação. Enquanto fim, os resultados

são o desenvolvimento de competências, no caso da Unidade de Proteção de Cultivos da Basf,

competências de recuperação de matas ciliares.

Por fim, espera-se que esse estudo tenha contribuído para fortalecer a conexão entre

aprendizagem social e sustentabilidade, tal como os teóricos da aprendizagem social para

sustentabilidade (PROJECT REPORT, 2011) recomendam para o avanço desse campo de

estudos. De forma análoga, espera-se o mesmo para a conexão entre aprendizagem social,

sustentabilidade e organizações com fins lucrativos.

Além disso, ao fornecer uma descrição bem detalhada do fenômeno de interesse, esse

estudo pode contribuir para o aprimoramento do discernimento conceitual de aprendizagem

social a partir da perspectiva de uma organização com fins lucrativos cujo foco não é somente

apoiar a resolução de problemas, mas também a transformação dessas crises em oportunidades

de geração de produtos e serviços sustentáveis.

Outra contribuição desta tese refere-se à utilização de procedimentos metodológicos

baseados em antenarrativas para contar histórias e narrativas de projetos voltados às questões

de sustentabilidade. Como se trata de um contexto de múltiplos elementos, conforme discutido

acima e, portanto, com muitos fragmentos, as antenarrativas permitem interpretar histórias

simultâneas que estejam acontecendo em diferentes ambientes, com uma rede de atores

construindo sentido dos diversos arranjos.

No meio corporativo, espera-se que este trabalho contribua para que outras

organizações encontrem elementos que as ajudem a construir as suas próprias narrativas e

histórias de aprendizagem social ao longo ou em parte da sua cadeia de valor.

Limitações e sugestões de pesquisas futuras

Dado a complexidade de se proceder a um estudo envolvendo narrativas e histórias de

múltiplos elementos, apenas um projeto, dentre vários que a Basf desenvolve com múltiplos

atores sociais e interesses, voltados às questões da sustentabilidade, foi selecionado para ser

investigado nesta tese. Também não foi possível analisar projetos em outras organizações, por

Page 223: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

222

isso, um dos desafios de comparabilidade dos casos investigados nos estudos sobre

aprendizagem social não foi possível ser executado.

Por isso, para pesquisas futuras, recomenda-se o estudo da aprendizagem social para

sustentabilidade em outras organizações com fins lucrativos, porém abrangendo outras

atividades da cadeia de valor, como por exemplo, as relações com os fornecedores.

Também se recomenda estudos que evidenciem processos de desenvolvimento dos

atores organizacionais para que contribuam para o fortalecimento da aprendizagem social em

suas organizações.

Page 224: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

223

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AGBALANCE: Mensurando a agricultura sustentável. Basf, 2012. 1 vídeo

ALVESSON, M.; DEETZ, S. Teoria crítica e abordagens pós-modernas para estudos

organizacionais. In: CLEGG, S. R.; HARDY, C.; NORD, W. R. Handbook de estudos

organizacionais: modelos de análise e novas questões em estudos organizacionais. São Paulo,

Editora Atlas, 1997.

ARGYRIS, C.; SCHON, D. Organizational learning: a theory of action perspective.

Reading, Mass: Addison Wesley, 1978.

ASHLEY, P. A. (Org.) et al. Ética e responsabilidade social nos negócios. São Paulo:

Saraiva, 2005.

BANDURA, A. Social learning theory. Englewood Cliffs: Prentice Hall, 1977.

BASF AGRO. Objetivos estratégicos. Sobre a Agro.Disponível em: <

http://www.agro.basf.com.br/agr/ms/apbrazil/pt_BR/content/APBrazil/about_us/index?mid=0

>. Acesso em: 20 nov. 2012.

BASF GUARATINGUETÁ: 50 anos transformando a química da vida. São Paulo: Basf, 2009.

BASF. Sustentabilidade. São Paulo, 2013. Disponível em: < http://www.basf.com.br>.

Acesso em: 15 out. 2012.

BASF. Eco-efficiency analysis. Alemanha, 2013. Disponível em: <

http://www.basf.com/group/corporate/en/content/sustainability/eco-efficiency-analysis/index

>. Acesso em: 10 nov. 2012.

BASF IMPRENSA. RAIO-X Ambiental: principais informações e números do Complexo

Químico de Guaratinguetá. Set. 2006.

BASF IMPRENSA. BASF inicia Programa de Adequação Ambiental em parceria com a

Fundação Espaço ECO. Abr. 2007.

BASF IMPRENSA. BASF amplia Programa Mata Viva com apoio de cooperativas e

produtores rurais. Maio 2008.

BASF IMPRENSA. A sustentabilidade como estratégia de sucesso. Abr. 2009.

BASF IMPRENSA. Programa Mata Viva promove sustentabilidade na agricultura. Fev.

2011.

Page 225: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

224

BASF IMPRENSA. Aplicativo da BASF agiliza acesso às informações para agricultores.

Fev. 2012.

BASF IMPRENSA. BASF apoia Projeto Letras em Cena que ocorre no Museu de Arte de

São Paulo (MASP). Mar. 2013.

BAUMAN, Z. Modernidade e ambivalência. Rio de Janeiro: Editora Jorge Zahar, 1999.

BECKER, D. F. (Org.) et al. Desenvolvimento sustentável: necessidade e/ou possibilidade?

Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 2002.

BECK, U. Sociedade de risco. São Paulo: Editora 34, 2010.

BERMAN, M. Tudo que é sólido desmancha no ar: a aventura da modernidade. São Paulo:

Companhia das Letras, 1986.

BIODIVERSITY AND AGRICULTURE. Basf, 2010.

BOJE, D. Stories of the storytelling organization: a postmodern analysis of disney as

"tamara-land". Academy of Management Review, New York, v. 38, n. 4. 997-1035, 1995.

BOJE, D. M. Narrative methods for organizational & communication research. Londres:

Sage Publications, 2001.

BOJE, D. M. Storytelling Organizations. Londres: Sage Publications, 2008.

BOJE, D. M. Storytelling and the future of organizations: an antenarrative handbook.

Londres: Routledge, 2011.

BRASIL. Decreto nº 23.793, de 23 de janeiro de 1934. Aprova o código florestal. Disponível

em: < http://www2.planalto.gov.br/presidencia/legislacao>. Acesso em: 15 out. 2012.

BRASIL. Lei 4.771, de 15 de setembro de 1965. Instituiu o código florestal brasileiro. Brasília,

DF, 1965. Disponível em: < http://www2.planalto.gov.br/presidencia/legislacao>. Acesso em:

15 out. 2012.

BRASIL. Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981. Dispõe sobre a Política Nacional do Meio

Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação e aplicação. Disponível em: <

http://www2.planalto.gov.br/presidencia/legislacao>. Acesso em: 15 out. 2012.

BRASIL. Lei 7.803, de 18 de julho de 1989. Altera a redação da Lei nº 4.771, de 15 de setembro

de 1965, e revoga as Leis nº 6.535, de 15 de junho de 1978, e 7.511, de 7 de julho de 1986.

Disponível em: < http://www2.planalto.gov.br/presidencia/legislacao>. Acesso em: 15 out.

2012.

BRASIL. Lei nº 7.804, de 18 de julho de 1989.. Altera a Lei nº 6.938, de 31 de agosto de 1981,

que dispõe sobre a Política Nacional do Meio Ambiente, seus fins e mecanismos de formulação

Page 226: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

225

e aplicação, a Lei nº 7.735, de 22 de fevereiro de 1989, a Lei nº 6.803, de 2 de julho de 1980.

Disponível em: < http://www2.planalto.gov.br/presidencia/legislacao>. Acesso em: 15 out.

2012.

BRASIL. Lei nº 8.028, de 12 de abril de 1990. Dispõe sobre a organização da Presidência da

República e dos Ministérios. Disponível em: <

http://www2.planalto.gov.br/presidencia/legislacao>. Acesso em: 15 out. 2012.

BRASIL. Lei nº 11.284, de 2 de março de 2006. Dispõe sobre a gestão de florestas públicas

para a produção sustentável; institui, na estrutura do Ministério do Meio Ambiente, o Serviço

Florestal Brasileiro - SFB; cria o Fundo Nacional de Desenvolvimento Florestal - FNDF; altera

as Leis nos 10.683, de 28 de maio de 2003, 5.868, de 12 de dezembro de 1972, 9.605, de 12 de

fevereiro de 1998, 4.771, de 15 de setembro de 1965, 6.938, de 31 de agosto de 1981, e 6.015,

de 31 de dezembro de 1973. em: < http://www2.planalto.gov.br/presidencia/legislacao>.

Acesso em: 15 out. 2012.

BRASIL. Lei nº 12.651, de 25 de maio de 2012. Dispõe sobre a proteção da vegetação nativa;

altera as Leis nos 6.938, de 31 de agosto de 1981, 9.393, de 19 de dezembro de 1996, e 11.428,

de 22 de dezembro de 2006; revoga as Leis nos 4.771, de 15 de setembro de 1965, e 7.754, de

14 de abril de 1989, e a Medida Provisória no 2.166-67, de 24 de agosto de 2001. Disponível

em: < http://www2.planalto.gov.br/presidencia/legislacao>. Acesso em: 15 out. 2012.

BOUWEN, R.; TAILLIEU, T. Multi-party Collaboration as Social Learning for

Interdependence: Developing Relational Knowing for Sustainable Natural Resource

Management. Journal of Community & Applied Social Psychology, v, 14, p. 137-153, 2004.

BROWN, V. A. et al. Sustainability and health: working together to support global integrity.

Nathan: Griffith University, 2003.

CAPRA, F. O ponto de mutação: a ciência, a sociedade e a cultura emergente. São Paulo:

Editora Cultrix, 1982.

CAPRA, F. Foreword. In: WALS, A. E. J. Social learning: towards a sustainable world.

Wageningen: Wageningen Academic Publishers, 2007. p. 13-15.

CASTANÕN, G. A. Construtivismo e ciências humanas. Ciências e Cognição, Rio de Janeiro,

v. 05, p. 36-49, 2005.

COHEN, M. Lista repleta de bons exemplos: experiências mostram que Brasil é o país que

facilmente pode chegar a uma economia verde. Valor Econômico Especial. São Paulo, p. 31,

outubro, 2010.

COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO (CMMAD).

Nosso futuro comum. Rio de Janeiro: Fundação Getulio Vargas, 1988.

COOPERCITRUS: 35 anos escrevendo uma história de sucesso. Bebedouro, 2011.

Page 227: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

226

COOPERCITRUS. Institucional. Bebedouro, 2013. Disponível em:

<http://www.coopercitrus.com.br//>. Acesso em: 10 nov. 2012.

D’ANGELO, M. J. Desenvolvimento de competências para a sustentabilidade: um estudo

sobre a gestão de projetos societais sob a perspectiva de grupos. 2009. 191 f. Dissertação

(Mestrado em Administração de Empresas)–Universidade Presbiteriana Mackenzie, São Paulo,

2009.

EAGLETON, T. As ilusões do pós-modernismo. Rio de Janeiro: Editora Jorge Zahar, 1998.

ELKJAER, B. Em busca de uma teoria social de aprendizagem social. In:

EASTERBY-SMITH, M.; BURGOYNE, J.; ARAUJO, L. (coords.). Aprendizagem

organizacional e organização de aprendizagem: desenvolvimento na teoria e na prática. São

Paulo: Atlas, 2001. p. 100-118.

ELKJAER, B. Social learning theory: learning as participation in social process. In:

EASTERBY-SMITH, M.; LYLES, M. A. (Ed.). The Blackwell handbook of organizational

learning and knowledge management. Oxford: Blackwell Publishing, 2003. p. 38-53.

ENRIQUEZ, G. E. V. As melhores práticas de empresas baseadas em cadeias produtivas da

biodiversidade: uma visão ecológica. In: ALTEC – Associação Latino Americana de Gestão

Tecnológica e da Inovação, 2009, Cartagena.

FALEIROS, G; ADEODATO, S. Uma chance para cuidar do planeta: complexas negociações

podem determinar novos padrões de acesso aos recursos naturais. Valor Econômico Especial.

São Paulo, p. 8-14, outubro, 2010.

FERDMAN, B. M. Cutural identity and diversity in organizations: bridging the gap between

group differences and individual uniqueness. In: CHEMERS, M. M.; OSKAMP, S.;

COSTANZO, M. A. Diversity in organizations. Thousand Oaks: Sage Publications, 1995.

FREEMAN, R. E. Strategic management: a stakeholder approach. Boston: Pitman, 1984.

FRIEDMAN, M. Capitalismo e Liberdade. São Paulo: Editora Abril, 1984.

FUNDAÇÃO ESPAÇO ECO, 2012, 1 Vídeo Institucional.

FUNDAÇÃO ESPAÇO ECO. Sobre a Fundação. História. São Bernardo do Campo,

Disponível em: < h http://www.espacoeco.com.br/sobre-a-fundacao/historia/>. Acesso em: 26

out. 2012.

FUNTOWICZ, S. O.; RAVETZ, J. R. Science for the post-normal age. Futures, v. 25, p. 739–

755, 1993.

GEODINAMICA. O que fazemos. São Paulo, Disponível em:

http://www.geodinamica.com.br/o-que-fazemos. Acesso em: 15 jan. 2013.

Page 228: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

227

GLASSER, H. Minding the gap: the role of social learning in linking our stated desire for a

more sustainable world to our everyday actions and policies. In: WALS, A. E. J. Social

learning: towards a sustainable world. Wageningen: Wageningen Academic Publishers, 2007.

p. 35-61.

GODOI, C. K.; FREITAS, S. F. Aprendizagem organizacional sob a perspectiva

sócio-cognitiva: contribuições de Lewin, Bandura e Giddens. Revista de Negócios, Blumenau,

v. 13, n. 4, p. 40 – 55, out./dez. 2008.

GODOY, A. S. Introdução à pesquisa qualitativa e suas possibilidades. Revista de

Administração de Empresas, São Paulo, v. 35, n. 2, p. 57-63, 1995a.

GODOY, A. S. Pesquisa qualitativa: tipos fundamentais. Revista de Administração de

Empresas, São Paulo, v. 35, n. 3, p. 20-29, 1995b.

GLOBAL REPORTING INITIATIVE. Diretrizes para Relatório de Sustentabilidade,

Amsterdam, 2000-2006.

HARMONICOP WP2 REFERENCE DOCUMENT. Social Learning in River Basin

Management, 2003.

HARMONISING COLLABORATIVE PLANNING, HARMONICOP. Learning together to

manage together: improving participation in water management, Osnabrück, 2005.

HART, S. L. The natural-resource-based-view of the firm. Academy of Management Review,

Nova Yoork, v. 20, p. 986-1014, 1995.

HOBSBAWN, E. Era dos Extremos: o breve século XX 1914-1991. São Paulo: Companhia

das Letras, 1994.

HOTTOIS, G. Do renascimento à pós-modernidade: uma história da filosofia moderna e

contemporânea. Aparecida, Editora Idéias e Letras, 2002.

IBGE. Cidades. São Paulo, 2013. Disponível em: <

http://www.ibge.gov.br/cidadesat/painel/painel.php?codmun=351840>. Acesso em: 15 out.

2012.

JACOBI, P. R. et al. Aprendizagem Social, práticas educativas e participação da sociedade civil

como estratégias de aprimoramento para a gestão compartilhada em bacias hidrográficas.

Perspectiva, v. 20, n. 2, p. 5-18, abr./jun. 2006.

KEEN, M.; BROWN, V; DYBALL, R. Social learning in environmental management:

towards a sustainable future. Londres: Earthscan, 2005.

KILVINGTON, M. Social learning as framework for building capacity to work on complex

environmental management problems. Landcare Research, Nova Zelândia, 2007. Disponível

em:<http://www.landcareresearch.co.nz/publications/researchpubs>. Acesso em: 3 dez. 2008.

Page 229: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

228

KILVINGTON, M. Building Capacity for Social Learning in Environmental

Management. 2010. 365f. Tese (Doutorado em Filosofia)- Lincoln University, Canterbury,

Nova Zelândia, 2010.

KOLB, D. Organizational behaviour: na experiential approach. Englewood Cliffs: Prentice

Hall, 1995.

KUHN, T.. A estrutura das revoluções científicas. São Paulo: Perspectiva, 2003.

LAMPERT, E. et al. Pós-modernidade e conhecimento: educação, sociedade, ambiente e

comportamento humano. Porto Alegre: Editora Sulina, 2005.

LIMA, R. G. S. O Ciclo do Café Vale-paraibano. Revista do Instituto Histórico e Geográfico

Brasileiro, Rio de Janeiro, v. 12, p. 237-262, 2003.

LYOTARD, J.F. A condição pós-moderna. Rio de Janeiro: Editora José Olympio Ltda., 1979.

MAARLEVELD, M.; DANGBÉGNON, C. Managing natural resources: a social learning

perspective. Agriculture and Human Values, v. 16, 267–280, 1999.

MEIRELLES, G. Apesar de ações positivas, o futuro preocupa: iniciativas de preservação do

bioma ainda dependem muito de organizações não-governamentais, empresas e fazendeiros.

Valor Econômico Especial. São Paulo, p. 31, outubro, 2010.

MONTIBELLER; G. Apropriações diferenciadas do conceito de desenvolvimento sustentável.

Geosul, Florianópolis, v. 15, n. 29, p. 44-54, jan./jun. 2000.

MONTIBELLER; G. O mito do desenvolvimento sustentável: meio ambiente e custos

sociais no moderno sistema produtos de mercadorias. Florianópolis: Editora da UFSC, 2004.

MOR BARAK, M. Managing Diversity: toward a globally inclusive workplace. SAGE

Publications, 2005.

OLIVEIRA, A. I. A. Introdução à legislação ambiental brasileira e licenciamento

ambiental. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2005.

ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA ALIMENTAÇÃO E AGRICULTURA

(FAO). Quem somos. Brasília, 2012. Disponível em: https://www.fao.org.br/>. Acesso em: 20

nov. 2012.

PAHL-WOSTL, C. et al. Managing Change toward Adaptive Water Management through

Social Learning. Ecology and Society , v. 12, n.2 , 2007.

PACTO GLOBAL REDE BRASILEIRA. O que é o pacto? Brasília, 2012. Disponível em:

<http://www.pactoglobal.org.br/pactoGlobal.aspx/>. Acesso em: 03 nov. 2012.

Page 230: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

229

PARSON, E. A.; CLARK, W.C. Sustainable development as social learning: theoretical

perspectives and practical challenges for the design of a research program. In: GUNDERSON,

L. H.; HOLLING, C. S.; LIGHT, S. S. Barriers and bridges to the renewal of ecosystems

and institutions. Nova Yok: Columbia University Press, 1995. P. 428-460.

PROJECT REPORT. Social learning and sustainability: exploring critical issues in relation

to environmental change and governance, Workshop proceedings, Stockholm Resilience

Centre, Estocolmo, Suécia, 2011.

RELATÓRIO ANUAL. São Paulo: Basf, 2007-

RELATÓRIO MATA VIVA: Programa de recomposição da mata ciliar do rio Paraíba do Sul.

Guaratinguetá: Basf, 2005.

RESUMO DE ATIVIDADES. São Paulo: Fundação Espaço Eco, 2011-

REVISTA CARTA CAPITAL. As empresas mais admiradas no Brasil em 2009. São Paulo,

n. 277, nov. 2009.

REVISTA COOPERCITRUS. Coopercitrus, Credicitrus e Basf lançam Atlas Ambiental de

Bebedouro. Ano XXII, n. 265, Nov. 2008.

REVISTA COOPERCITRUS. Renovando o verde com o Projeto Mata Viva. Ano XXII, n.

271, Maio 2009.

SECRETARIA DE AGRICULTURA E ABASTECIMENTO. Notícias. II Mutirão

Agroflorestal: tecnologias para conciliar agricultura e recuperação ambiental. São Paulo,

2013. Disponível em:

<hhttp://www.agricultura.sp.gov.br/noticias/2674-ii-mutirao-agroflorestal-tecnologias-para-co

nciliar-agricultura-e-recuperacao-ambiental. Acesso em: 17 jan. 2013.

SELLTIZ, C., WRIGHTSMAN, L. S.; COOK, S. W. Métodos de pesquisa nas relações

sociais. São Paulo: EDUSP, 1974.

SHRIVASTAVA, P. Ecocentric management for a risk society. Academy of Management

Review, New York, v. 20, n.1, p. 118-137, 1995.

SILVA, J. A. Direito constitucional ambiental. São Paulo: Forense, 1995.

SOCIEDADE BRASILEIRA PARA O PROGRESSO DA CIÊNCIA. ACADEMIA

BRASILEIRA DE CIÊNCIAS. O código florestal e a ciência: contribuições para o diálogo. São

Paulo: SBPC, 2011.

SOS FLORESTAS. Entenda a questão. Brasília, 2012. Disponível em:

<http://www.sosflorestas.com.br/>. Acesso em: 15 out. 2012.

Page 231: Marcia Juliana d’Angelo - tede.mackenzie.brtede.mackenzie.br/jspui/bitstream/tede/809/1/Marcia Juliana dAngelo... · Marcia Juliana d’Angelo Aprendizagem social para a sustentabilidade:

230

SWIOKLO, M.T. Legislação florestal: evolução e avaliação. In: CONGRESSO FLORESTAL

BRASILEIRO, 6, 1990, Campos do Jordão, SP. Anais... Campos do Jordão, p.55-58. 1990.

UNDP. Capacity development: a UNDP primer. Nova York, 2011.

VAILL, P. B. Learning as a Way of Being: Strategies for Survival in a World of Permanent

White Water. San Francisco: Jossey-Bass Publishers, 1996.

WALS, A. E. J.; VAN DER LEIJ, T. Introduction.In: WALS, A. E. J. Social learning:

towards a sustainable world. Wageningen: Wageningen Academic Publishers, 2007. p.

17-32.

WORLD BUSINESS COUNCIL FOR SUSTAINABLE DEVELOPMENT (WBCSD).

WWF BRASIL. O que fazemos? Sobre nosso mundo. O que são as matas ciliares?

Brasília, 2013. Disponível em:

http://www.wwf.org.br/natureza_brasileira/questoes_ambientais/matas_ciliares. Acesso em:

15 out. 2012.