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UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO CENTRO DE ARTES E COMUNICAÇÃO DEPARTAMENTO DE LETRAS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM LETRAS Gustavo da Silveira Amorim MARCAÇÃO NO CONTATO LINGUÍSTICO: O português falado pelos Latundê Recife 2015

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Page 1: MARCAÇÃO NO CONTATO LINGUÍSTICO: O português falado … · Transcrição Transcrição fonética Transcrição fonológica [ ] / / Vogais Vogal médio-baixa anterior [ɛ] Vogal

UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO

CENTRO DE ARTES E COMUNICACcedilAtildeO

DEPARTAMENTO DE LETRAS

PROGRAMA DE POacuteS-GRADUACcedilAtildeO EM LETRAS

Gustavo da Silveira Amorim

MARCACcedilAtildeO NO CONTATO LINGUIacuteSTICO O portuguecircs falado pelos Latundecirc

Recife 2015

GUSTAVO DA SILVEIRA AMORIM

MARCACcedilAtildeO NO CONTATO LINGUIacuteSTICO O portuguecircs falado pelos Latundecirc

Tese apresentada agrave Coordenaccedilatildeo do Curso de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Letras da Universidade Federal de Pernambuco como requisito parcial para obtenccedilatildeo do grau de Doutor em Linguiacutestica Orientadora Profordf Drordf Stella Virgiacutenia Telles de Arauacutejo Pereira Lima

Recife 2015

Catalogaccedilatildeo na fonte

Bibliotecaacuteria Nathaacutelia Sena CRB4-1719

A524m Amorim Gustavo da Silveira Marcaccedilatildeo no contato linguumliacutestico o portuguecircs falado pelos Latundecirc

Gustavo da Silveira Amorim ndash Recife 2015 241 f il

Orientadora Stella Virgiacutenia Telles de Arauacutejo Pereira Lima Tese (Doutorado) ndash Universidade Federal de Pernambuco Centro de

Artes e Comunicaccedilatildeo Letras 2015

Inclui referecircncias

1 Fonologia 2 Liacutenguas em contato 3 Marcaccedilatildeo e liacutenguas indiacutegenas I Lima Stella Virgiacutenia Telles de Arauacutejo Pereira (Orientadora) II Tiacutetulo

410 CDD (22ed) UFPE (CAC 2017- 213)

For from him and through him and to him are all things To him be glory forever Amen

Romans 1136

AGRADECIMENTOS

A Deus por me capacitar e me fazer sentir o teu zelo cuidado e proteccedilatildeo

constantemente

Aos meus familiares em especial a minha matildee e o meu pai pelo suporte

coragem e exemplos a mim transmitidos

A minha esposa Jane pelo carinho e compreensatildeo pelas horas que natildeo

pude estar ao seu lado dedicando-me a este trabalho

Aos meus filhos Breno e Estela meu tesouros por me fazerem acreditar

que o mundo pode ser melhor

A minha orientadora Stella Telles pelo carinho compreensatildeo

engajamento e ensino por me fazer acreditar que podemos ser altruiacutestas sem

perdermos a essecircncia da humildade Por compartilhar-me com despreendemento

os seus dados

Agraves coordenadoras do PG-Letras Evandra Gligoletto e Fabiele Stockmans

pela presteza sempre que necessaacuterio

Aos meus mestres do Doutorado pelo trabalho que foi realizado durante o

curso em especial Stella Telles Marlos Pessoa Claacuteudia Roberta Siane Goes

Benedito Bezerra Virgiacutenia Leal Alberto Poza e Nelly Carvalho

Aos professores do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo (UFPE)

Flaacutevio Brainer Artur Gomes Maacutercia Mendonccedila e Joatildeo Batista pela colaboraccedilatildeo

na trajetoacuteria acadecircmica

A Abuecircndia Padilha e Gilda Lins (in memoriam) pela dedicaccedilatildeo e carinho

que demonstraram durante as aulas

Aos meus colegas do Doutorado Solange Carvalho Ana Cristina Cleber

Morgana Jaciara Carolina Pires Juliane Acircngela Socircnia Ismar Rinalda Ludimila

e Clara por me ajudarem nos momentos de dificuldades e de (muitas)

necessidades

Aos colegas da GER ndash Vale do Capibaribe pela ajuda sempre que

necessaacuterio em especial Marta Morgana Edjane e Janecleide

Aos colegas e alunos do IFAL (Instituto Federal de Alagoas) pela grande

ajuda e carinho que demonstraram durante a realizaccedilatildeo deste trabalho Pela

compreensatildeo das faltas e substituiccedilotildees que de mim foram demandadas

Aos membros da banca que tatildeo gentilmente aceitaram o convite

Aos meus amigos familiares entes queridos todos que direta ou

diretamente me ajudaram nesta caminhada Nenhum trabalho eacute feito sozinho

portanto os meacuteritos tambeacutem satildeo de vocecircs

RESUMO

O presente trabalho eacute o resultado de um estudo sobre a Marcaccedilatildeo no Contato

Linguiacutestico entre o Latundecirc e o Portuguecircs Trata-se de uma investigaccedilatildeo com

base na abordagem tipoloacutegica da linguiacutestica visando agrave elucidaccedilatildeo das unidades

mais e as menos marcadas que satildeo ou natildeo transferidas no processo de

acomodaccedilatildeo dos inventaacuterios foneacuteticos de ambas as liacutenguas Utilizamos como

base os pressupostos teoacutericos defendidos por CROFT (1990) JAKOBSON

(1953) BATTISTELLA (1996) MATRAS amp ELSIK (2006) e LACY (2006) para a

descriccedilatildeo dos universais linguiacutesticos e da marcaccedilatildeo No que tange ao contato

linguiacutestico nos respaldamos nas reflexotildees de ROMAINE (2000) THOMASON

(2001) AIKHENVALD (2007) e HYMES (1971) Para descriccedilatildeo linguiacutestica e

histoacuterica dos Latundecirc nos baseamos em TELLES (2002) ANOMBY (2009) e

PRICE (1977) No que tange ao aporte foneacutetico para descriccedilatildeo do contato entre

ambas as liacutenguas nos valemos dos escritos de WEINREICH (1953) BISOL

(1996) VAN COETSEM (1988) e MATRAS (2009) Quanto agraves anaacutelises nos

fundamentamos nas observaccedilotildees de SPENCER (1996) LASS (2000) e RICE

(2007) O nosso corpus eacute formado de trinta horas de fala transcritas

foneticamente de acordo com IPA de vinte informantes da comunidade Latundecirc

Os dados fazem parte do acervo do NEI (Nuacutecleo de Estudos Indigenistas) da

UFPE A partir da nossa pesquisa chegamos agrave conclusatildeo que os mais jovens

tendem a natildeo transferir os padrotildees mais marcados da sua liacutengua para a liacutengua

adquirida enquanto os mais velhos reproduzem com menor frequecircncia os

padrotildees mais marcados do Portuguecircs alguns contextos licenciam enquanto

outros bloqueiam a marcaccedilatildeo gerando um caraacuteter variaacutevel que demonstra o quatildeo

conflitante eacute a situaccedilatildeo do contato embora natildeo haja uma padronizaccedilatildeo no que

tange agrave estrutura silaacutebica o padratildeo CV eacute o mais recorrente e menos marcado

corroborando o que apregoa os pressupostos da tipologia linguiacutestica os

processos que envolvem perda e permuta de segmentos satildeo mais numerosos e

mais marcados dos que os que envolvem ganho de segmento os fonemas natildeo

presentes no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc tendem a ser apagados ou

reinterpretados pelo segmento mais proacuteximo do Portuguecircs quanto agrave manutenccedilatildeo

ou perda o comportamento dos traccedilos mais marcados do Latundecirc depende natildeo

categoricamente da fonologia do Portuguecircs a marcaccedilatildeo natildeo estaacute condicionada

apenas aos universais linguiacutesticos mas agraves especificidades da liacutengua

PALAVRAS-CHAVE Fonologia Liacutenguas em Contato Marcaccedilatildeo e Liacutenguas

Indiacutegenas

ABSTRACT

The present work describes phenomena of phonological transference of Latundecirc

a Brazilian indigenous language in Portuguese in language contact situation The

observed phenomena were examined under the light of the assumptions of

Linguistic Marking in its typological approach As basis we used CROFT (1990)

JAKOBSON (1953) BATTISTELLA (1996) MATRAS ELSIK (2006) and LACY

(2006) studies for the description of linguistic universals and marking About

language contact we were supported by the reflections of ROMAINE (2000)

THOMASON (2001) AIKHENVALD (2007) and HYMES (1971) For the linguistic

and historical description of Latundecirc we were based on TELLES (2002)

ANOMBY (2009) and PRICE (1977) About the phonology of Portuguese we were

supported by BISOL (1996) For description of the contact between both

languages we used the writings of WEINREICH (1953) VAN COETSEM (1988)

and MATRAS (2009) The one of phonological phenomena observed was backed

in SPENCER (1996) LASS (2000) and RICE (2007) Our corpus is formed of thirty

hours of talk phonetically transcribed according to IPA In the survey we used the

speech production of 20 individuals from the Ladundecirc people among these 8

belonging to the pre-contact generation with the non- indigenous society and 12

belonging to the post-contact generation The data are part of the acquis of NEI

(Nuacutecleo de Estudos Indiacutegenas) of UFPE With our research we came to the

following results post-contact generation tends not to transfer most marked

patterns of their language to the acquired language while the native of pre-contact

generation do in a lower frequency the more marked standards of Portuguese

The processes that involve loss and exchange of segments are more numerous

than those involving segment gain The phonemes of Portuguese that do not exist

in Latundecirc tend to be erased or reinterpreted by the closest segment to

Portuguese resulting in the loss of contrast and in the emergence of the

unmarked through the phonological neutralisation There are phenomena that

show a tendency towards the universal as the deletion of the coda in favor of CV

standard syllabic and others that are arising out of restrictions of Latundecirc as the

monophthongization of nasal diphthong and the change of vowel quality in word-

final position In the set of phenomena we noticed that the interference is variable

and not always motivated by phonological or natural marking

KEYWORDS Phonology Marking Languages in contact Portuguese and

Latundecirc

RESUMEN

El presente estudio describe los fenoacutemenos de la transferencia fonoloacutegica del

Latundeacute una lengua indiacutegena Brasilera en el portugueacutes en una situacioacuten de

contacto linguumliacutestico Los fenoacutemenos observados fueron examinados a la luz de los

presupuestos de marcacioacuten linguumliacutestica en su abordaje tipoloacutegico Como modelo

de fundamentacioacuten se han utilizado los estudios de CROFT (1990) JAKOBSON

(1953) BATTISTELLA (1996) MATRAS amp ELSIK (2006) y LACY (2006) para las

descripcioacuten de los universales linguumliacutesticos y de la marcacioacuten Sobre el contacto

linguumliacutestico fueron tomados como soporte cientiacutefico las reflexiones de ROMAINE

(2000) THOMASON (2001) AIKHENVALD (2007) y HYMES (1971) Para la

descripcioacuten linguumliacutestica de los Lantundeacute esta investigacioacuten se basoacute en TELLES

(2002) ANOMBY (2009)y PRICE (1977) Sobre la fonologiacutea del portugueacutes se

tuvieron en cuenta los estudios de BISOL (1996) Para la descripcioacuten del contacto

entre ambas lenguas fueron necesarios los escritos de WEINREICH (1053) VAN

COETSEM(1988) y MATRAS (2009) Finalmente el estudio de los fenoacutemenos

fonoloacutegicos observados fueron abordados en las investigaciones de SPENCER

(1996) LASS (2000) y RICE (2007) El corpus de este trabajo acadeacutemico estaacute

compuesto por treinta horas de diaacutelogos transcritos foneacuteticamente de acuerdo con

el IPA En la investigacioacuten se ha utilizado la produccioacuten del diaacutelogo de 20

individuos del pueblo Latundeacute dentro de ellos 8 pertenecientes a la generacioacuten

del pre contacto con la sociedad no indiacutegena y 12 pertenecientes a la generacioacuten

del post contacto Los datos hacen parte del acervo del Nuacutecleo de Estudios

Indigenistas (NEI) de la UFPE Con esta investigacioacuten se ha llegado a la siguiente

conclusioacuten La generacioacuten post contacto tiende a no transferir los patrones maacutes

acentuados de su lengua hacia la lengua adquirida mientras que los indiacutegenas de

la generacioacuten del pre contacto realizan con menor frecuencia los patrones maacutes

marcados del portugueacutes Los procesos que envuelven la peacuterdida y permuta de los

segmentos son maacutes numerosos de aquellos que involucran la ganancia del

segmento Los fonemas del portugueacutes que no existen en el Latundeacute tienden a ser

borrados o reinterpretados por el segmento maacutes proacuteximo al portugueacutes resultando

en una peacuterdida de contraste y en la emergencia del no marcado a traveacutes de la

neutralizacioacuten fonoloacutegica Hay fenoacutemenos que revelan una tendencia a lo

universal como desvanecimiento de la coda en a favor de patroacuten silaacutebico CV y

otros que son consecuencia de las restricciones del Latundeacute como la

monoptongacioacuten de diptongo nasal y la mudanza de la cualidad vocaacutelica en

posicioacuten final de la palabra El en conjunto de fenoacutemenos verificamos que la

interferencia es variable y no siempre estaacute motivada por la acentuacioacuten fonoloacutegica

o natural

Palabras Clave Fonologiacutea Acentuacioacuten Lenguas en Contacto Portugueacutes y

Latundeacute

LISTA DE SIacuteMBOLOS

Transcriccedilatildeo

Transcriccedilatildeo foneacutetica

Transcriccedilatildeo fonoloacutegica

[ ]

Vogais

Vogal meacutedio-baixa anterior [ɛ]

Vogal meacutedio-alta anterior [e]

Vogal alta anterior [i]

Vogal baixa central [a]

Vogal meacutedio-baixa posterior [ɔ]

Vogal meacutedio-alta posterior [o]

Vogal alta posterior [u]

Vogal alta anterior nasal [ i ]

Vogal meacutedio-alta anterior nasal [e ]

Vogal baixa central nasal [atilde]

Vogal meacutedio-alta posterior nasal [otilde]

Vogal alta posterior nasal [u ]

Consoantes

Oclusiva alveolar surda [t]

Oclusiva alveolar sonora [d]

Fricativa alveolar surda [s]

Fricativa alveolar sonora [z]

Nasal alveolar [n]

Lateral alveolar [l]

Africada alveopalatal surda [tʃ]

Africada alveopalatal sonora [dʒ]

Lateral palatal [ʎ]

Nasal palatal [ɳ]

Fricativa palatal surda [ʃ]

Fricativa palatal sonora [ʒ]

Oclusiva velar surda [k]

Oclusiva velar sonora [g]

Fricativa velar [x]

Oclusiva bilabial surda [p]

Oclusiva bilabial sonora [b]

Nasal bilabial [m]

Fricativa labiodental surda [f]

Fricativa labiodental sonora [v]

LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 Diagrama de Hall

67

FIGURA 2 Configuraccedilotildees da Mescla Linguiacutestica segundo Romaine (2000 p185)

71

FIGURA 3 Esquema de representaccedilatildeo do bilinguismo social segundo Appel e Muysken (1986 p 23)

74

FIGURA 4 Escolha de liacutengua e code-switching conforme Grosjean (1982 p127)

82

FIGURA 5 Classificaccedilatildeo das liacutenguas da Famiacutelia Nambikwaacutera de acordo com Rodrigues (1986 p 134)

87

FIGURA 6 Localizaccedilatildeo e aacuterea dos Nambikwaacutera de acordo com Roquete-Pinto (1919)

88

FIGURA 7 Territoacuterio Nambikwaacutera descrito por Price (1983)

89

FIGURA 8 Localizaccedilatildeo atual dos Nambikwaacutera

91

FIGURA 9

Localizaccedilatildeo da TI Tubaratildeo-Latundecirc

94

FIGURA 10

Primeiros contatos com os Latundecirc (Foto Price 1977)

97

FIGURA 11 Iacutendios Latundecirc na TI Tubaratildeo-Latundecirc

104

FIGURA 12

Ligaccedilotildees entre a intensidade do bilinguismo o tipo de processo de acomodaccedilatildeo e sobreposiccedilatildeo entre os sistemas fonoloacutegicos

118

FIGURA 13

Correspondecircncia entre liacutenguas e contato linguiacutestico

120

FIGURA 14 Agentividade da Liacutengua Recipiente de acordo Van Coetsem 1988 p10

122

FIGURA 15 Agentividade da Liacutengua de Origem de acordo Van Coetsem 1988 p11

122

FIGURA 16 Relaccedilatildeo de agentividade entre o Portuguecircs e o Latundecirc

123

FIGURA 17 Estrutura silaacutebica do Latundecirc

168

FIGURA 18 Estrutura silaacutebica do Portuguecircs (Cacircmara-Juacutenior)

169

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Unidades e estruturas mais marcadas conforme

levantamento de Moreira da Silva (2011)

50

Quadro 2 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Leacutevi-Strauss (1948)

92

Quadro 3 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Price e Cook (1969)

93

Quadro 4 Distribuiccedilatildeo dos povos pertencentes a TI Tubaratildeo-Latundecirc

95

Quadro 5 Nuacutecleos familiares de acordo com a habitaccedilatildeo em 1999

98

Quadro 6 Situaccedilatildeo sociolinguiacutestica dos Latundecirc (dados de 1999)

101

Quadro 7 Quadro Comparativo dos Sistemas Foneacuteticos do Romansh e do Schweizerdeutsch de acordo com Weinreich (1953)

111

Quadro 8 Tipos de processos que conduzem a mudanccedila fonoloacutegica induzida por contato

116

Quadro 9 Fonemas consonantais do Latundecirc

125

Quadro 10 Fonemas vocaacutelicos do Latundecirc

125

Quadro 11 Ditongos do Latundecirc

126

Quadro 12 Descriccedilatildeo dos fonemas consonantais (Retirada de Telles 2002)

126

Quadro 13 Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos orais (Com base em Telles 2002)

149

Quadro 14

Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos nasais (Com base em Telles 2002)

153

Quadro 15

Vogais no Portuguecircs (Cacircmara Jr 1970)

154

Quadro 16

Consoantes no Portuguecircs (Silva 2002)

155

Quadro 17 Sistemas consonantais x Sistemas vocaacutelicos

156

Quadro 18 Resultado mais frequente do processo de monotongaccedilatildeo em Latundecirc

162

Quadro 19 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Latundecirc

166

Quadro 20 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Portuguecircs

167

Quadro 21 Escala de Sonoridade (Bonet e Mascaroacute 1997 p 109)

196

SUMAacuteRIO

1 SOBRE A PESQUISA 20

11 INTRODUCcedilAtildeO 20

12 JUSTIFICATIVA 24

13 OBJETIVOS 25

14 METODOLOGIA 26

15

DISPOSICcedilAtildeO DA TESE 27

2 MARCACcedilAtildeO LINGUIacuteSTICA 29

21 INTRODUCcedilAtildeO 29

22 MARCACcedilAtildeO 31

221 A concepccedilatildeo de Jakobson e Trubetzkoy 35

222 Abordagem Gerativa 37

223 Abordagem Tipoloacutegica (Interlinguiacutestica) 39

224 Abordagem Naturalista (Morfologia Natural) 41

23 CRITEacuteRIOS DE MARCACcedilAtildeO 42

24 MARCACcedilAtildeO MUDANCcedilA E CONTATO LINGUIacuteSTICO 45

25 JAKOBSON E A ABORDAGEM FONOLOacuteGICA DA

MARCACcedilAtildeO

48

3 O CONTATO LINGUIacuteSTICO 54

31 INTRODUCcedilAtildeO 54

32 SOBRE O CONTATO LINGUIacuteSTICO 57

33 MESCLAS DE CONTATO PIDGIN CRIOULO LIacuteNGUA

FRANCA E JARGAtildeO

60

331 Pidgin 63

332 Crioulo 65

333 Liacutengua Franca ou Sapir 69

334 Jargatildeo 71

34 IMPLICACcedilOtildeES DO CONTATO LINGUIacuteSTICO 72

341 Bilinguismo 72

342 Diglossia 78

343 Alternacircncia de coacutedigo 80

344 Morte da liacutengua

83

4 COMUNIDADE DE ESTUDO OS LATUNDEcirc 86

41 INTRODUCcedilAtildeO 86

42 A FAMIacuteLIA NAMBIKWARA 86

43 OS LATUNDEcirc

94

5 INTERFEREcircNCIA FONEacuteTICO-FONOLOacuteGICA DO LATUNDEcirc

NO PORTUGUEcircS

106

51 INTRODUCcedilAtildeO 106

52 INTERFEREcircNCIA FUSAtildeO COEXISTEcircNCIA E

TRANSFEREcircNCIA LINGUIacuteSTICA

107

53 FONOLOGIA DO LATUNDEcirc 124

54 FONOLOGIA DO PORTUGUEcircS 154

55 COMPARACcedilAtildeO ENTRE OS SISTEMAS FONEacuteTICOS DO

PORTUGUEcircS E DO LATUNDEcirc

156

6 PROCESSOS FONOLOacuteGICOS DO PORTUGUEcircS FALADO

PELOS LATUNDEcirc

158

61 Introduccedilatildeo 158

611 Perda de elementos 161

6111 Monotongaccedilatildeo 161

6112 Siacutencope em onset complexo de l e r 168

6113 Apagamento da coda 171

6114 Reduccedilatildeo do geruacutendio ndash Anteriorizaccedilatildeo da vogal final 173

6115 Reduccedilatildeo das palatais (nasal e lateral) 174

6116 Afeacuterese 177

6117 Apoacutecope 178

6118 Siacutencope 180

612 Ganho de elementos (Inserccedilatildeo de elementos) 181

613 Alteraccedilatildeo de elementos (permuta ou transposiccedilatildeo) 184

6131 Despalatalizaccedilatildeo de [ʃ] e [ʒ] 184

6132 Palatalizaccedilatildeo 186

6133 Vozeamento e desvozeamento 189

6134 Abaixamento e elevaccedilatildeo das vogais orais 191

6135 Nasalizaccedilatildeo e desnasalizaccedilatildeo 194

6136 Fenocircmenos envolvendo os roacuteticos 195

6137 Labializaccedilatildeo e deslabializaccedilatildeo 197

6138 Metaacutetese 198

6139 Siacutestole 199

61310 Fortalecimento

200

7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

201

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS

208

ANEXOS 221

20

1 SOBRE A PESQUISA

O estudo dessas liacutenguas eacute evidentemente de grande importacircncia para o incremento dos conhecimentos linguiacutesticos Cada nova liacutengua que se investiga traz novas contribuiccedilotildees agrave linguiacutestica cada nova liacutengua eacute outra manifestaccedilatildeo de como se pode realizar a linguagem

humana Cacircmara Jr (1977 p 4)

11 INTRODUCcedilAtildeO

Neste capiacutetulo discorreremos sobre a diversidade e a situaccedilatildeo das liacutenguas

indiacutegenas brasileiras1 bem como a motivaccedilatildeo para o presente estudo Tambeacutem

faratildeo parte desta introduccedilatildeo a justificativa para a realizaccedilatildeo desta pesquisa os

objetivos almejados os procedimentos metodoloacutegicos e a descriccedilatildeo da estrutura

da tese

Por se tratar de um estudo que diz respeito agrave linguiacutestica indigenista brasileira vale

iniciar a discussatildeo situando aqueles que satildeo os sujeitos da nossa pesquisa os

iacutendios Sabe-se que os povos indiacutegenas satildeo vistos geralmente como personagens

passivos na da nossa histoacuteria Eacute um equiacutevoco concebecirc-los na nossa narrativa

dessa forma pois seja no papel de aliados ou de inimigos esses povos tiveram

um papel importante na formaccedilatildeo de sociedades coloniais e poacutes-coloniais

(ALMEIDA 2013 p9)

1 Aleacutem do portuguecircs haacute no Brasil aproximadamente 180 liacutenguas indiacutegenas faladas por 225 etnias

Dessas liacutenguas 110 satildeo consideradas em extinccedilatildeo pelo fato de serem faladas por menos de 500 pessoas Estima-se que em 1500 cerca de seis milhotildees de iacutendios falavam 1078 idiomas Hoje a populaccedilatildeo indiacutegena brasileira chega a no maacuteximo entre 440 mil e 500 mil indiviacuteduos Atribui-se o desaparecimento das liacutenguas indiacutegenas agraves pressotildees poliacuteticas do colonizador e posteriormente agraves necessidades de sobrevivecircncia das populaccedilotildees indiacutegenas Revista Liacutengua portuguesa n 26 p 57 2010

21

Embora natildeo seja amplamente divulgado no Brasil haacute cerca de 180 liacutenguas

indiacutegenas o que nos torna um paiacutes plurilinguiacutestico Esse percentual era de 1200

antes da chegada dos portugueses Durante esses cinco seacuteculos de colonizaccedilatildeo

um glotociacutedio foi visto intensificamente no nosso territoacuterio

Mesmo sendo viacutetimas de um processo de colonizaccedilatildeo desenfreado e

escravizador estes povos com o tempo passaram a ser reconhecidos como

agentes na sociedade Suas accedilotildees satildeo vistas a partir de um recente periacuteodo

histoacuterico como importantes para explicar a histoacuteria deles e consequentemente a

nossa Saindo de um quadro de contato onde eram vistos como coadjuvantes

passando a ser tambeacutem protagonistas

Hoje os estudos indigenistas satildeo mais frequentes uma vez que na antropologia

atual os povos que foram definidos como aculturados passaram a ser

coadjuvantes de um processo histoacuterico e participativo

A reportagem da Revista Continente Maio de 2009 sobre os Fulniocirc faz parte de

um arsenal que descreve o que jaacute eacute sabido pela comunidade cientiacutefica as liacutenguas

indiacutegenas brasileiras estatildeo desaparecendo em ritmo acelerado Posto dessa

forma podemos perceber que haacute urgecircncia em descrever como tais liacutenguas se

comportam em si e em contatos com outras

Cacircmara-Juacutenior (1977 p 7) postula que os estudos indigenistas mais

precisamente sobre os de suas liacutenguas constitui no Brasil uma tarefa natildeo

somente enorme mas tambeacutem urgente Hoje meio seacuteculo depois esta citaccedilatildeo se

faz atual Os estudos indigenistas ainda se monstram tiacutemidos e carentes de

recursos e pesquisadores

22

Em continuidade o autor afirma que

Jaacute desapareceram no Brasil muitas liacutenguas agora totalmente irrecuperaacuteveis para a ciecircncia Eacute muito difiacutecil avaliar hoje em dia quantas liacutenguas se teriam falado no Brasil haacute 400 anos na eacutepoca do descobrimento do paiacutes pelos europeus Mas a quantidade de liacutenguas que subsistem ainda hoje () eacute ainda um nuacutemero consideraacutevel ndash cento e tantas Todas elas entretanto estatildeo ameaccediladas de desaparecer dentro de muitos poucos anos

O fato eacute que precisamos catalogar essas liacutenguas e como elas agem durante o

contato linguiacutestico Esses estudos satildeo de grande valia porque podem mostrar

como se deu analogicamente o contato do portuguecircs com outras liacutenguas E as

evidecircncias aqui encontradas contribuiratildeo para a descriccedilatildeo linguiacutestica aleacutem de

proporcionar agraves geraccedilotildees futuras o conhecimento mais apurado sobre as liacutenguas

de contato

Sobre esta relaccedilatildeo Almeida (idem p 14) afirma que

[] As relaccedilotildees de contato com sociedades envolventes e vaacuterios processos de mudanccedila cultural vivenciados pelos grupos indiacutegenas eram considerados simples relaccedilotildees de dominaccedilatildeo impostas aos iacutendios de tal forma que natildeo lhes restava nenhuma margem de manobra a natildeo ser a submissatildeo passiva a um processo de mudanccedilas culturais que os levaria a serem assimilados e confundidos com a massa da populaccedilatildeo

A autora ainda reitera que ldquoas relaccedilotildees de contato eram entatildeo grosso modo

vistas como relaccedilotildees de dominaccedilatildeo submissatildeo na qual uma cultura se impunha

sobre a outra anulando-ardquo p16

23

O contato entre liacutenguas contribuiu para o leacutexico portuguecircs2 E eacute o contato

linguiacutestico um dos fatores que coloca o iacutendio em situaccedilatildeo ativa na histoacuteria do

Brasil mesmo apoacutes o decreto do Marquecircs de Pombal3

Todavia assim como ocorrera com os negros eacute possiacutevel que o contato com

iacutendios possa ter influenciado outros niacuteveis da nossa gramaacutetica 4

Seki (1995 p 33) ao discutir sobre a situaccedilatildeo das liacutenguas indiacutegenas brasileiras

diz que

Essas estimativas devem ser ainda consideradas com certa cautela pois as liacutenguas indiacutegenas encontram-se sob as mais diferentes pressotildees sofrendo o impacto do crescente contato com a populaccedilatildeo envolvente e a liacutengua majoritaacuteria Contudo natildeo haacute em geral levantamentos que permitam estabelecer com maior margem de exatidatildeo os reflexos do impacto do Portuguecircs nos distintos grupos em termos de deslocamento de liacutengua indiacutegena tanto no que se refere a graus de bilinguismo monolinguismo quanto no que se refere agrave interferecircncia do Portuguecircs nessas liacutenguas nem sempre claramente perceptiacutevel nas fases iniciais mas que vai aos poucos contribuindo para a perda da liacutengua minoritaacuteria

2 Citamos aqui como exemplos o caso dos grupos de palavras oriundos de outros povos que

foram acoplados ao nosso leacutexico como indianismos e africanismos 3 Para estabelecer uma comunicaccedilatildeo com os nativos os portugueses foram aprendendo os

dialetos e idiomas indiacutegenas A partir do tupinambaacute falado pelos grupos mais abertos ao contato com os colonizadores criou-se uma liacutengua geral comum a iacutendios e natildeo-iacutendios O crescente nuacutemero de falantes do portuguecircs comeccedila a tornar o bilinguumlismo das famiacutelias portuguesas no paiacutes cada vez menor Em 17 de agosto de 1758 a liacutengua portuguesa se torna idioma oficial do Brasil atraveacutes de um decreto do Marquecircs de Pombal que tambeacutem proiacutebe o uso da liacutengua geral Disponiacutevel em httpwwwcomcienciabrreportagenslinguagemling03htm em 18122014 4 Alguns estudiosos afirmam que as influecircncias natildeo se restringiram apenas ao vocabulaacuterio

Jacques Raimundo em O Elemento Afro-Negro na Liacutengua Portuguesa aponta algumas mudanccedilas foneacuteticas iniciadas na fala dos escravos que ainda se mantecircm em algumas variedades do portuguecircs do Brasil as vogais meacutedias pretocircnicas e e o passam a ser pronunciadas como vogais altas respectivamente i e u (mininu nuticcedila) as vogais tocircnicas de palavras oxiacutetonas terminadas em s mesmo as grafadas com z se tornam ditongos (atrais mecircis vecircis) a marca de terceira pessoa do plural nos verbos do preteacuterito perfeito se reduz a o (fizero caiacutero tocaro)Em 1822 Jeroacutenimo Soares Barbosa registrava em sua Grammatica Philosophica uma peculiaridade sintaacutetica originada na fala dos escravos que ateacute hoje eacute apontada como uma das distinccedilotildees entre o portuguecircs falado em Portugal e o que se fala no Brasil a colocaccedilatildeo de pronomes aacutetonos antes dos verbos (mi deu ti falocirc) Disponiacutevel em httpwwwcomcienciabrreportagenslinguagemling03htm em 18122014

24

Embora a preocupaccedilatildeo da maioria dos estudiosos de liacutenguas indiacutegenas seja com

as liacutenguas minoritaacuterias esta pesquisa trafega no sentido contraacuterio ao buscar

descrever a influecircncia dessas liacutenguas tidas como fraacutegeis no indioma nacional

Vale ressaltar que mesmo em territoacuterio nacional o portuguecircs aqui eacute tido como

segunda liacutengua

12 JUSTIFICATIVA

O contato linguiacutestico e suas consequecircncias se datildeo em todas as liacutenguas do

mundo No entanto no que tange ao desaparecimento de liacutenguas o prejuiacutezo eacute

maior uma vez que a natildeo catalogaccedilatildeo dessas liacutenguas geraria um deacuteficit linguiacutestico

que poderia prejudicar os estudos linguiacutesticos vigentes e futuros aleacutem dos

problemas humanos advindos do processo de aculturaccedilatildeo entre povos

Ao corroborar com esta acertiva Telles (2009 p25) afirma que

Quando um povo perde uma liacutengua tambeacutem perde diversidade humana perdem-se meios de compreensatildeo e explicaccedilatildeo do mundo perdem-se soluccedilotildees de adaptalidade do homem ao meio perde-se o conhecimento do potencial e do usufruto sustentaacutevel deste meio Enfim perdem-se conhecimentos fundamentais que venham a coloborar para a continuidade da sobrevivecircncia do homem no planeta

O estudo de uma liacutengua diferente da nossa pode nos dar a impressatildeo de que

vamos encontrar algo distante da nossa realidade O que natildeo eacute verdade visto

que as semelhanccedilas linguiacutesticas satildeo em maior nuacutemero Cacircmara-Juacutenior (1977

p18)

25

Antes da perda total de uma liacutengua que pode ser assim configurado ou natildeo o

processo inicial se daacute pelo contato entre elas Soacute depois de existirem lado a lado

eacute que tais liacutenguas podem a depender da dinacircmica se fundirem desaparecerem

ou conviverem entre si

No caso do relacionamento entre o Latundecirc e o Portuguecircs percebe-se que tal

contato caminha para o desparecimento do Latundecirc dado as circunstacircncias

histoacutericas e sociais pelas quais esta liacutengua tem passado Hoje este povo eacute

composto de 20 falantes dispersos Como os mais novos natildeo podem coabitar

entre si a continuidade da etnia estaacute com os dias marcados Logo torna-se

urgente as tentativas de descriccedilatildeo da liacutengua e de seu comportamento

Analisar e descrever o contato com base nos padrotildees de marcaccedilatildeo e simetria

contribuiraacute com o princiacutepio de naturalidade que eacute pre-requesito para a tipologia

linguiacutestica No mais as investigaccedilotildees sobre o contato linguiacutestico satildeo de grande

valia para o conhecimento mais apurado das liacutenguas do mundo e da nossa liacutengua

especificamente

13 OBJETIVOS

Esta pesquisa objetiva o estudo da interferecircncia foneacutetica do Latundecirc no

Portuguecircs levando em consideraccedilatildeo o papel da marcaccedilatildeo no contato linguiacutestico

entre estas liacutenguas Tambeacutem busca refletir sobre os processos foneacuteticos oriundos

do contato e como eles se evidenciam a partir das liacutenguas em xeque

26

No decorrer da tese aleacutem dos objetivos postos aqui buscaremos responder as

questotildees postuladas

Investigar se os fatores internos (linguiacutesticos) e externos (estruturais)

interagem com os princiacutepios da marcaccedilatildeo

Identificar qual o papel da marcaccedilatildeo no contato linguiacutestico

Verificar se e quais os traccedilos mais marcados da liacutengua dominada passam

para a dominante

Dessa forma ao refletirmos sobre as questotildees acima esperamos contribuir com

os estudos dos universais linguiacutesticos e da cogniccedilatildeo humana

14 METODOLOGIA

O corpus utilizado nesta pesquisa foi coletado pela professora Stella Virgiacutenia

Telles e faz parte do NEI ndash Nuacutecleo de Estudos Indigenistas ndash da Universidade

Federal de Pernambuco Os dados foram gravados em CDrsquos em formato wave e

estruturados em forma de perguntas e respostas DID ndash Diaacutelogo entre

entrevistador e entrevistado

Foram escutados aproximadamente 30 horas de gravaccedilatildeo de fala dos 20

informantes Latundecirc Incialmente analisamos de oitiva os dados que foram

depois transcritos foneticamente com base no Alfabeto Foneacutetico Internacional -

IPA e organizados em tabelas Apoacutes segunda anaacutelise em caso de duacutevidas os

dados foram submetidos ao programa PRAAT para melhor audiccedilatildeo No que tange

27

agrave anaacutelise os dados foram disponibilizados em tabelas e enumerados com os

respectivos comentaacuterios abaixo

15 DISPOSICcedilAtildeO DA TESE

Para este estudo utilizamos os pressupostos cientiacuteficos da tipolologia linguiacutestica

de base aleacutem de autores que foquem em seus estudos contato interferecircncia

foneacutetica marcaccedilatildeo e naturalidade

No capiacutetulo 1 discorremos sobre os elementos basilares da tese justificativa

objetivos perguntas norteadoras metodologia e disposiccedilatildeo da tese

No capiacutetulo 2 trataremos sobre a marcaccedilatildeo Nele abordaremos o conceito de

marcaccedilatildeo e sua relaccedilatildeo com os princiacutepios de simetria e naturalidade Veremos a

partir do panorama de Matras amp Elsik (2006) Battistella (1996) Lacy (2006) as

abordagens de marcaccedilatildeo estruturalista gerativa tipoloacutegica e naturalista

Na seccedilatildeo 23 discorreremos sobre os criteacuterios de marcaccedilatildeo e na seccedilatildeo 24

sobre a mudanccedila linguiacutestica contato e marcaccedilatildeo Nos deteremos aos estudos de

Jakobson na abordagem fonoloacutegica na seccedilatildeo 25 bem como os universais

linguiacutesticos para a marcaccedilatildeo observados por Moreira da Silva (2011) em

contraponto com os padrotildees mais marcados do Latundecirc

No Capiacutetulo 3 o contato linguiacutestico seraacute nosso escopo Nele discutiremos os tipos

de mesclas de contato pidgin crioulo liacutengua Franca e jargatildeo a partir dos

pressupostos de Tarallo e Alkimin (1987) Calvet (2004) Couto (2001) Hall

28

(1996) Hymes (1971) Romaine (2000) e AiKhenvald e Dixon (2006)

Abordaremos tambeacutem a diglossia conforme Ferguson (1991) a alternacircncia de

coacutedigo de acordo com Auer (1999) Morte de liacutengua segundo Mcmahon (1994)

Trask (2004) e Cristoacutefaro-Silva (2002)

No capiacutetulo 4 apresentaremos a comunidade de estudo os Latundecirc Inicialmente

com base em Rodrigues (1995) Roquete-Pinto (1919) Leacutevi-Strauss (1946) Price

e Cook (1969) Anomby (2009) e Telles (2002) faremos uma descriccedilatildeo dos povos

e famiacutelias indiacutegenas do Brasil e dos Latundecirc especificamente Recapitularemos o

contexto histoacuterico formaccedilatildeo contato com os outros povos indiacutegenas e com os

natildeo iacutendios limites geograacuteficos e situaccedilatildeo atual

No capiacutetulo 5 trataremos da interferecircncia e transferecircncia foneacutetica do Latundecirc

para o Portuguecircs Com base em Cristoacutefaro-Silva (2002) Bisol (1996) Weinreich

(1953) Van Coetesem (1988) e Matras (2009) discutiremos os processos de

interferecircncia fusatildeo coexistecircncia e transferecircncia linguiacutestica Apresentaremos os

aspectos mais relevantes da fonologia Latundecirc e do Portuguecircs

No capiacutetulo 6 faremos as anaacutelises dos processos foneacuteticos presentes no contato

do Latundecirc com o Portuguecircs A partir da perspectiva claacutessica de perda

manutenccedilatildeo ou ganho de elementos discutiremos sobre quais os processos

foneacuteticos mais marcados do Latundecirc permanecem ou natildeo atestados no

Portuguecircs falado por Latundecirc

Por fim chegaremos agraves divagaccedilotildees finais dos resultados configurados na

pesquisa e agrave perspectiva de continuidade do trabalho Nos anexos encontram-se

os dados analisados transcritos foneticamente e dispostos em tabelas

29

2 MARCACcedilAtildeO LINGUIacuteSTICA

A nossa vida eacute mesmo assim Crescemos uns qual aacutervore indivisa levados pela forccedila de um destino retiliacuteneo como as palmeiras crescem

outros com a vida ramificada pelos empuxos ambientes Pretendemos Tentamos Retrocedemos

Afinal caminhamos na diretriz primitivamente escolhida quando o tempo nos concede alcanccedilar crescemos como as lianas5

(ROQUETTE-PINTO 1919 p 37)

21 INTRODUCcedilAtildeO

Eacute fato que o universo eacute regido por leis naturais O que aparentemente demonstra

ser fruto da eventualidade eacute um conjunto de princiacutepios explicaacuteveis que agem de

forma complementar sob as forccedilas centriacutefugas e centriacutepetas Com a liacutengua(gem)

natildeo diferentemente enquanto sistema de relaccedilotildees ela reflete estas

caracteriacutesticas Para Croft (2003 p 25) ela reflete a tensatildeo entre duas tendecircncias

concorrentes - uma em direccedilatildeo agrave regularidade a outra em direccedilatildeo agrave

hierarquizaccedilatildeo

Com o objetivo de melhor compreensatildeo dos pressupostos da tese neste capiacutetulo

nos deteremos agrave compreensatildeo dos conceitos de marcaccedilatildeo assimetria e

naturalidade Oriundos da linguiacutestica de base estes termos estatildeo relacionados

aos universais linguiacutesticos A complexidade destes conceitos por outro lado

apontam para o que eacute individual e para o que eacute geral Tem a ver com o que jaacute

defendia Chomsky ao estabelecer a dicotomia Princiacutepios x Paracircmetros

Obviamente posta a complexidade da liacutengua esses ldquoagentesrdquo da linguagem

5 Espeacutecie de trepadeira que manteacutem sua raiz no solo mas necessita de um suporte para manter-

se ereta e crescer em direccedilatildeo agrave luz

30

estatildeo submetidos tambeacutem aos fatores internos e externos nas liacutenguas do mundo

Logo o que eacute marcado numa liacutengua pode natildeo ser em outra ou podem ocorrer

marcaccedilotildees mais globais

Matras e Elsik (2006 p12) discorrem que

A tarefa da teoria linguiacutestica eacute a nosso ver descrever como essas tendecircncias concorrentes satildeo responsaacuteveis pela formaccedilatildeo de estruturas linguiacutesticas Trata-se de um jogo a niacutevel local de vaacuterios fatores a estrutura e sua funccedilatildeo na comunicaccedilatildeo o membro e o valor que ela representa tanto dentro do paradigma e em um quadro conceitual mais universal a natureza do processo especiacutefico envolvido na formaccedilatildeo a estrutura e a motivaccedilatildeo para aplicar esse processo para o paradigma ou partes dele Esta complexa interaccedilatildeo de fatores nunca eacute preacute-determinada uma vez que diferentes combinaccedilotildees de fatores tornaratildeo resultados diferentes A este respeito tomamos uma visatildeo imparcial do que condiccedilatildeo marcada eacute e se eacute ou natildeo uma estrutura eacute marcado ldquoem comparaccedilatildeo com a outrardquo Em vez disso nosso interesse eacute em explorar padrotildees nos resultados de diferentes combinaccedilotildees de fatores em niacutevel local

A assimetria e a naturalidade efetivamente teriam uma relaccedilatildeo direta com a

marcaccedilatildeo O que eacute assimeacutetrico tende a ser mais marcado e menos natural Por

outro lado o que eacute mais natural tende a ser menos marcado e mais simeacutetrico

Esta eacute uma condiccedilatildeo elementar mas natildeo totalitaacuteria para as liacutenguas do mundo

Para Batistella (1996 p115) haacute um nuacutemero de pesquisadores que sugerem

formas especiacuteficas em que as condiccedilotildees de marcaccedilatildeo desempenham um papel

na descriccedilatildeo na alteraccedilatildeo ou na aquisiccedilatildeo da liacutengua(gem) exercendo uma

funccedilatildeo relevante na definiccedilatildeo da gramaacutetica oacutetima agravequela que eacute o resultado

satisfatoacuterio na teoria da otimalidade6

6 Mesmo natildeo trabalhando diretamente com a teoria da otimalidade nesta tese eacute vaacutelido ressaltar

que os princiacutepios de marcaccedilatildeo simetria e naturalidade fazem parte do arcabouccedilo teoacuterico de seu axioma

31

No que diz respeito agrave fonologia aacuterea da linguiacutestica sob a qual se debruccedila o objeto

de estudo desse trabalho Battistella (1966 p65) observa que condiccedilatildeo marcada

eacute uma propriedade da relaccedilatildeo entre os dois sinais de um paradigma diacriacutetico

que eacute em parte independente da substacircncia linguiacutestica articulaccedilatildeo e percepccedilatildeo e

deve ser definido principalmente como conceitual

No que se refere aos conceitos postos aqui utilizaremos os pressupostos teoacutericos

defendidos por CROFT (1996 2003) JAKOBSON (1953) BATTISTELLA (1996)

MATRAS amp ELSIK (2006) para descriccedilatildeo teoacuterica e abordagem histoacuterica e LACY

(2006) para a descriccedilatildeo dos universais marcados para tratarmos das elucidaccedilotildees

sobre Marcaccedilatildeo Tipoloacutegica (no contato linguiacutestico) e Naturalidade

22 MARCACcedilAtildeO

Battistella (1996 p7) afirma que em muitas aacutereas alguns conceitos apresentam

problemas quanto agrave sua complexidade axioloacutegica Natildeo diferentemente no campo

da linguiacutestica tais discussotildees emblemaacuteticas ainda hoje se fazem presentes Uma

dessas discussotildees gira em torno do conceito de marcaccedilatildeo pois segundo ele

A dicotomia natildeo-marcado versus marcado eacute um dos conceitos-chave tanto a teoria da gramaacutetica gerativa desenvolvida por Noam Chomsky e a teoria da linguiacutestica estrutural desenvolvida por Roman Jakobson Ela tem sido usada em aacutereas da linguiacutestica que vatildeo desde a descritiva e tipoloacutegica ateacute a aplicada e foi emprestado para campos tatildeo diversos como a antropologia arte muacutesica poesia e literatura

O termo que fora introduzido na linguiacutestica na deacutecada de 1920 pelos linguistas

europeus da Escola de Praga cujo significado da condiccedilatildeo marcada natildeo

32

permaneceu constante mesmo dentro de uma uacutenica estrutura intelectual hoje eacute

um marco central na linguiacutestica O conceito de marcaccedilatildeo estaacute relacionado agrave

frequecircncia daquilo que eacute menos comum na liacutengua Logo a relaccedilatildeo deste conceito

se coaduna agrave noccedilatildeo de naturalidade Se um elemento eacute mais natural ele seraacute

menos marcado Se o oposto seraacute mais marcado Deste modo as liacutenguas teriam

uma tendecircncia a optar por padrotildees natildeo marcados

Battistella (2006 p13) expotildee que

A possibilidade de relaccedilotildees universais marcado natildeo-marcado eacute atenuada por outros fatores Um deles eacute a observaccedilatildeo de que a assimetria eacute muitas vezes sensiacutevel ao contexto Isso faz com que uma condiccedilatildeo local marcada em vez de um fenocircmeno geral signifique que contexto deve sempre ser considerado ao determinar valores de condiccedilatildeo marcada Poderia ser eacute claro que o aspecto contextual da condiccedilatildeo marcada seja dado universalmente mas este natildeo eacute de modo algum faacutecil de mostrar aleacutem do niacutevel de fonologia Uma preocupaccedilatildeo relacionada sobre as implicaccedilotildees universais decorre do fato de que muitas assimetrias podem ser revertidas entre as diferentes comunidades de fala periacuteodos de tempo ou registradores

Para Trask (2004 p187) os vaacuterios criteacuterios para entender que uma forma ou

construccedilatildeo eacute marcada podem natildeo coincidir e os valores da alternativa marcado

natildeo-marcado podem tambeacutem mudar ao longo do tempo A complexidade posta na

interaccedilatildeo de fatores nunca eacute previamente estabelecida uma vez que as

diferentes combinaccedilotildees deles tornaratildeo consequentemente os resultados

diferentes

Em continuidade ele afirma que

Ser marcado eacute uma noccedilatildeo muito ampla que se aplica em todos os niacuteveis de anaacutelise Em termos gerais eacute marcada qualquer forma linguiacutestica que ndash sob qualquer ponto de vista ndash menos usual ou menos neutra do que alguma outra forma a forma natildeo-

33

marcada Uma forma marcada pode distinguir-se de outra tambeacutem marcada pela presenccedila de mais material de maior quantidade de matizes de significado por ser mais rara numa determinada liacutengua ou nas liacutenguas em geral ou de vaacuterios outros modos (idem p129)

Na e para a fonologia eacute sugerido que processos fonoloacutegicos estejam diretamente

sensiacuteveis agrave distinccedilatildeo entre os elementos marcados e os natildeo marcados Nesta

relaccedilatildeo a marcaccedilatildeo dos segmentos foneacuteticos estaacute relacionada a propriedades

linguiacutesticas como i) serem pouco comuns ii) serem pouco frequentes iii) serem

adquiridos tardiamente iv) serem pouco estaacuteveis quanto agrave mudanccedila sonora

(CRISTOacuteFARO-SILVA 2011 p148)

Segundo Battistella (2006 p 13) ldquoa condiccedilatildeo marcada na fonologia eacute uma

propriedade da relaccedilatildeo entre os dois sinais de um paradigma diacriacutetico que eacute em

parte independente da substacircncia linguiacutestica (articulaccedilatildeo e percepccedilatildeo) e deve ser

definida principalmente como conceitualrdquo

O conceito de marcaccedilatildeo estaacute diretamente relacionado ao de simetria propriedade

matemaacutetica que consiste na correspondecircncia e permuta de elementos dentro de

um conjunto onde mesmo com a troca de lugares eles continuam tendo o

mesmo valor Neste caso a marcaccedilatildeo estaria ligada ao conceito de assimetria

posto que esta seja a quebra da valoraccedilatildeo de correspondecircncia dos elementos

Trask 2007

Para Matras e Elsik (2006 p 8)

Assimetrias de paradigmas tecircm vindo a ser associado com a noccedilatildeo de condiccedilatildeo marcadardquo O conceito pressupotildee que a relaccedilatildeo estrutural entre os dois polos de um paradigma eacute previsiacutevel em certa medida Ele tambeacutem assume que um dos

34

polos marcado seraacute sempre exibir propriedades que o outro polo desmarcado natildeo tem

Os referidos autores tratam dos aspectos sobre assimetria afirmando que a

simetria eacute mais simples por ser explicada ldquoem termos formais ao niacutevel do

paradigma e em termos funcionais atraveacutes de regularidade na posiccedilatildeo e

formas das estruturas que executam operaccedilotildees lineares semelhantes na

organizaccedilatildeo de informaccedilatildeo de enunciadosrdquo Eles ainda afirmam que as ldquoas forccedilas

que provocam a assimetria satildeo muito mais opacasrdquo pois ldquoelas competem em

vaacuterios niacuteveis locais contra o poder aparentemente esmagador e sempre presente

da busca pela simetriardquo (idem p 10)

A noccedilatildeo de valores dos conceitos de marcados e natildeo marcados foi inicialmente

desenvolvido para sistemas fonoloacutegicos por Trubetzkoy (1931) e primeiro aplicado

a categorias morfossintaacuteticas e semacircnticas por Jakobson (1932) Croft (1990 p

87) afirma que Markedness has since been adopted by both the generative and

the typological approaches to linguistic theory not surprisingly in rather different

ways7 Por isso a depender da corrente teoacuterica adotada o conceito de marcaccedilatildeo

pode ser compreendido de forma distinta dadas as interpretaccedilotildees e as

abrangecircncias a que elas se propotildeem

Conforme Battistella (1996 p 12) O termo marcaccedilatildeo abrange uma seacuterie de

conceitos

algumas tentativas foram feitas para separar os conceitos subjacentes a este termo e distinguir entre diferentes tipos de condiccedilotildees marcadas Jakobson por exemplo manteacutem uma

7 O conceito de marcaccedilatildeo tem sido adotado nas abordagens gerativista e tipoloacutegica natildeo surpreendentemente de maneiras bastante diferentes

35

distinccedilatildeo entre condiccedilatildeo fonoloacutegica marcada que envolve categorias cujos significados satildeo meros diferenciadores e condiccedilatildeo marcada semacircntica que envolve categorias conceituais que sinalizam o que significa bem como distinguem os vocaacutebulos

Com os passar do tempo os modelos teoacutericos sobre marcaccedilatildeo tambeacutem foram

discutidos e repensados de acordo com a corrente a que se propunha Nos

paraacutegrafos que seguem discorremos seguindo o percurso histoacuterico descrito por

Battistella 2006 sobre estes modelos estruturalista gerativista tipoloacutegica e

naturalista

221 A concepccedilatildeo de Jakobson e Trubetzkoy

A abordagem estruturalista estaacute diretamente ligada agraves pessoas de Jakobson e

Trubetzkoy componentes do Ciacuterculo de Praga para quem as correlaccedilotildees

fonoloacutegicas satildeo compartilhadas em um elemento definidor comum A partir da

observaccedilatildeo do comportamento dos traccedilos fonoloacutegicos eles introduzem os termos

marcado e natildeo-marcado It was in the context of the search for correlations

among phonemes that the terms marked and unmarked were first proposed

Battistella (2006 p 19)

Na visatildeo semioacutetica estruturalista de acordo com Matras e Elsik (2006 p 15)

Trubetzkoy (1939) introduziu o conceito de condiccedilatildeo marcada no contexto de sua

pesquisa sobre correlaccedilotildees fonoloacutegicas com base nas relaccedilotildees entre a presenccedila

de alguma caracteriacutestica fonoloacutegica e sua ausecircncia na consciecircncia dos falantes

Mais adiante ele restringiu a aplicaccedilatildeo da condiccedilatildeo marcada agraves neutralizaacuteveis

36

oposiccedilotildees fonoloacutegicas A partir daiacute a neutralizaccedilatildeo tornou-se o criteacuterio de

marcaccedilatildeo

Por isso diz-se que a neutralizaccedilatildeo eacute um criteacuterio originalmente fonoloacutegico que foi

estendido (nem sempre bem) para a situaccedilatildeo em que algum contexto requer o

cancelamento do contraste entre os membros de uma oposiccedilatildeo Battistella (1996

p 11)

Batistella (idem p12) tambeacutem afirma que Jakobson aplicou o conceito de

marcaccedilatildeo em vaacuterias direccedilotildees e aleacutem da fonologia a outros niacuteveis linguiacutesticos e

domiacutenios da semioacutetica com base natildeo apenas nos atributos linguiacutesticos mas nas

categorias semacircnticas da gramaacutetica e da cultura Ele tambeacutem afirmou que a

condiccedilatildeo marcada pode ser vista como uma relaccedilatildeo binaacuteria

O autor em estudo ainda discorre que Jakobson observando aleacutem disso ldquouma

seacuterie de correlaccedilotildees de condiccedilatildeo marcada notou que os valores natildeo marcados

tendem a ser representado por zero formardquo sugerindo que existe uma

correspondecircncia entre as caracteriacutesticas semacircnticas e sua expressatildeo fonoloacutegica

ldquonatildeo apenas os valores marcados tendem a ser codificados por meio de

marcadores manifestados mas tambeacutem valores semanticamente proacuteximos de

uma categoria que tendem a ser expressos fonologicamente ou marcadores

fonotaticamente semelhantesrdquo Os valores marcados tambeacutem tendem a mostrar

diferenciaccedilatildeo menos formal do que os valores natildeo marcados

Jakobson tambeacutem teria evidenciado seus estudos com base nas observaccedilotildees

sobre a aquisiccedilatildeo de primeira liacutengua e sobre a afasia Em suas pesquisas ele

descobriu correlatos extralinguiacutesticos de condiccedilatildeo marcada propondo uma

37

hierarquia das caracteriacutesticas fonoloacutegicas universais ao coletar dados

corroboradores da tese de que as caracteriacutesticas ou segmentos marcados satildeo

mais difiacuteceis de serem adquiridos por crianccedilas e de serem apreendidos por

afaacutesicos Battistella (idem 16)

222 Abordagem Gerativa

Para Matras amp Elsik (2006 p10) a visatildeo de Chomsky de marcaccedilatildeo mostra uma

flexibilidade notaacutevel uma vez que o conceito natildeo foi desenvolvido de forma

sistemaacutetica e que eacute difiacutecil falar sobre a existecircncia de um trabalho mais bem

elaborado sobre marcaccedilatildeo em sua obra

Battistella afirma que na concepccedilatildeo gerativista o conceito de marcaccedilatildeo exposto

por Chomsky estaacute relacionado a duas ideias centrais i) a condiccedilatildeo marcada eacute

concebida como codificaccedilatildeo de uma estrutura de preferecircncia ou a estrutura

padratildeo para a aquisiccedilatildeo da linguagem e ii) a condiccedilatildeo marcada eacute vista como

aquela que reflete o custo de determinadas opccedilotildees analiacuteticas Em tal conceito as

duas ideias estatildeo interligadas na abordagem gerativa na medida em que uma

teoria formal eacute necessaacuteria para expor a adequaccedilatildeo explicativa no que diz respeito

agrave aquisiccedilatildeo da linguagem (1996 p18)

Ainda segundo o autor Chomsky tambeacutem distinguiu dois tipos de condiccedilatildeo

marcada a distinccedilatildeo entre uma gramaacutetica sem marcaccedilatildeo do nuacutecleo e uma

periferia marcada e as estruturas de preferecircncia dentro do nuacutecleo e dentro da

periferia

38

No que tange agrave fonologia para Moreira da Silva (2011 p 31)

No contexto da Gramaacutetica Gerativa Chomsky amp Halle (1968 p 402) propotildeem uma teoria de marcaccedilatildeo baseada num conjunto de convenccedilotildees de marcaccedilatildeo ou definiccedilotildees dos valores ldquomarcadordquo ldquonatildeo-marcadordquo para os traccedilos fonoloacutegicos em contextos particulares A marcaccedilatildeo concebe uma estrutura como preferida ou que surge por defeito omissatildeo Os elementos marcados e natildeo marcados satildeo compreendidos como os que apresentam maior ou menor custo Satildeo as regras da Gramaacutetica Universal que atribuem um valor natildeo marcado aos traccedilos Com efeito os valores por omissatildeo estatildeo codificados na Gramaacutetica Universal havendo um conjunto de regras que fazem emergir os valores marcados

Chomsky amp Halle (idem p 425) propotildeem uma marcaccedilatildeo universal e inata Os

segmentos marcados ou os valores dos traccedilos satildeo estabelecidos de acordo com

universais interlinguiacutesticos frequecircncia distribucional mudanccedila linguiacutestica e

aquisiccedilatildeo da liacutengua

Eacute no final dos anos 70 e durante a deacutecada de 80 que segundo Battistella (1996

p 10)

a condiccedilatildeo marcada comeccedilou a ser tratada como parte de uma teoria do nuacutecleo da gramaacutetica A Gramaacutetica nuclear consistia em alguns paracircmetros que deveriam ser corrigidos durante a aquisiccedilatildeo de uma linguagem real O conceito de condiccedilatildeo marcada foi aplicado duplamente neste quadro Em primeiro lugar todo o nuacutecleo da gramaacutetica foi considerado como natildeo marcado contra a periferia marcada A condiccedilatildeo marcada de uma construccedilatildeo foi determinada pela sua regularidade estabilidade e centralidade para o nuacutecleo de uma linguagem particular bem como por generalizaccedilotildees intralinguiacutesticas sobre os tipos de construccedilatildeo Em segundo lugar a condiccedilatildeo marcada seria tambeacutem aplicada aos valores de paracircmetros no interior do nuacutecleo e no interior da periferia Assim condiccedilatildeo marcada tambeacutem foi visto como uma estrutura de preferecircncia dentro dos dois componentes da gramaacutetica

Moreira da Silva (2011 p32) afirma que no que diz respeito agrave Teoria da

Otimidade formulada por Prince amp Smolensky (1993) a marcaccedilatildeo eacute vista como a

39

violaccedilatildeo de uma restriccedilatildeo ou princiacutepio da liacutengua Segundo esta teoria cada liacutengua

eacute definida como um conjunto de hierarquizaccedilotildees de princiacutepios universais As

restriccedilotildees numa posiccedilatildeo mais elevada e que satildeo raramente violadas indicam os

aspetos natildeo marcados enquanto as menos importantes e que satildeo violadas

frequentemente mostram os aspetos mais marcados

223 Abordagem Tipoloacutegica (Interlinguiacutestica)

Croft (1996 p4) afirma que a principal caracteriacutestica da tipologia linguiacutestica eacute

verificar as regras de comparaccedilatildeo nas liacutenguas do mundo A comparaccedilatildeo

Interlinguiacutestica coloca a explicaccedilatildeo dos fenocircmenos linguiacutesticos de uma uacutenica

liacutengua em uma nova e diferente perspectiva

A fim de distinguir o conceito de marcaccedilatildeo de outras escolas teoacutericas Croft

(1996) introduziu a concepccedilatildeo de marcaccedilatildeo tipoloacutegica Para ele

Marcaccedilatildeo tipoloacutegica eacute uma rede de relaccedilotildees causais aparentes entre um subtipo de assimetrias interlinguiacutesticas todas as quais tecircm a ver com a forma como a funccedilatildeo eacute codificada em forma gramatical O tema geral da assimetria tambeacutem sugere um link para os padrotildees assimeacutetricos na ordem das palavras e na fonologia que diferem de marcaccedilatildeo tipoloacutegica de forma significativa Marcaccedilatildeo tipoloacutegica eacute uma propriedade universal de uma categoria conceitual natildeo uma propriedade de uma linguagem especiacutefica ou de uma categoria gramatical de linguagem particular como eacute concebida em marcaccedilatildeo para a Escola de Praga (p87 - 88)8

8 Typological markedness is a network of apparent causal relationships among a subtype of cross-

linguistic asymmetries all of which have to do with how function is encoded into grammatical form The general theme of asymmetry also suggests a link to asymmetrical patterns in word order and phonology which differ from typological markedness in significant ways Typological markedness is a universal property of a conceptual category not a language-particular property of a language-particular grammatical category as it is in Prague School markedness

40

Quanto agrave marcaccedilatildeo na abordagem tipoloacutegica autores como Croft (1996) e Givoacuten

(1990) se utilizaram da perspectiva estruturalista para embasar a sua teoria Esta

concepccedilatildeo se vale dos fenocircmenos interlinguiacutesticos e universais que eacute a sua

caracteriacutestica definidora Battistella (2006 p19) A marcaccedilatildeo tipoloacutegica eacute

portanto uma ferramenta importante para o tipologista porque fornece um meio

para ligar diretamente propriedades linguiacutesticas (estruturais) formais em todos os

idiomas

A condiccedilatildeo marcada eacute assegurada por padrotildees interlinguiacutesticos que podem ser

formulados como restriccedilotildees sobre possiacuteveis combinaccedilotildees de propriedades

linguiacutesticas Na abordagem tipoloacutegica a marcaccedilatildeo eacute vista como uma rede de

relacionamentos que engloba uma seacuterie de padrotildees gerais logicamente

independentes Croft (1990 p87) reclassifica os criteacuterios utilizados pelos

estruturalistas em trecircs estruturais comportamentais e de frequecircncia de token

Na abordagem tipoloacutegica um valor de categoria eacute mais ou menos marcado em

vez de individualmente ou duplamente marcadas como na abordagem semioacutetica

De acordo com Croft (2003 p87) o fato de que a neutralizaccedilatildeo natildeo eacute um

conceito relativo explica por que eacute um criteacuterio vaacutelido de condiccedilatildeo marcada

tipoloacutegica

Para Matras e Elsik o reconhecimento do caraacuteter relativo (gradual ou escalar) da

condiccedilatildeo marcada permite que se desenhe em alguns conceitos fundamentais da

tipologia linguiacutestica o que diz respeito agrave condiccedilatildeo de marcada Aleacutem de simples

implicacionais universais hierarquias e protoacutetipos tambeacutem podem ser vistos como

padrotildees da condiccedilatildeo marcada (2006 p18)

41

224 Abordagem Naturalista9 (Morfologia Natural)

Na abordagem naturalista de acordo com Matras amp Elsik (2006 p13) a condiccedilatildeo

marcada foi desenvolvida na escola de Morfologia Natural que surgiu na Aacuteustria e

na Alemanha em meados dos anos 1970 Os estudos de Dressler et al (1987)

para quem ldquoa naturalidade universal corresponde agrave facilidade para o ceacuterebro

humano (Dressler et all 1987 p11) fazem parte desta corrente que se debruccedilou

sobre a morfologia natural para dar sustentaccedilatildeo a sua tese Ainda para estes

autores

Os proponentes da Morfologia Natural caracterizam sua abordagem como semioacutetica e ao mesmo tempo funcional A escola foi inspirada entre outros pela teoria da marcaccedilatildeo desenvolvida na Escola de Praga Por outro lado morfologistas naturais compartilham de uma seacuterie de pontos de vista teoacutericos com o paradigma funcionalista e principalmente com orientaccedilatildeo de funccedilatildeo tipoloacutegica como a assunccedilatildeo do caraacuteter relativo da condiccedilatildeo marcada a suposiccedilatildeo de protoacutetipos e a dependecircncia de motivaccedilotildees e evidecircncias extralinguiacutesticas e intralinguiacutesticas (Idem p12)

Ainda de acordo com Matras amp Elsik (idem p 14) a Teoria da Morfologia Natural

eacute concebida como uma teoria da Naturalidade onde satildeo reconhecidos vaacuterios

niacuteveis de anaacutelise linguiacutestica que satildeo organizados por outras subteorias

correspondentes

A Morfologia Natural objetiva nesse aspecto estabelecer conflitos entre os

princiacutepios de naturalidade Dois desses satildeo i) os conflitos entre princiacutepios de

naturalidade (o que eacute natural e o que eacute especiacutefico do idioma) e ii) os conflitos

entre os diferentes componentes do sistema de linguagem

9 The naturalness approach

42

Comumente a naturalidade eacute vista por ter fundamentos extralinguiacutesticos que

determinam ou proiacutebem favorecem ou desfavorecem as estruturas linguiacutesticas

restringindo as possibilidades e especificam as preferecircncias da faculdade da

linguagem universal No entanto embora a morfologia privilegie os fatores

extralinguiacutesticos (neurobioloacutegicos e sociocomunicativos) os fatores linguiacutesticos

natildeo satildeo redutiacuteveis aos extralinguiacutesticos (ibidem p14)

23 CRITEacuteRIOS DE MARCACcedilAtildeO

Matras amp Elsik (2006 p15) elencam quatro criteacuterios relevantes para a marcaccedilatildeo

Satildeo eles i) frequecircncia ii) complexidade conceitual iii) complexidade estrutural iv)

distribuiccedilatildeo

A frequecircncia tem ocupado uma posiccedilatildeo central na abordagem tipoloacutegica da

condiccedilatildeo marcada Embora acredite-se que os elementos natildeo marcados satildeo

mais frequentes que os marcados este criteacuterio eacute relativo e universalmente

aplicaacutevel sendo bastante questionaacutevel na abordagem tipoloacutegica chegando a ser

abandonado por Croft 1990 p84 ao afirmar que ldquoo criteacuterio de frequecircncia mostra

uma conexatildeo direta entre as propriedades de estrutura da linguagem e

propriedades de uso da linguagemrdquo

Ainda segundo Croft (idem p159) a condiccedilatildeo marcada eacute mais do que uma

manifestaccedilatildeo de motivaccedilatildeo econocircmica havendo a necessidade de olhar para

outras causas da frequecircncia de certos valores gramaticais na fala

43

Na abordagem estruturalista semioacutetica a complexidade conceitual eacute a

propriedade que define a condiccedilatildeo semanticamente marcada Para Jakobson a

marcaccedilatildeo eacute definida como uma relaccedilatildeo assimeacutetrica entre sinalizaccedilatildeo e natildeo-

sinalizaccedilatildeo de uma determinada propriedade Assim o membro marcado da

oposiccedilatildeo eacute por definiccedilatildeo mais complexo semanticamente que o membro natildeo

marcado como outros criteacuterios melhores correlatos da condiccedilatildeo marcada de

diagnoacutesticos de complexidade conceitual (Matras amp Elsik 2006 p 17)

Ainda segundo estes autores (Idem p 19) o reconhecimento da extensatildeo e da

complexidade de um marcador em termos fonoloacutegicos como um fator relevante

em vez de um morfoloacutegico eacute tido por outros autores que trabalham com a

tipologia linguiacutestica Como exemplo eles citam a codificaccedilatildeo morfossintaacutetica que

eacute chamada de codificaccedilatildeo zero onde natildeo existe evidente formal de marcaccedilatildeo de

um valor de categoria

Os criteacuterios de marcaccedilatildeo com base na distribuiccedilatildeo compreendem os criteacuterios

comportamentais e o criteacuterio de valor neutro Os criteacuterios comportamentais foram

desenvolvidos especificamente na abordagem tipoloacutegica e dizem respeito a

qualquer tipo de evidecircncia do comportamento linguiacutestico dos elementos que

demonstram que um valor de uma categoria conceitual eacute gramaticalmente mais

versaacutetil do que outro Croft (1990 p 93)

Jaacute o criteacuterio de valor neutro diz respeito agrave neutralizaccedilatildeo de contrastes

paradigmaacuteticos em determinados contextos O criteacuterio foi desenvolvido na Escola

de Praga e tomado por Greenberg (1966) No entanto o valor neutro eacute

descartado como um criteacuterio vaacutelido de marcaccedilatildeo tipoloacutegica visto que natildeo haacute

44

consistecircncia interlinguiacutestica Natildeo existe um padratildeo interlinguiacutestico consistente de

contextos neutros que podem ser ligados agrave codificaccedilatildeo estrutural ou potencial

comportamental (Croft idem p96)

A razatildeo para a introduccedilatildeo de criteacuterios dependentes do sistema em Morfologia

Natural segundo Matras amp Elsik (2006 p 19) eacute que o conceito de naturalidade

baseada exclusivamente em fatores independentes de sistema resulta em

prediccedilotildees incorretas especialmente na mudanccedila de linguagem Eles consideram

certos aspectos da normalidade dependente de idioma para ser parte de

naturalidade

Segundo Croft (1990 p 97) no que tange aos criteacuterios externos da marcaccedilatildeo os

proponentes da abordagem naturalista introduziram uma seacuterie de criteacuterios ou

correlatos extralinguiacutesticos da condiccedilatildeo marcada como

evoluccedilatildeo da linguagem (o mais tarde o mais marcado)

maturaccedilatildeo ontogeneacutetica (o mais tarde o mais marcado)

fala do bebecirc (menos elementos marcados preferidos pelos adultos no

maiecircs)

aquisiccedilatildeo da linguagem (menos marcado adquirido antes do mais

marcado)

distuacuterbios da linguagem e da fala (mais marcado afetado anteriormente

menos marcado)

testes de percepccedilatildeo (menos marcado mais facilmente percebida do que

mais marcado)

45

e erros linguiacutesticos (mais marcados evocam mais erros do que os menos

marcados)

Esses criteacuterios satildeo basilares e dariam conta de uma seacuterie de elementos

universais linguiacutesticos

24 MARCACcedilAtildeO MUDANCcedilA E CONTATO LINGUIacuteSTICO

Matras amp Elsik (2006 p 22) garantem que em muitas abordagens a

mudanccedila linguiacutestica eacute vista como cooperadora para compreensatildeo da marcaccedilatildeo

Logo a mudanccedila de idioma eacute tida como criteacuterio de marcaccedilatildeo Esta assertiva faz

sentido nesse trabalho visto que o objeto de anaacutelise o portuguecircs resultante do

contato entre o Portuguecircs e o Latundecirc trata de cacircmbio de materiais linguiacutesticos

Neste caso especificamente dos elementos foneacuteticos

Ainda de acordo com estes autores

A existecircncia de estruturas marcadas eacute um resultado inevitaacutevel da compartimentaccedilatildeo e da abertura do sistema de linguagem E uma vez que diferentes componentes da linguagem tecircm funccedilotildees divergentes e tendem a seguir diferentes princiacutepios de naturalidade o abandono das estruturas marcadas em um niacutevel implica em estruturas marcadas em outro niacutevel (Idem p

25)

Em outras palavras a mudanccedila linguiacutestica leva agrave condiccedilatildeo de marcaccedilatildeo na

mudanccedila de um componente da liacutengua para outro ao inveacutes de uma reduccedilatildeo

global de condiccedilatildeo marcada Tais estruturas marcadas satildeo obrigadas a existir em

qualquer momento na histoacuteria de uma liacutengua

46

Os estudiosos apontam para os dois tipos de forccedilas que agem no contato

linguiacutestico a interna e a externa Assim tais forccedilas podem simplificar ou complicar

a gramaacutetica de uma liacutengua Givoacuten (1979 p 123) diz que os falantes satildeo

propensos a recorrer a estruturas natildeo marcadas da Gramaacutetica Universal em

situaccedilotildees cujo contato estaacute ligado ao estresse comunicativo enquanto situaccedilotildees

de contato menos marcados aquelas que prosseguem de forma mais gradual

natildeo precisam

Givoacuten (idem 124) diz que nas situaccedilotildees de pidgin a condiccedilatildeo de marcaccedilatildeo eacute

reduzida e situaccedilotildees de contato entre liacutenguas podem resultar em aumento de

elementos marcados As categorias marcadas satildeo reduzidas em pidgins

enquanto as natildeo-marcadas satildeo as primeiras a serem inovadas durante o

processo de crioulizaccedilatildeo A marcaccedilatildeo sugere que em situaccedilotildees de contato

envolvendo a interferecircncia deve favorecer a reduccedilatildeo da condiccedilatildeo marcada

Na aquisiccedilatildeo de segunda liacutengua o grau relativo de dificuldade para o aprendiz

estaacute relacionado a fatores extralinguiacutesticos como idade Eacute fato que na aquisiccedilatildeo

de uma segunda liacutengua os adultos tendem a terem dificuldades com os padrotildees

mais marcados enquanto os mais novos natildeo a tem Estruturas marcadas da

liacutengua em aquisiccedilatildeo podem deixar de serem adquiridas durante a aprendizagem

caso sejam os adultos que a esteja adquirindo Por isso estruturas natildeo marcadas

satildeo mais propensas a surgir em grandes sociedades caracterizadas por um

intenso contato linguiacutestico levando agraves liacutenguas a simplificaccedilatildeo dos seus sistemas

linguiacutesticos Croft (2000 p 192-193)

47

Jakobson (1978 p 35-37) afirma que quanto maior a funccedilatildeo socioespacial de um

dialeto mais simples seraacute o seu sistema linguiacutestico Dialetos e liacutenguas

relativamente isoladas satildeo mais propensas a desenvolverem condiccedilotildees marcadas

e estruturas redundantes como conjunto de fonemas complexos com um elevado

nuacutemero de contrastes fonoloacutegicos complexidade alofocircnica e alomoacuterfica

irregularidade morfoloacutegica e padrotildees de concordacircncia complexos Por outro lado

os casos de alto contato dialeacutetico que satildeo caracterizadas por redes sociais

relativamente abertas satildeo susceptiacuteveis agrave produccedilatildeo de estruturas linguiacutesticas natildeo

marcadas pela diminuiccedilatildeo da irregularidade da redundacircncia e da complexidade

Apesar de os empreacutestimos serem um aspecto do aumento da condiccedilatildeo marcada

ela (a condiccedilatildeo) eacute operativamente especiacutefica de cada empreacutestimo Esta condiccedilatildeo

marcada do empreacutestimo coodetermina quais as formas e funccedilotildees satildeo mais

susceptiacuteveis de serem emprestadas do que outras Quanto mais transparente e

menos integrador for um elemento na liacutengua de origem torna-se mais provaacutevel de

ser emprestado A condiccedilatildeo marcada eacute relativa ao contexto agrave saliecircncia agrave

frequecircncia agrave ocorrecircncia e agrave distacircncia tipoloacutegica da situaccedilatildeo do contato Matras amp

Elsik (2006 p 26)

Croft (2000 p198) estende a noccedilatildeo de condiccedilatildeo marcada natildeo soacute para os

mecanismos de mudanccedila mas tambeacutem para as formas de contextos de difusatildeo

ou seja padrotildees de realizaccedilatildeo Ele afirma que enquanto na mudanccedila interna as

inovaccedilotildees entram nos pontos menos marcados e estendem a ambientes mais

acentuados em empreacutestimos e outras inovaccedilotildees mudanccedilas motivadas

externamente se espalham de pontos marcados para menos contextos marcados

48

25 JAKOBSON E A ABORDAGEM FONOLOacuteGICA DA MARCACcedilAtildeO

O termo marcaccedilatildeo recebeu o tratamento mais expansivo nos estudos de Roman

Jakobson a partir de 1930 Ele e Trubetzkoy difundiram a ideia de correlaccedilatildeo

fonoloacutegica como uma seacuterie de oposiccedilotildees binaacuterias que compartilham elementos

em comum Eacute Jakobson que afirma que a neutralizaccedilatildeo e o estaacutegio onde as

posiccedilotildees marcadas natildeo estatildeo em estado de marcaccedilatildeo

Eacute tambeacutem Jakobson quem introduz a concepccedilatildeo de niacuteveis de marcaccedilatildeo propondo

que a forma natildeo marcada tanto tem uma forma geral como uma parcial Ele

descobriu uma relaccedilatildeo entre a marcaccedilatildeo em uma hierarquia universal de traccedilos

fonoloacutegicos os traccedilos marcados implicam maior dificuldade de aprendizagem e

uma maior facilidade de perda por parte de pessoas com afasia Ele ainda diz

que

O padratildeo do desenvolvimento fonoloacutegico universal consiste numa progressatildeo de diferenciaccedilotildees cada vez mais finas entre traccedilos distintivos inicialmente distinccedilatildeo entre consoantes e vogais formando-se posteriormente oposiccedilotildees cada vez menos universais A dissoluccedilatildeo da competecircncia linguiacutestica individual nas patologias da linguagem eacute governada pela mesma regularidade a perda do valor primaacuterio pressupotildee a perda do valor secundaacuterio e eacute por isso que se fala da infantilidade da fala dos afaacutesicos A dissoluccedilatildeo do sistema de sons nos afaacutesicos fornece uma imagem de espelho do desenvolvimento fonoloacutegico da crianccedila ndash os sons a serem adquiridos mais tardiamente satildeo os primeiros a serem perdidos (1941 p 60-63)

No percurso da fonologia Jakobson (1941 p 84) viu a representaccedilatildeo fonecircmica

como um niacutevel sem redundacircncia de representaccedilatildeo que conteacutem apenas

informaccedilotildees distintivas A praacutetica descritiva da informaccedilatildeo teoacuterica de Jakobson

49

teve uma grande e importante influecircncia sobre a notaccedilatildeo livre da redundacircncia na

fonologia e na sintaxe gerativas

Com base na literatura meacutedica Jakobson examinou a aquisiccedilatildeo da linguagem e a

afasia da fala agrave luz dos universais linguiacutesticos propondo uma relaccedilatildeo entre uma

hierarquia universal dos traccedilos fonoloacutegicos a aquisiccedilatildeo da linguagem na infacircncia

e a perda dela durante a afasia A aquisiccedilatildeo fonoloacutegica da crianccedila e os distuacuterbios

dos afaacutesicos baseiam-se nas mesmas leis de solidariedade como o inventaacuterio

fonoloacutegico o percurso fonoloacutegico das liacutenguas do mundo

Os estudos de Jakobson e de Trubetzkoy sobre a tipologia fonoloacutegica levaram

Jakobson a propor que os sistemas de sons satildeo organizados hierarquicamente e

que certas oposiccedilotildees fonoloacutegicas fornecem o nuacutecleo do sistema de som de todas

as liacutenguas Estas satildeo as oposiccedilotildees que definem os sons mais prototiacutepicos mdash

vogais e consoantes que ocorreratildeo em todos os idiomas vogais cardeais a i

u consoantes plosivas p t k e as nasais m n Estes sons satildeo

encontrados em praticamente todas as liacutenguas do mundo

Jakobson propotildee novas leis implicativas entre estes sons e os sons fora do

inventaacuterio baacutesico Dessa forma as leis tipoloacutegicas preveem que em nenhuma

liacutengua haveraacute vogais nasais a menos que haja vogais orais nenhuma liacutengua teraacute

uma vogal arredondada posterior a menos que ela tambeacutem tenha uma vogal

anterior fechada natildeo arredondada nenhuma liacutengua teraacute uma vogal fechada natildeo

arredondada a menos que ela tambeacutem tenha uma arredondada nenhuma liacutengua

teraacute uma fricativa dental simples sem uma fricativa dental estridente (Idem 1941

p 86)

50

Jakobson tambeacutem observa que certos sons satildeo muito raros nas liacutenguas do

mundo por exemplo as fricativas laterais e o r tcheco estridente Ele propotildee que

esses sons satildeo mais afastados do nuacutecleo e portanto menor nesta hierarquia

A hierarquia de oposiccedilotildees fonoloacutegicas definida pela tipologia encontra-se tambeacutem

no desenvolvimento do sistema foneacutetico da crianccedila Com base em estudos diaacuterios

de aquisiccedilatildeo da linguagem ele confirma a hierarquia na aquisiccedilatildeo dos padrotildees e

os padrotildees mais marcados seriam adquiridos tardiamente

Moreira da Silva (2011 p36) elenca os criteacuterios de marcaccedilatildeo No entanto a

autora chama a atenccedilatildeo para o fato de que eles nem sempre funcionam do modo

esperado Satildeo eles frequecircncia distribuiccedilatildeo aquisiccedilatildeo da liacutengua patologias da

linguagem histoacuteria da liacutengua facilidade de produccedilatildeo e percepccedilatildeo universalidade

implicaccedilatildeo e processos fonoloacutegicos Ela tambeacutem apresenta algumas unidades e

estruturas consideradas mais marcadas como podemos ver a seguir

Quadro 1 Unidades e estruturas mais marcadas conforme levantamento de Moreira da

Silva (2011)

Segmentos e estruturas mais marcadas Autores

1 Vogais nasais Ferguson amp Chowdbury 1960

Greenberg 1966 14 Durand 1990

74 Kenstowicz 1994 63

2 Vogais longas Zipf 1935 1963 Greenberg 1966

14

3 Vogais meacutedias em comparaccedilatildeo com as

vogais altas

Kenstowicz 1994 65

4 Consoantes aspiradas Greenberg 1966 14

5 Consoantes glotalizadas Greenberg 1966 17

6 Obstruintes [+vozeadas] por oposiccedilatildeo agraves [- Greenberg 1966 14 24

51

vozeadas] Lass1984 155 Kenstowicz 1994

62

7 Consoantes fricativas por oposiccedilatildeo agraves

oclusivas

Kenstowicz 1994 65

8 Articulaccedilotildees secundaacuterias como labializaccedilatildeo

palatalizaccedilatildeo e velarizaccedilatildeo

Kenstowicz 1994 65

9 A regiatildeo dental alveolar eacute preferida com

exceccedilatildeo das africadas o que pode ser

observado pelo fato de este ser o ponto de

articulaccedilatildeo usado quando numa liacutengua

existe apenas uma obstruinte Nas nasais

esta tendecircncia ainda se faz notar mais

resultando na preferecircncia por n

Lass 1984 154-156

10 Segmentos com articulaccedilotildees muacuteltiplas e

complexas no geral satildeo mais marcados em

comparaccedilatildeo com segmentos com

articulaccedilotildees singulares

Kenstowicz 1994 65

11 Quanto agraves liacutequidas a lateral seraacute a menos

marcada jaacute que as liacutenguas que possuem

duas ou mais liacutequidas tecircm provavelmente

uma lateral e um contraste lateral natildeo

lateral

Lass 1984 158

12 Em termos de semivogais haacute uma

preferecircncia por j embora a maioria das

liacutenguas possua tambeacutem w as outras

semivogais satildeo raras

Lass 1984 158

13 Siacutelabas acentuadas ndash nem todas as liacutenguas

tecircm siacutelabas acentuadas embora estas

surjam cedo na aquisiccedilatildeo talvez devido agrave

sua saliecircncia perceptiva e no caso do inglecircs

devido ao fato de as palavras lexicais serem

iniciadas por siacutelaba toacutenica

Demuth 1996 121

14 Quanto agrave siacutelaba existe a preferecircncia pelo

formato natildeo marcado CV

Blevins 1995 213

15 De acordo com a TO a siacutelaba estaacute sujeita agraves Archangeli 1997 7 Hammond

52

seguintes restriccedilotildees universais

a) As siacutelabas comeccedilam com consoante -

Ataque

b) As siacutelabas tecircm uma vogal - Nuacutecleo

c) As siacutelabas acabam com uma vogal - Natildeo

Coda

d) As siacutelabas tecircm no maacuteximo uma consoante

numa margem - Complexo

(significa que os ataques complexos e codas

complexas satildeo inaceitaacuteveis)

e) As siacutelabas satildeo compostas por consoantes

e vogais - Ataque e Nuacutecleo

1997 36

As estruturas elencadas no quadro acima satildeo validadas interlinguisticamente

Com relaccedilatildeo agraves liacutenguas em contato objeto deste estudo podemos afirmar que o

portuguecircs apresenta menos estruturas marcadas do que o Latundecirc No caso do

portuguecircs as estruturas em 2 4 5 e 10 constantes do quadro acima natildeo satildeo

observadas

Jaacute no Latundecirc aleacutem de todas as estruturas apresentadas no quadro ainda satildeo

observadas as seguintes estruturas mais marcadas

estrutura silaacutebica bastante complexa

inventaacuterio vocaacutelico maior do que o consonantal

53

combinaccedilatildeo de dois traccedilos mais marcados em um segmento (vogais

nasais e laringais) e

acento e tom lexicais

Para refletirmos sobre a marcaccedilatildeo no processo de interferecircncia Latundecirc ndash

Portuguecircs trataremos no capiacutetulo seguinte de conceitos a cerca do contato

linguiacutestico

54

3 CONTATO LINGUIacuteSTICO

ldquoBilingualism is for me the fundamental problem of linguisticsrdquo Jakobson10

31 INTRODUCcedilAtildeO

A histoacuteria em grande parte gira em torno de lendas e mitos Um desses mitos eacute o

surgimento das liacutenguas do mundo Questionamentos de como e quando elas

sugiram permeiam ainda hoje as mentes dos filoacutesofos e cientistas Natildeo

diferentemente das demais aacutereas a perspectiva teoloacutegica descreve a narrativa da

construccedilatildeo da Torre de Babel como uma dessas tentativas de explicaccedilatildeo no que

tange agrave miscelacircnea de liacutenguas existentes Jackob Bohme teoacutelogo do seacuteculo XVII

afirma em seu De Signatura Rerum11 que a liacutengua divina original raiz ou matildee de

todas as liacutenguas do mundo eacute chave para um conhecimento verdadeiro e perfeito

de todas as coisas Eacute no ato da criaccedilatildeo que o primeiro homem Adatildeo

contemplando as obras do Criador de toda a natureza nomeara todas as

criaturas de acordo com suas proacuteprias qualidades essenciais usando a

linguagem humana como meio

A hipoacutetese defendida por Bohme tambeacutem fora amplamente sustentada pelos

filoacutelogos e comparatistas do final do seacuteculo XVIII Sem viacutenculo com a teologia

estes estudiosos buscavam atraveacutes da reconstruccedilatildeo da aacutervore linguiacutestica a

protoliacutengua a liacutengua-matildee geradora das demais liacutenguas

10

Apud Romaine 1995 p1 11

De Signatura Rerum (Desde o nascimento e o nome de todos os seres) 1622

55

Jacob Grimm filoacutelogo alematildeo com base nas descobertas de Rasmus Rask

aperfeiccediloou o meacutetodo comparatista sobretudo o que fora denominada de

ldquomudanccedila de somrdquo ou ldquoLei de Grimmrdquo12 com intuito de descrever as mudanccedilas

ocorridas na liacutengua-matildee o proto-indo-europeu (PIE) A Lei de Grimm estava na

base das discussotildees ocorridas mais tarde na Universidade de Leipzig

Alemanha no conhecido grupo dos neogramaacuteticos Os estudiosos desse ciacuterculo

questionaram os estudos de Grimm e seus compatriotas ao apontarem para o fato

de que os estudos comparatistas se basearem em dados de liacutengua escrita e natildeo

de liacutengua falada (GABAS JR 2008 p 80)

Humberto Eco em A busca da liacutengua perfeita13 nos relata sobre os projetos de

reconstruccedilatildeo em busca da liacutengua sagrada No seu livro o autor nos mostra que a

tentativa de procura de correlatos entre as liacutenguas do mundo eacute interesse antigo

das civilizaccedilotildees Ele afirma que na Europa no seacuteculo XIX houve 173 projetos de

reconstruccedilatildeo linguiacutestica

Dadas ateacute aqui as investigaccedilotildees eacute comum pensarmos que pelo prisma

teoloacutegico o surgimento das liacutenguas no planeta eacute fruto da desobediecircncia e

soberba humanas Eco idem nos mostra que haacute um equiacutevoco quanto a esta

interpretaccedilatildeo uma vez que no capiacutetulo XI v 1 do livro de Gecircnesis a Biacuteblia

12

A Lei de Grimm analisou sobre o vieacutes da fonologia as relaccedilotildees que havia entre as liacutenguas indo-

europeias As similaridades entre o alematildeo claacutessico grego e inglecircs antigo eram previstas a partir de leis foneacuteticas i) as consoantes oclusivas surdas (p t k kw) do PIE mudaram em fricativas surdas correspondentes (f θ h hw) nas liacutenguas germacircnicas ii) as consoantes oclusivas sonoras (bdggw) do PIE mudaram em oclusivas surdas correspondentes (p t k kw) nas liacutenguas germacircnicas iii) as consoantes aspiradas sonoras (bh dh gh gwh) do PIE mudaram em oclusivas natildeo-aspiradas sonoras correspondentes (bdggw) nas liacutenguas germacircnicas (GABAS JR 2008 p 78) 13

ECO Humberto A busca da liacutengua perfeita Traduccedilatildeo de Antonio Angonese Bauru Edusc

2001

56

discorre sobre a existecircncia de uma uacutenica genealogia de uma mesma liacutengua e de

uma mesma fala

Diferentemente no capiacutetulo que antecede a narrativa de Babel a proacutepria Biacuteblia

aponta para a existecircncia de famiacutelias linguiacutesticas distintas conforme Gecircnesis 11

v 5 Por estes foram repartidas as ilhas dos gentios nas suas

terras cada qual segundo a sua liacutengua segundo as suas

famiacutelias entre as suas naccedilotildees

v20 Estes satildeo os filhos de Catildeo segundo as suas famiacutelias

segundo as suas liacutenguas em suas terras em suas naccedilotildees

v 31 Estes satildeo os filhos de Sem segundo as suas famiacutelias

segundo as suas liacutenguas nas suas terras segundo as suas

naccedilotildees

Uma explicaccedilatildeo para tal passagem se daacute a partir da perspectiva dos filoacutesofos

gregos que concebiam os povos que falava de forma diferente como bagraverbaroi

seres que balbuciavam falando de forma incompreensiacutevel Logo acreditavam que

aqueles outros eram serem inferiores que natildeo falavam a liacutengua verdadeira da

razatildeo e do pensamento o logos

Tal conflito entre as liacutenguas existentes apontam para uma poliacutetica linguiacutestica que

muito explica a hierarquia (status) linguiacutestica ainda hoje atuante O status

linguiacutestico resultante das relaccedilotildees assimeacutetricas entre sociedades ou subgrupos de

uma sociedade decorre tambeacutem das circunstacircncias e condiccedilotildees que envolvem o

contato linguiacutestico Esse por sua vez evolue da dinacircmica proacutepria do processo em

que ocorrem conflitos e acomodaccedilotildees e que pode derivar pidgins crioulos e

mudanccedila linguiacutestica

57

No reconhecimento de um universo entrelaccedilado compartilhamos com o ponto de

vista de Eco (2001) e assumimos a ideia de que a existecircncia de cada liacutengua e de

sua historicidade eacute reveladora do entendimento do mundo

ldquoCada liacutengua constitui um determinado modelo de Universo um sistema semioacutetico de compreensatildeo do mundo e se temos quatro mil modos diferentes de descrever o mundo isto nos torna mais ricos Deveriacuteamos nos preocupar pela preservaccedilatildeo das liacutenguas tal como nos preocupamos com a ecologiardquo (ECO 2001 p234)

32 SOBRE O CONTATO LINGUIacuteSTICO

Pouco eacute sabido sobre o contato entre as liacutenguas do mundo quando diante da

imensidatildeo que eacute o universo linguiacutestico com o qual nos deparamos14 A

necessidade que os humanos tecircm de se comunicarem a partir do momento que a

interaccedilatildeo foi estabelecida eacute condiccedilatildeo imprescindiacutevel para o contato linguiacutestico

Trask (2004 p 66) afirma que poucas liacutenguas estatildeo - ou estiveram -

suficientemente isoladas para evitar todo tipo de proximidade e portanto toda

liacutengua mostra alguma prova de um contato antigo ou moderno entre liacutenguas

Thurston (1987 p 34) afirma que

toda liacutengua deve ter sofrido alguma influecircncia de seus vizinhos em um determinado ponto e tempo Para ele todos os idiomas satildeo liacutenguas mistas na medida em que todos copiaram formas lexicais e outros recursos linguumliacutesticos de liacutenguas vizinhas

Embora natildeo saibamos exatamente como se deu o contato entre as liacutenguas do

mundo as evidecircncias do contato podem ser observadas de forma objetiva

atraveacutes de empreacutestimos lexicais O contato linguiacutestico entretanto natildeo se reduz

14

Eacute estimado o nuacutemero de sete mil liacutenguas vivas atualmente ao redor do mundo (httpwwwethnologuecomworld Em 21 de janeiro de 2015)

58

apenas a itens lexicais oriundos dos empreacutestimos entre culturas distintas com

base na dominaccedilatildeo na expansatildeo do comeacutercio ou em qualquer circunstacircncia que

promova a necessidade de comunicaccedilatildeo entre culturas de liacutenguas diferentes

O contato a depender das liacutenguas envolvidas pode trazer consequecircncias muito

devastadoras Em casos extremos o impacto do contato pode ser avassalador

fazendo com que uma das liacutenguas seja extinta quer seja pelo deslocamento

linguiacutestico que seja pelo etnociacutedio Nestes casos ocorre a morte de uma das

liacutenguas em contato aspecto que discorremos na seccedilatildeo sobre as consequecircncias

do contato

No tocante aos efeitos do contato em relaccedilatildeo aos niacuteveis linguiacutesticos Trask Idem

afirma que o contato linguiacutestico pode ir mais longe que a interferecircncia lexical

afetando a gramaacutetica e a pronuacutencia

Concordando com o que afirma Trask Thomason postula que embora seja senso

comum que o resultado mais comum da mescla linguiacutestica seja o empreacutestimo de

palavras este eacute apenas a consequecircncia mais comum quando se trata da

intersecccedilatildeo linguiacutestica

When the agents of change are fluent speakers of the receiving language the first and redominant interference features are lexical items belonging to the nonbasic vocabulary later under increasingly intense contact conditions structural features and basic vocabulary may also be transferred from one language to the other (THOMASON 2001 p 36)

Natildeo obstante podem-se detectar exemplos de transferecircncias em todos os

aspectos linguiacutesticos uma vez que todos os niacuteveis da estrutura linguiacutestica satildeo

59

possiacuteveis de serem transferidos entre idiomas muacutetuos sem qualquer tipo de

restriccedilatildeo dadas as possibilidades de conjunturas sociais e estruturais

Quando as liacutenguas entram em contato as suas gramaacuteticas tambeacutem satildeo

intercruzadas Tal processo natildeo eacute algo simples e justo Diversos fatores externos

satildeo responsaacuteveis por esta miscelacircnea que devido a tais fatores nem sempre eacute

concebida de forma inocente

Em meio a condicionantes sociolinguiacutesticas assumimos que as gramaacuteticas

(sendo tambeacutem reflexo das relaccedilotildees intersocietaacuterias) entram num jogo em que

as peccedilas satildeo acomodadas de acordo com as necessidades comunicativas dos

interlocutores (GILES e CUPLAND 1991) Em meio a esse ldquojogordquo nos importa

refletir como os fenocircmenos que emergem do contato entre liacutenguas podem refletir

questotildees que envolvem a marcaccedilatildeo e universais linguiacutesticos

Para Aikhenvald (2007 p1)

As liacutenguas podem assemelhar-se umas as outras em categorias construccedilotildees e significados e nas formas reais usadas para expressaacute-las As categorias podem ser semelhantes porque satildeo universais e cada liacutengua tem alguma forma de fazer uma pergunta ou a elaboraccedilatildeo de um comando Ocasionalmente duas liacutenguas compartilham a forma por pura coincidecircncia

A literatura linguiacutestica atesta que a semelhanccedila interlinguiacutestica motiva estudos

tipoloacutegicos haacute deacutecadas (CROFT 1990 COMRIE 1989 WHALEY 1997) Embora

liacutenguas apresentem padrotildees regulares de desemelhanccedilas aquelas podem ser

agrupadas em tipos baacutesicos Essa realidade induz a reflexatildeo acerca da existecircncia

de universais linguiacutesticos

60

As liacutenguas individuais independentemente das semelhanccedilas tipoloacutegicas eou

geneacuteticas observadas entre elas satildeo sujeitas a mudanccedilas continuadas que

ocorrem tambeacutem devido ao contato linguiacutestico Para Thomason (2001 p14) as

influecircncias e consequecircncias do contato linguiacutestico satildeo descritas em trecircs niacuteveis i)

mudanccedila induzida pelo contato ii) mescla linguiacutestica extrema o que resulta em

pidgin crioulo e liacutenguas biliacutengues e iii) morte da liacutengua

A seguir abordaremos fenocircmenos decorrentes do contato linguiacutestico

33 MESCLAS DE CONTATO PIDGIN CRIOULO LIacuteNGUA FRANCA E JARGAtildeO

Um ponto saliente dos estudos sobre o contato linguiacutestio eacute o conceito de

ldquomescla15rdquo Este termo utilizado por Tarallo e Alkimin (1987 p7) descreve a

relaccedilatildeo entre as liacutenguas e seus resultados Inicialmente eles chamam a atenccedilatildeo

para o fato de a mescla ser interpretada como algo impuro definhamento

deterioraccedilatildeo Esta impureza linguiacutestica historicamente levou a sociedade a

alimentar a ideia de contaminaccedilatildeo e obviamente construir a discriminaccedilatildeo

linguiacutestica

Ao pensarmos sobre o processo de simbiose que as coisas e os elementos do

mundo estatildeo sujeitos em todo o tempo podemos ter uma ideia clara de que o

processo de amaacutelgama eacute proacuteprio natildeo apenas da natureza linguiacutestica mas de tudo

o que pode existir Apesar disso as mesclas com graus niacuteveis e saliecircncias

variadas nem sempre satildeo refletidas ou percebidas pelos usuaacuterios das liacutenguas do

15 Mescla eacute mistura contato amaacutelgama etc Tarallo e Alkimin (1987 p7)

61

mundo Focalizando a natureza da mescla o estudo das liacutenguas por seu turno

seja sincrocircnico ou diacrocircnico pode evidenciar os fenocircmenos do contato nos

diferentes niacuteveis linguiacutesticos

Tarallo e Alkimin (idem p9) salientam que o dinamismo linguiacutestico se daacute nas

ldquocomunidades de falardquo16 Eacute nelas e entre elas que se concretizam o contato

linguiacutestico que por sua vez produzem fenocircmenos de mescla ou de convivecircncia

coexistecircncia mecanismo ativado pelos indiviacuteduos que integram tais comunidades

Esse fato se alinha agrave perspectiva de que uma comunidade de fala natildeo eacute em

absoluto homogecircnea Nela podem coexistir processos de ordem interna e

externa assim como forccedilas centriacutefugas e centriacutepetas (BAKHTIN 2010)17

A dinacircmica social eacute tambeacutem pontuada por Tarallo e Alkimin (ibidem p9) Esses

autores mencionam que a mescla linguiacutestica resultante da dinacircmica pode ser

intracomunidade ou intercomunidade No primeiro caso as variantes convivem

eou se entrecruzam em uma mesma comunidade de fala em que apenas uma

liacutengua eacute falada No segundo liacutenguas distintas coexistem e se misturam em uma

mesma comunidade Como exemplo de mesclas intracomunidades podemos citar

o portuguecircs e suas variantes questotildees geograacuteficas histoacutericas e sociais Satildeo

variantes que convivem ldquopacificamenterdquo em territoacuterio nacional Jaacute para as mesclas

intercomunidades tomemos o exemplo do conviacutevio do portuguecircs e demais liacutenguas

16

Labov (1972) conceitua comunidade de fala como grupo de falantes que segue as mesmas normas relativas ao uso da liacutengua Para Romaine (2000) trata-se de um grupo de falantes que natildeo compartilham necessariamente a mesma liacutengua poreacutem compartilham um conjunto de normas

e regras no uso da liacutengua 17

Bakhtin aponta a luta entre classes as forccedilas que agem de dentro para fora do sujeito ou das instituiccedilotildees assim como as forccedilas que agem fazendo o movimento oposto Eacute imprescindiacutevel vislumbrar o poder poliacutetico que a liacutengua tem

62

(alematildeo polonecircs e italiano) na regiatildeo sul bem como a coexistecircncia espaccedilo-

temporal entre diferentes liacutenguas indiacutegenas e entre elas e a liacutengua portuguesa

Ao discutir a mescla linguiacutestica sob a eacutegide do contato linguiacutestico Calvet (2004

p35) considera que haacute aproximadamente na Terra cerca de 5000 liacutenguas e

cerca de 150 paiacuteses Com base nesses nuacutemeros o autor nos diz que cada paiacutes

poderia ter 30 liacutenguas Apesar de em termos reais a distribuiccedilatildeo das liacutenguas natildeo

corresponder a esse cenaacuterio o pesquisador aponta para o fato de

que o mundo eacute pluriliacutengue em cada um de seus pontos e que as comunidades linguiacutesticas se costeiam se superpotildeem continuamente O plurilinguismo faz com que as liacutenguas estejam constantemente em contato O lugar desses contatos pode ser o indiviacuteduo (biliacutengue ou em situaccedilatildeo de aquisiccedilatildeo) ou a comunidade Idem (2002 p 35)

Os dados de Calvet deixam claro que desde sempre o contato linguiacutestico eacute uma

realidade da vivecircncia do humano Os acontecimentos histoacutericos de guerra

expansatildeo e colonizaccedilatildeo apontam para a mescla linguiacutestica Diante deste

contexto vemos que o relacionamento entre as liacutenguas do mundo eacute um processo

feacutertil para a diversidade linguiacutestica Outro aspecto de interesse decorre do fato de

o contato permitir a emergecircncia de padrotildees estruturais os quais trazem luzes

para a compreensatildeo da faculdade da linguagem

A depender do contato podemos avaliar diferentes fenocircmenos resultantes A

intensidade o contato linguiacutestico pode derivar instrumentos mais ou menos

elaborados de comunicaccedilatildeo definidos como jargatildeo pidgin e crioulo

63

Os primeiros estudiosos a se aterem sobre o estudo das liacutenguas pidgins e

crioulas se utilizaram dos dados (relatos) de missionaacuterios e comerciantes que

viajaram e mantiveram contato com as aacutereas das mesclas18

331 Pidgin

O termo pidgin foi usado pela primeira vez em 1850 para conceituar o conviacutevio do

inglecircs e o chinecircs19 Mas outras duas hipoacuteteses tambeacutem satildeo colocadas quando

se trata de pidgin A segunda afirma que o termo fora transportado da Ameacuterica do

Sul no iniacutecio do seacuteculo XVII pelos marinheiros e comerciantes ingleses da colocircnia

de Leigh ao estabelecerem contato com os iacutendios Pidiam A terceira explicaccedilatildeo eacute

a origem a partir da palavra portuguesa ocupaccedilatildeo que teria sofrido algumas

mudanccedilas foneacuteticas ateacute resultar em pidgin (TARALLO e ALKMIN 1987 p80)20

Para Couto (2001 p 1) o pidgin eacute uma liacutengua com uma reduccedilatildeo draacutestica da

gramaacutetica Esta reduccedilatildeo se daacute sobre a morfologia e o leacutexico Natildeo eacute liacutengua

materna de ningueacutem pois entre si os povos dominados soacute falam suas respectivas

liacutenguas ao passo que os dominadores nunca se datildeo ao trabalho de falar outra

liacutengua que natildeo a sua proacutepria

Crystal (2008 p 201) afirma que aleacutem do processo de reduccedilatildeo para o

surgimento do pidgin as comunidades de falas envolvidas neste processo

18

Tarallo e Alkimin 1987 p 109-114 citam Francisco Adolfo Coelho Hugo Schuchardt e Dirk Christiaan Hesseling como os pioneiros neste campo de estudo Este uacuteltimo atribui aos escravos europeus a forccedila linguiacutestica Foram eles (os escravos) os responsaacuteveis pelas alteraccedilotildees sofridas pelas liacutenguas maternas 19

Neste caso o termo business ao ser empregada na expressatildeo do pidgin chinecircs de base inglesa

dɛacuteju pidzIn significando thatrsquos your business 20

Ocupaccedilatildeo gt parsquosaw ou pasaɳ

64

necessitam cada uma delas se aproximarem sucessivamente dos traccedilos mais

oacutebvios da outra liacutengua Trata-se de uma intersecccedilatildeo nem sempre consciente mas

motivada por aspectos econocircmicos como o comeacutercio Daiacute o grande surgimento de

pidgins em aacutereas de intenso comeacutercio e desenvolvimento econocircmico

Dubois et all (1998 p 469) discorre que o pidgin mesmo natildeo sendo uma liacutengua

em si mesma eacute um sistema mais completo que o sabir pois seu vocabulaacuterio

cobre numerosas atividades O sabir ou liacutengua franca21 por sua vez eacute um

sistema linguiacutestico reduzido a algumas regras de combinaccedilatildeo e ao vocabulaacuterio de

determinado campo lexical

Ainda de acordo com Tarallo e Alkmin (1987 p 88)

Fontes histoacutericas indicam que no tempo das cruzadas nas regiotildees de batalhas entre mulccedilumanos e cristatildeos teria florescido uma liacutengua de contato denominada Liacutengua Franca ou sabir Com documentaccedilatildeo precaacuteria a existecircncia dessa liacutengua eacute contestada por alguns estudiosos Originalmente usada entre aacuterabes e europeus essa liacutengua teria se expandido tendo sido usada ao longo da costa do Mediterracircneo especialmente na Aacutefrica do Norte

Em Trask (2004 p228) o conceito de liacutengua franca eacute mais explorado Para ele a

liacutengua franca se distingue do pidgin quando por ventura um dos grupos

ldquoaprenderdquo a liacutengua do outro Neste caso a gramaacutetica e o leacutexico de uma

21

Na atualidade conforme Tarallo e Alkmin 1987 p 90 a expressatildeo liacutengua franca refere-se a um

fenocircmeno mais amplo a mescla de contato para intercomunicaccedilatildeo em situaccedilotildees biliacutengues e pluriliacutengues Como exemplo os autores citam a liacutengua wolof no Senegal do swahili no Quecircnia na Tanzacircnia e em Comores do Tucano no Nordeste da Amazocircnia

65

sobressaem agrave outra O pidgin eacute compreendido entatildeo como uma colcha de

retalhos que permite uma forma bastante rudimentar de comunicaccedilatildeo22

Ainda de acordo com Trasky (p229) um pidgin pode seguir caminhos distintos i)

ele pode cair em desuso ii) ele pode continuar em uso por vaacuterias geraccedilotildees e

durar seacuteculos iii) ele pode sofre algumas alteraccedilotildees e se transformar em liacutengua

materna Neste uacuteltimo caso trata-se do processo de crioulizaccedilatildeo do qual

abordaremos mais agrave frente

Hall apud Tarallo e Alkmin (1987 p 86) ao tratar do caraacuteter reducionista que o

pidgin apresenta em sua estrutura e leacutexico aponta algumas caracteriacutesticas que

definem tais simplificaccedilotildees

Niacutevel fonoloacutegico ndash o nuacutemero de contrastes empregados eacute reduzido As vogais representadas satildeo em geral as chamadas vogais cardinais (a e i o u) enquanto os grupos consonantais satildeo caracteristicamente evitados

Niacutevel morfoloacutegico ndash ausecircncia de algumas categorias flexionadas como gecircnero nuacutemero e tempo verbal

Niacutevel sintaacutetico ndash as estruturas sentenciais satildeo simples as sequecircncias tendem a ser coordenadas evitando-se as estruturas complexas e subordinaccedilatildeo extensiva

Niacutevel lexical ndash nuacutemero reduzido de vocaacutebulos cuja accedilatildeo se norteia pela extensatildeo de significados e por polissemias significativas

332 Crioulo

O crioulo eacute um pidgin consolidado Quando os falantes crianccedilas oriundos dessa

mescla linguiacutestica utilizam o pidgin como uacutenica liacutengua ou a liacutengua que passa a

ganhar mais evidecircncia esta se consolida como liacutengua materna

22

Conforme Tarallo e Alkmin (idem p 8) algumas caracteriacutesticas do pidgin satildeo i) seu caraacuteter

auxiliar e secundaacuterio para os dois grupos cada um dos grupos manteacutem sua proacutepria liacutengua no conviacutevio social do cotidiano e do habitual ii) as liacutenguas pidgin preenchem funccedilotildees sociais limitadas sobretudo aquelas vinculadas a atividades comerciais mercantilistas

66

Para Couto (2001 p2)

Liacutengua crioula eacute um pidgin que foi adquirido como liacutengua nativa como preconiza a chamada teoria da nativizaccedilatildeo De acordo com essa concepccedilatildeo o crioulo eacute um ex-pidgin ou seja um pidgin que virou liacutengua materna de uma comunidade

Ainda para Tarallo e Alkmin (1987 p 95) as liacutenguas crioulas constituem um

conjunto de liacutenguas cuja histoacuteria conhecida eacute ligada a uma situaccedilatildeo de contato

entre populaccedilotildees linguiacutesticas cultural e etnicamente distintas Estas satildeo

distinguidas das liacutenguas pidgin por possuiacuterem uma comunidade de falantes

nativos e consequentemente por desempenharem funccedilotildees sociais amplas como

qualquer liacutengua natural

Em Dubois et all (1998 p 161) daacute-se o nome de crioulos a sabires pseudo-

sabires ou pidgins que por motivos diversos de ordem histoacuterica ou sociocultural

se tornaram liacutenguas maternas de toda uma comunidade

As liacutenguas tipo pidgin de acordo com autores como Tarallo e Alkimin (1987 p

96) aleacutem de serem as liacutenguas que daratildeo origem aos crioulos (pois todo crioulo se

origina de um pidgin embora nem todo pidgin se transforme em crioulo) satildeo

associadas a atividades de comeacutercio enquanto os crioulos satildeo marcados pela

relaccedilatildeo de escravidatildeo

Quanto ao aspecto funcional as liacutenguas crioulas datildeo conta das necessidades

comunicativas totais de seus falantes nativos e usuaacuterios uma vez que a

passagem do estaacutegio de pidgin a crioulo eacute marcada por uma ampliaccedilatildeo do leacutexico

67

e de estrutura Neste caso para os estudiosos os crioulos nada mais satildeo que

pidgins enriquecidos23

O processo de evoluccedilatildeo de um pidgin em crioulo eacute descrito por Hall (1996 p 4)

em um diagrama Nele podemos ver que inicialmente o pidgin eacute configurado a

partir de um jargatildeo uma espeacutecie de pidgin instaacutevel Depois o pidgin ganha

estabilidade se configurando como um preacute-crioulo Por fim jaacute estabilizado o

pidgin se transforma em crioulo

Figura 1 Diagrama de Hall

LL = Liacutengua lexificadora ou de superstrato LS = Liacutengua de Substrato

De acordo com Hall (idem p 5) a evoluccedilatildeo do jargatildeo para o pidgin estaacutevel eacute

chamada de pidginizaccedilatildeo A evoluccedilatildeo do pidgin estaacutevel para o crioulo eacute

23

Valdman apud Tarallo e Alkimin 1987 p 96 cita um conjunto de traccedilos negativos dos crioulos franceses do Haiti de Guadalupe Martinica Reuniatildeo Mauriacutecio Seychelles e Rodrigues como i) ausecircncia de distinccedilatildeo de gecircnero ii) natildeo-obrigatoriedade de marcador de plural iii) verbos natildeo-flexionados iv) relacionamento parataacutetico no interior do sintagma nominal v) ausecircncia de hipotaxe vi) construccedilotildees passivas vii) vogais arredondadas viii) certos grupos consonantais

I = LL + LS pidgin instaacutevel jargatildeo

crioulo = III II = pidgin estaacutevel

68

denominada crioulizaccedilatildeo A volta do crioulo para o jargatildeo processo tambeacutem

possiacutevel eacute conhecido como descrioulizaccedilatildeo

Obviamente o crioulo eacute consequecircncia natural de situaccedilotildees de contato No

entanto nem todo contato linguiacutestico gera automaticamente um pidgin ou um

crioulo Os contatos podem daacute origem a fenocircmenos de mesclas diversas que

podem ou natildeo desaparecer ou serem absorvidas pelas liacutenguas presentes na

alquimia (TARALLO e ALKMIN 1987 p 103)

Quanto ao processo de desenvolvimento e de formaccedilatildeo de um pidgin e de

crioulos Hymes (1971 p 93) afirma que

A pidginizaccedilatildeo e a crioulizaccedilatildeo da linguagem natildeo satildeo processos marginais ao contraacuterio satildeo processos que ocorrem nas liacutenguas em geral Tais processos de natureza bastante complexa compreendem a ocorrecircncia de outros subprocessos os de mudanccedila A incidecircncia desses processos ocorre principalmente 1) na forma interna das liacutenguas (fala-se assim em reduccedilatildeo ou expansatildeo) 2) na forma externa das liacutenguas (daiacute se falar em amplificaccedilatildeo e complicaccedilatildeo) 3) no escopo de uso (o domiacutenio) de uma variedade linguiacutestica (fala-se assim em restriccedilatildeo ou extensatildeo)

Hymes (idem p 94) ainda explica que diferentemente da posiccedilatildeo claacutessica onde

um crioulo era oriundo (ou natildeo) de um pidgin nesta segunda proposta a

evoluccedilatildeo de um pidgin natildeo produz necessariamente um crioulo mas um conjunto

de variedades concorrentes chamada de contiacutenuo preacute-pidgin24

24

Para Hymes o contiacutenuo preacute-pidgin poderia evoluir e gerar a cristalizaccedilatildeo de um pidgin e teria autonomia enquanto sistema de comunicaccedilatildeo Com base nesta assertiva um pidgin seria o resultado de um processo que ganharia autonomia Esse pidgin constituiacutedo poderia se transformar em crioulo Mas o contiacutenuo preacute-pidgin natildeo evolui para um pidgin Torna-se possiacutevel supor a cristalizaccedilatildeo de um crioulo sem a existecircncia de um pidgin anterior (TARALLO E ALKMIN 1987 p 105)

69

Na concepccedilatildeo final deste autor o contexto inicial em que fora estabelecido o

contiacutenuo preacute-pidgin poderia alccedilar trecircs resultados aceitaacuteveis i) a cristalizaccedilatildeo de

um pidigin ii) a cristalizaccedilatildeo de um pidgin que se criouliza iii) a cristalizaccedilatildeo de

um crioulo sem necessariamente ter sido oriundo de um pidgin anterior

Tarallo e Alkimin (1987 p 106) afirma que a cristalizaccedilatildeo de um crioulo eacute apenas

uma das trecircs possibilidades para a mescla de contato que pode ser descrita da

seguinte forma i) o crioulo pode submergir ii) o crioulo pode se estabilizar sem

muitas variaccedilotildees iii) o crioulo pode se mesclar com liacutengua padratildeo oficial

De acordo com o que vimos ateacute aqui podemos descrever o processo de

hibridizaccedilatildeo linguiacutestica com base na mescla a partir dos seguintes estaacutegios i)

contiacutenuo preacute-pidgin ii) pidgin cristalizado iii) pidgin em processo de

despidginizaccedilatildeo iv) pidgin em processo de crioulizaccedilatildeo v) crioulo cristalizado vi)

crioulo em processo de descrioulizaccedilatildeo (contiacutenuo poacutes-crioulo)

333 Liacutengua Franca ou Sapir

O termo liacutengua franca refere-se agrave liacutengua de contato entre grupos ou membros de

grupos de liacutenguas distintas com finalidade para o comeacutercio Durante o Impeacuterio

Romano o grego serviu como liacutengua franca no oriente e no milecircnio seguinte o

latim no ocidente Esta liacutengua (o sapir) tambeacutem eacute conhecida como liacutengua de

marinheiro No mundo moderno o inglecircs desempenha este papel ao ser

considerado como liacutengua do comeacutercio e das ciecircncias

70

Devido agrave natureza colonizadora dos falantes suas liacutenguas serviram de liacutengua

franca em certos momentos da histoacuteria Eacute o caso do portuguecircs e do espanhol

durante a expansatildeo mariacutetima e do francecircs durante o seacuteculo VII

Trask (2004 p 167) relata que a expressatildeo lingua franca fora originadamente

utilizada para as liacutenguas dos francos francocircnio mas teve o sentido modificado

assumindo o sentido de liacutengua europeia ou liacutengua cristatilde Ele ainda assegura que

a liacutengua franca

era uma variedade de italiano fortemente suplementada com palavras derivadas do francecircs do espanhol do grego do aacuterabe e do turco que se usava como liacutengua do comeacutercio no Mediterracircneo oriental no final da Idade Meacutedia Desde entatildeo a denominaccedilatildeo aplica-se a toda liacutengua que desfruta de um amplo entre falantes de um grande nuacutemero de liacutenguas numa dada regiatildeo

No presente o termo eacute utilizado para designar uma liacutengua estabelecida haacute algum

tempo tida como materna em um grupo influente e que serve de comunicaccedilatildeo

entre os falantes de outras liacutenguas como por exemplo o papel que o inglecircs

exerce em Cingapura

Atualmente aleacutem do inglecircs inuacutemeras liacutenguas servem de liacutengua franca para

comunicaccedilatildeo entre os povos como por exemplo o tupi No entanto um caso que

merece destaque eacute o do esperanto liacutengua que vem sendo incorporada no mundo

desde a deacutecada de 80 com a finalidade de ser a liacutengua franca universal Vale

ressaltar que neste caso os interesses para que tal liacutengua se propagasse

eficientemente eacute diferente das liacutenguas francas da Idade Meacutedia uma vez que se

trata de uma liacutengua artificial criada com ideologias poliacuteticas filosoacuteficas e

religiosas

71

334 Jargatildeo

O jargatildeo eacute um pidgin instaacutevel Sua concepccedilatildeo se aproxima do sabir ou liacutengua

franca Romaine (2000 p182) faz uso desse termo para exemplificar o processo

de criaccedilatildeo de um crioulo

A simplificaccedilatildeo e a instabilidade satildeo as marcas mais salientes de um jargatildeo No

pidgin as normas satildeo mais estaacuteveis enquanto que no jargatildeo as normas natildeo satildeo

afixadas Segundo esta autora eacute a partir do jargatildeo que a mescla linguiacutestica se

configura

Figura 2 Configuraccedilotildees da Mescla Linguiacutestica segundo Romaine (2000 p185)

Tipo 1 Jargatildeo

Tipo 2 Jargatildeo

Tipo 3 Jargatildeo

Pidgin estabilizado

Pidgin estabilizado

Pidgin expandido

Crioulo

Crioulo

Crioulo

No tipo 1 o jargatildeo deu origem diretamente a um crioulo De forma diferente no 2

o crioulo natildeo se originou diretamente de um jargatildeo Este deu origem a um pidgin

estabilizado para posteriormente chegar a um crioulo No tipo 3 o jargatildeo evolui

se transformando em um pidgin estabilizado depois em um pidgin expandido ateacute

chegar a um crioulo O fato eacute que a origem nos trecircs casos estaacute em um jargatildeo

72

34 IMPLICACcedilOtildeES DO CONTATO LINGUIacuteSTICO

Todo contato resulta em processos linguiacutesticos que alteram e dinamizam as

liacutenguas do mundo que passam por transformaccedilotildees que advecircm tanto da sua

motivaccedilatildeo interna quanto da externa No que tange agraves motivaccedilotildees externas

podemos afirmar que satildeo os contatos os grandes responsaacuteveis por muitas dessas

transformaccedilotildees podendo resultar enoutros processos orirundos ou que se

assentam no contato

341 Bilinguismo

Os estudos e as correntes linguiacutesticas na sua maioria tecircm como base liacutenguas

uacutenicas ou comunidades monoliacutengues Contudo o bilinguismo ocorre amplamente

atraveacutes do mundo e permanece apresentando um leque de questionamento para

a comunidade cientiacutefica atual Embora natildeo seja de hoje o questionamento em

torno do bilinguismo25 soacute agora podemos vislumbrar o descortinar desse tema

Estudiosos do passado jaacute reconheciam a relevacircncia do fenocircmeno Jakobson

(1953) por exemplo assumiu que ldquobilingualism is for me the fundamental problem

of linguiacutesticsrdquo

Romaine (1995 p6) elenca alguns questionamentos com base no que deve ser

observado ao estudar o contato linguiacutestico

O que eacute que o desempenho dos falantes diante do processo biliacutengue nos diz

sobre a competecircncia de pessoas e das comunidades multiliacutengues

25

Do inglecircs bilingualism

73

Eacute a troca de elementos linguiacutesticos por acaso comportamento linguiacutestico e o

cacircmbio linguiacutestico aleatoacuterio

Isto eacute indicativo de fluecircncia pobre e inabilidade em uma ou ambas as liacutenguas em

outras palavras o resultado de competecircncia imperfeita

Ao contraacuterio com qual criteacuterio medimos a competecircncia dos biliacutengues

Pode-se distinguir entre troca empreacutestimo e interferecircncia linguiacutestica

Satildeo a mudanccedila de coacutedigo e o bilinguismo generalizado em uma comunidade

sinais de atrito de uma liacutengua minoritaacuteria

Satildeo os sistemas de idiomas que estatildeo disponiacuteveis para um indiviacuteduo biliacutengue

fundidos ou separados

Aleacutem desses questionamentos outros de base sociofilosoacutefica tambeacutem estatildeo

inseridos nos estudos sobre o bilinguismo Para alguns pesquisadores muitas

liacutenguas minoritaacuterias foram exterminadas devido agrave forte influecircncia e agrave troca

linguiacutestica No entanto mesmo sendo acusado por estes como um passo para o

extermiacutenio das liacutenguas minoritaacuterias o bilinguismo natildeo deve ser visto como o

responsaacutevel pela extinccedilatildeo pelo contraacuterio o estudo dele aliado ao conhecimento

metacognitivo poderatildeo contribuir para o salvamento de muitas dessas liacutenguas

ainda que no plano escrito jaacute que na oralidade muitas natildeo gozam do status de

suas liacutenguas como oficiais nas atividades sociais sendo relegadas aos rituais de

suas sociedades

O comportamento linguiacutestico de uma determinada sociedade natildeo pode servir

unicamente de paracircmetro para outras Assim se algumas comunidades

apresentam mais facilidade em absorver outra forma linguiacutestica umas tecircm maior

resistecircncia enquanto que outras convivem por centenas de anos lado a lado com

determinadas liacutenguas

74

O bilinguismo tambeacutem pode ser classificado como social ou individual Segundo

Appel e Muysken (1986) o bilinguismo social ocorre quando em determinada

sociedade duas ou mais formas linguiacutesticas satildeo faladas quando cedo toda

sociedade se torna biliacutengue mas elas podem se tornar diferentes no que se

relaciona ao niacutevel ou forma de bilinguismo conforme figura abaixo

Figura 3 Esquema de representaccedilatildeo do bilinguismo social segundo Appel e Muysken

(1986)26

De acordo com a figura na comunidade I as duas liacutenguas satildeo faladas por dois

diferentes grupos monoliacutengues No entanto um grupo reduzido de falantes

biliacutengues seraacute necessaacuterio para fazer a comunicaccedilatildeo entre os grupos Esta forma

de bilinguismo social geralmente ocorre no periacuteodo colonial dos paiacuteses Pode-se

tomar por exemplo o Brasil quando os portugueses aqui chegaram

Em sociedades representadas pela forma II todos os falantes satildeo biliacutengues Em

paiacuteses como Aacutefrica Iacutendia e Brasil existem muitas sociedades totalmente

biliacutengues em que os falantes dominam as duas formas linguiacutesticas existentes

26

Apud Appel e Muysken (1986) p 2

75

Na forma III um grupo dessa comunidade eacute biliacutengue enquanto a outra eacute

monoliacutengue sendo este grupo na maioria das vezes a minoria Pois geralmente

o grupo biliacutengue eacute o dominante e o outro o dominado Tal circunstacircncia eacute tiacutepica

das assimetrias comuns nas relaccedilotildees entre os sujeitos do contato Situaccedilatildeo

como essa evidencia o papel da liacutengua para uma sociedade a qual pode ser

objeto de libertaccedilatildeo e tambeacutem de dominaccedilatildeo

Como dito anteriormente estas formas de bilinguismo social natildeo satildeo uniformes

nem tatildeo pouco refletem em detalhe de todas as existentes no interior das

sociedades Em muitas comunidades a situaccedilatildeo linguiacutestica eacute extremamente

complexa com mais de dois grupos e linguagens envolvidos

Com relaccedilatildeo aos aspectos linguiacutesticos o estudo do bilinguismo pode responder e

explicitar os fenocircmenos decorrentes da situaccedilatildeo do contato Fenocircmenos no

domiacutenio do leacutexico ou da sintaxe podem ser muito produtivos Entretanto podemos

considerar que eacute o niacutevel da foneacuteticafonologia que marcadamente sofre a

interferecircncia com o contato linguiacutestico

No contato duas ou mais formas linguiacutesticas podem perdurar por anos conforme

os quadros I e III na figura 3 No entanto alguns fenocircmenos linguiacutesticos podem

ocorrer paralelamente Um embate linguiacutestico pode surgir dentro dessas

comunidades linguiacutesticas e estas liacutenguas podem cambiar o leacutexico uma da outra

Sobre isso Bloomfield (1961 p 25) classifica esses empreacutestimos em iacutentimos

culturais e dialetais

76

O empreacutestimo externo ou cultural sempre eacute motivado por contatos poliacutetico sociais

e comerciais inclusive militares sempre com a dominaccedilatildeo de um dos povos Jaacute

os empreacutestimos dialetais se datildeo entre os contatos dentro de uma mesma liacutengua

satildeo as variantes regionais

O que particularmente nos interessa - o empreacutestimo iacutentimo - ocorre quando as

duas liacutenguas passam a conviverem no mesmo campo geograacutefico Dessa forma

se a liacutengua A domina a liacutengua B poderatildeo ocorrer trecircs hipoacuteteses i) B desaparece

e deixa um substrato em A ii) A desaparece e deixa um superstrato em B iii)

permanecem as duas trocando elementos na condiccedilatildeo de adstrato No entanto

natildeo devemos esquecer que as motivaccedilotildees pelas quais os falantes se apropriam

ou satildeo obrigados a se apropriarem para adquirem outra(s) liacutengua(s) extrapolam

os aspectos aqui vislumbrados

Os exemplos dados por Romaine (1995 p 2) demonstram como pode ocorrer o

cacircmbio linguiacutestico entre a liacutengua materna e a liacutengua adquirida posteriormente A

partir desses exemplos a estudiosa elenca os questionamentos mais relevantes

que deveratildeo ser observados em pesquisas que tratam da anaacutelise das

comunidades biliacutengues

(a) Kio Ke six sevem hours te school de vie spend karde ne they are speaking English all the time (Panjabi Inglecircs)

Because they spend six or seven hours a day at school they are speaking English all the time27

(b) Will you rubim off Ol man will come (Tok Pisin Inglecircs)

27

ldquoPorque eles passam seis ou sete horas por dia na escola eles estatildeo falando inglecircs o tempo todordquo

77

Will you rub [that off the blackboard] The men will come28

(c) Sano esttaacute tulla tanne ettaacute Iacutem very sick (Finlandecircs Inglecircs)

Tell them to come here that Iacutem very sick 29

(d) Kodomotachi liked it (Japonecircs Inglecircs)

The children liked it 30

(e) Won o arrest a single person (Yoruba Inglecircs)

They did not arrest a single person 31

(f) This morning I hantar my baby tu dekat babysitter tu lah (Malay Inglecircs)

This morning I took my baby to the babysitter 32

De acordo com AiKhenvald e Dixon (2006 p 2)

Se duas ou mais liacutenguas estatildeo em contato os falantes de uma tendo conhecimento da outra eles podem compartilhar traccedilos linguiacutesticos incluindo haacutebitos de pronuacutencia Historicamente todo idioma deve ter sofrido certa influecircncia de seus vizinhos O impacto do contato eacute mais forte e mais faacutecil de ser discernido em alguns idiomas enquanto em outros eacute mais fraco

O que fora dito acima pode ser comprovado em qualquer comunidade em que a

liacutengua do colonizador fora imposta durante o ato de conquista ou de contato Em

algumas comunidades a situaccedilatildeo de bilinguismo eacute motivada por outras

28

ldquoVocecirc esfregaraacute [o quadro-negro de fora] Os homens viratildeordquo 29

ldquoChame-os aqui que eu estou muito doenterdquo 30

ldquoAs crianccedilas gostam dissordquo 31

ldquoEles natildeo prenderam uma uacutenica pessoardquo 32

ldquoEsta manhatilde eu ocupei meu bebecirc agrave babaacuterdquo

78

necessidades que se fazem presente nessa sociedade O portuguecircs eacute a liacutengua de

contato que eacute utilizada por todos os membros em situaccedilotildees diaacuterias e em contatos

com a comunidade externa Enquanto a liacutengua interna eacute utilizada em seus rituais

e eacute utilizada em contexto familiar que exige mais aproximaccedilatildeo familiar entre os

membros 33

342 Diglossia

O processo de diglossia pode ser compreendido conforme Dubois et all (1998 p

190) como i) situaccedilatildeo de bilinguismo ii) situaccedilatildeo biliacutengue na qual uma das

liacutenguas eacute de status sociopoliacutetico inferior iii) aptidatildeo que tem um indiviacuteduo de

praticar corretamente outra liacutengua aleacutem da liacutengua materna

Embora seja entendida tambeacutem como uma competecircncia linguiacutestica em que o

falante de uma determinada liacutengua possa conhecer os niacuteveis formal e informal de

sua gramaacutetica para este trabalho o conceito que recorremos eacute o de diglossia

enquanto situaccedilatildeo de conviacutevio de duas ou mais liacutenguas em uma comunidade

Trata-se neste caso da utilizaccedilatildeo de uma das liacutenguas como liacutengua oficial

enquanto a outra fica a cabo das situaccedilotildees de conviacutevio Geralmente a liacutengua do

dominador eacute a liacutengua das relaccedilotildees comerciais a outra eacute utilizada nos rituais ou no

seio das famiacutelias (comunidade)

Devido agraves colonizaccedilotildees e agrave globalizaccedilatildeo a diglossia eacute muito comum no mundo

poacutes-moderno Em paiacuteses que foram colocircnias portuguesas como Moccedilambique e

33

Como exemplo podemos citar o que ocorre com o Fulni-ocirc Conforme COSTA1993 p 58

79

Timor Leste por exemplo o Portuguecircs eacute a liacutengua oficial enquanto as liacutenguas

nativas satildeo conservadas no acircmbito familiar e em ciclos informais Assim como

nas comunidades mais desenvolvidas o aprendizado de mais de uma segunda

liacutengua faz com que as comunidades se tornem pluriliacutengues

Por causa desta competecircncia linguiacutestica em que o sujeito passa a dominar dois

ou mais coacutedigos o conceito de diglossia fora ampliado agraves comunidades

monoliacutengues Neste caso entende-se que o sujeito pode ser bi- ou multiliacutengue

fora e dentro da sua proacutepria liacutengua34

Para Ferguson (1991 p 5) a diglossia eacute

Uma situaccedilatildeo linguiacutestica relativamente estaacutevel em que junto aos dialetos primaacuterios da liacutengua (que podem incluir a variante padratildeo ou as normas regionais) haacute um dialeto muito divergente altamente codificado (muitas vezes bastante complexo gramaticalmente) sobrepondo-se agrave variedade Eacute o veiacuteculo de um grande e respectivo corpo de literatura escrita tanto de periacuteodo anterior ou de outra comunidade de fala eacute aprendido atraveacutes da educaccedilatildeo formal usado na escrita e na fala em contextos formais mas natildeo eacute usado em qualquer uma das seccedilotildees de comunidade para conversaccedilatildeo coloquial

Fishman (1967 p 8) afirma que a diglossia eacute gradual e variaacutevel Para ele o

conceito de diglossia estaacute ligado ao aspecto social enquanto o bilinguismo ao

individual Dessa forma a relaccedilatildeo entre bilinguismo e diglossia na situaccedilatildeo do

contato pode se dar das seguintes formas i) diglossia e bilinguismo atuando

juntos ii) bilinguismo sem diglossia iii) diglossia sem bilinguismo e iv) nem

diglossia nem bilinguismo

34

Crystal (1985 p 82) discorre que em geral os sociolinguistas se referem a uma variedade alta (A) e outra baixa (B) correspondendo grosso modo a uma diferenccedila de formalidade A variedade alta eacute apreendida na escola costuma ser usada nos locais cuja formalidade eacute maior A variedade baixa eacute usada em outros ambientes relativamente informais

80

O referido autor complementa afirmando que

O bilinguismo sem a diglossia tende a ser transicional tanto em termos de repertoacuterios linguiacutesticos de comunidade de fala como em termos das variedades de fala envolvidas per si Sem separar no entanto as normas complementares e valores para estabelecer e manter a separaccedilatildeo funcional das variedades de fala aquela liacutengua ou variedade que seja o bastante favoraacutevel para ser associada ao movimento predominante das forccedilas sociais tende a substituir a(s) outra (s) (idem p7)

No caso dos Latundecirc a diglossia se configura como um processo em que os

falantes foram obrigados a aprender a liacutengua dos brancos utilizando-a nas

atividades em contexto de contato com o natildeo iacutendio No entanto o grupo conserva

a liacutengua original nos rituais e no reduto familiar como fora explicado

anteriormente 35

343 Alternacircncia de coacutedigo36

O processo de diglossia quando eacute configurado entre duas liacutenguas distintas resulta

em bilinguismo O bilinguismo abordado no item 231 pode ser analisado de

diversos pontos de vista mas um em especial que seraacute tratado neste toacutepico eacute a

alternacircncia de coacutedigo ou code-switching Trata-se de um processo linguiacutestico

inerente ao falante biliacutengue desenvolto ou natildeo na liacutengua que aprendera como

segunda liacutengua no caso do biliacutengue ou da terceira por diante como nos

pluriliacutengues

35

Vale ressaltar que atualmente devido agrave incorporaccedilatildeo da cultura do branco os Latundecirc estatildeo

falando mais frequentemente o Portuguecircs em diversas situaccedilotildees de comunicaccedilatildeo ateacute mesmos nas mais informais Isso se deve ao fato de as geraccedilotildees mais novas serem menos conservadoras e resistentes ao contato 36

Tratamos tambeacutem deste processo ao discorremos sobre o bilinguismo na seccedilatildeo 231

81

Dessa forma o falante biliacutengue ao se comunicar com outro falante que detenha

suas mesmas liacutenguas poderaacute fazer escolhas linguiacutesticas dentro de cada coacutedigo

ou alternando os coacutedigos Por isso os pesquisadores dizem que o falante biliacutengue

apresenta um comportamento proacuteprio em seu processo de interaccedilatildeo que eacute a

utilizaccedilatildeo do code-switching que se caracteriza por ser uma estrateacutegia de

adequaccedilatildeo interativa desejaacutevel e favoraacutevel do ponto de vista pragmaacutetico Este

processo constitui um processo de ativaccedilatildeo e desativaccedilatildeo de uma ou de outra

liacutengua

Para Auer (1999 p 46)

O termo code-switching reserva-se para os casos em que a justaposiccedilatildeo dos dois coacutedigos eacute percebida e interpretada como um ato localmente significativo pelos participantes Contrapotildee-se assim ao code-switching tambeacutem denominado language mixing (mistura de coacutedigo ou de liacutenguas) em que a justaposiccedilatildeo dos coacutedigos tem significaccedilatildeo para os participantes em sentido mais global sendo um padratildeo recorrente de comunicaccedilatildeo

Um falante biliacutengue decide primeiramente qual deveraacute ser a liacutengua de base para

ser utilizada com o outro falante que domina suas liacutenguas tambeacutem e a partir daiacute

decide se faraacute uso ou natildeo do code-switching eacute o que afirma Grosjean (1982 p

127) a partir do esquema abaixo

82

Figura 4 Escolha de liacutengua e code-switching conforme Grosjean (1982 p127)

Conforme o esquema acima o falante biliacutengue apresenta competecircncia linguiacutestica

para se comunicar tanto com um falante monoliacutengue quanto outro biliacutengue Ao se

comunicar com o falante monoliacutengue o referido falante biliacutengue faraacute a escolha de

uma liacutengua A ou a liacutengua B Neste caso natildeo poderaacute fazer uso das duas No

processo comunicativo com outro falante biliacutengue ele poderaacute utilizar a liacutengua A

com ou sem alternacircncia com a liacutengua B Ou utilizar a liacutengua B com ou sem

alternacircncia com a liacutengua A O que determina tais escolhas satildeo as vantagens e

desvantagens do cacircmbio linguiacutestico

Neste trabalho natildeo trataremos diretamente do code-switching por entendermos

que nos desviariacuteamos do objetivo basilar desta pesquisa que eacute o enfoque nos

segmentos foneacuteticos Outro aspecto seria o fato de os falantes latundecirc soacute

apresentarem a alternacircncia de coacutedigo durante as narrativas discorridas nas

83

entrevistas quando solicitados para que narrassem os acontecimentos e lendas

do seu povo

344 Morte da liacutengua

O contato linguiacutestico eacute um processo tambeacutem poliacutetico cujas consequecircncias podem

ser apenas o de mixagem ou mais intensamente a morte da liacutengua Muitas

vezes o contato eacute tatildeo devastador que extermina as liacutenguas minoritaacuterias trata-se

de um verdadeiro glotociacutedio37

Para Mcmahon (1994 p 228) a morte de uma liacutengua

Envolve essencialmente uma transferecircncia de obediecircncia de parte de uma populaccedilatildeo a partir de uma liacutengua que foi nativa na aacuterea para uma liacutengua mais recentemente introduzida na qual a populaccedilatildeo indiacutegena tornou-se biliacutengue A nova linguagem eacute geralmente falada nativamente por falantes mais potentes que podem tambeacutem ser mais numerosos e normalmente eacute associada pelos falantes da liacutengua minoritaacuteria com a riqueza prestiacutegio e progresso a liacutengua minoritaacuteria eacute entatildeo efetivamente abandonada por seus falantes tornando-se apropriada para uso em cada vez menor (e menor) contexto ateacute que seja inteiramente suplantada pela liacutengua que estaacute entrando

Dubois et all (1998 p 422) afirma que uma liacutengua morta eacute uma liacutengua que deixou

de ser falada mas cujo estatuto numa comunidade sociocultura eacute agraves vezes

desempenhar ainda um papel no ensino nas cerimocircnias rituais etc como o

latim

Para Trask (2004 p 200) a liacutengua eacute considerada moribunda ou estaacute prestes a

morrer quando o resultado de morte eacute praticamente inevitaacutevel Segundo o autor

37

Calcula-se que no iniacutecio da colonizaccedilatildeo portuguesa existiam aqui cerca de 1200 liacutenguas que

apoacutes anos de ocupaccedilatildeo de territoacuterio se resume a 180 Conforme Rodrigues 2002 p19 muitas delas estatildeo moribundas e carecem ser catalogadas

84

a cabo de uma ou duas geraccedilotildees ningueacutem mais seraacute capaz de falar esta liacutengua

pura e simplesmente Eacute a morte da liacutengua que resulta do processo denominado

substituiccedilatildeo da liacutengua

Ao dar continuidade ao seu argumento o referido autor assegura que a morte de

uma liacutengua eacute um processo gradual Assim exemplifica o pesquisador

em um dado lugar em um determinado momento algumas crianccedilas ainda estatildeo aprendendo - como sua liacutengua materna - a liacutengua que estaacute morrendo enquanto outras a estatildeo aprendendo apenas imperfeitamente e outras ainda natildeo estatildeo aprendendo de maneira nenhuma A liacutengua pode desaparecer por completo em certas aacutereas e sobreviver em outras Idem p 201

Ainda segundo Trask ibidem satildeo caracteriacutesticas da morte de uma liacutengua i) a

perda das irregularidades ii) a queda em desuso das formas e dos esquemas de

construccedilatildeo sentencial mais complexos ou menos frequente iii) a substituiccedilatildeo

maciccedila das palavras nativas por palavras tiradas da liacutengua de prestiacutegio iv) a

mudanccedila de pronuacutencia que se torna mais proacutexima da liacutengua de prestiacutegio v) a

perda da variaccedilatildeo estiliacutestica que leva agrave sobrevivecircncia de um uacutenico estilo

invariaacutevel

Nem sempre a morte de uma liacutengua estaacute diretamente ligada a aspectos

linguiacutesticos Cristoacutefaro-Silva (2002 p 56) elenca trecircs aspectos natildeo linguiacutesticos

que contribuem para a aniquilaccedilatildeo de uma liacutengua O primeiro diz respeito ao fato

de o pesquisador natildeo poder investigar o processo de morte devido agrave presenccedila de

uns poucos falantes da liacutengua O segundo trata da opressatildeo poliacutetica imposta aos

falantes que neste caso deixam de falar a liacutengua para natildeo serem perseguidos E

85

o terceiro ocorre quando a liacutengua eacute mantida apenas em rituais em que os falantes

natildeo sabem mais o teor semacircntico do que verbalizam

Natildeo diferente do aqui fora apresentado a situaccedilatildeo da liacutengua Latundecirc eacute bastante

delicada uma vez que a comunidade passou por diversos transtornos que

impactaram a forma como se organizavam socialmente O nuacutemero de nuacutemero de

falantes diminuiu e consequentemente a liacutengua se encontra altamente

ameaccedilada O portuguecircs sendo a liacutengua dominante de prestiacutegio e funcional para

a relaccedilatildeo com o mundo natildeo indiacutegena ganha espaccedilo crescente entre os Latundecirc

Esta eacute a situaccedilatildeo natildeo soacute do Latundecirc mas de vaacuterios grupos indiacutegenas

86

4 COMUNIDADE DE ESTUDO OS LATUNDEcirc

Que gente eacute essa que fala idioma tatildeo diferente das liacutenguas conhecidas tatildeo diferente da liacutengua dos seus mais proacuteximos vizinhos

que tem costumes tatildeo estranhos aos que vivem perto que natildeo conhece os objetos essenciais da vida dos seus companheiros de sertatildeo

De onde veio Por onde passou que natildeo deixou rastros Quando chegou agravequelas matas onde vive haacute tanto tempo

Que ligaccedilotildees tem com os outros filhos do Brasil Roquete-Pinto (1975 p121)

41 INTRODUCcedilAtildeO

Discorremos neste capiacutetulo sobre o povo Latundecirc e a sua comunidade descriccedilatildeo

contexto histoacuterico cultural e geograacutefico desta etnia Histoacuteria do contato conflitos

internos e externos dificuldades enfrentadas pelo grupo ao longo de sua

existecircncia denominaccedilatildeo acesso hierarquia social padratildeo e constituiccedilatildeo familiar

contatos intereacutetnico bilinguismo e ensino na aldeia

42 A FAMIacuteLIA NAMBIKWAacuteRA38 39 40

Os Nambikwaacutera41 satildeo conhecidos na etnologia brasileira por terem sido

oficialmente contatados pelo Marechal Rodom e por terem sido estudados por

Leacutevi-Strauss De origem Tupi o vocaacutebulo Nambikwaacutera eacute o resultado da fusatildeo dos

38

Os Nambikwara se auto denominam Anunsu Conforme Price amp Cook Jr The Nambikwara call

themselves aacute nu suacute people This name written anunzecirc has apereared throughout the literature but has been erroneously thought to be a band name (1969 p 690) 39

Os Nambikwra satildeo famosos na etnologia brasileira por terem sido oficialmente contatados pelo Marechal Rodom e por terem sido estudados por Leacutevi-Strauss 40

Os Nambikwara natildeo estatildeo ligados aos troncos Tupi e Macro-Jecirc Trata-se de uma famiacutelia linguiacutestica isolada com caracteriacutesticas especiacuteficas que natildeo se enquadra em nenhum desses dois grupos 41

Leacutevi-Strauss (1946 p 139) afirma que se trata de uma palavra Tupi e que deve ser escrita como Nhambikwara

87

termos ldquonambirdquo que significa ldquoorelhardquo e ldquokuarardquo cujo significado eacute ldquoburacordquo

Portanto Nambikwaacutera42 eacute ldquoburaco de orelhardquo

Coforme Leacutevi-Strauss (1946 p 48)

The name Nambikwra was mentioned for the first time and only by hearsay by Antonio Pires de Campos in the beginning of the 18th century Since then it appeared several times with reference to an unknown tribe located on the headwaters of Tapajoz There is a great discrepancy between the different spellings When General Candido Mariano da Silva Rondon began to explore the land between the Tapajoz and Gi-Parana in 1907 he met with unknown group of a unknown language and he did not hesitate to identify them with the tribe often mentioned in the early documents It was at that time that the name Nhambikwara was

definitely adopted its spelling fixed and that it was recognized as a Tupi nickname the meaning of which is big ears

A famiacutelia Nambikwara eacute dividida em dois grandes grupos aleacutem de outra

remanescente conforme figura abaixo

Figura 5 Classificaccedilatildeo das liacutenguas da Famiacutelia Nambikwaacutera de acordo com Rodrigues

(1986 p 134)

42

Seguimos neste trabalho a orientaccedilatildeo da Associaccedilatildeo de Antropologia Brasileira que em 1953

estabeleceu a fim de padronizar os nomes dos povos indiacutegenas do Brasil com o intuito de facilitar os estudos etnograacuteficos e Linguiacutesticos a nomenclatura padratildeo

88

Conforme figura acima o povo Latundecirc faz parte da famiacutelia Nambikwaacutera que se

divide em Nambikwaacutera do Norte Nambikwaacutera do Sul e Sabanecirc Os Latundecirc

juntamente com os Lakondecirc os Tawandecirc os Mamaindecirc e os Negarotecirc

pertencem ao grupo Nambikwaacutera do Norte Jaacute o Nambikwaacutera do Sul eacute composto

pelos povos Galera Kabixi Munduacuteka e Nambikwaacutera do Campo cada um

correspondendo a um complexo dialetal O Sabanecirc eacute uma liacutengua agrave parte por se

acreditar que natildeo haacute muitas semelhanccedilas entre as estruturas linguiacutesticas dessa

liacutengua e as demais liacutenguas desse grupo

Situado na aacuterea entre os rios Juruena e Comemoraccedilatildeo o territoacuterio consta do

registro de muitos autores Roquete-Pinto (1919) Leacutevi-Strauss (1946) Price e

Cook (1969) Price (1977) Mas eacute de Roquete-Pinto (1919) e Price (1983) a

exposiccedilatildeo mais aceita Em ambos os limites geograacuteficos desses povos satildeo

relatados da seguinte forma pelo Rio Papagaio (sul) pelo rio Gi-Paranaacute (norte)

pelo rio Tapajoacutes (leste) e pelo rio Guaporeacute (oeste)

Figura 6 Localizaccedilatildeo e aacuterea dos Nambikwaacutera de acordo com Roquete-Pinto (1919)

89

De acordo com a FUNAI43 os dados atuais indicam que os Nambikwaacutera hoje

com cerca de dois mil iacutendios estatildeo distribuiacutedos em seis Terras indiacutegenas (TI)

vivem no sudoeste do Mato Grosso e aacutereas proacuteximas de Rondocircnia entre a

floresta amazocircnica e o cerrado

Figura 7 Territoacuterio Nambikwaacutera descrito por Price (1983)

No que tange ao conhecimento desses povos eacute de meados do seacuteculo XVIII que

obtemos os primeiros contatos com os Nambikwaacutera Foi Luiz Pinto de Souza

Coutinho terceiro capitatildeo geral do Estado do Mato Grosso o organizador de uma

expediccedilatildeo pelas margens do Rio Guaporeacute com o propoacutesito de abrir caminhos

entre a capital de entatildeo Proviacutencia de Mato Grosso e o Forte Braganccedila

43

Fundaccedilatildeo Nacional do Iacutendio

90

Os relatos histoacutericos nos mostram que era prioridade do Governo Militar apoacutes a

Proclamaccedilatildeo da Repuacuteblica em 1889 a integraccedilatildeo de todas as terras brasileiras

Uma das accedilotildees dessa integraccedilatildeo foi a determinaccedilatildeo do governo em construir

linhas telegraacuteficas em terras indiacutegenas da Amazocircnia com o propoacutesito de interligar

o Rio de Janeiro a Cuiabaacute Agrave frente dessa empreitada estava o Major Antonio

Gomes Carneiro e entre a comitiva o seu aluno Cacircndido Mariano da Silva

Rondon

Eacute Rodon o principal agente de contato entre os iacutendios Nambikwaacutera e os natildeo

iacutendios Pois como eacute sabido dele partia o discurso de apaziguamento entre o

contato preferindo antes de qualquer coisa ser atingido a atingir os silviacutecolas

Aleacutem da motivaccedilatildeo de expansatildeo para a implantaccedilatildeo das linhas telegraacuteficas

Rondon era conduzido por um desejo ardente de respeito e proteccedilatildeo aos povos

daquela regiatildeo

Dessa forma os iacutendios Nambikwaacutera estavam entre os indiacutegenas que ajudaram a

comissatildeo do governo a alcanccedilar os lugares mais hostis Este encontro entre

indiacutegenas e brancos culminou em invasotildees e conflitos entre povos aleacutem das

doenccedilas que foram trazidas pelos natildeo indiacutegenas por isso a extinccedilatildeo de vaacuterias

tribos e povos aleacutem do prejuiacutezo linguiacutestico resultante da aculturaccedilatildeo dos

indiacutegenas frente agrave presenccedila do natildeo iacutendio uma vez que para que ocorresse o

processo de interaccedilatildeo os indiacutegenas se viram obrigados a aprender o portuguecircs

O contato entre os grupos Nambikwaacutera natildeo se deu de forma paciacutefica Os

Nambikwaacutera do Norte natildeo foram receptivos e os planos dos governos foram

frustrados De forma diferente o contato com os Nambikwaacutera do Sul se deu de

91

forma mais intensa Mesmo apoacutes os constantes conflitos o contato perdurou por

mais tempo que com os do Norte acarretando mudanccedilas culturais de costumes e

da liacutengua

Telles (2002 p 10) afirma que

Do grupo linguiacutestico do Norte hoje restam apenas remanescentes de cinco etnias Tawandecirc Lakondecirc Mamaindecirc Negarotecirc e Latundecirc Destes os trecircs uacuteltimos permanecem em aacutereas proacuteximas de seus territoacuterios tradicionais e se preservam enquanto grupos relativamente autocircnomos Estes povos natildeo habitavam tradicionalmente a regiatildeo norte do territoacuterio Nambikwaacutera e esse fato pode ter favorecido a sua independecircncia grupal ao longo do percurso histoacuterico

Figura 8 Localizaccedilatildeo atual dos Nambikwaacutera

Como consequecircncia do contato no final do seacuteculo XX a populaccedilatildeo desses povos

foi reduzida a mais ou menos 650 sendo 50 deles crianccedilas Price (1985 p 312)

92

chama a atenccedilatildeo para o processo de aculturaccedilatildeo pois para as crianccedilas ldquoseria

mais confortaacutevel falar portuguecircs que a liacutengua dos seus paisrdquo44

Ainda com relaccedilatildeo agrave classificaccedilatildeo linguiacutestica alguns estudiosos utilizam

classificaccedilotildees diferentes para organizar os povos Nambikwaacutera A divisatildeo claacutessica

de Leacutevi-Strauss (1948) distribui os Nambikwaacutera de acordo com a aproximaccedilatildeo

linguiacutestica que haacute entre eles Para ele haacute trecircs grupos principais que se subdividem

formando cinco unidades constituiacutedas por vaacuterios dialetos de uma mesma liacutengua

Price e Cook (1969) em trabalho posterior sugerem outra classificaccedilatildeo para a

famiacutelia Nambikwaacutera Para eles haacute dois grandes grupos os Sabanecirc e os

Nambikwaacutera Entretanto embora o Sabanecirc natildeo seja compreensiacutevel para os

outros grupos linguiacutesticos por razotildees estruturais Price (1972) com base num

estudo comparativo considera o Sabanecirc como integrante da famiacutelia linguiacutestica

Nambikwaacutera Para uma visualizaccedilatildeo das propostas de Leacutevi-Strauss e de Price e

Cook apresentamos as respectivas classificaccedilotildees nas tabelas a seguir

Quadro 2 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Leacutevi-Strauss (1948)

44

ldquofifty were children who are probably more comfortable speaking Portuguese than the languages of their parents

Grupo a

Grupo b

Grupo c

Subgrupo a1

Subgrupo a2

Subgrupo b1

Subgrupo b2

Oakleacutetosu

Haloacutetesu

Kiaaacuteru

Kuritsu

Soaacutelesu

Kodaacuteteli

Munuacutekoti

Nikedeacutetosu

Taruacutende

Maimatildende

Toatildende

Ioacutelola

Naseacutelate

Lakotildende

Sovaacuteinte

Sabaacutene

93

Quadro 3 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Price e Cook (1969)

Leacutevi-Strass natildeo aponta os Latundecirc como pertencente ao grupo Nambikwaacutera

devido ao natildeo contato com este povo que soacute fora inicialmente descobertos

(contatados) em 1975 pelos Aikanaacute conforme veremos a seguir

43 OS LATUNDEcirc

O povo Latundecirc pertencente ao Nambikwaacutera do Norte habita uma aacuterea de

116613671 hec no municiacutepio de Chupinguaia na regiatildeo sudoeste do estado de

Rondocircnia Com eles convivem outros dois grupos que natildeo possuem nenhum

Navaacuteite

Taiate

Nambikwaacutera

Sabanecirc

Do Norte

Do Sul

Latundecirc

Lakundecirc

Tawandecirc

Mamaindecirc

Negarotecirc

Vale do Jurema

Vale do Guaporeacute

Vale do Sarareacute

Haloteacutesu

Kithaulhu

Sawenteacutesu

Wakalitesu

Wasusu

Sarareacute

Alacircntesu

Waikisu

Hahatildetesu

94

grau de parentesco linguiacutestico Satildeo os Aikanaacute e os Kwazaacute que fazem parte da

Terra Indiacutegena (TI) Tubaratildeo-Latundecirc45

No mapa abaixo pode-se obervar a localizaccedilatildeo da TI Tubaratildeo-Latundecirc que se

situa entre a RO 370 e a BR 364

Figura 9 Localizaccedilatildeo da TI Tubaratildeo-Latundecirc46

A reserva estaacute localizada a oeste do municiacutepio de Vilhena Nela haacute trecircs vilas Rio

do Ouro Barroso e Gleba (tambeacutem conhecida como Tubaratildeo) Gleba eacute a que

conteacutem a maior populaccedilatildeo mista De faacutecil acesso pode ser adentrada pela cidade

de Chupinguaia que fica a 19 km da TI Rio do Ouro possui uma populaccedilatildeo

exclusivamente Aikanatilde e estaacute a 20 km da Gleba Barroso conteacutem a menor

populaccedilatildeo e corresponde a uma aacuterea de ocupaccedilatildeo esparsa em que se distribuem

45

Conforme Anonby the Tubaratildeo-Latundecirc Indian Reserve is inhabited by people from several tribes the tree main linguistically-unrelated Aikanatilde (also known as Tubaratildeo) Kwazaacute and Latundecirc 2009 p3 46

Inicialmente estes povos ocupavam uma aacuterea de ricas florestas no oeste do rio Pimenta Bueno

proacuteximo a uma pequena vila denominada de Satildeo Pedro

95

remanescentes Kwazaacute Aikanaacute e Latundecirc A meacutedia de distacircncia do Barroso para a

Gleba eacute de aproximadamente 25 km O acesso se daacute por uma estrada

parcialmente carroccedilaacutevel de difiacutecil locomoccedilatildeo

Com relaccedilatildeo agrave populaccedilatildeo de cada povo Anomby (2009 p5) afirma que o

quantitativo total de pessoas eacute de 219 iacutendios Deles 175 satildeo Aikanatilde 25 satildeo

Kwazaacute e 19 satildeo Latundecirc Haacute ainda 189 iacutendios distribuiacutedos por outras localidades

fora da TI 47

Quadro 4 Distribuiccedilatildeo dos povos pertencentes a TI Tubaratildeo-Latundecirc

TI Rio do Ouro 67

Gleba 48

Barroso 34

Outras localidades

Satildeo Pedro 18

Vilhena 15

Chupinguaia 7

Total 189

Durante muitos anos os Latundecirc os Kwazaacute e os Aikanatilde viveram em contato com

grupos vizinhos como os Kanoecirc Mekens Sakirap Tupariacute Salamatildei entre outros

povos que tecircm sido acolhidos pela populaccedilatildeo local da TI Mesmo com diferentes

liacutenguas eles se relacionavam com festivais e casamentos intergrupais A cultura

desses povos tornou-se muito similar devido ao contato intenso entre eles De

acordo com Anomby (2009 p 6) os traccedilos mais comuns entre este povos

incluem cestas de fibra de marico casas em forma de colmeia para

47

Em conversa com os professores desses povos Anomby Idem natildeo afirma os motivos pelos

quais tais iacutendios estatildeo afastados dos demais

96

aproximadamente dez famiacutelias bebida de milho fermentado canibalismo e

divisatildeo de clatildes

Quanto ao contato sabe-se que foram os iacutendios Aikanaacute os primeiros a contatarem

com os Latundecirc Price (1977 p 72 - 73) descreve que o entatildeo Capataz Rural

Jorge Falcatildeo fora informalmente designado encarregado da operaccedilatildeo de contato

No ano de 1976 acompanhado por cinco iacutendios Aikanaacute e um serigueiro apoacutes

cinco dias de intensa caminhada ocorreu o encontro com os Latundecirc Neste

primeiro momento o desconhecido povo tremia de medo mas se posicionaram

ainda que fragilmente na linha de defesa Apoacutes dormirem no campo o capataz e

demais membros da excursatildeo conseguiram no outro dia um contato comprovado

por poucas fotografias com o povo Latundecirc Jorge descreveu que tais iacutendios natildeo

conseguiram se comunicar com os Aikanaacute e que eram em nuacutemero de 10 homens

e 8 crianccedilas afora poucas crianccedilas que afirma natildeo tecirc-las visto

A FUNAI em 1977 com a ajuda do Capataz Rural realizou uma nova excursatildeo

aos iacutendios Latundecirc Desta vez aleacutem de Jorge juntos a ele estavam presentes

David Price e dois iacutendios Nambikwara do Norte (Lakondecirc) que conseguiram

identificar os Latundecirc como tambeacutem pertencentes agrave etnia Nambikwara do Norte

Foram mensurados como uma aldeia composta por oito casas e dezenove

habitantes 48

48

Para uma descriccedilatildeo mais detalhada ver Telles 2002 p17

97

Figura 10 Primeiros contatos com os Latundecirc (Foto Price 1977)

Em 1999 o povo era composto por vinte pessoas Entre 1999 e 2000 a grupo ficou

ainda menor com a saiacuteda de trecircs dos membros Faacutetima (irmatilde de Terezinha49)

Batataacute (a anciatilde do grupo) e Joatildeo (irmatildeo solteiro de Terezinha) As crianccedilas e os

jovens do grupo satildeo na sua maioria parentes consanguiacuteneos De acordo com as

relaccedilotildees de parentesco os mais novos natildeo poderatildeo coabitar entre si o que

implica a natildeo autonomia e a natildeo perpetuaccedilatildeo do grupo Latundecirc

49

Trata-se de a informante deste projeto de pesquisa

98

Quadro 5 Nuacutecleos familiares de acordo com a habitaccedilatildeo em 199950

Casa 1

Pais Filhos Agregados

Maneacute Torto (60) Terezinha (45)

Luiz (22) Antocircnio (20) Lorena (12) Catarino (10) Justino (8) Jaelson (4)

Joatildeo (26) Francisco (25) Irmatildeos de Terezinha

Maneacute Torto (60) Faacutetima (30)

Maria (13)

Casa 2

Joseacute (40) Lurdes (40)

Jair (13) Dido (11) Lourival (3) Lorimar (6 meses)

Cinzeiro (50) Irmatildeo de Lurdes

Casa 3 Batataacute (65)

Dados atuais51 noticiam que o grupo se enfraqueceu politicamente Tereza

mudou-se para uma aldeia de outro grupo Nambikwaacutera do Norte e Maria e Lorena

foram morar na Gleba

No que concerne agraves atividades econocircmicas a extraccedilatildeo de borracha foi a grande

atividade econocircmica na deacutecada de 30 do seacuteculo passado no sul de Rondocircnia

Durante o apogeu dessa atividade os Aikanatilde e os Kwazaacute trabalharam para

barotildees da borracha em troca de cafeacute accediluacutecar e armas de fogo

Consequentemente apoacutes aprenderem as estrateacutegias de negociaccedilatildeo na deacutecada

de 70 os proacuteprios iacutendios agora independentes passaram a vender a sua proacutepria

borracha nas cidades vizinhas (Van der Voort 1998)

50

Telles 2002 p 19 51

Informaccedilatildeo proveniente de comunicaccedilatildeo pessoal com Stella Telles janeiro de 2015

99

A comercializaccedilatildeo da borracha tambeacutem fora um pano de fundo para o processo

de bilinguismo ocorrente entre os povos dessa regiatildeo O portuguecircs se tornara

uma espeacutecie de liacutengua franca utilizada para a comercializaccedilatildeo do produto no

exterior e na interaccedilatildeo com os seringalistas Contudo as liacutenguas indiacutegenas

permaneciam sendo usadas mais provavelmente na retirada e no processamento

da borracha nas reservas52

A economia na aldeia diferentemente do que fora no passado representa a atual

situaccedilatildeo dos iacutendios Haacute pouca lavoura de subsistecircncia53 o que faz com que a

produccedilatildeo de comida seja escassa Os integrantes da aldeia quando precisam de

provimentos compram sua comida na cidade ou recebem-na dos parentes que

vivem em Rio do Ouro

Ainda de acordo com Anomby (2009 p7)

As principais fontes de dinheiro em ambas as aldeias como a maioria das aldeias no Brasil satildeo as remessas de aposentadoria para os idosos e da venda de artesanato indiacutegena aleacutem da venda de madeira e os pequenos serviccedilos prestados aos demais moradores e visitantes

No que diz respeito agrave religiatildeo atualmente a presenccedila do protestantismo eacute muito

forte na TI Tubaratildeo-Latundecirc Missionaacuterios UNIEDAS54 (iacutendios da tribo Terena)

comeccedilaram a trabalhar na aacuterea em 1980 e como resultado a maioria das

pessoas que vivem na reserva iacutendios Tubaratildeo-Latundecirc hoje se consideram

52

Neste contexto histoacuterico pode-se perceber claramente a hierarquizaccedilatildeo linguiacutestica no que tange agrave utilizaccedilatildeo da liacutengua materna Para os iacutendios jaacute ocorria o processo de contato oriundo do dominador Mesmo reconhecendo a necessidade advinda da dependecircncia econocircmica os iacutendios relutavam em manter a liacutengua matildee no interior da aldeia ou seja no seio familiar 53

Devido agrave cultura errocircnea da terra e a constante presenccedila das aposentadorias concedidas aos idosos e invaacutelidos a rotina desses povos estaacute sendo fortemente alterada 54

Uniatildeo das Igrejas Evangeacutelicas da Ameacuterica do Sul criada por missionaacuterios americanos em 1912 que eacute atualmente conduzida por lideranccedila indiacutegena

100

protestantes Os Terenas ministram suas pregaccedilotildees exclusivamente em

Portuguecircs

Uma outra famiacutelia missionaacuteria protestante pertencente agrave missatildeo ALEM55 vivem

na aldeia Rio do Ouro onde o marido Warrisson eacute um professor e sua esposa

Ana eacute uma liacuteder de igreja Eles trabalham na reserva haacute doze anos e soacute falam

Portuguecircs

Anomby (2009 p8) relata o fato de os iacutendios ainda hoje rejeitarem os esforccedilos

dos missionaacuterios da ALEM para usar o Aikanatilde na igreja

Quando Ana veio pela primeira vez a Gleba 12 anos atraacutes as pessoas disse-lhe que queria igreja em Portuguecircs e natildeo em Aikanatilde Eles especificamente disse-nos Noacutes natildeo quer um linguista Queremos algueacutem que vai fazer igreja em Portuguecircs Ana compocircs algumas canccedilotildees em Aikanatilde mas quando ela cantou para os iacutendios eles disseram que soava feio Ana pediu que as pessoas orassem em Aikanatilde mas eles sempre recusam Em um culto que participou no Rio do Ouro Ana escolheu cinco pessoas aleatoriamente para ler partes do Biacuteblia Todos foram fluentes Ana disse-nos que ateacute hoje os iacutendios nunca pediu nada em Aikanatilde - eles parecem sentir que igreja deve ser em Portuguecircs

Os Latundecirc em particular natildeo se converteram ao protestantismo Localizados

mais remotamente o difiacutecil acesso agraves igrejas existentes da Gleba e no Rio do

Ouro natildeo favoreceu ao longo de anos a frenquecircncia do Latundecirc nos cultos

A educaccedilatildeo escolar tambeacutem tem situaccedilatildeo similar entre os Latundecirc Nunca houve

escola no Barroso nas proximidades das casas dos Latundecirc Dessa forma

apenas com a ida mais sistemaacutetica dos mais jovens Latundecirc para as aldeias

Aikanaacute - sobretudo a partir do ano de 2000 - eacute que as crianccedilas Latundecirc passaram

55

Associaccedilatildeo Linguiacutestica Evangeacutelica Missionaacuteria eacute uma organizaccedilatildeo missionaacuteria fundada em 1982

sob a inspiraccedilatildeo da Wycliffe Bible Translators

101

a frequentar escola Sobre isso Anomby Idem nos relata que eacute ensinado ateacute

quarta seacuterie em todas as aldeias e a maioria dos Aikanatilde e Kwazaacute satildeo

alfabetizados em Portuguecircs Em Rio do Ouro haacute dois professores um brasileiro

que leciona em Portuguecircs e um professor biliacutengue que explica os assuntos em

Aikanatilde Trecircs moradores estatildeo terminando o ensino meacutedio dois da Gleba e um

do Rio do Ouro A liacutengua Latundecirc natildeo eacute objeto de conteuacutedo escolar

Com relaccedilatildeo agrave situaccedilatildeo linguiacutestica dos Latundecirc56 sabe-se que com exceccedilatildeo de

Maneacute Torto que eacute falante nativo de uma liacutengua Nabikwaacutera do Norte muito proacutexima

do Latundecirc o nuacutemero de falantes do Latundecirc eacute de dezenove pessoas O grupo

excetuando a Batataacute que natildeo fala portuguecircs apresenta bilinguismo em Latundecirc

Portuguecircs O bilinguismo resultante do contato que se deu em 1976 se firmou

com o contato crescente com os Aikanaacute com quem se comunicam em portuguecircs

A complexidade linguiacutestica que se instaurou entre os Latundecirc pode ser observada

na tabela seguinte

Quadro 6 Situaccedilatildeo sociolinguiacutestica dos Latundecirc (dados de 1999)

Membros

Situaccedilatildeo Social

Situaccedilatildeo Linguacuteiacutestica

Maneacute Torto (60) Liacuteder interno da tribo Natildeo Latundecirc

Cinzeiro (50)

Batataacute (65)

Membros mais velhos

da tribo

Satildeo monoliacutengues em Latundecirc

Lurdes (40) Matriarca da casa 2 Apresenta distuacuterbio de fala Eacute considerada

uma falante ruim pela proacutepria tribo Fala um

pidgin com seus filhos

Joseacute (40) Patriarca da casa 2 Fala um portuguecircs pouco claro

56

Anomby (2009 p 5) chama a atenccedilatildeo para o fato de os povos presentes na TI Tubaratildeo-Latundecirc

natildeo serem estudados extensivamente ainda Dos estudos realizados podem-se citar as pesquisas realizadas no acircmbito antropoloacutegico e no linguiacutestico Leacutevi-Strauss (1930) Lieuntenabt Zack (1942) Melatti e Price (1970) Carlson (1984) Vasconcelos (19931996) Van der Voort (19951998) e Telles (2002)

102

Jair (13)

Dido (11)

Filhos mais velhos da

casa 2

Devido ao desempenho dos pais

apresentam problemas de comunicaccedilatildeo em

ambas as liacutenguas

Lourival (3)

Lorimar (6 meses)

Filhos mais novos da

casa 2

Estatildeo em processo de aquisiccedilatildeo da

linguagem

Terezinha (45)

Matriarca da casa 1

uma das mulheres de

Maneacute Torto

Apresenta boa competecircncia comunicativa

Apesar de ser considerada biliacutengue

apresenta problemas com relaccedilatildeo agrave

compreensatildeo do Portuguecircs

Joatildeo (26)

Francisco (25)

Irmatildeos de Terezinha Falam Portuguecircs sem muita fluecircncia

Faacutetima (30)

Irmatilde de Terezinha Apresenta niacutevel de compreensatildeo muito

inferior ao da sua fala

Luiz (22)

Antocircnio (20)

Lorena (12)

Catarino (10)

Justino (8)

Jaelson (4)

Filhos de Terezinha e

Maneacute Torto

Falam um bom Portuguecircs

Maria (13) Tambeacutem fala um bom Portuguecircs

Entre 1995 e 2000 Telles (comunicaccedilatildeo pessoal em novembro de 2014) verificou

que o aprendizado do Latundecirc na comunidade eacute mais tardio do que o Portuguecircs

mesmo sendo as crianccedilas desde o nascimento expostas e estimuladas agraves duas

liacutenguas simultaneamente Na avaliaccedilatildeo subjetiva dos indiacutegenas o Latundecirc eacute uma

liacutengua mais difiacutecil sendo essa a razatildeo de as crianccedilas apresentarem melhor

desempenho no Portuguecircs Soacute em torno dos dez anos comeccedilam a utilizar com

fluecircncia o Latundecirc embora apresentem conhecimento passivo da liacutengua desde a

primeira infacircncia quando atendem com pertinecircncia aos comandos em Latundecirc

Outro fator que pode responder ao fato de a produccedilatildeo linguiacutestica ocorrer

103

primeiramente em Portuguecirc deve ser o prestiacutegio social que essa liacutengua alcanccedila

entre comunidades minoritaacuterias57

Essa situaccedilatildeo decorrente do contato linguiacutestico se daacute devido agrave mescla linguiacutestica

presente na TI e agraves necessidades de os indiacutegenas se ausentarem das terras da

TI Os povos que vivem em Rio do Ouro viajam a cidade pelo menos uma vez por

mecircs para fazer compras ou ir buscar assistecircncia meacutedica Os da Gleba se

deslocam para a cidade todos os dias quando precisam ir para a sede do

municiacutepio de Chupinguaia Dependendo da necessidade eles ficam hospedados

na casa de algueacutem conhecido ou na Casa do Iacutendio uma espeacutecie de guarita

para os iacutendios A Casa do Iacutendio mais proacutexima da TI se localiza em Vilhena

Ainda quanto ao contato linguiacutestico estudos mostram que os iacutendios do sul de

Rondocircnia tecircm o haacutebito de casar-se com iacutendios de tribos amigas Isto pode ser

comprovado com a presenccedila de palavras no leacutexico das liacutenguas em que foram

coadunadas

Conforme dados mais recentes na Gleba cerca de cinquenta por cento dos

casamentos satildeo mistos com iacutendios de outras etnias ou com natildeo iacutendios Embora

haja certa rivalidade entre os povos da Gleba e os do Rio dos Ouros o nuacutemero de

casamentos entre os iacutendios dessas duas aldeias satildeo muito frequentes

Quanto aos iacutendios Latundecirc Anomby (2009 p 9) discorre que

Os iacutendios da aldeia de Latundecirc Barroso tecircm o menor prestiacutegio e satildeo um pouco culturalmente e economicamente subjugados pelo Aikanatilde e Kwazaacute Devido agraves pequenas populaccedilotildees de Kwazaacute e Latundecirc eacute quase impossiacutevel para eles para se casar dentro de

57

Discorreremos com mais detalhes sobre o processo de bilinguismo no povo Latundecirc no trabalho proposto a ser desenvolvido

104

sua tribo Assim a sobrevivecircncia das liacutenguas e ateacute mesmo o povo como um grupo distinto eacute muito tecircnue

Devido agraves constantes necessidades de cuidado desses povos a OSCIP Creatio58

realizou estudos sobre os impactos soacutecio-antropoloacutegicos-ambientais na TI

Tubaratildeo-Latundecirc jaacute que toda regiatildeo estaacute sobre a influecircncia da PCH59 Cascata

que estaacute sendo construiacuteda no Rio Pimenta Bueno Tais estudos visam objetivar

informaccedilotildees que subsidiem a descriccedilatildeo dos possiacuteveis impactos oriundos da PCH

sobre esta TI

Figura 11 Iacutendios Latundecirc na TI Tubaratildeo-Latundecirc

Outro ponto que deve ser levado em conta ao considerar falantes biliacutengues e

monoliacutengues eacute que eles natildeo podem ser nitidamente diferenciados A avaliaccedilatildeo do

grau de bilinguismo eacute complexa dado que a sua medidade eacute escalar ou seja o

58

Organizaccedilatildeo da Sociedade Civil de Interesse Puacuteblico 59

Pequena Central Hidreleacutetrica

105

conhecimento de outra liacutengua eacute uma questatildeo de grau que vai desde 0 ateacute a

ldquoperfeiccedilatildeordquo (Van Coetesem 1988 p 9)

106

5 INTERFEREcircNCIA FONEacuteTICO-FONOLOacuteGICA DO LATUNDEcirc NO

PORTUGUEcircS

ldquoO contato linguiacutestico eacute apenas um aspecto do contato cultural e a interferecircncia linguiacutestica eacute uma face da difusatildeo lexical e aculturaccedilatildeordquo

Weinreich (1953 p 5)

51 INTRODUCcedilAtildeO

Para Thomason (2001 p 5) o contato entre liacutenguas estaacute em toda a parte muitos

paiacuteses tecircm mais do que uma liacutengua oficial e muito provavelmente a maior parte

da populaccedilatildeo mundial fala duas ou mais liacutenguas Posto dessa maneira

compreende-se que satildeo muitos os estudos que abordam sob formas aacutereas

concepccedilotildees diversas e interdisciplinares o contato linguiacutestico No que concerne agrave

linguiacutestica estes estudos satildeo de igual abundacircncia De acordo com Weinreich

(1953) grande ou pequena as diferenccedilas e similaridades entre as liacutenguas em

contato podem ser exaustivamente estabelecidas em muitos domiacutenios Todavia

quando se trata da investigaccedilatildeo do contato sob a eacutegide da fonologia e da foneacutetica

o nuacutemero destes estudos diminui consideravelmente Tal constataccedilatildeo corrobora

com a necessidade de estudos linguiacutesticos que tratem dos aspectos foneacuteticos

quando observados no contato entre liacutenguas

Por se tratar de uma sessatildeo importante para as elucidaccedilotildees dos processos

ocorridos no Portuguecircs falado pelos Latundecirc a serem discorridos no Capiacutetulo VI

descrevemos neta seccedilatildeo os segmentos das liacutenguas em anaacutelise e quais satildeos mais

suscetiacuteveis agrave influecircncia do contado linguiacutestico Devido agrave escassez de pesquisas

107

foneacuteticas fonoloacutegicas na aacuterea especificamente no Latundecirc e no Portuguecircs

Brasileiro seratildeo utilizadas como cabedal para esta anaacutelise as pesquisas de

TELLES (2002) e para a investigaccedilatildeo do inventaacuterio do sistema fonoloacutegico do

Portuguecircs a de BISOL (1996) e de SILVA (2002)

Dada a profundidade investigativa da natureza do contato cabe-nos ressaltar aqui

que o presente estudo natildeo se encarregaraacute de tratar de todas a suas nuances

visto que seu objeto estaacute delimitado quanto aos processos foneacuteticos resultantes

de tal contato

Quanto ao aporte teoacuterico seratildeo citados os trabalhos de WEINREICH (1953)

pioneiro a tratar das questotildees de interferecircncia foneacuteticas oriundas do contato entre

liacutenguas VAN COETSEM (1988) e MATRAS (2009) para elucidar os processos

ocorrentes no contato em questatildeo

52 INTERFEREcircNCIA FUSAtildeO COEXISTEcircNCIA E TRANSFEREcircNCIA

LINGUIacuteSTICA

Um dos precursores dos estudos sobre contatos linguiacutesticos Uriel Weinreich

descreve em seu livro Language in Contact (1953) os mecanismos foneacuteticos que

regem a intersecccedilatildeo existente no contato

No que concerne aos aspectos extralinguiacutesticos que regem os efeitos do contato

sobre a fala de determinado componente social Weinreich chama a atenccedilatildeo para

os fatores que estatildeo aleacutem das diferenccedilas estruturais bem como das

inadequaccedilotildees lexicais da liacutengua Segundo ele esses fatores natildeo estruturais satildeo

inerentes aos falantes que estatildeo expostos agrave situaccedilatildeo do contato por exemplo

108

a) A facilidade de o falante se expressar verbalmente e sua

debilidade de lidar coma as duas liacutenguas separadamente

b) Proficiecircncia relativa em cada liacutengua

c) Especializaccedilatildeo no uso de cada liacutengua por toacutepicos e

interlocutores

d) Forma de aprendizado em cada liacutengua

e) Atitudes para cada liacutengua se idiossincraacutetico ou estereotipado

f) A dimensatildeo do grupo biliacutengue e sua homogeneidade

sociocultural ou diferenciaccedilatildeo colapso entre subgrupos usando

uma ou outra liacutengua como sua liacutengua-matildee fatos demograacuteficos

sociais e as relaccedilotildees poliacuteticas entre esses subgrupos

g) Prevalecircncia individuais de bilinguismo com dadas caracteriacutesticas

de comportamento de fala em subgrupos em geral

h) Atitudes estereotipadas em relaccedilatildeo a cada liacutengua (prestiacutegio)

status indiacutegena ou imigrante da liacutengua em xeque

i) Atitudes em relaccedilatildeo agrave cultura de cada comunidade linguiacutestica

j) Atitudes em relaccedilatildeo ao bilinguismo como tal

k) Toleracircncia ou intoleracircncia com respeito agrave mistura linguiacutestica e

com a fala incorreta de cada um

l) Relaccedilatildeo entre o grupo biliacutengue e cada um das duas

comunidades em que ela eacute um segmento marginal (Weinreich

1953 p 4)

Um dos pressupostos baacutesicos agrave natureza do falante diz respeito ao fato de duas

ou mais liacutenguas soacute poderem estar em contato se usadas alternadamente pelas

mesmas pessoas O uso individual da liacutengua seraacute o locus do contato Quando isto

ocorre a transferecircncia de elementos foneacuteticos seraacute a motivadora pela

reorganizaccedilatildeo de todo o velho sistema de oposiccedilatildeo Ele assegura que the term

interference implies the rearrangement of patterns that result from the introduction

of foreign elements into the more highly structured domains of language such as

the bulk of the phonemic system a larger part of the morphology and syntax and

some areas of the vocabulary (p 1)60

60

O termo interferecircncia implica a reorganizaccedilatildeo de padrotildees que resultam na introduccedilatildeo de elementos no mais alto (profundo) domiacutenio de estruturas da linguagem tal como a maior parte do sistema fonecircmico uma larga parte da morfologia e sintaxe e algumas aacutereas do vocabulaacuterio

109

Quando dois sistemas satildeo confrontados no contato pode ocorrer o

reordenamento de padrotildees ou interferecircncia ou exclusatildeo Na interferecircncia

linguiacutestica o problema de maior interesse eacute a accedilatildeo reciacuteproca dos fatores

estruturais e dos natildeo estruturais ao promoverem estimularem ou impedirem cada

interferecircncia

Concernente aos ldquoMecanismos e causas estruturais de interferecircnciardquo Weinreich

idem p7 coloca que haacute um tipo de interferecircncia que eacute extremamente comum no

contato linguiacutestico trata-se da relaccedilatildeo de empreacutestimo na qual natildeo haacute uma total

transferecircncia de todos os elementos Logo percebe-se que eacute comum a

transferecircncia de parte de um sistema ou de traccedilos desse sistema fazendo com

que haja uma ldquocoexistecircncia de fusatildeo de sistemasrdquo

A coexistecircncia ou fusatildeo de sistemas linguiacutesticos pode de acordo com este

estudioso afetar a natureza de um signo linguiacutestico jaacute que esta eacute a combinaccedilatildeo

de uma unidade de expressatildeo e uma de conteuacutedo Neste niacutevel de bilinguismo ou

de interferecircncia de sistemas pode-se entendender que a relaccedilatildeo de significado e

significante natildeo se daacute de maneira uniacutevoca

Diante da complexidade que eacute a transferecircncia linguiacutestica a ilustraccedilatildeo por ele

adotada eacute a de que a interferecircncia eacute como areia carregada por um fluxo de aacutegua

Na liacutengua ela estaacute sedimentada no fundo de um lago E este fenocircmeno se daacute em

todos os niacuteveis da gramaacutetica p 11

Ao tratar dos tipos de interferecircncia nos sistemas foneacuteticos Weinreich afirma que

The problem of phonic interference concerns the manner in which a speaker perceives and reproduces the sounds of one

110

language which might be designated secondary in terms of another to be called primary Interference arises when a bilingual identifies a phoneme of the secondary system with one in the primary system and in reproducing it subjects it to the fonetic rules of the primary language (1953 p 15)61

Neste caso a interferecircncia resulta quando um falante identifica na segunda liacutengua

elementos foneacuteticos presentes na primeira liacutengua Ao reproduzir o segmento o

falante o sujeita agraves regras foneacuteticas da primeira liacutengua a liacutengua matildee

Ao prosseguir Weinreich tambeacutem aponta dois tipos de interferecircncia a partir do

quadro comparatoacuterio entre os sistemas linguiacutesticos do Romansh62 e do

Schweizerdeutsch63 liacutenguas coexistentes no Cantatildeo de Grisons na Suiacuteccedila No

primeiro caso o sistema foneacutetico do Romansh se configura como o sistema

primaacuterio e o Schweizerdeutsch como secundaacuterio No segundo caso os sistemas

satildeo alternados o sistema foneacutetico do Schweizerdeutsch assume o lugar do

sistema primaacuterio e o Romansh o secundaacuterio

61

O problema da interferecircncia foneacutetica consiste na maneira como o falante percebe (reconhece) e reproduz os sons de uma liacutengua que pode ser designado secundaacuterio em outros termos primaacuterio A interferecircncia surge quando um biliacutenguumle identifica um fonema do sistema secundaacuterio com um no sistema primaacuterio e em reproduzi-lo sujeitando-o agraves regras foneacuteticas da primeira liacutengua 62

Eacute uma das quatro liacutenguas nacionais da Suiacuteccedila juntamente com a liacutengua alematilde a liacutengua italiana e a liacutengua francesa Trata-se de uma liacutengua romacircnica do ramo ocidental que se acredita descender do latim vulgar falado pelos romanos que ocuparam a aacuterea na Antiguidade 63

Eacute qualquer um dos dialetos alemacircnicos falados na Suiacuteccedila no Liechtenstein e nas zonas fronteiriccedilas da Aacuteustria

111

Quadro 7 Quadro Comparativo dos Sistemas Foneacuteticos do Romansh e do

Schweizerdeutsch de acordo com Weinreich (1953)

Mais adiante seraacute observada a influecircncia do Latundecirc no Portuguecircs Desta forma

o Portuguecircs mesmo sendo a segunda liacutengua adquirida seraacute visto como o objeto

influenciado do contato linguiacutestico

112

Quando observou o contato entre os dois sistemas linguiacutesticos em voga

Weinreich (idem p 18 e 19) examinou o processo de interferecircncia representado

no segundo sistema fonecircmico Assim ele elencou quatro tipos de interferecircncias i)

subdiferenciaccedilatildeo de fonemas ii) superdiferenciaccedilatildeo de fonemas iii)

reinterpretaccedilatildeo de traccedilos relevantes iv) substituiccedilatildeo de fone atual

A subdiferenciaccedilatildeo de fonemas ocorre quando dois sons de um segundo sistema

cujos correspondentes que natildeo se distinguem no sistema primaacuterio natildeo satildeo bem

definidos Tal confusatildeo eacute evidenciada pela alternacircncia que o falante do Romansh

faz ao pronunciar os segmentos y e i do Schweizerdeutsch ou quando o falante

do Schweizerdeutsch faz ao pronunciar de forma insegura os segmentos i e

O processo de superdiferenciaccedilatildeo envolve a imposiccedilatildeo de distinccedilotildees fonecircmicas

do sistema primaacuterio sobre os sons do sistema secundaacuterio onde eles natildeo satildeo

necessaacuterios O processo pode ser inferido a partir de uma comparaccedilatildeo entre os

sistemas de som em contacto mesmo que nem sempre seja perceptiacutevel No

contanto entre os dois dialetos o vocaacutebulo rsquolada lsquoamplorsquo do Romansh eacute

pronunciado como acutelada no Schwyzertutsch

A reinterpretaccedilatildeo de traccedilos relevantes ocorre quando o falante biliacutengue distingue

fonemas do sistema secundaacuterio cujas caracteriacutesticas que nesse sistema satildeo

meramente concomitante ou redundante mas que satildeo relevantes no seu sistema

principal Por exemplo a palavra do dialeto Romansh [lsquomєsbullɐ] bagunccedila pode

ser interpretada quase como no Schwyzertutsch rsquomesa

Por fim o processo de substituiccedilatildeo de fone atual eacute aplicado aos fonemas que satildeo

definidos de forma idecircntica nos dois idiomas mas que se comportam de froma

113

distintas Na situaccedilatildeo descrita o segmento do Romanche e o do

Schwyzertatsch satildeo ambos definidos como vogais frontais de abertura

maacutexima mas o fonema do sistema Schwyzertfitsch eacute pronunciado mais aberto

Os fonemas b do Romansh e o B do Schwyzertfitsch satildeo ambos definidos por

suas oposiccedilotildees tensa (sem voz) consoante aspirante e nasal homorgacircnica mas

b eacute sempre vozeado B apenas ocasionalmente

Quando ao tratar dos fatores estruturais favorecedores ou inibidores da

interferecircncia foneacutetica o pesquisador em questatildeo afirma que a anaacutelise contrastiva

dos fonemas de duas liacutenguas e a forma como eles satildeo usados produz uma lista

de formas de interferecircncias focircnicas esperada em uma situaccedilatildeo de contato

particular Quando os sons satildeo vistos como parte de um sistema focircnico certos

fatores adicionais emergem favorecendo ou inibindo a reproduccedilatildeo de som

defeituoso (pg 23)

Em continuidade ele afirma que ldquoum fator que elimina certos ruiacutedos na fala em

liacutengua estrangeira eacute a existecircncia de vazios no padratildeo no sistema fonecircmico

primaacuterio em que fonemas estranhos do sistema secundaacuterio podem ser

recuperados (rotulados)rdquo Isso se daacute devido agrave semelhanccedila com o(s) segmento(s)

cujas caracteriacutesticas satildeo mais aproximadas

Sobre a difusatildeo dos fenocircmenos de interferecircncia foneacutetica Weinreich assegura que

no estudo da propagaccedilatildeo de sons oriundos do contato linguiacutestico sobretudo na

influecircncia da liacutengua estrangeira (liacutengua de contato) seria relevante que

investigasse se o resultado de muitos tipos de interferecircncia eacute difundido da mesma

forma ou com igual facilidade

114

Ao citar Sapir ele afirma que

Podemos supor que as variaccedilotildees individuais decorrentes em fronteiras linguiacutesticas tecircm sido gradualmente incorporadas ao desvio foneacutetico de uma liacutengua Isto mostra aliaacutes que um sistema de som que eacute conhecido por ter sido influenciada por um estrangeiro natildeo precisa esperar para representar uma reacuteplica exata do sistema influenciando (1949 p213)64

Para ele um dos motivos que contribuiria para a interferecircncia foneacutetica seria

agravequela desencadeada pelo status

Com base na reduplicaccedilatildeo de som de Weinreich Matra (2009 p 241) descreve

que a produccedilatildeo de segmentos foneacuteticos eacute vulneraacutevel No entanto

A replicaccedilatildeo fonoloacutegica (interferecircncia transferecircncia ou ldquoempreacutestimordquo) pode afetar qualquer niacutevel da estrutura de som a articulaccedilatildeo de fonemas individuais ou fonemas dentro das palavras o comprimento e a geminaccedilatildeo acento e tom prosoacutedia e entonaccedilatildeo Em fonologia os empreacutestimos foram muitas vezes considerados como estrateacutegias para preencher as chamadas lacunas estruturais no sistema destinataacuterio65

Matras ainda defende que a mudanccedila induzida pelo contato fonoloacutegico eacute o

resultado da incapacidade ou da relutacircncia dos falantes para manter a separaccedilatildeo

completa e consistente entre os sistemas fonoloacutegicos de duas liacutenguas Ele cita

como exemplo o fato de os falantes da liacutengua receptora lidarem com a pronuacutencia

de termos da liacutengua de origem66

64

We may suppose that individual variations arising at linguistic borderlands - whether by the unconscious suggestive influence of foreign speech or the actual transfer of foreign sounds into the speech of bilingual individuals - have been gradually incorporate into the phonetic drift of a language This shows incidentally that a sound system which is known to have been influenced by a foreign one need not be expected to represent an exact replica of the influencing system 66

Isso ocorre mais frequentemente quando uma palavra estrangeira eacute introduzida na liacutengua de

destino por apenas um pequeno grupo de biliacutengues ou semibiliacutengues e se espalha por toda fala da comunidade inclusive para os monoliacutengues natildeo estatildeo familiarizados com os sons originais da

115

Quando emprestado de uma liacutengua doadora um vocaacutebulo natildeo acarretaraacute

necessariamente em mudanccedila no sistema fonoloacutegico da liacutengua receptora O que

ocorre como jaacute fora colocado aqui eacute o processo de acomodaccedilatildeo fonoloacutegica O

vocaacutebulo emprestado passa a ser pronunciado com os segmentos foneacuteticos da

liacutengua receptora

Todavia Matra (2009 p 222-223) chama a atenccedilatildeo para um segundo tipo de

processo em que ldquoos sons que aparecem nos vocaacutebulos emprestados que satildeo

normalmente ausentes do sistema da liacutengua destinataacuteria podem ser replicados

juntamente com o proacuteprio vocaacutebulordquo fazendo com que haja um enriquecimento no

inventaacuterio foneacutetico na liacutengua receptora 67

Segundo o autor este tipo de processo ocorre com normalidade em situaccedilotildees

em que o bilinguismo eacute muito generalizado Logo ldquomembros biliacutengues de uma

comunidade que estatildeo cientes da forma original da pronuacutencia da liacutengua doadora

fazem um esforccedilo para autenticar o vocaacutebulo emprestado replicando sua forma

originalrdquo

Em continuidade ele afirma que

Uma vez que a liacutengua doadora goza de alguma forma de prestiacutegio muitas vezes devido a associaccedilotildees com comeacutercio tecnologia conhecimento e outros tipos de inovaccedilatildeo ou de poder a replicaccedilatildeo de pronuacutencias originais da liacutengua doadora satildeo imitadas por muitos monoliacutengues (natildeo falantes da liacutengua doadora) como tal levando agrave propagaccedilatildeo dentro da liacutengua destinataacuteria dos novos fonemas nos vocaacutebulos emprestados que satildeo relevantes Isso comprova o respeito dos falantes para a linguagem dos doadores e agrave sua flexibilidade no uso de sua liacutengua materna (a liacutengua do destinataacuterio) indicando que os

liacutengua doadora Em tais situaccedilotildees haacute uma forte lealdade para com a liacutengua de destino e geralmente apenas com superficial conhecimento com a liacutengua de origem (p 242) 67

Como exemplo eacute citado o caso da africada dʒ que em situaccedilatildeo de empreacutestimo pode ser

pronunciada como tʃ em palavras que oriundas do inglecircs

116

falantes se contentam em atribuir fonologicamente autenticidade agrave replicaccedilatildeo de empreacutestimos lexicais prioritaacuterios maiores do que para a preservaccedilatildeo das estruturas fonoloacutegicas coerentes de sua liacutengua nativa (idem p 224)

Em uma situaccedilatildeo onde o bilinguismo eacute estabelecido e prolongado os falantes (na

maioria de uma liacutengua minoritaacuteria como o caso dos Latundecirc) podem ajustar o

inventaacuterio de sons e as regras que regem a sua distribuiccedilatildeo para coincidir com as

do outro

Matras (2009 p 225) atraveacutes de um quadro descreve os quatro tipos de

mudanccedilas fonoloacutegicas oriundas do contato linguiacutestico com base nos perfis dos

falantes linguagem e atitudes

Quadro 8 Tipos de processos que conduzem a mudanccedila fonoloacutegica induzida por contato

117

Com base no quadro anterior depreende-se que

i) O tipo A eacute diferente na medida em que natildeo envolve nenhuma mudanccedila no

sistema fonoloacutegico mas apenas uma mudanccedila de palavras individuais

enquanto os tipos B-D todas envolvem algum grau de modificaccedilatildeo para o

sistema tal como utilizado por colunas numa base regular No entanto

existem semelhanccedilas entre os tipos de aspectos individuais

ii) Os tipos A e B satildeo semelhantes e giram em torno de palavras emprestadas

individualmente

iii) Os tipos A e C satildeo semelhantes em que ambos envolvem a transferecircncia

de recursos de liacutengua nativa para material diferente

iv) Os tipos B e D satildeo semelhantes em que ambos envolvem a adoccedilatildeo de

padrotildees sonoros estrangeiros e sua integraccedilatildeo na liacutengua nativa

v) Os tipos C e D mostram como mencionado acima o fato de que os

falantes tentam evitar que para selecionar os sons de dois conjuntos

distintos de inventaacuterio e ateacute generalize apenas um conjunto de sons para

serem usadas em ambas as liacutenguas isto eacute em toda a interaccedilatildeo contextos

Os falantes do portuguecircs falado por Latundecirc se estendem em duas direccedilotildees Em

tipos A e C onde os falantes reinterpretam os sons dos vocaacutebulos emprestados

da liacutengua doadora alinhando-os aos padrotildees e inventaacuterio da liacutengua receptora

(nativa) No tipo D os falantes modificam os segmentos foneacuteticos com base no

inventaacuterio externo A aplicaccedilatildeo de uma determinada regra fonoloacutegica pode

resultar na perda ou em ganho de fonemas p226

118

O contato linguiacutestico pode ser representado ainda como um contiacutenuo Nele

ocorrem forccedilas centriacutefugas e centriacutepetas que dinamizam os sistemas linguiacutesticos

Para Matras idem p 226 fatores como normas sociais lealdade e consciecircncia

de identidade podem interferir e ateacute mesmo neutralizar os fenocircmenos advindos do

contato O empreacutestimo sofreria portanto estas pressotildees

Figura 12 Ligaccedilotildees entre a intensidade do bilinguismo o tipo de processo de acomodaccedilatildeo e sobreposiccedilatildeo entre os sistemas fonoloacutegicos

Quanto menor for o bilinguismo maior seraacute a separaccedilatildeo de sistemas Por outro

lado quanto mais intenso for o bilinguismo maior seraacute a convergecircncia de

sistemas fonoloacutegicos

No que concerne agrave integraccedilatildeo fonoloacutegica Matras (2009 p 227) explica que a

substituiccedilatildeo de fonemas eacute uma das formas mais comuns posto que este

processo permite uma aproximaccedilatildeo de caracteriacutesticas entre o sistema interno e

externo Dessa forma a substituiccedilatildeo eacute mais comum uma vez que os fonemas

satildeo combinaccedilotildees de recursos articulatoacuterios e as caracteriacutesticas em comum satildeo

mantidas em detrimento agraves complexidades dos fonemas que natildeo compartilham de

traccedilos em comum

119

Ele tambeacutem chama a atenccedilatildeo para a estrutura silaacutebica dos sistemas fonoloacutegicos

que entram em contato afirmando que ldquoos estrangeirismos podem acomodar a

siacutelaba e a estrutura do acentordquo (idem p 228)

A aplicaccedilatildeo de regras sobre a distribuiccedilatildeo de fonemas oriundos do empreacutestimo

pode resultar na perda de um traccedilo ou de um fonema A integraccedilatildeo de fonemas

tambeacutem pode levar agrave omissatildeo de outros fonemas que natildeo fazem parte o

inventaacuterio fonoloacutegico da liacutengua receptora E a omissatildeo de certas caracteriacutesticas

durante a replicaccedilatildeo de fonemas pode ser prejudicial para o sistema como um

todo e isso pode resultar em uma reduccedilatildeo de pares miacutenimos

Sobre a convergecircncia dos sistemas fonoloacutegicos Matras (2009 p 229) assegura

que um fator que retarda o processo de substituiccedilatildeo de som eacute a presenccedila de

vaacuterios pares de vocaacutebulos que contam com o contraste Neste caso a

convergecircncia aumenta as semelhanccedilas entre os inventaacuterios fonoloacutegicos das duas

liacutenguas E a replicaccedilatildeo da variaccedilatildeo alofocircnica eacute uma via comum para a

convergecircncia

Quanto aos segmentos foneacuteticos ainda de acordo com o pesquisador em

questatildeo as consoantes satildeo as mais introduzidas nos estrangeirismos Uma vez

que nas liacutenguas do mundo o nuacutemero de segmentos consonantais eacute maior que o

das vogais Logo os vocaacutebulos emprestados satildeo mais propensos a introduzir

mais consoantes que vogais

No caso Portuguecircs falado por Latundecirc tal assertiva em parte se configura A

anaacutelise dos dados prova que satildeo as consoantes as mais favoraacuteveis para a

realizaccedilatildeo dos processos foneacuteticos Todavia o nuacutemero de consoantes nessa

120

liacutengua eacute menor que o de vogais conforme descriccedilatildeo de Telles 2002 a qual

veremos na proacutexima seccedilatildeo

Van Coetsem (1988 p7) tambeacutem aborda os processos e comportamentos

oriundos do contato linguiacutestico68 E para que este contato seja estabelecido eacute

necessaacuterio que se tenha uma liacutengua de origem (SL) e uma liacutengua destinataacuteria

(RL)

Figura 13 Correspondecircncia entre liacutenguas e contato linguiacutestico

Embora o modelo de Van Coetesem seja universal e demonstre que na maioria

dos contatos linguiacutesticos a liacutengua de origem seja uma liacutengua dominante

ressaltamos que neste trabalho a liacutengua de origem (SL) eacute a liacutengua minoritaacuteria o

Latundecirc E o substrato analisado eacute uma modalidade de portuguecircs falado pelos

Latundecirc

Em continuidade este estudioso afirma que

Um empreacutestimo fonoloacutegico eacute uma imitaccedilatildeo uma reacuteplica ou uma reproduccedilatildeo na liacutengua recipiente (RL) de um elemento estrangeiro ou uma pronuacutencia da liacutengua de origem (SL) Esse tipo de imitaccedilatildeo eacute muitas vezes apenas uma aproximaccedilatildeo Para o imitador a imitaccedilatildeo implica o uso de algo que ele natildeo tem na sua proacutepria liacutengua Um empreacutestimo fonoloacutegico como uma imitaccedilatildeo eacute portanto algo que o falante imitador da RL natildeo tem em sua fonologia integrada ou nativa ou seja algo

68

Para Van Coetsen o termo ldquoempreacutestimo fonoloacutegicordquo indica qualquer forma de empreacutestimo no acircmbito da fonologia segmentar ou suprassegmental independentemente se isto afeta a dimensatildeo paradigmaacutetica a dimensatildeo sintagmaacutetica ou ambas (p7)

121

fonoloacutegico ou subfonoloacutegico que deriva de seu sistema fonoloacutegico nativo (Idem p 8)69

A intenccedilatildeo do falante ao fazer uso do segmento emprestado eacute reproduzi-lo da

melhor forma possiacutevel Ao fazer isso ele obedece agraves consideraccedilotildees sociais O

proacuteprio fato de que o segmento natildeo esteja inserido em seu proacuteprio sistema faz

com que na pressatildeo de se adaptar a diferentes pronuacutencias ele (o falante) procure

o equivalente mais proacuteximo em seu sistema

Para que isso ocorra ldquoo falante faz uso de dois processos a imitaccedilatildeo e a

adaptaccedilatildeo p 9rdquo Ambos pressupotildeem a existecircncia de um conjunto organizado de

segmentos fonoloacutegicos e distribuiccedilatildeo de unidades inseridas pelo falante da liacutengua

recipiente por um lado e por outro o confronto das pronuacutencias estrangeiras com

que o falante tem que lidar

Aleacutem dos processos de imitaccedilatildeo e adaptaccedilatildeo Van Coetesem tambeacutem utiliza a

noccedilatildeo de integraccedilatildeo ldquoque eacute a incorporaccedilatildeo de elementos em uma dada liacutengua

advindos de outra(s) liacutengua(s)rdquo A imitaccedilatildeo seria portanto o preacute-requisito para a

integraccedilatildeo No caso do portuguecircs falado pelos Latundecirc natildeo haacute indiacutecios de

integraccedilatildeo de fonemas especiacuteficos da sua liacutengua de origem

Para que ocorra o processo de imitaccedilatildeo eacute necessaacuterio que haja uma agentividade

que eacute um tipo especiacutefico de transferecircncia onde o falante de uma dada liacutengua eacute

ativo e o outro passivo O inverso tambeacutem pode ocorrer

69

A phonological loan is an imitation replication or reproduction in the RL of a foreign or SL

pronunciation such an imitation is often only an approximation For the imitator imitation implies the use of something that he does not (yet) have of his own A phonological loan as an imitation is thus something that the imitating RL speaker does not have in his integrated or native phonology something phonemic or subphonemic that deviates from his native phonological system

122

Figura 14 Agentividade da Liacutengua Recipiente de acordo Van Coetsem 1988 p10

Na agentividade da liacutengua recipiente (RL)70 o segmento dominante na relaccedilatildeo

entre a liacutengua recipiente e a liacutengua de origem71 eacute o da liacutengua recipiente Logo o

domiacutenio linguiacutestico seraacute o da liacutengua recipiente

Figura 15 Agentividade da Liacutengua de Origem de acordo Van Coetsem (1988 p11)

Na agentividade da liacutengua de origem (SL) o segmento dominante na relaccedilatildeo

entre a liacutengua recipiente e a liacutengua de origem eacute o da liacutengua de origem Sendo

assim o domiacutenio linguiacutestico seraacute o da liacutengua de origem

Tomando como referencial os modelos apresentados podemos estabelecer um

contiacutenuo cronoloacutegico para compreender como se daacute a agentividade sobre o

contado do Portuguecircs com o Latundecirc

70

No caso em questatildeo a modalidade do portuguecircs falado pelos Latundecirc eacute a liacutengua recipiente 71

Consequentemente a liacutengua de origem (SL) eacute o Latundecirc

123

Figura 16 Relaccedilatildeo de agentividade entre o Portuguecircs e o Latundecirc

Historicamente devido aos fatores socioeconocircmicos o contato inicial se daacute entre

o Portuguecircs influenciando o Latundecirc Aquele como liacutengua majoritaacuteria e este como

minoritaacuteria

O Latundecirc por ser a liacutengua do povo dominado eacute submetido agraves interferecircncias da

liacutengua de domiacutenio Deste contato resulta uma modalidade especiacutefica do

Portuguecircs que eacute o falado por Latundecirc

Em suma podemos afirmar que embora seja o Portuguecircs a liacutengua dominante e

que inicialmente seja ele o agente sobre o Latundecirc a posteriori fora o Latundecirc o

agente pelas transformaccedilotildees ocorrentes no Portuguecircs de contato Posto dessa

forma a agentividade se daacute em ambos os contextos a partir do referencial que se

tenha uma vez que o Portuguecircs e o Latundecirc tanto influenciaram como foram

influenciados Mas vale ressalvar que para este recorte o Portuguecircs eacute a liacutengua

que sofre influecircncia Eacute este o fio condutor da nossa pesquisa

Portuguecircs Latundecirc Portuguecircs falado por Latundecirc

124

53 FONOLOGIA DO LATUNDEcirc

Para uma melhor compreensatildeo futura passaremos agora a descrever os

sistemas fonoloacutegicos das liacutenguas em estudo

Elencamos abaixo as principais caracteriacutesticas fonoloacutegicas do Latundecirc

Eacute uma liacutengua com maior quantidade de elementos vocaacutelicos (dezesseis)

em detrimento aos consonantais (onze) Eacute uma liacutengua vocaacutelica portanto

Apresenta dez vogais orais e seis nasais Dessas oito satildeo laringais72

As vogais nasais satildeo contrativas apenas na posiccedilatildeo do acento

Os glides w j quando em posiccedilatildeo de onset sofrem o processo de

consonantizaccedilatildeo

Apresenta seis tipos de siacutelabas fonoloacutegicas que satildeo derivadas da extensatildeo

(C)V(C)(C) V VC VCC VC CVC e CVCC

O nuacutecleo silaacutebico eacute sempre preenchido por uma vogal

Dos segmentos consonantais apenas a oclusiva glotal ʔ natildeo eacute observada

em posiccedilatildeo de onset

A coda pode ter desdobramento ramificado sendo a primeira posiccedilatildeo

preenchida sempre por um glide

Os padrotildees silaacutebicos VC e CVC satildeo os mais frequentes e ocorrem tanto

em siacutelaba tocircnica como aacutetona

Tem uma forte tendecircncia agrave monotongaccedilatildeo

O sistema acentual eacute misto que associa o acento lexical ao acento foneacutetico

72

Telles explica que as mais novas geraccedilotildees Latundecirc abaixo de 20 anos realizam o traccedilo laringal com menor frequecircncia e audibilidade

125

O acento eacute realizado foneticamente como tom (pitch) alto

Eacute uma liacutengua de caracteriacutestica de liacutenguas pitch accent

Apresenta processos fonoloacutegicos em niacutevel poacutes-lexical fundamentalmente

Estes processos satildeo agrupados em assimilaccedilatildeo (harmonia vocaacutelica e

vozeamento das oclusivas) dissimilaccedilatildeo reduccedilatildeo apagamento silaacutebico e

epecircntese

Quadro 9 Fonemas consonantais do Latundecirc

Fonemas Consonantais

Labiais Coronais Dorsal Glotais

+ anterior - anterior + anterior - anterior - anterior - anterior

Plosivas p t k

Nasais m n

Fricativas s h

Lateral l

Glide w j

Quadro 10 Fonemas vocaacutelicos do Latundecirc

Fonemas Vocaacutelicos

Vogais Vogais Laringais

Altas i u i u

Altas Nasais ĩ ũ i u

Meacutedias e o e o

Baixa a a

Baixa Nasal a a

126

Quadro 11 Ditongos do Latundecirc

Ditongos

Crescentes Decrescentes

w j w J

i wi iw

e e we we je je ej e j

a a a a wa wa ja ja ja aw a w a w aj a j atildej

o o wo jo ow

u u u ju ju ju

Quadro 12 Descriccedilatildeo dos fonemas consonantais (Retirada de Telles 2002)

Segmento - Descriccedilatildeo - Contexto de realizaccedilatildeo e especificidades

Exemplos

Traduccedilatildeo

p73 - Oclusiva bilabial surda

Eacute de extrema limitaccedilatildeo de realizaccedilatildeo na liacutengua

Ocorre em posiccedilatildeo de onset formando

siacutelabas com as vogais i a atilde o u

Pode se realizar como [p] oclusiva bilabial surda [b] oclusiva bilabial

sonora [ɓ] oclusiva bilabial sonora

implosiva

Em iniacutecio de palavras realiza-se [p]

diante da vogal coronal [i] e [b ɓ] e

diante da vogal baixa [a]

Em meio de palavra ou enunciado quando precedido por oclusiva glotal realiza-se [p]

[pite]

piʔ-te

[ιɓ

pan-tatilden

[diʔpa natildenʌ]

jaliʔ pan-tatilden-ta

[kotildebayte] ~ [kotildebayte]

kownpayt-te

[sabagnĩde]

Espeacutecie de paacutessaro chupito Satildeo dois Satildeo dois colares Tatu espeacutecie de

73

Outros estudos com liacutenguas proacuteximas tambeacutem indicam a baixa frequecircncia da realizaccedilatildeo do p

nas liacutenguas desse grupo Kingston 1970 para o Mamaindecirc e Lowe 1961 para o Nambikwaacutera do sul (Galera Kabixi Munduacuteka Nambikwaacutera do Campo)

127

Em meio de palavras ou enunciados em ambiente intervocaacutelico ou nasal adjacente realiza-se [b]

sapan-kinĩn-te

[tʃabatildeʔginĩde]

sapatilden-kin-te

Pente Taioba

m - Nasal labial + anterior

Oclusiva bilabial nasal com distribuiccedilatildeo mais larga do que a do p

Apresenta ocorrecircncia restrita quanto comparada agrave nasal alveolar n

Realiza-se [m]

Ocorre em iniacutecio de siacutelaba diante das

vogais i i i i a a a u u u u

Natildeo forma siacutelaba com as vogais

meacutedias frontais e e e com as

posteriores o o

Apoacutes pausa e seguida de a pode se realizar como oclusiva bilabial nasal

preacute-glotalizada - [ ʔm ]

[ miɾatildenʌ]

mih-tatilden-ta

[katilde ɾatildenʌ]

kami h-tatilden-ta

[ a ĩ de]

e ĩn-te

[ e ĩ de]

e ĩ -te]

[ ma hɾatilden]

mah-tatilden

[ atildega ɾe]

atilden-kaloh-te

[ka a ʔɾatildenʌ]

ka- a -tatilde-ta

[ datildena]

n-tatilden-ta

[tumuʔku ɾe]

tumuʔku-te

Estaacute chovendo Aacutegua estaacute suja Cobra espeacutecie de Couro Ele estaacute esperando Roupa Estaacute molhado Estaacute bonito Jacu

128

Em fronteira de morfema precedido pela fricativa glotal h teraacute a sua realizaccedilatildeo ensurdecida

[ a datildenʌ]

a n-tatilden-ta

[ʔ atilde ɳ datilden]~[ a n datilden]

atilden-tatilden

[ʔ atildeʔ n datilden] ~

[ atildeʔ ndatilden]

atilden- n-tatilden

[n h atildega tna ]

n - atilden-ka -tatilden-na

Estaacute inchado Estaacute queimando Vocecirc estaacute mandando Eacute nossa roupa

w - Glide labial - anterior

Glide laacutebio-velar sonoro

Ocupa as posiccedilotildees de onset e coda

Apresenta leve arredondamento nos laacutebios

Eacute o segmento mais frequente das labiais

Realiza-se como [w] em iniacutecio de

siacutelaba diante das vogais i e e a a o

tambeacutem podendo variar com [ʋ]

fricativa laacutebio-dental que eacute realizada com fraco grau de fricccedilatildeo

[ wi rsquoɾatilden] ~ [ ʋi ɾatilden]

wi -tatilden

[woda h de] ~ [ʋoda h de]

wotah-te

[na weʔrsquoa jrsquoɾe] ~ [na ʋeʔajrsquoɾe ]

na jn-weʔa jh-te

[ kowajna tatildenʌ]~ [koʋajna tatildenʌ]

hah-wa jn-ta-tatilden-ta

[daweʔgɾatilde ni]

taweʔ-ka-tatilden-ti

[ we jginĩdatildena]

we jn-kinĩn-tatilden-ta

[ wajkinĩ de]

wajʔ-kinĩn-te

Ele comeu Pomba Eacute para colocar na cabeccedila Satildeo poucos laacutepis Ele cozinhou Eacute fruto da bacaba

129

Em dissiacutelabos no onset de siacutelaba preacute-tocircnica aberta seguido de vogal a central baixa pode ocorrer a fusatildeo entre o w e a vogal a realizando-se como [ͻ o u]74

Na sequecircncia w + a o a pode sofrer harmonia vocaacutelica recebendo o ponto de articulaccedilatildeo da vogal acentuada sendo realizada [e]

Quando em final de siacutelaba segue as

vogais i o a a

E depois das vogais io pode alongar-se

Se a vogal precedente for a baixa a

a ocorreraacute a fusatildeo resultando as

posteriores ͻ ͻ

Quando em siacutelaba em siacutelaba

acentuada ͻ ͻ podem ser alongados

ou seguido de oclusatildeo glotal [ʔ] ou

ocorrer uma assimilaccedilatildeo regressiva

das baixas aa passando a [ͻ ͻ ]

Quanto agrave frequecircncia w se mais

ocorrente depois da vogal baixa a a

e baixiacutessima ocorrecircncia depois da vogal i o

Ao integrar uma siacutelaba (C)v wN onde a

vogal eacute nasalizada o glide pode ser nasalizado ou coalescer com a consoante nasal na coda

Em posiccedilatildeo de onset e pronunciada rapidamente eacute fortificada podendo ser realizada como [p] e [m]75

[ wa jkinĩ de]

wa jh-kinĩn-te

[waɾaɾwaɾaʔĩ datildenʌ] ~

[wͻɾaʔwͻɾaʔĩ datildenʌ] ~

[ͻɾaʔͻɾaʔĩ datildenʌ]

watajwatajn-tatilden-ta

[weli nde] ~ [uli n de]

wa ĩn-te

[weɾe ɾatildena] ~ [ ɾe ɾatildena] ~

[ rsquoɾe ɾa na]

wateh-tatilden-ta

[giw ladaɾe] ~ [gi la de]

kiwlah-tah-te

[kowa ɾe] ~ [koa ɾe]

kowah-te

[a wde] ~ [ ͻ de] ~ [ ͻ ʔde]

a w-te

[aw de] ~ [ͻ de] ~ [ͻʔ de]

awh-te

[na w du] ~ [nͻ du] ~ [nͻ w du]

na wh-tu

[a wm datilden] ~ [atilde w m datilden] ~

Amendoim Fruto do accedilaiacute Estaacute fino Tamanduaacute Estaacute sumido Cascavel Andorinha Flexa Gaviatildeo

74

Conforme Telles (2002 p 42) Estas alofonias variam de acordo com a qualidade da vogal

tocircnica da siacutelaba seguinte com a qual sua vogal aacutetona nuclear se harmoniza 75

Tal ocorrecircncia eacute mais frequentemente constatada em falantes monoliacutengues em Latundecirc

130

[atilde m datilden]

atilde wn-tatilden

[woloʔʔnatildenʌ] ~ [polo ʔnatildenʌ]

walon-tatilde-ta

[wʌnaʔkinĩ de] ~ [mʌnaʔkinĩ de]

~ [wanaʔkinĩ de]

wanaʔ-kinĩn-te

[wo nut ʔna ] ~ [mo nut ʔna ]

wo nuʔ-tatilden-na

[wʌ na jginĩ datildenʌ] ~

[mana jginĩ datildenʌ] ~

wa -na jn-kin-tatilden-ta

[wa ʃi de] ~ [maʔ ʃi de]

wa-sin-te

Lontra Estaacute assando no burralho Estaacute podre Castanha do caju Eacute corpo inteiro Eacute tua cabeccedila Espeacutecie de abelha

t - Plosiva coronal + anterior

Oclusiva alveolar surda

Ocorre com as vogais ie e a

a atilde o o u ũ

t realiza-se [d] em siacutelaba acentuada podendo ainda variar em posiccedilatildeo medial como [|]

Em iniacutecio de palavra o alofone [d] pode ser realizado como preacute-

[diko lo n de]

tiʔ-ko lo n-te

[ de he ɾaɾe]

te h-tah-te

Paacutessaro pintado espeacutecie de paacutessaro Ele cozinhou

131

glotalizado realizando-se como

[ɗ]

Em fala lenta pode ser realizado como [d]

Em contexto fora do acento ocorre [t] com raros exemplos de variaccedilatildeo entre os alofones [d] e [t]

[ de geɾatilden]

te h-ka-tatilden

[daʔjͻ ratildena]

ta-jaw-tatilden-ta

[da jginĩ de]

ta jn-kinĩn-te

[ doɾatilden] ~ [d ɾatilden]

toh-tatilden

[do h gratilden]

to h-ka-tatilden

[du ɾatilden]

tu-tatilden

[d hdatilden]

tu-tatilden

[kͻdͻ ɾe]

kataw-te

[kado ndatildenʌ]

katon-tatilden-ta

[teda de]

teta-te

[toʔdatilde n de]

toʔtatilden-te

[tigi ɾe]

tikih-te

Sucuri Ele estaacute sentado Pedra Ele morreu Ele procurou Ele pegou Ele chupou Patuaacute Estaacute cru Jaoacute Nambu

132

As possibilidades alofocircnicas de t entre segmentos depende do acento e do contexto adjacente Estas duas condiccedilotildees definem as alofonias76

Precedido de vogal em ambiente

intervocaacutelico realiza-se [tdɾ]

sendo [d] o preferencial

Quando t eacute precedido por h

realiza-se como [tdɾ] A

presenccedila da fricativa favorece o rotacismo de t tornando-o em

[ɾ]

Quando t eacute precedido de ʔ ou

de t a realizaccedilatildeo pode ser [t] mas [d] pode permanecer em raros casos

Em contexto de nasalizaccedilatildeo trecircs realizaccedilotildees satildeo possiacuteveis para t i) vozeamento da oclusiva alveolar ii) preacute-nasalizaccedilatildeo da oclusiva alveolar em iniacutecio de siacutelaba tocircnica e iii) assimilaccedilatildeo total da nasal adjacente

[tabawdnͻde]

tapawn-naw-te

[tala de] ~ [dala de]

tala-te

[tolowm datilde ]

talown-tatilden

[lodo ɾa ɾe] ~ [lo to ɾa ɾe] ~

[loto ɾa ɾe]

loto-tah-te

[doʔ daj de] ~ [toʔ ɾaj de]

to-tajn-te

[nu h ɾe] ~ [ nu h de]

nu h-te

[lo hrsquoɾe] ~ [lo h de] ~

[lo h te]

loh-te

[hu te] ~ [hu de]

huʔ-te

[keja te] ~ [kejaʔ te]

kejat-te

[ĩ datildena] ~ [i ndatildena] ~ [i natildena]

Macaco pequeno Ombro Tipoia Ele terminou Rato grande Abelha vermelha Lagarto grande Urubu

76

Dessas alofonias o flap [ɾ] tem sua ocorrecircncia ligada ao acento

133

Em siacutelaba natildeo acentuada t pode sofrer fricatizaccedilatildeo passando a se realizar como [s]

ou [ts] ou [ʔs]

Ainda neste contexto permanecem possiacuteveis as realizaccedilotildees [t] e [d] se o t sofrer fricatizaccedilatildeo a aspiraccedilatildeo glotal precedente do h natildeo se realiza

Em travamento silaacutebico t realiza-se de preferecircncia como

ʔ Pode ser deletado

ocasionando o prolongamento da vogal tautossilaacutebico

in-tatilden-ta

[katilde datildena] ~ [katilde ndatildena] ~

[katilde natildena]

katilden-tatilden-ta]

[kejaʔ n da ɾe] ~ [kejaʔ na e]

kejan-tah-te

[losa na ʔ] ~ [lostsa na ʔ] ~

[lo ʔ sa na ʔ] ~ [lo h ta na ʔ]

loh-ta-na

[kejate] ~ [kejaʔte]

kejat-te

[kejaʔtiʔjoho]

kejat-ti-jo-ho

[lote] ~ [loʔte]

lot-te

[acute tʃjͻna ]

lot-ti-jaw-na

Arco Milho Estaacute apimentado Estaacute duro Lambari grande Eacute urubu Milho Talvez seja milho Paca A paca estava aiacute

134

n - Nasal coronal - anterior

Oclusiva alveolar nasal

Suas alofonias satildeo condicionadas pelo contexto adjacente agrave sua posiccedilatildeo de ocorrecircncia e agrave estrutura silaacutebica

Em onset realiza-se como [n] com as

vogais i i ĩ ĩ a a atilde atilde u u ũ ũ

Tambeacutem pode apresentar flutuaccedilatildeo em

onset realizando-se [ʔn]77 alveolar

nasal preacute-glotalizada com preferecircncia quando seguido por a

Em posiccedilatildeo de onset e em fronteira de morfema dependendo do seguimento seguinte sofreraacute alteraccedilatildeo

Quando precedido por h sofreraacute ensurdecimento

Quando precedido por outro n na coda silaacutebica precedente poderaacute ser

preacute-glotalizada [ʔn]

[ni du]

ni-tu

[ni ʔkinĩnatildena]

ni ʔ-kinĩn-tatilden-ta

[nagatilde de]

nakatilden-te

[katildena ratilden]

kana h-tatilden

[natildejd ]

natildejn-tu]

[ʔnatilde natilde ʌ]

natilde n-tatilden-ta

[nu h e]

nuʔ-te

[lsquon h ɾe]

nu h-te

[n n de]

n n-te

[n h n atildega tatildena]

Tipo de lenha Eacute fruto Lagarto Estaacute escuro Pacu Estaacute chorando Braccedilo Lagarto Espeacutecie de Bicho

77

Tal qual ocorre com m a glotalizaccedilatildeo de n deve-se em alguns casos aacute reduccedilatildeo da siacutelaba

inicial da palavra

135

Em posiccedilatildeo de coda de siacutelaba acentuada gera processo de assimilaccedilatildeo de dissimilaccedilatildeo e de elisatildeo resultando numa seacuterie de alofonias

Ainda em siacutelaba acentuada se a vogal tautossilaacutebica for oral e entre a coda nasal existir um glide labial-velar constituindo uma siacutelaba com ditongos awn own n se realiza como [m] preferencialmente

w e n em posiccedilatildeo de coda pode sofrer coalescecircncia realizando-se como [m] ou [n]

Se o glide ocupante da primeira posiccedilatildeo da coda for j ou se a siacutelaba tiver a coda preenchida pela nasal n a realizaccedilatildeo desta nasal seraacute [n]

Os glides que seguem a vogal na primeira posiccedilatildeo de coda podem

n -natilden-kah-tatilden-ta

[udʔna]

un-na

[iwm de]

iwn-te

[tʌlawm natildenʌ] ~ [tʌlaw natildenʌ]

talawn-tatilden-ta

[wawm datildenʌ] ~ [wͻwm datildenʌ]

wawn-tatilden-ta

[tolowm datildenʌ]

talown-tatilden-ta

[jatildew de] ~ [iɲatildew de] ~

[jatilde de]

jatildewn-te

[a wm datilden] ~ [atilde m datilden]

atilde wn-tatilden

[iʃɛʔ ɾʌ m datilden]

isaj-tatildewn-tatilden

[toʔkotilde datilden] ~ [t ʔkʌ datilden]

toʔkatildewn-tatilden

Eacute nosso Estaacute vivo Larva Estaacute grosso Estaacute vermelho Estaacute pronto Larva Estaacute assando no burralho

136

assimilar a nasalidade da consoante precedente 78

Se a vogal for nasal na maioria das ocorrecircncias a consoante nasal na coda seraacute apagada deixando seu tempo na vogal precedente e na consoante seguinte

Quando a coda nasal n segue ditongo formado por vogal nasal subjacente mais glide palatal j n em posiccedilatildeo de coda pode espalhar nasalidade regressiva para o glide precedente e pode ser apagada

Quando em coda nasal iraacute participar de outros processos fonoloacutegicos aleacutem da vogal precedente

Na posiccedilatildeo de siacutelaba acentuada em meio de palavra seguida por k n promove a sonorizaccedilatildeo de k e passa

a se realizar como [ʔ] oclusiva glotal

[kotilde baj te] ~ [kotildebay te]

kownpajt-te

[a ʔ n de] ~ [a n de]

a n-te

[je n datilden]

je n-tatilden

[i n datilde na ]

in-tatilden-na

[ hej ndatilden] ~ [ hej n datilden]

hejn-tatilden]

[ natildej de] ~ [ naj n de]

natildejn-te

[ atildendatilden]

atilden-tatilden

[ atilde n datilden]

atilden tatilden]

[ mɔ de] ~ [ de]

n-te

[n n de]

n n-te

Eles estatildeo correndo Ele misturou Tatu Tatu galinha Estaacute sujo Ele estaacute mamando Ele lavou Pacu Ele atirou

78

Para uma descriccedilatildeo mais detalhada sobre o comportamento de n e os glides ver a tese de

Telles 2002 55-57

137

Ainda quanto ao contexto semelhantemente descrito acima n for seguida por uma oclusiva surda homorgacircnica t poderaacute ocorrer processos que possibilitem uma alofonia em variaccedilatildeo livre

n sonoriza t

n sofre desnasalizaccedilatildeo

Quando n sonoriza a consoante seguinte ocorre a elisatildeo podendo ocorrer ou natildeo o alongamento compensatoacuterio da vogal precedente ou a preacute-nasalizaccedilatildeo da consoante seguinte

Quando n sofre elisatildeo alonga a vogal precedente e a consoante seguinte se assimila progressivamente com o traccedilo nasal passando a se realizar como [n]

n se vocaliza e recebe os traccedilos da vogal central e realiza-se nasal

Se n for seguida em coda por uma consoante nasal idecircntica ocupando a posiccedilatildeo do onset da siacutelaba seguinte poderaacute haver duas possibilidades de comportamento da coda nasal dependendo de ser a sua vogal tautossilaacutebica assimilar ou natildeo

Se a vogal precedente for nasal a coda sofreraacute elisatildeo e a vogal se alongaraacute

Se a vogal central for oral a consoante nasal da coda que precede a nasal idecircntica no onset da siacutelaba seguinte sofreraacute dissimilaccedilatildeo do traccedilo nasal79

[ natildej de] ~ [ naj n de]

natildejn-te

[ku ʔginĩ de]

ku n-kinĩn-te

[ dega tatilden]

te n-kaloh-tatilden

[ atildega ɾe]

atilden-kaloh-te

[ ku ndatildenʌ]

ku n-tatilden-ta

[ ku ddatildenʌ]

ku n-tatilden-ta

[ ku n datildenʌ] ~ [ ku datildenʌ]

ku n-tatilde-ta

[ ku natildenʌ]

ku n-tatilden-ta

Estaacute branco Bom-dia espeacutecie de aacutervore Bicho Pacu Rolo de fio de algodatildeo Roupa velha Roupa Estaacute fumando

79

A liacutengua Latundecirc eacute caracterizada pelo OCP (Princiacutepio do Contorno Obrigatoacuterio)

138

[ku datildenʌ]

ku n-tatilden-ta

[katilde na ]

katilden-na

[lidnu ɾe]

lin-nu-te

[lid na j ɾe]

lin-na jh-te

Estaacute fumando Estaacute fumando Estaacute fumando Estaacute fumando Estaacute duro Beiju de mandioca Raiz de mandioca

s - Fricativa alveolar surda

Fricativacoronal+ anterior forma siacutelaba

com as vogais i ĩ e a a atilde o uu ũ

Realiza-se como [s] [ʃ] [tʃ] [ʔs]

Em menor frequecircncia pode ser realizada como [t] e [t h]

Em siacutelaba acentuada em iniacutecio de palavras a fricativa pode se realizar

[tʃi ɾatilden] ~ [ʔsi ɾatilden]

sih-tatilden

[ ʔsitatilden] ~ [ sitatilden]

set-tan

Estaacute liso Trovejou

139

como palatal africada preacute-glotal ou como alveolar 80

Quando s se fortifica e passa a se realizar como [t] e ou como [t h] apresentam restriccedilatildeo ao contexto de vogal baixa seguinte podendo ocorrer em iniacutecio ou em meio de palavra Nestes contextos tambeacutem permanecem possiacuteveis as demais alofonias

A fortificaccedilatildeo de s eacute frequente em siacutelaba natildeo acentuada em iniacutecio de palavra Embora as siacutelabas acentuadas contenham maiores iacutendices Em posiccedilatildeo natildeo acentuada a alveolar ocorre em maior nuacutemero

A palatalizaccedilatildeo da fricativa eacute obrigatoacuteria quando precedida por i Sua realizaccedilatildeo eacute alveolar em posiccedilatildeo intervocaacutelica

[ʔsĩ du ɾatilden]

sĩn-tu-tatilden

[ʃa h ɾe] ~ [sa h ɾe]

sa h-te

[ tʃoɾatildenʌ] ~ [ ʃoɾatildenʌ]

soh-tatilden-ta

[ʃ de] ~ [s n de]

s n-te

[thathaʔi natildenʌ] ~ [ʃaʃaʔi natildenʌ]

sasan-tatilden-ta

[kejͻ ʔhe neʔt h o ɾeʔ] ~

[kejͻʔhe neʔto ɾeʔ]

keja w-haniʔ-s aw-te

[t datilde na ] ~ [t h datilde na ]

so-tatilden-na

[tʃamaj de] ~ [tamaj de] ~ [sama

de]

saman-te

[ʔʃamaʔdʌ ɾatildena]

saman-tah-tatilden-ta

[iʃatilde datilde na ]

isatilde n-tatilden-na

Estaacute arrastando Timboacute do mato Estaacute sujo Sol Estaacute mole Oacuteleo Eacute guarantatilde (espeacutecie de aacutervore) Tanajura Eacute tanajura

80

A africada eacute a mais utilizada pelos velhos enquanto a fricativa e a alveolar satildeo mais utilizadas

pelos jovens

140

[iʃu datildenʌ]

isu -tatilden-ta

[wasa h ɾe] - [wͻsa h ɾe]

wasah-te

Eacute folha Ele estaacute com frio Besouro

l- Lateral alveolar sonora

Lateral coronal + anterior

Forma siacutelaba em iniacutecio e meio de

palavras com as vogais i e a a o o

u

Fortifica-se em iniacutecio de palavras quando encontra-se na posiccedilatildeo de acento pode ser precedido por vogal aacutetona sem onset que tende a ser apagada

Diante do contexto acima realiza-se

[li tatilden]

lit-tatilden

[dale de]

tale-te

[giwla de]

kiwlah-te

[la ɾ e]

la h-te

[lo ɾatildena]

loh-tatilden-ta

[ko lo ko lo n de]

ko loʔ ko lo n-te

[toluʔ tatildena]

taluʔ-tatilden-ta

[ʔta e] ~ [da e]

la h-te

Ele saiu Embira Cobre cascavel Jacucaacuteca Estaacute comprido Pintado Ele tossiu

141

como alofones [ʔl] e [d]

Acompanhado por consoante nasal em onset silaacutebico pode assimilar progressivamente a nasalidade sendo realizado como [n]

Pode apresentar sobreposiccedilatildeo na maneira como se realizam

[t ~s ]

[t ~ n]

[n ~ l]

[t ~ l ]

[ʔlo tatilden] ~ [a tatilden]

atilde-loʔ-tatilden

[diʔ pa natildena] ~ [i iʔ pa natildena]

jaliʔ pan-tatilde-ta

[ naginila h ni ɾ atilden] ~

[ naginina h ni ɾatilden]

sapatilden-kinĩn-te

[kaas tatildena] ~ [kata tatildena]

kasaʔ-tatilden-ta

[tidit na j de] ~ [tidit ta de]

tatiʔ-najn-te

[nagatilde de] ~ [ agatilde n de]

nakatilden-te

[wota h ɾe] ~ [wola h ɾe]

wotah-te

Jacucaacuteca Ele estaacute afundado atolado Satildeo dois colares Eu natildeo sei se ele estaacute doente Taioba Estaacute grosso Mandioca mansa Lagarto do campo Pomba

142

j - Glide coronal - anterior

Eacute um glide palatal que ocupa a posiccedilatildeo de onset e de coda na siacutelaba

Em iniacutecio de siacutelaba j antecede as

vogais e e o a a atilde u u ũ

Quando em posiccedilatildeo inicial na siacutelaba e

acompanhado por e e em siacutelaba

acentuada ou seguido por a em siacutelaba aacutetona j pode se fortificar e se realizar

como [ʒ] sendo possiacutevel neste caso

ser seguido por um preacute glide [j] de fraca e raacutepida duraccedilatildeo

Quando seguido por a em siacutelaba aacutetona eacute opcional a fusatildeo entre o glide e a vogal derivando a vogal longa [i]

[je n datilden]

je n-tatilden

[ja te]

jaʔ-te

[ja te]

ja ʔ te

[jatildeʔ datilden] ~ [iɲatildeʔ datilden]

jatilden- n-tatilden

[jo ɾatilden]

joh-tatilden

[ju te]

ju-te

[ju te]

ju -rsquote

[j ginĩ de]

j n-kinĩn-te

[je natilden te] ~ [ʒe natilden te]

ja natilde-nu-te

[ j ʒe n datilden] ~ [ʒe n datilden] ~

[je n datilden]

je n-tatilden

[ʒɛge datilden] ~ [ʒɛga j datilden]

Estaacute sujo Maribondo espeacutecie Porco Vocecirc tem coragem Estaacute baixo Boca Peacute Pedra de gelo granizo Porco espinho Estaacute sujo

143

Se em posiccedilatildeo de onset e seguido de vogal nasal pode ocorrer uma consoante palatal seguindo o glide palatal e precedendo a vogal nuclear

Se for atilde a consoante intrusiva se realizaraacute com mais forccedila e separaraacute a sequecircncia jatilden em duas siacutelabas

Quando o glide vier antes da vogal ũ a consoante intrusiva poderaacute resultar no apagamento do glide podendo se realizar como consoante palatal ou preacute-glide

Em posiccedilatildeo final de siacutelabas

acompanha as vogais e e a a

jaka jn-tatilden

[inatilde de]

janatilde n-te

[jeda n de] ~ [ʒida n de] ~ [ida

n de]

jatan-te

[jatilde datilden] ~ [ iɲatildeʔ datilden]

jatilden- n-tatilden

[jatildew de] ~ [iɲatildew de] ~

[jatilde de]

jatildewn-te

[j ginĩ de] ~ [ j ɲ gibi de]

j n-kinĩn-te

[ ejdnirsquoɾatilde]

hejn-ten-ni-tatilde

[ e jtatilden]

e ʔ-tatilden

[wajkinĩ du]

wajʔ-kinĩn-tu

[na j de]

na j -te

[ natildejde]

natildejn-te

Eacute pica-pau pequeno espeacutecie Abelha do chatildeo espeacutecie veado espeacutecie Vocecirc tem coragem Larva espeacutecie Pedra de gelo granizo Eu vou lavar Ele fez fogo Amendoim

144

Maribondo espeacutecie Pacu espeacutecie de peixe

k- Plosiva dorsal - anterior

Eacute oclusiva velar surda Tem larga distribuiccedilatildeo e se realiza diante de todas as vogais do Latundecirc

Satildeo seus alofones [ʔk] [ɠ] [g] e [k]

Em iniacutecio de palavra se realiza preferencialmente como [k]

[kiliʔkinĩ de]

kiliʔ-kinĩn-te

[ki de]

ki -te

[ke ɾatildena]

keh-tatilden-ta

[ke ja ʔ n de]

ke ja jn-te

[ka ɾatildena]

kah-tatilde -ta

[ka

ka jn-te

[katilde natildena]

katilden-tatilden-ta

[ko h ɾe]

koh-te

[ko lo ʔko lo n datildeda]

ko lo ʔko lo n-tatilden-ta

Coco da palmeira inajaacute Macaco noturno Ele estaacute caccedilando Caititu Estaacute azedo Formiga Estaacute duro Tesoura

145

Em contexto de fala raacutepida em iniacutecio

de vocaacutebulos a velar preacute-glotal [ʔk]

pode ocorrer pode flutuar tambeacutem como velar plena [k]

Em mesmo contexto pode-se flutuar a velar sonora [g] ou a velar implosiva

[ɠ] ou a velar surda [k] ou a velar

surda preacute-glotalizada [ʔk]

Quando em meio de vocaacutebulo em contexto que envolve a consoante nasal lexical precedente a realizaccedilatildeo de [g] eacute categoacuterica

Entre vogais eacute possiacutevel que se encontre a variaccedilatildeo entre [k] e [g] sendo a surda a preferencial e em maior nuacutemero de realizaccedilotildees

[k n de]

k n-te

[ku n de]

ku n-te

[ʔkolo ɾe] ~ [kolo ɾe]

koloh-te

[ʔka laʔkala ɾe] ~ [ka laʔkala ɾe]

kalaʔkalaʔ-te

[golota taʔnatildena] ~

[kolota taʔ natildena]

kolon-sasan-tatilden-ta

[ gi natildena] ~ [ ɠi natildena]

ki n-tatilden-ta

[giʃaj n datildena] ~ [ɠiʃaj ndatildena] ~

[kiʃaj n datildena]

kisajn-tatilden-ta

[ atildega ɾe]

atilden-kaloh-te

[j ginĩ de]

j n-kinĩn-te

[waka de]

waka-te

Eacute pintado Timboacute do campo Algodatildeo Barata Galinha Estaacute maduro Estaacute coccedilando Estaacute pontudo Roupa

146

Em onset da siacutelaba acentuada em final de vocaacutebulo k pode se realizar [k h]

[lukaj de]

lukajn-te

[nakatilde n de] ~ [naga n de]

nakatilden-te

[ iwgula ɾatilden]

iwkulah-tatilden

[ i ʔga laʔga na ]

iʔka la n-ka-na

[ ɛtduʔ da jowi k h e ]

ajhtu ta-jaw-wi-ka

Pedra de gelo granizo Garccedila Flecha Lagarto Ele subiu Eles estatildeo brincando Pega (o banco) vamos sentar

- Plosiva glotal - anterior

Eacute uma oclusiva glotal surda com

realizaccedilatildeo [ʔ] que se restringe agrave

posiccedilatildeo de coda silaacutebica81

Tem seu comportamento condicionado pela presenccedila das consoantes adjacentes p t k

Pode se realizar como [ʔ] em fala

raacutepida preceder a oclusiva velar surda k

Como [j] quando a vogal nuclear for a meacutedia frontal e ou a baixa a

Como [w] quando a vogal nuclear for a meacutedia posterior o

[huʔ kaʔ datilden] ~ [ kaʔ datilden]

huʔ-kah-tatilden

[kidiʔka tatilden]

kitiʔ-kah-tatilden

[ atilde ʔ tatilden] ~ [ atilde tatilden] ~

[malo h tatildeni]

atilden-loʔ-tatilden

Eacute arco Eacute furador Ele queimou

81

A entre l e s natildeo foi observada na liacutengua Latundecirc

147

E favorecer a deleccedilatildeo de motivando um alongamento que compensa a vogal nuclear ou alongar ainda alongar esta vogal seguindo de leve aspiraccedilatildeo

A realizaccedilatildeo de [ʔ] nas alofonias

acima soacute eacute notada quando na siacutelaba na qual estaacute presente quando apenas a oclusiva estiver no travamento

silaacutebico (CVʔ)

Quando em posiccedilatildeo de coda pode assimilar o ponto da consoante seguinte e se realizar como [t] ou [d] diante de tnl e [p] ou [b] diante de m Neste caso as realizaccedilotildees homorgacircnicas surdas satildeo sempre preferenciais

[wolo te] ~ [woloʔ te]

woloʔ-te

[ej tatilden] ~ [e tatilden]

eʔ-tatilden

[wajkinĩ de]

wajʔ-kinĩn-te

[loʔ tatilden] ~ [ tatilden] ~ [ wtatilden]

loʔ-tatilden

[tidit na jdatilde na ]

tatiʔ-na jn-tatilden-na

[wa jtna de]

wa jh-na n-te

[at natilde da na]

a ʔnatilde n-tatilden-ta

[a p otildedatildena] ~ [a b otildedatildena]

a ʔ n-tatilden-ta

Espeacutecie de paacutessaro Ele ralou Amendoin Ele afogou Eacute raiz de mandioca Palha da palmeira accedilaiacute Ele estaacute chorando muito Ele estaacute muito bonito

h- Fricativa glotal - anterior

Eacute fricativa glotal surda que em iniacutecio de

siacutelaba ocorre com as vogais i e a a

o u

Quando em iniacutecio de palavra e em siacutelaba acentuada seguida de i realiza-

se como [ʒ]

Quando entre vogais realiza-se como

[hu te] ~ [hu h de]

huʔ-te

[hej de]

hejn-te

Arco Buriti

148

fricativa glotal sonora [ɦ]

Se vier em iniacutecio de palavra em fala raacutepida e em raiacutezes dissilaacutebicas na posiccedilatildeo de onset de siacutelaba natildeo acentuada poderaacute ser apagado

Quando em onset de siacutelaba acentuada acompanhada de consoante nasal assimila a nasalidade da consoante

adjacente sendo realizada como [n ]

Em final de siacutelaba eacute produzido com pouca fricccedilatildeo Em coda acentuada motiva o alongamento da vogal com frequecircncia como resultado teremos uma vogal com leve aspiraccedilatildeo

Demais realizaccedilotildees de h em coda tendem a seguir o comportamento da

oclusiva glotal ʔ

[hata tatilden]

hat-ta-tatilden]

[ha de]

ha n-te

[hoɦo h de]

hohoʔ-te

[hi ɾ e] ~ [ʒi ɾe]

hih-te

[hiwa n de] ~ [iwa n de]

hiwan-te

[ e ĩ n de] ~ [e ĩ n de]

e ĩ n-te

[ɛ hejdn a ]

ajhhejn-ha

[o h datildeda]

o hna-tatilden-ta

[ lo h tatilde na ]

loh-tatilden-na

[ʃi h ɾe]

sih- te

[ke h atilden] ~ [ke atilden]

Eu natildeo tenho Caraacute Espeacutecie de coruja Pau lenha Gambaacute Couro Vamos lavar (algo) Estaacute alto Eacute onccedila

149

keh-tatilden

[nakadʔnatilde na ]

naka natilde n-na

[ka ɾatilden]

kah-tatilden

[naw ɾe] ~ [nͻ e]

na wh-te

[wede e] ~ [wede ʔ ɾe]

wate h-te

[sej ɾatilde]

sih-tatilden

Casa Ele caccedilou Ela ainda estaacute chorando Estaacute azedo Lontra Espeacutecie de tamanduaacute Eacute largo

Quadro 13 Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos orais (Com base em Telles 2002)

i - vogal alta frontal e i - vogal alta

frontal laringal

Realiza-se como [i] e [i ] podem ser

nuacutecleo de siacutelaba e podem tambeacutem iniciam palavras

i segue qualquer consoante enquanto

i ocorre apenas apoacutes as consoantes

m k h

Quando a coda eacute apagada realiza-se como [i] compensando tal apagamento

[ iɾatilden]

i-tatilden

[i n datildenʌ]

i n-tatilden-ta

[giw lada ɾe] ~ [gi la de]

kiwlah-tah-te

Ele mordeu Estaacute quente Cobra cascavel espeacutecie de cobra

150

e - vogal meacutedia frontal e e - vogal

meacutedia frontal laringal

Realizam-se como [e] e [e ] e correm em

iniacutecio de palavras

Quando seguem consoantes natildeo se realizam apoacutes pmn

Tambeacutem natildeo foram detectadas diante de s l h

Ao serem seguidos pelo glide palatal j favorecem a fusatildeo entre as vogais e o

glide realizando-se como [i] e [i ]

O alongamento tambeacutem se daacute em casos de queda de coda

Em siacutelaba aacutetona de morfemas dissiacutelabos poderaacute ocorrer harmonizaccedilatildeo entre a vogal meacutedia frontal e a vogal tocircnica mais alta da siacutelaba seguinte

Pode ocorrer harmonizaccedilatildeo entre a vogal da raiz lexical e a vogal do sufixo classificatoacuterio

[e ɾatilden]

e-tatilden

[ etatilden]

e ʔ-tatilden

[ sejtatilden] ~ [sitatilden]

set-tatilden

[ weʔkinĩde] ~ [ wiʔkinĩde]

wet-kinĩn-te

[kenĩ de] ~ [kinĩ de]

kanĩn-te

Ele viu Ele fez fogo Ele falou Crianccedila Esquilo

a - vogal baixa central e a - vogal

baixa central laringal

A vogal baixa central a apresenta larga distribuiccedilatildeo e segue qualquer consoante e os dois glides

A vogal baixa central laringal segue quase todas as consoante e dos dois glides

Ambas iniciam palavras e apresentam

vaacuterias alofonias [a] [ʌ] [ͻ] [o] [u] [e]

[ɛ] [aelig] e [i] que podem ser ou natildeo

laringais dependendo da vogal subjacente e da condiccedilatildeo do tom e da harmonia vocaacutelica

Quando em siacutelaba tocircnica a se realiza como [a] [ͻ] e [ͻ]

[ͻ] pode ocorrer quando o nuacutecleo vocaacutelico a assimila o traccedilo labial da coda tautossilaacutebica de w

A segunda variaccedilatildeo [ͻ] resulta da fusatildeo

[a h ɾe]

ah-te

[awde] ~ [ͻ de] ~ [ͻʔ de]

awh-te

[ a wde] ~ [ ͻde] ~ [ ͻʔde]

a w-te

[a wm de] ~ [ ͻ m de] ~ [ͻ m de]

a wn-te

Espeacutecie de abelha Gaviatildeo Flecha Louro

151

entre o nuacutecleo a e a coda w

O alongamento da vogal nuclear ou da coda eacute necessaacuterio agrave preservaccedilatildeo do peso silaacutebico para a aposiccedilatildeo do acento

Em siacutelaba tocircnica se a a eacute seguida por j na coda (nuacutecleo do ditongo) pode se

realizar como [a] [ɛ] [ɛ] e [aelig]

Em siacutelaba aacutetona a realiza-se como [ʌ] preferencialmente

Quanto em posiccedilatildeo aacutetona a se harmoniza com a vogal tocircnica da siacutelaba seguinte quando esta for meacutedia ou alta

As realizaccedilotildees provenientes dessa harmonia vocaacutelica satildeo as vogais [ieou]

O processo de assimilaccedilatildeo pode ocorrer em iniacutecio de siacutelaba aacutetona fazendo com que a se realize como [ͻ] a partir de segmento adjacente seja tautossilaacutebico ou natildeo

[ ajɾatildena] ~ [ ɛatildena]

ajh-tatilden-ta

[a j ɾatilden] ~ [aelig ɾatilden] ~ [ɛ ɾatilden]

a jh-tatilden

[ a j atilde m datilden] ~ [ aelig ʔatildem datilden]

a jn atilde wn-tatilden

[ͻ ɾaʔͻɾaʔi datildenʌ] ~

[ͻ ɾɛʔͻɾɛʔi datildenʌ]

watajwatajn-tatilden-ta

[wͻdaʔ nde] ~ [wadaʔ nde]

watan-te

[i n dacircnʌ]

i n-tatilden-ta

[tʌlawm natildenʌ]

talawn-tatilden-ta

[kimi ɾatildena] ~ [kͻmi ɾatildena]

kamih-tatilden-ta

[walin de] ~ [weli de]

walin-te

[tʌlow natildena] ~ [tolow natildenʌ]

talown-tatilden-ta

[tunu ratildeni]

tanũh-tatilden

Eacute roccedila Ele foi Ele assou peixe Eacute fino Panela Estaacute quente Estaacute grosso Estaccedilatildeo seca Tamanduaacute

152

Devido agrave labializaccedilatildeo de a a realizaccedilatildeo resultante sofre assimilaccedilatildeo de palatalizaccedilatildeo altura de glide precedente ou se funde quando o glide eacute tautossilaacutebico e ocupa onset de siacutelaba em que a eacute a vogal nuclear

[kʌmaʔ matilde n de] ~

[kͻmaʔ matilde n de]

kama-matilden-te

[ͻ ɾaʔͻɾaʔĩ datildenʌ] ~

[ͻ ɾɛʔͻɾɛʔĩ datildenʌ]

watajwatajn-tatilden-ta

[wada n de] ~ [wͻda n de]

watan-te

[jeda n de] ~ [ʒida n de] ~

[ida n de]

Estaacute terminado Ele deu Borboleta Eacute fino Panela cabaccedila Espeacutecie de veado

o - vogal meacutedia fechada posterior e

o - vogal meacutedia fechada laringal

Realizam-se [o] e [o ] respectivamente

Natildeo se realizam apoacutes as consoantes nasais mn

o soacute foi realizada apoacutes as consoantes

t l k

Ambas podem ser realizadas em iniacutecio de vocaacutebulo

As realizaccedilotildees [o] e [o ] satildeo resultados

do alongamento compensatoacuterio que provem da delaccedilatildeo de coda

[o ɾatilden]

oh-tatilden

[o te]

o h-te

[ko n de] ~ [kow n de]

kon-te

Ele misturou massa Macuco Espeacutecie Jabuti

u - vogal alta posterior e u - vogal

alta posterior laringal

Apresentam larga frequecircncia nas realizaccedilotildees

u segue qualquer consoante

[ke ju ɾe]

kejuh-te

Macaco da noite

153

u ocorre apoacutes m n s k j

Ambas iniciam palavras

As realizaccedilotildees alongadas [u] e [u ] satildeo

provenientes de alongamento compensatoacuterio quando a coda eacute elidida

[ku n datildenʌ] ~ [ku datildenʌ]

ku n-tatilden-ta

Ele estaacute fumando

Quadro 14 Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos nasais (Com base em Telles 2002)

ĩ - vogal nasal alta anterior

Sua ocorrecircncia soacute fora verificada a partir do comportamento do morfema ĩ- que eacute uma raiz lexical semanticamente vazia prefixada a morfemas classificadores nominais para funcionar como nuacutecleo nominal

A subjacecircncia de ĩ- sem coda nasal pode ser evidenciada na sonorizaccedilatildeo opcional da oclusiva velar k e no natildeo alongamento da vogal ĩ

[ ĩkalo ɾe] ~ [ ĩgaloɾe]

ĩ-kaloh-te

Taacutebua

atilde - vogal nasal baixa

Eacute encontrada a partir do condicionamento morfoloacutegico no prefixo verbal atildel-

Este prefixo tem valor causativo resultativo

Quanto agrave subjacecircncia de atilde pode-se interpretar que a realizaccedilatildeo do morfema agentivo [atildel- atilde-] estaacute condicionada ao segmento inicial da raiz lexical a qual o prefixo se apotildee

[atildelͻwtatildenʌ] ~ [ a lͻtatildenʌ]

atildel-awt-tatilden-ta

[atilde laj n datildenʌ] ~ [a laj n datildenʌ]

atildel-ajn-tatilden-ta

[atildelo tatildenʌ] ~ [alo tatildenʌ]

atildel-loʔ-tatilden-ta

[atildemũmaj na ]

atildel-mumaʔ-na

[ũba tatildenʌ] ~ [atildeba tatildenʌ]

atildel-pat-tatilden-ta

[ natildej de] ~ [ naj n de]

natildejn-te

Estaacute foi quebrado (algo) Estaacute foi cortado (algo) Estaacute foi afundado (algo) Estaacute foi amansado (algo) Estaacute foi colocado (algo)

154

Quando a raiz verbal eacute iniciada por vogal a forma sobrejacente eacute [atilde-] quando a raiz verbal eacute iniciada por vogal a forma sobrejacente eacute [atildel-]

Outra forma de ocorrecircncia da vogal atilde eacute confirmada na base do contraste entre os ditongos orais aj aw e nasais atildej atildewmesmo quando seguidos por coda nasal formando as sequecircncias ajn awn atildejn atildewn

[ aj n datildeni] ~ [ aj n datildeni]

ajn-tatilden

[jatildewm de] ~ [jatildemde]

jatildewn-te

[wawm datildena] ~ [wͻwm datildena]

wawn-tatilden-ta

Pacu espeacutecie de peixe Ele cortou (algo) Espeacutecie de larva Estaacute vermelho amarelo

ũ - vogal nasal alta posterior

Observada a partir da construccedilatildeo interna e comportamento do morfema prefixal nũh - possessivo de 1pp e de seu homoacutefono nũh - verbo adjetival estar soacute

Quanto agrave subjacecircncia de u eacute observada quando a coda fricativa glotal eacute ressilibificada ao se afixar agrave raiz iniciada por vogal ou glide

[ nũhju te]

nũh-ju -te

[ nũhaj ɾatilden]

[nũhajh-oslash-tatilden

Nossos peacutes Ele vai sozinho

54 FONOLOGIA DO PORTUGUEcircS

Diferentemente do Latundecirc o sistema fonoloacutegico do portuguecircs eacute formado

conforme Cacircmara Jr (1970 p33 ndash 34) por sete vogais que se mantecircm na

mesma quantidade em posiccedilatildeo tocircnica que satildeo reduzidas a cinco quando em

posiccedilatildeo tocircnica diante de nasal em posiccedilatildeo pretocircnica em posiccedilatildeo postocircnica natildeo-

final e em postocircnica final

Quadro 15 Vogais no Portuguecircs (Cacircmara Jr 1970)

Natildeo-arredondadas Arredondadas

Altas i u

Meacutedias Altas e o 2ordm Grau

155

Meacutedias Baixas ɛ ɔ 1ordm Grau

Baixa a

Anterior Central Posterior

Quanto aos segmentos consonantais o portuguecircs dispotildee de acordo com Lopez

1979 p5482 de vinte e dois fonemas que ocupam as posiccedilotildees de onset e coda

Os segmentos consonantais satildeo classificados quanto ao modo e ao ponto de

articulaccedilatildeo

Os segmentos consonantais do portuguecircs ainda podem ser influenciados por

articulaccedilotildees secundaacuterias labializaccedilatildeo palatalizaccedilatildeo velarizaccedilatildeo e dentalizaccedilatildeo

Quadro 16 Consoantes no Portuguecircs (Silva 2002)

Articulaccedilatildeo

Bilabial Labiodental Dental ou alveolar

Alveopalatal Palatal Velar Glotal

Oclusiva p b t d k g Africada tʃ dʒ

Fricativa f v s z ʃ ʒ X Ɣ h ɦ

Nasal m n ɲ y

Tepe ɾ

Vibrante ř

Retroflexa ɹ

Lateral l ɫ ʎ l j

82

Apud Bisol 1996 p198

156

55 COMPARACcedilAtildeO ENTRE OS SISTEMAS FONEacuteTICOS DO PORTUGUEcircS E

DO LATUNDEcirc

Passemos entatildeo agrave comparaccedilatildeo ds sistemas fonoloacutegicos do Portuguecircs e do

Latundecirc para melhor compreensatildeo dos processos foneacuteticos oriundos desse

contato

Quadro 17 Sistemas consonantais x Sistemas vocaacutelicos

Consoantes Vogais

Portuguecircs p b m w t d s z l j n f v ɾ k g h ɹ ɲ ʎ X a ɛ e i ɔ o u

Latundecirc p m w t s l j n k h a atilde a a e e i i i i o o u u u u

Como podemos perceber as liacutenguas apresentam padrotildees distintos no que tange

agrave quantidade de segmentos consonantais e de segmentos vocaacutelicos O portuguecircs

eacute uma liacutengua com mais consoantes enquanto o Latundecirc eacute uma liacutengua

extremamente vocaacutelica

No que tange aos fonemas consonantais o Latundecirc natildeo apresenta muitos dos

fonemas vozeados que compotildeem os pares miacutenimos aleacutem das labiodentais [f v]

Tambeacutem natildeo apresenta as fricativas alvopalatais [ʃ ʒ] nem as palatais nasal e

lateral [ɲ ʎ]

O portuguecircs natildeo dispotildee de vogais laringais enquanto o Latundecirc tem o seu

inventaacuterio basicamente composto por elas

157

A disposiccedilatildeo e presenccedila desses elementos tecircm uma ligaccedilatildeo direta com os

processos fonoloacutegicos ocorrentes o portuguecircs resultante do contato do Portuguecircs

com o Latundecirc como veremos no capiacutetulo VI

158

6 PROCESSOS FONOLOacuteGICOS NO PORTUGUEcircS FALADO PELOS LATUNDEcirc

ldquoComo a liacutengua estaacute a todo momento se equilibrando entre

tendecircncias potencialmente conflitantes e ateacute mesmo opostas estaacute sujeita a sofrer mudanccedilas pois esse equiliacutebrio pode vir a ser alterado por qualquer tipo de fator interno ou

externordquo Chagas (2004 p 151)

61 INTRODUCcedilAtildeO

Eacute senso comum entre os estudiosos que as liacutenguas mudam em diversos

aspectos Certamente a variaccedilatildeo e a mudanccedila lhes satildeo inerentes conforme

Cezario amp Votre (2008 p 141)

Em face da mudanccedila a assertiva acima abarca um conjunto de motivaccedilotildees

internas a uma dada liacutengua bem como outras decorrentes de forccedilas externas em

que se inserem aquelas oriundas do contato linguiacutestico Isso nos chama a

atenccedilatildeo para o fato de que aleacutem do fator tempo outros aspectos podem estar

diretamente ligados agraves transformaccedilotildees pelas quais uma liacutengua passa

A forma como as mudanccedilas sonoras operam na liacutengua eacute tema de discussatildeo haacute

seacuteculos Sobre essa temaacutetica Labov (1981 p269) nos diz que

Sound change appears to be systematic in that a particular change affects all eligible words in a lexicon (McMahon 1994) It is not known however how this process takes place A group of 19th century German linguists called the Neogrammarians originally proposed that sound change occurs abruptly across the lexicon This view is still accepted by many linguists (eg Hock 1991 Labov 1994) In contrast others have argued that sound change spreads gradually across the lexicon (eg Chen amp Wang 1975 Krishnamurti 1978) The same language data is sometimes used to support each hypothesis For instance the

159

English Great Vowel Shift which brought about a series of vowel changes in Early Modern English is used as an example of gradual change (Ogura 1987 Aitchison 1991) as well as abrupt change (Hock 1991 Labov 1994) So the argument over whether sound change occurs abruptly or gradually presents a paradox ldquoboth (views) are right but both cannot be right 269)rdquo

A discussatildeo acerca da natureza da mudanccedila sonora no sentido das duas visotildees

pontuadas acima ainda alcanccedila uma dimensatildeo mais larga quando o contato

intersocietaacuterio eacute considerado As implicaccedilotildees que a variaccedilatildeo assume quando a

emergecircncia das escolhas linguiacutesticas envolve o impacto das interaccedilotildees entre

liacutenguas satildeo multifatoriais Devido agrave complexidade das transformaccedilotildees linguiacutesticas

natildeo podemos estabelecer um uacutenico molde para explicar estas modificaccedilotildees haja

vista que cada caso eacute particular quando tratamos de mudanccedila linguiacutestica

Como fora tratado no capiacutetulo sobre Contato linguiacutestico o encontro de duas ou

mais liacutenguas pode resultar ou natildeo em outras liacutenguas O niacutevel de interferecircncia

oriundo do contato pode fazer com que uma das liacutenguas desapareccedila o que

ocasionaria a sua morte e geralmente neste caso sobreviveria a liacutengua do

dominador ou a permanecircncia dos dois coacutedigos linguiacutesticos tal qual ocorre entre

os Latundecirc

A complexidade da fusatildeo de duas liacutenguas desencadeia por si soacute uma seacuterie de

processos que perpassa os diferentes niacuteveis da gramaacutetica No entanto eacute no niacutevel

foneacutetico fonoloacutegico que estes processos satildeo provavelmente mais evidentes e

mais frutiacuteferos Sendo assim podemos afirmar que os niacuteveis foneacuteticos e

fonoloacutegicos apresentam o maior iacutendice de mudanccedila e variaccedilatildeo de uma liacutengua Por

outro lado de acordo com Cavaliere (2005 p 56)

160

Os estudos desses processos nos auxiliam enquanto estudiosos da liacutengua a entender como se comporta a mudanccedila da liacutengua mediante verificaccedilatildeo dos fatos ocorridos no passado que se mantecircm no presente bem como os que natildeo mais se manifestam as mudanccedilas dos sons nos usos hodiernos

A anaacutelise realizada dos processos fonoloacutegicos do Portuguecircs falado pelos Latundecirc

teraacute como base a estrutura silaacutebica do Portuguecircs e do Latundecirc Para a anaacutelise

consideramos uacutetil adotar a classificaccedilatildeo tradicional dos processos focircnicos

encontrados na linguiacutestica histoacuterica (HOCK1991) por nomear em detalhe os

variados tipos de processos observados Aleacutem disso nos pautamos nos trabalhos

de Spencer (1996) e Lass (2000) que associam reflexotildees mais abstratas para

explicar as ocorrecircncias encontradas Esclarecemos que natildeo eacute nosso propoacutesito

realizar uma anaacutelise fonoloacutegica per si Neste trabalho partimos da descriccedilatildeo dos

processos fonoloacutegicos operantes a fim de refletir sobre o resultado do contato

linguiacutestico de uma liacutengua minoritaacuteria (o Latundecirc) com uma liacutengua

sociohistoricamente dominante o portuguecircs e avaliar o papel da marcaccedilatildeo

linguiacutestica no contexto da interferecircncia Os dados como jaacute afirmamos fazem

parte do acervo do NEI (Nuacutecleo de Estudos Indigenistas) da UFPE

Para uma melhor compreensatildeo a anaacutelise dos fenocircmenos observados segue

distribuiacuteda em quatro subgrupos que evolvem os processos foneacutetico-fonoloacutegicos

observados i) perda de elementos ii) ganho iii) alteraccedilatildeo (transposiccedilatildeo ou

permuta) que estatildeo diretamente ligados aos processos fonoloacutegicos de

assimilaccedilatildeo (progressiva e regressiva) fortalecimento leniccedilatildeo apagamento

inserccedilatildeo e coalescecircncia A classificaccedilatildeo desses processos nos remete agrave

termonoligia claacutessica da linguiacutestica de base

161

611 Perda de elementos

Seguindo a tendecircncia das liacutenguas do mundo os processos que envolvem perda

de elementos tambeacutem satildeo os mais recorrentes no portuguecircs falado pelos

Latundecirc Dessa feita estes processos satildeo os que tecircm uma relaccedilatildeo direta com a

estrutura silaacutebica do Portuguecircs que se vecirc obrigada a rearranjar os componentes

da siacutelaba para o padratildeo (CV)

Quanto agrave marcaccedilatildeo o portuguecircs assimilado pelos Latundecirc nem sempre tende a

preservar os padrotildees mais marcados de sua liacutengua conforme descriccedilatildeo nos

processos que se seguem

6111 Monotongaccedilatildeo

Assim como no Portuguecircs a monotongaccedilatildeo eacute um processo natural e bastante

atuante no Latundecirc que eacute uma liacutengua propensa a tal fenocircmeno Eacute uma tendecircncia

geral observada na produccedilatildeo da fala da comunidade Latundecirc verifica-se que os

ditongos crescentes e decrescentes estatildeo sendo frequentemente fusionados

realizando-se como monotongos (TELLES 2002 p100 - 102)

Quanto aos ditongos crescentes Telles (idem p 103) afirma que a tendecircncia ao

processo de monotongaccedilatildeo em ditongos crescentes eacute quase categoacuterica nas

siacutelabas aacutetonas de raiacutezes dissilaacutebicas quando a vogal nuclear eacute a central baixa a

Outros aspectos observados pela autora que fazem menccedilatildeo agrave monotongaccedilatildeo

apontam que a geraccedilatildeo poacutes-contato realizam sistematicamente e com frequecircncia

162

a fusatildeo entre os ditongos decrescentes Os ditongos aw a w aj a j satildeo os que

mais regularmente sofrem processo dos quais decorrem as realizaccedilotildees meacutedias

baixas [ɔ ɔ ɛ ɛ ] que natildeo fazem parte do inventaacuterio fonoloacutegico das vogais do

Latundecirc

Os ditongos iw ow que ocorrem em menor frequecircncia satildeo mais marcados

Nestes a monotongaccedilatildeo se daacute com a preservaccedilatildeo da vogal do nuacutecleo i o O

ditongo e j apresenta pouquiacutessimos casos de fusatildeo mantendo a qualidade do

glide diferentemente dos demais ditongos que satildeo constituiacutedos por vogais natildeo

baixas Sua realizaccedilatildeo seraacute a vogal alta anterior [i]

Apresentamos abaixo os dados apresentados por Telles (idem 101) onde os

resultados foneacuteticos do processo de monotongaccedilatildeo satildeo mais frequentes

Quadro 18 Resultado mais frequente do processo de monotongaccedilatildeo em Latundecirc

Em tritongos a fusatildeo eacute mais frequente quando o glide labial w preenche a

posiccedilatildeo da coda diferentemente da palatal j que pouco se fusiona Nos dois

casos a fusatildeo se daacute apenas com o apagamento do glide poacutes-nuclear

aw gt ɔ [lsquoɔɾe] rsquoawh-lsquote Gaviatildeo

a w gt ɔ [ɔ rsquode] a w-lsquote Fleche

aj gt ɛ [ɛrsquoɾatildena] ajh-lsquotatilden-ta eacute roccedila

aj gt ɛ [ɛ rsquoɾatildena] rsquoa jh-lsquotatilden-ta ele tem andado

iw gt i [lsquogilade] rsquokiwlah-lsquote cobra cascavel

ow gt o [torsquolodatildena] tarsquolown-lsquotatilden-ta ele tem terminado

163

No que se refere ao comportamento de ditongos decrescentes diante de

consoante nasal tautossilaacutebica podem ocorrer diferentes manifestaccedilotildees de

superfiacutecie a depender do ponto do glide Se os ditongos decrescentes terminarem

com glide laacutebio-dorsal w e seguidos por elemento nasal tautossilaacutebico awn a wn

atildewn own apagaratildeo o glide da coda e a vogal nuclear preservaraacute o ponto de

articulaccedilatildeo

Caso o ditongo seja oral a realizaccedilatildeo preferencial seraacute a da manutenccedilatildeo do

ditongo com o glide ocorrendo na superfiacutecie Se o ditongo for nasal o glide pode

ser nasalizado regressivamente Todavia a realizaccedilatildeo preferencial seraacute o glide

Em preferecircncia o glide j eacute mantido conservando sua palatalidade em ditongos

decrescentes que terminam com o glide j constituindo os ditongos ajn a jn atildejn

jn

Os glides wj na posiccedilatildeo de onset podem ser consonantizados O glide j natildeo se

apresenta como fator motivador para este processo Nos poucos casos

apresentados a vogal nuclear eacute a anterior e ou a central a

De acordo com a literatura existente para o Portuguecircs a monotongaccedilatildeo se aplica

a todos os ditongos Entretanto alguns contextos licenciam o processo enquanto

outros o bloqueiam No portuguecircs falado pelos Latundecirc os ditongos decrescentes

orais83 assim como no portuguecircs de longe foram os mais monotongados Aleacutem

destes o ditongo nasal decrescente [atildew] tanto em final de verbos quanto de

nomes mostrou-se recorrente na reduccedilatildeo

83

[aj][ aw] [ej] [ew] [ow] [oj]

164

Enquanto processo natural a monotongaccedilatildeo no portuguecircs falado por Latundecirc

visa simplificar os padrotildees silaacutebicos mais marcados sobretudo na posiccedilatildeo final de

vocaacutebulos jaacute que no Latundecirc natildeo haacute a ocorrecircncia deles

Esclarecemos que os processos observados na fala dos Latundecirc que tambeacutem

ocorrem no portuguecircs atual natildeo foram incluiacutedos nos dados discutidos neste

capiacutetulo ressalvando-se situaccedilotildees nas quais eram necessaacuterios agraves nossas

reflexotildees

De acordo com os exemplos

acima o processo de

monotongaccedilatildeo pode se dar de

duas formas i) apagamento

de um segmento geralmente

o glide ii) fusatildeo de elementos

Os ditongos mais propensos agrave

monotongaccedilatildeo satildeo os

decrescentes Quanto agraves classes de palavras os ditongos presentes nas formas

verbais satildeo mais frequentemente monotongados

No portuguecircs o processo de monotogaccedilatildeo eacute operante porem haacute restriccedilotildees que

natildeo coincidem com o observado na fala dos Latundecirc Bisol (2001 p 112) afirma

(1) [keme] queimei (2) [satildersquogɾaɾi] sangraram

[firsquokaɾi]

ficaram

(3) [fakotilde] facatildeo [motilde] matildeo [koɾasotilde] coraccedilatildeo

[gɾatildedotilde] grandatildeo

[tubaɾotilde]

tubaratildeo

(4) [kaze]

causa

(5) [note]

noite

(6) [lsquotaba] taacutebua (7) lsquomatildeoslash matildersquodava matildee mandava

165

que apenas os ditongos decrescentes satildeo verdadeiros Os crescentes de acordo

com ela seriam falsos pois podem ser realizados como hiato e tecircm variaccedilatildeo livre

Aleacutem disso com respeito aos ditongos decrescentes a autora ainda considera

que haacute dois diferentes tipos de ditongos um considerado pesado que natildeo sofre

reduccedilatildeo (leite) e outro leve passiacutevel de reduccedilatildeo (couro) Ela elenca alguns

ambientes que condicionam a monotongaccedilatildeo como a presenccedila da tepe ou da

palatal em posiccedilatildeo seguinte

Entretanto os dados de (1) a (7) acima nos mostram ocorrecircncias da

monotongaccedilatildeo em contextos muito distintos do que ocorre em Portuguecircs Sobre

estes avaliamos sua ocorrecircncia como segue

Quando em final de vocaacutebulos principalmente nas formas verbais do passado

simples conforme visto em (2) o que ocorre natildeo eacute um fenocircmeno de

monotongaccedilatildeo em que se espera o apagamento de um dos segmentos ou a

fusatildeo dos formadores do ditongo Nos dados em (2) entretanto encontra-se a

substituiccedilatildeo do ditongo por um segmento que articulatoriamente natildeo deriva da

estrutura lexical A vogal anterior com traccedilo de ponto coronal84 realizada em

[firsquokaɾi] ldquoficaramrdquo [satildersquogɾaɾi] ldquosangraramrdquo ocorre em posiccedilatildeo aacutetona final Essa

realizaccedilatildeo pode ser decorrente do espraiamento da coronalidade da consoante

precedente Outros aspectos de relevo para explicar esse fenocircmeno satildeo a

posiccedilatildeo final dos segmentos e a atonicidade Esses condicionantes favorecem a

substituiccedilatildeo total do ditongo nasal para a vogal anterior alta Essa produccedilatildeo eacute

84

Assumimos largamente neste trabalho a terminologia da fonologia claacutessica estrutural (GLEASON 1969) Entretanto termos mais teacutecnicos provenientes da teoria dos traccedilos distintivos (JAKOBSON 1952 CHOMSKY e HALE 1968) satildeo introduzidos quando favorecem a elucidaccedilatildeo dos fatos Da mesma forma ocasionalmente nos referimos a processos ancorados na fonologia poacutes-gerativa (CLEMENTS e HUME 1995)

166

restrita agrave fala dos indiacutegenas da geraccedilatildeo preacute-contato que adquiriram o portuguecircs

pelo menos no iniacutecio da idade adulta

A relevacircncia da tonicidade tambeacutem se evidencia nos dados em (3) Nesses casos

([fakotilde] ldquo facatildeordquo [lsquomotilde] ldquomatildeordquo [koɾasotilde] ldquocoraccedilatildeordquo) apesar de o ditongo nasal atildew

sofrer a fusatildeo passando a ser realizado [otilde] a posiccedilatildeo do acento preserva a

identidade de parte da estrutura nasalizaccedilatildeo e posteriorizaccedilatildeo com

arredondamento A tendecircncia aacute preservaccedilatildeo da estrutura tambeacutem eacute encontrada

no dado em (1) A monotongaccedilatildeo na siacutelaba tocircnica preserva a qualidade da vogal

nuclear em [kersquome] ldquoqueimeirdquo

O Latundecirc evita coda Esse comportamento se alinha agrave ideia de que The CV

syllable is a prototypical example widely considered to be the universally

unmarked syllable type (HUME 2004)

A monotongaccedilatildeo do ditongo nasal atildej em matildej gt matilde natildeo eacute encontrado

regularmente na fala latundecirc Esse fenocircmeno deve ter sido engatilhado pela

juntura externa na qual se observa que a siacutelaba da palavra seguinte conteacutem

sequecircncia focircnica semelhante agrave da siacutelaba que sofreu supressatildeo da semivogal

Um mesmo ditongo pode ou natildeo apresentar diferentes realizaccedilotildees em cada

liacutenguas Por exemplo os ditongos aw atildew aj atildej que existem tanto no Latundecirc

quanto no Portuguecircs se comportam da seguinte forma

Quadro 19 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Latundecirc

aw ɔ [lsquoɔɾe] ˈawh-te lsquogaviatildeorsquo

atildew atildew ~ AM [ˈjatildewmde] ~ [ˈjatildemde] ˈjatildewm-te lsquolarvarsquo

aj ɛ [єrsquoɾatildena] ˈajh-ˈtatilden-ta lsquoeacute roccedilarsquo

atildej atildej ~ atildej [ˌatildejˈdatildeni] ~ [atildejndatildeni] ˈatildejn-tatilden lsquoele cortoursquo

167

Quadro 20 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Latundecirc

aw aw [lsquopaw] pau lsquopaursquo atildew otilde [ˈsotilde] satildew lsquosatildeorsquo atildew i [satildeˈgɾaɾi] sangɾaɾatildew lsquosangraratildeorsquo

atildej atildej [ˈmatildej] matildej lsquomatildeersquo

aj aj [ˈpaj] pai lsquopairsquo

Os ditongos aw em posiccedilatildeo do acento resultam nas vogais meacutedias baixas ɔ e

ɛ no proacuteprio Latundecirc mesmo sendo essas vogais mais marcadas e natildeo

fonoloacutegicas na liacutengua Entretanto no portuguecircs esses ditongos natildeo sofrem

processo de fusatildeo quando ocorrem em siacutelaba tocircnica

A uacutenica vogal nasal constatada na reduccedilatildeo do ditongo eacute [otilde] resultante do ditongo

decrescente nasal atildew Neste caso eacute proacutepria vogal nasal que favorece a vogal

resultante da fusatildeo

Diferentemente do Portuguecircs em Latundecirc os ditongos natildeo se realizam em fim de

vocaacutebulos Desta forma o Portuguecircs falado por Latundecirc tende a seguir o que eacute

posto no Portuguecircs utilizando as vogais menos marcadas [satildegɾaɾɪ] ~ sangraram

[desaɾƱ] ~ deixaram

O que podemos verificar quanto agrave monotongaccedilatildeo eacute que em termos gerais o

Latundecirc natildeo transfere os traccedilos e caracteriacutesticas mais marcadas na liacutengua para o

Portuguecircs falado por eles

168

6112 Siacutencope em onset complexo de l e ɾ

A reduccedilatildeo do onset complexo em Portuguecircs falado pelos Latundecirc eacute um processo

muito comum que se daacute devido a natildeo aceitaccedilatildeo de um segundo elemento no

onset Como podemos observar eacute um processo variante que estaacute atrelado agrave

reorganizaccedilatildeo da siacutelaba e que eacute passiacutevel de sistematicidade

De acordo com Telles (2002 p105) a estrutura silaacutebica do Latundecirc permite a

composiccedilatildeo de seis padrotildees V VC VCC CV CVC CVCC que se

incluem na extensatildeo (C)V(C)(C) que podem ser representados de acordo com

estrutura silaacutebica descrita abaixo

Figura 17 Estrutura silaacutebica do Latundecirc

Os elementos que se encontram entre parecircnteses satildeo opcionais Em Latundecirc as

sequecircncias CV V VC CVC VCC e CVCC ocorrem com frequecircncia

169

sendo os dois primeiros padrotildees os mais frequentes Isso nos mostra o quanto o

Latundecirc evita onsets complexos e codas

A estrutura silaacutebica do portuguecircs de acordo com Mattoso Cacircmara (1969) define

o molde silaacutebico CCVCC conforme figura abaixo

Figura 18 Estrutura silaacutebica do Latundecirc (Cacircmara-Juacutenior)

Seguindo a proposta de Mattoso Cacircmara com respeito agrave distribuiccedilatildeo interna dos

constituintes da siacutelaba as uacutenicas consoantes que preenchem a segunda posiccedilatildeo

do onset satildeo as liacutequidas l e ɾ A coda pode ser preenchida pelas consoantes l

e pelos arquifonemas R S N

No Latundecirc o grupo consonantal no onset natildeo eacute fonoloacutegico Entretanto eacute

atestada a ocorrecircncia dos [tɾ dɾ kɾ gɾ] no plano foneacutetico como resultado da

reduccedilatildeo em siacutelaba pretocircnica de sufixo nominal e verbal A formaccedilatildeo de onset

complexo eacute estrutura marcada no Latundecirc como tambeacutem interlinguisticamente

A estrutura mais complexa e menos frequente (marcada) do encontro consonantal

no onset tende a ser simplificada no portuguecircs falado pelos Latundecirc Como

170

podemos observar em (8) e (9) os grupos consonantais satildeo pronunciados como

um soacute elemento Trata-se do apagamento da tepe e da lateral liacutequida Eacute um

processo em acomodaccedilatildeo que estaacute diretamente ligado agrave faixa etaacuteria dos falantes

Assim os mais novos seguem a tendecircncia de pronunciar o onset complexo

diferentemente dos mais velhos

(8) [bi ka nƱ] brincando

[de tƱ] dentro

[kɛbapƱ] quebraram

[otƱ] outro

(9) [buza] blusa [biciketɪ] bicicleta Embora a reduccedilatildeo do onset complexo seja um fenocircmeno variaacutevel para algumas

variedades do portuguecircs as realizaccedilotildees acima natildeo correspondem agrave fala de

adultos sendo resultantes no processo da aquisiccedilatildeo da liacutengua

Jaacute entre os Latundecirc satildeo os mais velhos que apresentam a realizaccedilatildeo do onset

simplificado como um fenocircmeno variaacutevel conforme observamos em (10)

(10) [b ɾ ĩkarƱ] brincaram [sotildebrasotilde] assombraccedilatildeo [pɾimeɾɪ] primeiro

[febrƱ] febre [fɾɛsa] flecha

O rotacismo (l gt ɾ) da lateral presente em lsquoflecharsquo acima que eacute muito frequente

no portuguecircs menos escolarizado tambeacutem ocorre na fala dos indiacutegenas

171

6113 Apagamento da coda

Em portuguecircs quatro elementos podem ocupar a posiccedilatildeo de coda RSlN aleacutem

dos glides wj85 Em Latundecirc a coda pode ser ramificada e satildeo seis os

segmentos que podem preencher o espaccedilo da coda os glides w j aleacutem das

consoantes t h n Ɂ Como a coda pode ter ateacute duas posiccedilotildees preenchidas os

primeiros elementos satildeo sempre neste caso os glides w j Embora a coda da

siacutelaba fonoloacutegica possa ser preenchida pelas consoantes acima o Latundecirc eacute uma

liacutengua que evita coda na superfiacutecie O fenocircmeno que decorre dessa tendecircncia eacute o

alongamento compensatoacuterio (Clements e Hume 1995)

(11) [ˌn ˈh te]

ˈn h-ˈ Ɂ -te

lsquonossos peacutesrsquo

No dado acima podemos observar a natildeo realizaccedilatildeo da coda fricativa glotal h na

marca de posse ˈnu h- e da coda oclusiva glotal Ɂ o item lexical ldquopeacuterdquo ˈju Ɂ

Nos dois casos o apagamento da coda eacute compensado pelo alongamento

vocaacutelico No caso do morfema de posse ocorre a ressilabaccedilatildeo da coda fricativa

Do ponto de vista da marcaccedilatildeo a siacutelaba menos marcada eacute a que apresenta o

padratildeo CV (Hume 2004 p 183) O Latundecirc tem a tendecircncia a seguir esse

padratildeo de forma que para a liacutengua a coda embora fonoloacutegica eacute mais marcada

A simplificaccedilatildeo da estrutura mais marcada (presenccedila de coda) eacute transferida para

o portuguecircs Conforme os dados descritos abaixo os segmentos que mais satildeo

apagados em posiccedilatildeo de coda satildeo os glides j w e as consoantes h s Como o

85

Mattoso Cacircmara (1969) considera que os glides pertencem ao nuacutecleo Neste caso trata-se de um nuacutecleo ramificado

172

Latundecirc natildeo tem na sua estrutura silaacutebica a coda fricativa alveolar s esse

segmento natildeo eacute licenciado no portuguecircs dos indiacutegenas (dados em 13) Esse

fenocircmeno eacute categoacuterico na fala dos mais velhos e eacute variaacutevel na fala dos indiacutegenas

da geraccedilatildeo poacutes-contato

(12) [m to] muito [koɾƱ] couro

[voto] voltou (13) [dumi] durmir [pig ta] pergunta [pota] porta [kota] corta [pɛtƱ] perto

[kotildekorsquodo] concordou [barsquobudƱ] barbudo (14) [hipotildersquodew] respondeu [gorsquotozƱ] gostoso [iˈtɛla] Stella ([isˈtɛla])

A coda eacute um elemento universalmente marcado No Latundecirc a sua realizaccedilatildeo eacute

em menor frequecircncia do que o Portuguecircs apesar de sua larga presenccedila na

subjacecircncia O que percebemos ademais eacute que o apagamento do R e do s em

coda contribui para a elevaccedilatildeo da vogal meacutedia pretocircnica tautossilaacutebica conforme

os dados ldquocorta e portardquo em (12)

A regra abaixo sintetiza o comportamento da coda no portuguecircs dos Latundecirc

C ou V [oslash] coda

173

Como vimos no Portuguecircs falado por Latundecirc qualquer consoante ou vogal

poderaacute ser apagada em posiccedilatildeo de coda Esta regra tem se mostrado menos

produtiva nas faixas etaacuterias mais novas Nessas geraccedilotildees o apagamento eacute mais

produtivo quando coincide com a realizaccedilatildeo encontrada por nativos em

portuguecircs ([ˈfosa] lsquoforccedilardquo)

6114 Reduccedilatildeo do geruacutendio ndash Anteriorizaccedilatildeo da vogal final

A reduccedilatildeo do geruacutendio eacute um processo comum em alguns dialetos brasileiros

sobretudo em registro menos tenso Esse eacute mais um processo que resulta no

apagamento de segmentos No portuguecircs falado pelos Latundecirc eacute praticamente

categoacuterica a ocorrecircncia da assimilaccedilatildeo da alveolar em geruacutendio

(15) [falatildenƱ] falando [b ɾ ĩgatildenƱ] brigando [kume nƱ] comendo

[bersquobe nƱ] bebendo

[sorsquo ɾ anƱ] chorando

[mersquosenƱ] mexendo [mi ti nƱ] mentindo

Por ser esse um fenocircmeno de larga frequecircncia no portuguecircs nativo entendemos

que a simplificaccedilatildeo segmental da estrutura gerundiva natildeo eacute surpreendente no

portuguecircs indiacutegena Entretanto na produccedilatildeo da geraccedilatildeo preacute-contato a

assimilaccedilatildeo total da oclusiva alveolar eacute acompanhada pela anteriorizaccedilatildeo da

vogal final conforme dados a seguir

174

(16) [dimuɾatildenɪ] demorando

[asinatildenɪ] ensinando [tiɾatildenɪ] tirando

[katildetatildenɪ] catando [kɾese nɪ] crescendo

Para anaacutelise das ocorrecircncias acima precisamos considerar a estrutura do

Latundecirc nessa liacutengua uma terminaccedilatildeo verbal altamente produtiva eacute o morfema

aspectual acentuado -ˈtatilden Esse morfema pode ser seguido pelo morfema de

modo neutro -i resultando nas sequecircncias -ˈtatildeni conforme exemplo abaixo

(17) [keˈja ˌdaˈɾatildeni]

keˈjat ˈta-tatilden-i milho deitar-imperfectivo-neutro

eacute milho deitado (espalhado no chatildeo)

Como no Latundecirc o verbo (e nome) natildeo termina em vogal posterior tal restriccedilatildeo

pode explicar a anteriorizaccedilatildeo do geruacutendio do portuguecircs

6115 Reduccedilatildeo das palatais nasal e lateral

A reduccedilatildeo das palatais nasal e lateral estaacute diretamente ligada agrave natildeo existecircncia

destes segmentos no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc No entanto Clements e

Hume (1995) em seus estudos apontam estes fonemas como complexos do ponto

de vista de seu comportamento

175

Os segmentos ɲ e ʎ satildeo consoantes mais marcadas A natildeo realizaccedilatildeo destas

consoantes no Latundecirc jaacute eacute um fator para a natildeo realizaccedilatildeo no Portuguecircs devido agrave

complexidade inerente de tais segmentos Enquanto segmentos mais complexos

as palatais satildeo sujeitas ao enfraquecimento atraveacutes da iotizaccedilatildeo (vocalizaccedilatildeo)

Mesmo no portuguecircs esse eacute um processo operante particularmente em

variedades populares Mattoso Cacircmara (1981 p 149) descreve que se trata de

ldquomudanccedila de uma vogal ou consoante para a vogal anterior alta i ou para a semivogal correspondente ou iode Nos falares crioulos portugueses haacute a iotizaccedilatildeo das consoantes molhadas ʎ e ɲ ex mulher gt muyeacute nhonho gt ioiocirc (africanismo)rdquo

Aleacutem da iotizaccedilatildeo o portuguecircs apresenta a despalatizaccedilatildeo da lateral em que ʎ

realiza-se [l] como em [muˈlɛ] lsquomulherrsquo

No portuguecircs dos Latundecirc o enfraquecimento se daacute mais frequentemente pela

iotizaccedilatildeo como em (18) Estas realizaccedilotildees ocorrem na fala dos mais velhos na

geraccedilatildeo anterior ao contato

18) [muˈjɛ] mulher

[baɾuj] barulho

[ojˈatildenƱ] olhando

[vimej] vermelho (19) [fila] filha [fola] folha

Weinreich (1953 p 18) explica que quando em sistemas foneacuteticos em contato

podem ocorrer os processos de reinterpretaccedilatildeo de fone que leva a substituiccedilatildeo

de segmento Eacute o que acontece nos exemplos acima

176

Em (20) e (21) o processo de despalatalizaccedilatildeo resulta no apagamento total da

palatal

(20) [miƱ] milho [fii] filho (21) [mia] minha A reduccedilatildeo tem menos restriccedilotildees se comparada com os fatos do portuguecircs falado

por nativo Em (20) as ocorrecircncias satildeo atestadas no portuguecircs enquanto primeira

liacutengua Diante da vogal posterior natildeo apenas o apagamento da palatal pode

ocorrer como tambeacutem o da siacutelaba inteira Em (21) observamos uma realizaccedilatildeo

particular dos Latundecirc em que a consoante palatal nasal eacute apagada plenamente

sem deixar vestiacutegio nasal na vogal que a precede Esse fato tem relaccedilatildeo com a

complexidade que envolve as nasais na liacutengua indiacutegena a qual natildeo coincide com

os processos existentes no portuguecircs

No caso de (22) ocorre o apagamento da siacutelaba em que se encontra a palatal

nasal do diminutivo eacute comum a variedades populares do portuguecircs

(22) [pikinĩnĩ ] pequenininho [faki ] faquinha

Como afirmamos no iniacutecio da seccedilatildeo os segmentos palatais natildeo existem em

Latundecirc o que torna sua produccedilatildeo no Portuguecircs falado pelos Latundecirc mais

marcada e de difiacutecil ocorrecircncia

177

6116 Afeacuterese

A afeacuterese eacute um processo foneacutetico que consiste na queda de elementos iniciais do

vocaacutebulo Este processo que fora responsaacutevel pelas modificaccedilotildees foneacuteticas do

Latim para o Portuguecircs ainda eacute atuante no estaacutegio atual da liacutengua

A queda da siacutelaba inicial es- em verbos como esperar e estar e do a- em

vocaacutebulos como aqui e acabar eacute muito comum em alguns dialetos brasileiros

Entretanto este tipo de delaccedilatildeo no portuguecircs falado pelos Latundecirc se expande

para outros vocaacutebulos da liacutengua conforme os exemplos abaixo

(23) [kutatildeni] escutando [kapa] escapa [kapo] escapou [peɾatildenƱ] esperando

[pi gada] espingarda

(24) [tupiw] entupiu [gatildeno] enganou [tehaɾƱ] enterraram

(25) [kɪ] aqui [lsquokelɪ] aquele [bɾasadƱ] abraccedilado

[meto] aumentou [korsquodadƱ] acordado [batildedono] abandonou [kaboʃe] acabou-se

(26) [fiɾe tɪ] diferente

[pitaw] hospital

178

Natildeo consta no inventaacuterio fonoloacutegico dessa liacutengua a presenccedila da fricativa alveolar

surda em posiccedilatildeo de coda Essa restriccedilatildeo eacute transferida para o portuguecircs falado

por Latundecirc conforme (23)

Outra razatildeo para esse fenocircmeno pode estar na estrutura prosoacutedica da palavra no

Latundecirc Nessa liacutengua as palavras satildeo monossilaacutebicas ou dissilaacutebicas Raiacutezes

com mais de duas siacutelabas satildeo raras (TELLES 2002) Associado a isso o acento

eacute morfoloacutegico em raiacutezes Nas dissilaacutebicas o acento recai na segunda siacutelaba

(27) [ˈmatilde ginĩde] ˈmatildejn-kiˈnĩn-te caju-redondo-Sufixo Nominal

lsquocastanha de cajursquo

No dado (27) encontramos exemplos de raiz monossilaacutebica e de raiz dissilaacutebica

Jaacute no portuguecircs haacute um nuacutemero relevante de palavras trissiacutelabas e polissiacutelabas

Diante disso a afeacuterese pode ser uma interferecircncia da estrutura do leacutexico da

liacutengua indiacutegena para simplificar a estrutura do portuguecircs - mais marcada no

Latundecirc Este fenocircmeno natildeo afeta o acento e eacute operante sobretudo quando a

siacutelaba inicial natildeo tem onset

6117 Apoacutecope

A apoacutecope eacute uma das formas de apagamento de segmentos que estaacute

relacionada assim como a afeacuterese a outros processos foneacuteticos

179

A queda de elementos finais eacute uma das formas de reduccedilatildeo ou reorganizaccedilatildeo

silaacutebica e de palavras Assim como nos demais processos a siacutelaba tocircnica eacute

preservada de qualquer alteraccedilatildeo

Embora alguns processos explicados aqui tratem da apoacutecope como a reduccedilatildeo do

geruacutendio e ditongo finais ou apagamento da nasal palatal a exemplo de (27)

estes exemplos jaacute foram mecionados nas seccedilotildees anteriores A presenccedila deles

aqui eacute para mostrar que os outros processos foneacuteticos resultam na apoacutecope

(28) [ ʒ rsquotaɾɪ] juntaram

[tursquodĩ] tudinho [ti ] tinha

[lsquovE ] velho [kabersquosĩ] cabecinha [lsquonatilde] natildeo [lsquomatilde] matildee (29) [lsquove] ver [lsquokɛ] quer (30) [nɔj] noacutes

[maj] mais [dirsquofisɪ] difiacutecil [dirsquofisƱ] difiacutecil [tatildersquome j] tambeacutem

(31) [virsquoa] viado [lsquoluɾɪ] Lurdes

[lsquote ] dele

Em (29) a apoacutecope do R final eacute processo muito comum no portuguecircs atual

Diante de tal explicaccedilatildeo natildeo nos cabe assegurar se o processo eacute proacuteprio do

180

Latundecirc ou se da variedade atraveacutes da qual os indiacutegenas adquiriram o portuguecircs

Os dados em (30) tambeacutem apontam para a interpretaccedilatildeo dos dados mostrados

em (29)

Em (31) os dados apresentam um apagamento incomum ao portuguecircs de

nativos A fala espontacircnea e natildeo tensa eacute uma possibilidade explicativa uma vez

que essas ocorrecircncias natildeo satildeo sistemaacuteticas

Os dados de apoacutecope natildeo evidenciam a transferecircncia de traccedilos mais marcados

do Latundecirc para o portuguecircs

6118 Siacutencope86

A forma mais comum deste processo se apresenta no portuguecircs nas

proparoxiacutetonas Em alguns dialetos a depender do contexto linguiacutestico eacute

categoacuterico a ocorrecircncia da reduccedilatildeo interna no vocaacutebulo

Nos exemplos elencados em (32) no caso das proparoxiacutetonas tal reduccedilatildeo eacute

motivada pelo padratildeo acentual do portuguecircs que permite com mais toleracircncia o

padratildeo paroxiacutetono ao proparoxiacutetono conforme Silva (2006 p78)

Quando ocorrente no Portuguecircs este processo estaacute relacionado ao apagamento

da vogal postocircnica medial Com a reduccedilatildeo vocaacutelica a consoante precedente

pode tomar dois caminhos i) eacute incorporado agrave siacutelaba tocircnica na posiccedilatildeo de coda ii)

86

Os exemplos apresentados demonstram que o processo ocorrente eacute muito mais motivado pelo

Portuguecircs do que pelo Latundecirc A nossa classificaccedilatildeo fica aqui a caraacuteter de registro

181

passa a onset da siacutelaba aacutetona seguinte o que afeta sua constituiccedilatildeo O

apagamento vocaacutelico resulta em uma palavra paroxiacutetona

(32) [lsquomuʒka] muacutesica [lsquohapƱ] raacutepido [lsquokOʃka] coacutecega [lsquoavɾɪ] aacutervore

Entendemos que muitas destas ocorrecircncias no Latundecirc se datildeo pelo portuguecircs de

contato Isso eacute confirmado pela produccedilatildeo de ldquomuacutesicardquo e ldquocoacutecegardquo que licencia

uma restriccedilatildeo forte no Latundecirc a fricativa sibilante em coda Aleacutem disso a

produccedilatildeo de ldquoraacutepidordquo ([ˈhapƱ]) tambeacutem coincide com a realizaccedilatildeo encontrada no

portuguecircs popular na qual a consoante em onset da siacutelaba apagada passa a

onset da siacutelaba seguinte devido agrave restriccedilatildeo no portuguecircs de onda oclusiva

612 Ganho de elementos (Inserccedilatildeo de elementos)

Embora em menor nuacutemero os processos que resultam em ganhos de elementos

tambeacutem ocorrem no Portuguecircs falado pelos Latundecirc Satildeo poucos os processos e

menores ainda os casos em que eles ocorrem Isso pode ser explicado como jaacute

fora dito devido ao fato de as liacutenguas em geral terem um dinamismo proacuteprio que

favorece mais agrave perda do que o ganho de elemento Em alguns casos a

motivaccedilatildeo para o ganho de material foneacutetico satildeo as restriccedilotildees fonotaacuteticas da

liacutengua e ou a tendecircncia agrave formaccedilatildeo de padratildeo silaacutebico menos marcado No caso

do portuguecircs de acordo com Collischonn (2004 p 67) um tipo de ganho de

material precisamente a epecircntese vocaacutelica

ocorre mais quando a consoante perdida estaacute em posiccedilatildeo pretocircnica como em objeto magneacutetico e opccedilatildeo ocorrendo em apenas 24 dos vocaacutebulos na posiccedilatildeo postocircnica em palavras como egiacutepcios eacutetnico ou ritmo Mais especificamente estes resultados mostram que a epecircntese que em outros contextos

182

ocorre numa taxa bastante alta eacute dramaticamente reduzida em posiccedilatildeo postocircnica

Exemplos do que a autora descreve seguem apresentados abaixo em (33) O

primeiro dado traz a inserccedilatildeo da vogal epenteacutetica default no portuguecircs a anterior

alta [i] e a segundo natildeo ocorrecircncia da inserccedilatildeo

(33) [lsquoabiˈsuhdƱ] absurdo [koˈlapisƱ] colapso

A epecircntese vocaacutelica nos dados examinados natildeo foi muito expressiva sobretudo

pelo fato de natildeo termos encontrado um nuacutemero significativo de palavras com

encontro consonantal no leacutexico dos indiacutegenas Entretanto alguns casos como em

(34) ilustram a ocorrecircncia no portuguecircs dos Latundecirc

(34) [ˈmɔgunƱ] mogno (35) [piˈnew] pneu

A estrutura que favorece a epecircntese no portuguecircs natildeo faz parte das regras

fonotaacuteticas do Latundecirc o que tambeacutem pode favorecer a vogal epenteacutetica nos

dados observados

(36) [haacutersquopazɪ] rapaz [haacutersquopazƱ] rapaz [parsquope sɪ] papeacuteis [dorsquose zɪ] de vocecircs [lsquonͻ zɪ] noacutes

183

Diferentemente do que ocorre em (34 - 35) os dados de (36) nos direcionam para

a paragoge processo que se caracteriza pela inserccedilatildeo de elemento(s) no final do

vocaacutebulo Este processo tambeacutem estaacute diretamente ligado agrave presenccedila da fricativa

alveolar desvozeada em coda sendo esse segmento proibido nessa posiccedilatildeo no

Latundecirc No caso citado a inserccedilatildeo pode ser da vogal alta posterior rapaz

[hapazƱ] mas a preferecircncia eacute pela vogal alta anterior que eacute a vogal menos

marcada [hapazɪ] rapaz noacutes [lsquonͻ zɪ]

Em (37) o processo de paragoge ocorre apoacutes o processo de monotongaccedilatildeo

ocorrendo no ditongo [atildew] que passa a ser realizado como a vogal nasal meacutedia

posterior conforme discutido em 5111 Apoacutes esse processo haacute a inserccedilatildeo do

consoante nasal seguida da vogal alta anterior A paragoge eacute variaacutevel com a

reduccedilatildeo do ditongo ([tubaˈɾotilde]) A inserccedilatildeo da siacutelaba final [-ni] pode decorrer da

existecircncia produtiva de terminaccedilatildeo sonora semelhante em vocaacutebulos (nominais e

verbais) no Latundecirc

(37) [tubarsquoɾotildenɪ] tubaratildeo

Em (38) o processo ocorrente eacute a proacutetese Se para o processo inverso - a afeacuterese

- os dados satildeo em maior quantidade para a proacutetese satildeo pouquiacutessimos os

contextos em que ela ocorre No caso deste exemplo a proacutetese se daacute a presenccedila

da vogal baixa diante do verbo Este tipo de proacutetese eacute bem recorrente no

Portuguecircs em dados como ([alemˈbra]) Entretanto o caraacuteter pontual da

ocorrecircncia do fenocircmeno natildeo favorece uma interpretaccedilatildeo mais segura

(38) [atorsquomaɾu] tomaram

184

Outra forma de ganho de elementos pode ser o prolongamento da vogal final O

exemplo de (39) nos mostra o prolongamento da vogal meacutedia anterior Essa

ocorrecircncia foi observada no contexto especiacutefico de ecircnfase

(39) [dese] desse [se] esse

613 Alteraccedilatildeo de elementos (Permuta ou transposiccedilatildeo)

A alteraccedilatildeo de elementos linguiacutesticos eacute considerada na literatura histoacuterica como o

terceiro tipo de alternacircncia focircnica inerente agraves liacutenguas Os contextos em que o

cacircmbio eacute permitido satildeo diversos e direcionados por distintas regras fonoloacutegicas

Muitos desses processos natildeo alteram a estrutura silaacutebica nem atinge a estrutura

lexical O que ocorre de fato eacute a acomodaccedilatildeo de alguns segmentos no dialeto

falado seja pela mudanccedila de traccedilo(s) ou seja pela de segmento(s)

6131 Despalatalizaccedilatildeo de [ʃ] e [ʒ]

Tratamos na seccedilatildeo 5115 do processo da reduccedilatildeo das palatais [ʎ] e [ɳ] que

tambeacutem se configura como um caso de despalatalizaccedilatildeo Todavia tal

classificaccedilatildeo se daacute devido ao fato de estaacute ligada agrave perda de elementos enquanto

a que trataremos agora se configura da permuta ou da reduccedilatildeo de traccedilos

185

Em Latundecirc a presenccedila das palatais [ʃ] e [tʃ] satildeo realizaccedilotildees de s Estas podem

vir em iniacutecio e em meio de palavras As realizaccedilotildees [ʃ] e [s] satildeo preferidas pelos

mais novos enquanto os mais velhos optam pela africada alveolo-palatal surda

Diferentemente no Portuguecircs falado por Latundecirc as realizaccedilotildees natildeo

palatalizadas satildeo preferidas Os Latundecirc natildeo transferem o segmento mais

marcado para o Portuguecircs Contudo conforme seccedilatildeo a seguir veremos que este

processo eacute variaacutevel e pode se dar em qualquer posiccedilatildeo do vocaacutebulo conforme

dados de (40)

(40) [sersquogo] chegou [sersquogamƱ] chegamos [sorsquoɾanƱ] chorando [sursquopaha] chupava [satildematildedƱ] chamando [dersquosaɾƱ] deixaram [casueɾƱ] cachoeira

[mersquosenƱ] mexendo [bisƱ] bicho [baso] baixo [debasƱ] debaixo [lsquopesƱ] peixe [dirsquoso] deixou

Natildeo consta no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc as consoantes z e ʒ de forma

que a liacutengua natildeo apresenta oposiccedilatildeo entre surda e sonora para as fricativas

sibilantes Em (41) o processo de despalatalizaccedilatildeo atinge a fricativa alveopalatal

vozeada que passa a se comportar como fricativa alveolar em iniacutecio de siacutelaba e

em meio de palavras

(41) [lizeɾƱ] ligeiro

186

[lsquolotildezɪ] longe [lsquosuzɪ] suja [lsquosuzu] sujo [azursquoda] ajudar [lsquozudia] judia [azersquota] ajeitar

A escolha do segmento menos marcado segue o que ocorreu com s a

realizaccedilatildeo desses segmentos satildeo adquiridos analogicamente e a presenccedila se daacute

no interior do vocaacutebulo Trata-se da reinterpretaccedilatildeo e acomodaccedilatildeo do segmento

Neste caso do menos marcado jaacute que ambos satildeo menos naturais em sua liacutengua

(WEINREICH 1953)

6132 Palatalizaccedilatildeo

A quantidade de sons palatais do Latundecirc natildeo corresponde aos do Portuguecircs

Em Latundecirc a palatalizaccedilatildeo eacute um processo foneacutetico que ocorre com o segmento

s e em incidecircncia extremamente escassa com t em ambientes que jaacute foram

postos no Capiacutetulo IV que trata deste sistema foneacutetico Eacute um processo bastante

variaacutevel tendo em vista a natildeo presenccedila desse segmento na subjacecircncia da

liacutengua Essa variaccedilatildeo ocorre marcadamente na fala dos mais velhos Os mais

jovens que adquiriram ambas as liacutenguas (Portuguecircs e Latundecirc)

simultaneamente produzem em menor proporccedilatildeo este processo

A africada [tʃ] eacute um segmento que tambeacutem apresenta uma realizaccedilatildeo altamente

variaacutevel provavelmente devido agrave histoacuteria interna da liacutengua conforme Telles

187

(2002 p85) No Latundecirc natildeo haacute diferenccedila entre a oposiccedilatildeo foneacutetica entre as

alveolares de um lado e as palatais e alveacuteolo-palatais de outro

Em (42) e (43) a palatalizaccedilatildeo atinge tanto a fricativa alveolar vozeada quanto a

desvozeada

(42) [ʃu rsquomiɾƱ] sumiram

[ lsquoʃi ma] cima

[ʃigursquoɾow] segurou

(43) [lsquoua] usa

[bursquoʒoɾƱ] Besouro

Em (44) e (45) a palatalizaccedilatildeo abrange as consoantes oclusivas alveolares que

se realizam como africadas alveolo-palatais podendo ocorrer em qualquer

posiccedilatildeo ou contexto da palavra

(44) [lsquoĩdƱ] iacutendio

[matildersquodɔga] mandioca

[ɛrsquoĩ] zezinho

[odʒɪ] hoje [tʃi rsquodʒeɾƱ] cinzeiro

Embora no Portuguecircs o processo de africativizaccedilatildeo de oclusivas alveolares [t d]

seja comum a alguns dialetos como o do Rio de Janeiro [lsquotʃia] e do portuguecircs

popular no Nordeste [lsquoojtʃƱ] sua ocorrecircncia eacute condicionada agrave contiguidade de uma

vogal anterior alta [i] Diferentemente em Latundecirc a palatalizaccedilatildeo e a

188

fricativizaccedilatildeo variam entre si e ocorrem tambeacutem com a fricativa alveolar s Este

processo pode ocorrer em qualquer lugar da palavra

(45) [tʃai] sair [tʃiɾi ga] seringa

[barsquotʃotilde] batom [tʃͻ] soacute [tʃumiɾƱ] sumiram

[tʃobɾo] sobrou

[arsquotʃi ] assim

[tʃubi nƱ] subindo

[pɔtʃa] porta

[rsquotʃua] suja

Os exemplos de (46) apontam para um processo secundaacuterio o fortalecimento

Neste caso a fricativa alveopalatal passa a ser pronunciada como africada

(46) [ tʃoɾatildenƱ] chorando [tʃama] chama [tʃega] chega [ tʃursquoveɾƱ] chuveiro [kaharsquopitʃƱ] carrapicho

No que tange agrave abordagem das palatais a variaccedilatildeo no processo de acomodaccedilatildeo

desses inventaacuterios fonoloacutegicos eacute muito grande A partir das incidecircncias

percebemos que no Portuguecircs resultante do contato a ocorrecircncia desses

segmentos complexos se mostra tambeacutem na mesma proporccedilatildeo

Diante da palatalizaccedilatildeo incluindo a africativizaccedilatildeo observamos que os dados

apresentam duas direccedilotildees quanto ao processo Nos mesmos contextos tanto

ocorre a despalatalizaccedilatildeo quanto a palatalizaccedilatildeo Essa variaccedilatildeo no portuguecircs dos

189

indiacutegenas eacute engatilhada pela ausecircncia do contraste szʃʒ em sua primeira

liacutengua

6133 Desvozeamento e vozeamento

Diferente do portuguecircs no Latundecirc natildeo haacute oposiccedilatildeo das oclusivas quanto agrave

sonoridade As consoantes oclusivas subjacentes satildeo as surdas bilabial alveolar

e velar p t e k respectivamente Sua realizaccedilatildeo sonora eacute condicionada pela

posiccedilatildeo na palavra pelo ambiente (contiguidade nasal) e pelo acento O

vozeamente obrigatoacuterio ocorre quando elas precedidas por consoante nasal na

coda da siacutelaba anterior O processo ocorre tanto no interior quanto em fronteiras

de morfemas (TELLES 2002 p135)

A ausecircncia do contraste surdo-sonoro nas consoantes oclusivas do Latundecirc afeta

a realizaccedilatildeo das consoantes no portuguecircs resultante do contato Na produccedilatildeo dos

indiacutegenas mais velhos (esse fenocircmeno natildeo foi observado na geraccedilatildeo mais

jovem) o processo de desvozeamento atinge as consoantes oclusivas sonoras g

d do portuguecircs conforme (47) e (48)

A realizaccedilatildeo sonora Latundecirc envolve o traccedilo laringal Foneticamente em fala

lenta haacute a realizaccedilatildeo de [d] como alofone de t Telles (2002 p 45) explica que

os falantes mais jovens da geraccedilatildeo poacutes-contato que adquiriram o Portuguecircs

simultaneamente ao Latundecirc neutralizaram o contraste entre sons realizando

preferencialmente o som menos marcado natildeo-implodido Diferentemente dos

mais novos os mais velhos preferem o som implosivo [ɗ]

190

Quanto ao segmento [g] o Latundecirc o tem enquanto alofone de [k] e pode ser

encontrado em iniacutecio de palavra quando em fala raacutepida Mostra-se categoacuterico em

meio de palavra quando diante de uma nasal lexical Em ambiente intervocaacutelico

pode-se encontrar a variaccedilatildeo entre [k] e [g] das quais eacute preferencial a realizaccedilatildeo

da vogal surda (idem p73) A falta do contraste no Latundecirc explica as

realizaccedilotildees de (47)

(47) [lsquobɾika] briga [lsquokoʃta] gosta [kɔviotilde] gaviatildeo

[katildersquoba] gambaacute

A ausecircncia do segmento [d] em Latundecirc eacute a responsaacutevel pela variaccedilatildeo e pela natildeo

realizaccedilatildeo dessa consoante que ocorre como oclusiva alveacuteolo-palatal t

(48) [tipoj] depois [se rsquotatu] sentado

(49) [hatildega] arranca

Em (49) diferentemente do processo de desvozeamento a oclusiva velar se

realiza como sonora A contiguidade nasal em posiccedilatildeo precedente condiciona o

vozeamente da oclusiva velar

Em todos os casos observados acima fica evidente a interferecircncia do Latundecirc no

portuguecircs indiacutegena As consoantes sonoras que satildeo mais marcadas

interliguisticamente por natildeo fonoloacutegicas no Latundecirc se tornam ainda mais

marcadas nessa liacutengua Na produccedilatildeo do portuguecircs os Latundecirc mais velhos

191

preservam a marcaccedilatildeo e apresentam uma realizaccedilatildeo com condicionamento

emprestado da liacutengua indiacutegena

6134 Abaixamento e Elevaccedilatildeo das Vogais Orais

No portuguecircs falado pelos Latundecirc os processos de abaixamento e elevaccedilatildeo

diferenciam-se dos contextos em que ocorrem no portuguecircs Os de elevaccedilatildeo satildeo

em maior nuacutemero que os de abaixamento fato este tambeacutem verificado no

portuguecircs falado pelos Latundecirc

No caso de (50) o uacutenico caso de abaixamento ocorre na vogal anterior nasal e

que passa a ser pronunciada como vogal baixa oral

(50) [asina] ensinar [asinatildenɪ] ensinando

Em (51) a elevaccedilatildeo ocorre com a vogal central baixa final que passa a alta

anterior

(51) [suzɪ] suja [kazɪ] causa [kazɪ] casa [li gɪ] liacutengua

[pɾersquogisɪ] preguiccedila

Assim como em (51) em (52) a elevaccedilatildeo da vogal final tambeacutem eacute realizada como

alta anterior No segundo caso natildeo se trata de elevaccedilatildeo mas de anteriorizaccedilatildeo

uma vez que a vogal meacutedia posterior que ocorre em nomes no portuguecircs eacute

realizada como alta posterior

192

(52) [li pɪ] limpo

[kotildemɪ] como [pɾeti] preto

[saɾatildepɪ] sarampo

[pɾimeɾɪ] primeiro

[morsquosegɪ] morcego [morsquohe dɪ] morrendo

[novɪ ] novo

[kursquoɳadɪ] cunhado [otɪ] outro [fikatildenɪ] ficando

A elevaccedilatildeo e posteriorizaccedilatildeo tambeacutem ocorrem no final dos vocaacutebulos como em

(53)

(53) [kabesƱ] cabeccedila [kanɛlƱ] canela

[mini nadƱ] mininada

[malaɾƱ] malaacuteria

[kursquoru Ʊ] coruja

Em (54) temos tambeacutem a posteriorizaccedilatildeo da alta anterior Assim como a meacutedia

posterior em (52) a meacutedia anterior no portuguecircs eacute amplamente produzida como

alta anterior de forma que o alccedilamento em si natildeo se configura como um

processo do portuguecircs do contato

(54) [hedƱ] rede [bastatildetƱ] bastante [pesƱ] peixe [notƱ] noite [febɾƱ] febre

193

Apesar de natildeo encontrarmos itens que mostrassem a sistematicidade do

condicionamento entre [i] e [u] em final de palavras os dados nos mostram que

haacute uma tendecircncia na base das realizaccedilotildees Os vocaacutebulos terminados em [Ʊ]

tendem a ser produzidos com [ɪ] e os terminados por [a] tendem a ser realizados

com [Ʊ]

Nos dados observados a variaccedilatildeo entre [i] e [Ʊ] soacute ocorre em final de vocaacutebulo

quando se trata da paragoge conforme visto nos exemplos (36) em 512

[harsquopazɪ] ~ [harsquopazʊ]

Os dados em (55) ilustram a falta de regularidade no alccedilamento das vogais

pretocircnicas Como vemos em [fuˈkatildemƱ] e [virsquome ] a tonicidade ou a contiguidade

segmental natildeo condiciona a elevaccedilatildeo da pretocircnica

(55) [pig ta] pergunta [piskosƱ] pescoccedilo [hirsquopotildedew] respondeu [pigu rsquotatildenɪ] perguntando

[dimorsquoɾo] demorou

[virsquome ] vermelho [dimursquoɾatildenɪ] demorando

[fuˈkatildemƱ] ficamos

[kuˈmiw] comeu

194

6135 Nasalizaccedilatildeo e Desnasalizaccedilatildeo

No Latundecirc a nasalidade vocaacutelica eacute contrastiva para a central baixa a anterior

alta e a posterior alta seguidas por consoante nasal tautossilaacutebica A nasalizaccedilatildeo

alofocircnica soacute ocorre com vogais aacutetonas Apesar de a organizaccedilatildeo do traccedilo nasal

na fonologia do Latundecirc ser distinta da do portuguecircs o status contrastivo do traccedilo

em ambas as liacutenguas favorece sua percepccedilatildeo e realizaccedilatildeo na produccedilatildeo na sala

no portuguecircs Entretanto a nasal depende tambeacutem de outros fenocircmenos

cooperantes

Os dados a seguir ilustram a ocorrecircncia da nasalizaccedilatildeo em vogais A

contiguidade da vogal com uma consoante nasal mesmo heterossilaacutebica pode

resultar na nasalizaccedilatildeo O primeiro dado abaixo foge do esperado em liacutengua

portuguesa e tampouco decorre de uma interferecircncia do Latundecirc

(56) [mersquoatilde] meia [bɾĩrsquogatildenƱ] brigando [ʃu miɾƱ] sumiram

[mi mƱ] mesmo

Em (57) ocorre a desnasalizaccedilatildeo em palavras funcionais Esses casos natildeo satildeo

frequentes no leacutexico e natildeo podem ser analisados como resultados de interferecircncia

direta O apagamento da nasal em coda ou em onset seguinte impede a

nasalizaccedilatildeo

(57) [nɪ] nem (natildeo) [mia] minha

195

6136 Fenocircmenos evolvendo os roacuteticos

O tratamento do roacutetico requer uma consideraccedilatildeo sobre o seu comportamento

interlinguiacutestico Retomando as palavras de Bonet e Mascaroacute (1997 p 103)

It is well know that the phonetic realization of rhotics varies considerably from language to language even from dialect to dialect Rhotics can be realized as flaps taps trills (uvular coronal ou bilabial) or as assibilated or fricative variants They ca alternate with a lateral liquid with glides and in some cases a flap can occur as the phonetic realization of a coronal stop in specific environments

Os roacuteticos satildeo segmentos que apresentam uma grande variaccedilatildeo no portuguecircs

Natildeo diferentemente estes elementos tambeacutem se mostraram como motivadores

de vaacuterios processos fonoloacutegicos do portuguecircs falado pelos Latundecirc

Os exemplos dispostos em (58) apontam para a aspiraccedilatildeo do R em coda

silaacutebica Processo este que eacute comum a variedades do portuguecircs e que tambeacutem

no caso em tela pode ser motivado pela preferecircncia de natildeo coda da liacutengua

Latundecirc que favorece o seu enfraquecimento atraveacutes de uma realizaccedilatildeo fricativa

glotal

(58) [duhmɪ] Dormi [mɛgursquola] mergulhar

[fosa] Forsa

O rotacismo eacute um fenocircmeno presente no portuguecircs dos Latundecirc especialmente

entre os mais velhos Fonemas distintos podem sofrer o processo Em (59) a

realizaccedilatildeo do flap tem na base uma sibilante uma lateral palatal e uma oclusiva

196

alveolar Em ldquotrabalhavardquo a lateral palatal inexistente no Latundecirc poderia ser

subtituida pela lateral alveolar constante do inventaacuterio da liacutengua indiacutegena

Entretanto o flap apesar de natildeo fonoloacutegico no Latundecirc eacute um segmento muito

frequente na liacutengua decorrente de processo de enfraquecimento Essa tendecircncia

do Latundecirc pode estar na base da realizaccedilatildeo do portuguecircs Dentre as ocorrecircncias

abaixo a uacuteltima se coloca como um processo frequente no proacuteprio Latundecirc no

qual uma oclusiva passa a flap em ambiente intervocaacutelico

(59) [karsquoboɾe] acabou-se

[tabaɾava] trabalhava

[poɾɪ] pode

Em Portuguecircs particularmente falado por sujeitos menos escolarizados o

fenocircmeno do rotacismo tambeacutem eacute frequente em encontros consonantais

tautossilaacutebicos em que a segunda consoante eacute a lateral alveolar l Dessa forma

produccedilatildeo encontrada em (60) pode ser devido ao contato com o Portuguecircs local

(60) [pɾatildeta] planta

[gɾɛba] gleba

[fɾɛsa] flecha

Em termos da organizaccedilatildeo da fonologia de ambas as liacutenguas os dados em (60)

assim como aqueles em (59) podem ser refletidos a partir da escala de

sonoridade proposta por Bonet e Mascaroacute (1997 p 109)

197

Quadro 21 Escala de Sonoridade adaptada de Bonet e Mascaroacute 1997 p 109)

0 1 2 3 4

Obstruintes

(oclusivas

fricativas trill)

nasais laterais glides

flap

vogais

Considerando a posiccedilatildeo do flap na escala de Bonet e Mascaroacute podemos

interpretar tanto o rotacimo no portuguecircs natildeo padratildeo quanto aquele presente no

Latundecirc como resultado de enfraquecimento de diferentes segmentos situados

mais agrave esquerda no ranking de sonoridade Entre esses segmentos como

observamos na escala acima encontra-se a proacutepria lateral alveolar que apesar

de tradicionalmente formar a classe das liacutequidas ao lado dos roacuteticos natildeo

apresenta a mesma sonoridade que o flap

6137 Labializaccedilatildeo e Deslabializaccedilatildeo

No Portuguecircs falado pelos Latundecirc os processos que envolvem articulaccedilatildeo

secundaacuteria especificamente a labializaccedilatildeo e a deslabializaccedilatildeo estatildeo

relacionados agraves consoantes oclusivas velares e se realizam praticamente nos

mesmos contextos Trata-se de um processo foneacutetico variaacutevel

(61) [kƱɪ] que [kƱelɪ] com ele (62) [kazɪ] quase [katildedƱ] quando

198

[karsquokƱɛ] qualquer

[li gɪ] liacutengua

No Latundecirc a labializaccedilatildeo pode ser derivada de processo mas eacute restrita em

ocorrecircncia Aleacutem disso a sequecircncia da olusiva seguida do glide formando

encontro consonantal tambeacutem natildeo faz parte da fonologia do Latundecirc Esses fatos

favorecem a produccedilatildeo irregular do portuguecircs em que observamos a

deslabializaccedilatildeo (ou o apagamento do glide) como em (62) e a labializaccedilatildeo (ou

inserccedilatildeo do glide) em (61)

6138 Metaacutetese

A alternacircncia de segmentos no portuguecircs falado pelos Latundecirc pode ocorrer

entres siacutelabas diferentes ou entre elementos da mesma siacutelaba Aleacutem disso

ocorre nas duas direccedilotildees (da esquerda para a direita e da direita para a

esquerda)

(63) [bahiƱ] bairro [fɾevenƱ] fervendo [parsquoguo] apagou

Como vemos acima no primeiro dado de (63) ocorre natildeo apenas a metaacutetese

como tambeacutem o avanccedilo do acento resultando numa palavra oxiacutetona Nos demais

dados a tranposiccedilatildeo segmental natildeo interfere na estrutura suprassegmental O

segundo dado de ldquofervendordquo eacute tiacutepico do portuguecircs e pode decorrer da variedade

de contato sobretudo pelo fato de o onset complexo natildeo fazer parte da liacutengua

indiacutegena Em ldquoapaguordquo a metaacutetese resulta na labializaccedilatildeo da oclusiva velar Essa

199

forma de palavra tem como realizaccedilatildeo foneacutetica frequente mesmo no portuguecircs

nativo a monotongaccedilatildeo Nesse caso a metaacutetese resulta de processo irregular e

pontual nos dados observados

Como vimos nas seccedilotildees anteriores os resultados da metaacutetese natildeo correspondem

a estruturas fonoloacutegicas no Latundecirc sendo sua ocorrecircncia derivada de processo

foneacutetico sem condicionamento prosoacutedico

6139 Siacutestole

Alguns casos de siacutestole em que ocorre o recuo do acento foram encontrados na

fala dos mais velhos Natildeo identificamos contexto linguiacutestico como o

sequenciamento focircnico do enunciado fonoloacutegico que justificasse essas

realizaccedilotildees Considerando o fato de a produccedilatildeo ter sido encontrada apenas na

fala da geraccedilatildeo mais velha e de o acento lexial no Latundecirc ser morfoloacutegico

ancorado em uma das duas promeiras siacutelabas da raiz da palavra (TELLES 2002)

eacute plausiacutevel supor uma interferecircncia do padratildeo acentual da liacutengua indiacutegena no

portuguecircs dos Latundecirc Os dados em (64) evidencia o recuo do acento

(64) [mɔhe] morrer

[kalo] calor [katɪ] quati [pega] pegar

Nos dados acima importa considerar tambeacutem o fato de se tratarem de itens

nominais (incluindo as formas nominais dos verbos) Diante disso uma analogia

possiacutevel dos Latundecirc seria a de considerar a raiz monossilaacutebica que eacute altamente

200

produtiva na liacutengua indiacutegena o que tambeacutem justificaria o acento na primeira

siacutelaba da palavra

61310 Fortalecimento

Casos de fortalecimento jaacute foram abordados nas seccedilotildees anteriores em que

tratamos da palatalizaccedilatildeo e da dessonorizaccedilatildeo Nesta seccedilatildeo outro fenocircmeno de

fortalecimento eacute apresentado no qual ocorre a oclusivizaccedilatildeo de fricativas

Salientamos entretanto que essas foram realizaccedilotildees mais esporaacutedicas e menos

recorrentes que as demais

(65) [istubidƱ] subindo [tiguɾa] segura

[torsquoteɾƱ] solteiro

[batitaɾƱ] batizaram

O processo ocorre no iniacutecio e em meio de palavra No primeiro dado em fato haacute

uma epecircntese da oclusiva alveolar surda [t] tendo em vista a preservaccedilatildeo de uma

sutil sibilaccedilatildeo do s em coda da siacutelaba precedente

Na fonologia do Latundecirc o fonema s tem como alofone o fone [t] que ocorre em

siacutelaba aacutetona (TELLES 2002) Embora essa natildeo seja a realizaccedilatildeo mais frequente

a interferecircncia do Latundecirc natildeo pode ser desconsiderada Em todos os dados de

(65) haacute a presenccedila de segmento oclusivo em siacutelaba contiacutegua que tambeacutem pode

ter motivado o fortalecimento do s

201

7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

No que concerne agraves poliacuteticas linguiacutesticas diante do glotociacutedio que tem se

instaurado no Brasil desde a chegada dos portugueses dado o estado em que se

encontram as liacutenguas indiacutegenas brasileiras eacute de grande valia qualquer estudo

que vise agrave contribuiccedilatildeo e que favoreccedila natildeo soacute a proteccedilatildeo como o conhecimento

cientiacutefico dessas liacutenguas

O Latundecirc como jaacute mencionamos eacute uma dessas liacutenguas minoritaacuterias Ela se

encontra em extinccedilatildeo uma vez que hoje dispotildee de menos de 20 falantes com

autonomia poliacutetica Devido agrave populaccedilatildeo restrita e agraves relaccedilotildees tradicionais de

parentesco os jovens Latundecirc natildeo podem coabitar entre si de forma que a

interaccedilatildeo com o mundo externo eacute a via de perpetuaccedilatildeo social e ao mesmo

tempo de crescente e natildeo planejado contato linguiacutestico Tais circunstacircncias

implicam a urgecircncia de mais estudos sobre a realidade desse povo

Entedemos que estudar as liacutenguas menos conhecidas eacute de grande valia para o

incremento da ciecircncia linguiacutestica A investigaccedilatildeo de cada nova liacutengua eacute uma

maneira de conceber a linguagem humana e de contribuir dessa forma com os

universais linguiacutesticos e com o entendimento da faculdade humana da linguagem

(CAcircMARA-JR 1977 p6)

Seja entre si ou em contato com outras estas liacutenguas natildeo estatildeo (ou natildeo

estiveram) suficientemente isoladas para evitar algum tipo de proximidade

Thurston (1987 p 165) propaga que toda liacutengua deve ter sofrido alguma

202

influecircncia de seus vizinhos em um determinado ponto e tempo Todos os idiomas

satildeo portanto liacutenguas mistas na medida em que todos copiaram formas lexicais e

outros recursos linguiacutesticos de liacutenguas vizinhas

Thomason (2001 p 17) afirma que o contato linguiacutestico estaacute em toda a parte

muitos paiacuteses tecircm mais do que uma liacutengua oficial e muito provavelmente a maior

parte da populaccedilatildeo mundial fala duas ou mais liacutenguas

Contudo mesmo em grande quantidade os estudos que se encarregam da

observaccedilatildeo do contato linguiacutestico se debruccedilam ainda timidamente nos aspectos

foneacuteticos Com base nesta assertiva este trabalho se propocircs a observar como se

daacute o comportamento entre o Portuguecircs e o Latundecirc a partir da verificaccedilatildeo dos

padrotildees mais e menos marcados nos processos foneacuteticos de acomodaccedilatildeo Eacute um

estudo descritivo em que o Portuguecircs eacute a segunda liacutengua mesmo em face de seu

caraacuteter nacional Essa pluralidade linguiacutestica ainda existente no paiacutes demanda a

concretizaccedilatildeo das poliacuteticas a favor da salvaguarda da diversidade no planeta

Posto que toda liacutengua sofra influecircncia das forccedilas internas e externas que agem

sobre ela partimos do pressuposto de que em qualquer pesquisa linguiacutestica natildeo

encontraremos nada de extraordinaacuterio nada que exceda a experiecircncia do

humano Dessa sorte vamos encontrar () uma estrutura linguiacutestica como

qualquer outra e em muita coisa ateacute possivelmente semelhante agrave nossa

(MATTOSO CAcircMARA-JR 1977 p7)

E quando sistemas entram em contado fenocircmenos emergentes podem ajudar a

esclarecer os princiacutepios e as restriccedilotildees que regem as liacutenguas particulares Com

base na complexidade e na riqueza que advecircm do contato linguiacutestico analisamos

203

estas forccedilas conflitantes com base nos princiacutepios de hierarquizaccedilatildeo e

regularidade que satildeo forccedilas motrizes da marcaccedilatildeo nos processos foneacuteticos Aleacutem

do fator tempo outros aspectos podem estar diretamente ligados agraves

transformaccedilotildees pelas quais uma liacutengua passa como relaccedilotildees de poder

influecircncias de outras liacutenguas subjetividade de seus falantes etc

A marcaccedilatildeo estaacute diretamente ligada agrave simetria frequecircncia e naturalidade

Entretanto Rice (2007) apresenta as caracteriacutesticas da marcaccedilatildeo agrupando-as

em dois conjuntos O primeiro envolve os termos relativos a uma marcaccedilatildeo

considerada natural ou pautada na frequecircncia e diz respeito em larga medida a

ldquophonetic basis of an oppositionrdquo Nele se encontram oposiccedilatildeo como ldquomais ou

menos naturalrdquo ldquomais ou menos complexordquo ldquomais ou menos estaacutevelrdquo ldquosujeito agrave

aquisiccedilatildeo mais ou menos tardiardquo etc (Rice 2007 p 81) O segundo grupo eacute

relativo a comportamentos de sistemas fonoloacutegicos como ser ldquosujeito ou

resultado de neutralizaccedilatildeordquo ldquoser gatilho ou alvo de assimilaccedilatildeordquo Esse grupo

portanto diz respeito agrave marcaccedilatildeo fonoloacutegica ou estrutural

No que diz respeito agrave anaacutelise dos dados quanto aos processos foneacuteticos

percebemos em nosso estudo que

Ainda que com algumas restriccedilotildees a tendecircncia agrave monotongaccedilatildeo eacute

transferida para o Portuguecircs falado por Latundecirc [satildersquogɾaɾi] ldquosangraramrdquo

[kaze] ldquocausardquo

Mesmo em variaccedilatildeo a reduccedilatildeo do onset complexo eacute transferida para o

Portuguecircs seguindo a tendecircncia que o Latundecirc tem de evitar esse tipo de

sequecircncia [bĩ katildenƱ] ldquobrincandordquo [kɛbaɾƱ] ldquoquebraramrdquo

204

O preenchimento da coda eacute evitado pelo Latundecirc processo esse que

tambeacutem eacute atestado no Portuguecircs falado por Latundecirc [pi gũta] ldquoperguntardquo

[gorsquotozƱ] ldquogostosordquo

As consoantes ɲ e ʎ mais marcadas interlinguisticamente tambeacutem o

satildeo no Latundecirc que natildeo os tecircm no seu inventaacuterio fonoloacutegico Como

resultado esses segmentos natildeo satildeo produzidos no Portuguecircs falado pelos

Latundecirc Alternativamente ocorre a substituiccedilatildeo desses fonemas por

segmentos articulatoriamente mais proacuteximos ou o seu apagamento [vimej]

ldquovermelhordquo [fila] ldquofilhardquo [farsquokĩ] ldquofaquinhardquo

A reduccedilatildeo silaacutebica eacute atuante tambeacutem atraveacutes da afeacuterese Como natildeo consta

no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc a presenccedila da fricativa alveolar surda

em posiccedilatildeo de coda essa restriccedilatildeo eacute transferida para o portuguecircs dos

Latundecirc que tambeacutem evita vocaacutebulos com mais de trecircs siacutelabas [kutatildeni]

ldquoescutandordquo [bɾa sadƱ] ldquoabraccediladordquo [fiɾ tɪ] ldquodiferenterdquo

O Latundecirc evita o onset em final de palavra adicionando uma vogal para

reorganizar o padratildeo silaacutebico A vogal mais frequente seraacute a alta anterior

[i] [harsquopazɪ] ldquorapazrdquo [dorsquosejzɪ] ldquode vocecircsrdquo

Os sons [ʃ] [ʒ] [tʃ] e [dʒ] satildeo evitados por natildeo fazerem parte do inventaacuterio

fonoloacutegico do Latundecirc de forma que a sua realizaccedilatildeo eacute mais marcada na

liacutengua O comportamento desses segmentos eacute muito variaacutevel Nos mais

jovens satildeo realizados com mais frequecircncia e nos mais velhos satildeo

reinterpretados envolvendo processos diversos [sersquogamƱ] ldquochegamosrdquo

205

[dersquosaɾƱ] ldquodeixaramrdquo [lizeɾƱ] ldquoligeirordquo [azersquota] ldquoajeitarrdquo [ʃũrsquomiɾƱ] ldquosumiramrdquo

[bursquoʒoɾƱ] ldquobesourordquo [tʃĩrsquodʒeɾƱ] ldquocinzeirordquo

A ausecircncia do contraste surdo-sonoro nas consoantes oclusivas t e k do

Latundecirc promove sua neutralizaccedilatildeo na realizaccedilatildeo das consoantes no

portuguecircs dos indiacutegenas [lsquobɾika] ~ [lsquobriga] ldquobrigardquo [s rsquotatu] ~ [se rsquotado]

ldquosentadordquo

No que tange ao comportamento das vogais meacutedias postocircnicas os

vocaacutebulos terminados em [Ʊ] tendem a ser produzidos com [ɪ] e os

terminados por [a] tendem a ser realizados com [Ʊ] que satildeo vogais menos

marcadas [kazɪ] ldquocausardquo [ lĩpɪ] ldquolimpordquo [ka besƱ] ldquocabeccedilardquo [bas tatildetƱ]

ldquobastanterdquo

A partir dos fenocircmenos observados buscamos responder agraves perguntas

norteadoras da nossa pesquisa abaixo retomadas

Fatores internos (linguiacutesticos) e externos (estruturais) interagem com os

princiacutepios da marcaccedilatildeo

Resposta Quanto aos fatores externos no que diz respeito agrave faixa etaacuteria

os mais jovens tendem a natildeo transferir os padrotildees mais marcados da sua

liacutengua para a liacutengua adquirida Em contrapartida os mais velhos

reproduzem com menor frequecircncia os padrotildees mais marcados do

Portuguecircs (liacutengua dominante)

Qual o papel da marcaccedilatildeo no contato linguiacutestico

206

Resposta A marcaccedilatildeo considerada natural responde pela escolha de

padrotildees mais ou menos marcados interlinguisticamente Por essa razatildeo

prevalece a tendecircncia agrave siacutelaba CV do que decorre o apagamento da coda e

a simplificaccedilatildeo de onset complexo De outro lado haacute o natildeo repasse da

laringalizaccedilatildeo vocaacutelica que mesmo fonoloacutegica no Latunecirc eacute menos natural

e mais marcada nas liacutenguas do mundo A marcaccedilatildeo fonoloacutegica eacute

observada na neutralizaccedilatildeo de oposiccedilotildees vaacutelidas no portuguecircs poreacutem

inexitentes na liacutengua indiacutegena como o contraste quanto agrave sonoridade nas

oclusivas e agrave escolha da vogal em posiccedilatildeo final de nomes

Efetivamente um aspecto da marcaccedilatildeo natural pode responder pelo

comportamento da marcaccedilatildeo fonoloacutegica de maneira que natildeo satildeo

caracteriacutesticas de marcaccedilatildeo oponentes entre si No caso em estudo as

duas marcaccedilotildees operam mas natildeo respondem por todos os fenocircmenos

observados Aleacutem disso o caraacuteter altamente variaacutevel das realizaccedilotildees e as

condicionantes sociais dos falantes datildeo chance para a emergecircncia de

processos mais decorrentes da falha na percepccedilatildeo do sinal sem que se

estabeleccedila a regularidade na sua produccedilatildeo

Os traccedilos mais marcados da liacutengua dominada passam para a dominante

Resposta Em alguns caso sim como a africativizaccedilatildeo do s Em outros

natildeo como o natildeo repasse da larinzalizaccedilatildeo vocaacutelica e a oposinccedilatildeo entre

vogais orais e nasais

Ademais em face dos fenocircmenos observados podemos pontuar algums

aspectos relevantes os processos que envolvem perda e permuta de segmentos

satildeo mais frequentes dos que os que envolvem ganho de segmento os segmentos

207

natildeo presentes no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc (liacutengua originaacuteria) tendem a

ser apagados ou reinterpretados pelo segmento mais proacuteximo do portuguecircs

sendo este uacuteltimo o mais frequente os traccedilos mais marcados do Latundecirc estatildeo

mais evidentes nas falas da geraccedilatildeo preacute-contato e a marcaccedilatildeo natildeo estaacute

condicionada apenas aos universais linguiacutesticos mas agraves especificidades das

liacutenguas

Por fim salientamos que o nosso propoacutesito neste estudo foi o de contribuir para a

descriccedilatildeo de liacutenguas incluindo as indiacutegenas e de abrir caminhos para o estudo

do contato linguiacutestico especialmente em niacutevel da foneacutetica e da fonologia

Ressaltamos que este trabalho natildeo encerra o estudo sobre o contato entre as

duas liacutenguas Reconhecemos que os nossos resultados representam um ponto de

partida para investigaccedilotildees posteriores as quais poderatildeo expandir o tema e

avanccedilar no campo da inter-relaccedilatildeo entre contato linguiacutestico e a marcaccedilatildeo

208

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221

ANEXOS

(Dados Transcritos)

parsquoguo Apagou marsquoma Mamar pegũrsquotatildenu Perguntando barsquoʃo Vassoura rsquokɔsa Coccedilar

marsquoduu Mais duro

rsquokati Quati

arsquoh ti A gente rsquootu Outro irsquoarsquov j E jaacute vem v rsquone ni Veneno pɛgũrsquoto Perguntou rsquofoʃ Foi pɾatildersquoto Plantou rsquosuzu Sujo karsquobeli Cabelo gursquoduɾu Gordura rsquootildemi Homem rsquogodu Gordo rsquopega Pegar dersquotadu Deitado

marsquotau Mataram

korsquokin Coquinho guɾirsquozĩ Gurizinho rsquotakorsquosotildenu Taacute com sono (manutenccedilatildeo) mũdi Mundo ʃursquov ni Chovendo pigũrsquota ni Perguntando sursquov ni Chovendo rsquopɔtʃa Porta kursquomigi Comigo kũversquosatildeni Conversando larsquovatildeni Lavando morsquoh di Morrendo ikursquotatildenu Escutando mursquohidu Morrido marsquohadu Amarrado irsquokutu Escuto

persquohu torsquose Pergunto a vocecirc

rsquoseja Cheia rsquoozi Hoje

rsquoʃuʊ Sujo

222

ursquozotursquopatildejrsquoagʊa Os outros apanham aacutegua

rsquotʃua Suja

bu rsquonitu Bonito

rsquokɛla Aquela

rsquomu tu Muito

vehrsquomejo Vermelho rsquomasu Manso marsquosatildedu Amansando arsquoɾisi Arisco hursquoo Avoou rsquoaga Aacutegua

rsquode tu Dentro

rsquomu tu Muito

rsquotud Tudo irsquopia Espirra isrsquopritu Espiacuterito

rsquofɔti Forte

timirsquotɛi Cemiteacuterio

tɛrsquoha Enterrar

ɔʊrsquoa Jogar (o bicho fora)

tersquoou Enterrou rsquoela Ela matildersquodatilden Mandando batorsquose Bater em vocecirc rsquotokursquotatildenu Tocirc escutando rsquobatildej Banho bɾab Brabo

rsquosɛtu Certo

Kabirsquosela Cabeceira (do rio)

karsquosi bu Cachimbo

tʃursquoveɾu Chuveiro (pau de) rsquoleti Leite rsquofutu Fruto karsquoɾoʃi Caroccedilo kaharsquopitʃu Carrapicho rsquokɾu Crua rsquomasu Massa

pe rsquoʃa Pensar

ojrsquoatildedu Olhando (idem)

pe rsquoʃatilden

Pensando

i te rsquode nu Entendendo

223

irsquokuta Escuta

kwatildedu ew piki nĩnĩ Quando eu era pequenininha

ew bĩrsquokava rorsquodeɾa cũ a lɔrsquoɾĩne

Eu brincava de roda com a Lorine

katildendu pi ĩ

Quando piin

ew tatildebȇĩ cũ a lorsquoɾine

Eu tambeacutem com a Lorine

i lsquoluɾi ku a marsquoɾi

E Lurdes com a Mariacute

mĩa matildey natildew deʃa bɾĩrsquoka

Minha matildee natildeo deixava brincar

eli bɾika corsquomigu

Ela brigava comigo

e koʃta brinrsquoka ni lsquoKotildepu E gostava de brincar no campo

mĩa matildej natildew deʃa bɾĩka Minha matildee natildeo deixava brincar

ersquoli tatildebe j diskuti Ela tambeacutem discutia

tatildebej kɾiatildesa natildew paɾa lsquonɛ Tambeacutem crianccedila natildeo para neacute

fika bahaka bɾĩkatildeni lsquonɛ Fica na barraca brincando neacute

fika gɾitatildeni Fica gritando

a mĩa matilde matildedava bɾĩka lotildeʒi A minha matildee mandava brincar longe

natildew kɛ ve baɾuj na bahaka natildew Natildeo quer ver barulho na barraca natildeo

ki falatildenu O que eu tocirc falando

ki lsquota bɾĩganu nu katildepu Que eu tava brincando no campo

a fruta kirsquoli cotildepi nɛ

A fruta que ele come neacute

kinotildemi di fɾuta Que nome de fruta

akeli iogrii nɛ

Aquele neacute

nɔy sursquopaha lsquo deli Noacutes chupava dele

so eli komenu fɾuta Soacute ali comendo fruta

noj fike mu arsquotɛ ʃersquoga meatilde note

sersquoga

Noacutes ficamos ateacute a meia noite chegar

mĩa matildej bɾiga kumigu Minha matildee brigava comigo

224

tava se ew levatildeta sedu se ew levatildeta sedu

Estava ʔ

va la nu katildepu bɾĩrsquoka Vaacute laacute no campo brincar

u katildepu lsquota satildematildedu orsquosejs O campo taacute chamando vocecircs

noj levatildersquota pɾa bɾĩrsquoka nu kotildepu Noacutes levantaacutevamos para brincar no campo

o katildepu ɛ u maj limpi O campo eacute o mais limpo

eli bɾĩkaru eli istubidu Eles brincaram eles subiram

ɛ ke katildepu num ɛ awto katildepu mũto

baso

Eacute que o campo natildeo eacute alto O campo eacute muito baixo

nɔj sersquogamu bersquobe nu i corsquome nu Noacutes chegamos bebendo e comendo

miu asadu batata e bebe nu

Milho assado batata e bebendo

ew nũm fikej ew bɾĩkava dinoti Eu natildeo fiquei eu brincava de noite

mĩa matildej natildew desa duhmi mĩa matildej bɾiga kumigo

Minha matildee natildeo deixa dormir minha matildee briga comigo

mĩa paj farsquolo sej dumi sedu se pikaɾu cobɾa Kotildemu ki darsquoi

Meu pai falou vocecircs durmam cedo se cobra picar e daiacute

vai sarsquoɾa ou vai a mɔhe Vai sarar ou vai morrer

mĩa paj bɾĩkow diskuti dele natildew Meu pai brigou porque eu natildeo escutava ele natildeo

dohmi amatildersquoɳatilde sedu vorsquose bɾĩrsquoka corsquome mũĩtu fɾuta

Dorme amanhatilde cedo vocecirc vai brincar comer muito fruto

mĩa paj natildew desa ew bɾĩka natildew Meu pai natildeo deixava eu brincar natildeo

natildew icuti dele natildew Natildeo escutei ele natildeo

cɾiatildesa icursquoto crianccedila escutou

iheni fala icursquoto ɛ A gente fala escutou eacute (a gente fala e ela ndash a crianccedila ndash escutou eacute

ni batia natilde mi batia na Natildeo batia natildeo me batia maj eli nũ sabe barsquotih Mas ele natildeo sabia bater

225

falava di bɾabu mihmu Falava bravo mesmo

matildeda agwa matildedƷɔga Mandava buscar aacutegua buscar mandioca

asa biƷu kome Assar beiju comer

nĩ tĩ aacutegua pɾa eli natildew Natildeo tinha aacutegua pra ele natildeo

mĩa matildej natildeo desa ew vĩrsquoga Minha matildee natildeo deixava eu brincar

mĩa povu

Meu povo

bĩ botilde natildew Bem bom natildeo

esi aki bisu bɾabu Esse aqui bicho brabo

mĩa povu matatildedu nosu tudo Meu povo matando o nosso tudo

e ki nomi dee ɛ E que o nome dele eacute

nũ pe rsquosa nisu aki la Natildeo pensar nisso aqui laacute

mĩa matildee falo natildew podi bɾĩka de tu

dagwa notilde

Minha matildee falou natildeo pode brincar dentro drsquoaacutegua natildeo

agwa e mũitu peɾigoso A aacutegua eacute muito perigoso

ĩdƷu vĩ i mata tudĩ nũ iscapa ũ notilde Iacutendio veio e matar tudinho natildeo escapa um natildeo

distotildena kohpu sɔ leva sɔ cabesu Destrona corpo soacute leva soacute a cabeccedila

isu aki nũ ɛ mĩa pare ti notilde Isso aqui natildeo eacute meu parente natildeo

io mimu Eu mesma

nĩge j notilde sabi Ningueacutem natildeo sabe

esi ki ĩdiu moɾava ki i uvi Esse aqui iacutendio morava aqui e ouvi

kɛbaɾu asĩ levo di Quebraram assim levou de Alternacircncia de coacutedigo

demorsquoɾo i ew sersquoge tame j Demorou e eu cheguei tambeacutem

Komi ki rapaɾi kebɾo

Como eacute que o rapaz morreu

226

ai fala pɾa eli nɛ isu ku hapazu Aiacute falou pra ele neacute Isso com o rapaz

eli moɾa debasu di paw nɛ Ele morava debaixo de pau neacute

ve tu dehubo caiw cima deli na

hedu

Vento derrubou caiu em cima dele na rede

sɔ o paj deli capow Soacute o pai dele escapou

vose da mujɛ notilde Vocecirc da mulher natildeo

akeli povu deli mĩ mata todo mĩa povu

Aquele povo dele mata todo meu povo

ĩ via pɾetu Em Veado Preto

paɾEsi kũ ƷEƷĩ Parece com Zezinho

ew moɾa hũtu aki Eu moro junto daqui

keli otɾu Aquele outro

patɾaj iɾe boɾa Para traz ir embora

ai dimorsquoɾo Aiacute demorou

sersquogo Chegou

keli cahĩ sersquogo Aquele Carlinhos chegou

sarsquoi hora orsquoʎa Saiacute fora pra olhar

arsquoi farsquolo dersquosaɾu Aiacute falou deixaram

ota lĩgwa difire ti Outra liacutengua diferente

ta sorsquoɾanu Taacute chorando

ta bĩbotilde natildew Taacute bem bom natildeo

fika tʃorsquoɾatildenu Fica chorando

mĩa pare ti desaɾu mĩa mursquoje Meus parentes deixaram minha mulher

te j bastatildeti Tem bastante

pigũta pa eli Pergunta pra ele

227

maselu kwidava Marcelo cuidava

oti tipu Outro tipo

kotildevɛsa deli nũte di notilde A conversa dele natildeo entendo natildeo

komu ki fala fire ti Como eacute que fala diferente (afeacuterese)

na kohpu uƷa No corpo usa

lizeɾu Ligeiro

tʃarsquoma eli Chamar ele

matildersquodo sabotilde pa eli Mandou sabatildeo pra ele

abɾiw pota Abriu a porta

lava motilde lava pɛ lava bɾasu Lavei a matildeo lavei o peacute lavei o braccedilo

ai ew fikej oiatildenu ai Aiacute eu fiquei olhando aiacute

fikej na pota oiatildenu cutatildeni Eu fiquei na porta olhando

nũ capa niũ Natildeo escapa nenhum

marsquoto cota piskosu Matou e cortou o pescoccedilo

kabesĩn Cabecinha

cusivi kimigu Inclusive comigo

batildeku busa sĩ Branco blusa assim

kursquomiɾu a karsquobesa da lsquoge ti Comeram a cabeccedila da gente

ũ nũ firsquokaɾi Um natildeo ficou

otirsquoĩdʒu Outro iacutendio

ʒũrsquotaɾu Juntaram

bɾirsquogamu pɾa eli Explicamos pra ele

ɔto dii ele vorsquoto dinovu Outro dia ele voltou de novo

ew sarsquoi hora Eu saiacute fora

otoɾapaj cursquoto Outro rapaz escutou

228

oʎa lotildezi Olhou longe

ew lsquoho

Eu vou

desa notilde Deixava natildeo

kuta baɾuj Escuta barulho

marsquoto tudi noɔɾa Matou tudo na hora

sɔ cabesu levo kumew Soacute a cabeccedila levou e comeu

mi a matildej cu tava Minha matildee contava

agwa tupiw tudo A aacutegua entupiu

agwa be j pɾeti mehmu Aacutegua bem preta mesmo

agwa suzi Aacutegua suja

pɾimiɾu kanɛlu Primeiro canela

i totilde paɾi Entatildeo eu parei

nu sarsquobi Natildeo sabia

pɾimeɾu u tigu Primeiro antigo

bastatildetu

Bastante

bastatildetu Bastante

todu tiɾatildenu levatildenu Tudo tirando levando

rsquokaze disu ficaɾu Por causa disso ficaram

tu kɾiatildesa Tudo crianccedila

lersquova todu mini nadu Levar toda meninada

eli mi tinu Ele mentindo

kotildemu orsquose pɾatildeta mu ito Como vocecirc planta muito (rotacismo)

nɔj kume nu aki Noacutes comendo aqui

nɔj seskɛse nu fukamu Noacutes nos esquecemos e ficamos

a noti marsquotaɾu tudu Agrave noite mataram tudo

229

eli sego gatildersquono Ele chegou enganou

kotildemiɾu Comeram

eli kotildersquoto soɾatildeni Ele contou chorando

ke j kwi kiɾo Quem que tirou

mi da mi a filu Me daacute meu filho

sɔ u ki karsquopo Soacute um que escapou

kɾirsquoa na kolu Criar no colo

vi de la u motildeti di he ti Veio de laacute um monte de gente

ew tatildebe j gotava

Eu tambeacutem gostava

na kɔba no basu

Na cobra no braccedilo

bisi u Bichinho

kabeseɾa pɛtu Cabeceira perto

mɔɾa pa basu Mora pra baixo

dirsquofisu marsquota Difiacutecil matar

sɔ bisotilde Soacute bichatildeo

ɛ h~undo Eacute fundo

pohku Porco

fɾɛsa Flecha

mi a matildej falaɾu Minha matildee falou

mi a matildej fikaɾu Minha matildee ficaram (ficou)

pɾimi mehmi Primo mesmo

tatɾa paj tambe j Trata pai tambeacutem

mi atilde ihmatilde maj vɛj Minha irmatilde mais velha

tu tia vɛj ta i Tua tia velha ta aiacute

tɾata gwau gwau ahe ti Trata igual igual a gente

230

halu hɛlarsquodo Ralo ralador

basoɾa ipi Vassoura espinho

fakotilde kotaɾu Facatildeo cortaram

hɛla matildersquodʒɔka Rala mandioca

ai dipoj Aiacute depois

ku faki pike nu Com faquinha pequena

hɛla tatildeme j Rela tambeacutem

mi a paj asirsquona Meu pai ensinar

kɔtaɾu kotilde a taba Cortaram com a taacutebua

disaɾu Deixaram

nu kotildepu No campo

la i basu Laacute embaixo

mi a paj nu hipotildedew natildew Meu pai natildeo respondeu natildeo

pesu Peixe

a notu toda A noite toda

baztatildeti poɹku la Bastante porco laacute

u digu vi Um dia que vim

mi atilde matildej kotildekorsquodo Minha matildee quando acordou

mi atilde matildej forsquola Minha matildee foi laacute

kazi gɾatildedi Quase grande

nɔj te j medu dosejzi Noacutes temos medo de vocecircs

bersquozu kumiw Beiju comeu

mohew saɾatildepi Morreu de sarampo

pigu tatildeni Perguntando

na katildepa No campo kahni asadu Carne assada

231

morsquohe tudi a Morrer tudinho

depoj ʃu miɾu Depois sumiram

dimorsquoɾo mujtu Demorou muito

mɔdi tehu Por causa da terra

ja vaj tʃarsquoi Jaacute vai sair

batildedorsquono Abandonou

fike mu arsquoi Ficamos aiacute

aʒe ti ojrsquoo A gente olhou

hatildeka karsquoɾa Arranca caraacute

tʃiɾi ga basi na Seringa para vacina

barsquotʃotilde Batom

nɔj peɾatildenu Noacutes esperando

mi asu rsquoto Me assustou

i odʒi E hoje

be j vimej Bem vermelho

otu di ʃi ma Outro de cima

sersquogo corsquohe Chegou correr

i te di be j Entende bem

mi asursquoto Me assustou

matatildenu nɔjzi Matando noacutes

mi a fila Minha filha

kumiɾu Comeram

azersquota korsquola pɾa eli Ajeitar colar pra ele

sarsquoma eli

Chamar ele

tʃega logu Chega logo

ʃiguɾow di novʊ Segurou de novo

232

dirsquoso firsquoko Deixou ficou

arsquotɛ dɛrsquozoɾa Ateacute dez horas

tʃɔ ɔjrsquoa Soacute olhar

pi gada Espingarda

pɛhtu casueɾu Perto da cachoeira

maj pɛtu Mais perto

ote la Outra laacute

pɛga pesi Pega peixe

oti kazi Outra casa

pɛga milu Pegar milho

depoj tʃumiɾu bɾatildeku Depois sumiu o branco

mi rsquode ɾu Me deram

satildegɾaɾi asi Sangraram assim

bastatildetu Bastante

atildersquoda karsquosatildedu

Andar caccedilando

mi atilde filu Meu filho

nɔj fikatildeni Noacutes ficamos

ki kursquoto Que escutou

sɔ sorsquoɾatildenu Soacute chorando

depoj deli mohidu Depois dele morrer

nu ta vɛj Natildeo taacute velho

ta noj i da Taacute novo ainda

mi atilde matildej ta bii noj i da Minha matildee ta bem nova ainda

pɛrsquoga baʒtatildetu Pegar bastante

ew persquoge Eu peguei

233

mi atilde lsquoho farsquolo Meu avocirc falou

dimuɾatildeni Demorando

tehaɾu la mehmu Enterraram laacute mesmo

mi atilde matildej soɾatildenu Minha matildee chorando

mi atilde imatilde Minha irmatilde

E cursquoɳadi deli Eacute cunhado dele

E fii deli Eacute filho dele

kursquoɳadi deli Cunhado dele

hɔba demaj Rouba demais

ta difisi Ta difiacutecil

eli tʃobɾo Ele sobrou

saɾatildepi persquogo Sarampo pegou

pɾimeɾi morsquohe Primeiro morreu

ew kutej Eu escutei

sarsquoma matildej Chamar matildee

ta dirsquovisi Taacute difiacutecil

mohew ve me nadu Morreu envenenado

ki kɾirsquoari Que criaram

mi atorsquomaɾu Me tomaram

i ew torsquoteɾu E eu solteiro

kazadu kotildersquose Casado com vocecirc

natildew firsquoka diɾetu Natildeo ficar direito

firsquoka kweli Ficar com ele

mersquosenu Mexendo

ta setu Ta certo

234

bɾabu persquoeli Bravo por ele

tasirsquooma komigu Tem ciuacutemes de mim

E gotozu Eacute gostoso

tipu bursquoʒohu Tipo besouro

tʃi rsquodʒeɾu Cinzeiro

na li gi Na liacutengua

bɾatildeku batirsquotaɾu Brancos batizaram

katildedu eɾa novi Quando era novinho

arsquoi tipoj Aiacute depois

karsquoboɾe Acabou-se

tiguɾa na matildew Segura na matildeo

rsquoɛ lsquopɾimɛ lsquodeli Eacute primo dele

asinatildeni Ensinando

ew kersquome Eu queimei

pɾatildersquota maj Plantar mais

ew vo lsquopɾatildeta Eu vou plantar

karsquokwɛ Qualquer

tabaɾava Trabalhava

tubaɾotildeni Tubaratildeo

poɾi pɛɾa Pode esperar

mi ti nu Mentindo

eli sersquogo Ele chegou

atildersquototilde Entatildeo

ta lsquosetu natildew Ta certo natildeo

mesew kotildersquomigu Mexeu comigo

235

ʃersquoga dinote Chegar de noite

lersquova pirsquotaw Levar pro hospital

ta suzu Ta sujo

rsquobahio Bairro

atildebɾarsquosada Abraccedilada

masɛlu babudo Marcelo barbudo

pɾatildeta milu Planta milho

na gɾɛba Na gleba

bɾasadu Abraccedilado

komi he tʃi Comi gente

kɛ azursquoda Quer ajudar

sotildebɾasotilde Assombraccedilatildeo

nu podi atildersquoda Natildeo pode andar

pɛga na tiheɾu Pega no terreiro

kɔviotilde Gaviatildeo

sɔ eli karsquopo Soacute ele escapou

me rsquoto Aumentou

levava uz vɛio Levava os velhos

matildenɛ desaɾu Maneacute deixaram

pusa no kabelu Puxa no cabelo

kabelu ge ti hatildega Cabelo de gente arranca

iɔga ge ti pɾa la Joga gente pra laacute

hu tu Junto

kɛma he ti queima a gente

ki sɔ a oti Que soacute haacute outro

bagas~i Bagacinho

236

tiɾatildeni katildetatildeni Tirando cantando

kɾese ni Crescendo

dirsquoɾetu Direito

febɾu marsquolaɾu Febre malaacuteria

maj sarsquobiw Mais sabia

tiɾaɾu Tiraram

batildei Banho

ipia deli Espirro dele

Korsquodadu mehmo Acordado mesmo di notu De noite

kasu Caccedila

baɾizadu otu Batizado outro

atʃi mi a ihmatilde fala Assim minha irmatilde fala

kotadu Encostado

nu zudia deli natildew Natildeo judia dele natildeo

gɔta maj deli Gosta mais dele

samatildedu otu Chamando outro

mi atilde subɾi Meu sobrinho

mi atilde pohu Meu povo

mi atilde matilde Minha irmatilde

mi atilde muʒka Minha muacutesica

sɔ bɾi ga Soacute brinca

tʃubi nu Subindo

kahega na koʃta Carrega nas costas dese Desse aiacute istu Isto katildersquoba Gambaacute

237

kursquotia Cutia kursquotʃia Cutia

marsquoɾɛlu Amarelo

versquomela versquomelo Vermelha vermelho rsquose Esse

te natildeʊ te natilde Tem natildeo

esersquoki Esse aqui

rsquoɛmarsquokakupɾersquogisi Eacute macaco preguiccedila

morsquosegi Morcego

defersquore ti Diferente

rsquopodƷi Pode

rsquosersquonatilde Sei natildeo

rsquosersquoviw Vocecirc viu

arsquoinrsquoɛgarsquoviatildew Aiacute eacute gaviatildeo

jabutʃi Jabuti

parsquoɾɛsirsquokele Parece aquele

ɛrsquokele Eacute aquele

rsquoessersquote Esse tem

be i natildeu Tambeacutem natildeo

kursquoruja Coruja

pike nu Pequeno

defersquore ti Diferente

rsquokelersquoɛrsquootro Aquele eacute outro

rsquoejarsquobutʃi E jabuti gɾatildersquodatilde grandatildeo rsquomesmu mesmo

rsquomemu Mesmo

ɔrsquoɾɔpa Europa

arsquobeja Abelha

iscɔhpiatildew escorpiatildeo

ewmɔrsquoʎa Eu molhar ~ Eu molho

pirsquodi pedir tasrsquocɾitu Ta escrito

pɛdƷi Pedi (a gente )

Kersquoma queimar

mode nu Mordendo

morsquodemas Mordeu mais rsquonoj rsquodoj Noacutes dois

aʃe ti A gente (noacutes)

rsquopadirsquoze Pra dizer

238

rsquokɔta Corta

ahatildejrsquoo Arranhou

mujrsquoɛ Mulher

ahajrsquoaelig Arranhou orsquosersquomehm Vocecirc mesmo

isrsquopi Espinho

sorsquome Somente

rsquokalo ~karsquolo Calor doi Dois

tatildebe Tambeacutem

ispi rsquogada Espingarda

persquode Perdeu

se rsquotatu Sentado

rsquohe ti Gente

arsquodidu Ardido rsquokoda Corda mərsquota Matar marsquotani matando

rsquoʃɔmarsquota Soacute matar

rsquobisu Bicho rsquoota Outra

patildersquota ~rsquopɾatildeta Plantar

atildersquodatildeni Andando

ve tatildeni Ventando

defersquore ti Diferente

hursquoatildenu Voando vorsquoto Voltou rsquopodirsquoze Pode dizer marsquotaforsquogatilden Matar afogando rsquodaga Da aacutegua (drsquoaacutegua) arsquoɾea Areia

rsquofu da Afunda

rsquokɛlaforsquogo Que ela afogou

mɛgursquola Mergulhar

eʃpɾersquome Espremer

hɛlatilden Ralando (verbo ralar)

mɔrsquolada Amolada

kwatildeni Quando arsquotia Ateia (verbo atear)

239

i pursquoha Empurrar

epursquohej Eu empurrei

pursquoha Empurrar rsquofoti Forte

rsquofosa Forccedila

rsquohapu Raacutepido

ku rsquopɛ Com o peacute

eki pursquohe Eu que empurrei

sirsquonɛlu Chinelo

i pursquohan Empurrando

sɔrsquose Soacute vocecirc

rsquotapursquohanu Taacute empurrando

sɔrsquozi Sozinho

rsquohatildeka Arrancar

rsquosɔhatildersquoka Soacute arrancar

jrsquoahatildersquoke Jaacute arranquei

arsquohatildekui rsquoʃada Arranco com a enxada

rsquopuʃa Puxar cabelo pursquoʃo Puxou pursquoʃe Puxei haʃrsquoto Arrastou haʃrsquote Arrastei

tʃirsquoa Tirar

buʃrsquoca Buscar buʃrsquoke Busquei (eu passado) rsquooto Outra rsquohopa Roupa rsquomemo Mesmo rsquodeʃa Deixa

tirsquoe Tirei

rsquosɛtu Certo

rsquohejtu Jeito iskujrsquoe Escolher rsquotakujrsquoenu Taacute escolhendo ojrsquoan Olhando

tʃumi Sumiu

dimursquoranu Demorando kersquoma Queimar ursquozotu Os outros kersquome Queimei

rsquonɔj Noacutes

rsquopejsi Peixe

Ku rsquome Comer

240

pɾicirsquoza Precisar pɾisirsquozanu Precisando korsquoseɾa Coceira mirsquoƷatilden Mijando atildersquodatildenu Andando

barsquote nu Batendo

i rsquoʃima Encima

rsquokatildem Cama atirsquoɾo Atirou

rsquohaʃarsquole Racha lenha

vɔrsquota Voltar

tursquomatilden Tomando

varsquoɾi Varinha

gɾitrsquoatilden Gritando

fɾɛrsquoga Esfregar

mirsquodi Medir

mi rsquotinu Mentindo

rsquokɔʃka Coacutecega

barsquosi u Baixinho

pɔdirsquoze Pode dizer

pe rsquota Pentear

rsquobatildej Banho rsquomaiƷrsquotadi Mais tarde rsquofoja Folha batildenarsquodo Abanador bursquonitu Bonito

rsquosersquokirsquode Vocecirc que deu

siparsquoradu Separado rsquosatildew Chatildeo

tursquodi Tudinho

karsquoe Cair kersquobɾe Quebrei arsquohatildejorsquose Arranho vocecirc rsquomuja Molha rsquosevi Serve rsquopaj Palha pirsquodi Pedir dersquosa Deixar rsquomoj Molho fɾersquovenu Fervendo pursquolo Pulou

norsquovi Novinho

241

firsquodido Fedido mursquolada Amolada

rsquonɔʃi Nosso

patildersquoneɾu Paneiro motildersquodeli Matildeo dele dursquozotu Dos outros

rsquonɔj Noacutes

rsquopodi Podre firsquodid Fedido dersquota Deitar dersquotadu Deitado cuʃtursquoɾa Costurar

barsquote m Batendo

dersquosa Deixar

rsquofɾɛʃa ~rsquofɾEʃ Flecha

iskersquosidu Esquecido

tatildersquome j Tambeacutem

abersquoli Abelhinha

me rsquodu i Amendoim

pɔrsquodirsquoze Pode dizer

rsquoavi Aacutervore

rsquopesi Peixe

tatursquozi Tatuzinho

rsquovɛja Velha

arsquodea Aldeia

rsquode tu Dentro

rsquohe ti Gente

rsquohadu Raacutedio rsquohejtu Jeito iʃtɾarsquogadu Estragado

rsquode tirsquokaza Dentro de casa

rsquopoku Porco

pihu rsquotatildenu Perguntando

gwahrsquode Guardei firsquogeɾa Figueira

kɔrsquota Cortar

ojrsquoa Olhar

pi dursquoɾa pendurar

mitʃursquoɾa Misturar

rsquofɔtʃi Forte

242

matildersquodƷɔka Mandioca

birsquoƷu Beiju

marsquoɾɛlu Amarelo

atildersquozɔ Anzol

rsquopɛda Pedra

Page 2: MARCAÇÃO NO CONTATO LINGUÍSTICO: O português falado … · Transcrição Transcrição fonética Transcrição fonológica [ ] / / Vogais Vogal médio-baixa anterior [ɛ] Vogal

GUSTAVO DA SILVEIRA AMORIM

MARCACcedilAtildeO NO CONTATO LINGUIacuteSTICO O portuguecircs falado pelos Latundecirc

Tese apresentada agrave Coordenaccedilatildeo do Curso de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Letras da Universidade Federal de Pernambuco como requisito parcial para obtenccedilatildeo do grau de Doutor em Linguiacutestica Orientadora Profordf Drordf Stella Virgiacutenia Telles de Arauacutejo Pereira Lima

Recife 2015

Catalogaccedilatildeo na fonte

Bibliotecaacuteria Nathaacutelia Sena CRB4-1719

A524m Amorim Gustavo da Silveira Marcaccedilatildeo no contato linguumliacutestico o portuguecircs falado pelos Latundecirc

Gustavo da Silveira Amorim ndash Recife 2015 241 f il

Orientadora Stella Virgiacutenia Telles de Arauacutejo Pereira Lima Tese (Doutorado) ndash Universidade Federal de Pernambuco Centro de

Artes e Comunicaccedilatildeo Letras 2015

Inclui referecircncias

1 Fonologia 2 Liacutenguas em contato 3 Marcaccedilatildeo e liacutenguas indiacutegenas I Lima Stella Virgiacutenia Telles de Arauacutejo Pereira (Orientadora) II Tiacutetulo

410 CDD (22ed) UFPE (CAC 2017- 213)

For from him and through him and to him are all things To him be glory forever Amen

Romans 1136

AGRADECIMENTOS

A Deus por me capacitar e me fazer sentir o teu zelo cuidado e proteccedilatildeo

constantemente

Aos meus familiares em especial a minha matildee e o meu pai pelo suporte

coragem e exemplos a mim transmitidos

A minha esposa Jane pelo carinho e compreensatildeo pelas horas que natildeo

pude estar ao seu lado dedicando-me a este trabalho

Aos meus filhos Breno e Estela meu tesouros por me fazerem acreditar

que o mundo pode ser melhor

A minha orientadora Stella Telles pelo carinho compreensatildeo

engajamento e ensino por me fazer acreditar que podemos ser altruiacutestas sem

perdermos a essecircncia da humildade Por compartilhar-me com despreendemento

os seus dados

Agraves coordenadoras do PG-Letras Evandra Gligoletto e Fabiele Stockmans

pela presteza sempre que necessaacuterio

Aos meus mestres do Doutorado pelo trabalho que foi realizado durante o

curso em especial Stella Telles Marlos Pessoa Claacuteudia Roberta Siane Goes

Benedito Bezerra Virgiacutenia Leal Alberto Poza e Nelly Carvalho

Aos professores do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo (UFPE)

Flaacutevio Brainer Artur Gomes Maacutercia Mendonccedila e Joatildeo Batista pela colaboraccedilatildeo

na trajetoacuteria acadecircmica

A Abuecircndia Padilha e Gilda Lins (in memoriam) pela dedicaccedilatildeo e carinho

que demonstraram durante as aulas

Aos meus colegas do Doutorado Solange Carvalho Ana Cristina Cleber

Morgana Jaciara Carolina Pires Juliane Acircngela Socircnia Ismar Rinalda Ludimila

e Clara por me ajudarem nos momentos de dificuldades e de (muitas)

necessidades

Aos colegas da GER ndash Vale do Capibaribe pela ajuda sempre que

necessaacuterio em especial Marta Morgana Edjane e Janecleide

Aos colegas e alunos do IFAL (Instituto Federal de Alagoas) pela grande

ajuda e carinho que demonstraram durante a realizaccedilatildeo deste trabalho Pela

compreensatildeo das faltas e substituiccedilotildees que de mim foram demandadas

Aos membros da banca que tatildeo gentilmente aceitaram o convite

Aos meus amigos familiares entes queridos todos que direta ou

diretamente me ajudaram nesta caminhada Nenhum trabalho eacute feito sozinho

portanto os meacuteritos tambeacutem satildeo de vocecircs

RESUMO

O presente trabalho eacute o resultado de um estudo sobre a Marcaccedilatildeo no Contato

Linguiacutestico entre o Latundecirc e o Portuguecircs Trata-se de uma investigaccedilatildeo com

base na abordagem tipoloacutegica da linguiacutestica visando agrave elucidaccedilatildeo das unidades

mais e as menos marcadas que satildeo ou natildeo transferidas no processo de

acomodaccedilatildeo dos inventaacuterios foneacuteticos de ambas as liacutenguas Utilizamos como

base os pressupostos teoacutericos defendidos por CROFT (1990) JAKOBSON

(1953) BATTISTELLA (1996) MATRAS amp ELSIK (2006) e LACY (2006) para a

descriccedilatildeo dos universais linguiacutesticos e da marcaccedilatildeo No que tange ao contato

linguiacutestico nos respaldamos nas reflexotildees de ROMAINE (2000) THOMASON

(2001) AIKHENVALD (2007) e HYMES (1971) Para descriccedilatildeo linguiacutestica e

histoacuterica dos Latundecirc nos baseamos em TELLES (2002) ANOMBY (2009) e

PRICE (1977) No que tange ao aporte foneacutetico para descriccedilatildeo do contato entre

ambas as liacutenguas nos valemos dos escritos de WEINREICH (1953) BISOL

(1996) VAN COETSEM (1988) e MATRAS (2009) Quanto agraves anaacutelises nos

fundamentamos nas observaccedilotildees de SPENCER (1996) LASS (2000) e RICE

(2007) O nosso corpus eacute formado de trinta horas de fala transcritas

foneticamente de acordo com IPA de vinte informantes da comunidade Latundecirc

Os dados fazem parte do acervo do NEI (Nuacutecleo de Estudos Indigenistas) da

UFPE A partir da nossa pesquisa chegamos agrave conclusatildeo que os mais jovens

tendem a natildeo transferir os padrotildees mais marcados da sua liacutengua para a liacutengua

adquirida enquanto os mais velhos reproduzem com menor frequecircncia os

padrotildees mais marcados do Portuguecircs alguns contextos licenciam enquanto

outros bloqueiam a marcaccedilatildeo gerando um caraacuteter variaacutevel que demonstra o quatildeo

conflitante eacute a situaccedilatildeo do contato embora natildeo haja uma padronizaccedilatildeo no que

tange agrave estrutura silaacutebica o padratildeo CV eacute o mais recorrente e menos marcado

corroborando o que apregoa os pressupostos da tipologia linguiacutestica os

processos que envolvem perda e permuta de segmentos satildeo mais numerosos e

mais marcados dos que os que envolvem ganho de segmento os fonemas natildeo

presentes no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc tendem a ser apagados ou

reinterpretados pelo segmento mais proacuteximo do Portuguecircs quanto agrave manutenccedilatildeo

ou perda o comportamento dos traccedilos mais marcados do Latundecirc depende natildeo

categoricamente da fonologia do Portuguecircs a marcaccedilatildeo natildeo estaacute condicionada

apenas aos universais linguiacutesticos mas agraves especificidades da liacutengua

PALAVRAS-CHAVE Fonologia Liacutenguas em Contato Marcaccedilatildeo e Liacutenguas

Indiacutegenas

ABSTRACT

The present work describes phenomena of phonological transference of Latundecirc

a Brazilian indigenous language in Portuguese in language contact situation The

observed phenomena were examined under the light of the assumptions of

Linguistic Marking in its typological approach As basis we used CROFT (1990)

JAKOBSON (1953) BATTISTELLA (1996) MATRAS ELSIK (2006) and LACY

(2006) studies for the description of linguistic universals and marking About

language contact we were supported by the reflections of ROMAINE (2000)

THOMASON (2001) AIKHENVALD (2007) and HYMES (1971) For the linguistic

and historical description of Latundecirc we were based on TELLES (2002)

ANOMBY (2009) and PRICE (1977) About the phonology of Portuguese we were

supported by BISOL (1996) For description of the contact between both

languages we used the writings of WEINREICH (1953) VAN COETSEM (1988)

and MATRAS (2009) The one of phonological phenomena observed was backed

in SPENCER (1996) LASS (2000) and RICE (2007) Our corpus is formed of thirty

hours of talk phonetically transcribed according to IPA In the survey we used the

speech production of 20 individuals from the Ladundecirc people among these 8

belonging to the pre-contact generation with the non- indigenous society and 12

belonging to the post-contact generation The data are part of the acquis of NEI

(Nuacutecleo de Estudos Indiacutegenas) of UFPE With our research we came to the

following results post-contact generation tends not to transfer most marked

patterns of their language to the acquired language while the native of pre-contact

generation do in a lower frequency the more marked standards of Portuguese

The processes that involve loss and exchange of segments are more numerous

than those involving segment gain The phonemes of Portuguese that do not exist

in Latundecirc tend to be erased or reinterpreted by the closest segment to

Portuguese resulting in the loss of contrast and in the emergence of the

unmarked through the phonological neutralisation There are phenomena that

show a tendency towards the universal as the deletion of the coda in favor of CV

standard syllabic and others that are arising out of restrictions of Latundecirc as the

monophthongization of nasal diphthong and the change of vowel quality in word-

final position In the set of phenomena we noticed that the interference is variable

and not always motivated by phonological or natural marking

KEYWORDS Phonology Marking Languages in contact Portuguese and

Latundecirc

RESUMEN

El presente estudio describe los fenoacutemenos de la transferencia fonoloacutegica del

Latundeacute una lengua indiacutegena Brasilera en el portugueacutes en una situacioacuten de

contacto linguumliacutestico Los fenoacutemenos observados fueron examinados a la luz de los

presupuestos de marcacioacuten linguumliacutestica en su abordaje tipoloacutegico Como modelo

de fundamentacioacuten se han utilizado los estudios de CROFT (1990) JAKOBSON

(1953) BATTISTELLA (1996) MATRAS amp ELSIK (2006) y LACY (2006) para las

descripcioacuten de los universales linguumliacutesticos y de la marcacioacuten Sobre el contacto

linguumliacutestico fueron tomados como soporte cientiacutefico las reflexiones de ROMAINE

(2000) THOMASON (2001) AIKHENVALD (2007) y HYMES (1971) Para la

descripcioacuten linguumliacutestica de los Lantundeacute esta investigacioacuten se basoacute en TELLES

(2002) ANOMBY (2009)y PRICE (1977) Sobre la fonologiacutea del portugueacutes se

tuvieron en cuenta los estudios de BISOL (1996) Para la descripcioacuten del contacto

entre ambas lenguas fueron necesarios los escritos de WEINREICH (1053) VAN

COETSEM(1988) y MATRAS (2009) Finalmente el estudio de los fenoacutemenos

fonoloacutegicos observados fueron abordados en las investigaciones de SPENCER

(1996) LASS (2000) y RICE (2007) El corpus de este trabajo acadeacutemico estaacute

compuesto por treinta horas de diaacutelogos transcritos foneacuteticamente de acuerdo con

el IPA En la investigacioacuten se ha utilizado la produccioacuten del diaacutelogo de 20

individuos del pueblo Latundeacute dentro de ellos 8 pertenecientes a la generacioacuten

del pre contacto con la sociedad no indiacutegena y 12 pertenecientes a la generacioacuten

del post contacto Los datos hacen parte del acervo del Nuacutecleo de Estudios

Indigenistas (NEI) de la UFPE Con esta investigacioacuten se ha llegado a la siguiente

conclusioacuten La generacioacuten post contacto tiende a no transferir los patrones maacutes

acentuados de su lengua hacia la lengua adquirida mientras que los indiacutegenas de

la generacioacuten del pre contacto realizan con menor frecuencia los patrones maacutes

marcados del portugueacutes Los procesos que envuelven la peacuterdida y permuta de los

segmentos son maacutes numerosos de aquellos que involucran la ganancia del

segmento Los fonemas del portugueacutes que no existen en el Latundeacute tienden a ser

borrados o reinterpretados por el segmento maacutes proacuteximo al portugueacutes resultando

en una peacuterdida de contraste y en la emergencia del no marcado a traveacutes de la

neutralizacioacuten fonoloacutegica Hay fenoacutemenos que revelan una tendencia a lo

universal como desvanecimiento de la coda en a favor de patroacuten silaacutebico CV y

otros que son consecuencia de las restricciones del Latundeacute como la

monoptongacioacuten de diptongo nasal y la mudanza de la cualidad vocaacutelica en

posicioacuten final de la palabra El en conjunto de fenoacutemenos verificamos que la

interferencia es variable y no siempre estaacute motivada por la acentuacioacuten fonoloacutegica

o natural

Palabras Clave Fonologiacutea Acentuacioacuten Lenguas en Contacto Portugueacutes y

Latundeacute

LISTA DE SIacuteMBOLOS

Transcriccedilatildeo

Transcriccedilatildeo foneacutetica

Transcriccedilatildeo fonoloacutegica

[ ]

Vogais

Vogal meacutedio-baixa anterior [ɛ]

Vogal meacutedio-alta anterior [e]

Vogal alta anterior [i]

Vogal baixa central [a]

Vogal meacutedio-baixa posterior [ɔ]

Vogal meacutedio-alta posterior [o]

Vogal alta posterior [u]

Vogal alta anterior nasal [ i ]

Vogal meacutedio-alta anterior nasal [e ]

Vogal baixa central nasal [atilde]

Vogal meacutedio-alta posterior nasal [otilde]

Vogal alta posterior nasal [u ]

Consoantes

Oclusiva alveolar surda [t]

Oclusiva alveolar sonora [d]

Fricativa alveolar surda [s]

Fricativa alveolar sonora [z]

Nasal alveolar [n]

Lateral alveolar [l]

Africada alveopalatal surda [tʃ]

Africada alveopalatal sonora [dʒ]

Lateral palatal [ʎ]

Nasal palatal [ɳ]

Fricativa palatal surda [ʃ]

Fricativa palatal sonora [ʒ]

Oclusiva velar surda [k]

Oclusiva velar sonora [g]

Fricativa velar [x]

Oclusiva bilabial surda [p]

Oclusiva bilabial sonora [b]

Nasal bilabial [m]

Fricativa labiodental surda [f]

Fricativa labiodental sonora [v]

LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 Diagrama de Hall

67

FIGURA 2 Configuraccedilotildees da Mescla Linguiacutestica segundo Romaine (2000 p185)

71

FIGURA 3 Esquema de representaccedilatildeo do bilinguismo social segundo Appel e Muysken (1986 p 23)

74

FIGURA 4 Escolha de liacutengua e code-switching conforme Grosjean (1982 p127)

82

FIGURA 5 Classificaccedilatildeo das liacutenguas da Famiacutelia Nambikwaacutera de acordo com Rodrigues (1986 p 134)

87

FIGURA 6 Localizaccedilatildeo e aacuterea dos Nambikwaacutera de acordo com Roquete-Pinto (1919)

88

FIGURA 7 Territoacuterio Nambikwaacutera descrito por Price (1983)

89

FIGURA 8 Localizaccedilatildeo atual dos Nambikwaacutera

91

FIGURA 9

Localizaccedilatildeo da TI Tubaratildeo-Latundecirc

94

FIGURA 10

Primeiros contatos com os Latundecirc (Foto Price 1977)

97

FIGURA 11 Iacutendios Latundecirc na TI Tubaratildeo-Latundecirc

104

FIGURA 12

Ligaccedilotildees entre a intensidade do bilinguismo o tipo de processo de acomodaccedilatildeo e sobreposiccedilatildeo entre os sistemas fonoloacutegicos

118

FIGURA 13

Correspondecircncia entre liacutenguas e contato linguiacutestico

120

FIGURA 14 Agentividade da Liacutengua Recipiente de acordo Van Coetsem 1988 p10

122

FIGURA 15 Agentividade da Liacutengua de Origem de acordo Van Coetsem 1988 p11

122

FIGURA 16 Relaccedilatildeo de agentividade entre o Portuguecircs e o Latundecirc

123

FIGURA 17 Estrutura silaacutebica do Latundecirc

168

FIGURA 18 Estrutura silaacutebica do Portuguecircs (Cacircmara-Juacutenior)

169

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Unidades e estruturas mais marcadas conforme

levantamento de Moreira da Silva (2011)

50

Quadro 2 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Leacutevi-Strauss (1948)

92

Quadro 3 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Price e Cook (1969)

93

Quadro 4 Distribuiccedilatildeo dos povos pertencentes a TI Tubaratildeo-Latundecirc

95

Quadro 5 Nuacutecleos familiares de acordo com a habitaccedilatildeo em 1999

98

Quadro 6 Situaccedilatildeo sociolinguiacutestica dos Latundecirc (dados de 1999)

101

Quadro 7 Quadro Comparativo dos Sistemas Foneacuteticos do Romansh e do Schweizerdeutsch de acordo com Weinreich (1953)

111

Quadro 8 Tipos de processos que conduzem a mudanccedila fonoloacutegica induzida por contato

116

Quadro 9 Fonemas consonantais do Latundecirc

125

Quadro 10 Fonemas vocaacutelicos do Latundecirc

125

Quadro 11 Ditongos do Latundecirc

126

Quadro 12 Descriccedilatildeo dos fonemas consonantais (Retirada de Telles 2002)

126

Quadro 13 Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos orais (Com base em Telles 2002)

149

Quadro 14

Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos nasais (Com base em Telles 2002)

153

Quadro 15

Vogais no Portuguecircs (Cacircmara Jr 1970)

154

Quadro 16

Consoantes no Portuguecircs (Silva 2002)

155

Quadro 17 Sistemas consonantais x Sistemas vocaacutelicos

156

Quadro 18 Resultado mais frequente do processo de monotongaccedilatildeo em Latundecirc

162

Quadro 19 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Latundecirc

166

Quadro 20 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Portuguecircs

167

Quadro 21 Escala de Sonoridade (Bonet e Mascaroacute 1997 p 109)

196

SUMAacuteRIO

1 SOBRE A PESQUISA 20

11 INTRODUCcedilAtildeO 20

12 JUSTIFICATIVA 24

13 OBJETIVOS 25

14 METODOLOGIA 26

15

DISPOSICcedilAtildeO DA TESE 27

2 MARCACcedilAtildeO LINGUIacuteSTICA 29

21 INTRODUCcedilAtildeO 29

22 MARCACcedilAtildeO 31

221 A concepccedilatildeo de Jakobson e Trubetzkoy 35

222 Abordagem Gerativa 37

223 Abordagem Tipoloacutegica (Interlinguiacutestica) 39

224 Abordagem Naturalista (Morfologia Natural) 41

23 CRITEacuteRIOS DE MARCACcedilAtildeO 42

24 MARCACcedilAtildeO MUDANCcedilA E CONTATO LINGUIacuteSTICO 45

25 JAKOBSON E A ABORDAGEM FONOLOacuteGICA DA

MARCACcedilAtildeO

48

3 O CONTATO LINGUIacuteSTICO 54

31 INTRODUCcedilAtildeO 54

32 SOBRE O CONTATO LINGUIacuteSTICO 57

33 MESCLAS DE CONTATO PIDGIN CRIOULO LIacuteNGUA

FRANCA E JARGAtildeO

60

331 Pidgin 63

332 Crioulo 65

333 Liacutengua Franca ou Sapir 69

334 Jargatildeo 71

34 IMPLICACcedilOtildeES DO CONTATO LINGUIacuteSTICO 72

341 Bilinguismo 72

342 Diglossia 78

343 Alternacircncia de coacutedigo 80

344 Morte da liacutengua

83

4 COMUNIDADE DE ESTUDO OS LATUNDEcirc 86

41 INTRODUCcedilAtildeO 86

42 A FAMIacuteLIA NAMBIKWARA 86

43 OS LATUNDEcirc

94

5 INTERFEREcircNCIA FONEacuteTICO-FONOLOacuteGICA DO LATUNDEcirc

NO PORTUGUEcircS

106

51 INTRODUCcedilAtildeO 106

52 INTERFEREcircNCIA FUSAtildeO COEXISTEcircNCIA E

TRANSFEREcircNCIA LINGUIacuteSTICA

107

53 FONOLOGIA DO LATUNDEcirc 124

54 FONOLOGIA DO PORTUGUEcircS 154

55 COMPARACcedilAtildeO ENTRE OS SISTEMAS FONEacuteTICOS DO

PORTUGUEcircS E DO LATUNDEcirc

156

6 PROCESSOS FONOLOacuteGICOS DO PORTUGUEcircS FALADO

PELOS LATUNDEcirc

158

61 Introduccedilatildeo 158

611 Perda de elementos 161

6111 Monotongaccedilatildeo 161

6112 Siacutencope em onset complexo de l e r 168

6113 Apagamento da coda 171

6114 Reduccedilatildeo do geruacutendio ndash Anteriorizaccedilatildeo da vogal final 173

6115 Reduccedilatildeo das palatais (nasal e lateral) 174

6116 Afeacuterese 177

6117 Apoacutecope 178

6118 Siacutencope 180

612 Ganho de elementos (Inserccedilatildeo de elementos) 181

613 Alteraccedilatildeo de elementos (permuta ou transposiccedilatildeo) 184

6131 Despalatalizaccedilatildeo de [ʃ] e [ʒ] 184

6132 Palatalizaccedilatildeo 186

6133 Vozeamento e desvozeamento 189

6134 Abaixamento e elevaccedilatildeo das vogais orais 191

6135 Nasalizaccedilatildeo e desnasalizaccedilatildeo 194

6136 Fenocircmenos envolvendo os roacuteticos 195

6137 Labializaccedilatildeo e deslabializaccedilatildeo 197

6138 Metaacutetese 198

6139 Siacutestole 199

61310 Fortalecimento

200

7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

201

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS

208

ANEXOS 221

20

1 SOBRE A PESQUISA

O estudo dessas liacutenguas eacute evidentemente de grande importacircncia para o incremento dos conhecimentos linguiacutesticos Cada nova liacutengua que se investiga traz novas contribuiccedilotildees agrave linguiacutestica cada nova liacutengua eacute outra manifestaccedilatildeo de como se pode realizar a linguagem

humana Cacircmara Jr (1977 p 4)

11 INTRODUCcedilAtildeO

Neste capiacutetulo discorreremos sobre a diversidade e a situaccedilatildeo das liacutenguas

indiacutegenas brasileiras1 bem como a motivaccedilatildeo para o presente estudo Tambeacutem

faratildeo parte desta introduccedilatildeo a justificativa para a realizaccedilatildeo desta pesquisa os

objetivos almejados os procedimentos metodoloacutegicos e a descriccedilatildeo da estrutura

da tese

Por se tratar de um estudo que diz respeito agrave linguiacutestica indigenista brasileira vale

iniciar a discussatildeo situando aqueles que satildeo os sujeitos da nossa pesquisa os

iacutendios Sabe-se que os povos indiacutegenas satildeo vistos geralmente como personagens

passivos na da nossa histoacuteria Eacute um equiacutevoco concebecirc-los na nossa narrativa

dessa forma pois seja no papel de aliados ou de inimigos esses povos tiveram

um papel importante na formaccedilatildeo de sociedades coloniais e poacutes-coloniais

(ALMEIDA 2013 p9)

1 Aleacutem do portuguecircs haacute no Brasil aproximadamente 180 liacutenguas indiacutegenas faladas por 225 etnias

Dessas liacutenguas 110 satildeo consideradas em extinccedilatildeo pelo fato de serem faladas por menos de 500 pessoas Estima-se que em 1500 cerca de seis milhotildees de iacutendios falavam 1078 idiomas Hoje a populaccedilatildeo indiacutegena brasileira chega a no maacuteximo entre 440 mil e 500 mil indiviacuteduos Atribui-se o desaparecimento das liacutenguas indiacutegenas agraves pressotildees poliacuteticas do colonizador e posteriormente agraves necessidades de sobrevivecircncia das populaccedilotildees indiacutegenas Revista Liacutengua portuguesa n 26 p 57 2010

21

Embora natildeo seja amplamente divulgado no Brasil haacute cerca de 180 liacutenguas

indiacutegenas o que nos torna um paiacutes plurilinguiacutestico Esse percentual era de 1200

antes da chegada dos portugueses Durante esses cinco seacuteculos de colonizaccedilatildeo

um glotociacutedio foi visto intensificamente no nosso territoacuterio

Mesmo sendo viacutetimas de um processo de colonizaccedilatildeo desenfreado e

escravizador estes povos com o tempo passaram a ser reconhecidos como

agentes na sociedade Suas accedilotildees satildeo vistas a partir de um recente periacuteodo

histoacuterico como importantes para explicar a histoacuteria deles e consequentemente a

nossa Saindo de um quadro de contato onde eram vistos como coadjuvantes

passando a ser tambeacutem protagonistas

Hoje os estudos indigenistas satildeo mais frequentes uma vez que na antropologia

atual os povos que foram definidos como aculturados passaram a ser

coadjuvantes de um processo histoacuterico e participativo

A reportagem da Revista Continente Maio de 2009 sobre os Fulniocirc faz parte de

um arsenal que descreve o que jaacute eacute sabido pela comunidade cientiacutefica as liacutenguas

indiacutegenas brasileiras estatildeo desaparecendo em ritmo acelerado Posto dessa

forma podemos perceber que haacute urgecircncia em descrever como tais liacutenguas se

comportam em si e em contatos com outras

Cacircmara-Juacutenior (1977 p 7) postula que os estudos indigenistas mais

precisamente sobre os de suas liacutenguas constitui no Brasil uma tarefa natildeo

somente enorme mas tambeacutem urgente Hoje meio seacuteculo depois esta citaccedilatildeo se

faz atual Os estudos indigenistas ainda se monstram tiacutemidos e carentes de

recursos e pesquisadores

22

Em continuidade o autor afirma que

Jaacute desapareceram no Brasil muitas liacutenguas agora totalmente irrecuperaacuteveis para a ciecircncia Eacute muito difiacutecil avaliar hoje em dia quantas liacutenguas se teriam falado no Brasil haacute 400 anos na eacutepoca do descobrimento do paiacutes pelos europeus Mas a quantidade de liacutenguas que subsistem ainda hoje () eacute ainda um nuacutemero consideraacutevel ndash cento e tantas Todas elas entretanto estatildeo ameaccediladas de desaparecer dentro de muitos poucos anos

O fato eacute que precisamos catalogar essas liacutenguas e como elas agem durante o

contato linguiacutestico Esses estudos satildeo de grande valia porque podem mostrar

como se deu analogicamente o contato do portuguecircs com outras liacutenguas E as

evidecircncias aqui encontradas contribuiratildeo para a descriccedilatildeo linguiacutestica aleacutem de

proporcionar agraves geraccedilotildees futuras o conhecimento mais apurado sobre as liacutenguas

de contato

Sobre esta relaccedilatildeo Almeida (idem p 14) afirma que

[] As relaccedilotildees de contato com sociedades envolventes e vaacuterios processos de mudanccedila cultural vivenciados pelos grupos indiacutegenas eram considerados simples relaccedilotildees de dominaccedilatildeo impostas aos iacutendios de tal forma que natildeo lhes restava nenhuma margem de manobra a natildeo ser a submissatildeo passiva a um processo de mudanccedilas culturais que os levaria a serem assimilados e confundidos com a massa da populaccedilatildeo

A autora ainda reitera que ldquoas relaccedilotildees de contato eram entatildeo grosso modo

vistas como relaccedilotildees de dominaccedilatildeo submissatildeo na qual uma cultura se impunha

sobre a outra anulando-ardquo p16

23

O contato entre liacutenguas contribuiu para o leacutexico portuguecircs2 E eacute o contato

linguiacutestico um dos fatores que coloca o iacutendio em situaccedilatildeo ativa na histoacuteria do

Brasil mesmo apoacutes o decreto do Marquecircs de Pombal3

Todavia assim como ocorrera com os negros eacute possiacutevel que o contato com

iacutendios possa ter influenciado outros niacuteveis da nossa gramaacutetica 4

Seki (1995 p 33) ao discutir sobre a situaccedilatildeo das liacutenguas indiacutegenas brasileiras

diz que

Essas estimativas devem ser ainda consideradas com certa cautela pois as liacutenguas indiacutegenas encontram-se sob as mais diferentes pressotildees sofrendo o impacto do crescente contato com a populaccedilatildeo envolvente e a liacutengua majoritaacuteria Contudo natildeo haacute em geral levantamentos que permitam estabelecer com maior margem de exatidatildeo os reflexos do impacto do Portuguecircs nos distintos grupos em termos de deslocamento de liacutengua indiacutegena tanto no que se refere a graus de bilinguismo monolinguismo quanto no que se refere agrave interferecircncia do Portuguecircs nessas liacutenguas nem sempre claramente perceptiacutevel nas fases iniciais mas que vai aos poucos contribuindo para a perda da liacutengua minoritaacuteria

2 Citamos aqui como exemplos o caso dos grupos de palavras oriundos de outros povos que

foram acoplados ao nosso leacutexico como indianismos e africanismos 3 Para estabelecer uma comunicaccedilatildeo com os nativos os portugueses foram aprendendo os

dialetos e idiomas indiacutegenas A partir do tupinambaacute falado pelos grupos mais abertos ao contato com os colonizadores criou-se uma liacutengua geral comum a iacutendios e natildeo-iacutendios O crescente nuacutemero de falantes do portuguecircs comeccedila a tornar o bilinguumlismo das famiacutelias portuguesas no paiacutes cada vez menor Em 17 de agosto de 1758 a liacutengua portuguesa se torna idioma oficial do Brasil atraveacutes de um decreto do Marquecircs de Pombal que tambeacutem proiacutebe o uso da liacutengua geral Disponiacutevel em httpwwwcomcienciabrreportagenslinguagemling03htm em 18122014 4 Alguns estudiosos afirmam que as influecircncias natildeo se restringiram apenas ao vocabulaacuterio

Jacques Raimundo em O Elemento Afro-Negro na Liacutengua Portuguesa aponta algumas mudanccedilas foneacuteticas iniciadas na fala dos escravos que ainda se mantecircm em algumas variedades do portuguecircs do Brasil as vogais meacutedias pretocircnicas e e o passam a ser pronunciadas como vogais altas respectivamente i e u (mininu nuticcedila) as vogais tocircnicas de palavras oxiacutetonas terminadas em s mesmo as grafadas com z se tornam ditongos (atrais mecircis vecircis) a marca de terceira pessoa do plural nos verbos do preteacuterito perfeito se reduz a o (fizero caiacutero tocaro)Em 1822 Jeroacutenimo Soares Barbosa registrava em sua Grammatica Philosophica uma peculiaridade sintaacutetica originada na fala dos escravos que ateacute hoje eacute apontada como uma das distinccedilotildees entre o portuguecircs falado em Portugal e o que se fala no Brasil a colocaccedilatildeo de pronomes aacutetonos antes dos verbos (mi deu ti falocirc) Disponiacutevel em httpwwwcomcienciabrreportagenslinguagemling03htm em 18122014

24

Embora a preocupaccedilatildeo da maioria dos estudiosos de liacutenguas indiacutegenas seja com

as liacutenguas minoritaacuterias esta pesquisa trafega no sentido contraacuterio ao buscar

descrever a influecircncia dessas liacutenguas tidas como fraacutegeis no indioma nacional

Vale ressaltar que mesmo em territoacuterio nacional o portuguecircs aqui eacute tido como

segunda liacutengua

12 JUSTIFICATIVA

O contato linguiacutestico e suas consequecircncias se datildeo em todas as liacutenguas do

mundo No entanto no que tange ao desaparecimento de liacutenguas o prejuiacutezo eacute

maior uma vez que a natildeo catalogaccedilatildeo dessas liacutenguas geraria um deacuteficit linguiacutestico

que poderia prejudicar os estudos linguiacutesticos vigentes e futuros aleacutem dos

problemas humanos advindos do processo de aculturaccedilatildeo entre povos

Ao corroborar com esta acertiva Telles (2009 p25) afirma que

Quando um povo perde uma liacutengua tambeacutem perde diversidade humana perdem-se meios de compreensatildeo e explicaccedilatildeo do mundo perdem-se soluccedilotildees de adaptalidade do homem ao meio perde-se o conhecimento do potencial e do usufruto sustentaacutevel deste meio Enfim perdem-se conhecimentos fundamentais que venham a coloborar para a continuidade da sobrevivecircncia do homem no planeta

O estudo de uma liacutengua diferente da nossa pode nos dar a impressatildeo de que

vamos encontrar algo distante da nossa realidade O que natildeo eacute verdade visto

que as semelhanccedilas linguiacutesticas satildeo em maior nuacutemero Cacircmara-Juacutenior (1977

p18)

25

Antes da perda total de uma liacutengua que pode ser assim configurado ou natildeo o

processo inicial se daacute pelo contato entre elas Soacute depois de existirem lado a lado

eacute que tais liacutenguas podem a depender da dinacircmica se fundirem desaparecerem

ou conviverem entre si

No caso do relacionamento entre o Latundecirc e o Portuguecircs percebe-se que tal

contato caminha para o desparecimento do Latundecirc dado as circunstacircncias

histoacutericas e sociais pelas quais esta liacutengua tem passado Hoje este povo eacute

composto de 20 falantes dispersos Como os mais novos natildeo podem coabitar

entre si a continuidade da etnia estaacute com os dias marcados Logo torna-se

urgente as tentativas de descriccedilatildeo da liacutengua e de seu comportamento

Analisar e descrever o contato com base nos padrotildees de marcaccedilatildeo e simetria

contribuiraacute com o princiacutepio de naturalidade que eacute pre-requesito para a tipologia

linguiacutestica No mais as investigaccedilotildees sobre o contato linguiacutestico satildeo de grande

valia para o conhecimento mais apurado das liacutenguas do mundo e da nossa liacutengua

especificamente

13 OBJETIVOS

Esta pesquisa objetiva o estudo da interferecircncia foneacutetica do Latundecirc no

Portuguecircs levando em consideraccedilatildeo o papel da marcaccedilatildeo no contato linguiacutestico

entre estas liacutenguas Tambeacutem busca refletir sobre os processos foneacuteticos oriundos

do contato e como eles se evidenciam a partir das liacutenguas em xeque

26

No decorrer da tese aleacutem dos objetivos postos aqui buscaremos responder as

questotildees postuladas

Investigar se os fatores internos (linguiacutesticos) e externos (estruturais)

interagem com os princiacutepios da marcaccedilatildeo

Identificar qual o papel da marcaccedilatildeo no contato linguiacutestico

Verificar se e quais os traccedilos mais marcados da liacutengua dominada passam

para a dominante

Dessa forma ao refletirmos sobre as questotildees acima esperamos contribuir com

os estudos dos universais linguiacutesticos e da cogniccedilatildeo humana

14 METODOLOGIA

O corpus utilizado nesta pesquisa foi coletado pela professora Stella Virgiacutenia

Telles e faz parte do NEI ndash Nuacutecleo de Estudos Indigenistas ndash da Universidade

Federal de Pernambuco Os dados foram gravados em CDrsquos em formato wave e

estruturados em forma de perguntas e respostas DID ndash Diaacutelogo entre

entrevistador e entrevistado

Foram escutados aproximadamente 30 horas de gravaccedilatildeo de fala dos 20

informantes Latundecirc Incialmente analisamos de oitiva os dados que foram

depois transcritos foneticamente com base no Alfabeto Foneacutetico Internacional -

IPA e organizados em tabelas Apoacutes segunda anaacutelise em caso de duacutevidas os

dados foram submetidos ao programa PRAAT para melhor audiccedilatildeo No que tange

27

agrave anaacutelise os dados foram disponibilizados em tabelas e enumerados com os

respectivos comentaacuterios abaixo

15 DISPOSICcedilAtildeO DA TESE

Para este estudo utilizamos os pressupostos cientiacuteficos da tipolologia linguiacutestica

de base aleacutem de autores que foquem em seus estudos contato interferecircncia

foneacutetica marcaccedilatildeo e naturalidade

No capiacutetulo 1 discorremos sobre os elementos basilares da tese justificativa

objetivos perguntas norteadoras metodologia e disposiccedilatildeo da tese

No capiacutetulo 2 trataremos sobre a marcaccedilatildeo Nele abordaremos o conceito de

marcaccedilatildeo e sua relaccedilatildeo com os princiacutepios de simetria e naturalidade Veremos a

partir do panorama de Matras amp Elsik (2006) Battistella (1996) Lacy (2006) as

abordagens de marcaccedilatildeo estruturalista gerativa tipoloacutegica e naturalista

Na seccedilatildeo 23 discorreremos sobre os criteacuterios de marcaccedilatildeo e na seccedilatildeo 24

sobre a mudanccedila linguiacutestica contato e marcaccedilatildeo Nos deteremos aos estudos de

Jakobson na abordagem fonoloacutegica na seccedilatildeo 25 bem como os universais

linguiacutesticos para a marcaccedilatildeo observados por Moreira da Silva (2011) em

contraponto com os padrotildees mais marcados do Latundecirc

No Capiacutetulo 3 o contato linguiacutestico seraacute nosso escopo Nele discutiremos os tipos

de mesclas de contato pidgin crioulo liacutengua Franca e jargatildeo a partir dos

pressupostos de Tarallo e Alkimin (1987) Calvet (2004) Couto (2001) Hall

28

(1996) Hymes (1971) Romaine (2000) e AiKhenvald e Dixon (2006)

Abordaremos tambeacutem a diglossia conforme Ferguson (1991) a alternacircncia de

coacutedigo de acordo com Auer (1999) Morte de liacutengua segundo Mcmahon (1994)

Trask (2004) e Cristoacutefaro-Silva (2002)

No capiacutetulo 4 apresentaremos a comunidade de estudo os Latundecirc Inicialmente

com base em Rodrigues (1995) Roquete-Pinto (1919) Leacutevi-Strauss (1946) Price

e Cook (1969) Anomby (2009) e Telles (2002) faremos uma descriccedilatildeo dos povos

e famiacutelias indiacutegenas do Brasil e dos Latundecirc especificamente Recapitularemos o

contexto histoacuterico formaccedilatildeo contato com os outros povos indiacutegenas e com os

natildeo iacutendios limites geograacuteficos e situaccedilatildeo atual

No capiacutetulo 5 trataremos da interferecircncia e transferecircncia foneacutetica do Latundecirc

para o Portuguecircs Com base em Cristoacutefaro-Silva (2002) Bisol (1996) Weinreich

(1953) Van Coetesem (1988) e Matras (2009) discutiremos os processos de

interferecircncia fusatildeo coexistecircncia e transferecircncia linguiacutestica Apresentaremos os

aspectos mais relevantes da fonologia Latundecirc e do Portuguecircs

No capiacutetulo 6 faremos as anaacutelises dos processos foneacuteticos presentes no contato

do Latundecirc com o Portuguecircs A partir da perspectiva claacutessica de perda

manutenccedilatildeo ou ganho de elementos discutiremos sobre quais os processos

foneacuteticos mais marcados do Latundecirc permanecem ou natildeo atestados no

Portuguecircs falado por Latundecirc

Por fim chegaremos agraves divagaccedilotildees finais dos resultados configurados na

pesquisa e agrave perspectiva de continuidade do trabalho Nos anexos encontram-se

os dados analisados transcritos foneticamente e dispostos em tabelas

29

2 MARCACcedilAtildeO LINGUIacuteSTICA

A nossa vida eacute mesmo assim Crescemos uns qual aacutervore indivisa levados pela forccedila de um destino retiliacuteneo como as palmeiras crescem

outros com a vida ramificada pelos empuxos ambientes Pretendemos Tentamos Retrocedemos

Afinal caminhamos na diretriz primitivamente escolhida quando o tempo nos concede alcanccedilar crescemos como as lianas5

(ROQUETTE-PINTO 1919 p 37)

21 INTRODUCcedilAtildeO

Eacute fato que o universo eacute regido por leis naturais O que aparentemente demonstra

ser fruto da eventualidade eacute um conjunto de princiacutepios explicaacuteveis que agem de

forma complementar sob as forccedilas centriacutefugas e centriacutepetas Com a liacutengua(gem)

natildeo diferentemente enquanto sistema de relaccedilotildees ela reflete estas

caracteriacutesticas Para Croft (2003 p 25) ela reflete a tensatildeo entre duas tendecircncias

concorrentes - uma em direccedilatildeo agrave regularidade a outra em direccedilatildeo agrave

hierarquizaccedilatildeo

Com o objetivo de melhor compreensatildeo dos pressupostos da tese neste capiacutetulo

nos deteremos agrave compreensatildeo dos conceitos de marcaccedilatildeo assimetria e

naturalidade Oriundos da linguiacutestica de base estes termos estatildeo relacionados

aos universais linguiacutesticos A complexidade destes conceitos por outro lado

apontam para o que eacute individual e para o que eacute geral Tem a ver com o que jaacute

defendia Chomsky ao estabelecer a dicotomia Princiacutepios x Paracircmetros

Obviamente posta a complexidade da liacutengua esses ldquoagentesrdquo da linguagem

5 Espeacutecie de trepadeira que manteacutem sua raiz no solo mas necessita de um suporte para manter-

se ereta e crescer em direccedilatildeo agrave luz

30

estatildeo submetidos tambeacutem aos fatores internos e externos nas liacutenguas do mundo

Logo o que eacute marcado numa liacutengua pode natildeo ser em outra ou podem ocorrer

marcaccedilotildees mais globais

Matras e Elsik (2006 p12) discorrem que

A tarefa da teoria linguiacutestica eacute a nosso ver descrever como essas tendecircncias concorrentes satildeo responsaacuteveis pela formaccedilatildeo de estruturas linguiacutesticas Trata-se de um jogo a niacutevel local de vaacuterios fatores a estrutura e sua funccedilatildeo na comunicaccedilatildeo o membro e o valor que ela representa tanto dentro do paradigma e em um quadro conceitual mais universal a natureza do processo especiacutefico envolvido na formaccedilatildeo a estrutura e a motivaccedilatildeo para aplicar esse processo para o paradigma ou partes dele Esta complexa interaccedilatildeo de fatores nunca eacute preacute-determinada uma vez que diferentes combinaccedilotildees de fatores tornaratildeo resultados diferentes A este respeito tomamos uma visatildeo imparcial do que condiccedilatildeo marcada eacute e se eacute ou natildeo uma estrutura eacute marcado ldquoem comparaccedilatildeo com a outrardquo Em vez disso nosso interesse eacute em explorar padrotildees nos resultados de diferentes combinaccedilotildees de fatores em niacutevel local

A assimetria e a naturalidade efetivamente teriam uma relaccedilatildeo direta com a

marcaccedilatildeo O que eacute assimeacutetrico tende a ser mais marcado e menos natural Por

outro lado o que eacute mais natural tende a ser menos marcado e mais simeacutetrico

Esta eacute uma condiccedilatildeo elementar mas natildeo totalitaacuteria para as liacutenguas do mundo

Para Batistella (1996 p115) haacute um nuacutemero de pesquisadores que sugerem

formas especiacuteficas em que as condiccedilotildees de marcaccedilatildeo desempenham um papel

na descriccedilatildeo na alteraccedilatildeo ou na aquisiccedilatildeo da liacutengua(gem) exercendo uma

funccedilatildeo relevante na definiccedilatildeo da gramaacutetica oacutetima agravequela que eacute o resultado

satisfatoacuterio na teoria da otimalidade6

6 Mesmo natildeo trabalhando diretamente com a teoria da otimalidade nesta tese eacute vaacutelido ressaltar

que os princiacutepios de marcaccedilatildeo simetria e naturalidade fazem parte do arcabouccedilo teoacuterico de seu axioma

31

No que diz respeito agrave fonologia aacuterea da linguiacutestica sob a qual se debruccedila o objeto

de estudo desse trabalho Battistella (1966 p65) observa que condiccedilatildeo marcada

eacute uma propriedade da relaccedilatildeo entre os dois sinais de um paradigma diacriacutetico

que eacute em parte independente da substacircncia linguiacutestica articulaccedilatildeo e percepccedilatildeo e

deve ser definido principalmente como conceitual

No que se refere aos conceitos postos aqui utilizaremos os pressupostos teoacutericos

defendidos por CROFT (1996 2003) JAKOBSON (1953) BATTISTELLA (1996)

MATRAS amp ELSIK (2006) para descriccedilatildeo teoacuterica e abordagem histoacuterica e LACY

(2006) para a descriccedilatildeo dos universais marcados para tratarmos das elucidaccedilotildees

sobre Marcaccedilatildeo Tipoloacutegica (no contato linguiacutestico) e Naturalidade

22 MARCACcedilAtildeO

Battistella (1996 p7) afirma que em muitas aacutereas alguns conceitos apresentam

problemas quanto agrave sua complexidade axioloacutegica Natildeo diferentemente no campo

da linguiacutestica tais discussotildees emblemaacuteticas ainda hoje se fazem presentes Uma

dessas discussotildees gira em torno do conceito de marcaccedilatildeo pois segundo ele

A dicotomia natildeo-marcado versus marcado eacute um dos conceitos-chave tanto a teoria da gramaacutetica gerativa desenvolvida por Noam Chomsky e a teoria da linguiacutestica estrutural desenvolvida por Roman Jakobson Ela tem sido usada em aacutereas da linguiacutestica que vatildeo desde a descritiva e tipoloacutegica ateacute a aplicada e foi emprestado para campos tatildeo diversos como a antropologia arte muacutesica poesia e literatura

O termo que fora introduzido na linguiacutestica na deacutecada de 1920 pelos linguistas

europeus da Escola de Praga cujo significado da condiccedilatildeo marcada natildeo

32

permaneceu constante mesmo dentro de uma uacutenica estrutura intelectual hoje eacute

um marco central na linguiacutestica O conceito de marcaccedilatildeo estaacute relacionado agrave

frequecircncia daquilo que eacute menos comum na liacutengua Logo a relaccedilatildeo deste conceito

se coaduna agrave noccedilatildeo de naturalidade Se um elemento eacute mais natural ele seraacute

menos marcado Se o oposto seraacute mais marcado Deste modo as liacutenguas teriam

uma tendecircncia a optar por padrotildees natildeo marcados

Battistella (2006 p13) expotildee que

A possibilidade de relaccedilotildees universais marcado natildeo-marcado eacute atenuada por outros fatores Um deles eacute a observaccedilatildeo de que a assimetria eacute muitas vezes sensiacutevel ao contexto Isso faz com que uma condiccedilatildeo local marcada em vez de um fenocircmeno geral signifique que contexto deve sempre ser considerado ao determinar valores de condiccedilatildeo marcada Poderia ser eacute claro que o aspecto contextual da condiccedilatildeo marcada seja dado universalmente mas este natildeo eacute de modo algum faacutecil de mostrar aleacutem do niacutevel de fonologia Uma preocupaccedilatildeo relacionada sobre as implicaccedilotildees universais decorre do fato de que muitas assimetrias podem ser revertidas entre as diferentes comunidades de fala periacuteodos de tempo ou registradores

Para Trask (2004 p187) os vaacuterios criteacuterios para entender que uma forma ou

construccedilatildeo eacute marcada podem natildeo coincidir e os valores da alternativa marcado

natildeo-marcado podem tambeacutem mudar ao longo do tempo A complexidade posta na

interaccedilatildeo de fatores nunca eacute previamente estabelecida uma vez que as

diferentes combinaccedilotildees deles tornaratildeo consequentemente os resultados

diferentes

Em continuidade ele afirma que

Ser marcado eacute uma noccedilatildeo muito ampla que se aplica em todos os niacuteveis de anaacutelise Em termos gerais eacute marcada qualquer forma linguiacutestica que ndash sob qualquer ponto de vista ndash menos usual ou menos neutra do que alguma outra forma a forma natildeo-

33

marcada Uma forma marcada pode distinguir-se de outra tambeacutem marcada pela presenccedila de mais material de maior quantidade de matizes de significado por ser mais rara numa determinada liacutengua ou nas liacutenguas em geral ou de vaacuterios outros modos (idem p129)

Na e para a fonologia eacute sugerido que processos fonoloacutegicos estejam diretamente

sensiacuteveis agrave distinccedilatildeo entre os elementos marcados e os natildeo marcados Nesta

relaccedilatildeo a marcaccedilatildeo dos segmentos foneacuteticos estaacute relacionada a propriedades

linguiacutesticas como i) serem pouco comuns ii) serem pouco frequentes iii) serem

adquiridos tardiamente iv) serem pouco estaacuteveis quanto agrave mudanccedila sonora

(CRISTOacuteFARO-SILVA 2011 p148)

Segundo Battistella (2006 p 13) ldquoa condiccedilatildeo marcada na fonologia eacute uma

propriedade da relaccedilatildeo entre os dois sinais de um paradigma diacriacutetico que eacute em

parte independente da substacircncia linguiacutestica (articulaccedilatildeo e percepccedilatildeo) e deve ser

definida principalmente como conceitualrdquo

O conceito de marcaccedilatildeo estaacute diretamente relacionado ao de simetria propriedade

matemaacutetica que consiste na correspondecircncia e permuta de elementos dentro de

um conjunto onde mesmo com a troca de lugares eles continuam tendo o

mesmo valor Neste caso a marcaccedilatildeo estaria ligada ao conceito de assimetria

posto que esta seja a quebra da valoraccedilatildeo de correspondecircncia dos elementos

Trask 2007

Para Matras e Elsik (2006 p 8)

Assimetrias de paradigmas tecircm vindo a ser associado com a noccedilatildeo de condiccedilatildeo marcadardquo O conceito pressupotildee que a relaccedilatildeo estrutural entre os dois polos de um paradigma eacute previsiacutevel em certa medida Ele tambeacutem assume que um dos

34

polos marcado seraacute sempre exibir propriedades que o outro polo desmarcado natildeo tem

Os referidos autores tratam dos aspectos sobre assimetria afirmando que a

simetria eacute mais simples por ser explicada ldquoem termos formais ao niacutevel do

paradigma e em termos funcionais atraveacutes de regularidade na posiccedilatildeo e

formas das estruturas que executam operaccedilotildees lineares semelhantes na

organizaccedilatildeo de informaccedilatildeo de enunciadosrdquo Eles ainda afirmam que as ldquoas forccedilas

que provocam a assimetria satildeo muito mais opacasrdquo pois ldquoelas competem em

vaacuterios niacuteveis locais contra o poder aparentemente esmagador e sempre presente

da busca pela simetriardquo (idem p 10)

A noccedilatildeo de valores dos conceitos de marcados e natildeo marcados foi inicialmente

desenvolvido para sistemas fonoloacutegicos por Trubetzkoy (1931) e primeiro aplicado

a categorias morfossintaacuteticas e semacircnticas por Jakobson (1932) Croft (1990 p

87) afirma que Markedness has since been adopted by both the generative and

the typological approaches to linguistic theory not surprisingly in rather different

ways7 Por isso a depender da corrente teoacuterica adotada o conceito de marcaccedilatildeo

pode ser compreendido de forma distinta dadas as interpretaccedilotildees e as

abrangecircncias a que elas se propotildeem

Conforme Battistella (1996 p 12) O termo marcaccedilatildeo abrange uma seacuterie de

conceitos

algumas tentativas foram feitas para separar os conceitos subjacentes a este termo e distinguir entre diferentes tipos de condiccedilotildees marcadas Jakobson por exemplo manteacutem uma

7 O conceito de marcaccedilatildeo tem sido adotado nas abordagens gerativista e tipoloacutegica natildeo surpreendentemente de maneiras bastante diferentes

35

distinccedilatildeo entre condiccedilatildeo fonoloacutegica marcada que envolve categorias cujos significados satildeo meros diferenciadores e condiccedilatildeo marcada semacircntica que envolve categorias conceituais que sinalizam o que significa bem como distinguem os vocaacutebulos

Com os passar do tempo os modelos teoacutericos sobre marcaccedilatildeo tambeacutem foram

discutidos e repensados de acordo com a corrente a que se propunha Nos

paraacutegrafos que seguem discorremos seguindo o percurso histoacuterico descrito por

Battistella 2006 sobre estes modelos estruturalista gerativista tipoloacutegica e

naturalista

221 A concepccedilatildeo de Jakobson e Trubetzkoy

A abordagem estruturalista estaacute diretamente ligada agraves pessoas de Jakobson e

Trubetzkoy componentes do Ciacuterculo de Praga para quem as correlaccedilotildees

fonoloacutegicas satildeo compartilhadas em um elemento definidor comum A partir da

observaccedilatildeo do comportamento dos traccedilos fonoloacutegicos eles introduzem os termos

marcado e natildeo-marcado It was in the context of the search for correlations

among phonemes that the terms marked and unmarked were first proposed

Battistella (2006 p 19)

Na visatildeo semioacutetica estruturalista de acordo com Matras e Elsik (2006 p 15)

Trubetzkoy (1939) introduziu o conceito de condiccedilatildeo marcada no contexto de sua

pesquisa sobre correlaccedilotildees fonoloacutegicas com base nas relaccedilotildees entre a presenccedila

de alguma caracteriacutestica fonoloacutegica e sua ausecircncia na consciecircncia dos falantes

Mais adiante ele restringiu a aplicaccedilatildeo da condiccedilatildeo marcada agraves neutralizaacuteveis

36

oposiccedilotildees fonoloacutegicas A partir daiacute a neutralizaccedilatildeo tornou-se o criteacuterio de

marcaccedilatildeo

Por isso diz-se que a neutralizaccedilatildeo eacute um criteacuterio originalmente fonoloacutegico que foi

estendido (nem sempre bem) para a situaccedilatildeo em que algum contexto requer o

cancelamento do contraste entre os membros de uma oposiccedilatildeo Battistella (1996

p 11)

Batistella (idem p12) tambeacutem afirma que Jakobson aplicou o conceito de

marcaccedilatildeo em vaacuterias direccedilotildees e aleacutem da fonologia a outros niacuteveis linguiacutesticos e

domiacutenios da semioacutetica com base natildeo apenas nos atributos linguiacutesticos mas nas

categorias semacircnticas da gramaacutetica e da cultura Ele tambeacutem afirmou que a

condiccedilatildeo marcada pode ser vista como uma relaccedilatildeo binaacuteria

O autor em estudo ainda discorre que Jakobson observando aleacutem disso ldquouma

seacuterie de correlaccedilotildees de condiccedilatildeo marcada notou que os valores natildeo marcados

tendem a ser representado por zero formardquo sugerindo que existe uma

correspondecircncia entre as caracteriacutesticas semacircnticas e sua expressatildeo fonoloacutegica

ldquonatildeo apenas os valores marcados tendem a ser codificados por meio de

marcadores manifestados mas tambeacutem valores semanticamente proacuteximos de

uma categoria que tendem a ser expressos fonologicamente ou marcadores

fonotaticamente semelhantesrdquo Os valores marcados tambeacutem tendem a mostrar

diferenciaccedilatildeo menos formal do que os valores natildeo marcados

Jakobson tambeacutem teria evidenciado seus estudos com base nas observaccedilotildees

sobre a aquisiccedilatildeo de primeira liacutengua e sobre a afasia Em suas pesquisas ele

descobriu correlatos extralinguiacutesticos de condiccedilatildeo marcada propondo uma

37

hierarquia das caracteriacutesticas fonoloacutegicas universais ao coletar dados

corroboradores da tese de que as caracteriacutesticas ou segmentos marcados satildeo

mais difiacuteceis de serem adquiridos por crianccedilas e de serem apreendidos por

afaacutesicos Battistella (idem 16)

222 Abordagem Gerativa

Para Matras amp Elsik (2006 p10) a visatildeo de Chomsky de marcaccedilatildeo mostra uma

flexibilidade notaacutevel uma vez que o conceito natildeo foi desenvolvido de forma

sistemaacutetica e que eacute difiacutecil falar sobre a existecircncia de um trabalho mais bem

elaborado sobre marcaccedilatildeo em sua obra

Battistella afirma que na concepccedilatildeo gerativista o conceito de marcaccedilatildeo exposto

por Chomsky estaacute relacionado a duas ideias centrais i) a condiccedilatildeo marcada eacute

concebida como codificaccedilatildeo de uma estrutura de preferecircncia ou a estrutura

padratildeo para a aquisiccedilatildeo da linguagem e ii) a condiccedilatildeo marcada eacute vista como

aquela que reflete o custo de determinadas opccedilotildees analiacuteticas Em tal conceito as

duas ideias estatildeo interligadas na abordagem gerativa na medida em que uma

teoria formal eacute necessaacuteria para expor a adequaccedilatildeo explicativa no que diz respeito

agrave aquisiccedilatildeo da linguagem (1996 p18)

Ainda segundo o autor Chomsky tambeacutem distinguiu dois tipos de condiccedilatildeo

marcada a distinccedilatildeo entre uma gramaacutetica sem marcaccedilatildeo do nuacutecleo e uma

periferia marcada e as estruturas de preferecircncia dentro do nuacutecleo e dentro da

periferia

38

No que tange agrave fonologia para Moreira da Silva (2011 p 31)

No contexto da Gramaacutetica Gerativa Chomsky amp Halle (1968 p 402) propotildeem uma teoria de marcaccedilatildeo baseada num conjunto de convenccedilotildees de marcaccedilatildeo ou definiccedilotildees dos valores ldquomarcadordquo ldquonatildeo-marcadordquo para os traccedilos fonoloacutegicos em contextos particulares A marcaccedilatildeo concebe uma estrutura como preferida ou que surge por defeito omissatildeo Os elementos marcados e natildeo marcados satildeo compreendidos como os que apresentam maior ou menor custo Satildeo as regras da Gramaacutetica Universal que atribuem um valor natildeo marcado aos traccedilos Com efeito os valores por omissatildeo estatildeo codificados na Gramaacutetica Universal havendo um conjunto de regras que fazem emergir os valores marcados

Chomsky amp Halle (idem p 425) propotildeem uma marcaccedilatildeo universal e inata Os

segmentos marcados ou os valores dos traccedilos satildeo estabelecidos de acordo com

universais interlinguiacutesticos frequecircncia distribucional mudanccedila linguiacutestica e

aquisiccedilatildeo da liacutengua

Eacute no final dos anos 70 e durante a deacutecada de 80 que segundo Battistella (1996

p 10)

a condiccedilatildeo marcada comeccedilou a ser tratada como parte de uma teoria do nuacutecleo da gramaacutetica A Gramaacutetica nuclear consistia em alguns paracircmetros que deveriam ser corrigidos durante a aquisiccedilatildeo de uma linguagem real O conceito de condiccedilatildeo marcada foi aplicado duplamente neste quadro Em primeiro lugar todo o nuacutecleo da gramaacutetica foi considerado como natildeo marcado contra a periferia marcada A condiccedilatildeo marcada de uma construccedilatildeo foi determinada pela sua regularidade estabilidade e centralidade para o nuacutecleo de uma linguagem particular bem como por generalizaccedilotildees intralinguiacutesticas sobre os tipos de construccedilatildeo Em segundo lugar a condiccedilatildeo marcada seria tambeacutem aplicada aos valores de paracircmetros no interior do nuacutecleo e no interior da periferia Assim condiccedilatildeo marcada tambeacutem foi visto como uma estrutura de preferecircncia dentro dos dois componentes da gramaacutetica

Moreira da Silva (2011 p32) afirma que no que diz respeito agrave Teoria da

Otimidade formulada por Prince amp Smolensky (1993) a marcaccedilatildeo eacute vista como a

39

violaccedilatildeo de uma restriccedilatildeo ou princiacutepio da liacutengua Segundo esta teoria cada liacutengua

eacute definida como um conjunto de hierarquizaccedilotildees de princiacutepios universais As

restriccedilotildees numa posiccedilatildeo mais elevada e que satildeo raramente violadas indicam os

aspetos natildeo marcados enquanto as menos importantes e que satildeo violadas

frequentemente mostram os aspetos mais marcados

223 Abordagem Tipoloacutegica (Interlinguiacutestica)

Croft (1996 p4) afirma que a principal caracteriacutestica da tipologia linguiacutestica eacute

verificar as regras de comparaccedilatildeo nas liacutenguas do mundo A comparaccedilatildeo

Interlinguiacutestica coloca a explicaccedilatildeo dos fenocircmenos linguiacutesticos de uma uacutenica

liacutengua em uma nova e diferente perspectiva

A fim de distinguir o conceito de marcaccedilatildeo de outras escolas teoacutericas Croft

(1996) introduziu a concepccedilatildeo de marcaccedilatildeo tipoloacutegica Para ele

Marcaccedilatildeo tipoloacutegica eacute uma rede de relaccedilotildees causais aparentes entre um subtipo de assimetrias interlinguiacutesticas todas as quais tecircm a ver com a forma como a funccedilatildeo eacute codificada em forma gramatical O tema geral da assimetria tambeacutem sugere um link para os padrotildees assimeacutetricos na ordem das palavras e na fonologia que diferem de marcaccedilatildeo tipoloacutegica de forma significativa Marcaccedilatildeo tipoloacutegica eacute uma propriedade universal de uma categoria conceitual natildeo uma propriedade de uma linguagem especiacutefica ou de uma categoria gramatical de linguagem particular como eacute concebida em marcaccedilatildeo para a Escola de Praga (p87 - 88)8

8 Typological markedness is a network of apparent causal relationships among a subtype of cross-

linguistic asymmetries all of which have to do with how function is encoded into grammatical form The general theme of asymmetry also suggests a link to asymmetrical patterns in word order and phonology which differ from typological markedness in significant ways Typological markedness is a universal property of a conceptual category not a language-particular property of a language-particular grammatical category as it is in Prague School markedness

40

Quanto agrave marcaccedilatildeo na abordagem tipoloacutegica autores como Croft (1996) e Givoacuten

(1990) se utilizaram da perspectiva estruturalista para embasar a sua teoria Esta

concepccedilatildeo se vale dos fenocircmenos interlinguiacutesticos e universais que eacute a sua

caracteriacutestica definidora Battistella (2006 p19) A marcaccedilatildeo tipoloacutegica eacute

portanto uma ferramenta importante para o tipologista porque fornece um meio

para ligar diretamente propriedades linguiacutesticas (estruturais) formais em todos os

idiomas

A condiccedilatildeo marcada eacute assegurada por padrotildees interlinguiacutesticos que podem ser

formulados como restriccedilotildees sobre possiacuteveis combinaccedilotildees de propriedades

linguiacutesticas Na abordagem tipoloacutegica a marcaccedilatildeo eacute vista como uma rede de

relacionamentos que engloba uma seacuterie de padrotildees gerais logicamente

independentes Croft (1990 p87) reclassifica os criteacuterios utilizados pelos

estruturalistas em trecircs estruturais comportamentais e de frequecircncia de token

Na abordagem tipoloacutegica um valor de categoria eacute mais ou menos marcado em

vez de individualmente ou duplamente marcadas como na abordagem semioacutetica

De acordo com Croft (2003 p87) o fato de que a neutralizaccedilatildeo natildeo eacute um

conceito relativo explica por que eacute um criteacuterio vaacutelido de condiccedilatildeo marcada

tipoloacutegica

Para Matras e Elsik o reconhecimento do caraacuteter relativo (gradual ou escalar) da

condiccedilatildeo marcada permite que se desenhe em alguns conceitos fundamentais da

tipologia linguiacutestica o que diz respeito agrave condiccedilatildeo de marcada Aleacutem de simples

implicacionais universais hierarquias e protoacutetipos tambeacutem podem ser vistos como

padrotildees da condiccedilatildeo marcada (2006 p18)

41

224 Abordagem Naturalista9 (Morfologia Natural)

Na abordagem naturalista de acordo com Matras amp Elsik (2006 p13) a condiccedilatildeo

marcada foi desenvolvida na escola de Morfologia Natural que surgiu na Aacuteustria e

na Alemanha em meados dos anos 1970 Os estudos de Dressler et al (1987)

para quem ldquoa naturalidade universal corresponde agrave facilidade para o ceacuterebro

humano (Dressler et all 1987 p11) fazem parte desta corrente que se debruccedilou

sobre a morfologia natural para dar sustentaccedilatildeo a sua tese Ainda para estes

autores

Os proponentes da Morfologia Natural caracterizam sua abordagem como semioacutetica e ao mesmo tempo funcional A escola foi inspirada entre outros pela teoria da marcaccedilatildeo desenvolvida na Escola de Praga Por outro lado morfologistas naturais compartilham de uma seacuterie de pontos de vista teoacutericos com o paradigma funcionalista e principalmente com orientaccedilatildeo de funccedilatildeo tipoloacutegica como a assunccedilatildeo do caraacuteter relativo da condiccedilatildeo marcada a suposiccedilatildeo de protoacutetipos e a dependecircncia de motivaccedilotildees e evidecircncias extralinguiacutesticas e intralinguiacutesticas (Idem p12)

Ainda de acordo com Matras amp Elsik (idem p 14) a Teoria da Morfologia Natural

eacute concebida como uma teoria da Naturalidade onde satildeo reconhecidos vaacuterios

niacuteveis de anaacutelise linguiacutestica que satildeo organizados por outras subteorias

correspondentes

A Morfologia Natural objetiva nesse aspecto estabelecer conflitos entre os

princiacutepios de naturalidade Dois desses satildeo i) os conflitos entre princiacutepios de

naturalidade (o que eacute natural e o que eacute especiacutefico do idioma) e ii) os conflitos

entre os diferentes componentes do sistema de linguagem

9 The naturalness approach

42

Comumente a naturalidade eacute vista por ter fundamentos extralinguiacutesticos que

determinam ou proiacutebem favorecem ou desfavorecem as estruturas linguiacutesticas

restringindo as possibilidades e especificam as preferecircncias da faculdade da

linguagem universal No entanto embora a morfologia privilegie os fatores

extralinguiacutesticos (neurobioloacutegicos e sociocomunicativos) os fatores linguiacutesticos

natildeo satildeo redutiacuteveis aos extralinguiacutesticos (ibidem p14)

23 CRITEacuteRIOS DE MARCACcedilAtildeO

Matras amp Elsik (2006 p15) elencam quatro criteacuterios relevantes para a marcaccedilatildeo

Satildeo eles i) frequecircncia ii) complexidade conceitual iii) complexidade estrutural iv)

distribuiccedilatildeo

A frequecircncia tem ocupado uma posiccedilatildeo central na abordagem tipoloacutegica da

condiccedilatildeo marcada Embora acredite-se que os elementos natildeo marcados satildeo

mais frequentes que os marcados este criteacuterio eacute relativo e universalmente

aplicaacutevel sendo bastante questionaacutevel na abordagem tipoloacutegica chegando a ser

abandonado por Croft 1990 p84 ao afirmar que ldquoo criteacuterio de frequecircncia mostra

uma conexatildeo direta entre as propriedades de estrutura da linguagem e

propriedades de uso da linguagemrdquo

Ainda segundo Croft (idem p159) a condiccedilatildeo marcada eacute mais do que uma

manifestaccedilatildeo de motivaccedilatildeo econocircmica havendo a necessidade de olhar para

outras causas da frequecircncia de certos valores gramaticais na fala

43

Na abordagem estruturalista semioacutetica a complexidade conceitual eacute a

propriedade que define a condiccedilatildeo semanticamente marcada Para Jakobson a

marcaccedilatildeo eacute definida como uma relaccedilatildeo assimeacutetrica entre sinalizaccedilatildeo e natildeo-

sinalizaccedilatildeo de uma determinada propriedade Assim o membro marcado da

oposiccedilatildeo eacute por definiccedilatildeo mais complexo semanticamente que o membro natildeo

marcado como outros criteacuterios melhores correlatos da condiccedilatildeo marcada de

diagnoacutesticos de complexidade conceitual (Matras amp Elsik 2006 p 17)

Ainda segundo estes autores (Idem p 19) o reconhecimento da extensatildeo e da

complexidade de um marcador em termos fonoloacutegicos como um fator relevante

em vez de um morfoloacutegico eacute tido por outros autores que trabalham com a

tipologia linguiacutestica Como exemplo eles citam a codificaccedilatildeo morfossintaacutetica que

eacute chamada de codificaccedilatildeo zero onde natildeo existe evidente formal de marcaccedilatildeo de

um valor de categoria

Os criteacuterios de marcaccedilatildeo com base na distribuiccedilatildeo compreendem os criteacuterios

comportamentais e o criteacuterio de valor neutro Os criteacuterios comportamentais foram

desenvolvidos especificamente na abordagem tipoloacutegica e dizem respeito a

qualquer tipo de evidecircncia do comportamento linguiacutestico dos elementos que

demonstram que um valor de uma categoria conceitual eacute gramaticalmente mais

versaacutetil do que outro Croft (1990 p 93)

Jaacute o criteacuterio de valor neutro diz respeito agrave neutralizaccedilatildeo de contrastes

paradigmaacuteticos em determinados contextos O criteacuterio foi desenvolvido na Escola

de Praga e tomado por Greenberg (1966) No entanto o valor neutro eacute

descartado como um criteacuterio vaacutelido de marcaccedilatildeo tipoloacutegica visto que natildeo haacute

44

consistecircncia interlinguiacutestica Natildeo existe um padratildeo interlinguiacutestico consistente de

contextos neutros que podem ser ligados agrave codificaccedilatildeo estrutural ou potencial

comportamental (Croft idem p96)

A razatildeo para a introduccedilatildeo de criteacuterios dependentes do sistema em Morfologia

Natural segundo Matras amp Elsik (2006 p 19) eacute que o conceito de naturalidade

baseada exclusivamente em fatores independentes de sistema resulta em

prediccedilotildees incorretas especialmente na mudanccedila de linguagem Eles consideram

certos aspectos da normalidade dependente de idioma para ser parte de

naturalidade

Segundo Croft (1990 p 97) no que tange aos criteacuterios externos da marcaccedilatildeo os

proponentes da abordagem naturalista introduziram uma seacuterie de criteacuterios ou

correlatos extralinguiacutesticos da condiccedilatildeo marcada como

evoluccedilatildeo da linguagem (o mais tarde o mais marcado)

maturaccedilatildeo ontogeneacutetica (o mais tarde o mais marcado)

fala do bebecirc (menos elementos marcados preferidos pelos adultos no

maiecircs)

aquisiccedilatildeo da linguagem (menos marcado adquirido antes do mais

marcado)

distuacuterbios da linguagem e da fala (mais marcado afetado anteriormente

menos marcado)

testes de percepccedilatildeo (menos marcado mais facilmente percebida do que

mais marcado)

45

e erros linguiacutesticos (mais marcados evocam mais erros do que os menos

marcados)

Esses criteacuterios satildeo basilares e dariam conta de uma seacuterie de elementos

universais linguiacutesticos

24 MARCACcedilAtildeO MUDANCcedilA E CONTATO LINGUIacuteSTICO

Matras amp Elsik (2006 p 22) garantem que em muitas abordagens a

mudanccedila linguiacutestica eacute vista como cooperadora para compreensatildeo da marcaccedilatildeo

Logo a mudanccedila de idioma eacute tida como criteacuterio de marcaccedilatildeo Esta assertiva faz

sentido nesse trabalho visto que o objeto de anaacutelise o portuguecircs resultante do

contato entre o Portuguecircs e o Latundecirc trata de cacircmbio de materiais linguiacutesticos

Neste caso especificamente dos elementos foneacuteticos

Ainda de acordo com estes autores

A existecircncia de estruturas marcadas eacute um resultado inevitaacutevel da compartimentaccedilatildeo e da abertura do sistema de linguagem E uma vez que diferentes componentes da linguagem tecircm funccedilotildees divergentes e tendem a seguir diferentes princiacutepios de naturalidade o abandono das estruturas marcadas em um niacutevel implica em estruturas marcadas em outro niacutevel (Idem p

25)

Em outras palavras a mudanccedila linguiacutestica leva agrave condiccedilatildeo de marcaccedilatildeo na

mudanccedila de um componente da liacutengua para outro ao inveacutes de uma reduccedilatildeo

global de condiccedilatildeo marcada Tais estruturas marcadas satildeo obrigadas a existir em

qualquer momento na histoacuteria de uma liacutengua

46

Os estudiosos apontam para os dois tipos de forccedilas que agem no contato

linguiacutestico a interna e a externa Assim tais forccedilas podem simplificar ou complicar

a gramaacutetica de uma liacutengua Givoacuten (1979 p 123) diz que os falantes satildeo

propensos a recorrer a estruturas natildeo marcadas da Gramaacutetica Universal em

situaccedilotildees cujo contato estaacute ligado ao estresse comunicativo enquanto situaccedilotildees

de contato menos marcados aquelas que prosseguem de forma mais gradual

natildeo precisam

Givoacuten (idem 124) diz que nas situaccedilotildees de pidgin a condiccedilatildeo de marcaccedilatildeo eacute

reduzida e situaccedilotildees de contato entre liacutenguas podem resultar em aumento de

elementos marcados As categorias marcadas satildeo reduzidas em pidgins

enquanto as natildeo-marcadas satildeo as primeiras a serem inovadas durante o

processo de crioulizaccedilatildeo A marcaccedilatildeo sugere que em situaccedilotildees de contato

envolvendo a interferecircncia deve favorecer a reduccedilatildeo da condiccedilatildeo marcada

Na aquisiccedilatildeo de segunda liacutengua o grau relativo de dificuldade para o aprendiz

estaacute relacionado a fatores extralinguiacutesticos como idade Eacute fato que na aquisiccedilatildeo

de uma segunda liacutengua os adultos tendem a terem dificuldades com os padrotildees

mais marcados enquanto os mais novos natildeo a tem Estruturas marcadas da

liacutengua em aquisiccedilatildeo podem deixar de serem adquiridas durante a aprendizagem

caso sejam os adultos que a esteja adquirindo Por isso estruturas natildeo marcadas

satildeo mais propensas a surgir em grandes sociedades caracterizadas por um

intenso contato linguiacutestico levando agraves liacutenguas a simplificaccedilatildeo dos seus sistemas

linguiacutesticos Croft (2000 p 192-193)

47

Jakobson (1978 p 35-37) afirma que quanto maior a funccedilatildeo socioespacial de um

dialeto mais simples seraacute o seu sistema linguiacutestico Dialetos e liacutenguas

relativamente isoladas satildeo mais propensas a desenvolverem condiccedilotildees marcadas

e estruturas redundantes como conjunto de fonemas complexos com um elevado

nuacutemero de contrastes fonoloacutegicos complexidade alofocircnica e alomoacuterfica

irregularidade morfoloacutegica e padrotildees de concordacircncia complexos Por outro lado

os casos de alto contato dialeacutetico que satildeo caracterizadas por redes sociais

relativamente abertas satildeo susceptiacuteveis agrave produccedilatildeo de estruturas linguiacutesticas natildeo

marcadas pela diminuiccedilatildeo da irregularidade da redundacircncia e da complexidade

Apesar de os empreacutestimos serem um aspecto do aumento da condiccedilatildeo marcada

ela (a condiccedilatildeo) eacute operativamente especiacutefica de cada empreacutestimo Esta condiccedilatildeo

marcada do empreacutestimo coodetermina quais as formas e funccedilotildees satildeo mais

susceptiacuteveis de serem emprestadas do que outras Quanto mais transparente e

menos integrador for um elemento na liacutengua de origem torna-se mais provaacutevel de

ser emprestado A condiccedilatildeo marcada eacute relativa ao contexto agrave saliecircncia agrave

frequecircncia agrave ocorrecircncia e agrave distacircncia tipoloacutegica da situaccedilatildeo do contato Matras amp

Elsik (2006 p 26)

Croft (2000 p198) estende a noccedilatildeo de condiccedilatildeo marcada natildeo soacute para os

mecanismos de mudanccedila mas tambeacutem para as formas de contextos de difusatildeo

ou seja padrotildees de realizaccedilatildeo Ele afirma que enquanto na mudanccedila interna as

inovaccedilotildees entram nos pontos menos marcados e estendem a ambientes mais

acentuados em empreacutestimos e outras inovaccedilotildees mudanccedilas motivadas

externamente se espalham de pontos marcados para menos contextos marcados

48

25 JAKOBSON E A ABORDAGEM FONOLOacuteGICA DA MARCACcedilAtildeO

O termo marcaccedilatildeo recebeu o tratamento mais expansivo nos estudos de Roman

Jakobson a partir de 1930 Ele e Trubetzkoy difundiram a ideia de correlaccedilatildeo

fonoloacutegica como uma seacuterie de oposiccedilotildees binaacuterias que compartilham elementos

em comum Eacute Jakobson que afirma que a neutralizaccedilatildeo e o estaacutegio onde as

posiccedilotildees marcadas natildeo estatildeo em estado de marcaccedilatildeo

Eacute tambeacutem Jakobson quem introduz a concepccedilatildeo de niacuteveis de marcaccedilatildeo propondo

que a forma natildeo marcada tanto tem uma forma geral como uma parcial Ele

descobriu uma relaccedilatildeo entre a marcaccedilatildeo em uma hierarquia universal de traccedilos

fonoloacutegicos os traccedilos marcados implicam maior dificuldade de aprendizagem e

uma maior facilidade de perda por parte de pessoas com afasia Ele ainda diz

que

O padratildeo do desenvolvimento fonoloacutegico universal consiste numa progressatildeo de diferenciaccedilotildees cada vez mais finas entre traccedilos distintivos inicialmente distinccedilatildeo entre consoantes e vogais formando-se posteriormente oposiccedilotildees cada vez menos universais A dissoluccedilatildeo da competecircncia linguiacutestica individual nas patologias da linguagem eacute governada pela mesma regularidade a perda do valor primaacuterio pressupotildee a perda do valor secundaacuterio e eacute por isso que se fala da infantilidade da fala dos afaacutesicos A dissoluccedilatildeo do sistema de sons nos afaacutesicos fornece uma imagem de espelho do desenvolvimento fonoloacutegico da crianccedila ndash os sons a serem adquiridos mais tardiamente satildeo os primeiros a serem perdidos (1941 p 60-63)

No percurso da fonologia Jakobson (1941 p 84) viu a representaccedilatildeo fonecircmica

como um niacutevel sem redundacircncia de representaccedilatildeo que conteacutem apenas

informaccedilotildees distintivas A praacutetica descritiva da informaccedilatildeo teoacuterica de Jakobson

49

teve uma grande e importante influecircncia sobre a notaccedilatildeo livre da redundacircncia na

fonologia e na sintaxe gerativas

Com base na literatura meacutedica Jakobson examinou a aquisiccedilatildeo da linguagem e a

afasia da fala agrave luz dos universais linguiacutesticos propondo uma relaccedilatildeo entre uma

hierarquia universal dos traccedilos fonoloacutegicos a aquisiccedilatildeo da linguagem na infacircncia

e a perda dela durante a afasia A aquisiccedilatildeo fonoloacutegica da crianccedila e os distuacuterbios

dos afaacutesicos baseiam-se nas mesmas leis de solidariedade como o inventaacuterio

fonoloacutegico o percurso fonoloacutegico das liacutenguas do mundo

Os estudos de Jakobson e de Trubetzkoy sobre a tipologia fonoloacutegica levaram

Jakobson a propor que os sistemas de sons satildeo organizados hierarquicamente e

que certas oposiccedilotildees fonoloacutegicas fornecem o nuacutecleo do sistema de som de todas

as liacutenguas Estas satildeo as oposiccedilotildees que definem os sons mais prototiacutepicos mdash

vogais e consoantes que ocorreratildeo em todos os idiomas vogais cardeais a i

u consoantes plosivas p t k e as nasais m n Estes sons satildeo

encontrados em praticamente todas as liacutenguas do mundo

Jakobson propotildee novas leis implicativas entre estes sons e os sons fora do

inventaacuterio baacutesico Dessa forma as leis tipoloacutegicas preveem que em nenhuma

liacutengua haveraacute vogais nasais a menos que haja vogais orais nenhuma liacutengua teraacute

uma vogal arredondada posterior a menos que ela tambeacutem tenha uma vogal

anterior fechada natildeo arredondada nenhuma liacutengua teraacute uma vogal fechada natildeo

arredondada a menos que ela tambeacutem tenha uma arredondada nenhuma liacutengua

teraacute uma fricativa dental simples sem uma fricativa dental estridente (Idem 1941

p 86)

50

Jakobson tambeacutem observa que certos sons satildeo muito raros nas liacutenguas do

mundo por exemplo as fricativas laterais e o r tcheco estridente Ele propotildee que

esses sons satildeo mais afastados do nuacutecleo e portanto menor nesta hierarquia

A hierarquia de oposiccedilotildees fonoloacutegicas definida pela tipologia encontra-se tambeacutem

no desenvolvimento do sistema foneacutetico da crianccedila Com base em estudos diaacuterios

de aquisiccedilatildeo da linguagem ele confirma a hierarquia na aquisiccedilatildeo dos padrotildees e

os padrotildees mais marcados seriam adquiridos tardiamente

Moreira da Silva (2011 p36) elenca os criteacuterios de marcaccedilatildeo No entanto a

autora chama a atenccedilatildeo para o fato de que eles nem sempre funcionam do modo

esperado Satildeo eles frequecircncia distribuiccedilatildeo aquisiccedilatildeo da liacutengua patologias da

linguagem histoacuteria da liacutengua facilidade de produccedilatildeo e percepccedilatildeo universalidade

implicaccedilatildeo e processos fonoloacutegicos Ela tambeacutem apresenta algumas unidades e

estruturas consideradas mais marcadas como podemos ver a seguir

Quadro 1 Unidades e estruturas mais marcadas conforme levantamento de Moreira da

Silva (2011)

Segmentos e estruturas mais marcadas Autores

1 Vogais nasais Ferguson amp Chowdbury 1960

Greenberg 1966 14 Durand 1990

74 Kenstowicz 1994 63

2 Vogais longas Zipf 1935 1963 Greenberg 1966

14

3 Vogais meacutedias em comparaccedilatildeo com as

vogais altas

Kenstowicz 1994 65

4 Consoantes aspiradas Greenberg 1966 14

5 Consoantes glotalizadas Greenberg 1966 17

6 Obstruintes [+vozeadas] por oposiccedilatildeo agraves [- Greenberg 1966 14 24

51

vozeadas] Lass1984 155 Kenstowicz 1994

62

7 Consoantes fricativas por oposiccedilatildeo agraves

oclusivas

Kenstowicz 1994 65

8 Articulaccedilotildees secundaacuterias como labializaccedilatildeo

palatalizaccedilatildeo e velarizaccedilatildeo

Kenstowicz 1994 65

9 A regiatildeo dental alveolar eacute preferida com

exceccedilatildeo das africadas o que pode ser

observado pelo fato de este ser o ponto de

articulaccedilatildeo usado quando numa liacutengua

existe apenas uma obstruinte Nas nasais

esta tendecircncia ainda se faz notar mais

resultando na preferecircncia por n

Lass 1984 154-156

10 Segmentos com articulaccedilotildees muacuteltiplas e

complexas no geral satildeo mais marcados em

comparaccedilatildeo com segmentos com

articulaccedilotildees singulares

Kenstowicz 1994 65

11 Quanto agraves liacutequidas a lateral seraacute a menos

marcada jaacute que as liacutenguas que possuem

duas ou mais liacutequidas tecircm provavelmente

uma lateral e um contraste lateral natildeo

lateral

Lass 1984 158

12 Em termos de semivogais haacute uma

preferecircncia por j embora a maioria das

liacutenguas possua tambeacutem w as outras

semivogais satildeo raras

Lass 1984 158

13 Siacutelabas acentuadas ndash nem todas as liacutenguas

tecircm siacutelabas acentuadas embora estas

surjam cedo na aquisiccedilatildeo talvez devido agrave

sua saliecircncia perceptiva e no caso do inglecircs

devido ao fato de as palavras lexicais serem

iniciadas por siacutelaba toacutenica

Demuth 1996 121

14 Quanto agrave siacutelaba existe a preferecircncia pelo

formato natildeo marcado CV

Blevins 1995 213

15 De acordo com a TO a siacutelaba estaacute sujeita agraves Archangeli 1997 7 Hammond

52

seguintes restriccedilotildees universais

a) As siacutelabas comeccedilam com consoante -

Ataque

b) As siacutelabas tecircm uma vogal - Nuacutecleo

c) As siacutelabas acabam com uma vogal - Natildeo

Coda

d) As siacutelabas tecircm no maacuteximo uma consoante

numa margem - Complexo

(significa que os ataques complexos e codas

complexas satildeo inaceitaacuteveis)

e) As siacutelabas satildeo compostas por consoantes

e vogais - Ataque e Nuacutecleo

1997 36

As estruturas elencadas no quadro acima satildeo validadas interlinguisticamente

Com relaccedilatildeo agraves liacutenguas em contato objeto deste estudo podemos afirmar que o

portuguecircs apresenta menos estruturas marcadas do que o Latundecirc No caso do

portuguecircs as estruturas em 2 4 5 e 10 constantes do quadro acima natildeo satildeo

observadas

Jaacute no Latundecirc aleacutem de todas as estruturas apresentadas no quadro ainda satildeo

observadas as seguintes estruturas mais marcadas

estrutura silaacutebica bastante complexa

inventaacuterio vocaacutelico maior do que o consonantal

53

combinaccedilatildeo de dois traccedilos mais marcados em um segmento (vogais

nasais e laringais) e

acento e tom lexicais

Para refletirmos sobre a marcaccedilatildeo no processo de interferecircncia Latundecirc ndash

Portuguecircs trataremos no capiacutetulo seguinte de conceitos a cerca do contato

linguiacutestico

54

3 CONTATO LINGUIacuteSTICO

ldquoBilingualism is for me the fundamental problem of linguisticsrdquo Jakobson10

31 INTRODUCcedilAtildeO

A histoacuteria em grande parte gira em torno de lendas e mitos Um desses mitos eacute o

surgimento das liacutenguas do mundo Questionamentos de como e quando elas

sugiram permeiam ainda hoje as mentes dos filoacutesofos e cientistas Natildeo

diferentemente das demais aacutereas a perspectiva teoloacutegica descreve a narrativa da

construccedilatildeo da Torre de Babel como uma dessas tentativas de explicaccedilatildeo no que

tange agrave miscelacircnea de liacutenguas existentes Jackob Bohme teoacutelogo do seacuteculo XVII

afirma em seu De Signatura Rerum11 que a liacutengua divina original raiz ou matildee de

todas as liacutenguas do mundo eacute chave para um conhecimento verdadeiro e perfeito

de todas as coisas Eacute no ato da criaccedilatildeo que o primeiro homem Adatildeo

contemplando as obras do Criador de toda a natureza nomeara todas as

criaturas de acordo com suas proacuteprias qualidades essenciais usando a

linguagem humana como meio

A hipoacutetese defendida por Bohme tambeacutem fora amplamente sustentada pelos

filoacutelogos e comparatistas do final do seacuteculo XVIII Sem viacutenculo com a teologia

estes estudiosos buscavam atraveacutes da reconstruccedilatildeo da aacutervore linguiacutestica a

protoliacutengua a liacutengua-matildee geradora das demais liacutenguas

10

Apud Romaine 1995 p1 11

De Signatura Rerum (Desde o nascimento e o nome de todos os seres) 1622

55

Jacob Grimm filoacutelogo alematildeo com base nas descobertas de Rasmus Rask

aperfeiccediloou o meacutetodo comparatista sobretudo o que fora denominada de

ldquomudanccedila de somrdquo ou ldquoLei de Grimmrdquo12 com intuito de descrever as mudanccedilas

ocorridas na liacutengua-matildee o proto-indo-europeu (PIE) A Lei de Grimm estava na

base das discussotildees ocorridas mais tarde na Universidade de Leipzig

Alemanha no conhecido grupo dos neogramaacuteticos Os estudiosos desse ciacuterculo

questionaram os estudos de Grimm e seus compatriotas ao apontarem para o fato

de que os estudos comparatistas se basearem em dados de liacutengua escrita e natildeo

de liacutengua falada (GABAS JR 2008 p 80)

Humberto Eco em A busca da liacutengua perfeita13 nos relata sobre os projetos de

reconstruccedilatildeo em busca da liacutengua sagrada No seu livro o autor nos mostra que a

tentativa de procura de correlatos entre as liacutenguas do mundo eacute interesse antigo

das civilizaccedilotildees Ele afirma que na Europa no seacuteculo XIX houve 173 projetos de

reconstruccedilatildeo linguiacutestica

Dadas ateacute aqui as investigaccedilotildees eacute comum pensarmos que pelo prisma

teoloacutegico o surgimento das liacutenguas no planeta eacute fruto da desobediecircncia e

soberba humanas Eco idem nos mostra que haacute um equiacutevoco quanto a esta

interpretaccedilatildeo uma vez que no capiacutetulo XI v 1 do livro de Gecircnesis a Biacuteblia

12

A Lei de Grimm analisou sobre o vieacutes da fonologia as relaccedilotildees que havia entre as liacutenguas indo-

europeias As similaridades entre o alematildeo claacutessico grego e inglecircs antigo eram previstas a partir de leis foneacuteticas i) as consoantes oclusivas surdas (p t k kw) do PIE mudaram em fricativas surdas correspondentes (f θ h hw) nas liacutenguas germacircnicas ii) as consoantes oclusivas sonoras (bdggw) do PIE mudaram em oclusivas surdas correspondentes (p t k kw) nas liacutenguas germacircnicas iii) as consoantes aspiradas sonoras (bh dh gh gwh) do PIE mudaram em oclusivas natildeo-aspiradas sonoras correspondentes (bdggw) nas liacutenguas germacircnicas (GABAS JR 2008 p 78) 13

ECO Humberto A busca da liacutengua perfeita Traduccedilatildeo de Antonio Angonese Bauru Edusc

2001

56

discorre sobre a existecircncia de uma uacutenica genealogia de uma mesma liacutengua e de

uma mesma fala

Diferentemente no capiacutetulo que antecede a narrativa de Babel a proacutepria Biacuteblia

aponta para a existecircncia de famiacutelias linguiacutesticas distintas conforme Gecircnesis 11

v 5 Por estes foram repartidas as ilhas dos gentios nas suas

terras cada qual segundo a sua liacutengua segundo as suas

famiacutelias entre as suas naccedilotildees

v20 Estes satildeo os filhos de Catildeo segundo as suas famiacutelias

segundo as suas liacutenguas em suas terras em suas naccedilotildees

v 31 Estes satildeo os filhos de Sem segundo as suas famiacutelias

segundo as suas liacutenguas nas suas terras segundo as suas

naccedilotildees

Uma explicaccedilatildeo para tal passagem se daacute a partir da perspectiva dos filoacutesofos

gregos que concebiam os povos que falava de forma diferente como bagraverbaroi

seres que balbuciavam falando de forma incompreensiacutevel Logo acreditavam que

aqueles outros eram serem inferiores que natildeo falavam a liacutengua verdadeira da

razatildeo e do pensamento o logos

Tal conflito entre as liacutenguas existentes apontam para uma poliacutetica linguiacutestica que

muito explica a hierarquia (status) linguiacutestica ainda hoje atuante O status

linguiacutestico resultante das relaccedilotildees assimeacutetricas entre sociedades ou subgrupos de

uma sociedade decorre tambeacutem das circunstacircncias e condiccedilotildees que envolvem o

contato linguiacutestico Esse por sua vez evolue da dinacircmica proacutepria do processo em

que ocorrem conflitos e acomodaccedilotildees e que pode derivar pidgins crioulos e

mudanccedila linguiacutestica

57

No reconhecimento de um universo entrelaccedilado compartilhamos com o ponto de

vista de Eco (2001) e assumimos a ideia de que a existecircncia de cada liacutengua e de

sua historicidade eacute reveladora do entendimento do mundo

ldquoCada liacutengua constitui um determinado modelo de Universo um sistema semioacutetico de compreensatildeo do mundo e se temos quatro mil modos diferentes de descrever o mundo isto nos torna mais ricos Deveriacuteamos nos preocupar pela preservaccedilatildeo das liacutenguas tal como nos preocupamos com a ecologiardquo (ECO 2001 p234)

32 SOBRE O CONTATO LINGUIacuteSTICO

Pouco eacute sabido sobre o contato entre as liacutenguas do mundo quando diante da

imensidatildeo que eacute o universo linguiacutestico com o qual nos deparamos14 A

necessidade que os humanos tecircm de se comunicarem a partir do momento que a

interaccedilatildeo foi estabelecida eacute condiccedilatildeo imprescindiacutevel para o contato linguiacutestico

Trask (2004 p 66) afirma que poucas liacutenguas estatildeo - ou estiveram -

suficientemente isoladas para evitar todo tipo de proximidade e portanto toda

liacutengua mostra alguma prova de um contato antigo ou moderno entre liacutenguas

Thurston (1987 p 34) afirma que

toda liacutengua deve ter sofrido alguma influecircncia de seus vizinhos em um determinado ponto e tempo Para ele todos os idiomas satildeo liacutenguas mistas na medida em que todos copiaram formas lexicais e outros recursos linguumliacutesticos de liacutenguas vizinhas

Embora natildeo saibamos exatamente como se deu o contato entre as liacutenguas do

mundo as evidecircncias do contato podem ser observadas de forma objetiva

atraveacutes de empreacutestimos lexicais O contato linguiacutestico entretanto natildeo se reduz

14

Eacute estimado o nuacutemero de sete mil liacutenguas vivas atualmente ao redor do mundo (httpwwwethnologuecomworld Em 21 de janeiro de 2015)

58

apenas a itens lexicais oriundos dos empreacutestimos entre culturas distintas com

base na dominaccedilatildeo na expansatildeo do comeacutercio ou em qualquer circunstacircncia que

promova a necessidade de comunicaccedilatildeo entre culturas de liacutenguas diferentes

O contato a depender das liacutenguas envolvidas pode trazer consequecircncias muito

devastadoras Em casos extremos o impacto do contato pode ser avassalador

fazendo com que uma das liacutenguas seja extinta quer seja pelo deslocamento

linguiacutestico que seja pelo etnociacutedio Nestes casos ocorre a morte de uma das

liacutenguas em contato aspecto que discorremos na seccedilatildeo sobre as consequecircncias

do contato

No tocante aos efeitos do contato em relaccedilatildeo aos niacuteveis linguiacutesticos Trask Idem

afirma que o contato linguiacutestico pode ir mais longe que a interferecircncia lexical

afetando a gramaacutetica e a pronuacutencia

Concordando com o que afirma Trask Thomason postula que embora seja senso

comum que o resultado mais comum da mescla linguiacutestica seja o empreacutestimo de

palavras este eacute apenas a consequecircncia mais comum quando se trata da

intersecccedilatildeo linguiacutestica

When the agents of change are fluent speakers of the receiving language the first and redominant interference features are lexical items belonging to the nonbasic vocabulary later under increasingly intense contact conditions structural features and basic vocabulary may also be transferred from one language to the other (THOMASON 2001 p 36)

Natildeo obstante podem-se detectar exemplos de transferecircncias em todos os

aspectos linguiacutesticos uma vez que todos os niacuteveis da estrutura linguiacutestica satildeo

59

possiacuteveis de serem transferidos entre idiomas muacutetuos sem qualquer tipo de

restriccedilatildeo dadas as possibilidades de conjunturas sociais e estruturais

Quando as liacutenguas entram em contato as suas gramaacuteticas tambeacutem satildeo

intercruzadas Tal processo natildeo eacute algo simples e justo Diversos fatores externos

satildeo responsaacuteveis por esta miscelacircnea que devido a tais fatores nem sempre eacute

concebida de forma inocente

Em meio a condicionantes sociolinguiacutesticas assumimos que as gramaacuteticas

(sendo tambeacutem reflexo das relaccedilotildees intersocietaacuterias) entram num jogo em que

as peccedilas satildeo acomodadas de acordo com as necessidades comunicativas dos

interlocutores (GILES e CUPLAND 1991) Em meio a esse ldquojogordquo nos importa

refletir como os fenocircmenos que emergem do contato entre liacutenguas podem refletir

questotildees que envolvem a marcaccedilatildeo e universais linguiacutesticos

Para Aikhenvald (2007 p1)

As liacutenguas podem assemelhar-se umas as outras em categorias construccedilotildees e significados e nas formas reais usadas para expressaacute-las As categorias podem ser semelhantes porque satildeo universais e cada liacutengua tem alguma forma de fazer uma pergunta ou a elaboraccedilatildeo de um comando Ocasionalmente duas liacutenguas compartilham a forma por pura coincidecircncia

A literatura linguiacutestica atesta que a semelhanccedila interlinguiacutestica motiva estudos

tipoloacutegicos haacute deacutecadas (CROFT 1990 COMRIE 1989 WHALEY 1997) Embora

liacutenguas apresentem padrotildees regulares de desemelhanccedilas aquelas podem ser

agrupadas em tipos baacutesicos Essa realidade induz a reflexatildeo acerca da existecircncia

de universais linguiacutesticos

60

As liacutenguas individuais independentemente das semelhanccedilas tipoloacutegicas eou

geneacuteticas observadas entre elas satildeo sujeitas a mudanccedilas continuadas que

ocorrem tambeacutem devido ao contato linguiacutestico Para Thomason (2001 p14) as

influecircncias e consequecircncias do contato linguiacutestico satildeo descritas em trecircs niacuteveis i)

mudanccedila induzida pelo contato ii) mescla linguiacutestica extrema o que resulta em

pidgin crioulo e liacutenguas biliacutengues e iii) morte da liacutengua

A seguir abordaremos fenocircmenos decorrentes do contato linguiacutestico

33 MESCLAS DE CONTATO PIDGIN CRIOULO LIacuteNGUA FRANCA E JARGAtildeO

Um ponto saliente dos estudos sobre o contato linguiacutestio eacute o conceito de

ldquomescla15rdquo Este termo utilizado por Tarallo e Alkimin (1987 p7) descreve a

relaccedilatildeo entre as liacutenguas e seus resultados Inicialmente eles chamam a atenccedilatildeo

para o fato de a mescla ser interpretada como algo impuro definhamento

deterioraccedilatildeo Esta impureza linguiacutestica historicamente levou a sociedade a

alimentar a ideia de contaminaccedilatildeo e obviamente construir a discriminaccedilatildeo

linguiacutestica

Ao pensarmos sobre o processo de simbiose que as coisas e os elementos do

mundo estatildeo sujeitos em todo o tempo podemos ter uma ideia clara de que o

processo de amaacutelgama eacute proacuteprio natildeo apenas da natureza linguiacutestica mas de tudo

o que pode existir Apesar disso as mesclas com graus niacuteveis e saliecircncias

variadas nem sempre satildeo refletidas ou percebidas pelos usuaacuterios das liacutenguas do

15 Mescla eacute mistura contato amaacutelgama etc Tarallo e Alkimin (1987 p7)

61

mundo Focalizando a natureza da mescla o estudo das liacutenguas por seu turno

seja sincrocircnico ou diacrocircnico pode evidenciar os fenocircmenos do contato nos

diferentes niacuteveis linguiacutesticos

Tarallo e Alkimin (idem p9) salientam que o dinamismo linguiacutestico se daacute nas

ldquocomunidades de falardquo16 Eacute nelas e entre elas que se concretizam o contato

linguiacutestico que por sua vez produzem fenocircmenos de mescla ou de convivecircncia

coexistecircncia mecanismo ativado pelos indiviacuteduos que integram tais comunidades

Esse fato se alinha agrave perspectiva de que uma comunidade de fala natildeo eacute em

absoluto homogecircnea Nela podem coexistir processos de ordem interna e

externa assim como forccedilas centriacutefugas e centriacutepetas (BAKHTIN 2010)17

A dinacircmica social eacute tambeacutem pontuada por Tarallo e Alkimin (ibidem p9) Esses

autores mencionam que a mescla linguiacutestica resultante da dinacircmica pode ser

intracomunidade ou intercomunidade No primeiro caso as variantes convivem

eou se entrecruzam em uma mesma comunidade de fala em que apenas uma

liacutengua eacute falada No segundo liacutenguas distintas coexistem e se misturam em uma

mesma comunidade Como exemplo de mesclas intracomunidades podemos citar

o portuguecircs e suas variantes questotildees geograacuteficas histoacutericas e sociais Satildeo

variantes que convivem ldquopacificamenterdquo em territoacuterio nacional Jaacute para as mesclas

intercomunidades tomemos o exemplo do conviacutevio do portuguecircs e demais liacutenguas

16

Labov (1972) conceitua comunidade de fala como grupo de falantes que segue as mesmas normas relativas ao uso da liacutengua Para Romaine (2000) trata-se de um grupo de falantes que natildeo compartilham necessariamente a mesma liacutengua poreacutem compartilham um conjunto de normas

e regras no uso da liacutengua 17

Bakhtin aponta a luta entre classes as forccedilas que agem de dentro para fora do sujeito ou das instituiccedilotildees assim como as forccedilas que agem fazendo o movimento oposto Eacute imprescindiacutevel vislumbrar o poder poliacutetico que a liacutengua tem

62

(alematildeo polonecircs e italiano) na regiatildeo sul bem como a coexistecircncia espaccedilo-

temporal entre diferentes liacutenguas indiacutegenas e entre elas e a liacutengua portuguesa

Ao discutir a mescla linguiacutestica sob a eacutegide do contato linguiacutestico Calvet (2004

p35) considera que haacute aproximadamente na Terra cerca de 5000 liacutenguas e

cerca de 150 paiacuteses Com base nesses nuacutemeros o autor nos diz que cada paiacutes

poderia ter 30 liacutenguas Apesar de em termos reais a distribuiccedilatildeo das liacutenguas natildeo

corresponder a esse cenaacuterio o pesquisador aponta para o fato de

que o mundo eacute pluriliacutengue em cada um de seus pontos e que as comunidades linguiacutesticas se costeiam se superpotildeem continuamente O plurilinguismo faz com que as liacutenguas estejam constantemente em contato O lugar desses contatos pode ser o indiviacuteduo (biliacutengue ou em situaccedilatildeo de aquisiccedilatildeo) ou a comunidade Idem (2002 p 35)

Os dados de Calvet deixam claro que desde sempre o contato linguiacutestico eacute uma

realidade da vivecircncia do humano Os acontecimentos histoacutericos de guerra

expansatildeo e colonizaccedilatildeo apontam para a mescla linguiacutestica Diante deste

contexto vemos que o relacionamento entre as liacutenguas do mundo eacute um processo

feacutertil para a diversidade linguiacutestica Outro aspecto de interesse decorre do fato de

o contato permitir a emergecircncia de padrotildees estruturais os quais trazem luzes

para a compreensatildeo da faculdade da linguagem

A depender do contato podemos avaliar diferentes fenocircmenos resultantes A

intensidade o contato linguiacutestico pode derivar instrumentos mais ou menos

elaborados de comunicaccedilatildeo definidos como jargatildeo pidgin e crioulo

63

Os primeiros estudiosos a se aterem sobre o estudo das liacutenguas pidgins e

crioulas se utilizaram dos dados (relatos) de missionaacuterios e comerciantes que

viajaram e mantiveram contato com as aacutereas das mesclas18

331 Pidgin

O termo pidgin foi usado pela primeira vez em 1850 para conceituar o conviacutevio do

inglecircs e o chinecircs19 Mas outras duas hipoacuteteses tambeacutem satildeo colocadas quando

se trata de pidgin A segunda afirma que o termo fora transportado da Ameacuterica do

Sul no iniacutecio do seacuteculo XVII pelos marinheiros e comerciantes ingleses da colocircnia

de Leigh ao estabelecerem contato com os iacutendios Pidiam A terceira explicaccedilatildeo eacute

a origem a partir da palavra portuguesa ocupaccedilatildeo que teria sofrido algumas

mudanccedilas foneacuteticas ateacute resultar em pidgin (TARALLO e ALKMIN 1987 p80)20

Para Couto (2001 p 1) o pidgin eacute uma liacutengua com uma reduccedilatildeo draacutestica da

gramaacutetica Esta reduccedilatildeo se daacute sobre a morfologia e o leacutexico Natildeo eacute liacutengua

materna de ningueacutem pois entre si os povos dominados soacute falam suas respectivas

liacutenguas ao passo que os dominadores nunca se datildeo ao trabalho de falar outra

liacutengua que natildeo a sua proacutepria

Crystal (2008 p 201) afirma que aleacutem do processo de reduccedilatildeo para o

surgimento do pidgin as comunidades de falas envolvidas neste processo

18

Tarallo e Alkimin 1987 p 109-114 citam Francisco Adolfo Coelho Hugo Schuchardt e Dirk Christiaan Hesseling como os pioneiros neste campo de estudo Este uacuteltimo atribui aos escravos europeus a forccedila linguiacutestica Foram eles (os escravos) os responsaacuteveis pelas alteraccedilotildees sofridas pelas liacutenguas maternas 19

Neste caso o termo business ao ser empregada na expressatildeo do pidgin chinecircs de base inglesa

dɛacuteju pidzIn significando thatrsquos your business 20

Ocupaccedilatildeo gt parsquosaw ou pasaɳ

64

necessitam cada uma delas se aproximarem sucessivamente dos traccedilos mais

oacutebvios da outra liacutengua Trata-se de uma intersecccedilatildeo nem sempre consciente mas

motivada por aspectos econocircmicos como o comeacutercio Daiacute o grande surgimento de

pidgins em aacutereas de intenso comeacutercio e desenvolvimento econocircmico

Dubois et all (1998 p 469) discorre que o pidgin mesmo natildeo sendo uma liacutengua

em si mesma eacute um sistema mais completo que o sabir pois seu vocabulaacuterio

cobre numerosas atividades O sabir ou liacutengua franca21 por sua vez eacute um

sistema linguiacutestico reduzido a algumas regras de combinaccedilatildeo e ao vocabulaacuterio de

determinado campo lexical

Ainda de acordo com Tarallo e Alkmin (1987 p 88)

Fontes histoacutericas indicam que no tempo das cruzadas nas regiotildees de batalhas entre mulccedilumanos e cristatildeos teria florescido uma liacutengua de contato denominada Liacutengua Franca ou sabir Com documentaccedilatildeo precaacuteria a existecircncia dessa liacutengua eacute contestada por alguns estudiosos Originalmente usada entre aacuterabes e europeus essa liacutengua teria se expandido tendo sido usada ao longo da costa do Mediterracircneo especialmente na Aacutefrica do Norte

Em Trask (2004 p228) o conceito de liacutengua franca eacute mais explorado Para ele a

liacutengua franca se distingue do pidgin quando por ventura um dos grupos

ldquoaprenderdquo a liacutengua do outro Neste caso a gramaacutetica e o leacutexico de uma

21

Na atualidade conforme Tarallo e Alkmin 1987 p 90 a expressatildeo liacutengua franca refere-se a um

fenocircmeno mais amplo a mescla de contato para intercomunicaccedilatildeo em situaccedilotildees biliacutengues e pluriliacutengues Como exemplo os autores citam a liacutengua wolof no Senegal do swahili no Quecircnia na Tanzacircnia e em Comores do Tucano no Nordeste da Amazocircnia

65

sobressaem agrave outra O pidgin eacute compreendido entatildeo como uma colcha de

retalhos que permite uma forma bastante rudimentar de comunicaccedilatildeo22

Ainda de acordo com Trasky (p229) um pidgin pode seguir caminhos distintos i)

ele pode cair em desuso ii) ele pode continuar em uso por vaacuterias geraccedilotildees e

durar seacuteculos iii) ele pode sofre algumas alteraccedilotildees e se transformar em liacutengua

materna Neste uacuteltimo caso trata-se do processo de crioulizaccedilatildeo do qual

abordaremos mais agrave frente

Hall apud Tarallo e Alkmin (1987 p 86) ao tratar do caraacuteter reducionista que o

pidgin apresenta em sua estrutura e leacutexico aponta algumas caracteriacutesticas que

definem tais simplificaccedilotildees

Niacutevel fonoloacutegico ndash o nuacutemero de contrastes empregados eacute reduzido As vogais representadas satildeo em geral as chamadas vogais cardinais (a e i o u) enquanto os grupos consonantais satildeo caracteristicamente evitados

Niacutevel morfoloacutegico ndash ausecircncia de algumas categorias flexionadas como gecircnero nuacutemero e tempo verbal

Niacutevel sintaacutetico ndash as estruturas sentenciais satildeo simples as sequecircncias tendem a ser coordenadas evitando-se as estruturas complexas e subordinaccedilatildeo extensiva

Niacutevel lexical ndash nuacutemero reduzido de vocaacutebulos cuja accedilatildeo se norteia pela extensatildeo de significados e por polissemias significativas

332 Crioulo

O crioulo eacute um pidgin consolidado Quando os falantes crianccedilas oriundos dessa

mescla linguiacutestica utilizam o pidgin como uacutenica liacutengua ou a liacutengua que passa a

ganhar mais evidecircncia esta se consolida como liacutengua materna

22

Conforme Tarallo e Alkmin (idem p 8) algumas caracteriacutesticas do pidgin satildeo i) seu caraacuteter

auxiliar e secundaacuterio para os dois grupos cada um dos grupos manteacutem sua proacutepria liacutengua no conviacutevio social do cotidiano e do habitual ii) as liacutenguas pidgin preenchem funccedilotildees sociais limitadas sobretudo aquelas vinculadas a atividades comerciais mercantilistas

66

Para Couto (2001 p2)

Liacutengua crioula eacute um pidgin que foi adquirido como liacutengua nativa como preconiza a chamada teoria da nativizaccedilatildeo De acordo com essa concepccedilatildeo o crioulo eacute um ex-pidgin ou seja um pidgin que virou liacutengua materna de uma comunidade

Ainda para Tarallo e Alkmin (1987 p 95) as liacutenguas crioulas constituem um

conjunto de liacutenguas cuja histoacuteria conhecida eacute ligada a uma situaccedilatildeo de contato

entre populaccedilotildees linguiacutesticas cultural e etnicamente distintas Estas satildeo

distinguidas das liacutenguas pidgin por possuiacuterem uma comunidade de falantes

nativos e consequentemente por desempenharem funccedilotildees sociais amplas como

qualquer liacutengua natural

Em Dubois et all (1998 p 161) daacute-se o nome de crioulos a sabires pseudo-

sabires ou pidgins que por motivos diversos de ordem histoacuterica ou sociocultural

se tornaram liacutenguas maternas de toda uma comunidade

As liacutenguas tipo pidgin de acordo com autores como Tarallo e Alkimin (1987 p

96) aleacutem de serem as liacutenguas que daratildeo origem aos crioulos (pois todo crioulo se

origina de um pidgin embora nem todo pidgin se transforme em crioulo) satildeo

associadas a atividades de comeacutercio enquanto os crioulos satildeo marcados pela

relaccedilatildeo de escravidatildeo

Quanto ao aspecto funcional as liacutenguas crioulas datildeo conta das necessidades

comunicativas totais de seus falantes nativos e usuaacuterios uma vez que a

passagem do estaacutegio de pidgin a crioulo eacute marcada por uma ampliaccedilatildeo do leacutexico

67

e de estrutura Neste caso para os estudiosos os crioulos nada mais satildeo que

pidgins enriquecidos23

O processo de evoluccedilatildeo de um pidgin em crioulo eacute descrito por Hall (1996 p 4)

em um diagrama Nele podemos ver que inicialmente o pidgin eacute configurado a

partir de um jargatildeo uma espeacutecie de pidgin instaacutevel Depois o pidgin ganha

estabilidade se configurando como um preacute-crioulo Por fim jaacute estabilizado o

pidgin se transforma em crioulo

Figura 1 Diagrama de Hall

LL = Liacutengua lexificadora ou de superstrato LS = Liacutengua de Substrato

De acordo com Hall (idem p 5) a evoluccedilatildeo do jargatildeo para o pidgin estaacutevel eacute

chamada de pidginizaccedilatildeo A evoluccedilatildeo do pidgin estaacutevel para o crioulo eacute

23

Valdman apud Tarallo e Alkimin 1987 p 96 cita um conjunto de traccedilos negativos dos crioulos franceses do Haiti de Guadalupe Martinica Reuniatildeo Mauriacutecio Seychelles e Rodrigues como i) ausecircncia de distinccedilatildeo de gecircnero ii) natildeo-obrigatoriedade de marcador de plural iii) verbos natildeo-flexionados iv) relacionamento parataacutetico no interior do sintagma nominal v) ausecircncia de hipotaxe vi) construccedilotildees passivas vii) vogais arredondadas viii) certos grupos consonantais

I = LL + LS pidgin instaacutevel jargatildeo

crioulo = III II = pidgin estaacutevel

68

denominada crioulizaccedilatildeo A volta do crioulo para o jargatildeo processo tambeacutem

possiacutevel eacute conhecido como descrioulizaccedilatildeo

Obviamente o crioulo eacute consequecircncia natural de situaccedilotildees de contato No

entanto nem todo contato linguiacutestico gera automaticamente um pidgin ou um

crioulo Os contatos podem daacute origem a fenocircmenos de mesclas diversas que

podem ou natildeo desaparecer ou serem absorvidas pelas liacutenguas presentes na

alquimia (TARALLO e ALKMIN 1987 p 103)

Quanto ao processo de desenvolvimento e de formaccedilatildeo de um pidgin e de

crioulos Hymes (1971 p 93) afirma que

A pidginizaccedilatildeo e a crioulizaccedilatildeo da linguagem natildeo satildeo processos marginais ao contraacuterio satildeo processos que ocorrem nas liacutenguas em geral Tais processos de natureza bastante complexa compreendem a ocorrecircncia de outros subprocessos os de mudanccedila A incidecircncia desses processos ocorre principalmente 1) na forma interna das liacutenguas (fala-se assim em reduccedilatildeo ou expansatildeo) 2) na forma externa das liacutenguas (daiacute se falar em amplificaccedilatildeo e complicaccedilatildeo) 3) no escopo de uso (o domiacutenio) de uma variedade linguiacutestica (fala-se assim em restriccedilatildeo ou extensatildeo)

Hymes (idem p 94) ainda explica que diferentemente da posiccedilatildeo claacutessica onde

um crioulo era oriundo (ou natildeo) de um pidgin nesta segunda proposta a

evoluccedilatildeo de um pidgin natildeo produz necessariamente um crioulo mas um conjunto

de variedades concorrentes chamada de contiacutenuo preacute-pidgin24

24

Para Hymes o contiacutenuo preacute-pidgin poderia evoluir e gerar a cristalizaccedilatildeo de um pidgin e teria autonomia enquanto sistema de comunicaccedilatildeo Com base nesta assertiva um pidgin seria o resultado de um processo que ganharia autonomia Esse pidgin constituiacutedo poderia se transformar em crioulo Mas o contiacutenuo preacute-pidgin natildeo evolui para um pidgin Torna-se possiacutevel supor a cristalizaccedilatildeo de um crioulo sem a existecircncia de um pidgin anterior (TARALLO E ALKMIN 1987 p 105)

69

Na concepccedilatildeo final deste autor o contexto inicial em que fora estabelecido o

contiacutenuo preacute-pidgin poderia alccedilar trecircs resultados aceitaacuteveis i) a cristalizaccedilatildeo de

um pidigin ii) a cristalizaccedilatildeo de um pidgin que se criouliza iii) a cristalizaccedilatildeo de

um crioulo sem necessariamente ter sido oriundo de um pidgin anterior

Tarallo e Alkimin (1987 p 106) afirma que a cristalizaccedilatildeo de um crioulo eacute apenas

uma das trecircs possibilidades para a mescla de contato que pode ser descrita da

seguinte forma i) o crioulo pode submergir ii) o crioulo pode se estabilizar sem

muitas variaccedilotildees iii) o crioulo pode se mesclar com liacutengua padratildeo oficial

De acordo com o que vimos ateacute aqui podemos descrever o processo de

hibridizaccedilatildeo linguiacutestica com base na mescla a partir dos seguintes estaacutegios i)

contiacutenuo preacute-pidgin ii) pidgin cristalizado iii) pidgin em processo de

despidginizaccedilatildeo iv) pidgin em processo de crioulizaccedilatildeo v) crioulo cristalizado vi)

crioulo em processo de descrioulizaccedilatildeo (contiacutenuo poacutes-crioulo)

333 Liacutengua Franca ou Sapir

O termo liacutengua franca refere-se agrave liacutengua de contato entre grupos ou membros de

grupos de liacutenguas distintas com finalidade para o comeacutercio Durante o Impeacuterio

Romano o grego serviu como liacutengua franca no oriente e no milecircnio seguinte o

latim no ocidente Esta liacutengua (o sapir) tambeacutem eacute conhecida como liacutengua de

marinheiro No mundo moderno o inglecircs desempenha este papel ao ser

considerado como liacutengua do comeacutercio e das ciecircncias

70

Devido agrave natureza colonizadora dos falantes suas liacutenguas serviram de liacutengua

franca em certos momentos da histoacuteria Eacute o caso do portuguecircs e do espanhol

durante a expansatildeo mariacutetima e do francecircs durante o seacuteculo VII

Trask (2004 p 167) relata que a expressatildeo lingua franca fora originadamente

utilizada para as liacutenguas dos francos francocircnio mas teve o sentido modificado

assumindo o sentido de liacutengua europeia ou liacutengua cristatilde Ele ainda assegura que

a liacutengua franca

era uma variedade de italiano fortemente suplementada com palavras derivadas do francecircs do espanhol do grego do aacuterabe e do turco que se usava como liacutengua do comeacutercio no Mediterracircneo oriental no final da Idade Meacutedia Desde entatildeo a denominaccedilatildeo aplica-se a toda liacutengua que desfruta de um amplo entre falantes de um grande nuacutemero de liacutenguas numa dada regiatildeo

No presente o termo eacute utilizado para designar uma liacutengua estabelecida haacute algum

tempo tida como materna em um grupo influente e que serve de comunicaccedilatildeo

entre os falantes de outras liacutenguas como por exemplo o papel que o inglecircs

exerce em Cingapura

Atualmente aleacutem do inglecircs inuacutemeras liacutenguas servem de liacutengua franca para

comunicaccedilatildeo entre os povos como por exemplo o tupi No entanto um caso que

merece destaque eacute o do esperanto liacutengua que vem sendo incorporada no mundo

desde a deacutecada de 80 com a finalidade de ser a liacutengua franca universal Vale

ressaltar que neste caso os interesses para que tal liacutengua se propagasse

eficientemente eacute diferente das liacutenguas francas da Idade Meacutedia uma vez que se

trata de uma liacutengua artificial criada com ideologias poliacuteticas filosoacuteficas e

religiosas

71

334 Jargatildeo

O jargatildeo eacute um pidgin instaacutevel Sua concepccedilatildeo se aproxima do sabir ou liacutengua

franca Romaine (2000 p182) faz uso desse termo para exemplificar o processo

de criaccedilatildeo de um crioulo

A simplificaccedilatildeo e a instabilidade satildeo as marcas mais salientes de um jargatildeo No

pidgin as normas satildeo mais estaacuteveis enquanto que no jargatildeo as normas natildeo satildeo

afixadas Segundo esta autora eacute a partir do jargatildeo que a mescla linguiacutestica se

configura

Figura 2 Configuraccedilotildees da Mescla Linguiacutestica segundo Romaine (2000 p185)

Tipo 1 Jargatildeo

Tipo 2 Jargatildeo

Tipo 3 Jargatildeo

Pidgin estabilizado

Pidgin estabilizado

Pidgin expandido

Crioulo

Crioulo

Crioulo

No tipo 1 o jargatildeo deu origem diretamente a um crioulo De forma diferente no 2

o crioulo natildeo se originou diretamente de um jargatildeo Este deu origem a um pidgin

estabilizado para posteriormente chegar a um crioulo No tipo 3 o jargatildeo evolui

se transformando em um pidgin estabilizado depois em um pidgin expandido ateacute

chegar a um crioulo O fato eacute que a origem nos trecircs casos estaacute em um jargatildeo

72

34 IMPLICACcedilOtildeES DO CONTATO LINGUIacuteSTICO

Todo contato resulta em processos linguiacutesticos que alteram e dinamizam as

liacutenguas do mundo que passam por transformaccedilotildees que advecircm tanto da sua

motivaccedilatildeo interna quanto da externa No que tange agraves motivaccedilotildees externas

podemos afirmar que satildeo os contatos os grandes responsaacuteveis por muitas dessas

transformaccedilotildees podendo resultar enoutros processos orirundos ou que se

assentam no contato

341 Bilinguismo

Os estudos e as correntes linguiacutesticas na sua maioria tecircm como base liacutenguas

uacutenicas ou comunidades monoliacutengues Contudo o bilinguismo ocorre amplamente

atraveacutes do mundo e permanece apresentando um leque de questionamento para

a comunidade cientiacutefica atual Embora natildeo seja de hoje o questionamento em

torno do bilinguismo25 soacute agora podemos vislumbrar o descortinar desse tema

Estudiosos do passado jaacute reconheciam a relevacircncia do fenocircmeno Jakobson

(1953) por exemplo assumiu que ldquobilingualism is for me the fundamental problem

of linguiacutesticsrdquo

Romaine (1995 p6) elenca alguns questionamentos com base no que deve ser

observado ao estudar o contato linguiacutestico

O que eacute que o desempenho dos falantes diante do processo biliacutengue nos diz

sobre a competecircncia de pessoas e das comunidades multiliacutengues

25

Do inglecircs bilingualism

73

Eacute a troca de elementos linguiacutesticos por acaso comportamento linguiacutestico e o

cacircmbio linguiacutestico aleatoacuterio

Isto eacute indicativo de fluecircncia pobre e inabilidade em uma ou ambas as liacutenguas em

outras palavras o resultado de competecircncia imperfeita

Ao contraacuterio com qual criteacuterio medimos a competecircncia dos biliacutengues

Pode-se distinguir entre troca empreacutestimo e interferecircncia linguiacutestica

Satildeo a mudanccedila de coacutedigo e o bilinguismo generalizado em uma comunidade

sinais de atrito de uma liacutengua minoritaacuteria

Satildeo os sistemas de idiomas que estatildeo disponiacuteveis para um indiviacuteduo biliacutengue

fundidos ou separados

Aleacutem desses questionamentos outros de base sociofilosoacutefica tambeacutem estatildeo

inseridos nos estudos sobre o bilinguismo Para alguns pesquisadores muitas

liacutenguas minoritaacuterias foram exterminadas devido agrave forte influecircncia e agrave troca

linguiacutestica No entanto mesmo sendo acusado por estes como um passo para o

extermiacutenio das liacutenguas minoritaacuterias o bilinguismo natildeo deve ser visto como o

responsaacutevel pela extinccedilatildeo pelo contraacuterio o estudo dele aliado ao conhecimento

metacognitivo poderatildeo contribuir para o salvamento de muitas dessas liacutenguas

ainda que no plano escrito jaacute que na oralidade muitas natildeo gozam do status de

suas liacutenguas como oficiais nas atividades sociais sendo relegadas aos rituais de

suas sociedades

O comportamento linguiacutestico de uma determinada sociedade natildeo pode servir

unicamente de paracircmetro para outras Assim se algumas comunidades

apresentam mais facilidade em absorver outra forma linguiacutestica umas tecircm maior

resistecircncia enquanto que outras convivem por centenas de anos lado a lado com

determinadas liacutenguas

74

O bilinguismo tambeacutem pode ser classificado como social ou individual Segundo

Appel e Muysken (1986) o bilinguismo social ocorre quando em determinada

sociedade duas ou mais formas linguiacutesticas satildeo faladas quando cedo toda

sociedade se torna biliacutengue mas elas podem se tornar diferentes no que se

relaciona ao niacutevel ou forma de bilinguismo conforme figura abaixo

Figura 3 Esquema de representaccedilatildeo do bilinguismo social segundo Appel e Muysken

(1986)26

De acordo com a figura na comunidade I as duas liacutenguas satildeo faladas por dois

diferentes grupos monoliacutengues No entanto um grupo reduzido de falantes

biliacutengues seraacute necessaacuterio para fazer a comunicaccedilatildeo entre os grupos Esta forma

de bilinguismo social geralmente ocorre no periacuteodo colonial dos paiacuteses Pode-se

tomar por exemplo o Brasil quando os portugueses aqui chegaram

Em sociedades representadas pela forma II todos os falantes satildeo biliacutengues Em

paiacuteses como Aacutefrica Iacutendia e Brasil existem muitas sociedades totalmente

biliacutengues em que os falantes dominam as duas formas linguiacutesticas existentes

26

Apud Appel e Muysken (1986) p 2

75

Na forma III um grupo dessa comunidade eacute biliacutengue enquanto a outra eacute

monoliacutengue sendo este grupo na maioria das vezes a minoria Pois geralmente

o grupo biliacutengue eacute o dominante e o outro o dominado Tal circunstacircncia eacute tiacutepica

das assimetrias comuns nas relaccedilotildees entre os sujeitos do contato Situaccedilatildeo

como essa evidencia o papel da liacutengua para uma sociedade a qual pode ser

objeto de libertaccedilatildeo e tambeacutem de dominaccedilatildeo

Como dito anteriormente estas formas de bilinguismo social natildeo satildeo uniformes

nem tatildeo pouco refletem em detalhe de todas as existentes no interior das

sociedades Em muitas comunidades a situaccedilatildeo linguiacutestica eacute extremamente

complexa com mais de dois grupos e linguagens envolvidos

Com relaccedilatildeo aos aspectos linguiacutesticos o estudo do bilinguismo pode responder e

explicitar os fenocircmenos decorrentes da situaccedilatildeo do contato Fenocircmenos no

domiacutenio do leacutexico ou da sintaxe podem ser muito produtivos Entretanto podemos

considerar que eacute o niacutevel da foneacuteticafonologia que marcadamente sofre a

interferecircncia com o contato linguiacutestico

No contato duas ou mais formas linguiacutesticas podem perdurar por anos conforme

os quadros I e III na figura 3 No entanto alguns fenocircmenos linguiacutesticos podem

ocorrer paralelamente Um embate linguiacutestico pode surgir dentro dessas

comunidades linguiacutesticas e estas liacutenguas podem cambiar o leacutexico uma da outra

Sobre isso Bloomfield (1961 p 25) classifica esses empreacutestimos em iacutentimos

culturais e dialetais

76

O empreacutestimo externo ou cultural sempre eacute motivado por contatos poliacutetico sociais

e comerciais inclusive militares sempre com a dominaccedilatildeo de um dos povos Jaacute

os empreacutestimos dialetais se datildeo entre os contatos dentro de uma mesma liacutengua

satildeo as variantes regionais

O que particularmente nos interessa - o empreacutestimo iacutentimo - ocorre quando as

duas liacutenguas passam a conviverem no mesmo campo geograacutefico Dessa forma

se a liacutengua A domina a liacutengua B poderatildeo ocorrer trecircs hipoacuteteses i) B desaparece

e deixa um substrato em A ii) A desaparece e deixa um superstrato em B iii)

permanecem as duas trocando elementos na condiccedilatildeo de adstrato No entanto

natildeo devemos esquecer que as motivaccedilotildees pelas quais os falantes se apropriam

ou satildeo obrigados a se apropriarem para adquirem outra(s) liacutengua(s) extrapolam

os aspectos aqui vislumbrados

Os exemplos dados por Romaine (1995 p 2) demonstram como pode ocorrer o

cacircmbio linguiacutestico entre a liacutengua materna e a liacutengua adquirida posteriormente A

partir desses exemplos a estudiosa elenca os questionamentos mais relevantes

que deveratildeo ser observados em pesquisas que tratam da anaacutelise das

comunidades biliacutengues

(a) Kio Ke six sevem hours te school de vie spend karde ne they are speaking English all the time (Panjabi Inglecircs)

Because they spend six or seven hours a day at school they are speaking English all the time27

(b) Will you rubim off Ol man will come (Tok Pisin Inglecircs)

27

ldquoPorque eles passam seis ou sete horas por dia na escola eles estatildeo falando inglecircs o tempo todordquo

77

Will you rub [that off the blackboard] The men will come28

(c) Sano esttaacute tulla tanne ettaacute Iacutem very sick (Finlandecircs Inglecircs)

Tell them to come here that Iacutem very sick 29

(d) Kodomotachi liked it (Japonecircs Inglecircs)

The children liked it 30

(e) Won o arrest a single person (Yoruba Inglecircs)

They did not arrest a single person 31

(f) This morning I hantar my baby tu dekat babysitter tu lah (Malay Inglecircs)

This morning I took my baby to the babysitter 32

De acordo com AiKhenvald e Dixon (2006 p 2)

Se duas ou mais liacutenguas estatildeo em contato os falantes de uma tendo conhecimento da outra eles podem compartilhar traccedilos linguiacutesticos incluindo haacutebitos de pronuacutencia Historicamente todo idioma deve ter sofrido certa influecircncia de seus vizinhos O impacto do contato eacute mais forte e mais faacutecil de ser discernido em alguns idiomas enquanto em outros eacute mais fraco

O que fora dito acima pode ser comprovado em qualquer comunidade em que a

liacutengua do colonizador fora imposta durante o ato de conquista ou de contato Em

algumas comunidades a situaccedilatildeo de bilinguismo eacute motivada por outras

28

ldquoVocecirc esfregaraacute [o quadro-negro de fora] Os homens viratildeordquo 29

ldquoChame-os aqui que eu estou muito doenterdquo 30

ldquoAs crianccedilas gostam dissordquo 31

ldquoEles natildeo prenderam uma uacutenica pessoardquo 32

ldquoEsta manhatilde eu ocupei meu bebecirc agrave babaacuterdquo

78

necessidades que se fazem presente nessa sociedade O portuguecircs eacute a liacutengua de

contato que eacute utilizada por todos os membros em situaccedilotildees diaacuterias e em contatos

com a comunidade externa Enquanto a liacutengua interna eacute utilizada em seus rituais

e eacute utilizada em contexto familiar que exige mais aproximaccedilatildeo familiar entre os

membros 33

342 Diglossia

O processo de diglossia pode ser compreendido conforme Dubois et all (1998 p

190) como i) situaccedilatildeo de bilinguismo ii) situaccedilatildeo biliacutengue na qual uma das

liacutenguas eacute de status sociopoliacutetico inferior iii) aptidatildeo que tem um indiviacuteduo de

praticar corretamente outra liacutengua aleacutem da liacutengua materna

Embora seja entendida tambeacutem como uma competecircncia linguiacutestica em que o

falante de uma determinada liacutengua possa conhecer os niacuteveis formal e informal de

sua gramaacutetica para este trabalho o conceito que recorremos eacute o de diglossia

enquanto situaccedilatildeo de conviacutevio de duas ou mais liacutenguas em uma comunidade

Trata-se neste caso da utilizaccedilatildeo de uma das liacutenguas como liacutengua oficial

enquanto a outra fica a cabo das situaccedilotildees de conviacutevio Geralmente a liacutengua do

dominador eacute a liacutengua das relaccedilotildees comerciais a outra eacute utilizada nos rituais ou no

seio das famiacutelias (comunidade)

Devido agraves colonizaccedilotildees e agrave globalizaccedilatildeo a diglossia eacute muito comum no mundo

poacutes-moderno Em paiacuteses que foram colocircnias portuguesas como Moccedilambique e

33

Como exemplo podemos citar o que ocorre com o Fulni-ocirc Conforme COSTA1993 p 58

79

Timor Leste por exemplo o Portuguecircs eacute a liacutengua oficial enquanto as liacutenguas

nativas satildeo conservadas no acircmbito familiar e em ciclos informais Assim como

nas comunidades mais desenvolvidas o aprendizado de mais de uma segunda

liacutengua faz com que as comunidades se tornem pluriliacutengues

Por causa desta competecircncia linguiacutestica em que o sujeito passa a dominar dois

ou mais coacutedigos o conceito de diglossia fora ampliado agraves comunidades

monoliacutengues Neste caso entende-se que o sujeito pode ser bi- ou multiliacutengue

fora e dentro da sua proacutepria liacutengua34

Para Ferguson (1991 p 5) a diglossia eacute

Uma situaccedilatildeo linguiacutestica relativamente estaacutevel em que junto aos dialetos primaacuterios da liacutengua (que podem incluir a variante padratildeo ou as normas regionais) haacute um dialeto muito divergente altamente codificado (muitas vezes bastante complexo gramaticalmente) sobrepondo-se agrave variedade Eacute o veiacuteculo de um grande e respectivo corpo de literatura escrita tanto de periacuteodo anterior ou de outra comunidade de fala eacute aprendido atraveacutes da educaccedilatildeo formal usado na escrita e na fala em contextos formais mas natildeo eacute usado em qualquer uma das seccedilotildees de comunidade para conversaccedilatildeo coloquial

Fishman (1967 p 8) afirma que a diglossia eacute gradual e variaacutevel Para ele o

conceito de diglossia estaacute ligado ao aspecto social enquanto o bilinguismo ao

individual Dessa forma a relaccedilatildeo entre bilinguismo e diglossia na situaccedilatildeo do

contato pode se dar das seguintes formas i) diglossia e bilinguismo atuando

juntos ii) bilinguismo sem diglossia iii) diglossia sem bilinguismo e iv) nem

diglossia nem bilinguismo

34

Crystal (1985 p 82) discorre que em geral os sociolinguistas se referem a uma variedade alta (A) e outra baixa (B) correspondendo grosso modo a uma diferenccedila de formalidade A variedade alta eacute apreendida na escola costuma ser usada nos locais cuja formalidade eacute maior A variedade baixa eacute usada em outros ambientes relativamente informais

80

O referido autor complementa afirmando que

O bilinguismo sem a diglossia tende a ser transicional tanto em termos de repertoacuterios linguiacutesticos de comunidade de fala como em termos das variedades de fala envolvidas per si Sem separar no entanto as normas complementares e valores para estabelecer e manter a separaccedilatildeo funcional das variedades de fala aquela liacutengua ou variedade que seja o bastante favoraacutevel para ser associada ao movimento predominante das forccedilas sociais tende a substituir a(s) outra (s) (idem p7)

No caso dos Latundecirc a diglossia se configura como um processo em que os

falantes foram obrigados a aprender a liacutengua dos brancos utilizando-a nas

atividades em contexto de contato com o natildeo iacutendio No entanto o grupo conserva

a liacutengua original nos rituais e no reduto familiar como fora explicado

anteriormente 35

343 Alternacircncia de coacutedigo36

O processo de diglossia quando eacute configurado entre duas liacutenguas distintas resulta

em bilinguismo O bilinguismo abordado no item 231 pode ser analisado de

diversos pontos de vista mas um em especial que seraacute tratado neste toacutepico eacute a

alternacircncia de coacutedigo ou code-switching Trata-se de um processo linguiacutestico

inerente ao falante biliacutengue desenvolto ou natildeo na liacutengua que aprendera como

segunda liacutengua no caso do biliacutengue ou da terceira por diante como nos

pluriliacutengues

35

Vale ressaltar que atualmente devido agrave incorporaccedilatildeo da cultura do branco os Latundecirc estatildeo

falando mais frequentemente o Portuguecircs em diversas situaccedilotildees de comunicaccedilatildeo ateacute mesmos nas mais informais Isso se deve ao fato de as geraccedilotildees mais novas serem menos conservadoras e resistentes ao contato 36

Tratamos tambeacutem deste processo ao discorremos sobre o bilinguismo na seccedilatildeo 231

81

Dessa forma o falante biliacutengue ao se comunicar com outro falante que detenha

suas mesmas liacutenguas poderaacute fazer escolhas linguiacutesticas dentro de cada coacutedigo

ou alternando os coacutedigos Por isso os pesquisadores dizem que o falante biliacutengue

apresenta um comportamento proacuteprio em seu processo de interaccedilatildeo que eacute a

utilizaccedilatildeo do code-switching que se caracteriza por ser uma estrateacutegia de

adequaccedilatildeo interativa desejaacutevel e favoraacutevel do ponto de vista pragmaacutetico Este

processo constitui um processo de ativaccedilatildeo e desativaccedilatildeo de uma ou de outra

liacutengua

Para Auer (1999 p 46)

O termo code-switching reserva-se para os casos em que a justaposiccedilatildeo dos dois coacutedigos eacute percebida e interpretada como um ato localmente significativo pelos participantes Contrapotildee-se assim ao code-switching tambeacutem denominado language mixing (mistura de coacutedigo ou de liacutenguas) em que a justaposiccedilatildeo dos coacutedigos tem significaccedilatildeo para os participantes em sentido mais global sendo um padratildeo recorrente de comunicaccedilatildeo

Um falante biliacutengue decide primeiramente qual deveraacute ser a liacutengua de base para

ser utilizada com o outro falante que domina suas liacutenguas tambeacutem e a partir daiacute

decide se faraacute uso ou natildeo do code-switching eacute o que afirma Grosjean (1982 p

127) a partir do esquema abaixo

82

Figura 4 Escolha de liacutengua e code-switching conforme Grosjean (1982 p127)

Conforme o esquema acima o falante biliacutengue apresenta competecircncia linguiacutestica

para se comunicar tanto com um falante monoliacutengue quanto outro biliacutengue Ao se

comunicar com o falante monoliacutengue o referido falante biliacutengue faraacute a escolha de

uma liacutengua A ou a liacutengua B Neste caso natildeo poderaacute fazer uso das duas No

processo comunicativo com outro falante biliacutengue ele poderaacute utilizar a liacutengua A

com ou sem alternacircncia com a liacutengua B Ou utilizar a liacutengua B com ou sem

alternacircncia com a liacutengua A O que determina tais escolhas satildeo as vantagens e

desvantagens do cacircmbio linguiacutestico

Neste trabalho natildeo trataremos diretamente do code-switching por entendermos

que nos desviariacuteamos do objetivo basilar desta pesquisa que eacute o enfoque nos

segmentos foneacuteticos Outro aspecto seria o fato de os falantes latundecirc soacute

apresentarem a alternacircncia de coacutedigo durante as narrativas discorridas nas

83

entrevistas quando solicitados para que narrassem os acontecimentos e lendas

do seu povo

344 Morte da liacutengua

O contato linguiacutestico eacute um processo tambeacutem poliacutetico cujas consequecircncias podem

ser apenas o de mixagem ou mais intensamente a morte da liacutengua Muitas

vezes o contato eacute tatildeo devastador que extermina as liacutenguas minoritaacuterias trata-se

de um verdadeiro glotociacutedio37

Para Mcmahon (1994 p 228) a morte de uma liacutengua

Envolve essencialmente uma transferecircncia de obediecircncia de parte de uma populaccedilatildeo a partir de uma liacutengua que foi nativa na aacuterea para uma liacutengua mais recentemente introduzida na qual a populaccedilatildeo indiacutegena tornou-se biliacutengue A nova linguagem eacute geralmente falada nativamente por falantes mais potentes que podem tambeacutem ser mais numerosos e normalmente eacute associada pelos falantes da liacutengua minoritaacuteria com a riqueza prestiacutegio e progresso a liacutengua minoritaacuteria eacute entatildeo efetivamente abandonada por seus falantes tornando-se apropriada para uso em cada vez menor (e menor) contexto ateacute que seja inteiramente suplantada pela liacutengua que estaacute entrando

Dubois et all (1998 p 422) afirma que uma liacutengua morta eacute uma liacutengua que deixou

de ser falada mas cujo estatuto numa comunidade sociocultura eacute agraves vezes

desempenhar ainda um papel no ensino nas cerimocircnias rituais etc como o

latim

Para Trask (2004 p 200) a liacutengua eacute considerada moribunda ou estaacute prestes a

morrer quando o resultado de morte eacute praticamente inevitaacutevel Segundo o autor

37

Calcula-se que no iniacutecio da colonizaccedilatildeo portuguesa existiam aqui cerca de 1200 liacutenguas que

apoacutes anos de ocupaccedilatildeo de territoacuterio se resume a 180 Conforme Rodrigues 2002 p19 muitas delas estatildeo moribundas e carecem ser catalogadas

84

a cabo de uma ou duas geraccedilotildees ningueacutem mais seraacute capaz de falar esta liacutengua

pura e simplesmente Eacute a morte da liacutengua que resulta do processo denominado

substituiccedilatildeo da liacutengua

Ao dar continuidade ao seu argumento o referido autor assegura que a morte de

uma liacutengua eacute um processo gradual Assim exemplifica o pesquisador

em um dado lugar em um determinado momento algumas crianccedilas ainda estatildeo aprendendo - como sua liacutengua materna - a liacutengua que estaacute morrendo enquanto outras a estatildeo aprendendo apenas imperfeitamente e outras ainda natildeo estatildeo aprendendo de maneira nenhuma A liacutengua pode desaparecer por completo em certas aacutereas e sobreviver em outras Idem p 201

Ainda segundo Trask ibidem satildeo caracteriacutesticas da morte de uma liacutengua i) a

perda das irregularidades ii) a queda em desuso das formas e dos esquemas de

construccedilatildeo sentencial mais complexos ou menos frequente iii) a substituiccedilatildeo

maciccedila das palavras nativas por palavras tiradas da liacutengua de prestiacutegio iv) a

mudanccedila de pronuacutencia que se torna mais proacutexima da liacutengua de prestiacutegio v) a

perda da variaccedilatildeo estiliacutestica que leva agrave sobrevivecircncia de um uacutenico estilo

invariaacutevel

Nem sempre a morte de uma liacutengua estaacute diretamente ligada a aspectos

linguiacutesticos Cristoacutefaro-Silva (2002 p 56) elenca trecircs aspectos natildeo linguiacutesticos

que contribuem para a aniquilaccedilatildeo de uma liacutengua O primeiro diz respeito ao fato

de o pesquisador natildeo poder investigar o processo de morte devido agrave presenccedila de

uns poucos falantes da liacutengua O segundo trata da opressatildeo poliacutetica imposta aos

falantes que neste caso deixam de falar a liacutengua para natildeo serem perseguidos E

85

o terceiro ocorre quando a liacutengua eacute mantida apenas em rituais em que os falantes

natildeo sabem mais o teor semacircntico do que verbalizam

Natildeo diferente do aqui fora apresentado a situaccedilatildeo da liacutengua Latundecirc eacute bastante

delicada uma vez que a comunidade passou por diversos transtornos que

impactaram a forma como se organizavam socialmente O nuacutemero de nuacutemero de

falantes diminuiu e consequentemente a liacutengua se encontra altamente

ameaccedilada O portuguecircs sendo a liacutengua dominante de prestiacutegio e funcional para

a relaccedilatildeo com o mundo natildeo indiacutegena ganha espaccedilo crescente entre os Latundecirc

Esta eacute a situaccedilatildeo natildeo soacute do Latundecirc mas de vaacuterios grupos indiacutegenas

86

4 COMUNIDADE DE ESTUDO OS LATUNDEcirc

Que gente eacute essa que fala idioma tatildeo diferente das liacutenguas conhecidas tatildeo diferente da liacutengua dos seus mais proacuteximos vizinhos

que tem costumes tatildeo estranhos aos que vivem perto que natildeo conhece os objetos essenciais da vida dos seus companheiros de sertatildeo

De onde veio Por onde passou que natildeo deixou rastros Quando chegou agravequelas matas onde vive haacute tanto tempo

Que ligaccedilotildees tem com os outros filhos do Brasil Roquete-Pinto (1975 p121)

41 INTRODUCcedilAtildeO

Discorremos neste capiacutetulo sobre o povo Latundecirc e a sua comunidade descriccedilatildeo

contexto histoacuterico cultural e geograacutefico desta etnia Histoacuteria do contato conflitos

internos e externos dificuldades enfrentadas pelo grupo ao longo de sua

existecircncia denominaccedilatildeo acesso hierarquia social padratildeo e constituiccedilatildeo familiar

contatos intereacutetnico bilinguismo e ensino na aldeia

42 A FAMIacuteLIA NAMBIKWAacuteRA38 39 40

Os Nambikwaacutera41 satildeo conhecidos na etnologia brasileira por terem sido

oficialmente contatados pelo Marechal Rodom e por terem sido estudados por

Leacutevi-Strauss De origem Tupi o vocaacutebulo Nambikwaacutera eacute o resultado da fusatildeo dos

38

Os Nambikwara se auto denominam Anunsu Conforme Price amp Cook Jr The Nambikwara call

themselves aacute nu suacute people This name written anunzecirc has apereared throughout the literature but has been erroneously thought to be a band name (1969 p 690) 39

Os Nambikwra satildeo famosos na etnologia brasileira por terem sido oficialmente contatados pelo Marechal Rodom e por terem sido estudados por Leacutevi-Strauss 40

Os Nambikwara natildeo estatildeo ligados aos troncos Tupi e Macro-Jecirc Trata-se de uma famiacutelia linguiacutestica isolada com caracteriacutesticas especiacuteficas que natildeo se enquadra em nenhum desses dois grupos 41

Leacutevi-Strauss (1946 p 139) afirma que se trata de uma palavra Tupi e que deve ser escrita como Nhambikwara

87

termos ldquonambirdquo que significa ldquoorelhardquo e ldquokuarardquo cujo significado eacute ldquoburacordquo

Portanto Nambikwaacutera42 eacute ldquoburaco de orelhardquo

Coforme Leacutevi-Strauss (1946 p 48)

The name Nambikwra was mentioned for the first time and only by hearsay by Antonio Pires de Campos in the beginning of the 18th century Since then it appeared several times with reference to an unknown tribe located on the headwaters of Tapajoz There is a great discrepancy between the different spellings When General Candido Mariano da Silva Rondon began to explore the land between the Tapajoz and Gi-Parana in 1907 he met with unknown group of a unknown language and he did not hesitate to identify them with the tribe often mentioned in the early documents It was at that time that the name Nhambikwara was

definitely adopted its spelling fixed and that it was recognized as a Tupi nickname the meaning of which is big ears

A famiacutelia Nambikwara eacute dividida em dois grandes grupos aleacutem de outra

remanescente conforme figura abaixo

Figura 5 Classificaccedilatildeo das liacutenguas da Famiacutelia Nambikwaacutera de acordo com Rodrigues

(1986 p 134)

42

Seguimos neste trabalho a orientaccedilatildeo da Associaccedilatildeo de Antropologia Brasileira que em 1953

estabeleceu a fim de padronizar os nomes dos povos indiacutegenas do Brasil com o intuito de facilitar os estudos etnograacuteficos e Linguiacutesticos a nomenclatura padratildeo

88

Conforme figura acima o povo Latundecirc faz parte da famiacutelia Nambikwaacutera que se

divide em Nambikwaacutera do Norte Nambikwaacutera do Sul e Sabanecirc Os Latundecirc

juntamente com os Lakondecirc os Tawandecirc os Mamaindecirc e os Negarotecirc

pertencem ao grupo Nambikwaacutera do Norte Jaacute o Nambikwaacutera do Sul eacute composto

pelos povos Galera Kabixi Munduacuteka e Nambikwaacutera do Campo cada um

correspondendo a um complexo dialetal O Sabanecirc eacute uma liacutengua agrave parte por se

acreditar que natildeo haacute muitas semelhanccedilas entre as estruturas linguiacutesticas dessa

liacutengua e as demais liacutenguas desse grupo

Situado na aacuterea entre os rios Juruena e Comemoraccedilatildeo o territoacuterio consta do

registro de muitos autores Roquete-Pinto (1919) Leacutevi-Strauss (1946) Price e

Cook (1969) Price (1977) Mas eacute de Roquete-Pinto (1919) e Price (1983) a

exposiccedilatildeo mais aceita Em ambos os limites geograacuteficos desses povos satildeo

relatados da seguinte forma pelo Rio Papagaio (sul) pelo rio Gi-Paranaacute (norte)

pelo rio Tapajoacutes (leste) e pelo rio Guaporeacute (oeste)

Figura 6 Localizaccedilatildeo e aacuterea dos Nambikwaacutera de acordo com Roquete-Pinto (1919)

89

De acordo com a FUNAI43 os dados atuais indicam que os Nambikwaacutera hoje

com cerca de dois mil iacutendios estatildeo distribuiacutedos em seis Terras indiacutegenas (TI)

vivem no sudoeste do Mato Grosso e aacutereas proacuteximas de Rondocircnia entre a

floresta amazocircnica e o cerrado

Figura 7 Territoacuterio Nambikwaacutera descrito por Price (1983)

No que tange ao conhecimento desses povos eacute de meados do seacuteculo XVIII que

obtemos os primeiros contatos com os Nambikwaacutera Foi Luiz Pinto de Souza

Coutinho terceiro capitatildeo geral do Estado do Mato Grosso o organizador de uma

expediccedilatildeo pelas margens do Rio Guaporeacute com o propoacutesito de abrir caminhos

entre a capital de entatildeo Proviacutencia de Mato Grosso e o Forte Braganccedila

43

Fundaccedilatildeo Nacional do Iacutendio

90

Os relatos histoacutericos nos mostram que era prioridade do Governo Militar apoacutes a

Proclamaccedilatildeo da Repuacuteblica em 1889 a integraccedilatildeo de todas as terras brasileiras

Uma das accedilotildees dessa integraccedilatildeo foi a determinaccedilatildeo do governo em construir

linhas telegraacuteficas em terras indiacutegenas da Amazocircnia com o propoacutesito de interligar

o Rio de Janeiro a Cuiabaacute Agrave frente dessa empreitada estava o Major Antonio

Gomes Carneiro e entre a comitiva o seu aluno Cacircndido Mariano da Silva

Rondon

Eacute Rodon o principal agente de contato entre os iacutendios Nambikwaacutera e os natildeo

iacutendios Pois como eacute sabido dele partia o discurso de apaziguamento entre o

contato preferindo antes de qualquer coisa ser atingido a atingir os silviacutecolas

Aleacutem da motivaccedilatildeo de expansatildeo para a implantaccedilatildeo das linhas telegraacuteficas

Rondon era conduzido por um desejo ardente de respeito e proteccedilatildeo aos povos

daquela regiatildeo

Dessa forma os iacutendios Nambikwaacutera estavam entre os indiacutegenas que ajudaram a

comissatildeo do governo a alcanccedilar os lugares mais hostis Este encontro entre

indiacutegenas e brancos culminou em invasotildees e conflitos entre povos aleacutem das

doenccedilas que foram trazidas pelos natildeo indiacutegenas por isso a extinccedilatildeo de vaacuterias

tribos e povos aleacutem do prejuiacutezo linguiacutestico resultante da aculturaccedilatildeo dos

indiacutegenas frente agrave presenccedila do natildeo iacutendio uma vez que para que ocorresse o

processo de interaccedilatildeo os indiacutegenas se viram obrigados a aprender o portuguecircs

O contato entre os grupos Nambikwaacutera natildeo se deu de forma paciacutefica Os

Nambikwaacutera do Norte natildeo foram receptivos e os planos dos governos foram

frustrados De forma diferente o contato com os Nambikwaacutera do Sul se deu de

91

forma mais intensa Mesmo apoacutes os constantes conflitos o contato perdurou por

mais tempo que com os do Norte acarretando mudanccedilas culturais de costumes e

da liacutengua

Telles (2002 p 10) afirma que

Do grupo linguiacutestico do Norte hoje restam apenas remanescentes de cinco etnias Tawandecirc Lakondecirc Mamaindecirc Negarotecirc e Latundecirc Destes os trecircs uacuteltimos permanecem em aacutereas proacuteximas de seus territoacuterios tradicionais e se preservam enquanto grupos relativamente autocircnomos Estes povos natildeo habitavam tradicionalmente a regiatildeo norte do territoacuterio Nambikwaacutera e esse fato pode ter favorecido a sua independecircncia grupal ao longo do percurso histoacuterico

Figura 8 Localizaccedilatildeo atual dos Nambikwaacutera

Como consequecircncia do contato no final do seacuteculo XX a populaccedilatildeo desses povos

foi reduzida a mais ou menos 650 sendo 50 deles crianccedilas Price (1985 p 312)

92

chama a atenccedilatildeo para o processo de aculturaccedilatildeo pois para as crianccedilas ldquoseria

mais confortaacutevel falar portuguecircs que a liacutengua dos seus paisrdquo44

Ainda com relaccedilatildeo agrave classificaccedilatildeo linguiacutestica alguns estudiosos utilizam

classificaccedilotildees diferentes para organizar os povos Nambikwaacutera A divisatildeo claacutessica

de Leacutevi-Strauss (1948) distribui os Nambikwaacutera de acordo com a aproximaccedilatildeo

linguiacutestica que haacute entre eles Para ele haacute trecircs grupos principais que se subdividem

formando cinco unidades constituiacutedas por vaacuterios dialetos de uma mesma liacutengua

Price e Cook (1969) em trabalho posterior sugerem outra classificaccedilatildeo para a

famiacutelia Nambikwaacutera Para eles haacute dois grandes grupos os Sabanecirc e os

Nambikwaacutera Entretanto embora o Sabanecirc natildeo seja compreensiacutevel para os

outros grupos linguiacutesticos por razotildees estruturais Price (1972) com base num

estudo comparativo considera o Sabanecirc como integrante da famiacutelia linguiacutestica

Nambikwaacutera Para uma visualizaccedilatildeo das propostas de Leacutevi-Strauss e de Price e

Cook apresentamos as respectivas classificaccedilotildees nas tabelas a seguir

Quadro 2 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Leacutevi-Strauss (1948)

44

ldquofifty were children who are probably more comfortable speaking Portuguese than the languages of their parents

Grupo a

Grupo b

Grupo c

Subgrupo a1

Subgrupo a2

Subgrupo b1

Subgrupo b2

Oakleacutetosu

Haloacutetesu

Kiaaacuteru

Kuritsu

Soaacutelesu

Kodaacuteteli

Munuacutekoti

Nikedeacutetosu

Taruacutende

Maimatildende

Toatildende

Ioacutelola

Naseacutelate

Lakotildende

Sovaacuteinte

Sabaacutene

93

Quadro 3 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Price e Cook (1969)

Leacutevi-Strass natildeo aponta os Latundecirc como pertencente ao grupo Nambikwaacutera

devido ao natildeo contato com este povo que soacute fora inicialmente descobertos

(contatados) em 1975 pelos Aikanaacute conforme veremos a seguir

43 OS LATUNDEcirc

O povo Latundecirc pertencente ao Nambikwaacutera do Norte habita uma aacuterea de

116613671 hec no municiacutepio de Chupinguaia na regiatildeo sudoeste do estado de

Rondocircnia Com eles convivem outros dois grupos que natildeo possuem nenhum

Navaacuteite

Taiate

Nambikwaacutera

Sabanecirc

Do Norte

Do Sul

Latundecirc

Lakundecirc

Tawandecirc

Mamaindecirc

Negarotecirc

Vale do Jurema

Vale do Guaporeacute

Vale do Sarareacute

Haloteacutesu

Kithaulhu

Sawenteacutesu

Wakalitesu

Wasusu

Sarareacute

Alacircntesu

Waikisu

Hahatildetesu

94

grau de parentesco linguiacutestico Satildeo os Aikanaacute e os Kwazaacute que fazem parte da

Terra Indiacutegena (TI) Tubaratildeo-Latundecirc45

No mapa abaixo pode-se obervar a localizaccedilatildeo da TI Tubaratildeo-Latundecirc que se

situa entre a RO 370 e a BR 364

Figura 9 Localizaccedilatildeo da TI Tubaratildeo-Latundecirc46

A reserva estaacute localizada a oeste do municiacutepio de Vilhena Nela haacute trecircs vilas Rio

do Ouro Barroso e Gleba (tambeacutem conhecida como Tubaratildeo) Gleba eacute a que

conteacutem a maior populaccedilatildeo mista De faacutecil acesso pode ser adentrada pela cidade

de Chupinguaia que fica a 19 km da TI Rio do Ouro possui uma populaccedilatildeo

exclusivamente Aikanatilde e estaacute a 20 km da Gleba Barroso conteacutem a menor

populaccedilatildeo e corresponde a uma aacuterea de ocupaccedilatildeo esparsa em que se distribuem

45

Conforme Anonby the Tubaratildeo-Latundecirc Indian Reserve is inhabited by people from several tribes the tree main linguistically-unrelated Aikanatilde (also known as Tubaratildeo) Kwazaacute and Latundecirc 2009 p3 46

Inicialmente estes povos ocupavam uma aacuterea de ricas florestas no oeste do rio Pimenta Bueno

proacuteximo a uma pequena vila denominada de Satildeo Pedro

95

remanescentes Kwazaacute Aikanaacute e Latundecirc A meacutedia de distacircncia do Barroso para a

Gleba eacute de aproximadamente 25 km O acesso se daacute por uma estrada

parcialmente carroccedilaacutevel de difiacutecil locomoccedilatildeo

Com relaccedilatildeo agrave populaccedilatildeo de cada povo Anomby (2009 p5) afirma que o

quantitativo total de pessoas eacute de 219 iacutendios Deles 175 satildeo Aikanatilde 25 satildeo

Kwazaacute e 19 satildeo Latundecirc Haacute ainda 189 iacutendios distribuiacutedos por outras localidades

fora da TI 47

Quadro 4 Distribuiccedilatildeo dos povos pertencentes a TI Tubaratildeo-Latundecirc

TI Rio do Ouro 67

Gleba 48

Barroso 34

Outras localidades

Satildeo Pedro 18

Vilhena 15

Chupinguaia 7

Total 189

Durante muitos anos os Latundecirc os Kwazaacute e os Aikanatilde viveram em contato com

grupos vizinhos como os Kanoecirc Mekens Sakirap Tupariacute Salamatildei entre outros

povos que tecircm sido acolhidos pela populaccedilatildeo local da TI Mesmo com diferentes

liacutenguas eles se relacionavam com festivais e casamentos intergrupais A cultura

desses povos tornou-se muito similar devido ao contato intenso entre eles De

acordo com Anomby (2009 p 6) os traccedilos mais comuns entre este povos

incluem cestas de fibra de marico casas em forma de colmeia para

47

Em conversa com os professores desses povos Anomby Idem natildeo afirma os motivos pelos

quais tais iacutendios estatildeo afastados dos demais

96

aproximadamente dez famiacutelias bebida de milho fermentado canibalismo e

divisatildeo de clatildes

Quanto ao contato sabe-se que foram os iacutendios Aikanaacute os primeiros a contatarem

com os Latundecirc Price (1977 p 72 - 73) descreve que o entatildeo Capataz Rural

Jorge Falcatildeo fora informalmente designado encarregado da operaccedilatildeo de contato

No ano de 1976 acompanhado por cinco iacutendios Aikanaacute e um serigueiro apoacutes

cinco dias de intensa caminhada ocorreu o encontro com os Latundecirc Neste

primeiro momento o desconhecido povo tremia de medo mas se posicionaram

ainda que fragilmente na linha de defesa Apoacutes dormirem no campo o capataz e

demais membros da excursatildeo conseguiram no outro dia um contato comprovado

por poucas fotografias com o povo Latundecirc Jorge descreveu que tais iacutendios natildeo

conseguiram se comunicar com os Aikanaacute e que eram em nuacutemero de 10 homens

e 8 crianccedilas afora poucas crianccedilas que afirma natildeo tecirc-las visto

A FUNAI em 1977 com a ajuda do Capataz Rural realizou uma nova excursatildeo

aos iacutendios Latundecirc Desta vez aleacutem de Jorge juntos a ele estavam presentes

David Price e dois iacutendios Nambikwara do Norte (Lakondecirc) que conseguiram

identificar os Latundecirc como tambeacutem pertencentes agrave etnia Nambikwara do Norte

Foram mensurados como uma aldeia composta por oito casas e dezenove

habitantes 48

48

Para uma descriccedilatildeo mais detalhada ver Telles 2002 p17

97

Figura 10 Primeiros contatos com os Latundecirc (Foto Price 1977)

Em 1999 o povo era composto por vinte pessoas Entre 1999 e 2000 a grupo ficou

ainda menor com a saiacuteda de trecircs dos membros Faacutetima (irmatilde de Terezinha49)

Batataacute (a anciatilde do grupo) e Joatildeo (irmatildeo solteiro de Terezinha) As crianccedilas e os

jovens do grupo satildeo na sua maioria parentes consanguiacuteneos De acordo com as

relaccedilotildees de parentesco os mais novos natildeo poderatildeo coabitar entre si o que

implica a natildeo autonomia e a natildeo perpetuaccedilatildeo do grupo Latundecirc

49

Trata-se de a informante deste projeto de pesquisa

98

Quadro 5 Nuacutecleos familiares de acordo com a habitaccedilatildeo em 199950

Casa 1

Pais Filhos Agregados

Maneacute Torto (60) Terezinha (45)

Luiz (22) Antocircnio (20) Lorena (12) Catarino (10) Justino (8) Jaelson (4)

Joatildeo (26) Francisco (25) Irmatildeos de Terezinha

Maneacute Torto (60) Faacutetima (30)

Maria (13)

Casa 2

Joseacute (40) Lurdes (40)

Jair (13) Dido (11) Lourival (3) Lorimar (6 meses)

Cinzeiro (50) Irmatildeo de Lurdes

Casa 3 Batataacute (65)

Dados atuais51 noticiam que o grupo se enfraqueceu politicamente Tereza

mudou-se para uma aldeia de outro grupo Nambikwaacutera do Norte e Maria e Lorena

foram morar na Gleba

No que concerne agraves atividades econocircmicas a extraccedilatildeo de borracha foi a grande

atividade econocircmica na deacutecada de 30 do seacuteculo passado no sul de Rondocircnia

Durante o apogeu dessa atividade os Aikanatilde e os Kwazaacute trabalharam para

barotildees da borracha em troca de cafeacute accediluacutecar e armas de fogo

Consequentemente apoacutes aprenderem as estrateacutegias de negociaccedilatildeo na deacutecada

de 70 os proacuteprios iacutendios agora independentes passaram a vender a sua proacutepria

borracha nas cidades vizinhas (Van der Voort 1998)

50

Telles 2002 p 19 51

Informaccedilatildeo proveniente de comunicaccedilatildeo pessoal com Stella Telles janeiro de 2015

99

A comercializaccedilatildeo da borracha tambeacutem fora um pano de fundo para o processo

de bilinguismo ocorrente entre os povos dessa regiatildeo O portuguecircs se tornara

uma espeacutecie de liacutengua franca utilizada para a comercializaccedilatildeo do produto no

exterior e na interaccedilatildeo com os seringalistas Contudo as liacutenguas indiacutegenas

permaneciam sendo usadas mais provavelmente na retirada e no processamento

da borracha nas reservas52

A economia na aldeia diferentemente do que fora no passado representa a atual

situaccedilatildeo dos iacutendios Haacute pouca lavoura de subsistecircncia53 o que faz com que a

produccedilatildeo de comida seja escassa Os integrantes da aldeia quando precisam de

provimentos compram sua comida na cidade ou recebem-na dos parentes que

vivem em Rio do Ouro

Ainda de acordo com Anomby (2009 p7)

As principais fontes de dinheiro em ambas as aldeias como a maioria das aldeias no Brasil satildeo as remessas de aposentadoria para os idosos e da venda de artesanato indiacutegena aleacutem da venda de madeira e os pequenos serviccedilos prestados aos demais moradores e visitantes

No que diz respeito agrave religiatildeo atualmente a presenccedila do protestantismo eacute muito

forte na TI Tubaratildeo-Latundecirc Missionaacuterios UNIEDAS54 (iacutendios da tribo Terena)

comeccedilaram a trabalhar na aacuterea em 1980 e como resultado a maioria das

pessoas que vivem na reserva iacutendios Tubaratildeo-Latundecirc hoje se consideram

52

Neste contexto histoacuterico pode-se perceber claramente a hierarquizaccedilatildeo linguiacutestica no que tange agrave utilizaccedilatildeo da liacutengua materna Para os iacutendios jaacute ocorria o processo de contato oriundo do dominador Mesmo reconhecendo a necessidade advinda da dependecircncia econocircmica os iacutendios relutavam em manter a liacutengua matildee no interior da aldeia ou seja no seio familiar 53

Devido agrave cultura errocircnea da terra e a constante presenccedila das aposentadorias concedidas aos idosos e invaacutelidos a rotina desses povos estaacute sendo fortemente alterada 54

Uniatildeo das Igrejas Evangeacutelicas da Ameacuterica do Sul criada por missionaacuterios americanos em 1912 que eacute atualmente conduzida por lideranccedila indiacutegena

100

protestantes Os Terenas ministram suas pregaccedilotildees exclusivamente em

Portuguecircs

Uma outra famiacutelia missionaacuteria protestante pertencente agrave missatildeo ALEM55 vivem

na aldeia Rio do Ouro onde o marido Warrisson eacute um professor e sua esposa

Ana eacute uma liacuteder de igreja Eles trabalham na reserva haacute doze anos e soacute falam

Portuguecircs

Anomby (2009 p8) relata o fato de os iacutendios ainda hoje rejeitarem os esforccedilos

dos missionaacuterios da ALEM para usar o Aikanatilde na igreja

Quando Ana veio pela primeira vez a Gleba 12 anos atraacutes as pessoas disse-lhe que queria igreja em Portuguecircs e natildeo em Aikanatilde Eles especificamente disse-nos Noacutes natildeo quer um linguista Queremos algueacutem que vai fazer igreja em Portuguecircs Ana compocircs algumas canccedilotildees em Aikanatilde mas quando ela cantou para os iacutendios eles disseram que soava feio Ana pediu que as pessoas orassem em Aikanatilde mas eles sempre recusam Em um culto que participou no Rio do Ouro Ana escolheu cinco pessoas aleatoriamente para ler partes do Biacuteblia Todos foram fluentes Ana disse-nos que ateacute hoje os iacutendios nunca pediu nada em Aikanatilde - eles parecem sentir que igreja deve ser em Portuguecircs

Os Latundecirc em particular natildeo se converteram ao protestantismo Localizados

mais remotamente o difiacutecil acesso agraves igrejas existentes da Gleba e no Rio do

Ouro natildeo favoreceu ao longo de anos a frenquecircncia do Latundecirc nos cultos

A educaccedilatildeo escolar tambeacutem tem situaccedilatildeo similar entre os Latundecirc Nunca houve

escola no Barroso nas proximidades das casas dos Latundecirc Dessa forma

apenas com a ida mais sistemaacutetica dos mais jovens Latundecirc para as aldeias

Aikanaacute - sobretudo a partir do ano de 2000 - eacute que as crianccedilas Latundecirc passaram

55

Associaccedilatildeo Linguiacutestica Evangeacutelica Missionaacuteria eacute uma organizaccedilatildeo missionaacuteria fundada em 1982

sob a inspiraccedilatildeo da Wycliffe Bible Translators

101

a frequentar escola Sobre isso Anomby Idem nos relata que eacute ensinado ateacute

quarta seacuterie em todas as aldeias e a maioria dos Aikanatilde e Kwazaacute satildeo

alfabetizados em Portuguecircs Em Rio do Ouro haacute dois professores um brasileiro

que leciona em Portuguecircs e um professor biliacutengue que explica os assuntos em

Aikanatilde Trecircs moradores estatildeo terminando o ensino meacutedio dois da Gleba e um

do Rio do Ouro A liacutengua Latundecirc natildeo eacute objeto de conteuacutedo escolar

Com relaccedilatildeo agrave situaccedilatildeo linguiacutestica dos Latundecirc56 sabe-se que com exceccedilatildeo de

Maneacute Torto que eacute falante nativo de uma liacutengua Nabikwaacutera do Norte muito proacutexima

do Latundecirc o nuacutemero de falantes do Latundecirc eacute de dezenove pessoas O grupo

excetuando a Batataacute que natildeo fala portuguecircs apresenta bilinguismo em Latundecirc

Portuguecircs O bilinguismo resultante do contato que se deu em 1976 se firmou

com o contato crescente com os Aikanaacute com quem se comunicam em portuguecircs

A complexidade linguiacutestica que se instaurou entre os Latundecirc pode ser observada

na tabela seguinte

Quadro 6 Situaccedilatildeo sociolinguiacutestica dos Latundecirc (dados de 1999)

Membros

Situaccedilatildeo Social

Situaccedilatildeo Linguacuteiacutestica

Maneacute Torto (60) Liacuteder interno da tribo Natildeo Latundecirc

Cinzeiro (50)

Batataacute (65)

Membros mais velhos

da tribo

Satildeo monoliacutengues em Latundecirc

Lurdes (40) Matriarca da casa 2 Apresenta distuacuterbio de fala Eacute considerada

uma falante ruim pela proacutepria tribo Fala um

pidgin com seus filhos

Joseacute (40) Patriarca da casa 2 Fala um portuguecircs pouco claro

56

Anomby (2009 p 5) chama a atenccedilatildeo para o fato de os povos presentes na TI Tubaratildeo-Latundecirc

natildeo serem estudados extensivamente ainda Dos estudos realizados podem-se citar as pesquisas realizadas no acircmbito antropoloacutegico e no linguiacutestico Leacutevi-Strauss (1930) Lieuntenabt Zack (1942) Melatti e Price (1970) Carlson (1984) Vasconcelos (19931996) Van der Voort (19951998) e Telles (2002)

102

Jair (13)

Dido (11)

Filhos mais velhos da

casa 2

Devido ao desempenho dos pais

apresentam problemas de comunicaccedilatildeo em

ambas as liacutenguas

Lourival (3)

Lorimar (6 meses)

Filhos mais novos da

casa 2

Estatildeo em processo de aquisiccedilatildeo da

linguagem

Terezinha (45)

Matriarca da casa 1

uma das mulheres de

Maneacute Torto

Apresenta boa competecircncia comunicativa

Apesar de ser considerada biliacutengue

apresenta problemas com relaccedilatildeo agrave

compreensatildeo do Portuguecircs

Joatildeo (26)

Francisco (25)

Irmatildeos de Terezinha Falam Portuguecircs sem muita fluecircncia

Faacutetima (30)

Irmatilde de Terezinha Apresenta niacutevel de compreensatildeo muito

inferior ao da sua fala

Luiz (22)

Antocircnio (20)

Lorena (12)

Catarino (10)

Justino (8)

Jaelson (4)

Filhos de Terezinha e

Maneacute Torto

Falam um bom Portuguecircs

Maria (13) Tambeacutem fala um bom Portuguecircs

Entre 1995 e 2000 Telles (comunicaccedilatildeo pessoal em novembro de 2014) verificou

que o aprendizado do Latundecirc na comunidade eacute mais tardio do que o Portuguecircs

mesmo sendo as crianccedilas desde o nascimento expostas e estimuladas agraves duas

liacutenguas simultaneamente Na avaliaccedilatildeo subjetiva dos indiacutegenas o Latundecirc eacute uma

liacutengua mais difiacutecil sendo essa a razatildeo de as crianccedilas apresentarem melhor

desempenho no Portuguecircs Soacute em torno dos dez anos comeccedilam a utilizar com

fluecircncia o Latundecirc embora apresentem conhecimento passivo da liacutengua desde a

primeira infacircncia quando atendem com pertinecircncia aos comandos em Latundecirc

Outro fator que pode responder ao fato de a produccedilatildeo linguiacutestica ocorrer

103

primeiramente em Portuguecirc deve ser o prestiacutegio social que essa liacutengua alcanccedila

entre comunidades minoritaacuterias57

Essa situaccedilatildeo decorrente do contato linguiacutestico se daacute devido agrave mescla linguiacutestica

presente na TI e agraves necessidades de os indiacutegenas se ausentarem das terras da

TI Os povos que vivem em Rio do Ouro viajam a cidade pelo menos uma vez por

mecircs para fazer compras ou ir buscar assistecircncia meacutedica Os da Gleba se

deslocam para a cidade todos os dias quando precisam ir para a sede do

municiacutepio de Chupinguaia Dependendo da necessidade eles ficam hospedados

na casa de algueacutem conhecido ou na Casa do Iacutendio uma espeacutecie de guarita

para os iacutendios A Casa do Iacutendio mais proacutexima da TI se localiza em Vilhena

Ainda quanto ao contato linguiacutestico estudos mostram que os iacutendios do sul de

Rondocircnia tecircm o haacutebito de casar-se com iacutendios de tribos amigas Isto pode ser

comprovado com a presenccedila de palavras no leacutexico das liacutenguas em que foram

coadunadas

Conforme dados mais recentes na Gleba cerca de cinquenta por cento dos

casamentos satildeo mistos com iacutendios de outras etnias ou com natildeo iacutendios Embora

haja certa rivalidade entre os povos da Gleba e os do Rio dos Ouros o nuacutemero de

casamentos entre os iacutendios dessas duas aldeias satildeo muito frequentes

Quanto aos iacutendios Latundecirc Anomby (2009 p 9) discorre que

Os iacutendios da aldeia de Latundecirc Barroso tecircm o menor prestiacutegio e satildeo um pouco culturalmente e economicamente subjugados pelo Aikanatilde e Kwazaacute Devido agraves pequenas populaccedilotildees de Kwazaacute e Latundecirc eacute quase impossiacutevel para eles para se casar dentro de

57

Discorreremos com mais detalhes sobre o processo de bilinguismo no povo Latundecirc no trabalho proposto a ser desenvolvido

104

sua tribo Assim a sobrevivecircncia das liacutenguas e ateacute mesmo o povo como um grupo distinto eacute muito tecircnue

Devido agraves constantes necessidades de cuidado desses povos a OSCIP Creatio58

realizou estudos sobre os impactos soacutecio-antropoloacutegicos-ambientais na TI

Tubaratildeo-Latundecirc jaacute que toda regiatildeo estaacute sobre a influecircncia da PCH59 Cascata

que estaacute sendo construiacuteda no Rio Pimenta Bueno Tais estudos visam objetivar

informaccedilotildees que subsidiem a descriccedilatildeo dos possiacuteveis impactos oriundos da PCH

sobre esta TI

Figura 11 Iacutendios Latundecirc na TI Tubaratildeo-Latundecirc

Outro ponto que deve ser levado em conta ao considerar falantes biliacutengues e

monoliacutengues eacute que eles natildeo podem ser nitidamente diferenciados A avaliaccedilatildeo do

grau de bilinguismo eacute complexa dado que a sua medidade eacute escalar ou seja o

58

Organizaccedilatildeo da Sociedade Civil de Interesse Puacuteblico 59

Pequena Central Hidreleacutetrica

105

conhecimento de outra liacutengua eacute uma questatildeo de grau que vai desde 0 ateacute a

ldquoperfeiccedilatildeordquo (Van Coetesem 1988 p 9)

106

5 INTERFEREcircNCIA FONEacuteTICO-FONOLOacuteGICA DO LATUNDEcirc NO

PORTUGUEcircS

ldquoO contato linguiacutestico eacute apenas um aspecto do contato cultural e a interferecircncia linguiacutestica eacute uma face da difusatildeo lexical e aculturaccedilatildeordquo

Weinreich (1953 p 5)

51 INTRODUCcedilAtildeO

Para Thomason (2001 p 5) o contato entre liacutenguas estaacute em toda a parte muitos

paiacuteses tecircm mais do que uma liacutengua oficial e muito provavelmente a maior parte

da populaccedilatildeo mundial fala duas ou mais liacutenguas Posto dessa maneira

compreende-se que satildeo muitos os estudos que abordam sob formas aacutereas

concepccedilotildees diversas e interdisciplinares o contato linguiacutestico No que concerne agrave

linguiacutestica estes estudos satildeo de igual abundacircncia De acordo com Weinreich

(1953) grande ou pequena as diferenccedilas e similaridades entre as liacutenguas em

contato podem ser exaustivamente estabelecidas em muitos domiacutenios Todavia

quando se trata da investigaccedilatildeo do contato sob a eacutegide da fonologia e da foneacutetica

o nuacutemero destes estudos diminui consideravelmente Tal constataccedilatildeo corrobora

com a necessidade de estudos linguiacutesticos que tratem dos aspectos foneacuteticos

quando observados no contato entre liacutenguas

Por se tratar de uma sessatildeo importante para as elucidaccedilotildees dos processos

ocorridos no Portuguecircs falado pelos Latundecirc a serem discorridos no Capiacutetulo VI

descrevemos neta seccedilatildeo os segmentos das liacutenguas em anaacutelise e quais satildeos mais

suscetiacuteveis agrave influecircncia do contado linguiacutestico Devido agrave escassez de pesquisas

107

foneacuteticas fonoloacutegicas na aacuterea especificamente no Latundecirc e no Portuguecircs

Brasileiro seratildeo utilizadas como cabedal para esta anaacutelise as pesquisas de

TELLES (2002) e para a investigaccedilatildeo do inventaacuterio do sistema fonoloacutegico do

Portuguecircs a de BISOL (1996) e de SILVA (2002)

Dada a profundidade investigativa da natureza do contato cabe-nos ressaltar aqui

que o presente estudo natildeo se encarregaraacute de tratar de todas a suas nuances

visto que seu objeto estaacute delimitado quanto aos processos foneacuteticos resultantes

de tal contato

Quanto ao aporte teoacuterico seratildeo citados os trabalhos de WEINREICH (1953)

pioneiro a tratar das questotildees de interferecircncia foneacuteticas oriundas do contato entre

liacutenguas VAN COETSEM (1988) e MATRAS (2009) para elucidar os processos

ocorrentes no contato em questatildeo

52 INTERFEREcircNCIA FUSAtildeO COEXISTEcircNCIA E TRANSFEREcircNCIA

LINGUIacuteSTICA

Um dos precursores dos estudos sobre contatos linguiacutesticos Uriel Weinreich

descreve em seu livro Language in Contact (1953) os mecanismos foneacuteticos que

regem a intersecccedilatildeo existente no contato

No que concerne aos aspectos extralinguiacutesticos que regem os efeitos do contato

sobre a fala de determinado componente social Weinreich chama a atenccedilatildeo para

os fatores que estatildeo aleacutem das diferenccedilas estruturais bem como das

inadequaccedilotildees lexicais da liacutengua Segundo ele esses fatores natildeo estruturais satildeo

inerentes aos falantes que estatildeo expostos agrave situaccedilatildeo do contato por exemplo

108

a) A facilidade de o falante se expressar verbalmente e sua

debilidade de lidar coma as duas liacutenguas separadamente

b) Proficiecircncia relativa em cada liacutengua

c) Especializaccedilatildeo no uso de cada liacutengua por toacutepicos e

interlocutores

d) Forma de aprendizado em cada liacutengua

e) Atitudes para cada liacutengua se idiossincraacutetico ou estereotipado

f) A dimensatildeo do grupo biliacutengue e sua homogeneidade

sociocultural ou diferenciaccedilatildeo colapso entre subgrupos usando

uma ou outra liacutengua como sua liacutengua-matildee fatos demograacuteficos

sociais e as relaccedilotildees poliacuteticas entre esses subgrupos

g) Prevalecircncia individuais de bilinguismo com dadas caracteriacutesticas

de comportamento de fala em subgrupos em geral

h) Atitudes estereotipadas em relaccedilatildeo a cada liacutengua (prestiacutegio)

status indiacutegena ou imigrante da liacutengua em xeque

i) Atitudes em relaccedilatildeo agrave cultura de cada comunidade linguiacutestica

j) Atitudes em relaccedilatildeo ao bilinguismo como tal

k) Toleracircncia ou intoleracircncia com respeito agrave mistura linguiacutestica e

com a fala incorreta de cada um

l) Relaccedilatildeo entre o grupo biliacutengue e cada um das duas

comunidades em que ela eacute um segmento marginal (Weinreich

1953 p 4)

Um dos pressupostos baacutesicos agrave natureza do falante diz respeito ao fato de duas

ou mais liacutenguas soacute poderem estar em contato se usadas alternadamente pelas

mesmas pessoas O uso individual da liacutengua seraacute o locus do contato Quando isto

ocorre a transferecircncia de elementos foneacuteticos seraacute a motivadora pela

reorganizaccedilatildeo de todo o velho sistema de oposiccedilatildeo Ele assegura que the term

interference implies the rearrangement of patterns that result from the introduction

of foreign elements into the more highly structured domains of language such as

the bulk of the phonemic system a larger part of the morphology and syntax and

some areas of the vocabulary (p 1)60

60

O termo interferecircncia implica a reorganizaccedilatildeo de padrotildees que resultam na introduccedilatildeo de elementos no mais alto (profundo) domiacutenio de estruturas da linguagem tal como a maior parte do sistema fonecircmico uma larga parte da morfologia e sintaxe e algumas aacutereas do vocabulaacuterio

109

Quando dois sistemas satildeo confrontados no contato pode ocorrer o

reordenamento de padrotildees ou interferecircncia ou exclusatildeo Na interferecircncia

linguiacutestica o problema de maior interesse eacute a accedilatildeo reciacuteproca dos fatores

estruturais e dos natildeo estruturais ao promoverem estimularem ou impedirem cada

interferecircncia

Concernente aos ldquoMecanismos e causas estruturais de interferecircnciardquo Weinreich

idem p7 coloca que haacute um tipo de interferecircncia que eacute extremamente comum no

contato linguiacutestico trata-se da relaccedilatildeo de empreacutestimo na qual natildeo haacute uma total

transferecircncia de todos os elementos Logo percebe-se que eacute comum a

transferecircncia de parte de um sistema ou de traccedilos desse sistema fazendo com

que haja uma ldquocoexistecircncia de fusatildeo de sistemasrdquo

A coexistecircncia ou fusatildeo de sistemas linguiacutesticos pode de acordo com este

estudioso afetar a natureza de um signo linguiacutestico jaacute que esta eacute a combinaccedilatildeo

de uma unidade de expressatildeo e uma de conteuacutedo Neste niacutevel de bilinguismo ou

de interferecircncia de sistemas pode-se entendender que a relaccedilatildeo de significado e

significante natildeo se daacute de maneira uniacutevoca

Diante da complexidade que eacute a transferecircncia linguiacutestica a ilustraccedilatildeo por ele

adotada eacute a de que a interferecircncia eacute como areia carregada por um fluxo de aacutegua

Na liacutengua ela estaacute sedimentada no fundo de um lago E este fenocircmeno se daacute em

todos os niacuteveis da gramaacutetica p 11

Ao tratar dos tipos de interferecircncia nos sistemas foneacuteticos Weinreich afirma que

The problem of phonic interference concerns the manner in which a speaker perceives and reproduces the sounds of one

110

language which might be designated secondary in terms of another to be called primary Interference arises when a bilingual identifies a phoneme of the secondary system with one in the primary system and in reproducing it subjects it to the fonetic rules of the primary language (1953 p 15)61

Neste caso a interferecircncia resulta quando um falante identifica na segunda liacutengua

elementos foneacuteticos presentes na primeira liacutengua Ao reproduzir o segmento o

falante o sujeita agraves regras foneacuteticas da primeira liacutengua a liacutengua matildee

Ao prosseguir Weinreich tambeacutem aponta dois tipos de interferecircncia a partir do

quadro comparatoacuterio entre os sistemas linguiacutesticos do Romansh62 e do

Schweizerdeutsch63 liacutenguas coexistentes no Cantatildeo de Grisons na Suiacuteccedila No

primeiro caso o sistema foneacutetico do Romansh se configura como o sistema

primaacuterio e o Schweizerdeutsch como secundaacuterio No segundo caso os sistemas

satildeo alternados o sistema foneacutetico do Schweizerdeutsch assume o lugar do

sistema primaacuterio e o Romansh o secundaacuterio

61

O problema da interferecircncia foneacutetica consiste na maneira como o falante percebe (reconhece) e reproduz os sons de uma liacutengua que pode ser designado secundaacuterio em outros termos primaacuterio A interferecircncia surge quando um biliacutenguumle identifica um fonema do sistema secundaacuterio com um no sistema primaacuterio e em reproduzi-lo sujeitando-o agraves regras foneacuteticas da primeira liacutengua 62

Eacute uma das quatro liacutenguas nacionais da Suiacuteccedila juntamente com a liacutengua alematilde a liacutengua italiana e a liacutengua francesa Trata-se de uma liacutengua romacircnica do ramo ocidental que se acredita descender do latim vulgar falado pelos romanos que ocuparam a aacuterea na Antiguidade 63

Eacute qualquer um dos dialetos alemacircnicos falados na Suiacuteccedila no Liechtenstein e nas zonas fronteiriccedilas da Aacuteustria

111

Quadro 7 Quadro Comparativo dos Sistemas Foneacuteticos do Romansh e do

Schweizerdeutsch de acordo com Weinreich (1953)

Mais adiante seraacute observada a influecircncia do Latundecirc no Portuguecircs Desta forma

o Portuguecircs mesmo sendo a segunda liacutengua adquirida seraacute visto como o objeto

influenciado do contato linguiacutestico

112

Quando observou o contato entre os dois sistemas linguiacutesticos em voga

Weinreich (idem p 18 e 19) examinou o processo de interferecircncia representado

no segundo sistema fonecircmico Assim ele elencou quatro tipos de interferecircncias i)

subdiferenciaccedilatildeo de fonemas ii) superdiferenciaccedilatildeo de fonemas iii)

reinterpretaccedilatildeo de traccedilos relevantes iv) substituiccedilatildeo de fone atual

A subdiferenciaccedilatildeo de fonemas ocorre quando dois sons de um segundo sistema

cujos correspondentes que natildeo se distinguem no sistema primaacuterio natildeo satildeo bem

definidos Tal confusatildeo eacute evidenciada pela alternacircncia que o falante do Romansh

faz ao pronunciar os segmentos y e i do Schweizerdeutsch ou quando o falante

do Schweizerdeutsch faz ao pronunciar de forma insegura os segmentos i e

O processo de superdiferenciaccedilatildeo envolve a imposiccedilatildeo de distinccedilotildees fonecircmicas

do sistema primaacuterio sobre os sons do sistema secundaacuterio onde eles natildeo satildeo

necessaacuterios O processo pode ser inferido a partir de uma comparaccedilatildeo entre os

sistemas de som em contacto mesmo que nem sempre seja perceptiacutevel No

contanto entre os dois dialetos o vocaacutebulo rsquolada lsquoamplorsquo do Romansh eacute

pronunciado como acutelada no Schwyzertutsch

A reinterpretaccedilatildeo de traccedilos relevantes ocorre quando o falante biliacutengue distingue

fonemas do sistema secundaacuterio cujas caracteriacutesticas que nesse sistema satildeo

meramente concomitante ou redundante mas que satildeo relevantes no seu sistema

principal Por exemplo a palavra do dialeto Romansh [lsquomєsbullɐ] bagunccedila pode

ser interpretada quase como no Schwyzertutsch rsquomesa

Por fim o processo de substituiccedilatildeo de fone atual eacute aplicado aos fonemas que satildeo

definidos de forma idecircntica nos dois idiomas mas que se comportam de froma

113

distintas Na situaccedilatildeo descrita o segmento do Romanche e o do

Schwyzertatsch satildeo ambos definidos como vogais frontais de abertura

maacutexima mas o fonema do sistema Schwyzertfitsch eacute pronunciado mais aberto

Os fonemas b do Romansh e o B do Schwyzertfitsch satildeo ambos definidos por

suas oposiccedilotildees tensa (sem voz) consoante aspirante e nasal homorgacircnica mas

b eacute sempre vozeado B apenas ocasionalmente

Quando ao tratar dos fatores estruturais favorecedores ou inibidores da

interferecircncia foneacutetica o pesquisador em questatildeo afirma que a anaacutelise contrastiva

dos fonemas de duas liacutenguas e a forma como eles satildeo usados produz uma lista

de formas de interferecircncias focircnicas esperada em uma situaccedilatildeo de contato

particular Quando os sons satildeo vistos como parte de um sistema focircnico certos

fatores adicionais emergem favorecendo ou inibindo a reproduccedilatildeo de som

defeituoso (pg 23)

Em continuidade ele afirma que ldquoum fator que elimina certos ruiacutedos na fala em

liacutengua estrangeira eacute a existecircncia de vazios no padratildeo no sistema fonecircmico

primaacuterio em que fonemas estranhos do sistema secundaacuterio podem ser

recuperados (rotulados)rdquo Isso se daacute devido agrave semelhanccedila com o(s) segmento(s)

cujas caracteriacutesticas satildeo mais aproximadas

Sobre a difusatildeo dos fenocircmenos de interferecircncia foneacutetica Weinreich assegura que

no estudo da propagaccedilatildeo de sons oriundos do contato linguiacutestico sobretudo na

influecircncia da liacutengua estrangeira (liacutengua de contato) seria relevante que

investigasse se o resultado de muitos tipos de interferecircncia eacute difundido da mesma

forma ou com igual facilidade

114

Ao citar Sapir ele afirma que

Podemos supor que as variaccedilotildees individuais decorrentes em fronteiras linguiacutesticas tecircm sido gradualmente incorporadas ao desvio foneacutetico de uma liacutengua Isto mostra aliaacutes que um sistema de som que eacute conhecido por ter sido influenciada por um estrangeiro natildeo precisa esperar para representar uma reacuteplica exata do sistema influenciando (1949 p213)64

Para ele um dos motivos que contribuiria para a interferecircncia foneacutetica seria

agravequela desencadeada pelo status

Com base na reduplicaccedilatildeo de som de Weinreich Matra (2009 p 241) descreve

que a produccedilatildeo de segmentos foneacuteticos eacute vulneraacutevel No entanto

A replicaccedilatildeo fonoloacutegica (interferecircncia transferecircncia ou ldquoempreacutestimordquo) pode afetar qualquer niacutevel da estrutura de som a articulaccedilatildeo de fonemas individuais ou fonemas dentro das palavras o comprimento e a geminaccedilatildeo acento e tom prosoacutedia e entonaccedilatildeo Em fonologia os empreacutestimos foram muitas vezes considerados como estrateacutegias para preencher as chamadas lacunas estruturais no sistema destinataacuterio65

Matras ainda defende que a mudanccedila induzida pelo contato fonoloacutegico eacute o

resultado da incapacidade ou da relutacircncia dos falantes para manter a separaccedilatildeo

completa e consistente entre os sistemas fonoloacutegicos de duas liacutenguas Ele cita

como exemplo o fato de os falantes da liacutengua receptora lidarem com a pronuacutencia

de termos da liacutengua de origem66

64

We may suppose that individual variations arising at linguistic borderlands - whether by the unconscious suggestive influence of foreign speech or the actual transfer of foreign sounds into the speech of bilingual individuals - have been gradually incorporate into the phonetic drift of a language This shows incidentally that a sound system which is known to have been influenced by a foreign one need not be expected to represent an exact replica of the influencing system 66

Isso ocorre mais frequentemente quando uma palavra estrangeira eacute introduzida na liacutengua de

destino por apenas um pequeno grupo de biliacutengues ou semibiliacutengues e se espalha por toda fala da comunidade inclusive para os monoliacutengues natildeo estatildeo familiarizados com os sons originais da

115

Quando emprestado de uma liacutengua doadora um vocaacutebulo natildeo acarretaraacute

necessariamente em mudanccedila no sistema fonoloacutegico da liacutengua receptora O que

ocorre como jaacute fora colocado aqui eacute o processo de acomodaccedilatildeo fonoloacutegica O

vocaacutebulo emprestado passa a ser pronunciado com os segmentos foneacuteticos da

liacutengua receptora

Todavia Matra (2009 p 222-223) chama a atenccedilatildeo para um segundo tipo de

processo em que ldquoos sons que aparecem nos vocaacutebulos emprestados que satildeo

normalmente ausentes do sistema da liacutengua destinataacuteria podem ser replicados

juntamente com o proacuteprio vocaacutebulordquo fazendo com que haja um enriquecimento no

inventaacuterio foneacutetico na liacutengua receptora 67

Segundo o autor este tipo de processo ocorre com normalidade em situaccedilotildees

em que o bilinguismo eacute muito generalizado Logo ldquomembros biliacutengues de uma

comunidade que estatildeo cientes da forma original da pronuacutencia da liacutengua doadora

fazem um esforccedilo para autenticar o vocaacutebulo emprestado replicando sua forma

originalrdquo

Em continuidade ele afirma que

Uma vez que a liacutengua doadora goza de alguma forma de prestiacutegio muitas vezes devido a associaccedilotildees com comeacutercio tecnologia conhecimento e outros tipos de inovaccedilatildeo ou de poder a replicaccedilatildeo de pronuacutencias originais da liacutengua doadora satildeo imitadas por muitos monoliacutengues (natildeo falantes da liacutengua doadora) como tal levando agrave propagaccedilatildeo dentro da liacutengua destinataacuteria dos novos fonemas nos vocaacutebulos emprestados que satildeo relevantes Isso comprova o respeito dos falantes para a linguagem dos doadores e agrave sua flexibilidade no uso de sua liacutengua materna (a liacutengua do destinataacuterio) indicando que os

liacutengua doadora Em tais situaccedilotildees haacute uma forte lealdade para com a liacutengua de destino e geralmente apenas com superficial conhecimento com a liacutengua de origem (p 242) 67

Como exemplo eacute citado o caso da africada dʒ que em situaccedilatildeo de empreacutestimo pode ser

pronunciada como tʃ em palavras que oriundas do inglecircs

116

falantes se contentam em atribuir fonologicamente autenticidade agrave replicaccedilatildeo de empreacutestimos lexicais prioritaacuterios maiores do que para a preservaccedilatildeo das estruturas fonoloacutegicas coerentes de sua liacutengua nativa (idem p 224)

Em uma situaccedilatildeo onde o bilinguismo eacute estabelecido e prolongado os falantes (na

maioria de uma liacutengua minoritaacuteria como o caso dos Latundecirc) podem ajustar o

inventaacuterio de sons e as regras que regem a sua distribuiccedilatildeo para coincidir com as

do outro

Matras (2009 p 225) atraveacutes de um quadro descreve os quatro tipos de

mudanccedilas fonoloacutegicas oriundas do contato linguiacutestico com base nos perfis dos

falantes linguagem e atitudes

Quadro 8 Tipos de processos que conduzem a mudanccedila fonoloacutegica induzida por contato

117

Com base no quadro anterior depreende-se que

i) O tipo A eacute diferente na medida em que natildeo envolve nenhuma mudanccedila no

sistema fonoloacutegico mas apenas uma mudanccedila de palavras individuais

enquanto os tipos B-D todas envolvem algum grau de modificaccedilatildeo para o

sistema tal como utilizado por colunas numa base regular No entanto

existem semelhanccedilas entre os tipos de aspectos individuais

ii) Os tipos A e B satildeo semelhantes e giram em torno de palavras emprestadas

individualmente

iii) Os tipos A e C satildeo semelhantes em que ambos envolvem a transferecircncia

de recursos de liacutengua nativa para material diferente

iv) Os tipos B e D satildeo semelhantes em que ambos envolvem a adoccedilatildeo de

padrotildees sonoros estrangeiros e sua integraccedilatildeo na liacutengua nativa

v) Os tipos C e D mostram como mencionado acima o fato de que os

falantes tentam evitar que para selecionar os sons de dois conjuntos

distintos de inventaacuterio e ateacute generalize apenas um conjunto de sons para

serem usadas em ambas as liacutenguas isto eacute em toda a interaccedilatildeo contextos

Os falantes do portuguecircs falado por Latundecirc se estendem em duas direccedilotildees Em

tipos A e C onde os falantes reinterpretam os sons dos vocaacutebulos emprestados

da liacutengua doadora alinhando-os aos padrotildees e inventaacuterio da liacutengua receptora

(nativa) No tipo D os falantes modificam os segmentos foneacuteticos com base no

inventaacuterio externo A aplicaccedilatildeo de uma determinada regra fonoloacutegica pode

resultar na perda ou em ganho de fonemas p226

118

O contato linguiacutestico pode ser representado ainda como um contiacutenuo Nele

ocorrem forccedilas centriacutefugas e centriacutepetas que dinamizam os sistemas linguiacutesticos

Para Matras idem p 226 fatores como normas sociais lealdade e consciecircncia

de identidade podem interferir e ateacute mesmo neutralizar os fenocircmenos advindos do

contato O empreacutestimo sofreria portanto estas pressotildees

Figura 12 Ligaccedilotildees entre a intensidade do bilinguismo o tipo de processo de acomodaccedilatildeo e sobreposiccedilatildeo entre os sistemas fonoloacutegicos

Quanto menor for o bilinguismo maior seraacute a separaccedilatildeo de sistemas Por outro

lado quanto mais intenso for o bilinguismo maior seraacute a convergecircncia de

sistemas fonoloacutegicos

No que concerne agrave integraccedilatildeo fonoloacutegica Matras (2009 p 227) explica que a

substituiccedilatildeo de fonemas eacute uma das formas mais comuns posto que este

processo permite uma aproximaccedilatildeo de caracteriacutesticas entre o sistema interno e

externo Dessa forma a substituiccedilatildeo eacute mais comum uma vez que os fonemas

satildeo combinaccedilotildees de recursos articulatoacuterios e as caracteriacutesticas em comum satildeo

mantidas em detrimento agraves complexidades dos fonemas que natildeo compartilham de

traccedilos em comum

119

Ele tambeacutem chama a atenccedilatildeo para a estrutura silaacutebica dos sistemas fonoloacutegicos

que entram em contato afirmando que ldquoos estrangeirismos podem acomodar a

siacutelaba e a estrutura do acentordquo (idem p 228)

A aplicaccedilatildeo de regras sobre a distribuiccedilatildeo de fonemas oriundos do empreacutestimo

pode resultar na perda de um traccedilo ou de um fonema A integraccedilatildeo de fonemas

tambeacutem pode levar agrave omissatildeo de outros fonemas que natildeo fazem parte o

inventaacuterio fonoloacutegico da liacutengua receptora E a omissatildeo de certas caracteriacutesticas

durante a replicaccedilatildeo de fonemas pode ser prejudicial para o sistema como um

todo e isso pode resultar em uma reduccedilatildeo de pares miacutenimos

Sobre a convergecircncia dos sistemas fonoloacutegicos Matras (2009 p 229) assegura

que um fator que retarda o processo de substituiccedilatildeo de som eacute a presenccedila de

vaacuterios pares de vocaacutebulos que contam com o contraste Neste caso a

convergecircncia aumenta as semelhanccedilas entre os inventaacuterios fonoloacutegicos das duas

liacutenguas E a replicaccedilatildeo da variaccedilatildeo alofocircnica eacute uma via comum para a

convergecircncia

Quanto aos segmentos foneacuteticos ainda de acordo com o pesquisador em

questatildeo as consoantes satildeo as mais introduzidas nos estrangeirismos Uma vez

que nas liacutenguas do mundo o nuacutemero de segmentos consonantais eacute maior que o

das vogais Logo os vocaacutebulos emprestados satildeo mais propensos a introduzir

mais consoantes que vogais

No caso Portuguecircs falado por Latundecirc tal assertiva em parte se configura A

anaacutelise dos dados prova que satildeo as consoantes as mais favoraacuteveis para a

realizaccedilatildeo dos processos foneacuteticos Todavia o nuacutemero de consoantes nessa

120

liacutengua eacute menor que o de vogais conforme descriccedilatildeo de Telles 2002 a qual

veremos na proacutexima seccedilatildeo

Van Coetsem (1988 p7) tambeacutem aborda os processos e comportamentos

oriundos do contato linguiacutestico68 E para que este contato seja estabelecido eacute

necessaacuterio que se tenha uma liacutengua de origem (SL) e uma liacutengua destinataacuteria

(RL)

Figura 13 Correspondecircncia entre liacutenguas e contato linguiacutestico

Embora o modelo de Van Coetesem seja universal e demonstre que na maioria

dos contatos linguiacutesticos a liacutengua de origem seja uma liacutengua dominante

ressaltamos que neste trabalho a liacutengua de origem (SL) eacute a liacutengua minoritaacuteria o

Latundecirc E o substrato analisado eacute uma modalidade de portuguecircs falado pelos

Latundecirc

Em continuidade este estudioso afirma que

Um empreacutestimo fonoloacutegico eacute uma imitaccedilatildeo uma reacuteplica ou uma reproduccedilatildeo na liacutengua recipiente (RL) de um elemento estrangeiro ou uma pronuacutencia da liacutengua de origem (SL) Esse tipo de imitaccedilatildeo eacute muitas vezes apenas uma aproximaccedilatildeo Para o imitador a imitaccedilatildeo implica o uso de algo que ele natildeo tem na sua proacutepria liacutengua Um empreacutestimo fonoloacutegico como uma imitaccedilatildeo eacute portanto algo que o falante imitador da RL natildeo tem em sua fonologia integrada ou nativa ou seja algo

68

Para Van Coetsen o termo ldquoempreacutestimo fonoloacutegicordquo indica qualquer forma de empreacutestimo no acircmbito da fonologia segmentar ou suprassegmental independentemente se isto afeta a dimensatildeo paradigmaacutetica a dimensatildeo sintagmaacutetica ou ambas (p7)

121

fonoloacutegico ou subfonoloacutegico que deriva de seu sistema fonoloacutegico nativo (Idem p 8)69

A intenccedilatildeo do falante ao fazer uso do segmento emprestado eacute reproduzi-lo da

melhor forma possiacutevel Ao fazer isso ele obedece agraves consideraccedilotildees sociais O

proacuteprio fato de que o segmento natildeo esteja inserido em seu proacuteprio sistema faz

com que na pressatildeo de se adaptar a diferentes pronuacutencias ele (o falante) procure

o equivalente mais proacuteximo em seu sistema

Para que isso ocorra ldquoo falante faz uso de dois processos a imitaccedilatildeo e a

adaptaccedilatildeo p 9rdquo Ambos pressupotildeem a existecircncia de um conjunto organizado de

segmentos fonoloacutegicos e distribuiccedilatildeo de unidades inseridas pelo falante da liacutengua

recipiente por um lado e por outro o confronto das pronuacutencias estrangeiras com

que o falante tem que lidar

Aleacutem dos processos de imitaccedilatildeo e adaptaccedilatildeo Van Coetesem tambeacutem utiliza a

noccedilatildeo de integraccedilatildeo ldquoque eacute a incorporaccedilatildeo de elementos em uma dada liacutengua

advindos de outra(s) liacutengua(s)rdquo A imitaccedilatildeo seria portanto o preacute-requisito para a

integraccedilatildeo No caso do portuguecircs falado pelos Latundecirc natildeo haacute indiacutecios de

integraccedilatildeo de fonemas especiacuteficos da sua liacutengua de origem

Para que ocorra o processo de imitaccedilatildeo eacute necessaacuterio que haja uma agentividade

que eacute um tipo especiacutefico de transferecircncia onde o falante de uma dada liacutengua eacute

ativo e o outro passivo O inverso tambeacutem pode ocorrer

69

A phonological loan is an imitation replication or reproduction in the RL of a foreign or SL

pronunciation such an imitation is often only an approximation For the imitator imitation implies the use of something that he does not (yet) have of his own A phonological loan as an imitation is thus something that the imitating RL speaker does not have in his integrated or native phonology something phonemic or subphonemic that deviates from his native phonological system

122

Figura 14 Agentividade da Liacutengua Recipiente de acordo Van Coetsem 1988 p10

Na agentividade da liacutengua recipiente (RL)70 o segmento dominante na relaccedilatildeo

entre a liacutengua recipiente e a liacutengua de origem71 eacute o da liacutengua recipiente Logo o

domiacutenio linguiacutestico seraacute o da liacutengua recipiente

Figura 15 Agentividade da Liacutengua de Origem de acordo Van Coetsem (1988 p11)

Na agentividade da liacutengua de origem (SL) o segmento dominante na relaccedilatildeo

entre a liacutengua recipiente e a liacutengua de origem eacute o da liacutengua de origem Sendo

assim o domiacutenio linguiacutestico seraacute o da liacutengua de origem

Tomando como referencial os modelos apresentados podemos estabelecer um

contiacutenuo cronoloacutegico para compreender como se daacute a agentividade sobre o

contado do Portuguecircs com o Latundecirc

70

No caso em questatildeo a modalidade do portuguecircs falado pelos Latundecirc eacute a liacutengua recipiente 71

Consequentemente a liacutengua de origem (SL) eacute o Latundecirc

123

Figura 16 Relaccedilatildeo de agentividade entre o Portuguecircs e o Latundecirc

Historicamente devido aos fatores socioeconocircmicos o contato inicial se daacute entre

o Portuguecircs influenciando o Latundecirc Aquele como liacutengua majoritaacuteria e este como

minoritaacuteria

O Latundecirc por ser a liacutengua do povo dominado eacute submetido agraves interferecircncias da

liacutengua de domiacutenio Deste contato resulta uma modalidade especiacutefica do

Portuguecircs que eacute o falado por Latundecirc

Em suma podemos afirmar que embora seja o Portuguecircs a liacutengua dominante e

que inicialmente seja ele o agente sobre o Latundecirc a posteriori fora o Latundecirc o

agente pelas transformaccedilotildees ocorrentes no Portuguecircs de contato Posto dessa

forma a agentividade se daacute em ambos os contextos a partir do referencial que se

tenha uma vez que o Portuguecircs e o Latundecirc tanto influenciaram como foram

influenciados Mas vale ressalvar que para este recorte o Portuguecircs eacute a liacutengua

que sofre influecircncia Eacute este o fio condutor da nossa pesquisa

Portuguecircs Latundecirc Portuguecircs falado por Latundecirc

124

53 FONOLOGIA DO LATUNDEcirc

Para uma melhor compreensatildeo futura passaremos agora a descrever os

sistemas fonoloacutegicos das liacutenguas em estudo

Elencamos abaixo as principais caracteriacutesticas fonoloacutegicas do Latundecirc

Eacute uma liacutengua com maior quantidade de elementos vocaacutelicos (dezesseis)

em detrimento aos consonantais (onze) Eacute uma liacutengua vocaacutelica portanto

Apresenta dez vogais orais e seis nasais Dessas oito satildeo laringais72

As vogais nasais satildeo contrativas apenas na posiccedilatildeo do acento

Os glides w j quando em posiccedilatildeo de onset sofrem o processo de

consonantizaccedilatildeo

Apresenta seis tipos de siacutelabas fonoloacutegicas que satildeo derivadas da extensatildeo

(C)V(C)(C) V VC VCC VC CVC e CVCC

O nuacutecleo silaacutebico eacute sempre preenchido por uma vogal

Dos segmentos consonantais apenas a oclusiva glotal ʔ natildeo eacute observada

em posiccedilatildeo de onset

A coda pode ter desdobramento ramificado sendo a primeira posiccedilatildeo

preenchida sempre por um glide

Os padrotildees silaacutebicos VC e CVC satildeo os mais frequentes e ocorrem tanto

em siacutelaba tocircnica como aacutetona

Tem uma forte tendecircncia agrave monotongaccedilatildeo

O sistema acentual eacute misto que associa o acento lexical ao acento foneacutetico

72

Telles explica que as mais novas geraccedilotildees Latundecirc abaixo de 20 anos realizam o traccedilo laringal com menor frequecircncia e audibilidade

125

O acento eacute realizado foneticamente como tom (pitch) alto

Eacute uma liacutengua de caracteriacutestica de liacutenguas pitch accent

Apresenta processos fonoloacutegicos em niacutevel poacutes-lexical fundamentalmente

Estes processos satildeo agrupados em assimilaccedilatildeo (harmonia vocaacutelica e

vozeamento das oclusivas) dissimilaccedilatildeo reduccedilatildeo apagamento silaacutebico e

epecircntese

Quadro 9 Fonemas consonantais do Latundecirc

Fonemas Consonantais

Labiais Coronais Dorsal Glotais

+ anterior - anterior + anterior - anterior - anterior - anterior

Plosivas p t k

Nasais m n

Fricativas s h

Lateral l

Glide w j

Quadro 10 Fonemas vocaacutelicos do Latundecirc

Fonemas Vocaacutelicos

Vogais Vogais Laringais

Altas i u i u

Altas Nasais ĩ ũ i u

Meacutedias e o e o

Baixa a a

Baixa Nasal a a

126

Quadro 11 Ditongos do Latundecirc

Ditongos

Crescentes Decrescentes

w j w J

i wi iw

e e we we je je ej e j

a a a a wa wa ja ja ja aw a w a w aj a j atildej

o o wo jo ow

u u u ju ju ju

Quadro 12 Descriccedilatildeo dos fonemas consonantais (Retirada de Telles 2002)

Segmento - Descriccedilatildeo - Contexto de realizaccedilatildeo e especificidades

Exemplos

Traduccedilatildeo

p73 - Oclusiva bilabial surda

Eacute de extrema limitaccedilatildeo de realizaccedilatildeo na liacutengua

Ocorre em posiccedilatildeo de onset formando

siacutelabas com as vogais i a atilde o u

Pode se realizar como [p] oclusiva bilabial surda [b] oclusiva bilabial

sonora [ɓ] oclusiva bilabial sonora

implosiva

Em iniacutecio de palavras realiza-se [p]

diante da vogal coronal [i] e [b ɓ] e

diante da vogal baixa [a]

Em meio de palavra ou enunciado quando precedido por oclusiva glotal realiza-se [p]

[pite]

piʔ-te

[ιɓ

pan-tatilden

[diʔpa natildenʌ]

jaliʔ pan-tatilden-ta

[kotildebayte] ~ [kotildebayte]

kownpayt-te

[sabagnĩde]

Espeacutecie de paacutessaro chupito Satildeo dois Satildeo dois colares Tatu espeacutecie de

73

Outros estudos com liacutenguas proacuteximas tambeacutem indicam a baixa frequecircncia da realizaccedilatildeo do p

nas liacutenguas desse grupo Kingston 1970 para o Mamaindecirc e Lowe 1961 para o Nambikwaacutera do sul (Galera Kabixi Munduacuteka Nambikwaacutera do Campo)

127

Em meio de palavras ou enunciados em ambiente intervocaacutelico ou nasal adjacente realiza-se [b]

sapan-kinĩn-te

[tʃabatildeʔginĩde]

sapatilden-kin-te

Pente Taioba

m - Nasal labial + anterior

Oclusiva bilabial nasal com distribuiccedilatildeo mais larga do que a do p

Apresenta ocorrecircncia restrita quanto comparada agrave nasal alveolar n

Realiza-se [m]

Ocorre em iniacutecio de siacutelaba diante das

vogais i i i i a a a u u u u

Natildeo forma siacutelaba com as vogais

meacutedias frontais e e e com as

posteriores o o

Apoacutes pausa e seguida de a pode se realizar como oclusiva bilabial nasal

preacute-glotalizada - [ ʔm ]

[ miɾatildenʌ]

mih-tatilden-ta

[katilde ɾatildenʌ]

kami h-tatilden-ta

[ a ĩ de]

e ĩn-te

[ e ĩ de]

e ĩ -te]

[ ma hɾatilden]

mah-tatilden

[ atildega ɾe]

atilden-kaloh-te

[ka a ʔɾatildenʌ]

ka- a -tatilde-ta

[ datildena]

n-tatilden-ta

[tumuʔku ɾe]

tumuʔku-te

Estaacute chovendo Aacutegua estaacute suja Cobra espeacutecie de Couro Ele estaacute esperando Roupa Estaacute molhado Estaacute bonito Jacu

128

Em fronteira de morfema precedido pela fricativa glotal h teraacute a sua realizaccedilatildeo ensurdecida

[ a datildenʌ]

a n-tatilden-ta

[ʔ atilde ɳ datilden]~[ a n datilden]

atilden-tatilden

[ʔ atildeʔ n datilden] ~

[ atildeʔ ndatilden]

atilden- n-tatilden

[n h atildega tna ]

n - atilden-ka -tatilden-na

Estaacute inchado Estaacute queimando Vocecirc estaacute mandando Eacute nossa roupa

w - Glide labial - anterior

Glide laacutebio-velar sonoro

Ocupa as posiccedilotildees de onset e coda

Apresenta leve arredondamento nos laacutebios

Eacute o segmento mais frequente das labiais

Realiza-se como [w] em iniacutecio de

siacutelaba diante das vogais i e e a a o

tambeacutem podendo variar com [ʋ]

fricativa laacutebio-dental que eacute realizada com fraco grau de fricccedilatildeo

[ wi rsquoɾatilden] ~ [ ʋi ɾatilden]

wi -tatilden

[woda h de] ~ [ʋoda h de]

wotah-te

[na weʔrsquoa jrsquoɾe] ~ [na ʋeʔajrsquoɾe ]

na jn-weʔa jh-te

[ kowajna tatildenʌ]~ [koʋajna tatildenʌ]

hah-wa jn-ta-tatilden-ta

[daweʔgɾatilde ni]

taweʔ-ka-tatilden-ti

[ we jginĩdatildena]

we jn-kinĩn-tatilden-ta

[ wajkinĩ de]

wajʔ-kinĩn-te

Ele comeu Pomba Eacute para colocar na cabeccedila Satildeo poucos laacutepis Ele cozinhou Eacute fruto da bacaba

129

Em dissiacutelabos no onset de siacutelaba preacute-tocircnica aberta seguido de vogal a central baixa pode ocorrer a fusatildeo entre o w e a vogal a realizando-se como [ͻ o u]74

Na sequecircncia w + a o a pode sofrer harmonia vocaacutelica recebendo o ponto de articulaccedilatildeo da vogal acentuada sendo realizada [e]

Quando em final de siacutelaba segue as

vogais i o a a

E depois das vogais io pode alongar-se

Se a vogal precedente for a baixa a

a ocorreraacute a fusatildeo resultando as

posteriores ͻ ͻ

Quando em siacutelaba em siacutelaba

acentuada ͻ ͻ podem ser alongados

ou seguido de oclusatildeo glotal [ʔ] ou

ocorrer uma assimilaccedilatildeo regressiva

das baixas aa passando a [ͻ ͻ ]

Quanto agrave frequecircncia w se mais

ocorrente depois da vogal baixa a a

e baixiacutessima ocorrecircncia depois da vogal i o

Ao integrar uma siacutelaba (C)v wN onde a

vogal eacute nasalizada o glide pode ser nasalizado ou coalescer com a consoante nasal na coda

Em posiccedilatildeo de onset e pronunciada rapidamente eacute fortificada podendo ser realizada como [p] e [m]75

[ wa jkinĩ de]

wa jh-kinĩn-te

[waɾaɾwaɾaʔĩ datildenʌ] ~

[wͻɾaʔwͻɾaʔĩ datildenʌ] ~

[ͻɾaʔͻɾaʔĩ datildenʌ]

watajwatajn-tatilden-ta

[weli nde] ~ [uli n de]

wa ĩn-te

[weɾe ɾatildena] ~ [ ɾe ɾatildena] ~

[ rsquoɾe ɾa na]

wateh-tatilden-ta

[giw ladaɾe] ~ [gi la de]

kiwlah-tah-te

[kowa ɾe] ~ [koa ɾe]

kowah-te

[a wde] ~ [ ͻ de] ~ [ ͻ ʔde]

a w-te

[aw de] ~ [ͻ de] ~ [ͻʔ de]

awh-te

[na w du] ~ [nͻ du] ~ [nͻ w du]

na wh-tu

[a wm datilden] ~ [atilde w m datilden] ~

Amendoim Fruto do accedilaiacute Estaacute fino Tamanduaacute Estaacute sumido Cascavel Andorinha Flexa Gaviatildeo

74

Conforme Telles (2002 p 42) Estas alofonias variam de acordo com a qualidade da vogal

tocircnica da siacutelaba seguinte com a qual sua vogal aacutetona nuclear se harmoniza 75

Tal ocorrecircncia eacute mais frequentemente constatada em falantes monoliacutengues em Latundecirc

130

[atilde m datilden]

atilde wn-tatilden

[woloʔʔnatildenʌ] ~ [polo ʔnatildenʌ]

walon-tatilde-ta

[wʌnaʔkinĩ de] ~ [mʌnaʔkinĩ de]

~ [wanaʔkinĩ de]

wanaʔ-kinĩn-te

[wo nut ʔna ] ~ [mo nut ʔna ]

wo nuʔ-tatilden-na

[wʌ na jginĩ datildenʌ] ~

[mana jginĩ datildenʌ] ~

wa -na jn-kin-tatilden-ta

[wa ʃi de] ~ [maʔ ʃi de]

wa-sin-te

Lontra Estaacute assando no burralho Estaacute podre Castanha do caju Eacute corpo inteiro Eacute tua cabeccedila Espeacutecie de abelha

t - Plosiva coronal + anterior

Oclusiva alveolar surda

Ocorre com as vogais ie e a

a atilde o o u ũ

t realiza-se [d] em siacutelaba acentuada podendo ainda variar em posiccedilatildeo medial como [|]

Em iniacutecio de palavra o alofone [d] pode ser realizado como preacute-

[diko lo n de]

tiʔ-ko lo n-te

[ de he ɾaɾe]

te h-tah-te

Paacutessaro pintado espeacutecie de paacutessaro Ele cozinhou

131

glotalizado realizando-se como

[ɗ]

Em fala lenta pode ser realizado como [d]

Em contexto fora do acento ocorre [t] com raros exemplos de variaccedilatildeo entre os alofones [d] e [t]

[ de geɾatilden]

te h-ka-tatilden

[daʔjͻ ratildena]

ta-jaw-tatilden-ta

[da jginĩ de]

ta jn-kinĩn-te

[ doɾatilden] ~ [d ɾatilden]

toh-tatilden

[do h gratilden]

to h-ka-tatilden

[du ɾatilden]

tu-tatilden

[d hdatilden]

tu-tatilden

[kͻdͻ ɾe]

kataw-te

[kado ndatildenʌ]

katon-tatilden-ta

[teda de]

teta-te

[toʔdatilde n de]

toʔtatilden-te

[tigi ɾe]

tikih-te

Sucuri Ele estaacute sentado Pedra Ele morreu Ele procurou Ele pegou Ele chupou Patuaacute Estaacute cru Jaoacute Nambu

132

As possibilidades alofocircnicas de t entre segmentos depende do acento e do contexto adjacente Estas duas condiccedilotildees definem as alofonias76

Precedido de vogal em ambiente

intervocaacutelico realiza-se [tdɾ]

sendo [d] o preferencial

Quando t eacute precedido por h

realiza-se como [tdɾ] A

presenccedila da fricativa favorece o rotacismo de t tornando-o em

[ɾ]

Quando t eacute precedido de ʔ ou

de t a realizaccedilatildeo pode ser [t] mas [d] pode permanecer em raros casos

Em contexto de nasalizaccedilatildeo trecircs realizaccedilotildees satildeo possiacuteveis para t i) vozeamento da oclusiva alveolar ii) preacute-nasalizaccedilatildeo da oclusiva alveolar em iniacutecio de siacutelaba tocircnica e iii) assimilaccedilatildeo total da nasal adjacente

[tabawdnͻde]

tapawn-naw-te

[tala de] ~ [dala de]

tala-te

[tolowm datilde ]

talown-tatilden

[lodo ɾa ɾe] ~ [lo to ɾa ɾe] ~

[loto ɾa ɾe]

loto-tah-te

[doʔ daj de] ~ [toʔ ɾaj de]

to-tajn-te

[nu h ɾe] ~ [ nu h de]

nu h-te

[lo hrsquoɾe] ~ [lo h de] ~

[lo h te]

loh-te

[hu te] ~ [hu de]

huʔ-te

[keja te] ~ [kejaʔ te]

kejat-te

[ĩ datildena] ~ [i ndatildena] ~ [i natildena]

Macaco pequeno Ombro Tipoia Ele terminou Rato grande Abelha vermelha Lagarto grande Urubu

76

Dessas alofonias o flap [ɾ] tem sua ocorrecircncia ligada ao acento

133

Em siacutelaba natildeo acentuada t pode sofrer fricatizaccedilatildeo passando a se realizar como [s]

ou [ts] ou [ʔs]

Ainda neste contexto permanecem possiacuteveis as realizaccedilotildees [t] e [d] se o t sofrer fricatizaccedilatildeo a aspiraccedilatildeo glotal precedente do h natildeo se realiza

Em travamento silaacutebico t realiza-se de preferecircncia como

ʔ Pode ser deletado

ocasionando o prolongamento da vogal tautossilaacutebico

in-tatilden-ta

[katilde datildena] ~ [katilde ndatildena] ~

[katilde natildena]

katilden-tatilden-ta]

[kejaʔ n da ɾe] ~ [kejaʔ na e]

kejan-tah-te

[losa na ʔ] ~ [lostsa na ʔ] ~

[lo ʔ sa na ʔ] ~ [lo h ta na ʔ]

loh-ta-na

[kejate] ~ [kejaʔte]

kejat-te

[kejaʔtiʔjoho]

kejat-ti-jo-ho

[lote] ~ [loʔte]

lot-te

[acute tʃjͻna ]

lot-ti-jaw-na

Arco Milho Estaacute apimentado Estaacute duro Lambari grande Eacute urubu Milho Talvez seja milho Paca A paca estava aiacute

134

n - Nasal coronal - anterior

Oclusiva alveolar nasal

Suas alofonias satildeo condicionadas pelo contexto adjacente agrave sua posiccedilatildeo de ocorrecircncia e agrave estrutura silaacutebica

Em onset realiza-se como [n] com as

vogais i i ĩ ĩ a a atilde atilde u u ũ ũ

Tambeacutem pode apresentar flutuaccedilatildeo em

onset realizando-se [ʔn]77 alveolar

nasal preacute-glotalizada com preferecircncia quando seguido por a

Em posiccedilatildeo de onset e em fronteira de morfema dependendo do seguimento seguinte sofreraacute alteraccedilatildeo

Quando precedido por h sofreraacute ensurdecimento

Quando precedido por outro n na coda silaacutebica precedente poderaacute ser

preacute-glotalizada [ʔn]

[ni du]

ni-tu

[ni ʔkinĩnatildena]

ni ʔ-kinĩn-tatilden-ta

[nagatilde de]

nakatilden-te

[katildena ratilden]

kana h-tatilden

[natildejd ]

natildejn-tu]

[ʔnatilde natilde ʌ]

natilde n-tatilden-ta

[nu h e]

nuʔ-te

[lsquon h ɾe]

nu h-te

[n n de]

n n-te

[n h n atildega tatildena]

Tipo de lenha Eacute fruto Lagarto Estaacute escuro Pacu Estaacute chorando Braccedilo Lagarto Espeacutecie de Bicho

77

Tal qual ocorre com m a glotalizaccedilatildeo de n deve-se em alguns casos aacute reduccedilatildeo da siacutelaba

inicial da palavra

135

Em posiccedilatildeo de coda de siacutelaba acentuada gera processo de assimilaccedilatildeo de dissimilaccedilatildeo e de elisatildeo resultando numa seacuterie de alofonias

Ainda em siacutelaba acentuada se a vogal tautossilaacutebica for oral e entre a coda nasal existir um glide labial-velar constituindo uma siacutelaba com ditongos awn own n se realiza como [m] preferencialmente

w e n em posiccedilatildeo de coda pode sofrer coalescecircncia realizando-se como [m] ou [n]

Se o glide ocupante da primeira posiccedilatildeo da coda for j ou se a siacutelaba tiver a coda preenchida pela nasal n a realizaccedilatildeo desta nasal seraacute [n]

Os glides que seguem a vogal na primeira posiccedilatildeo de coda podem

n -natilden-kah-tatilden-ta

[udʔna]

un-na

[iwm de]

iwn-te

[tʌlawm natildenʌ] ~ [tʌlaw natildenʌ]

talawn-tatilden-ta

[wawm datildenʌ] ~ [wͻwm datildenʌ]

wawn-tatilden-ta

[tolowm datildenʌ]

talown-tatilden-ta

[jatildew de] ~ [iɲatildew de] ~

[jatilde de]

jatildewn-te

[a wm datilden] ~ [atilde m datilden]

atilde wn-tatilden

[iʃɛʔ ɾʌ m datilden]

isaj-tatildewn-tatilden

[toʔkotilde datilden] ~ [t ʔkʌ datilden]

toʔkatildewn-tatilden

Eacute nosso Estaacute vivo Larva Estaacute grosso Estaacute vermelho Estaacute pronto Larva Estaacute assando no burralho

136

assimilar a nasalidade da consoante precedente 78

Se a vogal for nasal na maioria das ocorrecircncias a consoante nasal na coda seraacute apagada deixando seu tempo na vogal precedente e na consoante seguinte

Quando a coda nasal n segue ditongo formado por vogal nasal subjacente mais glide palatal j n em posiccedilatildeo de coda pode espalhar nasalidade regressiva para o glide precedente e pode ser apagada

Quando em coda nasal iraacute participar de outros processos fonoloacutegicos aleacutem da vogal precedente

Na posiccedilatildeo de siacutelaba acentuada em meio de palavra seguida por k n promove a sonorizaccedilatildeo de k e passa

a se realizar como [ʔ] oclusiva glotal

[kotilde baj te] ~ [kotildebay te]

kownpajt-te

[a ʔ n de] ~ [a n de]

a n-te

[je n datilden]

je n-tatilden

[i n datilde na ]

in-tatilden-na

[ hej ndatilden] ~ [ hej n datilden]

hejn-tatilden]

[ natildej de] ~ [ naj n de]

natildejn-te

[ atildendatilden]

atilden-tatilden

[ atilde n datilden]

atilden tatilden]

[ mɔ de] ~ [ de]

n-te

[n n de]

n n-te

Eles estatildeo correndo Ele misturou Tatu Tatu galinha Estaacute sujo Ele estaacute mamando Ele lavou Pacu Ele atirou

78

Para uma descriccedilatildeo mais detalhada sobre o comportamento de n e os glides ver a tese de

Telles 2002 55-57

137

Ainda quanto ao contexto semelhantemente descrito acima n for seguida por uma oclusiva surda homorgacircnica t poderaacute ocorrer processos que possibilitem uma alofonia em variaccedilatildeo livre

n sonoriza t

n sofre desnasalizaccedilatildeo

Quando n sonoriza a consoante seguinte ocorre a elisatildeo podendo ocorrer ou natildeo o alongamento compensatoacuterio da vogal precedente ou a preacute-nasalizaccedilatildeo da consoante seguinte

Quando n sofre elisatildeo alonga a vogal precedente e a consoante seguinte se assimila progressivamente com o traccedilo nasal passando a se realizar como [n]

n se vocaliza e recebe os traccedilos da vogal central e realiza-se nasal

Se n for seguida em coda por uma consoante nasal idecircntica ocupando a posiccedilatildeo do onset da siacutelaba seguinte poderaacute haver duas possibilidades de comportamento da coda nasal dependendo de ser a sua vogal tautossilaacutebica assimilar ou natildeo

Se a vogal precedente for nasal a coda sofreraacute elisatildeo e a vogal se alongaraacute

Se a vogal central for oral a consoante nasal da coda que precede a nasal idecircntica no onset da siacutelaba seguinte sofreraacute dissimilaccedilatildeo do traccedilo nasal79

[ natildej de] ~ [ naj n de]

natildejn-te

[ku ʔginĩ de]

ku n-kinĩn-te

[ dega tatilden]

te n-kaloh-tatilden

[ atildega ɾe]

atilden-kaloh-te

[ ku ndatildenʌ]

ku n-tatilden-ta

[ ku ddatildenʌ]

ku n-tatilden-ta

[ ku n datildenʌ] ~ [ ku datildenʌ]

ku n-tatilde-ta

[ ku natildenʌ]

ku n-tatilden-ta

Estaacute branco Bom-dia espeacutecie de aacutervore Bicho Pacu Rolo de fio de algodatildeo Roupa velha Roupa Estaacute fumando

79

A liacutengua Latundecirc eacute caracterizada pelo OCP (Princiacutepio do Contorno Obrigatoacuterio)

138

[ku datildenʌ]

ku n-tatilden-ta

[katilde na ]

katilden-na

[lidnu ɾe]

lin-nu-te

[lid na j ɾe]

lin-na jh-te

Estaacute fumando Estaacute fumando Estaacute fumando Estaacute fumando Estaacute duro Beiju de mandioca Raiz de mandioca

s - Fricativa alveolar surda

Fricativacoronal+ anterior forma siacutelaba

com as vogais i ĩ e a a atilde o uu ũ

Realiza-se como [s] [ʃ] [tʃ] [ʔs]

Em menor frequecircncia pode ser realizada como [t] e [t h]

Em siacutelaba acentuada em iniacutecio de palavras a fricativa pode se realizar

[tʃi ɾatilden] ~ [ʔsi ɾatilden]

sih-tatilden

[ ʔsitatilden] ~ [ sitatilden]

set-tan

Estaacute liso Trovejou

139

como palatal africada preacute-glotal ou como alveolar 80

Quando s se fortifica e passa a se realizar como [t] e ou como [t h] apresentam restriccedilatildeo ao contexto de vogal baixa seguinte podendo ocorrer em iniacutecio ou em meio de palavra Nestes contextos tambeacutem permanecem possiacuteveis as demais alofonias

A fortificaccedilatildeo de s eacute frequente em siacutelaba natildeo acentuada em iniacutecio de palavra Embora as siacutelabas acentuadas contenham maiores iacutendices Em posiccedilatildeo natildeo acentuada a alveolar ocorre em maior nuacutemero

A palatalizaccedilatildeo da fricativa eacute obrigatoacuteria quando precedida por i Sua realizaccedilatildeo eacute alveolar em posiccedilatildeo intervocaacutelica

[ʔsĩ du ɾatilden]

sĩn-tu-tatilden

[ʃa h ɾe] ~ [sa h ɾe]

sa h-te

[ tʃoɾatildenʌ] ~ [ ʃoɾatildenʌ]

soh-tatilden-ta

[ʃ de] ~ [s n de]

s n-te

[thathaʔi natildenʌ] ~ [ʃaʃaʔi natildenʌ]

sasan-tatilden-ta

[kejͻ ʔhe neʔt h o ɾeʔ] ~

[kejͻʔhe neʔto ɾeʔ]

keja w-haniʔ-s aw-te

[t datilde na ] ~ [t h datilde na ]

so-tatilden-na

[tʃamaj de] ~ [tamaj de] ~ [sama

de]

saman-te

[ʔʃamaʔdʌ ɾatildena]

saman-tah-tatilden-ta

[iʃatilde datilde na ]

isatilde n-tatilden-na

Estaacute arrastando Timboacute do mato Estaacute sujo Sol Estaacute mole Oacuteleo Eacute guarantatilde (espeacutecie de aacutervore) Tanajura Eacute tanajura

80

A africada eacute a mais utilizada pelos velhos enquanto a fricativa e a alveolar satildeo mais utilizadas

pelos jovens

140

[iʃu datildenʌ]

isu -tatilden-ta

[wasa h ɾe] - [wͻsa h ɾe]

wasah-te

Eacute folha Ele estaacute com frio Besouro

l- Lateral alveolar sonora

Lateral coronal + anterior

Forma siacutelaba em iniacutecio e meio de

palavras com as vogais i e a a o o

u

Fortifica-se em iniacutecio de palavras quando encontra-se na posiccedilatildeo de acento pode ser precedido por vogal aacutetona sem onset que tende a ser apagada

Diante do contexto acima realiza-se

[li tatilden]

lit-tatilden

[dale de]

tale-te

[giwla de]

kiwlah-te

[la ɾ e]

la h-te

[lo ɾatildena]

loh-tatilden-ta

[ko lo ko lo n de]

ko loʔ ko lo n-te

[toluʔ tatildena]

taluʔ-tatilden-ta

[ʔta e] ~ [da e]

la h-te

Ele saiu Embira Cobre cascavel Jacucaacuteca Estaacute comprido Pintado Ele tossiu

141

como alofones [ʔl] e [d]

Acompanhado por consoante nasal em onset silaacutebico pode assimilar progressivamente a nasalidade sendo realizado como [n]

Pode apresentar sobreposiccedilatildeo na maneira como se realizam

[t ~s ]

[t ~ n]

[n ~ l]

[t ~ l ]

[ʔlo tatilden] ~ [a tatilden]

atilde-loʔ-tatilden

[diʔ pa natildena] ~ [i iʔ pa natildena]

jaliʔ pan-tatilde-ta

[ naginila h ni ɾ atilden] ~

[ naginina h ni ɾatilden]

sapatilden-kinĩn-te

[kaas tatildena] ~ [kata tatildena]

kasaʔ-tatilden-ta

[tidit na j de] ~ [tidit ta de]

tatiʔ-najn-te

[nagatilde de] ~ [ agatilde n de]

nakatilden-te

[wota h ɾe] ~ [wola h ɾe]

wotah-te

Jacucaacuteca Ele estaacute afundado atolado Satildeo dois colares Eu natildeo sei se ele estaacute doente Taioba Estaacute grosso Mandioca mansa Lagarto do campo Pomba

142

j - Glide coronal - anterior

Eacute um glide palatal que ocupa a posiccedilatildeo de onset e de coda na siacutelaba

Em iniacutecio de siacutelaba j antecede as

vogais e e o a a atilde u u ũ

Quando em posiccedilatildeo inicial na siacutelaba e

acompanhado por e e em siacutelaba

acentuada ou seguido por a em siacutelaba aacutetona j pode se fortificar e se realizar

como [ʒ] sendo possiacutevel neste caso

ser seguido por um preacute glide [j] de fraca e raacutepida duraccedilatildeo

Quando seguido por a em siacutelaba aacutetona eacute opcional a fusatildeo entre o glide e a vogal derivando a vogal longa [i]

[je n datilden]

je n-tatilden

[ja te]

jaʔ-te

[ja te]

ja ʔ te

[jatildeʔ datilden] ~ [iɲatildeʔ datilden]

jatilden- n-tatilden

[jo ɾatilden]

joh-tatilden

[ju te]

ju-te

[ju te]

ju -rsquote

[j ginĩ de]

j n-kinĩn-te

[je natilden te] ~ [ʒe natilden te]

ja natilde-nu-te

[ j ʒe n datilden] ~ [ʒe n datilden] ~

[je n datilden]

je n-tatilden

[ʒɛge datilden] ~ [ʒɛga j datilden]

Estaacute sujo Maribondo espeacutecie Porco Vocecirc tem coragem Estaacute baixo Boca Peacute Pedra de gelo granizo Porco espinho Estaacute sujo

143

Se em posiccedilatildeo de onset e seguido de vogal nasal pode ocorrer uma consoante palatal seguindo o glide palatal e precedendo a vogal nuclear

Se for atilde a consoante intrusiva se realizaraacute com mais forccedila e separaraacute a sequecircncia jatilden em duas siacutelabas

Quando o glide vier antes da vogal ũ a consoante intrusiva poderaacute resultar no apagamento do glide podendo se realizar como consoante palatal ou preacute-glide

Em posiccedilatildeo final de siacutelabas

acompanha as vogais e e a a

jaka jn-tatilden

[inatilde de]

janatilde n-te

[jeda n de] ~ [ʒida n de] ~ [ida

n de]

jatan-te

[jatilde datilden] ~ [ iɲatildeʔ datilden]

jatilden- n-tatilden

[jatildew de] ~ [iɲatildew de] ~

[jatilde de]

jatildewn-te

[j ginĩ de] ~ [ j ɲ gibi de]

j n-kinĩn-te

[ ejdnirsquoɾatilde]

hejn-ten-ni-tatilde

[ e jtatilden]

e ʔ-tatilden

[wajkinĩ du]

wajʔ-kinĩn-tu

[na j de]

na j -te

[ natildejde]

natildejn-te

Eacute pica-pau pequeno espeacutecie Abelha do chatildeo espeacutecie veado espeacutecie Vocecirc tem coragem Larva espeacutecie Pedra de gelo granizo Eu vou lavar Ele fez fogo Amendoim

144

Maribondo espeacutecie Pacu espeacutecie de peixe

k- Plosiva dorsal - anterior

Eacute oclusiva velar surda Tem larga distribuiccedilatildeo e se realiza diante de todas as vogais do Latundecirc

Satildeo seus alofones [ʔk] [ɠ] [g] e [k]

Em iniacutecio de palavra se realiza preferencialmente como [k]

[kiliʔkinĩ de]

kiliʔ-kinĩn-te

[ki de]

ki -te

[ke ɾatildena]

keh-tatilden-ta

[ke ja ʔ n de]

ke ja jn-te

[ka ɾatildena]

kah-tatilde -ta

[ka

ka jn-te

[katilde natildena]

katilden-tatilden-ta

[ko h ɾe]

koh-te

[ko lo ʔko lo n datildeda]

ko lo ʔko lo n-tatilden-ta

Coco da palmeira inajaacute Macaco noturno Ele estaacute caccedilando Caititu Estaacute azedo Formiga Estaacute duro Tesoura

145

Em contexto de fala raacutepida em iniacutecio

de vocaacutebulos a velar preacute-glotal [ʔk]

pode ocorrer pode flutuar tambeacutem como velar plena [k]

Em mesmo contexto pode-se flutuar a velar sonora [g] ou a velar implosiva

[ɠ] ou a velar surda [k] ou a velar

surda preacute-glotalizada [ʔk]

Quando em meio de vocaacutebulo em contexto que envolve a consoante nasal lexical precedente a realizaccedilatildeo de [g] eacute categoacuterica

Entre vogais eacute possiacutevel que se encontre a variaccedilatildeo entre [k] e [g] sendo a surda a preferencial e em maior nuacutemero de realizaccedilotildees

[k n de]

k n-te

[ku n de]

ku n-te

[ʔkolo ɾe] ~ [kolo ɾe]

koloh-te

[ʔka laʔkala ɾe] ~ [ka laʔkala ɾe]

kalaʔkalaʔ-te

[golota taʔnatildena] ~

[kolota taʔ natildena]

kolon-sasan-tatilden-ta

[ gi natildena] ~ [ ɠi natildena]

ki n-tatilden-ta

[giʃaj n datildena] ~ [ɠiʃaj ndatildena] ~

[kiʃaj n datildena]

kisajn-tatilden-ta

[ atildega ɾe]

atilden-kaloh-te

[j ginĩ de]

j n-kinĩn-te

[waka de]

waka-te

Eacute pintado Timboacute do campo Algodatildeo Barata Galinha Estaacute maduro Estaacute coccedilando Estaacute pontudo Roupa

146

Em onset da siacutelaba acentuada em final de vocaacutebulo k pode se realizar [k h]

[lukaj de]

lukajn-te

[nakatilde n de] ~ [naga n de]

nakatilden-te

[ iwgula ɾatilden]

iwkulah-tatilden

[ i ʔga laʔga na ]

iʔka la n-ka-na

[ ɛtduʔ da jowi k h e ]

ajhtu ta-jaw-wi-ka

Pedra de gelo granizo Garccedila Flecha Lagarto Ele subiu Eles estatildeo brincando Pega (o banco) vamos sentar

- Plosiva glotal - anterior

Eacute uma oclusiva glotal surda com

realizaccedilatildeo [ʔ] que se restringe agrave

posiccedilatildeo de coda silaacutebica81

Tem seu comportamento condicionado pela presenccedila das consoantes adjacentes p t k

Pode se realizar como [ʔ] em fala

raacutepida preceder a oclusiva velar surda k

Como [j] quando a vogal nuclear for a meacutedia frontal e ou a baixa a

Como [w] quando a vogal nuclear for a meacutedia posterior o

[huʔ kaʔ datilden] ~ [ kaʔ datilden]

huʔ-kah-tatilden

[kidiʔka tatilden]

kitiʔ-kah-tatilden

[ atilde ʔ tatilden] ~ [ atilde tatilden] ~

[malo h tatildeni]

atilden-loʔ-tatilden

Eacute arco Eacute furador Ele queimou

81

A entre l e s natildeo foi observada na liacutengua Latundecirc

147

E favorecer a deleccedilatildeo de motivando um alongamento que compensa a vogal nuclear ou alongar ainda alongar esta vogal seguindo de leve aspiraccedilatildeo

A realizaccedilatildeo de [ʔ] nas alofonias

acima soacute eacute notada quando na siacutelaba na qual estaacute presente quando apenas a oclusiva estiver no travamento

silaacutebico (CVʔ)

Quando em posiccedilatildeo de coda pode assimilar o ponto da consoante seguinte e se realizar como [t] ou [d] diante de tnl e [p] ou [b] diante de m Neste caso as realizaccedilotildees homorgacircnicas surdas satildeo sempre preferenciais

[wolo te] ~ [woloʔ te]

woloʔ-te

[ej tatilden] ~ [e tatilden]

eʔ-tatilden

[wajkinĩ de]

wajʔ-kinĩn-te

[loʔ tatilden] ~ [ tatilden] ~ [ wtatilden]

loʔ-tatilden

[tidit na jdatilde na ]

tatiʔ-na jn-tatilden-na

[wa jtna de]

wa jh-na n-te

[at natilde da na]

a ʔnatilde n-tatilden-ta

[a p otildedatildena] ~ [a b otildedatildena]

a ʔ n-tatilden-ta

Espeacutecie de paacutessaro Ele ralou Amendoin Ele afogou Eacute raiz de mandioca Palha da palmeira accedilaiacute Ele estaacute chorando muito Ele estaacute muito bonito

h- Fricativa glotal - anterior

Eacute fricativa glotal surda que em iniacutecio de

siacutelaba ocorre com as vogais i e a a

o u

Quando em iniacutecio de palavra e em siacutelaba acentuada seguida de i realiza-

se como [ʒ]

Quando entre vogais realiza-se como

[hu te] ~ [hu h de]

huʔ-te

[hej de]

hejn-te

Arco Buriti

148

fricativa glotal sonora [ɦ]

Se vier em iniacutecio de palavra em fala raacutepida e em raiacutezes dissilaacutebicas na posiccedilatildeo de onset de siacutelaba natildeo acentuada poderaacute ser apagado

Quando em onset de siacutelaba acentuada acompanhada de consoante nasal assimila a nasalidade da consoante

adjacente sendo realizada como [n ]

Em final de siacutelaba eacute produzido com pouca fricccedilatildeo Em coda acentuada motiva o alongamento da vogal com frequecircncia como resultado teremos uma vogal com leve aspiraccedilatildeo

Demais realizaccedilotildees de h em coda tendem a seguir o comportamento da

oclusiva glotal ʔ

[hata tatilden]

hat-ta-tatilden]

[ha de]

ha n-te

[hoɦo h de]

hohoʔ-te

[hi ɾ e] ~ [ʒi ɾe]

hih-te

[hiwa n de] ~ [iwa n de]

hiwan-te

[ e ĩ n de] ~ [e ĩ n de]

e ĩ n-te

[ɛ hejdn a ]

ajhhejn-ha

[o h datildeda]

o hna-tatilden-ta

[ lo h tatilde na ]

loh-tatilden-na

[ʃi h ɾe]

sih- te

[ke h atilden] ~ [ke atilden]

Eu natildeo tenho Caraacute Espeacutecie de coruja Pau lenha Gambaacute Couro Vamos lavar (algo) Estaacute alto Eacute onccedila

149

keh-tatilden

[nakadʔnatilde na ]

naka natilde n-na

[ka ɾatilden]

kah-tatilden

[naw ɾe] ~ [nͻ e]

na wh-te

[wede e] ~ [wede ʔ ɾe]

wate h-te

[sej ɾatilde]

sih-tatilden

Casa Ele caccedilou Ela ainda estaacute chorando Estaacute azedo Lontra Espeacutecie de tamanduaacute Eacute largo

Quadro 13 Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos orais (Com base em Telles 2002)

i - vogal alta frontal e i - vogal alta

frontal laringal

Realiza-se como [i] e [i ] podem ser

nuacutecleo de siacutelaba e podem tambeacutem iniciam palavras

i segue qualquer consoante enquanto

i ocorre apenas apoacutes as consoantes

m k h

Quando a coda eacute apagada realiza-se como [i] compensando tal apagamento

[ iɾatilden]

i-tatilden

[i n datildenʌ]

i n-tatilden-ta

[giw lada ɾe] ~ [gi la de]

kiwlah-tah-te

Ele mordeu Estaacute quente Cobra cascavel espeacutecie de cobra

150

e - vogal meacutedia frontal e e - vogal

meacutedia frontal laringal

Realizam-se como [e] e [e ] e correm em

iniacutecio de palavras

Quando seguem consoantes natildeo se realizam apoacutes pmn

Tambeacutem natildeo foram detectadas diante de s l h

Ao serem seguidos pelo glide palatal j favorecem a fusatildeo entre as vogais e o

glide realizando-se como [i] e [i ]

O alongamento tambeacutem se daacute em casos de queda de coda

Em siacutelaba aacutetona de morfemas dissiacutelabos poderaacute ocorrer harmonizaccedilatildeo entre a vogal meacutedia frontal e a vogal tocircnica mais alta da siacutelaba seguinte

Pode ocorrer harmonizaccedilatildeo entre a vogal da raiz lexical e a vogal do sufixo classificatoacuterio

[e ɾatilden]

e-tatilden

[ etatilden]

e ʔ-tatilden

[ sejtatilden] ~ [sitatilden]

set-tatilden

[ weʔkinĩde] ~ [ wiʔkinĩde]

wet-kinĩn-te

[kenĩ de] ~ [kinĩ de]

kanĩn-te

Ele viu Ele fez fogo Ele falou Crianccedila Esquilo

a - vogal baixa central e a - vogal

baixa central laringal

A vogal baixa central a apresenta larga distribuiccedilatildeo e segue qualquer consoante e os dois glides

A vogal baixa central laringal segue quase todas as consoante e dos dois glides

Ambas iniciam palavras e apresentam

vaacuterias alofonias [a] [ʌ] [ͻ] [o] [u] [e]

[ɛ] [aelig] e [i] que podem ser ou natildeo

laringais dependendo da vogal subjacente e da condiccedilatildeo do tom e da harmonia vocaacutelica

Quando em siacutelaba tocircnica a se realiza como [a] [ͻ] e [ͻ]

[ͻ] pode ocorrer quando o nuacutecleo vocaacutelico a assimila o traccedilo labial da coda tautossilaacutebica de w

A segunda variaccedilatildeo [ͻ] resulta da fusatildeo

[a h ɾe]

ah-te

[awde] ~ [ͻ de] ~ [ͻʔ de]

awh-te

[ a wde] ~ [ ͻde] ~ [ ͻʔde]

a w-te

[a wm de] ~ [ ͻ m de] ~ [ͻ m de]

a wn-te

Espeacutecie de abelha Gaviatildeo Flecha Louro

151

entre o nuacutecleo a e a coda w

O alongamento da vogal nuclear ou da coda eacute necessaacuterio agrave preservaccedilatildeo do peso silaacutebico para a aposiccedilatildeo do acento

Em siacutelaba tocircnica se a a eacute seguida por j na coda (nuacutecleo do ditongo) pode se

realizar como [a] [ɛ] [ɛ] e [aelig]

Em siacutelaba aacutetona a realiza-se como [ʌ] preferencialmente

Quanto em posiccedilatildeo aacutetona a se harmoniza com a vogal tocircnica da siacutelaba seguinte quando esta for meacutedia ou alta

As realizaccedilotildees provenientes dessa harmonia vocaacutelica satildeo as vogais [ieou]

O processo de assimilaccedilatildeo pode ocorrer em iniacutecio de siacutelaba aacutetona fazendo com que a se realize como [ͻ] a partir de segmento adjacente seja tautossilaacutebico ou natildeo

[ ajɾatildena] ~ [ ɛatildena]

ajh-tatilden-ta

[a j ɾatilden] ~ [aelig ɾatilden] ~ [ɛ ɾatilden]

a jh-tatilden

[ a j atilde m datilden] ~ [ aelig ʔatildem datilden]

a jn atilde wn-tatilden

[ͻ ɾaʔͻɾaʔi datildenʌ] ~

[ͻ ɾɛʔͻɾɛʔi datildenʌ]

watajwatajn-tatilden-ta

[wͻdaʔ nde] ~ [wadaʔ nde]

watan-te

[i n dacircnʌ]

i n-tatilden-ta

[tʌlawm natildenʌ]

talawn-tatilden-ta

[kimi ɾatildena] ~ [kͻmi ɾatildena]

kamih-tatilden-ta

[walin de] ~ [weli de]

walin-te

[tʌlow natildena] ~ [tolow natildenʌ]

talown-tatilden-ta

[tunu ratildeni]

tanũh-tatilden

Eacute roccedila Ele foi Ele assou peixe Eacute fino Panela Estaacute quente Estaacute grosso Estaccedilatildeo seca Tamanduaacute

152

Devido agrave labializaccedilatildeo de a a realizaccedilatildeo resultante sofre assimilaccedilatildeo de palatalizaccedilatildeo altura de glide precedente ou se funde quando o glide eacute tautossilaacutebico e ocupa onset de siacutelaba em que a eacute a vogal nuclear

[kʌmaʔ matilde n de] ~

[kͻmaʔ matilde n de]

kama-matilden-te

[ͻ ɾaʔͻɾaʔĩ datildenʌ] ~

[ͻ ɾɛʔͻɾɛʔĩ datildenʌ]

watajwatajn-tatilden-ta

[wada n de] ~ [wͻda n de]

watan-te

[jeda n de] ~ [ʒida n de] ~

[ida n de]

Estaacute terminado Ele deu Borboleta Eacute fino Panela cabaccedila Espeacutecie de veado

o - vogal meacutedia fechada posterior e

o - vogal meacutedia fechada laringal

Realizam-se [o] e [o ] respectivamente

Natildeo se realizam apoacutes as consoantes nasais mn

o soacute foi realizada apoacutes as consoantes

t l k

Ambas podem ser realizadas em iniacutecio de vocaacutebulo

As realizaccedilotildees [o] e [o ] satildeo resultados

do alongamento compensatoacuterio que provem da delaccedilatildeo de coda

[o ɾatilden]

oh-tatilden

[o te]

o h-te

[ko n de] ~ [kow n de]

kon-te

Ele misturou massa Macuco Espeacutecie Jabuti

u - vogal alta posterior e u - vogal

alta posterior laringal

Apresentam larga frequecircncia nas realizaccedilotildees

u segue qualquer consoante

[ke ju ɾe]

kejuh-te

Macaco da noite

153

u ocorre apoacutes m n s k j

Ambas iniciam palavras

As realizaccedilotildees alongadas [u] e [u ] satildeo

provenientes de alongamento compensatoacuterio quando a coda eacute elidida

[ku n datildenʌ] ~ [ku datildenʌ]

ku n-tatilden-ta

Ele estaacute fumando

Quadro 14 Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos nasais (Com base em Telles 2002)

ĩ - vogal nasal alta anterior

Sua ocorrecircncia soacute fora verificada a partir do comportamento do morfema ĩ- que eacute uma raiz lexical semanticamente vazia prefixada a morfemas classificadores nominais para funcionar como nuacutecleo nominal

A subjacecircncia de ĩ- sem coda nasal pode ser evidenciada na sonorizaccedilatildeo opcional da oclusiva velar k e no natildeo alongamento da vogal ĩ

[ ĩkalo ɾe] ~ [ ĩgaloɾe]

ĩ-kaloh-te

Taacutebua

atilde - vogal nasal baixa

Eacute encontrada a partir do condicionamento morfoloacutegico no prefixo verbal atildel-

Este prefixo tem valor causativo resultativo

Quanto agrave subjacecircncia de atilde pode-se interpretar que a realizaccedilatildeo do morfema agentivo [atildel- atilde-] estaacute condicionada ao segmento inicial da raiz lexical a qual o prefixo se apotildee

[atildelͻwtatildenʌ] ~ [ a lͻtatildenʌ]

atildel-awt-tatilden-ta

[atilde laj n datildenʌ] ~ [a laj n datildenʌ]

atildel-ajn-tatilden-ta

[atildelo tatildenʌ] ~ [alo tatildenʌ]

atildel-loʔ-tatilden-ta

[atildemũmaj na ]

atildel-mumaʔ-na

[ũba tatildenʌ] ~ [atildeba tatildenʌ]

atildel-pat-tatilden-ta

[ natildej de] ~ [ naj n de]

natildejn-te

Estaacute foi quebrado (algo) Estaacute foi cortado (algo) Estaacute foi afundado (algo) Estaacute foi amansado (algo) Estaacute foi colocado (algo)

154

Quando a raiz verbal eacute iniciada por vogal a forma sobrejacente eacute [atilde-] quando a raiz verbal eacute iniciada por vogal a forma sobrejacente eacute [atildel-]

Outra forma de ocorrecircncia da vogal atilde eacute confirmada na base do contraste entre os ditongos orais aj aw e nasais atildej atildewmesmo quando seguidos por coda nasal formando as sequecircncias ajn awn atildejn atildewn

[ aj n datildeni] ~ [ aj n datildeni]

ajn-tatilden

[jatildewm de] ~ [jatildemde]

jatildewn-te

[wawm datildena] ~ [wͻwm datildena]

wawn-tatilden-ta

Pacu espeacutecie de peixe Ele cortou (algo) Espeacutecie de larva Estaacute vermelho amarelo

ũ - vogal nasal alta posterior

Observada a partir da construccedilatildeo interna e comportamento do morfema prefixal nũh - possessivo de 1pp e de seu homoacutefono nũh - verbo adjetival estar soacute

Quanto agrave subjacecircncia de u eacute observada quando a coda fricativa glotal eacute ressilibificada ao se afixar agrave raiz iniciada por vogal ou glide

[ nũhju te]

nũh-ju -te

[ nũhaj ɾatilden]

[nũhajh-oslash-tatilden

Nossos peacutes Ele vai sozinho

54 FONOLOGIA DO PORTUGUEcircS

Diferentemente do Latundecirc o sistema fonoloacutegico do portuguecircs eacute formado

conforme Cacircmara Jr (1970 p33 ndash 34) por sete vogais que se mantecircm na

mesma quantidade em posiccedilatildeo tocircnica que satildeo reduzidas a cinco quando em

posiccedilatildeo tocircnica diante de nasal em posiccedilatildeo pretocircnica em posiccedilatildeo postocircnica natildeo-

final e em postocircnica final

Quadro 15 Vogais no Portuguecircs (Cacircmara Jr 1970)

Natildeo-arredondadas Arredondadas

Altas i u

Meacutedias Altas e o 2ordm Grau

155

Meacutedias Baixas ɛ ɔ 1ordm Grau

Baixa a

Anterior Central Posterior

Quanto aos segmentos consonantais o portuguecircs dispotildee de acordo com Lopez

1979 p5482 de vinte e dois fonemas que ocupam as posiccedilotildees de onset e coda

Os segmentos consonantais satildeo classificados quanto ao modo e ao ponto de

articulaccedilatildeo

Os segmentos consonantais do portuguecircs ainda podem ser influenciados por

articulaccedilotildees secundaacuterias labializaccedilatildeo palatalizaccedilatildeo velarizaccedilatildeo e dentalizaccedilatildeo

Quadro 16 Consoantes no Portuguecircs (Silva 2002)

Articulaccedilatildeo

Bilabial Labiodental Dental ou alveolar

Alveopalatal Palatal Velar Glotal

Oclusiva p b t d k g Africada tʃ dʒ

Fricativa f v s z ʃ ʒ X Ɣ h ɦ

Nasal m n ɲ y

Tepe ɾ

Vibrante ř

Retroflexa ɹ

Lateral l ɫ ʎ l j

82

Apud Bisol 1996 p198

156

55 COMPARACcedilAtildeO ENTRE OS SISTEMAS FONEacuteTICOS DO PORTUGUEcircS E

DO LATUNDEcirc

Passemos entatildeo agrave comparaccedilatildeo ds sistemas fonoloacutegicos do Portuguecircs e do

Latundecirc para melhor compreensatildeo dos processos foneacuteticos oriundos desse

contato

Quadro 17 Sistemas consonantais x Sistemas vocaacutelicos

Consoantes Vogais

Portuguecircs p b m w t d s z l j n f v ɾ k g h ɹ ɲ ʎ X a ɛ e i ɔ o u

Latundecirc p m w t s l j n k h a atilde a a e e i i i i o o u u u u

Como podemos perceber as liacutenguas apresentam padrotildees distintos no que tange

agrave quantidade de segmentos consonantais e de segmentos vocaacutelicos O portuguecircs

eacute uma liacutengua com mais consoantes enquanto o Latundecirc eacute uma liacutengua

extremamente vocaacutelica

No que tange aos fonemas consonantais o Latundecirc natildeo apresenta muitos dos

fonemas vozeados que compotildeem os pares miacutenimos aleacutem das labiodentais [f v]

Tambeacutem natildeo apresenta as fricativas alvopalatais [ʃ ʒ] nem as palatais nasal e

lateral [ɲ ʎ]

O portuguecircs natildeo dispotildee de vogais laringais enquanto o Latundecirc tem o seu

inventaacuterio basicamente composto por elas

157

A disposiccedilatildeo e presenccedila desses elementos tecircm uma ligaccedilatildeo direta com os

processos fonoloacutegicos ocorrentes o portuguecircs resultante do contato do Portuguecircs

com o Latundecirc como veremos no capiacutetulo VI

158

6 PROCESSOS FONOLOacuteGICOS NO PORTUGUEcircS FALADO PELOS LATUNDEcirc

ldquoComo a liacutengua estaacute a todo momento se equilibrando entre

tendecircncias potencialmente conflitantes e ateacute mesmo opostas estaacute sujeita a sofrer mudanccedilas pois esse equiliacutebrio pode vir a ser alterado por qualquer tipo de fator interno ou

externordquo Chagas (2004 p 151)

61 INTRODUCcedilAtildeO

Eacute senso comum entre os estudiosos que as liacutenguas mudam em diversos

aspectos Certamente a variaccedilatildeo e a mudanccedila lhes satildeo inerentes conforme

Cezario amp Votre (2008 p 141)

Em face da mudanccedila a assertiva acima abarca um conjunto de motivaccedilotildees

internas a uma dada liacutengua bem como outras decorrentes de forccedilas externas em

que se inserem aquelas oriundas do contato linguiacutestico Isso nos chama a

atenccedilatildeo para o fato de que aleacutem do fator tempo outros aspectos podem estar

diretamente ligados agraves transformaccedilotildees pelas quais uma liacutengua passa

A forma como as mudanccedilas sonoras operam na liacutengua eacute tema de discussatildeo haacute

seacuteculos Sobre essa temaacutetica Labov (1981 p269) nos diz que

Sound change appears to be systematic in that a particular change affects all eligible words in a lexicon (McMahon 1994) It is not known however how this process takes place A group of 19th century German linguists called the Neogrammarians originally proposed that sound change occurs abruptly across the lexicon This view is still accepted by many linguists (eg Hock 1991 Labov 1994) In contrast others have argued that sound change spreads gradually across the lexicon (eg Chen amp Wang 1975 Krishnamurti 1978) The same language data is sometimes used to support each hypothesis For instance the

159

English Great Vowel Shift which brought about a series of vowel changes in Early Modern English is used as an example of gradual change (Ogura 1987 Aitchison 1991) as well as abrupt change (Hock 1991 Labov 1994) So the argument over whether sound change occurs abruptly or gradually presents a paradox ldquoboth (views) are right but both cannot be right 269)rdquo

A discussatildeo acerca da natureza da mudanccedila sonora no sentido das duas visotildees

pontuadas acima ainda alcanccedila uma dimensatildeo mais larga quando o contato

intersocietaacuterio eacute considerado As implicaccedilotildees que a variaccedilatildeo assume quando a

emergecircncia das escolhas linguiacutesticas envolve o impacto das interaccedilotildees entre

liacutenguas satildeo multifatoriais Devido agrave complexidade das transformaccedilotildees linguiacutesticas

natildeo podemos estabelecer um uacutenico molde para explicar estas modificaccedilotildees haja

vista que cada caso eacute particular quando tratamos de mudanccedila linguiacutestica

Como fora tratado no capiacutetulo sobre Contato linguiacutestico o encontro de duas ou

mais liacutenguas pode resultar ou natildeo em outras liacutenguas O niacutevel de interferecircncia

oriundo do contato pode fazer com que uma das liacutenguas desapareccedila o que

ocasionaria a sua morte e geralmente neste caso sobreviveria a liacutengua do

dominador ou a permanecircncia dos dois coacutedigos linguiacutesticos tal qual ocorre entre

os Latundecirc

A complexidade da fusatildeo de duas liacutenguas desencadeia por si soacute uma seacuterie de

processos que perpassa os diferentes niacuteveis da gramaacutetica No entanto eacute no niacutevel

foneacutetico fonoloacutegico que estes processos satildeo provavelmente mais evidentes e

mais frutiacuteferos Sendo assim podemos afirmar que os niacuteveis foneacuteticos e

fonoloacutegicos apresentam o maior iacutendice de mudanccedila e variaccedilatildeo de uma liacutengua Por

outro lado de acordo com Cavaliere (2005 p 56)

160

Os estudos desses processos nos auxiliam enquanto estudiosos da liacutengua a entender como se comporta a mudanccedila da liacutengua mediante verificaccedilatildeo dos fatos ocorridos no passado que se mantecircm no presente bem como os que natildeo mais se manifestam as mudanccedilas dos sons nos usos hodiernos

A anaacutelise realizada dos processos fonoloacutegicos do Portuguecircs falado pelos Latundecirc

teraacute como base a estrutura silaacutebica do Portuguecircs e do Latundecirc Para a anaacutelise

consideramos uacutetil adotar a classificaccedilatildeo tradicional dos processos focircnicos

encontrados na linguiacutestica histoacuterica (HOCK1991) por nomear em detalhe os

variados tipos de processos observados Aleacutem disso nos pautamos nos trabalhos

de Spencer (1996) e Lass (2000) que associam reflexotildees mais abstratas para

explicar as ocorrecircncias encontradas Esclarecemos que natildeo eacute nosso propoacutesito

realizar uma anaacutelise fonoloacutegica per si Neste trabalho partimos da descriccedilatildeo dos

processos fonoloacutegicos operantes a fim de refletir sobre o resultado do contato

linguiacutestico de uma liacutengua minoritaacuteria (o Latundecirc) com uma liacutengua

sociohistoricamente dominante o portuguecircs e avaliar o papel da marcaccedilatildeo

linguiacutestica no contexto da interferecircncia Os dados como jaacute afirmamos fazem

parte do acervo do NEI (Nuacutecleo de Estudos Indigenistas) da UFPE

Para uma melhor compreensatildeo a anaacutelise dos fenocircmenos observados segue

distribuiacuteda em quatro subgrupos que evolvem os processos foneacutetico-fonoloacutegicos

observados i) perda de elementos ii) ganho iii) alteraccedilatildeo (transposiccedilatildeo ou

permuta) que estatildeo diretamente ligados aos processos fonoloacutegicos de

assimilaccedilatildeo (progressiva e regressiva) fortalecimento leniccedilatildeo apagamento

inserccedilatildeo e coalescecircncia A classificaccedilatildeo desses processos nos remete agrave

termonoligia claacutessica da linguiacutestica de base

161

611 Perda de elementos

Seguindo a tendecircncia das liacutenguas do mundo os processos que envolvem perda

de elementos tambeacutem satildeo os mais recorrentes no portuguecircs falado pelos

Latundecirc Dessa feita estes processos satildeo os que tecircm uma relaccedilatildeo direta com a

estrutura silaacutebica do Portuguecircs que se vecirc obrigada a rearranjar os componentes

da siacutelaba para o padratildeo (CV)

Quanto agrave marcaccedilatildeo o portuguecircs assimilado pelos Latundecirc nem sempre tende a

preservar os padrotildees mais marcados de sua liacutengua conforme descriccedilatildeo nos

processos que se seguem

6111 Monotongaccedilatildeo

Assim como no Portuguecircs a monotongaccedilatildeo eacute um processo natural e bastante

atuante no Latundecirc que eacute uma liacutengua propensa a tal fenocircmeno Eacute uma tendecircncia

geral observada na produccedilatildeo da fala da comunidade Latundecirc verifica-se que os

ditongos crescentes e decrescentes estatildeo sendo frequentemente fusionados

realizando-se como monotongos (TELLES 2002 p100 - 102)

Quanto aos ditongos crescentes Telles (idem p 103) afirma que a tendecircncia ao

processo de monotongaccedilatildeo em ditongos crescentes eacute quase categoacuterica nas

siacutelabas aacutetonas de raiacutezes dissilaacutebicas quando a vogal nuclear eacute a central baixa a

Outros aspectos observados pela autora que fazem menccedilatildeo agrave monotongaccedilatildeo

apontam que a geraccedilatildeo poacutes-contato realizam sistematicamente e com frequecircncia

162

a fusatildeo entre os ditongos decrescentes Os ditongos aw a w aj a j satildeo os que

mais regularmente sofrem processo dos quais decorrem as realizaccedilotildees meacutedias

baixas [ɔ ɔ ɛ ɛ ] que natildeo fazem parte do inventaacuterio fonoloacutegico das vogais do

Latundecirc

Os ditongos iw ow que ocorrem em menor frequecircncia satildeo mais marcados

Nestes a monotongaccedilatildeo se daacute com a preservaccedilatildeo da vogal do nuacutecleo i o O

ditongo e j apresenta pouquiacutessimos casos de fusatildeo mantendo a qualidade do

glide diferentemente dos demais ditongos que satildeo constituiacutedos por vogais natildeo

baixas Sua realizaccedilatildeo seraacute a vogal alta anterior [i]

Apresentamos abaixo os dados apresentados por Telles (idem 101) onde os

resultados foneacuteticos do processo de monotongaccedilatildeo satildeo mais frequentes

Quadro 18 Resultado mais frequente do processo de monotongaccedilatildeo em Latundecirc

Em tritongos a fusatildeo eacute mais frequente quando o glide labial w preenche a

posiccedilatildeo da coda diferentemente da palatal j que pouco se fusiona Nos dois

casos a fusatildeo se daacute apenas com o apagamento do glide poacutes-nuclear

aw gt ɔ [lsquoɔɾe] rsquoawh-lsquote Gaviatildeo

a w gt ɔ [ɔ rsquode] a w-lsquote Fleche

aj gt ɛ [ɛrsquoɾatildena] ajh-lsquotatilden-ta eacute roccedila

aj gt ɛ [ɛ rsquoɾatildena] rsquoa jh-lsquotatilden-ta ele tem andado

iw gt i [lsquogilade] rsquokiwlah-lsquote cobra cascavel

ow gt o [torsquolodatildena] tarsquolown-lsquotatilden-ta ele tem terminado

163

No que se refere ao comportamento de ditongos decrescentes diante de

consoante nasal tautossilaacutebica podem ocorrer diferentes manifestaccedilotildees de

superfiacutecie a depender do ponto do glide Se os ditongos decrescentes terminarem

com glide laacutebio-dorsal w e seguidos por elemento nasal tautossilaacutebico awn a wn

atildewn own apagaratildeo o glide da coda e a vogal nuclear preservaraacute o ponto de

articulaccedilatildeo

Caso o ditongo seja oral a realizaccedilatildeo preferencial seraacute a da manutenccedilatildeo do

ditongo com o glide ocorrendo na superfiacutecie Se o ditongo for nasal o glide pode

ser nasalizado regressivamente Todavia a realizaccedilatildeo preferencial seraacute o glide

Em preferecircncia o glide j eacute mantido conservando sua palatalidade em ditongos

decrescentes que terminam com o glide j constituindo os ditongos ajn a jn atildejn

jn

Os glides wj na posiccedilatildeo de onset podem ser consonantizados O glide j natildeo se

apresenta como fator motivador para este processo Nos poucos casos

apresentados a vogal nuclear eacute a anterior e ou a central a

De acordo com a literatura existente para o Portuguecircs a monotongaccedilatildeo se aplica

a todos os ditongos Entretanto alguns contextos licenciam o processo enquanto

outros o bloqueiam No portuguecircs falado pelos Latundecirc os ditongos decrescentes

orais83 assim como no portuguecircs de longe foram os mais monotongados Aleacutem

destes o ditongo nasal decrescente [atildew] tanto em final de verbos quanto de

nomes mostrou-se recorrente na reduccedilatildeo

83

[aj][ aw] [ej] [ew] [ow] [oj]

164

Enquanto processo natural a monotongaccedilatildeo no portuguecircs falado por Latundecirc

visa simplificar os padrotildees silaacutebicos mais marcados sobretudo na posiccedilatildeo final de

vocaacutebulos jaacute que no Latundecirc natildeo haacute a ocorrecircncia deles

Esclarecemos que os processos observados na fala dos Latundecirc que tambeacutem

ocorrem no portuguecircs atual natildeo foram incluiacutedos nos dados discutidos neste

capiacutetulo ressalvando-se situaccedilotildees nas quais eram necessaacuterios agraves nossas

reflexotildees

De acordo com os exemplos

acima o processo de

monotongaccedilatildeo pode se dar de

duas formas i) apagamento

de um segmento geralmente

o glide ii) fusatildeo de elementos

Os ditongos mais propensos agrave

monotongaccedilatildeo satildeo os

decrescentes Quanto agraves classes de palavras os ditongos presentes nas formas

verbais satildeo mais frequentemente monotongados

No portuguecircs o processo de monotogaccedilatildeo eacute operante porem haacute restriccedilotildees que

natildeo coincidem com o observado na fala dos Latundecirc Bisol (2001 p 112) afirma

(1) [keme] queimei (2) [satildersquogɾaɾi] sangraram

[firsquokaɾi]

ficaram

(3) [fakotilde] facatildeo [motilde] matildeo [koɾasotilde] coraccedilatildeo

[gɾatildedotilde] grandatildeo

[tubaɾotilde]

tubaratildeo

(4) [kaze]

causa

(5) [note]

noite

(6) [lsquotaba] taacutebua (7) lsquomatildeoslash matildersquodava matildee mandava

165

que apenas os ditongos decrescentes satildeo verdadeiros Os crescentes de acordo

com ela seriam falsos pois podem ser realizados como hiato e tecircm variaccedilatildeo livre

Aleacutem disso com respeito aos ditongos decrescentes a autora ainda considera

que haacute dois diferentes tipos de ditongos um considerado pesado que natildeo sofre

reduccedilatildeo (leite) e outro leve passiacutevel de reduccedilatildeo (couro) Ela elenca alguns

ambientes que condicionam a monotongaccedilatildeo como a presenccedila da tepe ou da

palatal em posiccedilatildeo seguinte

Entretanto os dados de (1) a (7) acima nos mostram ocorrecircncias da

monotongaccedilatildeo em contextos muito distintos do que ocorre em Portuguecircs Sobre

estes avaliamos sua ocorrecircncia como segue

Quando em final de vocaacutebulos principalmente nas formas verbais do passado

simples conforme visto em (2) o que ocorre natildeo eacute um fenocircmeno de

monotongaccedilatildeo em que se espera o apagamento de um dos segmentos ou a

fusatildeo dos formadores do ditongo Nos dados em (2) entretanto encontra-se a

substituiccedilatildeo do ditongo por um segmento que articulatoriamente natildeo deriva da

estrutura lexical A vogal anterior com traccedilo de ponto coronal84 realizada em

[firsquokaɾi] ldquoficaramrdquo [satildersquogɾaɾi] ldquosangraramrdquo ocorre em posiccedilatildeo aacutetona final Essa

realizaccedilatildeo pode ser decorrente do espraiamento da coronalidade da consoante

precedente Outros aspectos de relevo para explicar esse fenocircmeno satildeo a

posiccedilatildeo final dos segmentos e a atonicidade Esses condicionantes favorecem a

substituiccedilatildeo total do ditongo nasal para a vogal anterior alta Essa produccedilatildeo eacute

84

Assumimos largamente neste trabalho a terminologia da fonologia claacutessica estrutural (GLEASON 1969) Entretanto termos mais teacutecnicos provenientes da teoria dos traccedilos distintivos (JAKOBSON 1952 CHOMSKY e HALE 1968) satildeo introduzidos quando favorecem a elucidaccedilatildeo dos fatos Da mesma forma ocasionalmente nos referimos a processos ancorados na fonologia poacutes-gerativa (CLEMENTS e HUME 1995)

166

restrita agrave fala dos indiacutegenas da geraccedilatildeo preacute-contato que adquiriram o portuguecircs

pelo menos no iniacutecio da idade adulta

A relevacircncia da tonicidade tambeacutem se evidencia nos dados em (3) Nesses casos

([fakotilde] ldquo facatildeordquo [lsquomotilde] ldquomatildeordquo [koɾasotilde] ldquocoraccedilatildeordquo) apesar de o ditongo nasal atildew

sofrer a fusatildeo passando a ser realizado [otilde] a posiccedilatildeo do acento preserva a

identidade de parte da estrutura nasalizaccedilatildeo e posteriorizaccedilatildeo com

arredondamento A tendecircncia aacute preservaccedilatildeo da estrutura tambeacutem eacute encontrada

no dado em (1) A monotongaccedilatildeo na siacutelaba tocircnica preserva a qualidade da vogal

nuclear em [kersquome] ldquoqueimeirdquo

O Latundecirc evita coda Esse comportamento se alinha agrave ideia de que The CV

syllable is a prototypical example widely considered to be the universally

unmarked syllable type (HUME 2004)

A monotongaccedilatildeo do ditongo nasal atildej em matildej gt matilde natildeo eacute encontrado

regularmente na fala latundecirc Esse fenocircmeno deve ter sido engatilhado pela

juntura externa na qual se observa que a siacutelaba da palavra seguinte conteacutem

sequecircncia focircnica semelhante agrave da siacutelaba que sofreu supressatildeo da semivogal

Um mesmo ditongo pode ou natildeo apresentar diferentes realizaccedilotildees em cada

liacutenguas Por exemplo os ditongos aw atildew aj atildej que existem tanto no Latundecirc

quanto no Portuguecircs se comportam da seguinte forma

Quadro 19 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Latundecirc

aw ɔ [lsquoɔɾe] ˈawh-te lsquogaviatildeorsquo

atildew atildew ~ AM [ˈjatildewmde] ~ [ˈjatildemde] ˈjatildewm-te lsquolarvarsquo

aj ɛ [єrsquoɾatildena] ˈajh-ˈtatilden-ta lsquoeacute roccedilarsquo

atildej atildej ~ atildej [ˌatildejˈdatildeni] ~ [atildejndatildeni] ˈatildejn-tatilden lsquoele cortoursquo

167

Quadro 20 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Latundecirc

aw aw [lsquopaw] pau lsquopaursquo atildew otilde [ˈsotilde] satildew lsquosatildeorsquo atildew i [satildeˈgɾaɾi] sangɾaɾatildew lsquosangraratildeorsquo

atildej atildej [ˈmatildej] matildej lsquomatildeersquo

aj aj [ˈpaj] pai lsquopairsquo

Os ditongos aw em posiccedilatildeo do acento resultam nas vogais meacutedias baixas ɔ e

ɛ no proacuteprio Latundecirc mesmo sendo essas vogais mais marcadas e natildeo

fonoloacutegicas na liacutengua Entretanto no portuguecircs esses ditongos natildeo sofrem

processo de fusatildeo quando ocorrem em siacutelaba tocircnica

A uacutenica vogal nasal constatada na reduccedilatildeo do ditongo eacute [otilde] resultante do ditongo

decrescente nasal atildew Neste caso eacute proacutepria vogal nasal que favorece a vogal

resultante da fusatildeo

Diferentemente do Portuguecircs em Latundecirc os ditongos natildeo se realizam em fim de

vocaacutebulos Desta forma o Portuguecircs falado por Latundecirc tende a seguir o que eacute

posto no Portuguecircs utilizando as vogais menos marcadas [satildegɾaɾɪ] ~ sangraram

[desaɾƱ] ~ deixaram

O que podemos verificar quanto agrave monotongaccedilatildeo eacute que em termos gerais o

Latundecirc natildeo transfere os traccedilos e caracteriacutesticas mais marcadas na liacutengua para o

Portuguecircs falado por eles

168

6112 Siacutencope em onset complexo de l e ɾ

A reduccedilatildeo do onset complexo em Portuguecircs falado pelos Latundecirc eacute um processo

muito comum que se daacute devido a natildeo aceitaccedilatildeo de um segundo elemento no

onset Como podemos observar eacute um processo variante que estaacute atrelado agrave

reorganizaccedilatildeo da siacutelaba e que eacute passiacutevel de sistematicidade

De acordo com Telles (2002 p105) a estrutura silaacutebica do Latundecirc permite a

composiccedilatildeo de seis padrotildees V VC VCC CV CVC CVCC que se

incluem na extensatildeo (C)V(C)(C) que podem ser representados de acordo com

estrutura silaacutebica descrita abaixo

Figura 17 Estrutura silaacutebica do Latundecirc

Os elementos que se encontram entre parecircnteses satildeo opcionais Em Latundecirc as

sequecircncias CV V VC CVC VCC e CVCC ocorrem com frequecircncia

169

sendo os dois primeiros padrotildees os mais frequentes Isso nos mostra o quanto o

Latundecirc evita onsets complexos e codas

A estrutura silaacutebica do portuguecircs de acordo com Mattoso Cacircmara (1969) define

o molde silaacutebico CCVCC conforme figura abaixo

Figura 18 Estrutura silaacutebica do Latundecirc (Cacircmara-Juacutenior)

Seguindo a proposta de Mattoso Cacircmara com respeito agrave distribuiccedilatildeo interna dos

constituintes da siacutelaba as uacutenicas consoantes que preenchem a segunda posiccedilatildeo

do onset satildeo as liacutequidas l e ɾ A coda pode ser preenchida pelas consoantes l

e pelos arquifonemas R S N

No Latundecirc o grupo consonantal no onset natildeo eacute fonoloacutegico Entretanto eacute

atestada a ocorrecircncia dos [tɾ dɾ kɾ gɾ] no plano foneacutetico como resultado da

reduccedilatildeo em siacutelaba pretocircnica de sufixo nominal e verbal A formaccedilatildeo de onset

complexo eacute estrutura marcada no Latundecirc como tambeacutem interlinguisticamente

A estrutura mais complexa e menos frequente (marcada) do encontro consonantal

no onset tende a ser simplificada no portuguecircs falado pelos Latundecirc Como

170

podemos observar em (8) e (9) os grupos consonantais satildeo pronunciados como

um soacute elemento Trata-se do apagamento da tepe e da lateral liacutequida Eacute um

processo em acomodaccedilatildeo que estaacute diretamente ligado agrave faixa etaacuteria dos falantes

Assim os mais novos seguem a tendecircncia de pronunciar o onset complexo

diferentemente dos mais velhos

(8) [bi ka nƱ] brincando

[de tƱ] dentro

[kɛbapƱ] quebraram

[otƱ] outro

(9) [buza] blusa [biciketɪ] bicicleta Embora a reduccedilatildeo do onset complexo seja um fenocircmeno variaacutevel para algumas

variedades do portuguecircs as realizaccedilotildees acima natildeo correspondem agrave fala de

adultos sendo resultantes no processo da aquisiccedilatildeo da liacutengua

Jaacute entre os Latundecirc satildeo os mais velhos que apresentam a realizaccedilatildeo do onset

simplificado como um fenocircmeno variaacutevel conforme observamos em (10)

(10) [b ɾ ĩkarƱ] brincaram [sotildebrasotilde] assombraccedilatildeo [pɾimeɾɪ] primeiro

[febrƱ] febre [fɾɛsa] flecha

O rotacismo (l gt ɾ) da lateral presente em lsquoflecharsquo acima que eacute muito frequente

no portuguecircs menos escolarizado tambeacutem ocorre na fala dos indiacutegenas

171

6113 Apagamento da coda

Em portuguecircs quatro elementos podem ocupar a posiccedilatildeo de coda RSlN aleacutem

dos glides wj85 Em Latundecirc a coda pode ser ramificada e satildeo seis os

segmentos que podem preencher o espaccedilo da coda os glides w j aleacutem das

consoantes t h n Ɂ Como a coda pode ter ateacute duas posiccedilotildees preenchidas os

primeiros elementos satildeo sempre neste caso os glides w j Embora a coda da

siacutelaba fonoloacutegica possa ser preenchida pelas consoantes acima o Latundecirc eacute uma

liacutengua que evita coda na superfiacutecie O fenocircmeno que decorre dessa tendecircncia eacute o

alongamento compensatoacuterio (Clements e Hume 1995)

(11) [ˌn ˈh te]

ˈn h-ˈ Ɂ -te

lsquonossos peacutesrsquo

No dado acima podemos observar a natildeo realizaccedilatildeo da coda fricativa glotal h na

marca de posse ˈnu h- e da coda oclusiva glotal Ɂ o item lexical ldquopeacuterdquo ˈju Ɂ

Nos dois casos o apagamento da coda eacute compensado pelo alongamento

vocaacutelico No caso do morfema de posse ocorre a ressilabaccedilatildeo da coda fricativa

Do ponto de vista da marcaccedilatildeo a siacutelaba menos marcada eacute a que apresenta o

padratildeo CV (Hume 2004 p 183) O Latundecirc tem a tendecircncia a seguir esse

padratildeo de forma que para a liacutengua a coda embora fonoloacutegica eacute mais marcada

A simplificaccedilatildeo da estrutura mais marcada (presenccedila de coda) eacute transferida para

o portuguecircs Conforme os dados descritos abaixo os segmentos que mais satildeo

apagados em posiccedilatildeo de coda satildeo os glides j w e as consoantes h s Como o

85

Mattoso Cacircmara (1969) considera que os glides pertencem ao nuacutecleo Neste caso trata-se de um nuacutecleo ramificado

172

Latundecirc natildeo tem na sua estrutura silaacutebica a coda fricativa alveolar s esse

segmento natildeo eacute licenciado no portuguecircs dos indiacutegenas (dados em 13) Esse

fenocircmeno eacute categoacuterico na fala dos mais velhos e eacute variaacutevel na fala dos indiacutegenas

da geraccedilatildeo poacutes-contato

(12) [m to] muito [koɾƱ] couro

[voto] voltou (13) [dumi] durmir [pig ta] pergunta [pota] porta [kota] corta [pɛtƱ] perto

[kotildekorsquodo] concordou [barsquobudƱ] barbudo (14) [hipotildersquodew] respondeu [gorsquotozƱ] gostoso [iˈtɛla] Stella ([isˈtɛla])

A coda eacute um elemento universalmente marcado No Latundecirc a sua realizaccedilatildeo eacute

em menor frequecircncia do que o Portuguecircs apesar de sua larga presenccedila na

subjacecircncia O que percebemos ademais eacute que o apagamento do R e do s em

coda contribui para a elevaccedilatildeo da vogal meacutedia pretocircnica tautossilaacutebica conforme

os dados ldquocorta e portardquo em (12)

A regra abaixo sintetiza o comportamento da coda no portuguecircs dos Latundecirc

C ou V [oslash] coda

173

Como vimos no Portuguecircs falado por Latundecirc qualquer consoante ou vogal

poderaacute ser apagada em posiccedilatildeo de coda Esta regra tem se mostrado menos

produtiva nas faixas etaacuterias mais novas Nessas geraccedilotildees o apagamento eacute mais

produtivo quando coincide com a realizaccedilatildeo encontrada por nativos em

portuguecircs ([ˈfosa] lsquoforccedilardquo)

6114 Reduccedilatildeo do geruacutendio ndash Anteriorizaccedilatildeo da vogal final

A reduccedilatildeo do geruacutendio eacute um processo comum em alguns dialetos brasileiros

sobretudo em registro menos tenso Esse eacute mais um processo que resulta no

apagamento de segmentos No portuguecircs falado pelos Latundecirc eacute praticamente

categoacuterica a ocorrecircncia da assimilaccedilatildeo da alveolar em geruacutendio

(15) [falatildenƱ] falando [b ɾ ĩgatildenƱ] brigando [kume nƱ] comendo

[bersquobe nƱ] bebendo

[sorsquo ɾ anƱ] chorando

[mersquosenƱ] mexendo [mi ti nƱ] mentindo

Por ser esse um fenocircmeno de larga frequecircncia no portuguecircs nativo entendemos

que a simplificaccedilatildeo segmental da estrutura gerundiva natildeo eacute surpreendente no

portuguecircs indiacutegena Entretanto na produccedilatildeo da geraccedilatildeo preacute-contato a

assimilaccedilatildeo total da oclusiva alveolar eacute acompanhada pela anteriorizaccedilatildeo da

vogal final conforme dados a seguir

174

(16) [dimuɾatildenɪ] demorando

[asinatildenɪ] ensinando [tiɾatildenɪ] tirando

[katildetatildenɪ] catando [kɾese nɪ] crescendo

Para anaacutelise das ocorrecircncias acima precisamos considerar a estrutura do

Latundecirc nessa liacutengua uma terminaccedilatildeo verbal altamente produtiva eacute o morfema

aspectual acentuado -ˈtatilden Esse morfema pode ser seguido pelo morfema de

modo neutro -i resultando nas sequecircncias -ˈtatildeni conforme exemplo abaixo

(17) [keˈja ˌdaˈɾatildeni]

keˈjat ˈta-tatilden-i milho deitar-imperfectivo-neutro

eacute milho deitado (espalhado no chatildeo)

Como no Latundecirc o verbo (e nome) natildeo termina em vogal posterior tal restriccedilatildeo

pode explicar a anteriorizaccedilatildeo do geruacutendio do portuguecircs

6115 Reduccedilatildeo das palatais nasal e lateral

A reduccedilatildeo das palatais nasal e lateral estaacute diretamente ligada agrave natildeo existecircncia

destes segmentos no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc No entanto Clements e

Hume (1995) em seus estudos apontam estes fonemas como complexos do ponto

de vista de seu comportamento

175

Os segmentos ɲ e ʎ satildeo consoantes mais marcadas A natildeo realizaccedilatildeo destas

consoantes no Latundecirc jaacute eacute um fator para a natildeo realizaccedilatildeo no Portuguecircs devido agrave

complexidade inerente de tais segmentos Enquanto segmentos mais complexos

as palatais satildeo sujeitas ao enfraquecimento atraveacutes da iotizaccedilatildeo (vocalizaccedilatildeo)

Mesmo no portuguecircs esse eacute um processo operante particularmente em

variedades populares Mattoso Cacircmara (1981 p 149) descreve que se trata de

ldquomudanccedila de uma vogal ou consoante para a vogal anterior alta i ou para a semivogal correspondente ou iode Nos falares crioulos portugueses haacute a iotizaccedilatildeo das consoantes molhadas ʎ e ɲ ex mulher gt muyeacute nhonho gt ioiocirc (africanismo)rdquo

Aleacutem da iotizaccedilatildeo o portuguecircs apresenta a despalatizaccedilatildeo da lateral em que ʎ

realiza-se [l] como em [muˈlɛ] lsquomulherrsquo

No portuguecircs dos Latundecirc o enfraquecimento se daacute mais frequentemente pela

iotizaccedilatildeo como em (18) Estas realizaccedilotildees ocorrem na fala dos mais velhos na

geraccedilatildeo anterior ao contato

18) [muˈjɛ] mulher

[baɾuj] barulho

[ojˈatildenƱ] olhando

[vimej] vermelho (19) [fila] filha [fola] folha

Weinreich (1953 p 18) explica que quando em sistemas foneacuteticos em contato

podem ocorrer os processos de reinterpretaccedilatildeo de fone que leva a substituiccedilatildeo

de segmento Eacute o que acontece nos exemplos acima

176

Em (20) e (21) o processo de despalatalizaccedilatildeo resulta no apagamento total da

palatal

(20) [miƱ] milho [fii] filho (21) [mia] minha A reduccedilatildeo tem menos restriccedilotildees se comparada com os fatos do portuguecircs falado

por nativo Em (20) as ocorrecircncias satildeo atestadas no portuguecircs enquanto primeira

liacutengua Diante da vogal posterior natildeo apenas o apagamento da palatal pode

ocorrer como tambeacutem o da siacutelaba inteira Em (21) observamos uma realizaccedilatildeo

particular dos Latundecirc em que a consoante palatal nasal eacute apagada plenamente

sem deixar vestiacutegio nasal na vogal que a precede Esse fato tem relaccedilatildeo com a

complexidade que envolve as nasais na liacutengua indiacutegena a qual natildeo coincide com

os processos existentes no portuguecircs

No caso de (22) ocorre o apagamento da siacutelaba em que se encontra a palatal

nasal do diminutivo eacute comum a variedades populares do portuguecircs

(22) [pikinĩnĩ ] pequenininho [faki ] faquinha

Como afirmamos no iniacutecio da seccedilatildeo os segmentos palatais natildeo existem em

Latundecirc o que torna sua produccedilatildeo no Portuguecircs falado pelos Latundecirc mais

marcada e de difiacutecil ocorrecircncia

177

6116 Afeacuterese

A afeacuterese eacute um processo foneacutetico que consiste na queda de elementos iniciais do

vocaacutebulo Este processo que fora responsaacutevel pelas modificaccedilotildees foneacuteticas do

Latim para o Portuguecircs ainda eacute atuante no estaacutegio atual da liacutengua

A queda da siacutelaba inicial es- em verbos como esperar e estar e do a- em

vocaacutebulos como aqui e acabar eacute muito comum em alguns dialetos brasileiros

Entretanto este tipo de delaccedilatildeo no portuguecircs falado pelos Latundecirc se expande

para outros vocaacutebulos da liacutengua conforme os exemplos abaixo

(23) [kutatildeni] escutando [kapa] escapa [kapo] escapou [peɾatildenƱ] esperando

[pi gada] espingarda

(24) [tupiw] entupiu [gatildeno] enganou [tehaɾƱ] enterraram

(25) [kɪ] aqui [lsquokelɪ] aquele [bɾasadƱ] abraccedilado

[meto] aumentou [korsquodadƱ] acordado [batildedono] abandonou [kaboʃe] acabou-se

(26) [fiɾe tɪ] diferente

[pitaw] hospital

178

Natildeo consta no inventaacuterio fonoloacutegico dessa liacutengua a presenccedila da fricativa alveolar

surda em posiccedilatildeo de coda Essa restriccedilatildeo eacute transferida para o portuguecircs falado

por Latundecirc conforme (23)

Outra razatildeo para esse fenocircmeno pode estar na estrutura prosoacutedica da palavra no

Latundecirc Nessa liacutengua as palavras satildeo monossilaacutebicas ou dissilaacutebicas Raiacutezes

com mais de duas siacutelabas satildeo raras (TELLES 2002) Associado a isso o acento

eacute morfoloacutegico em raiacutezes Nas dissilaacutebicas o acento recai na segunda siacutelaba

(27) [ˈmatilde ginĩde] ˈmatildejn-kiˈnĩn-te caju-redondo-Sufixo Nominal

lsquocastanha de cajursquo

No dado (27) encontramos exemplos de raiz monossilaacutebica e de raiz dissilaacutebica

Jaacute no portuguecircs haacute um nuacutemero relevante de palavras trissiacutelabas e polissiacutelabas

Diante disso a afeacuterese pode ser uma interferecircncia da estrutura do leacutexico da

liacutengua indiacutegena para simplificar a estrutura do portuguecircs - mais marcada no

Latundecirc Este fenocircmeno natildeo afeta o acento e eacute operante sobretudo quando a

siacutelaba inicial natildeo tem onset

6117 Apoacutecope

A apoacutecope eacute uma das formas de apagamento de segmentos que estaacute

relacionada assim como a afeacuterese a outros processos foneacuteticos

179

A queda de elementos finais eacute uma das formas de reduccedilatildeo ou reorganizaccedilatildeo

silaacutebica e de palavras Assim como nos demais processos a siacutelaba tocircnica eacute

preservada de qualquer alteraccedilatildeo

Embora alguns processos explicados aqui tratem da apoacutecope como a reduccedilatildeo do

geruacutendio e ditongo finais ou apagamento da nasal palatal a exemplo de (27)

estes exemplos jaacute foram mecionados nas seccedilotildees anteriores A presenccedila deles

aqui eacute para mostrar que os outros processos foneacuteticos resultam na apoacutecope

(28) [ ʒ rsquotaɾɪ] juntaram

[tursquodĩ] tudinho [ti ] tinha

[lsquovE ] velho [kabersquosĩ] cabecinha [lsquonatilde] natildeo [lsquomatilde] matildee (29) [lsquove] ver [lsquokɛ] quer (30) [nɔj] noacutes

[maj] mais [dirsquofisɪ] difiacutecil [dirsquofisƱ] difiacutecil [tatildersquome j] tambeacutem

(31) [virsquoa] viado [lsquoluɾɪ] Lurdes

[lsquote ] dele

Em (29) a apoacutecope do R final eacute processo muito comum no portuguecircs atual

Diante de tal explicaccedilatildeo natildeo nos cabe assegurar se o processo eacute proacuteprio do

180

Latundecirc ou se da variedade atraveacutes da qual os indiacutegenas adquiriram o portuguecircs

Os dados em (30) tambeacutem apontam para a interpretaccedilatildeo dos dados mostrados

em (29)

Em (31) os dados apresentam um apagamento incomum ao portuguecircs de

nativos A fala espontacircnea e natildeo tensa eacute uma possibilidade explicativa uma vez

que essas ocorrecircncias natildeo satildeo sistemaacuteticas

Os dados de apoacutecope natildeo evidenciam a transferecircncia de traccedilos mais marcados

do Latundecirc para o portuguecircs

6118 Siacutencope86

A forma mais comum deste processo se apresenta no portuguecircs nas

proparoxiacutetonas Em alguns dialetos a depender do contexto linguiacutestico eacute

categoacuterico a ocorrecircncia da reduccedilatildeo interna no vocaacutebulo

Nos exemplos elencados em (32) no caso das proparoxiacutetonas tal reduccedilatildeo eacute

motivada pelo padratildeo acentual do portuguecircs que permite com mais toleracircncia o

padratildeo paroxiacutetono ao proparoxiacutetono conforme Silva (2006 p78)

Quando ocorrente no Portuguecircs este processo estaacute relacionado ao apagamento

da vogal postocircnica medial Com a reduccedilatildeo vocaacutelica a consoante precedente

pode tomar dois caminhos i) eacute incorporado agrave siacutelaba tocircnica na posiccedilatildeo de coda ii)

86

Os exemplos apresentados demonstram que o processo ocorrente eacute muito mais motivado pelo

Portuguecircs do que pelo Latundecirc A nossa classificaccedilatildeo fica aqui a caraacuteter de registro

181

passa a onset da siacutelaba aacutetona seguinte o que afeta sua constituiccedilatildeo O

apagamento vocaacutelico resulta em uma palavra paroxiacutetona

(32) [lsquomuʒka] muacutesica [lsquohapƱ] raacutepido [lsquokOʃka] coacutecega [lsquoavɾɪ] aacutervore

Entendemos que muitas destas ocorrecircncias no Latundecirc se datildeo pelo portuguecircs de

contato Isso eacute confirmado pela produccedilatildeo de ldquomuacutesicardquo e ldquocoacutecegardquo que licencia

uma restriccedilatildeo forte no Latundecirc a fricativa sibilante em coda Aleacutem disso a

produccedilatildeo de ldquoraacutepidordquo ([ˈhapƱ]) tambeacutem coincide com a realizaccedilatildeo encontrada no

portuguecircs popular na qual a consoante em onset da siacutelaba apagada passa a

onset da siacutelaba seguinte devido agrave restriccedilatildeo no portuguecircs de onda oclusiva

612 Ganho de elementos (Inserccedilatildeo de elementos)

Embora em menor nuacutemero os processos que resultam em ganhos de elementos

tambeacutem ocorrem no Portuguecircs falado pelos Latundecirc Satildeo poucos os processos e

menores ainda os casos em que eles ocorrem Isso pode ser explicado como jaacute

fora dito devido ao fato de as liacutenguas em geral terem um dinamismo proacuteprio que

favorece mais agrave perda do que o ganho de elemento Em alguns casos a

motivaccedilatildeo para o ganho de material foneacutetico satildeo as restriccedilotildees fonotaacuteticas da

liacutengua e ou a tendecircncia agrave formaccedilatildeo de padratildeo silaacutebico menos marcado No caso

do portuguecircs de acordo com Collischonn (2004 p 67) um tipo de ganho de

material precisamente a epecircntese vocaacutelica

ocorre mais quando a consoante perdida estaacute em posiccedilatildeo pretocircnica como em objeto magneacutetico e opccedilatildeo ocorrendo em apenas 24 dos vocaacutebulos na posiccedilatildeo postocircnica em palavras como egiacutepcios eacutetnico ou ritmo Mais especificamente estes resultados mostram que a epecircntese que em outros contextos

182

ocorre numa taxa bastante alta eacute dramaticamente reduzida em posiccedilatildeo postocircnica

Exemplos do que a autora descreve seguem apresentados abaixo em (33) O

primeiro dado traz a inserccedilatildeo da vogal epenteacutetica default no portuguecircs a anterior

alta [i] e a segundo natildeo ocorrecircncia da inserccedilatildeo

(33) [lsquoabiˈsuhdƱ] absurdo [koˈlapisƱ] colapso

A epecircntese vocaacutelica nos dados examinados natildeo foi muito expressiva sobretudo

pelo fato de natildeo termos encontrado um nuacutemero significativo de palavras com

encontro consonantal no leacutexico dos indiacutegenas Entretanto alguns casos como em

(34) ilustram a ocorrecircncia no portuguecircs dos Latundecirc

(34) [ˈmɔgunƱ] mogno (35) [piˈnew] pneu

A estrutura que favorece a epecircntese no portuguecircs natildeo faz parte das regras

fonotaacuteticas do Latundecirc o que tambeacutem pode favorecer a vogal epenteacutetica nos

dados observados

(36) [haacutersquopazɪ] rapaz [haacutersquopazƱ] rapaz [parsquope sɪ] papeacuteis [dorsquose zɪ] de vocecircs [lsquonͻ zɪ] noacutes

183

Diferentemente do que ocorre em (34 - 35) os dados de (36) nos direcionam para

a paragoge processo que se caracteriza pela inserccedilatildeo de elemento(s) no final do

vocaacutebulo Este processo tambeacutem estaacute diretamente ligado agrave presenccedila da fricativa

alveolar desvozeada em coda sendo esse segmento proibido nessa posiccedilatildeo no

Latundecirc No caso citado a inserccedilatildeo pode ser da vogal alta posterior rapaz

[hapazƱ] mas a preferecircncia eacute pela vogal alta anterior que eacute a vogal menos

marcada [hapazɪ] rapaz noacutes [lsquonͻ zɪ]

Em (37) o processo de paragoge ocorre apoacutes o processo de monotongaccedilatildeo

ocorrendo no ditongo [atildew] que passa a ser realizado como a vogal nasal meacutedia

posterior conforme discutido em 5111 Apoacutes esse processo haacute a inserccedilatildeo do

consoante nasal seguida da vogal alta anterior A paragoge eacute variaacutevel com a

reduccedilatildeo do ditongo ([tubaˈɾotilde]) A inserccedilatildeo da siacutelaba final [-ni] pode decorrer da

existecircncia produtiva de terminaccedilatildeo sonora semelhante em vocaacutebulos (nominais e

verbais) no Latundecirc

(37) [tubarsquoɾotildenɪ] tubaratildeo

Em (38) o processo ocorrente eacute a proacutetese Se para o processo inverso - a afeacuterese

- os dados satildeo em maior quantidade para a proacutetese satildeo pouquiacutessimos os

contextos em que ela ocorre No caso deste exemplo a proacutetese se daacute a presenccedila

da vogal baixa diante do verbo Este tipo de proacutetese eacute bem recorrente no

Portuguecircs em dados como ([alemˈbra]) Entretanto o caraacuteter pontual da

ocorrecircncia do fenocircmeno natildeo favorece uma interpretaccedilatildeo mais segura

(38) [atorsquomaɾu] tomaram

184

Outra forma de ganho de elementos pode ser o prolongamento da vogal final O

exemplo de (39) nos mostra o prolongamento da vogal meacutedia anterior Essa

ocorrecircncia foi observada no contexto especiacutefico de ecircnfase

(39) [dese] desse [se] esse

613 Alteraccedilatildeo de elementos (Permuta ou transposiccedilatildeo)

A alteraccedilatildeo de elementos linguiacutesticos eacute considerada na literatura histoacuterica como o

terceiro tipo de alternacircncia focircnica inerente agraves liacutenguas Os contextos em que o

cacircmbio eacute permitido satildeo diversos e direcionados por distintas regras fonoloacutegicas

Muitos desses processos natildeo alteram a estrutura silaacutebica nem atinge a estrutura

lexical O que ocorre de fato eacute a acomodaccedilatildeo de alguns segmentos no dialeto

falado seja pela mudanccedila de traccedilo(s) ou seja pela de segmento(s)

6131 Despalatalizaccedilatildeo de [ʃ] e [ʒ]

Tratamos na seccedilatildeo 5115 do processo da reduccedilatildeo das palatais [ʎ] e [ɳ] que

tambeacutem se configura como um caso de despalatalizaccedilatildeo Todavia tal

classificaccedilatildeo se daacute devido ao fato de estaacute ligada agrave perda de elementos enquanto

a que trataremos agora se configura da permuta ou da reduccedilatildeo de traccedilos

185

Em Latundecirc a presenccedila das palatais [ʃ] e [tʃ] satildeo realizaccedilotildees de s Estas podem

vir em iniacutecio e em meio de palavras As realizaccedilotildees [ʃ] e [s] satildeo preferidas pelos

mais novos enquanto os mais velhos optam pela africada alveolo-palatal surda

Diferentemente no Portuguecircs falado por Latundecirc as realizaccedilotildees natildeo

palatalizadas satildeo preferidas Os Latundecirc natildeo transferem o segmento mais

marcado para o Portuguecircs Contudo conforme seccedilatildeo a seguir veremos que este

processo eacute variaacutevel e pode se dar em qualquer posiccedilatildeo do vocaacutebulo conforme

dados de (40)

(40) [sersquogo] chegou [sersquogamƱ] chegamos [sorsquoɾanƱ] chorando [sursquopaha] chupava [satildematildedƱ] chamando [dersquosaɾƱ] deixaram [casueɾƱ] cachoeira

[mersquosenƱ] mexendo [bisƱ] bicho [baso] baixo [debasƱ] debaixo [lsquopesƱ] peixe [dirsquoso] deixou

Natildeo consta no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc as consoantes z e ʒ de forma

que a liacutengua natildeo apresenta oposiccedilatildeo entre surda e sonora para as fricativas

sibilantes Em (41) o processo de despalatalizaccedilatildeo atinge a fricativa alveopalatal

vozeada que passa a se comportar como fricativa alveolar em iniacutecio de siacutelaba e

em meio de palavras

(41) [lizeɾƱ] ligeiro

186

[lsquolotildezɪ] longe [lsquosuzɪ] suja [lsquosuzu] sujo [azursquoda] ajudar [lsquozudia] judia [azersquota] ajeitar

A escolha do segmento menos marcado segue o que ocorreu com s a

realizaccedilatildeo desses segmentos satildeo adquiridos analogicamente e a presenccedila se daacute

no interior do vocaacutebulo Trata-se da reinterpretaccedilatildeo e acomodaccedilatildeo do segmento

Neste caso do menos marcado jaacute que ambos satildeo menos naturais em sua liacutengua

(WEINREICH 1953)

6132 Palatalizaccedilatildeo

A quantidade de sons palatais do Latundecirc natildeo corresponde aos do Portuguecircs

Em Latundecirc a palatalizaccedilatildeo eacute um processo foneacutetico que ocorre com o segmento

s e em incidecircncia extremamente escassa com t em ambientes que jaacute foram

postos no Capiacutetulo IV que trata deste sistema foneacutetico Eacute um processo bastante

variaacutevel tendo em vista a natildeo presenccedila desse segmento na subjacecircncia da

liacutengua Essa variaccedilatildeo ocorre marcadamente na fala dos mais velhos Os mais

jovens que adquiriram ambas as liacutenguas (Portuguecircs e Latundecirc)

simultaneamente produzem em menor proporccedilatildeo este processo

A africada [tʃ] eacute um segmento que tambeacutem apresenta uma realizaccedilatildeo altamente

variaacutevel provavelmente devido agrave histoacuteria interna da liacutengua conforme Telles

187

(2002 p85) No Latundecirc natildeo haacute diferenccedila entre a oposiccedilatildeo foneacutetica entre as

alveolares de um lado e as palatais e alveacuteolo-palatais de outro

Em (42) e (43) a palatalizaccedilatildeo atinge tanto a fricativa alveolar vozeada quanto a

desvozeada

(42) [ʃu rsquomiɾƱ] sumiram

[ lsquoʃi ma] cima

[ʃigursquoɾow] segurou

(43) [lsquoua] usa

[bursquoʒoɾƱ] Besouro

Em (44) e (45) a palatalizaccedilatildeo abrange as consoantes oclusivas alveolares que

se realizam como africadas alveolo-palatais podendo ocorrer em qualquer

posiccedilatildeo ou contexto da palavra

(44) [lsquoĩdƱ] iacutendio

[matildersquodɔga] mandioca

[ɛrsquoĩ] zezinho

[odʒɪ] hoje [tʃi rsquodʒeɾƱ] cinzeiro

Embora no Portuguecircs o processo de africativizaccedilatildeo de oclusivas alveolares [t d]

seja comum a alguns dialetos como o do Rio de Janeiro [lsquotʃia] e do portuguecircs

popular no Nordeste [lsquoojtʃƱ] sua ocorrecircncia eacute condicionada agrave contiguidade de uma

vogal anterior alta [i] Diferentemente em Latundecirc a palatalizaccedilatildeo e a

188

fricativizaccedilatildeo variam entre si e ocorrem tambeacutem com a fricativa alveolar s Este

processo pode ocorrer em qualquer lugar da palavra

(45) [tʃai] sair [tʃiɾi ga] seringa

[barsquotʃotilde] batom [tʃͻ] soacute [tʃumiɾƱ] sumiram

[tʃobɾo] sobrou

[arsquotʃi ] assim

[tʃubi nƱ] subindo

[pɔtʃa] porta

[rsquotʃua] suja

Os exemplos de (46) apontam para um processo secundaacuterio o fortalecimento

Neste caso a fricativa alveopalatal passa a ser pronunciada como africada

(46) [ tʃoɾatildenƱ] chorando [tʃama] chama [tʃega] chega [ tʃursquoveɾƱ] chuveiro [kaharsquopitʃƱ] carrapicho

No que tange agrave abordagem das palatais a variaccedilatildeo no processo de acomodaccedilatildeo

desses inventaacuterios fonoloacutegicos eacute muito grande A partir das incidecircncias

percebemos que no Portuguecircs resultante do contato a ocorrecircncia desses

segmentos complexos se mostra tambeacutem na mesma proporccedilatildeo

Diante da palatalizaccedilatildeo incluindo a africativizaccedilatildeo observamos que os dados

apresentam duas direccedilotildees quanto ao processo Nos mesmos contextos tanto

ocorre a despalatalizaccedilatildeo quanto a palatalizaccedilatildeo Essa variaccedilatildeo no portuguecircs dos

189

indiacutegenas eacute engatilhada pela ausecircncia do contraste szʃʒ em sua primeira

liacutengua

6133 Desvozeamento e vozeamento

Diferente do portuguecircs no Latundecirc natildeo haacute oposiccedilatildeo das oclusivas quanto agrave

sonoridade As consoantes oclusivas subjacentes satildeo as surdas bilabial alveolar

e velar p t e k respectivamente Sua realizaccedilatildeo sonora eacute condicionada pela

posiccedilatildeo na palavra pelo ambiente (contiguidade nasal) e pelo acento O

vozeamente obrigatoacuterio ocorre quando elas precedidas por consoante nasal na

coda da siacutelaba anterior O processo ocorre tanto no interior quanto em fronteiras

de morfemas (TELLES 2002 p135)

A ausecircncia do contraste surdo-sonoro nas consoantes oclusivas do Latundecirc afeta

a realizaccedilatildeo das consoantes no portuguecircs resultante do contato Na produccedilatildeo dos

indiacutegenas mais velhos (esse fenocircmeno natildeo foi observado na geraccedilatildeo mais

jovem) o processo de desvozeamento atinge as consoantes oclusivas sonoras g

d do portuguecircs conforme (47) e (48)

A realizaccedilatildeo sonora Latundecirc envolve o traccedilo laringal Foneticamente em fala

lenta haacute a realizaccedilatildeo de [d] como alofone de t Telles (2002 p 45) explica que

os falantes mais jovens da geraccedilatildeo poacutes-contato que adquiriram o Portuguecircs

simultaneamente ao Latundecirc neutralizaram o contraste entre sons realizando

preferencialmente o som menos marcado natildeo-implodido Diferentemente dos

mais novos os mais velhos preferem o som implosivo [ɗ]

190

Quanto ao segmento [g] o Latundecirc o tem enquanto alofone de [k] e pode ser

encontrado em iniacutecio de palavra quando em fala raacutepida Mostra-se categoacuterico em

meio de palavra quando diante de uma nasal lexical Em ambiente intervocaacutelico

pode-se encontrar a variaccedilatildeo entre [k] e [g] das quais eacute preferencial a realizaccedilatildeo

da vogal surda (idem p73) A falta do contraste no Latundecirc explica as

realizaccedilotildees de (47)

(47) [lsquobɾika] briga [lsquokoʃta] gosta [kɔviotilde] gaviatildeo

[katildersquoba] gambaacute

A ausecircncia do segmento [d] em Latundecirc eacute a responsaacutevel pela variaccedilatildeo e pela natildeo

realizaccedilatildeo dessa consoante que ocorre como oclusiva alveacuteolo-palatal t

(48) [tipoj] depois [se rsquotatu] sentado

(49) [hatildega] arranca

Em (49) diferentemente do processo de desvozeamento a oclusiva velar se

realiza como sonora A contiguidade nasal em posiccedilatildeo precedente condiciona o

vozeamente da oclusiva velar

Em todos os casos observados acima fica evidente a interferecircncia do Latundecirc no

portuguecircs indiacutegena As consoantes sonoras que satildeo mais marcadas

interliguisticamente por natildeo fonoloacutegicas no Latundecirc se tornam ainda mais

marcadas nessa liacutengua Na produccedilatildeo do portuguecircs os Latundecirc mais velhos

191

preservam a marcaccedilatildeo e apresentam uma realizaccedilatildeo com condicionamento

emprestado da liacutengua indiacutegena

6134 Abaixamento e Elevaccedilatildeo das Vogais Orais

No portuguecircs falado pelos Latundecirc os processos de abaixamento e elevaccedilatildeo

diferenciam-se dos contextos em que ocorrem no portuguecircs Os de elevaccedilatildeo satildeo

em maior nuacutemero que os de abaixamento fato este tambeacutem verificado no

portuguecircs falado pelos Latundecirc

No caso de (50) o uacutenico caso de abaixamento ocorre na vogal anterior nasal e

que passa a ser pronunciada como vogal baixa oral

(50) [asina] ensinar [asinatildenɪ] ensinando

Em (51) a elevaccedilatildeo ocorre com a vogal central baixa final que passa a alta

anterior

(51) [suzɪ] suja [kazɪ] causa [kazɪ] casa [li gɪ] liacutengua

[pɾersquogisɪ] preguiccedila

Assim como em (51) em (52) a elevaccedilatildeo da vogal final tambeacutem eacute realizada como

alta anterior No segundo caso natildeo se trata de elevaccedilatildeo mas de anteriorizaccedilatildeo

uma vez que a vogal meacutedia posterior que ocorre em nomes no portuguecircs eacute

realizada como alta posterior

192

(52) [li pɪ] limpo

[kotildemɪ] como [pɾeti] preto

[saɾatildepɪ] sarampo

[pɾimeɾɪ] primeiro

[morsquosegɪ] morcego [morsquohe dɪ] morrendo

[novɪ ] novo

[kursquoɳadɪ] cunhado [otɪ] outro [fikatildenɪ] ficando

A elevaccedilatildeo e posteriorizaccedilatildeo tambeacutem ocorrem no final dos vocaacutebulos como em

(53)

(53) [kabesƱ] cabeccedila [kanɛlƱ] canela

[mini nadƱ] mininada

[malaɾƱ] malaacuteria

[kursquoru Ʊ] coruja

Em (54) temos tambeacutem a posteriorizaccedilatildeo da alta anterior Assim como a meacutedia

posterior em (52) a meacutedia anterior no portuguecircs eacute amplamente produzida como

alta anterior de forma que o alccedilamento em si natildeo se configura como um

processo do portuguecircs do contato

(54) [hedƱ] rede [bastatildetƱ] bastante [pesƱ] peixe [notƱ] noite [febɾƱ] febre

193

Apesar de natildeo encontrarmos itens que mostrassem a sistematicidade do

condicionamento entre [i] e [u] em final de palavras os dados nos mostram que

haacute uma tendecircncia na base das realizaccedilotildees Os vocaacutebulos terminados em [Ʊ]

tendem a ser produzidos com [ɪ] e os terminados por [a] tendem a ser realizados

com [Ʊ]

Nos dados observados a variaccedilatildeo entre [i] e [Ʊ] soacute ocorre em final de vocaacutebulo

quando se trata da paragoge conforme visto nos exemplos (36) em 512

[harsquopazɪ] ~ [harsquopazʊ]

Os dados em (55) ilustram a falta de regularidade no alccedilamento das vogais

pretocircnicas Como vemos em [fuˈkatildemƱ] e [virsquome ] a tonicidade ou a contiguidade

segmental natildeo condiciona a elevaccedilatildeo da pretocircnica

(55) [pig ta] pergunta [piskosƱ] pescoccedilo [hirsquopotildedew] respondeu [pigu rsquotatildenɪ] perguntando

[dimorsquoɾo] demorou

[virsquome ] vermelho [dimursquoɾatildenɪ] demorando

[fuˈkatildemƱ] ficamos

[kuˈmiw] comeu

194

6135 Nasalizaccedilatildeo e Desnasalizaccedilatildeo

No Latundecirc a nasalidade vocaacutelica eacute contrastiva para a central baixa a anterior

alta e a posterior alta seguidas por consoante nasal tautossilaacutebica A nasalizaccedilatildeo

alofocircnica soacute ocorre com vogais aacutetonas Apesar de a organizaccedilatildeo do traccedilo nasal

na fonologia do Latundecirc ser distinta da do portuguecircs o status contrastivo do traccedilo

em ambas as liacutenguas favorece sua percepccedilatildeo e realizaccedilatildeo na produccedilatildeo na sala

no portuguecircs Entretanto a nasal depende tambeacutem de outros fenocircmenos

cooperantes

Os dados a seguir ilustram a ocorrecircncia da nasalizaccedilatildeo em vogais A

contiguidade da vogal com uma consoante nasal mesmo heterossilaacutebica pode

resultar na nasalizaccedilatildeo O primeiro dado abaixo foge do esperado em liacutengua

portuguesa e tampouco decorre de uma interferecircncia do Latundecirc

(56) [mersquoatilde] meia [bɾĩrsquogatildenƱ] brigando [ʃu miɾƱ] sumiram

[mi mƱ] mesmo

Em (57) ocorre a desnasalizaccedilatildeo em palavras funcionais Esses casos natildeo satildeo

frequentes no leacutexico e natildeo podem ser analisados como resultados de interferecircncia

direta O apagamento da nasal em coda ou em onset seguinte impede a

nasalizaccedilatildeo

(57) [nɪ] nem (natildeo) [mia] minha

195

6136 Fenocircmenos evolvendo os roacuteticos

O tratamento do roacutetico requer uma consideraccedilatildeo sobre o seu comportamento

interlinguiacutestico Retomando as palavras de Bonet e Mascaroacute (1997 p 103)

It is well know that the phonetic realization of rhotics varies considerably from language to language even from dialect to dialect Rhotics can be realized as flaps taps trills (uvular coronal ou bilabial) or as assibilated or fricative variants They ca alternate with a lateral liquid with glides and in some cases a flap can occur as the phonetic realization of a coronal stop in specific environments

Os roacuteticos satildeo segmentos que apresentam uma grande variaccedilatildeo no portuguecircs

Natildeo diferentemente estes elementos tambeacutem se mostraram como motivadores

de vaacuterios processos fonoloacutegicos do portuguecircs falado pelos Latundecirc

Os exemplos dispostos em (58) apontam para a aspiraccedilatildeo do R em coda

silaacutebica Processo este que eacute comum a variedades do portuguecircs e que tambeacutem

no caso em tela pode ser motivado pela preferecircncia de natildeo coda da liacutengua

Latundecirc que favorece o seu enfraquecimento atraveacutes de uma realizaccedilatildeo fricativa

glotal

(58) [duhmɪ] Dormi [mɛgursquola] mergulhar

[fosa] Forsa

O rotacismo eacute um fenocircmeno presente no portuguecircs dos Latundecirc especialmente

entre os mais velhos Fonemas distintos podem sofrer o processo Em (59) a

realizaccedilatildeo do flap tem na base uma sibilante uma lateral palatal e uma oclusiva

196

alveolar Em ldquotrabalhavardquo a lateral palatal inexistente no Latundecirc poderia ser

subtituida pela lateral alveolar constante do inventaacuterio da liacutengua indiacutegena

Entretanto o flap apesar de natildeo fonoloacutegico no Latundecirc eacute um segmento muito

frequente na liacutengua decorrente de processo de enfraquecimento Essa tendecircncia

do Latundecirc pode estar na base da realizaccedilatildeo do portuguecircs Dentre as ocorrecircncias

abaixo a uacuteltima se coloca como um processo frequente no proacuteprio Latundecirc no

qual uma oclusiva passa a flap em ambiente intervocaacutelico

(59) [karsquoboɾe] acabou-se

[tabaɾava] trabalhava

[poɾɪ] pode

Em Portuguecircs particularmente falado por sujeitos menos escolarizados o

fenocircmeno do rotacismo tambeacutem eacute frequente em encontros consonantais

tautossilaacutebicos em que a segunda consoante eacute a lateral alveolar l Dessa forma

produccedilatildeo encontrada em (60) pode ser devido ao contato com o Portuguecircs local

(60) [pɾatildeta] planta

[gɾɛba] gleba

[fɾɛsa] flecha

Em termos da organizaccedilatildeo da fonologia de ambas as liacutenguas os dados em (60)

assim como aqueles em (59) podem ser refletidos a partir da escala de

sonoridade proposta por Bonet e Mascaroacute (1997 p 109)

197

Quadro 21 Escala de Sonoridade adaptada de Bonet e Mascaroacute 1997 p 109)

0 1 2 3 4

Obstruintes

(oclusivas

fricativas trill)

nasais laterais glides

flap

vogais

Considerando a posiccedilatildeo do flap na escala de Bonet e Mascaroacute podemos

interpretar tanto o rotacimo no portuguecircs natildeo padratildeo quanto aquele presente no

Latundecirc como resultado de enfraquecimento de diferentes segmentos situados

mais agrave esquerda no ranking de sonoridade Entre esses segmentos como

observamos na escala acima encontra-se a proacutepria lateral alveolar que apesar

de tradicionalmente formar a classe das liacutequidas ao lado dos roacuteticos natildeo

apresenta a mesma sonoridade que o flap

6137 Labializaccedilatildeo e Deslabializaccedilatildeo

No Portuguecircs falado pelos Latundecirc os processos que envolvem articulaccedilatildeo

secundaacuteria especificamente a labializaccedilatildeo e a deslabializaccedilatildeo estatildeo

relacionados agraves consoantes oclusivas velares e se realizam praticamente nos

mesmos contextos Trata-se de um processo foneacutetico variaacutevel

(61) [kƱɪ] que [kƱelɪ] com ele (62) [kazɪ] quase [katildedƱ] quando

198

[karsquokƱɛ] qualquer

[li gɪ] liacutengua

No Latundecirc a labializaccedilatildeo pode ser derivada de processo mas eacute restrita em

ocorrecircncia Aleacutem disso a sequecircncia da olusiva seguida do glide formando

encontro consonantal tambeacutem natildeo faz parte da fonologia do Latundecirc Esses fatos

favorecem a produccedilatildeo irregular do portuguecircs em que observamos a

deslabializaccedilatildeo (ou o apagamento do glide) como em (62) e a labializaccedilatildeo (ou

inserccedilatildeo do glide) em (61)

6138 Metaacutetese

A alternacircncia de segmentos no portuguecircs falado pelos Latundecirc pode ocorrer

entres siacutelabas diferentes ou entre elementos da mesma siacutelaba Aleacutem disso

ocorre nas duas direccedilotildees (da esquerda para a direita e da direita para a

esquerda)

(63) [bahiƱ] bairro [fɾevenƱ] fervendo [parsquoguo] apagou

Como vemos acima no primeiro dado de (63) ocorre natildeo apenas a metaacutetese

como tambeacutem o avanccedilo do acento resultando numa palavra oxiacutetona Nos demais

dados a tranposiccedilatildeo segmental natildeo interfere na estrutura suprassegmental O

segundo dado de ldquofervendordquo eacute tiacutepico do portuguecircs e pode decorrer da variedade

de contato sobretudo pelo fato de o onset complexo natildeo fazer parte da liacutengua

indiacutegena Em ldquoapaguordquo a metaacutetese resulta na labializaccedilatildeo da oclusiva velar Essa

199

forma de palavra tem como realizaccedilatildeo foneacutetica frequente mesmo no portuguecircs

nativo a monotongaccedilatildeo Nesse caso a metaacutetese resulta de processo irregular e

pontual nos dados observados

Como vimos nas seccedilotildees anteriores os resultados da metaacutetese natildeo correspondem

a estruturas fonoloacutegicas no Latundecirc sendo sua ocorrecircncia derivada de processo

foneacutetico sem condicionamento prosoacutedico

6139 Siacutestole

Alguns casos de siacutestole em que ocorre o recuo do acento foram encontrados na

fala dos mais velhos Natildeo identificamos contexto linguiacutestico como o

sequenciamento focircnico do enunciado fonoloacutegico que justificasse essas

realizaccedilotildees Considerando o fato de a produccedilatildeo ter sido encontrada apenas na

fala da geraccedilatildeo mais velha e de o acento lexial no Latundecirc ser morfoloacutegico

ancorado em uma das duas promeiras siacutelabas da raiz da palavra (TELLES 2002)

eacute plausiacutevel supor uma interferecircncia do padratildeo acentual da liacutengua indiacutegena no

portuguecircs dos Latundecirc Os dados em (64) evidencia o recuo do acento

(64) [mɔhe] morrer

[kalo] calor [katɪ] quati [pega] pegar

Nos dados acima importa considerar tambeacutem o fato de se tratarem de itens

nominais (incluindo as formas nominais dos verbos) Diante disso uma analogia

possiacutevel dos Latundecirc seria a de considerar a raiz monossilaacutebica que eacute altamente

200

produtiva na liacutengua indiacutegena o que tambeacutem justificaria o acento na primeira

siacutelaba da palavra

61310 Fortalecimento

Casos de fortalecimento jaacute foram abordados nas seccedilotildees anteriores em que

tratamos da palatalizaccedilatildeo e da dessonorizaccedilatildeo Nesta seccedilatildeo outro fenocircmeno de

fortalecimento eacute apresentado no qual ocorre a oclusivizaccedilatildeo de fricativas

Salientamos entretanto que essas foram realizaccedilotildees mais esporaacutedicas e menos

recorrentes que as demais

(65) [istubidƱ] subindo [tiguɾa] segura

[torsquoteɾƱ] solteiro

[batitaɾƱ] batizaram

O processo ocorre no iniacutecio e em meio de palavra No primeiro dado em fato haacute

uma epecircntese da oclusiva alveolar surda [t] tendo em vista a preservaccedilatildeo de uma

sutil sibilaccedilatildeo do s em coda da siacutelaba precedente

Na fonologia do Latundecirc o fonema s tem como alofone o fone [t] que ocorre em

siacutelaba aacutetona (TELLES 2002) Embora essa natildeo seja a realizaccedilatildeo mais frequente

a interferecircncia do Latundecirc natildeo pode ser desconsiderada Em todos os dados de

(65) haacute a presenccedila de segmento oclusivo em siacutelaba contiacutegua que tambeacutem pode

ter motivado o fortalecimento do s

201

7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

No que concerne agraves poliacuteticas linguiacutesticas diante do glotociacutedio que tem se

instaurado no Brasil desde a chegada dos portugueses dado o estado em que se

encontram as liacutenguas indiacutegenas brasileiras eacute de grande valia qualquer estudo

que vise agrave contribuiccedilatildeo e que favoreccedila natildeo soacute a proteccedilatildeo como o conhecimento

cientiacutefico dessas liacutenguas

O Latundecirc como jaacute mencionamos eacute uma dessas liacutenguas minoritaacuterias Ela se

encontra em extinccedilatildeo uma vez que hoje dispotildee de menos de 20 falantes com

autonomia poliacutetica Devido agrave populaccedilatildeo restrita e agraves relaccedilotildees tradicionais de

parentesco os jovens Latundecirc natildeo podem coabitar entre si de forma que a

interaccedilatildeo com o mundo externo eacute a via de perpetuaccedilatildeo social e ao mesmo

tempo de crescente e natildeo planejado contato linguiacutestico Tais circunstacircncias

implicam a urgecircncia de mais estudos sobre a realidade desse povo

Entedemos que estudar as liacutenguas menos conhecidas eacute de grande valia para o

incremento da ciecircncia linguiacutestica A investigaccedilatildeo de cada nova liacutengua eacute uma

maneira de conceber a linguagem humana e de contribuir dessa forma com os

universais linguiacutesticos e com o entendimento da faculdade humana da linguagem

(CAcircMARA-JR 1977 p6)

Seja entre si ou em contato com outras estas liacutenguas natildeo estatildeo (ou natildeo

estiveram) suficientemente isoladas para evitar algum tipo de proximidade

Thurston (1987 p 165) propaga que toda liacutengua deve ter sofrido alguma

202

influecircncia de seus vizinhos em um determinado ponto e tempo Todos os idiomas

satildeo portanto liacutenguas mistas na medida em que todos copiaram formas lexicais e

outros recursos linguiacutesticos de liacutenguas vizinhas

Thomason (2001 p 17) afirma que o contato linguiacutestico estaacute em toda a parte

muitos paiacuteses tecircm mais do que uma liacutengua oficial e muito provavelmente a maior

parte da populaccedilatildeo mundial fala duas ou mais liacutenguas

Contudo mesmo em grande quantidade os estudos que se encarregam da

observaccedilatildeo do contato linguiacutestico se debruccedilam ainda timidamente nos aspectos

foneacuteticos Com base nesta assertiva este trabalho se propocircs a observar como se

daacute o comportamento entre o Portuguecircs e o Latundecirc a partir da verificaccedilatildeo dos

padrotildees mais e menos marcados nos processos foneacuteticos de acomodaccedilatildeo Eacute um

estudo descritivo em que o Portuguecircs eacute a segunda liacutengua mesmo em face de seu

caraacuteter nacional Essa pluralidade linguiacutestica ainda existente no paiacutes demanda a

concretizaccedilatildeo das poliacuteticas a favor da salvaguarda da diversidade no planeta

Posto que toda liacutengua sofra influecircncia das forccedilas internas e externas que agem

sobre ela partimos do pressuposto de que em qualquer pesquisa linguiacutestica natildeo

encontraremos nada de extraordinaacuterio nada que exceda a experiecircncia do

humano Dessa sorte vamos encontrar () uma estrutura linguiacutestica como

qualquer outra e em muita coisa ateacute possivelmente semelhante agrave nossa

(MATTOSO CAcircMARA-JR 1977 p7)

E quando sistemas entram em contado fenocircmenos emergentes podem ajudar a

esclarecer os princiacutepios e as restriccedilotildees que regem as liacutenguas particulares Com

base na complexidade e na riqueza que advecircm do contato linguiacutestico analisamos

203

estas forccedilas conflitantes com base nos princiacutepios de hierarquizaccedilatildeo e

regularidade que satildeo forccedilas motrizes da marcaccedilatildeo nos processos foneacuteticos Aleacutem

do fator tempo outros aspectos podem estar diretamente ligados agraves

transformaccedilotildees pelas quais uma liacutengua passa como relaccedilotildees de poder

influecircncias de outras liacutenguas subjetividade de seus falantes etc

A marcaccedilatildeo estaacute diretamente ligada agrave simetria frequecircncia e naturalidade

Entretanto Rice (2007) apresenta as caracteriacutesticas da marcaccedilatildeo agrupando-as

em dois conjuntos O primeiro envolve os termos relativos a uma marcaccedilatildeo

considerada natural ou pautada na frequecircncia e diz respeito em larga medida a

ldquophonetic basis of an oppositionrdquo Nele se encontram oposiccedilatildeo como ldquomais ou

menos naturalrdquo ldquomais ou menos complexordquo ldquomais ou menos estaacutevelrdquo ldquosujeito agrave

aquisiccedilatildeo mais ou menos tardiardquo etc (Rice 2007 p 81) O segundo grupo eacute

relativo a comportamentos de sistemas fonoloacutegicos como ser ldquosujeito ou

resultado de neutralizaccedilatildeordquo ldquoser gatilho ou alvo de assimilaccedilatildeordquo Esse grupo

portanto diz respeito agrave marcaccedilatildeo fonoloacutegica ou estrutural

No que diz respeito agrave anaacutelise dos dados quanto aos processos foneacuteticos

percebemos em nosso estudo que

Ainda que com algumas restriccedilotildees a tendecircncia agrave monotongaccedilatildeo eacute

transferida para o Portuguecircs falado por Latundecirc [satildersquogɾaɾi] ldquosangraramrdquo

[kaze] ldquocausardquo

Mesmo em variaccedilatildeo a reduccedilatildeo do onset complexo eacute transferida para o

Portuguecircs seguindo a tendecircncia que o Latundecirc tem de evitar esse tipo de

sequecircncia [bĩ katildenƱ] ldquobrincandordquo [kɛbaɾƱ] ldquoquebraramrdquo

204

O preenchimento da coda eacute evitado pelo Latundecirc processo esse que

tambeacutem eacute atestado no Portuguecircs falado por Latundecirc [pi gũta] ldquoperguntardquo

[gorsquotozƱ] ldquogostosordquo

As consoantes ɲ e ʎ mais marcadas interlinguisticamente tambeacutem o

satildeo no Latundecirc que natildeo os tecircm no seu inventaacuterio fonoloacutegico Como

resultado esses segmentos natildeo satildeo produzidos no Portuguecircs falado pelos

Latundecirc Alternativamente ocorre a substituiccedilatildeo desses fonemas por

segmentos articulatoriamente mais proacuteximos ou o seu apagamento [vimej]

ldquovermelhordquo [fila] ldquofilhardquo [farsquokĩ] ldquofaquinhardquo

A reduccedilatildeo silaacutebica eacute atuante tambeacutem atraveacutes da afeacuterese Como natildeo consta

no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc a presenccedila da fricativa alveolar surda

em posiccedilatildeo de coda essa restriccedilatildeo eacute transferida para o portuguecircs dos

Latundecirc que tambeacutem evita vocaacutebulos com mais de trecircs siacutelabas [kutatildeni]

ldquoescutandordquo [bɾa sadƱ] ldquoabraccediladordquo [fiɾ tɪ] ldquodiferenterdquo

O Latundecirc evita o onset em final de palavra adicionando uma vogal para

reorganizar o padratildeo silaacutebico A vogal mais frequente seraacute a alta anterior

[i] [harsquopazɪ] ldquorapazrdquo [dorsquosejzɪ] ldquode vocecircsrdquo

Os sons [ʃ] [ʒ] [tʃ] e [dʒ] satildeo evitados por natildeo fazerem parte do inventaacuterio

fonoloacutegico do Latundecirc de forma que a sua realizaccedilatildeo eacute mais marcada na

liacutengua O comportamento desses segmentos eacute muito variaacutevel Nos mais

jovens satildeo realizados com mais frequecircncia e nos mais velhos satildeo

reinterpretados envolvendo processos diversos [sersquogamƱ] ldquochegamosrdquo

205

[dersquosaɾƱ] ldquodeixaramrdquo [lizeɾƱ] ldquoligeirordquo [azersquota] ldquoajeitarrdquo [ʃũrsquomiɾƱ] ldquosumiramrdquo

[bursquoʒoɾƱ] ldquobesourordquo [tʃĩrsquodʒeɾƱ] ldquocinzeirordquo

A ausecircncia do contraste surdo-sonoro nas consoantes oclusivas t e k do

Latundecirc promove sua neutralizaccedilatildeo na realizaccedilatildeo das consoantes no

portuguecircs dos indiacutegenas [lsquobɾika] ~ [lsquobriga] ldquobrigardquo [s rsquotatu] ~ [se rsquotado]

ldquosentadordquo

No que tange ao comportamento das vogais meacutedias postocircnicas os

vocaacutebulos terminados em [Ʊ] tendem a ser produzidos com [ɪ] e os

terminados por [a] tendem a ser realizados com [Ʊ] que satildeo vogais menos

marcadas [kazɪ] ldquocausardquo [ lĩpɪ] ldquolimpordquo [ka besƱ] ldquocabeccedilardquo [bas tatildetƱ]

ldquobastanterdquo

A partir dos fenocircmenos observados buscamos responder agraves perguntas

norteadoras da nossa pesquisa abaixo retomadas

Fatores internos (linguiacutesticos) e externos (estruturais) interagem com os

princiacutepios da marcaccedilatildeo

Resposta Quanto aos fatores externos no que diz respeito agrave faixa etaacuteria

os mais jovens tendem a natildeo transferir os padrotildees mais marcados da sua

liacutengua para a liacutengua adquirida Em contrapartida os mais velhos

reproduzem com menor frequecircncia os padrotildees mais marcados do

Portuguecircs (liacutengua dominante)

Qual o papel da marcaccedilatildeo no contato linguiacutestico

206

Resposta A marcaccedilatildeo considerada natural responde pela escolha de

padrotildees mais ou menos marcados interlinguisticamente Por essa razatildeo

prevalece a tendecircncia agrave siacutelaba CV do que decorre o apagamento da coda e

a simplificaccedilatildeo de onset complexo De outro lado haacute o natildeo repasse da

laringalizaccedilatildeo vocaacutelica que mesmo fonoloacutegica no Latunecirc eacute menos natural

e mais marcada nas liacutenguas do mundo A marcaccedilatildeo fonoloacutegica eacute

observada na neutralizaccedilatildeo de oposiccedilotildees vaacutelidas no portuguecircs poreacutem

inexitentes na liacutengua indiacutegena como o contraste quanto agrave sonoridade nas

oclusivas e agrave escolha da vogal em posiccedilatildeo final de nomes

Efetivamente um aspecto da marcaccedilatildeo natural pode responder pelo

comportamento da marcaccedilatildeo fonoloacutegica de maneira que natildeo satildeo

caracteriacutesticas de marcaccedilatildeo oponentes entre si No caso em estudo as

duas marcaccedilotildees operam mas natildeo respondem por todos os fenocircmenos

observados Aleacutem disso o caraacuteter altamente variaacutevel das realizaccedilotildees e as

condicionantes sociais dos falantes datildeo chance para a emergecircncia de

processos mais decorrentes da falha na percepccedilatildeo do sinal sem que se

estabeleccedila a regularidade na sua produccedilatildeo

Os traccedilos mais marcados da liacutengua dominada passam para a dominante

Resposta Em alguns caso sim como a africativizaccedilatildeo do s Em outros

natildeo como o natildeo repasse da larinzalizaccedilatildeo vocaacutelica e a oposinccedilatildeo entre

vogais orais e nasais

Ademais em face dos fenocircmenos observados podemos pontuar algums

aspectos relevantes os processos que envolvem perda e permuta de segmentos

satildeo mais frequentes dos que os que envolvem ganho de segmento os segmentos

207

natildeo presentes no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc (liacutengua originaacuteria) tendem a

ser apagados ou reinterpretados pelo segmento mais proacuteximo do portuguecircs

sendo este uacuteltimo o mais frequente os traccedilos mais marcados do Latundecirc estatildeo

mais evidentes nas falas da geraccedilatildeo preacute-contato e a marcaccedilatildeo natildeo estaacute

condicionada apenas aos universais linguiacutesticos mas agraves especificidades das

liacutenguas

Por fim salientamos que o nosso propoacutesito neste estudo foi o de contribuir para a

descriccedilatildeo de liacutenguas incluindo as indiacutegenas e de abrir caminhos para o estudo

do contato linguiacutestico especialmente em niacutevel da foneacutetica e da fonologia

Ressaltamos que este trabalho natildeo encerra o estudo sobre o contato entre as

duas liacutenguas Reconhecemos que os nossos resultados representam um ponto de

partida para investigaccedilotildees posteriores as quais poderatildeo expandir o tema e

avanccedilar no campo da inter-relaccedilatildeo entre contato linguiacutestico e a marcaccedilatildeo

208

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ANEXOS

(Dados Transcritos)

parsquoguo Apagou marsquoma Mamar pegũrsquotatildenu Perguntando barsquoʃo Vassoura rsquokɔsa Coccedilar

marsquoduu Mais duro

rsquokati Quati

arsquoh ti A gente rsquootu Outro irsquoarsquov j E jaacute vem v rsquone ni Veneno pɛgũrsquoto Perguntou rsquofoʃ Foi pɾatildersquoto Plantou rsquosuzu Sujo karsquobeli Cabelo gursquoduɾu Gordura rsquootildemi Homem rsquogodu Gordo rsquopega Pegar dersquotadu Deitado

marsquotau Mataram

korsquokin Coquinho guɾirsquozĩ Gurizinho rsquotakorsquosotildenu Taacute com sono (manutenccedilatildeo) mũdi Mundo ʃursquov ni Chovendo pigũrsquota ni Perguntando sursquov ni Chovendo rsquopɔtʃa Porta kursquomigi Comigo kũversquosatildeni Conversando larsquovatildeni Lavando morsquoh di Morrendo ikursquotatildenu Escutando mursquohidu Morrido marsquohadu Amarrado irsquokutu Escuto

persquohu torsquose Pergunto a vocecirc

rsquoseja Cheia rsquoozi Hoje

rsquoʃuʊ Sujo

222

ursquozotursquopatildejrsquoagʊa Os outros apanham aacutegua

rsquotʃua Suja

bu rsquonitu Bonito

rsquokɛla Aquela

rsquomu tu Muito

vehrsquomejo Vermelho rsquomasu Manso marsquosatildedu Amansando arsquoɾisi Arisco hursquoo Avoou rsquoaga Aacutegua

rsquode tu Dentro

rsquomu tu Muito

rsquotud Tudo irsquopia Espirra isrsquopritu Espiacuterito

rsquofɔti Forte

timirsquotɛi Cemiteacuterio

tɛrsquoha Enterrar

ɔʊrsquoa Jogar (o bicho fora)

tersquoou Enterrou rsquoela Ela matildersquodatilden Mandando batorsquose Bater em vocecirc rsquotokursquotatildenu Tocirc escutando rsquobatildej Banho bɾab Brabo

rsquosɛtu Certo

Kabirsquosela Cabeceira (do rio)

karsquosi bu Cachimbo

tʃursquoveɾu Chuveiro (pau de) rsquoleti Leite rsquofutu Fruto karsquoɾoʃi Caroccedilo kaharsquopitʃu Carrapicho rsquokɾu Crua rsquomasu Massa

pe rsquoʃa Pensar

ojrsquoatildedu Olhando (idem)

pe rsquoʃatilden

Pensando

i te rsquode nu Entendendo

223

irsquokuta Escuta

kwatildedu ew piki nĩnĩ Quando eu era pequenininha

ew bĩrsquokava rorsquodeɾa cũ a lɔrsquoɾĩne

Eu brincava de roda com a Lorine

katildendu pi ĩ

Quando piin

ew tatildebȇĩ cũ a lorsquoɾine

Eu tambeacutem com a Lorine

i lsquoluɾi ku a marsquoɾi

E Lurdes com a Mariacute

mĩa matildey natildew deʃa bɾĩrsquoka

Minha matildee natildeo deixava brincar

eli bɾika corsquomigu

Ela brigava comigo

e koʃta brinrsquoka ni lsquoKotildepu E gostava de brincar no campo

mĩa matildej natildew deʃa bɾĩka Minha matildee natildeo deixava brincar

ersquoli tatildebe j diskuti Ela tambeacutem discutia

tatildebej kɾiatildesa natildew paɾa lsquonɛ Tambeacutem crianccedila natildeo para neacute

fika bahaka bɾĩkatildeni lsquonɛ Fica na barraca brincando neacute

fika gɾitatildeni Fica gritando

a mĩa matilde matildedava bɾĩka lotildeʒi A minha matildee mandava brincar longe

natildew kɛ ve baɾuj na bahaka natildew Natildeo quer ver barulho na barraca natildeo

ki falatildenu O que eu tocirc falando

ki lsquota bɾĩganu nu katildepu Que eu tava brincando no campo

a fruta kirsquoli cotildepi nɛ

A fruta que ele come neacute

kinotildemi di fɾuta Que nome de fruta

akeli iogrii nɛ

Aquele neacute

nɔy sursquopaha lsquo deli Noacutes chupava dele

so eli komenu fɾuta Soacute ali comendo fruta

noj fike mu arsquotɛ ʃersquoga meatilde note

sersquoga

Noacutes ficamos ateacute a meia noite chegar

mĩa matildej bɾiga kumigu Minha matildee brigava comigo

224

tava se ew levatildeta sedu se ew levatildeta sedu

Estava ʔ

va la nu katildepu bɾĩrsquoka Vaacute laacute no campo brincar

u katildepu lsquota satildematildedu orsquosejs O campo taacute chamando vocecircs

noj levatildersquota pɾa bɾĩrsquoka nu kotildepu Noacutes levantaacutevamos para brincar no campo

o katildepu ɛ u maj limpi O campo eacute o mais limpo

eli bɾĩkaru eli istubidu Eles brincaram eles subiram

ɛ ke katildepu num ɛ awto katildepu mũto

baso

Eacute que o campo natildeo eacute alto O campo eacute muito baixo

nɔj sersquogamu bersquobe nu i corsquome nu Noacutes chegamos bebendo e comendo

miu asadu batata e bebe nu

Milho assado batata e bebendo

ew nũm fikej ew bɾĩkava dinoti Eu natildeo fiquei eu brincava de noite

mĩa matildej natildew desa duhmi mĩa matildej bɾiga kumigo

Minha matildee natildeo deixa dormir minha matildee briga comigo

mĩa paj farsquolo sej dumi sedu se pikaɾu cobɾa Kotildemu ki darsquoi

Meu pai falou vocecircs durmam cedo se cobra picar e daiacute

vai sarsquoɾa ou vai a mɔhe Vai sarar ou vai morrer

mĩa paj bɾĩkow diskuti dele natildew Meu pai brigou porque eu natildeo escutava ele natildeo

dohmi amatildersquoɳatilde sedu vorsquose bɾĩrsquoka corsquome mũĩtu fɾuta

Dorme amanhatilde cedo vocecirc vai brincar comer muito fruto

mĩa paj natildew desa ew bɾĩka natildew Meu pai natildeo deixava eu brincar natildeo

natildew icuti dele natildew Natildeo escutei ele natildeo

cɾiatildesa icursquoto crianccedila escutou

iheni fala icursquoto ɛ A gente fala escutou eacute (a gente fala e ela ndash a crianccedila ndash escutou eacute

ni batia natilde mi batia na Natildeo batia natildeo me batia maj eli nũ sabe barsquotih Mas ele natildeo sabia bater

225

falava di bɾabu mihmu Falava bravo mesmo

matildeda agwa matildedƷɔga Mandava buscar aacutegua buscar mandioca

asa biƷu kome Assar beiju comer

nĩ tĩ aacutegua pɾa eli natildew Natildeo tinha aacutegua pra ele natildeo

mĩa matildej natildeo desa ew vĩrsquoga Minha matildee natildeo deixava eu brincar

mĩa povu

Meu povo

bĩ botilde natildew Bem bom natildeo

esi aki bisu bɾabu Esse aqui bicho brabo

mĩa povu matatildedu nosu tudo Meu povo matando o nosso tudo

e ki nomi dee ɛ E que o nome dele eacute

nũ pe rsquosa nisu aki la Natildeo pensar nisso aqui laacute

mĩa matildee falo natildew podi bɾĩka de tu

dagwa notilde

Minha matildee falou natildeo pode brincar dentro drsquoaacutegua natildeo

agwa e mũitu peɾigoso A aacutegua eacute muito perigoso

ĩdƷu vĩ i mata tudĩ nũ iscapa ũ notilde Iacutendio veio e matar tudinho natildeo escapa um natildeo

distotildena kohpu sɔ leva sɔ cabesu Destrona corpo soacute leva soacute a cabeccedila

isu aki nũ ɛ mĩa pare ti notilde Isso aqui natildeo eacute meu parente natildeo

io mimu Eu mesma

nĩge j notilde sabi Ningueacutem natildeo sabe

esi ki ĩdiu moɾava ki i uvi Esse aqui iacutendio morava aqui e ouvi

kɛbaɾu asĩ levo di Quebraram assim levou de Alternacircncia de coacutedigo

demorsquoɾo i ew sersquoge tame j Demorou e eu cheguei tambeacutem

Komi ki rapaɾi kebɾo

Como eacute que o rapaz morreu

226

ai fala pɾa eli nɛ isu ku hapazu Aiacute falou pra ele neacute Isso com o rapaz

eli moɾa debasu di paw nɛ Ele morava debaixo de pau neacute

ve tu dehubo caiw cima deli na

hedu

Vento derrubou caiu em cima dele na rede

sɔ o paj deli capow Soacute o pai dele escapou

vose da mujɛ notilde Vocecirc da mulher natildeo

akeli povu deli mĩ mata todo mĩa povu

Aquele povo dele mata todo meu povo

ĩ via pɾetu Em Veado Preto

paɾEsi kũ ƷEƷĩ Parece com Zezinho

ew moɾa hũtu aki Eu moro junto daqui

keli otɾu Aquele outro

patɾaj iɾe boɾa Para traz ir embora

ai dimorsquoɾo Aiacute demorou

sersquogo Chegou

keli cahĩ sersquogo Aquele Carlinhos chegou

sarsquoi hora orsquoʎa Saiacute fora pra olhar

arsquoi farsquolo dersquosaɾu Aiacute falou deixaram

ota lĩgwa difire ti Outra liacutengua diferente

ta sorsquoɾanu Taacute chorando

ta bĩbotilde natildew Taacute bem bom natildeo

fika tʃorsquoɾatildenu Fica chorando

mĩa pare ti desaɾu mĩa mursquoje Meus parentes deixaram minha mulher

te j bastatildeti Tem bastante

pigũta pa eli Pergunta pra ele

227

maselu kwidava Marcelo cuidava

oti tipu Outro tipo

kotildevɛsa deli nũte di notilde A conversa dele natildeo entendo natildeo

komu ki fala fire ti Como eacute que fala diferente (afeacuterese)

na kohpu uƷa No corpo usa

lizeɾu Ligeiro

tʃarsquoma eli Chamar ele

matildersquodo sabotilde pa eli Mandou sabatildeo pra ele

abɾiw pota Abriu a porta

lava motilde lava pɛ lava bɾasu Lavei a matildeo lavei o peacute lavei o braccedilo

ai ew fikej oiatildenu ai Aiacute eu fiquei olhando aiacute

fikej na pota oiatildenu cutatildeni Eu fiquei na porta olhando

nũ capa niũ Natildeo escapa nenhum

marsquoto cota piskosu Matou e cortou o pescoccedilo

kabesĩn Cabecinha

cusivi kimigu Inclusive comigo

batildeku busa sĩ Branco blusa assim

kursquomiɾu a karsquobesa da lsquoge ti Comeram a cabeccedila da gente

ũ nũ firsquokaɾi Um natildeo ficou

otirsquoĩdʒu Outro iacutendio

ʒũrsquotaɾu Juntaram

bɾirsquogamu pɾa eli Explicamos pra ele

ɔto dii ele vorsquoto dinovu Outro dia ele voltou de novo

ew sarsquoi hora Eu saiacute fora

otoɾapaj cursquoto Outro rapaz escutou

228

oʎa lotildezi Olhou longe

ew lsquoho

Eu vou

desa notilde Deixava natildeo

kuta baɾuj Escuta barulho

marsquoto tudi noɔɾa Matou tudo na hora

sɔ cabesu levo kumew Soacute a cabeccedila levou e comeu

mi a matildej cu tava Minha matildee contava

agwa tupiw tudo A aacutegua entupiu

agwa be j pɾeti mehmu Aacutegua bem preta mesmo

agwa suzi Aacutegua suja

pɾimiɾu kanɛlu Primeiro canela

i totilde paɾi Entatildeo eu parei

nu sarsquobi Natildeo sabia

pɾimeɾu u tigu Primeiro antigo

bastatildetu

Bastante

bastatildetu Bastante

todu tiɾatildenu levatildenu Tudo tirando levando

rsquokaze disu ficaɾu Por causa disso ficaram

tu kɾiatildesa Tudo crianccedila

lersquova todu mini nadu Levar toda meninada

eli mi tinu Ele mentindo

kotildemu orsquose pɾatildeta mu ito Como vocecirc planta muito (rotacismo)

nɔj kume nu aki Noacutes comendo aqui

nɔj seskɛse nu fukamu Noacutes nos esquecemos e ficamos

a noti marsquotaɾu tudu Agrave noite mataram tudo

229

eli sego gatildersquono Ele chegou enganou

kotildemiɾu Comeram

eli kotildersquoto soɾatildeni Ele contou chorando

ke j kwi kiɾo Quem que tirou

mi da mi a filu Me daacute meu filho

sɔ u ki karsquopo Soacute um que escapou

kɾirsquoa na kolu Criar no colo

vi de la u motildeti di he ti Veio de laacute um monte de gente

ew tatildebe j gotava

Eu tambeacutem gostava

na kɔba no basu

Na cobra no braccedilo

bisi u Bichinho

kabeseɾa pɛtu Cabeceira perto

mɔɾa pa basu Mora pra baixo

dirsquofisu marsquota Difiacutecil matar

sɔ bisotilde Soacute bichatildeo

ɛ h~undo Eacute fundo

pohku Porco

fɾɛsa Flecha

mi a matildej falaɾu Minha matildee falou

mi a matildej fikaɾu Minha matildee ficaram (ficou)

pɾimi mehmi Primo mesmo

tatɾa paj tambe j Trata pai tambeacutem

mi atilde ihmatilde maj vɛj Minha irmatilde mais velha

tu tia vɛj ta i Tua tia velha ta aiacute

tɾata gwau gwau ahe ti Trata igual igual a gente

230

halu hɛlarsquodo Ralo ralador

basoɾa ipi Vassoura espinho

fakotilde kotaɾu Facatildeo cortaram

hɛla matildersquodʒɔka Rala mandioca

ai dipoj Aiacute depois

ku faki pike nu Com faquinha pequena

hɛla tatildeme j Rela tambeacutem

mi a paj asirsquona Meu pai ensinar

kɔtaɾu kotilde a taba Cortaram com a taacutebua

disaɾu Deixaram

nu kotildepu No campo

la i basu Laacute embaixo

mi a paj nu hipotildedew natildew Meu pai natildeo respondeu natildeo

pesu Peixe

a notu toda A noite toda

baztatildeti poɹku la Bastante porco laacute

u digu vi Um dia que vim

mi atilde matildej kotildekorsquodo Minha matildee quando acordou

mi atilde matildej forsquola Minha matildee foi laacute

kazi gɾatildedi Quase grande

nɔj te j medu dosejzi Noacutes temos medo de vocecircs

bersquozu kumiw Beiju comeu

mohew saɾatildepi Morreu de sarampo

pigu tatildeni Perguntando

na katildepa No campo kahni asadu Carne assada

231

morsquohe tudi a Morrer tudinho

depoj ʃu miɾu Depois sumiram

dimorsquoɾo mujtu Demorou muito

mɔdi tehu Por causa da terra

ja vaj tʃarsquoi Jaacute vai sair

batildedorsquono Abandonou

fike mu arsquoi Ficamos aiacute

aʒe ti ojrsquoo A gente olhou

hatildeka karsquoɾa Arranca caraacute

tʃiɾi ga basi na Seringa para vacina

barsquotʃotilde Batom

nɔj peɾatildenu Noacutes esperando

mi asu rsquoto Me assustou

i odʒi E hoje

be j vimej Bem vermelho

otu di ʃi ma Outro de cima

sersquogo corsquohe Chegou correr

i te di be j Entende bem

mi asursquoto Me assustou

matatildenu nɔjzi Matando noacutes

mi a fila Minha filha

kumiɾu Comeram

azersquota korsquola pɾa eli Ajeitar colar pra ele

sarsquoma eli

Chamar ele

tʃega logu Chega logo

ʃiguɾow di novʊ Segurou de novo

232

dirsquoso firsquoko Deixou ficou

arsquotɛ dɛrsquozoɾa Ateacute dez horas

tʃɔ ɔjrsquoa Soacute olhar

pi gada Espingarda

pɛhtu casueɾu Perto da cachoeira

maj pɛtu Mais perto

ote la Outra laacute

pɛga pesi Pega peixe

oti kazi Outra casa

pɛga milu Pegar milho

depoj tʃumiɾu bɾatildeku Depois sumiu o branco

mi rsquode ɾu Me deram

satildegɾaɾi asi Sangraram assim

bastatildetu Bastante

atildersquoda karsquosatildedu

Andar caccedilando

mi atilde filu Meu filho

nɔj fikatildeni Noacutes ficamos

ki kursquoto Que escutou

sɔ sorsquoɾatildenu Soacute chorando

depoj deli mohidu Depois dele morrer

nu ta vɛj Natildeo taacute velho

ta noj i da Taacute novo ainda

mi atilde matildej ta bii noj i da Minha matildee ta bem nova ainda

pɛrsquoga baʒtatildetu Pegar bastante

ew persquoge Eu peguei

233

mi atilde lsquoho farsquolo Meu avocirc falou

dimuɾatildeni Demorando

tehaɾu la mehmu Enterraram laacute mesmo

mi atilde matildej soɾatildenu Minha matildee chorando

mi atilde imatilde Minha irmatilde

E cursquoɳadi deli Eacute cunhado dele

E fii deli Eacute filho dele

kursquoɳadi deli Cunhado dele

hɔba demaj Rouba demais

ta difisi Ta difiacutecil

eli tʃobɾo Ele sobrou

saɾatildepi persquogo Sarampo pegou

pɾimeɾi morsquohe Primeiro morreu

ew kutej Eu escutei

sarsquoma matildej Chamar matildee

ta dirsquovisi Taacute difiacutecil

mohew ve me nadu Morreu envenenado

ki kɾirsquoari Que criaram

mi atorsquomaɾu Me tomaram

i ew torsquoteɾu E eu solteiro

kazadu kotildersquose Casado com vocecirc

natildew firsquoka diɾetu Natildeo ficar direito

firsquoka kweli Ficar com ele

mersquosenu Mexendo

ta setu Ta certo

234

bɾabu persquoeli Bravo por ele

tasirsquooma komigu Tem ciuacutemes de mim

E gotozu Eacute gostoso

tipu bursquoʒohu Tipo besouro

tʃi rsquodʒeɾu Cinzeiro

na li gi Na liacutengua

bɾatildeku batirsquotaɾu Brancos batizaram

katildedu eɾa novi Quando era novinho

arsquoi tipoj Aiacute depois

karsquoboɾe Acabou-se

tiguɾa na matildew Segura na matildeo

rsquoɛ lsquopɾimɛ lsquodeli Eacute primo dele

asinatildeni Ensinando

ew kersquome Eu queimei

pɾatildersquota maj Plantar mais

ew vo lsquopɾatildeta Eu vou plantar

karsquokwɛ Qualquer

tabaɾava Trabalhava

tubaɾotildeni Tubaratildeo

poɾi pɛɾa Pode esperar

mi ti nu Mentindo

eli sersquogo Ele chegou

atildersquototilde Entatildeo

ta lsquosetu natildew Ta certo natildeo

mesew kotildersquomigu Mexeu comigo

235

ʃersquoga dinote Chegar de noite

lersquova pirsquotaw Levar pro hospital

ta suzu Ta sujo

rsquobahio Bairro

atildebɾarsquosada Abraccedilada

masɛlu babudo Marcelo barbudo

pɾatildeta milu Planta milho

na gɾɛba Na gleba

bɾasadu Abraccedilado

komi he tʃi Comi gente

kɛ azursquoda Quer ajudar

sotildebɾasotilde Assombraccedilatildeo

nu podi atildersquoda Natildeo pode andar

pɛga na tiheɾu Pega no terreiro

kɔviotilde Gaviatildeo

sɔ eli karsquopo Soacute ele escapou

me rsquoto Aumentou

levava uz vɛio Levava os velhos

matildenɛ desaɾu Maneacute deixaram

pusa no kabelu Puxa no cabelo

kabelu ge ti hatildega Cabelo de gente arranca

iɔga ge ti pɾa la Joga gente pra laacute

hu tu Junto

kɛma he ti queima a gente

ki sɔ a oti Que soacute haacute outro

bagas~i Bagacinho

236

tiɾatildeni katildetatildeni Tirando cantando

kɾese ni Crescendo

dirsquoɾetu Direito

febɾu marsquolaɾu Febre malaacuteria

maj sarsquobiw Mais sabia

tiɾaɾu Tiraram

batildei Banho

ipia deli Espirro dele

Korsquodadu mehmo Acordado mesmo di notu De noite

kasu Caccedila

baɾizadu otu Batizado outro

atʃi mi a ihmatilde fala Assim minha irmatilde fala

kotadu Encostado

nu zudia deli natildew Natildeo judia dele natildeo

gɔta maj deli Gosta mais dele

samatildedu otu Chamando outro

mi atilde subɾi Meu sobrinho

mi atilde pohu Meu povo

mi atilde matilde Minha irmatilde

mi atilde muʒka Minha muacutesica

sɔ bɾi ga Soacute brinca

tʃubi nu Subindo

kahega na koʃta Carrega nas costas dese Desse aiacute istu Isto katildersquoba Gambaacute

237

kursquotia Cutia kursquotʃia Cutia

marsquoɾɛlu Amarelo

versquomela versquomelo Vermelha vermelho rsquose Esse

te natildeʊ te natilde Tem natildeo

esersquoki Esse aqui

rsquoɛmarsquokakupɾersquogisi Eacute macaco preguiccedila

morsquosegi Morcego

defersquore ti Diferente

rsquopodƷi Pode

rsquosersquonatilde Sei natildeo

rsquosersquoviw Vocecirc viu

arsquoinrsquoɛgarsquoviatildew Aiacute eacute gaviatildeo

jabutʃi Jabuti

parsquoɾɛsirsquokele Parece aquele

ɛrsquokele Eacute aquele

rsquoessersquote Esse tem

be i natildeu Tambeacutem natildeo

kursquoruja Coruja

pike nu Pequeno

defersquore ti Diferente

rsquokelersquoɛrsquootro Aquele eacute outro

rsquoejarsquobutʃi E jabuti gɾatildersquodatilde grandatildeo rsquomesmu mesmo

rsquomemu Mesmo

ɔrsquoɾɔpa Europa

arsquobeja Abelha

iscɔhpiatildew escorpiatildeo

ewmɔrsquoʎa Eu molhar ~ Eu molho

pirsquodi pedir tasrsquocɾitu Ta escrito

pɛdƷi Pedi (a gente )

Kersquoma queimar

mode nu Mordendo

morsquodemas Mordeu mais rsquonoj rsquodoj Noacutes dois

aʃe ti A gente (noacutes)

rsquopadirsquoze Pra dizer

238

rsquokɔta Corta

ahatildejrsquoo Arranhou

mujrsquoɛ Mulher

ahajrsquoaelig Arranhou orsquosersquomehm Vocecirc mesmo

isrsquopi Espinho

sorsquome Somente

rsquokalo ~karsquolo Calor doi Dois

tatildebe Tambeacutem

ispi rsquogada Espingarda

persquode Perdeu

se rsquotatu Sentado

rsquohe ti Gente

arsquodidu Ardido rsquokoda Corda mərsquota Matar marsquotani matando

rsquoʃɔmarsquota Soacute matar

rsquobisu Bicho rsquoota Outra

patildersquota ~rsquopɾatildeta Plantar

atildersquodatildeni Andando

ve tatildeni Ventando

defersquore ti Diferente

hursquoatildenu Voando vorsquoto Voltou rsquopodirsquoze Pode dizer marsquotaforsquogatilden Matar afogando rsquodaga Da aacutegua (drsquoaacutegua) arsquoɾea Areia

rsquofu da Afunda

rsquokɛlaforsquogo Que ela afogou

mɛgursquola Mergulhar

eʃpɾersquome Espremer

hɛlatilden Ralando (verbo ralar)

mɔrsquolada Amolada

kwatildeni Quando arsquotia Ateia (verbo atear)

239

i pursquoha Empurrar

epursquohej Eu empurrei

pursquoha Empurrar rsquofoti Forte

rsquofosa Forccedila

rsquohapu Raacutepido

ku rsquopɛ Com o peacute

eki pursquohe Eu que empurrei

sirsquonɛlu Chinelo

i pursquohan Empurrando

sɔrsquose Soacute vocecirc

rsquotapursquohanu Taacute empurrando

sɔrsquozi Sozinho

rsquohatildeka Arrancar

rsquosɔhatildersquoka Soacute arrancar

jrsquoahatildersquoke Jaacute arranquei

arsquohatildekui rsquoʃada Arranco com a enxada

rsquopuʃa Puxar cabelo pursquoʃo Puxou pursquoʃe Puxei haʃrsquoto Arrastou haʃrsquote Arrastei

tʃirsquoa Tirar

buʃrsquoca Buscar buʃrsquoke Busquei (eu passado) rsquooto Outra rsquohopa Roupa rsquomemo Mesmo rsquodeʃa Deixa

tirsquoe Tirei

rsquosɛtu Certo

rsquohejtu Jeito iskujrsquoe Escolher rsquotakujrsquoenu Taacute escolhendo ojrsquoan Olhando

tʃumi Sumiu

dimursquoranu Demorando kersquoma Queimar ursquozotu Os outros kersquome Queimei

rsquonɔj Noacutes

rsquopejsi Peixe

Ku rsquome Comer

240

pɾicirsquoza Precisar pɾisirsquozanu Precisando korsquoseɾa Coceira mirsquoƷatilden Mijando atildersquodatildenu Andando

barsquote nu Batendo

i rsquoʃima Encima

rsquokatildem Cama atirsquoɾo Atirou

rsquohaʃarsquole Racha lenha

vɔrsquota Voltar

tursquomatilden Tomando

varsquoɾi Varinha

gɾitrsquoatilden Gritando

fɾɛrsquoga Esfregar

mirsquodi Medir

mi rsquotinu Mentindo

rsquokɔʃka Coacutecega

barsquosi u Baixinho

pɔdirsquoze Pode dizer

pe rsquota Pentear

rsquobatildej Banho rsquomaiƷrsquotadi Mais tarde rsquofoja Folha batildenarsquodo Abanador bursquonitu Bonito

rsquosersquokirsquode Vocecirc que deu

siparsquoradu Separado rsquosatildew Chatildeo

tursquodi Tudinho

karsquoe Cair kersquobɾe Quebrei arsquohatildejorsquose Arranho vocecirc rsquomuja Molha rsquosevi Serve rsquopaj Palha pirsquodi Pedir dersquosa Deixar rsquomoj Molho fɾersquovenu Fervendo pursquolo Pulou

norsquovi Novinho

241

firsquodido Fedido mursquolada Amolada

rsquonɔʃi Nosso

patildersquoneɾu Paneiro motildersquodeli Matildeo dele dursquozotu Dos outros

rsquonɔj Noacutes

rsquopodi Podre firsquodid Fedido dersquota Deitar dersquotadu Deitado cuʃtursquoɾa Costurar

barsquote m Batendo

dersquosa Deixar

rsquofɾɛʃa ~rsquofɾEʃ Flecha

iskersquosidu Esquecido

tatildersquome j Tambeacutem

abersquoli Abelhinha

me rsquodu i Amendoim

pɔrsquodirsquoze Pode dizer

rsquoavi Aacutervore

rsquopesi Peixe

tatursquozi Tatuzinho

rsquovɛja Velha

arsquodea Aldeia

rsquode tu Dentro

rsquohe ti Gente

rsquohadu Raacutedio rsquohejtu Jeito iʃtɾarsquogadu Estragado

rsquode tirsquokaza Dentro de casa

rsquopoku Porco

pihu rsquotatildenu Perguntando

gwahrsquode Guardei firsquogeɾa Figueira

kɔrsquota Cortar

ojrsquoa Olhar

pi dursquoɾa pendurar

mitʃursquoɾa Misturar

rsquofɔtʃi Forte

242

matildersquodƷɔka Mandioca

birsquoƷu Beiju

marsquoɾɛlu Amarelo

atildersquozɔ Anzol

rsquopɛda Pedra

Page 3: MARCAÇÃO NO CONTATO LINGUÍSTICO: O português falado … · Transcrição Transcrição fonética Transcrição fonológica [ ] / / Vogais Vogal médio-baixa anterior [ɛ] Vogal

Catalogaccedilatildeo na fonte

Bibliotecaacuteria Nathaacutelia Sena CRB4-1719

A524m Amorim Gustavo da Silveira Marcaccedilatildeo no contato linguumliacutestico o portuguecircs falado pelos Latundecirc

Gustavo da Silveira Amorim ndash Recife 2015 241 f il

Orientadora Stella Virgiacutenia Telles de Arauacutejo Pereira Lima Tese (Doutorado) ndash Universidade Federal de Pernambuco Centro de

Artes e Comunicaccedilatildeo Letras 2015

Inclui referecircncias

1 Fonologia 2 Liacutenguas em contato 3 Marcaccedilatildeo e liacutenguas indiacutegenas I Lima Stella Virgiacutenia Telles de Arauacutejo Pereira (Orientadora) II Tiacutetulo

410 CDD (22ed) UFPE (CAC 2017- 213)

For from him and through him and to him are all things To him be glory forever Amen

Romans 1136

AGRADECIMENTOS

A Deus por me capacitar e me fazer sentir o teu zelo cuidado e proteccedilatildeo

constantemente

Aos meus familiares em especial a minha matildee e o meu pai pelo suporte

coragem e exemplos a mim transmitidos

A minha esposa Jane pelo carinho e compreensatildeo pelas horas que natildeo

pude estar ao seu lado dedicando-me a este trabalho

Aos meus filhos Breno e Estela meu tesouros por me fazerem acreditar

que o mundo pode ser melhor

A minha orientadora Stella Telles pelo carinho compreensatildeo

engajamento e ensino por me fazer acreditar que podemos ser altruiacutestas sem

perdermos a essecircncia da humildade Por compartilhar-me com despreendemento

os seus dados

Agraves coordenadoras do PG-Letras Evandra Gligoletto e Fabiele Stockmans

pela presteza sempre que necessaacuterio

Aos meus mestres do Doutorado pelo trabalho que foi realizado durante o

curso em especial Stella Telles Marlos Pessoa Claacuteudia Roberta Siane Goes

Benedito Bezerra Virgiacutenia Leal Alberto Poza e Nelly Carvalho

Aos professores do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo (UFPE)

Flaacutevio Brainer Artur Gomes Maacutercia Mendonccedila e Joatildeo Batista pela colaboraccedilatildeo

na trajetoacuteria acadecircmica

A Abuecircndia Padilha e Gilda Lins (in memoriam) pela dedicaccedilatildeo e carinho

que demonstraram durante as aulas

Aos meus colegas do Doutorado Solange Carvalho Ana Cristina Cleber

Morgana Jaciara Carolina Pires Juliane Acircngela Socircnia Ismar Rinalda Ludimila

e Clara por me ajudarem nos momentos de dificuldades e de (muitas)

necessidades

Aos colegas da GER ndash Vale do Capibaribe pela ajuda sempre que

necessaacuterio em especial Marta Morgana Edjane e Janecleide

Aos colegas e alunos do IFAL (Instituto Federal de Alagoas) pela grande

ajuda e carinho que demonstraram durante a realizaccedilatildeo deste trabalho Pela

compreensatildeo das faltas e substituiccedilotildees que de mim foram demandadas

Aos membros da banca que tatildeo gentilmente aceitaram o convite

Aos meus amigos familiares entes queridos todos que direta ou

diretamente me ajudaram nesta caminhada Nenhum trabalho eacute feito sozinho

portanto os meacuteritos tambeacutem satildeo de vocecircs

RESUMO

O presente trabalho eacute o resultado de um estudo sobre a Marcaccedilatildeo no Contato

Linguiacutestico entre o Latundecirc e o Portuguecircs Trata-se de uma investigaccedilatildeo com

base na abordagem tipoloacutegica da linguiacutestica visando agrave elucidaccedilatildeo das unidades

mais e as menos marcadas que satildeo ou natildeo transferidas no processo de

acomodaccedilatildeo dos inventaacuterios foneacuteticos de ambas as liacutenguas Utilizamos como

base os pressupostos teoacutericos defendidos por CROFT (1990) JAKOBSON

(1953) BATTISTELLA (1996) MATRAS amp ELSIK (2006) e LACY (2006) para a

descriccedilatildeo dos universais linguiacutesticos e da marcaccedilatildeo No que tange ao contato

linguiacutestico nos respaldamos nas reflexotildees de ROMAINE (2000) THOMASON

(2001) AIKHENVALD (2007) e HYMES (1971) Para descriccedilatildeo linguiacutestica e

histoacuterica dos Latundecirc nos baseamos em TELLES (2002) ANOMBY (2009) e

PRICE (1977) No que tange ao aporte foneacutetico para descriccedilatildeo do contato entre

ambas as liacutenguas nos valemos dos escritos de WEINREICH (1953) BISOL

(1996) VAN COETSEM (1988) e MATRAS (2009) Quanto agraves anaacutelises nos

fundamentamos nas observaccedilotildees de SPENCER (1996) LASS (2000) e RICE

(2007) O nosso corpus eacute formado de trinta horas de fala transcritas

foneticamente de acordo com IPA de vinte informantes da comunidade Latundecirc

Os dados fazem parte do acervo do NEI (Nuacutecleo de Estudos Indigenistas) da

UFPE A partir da nossa pesquisa chegamos agrave conclusatildeo que os mais jovens

tendem a natildeo transferir os padrotildees mais marcados da sua liacutengua para a liacutengua

adquirida enquanto os mais velhos reproduzem com menor frequecircncia os

padrotildees mais marcados do Portuguecircs alguns contextos licenciam enquanto

outros bloqueiam a marcaccedilatildeo gerando um caraacuteter variaacutevel que demonstra o quatildeo

conflitante eacute a situaccedilatildeo do contato embora natildeo haja uma padronizaccedilatildeo no que

tange agrave estrutura silaacutebica o padratildeo CV eacute o mais recorrente e menos marcado

corroborando o que apregoa os pressupostos da tipologia linguiacutestica os

processos que envolvem perda e permuta de segmentos satildeo mais numerosos e

mais marcados dos que os que envolvem ganho de segmento os fonemas natildeo

presentes no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc tendem a ser apagados ou

reinterpretados pelo segmento mais proacuteximo do Portuguecircs quanto agrave manutenccedilatildeo

ou perda o comportamento dos traccedilos mais marcados do Latundecirc depende natildeo

categoricamente da fonologia do Portuguecircs a marcaccedilatildeo natildeo estaacute condicionada

apenas aos universais linguiacutesticos mas agraves especificidades da liacutengua

PALAVRAS-CHAVE Fonologia Liacutenguas em Contato Marcaccedilatildeo e Liacutenguas

Indiacutegenas

ABSTRACT

The present work describes phenomena of phonological transference of Latundecirc

a Brazilian indigenous language in Portuguese in language contact situation The

observed phenomena were examined under the light of the assumptions of

Linguistic Marking in its typological approach As basis we used CROFT (1990)

JAKOBSON (1953) BATTISTELLA (1996) MATRAS ELSIK (2006) and LACY

(2006) studies for the description of linguistic universals and marking About

language contact we were supported by the reflections of ROMAINE (2000)

THOMASON (2001) AIKHENVALD (2007) and HYMES (1971) For the linguistic

and historical description of Latundecirc we were based on TELLES (2002)

ANOMBY (2009) and PRICE (1977) About the phonology of Portuguese we were

supported by BISOL (1996) For description of the contact between both

languages we used the writings of WEINREICH (1953) VAN COETSEM (1988)

and MATRAS (2009) The one of phonological phenomena observed was backed

in SPENCER (1996) LASS (2000) and RICE (2007) Our corpus is formed of thirty

hours of talk phonetically transcribed according to IPA In the survey we used the

speech production of 20 individuals from the Ladundecirc people among these 8

belonging to the pre-contact generation with the non- indigenous society and 12

belonging to the post-contact generation The data are part of the acquis of NEI

(Nuacutecleo de Estudos Indiacutegenas) of UFPE With our research we came to the

following results post-contact generation tends not to transfer most marked

patterns of their language to the acquired language while the native of pre-contact

generation do in a lower frequency the more marked standards of Portuguese

The processes that involve loss and exchange of segments are more numerous

than those involving segment gain The phonemes of Portuguese that do not exist

in Latundecirc tend to be erased or reinterpreted by the closest segment to

Portuguese resulting in the loss of contrast and in the emergence of the

unmarked through the phonological neutralisation There are phenomena that

show a tendency towards the universal as the deletion of the coda in favor of CV

standard syllabic and others that are arising out of restrictions of Latundecirc as the

monophthongization of nasal diphthong and the change of vowel quality in word-

final position In the set of phenomena we noticed that the interference is variable

and not always motivated by phonological or natural marking

KEYWORDS Phonology Marking Languages in contact Portuguese and

Latundecirc

RESUMEN

El presente estudio describe los fenoacutemenos de la transferencia fonoloacutegica del

Latundeacute una lengua indiacutegena Brasilera en el portugueacutes en una situacioacuten de

contacto linguumliacutestico Los fenoacutemenos observados fueron examinados a la luz de los

presupuestos de marcacioacuten linguumliacutestica en su abordaje tipoloacutegico Como modelo

de fundamentacioacuten se han utilizado los estudios de CROFT (1990) JAKOBSON

(1953) BATTISTELLA (1996) MATRAS amp ELSIK (2006) y LACY (2006) para las

descripcioacuten de los universales linguumliacutesticos y de la marcacioacuten Sobre el contacto

linguumliacutestico fueron tomados como soporte cientiacutefico las reflexiones de ROMAINE

(2000) THOMASON (2001) AIKHENVALD (2007) y HYMES (1971) Para la

descripcioacuten linguumliacutestica de los Lantundeacute esta investigacioacuten se basoacute en TELLES

(2002) ANOMBY (2009)y PRICE (1977) Sobre la fonologiacutea del portugueacutes se

tuvieron en cuenta los estudios de BISOL (1996) Para la descripcioacuten del contacto

entre ambas lenguas fueron necesarios los escritos de WEINREICH (1053) VAN

COETSEM(1988) y MATRAS (2009) Finalmente el estudio de los fenoacutemenos

fonoloacutegicos observados fueron abordados en las investigaciones de SPENCER

(1996) LASS (2000) y RICE (2007) El corpus de este trabajo acadeacutemico estaacute

compuesto por treinta horas de diaacutelogos transcritos foneacuteticamente de acuerdo con

el IPA En la investigacioacuten se ha utilizado la produccioacuten del diaacutelogo de 20

individuos del pueblo Latundeacute dentro de ellos 8 pertenecientes a la generacioacuten

del pre contacto con la sociedad no indiacutegena y 12 pertenecientes a la generacioacuten

del post contacto Los datos hacen parte del acervo del Nuacutecleo de Estudios

Indigenistas (NEI) de la UFPE Con esta investigacioacuten se ha llegado a la siguiente

conclusioacuten La generacioacuten post contacto tiende a no transferir los patrones maacutes

acentuados de su lengua hacia la lengua adquirida mientras que los indiacutegenas de

la generacioacuten del pre contacto realizan con menor frecuencia los patrones maacutes

marcados del portugueacutes Los procesos que envuelven la peacuterdida y permuta de los

segmentos son maacutes numerosos de aquellos que involucran la ganancia del

segmento Los fonemas del portugueacutes que no existen en el Latundeacute tienden a ser

borrados o reinterpretados por el segmento maacutes proacuteximo al portugueacutes resultando

en una peacuterdida de contraste y en la emergencia del no marcado a traveacutes de la

neutralizacioacuten fonoloacutegica Hay fenoacutemenos que revelan una tendencia a lo

universal como desvanecimiento de la coda en a favor de patroacuten silaacutebico CV y

otros que son consecuencia de las restricciones del Latundeacute como la

monoptongacioacuten de diptongo nasal y la mudanza de la cualidad vocaacutelica en

posicioacuten final de la palabra El en conjunto de fenoacutemenos verificamos que la

interferencia es variable y no siempre estaacute motivada por la acentuacioacuten fonoloacutegica

o natural

Palabras Clave Fonologiacutea Acentuacioacuten Lenguas en Contacto Portugueacutes y

Latundeacute

LISTA DE SIacuteMBOLOS

Transcriccedilatildeo

Transcriccedilatildeo foneacutetica

Transcriccedilatildeo fonoloacutegica

[ ]

Vogais

Vogal meacutedio-baixa anterior [ɛ]

Vogal meacutedio-alta anterior [e]

Vogal alta anterior [i]

Vogal baixa central [a]

Vogal meacutedio-baixa posterior [ɔ]

Vogal meacutedio-alta posterior [o]

Vogal alta posterior [u]

Vogal alta anterior nasal [ i ]

Vogal meacutedio-alta anterior nasal [e ]

Vogal baixa central nasal [atilde]

Vogal meacutedio-alta posterior nasal [otilde]

Vogal alta posterior nasal [u ]

Consoantes

Oclusiva alveolar surda [t]

Oclusiva alveolar sonora [d]

Fricativa alveolar surda [s]

Fricativa alveolar sonora [z]

Nasal alveolar [n]

Lateral alveolar [l]

Africada alveopalatal surda [tʃ]

Africada alveopalatal sonora [dʒ]

Lateral palatal [ʎ]

Nasal palatal [ɳ]

Fricativa palatal surda [ʃ]

Fricativa palatal sonora [ʒ]

Oclusiva velar surda [k]

Oclusiva velar sonora [g]

Fricativa velar [x]

Oclusiva bilabial surda [p]

Oclusiva bilabial sonora [b]

Nasal bilabial [m]

Fricativa labiodental surda [f]

Fricativa labiodental sonora [v]

LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 Diagrama de Hall

67

FIGURA 2 Configuraccedilotildees da Mescla Linguiacutestica segundo Romaine (2000 p185)

71

FIGURA 3 Esquema de representaccedilatildeo do bilinguismo social segundo Appel e Muysken (1986 p 23)

74

FIGURA 4 Escolha de liacutengua e code-switching conforme Grosjean (1982 p127)

82

FIGURA 5 Classificaccedilatildeo das liacutenguas da Famiacutelia Nambikwaacutera de acordo com Rodrigues (1986 p 134)

87

FIGURA 6 Localizaccedilatildeo e aacuterea dos Nambikwaacutera de acordo com Roquete-Pinto (1919)

88

FIGURA 7 Territoacuterio Nambikwaacutera descrito por Price (1983)

89

FIGURA 8 Localizaccedilatildeo atual dos Nambikwaacutera

91

FIGURA 9

Localizaccedilatildeo da TI Tubaratildeo-Latundecirc

94

FIGURA 10

Primeiros contatos com os Latundecirc (Foto Price 1977)

97

FIGURA 11 Iacutendios Latundecirc na TI Tubaratildeo-Latundecirc

104

FIGURA 12

Ligaccedilotildees entre a intensidade do bilinguismo o tipo de processo de acomodaccedilatildeo e sobreposiccedilatildeo entre os sistemas fonoloacutegicos

118

FIGURA 13

Correspondecircncia entre liacutenguas e contato linguiacutestico

120

FIGURA 14 Agentividade da Liacutengua Recipiente de acordo Van Coetsem 1988 p10

122

FIGURA 15 Agentividade da Liacutengua de Origem de acordo Van Coetsem 1988 p11

122

FIGURA 16 Relaccedilatildeo de agentividade entre o Portuguecircs e o Latundecirc

123

FIGURA 17 Estrutura silaacutebica do Latundecirc

168

FIGURA 18 Estrutura silaacutebica do Portuguecircs (Cacircmara-Juacutenior)

169

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Unidades e estruturas mais marcadas conforme

levantamento de Moreira da Silva (2011)

50

Quadro 2 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Leacutevi-Strauss (1948)

92

Quadro 3 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Price e Cook (1969)

93

Quadro 4 Distribuiccedilatildeo dos povos pertencentes a TI Tubaratildeo-Latundecirc

95

Quadro 5 Nuacutecleos familiares de acordo com a habitaccedilatildeo em 1999

98

Quadro 6 Situaccedilatildeo sociolinguiacutestica dos Latundecirc (dados de 1999)

101

Quadro 7 Quadro Comparativo dos Sistemas Foneacuteticos do Romansh e do Schweizerdeutsch de acordo com Weinreich (1953)

111

Quadro 8 Tipos de processos que conduzem a mudanccedila fonoloacutegica induzida por contato

116

Quadro 9 Fonemas consonantais do Latundecirc

125

Quadro 10 Fonemas vocaacutelicos do Latundecirc

125

Quadro 11 Ditongos do Latundecirc

126

Quadro 12 Descriccedilatildeo dos fonemas consonantais (Retirada de Telles 2002)

126

Quadro 13 Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos orais (Com base em Telles 2002)

149

Quadro 14

Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos nasais (Com base em Telles 2002)

153

Quadro 15

Vogais no Portuguecircs (Cacircmara Jr 1970)

154

Quadro 16

Consoantes no Portuguecircs (Silva 2002)

155

Quadro 17 Sistemas consonantais x Sistemas vocaacutelicos

156

Quadro 18 Resultado mais frequente do processo de monotongaccedilatildeo em Latundecirc

162

Quadro 19 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Latundecirc

166

Quadro 20 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Portuguecircs

167

Quadro 21 Escala de Sonoridade (Bonet e Mascaroacute 1997 p 109)

196

SUMAacuteRIO

1 SOBRE A PESQUISA 20

11 INTRODUCcedilAtildeO 20

12 JUSTIFICATIVA 24

13 OBJETIVOS 25

14 METODOLOGIA 26

15

DISPOSICcedilAtildeO DA TESE 27

2 MARCACcedilAtildeO LINGUIacuteSTICA 29

21 INTRODUCcedilAtildeO 29

22 MARCACcedilAtildeO 31

221 A concepccedilatildeo de Jakobson e Trubetzkoy 35

222 Abordagem Gerativa 37

223 Abordagem Tipoloacutegica (Interlinguiacutestica) 39

224 Abordagem Naturalista (Morfologia Natural) 41

23 CRITEacuteRIOS DE MARCACcedilAtildeO 42

24 MARCACcedilAtildeO MUDANCcedilA E CONTATO LINGUIacuteSTICO 45

25 JAKOBSON E A ABORDAGEM FONOLOacuteGICA DA

MARCACcedilAtildeO

48

3 O CONTATO LINGUIacuteSTICO 54

31 INTRODUCcedilAtildeO 54

32 SOBRE O CONTATO LINGUIacuteSTICO 57

33 MESCLAS DE CONTATO PIDGIN CRIOULO LIacuteNGUA

FRANCA E JARGAtildeO

60

331 Pidgin 63

332 Crioulo 65

333 Liacutengua Franca ou Sapir 69

334 Jargatildeo 71

34 IMPLICACcedilOtildeES DO CONTATO LINGUIacuteSTICO 72

341 Bilinguismo 72

342 Diglossia 78

343 Alternacircncia de coacutedigo 80

344 Morte da liacutengua

83

4 COMUNIDADE DE ESTUDO OS LATUNDEcirc 86

41 INTRODUCcedilAtildeO 86

42 A FAMIacuteLIA NAMBIKWARA 86

43 OS LATUNDEcirc

94

5 INTERFEREcircNCIA FONEacuteTICO-FONOLOacuteGICA DO LATUNDEcirc

NO PORTUGUEcircS

106

51 INTRODUCcedilAtildeO 106

52 INTERFEREcircNCIA FUSAtildeO COEXISTEcircNCIA E

TRANSFEREcircNCIA LINGUIacuteSTICA

107

53 FONOLOGIA DO LATUNDEcirc 124

54 FONOLOGIA DO PORTUGUEcircS 154

55 COMPARACcedilAtildeO ENTRE OS SISTEMAS FONEacuteTICOS DO

PORTUGUEcircS E DO LATUNDEcirc

156

6 PROCESSOS FONOLOacuteGICOS DO PORTUGUEcircS FALADO

PELOS LATUNDEcirc

158

61 Introduccedilatildeo 158

611 Perda de elementos 161

6111 Monotongaccedilatildeo 161

6112 Siacutencope em onset complexo de l e r 168

6113 Apagamento da coda 171

6114 Reduccedilatildeo do geruacutendio ndash Anteriorizaccedilatildeo da vogal final 173

6115 Reduccedilatildeo das palatais (nasal e lateral) 174

6116 Afeacuterese 177

6117 Apoacutecope 178

6118 Siacutencope 180

612 Ganho de elementos (Inserccedilatildeo de elementos) 181

613 Alteraccedilatildeo de elementos (permuta ou transposiccedilatildeo) 184

6131 Despalatalizaccedilatildeo de [ʃ] e [ʒ] 184

6132 Palatalizaccedilatildeo 186

6133 Vozeamento e desvozeamento 189

6134 Abaixamento e elevaccedilatildeo das vogais orais 191

6135 Nasalizaccedilatildeo e desnasalizaccedilatildeo 194

6136 Fenocircmenos envolvendo os roacuteticos 195

6137 Labializaccedilatildeo e deslabializaccedilatildeo 197

6138 Metaacutetese 198

6139 Siacutestole 199

61310 Fortalecimento

200

7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

201

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS

208

ANEXOS 221

20

1 SOBRE A PESQUISA

O estudo dessas liacutenguas eacute evidentemente de grande importacircncia para o incremento dos conhecimentos linguiacutesticos Cada nova liacutengua que se investiga traz novas contribuiccedilotildees agrave linguiacutestica cada nova liacutengua eacute outra manifestaccedilatildeo de como se pode realizar a linguagem

humana Cacircmara Jr (1977 p 4)

11 INTRODUCcedilAtildeO

Neste capiacutetulo discorreremos sobre a diversidade e a situaccedilatildeo das liacutenguas

indiacutegenas brasileiras1 bem como a motivaccedilatildeo para o presente estudo Tambeacutem

faratildeo parte desta introduccedilatildeo a justificativa para a realizaccedilatildeo desta pesquisa os

objetivos almejados os procedimentos metodoloacutegicos e a descriccedilatildeo da estrutura

da tese

Por se tratar de um estudo que diz respeito agrave linguiacutestica indigenista brasileira vale

iniciar a discussatildeo situando aqueles que satildeo os sujeitos da nossa pesquisa os

iacutendios Sabe-se que os povos indiacutegenas satildeo vistos geralmente como personagens

passivos na da nossa histoacuteria Eacute um equiacutevoco concebecirc-los na nossa narrativa

dessa forma pois seja no papel de aliados ou de inimigos esses povos tiveram

um papel importante na formaccedilatildeo de sociedades coloniais e poacutes-coloniais

(ALMEIDA 2013 p9)

1 Aleacutem do portuguecircs haacute no Brasil aproximadamente 180 liacutenguas indiacutegenas faladas por 225 etnias

Dessas liacutenguas 110 satildeo consideradas em extinccedilatildeo pelo fato de serem faladas por menos de 500 pessoas Estima-se que em 1500 cerca de seis milhotildees de iacutendios falavam 1078 idiomas Hoje a populaccedilatildeo indiacutegena brasileira chega a no maacuteximo entre 440 mil e 500 mil indiviacuteduos Atribui-se o desaparecimento das liacutenguas indiacutegenas agraves pressotildees poliacuteticas do colonizador e posteriormente agraves necessidades de sobrevivecircncia das populaccedilotildees indiacutegenas Revista Liacutengua portuguesa n 26 p 57 2010

21

Embora natildeo seja amplamente divulgado no Brasil haacute cerca de 180 liacutenguas

indiacutegenas o que nos torna um paiacutes plurilinguiacutestico Esse percentual era de 1200

antes da chegada dos portugueses Durante esses cinco seacuteculos de colonizaccedilatildeo

um glotociacutedio foi visto intensificamente no nosso territoacuterio

Mesmo sendo viacutetimas de um processo de colonizaccedilatildeo desenfreado e

escravizador estes povos com o tempo passaram a ser reconhecidos como

agentes na sociedade Suas accedilotildees satildeo vistas a partir de um recente periacuteodo

histoacuterico como importantes para explicar a histoacuteria deles e consequentemente a

nossa Saindo de um quadro de contato onde eram vistos como coadjuvantes

passando a ser tambeacutem protagonistas

Hoje os estudos indigenistas satildeo mais frequentes uma vez que na antropologia

atual os povos que foram definidos como aculturados passaram a ser

coadjuvantes de um processo histoacuterico e participativo

A reportagem da Revista Continente Maio de 2009 sobre os Fulniocirc faz parte de

um arsenal que descreve o que jaacute eacute sabido pela comunidade cientiacutefica as liacutenguas

indiacutegenas brasileiras estatildeo desaparecendo em ritmo acelerado Posto dessa

forma podemos perceber que haacute urgecircncia em descrever como tais liacutenguas se

comportam em si e em contatos com outras

Cacircmara-Juacutenior (1977 p 7) postula que os estudos indigenistas mais

precisamente sobre os de suas liacutenguas constitui no Brasil uma tarefa natildeo

somente enorme mas tambeacutem urgente Hoje meio seacuteculo depois esta citaccedilatildeo se

faz atual Os estudos indigenistas ainda se monstram tiacutemidos e carentes de

recursos e pesquisadores

22

Em continuidade o autor afirma que

Jaacute desapareceram no Brasil muitas liacutenguas agora totalmente irrecuperaacuteveis para a ciecircncia Eacute muito difiacutecil avaliar hoje em dia quantas liacutenguas se teriam falado no Brasil haacute 400 anos na eacutepoca do descobrimento do paiacutes pelos europeus Mas a quantidade de liacutenguas que subsistem ainda hoje () eacute ainda um nuacutemero consideraacutevel ndash cento e tantas Todas elas entretanto estatildeo ameaccediladas de desaparecer dentro de muitos poucos anos

O fato eacute que precisamos catalogar essas liacutenguas e como elas agem durante o

contato linguiacutestico Esses estudos satildeo de grande valia porque podem mostrar

como se deu analogicamente o contato do portuguecircs com outras liacutenguas E as

evidecircncias aqui encontradas contribuiratildeo para a descriccedilatildeo linguiacutestica aleacutem de

proporcionar agraves geraccedilotildees futuras o conhecimento mais apurado sobre as liacutenguas

de contato

Sobre esta relaccedilatildeo Almeida (idem p 14) afirma que

[] As relaccedilotildees de contato com sociedades envolventes e vaacuterios processos de mudanccedila cultural vivenciados pelos grupos indiacutegenas eram considerados simples relaccedilotildees de dominaccedilatildeo impostas aos iacutendios de tal forma que natildeo lhes restava nenhuma margem de manobra a natildeo ser a submissatildeo passiva a um processo de mudanccedilas culturais que os levaria a serem assimilados e confundidos com a massa da populaccedilatildeo

A autora ainda reitera que ldquoas relaccedilotildees de contato eram entatildeo grosso modo

vistas como relaccedilotildees de dominaccedilatildeo submissatildeo na qual uma cultura se impunha

sobre a outra anulando-ardquo p16

23

O contato entre liacutenguas contribuiu para o leacutexico portuguecircs2 E eacute o contato

linguiacutestico um dos fatores que coloca o iacutendio em situaccedilatildeo ativa na histoacuteria do

Brasil mesmo apoacutes o decreto do Marquecircs de Pombal3

Todavia assim como ocorrera com os negros eacute possiacutevel que o contato com

iacutendios possa ter influenciado outros niacuteveis da nossa gramaacutetica 4

Seki (1995 p 33) ao discutir sobre a situaccedilatildeo das liacutenguas indiacutegenas brasileiras

diz que

Essas estimativas devem ser ainda consideradas com certa cautela pois as liacutenguas indiacutegenas encontram-se sob as mais diferentes pressotildees sofrendo o impacto do crescente contato com a populaccedilatildeo envolvente e a liacutengua majoritaacuteria Contudo natildeo haacute em geral levantamentos que permitam estabelecer com maior margem de exatidatildeo os reflexos do impacto do Portuguecircs nos distintos grupos em termos de deslocamento de liacutengua indiacutegena tanto no que se refere a graus de bilinguismo monolinguismo quanto no que se refere agrave interferecircncia do Portuguecircs nessas liacutenguas nem sempre claramente perceptiacutevel nas fases iniciais mas que vai aos poucos contribuindo para a perda da liacutengua minoritaacuteria

2 Citamos aqui como exemplos o caso dos grupos de palavras oriundos de outros povos que

foram acoplados ao nosso leacutexico como indianismos e africanismos 3 Para estabelecer uma comunicaccedilatildeo com os nativos os portugueses foram aprendendo os

dialetos e idiomas indiacutegenas A partir do tupinambaacute falado pelos grupos mais abertos ao contato com os colonizadores criou-se uma liacutengua geral comum a iacutendios e natildeo-iacutendios O crescente nuacutemero de falantes do portuguecircs comeccedila a tornar o bilinguumlismo das famiacutelias portuguesas no paiacutes cada vez menor Em 17 de agosto de 1758 a liacutengua portuguesa se torna idioma oficial do Brasil atraveacutes de um decreto do Marquecircs de Pombal que tambeacutem proiacutebe o uso da liacutengua geral Disponiacutevel em httpwwwcomcienciabrreportagenslinguagemling03htm em 18122014 4 Alguns estudiosos afirmam que as influecircncias natildeo se restringiram apenas ao vocabulaacuterio

Jacques Raimundo em O Elemento Afro-Negro na Liacutengua Portuguesa aponta algumas mudanccedilas foneacuteticas iniciadas na fala dos escravos que ainda se mantecircm em algumas variedades do portuguecircs do Brasil as vogais meacutedias pretocircnicas e e o passam a ser pronunciadas como vogais altas respectivamente i e u (mininu nuticcedila) as vogais tocircnicas de palavras oxiacutetonas terminadas em s mesmo as grafadas com z se tornam ditongos (atrais mecircis vecircis) a marca de terceira pessoa do plural nos verbos do preteacuterito perfeito se reduz a o (fizero caiacutero tocaro)Em 1822 Jeroacutenimo Soares Barbosa registrava em sua Grammatica Philosophica uma peculiaridade sintaacutetica originada na fala dos escravos que ateacute hoje eacute apontada como uma das distinccedilotildees entre o portuguecircs falado em Portugal e o que se fala no Brasil a colocaccedilatildeo de pronomes aacutetonos antes dos verbos (mi deu ti falocirc) Disponiacutevel em httpwwwcomcienciabrreportagenslinguagemling03htm em 18122014

24

Embora a preocupaccedilatildeo da maioria dos estudiosos de liacutenguas indiacutegenas seja com

as liacutenguas minoritaacuterias esta pesquisa trafega no sentido contraacuterio ao buscar

descrever a influecircncia dessas liacutenguas tidas como fraacutegeis no indioma nacional

Vale ressaltar que mesmo em territoacuterio nacional o portuguecircs aqui eacute tido como

segunda liacutengua

12 JUSTIFICATIVA

O contato linguiacutestico e suas consequecircncias se datildeo em todas as liacutenguas do

mundo No entanto no que tange ao desaparecimento de liacutenguas o prejuiacutezo eacute

maior uma vez que a natildeo catalogaccedilatildeo dessas liacutenguas geraria um deacuteficit linguiacutestico

que poderia prejudicar os estudos linguiacutesticos vigentes e futuros aleacutem dos

problemas humanos advindos do processo de aculturaccedilatildeo entre povos

Ao corroborar com esta acertiva Telles (2009 p25) afirma que

Quando um povo perde uma liacutengua tambeacutem perde diversidade humana perdem-se meios de compreensatildeo e explicaccedilatildeo do mundo perdem-se soluccedilotildees de adaptalidade do homem ao meio perde-se o conhecimento do potencial e do usufruto sustentaacutevel deste meio Enfim perdem-se conhecimentos fundamentais que venham a coloborar para a continuidade da sobrevivecircncia do homem no planeta

O estudo de uma liacutengua diferente da nossa pode nos dar a impressatildeo de que

vamos encontrar algo distante da nossa realidade O que natildeo eacute verdade visto

que as semelhanccedilas linguiacutesticas satildeo em maior nuacutemero Cacircmara-Juacutenior (1977

p18)

25

Antes da perda total de uma liacutengua que pode ser assim configurado ou natildeo o

processo inicial se daacute pelo contato entre elas Soacute depois de existirem lado a lado

eacute que tais liacutenguas podem a depender da dinacircmica se fundirem desaparecerem

ou conviverem entre si

No caso do relacionamento entre o Latundecirc e o Portuguecircs percebe-se que tal

contato caminha para o desparecimento do Latundecirc dado as circunstacircncias

histoacutericas e sociais pelas quais esta liacutengua tem passado Hoje este povo eacute

composto de 20 falantes dispersos Como os mais novos natildeo podem coabitar

entre si a continuidade da etnia estaacute com os dias marcados Logo torna-se

urgente as tentativas de descriccedilatildeo da liacutengua e de seu comportamento

Analisar e descrever o contato com base nos padrotildees de marcaccedilatildeo e simetria

contribuiraacute com o princiacutepio de naturalidade que eacute pre-requesito para a tipologia

linguiacutestica No mais as investigaccedilotildees sobre o contato linguiacutestico satildeo de grande

valia para o conhecimento mais apurado das liacutenguas do mundo e da nossa liacutengua

especificamente

13 OBJETIVOS

Esta pesquisa objetiva o estudo da interferecircncia foneacutetica do Latundecirc no

Portuguecircs levando em consideraccedilatildeo o papel da marcaccedilatildeo no contato linguiacutestico

entre estas liacutenguas Tambeacutem busca refletir sobre os processos foneacuteticos oriundos

do contato e como eles se evidenciam a partir das liacutenguas em xeque

26

No decorrer da tese aleacutem dos objetivos postos aqui buscaremos responder as

questotildees postuladas

Investigar se os fatores internos (linguiacutesticos) e externos (estruturais)

interagem com os princiacutepios da marcaccedilatildeo

Identificar qual o papel da marcaccedilatildeo no contato linguiacutestico

Verificar se e quais os traccedilos mais marcados da liacutengua dominada passam

para a dominante

Dessa forma ao refletirmos sobre as questotildees acima esperamos contribuir com

os estudos dos universais linguiacutesticos e da cogniccedilatildeo humana

14 METODOLOGIA

O corpus utilizado nesta pesquisa foi coletado pela professora Stella Virgiacutenia

Telles e faz parte do NEI ndash Nuacutecleo de Estudos Indigenistas ndash da Universidade

Federal de Pernambuco Os dados foram gravados em CDrsquos em formato wave e

estruturados em forma de perguntas e respostas DID ndash Diaacutelogo entre

entrevistador e entrevistado

Foram escutados aproximadamente 30 horas de gravaccedilatildeo de fala dos 20

informantes Latundecirc Incialmente analisamos de oitiva os dados que foram

depois transcritos foneticamente com base no Alfabeto Foneacutetico Internacional -

IPA e organizados em tabelas Apoacutes segunda anaacutelise em caso de duacutevidas os

dados foram submetidos ao programa PRAAT para melhor audiccedilatildeo No que tange

27

agrave anaacutelise os dados foram disponibilizados em tabelas e enumerados com os

respectivos comentaacuterios abaixo

15 DISPOSICcedilAtildeO DA TESE

Para este estudo utilizamos os pressupostos cientiacuteficos da tipolologia linguiacutestica

de base aleacutem de autores que foquem em seus estudos contato interferecircncia

foneacutetica marcaccedilatildeo e naturalidade

No capiacutetulo 1 discorremos sobre os elementos basilares da tese justificativa

objetivos perguntas norteadoras metodologia e disposiccedilatildeo da tese

No capiacutetulo 2 trataremos sobre a marcaccedilatildeo Nele abordaremos o conceito de

marcaccedilatildeo e sua relaccedilatildeo com os princiacutepios de simetria e naturalidade Veremos a

partir do panorama de Matras amp Elsik (2006) Battistella (1996) Lacy (2006) as

abordagens de marcaccedilatildeo estruturalista gerativa tipoloacutegica e naturalista

Na seccedilatildeo 23 discorreremos sobre os criteacuterios de marcaccedilatildeo e na seccedilatildeo 24

sobre a mudanccedila linguiacutestica contato e marcaccedilatildeo Nos deteremos aos estudos de

Jakobson na abordagem fonoloacutegica na seccedilatildeo 25 bem como os universais

linguiacutesticos para a marcaccedilatildeo observados por Moreira da Silva (2011) em

contraponto com os padrotildees mais marcados do Latundecirc

No Capiacutetulo 3 o contato linguiacutestico seraacute nosso escopo Nele discutiremos os tipos

de mesclas de contato pidgin crioulo liacutengua Franca e jargatildeo a partir dos

pressupostos de Tarallo e Alkimin (1987) Calvet (2004) Couto (2001) Hall

28

(1996) Hymes (1971) Romaine (2000) e AiKhenvald e Dixon (2006)

Abordaremos tambeacutem a diglossia conforme Ferguson (1991) a alternacircncia de

coacutedigo de acordo com Auer (1999) Morte de liacutengua segundo Mcmahon (1994)

Trask (2004) e Cristoacutefaro-Silva (2002)

No capiacutetulo 4 apresentaremos a comunidade de estudo os Latundecirc Inicialmente

com base em Rodrigues (1995) Roquete-Pinto (1919) Leacutevi-Strauss (1946) Price

e Cook (1969) Anomby (2009) e Telles (2002) faremos uma descriccedilatildeo dos povos

e famiacutelias indiacutegenas do Brasil e dos Latundecirc especificamente Recapitularemos o

contexto histoacuterico formaccedilatildeo contato com os outros povos indiacutegenas e com os

natildeo iacutendios limites geograacuteficos e situaccedilatildeo atual

No capiacutetulo 5 trataremos da interferecircncia e transferecircncia foneacutetica do Latundecirc

para o Portuguecircs Com base em Cristoacutefaro-Silva (2002) Bisol (1996) Weinreich

(1953) Van Coetesem (1988) e Matras (2009) discutiremos os processos de

interferecircncia fusatildeo coexistecircncia e transferecircncia linguiacutestica Apresentaremos os

aspectos mais relevantes da fonologia Latundecirc e do Portuguecircs

No capiacutetulo 6 faremos as anaacutelises dos processos foneacuteticos presentes no contato

do Latundecirc com o Portuguecircs A partir da perspectiva claacutessica de perda

manutenccedilatildeo ou ganho de elementos discutiremos sobre quais os processos

foneacuteticos mais marcados do Latundecirc permanecem ou natildeo atestados no

Portuguecircs falado por Latundecirc

Por fim chegaremos agraves divagaccedilotildees finais dos resultados configurados na

pesquisa e agrave perspectiva de continuidade do trabalho Nos anexos encontram-se

os dados analisados transcritos foneticamente e dispostos em tabelas

29

2 MARCACcedilAtildeO LINGUIacuteSTICA

A nossa vida eacute mesmo assim Crescemos uns qual aacutervore indivisa levados pela forccedila de um destino retiliacuteneo como as palmeiras crescem

outros com a vida ramificada pelos empuxos ambientes Pretendemos Tentamos Retrocedemos

Afinal caminhamos na diretriz primitivamente escolhida quando o tempo nos concede alcanccedilar crescemos como as lianas5

(ROQUETTE-PINTO 1919 p 37)

21 INTRODUCcedilAtildeO

Eacute fato que o universo eacute regido por leis naturais O que aparentemente demonstra

ser fruto da eventualidade eacute um conjunto de princiacutepios explicaacuteveis que agem de

forma complementar sob as forccedilas centriacutefugas e centriacutepetas Com a liacutengua(gem)

natildeo diferentemente enquanto sistema de relaccedilotildees ela reflete estas

caracteriacutesticas Para Croft (2003 p 25) ela reflete a tensatildeo entre duas tendecircncias

concorrentes - uma em direccedilatildeo agrave regularidade a outra em direccedilatildeo agrave

hierarquizaccedilatildeo

Com o objetivo de melhor compreensatildeo dos pressupostos da tese neste capiacutetulo

nos deteremos agrave compreensatildeo dos conceitos de marcaccedilatildeo assimetria e

naturalidade Oriundos da linguiacutestica de base estes termos estatildeo relacionados

aos universais linguiacutesticos A complexidade destes conceitos por outro lado

apontam para o que eacute individual e para o que eacute geral Tem a ver com o que jaacute

defendia Chomsky ao estabelecer a dicotomia Princiacutepios x Paracircmetros

Obviamente posta a complexidade da liacutengua esses ldquoagentesrdquo da linguagem

5 Espeacutecie de trepadeira que manteacutem sua raiz no solo mas necessita de um suporte para manter-

se ereta e crescer em direccedilatildeo agrave luz

30

estatildeo submetidos tambeacutem aos fatores internos e externos nas liacutenguas do mundo

Logo o que eacute marcado numa liacutengua pode natildeo ser em outra ou podem ocorrer

marcaccedilotildees mais globais

Matras e Elsik (2006 p12) discorrem que

A tarefa da teoria linguiacutestica eacute a nosso ver descrever como essas tendecircncias concorrentes satildeo responsaacuteveis pela formaccedilatildeo de estruturas linguiacutesticas Trata-se de um jogo a niacutevel local de vaacuterios fatores a estrutura e sua funccedilatildeo na comunicaccedilatildeo o membro e o valor que ela representa tanto dentro do paradigma e em um quadro conceitual mais universal a natureza do processo especiacutefico envolvido na formaccedilatildeo a estrutura e a motivaccedilatildeo para aplicar esse processo para o paradigma ou partes dele Esta complexa interaccedilatildeo de fatores nunca eacute preacute-determinada uma vez que diferentes combinaccedilotildees de fatores tornaratildeo resultados diferentes A este respeito tomamos uma visatildeo imparcial do que condiccedilatildeo marcada eacute e se eacute ou natildeo uma estrutura eacute marcado ldquoem comparaccedilatildeo com a outrardquo Em vez disso nosso interesse eacute em explorar padrotildees nos resultados de diferentes combinaccedilotildees de fatores em niacutevel local

A assimetria e a naturalidade efetivamente teriam uma relaccedilatildeo direta com a

marcaccedilatildeo O que eacute assimeacutetrico tende a ser mais marcado e menos natural Por

outro lado o que eacute mais natural tende a ser menos marcado e mais simeacutetrico

Esta eacute uma condiccedilatildeo elementar mas natildeo totalitaacuteria para as liacutenguas do mundo

Para Batistella (1996 p115) haacute um nuacutemero de pesquisadores que sugerem

formas especiacuteficas em que as condiccedilotildees de marcaccedilatildeo desempenham um papel

na descriccedilatildeo na alteraccedilatildeo ou na aquisiccedilatildeo da liacutengua(gem) exercendo uma

funccedilatildeo relevante na definiccedilatildeo da gramaacutetica oacutetima agravequela que eacute o resultado

satisfatoacuterio na teoria da otimalidade6

6 Mesmo natildeo trabalhando diretamente com a teoria da otimalidade nesta tese eacute vaacutelido ressaltar

que os princiacutepios de marcaccedilatildeo simetria e naturalidade fazem parte do arcabouccedilo teoacuterico de seu axioma

31

No que diz respeito agrave fonologia aacuterea da linguiacutestica sob a qual se debruccedila o objeto

de estudo desse trabalho Battistella (1966 p65) observa que condiccedilatildeo marcada

eacute uma propriedade da relaccedilatildeo entre os dois sinais de um paradigma diacriacutetico

que eacute em parte independente da substacircncia linguiacutestica articulaccedilatildeo e percepccedilatildeo e

deve ser definido principalmente como conceitual

No que se refere aos conceitos postos aqui utilizaremos os pressupostos teoacutericos

defendidos por CROFT (1996 2003) JAKOBSON (1953) BATTISTELLA (1996)

MATRAS amp ELSIK (2006) para descriccedilatildeo teoacuterica e abordagem histoacuterica e LACY

(2006) para a descriccedilatildeo dos universais marcados para tratarmos das elucidaccedilotildees

sobre Marcaccedilatildeo Tipoloacutegica (no contato linguiacutestico) e Naturalidade

22 MARCACcedilAtildeO

Battistella (1996 p7) afirma que em muitas aacutereas alguns conceitos apresentam

problemas quanto agrave sua complexidade axioloacutegica Natildeo diferentemente no campo

da linguiacutestica tais discussotildees emblemaacuteticas ainda hoje se fazem presentes Uma

dessas discussotildees gira em torno do conceito de marcaccedilatildeo pois segundo ele

A dicotomia natildeo-marcado versus marcado eacute um dos conceitos-chave tanto a teoria da gramaacutetica gerativa desenvolvida por Noam Chomsky e a teoria da linguiacutestica estrutural desenvolvida por Roman Jakobson Ela tem sido usada em aacutereas da linguiacutestica que vatildeo desde a descritiva e tipoloacutegica ateacute a aplicada e foi emprestado para campos tatildeo diversos como a antropologia arte muacutesica poesia e literatura

O termo que fora introduzido na linguiacutestica na deacutecada de 1920 pelos linguistas

europeus da Escola de Praga cujo significado da condiccedilatildeo marcada natildeo

32

permaneceu constante mesmo dentro de uma uacutenica estrutura intelectual hoje eacute

um marco central na linguiacutestica O conceito de marcaccedilatildeo estaacute relacionado agrave

frequecircncia daquilo que eacute menos comum na liacutengua Logo a relaccedilatildeo deste conceito

se coaduna agrave noccedilatildeo de naturalidade Se um elemento eacute mais natural ele seraacute

menos marcado Se o oposto seraacute mais marcado Deste modo as liacutenguas teriam

uma tendecircncia a optar por padrotildees natildeo marcados

Battistella (2006 p13) expotildee que

A possibilidade de relaccedilotildees universais marcado natildeo-marcado eacute atenuada por outros fatores Um deles eacute a observaccedilatildeo de que a assimetria eacute muitas vezes sensiacutevel ao contexto Isso faz com que uma condiccedilatildeo local marcada em vez de um fenocircmeno geral signifique que contexto deve sempre ser considerado ao determinar valores de condiccedilatildeo marcada Poderia ser eacute claro que o aspecto contextual da condiccedilatildeo marcada seja dado universalmente mas este natildeo eacute de modo algum faacutecil de mostrar aleacutem do niacutevel de fonologia Uma preocupaccedilatildeo relacionada sobre as implicaccedilotildees universais decorre do fato de que muitas assimetrias podem ser revertidas entre as diferentes comunidades de fala periacuteodos de tempo ou registradores

Para Trask (2004 p187) os vaacuterios criteacuterios para entender que uma forma ou

construccedilatildeo eacute marcada podem natildeo coincidir e os valores da alternativa marcado

natildeo-marcado podem tambeacutem mudar ao longo do tempo A complexidade posta na

interaccedilatildeo de fatores nunca eacute previamente estabelecida uma vez que as

diferentes combinaccedilotildees deles tornaratildeo consequentemente os resultados

diferentes

Em continuidade ele afirma que

Ser marcado eacute uma noccedilatildeo muito ampla que se aplica em todos os niacuteveis de anaacutelise Em termos gerais eacute marcada qualquer forma linguiacutestica que ndash sob qualquer ponto de vista ndash menos usual ou menos neutra do que alguma outra forma a forma natildeo-

33

marcada Uma forma marcada pode distinguir-se de outra tambeacutem marcada pela presenccedila de mais material de maior quantidade de matizes de significado por ser mais rara numa determinada liacutengua ou nas liacutenguas em geral ou de vaacuterios outros modos (idem p129)

Na e para a fonologia eacute sugerido que processos fonoloacutegicos estejam diretamente

sensiacuteveis agrave distinccedilatildeo entre os elementos marcados e os natildeo marcados Nesta

relaccedilatildeo a marcaccedilatildeo dos segmentos foneacuteticos estaacute relacionada a propriedades

linguiacutesticas como i) serem pouco comuns ii) serem pouco frequentes iii) serem

adquiridos tardiamente iv) serem pouco estaacuteveis quanto agrave mudanccedila sonora

(CRISTOacuteFARO-SILVA 2011 p148)

Segundo Battistella (2006 p 13) ldquoa condiccedilatildeo marcada na fonologia eacute uma

propriedade da relaccedilatildeo entre os dois sinais de um paradigma diacriacutetico que eacute em

parte independente da substacircncia linguiacutestica (articulaccedilatildeo e percepccedilatildeo) e deve ser

definida principalmente como conceitualrdquo

O conceito de marcaccedilatildeo estaacute diretamente relacionado ao de simetria propriedade

matemaacutetica que consiste na correspondecircncia e permuta de elementos dentro de

um conjunto onde mesmo com a troca de lugares eles continuam tendo o

mesmo valor Neste caso a marcaccedilatildeo estaria ligada ao conceito de assimetria

posto que esta seja a quebra da valoraccedilatildeo de correspondecircncia dos elementos

Trask 2007

Para Matras e Elsik (2006 p 8)

Assimetrias de paradigmas tecircm vindo a ser associado com a noccedilatildeo de condiccedilatildeo marcadardquo O conceito pressupotildee que a relaccedilatildeo estrutural entre os dois polos de um paradigma eacute previsiacutevel em certa medida Ele tambeacutem assume que um dos

34

polos marcado seraacute sempre exibir propriedades que o outro polo desmarcado natildeo tem

Os referidos autores tratam dos aspectos sobre assimetria afirmando que a

simetria eacute mais simples por ser explicada ldquoem termos formais ao niacutevel do

paradigma e em termos funcionais atraveacutes de regularidade na posiccedilatildeo e

formas das estruturas que executam operaccedilotildees lineares semelhantes na

organizaccedilatildeo de informaccedilatildeo de enunciadosrdquo Eles ainda afirmam que as ldquoas forccedilas

que provocam a assimetria satildeo muito mais opacasrdquo pois ldquoelas competem em

vaacuterios niacuteveis locais contra o poder aparentemente esmagador e sempre presente

da busca pela simetriardquo (idem p 10)

A noccedilatildeo de valores dos conceitos de marcados e natildeo marcados foi inicialmente

desenvolvido para sistemas fonoloacutegicos por Trubetzkoy (1931) e primeiro aplicado

a categorias morfossintaacuteticas e semacircnticas por Jakobson (1932) Croft (1990 p

87) afirma que Markedness has since been adopted by both the generative and

the typological approaches to linguistic theory not surprisingly in rather different

ways7 Por isso a depender da corrente teoacuterica adotada o conceito de marcaccedilatildeo

pode ser compreendido de forma distinta dadas as interpretaccedilotildees e as

abrangecircncias a que elas se propotildeem

Conforme Battistella (1996 p 12) O termo marcaccedilatildeo abrange uma seacuterie de

conceitos

algumas tentativas foram feitas para separar os conceitos subjacentes a este termo e distinguir entre diferentes tipos de condiccedilotildees marcadas Jakobson por exemplo manteacutem uma

7 O conceito de marcaccedilatildeo tem sido adotado nas abordagens gerativista e tipoloacutegica natildeo surpreendentemente de maneiras bastante diferentes

35

distinccedilatildeo entre condiccedilatildeo fonoloacutegica marcada que envolve categorias cujos significados satildeo meros diferenciadores e condiccedilatildeo marcada semacircntica que envolve categorias conceituais que sinalizam o que significa bem como distinguem os vocaacutebulos

Com os passar do tempo os modelos teoacutericos sobre marcaccedilatildeo tambeacutem foram

discutidos e repensados de acordo com a corrente a que se propunha Nos

paraacutegrafos que seguem discorremos seguindo o percurso histoacuterico descrito por

Battistella 2006 sobre estes modelos estruturalista gerativista tipoloacutegica e

naturalista

221 A concepccedilatildeo de Jakobson e Trubetzkoy

A abordagem estruturalista estaacute diretamente ligada agraves pessoas de Jakobson e

Trubetzkoy componentes do Ciacuterculo de Praga para quem as correlaccedilotildees

fonoloacutegicas satildeo compartilhadas em um elemento definidor comum A partir da

observaccedilatildeo do comportamento dos traccedilos fonoloacutegicos eles introduzem os termos

marcado e natildeo-marcado It was in the context of the search for correlations

among phonemes that the terms marked and unmarked were first proposed

Battistella (2006 p 19)

Na visatildeo semioacutetica estruturalista de acordo com Matras e Elsik (2006 p 15)

Trubetzkoy (1939) introduziu o conceito de condiccedilatildeo marcada no contexto de sua

pesquisa sobre correlaccedilotildees fonoloacutegicas com base nas relaccedilotildees entre a presenccedila

de alguma caracteriacutestica fonoloacutegica e sua ausecircncia na consciecircncia dos falantes

Mais adiante ele restringiu a aplicaccedilatildeo da condiccedilatildeo marcada agraves neutralizaacuteveis

36

oposiccedilotildees fonoloacutegicas A partir daiacute a neutralizaccedilatildeo tornou-se o criteacuterio de

marcaccedilatildeo

Por isso diz-se que a neutralizaccedilatildeo eacute um criteacuterio originalmente fonoloacutegico que foi

estendido (nem sempre bem) para a situaccedilatildeo em que algum contexto requer o

cancelamento do contraste entre os membros de uma oposiccedilatildeo Battistella (1996

p 11)

Batistella (idem p12) tambeacutem afirma que Jakobson aplicou o conceito de

marcaccedilatildeo em vaacuterias direccedilotildees e aleacutem da fonologia a outros niacuteveis linguiacutesticos e

domiacutenios da semioacutetica com base natildeo apenas nos atributos linguiacutesticos mas nas

categorias semacircnticas da gramaacutetica e da cultura Ele tambeacutem afirmou que a

condiccedilatildeo marcada pode ser vista como uma relaccedilatildeo binaacuteria

O autor em estudo ainda discorre que Jakobson observando aleacutem disso ldquouma

seacuterie de correlaccedilotildees de condiccedilatildeo marcada notou que os valores natildeo marcados

tendem a ser representado por zero formardquo sugerindo que existe uma

correspondecircncia entre as caracteriacutesticas semacircnticas e sua expressatildeo fonoloacutegica

ldquonatildeo apenas os valores marcados tendem a ser codificados por meio de

marcadores manifestados mas tambeacutem valores semanticamente proacuteximos de

uma categoria que tendem a ser expressos fonologicamente ou marcadores

fonotaticamente semelhantesrdquo Os valores marcados tambeacutem tendem a mostrar

diferenciaccedilatildeo menos formal do que os valores natildeo marcados

Jakobson tambeacutem teria evidenciado seus estudos com base nas observaccedilotildees

sobre a aquisiccedilatildeo de primeira liacutengua e sobre a afasia Em suas pesquisas ele

descobriu correlatos extralinguiacutesticos de condiccedilatildeo marcada propondo uma

37

hierarquia das caracteriacutesticas fonoloacutegicas universais ao coletar dados

corroboradores da tese de que as caracteriacutesticas ou segmentos marcados satildeo

mais difiacuteceis de serem adquiridos por crianccedilas e de serem apreendidos por

afaacutesicos Battistella (idem 16)

222 Abordagem Gerativa

Para Matras amp Elsik (2006 p10) a visatildeo de Chomsky de marcaccedilatildeo mostra uma

flexibilidade notaacutevel uma vez que o conceito natildeo foi desenvolvido de forma

sistemaacutetica e que eacute difiacutecil falar sobre a existecircncia de um trabalho mais bem

elaborado sobre marcaccedilatildeo em sua obra

Battistella afirma que na concepccedilatildeo gerativista o conceito de marcaccedilatildeo exposto

por Chomsky estaacute relacionado a duas ideias centrais i) a condiccedilatildeo marcada eacute

concebida como codificaccedilatildeo de uma estrutura de preferecircncia ou a estrutura

padratildeo para a aquisiccedilatildeo da linguagem e ii) a condiccedilatildeo marcada eacute vista como

aquela que reflete o custo de determinadas opccedilotildees analiacuteticas Em tal conceito as

duas ideias estatildeo interligadas na abordagem gerativa na medida em que uma

teoria formal eacute necessaacuteria para expor a adequaccedilatildeo explicativa no que diz respeito

agrave aquisiccedilatildeo da linguagem (1996 p18)

Ainda segundo o autor Chomsky tambeacutem distinguiu dois tipos de condiccedilatildeo

marcada a distinccedilatildeo entre uma gramaacutetica sem marcaccedilatildeo do nuacutecleo e uma

periferia marcada e as estruturas de preferecircncia dentro do nuacutecleo e dentro da

periferia

38

No que tange agrave fonologia para Moreira da Silva (2011 p 31)

No contexto da Gramaacutetica Gerativa Chomsky amp Halle (1968 p 402) propotildeem uma teoria de marcaccedilatildeo baseada num conjunto de convenccedilotildees de marcaccedilatildeo ou definiccedilotildees dos valores ldquomarcadordquo ldquonatildeo-marcadordquo para os traccedilos fonoloacutegicos em contextos particulares A marcaccedilatildeo concebe uma estrutura como preferida ou que surge por defeito omissatildeo Os elementos marcados e natildeo marcados satildeo compreendidos como os que apresentam maior ou menor custo Satildeo as regras da Gramaacutetica Universal que atribuem um valor natildeo marcado aos traccedilos Com efeito os valores por omissatildeo estatildeo codificados na Gramaacutetica Universal havendo um conjunto de regras que fazem emergir os valores marcados

Chomsky amp Halle (idem p 425) propotildeem uma marcaccedilatildeo universal e inata Os

segmentos marcados ou os valores dos traccedilos satildeo estabelecidos de acordo com

universais interlinguiacutesticos frequecircncia distribucional mudanccedila linguiacutestica e

aquisiccedilatildeo da liacutengua

Eacute no final dos anos 70 e durante a deacutecada de 80 que segundo Battistella (1996

p 10)

a condiccedilatildeo marcada comeccedilou a ser tratada como parte de uma teoria do nuacutecleo da gramaacutetica A Gramaacutetica nuclear consistia em alguns paracircmetros que deveriam ser corrigidos durante a aquisiccedilatildeo de uma linguagem real O conceito de condiccedilatildeo marcada foi aplicado duplamente neste quadro Em primeiro lugar todo o nuacutecleo da gramaacutetica foi considerado como natildeo marcado contra a periferia marcada A condiccedilatildeo marcada de uma construccedilatildeo foi determinada pela sua regularidade estabilidade e centralidade para o nuacutecleo de uma linguagem particular bem como por generalizaccedilotildees intralinguiacutesticas sobre os tipos de construccedilatildeo Em segundo lugar a condiccedilatildeo marcada seria tambeacutem aplicada aos valores de paracircmetros no interior do nuacutecleo e no interior da periferia Assim condiccedilatildeo marcada tambeacutem foi visto como uma estrutura de preferecircncia dentro dos dois componentes da gramaacutetica

Moreira da Silva (2011 p32) afirma que no que diz respeito agrave Teoria da

Otimidade formulada por Prince amp Smolensky (1993) a marcaccedilatildeo eacute vista como a

39

violaccedilatildeo de uma restriccedilatildeo ou princiacutepio da liacutengua Segundo esta teoria cada liacutengua

eacute definida como um conjunto de hierarquizaccedilotildees de princiacutepios universais As

restriccedilotildees numa posiccedilatildeo mais elevada e que satildeo raramente violadas indicam os

aspetos natildeo marcados enquanto as menos importantes e que satildeo violadas

frequentemente mostram os aspetos mais marcados

223 Abordagem Tipoloacutegica (Interlinguiacutestica)

Croft (1996 p4) afirma que a principal caracteriacutestica da tipologia linguiacutestica eacute

verificar as regras de comparaccedilatildeo nas liacutenguas do mundo A comparaccedilatildeo

Interlinguiacutestica coloca a explicaccedilatildeo dos fenocircmenos linguiacutesticos de uma uacutenica

liacutengua em uma nova e diferente perspectiva

A fim de distinguir o conceito de marcaccedilatildeo de outras escolas teoacutericas Croft

(1996) introduziu a concepccedilatildeo de marcaccedilatildeo tipoloacutegica Para ele

Marcaccedilatildeo tipoloacutegica eacute uma rede de relaccedilotildees causais aparentes entre um subtipo de assimetrias interlinguiacutesticas todas as quais tecircm a ver com a forma como a funccedilatildeo eacute codificada em forma gramatical O tema geral da assimetria tambeacutem sugere um link para os padrotildees assimeacutetricos na ordem das palavras e na fonologia que diferem de marcaccedilatildeo tipoloacutegica de forma significativa Marcaccedilatildeo tipoloacutegica eacute uma propriedade universal de uma categoria conceitual natildeo uma propriedade de uma linguagem especiacutefica ou de uma categoria gramatical de linguagem particular como eacute concebida em marcaccedilatildeo para a Escola de Praga (p87 - 88)8

8 Typological markedness is a network of apparent causal relationships among a subtype of cross-

linguistic asymmetries all of which have to do with how function is encoded into grammatical form The general theme of asymmetry also suggests a link to asymmetrical patterns in word order and phonology which differ from typological markedness in significant ways Typological markedness is a universal property of a conceptual category not a language-particular property of a language-particular grammatical category as it is in Prague School markedness

40

Quanto agrave marcaccedilatildeo na abordagem tipoloacutegica autores como Croft (1996) e Givoacuten

(1990) se utilizaram da perspectiva estruturalista para embasar a sua teoria Esta

concepccedilatildeo se vale dos fenocircmenos interlinguiacutesticos e universais que eacute a sua

caracteriacutestica definidora Battistella (2006 p19) A marcaccedilatildeo tipoloacutegica eacute

portanto uma ferramenta importante para o tipologista porque fornece um meio

para ligar diretamente propriedades linguiacutesticas (estruturais) formais em todos os

idiomas

A condiccedilatildeo marcada eacute assegurada por padrotildees interlinguiacutesticos que podem ser

formulados como restriccedilotildees sobre possiacuteveis combinaccedilotildees de propriedades

linguiacutesticas Na abordagem tipoloacutegica a marcaccedilatildeo eacute vista como uma rede de

relacionamentos que engloba uma seacuterie de padrotildees gerais logicamente

independentes Croft (1990 p87) reclassifica os criteacuterios utilizados pelos

estruturalistas em trecircs estruturais comportamentais e de frequecircncia de token

Na abordagem tipoloacutegica um valor de categoria eacute mais ou menos marcado em

vez de individualmente ou duplamente marcadas como na abordagem semioacutetica

De acordo com Croft (2003 p87) o fato de que a neutralizaccedilatildeo natildeo eacute um

conceito relativo explica por que eacute um criteacuterio vaacutelido de condiccedilatildeo marcada

tipoloacutegica

Para Matras e Elsik o reconhecimento do caraacuteter relativo (gradual ou escalar) da

condiccedilatildeo marcada permite que se desenhe em alguns conceitos fundamentais da

tipologia linguiacutestica o que diz respeito agrave condiccedilatildeo de marcada Aleacutem de simples

implicacionais universais hierarquias e protoacutetipos tambeacutem podem ser vistos como

padrotildees da condiccedilatildeo marcada (2006 p18)

41

224 Abordagem Naturalista9 (Morfologia Natural)

Na abordagem naturalista de acordo com Matras amp Elsik (2006 p13) a condiccedilatildeo

marcada foi desenvolvida na escola de Morfologia Natural que surgiu na Aacuteustria e

na Alemanha em meados dos anos 1970 Os estudos de Dressler et al (1987)

para quem ldquoa naturalidade universal corresponde agrave facilidade para o ceacuterebro

humano (Dressler et all 1987 p11) fazem parte desta corrente que se debruccedilou

sobre a morfologia natural para dar sustentaccedilatildeo a sua tese Ainda para estes

autores

Os proponentes da Morfologia Natural caracterizam sua abordagem como semioacutetica e ao mesmo tempo funcional A escola foi inspirada entre outros pela teoria da marcaccedilatildeo desenvolvida na Escola de Praga Por outro lado morfologistas naturais compartilham de uma seacuterie de pontos de vista teoacutericos com o paradigma funcionalista e principalmente com orientaccedilatildeo de funccedilatildeo tipoloacutegica como a assunccedilatildeo do caraacuteter relativo da condiccedilatildeo marcada a suposiccedilatildeo de protoacutetipos e a dependecircncia de motivaccedilotildees e evidecircncias extralinguiacutesticas e intralinguiacutesticas (Idem p12)

Ainda de acordo com Matras amp Elsik (idem p 14) a Teoria da Morfologia Natural

eacute concebida como uma teoria da Naturalidade onde satildeo reconhecidos vaacuterios

niacuteveis de anaacutelise linguiacutestica que satildeo organizados por outras subteorias

correspondentes

A Morfologia Natural objetiva nesse aspecto estabelecer conflitos entre os

princiacutepios de naturalidade Dois desses satildeo i) os conflitos entre princiacutepios de

naturalidade (o que eacute natural e o que eacute especiacutefico do idioma) e ii) os conflitos

entre os diferentes componentes do sistema de linguagem

9 The naturalness approach

42

Comumente a naturalidade eacute vista por ter fundamentos extralinguiacutesticos que

determinam ou proiacutebem favorecem ou desfavorecem as estruturas linguiacutesticas

restringindo as possibilidades e especificam as preferecircncias da faculdade da

linguagem universal No entanto embora a morfologia privilegie os fatores

extralinguiacutesticos (neurobioloacutegicos e sociocomunicativos) os fatores linguiacutesticos

natildeo satildeo redutiacuteveis aos extralinguiacutesticos (ibidem p14)

23 CRITEacuteRIOS DE MARCACcedilAtildeO

Matras amp Elsik (2006 p15) elencam quatro criteacuterios relevantes para a marcaccedilatildeo

Satildeo eles i) frequecircncia ii) complexidade conceitual iii) complexidade estrutural iv)

distribuiccedilatildeo

A frequecircncia tem ocupado uma posiccedilatildeo central na abordagem tipoloacutegica da

condiccedilatildeo marcada Embora acredite-se que os elementos natildeo marcados satildeo

mais frequentes que os marcados este criteacuterio eacute relativo e universalmente

aplicaacutevel sendo bastante questionaacutevel na abordagem tipoloacutegica chegando a ser

abandonado por Croft 1990 p84 ao afirmar que ldquoo criteacuterio de frequecircncia mostra

uma conexatildeo direta entre as propriedades de estrutura da linguagem e

propriedades de uso da linguagemrdquo

Ainda segundo Croft (idem p159) a condiccedilatildeo marcada eacute mais do que uma

manifestaccedilatildeo de motivaccedilatildeo econocircmica havendo a necessidade de olhar para

outras causas da frequecircncia de certos valores gramaticais na fala

43

Na abordagem estruturalista semioacutetica a complexidade conceitual eacute a

propriedade que define a condiccedilatildeo semanticamente marcada Para Jakobson a

marcaccedilatildeo eacute definida como uma relaccedilatildeo assimeacutetrica entre sinalizaccedilatildeo e natildeo-

sinalizaccedilatildeo de uma determinada propriedade Assim o membro marcado da

oposiccedilatildeo eacute por definiccedilatildeo mais complexo semanticamente que o membro natildeo

marcado como outros criteacuterios melhores correlatos da condiccedilatildeo marcada de

diagnoacutesticos de complexidade conceitual (Matras amp Elsik 2006 p 17)

Ainda segundo estes autores (Idem p 19) o reconhecimento da extensatildeo e da

complexidade de um marcador em termos fonoloacutegicos como um fator relevante

em vez de um morfoloacutegico eacute tido por outros autores que trabalham com a

tipologia linguiacutestica Como exemplo eles citam a codificaccedilatildeo morfossintaacutetica que

eacute chamada de codificaccedilatildeo zero onde natildeo existe evidente formal de marcaccedilatildeo de

um valor de categoria

Os criteacuterios de marcaccedilatildeo com base na distribuiccedilatildeo compreendem os criteacuterios

comportamentais e o criteacuterio de valor neutro Os criteacuterios comportamentais foram

desenvolvidos especificamente na abordagem tipoloacutegica e dizem respeito a

qualquer tipo de evidecircncia do comportamento linguiacutestico dos elementos que

demonstram que um valor de uma categoria conceitual eacute gramaticalmente mais

versaacutetil do que outro Croft (1990 p 93)

Jaacute o criteacuterio de valor neutro diz respeito agrave neutralizaccedilatildeo de contrastes

paradigmaacuteticos em determinados contextos O criteacuterio foi desenvolvido na Escola

de Praga e tomado por Greenberg (1966) No entanto o valor neutro eacute

descartado como um criteacuterio vaacutelido de marcaccedilatildeo tipoloacutegica visto que natildeo haacute

44

consistecircncia interlinguiacutestica Natildeo existe um padratildeo interlinguiacutestico consistente de

contextos neutros que podem ser ligados agrave codificaccedilatildeo estrutural ou potencial

comportamental (Croft idem p96)

A razatildeo para a introduccedilatildeo de criteacuterios dependentes do sistema em Morfologia

Natural segundo Matras amp Elsik (2006 p 19) eacute que o conceito de naturalidade

baseada exclusivamente em fatores independentes de sistema resulta em

prediccedilotildees incorretas especialmente na mudanccedila de linguagem Eles consideram

certos aspectos da normalidade dependente de idioma para ser parte de

naturalidade

Segundo Croft (1990 p 97) no que tange aos criteacuterios externos da marcaccedilatildeo os

proponentes da abordagem naturalista introduziram uma seacuterie de criteacuterios ou

correlatos extralinguiacutesticos da condiccedilatildeo marcada como

evoluccedilatildeo da linguagem (o mais tarde o mais marcado)

maturaccedilatildeo ontogeneacutetica (o mais tarde o mais marcado)

fala do bebecirc (menos elementos marcados preferidos pelos adultos no

maiecircs)

aquisiccedilatildeo da linguagem (menos marcado adquirido antes do mais

marcado)

distuacuterbios da linguagem e da fala (mais marcado afetado anteriormente

menos marcado)

testes de percepccedilatildeo (menos marcado mais facilmente percebida do que

mais marcado)

45

e erros linguiacutesticos (mais marcados evocam mais erros do que os menos

marcados)

Esses criteacuterios satildeo basilares e dariam conta de uma seacuterie de elementos

universais linguiacutesticos

24 MARCACcedilAtildeO MUDANCcedilA E CONTATO LINGUIacuteSTICO

Matras amp Elsik (2006 p 22) garantem que em muitas abordagens a

mudanccedila linguiacutestica eacute vista como cooperadora para compreensatildeo da marcaccedilatildeo

Logo a mudanccedila de idioma eacute tida como criteacuterio de marcaccedilatildeo Esta assertiva faz

sentido nesse trabalho visto que o objeto de anaacutelise o portuguecircs resultante do

contato entre o Portuguecircs e o Latundecirc trata de cacircmbio de materiais linguiacutesticos

Neste caso especificamente dos elementos foneacuteticos

Ainda de acordo com estes autores

A existecircncia de estruturas marcadas eacute um resultado inevitaacutevel da compartimentaccedilatildeo e da abertura do sistema de linguagem E uma vez que diferentes componentes da linguagem tecircm funccedilotildees divergentes e tendem a seguir diferentes princiacutepios de naturalidade o abandono das estruturas marcadas em um niacutevel implica em estruturas marcadas em outro niacutevel (Idem p

25)

Em outras palavras a mudanccedila linguiacutestica leva agrave condiccedilatildeo de marcaccedilatildeo na

mudanccedila de um componente da liacutengua para outro ao inveacutes de uma reduccedilatildeo

global de condiccedilatildeo marcada Tais estruturas marcadas satildeo obrigadas a existir em

qualquer momento na histoacuteria de uma liacutengua

46

Os estudiosos apontam para os dois tipos de forccedilas que agem no contato

linguiacutestico a interna e a externa Assim tais forccedilas podem simplificar ou complicar

a gramaacutetica de uma liacutengua Givoacuten (1979 p 123) diz que os falantes satildeo

propensos a recorrer a estruturas natildeo marcadas da Gramaacutetica Universal em

situaccedilotildees cujo contato estaacute ligado ao estresse comunicativo enquanto situaccedilotildees

de contato menos marcados aquelas que prosseguem de forma mais gradual

natildeo precisam

Givoacuten (idem 124) diz que nas situaccedilotildees de pidgin a condiccedilatildeo de marcaccedilatildeo eacute

reduzida e situaccedilotildees de contato entre liacutenguas podem resultar em aumento de

elementos marcados As categorias marcadas satildeo reduzidas em pidgins

enquanto as natildeo-marcadas satildeo as primeiras a serem inovadas durante o

processo de crioulizaccedilatildeo A marcaccedilatildeo sugere que em situaccedilotildees de contato

envolvendo a interferecircncia deve favorecer a reduccedilatildeo da condiccedilatildeo marcada

Na aquisiccedilatildeo de segunda liacutengua o grau relativo de dificuldade para o aprendiz

estaacute relacionado a fatores extralinguiacutesticos como idade Eacute fato que na aquisiccedilatildeo

de uma segunda liacutengua os adultos tendem a terem dificuldades com os padrotildees

mais marcados enquanto os mais novos natildeo a tem Estruturas marcadas da

liacutengua em aquisiccedilatildeo podem deixar de serem adquiridas durante a aprendizagem

caso sejam os adultos que a esteja adquirindo Por isso estruturas natildeo marcadas

satildeo mais propensas a surgir em grandes sociedades caracterizadas por um

intenso contato linguiacutestico levando agraves liacutenguas a simplificaccedilatildeo dos seus sistemas

linguiacutesticos Croft (2000 p 192-193)

47

Jakobson (1978 p 35-37) afirma que quanto maior a funccedilatildeo socioespacial de um

dialeto mais simples seraacute o seu sistema linguiacutestico Dialetos e liacutenguas

relativamente isoladas satildeo mais propensas a desenvolverem condiccedilotildees marcadas

e estruturas redundantes como conjunto de fonemas complexos com um elevado

nuacutemero de contrastes fonoloacutegicos complexidade alofocircnica e alomoacuterfica

irregularidade morfoloacutegica e padrotildees de concordacircncia complexos Por outro lado

os casos de alto contato dialeacutetico que satildeo caracterizadas por redes sociais

relativamente abertas satildeo susceptiacuteveis agrave produccedilatildeo de estruturas linguiacutesticas natildeo

marcadas pela diminuiccedilatildeo da irregularidade da redundacircncia e da complexidade

Apesar de os empreacutestimos serem um aspecto do aumento da condiccedilatildeo marcada

ela (a condiccedilatildeo) eacute operativamente especiacutefica de cada empreacutestimo Esta condiccedilatildeo

marcada do empreacutestimo coodetermina quais as formas e funccedilotildees satildeo mais

susceptiacuteveis de serem emprestadas do que outras Quanto mais transparente e

menos integrador for um elemento na liacutengua de origem torna-se mais provaacutevel de

ser emprestado A condiccedilatildeo marcada eacute relativa ao contexto agrave saliecircncia agrave

frequecircncia agrave ocorrecircncia e agrave distacircncia tipoloacutegica da situaccedilatildeo do contato Matras amp

Elsik (2006 p 26)

Croft (2000 p198) estende a noccedilatildeo de condiccedilatildeo marcada natildeo soacute para os

mecanismos de mudanccedila mas tambeacutem para as formas de contextos de difusatildeo

ou seja padrotildees de realizaccedilatildeo Ele afirma que enquanto na mudanccedila interna as

inovaccedilotildees entram nos pontos menos marcados e estendem a ambientes mais

acentuados em empreacutestimos e outras inovaccedilotildees mudanccedilas motivadas

externamente se espalham de pontos marcados para menos contextos marcados

48

25 JAKOBSON E A ABORDAGEM FONOLOacuteGICA DA MARCACcedilAtildeO

O termo marcaccedilatildeo recebeu o tratamento mais expansivo nos estudos de Roman

Jakobson a partir de 1930 Ele e Trubetzkoy difundiram a ideia de correlaccedilatildeo

fonoloacutegica como uma seacuterie de oposiccedilotildees binaacuterias que compartilham elementos

em comum Eacute Jakobson que afirma que a neutralizaccedilatildeo e o estaacutegio onde as

posiccedilotildees marcadas natildeo estatildeo em estado de marcaccedilatildeo

Eacute tambeacutem Jakobson quem introduz a concepccedilatildeo de niacuteveis de marcaccedilatildeo propondo

que a forma natildeo marcada tanto tem uma forma geral como uma parcial Ele

descobriu uma relaccedilatildeo entre a marcaccedilatildeo em uma hierarquia universal de traccedilos

fonoloacutegicos os traccedilos marcados implicam maior dificuldade de aprendizagem e

uma maior facilidade de perda por parte de pessoas com afasia Ele ainda diz

que

O padratildeo do desenvolvimento fonoloacutegico universal consiste numa progressatildeo de diferenciaccedilotildees cada vez mais finas entre traccedilos distintivos inicialmente distinccedilatildeo entre consoantes e vogais formando-se posteriormente oposiccedilotildees cada vez menos universais A dissoluccedilatildeo da competecircncia linguiacutestica individual nas patologias da linguagem eacute governada pela mesma regularidade a perda do valor primaacuterio pressupotildee a perda do valor secundaacuterio e eacute por isso que se fala da infantilidade da fala dos afaacutesicos A dissoluccedilatildeo do sistema de sons nos afaacutesicos fornece uma imagem de espelho do desenvolvimento fonoloacutegico da crianccedila ndash os sons a serem adquiridos mais tardiamente satildeo os primeiros a serem perdidos (1941 p 60-63)

No percurso da fonologia Jakobson (1941 p 84) viu a representaccedilatildeo fonecircmica

como um niacutevel sem redundacircncia de representaccedilatildeo que conteacutem apenas

informaccedilotildees distintivas A praacutetica descritiva da informaccedilatildeo teoacuterica de Jakobson

49

teve uma grande e importante influecircncia sobre a notaccedilatildeo livre da redundacircncia na

fonologia e na sintaxe gerativas

Com base na literatura meacutedica Jakobson examinou a aquisiccedilatildeo da linguagem e a

afasia da fala agrave luz dos universais linguiacutesticos propondo uma relaccedilatildeo entre uma

hierarquia universal dos traccedilos fonoloacutegicos a aquisiccedilatildeo da linguagem na infacircncia

e a perda dela durante a afasia A aquisiccedilatildeo fonoloacutegica da crianccedila e os distuacuterbios

dos afaacutesicos baseiam-se nas mesmas leis de solidariedade como o inventaacuterio

fonoloacutegico o percurso fonoloacutegico das liacutenguas do mundo

Os estudos de Jakobson e de Trubetzkoy sobre a tipologia fonoloacutegica levaram

Jakobson a propor que os sistemas de sons satildeo organizados hierarquicamente e

que certas oposiccedilotildees fonoloacutegicas fornecem o nuacutecleo do sistema de som de todas

as liacutenguas Estas satildeo as oposiccedilotildees que definem os sons mais prototiacutepicos mdash

vogais e consoantes que ocorreratildeo em todos os idiomas vogais cardeais a i

u consoantes plosivas p t k e as nasais m n Estes sons satildeo

encontrados em praticamente todas as liacutenguas do mundo

Jakobson propotildee novas leis implicativas entre estes sons e os sons fora do

inventaacuterio baacutesico Dessa forma as leis tipoloacutegicas preveem que em nenhuma

liacutengua haveraacute vogais nasais a menos que haja vogais orais nenhuma liacutengua teraacute

uma vogal arredondada posterior a menos que ela tambeacutem tenha uma vogal

anterior fechada natildeo arredondada nenhuma liacutengua teraacute uma vogal fechada natildeo

arredondada a menos que ela tambeacutem tenha uma arredondada nenhuma liacutengua

teraacute uma fricativa dental simples sem uma fricativa dental estridente (Idem 1941

p 86)

50

Jakobson tambeacutem observa que certos sons satildeo muito raros nas liacutenguas do

mundo por exemplo as fricativas laterais e o r tcheco estridente Ele propotildee que

esses sons satildeo mais afastados do nuacutecleo e portanto menor nesta hierarquia

A hierarquia de oposiccedilotildees fonoloacutegicas definida pela tipologia encontra-se tambeacutem

no desenvolvimento do sistema foneacutetico da crianccedila Com base em estudos diaacuterios

de aquisiccedilatildeo da linguagem ele confirma a hierarquia na aquisiccedilatildeo dos padrotildees e

os padrotildees mais marcados seriam adquiridos tardiamente

Moreira da Silva (2011 p36) elenca os criteacuterios de marcaccedilatildeo No entanto a

autora chama a atenccedilatildeo para o fato de que eles nem sempre funcionam do modo

esperado Satildeo eles frequecircncia distribuiccedilatildeo aquisiccedilatildeo da liacutengua patologias da

linguagem histoacuteria da liacutengua facilidade de produccedilatildeo e percepccedilatildeo universalidade

implicaccedilatildeo e processos fonoloacutegicos Ela tambeacutem apresenta algumas unidades e

estruturas consideradas mais marcadas como podemos ver a seguir

Quadro 1 Unidades e estruturas mais marcadas conforme levantamento de Moreira da

Silva (2011)

Segmentos e estruturas mais marcadas Autores

1 Vogais nasais Ferguson amp Chowdbury 1960

Greenberg 1966 14 Durand 1990

74 Kenstowicz 1994 63

2 Vogais longas Zipf 1935 1963 Greenberg 1966

14

3 Vogais meacutedias em comparaccedilatildeo com as

vogais altas

Kenstowicz 1994 65

4 Consoantes aspiradas Greenberg 1966 14

5 Consoantes glotalizadas Greenberg 1966 17

6 Obstruintes [+vozeadas] por oposiccedilatildeo agraves [- Greenberg 1966 14 24

51

vozeadas] Lass1984 155 Kenstowicz 1994

62

7 Consoantes fricativas por oposiccedilatildeo agraves

oclusivas

Kenstowicz 1994 65

8 Articulaccedilotildees secundaacuterias como labializaccedilatildeo

palatalizaccedilatildeo e velarizaccedilatildeo

Kenstowicz 1994 65

9 A regiatildeo dental alveolar eacute preferida com

exceccedilatildeo das africadas o que pode ser

observado pelo fato de este ser o ponto de

articulaccedilatildeo usado quando numa liacutengua

existe apenas uma obstruinte Nas nasais

esta tendecircncia ainda se faz notar mais

resultando na preferecircncia por n

Lass 1984 154-156

10 Segmentos com articulaccedilotildees muacuteltiplas e

complexas no geral satildeo mais marcados em

comparaccedilatildeo com segmentos com

articulaccedilotildees singulares

Kenstowicz 1994 65

11 Quanto agraves liacutequidas a lateral seraacute a menos

marcada jaacute que as liacutenguas que possuem

duas ou mais liacutequidas tecircm provavelmente

uma lateral e um contraste lateral natildeo

lateral

Lass 1984 158

12 Em termos de semivogais haacute uma

preferecircncia por j embora a maioria das

liacutenguas possua tambeacutem w as outras

semivogais satildeo raras

Lass 1984 158

13 Siacutelabas acentuadas ndash nem todas as liacutenguas

tecircm siacutelabas acentuadas embora estas

surjam cedo na aquisiccedilatildeo talvez devido agrave

sua saliecircncia perceptiva e no caso do inglecircs

devido ao fato de as palavras lexicais serem

iniciadas por siacutelaba toacutenica

Demuth 1996 121

14 Quanto agrave siacutelaba existe a preferecircncia pelo

formato natildeo marcado CV

Blevins 1995 213

15 De acordo com a TO a siacutelaba estaacute sujeita agraves Archangeli 1997 7 Hammond

52

seguintes restriccedilotildees universais

a) As siacutelabas comeccedilam com consoante -

Ataque

b) As siacutelabas tecircm uma vogal - Nuacutecleo

c) As siacutelabas acabam com uma vogal - Natildeo

Coda

d) As siacutelabas tecircm no maacuteximo uma consoante

numa margem - Complexo

(significa que os ataques complexos e codas

complexas satildeo inaceitaacuteveis)

e) As siacutelabas satildeo compostas por consoantes

e vogais - Ataque e Nuacutecleo

1997 36

As estruturas elencadas no quadro acima satildeo validadas interlinguisticamente

Com relaccedilatildeo agraves liacutenguas em contato objeto deste estudo podemos afirmar que o

portuguecircs apresenta menos estruturas marcadas do que o Latundecirc No caso do

portuguecircs as estruturas em 2 4 5 e 10 constantes do quadro acima natildeo satildeo

observadas

Jaacute no Latundecirc aleacutem de todas as estruturas apresentadas no quadro ainda satildeo

observadas as seguintes estruturas mais marcadas

estrutura silaacutebica bastante complexa

inventaacuterio vocaacutelico maior do que o consonantal

53

combinaccedilatildeo de dois traccedilos mais marcados em um segmento (vogais

nasais e laringais) e

acento e tom lexicais

Para refletirmos sobre a marcaccedilatildeo no processo de interferecircncia Latundecirc ndash

Portuguecircs trataremos no capiacutetulo seguinte de conceitos a cerca do contato

linguiacutestico

54

3 CONTATO LINGUIacuteSTICO

ldquoBilingualism is for me the fundamental problem of linguisticsrdquo Jakobson10

31 INTRODUCcedilAtildeO

A histoacuteria em grande parte gira em torno de lendas e mitos Um desses mitos eacute o

surgimento das liacutenguas do mundo Questionamentos de como e quando elas

sugiram permeiam ainda hoje as mentes dos filoacutesofos e cientistas Natildeo

diferentemente das demais aacutereas a perspectiva teoloacutegica descreve a narrativa da

construccedilatildeo da Torre de Babel como uma dessas tentativas de explicaccedilatildeo no que

tange agrave miscelacircnea de liacutenguas existentes Jackob Bohme teoacutelogo do seacuteculo XVII

afirma em seu De Signatura Rerum11 que a liacutengua divina original raiz ou matildee de

todas as liacutenguas do mundo eacute chave para um conhecimento verdadeiro e perfeito

de todas as coisas Eacute no ato da criaccedilatildeo que o primeiro homem Adatildeo

contemplando as obras do Criador de toda a natureza nomeara todas as

criaturas de acordo com suas proacuteprias qualidades essenciais usando a

linguagem humana como meio

A hipoacutetese defendida por Bohme tambeacutem fora amplamente sustentada pelos

filoacutelogos e comparatistas do final do seacuteculo XVIII Sem viacutenculo com a teologia

estes estudiosos buscavam atraveacutes da reconstruccedilatildeo da aacutervore linguiacutestica a

protoliacutengua a liacutengua-matildee geradora das demais liacutenguas

10

Apud Romaine 1995 p1 11

De Signatura Rerum (Desde o nascimento e o nome de todos os seres) 1622

55

Jacob Grimm filoacutelogo alematildeo com base nas descobertas de Rasmus Rask

aperfeiccediloou o meacutetodo comparatista sobretudo o que fora denominada de

ldquomudanccedila de somrdquo ou ldquoLei de Grimmrdquo12 com intuito de descrever as mudanccedilas

ocorridas na liacutengua-matildee o proto-indo-europeu (PIE) A Lei de Grimm estava na

base das discussotildees ocorridas mais tarde na Universidade de Leipzig

Alemanha no conhecido grupo dos neogramaacuteticos Os estudiosos desse ciacuterculo

questionaram os estudos de Grimm e seus compatriotas ao apontarem para o fato

de que os estudos comparatistas se basearem em dados de liacutengua escrita e natildeo

de liacutengua falada (GABAS JR 2008 p 80)

Humberto Eco em A busca da liacutengua perfeita13 nos relata sobre os projetos de

reconstruccedilatildeo em busca da liacutengua sagrada No seu livro o autor nos mostra que a

tentativa de procura de correlatos entre as liacutenguas do mundo eacute interesse antigo

das civilizaccedilotildees Ele afirma que na Europa no seacuteculo XIX houve 173 projetos de

reconstruccedilatildeo linguiacutestica

Dadas ateacute aqui as investigaccedilotildees eacute comum pensarmos que pelo prisma

teoloacutegico o surgimento das liacutenguas no planeta eacute fruto da desobediecircncia e

soberba humanas Eco idem nos mostra que haacute um equiacutevoco quanto a esta

interpretaccedilatildeo uma vez que no capiacutetulo XI v 1 do livro de Gecircnesis a Biacuteblia

12

A Lei de Grimm analisou sobre o vieacutes da fonologia as relaccedilotildees que havia entre as liacutenguas indo-

europeias As similaridades entre o alematildeo claacutessico grego e inglecircs antigo eram previstas a partir de leis foneacuteticas i) as consoantes oclusivas surdas (p t k kw) do PIE mudaram em fricativas surdas correspondentes (f θ h hw) nas liacutenguas germacircnicas ii) as consoantes oclusivas sonoras (bdggw) do PIE mudaram em oclusivas surdas correspondentes (p t k kw) nas liacutenguas germacircnicas iii) as consoantes aspiradas sonoras (bh dh gh gwh) do PIE mudaram em oclusivas natildeo-aspiradas sonoras correspondentes (bdggw) nas liacutenguas germacircnicas (GABAS JR 2008 p 78) 13

ECO Humberto A busca da liacutengua perfeita Traduccedilatildeo de Antonio Angonese Bauru Edusc

2001

56

discorre sobre a existecircncia de uma uacutenica genealogia de uma mesma liacutengua e de

uma mesma fala

Diferentemente no capiacutetulo que antecede a narrativa de Babel a proacutepria Biacuteblia

aponta para a existecircncia de famiacutelias linguiacutesticas distintas conforme Gecircnesis 11

v 5 Por estes foram repartidas as ilhas dos gentios nas suas

terras cada qual segundo a sua liacutengua segundo as suas

famiacutelias entre as suas naccedilotildees

v20 Estes satildeo os filhos de Catildeo segundo as suas famiacutelias

segundo as suas liacutenguas em suas terras em suas naccedilotildees

v 31 Estes satildeo os filhos de Sem segundo as suas famiacutelias

segundo as suas liacutenguas nas suas terras segundo as suas

naccedilotildees

Uma explicaccedilatildeo para tal passagem se daacute a partir da perspectiva dos filoacutesofos

gregos que concebiam os povos que falava de forma diferente como bagraverbaroi

seres que balbuciavam falando de forma incompreensiacutevel Logo acreditavam que

aqueles outros eram serem inferiores que natildeo falavam a liacutengua verdadeira da

razatildeo e do pensamento o logos

Tal conflito entre as liacutenguas existentes apontam para uma poliacutetica linguiacutestica que

muito explica a hierarquia (status) linguiacutestica ainda hoje atuante O status

linguiacutestico resultante das relaccedilotildees assimeacutetricas entre sociedades ou subgrupos de

uma sociedade decorre tambeacutem das circunstacircncias e condiccedilotildees que envolvem o

contato linguiacutestico Esse por sua vez evolue da dinacircmica proacutepria do processo em

que ocorrem conflitos e acomodaccedilotildees e que pode derivar pidgins crioulos e

mudanccedila linguiacutestica

57

No reconhecimento de um universo entrelaccedilado compartilhamos com o ponto de

vista de Eco (2001) e assumimos a ideia de que a existecircncia de cada liacutengua e de

sua historicidade eacute reveladora do entendimento do mundo

ldquoCada liacutengua constitui um determinado modelo de Universo um sistema semioacutetico de compreensatildeo do mundo e se temos quatro mil modos diferentes de descrever o mundo isto nos torna mais ricos Deveriacuteamos nos preocupar pela preservaccedilatildeo das liacutenguas tal como nos preocupamos com a ecologiardquo (ECO 2001 p234)

32 SOBRE O CONTATO LINGUIacuteSTICO

Pouco eacute sabido sobre o contato entre as liacutenguas do mundo quando diante da

imensidatildeo que eacute o universo linguiacutestico com o qual nos deparamos14 A

necessidade que os humanos tecircm de se comunicarem a partir do momento que a

interaccedilatildeo foi estabelecida eacute condiccedilatildeo imprescindiacutevel para o contato linguiacutestico

Trask (2004 p 66) afirma que poucas liacutenguas estatildeo - ou estiveram -

suficientemente isoladas para evitar todo tipo de proximidade e portanto toda

liacutengua mostra alguma prova de um contato antigo ou moderno entre liacutenguas

Thurston (1987 p 34) afirma que

toda liacutengua deve ter sofrido alguma influecircncia de seus vizinhos em um determinado ponto e tempo Para ele todos os idiomas satildeo liacutenguas mistas na medida em que todos copiaram formas lexicais e outros recursos linguumliacutesticos de liacutenguas vizinhas

Embora natildeo saibamos exatamente como se deu o contato entre as liacutenguas do

mundo as evidecircncias do contato podem ser observadas de forma objetiva

atraveacutes de empreacutestimos lexicais O contato linguiacutestico entretanto natildeo se reduz

14

Eacute estimado o nuacutemero de sete mil liacutenguas vivas atualmente ao redor do mundo (httpwwwethnologuecomworld Em 21 de janeiro de 2015)

58

apenas a itens lexicais oriundos dos empreacutestimos entre culturas distintas com

base na dominaccedilatildeo na expansatildeo do comeacutercio ou em qualquer circunstacircncia que

promova a necessidade de comunicaccedilatildeo entre culturas de liacutenguas diferentes

O contato a depender das liacutenguas envolvidas pode trazer consequecircncias muito

devastadoras Em casos extremos o impacto do contato pode ser avassalador

fazendo com que uma das liacutenguas seja extinta quer seja pelo deslocamento

linguiacutestico que seja pelo etnociacutedio Nestes casos ocorre a morte de uma das

liacutenguas em contato aspecto que discorremos na seccedilatildeo sobre as consequecircncias

do contato

No tocante aos efeitos do contato em relaccedilatildeo aos niacuteveis linguiacutesticos Trask Idem

afirma que o contato linguiacutestico pode ir mais longe que a interferecircncia lexical

afetando a gramaacutetica e a pronuacutencia

Concordando com o que afirma Trask Thomason postula que embora seja senso

comum que o resultado mais comum da mescla linguiacutestica seja o empreacutestimo de

palavras este eacute apenas a consequecircncia mais comum quando se trata da

intersecccedilatildeo linguiacutestica

When the agents of change are fluent speakers of the receiving language the first and redominant interference features are lexical items belonging to the nonbasic vocabulary later under increasingly intense contact conditions structural features and basic vocabulary may also be transferred from one language to the other (THOMASON 2001 p 36)

Natildeo obstante podem-se detectar exemplos de transferecircncias em todos os

aspectos linguiacutesticos uma vez que todos os niacuteveis da estrutura linguiacutestica satildeo

59

possiacuteveis de serem transferidos entre idiomas muacutetuos sem qualquer tipo de

restriccedilatildeo dadas as possibilidades de conjunturas sociais e estruturais

Quando as liacutenguas entram em contato as suas gramaacuteticas tambeacutem satildeo

intercruzadas Tal processo natildeo eacute algo simples e justo Diversos fatores externos

satildeo responsaacuteveis por esta miscelacircnea que devido a tais fatores nem sempre eacute

concebida de forma inocente

Em meio a condicionantes sociolinguiacutesticas assumimos que as gramaacuteticas

(sendo tambeacutem reflexo das relaccedilotildees intersocietaacuterias) entram num jogo em que

as peccedilas satildeo acomodadas de acordo com as necessidades comunicativas dos

interlocutores (GILES e CUPLAND 1991) Em meio a esse ldquojogordquo nos importa

refletir como os fenocircmenos que emergem do contato entre liacutenguas podem refletir

questotildees que envolvem a marcaccedilatildeo e universais linguiacutesticos

Para Aikhenvald (2007 p1)

As liacutenguas podem assemelhar-se umas as outras em categorias construccedilotildees e significados e nas formas reais usadas para expressaacute-las As categorias podem ser semelhantes porque satildeo universais e cada liacutengua tem alguma forma de fazer uma pergunta ou a elaboraccedilatildeo de um comando Ocasionalmente duas liacutenguas compartilham a forma por pura coincidecircncia

A literatura linguiacutestica atesta que a semelhanccedila interlinguiacutestica motiva estudos

tipoloacutegicos haacute deacutecadas (CROFT 1990 COMRIE 1989 WHALEY 1997) Embora

liacutenguas apresentem padrotildees regulares de desemelhanccedilas aquelas podem ser

agrupadas em tipos baacutesicos Essa realidade induz a reflexatildeo acerca da existecircncia

de universais linguiacutesticos

60

As liacutenguas individuais independentemente das semelhanccedilas tipoloacutegicas eou

geneacuteticas observadas entre elas satildeo sujeitas a mudanccedilas continuadas que

ocorrem tambeacutem devido ao contato linguiacutestico Para Thomason (2001 p14) as

influecircncias e consequecircncias do contato linguiacutestico satildeo descritas em trecircs niacuteveis i)

mudanccedila induzida pelo contato ii) mescla linguiacutestica extrema o que resulta em

pidgin crioulo e liacutenguas biliacutengues e iii) morte da liacutengua

A seguir abordaremos fenocircmenos decorrentes do contato linguiacutestico

33 MESCLAS DE CONTATO PIDGIN CRIOULO LIacuteNGUA FRANCA E JARGAtildeO

Um ponto saliente dos estudos sobre o contato linguiacutestio eacute o conceito de

ldquomescla15rdquo Este termo utilizado por Tarallo e Alkimin (1987 p7) descreve a

relaccedilatildeo entre as liacutenguas e seus resultados Inicialmente eles chamam a atenccedilatildeo

para o fato de a mescla ser interpretada como algo impuro definhamento

deterioraccedilatildeo Esta impureza linguiacutestica historicamente levou a sociedade a

alimentar a ideia de contaminaccedilatildeo e obviamente construir a discriminaccedilatildeo

linguiacutestica

Ao pensarmos sobre o processo de simbiose que as coisas e os elementos do

mundo estatildeo sujeitos em todo o tempo podemos ter uma ideia clara de que o

processo de amaacutelgama eacute proacuteprio natildeo apenas da natureza linguiacutestica mas de tudo

o que pode existir Apesar disso as mesclas com graus niacuteveis e saliecircncias

variadas nem sempre satildeo refletidas ou percebidas pelos usuaacuterios das liacutenguas do

15 Mescla eacute mistura contato amaacutelgama etc Tarallo e Alkimin (1987 p7)

61

mundo Focalizando a natureza da mescla o estudo das liacutenguas por seu turno

seja sincrocircnico ou diacrocircnico pode evidenciar os fenocircmenos do contato nos

diferentes niacuteveis linguiacutesticos

Tarallo e Alkimin (idem p9) salientam que o dinamismo linguiacutestico se daacute nas

ldquocomunidades de falardquo16 Eacute nelas e entre elas que se concretizam o contato

linguiacutestico que por sua vez produzem fenocircmenos de mescla ou de convivecircncia

coexistecircncia mecanismo ativado pelos indiviacuteduos que integram tais comunidades

Esse fato se alinha agrave perspectiva de que uma comunidade de fala natildeo eacute em

absoluto homogecircnea Nela podem coexistir processos de ordem interna e

externa assim como forccedilas centriacutefugas e centriacutepetas (BAKHTIN 2010)17

A dinacircmica social eacute tambeacutem pontuada por Tarallo e Alkimin (ibidem p9) Esses

autores mencionam que a mescla linguiacutestica resultante da dinacircmica pode ser

intracomunidade ou intercomunidade No primeiro caso as variantes convivem

eou se entrecruzam em uma mesma comunidade de fala em que apenas uma

liacutengua eacute falada No segundo liacutenguas distintas coexistem e se misturam em uma

mesma comunidade Como exemplo de mesclas intracomunidades podemos citar

o portuguecircs e suas variantes questotildees geograacuteficas histoacutericas e sociais Satildeo

variantes que convivem ldquopacificamenterdquo em territoacuterio nacional Jaacute para as mesclas

intercomunidades tomemos o exemplo do conviacutevio do portuguecircs e demais liacutenguas

16

Labov (1972) conceitua comunidade de fala como grupo de falantes que segue as mesmas normas relativas ao uso da liacutengua Para Romaine (2000) trata-se de um grupo de falantes que natildeo compartilham necessariamente a mesma liacutengua poreacutem compartilham um conjunto de normas

e regras no uso da liacutengua 17

Bakhtin aponta a luta entre classes as forccedilas que agem de dentro para fora do sujeito ou das instituiccedilotildees assim como as forccedilas que agem fazendo o movimento oposto Eacute imprescindiacutevel vislumbrar o poder poliacutetico que a liacutengua tem

62

(alematildeo polonecircs e italiano) na regiatildeo sul bem como a coexistecircncia espaccedilo-

temporal entre diferentes liacutenguas indiacutegenas e entre elas e a liacutengua portuguesa

Ao discutir a mescla linguiacutestica sob a eacutegide do contato linguiacutestico Calvet (2004

p35) considera que haacute aproximadamente na Terra cerca de 5000 liacutenguas e

cerca de 150 paiacuteses Com base nesses nuacutemeros o autor nos diz que cada paiacutes

poderia ter 30 liacutenguas Apesar de em termos reais a distribuiccedilatildeo das liacutenguas natildeo

corresponder a esse cenaacuterio o pesquisador aponta para o fato de

que o mundo eacute pluriliacutengue em cada um de seus pontos e que as comunidades linguiacutesticas se costeiam se superpotildeem continuamente O plurilinguismo faz com que as liacutenguas estejam constantemente em contato O lugar desses contatos pode ser o indiviacuteduo (biliacutengue ou em situaccedilatildeo de aquisiccedilatildeo) ou a comunidade Idem (2002 p 35)

Os dados de Calvet deixam claro que desde sempre o contato linguiacutestico eacute uma

realidade da vivecircncia do humano Os acontecimentos histoacutericos de guerra

expansatildeo e colonizaccedilatildeo apontam para a mescla linguiacutestica Diante deste

contexto vemos que o relacionamento entre as liacutenguas do mundo eacute um processo

feacutertil para a diversidade linguiacutestica Outro aspecto de interesse decorre do fato de

o contato permitir a emergecircncia de padrotildees estruturais os quais trazem luzes

para a compreensatildeo da faculdade da linguagem

A depender do contato podemos avaliar diferentes fenocircmenos resultantes A

intensidade o contato linguiacutestico pode derivar instrumentos mais ou menos

elaborados de comunicaccedilatildeo definidos como jargatildeo pidgin e crioulo

63

Os primeiros estudiosos a se aterem sobre o estudo das liacutenguas pidgins e

crioulas se utilizaram dos dados (relatos) de missionaacuterios e comerciantes que

viajaram e mantiveram contato com as aacutereas das mesclas18

331 Pidgin

O termo pidgin foi usado pela primeira vez em 1850 para conceituar o conviacutevio do

inglecircs e o chinecircs19 Mas outras duas hipoacuteteses tambeacutem satildeo colocadas quando

se trata de pidgin A segunda afirma que o termo fora transportado da Ameacuterica do

Sul no iniacutecio do seacuteculo XVII pelos marinheiros e comerciantes ingleses da colocircnia

de Leigh ao estabelecerem contato com os iacutendios Pidiam A terceira explicaccedilatildeo eacute

a origem a partir da palavra portuguesa ocupaccedilatildeo que teria sofrido algumas

mudanccedilas foneacuteticas ateacute resultar em pidgin (TARALLO e ALKMIN 1987 p80)20

Para Couto (2001 p 1) o pidgin eacute uma liacutengua com uma reduccedilatildeo draacutestica da

gramaacutetica Esta reduccedilatildeo se daacute sobre a morfologia e o leacutexico Natildeo eacute liacutengua

materna de ningueacutem pois entre si os povos dominados soacute falam suas respectivas

liacutenguas ao passo que os dominadores nunca se datildeo ao trabalho de falar outra

liacutengua que natildeo a sua proacutepria

Crystal (2008 p 201) afirma que aleacutem do processo de reduccedilatildeo para o

surgimento do pidgin as comunidades de falas envolvidas neste processo

18

Tarallo e Alkimin 1987 p 109-114 citam Francisco Adolfo Coelho Hugo Schuchardt e Dirk Christiaan Hesseling como os pioneiros neste campo de estudo Este uacuteltimo atribui aos escravos europeus a forccedila linguiacutestica Foram eles (os escravos) os responsaacuteveis pelas alteraccedilotildees sofridas pelas liacutenguas maternas 19

Neste caso o termo business ao ser empregada na expressatildeo do pidgin chinecircs de base inglesa

dɛacuteju pidzIn significando thatrsquos your business 20

Ocupaccedilatildeo gt parsquosaw ou pasaɳ

64

necessitam cada uma delas se aproximarem sucessivamente dos traccedilos mais

oacutebvios da outra liacutengua Trata-se de uma intersecccedilatildeo nem sempre consciente mas

motivada por aspectos econocircmicos como o comeacutercio Daiacute o grande surgimento de

pidgins em aacutereas de intenso comeacutercio e desenvolvimento econocircmico

Dubois et all (1998 p 469) discorre que o pidgin mesmo natildeo sendo uma liacutengua

em si mesma eacute um sistema mais completo que o sabir pois seu vocabulaacuterio

cobre numerosas atividades O sabir ou liacutengua franca21 por sua vez eacute um

sistema linguiacutestico reduzido a algumas regras de combinaccedilatildeo e ao vocabulaacuterio de

determinado campo lexical

Ainda de acordo com Tarallo e Alkmin (1987 p 88)

Fontes histoacutericas indicam que no tempo das cruzadas nas regiotildees de batalhas entre mulccedilumanos e cristatildeos teria florescido uma liacutengua de contato denominada Liacutengua Franca ou sabir Com documentaccedilatildeo precaacuteria a existecircncia dessa liacutengua eacute contestada por alguns estudiosos Originalmente usada entre aacuterabes e europeus essa liacutengua teria se expandido tendo sido usada ao longo da costa do Mediterracircneo especialmente na Aacutefrica do Norte

Em Trask (2004 p228) o conceito de liacutengua franca eacute mais explorado Para ele a

liacutengua franca se distingue do pidgin quando por ventura um dos grupos

ldquoaprenderdquo a liacutengua do outro Neste caso a gramaacutetica e o leacutexico de uma

21

Na atualidade conforme Tarallo e Alkmin 1987 p 90 a expressatildeo liacutengua franca refere-se a um

fenocircmeno mais amplo a mescla de contato para intercomunicaccedilatildeo em situaccedilotildees biliacutengues e pluriliacutengues Como exemplo os autores citam a liacutengua wolof no Senegal do swahili no Quecircnia na Tanzacircnia e em Comores do Tucano no Nordeste da Amazocircnia

65

sobressaem agrave outra O pidgin eacute compreendido entatildeo como uma colcha de

retalhos que permite uma forma bastante rudimentar de comunicaccedilatildeo22

Ainda de acordo com Trasky (p229) um pidgin pode seguir caminhos distintos i)

ele pode cair em desuso ii) ele pode continuar em uso por vaacuterias geraccedilotildees e

durar seacuteculos iii) ele pode sofre algumas alteraccedilotildees e se transformar em liacutengua

materna Neste uacuteltimo caso trata-se do processo de crioulizaccedilatildeo do qual

abordaremos mais agrave frente

Hall apud Tarallo e Alkmin (1987 p 86) ao tratar do caraacuteter reducionista que o

pidgin apresenta em sua estrutura e leacutexico aponta algumas caracteriacutesticas que

definem tais simplificaccedilotildees

Niacutevel fonoloacutegico ndash o nuacutemero de contrastes empregados eacute reduzido As vogais representadas satildeo em geral as chamadas vogais cardinais (a e i o u) enquanto os grupos consonantais satildeo caracteristicamente evitados

Niacutevel morfoloacutegico ndash ausecircncia de algumas categorias flexionadas como gecircnero nuacutemero e tempo verbal

Niacutevel sintaacutetico ndash as estruturas sentenciais satildeo simples as sequecircncias tendem a ser coordenadas evitando-se as estruturas complexas e subordinaccedilatildeo extensiva

Niacutevel lexical ndash nuacutemero reduzido de vocaacutebulos cuja accedilatildeo se norteia pela extensatildeo de significados e por polissemias significativas

332 Crioulo

O crioulo eacute um pidgin consolidado Quando os falantes crianccedilas oriundos dessa

mescla linguiacutestica utilizam o pidgin como uacutenica liacutengua ou a liacutengua que passa a

ganhar mais evidecircncia esta se consolida como liacutengua materna

22

Conforme Tarallo e Alkmin (idem p 8) algumas caracteriacutesticas do pidgin satildeo i) seu caraacuteter

auxiliar e secundaacuterio para os dois grupos cada um dos grupos manteacutem sua proacutepria liacutengua no conviacutevio social do cotidiano e do habitual ii) as liacutenguas pidgin preenchem funccedilotildees sociais limitadas sobretudo aquelas vinculadas a atividades comerciais mercantilistas

66

Para Couto (2001 p2)

Liacutengua crioula eacute um pidgin que foi adquirido como liacutengua nativa como preconiza a chamada teoria da nativizaccedilatildeo De acordo com essa concepccedilatildeo o crioulo eacute um ex-pidgin ou seja um pidgin que virou liacutengua materna de uma comunidade

Ainda para Tarallo e Alkmin (1987 p 95) as liacutenguas crioulas constituem um

conjunto de liacutenguas cuja histoacuteria conhecida eacute ligada a uma situaccedilatildeo de contato

entre populaccedilotildees linguiacutesticas cultural e etnicamente distintas Estas satildeo

distinguidas das liacutenguas pidgin por possuiacuterem uma comunidade de falantes

nativos e consequentemente por desempenharem funccedilotildees sociais amplas como

qualquer liacutengua natural

Em Dubois et all (1998 p 161) daacute-se o nome de crioulos a sabires pseudo-

sabires ou pidgins que por motivos diversos de ordem histoacuterica ou sociocultural

se tornaram liacutenguas maternas de toda uma comunidade

As liacutenguas tipo pidgin de acordo com autores como Tarallo e Alkimin (1987 p

96) aleacutem de serem as liacutenguas que daratildeo origem aos crioulos (pois todo crioulo se

origina de um pidgin embora nem todo pidgin se transforme em crioulo) satildeo

associadas a atividades de comeacutercio enquanto os crioulos satildeo marcados pela

relaccedilatildeo de escravidatildeo

Quanto ao aspecto funcional as liacutenguas crioulas datildeo conta das necessidades

comunicativas totais de seus falantes nativos e usuaacuterios uma vez que a

passagem do estaacutegio de pidgin a crioulo eacute marcada por uma ampliaccedilatildeo do leacutexico

67

e de estrutura Neste caso para os estudiosos os crioulos nada mais satildeo que

pidgins enriquecidos23

O processo de evoluccedilatildeo de um pidgin em crioulo eacute descrito por Hall (1996 p 4)

em um diagrama Nele podemos ver que inicialmente o pidgin eacute configurado a

partir de um jargatildeo uma espeacutecie de pidgin instaacutevel Depois o pidgin ganha

estabilidade se configurando como um preacute-crioulo Por fim jaacute estabilizado o

pidgin se transforma em crioulo

Figura 1 Diagrama de Hall

LL = Liacutengua lexificadora ou de superstrato LS = Liacutengua de Substrato

De acordo com Hall (idem p 5) a evoluccedilatildeo do jargatildeo para o pidgin estaacutevel eacute

chamada de pidginizaccedilatildeo A evoluccedilatildeo do pidgin estaacutevel para o crioulo eacute

23

Valdman apud Tarallo e Alkimin 1987 p 96 cita um conjunto de traccedilos negativos dos crioulos franceses do Haiti de Guadalupe Martinica Reuniatildeo Mauriacutecio Seychelles e Rodrigues como i) ausecircncia de distinccedilatildeo de gecircnero ii) natildeo-obrigatoriedade de marcador de plural iii) verbos natildeo-flexionados iv) relacionamento parataacutetico no interior do sintagma nominal v) ausecircncia de hipotaxe vi) construccedilotildees passivas vii) vogais arredondadas viii) certos grupos consonantais

I = LL + LS pidgin instaacutevel jargatildeo

crioulo = III II = pidgin estaacutevel

68

denominada crioulizaccedilatildeo A volta do crioulo para o jargatildeo processo tambeacutem

possiacutevel eacute conhecido como descrioulizaccedilatildeo

Obviamente o crioulo eacute consequecircncia natural de situaccedilotildees de contato No

entanto nem todo contato linguiacutestico gera automaticamente um pidgin ou um

crioulo Os contatos podem daacute origem a fenocircmenos de mesclas diversas que

podem ou natildeo desaparecer ou serem absorvidas pelas liacutenguas presentes na

alquimia (TARALLO e ALKMIN 1987 p 103)

Quanto ao processo de desenvolvimento e de formaccedilatildeo de um pidgin e de

crioulos Hymes (1971 p 93) afirma que

A pidginizaccedilatildeo e a crioulizaccedilatildeo da linguagem natildeo satildeo processos marginais ao contraacuterio satildeo processos que ocorrem nas liacutenguas em geral Tais processos de natureza bastante complexa compreendem a ocorrecircncia de outros subprocessos os de mudanccedila A incidecircncia desses processos ocorre principalmente 1) na forma interna das liacutenguas (fala-se assim em reduccedilatildeo ou expansatildeo) 2) na forma externa das liacutenguas (daiacute se falar em amplificaccedilatildeo e complicaccedilatildeo) 3) no escopo de uso (o domiacutenio) de uma variedade linguiacutestica (fala-se assim em restriccedilatildeo ou extensatildeo)

Hymes (idem p 94) ainda explica que diferentemente da posiccedilatildeo claacutessica onde

um crioulo era oriundo (ou natildeo) de um pidgin nesta segunda proposta a

evoluccedilatildeo de um pidgin natildeo produz necessariamente um crioulo mas um conjunto

de variedades concorrentes chamada de contiacutenuo preacute-pidgin24

24

Para Hymes o contiacutenuo preacute-pidgin poderia evoluir e gerar a cristalizaccedilatildeo de um pidgin e teria autonomia enquanto sistema de comunicaccedilatildeo Com base nesta assertiva um pidgin seria o resultado de um processo que ganharia autonomia Esse pidgin constituiacutedo poderia se transformar em crioulo Mas o contiacutenuo preacute-pidgin natildeo evolui para um pidgin Torna-se possiacutevel supor a cristalizaccedilatildeo de um crioulo sem a existecircncia de um pidgin anterior (TARALLO E ALKMIN 1987 p 105)

69

Na concepccedilatildeo final deste autor o contexto inicial em que fora estabelecido o

contiacutenuo preacute-pidgin poderia alccedilar trecircs resultados aceitaacuteveis i) a cristalizaccedilatildeo de

um pidigin ii) a cristalizaccedilatildeo de um pidgin que se criouliza iii) a cristalizaccedilatildeo de

um crioulo sem necessariamente ter sido oriundo de um pidgin anterior

Tarallo e Alkimin (1987 p 106) afirma que a cristalizaccedilatildeo de um crioulo eacute apenas

uma das trecircs possibilidades para a mescla de contato que pode ser descrita da

seguinte forma i) o crioulo pode submergir ii) o crioulo pode se estabilizar sem

muitas variaccedilotildees iii) o crioulo pode se mesclar com liacutengua padratildeo oficial

De acordo com o que vimos ateacute aqui podemos descrever o processo de

hibridizaccedilatildeo linguiacutestica com base na mescla a partir dos seguintes estaacutegios i)

contiacutenuo preacute-pidgin ii) pidgin cristalizado iii) pidgin em processo de

despidginizaccedilatildeo iv) pidgin em processo de crioulizaccedilatildeo v) crioulo cristalizado vi)

crioulo em processo de descrioulizaccedilatildeo (contiacutenuo poacutes-crioulo)

333 Liacutengua Franca ou Sapir

O termo liacutengua franca refere-se agrave liacutengua de contato entre grupos ou membros de

grupos de liacutenguas distintas com finalidade para o comeacutercio Durante o Impeacuterio

Romano o grego serviu como liacutengua franca no oriente e no milecircnio seguinte o

latim no ocidente Esta liacutengua (o sapir) tambeacutem eacute conhecida como liacutengua de

marinheiro No mundo moderno o inglecircs desempenha este papel ao ser

considerado como liacutengua do comeacutercio e das ciecircncias

70

Devido agrave natureza colonizadora dos falantes suas liacutenguas serviram de liacutengua

franca em certos momentos da histoacuteria Eacute o caso do portuguecircs e do espanhol

durante a expansatildeo mariacutetima e do francecircs durante o seacuteculo VII

Trask (2004 p 167) relata que a expressatildeo lingua franca fora originadamente

utilizada para as liacutenguas dos francos francocircnio mas teve o sentido modificado

assumindo o sentido de liacutengua europeia ou liacutengua cristatilde Ele ainda assegura que

a liacutengua franca

era uma variedade de italiano fortemente suplementada com palavras derivadas do francecircs do espanhol do grego do aacuterabe e do turco que se usava como liacutengua do comeacutercio no Mediterracircneo oriental no final da Idade Meacutedia Desde entatildeo a denominaccedilatildeo aplica-se a toda liacutengua que desfruta de um amplo entre falantes de um grande nuacutemero de liacutenguas numa dada regiatildeo

No presente o termo eacute utilizado para designar uma liacutengua estabelecida haacute algum

tempo tida como materna em um grupo influente e que serve de comunicaccedilatildeo

entre os falantes de outras liacutenguas como por exemplo o papel que o inglecircs

exerce em Cingapura

Atualmente aleacutem do inglecircs inuacutemeras liacutenguas servem de liacutengua franca para

comunicaccedilatildeo entre os povos como por exemplo o tupi No entanto um caso que

merece destaque eacute o do esperanto liacutengua que vem sendo incorporada no mundo

desde a deacutecada de 80 com a finalidade de ser a liacutengua franca universal Vale

ressaltar que neste caso os interesses para que tal liacutengua se propagasse

eficientemente eacute diferente das liacutenguas francas da Idade Meacutedia uma vez que se

trata de uma liacutengua artificial criada com ideologias poliacuteticas filosoacuteficas e

religiosas

71

334 Jargatildeo

O jargatildeo eacute um pidgin instaacutevel Sua concepccedilatildeo se aproxima do sabir ou liacutengua

franca Romaine (2000 p182) faz uso desse termo para exemplificar o processo

de criaccedilatildeo de um crioulo

A simplificaccedilatildeo e a instabilidade satildeo as marcas mais salientes de um jargatildeo No

pidgin as normas satildeo mais estaacuteveis enquanto que no jargatildeo as normas natildeo satildeo

afixadas Segundo esta autora eacute a partir do jargatildeo que a mescla linguiacutestica se

configura

Figura 2 Configuraccedilotildees da Mescla Linguiacutestica segundo Romaine (2000 p185)

Tipo 1 Jargatildeo

Tipo 2 Jargatildeo

Tipo 3 Jargatildeo

Pidgin estabilizado

Pidgin estabilizado

Pidgin expandido

Crioulo

Crioulo

Crioulo

No tipo 1 o jargatildeo deu origem diretamente a um crioulo De forma diferente no 2

o crioulo natildeo se originou diretamente de um jargatildeo Este deu origem a um pidgin

estabilizado para posteriormente chegar a um crioulo No tipo 3 o jargatildeo evolui

se transformando em um pidgin estabilizado depois em um pidgin expandido ateacute

chegar a um crioulo O fato eacute que a origem nos trecircs casos estaacute em um jargatildeo

72

34 IMPLICACcedilOtildeES DO CONTATO LINGUIacuteSTICO

Todo contato resulta em processos linguiacutesticos que alteram e dinamizam as

liacutenguas do mundo que passam por transformaccedilotildees que advecircm tanto da sua

motivaccedilatildeo interna quanto da externa No que tange agraves motivaccedilotildees externas

podemos afirmar que satildeo os contatos os grandes responsaacuteveis por muitas dessas

transformaccedilotildees podendo resultar enoutros processos orirundos ou que se

assentam no contato

341 Bilinguismo

Os estudos e as correntes linguiacutesticas na sua maioria tecircm como base liacutenguas

uacutenicas ou comunidades monoliacutengues Contudo o bilinguismo ocorre amplamente

atraveacutes do mundo e permanece apresentando um leque de questionamento para

a comunidade cientiacutefica atual Embora natildeo seja de hoje o questionamento em

torno do bilinguismo25 soacute agora podemos vislumbrar o descortinar desse tema

Estudiosos do passado jaacute reconheciam a relevacircncia do fenocircmeno Jakobson

(1953) por exemplo assumiu que ldquobilingualism is for me the fundamental problem

of linguiacutesticsrdquo

Romaine (1995 p6) elenca alguns questionamentos com base no que deve ser

observado ao estudar o contato linguiacutestico

O que eacute que o desempenho dos falantes diante do processo biliacutengue nos diz

sobre a competecircncia de pessoas e das comunidades multiliacutengues

25

Do inglecircs bilingualism

73

Eacute a troca de elementos linguiacutesticos por acaso comportamento linguiacutestico e o

cacircmbio linguiacutestico aleatoacuterio

Isto eacute indicativo de fluecircncia pobre e inabilidade em uma ou ambas as liacutenguas em

outras palavras o resultado de competecircncia imperfeita

Ao contraacuterio com qual criteacuterio medimos a competecircncia dos biliacutengues

Pode-se distinguir entre troca empreacutestimo e interferecircncia linguiacutestica

Satildeo a mudanccedila de coacutedigo e o bilinguismo generalizado em uma comunidade

sinais de atrito de uma liacutengua minoritaacuteria

Satildeo os sistemas de idiomas que estatildeo disponiacuteveis para um indiviacuteduo biliacutengue

fundidos ou separados

Aleacutem desses questionamentos outros de base sociofilosoacutefica tambeacutem estatildeo

inseridos nos estudos sobre o bilinguismo Para alguns pesquisadores muitas

liacutenguas minoritaacuterias foram exterminadas devido agrave forte influecircncia e agrave troca

linguiacutestica No entanto mesmo sendo acusado por estes como um passo para o

extermiacutenio das liacutenguas minoritaacuterias o bilinguismo natildeo deve ser visto como o

responsaacutevel pela extinccedilatildeo pelo contraacuterio o estudo dele aliado ao conhecimento

metacognitivo poderatildeo contribuir para o salvamento de muitas dessas liacutenguas

ainda que no plano escrito jaacute que na oralidade muitas natildeo gozam do status de

suas liacutenguas como oficiais nas atividades sociais sendo relegadas aos rituais de

suas sociedades

O comportamento linguiacutestico de uma determinada sociedade natildeo pode servir

unicamente de paracircmetro para outras Assim se algumas comunidades

apresentam mais facilidade em absorver outra forma linguiacutestica umas tecircm maior

resistecircncia enquanto que outras convivem por centenas de anos lado a lado com

determinadas liacutenguas

74

O bilinguismo tambeacutem pode ser classificado como social ou individual Segundo

Appel e Muysken (1986) o bilinguismo social ocorre quando em determinada

sociedade duas ou mais formas linguiacutesticas satildeo faladas quando cedo toda

sociedade se torna biliacutengue mas elas podem se tornar diferentes no que se

relaciona ao niacutevel ou forma de bilinguismo conforme figura abaixo

Figura 3 Esquema de representaccedilatildeo do bilinguismo social segundo Appel e Muysken

(1986)26

De acordo com a figura na comunidade I as duas liacutenguas satildeo faladas por dois

diferentes grupos monoliacutengues No entanto um grupo reduzido de falantes

biliacutengues seraacute necessaacuterio para fazer a comunicaccedilatildeo entre os grupos Esta forma

de bilinguismo social geralmente ocorre no periacuteodo colonial dos paiacuteses Pode-se

tomar por exemplo o Brasil quando os portugueses aqui chegaram

Em sociedades representadas pela forma II todos os falantes satildeo biliacutengues Em

paiacuteses como Aacutefrica Iacutendia e Brasil existem muitas sociedades totalmente

biliacutengues em que os falantes dominam as duas formas linguiacutesticas existentes

26

Apud Appel e Muysken (1986) p 2

75

Na forma III um grupo dessa comunidade eacute biliacutengue enquanto a outra eacute

monoliacutengue sendo este grupo na maioria das vezes a minoria Pois geralmente

o grupo biliacutengue eacute o dominante e o outro o dominado Tal circunstacircncia eacute tiacutepica

das assimetrias comuns nas relaccedilotildees entre os sujeitos do contato Situaccedilatildeo

como essa evidencia o papel da liacutengua para uma sociedade a qual pode ser

objeto de libertaccedilatildeo e tambeacutem de dominaccedilatildeo

Como dito anteriormente estas formas de bilinguismo social natildeo satildeo uniformes

nem tatildeo pouco refletem em detalhe de todas as existentes no interior das

sociedades Em muitas comunidades a situaccedilatildeo linguiacutestica eacute extremamente

complexa com mais de dois grupos e linguagens envolvidos

Com relaccedilatildeo aos aspectos linguiacutesticos o estudo do bilinguismo pode responder e

explicitar os fenocircmenos decorrentes da situaccedilatildeo do contato Fenocircmenos no

domiacutenio do leacutexico ou da sintaxe podem ser muito produtivos Entretanto podemos

considerar que eacute o niacutevel da foneacuteticafonologia que marcadamente sofre a

interferecircncia com o contato linguiacutestico

No contato duas ou mais formas linguiacutesticas podem perdurar por anos conforme

os quadros I e III na figura 3 No entanto alguns fenocircmenos linguiacutesticos podem

ocorrer paralelamente Um embate linguiacutestico pode surgir dentro dessas

comunidades linguiacutesticas e estas liacutenguas podem cambiar o leacutexico uma da outra

Sobre isso Bloomfield (1961 p 25) classifica esses empreacutestimos em iacutentimos

culturais e dialetais

76

O empreacutestimo externo ou cultural sempre eacute motivado por contatos poliacutetico sociais

e comerciais inclusive militares sempre com a dominaccedilatildeo de um dos povos Jaacute

os empreacutestimos dialetais se datildeo entre os contatos dentro de uma mesma liacutengua

satildeo as variantes regionais

O que particularmente nos interessa - o empreacutestimo iacutentimo - ocorre quando as

duas liacutenguas passam a conviverem no mesmo campo geograacutefico Dessa forma

se a liacutengua A domina a liacutengua B poderatildeo ocorrer trecircs hipoacuteteses i) B desaparece

e deixa um substrato em A ii) A desaparece e deixa um superstrato em B iii)

permanecem as duas trocando elementos na condiccedilatildeo de adstrato No entanto

natildeo devemos esquecer que as motivaccedilotildees pelas quais os falantes se apropriam

ou satildeo obrigados a se apropriarem para adquirem outra(s) liacutengua(s) extrapolam

os aspectos aqui vislumbrados

Os exemplos dados por Romaine (1995 p 2) demonstram como pode ocorrer o

cacircmbio linguiacutestico entre a liacutengua materna e a liacutengua adquirida posteriormente A

partir desses exemplos a estudiosa elenca os questionamentos mais relevantes

que deveratildeo ser observados em pesquisas que tratam da anaacutelise das

comunidades biliacutengues

(a) Kio Ke six sevem hours te school de vie spend karde ne they are speaking English all the time (Panjabi Inglecircs)

Because they spend six or seven hours a day at school they are speaking English all the time27

(b) Will you rubim off Ol man will come (Tok Pisin Inglecircs)

27

ldquoPorque eles passam seis ou sete horas por dia na escola eles estatildeo falando inglecircs o tempo todordquo

77

Will you rub [that off the blackboard] The men will come28

(c) Sano esttaacute tulla tanne ettaacute Iacutem very sick (Finlandecircs Inglecircs)

Tell them to come here that Iacutem very sick 29

(d) Kodomotachi liked it (Japonecircs Inglecircs)

The children liked it 30

(e) Won o arrest a single person (Yoruba Inglecircs)

They did not arrest a single person 31

(f) This morning I hantar my baby tu dekat babysitter tu lah (Malay Inglecircs)

This morning I took my baby to the babysitter 32

De acordo com AiKhenvald e Dixon (2006 p 2)

Se duas ou mais liacutenguas estatildeo em contato os falantes de uma tendo conhecimento da outra eles podem compartilhar traccedilos linguiacutesticos incluindo haacutebitos de pronuacutencia Historicamente todo idioma deve ter sofrido certa influecircncia de seus vizinhos O impacto do contato eacute mais forte e mais faacutecil de ser discernido em alguns idiomas enquanto em outros eacute mais fraco

O que fora dito acima pode ser comprovado em qualquer comunidade em que a

liacutengua do colonizador fora imposta durante o ato de conquista ou de contato Em

algumas comunidades a situaccedilatildeo de bilinguismo eacute motivada por outras

28

ldquoVocecirc esfregaraacute [o quadro-negro de fora] Os homens viratildeordquo 29

ldquoChame-os aqui que eu estou muito doenterdquo 30

ldquoAs crianccedilas gostam dissordquo 31

ldquoEles natildeo prenderam uma uacutenica pessoardquo 32

ldquoEsta manhatilde eu ocupei meu bebecirc agrave babaacuterdquo

78

necessidades que se fazem presente nessa sociedade O portuguecircs eacute a liacutengua de

contato que eacute utilizada por todos os membros em situaccedilotildees diaacuterias e em contatos

com a comunidade externa Enquanto a liacutengua interna eacute utilizada em seus rituais

e eacute utilizada em contexto familiar que exige mais aproximaccedilatildeo familiar entre os

membros 33

342 Diglossia

O processo de diglossia pode ser compreendido conforme Dubois et all (1998 p

190) como i) situaccedilatildeo de bilinguismo ii) situaccedilatildeo biliacutengue na qual uma das

liacutenguas eacute de status sociopoliacutetico inferior iii) aptidatildeo que tem um indiviacuteduo de

praticar corretamente outra liacutengua aleacutem da liacutengua materna

Embora seja entendida tambeacutem como uma competecircncia linguiacutestica em que o

falante de uma determinada liacutengua possa conhecer os niacuteveis formal e informal de

sua gramaacutetica para este trabalho o conceito que recorremos eacute o de diglossia

enquanto situaccedilatildeo de conviacutevio de duas ou mais liacutenguas em uma comunidade

Trata-se neste caso da utilizaccedilatildeo de uma das liacutenguas como liacutengua oficial

enquanto a outra fica a cabo das situaccedilotildees de conviacutevio Geralmente a liacutengua do

dominador eacute a liacutengua das relaccedilotildees comerciais a outra eacute utilizada nos rituais ou no

seio das famiacutelias (comunidade)

Devido agraves colonizaccedilotildees e agrave globalizaccedilatildeo a diglossia eacute muito comum no mundo

poacutes-moderno Em paiacuteses que foram colocircnias portuguesas como Moccedilambique e

33

Como exemplo podemos citar o que ocorre com o Fulni-ocirc Conforme COSTA1993 p 58

79

Timor Leste por exemplo o Portuguecircs eacute a liacutengua oficial enquanto as liacutenguas

nativas satildeo conservadas no acircmbito familiar e em ciclos informais Assim como

nas comunidades mais desenvolvidas o aprendizado de mais de uma segunda

liacutengua faz com que as comunidades se tornem pluriliacutengues

Por causa desta competecircncia linguiacutestica em que o sujeito passa a dominar dois

ou mais coacutedigos o conceito de diglossia fora ampliado agraves comunidades

monoliacutengues Neste caso entende-se que o sujeito pode ser bi- ou multiliacutengue

fora e dentro da sua proacutepria liacutengua34

Para Ferguson (1991 p 5) a diglossia eacute

Uma situaccedilatildeo linguiacutestica relativamente estaacutevel em que junto aos dialetos primaacuterios da liacutengua (que podem incluir a variante padratildeo ou as normas regionais) haacute um dialeto muito divergente altamente codificado (muitas vezes bastante complexo gramaticalmente) sobrepondo-se agrave variedade Eacute o veiacuteculo de um grande e respectivo corpo de literatura escrita tanto de periacuteodo anterior ou de outra comunidade de fala eacute aprendido atraveacutes da educaccedilatildeo formal usado na escrita e na fala em contextos formais mas natildeo eacute usado em qualquer uma das seccedilotildees de comunidade para conversaccedilatildeo coloquial

Fishman (1967 p 8) afirma que a diglossia eacute gradual e variaacutevel Para ele o

conceito de diglossia estaacute ligado ao aspecto social enquanto o bilinguismo ao

individual Dessa forma a relaccedilatildeo entre bilinguismo e diglossia na situaccedilatildeo do

contato pode se dar das seguintes formas i) diglossia e bilinguismo atuando

juntos ii) bilinguismo sem diglossia iii) diglossia sem bilinguismo e iv) nem

diglossia nem bilinguismo

34

Crystal (1985 p 82) discorre que em geral os sociolinguistas se referem a uma variedade alta (A) e outra baixa (B) correspondendo grosso modo a uma diferenccedila de formalidade A variedade alta eacute apreendida na escola costuma ser usada nos locais cuja formalidade eacute maior A variedade baixa eacute usada em outros ambientes relativamente informais

80

O referido autor complementa afirmando que

O bilinguismo sem a diglossia tende a ser transicional tanto em termos de repertoacuterios linguiacutesticos de comunidade de fala como em termos das variedades de fala envolvidas per si Sem separar no entanto as normas complementares e valores para estabelecer e manter a separaccedilatildeo funcional das variedades de fala aquela liacutengua ou variedade que seja o bastante favoraacutevel para ser associada ao movimento predominante das forccedilas sociais tende a substituir a(s) outra (s) (idem p7)

No caso dos Latundecirc a diglossia se configura como um processo em que os

falantes foram obrigados a aprender a liacutengua dos brancos utilizando-a nas

atividades em contexto de contato com o natildeo iacutendio No entanto o grupo conserva

a liacutengua original nos rituais e no reduto familiar como fora explicado

anteriormente 35

343 Alternacircncia de coacutedigo36

O processo de diglossia quando eacute configurado entre duas liacutenguas distintas resulta

em bilinguismo O bilinguismo abordado no item 231 pode ser analisado de

diversos pontos de vista mas um em especial que seraacute tratado neste toacutepico eacute a

alternacircncia de coacutedigo ou code-switching Trata-se de um processo linguiacutestico

inerente ao falante biliacutengue desenvolto ou natildeo na liacutengua que aprendera como

segunda liacutengua no caso do biliacutengue ou da terceira por diante como nos

pluriliacutengues

35

Vale ressaltar que atualmente devido agrave incorporaccedilatildeo da cultura do branco os Latundecirc estatildeo

falando mais frequentemente o Portuguecircs em diversas situaccedilotildees de comunicaccedilatildeo ateacute mesmos nas mais informais Isso se deve ao fato de as geraccedilotildees mais novas serem menos conservadoras e resistentes ao contato 36

Tratamos tambeacutem deste processo ao discorremos sobre o bilinguismo na seccedilatildeo 231

81

Dessa forma o falante biliacutengue ao se comunicar com outro falante que detenha

suas mesmas liacutenguas poderaacute fazer escolhas linguiacutesticas dentro de cada coacutedigo

ou alternando os coacutedigos Por isso os pesquisadores dizem que o falante biliacutengue

apresenta um comportamento proacuteprio em seu processo de interaccedilatildeo que eacute a

utilizaccedilatildeo do code-switching que se caracteriza por ser uma estrateacutegia de

adequaccedilatildeo interativa desejaacutevel e favoraacutevel do ponto de vista pragmaacutetico Este

processo constitui um processo de ativaccedilatildeo e desativaccedilatildeo de uma ou de outra

liacutengua

Para Auer (1999 p 46)

O termo code-switching reserva-se para os casos em que a justaposiccedilatildeo dos dois coacutedigos eacute percebida e interpretada como um ato localmente significativo pelos participantes Contrapotildee-se assim ao code-switching tambeacutem denominado language mixing (mistura de coacutedigo ou de liacutenguas) em que a justaposiccedilatildeo dos coacutedigos tem significaccedilatildeo para os participantes em sentido mais global sendo um padratildeo recorrente de comunicaccedilatildeo

Um falante biliacutengue decide primeiramente qual deveraacute ser a liacutengua de base para

ser utilizada com o outro falante que domina suas liacutenguas tambeacutem e a partir daiacute

decide se faraacute uso ou natildeo do code-switching eacute o que afirma Grosjean (1982 p

127) a partir do esquema abaixo

82

Figura 4 Escolha de liacutengua e code-switching conforme Grosjean (1982 p127)

Conforme o esquema acima o falante biliacutengue apresenta competecircncia linguiacutestica

para se comunicar tanto com um falante monoliacutengue quanto outro biliacutengue Ao se

comunicar com o falante monoliacutengue o referido falante biliacutengue faraacute a escolha de

uma liacutengua A ou a liacutengua B Neste caso natildeo poderaacute fazer uso das duas No

processo comunicativo com outro falante biliacutengue ele poderaacute utilizar a liacutengua A

com ou sem alternacircncia com a liacutengua B Ou utilizar a liacutengua B com ou sem

alternacircncia com a liacutengua A O que determina tais escolhas satildeo as vantagens e

desvantagens do cacircmbio linguiacutestico

Neste trabalho natildeo trataremos diretamente do code-switching por entendermos

que nos desviariacuteamos do objetivo basilar desta pesquisa que eacute o enfoque nos

segmentos foneacuteticos Outro aspecto seria o fato de os falantes latundecirc soacute

apresentarem a alternacircncia de coacutedigo durante as narrativas discorridas nas

83

entrevistas quando solicitados para que narrassem os acontecimentos e lendas

do seu povo

344 Morte da liacutengua

O contato linguiacutestico eacute um processo tambeacutem poliacutetico cujas consequecircncias podem

ser apenas o de mixagem ou mais intensamente a morte da liacutengua Muitas

vezes o contato eacute tatildeo devastador que extermina as liacutenguas minoritaacuterias trata-se

de um verdadeiro glotociacutedio37

Para Mcmahon (1994 p 228) a morte de uma liacutengua

Envolve essencialmente uma transferecircncia de obediecircncia de parte de uma populaccedilatildeo a partir de uma liacutengua que foi nativa na aacuterea para uma liacutengua mais recentemente introduzida na qual a populaccedilatildeo indiacutegena tornou-se biliacutengue A nova linguagem eacute geralmente falada nativamente por falantes mais potentes que podem tambeacutem ser mais numerosos e normalmente eacute associada pelos falantes da liacutengua minoritaacuteria com a riqueza prestiacutegio e progresso a liacutengua minoritaacuteria eacute entatildeo efetivamente abandonada por seus falantes tornando-se apropriada para uso em cada vez menor (e menor) contexto ateacute que seja inteiramente suplantada pela liacutengua que estaacute entrando

Dubois et all (1998 p 422) afirma que uma liacutengua morta eacute uma liacutengua que deixou

de ser falada mas cujo estatuto numa comunidade sociocultura eacute agraves vezes

desempenhar ainda um papel no ensino nas cerimocircnias rituais etc como o

latim

Para Trask (2004 p 200) a liacutengua eacute considerada moribunda ou estaacute prestes a

morrer quando o resultado de morte eacute praticamente inevitaacutevel Segundo o autor

37

Calcula-se que no iniacutecio da colonizaccedilatildeo portuguesa existiam aqui cerca de 1200 liacutenguas que

apoacutes anos de ocupaccedilatildeo de territoacuterio se resume a 180 Conforme Rodrigues 2002 p19 muitas delas estatildeo moribundas e carecem ser catalogadas

84

a cabo de uma ou duas geraccedilotildees ningueacutem mais seraacute capaz de falar esta liacutengua

pura e simplesmente Eacute a morte da liacutengua que resulta do processo denominado

substituiccedilatildeo da liacutengua

Ao dar continuidade ao seu argumento o referido autor assegura que a morte de

uma liacutengua eacute um processo gradual Assim exemplifica o pesquisador

em um dado lugar em um determinado momento algumas crianccedilas ainda estatildeo aprendendo - como sua liacutengua materna - a liacutengua que estaacute morrendo enquanto outras a estatildeo aprendendo apenas imperfeitamente e outras ainda natildeo estatildeo aprendendo de maneira nenhuma A liacutengua pode desaparecer por completo em certas aacutereas e sobreviver em outras Idem p 201

Ainda segundo Trask ibidem satildeo caracteriacutesticas da morte de uma liacutengua i) a

perda das irregularidades ii) a queda em desuso das formas e dos esquemas de

construccedilatildeo sentencial mais complexos ou menos frequente iii) a substituiccedilatildeo

maciccedila das palavras nativas por palavras tiradas da liacutengua de prestiacutegio iv) a

mudanccedila de pronuacutencia que se torna mais proacutexima da liacutengua de prestiacutegio v) a

perda da variaccedilatildeo estiliacutestica que leva agrave sobrevivecircncia de um uacutenico estilo

invariaacutevel

Nem sempre a morte de uma liacutengua estaacute diretamente ligada a aspectos

linguiacutesticos Cristoacutefaro-Silva (2002 p 56) elenca trecircs aspectos natildeo linguiacutesticos

que contribuem para a aniquilaccedilatildeo de uma liacutengua O primeiro diz respeito ao fato

de o pesquisador natildeo poder investigar o processo de morte devido agrave presenccedila de

uns poucos falantes da liacutengua O segundo trata da opressatildeo poliacutetica imposta aos

falantes que neste caso deixam de falar a liacutengua para natildeo serem perseguidos E

85

o terceiro ocorre quando a liacutengua eacute mantida apenas em rituais em que os falantes

natildeo sabem mais o teor semacircntico do que verbalizam

Natildeo diferente do aqui fora apresentado a situaccedilatildeo da liacutengua Latundecirc eacute bastante

delicada uma vez que a comunidade passou por diversos transtornos que

impactaram a forma como se organizavam socialmente O nuacutemero de nuacutemero de

falantes diminuiu e consequentemente a liacutengua se encontra altamente

ameaccedilada O portuguecircs sendo a liacutengua dominante de prestiacutegio e funcional para

a relaccedilatildeo com o mundo natildeo indiacutegena ganha espaccedilo crescente entre os Latundecirc

Esta eacute a situaccedilatildeo natildeo soacute do Latundecirc mas de vaacuterios grupos indiacutegenas

86

4 COMUNIDADE DE ESTUDO OS LATUNDEcirc

Que gente eacute essa que fala idioma tatildeo diferente das liacutenguas conhecidas tatildeo diferente da liacutengua dos seus mais proacuteximos vizinhos

que tem costumes tatildeo estranhos aos que vivem perto que natildeo conhece os objetos essenciais da vida dos seus companheiros de sertatildeo

De onde veio Por onde passou que natildeo deixou rastros Quando chegou agravequelas matas onde vive haacute tanto tempo

Que ligaccedilotildees tem com os outros filhos do Brasil Roquete-Pinto (1975 p121)

41 INTRODUCcedilAtildeO

Discorremos neste capiacutetulo sobre o povo Latundecirc e a sua comunidade descriccedilatildeo

contexto histoacuterico cultural e geograacutefico desta etnia Histoacuteria do contato conflitos

internos e externos dificuldades enfrentadas pelo grupo ao longo de sua

existecircncia denominaccedilatildeo acesso hierarquia social padratildeo e constituiccedilatildeo familiar

contatos intereacutetnico bilinguismo e ensino na aldeia

42 A FAMIacuteLIA NAMBIKWAacuteRA38 39 40

Os Nambikwaacutera41 satildeo conhecidos na etnologia brasileira por terem sido

oficialmente contatados pelo Marechal Rodom e por terem sido estudados por

Leacutevi-Strauss De origem Tupi o vocaacutebulo Nambikwaacutera eacute o resultado da fusatildeo dos

38

Os Nambikwara se auto denominam Anunsu Conforme Price amp Cook Jr The Nambikwara call

themselves aacute nu suacute people This name written anunzecirc has apereared throughout the literature but has been erroneously thought to be a band name (1969 p 690) 39

Os Nambikwra satildeo famosos na etnologia brasileira por terem sido oficialmente contatados pelo Marechal Rodom e por terem sido estudados por Leacutevi-Strauss 40

Os Nambikwara natildeo estatildeo ligados aos troncos Tupi e Macro-Jecirc Trata-se de uma famiacutelia linguiacutestica isolada com caracteriacutesticas especiacuteficas que natildeo se enquadra em nenhum desses dois grupos 41

Leacutevi-Strauss (1946 p 139) afirma que se trata de uma palavra Tupi e que deve ser escrita como Nhambikwara

87

termos ldquonambirdquo que significa ldquoorelhardquo e ldquokuarardquo cujo significado eacute ldquoburacordquo

Portanto Nambikwaacutera42 eacute ldquoburaco de orelhardquo

Coforme Leacutevi-Strauss (1946 p 48)

The name Nambikwra was mentioned for the first time and only by hearsay by Antonio Pires de Campos in the beginning of the 18th century Since then it appeared several times with reference to an unknown tribe located on the headwaters of Tapajoz There is a great discrepancy between the different spellings When General Candido Mariano da Silva Rondon began to explore the land between the Tapajoz and Gi-Parana in 1907 he met with unknown group of a unknown language and he did not hesitate to identify them with the tribe often mentioned in the early documents It was at that time that the name Nhambikwara was

definitely adopted its spelling fixed and that it was recognized as a Tupi nickname the meaning of which is big ears

A famiacutelia Nambikwara eacute dividida em dois grandes grupos aleacutem de outra

remanescente conforme figura abaixo

Figura 5 Classificaccedilatildeo das liacutenguas da Famiacutelia Nambikwaacutera de acordo com Rodrigues

(1986 p 134)

42

Seguimos neste trabalho a orientaccedilatildeo da Associaccedilatildeo de Antropologia Brasileira que em 1953

estabeleceu a fim de padronizar os nomes dos povos indiacutegenas do Brasil com o intuito de facilitar os estudos etnograacuteficos e Linguiacutesticos a nomenclatura padratildeo

88

Conforme figura acima o povo Latundecirc faz parte da famiacutelia Nambikwaacutera que se

divide em Nambikwaacutera do Norte Nambikwaacutera do Sul e Sabanecirc Os Latundecirc

juntamente com os Lakondecirc os Tawandecirc os Mamaindecirc e os Negarotecirc

pertencem ao grupo Nambikwaacutera do Norte Jaacute o Nambikwaacutera do Sul eacute composto

pelos povos Galera Kabixi Munduacuteka e Nambikwaacutera do Campo cada um

correspondendo a um complexo dialetal O Sabanecirc eacute uma liacutengua agrave parte por se

acreditar que natildeo haacute muitas semelhanccedilas entre as estruturas linguiacutesticas dessa

liacutengua e as demais liacutenguas desse grupo

Situado na aacuterea entre os rios Juruena e Comemoraccedilatildeo o territoacuterio consta do

registro de muitos autores Roquete-Pinto (1919) Leacutevi-Strauss (1946) Price e

Cook (1969) Price (1977) Mas eacute de Roquete-Pinto (1919) e Price (1983) a

exposiccedilatildeo mais aceita Em ambos os limites geograacuteficos desses povos satildeo

relatados da seguinte forma pelo Rio Papagaio (sul) pelo rio Gi-Paranaacute (norte)

pelo rio Tapajoacutes (leste) e pelo rio Guaporeacute (oeste)

Figura 6 Localizaccedilatildeo e aacuterea dos Nambikwaacutera de acordo com Roquete-Pinto (1919)

89

De acordo com a FUNAI43 os dados atuais indicam que os Nambikwaacutera hoje

com cerca de dois mil iacutendios estatildeo distribuiacutedos em seis Terras indiacutegenas (TI)

vivem no sudoeste do Mato Grosso e aacutereas proacuteximas de Rondocircnia entre a

floresta amazocircnica e o cerrado

Figura 7 Territoacuterio Nambikwaacutera descrito por Price (1983)

No que tange ao conhecimento desses povos eacute de meados do seacuteculo XVIII que

obtemos os primeiros contatos com os Nambikwaacutera Foi Luiz Pinto de Souza

Coutinho terceiro capitatildeo geral do Estado do Mato Grosso o organizador de uma

expediccedilatildeo pelas margens do Rio Guaporeacute com o propoacutesito de abrir caminhos

entre a capital de entatildeo Proviacutencia de Mato Grosso e o Forte Braganccedila

43

Fundaccedilatildeo Nacional do Iacutendio

90

Os relatos histoacutericos nos mostram que era prioridade do Governo Militar apoacutes a

Proclamaccedilatildeo da Repuacuteblica em 1889 a integraccedilatildeo de todas as terras brasileiras

Uma das accedilotildees dessa integraccedilatildeo foi a determinaccedilatildeo do governo em construir

linhas telegraacuteficas em terras indiacutegenas da Amazocircnia com o propoacutesito de interligar

o Rio de Janeiro a Cuiabaacute Agrave frente dessa empreitada estava o Major Antonio

Gomes Carneiro e entre a comitiva o seu aluno Cacircndido Mariano da Silva

Rondon

Eacute Rodon o principal agente de contato entre os iacutendios Nambikwaacutera e os natildeo

iacutendios Pois como eacute sabido dele partia o discurso de apaziguamento entre o

contato preferindo antes de qualquer coisa ser atingido a atingir os silviacutecolas

Aleacutem da motivaccedilatildeo de expansatildeo para a implantaccedilatildeo das linhas telegraacuteficas

Rondon era conduzido por um desejo ardente de respeito e proteccedilatildeo aos povos

daquela regiatildeo

Dessa forma os iacutendios Nambikwaacutera estavam entre os indiacutegenas que ajudaram a

comissatildeo do governo a alcanccedilar os lugares mais hostis Este encontro entre

indiacutegenas e brancos culminou em invasotildees e conflitos entre povos aleacutem das

doenccedilas que foram trazidas pelos natildeo indiacutegenas por isso a extinccedilatildeo de vaacuterias

tribos e povos aleacutem do prejuiacutezo linguiacutestico resultante da aculturaccedilatildeo dos

indiacutegenas frente agrave presenccedila do natildeo iacutendio uma vez que para que ocorresse o

processo de interaccedilatildeo os indiacutegenas se viram obrigados a aprender o portuguecircs

O contato entre os grupos Nambikwaacutera natildeo se deu de forma paciacutefica Os

Nambikwaacutera do Norte natildeo foram receptivos e os planos dos governos foram

frustrados De forma diferente o contato com os Nambikwaacutera do Sul se deu de

91

forma mais intensa Mesmo apoacutes os constantes conflitos o contato perdurou por

mais tempo que com os do Norte acarretando mudanccedilas culturais de costumes e

da liacutengua

Telles (2002 p 10) afirma que

Do grupo linguiacutestico do Norte hoje restam apenas remanescentes de cinco etnias Tawandecirc Lakondecirc Mamaindecirc Negarotecirc e Latundecirc Destes os trecircs uacuteltimos permanecem em aacutereas proacuteximas de seus territoacuterios tradicionais e se preservam enquanto grupos relativamente autocircnomos Estes povos natildeo habitavam tradicionalmente a regiatildeo norte do territoacuterio Nambikwaacutera e esse fato pode ter favorecido a sua independecircncia grupal ao longo do percurso histoacuterico

Figura 8 Localizaccedilatildeo atual dos Nambikwaacutera

Como consequecircncia do contato no final do seacuteculo XX a populaccedilatildeo desses povos

foi reduzida a mais ou menos 650 sendo 50 deles crianccedilas Price (1985 p 312)

92

chama a atenccedilatildeo para o processo de aculturaccedilatildeo pois para as crianccedilas ldquoseria

mais confortaacutevel falar portuguecircs que a liacutengua dos seus paisrdquo44

Ainda com relaccedilatildeo agrave classificaccedilatildeo linguiacutestica alguns estudiosos utilizam

classificaccedilotildees diferentes para organizar os povos Nambikwaacutera A divisatildeo claacutessica

de Leacutevi-Strauss (1948) distribui os Nambikwaacutera de acordo com a aproximaccedilatildeo

linguiacutestica que haacute entre eles Para ele haacute trecircs grupos principais que se subdividem

formando cinco unidades constituiacutedas por vaacuterios dialetos de uma mesma liacutengua

Price e Cook (1969) em trabalho posterior sugerem outra classificaccedilatildeo para a

famiacutelia Nambikwaacutera Para eles haacute dois grandes grupos os Sabanecirc e os

Nambikwaacutera Entretanto embora o Sabanecirc natildeo seja compreensiacutevel para os

outros grupos linguiacutesticos por razotildees estruturais Price (1972) com base num

estudo comparativo considera o Sabanecirc como integrante da famiacutelia linguiacutestica

Nambikwaacutera Para uma visualizaccedilatildeo das propostas de Leacutevi-Strauss e de Price e

Cook apresentamos as respectivas classificaccedilotildees nas tabelas a seguir

Quadro 2 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Leacutevi-Strauss (1948)

44

ldquofifty were children who are probably more comfortable speaking Portuguese than the languages of their parents

Grupo a

Grupo b

Grupo c

Subgrupo a1

Subgrupo a2

Subgrupo b1

Subgrupo b2

Oakleacutetosu

Haloacutetesu

Kiaaacuteru

Kuritsu

Soaacutelesu

Kodaacuteteli

Munuacutekoti

Nikedeacutetosu

Taruacutende

Maimatildende

Toatildende

Ioacutelola

Naseacutelate

Lakotildende

Sovaacuteinte

Sabaacutene

93

Quadro 3 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Price e Cook (1969)

Leacutevi-Strass natildeo aponta os Latundecirc como pertencente ao grupo Nambikwaacutera

devido ao natildeo contato com este povo que soacute fora inicialmente descobertos

(contatados) em 1975 pelos Aikanaacute conforme veremos a seguir

43 OS LATUNDEcirc

O povo Latundecirc pertencente ao Nambikwaacutera do Norte habita uma aacuterea de

116613671 hec no municiacutepio de Chupinguaia na regiatildeo sudoeste do estado de

Rondocircnia Com eles convivem outros dois grupos que natildeo possuem nenhum

Navaacuteite

Taiate

Nambikwaacutera

Sabanecirc

Do Norte

Do Sul

Latundecirc

Lakundecirc

Tawandecirc

Mamaindecirc

Negarotecirc

Vale do Jurema

Vale do Guaporeacute

Vale do Sarareacute

Haloteacutesu

Kithaulhu

Sawenteacutesu

Wakalitesu

Wasusu

Sarareacute

Alacircntesu

Waikisu

Hahatildetesu

94

grau de parentesco linguiacutestico Satildeo os Aikanaacute e os Kwazaacute que fazem parte da

Terra Indiacutegena (TI) Tubaratildeo-Latundecirc45

No mapa abaixo pode-se obervar a localizaccedilatildeo da TI Tubaratildeo-Latundecirc que se

situa entre a RO 370 e a BR 364

Figura 9 Localizaccedilatildeo da TI Tubaratildeo-Latundecirc46

A reserva estaacute localizada a oeste do municiacutepio de Vilhena Nela haacute trecircs vilas Rio

do Ouro Barroso e Gleba (tambeacutem conhecida como Tubaratildeo) Gleba eacute a que

conteacutem a maior populaccedilatildeo mista De faacutecil acesso pode ser adentrada pela cidade

de Chupinguaia que fica a 19 km da TI Rio do Ouro possui uma populaccedilatildeo

exclusivamente Aikanatilde e estaacute a 20 km da Gleba Barroso conteacutem a menor

populaccedilatildeo e corresponde a uma aacuterea de ocupaccedilatildeo esparsa em que se distribuem

45

Conforme Anonby the Tubaratildeo-Latundecirc Indian Reserve is inhabited by people from several tribes the tree main linguistically-unrelated Aikanatilde (also known as Tubaratildeo) Kwazaacute and Latundecirc 2009 p3 46

Inicialmente estes povos ocupavam uma aacuterea de ricas florestas no oeste do rio Pimenta Bueno

proacuteximo a uma pequena vila denominada de Satildeo Pedro

95

remanescentes Kwazaacute Aikanaacute e Latundecirc A meacutedia de distacircncia do Barroso para a

Gleba eacute de aproximadamente 25 km O acesso se daacute por uma estrada

parcialmente carroccedilaacutevel de difiacutecil locomoccedilatildeo

Com relaccedilatildeo agrave populaccedilatildeo de cada povo Anomby (2009 p5) afirma que o

quantitativo total de pessoas eacute de 219 iacutendios Deles 175 satildeo Aikanatilde 25 satildeo

Kwazaacute e 19 satildeo Latundecirc Haacute ainda 189 iacutendios distribuiacutedos por outras localidades

fora da TI 47

Quadro 4 Distribuiccedilatildeo dos povos pertencentes a TI Tubaratildeo-Latundecirc

TI Rio do Ouro 67

Gleba 48

Barroso 34

Outras localidades

Satildeo Pedro 18

Vilhena 15

Chupinguaia 7

Total 189

Durante muitos anos os Latundecirc os Kwazaacute e os Aikanatilde viveram em contato com

grupos vizinhos como os Kanoecirc Mekens Sakirap Tupariacute Salamatildei entre outros

povos que tecircm sido acolhidos pela populaccedilatildeo local da TI Mesmo com diferentes

liacutenguas eles se relacionavam com festivais e casamentos intergrupais A cultura

desses povos tornou-se muito similar devido ao contato intenso entre eles De

acordo com Anomby (2009 p 6) os traccedilos mais comuns entre este povos

incluem cestas de fibra de marico casas em forma de colmeia para

47

Em conversa com os professores desses povos Anomby Idem natildeo afirma os motivos pelos

quais tais iacutendios estatildeo afastados dos demais

96

aproximadamente dez famiacutelias bebida de milho fermentado canibalismo e

divisatildeo de clatildes

Quanto ao contato sabe-se que foram os iacutendios Aikanaacute os primeiros a contatarem

com os Latundecirc Price (1977 p 72 - 73) descreve que o entatildeo Capataz Rural

Jorge Falcatildeo fora informalmente designado encarregado da operaccedilatildeo de contato

No ano de 1976 acompanhado por cinco iacutendios Aikanaacute e um serigueiro apoacutes

cinco dias de intensa caminhada ocorreu o encontro com os Latundecirc Neste

primeiro momento o desconhecido povo tremia de medo mas se posicionaram

ainda que fragilmente na linha de defesa Apoacutes dormirem no campo o capataz e

demais membros da excursatildeo conseguiram no outro dia um contato comprovado

por poucas fotografias com o povo Latundecirc Jorge descreveu que tais iacutendios natildeo

conseguiram se comunicar com os Aikanaacute e que eram em nuacutemero de 10 homens

e 8 crianccedilas afora poucas crianccedilas que afirma natildeo tecirc-las visto

A FUNAI em 1977 com a ajuda do Capataz Rural realizou uma nova excursatildeo

aos iacutendios Latundecirc Desta vez aleacutem de Jorge juntos a ele estavam presentes

David Price e dois iacutendios Nambikwara do Norte (Lakondecirc) que conseguiram

identificar os Latundecirc como tambeacutem pertencentes agrave etnia Nambikwara do Norte

Foram mensurados como uma aldeia composta por oito casas e dezenove

habitantes 48

48

Para uma descriccedilatildeo mais detalhada ver Telles 2002 p17

97

Figura 10 Primeiros contatos com os Latundecirc (Foto Price 1977)

Em 1999 o povo era composto por vinte pessoas Entre 1999 e 2000 a grupo ficou

ainda menor com a saiacuteda de trecircs dos membros Faacutetima (irmatilde de Terezinha49)

Batataacute (a anciatilde do grupo) e Joatildeo (irmatildeo solteiro de Terezinha) As crianccedilas e os

jovens do grupo satildeo na sua maioria parentes consanguiacuteneos De acordo com as

relaccedilotildees de parentesco os mais novos natildeo poderatildeo coabitar entre si o que

implica a natildeo autonomia e a natildeo perpetuaccedilatildeo do grupo Latundecirc

49

Trata-se de a informante deste projeto de pesquisa

98

Quadro 5 Nuacutecleos familiares de acordo com a habitaccedilatildeo em 199950

Casa 1

Pais Filhos Agregados

Maneacute Torto (60) Terezinha (45)

Luiz (22) Antocircnio (20) Lorena (12) Catarino (10) Justino (8) Jaelson (4)

Joatildeo (26) Francisco (25) Irmatildeos de Terezinha

Maneacute Torto (60) Faacutetima (30)

Maria (13)

Casa 2

Joseacute (40) Lurdes (40)

Jair (13) Dido (11) Lourival (3) Lorimar (6 meses)

Cinzeiro (50) Irmatildeo de Lurdes

Casa 3 Batataacute (65)

Dados atuais51 noticiam que o grupo se enfraqueceu politicamente Tereza

mudou-se para uma aldeia de outro grupo Nambikwaacutera do Norte e Maria e Lorena

foram morar na Gleba

No que concerne agraves atividades econocircmicas a extraccedilatildeo de borracha foi a grande

atividade econocircmica na deacutecada de 30 do seacuteculo passado no sul de Rondocircnia

Durante o apogeu dessa atividade os Aikanatilde e os Kwazaacute trabalharam para

barotildees da borracha em troca de cafeacute accediluacutecar e armas de fogo

Consequentemente apoacutes aprenderem as estrateacutegias de negociaccedilatildeo na deacutecada

de 70 os proacuteprios iacutendios agora independentes passaram a vender a sua proacutepria

borracha nas cidades vizinhas (Van der Voort 1998)

50

Telles 2002 p 19 51

Informaccedilatildeo proveniente de comunicaccedilatildeo pessoal com Stella Telles janeiro de 2015

99

A comercializaccedilatildeo da borracha tambeacutem fora um pano de fundo para o processo

de bilinguismo ocorrente entre os povos dessa regiatildeo O portuguecircs se tornara

uma espeacutecie de liacutengua franca utilizada para a comercializaccedilatildeo do produto no

exterior e na interaccedilatildeo com os seringalistas Contudo as liacutenguas indiacutegenas

permaneciam sendo usadas mais provavelmente na retirada e no processamento

da borracha nas reservas52

A economia na aldeia diferentemente do que fora no passado representa a atual

situaccedilatildeo dos iacutendios Haacute pouca lavoura de subsistecircncia53 o que faz com que a

produccedilatildeo de comida seja escassa Os integrantes da aldeia quando precisam de

provimentos compram sua comida na cidade ou recebem-na dos parentes que

vivem em Rio do Ouro

Ainda de acordo com Anomby (2009 p7)

As principais fontes de dinheiro em ambas as aldeias como a maioria das aldeias no Brasil satildeo as remessas de aposentadoria para os idosos e da venda de artesanato indiacutegena aleacutem da venda de madeira e os pequenos serviccedilos prestados aos demais moradores e visitantes

No que diz respeito agrave religiatildeo atualmente a presenccedila do protestantismo eacute muito

forte na TI Tubaratildeo-Latundecirc Missionaacuterios UNIEDAS54 (iacutendios da tribo Terena)

comeccedilaram a trabalhar na aacuterea em 1980 e como resultado a maioria das

pessoas que vivem na reserva iacutendios Tubaratildeo-Latundecirc hoje se consideram

52

Neste contexto histoacuterico pode-se perceber claramente a hierarquizaccedilatildeo linguiacutestica no que tange agrave utilizaccedilatildeo da liacutengua materna Para os iacutendios jaacute ocorria o processo de contato oriundo do dominador Mesmo reconhecendo a necessidade advinda da dependecircncia econocircmica os iacutendios relutavam em manter a liacutengua matildee no interior da aldeia ou seja no seio familiar 53

Devido agrave cultura errocircnea da terra e a constante presenccedila das aposentadorias concedidas aos idosos e invaacutelidos a rotina desses povos estaacute sendo fortemente alterada 54

Uniatildeo das Igrejas Evangeacutelicas da Ameacuterica do Sul criada por missionaacuterios americanos em 1912 que eacute atualmente conduzida por lideranccedila indiacutegena

100

protestantes Os Terenas ministram suas pregaccedilotildees exclusivamente em

Portuguecircs

Uma outra famiacutelia missionaacuteria protestante pertencente agrave missatildeo ALEM55 vivem

na aldeia Rio do Ouro onde o marido Warrisson eacute um professor e sua esposa

Ana eacute uma liacuteder de igreja Eles trabalham na reserva haacute doze anos e soacute falam

Portuguecircs

Anomby (2009 p8) relata o fato de os iacutendios ainda hoje rejeitarem os esforccedilos

dos missionaacuterios da ALEM para usar o Aikanatilde na igreja

Quando Ana veio pela primeira vez a Gleba 12 anos atraacutes as pessoas disse-lhe que queria igreja em Portuguecircs e natildeo em Aikanatilde Eles especificamente disse-nos Noacutes natildeo quer um linguista Queremos algueacutem que vai fazer igreja em Portuguecircs Ana compocircs algumas canccedilotildees em Aikanatilde mas quando ela cantou para os iacutendios eles disseram que soava feio Ana pediu que as pessoas orassem em Aikanatilde mas eles sempre recusam Em um culto que participou no Rio do Ouro Ana escolheu cinco pessoas aleatoriamente para ler partes do Biacuteblia Todos foram fluentes Ana disse-nos que ateacute hoje os iacutendios nunca pediu nada em Aikanatilde - eles parecem sentir que igreja deve ser em Portuguecircs

Os Latundecirc em particular natildeo se converteram ao protestantismo Localizados

mais remotamente o difiacutecil acesso agraves igrejas existentes da Gleba e no Rio do

Ouro natildeo favoreceu ao longo de anos a frenquecircncia do Latundecirc nos cultos

A educaccedilatildeo escolar tambeacutem tem situaccedilatildeo similar entre os Latundecirc Nunca houve

escola no Barroso nas proximidades das casas dos Latundecirc Dessa forma

apenas com a ida mais sistemaacutetica dos mais jovens Latundecirc para as aldeias

Aikanaacute - sobretudo a partir do ano de 2000 - eacute que as crianccedilas Latundecirc passaram

55

Associaccedilatildeo Linguiacutestica Evangeacutelica Missionaacuteria eacute uma organizaccedilatildeo missionaacuteria fundada em 1982

sob a inspiraccedilatildeo da Wycliffe Bible Translators

101

a frequentar escola Sobre isso Anomby Idem nos relata que eacute ensinado ateacute

quarta seacuterie em todas as aldeias e a maioria dos Aikanatilde e Kwazaacute satildeo

alfabetizados em Portuguecircs Em Rio do Ouro haacute dois professores um brasileiro

que leciona em Portuguecircs e um professor biliacutengue que explica os assuntos em

Aikanatilde Trecircs moradores estatildeo terminando o ensino meacutedio dois da Gleba e um

do Rio do Ouro A liacutengua Latundecirc natildeo eacute objeto de conteuacutedo escolar

Com relaccedilatildeo agrave situaccedilatildeo linguiacutestica dos Latundecirc56 sabe-se que com exceccedilatildeo de

Maneacute Torto que eacute falante nativo de uma liacutengua Nabikwaacutera do Norte muito proacutexima

do Latundecirc o nuacutemero de falantes do Latundecirc eacute de dezenove pessoas O grupo

excetuando a Batataacute que natildeo fala portuguecircs apresenta bilinguismo em Latundecirc

Portuguecircs O bilinguismo resultante do contato que se deu em 1976 se firmou

com o contato crescente com os Aikanaacute com quem se comunicam em portuguecircs

A complexidade linguiacutestica que se instaurou entre os Latundecirc pode ser observada

na tabela seguinte

Quadro 6 Situaccedilatildeo sociolinguiacutestica dos Latundecirc (dados de 1999)

Membros

Situaccedilatildeo Social

Situaccedilatildeo Linguacuteiacutestica

Maneacute Torto (60) Liacuteder interno da tribo Natildeo Latundecirc

Cinzeiro (50)

Batataacute (65)

Membros mais velhos

da tribo

Satildeo monoliacutengues em Latundecirc

Lurdes (40) Matriarca da casa 2 Apresenta distuacuterbio de fala Eacute considerada

uma falante ruim pela proacutepria tribo Fala um

pidgin com seus filhos

Joseacute (40) Patriarca da casa 2 Fala um portuguecircs pouco claro

56

Anomby (2009 p 5) chama a atenccedilatildeo para o fato de os povos presentes na TI Tubaratildeo-Latundecirc

natildeo serem estudados extensivamente ainda Dos estudos realizados podem-se citar as pesquisas realizadas no acircmbito antropoloacutegico e no linguiacutestico Leacutevi-Strauss (1930) Lieuntenabt Zack (1942) Melatti e Price (1970) Carlson (1984) Vasconcelos (19931996) Van der Voort (19951998) e Telles (2002)

102

Jair (13)

Dido (11)

Filhos mais velhos da

casa 2

Devido ao desempenho dos pais

apresentam problemas de comunicaccedilatildeo em

ambas as liacutenguas

Lourival (3)

Lorimar (6 meses)

Filhos mais novos da

casa 2

Estatildeo em processo de aquisiccedilatildeo da

linguagem

Terezinha (45)

Matriarca da casa 1

uma das mulheres de

Maneacute Torto

Apresenta boa competecircncia comunicativa

Apesar de ser considerada biliacutengue

apresenta problemas com relaccedilatildeo agrave

compreensatildeo do Portuguecircs

Joatildeo (26)

Francisco (25)

Irmatildeos de Terezinha Falam Portuguecircs sem muita fluecircncia

Faacutetima (30)

Irmatilde de Terezinha Apresenta niacutevel de compreensatildeo muito

inferior ao da sua fala

Luiz (22)

Antocircnio (20)

Lorena (12)

Catarino (10)

Justino (8)

Jaelson (4)

Filhos de Terezinha e

Maneacute Torto

Falam um bom Portuguecircs

Maria (13) Tambeacutem fala um bom Portuguecircs

Entre 1995 e 2000 Telles (comunicaccedilatildeo pessoal em novembro de 2014) verificou

que o aprendizado do Latundecirc na comunidade eacute mais tardio do que o Portuguecircs

mesmo sendo as crianccedilas desde o nascimento expostas e estimuladas agraves duas

liacutenguas simultaneamente Na avaliaccedilatildeo subjetiva dos indiacutegenas o Latundecirc eacute uma

liacutengua mais difiacutecil sendo essa a razatildeo de as crianccedilas apresentarem melhor

desempenho no Portuguecircs Soacute em torno dos dez anos comeccedilam a utilizar com

fluecircncia o Latundecirc embora apresentem conhecimento passivo da liacutengua desde a

primeira infacircncia quando atendem com pertinecircncia aos comandos em Latundecirc

Outro fator que pode responder ao fato de a produccedilatildeo linguiacutestica ocorrer

103

primeiramente em Portuguecirc deve ser o prestiacutegio social que essa liacutengua alcanccedila

entre comunidades minoritaacuterias57

Essa situaccedilatildeo decorrente do contato linguiacutestico se daacute devido agrave mescla linguiacutestica

presente na TI e agraves necessidades de os indiacutegenas se ausentarem das terras da

TI Os povos que vivem em Rio do Ouro viajam a cidade pelo menos uma vez por

mecircs para fazer compras ou ir buscar assistecircncia meacutedica Os da Gleba se

deslocam para a cidade todos os dias quando precisam ir para a sede do

municiacutepio de Chupinguaia Dependendo da necessidade eles ficam hospedados

na casa de algueacutem conhecido ou na Casa do Iacutendio uma espeacutecie de guarita

para os iacutendios A Casa do Iacutendio mais proacutexima da TI se localiza em Vilhena

Ainda quanto ao contato linguiacutestico estudos mostram que os iacutendios do sul de

Rondocircnia tecircm o haacutebito de casar-se com iacutendios de tribos amigas Isto pode ser

comprovado com a presenccedila de palavras no leacutexico das liacutenguas em que foram

coadunadas

Conforme dados mais recentes na Gleba cerca de cinquenta por cento dos

casamentos satildeo mistos com iacutendios de outras etnias ou com natildeo iacutendios Embora

haja certa rivalidade entre os povos da Gleba e os do Rio dos Ouros o nuacutemero de

casamentos entre os iacutendios dessas duas aldeias satildeo muito frequentes

Quanto aos iacutendios Latundecirc Anomby (2009 p 9) discorre que

Os iacutendios da aldeia de Latundecirc Barroso tecircm o menor prestiacutegio e satildeo um pouco culturalmente e economicamente subjugados pelo Aikanatilde e Kwazaacute Devido agraves pequenas populaccedilotildees de Kwazaacute e Latundecirc eacute quase impossiacutevel para eles para se casar dentro de

57

Discorreremos com mais detalhes sobre o processo de bilinguismo no povo Latundecirc no trabalho proposto a ser desenvolvido

104

sua tribo Assim a sobrevivecircncia das liacutenguas e ateacute mesmo o povo como um grupo distinto eacute muito tecircnue

Devido agraves constantes necessidades de cuidado desses povos a OSCIP Creatio58

realizou estudos sobre os impactos soacutecio-antropoloacutegicos-ambientais na TI

Tubaratildeo-Latundecirc jaacute que toda regiatildeo estaacute sobre a influecircncia da PCH59 Cascata

que estaacute sendo construiacuteda no Rio Pimenta Bueno Tais estudos visam objetivar

informaccedilotildees que subsidiem a descriccedilatildeo dos possiacuteveis impactos oriundos da PCH

sobre esta TI

Figura 11 Iacutendios Latundecirc na TI Tubaratildeo-Latundecirc

Outro ponto que deve ser levado em conta ao considerar falantes biliacutengues e

monoliacutengues eacute que eles natildeo podem ser nitidamente diferenciados A avaliaccedilatildeo do

grau de bilinguismo eacute complexa dado que a sua medidade eacute escalar ou seja o

58

Organizaccedilatildeo da Sociedade Civil de Interesse Puacuteblico 59

Pequena Central Hidreleacutetrica

105

conhecimento de outra liacutengua eacute uma questatildeo de grau que vai desde 0 ateacute a

ldquoperfeiccedilatildeordquo (Van Coetesem 1988 p 9)

106

5 INTERFEREcircNCIA FONEacuteTICO-FONOLOacuteGICA DO LATUNDEcirc NO

PORTUGUEcircS

ldquoO contato linguiacutestico eacute apenas um aspecto do contato cultural e a interferecircncia linguiacutestica eacute uma face da difusatildeo lexical e aculturaccedilatildeordquo

Weinreich (1953 p 5)

51 INTRODUCcedilAtildeO

Para Thomason (2001 p 5) o contato entre liacutenguas estaacute em toda a parte muitos

paiacuteses tecircm mais do que uma liacutengua oficial e muito provavelmente a maior parte

da populaccedilatildeo mundial fala duas ou mais liacutenguas Posto dessa maneira

compreende-se que satildeo muitos os estudos que abordam sob formas aacutereas

concepccedilotildees diversas e interdisciplinares o contato linguiacutestico No que concerne agrave

linguiacutestica estes estudos satildeo de igual abundacircncia De acordo com Weinreich

(1953) grande ou pequena as diferenccedilas e similaridades entre as liacutenguas em

contato podem ser exaustivamente estabelecidas em muitos domiacutenios Todavia

quando se trata da investigaccedilatildeo do contato sob a eacutegide da fonologia e da foneacutetica

o nuacutemero destes estudos diminui consideravelmente Tal constataccedilatildeo corrobora

com a necessidade de estudos linguiacutesticos que tratem dos aspectos foneacuteticos

quando observados no contato entre liacutenguas

Por se tratar de uma sessatildeo importante para as elucidaccedilotildees dos processos

ocorridos no Portuguecircs falado pelos Latundecirc a serem discorridos no Capiacutetulo VI

descrevemos neta seccedilatildeo os segmentos das liacutenguas em anaacutelise e quais satildeos mais

suscetiacuteveis agrave influecircncia do contado linguiacutestico Devido agrave escassez de pesquisas

107

foneacuteticas fonoloacutegicas na aacuterea especificamente no Latundecirc e no Portuguecircs

Brasileiro seratildeo utilizadas como cabedal para esta anaacutelise as pesquisas de

TELLES (2002) e para a investigaccedilatildeo do inventaacuterio do sistema fonoloacutegico do

Portuguecircs a de BISOL (1996) e de SILVA (2002)

Dada a profundidade investigativa da natureza do contato cabe-nos ressaltar aqui

que o presente estudo natildeo se encarregaraacute de tratar de todas a suas nuances

visto que seu objeto estaacute delimitado quanto aos processos foneacuteticos resultantes

de tal contato

Quanto ao aporte teoacuterico seratildeo citados os trabalhos de WEINREICH (1953)

pioneiro a tratar das questotildees de interferecircncia foneacuteticas oriundas do contato entre

liacutenguas VAN COETSEM (1988) e MATRAS (2009) para elucidar os processos

ocorrentes no contato em questatildeo

52 INTERFEREcircNCIA FUSAtildeO COEXISTEcircNCIA E TRANSFEREcircNCIA

LINGUIacuteSTICA

Um dos precursores dos estudos sobre contatos linguiacutesticos Uriel Weinreich

descreve em seu livro Language in Contact (1953) os mecanismos foneacuteticos que

regem a intersecccedilatildeo existente no contato

No que concerne aos aspectos extralinguiacutesticos que regem os efeitos do contato

sobre a fala de determinado componente social Weinreich chama a atenccedilatildeo para

os fatores que estatildeo aleacutem das diferenccedilas estruturais bem como das

inadequaccedilotildees lexicais da liacutengua Segundo ele esses fatores natildeo estruturais satildeo

inerentes aos falantes que estatildeo expostos agrave situaccedilatildeo do contato por exemplo

108

a) A facilidade de o falante se expressar verbalmente e sua

debilidade de lidar coma as duas liacutenguas separadamente

b) Proficiecircncia relativa em cada liacutengua

c) Especializaccedilatildeo no uso de cada liacutengua por toacutepicos e

interlocutores

d) Forma de aprendizado em cada liacutengua

e) Atitudes para cada liacutengua se idiossincraacutetico ou estereotipado

f) A dimensatildeo do grupo biliacutengue e sua homogeneidade

sociocultural ou diferenciaccedilatildeo colapso entre subgrupos usando

uma ou outra liacutengua como sua liacutengua-matildee fatos demograacuteficos

sociais e as relaccedilotildees poliacuteticas entre esses subgrupos

g) Prevalecircncia individuais de bilinguismo com dadas caracteriacutesticas

de comportamento de fala em subgrupos em geral

h) Atitudes estereotipadas em relaccedilatildeo a cada liacutengua (prestiacutegio)

status indiacutegena ou imigrante da liacutengua em xeque

i) Atitudes em relaccedilatildeo agrave cultura de cada comunidade linguiacutestica

j) Atitudes em relaccedilatildeo ao bilinguismo como tal

k) Toleracircncia ou intoleracircncia com respeito agrave mistura linguiacutestica e

com a fala incorreta de cada um

l) Relaccedilatildeo entre o grupo biliacutengue e cada um das duas

comunidades em que ela eacute um segmento marginal (Weinreich

1953 p 4)

Um dos pressupostos baacutesicos agrave natureza do falante diz respeito ao fato de duas

ou mais liacutenguas soacute poderem estar em contato se usadas alternadamente pelas

mesmas pessoas O uso individual da liacutengua seraacute o locus do contato Quando isto

ocorre a transferecircncia de elementos foneacuteticos seraacute a motivadora pela

reorganizaccedilatildeo de todo o velho sistema de oposiccedilatildeo Ele assegura que the term

interference implies the rearrangement of patterns that result from the introduction

of foreign elements into the more highly structured domains of language such as

the bulk of the phonemic system a larger part of the morphology and syntax and

some areas of the vocabulary (p 1)60

60

O termo interferecircncia implica a reorganizaccedilatildeo de padrotildees que resultam na introduccedilatildeo de elementos no mais alto (profundo) domiacutenio de estruturas da linguagem tal como a maior parte do sistema fonecircmico uma larga parte da morfologia e sintaxe e algumas aacutereas do vocabulaacuterio

109

Quando dois sistemas satildeo confrontados no contato pode ocorrer o

reordenamento de padrotildees ou interferecircncia ou exclusatildeo Na interferecircncia

linguiacutestica o problema de maior interesse eacute a accedilatildeo reciacuteproca dos fatores

estruturais e dos natildeo estruturais ao promoverem estimularem ou impedirem cada

interferecircncia

Concernente aos ldquoMecanismos e causas estruturais de interferecircnciardquo Weinreich

idem p7 coloca que haacute um tipo de interferecircncia que eacute extremamente comum no

contato linguiacutestico trata-se da relaccedilatildeo de empreacutestimo na qual natildeo haacute uma total

transferecircncia de todos os elementos Logo percebe-se que eacute comum a

transferecircncia de parte de um sistema ou de traccedilos desse sistema fazendo com

que haja uma ldquocoexistecircncia de fusatildeo de sistemasrdquo

A coexistecircncia ou fusatildeo de sistemas linguiacutesticos pode de acordo com este

estudioso afetar a natureza de um signo linguiacutestico jaacute que esta eacute a combinaccedilatildeo

de uma unidade de expressatildeo e uma de conteuacutedo Neste niacutevel de bilinguismo ou

de interferecircncia de sistemas pode-se entendender que a relaccedilatildeo de significado e

significante natildeo se daacute de maneira uniacutevoca

Diante da complexidade que eacute a transferecircncia linguiacutestica a ilustraccedilatildeo por ele

adotada eacute a de que a interferecircncia eacute como areia carregada por um fluxo de aacutegua

Na liacutengua ela estaacute sedimentada no fundo de um lago E este fenocircmeno se daacute em

todos os niacuteveis da gramaacutetica p 11

Ao tratar dos tipos de interferecircncia nos sistemas foneacuteticos Weinreich afirma que

The problem of phonic interference concerns the manner in which a speaker perceives and reproduces the sounds of one

110

language which might be designated secondary in terms of another to be called primary Interference arises when a bilingual identifies a phoneme of the secondary system with one in the primary system and in reproducing it subjects it to the fonetic rules of the primary language (1953 p 15)61

Neste caso a interferecircncia resulta quando um falante identifica na segunda liacutengua

elementos foneacuteticos presentes na primeira liacutengua Ao reproduzir o segmento o

falante o sujeita agraves regras foneacuteticas da primeira liacutengua a liacutengua matildee

Ao prosseguir Weinreich tambeacutem aponta dois tipos de interferecircncia a partir do

quadro comparatoacuterio entre os sistemas linguiacutesticos do Romansh62 e do

Schweizerdeutsch63 liacutenguas coexistentes no Cantatildeo de Grisons na Suiacuteccedila No

primeiro caso o sistema foneacutetico do Romansh se configura como o sistema

primaacuterio e o Schweizerdeutsch como secundaacuterio No segundo caso os sistemas

satildeo alternados o sistema foneacutetico do Schweizerdeutsch assume o lugar do

sistema primaacuterio e o Romansh o secundaacuterio

61

O problema da interferecircncia foneacutetica consiste na maneira como o falante percebe (reconhece) e reproduz os sons de uma liacutengua que pode ser designado secundaacuterio em outros termos primaacuterio A interferecircncia surge quando um biliacutenguumle identifica um fonema do sistema secundaacuterio com um no sistema primaacuterio e em reproduzi-lo sujeitando-o agraves regras foneacuteticas da primeira liacutengua 62

Eacute uma das quatro liacutenguas nacionais da Suiacuteccedila juntamente com a liacutengua alematilde a liacutengua italiana e a liacutengua francesa Trata-se de uma liacutengua romacircnica do ramo ocidental que se acredita descender do latim vulgar falado pelos romanos que ocuparam a aacuterea na Antiguidade 63

Eacute qualquer um dos dialetos alemacircnicos falados na Suiacuteccedila no Liechtenstein e nas zonas fronteiriccedilas da Aacuteustria

111

Quadro 7 Quadro Comparativo dos Sistemas Foneacuteticos do Romansh e do

Schweizerdeutsch de acordo com Weinreich (1953)

Mais adiante seraacute observada a influecircncia do Latundecirc no Portuguecircs Desta forma

o Portuguecircs mesmo sendo a segunda liacutengua adquirida seraacute visto como o objeto

influenciado do contato linguiacutestico

112

Quando observou o contato entre os dois sistemas linguiacutesticos em voga

Weinreich (idem p 18 e 19) examinou o processo de interferecircncia representado

no segundo sistema fonecircmico Assim ele elencou quatro tipos de interferecircncias i)

subdiferenciaccedilatildeo de fonemas ii) superdiferenciaccedilatildeo de fonemas iii)

reinterpretaccedilatildeo de traccedilos relevantes iv) substituiccedilatildeo de fone atual

A subdiferenciaccedilatildeo de fonemas ocorre quando dois sons de um segundo sistema

cujos correspondentes que natildeo se distinguem no sistema primaacuterio natildeo satildeo bem

definidos Tal confusatildeo eacute evidenciada pela alternacircncia que o falante do Romansh

faz ao pronunciar os segmentos y e i do Schweizerdeutsch ou quando o falante

do Schweizerdeutsch faz ao pronunciar de forma insegura os segmentos i e

O processo de superdiferenciaccedilatildeo envolve a imposiccedilatildeo de distinccedilotildees fonecircmicas

do sistema primaacuterio sobre os sons do sistema secundaacuterio onde eles natildeo satildeo

necessaacuterios O processo pode ser inferido a partir de uma comparaccedilatildeo entre os

sistemas de som em contacto mesmo que nem sempre seja perceptiacutevel No

contanto entre os dois dialetos o vocaacutebulo rsquolada lsquoamplorsquo do Romansh eacute

pronunciado como acutelada no Schwyzertutsch

A reinterpretaccedilatildeo de traccedilos relevantes ocorre quando o falante biliacutengue distingue

fonemas do sistema secundaacuterio cujas caracteriacutesticas que nesse sistema satildeo

meramente concomitante ou redundante mas que satildeo relevantes no seu sistema

principal Por exemplo a palavra do dialeto Romansh [lsquomєsbullɐ] bagunccedila pode

ser interpretada quase como no Schwyzertutsch rsquomesa

Por fim o processo de substituiccedilatildeo de fone atual eacute aplicado aos fonemas que satildeo

definidos de forma idecircntica nos dois idiomas mas que se comportam de froma

113

distintas Na situaccedilatildeo descrita o segmento do Romanche e o do

Schwyzertatsch satildeo ambos definidos como vogais frontais de abertura

maacutexima mas o fonema do sistema Schwyzertfitsch eacute pronunciado mais aberto

Os fonemas b do Romansh e o B do Schwyzertfitsch satildeo ambos definidos por

suas oposiccedilotildees tensa (sem voz) consoante aspirante e nasal homorgacircnica mas

b eacute sempre vozeado B apenas ocasionalmente

Quando ao tratar dos fatores estruturais favorecedores ou inibidores da

interferecircncia foneacutetica o pesquisador em questatildeo afirma que a anaacutelise contrastiva

dos fonemas de duas liacutenguas e a forma como eles satildeo usados produz uma lista

de formas de interferecircncias focircnicas esperada em uma situaccedilatildeo de contato

particular Quando os sons satildeo vistos como parte de um sistema focircnico certos

fatores adicionais emergem favorecendo ou inibindo a reproduccedilatildeo de som

defeituoso (pg 23)

Em continuidade ele afirma que ldquoum fator que elimina certos ruiacutedos na fala em

liacutengua estrangeira eacute a existecircncia de vazios no padratildeo no sistema fonecircmico

primaacuterio em que fonemas estranhos do sistema secundaacuterio podem ser

recuperados (rotulados)rdquo Isso se daacute devido agrave semelhanccedila com o(s) segmento(s)

cujas caracteriacutesticas satildeo mais aproximadas

Sobre a difusatildeo dos fenocircmenos de interferecircncia foneacutetica Weinreich assegura que

no estudo da propagaccedilatildeo de sons oriundos do contato linguiacutestico sobretudo na

influecircncia da liacutengua estrangeira (liacutengua de contato) seria relevante que

investigasse se o resultado de muitos tipos de interferecircncia eacute difundido da mesma

forma ou com igual facilidade

114

Ao citar Sapir ele afirma que

Podemos supor que as variaccedilotildees individuais decorrentes em fronteiras linguiacutesticas tecircm sido gradualmente incorporadas ao desvio foneacutetico de uma liacutengua Isto mostra aliaacutes que um sistema de som que eacute conhecido por ter sido influenciada por um estrangeiro natildeo precisa esperar para representar uma reacuteplica exata do sistema influenciando (1949 p213)64

Para ele um dos motivos que contribuiria para a interferecircncia foneacutetica seria

agravequela desencadeada pelo status

Com base na reduplicaccedilatildeo de som de Weinreich Matra (2009 p 241) descreve

que a produccedilatildeo de segmentos foneacuteticos eacute vulneraacutevel No entanto

A replicaccedilatildeo fonoloacutegica (interferecircncia transferecircncia ou ldquoempreacutestimordquo) pode afetar qualquer niacutevel da estrutura de som a articulaccedilatildeo de fonemas individuais ou fonemas dentro das palavras o comprimento e a geminaccedilatildeo acento e tom prosoacutedia e entonaccedilatildeo Em fonologia os empreacutestimos foram muitas vezes considerados como estrateacutegias para preencher as chamadas lacunas estruturais no sistema destinataacuterio65

Matras ainda defende que a mudanccedila induzida pelo contato fonoloacutegico eacute o

resultado da incapacidade ou da relutacircncia dos falantes para manter a separaccedilatildeo

completa e consistente entre os sistemas fonoloacutegicos de duas liacutenguas Ele cita

como exemplo o fato de os falantes da liacutengua receptora lidarem com a pronuacutencia

de termos da liacutengua de origem66

64

We may suppose that individual variations arising at linguistic borderlands - whether by the unconscious suggestive influence of foreign speech or the actual transfer of foreign sounds into the speech of bilingual individuals - have been gradually incorporate into the phonetic drift of a language This shows incidentally that a sound system which is known to have been influenced by a foreign one need not be expected to represent an exact replica of the influencing system 66

Isso ocorre mais frequentemente quando uma palavra estrangeira eacute introduzida na liacutengua de

destino por apenas um pequeno grupo de biliacutengues ou semibiliacutengues e se espalha por toda fala da comunidade inclusive para os monoliacutengues natildeo estatildeo familiarizados com os sons originais da

115

Quando emprestado de uma liacutengua doadora um vocaacutebulo natildeo acarretaraacute

necessariamente em mudanccedila no sistema fonoloacutegico da liacutengua receptora O que

ocorre como jaacute fora colocado aqui eacute o processo de acomodaccedilatildeo fonoloacutegica O

vocaacutebulo emprestado passa a ser pronunciado com os segmentos foneacuteticos da

liacutengua receptora

Todavia Matra (2009 p 222-223) chama a atenccedilatildeo para um segundo tipo de

processo em que ldquoos sons que aparecem nos vocaacutebulos emprestados que satildeo

normalmente ausentes do sistema da liacutengua destinataacuteria podem ser replicados

juntamente com o proacuteprio vocaacutebulordquo fazendo com que haja um enriquecimento no

inventaacuterio foneacutetico na liacutengua receptora 67

Segundo o autor este tipo de processo ocorre com normalidade em situaccedilotildees

em que o bilinguismo eacute muito generalizado Logo ldquomembros biliacutengues de uma

comunidade que estatildeo cientes da forma original da pronuacutencia da liacutengua doadora

fazem um esforccedilo para autenticar o vocaacutebulo emprestado replicando sua forma

originalrdquo

Em continuidade ele afirma que

Uma vez que a liacutengua doadora goza de alguma forma de prestiacutegio muitas vezes devido a associaccedilotildees com comeacutercio tecnologia conhecimento e outros tipos de inovaccedilatildeo ou de poder a replicaccedilatildeo de pronuacutencias originais da liacutengua doadora satildeo imitadas por muitos monoliacutengues (natildeo falantes da liacutengua doadora) como tal levando agrave propagaccedilatildeo dentro da liacutengua destinataacuteria dos novos fonemas nos vocaacutebulos emprestados que satildeo relevantes Isso comprova o respeito dos falantes para a linguagem dos doadores e agrave sua flexibilidade no uso de sua liacutengua materna (a liacutengua do destinataacuterio) indicando que os

liacutengua doadora Em tais situaccedilotildees haacute uma forte lealdade para com a liacutengua de destino e geralmente apenas com superficial conhecimento com a liacutengua de origem (p 242) 67

Como exemplo eacute citado o caso da africada dʒ que em situaccedilatildeo de empreacutestimo pode ser

pronunciada como tʃ em palavras que oriundas do inglecircs

116

falantes se contentam em atribuir fonologicamente autenticidade agrave replicaccedilatildeo de empreacutestimos lexicais prioritaacuterios maiores do que para a preservaccedilatildeo das estruturas fonoloacutegicas coerentes de sua liacutengua nativa (idem p 224)

Em uma situaccedilatildeo onde o bilinguismo eacute estabelecido e prolongado os falantes (na

maioria de uma liacutengua minoritaacuteria como o caso dos Latundecirc) podem ajustar o

inventaacuterio de sons e as regras que regem a sua distribuiccedilatildeo para coincidir com as

do outro

Matras (2009 p 225) atraveacutes de um quadro descreve os quatro tipos de

mudanccedilas fonoloacutegicas oriundas do contato linguiacutestico com base nos perfis dos

falantes linguagem e atitudes

Quadro 8 Tipos de processos que conduzem a mudanccedila fonoloacutegica induzida por contato

117

Com base no quadro anterior depreende-se que

i) O tipo A eacute diferente na medida em que natildeo envolve nenhuma mudanccedila no

sistema fonoloacutegico mas apenas uma mudanccedila de palavras individuais

enquanto os tipos B-D todas envolvem algum grau de modificaccedilatildeo para o

sistema tal como utilizado por colunas numa base regular No entanto

existem semelhanccedilas entre os tipos de aspectos individuais

ii) Os tipos A e B satildeo semelhantes e giram em torno de palavras emprestadas

individualmente

iii) Os tipos A e C satildeo semelhantes em que ambos envolvem a transferecircncia

de recursos de liacutengua nativa para material diferente

iv) Os tipos B e D satildeo semelhantes em que ambos envolvem a adoccedilatildeo de

padrotildees sonoros estrangeiros e sua integraccedilatildeo na liacutengua nativa

v) Os tipos C e D mostram como mencionado acima o fato de que os

falantes tentam evitar que para selecionar os sons de dois conjuntos

distintos de inventaacuterio e ateacute generalize apenas um conjunto de sons para

serem usadas em ambas as liacutenguas isto eacute em toda a interaccedilatildeo contextos

Os falantes do portuguecircs falado por Latundecirc se estendem em duas direccedilotildees Em

tipos A e C onde os falantes reinterpretam os sons dos vocaacutebulos emprestados

da liacutengua doadora alinhando-os aos padrotildees e inventaacuterio da liacutengua receptora

(nativa) No tipo D os falantes modificam os segmentos foneacuteticos com base no

inventaacuterio externo A aplicaccedilatildeo de uma determinada regra fonoloacutegica pode

resultar na perda ou em ganho de fonemas p226

118

O contato linguiacutestico pode ser representado ainda como um contiacutenuo Nele

ocorrem forccedilas centriacutefugas e centriacutepetas que dinamizam os sistemas linguiacutesticos

Para Matras idem p 226 fatores como normas sociais lealdade e consciecircncia

de identidade podem interferir e ateacute mesmo neutralizar os fenocircmenos advindos do

contato O empreacutestimo sofreria portanto estas pressotildees

Figura 12 Ligaccedilotildees entre a intensidade do bilinguismo o tipo de processo de acomodaccedilatildeo e sobreposiccedilatildeo entre os sistemas fonoloacutegicos

Quanto menor for o bilinguismo maior seraacute a separaccedilatildeo de sistemas Por outro

lado quanto mais intenso for o bilinguismo maior seraacute a convergecircncia de

sistemas fonoloacutegicos

No que concerne agrave integraccedilatildeo fonoloacutegica Matras (2009 p 227) explica que a

substituiccedilatildeo de fonemas eacute uma das formas mais comuns posto que este

processo permite uma aproximaccedilatildeo de caracteriacutesticas entre o sistema interno e

externo Dessa forma a substituiccedilatildeo eacute mais comum uma vez que os fonemas

satildeo combinaccedilotildees de recursos articulatoacuterios e as caracteriacutesticas em comum satildeo

mantidas em detrimento agraves complexidades dos fonemas que natildeo compartilham de

traccedilos em comum

119

Ele tambeacutem chama a atenccedilatildeo para a estrutura silaacutebica dos sistemas fonoloacutegicos

que entram em contato afirmando que ldquoos estrangeirismos podem acomodar a

siacutelaba e a estrutura do acentordquo (idem p 228)

A aplicaccedilatildeo de regras sobre a distribuiccedilatildeo de fonemas oriundos do empreacutestimo

pode resultar na perda de um traccedilo ou de um fonema A integraccedilatildeo de fonemas

tambeacutem pode levar agrave omissatildeo de outros fonemas que natildeo fazem parte o

inventaacuterio fonoloacutegico da liacutengua receptora E a omissatildeo de certas caracteriacutesticas

durante a replicaccedilatildeo de fonemas pode ser prejudicial para o sistema como um

todo e isso pode resultar em uma reduccedilatildeo de pares miacutenimos

Sobre a convergecircncia dos sistemas fonoloacutegicos Matras (2009 p 229) assegura

que um fator que retarda o processo de substituiccedilatildeo de som eacute a presenccedila de

vaacuterios pares de vocaacutebulos que contam com o contraste Neste caso a

convergecircncia aumenta as semelhanccedilas entre os inventaacuterios fonoloacutegicos das duas

liacutenguas E a replicaccedilatildeo da variaccedilatildeo alofocircnica eacute uma via comum para a

convergecircncia

Quanto aos segmentos foneacuteticos ainda de acordo com o pesquisador em

questatildeo as consoantes satildeo as mais introduzidas nos estrangeirismos Uma vez

que nas liacutenguas do mundo o nuacutemero de segmentos consonantais eacute maior que o

das vogais Logo os vocaacutebulos emprestados satildeo mais propensos a introduzir

mais consoantes que vogais

No caso Portuguecircs falado por Latundecirc tal assertiva em parte se configura A

anaacutelise dos dados prova que satildeo as consoantes as mais favoraacuteveis para a

realizaccedilatildeo dos processos foneacuteticos Todavia o nuacutemero de consoantes nessa

120

liacutengua eacute menor que o de vogais conforme descriccedilatildeo de Telles 2002 a qual

veremos na proacutexima seccedilatildeo

Van Coetsem (1988 p7) tambeacutem aborda os processos e comportamentos

oriundos do contato linguiacutestico68 E para que este contato seja estabelecido eacute

necessaacuterio que se tenha uma liacutengua de origem (SL) e uma liacutengua destinataacuteria

(RL)

Figura 13 Correspondecircncia entre liacutenguas e contato linguiacutestico

Embora o modelo de Van Coetesem seja universal e demonstre que na maioria

dos contatos linguiacutesticos a liacutengua de origem seja uma liacutengua dominante

ressaltamos que neste trabalho a liacutengua de origem (SL) eacute a liacutengua minoritaacuteria o

Latundecirc E o substrato analisado eacute uma modalidade de portuguecircs falado pelos

Latundecirc

Em continuidade este estudioso afirma que

Um empreacutestimo fonoloacutegico eacute uma imitaccedilatildeo uma reacuteplica ou uma reproduccedilatildeo na liacutengua recipiente (RL) de um elemento estrangeiro ou uma pronuacutencia da liacutengua de origem (SL) Esse tipo de imitaccedilatildeo eacute muitas vezes apenas uma aproximaccedilatildeo Para o imitador a imitaccedilatildeo implica o uso de algo que ele natildeo tem na sua proacutepria liacutengua Um empreacutestimo fonoloacutegico como uma imitaccedilatildeo eacute portanto algo que o falante imitador da RL natildeo tem em sua fonologia integrada ou nativa ou seja algo

68

Para Van Coetsen o termo ldquoempreacutestimo fonoloacutegicordquo indica qualquer forma de empreacutestimo no acircmbito da fonologia segmentar ou suprassegmental independentemente se isto afeta a dimensatildeo paradigmaacutetica a dimensatildeo sintagmaacutetica ou ambas (p7)

121

fonoloacutegico ou subfonoloacutegico que deriva de seu sistema fonoloacutegico nativo (Idem p 8)69

A intenccedilatildeo do falante ao fazer uso do segmento emprestado eacute reproduzi-lo da

melhor forma possiacutevel Ao fazer isso ele obedece agraves consideraccedilotildees sociais O

proacuteprio fato de que o segmento natildeo esteja inserido em seu proacuteprio sistema faz

com que na pressatildeo de se adaptar a diferentes pronuacutencias ele (o falante) procure

o equivalente mais proacuteximo em seu sistema

Para que isso ocorra ldquoo falante faz uso de dois processos a imitaccedilatildeo e a

adaptaccedilatildeo p 9rdquo Ambos pressupotildeem a existecircncia de um conjunto organizado de

segmentos fonoloacutegicos e distribuiccedilatildeo de unidades inseridas pelo falante da liacutengua

recipiente por um lado e por outro o confronto das pronuacutencias estrangeiras com

que o falante tem que lidar

Aleacutem dos processos de imitaccedilatildeo e adaptaccedilatildeo Van Coetesem tambeacutem utiliza a

noccedilatildeo de integraccedilatildeo ldquoque eacute a incorporaccedilatildeo de elementos em uma dada liacutengua

advindos de outra(s) liacutengua(s)rdquo A imitaccedilatildeo seria portanto o preacute-requisito para a

integraccedilatildeo No caso do portuguecircs falado pelos Latundecirc natildeo haacute indiacutecios de

integraccedilatildeo de fonemas especiacuteficos da sua liacutengua de origem

Para que ocorra o processo de imitaccedilatildeo eacute necessaacuterio que haja uma agentividade

que eacute um tipo especiacutefico de transferecircncia onde o falante de uma dada liacutengua eacute

ativo e o outro passivo O inverso tambeacutem pode ocorrer

69

A phonological loan is an imitation replication or reproduction in the RL of a foreign or SL

pronunciation such an imitation is often only an approximation For the imitator imitation implies the use of something that he does not (yet) have of his own A phonological loan as an imitation is thus something that the imitating RL speaker does not have in his integrated or native phonology something phonemic or subphonemic that deviates from his native phonological system

122

Figura 14 Agentividade da Liacutengua Recipiente de acordo Van Coetsem 1988 p10

Na agentividade da liacutengua recipiente (RL)70 o segmento dominante na relaccedilatildeo

entre a liacutengua recipiente e a liacutengua de origem71 eacute o da liacutengua recipiente Logo o

domiacutenio linguiacutestico seraacute o da liacutengua recipiente

Figura 15 Agentividade da Liacutengua de Origem de acordo Van Coetsem (1988 p11)

Na agentividade da liacutengua de origem (SL) o segmento dominante na relaccedilatildeo

entre a liacutengua recipiente e a liacutengua de origem eacute o da liacutengua de origem Sendo

assim o domiacutenio linguiacutestico seraacute o da liacutengua de origem

Tomando como referencial os modelos apresentados podemos estabelecer um

contiacutenuo cronoloacutegico para compreender como se daacute a agentividade sobre o

contado do Portuguecircs com o Latundecirc

70

No caso em questatildeo a modalidade do portuguecircs falado pelos Latundecirc eacute a liacutengua recipiente 71

Consequentemente a liacutengua de origem (SL) eacute o Latundecirc

123

Figura 16 Relaccedilatildeo de agentividade entre o Portuguecircs e o Latundecirc

Historicamente devido aos fatores socioeconocircmicos o contato inicial se daacute entre

o Portuguecircs influenciando o Latundecirc Aquele como liacutengua majoritaacuteria e este como

minoritaacuteria

O Latundecirc por ser a liacutengua do povo dominado eacute submetido agraves interferecircncias da

liacutengua de domiacutenio Deste contato resulta uma modalidade especiacutefica do

Portuguecircs que eacute o falado por Latundecirc

Em suma podemos afirmar que embora seja o Portuguecircs a liacutengua dominante e

que inicialmente seja ele o agente sobre o Latundecirc a posteriori fora o Latundecirc o

agente pelas transformaccedilotildees ocorrentes no Portuguecircs de contato Posto dessa

forma a agentividade se daacute em ambos os contextos a partir do referencial que se

tenha uma vez que o Portuguecircs e o Latundecirc tanto influenciaram como foram

influenciados Mas vale ressalvar que para este recorte o Portuguecircs eacute a liacutengua

que sofre influecircncia Eacute este o fio condutor da nossa pesquisa

Portuguecircs Latundecirc Portuguecircs falado por Latundecirc

124

53 FONOLOGIA DO LATUNDEcirc

Para uma melhor compreensatildeo futura passaremos agora a descrever os

sistemas fonoloacutegicos das liacutenguas em estudo

Elencamos abaixo as principais caracteriacutesticas fonoloacutegicas do Latundecirc

Eacute uma liacutengua com maior quantidade de elementos vocaacutelicos (dezesseis)

em detrimento aos consonantais (onze) Eacute uma liacutengua vocaacutelica portanto

Apresenta dez vogais orais e seis nasais Dessas oito satildeo laringais72

As vogais nasais satildeo contrativas apenas na posiccedilatildeo do acento

Os glides w j quando em posiccedilatildeo de onset sofrem o processo de

consonantizaccedilatildeo

Apresenta seis tipos de siacutelabas fonoloacutegicas que satildeo derivadas da extensatildeo

(C)V(C)(C) V VC VCC VC CVC e CVCC

O nuacutecleo silaacutebico eacute sempre preenchido por uma vogal

Dos segmentos consonantais apenas a oclusiva glotal ʔ natildeo eacute observada

em posiccedilatildeo de onset

A coda pode ter desdobramento ramificado sendo a primeira posiccedilatildeo

preenchida sempre por um glide

Os padrotildees silaacutebicos VC e CVC satildeo os mais frequentes e ocorrem tanto

em siacutelaba tocircnica como aacutetona

Tem uma forte tendecircncia agrave monotongaccedilatildeo

O sistema acentual eacute misto que associa o acento lexical ao acento foneacutetico

72

Telles explica que as mais novas geraccedilotildees Latundecirc abaixo de 20 anos realizam o traccedilo laringal com menor frequecircncia e audibilidade

125

O acento eacute realizado foneticamente como tom (pitch) alto

Eacute uma liacutengua de caracteriacutestica de liacutenguas pitch accent

Apresenta processos fonoloacutegicos em niacutevel poacutes-lexical fundamentalmente

Estes processos satildeo agrupados em assimilaccedilatildeo (harmonia vocaacutelica e

vozeamento das oclusivas) dissimilaccedilatildeo reduccedilatildeo apagamento silaacutebico e

epecircntese

Quadro 9 Fonemas consonantais do Latundecirc

Fonemas Consonantais

Labiais Coronais Dorsal Glotais

+ anterior - anterior + anterior - anterior - anterior - anterior

Plosivas p t k

Nasais m n

Fricativas s h

Lateral l

Glide w j

Quadro 10 Fonemas vocaacutelicos do Latundecirc

Fonemas Vocaacutelicos

Vogais Vogais Laringais

Altas i u i u

Altas Nasais ĩ ũ i u

Meacutedias e o e o

Baixa a a

Baixa Nasal a a

126

Quadro 11 Ditongos do Latundecirc

Ditongos

Crescentes Decrescentes

w j w J

i wi iw

e e we we je je ej e j

a a a a wa wa ja ja ja aw a w a w aj a j atildej

o o wo jo ow

u u u ju ju ju

Quadro 12 Descriccedilatildeo dos fonemas consonantais (Retirada de Telles 2002)

Segmento - Descriccedilatildeo - Contexto de realizaccedilatildeo e especificidades

Exemplos

Traduccedilatildeo

p73 - Oclusiva bilabial surda

Eacute de extrema limitaccedilatildeo de realizaccedilatildeo na liacutengua

Ocorre em posiccedilatildeo de onset formando

siacutelabas com as vogais i a atilde o u

Pode se realizar como [p] oclusiva bilabial surda [b] oclusiva bilabial

sonora [ɓ] oclusiva bilabial sonora

implosiva

Em iniacutecio de palavras realiza-se [p]

diante da vogal coronal [i] e [b ɓ] e

diante da vogal baixa [a]

Em meio de palavra ou enunciado quando precedido por oclusiva glotal realiza-se [p]

[pite]

piʔ-te

[ιɓ

pan-tatilden

[diʔpa natildenʌ]

jaliʔ pan-tatilden-ta

[kotildebayte] ~ [kotildebayte]

kownpayt-te

[sabagnĩde]

Espeacutecie de paacutessaro chupito Satildeo dois Satildeo dois colares Tatu espeacutecie de

73

Outros estudos com liacutenguas proacuteximas tambeacutem indicam a baixa frequecircncia da realizaccedilatildeo do p

nas liacutenguas desse grupo Kingston 1970 para o Mamaindecirc e Lowe 1961 para o Nambikwaacutera do sul (Galera Kabixi Munduacuteka Nambikwaacutera do Campo)

127

Em meio de palavras ou enunciados em ambiente intervocaacutelico ou nasal adjacente realiza-se [b]

sapan-kinĩn-te

[tʃabatildeʔginĩde]

sapatilden-kin-te

Pente Taioba

m - Nasal labial + anterior

Oclusiva bilabial nasal com distribuiccedilatildeo mais larga do que a do p

Apresenta ocorrecircncia restrita quanto comparada agrave nasal alveolar n

Realiza-se [m]

Ocorre em iniacutecio de siacutelaba diante das

vogais i i i i a a a u u u u

Natildeo forma siacutelaba com as vogais

meacutedias frontais e e e com as

posteriores o o

Apoacutes pausa e seguida de a pode se realizar como oclusiva bilabial nasal

preacute-glotalizada - [ ʔm ]

[ miɾatildenʌ]

mih-tatilden-ta

[katilde ɾatildenʌ]

kami h-tatilden-ta

[ a ĩ de]

e ĩn-te

[ e ĩ de]

e ĩ -te]

[ ma hɾatilden]

mah-tatilden

[ atildega ɾe]

atilden-kaloh-te

[ka a ʔɾatildenʌ]

ka- a -tatilde-ta

[ datildena]

n-tatilden-ta

[tumuʔku ɾe]

tumuʔku-te

Estaacute chovendo Aacutegua estaacute suja Cobra espeacutecie de Couro Ele estaacute esperando Roupa Estaacute molhado Estaacute bonito Jacu

128

Em fronteira de morfema precedido pela fricativa glotal h teraacute a sua realizaccedilatildeo ensurdecida

[ a datildenʌ]

a n-tatilden-ta

[ʔ atilde ɳ datilden]~[ a n datilden]

atilden-tatilden

[ʔ atildeʔ n datilden] ~

[ atildeʔ ndatilden]

atilden- n-tatilden

[n h atildega tna ]

n - atilden-ka -tatilden-na

Estaacute inchado Estaacute queimando Vocecirc estaacute mandando Eacute nossa roupa

w - Glide labial - anterior

Glide laacutebio-velar sonoro

Ocupa as posiccedilotildees de onset e coda

Apresenta leve arredondamento nos laacutebios

Eacute o segmento mais frequente das labiais

Realiza-se como [w] em iniacutecio de

siacutelaba diante das vogais i e e a a o

tambeacutem podendo variar com [ʋ]

fricativa laacutebio-dental que eacute realizada com fraco grau de fricccedilatildeo

[ wi rsquoɾatilden] ~ [ ʋi ɾatilden]

wi -tatilden

[woda h de] ~ [ʋoda h de]

wotah-te

[na weʔrsquoa jrsquoɾe] ~ [na ʋeʔajrsquoɾe ]

na jn-weʔa jh-te

[ kowajna tatildenʌ]~ [koʋajna tatildenʌ]

hah-wa jn-ta-tatilden-ta

[daweʔgɾatilde ni]

taweʔ-ka-tatilden-ti

[ we jginĩdatildena]

we jn-kinĩn-tatilden-ta

[ wajkinĩ de]

wajʔ-kinĩn-te

Ele comeu Pomba Eacute para colocar na cabeccedila Satildeo poucos laacutepis Ele cozinhou Eacute fruto da bacaba

129

Em dissiacutelabos no onset de siacutelaba preacute-tocircnica aberta seguido de vogal a central baixa pode ocorrer a fusatildeo entre o w e a vogal a realizando-se como [ͻ o u]74

Na sequecircncia w + a o a pode sofrer harmonia vocaacutelica recebendo o ponto de articulaccedilatildeo da vogal acentuada sendo realizada [e]

Quando em final de siacutelaba segue as

vogais i o a a

E depois das vogais io pode alongar-se

Se a vogal precedente for a baixa a

a ocorreraacute a fusatildeo resultando as

posteriores ͻ ͻ

Quando em siacutelaba em siacutelaba

acentuada ͻ ͻ podem ser alongados

ou seguido de oclusatildeo glotal [ʔ] ou

ocorrer uma assimilaccedilatildeo regressiva

das baixas aa passando a [ͻ ͻ ]

Quanto agrave frequecircncia w se mais

ocorrente depois da vogal baixa a a

e baixiacutessima ocorrecircncia depois da vogal i o

Ao integrar uma siacutelaba (C)v wN onde a

vogal eacute nasalizada o glide pode ser nasalizado ou coalescer com a consoante nasal na coda

Em posiccedilatildeo de onset e pronunciada rapidamente eacute fortificada podendo ser realizada como [p] e [m]75

[ wa jkinĩ de]

wa jh-kinĩn-te

[waɾaɾwaɾaʔĩ datildenʌ] ~

[wͻɾaʔwͻɾaʔĩ datildenʌ] ~

[ͻɾaʔͻɾaʔĩ datildenʌ]

watajwatajn-tatilden-ta

[weli nde] ~ [uli n de]

wa ĩn-te

[weɾe ɾatildena] ~ [ ɾe ɾatildena] ~

[ rsquoɾe ɾa na]

wateh-tatilden-ta

[giw ladaɾe] ~ [gi la de]

kiwlah-tah-te

[kowa ɾe] ~ [koa ɾe]

kowah-te

[a wde] ~ [ ͻ de] ~ [ ͻ ʔde]

a w-te

[aw de] ~ [ͻ de] ~ [ͻʔ de]

awh-te

[na w du] ~ [nͻ du] ~ [nͻ w du]

na wh-tu

[a wm datilden] ~ [atilde w m datilden] ~

Amendoim Fruto do accedilaiacute Estaacute fino Tamanduaacute Estaacute sumido Cascavel Andorinha Flexa Gaviatildeo

74

Conforme Telles (2002 p 42) Estas alofonias variam de acordo com a qualidade da vogal

tocircnica da siacutelaba seguinte com a qual sua vogal aacutetona nuclear se harmoniza 75

Tal ocorrecircncia eacute mais frequentemente constatada em falantes monoliacutengues em Latundecirc

130

[atilde m datilden]

atilde wn-tatilden

[woloʔʔnatildenʌ] ~ [polo ʔnatildenʌ]

walon-tatilde-ta

[wʌnaʔkinĩ de] ~ [mʌnaʔkinĩ de]

~ [wanaʔkinĩ de]

wanaʔ-kinĩn-te

[wo nut ʔna ] ~ [mo nut ʔna ]

wo nuʔ-tatilden-na

[wʌ na jginĩ datildenʌ] ~

[mana jginĩ datildenʌ] ~

wa -na jn-kin-tatilden-ta

[wa ʃi de] ~ [maʔ ʃi de]

wa-sin-te

Lontra Estaacute assando no burralho Estaacute podre Castanha do caju Eacute corpo inteiro Eacute tua cabeccedila Espeacutecie de abelha

t - Plosiva coronal + anterior

Oclusiva alveolar surda

Ocorre com as vogais ie e a

a atilde o o u ũ

t realiza-se [d] em siacutelaba acentuada podendo ainda variar em posiccedilatildeo medial como [|]

Em iniacutecio de palavra o alofone [d] pode ser realizado como preacute-

[diko lo n de]

tiʔ-ko lo n-te

[ de he ɾaɾe]

te h-tah-te

Paacutessaro pintado espeacutecie de paacutessaro Ele cozinhou

131

glotalizado realizando-se como

[ɗ]

Em fala lenta pode ser realizado como [d]

Em contexto fora do acento ocorre [t] com raros exemplos de variaccedilatildeo entre os alofones [d] e [t]

[ de geɾatilden]

te h-ka-tatilden

[daʔjͻ ratildena]

ta-jaw-tatilden-ta

[da jginĩ de]

ta jn-kinĩn-te

[ doɾatilden] ~ [d ɾatilden]

toh-tatilden

[do h gratilden]

to h-ka-tatilden

[du ɾatilden]

tu-tatilden

[d hdatilden]

tu-tatilden

[kͻdͻ ɾe]

kataw-te

[kado ndatildenʌ]

katon-tatilden-ta

[teda de]

teta-te

[toʔdatilde n de]

toʔtatilden-te

[tigi ɾe]

tikih-te

Sucuri Ele estaacute sentado Pedra Ele morreu Ele procurou Ele pegou Ele chupou Patuaacute Estaacute cru Jaoacute Nambu

132

As possibilidades alofocircnicas de t entre segmentos depende do acento e do contexto adjacente Estas duas condiccedilotildees definem as alofonias76

Precedido de vogal em ambiente

intervocaacutelico realiza-se [tdɾ]

sendo [d] o preferencial

Quando t eacute precedido por h

realiza-se como [tdɾ] A

presenccedila da fricativa favorece o rotacismo de t tornando-o em

[ɾ]

Quando t eacute precedido de ʔ ou

de t a realizaccedilatildeo pode ser [t] mas [d] pode permanecer em raros casos

Em contexto de nasalizaccedilatildeo trecircs realizaccedilotildees satildeo possiacuteveis para t i) vozeamento da oclusiva alveolar ii) preacute-nasalizaccedilatildeo da oclusiva alveolar em iniacutecio de siacutelaba tocircnica e iii) assimilaccedilatildeo total da nasal adjacente

[tabawdnͻde]

tapawn-naw-te

[tala de] ~ [dala de]

tala-te

[tolowm datilde ]

talown-tatilden

[lodo ɾa ɾe] ~ [lo to ɾa ɾe] ~

[loto ɾa ɾe]

loto-tah-te

[doʔ daj de] ~ [toʔ ɾaj de]

to-tajn-te

[nu h ɾe] ~ [ nu h de]

nu h-te

[lo hrsquoɾe] ~ [lo h de] ~

[lo h te]

loh-te

[hu te] ~ [hu de]

huʔ-te

[keja te] ~ [kejaʔ te]

kejat-te

[ĩ datildena] ~ [i ndatildena] ~ [i natildena]

Macaco pequeno Ombro Tipoia Ele terminou Rato grande Abelha vermelha Lagarto grande Urubu

76

Dessas alofonias o flap [ɾ] tem sua ocorrecircncia ligada ao acento

133

Em siacutelaba natildeo acentuada t pode sofrer fricatizaccedilatildeo passando a se realizar como [s]

ou [ts] ou [ʔs]

Ainda neste contexto permanecem possiacuteveis as realizaccedilotildees [t] e [d] se o t sofrer fricatizaccedilatildeo a aspiraccedilatildeo glotal precedente do h natildeo se realiza

Em travamento silaacutebico t realiza-se de preferecircncia como

ʔ Pode ser deletado

ocasionando o prolongamento da vogal tautossilaacutebico

in-tatilden-ta

[katilde datildena] ~ [katilde ndatildena] ~

[katilde natildena]

katilden-tatilden-ta]

[kejaʔ n da ɾe] ~ [kejaʔ na e]

kejan-tah-te

[losa na ʔ] ~ [lostsa na ʔ] ~

[lo ʔ sa na ʔ] ~ [lo h ta na ʔ]

loh-ta-na

[kejate] ~ [kejaʔte]

kejat-te

[kejaʔtiʔjoho]

kejat-ti-jo-ho

[lote] ~ [loʔte]

lot-te

[acute tʃjͻna ]

lot-ti-jaw-na

Arco Milho Estaacute apimentado Estaacute duro Lambari grande Eacute urubu Milho Talvez seja milho Paca A paca estava aiacute

134

n - Nasal coronal - anterior

Oclusiva alveolar nasal

Suas alofonias satildeo condicionadas pelo contexto adjacente agrave sua posiccedilatildeo de ocorrecircncia e agrave estrutura silaacutebica

Em onset realiza-se como [n] com as

vogais i i ĩ ĩ a a atilde atilde u u ũ ũ

Tambeacutem pode apresentar flutuaccedilatildeo em

onset realizando-se [ʔn]77 alveolar

nasal preacute-glotalizada com preferecircncia quando seguido por a

Em posiccedilatildeo de onset e em fronteira de morfema dependendo do seguimento seguinte sofreraacute alteraccedilatildeo

Quando precedido por h sofreraacute ensurdecimento

Quando precedido por outro n na coda silaacutebica precedente poderaacute ser

preacute-glotalizada [ʔn]

[ni du]

ni-tu

[ni ʔkinĩnatildena]

ni ʔ-kinĩn-tatilden-ta

[nagatilde de]

nakatilden-te

[katildena ratilden]

kana h-tatilden

[natildejd ]

natildejn-tu]

[ʔnatilde natilde ʌ]

natilde n-tatilden-ta

[nu h e]

nuʔ-te

[lsquon h ɾe]

nu h-te

[n n de]

n n-te

[n h n atildega tatildena]

Tipo de lenha Eacute fruto Lagarto Estaacute escuro Pacu Estaacute chorando Braccedilo Lagarto Espeacutecie de Bicho

77

Tal qual ocorre com m a glotalizaccedilatildeo de n deve-se em alguns casos aacute reduccedilatildeo da siacutelaba

inicial da palavra

135

Em posiccedilatildeo de coda de siacutelaba acentuada gera processo de assimilaccedilatildeo de dissimilaccedilatildeo e de elisatildeo resultando numa seacuterie de alofonias

Ainda em siacutelaba acentuada se a vogal tautossilaacutebica for oral e entre a coda nasal existir um glide labial-velar constituindo uma siacutelaba com ditongos awn own n se realiza como [m] preferencialmente

w e n em posiccedilatildeo de coda pode sofrer coalescecircncia realizando-se como [m] ou [n]

Se o glide ocupante da primeira posiccedilatildeo da coda for j ou se a siacutelaba tiver a coda preenchida pela nasal n a realizaccedilatildeo desta nasal seraacute [n]

Os glides que seguem a vogal na primeira posiccedilatildeo de coda podem

n -natilden-kah-tatilden-ta

[udʔna]

un-na

[iwm de]

iwn-te

[tʌlawm natildenʌ] ~ [tʌlaw natildenʌ]

talawn-tatilden-ta

[wawm datildenʌ] ~ [wͻwm datildenʌ]

wawn-tatilden-ta

[tolowm datildenʌ]

talown-tatilden-ta

[jatildew de] ~ [iɲatildew de] ~

[jatilde de]

jatildewn-te

[a wm datilden] ~ [atilde m datilden]

atilde wn-tatilden

[iʃɛʔ ɾʌ m datilden]

isaj-tatildewn-tatilden

[toʔkotilde datilden] ~ [t ʔkʌ datilden]

toʔkatildewn-tatilden

Eacute nosso Estaacute vivo Larva Estaacute grosso Estaacute vermelho Estaacute pronto Larva Estaacute assando no burralho

136

assimilar a nasalidade da consoante precedente 78

Se a vogal for nasal na maioria das ocorrecircncias a consoante nasal na coda seraacute apagada deixando seu tempo na vogal precedente e na consoante seguinte

Quando a coda nasal n segue ditongo formado por vogal nasal subjacente mais glide palatal j n em posiccedilatildeo de coda pode espalhar nasalidade regressiva para o glide precedente e pode ser apagada

Quando em coda nasal iraacute participar de outros processos fonoloacutegicos aleacutem da vogal precedente

Na posiccedilatildeo de siacutelaba acentuada em meio de palavra seguida por k n promove a sonorizaccedilatildeo de k e passa

a se realizar como [ʔ] oclusiva glotal

[kotilde baj te] ~ [kotildebay te]

kownpajt-te

[a ʔ n de] ~ [a n de]

a n-te

[je n datilden]

je n-tatilden

[i n datilde na ]

in-tatilden-na

[ hej ndatilden] ~ [ hej n datilden]

hejn-tatilden]

[ natildej de] ~ [ naj n de]

natildejn-te

[ atildendatilden]

atilden-tatilden

[ atilde n datilden]

atilden tatilden]

[ mɔ de] ~ [ de]

n-te

[n n de]

n n-te

Eles estatildeo correndo Ele misturou Tatu Tatu galinha Estaacute sujo Ele estaacute mamando Ele lavou Pacu Ele atirou

78

Para uma descriccedilatildeo mais detalhada sobre o comportamento de n e os glides ver a tese de

Telles 2002 55-57

137

Ainda quanto ao contexto semelhantemente descrito acima n for seguida por uma oclusiva surda homorgacircnica t poderaacute ocorrer processos que possibilitem uma alofonia em variaccedilatildeo livre

n sonoriza t

n sofre desnasalizaccedilatildeo

Quando n sonoriza a consoante seguinte ocorre a elisatildeo podendo ocorrer ou natildeo o alongamento compensatoacuterio da vogal precedente ou a preacute-nasalizaccedilatildeo da consoante seguinte

Quando n sofre elisatildeo alonga a vogal precedente e a consoante seguinte se assimila progressivamente com o traccedilo nasal passando a se realizar como [n]

n se vocaliza e recebe os traccedilos da vogal central e realiza-se nasal

Se n for seguida em coda por uma consoante nasal idecircntica ocupando a posiccedilatildeo do onset da siacutelaba seguinte poderaacute haver duas possibilidades de comportamento da coda nasal dependendo de ser a sua vogal tautossilaacutebica assimilar ou natildeo

Se a vogal precedente for nasal a coda sofreraacute elisatildeo e a vogal se alongaraacute

Se a vogal central for oral a consoante nasal da coda que precede a nasal idecircntica no onset da siacutelaba seguinte sofreraacute dissimilaccedilatildeo do traccedilo nasal79

[ natildej de] ~ [ naj n de]

natildejn-te

[ku ʔginĩ de]

ku n-kinĩn-te

[ dega tatilden]

te n-kaloh-tatilden

[ atildega ɾe]

atilden-kaloh-te

[ ku ndatildenʌ]

ku n-tatilden-ta

[ ku ddatildenʌ]

ku n-tatilden-ta

[ ku n datildenʌ] ~ [ ku datildenʌ]

ku n-tatilde-ta

[ ku natildenʌ]

ku n-tatilden-ta

Estaacute branco Bom-dia espeacutecie de aacutervore Bicho Pacu Rolo de fio de algodatildeo Roupa velha Roupa Estaacute fumando

79

A liacutengua Latundecirc eacute caracterizada pelo OCP (Princiacutepio do Contorno Obrigatoacuterio)

138

[ku datildenʌ]

ku n-tatilden-ta

[katilde na ]

katilden-na

[lidnu ɾe]

lin-nu-te

[lid na j ɾe]

lin-na jh-te

Estaacute fumando Estaacute fumando Estaacute fumando Estaacute fumando Estaacute duro Beiju de mandioca Raiz de mandioca

s - Fricativa alveolar surda

Fricativacoronal+ anterior forma siacutelaba

com as vogais i ĩ e a a atilde o uu ũ

Realiza-se como [s] [ʃ] [tʃ] [ʔs]

Em menor frequecircncia pode ser realizada como [t] e [t h]

Em siacutelaba acentuada em iniacutecio de palavras a fricativa pode se realizar

[tʃi ɾatilden] ~ [ʔsi ɾatilden]

sih-tatilden

[ ʔsitatilden] ~ [ sitatilden]

set-tan

Estaacute liso Trovejou

139

como palatal africada preacute-glotal ou como alveolar 80

Quando s se fortifica e passa a se realizar como [t] e ou como [t h] apresentam restriccedilatildeo ao contexto de vogal baixa seguinte podendo ocorrer em iniacutecio ou em meio de palavra Nestes contextos tambeacutem permanecem possiacuteveis as demais alofonias

A fortificaccedilatildeo de s eacute frequente em siacutelaba natildeo acentuada em iniacutecio de palavra Embora as siacutelabas acentuadas contenham maiores iacutendices Em posiccedilatildeo natildeo acentuada a alveolar ocorre em maior nuacutemero

A palatalizaccedilatildeo da fricativa eacute obrigatoacuteria quando precedida por i Sua realizaccedilatildeo eacute alveolar em posiccedilatildeo intervocaacutelica

[ʔsĩ du ɾatilden]

sĩn-tu-tatilden

[ʃa h ɾe] ~ [sa h ɾe]

sa h-te

[ tʃoɾatildenʌ] ~ [ ʃoɾatildenʌ]

soh-tatilden-ta

[ʃ de] ~ [s n de]

s n-te

[thathaʔi natildenʌ] ~ [ʃaʃaʔi natildenʌ]

sasan-tatilden-ta

[kejͻ ʔhe neʔt h o ɾeʔ] ~

[kejͻʔhe neʔto ɾeʔ]

keja w-haniʔ-s aw-te

[t datilde na ] ~ [t h datilde na ]

so-tatilden-na

[tʃamaj de] ~ [tamaj de] ~ [sama

de]

saman-te

[ʔʃamaʔdʌ ɾatildena]

saman-tah-tatilden-ta

[iʃatilde datilde na ]

isatilde n-tatilden-na

Estaacute arrastando Timboacute do mato Estaacute sujo Sol Estaacute mole Oacuteleo Eacute guarantatilde (espeacutecie de aacutervore) Tanajura Eacute tanajura

80

A africada eacute a mais utilizada pelos velhos enquanto a fricativa e a alveolar satildeo mais utilizadas

pelos jovens

140

[iʃu datildenʌ]

isu -tatilden-ta

[wasa h ɾe] - [wͻsa h ɾe]

wasah-te

Eacute folha Ele estaacute com frio Besouro

l- Lateral alveolar sonora

Lateral coronal + anterior

Forma siacutelaba em iniacutecio e meio de

palavras com as vogais i e a a o o

u

Fortifica-se em iniacutecio de palavras quando encontra-se na posiccedilatildeo de acento pode ser precedido por vogal aacutetona sem onset que tende a ser apagada

Diante do contexto acima realiza-se

[li tatilden]

lit-tatilden

[dale de]

tale-te

[giwla de]

kiwlah-te

[la ɾ e]

la h-te

[lo ɾatildena]

loh-tatilden-ta

[ko lo ko lo n de]

ko loʔ ko lo n-te

[toluʔ tatildena]

taluʔ-tatilden-ta

[ʔta e] ~ [da e]

la h-te

Ele saiu Embira Cobre cascavel Jacucaacuteca Estaacute comprido Pintado Ele tossiu

141

como alofones [ʔl] e [d]

Acompanhado por consoante nasal em onset silaacutebico pode assimilar progressivamente a nasalidade sendo realizado como [n]

Pode apresentar sobreposiccedilatildeo na maneira como se realizam

[t ~s ]

[t ~ n]

[n ~ l]

[t ~ l ]

[ʔlo tatilden] ~ [a tatilden]

atilde-loʔ-tatilden

[diʔ pa natildena] ~ [i iʔ pa natildena]

jaliʔ pan-tatilde-ta

[ naginila h ni ɾ atilden] ~

[ naginina h ni ɾatilden]

sapatilden-kinĩn-te

[kaas tatildena] ~ [kata tatildena]

kasaʔ-tatilden-ta

[tidit na j de] ~ [tidit ta de]

tatiʔ-najn-te

[nagatilde de] ~ [ agatilde n de]

nakatilden-te

[wota h ɾe] ~ [wola h ɾe]

wotah-te

Jacucaacuteca Ele estaacute afundado atolado Satildeo dois colares Eu natildeo sei se ele estaacute doente Taioba Estaacute grosso Mandioca mansa Lagarto do campo Pomba

142

j - Glide coronal - anterior

Eacute um glide palatal que ocupa a posiccedilatildeo de onset e de coda na siacutelaba

Em iniacutecio de siacutelaba j antecede as

vogais e e o a a atilde u u ũ

Quando em posiccedilatildeo inicial na siacutelaba e

acompanhado por e e em siacutelaba

acentuada ou seguido por a em siacutelaba aacutetona j pode se fortificar e se realizar

como [ʒ] sendo possiacutevel neste caso

ser seguido por um preacute glide [j] de fraca e raacutepida duraccedilatildeo

Quando seguido por a em siacutelaba aacutetona eacute opcional a fusatildeo entre o glide e a vogal derivando a vogal longa [i]

[je n datilden]

je n-tatilden

[ja te]

jaʔ-te

[ja te]

ja ʔ te

[jatildeʔ datilden] ~ [iɲatildeʔ datilden]

jatilden- n-tatilden

[jo ɾatilden]

joh-tatilden

[ju te]

ju-te

[ju te]

ju -rsquote

[j ginĩ de]

j n-kinĩn-te

[je natilden te] ~ [ʒe natilden te]

ja natilde-nu-te

[ j ʒe n datilden] ~ [ʒe n datilden] ~

[je n datilden]

je n-tatilden

[ʒɛge datilden] ~ [ʒɛga j datilden]

Estaacute sujo Maribondo espeacutecie Porco Vocecirc tem coragem Estaacute baixo Boca Peacute Pedra de gelo granizo Porco espinho Estaacute sujo

143

Se em posiccedilatildeo de onset e seguido de vogal nasal pode ocorrer uma consoante palatal seguindo o glide palatal e precedendo a vogal nuclear

Se for atilde a consoante intrusiva se realizaraacute com mais forccedila e separaraacute a sequecircncia jatilden em duas siacutelabas

Quando o glide vier antes da vogal ũ a consoante intrusiva poderaacute resultar no apagamento do glide podendo se realizar como consoante palatal ou preacute-glide

Em posiccedilatildeo final de siacutelabas

acompanha as vogais e e a a

jaka jn-tatilden

[inatilde de]

janatilde n-te

[jeda n de] ~ [ʒida n de] ~ [ida

n de]

jatan-te

[jatilde datilden] ~ [ iɲatildeʔ datilden]

jatilden- n-tatilden

[jatildew de] ~ [iɲatildew de] ~

[jatilde de]

jatildewn-te

[j ginĩ de] ~ [ j ɲ gibi de]

j n-kinĩn-te

[ ejdnirsquoɾatilde]

hejn-ten-ni-tatilde

[ e jtatilden]

e ʔ-tatilden

[wajkinĩ du]

wajʔ-kinĩn-tu

[na j de]

na j -te

[ natildejde]

natildejn-te

Eacute pica-pau pequeno espeacutecie Abelha do chatildeo espeacutecie veado espeacutecie Vocecirc tem coragem Larva espeacutecie Pedra de gelo granizo Eu vou lavar Ele fez fogo Amendoim

144

Maribondo espeacutecie Pacu espeacutecie de peixe

k- Plosiva dorsal - anterior

Eacute oclusiva velar surda Tem larga distribuiccedilatildeo e se realiza diante de todas as vogais do Latundecirc

Satildeo seus alofones [ʔk] [ɠ] [g] e [k]

Em iniacutecio de palavra se realiza preferencialmente como [k]

[kiliʔkinĩ de]

kiliʔ-kinĩn-te

[ki de]

ki -te

[ke ɾatildena]

keh-tatilden-ta

[ke ja ʔ n de]

ke ja jn-te

[ka ɾatildena]

kah-tatilde -ta

[ka

ka jn-te

[katilde natildena]

katilden-tatilden-ta

[ko h ɾe]

koh-te

[ko lo ʔko lo n datildeda]

ko lo ʔko lo n-tatilden-ta

Coco da palmeira inajaacute Macaco noturno Ele estaacute caccedilando Caititu Estaacute azedo Formiga Estaacute duro Tesoura

145

Em contexto de fala raacutepida em iniacutecio

de vocaacutebulos a velar preacute-glotal [ʔk]

pode ocorrer pode flutuar tambeacutem como velar plena [k]

Em mesmo contexto pode-se flutuar a velar sonora [g] ou a velar implosiva

[ɠ] ou a velar surda [k] ou a velar

surda preacute-glotalizada [ʔk]

Quando em meio de vocaacutebulo em contexto que envolve a consoante nasal lexical precedente a realizaccedilatildeo de [g] eacute categoacuterica

Entre vogais eacute possiacutevel que se encontre a variaccedilatildeo entre [k] e [g] sendo a surda a preferencial e em maior nuacutemero de realizaccedilotildees

[k n de]

k n-te

[ku n de]

ku n-te

[ʔkolo ɾe] ~ [kolo ɾe]

koloh-te

[ʔka laʔkala ɾe] ~ [ka laʔkala ɾe]

kalaʔkalaʔ-te

[golota taʔnatildena] ~

[kolota taʔ natildena]

kolon-sasan-tatilden-ta

[ gi natildena] ~ [ ɠi natildena]

ki n-tatilden-ta

[giʃaj n datildena] ~ [ɠiʃaj ndatildena] ~

[kiʃaj n datildena]

kisajn-tatilden-ta

[ atildega ɾe]

atilden-kaloh-te

[j ginĩ de]

j n-kinĩn-te

[waka de]

waka-te

Eacute pintado Timboacute do campo Algodatildeo Barata Galinha Estaacute maduro Estaacute coccedilando Estaacute pontudo Roupa

146

Em onset da siacutelaba acentuada em final de vocaacutebulo k pode se realizar [k h]

[lukaj de]

lukajn-te

[nakatilde n de] ~ [naga n de]

nakatilden-te

[ iwgula ɾatilden]

iwkulah-tatilden

[ i ʔga laʔga na ]

iʔka la n-ka-na

[ ɛtduʔ da jowi k h e ]

ajhtu ta-jaw-wi-ka

Pedra de gelo granizo Garccedila Flecha Lagarto Ele subiu Eles estatildeo brincando Pega (o banco) vamos sentar

- Plosiva glotal - anterior

Eacute uma oclusiva glotal surda com

realizaccedilatildeo [ʔ] que se restringe agrave

posiccedilatildeo de coda silaacutebica81

Tem seu comportamento condicionado pela presenccedila das consoantes adjacentes p t k

Pode se realizar como [ʔ] em fala

raacutepida preceder a oclusiva velar surda k

Como [j] quando a vogal nuclear for a meacutedia frontal e ou a baixa a

Como [w] quando a vogal nuclear for a meacutedia posterior o

[huʔ kaʔ datilden] ~ [ kaʔ datilden]

huʔ-kah-tatilden

[kidiʔka tatilden]

kitiʔ-kah-tatilden

[ atilde ʔ tatilden] ~ [ atilde tatilden] ~

[malo h tatildeni]

atilden-loʔ-tatilden

Eacute arco Eacute furador Ele queimou

81

A entre l e s natildeo foi observada na liacutengua Latundecirc

147

E favorecer a deleccedilatildeo de motivando um alongamento que compensa a vogal nuclear ou alongar ainda alongar esta vogal seguindo de leve aspiraccedilatildeo

A realizaccedilatildeo de [ʔ] nas alofonias

acima soacute eacute notada quando na siacutelaba na qual estaacute presente quando apenas a oclusiva estiver no travamento

silaacutebico (CVʔ)

Quando em posiccedilatildeo de coda pode assimilar o ponto da consoante seguinte e se realizar como [t] ou [d] diante de tnl e [p] ou [b] diante de m Neste caso as realizaccedilotildees homorgacircnicas surdas satildeo sempre preferenciais

[wolo te] ~ [woloʔ te]

woloʔ-te

[ej tatilden] ~ [e tatilden]

eʔ-tatilden

[wajkinĩ de]

wajʔ-kinĩn-te

[loʔ tatilden] ~ [ tatilden] ~ [ wtatilden]

loʔ-tatilden

[tidit na jdatilde na ]

tatiʔ-na jn-tatilden-na

[wa jtna de]

wa jh-na n-te

[at natilde da na]

a ʔnatilde n-tatilden-ta

[a p otildedatildena] ~ [a b otildedatildena]

a ʔ n-tatilden-ta

Espeacutecie de paacutessaro Ele ralou Amendoin Ele afogou Eacute raiz de mandioca Palha da palmeira accedilaiacute Ele estaacute chorando muito Ele estaacute muito bonito

h- Fricativa glotal - anterior

Eacute fricativa glotal surda que em iniacutecio de

siacutelaba ocorre com as vogais i e a a

o u

Quando em iniacutecio de palavra e em siacutelaba acentuada seguida de i realiza-

se como [ʒ]

Quando entre vogais realiza-se como

[hu te] ~ [hu h de]

huʔ-te

[hej de]

hejn-te

Arco Buriti

148

fricativa glotal sonora [ɦ]

Se vier em iniacutecio de palavra em fala raacutepida e em raiacutezes dissilaacutebicas na posiccedilatildeo de onset de siacutelaba natildeo acentuada poderaacute ser apagado

Quando em onset de siacutelaba acentuada acompanhada de consoante nasal assimila a nasalidade da consoante

adjacente sendo realizada como [n ]

Em final de siacutelaba eacute produzido com pouca fricccedilatildeo Em coda acentuada motiva o alongamento da vogal com frequecircncia como resultado teremos uma vogal com leve aspiraccedilatildeo

Demais realizaccedilotildees de h em coda tendem a seguir o comportamento da

oclusiva glotal ʔ

[hata tatilden]

hat-ta-tatilden]

[ha de]

ha n-te

[hoɦo h de]

hohoʔ-te

[hi ɾ e] ~ [ʒi ɾe]

hih-te

[hiwa n de] ~ [iwa n de]

hiwan-te

[ e ĩ n de] ~ [e ĩ n de]

e ĩ n-te

[ɛ hejdn a ]

ajhhejn-ha

[o h datildeda]

o hna-tatilden-ta

[ lo h tatilde na ]

loh-tatilden-na

[ʃi h ɾe]

sih- te

[ke h atilden] ~ [ke atilden]

Eu natildeo tenho Caraacute Espeacutecie de coruja Pau lenha Gambaacute Couro Vamos lavar (algo) Estaacute alto Eacute onccedila

149

keh-tatilden

[nakadʔnatilde na ]

naka natilde n-na

[ka ɾatilden]

kah-tatilden

[naw ɾe] ~ [nͻ e]

na wh-te

[wede e] ~ [wede ʔ ɾe]

wate h-te

[sej ɾatilde]

sih-tatilden

Casa Ele caccedilou Ela ainda estaacute chorando Estaacute azedo Lontra Espeacutecie de tamanduaacute Eacute largo

Quadro 13 Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos orais (Com base em Telles 2002)

i - vogal alta frontal e i - vogal alta

frontal laringal

Realiza-se como [i] e [i ] podem ser

nuacutecleo de siacutelaba e podem tambeacutem iniciam palavras

i segue qualquer consoante enquanto

i ocorre apenas apoacutes as consoantes

m k h

Quando a coda eacute apagada realiza-se como [i] compensando tal apagamento

[ iɾatilden]

i-tatilden

[i n datildenʌ]

i n-tatilden-ta

[giw lada ɾe] ~ [gi la de]

kiwlah-tah-te

Ele mordeu Estaacute quente Cobra cascavel espeacutecie de cobra

150

e - vogal meacutedia frontal e e - vogal

meacutedia frontal laringal

Realizam-se como [e] e [e ] e correm em

iniacutecio de palavras

Quando seguem consoantes natildeo se realizam apoacutes pmn

Tambeacutem natildeo foram detectadas diante de s l h

Ao serem seguidos pelo glide palatal j favorecem a fusatildeo entre as vogais e o

glide realizando-se como [i] e [i ]

O alongamento tambeacutem se daacute em casos de queda de coda

Em siacutelaba aacutetona de morfemas dissiacutelabos poderaacute ocorrer harmonizaccedilatildeo entre a vogal meacutedia frontal e a vogal tocircnica mais alta da siacutelaba seguinte

Pode ocorrer harmonizaccedilatildeo entre a vogal da raiz lexical e a vogal do sufixo classificatoacuterio

[e ɾatilden]

e-tatilden

[ etatilden]

e ʔ-tatilden

[ sejtatilden] ~ [sitatilden]

set-tatilden

[ weʔkinĩde] ~ [ wiʔkinĩde]

wet-kinĩn-te

[kenĩ de] ~ [kinĩ de]

kanĩn-te

Ele viu Ele fez fogo Ele falou Crianccedila Esquilo

a - vogal baixa central e a - vogal

baixa central laringal

A vogal baixa central a apresenta larga distribuiccedilatildeo e segue qualquer consoante e os dois glides

A vogal baixa central laringal segue quase todas as consoante e dos dois glides

Ambas iniciam palavras e apresentam

vaacuterias alofonias [a] [ʌ] [ͻ] [o] [u] [e]

[ɛ] [aelig] e [i] que podem ser ou natildeo

laringais dependendo da vogal subjacente e da condiccedilatildeo do tom e da harmonia vocaacutelica

Quando em siacutelaba tocircnica a se realiza como [a] [ͻ] e [ͻ]

[ͻ] pode ocorrer quando o nuacutecleo vocaacutelico a assimila o traccedilo labial da coda tautossilaacutebica de w

A segunda variaccedilatildeo [ͻ] resulta da fusatildeo

[a h ɾe]

ah-te

[awde] ~ [ͻ de] ~ [ͻʔ de]

awh-te

[ a wde] ~ [ ͻde] ~ [ ͻʔde]

a w-te

[a wm de] ~ [ ͻ m de] ~ [ͻ m de]

a wn-te

Espeacutecie de abelha Gaviatildeo Flecha Louro

151

entre o nuacutecleo a e a coda w

O alongamento da vogal nuclear ou da coda eacute necessaacuterio agrave preservaccedilatildeo do peso silaacutebico para a aposiccedilatildeo do acento

Em siacutelaba tocircnica se a a eacute seguida por j na coda (nuacutecleo do ditongo) pode se

realizar como [a] [ɛ] [ɛ] e [aelig]

Em siacutelaba aacutetona a realiza-se como [ʌ] preferencialmente

Quanto em posiccedilatildeo aacutetona a se harmoniza com a vogal tocircnica da siacutelaba seguinte quando esta for meacutedia ou alta

As realizaccedilotildees provenientes dessa harmonia vocaacutelica satildeo as vogais [ieou]

O processo de assimilaccedilatildeo pode ocorrer em iniacutecio de siacutelaba aacutetona fazendo com que a se realize como [ͻ] a partir de segmento adjacente seja tautossilaacutebico ou natildeo

[ ajɾatildena] ~ [ ɛatildena]

ajh-tatilden-ta

[a j ɾatilden] ~ [aelig ɾatilden] ~ [ɛ ɾatilden]

a jh-tatilden

[ a j atilde m datilden] ~ [ aelig ʔatildem datilden]

a jn atilde wn-tatilden

[ͻ ɾaʔͻɾaʔi datildenʌ] ~

[ͻ ɾɛʔͻɾɛʔi datildenʌ]

watajwatajn-tatilden-ta

[wͻdaʔ nde] ~ [wadaʔ nde]

watan-te

[i n dacircnʌ]

i n-tatilden-ta

[tʌlawm natildenʌ]

talawn-tatilden-ta

[kimi ɾatildena] ~ [kͻmi ɾatildena]

kamih-tatilden-ta

[walin de] ~ [weli de]

walin-te

[tʌlow natildena] ~ [tolow natildenʌ]

talown-tatilden-ta

[tunu ratildeni]

tanũh-tatilden

Eacute roccedila Ele foi Ele assou peixe Eacute fino Panela Estaacute quente Estaacute grosso Estaccedilatildeo seca Tamanduaacute

152

Devido agrave labializaccedilatildeo de a a realizaccedilatildeo resultante sofre assimilaccedilatildeo de palatalizaccedilatildeo altura de glide precedente ou se funde quando o glide eacute tautossilaacutebico e ocupa onset de siacutelaba em que a eacute a vogal nuclear

[kʌmaʔ matilde n de] ~

[kͻmaʔ matilde n de]

kama-matilden-te

[ͻ ɾaʔͻɾaʔĩ datildenʌ] ~

[ͻ ɾɛʔͻɾɛʔĩ datildenʌ]

watajwatajn-tatilden-ta

[wada n de] ~ [wͻda n de]

watan-te

[jeda n de] ~ [ʒida n de] ~

[ida n de]

Estaacute terminado Ele deu Borboleta Eacute fino Panela cabaccedila Espeacutecie de veado

o - vogal meacutedia fechada posterior e

o - vogal meacutedia fechada laringal

Realizam-se [o] e [o ] respectivamente

Natildeo se realizam apoacutes as consoantes nasais mn

o soacute foi realizada apoacutes as consoantes

t l k

Ambas podem ser realizadas em iniacutecio de vocaacutebulo

As realizaccedilotildees [o] e [o ] satildeo resultados

do alongamento compensatoacuterio que provem da delaccedilatildeo de coda

[o ɾatilden]

oh-tatilden

[o te]

o h-te

[ko n de] ~ [kow n de]

kon-te

Ele misturou massa Macuco Espeacutecie Jabuti

u - vogal alta posterior e u - vogal

alta posterior laringal

Apresentam larga frequecircncia nas realizaccedilotildees

u segue qualquer consoante

[ke ju ɾe]

kejuh-te

Macaco da noite

153

u ocorre apoacutes m n s k j

Ambas iniciam palavras

As realizaccedilotildees alongadas [u] e [u ] satildeo

provenientes de alongamento compensatoacuterio quando a coda eacute elidida

[ku n datildenʌ] ~ [ku datildenʌ]

ku n-tatilden-ta

Ele estaacute fumando

Quadro 14 Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos nasais (Com base em Telles 2002)

ĩ - vogal nasal alta anterior

Sua ocorrecircncia soacute fora verificada a partir do comportamento do morfema ĩ- que eacute uma raiz lexical semanticamente vazia prefixada a morfemas classificadores nominais para funcionar como nuacutecleo nominal

A subjacecircncia de ĩ- sem coda nasal pode ser evidenciada na sonorizaccedilatildeo opcional da oclusiva velar k e no natildeo alongamento da vogal ĩ

[ ĩkalo ɾe] ~ [ ĩgaloɾe]

ĩ-kaloh-te

Taacutebua

atilde - vogal nasal baixa

Eacute encontrada a partir do condicionamento morfoloacutegico no prefixo verbal atildel-

Este prefixo tem valor causativo resultativo

Quanto agrave subjacecircncia de atilde pode-se interpretar que a realizaccedilatildeo do morfema agentivo [atildel- atilde-] estaacute condicionada ao segmento inicial da raiz lexical a qual o prefixo se apotildee

[atildelͻwtatildenʌ] ~ [ a lͻtatildenʌ]

atildel-awt-tatilden-ta

[atilde laj n datildenʌ] ~ [a laj n datildenʌ]

atildel-ajn-tatilden-ta

[atildelo tatildenʌ] ~ [alo tatildenʌ]

atildel-loʔ-tatilden-ta

[atildemũmaj na ]

atildel-mumaʔ-na

[ũba tatildenʌ] ~ [atildeba tatildenʌ]

atildel-pat-tatilden-ta

[ natildej de] ~ [ naj n de]

natildejn-te

Estaacute foi quebrado (algo) Estaacute foi cortado (algo) Estaacute foi afundado (algo) Estaacute foi amansado (algo) Estaacute foi colocado (algo)

154

Quando a raiz verbal eacute iniciada por vogal a forma sobrejacente eacute [atilde-] quando a raiz verbal eacute iniciada por vogal a forma sobrejacente eacute [atildel-]

Outra forma de ocorrecircncia da vogal atilde eacute confirmada na base do contraste entre os ditongos orais aj aw e nasais atildej atildewmesmo quando seguidos por coda nasal formando as sequecircncias ajn awn atildejn atildewn

[ aj n datildeni] ~ [ aj n datildeni]

ajn-tatilden

[jatildewm de] ~ [jatildemde]

jatildewn-te

[wawm datildena] ~ [wͻwm datildena]

wawn-tatilden-ta

Pacu espeacutecie de peixe Ele cortou (algo) Espeacutecie de larva Estaacute vermelho amarelo

ũ - vogal nasal alta posterior

Observada a partir da construccedilatildeo interna e comportamento do morfema prefixal nũh - possessivo de 1pp e de seu homoacutefono nũh - verbo adjetival estar soacute

Quanto agrave subjacecircncia de u eacute observada quando a coda fricativa glotal eacute ressilibificada ao se afixar agrave raiz iniciada por vogal ou glide

[ nũhju te]

nũh-ju -te

[ nũhaj ɾatilden]

[nũhajh-oslash-tatilden

Nossos peacutes Ele vai sozinho

54 FONOLOGIA DO PORTUGUEcircS

Diferentemente do Latundecirc o sistema fonoloacutegico do portuguecircs eacute formado

conforme Cacircmara Jr (1970 p33 ndash 34) por sete vogais que se mantecircm na

mesma quantidade em posiccedilatildeo tocircnica que satildeo reduzidas a cinco quando em

posiccedilatildeo tocircnica diante de nasal em posiccedilatildeo pretocircnica em posiccedilatildeo postocircnica natildeo-

final e em postocircnica final

Quadro 15 Vogais no Portuguecircs (Cacircmara Jr 1970)

Natildeo-arredondadas Arredondadas

Altas i u

Meacutedias Altas e o 2ordm Grau

155

Meacutedias Baixas ɛ ɔ 1ordm Grau

Baixa a

Anterior Central Posterior

Quanto aos segmentos consonantais o portuguecircs dispotildee de acordo com Lopez

1979 p5482 de vinte e dois fonemas que ocupam as posiccedilotildees de onset e coda

Os segmentos consonantais satildeo classificados quanto ao modo e ao ponto de

articulaccedilatildeo

Os segmentos consonantais do portuguecircs ainda podem ser influenciados por

articulaccedilotildees secundaacuterias labializaccedilatildeo palatalizaccedilatildeo velarizaccedilatildeo e dentalizaccedilatildeo

Quadro 16 Consoantes no Portuguecircs (Silva 2002)

Articulaccedilatildeo

Bilabial Labiodental Dental ou alveolar

Alveopalatal Palatal Velar Glotal

Oclusiva p b t d k g Africada tʃ dʒ

Fricativa f v s z ʃ ʒ X Ɣ h ɦ

Nasal m n ɲ y

Tepe ɾ

Vibrante ř

Retroflexa ɹ

Lateral l ɫ ʎ l j

82

Apud Bisol 1996 p198

156

55 COMPARACcedilAtildeO ENTRE OS SISTEMAS FONEacuteTICOS DO PORTUGUEcircS E

DO LATUNDEcirc

Passemos entatildeo agrave comparaccedilatildeo ds sistemas fonoloacutegicos do Portuguecircs e do

Latundecirc para melhor compreensatildeo dos processos foneacuteticos oriundos desse

contato

Quadro 17 Sistemas consonantais x Sistemas vocaacutelicos

Consoantes Vogais

Portuguecircs p b m w t d s z l j n f v ɾ k g h ɹ ɲ ʎ X a ɛ e i ɔ o u

Latundecirc p m w t s l j n k h a atilde a a e e i i i i o o u u u u

Como podemos perceber as liacutenguas apresentam padrotildees distintos no que tange

agrave quantidade de segmentos consonantais e de segmentos vocaacutelicos O portuguecircs

eacute uma liacutengua com mais consoantes enquanto o Latundecirc eacute uma liacutengua

extremamente vocaacutelica

No que tange aos fonemas consonantais o Latundecirc natildeo apresenta muitos dos

fonemas vozeados que compotildeem os pares miacutenimos aleacutem das labiodentais [f v]

Tambeacutem natildeo apresenta as fricativas alvopalatais [ʃ ʒ] nem as palatais nasal e

lateral [ɲ ʎ]

O portuguecircs natildeo dispotildee de vogais laringais enquanto o Latundecirc tem o seu

inventaacuterio basicamente composto por elas

157

A disposiccedilatildeo e presenccedila desses elementos tecircm uma ligaccedilatildeo direta com os

processos fonoloacutegicos ocorrentes o portuguecircs resultante do contato do Portuguecircs

com o Latundecirc como veremos no capiacutetulo VI

158

6 PROCESSOS FONOLOacuteGICOS NO PORTUGUEcircS FALADO PELOS LATUNDEcirc

ldquoComo a liacutengua estaacute a todo momento se equilibrando entre

tendecircncias potencialmente conflitantes e ateacute mesmo opostas estaacute sujeita a sofrer mudanccedilas pois esse equiliacutebrio pode vir a ser alterado por qualquer tipo de fator interno ou

externordquo Chagas (2004 p 151)

61 INTRODUCcedilAtildeO

Eacute senso comum entre os estudiosos que as liacutenguas mudam em diversos

aspectos Certamente a variaccedilatildeo e a mudanccedila lhes satildeo inerentes conforme

Cezario amp Votre (2008 p 141)

Em face da mudanccedila a assertiva acima abarca um conjunto de motivaccedilotildees

internas a uma dada liacutengua bem como outras decorrentes de forccedilas externas em

que se inserem aquelas oriundas do contato linguiacutestico Isso nos chama a

atenccedilatildeo para o fato de que aleacutem do fator tempo outros aspectos podem estar

diretamente ligados agraves transformaccedilotildees pelas quais uma liacutengua passa

A forma como as mudanccedilas sonoras operam na liacutengua eacute tema de discussatildeo haacute

seacuteculos Sobre essa temaacutetica Labov (1981 p269) nos diz que

Sound change appears to be systematic in that a particular change affects all eligible words in a lexicon (McMahon 1994) It is not known however how this process takes place A group of 19th century German linguists called the Neogrammarians originally proposed that sound change occurs abruptly across the lexicon This view is still accepted by many linguists (eg Hock 1991 Labov 1994) In contrast others have argued that sound change spreads gradually across the lexicon (eg Chen amp Wang 1975 Krishnamurti 1978) The same language data is sometimes used to support each hypothesis For instance the

159

English Great Vowel Shift which brought about a series of vowel changes in Early Modern English is used as an example of gradual change (Ogura 1987 Aitchison 1991) as well as abrupt change (Hock 1991 Labov 1994) So the argument over whether sound change occurs abruptly or gradually presents a paradox ldquoboth (views) are right but both cannot be right 269)rdquo

A discussatildeo acerca da natureza da mudanccedila sonora no sentido das duas visotildees

pontuadas acima ainda alcanccedila uma dimensatildeo mais larga quando o contato

intersocietaacuterio eacute considerado As implicaccedilotildees que a variaccedilatildeo assume quando a

emergecircncia das escolhas linguiacutesticas envolve o impacto das interaccedilotildees entre

liacutenguas satildeo multifatoriais Devido agrave complexidade das transformaccedilotildees linguiacutesticas

natildeo podemos estabelecer um uacutenico molde para explicar estas modificaccedilotildees haja

vista que cada caso eacute particular quando tratamos de mudanccedila linguiacutestica

Como fora tratado no capiacutetulo sobre Contato linguiacutestico o encontro de duas ou

mais liacutenguas pode resultar ou natildeo em outras liacutenguas O niacutevel de interferecircncia

oriundo do contato pode fazer com que uma das liacutenguas desapareccedila o que

ocasionaria a sua morte e geralmente neste caso sobreviveria a liacutengua do

dominador ou a permanecircncia dos dois coacutedigos linguiacutesticos tal qual ocorre entre

os Latundecirc

A complexidade da fusatildeo de duas liacutenguas desencadeia por si soacute uma seacuterie de

processos que perpassa os diferentes niacuteveis da gramaacutetica No entanto eacute no niacutevel

foneacutetico fonoloacutegico que estes processos satildeo provavelmente mais evidentes e

mais frutiacuteferos Sendo assim podemos afirmar que os niacuteveis foneacuteticos e

fonoloacutegicos apresentam o maior iacutendice de mudanccedila e variaccedilatildeo de uma liacutengua Por

outro lado de acordo com Cavaliere (2005 p 56)

160

Os estudos desses processos nos auxiliam enquanto estudiosos da liacutengua a entender como se comporta a mudanccedila da liacutengua mediante verificaccedilatildeo dos fatos ocorridos no passado que se mantecircm no presente bem como os que natildeo mais se manifestam as mudanccedilas dos sons nos usos hodiernos

A anaacutelise realizada dos processos fonoloacutegicos do Portuguecircs falado pelos Latundecirc

teraacute como base a estrutura silaacutebica do Portuguecircs e do Latundecirc Para a anaacutelise

consideramos uacutetil adotar a classificaccedilatildeo tradicional dos processos focircnicos

encontrados na linguiacutestica histoacuterica (HOCK1991) por nomear em detalhe os

variados tipos de processos observados Aleacutem disso nos pautamos nos trabalhos

de Spencer (1996) e Lass (2000) que associam reflexotildees mais abstratas para

explicar as ocorrecircncias encontradas Esclarecemos que natildeo eacute nosso propoacutesito

realizar uma anaacutelise fonoloacutegica per si Neste trabalho partimos da descriccedilatildeo dos

processos fonoloacutegicos operantes a fim de refletir sobre o resultado do contato

linguiacutestico de uma liacutengua minoritaacuteria (o Latundecirc) com uma liacutengua

sociohistoricamente dominante o portuguecircs e avaliar o papel da marcaccedilatildeo

linguiacutestica no contexto da interferecircncia Os dados como jaacute afirmamos fazem

parte do acervo do NEI (Nuacutecleo de Estudos Indigenistas) da UFPE

Para uma melhor compreensatildeo a anaacutelise dos fenocircmenos observados segue

distribuiacuteda em quatro subgrupos que evolvem os processos foneacutetico-fonoloacutegicos

observados i) perda de elementos ii) ganho iii) alteraccedilatildeo (transposiccedilatildeo ou

permuta) que estatildeo diretamente ligados aos processos fonoloacutegicos de

assimilaccedilatildeo (progressiva e regressiva) fortalecimento leniccedilatildeo apagamento

inserccedilatildeo e coalescecircncia A classificaccedilatildeo desses processos nos remete agrave

termonoligia claacutessica da linguiacutestica de base

161

611 Perda de elementos

Seguindo a tendecircncia das liacutenguas do mundo os processos que envolvem perda

de elementos tambeacutem satildeo os mais recorrentes no portuguecircs falado pelos

Latundecirc Dessa feita estes processos satildeo os que tecircm uma relaccedilatildeo direta com a

estrutura silaacutebica do Portuguecircs que se vecirc obrigada a rearranjar os componentes

da siacutelaba para o padratildeo (CV)

Quanto agrave marcaccedilatildeo o portuguecircs assimilado pelos Latundecirc nem sempre tende a

preservar os padrotildees mais marcados de sua liacutengua conforme descriccedilatildeo nos

processos que se seguem

6111 Monotongaccedilatildeo

Assim como no Portuguecircs a monotongaccedilatildeo eacute um processo natural e bastante

atuante no Latundecirc que eacute uma liacutengua propensa a tal fenocircmeno Eacute uma tendecircncia

geral observada na produccedilatildeo da fala da comunidade Latundecirc verifica-se que os

ditongos crescentes e decrescentes estatildeo sendo frequentemente fusionados

realizando-se como monotongos (TELLES 2002 p100 - 102)

Quanto aos ditongos crescentes Telles (idem p 103) afirma que a tendecircncia ao

processo de monotongaccedilatildeo em ditongos crescentes eacute quase categoacuterica nas

siacutelabas aacutetonas de raiacutezes dissilaacutebicas quando a vogal nuclear eacute a central baixa a

Outros aspectos observados pela autora que fazem menccedilatildeo agrave monotongaccedilatildeo

apontam que a geraccedilatildeo poacutes-contato realizam sistematicamente e com frequecircncia

162

a fusatildeo entre os ditongos decrescentes Os ditongos aw a w aj a j satildeo os que

mais regularmente sofrem processo dos quais decorrem as realizaccedilotildees meacutedias

baixas [ɔ ɔ ɛ ɛ ] que natildeo fazem parte do inventaacuterio fonoloacutegico das vogais do

Latundecirc

Os ditongos iw ow que ocorrem em menor frequecircncia satildeo mais marcados

Nestes a monotongaccedilatildeo se daacute com a preservaccedilatildeo da vogal do nuacutecleo i o O

ditongo e j apresenta pouquiacutessimos casos de fusatildeo mantendo a qualidade do

glide diferentemente dos demais ditongos que satildeo constituiacutedos por vogais natildeo

baixas Sua realizaccedilatildeo seraacute a vogal alta anterior [i]

Apresentamos abaixo os dados apresentados por Telles (idem 101) onde os

resultados foneacuteticos do processo de monotongaccedilatildeo satildeo mais frequentes

Quadro 18 Resultado mais frequente do processo de monotongaccedilatildeo em Latundecirc

Em tritongos a fusatildeo eacute mais frequente quando o glide labial w preenche a

posiccedilatildeo da coda diferentemente da palatal j que pouco se fusiona Nos dois

casos a fusatildeo se daacute apenas com o apagamento do glide poacutes-nuclear

aw gt ɔ [lsquoɔɾe] rsquoawh-lsquote Gaviatildeo

a w gt ɔ [ɔ rsquode] a w-lsquote Fleche

aj gt ɛ [ɛrsquoɾatildena] ajh-lsquotatilden-ta eacute roccedila

aj gt ɛ [ɛ rsquoɾatildena] rsquoa jh-lsquotatilden-ta ele tem andado

iw gt i [lsquogilade] rsquokiwlah-lsquote cobra cascavel

ow gt o [torsquolodatildena] tarsquolown-lsquotatilden-ta ele tem terminado

163

No que se refere ao comportamento de ditongos decrescentes diante de

consoante nasal tautossilaacutebica podem ocorrer diferentes manifestaccedilotildees de

superfiacutecie a depender do ponto do glide Se os ditongos decrescentes terminarem

com glide laacutebio-dorsal w e seguidos por elemento nasal tautossilaacutebico awn a wn

atildewn own apagaratildeo o glide da coda e a vogal nuclear preservaraacute o ponto de

articulaccedilatildeo

Caso o ditongo seja oral a realizaccedilatildeo preferencial seraacute a da manutenccedilatildeo do

ditongo com o glide ocorrendo na superfiacutecie Se o ditongo for nasal o glide pode

ser nasalizado regressivamente Todavia a realizaccedilatildeo preferencial seraacute o glide

Em preferecircncia o glide j eacute mantido conservando sua palatalidade em ditongos

decrescentes que terminam com o glide j constituindo os ditongos ajn a jn atildejn

jn

Os glides wj na posiccedilatildeo de onset podem ser consonantizados O glide j natildeo se

apresenta como fator motivador para este processo Nos poucos casos

apresentados a vogal nuclear eacute a anterior e ou a central a

De acordo com a literatura existente para o Portuguecircs a monotongaccedilatildeo se aplica

a todos os ditongos Entretanto alguns contextos licenciam o processo enquanto

outros o bloqueiam No portuguecircs falado pelos Latundecirc os ditongos decrescentes

orais83 assim como no portuguecircs de longe foram os mais monotongados Aleacutem

destes o ditongo nasal decrescente [atildew] tanto em final de verbos quanto de

nomes mostrou-se recorrente na reduccedilatildeo

83

[aj][ aw] [ej] [ew] [ow] [oj]

164

Enquanto processo natural a monotongaccedilatildeo no portuguecircs falado por Latundecirc

visa simplificar os padrotildees silaacutebicos mais marcados sobretudo na posiccedilatildeo final de

vocaacutebulos jaacute que no Latundecirc natildeo haacute a ocorrecircncia deles

Esclarecemos que os processos observados na fala dos Latundecirc que tambeacutem

ocorrem no portuguecircs atual natildeo foram incluiacutedos nos dados discutidos neste

capiacutetulo ressalvando-se situaccedilotildees nas quais eram necessaacuterios agraves nossas

reflexotildees

De acordo com os exemplos

acima o processo de

monotongaccedilatildeo pode se dar de

duas formas i) apagamento

de um segmento geralmente

o glide ii) fusatildeo de elementos

Os ditongos mais propensos agrave

monotongaccedilatildeo satildeo os

decrescentes Quanto agraves classes de palavras os ditongos presentes nas formas

verbais satildeo mais frequentemente monotongados

No portuguecircs o processo de monotogaccedilatildeo eacute operante porem haacute restriccedilotildees que

natildeo coincidem com o observado na fala dos Latundecirc Bisol (2001 p 112) afirma

(1) [keme] queimei (2) [satildersquogɾaɾi] sangraram

[firsquokaɾi]

ficaram

(3) [fakotilde] facatildeo [motilde] matildeo [koɾasotilde] coraccedilatildeo

[gɾatildedotilde] grandatildeo

[tubaɾotilde]

tubaratildeo

(4) [kaze]

causa

(5) [note]

noite

(6) [lsquotaba] taacutebua (7) lsquomatildeoslash matildersquodava matildee mandava

165

que apenas os ditongos decrescentes satildeo verdadeiros Os crescentes de acordo

com ela seriam falsos pois podem ser realizados como hiato e tecircm variaccedilatildeo livre

Aleacutem disso com respeito aos ditongos decrescentes a autora ainda considera

que haacute dois diferentes tipos de ditongos um considerado pesado que natildeo sofre

reduccedilatildeo (leite) e outro leve passiacutevel de reduccedilatildeo (couro) Ela elenca alguns

ambientes que condicionam a monotongaccedilatildeo como a presenccedila da tepe ou da

palatal em posiccedilatildeo seguinte

Entretanto os dados de (1) a (7) acima nos mostram ocorrecircncias da

monotongaccedilatildeo em contextos muito distintos do que ocorre em Portuguecircs Sobre

estes avaliamos sua ocorrecircncia como segue

Quando em final de vocaacutebulos principalmente nas formas verbais do passado

simples conforme visto em (2) o que ocorre natildeo eacute um fenocircmeno de

monotongaccedilatildeo em que se espera o apagamento de um dos segmentos ou a

fusatildeo dos formadores do ditongo Nos dados em (2) entretanto encontra-se a

substituiccedilatildeo do ditongo por um segmento que articulatoriamente natildeo deriva da

estrutura lexical A vogal anterior com traccedilo de ponto coronal84 realizada em

[firsquokaɾi] ldquoficaramrdquo [satildersquogɾaɾi] ldquosangraramrdquo ocorre em posiccedilatildeo aacutetona final Essa

realizaccedilatildeo pode ser decorrente do espraiamento da coronalidade da consoante

precedente Outros aspectos de relevo para explicar esse fenocircmeno satildeo a

posiccedilatildeo final dos segmentos e a atonicidade Esses condicionantes favorecem a

substituiccedilatildeo total do ditongo nasal para a vogal anterior alta Essa produccedilatildeo eacute

84

Assumimos largamente neste trabalho a terminologia da fonologia claacutessica estrutural (GLEASON 1969) Entretanto termos mais teacutecnicos provenientes da teoria dos traccedilos distintivos (JAKOBSON 1952 CHOMSKY e HALE 1968) satildeo introduzidos quando favorecem a elucidaccedilatildeo dos fatos Da mesma forma ocasionalmente nos referimos a processos ancorados na fonologia poacutes-gerativa (CLEMENTS e HUME 1995)

166

restrita agrave fala dos indiacutegenas da geraccedilatildeo preacute-contato que adquiriram o portuguecircs

pelo menos no iniacutecio da idade adulta

A relevacircncia da tonicidade tambeacutem se evidencia nos dados em (3) Nesses casos

([fakotilde] ldquo facatildeordquo [lsquomotilde] ldquomatildeordquo [koɾasotilde] ldquocoraccedilatildeordquo) apesar de o ditongo nasal atildew

sofrer a fusatildeo passando a ser realizado [otilde] a posiccedilatildeo do acento preserva a

identidade de parte da estrutura nasalizaccedilatildeo e posteriorizaccedilatildeo com

arredondamento A tendecircncia aacute preservaccedilatildeo da estrutura tambeacutem eacute encontrada

no dado em (1) A monotongaccedilatildeo na siacutelaba tocircnica preserva a qualidade da vogal

nuclear em [kersquome] ldquoqueimeirdquo

O Latundecirc evita coda Esse comportamento se alinha agrave ideia de que The CV

syllable is a prototypical example widely considered to be the universally

unmarked syllable type (HUME 2004)

A monotongaccedilatildeo do ditongo nasal atildej em matildej gt matilde natildeo eacute encontrado

regularmente na fala latundecirc Esse fenocircmeno deve ter sido engatilhado pela

juntura externa na qual se observa que a siacutelaba da palavra seguinte conteacutem

sequecircncia focircnica semelhante agrave da siacutelaba que sofreu supressatildeo da semivogal

Um mesmo ditongo pode ou natildeo apresentar diferentes realizaccedilotildees em cada

liacutenguas Por exemplo os ditongos aw atildew aj atildej que existem tanto no Latundecirc

quanto no Portuguecircs se comportam da seguinte forma

Quadro 19 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Latundecirc

aw ɔ [lsquoɔɾe] ˈawh-te lsquogaviatildeorsquo

atildew atildew ~ AM [ˈjatildewmde] ~ [ˈjatildemde] ˈjatildewm-te lsquolarvarsquo

aj ɛ [єrsquoɾatildena] ˈajh-ˈtatilden-ta lsquoeacute roccedilarsquo

atildej atildej ~ atildej [ˌatildejˈdatildeni] ~ [atildejndatildeni] ˈatildejn-tatilden lsquoele cortoursquo

167

Quadro 20 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Latundecirc

aw aw [lsquopaw] pau lsquopaursquo atildew otilde [ˈsotilde] satildew lsquosatildeorsquo atildew i [satildeˈgɾaɾi] sangɾaɾatildew lsquosangraratildeorsquo

atildej atildej [ˈmatildej] matildej lsquomatildeersquo

aj aj [ˈpaj] pai lsquopairsquo

Os ditongos aw em posiccedilatildeo do acento resultam nas vogais meacutedias baixas ɔ e

ɛ no proacuteprio Latundecirc mesmo sendo essas vogais mais marcadas e natildeo

fonoloacutegicas na liacutengua Entretanto no portuguecircs esses ditongos natildeo sofrem

processo de fusatildeo quando ocorrem em siacutelaba tocircnica

A uacutenica vogal nasal constatada na reduccedilatildeo do ditongo eacute [otilde] resultante do ditongo

decrescente nasal atildew Neste caso eacute proacutepria vogal nasal que favorece a vogal

resultante da fusatildeo

Diferentemente do Portuguecircs em Latundecirc os ditongos natildeo se realizam em fim de

vocaacutebulos Desta forma o Portuguecircs falado por Latundecirc tende a seguir o que eacute

posto no Portuguecircs utilizando as vogais menos marcadas [satildegɾaɾɪ] ~ sangraram

[desaɾƱ] ~ deixaram

O que podemos verificar quanto agrave monotongaccedilatildeo eacute que em termos gerais o

Latundecirc natildeo transfere os traccedilos e caracteriacutesticas mais marcadas na liacutengua para o

Portuguecircs falado por eles

168

6112 Siacutencope em onset complexo de l e ɾ

A reduccedilatildeo do onset complexo em Portuguecircs falado pelos Latundecirc eacute um processo

muito comum que se daacute devido a natildeo aceitaccedilatildeo de um segundo elemento no

onset Como podemos observar eacute um processo variante que estaacute atrelado agrave

reorganizaccedilatildeo da siacutelaba e que eacute passiacutevel de sistematicidade

De acordo com Telles (2002 p105) a estrutura silaacutebica do Latundecirc permite a

composiccedilatildeo de seis padrotildees V VC VCC CV CVC CVCC que se

incluem na extensatildeo (C)V(C)(C) que podem ser representados de acordo com

estrutura silaacutebica descrita abaixo

Figura 17 Estrutura silaacutebica do Latundecirc

Os elementos que se encontram entre parecircnteses satildeo opcionais Em Latundecirc as

sequecircncias CV V VC CVC VCC e CVCC ocorrem com frequecircncia

169

sendo os dois primeiros padrotildees os mais frequentes Isso nos mostra o quanto o

Latundecirc evita onsets complexos e codas

A estrutura silaacutebica do portuguecircs de acordo com Mattoso Cacircmara (1969) define

o molde silaacutebico CCVCC conforme figura abaixo

Figura 18 Estrutura silaacutebica do Latundecirc (Cacircmara-Juacutenior)

Seguindo a proposta de Mattoso Cacircmara com respeito agrave distribuiccedilatildeo interna dos

constituintes da siacutelaba as uacutenicas consoantes que preenchem a segunda posiccedilatildeo

do onset satildeo as liacutequidas l e ɾ A coda pode ser preenchida pelas consoantes l

e pelos arquifonemas R S N

No Latundecirc o grupo consonantal no onset natildeo eacute fonoloacutegico Entretanto eacute

atestada a ocorrecircncia dos [tɾ dɾ kɾ gɾ] no plano foneacutetico como resultado da

reduccedilatildeo em siacutelaba pretocircnica de sufixo nominal e verbal A formaccedilatildeo de onset

complexo eacute estrutura marcada no Latundecirc como tambeacutem interlinguisticamente

A estrutura mais complexa e menos frequente (marcada) do encontro consonantal

no onset tende a ser simplificada no portuguecircs falado pelos Latundecirc Como

170

podemos observar em (8) e (9) os grupos consonantais satildeo pronunciados como

um soacute elemento Trata-se do apagamento da tepe e da lateral liacutequida Eacute um

processo em acomodaccedilatildeo que estaacute diretamente ligado agrave faixa etaacuteria dos falantes

Assim os mais novos seguem a tendecircncia de pronunciar o onset complexo

diferentemente dos mais velhos

(8) [bi ka nƱ] brincando

[de tƱ] dentro

[kɛbapƱ] quebraram

[otƱ] outro

(9) [buza] blusa [biciketɪ] bicicleta Embora a reduccedilatildeo do onset complexo seja um fenocircmeno variaacutevel para algumas

variedades do portuguecircs as realizaccedilotildees acima natildeo correspondem agrave fala de

adultos sendo resultantes no processo da aquisiccedilatildeo da liacutengua

Jaacute entre os Latundecirc satildeo os mais velhos que apresentam a realizaccedilatildeo do onset

simplificado como um fenocircmeno variaacutevel conforme observamos em (10)

(10) [b ɾ ĩkarƱ] brincaram [sotildebrasotilde] assombraccedilatildeo [pɾimeɾɪ] primeiro

[febrƱ] febre [fɾɛsa] flecha

O rotacismo (l gt ɾ) da lateral presente em lsquoflecharsquo acima que eacute muito frequente

no portuguecircs menos escolarizado tambeacutem ocorre na fala dos indiacutegenas

171

6113 Apagamento da coda

Em portuguecircs quatro elementos podem ocupar a posiccedilatildeo de coda RSlN aleacutem

dos glides wj85 Em Latundecirc a coda pode ser ramificada e satildeo seis os

segmentos que podem preencher o espaccedilo da coda os glides w j aleacutem das

consoantes t h n Ɂ Como a coda pode ter ateacute duas posiccedilotildees preenchidas os

primeiros elementos satildeo sempre neste caso os glides w j Embora a coda da

siacutelaba fonoloacutegica possa ser preenchida pelas consoantes acima o Latundecirc eacute uma

liacutengua que evita coda na superfiacutecie O fenocircmeno que decorre dessa tendecircncia eacute o

alongamento compensatoacuterio (Clements e Hume 1995)

(11) [ˌn ˈh te]

ˈn h-ˈ Ɂ -te

lsquonossos peacutesrsquo

No dado acima podemos observar a natildeo realizaccedilatildeo da coda fricativa glotal h na

marca de posse ˈnu h- e da coda oclusiva glotal Ɂ o item lexical ldquopeacuterdquo ˈju Ɂ

Nos dois casos o apagamento da coda eacute compensado pelo alongamento

vocaacutelico No caso do morfema de posse ocorre a ressilabaccedilatildeo da coda fricativa

Do ponto de vista da marcaccedilatildeo a siacutelaba menos marcada eacute a que apresenta o

padratildeo CV (Hume 2004 p 183) O Latundecirc tem a tendecircncia a seguir esse

padratildeo de forma que para a liacutengua a coda embora fonoloacutegica eacute mais marcada

A simplificaccedilatildeo da estrutura mais marcada (presenccedila de coda) eacute transferida para

o portuguecircs Conforme os dados descritos abaixo os segmentos que mais satildeo

apagados em posiccedilatildeo de coda satildeo os glides j w e as consoantes h s Como o

85

Mattoso Cacircmara (1969) considera que os glides pertencem ao nuacutecleo Neste caso trata-se de um nuacutecleo ramificado

172

Latundecirc natildeo tem na sua estrutura silaacutebica a coda fricativa alveolar s esse

segmento natildeo eacute licenciado no portuguecircs dos indiacutegenas (dados em 13) Esse

fenocircmeno eacute categoacuterico na fala dos mais velhos e eacute variaacutevel na fala dos indiacutegenas

da geraccedilatildeo poacutes-contato

(12) [m to] muito [koɾƱ] couro

[voto] voltou (13) [dumi] durmir [pig ta] pergunta [pota] porta [kota] corta [pɛtƱ] perto

[kotildekorsquodo] concordou [barsquobudƱ] barbudo (14) [hipotildersquodew] respondeu [gorsquotozƱ] gostoso [iˈtɛla] Stella ([isˈtɛla])

A coda eacute um elemento universalmente marcado No Latundecirc a sua realizaccedilatildeo eacute

em menor frequecircncia do que o Portuguecircs apesar de sua larga presenccedila na

subjacecircncia O que percebemos ademais eacute que o apagamento do R e do s em

coda contribui para a elevaccedilatildeo da vogal meacutedia pretocircnica tautossilaacutebica conforme

os dados ldquocorta e portardquo em (12)

A regra abaixo sintetiza o comportamento da coda no portuguecircs dos Latundecirc

C ou V [oslash] coda

173

Como vimos no Portuguecircs falado por Latundecirc qualquer consoante ou vogal

poderaacute ser apagada em posiccedilatildeo de coda Esta regra tem se mostrado menos

produtiva nas faixas etaacuterias mais novas Nessas geraccedilotildees o apagamento eacute mais

produtivo quando coincide com a realizaccedilatildeo encontrada por nativos em

portuguecircs ([ˈfosa] lsquoforccedilardquo)

6114 Reduccedilatildeo do geruacutendio ndash Anteriorizaccedilatildeo da vogal final

A reduccedilatildeo do geruacutendio eacute um processo comum em alguns dialetos brasileiros

sobretudo em registro menos tenso Esse eacute mais um processo que resulta no

apagamento de segmentos No portuguecircs falado pelos Latundecirc eacute praticamente

categoacuterica a ocorrecircncia da assimilaccedilatildeo da alveolar em geruacutendio

(15) [falatildenƱ] falando [b ɾ ĩgatildenƱ] brigando [kume nƱ] comendo

[bersquobe nƱ] bebendo

[sorsquo ɾ anƱ] chorando

[mersquosenƱ] mexendo [mi ti nƱ] mentindo

Por ser esse um fenocircmeno de larga frequecircncia no portuguecircs nativo entendemos

que a simplificaccedilatildeo segmental da estrutura gerundiva natildeo eacute surpreendente no

portuguecircs indiacutegena Entretanto na produccedilatildeo da geraccedilatildeo preacute-contato a

assimilaccedilatildeo total da oclusiva alveolar eacute acompanhada pela anteriorizaccedilatildeo da

vogal final conforme dados a seguir

174

(16) [dimuɾatildenɪ] demorando

[asinatildenɪ] ensinando [tiɾatildenɪ] tirando

[katildetatildenɪ] catando [kɾese nɪ] crescendo

Para anaacutelise das ocorrecircncias acima precisamos considerar a estrutura do

Latundecirc nessa liacutengua uma terminaccedilatildeo verbal altamente produtiva eacute o morfema

aspectual acentuado -ˈtatilden Esse morfema pode ser seguido pelo morfema de

modo neutro -i resultando nas sequecircncias -ˈtatildeni conforme exemplo abaixo

(17) [keˈja ˌdaˈɾatildeni]

keˈjat ˈta-tatilden-i milho deitar-imperfectivo-neutro

eacute milho deitado (espalhado no chatildeo)

Como no Latundecirc o verbo (e nome) natildeo termina em vogal posterior tal restriccedilatildeo

pode explicar a anteriorizaccedilatildeo do geruacutendio do portuguecircs

6115 Reduccedilatildeo das palatais nasal e lateral

A reduccedilatildeo das palatais nasal e lateral estaacute diretamente ligada agrave natildeo existecircncia

destes segmentos no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc No entanto Clements e

Hume (1995) em seus estudos apontam estes fonemas como complexos do ponto

de vista de seu comportamento

175

Os segmentos ɲ e ʎ satildeo consoantes mais marcadas A natildeo realizaccedilatildeo destas

consoantes no Latundecirc jaacute eacute um fator para a natildeo realizaccedilatildeo no Portuguecircs devido agrave

complexidade inerente de tais segmentos Enquanto segmentos mais complexos

as palatais satildeo sujeitas ao enfraquecimento atraveacutes da iotizaccedilatildeo (vocalizaccedilatildeo)

Mesmo no portuguecircs esse eacute um processo operante particularmente em

variedades populares Mattoso Cacircmara (1981 p 149) descreve que se trata de

ldquomudanccedila de uma vogal ou consoante para a vogal anterior alta i ou para a semivogal correspondente ou iode Nos falares crioulos portugueses haacute a iotizaccedilatildeo das consoantes molhadas ʎ e ɲ ex mulher gt muyeacute nhonho gt ioiocirc (africanismo)rdquo

Aleacutem da iotizaccedilatildeo o portuguecircs apresenta a despalatizaccedilatildeo da lateral em que ʎ

realiza-se [l] como em [muˈlɛ] lsquomulherrsquo

No portuguecircs dos Latundecirc o enfraquecimento se daacute mais frequentemente pela

iotizaccedilatildeo como em (18) Estas realizaccedilotildees ocorrem na fala dos mais velhos na

geraccedilatildeo anterior ao contato

18) [muˈjɛ] mulher

[baɾuj] barulho

[ojˈatildenƱ] olhando

[vimej] vermelho (19) [fila] filha [fola] folha

Weinreich (1953 p 18) explica que quando em sistemas foneacuteticos em contato

podem ocorrer os processos de reinterpretaccedilatildeo de fone que leva a substituiccedilatildeo

de segmento Eacute o que acontece nos exemplos acima

176

Em (20) e (21) o processo de despalatalizaccedilatildeo resulta no apagamento total da

palatal

(20) [miƱ] milho [fii] filho (21) [mia] minha A reduccedilatildeo tem menos restriccedilotildees se comparada com os fatos do portuguecircs falado

por nativo Em (20) as ocorrecircncias satildeo atestadas no portuguecircs enquanto primeira

liacutengua Diante da vogal posterior natildeo apenas o apagamento da palatal pode

ocorrer como tambeacutem o da siacutelaba inteira Em (21) observamos uma realizaccedilatildeo

particular dos Latundecirc em que a consoante palatal nasal eacute apagada plenamente

sem deixar vestiacutegio nasal na vogal que a precede Esse fato tem relaccedilatildeo com a

complexidade que envolve as nasais na liacutengua indiacutegena a qual natildeo coincide com

os processos existentes no portuguecircs

No caso de (22) ocorre o apagamento da siacutelaba em que se encontra a palatal

nasal do diminutivo eacute comum a variedades populares do portuguecircs

(22) [pikinĩnĩ ] pequenininho [faki ] faquinha

Como afirmamos no iniacutecio da seccedilatildeo os segmentos palatais natildeo existem em

Latundecirc o que torna sua produccedilatildeo no Portuguecircs falado pelos Latundecirc mais

marcada e de difiacutecil ocorrecircncia

177

6116 Afeacuterese

A afeacuterese eacute um processo foneacutetico que consiste na queda de elementos iniciais do

vocaacutebulo Este processo que fora responsaacutevel pelas modificaccedilotildees foneacuteticas do

Latim para o Portuguecircs ainda eacute atuante no estaacutegio atual da liacutengua

A queda da siacutelaba inicial es- em verbos como esperar e estar e do a- em

vocaacutebulos como aqui e acabar eacute muito comum em alguns dialetos brasileiros

Entretanto este tipo de delaccedilatildeo no portuguecircs falado pelos Latundecirc se expande

para outros vocaacutebulos da liacutengua conforme os exemplos abaixo

(23) [kutatildeni] escutando [kapa] escapa [kapo] escapou [peɾatildenƱ] esperando

[pi gada] espingarda

(24) [tupiw] entupiu [gatildeno] enganou [tehaɾƱ] enterraram

(25) [kɪ] aqui [lsquokelɪ] aquele [bɾasadƱ] abraccedilado

[meto] aumentou [korsquodadƱ] acordado [batildedono] abandonou [kaboʃe] acabou-se

(26) [fiɾe tɪ] diferente

[pitaw] hospital

178

Natildeo consta no inventaacuterio fonoloacutegico dessa liacutengua a presenccedila da fricativa alveolar

surda em posiccedilatildeo de coda Essa restriccedilatildeo eacute transferida para o portuguecircs falado

por Latundecirc conforme (23)

Outra razatildeo para esse fenocircmeno pode estar na estrutura prosoacutedica da palavra no

Latundecirc Nessa liacutengua as palavras satildeo monossilaacutebicas ou dissilaacutebicas Raiacutezes

com mais de duas siacutelabas satildeo raras (TELLES 2002) Associado a isso o acento

eacute morfoloacutegico em raiacutezes Nas dissilaacutebicas o acento recai na segunda siacutelaba

(27) [ˈmatilde ginĩde] ˈmatildejn-kiˈnĩn-te caju-redondo-Sufixo Nominal

lsquocastanha de cajursquo

No dado (27) encontramos exemplos de raiz monossilaacutebica e de raiz dissilaacutebica

Jaacute no portuguecircs haacute um nuacutemero relevante de palavras trissiacutelabas e polissiacutelabas

Diante disso a afeacuterese pode ser uma interferecircncia da estrutura do leacutexico da

liacutengua indiacutegena para simplificar a estrutura do portuguecircs - mais marcada no

Latundecirc Este fenocircmeno natildeo afeta o acento e eacute operante sobretudo quando a

siacutelaba inicial natildeo tem onset

6117 Apoacutecope

A apoacutecope eacute uma das formas de apagamento de segmentos que estaacute

relacionada assim como a afeacuterese a outros processos foneacuteticos

179

A queda de elementos finais eacute uma das formas de reduccedilatildeo ou reorganizaccedilatildeo

silaacutebica e de palavras Assim como nos demais processos a siacutelaba tocircnica eacute

preservada de qualquer alteraccedilatildeo

Embora alguns processos explicados aqui tratem da apoacutecope como a reduccedilatildeo do

geruacutendio e ditongo finais ou apagamento da nasal palatal a exemplo de (27)

estes exemplos jaacute foram mecionados nas seccedilotildees anteriores A presenccedila deles

aqui eacute para mostrar que os outros processos foneacuteticos resultam na apoacutecope

(28) [ ʒ rsquotaɾɪ] juntaram

[tursquodĩ] tudinho [ti ] tinha

[lsquovE ] velho [kabersquosĩ] cabecinha [lsquonatilde] natildeo [lsquomatilde] matildee (29) [lsquove] ver [lsquokɛ] quer (30) [nɔj] noacutes

[maj] mais [dirsquofisɪ] difiacutecil [dirsquofisƱ] difiacutecil [tatildersquome j] tambeacutem

(31) [virsquoa] viado [lsquoluɾɪ] Lurdes

[lsquote ] dele

Em (29) a apoacutecope do R final eacute processo muito comum no portuguecircs atual

Diante de tal explicaccedilatildeo natildeo nos cabe assegurar se o processo eacute proacuteprio do

180

Latundecirc ou se da variedade atraveacutes da qual os indiacutegenas adquiriram o portuguecircs

Os dados em (30) tambeacutem apontam para a interpretaccedilatildeo dos dados mostrados

em (29)

Em (31) os dados apresentam um apagamento incomum ao portuguecircs de

nativos A fala espontacircnea e natildeo tensa eacute uma possibilidade explicativa uma vez

que essas ocorrecircncias natildeo satildeo sistemaacuteticas

Os dados de apoacutecope natildeo evidenciam a transferecircncia de traccedilos mais marcados

do Latundecirc para o portuguecircs

6118 Siacutencope86

A forma mais comum deste processo se apresenta no portuguecircs nas

proparoxiacutetonas Em alguns dialetos a depender do contexto linguiacutestico eacute

categoacuterico a ocorrecircncia da reduccedilatildeo interna no vocaacutebulo

Nos exemplos elencados em (32) no caso das proparoxiacutetonas tal reduccedilatildeo eacute

motivada pelo padratildeo acentual do portuguecircs que permite com mais toleracircncia o

padratildeo paroxiacutetono ao proparoxiacutetono conforme Silva (2006 p78)

Quando ocorrente no Portuguecircs este processo estaacute relacionado ao apagamento

da vogal postocircnica medial Com a reduccedilatildeo vocaacutelica a consoante precedente

pode tomar dois caminhos i) eacute incorporado agrave siacutelaba tocircnica na posiccedilatildeo de coda ii)

86

Os exemplos apresentados demonstram que o processo ocorrente eacute muito mais motivado pelo

Portuguecircs do que pelo Latundecirc A nossa classificaccedilatildeo fica aqui a caraacuteter de registro

181

passa a onset da siacutelaba aacutetona seguinte o que afeta sua constituiccedilatildeo O

apagamento vocaacutelico resulta em uma palavra paroxiacutetona

(32) [lsquomuʒka] muacutesica [lsquohapƱ] raacutepido [lsquokOʃka] coacutecega [lsquoavɾɪ] aacutervore

Entendemos que muitas destas ocorrecircncias no Latundecirc se datildeo pelo portuguecircs de

contato Isso eacute confirmado pela produccedilatildeo de ldquomuacutesicardquo e ldquocoacutecegardquo que licencia

uma restriccedilatildeo forte no Latundecirc a fricativa sibilante em coda Aleacutem disso a

produccedilatildeo de ldquoraacutepidordquo ([ˈhapƱ]) tambeacutem coincide com a realizaccedilatildeo encontrada no

portuguecircs popular na qual a consoante em onset da siacutelaba apagada passa a

onset da siacutelaba seguinte devido agrave restriccedilatildeo no portuguecircs de onda oclusiva

612 Ganho de elementos (Inserccedilatildeo de elementos)

Embora em menor nuacutemero os processos que resultam em ganhos de elementos

tambeacutem ocorrem no Portuguecircs falado pelos Latundecirc Satildeo poucos os processos e

menores ainda os casos em que eles ocorrem Isso pode ser explicado como jaacute

fora dito devido ao fato de as liacutenguas em geral terem um dinamismo proacuteprio que

favorece mais agrave perda do que o ganho de elemento Em alguns casos a

motivaccedilatildeo para o ganho de material foneacutetico satildeo as restriccedilotildees fonotaacuteticas da

liacutengua e ou a tendecircncia agrave formaccedilatildeo de padratildeo silaacutebico menos marcado No caso

do portuguecircs de acordo com Collischonn (2004 p 67) um tipo de ganho de

material precisamente a epecircntese vocaacutelica

ocorre mais quando a consoante perdida estaacute em posiccedilatildeo pretocircnica como em objeto magneacutetico e opccedilatildeo ocorrendo em apenas 24 dos vocaacutebulos na posiccedilatildeo postocircnica em palavras como egiacutepcios eacutetnico ou ritmo Mais especificamente estes resultados mostram que a epecircntese que em outros contextos

182

ocorre numa taxa bastante alta eacute dramaticamente reduzida em posiccedilatildeo postocircnica

Exemplos do que a autora descreve seguem apresentados abaixo em (33) O

primeiro dado traz a inserccedilatildeo da vogal epenteacutetica default no portuguecircs a anterior

alta [i] e a segundo natildeo ocorrecircncia da inserccedilatildeo

(33) [lsquoabiˈsuhdƱ] absurdo [koˈlapisƱ] colapso

A epecircntese vocaacutelica nos dados examinados natildeo foi muito expressiva sobretudo

pelo fato de natildeo termos encontrado um nuacutemero significativo de palavras com

encontro consonantal no leacutexico dos indiacutegenas Entretanto alguns casos como em

(34) ilustram a ocorrecircncia no portuguecircs dos Latundecirc

(34) [ˈmɔgunƱ] mogno (35) [piˈnew] pneu

A estrutura que favorece a epecircntese no portuguecircs natildeo faz parte das regras

fonotaacuteticas do Latundecirc o que tambeacutem pode favorecer a vogal epenteacutetica nos

dados observados

(36) [haacutersquopazɪ] rapaz [haacutersquopazƱ] rapaz [parsquope sɪ] papeacuteis [dorsquose zɪ] de vocecircs [lsquonͻ zɪ] noacutes

183

Diferentemente do que ocorre em (34 - 35) os dados de (36) nos direcionam para

a paragoge processo que se caracteriza pela inserccedilatildeo de elemento(s) no final do

vocaacutebulo Este processo tambeacutem estaacute diretamente ligado agrave presenccedila da fricativa

alveolar desvozeada em coda sendo esse segmento proibido nessa posiccedilatildeo no

Latundecirc No caso citado a inserccedilatildeo pode ser da vogal alta posterior rapaz

[hapazƱ] mas a preferecircncia eacute pela vogal alta anterior que eacute a vogal menos

marcada [hapazɪ] rapaz noacutes [lsquonͻ zɪ]

Em (37) o processo de paragoge ocorre apoacutes o processo de monotongaccedilatildeo

ocorrendo no ditongo [atildew] que passa a ser realizado como a vogal nasal meacutedia

posterior conforme discutido em 5111 Apoacutes esse processo haacute a inserccedilatildeo do

consoante nasal seguida da vogal alta anterior A paragoge eacute variaacutevel com a

reduccedilatildeo do ditongo ([tubaˈɾotilde]) A inserccedilatildeo da siacutelaba final [-ni] pode decorrer da

existecircncia produtiva de terminaccedilatildeo sonora semelhante em vocaacutebulos (nominais e

verbais) no Latundecirc

(37) [tubarsquoɾotildenɪ] tubaratildeo

Em (38) o processo ocorrente eacute a proacutetese Se para o processo inverso - a afeacuterese

- os dados satildeo em maior quantidade para a proacutetese satildeo pouquiacutessimos os

contextos em que ela ocorre No caso deste exemplo a proacutetese se daacute a presenccedila

da vogal baixa diante do verbo Este tipo de proacutetese eacute bem recorrente no

Portuguecircs em dados como ([alemˈbra]) Entretanto o caraacuteter pontual da

ocorrecircncia do fenocircmeno natildeo favorece uma interpretaccedilatildeo mais segura

(38) [atorsquomaɾu] tomaram

184

Outra forma de ganho de elementos pode ser o prolongamento da vogal final O

exemplo de (39) nos mostra o prolongamento da vogal meacutedia anterior Essa

ocorrecircncia foi observada no contexto especiacutefico de ecircnfase

(39) [dese] desse [se] esse

613 Alteraccedilatildeo de elementos (Permuta ou transposiccedilatildeo)

A alteraccedilatildeo de elementos linguiacutesticos eacute considerada na literatura histoacuterica como o

terceiro tipo de alternacircncia focircnica inerente agraves liacutenguas Os contextos em que o

cacircmbio eacute permitido satildeo diversos e direcionados por distintas regras fonoloacutegicas

Muitos desses processos natildeo alteram a estrutura silaacutebica nem atinge a estrutura

lexical O que ocorre de fato eacute a acomodaccedilatildeo de alguns segmentos no dialeto

falado seja pela mudanccedila de traccedilo(s) ou seja pela de segmento(s)

6131 Despalatalizaccedilatildeo de [ʃ] e [ʒ]

Tratamos na seccedilatildeo 5115 do processo da reduccedilatildeo das palatais [ʎ] e [ɳ] que

tambeacutem se configura como um caso de despalatalizaccedilatildeo Todavia tal

classificaccedilatildeo se daacute devido ao fato de estaacute ligada agrave perda de elementos enquanto

a que trataremos agora se configura da permuta ou da reduccedilatildeo de traccedilos

185

Em Latundecirc a presenccedila das palatais [ʃ] e [tʃ] satildeo realizaccedilotildees de s Estas podem

vir em iniacutecio e em meio de palavras As realizaccedilotildees [ʃ] e [s] satildeo preferidas pelos

mais novos enquanto os mais velhos optam pela africada alveolo-palatal surda

Diferentemente no Portuguecircs falado por Latundecirc as realizaccedilotildees natildeo

palatalizadas satildeo preferidas Os Latundecirc natildeo transferem o segmento mais

marcado para o Portuguecircs Contudo conforme seccedilatildeo a seguir veremos que este

processo eacute variaacutevel e pode se dar em qualquer posiccedilatildeo do vocaacutebulo conforme

dados de (40)

(40) [sersquogo] chegou [sersquogamƱ] chegamos [sorsquoɾanƱ] chorando [sursquopaha] chupava [satildematildedƱ] chamando [dersquosaɾƱ] deixaram [casueɾƱ] cachoeira

[mersquosenƱ] mexendo [bisƱ] bicho [baso] baixo [debasƱ] debaixo [lsquopesƱ] peixe [dirsquoso] deixou

Natildeo consta no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc as consoantes z e ʒ de forma

que a liacutengua natildeo apresenta oposiccedilatildeo entre surda e sonora para as fricativas

sibilantes Em (41) o processo de despalatalizaccedilatildeo atinge a fricativa alveopalatal

vozeada que passa a se comportar como fricativa alveolar em iniacutecio de siacutelaba e

em meio de palavras

(41) [lizeɾƱ] ligeiro

186

[lsquolotildezɪ] longe [lsquosuzɪ] suja [lsquosuzu] sujo [azursquoda] ajudar [lsquozudia] judia [azersquota] ajeitar

A escolha do segmento menos marcado segue o que ocorreu com s a

realizaccedilatildeo desses segmentos satildeo adquiridos analogicamente e a presenccedila se daacute

no interior do vocaacutebulo Trata-se da reinterpretaccedilatildeo e acomodaccedilatildeo do segmento

Neste caso do menos marcado jaacute que ambos satildeo menos naturais em sua liacutengua

(WEINREICH 1953)

6132 Palatalizaccedilatildeo

A quantidade de sons palatais do Latundecirc natildeo corresponde aos do Portuguecircs

Em Latundecirc a palatalizaccedilatildeo eacute um processo foneacutetico que ocorre com o segmento

s e em incidecircncia extremamente escassa com t em ambientes que jaacute foram

postos no Capiacutetulo IV que trata deste sistema foneacutetico Eacute um processo bastante

variaacutevel tendo em vista a natildeo presenccedila desse segmento na subjacecircncia da

liacutengua Essa variaccedilatildeo ocorre marcadamente na fala dos mais velhos Os mais

jovens que adquiriram ambas as liacutenguas (Portuguecircs e Latundecirc)

simultaneamente produzem em menor proporccedilatildeo este processo

A africada [tʃ] eacute um segmento que tambeacutem apresenta uma realizaccedilatildeo altamente

variaacutevel provavelmente devido agrave histoacuteria interna da liacutengua conforme Telles

187

(2002 p85) No Latundecirc natildeo haacute diferenccedila entre a oposiccedilatildeo foneacutetica entre as

alveolares de um lado e as palatais e alveacuteolo-palatais de outro

Em (42) e (43) a palatalizaccedilatildeo atinge tanto a fricativa alveolar vozeada quanto a

desvozeada

(42) [ʃu rsquomiɾƱ] sumiram

[ lsquoʃi ma] cima

[ʃigursquoɾow] segurou

(43) [lsquoua] usa

[bursquoʒoɾƱ] Besouro

Em (44) e (45) a palatalizaccedilatildeo abrange as consoantes oclusivas alveolares que

se realizam como africadas alveolo-palatais podendo ocorrer em qualquer

posiccedilatildeo ou contexto da palavra

(44) [lsquoĩdƱ] iacutendio

[matildersquodɔga] mandioca

[ɛrsquoĩ] zezinho

[odʒɪ] hoje [tʃi rsquodʒeɾƱ] cinzeiro

Embora no Portuguecircs o processo de africativizaccedilatildeo de oclusivas alveolares [t d]

seja comum a alguns dialetos como o do Rio de Janeiro [lsquotʃia] e do portuguecircs

popular no Nordeste [lsquoojtʃƱ] sua ocorrecircncia eacute condicionada agrave contiguidade de uma

vogal anterior alta [i] Diferentemente em Latundecirc a palatalizaccedilatildeo e a

188

fricativizaccedilatildeo variam entre si e ocorrem tambeacutem com a fricativa alveolar s Este

processo pode ocorrer em qualquer lugar da palavra

(45) [tʃai] sair [tʃiɾi ga] seringa

[barsquotʃotilde] batom [tʃͻ] soacute [tʃumiɾƱ] sumiram

[tʃobɾo] sobrou

[arsquotʃi ] assim

[tʃubi nƱ] subindo

[pɔtʃa] porta

[rsquotʃua] suja

Os exemplos de (46) apontam para um processo secundaacuterio o fortalecimento

Neste caso a fricativa alveopalatal passa a ser pronunciada como africada

(46) [ tʃoɾatildenƱ] chorando [tʃama] chama [tʃega] chega [ tʃursquoveɾƱ] chuveiro [kaharsquopitʃƱ] carrapicho

No que tange agrave abordagem das palatais a variaccedilatildeo no processo de acomodaccedilatildeo

desses inventaacuterios fonoloacutegicos eacute muito grande A partir das incidecircncias

percebemos que no Portuguecircs resultante do contato a ocorrecircncia desses

segmentos complexos se mostra tambeacutem na mesma proporccedilatildeo

Diante da palatalizaccedilatildeo incluindo a africativizaccedilatildeo observamos que os dados

apresentam duas direccedilotildees quanto ao processo Nos mesmos contextos tanto

ocorre a despalatalizaccedilatildeo quanto a palatalizaccedilatildeo Essa variaccedilatildeo no portuguecircs dos

189

indiacutegenas eacute engatilhada pela ausecircncia do contraste szʃʒ em sua primeira

liacutengua

6133 Desvozeamento e vozeamento

Diferente do portuguecircs no Latundecirc natildeo haacute oposiccedilatildeo das oclusivas quanto agrave

sonoridade As consoantes oclusivas subjacentes satildeo as surdas bilabial alveolar

e velar p t e k respectivamente Sua realizaccedilatildeo sonora eacute condicionada pela

posiccedilatildeo na palavra pelo ambiente (contiguidade nasal) e pelo acento O

vozeamente obrigatoacuterio ocorre quando elas precedidas por consoante nasal na

coda da siacutelaba anterior O processo ocorre tanto no interior quanto em fronteiras

de morfemas (TELLES 2002 p135)

A ausecircncia do contraste surdo-sonoro nas consoantes oclusivas do Latundecirc afeta

a realizaccedilatildeo das consoantes no portuguecircs resultante do contato Na produccedilatildeo dos

indiacutegenas mais velhos (esse fenocircmeno natildeo foi observado na geraccedilatildeo mais

jovem) o processo de desvozeamento atinge as consoantes oclusivas sonoras g

d do portuguecircs conforme (47) e (48)

A realizaccedilatildeo sonora Latundecirc envolve o traccedilo laringal Foneticamente em fala

lenta haacute a realizaccedilatildeo de [d] como alofone de t Telles (2002 p 45) explica que

os falantes mais jovens da geraccedilatildeo poacutes-contato que adquiriram o Portuguecircs

simultaneamente ao Latundecirc neutralizaram o contraste entre sons realizando

preferencialmente o som menos marcado natildeo-implodido Diferentemente dos

mais novos os mais velhos preferem o som implosivo [ɗ]

190

Quanto ao segmento [g] o Latundecirc o tem enquanto alofone de [k] e pode ser

encontrado em iniacutecio de palavra quando em fala raacutepida Mostra-se categoacuterico em

meio de palavra quando diante de uma nasal lexical Em ambiente intervocaacutelico

pode-se encontrar a variaccedilatildeo entre [k] e [g] das quais eacute preferencial a realizaccedilatildeo

da vogal surda (idem p73) A falta do contraste no Latundecirc explica as

realizaccedilotildees de (47)

(47) [lsquobɾika] briga [lsquokoʃta] gosta [kɔviotilde] gaviatildeo

[katildersquoba] gambaacute

A ausecircncia do segmento [d] em Latundecirc eacute a responsaacutevel pela variaccedilatildeo e pela natildeo

realizaccedilatildeo dessa consoante que ocorre como oclusiva alveacuteolo-palatal t

(48) [tipoj] depois [se rsquotatu] sentado

(49) [hatildega] arranca

Em (49) diferentemente do processo de desvozeamento a oclusiva velar se

realiza como sonora A contiguidade nasal em posiccedilatildeo precedente condiciona o

vozeamente da oclusiva velar

Em todos os casos observados acima fica evidente a interferecircncia do Latundecirc no

portuguecircs indiacutegena As consoantes sonoras que satildeo mais marcadas

interliguisticamente por natildeo fonoloacutegicas no Latundecirc se tornam ainda mais

marcadas nessa liacutengua Na produccedilatildeo do portuguecircs os Latundecirc mais velhos

191

preservam a marcaccedilatildeo e apresentam uma realizaccedilatildeo com condicionamento

emprestado da liacutengua indiacutegena

6134 Abaixamento e Elevaccedilatildeo das Vogais Orais

No portuguecircs falado pelos Latundecirc os processos de abaixamento e elevaccedilatildeo

diferenciam-se dos contextos em que ocorrem no portuguecircs Os de elevaccedilatildeo satildeo

em maior nuacutemero que os de abaixamento fato este tambeacutem verificado no

portuguecircs falado pelos Latundecirc

No caso de (50) o uacutenico caso de abaixamento ocorre na vogal anterior nasal e

que passa a ser pronunciada como vogal baixa oral

(50) [asina] ensinar [asinatildenɪ] ensinando

Em (51) a elevaccedilatildeo ocorre com a vogal central baixa final que passa a alta

anterior

(51) [suzɪ] suja [kazɪ] causa [kazɪ] casa [li gɪ] liacutengua

[pɾersquogisɪ] preguiccedila

Assim como em (51) em (52) a elevaccedilatildeo da vogal final tambeacutem eacute realizada como

alta anterior No segundo caso natildeo se trata de elevaccedilatildeo mas de anteriorizaccedilatildeo

uma vez que a vogal meacutedia posterior que ocorre em nomes no portuguecircs eacute

realizada como alta posterior

192

(52) [li pɪ] limpo

[kotildemɪ] como [pɾeti] preto

[saɾatildepɪ] sarampo

[pɾimeɾɪ] primeiro

[morsquosegɪ] morcego [morsquohe dɪ] morrendo

[novɪ ] novo

[kursquoɳadɪ] cunhado [otɪ] outro [fikatildenɪ] ficando

A elevaccedilatildeo e posteriorizaccedilatildeo tambeacutem ocorrem no final dos vocaacutebulos como em

(53)

(53) [kabesƱ] cabeccedila [kanɛlƱ] canela

[mini nadƱ] mininada

[malaɾƱ] malaacuteria

[kursquoru Ʊ] coruja

Em (54) temos tambeacutem a posteriorizaccedilatildeo da alta anterior Assim como a meacutedia

posterior em (52) a meacutedia anterior no portuguecircs eacute amplamente produzida como

alta anterior de forma que o alccedilamento em si natildeo se configura como um

processo do portuguecircs do contato

(54) [hedƱ] rede [bastatildetƱ] bastante [pesƱ] peixe [notƱ] noite [febɾƱ] febre

193

Apesar de natildeo encontrarmos itens que mostrassem a sistematicidade do

condicionamento entre [i] e [u] em final de palavras os dados nos mostram que

haacute uma tendecircncia na base das realizaccedilotildees Os vocaacutebulos terminados em [Ʊ]

tendem a ser produzidos com [ɪ] e os terminados por [a] tendem a ser realizados

com [Ʊ]

Nos dados observados a variaccedilatildeo entre [i] e [Ʊ] soacute ocorre em final de vocaacutebulo

quando se trata da paragoge conforme visto nos exemplos (36) em 512

[harsquopazɪ] ~ [harsquopazʊ]

Os dados em (55) ilustram a falta de regularidade no alccedilamento das vogais

pretocircnicas Como vemos em [fuˈkatildemƱ] e [virsquome ] a tonicidade ou a contiguidade

segmental natildeo condiciona a elevaccedilatildeo da pretocircnica

(55) [pig ta] pergunta [piskosƱ] pescoccedilo [hirsquopotildedew] respondeu [pigu rsquotatildenɪ] perguntando

[dimorsquoɾo] demorou

[virsquome ] vermelho [dimursquoɾatildenɪ] demorando

[fuˈkatildemƱ] ficamos

[kuˈmiw] comeu

194

6135 Nasalizaccedilatildeo e Desnasalizaccedilatildeo

No Latundecirc a nasalidade vocaacutelica eacute contrastiva para a central baixa a anterior

alta e a posterior alta seguidas por consoante nasal tautossilaacutebica A nasalizaccedilatildeo

alofocircnica soacute ocorre com vogais aacutetonas Apesar de a organizaccedilatildeo do traccedilo nasal

na fonologia do Latundecirc ser distinta da do portuguecircs o status contrastivo do traccedilo

em ambas as liacutenguas favorece sua percepccedilatildeo e realizaccedilatildeo na produccedilatildeo na sala

no portuguecircs Entretanto a nasal depende tambeacutem de outros fenocircmenos

cooperantes

Os dados a seguir ilustram a ocorrecircncia da nasalizaccedilatildeo em vogais A

contiguidade da vogal com uma consoante nasal mesmo heterossilaacutebica pode

resultar na nasalizaccedilatildeo O primeiro dado abaixo foge do esperado em liacutengua

portuguesa e tampouco decorre de uma interferecircncia do Latundecirc

(56) [mersquoatilde] meia [bɾĩrsquogatildenƱ] brigando [ʃu miɾƱ] sumiram

[mi mƱ] mesmo

Em (57) ocorre a desnasalizaccedilatildeo em palavras funcionais Esses casos natildeo satildeo

frequentes no leacutexico e natildeo podem ser analisados como resultados de interferecircncia

direta O apagamento da nasal em coda ou em onset seguinte impede a

nasalizaccedilatildeo

(57) [nɪ] nem (natildeo) [mia] minha

195

6136 Fenocircmenos evolvendo os roacuteticos

O tratamento do roacutetico requer uma consideraccedilatildeo sobre o seu comportamento

interlinguiacutestico Retomando as palavras de Bonet e Mascaroacute (1997 p 103)

It is well know that the phonetic realization of rhotics varies considerably from language to language even from dialect to dialect Rhotics can be realized as flaps taps trills (uvular coronal ou bilabial) or as assibilated or fricative variants They ca alternate with a lateral liquid with glides and in some cases a flap can occur as the phonetic realization of a coronal stop in specific environments

Os roacuteticos satildeo segmentos que apresentam uma grande variaccedilatildeo no portuguecircs

Natildeo diferentemente estes elementos tambeacutem se mostraram como motivadores

de vaacuterios processos fonoloacutegicos do portuguecircs falado pelos Latundecirc

Os exemplos dispostos em (58) apontam para a aspiraccedilatildeo do R em coda

silaacutebica Processo este que eacute comum a variedades do portuguecircs e que tambeacutem

no caso em tela pode ser motivado pela preferecircncia de natildeo coda da liacutengua

Latundecirc que favorece o seu enfraquecimento atraveacutes de uma realizaccedilatildeo fricativa

glotal

(58) [duhmɪ] Dormi [mɛgursquola] mergulhar

[fosa] Forsa

O rotacismo eacute um fenocircmeno presente no portuguecircs dos Latundecirc especialmente

entre os mais velhos Fonemas distintos podem sofrer o processo Em (59) a

realizaccedilatildeo do flap tem na base uma sibilante uma lateral palatal e uma oclusiva

196

alveolar Em ldquotrabalhavardquo a lateral palatal inexistente no Latundecirc poderia ser

subtituida pela lateral alveolar constante do inventaacuterio da liacutengua indiacutegena

Entretanto o flap apesar de natildeo fonoloacutegico no Latundecirc eacute um segmento muito

frequente na liacutengua decorrente de processo de enfraquecimento Essa tendecircncia

do Latundecirc pode estar na base da realizaccedilatildeo do portuguecircs Dentre as ocorrecircncias

abaixo a uacuteltima se coloca como um processo frequente no proacuteprio Latundecirc no

qual uma oclusiva passa a flap em ambiente intervocaacutelico

(59) [karsquoboɾe] acabou-se

[tabaɾava] trabalhava

[poɾɪ] pode

Em Portuguecircs particularmente falado por sujeitos menos escolarizados o

fenocircmeno do rotacismo tambeacutem eacute frequente em encontros consonantais

tautossilaacutebicos em que a segunda consoante eacute a lateral alveolar l Dessa forma

produccedilatildeo encontrada em (60) pode ser devido ao contato com o Portuguecircs local

(60) [pɾatildeta] planta

[gɾɛba] gleba

[fɾɛsa] flecha

Em termos da organizaccedilatildeo da fonologia de ambas as liacutenguas os dados em (60)

assim como aqueles em (59) podem ser refletidos a partir da escala de

sonoridade proposta por Bonet e Mascaroacute (1997 p 109)

197

Quadro 21 Escala de Sonoridade adaptada de Bonet e Mascaroacute 1997 p 109)

0 1 2 3 4

Obstruintes

(oclusivas

fricativas trill)

nasais laterais glides

flap

vogais

Considerando a posiccedilatildeo do flap na escala de Bonet e Mascaroacute podemos

interpretar tanto o rotacimo no portuguecircs natildeo padratildeo quanto aquele presente no

Latundecirc como resultado de enfraquecimento de diferentes segmentos situados

mais agrave esquerda no ranking de sonoridade Entre esses segmentos como

observamos na escala acima encontra-se a proacutepria lateral alveolar que apesar

de tradicionalmente formar a classe das liacutequidas ao lado dos roacuteticos natildeo

apresenta a mesma sonoridade que o flap

6137 Labializaccedilatildeo e Deslabializaccedilatildeo

No Portuguecircs falado pelos Latundecirc os processos que envolvem articulaccedilatildeo

secundaacuteria especificamente a labializaccedilatildeo e a deslabializaccedilatildeo estatildeo

relacionados agraves consoantes oclusivas velares e se realizam praticamente nos

mesmos contextos Trata-se de um processo foneacutetico variaacutevel

(61) [kƱɪ] que [kƱelɪ] com ele (62) [kazɪ] quase [katildedƱ] quando

198

[karsquokƱɛ] qualquer

[li gɪ] liacutengua

No Latundecirc a labializaccedilatildeo pode ser derivada de processo mas eacute restrita em

ocorrecircncia Aleacutem disso a sequecircncia da olusiva seguida do glide formando

encontro consonantal tambeacutem natildeo faz parte da fonologia do Latundecirc Esses fatos

favorecem a produccedilatildeo irregular do portuguecircs em que observamos a

deslabializaccedilatildeo (ou o apagamento do glide) como em (62) e a labializaccedilatildeo (ou

inserccedilatildeo do glide) em (61)

6138 Metaacutetese

A alternacircncia de segmentos no portuguecircs falado pelos Latundecirc pode ocorrer

entres siacutelabas diferentes ou entre elementos da mesma siacutelaba Aleacutem disso

ocorre nas duas direccedilotildees (da esquerda para a direita e da direita para a

esquerda)

(63) [bahiƱ] bairro [fɾevenƱ] fervendo [parsquoguo] apagou

Como vemos acima no primeiro dado de (63) ocorre natildeo apenas a metaacutetese

como tambeacutem o avanccedilo do acento resultando numa palavra oxiacutetona Nos demais

dados a tranposiccedilatildeo segmental natildeo interfere na estrutura suprassegmental O

segundo dado de ldquofervendordquo eacute tiacutepico do portuguecircs e pode decorrer da variedade

de contato sobretudo pelo fato de o onset complexo natildeo fazer parte da liacutengua

indiacutegena Em ldquoapaguordquo a metaacutetese resulta na labializaccedilatildeo da oclusiva velar Essa

199

forma de palavra tem como realizaccedilatildeo foneacutetica frequente mesmo no portuguecircs

nativo a monotongaccedilatildeo Nesse caso a metaacutetese resulta de processo irregular e

pontual nos dados observados

Como vimos nas seccedilotildees anteriores os resultados da metaacutetese natildeo correspondem

a estruturas fonoloacutegicas no Latundecirc sendo sua ocorrecircncia derivada de processo

foneacutetico sem condicionamento prosoacutedico

6139 Siacutestole

Alguns casos de siacutestole em que ocorre o recuo do acento foram encontrados na

fala dos mais velhos Natildeo identificamos contexto linguiacutestico como o

sequenciamento focircnico do enunciado fonoloacutegico que justificasse essas

realizaccedilotildees Considerando o fato de a produccedilatildeo ter sido encontrada apenas na

fala da geraccedilatildeo mais velha e de o acento lexial no Latundecirc ser morfoloacutegico

ancorado em uma das duas promeiras siacutelabas da raiz da palavra (TELLES 2002)

eacute plausiacutevel supor uma interferecircncia do padratildeo acentual da liacutengua indiacutegena no

portuguecircs dos Latundecirc Os dados em (64) evidencia o recuo do acento

(64) [mɔhe] morrer

[kalo] calor [katɪ] quati [pega] pegar

Nos dados acima importa considerar tambeacutem o fato de se tratarem de itens

nominais (incluindo as formas nominais dos verbos) Diante disso uma analogia

possiacutevel dos Latundecirc seria a de considerar a raiz monossilaacutebica que eacute altamente

200

produtiva na liacutengua indiacutegena o que tambeacutem justificaria o acento na primeira

siacutelaba da palavra

61310 Fortalecimento

Casos de fortalecimento jaacute foram abordados nas seccedilotildees anteriores em que

tratamos da palatalizaccedilatildeo e da dessonorizaccedilatildeo Nesta seccedilatildeo outro fenocircmeno de

fortalecimento eacute apresentado no qual ocorre a oclusivizaccedilatildeo de fricativas

Salientamos entretanto que essas foram realizaccedilotildees mais esporaacutedicas e menos

recorrentes que as demais

(65) [istubidƱ] subindo [tiguɾa] segura

[torsquoteɾƱ] solteiro

[batitaɾƱ] batizaram

O processo ocorre no iniacutecio e em meio de palavra No primeiro dado em fato haacute

uma epecircntese da oclusiva alveolar surda [t] tendo em vista a preservaccedilatildeo de uma

sutil sibilaccedilatildeo do s em coda da siacutelaba precedente

Na fonologia do Latundecirc o fonema s tem como alofone o fone [t] que ocorre em

siacutelaba aacutetona (TELLES 2002) Embora essa natildeo seja a realizaccedilatildeo mais frequente

a interferecircncia do Latundecirc natildeo pode ser desconsiderada Em todos os dados de

(65) haacute a presenccedila de segmento oclusivo em siacutelaba contiacutegua que tambeacutem pode

ter motivado o fortalecimento do s

201

7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

No que concerne agraves poliacuteticas linguiacutesticas diante do glotociacutedio que tem se

instaurado no Brasil desde a chegada dos portugueses dado o estado em que se

encontram as liacutenguas indiacutegenas brasileiras eacute de grande valia qualquer estudo

que vise agrave contribuiccedilatildeo e que favoreccedila natildeo soacute a proteccedilatildeo como o conhecimento

cientiacutefico dessas liacutenguas

O Latundecirc como jaacute mencionamos eacute uma dessas liacutenguas minoritaacuterias Ela se

encontra em extinccedilatildeo uma vez que hoje dispotildee de menos de 20 falantes com

autonomia poliacutetica Devido agrave populaccedilatildeo restrita e agraves relaccedilotildees tradicionais de

parentesco os jovens Latundecirc natildeo podem coabitar entre si de forma que a

interaccedilatildeo com o mundo externo eacute a via de perpetuaccedilatildeo social e ao mesmo

tempo de crescente e natildeo planejado contato linguiacutestico Tais circunstacircncias

implicam a urgecircncia de mais estudos sobre a realidade desse povo

Entedemos que estudar as liacutenguas menos conhecidas eacute de grande valia para o

incremento da ciecircncia linguiacutestica A investigaccedilatildeo de cada nova liacutengua eacute uma

maneira de conceber a linguagem humana e de contribuir dessa forma com os

universais linguiacutesticos e com o entendimento da faculdade humana da linguagem

(CAcircMARA-JR 1977 p6)

Seja entre si ou em contato com outras estas liacutenguas natildeo estatildeo (ou natildeo

estiveram) suficientemente isoladas para evitar algum tipo de proximidade

Thurston (1987 p 165) propaga que toda liacutengua deve ter sofrido alguma

202

influecircncia de seus vizinhos em um determinado ponto e tempo Todos os idiomas

satildeo portanto liacutenguas mistas na medida em que todos copiaram formas lexicais e

outros recursos linguiacutesticos de liacutenguas vizinhas

Thomason (2001 p 17) afirma que o contato linguiacutestico estaacute em toda a parte

muitos paiacuteses tecircm mais do que uma liacutengua oficial e muito provavelmente a maior

parte da populaccedilatildeo mundial fala duas ou mais liacutenguas

Contudo mesmo em grande quantidade os estudos que se encarregam da

observaccedilatildeo do contato linguiacutestico se debruccedilam ainda timidamente nos aspectos

foneacuteticos Com base nesta assertiva este trabalho se propocircs a observar como se

daacute o comportamento entre o Portuguecircs e o Latundecirc a partir da verificaccedilatildeo dos

padrotildees mais e menos marcados nos processos foneacuteticos de acomodaccedilatildeo Eacute um

estudo descritivo em que o Portuguecircs eacute a segunda liacutengua mesmo em face de seu

caraacuteter nacional Essa pluralidade linguiacutestica ainda existente no paiacutes demanda a

concretizaccedilatildeo das poliacuteticas a favor da salvaguarda da diversidade no planeta

Posto que toda liacutengua sofra influecircncia das forccedilas internas e externas que agem

sobre ela partimos do pressuposto de que em qualquer pesquisa linguiacutestica natildeo

encontraremos nada de extraordinaacuterio nada que exceda a experiecircncia do

humano Dessa sorte vamos encontrar () uma estrutura linguiacutestica como

qualquer outra e em muita coisa ateacute possivelmente semelhante agrave nossa

(MATTOSO CAcircMARA-JR 1977 p7)

E quando sistemas entram em contado fenocircmenos emergentes podem ajudar a

esclarecer os princiacutepios e as restriccedilotildees que regem as liacutenguas particulares Com

base na complexidade e na riqueza que advecircm do contato linguiacutestico analisamos

203

estas forccedilas conflitantes com base nos princiacutepios de hierarquizaccedilatildeo e

regularidade que satildeo forccedilas motrizes da marcaccedilatildeo nos processos foneacuteticos Aleacutem

do fator tempo outros aspectos podem estar diretamente ligados agraves

transformaccedilotildees pelas quais uma liacutengua passa como relaccedilotildees de poder

influecircncias de outras liacutenguas subjetividade de seus falantes etc

A marcaccedilatildeo estaacute diretamente ligada agrave simetria frequecircncia e naturalidade

Entretanto Rice (2007) apresenta as caracteriacutesticas da marcaccedilatildeo agrupando-as

em dois conjuntos O primeiro envolve os termos relativos a uma marcaccedilatildeo

considerada natural ou pautada na frequecircncia e diz respeito em larga medida a

ldquophonetic basis of an oppositionrdquo Nele se encontram oposiccedilatildeo como ldquomais ou

menos naturalrdquo ldquomais ou menos complexordquo ldquomais ou menos estaacutevelrdquo ldquosujeito agrave

aquisiccedilatildeo mais ou menos tardiardquo etc (Rice 2007 p 81) O segundo grupo eacute

relativo a comportamentos de sistemas fonoloacutegicos como ser ldquosujeito ou

resultado de neutralizaccedilatildeordquo ldquoser gatilho ou alvo de assimilaccedilatildeordquo Esse grupo

portanto diz respeito agrave marcaccedilatildeo fonoloacutegica ou estrutural

No que diz respeito agrave anaacutelise dos dados quanto aos processos foneacuteticos

percebemos em nosso estudo que

Ainda que com algumas restriccedilotildees a tendecircncia agrave monotongaccedilatildeo eacute

transferida para o Portuguecircs falado por Latundecirc [satildersquogɾaɾi] ldquosangraramrdquo

[kaze] ldquocausardquo

Mesmo em variaccedilatildeo a reduccedilatildeo do onset complexo eacute transferida para o

Portuguecircs seguindo a tendecircncia que o Latundecirc tem de evitar esse tipo de

sequecircncia [bĩ katildenƱ] ldquobrincandordquo [kɛbaɾƱ] ldquoquebraramrdquo

204

O preenchimento da coda eacute evitado pelo Latundecirc processo esse que

tambeacutem eacute atestado no Portuguecircs falado por Latundecirc [pi gũta] ldquoperguntardquo

[gorsquotozƱ] ldquogostosordquo

As consoantes ɲ e ʎ mais marcadas interlinguisticamente tambeacutem o

satildeo no Latundecirc que natildeo os tecircm no seu inventaacuterio fonoloacutegico Como

resultado esses segmentos natildeo satildeo produzidos no Portuguecircs falado pelos

Latundecirc Alternativamente ocorre a substituiccedilatildeo desses fonemas por

segmentos articulatoriamente mais proacuteximos ou o seu apagamento [vimej]

ldquovermelhordquo [fila] ldquofilhardquo [farsquokĩ] ldquofaquinhardquo

A reduccedilatildeo silaacutebica eacute atuante tambeacutem atraveacutes da afeacuterese Como natildeo consta

no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc a presenccedila da fricativa alveolar surda

em posiccedilatildeo de coda essa restriccedilatildeo eacute transferida para o portuguecircs dos

Latundecirc que tambeacutem evita vocaacutebulos com mais de trecircs siacutelabas [kutatildeni]

ldquoescutandordquo [bɾa sadƱ] ldquoabraccediladordquo [fiɾ tɪ] ldquodiferenterdquo

O Latundecirc evita o onset em final de palavra adicionando uma vogal para

reorganizar o padratildeo silaacutebico A vogal mais frequente seraacute a alta anterior

[i] [harsquopazɪ] ldquorapazrdquo [dorsquosejzɪ] ldquode vocecircsrdquo

Os sons [ʃ] [ʒ] [tʃ] e [dʒ] satildeo evitados por natildeo fazerem parte do inventaacuterio

fonoloacutegico do Latundecirc de forma que a sua realizaccedilatildeo eacute mais marcada na

liacutengua O comportamento desses segmentos eacute muito variaacutevel Nos mais

jovens satildeo realizados com mais frequecircncia e nos mais velhos satildeo

reinterpretados envolvendo processos diversos [sersquogamƱ] ldquochegamosrdquo

205

[dersquosaɾƱ] ldquodeixaramrdquo [lizeɾƱ] ldquoligeirordquo [azersquota] ldquoajeitarrdquo [ʃũrsquomiɾƱ] ldquosumiramrdquo

[bursquoʒoɾƱ] ldquobesourordquo [tʃĩrsquodʒeɾƱ] ldquocinzeirordquo

A ausecircncia do contraste surdo-sonoro nas consoantes oclusivas t e k do

Latundecirc promove sua neutralizaccedilatildeo na realizaccedilatildeo das consoantes no

portuguecircs dos indiacutegenas [lsquobɾika] ~ [lsquobriga] ldquobrigardquo [s rsquotatu] ~ [se rsquotado]

ldquosentadordquo

No que tange ao comportamento das vogais meacutedias postocircnicas os

vocaacutebulos terminados em [Ʊ] tendem a ser produzidos com [ɪ] e os

terminados por [a] tendem a ser realizados com [Ʊ] que satildeo vogais menos

marcadas [kazɪ] ldquocausardquo [ lĩpɪ] ldquolimpordquo [ka besƱ] ldquocabeccedilardquo [bas tatildetƱ]

ldquobastanterdquo

A partir dos fenocircmenos observados buscamos responder agraves perguntas

norteadoras da nossa pesquisa abaixo retomadas

Fatores internos (linguiacutesticos) e externos (estruturais) interagem com os

princiacutepios da marcaccedilatildeo

Resposta Quanto aos fatores externos no que diz respeito agrave faixa etaacuteria

os mais jovens tendem a natildeo transferir os padrotildees mais marcados da sua

liacutengua para a liacutengua adquirida Em contrapartida os mais velhos

reproduzem com menor frequecircncia os padrotildees mais marcados do

Portuguecircs (liacutengua dominante)

Qual o papel da marcaccedilatildeo no contato linguiacutestico

206

Resposta A marcaccedilatildeo considerada natural responde pela escolha de

padrotildees mais ou menos marcados interlinguisticamente Por essa razatildeo

prevalece a tendecircncia agrave siacutelaba CV do que decorre o apagamento da coda e

a simplificaccedilatildeo de onset complexo De outro lado haacute o natildeo repasse da

laringalizaccedilatildeo vocaacutelica que mesmo fonoloacutegica no Latunecirc eacute menos natural

e mais marcada nas liacutenguas do mundo A marcaccedilatildeo fonoloacutegica eacute

observada na neutralizaccedilatildeo de oposiccedilotildees vaacutelidas no portuguecircs poreacutem

inexitentes na liacutengua indiacutegena como o contraste quanto agrave sonoridade nas

oclusivas e agrave escolha da vogal em posiccedilatildeo final de nomes

Efetivamente um aspecto da marcaccedilatildeo natural pode responder pelo

comportamento da marcaccedilatildeo fonoloacutegica de maneira que natildeo satildeo

caracteriacutesticas de marcaccedilatildeo oponentes entre si No caso em estudo as

duas marcaccedilotildees operam mas natildeo respondem por todos os fenocircmenos

observados Aleacutem disso o caraacuteter altamente variaacutevel das realizaccedilotildees e as

condicionantes sociais dos falantes datildeo chance para a emergecircncia de

processos mais decorrentes da falha na percepccedilatildeo do sinal sem que se

estabeleccedila a regularidade na sua produccedilatildeo

Os traccedilos mais marcados da liacutengua dominada passam para a dominante

Resposta Em alguns caso sim como a africativizaccedilatildeo do s Em outros

natildeo como o natildeo repasse da larinzalizaccedilatildeo vocaacutelica e a oposinccedilatildeo entre

vogais orais e nasais

Ademais em face dos fenocircmenos observados podemos pontuar algums

aspectos relevantes os processos que envolvem perda e permuta de segmentos

satildeo mais frequentes dos que os que envolvem ganho de segmento os segmentos

207

natildeo presentes no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc (liacutengua originaacuteria) tendem a

ser apagados ou reinterpretados pelo segmento mais proacuteximo do portuguecircs

sendo este uacuteltimo o mais frequente os traccedilos mais marcados do Latundecirc estatildeo

mais evidentes nas falas da geraccedilatildeo preacute-contato e a marcaccedilatildeo natildeo estaacute

condicionada apenas aos universais linguiacutesticos mas agraves especificidades das

liacutenguas

Por fim salientamos que o nosso propoacutesito neste estudo foi o de contribuir para a

descriccedilatildeo de liacutenguas incluindo as indiacutegenas e de abrir caminhos para o estudo

do contato linguiacutestico especialmente em niacutevel da foneacutetica e da fonologia

Ressaltamos que este trabalho natildeo encerra o estudo sobre o contato entre as

duas liacutenguas Reconhecemos que os nossos resultados representam um ponto de

partida para investigaccedilotildees posteriores as quais poderatildeo expandir o tema e

avanccedilar no campo da inter-relaccedilatildeo entre contato linguiacutestico e a marcaccedilatildeo

208

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ANEXOS

(Dados Transcritos)

parsquoguo Apagou marsquoma Mamar pegũrsquotatildenu Perguntando barsquoʃo Vassoura rsquokɔsa Coccedilar

marsquoduu Mais duro

rsquokati Quati

arsquoh ti A gente rsquootu Outro irsquoarsquov j E jaacute vem v rsquone ni Veneno pɛgũrsquoto Perguntou rsquofoʃ Foi pɾatildersquoto Plantou rsquosuzu Sujo karsquobeli Cabelo gursquoduɾu Gordura rsquootildemi Homem rsquogodu Gordo rsquopega Pegar dersquotadu Deitado

marsquotau Mataram

korsquokin Coquinho guɾirsquozĩ Gurizinho rsquotakorsquosotildenu Taacute com sono (manutenccedilatildeo) mũdi Mundo ʃursquov ni Chovendo pigũrsquota ni Perguntando sursquov ni Chovendo rsquopɔtʃa Porta kursquomigi Comigo kũversquosatildeni Conversando larsquovatildeni Lavando morsquoh di Morrendo ikursquotatildenu Escutando mursquohidu Morrido marsquohadu Amarrado irsquokutu Escuto

persquohu torsquose Pergunto a vocecirc

rsquoseja Cheia rsquoozi Hoje

rsquoʃuʊ Sujo

222

ursquozotursquopatildejrsquoagʊa Os outros apanham aacutegua

rsquotʃua Suja

bu rsquonitu Bonito

rsquokɛla Aquela

rsquomu tu Muito

vehrsquomejo Vermelho rsquomasu Manso marsquosatildedu Amansando arsquoɾisi Arisco hursquoo Avoou rsquoaga Aacutegua

rsquode tu Dentro

rsquomu tu Muito

rsquotud Tudo irsquopia Espirra isrsquopritu Espiacuterito

rsquofɔti Forte

timirsquotɛi Cemiteacuterio

tɛrsquoha Enterrar

ɔʊrsquoa Jogar (o bicho fora)

tersquoou Enterrou rsquoela Ela matildersquodatilden Mandando batorsquose Bater em vocecirc rsquotokursquotatildenu Tocirc escutando rsquobatildej Banho bɾab Brabo

rsquosɛtu Certo

Kabirsquosela Cabeceira (do rio)

karsquosi bu Cachimbo

tʃursquoveɾu Chuveiro (pau de) rsquoleti Leite rsquofutu Fruto karsquoɾoʃi Caroccedilo kaharsquopitʃu Carrapicho rsquokɾu Crua rsquomasu Massa

pe rsquoʃa Pensar

ojrsquoatildedu Olhando (idem)

pe rsquoʃatilden

Pensando

i te rsquode nu Entendendo

223

irsquokuta Escuta

kwatildedu ew piki nĩnĩ Quando eu era pequenininha

ew bĩrsquokava rorsquodeɾa cũ a lɔrsquoɾĩne

Eu brincava de roda com a Lorine

katildendu pi ĩ

Quando piin

ew tatildebȇĩ cũ a lorsquoɾine

Eu tambeacutem com a Lorine

i lsquoluɾi ku a marsquoɾi

E Lurdes com a Mariacute

mĩa matildey natildew deʃa bɾĩrsquoka

Minha matildee natildeo deixava brincar

eli bɾika corsquomigu

Ela brigava comigo

e koʃta brinrsquoka ni lsquoKotildepu E gostava de brincar no campo

mĩa matildej natildew deʃa bɾĩka Minha matildee natildeo deixava brincar

ersquoli tatildebe j diskuti Ela tambeacutem discutia

tatildebej kɾiatildesa natildew paɾa lsquonɛ Tambeacutem crianccedila natildeo para neacute

fika bahaka bɾĩkatildeni lsquonɛ Fica na barraca brincando neacute

fika gɾitatildeni Fica gritando

a mĩa matilde matildedava bɾĩka lotildeʒi A minha matildee mandava brincar longe

natildew kɛ ve baɾuj na bahaka natildew Natildeo quer ver barulho na barraca natildeo

ki falatildenu O que eu tocirc falando

ki lsquota bɾĩganu nu katildepu Que eu tava brincando no campo

a fruta kirsquoli cotildepi nɛ

A fruta que ele come neacute

kinotildemi di fɾuta Que nome de fruta

akeli iogrii nɛ

Aquele neacute

nɔy sursquopaha lsquo deli Noacutes chupava dele

so eli komenu fɾuta Soacute ali comendo fruta

noj fike mu arsquotɛ ʃersquoga meatilde note

sersquoga

Noacutes ficamos ateacute a meia noite chegar

mĩa matildej bɾiga kumigu Minha matildee brigava comigo

224

tava se ew levatildeta sedu se ew levatildeta sedu

Estava ʔ

va la nu katildepu bɾĩrsquoka Vaacute laacute no campo brincar

u katildepu lsquota satildematildedu orsquosejs O campo taacute chamando vocecircs

noj levatildersquota pɾa bɾĩrsquoka nu kotildepu Noacutes levantaacutevamos para brincar no campo

o katildepu ɛ u maj limpi O campo eacute o mais limpo

eli bɾĩkaru eli istubidu Eles brincaram eles subiram

ɛ ke katildepu num ɛ awto katildepu mũto

baso

Eacute que o campo natildeo eacute alto O campo eacute muito baixo

nɔj sersquogamu bersquobe nu i corsquome nu Noacutes chegamos bebendo e comendo

miu asadu batata e bebe nu

Milho assado batata e bebendo

ew nũm fikej ew bɾĩkava dinoti Eu natildeo fiquei eu brincava de noite

mĩa matildej natildew desa duhmi mĩa matildej bɾiga kumigo

Minha matildee natildeo deixa dormir minha matildee briga comigo

mĩa paj farsquolo sej dumi sedu se pikaɾu cobɾa Kotildemu ki darsquoi

Meu pai falou vocecircs durmam cedo se cobra picar e daiacute

vai sarsquoɾa ou vai a mɔhe Vai sarar ou vai morrer

mĩa paj bɾĩkow diskuti dele natildew Meu pai brigou porque eu natildeo escutava ele natildeo

dohmi amatildersquoɳatilde sedu vorsquose bɾĩrsquoka corsquome mũĩtu fɾuta

Dorme amanhatilde cedo vocecirc vai brincar comer muito fruto

mĩa paj natildew desa ew bɾĩka natildew Meu pai natildeo deixava eu brincar natildeo

natildew icuti dele natildew Natildeo escutei ele natildeo

cɾiatildesa icursquoto crianccedila escutou

iheni fala icursquoto ɛ A gente fala escutou eacute (a gente fala e ela ndash a crianccedila ndash escutou eacute

ni batia natilde mi batia na Natildeo batia natildeo me batia maj eli nũ sabe barsquotih Mas ele natildeo sabia bater

225

falava di bɾabu mihmu Falava bravo mesmo

matildeda agwa matildedƷɔga Mandava buscar aacutegua buscar mandioca

asa biƷu kome Assar beiju comer

nĩ tĩ aacutegua pɾa eli natildew Natildeo tinha aacutegua pra ele natildeo

mĩa matildej natildeo desa ew vĩrsquoga Minha matildee natildeo deixava eu brincar

mĩa povu

Meu povo

bĩ botilde natildew Bem bom natildeo

esi aki bisu bɾabu Esse aqui bicho brabo

mĩa povu matatildedu nosu tudo Meu povo matando o nosso tudo

e ki nomi dee ɛ E que o nome dele eacute

nũ pe rsquosa nisu aki la Natildeo pensar nisso aqui laacute

mĩa matildee falo natildew podi bɾĩka de tu

dagwa notilde

Minha matildee falou natildeo pode brincar dentro drsquoaacutegua natildeo

agwa e mũitu peɾigoso A aacutegua eacute muito perigoso

ĩdƷu vĩ i mata tudĩ nũ iscapa ũ notilde Iacutendio veio e matar tudinho natildeo escapa um natildeo

distotildena kohpu sɔ leva sɔ cabesu Destrona corpo soacute leva soacute a cabeccedila

isu aki nũ ɛ mĩa pare ti notilde Isso aqui natildeo eacute meu parente natildeo

io mimu Eu mesma

nĩge j notilde sabi Ningueacutem natildeo sabe

esi ki ĩdiu moɾava ki i uvi Esse aqui iacutendio morava aqui e ouvi

kɛbaɾu asĩ levo di Quebraram assim levou de Alternacircncia de coacutedigo

demorsquoɾo i ew sersquoge tame j Demorou e eu cheguei tambeacutem

Komi ki rapaɾi kebɾo

Como eacute que o rapaz morreu

226

ai fala pɾa eli nɛ isu ku hapazu Aiacute falou pra ele neacute Isso com o rapaz

eli moɾa debasu di paw nɛ Ele morava debaixo de pau neacute

ve tu dehubo caiw cima deli na

hedu

Vento derrubou caiu em cima dele na rede

sɔ o paj deli capow Soacute o pai dele escapou

vose da mujɛ notilde Vocecirc da mulher natildeo

akeli povu deli mĩ mata todo mĩa povu

Aquele povo dele mata todo meu povo

ĩ via pɾetu Em Veado Preto

paɾEsi kũ ƷEƷĩ Parece com Zezinho

ew moɾa hũtu aki Eu moro junto daqui

keli otɾu Aquele outro

patɾaj iɾe boɾa Para traz ir embora

ai dimorsquoɾo Aiacute demorou

sersquogo Chegou

keli cahĩ sersquogo Aquele Carlinhos chegou

sarsquoi hora orsquoʎa Saiacute fora pra olhar

arsquoi farsquolo dersquosaɾu Aiacute falou deixaram

ota lĩgwa difire ti Outra liacutengua diferente

ta sorsquoɾanu Taacute chorando

ta bĩbotilde natildew Taacute bem bom natildeo

fika tʃorsquoɾatildenu Fica chorando

mĩa pare ti desaɾu mĩa mursquoje Meus parentes deixaram minha mulher

te j bastatildeti Tem bastante

pigũta pa eli Pergunta pra ele

227

maselu kwidava Marcelo cuidava

oti tipu Outro tipo

kotildevɛsa deli nũte di notilde A conversa dele natildeo entendo natildeo

komu ki fala fire ti Como eacute que fala diferente (afeacuterese)

na kohpu uƷa No corpo usa

lizeɾu Ligeiro

tʃarsquoma eli Chamar ele

matildersquodo sabotilde pa eli Mandou sabatildeo pra ele

abɾiw pota Abriu a porta

lava motilde lava pɛ lava bɾasu Lavei a matildeo lavei o peacute lavei o braccedilo

ai ew fikej oiatildenu ai Aiacute eu fiquei olhando aiacute

fikej na pota oiatildenu cutatildeni Eu fiquei na porta olhando

nũ capa niũ Natildeo escapa nenhum

marsquoto cota piskosu Matou e cortou o pescoccedilo

kabesĩn Cabecinha

cusivi kimigu Inclusive comigo

batildeku busa sĩ Branco blusa assim

kursquomiɾu a karsquobesa da lsquoge ti Comeram a cabeccedila da gente

ũ nũ firsquokaɾi Um natildeo ficou

otirsquoĩdʒu Outro iacutendio

ʒũrsquotaɾu Juntaram

bɾirsquogamu pɾa eli Explicamos pra ele

ɔto dii ele vorsquoto dinovu Outro dia ele voltou de novo

ew sarsquoi hora Eu saiacute fora

otoɾapaj cursquoto Outro rapaz escutou

228

oʎa lotildezi Olhou longe

ew lsquoho

Eu vou

desa notilde Deixava natildeo

kuta baɾuj Escuta barulho

marsquoto tudi noɔɾa Matou tudo na hora

sɔ cabesu levo kumew Soacute a cabeccedila levou e comeu

mi a matildej cu tava Minha matildee contava

agwa tupiw tudo A aacutegua entupiu

agwa be j pɾeti mehmu Aacutegua bem preta mesmo

agwa suzi Aacutegua suja

pɾimiɾu kanɛlu Primeiro canela

i totilde paɾi Entatildeo eu parei

nu sarsquobi Natildeo sabia

pɾimeɾu u tigu Primeiro antigo

bastatildetu

Bastante

bastatildetu Bastante

todu tiɾatildenu levatildenu Tudo tirando levando

rsquokaze disu ficaɾu Por causa disso ficaram

tu kɾiatildesa Tudo crianccedila

lersquova todu mini nadu Levar toda meninada

eli mi tinu Ele mentindo

kotildemu orsquose pɾatildeta mu ito Como vocecirc planta muito (rotacismo)

nɔj kume nu aki Noacutes comendo aqui

nɔj seskɛse nu fukamu Noacutes nos esquecemos e ficamos

a noti marsquotaɾu tudu Agrave noite mataram tudo

229

eli sego gatildersquono Ele chegou enganou

kotildemiɾu Comeram

eli kotildersquoto soɾatildeni Ele contou chorando

ke j kwi kiɾo Quem que tirou

mi da mi a filu Me daacute meu filho

sɔ u ki karsquopo Soacute um que escapou

kɾirsquoa na kolu Criar no colo

vi de la u motildeti di he ti Veio de laacute um monte de gente

ew tatildebe j gotava

Eu tambeacutem gostava

na kɔba no basu

Na cobra no braccedilo

bisi u Bichinho

kabeseɾa pɛtu Cabeceira perto

mɔɾa pa basu Mora pra baixo

dirsquofisu marsquota Difiacutecil matar

sɔ bisotilde Soacute bichatildeo

ɛ h~undo Eacute fundo

pohku Porco

fɾɛsa Flecha

mi a matildej falaɾu Minha matildee falou

mi a matildej fikaɾu Minha matildee ficaram (ficou)

pɾimi mehmi Primo mesmo

tatɾa paj tambe j Trata pai tambeacutem

mi atilde ihmatilde maj vɛj Minha irmatilde mais velha

tu tia vɛj ta i Tua tia velha ta aiacute

tɾata gwau gwau ahe ti Trata igual igual a gente

230

halu hɛlarsquodo Ralo ralador

basoɾa ipi Vassoura espinho

fakotilde kotaɾu Facatildeo cortaram

hɛla matildersquodʒɔka Rala mandioca

ai dipoj Aiacute depois

ku faki pike nu Com faquinha pequena

hɛla tatildeme j Rela tambeacutem

mi a paj asirsquona Meu pai ensinar

kɔtaɾu kotilde a taba Cortaram com a taacutebua

disaɾu Deixaram

nu kotildepu No campo

la i basu Laacute embaixo

mi a paj nu hipotildedew natildew Meu pai natildeo respondeu natildeo

pesu Peixe

a notu toda A noite toda

baztatildeti poɹku la Bastante porco laacute

u digu vi Um dia que vim

mi atilde matildej kotildekorsquodo Minha matildee quando acordou

mi atilde matildej forsquola Minha matildee foi laacute

kazi gɾatildedi Quase grande

nɔj te j medu dosejzi Noacutes temos medo de vocecircs

bersquozu kumiw Beiju comeu

mohew saɾatildepi Morreu de sarampo

pigu tatildeni Perguntando

na katildepa No campo kahni asadu Carne assada

231

morsquohe tudi a Morrer tudinho

depoj ʃu miɾu Depois sumiram

dimorsquoɾo mujtu Demorou muito

mɔdi tehu Por causa da terra

ja vaj tʃarsquoi Jaacute vai sair

batildedorsquono Abandonou

fike mu arsquoi Ficamos aiacute

aʒe ti ojrsquoo A gente olhou

hatildeka karsquoɾa Arranca caraacute

tʃiɾi ga basi na Seringa para vacina

barsquotʃotilde Batom

nɔj peɾatildenu Noacutes esperando

mi asu rsquoto Me assustou

i odʒi E hoje

be j vimej Bem vermelho

otu di ʃi ma Outro de cima

sersquogo corsquohe Chegou correr

i te di be j Entende bem

mi asursquoto Me assustou

matatildenu nɔjzi Matando noacutes

mi a fila Minha filha

kumiɾu Comeram

azersquota korsquola pɾa eli Ajeitar colar pra ele

sarsquoma eli

Chamar ele

tʃega logu Chega logo

ʃiguɾow di novʊ Segurou de novo

232

dirsquoso firsquoko Deixou ficou

arsquotɛ dɛrsquozoɾa Ateacute dez horas

tʃɔ ɔjrsquoa Soacute olhar

pi gada Espingarda

pɛhtu casueɾu Perto da cachoeira

maj pɛtu Mais perto

ote la Outra laacute

pɛga pesi Pega peixe

oti kazi Outra casa

pɛga milu Pegar milho

depoj tʃumiɾu bɾatildeku Depois sumiu o branco

mi rsquode ɾu Me deram

satildegɾaɾi asi Sangraram assim

bastatildetu Bastante

atildersquoda karsquosatildedu

Andar caccedilando

mi atilde filu Meu filho

nɔj fikatildeni Noacutes ficamos

ki kursquoto Que escutou

sɔ sorsquoɾatildenu Soacute chorando

depoj deli mohidu Depois dele morrer

nu ta vɛj Natildeo taacute velho

ta noj i da Taacute novo ainda

mi atilde matildej ta bii noj i da Minha matildee ta bem nova ainda

pɛrsquoga baʒtatildetu Pegar bastante

ew persquoge Eu peguei

233

mi atilde lsquoho farsquolo Meu avocirc falou

dimuɾatildeni Demorando

tehaɾu la mehmu Enterraram laacute mesmo

mi atilde matildej soɾatildenu Minha matildee chorando

mi atilde imatilde Minha irmatilde

E cursquoɳadi deli Eacute cunhado dele

E fii deli Eacute filho dele

kursquoɳadi deli Cunhado dele

hɔba demaj Rouba demais

ta difisi Ta difiacutecil

eli tʃobɾo Ele sobrou

saɾatildepi persquogo Sarampo pegou

pɾimeɾi morsquohe Primeiro morreu

ew kutej Eu escutei

sarsquoma matildej Chamar matildee

ta dirsquovisi Taacute difiacutecil

mohew ve me nadu Morreu envenenado

ki kɾirsquoari Que criaram

mi atorsquomaɾu Me tomaram

i ew torsquoteɾu E eu solteiro

kazadu kotildersquose Casado com vocecirc

natildew firsquoka diɾetu Natildeo ficar direito

firsquoka kweli Ficar com ele

mersquosenu Mexendo

ta setu Ta certo

234

bɾabu persquoeli Bravo por ele

tasirsquooma komigu Tem ciuacutemes de mim

E gotozu Eacute gostoso

tipu bursquoʒohu Tipo besouro

tʃi rsquodʒeɾu Cinzeiro

na li gi Na liacutengua

bɾatildeku batirsquotaɾu Brancos batizaram

katildedu eɾa novi Quando era novinho

arsquoi tipoj Aiacute depois

karsquoboɾe Acabou-se

tiguɾa na matildew Segura na matildeo

rsquoɛ lsquopɾimɛ lsquodeli Eacute primo dele

asinatildeni Ensinando

ew kersquome Eu queimei

pɾatildersquota maj Plantar mais

ew vo lsquopɾatildeta Eu vou plantar

karsquokwɛ Qualquer

tabaɾava Trabalhava

tubaɾotildeni Tubaratildeo

poɾi pɛɾa Pode esperar

mi ti nu Mentindo

eli sersquogo Ele chegou

atildersquototilde Entatildeo

ta lsquosetu natildew Ta certo natildeo

mesew kotildersquomigu Mexeu comigo

235

ʃersquoga dinote Chegar de noite

lersquova pirsquotaw Levar pro hospital

ta suzu Ta sujo

rsquobahio Bairro

atildebɾarsquosada Abraccedilada

masɛlu babudo Marcelo barbudo

pɾatildeta milu Planta milho

na gɾɛba Na gleba

bɾasadu Abraccedilado

komi he tʃi Comi gente

kɛ azursquoda Quer ajudar

sotildebɾasotilde Assombraccedilatildeo

nu podi atildersquoda Natildeo pode andar

pɛga na tiheɾu Pega no terreiro

kɔviotilde Gaviatildeo

sɔ eli karsquopo Soacute ele escapou

me rsquoto Aumentou

levava uz vɛio Levava os velhos

matildenɛ desaɾu Maneacute deixaram

pusa no kabelu Puxa no cabelo

kabelu ge ti hatildega Cabelo de gente arranca

iɔga ge ti pɾa la Joga gente pra laacute

hu tu Junto

kɛma he ti queima a gente

ki sɔ a oti Que soacute haacute outro

bagas~i Bagacinho

236

tiɾatildeni katildetatildeni Tirando cantando

kɾese ni Crescendo

dirsquoɾetu Direito

febɾu marsquolaɾu Febre malaacuteria

maj sarsquobiw Mais sabia

tiɾaɾu Tiraram

batildei Banho

ipia deli Espirro dele

Korsquodadu mehmo Acordado mesmo di notu De noite

kasu Caccedila

baɾizadu otu Batizado outro

atʃi mi a ihmatilde fala Assim minha irmatilde fala

kotadu Encostado

nu zudia deli natildew Natildeo judia dele natildeo

gɔta maj deli Gosta mais dele

samatildedu otu Chamando outro

mi atilde subɾi Meu sobrinho

mi atilde pohu Meu povo

mi atilde matilde Minha irmatilde

mi atilde muʒka Minha muacutesica

sɔ bɾi ga Soacute brinca

tʃubi nu Subindo

kahega na koʃta Carrega nas costas dese Desse aiacute istu Isto katildersquoba Gambaacute

237

kursquotia Cutia kursquotʃia Cutia

marsquoɾɛlu Amarelo

versquomela versquomelo Vermelha vermelho rsquose Esse

te natildeʊ te natilde Tem natildeo

esersquoki Esse aqui

rsquoɛmarsquokakupɾersquogisi Eacute macaco preguiccedila

morsquosegi Morcego

defersquore ti Diferente

rsquopodƷi Pode

rsquosersquonatilde Sei natildeo

rsquosersquoviw Vocecirc viu

arsquoinrsquoɛgarsquoviatildew Aiacute eacute gaviatildeo

jabutʃi Jabuti

parsquoɾɛsirsquokele Parece aquele

ɛrsquokele Eacute aquele

rsquoessersquote Esse tem

be i natildeu Tambeacutem natildeo

kursquoruja Coruja

pike nu Pequeno

defersquore ti Diferente

rsquokelersquoɛrsquootro Aquele eacute outro

rsquoejarsquobutʃi E jabuti gɾatildersquodatilde grandatildeo rsquomesmu mesmo

rsquomemu Mesmo

ɔrsquoɾɔpa Europa

arsquobeja Abelha

iscɔhpiatildew escorpiatildeo

ewmɔrsquoʎa Eu molhar ~ Eu molho

pirsquodi pedir tasrsquocɾitu Ta escrito

pɛdƷi Pedi (a gente )

Kersquoma queimar

mode nu Mordendo

morsquodemas Mordeu mais rsquonoj rsquodoj Noacutes dois

aʃe ti A gente (noacutes)

rsquopadirsquoze Pra dizer

238

rsquokɔta Corta

ahatildejrsquoo Arranhou

mujrsquoɛ Mulher

ahajrsquoaelig Arranhou orsquosersquomehm Vocecirc mesmo

isrsquopi Espinho

sorsquome Somente

rsquokalo ~karsquolo Calor doi Dois

tatildebe Tambeacutem

ispi rsquogada Espingarda

persquode Perdeu

se rsquotatu Sentado

rsquohe ti Gente

arsquodidu Ardido rsquokoda Corda mərsquota Matar marsquotani matando

rsquoʃɔmarsquota Soacute matar

rsquobisu Bicho rsquoota Outra

patildersquota ~rsquopɾatildeta Plantar

atildersquodatildeni Andando

ve tatildeni Ventando

defersquore ti Diferente

hursquoatildenu Voando vorsquoto Voltou rsquopodirsquoze Pode dizer marsquotaforsquogatilden Matar afogando rsquodaga Da aacutegua (drsquoaacutegua) arsquoɾea Areia

rsquofu da Afunda

rsquokɛlaforsquogo Que ela afogou

mɛgursquola Mergulhar

eʃpɾersquome Espremer

hɛlatilden Ralando (verbo ralar)

mɔrsquolada Amolada

kwatildeni Quando arsquotia Ateia (verbo atear)

239

i pursquoha Empurrar

epursquohej Eu empurrei

pursquoha Empurrar rsquofoti Forte

rsquofosa Forccedila

rsquohapu Raacutepido

ku rsquopɛ Com o peacute

eki pursquohe Eu que empurrei

sirsquonɛlu Chinelo

i pursquohan Empurrando

sɔrsquose Soacute vocecirc

rsquotapursquohanu Taacute empurrando

sɔrsquozi Sozinho

rsquohatildeka Arrancar

rsquosɔhatildersquoka Soacute arrancar

jrsquoahatildersquoke Jaacute arranquei

arsquohatildekui rsquoʃada Arranco com a enxada

rsquopuʃa Puxar cabelo pursquoʃo Puxou pursquoʃe Puxei haʃrsquoto Arrastou haʃrsquote Arrastei

tʃirsquoa Tirar

buʃrsquoca Buscar buʃrsquoke Busquei (eu passado) rsquooto Outra rsquohopa Roupa rsquomemo Mesmo rsquodeʃa Deixa

tirsquoe Tirei

rsquosɛtu Certo

rsquohejtu Jeito iskujrsquoe Escolher rsquotakujrsquoenu Taacute escolhendo ojrsquoan Olhando

tʃumi Sumiu

dimursquoranu Demorando kersquoma Queimar ursquozotu Os outros kersquome Queimei

rsquonɔj Noacutes

rsquopejsi Peixe

Ku rsquome Comer

240

pɾicirsquoza Precisar pɾisirsquozanu Precisando korsquoseɾa Coceira mirsquoƷatilden Mijando atildersquodatildenu Andando

barsquote nu Batendo

i rsquoʃima Encima

rsquokatildem Cama atirsquoɾo Atirou

rsquohaʃarsquole Racha lenha

vɔrsquota Voltar

tursquomatilden Tomando

varsquoɾi Varinha

gɾitrsquoatilden Gritando

fɾɛrsquoga Esfregar

mirsquodi Medir

mi rsquotinu Mentindo

rsquokɔʃka Coacutecega

barsquosi u Baixinho

pɔdirsquoze Pode dizer

pe rsquota Pentear

rsquobatildej Banho rsquomaiƷrsquotadi Mais tarde rsquofoja Folha batildenarsquodo Abanador bursquonitu Bonito

rsquosersquokirsquode Vocecirc que deu

siparsquoradu Separado rsquosatildew Chatildeo

tursquodi Tudinho

karsquoe Cair kersquobɾe Quebrei arsquohatildejorsquose Arranho vocecirc rsquomuja Molha rsquosevi Serve rsquopaj Palha pirsquodi Pedir dersquosa Deixar rsquomoj Molho fɾersquovenu Fervendo pursquolo Pulou

norsquovi Novinho

241

firsquodido Fedido mursquolada Amolada

rsquonɔʃi Nosso

patildersquoneɾu Paneiro motildersquodeli Matildeo dele dursquozotu Dos outros

rsquonɔj Noacutes

rsquopodi Podre firsquodid Fedido dersquota Deitar dersquotadu Deitado cuʃtursquoɾa Costurar

barsquote m Batendo

dersquosa Deixar

rsquofɾɛʃa ~rsquofɾEʃ Flecha

iskersquosidu Esquecido

tatildersquome j Tambeacutem

abersquoli Abelhinha

me rsquodu i Amendoim

pɔrsquodirsquoze Pode dizer

rsquoavi Aacutervore

rsquopesi Peixe

tatursquozi Tatuzinho

rsquovɛja Velha

arsquodea Aldeia

rsquode tu Dentro

rsquohe ti Gente

rsquohadu Raacutedio rsquohejtu Jeito iʃtɾarsquogadu Estragado

rsquode tirsquokaza Dentro de casa

rsquopoku Porco

pihu rsquotatildenu Perguntando

gwahrsquode Guardei firsquogeɾa Figueira

kɔrsquota Cortar

ojrsquoa Olhar

pi dursquoɾa pendurar

mitʃursquoɾa Misturar

rsquofɔtʃi Forte

242

matildersquodƷɔka Mandioca

birsquoƷu Beiju

marsquoɾɛlu Amarelo

atildersquozɔ Anzol

rsquopɛda Pedra

Page 4: MARCAÇÃO NO CONTATO LINGUÍSTICO: O português falado … · Transcrição Transcrição fonética Transcrição fonológica [ ] / / Vogais Vogal médio-baixa anterior [ɛ] Vogal

For from him and through him and to him are all things To him be glory forever Amen

Romans 1136

AGRADECIMENTOS

A Deus por me capacitar e me fazer sentir o teu zelo cuidado e proteccedilatildeo

constantemente

Aos meus familiares em especial a minha matildee e o meu pai pelo suporte

coragem e exemplos a mim transmitidos

A minha esposa Jane pelo carinho e compreensatildeo pelas horas que natildeo

pude estar ao seu lado dedicando-me a este trabalho

Aos meus filhos Breno e Estela meu tesouros por me fazerem acreditar

que o mundo pode ser melhor

A minha orientadora Stella Telles pelo carinho compreensatildeo

engajamento e ensino por me fazer acreditar que podemos ser altruiacutestas sem

perdermos a essecircncia da humildade Por compartilhar-me com despreendemento

os seus dados

Agraves coordenadoras do PG-Letras Evandra Gligoletto e Fabiele Stockmans

pela presteza sempre que necessaacuterio

Aos meus mestres do Doutorado pelo trabalho que foi realizado durante o

curso em especial Stella Telles Marlos Pessoa Claacuteudia Roberta Siane Goes

Benedito Bezerra Virgiacutenia Leal Alberto Poza e Nelly Carvalho

Aos professores do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo (UFPE)

Flaacutevio Brainer Artur Gomes Maacutercia Mendonccedila e Joatildeo Batista pela colaboraccedilatildeo

na trajetoacuteria acadecircmica

A Abuecircndia Padilha e Gilda Lins (in memoriam) pela dedicaccedilatildeo e carinho

que demonstraram durante as aulas

Aos meus colegas do Doutorado Solange Carvalho Ana Cristina Cleber

Morgana Jaciara Carolina Pires Juliane Acircngela Socircnia Ismar Rinalda Ludimila

e Clara por me ajudarem nos momentos de dificuldades e de (muitas)

necessidades

Aos colegas da GER ndash Vale do Capibaribe pela ajuda sempre que

necessaacuterio em especial Marta Morgana Edjane e Janecleide

Aos colegas e alunos do IFAL (Instituto Federal de Alagoas) pela grande

ajuda e carinho que demonstraram durante a realizaccedilatildeo deste trabalho Pela

compreensatildeo das faltas e substituiccedilotildees que de mim foram demandadas

Aos membros da banca que tatildeo gentilmente aceitaram o convite

Aos meus amigos familiares entes queridos todos que direta ou

diretamente me ajudaram nesta caminhada Nenhum trabalho eacute feito sozinho

portanto os meacuteritos tambeacutem satildeo de vocecircs

RESUMO

O presente trabalho eacute o resultado de um estudo sobre a Marcaccedilatildeo no Contato

Linguiacutestico entre o Latundecirc e o Portuguecircs Trata-se de uma investigaccedilatildeo com

base na abordagem tipoloacutegica da linguiacutestica visando agrave elucidaccedilatildeo das unidades

mais e as menos marcadas que satildeo ou natildeo transferidas no processo de

acomodaccedilatildeo dos inventaacuterios foneacuteticos de ambas as liacutenguas Utilizamos como

base os pressupostos teoacutericos defendidos por CROFT (1990) JAKOBSON

(1953) BATTISTELLA (1996) MATRAS amp ELSIK (2006) e LACY (2006) para a

descriccedilatildeo dos universais linguiacutesticos e da marcaccedilatildeo No que tange ao contato

linguiacutestico nos respaldamos nas reflexotildees de ROMAINE (2000) THOMASON

(2001) AIKHENVALD (2007) e HYMES (1971) Para descriccedilatildeo linguiacutestica e

histoacuterica dos Latundecirc nos baseamos em TELLES (2002) ANOMBY (2009) e

PRICE (1977) No que tange ao aporte foneacutetico para descriccedilatildeo do contato entre

ambas as liacutenguas nos valemos dos escritos de WEINREICH (1953) BISOL

(1996) VAN COETSEM (1988) e MATRAS (2009) Quanto agraves anaacutelises nos

fundamentamos nas observaccedilotildees de SPENCER (1996) LASS (2000) e RICE

(2007) O nosso corpus eacute formado de trinta horas de fala transcritas

foneticamente de acordo com IPA de vinte informantes da comunidade Latundecirc

Os dados fazem parte do acervo do NEI (Nuacutecleo de Estudos Indigenistas) da

UFPE A partir da nossa pesquisa chegamos agrave conclusatildeo que os mais jovens

tendem a natildeo transferir os padrotildees mais marcados da sua liacutengua para a liacutengua

adquirida enquanto os mais velhos reproduzem com menor frequecircncia os

padrotildees mais marcados do Portuguecircs alguns contextos licenciam enquanto

outros bloqueiam a marcaccedilatildeo gerando um caraacuteter variaacutevel que demonstra o quatildeo

conflitante eacute a situaccedilatildeo do contato embora natildeo haja uma padronizaccedilatildeo no que

tange agrave estrutura silaacutebica o padratildeo CV eacute o mais recorrente e menos marcado

corroborando o que apregoa os pressupostos da tipologia linguiacutestica os

processos que envolvem perda e permuta de segmentos satildeo mais numerosos e

mais marcados dos que os que envolvem ganho de segmento os fonemas natildeo

presentes no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc tendem a ser apagados ou

reinterpretados pelo segmento mais proacuteximo do Portuguecircs quanto agrave manutenccedilatildeo

ou perda o comportamento dos traccedilos mais marcados do Latundecirc depende natildeo

categoricamente da fonologia do Portuguecircs a marcaccedilatildeo natildeo estaacute condicionada

apenas aos universais linguiacutesticos mas agraves especificidades da liacutengua

PALAVRAS-CHAVE Fonologia Liacutenguas em Contato Marcaccedilatildeo e Liacutenguas

Indiacutegenas

ABSTRACT

The present work describes phenomena of phonological transference of Latundecirc

a Brazilian indigenous language in Portuguese in language contact situation The

observed phenomena were examined under the light of the assumptions of

Linguistic Marking in its typological approach As basis we used CROFT (1990)

JAKOBSON (1953) BATTISTELLA (1996) MATRAS ELSIK (2006) and LACY

(2006) studies for the description of linguistic universals and marking About

language contact we were supported by the reflections of ROMAINE (2000)

THOMASON (2001) AIKHENVALD (2007) and HYMES (1971) For the linguistic

and historical description of Latundecirc we were based on TELLES (2002)

ANOMBY (2009) and PRICE (1977) About the phonology of Portuguese we were

supported by BISOL (1996) For description of the contact between both

languages we used the writings of WEINREICH (1953) VAN COETSEM (1988)

and MATRAS (2009) The one of phonological phenomena observed was backed

in SPENCER (1996) LASS (2000) and RICE (2007) Our corpus is formed of thirty

hours of talk phonetically transcribed according to IPA In the survey we used the

speech production of 20 individuals from the Ladundecirc people among these 8

belonging to the pre-contact generation with the non- indigenous society and 12

belonging to the post-contact generation The data are part of the acquis of NEI

(Nuacutecleo de Estudos Indiacutegenas) of UFPE With our research we came to the

following results post-contact generation tends not to transfer most marked

patterns of their language to the acquired language while the native of pre-contact

generation do in a lower frequency the more marked standards of Portuguese

The processes that involve loss and exchange of segments are more numerous

than those involving segment gain The phonemes of Portuguese that do not exist

in Latundecirc tend to be erased or reinterpreted by the closest segment to

Portuguese resulting in the loss of contrast and in the emergence of the

unmarked through the phonological neutralisation There are phenomena that

show a tendency towards the universal as the deletion of the coda in favor of CV

standard syllabic and others that are arising out of restrictions of Latundecirc as the

monophthongization of nasal diphthong and the change of vowel quality in word-

final position In the set of phenomena we noticed that the interference is variable

and not always motivated by phonological or natural marking

KEYWORDS Phonology Marking Languages in contact Portuguese and

Latundecirc

RESUMEN

El presente estudio describe los fenoacutemenos de la transferencia fonoloacutegica del

Latundeacute una lengua indiacutegena Brasilera en el portugueacutes en una situacioacuten de

contacto linguumliacutestico Los fenoacutemenos observados fueron examinados a la luz de los

presupuestos de marcacioacuten linguumliacutestica en su abordaje tipoloacutegico Como modelo

de fundamentacioacuten se han utilizado los estudios de CROFT (1990) JAKOBSON

(1953) BATTISTELLA (1996) MATRAS amp ELSIK (2006) y LACY (2006) para las

descripcioacuten de los universales linguumliacutesticos y de la marcacioacuten Sobre el contacto

linguumliacutestico fueron tomados como soporte cientiacutefico las reflexiones de ROMAINE

(2000) THOMASON (2001) AIKHENVALD (2007) y HYMES (1971) Para la

descripcioacuten linguumliacutestica de los Lantundeacute esta investigacioacuten se basoacute en TELLES

(2002) ANOMBY (2009)y PRICE (1977) Sobre la fonologiacutea del portugueacutes se

tuvieron en cuenta los estudios de BISOL (1996) Para la descripcioacuten del contacto

entre ambas lenguas fueron necesarios los escritos de WEINREICH (1053) VAN

COETSEM(1988) y MATRAS (2009) Finalmente el estudio de los fenoacutemenos

fonoloacutegicos observados fueron abordados en las investigaciones de SPENCER

(1996) LASS (2000) y RICE (2007) El corpus de este trabajo acadeacutemico estaacute

compuesto por treinta horas de diaacutelogos transcritos foneacuteticamente de acuerdo con

el IPA En la investigacioacuten se ha utilizado la produccioacuten del diaacutelogo de 20

individuos del pueblo Latundeacute dentro de ellos 8 pertenecientes a la generacioacuten

del pre contacto con la sociedad no indiacutegena y 12 pertenecientes a la generacioacuten

del post contacto Los datos hacen parte del acervo del Nuacutecleo de Estudios

Indigenistas (NEI) de la UFPE Con esta investigacioacuten se ha llegado a la siguiente

conclusioacuten La generacioacuten post contacto tiende a no transferir los patrones maacutes

acentuados de su lengua hacia la lengua adquirida mientras que los indiacutegenas de

la generacioacuten del pre contacto realizan con menor frecuencia los patrones maacutes

marcados del portugueacutes Los procesos que envuelven la peacuterdida y permuta de los

segmentos son maacutes numerosos de aquellos que involucran la ganancia del

segmento Los fonemas del portugueacutes que no existen en el Latundeacute tienden a ser

borrados o reinterpretados por el segmento maacutes proacuteximo al portugueacutes resultando

en una peacuterdida de contraste y en la emergencia del no marcado a traveacutes de la

neutralizacioacuten fonoloacutegica Hay fenoacutemenos que revelan una tendencia a lo

universal como desvanecimiento de la coda en a favor de patroacuten silaacutebico CV y

otros que son consecuencia de las restricciones del Latundeacute como la

monoptongacioacuten de diptongo nasal y la mudanza de la cualidad vocaacutelica en

posicioacuten final de la palabra El en conjunto de fenoacutemenos verificamos que la

interferencia es variable y no siempre estaacute motivada por la acentuacioacuten fonoloacutegica

o natural

Palabras Clave Fonologiacutea Acentuacioacuten Lenguas en Contacto Portugueacutes y

Latundeacute

LISTA DE SIacuteMBOLOS

Transcriccedilatildeo

Transcriccedilatildeo foneacutetica

Transcriccedilatildeo fonoloacutegica

[ ]

Vogais

Vogal meacutedio-baixa anterior [ɛ]

Vogal meacutedio-alta anterior [e]

Vogal alta anterior [i]

Vogal baixa central [a]

Vogal meacutedio-baixa posterior [ɔ]

Vogal meacutedio-alta posterior [o]

Vogal alta posterior [u]

Vogal alta anterior nasal [ i ]

Vogal meacutedio-alta anterior nasal [e ]

Vogal baixa central nasal [atilde]

Vogal meacutedio-alta posterior nasal [otilde]

Vogal alta posterior nasal [u ]

Consoantes

Oclusiva alveolar surda [t]

Oclusiva alveolar sonora [d]

Fricativa alveolar surda [s]

Fricativa alveolar sonora [z]

Nasal alveolar [n]

Lateral alveolar [l]

Africada alveopalatal surda [tʃ]

Africada alveopalatal sonora [dʒ]

Lateral palatal [ʎ]

Nasal palatal [ɳ]

Fricativa palatal surda [ʃ]

Fricativa palatal sonora [ʒ]

Oclusiva velar surda [k]

Oclusiva velar sonora [g]

Fricativa velar [x]

Oclusiva bilabial surda [p]

Oclusiva bilabial sonora [b]

Nasal bilabial [m]

Fricativa labiodental surda [f]

Fricativa labiodental sonora [v]

LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 Diagrama de Hall

67

FIGURA 2 Configuraccedilotildees da Mescla Linguiacutestica segundo Romaine (2000 p185)

71

FIGURA 3 Esquema de representaccedilatildeo do bilinguismo social segundo Appel e Muysken (1986 p 23)

74

FIGURA 4 Escolha de liacutengua e code-switching conforme Grosjean (1982 p127)

82

FIGURA 5 Classificaccedilatildeo das liacutenguas da Famiacutelia Nambikwaacutera de acordo com Rodrigues (1986 p 134)

87

FIGURA 6 Localizaccedilatildeo e aacuterea dos Nambikwaacutera de acordo com Roquete-Pinto (1919)

88

FIGURA 7 Territoacuterio Nambikwaacutera descrito por Price (1983)

89

FIGURA 8 Localizaccedilatildeo atual dos Nambikwaacutera

91

FIGURA 9

Localizaccedilatildeo da TI Tubaratildeo-Latundecirc

94

FIGURA 10

Primeiros contatos com os Latundecirc (Foto Price 1977)

97

FIGURA 11 Iacutendios Latundecirc na TI Tubaratildeo-Latundecirc

104

FIGURA 12

Ligaccedilotildees entre a intensidade do bilinguismo o tipo de processo de acomodaccedilatildeo e sobreposiccedilatildeo entre os sistemas fonoloacutegicos

118

FIGURA 13

Correspondecircncia entre liacutenguas e contato linguiacutestico

120

FIGURA 14 Agentividade da Liacutengua Recipiente de acordo Van Coetsem 1988 p10

122

FIGURA 15 Agentividade da Liacutengua de Origem de acordo Van Coetsem 1988 p11

122

FIGURA 16 Relaccedilatildeo de agentividade entre o Portuguecircs e o Latundecirc

123

FIGURA 17 Estrutura silaacutebica do Latundecirc

168

FIGURA 18 Estrutura silaacutebica do Portuguecircs (Cacircmara-Juacutenior)

169

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Unidades e estruturas mais marcadas conforme

levantamento de Moreira da Silva (2011)

50

Quadro 2 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Leacutevi-Strauss (1948)

92

Quadro 3 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Price e Cook (1969)

93

Quadro 4 Distribuiccedilatildeo dos povos pertencentes a TI Tubaratildeo-Latundecirc

95

Quadro 5 Nuacutecleos familiares de acordo com a habitaccedilatildeo em 1999

98

Quadro 6 Situaccedilatildeo sociolinguiacutestica dos Latundecirc (dados de 1999)

101

Quadro 7 Quadro Comparativo dos Sistemas Foneacuteticos do Romansh e do Schweizerdeutsch de acordo com Weinreich (1953)

111

Quadro 8 Tipos de processos que conduzem a mudanccedila fonoloacutegica induzida por contato

116

Quadro 9 Fonemas consonantais do Latundecirc

125

Quadro 10 Fonemas vocaacutelicos do Latundecirc

125

Quadro 11 Ditongos do Latundecirc

126

Quadro 12 Descriccedilatildeo dos fonemas consonantais (Retirada de Telles 2002)

126

Quadro 13 Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos orais (Com base em Telles 2002)

149

Quadro 14

Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos nasais (Com base em Telles 2002)

153

Quadro 15

Vogais no Portuguecircs (Cacircmara Jr 1970)

154

Quadro 16

Consoantes no Portuguecircs (Silva 2002)

155

Quadro 17 Sistemas consonantais x Sistemas vocaacutelicos

156

Quadro 18 Resultado mais frequente do processo de monotongaccedilatildeo em Latundecirc

162

Quadro 19 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Latundecirc

166

Quadro 20 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Portuguecircs

167

Quadro 21 Escala de Sonoridade (Bonet e Mascaroacute 1997 p 109)

196

SUMAacuteRIO

1 SOBRE A PESQUISA 20

11 INTRODUCcedilAtildeO 20

12 JUSTIFICATIVA 24

13 OBJETIVOS 25

14 METODOLOGIA 26

15

DISPOSICcedilAtildeO DA TESE 27

2 MARCACcedilAtildeO LINGUIacuteSTICA 29

21 INTRODUCcedilAtildeO 29

22 MARCACcedilAtildeO 31

221 A concepccedilatildeo de Jakobson e Trubetzkoy 35

222 Abordagem Gerativa 37

223 Abordagem Tipoloacutegica (Interlinguiacutestica) 39

224 Abordagem Naturalista (Morfologia Natural) 41

23 CRITEacuteRIOS DE MARCACcedilAtildeO 42

24 MARCACcedilAtildeO MUDANCcedilA E CONTATO LINGUIacuteSTICO 45

25 JAKOBSON E A ABORDAGEM FONOLOacuteGICA DA

MARCACcedilAtildeO

48

3 O CONTATO LINGUIacuteSTICO 54

31 INTRODUCcedilAtildeO 54

32 SOBRE O CONTATO LINGUIacuteSTICO 57

33 MESCLAS DE CONTATO PIDGIN CRIOULO LIacuteNGUA

FRANCA E JARGAtildeO

60

331 Pidgin 63

332 Crioulo 65

333 Liacutengua Franca ou Sapir 69

334 Jargatildeo 71

34 IMPLICACcedilOtildeES DO CONTATO LINGUIacuteSTICO 72

341 Bilinguismo 72

342 Diglossia 78

343 Alternacircncia de coacutedigo 80

344 Morte da liacutengua

83

4 COMUNIDADE DE ESTUDO OS LATUNDEcirc 86

41 INTRODUCcedilAtildeO 86

42 A FAMIacuteLIA NAMBIKWARA 86

43 OS LATUNDEcirc

94

5 INTERFEREcircNCIA FONEacuteTICO-FONOLOacuteGICA DO LATUNDEcirc

NO PORTUGUEcircS

106

51 INTRODUCcedilAtildeO 106

52 INTERFEREcircNCIA FUSAtildeO COEXISTEcircNCIA E

TRANSFEREcircNCIA LINGUIacuteSTICA

107

53 FONOLOGIA DO LATUNDEcirc 124

54 FONOLOGIA DO PORTUGUEcircS 154

55 COMPARACcedilAtildeO ENTRE OS SISTEMAS FONEacuteTICOS DO

PORTUGUEcircS E DO LATUNDEcirc

156

6 PROCESSOS FONOLOacuteGICOS DO PORTUGUEcircS FALADO

PELOS LATUNDEcirc

158

61 Introduccedilatildeo 158

611 Perda de elementos 161

6111 Monotongaccedilatildeo 161

6112 Siacutencope em onset complexo de l e r 168

6113 Apagamento da coda 171

6114 Reduccedilatildeo do geruacutendio ndash Anteriorizaccedilatildeo da vogal final 173

6115 Reduccedilatildeo das palatais (nasal e lateral) 174

6116 Afeacuterese 177

6117 Apoacutecope 178

6118 Siacutencope 180

612 Ganho de elementos (Inserccedilatildeo de elementos) 181

613 Alteraccedilatildeo de elementos (permuta ou transposiccedilatildeo) 184

6131 Despalatalizaccedilatildeo de [ʃ] e [ʒ] 184

6132 Palatalizaccedilatildeo 186

6133 Vozeamento e desvozeamento 189

6134 Abaixamento e elevaccedilatildeo das vogais orais 191

6135 Nasalizaccedilatildeo e desnasalizaccedilatildeo 194

6136 Fenocircmenos envolvendo os roacuteticos 195

6137 Labializaccedilatildeo e deslabializaccedilatildeo 197

6138 Metaacutetese 198

6139 Siacutestole 199

61310 Fortalecimento

200

7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

201

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS

208

ANEXOS 221

20

1 SOBRE A PESQUISA

O estudo dessas liacutenguas eacute evidentemente de grande importacircncia para o incremento dos conhecimentos linguiacutesticos Cada nova liacutengua que se investiga traz novas contribuiccedilotildees agrave linguiacutestica cada nova liacutengua eacute outra manifestaccedilatildeo de como se pode realizar a linguagem

humana Cacircmara Jr (1977 p 4)

11 INTRODUCcedilAtildeO

Neste capiacutetulo discorreremos sobre a diversidade e a situaccedilatildeo das liacutenguas

indiacutegenas brasileiras1 bem como a motivaccedilatildeo para o presente estudo Tambeacutem

faratildeo parte desta introduccedilatildeo a justificativa para a realizaccedilatildeo desta pesquisa os

objetivos almejados os procedimentos metodoloacutegicos e a descriccedilatildeo da estrutura

da tese

Por se tratar de um estudo que diz respeito agrave linguiacutestica indigenista brasileira vale

iniciar a discussatildeo situando aqueles que satildeo os sujeitos da nossa pesquisa os

iacutendios Sabe-se que os povos indiacutegenas satildeo vistos geralmente como personagens

passivos na da nossa histoacuteria Eacute um equiacutevoco concebecirc-los na nossa narrativa

dessa forma pois seja no papel de aliados ou de inimigos esses povos tiveram

um papel importante na formaccedilatildeo de sociedades coloniais e poacutes-coloniais

(ALMEIDA 2013 p9)

1 Aleacutem do portuguecircs haacute no Brasil aproximadamente 180 liacutenguas indiacutegenas faladas por 225 etnias

Dessas liacutenguas 110 satildeo consideradas em extinccedilatildeo pelo fato de serem faladas por menos de 500 pessoas Estima-se que em 1500 cerca de seis milhotildees de iacutendios falavam 1078 idiomas Hoje a populaccedilatildeo indiacutegena brasileira chega a no maacuteximo entre 440 mil e 500 mil indiviacuteduos Atribui-se o desaparecimento das liacutenguas indiacutegenas agraves pressotildees poliacuteticas do colonizador e posteriormente agraves necessidades de sobrevivecircncia das populaccedilotildees indiacutegenas Revista Liacutengua portuguesa n 26 p 57 2010

21

Embora natildeo seja amplamente divulgado no Brasil haacute cerca de 180 liacutenguas

indiacutegenas o que nos torna um paiacutes plurilinguiacutestico Esse percentual era de 1200

antes da chegada dos portugueses Durante esses cinco seacuteculos de colonizaccedilatildeo

um glotociacutedio foi visto intensificamente no nosso territoacuterio

Mesmo sendo viacutetimas de um processo de colonizaccedilatildeo desenfreado e

escravizador estes povos com o tempo passaram a ser reconhecidos como

agentes na sociedade Suas accedilotildees satildeo vistas a partir de um recente periacuteodo

histoacuterico como importantes para explicar a histoacuteria deles e consequentemente a

nossa Saindo de um quadro de contato onde eram vistos como coadjuvantes

passando a ser tambeacutem protagonistas

Hoje os estudos indigenistas satildeo mais frequentes uma vez que na antropologia

atual os povos que foram definidos como aculturados passaram a ser

coadjuvantes de um processo histoacuterico e participativo

A reportagem da Revista Continente Maio de 2009 sobre os Fulniocirc faz parte de

um arsenal que descreve o que jaacute eacute sabido pela comunidade cientiacutefica as liacutenguas

indiacutegenas brasileiras estatildeo desaparecendo em ritmo acelerado Posto dessa

forma podemos perceber que haacute urgecircncia em descrever como tais liacutenguas se

comportam em si e em contatos com outras

Cacircmara-Juacutenior (1977 p 7) postula que os estudos indigenistas mais

precisamente sobre os de suas liacutenguas constitui no Brasil uma tarefa natildeo

somente enorme mas tambeacutem urgente Hoje meio seacuteculo depois esta citaccedilatildeo se

faz atual Os estudos indigenistas ainda se monstram tiacutemidos e carentes de

recursos e pesquisadores

22

Em continuidade o autor afirma que

Jaacute desapareceram no Brasil muitas liacutenguas agora totalmente irrecuperaacuteveis para a ciecircncia Eacute muito difiacutecil avaliar hoje em dia quantas liacutenguas se teriam falado no Brasil haacute 400 anos na eacutepoca do descobrimento do paiacutes pelos europeus Mas a quantidade de liacutenguas que subsistem ainda hoje () eacute ainda um nuacutemero consideraacutevel ndash cento e tantas Todas elas entretanto estatildeo ameaccediladas de desaparecer dentro de muitos poucos anos

O fato eacute que precisamos catalogar essas liacutenguas e como elas agem durante o

contato linguiacutestico Esses estudos satildeo de grande valia porque podem mostrar

como se deu analogicamente o contato do portuguecircs com outras liacutenguas E as

evidecircncias aqui encontradas contribuiratildeo para a descriccedilatildeo linguiacutestica aleacutem de

proporcionar agraves geraccedilotildees futuras o conhecimento mais apurado sobre as liacutenguas

de contato

Sobre esta relaccedilatildeo Almeida (idem p 14) afirma que

[] As relaccedilotildees de contato com sociedades envolventes e vaacuterios processos de mudanccedila cultural vivenciados pelos grupos indiacutegenas eram considerados simples relaccedilotildees de dominaccedilatildeo impostas aos iacutendios de tal forma que natildeo lhes restava nenhuma margem de manobra a natildeo ser a submissatildeo passiva a um processo de mudanccedilas culturais que os levaria a serem assimilados e confundidos com a massa da populaccedilatildeo

A autora ainda reitera que ldquoas relaccedilotildees de contato eram entatildeo grosso modo

vistas como relaccedilotildees de dominaccedilatildeo submissatildeo na qual uma cultura se impunha

sobre a outra anulando-ardquo p16

23

O contato entre liacutenguas contribuiu para o leacutexico portuguecircs2 E eacute o contato

linguiacutestico um dos fatores que coloca o iacutendio em situaccedilatildeo ativa na histoacuteria do

Brasil mesmo apoacutes o decreto do Marquecircs de Pombal3

Todavia assim como ocorrera com os negros eacute possiacutevel que o contato com

iacutendios possa ter influenciado outros niacuteveis da nossa gramaacutetica 4

Seki (1995 p 33) ao discutir sobre a situaccedilatildeo das liacutenguas indiacutegenas brasileiras

diz que

Essas estimativas devem ser ainda consideradas com certa cautela pois as liacutenguas indiacutegenas encontram-se sob as mais diferentes pressotildees sofrendo o impacto do crescente contato com a populaccedilatildeo envolvente e a liacutengua majoritaacuteria Contudo natildeo haacute em geral levantamentos que permitam estabelecer com maior margem de exatidatildeo os reflexos do impacto do Portuguecircs nos distintos grupos em termos de deslocamento de liacutengua indiacutegena tanto no que se refere a graus de bilinguismo monolinguismo quanto no que se refere agrave interferecircncia do Portuguecircs nessas liacutenguas nem sempre claramente perceptiacutevel nas fases iniciais mas que vai aos poucos contribuindo para a perda da liacutengua minoritaacuteria

2 Citamos aqui como exemplos o caso dos grupos de palavras oriundos de outros povos que

foram acoplados ao nosso leacutexico como indianismos e africanismos 3 Para estabelecer uma comunicaccedilatildeo com os nativos os portugueses foram aprendendo os

dialetos e idiomas indiacutegenas A partir do tupinambaacute falado pelos grupos mais abertos ao contato com os colonizadores criou-se uma liacutengua geral comum a iacutendios e natildeo-iacutendios O crescente nuacutemero de falantes do portuguecircs comeccedila a tornar o bilinguumlismo das famiacutelias portuguesas no paiacutes cada vez menor Em 17 de agosto de 1758 a liacutengua portuguesa se torna idioma oficial do Brasil atraveacutes de um decreto do Marquecircs de Pombal que tambeacutem proiacutebe o uso da liacutengua geral Disponiacutevel em httpwwwcomcienciabrreportagenslinguagemling03htm em 18122014 4 Alguns estudiosos afirmam que as influecircncias natildeo se restringiram apenas ao vocabulaacuterio

Jacques Raimundo em O Elemento Afro-Negro na Liacutengua Portuguesa aponta algumas mudanccedilas foneacuteticas iniciadas na fala dos escravos que ainda se mantecircm em algumas variedades do portuguecircs do Brasil as vogais meacutedias pretocircnicas e e o passam a ser pronunciadas como vogais altas respectivamente i e u (mininu nuticcedila) as vogais tocircnicas de palavras oxiacutetonas terminadas em s mesmo as grafadas com z se tornam ditongos (atrais mecircis vecircis) a marca de terceira pessoa do plural nos verbos do preteacuterito perfeito se reduz a o (fizero caiacutero tocaro)Em 1822 Jeroacutenimo Soares Barbosa registrava em sua Grammatica Philosophica uma peculiaridade sintaacutetica originada na fala dos escravos que ateacute hoje eacute apontada como uma das distinccedilotildees entre o portuguecircs falado em Portugal e o que se fala no Brasil a colocaccedilatildeo de pronomes aacutetonos antes dos verbos (mi deu ti falocirc) Disponiacutevel em httpwwwcomcienciabrreportagenslinguagemling03htm em 18122014

24

Embora a preocupaccedilatildeo da maioria dos estudiosos de liacutenguas indiacutegenas seja com

as liacutenguas minoritaacuterias esta pesquisa trafega no sentido contraacuterio ao buscar

descrever a influecircncia dessas liacutenguas tidas como fraacutegeis no indioma nacional

Vale ressaltar que mesmo em territoacuterio nacional o portuguecircs aqui eacute tido como

segunda liacutengua

12 JUSTIFICATIVA

O contato linguiacutestico e suas consequecircncias se datildeo em todas as liacutenguas do

mundo No entanto no que tange ao desaparecimento de liacutenguas o prejuiacutezo eacute

maior uma vez que a natildeo catalogaccedilatildeo dessas liacutenguas geraria um deacuteficit linguiacutestico

que poderia prejudicar os estudos linguiacutesticos vigentes e futuros aleacutem dos

problemas humanos advindos do processo de aculturaccedilatildeo entre povos

Ao corroborar com esta acertiva Telles (2009 p25) afirma que

Quando um povo perde uma liacutengua tambeacutem perde diversidade humana perdem-se meios de compreensatildeo e explicaccedilatildeo do mundo perdem-se soluccedilotildees de adaptalidade do homem ao meio perde-se o conhecimento do potencial e do usufruto sustentaacutevel deste meio Enfim perdem-se conhecimentos fundamentais que venham a coloborar para a continuidade da sobrevivecircncia do homem no planeta

O estudo de uma liacutengua diferente da nossa pode nos dar a impressatildeo de que

vamos encontrar algo distante da nossa realidade O que natildeo eacute verdade visto

que as semelhanccedilas linguiacutesticas satildeo em maior nuacutemero Cacircmara-Juacutenior (1977

p18)

25

Antes da perda total de uma liacutengua que pode ser assim configurado ou natildeo o

processo inicial se daacute pelo contato entre elas Soacute depois de existirem lado a lado

eacute que tais liacutenguas podem a depender da dinacircmica se fundirem desaparecerem

ou conviverem entre si

No caso do relacionamento entre o Latundecirc e o Portuguecircs percebe-se que tal

contato caminha para o desparecimento do Latundecirc dado as circunstacircncias

histoacutericas e sociais pelas quais esta liacutengua tem passado Hoje este povo eacute

composto de 20 falantes dispersos Como os mais novos natildeo podem coabitar

entre si a continuidade da etnia estaacute com os dias marcados Logo torna-se

urgente as tentativas de descriccedilatildeo da liacutengua e de seu comportamento

Analisar e descrever o contato com base nos padrotildees de marcaccedilatildeo e simetria

contribuiraacute com o princiacutepio de naturalidade que eacute pre-requesito para a tipologia

linguiacutestica No mais as investigaccedilotildees sobre o contato linguiacutestico satildeo de grande

valia para o conhecimento mais apurado das liacutenguas do mundo e da nossa liacutengua

especificamente

13 OBJETIVOS

Esta pesquisa objetiva o estudo da interferecircncia foneacutetica do Latundecirc no

Portuguecircs levando em consideraccedilatildeo o papel da marcaccedilatildeo no contato linguiacutestico

entre estas liacutenguas Tambeacutem busca refletir sobre os processos foneacuteticos oriundos

do contato e como eles se evidenciam a partir das liacutenguas em xeque

26

No decorrer da tese aleacutem dos objetivos postos aqui buscaremos responder as

questotildees postuladas

Investigar se os fatores internos (linguiacutesticos) e externos (estruturais)

interagem com os princiacutepios da marcaccedilatildeo

Identificar qual o papel da marcaccedilatildeo no contato linguiacutestico

Verificar se e quais os traccedilos mais marcados da liacutengua dominada passam

para a dominante

Dessa forma ao refletirmos sobre as questotildees acima esperamos contribuir com

os estudos dos universais linguiacutesticos e da cogniccedilatildeo humana

14 METODOLOGIA

O corpus utilizado nesta pesquisa foi coletado pela professora Stella Virgiacutenia

Telles e faz parte do NEI ndash Nuacutecleo de Estudos Indigenistas ndash da Universidade

Federal de Pernambuco Os dados foram gravados em CDrsquos em formato wave e

estruturados em forma de perguntas e respostas DID ndash Diaacutelogo entre

entrevistador e entrevistado

Foram escutados aproximadamente 30 horas de gravaccedilatildeo de fala dos 20

informantes Latundecirc Incialmente analisamos de oitiva os dados que foram

depois transcritos foneticamente com base no Alfabeto Foneacutetico Internacional -

IPA e organizados em tabelas Apoacutes segunda anaacutelise em caso de duacutevidas os

dados foram submetidos ao programa PRAAT para melhor audiccedilatildeo No que tange

27

agrave anaacutelise os dados foram disponibilizados em tabelas e enumerados com os

respectivos comentaacuterios abaixo

15 DISPOSICcedilAtildeO DA TESE

Para este estudo utilizamos os pressupostos cientiacuteficos da tipolologia linguiacutestica

de base aleacutem de autores que foquem em seus estudos contato interferecircncia

foneacutetica marcaccedilatildeo e naturalidade

No capiacutetulo 1 discorremos sobre os elementos basilares da tese justificativa

objetivos perguntas norteadoras metodologia e disposiccedilatildeo da tese

No capiacutetulo 2 trataremos sobre a marcaccedilatildeo Nele abordaremos o conceito de

marcaccedilatildeo e sua relaccedilatildeo com os princiacutepios de simetria e naturalidade Veremos a

partir do panorama de Matras amp Elsik (2006) Battistella (1996) Lacy (2006) as

abordagens de marcaccedilatildeo estruturalista gerativa tipoloacutegica e naturalista

Na seccedilatildeo 23 discorreremos sobre os criteacuterios de marcaccedilatildeo e na seccedilatildeo 24

sobre a mudanccedila linguiacutestica contato e marcaccedilatildeo Nos deteremos aos estudos de

Jakobson na abordagem fonoloacutegica na seccedilatildeo 25 bem como os universais

linguiacutesticos para a marcaccedilatildeo observados por Moreira da Silva (2011) em

contraponto com os padrotildees mais marcados do Latundecirc

No Capiacutetulo 3 o contato linguiacutestico seraacute nosso escopo Nele discutiremos os tipos

de mesclas de contato pidgin crioulo liacutengua Franca e jargatildeo a partir dos

pressupostos de Tarallo e Alkimin (1987) Calvet (2004) Couto (2001) Hall

28

(1996) Hymes (1971) Romaine (2000) e AiKhenvald e Dixon (2006)

Abordaremos tambeacutem a diglossia conforme Ferguson (1991) a alternacircncia de

coacutedigo de acordo com Auer (1999) Morte de liacutengua segundo Mcmahon (1994)

Trask (2004) e Cristoacutefaro-Silva (2002)

No capiacutetulo 4 apresentaremos a comunidade de estudo os Latundecirc Inicialmente

com base em Rodrigues (1995) Roquete-Pinto (1919) Leacutevi-Strauss (1946) Price

e Cook (1969) Anomby (2009) e Telles (2002) faremos uma descriccedilatildeo dos povos

e famiacutelias indiacutegenas do Brasil e dos Latundecirc especificamente Recapitularemos o

contexto histoacuterico formaccedilatildeo contato com os outros povos indiacutegenas e com os

natildeo iacutendios limites geograacuteficos e situaccedilatildeo atual

No capiacutetulo 5 trataremos da interferecircncia e transferecircncia foneacutetica do Latundecirc

para o Portuguecircs Com base em Cristoacutefaro-Silva (2002) Bisol (1996) Weinreich

(1953) Van Coetesem (1988) e Matras (2009) discutiremos os processos de

interferecircncia fusatildeo coexistecircncia e transferecircncia linguiacutestica Apresentaremos os

aspectos mais relevantes da fonologia Latundecirc e do Portuguecircs

No capiacutetulo 6 faremos as anaacutelises dos processos foneacuteticos presentes no contato

do Latundecirc com o Portuguecircs A partir da perspectiva claacutessica de perda

manutenccedilatildeo ou ganho de elementos discutiremos sobre quais os processos

foneacuteticos mais marcados do Latundecirc permanecem ou natildeo atestados no

Portuguecircs falado por Latundecirc

Por fim chegaremos agraves divagaccedilotildees finais dos resultados configurados na

pesquisa e agrave perspectiva de continuidade do trabalho Nos anexos encontram-se

os dados analisados transcritos foneticamente e dispostos em tabelas

29

2 MARCACcedilAtildeO LINGUIacuteSTICA

A nossa vida eacute mesmo assim Crescemos uns qual aacutervore indivisa levados pela forccedila de um destino retiliacuteneo como as palmeiras crescem

outros com a vida ramificada pelos empuxos ambientes Pretendemos Tentamos Retrocedemos

Afinal caminhamos na diretriz primitivamente escolhida quando o tempo nos concede alcanccedilar crescemos como as lianas5

(ROQUETTE-PINTO 1919 p 37)

21 INTRODUCcedilAtildeO

Eacute fato que o universo eacute regido por leis naturais O que aparentemente demonstra

ser fruto da eventualidade eacute um conjunto de princiacutepios explicaacuteveis que agem de

forma complementar sob as forccedilas centriacutefugas e centriacutepetas Com a liacutengua(gem)

natildeo diferentemente enquanto sistema de relaccedilotildees ela reflete estas

caracteriacutesticas Para Croft (2003 p 25) ela reflete a tensatildeo entre duas tendecircncias

concorrentes - uma em direccedilatildeo agrave regularidade a outra em direccedilatildeo agrave

hierarquizaccedilatildeo

Com o objetivo de melhor compreensatildeo dos pressupostos da tese neste capiacutetulo

nos deteremos agrave compreensatildeo dos conceitos de marcaccedilatildeo assimetria e

naturalidade Oriundos da linguiacutestica de base estes termos estatildeo relacionados

aos universais linguiacutesticos A complexidade destes conceitos por outro lado

apontam para o que eacute individual e para o que eacute geral Tem a ver com o que jaacute

defendia Chomsky ao estabelecer a dicotomia Princiacutepios x Paracircmetros

Obviamente posta a complexidade da liacutengua esses ldquoagentesrdquo da linguagem

5 Espeacutecie de trepadeira que manteacutem sua raiz no solo mas necessita de um suporte para manter-

se ereta e crescer em direccedilatildeo agrave luz

30

estatildeo submetidos tambeacutem aos fatores internos e externos nas liacutenguas do mundo

Logo o que eacute marcado numa liacutengua pode natildeo ser em outra ou podem ocorrer

marcaccedilotildees mais globais

Matras e Elsik (2006 p12) discorrem que

A tarefa da teoria linguiacutestica eacute a nosso ver descrever como essas tendecircncias concorrentes satildeo responsaacuteveis pela formaccedilatildeo de estruturas linguiacutesticas Trata-se de um jogo a niacutevel local de vaacuterios fatores a estrutura e sua funccedilatildeo na comunicaccedilatildeo o membro e o valor que ela representa tanto dentro do paradigma e em um quadro conceitual mais universal a natureza do processo especiacutefico envolvido na formaccedilatildeo a estrutura e a motivaccedilatildeo para aplicar esse processo para o paradigma ou partes dele Esta complexa interaccedilatildeo de fatores nunca eacute preacute-determinada uma vez que diferentes combinaccedilotildees de fatores tornaratildeo resultados diferentes A este respeito tomamos uma visatildeo imparcial do que condiccedilatildeo marcada eacute e se eacute ou natildeo uma estrutura eacute marcado ldquoem comparaccedilatildeo com a outrardquo Em vez disso nosso interesse eacute em explorar padrotildees nos resultados de diferentes combinaccedilotildees de fatores em niacutevel local

A assimetria e a naturalidade efetivamente teriam uma relaccedilatildeo direta com a

marcaccedilatildeo O que eacute assimeacutetrico tende a ser mais marcado e menos natural Por

outro lado o que eacute mais natural tende a ser menos marcado e mais simeacutetrico

Esta eacute uma condiccedilatildeo elementar mas natildeo totalitaacuteria para as liacutenguas do mundo

Para Batistella (1996 p115) haacute um nuacutemero de pesquisadores que sugerem

formas especiacuteficas em que as condiccedilotildees de marcaccedilatildeo desempenham um papel

na descriccedilatildeo na alteraccedilatildeo ou na aquisiccedilatildeo da liacutengua(gem) exercendo uma

funccedilatildeo relevante na definiccedilatildeo da gramaacutetica oacutetima agravequela que eacute o resultado

satisfatoacuterio na teoria da otimalidade6

6 Mesmo natildeo trabalhando diretamente com a teoria da otimalidade nesta tese eacute vaacutelido ressaltar

que os princiacutepios de marcaccedilatildeo simetria e naturalidade fazem parte do arcabouccedilo teoacuterico de seu axioma

31

No que diz respeito agrave fonologia aacuterea da linguiacutestica sob a qual se debruccedila o objeto

de estudo desse trabalho Battistella (1966 p65) observa que condiccedilatildeo marcada

eacute uma propriedade da relaccedilatildeo entre os dois sinais de um paradigma diacriacutetico

que eacute em parte independente da substacircncia linguiacutestica articulaccedilatildeo e percepccedilatildeo e

deve ser definido principalmente como conceitual

No que se refere aos conceitos postos aqui utilizaremos os pressupostos teoacutericos

defendidos por CROFT (1996 2003) JAKOBSON (1953) BATTISTELLA (1996)

MATRAS amp ELSIK (2006) para descriccedilatildeo teoacuterica e abordagem histoacuterica e LACY

(2006) para a descriccedilatildeo dos universais marcados para tratarmos das elucidaccedilotildees

sobre Marcaccedilatildeo Tipoloacutegica (no contato linguiacutestico) e Naturalidade

22 MARCACcedilAtildeO

Battistella (1996 p7) afirma que em muitas aacutereas alguns conceitos apresentam

problemas quanto agrave sua complexidade axioloacutegica Natildeo diferentemente no campo

da linguiacutestica tais discussotildees emblemaacuteticas ainda hoje se fazem presentes Uma

dessas discussotildees gira em torno do conceito de marcaccedilatildeo pois segundo ele

A dicotomia natildeo-marcado versus marcado eacute um dos conceitos-chave tanto a teoria da gramaacutetica gerativa desenvolvida por Noam Chomsky e a teoria da linguiacutestica estrutural desenvolvida por Roman Jakobson Ela tem sido usada em aacutereas da linguiacutestica que vatildeo desde a descritiva e tipoloacutegica ateacute a aplicada e foi emprestado para campos tatildeo diversos como a antropologia arte muacutesica poesia e literatura

O termo que fora introduzido na linguiacutestica na deacutecada de 1920 pelos linguistas

europeus da Escola de Praga cujo significado da condiccedilatildeo marcada natildeo

32

permaneceu constante mesmo dentro de uma uacutenica estrutura intelectual hoje eacute

um marco central na linguiacutestica O conceito de marcaccedilatildeo estaacute relacionado agrave

frequecircncia daquilo que eacute menos comum na liacutengua Logo a relaccedilatildeo deste conceito

se coaduna agrave noccedilatildeo de naturalidade Se um elemento eacute mais natural ele seraacute

menos marcado Se o oposto seraacute mais marcado Deste modo as liacutenguas teriam

uma tendecircncia a optar por padrotildees natildeo marcados

Battistella (2006 p13) expotildee que

A possibilidade de relaccedilotildees universais marcado natildeo-marcado eacute atenuada por outros fatores Um deles eacute a observaccedilatildeo de que a assimetria eacute muitas vezes sensiacutevel ao contexto Isso faz com que uma condiccedilatildeo local marcada em vez de um fenocircmeno geral signifique que contexto deve sempre ser considerado ao determinar valores de condiccedilatildeo marcada Poderia ser eacute claro que o aspecto contextual da condiccedilatildeo marcada seja dado universalmente mas este natildeo eacute de modo algum faacutecil de mostrar aleacutem do niacutevel de fonologia Uma preocupaccedilatildeo relacionada sobre as implicaccedilotildees universais decorre do fato de que muitas assimetrias podem ser revertidas entre as diferentes comunidades de fala periacuteodos de tempo ou registradores

Para Trask (2004 p187) os vaacuterios criteacuterios para entender que uma forma ou

construccedilatildeo eacute marcada podem natildeo coincidir e os valores da alternativa marcado

natildeo-marcado podem tambeacutem mudar ao longo do tempo A complexidade posta na

interaccedilatildeo de fatores nunca eacute previamente estabelecida uma vez que as

diferentes combinaccedilotildees deles tornaratildeo consequentemente os resultados

diferentes

Em continuidade ele afirma que

Ser marcado eacute uma noccedilatildeo muito ampla que se aplica em todos os niacuteveis de anaacutelise Em termos gerais eacute marcada qualquer forma linguiacutestica que ndash sob qualquer ponto de vista ndash menos usual ou menos neutra do que alguma outra forma a forma natildeo-

33

marcada Uma forma marcada pode distinguir-se de outra tambeacutem marcada pela presenccedila de mais material de maior quantidade de matizes de significado por ser mais rara numa determinada liacutengua ou nas liacutenguas em geral ou de vaacuterios outros modos (idem p129)

Na e para a fonologia eacute sugerido que processos fonoloacutegicos estejam diretamente

sensiacuteveis agrave distinccedilatildeo entre os elementos marcados e os natildeo marcados Nesta

relaccedilatildeo a marcaccedilatildeo dos segmentos foneacuteticos estaacute relacionada a propriedades

linguiacutesticas como i) serem pouco comuns ii) serem pouco frequentes iii) serem

adquiridos tardiamente iv) serem pouco estaacuteveis quanto agrave mudanccedila sonora

(CRISTOacuteFARO-SILVA 2011 p148)

Segundo Battistella (2006 p 13) ldquoa condiccedilatildeo marcada na fonologia eacute uma

propriedade da relaccedilatildeo entre os dois sinais de um paradigma diacriacutetico que eacute em

parte independente da substacircncia linguiacutestica (articulaccedilatildeo e percepccedilatildeo) e deve ser

definida principalmente como conceitualrdquo

O conceito de marcaccedilatildeo estaacute diretamente relacionado ao de simetria propriedade

matemaacutetica que consiste na correspondecircncia e permuta de elementos dentro de

um conjunto onde mesmo com a troca de lugares eles continuam tendo o

mesmo valor Neste caso a marcaccedilatildeo estaria ligada ao conceito de assimetria

posto que esta seja a quebra da valoraccedilatildeo de correspondecircncia dos elementos

Trask 2007

Para Matras e Elsik (2006 p 8)

Assimetrias de paradigmas tecircm vindo a ser associado com a noccedilatildeo de condiccedilatildeo marcadardquo O conceito pressupotildee que a relaccedilatildeo estrutural entre os dois polos de um paradigma eacute previsiacutevel em certa medida Ele tambeacutem assume que um dos

34

polos marcado seraacute sempre exibir propriedades que o outro polo desmarcado natildeo tem

Os referidos autores tratam dos aspectos sobre assimetria afirmando que a

simetria eacute mais simples por ser explicada ldquoem termos formais ao niacutevel do

paradigma e em termos funcionais atraveacutes de regularidade na posiccedilatildeo e

formas das estruturas que executam operaccedilotildees lineares semelhantes na

organizaccedilatildeo de informaccedilatildeo de enunciadosrdquo Eles ainda afirmam que as ldquoas forccedilas

que provocam a assimetria satildeo muito mais opacasrdquo pois ldquoelas competem em

vaacuterios niacuteveis locais contra o poder aparentemente esmagador e sempre presente

da busca pela simetriardquo (idem p 10)

A noccedilatildeo de valores dos conceitos de marcados e natildeo marcados foi inicialmente

desenvolvido para sistemas fonoloacutegicos por Trubetzkoy (1931) e primeiro aplicado

a categorias morfossintaacuteticas e semacircnticas por Jakobson (1932) Croft (1990 p

87) afirma que Markedness has since been adopted by both the generative and

the typological approaches to linguistic theory not surprisingly in rather different

ways7 Por isso a depender da corrente teoacuterica adotada o conceito de marcaccedilatildeo

pode ser compreendido de forma distinta dadas as interpretaccedilotildees e as

abrangecircncias a que elas se propotildeem

Conforme Battistella (1996 p 12) O termo marcaccedilatildeo abrange uma seacuterie de

conceitos

algumas tentativas foram feitas para separar os conceitos subjacentes a este termo e distinguir entre diferentes tipos de condiccedilotildees marcadas Jakobson por exemplo manteacutem uma

7 O conceito de marcaccedilatildeo tem sido adotado nas abordagens gerativista e tipoloacutegica natildeo surpreendentemente de maneiras bastante diferentes

35

distinccedilatildeo entre condiccedilatildeo fonoloacutegica marcada que envolve categorias cujos significados satildeo meros diferenciadores e condiccedilatildeo marcada semacircntica que envolve categorias conceituais que sinalizam o que significa bem como distinguem os vocaacutebulos

Com os passar do tempo os modelos teoacutericos sobre marcaccedilatildeo tambeacutem foram

discutidos e repensados de acordo com a corrente a que se propunha Nos

paraacutegrafos que seguem discorremos seguindo o percurso histoacuterico descrito por

Battistella 2006 sobre estes modelos estruturalista gerativista tipoloacutegica e

naturalista

221 A concepccedilatildeo de Jakobson e Trubetzkoy

A abordagem estruturalista estaacute diretamente ligada agraves pessoas de Jakobson e

Trubetzkoy componentes do Ciacuterculo de Praga para quem as correlaccedilotildees

fonoloacutegicas satildeo compartilhadas em um elemento definidor comum A partir da

observaccedilatildeo do comportamento dos traccedilos fonoloacutegicos eles introduzem os termos

marcado e natildeo-marcado It was in the context of the search for correlations

among phonemes that the terms marked and unmarked were first proposed

Battistella (2006 p 19)

Na visatildeo semioacutetica estruturalista de acordo com Matras e Elsik (2006 p 15)

Trubetzkoy (1939) introduziu o conceito de condiccedilatildeo marcada no contexto de sua

pesquisa sobre correlaccedilotildees fonoloacutegicas com base nas relaccedilotildees entre a presenccedila

de alguma caracteriacutestica fonoloacutegica e sua ausecircncia na consciecircncia dos falantes

Mais adiante ele restringiu a aplicaccedilatildeo da condiccedilatildeo marcada agraves neutralizaacuteveis

36

oposiccedilotildees fonoloacutegicas A partir daiacute a neutralizaccedilatildeo tornou-se o criteacuterio de

marcaccedilatildeo

Por isso diz-se que a neutralizaccedilatildeo eacute um criteacuterio originalmente fonoloacutegico que foi

estendido (nem sempre bem) para a situaccedilatildeo em que algum contexto requer o

cancelamento do contraste entre os membros de uma oposiccedilatildeo Battistella (1996

p 11)

Batistella (idem p12) tambeacutem afirma que Jakobson aplicou o conceito de

marcaccedilatildeo em vaacuterias direccedilotildees e aleacutem da fonologia a outros niacuteveis linguiacutesticos e

domiacutenios da semioacutetica com base natildeo apenas nos atributos linguiacutesticos mas nas

categorias semacircnticas da gramaacutetica e da cultura Ele tambeacutem afirmou que a

condiccedilatildeo marcada pode ser vista como uma relaccedilatildeo binaacuteria

O autor em estudo ainda discorre que Jakobson observando aleacutem disso ldquouma

seacuterie de correlaccedilotildees de condiccedilatildeo marcada notou que os valores natildeo marcados

tendem a ser representado por zero formardquo sugerindo que existe uma

correspondecircncia entre as caracteriacutesticas semacircnticas e sua expressatildeo fonoloacutegica

ldquonatildeo apenas os valores marcados tendem a ser codificados por meio de

marcadores manifestados mas tambeacutem valores semanticamente proacuteximos de

uma categoria que tendem a ser expressos fonologicamente ou marcadores

fonotaticamente semelhantesrdquo Os valores marcados tambeacutem tendem a mostrar

diferenciaccedilatildeo menos formal do que os valores natildeo marcados

Jakobson tambeacutem teria evidenciado seus estudos com base nas observaccedilotildees

sobre a aquisiccedilatildeo de primeira liacutengua e sobre a afasia Em suas pesquisas ele

descobriu correlatos extralinguiacutesticos de condiccedilatildeo marcada propondo uma

37

hierarquia das caracteriacutesticas fonoloacutegicas universais ao coletar dados

corroboradores da tese de que as caracteriacutesticas ou segmentos marcados satildeo

mais difiacuteceis de serem adquiridos por crianccedilas e de serem apreendidos por

afaacutesicos Battistella (idem 16)

222 Abordagem Gerativa

Para Matras amp Elsik (2006 p10) a visatildeo de Chomsky de marcaccedilatildeo mostra uma

flexibilidade notaacutevel uma vez que o conceito natildeo foi desenvolvido de forma

sistemaacutetica e que eacute difiacutecil falar sobre a existecircncia de um trabalho mais bem

elaborado sobre marcaccedilatildeo em sua obra

Battistella afirma que na concepccedilatildeo gerativista o conceito de marcaccedilatildeo exposto

por Chomsky estaacute relacionado a duas ideias centrais i) a condiccedilatildeo marcada eacute

concebida como codificaccedilatildeo de uma estrutura de preferecircncia ou a estrutura

padratildeo para a aquisiccedilatildeo da linguagem e ii) a condiccedilatildeo marcada eacute vista como

aquela que reflete o custo de determinadas opccedilotildees analiacuteticas Em tal conceito as

duas ideias estatildeo interligadas na abordagem gerativa na medida em que uma

teoria formal eacute necessaacuteria para expor a adequaccedilatildeo explicativa no que diz respeito

agrave aquisiccedilatildeo da linguagem (1996 p18)

Ainda segundo o autor Chomsky tambeacutem distinguiu dois tipos de condiccedilatildeo

marcada a distinccedilatildeo entre uma gramaacutetica sem marcaccedilatildeo do nuacutecleo e uma

periferia marcada e as estruturas de preferecircncia dentro do nuacutecleo e dentro da

periferia

38

No que tange agrave fonologia para Moreira da Silva (2011 p 31)

No contexto da Gramaacutetica Gerativa Chomsky amp Halle (1968 p 402) propotildeem uma teoria de marcaccedilatildeo baseada num conjunto de convenccedilotildees de marcaccedilatildeo ou definiccedilotildees dos valores ldquomarcadordquo ldquonatildeo-marcadordquo para os traccedilos fonoloacutegicos em contextos particulares A marcaccedilatildeo concebe uma estrutura como preferida ou que surge por defeito omissatildeo Os elementos marcados e natildeo marcados satildeo compreendidos como os que apresentam maior ou menor custo Satildeo as regras da Gramaacutetica Universal que atribuem um valor natildeo marcado aos traccedilos Com efeito os valores por omissatildeo estatildeo codificados na Gramaacutetica Universal havendo um conjunto de regras que fazem emergir os valores marcados

Chomsky amp Halle (idem p 425) propotildeem uma marcaccedilatildeo universal e inata Os

segmentos marcados ou os valores dos traccedilos satildeo estabelecidos de acordo com

universais interlinguiacutesticos frequecircncia distribucional mudanccedila linguiacutestica e

aquisiccedilatildeo da liacutengua

Eacute no final dos anos 70 e durante a deacutecada de 80 que segundo Battistella (1996

p 10)

a condiccedilatildeo marcada comeccedilou a ser tratada como parte de uma teoria do nuacutecleo da gramaacutetica A Gramaacutetica nuclear consistia em alguns paracircmetros que deveriam ser corrigidos durante a aquisiccedilatildeo de uma linguagem real O conceito de condiccedilatildeo marcada foi aplicado duplamente neste quadro Em primeiro lugar todo o nuacutecleo da gramaacutetica foi considerado como natildeo marcado contra a periferia marcada A condiccedilatildeo marcada de uma construccedilatildeo foi determinada pela sua regularidade estabilidade e centralidade para o nuacutecleo de uma linguagem particular bem como por generalizaccedilotildees intralinguiacutesticas sobre os tipos de construccedilatildeo Em segundo lugar a condiccedilatildeo marcada seria tambeacutem aplicada aos valores de paracircmetros no interior do nuacutecleo e no interior da periferia Assim condiccedilatildeo marcada tambeacutem foi visto como uma estrutura de preferecircncia dentro dos dois componentes da gramaacutetica

Moreira da Silva (2011 p32) afirma que no que diz respeito agrave Teoria da

Otimidade formulada por Prince amp Smolensky (1993) a marcaccedilatildeo eacute vista como a

39

violaccedilatildeo de uma restriccedilatildeo ou princiacutepio da liacutengua Segundo esta teoria cada liacutengua

eacute definida como um conjunto de hierarquizaccedilotildees de princiacutepios universais As

restriccedilotildees numa posiccedilatildeo mais elevada e que satildeo raramente violadas indicam os

aspetos natildeo marcados enquanto as menos importantes e que satildeo violadas

frequentemente mostram os aspetos mais marcados

223 Abordagem Tipoloacutegica (Interlinguiacutestica)

Croft (1996 p4) afirma que a principal caracteriacutestica da tipologia linguiacutestica eacute

verificar as regras de comparaccedilatildeo nas liacutenguas do mundo A comparaccedilatildeo

Interlinguiacutestica coloca a explicaccedilatildeo dos fenocircmenos linguiacutesticos de uma uacutenica

liacutengua em uma nova e diferente perspectiva

A fim de distinguir o conceito de marcaccedilatildeo de outras escolas teoacutericas Croft

(1996) introduziu a concepccedilatildeo de marcaccedilatildeo tipoloacutegica Para ele

Marcaccedilatildeo tipoloacutegica eacute uma rede de relaccedilotildees causais aparentes entre um subtipo de assimetrias interlinguiacutesticas todas as quais tecircm a ver com a forma como a funccedilatildeo eacute codificada em forma gramatical O tema geral da assimetria tambeacutem sugere um link para os padrotildees assimeacutetricos na ordem das palavras e na fonologia que diferem de marcaccedilatildeo tipoloacutegica de forma significativa Marcaccedilatildeo tipoloacutegica eacute uma propriedade universal de uma categoria conceitual natildeo uma propriedade de uma linguagem especiacutefica ou de uma categoria gramatical de linguagem particular como eacute concebida em marcaccedilatildeo para a Escola de Praga (p87 - 88)8

8 Typological markedness is a network of apparent causal relationships among a subtype of cross-

linguistic asymmetries all of which have to do with how function is encoded into grammatical form The general theme of asymmetry also suggests a link to asymmetrical patterns in word order and phonology which differ from typological markedness in significant ways Typological markedness is a universal property of a conceptual category not a language-particular property of a language-particular grammatical category as it is in Prague School markedness

40

Quanto agrave marcaccedilatildeo na abordagem tipoloacutegica autores como Croft (1996) e Givoacuten

(1990) se utilizaram da perspectiva estruturalista para embasar a sua teoria Esta

concepccedilatildeo se vale dos fenocircmenos interlinguiacutesticos e universais que eacute a sua

caracteriacutestica definidora Battistella (2006 p19) A marcaccedilatildeo tipoloacutegica eacute

portanto uma ferramenta importante para o tipologista porque fornece um meio

para ligar diretamente propriedades linguiacutesticas (estruturais) formais em todos os

idiomas

A condiccedilatildeo marcada eacute assegurada por padrotildees interlinguiacutesticos que podem ser

formulados como restriccedilotildees sobre possiacuteveis combinaccedilotildees de propriedades

linguiacutesticas Na abordagem tipoloacutegica a marcaccedilatildeo eacute vista como uma rede de

relacionamentos que engloba uma seacuterie de padrotildees gerais logicamente

independentes Croft (1990 p87) reclassifica os criteacuterios utilizados pelos

estruturalistas em trecircs estruturais comportamentais e de frequecircncia de token

Na abordagem tipoloacutegica um valor de categoria eacute mais ou menos marcado em

vez de individualmente ou duplamente marcadas como na abordagem semioacutetica

De acordo com Croft (2003 p87) o fato de que a neutralizaccedilatildeo natildeo eacute um

conceito relativo explica por que eacute um criteacuterio vaacutelido de condiccedilatildeo marcada

tipoloacutegica

Para Matras e Elsik o reconhecimento do caraacuteter relativo (gradual ou escalar) da

condiccedilatildeo marcada permite que se desenhe em alguns conceitos fundamentais da

tipologia linguiacutestica o que diz respeito agrave condiccedilatildeo de marcada Aleacutem de simples

implicacionais universais hierarquias e protoacutetipos tambeacutem podem ser vistos como

padrotildees da condiccedilatildeo marcada (2006 p18)

41

224 Abordagem Naturalista9 (Morfologia Natural)

Na abordagem naturalista de acordo com Matras amp Elsik (2006 p13) a condiccedilatildeo

marcada foi desenvolvida na escola de Morfologia Natural que surgiu na Aacuteustria e

na Alemanha em meados dos anos 1970 Os estudos de Dressler et al (1987)

para quem ldquoa naturalidade universal corresponde agrave facilidade para o ceacuterebro

humano (Dressler et all 1987 p11) fazem parte desta corrente que se debruccedilou

sobre a morfologia natural para dar sustentaccedilatildeo a sua tese Ainda para estes

autores

Os proponentes da Morfologia Natural caracterizam sua abordagem como semioacutetica e ao mesmo tempo funcional A escola foi inspirada entre outros pela teoria da marcaccedilatildeo desenvolvida na Escola de Praga Por outro lado morfologistas naturais compartilham de uma seacuterie de pontos de vista teoacutericos com o paradigma funcionalista e principalmente com orientaccedilatildeo de funccedilatildeo tipoloacutegica como a assunccedilatildeo do caraacuteter relativo da condiccedilatildeo marcada a suposiccedilatildeo de protoacutetipos e a dependecircncia de motivaccedilotildees e evidecircncias extralinguiacutesticas e intralinguiacutesticas (Idem p12)

Ainda de acordo com Matras amp Elsik (idem p 14) a Teoria da Morfologia Natural

eacute concebida como uma teoria da Naturalidade onde satildeo reconhecidos vaacuterios

niacuteveis de anaacutelise linguiacutestica que satildeo organizados por outras subteorias

correspondentes

A Morfologia Natural objetiva nesse aspecto estabelecer conflitos entre os

princiacutepios de naturalidade Dois desses satildeo i) os conflitos entre princiacutepios de

naturalidade (o que eacute natural e o que eacute especiacutefico do idioma) e ii) os conflitos

entre os diferentes componentes do sistema de linguagem

9 The naturalness approach

42

Comumente a naturalidade eacute vista por ter fundamentos extralinguiacutesticos que

determinam ou proiacutebem favorecem ou desfavorecem as estruturas linguiacutesticas

restringindo as possibilidades e especificam as preferecircncias da faculdade da

linguagem universal No entanto embora a morfologia privilegie os fatores

extralinguiacutesticos (neurobioloacutegicos e sociocomunicativos) os fatores linguiacutesticos

natildeo satildeo redutiacuteveis aos extralinguiacutesticos (ibidem p14)

23 CRITEacuteRIOS DE MARCACcedilAtildeO

Matras amp Elsik (2006 p15) elencam quatro criteacuterios relevantes para a marcaccedilatildeo

Satildeo eles i) frequecircncia ii) complexidade conceitual iii) complexidade estrutural iv)

distribuiccedilatildeo

A frequecircncia tem ocupado uma posiccedilatildeo central na abordagem tipoloacutegica da

condiccedilatildeo marcada Embora acredite-se que os elementos natildeo marcados satildeo

mais frequentes que os marcados este criteacuterio eacute relativo e universalmente

aplicaacutevel sendo bastante questionaacutevel na abordagem tipoloacutegica chegando a ser

abandonado por Croft 1990 p84 ao afirmar que ldquoo criteacuterio de frequecircncia mostra

uma conexatildeo direta entre as propriedades de estrutura da linguagem e

propriedades de uso da linguagemrdquo

Ainda segundo Croft (idem p159) a condiccedilatildeo marcada eacute mais do que uma

manifestaccedilatildeo de motivaccedilatildeo econocircmica havendo a necessidade de olhar para

outras causas da frequecircncia de certos valores gramaticais na fala

43

Na abordagem estruturalista semioacutetica a complexidade conceitual eacute a

propriedade que define a condiccedilatildeo semanticamente marcada Para Jakobson a

marcaccedilatildeo eacute definida como uma relaccedilatildeo assimeacutetrica entre sinalizaccedilatildeo e natildeo-

sinalizaccedilatildeo de uma determinada propriedade Assim o membro marcado da

oposiccedilatildeo eacute por definiccedilatildeo mais complexo semanticamente que o membro natildeo

marcado como outros criteacuterios melhores correlatos da condiccedilatildeo marcada de

diagnoacutesticos de complexidade conceitual (Matras amp Elsik 2006 p 17)

Ainda segundo estes autores (Idem p 19) o reconhecimento da extensatildeo e da

complexidade de um marcador em termos fonoloacutegicos como um fator relevante

em vez de um morfoloacutegico eacute tido por outros autores que trabalham com a

tipologia linguiacutestica Como exemplo eles citam a codificaccedilatildeo morfossintaacutetica que

eacute chamada de codificaccedilatildeo zero onde natildeo existe evidente formal de marcaccedilatildeo de

um valor de categoria

Os criteacuterios de marcaccedilatildeo com base na distribuiccedilatildeo compreendem os criteacuterios

comportamentais e o criteacuterio de valor neutro Os criteacuterios comportamentais foram

desenvolvidos especificamente na abordagem tipoloacutegica e dizem respeito a

qualquer tipo de evidecircncia do comportamento linguiacutestico dos elementos que

demonstram que um valor de uma categoria conceitual eacute gramaticalmente mais

versaacutetil do que outro Croft (1990 p 93)

Jaacute o criteacuterio de valor neutro diz respeito agrave neutralizaccedilatildeo de contrastes

paradigmaacuteticos em determinados contextos O criteacuterio foi desenvolvido na Escola

de Praga e tomado por Greenberg (1966) No entanto o valor neutro eacute

descartado como um criteacuterio vaacutelido de marcaccedilatildeo tipoloacutegica visto que natildeo haacute

44

consistecircncia interlinguiacutestica Natildeo existe um padratildeo interlinguiacutestico consistente de

contextos neutros que podem ser ligados agrave codificaccedilatildeo estrutural ou potencial

comportamental (Croft idem p96)

A razatildeo para a introduccedilatildeo de criteacuterios dependentes do sistema em Morfologia

Natural segundo Matras amp Elsik (2006 p 19) eacute que o conceito de naturalidade

baseada exclusivamente em fatores independentes de sistema resulta em

prediccedilotildees incorretas especialmente na mudanccedila de linguagem Eles consideram

certos aspectos da normalidade dependente de idioma para ser parte de

naturalidade

Segundo Croft (1990 p 97) no que tange aos criteacuterios externos da marcaccedilatildeo os

proponentes da abordagem naturalista introduziram uma seacuterie de criteacuterios ou

correlatos extralinguiacutesticos da condiccedilatildeo marcada como

evoluccedilatildeo da linguagem (o mais tarde o mais marcado)

maturaccedilatildeo ontogeneacutetica (o mais tarde o mais marcado)

fala do bebecirc (menos elementos marcados preferidos pelos adultos no

maiecircs)

aquisiccedilatildeo da linguagem (menos marcado adquirido antes do mais

marcado)

distuacuterbios da linguagem e da fala (mais marcado afetado anteriormente

menos marcado)

testes de percepccedilatildeo (menos marcado mais facilmente percebida do que

mais marcado)

45

e erros linguiacutesticos (mais marcados evocam mais erros do que os menos

marcados)

Esses criteacuterios satildeo basilares e dariam conta de uma seacuterie de elementos

universais linguiacutesticos

24 MARCACcedilAtildeO MUDANCcedilA E CONTATO LINGUIacuteSTICO

Matras amp Elsik (2006 p 22) garantem que em muitas abordagens a

mudanccedila linguiacutestica eacute vista como cooperadora para compreensatildeo da marcaccedilatildeo

Logo a mudanccedila de idioma eacute tida como criteacuterio de marcaccedilatildeo Esta assertiva faz

sentido nesse trabalho visto que o objeto de anaacutelise o portuguecircs resultante do

contato entre o Portuguecircs e o Latundecirc trata de cacircmbio de materiais linguiacutesticos

Neste caso especificamente dos elementos foneacuteticos

Ainda de acordo com estes autores

A existecircncia de estruturas marcadas eacute um resultado inevitaacutevel da compartimentaccedilatildeo e da abertura do sistema de linguagem E uma vez que diferentes componentes da linguagem tecircm funccedilotildees divergentes e tendem a seguir diferentes princiacutepios de naturalidade o abandono das estruturas marcadas em um niacutevel implica em estruturas marcadas em outro niacutevel (Idem p

25)

Em outras palavras a mudanccedila linguiacutestica leva agrave condiccedilatildeo de marcaccedilatildeo na

mudanccedila de um componente da liacutengua para outro ao inveacutes de uma reduccedilatildeo

global de condiccedilatildeo marcada Tais estruturas marcadas satildeo obrigadas a existir em

qualquer momento na histoacuteria de uma liacutengua

46

Os estudiosos apontam para os dois tipos de forccedilas que agem no contato

linguiacutestico a interna e a externa Assim tais forccedilas podem simplificar ou complicar

a gramaacutetica de uma liacutengua Givoacuten (1979 p 123) diz que os falantes satildeo

propensos a recorrer a estruturas natildeo marcadas da Gramaacutetica Universal em

situaccedilotildees cujo contato estaacute ligado ao estresse comunicativo enquanto situaccedilotildees

de contato menos marcados aquelas que prosseguem de forma mais gradual

natildeo precisam

Givoacuten (idem 124) diz que nas situaccedilotildees de pidgin a condiccedilatildeo de marcaccedilatildeo eacute

reduzida e situaccedilotildees de contato entre liacutenguas podem resultar em aumento de

elementos marcados As categorias marcadas satildeo reduzidas em pidgins

enquanto as natildeo-marcadas satildeo as primeiras a serem inovadas durante o

processo de crioulizaccedilatildeo A marcaccedilatildeo sugere que em situaccedilotildees de contato

envolvendo a interferecircncia deve favorecer a reduccedilatildeo da condiccedilatildeo marcada

Na aquisiccedilatildeo de segunda liacutengua o grau relativo de dificuldade para o aprendiz

estaacute relacionado a fatores extralinguiacutesticos como idade Eacute fato que na aquisiccedilatildeo

de uma segunda liacutengua os adultos tendem a terem dificuldades com os padrotildees

mais marcados enquanto os mais novos natildeo a tem Estruturas marcadas da

liacutengua em aquisiccedilatildeo podem deixar de serem adquiridas durante a aprendizagem

caso sejam os adultos que a esteja adquirindo Por isso estruturas natildeo marcadas

satildeo mais propensas a surgir em grandes sociedades caracterizadas por um

intenso contato linguiacutestico levando agraves liacutenguas a simplificaccedilatildeo dos seus sistemas

linguiacutesticos Croft (2000 p 192-193)

47

Jakobson (1978 p 35-37) afirma que quanto maior a funccedilatildeo socioespacial de um

dialeto mais simples seraacute o seu sistema linguiacutestico Dialetos e liacutenguas

relativamente isoladas satildeo mais propensas a desenvolverem condiccedilotildees marcadas

e estruturas redundantes como conjunto de fonemas complexos com um elevado

nuacutemero de contrastes fonoloacutegicos complexidade alofocircnica e alomoacuterfica

irregularidade morfoloacutegica e padrotildees de concordacircncia complexos Por outro lado

os casos de alto contato dialeacutetico que satildeo caracterizadas por redes sociais

relativamente abertas satildeo susceptiacuteveis agrave produccedilatildeo de estruturas linguiacutesticas natildeo

marcadas pela diminuiccedilatildeo da irregularidade da redundacircncia e da complexidade

Apesar de os empreacutestimos serem um aspecto do aumento da condiccedilatildeo marcada

ela (a condiccedilatildeo) eacute operativamente especiacutefica de cada empreacutestimo Esta condiccedilatildeo

marcada do empreacutestimo coodetermina quais as formas e funccedilotildees satildeo mais

susceptiacuteveis de serem emprestadas do que outras Quanto mais transparente e

menos integrador for um elemento na liacutengua de origem torna-se mais provaacutevel de

ser emprestado A condiccedilatildeo marcada eacute relativa ao contexto agrave saliecircncia agrave

frequecircncia agrave ocorrecircncia e agrave distacircncia tipoloacutegica da situaccedilatildeo do contato Matras amp

Elsik (2006 p 26)

Croft (2000 p198) estende a noccedilatildeo de condiccedilatildeo marcada natildeo soacute para os

mecanismos de mudanccedila mas tambeacutem para as formas de contextos de difusatildeo

ou seja padrotildees de realizaccedilatildeo Ele afirma que enquanto na mudanccedila interna as

inovaccedilotildees entram nos pontos menos marcados e estendem a ambientes mais

acentuados em empreacutestimos e outras inovaccedilotildees mudanccedilas motivadas

externamente se espalham de pontos marcados para menos contextos marcados

48

25 JAKOBSON E A ABORDAGEM FONOLOacuteGICA DA MARCACcedilAtildeO

O termo marcaccedilatildeo recebeu o tratamento mais expansivo nos estudos de Roman

Jakobson a partir de 1930 Ele e Trubetzkoy difundiram a ideia de correlaccedilatildeo

fonoloacutegica como uma seacuterie de oposiccedilotildees binaacuterias que compartilham elementos

em comum Eacute Jakobson que afirma que a neutralizaccedilatildeo e o estaacutegio onde as

posiccedilotildees marcadas natildeo estatildeo em estado de marcaccedilatildeo

Eacute tambeacutem Jakobson quem introduz a concepccedilatildeo de niacuteveis de marcaccedilatildeo propondo

que a forma natildeo marcada tanto tem uma forma geral como uma parcial Ele

descobriu uma relaccedilatildeo entre a marcaccedilatildeo em uma hierarquia universal de traccedilos

fonoloacutegicos os traccedilos marcados implicam maior dificuldade de aprendizagem e

uma maior facilidade de perda por parte de pessoas com afasia Ele ainda diz

que

O padratildeo do desenvolvimento fonoloacutegico universal consiste numa progressatildeo de diferenciaccedilotildees cada vez mais finas entre traccedilos distintivos inicialmente distinccedilatildeo entre consoantes e vogais formando-se posteriormente oposiccedilotildees cada vez menos universais A dissoluccedilatildeo da competecircncia linguiacutestica individual nas patologias da linguagem eacute governada pela mesma regularidade a perda do valor primaacuterio pressupotildee a perda do valor secundaacuterio e eacute por isso que se fala da infantilidade da fala dos afaacutesicos A dissoluccedilatildeo do sistema de sons nos afaacutesicos fornece uma imagem de espelho do desenvolvimento fonoloacutegico da crianccedila ndash os sons a serem adquiridos mais tardiamente satildeo os primeiros a serem perdidos (1941 p 60-63)

No percurso da fonologia Jakobson (1941 p 84) viu a representaccedilatildeo fonecircmica

como um niacutevel sem redundacircncia de representaccedilatildeo que conteacutem apenas

informaccedilotildees distintivas A praacutetica descritiva da informaccedilatildeo teoacuterica de Jakobson

49

teve uma grande e importante influecircncia sobre a notaccedilatildeo livre da redundacircncia na

fonologia e na sintaxe gerativas

Com base na literatura meacutedica Jakobson examinou a aquisiccedilatildeo da linguagem e a

afasia da fala agrave luz dos universais linguiacutesticos propondo uma relaccedilatildeo entre uma

hierarquia universal dos traccedilos fonoloacutegicos a aquisiccedilatildeo da linguagem na infacircncia

e a perda dela durante a afasia A aquisiccedilatildeo fonoloacutegica da crianccedila e os distuacuterbios

dos afaacutesicos baseiam-se nas mesmas leis de solidariedade como o inventaacuterio

fonoloacutegico o percurso fonoloacutegico das liacutenguas do mundo

Os estudos de Jakobson e de Trubetzkoy sobre a tipologia fonoloacutegica levaram

Jakobson a propor que os sistemas de sons satildeo organizados hierarquicamente e

que certas oposiccedilotildees fonoloacutegicas fornecem o nuacutecleo do sistema de som de todas

as liacutenguas Estas satildeo as oposiccedilotildees que definem os sons mais prototiacutepicos mdash

vogais e consoantes que ocorreratildeo em todos os idiomas vogais cardeais a i

u consoantes plosivas p t k e as nasais m n Estes sons satildeo

encontrados em praticamente todas as liacutenguas do mundo

Jakobson propotildee novas leis implicativas entre estes sons e os sons fora do

inventaacuterio baacutesico Dessa forma as leis tipoloacutegicas preveem que em nenhuma

liacutengua haveraacute vogais nasais a menos que haja vogais orais nenhuma liacutengua teraacute

uma vogal arredondada posterior a menos que ela tambeacutem tenha uma vogal

anterior fechada natildeo arredondada nenhuma liacutengua teraacute uma vogal fechada natildeo

arredondada a menos que ela tambeacutem tenha uma arredondada nenhuma liacutengua

teraacute uma fricativa dental simples sem uma fricativa dental estridente (Idem 1941

p 86)

50

Jakobson tambeacutem observa que certos sons satildeo muito raros nas liacutenguas do

mundo por exemplo as fricativas laterais e o r tcheco estridente Ele propotildee que

esses sons satildeo mais afastados do nuacutecleo e portanto menor nesta hierarquia

A hierarquia de oposiccedilotildees fonoloacutegicas definida pela tipologia encontra-se tambeacutem

no desenvolvimento do sistema foneacutetico da crianccedila Com base em estudos diaacuterios

de aquisiccedilatildeo da linguagem ele confirma a hierarquia na aquisiccedilatildeo dos padrotildees e

os padrotildees mais marcados seriam adquiridos tardiamente

Moreira da Silva (2011 p36) elenca os criteacuterios de marcaccedilatildeo No entanto a

autora chama a atenccedilatildeo para o fato de que eles nem sempre funcionam do modo

esperado Satildeo eles frequecircncia distribuiccedilatildeo aquisiccedilatildeo da liacutengua patologias da

linguagem histoacuteria da liacutengua facilidade de produccedilatildeo e percepccedilatildeo universalidade

implicaccedilatildeo e processos fonoloacutegicos Ela tambeacutem apresenta algumas unidades e

estruturas consideradas mais marcadas como podemos ver a seguir

Quadro 1 Unidades e estruturas mais marcadas conforme levantamento de Moreira da

Silva (2011)

Segmentos e estruturas mais marcadas Autores

1 Vogais nasais Ferguson amp Chowdbury 1960

Greenberg 1966 14 Durand 1990

74 Kenstowicz 1994 63

2 Vogais longas Zipf 1935 1963 Greenberg 1966

14

3 Vogais meacutedias em comparaccedilatildeo com as

vogais altas

Kenstowicz 1994 65

4 Consoantes aspiradas Greenberg 1966 14

5 Consoantes glotalizadas Greenberg 1966 17

6 Obstruintes [+vozeadas] por oposiccedilatildeo agraves [- Greenberg 1966 14 24

51

vozeadas] Lass1984 155 Kenstowicz 1994

62

7 Consoantes fricativas por oposiccedilatildeo agraves

oclusivas

Kenstowicz 1994 65

8 Articulaccedilotildees secundaacuterias como labializaccedilatildeo

palatalizaccedilatildeo e velarizaccedilatildeo

Kenstowicz 1994 65

9 A regiatildeo dental alveolar eacute preferida com

exceccedilatildeo das africadas o que pode ser

observado pelo fato de este ser o ponto de

articulaccedilatildeo usado quando numa liacutengua

existe apenas uma obstruinte Nas nasais

esta tendecircncia ainda se faz notar mais

resultando na preferecircncia por n

Lass 1984 154-156

10 Segmentos com articulaccedilotildees muacuteltiplas e

complexas no geral satildeo mais marcados em

comparaccedilatildeo com segmentos com

articulaccedilotildees singulares

Kenstowicz 1994 65

11 Quanto agraves liacutequidas a lateral seraacute a menos

marcada jaacute que as liacutenguas que possuem

duas ou mais liacutequidas tecircm provavelmente

uma lateral e um contraste lateral natildeo

lateral

Lass 1984 158

12 Em termos de semivogais haacute uma

preferecircncia por j embora a maioria das

liacutenguas possua tambeacutem w as outras

semivogais satildeo raras

Lass 1984 158

13 Siacutelabas acentuadas ndash nem todas as liacutenguas

tecircm siacutelabas acentuadas embora estas

surjam cedo na aquisiccedilatildeo talvez devido agrave

sua saliecircncia perceptiva e no caso do inglecircs

devido ao fato de as palavras lexicais serem

iniciadas por siacutelaba toacutenica

Demuth 1996 121

14 Quanto agrave siacutelaba existe a preferecircncia pelo

formato natildeo marcado CV

Blevins 1995 213

15 De acordo com a TO a siacutelaba estaacute sujeita agraves Archangeli 1997 7 Hammond

52

seguintes restriccedilotildees universais

a) As siacutelabas comeccedilam com consoante -

Ataque

b) As siacutelabas tecircm uma vogal - Nuacutecleo

c) As siacutelabas acabam com uma vogal - Natildeo

Coda

d) As siacutelabas tecircm no maacuteximo uma consoante

numa margem - Complexo

(significa que os ataques complexos e codas

complexas satildeo inaceitaacuteveis)

e) As siacutelabas satildeo compostas por consoantes

e vogais - Ataque e Nuacutecleo

1997 36

As estruturas elencadas no quadro acima satildeo validadas interlinguisticamente

Com relaccedilatildeo agraves liacutenguas em contato objeto deste estudo podemos afirmar que o

portuguecircs apresenta menos estruturas marcadas do que o Latundecirc No caso do

portuguecircs as estruturas em 2 4 5 e 10 constantes do quadro acima natildeo satildeo

observadas

Jaacute no Latundecirc aleacutem de todas as estruturas apresentadas no quadro ainda satildeo

observadas as seguintes estruturas mais marcadas

estrutura silaacutebica bastante complexa

inventaacuterio vocaacutelico maior do que o consonantal

53

combinaccedilatildeo de dois traccedilos mais marcados em um segmento (vogais

nasais e laringais) e

acento e tom lexicais

Para refletirmos sobre a marcaccedilatildeo no processo de interferecircncia Latundecirc ndash

Portuguecircs trataremos no capiacutetulo seguinte de conceitos a cerca do contato

linguiacutestico

54

3 CONTATO LINGUIacuteSTICO

ldquoBilingualism is for me the fundamental problem of linguisticsrdquo Jakobson10

31 INTRODUCcedilAtildeO

A histoacuteria em grande parte gira em torno de lendas e mitos Um desses mitos eacute o

surgimento das liacutenguas do mundo Questionamentos de como e quando elas

sugiram permeiam ainda hoje as mentes dos filoacutesofos e cientistas Natildeo

diferentemente das demais aacutereas a perspectiva teoloacutegica descreve a narrativa da

construccedilatildeo da Torre de Babel como uma dessas tentativas de explicaccedilatildeo no que

tange agrave miscelacircnea de liacutenguas existentes Jackob Bohme teoacutelogo do seacuteculo XVII

afirma em seu De Signatura Rerum11 que a liacutengua divina original raiz ou matildee de

todas as liacutenguas do mundo eacute chave para um conhecimento verdadeiro e perfeito

de todas as coisas Eacute no ato da criaccedilatildeo que o primeiro homem Adatildeo

contemplando as obras do Criador de toda a natureza nomeara todas as

criaturas de acordo com suas proacuteprias qualidades essenciais usando a

linguagem humana como meio

A hipoacutetese defendida por Bohme tambeacutem fora amplamente sustentada pelos

filoacutelogos e comparatistas do final do seacuteculo XVIII Sem viacutenculo com a teologia

estes estudiosos buscavam atraveacutes da reconstruccedilatildeo da aacutervore linguiacutestica a

protoliacutengua a liacutengua-matildee geradora das demais liacutenguas

10

Apud Romaine 1995 p1 11

De Signatura Rerum (Desde o nascimento e o nome de todos os seres) 1622

55

Jacob Grimm filoacutelogo alematildeo com base nas descobertas de Rasmus Rask

aperfeiccediloou o meacutetodo comparatista sobretudo o que fora denominada de

ldquomudanccedila de somrdquo ou ldquoLei de Grimmrdquo12 com intuito de descrever as mudanccedilas

ocorridas na liacutengua-matildee o proto-indo-europeu (PIE) A Lei de Grimm estava na

base das discussotildees ocorridas mais tarde na Universidade de Leipzig

Alemanha no conhecido grupo dos neogramaacuteticos Os estudiosos desse ciacuterculo

questionaram os estudos de Grimm e seus compatriotas ao apontarem para o fato

de que os estudos comparatistas se basearem em dados de liacutengua escrita e natildeo

de liacutengua falada (GABAS JR 2008 p 80)

Humberto Eco em A busca da liacutengua perfeita13 nos relata sobre os projetos de

reconstruccedilatildeo em busca da liacutengua sagrada No seu livro o autor nos mostra que a

tentativa de procura de correlatos entre as liacutenguas do mundo eacute interesse antigo

das civilizaccedilotildees Ele afirma que na Europa no seacuteculo XIX houve 173 projetos de

reconstruccedilatildeo linguiacutestica

Dadas ateacute aqui as investigaccedilotildees eacute comum pensarmos que pelo prisma

teoloacutegico o surgimento das liacutenguas no planeta eacute fruto da desobediecircncia e

soberba humanas Eco idem nos mostra que haacute um equiacutevoco quanto a esta

interpretaccedilatildeo uma vez que no capiacutetulo XI v 1 do livro de Gecircnesis a Biacuteblia

12

A Lei de Grimm analisou sobre o vieacutes da fonologia as relaccedilotildees que havia entre as liacutenguas indo-

europeias As similaridades entre o alematildeo claacutessico grego e inglecircs antigo eram previstas a partir de leis foneacuteticas i) as consoantes oclusivas surdas (p t k kw) do PIE mudaram em fricativas surdas correspondentes (f θ h hw) nas liacutenguas germacircnicas ii) as consoantes oclusivas sonoras (bdggw) do PIE mudaram em oclusivas surdas correspondentes (p t k kw) nas liacutenguas germacircnicas iii) as consoantes aspiradas sonoras (bh dh gh gwh) do PIE mudaram em oclusivas natildeo-aspiradas sonoras correspondentes (bdggw) nas liacutenguas germacircnicas (GABAS JR 2008 p 78) 13

ECO Humberto A busca da liacutengua perfeita Traduccedilatildeo de Antonio Angonese Bauru Edusc

2001

56

discorre sobre a existecircncia de uma uacutenica genealogia de uma mesma liacutengua e de

uma mesma fala

Diferentemente no capiacutetulo que antecede a narrativa de Babel a proacutepria Biacuteblia

aponta para a existecircncia de famiacutelias linguiacutesticas distintas conforme Gecircnesis 11

v 5 Por estes foram repartidas as ilhas dos gentios nas suas

terras cada qual segundo a sua liacutengua segundo as suas

famiacutelias entre as suas naccedilotildees

v20 Estes satildeo os filhos de Catildeo segundo as suas famiacutelias

segundo as suas liacutenguas em suas terras em suas naccedilotildees

v 31 Estes satildeo os filhos de Sem segundo as suas famiacutelias

segundo as suas liacutenguas nas suas terras segundo as suas

naccedilotildees

Uma explicaccedilatildeo para tal passagem se daacute a partir da perspectiva dos filoacutesofos

gregos que concebiam os povos que falava de forma diferente como bagraverbaroi

seres que balbuciavam falando de forma incompreensiacutevel Logo acreditavam que

aqueles outros eram serem inferiores que natildeo falavam a liacutengua verdadeira da

razatildeo e do pensamento o logos

Tal conflito entre as liacutenguas existentes apontam para uma poliacutetica linguiacutestica que

muito explica a hierarquia (status) linguiacutestica ainda hoje atuante O status

linguiacutestico resultante das relaccedilotildees assimeacutetricas entre sociedades ou subgrupos de

uma sociedade decorre tambeacutem das circunstacircncias e condiccedilotildees que envolvem o

contato linguiacutestico Esse por sua vez evolue da dinacircmica proacutepria do processo em

que ocorrem conflitos e acomodaccedilotildees e que pode derivar pidgins crioulos e

mudanccedila linguiacutestica

57

No reconhecimento de um universo entrelaccedilado compartilhamos com o ponto de

vista de Eco (2001) e assumimos a ideia de que a existecircncia de cada liacutengua e de

sua historicidade eacute reveladora do entendimento do mundo

ldquoCada liacutengua constitui um determinado modelo de Universo um sistema semioacutetico de compreensatildeo do mundo e se temos quatro mil modos diferentes de descrever o mundo isto nos torna mais ricos Deveriacuteamos nos preocupar pela preservaccedilatildeo das liacutenguas tal como nos preocupamos com a ecologiardquo (ECO 2001 p234)

32 SOBRE O CONTATO LINGUIacuteSTICO

Pouco eacute sabido sobre o contato entre as liacutenguas do mundo quando diante da

imensidatildeo que eacute o universo linguiacutestico com o qual nos deparamos14 A

necessidade que os humanos tecircm de se comunicarem a partir do momento que a

interaccedilatildeo foi estabelecida eacute condiccedilatildeo imprescindiacutevel para o contato linguiacutestico

Trask (2004 p 66) afirma que poucas liacutenguas estatildeo - ou estiveram -

suficientemente isoladas para evitar todo tipo de proximidade e portanto toda

liacutengua mostra alguma prova de um contato antigo ou moderno entre liacutenguas

Thurston (1987 p 34) afirma que

toda liacutengua deve ter sofrido alguma influecircncia de seus vizinhos em um determinado ponto e tempo Para ele todos os idiomas satildeo liacutenguas mistas na medida em que todos copiaram formas lexicais e outros recursos linguumliacutesticos de liacutenguas vizinhas

Embora natildeo saibamos exatamente como se deu o contato entre as liacutenguas do

mundo as evidecircncias do contato podem ser observadas de forma objetiva

atraveacutes de empreacutestimos lexicais O contato linguiacutestico entretanto natildeo se reduz

14

Eacute estimado o nuacutemero de sete mil liacutenguas vivas atualmente ao redor do mundo (httpwwwethnologuecomworld Em 21 de janeiro de 2015)

58

apenas a itens lexicais oriundos dos empreacutestimos entre culturas distintas com

base na dominaccedilatildeo na expansatildeo do comeacutercio ou em qualquer circunstacircncia que

promova a necessidade de comunicaccedilatildeo entre culturas de liacutenguas diferentes

O contato a depender das liacutenguas envolvidas pode trazer consequecircncias muito

devastadoras Em casos extremos o impacto do contato pode ser avassalador

fazendo com que uma das liacutenguas seja extinta quer seja pelo deslocamento

linguiacutestico que seja pelo etnociacutedio Nestes casos ocorre a morte de uma das

liacutenguas em contato aspecto que discorremos na seccedilatildeo sobre as consequecircncias

do contato

No tocante aos efeitos do contato em relaccedilatildeo aos niacuteveis linguiacutesticos Trask Idem

afirma que o contato linguiacutestico pode ir mais longe que a interferecircncia lexical

afetando a gramaacutetica e a pronuacutencia

Concordando com o que afirma Trask Thomason postula que embora seja senso

comum que o resultado mais comum da mescla linguiacutestica seja o empreacutestimo de

palavras este eacute apenas a consequecircncia mais comum quando se trata da

intersecccedilatildeo linguiacutestica

When the agents of change are fluent speakers of the receiving language the first and redominant interference features are lexical items belonging to the nonbasic vocabulary later under increasingly intense contact conditions structural features and basic vocabulary may also be transferred from one language to the other (THOMASON 2001 p 36)

Natildeo obstante podem-se detectar exemplos de transferecircncias em todos os

aspectos linguiacutesticos uma vez que todos os niacuteveis da estrutura linguiacutestica satildeo

59

possiacuteveis de serem transferidos entre idiomas muacutetuos sem qualquer tipo de

restriccedilatildeo dadas as possibilidades de conjunturas sociais e estruturais

Quando as liacutenguas entram em contato as suas gramaacuteticas tambeacutem satildeo

intercruzadas Tal processo natildeo eacute algo simples e justo Diversos fatores externos

satildeo responsaacuteveis por esta miscelacircnea que devido a tais fatores nem sempre eacute

concebida de forma inocente

Em meio a condicionantes sociolinguiacutesticas assumimos que as gramaacuteticas

(sendo tambeacutem reflexo das relaccedilotildees intersocietaacuterias) entram num jogo em que

as peccedilas satildeo acomodadas de acordo com as necessidades comunicativas dos

interlocutores (GILES e CUPLAND 1991) Em meio a esse ldquojogordquo nos importa

refletir como os fenocircmenos que emergem do contato entre liacutenguas podem refletir

questotildees que envolvem a marcaccedilatildeo e universais linguiacutesticos

Para Aikhenvald (2007 p1)

As liacutenguas podem assemelhar-se umas as outras em categorias construccedilotildees e significados e nas formas reais usadas para expressaacute-las As categorias podem ser semelhantes porque satildeo universais e cada liacutengua tem alguma forma de fazer uma pergunta ou a elaboraccedilatildeo de um comando Ocasionalmente duas liacutenguas compartilham a forma por pura coincidecircncia

A literatura linguiacutestica atesta que a semelhanccedila interlinguiacutestica motiva estudos

tipoloacutegicos haacute deacutecadas (CROFT 1990 COMRIE 1989 WHALEY 1997) Embora

liacutenguas apresentem padrotildees regulares de desemelhanccedilas aquelas podem ser

agrupadas em tipos baacutesicos Essa realidade induz a reflexatildeo acerca da existecircncia

de universais linguiacutesticos

60

As liacutenguas individuais independentemente das semelhanccedilas tipoloacutegicas eou

geneacuteticas observadas entre elas satildeo sujeitas a mudanccedilas continuadas que

ocorrem tambeacutem devido ao contato linguiacutestico Para Thomason (2001 p14) as

influecircncias e consequecircncias do contato linguiacutestico satildeo descritas em trecircs niacuteveis i)

mudanccedila induzida pelo contato ii) mescla linguiacutestica extrema o que resulta em

pidgin crioulo e liacutenguas biliacutengues e iii) morte da liacutengua

A seguir abordaremos fenocircmenos decorrentes do contato linguiacutestico

33 MESCLAS DE CONTATO PIDGIN CRIOULO LIacuteNGUA FRANCA E JARGAtildeO

Um ponto saliente dos estudos sobre o contato linguiacutestio eacute o conceito de

ldquomescla15rdquo Este termo utilizado por Tarallo e Alkimin (1987 p7) descreve a

relaccedilatildeo entre as liacutenguas e seus resultados Inicialmente eles chamam a atenccedilatildeo

para o fato de a mescla ser interpretada como algo impuro definhamento

deterioraccedilatildeo Esta impureza linguiacutestica historicamente levou a sociedade a

alimentar a ideia de contaminaccedilatildeo e obviamente construir a discriminaccedilatildeo

linguiacutestica

Ao pensarmos sobre o processo de simbiose que as coisas e os elementos do

mundo estatildeo sujeitos em todo o tempo podemos ter uma ideia clara de que o

processo de amaacutelgama eacute proacuteprio natildeo apenas da natureza linguiacutestica mas de tudo

o que pode existir Apesar disso as mesclas com graus niacuteveis e saliecircncias

variadas nem sempre satildeo refletidas ou percebidas pelos usuaacuterios das liacutenguas do

15 Mescla eacute mistura contato amaacutelgama etc Tarallo e Alkimin (1987 p7)

61

mundo Focalizando a natureza da mescla o estudo das liacutenguas por seu turno

seja sincrocircnico ou diacrocircnico pode evidenciar os fenocircmenos do contato nos

diferentes niacuteveis linguiacutesticos

Tarallo e Alkimin (idem p9) salientam que o dinamismo linguiacutestico se daacute nas

ldquocomunidades de falardquo16 Eacute nelas e entre elas que se concretizam o contato

linguiacutestico que por sua vez produzem fenocircmenos de mescla ou de convivecircncia

coexistecircncia mecanismo ativado pelos indiviacuteduos que integram tais comunidades

Esse fato se alinha agrave perspectiva de que uma comunidade de fala natildeo eacute em

absoluto homogecircnea Nela podem coexistir processos de ordem interna e

externa assim como forccedilas centriacutefugas e centriacutepetas (BAKHTIN 2010)17

A dinacircmica social eacute tambeacutem pontuada por Tarallo e Alkimin (ibidem p9) Esses

autores mencionam que a mescla linguiacutestica resultante da dinacircmica pode ser

intracomunidade ou intercomunidade No primeiro caso as variantes convivem

eou se entrecruzam em uma mesma comunidade de fala em que apenas uma

liacutengua eacute falada No segundo liacutenguas distintas coexistem e se misturam em uma

mesma comunidade Como exemplo de mesclas intracomunidades podemos citar

o portuguecircs e suas variantes questotildees geograacuteficas histoacutericas e sociais Satildeo

variantes que convivem ldquopacificamenterdquo em territoacuterio nacional Jaacute para as mesclas

intercomunidades tomemos o exemplo do conviacutevio do portuguecircs e demais liacutenguas

16

Labov (1972) conceitua comunidade de fala como grupo de falantes que segue as mesmas normas relativas ao uso da liacutengua Para Romaine (2000) trata-se de um grupo de falantes que natildeo compartilham necessariamente a mesma liacutengua poreacutem compartilham um conjunto de normas

e regras no uso da liacutengua 17

Bakhtin aponta a luta entre classes as forccedilas que agem de dentro para fora do sujeito ou das instituiccedilotildees assim como as forccedilas que agem fazendo o movimento oposto Eacute imprescindiacutevel vislumbrar o poder poliacutetico que a liacutengua tem

62

(alematildeo polonecircs e italiano) na regiatildeo sul bem como a coexistecircncia espaccedilo-

temporal entre diferentes liacutenguas indiacutegenas e entre elas e a liacutengua portuguesa

Ao discutir a mescla linguiacutestica sob a eacutegide do contato linguiacutestico Calvet (2004

p35) considera que haacute aproximadamente na Terra cerca de 5000 liacutenguas e

cerca de 150 paiacuteses Com base nesses nuacutemeros o autor nos diz que cada paiacutes

poderia ter 30 liacutenguas Apesar de em termos reais a distribuiccedilatildeo das liacutenguas natildeo

corresponder a esse cenaacuterio o pesquisador aponta para o fato de

que o mundo eacute pluriliacutengue em cada um de seus pontos e que as comunidades linguiacutesticas se costeiam se superpotildeem continuamente O plurilinguismo faz com que as liacutenguas estejam constantemente em contato O lugar desses contatos pode ser o indiviacuteduo (biliacutengue ou em situaccedilatildeo de aquisiccedilatildeo) ou a comunidade Idem (2002 p 35)

Os dados de Calvet deixam claro que desde sempre o contato linguiacutestico eacute uma

realidade da vivecircncia do humano Os acontecimentos histoacutericos de guerra

expansatildeo e colonizaccedilatildeo apontam para a mescla linguiacutestica Diante deste

contexto vemos que o relacionamento entre as liacutenguas do mundo eacute um processo

feacutertil para a diversidade linguiacutestica Outro aspecto de interesse decorre do fato de

o contato permitir a emergecircncia de padrotildees estruturais os quais trazem luzes

para a compreensatildeo da faculdade da linguagem

A depender do contato podemos avaliar diferentes fenocircmenos resultantes A

intensidade o contato linguiacutestico pode derivar instrumentos mais ou menos

elaborados de comunicaccedilatildeo definidos como jargatildeo pidgin e crioulo

63

Os primeiros estudiosos a se aterem sobre o estudo das liacutenguas pidgins e

crioulas se utilizaram dos dados (relatos) de missionaacuterios e comerciantes que

viajaram e mantiveram contato com as aacutereas das mesclas18

331 Pidgin

O termo pidgin foi usado pela primeira vez em 1850 para conceituar o conviacutevio do

inglecircs e o chinecircs19 Mas outras duas hipoacuteteses tambeacutem satildeo colocadas quando

se trata de pidgin A segunda afirma que o termo fora transportado da Ameacuterica do

Sul no iniacutecio do seacuteculo XVII pelos marinheiros e comerciantes ingleses da colocircnia

de Leigh ao estabelecerem contato com os iacutendios Pidiam A terceira explicaccedilatildeo eacute

a origem a partir da palavra portuguesa ocupaccedilatildeo que teria sofrido algumas

mudanccedilas foneacuteticas ateacute resultar em pidgin (TARALLO e ALKMIN 1987 p80)20

Para Couto (2001 p 1) o pidgin eacute uma liacutengua com uma reduccedilatildeo draacutestica da

gramaacutetica Esta reduccedilatildeo se daacute sobre a morfologia e o leacutexico Natildeo eacute liacutengua

materna de ningueacutem pois entre si os povos dominados soacute falam suas respectivas

liacutenguas ao passo que os dominadores nunca se datildeo ao trabalho de falar outra

liacutengua que natildeo a sua proacutepria

Crystal (2008 p 201) afirma que aleacutem do processo de reduccedilatildeo para o

surgimento do pidgin as comunidades de falas envolvidas neste processo

18

Tarallo e Alkimin 1987 p 109-114 citam Francisco Adolfo Coelho Hugo Schuchardt e Dirk Christiaan Hesseling como os pioneiros neste campo de estudo Este uacuteltimo atribui aos escravos europeus a forccedila linguiacutestica Foram eles (os escravos) os responsaacuteveis pelas alteraccedilotildees sofridas pelas liacutenguas maternas 19

Neste caso o termo business ao ser empregada na expressatildeo do pidgin chinecircs de base inglesa

dɛacuteju pidzIn significando thatrsquos your business 20

Ocupaccedilatildeo gt parsquosaw ou pasaɳ

64

necessitam cada uma delas se aproximarem sucessivamente dos traccedilos mais

oacutebvios da outra liacutengua Trata-se de uma intersecccedilatildeo nem sempre consciente mas

motivada por aspectos econocircmicos como o comeacutercio Daiacute o grande surgimento de

pidgins em aacutereas de intenso comeacutercio e desenvolvimento econocircmico

Dubois et all (1998 p 469) discorre que o pidgin mesmo natildeo sendo uma liacutengua

em si mesma eacute um sistema mais completo que o sabir pois seu vocabulaacuterio

cobre numerosas atividades O sabir ou liacutengua franca21 por sua vez eacute um

sistema linguiacutestico reduzido a algumas regras de combinaccedilatildeo e ao vocabulaacuterio de

determinado campo lexical

Ainda de acordo com Tarallo e Alkmin (1987 p 88)

Fontes histoacutericas indicam que no tempo das cruzadas nas regiotildees de batalhas entre mulccedilumanos e cristatildeos teria florescido uma liacutengua de contato denominada Liacutengua Franca ou sabir Com documentaccedilatildeo precaacuteria a existecircncia dessa liacutengua eacute contestada por alguns estudiosos Originalmente usada entre aacuterabes e europeus essa liacutengua teria se expandido tendo sido usada ao longo da costa do Mediterracircneo especialmente na Aacutefrica do Norte

Em Trask (2004 p228) o conceito de liacutengua franca eacute mais explorado Para ele a

liacutengua franca se distingue do pidgin quando por ventura um dos grupos

ldquoaprenderdquo a liacutengua do outro Neste caso a gramaacutetica e o leacutexico de uma

21

Na atualidade conforme Tarallo e Alkmin 1987 p 90 a expressatildeo liacutengua franca refere-se a um

fenocircmeno mais amplo a mescla de contato para intercomunicaccedilatildeo em situaccedilotildees biliacutengues e pluriliacutengues Como exemplo os autores citam a liacutengua wolof no Senegal do swahili no Quecircnia na Tanzacircnia e em Comores do Tucano no Nordeste da Amazocircnia

65

sobressaem agrave outra O pidgin eacute compreendido entatildeo como uma colcha de

retalhos que permite uma forma bastante rudimentar de comunicaccedilatildeo22

Ainda de acordo com Trasky (p229) um pidgin pode seguir caminhos distintos i)

ele pode cair em desuso ii) ele pode continuar em uso por vaacuterias geraccedilotildees e

durar seacuteculos iii) ele pode sofre algumas alteraccedilotildees e se transformar em liacutengua

materna Neste uacuteltimo caso trata-se do processo de crioulizaccedilatildeo do qual

abordaremos mais agrave frente

Hall apud Tarallo e Alkmin (1987 p 86) ao tratar do caraacuteter reducionista que o

pidgin apresenta em sua estrutura e leacutexico aponta algumas caracteriacutesticas que

definem tais simplificaccedilotildees

Niacutevel fonoloacutegico ndash o nuacutemero de contrastes empregados eacute reduzido As vogais representadas satildeo em geral as chamadas vogais cardinais (a e i o u) enquanto os grupos consonantais satildeo caracteristicamente evitados

Niacutevel morfoloacutegico ndash ausecircncia de algumas categorias flexionadas como gecircnero nuacutemero e tempo verbal

Niacutevel sintaacutetico ndash as estruturas sentenciais satildeo simples as sequecircncias tendem a ser coordenadas evitando-se as estruturas complexas e subordinaccedilatildeo extensiva

Niacutevel lexical ndash nuacutemero reduzido de vocaacutebulos cuja accedilatildeo se norteia pela extensatildeo de significados e por polissemias significativas

332 Crioulo

O crioulo eacute um pidgin consolidado Quando os falantes crianccedilas oriundos dessa

mescla linguiacutestica utilizam o pidgin como uacutenica liacutengua ou a liacutengua que passa a

ganhar mais evidecircncia esta se consolida como liacutengua materna

22

Conforme Tarallo e Alkmin (idem p 8) algumas caracteriacutesticas do pidgin satildeo i) seu caraacuteter

auxiliar e secundaacuterio para os dois grupos cada um dos grupos manteacutem sua proacutepria liacutengua no conviacutevio social do cotidiano e do habitual ii) as liacutenguas pidgin preenchem funccedilotildees sociais limitadas sobretudo aquelas vinculadas a atividades comerciais mercantilistas

66

Para Couto (2001 p2)

Liacutengua crioula eacute um pidgin que foi adquirido como liacutengua nativa como preconiza a chamada teoria da nativizaccedilatildeo De acordo com essa concepccedilatildeo o crioulo eacute um ex-pidgin ou seja um pidgin que virou liacutengua materna de uma comunidade

Ainda para Tarallo e Alkmin (1987 p 95) as liacutenguas crioulas constituem um

conjunto de liacutenguas cuja histoacuteria conhecida eacute ligada a uma situaccedilatildeo de contato

entre populaccedilotildees linguiacutesticas cultural e etnicamente distintas Estas satildeo

distinguidas das liacutenguas pidgin por possuiacuterem uma comunidade de falantes

nativos e consequentemente por desempenharem funccedilotildees sociais amplas como

qualquer liacutengua natural

Em Dubois et all (1998 p 161) daacute-se o nome de crioulos a sabires pseudo-

sabires ou pidgins que por motivos diversos de ordem histoacuterica ou sociocultural

se tornaram liacutenguas maternas de toda uma comunidade

As liacutenguas tipo pidgin de acordo com autores como Tarallo e Alkimin (1987 p

96) aleacutem de serem as liacutenguas que daratildeo origem aos crioulos (pois todo crioulo se

origina de um pidgin embora nem todo pidgin se transforme em crioulo) satildeo

associadas a atividades de comeacutercio enquanto os crioulos satildeo marcados pela

relaccedilatildeo de escravidatildeo

Quanto ao aspecto funcional as liacutenguas crioulas datildeo conta das necessidades

comunicativas totais de seus falantes nativos e usuaacuterios uma vez que a

passagem do estaacutegio de pidgin a crioulo eacute marcada por uma ampliaccedilatildeo do leacutexico

67

e de estrutura Neste caso para os estudiosos os crioulos nada mais satildeo que

pidgins enriquecidos23

O processo de evoluccedilatildeo de um pidgin em crioulo eacute descrito por Hall (1996 p 4)

em um diagrama Nele podemos ver que inicialmente o pidgin eacute configurado a

partir de um jargatildeo uma espeacutecie de pidgin instaacutevel Depois o pidgin ganha

estabilidade se configurando como um preacute-crioulo Por fim jaacute estabilizado o

pidgin se transforma em crioulo

Figura 1 Diagrama de Hall

LL = Liacutengua lexificadora ou de superstrato LS = Liacutengua de Substrato

De acordo com Hall (idem p 5) a evoluccedilatildeo do jargatildeo para o pidgin estaacutevel eacute

chamada de pidginizaccedilatildeo A evoluccedilatildeo do pidgin estaacutevel para o crioulo eacute

23

Valdman apud Tarallo e Alkimin 1987 p 96 cita um conjunto de traccedilos negativos dos crioulos franceses do Haiti de Guadalupe Martinica Reuniatildeo Mauriacutecio Seychelles e Rodrigues como i) ausecircncia de distinccedilatildeo de gecircnero ii) natildeo-obrigatoriedade de marcador de plural iii) verbos natildeo-flexionados iv) relacionamento parataacutetico no interior do sintagma nominal v) ausecircncia de hipotaxe vi) construccedilotildees passivas vii) vogais arredondadas viii) certos grupos consonantais

I = LL + LS pidgin instaacutevel jargatildeo

crioulo = III II = pidgin estaacutevel

68

denominada crioulizaccedilatildeo A volta do crioulo para o jargatildeo processo tambeacutem

possiacutevel eacute conhecido como descrioulizaccedilatildeo

Obviamente o crioulo eacute consequecircncia natural de situaccedilotildees de contato No

entanto nem todo contato linguiacutestico gera automaticamente um pidgin ou um

crioulo Os contatos podem daacute origem a fenocircmenos de mesclas diversas que

podem ou natildeo desaparecer ou serem absorvidas pelas liacutenguas presentes na

alquimia (TARALLO e ALKMIN 1987 p 103)

Quanto ao processo de desenvolvimento e de formaccedilatildeo de um pidgin e de

crioulos Hymes (1971 p 93) afirma que

A pidginizaccedilatildeo e a crioulizaccedilatildeo da linguagem natildeo satildeo processos marginais ao contraacuterio satildeo processos que ocorrem nas liacutenguas em geral Tais processos de natureza bastante complexa compreendem a ocorrecircncia de outros subprocessos os de mudanccedila A incidecircncia desses processos ocorre principalmente 1) na forma interna das liacutenguas (fala-se assim em reduccedilatildeo ou expansatildeo) 2) na forma externa das liacutenguas (daiacute se falar em amplificaccedilatildeo e complicaccedilatildeo) 3) no escopo de uso (o domiacutenio) de uma variedade linguiacutestica (fala-se assim em restriccedilatildeo ou extensatildeo)

Hymes (idem p 94) ainda explica que diferentemente da posiccedilatildeo claacutessica onde

um crioulo era oriundo (ou natildeo) de um pidgin nesta segunda proposta a

evoluccedilatildeo de um pidgin natildeo produz necessariamente um crioulo mas um conjunto

de variedades concorrentes chamada de contiacutenuo preacute-pidgin24

24

Para Hymes o contiacutenuo preacute-pidgin poderia evoluir e gerar a cristalizaccedilatildeo de um pidgin e teria autonomia enquanto sistema de comunicaccedilatildeo Com base nesta assertiva um pidgin seria o resultado de um processo que ganharia autonomia Esse pidgin constituiacutedo poderia se transformar em crioulo Mas o contiacutenuo preacute-pidgin natildeo evolui para um pidgin Torna-se possiacutevel supor a cristalizaccedilatildeo de um crioulo sem a existecircncia de um pidgin anterior (TARALLO E ALKMIN 1987 p 105)

69

Na concepccedilatildeo final deste autor o contexto inicial em que fora estabelecido o

contiacutenuo preacute-pidgin poderia alccedilar trecircs resultados aceitaacuteveis i) a cristalizaccedilatildeo de

um pidigin ii) a cristalizaccedilatildeo de um pidgin que se criouliza iii) a cristalizaccedilatildeo de

um crioulo sem necessariamente ter sido oriundo de um pidgin anterior

Tarallo e Alkimin (1987 p 106) afirma que a cristalizaccedilatildeo de um crioulo eacute apenas

uma das trecircs possibilidades para a mescla de contato que pode ser descrita da

seguinte forma i) o crioulo pode submergir ii) o crioulo pode se estabilizar sem

muitas variaccedilotildees iii) o crioulo pode se mesclar com liacutengua padratildeo oficial

De acordo com o que vimos ateacute aqui podemos descrever o processo de

hibridizaccedilatildeo linguiacutestica com base na mescla a partir dos seguintes estaacutegios i)

contiacutenuo preacute-pidgin ii) pidgin cristalizado iii) pidgin em processo de

despidginizaccedilatildeo iv) pidgin em processo de crioulizaccedilatildeo v) crioulo cristalizado vi)

crioulo em processo de descrioulizaccedilatildeo (contiacutenuo poacutes-crioulo)

333 Liacutengua Franca ou Sapir

O termo liacutengua franca refere-se agrave liacutengua de contato entre grupos ou membros de

grupos de liacutenguas distintas com finalidade para o comeacutercio Durante o Impeacuterio

Romano o grego serviu como liacutengua franca no oriente e no milecircnio seguinte o

latim no ocidente Esta liacutengua (o sapir) tambeacutem eacute conhecida como liacutengua de

marinheiro No mundo moderno o inglecircs desempenha este papel ao ser

considerado como liacutengua do comeacutercio e das ciecircncias

70

Devido agrave natureza colonizadora dos falantes suas liacutenguas serviram de liacutengua

franca em certos momentos da histoacuteria Eacute o caso do portuguecircs e do espanhol

durante a expansatildeo mariacutetima e do francecircs durante o seacuteculo VII

Trask (2004 p 167) relata que a expressatildeo lingua franca fora originadamente

utilizada para as liacutenguas dos francos francocircnio mas teve o sentido modificado

assumindo o sentido de liacutengua europeia ou liacutengua cristatilde Ele ainda assegura que

a liacutengua franca

era uma variedade de italiano fortemente suplementada com palavras derivadas do francecircs do espanhol do grego do aacuterabe e do turco que se usava como liacutengua do comeacutercio no Mediterracircneo oriental no final da Idade Meacutedia Desde entatildeo a denominaccedilatildeo aplica-se a toda liacutengua que desfruta de um amplo entre falantes de um grande nuacutemero de liacutenguas numa dada regiatildeo

No presente o termo eacute utilizado para designar uma liacutengua estabelecida haacute algum

tempo tida como materna em um grupo influente e que serve de comunicaccedilatildeo

entre os falantes de outras liacutenguas como por exemplo o papel que o inglecircs

exerce em Cingapura

Atualmente aleacutem do inglecircs inuacutemeras liacutenguas servem de liacutengua franca para

comunicaccedilatildeo entre os povos como por exemplo o tupi No entanto um caso que

merece destaque eacute o do esperanto liacutengua que vem sendo incorporada no mundo

desde a deacutecada de 80 com a finalidade de ser a liacutengua franca universal Vale

ressaltar que neste caso os interesses para que tal liacutengua se propagasse

eficientemente eacute diferente das liacutenguas francas da Idade Meacutedia uma vez que se

trata de uma liacutengua artificial criada com ideologias poliacuteticas filosoacuteficas e

religiosas

71

334 Jargatildeo

O jargatildeo eacute um pidgin instaacutevel Sua concepccedilatildeo se aproxima do sabir ou liacutengua

franca Romaine (2000 p182) faz uso desse termo para exemplificar o processo

de criaccedilatildeo de um crioulo

A simplificaccedilatildeo e a instabilidade satildeo as marcas mais salientes de um jargatildeo No

pidgin as normas satildeo mais estaacuteveis enquanto que no jargatildeo as normas natildeo satildeo

afixadas Segundo esta autora eacute a partir do jargatildeo que a mescla linguiacutestica se

configura

Figura 2 Configuraccedilotildees da Mescla Linguiacutestica segundo Romaine (2000 p185)

Tipo 1 Jargatildeo

Tipo 2 Jargatildeo

Tipo 3 Jargatildeo

Pidgin estabilizado

Pidgin estabilizado

Pidgin expandido

Crioulo

Crioulo

Crioulo

No tipo 1 o jargatildeo deu origem diretamente a um crioulo De forma diferente no 2

o crioulo natildeo se originou diretamente de um jargatildeo Este deu origem a um pidgin

estabilizado para posteriormente chegar a um crioulo No tipo 3 o jargatildeo evolui

se transformando em um pidgin estabilizado depois em um pidgin expandido ateacute

chegar a um crioulo O fato eacute que a origem nos trecircs casos estaacute em um jargatildeo

72

34 IMPLICACcedilOtildeES DO CONTATO LINGUIacuteSTICO

Todo contato resulta em processos linguiacutesticos que alteram e dinamizam as

liacutenguas do mundo que passam por transformaccedilotildees que advecircm tanto da sua

motivaccedilatildeo interna quanto da externa No que tange agraves motivaccedilotildees externas

podemos afirmar que satildeo os contatos os grandes responsaacuteveis por muitas dessas

transformaccedilotildees podendo resultar enoutros processos orirundos ou que se

assentam no contato

341 Bilinguismo

Os estudos e as correntes linguiacutesticas na sua maioria tecircm como base liacutenguas

uacutenicas ou comunidades monoliacutengues Contudo o bilinguismo ocorre amplamente

atraveacutes do mundo e permanece apresentando um leque de questionamento para

a comunidade cientiacutefica atual Embora natildeo seja de hoje o questionamento em

torno do bilinguismo25 soacute agora podemos vislumbrar o descortinar desse tema

Estudiosos do passado jaacute reconheciam a relevacircncia do fenocircmeno Jakobson

(1953) por exemplo assumiu que ldquobilingualism is for me the fundamental problem

of linguiacutesticsrdquo

Romaine (1995 p6) elenca alguns questionamentos com base no que deve ser

observado ao estudar o contato linguiacutestico

O que eacute que o desempenho dos falantes diante do processo biliacutengue nos diz

sobre a competecircncia de pessoas e das comunidades multiliacutengues

25

Do inglecircs bilingualism

73

Eacute a troca de elementos linguiacutesticos por acaso comportamento linguiacutestico e o

cacircmbio linguiacutestico aleatoacuterio

Isto eacute indicativo de fluecircncia pobre e inabilidade em uma ou ambas as liacutenguas em

outras palavras o resultado de competecircncia imperfeita

Ao contraacuterio com qual criteacuterio medimos a competecircncia dos biliacutengues

Pode-se distinguir entre troca empreacutestimo e interferecircncia linguiacutestica

Satildeo a mudanccedila de coacutedigo e o bilinguismo generalizado em uma comunidade

sinais de atrito de uma liacutengua minoritaacuteria

Satildeo os sistemas de idiomas que estatildeo disponiacuteveis para um indiviacuteduo biliacutengue

fundidos ou separados

Aleacutem desses questionamentos outros de base sociofilosoacutefica tambeacutem estatildeo

inseridos nos estudos sobre o bilinguismo Para alguns pesquisadores muitas

liacutenguas minoritaacuterias foram exterminadas devido agrave forte influecircncia e agrave troca

linguiacutestica No entanto mesmo sendo acusado por estes como um passo para o

extermiacutenio das liacutenguas minoritaacuterias o bilinguismo natildeo deve ser visto como o

responsaacutevel pela extinccedilatildeo pelo contraacuterio o estudo dele aliado ao conhecimento

metacognitivo poderatildeo contribuir para o salvamento de muitas dessas liacutenguas

ainda que no plano escrito jaacute que na oralidade muitas natildeo gozam do status de

suas liacutenguas como oficiais nas atividades sociais sendo relegadas aos rituais de

suas sociedades

O comportamento linguiacutestico de uma determinada sociedade natildeo pode servir

unicamente de paracircmetro para outras Assim se algumas comunidades

apresentam mais facilidade em absorver outra forma linguiacutestica umas tecircm maior

resistecircncia enquanto que outras convivem por centenas de anos lado a lado com

determinadas liacutenguas

74

O bilinguismo tambeacutem pode ser classificado como social ou individual Segundo

Appel e Muysken (1986) o bilinguismo social ocorre quando em determinada

sociedade duas ou mais formas linguiacutesticas satildeo faladas quando cedo toda

sociedade se torna biliacutengue mas elas podem se tornar diferentes no que se

relaciona ao niacutevel ou forma de bilinguismo conforme figura abaixo

Figura 3 Esquema de representaccedilatildeo do bilinguismo social segundo Appel e Muysken

(1986)26

De acordo com a figura na comunidade I as duas liacutenguas satildeo faladas por dois

diferentes grupos monoliacutengues No entanto um grupo reduzido de falantes

biliacutengues seraacute necessaacuterio para fazer a comunicaccedilatildeo entre os grupos Esta forma

de bilinguismo social geralmente ocorre no periacuteodo colonial dos paiacuteses Pode-se

tomar por exemplo o Brasil quando os portugueses aqui chegaram

Em sociedades representadas pela forma II todos os falantes satildeo biliacutengues Em

paiacuteses como Aacutefrica Iacutendia e Brasil existem muitas sociedades totalmente

biliacutengues em que os falantes dominam as duas formas linguiacutesticas existentes

26

Apud Appel e Muysken (1986) p 2

75

Na forma III um grupo dessa comunidade eacute biliacutengue enquanto a outra eacute

monoliacutengue sendo este grupo na maioria das vezes a minoria Pois geralmente

o grupo biliacutengue eacute o dominante e o outro o dominado Tal circunstacircncia eacute tiacutepica

das assimetrias comuns nas relaccedilotildees entre os sujeitos do contato Situaccedilatildeo

como essa evidencia o papel da liacutengua para uma sociedade a qual pode ser

objeto de libertaccedilatildeo e tambeacutem de dominaccedilatildeo

Como dito anteriormente estas formas de bilinguismo social natildeo satildeo uniformes

nem tatildeo pouco refletem em detalhe de todas as existentes no interior das

sociedades Em muitas comunidades a situaccedilatildeo linguiacutestica eacute extremamente

complexa com mais de dois grupos e linguagens envolvidos

Com relaccedilatildeo aos aspectos linguiacutesticos o estudo do bilinguismo pode responder e

explicitar os fenocircmenos decorrentes da situaccedilatildeo do contato Fenocircmenos no

domiacutenio do leacutexico ou da sintaxe podem ser muito produtivos Entretanto podemos

considerar que eacute o niacutevel da foneacuteticafonologia que marcadamente sofre a

interferecircncia com o contato linguiacutestico

No contato duas ou mais formas linguiacutesticas podem perdurar por anos conforme

os quadros I e III na figura 3 No entanto alguns fenocircmenos linguiacutesticos podem

ocorrer paralelamente Um embate linguiacutestico pode surgir dentro dessas

comunidades linguiacutesticas e estas liacutenguas podem cambiar o leacutexico uma da outra

Sobre isso Bloomfield (1961 p 25) classifica esses empreacutestimos em iacutentimos

culturais e dialetais

76

O empreacutestimo externo ou cultural sempre eacute motivado por contatos poliacutetico sociais

e comerciais inclusive militares sempre com a dominaccedilatildeo de um dos povos Jaacute

os empreacutestimos dialetais se datildeo entre os contatos dentro de uma mesma liacutengua

satildeo as variantes regionais

O que particularmente nos interessa - o empreacutestimo iacutentimo - ocorre quando as

duas liacutenguas passam a conviverem no mesmo campo geograacutefico Dessa forma

se a liacutengua A domina a liacutengua B poderatildeo ocorrer trecircs hipoacuteteses i) B desaparece

e deixa um substrato em A ii) A desaparece e deixa um superstrato em B iii)

permanecem as duas trocando elementos na condiccedilatildeo de adstrato No entanto

natildeo devemos esquecer que as motivaccedilotildees pelas quais os falantes se apropriam

ou satildeo obrigados a se apropriarem para adquirem outra(s) liacutengua(s) extrapolam

os aspectos aqui vislumbrados

Os exemplos dados por Romaine (1995 p 2) demonstram como pode ocorrer o

cacircmbio linguiacutestico entre a liacutengua materna e a liacutengua adquirida posteriormente A

partir desses exemplos a estudiosa elenca os questionamentos mais relevantes

que deveratildeo ser observados em pesquisas que tratam da anaacutelise das

comunidades biliacutengues

(a) Kio Ke six sevem hours te school de vie spend karde ne they are speaking English all the time (Panjabi Inglecircs)

Because they spend six or seven hours a day at school they are speaking English all the time27

(b) Will you rubim off Ol man will come (Tok Pisin Inglecircs)

27

ldquoPorque eles passam seis ou sete horas por dia na escola eles estatildeo falando inglecircs o tempo todordquo

77

Will you rub [that off the blackboard] The men will come28

(c) Sano esttaacute tulla tanne ettaacute Iacutem very sick (Finlandecircs Inglecircs)

Tell them to come here that Iacutem very sick 29

(d) Kodomotachi liked it (Japonecircs Inglecircs)

The children liked it 30

(e) Won o arrest a single person (Yoruba Inglecircs)

They did not arrest a single person 31

(f) This morning I hantar my baby tu dekat babysitter tu lah (Malay Inglecircs)

This morning I took my baby to the babysitter 32

De acordo com AiKhenvald e Dixon (2006 p 2)

Se duas ou mais liacutenguas estatildeo em contato os falantes de uma tendo conhecimento da outra eles podem compartilhar traccedilos linguiacutesticos incluindo haacutebitos de pronuacutencia Historicamente todo idioma deve ter sofrido certa influecircncia de seus vizinhos O impacto do contato eacute mais forte e mais faacutecil de ser discernido em alguns idiomas enquanto em outros eacute mais fraco

O que fora dito acima pode ser comprovado em qualquer comunidade em que a

liacutengua do colonizador fora imposta durante o ato de conquista ou de contato Em

algumas comunidades a situaccedilatildeo de bilinguismo eacute motivada por outras

28

ldquoVocecirc esfregaraacute [o quadro-negro de fora] Os homens viratildeordquo 29

ldquoChame-os aqui que eu estou muito doenterdquo 30

ldquoAs crianccedilas gostam dissordquo 31

ldquoEles natildeo prenderam uma uacutenica pessoardquo 32

ldquoEsta manhatilde eu ocupei meu bebecirc agrave babaacuterdquo

78

necessidades que se fazem presente nessa sociedade O portuguecircs eacute a liacutengua de

contato que eacute utilizada por todos os membros em situaccedilotildees diaacuterias e em contatos

com a comunidade externa Enquanto a liacutengua interna eacute utilizada em seus rituais

e eacute utilizada em contexto familiar que exige mais aproximaccedilatildeo familiar entre os

membros 33

342 Diglossia

O processo de diglossia pode ser compreendido conforme Dubois et all (1998 p

190) como i) situaccedilatildeo de bilinguismo ii) situaccedilatildeo biliacutengue na qual uma das

liacutenguas eacute de status sociopoliacutetico inferior iii) aptidatildeo que tem um indiviacuteduo de

praticar corretamente outra liacutengua aleacutem da liacutengua materna

Embora seja entendida tambeacutem como uma competecircncia linguiacutestica em que o

falante de uma determinada liacutengua possa conhecer os niacuteveis formal e informal de

sua gramaacutetica para este trabalho o conceito que recorremos eacute o de diglossia

enquanto situaccedilatildeo de conviacutevio de duas ou mais liacutenguas em uma comunidade

Trata-se neste caso da utilizaccedilatildeo de uma das liacutenguas como liacutengua oficial

enquanto a outra fica a cabo das situaccedilotildees de conviacutevio Geralmente a liacutengua do

dominador eacute a liacutengua das relaccedilotildees comerciais a outra eacute utilizada nos rituais ou no

seio das famiacutelias (comunidade)

Devido agraves colonizaccedilotildees e agrave globalizaccedilatildeo a diglossia eacute muito comum no mundo

poacutes-moderno Em paiacuteses que foram colocircnias portuguesas como Moccedilambique e

33

Como exemplo podemos citar o que ocorre com o Fulni-ocirc Conforme COSTA1993 p 58

79

Timor Leste por exemplo o Portuguecircs eacute a liacutengua oficial enquanto as liacutenguas

nativas satildeo conservadas no acircmbito familiar e em ciclos informais Assim como

nas comunidades mais desenvolvidas o aprendizado de mais de uma segunda

liacutengua faz com que as comunidades se tornem pluriliacutengues

Por causa desta competecircncia linguiacutestica em que o sujeito passa a dominar dois

ou mais coacutedigos o conceito de diglossia fora ampliado agraves comunidades

monoliacutengues Neste caso entende-se que o sujeito pode ser bi- ou multiliacutengue

fora e dentro da sua proacutepria liacutengua34

Para Ferguson (1991 p 5) a diglossia eacute

Uma situaccedilatildeo linguiacutestica relativamente estaacutevel em que junto aos dialetos primaacuterios da liacutengua (que podem incluir a variante padratildeo ou as normas regionais) haacute um dialeto muito divergente altamente codificado (muitas vezes bastante complexo gramaticalmente) sobrepondo-se agrave variedade Eacute o veiacuteculo de um grande e respectivo corpo de literatura escrita tanto de periacuteodo anterior ou de outra comunidade de fala eacute aprendido atraveacutes da educaccedilatildeo formal usado na escrita e na fala em contextos formais mas natildeo eacute usado em qualquer uma das seccedilotildees de comunidade para conversaccedilatildeo coloquial

Fishman (1967 p 8) afirma que a diglossia eacute gradual e variaacutevel Para ele o

conceito de diglossia estaacute ligado ao aspecto social enquanto o bilinguismo ao

individual Dessa forma a relaccedilatildeo entre bilinguismo e diglossia na situaccedilatildeo do

contato pode se dar das seguintes formas i) diglossia e bilinguismo atuando

juntos ii) bilinguismo sem diglossia iii) diglossia sem bilinguismo e iv) nem

diglossia nem bilinguismo

34

Crystal (1985 p 82) discorre que em geral os sociolinguistas se referem a uma variedade alta (A) e outra baixa (B) correspondendo grosso modo a uma diferenccedila de formalidade A variedade alta eacute apreendida na escola costuma ser usada nos locais cuja formalidade eacute maior A variedade baixa eacute usada em outros ambientes relativamente informais

80

O referido autor complementa afirmando que

O bilinguismo sem a diglossia tende a ser transicional tanto em termos de repertoacuterios linguiacutesticos de comunidade de fala como em termos das variedades de fala envolvidas per si Sem separar no entanto as normas complementares e valores para estabelecer e manter a separaccedilatildeo funcional das variedades de fala aquela liacutengua ou variedade que seja o bastante favoraacutevel para ser associada ao movimento predominante das forccedilas sociais tende a substituir a(s) outra (s) (idem p7)

No caso dos Latundecirc a diglossia se configura como um processo em que os

falantes foram obrigados a aprender a liacutengua dos brancos utilizando-a nas

atividades em contexto de contato com o natildeo iacutendio No entanto o grupo conserva

a liacutengua original nos rituais e no reduto familiar como fora explicado

anteriormente 35

343 Alternacircncia de coacutedigo36

O processo de diglossia quando eacute configurado entre duas liacutenguas distintas resulta

em bilinguismo O bilinguismo abordado no item 231 pode ser analisado de

diversos pontos de vista mas um em especial que seraacute tratado neste toacutepico eacute a

alternacircncia de coacutedigo ou code-switching Trata-se de um processo linguiacutestico

inerente ao falante biliacutengue desenvolto ou natildeo na liacutengua que aprendera como

segunda liacutengua no caso do biliacutengue ou da terceira por diante como nos

pluriliacutengues

35

Vale ressaltar que atualmente devido agrave incorporaccedilatildeo da cultura do branco os Latundecirc estatildeo

falando mais frequentemente o Portuguecircs em diversas situaccedilotildees de comunicaccedilatildeo ateacute mesmos nas mais informais Isso se deve ao fato de as geraccedilotildees mais novas serem menos conservadoras e resistentes ao contato 36

Tratamos tambeacutem deste processo ao discorremos sobre o bilinguismo na seccedilatildeo 231

81

Dessa forma o falante biliacutengue ao se comunicar com outro falante que detenha

suas mesmas liacutenguas poderaacute fazer escolhas linguiacutesticas dentro de cada coacutedigo

ou alternando os coacutedigos Por isso os pesquisadores dizem que o falante biliacutengue

apresenta um comportamento proacuteprio em seu processo de interaccedilatildeo que eacute a

utilizaccedilatildeo do code-switching que se caracteriza por ser uma estrateacutegia de

adequaccedilatildeo interativa desejaacutevel e favoraacutevel do ponto de vista pragmaacutetico Este

processo constitui um processo de ativaccedilatildeo e desativaccedilatildeo de uma ou de outra

liacutengua

Para Auer (1999 p 46)

O termo code-switching reserva-se para os casos em que a justaposiccedilatildeo dos dois coacutedigos eacute percebida e interpretada como um ato localmente significativo pelos participantes Contrapotildee-se assim ao code-switching tambeacutem denominado language mixing (mistura de coacutedigo ou de liacutenguas) em que a justaposiccedilatildeo dos coacutedigos tem significaccedilatildeo para os participantes em sentido mais global sendo um padratildeo recorrente de comunicaccedilatildeo

Um falante biliacutengue decide primeiramente qual deveraacute ser a liacutengua de base para

ser utilizada com o outro falante que domina suas liacutenguas tambeacutem e a partir daiacute

decide se faraacute uso ou natildeo do code-switching eacute o que afirma Grosjean (1982 p

127) a partir do esquema abaixo

82

Figura 4 Escolha de liacutengua e code-switching conforme Grosjean (1982 p127)

Conforme o esquema acima o falante biliacutengue apresenta competecircncia linguiacutestica

para se comunicar tanto com um falante monoliacutengue quanto outro biliacutengue Ao se

comunicar com o falante monoliacutengue o referido falante biliacutengue faraacute a escolha de

uma liacutengua A ou a liacutengua B Neste caso natildeo poderaacute fazer uso das duas No

processo comunicativo com outro falante biliacutengue ele poderaacute utilizar a liacutengua A

com ou sem alternacircncia com a liacutengua B Ou utilizar a liacutengua B com ou sem

alternacircncia com a liacutengua A O que determina tais escolhas satildeo as vantagens e

desvantagens do cacircmbio linguiacutestico

Neste trabalho natildeo trataremos diretamente do code-switching por entendermos

que nos desviariacuteamos do objetivo basilar desta pesquisa que eacute o enfoque nos

segmentos foneacuteticos Outro aspecto seria o fato de os falantes latundecirc soacute

apresentarem a alternacircncia de coacutedigo durante as narrativas discorridas nas

83

entrevistas quando solicitados para que narrassem os acontecimentos e lendas

do seu povo

344 Morte da liacutengua

O contato linguiacutestico eacute um processo tambeacutem poliacutetico cujas consequecircncias podem

ser apenas o de mixagem ou mais intensamente a morte da liacutengua Muitas

vezes o contato eacute tatildeo devastador que extermina as liacutenguas minoritaacuterias trata-se

de um verdadeiro glotociacutedio37

Para Mcmahon (1994 p 228) a morte de uma liacutengua

Envolve essencialmente uma transferecircncia de obediecircncia de parte de uma populaccedilatildeo a partir de uma liacutengua que foi nativa na aacuterea para uma liacutengua mais recentemente introduzida na qual a populaccedilatildeo indiacutegena tornou-se biliacutengue A nova linguagem eacute geralmente falada nativamente por falantes mais potentes que podem tambeacutem ser mais numerosos e normalmente eacute associada pelos falantes da liacutengua minoritaacuteria com a riqueza prestiacutegio e progresso a liacutengua minoritaacuteria eacute entatildeo efetivamente abandonada por seus falantes tornando-se apropriada para uso em cada vez menor (e menor) contexto ateacute que seja inteiramente suplantada pela liacutengua que estaacute entrando

Dubois et all (1998 p 422) afirma que uma liacutengua morta eacute uma liacutengua que deixou

de ser falada mas cujo estatuto numa comunidade sociocultura eacute agraves vezes

desempenhar ainda um papel no ensino nas cerimocircnias rituais etc como o

latim

Para Trask (2004 p 200) a liacutengua eacute considerada moribunda ou estaacute prestes a

morrer quando o resultado de morte eacute praticamente inevitaacutevel Segundo o autor

37

Calcula-se que no iniacutecio da colonizaccedilatildeo portuguesa existiam aqui cerca de 1200 liacutenguas que

apoacutes anos de ocupaccedilatildeo de territoacuterio se resume a 180 Conforme Rodrigues 2002 p19 muitas delas estatildeo moribundas e carecem ser catalogadas

84

a cabo de uma ou duas geraccedilotildees ningueacutem mais seraacute capaz de falar esta liacutengua

pura e simplesmente Eacute a morte da liacutengua que resulta do processo denominado

substituiccedilatildeo da liacutengua

Ao dar continuidade ao seu argumento o referido autor assegura que a morte de

uma liacutengua eacute um processo gradual Assim exemplifica o pesquisador

em um dado lugar em um determinado momento algumas crianccedilas ainda estatildeo aprendendo - como sua liacutengua materna - a liacutengua que estaacute morrendo enquanto outras a estatildeo aprendendo apenas imperfeitamente e outras ainda natildeo estatildeo aprendendo de maneira nenhuma A liacutengua pode desaparecer por completo em certas aacutereas e sobreviver em outras Idem p 201

Ainda segundo Trask ibidem satildeo caracteriacutesticas da morte de uma liacutengua i) a

perda das irregularidades ii) a queda em desuso das formas e dos esquemas de

construccedilatildeo sentencial mais complexos ou menos frequente iii) a substituiccedilatildeo

maciccedila das palavras nativas por palavras tiradas da liacutengua de prestiacutegio iv) a

mudanccedila de pronuacutencia que se torna mais proacutexima da liacutengua de prestiacutegio v) a

perda da variaccedilatildeo estiliacutestica que leva agrave sobrevivecircncia de um uacutenico estilo

invariaacutevel

Nem sempre a morte de uma liacutengua estaacute diretamente ligada a aspectos

linguiacutesticos Cristoacutefaro-Silva (2002 p 56) elenca trecircs aspectos natildeo linguiacutesticos

que contribuem para a aniquilaccedilatildeo de uma liacutengua O primeiro diz respeito ao fato

de o pesquisador natildeo poder investigar o processo de morte devido agrave presenccedila de

uns poucos falantes da liacutengua O segundo trata da opressatildeo poliacutetica imposta aos

falantes que neste caso deixam de falar a liacutengua para natildeo serem perseguidos E

85

o terceiro ocorre quando a liacutengua eacute mantida apenas em rituais em que os falantes

natildeo sabem mais o teor semacircntico do que verbalizam

Natildeo diferente do aqui fora apresentado a situaccedilatildeo da liacutengua Latundecirc eacute bastante

delicada uma vez que a comunidade passou por diversos transtornos que

impactaram a forma como se organizavam socialmente O nuacutemero de nuacutemero de

falantes diminuiu e consequentemente a liacutengua se encontra altamente

ameaccedilada O portuguecircs sendo a liacutengua dominante de prestiacutegio e funcional para

a relaccedilatildeo com o mundo natildeo indiacutegena ganha espaccedilo crescente entre os Latundecirc

Esta eacute a situaccedilatildeo natildeo soacute do Latundecirc mas de vaacuterios grupos indiacutegenas

86

4 COMUNIDADE DE ESTUDO OS LATUNDEcirc

Que gente eacute essa que fala idioma tatildeo diferente das liacutenguas conhecidas tatildeo diferente da liacutengua dos seus mais proacuteximos vizinhos

que tem costumes tatildeo estranhos aos que vivem perto que natildeo conhece os objetos essenciais da vida dos seus companheiros de sertatildeo

De onde veio Por onde passou que natildeo deixou rastros Quando chegou agravequelas matas onde vive haacute tanto tempo

Que ligaccedilotildees tem com os outros filhos do Brasil Roquete-Pinto (1975 p121)

41 INTRODUCcedilAtildeO

Discorremos neste capiacutetulo sobre o povo Latundecirc e a sua comunidade descriccedilatildeo

contexto histoacuterico cultural e geograacutefico desta etnia Histoacuteria do contato conflitos

internos e externos dificuldades enfrentadas pelo grupo ao longo de sua

existecircncia denominaccedilatildeo acesso hierarquia social padratildeo e constituiccedilatildeo familiar

contatos intereacutetnico bilinguismo e ensino na aldeia

42 A FAMIacuteLIA NAMBIKWAacuteRA38 39 40

Os Nambikwaacutera41 satildeo conhecidos na etnologia brasileira por terem sido

oficialmente contatados pelo Marechal Rodom e por terem sido estudados por

Leacutevi-Strauss De origem Tupi o vocaacutebulo Nambikwaacutera eacute o resultado da fusatildeo dos

38

Os Nambikwara se auto denominam Anunsu Conforme Price amp Cook Jr The Nambikwara call

themselves aacute nu suacute people This name written anunzecirc has apereared throughout the literature but has been erroneously thought to be a band name (1969 p 690) 39

Os Nambikwra satildeo famosos na etnologia brasileira por terem sido oficialmente contatados pelo Marechal Rodom e por terem sido estudados por Leacutevi-Strauss 40

Os Nambikwara natildeo estatildeo ligados aos troncos Tupi e Macro-Jecirc Trata-se de uma famiacutelia linguiacutestica isolada com caracteriacutesticas especiacuteficas que natildeo se enquadra em nenhum desses dois grupos 41

Leacutevi-Strauss (1946 p 139) afirma que se trata de uma palavra Tupi e que deve ser escrita como Nhambikwara

87

termos ldquonambirdquo que significa ldquoorelhardquo e ldquokuarardquo cujo significado eacute ldquoburacordquo

Portanto Nambikwaacutera42 eacute ldquoburaco de orelhardquo

Coforme Leacutevi-Strauss (1946 p 48)

The name Nambikwra was mentioned for the first time and only by hearsay by Antonio Pires de Campos in the beginning of the 18th century Since then it appeared several times with reference to an unknown tribe located on the headwaters of Tapajoz There is a great discrepancy between the different spellings When General Candido Mariano da Silva Rondon began to explore the land between the Tapajoz and Gi-Parana in 1907 he met with unknown group of a unknown language and he did not hesitate to identify them with the tribe often mentioned in the early documents It was at that time that the name Nhambikwara was

definitely adopted its spelling fixed and that it was recognized as a Tupi nickname the meaning of which is big ears

A famiacutelia Nambikwara eacute dividida em dois grandes grupos aleacutem de outra

remanescente conforme figura abaixo

Figura 5 Classificaccedilatildeo das liacutenguas da Famiacutelia Nambikwaacutera de acordo com Rodrigues

(1986 p 134)

42

Seguimos neste trabalho a orientaccedilatildeo da Associaccedilatildeo de Antropologia Brasileira que em 1953

estabeleceu a fim de padronizar os nomes dos povos indiacutegenas do Brasil com o intuito de facilitar os estudos etnograacuteficos e Linguiacutesticos a nomenclatura padratildeo

88

Conforme figura acima o povo Latundecirc faz parte da famiacutelia Nambikwaacutera que se

divide em Nambikwaacutera do Norte Nambikwaacutera do Sul e Sabanecirc Os Latundecirc

juntamente com os Lakondecirc os Tawandecirc os Mamaindecirc e os Negarotecirc

pertencem ao grupo Nambikwaacutera do Norte Jaacute o Nambikwaacutera do Sul eacute composto

pelos povos Galera Kabixi Munduacuteka e Nambikwaacutera do Campo cada um

correspondendo a um complexo dialetal O Sabanecirc eacute uma liacutengua agrave parte por se

acreditar que natildeo haacute muitas semelhanccedilas entre as estruturas linguiacutesticas dessa

liacutengua e as demais liacutenguas desse grupo

Situado na aacuterea entre os rios Juruena e Comemoraccedilatildeo o territoacuterio consta do

registro de muitos autores Roquete-Pinto (1919) Leacutevi-Strauss (1946) Price e

Cook (1969) Price (1977) Mas eacute de Roquete-Pinto (1919) e Price (1983) a

exposiccedilatildeo mais aceita Em ambos os limites geograacuteficos desses povos satildeo

relatados da seguinte forma pelo Rio Papagaio (sul) pelo rio Gi-Paranaacute (norte)

pelo rio Tapajoacutes (leste) e pelo rio Guaporeacute (oeste)

Figura 6 Localizaccedilatildeo e aacuterea dos Nambikwaacutera de acordo com Roquete-Pinto (1919)

89

De acordo com a FUNAI43 os dados atuais indicam que os Nambikwaacutera hoje

com cerca de dois mil iacutendios estatildeo distribuiacutedos em seis Terras indiacutegenas (TI)

vivem no sudoeste do Mato Grosso e aacutereas proacuteximas de Rondocircnia entre a

floresta amazocircnica e o cerrado

Figura 7 Territoacuterio Nambikwaacutera descrito por Price (1983)

No que tange ao conhecimento desses povos eacute de meados do seacuteculo XVIII que

obtemos os primeiros contatos com os Nambikwaacutera Foi Luiz Pinto de Souza

Coutinho terceiro capitatildeo geral do Estado do Mato Grosso o organizador de uma

expediccedilatildeo pelas margens do Rio Guaporeacute com o propoacutesito de abrir caminhos

entre a capital de entatildeo Proviacutencia de Mato Grosso e o Forte Braganccedila

43

Fundaccedilatildeo Nacional do Iacutendio

90

Os relatos histoacutericos nos mostram que era prioridade do Governo Militar apoacutes a

Proclamaccedilatildeo da Repuacuteblica em 1889 a integraccedilatildeo de todas as terras brasileiras

Uma das accedilotildees dessa integraccedilatildeo foi a determinaccedilatildeo do governo em construir

linhas telegraacuteficas em terras indiacutegenas da Amazocircnia com o propoacutesito de interligar

o Rio de Janeiro a Cuiabaacute Agrave frente dessa empreitada estava o Major Antonio

Gomes Carneiro e entre a comitiva o seu aluno Cacircndido Mariano da Silva

Rondon

Eacute Rodon o principal agente de contato entre os iacutendios Nambikwaacutera e os natildeo

iacutendios Pois como eacute sabido dele partia o discurso de apaziguamento entre o

contato preferindo antes de qualquer coisa ser atingido a atingir os silviacutecolas

Aleacutem da motivaccedilatildeo de expansatildeo para a implantaccedilatildeo das linhas telegraacuteficas

Rondon era conduzido por um desejo ardente de respeito e proteccedilatildeo aos povos

daquela regiatildeo

Dessa forma os iacutendios Nambikwaacutera estavam entre os indiacutegenas que ajudaram a

comissatildeo do governo a alcanccedilar os lugares mais hostis Este encontro entre

indiacutegenas e brancos culminou em invasotildees e conflitos entre povos aleacutem das

doenccedilas que foram trazidas pelos natildeo indiacutegenas por isso a extinccedilatildeo de vaacuterias

tribos e povos aleacutem do prejuiacutezo linguiacutestico resultante da aculturaccedilatildeo dos

indiacutegenas frente agrave presenccedila do natildeo iacutendio uma vez que para que ocorresse o

processo de interaccedilatildeo os indiacutegenas se viram obrigados a aprender o portuguecircs

O contato entre os grupos Nambikwaacutera natildeo se deu de forma paciacutefica Os

Nambikwaacutera do Norte natildeo foram receptivos e os planos dos governos foram

frustrados De forma diferente o contato com os Nambikwaacutera do Sul se deu de

91

forma mais intensa Mesmo apoacutes os constantes conflitos o contato perdurou por

mais tempo que com os do Norte acarretando mudanccedilas culturais de costumes e

da liacutengua

Telles (2002 p 10) afirma que

Do grupo linguiacutestico do Norte hoje restam apenas remanescentes de cinco etnias Tawandecirc Lakondecirc Mamaindecirc Negarotecirc e Latundecirc Destes os trecircs uacuteltimos permanecem em aacutereas proacuteximas de seus territoacuterios tradicionais e se preservam enquanto grupos relativamente autocircnomos Estes povos natildeo habitavam tradicionalmente a regiatildeo norte do territoacuterio Nambikwaacutera e esse fato pode ter favorecido a sua independecircncia grupal ao longo do percurso histoacuterico

Figura 8 Localizaccedilatildeo atual dos Nambikwaacutera

Como consequecircncia do contato no final do seacuteculo XX a populaccedilatildeo desses povos

foi reduzida a mais ou menos 650 sendo 50 deles crianccedilas Price (1985 p 312)

92

chama a atenccedilatildeo para o processo de aculturaccedilatildeo pois para as crianccedilas ldquoseria

mais confortaacutevel falar portuguecircs que a liacutengua dos seus paisrdquo44

Ainda com relaccedilatildeo agrave classificaccedilatildeo linguiacutestica alguns estudiosos utilizam

classificaccedilotildees diferentes para organizar os povos Nambikwaacutera A divisatildeo claacutessica

de Leacutevi-Strauss (1948) distribui os Nambikwaacutera de acordo com a aproximaccedilatildeo

linguiacutestica que haacute entre eles Para ele haacute trecircs grupos principais que se subdividem

formando cinco unidades constituiacutedas por vaacuterios dialetos de uma mesma liacutengua

Price e Cook (1969) em trabalho posterior sugerem outra classificaccedilatildeo para a

famiacutelia Nambikwaacutera Para eles haacute dois grandes grupos os Sabanecirc e os

Nambikwaacutera Entretanto embora o Sabanecirc natildeo seja compreensiacutevel para os

outros grupos linguiacutesticos por razotildees estruturais Price (1972) com base num

estudo comparativo considera o Sabanecirc como integrante da famiacutelia linguiacutestica

Nambikwaacutera Para uma visualizaccedilatildeo das propostas de Leacutevi-Strauss e de Price e

Cook apresentamos as respectivas classificaccedilotildees nas tabelas a seguir

Quadro 2 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Leacutevi-Strauss (1948)

44

ldquofifty were children who are probably more comfortable speaking Portuguese than the languages of their parents

Grupo a

Grupo b

Grupo c

Subgrupo a1

Subgrupo a2

Subgrupo b1

Subgrupo b2

Oakleacutetosu

Haloacutetesu

Kiaaacuteru

Kuritsu

Soaacutelesu

Kodaacuteteli

Munuacutekoti

Nikedeacutetosu

Taruacutende

Maimatildende

Toatildende

Ioacutelola

Naseacutelate

Lakotildende

Sovaacuteinte

Sabaacutene

93

Quadro 3 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Price e Cook (1969)

Leacutevi-Strass natildeo aponta os Latundecirc como pertencente ao grupo Nambikwaacutera

devido ao natildeo contato com este povo que soacute fora inicialmente descobertos

(contatados) em 1975 pelos Aikanaacute conforme veremos a seguir

43 OS LATUNDEcirc

O povo Latundecirc pertencente ao Nambikwaacutera do Norte habita uma aacuterea de

116613671 hec no municiacutepio de Chupinguaia na regiatildeo sudoeste do estado de

Rondocircnia Com eles convivem outros dois grupos que natildeo possuem nenhum

Navaacuteite

Taiate

Nambikwaacutera

Sabanecirc

Do Norte

Do Sul

Latundecirc

Lakundecirc

Tawandecirc

Mamaindecirc

Negarotecirc

Vale do Jurema

Vale do Guaporeacute

Vale do Sarareacute

Haloteacutesu

Kithaulhu

Sawenteacutesu

Wakalitesu

Wasusu

Sarareacute

Alacircntesu

Waikisu

Hahatildetesu

94

grau de parentesco linguiacutestico Satildeo os Aikanaacute e os Kwazaacute que fazem parte da

Terra Indiacutegena (TI) Tubaratildeo-Latundecirc45

No mapa abaixo pode-se obervar a localizaccedilatildeo da TI Tubaratildeo-Latundecirc que se

situa entre a RO 370 e a BR 364

Figura 9 Localizaccedilatildeo da TI Tubaratildeo-Latundecirc46

A reserva estaacute localizada a oeste do municiacutepio de Vilhena Nela haacute trecircs vilas Rio

do Ouro Barroso e Gleba (tambeacutem conhecida como Tubaratildeo) Gleba eacute a que

conteacutem a maior populaccedilatildeo mista De faacutecil acesso pode ser adentrada pela cidade

de Chupinguaia que fica a 19 km da TI Rio do Ouro possui uma populaccedilatildeo

exclusivamente Aikanatilde e estaacute a 20 km da Gleba Barroso conteacutem a menor

populaccedilatildeo e corresponde a uma aacuterea de ocupaccedilatildeo esparsa em que se distribuem

45

Conforme Anonby the Tubaratildeo-Latundecirc Indian Reserve is inhabited by people from several tribes the tree main linguistically-unrelated Aikanatilde (also known as Tubaratildeo) Kwazaacute and Latundecirc 2009 p3 46

Inicialmente estes povos ocupavam uma aacuterea de ricas florestas no oeste do rio Pimenta Bueno

proacuteximo a uma pequena vila denominada de Satildeo Pedro

95

remanescentes Kwazaacute Aikanaacute e Latundecirc A meacutedia de distacircncia do Barroso para a

Gleba eacute de aproximadamente 25 km O acesso se daacute por uma estrada

parcialmente carroccedilaacutevel de difiacutecil locomoccedilatildeo

Com relaccedilatildeo agrave populaccedilatildeo de cada povo Anomby (2009 p5) afirma que o

quantitativo total de pessoas eacute de 219 iacutendios Deles 175 satildeo Aikanatilde 25 satildeo

Kwazaacute e 19 satildeo Latundecirc Haacute ainda 189 iacutendios distribuiacutedos por outras localidades

fora da TI 47

Quadro 4 Distribuiccedilatildeo dos povos pertencentes a TI Tubaratildeo-Latundecirc

TI Rio do Ouro 67

Gleba 48

Barroso 34

Outras localidades

Satildeo Pedro 18

Vilhena 15

Chupinguaia 7

Total 189

Durante muitos anos os Latundecirc os Kwazaacute e os Aikanatilde viveram em contato com

grupos vizinhos como os Kanoecirc Mekens Sakirap Tupariacute Salamatildei entre outros

povos que tecircm sido acolhidos pela populaccedilatildeo local da TI Mesmo com diferentes

liacutenguas eles se relacionavam com festivais e casamentos intergrupais A cultura

desses povos tornou-se muito similar devido ao contato intenso entre eles De

acordo com Anomby (2009 p 6) os traccedilos mais comuns entre este povos

incluem cestas de fibra de marico casas em forma de colmeia para

47

Em conversa com os professores desses povos Anomby Idem natildeo afirma os motivos pelos

quais tais iacutendios estatildeo afastados dos demais

96

aproximadamente dez famiacutelias bebida de milho fermentado canibalismo e

divisatildeo de clatildes

Quanto ao contato sabe-se que foram os iacutendios Aikanaacute os primeiros a contatarem

com os Latundecirc Price (1977 p 72 - 73) descreve que o entatildeo Capataz Rural

Jorge Falcatildeo fora informalmente designado encarregado da operaccedilatildeo de contato

No ano de 1976 acompanhado por cinco iacutendios Aikanaacute e um serigueiro apoacutes

cinco dias de intensa caminhada ocorreu o encontro com os Latundecirc Neste

primeiro momento o desconhecido povo tremia de medo mas se posicionaram

ainda que fragilmente na linha de defesa Apoacutes dormirem no campo o capataz e

demais membros da excursatildeo conseguiram no outro dia um contato comprovado

por poucas fotografias com o povo Latundecirc Jorge descreveu que tais iacutendios natildeo

conseguiram se comunicar com os Aikanaacute e que eram em nuacutemero de 10 homens

e 8 crianccedilas afora poucas crianccedilas que afirma natildeo tecirc-las visto

A FUNAI em 1977 com a ajuda do Capataz Rural realizou uma nova excursatildeo

aos iacutendios Latundecirc Desta vez aleacutem de Jorge juntos a ele estavam presentes

David Price e dois iacutendios Nambikwara do Norte (Lakondecirc) que conseguiram

identificar os Latundecirc como tambeacutem pertencentes agrave etnia Nambikwara do Norte

Foram mensurados como uma aldeia composta por oito casas e dezenove

habitantes 48

48

Para uma descriccedilatildeo mais detalhada ver Telles 2002 p17

97

Figura 10 Primeiros contatos com os Latundecirc (Foto Price 1977)

Em 1999 o povo era composto por vinte pessoas Entre 1999 e 2000 a grupo ficou

ainda menor com a saiacuteda de trecircs dos membros Faacutetima (irmatilde de Terezinha49)

Batataacute (a anciatilde do grupo) e Joatildeo (irmatildeo solteiro de Terezinha) As crianccedilas e os

jovens do grupo satildeo na sua maioria parentes consanguiacuteneos De acordo com as

relaccedilotildees de parentesco os mais novos natildeo poderatildeo coabitar entre si o que

implica a natildeo autonomia e a natildeo perpetuaccedilatildeo do grupo Latundecirc

49

Trata-se de a informante deste projeto de pesquisa

98

Quadro 5 Nuacutecleos familiares de acordo com a habitaccedilatildeo em 199950

Casa 1

Pais Filhos Agregados

Maneacute Torto (60) Terezinha (45)

Luiz (22) Antocircnio (20) Lorena (12) Catarino (10) Justino (8) Jaelson (4)

Joatildeo (26) Francisco (25) Irmatildeos de Terezinha

Maneacute Torto (60) Faacutetima (30)

Maria (13)

Casa 2

Joseacute (40) Lurdes (40)

Jair (13) Dido (11) Lourival (3) Lorimar (6 meses)

Cinzeiro (50) Irmatildeo de Lurdes

Casa 3 Batataacute (65)

Dados atuais51 noticiam que o grupo se enfraqueceu politicamente Tereza

mudou-se para uma aldeia de outro grupo Nambikwaacutera do Norte e Maria e Lorena

foram morar na Gleba

No que concerne agraves atividades econocircmicas a extraccedilatildeo de borracha foi a grande

atividade econocircmica na deacutecada de 30 do seacuteculo passado no sul de Rondocircnia

Durante o apogeu dessa atividade os Aikanatilde e os Kwazaacute trabalharam para

barotildees da borracha em troca de cafeacute accediluacutecar e armas de fogo

Consequentemente apoacutes aprenderem as estrateacutegias de negociaccedilatildeo na deacutecada

de 70 os proacuteprios iacutendios agora independentes passaram a vender a sua proacutepria

borracha nas cidades vizinhas (Van der Voort 1998)

50

Telles 2002 p 19 51

Informaccedilatildeo proveniente de comunicaccedilatildeo pessoal com Stella Telles janeiro de 2015

99

A comercializaccedilatildeo da borracha tambeacutem fora um pano de fundo para o processo

de bilinguismo ocorrente entre os povos dessa regiatildeo O portuguecircs se tornara

uma espeacutecie de liacutengua franca utilizada para a comercializaccedilatildeo do produto no

exterior e na interaccedilatildeo com os seringalistas Contudo as liacutenguas indiacutegenas

permaneciam sendo usadas mais provavelmente na retirada e no processamento

da borracha nas reservas52

A economia na aldeia diferentemente do que fora no passado representa a atual

situaccedilatildeo dos iacutendios Haacute pouca lavoura de subsistecircncia53 o que faz com que a

produccedilatildeo de comida seja escassa Os integrantes da aldeia quando precisam de

provimentos compram sua comida na cidade ou recebem-na dos parentes que

vivem em Rio do Ouro

Ainda de acordo com Anomby (2009 p7)

As principais fontes de dinheiro em ambas as aldeias como a maioria das aldeias no Brasil satildeo as remessas de aposentadoria para os idosos e da venda de artesanato indiacutegena aleacutem da venda de madeira e os pequenos serviccedilos prestados aos demais moradores e visitantes

No que diz respeito agrave religiatildeo atualmente a presenccedila do protestantismo eacute muito

forte na TI Tubaratildeo-Latundecirc Missionaacuterios UNIEDAS54 (iacutendios da tribo Terena)

comeccedilaram a trabalhar na aacuterea em 1980 e como resultado a maioria das

pessoas que vivem na reserva iacutendios Tubaratildeo-Latundecirc hoje se consideram

52

Neste contexto histoacuterico pode-se perceber claramente a hierarquizaccedilatildeo linguiacutestica no que tange agrave utilizaccedilatildeo da liacutengua materna Para os iacutendios jaacute ocorria o processo de contato oriundo do dominador Mesmo reconhecendo a necessidade advinda da dependecircncia econocircmica os iacutendios relutavam em manter a liacutengua matildee no interior da aldeia ou seja no seio familiar 53

Devido agrave cultura errocircnea da terra e a constante presenccedila das aposentadorias concedidas aos idosos e invaacutelidos a rotina desses povos estaacute sendo fortemente alterada 54

Uniatildeo das Igrejas Evangeacutelicas da Ameacuterica do Sul criada por missionaacuterios americanos em 1912 que eacute atualmente conduzida por lideranccedila indiacutegena

100

protestantes Os Terenas ministram suas pregaccedilotildees exclusivamente em

Portuguecircs

Uma outra famiacutelia missionaacuteria protestante pertencente agrave missatildeo ALEM55 vivem

na aldeia Rio do Ouro onde o marido Warrisson eacute um professor e sua esposa

Ana eacute uma liacuteder de igreja Eles trabalham na reserva haacute doze anos e soacute falam

Portuguecircs

Anomby (2009 p8) relata o fato de os iacutendios ainda hoje rejeitarem os esforccedilos

dos missionaacuterios da ALEM para usar o Aikanatilde na igreja

Quando Ana veio pela primeira vez a Gleba 12 anos atraacutes as pessoas disse-lhe que queria igreja em Portuguecircs e natildeo em Aikanatilde Eles especificamente disse-nos Noacutes natildeo quer um linguista Queremos algueacutem que vai fazer igreja em Portuguecircs Ana compocircs algumas canccedilotildees em Aikanatilde mas quando ela cantou para os iacutendios eles disseram que soava feio Ana pediu que as pessoas orassem em Aikanatilde mas eles sempre recusam Em um culto que participou no Rio do Ouro Ana escolheu cinco pessoas aleatoriamente para ler partes do Biacuteblia Todos foram fluentes Ana disse-nos que ateacute hoje os iacutendios nunca pediu nada em Aikanatilde - eles parecem sentir que igreja deve ser em Portuguecircs

Os Latundecirc em particular natildeo se converteram ao protestantismo Localizados

mais remotamente o difiacutecil acesso agraves igrejas existentes da Gleba e no Rio do

Ouro natildeo favoreceu ao longo de anos a frenquecircncia do Latundecirc nos cultos

A educaccedilatildeo escolar tambeacutem tem situaccedilatildeo similar entre os Latundecirc Nunca houve

escola no Barroso nas proximidades das casas dos Latundecirc Dessa forma

apenas com a ida mais sistemaacutetica dos mais jovens Latundecirc para as aldeias

Aikanaacute - sobretudo a partir do ano de 2000 - eacute que as crianccedilas Latundecirc passaram

55

Associaccedilatildeo Linguiacutestica Evangeacutelica Missionaacuteria eacute uma organizaccedilatildeo missionaacuteria fundada em 1982

sob a inspiraccedilatildeo da Wycliffe Bible Translators

101

a frequentar escola Sobre isso Anomby Idem nos relata que eacute ensinado ateacute

quarta seacuterie em todas as aldeias e a maioria dos Aikanatilde e Kwazaacute satildeo

alfabetizados em Portuguecircs Em Rio do Ouro haacute dois professores um brasileiro

que leciona em Portuguecircs e um professor biliacutengue que explica os assuntos em

Aikanatilde Trecircs moradores estatildeo terminando o ensino meacutedio dois da Gleba e um

do Rio do Ouro A liacutengua Latundecirc natildeo eacute objeto de conteuacutedo escolar

Com relaccedilatildeo agrave situaccedilatildeo linguiacutestica dos Latundecirc56 sabe-se que com exceccedilatildeo de

Maneacute Torto que eacute falante nativo de uma liacutengua Nabikwaacutera do Norte muito proacutexima

do Latundecirc o nuacutemero de falantes do Latundecirc eacute de dezenove pessoas O grupo

excetuando a Batataacute que natildeo fala portuguecircs apresenta bilinguismo em Latundecirc

Portuguecircs O bilinguismo resultante do contato que se deu em 1976 se firmou

com o contato crescente com os Aikanaacute com quem se comunicam em portuguecircs

A complexidade linguiacutestica que se instaurou entre os Latundecirc pode ser observada

na tabela seguinte

Quadro 6 Situaccedilatildeo sociolinguiacutestica dos Latundecirc (dados de 1999)

Membros

Situaccedilatildeo Social

Situaccedilatildeo Linguacuteiacutestica

Maneacute Torto (60) Liacuteder interno da tribo Natildeo Latundecirc

Cinzeiro (50)

Batataacute (65)

Membros mais velhos

da tribo

Satildeo monoliacutengues em Latundecirc

Lurdes (40) Matriarca da casa 2 Apresenta distuacuterbio de fala Eacute considerada

uma falante ruim pela proacutepria tribo Fala um

pidgin com seus filhos

Joseacute (40) Patriarca da casa 2 Fala um portuguecircs pouco claro

56

Anomby (2009 p 5) chama a atenccedilatildeo para o fato de os povos presentes na TI Tubaratildeo-Latundecirc

natildeo serem estudados extensivamente ainda Dos estudos realizados podem-se citar as pesquisas realizadas no acircmbito antropoloacutegico e no linguiacutestico Leacutevi-Strauss (1930) Lieuntenabt Zack (1942) Melatti e Price (1970) Carlson (1984) Vasconcelos (19931996) Van der Voort (19951998) e Telles (2002)

102

Jair (13)

Dido (11)

Filhos mais velhos da

casa 2

Devido ao desempenho dos pais

apresentam problemas de comunicaccedilatildeo em

ambas as liacutenguas

Lourival (3)

Lorimar (6 meses)

Filhos mais novos da

casa 2

Estatildeo em processo de aquisiccedilatildeo da

linguagem

Terezinha (45)

Matriarca da casa 1

uma das mulheres de

Maneacute Torto

Apresenta boa competecircncia comunicativa

Apesar de ser considerada biliacutengue

apresenta problemas com relaccedilatildeo agrave

compreensatildeo do Portuguecircs

Joatildeo (26)

Francisco (25)

Irmatildeos de Terezinha Falam Portuguecircs sem muita fluecircncia

Faacutetima (30)

Irmatilde de Terezinha Apresenta niacutevel de compreensatildeo muito

inferior ao da sua fala

Luiz (22)

Antocircnio (20)

Lorena (12)

Catarino (10)

Justino (8)

Jaelson (4)

Filhos de Terezinha e

Maneacute Torto

Falam um bom Portuguecircs

Maria (13) Tambeacutem fala um bom Portuguecircs

Entre 1995 e 2000 Telles (comunicaccedilatildeo pessoal em novembro de 2014) verificou

que o aprendizado do Latundecirc na comunidade eacute mais tardio do que o Portuguecircs

mesmo sendo as crianccedilas desde o nascimento expostas e estimuladas agraves duas

liacutenguas simultaneamente Na avaliaccedilatildeo subjetiva dos indiacutegenas o Latundecirc eacute uma

liacutengua mais difiacutecil sendo essa a razatildeo de as crianccedilas apresentarem melhor

desempenho no Portuguecircs Soacute em torno dos dez anos comeccedilam a utilizar com

fluecircncia o Latundecirc embora apresentem conhecimento passivo da liacutengua desde a

primeira infacircncia quando atendem com pertinecircncia aos comandos em Latundecirc

Outro fator que pode responder ao fato de a produccedilatildeo linguiacutestica ocorrer

103

primeiramente em Portuguecirc deve ser o prestiacutegio social que essa liacutengua alcanccedila

entre comunidades minoritaacuterias57

Essa situaccedilatildeo decorrente do contato linguiacutestico se daacute devido agrave mescla linguiacutestica

presente na TI e agraves necessidades de os indiacutegenas se ausentarem das terras da

TI Os povos que vivem em Rio do Ouro viajam a cidade pelo menos uma vez por

mecircs para fazer compras ou ir buscar assistecircncia meacutedica Os da Gleba se

deslocam para a cidade todos os dias quando precisam ir para a sede do

municiacutepio de Chupinguaia Dependendo da necessidade eles ficam hospedados

na casa de algueacutem conhecido ou na Casa do Iacutendio uma espeacutecie de guarita

para os iacutendios A Casa do Iacutendio mais proacutexima da TI se localiza em Vilhena

Ainda quanto ao contato linguiacutestico estudos mostram que os iacutendios do sul de

Rondocircnia tecircm o haacutebito de casar-se com iacutendios de tribos amigas Isto pode ser

comprovado com a presenccedila de palavras no leacutexico das liacutenguas em que foram

coadunadas

Conforme dados mais recentes na Gleba cerca de cinquenta por cento dos

casamentos satildeo mistos com iacutendios de outras etnias ou com natildeo iacutendios Embora

haja certa rivalidade entre os povos da Gleba e os do Rio dos Ouros o nuacutemero de

casamentos entre os iacutendios dessas duas aldeias satildeo muito frequentes

Quanto aos iacutendios Latundecirc Anomby (2009 p 9) discorre que

Os iacutendios da aldeia de Latundecirc Barroso tecircm o menor prestiacutegio e satildeo um pouco culturalmente e economicamente subjugados pelo Aikanatilde e Kwazaacute Devido agraves pequenas populaccedilotildees de Kwazaacute e Latundecirc eacute quase impossiacutevel para eles para se casar dentro de

57

Discorreremos com mais detalhes sobre o processo de bilinguismo no povo Latundecirc no trabalho proposto a ser desenvolvido

104

sua tribo Assim a sobrevivecircncia das liacutenguas e ateacute mesmo o povo como um grupo distinto eacute muito tecircnue

Devido agraves constantes necessidades de cuidado desses povos a OSCIP Creatio58

realizou estudos sobre os impactos soacutecio-antropoloacutegicos-ambientais na TI

Tubaratildeo-Latundecirc jaacute que toda regiatildeo estaacute sobre a influecircncia da PCH59 Cascata

que estaacute sendo construiacuteda no Rio Pimenta Bueno Tais estudos visam objetivar

informaccedilotildees que subsidiem a descriccedilatildeo dos possiacuteveis impactos oriundos da PCH

sobre esta TI

Figura 11 Iacutendios Latundecirc na TI Tubaratildeo-Latundecirc

Outro ponto que deve ser levado em conta ao considerar falantes biliacutengues e

monoliacutengues eacute que eles natildeo podem ser nitidamente diferenciados A avaliaccedilatildeo do

grau de bilinguismo eacute complexa dado que a sua medidade eacute escalar ou seja o

58

Organizaccedilatildeo da Sociedade Civil de Interesse Puacuteblico 59

Pequena Central Hidreleacutetrica

105

conhecimento de outra liacutengua eacute uma questatildeo de grau que vai desde 0 ateacute a

ldquoperfeiccedilatildeordquo (Van Coetesem 1988 p 9)

106

5 INTERFEREcircNCIA FONEacuteTICO-FONOLOacuteGICA DO LATUNDEcirc NO

PORTUGUEcircS

ldquoO contato linguiacutestico eacute apenas um aspecto do contato cultural e a interferecircncia linguiacutestica eacute uma face da difusatildeo lexical e aculturaccedilatildeordquo

Weinreich (1953 p 5)

51 INTRODUCcedilAtildeO

Para Thomason (2001 p 5) o contato entre liacutenguas estaacute em toda a parte muitos

paiacuteses tecircm mais do que uma liacutengua oficial e muito provavelmente a maior parte

da populaccedilatildeo mundial fala duas ou mais liacutenguas Posto dessa maneira

compreende-se que satildeo muitos os estudos que abordam sob formas aacutereas

concepccedilotildees diversas e interdisciplinares o contato linguiacutestico No que concerne agrave

linguiacutestica estes estudos satildeo de igual abundacircncia De acordo com Weinreich

(1953) grande ou pequena as diferenccedilas e similaridades entre as liacutenguas em

contato podem ser exaustivamente estabelecidas em muitos domiacutenios Todavia

quando se trata da investigaccedilatildeo do contato sob a eacutegide da fonologia e da foneacutetica

o nuacutemero destes estudos diminui consideravelmente Tal constataccedilatildeo corrobora

com a necessidade de estudos linguiacutesticos que tratem dos aspectos foneacuteticos

quando observados no contato entre liacutenguas

Por se tratar de uma sessatildeo importante para as elucidaccedilotildees dos processos

ocorridos no Portuguecircs falado pelos Latundecirc a serem discorridos no Capiacutetulo VI

descrevemos neta seccedilatildeo os segmentos das liacutenguas em anaacutelise e quais satildeos mais

suscetiacuteveis agrave influecircncia do contado linguiacutestico Devido agrave escassez de pesquisas

107

foneacuteticas fonoloacutegicas na aacuterea especificamente no Latundecirc e no Portuguecircs

Brasileiro seratildeo utilizadas como cabedal para esta anaacutelise as pesquisas de

TELLES (2002) e para a investigaccedilatildeo do inventaacuterio do sistema fonoloacutegico do

Portuguecircs a de BISOL (1996) e de SILVA (2002)

Dada a profundidade investigativa da natureza do contato cabe-nos ressaltar aqui

que o presente estudo natildeo se encarregaraacute de tratar de todas a suas nuances

visto que seu objeto estaacute delimitado quanto aos processos foneacuteticos resultantes

de tal contato

Quanto ao aporte teoacuterico seratildeo citados os trabalhos de WEINREICH (1953)

pioneiro a tratar das questotildees de interferecircncia foneacuteticas oriundas do contato entre

liacutenguas VAN COETSEM (1988) e MATRAS (2009) para elucidar os processos

ocorrentes no contato em questatildeo

52 INTERFEREcircNCIA FUSAtildeO COEXISTEcircNCIA E TRANSFEREcircNCIA

LINGUIacuteSTICA

Um dos precursores dos estudos sobre contatos linguiacutesticos Uriel Weinreich

descreve em seu livro Language in Contact (1953) os mecanismos foneacuteticos que

regem a intersecccedilatildeo existente no contato

No que concerne aos aspectos extralinguiacutesticos que regem os efeitos do contato

sobre a fala de determinado componente social Weinreich chama a atenccedilatildeo para

os fatores que estatildeo aleacutem das diferenccedilas estruturais bem como das

inadequaccedilotildees lexicais da liacutengua Segundo ele esses fatores natildeo estruturais satildeo

inerentes aos falantes que estatildeo expostos agrave situaccedilatildeo do contato por exemplo

108

a) A facilidade de o falante se expressar verbalmente e sua

debilidade de lidar coma as duas liacutenguas separadamente

b) Proficiecircncia relativa em cada liacutengua

c) Especializaccedilatildeo no uso de cada liacutengua por toacutepicos e

interlocutores

d) Forma de aprendizado em cada liacutengua

e) Atitudes para cada liacutengua se idiossincraacutetico ou estereotipado

f) A dimensatildeo do grupo biliacutengue e sua homogeneidade

sociocultural ou diferenciaccedilatildeo colapso entre subgrupos usando

uma ou outra liacutengua como sua liacutengua-matildee fatos demograacuteficos

sociais e as relaccedilotildees poliacuteticas entre esses subgrupos

g) Prevalecircncia individuais de bilinguismo com dadas caracteriacutesticas

de comportamento de fala em subgrupos em geral

h) Atitudes estereotipadas em relaccedilatildeo a cada liacutengua (prestiacutegio)

status indiacutegena ou imigrante da liacutengua em xeque

i) Atitudes em relaccedilatildeo agrave cultura de cada comunidade linguiacutestica

j) Atitudes em relaccedilatildeo ao bilinguismo como tal

k) Toleracircncia ou intoleracircncia com respeito agrave mistura linguiacutestica e

com a fala incorreta de cada um

l) Relaccedilatildeo entre o grupo biliacutengue e cada um das duas

comunidades em que ela eacute um segmento marginal (Weinreich

1953 p 4)

Um dos pressupostos baacutesicos agrave natureza do falante diz respeito ao fato de duas

ou mais liacutenguas soacute poderem estar em contato se usadas alternadamente pelas

mesmas pessoas O uso individual da liacutengua seraacute o locus do contato Quando isto

ocorre a transferecircncia de elementos foneacuteticos seraacute a motivadora pela

reorganizaccedilatildeo de todo o velho sistema de oposiccedilatildeo Ele assegura que the term

interference implies the rearrangement of patterns that result from the introduction

of foreign elements into the more highly structured domains of language such as

the bulk of the phonemic system a larger part of the morphology and syntax and

some areas of the vocabulary (p 1)60

60

O termo interferecircncia implica a reorganizaccedilatildeo de padrotildees que resultam na introduccedilatildeo de elementos no mais alto (profundo) domiacutenio de estruturas da linguagem tal como a maior parte do sistema fonecircmico uma larga parte da morfologia e sintaxe e algumas aacutereas do vocabulaacuterio

109

Quando dois sistemas satildeo confrontados no contato pode ocorrer o

reordenamento de padrotildees ou interferecircncia ou exclusatildeo Na interferecircncia

linguiacutestica o problema de maior interesse eacute a accedilatildeo reciacuteproca dos fatores

estruturais e dos natildeo estruturais ao promoverem estimularem ou impedirem cada

interferecircncia

Concernente aos ldquoMecanismos e causas estruturais de interferecircnciardquo Weinreich

idem p7 coloca que haacute um tipo de interferecircncia que eacute extremamente comum no

contato linguiacutestico trata-se da relaccedilatildeo de empreacutestimo na qual natildeo haacute uma total

transferecircncia de todos os elementos Logo percebe-se que eacute comum a

transferecircncia de parte de um sistema ou de traccedilos desse sistema fazendo com

que haja uma ldquocoexistecircncia de fusatildeo de sistemasrdquo

A coexistecircncia ou fusatildeo de sistemas linguiacutesticos pode de acordo com este

estudioso afetar a natureza de um signo linguiacutestico jaacute que esta eacute a combinaccedilatildeo

de uma unidade de expressatildeo e uma de conteuacutedo Neste niacutevel de bilinguismo ou

de interferecircncia de sistemas pode-se entendender que a relaccedilatildeo de significado e

significante natildeo se daacute de maneira uniacutevoca

Diante da complexidade que eacute a transferecircncia linguiacutestica a ilustraccedilatildeo por ele

adotada eacute a de que a interferecircncia eacute como areia carregada por um fluxo de aacutegua

Na liacutengua ela estaacute sedimentada no fundo de um lago E este fenocircmeno se daacute em

todos os niacuteveis da gramaacutetica p 11

Ao tratar dos tipos de interferecircncia nos sistemas foneacuteticos Weinreich afirma que

The problem of phonic interference concerns the manner in which a speaker perceives and reproduces the sounds of one

110

language which might be designated secondary in terms of another to be called primary Interference arises when a bilingual identifies a phoneme of the secondary system with one in the primary system and in reproducing it subjects it to the fonetic rules of the primary language (1953 p 15)61

Neste caso a interferecircncia resulta quando um falante identifica na segunda liacutengua

elementos foneacuteticos presentes na primeira liacutengua Ao reproduzir o segmento o

falante o sujeita agraves regras foneacuteticas da primeira liacutengua a liacutengua matildee

Ao prosseguir Weinreich tambeacutem aponta dois tipos de interferecircncia a partir do

quadro comparatoacuterio entre os sistemas linguiacutesticos do Romansh62 e do

Schweizerdeutsch63 liacutenguas coexistentes no Cantatildeo de Grisons na Suiacuteccedila No

primeiro caso o sistema foneacutetico do Romansh se configura como o sistema

primaacuterio e o Schweizerdeutsch como secundaacuterio No segundo caso os sistemas

satildeo alternados o sistema foneacutetico do Schweizerdeutsch assume o lugar do

sistema primaacuterio e o Romansh o secundaacuterio

61

O problema da interferecircncia foneacutetica consiste na maneira como o falante percebe (reconhece) e reproduz os sons de uma liacutengua que pode ser designado secundaacuterio em outros termos primaacuterio A interferecircncia surge quando um biliacutenguumle identifica um fonema do sistema secundaacuterio com um no sistema primaacuterio e em reproduzi-lo sujeitando-o agraves regras foneacuteticas da primeira liacutengua 62

Eacute uma das quatro liacutenguas nacionais da Suiacuteccedila juntamente com a liacutengua alematilde a liacutengua italiana e a liacutengua francesa Trata-se de uma liacutengua romacircnica do ramo ocidental que se acredita descender do latim vulgar falado pelos romanos que ocuparam a aacuterea na Antiguidade 63

Eacute qualquer um dos dialetos alemacircnicos falados na Suiacuteccedila no Liechtenstein e nas zonas fronteiriccedilas da Aacuteustria

111

Quadro 7 Quadro Comparativo dos Sistemas Foneacuteticos do Romansh e do

Schweizerdeutsch de acordo com Weinreich (1953)

Mais adiante seraacute observada a influecircncia do Latundecirc no Portuguecircs Desta forma

o Portuguecircs mesmo sendo a segunda liacutengua adquirida seraacute visto como o objeto

influenciado do contato linguiacutestico

112

Quando observou o contato entre os dois sistemas linguiacutesticos em voga

Weinreich (idem p 18 e 19) examinou o processo de interferecircncia representado

no segundo sistema fonecircmico Assim ele elencou quatro tipos de interferecircncias i)

subdiferenciaccedilatildeo de fonemas ii) superdiferenciaccedilatildeo de fonemas iii)

reinterpretaccedilatildeo de traccedilos relevantes iv) substituiccedilatildeo de fone atual

A subdiferenciaccedilatildeo de fonemas ocorre quando dois sons de um segundo sistema

cujos correspondentes que natildeo se distinguem no sistema primaacuterio natildeo satildeo bem

definidos Tal confusatildeo eacute evidenciada pela alternacircncia que o falante do Romansh

faz ao pronunciar os segmentos y e i do Schweizerdeutsch ou quando o falante

do Schweizerdeutsch faz ao pronunciar de forma insegura os segmentos i e

O processo de superdiferenciaccedilatildeo envolve a imposiccedilatildeo de distinccedilotildees fonecircmicas

do sistema primaacuterio sobre os sons do sistema secundaacuterio onde eles natildeo satildeo

necessaacuterios O processo pode ser inferido a partir de uma comparaccedilatildeo entre os

sistemas de som em contacto mesmo que nem sempre seja perceptiacutevel No

contanto entre os dois dialetos o vocaacutebulo rsquolada lsquoamplorsquo do Romansh eacute

pronunciado como acutelada no Schwyzertutsch

A reinterpretaccedilatildeo de traccedilos relevantes ocorre quando o falante biliacutengue distingue

fonemas do sistema secundaacuterio cujas caracteriacutesticas que nesse sistema satildeo

meramente concomitante ou redundante mas que satildeo relevantes no seu sistema

principal Por exemplo a palavra do dialeto Romansh [lsquomєsbullɐ] bagunccedila pode

ser interpretada quase como no Schwyzertutsch rsquomesa

Por fim o processo de substituiccedilatildeo de fone atual eacute aplicado aos fonemas que satildeo

definidos de forma idecircntica nos dois idiomas mas que se comportam de froma

113

distintas Na situaccedilatildeo descrita o segmento do Romanche e o do

Schwyzertatsch satildeo ambos definidos como vogais frontais de abertura

maacutexima mas o fonema do sistema Schwyzertfitsch eacute pronunciado mais aberto

Os fonemas b do Romansh e o B do Schwyzertfitsch satildeo ambos definidos por

suas oposiccedilotildees tensa (sem voz) consoante aspirante e nasal homorgacircnica mas

b eacute sempre vozeado B apenas ocasionalmente

Quando ao tratar dos fatores estruturais favorecedores ou inibidores da

interferecircncia foneacutetica o pesquisador em questatildeo afirma que a anaacutelise contrastiva

dos fonemas de duas liacutenguas e a forma como eles satildeo usados produz uma lista

de formas de interferecircncias focircnicas esperada em uma situaccedilatildeo de contato

particular Quando os sons satildeo vistos como parte de um sistema focircnico certos

fatores adicionais emergem favorecendo ou inibindo a reproduccedilatildeo de som

defeituoso (pg 23)

Em continuidade ele afirma que ldquoum fator que elimina certos ruiacutedos na fala em

liacutengua estrangeira eacute a existecircncia de vazios no padratildeo no sistema fonecircmico

primaacuterio em que fonemas estranhos do sistema secundaacuterio podem ser

recuperados (rotulados)rdquo Isso se daacute devido agrave semelhanccedila com o(s) segmento(s)

cujas caracteriacutesticas satildeo mais aproximadas

Sobre a difusatildeo dos fenocircmenos de interferecircncia foneacutetica Weinreich assegura que

no estudo da propagaccedilatildeo de sons oriundos do contato linguiacutestico sobretudo na

influecircncia da liacutengua estrangeira (liacutengua de contato) seria relevante que

investigasse se o resultado de muitos tipos de interferecircncia eacute difundido da mesma

forma ou com igual facilidade

114

Ao citar Sapir ele afirma que

Podemos supor que as variaccedilotildees individuais decorrentes em fronteiras linguiacutesticas tecircm sido gradualmente incorporadas ao desvio foneacutetico de uma liacutengua Isto mostra aliaacutes que um sistema de som que eacute conhecido por ter sido influenciada por um estrangeiro natildeo precisa esperar para representar uma reacuteplica exata do sistema influenciando (1949 p213)64

Para ele um dos motivos que contribuiria para a interferecircncia foneacutetica seria

agravequela desencadeada pelo status

Com base na reduplicaccedilatildeo de som de Weinreich Matra (2009 p 241) descreve

que a produccedilatildeo de segmentos foneacuteticos eacute vulneraacutevel No entanto

A replicaccedilatildeo fonoloacutegica (interferecircncia transferecircncia ou ldquoempreacutestimordquo) pode afetar qualquer niacutevel da estrutura de som a articulaccedilatildeo de fonemas individuais ou fonemas dentro das palavras o comprimento e a geminaccedilatildeo acento e tom prosoacutedia e entonaccedilatildeo Em fonologia os empreacutestimos foram muitas vezes considerados como estrateacutegias para preencher as chamadas lacunas estruturais no sistema destinataacuterio65

Matras ainda defende que a mudanccedila induzida pelo contato fonoloacutegico eacute o

resultado da incapacidade ou da relutacircncia dos falantes para manter a separaccedilatildeo

completa e consistente entre os sistemas fonoloacutegicos de duas liacutenguas Ele cita

como exemplo o fato de os falantes da liacutengua receptora lidarem com a pronuacutencia

de termos da liacutengua de origem66

64

We may suppose that individual variations arising at linguistic borderlands - whether by the unconscious suggestive influence of foreign speech or the actual transfer of foreign sounds into the speech of bilingual individuals - have been gradually incorporate into the phonetic drift of a language This shows incidentally that a sound system which is known to have been influenced by a foreign one need not be expected to represent an exact replica of the influencing system 66

Isso ocorre mais frequentemente quando uma palavra estrangeira eacute introduzida na liacutengua de

destino por apenas um pequeno grupo de biliacutengues ou semibiliacutengues e se espalha por toda fala da comunidade inclusive para os monoliacutengues natildeo estatildeo familiarizados com os sons originais da

115

Quando emprestado de uma liacutengua doadora um vocaacutebulo natildeo acarretaraacute

necessariamente em mudanccedila no sistema fonoloacutegico da liacutengua receptora O que

ocorre como jaacute fora colocado aqui eacute o processo de acomodaccedilatildeo fonoloacutegica O

vocaacutebulo emprestado passa a ser pronunciado com os segmentos foneacuteticos da

liacutengua receptora

Todavia Matra (2009 p 222-223) chama a atenccedilatildeo para um segundo tipo de

processo em que ldquoos sons que aparecem nos vocaacutebulos emprestados que satildeo

normalmente ausentes do sistema da liacutengua destinataacuteria podem ser replicados

juntamente com o proacuteprio vocaacutebulordquo fazendo com que haja um enriquecimento no

inventaacuterio foneacutetico na liacutengua receptora 67

Segundo o autor este tipo de processo ocorre com normalidade em situaccedilotildees

em que o bilinguismo eacute muito generalizado Logo ldquomembros biliacutengues de uma

comunidade que estatildeo cientes da forma original da pronuacutencia da liacutengua doadora

fazem um esforccedilo para autenticar o vocaacutebulo emprestado replicando sua forma

originalrdquo

Em continuidade ele afirma que

Uma vez que a liacutengua doadora goza de alguma forma de prestiacutegio muitas vezes devido a associaccedilotildees com comeacutercio tecnologia conhecimento e outros tipos de inovaccedilatildeo ou de poder a replicaccedilatildeo de pronuacutencias originais da liacutengua doadora satildeo imitadas por muitos monoliacutengues (natildeo falantes da liacutengua doadora) como tal levando agrave propagaccedilatildeo dentro da liacutengua destinataacuteria dos novos fonemas nos vocaacutebulos emprestados que satildeo relevantes Isso comprova o respeito dos falantes para a linguagem dos doadores e agrave sua flexibilidade no uso de sua liacutengua materna (a liacutengua do destinataacuterio) indicando que os

liacutengua doadora Em tais situaccedilotildees haacute uma forte lealdade para com a liacutengua de destino e geralmente apenas com superficial conhecimento com a liacutengua de origem (p 242) 67

Como exemplo eacute citado o caso da africada dʒ que em situaccedilatildeo de empreacutestimo pode ser

pronunciada como tʃ em palavras que oriundas do inglecircs

116

falantes se contentam em atribuir fonologicamente autenticidade agrave replicaccedilatildeo de empreacutestimos lexicais prioritaacuterios maiores do que para a preservaccedilatildeo das estruturas fonoloacutegicas coerentes de sua liacutengua nativa (idem p 224)

Em uma situaccedilatildeo onde o bilinguismo eacute estabelecido e prolongado os falantes (na

maioria de uma liacutengua minoritaacuteria como o caso dos Latundecirc) podem ajustar o

inventaacuterio de sons e as regras que regem a sua distribuiccedilatildeo para coincidir com as

do outro

Matras (2009 p 225) atraveacutes de um quadro descreve os quatro tipos de

mudanccedilas fonoloacutegicas oriundas do contato linguiacutestico com base nos perfis dos

falantes linguagem e atitudes

Quadro 8 Tipos de processos que conduzem a mudanccedila fonoloacutegica induzida por contato

117

Com base no quadro anterior depreende-se que

i) O tipo A eacute diferente na medida em que natildeo envolve nenhuma mudanccedila no

sistema fonoloacutegico mas apenas uma mudanccedila de palavras individuais

enquanto os tipos B-D todas envolvem algum grau de modificaccedilatildeo para o

sistema tal como utilizado por colunas numa base regular No entanto

existem semelhanccedilas entre os tipos de aspectos individuais

ii) Os tipos A e B satildeo semelhantes e giram em torno de palavras emprestadas

individualmente

iii) Os tipos A e C satildeo semelhantes em que ambos envolvem a transferecircncia

de recursos de liacutengua nativa para material diferente

iv) Os tipos B e D satildeo semelhantes em que ambos envolvem a adoccedilatildeo de

padrotildees sonoros estrangeiros e sua integraccedilatildeo na liacutengua nativa

v) Os tipos C e D mostram como mencionado acima o fato de que os

falantes tentam evitar que para selecionar os sons de dois conjuntos

distintos de inventaacuterio e ateacute generalize apenas um conjunto de sons para

serem usadas em ambas as liacutenguas isto eacute em toda a interaccedilatildeo contextos

Os falantes do portuguecircs falado por Latundecirc se estendem em duas direccedilotildees Em

tipos A e C onde os falantes reinterpretam os sons dos vocaacutebulos emprestados

da liacutengua doadora alinhando-os aos padrotildees e inventaacuterio da liacutengua receptora

(nativa) No tipo D os falantes modificam os segmentos foneacuteticos com base no

inventaacuterio externo A aplicaccedilatildeo de uma determinada regra fonoloacutegica pode

resultar na perda ou em ganho de fonemas p226

118

O contato linguiacutestico pode ser representado ainda como um contiacutenuo Nele

ocorrem forccedilas centriacutefugas e centriacutepetas que dinamizam os sistemas linguiacutesticos

Para Matras idem p 226 fatores como normas sociais lealdade e consciecircncia

de identidade podem interferir e ateacute mesmo neutralizar os fenocircmenos advindos do

contato O empreacutestimo sofreria portanto estas pressotildees

Figura 12 Ligaccedilotildees entre a intensidade do bilinguismo o tipo de processo de acomodaccedilatildeo e sobreposiccedilatildeo entre os sistemas fonoloacutegicos

Quanto menor for o bilinguismo maior seraacute a separaccedilatildeo de sistemas Por outro

lado quanto mais intenso for o bilinguismo maior seraacute a convergecircncia de

sistemas fonoloacutegicos

No que concerne agrave integraccedilatildeo fonoloacutegica Matras (2009 p 227) explica que a

substituiccedilatildeo de fonemas eacute uma das formas mais comuns posto que este

processo permite uma aproximaccedilatildeo de caracteriacutesticas entre o sistema interno e

externo Dessa forma a substituiccedilatildeo eacute mais comum uma vez que os fonemas

satildeo combinaccedilotildees de recursos articulatoacuterios e as caracteriacutesticas em comum satildeo

mantidas em detrimento agraves complexidades dos fonemas que natildeo compartilham de

traccedilos em comum

119

Ele tambeacutem chama a atenccedilatildeo para a estrutura silaacutebica dos sistemas fonoloacutegicos

que entram em contato afirmando que ldquoos estrangeirismos podem acomodar a

siacutelaba e a estrutura do acentordquo (idem p 228)

A aplicaccedilatildeo de regras sobre a distribuiccedilatildeo de fonemas oriundos do empreacutestimo

pode resultar na perda de um traccedilo ou de um fonema A integraccedilatildeo de fonemas

tambeacutem pode levar agrave omissatildeo de outros fonemas que natildeo fazem parte o

inventaacuterio fonoloacutegico da liacutengua receptora E a omissatildeo de certas caracteriacutesticas

durante a replicaccedilatildeo de fonemas pode ser prejudicial para o sistema como um

todo e isso pode resultar em uma reduccedilatildeo de pares miacutenimos

Sobre a convergecircncia dos sistemas fonoloacutegicos Matras (2009 p 229) assegura

que um fator que retarda o processo de substituiccedilatildeo de som eacute a presenccedila de

vaacuterios pares de vocaacutebulos que contam com o contraste Neste caso a

convergecircncia aumenta as semelhanccedilas entre os inventaacuterios fonoloacutegicos das duas

liacutenguas E a replicaccedilatildeo da variaccedilatildeo alofocircnica eacute uma via comum para a

convergecircncia

Quanto aos segmentos foneacuteticos ainda de acordo com o pesquisador em

questatildeo as consoantes satildeo as mais introduzidas nos estrangeirismos Uma vez

que nas liacutenguas do mundo o nuacutemero de segmentos consonantais eacute maior que o

das vogais Logo os vocaacutebulos emprestados satildeo mais propensos a introduzir

mais consoantes que vogais

No caso Portuguecircs falado por Latundecirc tal assertiva em parte se configura A

anaacutelise dos dados prova que satildeo as consoantes as mais favoraacuteveis para a

realizaccedilatildeo dos processos foneacuteticos Todavia o nuacutemero de consoantes nessa

120

liacutengua eacute menor que o de vogais conforme descriccedilatildeo de Telles 2002 a qual

veremos na proacutexima seccedilatildeo

Van Coetsem (1988 p7) tambeacutem aborda os processos e comportamentos

oriundos do contato linguiacutestico68 E para que este contato seja estabelecido eacute

necessaacuterio que se tenha uma liacutengua de origem (SL) e uma liacutengua destinataacuteria

(RL)

Figura 13 Correspondecircncia entre liacutenguas e contato linguiacutestico

Embora o modelo de Van Coetesem seja universal e demonstre que na maioria

dos contatos linguiacutesticos a liacutengua de origem seja uma liacutengua dominante

ressaltamos que neste trabalho a liacutengua de origem (SL) eacute a liacutengua minoritaacuteria o

Latundecirc E o substrato analisado eacute uma modalidade de portuguecircs falado pelos

Latundecirc

Em continuidade este estudioso afirma que

Um empreacutestimo fonoloacutegico eacute uma imitaccedilatildeo uma reacuteplica ou uma reproduccedilatildeo na liacutengua recipiente (RL) de um elemento estrangeiro ou uma pronuacutencia da liacutengua de origem (SL) Esse tipo de imitaccedilatildeo eacute muitas vezes apenas uma aproximaccedilatildeo Para o imitador a imitaccedilatildeo implica o uso de algo que ele natildeo tem na sua proacutepria liacutengua Um empreacutestimo fonoloacutegico como uma imitaccedilatildeo eacute portanto algo que o falante imitador da RL natildeo tem em sua fonologia integrada ou nativa ou seja algo

68

Para Van Coetsen o termo ldquoempreacutestimo fonoloacutegicordquo indica qualquer forma de empreacutestimo no acircmbito da fonologia segmentar ou suprassegmental independentemente se isto afeta a dimensatildeo paradigmaacutetica a dimensatildeo sintagmaacutetica ou ambas (p7)

121

fonoloacutegico ou subfonoloacutegico que deriva de seu sistema fonoloacutegico nativo (Idem p 8)69

A intenccedilatildeo do falante ao fazer uso do segmento emprestado eacute reproduzi-lo da

melhor forma possiacutevel Ao fazer isso ele obedece agraves consideraccedilotildees sociais O

proacuteprio fato de que o segmento natildeo esteja inserido em seu proacuteprio sistema faz

com que na pressatildeo de se adaptar a diferentes pronuacutencias ele (o falante) procure

o equivalente mais proacuteximo em seu sistema

Para que isso ocorra ldquoo falante faz uso de dois processos a imitaccedilatildeo e a

adaptaccedilatildeo p 9rdquo Ambos pressupotildeem a existecircncia de um conjunto organizado de

segmentos fonoloacutegicos e distribuiccedilatildeo de unidades inseridas pelo falante da liacutengua

recipiente por um lado e por outro o confronto das pronuacutencias estrangeiras com

que o falante tem que lidar

Aleacutem dos processos de imitaccedilatildeo e adaptaccedilatildeo Van Coetesem tambeacutem utiliza a

noccedilatildeo de integraccedilatildeo ldquoque eacute a incorporaccedilatildeo de elementos em uma dada liacutengua

advindos de outra(s) liacutengua(s)rdquo A imitaccedilatildeo seria portanto o preacute-requisito para a

integraccedilatildeo No caso do portuguecircs falado pelos Latundecirc natildeo haacute indiacutecios de

integraccedilatildeo de fonemas especiacuteficos da sua liacutengua de origem

Para que ocorra o processo de imitaccedilatildeo eacute necessaacuterio que haja uma agentividade

que eacute um tipo especiacutefico de transferecircncia onde o falante de uma dada liacutengua eacute

ativo e o outro passivo O inverso tambeacutem pode ocorrer

69

A phonological loan is an imitation replication or reproduction in the RL of a foreign or SL

pronunciation such an imitation is often only an approximation For the imitator imitation implies the use of something that he does not (yet) have of his own A phonological loan as an imitation is thus something that the imitating RL speaker does not have in his integrated or native phonology something phonemic or subphonemic that deviates from his native phonological system

122

Figura 14 Agentividade da Liacutengua Recipiente de acordo Van Coetsem 1988 p10

Na agentividade da liacutengua recipiente (RL)70 o segmento dominante na relaccedilatildeo

entre a liacutengua recipiente e a liacutengua de origem71 eacute o da liacutengua recipiente Logo o

domiacutenio linguiacutestico seraacute o da liacutengua recipiente

Figura 15 Agentividade da Liacutengua de Origem de acordo Van Coetsem (1988 p11)

Na agentividade da liacutengua de origem (SL) o segmento dominante na relaccedilatildeo

entre a liacutengua recipiente e a liacutengua de origem eacute o da liacutengua de origem Sendo

assim o domiacutenio linguiacutestico seraacute o da liacutengua de origem

Tomando como referencial os modelos apresentados podemos estabelecer um

contiacutenuo cronoloacutegico para compreender como se daacute a agentividade sobre o

contado do Portuguecircs com o Latundecirc

70

No caso em questatildeo a modalidade do portuguecircs falado pelos Latundecirc eacute a liacutengua recipiente 71

Consequentemente a liacutengua de origem (SL) eacute o Latundecirc

123

Figura 16 Relaccedilatildeo de agentividade entre o Portuguecircs e o Latundecirc

Historicamente devido aos fatores socioeconocircmicos o contato inicial se daacute entre

o Portuguecircs influenciando o Latundecirc Aquele como liacutengua majoritaacuteria e este como

minoritaacuteria

O Latundecirc por ser a liacutengua do povo dominado eacute submetido agraves interferecircncias da

liacutengua de domiacutenio Deste contato resulta uma modalidade especiacutefica do

Portuguecircs que eacute o falado por Latundecirc

Em suma podemos afirmar que embora seja o Portuguecircs a liacutengua dominante e

que inicialmente seja ele o agente sobre o Latundecirc a posteriori fora o Latundecirc o

agente pelas transformaccedilotildees ocorrentes no Portuguecircs de contato Posto dessa

forma a agentividade se daacute em ambos os contextos a partir do referencial que se

tenha uma vez que o Portuguecircs e o Latundecirc tanto influenciaram como foram

influenciados Mas vale ressalvar que para este recorte o Portuguecircs eacute a liacutengua

que sofre influecircncia Eacute este o fio condutor da nossa pesquisa

Portuguecircs Latundecirc Portuguecircs falado por Latundecirc

124

53 FONOLOGIA DO LATUNDEcirc

Para uma melhor compreensatildeo futura passaremos agora a descrever os

sistemas fonoloacutegicos das liacutenguas em estudo

Elencamos abaixo as principais caracteriacutesticas fonoloacutegicas do Latundecirc

Eacute uma liacutengua com maior quantidade de elementos vocaacutelicos (dezesseis)

em detrimento aos consonantais (onze) Eacute uma liacutengua vocaacutelica portanto

Apresenta dez vogais orais e seis nasais Dessas oito satildeo laringais72

As vogais nasais satildeo contrativas apenas na posiccedilatildeo do acento

Os glides w j quando em posiccedilatildeo de onset sofrem o processo de

consonantizaccedilatildeo

Apresenta seis tipos de siacutelabas fonoloacutegicas que satildeo derivadas da extensatildeo

(C)V(C)(C) V VC VCC VC CVC e CVCC

O nuacutecleo silaacutebico eacute sempre preenchido por uma vogal

Dos segmentos consonantais apenas a oclusiva glotal ʔ natildeo eacute observada

em posiccedilatildeo de onset

A coda pode ter desdobramento ramificado sendo a primeira posiccedilatildeo

preenchida sempre por um glide

Os padrotildees silaacutebicos VC e CVC satildeo os mais frequentes e ocorrem tanto

em siacutelaba tocircnica como aacutetona

Tem uma forte tendecircncia agrave monotongaccedilatildeo

O sistema acentual eacute misto que associa o acento lexical ao acento foneacutetico

72

Telles explica que as mais novas geraccedilotildees Latundecirc abaixo de 20 anos realizam o traccedilo laringal com menor frequecircncia e audibilidade

125

O acento eacute realizado foneticamente como tom (pitch) alto

Eacute uma liacutengua de caracteriacutestica de liacutenguas pitch accent

Apresenta processos fonoloacutegicos em niacutevel poacutes-lexical fundamentalmente

Estes processos satildeo agrupados em assimilaccedilatildeo (harmonia vocaacutelica e

vozeamento das oclusivas) dissimilaccedilatildeo reduccedilatildeo apagamento silaacutebico e

epecircntese

Quadro 9 Fonemas consonantais do Latundecirc

Fonemas Consonantais

Labiais Coronais Dorsal Glotais

+ anterior - anterior + anterior - anterior - anterior - anterior

Plosivas p t k

Nasais m n

Fricativas s h

Lateral l

Glide w j

Quadro 10 Fonemas vocaacutelicos do Latundecirc

Fonemas Vocaacutelicos

Vogais Vogais Laringais

Altas i u i u

Altas Nasais ĩ ũ i u

Meacutedias e o e o

Baixa a a

Baixa Nasal a a

126

Quadro 11 Ditongos do Latundecirc

Ditongos

Crescentes Decrescentes

w j w J

i wi iw

e e we we je je ej e j

a a a a wa wa ja ja ja aw a w a w aj a j atildej

o o wo jo ow

u u u ju ju ju

Quadro 12 Descriccedilatildeo dos fonemas consonantais (Retirada de Telles 2002)

Segmento - Descriccedilatildeo - Contexto de realizaccedilatildeo e especificidades

Exemplos

Traduccedilatildeo

p73 - Oclusiva bilabial surda

Eacute de extrema limitaccedilatildeo de realizaccedilatildeo na liacutengua

Ocorre em posiccedilatildeo de onset formando

siacutelabas com as vogais i a atilde o u

Pode se realizar como [p] oclusiva bilabial surda [b] oclusiva bilabial

sonora [ɓ] oclusiva bilabial sonora

implosiva

Em iniacutecio de palavras realiza-se [p]

diante da vogal coronal [i] e [b ɓ] e

diante da vogal baixa [a]

Em meio de palavra ou enunciado quando precedido por oclusiva glotal realiza-se [p]

[pite]

piʔ-te

[ιɓ

pan-tatilden

[diʔpa natildenʌ]

jaliʔ pan-tatilden-ta

[kotildebayte] ~ [kotildebayte]

kownpayt-te

[sabagnĩde]

Espeacutecie de paacutessaro chupito Satildeo dois Satildeo dois colares Tatu espeacutecie de

73

Outros estudos com liacutenguas proacuteximas tambeacutem indicam a baixa frequecircncia da realizaccedilatildeo do p

nas liacutenguas desse grupo Kingston 1970 para o Mamaindecirc e Lowe 1961 para o Nambikwaacutera do sul (Galera Kabixi Munduacuteka Nambikwaacutera do Campo)

127

Em meio de palavras ou enunciados em ambiente intervocaacutelico ou nasal adjacente realiza-se [b]

sapan-kinĩn-te

[tʃabatildeʔginĩde]

sapatilden-kin-te

Pente Taioba

m - Nasal labial + anterior

Oclusiva bilabial nasal com distribuiccedilatildeo mais larga do que a do p

Apresenta ocorrecircncia restrita quanto comparada agrave nasal alveolar n

Realiza-se [m]

Ocorre em iniacutecio de siacutelaba diante das

vogais i i i i a a a u u u u

Natildeo forma siacutelaba com as vogais

meacutedias frontais e e e com as

posteriores o o

Apoacutes pausa e seguida de a pode se realizar como oclusiva bilabial nasal

preacute-glotalizada - [ ʔm ]

[ miɾatildenʌ]

mih-tatilden-ta

[katilde ɾatildenʌ]

kami h-tatilden-ta

[ a ĩ de]

e ĩn-te

[ e ĩ de]

e ĩ -te]

[ ma hɾatilden]

mah-tatilden

[ atildega ɾe]

atilden-kaloh-te

[ka a ʔɾatildenʌ]

ka- a -tatilde-ta

[ datildena]

n-tatilden-ta

[tumuʔku ɾe]

tumuʔku-te

Estaacute chovendo Aacutegua estaacute suja Cobra espeacutecie de Couro Ele estaacute esperando Roupa Estaacute molhado Estaacute bonito Jacu

128

Em fronteira de morfema precedido pela fricativa glotal h teraacute a sua realizaccedilatildeo ensurdecida

[ a datildenʌ]

a n-tatilden-ta

[ʔ atilde ɳ datilden]~[ a n datilden]

atilden-tatilden

[ʔ atildeʔ n datilden] ~

[ atildeʔ ndatilden]

atilden- n-tatilden

[n h atildega tna ]

n - atilden-ka -tatilden-na

Estaacute inchado Estaacute queimando Vocecirc estaacute mandando Eacute nossa roupa

w - Glide labial - anterior

Glide laacutebio-velar sonoro

Ocupa as posiccedilotildees de onset e coda

Apresenta leve arredondamento nos laacutebios

Eacute o segmento mais frequente das labiais

Realiza-se como [w] em iniacutecio de

siacutelaba diante das vogais i e e a a o

tambeacutem podendo variar com [ʋ]

fricativa laacutebio-dental que eacute realizada com fraco grau de fricccedilatildeo

[ wi rsquoɾatilden] ~ [ ʋi ɾatilden]

wi -tatilden

[woda h de] ~ [ʋoda h de]

wotah-te

[na weʔrsquoa jrsquoɾe] ~ [na ʋeʔajrsquoɾe ]

na jn-weʔa jh-te

[ kowajna tatildenʌ]~ [koʋajna tatildenʌ]

hah-wa jn-ta-tatilden-ta

[daweʔgɾatilde ni]

taweʔ-ka-tatilden-ti

[ we jginĩdatildena]

we jn-kinĩn-tatilden-ta

[ wajkinĩ de]

wajʔ-kinĩn-te

Ele comeu Pomba Eacute para colocar na cabeccedila Satildeo poucos laacutepis Ele cozinhou Eacute fruto da bacaba

129

Em dissiacutelabos no onset de siacutelaba preacute-tocircnica aberta seguido de vogal a central baixa pode ocorrer a fusatildeo entre o w e a vogal a realizando-se como [ͻ o u]74

Na sequecircncia w + a o a pode sofrer harmonia vocaacutelica recebendo o ponto de articulaccedilatildeo da vogal acentuada sendo realizada [e]

Quando em final de siacutelaba segue as

vogais i o a a

E depois das vogais io pode alongar-se

Se a vogal precedente for a baixa a

a ocorreraacute a fusatildeo resultando as

posteriores ͻ ͻ

Quando em siacutelaba em siacutelaba

acentuada ͻ ͻ podem ser alongados

ou seguido de oclusatildeo glotal [ʔ] ou

ocorrer uma assimilaccedilatildeo regressiva

das baixas aa passando a [ͻ ͻ ]

Quanto agrave frequecircncia w se mais

ocorrente depois da vogal baixa a a

e baixiacutessima ocorrecircncia depois da vogal i o

Ao integrar uma siacutelaba (C)v wN onde a

vogal eacute nasalizada o glide pode ser nasalizado ou coalescer com a consoante nasal na coda

Em posiccedilatildeo de onset e pronunciada rapidamente eacute fortificada podendo ser realizada como [p] e [m]75

[ wa jkinĩ de]

wa jh-kinĩn-te

[waɾaɾwaɾaʔĩ datildenʌ] ~

[wͻɾaʔwͻɾaʔĩ datildenʌ] ~

[ͻɾaʔͻɾaʔĩ datildenʌ]

watajwatajn-tatilden-ta

[weli nde] ~ [uli n de]

wa ĩn-te

[weɾe ɾatildena] ~ [ ɾe ɾatildena] ~

[ rsquoɾe ɾa na]

wateh-tatilden-ta

[giw ladaɾe] ~ [gi la de]

kiwlah-tah-te

[kowa ɾe] ~ [koa ɾe]

kowah-te

[a wde] ~ [ ͻ de] ~ [ ͻ ʔde]

a w-te

[aw de] ~ [ͻ de] ~ [ͻʔ de]

awh-te

[na w du] ~ [nͻ du] ~ [nͻ w du]

na wh-tu

[a wm datilden] ~ [atilde w m datilden] ~

Amendoim Fruto do accedilaiacute Estaacute fino Tamanduaacute Estaacute sumido Cascavel Andorinha Flexa Gaviatildeo

74

Conforme Telles (2002 p 42) Estas alofonias variam de acordo com a qualidade da vogal

tocircnica da siacutelaba seguinte com a qual sua vogal aacutetona nuclear se harmoniza 75

Tal ocorrecircncia eacute mais frequentemente constatada em falantes monoliacutengues em Latundecirc

130

[atilde m datilden]

atilde wn-tatilden

[woloʔʔnatildenʌ] ~ [polo ʔnatildenʌ]

walon-tatilde-ta

[wʌnaʔkinĩ de] ~ [mʌnaʔkinĩ de]

~ [wanaʔkinĩ de]

wanaʔ-kinĩn-te

[wo nut ʔna ] ~ [mo nut ʔna ]

wo nuʔ-tatilden-na

[wʌ na jginĩ datildenʌ] ~

[mana jginĩ datildenʌ] ~

wa -na jn-kin-tatilden-ta

[wa ʃi de] ~ [maʔ ʃi de]

wa-sin-te

Lontra Estaacute assando no burralho Estaacute podre Castanha do caju Eacute corpo inteiro Eacute tua cabeccedila Espeacutecie de abelha

t - Plosiva coronal + anterior

Oclusiva alveolar surda

Ocorre com as vogais ie e a

a atilde o o u ũ

t realiza-se [d] em siacutelaba acentuada podendo ainda variar em posiccedilatildeo medial como [|]

Em iniacutecio de palavra o alofone [d] pode ser realizado como preacute-

[diko lo n de]

tiʔ-ko lo n-te

[ de he ɾaɾe]

te h-tah-te

Paacutessaro pintado espeacutecie de paacutessaro Ele cozinhou

131

glotalizado realizando-se como

[ɗ]

Em fala lenta pode ser realizado como [d]

Em contexto fora do acento ocorre [t] com raros exemplos de variaccedilatildeo entre os alofones [d] e [t]

[ de geɾatilden]

te h-ka-tatilden

[daʔjͻ ratildena]

ta-jaw-tatilden-ta

[da jginĩ de]

ta jn-kinĩn-te

[ doɾatilden] ~ [d ɾatilden]

toh-tatilden

[do h gratilden]

to h-ka-tatilden

[du ɾatilden]

tu-tatilden

[d hdatilden]

tu-tatilden

[kͻdͻ ɾe]

kataw-te

[kado ndatildenʌ]

katon-tatilden-ta

[teda de]

teta-te

[toʔdatilde n de]

toʔtatilden-te

[tigi ɾe]

tikih-te

Sucuri Ele estaacute sentado Pedra Ele morreu Ele procurou Ele pegou Ele chupou Patuaacute Estaacute cru Jaoacute Nambu

132

As possibilidades alofocircnicas de t entre segmentos depende do acento e do contexto adjacente Estas duas condiccedilotildees definem as alofonias76

Precedido de vogal em ambiente

intervocaacutelico realiza-se [tdɾ]

sendo [d] o preferencial

Quando t eacute precedido por h

realiza-se como [tdɾ] A

presenccedila da fricativa favorece o rotacismo de t tornando-o em

[ɾ]

Quando t eacute precedido de ʔ ou

de t a realizaccedilatildeo pode ser [t] mas [d] pode permanecer em raros casos

Em contexto de nasalizaccedilatildeo trecircs realizaccedilotildees satildeo possiacuteveis para t i) vozeamento da oclusiva alveolar ii) preacute-nasalizaccedilatildeo da oclusiva alveolar em iniacutecio de siacutelaba tocircnica e iii) assimilaccedilatildeo total da nasal adjacente

[tabawdnͻde]

tapawn-naw-te

[tala de] ~ [dala de]

tala-te

[tolowm datilde ]

talown-tatilden

[lodo ɾa ɾe] ~ [lo to ɾa ɾe] ~

[loto ɾa ɾe]

loto-tah-te

[doʔ daj de] ~ [toʔ ɾaj de]

to-tajn-te

[nu h ɾe] ~ [ nu h de]

nu h-te

[lo hrsquoɾe] ~ [lo h de] ~

[lo h te]

loh-te

[hu te] ~ [hu de]

huʔ-te

[keja te] ~ [kejaʔ te]

kejat-te

[ĩ datildena] ~ [i ndatildena] ~ [i natildena]

Macaco pequeno Ombro Tipoia Ele terminou Rato grande Abelha vermelha Lagarto grande Urubu

76

Dessas alofonias o flap [ɾ] tem sua ocorrecircncia ligada ao acento

133

Em siacutelaba natildeo acentuada t pode sofrer fricatizaccedilatildeo passando a se realizar como [s]

ou [ts] ou [ʔs]

Ainda neste contexto permanecem possiacuteveis as realizaccedilotildees [t] e [d] se o t sofrer fricatizaccedilatildeo a aspiraccedilatildeo glotal precedente do h natildeo se realiza

Em travamento silaacutebico t realiza-se de preferecircncia como

ʔ Pode ser deletado

ocasionando o prolongamento da vogal tautossilaacutebico

in-tatilden-ta

[katilde datildena] ~ [katilde ndatildena] ~

[katilde natildena]

katilden-tatilden-ta]

[kejaʔ n da ɾe] ~ [kejaʔ na e]

kejan-tah-te

[losa na ʔ] ~ [lostsa na ʔ] ~

[lo ʔ sa na ʔ] ~ [lo h ta na ʔ]

loh-ta-na

[kejate] ~ [kejaʔte]

kejat-te

[kejaʔtiʔjoho]

kejat-ti-jo-ho

[lote] ~ [loʔte]

lot-te

[acute tʃjͻna ]

lot-ti-jaw-na

Arco Milho Estaacute apimentado Estaacute duro Lambari grande Eacute urubu Milho Talvez seja milho Paca A paca estava aiacute

134

n - Nasal coronal - anterior

Oclusiva alveolar nasal

Suas alofonias satildeo condicionadas pelo contexto adjacente agrave sua posiccedilatildeo de ocorrecircncia e agrave estrutura silaacutebica

Em onset realiza-se como [n] com as

vogais i i ĩ ĩ a a atilde atilde u u ũ ũ

Tambeacutem pode apresentar flutuaccedilatildeo em

onset realizando-se [ʔn]77 alveolar

nasal preacute-glotalizada com preferecircncia quando seguido por a

Em posiccedilatildeo de onset e em fronteira de morfema dependendo do seguimento seguinte sofreraacute alteraccedilatildeo

Quando precedido por h sofreraacute ensurdecimento

Quando precedido por outro n na coda silaacutebica precedente poderaacute ser

preacute-glotalizada [ʔn]

[ni du]

ni-tu

[ni ʔkinĩnatildena]

ni ʔ-kinĩn-tatilden-ta

[nagatilde de]

nakatilden-te

[katildena ratilden]

kana h-tatilden

[natildejd ]

natildejn-tu]

[ʔnatilde natilde ʌ]

natilde n-tatilden-ta

[nu h e]

nuʔ-te

[lsquon h ɾe]

nu h-te

[n n de]

n n-te

[n h n atildega tatildena]

Tipo de lenha Eacute fruto Lagarto Estaacute escuro Pacu Estaacute chorando Braccedilo Lagarto Espeacutecie de Bicho

77

Tal qual ocorre com m a glotalizaccedilatildeo de n deve-se em alguns casos aacute reduccedilatildeo da siacutelaba

inicial da palavra

135

Em posiccedilatildeo de coda de siacutelaba acentuada gera processo de assimilaccedilatildeo de dissimilaccedilatildeo e de elisatildeo resultando numa seacuterie de alofonias

Ainda em siacutelaba acentuada se a vogal tautossilaacutebica for oral e entre a coda nasal existir um glide labial-velar constituindo uma siacutelaba com ditongos awn own n se realiza como [m] preferencialmente

w e n em posiccedilatildeo de coda pode sofrer coalescecircncia realizando-se como [m] ou [n]

Se o glide ocupante da primeira posiccedilatildeo da coda for j ou se a siacutelaba tiver a coda preenchida pela nasal n a realizaccedilatildeo desta nasal seraacute [n]

Os glides que seguem a vogal na primeira posiccedilatildeo de coda podem

n -natilden-kah-tatilden-ta

[udʔna]

un-na

[iwm de]

iwn-te

[tʌlawm natildenʌ] ~ [tʌlaw natildenʌ]

talawn-tatilden-ta

[wawm datildenʌ] ~ [wͻwm datildenʌ]

wawn-tatilden-ta

[tolowm datildenʌ]

talown-tatilden-ta

[jatildew de] ~ [iɲatildew de] ~

[jatilde de]

jatildewn-te

[a wm datilden] ~ [atilde m datilden]

atilde wn-tatilden

[iʃɛʔ ɾʌ m datilden]

isaj-tatildewn-tatilden

[toʔkotilde datilden] ~ [t ʔkʌ datilden]

toʔkatildewn-tatilden

Eacute nosso Estaacute vivo Larva Estaacute grosso Estaacute vermelho Estaacute pronto Larva Estaacute assando no burralho

136

assimilar a nasalidade da consoante precedente 78

Se a vogal for nasal na maioria das ocorrecircncias a consoante nasal na coda seraacute apagada deixando seu tempo na vogal precedente e na consoante seguinte

Quando a coda nasal n segue ditongo formado por vogal nasal subjacente mais glide palatal j n em posiccedilatildeo de coda pode espalhar nasalidade regressiva para o glide precedente e pode ser apagada

Quando em coda nasal iraacute participar de outros processos fonoloacutegicos aleacutem da vogal precedente

Na posiccedilatildeo de siacutelaba acentuada em meio de palavra seguida por k n promove a sonorizaccedilatildeo de k e passa

a se realizar como [ʔ] oclusiva glotal

[kotilde baj te] ~ [kotildebay te]

kownpajt-te

[a ʔ n de] ~ [a n de]

a n-te

[je n datilden]

je n-tatilden

[i n datilde na ]

in-tatilden-na

[ hej ndatilden] ~ [ hej n datilden]

hejn-tatilden]

[ natildej de] ~ [ naj n de]

natildejn-te

[ atildendatilden]

atilden-tatilden

[ atilde n datilden]

atilden tatilden]

[ mɔ de] ~ [ de]

n-te

[n n de]

n n-te

Eles estatildeo correndo Ele misturou Tatu Tatu galinha Estaacute sujo Ele estaacute mamando Ele lavou Pacu Ele atirou

78

Para uma descriccedilatildeo mais detalhada sobre o comportamento de n e os glides ver a tese de

Telles 2002 55-57

137

Ainda quanto ao contexto semelhantemente descrito acima n for seguida por uma oclusiva surda homorgacircnica t poderaacute ocorrer processos que possibilitem uma alofonia em variaccedilatildeo livre

n sonoriza t

n sofre desnasalizaccedilatildeo

Quando n sonoriza a consoante seguinte ocorre a elisatildeo podendo ocorrer ou natildeo o alongamento compensatoacuterio da vogal precedente ou a preacute-nasalizaccedilatildeo da consoante seguinte

Quando n sofre elisatildeo alonga a vogal precedente e a consoante seguinte se assimila progressivamente com o traccedilo nasal passando a se realizar como [n]

n se vocaliza e recebe os traccedilos da vogal central e realiza-se nasal

Se n for seguida em coda por uma consoante nasal idecircntica ocupando a posiccedilatildeo do onset da siacutelaba seguinte poderaacute haver duas possibilidades de comportamento da coda nasal dependendo de ser a sua vogal tautossilaacutebica assimilar ou natildeo

Se a vogal precedente for nasal a coda sofreraacute elisatildeo e a vogal se alongaraacute

Se a vogal central for oral a consoante nasal da coda que precede a nasal idecircntica no onset da siacutelaba seguinte sofreraacute dissimilaccedilatildeo do traccedilo nasal79

[ natildej de] ~ [ naj n de]

natildejn-te

[ku ʔginĩ de]

ku n-kinĩn-te

[ dega tatilden]

te n-kaloh-tatilden

[ atildega ɾe]

atilden-kaloh-te

[ ku ndatildenʌ]

ku n-tatilden-ta

[ ku ddatildenʌ]

ku n-tatilden-ta

[ ku n datildenʌ] ~ [ ku datildenʌ]

ku n-tatilde-ta

[ ku natildenʌ]

ku n-tatilden-ta

Estaacute branco Bom-dia espeacutecie de aacutervore Bicho Pacu Rolo de fio de algodatildeo Roupa velha Roupa Estaacute fumando

79

A liacutengua Latundecirc eacute caracterizada pelo OCP (Princiacutepio do Contorno Obrigatoacuterio)

138

[ku datildenʌ]

ku n-tatilden-ta

[katilde na ]

katilden-na

[lidnu ɾe]

lin-nu-te

[lid na j ɾe]

lin-na jh-te

Estaacute fumando Estaacute fumando Estaacute fumando Estaacute fumando Estaacute duro Beiju de mandioca Raiz de mandioca

s - Fricativa alveolar surda

Fricativacoronal+ anterior forma siacutelaba

com as vogais i ĩ e a a atilde o uu ũ

Realiza-se como [s] [ʃ] [tʃ] [ʔs]

Em menor frequecircncia pode ser realizada como [t] e [t h]

Em siacutelaba acentuada em iniacutecio de palavras a fricativa pode se realizar

[tʃi ɾatilden] ~ [ʔsi ɾatilden]

sih-tatilden

[ ʔsitatilden] ~ [ sitatilden]

set-tan

Estaacute liso Trovejou

139

como palatal africada preacute-glotal ou como alveolar 80

Quando s se fortifica e passa a se realizar como [t] e ou como [t h] apresentam restriccedilatildeo ao contexto de vogal baixa seguinte podendo ocorrer em iniacutecio ou em meio de palavra Nestes contextos tambeacutem permanecem possiacuteveis as demais alofonias

A fortificaccedilatildeo de s eacute frequente em siacutelaba natildeo acentuada em iniacutecio de palavra Embora as siacutelabas acentuadas contenham maiores iacutendices Em posiccedilatildeo natildeo acentuada a alveolar ocorre em maior nuacutemero

A palatalizaccedilatildeo da fricativa eacute obrigatoacuteria quando precedida por i Sua realizaccedilatildeo eacute alveolar em posiccedilatildeo intervocaacutelica

[ʔsĩ du ɾatilden]

sĩn-tu-tatilden

[ʃa h ɾe] ~ [sa h ɾe]

sa h-te

[ tʃoɾatildenʌ] ~ [ ʃoɾatildenʌ]

soh-tatilden-ta

[ʃ de] ~ [s n de]

s n-te

[thathaʔi natildenʌ] ~ [ʃaʃaʔi natildenʌ]

sasan-tatilden-ta

[kejͻ ʔhe neʔt h o ɾeʔ] ~

[kejͻʔhe neʔto ɾeʔ]

keja w-haniʔ-s aw-te

[t datilde na ] ~ [t h datilde na ]

so-tatilden-na

[tʃamaj de] ~ [tamaj de] ~ [sama

de]

saman-te

[ʔʃamaʔdʌ ɾatildena]

saman-tah-tatilden-ta

[iʃatilde datilde na ]

isatilde n-tatilden-na

Estaacute arrastando Timboacute do mato Estaacute sujo Sol Estaacute mole Oacuteleo Eacute guarantatilde (espeacutecie de aacutervore) Tanajura Eacute tanajura

80

A africada eacute a mais utilizada pelos velhos enquanto a fricativa e a alveolar satildeo mais utilizadas

pelos jovens

140

[iʃu datildenʌ]

isu -tatilden-ta

[wasa h ɾe] - [wͻsa h ɾe]

wasah-te

Eacute folha Ele estaacute com frio Besouro

l- Lateral alveolar sonora

Lateral coronal + anterior

Forma siacutelaba em iniacutecio e meio de

palavras com as vogais i e a a o o

u

Fortifica-se em iniacutecio de palavras quando encontra-se na posiccedilatildeo de acento pode ser precedido por vogal aacutetona sem onset que tende a ser apagada

Diante do contexto acima realiza-se

[li tatilden]

lit-tatilden

[dale de]

tale-te

[giwla de]

kiwlah-te

[la ɾ e]

la h-te

[lo ɾatildena]

loh-tatilden-ta

[ko lo ko lo n de]

ko loʔ ko lo n-te

[toluʔ tatildena]

taluʔ-tatilden-ta

[ʔta e] ~ [da e]

la h-te

Ele saiu Embira Cobre cascavel Jacucaacuteca Estaacute comprido Pintado Ele tossiu

141

como alofones [ʔl] e [d]

Acompanhado por consoante nasal em onset silaacutebico pode assimilar progressivamente a nasalidade sendo realizado como [n]

Pode apresentar sobreposiccedilatildeo na maneira como se realizam

[t ~s ]

[t ~ n]

[n ~ l]

[t ~ l ]

[ʔlo tatilden] ~ [a tatilden]

atilde-loʔ-tatilden

[diʔ pa natildena] ~ [i iʔ pa natildena]

jaliʔ pan-tatilde-ta

[ naginila h ni ɾ atilden] ~

[ naginina h ni ɾatilden]

sapatilden-kinĩn-te

[kaas tatildena] ~ [kata tatildena]

kasaʔ-tatilden-ta

[tidit na j de] ~ [tidit ta de]

tatiʔ-najn-te

[nagatilde de] ~ [ agatilde n de]

nakatilden-te

[wota h ɾe] ~ [wola h ɾe]

wotah-te

Jacucaacuteca Ele estaacute afundado atolado Satildeo dois colares Eu natildeo sei se ele estaacute doente Taioba Estaacute grosso Mandioca mansa Lagarto do campo Pomba

142

j - Glide coronal - anterior

Eacute um glide palatal que ocupa a posiccedilatildeo de onset e de coda na siacutelaba

Em iniacutecio de siacutelaba j antecede as

vogais e e o a a atilde u u ũ

Quando em posiccedilatildeo inicial na siacutelaba e

acompanhado por e e em siacutelaba

acentuada ou seguido por a em siacutelaba aacutetona j pode se fortificar e se realizar

como [ʒ] sendo possiacutevel neste caso

ser seguido por um preacute glide [j] de fraca e raacutepida duraccedilatildeo

Quando seguido por a em siacutelaba aacutetona eacute opcional a fusatildeo entre o glide e a vogal derivando a vogal longa [i]

[je n datilden]

je n-tatilden

[ja te]

jaʔ-te

[ja te]

ja ʔ te

[jatildeʔ datilden] ~ [iɲatildeʔ datilden]

jatilden- n-tatilden

[jo ɾatilden]

joh-tatilden

[ju te]

ju-te

[ju te]

ju -rsquote

[j ginĩ de]

j n-kinĩn-te

[je natilden te] ~ [ʒe natilden te]

ja natilde-nu-te

[ j ʒe n datilden] ~ [ʒe n datilden] ~

[je n datilden]

je n-tatilden

[ʒɛge datilden] ~ [ʒɛga j datilden]

Estaacute sujo Maribondo espeacutecie Porco Vocecirc tem coragem Estaacute baixo Boca Peacute Pedra de gelo granizo Porco espinho Estaacute sujo

143

Se em posiccedilatildeo de onset e seguido de vogal nasal pode ocorrer uma consoante palatal seguindo o glide palatal e precedendo a vogal nuclear

Se for atilde a consoante intrusiva se realizaraacute com mais forccedila e separaraacute a sequecircncia jatilden em duas siacutelabas

Quando o glide vier antes da vogal ũ a consoante intrusiva poderaacute resultar no apagamento do glide podendo se realizar como consoante palatal ou preacute-glide

Em posiccedilatildeo final de siacutelabas

acompanha as vogais e e a a

jaka jn-tatilden

[inatilde de]

janatilde n-te

[jeda n de] ~ [ʒida n de] ~ [ida

n de]

jatan-te

[jatilde datilden] ~ [ iɲatildeʔ datilden]

jatilden- n-tatilden

[jatildew de] ~ [iɲatildew de] ~

[jatilde de]

jatildewn-te

[j ginĩ de] ~ [ j ɲ gibi de]

j n-kinĩn-te

[ ejdnirsquoɾatilde]

hejn-ten-ni-tatilde

[ e jtatilden]

e ʔ-tatilden

[wajkinĩ du]

wajʔ-kinĩn-tu

[na j de]

na j -te

[ natildejde]

natildejn-te

Eacute pica-pau pequeno espeacutecie Abelha do chatildeo espeacutecie veado espeacutecie Vocecirc tem coragem Larva espeacutecie Pedra de gelo granizo Eu vou lavar Ele fez fogo Amendoim

144

Maribondo espeacutecie Pacu espeacutecie de peixe

k- Plosiva dorsal - anterior

Eacute oclusiva velar surda Tem larga distribuiccedilatildeo e se realiza diante de todas as vogais do Latundecirc

Satildeo seus alofones [ʔk] [ɠ] [g] e [k]

Em iniacutecio de palavra se realiza preferencialmente como [k]

[kiliʔkinĩ de]

kiliʔ-kinĩn-te

[ki de]

ki -te

[ke ɾatildena]

keh-tatilden-ta

[ke ja ʔ n de]

ke ja jn-te

[ka ɾatildena]

kah-tatilde -ta

[ka

ka jn-te

[katilde natildena]

katilden-tatilden-ta

[ko h ɾe]

koh-te

[ko lo ʔko lo n datildeda]

ko lo ʔko lo n-tatilden-ta

Coco da palmeira inajaacute Macaco noturno Ele estaacute caccedilando Caititu Estaacute azedo Formiga Estaacute duro Tesoura

145

Em contexto de fala raacutepida em iniacutecio

de vocaacutebulos a velar preacute-glotal [ʔk]

pode ocorrer pode flutuar tambeacutem como velar plena [k]

Em mesmo contexto pode-se flutuar a velar sonora [g] ou a velar implosiva

[ɠ] ou a velar surda [k] ou a velar

surda preacute-glotalizada [ʔk]

Quando em meio de vocaacutebulo em contexto que envolve a consoante nasal lexical precedente a realizaccedilatildeo de [g] eacute categoacuterica

Entre vogais eacute possiacutevel que se encontre a variaccedilatildeo entre [k] e [g] sendo a surda a preferencial e em maior nuacutemero de realizaccedilotildees

[k n de]

k n-te

[ku n de]

ku n-te

[ʔkolo ɾe] ~ [kolo ɾe]

koloh-te

[ʔka laʔkala ɾe] ~ [ka laʔkala ɾe]

kalaʔkalaʔ-te

[golota taʔnatildena] ~

[kolota taʔ natildena]

kolon-sasan-tatilden-ta

[ gi natildena] ~ [ ɠi natildena]

ki n-tatilden-ta

[giʃaj n datildena] ~ [ɠiʃaj ndatildena] ~

[kiʃaj n datildena]

kisajn-tatilden-ta

[ atildega ɾe]

atilden-kaloh-te

[j ginĩ de]

j n-kinĩn-te

[waka de]

waka-te

Eacute pintado Timboacute do campo Algodatildeo Barata Galinha Estaacute maduro Estaacute coccedilando Estaacute pontudo Roupa

146

Em onset da siacutelaba acentuada em final de vocaacutebulo k pode se realizar [k h]

[lukaj de]

lukajn-te

[nakatilde n de] ~ [naga n de]

nakatilden-te

[ iwgula ɾatilden]

iwkulah-tatilden

[ i ʔga laʔga na ]

iʔka la n-ka-na

[ ɛtduʔ da jowi k h e ]

ajhtu ta-jaw-wi-ka

Pedra de gelo granizo Garccedila Flecha Lagarto Ele subiu Eles estatildeo brincando Pega (o banco) vamos sentar

- Plosiva glotal - anterior

Eacute uma oclusiva glotal surda com

realizaccedilatildeo [ʔ] que se restringe agrave

posiccedilatildeo de coda silaacutebica81

Tem seu comportamento condicionado pela presenccedila das consoantes adjacentes p t k

Pode se realizar como [ʔ] em fala

raacutepida preceder a oclusiva velar surda k

Como [j] quando a vogal nuclear for a meacutedia frontal e ou a baixa a

Como [w] quando a vogal nuclear for a meacutedia posterior o

[huʔ kaʔ datilden] ~ [ kaʔ datilden]

huʔ-kah-tatilden

[kidiʔka tatilden]

kitiʔ-kah-tatilden

[ atilde ʔ tatilden] ~ [ atilde tatilden] ~

[malo h tatildeni]

atilden-loʔ-tatilden

Eacute arco Eacute furador Ele queimou

81

A entre l e s natildeo foi observada na liacutengua Latundecirc

147

E favorecer a deleccedilatildeo de motivando um alongamento que compensa a vogal nuclear ou alongar ainda alongar esta vogal seguindo de leve aspiraccedilatildeo

A realizaccedilatildeo de [ʔ] nas alofonias

acima soacute eacute notada quando na siacutelaba na qual estaacute presente quando apenas a oclusiva estiver no travamento

silaacutebico (CVʔ)

Quando em posiccedilatildeo de coda pode assimilar o ponto da consoante seguinte e se realizar como [t] ou [d] diante de tnl e [p] ou [b] diante de m Neste caso as realizaccedilotildees homorgacircnicas surdas satildeo sempre preferenciais

[wolo te] ~ [woloʔ te]

woloʔ-te

[ej tatilden] ~ [e tatilden]

eʔ-tatilden

[wajkinĩ de]

wajʔ-kinĩn-te

[loʔ tatilden] ~ [ tatilden] ~ [ wtatilden]

loʔ-tatilden

[tidit na jdatilde na ]

tatiʔ-na jn-tatilden-na

[wa jtna de]

wa jh-na n-te

[at natilde da na]

a ʔnatilde n-tatilden-ta

[a p otildedatildena] ~ [a b otildedatildena]

a ʔ n-tatilden-ta

Espeacutecie de paacutessaro Ele ralou Amendoin Ele afogou Eacute raiz de mandioca Palha da palmeira accedilaiacute Ele estaacute chorando muito Ele estaacute muito bonito

h- Fricativa glotal - anterior

Eacute fricativa glotal surda que em iniacutecio de

siacutelaba ocorre com as vogais i e a a

o u

Quando em iniacutecio de palavra e em siacutelaba acentuada seguida de i realiza-

se como [ʒ]

Quando entre vogais realiza-se como

[hu te] ~ [hu h de]

huʔ-te

[hej de]

hejn-te

Arco Buriti

148

fricativa glotal sonora [ɦ]

Se vier em iniacutecio de palavra em fala raacutepida e em raiacutezes dissilaacutebicas na posiccedilatildeo de onset de siacutelaba natildeo acentuada poderaacute ser apagado

Quando em onset de siacutelaba acentuada acompanhada de consoante nasal assimila a nasalidade da consoante

adjacente sendo realizada como [n ]

Em final de siacutelaba eacute produzido com pouca fricccedilatildeo Em coda acentuada motiva o alongamento da vogal com frequecircncia como resultado teremos uma vogal com leve aspiraccedilatildeo

Demais realizaccedilotildees de h em coda tendem a seguir o comportamento da

oclusiva glotal ʔ

[hata tatilden]

hat-ta-tatilden]

[ha de]

ha n-te

[hoɦo h de]

hohoʔ-te

[hi ɾ e] ~ [ʒi ɾe]

hih-te

[hiwa n de] ~ [iwa n de]

hiwan-te

[ e ĩ n de] ~ [e ĩ n de]

e ĩ n-te

[ɛ hejdn a ]

ajhhejn-ha

[o h datildeda]

o hna-tatilden-ta

[ lo h tatilde na ]

loh-tatilden-na

[ʃi h ɾe]

sih- te

[ke h atilden] ~ [ke atilden]

Eu natildeo tenho Caraacute Espeacutecie de coruja Pau lenha Gambaacute Couro Vamos lavar (algo) Estaacute alto Eacute onccedila

149

keh-tatilden

[nakadʔnatilde na ]

naka natilde n-na

[ka ɾatilden]

kah-tatilden

[naw ɾe] ~ [nͻ e]

na wh-te

[wede e] ~ [wede ʔ ɾe]

wate h-te

[sej ɾatilde]

sih-tatilden

Casa Ele caccedilou Ela ainda estaacute chorando Estaacute azedo Lontra Espeacutecie de tamanduaacute Eacute largo

Quadro 13 Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos orais (Com base em Telles 2002)

i - vogal alta frontal e i - vogal alta

frontal laringal

Realiza-se como [i] e [i ] podem ser

nuacutecleo de siacutelaba e podem tambeacutem iniciam palavras

i segue qualquer consoante enquanto

i ocorre apenas apoacutes as consoantes

m k h

Quando a coda eacute apagada realiza-se como [i] compensando tal apagamento

[ iɾatilden]

i-tatilden

[i n datildenʌ]

i n-tatilden-ta

[giw lada ɾe] ~ [gi la de]

kiwlah-tah-te

Ele mordeu Estaacute quente Cobra cascavel espeacutecie de cobra

150

e - vogal meacutedia frontal e e - vogal

meacutedia frontal laringal

Realizam-se como [e] e [e ] e correm em

iniacutecio de palavras

Quando seguem consoantes natildeo se realizam apoacutes pmn

Tambeacutem natildeo foram detectadas diante de s l h

Ao serem seguidos pelo glide palatal j favorecem a fusatildeo entre as vogais e o

glide realizando-se como [i] e [i ]

O alongamento tambeacutem se daacute em casos de queda de coda

Em siacutelaba aacutetona de morfemas dissiacutelabos poderaacute ocorrer harmonizaccedilatildeo entre a vogal meacutedia frontal e a vogal tocircnica mais alta da siacutelaba seguinte

Pode ocorrer harmonizaccedilatildeo entre a vogal da raiz lexical e a vogal do sufixo classificatoacuterio

[e ɾatilden]

e-tatilden

[ etatilden]

e ʔ-tatilden

[ sejtatilden] ~ [sitatilden]

set-tatilden

[ weʔkinĩde] ~ [ wiʔkinĩde]

wet-kinĩn-te

[kenĩ de] ~ [kinĩ de]

kanĩn-te

Ele viu Ele fez fogo Ele falou Crianccedila Esquilo

a - vogal baixa central e a - vogal

baixa central laringal

A vogal baixa central a apresenta larga distribuiccedilatildeo e segue qualquer consoante e os dois glides

A vogal baixa central laringal segue quase todas as consoante e dos dois glides

Ambas iniciam palavras e apresentam

vaacuterias alofonias [a] [ʌ] [ͻ] [o] [u] [e]

[ɛ] [aelig] e [i] que podem ser ou natildeo

laringais dependendo da vogal subjacente e da condiccedilatildeo do tom e da harmonia vocaacutelica

Quando em siacutelaba tocircnica a se realiza como [a] [ͻ] e [ͻ]

[ͻ] pode ocorrer quando o nuacutecleo vocaacutelico a assimila o traccedilo labial da coda tautossilaacutebica de w

A segunda variaccedilatildeo [ͻ] resulta da fusatildeo

[a h ɾe]

ah-te

[awde] ~ [ͻ de] ~ [ͻʔ de]

awh-te

[ a wde] ~ [ ͻde] ~ [ ͻʔde]

a w-te

[a wm de] ~ [ ͻ m de] ~ [ͻ m de]

a wn-te

Espeacutecie de abelha Gaviatildeo Flecha Louro

151

entre o nuacutecleo a e a coda w

O alongamento da vogal nuclear ou da coda eacute necessaacuterio agrave preservaccedilatildeo do peso silaacutebico para a aposiccedilatildeo do acento

Em siacutelaba tocircnica se a a eacute seguida por j na coda (nuacutecleo do ditongo) pode se

realizar como [a] [ɛ] [ɛ] e [aelig]

Em siacutelaba aacutetona a realiza-se como [ʌ] preferencialmente

Quanto em posiccedilatildeo aacutetona a se harmoniza com a vogal tocircnica da siacutelaba seguinte quando esta for meacutedia ou alta

As realizaccedilotildees provenientes dessa harmonia vocaacutelica satildeo as vogais [ieou]

O processo de assimilaccedilatildeo pode ocorrer em iniacutecio de siacutelaba aacutetona fazendo com que a se realize como [ͻ] a partir de segmento adjacente seja tautossilaacutebico ou natildeo

[ ajɾatildena] ~ [ ɛatildena]

ajh-tatilden-ta

[a j ɾatilden] ~ [aelig ɾatilden] ~ [ɛ ɾatilden]

a jh-tatilden

[ a j atilde m datilden] ~ [ aelig ʔatildem datilden]

a jn atilde wn-tatilden

[ͻ ɾaʔͻɾaʔi datildenʌ] ~

[ͻ ɾɛʔͻɾɛʔi datildenʌ]

watajwatajn-tatilden-ta

[wͻdaʔ nde] ~ [wadaʔ nde]

watan-te

[i n dacircnʌ]

i n-tatilden-ta

[tʌlawm natildenʌ]

talawn-tatilden-ta

[kimi ɾatildena] ~ [kͻmi ɾatildena]

kamih-tatilden-ta

[walin de] ~ [weli de]

walin-te

[tʌlow natildena] ~ [tolow natildenʌ]

talown-tatilden-ta

[tunu ratildeni]

tanũh-tatilden

Eacute roccedila Ele foi Ele assou peixe Eacute fino Panela Estaacute quente Estaacute grosso Estaccedilatildeo seca Tamanduaacute

152

Devido agrave labializaccedilatildeo de a a realizaccedilatildeo resultante sofre assimilaccedilatildeo de palatalizaccedilatildeo altura de glide precedente ou se funde quando o glide eacute tautossilaacutebico e ocupa onset de siacutelaba em que a eacute a vogal nuclear

[kʌmaʔ matilde n de] ~

[kͻmaʔ matilde n de]

kama-matilden-te

[ͻ ɾaʔͻɾaʔĩ datildenʌ] ~

[ͻ ɾɛʔͻɾɛʔĩ datildenʌ]

watajwatajn-tatilden-ta

[wada n de] ~ [wͻda n de]

watan-te

[jeda n de] ~ [ʒida n de] ~

[ida n de]

Estaacute terminado Ele deu Borboleta Eacute fino Panela cabaccedila Espeacutecie de veado

o - vogal meacutedia fechada posterior e

o - vogal meacutedia fechada laringal

Realizam-se [o] e [o ] respectivamente

Natildeo se realizam apoacutes as consoantes nasais mn

o soacute foi realizada apoacutes as consoantes

t l k

Ambas podem ser realizadas em iniacutecio de vocaacutebulo

As realizaccedilotildees [o] e [o ] satildeo resultados

do alongamento compensatoacuterio que provem da delaccedilatildeo de coda

[o ɾatilden]

oh-tatilden

[o te]

o h-te

[ko n de] ~ [kow n de]

kon-te

Ele misturou massa Macuco Espeacutecie Jabuti

u - vogal alta posterior e u - vogal

alta posterior laringal

Apresentam larga frequecircncia nas realizaccedilotildees

u segue qualquer consoante

[ke ju ɾe]

kejuh-te

Macaco da noite

153

u ocorre apoacutes m n s k j

Ambas iniciam palavras

As realizaccedilotildees alongadas [u] e [u ] satildeo

provenientes de alongamento compensatoacuterio quando a coda eacute elidida

[ku n datildenʌ] ~ [ku datildenʌ]

ku n-tatilden-ta

Ele estaacute fumando

Quadro 14 Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos nasais (Com base em Telles 2002)

ĩ - vogal nasal alta anterior

Sua ocorrecircncia soacute fora verificada a partir do comportamento do morfema ĩ- que eacute uma raiz lexical semanticamente vazia prefixada a morfemas classificadores nominais para funcionar como nuacutecleo nominal

A subjacecircncia de ĩ- sem coda nasal pode ser evidenciada na sonorizaccedilatildeo opcional da oclusiva velar k e no natildeo alongamento da vogal ĩ

[ ĩkalo ɾe] ~ [ ĩgaloɾe]

ĩ-kaloh-te

Taacutebua

atilde - vogal nasal baixa

Eacute encontrada a partir do condicionamento morfoloacutegico no prefixo verbal atildel-

Este prefixo tem valor causativo resultativo

Quanto agrave subjacecircncia de atilde pode-se interpretar que a realizaccedilatildeo do morfema agentivo [atildel- atilde-] estaacute condicionada ao segmento inicial da raiz lexical a qual o prefixo se apotildee

[atildelͻwtatildenʌ] ~ [ a lͻtatildenʌ]

atildel-awt-tatilden-ta

[atilde laj n datildenʌ] ~ [a laj n datildenʌ]

atildel-ajn-tatilden-ta

[atildelo tatildenʌ] ~ [alo tatildenʌ]

atildel-loʔ-tatilden-ta

[atildemũmaj na ]

atildel-mumaʔ-na

[ũba tatildenʌ] ~ [atildeba tatildenʌ]

atildel-pat-tatilden-ta

[ natildej de] ~ [ naj n de]

natildejn-te

Estaacute foi quebrado (algo) Estaacute foi cortado (algo) Estaacute foi afundado (algo) Estaacute foi amansado (algo) Estaacute foi colocado (algo)

154

Quando a raiz verbal eacute iniciada por vogal a forma sobrejacente eacute [atilde-] quando a raiz verbal eacute iniciada por vogal a forma sobrejacente eacute [atildel-]

Outra forma de ocorrecircncia da vogal atilde eacute confirmada na base do contraste entre os ditongos orais aj aw e nasais atildej atildewmesmo quando seguidos por coda nasal formando as sequecircncias ajn awn atildejn atildewn

[ aj n datildeni] ~ [ aj n datildeni]

ajn-tatilden

[jatildewm de] ~ [jatildemde]

jatildewn-te

[wawm datildena] ~ [wͻwm datildena]

wawn-tatilden-ta

Pacu espeacutecie de peixe Ele cortou (algo) Espeacutecie de larva Estaacute vermelho amarelo

ũ - vogal nasal alta posterior

Observada a partir da construccedilatildeo interna e comportamento do morfema prefixal nũh - possessivo de 1pp e de seu homoacutefono nũh - verbo adjetival estar soacute

Quanto agrave subjacecircncia de u eacute observada quando a coda fricativa glotal eacute ressilibificada ao se afixar agrave raiz iniciada por vogal ou glide

[ nũhju te]

nũh-ju -te

[ nũhaj ɾatilden]

[nũhajh-oslash-tatilden

Nossos peacutes Ele vai sozinho

54 FONOLOGIA DO PORTUGUEcircS

Diferentemente do Latundecirc o sistema fonoloacutegico do portuguecircs eacute formado

conforme Cacircmara Jr (1970 p33 ndash 34) por sete vogais que se mantecircm na

mesma quantidade em posiccedilatildeo tocircnica que satildeo reduzidas a cinco quando em

posiccedilatildeo tocircnica diante de nasal em posiccedilatildeo pretocircnica em posiccedilatildeo postocircnica natildeo-

final e em postocircnica final

Quadro 15 Vogais no Portuguecircs (Cacircmara Jr 1970)

Natildeo-arredondadas Arredondadas

Altas i u

Meacutedias Altas e o 2ordm Grau

155

Meacutedias Baixas ɛ ɔ 1ordm Grau

Baixa a

Anterior Central Posterior

Quanto aos segmentos consonantais o portuguecircs dispotildee de acordo com Lopez

1979 p5482 de vinte e dois fonemas que ocupam as posiccedilotildees de onset e coda

Os segmentos consonantais satildeo classificados quanto ao modo e ao ponto de

articulaccedilatildeo

Os segmentos consonantais do portuguecircs ainda podem ser influenciados por

articulaccedilotildees secundaacuterias labializaccedilatildeo palatalizaccedilatildeo velarizaccedilatildeo e dentalizaccedilatildeo

Quadro 16 Consoantes no Portuguecircs (Silva 2002)

Articulaccedilatildeo

Bilabial Labiodental Dental ou alveolar

Alveopalatal Palatal Velar Glotal

Oclusiva p b t d k g Africada tʃ dʒ

Fricativa f v s z ʃ ʒ X Ɣ h ɦ

Nasal m n ɲ y

Tepe ɾ

Vibrante ř

Retroflexa ɹ

Lateral l ɫ ʎ l j

82

Apud Bisol 1996 p198

156

55 COMPARACcedilAtildeO ENTRE OS SISTEMAS FONEacuteTICOS DO PORTUGUEcircS E

DO LATUNDEcirc

Passemos entatildeo agrave comparaccedilatildeo ds sistemas fonoloacutegicos do Portuguecircs e do

Latundecirc para melhor compreensatildeo dos processos foneacuteticos oriundos desse

contato

Quadro 17 Sistemas consonantais x Sistemas vocaacutelicos

Consoantes Vogais

Portuguecircs p b m w t d s z l j n f v ɾ k g h ɹ ɲ ʎ X a ɛ e i ɔ o u

Latundecirc p m w t s l j n k h a atilde a a e e i i i i o o u u u u

Como podemos perceber as liacutenguas apresentam padrotildees distintos no que tange

agrave quantidade de segmentos consonantais e de segmentos vocaacutelicos O portuguecircs

eacute uma liacutengua com mais consoantes enquanto o Latundecirc eacute uma liacutengua

extremamente vocaacutelica

No que tange aos fonemas consonantais o Latundecirc natildeo apresenta muitos dos

fonemas vozeados que compotildeem os pares miacutenimos aleacutem das labiodentais [f v]

Tambeacutem natildeo apresenta as fricativas alvopalatais [ʃ ʒ] nem as palatais nasal e

lateral [ɲ ʎ]

O portuguecircs natildeo dispotildee de vogais laringais enquanto o Latundecirc tem o seu

inventaacuterio basicamente composto por elas

157

A disposiccedilatildeo e presenccedila desses elementos tecircm uma ligaccedilatildeo direta com os

processos fonoloacutegicos ocorrentes o portuguecircs resultante do contato do Portuguecircs

com o Latundecirc como veremos no capiacutetulo VI

158

6 PROCESSOS FONOLOacuteGICOS NO PORTUGUEcircS FALADO PELOS LATUNDEcirc

ldquoComo a liacutengua estaacute a todo momento se equilibrando entre

tendecircncias potencialmente conflitantes e ateacute mesmo opostas estaacute sujeita a sofrer mudanccedilas pois esse equiliacutebrio pode vir a ser alterado por qualquer tipo de fator interno ou

externordquo Chagas (2004 p 151)

61 INTRODUCcedilAtildeO

Eacute senso comum entre os estudiosos que as liacutenguas mudam em diversos

aspectos Certamente a variaccedilatildeo e a mudanccedila lhes satildeo inerentes conforme

Cezario amp Votre (2008 p 141)

Em face da mudanccedila a assertiva acima abarca um conjunto de motivaccedilotildees

internas a uma dada liacutengua bem como outras decorrentes de forccedilas externas em

que se inserem aquelas oriundas do contato linguiacutestico Isso nos chama a

atenccedilatildeo para o fato de que aleacutem do fator tempo outros aspectos podem estar

diretamente ligados agraves transformaccedilotildees pelas quais uma liacutengua passa

A forma como as mudanccedilas sonoras operam na liacutengua eacute tema de discussatildeo haacute

seacuteculos Sobre essa temaacutetica Labov (1981 p269) nos diz que

Sound change appears to be systematic in that a particular change affects all eligible words in a lexicon (McMahon 1994) It is not known however how this process takes place A group of 19th century German linguists called the Neogrammarians originally proposed that sound change occurs abruptly across the lexicon This view is still accepted by many linguists (eg Hock 1991 Labov 1994) In contrast others have argued that sound change spreads gradually across the lexicon (eg Chen amp Wang 1975 Krishnamurti 1978) The same language data is sometimes used to support each hypothesis For instance the

159

English Great Vowel Shift which brought about a series of vowel changes in Early Modern English is used as an example of gradual change (Ogura 1987 Aitchison 1991) as well as abrupt change (Hock 1991 Labov 1994) So the argument over whether sound change occurs abruptly or gradually presents a paradox ldquoboth (views) are right but both cannot be right 269)rdquo

A discussatildeo acerca da natureza da mudanccedila sonora no sentido das duas visotildees

pontuadas acima ainda alcanccedila uma dimensatildeo mais larga quando o contato

intersocietaacuterio eacute considerado As implicaccedilotildees que a variaccedilatildeo assume quando a

emergecircncia das escolhas linguiacutesticas envolve o impacto das interaccedilotildees entre

liacutenguas satildeo multifatoriais Devido agrave complexidade das transformaccedilotildees linguiacutesticas

natildeo podemos estabelecer um uacutenico molde para explicar estas modificaccedilotildees haja

vista que cada caso eacute particular quando tratamos de mudanccedila linguiacutestica

Como fora tratado no capiacutetulo sobre Contato linguiacutestico o encontro de duas ou

mais liacutenguas pode resultar ou natildeo em outras liacutenguas O niacutevel de interferecircncia

oriundo do contato pode fazer com que uma das liacutenguas desapareccedila o que

ocasionaria a sua morte e geralmente neste caso sobreviveria a liacutengua do

dominador ou a permanecircncia dos dois coacutedigos linguiacutesticos tal qual ocorre entre

os Latundecirc

A complexidade da fusatildeo de duas liacutenguas desencadeia por si soacute uma seacuterie de

processos que perpassa os diferentes niacuteveis da gramaacutetica No entanto eacute no niacutevel

foneacutetico fonoloacutegico que estes processos satildeo provavelmente mais evidentes e

mais frutiacuteferos Sendo assim podemos afirmar que os niacuteveis foneacuteticos e

fonoloacutegicos apresentam o maior iacutendice de mudanccedila e variaccedilatildeo de uma liacutengua Por

outro lado de acordo com Cavaliere (2005 p 56)

160

Os estudos desses processos nos auxiliam enquanto estudiosos da liacutengua a entender como se comporta a mudanccedila da liacutengua mediante verificaccedilatildeo dos fatos ocorridos no passado que se mantecircm no presente bem como os que natildeo mais se manifestam as mudanccedilas dos sons nos usos hodiernos

A anaacutelise realizada dos processos fonoloacutegicos do Portuguecircs falado pelos Latundecirc

teraacute como base a estrutura silaacutebica do Portuguecircs e do Latundecirc Para a anaacutelise

consideramos uacutetil adotar a classificaccedilatildeo tradicional dos processos focircnicos

encontrados na linguiacutestica histoacuterica (HOCK1991) por nomear em detalhe os

variados tipos de processos observados Aleacutem disso nos pautamos nos trabalhos

de Spencer (1996) e Lass (2000) que associam reflexotildees mais abstratas para

explicar as ocorrecircncias encontradas Esclarecemos que natildeo eacute nosso propoacutesito

realizar uma anaacutelise fonoloacutegica per si Neste trabalho partimos da descriccedilatildeo dos

processos fonoloacutegicos operantes a fim de refletir sobre o resultado do contato

linguiacutestico de uma liacutengua minoritaacuteria (o Latundecirc) com uma liacutengua

sociohistoricamente dominante o portuguecircs e avaliar o papel da marcaccedilatildeo

linguiacutestica no contexto da interferecircncia Os dados como jaacute afirmamos fazem

parte do acervo do NEI (Nuacutecleo de Estudos Indigenistas) da UFPE

Para uma melhor compreensatildeo a anaacutelise dos fenocircmenos observados segue

distribuiacuteda em quatro subgrupos que evolvem os processos foneacutetico-fonoloacutegicos

observados i) perda de elementos ii) ganho iii) alteraccedilatildeo (transposiccedilatildeo ou

permuta) que estatildeo diretamente ligados aos processos fonoloacutegicos de

assimilaccedilatildeo (progressiva e regressiva) fortalecimento leniccedilatildeo apagamento

inserccedilatildeo e coalescecircncia A classificaccedilatildeo desses processos nos remete agrave

termonoligia claacutessica da linguiacutestica de base

161

611 Perda de elementos

Seguindo a tendecircncia das liacutenguas do mundo os processos que envolvem perda

de elementos tambeacutem satildeo os mais recorrentes no portuguecircs falado pelos

Latundecirc Dessa feita estes processos satildeo os que tecircm uma relaccedilatildeo direta com a

estrutura silaacutebica do Portuguecircs que se vecirc obrigada a rearranjar os componentes

da siacutelaba para o padratildeo (CV)

Quanto agrave marcaccedilatildeo o portuguecircs assimilado pelos Latundecirc nem sempre tende a

preservar os padrotildees mais marcados de sua liacutengua conforme descriccedilatildeo nos

processos que se seguem

6111 Monotongaccedilatildeo

Assim como no Portuguecircs a monotongaccedilatildeo eacute um processo natural e bastante

atuante no Latundecirc que eacute uma liacutengua propensa a tal fenocircmeno Eacute uma tendecircncia

geral observada na produccedilatildeo da fala da comunidade Latundecirc verifica-se que os

ditongos crescentes e decrescentes estatildeo sendo frequentemente fusionados

realizando-se como monotongos (TELLES 2002 p100 - 102)

Quanto aos ditongos crescentes Telles (idem p 103) afirma que a tendecircncia ao

processo de monotongaccedilatildeo em ditongos crescentes eacute quase categoacuterica nas

siacutelabas aacutetonas de raiacutezes dissilaacutebicas quando a vogal nuclear eacute a central baixa a

Outros aspectos observados pela autora que fazem menccedilatildeo agrave monotongaccedilatildeo

apontam que a geraccedilatildeo poacutes-contato realizam sistematicamente e com frequecircncia

162

a fusatildeo entre os ditongos decrescentes Os ditongos aw a w aj a j satildeo os que

mais regularmente sofrem processo dos quais decorrem as realizaccedilotildees meacutedias

baixas [ɔ ɔ ɛ ɛ ] que natildeo fazem parte do inventaacuterio fonoloacutegico das vogais do

Latundecirc

Os ditongos iw ow que ocorrem em menor frequecircncia satildeo mais marcados

Nestes a monotongaccedilatildeo se daacute com a preservaccedilatildeo da vogal do nuacutecleo i o O

ditongo e j apresenta pouquiacutessimos casos de fusatildeo mantendo a qualidade do

glide diferentemente dos demais ditongos que satildeo constituiacutedos por vogais natildeo

baixas Sua realizaccedilatildeo seraacute a vogal alta anterior [i]

Apresentamos abaixo os dados apresentados por Telles (idem 101) onde os

resultados foneacuteticos do processo de monotongaccedilatildeo satildeo mais frequentes

Quadro 18 Resultado mais frequente do processo de monotongaccedilatildeo em Latundecirc

Em tritongos a fusatildeo eacute mais frequente quando o glide labial w preenche a

posiccedilatildeo da coda diferentemente da palatal j que pouco se fusiona Nos dois

casos a fusatildeo se daacute apenas com o apagamento do glide poacutes-nuclear

aw gt ɔ [lsquoɔɾe] rsquoawh-lsquote Gaviatildeo

a w gt ɔ [ɔ rsquode] a w-lsquote Fleche

aj gt ɛ [ɛrsquoɾatildena] ajh-lsquotatilden-ta eacute roccedila

aj gt ɛ [ɛ rsquoɾatildena] rsquoa jh-lsquotatilden-ta ele tem andado

iw gt i [lsquogilade] rsquokiwlah-lsquote cobra cascavel

ow gt o [torsquolodatildena] tarsquolown-lsquotatilden-ta ele tem terminado

163

No que se refere ao comportamento de ditongos decrescentes diante de

consoante nasal tautossilaacutebica podem ocorrer diferentes manifestaccedilotildees de

superfiacutecie a depender do ponto do glide Se os ditongos decrescentes terminarem

com glide laacutebio-dorsal w e seguidos por elemento nasal tautossilaacutebico awn a wn

atildewn own apagaratildeo o glide da coda e a vogal nuclear preservaraacute o ponto de

articulaccedilatildeo

Caso o ditongo seja oral a realizaccedilatildeo preferencial seraacute a da manutenccedilatildeo do

ditongo com o glide ocorrendo na superfiacutecie Se o ditongo for nasal o glide pode

ser nasalizado regressivamente Todavia a realizaccedilatildeo preferencial seraacute o glide

Em preferecircncia o glide j eacute mantido conservando sua palatalidade em ditongos

decrescentes que terminam com o glide j constituindo os ditongos ajn a jn atildejn

jn

Os glides wj na posiccedilatildeo de onset podem ser consonantizados O glide j natildeo se

apresenta como fator motivador para este processo Nos poucos casos

apresentados a vogal nuclear eacute a anterior e ou a central a

De acordo com a literatura existente para o Portuguecircs a monotongaccedilatildeo se aplica

a todos os ditongos Entretanto alguns contextos licenciam o processo enquanto

outros o bloqueiam No portuguecircs falado pelos Latundecirc os ditongos decrescentes

orais83 assim como no portuguecircs de longe foram os mais monotongados Aleacutem

destes o ditongo nasal decrescente [atildew] tanto em final de verbos quanto de

nomes mostrou-se recorrente na reduccedilatildeo

83

[aj][ aw] [ej] [ew] [ow] [oj]

164

Enquanto processo natural a monotongaccedilatildeo no portuguecircs falado por Latundecirc

visa simplificar os padrotildees silaacutebicos mais marcados sobretudo na posiccedilatildeo final de

vocaacutebulos jaacute que no Latundecirc natildeo haacute a ocorrecircncia deles

Esclarecemos que os processos observados na fala dos Latundecirc que tambeacutem

ocorrem no portuguecircs atual natildeo foram incluiacutedos nos dados discutidos neste

capiacutetulo ressalvando-se situaccedilotildees nas quais eram necessaacuterios agraves nossas

reflexotildees

De acordo com os exemplos

acima o processo de

monotongaccedilatildeo pode se dar de

duas formas i) apagamento

de um segmento geralmente

o glide ii) fusatildeo de elementos

Os ditongos mais propensos agrave

monotongaccedilatildeo satildeo os

decrescentes Quanto agraves classes de palavras os ditongos presentes nas formas

verbais satildeo mais frequentemente monotongados

No portuguecircs o processo de monotogaccedilatildeo eacute operante porem haacute restriccedilotildees que

natildeo coincidem com o observado na fala dos Latundecirc Bisol (2001 p 112) afirma

(1) [keme] queimei (2) [satildersquogɾaɾi] sangraram

[firsquokaɾi]

ficaram

(3) [fakotilde] facatildeo [motilde] matildeo [koɾasotilde] coraccedilatildeo

[gɾatildedotilde] grandatildeo

[tubaɾotilde]

tubaratildeo

(4) [kaze]

causa

(5) [note]

noite

(6) [lsquotaba] taacutebua (7) lsquomatildeoslash matildersquodava matildee mandava

165

que apenas os ditongos decrescentes satildeo verdadeiros Os crescentes de acordo

com ela seriam falsos pois podem ser realizados como hiato e tecircm variaccedilatildeo livre

Aleacutem disso com respeito aos ditongos decrescentes a autora ainda considera

que haacute dois diferentes tipos de ditongos um considerado pesado que natildeo sofre

reduccedilatildeo (leite) e outro leve passiacutevel de reduccedilatildeo (couro) Ela elenca alguns

ambientes que condicionam a monotongaccedilatildeo como a presenccedila da tepe ou da

palatal em posiccedilatildeo seguinte

Entretanto os dados de (1) a (7) acima nos mostram ocorrecircncias da

monotongaccedilatildeo em contextos muito distintos do que ocorre em Portuguecircs Sobre

estes avaliamos sua ocorrecircncia como segue

Quando em final de vocaacutebulos principalmente nas formas verbais do passado

simples conforme visto em (2) o que ocorre natildeo eacute um fenocircmeno de

monotongaccedilatildeo em que se espera o apagamento de um dos segmentos ou a

fusatildeo dos formadores do ditongo Nos dados em (2) entretanto encontra-se a

substituiccedilatildeo do ditongo por um segmento que articulatoriamente natildeo deriva da

estrutura lexical A vogal anterior com traccedilo de ponto coronal84 realizada em

[firsquokaɾi] ldquoficaramrdquo [satildersquogɾaɾi] ldquosangraramrdquo ocorre em posiccedilatildeo aacutetona final Essa

realizaccedilatildeo pode ser decorrente do espraiamento da coronalidade da consoante

precedente Outros aspectos de relevo para explicar esse fenocircmeno satildeo a

posiccedilatildeo final dos segmentos e a atonicidade Esses condicionantes favorecem a

substituiccedilatildeo total do ditongo nasal para a vogal anterior alta Essa produccedilatildeo eacute

84

Assumimos largamente neste trabalho a terminologia da fonologia claacutessica estrutural (GLEASON 1969) Entretanto termos mais teacutecnicos provenientes da teoria dos traccedilos distintivos (JAKOBSON 1952 CHOMSKY e HALE 1968) satildeo introduzidos quando favorecem a elucidaccedilatildeo dos fatos Da mesma forma ocasionalmente nos referimos a processos ancorados na fonologia poacutes-gerativa (CLEMENTS e HUME 1995)

166

restrita agrave fala dos indiacutegenas da geraccedilatildeo preacute-contato que adquiriram o portuguecircs

pelo menos no iniacutecio da idade adulta

A relevacircncia da tonicidade tambeacutem se evidencia nos dados em (3) Nesses casos

([fakotilde] ldquo facatildeordquo [lsquomotilde] ldquomatildeordquo [koɾasotilde] ldquocoraccedilatildeordquo) apesar de o ditongo nasal atildew

sofrer a fusatildeo passando a ser realizado [otilde] a posiccedilatildeo do acento preserva a

identidade de parte da estrutura nasalizaccedilatildeo e posteriorizaccedilatildeo com

arredondamento A tendecircncia aacute preservaccedilatildeo da estrutura tambeacutem eacute encontrada

no dado em (1) A monotongaccedilatildeo na siacutelaba tocircnica preserva a qualidade da vogal

nuclear em [kersquome] ldquoqueimeirdquo

O Latundecirc evita coda Esse comportamento se alinha agrave ideia de que The CV

syllable is a prototypical example widely considered to be the universally

unmarked syllable type (HUME 2004)

A monotongaccedilatildeo do ditongo nasal atildej em matildej gt matilde natildeo eacute encontrado

regularmente na fala latundecirc Esse fenocircmeno deve ter sido engatilhado pela

juntura externa na qual se observa que a siacutelaba da palavra seguinte conteacutem

sequecircncia focircnica semelhante agrave da siacutelaba que sofreu supressatildeo da semivogal

Um mesmo ditongo pode ou natildeo apresentar diferentes realizaccedilotildees em cada

liacutenguas Por exemplo os ditongos aw atildew aj atildej que existem tanto no Latundecirc

quanto no Portuguecircs se comportam da seguinte forma

Quadro 19 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Latundecirc

aw ɔ [lsquoɔɾe] ˈawh-te lsquogaviatildeorsquo

atildew atildew ~ AM [ˈjatildewmde] ~ [ˈjatildemde] ˈjatildewm-te lsquolarvarsquo

aj ɛ [єrsquoɾatildena] ˈajh-ˈtatilden-ta lsquoeacute roccedilarsquo

atildej atildej ~ atildej [ˌatildejˈdatildeni] ~ [atildejndatildeni] ˈatildejn-tatilden lsquoele cortoursquo

167

Quadro 20 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Latundecirc

aw aw [lsquopaw] pau lsquopaursquo atildew otilde [ˈsotilde] satildew lsquosatildeorsquo atildew i [satildeˈgɾaɾi] sangɾaɾatildew lsquosangraratildeorsquo

atildej atildej [ˈmatildej] matildej lsquomatildeersquo

aj aj [ˈpaj] pai lsquopairsquo

Os ditongos aw em posiccedilatildeo do acento resultam nas vogais meacutedias baixas ɔ e

ɛ no proacuteprio Latundecirc mesmo sendo essas vogais mais marcadas e natildeo

fonoloacutegicas na liacutengua Entretanto no portuguecircs esses ditongos natildeo sofrem

processo de fusatildeo quando ocorrem em siacutelaba tocircnica

A uacutenica vogal nasal constatada na reduccedilatildeo do ditongo eacute [otilde] resultante do ditongo

decrescente nasal atildew Neste caso eacute proacutepria vogal nasal que favorece a vogal

resultante da fusatildeo

Diferentemente do Portuguecircs em Latundecirc os ditongos natildeo se realizam em fim de

vocaacutebulos Desta forma o Portuguecircs falado por Latundecirc tende a seguir o que eacute

posto no Portuguecircs utilizando as vogais menos marcadas [satildegɾaɾɪ] ~ sangraram

[desaɾƱ] ~ deixaram

O que podemos verificar quanto agrave monotongaccedilatildeo eacute que em termos gerais o

Latundecirc natildeo transfere os traccedilos e caracteriacutesticas mais marcadas na liacutengua para o

Portuguecircs falado por eles

168

6112 Siacutencope em onset complexo de l e ɾ

A reduccedilatildeo do onset complexo em Portuguecircs falado pelos Latundecirc eacute um processo

muito comum que se daacute devido a natildeo aceitaccedilatildeo de um segundo elemento no

onset Como podemos observar eacute um processo variante que estaacute atrelado agrave

reorganizaccedilatildeo da siacutelaba e que eacute passiacutevel de sistematicidade

De acordo com Telles (2002 p105) a estrutura silaacutebica do Latundecirc permite a

composiccedilatildeo de seis padrotildees V VC VCC CV CVC CVCC que se

incluem na extensatildeo (C)V(C)(C) que podem ser representados de acordo com

estrutura silaacutebica descrita abaixo

Figura 17 Estrutura silaacutebica do Latundecirc

Os elementos que se encontram entre parecircnteses satildeo opcionais Em Latundecirc as

sequecircncias CV V VC CVC VCC e CVCC ocorrem com frequecircncia

169

sendo os dois primeiros padrotildees os mais frequentes Isso nos mostra o quanto o

Latundecirc evita onsets complexos e codas

A estrutura silaacutebica do portuguecircs de acordo com Mattoso Cacircmara (1969) define

o molde silaacutebico CCVCC conforme figura abaixo

Figura 18 Estrutura silaacutebica do Latundecirc (Cacircmara-Juacutenior)

Seguindo a proposta de Mattoso Cacircmara com respeito agrave distribuiccedilatildeo interna dos

constituintes da siacutelaba as uacutenicas consoantes que preenchem a segunda posiccedilatildeo

do onset satildeo as liacutequidas l e ɾ A coda pode ser preenchida pelas consoantes l

e pelos arquifonemas R S N

No Latundecirc o grupo consonantal no onset natildeo eacute fonoloacutegico Entretanto eacute

atestada a ocorrecircncia dos [tɾ dɾ kɾ gɾ] no plano foneacutetico como resultado da

reduccedilatildeo em siacutelaba pretocircnica de sufixo nominal e verbal A formaccedilatildeo de onset

complexo eacute estrutura marcada no Latundecirc como tambeacutem interlinguisticamente

A estrutura mais complexa e menos frequente (marcada) do encontro consonantal

no onset tende a ser simplificada no portuguecircs falado pelos Latundecirc Como

170

podemos observar em (8) e (9) os grupos consonantais satildeo pronunciados como

um soacute elemento Trata-se do apagamento da tepe e da lateral liacutequida Eacute um

processo em acomodaccedilatildeo que estaacute diretamente ligado agrave faixa etaacuteria dos falantes

Assim os mais novos seguem a tendecircncia de pronunciar o onset complexo

diferentemente dos mais velhos

(8) [bi ka nƱ] brincando

[de tƱ] dentro

[kɛbapƱ] quebraram

[otƱ] outro

(9) [buza] blusa [biciketɪ] bicicleta Embora a reduccedilatildeo do onset complexo seja um fenocircmeno variaacutevel para algumas

variedades do portuguecircs as realizaccedilotildees acima natildeo correspondem agrave fala de

adultos sendo resultantes no processo da aquisiccedilatildeo da liacutengua

Jaacute entre os Latundecirc satildeo os mais velhos que apresentam a realizaccedilatildeo do onset

simplificado como um fenocircmeno variaacutevel conforme observamos em (10)

(10) [b ɾ ĩkarƱ] brincaram [sotildebrasotilde] assombraccedilatildeo [pɾimeɾɪ] primeiro

[febrƱ] febre [fɾɛsa] flecha

O rotacismo (l gt ɾ) da lateral presente em lsquoflecharsquo acima que eacute muito frequente

no portuguecircs menos escolarizado tambeacutem ocorre na fala dos indiacutegenas

171

6113 Apagamento da coda

Em portuguecircs quatro elementos podem ocupar a posiccedilatildeo de coda RSlN aleacutem

dos glides wj85 Em Latundecirc a coda pode ser ramificada e satildeo seis os

segmentos que podem preencher o espaccedilo da coda os glides w j aleacutem das

consoantes t h n Ɂ Como a coda pode ter ateacute duas posiccedilotildees preenchidas os

primeiros elementos satildeo sempre neste caso os glides w j Embora a coda da

siacutelaba fonoloacutegica possa ser preenchida pelas consoantes acima o Latundecirc eacute uma

liacutengua que evita coda na superfiacutecie O fenocircmeno que decorre dessa tendecircncia eacute o

alongamento compensatoacuterio (Clements e Hume 1995)

(11) [ˌn ˈh te]

ˈn h-ˈ Ɂ -te

lsquonossos peacutesrsquo

No dado acima podemos observar a natildeo realizaccedilatildeo da coda fricativa glotal h na

marca de posse ˈnu h- e da coda oclusiva glotal Ɂ o item lexical ldquopeacuterdquo ˈju Ɂ

Nos dois casos o apagamento da coda eacute compensado pelo alongamento

vocaacutelico No caso do morfema de posse ocorre a ressilabaccedilatildeo da coda fricativa

Do ponto de vista da marcaccedilatildeo a siacutelaba menos marcada eacute a que apresenta o

padratildeo CV (Hume 2004 p 183) O Latundecirc tem a tendecircncia a seguir esse

padratildeo de forma que para a liacutengua a coda embora fonoloacutegica eacute mais marcada

A simplificaccedilatildeo da estrutura mais marcada (presenccedila de coda) eacute transferida para

o portuguecircs Conforme os dados descritos abaixo os segmentos que mais satildeo

apagados em posiccedilatildeo de coda satildeo os glides j w e as consoantes h s Como o

85

Mattoso Cacircmara (1969) considera que os glides pertencem ao nuacutecleo Neste caso trata-se de um nuacutecleo ramificado

172

Latundecirc natildeo tem na sua estrutura silaacutebica a coda fricativa alveolar s esse

segmento natildeo eacute licenciado no portuguecircs dos indiacutegenas (dados em 13) Esse

fenocircmeno eacute categoacuterico na fala dos mais velhos e eacute variaacutevel na fala dos indiacutegenas

da geraccedilatildeo poacutes-contato

(12) [m to] muito [koɾƱ] couro

[voto] voltou (13) [dumi] durmir [pig ta] pergunta [pota] porta [kota] corta [pɛtƱ] perto

[kotildekorsquodo] concordou [barsquobudƱ] barbudo (14) [hipotildersquodew] respondeu [gorsquotozƱ] gostoso [iˈtɛla] Stella ([isˈtɛla])

A coda eacute um elemento universalmente marcado No Latundecirc a sua realizaccedilatildeo eacute

em menor frequecircncia do que o Portuguecircs apesar de sua larga presenccedila na

subjacecircncia O que percebemos ademais eacute que o apagamento do R e do s em

coda contribui para a elevaccedilatildeo da vogal meacutedia pretocircnica tautossilaacutebica conforme

os dados ldquocorta e portardquo em (12)

A regra abaixo sintetiza o comportamento da coda no portuguecircs dos Latundecirc

C ou V [oslash] coda

173

Como vimos no Portuguecircs falado por Latundecirc qualquer consoante ou vogal

poderaacute ser apagada em posiccedilatildeo de coda Esta regra tem se mostrado menos

produtiva nas faixas etaacuterias mais novas Nessas geraccedilotildees o apagamento eacute mais

produtivo quando coincide com a realizaccedilatildeo encontrada por nativos em

portuguecircs ([ˈfosa] lsquoforccedilardquo)

6114 Reduccedilatildeo do geruacutendio ndash Anteriorizaccedilatildeo da vogal final

A reduccedilatildeo do geruacutendio eacute um processo comum em alguns dialetos brasileiros

sobretudo em registro menos tenso Esse eacute mais um processo que resulta no

apagamento de segmentos No portuguecircs falado pelos Latundecirc eacute praticamente

categoacuterica a ocorrecircncia da assimilaccedilatildeo da alveolar em geruacutendio

(15) [falatildenƱ] falando [b ɾ ĩgatildenƱ] brigando [kume nƱ] comendo

[bersquobe nƱ] bebendo

[sorsquo ɾ anƱ] chorando

[mersquosenƱ] mexendo [mi ti nƱ] mentindo

Por ser esse um fenocircmeno de larga frequecircncia no portuguecircs nativo entendemos

que a simplificaccedilatildeo segmental da estrutura gerundiva natildeo eacute surpreendente no

portuguecircs indiacutegena Entretanto na produccedilatildeo da geraccedilatildeo preacute-contato a

assimilaccedilatildeo total da oclusiva alveolar eacute acompanhada pela anteriorizaccedilatildeo da

vogal final conforme dados a seguir

174

(16) [dimuɾatildenɪ] demorando

[asinatildenɪ] ensinando [tiɾatildenɪ] tirando

[katildetatildenɪ] catando [kɾese nɪ] crescendo

Para anaacutelise das ocorrecircncias acima precisamos considerar a estrutura do

Latundecirc nessa liacutengua uma terminaccedilatildeo verbal altamente produtiva eacute o morfema

aspectual acentuado -ˈtatilden Esse morfema pode ser seguido pelo morfema de

modo neutro -i resultando nas sequecircncias -ˈtatildeni conforme exemplo abaixo

(17) [keˈja ˌdaˈɾatildeni]

keˈjat ˈta-tatilden-i milho deitar-imperfectivo-neutro

eacute milho deitado (espalhado no chatildeo)

Como no Latundecirc o verbo (e nome) natildeo termina em vogal posterior tal restriccedilatildeo

pode explicar a anteriorizaccedilatildeo do geruacutendio do portuguecircs

6115 Reduccedilatildeo das palatais nasal e lateral

A reduccedilatildeo das palatais nasal e lateral estaacute diretamente ligada agrave natildeo existecircncia

destes segmentos no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc No entanto Clements e

Hume (1995) em seus estudos apontam estes fonemas como complexos do ponto

de vista de seu comportamento

175

Os segmentos ɲ e ʎ satildeo consoantes mais marcadas A natildeo realizaccedilatildeo destas

consoantes no Latundecirc jaacute eacute um fator para a natildeo realizaccedilatildeo no Portuguecircs devido agrave

complexidade inerente de tais segmentos Enquanto segmentos mais complexos

as palatais satildeo sujeitas ao enfraquecimento atraveacutes da iotizaccedilatildeo (vocalizaccedilatildeo)

Mesmo no portuguecircs esse eacute um processo operante particularmente em

variedades populares Mattoso Cacircmara (1981 p 149) descreve que se trata de

ldquomudanccedila de uma vogal ou consoante para a vogal anterior alta i ou para a semivogal correspondente ou iode Nos falares crioulos portugueses haacute a iotizaccedilatildeo das consoantes molhadas ʎ e ɲ ex mulher gt muyeacute nhonho gt ioiocirc (africanismo)rdquo

Aleacutem da iotizaccedilatildeo o portuguecircs apresenta a despalatizaccedilatildeo da lateral em que ʎ

realiza-se [l] como em [muˈlɛ] lsquomulherrsquo

No portuguecircs dos Latundecirc o enfraquecimento se daacute mais frequentemente pela

iotizaccedilatildeo como em (18) Estas realizaccedilotildees ocorrem na fala dos mais velhos na

geraccedilatildeo anterior ao contato

18) [muˈjɛ] mulher

[baɾuj] barulho

[ojˈatildenƱ] olhando

[vimej] vermelho (19) [fila] filha [fola] folha

Weinreich (1953 p 18) explica que quando em sistemas foneacuteticos em contato

podem ocorrer os processos de reinterpretaccedilatildeo de fone que leva a substituiccedilatildeo

de segmento Eacute o que acontece nos exemplos acima

176

Em (20) e (21) o processo de despalatalizaccedilatildeo resulta no apagamento total da

palatal

(20) [miƱ] milho [fii] filho (21) [mia] minha A reduccedilatildeo tem menos restriccedilotildees se comparada com os fatos do portuguecircs falado

por nativo Em (20) as ocorrecircncias satildeo atestadas no portuguecircs enquanto primeira

liacutengua Diante da vogal posterior natildeo apenas o apagamento da palatal pode

ocorrer como tambeacutem o da siacutelaba inteira Em (21) observamos uma realizaccedilatildeo

particular dos Latundecirc em que a consoante palatal nasal eacute apagada plenamente

sem deixar vestiacutegio nasal na vogal que a precede Esse fato tem relaccedilatildeo com a

complexidade que envolve as nasais na liacutengua indiacutegena a qual natildeo coincide com

os processos existentes no portuguecircs

No caso de (22) ocorre o apagamento da siacutelaba em que se encontra a palatal

nasal do diminutivo eacute comum a variedades populares do portuguecircs

(22) [pikinĩnĩ ] pequenininho [faki ] faquinha

Como afirmamos no iniacutecio da seccedilatildeo os segmentos palatais natildeo existem em

Latundecirc o que torna sua produccedilatildeo no Portuguecircs falado pelos Latundecirc mais

marcada e de difiacutecil ocorrecircncia

177

6116 Afeacuterese

A afeacuterese eacute um processo foneacutetico que consiste na queda de elementos iniciais do

vocaacutebulo Este processo que fora responsaacutevel pelas modificaccedilotildees foneacuteticas do

Latim para o Portuguecircs ainda eacute atuante no estaacutegio atual da liacutengua

A queda da siacutelaba inicial es- em verbos como esperar e estar e do a- em

vocaacutebulos como aqui e acabar eacute muito comum em alguns dialetos brasileiros

Entretanto este tipo de delaccedilatildeo no portuguecircs falado pelos Latundecirc se expande

para outros vocaacutebulos da liacutengua conforme os exemplos abaixo

(23) [kutatildeni] escutando [kapa] escapa [kapo] escapou [peɾatildenƱ] esperando

[pi gada] espingarda

(24) [tupiw] entupiu [gatildeno] enganou [tehaɾƱ] enterraram

(25) [kɪ] aqui [lsquokelɪ] aquele [bɾasadƱ] abraccedilado

[meto] aumentou [korsquodadƱ] acordado [batildedono] abandonou [kaboʃe] acabou-se

(26) [fiɾe tɪ] diferente

[pitaw] hospital

178

Natildeo consta no inventaacuterio fonoloacutegico dessa liacutengua a presenccedila da fricativa alveolar

surda em posiccedilatildeo de coda Essa restriccedilatildeo eacute transferida para o portuguecircs falado

por Latundecirc conforme (23)

Outra razatildeo para esse fenocircmeno pode estar na estrutura prosoacutedica da palavra no

Latundecirc Nessa liacutengua as palavras satildeo monossilaacutebicas ou dissilaacutebicas Raiacutezes

com mais de duas siacutelabas satildeo raras (TELLES 2002) Associado a isso o acento

eacute morfoloacutegico em raiacutezes Nas dissilaacutebicas o acento recai na segunda siacutelaba

(27) [ˈmatilde ginĩde] ˈmatildejn-kiˈnĩn-te caju-redondo-Sufixo Nominal

lsquocastanha de cajursquo

No dado (27) encontramos exemplos de raiz monossilaacutebica e de raiz dissilaacutebica

Jaacute no portuguecircs haacute um nuacutemero relevante de palavras trissiacutelabas e polissiacutelabas

Diante disso a afeacuterese pode ser uma interferecircncia da estrutura do leacutexico da

liacutengua indiacutegena para simplificar a estrutura do portuguecircs - mais marcada no

Latundecirc Este fenocircmeno natildeo afeta o acento e eacute operante sobretudo quando a

siacutelaba inicial natildeo tem onset

6117 Apoacutecope

A apoacutecope eacute uma das formas de apagamento de segmentos que estaacute

relacionada assim como a afeacuterese a outros processos foneacuteticos

179

A queda de elementos finais eacute uma das formas de reduccedilatildeo ou reorganizaccedilatildeo

silaacutebica e de palavras Assim como nos demais processos a siacutelaba tocircnica eacute

preservada de qualquer alteraccedilatildeo

Embora alguns processos explicados aqui tratem da apoacutecope como a reduccedilatildeo do

geruacutendio e ditongo finais ou apagamento da nasal palatal a exemplo de (27)

estes exemplos jaacute foram mecionados nas seccedilotildees anteriores A presenccedila deles

aqui eacute para mostrar que os outros processos foneacuteticos resultam na apoacutecope

(28) [ ʒ rsquotaɾɪ] juntaram

[tursquodĩ] tudinho [ti ] tinha

[lsquovE ] velho [kabersquosĩ] cabecinha [lsquonatilde] natildeo [lsquomatilde] matildee (29) [lsquove] ver [lsquokɛ] quer (30) [nɔj] noacutes

[maj] mais [dirsquofisɪ] difiacutecil [dirsquofisƱ] difiacutecil [tatildersquome j] tambeacutem

(31) [virsquoa] viado [lsquoluɾɪ] Lurdes

[lsquote ] dele

Em (29) a apoacutecope do R final eacute processo muito comum no portuguecircs atual

Diante de tal explicaccedilatildeo natildeo nos cabe assegurar se o processo eacute proacuteprio do

180

Latundecirc ou se da variedade atraveacutes da qual os indiacutegenas adquiriram o portuguecircs

Os dados em (30) tambeacutem apontam para a interpretaccedilatildeo dos dados mostrados

em (29)

Em (31) os dados apresentam um apagamento incomum ao portuguecircs de

nativos A fala espontacircnea e natildeo tensa eacute uma possibilidade explicativa uma vez

que essas ocorrecircncias natildeo satildeo sistemaacuteticas

Os dados de apoacutecope natildeo evidenciam a transferecircncia de traccedilos mais marcados

do Latundecirc para o portuguecircs

6118 Siacutencope86

A forma mais comum deste processo se apresenta no portuguecircs nas

proparoxiacutetonas Em alguns dialetos a depender do contexto linguiacutestico eacute

categoacuterico a ocorrecircncia da reduccedilatildeo interna no vocaacutebulo

Nos exemplos elencados em (32) no caso das proparoxiacutetonas tal reduccedilatildeo eacute

motivada pelo padratildeo acentual do portuguecircs que permite com mais toleracircncia o

padratildeo paroxiacutetono ao proparoxiacutetono conforme Silva (2006 p78)

Quando ocorrente no Portuguecircs este processo estaacute relacionado ao apagamento

da vogal postocircnica medial Com a reduccedilatildeo vocaacutelica a consoante precedente

pode tomar dois caminhos i) eacute incorporado agrave siacutelaba tocircnica na posiccedilatildeo de coda ii)

86

Os exemplos apresentados demonstram que o processo ocorrente eacute muito mais motivado pelo

Portuguecircs do que pelo Latundecirc A nossa classificaccedilatildeo fica aqui a caraacuteter de registro

181

passa a onset da siacutelaba aacutetona seguinte o que afeta sua constituiccedilatildeo O

apagamento vocaacutelico resulta em uma palavra paroxiacutetona

(32) [lsquomuʒka] muacutesica [lsquohapƱ] raacutepido [lsquokOʃka] coacutecega [lsquoavɾɪ] aacutervore

Entendemos que muitas destas ocorrecircncias no Latundecirc se datildeo pelo portuguecircs de

contato Isso eacute confirmado pela produccedilatildeo de ldquomuacutesicardquo e ldquocoacutecegardquo que licencia

uma restriccedilatildeo forte no Latundecirc a fricativa sibilante em coda Aleacutem disso a

produccedilatildeo de ldquoraacutepidordquo ([ˈhapƱ]) tambeacutem coincide com a realizaccedilatildeo encontrada no

portuguecircs popular na qual a consoante em onset da siacutelaba apagada passa a

onset da siacutelaba seguinte devido agrave restriccedilatildeo no portuguecircs de onda oclusiva

612 Ganho de elementos (Inserccedilatildeo de elementos)

Embora em menor nuacutemero os processos que resultam em ganhos de elementos

tambeacutem ocorrem no Portuguecircs falado pelos Latundecirc Satildeo poucos os processos e

menores ainda os casos em que eles ocorrem Isso pode ser explicado como jaacute

fora dito devido ao fato de as liacutenguas em geral terem um dinamismo proacuteprio que

favorece mais agrave perda do que o ganho de elemento Em alguns casos a

motivaccedilatildeo para o ganho de material foneacutetico satildeo as restriccedilotildees fonotaacuteticas da

liacutengua e ou a tendecircncia agrave formaccedilatildeo de padratildeo silaacutebico menos marcado No caso

do portuguecircs de acordo com Collischonn (2004 p 67) um tipo de ganho de

material precisamente a epecircntese vocaacutelica

ocorre mais quando a consoante perdida estaacute em posiccedilatildeo pretocircnica como em objeto magneacutetico e opccedilatildeo ocorrendo em apenas 24 dos vocaacutebulos na posiccedilatildeo postocircnica em palavras como egiacutepcios eacutetnico ou ritmo Mais especificamente estes resultados mostram que a epecircntese que em outros contextos

182

ocorre numa taxa bastante alta eacute dramaticamente reduzida em posiccedilatildeo postocircnica

Exemplos do que a autora descreve seguem apresentados abaixo em (33) O

primeiro dado traz a inserccedilatildeo da vogal epenteacutetica default no portuguecircs a anterior

alta [i] e a segundo natildeo ocorrecircncia da inserccedilatildeo

(33) [lsquoabiˈsuhdƱ] absurdo [koˈlapisƱ] colapso

A epecircntese vocaacutelica nos dados examinados natildeo foi muito expressiva sobretudo

pelo fato de natildeo termos encontrado um nuacutemero significativo de palavras com

encontro consonantal no leacutexico dos indiacutegenas Entretanto alguns casos como em

(34) ilustram a ocorrecircncia no portuguecircs dos Latundecirc

(34) [ˈmɔgunƱ] mogno (35) [piˈnew] pneu

A estrutura que favorece a epecircntese no portuguecircs natildeo faz parte das regras

fonotaacuteticas do Latundecirc o que tambeacutem pode favorecer a vogal epenteacutetica nos

dados observados

(36) [haacutersquopazɪ] rapaz [haacutersquopazƱ] rapaz [parsquope sɪ] papeacuteis [dorsquose zɪ] de vocecircs [lsquonͻ zɪ] noacutes

183

Diferentemente do que ocorre em (34 - 35) os dados de (36) nos direcionam para

a paragoge processo que se caracteriza pela inserccedilatildeo de elemento(s) no final do

vocaacutebulo Este processo tambeacutem estaacute diretamente ligado agrave presenccedila da fricativa

alveolar desvozeada em coda sendo esse segmento proibido nessa posiccedilatildeo no

Latundecirc No caso citado a inserccedilatildeo pode ser da vogal alta posterior rapaz

[hapazƱ] mas a preferecircncia eacute pela vogal alta anterior que eacute a vogal menos

marcada [hapazɪ] rapaz noacutes [lsquonͻ zɪ]

Em (37) o processo de paragoge ocorre apoacutes o processo de monotongaccedilatildeo

ocorrendo no ditongo [atildew] que passa a ser realizado como a vogal nasal meacutedia

posterior conforme discutido em 5111 Apoacutes esse processo haacute a inserccedilatildeo do

consoante nasal seguida da vogal alta anterior A paragoge eacute variaacutevel com a

reduccedilatildeo do ditongo ([tubaˈɾotilde]) A inserccedilatildeo da siacutelaba final [-ni] pode decorrer da

existecircncia produtiva de terminaccedilatildeo sonora semelhante em vocaacutebulos (nominais e

verbais) no Latundecirc

(37) [tubarsquoɾotildenɪ] tubaratildeo

Em (38) o processo ocorrente eacute a proacutetese Se para o processo inverso - a afeacuterese

- os dados satildeo em maior quantidade para a proacutetese satildeo pouquiacutessimos os

contextos em que ela ocorre No caso deste exemplo a proacutetese se daacute a presenccedila

da vogal baixa diante do verbo Este tipo de proacutetese eacute bem recorrente no

Portuguecircs em dados como ([alemˈbra]) Entretanto o caraacuteter pontual da

ocorrecircncia do fenocircmeno natildeo favorece uma interpretaccedilatildeo mais segura

(38) [atorsquomaɾu] tomaram

184

Outra forma de ganho de elementos pode ser o prolongamento da vogal final O

exemplo de (39) nos mostra o prolongamento da vogal meacutedia anterior Essa

ocorrecircncia foi observada no contexto especiacutefico de ecircnfase

(39) [dese] desse [se] esse

613 Alteraccedilatildeo de elementos (Permuta ou transposiccedilatildeo)

A alteraccedilatildeo de elementos linguiacutesticos eacute considerada na literatura histoacuterica como o

terceiro tipo de alternacircncia focircnica inerente agraves liacutenguas Os contextos em que o

cacircmbio eacute permitido satildeo diversos e direcionados por distintas regras fonoloacutegicas

Muitos desses processos natildeo alteram a estrutura silaacutebica nem atinge a estrutura

lexical O que ocorre de fato eacute a acomodaccedilatildeo de alguns segmentos no dialeto

falado seja pela mudanccedila de traccedilo(s) ou seja pela de segmento(s)

6131 Despalatalizaccedilatildeo de [ʃ] e [ʒ]

Tratamos na seccedilatildeo 5115 do processo da reduccedilatildeo das palatais [ʎ] e [ɳ] que

tambeacutem se configura como um caso de despalatalizaccedilatildeo Todavia tal

classificaccedilatildeo se daacute devido ao fato de estaacute ligada agrave perda de elementos enquanto

a que trataremos agora se configura da permuta ou da reduccedilatildeo de traccedilos

185

Em Latundecirc a presenccedila das palatais [ʃ] e [tʃ] satildeo realizaccedilotildees de s Estas podem

vir em iniacutecio e em meio de palavras As realizaccedilotildees [ʃ] e [s] satildeo preferidas pelos

mais novos enquanto os mais velhos optam pela africada alveolo-palatal surda

Diferentemente no Portuguecircs falado por Latundecirc as realizaccedilotildees natildeo

palatalizadas satildeo preferidas Os Latundecirc natildeo transferem o segmento mais

marcado para o Portuguecircs Contudo conforme seccedilatildeo a seguir veremos que este

processo eacute variaacutevel e pode se dar em qualquer posiccedilatildeo do vocaacutebulo conforme

dados de (40)

(40) [sersquogo] chegou [sersquogamƱ] chegamos [sorsquoɾanƱ] chorando [sursquopaha] chupava [satildematildedƱ] chamando [dersquosaɾƱ] deixaram [casueɾƱ] cachoeira

[mersquosenƱ] mexendo [bisƱ] bicho [baso] baixo [debasƱ] debaixo [lsquopesƱ] peixe [dirsquoso] deixou

Natildeo consta no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc as consoantes z e ʒ de forma

que a liacutengua natildeo apresenta oposiccedilatildeo entre surda e sonora para as fricativas

sibilantes Em (41) o processo de despalatalizaccedilatildeo atinge a fricativa alveopalatal

vozeada que passa a se comportar como fricativa alveolar em iniacutecio de siacutelaba e

em meio de palavras

(41) [lizeɾƱ] ligeiro

186

[lsquolotildezɪ] longe [lsquosuzɪ] suja [lsquosuzu] sujo [azursquoda] ajudar [lsquozudia] judia [azersquota] ajeitar

A escolha do segmento menos marcado segue o que ocorreu com s a

realizaccedilatildeo desses segmentos satildeo adquiridos analogicamente e a presenccedila se daacute

no interior do vocaacutebulo Trata-se da reinterpretaccedilatildeo e acomodaccedilatildeo do segmento

Neste caso do menos marcado jaacute que ambos satildeo menos naturais em sua liacutengua

(WEINREICH 1953)

6132 Palatalizaccedilatildeo

A quantidade de sons palatais do Latundecirc natildeo corresponde aos do Portuguecircs

Em Latundecirc a palatalizaccedilatildeo eacute um processo foneacutetico que ocorre com o segmento

s e em incidecircncia extremamente escassa com t em ambientes que jaacute foram

postos no Capiacutetulo IV que trata deste sistema foneacutetico Eacute um processo bastante

variaacutevel tendo em vista a natildeo presenccedila desse segmento na subjacecircncia da

liacutengua Essa variaccedilatildeo ocorre marcadamente na fala dos mais velhos Os mais

jovens que adquiriram ambas as liacutenguas (Portuguecircs e Latundecirc)

simultaneamente produzem em menor proporccedilatildeo este processo

A africada [tʃ] eacute um segmento que tambeacutem apresenta uma realizaccedilatildeo altamente

variaacutevel provavelmente devido agrave histoacuteria interna da liacutengua conforme Telles

187

(2002 p85) No Latundecirc natildeo haacute diferenccedila entre a oposiccedilatildeo foneacutetica entre as

alveolares de um lado e as palatais e alveacuteolo-palatais de outro

Em (42) e (43) a palatalizaccedilatildeo atinge tanto a fricativa alveolar vozeada quanto a

desvozeada

(42) [ʃu rsquomiɾƱ] sumiram

[ lsquoʃi ma] cima

[ʃigursquoɾow] segurou

(43) [lsquoua] usa

[bursquoʒoɾƱ] Besouro

Em (44) e (45) a palatalizaccedilatildeo abrange as consoantes oclusivas alveolares que

se realizam como africadas alveolo-palatais podendo ocorrer em qualquer

posiccedilatildeo ou contexto da palavra

(44) [lsquoĩdƱ] iacutendio

[matildersquodɔga] mandioca

[ɛrsquoĩ] zezinho

[odʒɪ] hoje [tʃi rsquodʒeɾƱ] cinzeiro

Embora no Portuguecircs o processo de africativizaccedilatildeo de oclusivas alveolares [t d]

seja comum a alguns dialetos como o do Rio de Janeiro [lsquotʃia] e do portuguecircs

popular no Nordeste [lsquoojtʃƱ] sua ocorrecircncia eacute condicionada agrave contiguidade de uma

vogal anterior alta [i] Diferentemente em Latundecirc a palatalizaccedilatildeo e a

188

fricativizaccedilatildeo variam entre si e ocorrem tambeacutem com a fricativa alveolar s Este

processo pode ocorrer em qualquer lugar da palavra

(45) [tʃai] sair [tʃiɾi ga] seringa

[barsquotʃotilde] batom [tʃͻ] soacute [tʃumiɾƱ] sumiram

[tʃobɾo] sobrou

[arsquotʃi ] assim

[tʃubi nƱ] subindo

[pɔtʃa] porta

[rsquotʃua] suja

Os exemplos de (46) apontam para um processo secundaacuterio o fortalecimento

Neste caso a fricativa alveopalatal passa a ser pronunciada como africada

(46) [ tʃoɾatildenƱ] chorando [tʃama] chama [tʃega] chega [ tʃursquoveɾƱ] chuveiro [kaharsquopitʃƱ] carrapicho

No que tange agrave abordagem das palatais a variaccedilatildeo no processo de acomodaccedilatildeo

desses inventaacuterios fonoloacutegicos eacute muito grande A partir das incidecircncias

percebemos que no Portuguecircs resultante do contato a ocorrecircncia desses

segmentos complexos se mostra tambeacutem na mesma proporccedilatildeo

Diante da palatalizaccedilatildeo incluindo a africativizaccedilatildeo observamos que os dados

apresentam duas direccedilotildees quanto ao processo Nos mesmos contextos tanto

ocorre a despalatalizaccedilatildeo quanto a palatalizaccedilatildeo Essa variaccedilatildeo no portuguecircs dos

189

indiacutegenas eacute engatilhada pela ausecircncia do contraste szʃʒ em sua primeira

liacutengua

6133 Desvozeamento e vozeamento

Diferente do portuguecircs no Latundecirc natildeo haacute oposiccedilatildeo das oclusivas quanto agrave

sonoridade As consoantes oclusivas subjacentes satildeo as surdas bilabial alveolar

e velar p t e k respectivamente Sua realizaccedilatildeo sonora eacute condicionada pela

posiccedilatildeo na palavra pelo ambiente (contiguidade nasal) e pelo acento O

vozeamente obrigatoacuterio ocorre quando elas precedidas por consoante nasal na

coda da siacutelaba anterior O processo ocorre tanto no interior quanto em fronteiras

de morfemas (TELLES 2002 p135)

A ausecircncia do contraste surdo-sonoro nas consoantes oclusivas do Latundecirc afeta

a realizaccedilatildeo das consoantes no portuguecircs resultante do contato Na produccedilatildeo dos

indiacutegenas mais velhos (esse fenocircmeno natildeo foi observado na geraccedilatildeo mais

jovem) o processo de desvozeamento atinge as consoantes oclusivas sonoras g

d do portuguecircs conforme (47) e (48)

A realizaccedilatildeo sonora Latundecirc envolve o traccedilo laringal Foneticamente em fala

lenta haacute a realizaccedilatildeo de [d] como alofone de t Telles (2002 p 45) explica que

os falantes mais jovens da geraccedilatildeo poacutes-contato que adquiriram o Portuguecircs

simultaneamente ao Latundecirc neutralizaram o contraste entre sons realizando

preferencialmente o som menos marcado natildeo-implodido Diferentemente dos

mais novos os mais velhos preferem o som implosivo [ɗ]

190

Quanto ao segmento [g] o Latundecirc o tem enquanto alofone de [k] e pode ser

encontrado em iniacutecio de palavra quando em fala raacutepida Mostra-se categoacuterico em

meio de palavra quando diante de uma nasal lexical Em ambiente intervocaacutelico

pode-se encontrar a variaccedilatildeo entre [k] e [g] das quais eacute preferencial a realizaccedilatildeo

da vogal surda (idem p73) A falta do contraste no Latundecirc explica as

realizaccedilotildees de (47)

(47) [lsquobɾika] briga [lsquokoʃta] gosta [kɔviotilde] gaviatildeo

[katildersquoba] gambaacute

A ausecircncia do segmento [d] em Latundecirc eacute a responsaacutevel pela variaccedilatildeo e pela natildeo

realizaccedilatildeo dessa consoante que ocorre como oclusiva alveacuteolo-palatal t

(48) [tipoj] depois [se rsquotatu] sentado

(49) [hatildega] arranca

Em (49) diferentemente do processo de desvozeamento a oclusiva velar se

realiza como sonora A contiguidade nasal em posiccedilatildeo precedente condiciona o

vozeamente da oclusiva velar

Em todos os casos observados acima fica evidente a interferecircncia do Latundecirc no

portuguecircs indiacutegena As consoantes sonoras que satildeo mais marcadas

interliguisticamente por natildeo fonoloacutegicas no Latundecirc se tornam ainda mais

marcadas nessa liacutengua Na produccedilatildeo do portuguecircs os Latundecirc mais velhos

191

preservam a marcaccedilatildeo e apresentam uma realizaccedilatildeo com condicionamento

emprestado da liacutengua indiacutegena

6134 Abaixamento e Elevaccedilatildeo das Vogais Orais

No portuguecircs falado pelos Latundecirc os processos de abaixamento e elevaccedilatildeo

diferenciam-se dos contextos em que ocorrem no portuguecircs Os de elevaccedilatildeo satildeo

em maior nuacutemero que os de abaixamento fato este tambeacutem verificado no

portuguecircs falado pelos Latundecirc

No caso de (50) o uacutenico caso de abaixamento ocorre na vogal anterior nasal e

que passa a ser pronunciada como vogal baixa oral

(50) [asina] ensinar [asinatildenɪ] ensinando

Em (51) a elevaccedilatildeo ocorre com a vogal central baixa final que passa a alta

anterior

(51) [suzɪ] suja [kazɪ] causa [kazɪ] casa [li gɪ] liacutengua

[pɾersquogisɪ] preguiccedila

Assim como em (51) em (52) a elevaccedilatildeo da vogal final tambeacutem eacute realizada como

alta anterior No segundo caso natildeo se trata de elevaccedilatildeo mas de anteriorizaccedilatildeo

uma vez que a vogal meacutedia posterior que ocorre em nomes no portuguecircs eacute

realizada como alta posterior

192

(52) [li pɪ] limpo

[kotildemɪ] como [pɾeti] preto

[saɾatildepɪ] sarampo

[pɾimeɾɪ] primeiro

[morsquosegɪ] morcego [morsquohe dɪ] morrendo

[novɪ ] novo

[kursquoɳadɪ] cunhado [otɪ] outro [fikatildenɪ] ficando

A elevaccedilatildeo e posteriorizaccedilatildeo tambeacutem ocorrem no final dos vocaacutebulos como em

(53)

(53) [kabesƱ] cabeccedila [kanɛlƱ] canela

[mini nadƱ] mininada

[malaɾƱ] malaacuteria

[kursquoru Ʊ] coruja

Em (54) temos tambeacutem a posteriorizaccedilatildeo da alta anterior Assim como a meacutedia

posterior em (52) a meacutedia anterior no portuguecircs eacute amplamente produzida como

alta anterior de forma que o alccedilamento em si natildeo se configura como um

processo do portuguecircs do contato

(54) [hedƱ] rede [bastatildetƱ] bastante [pesƱ] peixe [notƱ] noite [febɾƱ] febre

193

Apesar de natildeo encontrarmos itens que mostrassem a sistematicidade do

condicionamento entre [i] e [u] em final de palavras os dados nos mostram que

haacute uma tendecircncia na base das realizaccedilotildees Os vocaacutebulos terminados em [Ʊ]

tendem a ser produzidos com [ɪ] e os terminados por [a] tendem a ser realizados

com [Ʊ]

Nos dados observados a variaccedilatildeo entre [i] e [Ʊ] soacute ocorre em final de vocaacutebulo

quando se trata da paragoge conforme visto nos exemplos (36) em 512

[harsquopazɪ] ~ [harsquopazʊ]

Os dados em (55) ilustram a falta de regularidade no alccedilamento das vogais

pretocircnicas Como vemos em [fuˈkatildemƱ] e [virsquome ] a tonicidade ou a contiguidade

segmental natildeo condiciona a elevaccedilatildeo da pretocircnica

(55) [pig ta] pergunta [piskosƱ] pescoccedilo [hirsquopotildedew] respondeu [pigu rsquotatildenɪ] perguntando

[dimorsquoɾo] demorou

[virsquome ] vermelho [dimursquoɾatildenɪ] demorando

[fuˈkatildemƱ] ficamos

[kuˈmiw] comeu

194

6135 Nasalizaccedilatildeo e Desnasalizaccedilatildeo

No Latundecirc a nasalidade vocaacutelica eacute contrastiva para a central baixa a anterior

alta e a posterior alta seguidas por consoante nasal tautossilaacutebica A nasalizaccedilatildeo

alofocircnica soacute ocorre com vogais aacutetonas Apesar de a organizaccedilatildeo do traccedilo nasal

na fonologia do Latundecirc ser distinta da do portuguecircs o status contrastivo do traccedilo

em ambas as liacutenguas favorece sua percepccedilatildeo e realizaccedilatildeo na produccedilatildeo na sala

no portuguecircs Entretanto a nasal depende tambeacutem de outros fenocircmenos

cooperantes

Os dados a seguir ilustram a ocorrecircncia da nasalizaccedilatildeo em vogais A

contiguidade da vogal com uma consoante nasal mesmo heterossilaacutebica pode

resultar na nasalizaccedilatildeo O primeiro dado abaixo foge do esperado em liacutengua

portuguesa e tampouco decorre de uma interferecircncia do Latundecirc

(56) [mersquoatilde] meia [bɾĩrsquogatildenƱ] brigando [ʃu miɾƱ] sumiram

[mi mƱ] mesmo

Em (57) ocorre a desnasalizaccedilatildeo em palavras funcionais Esses casos natildeo satildeo

frequentes no leacutexico e natildeo podem ser analisados como resultados de interferecircncia

direta O apagamento da nasal em coda ou em onset seguinte impede a

nasalizaccedilatildeo

(57) [nɪ] nem (natildeo) [mia] minha

195

6136 Fenocircmenos evolvendo os roacuteticos

O tratamento do roacutetico requer uma consideraccedilatildeo sobre o seu comportamento

interlinguiacutestico Retomando as palavras de Bonet e Mascaroacute (1997 p 103)

It is well know that the phonetic realization of rhotics varies considerably from language to language even from dialect to dialect Rhotics can be realized as flaps taps trills (uvular coronal ou bilabial) or as assibilated or fricative variants They ca alternate with a lateral liquid with glides and in some cases a flap can occur as the phonetic realization of a coronal stop in specific environments

Os roacuteticos satildeo segmentos que apresentam uma grande variaccedilatildeo no portuguecircs

Natildeo diferentemente estes elementos tambeacutem se mostraram como motivadores

de vaacuterios processos fonoloacutegicos do portuguecircs falado pelos Latundecirc

Os exemplos dispostos em (58) apontam para a aspiraccedilatildeo do R em coda

silaacutebica Processo este que eacute comum a variedades do portuguecircs e que tambeacutem

no caso em tela pode ser motivado pela preferecircncia de natildeo coda da liacutengua

Latundecirc que favorece o seu enfraquecimento atraveacutes de uma realizaccedilatildeo fricativa

glotal

(58) [duhmɪ] Dormi [mɛgursquola] mergulhar

[fosa] Forsa

O rotacismo eacute um fenocircmeno presente no portuguecircs dos Latundecirc especialmente

entre os mais velhos Fonemas distintos podem sofrer o processo Em (59) a

realizaccedilatildeo do flap tem na base uma sibilante uma lateral palatal e uma oclusiva

196

alveolar Em ldquotrabalhavardquo a lateral palatal inexistente no Latundecirc poderia ser

subtituida pela lateral alveolar constante do inventaacuterio da liacutengua indiacutegena

Entretanto o flap apesar de natildeo fonoloacutegico no Latundecirc eacute um segmento muito

frequente na liacutengua decorrente de processo de enfraquecimento Essa tendecircncia

do Latundecirc pode estar na base da realizaccedilatildeo do portuguecircs Dentre as ocorrecircncias

abaixo a uacuteltima se coloca como um processo frequente no proacuteprio Latundecirc no

qual uma oclusiva passa a flap em ambiente intervocaacutelico

(59) [karsquoboɾe] acabou-se

[tabaɾava] trabalhava

[poɾɪ] pode

Em Portuguecircs particularmente falado por sujeitos menos escolarizados o

fenocircmeno do rotacismo tambeacutem eacute frequente em encontros consonantais

tautossilaacutebicos em que a segunda consoante eacute a lateral alveolar l Dessa forma

produccedilatildeo encontrada em (60) pode ser devido ao contato com o Portuguecircs local

(60) [pɾatildeta] planta

[gɾɛba] gleba

[fɾɛsa] flecha

Em termos da organizaccedilatildeo da fonologia de ambas as liacutenguas os dados em (60)

assim como aqueles em (59) podem ser refletidos a partir da escala de

sonoridade proposta por Bonet e Mascaroacute (1997 p 109)

197

Quadro 21 Escala de Sonoridade adaptada de Bonet e Mascaroacute 1997 p 109)

0 1 2 3 4

Obstruintes

(oclusivas

fricativas trill)

nasais laterais glides

flap

vogais

Considerando a posiccedilatildeo do flap na escala de Bonet e Mascaroacute podemos

interpretar tanto o rotacimo no portuguecircs natildeo padratildeo quanto aquele presente no

Latundecirc como resultado de enfraquecimento de diferentes segmentos situados

mais agrave esquerda no ranking de sonoridade Entre esses segmentos como

observamos na escala acima encontra-se a proacutepria lateral alveolar que apesar

de tradicionalmente formar a classe das liacutequidas ao lado dos roacuteticos natildeo

apresenta a mesma sonoridade que o flap

6137 Labializaccedilatildeo e Deslabializaccedilatildeo

No Portuguecircs falado pelos Latundecirc os processos que envolvem articulaccedilatildeo

secundaacuteria especificamente a labializaccedilatildeo e a deslabializaccedilatildeo estatildeo

relacionados agraves consoantes oclusivas velares e se realizam praticamente nos

mesmos contextos Trata-se de um processo foneacutetico variaacutevel

(61) [kƱɪ] que [kƱelɪ] com ele (62) [kazɪ] quase [katildedƱ] quando

198

[karsquokƱɛ] qualquer

[li gɪ] liacutengua

No Latundecirc a labializaccedilatildeo pode ser derivada de processo mas eacute restrita em

ocorrecircncia Aleacutem disso a sequecircncia da olusiva seguida do glide formando

encontro consonantal tambeacutem natildeo faz parte da fonologia do Latundecirc Esses fatos

favorecem a produccedilatildeo irregular do portuguecircs em que observamos a

deslabializaccedilatildeo (ou o apagamento do glide) como em (62) e a labializaccedilatildeo (ou

inserccedilatildeo do glide) em (61)

6138 Metaacutetese

A alternacircncia de segmentos no portuguecircs falado pelos Latundecirc pode ocorrer

entres siacutelabas diferentes ou entre elementos da mesma siacutelaba Aleacutem disso

ocorre nas duas direccedilotildees (da esquerda para a direita e da direita para a

esquerda)

(63) [bahiƱ] bairro [fɾevenƱ] fervendo [parsquoguo] apagou

Como vemos acima no primeiro dado de (63) ocorre natildeo apenas a metaacutetese

como tambeacutem o avanccedilo do acento resultando numa palavra oxiacutetona Nos demais

dados a tranposiccedilatildeo segmental natildeo interfere na estrutura suprassegmental O

segundo dado de ldquofervendordquo eacute tiacutepico do portuguecircs e pode decorrer da variedade

de contato sobretudo pelo fato de o onset complexo natildeo fazer parte da liacutengua

indiacutegena Em ldquoapaguordquo a metaacutetese resulta na labializaccedilatildeo da oclusiva velar Essa

199

forma de palavra tem como realizaccedilatildeo foneacutetica frequente mesmo no portuguecircs

nativo a monotongaccedilatildeo Nesse caso a metaacutetese resulta de processo irregular e

pontual nos dados observados

Como vimos nas seccedilotildees anteriores os resultados da metaacutetese natildeo correspondem

a estruturas fonoloacutegicas no Latundecirc sendo sua ocorrecircncia derivada de processo

foneacutetico sem condicionamento prosoacutedico

6139 Siacutestole

Alguns casos de siacutestole em que ocorre o recuo do acento foram encontrados na

fala dos mais velhos Natildeo identificamos contexto linguiacutestico como o

sequenciamento focircnico do enunciado fonoloacutegico que justificasse essas

realizaccedilotildees Considerando o fato de a produccedilatildeo ter sido encontrada apenas na

fala da geraccedilatildeo mais velha e de o acento lexial no Latundecirc ser morfoloacutegico

ancorado em uma das duas promeiras siacutelabas da raiz da palavra (TELLES 2002)

eacute plausiacutevel supor uma interferecircncia do padratildeo acentual da liacutengua indiacutegena no

portuguecircs dos Latundecirc Os dados em (64) evidencia o recuo do acento

(64) [mɔhe] morrer

[kalo] calor [katɪ] quati [pega] pegar

Nos dados acima importa considerar tambeacutem o fato de se tratarem de itens

nominais (incluindo as formas nominais dos verbos) Diante disso uma analogia

possiacutevel dos Latundecirc seria a de considerar a raiz monossilaacutebica que eacute altamente

200

produtiva na liacutengua indiacutegena o que tambeacutem justificaria o acento na primeira

siacutelaba da palavra

61310 Fortalecimento

Casos de fortalecimento jaacute foram abordados nas seccedilotildees anteriores em que

tratamos da palatalizaccedilatildeo e da dessonorizaccedilatildeo Nesta seccedilatildeo outro fenocircmeno de

fortalecimento eacute apresentado no qual ocorre a oclusivizaccedilatildeo de fricativas

Salientamos entretanto que essas foram realizaccedilotildees mais esporaacutedicas e menos

recorrentes que as demais

(65) [istubidƱ] subindo [tiguɾa] segura

[torsquoteɾƱ] solteiro

[batitaɾƱ] batizaram

O processo ocorre no iniacutecio e em meio de palavra No primeiro dado em fato haacute

uma epecircntese da oclusiva alveolar surda [t] tendo em vista a preservaccedilatildeo de uma

sutil sibilaccedilatildeo do s em coda da siacutelaba precedente

Na fonologia do Latundecirc o fonema s tem como alofone o fone [t] que ocorre em

siacutelaba aacutetona (TELLES 2002) Embora essa natildeo seja a realizaccedilatildeo mais frequente

a interferecircncia do Latundecirc natildeo pode ser desconsiderada Em todos os dados de

(65) haacute a presenccedila de segmento oclusivo em siacutelaba contiacutegua que tambeacutem pode

ter motivado o fortalecimento do s

201

7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

No que concerne agraves poliacuteticas linguiacutesticas diante do glotociacutedio que tem se

instaurado no Brasil desde a chegada dos portugueses dado o estado em que se

encontram as liacutenguas indiacutegenas brasileiras eacute de grande valia qualquer estudo

que vise agrave contribuiccedilatildeo e que favoreccedila natildeo soacute a proteccedilatildeo como o conhecimento

cientiacutefico dessas liacutenguas

O Latundecirc como jaacute mencionamos eacute uma dessas liacutenguas minoritaacuterias Ela se

encontra em extinccedilatildeo uma vez que hoje dispotildee de menos de 20 falantes com

autonomia poliacutetica Devido agrave populaccedilatildeo restrita e agraves relaccedilotildees tradicionais de

parentesco os jovens Latundecirc natildeo podem coabitar entre si de forma que a

interaccedilatildeo com o mundo externo eacute a via de perpetuaccedilatildeo social e ao mesmo

tempo de crescente e natildeo planejado contato linguiacutestico Tais circunstacircncias

implicam a urgecircncia de mais estudos sobre a realidade desse povo

Entedemos que estudar as liacutenguas menos conhecidas eacute de grande valia para o

incremento da ciecircncia linguiacutestica A investigaccedilatildeo de cada nova liacutengua eacute uma

maneira de conceber a linguagem humana e de contribuir dessa forma com os

universais linguiacutesticos e com o entendimento da faculdade humana da linguagem

(CAcircMARA-JR 1977 p6)

Seja entre si ou em contato com outras estas liacutenguas natildeo estatildeo (ou natildeo

estiveram) suficientemente isoladas para evitar algum tipo de proximidade

Thurston (1987 p 165) propaga que toda liacutengua deve ter sofrido alguma

202

influecircncia de seus vizinhos em um determinado ponto e tempo Todos os idiomas

satildeo portanto liacutenguas mistas na medida em que todos copiaram formas lexicais e

outros recursos linguiacutesticos de liacutenguas vizinhas

Thomason (2001 p 17) afirma que o contato linguiacutestico estaacute em toda a parte

muitos paiacuteses tecircm mais do que uma liacutengua oficial e muito provavelmente a maior

parte da populaccedilatildeo mundial fala duas ou mais liacutenguas

Contudo mesmo em grande quantidade os estudos que se encarregam da

observaccedilatildeo do contato linguiacutestico se debruccedilam ainda timidamente nos aspectos

foneacuteticos Com base nesta assertiva este trabalho se propocircs a observar como se

daacute o comportamento entre o Portuguecircs e o Latundecirc a partir da verificaccedilatildeo dos

padrotildees mais e menos marcados nos processos foneacuteticos de acomodaccedilatildeo Eacute um

estudo descritivo em que o Portuguecircs eacute a segunda liacutengua mesmo em face de seu

caraacuteter nacional Essa pluralidade linguiacutestica ainda existente no paiacutes demanda a

concretizaccedilatildeo das poliacuteticas a favor da salvaguarda da diversidade no planeta

Posto que toda liacutengua sofra influecircncia das forccedilas internas e externas que agem

sobre ela partimos do pressuposto de que em qualquer pesquisa linguiacutestica natildeo

encontraremos nada de extraordinaacuterio nada que exceda a experiecircncia do

humano Dessa sorte vamos encontrar () uma estrutura linguiacutestica como

qualquer outra e em muita coisa ateacute possivelmente semelhante agrave nossa

(MATTOSO CAcircMARA-JR 1977 p7)

E quando sistemas entram em contado fenocircmenos emergentes podem ajudar a

esclarecer os princiacutepios e as restriccedilotildees que regem as liacutenguas particulares Com

base na complexidade e na riqueza que advecircm do contato linguiacutestico analisamos

203

estas forccedilas conflitantes com base nos princiacutepios de hierarquizaccedilatildeo e

regularidade que satildeo forccedilas motrizes da marcaccedilatildeo nos processos foneacuteticos Aleacutem

do fator tempo outros aspectos podem estar diretamente ligados agraves

transformaccedilotildees pelas quais uma liacutengua passa como relaccedilotildees de poder

influecircncias de outras liacutenguas subjetividade de seus falantes etc

A marcaccedilatildeo estaacute diretamente ligada agrave simetria frequecircncia e naturalidade

Entretanto Rice (2007) apresenta as caracteriacutesticas da marcaccedilatildeo agrupando-as

em dois conjuntos O primeiro envolve os termos relativos a uma marcaccedilatildeo

considerada natural ou pautada na frequecircncia e diz respeito em larga medida a

ldquophonetic basis of an oppositionrdquo Nele se encontram oposiccedilatildeo como ldquomais ou

menos naturalrdquo ldquomais ou menos complexordquo ldquomais ou menos estaacutevelrdquo ldquosujeito agrave

aquisiccedilatildeo mais ou menos tardiardquo etc (Rice 2007 p 81) O segundo grupo eacute

relativo a comportamentos de sistemas fonoloacutegicos como ser ldquosujeito ou

resultado de neutralizaccedilatildeordquo ldquoser gatilho ou alvo de assimilaccedilatildeordquo Esse grupo

portanto diz respeito agrave marcaccedilatildeo fonoloacutegica ou estrutural

No que diz respeito agrave anaacutelise dos dados quanto aos processos foneacuteticos

percebemos em nosso estudo que

Ainda que com algumas restriccedilotildees a tendecircncia agrave monotongaccedilatildeo eacute

transferida para o Portuguecircs falado por Latundecirc [satildersquogɾaɾi] ldquosangraramrdquo

[kaze] ldquocausardquo

Mesmo em variaccedilatildeo a reduccedilatildeo do onset complexo eacute transferida para o

Portuguecircs seguindo a tendecircncia que o Latundecirc tem de evitar esse tipo de

sequecircncia [bĩ katildenƱ] ldquobrincandordquo [kɛbaɾƱ] ldquoquebraramrdquo

204

O preenchimento da coda eacute evitado pelo Latundecirc processo esse que

tambeacutem eacute atestado no Portuguecircs falado por Latundecirc [pi gũta] ldquoperguntardquo

[gorsquotozƱ] ldquogostosordquo

As consoantes ɲ e ʎ mais marcadas interlinguisticamente tambeacutem o

satildeo no Latundecirc que natildeo os tecircm no seu inventaacuterio fonoloacutegico Como

resultado esses segmentos natildeo satildeo produzidos no Portuguecircs falado pelos

Latundecirc Alternativamente ocorre a substituiccedilatildeo desses fonemas por

segmentos articulatoriamente mais proacuteximos ou o seu apagamento [vimej]

ldquovermelhordquo [fila] ldquofilhardquo [farsquokĩ] ldquofaquinhardquo

A reduccedilatildeo silaacutebica eacute atuante tambeacutem atraveacutes da afeacuterese Como natildeo consta

no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc a presenccedila da fricativa alveolar surda

em posiccedilatildeo de coda essa restriccedilatildeo eacute transferida para o portuguecircs dos

Latundecirc que tambeacutem evita vocaacutebulos com mais de trecircs siacutelabas [kutatildeni]

ldquoescutandordquo [bɾa sadƱ] ldquoabraccediladordquo [fiɾ tɪ] ldquodiferenterdquo

O Latundecirc evita o onset em final de palavra adicionando uma vogal para

reorganizar o padratildeo silaacutebico A vogal mais frequente seraacute a alta anterior

[i] [harsquopazɪ] ldquorapazrdquo [dorsquosejzɪ] ldquode vocecircsrdquo

Os sons [ʃ] [ʒ] [tʃ] e [dʒ] satildeo evitados por natildeo fazerem parte do inventaacuterio

fonoloacutegico do Latundecirc de forma que a sua realizaccedilatildeo eacute mais marcada na

liacutengua O comportamento desses segmentos eacute muito variaacutevel Nos mais

jovens satildeo realizados com mais frequecircncia e nos mais velhos satildeo

reinterpretados envolvendo processos diversos [sersquogamƱ] ldquochegamosrdquo

205

[dersquosaɾƱ] ldquodeixaramrdquo [lizeɾƱ] ldquoligeirordquo [azersquota] ldquoajeitarrdquo [ʃũrsquomiɾƱ] ldquosumiramrdquo

[bursquoʒoɾƱ] ldquobesourordquo [tʃĩrsquodʒeɾƱ] ldquocinzeirordquo

A ausecircncia do contraste surdo-sonoro nas consoantes oclusivas t e k do

Latundecirc promove sua neutralizaccedilatildeo na realizaccedilatildeo das consoantes no

portuguecircs dos indiacutegenas [lsquobɾika] ~ [lsquobriga] ldquobrigardquo [s rsquotatu] ~ [se rsquotado]

ldquosentadordquo

No que tange ao comportamento das vogais meacutedias postocircnicas os

vocaacutebulos terminados em [Ʊ] tendem a ser produzidos com [ɪ] e os

terminados por [a] tendem a ser realizados com [Ʊ] que satildeo vogais menos

marcadas [kazɪ] ldquocausardquo [ lĩpɪ] ldquolimpordquo [ka besƱ] ldquocabeccedilardquo [bas tatildetƱ]

ldquobastanterdquo

A partir dos fenocircmenos observados buscamos responder agraves perguntas

norteadoras da nossa pesquisa abaixo retomadas

Fatores internos (linguiacutesticos) e externos (estruturais) interagem com os

princiacutepios da marcaccedilatildeo

Resposta Quanto aos fatores externos no que diz respeito agrave faixa etaacuteria

os mais jovens tendem a natildeo transferir os padrotildees mais marcados da sua

liacutengua para a liacutengua adquirida Em contrapartida os mais velhos

reproduzem com menor frequecircncia os padrotildees mais marcados do

Portuguecircs (liacutengua dominante)

Qual o papel da marcaccedilatildeo no contato linguiacutestico

206

Resposta A marcaccedilatildeo considerada natural responde pela escolha de

padrotildees mais ou menos marcados interlinguisticamente Por essa razatildeo

prevalece a tendecircncia agrave siacutelaba CV do que decorre o apagamento da coda e

a simplificaccedilatildeo de onset complexo De outro lado haacute o natildeo repasse da

laringalizaccedilatildeo vocaacutelica que mesmo fonoloacutegica no Latunecirc eacute menos natural

e mais marcada nas liacutenguas do mundo A marcaccedilatildeo fonoloacutegica eacute

observada na neutralizaccedilatildeo de oposiccedilotildees vaacutelidas no portuguecircs poreacutem

inexitentes na liacutengua indiacutegena como o contraste quanto agrave sonoridade nas

oclusivas e agrave escolha da vogal em posiccedilatildeo final de nomes

Efetivamente um aspecto da marcaccedilatildeo natural pode responder pelo

comportamento da marcaccedilatildeo fonoloacutegica de maneira que natildeo satildeo

caracteriacutesticas de marcaccedilatildeo oponentes entre si No caso em estudo as

duas marcaccedilotildees operam mas natildeo respondem por todos os fenocircmenos

observados Aleacutem disso o caraacuteter altamente variaacutevel das realizaccedilotildees e as

condicionantes sociais dos falantes datildeo chance para a emergecircncia de

processos mais decorrentes da falha na percepccedilatildeo do sinal sem que se

estabeleccedila a regularidade na sua produccedilatildeo

Os traccedilos mais marcados da liacutengua dominada passam para a dominante

Resposta Em alguns caso sim como a africativizaccedilatildeo do s Em outros

natildeo como o natildeo repasse da larinzalizaccedilatildeo vocaacutelica e a oposinccedilatildeo entre

vogais orais e nasais

Ademais em face dos fenocircmenos observados podemos pontuar algums

aspectos relevantes os processos que envolvem perda e permuta de segmentos

satildeo mais frequentes dos que os que envolvem ganho de segmento os segmentos

207

natildeo presentes no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc (liacutengua originaacuteria) tendem a

ser apagados ou reinterpretados pelo segmento mais proacuteximo do portuguecircs

sendo este uacuteltimo o mais frequente os traccedilos mais marcados do Latundecirc estatildeo

mais evidentes nas falas da geraccedilatildeo preacute-contato e a marcaccedilatildeo natildeo estaacute

condicionada apenas aos universais linguiacutesticos mas agraves especificidades das

liacutenguas

Por fim salientamos que o nosso propoacutesito neste estudo foi o de contribuir para a

descriccedilatildeo de liacutenguas incluindo as indiacutegenas e de abrir caminhos para o estudo

do contato linguiacutestico especialmente em niacutevel da foneacutetica e da fonologia

Ressaltamos que este trabalho natildeo encerra o estudo sobre o contato entre as

duas liacutenguas Reconhecemos que os nossos resultados representam um ponto de

partida para investigaccedilotildees posteriores as quais poderatildeo expandir o tema e

avanccedilar no campo da inter-relaccedilatildeo entre contato linguiacutestico e a marcaccedilatildeo

208

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ANEXOS

(Dados Transcritos)

parsquoguo Apagou marsquoma Mamar pegũrsquotatildenu Perguntando barsquoʃo Vassoura rsquokɔsa Coccedilar

marsquoduu Mais duro

rsquokati Quati

arsquoh ti A gente rsquootu Outro irsquoarsquov j E jaacute vem v rsquone ni Veneno pɛgũrsquoto Perguntou rsquofoʃ Foi pɾatildersquoto Plantou rsquosuzu Sujo karsquobeli Cabelo gursquoduɾu Gordura rsquootildemi Homem rsquogodu Gordo rsquopega Pegar dersquotadu Deitado

marsquotau Mataram

korsquokin Coquinho guɾirsquozĩ Gurizinho rsquotakorsquosotildenu Taacute com sono (manutenccedilatildeo) mũdi Mundo ʃursquov ni Chovendo pigũrsquota ni Perguntando sursquov ni Chovendo rsquopɔtʃa Porta kursquomigi Comigo kũversquosatildeni Conversando larsquovatildeni Lavando morsquoh di Morrendo ikursquotatildenu Escutando mursquohidu Morrido marsquohadu Amarrado irsquokutu Escuto

persquohu torsquose Pergunto a vocecirc

rsquoseja Cheia rsquoozi Hoje

rsquoʃuʊ Sujo

222

ursquozotursquopatildejrsquoagʊa Os outros apanham aacutegua

rsquotʃua Suja

bu rsquonitu Bonito

rsquokɛla Aquela

rsquomu tu Muito

vehrsquomejo Vermelho rsquomasu Manso marsquosatildedu Amansando arsquoɾisi Arisco hursquoo Avoou rsquoaga Aacutegua

rsquode tu Dentro

rsquomu tu Muito

rsquotud Tudo irsquopia Espirra isrsquopritu Espiacuterito

rsquofɔti Forte

timirsquotɛi Cemiteacuterio

tɛrsquoha Enterrar

ɔʊrsquoa Jogar (o bicho fora)

tersquoou Enterrou rsquoela Ela matildersquodatilden Mandando batorsquose Bater em vocecirc rsquotokursquotatildenu Tocirc escutando rsquobatildej Banho bɾab Brabo

rsquosɛtu Certo

Kabirsquosela Cabeceira (do rio)

karsquosi bu Cachimbo

tʃursquoveɾu Chuveiro (pau de) rsquoleti Leite rsquofutu Fruto karsquoɾoʃi Caroccedilo kaharsquopitʃu Carrapicho rsquokɾu Crua rsquomasu Massa

pe rsquoʃa Pensar

ojrsquoatildedu Olhando (idem)

pe rsquoʃatilden

Pensando

i te rsquode nu Entendendo

223

irsquokuta Escuta

kwatildedu ew piki nĩnĩ Quando eu era pequenininha

ew bĩrsquokava rorsquodeɾa cũ a lɔrsquoɾĩne

Eu brincava de roda com a Lorine

katildendu pi ĩ

Quando piin

ew tatildebȇĩ cũ a lorsquoɾine

Eu tambeacutem com a Lorine

i lsquoluɾi ku a marsquoɾi

E Lurdes com a Mariacute

mĩa matildey natildew deʃa bɾĩrsquoka

Minha matildee natildeo deixava brincar

eli bɾika corsquomigu

Ela brigava comigo

e koʃta brinrsquoka ni lsquoKotildepu E gostava de brincar no campo

mĩa matildej natildew deʃa bɾĩka Minha matildee natildeo deixava brincar

ersquoli tatildebe j diskuti Ela tambeacutem discutia

tatildebej kɾiatildesa natildew paɾa lsquonɛ Tambeacutem crianccedila natildeo para neacute

fika bahaka bɾĩkatildeni lsquonɛ Fica na barraca brincando neacute

fika gɾitatildeni Fica gritando

a mĩa matilde matildedava bɾĩka lotildeʒi A minha matildee mandava brincar longe

natildew kɛ ve baɾuj na bahaka natildew Natildeo quer ver barulho na barraca natildeo

ki falatildenu O que eu tocirc falando

ki lsquota bɾĩganu nu katildepu Que eu tava brincando no campo

a fruta kirsquoli cotildepi nɛ

A fruta que ele come neacute

kinotildemi di fɾuta Que nome de fruta

akeli iogrii nɛ

Aquele neacute

nɔy sursquopaha lsquo deli Noacutes chupava dele

so eli komenu fɾuta Soacute ali comendo fruta

noj fike mu arsquotɛ ʃersquoga meatilde note

sersquoga

Noacutes ficamos ateacute a meia noite chegar

mĩa matildej bɾiga kumigu Minha matildee brigava comigo

224

tava se ew levatildeta sedu se ew levatildeta sedu

Estava ʔ

va la nu katildepu bɾĩrsquoka Vaacute laacute no campo brincar

u katildepu lsquota satildematildedu orsquosejs O campo taacute chamando vocecircs

noj levatildersquota pɾa bɾĩrsquoka nu kotildepu Noacutes levantaacutevamos para brincar no campo

o katildepu ɛ u maj limpi O campo eacute o mais limpo

eli bɾĩkaru eli istubidu Eles brincaram eles subiram

ɛ ke katildepu num ɛ awto katildepu mũto

baso

Eacute que o campo natildeo eacute alto O campo eacute muito baixo

nɔj sersquogamu bersquobe nu i corsquome nu Noacutes chegamos bebendo e comendo

miu asadu batata e bebe nu

Milho assado batata e bebendo

ew nũm fikej ew bɾĩkava dinoti Eu natildeo fiquei eu brincava de noite

mĩa matildej natildew desa duhmi mĩa matildej bɾiga kumigo

Minha matildee natildeo deixa dormir minha matildee briga comigo

mĩa paj farsquolo sej dumi sedu se pikaɾu cobɾa Kotildemu ki darsquoi

Meu pai falou vocecircs durmam cedo se cobra picar e daiacute

vai sarsquoɾa ou vai a mɔhe Vai sarar ou vai morrer

mĩa paj bɾĩkow diskuti dele natildew Meu pai brigou porque eu natildeo escutava ele natildeo

dohmi amatildersquoɳatilde sedu vorsquose bɾĩrsquoka corsquome mũĩtu fɾuta

Dorme amanhatilde cedo vocecirc vai brincar comer muito fruto

mĩa paj natildew desa ew bɾĩka natildew Meu pai natildeo deixava eu brincar natildeo

natildew icuti dele natildew Natildeo escutei ele natildeo

cɾiatildesa icursquoto crianccedila escutou

iheni fala icursquoto ɛ A gente fala escutou eacute (a gente fala e ela ndash a crianccedila ndash escutou eacute

ni batia natilde mi batia na Natildeo batia natildeo me batia maj eli nũ sabe barsquotih Mas ele natildeo sabia bater

225

falava di bɾabu mihmu Falava bravo mesmo

matildeda agwa matildedƷɔga Mandava buscar aacutegua buscar mandioca

asa biƷu kome Assar beiju comer

nĩ tĩ aacutegua pɾa eli natildew Natildeo tinha aacutegua pra ele natildeo

mĩa matildej natildeo desa ew vĩrsquoga Minha matildee natildeo deixava eu brincar

mĩa povu

Meu povo

bĩ botilde natildew Bem bom natildeo

esi aki bisu bɾabu Esse aqui bicho brabo

mĩa povu matatildedu nosu tudo Meu povo matando o nosso tudo

e ki nomi dee ɛ E que o nome dele eacute

nũ pe rsquosa nisu aki la Natildeo pensar nisso aqui laacute

mĩa matildee falo natildew podi bɾĩka de tu

dagwa notilde

Minha matildee falou natildeo pode brincar dentro drsquoaacutegua natildeo

agwa e mũitu peɾigoso A aacutegua eacute muito perigoso

ĩdƷu vĩ i mata tudĩ nũ iscapa ũ notilde Iacutendio veio e matar tudinho natildeo escapa um natildeo

distotildena kohpu sɔ leva sɔ cabesu Destrona corpo soacute leva soacute a cabeccedila

isu aki nũ ɛ mĩa pare ti notilde Isso aqui natildeo eacute meu parente natildeo

io mimu Eu mesma

nĩge j notilde sabi Ningueacutem natildeo sabe

esi ki ĩdiu moɾava ki i uvi Esse aqui iacutendio morava aqui e ouvi

kɛbaɾu asĩ levo di Quebraram assim levou de Alternacircncia de coacutedigo

demorsquoɾo i ew sersquoge tame j Demorou e eu cheguei tambeacutem

Komi ki rapaɾi kebɾo

Como eacute que o rapaz morreu

226

ai fala pɾa eli nɛ isu ku hapazu Aiacute falou pra ele neacute Isso com o rapaz

eli moɾa debasu di paw nɛ Ele morava debaixo de pau neacute

ve tu dehubo caiw cima deli na

hedu

Vento derrubou caiu em cima dele na rede

sɔ o paj deli capow Soacute o pai dele escapou

vose da mujɛ notilde Vocecirc da mulher natildeo

akeli povu deli mĩ mata todo mĩa povu

Aquele povo dele mata todo meu povo

ĩ via pɾetu Em Veado Preto

paɾEsi kũ ƷEƷĩ Parece com Zezinho

ew moɾa hũtu aki Eu moro junto daqui

keli otɾu Aquele outro

patɾaj iɾe boɾa Para traz ir embora

ai dimorsquoɾo Aiacute demorou

sersquogo Chegou

keli cahĩ sersquogo Aquele Carlinhos chegou

sarsquoi hora orsquoʎa Saiacute fora pra olhar

arsquoi farsquolo dersquosaɾu Aiacute falou deixaram

ota lĩgwa difire ti Outra liacutengua diferente

ta sorsquoɾanu Taacute chorando

ta bĩbotilde natildew Taacute bem bom natildeo

fika tʃorsquoɾatildenu Fica chorando

mĩa pare ti desaɾu mĩa mursquoje Meus parentes deixaram minha mulher

te j bastatildeti Tem bastante

pigũta pa eli Pergunta pra ele

227

maselu kwidava Marcelo cuidava

oti tipu Outro tipo

kotildevɛsa deli nũte di notilde A conversa dele natildeo entendo natildeo

komu ki fala fire ti Como eacute que fala diferente (afeacuterese)

na kohpu uƷa No corpo usa

lizeɾu Ligeiro

tʃarsquoma eli Chamar ele

matildersquodo sabotilde pa eli Mandou sabatildeo pra ele

abɾiw pota Abriu a porta

lava motilde lava pɛ lava bɾasu Lavei a matildeo lavei o peacute lavei o braccedilo

ai ew fikej oiatildenu ai Aiacute eu fiquei olhando aiacute

fikej na pota oiatildenu cutatildeni Eu fiquei na porta olhando

nũ capa niũ Natildeo escapa nenhum

marsquoto cota piskosu Matou e cortou o pescoccedilo

kabesĩn Cabecinha

cusivi kimigu Inclusive comigo

batildeku busa sĩ Branco blusa assim

kursquomiɾu a karsquobesa da lsquoge ti Comeram a cabeccedila da gente

ũ nũ firsquokaɾi Um natildeo ficou

otirsquoĩdʒu Outro iacutendio

ʒũrsquotaɾu Juntaram

bɾirsquogamu pɾa eli Explicamos pra ele

ɔto dii ele vorsquoto dinovu Outro dia ele voltou de novo

ew sarsquoi hora Eu saiacute fora

otoɾapaj cursquoto Outro rapaz escutou

228

oʎa lotildezi Olhou longe

ew lsquoho

Eu vou

desa notilde Deixava natildeo

kuta baɾuj Escuta barulho

marsquoto tudi noɔɾa Matou tudo na hora

sɔ cabesu levo kumew Soacute a cabeccedila levou e comeu

mi a matildej cu tava Minha matildee contava

agwa tupiw tudo A aacutegua entupiu

agwa be j pɾeti mehmu Aacutegua bem preta mesmo

agwa suzi Aacutegua suja

pɾimiɾu kanɛlu Primeiro canela

i totilde paɾi Entatildeo eu parei

nu sarsquobi Natildeo sabia

pɾimeɾu u tigu Primeiro antigo

bastatildetu

Bastante

bastatildetu Bastante

todu tiɾatildenu levatildenu Tudo tirando levando

rsquokaze disu ficaɾu Por causa disso ficaram

tu kɾiatildesa Tudo crianccedila

lersquova todu mini nadu Levar toda meninada

eli mi tinu Ele mentindo

kotildemu orsquose pɾatildeta mu ito Como vocecirc planta muito (rotacismo)

nɔj kume nu aki Noacutes comendo aqui

nɔj seskɛse nu fukamu Noacutes nos esquecemos e ficamos

a noti marsquotaɾu tudu Agrave noite mataram tudo

229

eli sego gatildersquono Ele chegou enganou

kotildemiɾu Comeram

eli kotildersquoto soɾatildeni Ele contou chorando

ke j kwi kiɾo Quem que tirou

mi da mi a filu Me daacute meu filho

sɔ u ki karsquopo Soacute um que escapou

kɾirsquoa na kolu Criar no colo

vi de la u motildeti di he ti Veio de laacute um monte de gente

ew tatildebe j gotava

Eu tambeacutem gostava

na kɔba no basu

Na cobra no braccedilo

bisi u Bichinho

kabeseɾa pɛtu Cabeceira perto

mɔɾa pa basu Mora pra baixo

dirsquofisu marsquota Difiacutecil matar

sɔ bisotilde Soacute bichatildeo

ɛ h~undo Eacute fundo

pohku Porco

fɾɛsa Flecha

mi a matildej falaɾu Minha matildee falou

mi a matildej fikaɾu Minha matildee ficaram (ficou)

pɾimi mehmi Primo mesmo

tatɾa paj tambe j Trata pai tambeacutem

mi atilde ihmatilde maj vɛj Minha irmatilde mais velha

tu tia vɛj ta i Tua tia velha ta aiacute

tɾata gwau gwau ahe ti Trata igual igual a gente

230

halu hɛlarsquodo Ralo ralador

basoɾa ipi Vassoura espinho

fakotilde kotaɾu Facatildeo cortaram

hɛla matildersquodʒɔka Rala mandioca

ai dipoj Aiacute depois

ku faki pike nu Com faquinha pequena

hɛla tatildeme j Rela tambeacutem

mi a paj asirsquona Meu pai ensinar

kɔtaɾu kotilde a taba Cortaram com a taacutebua

disaɾu Deixaram

nu kotildepu No campo

la i basu Laacute embaixo

mi a paj nu hipotildedew natildew Meu pai natildeo respondeu natildeo

pesu Peixe

a notu toda A noite toda

baztatildeti poɹku la Bastante porco laacute

u digu vi Um dia que vim

mi atilde matildej kotildekorsquodo Minha matildee quando acordou

mi atilde matildej forsquola Minha matildee foi laacute

kazi gɾatildedi Quase grande

nɔj te j medu dosejzi Noacutes temos medo de vocecircs

bersquozu kumiw Beiju comeu

mohew saɾatildepi Morreu de sarampo

pigu tatildeni Perguntando

na katildepa No campo kahni asadu Carne assada

231

morsquohe tudi a Morrer tudinho

depoj ʃu miɾu Depois sumiram

dimorsquoɾo mujtu Demorou muito

mɔdi tehu Por causa da terra

ja vaj tʃarsquoi Jaacute vai sair

batildedorsquono Abandonou

fike mu arsquoi Ficamos aiacute

aʒe ti ojrsquoo A gente olhou

hatildeka karsquoɾa Arranca caraacute

tʃiɾi ga basi na Seringa para vacina

barsquotʃotilde Batom

nɔj peɾatildenu Noacutes esperando

mi asu rsquoto Me assustou

i odʒi E hoje

be j vimej Bem vermelho

otu di ʃi ma Outro de cima

sersquogo corsquohe Chegou correr

i te di be j Entende bem

mi asursquoto Me assustou

matatildenu nɔjzi Matando noacutes

mi a fila Minha filha

kumiɾu Comeram

azersquota korsquola pɾa eli Ajeitar colar pra ele

sarsquoma eli

Chamar ele

tʃega logu Chega logo

ʃiguɾow di novʊ Segurou de novo

232

dirsquoso firsquoko Deixou ficou

arsquotɛ dɛrsquozoɾa Ateacute dez horas

tʃɔ ɔjrsquoa Soacute olhar

pi gada Espingarda

pɛhtu casueɾu Perto da cachoeira

maj pɛtu Mais perto

ote la Outra laacute

pɛga pesi Pega peixe

oti kazi Outra casa

pɛga milu Pegar milho

depoj tʃumiɾu bɾatildeku Depois sumiu o branco

mi rsquode ɾu Me deram

satildegɾaɾi asi Sangraram assim

bastatildetu Bastante

atildersquoda karsquosatildedu

Andar caccedilando

mi atilde filu Meu filho

nɔj fikatildeni Noacutes ficamos

ki kursquoto Que escutou

sɔ sorsquoɾatildenu Soacute chorando

depoj deli mohidu Depois dele morrer

nu ta vɛj Natildeo taacute velho

ta noj i da Taacute novo ainda

mi atilde matildej ta bii noj i da Minha matildee ta bem nova ainda

pɛrsquoga baʒtatildetu Pegar bastante

ew persquoge Eu peguei

233

mi atilde lsquoho farsquolo Meu avocirc falou

dimuɾatildeni Demorando

tehaɾu la mehmu Enterraram laacute mesmo

mi atilde matildej soɾatildenu Minha matildee chorando

mi atilde imatilde Minha irmatilde

E cursquoɳadi deli Eacute cunhado dele

E fii deli Eacute filho dele

kursquoɳadi deli Cunhado dele

hɔba demaj Rouba demais

ta difisi Ta difiacutecil

eli tʃobɾo Ele sobrou

saɾatildepi persquogo Sarampo pegou

pɾimeɾi morsquohe Primeiro morreu

ew kutej Eu escutei

sarsquoma matildej Chamar matildee

ta dirsquovisi Taacute difiacutecil

mohew ve me nadu Morreu envenenado

ki kɾirsquoari Que criaram

mi atorsquomaɾu Me tomaram

i ew torsquoteɾu E eu solteiro

kazadu kotildersquose Casado com vocecirc

natildew firsquoka diɾetu Natildeo ficar direito

firsquoka kweli Ficar com ele

mersquosenu Mexendo

ta setu Ta certo

234

bɾabu persquoeli Bravo por ele

tasirsquooma komigu Tem ciuacutemes de mim

E gotozu Eacute gostoso

tipu bursquoʒohu Tipo besouro

tʃi rsquodʒeɾu Cinzeiro

na li gi Na liacutengua

bɾatildeku batirsquotaɾu Brancos batizaram

katildedu eɾa novi Quando era novinho

arsquoi tipoj Aiacute depois

karsquoboɾe Acabou-se

tiguɾa na matildew Segura na matildeo

rsquoɛ lsquopɾimɛ lsquodeli Eacute primo dele

asinatildeni Ensinando

ew kersquome Eu queimei

pɾatildersquota maj Plantar mais

ew vo lsquopɾatildeta Eu vou plantar

karsquokwɛ Qualquer

tabaɾava Trabalhava

tubaɾotildeni Tubaratildeo

poɾi pɛɾa Pode esperar

mi ti nu Mentindo

eli sersquogo Ele chegou

atildersquototilde Entatildeo

ta lsquosetu natildew Ta certo natildeo

mesew kotildersquomigu Mexeu comigo

235

ʃersquoga dinote Chegar de noite

lersquova pirsquotaw Levar pro hospital

ta suzu Ta sujo

rsquobahio Bairro

atildebɾarsquosada Abraccedilada

masɛlu babudo Marcelo barbudo

pɾatildeta milu Planta milho

na gɾɛba Na gleba

bɾasadu Abraccedilado

komi he tʃi Comi gente

kɛ azursquoda Quer ajudar

sotildebɾasotilde Assombraccedilatildeo

nu podi atildersquoda Natildeo pode andar

pɛga na tiheɾu Pega no terreiro

kɔviotilde Gaviatildeo

sɔ eli karsquopo Soacute ele escapou

me rsquoto Aumentou

levava uz vɛio Levava os velhos

matildenɛ desaɾu Maneacute deixaram

pusa no kabelu Puxa no cabelo

kabelu ge ti hatildega Cabelo de gente arranca

iɔga ge ti pɾa la Joga gente pra laacute

hu tu Junto

kɛma he ti queima a gente

ki sɔ a oti Que soacute haacute outro

bagas~i Bagacinho

236

tiɾatildeni katildetatildeni Tirando cantando

kɾese ni Crescendo

dirsquoɾetu Direito

febɾu marsquolaɾu Febre malaacuteria

maj sarsquobiw Mais sabia

tiɾaɾu Tiraram

batildei Banho

ipia deli Espirro dele

Korsquodadu mehmo Acordado mesmo di notu De noite

kasu Caccedila

baɾizadu otu Batizado outro

atʃi mi a ihmatilde fala Assim minha irmatilde fala

kotadu Encostado

nu zudia deli natildew Natildeo judia dele natildeo

gɔta maj deli Gosta mais dele

samatildedu otu Chamando outro

mi atilde subɾi Meu sobrinho

mi atilde pohu Meu povo

mi atilde matilde Minha irmatilde

mi atilde muʒka Minha muacutesica

sɔ bɾi ga Soacute brinca

tʃubi nu Subindo

kahega na koʃta Carrega nas costas dese Desse aiacute istu Isto katildersquoba Gambaacute

237

kursquotia Cutia kursquotʃia Cutia

marsquoɾɛlu Amarelo

versquomela versquomelo Vermelha vermelho rsquose Esse

te natildeʊ te natilde Tem natildeo

esersquoki Esse aqui

rsquoɛmarsquokakupɾersquogisi Eacute macaco preguiccedila

morsquosegi Morcego

defersquore ti Diferente

rsquopodƷi Pode

rsquosersquonatilde Sei natildeo

rsquosersquoviw Vocecirc viu

arsquoinrsquoɛgarsquoviatildew Aiacute eacute gaviatildeo

jabutʃi Jabuti

parsquoɾɛsirsquokele Parece aquele

ɛrsquokele Eacute aquele

rsquoessersquote Esse tem

be i natildeu Tambeacutem natildeo

kursquoruja Coruja

pike nu Pequeno

defersquore ti Diferente

rsquokelersquoɛrsquootro Aquele eacute outro

rsquoejarsquobutʃi E jabuti gɾatildersquodatilde grandatildeo rsquomesmu mesmo

rsquomemu Mesmo

ɔrsquoɾɔpa Europa

arsquobeja Abelha

iscɔhpiatildew escorpiatildeo

ewmɔrsquoʎa Eu molhar ~ Eu molho

pirsquodi pedir tasrsquocɾitu Ta escrito

pɛdƷi Pedi (a gente )

Kersquoma queimar

mode nu Mordendo

morsquodemas Mordeu mais rsquonoj rsquodoj Noacutes dois

aʃe ti A gente (noacutes)

rsquopadirsquoze Pra dizer

238

rsquokɔta Corta

ahatildejrsquoo Arranhou

mujrsquoɛ Mulher

ahajrsquoaelig Arranhou orsquosersquomehm Vocecirc mesmo

isrsquopi Espinho

sorsquome Somente

rsquokalo ~karsquolo Calor doi Dois

tatildebe Tambeacutem

ispi rsquogada Espingarda

persquode Perdeu

se rsquotatu Sentado

rsquohe ti Gente

arsquodidu Ardido rsquokoda Corda mərsquota Matar marsquotani matando

rsquoʃɔmarsquota Soacute matar

rsquobisu Bicho rsquoota Outra

patildersquota ~rsquopɾatildeta Plantar

atildersquodatildeni Andando

ve tatildeni Ventando

defersquore ti Diferente

hursquoatildenu Voando vorsquoto Voltou rsquopodirsquoze Pode dizer marsquotaforsquogatilden Matar afogando rsquodaga Da aacutegua (drsquoaacutegua) arsquoɾea Areia

rsquofu da Afunda

rsquokɛlaforsquogo Que ela afogou

mɛgursquola Mergulhar

eʃpɾersquome Espremer

hɛlatilden Ralando (verbo ralar)

mɔrsquolada Amolada

kwatildeni Quando arsquotia Ateia (verbo atear)

239

i pursquoha Empurrar

epursquohej Eu empurrei

pursquoha Empurrar rsquofoti Forte

rsquofosa Forccedila

rsquohapu Raacutepido

ku rsquopɛ Com o peacute

eki pursquohe Eu que empurrei

sirsquonɛlu Chinelo

i pursquohan Empurrando

sɔrsquose Soacute vocecirc

rsquotapursquohanu Taacute empurrando

sɔrsquozi Sozinho

rsquohatildeka Arrancar

rsquosɔhatildersquoka Soacute arrancar

jrsquoahatildersquoke Jaacute arranquei

arsquohatildekui rsquoʃada Arranco com a enxada

rsquopuʃa Puxar cabelo pursquoʃo Puxou pursquoʃe Puxei haʃrsquoto Arrastou haʃrsquote Arrastei

tʃirsquoa Tirar

buʃrsquoca Buscar buʃrsquoke Busquei (eu passado) rsquooto Outra rsquohopa Roupa rsquomemo Mesmo rsquodeʃa Deixa

tirsquoe Tirei

rsquosɛtu Certo

rsquohejtu Jeito iskujrsquoe Escolher rsquotakujrsquoenu Taacute escolhendo ojrsquoan Olhando

tʃumi Sumiu

dimursquoranu Demorando kersquoma Queimar ursquozotu Os outros kersquome Queimei

rsquonɔj Noacutes

rsquopejsi Peixe

Ku rsquome Comer

240

pɾicirsquoza Precisar pɾisirsquozanu Precisando korsquoseɾa Coceira mirsquoƷatilden Mijando atildersquodatildenu Andando

barsquote nu Batendo

i rsquoʃima Encima

rsquokatildem Cama atirsquoɾo Atirou

rsquohaʃarsquole Racha lenha

vɔrsquota Voltar

tursquomatilden Tomando

varsquoɾi Varinha

gɾitrsquoatilden Gritando

fɾɛrsquoga Esfregar

mirsquodi Medir

mi rsquotinu Mentindo

rsquokɔʃka Coacutecega

barsquosi u Baixinho

pɔdirsquoze Pode dizer

pe rsquota Pentear

rsquobatildej Banho rsquomaiƷrsquotadi Mais tarde rsquofoja Folha batildenarsquodo Abanador bursquonitu Bonito

rsquosersquokirsquode Vocecirc que deu

siparsquoradu Separado rsquosatildew Chatildeo

tursquodi Tudinho

karsquoe Cair kersquobɾe Quebrei arsquohatildejorsquose Arranho vocecirc rsquomuja Molha rsquosevi Serve rsquopaj Palha pirsquodi Pedir dersquosa Deixar rsquomoj Molho fɾersquovenu Fervendo pursquolo Pulou

norsquovi Novinho

241

firsquodido Fedido mursquolada Amolada

rsquonɔʃi Nosso

patildersquoneɾu Paneiro motildersquodeli Matildeo dele dursquozotu Dos outros

rsquonɔj Noacutes

rsquopodi Podre firsquodid Fedido dersquota Deitar dersquotadu Deitado cuʃtursquoɾa Costurar

barsquote m Batendo

dersquosa Deixar

rsquofɾɛʃa ~rsquofɾEʃ Flecha

iskersquosidu Esquecido

tatildersquome j Tambeacutem

abersquoli Abelhinha

me rsquodu i Amendoim

pɔrsquodirsquoze Pode dizer

rsquoavi Aacutervore

rsquopesi Peixe

tatursquozi Tatuzinho

rsquovɛja Velha

arsquodea Aldeia

rsquode tu Dentro

rsquohe ti Gente

rsquohadu Raacutedio rsquohejtu Jeito iʃtɾarsquogadu Estragado

rsquode tirsquokaza Dentro de casa

rsquopoku Porco

pihu rsquotatildenu Perguntando

gwahrsquode Guardei firsquogeɾa Figueira

kɔrsquota Cortar

ojrsquoa Olhar

pi dursquoɾa pendurar

mitʃursquoɾa Misturar

rsquofɔtʃi Forte

242

matildersquodƷɔka Mandioca

birsquoƷu Beiju

marsquoɾɛlu Amarelo

atildersquozɔ Anzol

rsquopɛda Pedra

Page 5: MARCAÇÃO NO CONTATO LINGUÍSTICO: O português falado … · Transcrição Transcrição fonética Transcrição fonológica [ ] / / Vogais Vogal médio-baixa anterior [ɛ] Vogal

AGRADECIMENTOS

A Deus por me capacitar e me fazer sentir o teu zelo cuidado e proteccedilatildeo

constantemente

Aos meus familiares em especial a minha matildee e o meu pai pelo suporte

coragem e exemplos a mim transmitidos

A minha esposa Jane pelo carinho e compreensatildeo pelas horas que natildeo

pude estar ao seu lado dedicando-me a este trabalho

Aos meus filhos Breno e Estela meu tesouros por me fazerem acreditar

que o mundo pode ser melhor

A minha orientadora Stella Telles pelo carinho compreensatildeo

engajamento e ensino por me fazer acreditar que podemos ser altruiacutestas sem

perdermos a essecircncia da humildade Por compartilhar-me com despreendemento

os seus dados

Agraves coordenadoras do PG-Letras Evandra Gligoletto e Fabiele Stockmans

pela presteza sempre que necessaacuterio

Aos meus mestres do Doutorado pelo trabalho que foi realizado durante o

curso em especial Stella Telles Marlos Pessoa Claacuteudia Roberta Siane Goes

Benedito Bezerra Virgiacutenia Leal Alberto Poza e Nelly Carvalho

Aos professores do Programa de Poacutes-Graduaccedilatildeo em Educaccedilatildeo (UFPE)

Flaacutevio Brainer Artur Gomes Maacutercia Mendonccedila e Joatildeo Batista pela colaboraccedilatildeo

na trajetoacuteria acadecircmica

A Abuecircndia Padilha e Gilda Lins (in memoriam) pela dedicaccedilatildeo e carinho

que demonstraram durante as aulas

Aos meus colegas do Doutorado Solange Carvalho Ana Cristina Cleber

Morgana Jaciara Carolina Pires Juliane Acircngela Socircnia Ismar Rinalda Ludimila

e Clara por me ajudarem nos momentos de dificuldades e de (muitas)

necessidades

Aos colegas da GER ndash Vale do Capibaribe pela ajuda sempre que

necessaacuterio em especial Marta Morgana Edjane e Janecleide

Aos colegas e alunos do IFAL (Instituto Federal de Alagoas) pela grande

ajuda e carinho que demonstraram durante a realizaccedilatildeo deste trabalho Pela

compreensatildeo das faltas e substituiccedilotildees que de mim foram demandadas

Aos membros da banca que tatildeo gentilmente aceitaram o convite

Aos meus amigos familiares entes queridos todos que direta ou

diretamente me ajudaram nesta caminhada Nenhum trabalho eacute feito sozinho

portanto os meacuteritos tambeacutem satildeo de vocecircs

RESUMO

O presente trabalho eacute o resultado de um estudo sobre a Marcaccedilatildeo no Contato

Linguiacutestico entre o Latundecirc e o Portuguecircs Trata-se de uma investigaccedilatildeo com

base na abordagem tipoloacutegica da linguiacutestica visando agrave elucidaccedilatildeo das unidades

mais e as menos marcadas que satildeo ou natildeo transferidas no processo de

acomodaccedilatildeo dos inventaacuterios foneacuteticos de ambas as liacutenguas Utilizamos como

base os pressupostos teoacutericos defendidos por CROFT (1990) JAKOBSON

(1953) BATTISTELLA (1996) MATRAS amp ELSIK (2006) e LACY (2006) para a

descriccedilatildeo dos universais linguiacutesticos e da marcaccedilatildeo No que tange ao contato

linguiacutestico nos respaldamos nas reflexotildees de ROMAINE (2000) THOMASON

(2001) AIKHENVALD (2007) e HYMES (1971) Para descriccedilatildeo linguiacutestica e

histoacuterica dos Latundecirc nos baseamos em TELLES (2002) ANOMBY (2009) e

PRICE (1977) No que tange ao aporte foneacutetico para descriccedilatildeo do contato entre

ambas as liacutenguas nos valemos dos escritos de WEINREICH (1953) BISOL

(1996) VAN COETSEM (1988) e MATRAS (2009) Quanto agraves anaacutelises nos

fundamentamos nas observaccedilotildees de SPENCER (1996) LASS (2000) e RICE

(2007) O nosso corpus eacute formado de trinta horas de fala transcritas

foneticamente de acordo com IPA de vinte informantes da comunidade Latundecirc

Os dados fazem parte do acervo do NEI (Nuacutecleo de Estudos Indigenistas) da

UFPE A partir da nossa pesquisa chegamos agrave conclusatildeo que os mais jovens

tendem a natildeo transferir os padrotildees mais marcados da sua liacutengua para a liacutengua

adquirida enquanto os mais velhos reproduzem com menor frequecircncia os

padrotildees mais marcados do Portuguecircs alguns contextos licenciam enquanto

outros bloqueiam a marcaccedilatildeo gerando um caraacuteter variaacutevel que demonstra o quatildeo

conflitante eacute a situaccedilatildeo do contato embora natildeo haja uma padronizaccedilatildeo no que

tange agrave estrutura silaacutebica o padratildeo CV eacute o mais recorrente e menos marcado

corroborando o que apregoa os pressupostos da tipologia linguiacutestica os

processos que envolvem perda e permuta de segmentos satildeo mais numerosos e

mais marcados dos que os que envolvem ganho de segmento os fonemas natildeo

presentes no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc tendem a ser apagados ou

reinterpretados pelo segmento mais proacuteximo do Portuguecircs quanto agrave manutenccedilatildeo

ou perda o comportamento dos traccedilos mais marcados do Latundecirc depende natildeo

categoricamente da fonologia do Portuguecircs a marcaccedilatildeo natildeo estaacute condicionada

apenas aos universais linguiacutesticos mas agraves especificidades da liacutengua

PALAVRAS-CHAVE Fonologia Liacutenguas em Contato Marcaccedilatildeo e Liacutenguas

Indiacutegenas

ABSTRACT

The present work describes phenomena of phonological transference of Latundecirc

a Brazilian indigenous language in Portuguese in language contact situation The

observed phenomena were examined under the light of the assumptions of

Linguistic Marking in its typological approach As basis we used CROFT (1990)

JAKOBSON (1953) BATTISTELLA (1996) MATRAS ELSIK (2006) and LACY

(2006) studies for the description of linguistic universals and marking About

language contact we were supported by the reflections of ROMAINE (2000)

THOMASON (2001) AIKHENVALD (2007) and HYMES (1971) For the linguistic

and historical description of Latundecirc we were based on TELLES (2002)

ANOMBY (2009) and PRICE (1977) About the phonology of Portuguese we were

supported by BISOL (1996) For description of the contact between both

languages we used the writings of WEINREICH (1953) VAN COETSEM (1988)

and MATRAS (2009) The one of phonological phenomena observed was backed

in SPENCER (1996) LASS (2000) and RICE (2007) Our corpus is formed of thirty

hours of talk phonetically transcribed according to IPA In the survey we used the

speech production of 20 individuals from the Ladundecirc people among these 8

belonging to the pre-contact generation with the non- indigenous society and 12

belonging to the post-contact generation The data are part of the acquis of NEI

(Nuacutecleo de Estudos Indiacutegenas) of UFPE With our research we came to the

following results post-contact generation tends not to transfer most marked

patterns of their language to the acquired language while the native of pre-contact

generation do in a lower frequency the more marked standards of Portuguese

The processes that involve loss and exchange of segments are more numerous

than those involving segment gain The phonemes of Portuguese that do not exist

in Latundecirc tend to be erased or reinterpreted by the closest segment to

Portuguese resulting in the loss of contrast and in the emergence of the

unmarked through the phonological neutralisation There are phenomena that

show a tendency towards the universal as the deletion of the coda in favor of CV

standard syllabic and others that are arising out of restrictions of Latundecirc as the

monophthongization of nasal diphthong and the change of vowel quality in word-

final position In the set of phenomena we noticed that the interference is variable

and not always motivated by phonological or natural marking

KEYWORDS Phonology Marking Languages in contact Portuguese and

Latundecirc

RESUMEN

El presente estudio describe los fenoacutemenos de la transferencia fonoloacutegica del

Latundeacute una lengua indiacutegena Brasilera en el portugueacutes en una situacioacuten de

contacto linguumliacutestico Los fenoacutemenos observados fueron examinados a la luz de los

presupuestos de marcacioacuten linguumliacutestica en su abordaje tipoloacutegico Como modelo

de fundamentacioacuten se han utilizado los estudios de CROFT (1990) JAKOBSON

(1953) BATTISTELLA (1996) MATRAS amp ELSIK (2006) y LACY (2006) para las

descripcioacuten de los universales linguumliacutesticos y de la marcacioacuten Sobre el contacto

linguumliacutestico fueron tomados como soporte cientiacutefico las reflexiones de ROMAINE

(2000) THOMASON (2001) AIKHENVALD (2007) y HYMES (1971) Para la

descripcioacuten linguumliacutestica de los Lantundeacute esta investigacioacuten se basoacute en TELLES

(2002) ANOMBY (2009)y PRICE (1977) Sobre la fonologiacutea del portugueacutes se

tuvieron en cuenta los estudios de BISOL (1996) Para la descripcioacuten del contacto

entre ambas lenguas fueron necesarios los escritos de WEINREICH (1053) VAN

COETSEM(1988) y MATRAS (2009) Finalmente el estudio de los fenoacutemenos

fonoloacutegicos observados fueron abordados en las investigaciones de SPENCER

(1996) LASS (2000) y RICE (2007) El corpus de este trabajo acadeacutemico estaacute

compuesto por treinta horas de diaacutelogos transcritos foneacuteticamente de acuerdo con

el IPA En la investigacioacuten se ha utilizado la produccioacuten del diaacutelogo de 20

individuos del pueblo Latundeacute dentro de ellos 8 pertenecientes a la generacioacuten

del pre contacto con la sociedad no indiacutegena y 12 pertenecientes a la generacioacuten

del post contacto Los datos hacen parte del acervo del Nuacutecleo de Estudios

Indigenistas (NEI) de la UFPE Con esta investigacioacuten se ha llegado a la siguiente

conclusioacuten La generacioacuten post contacto tiende a no transferir los patrones maacutes

acentuados de su lengua hacia la lengua adquirida mientras que los indiacutegenas de

la generacioacuten del pre contacto realizan con menor frecuencia los patrones maacutes

marcados del portugueacutes Los procesos que envuelven la peacuterdida y permuta de los

segmentos son maacutes numerosos de aquellos que involucran la ganancia del

segmento Los fonemas del portugueacutes que no existen en el Latundeacute tienden a ser

borrados o reinterpretados por el segmento maacutes proacuteximo al portugueacutes resultando

en una peacuterdida de contraste y en la emergencia del no marcado a traveacutes de la

neutralizacioacuten fonoloacutegica Hay fenoacutemenos que revelan una tendencia a lo

universal como desvanecimiento de la coda en a favor de patroacuten silaacutebico CV y

otros que son consecuencia de las restricciones del Latundeacute como la

monoptongacioacuten de diptongo nasal y la mudanza de la cualidad vocaacutelica en

posicioacuten final de la palabra El en conjunto de fenoacutemenos verificamos que la

interferencia es variable y no siempre estaacute motivada por la acentuacioacuten fonoloacutegica

o natural

Palabras Clave Fonologiacutea Acentuacioacuten Lenguas en Contacto Portugueacutes y

Latundeacute

LISTA DE SIacuteMBOLOS

Transcriccedilatildeo

Transcriccedilatildeo foneacutetica

Transcriccedilatildeo fonoloacutegica

[ ]

Vogais

Vogal meacutedio-baixa anterior [ɛ]

Vogal meacutedio-alta anterior [e]

Vogal alta anterior [i]

Vogal baixa central [a]

Vogal meacutedio-baixa posterior [ɔ]

Vogal meacutedio-alta posterior [o]

Vogal alta posterior [u]

Vogal alta anterior nasal [ i ]

Vogal meacutedio-alta anterior nasal [e ]

Vogal baixa central nasal [atilde]

Vogal meacutedio-alta posterior nasal [otilde]

Vogal alta posterior nasal [u ]

Consoantes

Oclusiva alveolar surda [t]

Oclusiva alveolar sonora [d]

Fricativa alveolar surda [s]

Fricativa alveolar sonora [z]

Nasal alveolar [n]

Lateral alveolar [l]

Africada alveopalatal surda [tʃ]

Africada alveopalatal sonora [dʒ]

Lateral palatal [ʎ]

Nasal palatal [ɳ]

Fricativa palatal surda [ʃ]

Fricativa palatal sonora [ʒ]

Oclusiva velar surda [k]

Oclusiva velar sonora [g]

Fricativa velar [x]

Oclusiva bilabial surda [p]

Oclusiva bilabial sonora [b]

Nasal bilabial [m]

Fricativa labiodental surda [f]

Fricativa labiodental sonora [v]

LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 Diagrama de Hall

67

FIGURA 2 Configuraccedilotildees da Mescla Linguiacutestica segundo Romaine (2000 p185)

71

FIGURA 3 Esquema de representaccedilatildeo do bilinguismo social segundo Appel e Muysken (1986 p 23)

74

FIGURA 4 Escolha de liacutengua e code-switching conforme Grosjean (1982 p127)

82

FIGURA 5 Classificaccedilatildeo das liacutenguas da Famiacutelia Nambikwaacutera de acordo com Rodrigues (1986 p 134)

87

FIGURA 6 Localizaccedilatildeo e aacuterea dos Nambikwaacutera de acordo com Roquete-Pinto (1919)

88

FIGURA 7 Territoacuterio Nambikwaacutera descrito por Price (1983)

89

FIGURA 8 Localizaccedilatildeo atual dos Nambikwaacutera

91

FIGURA 9

Localizaccedilatildeo da TI Tubaratildeo-Latundecirc

94

FIGURA 10

Primeiros contatos com os Latundecirc (Foto Price 1977)

97

FIGURA 11 Iacutendios Latundecirc na TI Tubaratildeo-Latundecirc

104

FIGURA 12

Ligaccedilotildees entre a intensidade do bilinguismo o tipo de processo de acomodaccedilatildeo e sobreposiccedilatildeo entre os sistemas fonoloacutegicos

118

FIGURA 13

Correspondecircncia entre liacutenguas e contato linguiacutestico

120

FIGURA 14 Agentividade da Liacutengua Recipiente de acordo Van Coetsem 1988 p10

122

FIGURA 15 Agentividade da Liacutengua de Origem de acordo Van Coetsem 1988 p11

122

FIGURA 16 Relaccedilatildeo de agentividade entre o Portuguecircs e o Latundecirc

123

FIGURA 17 Estrutura silaacutebica do Latundecirc

168

FIGURA 18 Estrutura silaacutebica do Portuguecircs (Cacircmara-Juacutenior)

169

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Unidades e estruturas mais marcadas conforme

levantamento de Moreira da Silva (2011)

50

Quadro 2 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Leacutevi-Strauss (1948)

92

Quadro 3 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Price e Cook (1969)

93

Quadro 4 Distribuiccedilatildeo dos povos pertencentes a TI Tubaratildeo-Latundecirc

95

Quadro 5 Nuacutecleos familiares de acordo com a habitaccedilatildeo em 1999

98

Quadro 6 Situaccedilatildeo sociolinguiacutestica dos Latundecirc (dados de 1999)

101

Quadro 7 Quadro Comparativo dos Sistemas Foneacuteticos do Romansh e do Schweizerdeutsch de acordo com Weinreich (1953)

111

Quadro 8 Tipos de processos que conduzem a mudanccedila fonoloacutegica induzida por contato

116

Quadro 9 Fonemas consonantais do Latundecirc

125

Quadro 10 Fonemas vocaacutelicos do Latundecirc

125

Quadro 11 Ditongos do Latundecirc

126

Quadro 12 Descriccedilatildeo dos fonemas consonantais (Retirada de Telles 2002)

126

Quadro 13 Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos orais (Com base em Telles 2002)

149

Quadro 14

Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos nasais (Com base em Telles 2002)

153

Quadro 15

Vogais no Portuguecircs (Cacircmara Jr 1970)

154

Quadro 16

Consoantes no Portuguecircs (Silva 2002)

155

Quadro 17 Sistemas consonantais x Sistemas vocaacutelicos

156

Quadro 18 Resultado mais frequente do processo de monotongaccedilatildeo em Latundecirc

162

Quadro 19 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Latundecirc

166

Quadro 20 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Portuguecircs

167

Quadro 21 Escala de Sonoridade (Bonet e Mascaroacute 1997 p 109)

196

SUMAacuteRIO

1 SOBRE A PESQUISA 20

11 INTRODUCcedilAtildeO 20

12 JUSTIFICATIVA 24

13 OBJETIVOS 25

14 METODOLOGIA 26

15

DISPOSICcedilAtildeO DA TESE 27

2 MARCACcedilAtildeO LINGUIacuteSTICA 29

21 INTRODUCcedilAtildeO 29

22 MARCACcedilAtildeO 31

221 A concepccedilatildeo de Jakobson e Trubetzkoy 35

222 Abordagem Gerativa 37

223 Abordagem Tipoloacutegica (Interlinguiacutestica) 39

224 Abordagem Naturalista (Morfologia Natural) 41

23 CRITEacuteRIOS DE MARCACcedilAtildeO 42

24 MARCACcedilAtildeO MUDANCcedilA E CONTATO LINGUIacuteSTICO 45

25 JAKOBSON E A ABORDAGEM FONOLOacuteGICA DA

MARCACcedilAtildeO

48

3 O CONTATO LINGUIacuteSTICO 54

31 INTRODUCcedilAtildeO 54

32 SOBRE O CONTATO LINGUIacuteSTICO 57

33 MESCLAS DE CONTATO PIDGIN CRIOULO LIacuteNGUA

FRANCA E JARGAtildeO

60

331 Pidgin 63

332 Crioulo 65

333 Liacutengua Franca ou Sapir 69

334 Jargatildeo 71

34 IMPLICACcedilOtildeES DO CONTATO LINGUIacuteSTICO 72

341 Bilinguismo 72

342 Diglossia 78

343 Alternacircncia de coacutedigo 80

344 Morte da liacutengua

83

4 COMUNIDADE DE ESTUDO OS LATUNDEcirc 86

41 INTRODUCcedilAtildeO 86

42 A FAMIacuteLIA NAMBIKWARA 86

43 OS LATUNDEcirc

94

5 INTERFEREcircNCIA FONEacuteTICO-FONOLOacuteGICA DO LATUNDEcirc

NO PORTUGUEcircS

106

51 INTRODUCcedilAtildeO 106

52 INTERFEREcircNCIA FUSAtildeO COEXISTEcircNCIA E

TRANSFEREcircNCIA LINGUIacuteSTICA

107

53 FONOLOGIA DO LATUNDEcirc 124

54 FONOLOGIA DO PORTUGUEcircS 154

55 COMPARACcedilAtildeO ENTRE OS SISTEMAS FONEacuteTICOS DO

PORTUGUEcircS E DO LATUNDEcirc

156

6 PROCESSOS FONOLOacuteGICOS DO PORTUGUEcircS FALADO

PELOS LATUNDEcirc

158

61 Introduccedilatildeo 158

611 Perda de elementos 161

6111 Monotongaccedilatildeo 161

6112 Siacutencope em onset complexo de l e r 168

6113 Apagamento da coda 171

6114 Reduccedilatildeo do geruacutendio ndash Anteriorizaccedilatildeo da vogal final 173

6115 Reduccedilatildeo das palatais (nasal e lateral) 174

6116 Afeacuterese 177

6117 Apoacutecope 178

6118 Siacutencope 180

612 Ganho de elementos (Inserccedilatildeo de elementos) 181

613 Alteraccedilatildeo de elementos (permuta ou transposiccedilatildeo) 184

6131 Despalatalizaccedilatildeo de [ʃ] e [ʒ] 184

6132 Palatalizaccedilatildeo 186

6133 Vozeamento e desvozeamento 189

6134 Abaixamento e elevaccedilatildeo das vogais orais 191

6135 Nasalizaccedilatildeo e desnasalizaccedilatildeo 194

6136 Fenocircmenos envolvendo os roacuteticos 195

6137 Labializaccedilatildeo e deslabializaccedilatildeo 197

6138 Metaacutetese 198

6139 Siacutestole 199

61310 Fortalecimento

200

7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

201

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS

208

ANEXOS 221

20

1 SOBRE A PESQUISA

O estudo dessas liacutenguas eacute evidentemente de grande importacircncia para o incremento dos conhecimentos linguiacutesticos Cada nova liacutengua que se investiga traz novas contribuiccedilotildees agrave linguiacutestica cada nova liacutengua eacute outra manifestaccedilatildeo de como se pode realizar a linguagem

humana Cacircmara Jr (1977 p 4)

11 INTRODUCcedilAtildeO

Neste capiacutetulo discorreremos sobre a diversidade e a situaccedilatildeo das liacutenguas

indiacutegenas brasileiras1 bem como a motivaccedilatildeo para o presente estudo Tambeacutem

faratildeo parte desta introduccedilatildeo a justificativa para a realizaccedilatildeo desta pesquisa os

objetivos almejados os procedimentos metodoloacutegicos e a descriccedilatildeo da estrutura

da tese

Por se tratar de um estudo que diz respeito agrave linguiacutestica indigenista brasileira vale

iniciar a discussatildeo situando aqueles que satildeo os sujeitos da nossa pesquisa os

iacutendios Sabe-se que os povos indiacutegenas satildeo vistos geralmente como personagens

passivos na da nossa histoacuteria Eacute um equiacutevoco concebecirc-los na nossa narrativa

dessa forma pois seja no papel de aliados ou de inimigos esses povos tiveram

um papel importante na formaccedilatildeo de sociedades coloniais e poacutes-coloniais

(ALMEIDA 2013 p9)

1 Aleacutem do portuguecircs haacute no Brasil aproximadamente 180 liacutenguas indiacutegenas faladas por 225 etnias

Dessas liacutenguas 110 satildeo consideradas em extinccedilatildeo pelo fato de serem faladas por menos de 500 pessoas Estima-se que em 1500 cerca de seis milhotildees de iacutendios falavam 1078 idiomas Hoje a populaccedilatildeo indiacutegena brasileira chega a no maacuteximo entre 440 mil e 500 mil indiviacuteduos Atribui-se o desaparecimento das liacutenguas indiacutegenas agraves pressotildees poliacuteticas do colonizador e posteriormente agraves necessidades de sobrevivecircncia das populaccedilotildees indiacutegenas Revista Liacutengua portuguesa n 26 p 57 2010

21

Embora natildeo seja amplamente divulgado no Brasil haacute cerca de 180 liacutenguas

indiacutegenas o que nos torna um paiacutes plurilinguiacutestico Esse percentual era de 1200

antes da chegada dos portugueses Durante esses cinco seacuteculos de colonizaccedilatildeo

um glotociacutedio foi visto intensificamente no nosso territoacuterio

Mesmo sendo viacutetimas de um processo de colonizaccedilatildeo desenfreado e

escravizador estes povos com o tempo passaram a ser reconhecidos como

agentes na sociedade Suas accedilotildees satildeo vistas a partir de um recente periacuteodo

histoacuterico como importantes para explicar a histoacuteria deles e consequentemente a

nossa Saindo de um quadro de contato onde eram vistos como coadjuvantes

passando a ser tambeacutem protagonistas

Hoje os estudos indigenistas satildeo mais frequentes uma vez que na antropologia

atual os povos que foram definidos como aculturados passaram a ser

coadjuvantes de um processo histoacuterico e participativo

A reportagem da Revista Continente Maio de 2009 sobre os Fulniocirc faz parte de

um arsenal que descreve o que jaacute eacute sabido pela comunidade cientiacutefica as liacutenguas

indiacutegenas brasileiras estatildeo desaparecendo em ritmo acelerado Posto dessa

forma podemos perceber que haacute urgecircncia em descrever como tais liacutenguas se

comportam em si e em contatos com outras

Cacircmara-Juacutenior (1977 p 7) postula que os estudos indigenistas mais

precisamente sobre os de suas liacutenguas constitui no Brasil uma tarefa natildeo

somente enorme mas tambeacutem urgente Hoje meio seacuteculo depois esta citaccedilatildeo se

faz atual Os estudos indigenistas ainda se monstram tiacutemidos e carentes de

recursos e pesquisadores

22

Em continuidade o autor afirma que

Jaacute desapareceram no Brasil muitas liacutenguas agora totalmente irrecuperaacuteveis para a ciecircncia Eacute muito difiacutecil avaliar hoje em dia quantas liacutenguas se teriam falado no Brasil haacute 400 anos na eacutepoca do descobrimento do paiacutes pelos europeus Mas a quantidade de liacutenguas que subsistem ainda hoje () eacute ainda um nuacutemero consideraacutevel ndash cento e tantas Todas elas entretanto estatildeo ameaccediladas de desaparecer dentro de muitos poucos anos

O fato eacute que precisamos catalogar essas liacutenguas e como elas agem durante o

contato linguiacutestico Esses estudos satildeo de grande valia porque podem mostrar

como se deu analogicamente o contato do portuguecircs com outras liacutenguas E as

evidecircncias aqui encontradas contribuiratildeo para a descriccedilatildeo linguiacutestica aleacutem de

proporcionar agraves geraccedilotildees futuras o conhecimento mais apurado sobre as liacutenguas

de contato

Sobre esta relaccedilatildeo Almeida (idem p 14) afirma que

[] As relaccedilotildees de contato com sociedades envolventes e vaacuterios processos de mudanccedila cultural vivenciados pelos grupos indiacutegenas eram considerados simples relaccedilotildees de dominaccedilatildeo impostas aos iacutendios de tal forma que natildeo lhes restava nenhuma margem de manobra a natildeo ser a submissatildeo passiva a um processo de mudanccedilas culturais que os levaria a serem assimilados e confundidos com a massa da populaccedilatildeo

A autora ainda reitera que ldquoas relaccedilotildees de contato eram entatildeo grosso modo

vistas como relaccedilotildees de dominaccedilatildeo submissatildeo na qual uma cultura se impunha

sobre a outra anulando-ardquo p16

23

O contato entre liacutenguas contribuiu para o leacutexico portuguecircs2 E eacute o contato

linguiacutestico um dos fatores que coloca o iacutendio em situaccedilatildeo ativa na histoacuteria do

Brasil mesmo apoacutes o decreto do Marquecircs de Pombal3

Todavia assim como ocorrera com os negros eacute possiacutevel que o contato com

iacutendios possa ter influenciado outros niacuteveis da nossa gramaacutetica 4

Seki (1995 p 33) ao discutir sobre a situaccedilatildeo das liacutenguas indiacutegenas brasileiras

diz que

Essas estimativas devem ser ainda consideradas com certa cautela pois as liacutenguas indiacutegenas encontram-se sob as mais diferentes pressotildees sofrendo o impacto do crescente contato com a populaccedilatildeo envolvente e a liacutengua majoritaacuteria Contudo natildeo haacute em geral levantamentos que permitam estabelecer com maior margem de exatidatildeo os reflexos do impacto do Portuguecircs nos distintos grupos em termos de deslocamento de liacutengua indiacutegena tanto no que se refere a graus de bilinguismo monolinguismo quanto no que se refere agrave interferecircncia do Portuguecircs nessas liacutenguas nem sempre claramente perceptiacutevel nas fases iniciais mas que vai aos poucos contribuindo para a perda da liacutengua minoritaacuteria

2 Citamos aqui como exemplos o caso dos grupos de palavras oriundos de outros povos que

foram acoplados ao nosso leacutexico como indianismos e africanismos 3 Para estabelecer uma comunicaccedilatildeo com os nativos os portugueses foram aprendendo os

dialetos e idiomas indiacutegenas A partir do tupinambaacute falado pelos grupos mais abertos ao contato com os colonizadores criou-se uma liacutengua geral comum a iacutendios e natildeo-iacutendios O crescente nuacutemero de falantes do portuguecircs comeccedila a tornar o bilinguumlismo das famiacutelias portuguesas no paiacutes cada vez menor Em 17 de agosto de 1758 a liacutengua portuguesa se torna idioma oficial do Brasil atraveacutes de um decreto do Marquecircs de Pombal que tambeacutem proiacutebe o uso da liacutengua geral Disponiacutevel em httpwwwcomcienciabrreportagenslinguagemling03htm em 18122014 4 Alguns estudiosos afirmam que as influecircncias natildeo se restringiram apenas ao vocabulaacuterio

Jacques Raimundo em O Elemento Afro-Negro na Liacutengua Portuguesa aponta algumas mudanccedilas foneacuteticas iniciadas na fala dos escravos que ainda se mantecircm em algumas variedades do portuguecircs do Brasil as vogais meacutedias pretocircnicas e e o passam a ser pronunciadas como vogais altas respectivamente i e u (mininu nuticcedila) as vogais tocircnicas de palavras oxiacutetonas terminadas em s mesmo as grafadas com z se tornam ditongos (atrais mecircis vecircis) a marca de terceira pessoa do plural nos verbos do preteacuterito perfeito se reduz a o (fizero caiacutero tocaro)Em 1822 Jeroacutenimo Soares Barbosa registrava em sua Grammatica Philosophica uma peculiaridade sintaacutetica originada na fala dos escravos que ateacute hoje eacute apontada como uma das distinccedilotildees entre o portuguecircs falado em Portugal e o que se fala no Brasil a colocaccedilatildeo de pronomes aacutetonos antes dos verbos (mi deu ti falocirc) Disponiacutevel em httpwwwcomcienciabrreportagenslinguagemling03htm em 18122014

24

Embora a preocupaccedilatildeo da maioria dos estudiosos de liacutenguas indiacutegenas seja com

as liacutenguas minoritaacuterias esta pesquisa trafega no sentido contraacuterio ao buscar

descrever a influecircncia dessas liacutenguas tidas como fraacutegeis no indioma nacional

Vale ressaltar que mesmo em territoacuterio nacional o portuguecircs aqui eacute tido como

segunda liacutengua

12 JUSTIFICATIVA

O contato linguiacutestico e suas consequecircncias se datildeo em todas as liacutenguas do

mundo No entanto no que tange ao desaparecimento de liacutenguas o prejuiacutezo eacute

maior uma vez que a natildeo catalogaccedilatildeo dessas liacutenguas geraria um deacuteficit linguiacutestico

que poderia prejudicar os estudos linguiacutesticos vigentes e futuros aleacutem dos

problemas humanos advindos do processo de aculturaccedilatildeo entre povos

Ao corroborar com esta acertiva Telles (2009 p25) afirma que

Quando um povo perde uma liacutengua tambeacutem perde diversidade humana perdem-se meios de compreensatildeo e explicaccedilatildeo do mundo perdem-se soluccedilotildees de adaptalidade do homem ao meio perde-se o conhecimento do potencial e do usufruto sustentaacutevel deste meio Enfim perdem-se conhecimentos fundamentais que venham a coloborar para a continuidade da sobrevivecircncia do homem no planeta

O estudo de uma liacutengua diferente da nossa pode nos dar a impressatildeo de que

vamos encontrar algo distante da nossa realidade O que natildeo eacute verdade visto

que as semelhanccedilas linguiacutesticas satildeo em maior nuacutemero Cacircmara-Juacutenior (1977

p18)

25

Antes da perda total de uma liacutengua que pode ser assim configurado ou natildeo o

processo inicial se daacute pelo contato entre elas Soacute depois de existirem lado a lado

eacute que tais liacutenguas podem a depender da dinacircmica se fundirem desaparecerem

ou conviverem entre si

No caso do relacionamento entre o Latundecirc e o Portuguecircs percebe-se que tal

contato caminha para o desparecimento do Latundecirc dado as circunstacircncias

histoacutericas e sociais pelas quais esta liacutengua tem passado Hoje este povo eacute

composto de 20 falantes dispersos Como os mais novos natildeo podem coabitar

entre si a continuidade da etnia estaacute com os dias marcados Logo torna-se

urgente as tentativas de descriccedilatildeo da liacutengua e de seu comportamento

Analisar e descrever o contato com base nos padrotildees de marcaccedilatildeo e simetria

contribuiraacute com o princiacutepio de naturalidade que eacute pre-requesito para a tipologia

linguiacutestica No mais as investigaccedilotildees sobre o contato linguiacutestico satildeo de grande

valia para o conhecimento mais apurado das liacutenguas do mundo e da nossa liacutengua

especificamente

13 OBJETIVOS

Esta pesquisa objetiva o estudo da interferecircncia foneacutetica do Latundecirc no

Portuguecircs levando em consideraccedilatildeo o papel da marcaccedilatildeo no contato linguiacutestico

entre estas liacutenguas Tambeacutem busca refletir sobre os processos foneacuteticos oriundos

do contato e como eles se evidenciam a partir das liacutenguas em xeque

26

No decorrer da tese aleacutem dos objetivos postos aqui buscaremos responder as

questotildees postuladas

Investigar se os fatores internos (linguiacutesticos) e externos (estruturais)

interagem com os princiacutepios da marcaccedilatildeo

Identificar qual o papel da marcaccedilatildeo no contato linguiacutestico

Verificar se e quais os traccedilos mais marcados da liacutengua dominada passam

para a dominante

Dessa forma ao refletirmos sobre as questotildees acima esperamos contribuir com

os estudos dos universais linguiacutesticos e da cogniccedilatildeo humana

14 METODOLOGIA

O corpus utilizado nesta pesquisa foi coletado pela professora Stella Virgiacutenia

Telles e faz parte do NEI ndash Nuacutecleo de Estudos Indigenistas ndash da Universidade

Federal de Pernambuco Os dados foram gravados em CDrsquos em formato wave e

estruturados em forma de perguntas e respostas DID ndash Diaacutelogo entre

entrevistador e entrevistado

Foram escutados aproximadamente 30 horas de gravaccedilatildeo de fala dos 20

informantes Latundecirc Incialmente analisamos de oitiva os dados que foram

depois transcritos foneticamente com base no Alfabeto Foneacutetico Internacional -

IPA e organizados em tabelas Apoacutes segunda anaacutelise em caso de duacutevidas os

dados foram submetidos ao programa PRAAT para melhor audiccedilatildeo No que tange

27

agrave anaacutelise os dados foram disponibilizados em tabelas e enumerados com os

respectivos comentaacuterios abaixo

15 DISPOSICcedilAtildeO DA TESE

Para este estudo utilizamos os pressupostos cientiacuteficos da tipolologia linguiacutestica

de base aleacutem de autores que foquem em seus estudos contato interferecircncia

foneacutetica marcaccedilatildeo e naturalidade

No capiacutetulo 1 discorremos sobre os elementos basilares da tese justificativa

objetivos perguntas norteadoras metodologia e disposiccedilatildeo da tese

No capiacutetulo 2 trataremos sobre a marcaccedilatildeo Nele abordaremos o conceito de

marcaccedilatildeo e sua relaccedilatildeo com os princiacutepios de simetria e naturalidade Veremos a

partir do panorama de Matras amp Elsik (2006) Battistella (1996) Lacy (2006) as

abordagens de marcaccedilatildeo estruturalista gerativa tipoloacutegica e naturalista

Na seccedilatildeo 23 discorreremos sobre os criteacuterios de marcaccedilatildeo e na seccedilatildeo 24

sobre a mudanccedila linguiacutestica contato e marcaccedilatildeo Nos deteremos aos estudos de

Jakobson na abordagem fonoloacutegica na seccedilatildeo 25 bem como os universais

linguiacutesticos para a marcaccedilatildeo observados por Moreira da Silva (2011) em

contraponto com os padrotildees mais marcados do Latundecirc

No Capiacutetulo 3 o contato linguiacutestico seraacute nosso escopo Nele discutiremos os tipos

de mesclas de contato pidgin crioulo liacutengua Franca e jargatildeo a partir dos

pressupostos de Tarallo e Alkimin (1987) Calvet (2004) Couto (2001) Hall

28

(1996) Hymes (1971) Romaine (2000) e AiKhenvald e Dixon (2006)

Abordaremos tambeacutem a diglossia conforme Ferguson (1991) a alternacircncia de

coacutedigo de acordo com Auer (1999) Morte de liacutengua segundo Mcmahon (1994)

Trask (2004) e Cristoacutefaro-Silva (2002)

No capiacutetulo 4 apresentaremos a comunidade de estudo os Latundecirc Inicialmente

com base em Rodrigues (1995) Roquete-Pinto (1919) Leacutevi-Strauss (1946) Price

e Cook (1969) Anomby (2009) e Telles (2002) faremos uma descriccedilatildeo dos povos

e famiacutelias indiacutegenas do Brasil e dos Latundecirc especificamente Recapitularemos o

contexto histoacuterico formaccedilatildeo contato com os outros povos indiacutegenas e com os

natildeo iacutendios limites geograacuteficos e situaccedilatildeo atual

No capiacutetulo 5 trataremos da interferecircncia e transferecircncia foneacutetica do Latundecirc

para o Portuguecircs Com base em Cristoacutefaro-Silva (2002) Bisol (1996) Weinreich

(1953) Van Coetesem (1988) e Matras (2009) discutiremos os processos de

interferecircncia fusatildeo coexistecircncia e transferecircncia linguiacutestica Apresentaremos os

aspectos mais relevantes da fonologia Latundecirc e do Portuguecircs

No capiacutetulo 6 faremos as anaacutelises dos processos foneacuteticos presentes no contato

do Latundecirc com o Portuguecircs A partir da perspectiva claacutessica de perda

manutenccedilatildeo ou ganho de elementos discutiremos sobre quais os processos

foneacuteticos mais marcados do Latundecirc permanecem ou natildeo atestados no

Portuguecircs falado por Latundecirc

Por fim chegaremos agraves divagaccedilotildees finais dos resultados configurados na

pesquisa e agrave perspectiva de continuidade do trabalho Nos anexos encontram-se

os dados analisados transcritos foneticamente e dispostos em tabelas

29

2 MARCACcedilAtildeO LINGUIacuteSTICA

A nossa vida eacute mesmo assim Crescemos uns qual aacutervore indivisa levados pela forccedila de um destino retiliacuteneo como as palmeiras crescem

outros com a vida ramificada pelos empuxos ambientes Pretendemos Tentamos Retrocedemos

Afinal caminhamos na diretriz primitivamente escolhida quando o tempo nos concede alcanccedilar crescemos como as lianas5

(ROQUETTE-PINTO 1919 p 37)

21 INTRODUCcedilAtildeO

Eacute fato que o universo eacute regido por leis naturais O que aparentemente demonstra

ser fruto da eventualidade eacute um conjunto de princiacutepios explicaacuteveis que agem de

forma complementar sob as forccedilas centriacutefugas e centriacutepetas Com a liacutengua(gem)

natildeo diferentemente enquanto sistema de relaccedilotildees ela reflete estas

caracteriacutesticas Para Croft (2003 p 25) ela reflete a tensatildeo entre duas tendecircncias

concorrentes - uma em direccedilatildeo agrave regularidade a outra em direccedilatildeo agrave

hierarquizaccedilatildeo

Com o objetivo de melhor compreensatildeo dos pressupostos da tese neste capiacutetulo

nos deteremos agrave compreensatildeo dos conceitos de marcaccedilatildeo assimetria e

naturalidade Oriundos da linguiacutestica de base estes termos estatildeo relacionados

aos universais linguiacutesticos A complexidade destes conceitos por outro lado

apontam para o que eacute individual e para o que eacute geral Tem a ver com o que jaacute

defendia Chomsky ao estabelecer a dicotomia Princiacutepios x Paracircmetros

Obviamente posta a complexidade da liacutengua esses ldquoagentesrdquo da linguagem

5 Espeacutecie de trepadeira que manteacutem sua raiz no solo mas necessita de um suporte para manter-

se ereta e crescer em direccedilatildeo agrave luz

30

estatildeo submetidos tambeacutem aos fatores internos e externos nas liacutenguas do mundo

Logo o que eacute marcado numa liacutengua pode natildeo ser em outra ou podem ocorrer

marcaccedilotildees mais globais

Matras e Elsik (2006 p12) discorrem que

A tarefa da teoria linguiacutestica eacute a nosso ver descrever como essas tendecircncias concorrentes satildeo responsaacuteveis pela formaccedilatildeo de estruturas linguiacutesticas Trata-se de um jogo a niacutevel local de vaacuterios fatores a estrutura e sua funccedilatildeo na comunicaccedilatildeo o membro e o valor que ela representa tanto dentro do paradigma e em um quadro conceitual mais universal a natureza do processo especiacutefico envolvido na formaccedilatildeo a estrutura e a motivaccedilatildeo para aplicar esse processo para o paradigma ou partes dele Esta complexa interaccedilatildeo de fatores nunca eacute preacute-determinada uma vez que diferentes combinaccedilotildees de fatores tornaratildeo resultados diferentes A este respeito tomamos uma visatildeo imparcial do que condiccedilatildeo marcada eacute e se eacute ou natildeo uma estrutura eacute marcado ldquoem comparaccedilatildeo com a outrardquo Em vez disso nosso interesse eacute em explorar padrotildees nos resultados de diferentes combinaccedilotildees de fatores em niacutevel local

A assimetria e a naturalidade efetivamente teriam uma relaccedilatildeo direta com a

marcaccedilatildeo O que eacute assimeacutetrico tende a ser mais marcado e menos natural Por

outro lado o que eacute mais natural tende a ser menos marcado e mais simeacutetrico

Esta eacute uma condiccedilatildeo elementar mas natildeo totalitaacuteria para as liacutenguas do mundo

Para Batistella (1996 p115) haacute um nuacutemero de pesquisadores que sugerem

formas especiacuteficas em que as condiccedilotildees de marcaccedilatildeo desempenham um papel

na descriccedilatildeo na alteraccedilatildeo ou na aquisiccedilatildeo da liacutengua(gem) exercendo uma

funccedilatildeo relevante na definiccedilatildeo da gramaacutetica oacutetima agravequela que eacute o resultado

satisfatoacuterio na teoria da otimalidade6

6 Mesmo natildeo trabalhando diretamente com a teoria da otimalidade nesta tese eacute vaacutelido ressaltar

que os princiacutepios de marcaccedilatildeo simetria e naturalidade fazem parte do arcabouccedilo teoacuterico de seu axioma

31

No que diz respeito agrave fonologia aacuterea da linguiacutestica sob a qual se debruccedila o objeto

de estudo desse trabalho Battistella (1966 p65) observa que condiccedilatildeo marcada

eacute uma propriedade da relaccedilatildeo entre os dois sinais de um paradigma diacriacutetico

que eacute em parte independente da substacircncia linguiacutestica articulaccedilatildeo e percepccedilatildeo e

deve ser definido principalmente como conceitual

No que se refere aos conceitos postos aqui utilizaremos os pressupostos teoacutericos

defendidos por CROFT (1996 2003) JAKOBSON (1953) BATTISTELLA (1996)

MATRAS amp ELSIK (2006) para descriccedilatildeo teoacuterica e abordagem histoacuterica e LACY

(2006) para a descriccedilatildeo dos universais marcados para tratarmos das elucidaccedilotildees

sobre Marcaccedilatildeo Tipoloacutegica (no contato linguiacutestico) e Naturalidade

22 MARCACcedilAtildeO

Battistella (1996 p7) afirma que em muitas aacutereas alguns conceitos apresentam

problemas quanto agrave sua complexidade axioloacutegica Natildeo diferentemente no campo

da linguiacutestica tais discussotildees emblemaacuteticas ainda hoje se fazem presentes Uma

dessas discussotildees gira em torno do conceito de marcaccedilatildeo pois segundo ele

A dicotomia natildeo-marcado versus marcado eacute um dos conceitos-chave tanto a teoria da gramaacutetica gerativa desenvolvida por Noam Chomsky e a teoria da linguiacutestica estrutural desenvolvida por Roman Jakobson Ela tem sido usada em aacutereas da linguiacutestica que vatildeo desde a descritiva e tipoloacutegica ateacute a aplicada e foi emprestado para campos tatildeo diversos como a antropologia arte muacutesica poesia e literatura

O termo que fora introduzido na linguiacutestica na deacutecada de 1920 pelos linguistas

europeus da Escola de Praga cujo significado da condiccedilatildeo marcada natildeo

32

permaneceu constante mesmo dentro de uma uacutenica estrutura intelectual hoje eacute

um marco central na linguiacutestica O conceito de marcaccedilatildeo estaacute relacionado agrave

frequecircncia daquilo que eacute menos comum na liacutengua Logo a relaccedilatildeo deste conceito

se coaduna agrave noccedilatildeo de naturalidade Se um elemento eacute mais natural ele seraacute

menos marcado Se o oposto seraacute mais marcado Deste modo as liacutenguas teriam

uma tendecircncia a optar por padrotildees natildeo marcados

Battistella (2006 p13) expotildee que

A possibilidade de relaccedilotildees universais marcado natildeo-marcado eacute atenuada por outros fatores Um deles eacute a observaccedilatildeo de que a assimetria eacute muitas vezes sensiacutevel ao contexto Isso faz com que uma condiccedilatildeo local marcada em vez de um fenocircmeno geral signifique que contexto deve sempre ser considerado ao determinar valores de condiccedilatildeo marcada Poderia ser eacute claro que o aspecto contextual da condiccedilatildeo marcada seja dado universalmente mas este natildeo eacute de modo algum faacutecil de mostrar aleacutem do niacutevel de fonologia Uma preocupaccedilatildeo relacionada sobre as implicaccedilotildees universais decorre do fato de que muitas assimetrias podem ser revertidas entre as diferentes comunidades de fala periacuteodos de tempo ou registradores

Para Trask (2004 p187) os vaacuterios criteacuterios para entender que uma forma ou

construccedilatildeo eacute marcada podem natildeo coincidir e os valores da alternativa marcado

natildeo-marcado podem tambeacutem mudar ao longo do tempo A complexidade posta na

interaccedilatildeo de fatores nunca eacute previamente estabelecida uma vez que as

diferentes combinaccedilotildees deles tornaratildeo consequentemente os resultados

diferentes

Em continuidade ele afirma que

Ser marcado eacute uma noccedilatildeo muito ampla que se aplica em todos os niacuteveis de anaacutelise Em termos gerais eacute marcada qualquer forma linguiacutestica que ndash sob qualquer ponto de vista ndash menos usual ou menos neutra do que alguma outra forma a forma natildeo-

33

marcada Uma forma marcada pode distinguir-se de outra tambeacutem marcada pela presenccedila de mais material de maior quantidade de matizes de significado por ser mais rara numa determinada liacutengua ou nas liacutenguas em geral ou de vaacuterios outros modos (idem p129)

Na e para a fonologia eacute sugerido que processos fonoloacutegicos estejam diretamente

sensiacuteveis agrave distinccedilatildeo entre os elementos marcados e os natildeo marcados Nesta

relaccedilatildeo a marcaccedilatildeo dos segmentos foneacuteticos estaacute relacionada a propriedades

linguiacutesticas como i) serem pouco comuns ii) serem pouco frequentes iii) serem

adquiridos tardiamente iv) serem pouco estaacuteveis quanto agrave mudanccedila sonora

(CRISTOacuteFARO-SILVA 2011 p148)

Segundo Battistella (2006 p 13) ldquoa condiccedilatildeo marcada na fonologia eacute uma

propriedade da relaccedilatildeo entre os dois sinais de um paradigma diacriacutetico que eacute em

parte independente da substacircncia linguiacutestica (articulaccedilatildeo e percepccedilatildeo) e deve ser

definida principalmente como conceitualrdquo

O conceito de marcaccedilatildeo estaacute diretamente relacionado ao de simetria propriedade

matemaacutetica que consiste na correspondecircncia e permuta de elementos dentro de

um conjunto onde mesmo com a troca de lugares eles continuam tendo o

mesmo valor Neste caso a marcaccedilatildeo estaria ligada ao conceito de assimetria

posto que esta seja a quebra da valoraccedilatildeo de correspondecircncia dos elementos

Trask 2007

Para Matras e Elsik (2006 p 8)

Assimetrias de paradigmas tecircm vindo a ser associado com a noccedilatildeo de condiccedilatildeo marcadardquo O conceito pressupotildee que a relaccedilatildeo estrutural entre os dois polos de um paradigma eacute previsiacutevel em certa medida Ele tambeacutem assume que um dos

34

polos marcado seraacute sempre exibir propriedades que o outro polo desmarcado natildeo tem

Os referidos autores tratam dos aspectos sobre assimetria afirmando que a

simetria eacute mais simples por ser explicada ldquoem termos formais ao niacutevel do

paradigma e em termos funcionais atraveacutes de regularidade na posiccedilatildeo e

formas das estruturas que executam operaccedilotildees lineares semelhantes na

organizaccedilatildeo de informaccedilatildeo de enunciadosrdquo Eles ainda afirmam que as ldquoas forccedilas

que provocam a assimetria satildeo muito mais opacasrdquo pois ldquoelas competem em

vaacuterios niacuteveis locais contra o poder aparentemente esmagador e sempre presente

da busca pela simetriardquo (idem p 10)

A noccedilatildeo de valores dos conceitos de marcados e natildeo marcados foi inicialmente

desenvolvido para sistemas fonoloacutegicos por Trubetzkoy (1931) e primeiro aplicado

a categorias morfossintaacuteticas e semacircnticas por Jakobson (1932) Croft (1990 p

87) afirma que Markedness has since been adopted by both the generative and

the typological approaches to linguistic theory not surprisingly in rather different

ways7 Por isso a depender da corrente teoacuterica adotada o conceito de marcaccedilatildeo

pode ser compreendido de forma distinta dadas as interpretaccedilotildees e as

abrangecircncias a que elas se propotildeem

Conforme Battistella (1996 p 12) O termo marcaccedilatildeo abrange uma seacuterie de

conceitos

algumas tentativas foram feitas para separar os conceitos subjacentes a este termo e distinguir entre diferentes tipos de condiccedilotildees marcadas Jakobson por exemplo manteacutem uma

7 O conceito de marcaccedilatildeo tem sido adotado nas abordagens gerativista e tipoloacutegica natildeo surpreendentemente de maneiras bastante diferentes

35

distinccedilatildeo entre condiccedilatildeo fonoloacutegica marcada que envolve categorias cujos significados satildeo meros diferenciadores e condiccedilatildeo marcada semacircntica que envolve categorias conceituais que sinalizam o que significa bem como distinguem os vocaacutebulos

Com os passar do tempo os modelos teoacutericos sobre marcaccedilatildeo tambeacutem foram

discutidos e repensados de acordo com a corrente a que se propunha Nos

paraacutegrafos que seguem discorremos seguindo o percurso histoacuterico descrito por

Battistella 2006 sobre estes modelos estruturalista gerativista tipoloacutegica e

naturalista

221 A concepccedilatildeo de Jakobson e Trubetzkoy

A abordagem estruturalista estaacute diretamente ligada agraves pessoas de Jakobson e

Trubetzkoy componentes do Ciacuterculo de Praga para quem as correlaccedilotildees

fonoloacutegicas satildeo compartilhadas em um elemento definidor comum A partir da

observaccedilatildeo do comportamento dos traccedilos fonoloacutegicos eles introduzem os termos

marcado e natildeo-marcado It was in the context of the search for correlations

among phonemes that the terms marked and unmarked were first proposed

Battistella (2006 p 19)

Na visatildeo semioacutetica estruturalista de acordo com Matras e Elsik (2006 p 15)

Trubetzkoy (1939) introduziu o conceito de condiccedilatildeo marcada no contexto de sua

pesquisa sobre correlaccedilotildees fonoloacutegicas com base nas relaccedilotildees entre a presenccedila

de alguma caracteriacutestica fonoloacutegica e sua ausecircncia na consciecircncia dos falantes

Mais adiante ele restringiu a aplicaccedilatildeo da condiccedilatildeo marcada agraves neutralizaacuteveis

36

oposiccedilotildees fonoloacutegicas A partir daiacute a neutralizaccedilatildeo tornou-se o criteacuterio de

marcaccedilatildeo

Por isso diz-se que a neutralizaccedilatildeo eacute um criteacuterio originalmente fonoloacutegico que foi

estendido (nem sempre bem) para a situaccedilatildeo em que algum contexto requer o

cancelamento do contraste entre os membros de uma oposiccedilatildeo Battistella (1996

p 11)

Batistella (idem p12) tambeacutem afirma que Jakobson aplicou o conceito de

marcaccedilatildeo em vaacuterias direccedilotildees e aleacutem da fonologia a outros niacuteveis linguiacutesticos e

domiacutenios da semioacutetica com base natildeo apenas nos atributos linguiacutesticos mas nas

categorias semacircnticas da gramaacutetica e da cultura Ele tambeacutem afirmou que a

condiccedilatildeo marcada pode ser vista como uma relaccedilatildeo binaacuteria

O autor em estudo ainda discorre que Jakobson observando aleacutem disso ldquouma

seacuterie de correlaccedilotildees de condiccedilatildeo marcada notou que os valores natildeo marcados

tendem a ser representado por zero formardquo sugerindo que existe uma

correspondecircncia entre as caracteriacutesticas semacircnticas e sua expressatildeo fonoloacutegica

ldquonatildeo apenas os valores marcados tendem a ser codificados por meio de

marcadores manifestados mas tambeacutem valores semanticamente proacuteximos de

uma categoria que tendem a ser expressos fonologicamente ou marcadores

fonotaticamente semelhantesrdquo Os valores marcados tambeacutem tendem a mostrar

diferenciaccedilatildeo menos formal do que os valores natildeo marcados

Jakobson tambeacutem teria evidenciado seus estudos com base nas observaccedilotildees

sobre a aquisiccedilatildeo de primeira liacutengua e sobre a afasia Em suas pesquisas ele

descobriu correlatos extralinguiacutesticos de condiccedilatildeo marcada propondo uma

37

hierarquia das caracteriacutesticas fonoloacutegicas universais ao coletar dados

corroboradores da tese de que as caracteriacutesticas ou segmentos marcados satildeo

mais difiacuteceis de serem adquiridos por crianccedilas e de serem apreendidos por

afaacutesicos Battistella (idem 16)

222 Abordagem Gerativa

Para Matras amp Elsik (2006 p10) a visatildeo de Chomsky de marcaccedilatildeo mostra uma

flexibilidade notaacutevel uma vez que o conceito natildeo foi desenvolvido de forma

sistemaacutetica e que eacute difiacutecil falar sobre a existecircncia de um trabalho mais bem

elaborado sobre marcaccedilatildeo em sua obra

Battistella afirma que na concepccedilatildeo gerativista o conceito de marcaccedilatildeo exposto

por Chomsky estaacute relacionado a duas ideias centrais i) a condiccedilatildeo marcada eacute

concebida como codificaccedilatildeo de uma estrutura de preferecircncia ou a estrutura

padratildeo para a aquisiccedilatildeo da linguagem e ii) a condiccedilatildeo marcada eacute vista como

aquela que reflete o custo de determinadas opccedilotildees analiacuteticas Em tal conceito as

duas ideias estatildeo interligadas na abordagem gerativa na medida em que uma

teoria formal eacute necessaacuteria para expor a adequaccedilatildeo explicativa no que diz respeito

agrave aquisiccedilatildeo da linguagem (1996 p18)

Ainda segundo o autor Chomsky tambeacutem distinguiu dois tipos de condiccedilatildeo

marcada a distinccedilatildeo entre uma gramaacutetica sem marcaccedilatildeo do nuacutecleo e uma

periferia marcada e as estruturas de preferecircncia dentro do nuacutecleo e dentro da

periferia

38

No que tange agrave fonologia para Moreira da Silva (2011 p 31)

No contexto da Gramaacutetica Gerativa Chomsky amp Halle (1968 p 402) propotildeem uma teoria de marcaccedilatildeo baseada num conjunto de convenccedilotildees de marcaccedilatildeo ou definiccedilotildees dos valores ldquomarcadordquo ldquonatildeo-marcadordquo para os traccedilos fonoloacutegicos em contextos particulares A marcaccedilatildeo concebe uma estrutura como preferida ou que surge por defeito omissatildeo Os elementos marcados e natildeo marcados satildeo compreendidos como os que apresentam maior ou menor custo Satildeo as regras da Gramaacutetica Universal que atribuem um valor natildeo marcado aos traccedilos Com efeito os valores por omissatildeo estatildeo codificados na Gramaacutetica Universal havendo um conjunto de regras que fazem emergir os valores marcados

Chomsky amp Halle (idem p 425) propotildeem uma marcaccedilatildeo universal e inata Os

segmentos marcados ou os valores dos traccedilos satildeo estabelecidos de acordo com

universais interlinguiacutesticos frequecircncia distribucional mudanccedila linguiacutestica e

aquisiccedilatildeo da liacutengua

Eacute no final dos anos 70 e durante a deacutecada de 80 que segundo Battistella (1996

p 10)

a condiccedilatildeo marcada comeccedilou a ser tratada como parte de uma teoria do nuacutecleo da gramaacutetica A Gramaacutetica nuclear consistia em alguns paracircmetros que deveriam ser corrigidos durante a aquisiccedilatildeo de uma linguagem real O conceito de condiccedilatildeo marcada foi aplicado duplamente neste quadro Em primeiro lugar todo o nuacutecleo da gramaacutetica foi considerado como natildeo marcado contra a periferia marcada A condiccedilatildeo marcada de uma construccedilatildeo foi determinada pela sua regularidade estabilidade e centralidade para o nuacutecleo de uma linguagem particular bem como por generalizaccedilotildees intralinguiacutesticas sobre os tipos de construccedilatildeo Em segundo lugar a condiccedilatildeo marcada seria tambeacutem aplicada aos valores de paracircmetros no interior do nuacutecleo e no interior da periferia Assim condiccedilatildeo marcada tambeacutem foi visto como uma estrutura de preferecircncia dentro dos dois componentes da gramaacutetica

Moreira da Silva (2011 p32) afirma que no que diz respeito agrave Teoria da

Otimidade formulada por Prince amp Smolensky (1993) a marcaccedilatildeo eacute vista como a

39

violaccedilatildeo de uma restriccedilatildeo ou princiacutepio da liacutengua Segundo esta teoria cada liacutengua

eacute definida como um conjunto de hierarquizaccedilotildees de princiacutepios universais As

restriccedilotildees numa posiccedilatildeo mais elevada e que satildeo raramente violadas indicam os

aspetos natildeo marcados enquanto as menos importantes e que satildeo violadas

frequentemente mostram os aspetos mais marcados

223 Abordagem Tipoloacutegica (Interlinguiacutestica)

Croft (1996 p4) afirma que a principal caracteriacutestica da tipologia linguiacutestica eacute

verificar as regras de comparaccedilatildeo nas liacutenguas do mundo A comparaccedilatildeo

Interlinguiacutestica coloca a explicaccedilatildeo dos fenocircmenos linguiacutesticos de uma uacutenica

liacutengua em uma nova e diferente perspectiva

A fim de distinguir o conceito de marcaccedilatildeo de outras escolas teoacutericas Croft

(1996) introduziu a concepccedilatildeo de marcaccedilatildeo tipoloacutegica Para ele

Marcaccedilatildeo tipoloacutegica eacute uma rede de relaccedilotildees causais aparentes entre um subtipo de assimetrias interlinguiacutesticas todas as quais tecircm a ver com a forma como a funccedilatildeo eacute codificada em forma gramatical O tema geral da assimetria tambeacutem sugere um link para os padrotildees assimeacutetricos na ordem das palavras e na fonologia que diferem de marcaccedilatildeo tipoloacutegica de forma significativa Marcaccedilatildeo tipoloacutegica eacute uma propriedade universal de uma categoria conceitual natildeo uma propriedade de uma linguagem especiacutefica ou de uma categoria gramatical de linguagem particular como eacute concebida em marcaccedilatildeo para a Escola de Praga (p87 - 88)8

8 Typological markedness is a network of apparent causal relationships among a subtype of cross-

linguistic asymmetries all of which have to do with how function is encoded into grammatical form The general theme of asymmetry also suggests a link to asymmetrical patterns in word order and phonology which differ from typological markedness in significant ways Typological markedness is a universal property of a conceptual category not a language-particular property of a language-particular grammatical category as it is in Prague School markedness

40

Quanto agrave marcaccedilatildeo na abordagem tipoloacutegica autores como Croft (1996) e Givoacuten

(1990) se utilizaram da perspectiva estruturalista para embasar a sua teoria Esta

concepccedilatildeo se vale dos fenocircmenos interlinguiacutesticos e universais que eacute a sua

caracteriacutestica definidora Battistella (2006 p19) A marcaccedilatildeo tipoloacutegica eacute

portanto uma ferramenta importante para o tipologista porque fornece um meio

para ligar diretamente propriedades linguiacutesticas (estruturais) formais em todos os

idiomas

A condiccedilatildeo marcada eacute assegurada por padrotildees interlinguiacutesticos que podem ser

formulados como restriccedilotildees sobre possiacuteveis combinaccedilotildees de propriedades

linguiacutesticas Na abordagem tipoloacutegica a marcaccedilatildeo eacute vista como uma rede de

relacionamentos que engloba uma seacuterie de padrotildees gerais logicamente

independentes Croft (1990 p87) reclassifica os criteacuterios utilizados pelos

estruturalistas em trecircs estruturais comportamentais e de frequecircncia de token

Na abordagem tipoloacutegica um valor de categoria eacute mais ou menos marcado em

vez de individualmente ou duplamente marcadas como na abordagem semioacutetica

De acordo com Croft (2003 p87) o fato de que a neutralizaccedilatildeo natildeo eacute um

conceito relativo explica por que eacute um criteacuterio vaacutelido de condiccedilatildeo marcada

tipoloacutegica

Para Matras e Elsik o reconhecimento do caraacuteter relativo (gradual ou escalar) da

condiccedilatildeo marcada permite que se desenhe em alguns conceitos fundamentais da

tipologia linguiacutestica o que diz respeito agrave condiccedilatildeo de marcada Aleacutem de simples

implicacionais universais hierarquias e protoacutetipos tambeacutem podem ser vistos como

padrotildees da condiccedilatildeo marcada (2006 p18)

41

224 Abordagem Naturalista9 (Morfologia Natural)

Na abordagem naturalista de acordo com Matras amp Elsik (2006 p13) a condiccedilatildeo

marcada foi desenvolvida na escola de Morfologia Natural que surgiu na Aacuteustria e

na Alemanha em meados dos anos 1970 Os estudos de Dressler et al (1987)

para quem ldquoa naturalidade universal corresponde agrave facilidade para o ceacuterebro

humano (Dressler et all 1987 p11) fazem parte desta corrente que se debruccedilou

sobre a morfologia natural para dar sustentaccedilatildeo a sua tese Ainda para estes

autores

Os proponentes da Morfologia Natural caracterizam sua abordagem como semioacutetica e ao mesmo tempo funcional A escola foi inspirada entre outros pela teoria da marcaccedilatildeo desenvolvida na Escola de Praga Por outro lado morfologistas naturais compartilham de uma seacuterie de pontos de vista teoacutericos com o paradigma funcionalista e principalmente com orientaccedilatildeo de funccedilatildeo tipoloacutegica como a assunccedilatildeo do caraacuteter relativo da condiccedilatildeo marcada a suposiccedilatildeo de protoacutetipos e a dependecircncia de motivaccedilotildees e evidecircncias extralinguiacutesticas e intralinguiacutesticas (Idem p12)

Ainda de acordo com Matras amp Elsik (idem p 14) a Teoria da Morfologia Natural

eacute concebida como uma teoria da Naturalidade onde satildeo reconhecidos vaacuterios

niacuteveis de anaacutelise linguiacutestica que satildeo organizados por outras subteorias

correspondentes

A Morfologia Natural objetiva nesse aspecto estabelecer conflitos entre os

princiacutepios de naturalidade Dois desses satildeo i) os conflitos entre princiacutepios de

naturalidade (o que eacute natural e o que eacute especiacutefico do idioma) e ii) os conflitos

entre os diferentes componentes do sistema de linguagem

9 The naturalness approach

42

Comumente a naturalidade eacute vista por ter fundamentos extralinguiacutesticos que

determinam ou proiacutebem favorecem ou desfavorecem as estruturas linguiacutesticas

restringindo as possibilidades e especificam as preferecircncias da faculdade da

linguagem universal No entanto embora a morfologia privilegie os fatores

extralinguiacutesticos (neurobioloacutegicos e sociocomunicativos) os fatores linguiacutesticos

natildeo satildeo redutiacuteveis aos extralinguiacutesticos (ibidem p14)

23 CRITEacuteRIOS DE MARCACcedilAtildeO

Matras amp Elsik (2006 p15) elencam quatro criteacuterios relevantes para a marcaccedilatildeo

Satildeo eles i) frequecircncia ii) complexidade conceitual iii) complexidade estrutural iv)

distribuiccedilatildeo

A frequecircncia tem ocupado uma posiccedilatildeo central na abordagem tipoloacutegica da

condiccedilatildeo marcada Embora acredite-se que os elementos natildeo marcados satildeo

mais frequentes que os marcados este criteacuterio eacute relativo e universalmente

aplicaacutevel sendo bastante questionaacutevel na abordagem tipoloacutegica chegando a ser

abandonado por Croft 1990 p84 ao afirmar que ldquoo criteacuterio de frequecircncia mostra

uma conexatildeo direta entre as propriedades de estrutura da linguagem e

propriedades de uso da linguagemrdquo

Ainda segundo Croft (idem p159) a condiccedilatildeo marcada eacute mais do que uma

manifestaccedilatildeo de motivaccedilatildeo econocircmica havendo a necessidade de olhar para

outras causas da frequecircncia de certos valores gramaticais na fala

43

Na abordagem estruturalista semioacutetica a complexidade conceitual eacute a

propriedade que define a condiccedilatildeo semanticamente marcada Para Jakobson a

marcaccedilatildeo eacute definida como uma relaccedilatildeo assimeacutetrica entre sinalizaccedilatildeo e natildeo-

sinalizaccedilatildeo de uma determinada propriedade Assim o membro marcado da

oposiccedilatildeo eacute por definiccedilatildeo mais complexo semanticamente que o membro natildeo

marcado como outros criteacuterios melhores correlatos da condiccedilatildeo marcada de

diagnoacutesticos de complexidade conceitual (Matras amp Elsik 2006 p 17)

Ainda segundo estes autores (Idem p 19) o reconhecimento da extensatildeo e da

complexidade de um marcador em termos fonoloacutegicos como um fator relevante

em vez de um morfoloacutegico eacute tido por outros autores que trabalham com a

tipologia linguiacutestica Como exemplo eles citam a codificaccedilatildeo morfossintaacutetica que

eacute chamada de codificaccedilatildeo zero onde natildeo existe evidente formal de marcaccedilatildeo de

um valor de categoria

Os criteacuterios de marcaccedilatildeo com base na distribuiccedilatildeo compreendem os criteacuterios

comportamentais e o criteacuterio de valor neutro Os criteacuterios comportamentais foram

desenvolvidos especificamente na abordagem tipoloacutegica e dizem respeito a

qualquer tipo de evidecircncia do comportamento linguiacutestico dos elementos que

demonstram que um valor de uma categoria conceitual eacute gramaticalmente mais

versaacutetil do que outro Croft (1990 p 93)

Jaacute o criteacuterio de valor neutro diz respeito agrave neutralizaccedilatildeo de contrastes

paradigmaacuteticos em determinados contextos O criteacuterio foi desenvolvido na Escola

de Praga e tomado por Greenberg (1966) No entanto o valor neutro eacute

descartado como um criteacuterio vaacutelido de marcaccedilatildeo tipoloacutegica visto que natildeo haacute

44

consistecircncia interlinguiacutestica Natildeo existe um padratildeo interlinguiacutestico consistente de

contextos neutros que podem ser ligados agrave codificaccedilatildeo estrutural ou potencial

comportamental (Croft idem p96)

A razatildeo para a introduccedilatildeo de criteacuterios dependentes do sistema em Morfologia

Natural segundo Matras amp Elsik (2006 p 19) eacute que o conceito de naturalidade

baseada exclusivamente em fatores independentes de sistema resulta em

prediccedilotildees incorretas especialmente na mudanccedila de linguagem Eles consideram

certos aspectos da normalidade dependente de idioma para ser parte de

naturalidade

Segundo Croft (1990 p 97) no que tange aos criteacuterios externos da marcaccedilatildeo os

proponentes da abordagem naturalista introduziram uma seacuterie de criteacuterios ou

correlatos extralinguiacutesticos da condiccedilatildeo marcada como

evoluccedilatildeo da linguagem (o mais tarde o mais marcado)

maturaccedilatildeo ontogeneacutetica (o mais tarde o mais marcado)

fala do bebecirc (menos elementos marcados preferidos pelos adultos no

maiecircs)

aquisiccedilatildeo da linguagem (menos marcado adquirido antes do mais

marcado)

distuacuterbios da linguagem e da fala (mais marcado afetado anteriormente

menos marcado)

testes de percepccedilatildeo (menos marcado mais facilmente percebida do que

mais marcado)

45

e erros linguiacutesticos (mais marcados evocam mais erros do que os menos

marcados)

Esses criteacuterios satildeo basilares e dariam conta de uma seacuterie de elementos

universais linguiacutesticos

24 MARCACcedilAtildeO MUDANCcedilA E CONTATO LINGUIacuteSTICO

Matras amp Elsik (2006 p 22) garantem que em muitas abordagens a

mudanccedila linguiacutestica eacute vista como cooperadora para compreensatildeo da marcaccedilatildeo

Logo a mudanccedila de idioma eacute tida como criteacuterio de marcaccedilatildeo Esta assertiva faz

sentido nesse trabalho visto que o objeto de anaacutelise o portuguecircs resultante do

contato entre o Portuguecircs e o Latundecirc trata de cacircmbio de materiais linguiacutesticos

Neste caso especificamente dos elementos foneacuteticos

Ainda de acordo com estes autores

A existecircncia de estruturas marcadas eacute um resultado inevitaacutevel da compartimentaccedilatildeo e da abertura do sistema de linguagem E uma vez que diferentes componentes da linguagem tecircm funccedilotildees divergentes e tendem a seguir diferentes princiacutepios de naturalidade o abandono das estruturas marcadas em um niacutevel implica em estruturas marcadas em outro niacutevel (Idem p

25)

Em outras palavras a mudanccedila linguiacutestica leva agrave condiccedilatildeo de marcaccedilatildeo na

mudanccedila de um componente da liacutengua para outro ao inveacutes de uma reduccedilatildeo

global de condiccedilatildeo marcada Tais estruturas marcadas satildeo obrigadas a existir em

qualquer momento na histoacuteria de uma liacutengua

46

Os estudiosos apontam para os dois tipos de forccedilas que agem no contato

linguiacutestico a interna e a externa Assim tais forccedilas podem simplificar ou complicar

a gramaacutetica de uma liacutengua Givoacuten (1979 p 123) diz que os falantes satildeo

propensos a recorrer a estruturas natildeo marcadas da Gramaacutetica Universal em

situaccedilotildees cujo contato estaacute ligado ao estresse comunicativo enquanto situaccedilotildees

de contato menos marcados aquelas que prosseguem de forma mais gradual

natildeo precisam

Givoacuten (idem 124) diz que nas situaccedilotildees de pidgin a condiccedilatildeo de marcaccedilatildeo eacute

reduzida e situaccedilotildees de contato entre liacutenguas podem resultar em aumento de

elementos marcados As categorias marcadas satildeo reduzidas em pidgins

enquanto as natildeo-marcadas satildeo as primeiras a serem inovadas durante o

processo de crioulizaccedilatildeo A marcaccedilatildeo sugere que em situaccedilotildees de contato

envolvendo a interferecircncia deve favorecer a reduccedilatildeo da condiccedilatildeo marcada

Na aquisiccedilatildeo de segunda liacutengua o grau relativo de dificuldade para o aprendiz

estaacute relacionado a fatores extralinguiacutesticos como idade Eacute fato que na aquisiccedilatildeo

de uma segunda liacutengua os adultos tendem a terem dificuldades com os padrotildees

mais marcados enquanto os mais novos natildeo a tem Estruturas marcadas da

liacutengua em aquisiccedilatildeo podem deixar de serem adquiridas durante a aprendizagem

caso sejam os adultos que a esteja adquirindo Por isso estruturas natildeo marcadas

satildeo mais propensas a surgir em grandes sociedades caracterizadas por um

intenso contato linguiacutestico levando agraves liacutenguas a simplificaccedilatildeo dos seus sistemas

linguiacutesticos Croft (2000 p 192-193)

47

Jakobson (1978 p 35-37) afirma que quanto maior a funccedilatildeo socioespacial de um

dialeto mais simples seraacute o seu sistema linguiacutestico Dialetos e liacutenguas

relativamente isoladas satildeo mais propensas a desenvolverem condiccedilotildees marcadas

e estruturas redundantes como conjunto de fonemas complexos com um elevado

nuacutemero de contrastes fonoloacutegicos complexidade alofocircnica e alomoacuterfica

irregularidade morfoloacutegica e padrotildees de concordacircncia complexos Por outro lado

os casos de alto contato dialeacutetico que satildeo caracterizadas por redes sociais

relativamente abertas satildeo susceptiacuteveis agrave produccedilatildeo de estruturas linguiacutesticas natildeo

marcadas pela diminuiccedilatildeo da irregularidade da redundacircncia e da complexidade

Apesar de os empreacutestimos serem um aspecto do aumento da condiccedilatildeo marcada

ela (a condiccedilatildeo) eacute operativamente especiacutefica de cada empreacutestimo Esta condiccedilatildeo

marcada do empreacutestimo coodetermina quais as formas e funccedilotildees satildeo mais

susceptiacuteveis de serem emprestadas do que outras Quanto mais transparente e

menos integrador for um elemento na liacutengua de origem torna-se mais provaacutevel de

ser emprestado A condiccedilatildeo marcada eacute relativa ao contexto agrave saliecircncia agrave

frequecircncia agrave ocorrecircncia e agrave distacircncia tipoloacutegica da situaccedilatildeo do contato Matras amp

Elsik (2006 p 26)

Croft (2000 p198) estende a noccedilatildeo de condiccedilatildeo marcada natildeo soacute para os

mecanismos de mudanccedila mas tambeacutem para as formas de contextos de difusatildeo

ou seja padrotildees de realizaccedilatildeo Ele afirma que enquanto na mudanccedila interna as

inovaccedilotildees entram nos pontos menos marcados e estendem a ambientes mais

acentuados em empreacutestimos e outras inovaccedilotildees mudanccedilas motivadas

externamente se espalham de pontos marcados para menos contextos marcados

48

25 JAKOBSON E A ABORDAGEM FONOLOacuteGICA DA MARCACcedilAtildeO

O termo marcaccedilatildeo recebeu o tratamento mais expansivo nos estudos de Roman

Jakobson a partir de 1930 Ele e Trubetzkoy difundiram a ideia de correlaccedilatildeo

fonoloacutegica como uma seacuterie de oposiccedilotildees binaacuterias que compartilham elementos

em comum Eacute Jakobson que afirma que a neutralizaccedilatildeo e o estaacutegio onde as

posiccedilotildees marcadas natildeo estatildeo em estado de marcaccedilatildeo

Eacute tambeacutem Jakobson quem introduz a concepccedilatildeo de niacuteveis de marcaccedilatildeo propondo

que a forma natildeo marcada tanto tem uma forma geral como uma parcial Ele

descobriu uma relaccedilatildeo entre a marcaccedilatildeo em uma hierarquia universal de traccedilos

fonoloacutegicos os traccedilos marcados implicam maior dificuldade de aprendizagem e

uma maior facilidade de perda por parte de pessoas com afasia Ele ainda diz

que

O padratildeo do desenvolvimento fonoloacutegico universal consiste numa progressatildeo de diferenciaccedilotildees cada vez mais finas entre traccedilos distintivos inicialmente distinccedilatildeo entre consoantes e vogais formando-se posteriormente oposiccedilotildees cada vez menos universais A dissoluccedilatildeo da competecircncia linguiacutestica individual nas patologias da linguagem eacute governada pela mesma regularidade a perda do valor primaacuterio pressupotildee a perda do valor secundaacuterio e eacute por isso que se fala da infantilidade da fala dos afaacutesicos A dissoluccedilatildeo do sistema de sons nos afaacutesicos fornece uma imagem de espelho do desenvolvimento fonoloacutegico da crianccedila ndash os sons a serem adquiridos mais tardiamente satildeo os primeiros a serem perdidos (1941 p 60-63)

No percurso da fonologia Jakobson (1941 p 84) viu a representaccedilatildeo fonecircmica

como um niacutevel sem redundacircncia de representaccedilatildeo que conteacutem apenas

informaccedilotildees distintivas A praacutetica descritiva da informaccedilatildeo teoacuterica de Jakobson

49

teve uma grande e importante influecircncia sobre a notaccedilatildeo livre da redundacircncia na

fonologia e na sintaxe gerativas

Com base na literatura meacutedica Jakobson examinou a aquisiccedilatildeo da linguagem e a

afasia da fala agrave luz dos universais linguiacutesticos propondo uma relaccedilatildeo entre uma

hierarquia universal dos traccedilos fonoloacutegicos a aquisiccedilatildeo da linguagem na infacircncia

e a perda dela durante a afasia A aquisiccedilatildeo fonoloacutegica da crianccedila e os distuacuterbios

dos afaacutesicos baseiam-se nas mesmas leis de solidariedade como o inventaacuterio

fonoloacutegico o percurso fonoloacutegico das liacutenguas do mundo

Os estudos de Jakobson e de Trubetzkoy sobre a tipologia fonoloacutegica levaram

Jakobson a propor que os sistemas de sons satildeo organizados hierarquicamente e

que certas oposiccedilotildees fonoloacutegicas fornecem o nuacutecleo do sistema de som de todas

as liacutenguas Estas satildeo as oposiccedilotildees que definem os sons mais prototiacutepicos mdash

vogais e consoantes que ocorreratildeo em todos os idiomas vogais cardeais a i

u consoantes plosivas p t k e as nasais m n Estes sons satildeo

encontrados em praticamente todas as liacutenguas do mundo

Jakobson propotildee novas leis implicativas entre estes sons e os sons fora do

inventaacuterio baacutesico Dessa forma as leis tipoloacutegicas preveem que em nenhuma

liacutengua haveraacute vogais nasais a menos que haja vogais orais nenhuma liacutengua teraacute

uma vogal arredondada posterior a menos que ela tambeacutem tenha uma vogal

anterior fechada natildeo arredondada nenhuma liacutengua teraacute uma vogal fechada natildeo

arredondada a menos que ela tambeacutem tenha uma arredondada nenhuma liacutengua

teraacute uma fricativa dental simples sem uma fricativa dental estridente (Idem 1941

p 86)

50

Jakobson tambeacutem observa que certos sons satildeo muito raros nas liacutenguas do

mundo por exemplo as fricativas laterais e o r tcheco estridente Ele propotildee que

esses sons satildeo mais afastados do nuacutecleo e portanto menor nesta hierarquia

A hierarquia de oposiccedilotildees fonoloacutegicas definida pela tipologia encontra-se tambeacutem

no desenvolvimento do sistema foneacutetico da crianccedila Com base em estudos diaacuterios

de aquisiccedilatildeo da linguagem ele confirma a hierarquia na aquisiccedilatildeo dos padrotildees e

os padrotildees mais marcados seriam adquiridos tardiamente

Moreira da Silva (2011 p36) elenca os criteacuterios de marcaccedilatildeo No entanto a

autora chama a atenccedilatildeo para o fato de que eles nem sempre funcionam do modo

esperado Satildeo eles frequecircncia distribuiccedilatildeo aquisiccedilatildeo da liacutengua patologias da

linguagem histoacuteria da liacutengua facilidade de produccedilatildeo e percepccedilatildeo universalidade

implicaccedilatildeo e processos fonoloacutegicos Ela tambeacutem apresenta algumas unidades e

estruturas consideradas mais marcadas como podemos ver a seguir

Quadro 1 Unidades e estruturas mais marcadas conforme levantamento de Moreira da

Silva (2011)

Segmentos e estruturas mais marcadas Autores

1 Vogais nasais Ferguson amp Chowdbury 1960

Greenberg 1966 14 Durand 1990

74 Kenstowicz 1994 63

2 Vogais longas Zipf 1935 1963 Greenberg 1966

14

3 Vogais meacutedias em comparaccedilatildeo com as

vogais altas

Kenstowicz 1994 65

4 Consoantes aspiradas Greenberg 1966 14

5 Consoantes glotalizadas Greenberg 1966 17

6 Obstruintes [+vozeadas] por oposiccedilatildeo agraves [- Greenberg 1966 14 24

51

vozeadas] Lass1984 155 Kenstowicz 1994

62

7 Consoantes fricativas por oposiccedilatildeo agraves

oclusivas

Kenstowicz 1994 65

8 Articulaccedilotildees secundaacuterias como labializaccedilatildeo

palatalizaccedilatildeo e velarizaccedilatildeo

Kenstowicz 1994 65

9 A regiatildeo dental alveolar eacute preferida com

exceccedilatildeo das africadas o que pode ser

observado pelo fato de este ser o ponto de

articulaccedilatildeo usado quando numa liacutengua

existe apenas uma obstruinte Nas nasais

esta tendecircncia ainda se faz notar mais

resultando na preferecircncia por n

Lass 1984 154-156

10 Segmentos com articulaccedilotildees muacuteltiplas e

complexas no geral satildeo mais marcados em

comparaccedilatildeo com segmentos com

articulaccedilotildees singulares

Kenstowicz 1994 65

11 Quanto agraves liacutequidas a lateral seraacute a menos

marcada jaacute que as liacutenguas que possuem

duas ou mais liacutequidas tecircm provavelmente

uma lateral e um contraste lateral natildeo

lateral

Lass 1984 158

12 Em termos de semivogais haacute uma

preferecircncia por j embora a maioria das

liacutenguas possua tambeacutem w as outras

semivogais satildeo raras

Lass 1984 158

13 Siacutelabas acentuadas ndash nem todas as liacutenguas

tecircm siacutelabas acentuadas embora estas

surjam cedo na aquisiccedilatildeo talvez devido agrave

sua saliecircncia perceptiva e no caso do inglecircs

devido ao fato de as palavras lexicais serem

iniciadas por siacutelaba toacutenica

Demuth 1996 121

14 Quanto agrave siacutelaba existe a preferecircncia pelo

formato natildeo marcado CV

Blevins 1995 213

15 De acordo com a TO a siacutelaba estaacute sujeita agraves Archangeli 1997 7 Hammond

52

seguintes restriccedilotildees universais

a) As siacutelabas comeccedilam com consoante -

Ataque

b) As siacutelabas tecircm uma vogal - Nuacutecleo

c) As siacutelabas acabam com uma vogal - Natildeo

Coda

d) As siacutelabas tecircm no maacuteximo uma consoante

numa margem - Complexo

(significa que os ataques complexos e codas

complexas satildeo inaceitaacuteveis)

e) As siacutelabas satildeo compostas por consoantes

e vogais - Ataque e Nuacutecleo

1997 36

As estruturas elencadas no quadro acima satildeo validadas interlinguisticamente

Com relaccedilatildeo agraves liacutenguas em contato objeto deste estudo podemos afirmar que o

portuguecircs apresenta menos estruturas marcadas do que o Latundecirc No caso do

portuguecircs as estruturas em 2 4 5 e 10 constantes do quadro acima natildeo satildeo

observadas

Jaacute no Latundecirc aleacutem de todas as estruturas apresentadas no quadro ainda satildeo

observadas as seguintes estruturas mais marcadas

estrutura silaacutebica bastante complexa

inventaacuterio vocaacutelico maior do que o consonantal

53

combinaccedilatildeo de dois traccedilos mais marcados em um segmento (vogais

nasais e laringais) e

acento e tom lexicais

Para refletirmos sobre a marcaccedilatildeo no processo de interferecircncia Latundecirc ndash

Portuguecircs trataremos no capiacutetulo seguinte de conceitos a cerca do contato

linguiacutestico

54

3 CONTATO LINGUIacuteSTICO

ldquoBilingualism is for me the fundamental problem of linguisticsrdquo Jakobson10

31 INTRODUCcedilAtildeO

A histoacuteria em grande parte gira em torno de lendas e mitos Um desses mitos eacute o

surgimento das liacutenguas do mundo Questionamentos de como e quando elas

sugiram permeiam ainda hoje as mentes dos filoacutesofos e cientistas Natildeo

diferentemente das demais aacutereas a perspectiva teoloacutegica descreve a narrativa da

construccedilatildeo da Torre de Babel como uma dessas tentativas de explicaccedilatildeo no que

tange agrave miscelacircnea de liacutenguas existentes Jackob Bohme teoacutelogo do seacuteculo XVII

afirma em seu De Signatura Rerum11 que a liacutengua divina original raiz ou matildee de

todas as liacutenguas do mundo eacute chave para um conhecimento verdadeiro e perfeito

de todas as coisas Eacute no ato da criaccedilatildeo que o primeiro homem Adatildeo

contemplando as obras do Criador de toda a natureza nomeara todas as

criaturas de acordo com suas proacuteprias qualidades essenciais usando a

linguagem humana como meio

A hipoacutetese defendida por Bohme tambeacutem fora amplamente sustentada pelos

filoacutelogos e comparatistas do final do seacuteculo XVIII Sem viacutenculo com a teologia

estes estudiosos buscavam atraveacutes da reconstruccedilatildeo da aacutervore linguiacutestica a

protoliacutengua a liacutengua-matildee geradora das demais liacutenguas

10

Apud Romaine 1995 p1 11

De Signatura Rerum (Desde o nascimento e o nome de todos os seres) 1622

55

Jacob Grimm filoacutelogo alematildeo com base nas descobertas de Rasmus Rask

aperfeiccediloou o meacutetodo comparatista sobretudo o que fora denominada de

ldquomudanccedila de somrdquo ou ldquoLei de Grimmrdquo12 com intuito de descrever as mudanccedilas

ocorridas na liacutengua-matildee o proto-indo-europeu (PIE) A Lei de Grimm estava na

base das discussotildees ocorridas mais tarde na Universidade de Leipzig

Alemanha no conhecido grupo dos neogramaacuteticos Os estudiosos desse ciacuterculo

questionaram os estudos de Grimm e seus compatriotas ao apontarem para o fato

de que os estudos comparatistas se basearem em dados de liacutengua escrita e natildeo

de liacutengua falada (GABAS JR 2008 p 80)

Humberto Eco em A busca da liacutengua perfeita13 nos relata sobre os projetos de

reconstruccedilatildeo em busca da liacutengua sagrada No seu livro o autor nos mostra que a

tentativa de procura de correlatos entre as liacutenguas do mundo eacute interesse antigo

das civilizaccedilotildees Ele afirma que na Europa no seacuteculo XIX houve 173 projetos de

reconstruccedilatildeo linguiacutestica

Dadas ateacute aqui as investigaccedilotildees eacute comum pensarmos que pelo prisma

teoloacutegico o surgimento das liacutenguas no planeta eacute fruto da desobediecircncia e

soberba humanas Eco idem nos mostra que haacute um equiacutevoco quanto a esta

interpretaccedilatildeo uma vez que no capiacutetulo XI v 1 do livro de Gecircnesis a Biacuteblia

12

A Lei de Grimm analisou sobre o vieacutes da fonologia as relaccedilotildees que havia entre as liacutenguas indo-

europeias As similaridades entre o alematildeo claacutessico grego e inglecircs antigo eram previstas a partir de leis foneacuteticas i) as consoantes oclusivas surdas (p t k kw) do PIE mudaram em fricativas surdas correspondentes (f θ h hw) nas liacutenguas germacircnicas ii) as consoantes oclusivas sonoras (bdggw) do PIE mudaram em oclusivas surdas correspondentes (p t k kw) nas liacutenguas germacircnicas iii) as consoantes aspiradas sonoras (bh dh gh gwh) do PIE mudaram em oclusivas natildeo-aspiradas sonoras correspondentes (bdggw) nas liacutenguas germacircnicas (GABAS JR 2008 p 78) 13

ECO Humberto A busca da liacutengua perfeita Traduccedilatildeo de Antonio Angonese Bauru Edusc

2001

56

discorre sobre a existecircncia de uma uacutenica genealogia de uma mesma liacutengua e de

uma mesma fala

Diferentemente no capiacutetulo que antecede a narrativa de Babel a proacutepria Biacuteblia

aponta para a existecircncia de famiacutelias linguiacutesticas distintas conforme Gecircnesis 11

v 5 Por estes foram repartidas as ilhas dos gentios nas suas

terras cada qual segundo a sua liacutengua segundo as suas

famiacutelias entre as suas naccedilotildees

v20 Estes satildeo os filhos de Catildeo segundo as suas famiacutelias

segundo as suas liacutenguas em suas terras em suas naccedilotildees

v 31 Estes satildeo os filhos de Sem segundo as suas famiacutelias

segundo as suas liacutenguas nas suas terras segundo as suas

naccedilotildees

Uma explicaccedilatildeo para tal passagem se daacute a partir da perspectiva dos filoacutesofos

gregos que concebiam os povos que falava de forma diferente como bagraverbaroi

seres que balbuciavam falando de forma incompreensiacutevel Logo acreditavam que

aqueles outros eram serem inferiores que natildeo falavam a liacutengua verdadeira da

razatildeo e do pensamento o logos

Tal conflito entre as liacutenguas existentes apontam para uma poliacutetica linguiacutestica que

muito explica a hierarquia (status) linguiacutestica ainda hoje atuante O status

linguiacutestico resultante das relaccedilotildees assimeacutetricas entre sociedades ou subgrupos de

uma sociedade decorre tambeacutem das circunstacircncias e condiccedilotildees que envolvem o

contato linguiacutestico Esse por sua vez evolue da dinacircmica proacutepria do processo em

que ocorrem conflitos e acomodaccedilotildees e que pode derivar pidgins crioulos e

mudanccedila linguiacutestica

57

No reconhecimento de um universo entrelaccedilado compartilhamos com o ponto de

vista de Eco (2001) e assumimos a ideia de que a existecircncia de cada liacutengua e de

sua historicidade eacute reveladora do entendimento do mundo

ldquoCada liacutengua constitui um determinado modelo de Universo um sistema semioacutetico de compreensatildeo do mundo e se temos quatro mil modos diferentes de descrever o mundo isto nos torna mais ricos Deveriacuteamos nos preocupar pela preservaccedilatildeo das liacutenguas tal como nos preocupamos com a ecologiardquo (ECO 2001 p234)

32 SOBRE O CONTATO LINGUIacuteSTICO

Pouco eacute sabido sobre o contato entre as liacutenguas do mundo quando diante da

imensidatildeo que eacute o universo linguiacutestico com o qual nos deparamos14 A

necessidade que os humanos tecircm de se comunicarem a partir do momento que a

interaccedilatildeo foi estabelecida eacute condiccedilatildeo imprescindiacutevel para o contato linguiacutestico

Trask (2004 p 66) afirma que poucas liacutenguas estatildeo - ou estiveram -

suficientemente isoladas para evitar todo tipo de proximidade e portanto toda

liacutengua mostra alguma prova de um contato antigo ou moderno entre liacutenguas

Thurston (1987 p 34) afirma que

toda liacutengua deve ter sofrido alguma influecircncia de seus vizinhos em um determinado ponto e tempo Para ele todos os idiomas satildeo liacutenguas mistas na medida em que todos copiaram formas lexicais e outros recursos linguumliacutesticos de liacutenguas vizinhas

Embora natildeo saibamos exatamente como se deu o contato entre as liacutenguas do

mundo as evidecircncias do contato podem ser observadas de forma objetiva

atraveacutes de empreacutestimos lexicais O contato linguiacutestico entretanto natildeo se reduz

14

Eacute estimado o nuacutemero de sete mil liacutenguas vivas atualmente ao redor do mundo (httpwwwethnologuecomworld Em 21 de janeiro de 2015)

58

apenas a itens lexicais oriundos dos empreacutestimos entre culturas distintas com

base na dominaccedilatildeo na expansatildeo do comeacutercio ou em qualquer circunstacircncia que

promova a necessidade de comunicaccedilatildeo entre culturas de liacutenguas diferentes

O contato a depender das liacutenguas envolvidas pode trazer consequecircncias muito

devastadoras Em casos extremos o impacto do contato pode ser avassalador

fazendo com que uma das liacutenguas seja extinta quer seja pelo deslocamento

linguiacutestico que seja pelo etnociacutedio Nestes casos ocorre a morte de uma das

liacutenguas em contato aspecto que discorremos na seccedilatildeo sobre as consequecircncias

do contato

No tocante aos efeitos do contato em relaccedilatildeo aos niacuteveis linguiacutesticos Trask Idem

afirma que o contato linguiacutestico pode ir mais longe que a interferecircncia lexical

afetando a gramaacutetica e a pronuacutencia

Concordando com o que afirma Trask Thomason postula que embora seja senso

comum que o resultado mais comum da mescla linguiacutestica seja o empreacutestimo de

palavras este eacute apenas a consequecircncia mais comum quando se trata da

intersecccedilatildeo linguiacutestica

When the agents of change are fluent speakers of the receiving language the first and redominant interference features are lexical items belonging to the nonbasic vocabulary later under increasingly intense contact conditions structural features and basic vocabulary may also be transferred from one language to the other (THOMASON 2001 p 36)

Natildeo obstante podem-se detectar exemplos de transferecircncias em todos os

aspectos linguiacutesticos uma vez que todos os niacuteveis da estrutura linguiacutestica satildeo

59

possiacuteveis de serem transferidos entre idiomas muacutetuos sem qualquer tipo de

restriccedilatildeo dadas as possibilidades de conjunturas sociais e estruturais

Quando as liacutenguas entram em contato as suas gramaacuteticas tambeacutem satildeo

intercruzadas Tal processo natildeo eacute algo simples e justo Diversos fatores externos

satildeo responsaacuteveis por esta miscelacircnea que devido a tais fatores nem sempre eacute

concebida de forma inocente

Em meio a condicionantes sociolinguiacutesticas assumimos que as gramaacuteticas

(sendo tambeacutem reflexo das relaccedilotildees intersocietaacuterias) entram num jogo em que

as peccedilas satildeo acomodadas de acordo com as necessidades comunicativas dos

interlocutores (GILES e CUPLAND 1991) Em meio a esse ldquojogordquo nos importa

refletir como os fenocircmenos que emergem do contato entre liacutenguas podem refletir

questotildees que envolvem a marcaccedilatildeo e universais linguiacutesticos

Para Aikhenvald (2007 p1)

As liacutenguas podem assemelhar-se umas as outras em categorias construccedilotildees e significados e nas formas reais usadas para expressaacute-las As categorias podem ser semelhantes porque satildeo universais e cada liacutengua tem alguma forma de fazer uma pergunta ou a elaboraccedilatildeo de um comando Ocasionalmente duas liacutenguas compartilham a forma por pura coincidecircncia

A literatura linguiacutestica atesta que a semelhanccedila interlinguiacutestica motiva estudos

tipoloacutegicos haacute deacutecadas (CROFT 1990 COMRIE 1989 WHALEY 1997) Embora

liacutenguas apresentem padrotildees regulares de desemelhanccedilas aquelas podem ser

agrupadas em tipos baacutesicos Essa realidade induz a reflexatildeo acerca da existecircncia

de universais linguiacutesticos

60

As liacutenguas individuais independentemente das semelhanccedilas tipoloacutegicas eou

geneacuteticas observadas entre elas satildeo sujeitas a mudanccedilas continuadas que

ocorrem tambeacutem devido ao contato linguiacutestico Para Thomason (2001 p14) as

influecircncias e consequecircncias do contato linguiacutestico satildeo descritas em trecircs niacuteveis i)

mudanccedila induzida pelo contato ii) mescla linguiacutestica extrema o que resulta em

pidgin crioulo e liacutenguas biliacutengues e iii) morte da liacutengua

A seguir abordaremos fenocircmenos decorrentes do contato linguiacutestico

33 MESCLAS DE CONTATO PIDGIN CRIOULO LIacuteNGUA FRANCA E JARGAtildeO

Um ponto saliente dos estudos sobre o contato linguiacutestio eacute o conceito de

ldquomescla15rdquo Este termo utilizado por Tarallo e Alkimin (1987 p7) descreve a

relaccedilatildeo entre as liacutenguas e seus resultados Inicialmente eles chamam a atenccedilatildeo

para o fato de a mescla ser interpretada como algo impuro definhamento

deterioraccedilatildeo Esta impureza linguiacutestica historicamente levou a sociedade a

alimentar a ideia de contaminaccedilatildeo e obviamente construir a discriminaccedilatildeo

linguiacutestica

Ao pensarmos sobre o processo de simbiose que as coisas e os elementos do

mundo estatildeo sujeitos em todo o tempo podemos ter uma ideia clara de que o

processo de amaacutelgama eacute proacuteprio natildeo apenas da natureza linguiacutestica mas de tudo

o que pode existir Apesar disso as mesclas com graus niacuteveis e saliecircncias

variadas nem sempre satildeo refletidas ou percebidas pelos usuaacuterios das liacutenguas do

15 Mescla eacute mistura contato amaacutelgama etc Tarallo e Alkimin (1987 p7)

61

mundo Focalizando a natureza da mescla o estudo das liacutenguas por seu turno

seja sincrocircnico ou diacrocircnico pode evidenciar os fenocircmenos do contato nos

diferentes niacuteveis linguiacutesticos

Tarallo e Alkimin (idem p9) salientam que o dinamismo linguiacutestico se daacute nas

ldquocomunidades de falardquo16 Eacute nelas e entre elas que se concretizam o contato

linguiacutestico que por sua vez produzem fenocircmenos de mescla ou de convivecircncia

coexistecircncia mecanismo ativado pelos indiviacuteduos que integram tais comunidades

Esse fato se alinha agrave perspectiva de que uma comunidade de fala natildeo eacute em

absoluto homogecircnea Nela podem coexistir processos de ordem interna e

externa assim como forccedilas centriacutefugas e centriacutepetas (BAKHTIN 2010)17

A dinacircmica social eacute tambeacutem pontuada por Tarallo e Alkimin (ibidem p9) Esses

autores mencionam que a mescla linguiacutestica resultante da dinacircmica pode ser

intracomunidade ou intercomunidade No primeiro caso as variantes convivem

eou se entrecruzam em uma mesma comunidade de fala em que apenas uma

liacutengua eacute falada No segundo liacutenguas distintas coexistem e se misturam em uma

mesma comunidade Como exemplo de mesclas intracomunidades podemos citar

o portuguecircs e suas variantes questotildees geograacuteficas histoacutericas e sociais Satildeo

variantes que convivem ldquopacificamenterdquo em territoacuterio nacional Jaacute para as mesclas

intercomunidades tomemos o exemplo do conviacutevio do portuguecircs e demais liacutenguas

16

Labov (1972) conceitua comunidade de fala como grupo de falantes que segue as mesmas normas relativas ao uso da liacutengua Para Romaine (2000) trata-se de um grupo de falantes que natildeo compartilham necessariamente a mesma liacutengua poreacutem compartilham um conjunto de normas

e regras no uso da liacutengua 17

Bakhtin aponta a luta entre classes as forccedilas que agem de dentro para fora do sujeito ou das instituiccedilotildees assim como as forccedilas que agem fazendo o movimento oposto Eacute imprescindiacutevel vislumbrar o poder poliacutetico que a liacutengua tem

62

(alematildeo polonecircs e italiano) na regiatildeo sul bem como a coexistecircncia espaccedilo-

temporal entre diferentes liacutenguas indiacutegenas e entre elas e a liacutengua portuguesa

Ao discutir a mescla linguiacutestica sob a eacutegide do contato linguiacutestico Calvet (2004

p35) considera que haacute aproximadamente na Terra cerca de 5000 liacutenguas e

cerca de 150 paiacuteses Com base nesses nuacutemeros o autor nos diz que cada paiacutes

poderia ter 30 liacutenguas Apesar de em termos reais a distribuiccedilatildeo das liacutenguas natildeo

corresponder a esse cenaacuterio o pesquisador aponta para o fato de

que o mundo eacute pluriliacutengue em cada um de seus pontos e que as comunidades linguiacutesticas se costeiam se superpotildeem continuamente O plurilinguismo faz com que as liacutenguas estejam constantemente em contato O lugar desses contatos pode ser o indiviacuteduo (biliacutengue ou em situaccedilatildeo de aquisiccedilatildeo) ou a comunidade Idem (2002 p 35)

Os dados de Calvet deixam claro que desde sempre o contato linguiacutestico eacute uma

realidade da vivecircncia do humano Os acontecimentos histoacutericos de guerra

expansatildeo e colonizaccedilatildeo apontam para a mescla linguiacutestica Diante deste

contexto vemos que o relacionamento entre as liacutenguas do mundo eacute um processo

feacutertil para a diversidade linguiacutestica Outro aspecto de interesse decorre do fato de

o contato permitir a emergecircncia de padrotildees estruturais os quais trazem luzes

para a compreensatildeo da faculdade da linguagem

A depender do contato podemos avaliar diferentes fenocircmenos resultantes A

intensidade o contato linguiacutestico pode derivar instrumentos mais ou menos

elaborados de comunicaccedilatildeo definidos como jargatildeo pidgin e crioulo

63

Os primeiros estudiosos a se aterem sobre o estudo das liacutenguas pidgins e

crioulas se utilizaram dos dados (relatos) de missionaacuterios e comerciantes que

viajaram e mantiveram contato com as aacutereas das mesclas18

331 Pidgin

O termo pidgin foi usado pela primeira vez em 1850 para conceituar o conviacutevio do

inglecircs e o chinecircs19 Mas outras duas hipoacuteteses tambeacutem satildeo colocadas quando

se trata de pidgin A segunda afirma que o termo fora transportado da Ameacuterica do

Sul no iniacutecio do seacuteculo XVII pelos marinheiros e comerciantes ingleses da colocircnia

de Leigh ao estabelecerem contato com os iacutendios Pidiam A terceira explicaccedilatildeo eacute

a origem a partir da palavra portuguesa ocupaccedilatildeo que teria sofrido algumas

mudanccedilas foneacuteticas ateacute resultar em pidgin (TARALLO e ALKMIN 1987 p80)20

Para Couto (2001 p 1) o pidgin eacute uma liacutengua com uma reduccedilatildeo draacutestica da

gramaacutetica Esta reduccedilatildeo se daacute sobre a morfologia e o leacutexico Natildeo eacute liacutengua

materna de ningueacutem pois entre si os povos dominados soacute falam suas respectivas

liacutenguas ao passo que os dominadores nunca se datildeo ao trabalho de falar outra

liacutengua que natildeo a sua proacutepria

Crystal (2008 p 201) afirma que aleacutem do processo de reduccedilatildeo para o

surgimento do pidgin as comunidades de falas envolvidas neste processo

18

Tarallo e Alkimin 1987 p 109-114 citam Francisco Adolfo Coelho Hugo Schuchardt e Dirk Christiaan Hesseling como os pioneiros neste campo de estudo Este uacuteltimo atribui aos escravos europeus a forccedila linguiacutestica Foram eles (os escravos) os responsaacuteveis pelas alteraccedilotildees sofridas pelas liacutenguas maternas 19

Neste caso o termo business ao ser empregada na expressatildeo do pidgin chinecircs de base inglesa

dɛacuteju pidzIn significando thatrsquos your business 20

Ocupaccedilatildeo gt parsquosaw ou pasaɳ

64

necessitam cada uma delas se aproximarem sucessivamente dos traccedilos mais

oacutebvios da outra liacutengua Trata-se de uma intersecccedilatildeo nem sempre consciente mas

motivada por aspectos econocircmicos como o comeacutercio Daiacute o grande surgimento de

pidgins em aacutereas de intenso comeacutercio e desenvolvimento econocircmico

Dubois et all (1998 p 469) discorre que o pidgin mesmo natildeo sendo uma liacutengua

em si mesma eacute um sistema mais completo que o sabir pois seu vocabulaacuterio

cobre numerosas atividades O sabir ou liacutengua franca21 por sua vez eacute um

sistema linguiacutestico reduzido a algumas regras de combinaccedilatildeo e ao vocabulaacuterio de

determinado campo lexical

Ainda de acordo com Tarallo e Alkmin (1987 p 88)

Fontes histoacutericas indicam que no tempo das cruzadas nas regiotildees de batalhas entre mulccedilumanos e cristatildeos teria florescido uma liacutengua de contato denominada Liacutengua Franca ou sabir Com documentaccedilatildeo precaacuteria a existecircncia dessa liacutengua eacute contestada por alguns estudiosos Originalmente usada entre aacuterabes e europeus essa liacutengua teria se expandido tendo sido usada ao longo da costa do Mediterracircneo especialmente na Aacutefrica do Norte

Em Trask (2004 p228) o conceito de liacutengua franca eacute mais explorado Para ele a

liacutengua franca se distingue do pidgin quando por ventura um dos grupos

ldquoaprenderdquo a liacutengua do outro Neste caso a gramaacutetica e o leacutexico de uma

21

Na atualidade conforme Tarallo e Alkmin 1987 p 90 a expressatildeo liacutengua franca refere-se a um

fenocircmeno mais amplo a mescla de contato para intercomunicaccedilatildeo em situaccedilotildees biliacutengues e pluriliacutengues Como exemplo os autores citam a liacutengua wolof no Senegal do swahili no Quecircnia na Tanzacircnia e em Comores do Tucano no Nordeste da Amazocircnia

65

sobressaem agrave outra O pidgin eacute compreendido entatildeo como uma colcha de

retalhos que permite uma forma bastante rudimentar de comunicaccedilatildeo22

Ainda de acordo com Trasky (p229) um pidgin pode seguir caminhos distintos i)

ele pode cair em desuso ii) ele pode continuar em uso por vaacuterias geraccedilotildees e

durar seacuteculos iii) ele pode sofre algumas alteraccedilotildees e se transformar em liacutengua

materna Neste uacuteltimo caso trata-se do processo de crioulizaccedilatildeo do qual

abordaremos mais agrave frente

Hall apud Tarallo e Alkmin (1987 p 86) ao tratar do caraacuteter reducionista que o

pidgin apresenta em sua estrutura e leacutexico aponta algumas caracteriacutesticas que

definem tais simplificaccedilotildees

Niacutevel fonoloacutegico ndash o nuacutemero de contrastes empregados eacute reduzido As vogais representadas satildeo em geral as chamadas vogais cardinais (a e i o u) enquanto os grupos consonantais satildeo caracteristicamente evitados

Niacutevel morfoloacutegico ndash ausecircncia de algumas categorias flexionadas como gecircnero nuacutemero e tempo verbal

Niacutevel sintaacutetico ndash as estruturas sentenciais satildeo simples as sequecircncias tendem a ser coordenadas evitando-se as estruturas complexas e subordinaccedilatildeo extensiva

Niacutevel lexical ndash nuacutemero reduzido de vocaacutebulos cuja accedilatildeo se norteia pela extensatildeo de significados e por polissemias significativas

332 Crioulo

O crioulo eacute um pidgin consolidado Quando os falantes crianccedilas oriundos dessa

mescla linguiacutestica utilizam o pidgin como uacutenica liacutengua ou a liacutengua que passa a

ganhar mais evidecircncia esta se consolida como liacutengua materna

22

Conforme Tarallo e Alkmin (idem p 8) algumas caracteriacutesticas do pidgin satildeo i) seu caraacuteter

auxiliar e secundaacuterio para os dois grupos cada um dos grupos manteacutem sua proacutepria liacutengua no conviacutevio social do cotidiano e do habitual ii) as liacutenguas pidgin preenchem funccedilotildees sociais limitadas sobretudo aquelas vinculadas a atividades comerciais mercantilistas

66

Para Couto (2001 p2)

Liacutengua crioula eacute um pidgin que foi adquirido como liacutengua nativa como preconiza a chamada teoria da nativizaccedilatildeo De acordo com essa concepccedilatildeo o crioulo eacute um ex-pidgin ou seja um pidgin que virou liacutengua materna de uma comunidade

Ainda para Tarallo e Alkmin (1987 p 95) as liacutenguas crioulas constituem um

conjunto de liacutenguas cuja histoacuteria conhecida eacute ligada a uma situaccedilatildeo de contato

entre populaccedilotildees linguiacutesticas cultural e etnicamente distintas Estas satildeo

distinguidas das liacutenguas pidgin por possuiacuterem uma comunidade de falantes

nativos e consequentemente por desempenharem funccedilotildees sociais amplas como

qualquer liacutengua natural

Em Dubois et all (1998 p 161) daacute-se o nome de crioulos a sabires pseudo-

sabires ou pidgins que por motivos diversos de ordem histoacuterica ou sociocultural

se tornaram liacutenguas maternas de toda uma comunidade

As liacutenguas tipo pidgin de acordo com autores como Tarallo e Alkimin (1987 p

96) aleacutem de serem as liacutenguas que daratildeo origem aos crioulos (pois todo crioulo se

origina de um pidgin embora nem todo pidgin se transforme em crioulo) satildeo

associadas a atividades de comeacutercio enquanto os crioulos satildeo marcados pela

relaccedilatildeo de escravidatildeo

Quanto ao aspecto funcional as liacutenguas crioulas datildeo conta das necessidades

comunicativas totais de seus falantes nativos e usuaacuterios uma vez que a

passagem do estaacutegio de pidgin a crioulo eacute marcada por uma ampliaccedilatildeo do leacutexico

67

e de estrutura Neste caso para os estudiosos os crioulos nada mais satildeo que

pidgins enriquecidos23

O processo de evoluccedilatildeo de um pidgin em crioulo eacute descrito por Hall (1996 p 4)

em um diagrama Nele podemos ver que inicialmente o pidgin eacute configurado a

partir de um jargatildeo uma espeacutecie de pidgin instaacutevel Depois o pidgin ganha

estabilidade se configurando como um preacute-crioulo Por fim jaacute estabilizado o

pidgin se transforma em crioulo

Figura 1 Diagrama de Hall

LL = Liacutengua lexificadora ou de superstrato LS = Liacutengua de Substrato

De acordo com Hall (idem p 5) a evoluccedilatildeo do jargatildeo para o pidgin estaacutevel eacute

chamada de pidginizaccedilatildeo A evoluccedilatildeo do pidgin estaacutevel para o crioulo eacute

23

Valdman apud Tarallo e Alkimin 1987 p 96 cita um conjunto de traccedilos negativos dos crioulos franceses do Haiti de Guadalupe Martinica Reuniatildeo Mauriacutecio Seychelles e Rodrigues como i) ausecircncia de distinccedilatildeo de gecircnero ii) natildeo-obrigatoriedade de marcador de plural iii) verbos natildeo-flexionados iv) relacionamento parataacutetico no interior do sintagma nominal v) ausecircncia de hipotaxe vi) construccedilotildees passivas vii) vogais arredondadas viii) certos grupos consonantais

I = LL + LS pidgin instaacutevel jargatildeo

crioulo = III II = pidgin estaacutevel

68

denominada crioulizaccedilatildeo A volta do crioulo para o jargatildeo processo tambeacutem

possiacutevel eacute conhecido como descrioulizaccedilatildeo

Obviamente o crioulo eacute consequecircncia natural de situaccedilotildees de contato No

entanto nem todo contato linguiacutestico gera automaticamente um pidgin ou um

crioulo Os contatos podem daacute origem a fenocircmenos de mesclas diversas que

podem ou natildeo desaparecer ou serem absorvidas pelas liacutenguas presentes na

alquimia (TARALLO e ALKMIN 1987 p 103)

Quanto ao processo de desenvolvimento e de formaccedilatildeo de um pidgin e de

crioulos Hymes (1971 p 93) afirma que

A pidginizaccedilatildeo e a crioulizaccedilatildeo da linguagem natildeo satildeo processos marginais ao contraacuterio satildeo processos que ocorrem nas liacutenguas em geral Tais processos de natureza bastante complexa compreendem a ocorrecircncia de outros subprocessos os de mudanccedila A incidecircncia desses processos ocorre principalmente 1) na forma interna das liacutenguas (fala-se assim em reduccedilatildeo ou expansatildeo) 2) na forma externa das liacutenguas (daiacute se falar em amplificaccedilatildeo e complicaccedilatildeo) 3) no escopo de uso (o domiacutenio) de uma variedade linguiacutestica (fala-se assim em restriccedilatildeo ou extensatildeo)

Hymes (idem p 94) ainda explica que diferentemente da posiccedilatildeo claacutessica onde

um crioulo era oriundo (ou natildeo) de um pidgin nesta segunda proposta a

evoluccedilatildeo de um pidgin natildeo produz necessariamente um crioulo mas um conjunto

de variedades concorrentes chamada de contiacutenuo preacute-pidgin24

24

Para Hymes o contiacutenuo preacute-pidgin poderia evoluir e gerar a cristalizaccedilatildeo de um pidgin e teria autonomia enquanto sistema de comunicaccedilatildeo Com base nesta assertiva um pidgin seria o resultado de um processo que ganharia autonomia Esse pidgin constituiacutedo poderia se transformar em crioulo Mas o contiacutenuo preacute-pidgin natildeo evolui para um pidgin Torna-se possiacutevel supor a cristalizaccedilatildeo de um crioulo sem a existecircncia de um pidgin anterior (TARALLO E ALKMIN 1987 p 105)

69

Na concepccedilatildeo final deste autor o contexto inicial em que fora estabelecido o

contiacutenuo preacute-pidgin poderia alccedilar trecircs resultados aceitaacuteveis i) a cristalizaccedilatildeo de

um pidigin ii) a cristalizaccedilatildeo de um pidgin que se criouliza iii) a cristalizaccedilatildeo de

um crioulo sem necessariamente ter sido oriundo de um pidgin anterior

Tarallo e Alkimin (1987 p 106) afirma que a cristalizaccedilatildeo de um crioulo eacute apenas

uma das trecircs possibilidades para a mescla de contato que pode ser descrita da

seguinte forma i) o crioulo pode submergir ii) o crioulo pode se estabilizar sem

muitas variaccedilotildees iii) o crioulo pode se mesclar com liacutengua padratildeo oficial

De acordo com o que vimos ateacute aqui podemos descrever o processo de

hibridizaccedilatildeo linguiacutestica com base na mescla a partir dos seguintes estaacutegios i)

contiacutenuo preacute-pidgin ii) pidgin cristalizado iii) pidgin em processo de

despidginizaccedilatildeo iv) pidgin em processo de crioulizaccedilatildeo v) crioulo cristalizado vi)

crioulo em processo de descrioulizaccedilatildeo (contiacutenuo poacutes-crioulo)

333 Liacutengua Franca ou Sapir

O termo liacutengua franca refere-se agrave liacutengua de contato entre grupos ou membros de

grupos de liacutenguas distintas com finalidade para o comeacutercio Durante o Impeacuterio

Romano o grego serviu como liacutengua franca no oriente e no milecircnio seguinte o

latim no ocidente Esta liacutengua (o sapir) tambeacutem eacute conhecida como liacutengua de

marinheiro No mundo moderno o inglecircs desempenha este papel ao ser

considerado como liacutengua do comeacutercio e das ciecircncias

70

Devido agrave natureza colonizadora dos falantes suas liacutenguas serviram de liacutengua

franca em certos momentos da histoacuteria Eacute o caso do portuguecircs e do espanhol

durante a expansatildeo mariacutetima e do francecircs durante o seacuteculo VII

Trask (2004 p 167) relata que a expressatildeo lingua franca fora originadamente

utilizada para as liacutenguas dos francos francocircnio mas teve o sentido modificado

assumindo o sentido de liacutengua europeia ou liacutengua cristatilde Ele ainda assegura que

a liacutengua franca

era uma variedade de italiano fortemente suplementada com palavras derivadas do francecircs do espanhol do grego do aacuterabe e do turco que se usava como liacutengua do comeacutercio no Mediterracircneo oriental no final da Idade Meacutedia Desde entatildeo a denominaccedilatildeo aplica-se a toda liacutengua que desfruta de um amplo entre falantes de um grande nuacutemero de liacutenguas numa dada regiatildeo

No presente o termo eacute utilizado para designar uma liacutengua estabelecida haacute algum

tempo tida como materna em um grupo influente e que serve de comunicaccedilatildeo

entre os falantes de outras liacutenguas como por exemplo o papel que o inglecircs

exerce em Cingapura

Atualmente aleacutem do inglecircs inuacutemeras liacutenguas servem de liacutengua franca para

comunicaccedilatildeo entre os povos como por exemplo o tupi No entanto um caso que

merece destaque eacute o do esperanto liacutengua que vem sendo incorporada no mundo

desde a deacutecada de 80 com a finalidade de ser a liacutengua franca universal Vale

ressaltar que neste caso os interesses para que tal liacutengua se propagasse

eficientemente eacute diferente das liacutenguas francas da Idade Meacutedia uma vez que se

trata de uma liacutengua artificial criada com ideologias poliacuteticas filosoacuteficas e

religiosas

71

334 Jargatildeo

O jargatildeo eacute um pidgin instaacutevel Sua concepccedilatildeo se aproxima do sabir ou liacutengua

franca Romaine (2000 p182) faz uso desse termo para exemplificar o processo

de criaccedilatildeo de um crioulo

A simplificaccedilatildeo e a instabilidade satildeo as marcas mais salientes de um jargatildeo No

pidgin as normas satildeo mais estaacuteveis enquanto que no jargatildeo as normas natildeo satildeo

afixadas Segundo esta autora eacute a partir do jargatildeo que a mescla linguiacutestica se

configura

Figura 2 Configuraccedilotildees da Mescla Linguiacutestica segundo Romaine (2000 p185)

Tipo 1 Jargatildeo

Tipo 2 Jargatildeo

Tipo 3 Jargatildeo

Pidgin estabilizado

Pidgin estabilizado

Pidgin expandido

Crioulo

Crioulo

Crioulo

No tipo 1 o jargatildeo deu origem diretamente a um crioulo De forma diferente no 2

o crioulo natildeo se originou diretamente de um jargatildeo Este deu origem a um pidgin

estabilizado para posteriormente chegar a um crioulo No tipo 3 o jargatildeo evolui

se transformando em um pidgin estabilizado depois em um pidgin expandido ateacute

chegar a um crioulo O fato eacute que a origem nos trecircs casos estaacute em um jargatildeo

72

34 IMPLICACcedilOtildeES DO CONTATO LINGUIacuteSTICO

Todo contato resulta em processos linguiacutesticos que alteram e dinamizam as

liacutenguas do mundo que passam por transformaccedilotildees que advecircm tanto da sua

motivaccedilatildeo interna quanto da externa No que tange agraves motivaccedilotildees externas

podemos afirmar que satildeo os contatos os grandes responsaacuteveis por muitas dessas

transformaccedilotildees podendo resultar enoutros processos orirundos ou que se

assentam no contato

341 Bilinguismo

Os estudos e as correntes linguiacutesticas na sua maioria tecircm como base liacutenguas

uacutenicas ou comunidades monoliacutengues Contudo o bilinguismo ocorre amplamente

atraveacutes do mundo e permanece apresentando um leque de questionamento para

a comunidade cientiacutefica atual Embora natildeo seja de hoje o questionamento em

torno do bilinguismo25 soacute agora podemos vislumbrar o descortinar desse tema

Estudiosos do passado jaacute reconheciam a relevacircncia do fenocircmeno Jakobson

(1953) por exemplo assumiu que ldquobilingualism is for me the fundamental problem

of linguiacutesticsrdquo

Romaine (1995 p6) elenca alguns questionamentos com base no que deve ser

observado ao estudar o contato linguiacutestico

O que eacute que o desempenho dos falantes diante do processo biliacutengue nos diz

sobre a competecircncia de pessoas e das comunidades multiliacutengues

25

Do inglecircs bilingualism

73

Eacute a troca de elementos linguiacutesticos por acaso comportamento linguiacutestico e o

cacircmbio linguiacutestico aleatoacuterio

Isto eacute indicativo de fluecircncia pobre e inabilidade em uma ou ambas as liacutenguas em

outras palavras o resultado de competecircncia imperfeita

Ao contraacuterio com qual criteacuterio medimos a competecircncia dos biliacutengues

Pode-se distinguir entre troca empreacutestimo e interferecircncia linguiacutestica

Satildeo a mudanccedila de coacutedigo e o bilinguismo generalizado em uma comunidade

sinais de atrito de uma liacutengua minoritaacuteria

Satildeo os sistemas de idiomas que estatildeo disponiacuteveis para um indiviacuteduo biliacutengue

fundidos ou separados

Aleacutem desses questionamentos outros de base sociofilosoacutefica tambeacutem estatildeo

inseridos nos estudos sobre o bilinguismo Para alguns pesquisadores muitas

liacutenguas minoritaacuterias foram exterminadas devido agrave forte influecircncia e agrave troca

linguiacutestica No entanto mesmo sendo acusado por estes como um passo para o

extermiacutenio das liacutenguas minoritaacuterias o bilinguismo natildeo deve ser visto como o

responsaacutevel pela extinccedilatildeo pelo contraacuterio o estudo dele aliado ao conhecimento

metacognitivo poderatildeo contribuir para o salvamento de muitas dessas liacutenguas

ainda que no plano escrito jaacute que na oralidade muitas natildeo gozam do status de

suas liacutenguas como oficiais nas atividades sociais sendo relegadas aos rituais de

suas sociedades

O comportamento linguiacutestico de uma determinada sociedade natildeo pode servir

unicamente de paracircmetro para outras Assim se algumas comunidades

apresentam mais facilidade em absorver outra forma linguiacutestica umas tecircm maior

resistecircncia enquanto que outras convivem por centenas de anos lado a lado com

determinadas liacutenguas

74

O bilinguismo tambeacutem pode ser classificado como social ou individual Segundo

Appel e Muysken (1986) o bilinguismo social ocorre quando em determinada

sociedade duas ou mais formas linguiacutesticas satildeo faladas quando cedo toda

sociedade se torna biliacutengue mas elas podem se tornar diferentes no que se

relaciona ao niacutevel ou forma de bilinguismo conforme figura abaixo

Figura 3 Esquema de representaccedilatildeo do bilinguismo social segundo Appel e Muysken

(1986)26

De acordo com a figura na comunidade I as duas liacutenguas satildeo faladas por dois

diferentes grupos monoliacutengues No entanto um grupo reduzido de falantes

biliacutengues seraacute necessaacuterio para fazer a comunicaccedilatildeo entre os grupos Esta forma

de bilinguismo social geralmente ocorre no periacuteodo colonial dos paiacuteses Pode-se

tomar por exemplo o Brasil quando os portugueses aqui chegaram

Em sociedades representadas pela forma II todos os falantes satildeo biliacutengues Em

paiacuteses como Aacutefrica Iacutendia e Brasil existem muitas sociedades totalmente

biliacutengues em que os falantes dominam as duas formas linguiacutesticas existentes

26

Apud Appel e Muysken (1986) p 2

75

Na forma III um grupo dessa comunidade eacute biliacutengue enquanto a outra eacute

monoliacutengue sendo este grupo na maioria das vezes a minoria Pois geralmente

o grupo biliacutengue eacute o dominante e o outro o dominado Tal circunstacircncia eacute tiacutepica

das assimetrias comuns nas relaccedilotildees entre os sujeitos do contato Situaccedilatildeo

como essa evidencia o papel da liacutengua para uma sociedade a qual pode ser

objeto de libertaccedilatildeo e tambeacutem de dominaccedilatildeo

Como dito anteriormente estas formas de bilinguismo social natildeo satildeo uniformes

nem tatildeo pouco refletem em detalhe de todas as existentes no interior das

sociedades Em muitas comunidades a situaccedilatildeo linguiacutestica eacute extremamente

complexa com mais de dois grupos e linguagens envolvidos

Com relaccedilatildeo aos aspectos linguiacutesticos o estudo do bilinguismo pode responder e

explicitar os fenocircmenos decorrentes da situaccedilatildeo do contato Fenocircmenos no

domiacutenio do leacutexico ou da sintaxe podem ser muito produtivos Entretanto podemos

considerar que eacute o niacutevel da foneacuteticafonologia que marcadamente sofre a

interferecircncia com o contato linguiacutestico

No contato duas ou mais formas linguiacutesticas podem perdurar por anos conforme

os quadros I e III na figura 3 No entanto alguns fenocircmenos linguiacutesticos podem

ocorrer paralelamente Um embate linguiacutestico pode surgir dentro dessas

comunidades linguiacutesticas e estas liacutenguas podem cambiar o leacutexico uma da outra

Sobre isso Bloomfield (1961 p 25) classifica esses empreacutestimos em iacutentimos

culturais e dialetais

76

O empreacutestimo externo ou cultural sempre eacute motivado por contatos poliacutetico sociais

e comerciais inclusive militares sempre com a dominaccedilatildeo de um dos povos Jaacute

os empreacutestimos dialetais se datildeo entre os contatos dentro de uma mesma liacutengua

satildeo as variantes regionais

O que particularmente nos interessa - o empreacutestimo iacutentimo - ocorre quando as

duas liacutenguas passam a conviverem no mesmo campo geograacutefico Dessa forma

se a liacutengua A domina a liacutengua B poderatildeo ocorrer trecircs hipoacuteteses i) B desaparece

e deixa um substrato em A ii) A desaparece e deixa um superstrato em B iii)

permanecem as duas trocando elementos na condiccedilatildeo de adstrato No entanto

natildeo devemos esquecer que as motivaccedilotildees pelas quais os falantes se apropriam

ou satildeo obrigados a se apropriarem para adquirem outra(s) liacutengua(s) extrapolam

os aspectos aqui vislumbrados

Os exemplos dados por Romaine (1995 p 2) demonstram como pode ocorrer o

cacircmbio linguiacutestico entre a liacutengua materna e a liacutengua adquirida posteriormente A

partir desses exemplos a estudiosa elenca os questionamentos mais relevantes

que deveratildeo ser observados em pesquisas que tratam da anaacutelise das

comunidades biliacutengues

(a) Kio Ke six sevem hours te school de vie spend karde ne they are speaking English all the time (Panjabi Inglecircs)

Because they spend six or seven hours a day at school they are speaking English all the time27

(b) Will you rubim off Ol man will come (Tok Pisin Inglecircs)

27

ldquoPorque eles passam seis ou sete horas por dia na escola eles estatildeo falando inglecircs o tempo todordquo

77

Will you rub [that off the blackboard] The men will come28

(c) Sano esttaacute tulla tanne ettaacute Iacutem very sick (Finlandecircs Inglecircs)

Tell them to come here that Iacutem very sick 29

(d) Kodomotachi liked it (Japonecircs Inglecircs)

The children liked it 30

(e) Won o arrest a single person (Yoruba Inglecircs)

They did not arrest a single person 31

(f) This morning I hantar my baby tu dekat babysitter tu lah (Malay Inglecircs)

This morning I took my baby to the babysitter 32

De acordo com AiKhenvald e Dixon (2006 p 2)

Se duas ou mais liacutenguas estatildeo em contato os falantes de uma tendo conhecimento da outra eles podem compartilhar traccedilos linguiacutesticos incluindo haacutebitos de pronuacutencia Historicamente todo idioma deve ter sofrido certa influecircncia de seus vizinhos O impacto do contato eacute mais forte e mais faacutecil de ser discernido em alguns idiomas enquanto em outros eacute mais fraco

O que fora dito acima pode ser comprovado em qualquer comunidade em que a

liacutengua do colonizador fora imposta durante o ato de conquista ou de contato Em

algumas comunidades a situaccedilatildeo de bilinguismo eacute motivada por outras

28

ldquoVocecirc esfregaraacute [o quadro-negro de fora] Os homens viratildeordquo 29

ldquoChame-os aqui que eu estou muito doenterdquo 30

ldquoAs crianccedilas gostam dissordquo 31

ldquoEles natildeo prenderam uma uacutenica pessoardquo 32

ldquoEsta manhatilde eu ocupei meu bebecirc agrave babaacuterdquo

78

necessidades que se fazem presente nessa sociedade O portuguecircs eacute a liacutengua de

contato que eacute utilizada por todos os membros em situaccedilotildees diaacuterias e em contatos

com a comunidade externa Enquanto a liacutengua interna eacute utilizada em seus rituais

e eacute utilizada em contexto familiar que exige mais aproximaccedilatildeo familiar entre os

membros 33

342 Diglossia

O processo de diglossia pode ser compreendido conforme Dubois et all (1998 p

190) como i) situaccedilatildeo de bilinguismo ii) situaccedilatildeo biliacutengue na qual uma das

liacutenguas eacute de status sociopoliacutetico inferior iii) aptidatildeo que tem um indiviacuteduo de

praticar corretamente outra liacutengua aleacutem da liacutengua materna

Embora seja entendida tambeacutem como uma competecircncia linguiacutestica em que o

falante de uma determinada liacutengua possa conhecer os niacuteveis formal e informal de

sua gramaacutetica para este trabalho o conceito que recorremos eacute o de diglossia

enquanto situaccedilatildeo de conviacutevio de duas ou mais liacutenguas em uma comunidade

Trata-se neste caso da utilizaccedilatildeo de uma das liacutenguas como liacutengua oficial

enquanto a outra fica a cabo das situaccedilotildees de conviacutevio Geralmente a liacutengua do

dominador eacute a liacutengua das relaccedilotildees comerciais a outra eacute utilizada nos rituais ou no

seio das famiacutelias (comunidade)

Devido agraves colonizaccedilotildees e agrave globalizaccedilatildeo a diglossia eacute muito comum no mundo

poacutes-moderno Em paiacuteses que foram colocircnias portuguesas como Moccedilambique e

33

Como exemplo podemos citar o que ocorre com o Fulni-ocirc Conforme COSTA1993 p 58

79

Timor Leste por exemplo o Portuguecircs eacute a liacutengua oficial enquanto as liacutenguas

nativas satildeo conservadas no acircmbito familiar e em ciclos informais Assim como

nas comunidades mais desenvolvidas o aprendizado de mais de uma segunda

liacutengua faz com que as comunidades se tornem pluriliacutengues

Por causa desta competecircncia linguiacutestica em que o sujeito passa a dominar dois

ou mais coacutedigos o conceito de diglossia fora ampliado agraves comunidades

monoliacutengues Neste caso entende-se que o sujeito pode ser bi- ou multiliacutengue

fora e dentro da sua proacutepria liacutengua34

Para Ferguson (1991 p 5) a diglossia eacute

Uma situaccedilatildeo linguiacutestica relativamente estaacutevel em que junto aos dialetos primaacuterios da liacutengua (que podem incluir a variante padratildeo ou as normas regionais) haacute um dialeto muito divergente altamente codificado (muitas vezes bastante complexo gramaticalmente) sobrepondo-se agrave variedade Eacute o veiacuteculo de um grande e respectivo corpo de literatura escrita tanto de periacuteodo anterior ou de outra comunidade de fala eacute aprendido atraveacutes da educaccedilatildeo formal usado na escrita e na fala em contextos formais mas natildeo eacute usado em qualquer uma das seccedilotildees de comunidade para conversaccedilatildeo coloquial

Fishman (1967 p 8) afirma que a diglossia eacute gradual e variaacutevel Para ele o

conceito de diglossia estaacute ligado ao aspecto social enquanto o bilinguismo ao

individual Dessa forma a relaccedilatildeo entre bilinguismo e diglossia na situaccedilatildeo do

contato pode se dar das seguintes formas i) diglossia e bilinguismo atuando

juntos ii) bilinguismo sem diglossia iii) diglossia sem bilinguismo e iv) nem

diglossia nem bilinguismo

34

Crystal (1985 p 82) discorre que em geral os sociolinguistas se referem a uma variedade alta (A) e outra baixa (B) correspondendo grosso modo a uma diferenccedila de formalidade A variedade alta eacute apreendida na escola costuma ser usada nos locais cuja formalidade eacute maior A variedade baixa eacute usada em outros ambientes relativamente informais

80

O referido autor complementa afirmando que

O bilinguismo sem a diglossia tende a ser transicional tanto em termos de repertoacuterios linguiacutesticos de comunidade de fala como em termos das variedades de fala envolvidas per si Sem separar no entanto as normas complementares e valores para estabelecer e manter a separaccedilatildeo funcional das variedades de fala aquela liacutengua ou variedade que seja o bastante favoraacutevel para ser associada ao movimento predominante das forccedilas sociais tende a substituir a(s) outra (s) (idem p7)

No caso dos Latundecirc a diglossia se configura como um processo em que os

falantes foram obrigados a aprender a liacutengua dos brancos utilizando-a nas

atividades em contexto de contato com o natildeo iacutendio No entanto o grupo conserva

a liacutengua original nos rituais e no reduto familiar como fora explicado

anteriormente 35

343 Alternacircncia de coacutedigo36

O processo de diglossia quando eacute configurado entre duas liacutenguas distintas resulta

em bilinguismo O bilinguismo abordado no item 231 pode ser analisado de

diversos pontos de vista mas um em especial que seraacute tratado neste toacutepico eacute a

alternacircncia de coacutedigo ou code-switching Trata-se de um processo linguiacutestico

inerente ao falante biliacutengue desenvolto ou natildeo na liacutengua que aprendera como

segunda liacutengua no caso do biliacutengue ou da terceira por diante como nos

pluriliacutengues

35

Vale ressaltar que atualmente devido agrave incorporaccedilatildeo da cultura do branco os Latundecirc estatildeo

falando mais frequentemente o Portuguecircs em diversas situaccedilotildees de comunicaccedilatildeo ateacute mesmos nas mais informais Isso se deve ao fato de as geraccedilotildees mais novas serem menos conservadoras e resistentes ao contato 36

Tratamos tambeacutem deste processo ao discorremos sobre o bilinguismo na seccedilatildeo 231

81

Dessa forma o falante biliacutengue ao se comunicar com outro falante que detenha

suas mesmas liacutenguas poderaacute fazer escolhas linguiacutesticas dentro de cada coacutedigo

ou alternando os coacutedigos Por isso os pesquisadores dizem que o falante biliacutengue

apresenta um comportamento proacuteprio em seu processo de interaccedilatildeo que eacute a

utilizaccedilatildeo do code-switching que se caracteriza por ser uma estrateacutegia de

adequaccedilatildeo interativa desejaacutevel e favoraacutevel do ponto de vista pragmaacutetico Este

processo constitui um processo de ativaccedilatildeo e desativaccedilatildeo de uma ou de outra

liacutengua

Para Auer (1999 p 46)

O termo code-switching reserva-se para os casos em que a justaposiccedilatildeo dos dois coacutedigos eacute percebida e interpretada como um ato localmente significativo pelos participantes Contrapotildee-se assim ao code-switching tambeacutem denominado language mixing (mistura de coacutedigo ou de liacutenguas) em que a justaposiccedilatildeo dos coacutedigos tem significaccedilatildeo para os participantes em sentido mais global sendo um padratildeo recorrente de comunicaccedilatildeo

Um falante biliacutengue decide primeiramente qual deveraacute ser a liacutengua de base para

ser utilizada com o outro falante que domina suas liacutenguas tambeacutem e a partir daiacute

decide se faraacute uso ou natildeo do code-switching eacute o que afirma Grosjean (1982 p

127) a partir do esquema abaixo

82

Figura 4 Escolha de liacutengua e code-switching conforme Grosjean (1982 p127)

Conforme o esquema acima o falante biliacutengue apresenta competecircncia linguiacutestica

para se comunicar tanto com um falante monoliacutengue quanto outro biliacutengue Ao se

comunicar com o falante monoliacutengue o referido falante biliacutengue faraacute a escolha de

uma liacutengua A ou a liacutengua B Neste caso natildeo poderaacute fazer uso das duas No

processo comunicativo com outro falante biliacutengue ele poderaacute utilizar a liacutengua A

com ou sem alternacircncia com a liacutengua B Ou utilizar a liacutengua B com ou sem

alternacircncia com a liacutengua A O que determina tais escolhas satildeo as vantagens e

desvantagens do cacircmbio linguiacutestico

Neste trabalho natildeo trataremos diretamente do code-switching por entendermos

que nos desviariacuteamos do objetivo basilar desta pesquisa que eacute o enfoque nos

segmentos foneacuteticos Outro aspecto seria o fato de os falantes latundecirc soacute

apresentarem a alternacircncia de coacutedigo durante as narrativas discorridas nas

83

entrevistas quando solicitados para que narrassem os acontecimentos e lendas

do seu povo

344 Morte da liacutengua

O contato linguiacutestico eacute um processo tambeacutem poliacutetico cujas consequecircncias podem

ser apenas o de mixagem ou mais intensamente a morte da liacutengua Muitas

vezes o contato eacute tatildeo devastador que extermina as liacutenguas minoritaacuterias trata-se

de um verdadeiro glotociacutedio37

Para Mcmahon (1994 p 228) a morte de uma liacutengua

Envolve essencialmente uma transferecircncia de obediecircncia de parte de uma populaccedilatildeo a partir de uma liacutengua que foi nativa na aacuterea para uma liacutengua mais recentemente introduzida na qual a populaccedilatildeo indiacutegena tornou-se biliacutengue A nova linguagem eacute geralmente falada nativamente por falantes mais potentes que podem tambeacutem ser mais numerosos e normalmente eacute associada pelos falantes da liacutengua minoritaacuteria com a riqueza prestiacutegio e progresso a liacutengua minoritaacuteria eacute entatildeo efetivamente abandonada por seus falantes tornando-se apropriada para uso em cada vez menor (e menor) contexto ateacute que seja inteiramente suplantada pela liacutengua que estaacute entrando

Dubois et all (1998 p 422) afirma que uma liacutengua morta eacute uma liacutengua que deixou

de ser falada mas cujo estatuto numa comunidade sociocultura eacute agraves vezes

desempenhar ainda um papel no ensino nas cerimocircnias rituais etc como o

latim

Para Trask (2004 p 200) a liacutengua eacute considerada moribunda ou estaacute prestes a

morrer quando o resultado de morte eacute praticamente inevitaacutevel Segundo o autor

37

Calcula-se que no iniacutecio da colonizaccedilatildeo portuguesa existiam aqui cerca de 1200 liacutenguas que

apoacutes anos de ocupaccedilatildeo de territoacuterio se resume a 180 Conforme Rodrigues 2002 p19 muitas delas estatildeo moribundas e carecem ser catalogadas

84

a cabo de uma ou duas geraccedilotildees ningueacutem mais seraacute capaz de falar esta liacutengua

pura e simplesmente Eacute a morte da liacutengua que resulta do processo denominado

substituiccedilatildeo da liacutengua

Ao dar continuidade ao seu argumento o referido autor assegura que a morte de

uma liacutengua eacute um processo gradual Assim exemplifica o pesquisador

em um dado lugar em um determinado momento algumas crianccedilas ainda estatildeo aprendendo - como sua liacutengua materna - a liacutengua que estaacute morrendo enquanto outras a estatildeo aprendendo apenas imperfeitamente e outras ainda natildeo estatildeo aprendendo de maneira nenhuma A liacutengua pode desaparecer por completo em certas aacutereas e sobreviver em outras Idem p 201

Ainda segundo Trask ibidem satildeo caracteriacutesticas da morte de uma liacutengua i) a

perda das irregularidades ii) a queda em desuso das formas e dos esquemas de

construccedilatildeo sentencial mais complexos ou menos frequente iii) a substituiccedilatildeo

maciccedila das palavras nativas por palavras tiradas da liacutengua de prestiacutegio iv) a

mudanccedila de pronuacutencia que se torna mais proacutexima da liacutengua de prestiacutegio v) a

perda da variaccedilatildeo estiliacutestica que leva agrave sobrevivecircncia de um uacutenico estilo

invariaacutevel

Nem sempre a morte de uma liacutengua estaacute diretamente ligada a aspectos

linguiacutesticos Cristoacutefaro-Silva (2002 p 56) elenca trecircs aspectos natildeo linguiacutesticos

que contribuem para a aniquilaccedilatildeo de uma liacutengua O primeiro diz respeito ao fato

de o pesquisador natildeo poder investigar o processo de morte devido agrave presenccedila de

uns poucos falantes da liacutengua O segundo trata da opressatildeo poliacutetica imposta aos

falantes que neste caso deixam de falar a liacutengua para natildeo serem perseguidos E

85

o terceiro ocorre quando a liacutengua eacute mantida apenas em rituais em que os falantes

natildeo sabem mais o teor semacircntico do que verbalizam

Natildeo diferente do aqui fora apresentado a situaccedilatildeo da liacutengua Latundecirc eacute bastante

delicada uma vez que a comunidade passou por diversos transtornos que

impactaram a forma como se organizavam socialmente O nuacutemero de nuacutemero de

falantes diminuiu e consequentemente a liacutengua se encontra altamente

ameaccedilada O portuguecircs sendo a liacutengua dominante de prestiacutegio e funcional para

a relaccedilatildeo com o mundo natildeo indiacutegena ganha espaccedilo crescente entre os Latundecirc

Esta eacute a situaccedilatildeo natildeo soacute do Latundecirc mas de vaacuterios grupos indiacutegenas

86

4 COMUNIDADE DE ESTUDO OS LATUNDEcirc

Que gente eacute essa que fala idioma tatildeo diferente das liacutenguas conhecidas tatildeo diferente da liacutengua dos seus mais proacuteximos vizinhos

que tem costumes tatildeo estranhos aos que vivem perto que natildeo conhece os objetos essenciais da vida dos seus companheiros de sertatildeo

De onde veio Por onde passou que natildeo deixou rastros Quando chegou agravequelas matas onde vive haacute tanto tempo

Que ligaccedilotildees tem com os outros filhos do Brasil Roquete-Pinto (1975 p121)

41 INTRODUCcedilAtildeO

Discorremos neste capiacutetulo sobre o povo Latundecirc e a sua comunidade descriccedilatildeo

contexto histoacuterico cultural e geograacutefico desta etnia Histoacuteria do contato conflitos

internos e externos dificuldades enfrentadas pelo grupo ao longo de sua

existecircncia denominaccedilatildeo acesso hierarquia social padratildeo e constituiccedilatildeo familiar

contatos intereacutetnico bilinguismo e ensino na aldeia

42 A FAMIacuteLIA NAMBIKWAacuteRA38 39 40

Os Nambikwaacutera41 satildeo conhecidos na etnologia brasileira por terem sido

oficialmente contatados pelo Marechal Rodom e por terem sido estudados por

Leacutevi-Strauss De origem Tupi o vocaacutebulo Nambikwaacutera eacute o resultado da fusatildeo dos

38

Os Nambikwara se auto denominam Anunsu Conforme Price amp Cook Jr The Nambikwara call

themselves aacute nu suacute people This name written anunzecirc has apereared throughout the literature but has been erroneously thought to be a band name (1969 p 690) 39

Os Nambikwra satildeo famosos na etnologia brasileira por terem sido oficialmente contatados pelo Marechal Rodom e por terem sido estudados por Leacutevi-Strauss 40

Os Nambikwara natildeo estatildeo ligados aos troncos Tupi e Macro-Jecirc Trata-se de uma famiacutelia linguiacutestica isolada com caracteriacutesticas especiacuteficas que natildeo se enquadra em nenhum desses dois grupos 41

Leacutevi-Strauss (1946 p 139) afirma que se trata de uma palavra Tupi e que deve ser escrita como Nhambikwara

87

termos ldquonambirdquo que significa ldquoorelhardquo e ldquokuarardquo cujo significado eacute ldquoburacordquo

Portanto Nambikwaacutera42 eacute ldquoburaco de orelhardquo

Coforme Leacutevi-Strauss (1946 p 48)

The name Nambikwra was mentioned for the first time and only by hearsay by Antonio Pires de Campos in the beginning of the 18th century Since then it appeared several times with reference to an unknown tribe located on the headwaters of Tapajoz There is a great discrepancy between the different spellings When General Candido Mariano da Silva Rondon began to explore the land between the Tapajoz and Gi-Parana in 1907 he met with unknown group of a unknown language and he did not hesitate to identify them with the tribe often mentioned in the early documents It was at that time that the name Nhambikwara was

definitely adopted its spelling fixed and that it was recognized as a Tupi nickname the meaning of which is big ears

A famiacutelia Nambikwara eacute dividida em dois grandes grupos aleacutem de outra

remanescente conforme figura abaixo

Figura 5 Classificaccedilatildeo das liacutenguas da Famiacutelia Nambikwaacutera de acordo com Rodrigues

(1986 p 134)

42

Seguimos neste trabalho a orientaccedilatildeo da Associaccedilatildeo de Antropologia Brasileira que em 1953

estabeleceu a fim de padronizar os nomes dos povos indiacutegenas do Brasil com o intuito de facilitar os estudos etnograacuteficos e Linguiacutesticos a nomenclatura padratildeo

88

Conforme figura acima o povo Latundecirc faz parte da famiacutelia Nambikwaacutera que se

divide em Nambikwaacutera do Norte Nambikwaacutera do Sul e Sabanecirc Os Latundecirc

juntamente com os Lakondecirc os Tawandecirc os Mamaindecirc e os Negarotecirc

pertencem ao grupo Nambikwaacutera do Norte Jaacute o Nambikwaacutera do Sul eacute composto

pelos povos Galera Kabixi Munduacuteka e Nambikwaacutera do Campo cada um

correspondendo a um complexo dialetal O Sabanecirc eacute uma liacutengua agrave parte por se

acreditar que natildeo haacute muitas semelhanccedilas entre as estruturas linguiacutesticas dessa

liacutengua e as demais liacutenguas desse grupo

Situado na aacuterea entre os rios Juruena e Comemoraccedilatildeo o territoacuterio consta do

registro de muitos autores Roquete-Pinto (1919) Leacutevi-Strauss (1946) Price e

Cook (1969) Price (1977) Mas eacute de Roquete-Pinto (1919) e Price (1983) a

exposiccedilatildeo mais aceita Em ambos os limites geograacuteficos desses povos satildeo

relatados da seguinte forma pelo Rio Papagaio (sul) pelo rio Gi-Paranaacute (norte)

pelo rio Tapajoacutes (leste) e pelo rio Guaporeacute (oeste)

Figura 6 Localizaccedilatildeo e aacuterea dos Nambikwaacutera de acordo com Roquete-Pinto (1919)

89

De acordo com a FUNAI43 os dados atuais indicam que os Nambikwaacutera hoje

com cerca de dois mil iacutendios estatildeo distribuiacutedos em seis Terras indiacutegenas (TI)

vivem no sudoeste do Mato Grosso e aacutereas proacuteximas de Rondocircnia entre a

floresta amazocircnica e o cerrado

Figura 7 Territoacuterio Nambikwaacutera descrito por Price (1983)

No que tange ao conhecimento desses povos eacute de meados do seacuteculo XVIII que

obtemos os primeiros contatos com os Nambikwaacutera Foi Luiz Pinto de Souza

Coutinho terceiro capitatildeo geral do Estado do Mato Grosso o organizador de uma

expediccedilatildeo pelas margens do Rio Guaporeacute com o propoacutesito de abrir caminhos

entre a capital de entatildeo Proviacutencia de Mato Grosso e o Forte Braganccedila

43

Fundaccedilatildeo Nacional do Iacutendio

90

Os relatos histoacutericos nos mostram que era prioridade do Governo Militar apoacutes a

Proclamaccedilatildeo da Repuacuteblica em 1889 a integraccedilatildeo de todas as terras brasileiras

Uma das accedilotildees dessa integraccedilatildeo foi a determinaccedilatildeo do governo em construir

linhas telegraacuteficas em terras indiacutegenas da Amazocircnia com o propoacutesito de interligar

o Rio de Janeiro a Cuiabaacute Agrave frente dessa empreitada estava o Major Antonio

Gomes Carneiro e entre a comitiva o seu aluno Cacircndido Mariano da Silva

Rondon

Eacute Rodon o principal agente de contato entre os iacutendios Nambikwaacutera e os natildeo

iacutendios Pois como eacute sabido dele partia o discurso de apaziguamento entre o

contato preferindo antes de qualquer coisa ser atingido a atingir os silviacutecolas

Aleacutem da motivaccedilatildeo de expansatildeo para a implantaccedilatildeo das linhas telegraacuteficas

Rondon era conduzido por um desejo ardente de respeito e proteccedilatildeo aos povos

daquela regiatildeo

Dessa forma os iacutendios Nambikwaacutera estavam entre os indiacutegenas que ajudaram a

comissatildeo do governo a alcanccedilar os lugares mais hostis Este encontro entre

indiacutegenas e brancos culminou em invasotildees e conflitos entre povos aleacutem das

doenccedilas que foram trazidas pelos natildeo indiacutegenas por isso a extinccedilatildeo de vaacuterias

tribos e povos aleacutem do prejuiacutezo linguiacutestico resultante da aculturaccedilatildeo dos

indiacutegenas frente agrave presenccedila do natildeo iacutendio uma vez que para que ocorresse o

processo de interaccedilatildeo os indiacutegenas se viram obrigados a aprender o portuguecircs

O contato entre os grupos Nambikwaacutera natildeo se deu de forma paciacutefica Os

Nambikwaacutera do Norte natildeo foram receptivos e os planos dos governos foram

frustrados De forma diferente o contato com os Nambikwaacutera do Sul se deu de

91

forma mais intensa Mesmo apoacutes os constantes conflitos o contato perdurou por

mais tempo que com os do Norte acarretando mudanccedilas culturais de costumes e

da liacutengua

Telles (2002 p 10) afirma que

Do grupo linguiacutestico do Norte hoje restam apenas remanescentes de cinco etnias Tawandecirc Lakondecirc Mamaindecirc Negarotecirc e Latundecirc Destes os trecircs uacuteltimos permanecem em aacutereas proacuteximas de seus territoacuterios tradicionais e se preservam enquanto grupos relativamente autocircnomos Estes povos natildeo habitavam tradicionalmente a regiatildeo norte do territoacuterio Nambikwaacutera e esse fato pode ter favorecido a sua independecircncia grupal ao longo do percurso histoacuterico

Figura 8 Localizaccedilatildeo atual dos Nambikwaacutera

Como consequecircncia do contato no final do seacuteculo XX a populaccedilatildeo desses povos

foi reduzida a mais ou menos 650 sendo 50 deles crianccedilas Price (1985 p 312)

92

chama a atenccedilatildeo para o processo de aculturaccedilatildeo pois para as crianccedilas ldquoseria

mais confortaacutevel falar portuguecircs que a liacutengua dos seus paisrdquo44

Ainda com relaccedilatildeo agrave classificaccedilatildeo linguiacutestica alguns estudiosos utilizam

classificaccedilotildees diferentes para organizar os povos Nambikwaacutera A divisatildeo claacutessica

de Leacutevi-Strauss (1948) distribui os Nambikwaacutera de acordo com a aproximaccedilatildeo

linguiacutestica que haacute entre eles Para ele haacute trecircs grupos principais que se subdividem

formando cinco unidades constituiacutedas por vaacuterios dialetos de uma mesma liacutengua

Price e Cook (1969) em trabalho posterior sugerem outra classificaccedilatildeo para a

famiacutelia Nambikwaacutera Para eles haacute dois grandes grupos os Sabanecirc e os

Nambikwaacutera Entretanto embora o Sabanecirc natildeo seja compreensiacutevel para os

outros grupos linguiacutesticos por razotildees estruturais Price (1972) com base num

estudo comparativo considera o Sabanecirc como integrante da famiacutelia linguiacutestica

Nambikwaacutera Para uma visualizaccedilatildeo das propostas de Leacutevi-Strauss e de Price e

Cook apresentamos as respectivas classificaccedilotildees nas tabelas a seguir

Quadro 2 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Leacutevi-Strauss (1948)

44

ldquofifty were children who are probably more comfortable speaking Portuguese than the languages of their parents

Grupo a

Grupo b

Grupo c

Subgrupo a1

Subgrupo a2

Subgrupo b1

Subgrupo b2

Oakleacutetosu

Haloacutetesu

Kiaaacuteru

Kuritsu

Soaacutelesu

Kodaacuteteli

Munuacutekoti

Nikedeacutetosu

Taruacutende

Maimatildende

Toatildende

Ioacutelola

Naseacutelate

Lakotildende

Sovaacuteinte

Sabaacutene

93

Quadro 3 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Price e Cook (1969)

Leacutevi-Strass natildeo aponta os Latundecirc como pertencente ao grupo Nambikwaacutera

devido ao natildeo contato com este povo que soacute fora inicialmente descobertos

(contatados) em 1975 pelos Aikanaacute conforme veremos a seguir

43 OS LATUNDEcirc

O povo Latundecirc pertencente ao Nambikwaacutera do Norte habita uma aacuterea de

116613671 hec no municiacutepio de Chupinguaia na regiatildeo sudoeste do estado de

Rondocircnia Com eles convivem outros dois grupos que natildeo possuem nenhum

Navaacuteite

Taiate

Nambikwaacutera

Sabanecirc

Do Norte

Do Sul

Latundecirc

Lakundecirc

Tawandecirc

Mamaindecirc

Negarotecirc

Vale do Jurema

Vale do Guaporeacute

Vale do Sarareacute

Haloteacutesu

Kithaulhu

Sawenteacutesu

Wakalitesu

Wasusu

Sarareacute

Alacircntesu

Waikisu

Hahatildetesu

94

grau de parentesco linguiacutestico Satildeo os Aikanaacute e os Kwazaacute que fazem parte da

Terra Indiacutegena (TI) Tubaratildeo-Latundecirc45

No mapa abaixo pode-se obervar a localizaccedilatildeo da TI Tubaratildeo-Latundecirc que se

situa entre a RO 370 e a BR 364

Figura 9 Localizaccedilatildeo da TI Tubaratildeo-Latundecirc46

A reserva estaacute localizada a oeste do municiacutepio de Vilhena Nela haacute trecircs vilas Rio

do Ouro Barroso e Gleba (tambeacutem conhecida como Tubaratildeo) Gleba eacute a que

conteacutem a maior populaccedilatildeo mista De faacutecil acesso pode ser adentrada pela cidade

de Chupinguaia que fica a 19 km da TI Rio do Ouro possui uma populaccedilatildeo

exclusivamente Aikanatilde e estaacute a 20 km da Gleba Barroso conteacutem a menor

populaccedilatildeo e corresponde a uma aacuterea de ocupaccedilatildeo esparsa em que se distribuem

45

Conforme Anonby the Tubaratildeo-Latundecirc Indian Reserve is inhabited by people from several tribes the tree main linguistically-unrelated Aikanatilde (also known as Tubaratildeo) Kwazaacute and Latundecirc 2009 p3 46

Inicialmente estes povos ocupavam uma aacuterea de ricas florestas no oeste do rio Pimenta Bueno

proacuteximo a uma pequena vila denominada de Satildeo Pedro

95

remanescentes Kwazaacute Aikanaacute e Latundecirc A meacutedia de distacircncia do Barroso para a

Gleba eacute de aproximadamente 25 km O acesso se daacute por uma estrada

parcialmente carroccedilaacutevel de difiacutecil locomoccedilatildeo

Com relaccedilatildeo agrave populaccedilatildeo de cada povo Anomby (2009 p5) afirma que o

quantitativo total de pessoas eacute de 219 iacutendios Deles 175 satildeo Aikanatilde 25 satildeo

Kwazaacute e 19 satildeo Latundecirc Haacute ainda 189 iacutendios distribuiacutedos por outras localidades

fora da TI 47

Quadro 4 Distribuiccedilatildeo dos povos pertencentes a TI Tubaratildeo-Latundecirc

TI Rio do Ouro 67

Gleba 48

Barroso 34

Outras localidades

Satildeo Pedro 18

Vilhena 15

Chupinguaia 7

Total 189

Durante muitos anos os Latundecirc os Kwazaacute e os Aikanatilde viveram em contato com

grupos vizinhos como os Kanoecirc Mekens Sakirap Tupariacute Salamatildei entre outros

povos que tecircm sido acolhidos pela populaccedilatildeo local da TI Mesmo com diferentes

liacutenguas eles se relacionavam com festivais e casamentos intergrupais A cultura

desses povos tornou-se muito similar devido ao contato intenso entre eles De

acordo com Anomby (2009 p 6) os traccedilos mais comuns entre este povos

incluem cestas de fibra de marico casas em forma de colmeia para

47

Em conversa com os professores desses povos Anomby Idem natildeo afirma os motivos pelos

quais tais iacutendios estatildeo afastados dos demais

96

aproximadamente dez famiacutelias bebida de milho fermentado canibalismo e

divisatildeo de clatildes

Quanto ao contato sabe-se que foram os iacutendios Aikanaacute os primeiros a contatarem

com os Latundecirc Price (1977 p 72 - 73) descreve que o entatildeo Capataz Rural

Jorge Falcatildeo fora informalmente designado encarregado da operaccedilatildeo de contato

No ano de 1976 acompanhado por cinco iacutendios Aikanaacute e um serigueiro apoacutes

cinco dias de intensa caminhada ocorreu o encontro com os Latundecirc Neste

primeiro momento o desconhecido povo tremia de medo mas se posicionaram

ainda que fragilmente na linha de defesa Apoacutes dormirem no campo o capataz e

demais membros da excursatildeo conseguiram no outro dia um contato comprovado

por poucas fotografias com o povo Latundecirc Jorge descreveu que tais iacutendios natildeo

conseguiram se comunicar com os Aikanaacute e que eram em nuacutemero de 10 homens

e 8 crianccedilas afora poucas crianccedilas que afirma natildeo tecirc-las visto

A FUNAI em 1977 com a ajuda do Capataz Rural realizou uma nova excursatildeo

aos iacutendios Latundecirc Desta vez aleacutem de Jorge juntos a ele estavam presentes

David Price e dois iacutendios Nambikwara do Norte (Lakondecirc) que conseguiram

identificar os Latundecirc como tambeacutem pertencentes agrave etnia Nambikwara do Norte

Foram mensurados como uma aldeia composta por oito casas e dezenove

habitantes 48

48

Para uma descriccedilatildeo mais detalhada ver Telles 2002 p17

97

Figura 10 Primeiros contatos com os Latundecirc (Foto Price 1977)

Em 1999 o povo era composto por vinte pessoas Entre 1999 e 2000 a grupo ficou

ainda menor com a saiacuteda de trecircs dos membros Faacutetima (irmatilde de Terezinha49)

Batataacute (a anciatilde do grupo) e Joatildeo (irmatildeo solteiro de Terezinha) As crianccedilas e os

jovens do grupo satildeo na sua maioria parentes consanguiacuteneos De acordo com as

relaccedilotildees de parentesco os mais novos natildeo poderatildeo coabitar entre si o que

implica a natildeo autonomia e a natildeo perpetuaccedilatildeo do grupo Latundecirc

49

Trata-se de a informante deste projeto de pesquisa

98

Quadro 5 Nuacutecleos familiares de acordo com a habitaccedilatildeo em 199950

Casa 1

Pais Filhos Agregados

Maneacute Torto (60) Terezinha (45)

Luiz (22) Antocircnio (20) Lorena (12) Catarino (10) Justino (8) Jaelson (4)

Joatildeo (26) Francisco (25) Irmatildeos de Terezinha

Maneacute Torto (60) Faacutetima (30)

Maria (13)

Casa 2

Joseacute (40) Lurdes (40)

Jair (13) Dido (11) Lourival (3) Lorimar (6 meses)

Cinzeiro (50) Irmatildeo de Lurdes

Casa 3 Batataacute (65)

Dados atuais51 noticiam que o grupo se enfraqueceu politicamente Tereza

mudou-se para uma aldeia de outro grupo Nambikwaacutera do Norte e Maria e Lorena

foram morar na Gleba

No que concerne agraves atividades econocircmicas a extraccedilatildeo de borracha foi a grande

atividade econocircmica na deacutecada de 30 do seacuteculo passado no sul de Rondocircnia

Durante o apogeu dessa atividade os Aikanatilde e os Kwazaacute trabalharam para

barotildees da borracha em troca de cafeacute accediluacutecar e armas de fogo

Consequentemente apoacutes aprenderem as estrateacutegias de negociaccedilatildeo na deacutecada

de 70 os proacuteprios iacutendios agora independentes passaram a vender a sua proacutepria

borracha nas cidades vizinhas (Van der Voort 1998)

50

Telles 2002 p 19 51

Informaccedilatildeo proveniente de comunicaccedilatildeo pessoal com Stella Telles janeiro de 2015

99

A comercializaccedilatildeo da borracha tambeacutem fora um pano de fundo para o processo

de bilinguismo ocorrente entre os povos dessa regiatildeo O portuguecircs se tornara

uma espeacutecie de liacutengua franca utilizada para a comercializaccedilatildeo do produto no

exterior e na interaccedilatildeo com os seringalistas Contudo as liacutenguas indiacutegenas

permaneciam sendo usadas mais provavelmente na retirada e no processamento

da borracha nas reservas52

A economia na aldeia diferentemente do que fora no passado representa a atual

situaccedilatildeo dos iacutendios Haacute pouca lavoura de subsistecircncia53 o que faz com que a

produccedilatildeo de comida seja escassa Os integrantes da aldeia quando precisam de

provimentos compram sua comida na cidade ou recebem-na dos parentes que

vivem em Rio do Ouro

Ainda de acordo com Anomby (2009 p7)

As principais fontes de dinheiro em ambas as aldeias como a maioria das aldeias no Brasil satildeo as remessas de aposentadoria para os idosos e da venda de artesanato indiacutegena aleacutem da venda de madeira e os pequenos serviccedilos prestados aos demais moradores e visitantes

No que diz respeito agrave religiatildeo atualmente a presenccedila do protestantismo eacute muito

forte na TI Tubaratildeo-Latundecirc Missionaacuterios UNIEDAS54 (iacutendios da tribo Terena)

comeccedilaram a trabalhar na aacuterea em 1980 e como resultado a maioria das

pessoas que vivem na reserva iacutendios Tubaratildeo-Latundecirc hoje se consideram

52

Neste contexto histoacuterico pode-se perceber claramente a hierarquizaccedilatildeo linguiacutestica no que tange agrave utilizaccedilatildeo da liacutengua materna Para os iacutendios jaacute ocorria o processo de contato oriundo do dominador Mesmo reconhecendo a necessidade advinda da dependecircncia econocircmica os iacutendios relutavam em manter a liacutengua matildee no interior da aldeia ou seja no seio familiar 53

Devido agrave cultura errocircnea da terra e a constante presenccedila das aposentadorias concedidas aos idosos e invaacutelidos a rotina desses povos estaacute sendo fortemente alterada 54

Uniatildeo das Igrejas Evangeacutelicas da Ameacuterica do Sul criada por missionaacuterios americanos em 1912 que eacute atualmente conduzida por lideranccedila indiacutegena

100

protestantes Os Terenas ministram suas pregaccedilotildees exclusivamente em

Portuguecircs

Uma outra famiacutelia missionaacuteria protestante pertencente agrave missatildeo ALEM55 vivem

na aldeia Rio do Ouro onde o marido Warrisson eacute um professor e sua esposa

Ana eacute uma liacuteder de igreja Eles trabalham na reserva haacute doze anos e soacute falam

Portuguecircs

Anomby (2009 p8) relata o fato de os iacutendios ainda hoje rejeitarem os esforccedilos

dos missionaacuterios da ALEM para usar o Aikanatilde na igreja

Quando Ana veio pela primeira vez a Gleba 12 anos atraacutes as pessoas disse-lhe que queria igreja em Portuguecircs e natildeo em Aikanatilde Eles especificamente disse-nos Noacutes natildeo quer um linguista Queremos algueacutem que vai fazer igreja em Portuguecircs Ana compocircs algumas canccedilotildees em Aikanatilde mas quando ela cantou para os iacutendios eles disseram que soava feio Ana pediu que as pessoas orassem em Aikanatilde mas eles sempre recusam Em um culto que participou no Rio do Ouro Ana escolheu cinco pessoas aleatoriamente para ler partes do Biacuteblia Todos foram fluentes Ana disse-nos que ateacute hoje os iacutendios nunca pediu nada em Aikanatilde - eles parecem sentir que igreja deve ser em Portuguecircs

Os Latundecirc em particular natildeo se converteram ao protestantismo Localizados

mais remotamente o difiacutecil acesso agraves igrejas existentes da Gleba e no Rio do

Ouro natildeo favoreceu ao longo de anos a frenquecircncia do Latundecirc nos cultos

A educaccedilatildeo escolar tambeacutem tem situaccedilatildeo similar entre os Latundecirc Nunca houve

escola no Barroso nas proximidades das casas dos Latundecirc Dessa forma

apenas com a ida mais sistemaacutetica dos mais jovens Latundecirc para as aldeias

Aikanaacute - sobretudo a partir do ano de 2000 - eacute que as crianccedilas Latundecirc passaram

55

Associaccedilatildeo Linguiacutestica Evangeacutelica Missionaacuteria eacute uma organizaccedilatildeo missionaacuteria fundada em 1982

sob a inspiraccedilatildeo da Wycliffe Bible Translators

101

a frequentar escola Sobre isso Anomby Idem nos relata que eacute ensinado ateacute

quarta seacuterie em todas as aldeias e a maioria dos Aikanatilde e Kwazaacute satildeo

alfabetizados em Portuguecircs Em Rio do Ouro haacute dois professores um brasileiro

que leciona em Portuguecircs e um professor biliacutengue que explica os assuntos em

Aikanatilde Trecircs moradores estatildeo terminando o ensino meacutedio dois da Gleba e um

do Rio do Ouro A liacutengua Latundecirc natildeo eacute objeto de conteuacutedo escolar

Com relaccedilatildeo agrave situaccedilatildeo linguiacutestica dos Latundecirc56 sabe-se que com exceccedilatildeo de

Maneacute Torto que eacute falante nativo de uma liacutengua Nabikwaacutera do Norte muito proacutexima

do Latundecirc o nuacutemero de falantes do Latundecirc eacute de dezenove pessoas O grupo

excetuando a Batataacute que natildeo fala portuguecircs apresenta bilinguismo em Latundecirc

Portuguecircs O bilinguismo resultante do contato que se deu em 1976 se firmou

com o contato crescente com os Aikanaacute com quem se comunicam em portuguecircs

A complexidade linguiacutestica que se instaurou entre os Latundecirc pode ser observada

na tabela seguinte

Quadro 6 Situaccedilatildeo sociolinguiacutestica dos Latundecirc (dados de 1999)

Membros

Situaccedilatildeo Social

Situaccedilatildeo Linguacuteiacutestica

Maneacute Torto (60) Liacuteder interno da tribo Natildeo Latundecirc

Cinzeiro (50)

Batataacute (65)

Membros mais velhos

da tribo

Satildeo monoliacutengues em Latundecirc

Lurdes (40) Matriarca da casa 2 Apresenta distuacuterbio de fala Eacute considerada

uma falante ruim pela proacutepria tribo Fala um

pidgin com seus filhos

Joseacute (40) Patriarca da casa 2 Fala um portuguecircs pouco claro

56

Anomby (2009 p 5) chama a atenccedilatildeo para o fato de os povos presentes na TI Tubaratildeo-Latundecirc

natildeo serem estudados extensivamente ainda Dos estudos realizados podem-se citar as pesquisas realizadas no acircmbito antropoloacutegico e no linguiacutestico Leacutevi-Strauss (1930) Lieuntenabt Zack (1942) Melatti e Price (1970) Carlson (1984) Vasconcelos (19931996) Van der Voort (19951998) e Telles (2002)

102

Jair (13)

Dido (11)

Filhos mais velhos da

casa 2

Devido ao desempenho dos pais

apresentam problemas de comunicaccedilatildeo em

ambas as liacutenguas

Lourival (3)

Lorimar (6 meses)

Filhos mais novos da

casa 2

Estatildeo em processo de aquisiccedilatildeo da

linguagem

Terezinha (45)

Matriarca da casa 1

uma das mulheres de

Maneacute Torto

Apresenta boa competecircncia comunicativa

Apesar de ser considerada biliacutengue

apresenta problemas com relaccedilatildeo agrave

compreensatildeo do Portuguecircs

Joatildeo (26)

Francisco (25)

Irmatildeos de Terezinha Falam Portuguecircs sem muita fluecircncia

Faacutetima (30)

Irmatilde de Terezinha Apresenta niacutevel de compreensatildeo muito

inferior ao da sua fala

Luiz (22)

Antocircnio (20)

Lorena (12)

Catarino (10)

Justino (8)

Jaelson (4)

Filhos de Terezinha e

Maneacute Torto

Falam um bom Portuguecircs

Maria (13) Tambeacutem fala um bom Portuguecircs

Entre 1995 e 2000 Telles (comunicaccedilatildeo pessoal em novembro de 2014) verificou

que o aprendizado do Latundecirc na comunidade eacute mais tardio do que o Portuguecircs

mesmo sendo as crianccedilas desde o nascimento expostas e estimuladas agraves duas

liacutenguas simultaneamente Na avaliaccedilatildeo subjetiva dos indiacutegenas o Latundecirc eacute uma

liacutengua mais difiacutecil sendo essa a razatildeo de as crianccedilas apresentarem melhor

desempenho no Portuguecircs Soacute em torno dos dez anos comeccedilam a utilizar com

fluecircncia o Latundecirc embora apresentem conhecimento passivo da liacutengua desde a

primeira infacircncia quando atendem com pertinecircncia aos comandos em Latundecirc

Outro fator que pode responder ao fato de a produccedilatildeo linguiacutestica ocorrer

103

primeiramente em Portuguecirc deve ser o prestiacutegio social que essa liacutengua alcanccedila

entre comunidades minoritaacuterias57

Essa situaccedilatildeo decorrente do contato linguiacutestico se daacute devido agrave mescla linguiacutestica

presente na TI e agraves necessidades de os indiacutegenas se ausentarem das terras da

TI Os povos que vivem em Rio do Ouro viajam a cidade pelo menos uma vez por

mecircs para fazer compras ou ir buscar assistecircncia meacutedica Os da Gleba se

deslocam para a cidade todos os dias quando precisam ir para a sede do

municiacutepio de Chupinguaia Dependendo da necessidade eles ficam hospedados

na casa de algueacutem conhecido ou na Casa do Iacutendio uma espeacutecie de guarita

para os iacutendios A Casa do Iacutendio mais proacutexima da TI se localiza em Vilhena

Ainda quanto ao contato linguiacutestico estudos mostram que os iacutendios do sul de

Rondocircnia tecircm o haacutebito de casar-se com iacutendios de tribos amigas Isto pode ser

comprovado com a presenccedila de palavras no leacutexico das liacutenguas em que foram

coadunadas

Conforme dados mais recentes na Gleba cerca de cinquenta por cento dos

casamentos satildeo mistos com iacutendios de outras etnias ou com natildeo iacutendios Embora

haja certa rivalidade entre os povos da Gleba e os do Rio dos Ouros o nuacutemero de

casamentos entre os iacutendios dessas duas aldeias satildeo muito frequentes

Quanto aos iacutendios Latundecirc Anomby (2009 p 9) discorre que

Os iacutendios da aldeia de Latundecirc Barroso tecircm o menor prestiacutegio e satildeo um pouco culturalmente e economicamente subjugados pelo Aikanatilde e Kwazaacute Devido agraves pequenas populaccedilotildees de Kwazaacute e Latundecirc eacute quase impossiacutevel para eles para se casar dentro de

57

Discorreremos com mais detalhes sobre o processo de bilinguismo no povo Latundecirc no trabalho proposto a ser desenvolvido

104

sua tribo Assim a sobrevivecircncia das liacutenguas e ateacute mesmo o povo como um grupo distinto eacute muito tecircnue

Devido agraves constantes necessidades de cuidado desses povos a OSCIP Creatio58

realizou estudos sobre os impactos soacutecio-antropoloacutegicos-ambientais na TI

Tubaratildeo-Latundecirc jaacute que toda regiatildeo estaacute sobre a influecircncia da PCH59 Cascata

que estaacute sendo construiacuteda no Rio Pimenta Bueno Tais estudos visam objetivar

informaccedilotildees que subsidiem a descriccedilatildeo dos possiacuteveis impactos oriundos da PCH

sobre esta TI

Figura 11 Iacutendios Latundecirc na TI Tubaratildeo-Latundecirc

Outro ponto que deve ser levado em conta ao considerar falantes biliacutengues e

monoliacutengues eacute que eles natildeo podem ser nitidamente diferenciados A avaliaccedilatildeo do

grau de bilinguismo eacute complexa dado que a sua medidade eacute escalar ou seja o

58

Organizaccedilatildeo da Sociedade Civil de Interesse Puacuteblico 59

Pequena Central Hidreleacutetrica

105

conhecimento de outra liacutengua eacute uma questatildeo de grau que vai desde 0 ateacute a

ldquoperfeiccedilatildeordquo (Van Coetesem 1988 p 9)

106

5 INTERFEREcircNCIA FONEacuteTICO-FONOLOacuteGICA DO LATUNDEcirc NO

PORTUGUEcircS

ldquoO contato linguiacutestico eacute apenas um aspecto do contato cultural e a interferecircncia linguiacutestica eacute uma face da difusatildeo lexical e aculturaccedilatildeordquo

Weinreich (1953 p 5)

51 INTRODUCcedilAtildeO

Para Thomason (2001 p 5) o contato entre liacutenguas estaacute em toda a parte muitos

paiacuteses tecircm mais do que uma liacutengua oficial e muito provavelmente a maior parte

da populaccedilatildeo mundial fala duas ou mais liacutenguas Posto dessa maneira

compreende-se que satildeo muitos os estudos que abordam sob formas aacutereas

concepccedilotildees diversas e interdisciplinares o contato linguiacutestico No que concerne agrave

linguiacutestica estes estudos satildeo de igual abundacircncia De acordo com Weinreich

(1953) grande ou pequena as diferenccedilas e similaridades entre as liacutenguas em

contato podem ser exaustivamente estabelecidas em muitos domiacutenios Todavia

quando se trata da investigaccedilatildeo do contato sob a eacutegide da fonologia e da foneacutetica

o nuacutemero destes estudos diminui consideravelmente Tal constataccedilatildeo corrobora

com a necessidade de estudos linguiacutesticos que tratem dos aspectos foneacuteticos

quando observados no contato entre liacutenguas

Por se tratar de uma sessatildeo importante para as elucidaccedilotildees dos processos

ocorridos no Portuguecircs falado pelos Latundecirc a serem discorridos no Capiacutetulo VI

descrevemos neta seccedilatildeo os segmentos das liacutenguas em anaacutelise e quais satildeos mais

suscetiacuteveis agrave influecircncia do contado linguiacutestico Devido agrave escassez de pesquisas

107

foneacuteticas fonoloacutegicas na aacuterea especificamente no Latundecirc e no Portuguecircs

Brasileiro seratildeo utilizadas como cabedal para esta anaacutelise as pesquisas de

TELLES (2002) e para a investigaccedilatildeo do inventaacuterio do sistema fonoloacutegico do

Portuguecircs a de BISOL (1996) e de SILVA (2002)

Dada a profundidade investigativa da natureza do contato cabe-nos ressaltar aqui

que o presente estudo natildeo se encarregaraacute de tratar de todas a suas nuances

visto que seu objeto estaacute delimitado quanto aos processos foneacuteticos resultantes

de tal contato

Quanto ao aporte teoacuterico seratildeo citados os trabalhos de WEINREICH (1953)

pioneiro a tratar das questotildees de interferecircncia foneacuteticas oriundas do contato entre

liacutenguas VAN COETSEM (1988) e MATRAS (2009) para elucidar os processos

ocorrentes no contato em questatildeo

52 INTERFEREcircNCIA FUSAtildeO COEXISTEcircNCIA E TRANSFEREcircNCIA

LINGUIacuteSTICA

Um dos precursores dos estudos sobre contatos linguiacutesticos Uriel Weinreich

descreve em seu livro Language in Contact (1953) os mecanismos foneacuteticos que

regem a intersecccedilatildeo existente no contato

No que concerne aos aspectos extralinguiacutesticos que regem os efeitos do contato

sobre a fala de determinado componente social Weinreich chama a atenccedilatildeo para

os fatores que estatildeo aleacutem das diferenccedilas estruturais bem como das

inadequaccedilotildees lexicais da liacutengua Segundo ele esses fatores natildeo estruturais satildeo

inerentes aos falantes que estatildeo expostos agrave situaccedilatildeo do contato por exemplo

108

a) A facilidade de o falante se expressar verbalmente e sua

debilidade de lidar coma as duas liacutenguas separadamente

b) Proficiecircncia relativa em cada liacutengua

c) Especializaccedilatildeo no uso de cada liacutengua por toacutepicos e

interlocutores

d) Forma de aprendizado em cada liacutengua

e) Atitudes para cada liacutengua se idiossincraacutetico ou estereotipado

f) A dimensatildeo do grupo biliacutengue e sua homogeneidade

sociocultural ou diferenciaccedilatildeo colapso entre subgrupos usando

uma ou outra liacutengua como sua liacutengua-matildee fatos demograacuteficos

sociais e as relaccedilotildees poliacuteticas entre esses subgrupos

g) Prevalecircncia individuais de bilinguismo com dadas caracteriacutesticas

de comportamento de fala em subgrupos em geral

h) Atitudes estereotipadas em relaccedilatildeo a cada liacutengua (prestiacutegio)

status indiacutegena ou imigrante da liacutengua em xeque

i) Atitudes em relaccedilatildeo agrave cultura de cada comunidade linguiacutestica

j) Atitudes em relaccedilatildeo ao bilinguismo como tal

k) Toleracircncia ou intoleracircncia com respeito agrave mistura linguiacutestica e

com a fala incorreta de cada um

l) Relaccedilatildeo entre o grupo biliacutengue e cada um das duas

comunidades em que ela eacute um segmento marginal (Weinreich

1953 p 4)

Um dos pressupostos baacutesicos agrave natureza do falante diz respeito ao fato de duas

ou mais liacutenguas soacute poderem estar em contato se usadas alternadamente pelas

mesmas pessoas O uso individual da liacutengua seraacute o locus do contato Quando isto

ocorre a transferecircncia de elementos foneacuteticos seraacute a motivadora pela

reorganizaccedilatildeo de todo o velho sistema de oposiccedilatildeo Ele assegura que the term

interference implies the rearrangement of patterns that result from the introduction

of foreign elements into the more highly structured domains of language such as

the bulk of the phonemic system a larger part of the morphology and syntax and

some areas of the vocabulary (p 1)60

60

O termo interferecircncia implica a reorganizaccedilatildeo de padrotildees que resultam na introduccedilatildeo de elementos no mais alto (profundo) domiacutenio de estruturas da linguagem tal como a maior parte do sistema fonecircmico uma larga parte da morfologia e sintaxe e algumas aacutereas do vocabulaacuterio

109

Quando dois sistemas satildeo confrontados no contato pode ocorrer o

reordenamento de padrotildees ou interferecircncia ou exclusatildeo Na interferecircncia

linguiacutestica o problema de maior interesse eacute a accedilatildeo reciacuteproca dos fatores

estruturais e dos natildeo estruturais ao promoverem estimularem ou impedirem cada

interferecircncia

Concernente aos ldquoMecanismos e causas estruturais de interferecircnciardquo Weinreich

idem p7 coloca que haacute um tipo de interferecircncia que eacute extremamente comum no

contato linguiacutestico trata-se da relaccedilatildeo de empreacutestimo na qual natildeo haacute uma total

transferecircncia de todos os elementos Logo percebe-se que eacute comum a

transferecircncia de parte de um sistema ou de traccedilos desse sistema fazendo com

que haja uma ldquocoexistecircncia de fusatildeo de sistemasrdquo

A coexistecircncia ou fusatildeo de sistemas linguiacutesticos pode de acordo com este

estudioso afetar a natureza de um signo linguiacutestico jaacute que esta eacute a combinaccedilatildeo

de uma unidade de expressatildeo e uma de conteuacutedo Neste niacutevel de bilinguismo ou

de interferecircncia de sistemas pode-se entendender que a relaccedilatildeo de significado e

significante natildeo se daacute de maneira uniacutevoca

Diante da complexidade que eacute a transferecircncia linguiacutestica a ilustraccedilatildeo por ele

adotada eacute a de que a interferecircncia eacute como areia carregada por um fluxo de aacutegua

Na liacutengua ela estaacute sedimentada no fundo de um lago E este fenocircmeno se daacute em

todos os niacuteveis da gramaacutetica p 11

Ao tratar dos tipos de interferecircncia nos sistemas foneacuteticos Weinreich afirma que

The problem of phonic interference concerns the manner in which a speaker perceives and reproduces the sounds of one

110

language which might be designated secondary in terms of another to be called primary Interference arises when a bilingual identifies a phoneme of the secondary system with one in the primary system and in reproducing it subjects it to the fonetic rules of the primary language (1953 p 15)61

Neste caso a interferecircncia resulta quando um falante identifica na segunda liacutengua

elementos foneacuteticos presentes na primeira liacutengua Ao reproduzir o segmento o

falante o sujeita agraves regras foneacuteticas da primeira liacutengua a liacutengua matildee

Ao prosseguir Weinreich tambeacutem aponta dois tipos de interferecircncia a partir do

quadro comparatoacuterio entre os sistemas linguiacutesticos do Romansh62 e do

Schweizerdeutsch63 liacutenguas coexistentes no Cantatildeo de Grisons na Suiacuteccedila No

primeiro caso o sistema foneacutetico do Romansh se configura como o sistema

primaacuterio e o Schweizerdeutsch como secundaacuterio No segundo caso os sistemas

satildeo alternados o sistema foneacutetico do Schweizerdeutsch assume o lugar do

sistema primaacuterio e o Romansh o secundaacuterio

61

O problema da interferecircncia foneacutetica consiste na maneira como o falante percebe (reconhece) e reproduz os sons de uma liacutengua que pode ser designado secundaacuterio em outros termos primaacuterio A interferecircncia surge quando um biliacutenguumle identifica um fonema do sistema secundaacuterio com um no sistema primaacuterio e em reproduzi-lo sujeitando-o agraves regras foneacuteticas da primeira liacutengua 62

Eacute uma das quatro liacutenguas nacionais da Suiacuteccedila juntamente com a liacutengua alematilde a liacutengua italiana e a liacutengua francesa Trata-se de uma liacutengua romacircnica do ramo ocidental que se acredita descender do latim vulgar falado pelos romanos que ocuparam a aacuterea na Antiguidade 63

Eacute qualquer um dos dialetos alemacircnicos falados na Suiacuteccedila no Liechtenstein e nas zonas fronteiriccedilas da Aacuteustria

111

Quadro 7 Quadro Comparativo dos Sistemas Foneacuteticos do Romansh e do

Schweizerdeutsch de acordo com Weinreich (1953)

Mais adiante seraacute observada a influecircncia do Latundecirc no Portuguecircs Desta forma

o Portuguecircs mesmo sendo a segunda liacutengua adquirida seraacute visto como o objeto

influenciado do contato linguiacutestico

112

Quando observou o contato entre os dois sistemas linguiacutesticos em voga

Weinreich (idem p 18 e 19) examinou o processo de interferecircncia representado

no segundo sistema fonecircmico Assim ele elencou quatro tipos de interferecircncias i)

subdiferenciaccedilatildeo de fonemas ii) superdiferenciaccedilatildeo de fonemas iii)

reinterpretaccedilatildeo de traccedilos relevantes iv) substituiccedilatildeo de fone atual

A subdiferenciaccedilatildeo de fonemas ocorre quando dois sons de um segundo sistema

cujos correspondentes que natildeo se distinguem no sistema primaacuterio natildeo satildeo bem

definidos Tal confusatildeo eacute evidenciada pela alternacircncia que o falante do Romansh

faz ao pronunciar os segmentos y e i do Schweizerdeutsch ou quando o falante

do Schweizerdeutsch faz ao pronunciar de forma insegura os segmentos i e

O processo de superdiferenciaccedilatildeo envolve a imposiccedilatildeo de distinccedilotildees fonecircmicas

do sistema primaacuterio sobre os sons do sistema secundaacuterio onde eles natildeo satildeo

necessaacuterios O processo pode ser inferido a partir de uma comparaccedilatildeo entre os

sistemas de som em contacto mesmo que nem sempre seja perceptiacutevel No

contanto entre os dois dialetos o vocaacutebulo rsquolada lsquoamplorsquo do Romansh eacute

pronunciado como acutelada no Schwyzertutsch

A reinterpretaccedilatildeo de traccedilos relevantes ocorre quando o falante biliacutengue distingue

fonemas do sistema secundaacuterio cujas caracteriacutesticas que nesse sistema satildeo

meramente concomitante ou redundante mas que satildeo relevantes no seu sistema

principal Por exemplo a palavra do dialeto Romansh [lsquomєsbullɐ] bagunccedila pode

ser interpretada quase como no Schwyzertutsch rsquomesa

Por fim o processo de substituiccedilatildeo de fone atual eacute aplicado aos fonemas que satildeo

definidos de forma idecircntica nos dois idiomas mas que se comportam de froma

113

distintas Na situaccedilatildeo descrita o segmento do Romanche e o do

Schwyzertatsch satildeo ambos definidos como vogais frontais de abertura

maacutexima mas o fonema do sistema Schwyzertfitsch eacute pronunciado mais aberto

Os fonemas b do Romansh e o B do Schwyzertfitsch satildeo ambos definidos por

suas oposiccedilotildees tensa (sem voz) consoante aspirante e nasal homorgacircnica mas

b eacute sempre vozeado B apenas ocasionalmente

Quando ao tratar dos fatores estruturais favorecedores ou inibidores da

interferecircncia foneacutetica o pesquisador em questatildeo afirma que a anaacutelise contrastiva

dos fonemas de duas liacutenguas e a forma como eles satildeo usados produz uma lista

de formas de interferecircncias focircnicas esperada em uma situaccedilatildeo de contato

particular Quando os sons satildeo vistos como parte de um sistema focircnico certos

fatores adicionais emergem favorecendo ou inibindo a reproduccedilatildeo de som

defeituoso (pg 23)

Em continuidade ele afirma que ldquoum fator que elimina certos ruiacutedos na fala em

liacutengua estrangeira eacute a existecircncia de vazios no padratildeo no sistema fonecircmico

primaacuterio em que fonemas estranhos do sistema secundaacuterio podem ser

recuperados (rotulados)rdquo Isso se daacute devido agrave semelhanccedila com o(s) segmento(s)

cujas caracteriacutesticas satildeo mais aproximadas

Sobre a difusatildeo dos fenocircmenos de interferecircncia foneacutetica Weinreich assegura que

no estudo da propagaccedilatildeo de sons oriundos do contato linguiacutestico sobretudo na

influecircncia da liacutengua estrangeira (liacutengua de contato) seria relevante que

investigasse se o resultado de muitos tipos de interferecircncia eacute difundido da mesma

forma ou com igual facilidade

114

Ao citar Sapir ele afirma que

Podemos supor que as variaccedilotildees individuais decorrentes em fronteiras linguiacutesticas tecircm sido gradualmente incorporadas ao desvio foneacutetico de uma liacutengua Isto mostra aliaacutes que um sistema de som que eacute conhecido por ter sido influenciada por um estrangeiro natildeo precisa esperar para representar uma reacuteplica exata do sistema influenciando (1949 p213)64

Para ele um dos motivos que contribuiria para a interferecircncia foneacutetica seria

agravequela desencadeada pelo status

Com base na reduplicaccedilatildeo de som de Weinreich Matra (2009 p 241) descreve

que a produccedilatildeo de segmentos foneacuteticos eacute vulneraacutevel No entanto

A replicaccedilatildeo fonoloacutegica (interferecircncia transferecircncia ou ldquoempreacutestimordquo) pode afetar qualquer niacutevel da estrutura de som a articulaccedilatildeo de fonemas individuais ou fonemas dentro das palavras o comprimento e a geminaccedilatildeo acento e tom prosoacutedia e entonaccedilatildeo Em fonologia os empreacutestimos foram muitas vezes considerados como estrateacutegias para preencher as chamadas lacunas estruturais no sistema destinataacuterio65

Matras ainda defende que a mudanccedila induzida pelo contato fonoloacutegico eacute o

resultado da incapacidade ou da relutacircncia dos falantes para manter a separaccedilatildeo

completa e consistente entre os sistemas fonoloacutegicos de duas liacutenguas Ele cita

como exemplo o fato de os falantes da liacutengua receptora lidarem com a pronuacutencia

de termos da liacutengua de origem66

64

We may suppose that individual variations arising at linguistic borderlands - whether by the unconscious suggestive influence of foreign speech or the actual transfer of foreign sounds into the speech of bilingual individuals - have been gradually incorporate into the phonetic drift of a language This shows incidentally that a sound system which is known to have been influenced by a foreign one need not be expected to represent an exact replica of the influencing system 66

Isso ocorre mais frequentemente quando uma palavra estrangeira eacute introduzida na liacutengua de

destino por apenas um pequeno grupo de biliacutengues ou semibiliacutengues e se espalha por toda fala da comunidade inclusive para os monoliacutengues natildeo estatildeo familiarizados com os sons originais da

115

Quando emprestado de uma liacutengua doadora um vocaacutebulo natildeo acarretaraacute

necessariamente em mudanccedila no sistema fonoloacutegico da liacutengua receptora O que

ocorre como jaacute fora colocado aqui eacute o processo de acomodaccedilatildeo fonoloacutegica O

vocaacutebulo emprestado passa a ser pronunciado com os segmentos foneacuteticos da

liacutengua receptora

Todavia Matra (2009 p 222-223) chama a atenccedilatildeo para um segundo tipo de

processo em que ldquoos sons que aparecem nos vocaacutebulos emprestados que satildeo

normalmente ausentes do sistema da liacutengua destinataacuteria podem ser replicados

juntamente com o proacuteprio vocaacutebulordquo fazendo com que haja um enriquecimento no

inventaacuterio foneacutetico na liacutengua receptora 67

Segundo o autor este tipo de processo ocorre com normalidade em situaccedilotildees

em que o bilinguismo eacute muito generalizado Logo ldquomembros biliacutengues de uma

comunidade que estatildeo cientes da forma original da pronuacutencia da liacutengua doadora

fazem um esforccedilo para autenticar o vocaacutebulo emprestado replicando sua forma

originalrdquo

Em continuidade ele afirma que

Uma vez que a liacutengua doadora goza de alguma forma de prestiacutegio muitas vezes devido a associaccedilotildees com comeacutercio tecnologia conhecimento e outros tipos de inovaccedilatildeo ou de poder a replicaccedilatildeo de pronuacutencias originais da liacutengua doadora satildeo imitadas por muitos monoliacutengues (natildeo falantes da liacutengua doadora) como tal levando agrave propagaccedilatildeo dentro da liacutengua destinataacuteria dos novos fonemas nos vocaacutebulos emprestados que satildeo relevantes Isso comprova o respeito dos falantes para a linguagem dos doadores e agrave sua flexibilidade no uso de sua liacutengua materna (a liacutengua do destinataacuterio) indicando que os

liacutengua doadora Em tais situaccedilotildees haacute uma forte lealdade para com a liacutengua de destino e geralmente apenas com superficial conhecimento com a liacutengua de origem (p 242) 67

Como exemplo eacute citado o caso da africada dʒ que em situaccedilatildeo de empreacutestimo pode ser

pronunciada como tʃ em palavras que oriundas do inglecircs

116

falantes se contentam em atribuir fonologicamente autenticidade agrave replicaccedilatildeo de empreacutestimos lexicais prioritaacuterios maiores do que para a preservaccedilatildeo das estruturas fonoloacutegicas coerentes de sua liacutengua nativa (idem p 224)

Em uma situaccedilatildeo onde o bilinguismo eacute estabelecido e prolongado os falantes (na

maioria de uma liacutengua minoritaacuteria como o caso dos Latundecirc) podem ajustar o

inventaacuterio de sons e as regras que regem a sua distribuiccedilatildeo para coincidir com as

do outro

Matras (2009 p 225) atraveacutes de um quadro descreve os quatro tipos de

mudanccedilas fonoloacutegicas oriundas do contato linguiacutestico com base nos perfis dos

falantes linguagem e atitudes

Quadro 8 Tipos de processos que conduzem a mudanccedila fonoloacutegica induzida por contato

117

Com base no quadro anterior depreende-se que

i) O tipo A eacute diferente na medida em que natildeo envolve nenhuma mudanccedila no

sistema fonoloacutegico mas apenas uma mudanccedila de palavras individuais

enquanto os tipos B-D todas envolvem algum grau de modificaccedilatildeo para o

sistema tal como utilizado por colunas numa base regular No entanto

existem semelhanccedilas entre os tipos de aspectos individuais

ii) Os tipos A e B satildeo semelhantes e giram em torno de palavras emprestadas

individualmente

iii) Os tipos A e C satildeo semelhantes em que ambos envolvem a transferecircncia

de recursos de liacutengua nativa para material diferente

iv) Os tipos B e D satildeo semelhantes em que ambos envolvem a adoccedilatildeo de

padrotildees sonoros estrangeiros e sua integraccedilatildeo na liacutengua nativa

v) Os tipos C e D mostram como mencionado acima o fato de que os

falantes tentam evitar que para selecionar os sons de dois conjuntos

distintos de inventaacuterio e ateacute generalize apenas um conjunto de sons para

serem usadas em ambas as liacutenguas isto eacute em toda a interaccedilatildeo contextos

Os falantes do portuguecircs falado por Latundecirc se estendem em duas direccedilotildees Em

tipos A e C onde os falantes reinterpretam os sons dos vocaacutebulos emprestados

da liacutengua doadora alinhando-os aos padrotildees e inventaacuterio da liacutengua receptora

(nativa) No tipo D os falantes modificam os segmentos foneacuteticos com base no

inventaacuterio externo A aplicaccedilatildeo de uma determinada regra fonoloacutegica pode

resultar na perda ou em ganho de fonemas p226

118

O contato linguiacutestico pode ser representado ainda como um contiacutenuo Nele

ocorrem forccedilas centriacutefugas e centriacutepetas que dinamizam os sistemas linguiacutesticos

Para Matras idem p 226 fatores como normas sociais lealdade e consciecircncia

de identidade podem interferir e ateacute mesmo neutralizar os fenocircmenos advindos do

contato O empreacutestimo sofreria portanto estas pressotildees

Figura 12 Ligaccedilotildees entre a intensidade do bilinguismo o tipo de processo de acomodaccedilatildeo e sobreposiccedilatildeo entre os sistemas fonoloacutegicos

Quanto menor for o bilinguismo maior seraacute a separaccedilatildeo de sistemas Por outro

lado quanto mais intenso for o bilinguismo maior seraacute a convergecircncia de

sistemas fonoloacutegicos

No que concerne agrave integraccedilatildeo fonoloacutegica Matras (2009 p 227) explica que a

substituiccedilatildeo de fonemas eacute uma das formas mais comuns posto que este

processo permite uma aproximaccedilatildeo de caracteriacutesticas entre o sistema interno e

externo Dessa forma a substituiccedilatildeo eacute mais comum uma vez que os fonemas

satildeo combinaccedilotildees de recursos articulatoacuterios e as caracteriacutesticas em comum satildeo

mantidas em detrimento agraves complexidades dos fonemas que natildeo compartilham de

traccedilos em comum

119

Ele tambeacutem chama a atenccedilatildeo para a estrutura silaacutebica dos sistemas fonoloacutegicos

que entram em contato afirmando que ldquoos estrangeirismos podem acomodar a

siacutelaba e a estrutura do acentordquo (idem p 228)

A aplicaccedilatildeo de regras sobre a distribuiccedilatildeo de fonemas oriundos do empreacutestimo

pode resultar na perda de um traccedilo ou de um fonema A integraccedilatildeo de fonemas

tambeacutem pode levar agrave omissatildeo de outros fonemas que natildeo fazem parte o

inventaacuterio fonoloacutegico da liacutengua receptora E a omissatildeo de certas caracteriacutesticas

durante a replicaccedilatildeo de fonemas pode ser prejudicial para o sistema como um

todo e isso pode resultar em uma reduccedilatildeo de pares miacutenimos

Sobre a convergecircncia dos sistemas fonoloacutegicos Matras (2009 p 229) assegura

que um fator que retarda o processo de substituiccedilatildeo de som eacute a presenccedila de

vaacuterios pares de vocaacutebulos que contam com o contraste Neste caso a

convergecircncia aumenta as semelhanccedilas entre os inventaacuterios fonoloacutegicos das duas

liacutenguas E a replicaccedilatildeo da variaccedilatildeo alofocircnica eacute uma via comum para a

convergecircncia

Quanto aos segmentos foneacuteticos ainda de acordo com o pesquisador em

questatildeo as consoantes satildeo as mais introduzidas nos estrangeirismos Uma vez

que nas liacutenguas do mundo o nuacutemero de segmentos consonantais eacute maior que o

das vogais Logo os vocaacutebulos emprestados satildeo mais propensos a introduzir

mais consoantes que vogais

No caso Portuguecircs falado por Latundecirc tal assertiva em parte se configura A

anaacutelise dos dados prova que satildeo as consoantes as mais favoraacuteveis para a

realizaccedilatildeo dos processos foneacuteticos Todavia o nuacutemero de consoantes nessa

120

liacutengua eacute menor que o de vogais conforme descriccedilatildeo de Telles 2002 a qual

veremos na proacutexima seccedilatildeo

Van Coetsem (1988 p7) tambeacutem aborda os processos e comportamentos

oriundos do contato linguiacutestico68 E para que este contato seja estabelecido eacute

necessaacuterio que se tenha uma liacutengua de origem (SL) e uma liacutengua destinataacuteria

(RL)

Figura 13 Correspondecircncia entre liacutenguas e contato linguiacutestico

Embora o modelo de Van Coetesem seja universal e demonstre que na maioria

dos contatos linguiacutesticos a liacutengua de origem seja uma liacutengua dominante

ressaltamos que neste trabalho a liacutengua de origem (SL) eacute a liacutengua minoritaacuteria o

Latundecirc E o substrato analisado eacute uma modalidade de portuguecircs falado pelos

Latundecirc

Em continuidade este estudioso afirma que

Um empreacutestimo fonoloacutegico eacute uma imitaccedilatildeo uma reacuteplica ou uma reproduccedilatildeo na liacutengua recipiente (RL) de um elemento estrangeiro ou uma pronuacutencia da liacutengua de origem (SL) Esse tipo de imitaccedilatildeo eacute muitas vezes apenas uma aproximaccedilatildeo Para o imitador a imitaccedilatildeo implica o uso de algo que ele natildeo tem na sua proacutepria liacutengua Um empreacutestimo fonoloacutegico como uma imitaccedilatildeo eacute portanto algo que o falante imitador da RL natildeo tem em sua fonologia integrada ou nativa ou seja algo

68

Para Van Coetsen o termo ldquoempreacutestimo fonoloacutegicordquo indica qualquer forma de empreacutestimo no acircmbito da fonologia segmentar ou suprassegmental independentemente se isto afeta a dimensatildeo paradigmaacutetica a dimensatildeo sintagmaacutetica ou ambas (p7)

121

fonoloacutegico ou subfonoloacutegico que deriva de seu sistema fonoloacutegico nativo (Idem p 8)69

A intenccedilatildeo do falante ao fazer uso do segmento emprestado eacute reproduzi-lo da

melhor forma possiacutevel Ao fazer isso ele obedece agraves consideraccedilotildees sociais O

proacuteprio fato de que o segmento natildeo esteja inserido em seu proacuteprio sistema faz

com que na pressatildeo de se adaptar a diferentes pronuacutencias ele (o falante) procure

o equivalente mais proacuteximo em seu sistema

Para que isso ocorra ldquoo falante faz uso de dois processos a imitaccedilatildeo e a

adaptaccedilatildeo p 9rdquo Ambos pressupotildeem a existecircncia de um conjunto organizado de

segmentos fonoloacutegicos e distribuiccedilatildeo de unidades inseridas pelo falante da liacutengua

recipiente por um lado e por outro o confronto das pronuacutencias estrangeiras com

que o falante tem que lidar

Aleacutem dos processos de imitaccedilatildeo e adaptaccedilatildeo Van Coetesem tambeacutem utiliza a

noccedilatildeo de integraccedilatildeo ldquoque eacute a incorporaccedilatildeo de elementos em uma dada liacutengua

advindos de outra(s) liacutengua(s)rdquo A imitaccedilatildeo seria portanto o preacute-requisito para a

integraccedilatildeo No caso do portuguecircs falado pelos Latundecirc natildeo haacute indiacutecios de

integraccedilatildeo de fonemas especiacuteficos da sua liacutengua de origem

Para que ocorra o processo de imitaccedilatildeo eacute necessaacuterio que haja uma agentividade

que eacute um tipo especiacutefico de transferecircncia onde o falante de uma dada liacutengua eacute

ativo e o outro passivo O inverso tambeacutem pode ocorrer

69

A phonological loan is an imitation replication or reproduction in the RL of a foreign or SL

pronunciation such an imitation is often only an approximation For the imitator imitation implies the use of something that he does not (yet) have of his own A phonological loan as an imitation is thus something that the imitating RL speaker does not have in his integrated or native phonology something phonemic or subphonemic that deviates from his native phonological system

122

Figura 14 Agentividade da Liacutengua Recipiente de acordo Van Coetsem 1988 p10

Na agentividade da liacutengua recipiente (RL)70 o segmento dominante na relaccedilatildeo

entre a liacutengua recipiente e a liacutengua de origem71 eacute o da liacutengua recipiente Logo o

domiacutenio linguiacutestico seraacute o da liacutengua recipiente

Figura 15 Agentividade da Liacutengua de Origem de acordo Van Coetsem (1988 p11)

Na agentividade da liacutengua de origem (SL) o segmento dominante na relaccedilatildeo

entre a liacutengua recipiente e a liacutengua de origem eacute o da liacutengua de origem Sendo

assim o domiacutenio linguiacutestico seraacute o da liacutengua de origem

Tomando como referencial os modelos apresentados podemos estabelecer um

contiacutenuo cronoloacutegico para compreender como se daacute a agentividade sobre o

contado do Portuguecircs com o Latundecirc

70

No caso em questatildeo a modalidade do portuguecircs falado pelos Latundecirc eacute a liacutengua recipiente 71

Consequentemente a liacutengua de origem (SL) eacute o Latundecirc

123

Figura 16 Relaccedilatildeo de agentividade entre o Portuguecircs e o Latundecirc

Historicamente devido aos fatores socioeconocircmicos o contato inicial se daacute entre

o Portuguecircs influenciando o Latundecirc Aquele como liacutengua majoritaacuteria e este como

minoritaacuteria

O Latundecirc por ser a liacutengua do povo dominado eacute submetido agraves interferecircncias da

liacutengua de domiacutenio Deste contato resulta uma modalidade especiacutefica do

Portuguecircs que eacute o falado por Latundecirc

Em suma podemos afirmar que embora seja o Portuguecircs a liacutengua dominante e

que inicialmente seja ele o agente sobre o Latundecirc a posteriori fora o Latundecirc o

agente pelas transformaccedilotildees ocorrentes no Portuguecircs de contato Posto dessa

forma a agentividade se daacute em ambos os contextos a partir do referencial que se

tenha uma vez que o Portuguecircs e o Latundecirc tanto influenciaram como foram

influenciados Mas vale ressalvar que para este recorte o Portuguecircs eacute a liacutengua

que sofre influecircncia Eacute este o fio condutor da nossa pesquisa

Portuguecircs Latundecirc Portuguecircs falado por Latundecirc

124

53 FONOLOGIA DO LATUNDEcirc

Para uma melhor compreensatildeo futura passaremos agora a descrever os

sistemas fonoloacutegicos das liacutenguas em estudo

Elencamos abaixo as principais caracteriacutesticas fonoloacutegicas do Latundecirc

Eacute uma liacutengua com maior quantidade de elementos vocaacutelicos (dezesseis)

em detrimento aos consonantais (onze) Eacute uma liacutengua vocaacutelica portanto

Apresenta dez vogais orais e seis nasais Dessas oito satildeo laringais72

As vogais nasais satildeo contrativas apenas na posiccedilatildeo do acento

Os glides w j quando em posiccedilatildeo de onset sofrem o processo de

consonantizaccedilatildeo

Apresenta seis tipos de siacutelabas fonoloacutegicas que satildeo derivadas da extensatildeo

(C)V(C)(C) V VC VCC VC CVC e CVCC

O nuacutecleo silaacutebico eacute sempre preenchido por uma vogal

Dos segmentos consonantais apenas a oclusiva glotal ʔ natildeo eacute observada

em posiccedilatildeo de onset

A coda pode ter desdobramento ramificado sendo a primeira posiccedilatildeo

preenchida sempre por um glide

Os padrotildees silaacutebicos VC e CVC satildeo os mais frequentes e ocorrem tanto

em siacutelaba tocircnica como aacutetona

Tem uma forte tendecircncia agrave monotongaccedilatildeo

O sistema acentual eacute misto que associa o acento lexical ao acento foneacutetico

72

Telles explica que as mais novas geraccedilotildees Latundecirc abaixo de 20 anos realizam o traccedilo laringal com menor frequecircncia e audibilidade

125

O acento eacute realizado foneticamente como tom (pitch) alto

Eacute uma liacutengua de caracteriacutestica de liacutenguas pitch accent

Apresenta processos fonoloacutegicos em niacutevel poacutes-lexical fundamentalmente

Estes processos satildeo agrupados em assimilaccedilatildeo (harmonia vocaacutelica e

vozeamento das oclusivas) dissimilaccedilatildeo reduccedilatildeo apagamento silaacutebico e

epecircntese

Quadro 9 Fonemas consonantais do Latundecirc

Fonemas Consonantais

Labiais Coronais Dorsal Glotais

+ anterior - anterior + anterior - anterior - anterior - anterior

Plosivas p t k

Nasais m n

Fricativas s h

Lateral l

Glide w j

Quadro 10 Fonemas vocaacutelicos do Latundecirc

Fonemas Vocaacutelicos

Vogais Vogais Laringais

Altas i u i u

Altas Nasais ĩ ũ i u

Meacutedias e o e o

Baixa a a

Baixa Nasal a a

126

Quadro 11 Ditongos do Latundecirc

Ditongos

Crescentes Decrescentes

w j w J

i wi iw

e e we we je je ej e j

a a a a wa wa ja ja ja aw a w a w aj a j atildej

o o wo jo ow

u u u ju ju ju

Quadro 12 Descriccedilatildeo dos fonemas consonantais (Retirada de Telles 2002)

Segmento - Descriccedilatildeo - Contexto de realizaccedilatildeo e especificidades

Exemplos

Traduccedilatildeo

p73 - Oclusiva bilabial surda

Eacute de extrema limitaccedilatildeo de realizaccedilatildeo na liacutengua

Ocorre em posiccedilatildeo de onset formando

siacutelabas com as vogais i a atilde o u

Pode se realizar como [p] oclusiva bilabial surda [b] oclusiva bilabial

sonora [ɓ] oclusiva bilabial sonora

implosiva

Em iniacutecio de palavras realiza-se [p]

diante da vogal coronal [i] e [b ɓ] e

diante da vogal baixa [a]

Em meio de palavra ou enunciado quando precedido por oclusiva glotal realiza-se [p]

[pite]

piʔ-te

[ιɓ

pan-tatilden

[diʔpa natildenʌ]

jaliʔ pan-tatilden-ta

[kotildebayte] ~ [kotildebayte]

kownpayt-te

[sabagnĩde]

Espeacutecie de paacutessaro chupito Satildeo dois Satildeo dois colares Tatu espeacutecie de

73

Outros estudos com liacutenguas proacuteximas tambeacutem indicam a baixa frequecircncia da realizaccedilatildeo do p

nas liacutenguas desse grupo Kingston 1970 para o Mamaindecirc e Lowe 1961 para o Nambikwaacutera do sul (Galera Kabixi Munduacuteka Nambikwaacutera do Campo)

127

Em meio de palavras ou enunciados em ambiente intervocaacutelico ou nasal adjacente realiza-se [b]

sapan-kinĩn-te

[tʃabatildeʔginĩde]

sapatilden-kin-te

Pente Taioba

m - Nasal labial + anterior

Oclusiva bilabial nasal com distribuiccedilatildeo mais larga do que a do p

Apresenta ocorrecircncia restrita quanto comparada agrave nasal alveolar n

Realiza-se [m]

Ocorre em iniacutecio de siacutelaba diante das

vogais i i i i a a a u u u u

Natildeo forma siacutelaba com as vogais

meacutedias frontais e e e com as

posteriores o o

Apoacutes pausa e seguida de a pode se realizar como oclusiva bilabial nasal

preacute-glotalizada - [ ʔm ]

[ miɾatildenʌ]

mih-tatilden-ta

[katilde ɾatildenʌ]

kami h-tatilden-ta

[ a ĩ de]

e ĩn-te

[ e ĩ de]

e ĩ -te]

[ ma hɾatilden]

mah-tatilden

[ atildega ɾe]

atilden-kaloh-te

[ka a ʔɾatildenʌ]

ka- a -tatilde-ta

[ datildena]

n-tatilden-ta

[tumuʔku ɾe]

tumuʔku-te

Estaacute chovendo Aacutegua estaacute suja Cobra espeacutecie de Couro Ele estaacute esperando Roupa Estaacute molhado Estaacute bonito Jacu

128

Em fronteira de morfema precedido pela fricativa glotal h teraacute a sua realizaccedilatildeo ensurdecida

[ a datildenʌ]

a n-tatilden-ta

[ʔ atilde ɳ datilden]~[ a n datilden]

atilden-tatilden

[ʔ atildeʔ n datilden] ~

[ atildeʔ ndatilden]

atilden- n-tatilden

[n h atildega tna ]

n - atilden-ka -tatilden-na

Estaacute inchado Estaacute queimando Vocecirc estaacute mandando Eacute nossa roupa

w - Glide labial - anterior

Glide laacutebio-velar sonoro

Ocupa as posiccedilotildees de onset e coda

Apresenta leve arredondamento nos laacutebios

Eacute o segmento mais frequente das labiais

Realiza-se como [w] em iniacutecio de

siacutelaba diante das vogais i e e a a o

tambeacutem podendo variar com [ʋ]

fricativa laacutebio-dental que eacute realizada com fraco grau de fricccedilatildeo

[ wi rsquoɾatilden] ~ [ ʋi ɾatilden]

wi -tatilden

[woda h de] ~ [ʋoda h de]

wotah-te

[na weʔrsquoa jrsquoɾe] ~ [na ʋeʔajrsquoɾe ]

na jn-weʔa jh-te

[ kowajna tatildenʌ]~ [koʋajna tatildenʌ]

hah-wa jn-ta-tatilden-ta

[daweʔgɾatilde ni]

taweʔ-ka-tatilden-ti

[ we jginĩdatildena]

we jn-kinĩn-tatilden-ta

[ wajkinĩ de]

wajʔ-kinĩn-te

Ele comeu Pomba Eacute para colocar na cabeccedila Satildeo poucos laacutepis Ele cozinhou Eacute fruto da bacaba

129

Em dissiacutelabos no onset de siacutelaba preacute-tocircnica aberta seguido de vogal a central baixa pode ocorrer a fusatildeo entre o w e a vogal a realizando-se como [ͻ o u]74

Na sequecircncia w + a o a pode sofrer harmonia vocaacutelica recebendo o ponto de articulaccedilatildeo da vogal acentuada sendo realizada [e]

Quando em final de siacutelaba segue as

vogais i o a a

E depois das vogais io pode alongar-se

Se a vogal precedente for a baixa a

a ocorreraacute a fusatildeo resultando as

posteriores ͻ ͻ

Quando em siacutelaba em siacutelaba

acentuada ͻ ͻ podem ser alongados

ou seguido de oclusatildeo glotal [ʔ] ou

ocorrer uma assimilaccedilatildeo regressiva

das baixas aa passando a [ͻ ͻ ]

Quanto agrave frequecircncia w se mais

ocorrente depois da vogal baixa a a

e baixiacutessima ocorrecircncia depois da vogal i o

Ao integrar uma siacutelaba (C)v wN onde a

vogal eacute nasalizada o glide pode ser nasalizado ou coalescer com a consoante nasal na coda

Em posiccedilatildeo de onset e pronunciada rapidamente eacute fortificada podendo ser realizada como [p] e [m]75

[ wa jkinĩ de]

wa jh-kinĩn-te

[waɾaɾwaɾaʔĩ datildenʌ] ~

[wͻɾaʔwͻɾaʔĩ datildenʌ] ~

[ͻɾaʔͻɾaʔĩ datildenʌ]

watajwatajn-tatilden-ta

[weli nde] ~ [uli n de]

wa ĩn-te

[weɾe ɾatildena] ~ [ ɾe ɾatildena] ~

[ rsquoɾe ɾa na]

wateh-tatilden-ta

[giw ladaɾe] ~ [gi la de]

kiwlah-tah-te

[kowa ɾe] ~ [koa ɾe]

kowah-te

[a wde] ~ [ ͻ de] ~ [ ͻ ʔde]

a w-te

[aw de] ~ [ͻ de] ~ [ͻʔ de]

awh-te

[na w du] ~ [nͻ du] ~ [nͻ w du]

na wh-tu

[a wm datilden] ~ [atilde w m datilden] ~

Amendoim Fruto do accedilaiacute Estaacute fino Tamanduaacute Estaacute sumido Cascavel Andorinha Flexa Gaviatildeo

74

Conforme Telles (2002 p 42) Estas alofonias variam de acordo com a qualidade da vogal

tocircnica da siacutelaba seguinte com a qual sua vogal aacutetona nuclear se harmoniza 75

Tal ocorrecircncia eacute mais frequentemente constatada em falantes monoliacutengues em Latundecirc

130

[atilde m datilden]

atilde wn-tatilden

[woloʔʔnatildenʌ] ~ [polo ʔnatildenʌ]

walon-tatilde-ta

[wʌnaʔkinĩ de] ~ [mʌnaʔkinĩ de]

~ [wanaʔkinĩ de]

wanaʔ-kinĩn-te

[wo nut ʔna ] ~ [mo nut ʔna ]

wo nuʔ-tatilden-na

[wʌ na jginĩ datildenʌ] ~

[mana jginĩ datildenʌ] ~

wa -na jn-kin-tatilden-ta

[wa ʃi de] ~ [maʔ ʃi de]

wa-sin-te

Lontra Estaacute assando no burralho Estaacute podre Castanha do caju Eacute corpo inteiro Eacute tua cabeccedila Espeacutecie de abelha

t - Plosiva coronal + anterior

Oclusiva alveolar surda

Ocorre com as vogais ie e a

a atilde o o u ũ

t realiza-se [d] em siacutelaba acentuada podendo ainda variar em posiccedilatildeo medial como [|]

Em iniacutecio de palavra o alofone [d] pode ser realizado como preacute-

[diko lo n de]

tiʔ-ko lo n-te

[ de he ɾaɾe]

te h-tah-te

Paacutessaro pintado espeacutecie de paacutessaro Ele cozinhou

131

glotalizado realizando-se como

[ɗ]

Em fala lenta pode ser realizado como [d]

Em contexto fora do acento ocorre [t] com raros exemplos de variaccedilatildeo entre os alofones [d] e [t]

[ de geɾatilden]

te h-ka-tatilden

[daʔjͻ ratildena]

ta-jaw-tatilden-ta

[da jginĩ de]

ta jn-kinĩn-te

[ doɾatilden] ~ [d ɾatilden]

toh-tatilden

[do h gratilden]

to h-ka-tatilden

[du ɾatilden]

tu-tatilden

[d hdatilden]

tu-tatilden

[kͻdͻ ɾe]

kataw-te

[kado ndatildenʌ]

katon-tatilden-ta

[teda de]

teta-te

[toʔdatilde n de]

toʔtatilden-te

[tigi ɾe]

tikih-te

Sucuri Ele estaacute sentado Pedra Ele morreu Ele procurou Ele pegou Ele chupou Patuaacute Estaacute cru Jaoacute Nambu

132

As possibilidades alofocircnicas de t entre segmentos depende do acento e do contexto adjacente Estas duas condiccedilotildees definem as alofonias76

Precedido de vogal em ambiente

intervocaacutelico realiza-se [tdɾ]

sendo [d] o preferencial

Quando t eacute precedido por h

realiza-se como [tdɾ] A

presenccedila da fricativa favorece o rotacismo de t tornando-o em

[ɾ]

Quando t eacute precedido de ʔ ou

de t a realizaccedilatildeo pode ser [t] mas [d] pode permanecer em raros casos

Em contexto de nasalizaccedilatildeo trecircs realizaccedilotildees satildeo possiacuteveis para t i) vozeamento da oclusiva alveolar ii) preacute-nasalizaccedilatildeo da oclusiva alveolar em iniacutecio de siacutelaba tocircnica e iii) assimilaccedilatildeo total da nasal adjacente

[tabawdnͻde]

tapawn-naw-te

[tala de] ~ [dala de]

tala-te

[tolowm datilde ]

talown-tatilden

[lodo ɾa ɾe] ~ [lo to ɾa ɾe] ~

[loto ɾa ɾe]

loto-tah-te

[doʔ daj de] ~ [toʔ ɾaj de]

to-tajn-te

[nu h ɾe] ~ [ nu h de]

nu h-te

[lo hrsquoɾe] ~ [lo h de] ~

[lo h te]

loh-te

[hu te] ~ [hu de]

huʔ-te

[keja te] ~ [kejaʔ te]

kejat-te

[ĩ datildena] ~ [i ndatildena] ~ [i natildena]

Macaco pequeno Ombro Tipoia Ele terminou Rato grande Abelha vermelha Lagarto grande Urubu

76

Dessas alofonias o flap [ɾ] tem sua ocorrecircncia ligada ao acento

133

Em siacutelaba natildeo acentuada t pode sofrer fricatizaccedilatildeo passando a se realizar como [s]

ou [ts] ou [ʔs]

Ainda neste contexto permanecem possiacuteveis as realizaccedilotildees [t] e [d] se o t sofrer fricatizaccedilatildeo a aspiraccedilatildeo glotal precedente do h natildeo se realiza

Em travamento silaacutebico t realiza-se de preferecircncia como

ʔ Pode ser deletado

ocasionando o prolongamento da vogal tautossilaacutebico

in-tatilden-ta

[katilde datildena] ~ [katilde ndatildena] ~

[katilde natildena]

katilden-tatilden-ta]

[kejaʔ n da ɾe] ~ [kejaʔ na e]

kejan-tah-te

[losa na ʔ] ~ [lostsa na ʔ] ~

[lo ʔ sa na ʔ] ~ [lo h ta na ʔ]

loh-ta-na

[kejate] ~ [kejaʔte]

kejat-te

[kejaʔtiʔjoho]

kejat-ti-jo-ho

[lote] ~ [loʔte]

lot-te

[acute tʃjͻna ]

lot-ti-jaw-na

Arco Milho Estaacute apimentado Estaacute duro Lambari grande Eacute urubu Milho Talvez seja milho Paca A paca estava aiacute

134

n - Nasal coronal - anterior

Oclusiva alveolar nasal

Suas alofonias satildeo condicionadas pelo contexto adjacente agrave sua posiccedilatildeo de ocorrecircncia e agrave estrutura silaacutebica

Em onset realiza-se como [n] com as

vogais i i ĩ ĩ a a atilde atilde u u ũ ũ

Tambeacutem pode apresentar flutuaccedilatildeo em

onset realizando-se [ʔn]77 alveolar

nasal preacute-glotalizada com preferecircncia quando seguido por a

Em posiccedilatildeo de onset e em fronteira de morfema dependendo do seguimento seguinte sofreraacute alteraccedilatildeo

Quando precedido por h sofreraacute ensurdecimento

Quando precedido por outro n na coda silaacutebica precedente poderaacute ser

preacute-glotalizada [ʔn]

[ni du]

ni-tu

[ni ʔkinĩnatildena]

ni ʔ-kinĩn-tatilden-ta

[nagatilde de]

nakatilden-te

[katildena ratilden]

kana h-tatilden

[natildejd ]

natildejn-tu]

[ʔnatilde natilde ʌ]

natilde n-tatilden-ta

[nu h e]

nuʔ-te

[lsquon h ɾe]

nu h-te

[n n de]

n n-te

[n h n atildega tatildena]

Tipo de lenha Eacute fruto Lagarto Estaacute escuro Pacu Estaacute chorando Braccedilo Lagarto Espeacutecie de Bicho

77

Tal qual ocorre com m a glotalizaccedilatildeo de n deve-se em alguns casos aacute reduccedilatildeo da siacutelaba

inicial da palavra

135

Em posiccedilatildeo de coda de siacutelaba acentuada gera processo de assimilaccedilatildeo de dissimilaccedilatildeo e de elisatildeo resultando numa seacuterie de alofonias

Ainda em siacutelaba acentuada se a vogal tautossilaacutebica for oral e entre a coda nasal existir um glide labial-velar constituindo uma siacutelaba com ditongos awn own n se realiza como [m] preferencialmente

w e n em posiccedilatildeo de coda pode sofrer coalescecircncia realizando-se como [m] ou [n]

Se o glide ocupante da primeira posiccedilatildeo da coda for j ou se a siacutelaba tiver a coda preenchida pela nasal n a realizaccedilatildeo desta nasal seraacute [n]

Os glides que seguem a vogal na primeira posiccedilatildeo de coda podem

n -natilden-kah-tatilden-ta

[udʔna]

un-na

[iwm de]

iwn-te

[tʌlawm natildenʌ] ~ [tʌlaw natildenʌ]

talawn-tatilden-ta

[wawm datildenʌ] ~ [wͻwm datildenʌ]

wawn-tatilden-ta

[tolowm datildenʌ]

talown-tatilden-ta

[jatildew de] ~ [iɲatildew de] ~

[jatilde de]

jatildewn-te

[a wm datilden] ~ [atilde m datilden]

atilde wn-tatilden

[iʃɛʔ ɾʌ m datilden]

isaj-tatildewn-tatilden

[toʔkotilde datilden] ~ [t ʔkʌ datilden]

toʔkatildewn-tatilden

Eacute nosso Estaacute vivo Larva Estaacute grosso Estaacute vermelho Estaacute pronto Larva Estaacute assando no burralho

136

assimilar a nasalidade da consoante precedente 78

Se a vogal for nasal na maioria das ocorrecircncias a consoante nasal na coda seraacute apagada deixando seu tempo na vogal precedente e na consoante seguinte

Quando a coda nasal n segue ditongo formado por vogal nasal subjacente mais glide palatal j n em posiccedilatildeo de coda pode espalhar nasalidade regressiva para o glide precedente e pode ser apagada

Quando em coda nasal iraacute participar de outros processos fonoloacutegicos aleacutem da vogal precedente

Na posiccedilatildeo de siacutelaba acentuada em meio de palavra seguida por k n promove a sonorizaccedilatildeo de k e passa

a se realizar como [ʔ] oclusiva glotal

[kotilde baj te] ~ [kotildebay te]

kownpajt-te

[a ʔ n de] ~ [a n de]

a n-te

[je n datilden]

je n-tatilden

[i n datilde na ]

in-tatilden-na

[ hej ndatilden] ~ [ hej n datilden]

hejn-tatilden]

[ natildej de] ~ [ naj n de]

natildejn-te

[ atildendatilden]

atilden-tatilden

[ atilde n datilden]

atilden tatilden]

[ mɔ de] ~ [ de]

n-te

[n n de]

n n-te

Eles estatildeo correndo Ele misturou Tatu Tatu galinha Estaacute sujo Ele estaacute mamando Ele lavou Pacu Ele atirou

78

Para uma descriccedilatildeo mais detalhada sobre o comportamento de n e os glides ver a tese de

Telles 2002 55-57

137

Ainda quanto ao contexto semelhantemente descrito acima n for seguida por uma oclusiva surda homorgacircnica t poderaacute ocorrer processos que possibilitem uma alofonia em variaccedilatildeo livre

n sonoriza t

n sofre desnasalizaccedilatildeo

Quando n sonoriza a consoante seguinte ocorre a elisatildeo podendo ocorrer ou natildeo o alongamento compensatoacuterio da vogal precedente ou a preacute-nasalizaccedilatildeo da consoante seguinte

Quando n sofre elisatildeo alonga a vogal precedente e a consoante seguinte se assimila progressivamente com o traccedilo nasal passando a se realizar como [n]

n se vocaliza e recebe os traccedilos da vogal central e realiza-se nasal

Se n for seguida em coda por uma consoante nasal idecircntica ocupando a posiccedilatildeo do onset da siacutelaba seguinte poderaacute haver duas possibilidades de comportamento da coda nasal dependendo de ser a sua vogal tautossilaacutebica assimilar ou natildeo

Se a vogal precedente for nasal a coda sofreraacute elisatildeo e a vogal se alongaraacute

Se a vogal central for oral a consoante nasal da coda que precede a nasal idecircntica no onset da siacutelaba seguinte sofreraacute dissimilaccedilatildeo do traccedilo nasal79

[ natildej de] ~ [ naj n de]

natildejn-te

[ku ʔginĩ de]

ku n-kinĩn-te

[ dega tatilden]

te n-kaloh-tatilden

[ atildega ɾe]

atilden-kaloh-te

[ ku ndatildenʌ]

ku n-tatilden-ta

[ ku ddatildenʌ]

ku n-tatilden-ta

[ ku n datildenʌ] ~ [ ku datildenʌ]

ku n-tatilde-ta

[ ku natildenʌ]

ku n-tatilden-ta

Estaacute branco Bom-dia espeacutecie de aacutervore Bicho Pacu Rolo de fio de algodatildeo Roupa velha Roupa Estaacute fumando

79

A liacutengua Latundecirc eacute caracterizada pelo OCP (Princiacutepio do Contorno Obrigatoacuterio)

138

[ku datildenʌ]

ku n-tatilden-ta

[katilde na ]

katilden-na

[lidnu ɾe]

lin-nu-te

[lid na j ɾe]

lin-na jh-te

Estaacute fumando Estaacute fumando Estaacute fumando Estaacute fumando Estaacute duro Beiju de mandioca Raiz de mandioca

s - Fricativa alveolar surda

Fricativacoronal+ anterior forma siacutelaba

com as vogais i ĩ e a a atilde o uu ũ

Realiza-se como [s] [ʃ] [tʃ] [ʔs]

Em menor frequecircncia pode ser realizada como [t] e [t h]

Em siacutelaba acentuada em iniacutecio de palavras a fricativa pode se realizar

[tʃi ɾatilden] ~ [ʔsi ɾatilden]

sih-tatilden

[ ʔsitatilden] ~ [ sitatilden]

set-tan

Estaacute liso Trovejou

139

como palatal africada preacute-glotal ou como alveolar 80

Quando s se fortifica e passa a se realizar como [t] e ou como [t h] apresentam restriccedilatildeo ao contexto de vogal baixa seguinte podendo ocorrer em iniacutecio ou em meio de palavra Nestes contextos tambeacutem permanecem possiacuteveis as demais alofonias

A fortificaccedilatildeo de s eacute frequente em siacutelaba natildeo acentuada em iniacutecio de palavra Embora as siacutelabas acentuadas contenham maiores iacutendices Em posiccedilatildeo natildeo acentuada a alveolar ocorre em maior nuacutemero

A palatalizaccedilatildeo da fricativa eacute obrigatoacuteria quando precedida por i Sua realizaccedilatildeo eacute alveolar em posiccedilatildeo intervocaacutelica

[ʔsĩ du ɾatilden]

sĩn-tu-tatilden

[ʃa h ɾe] ~ [sa h ɾe]

sa h-te

[ tʃoɾatildenʌ] ~ [ ʃoɾatildenʌ]

soh-tatilden-ta

[ʃ de] ~ [s n de]

s n-te

[thathaʔi natildenʌ] ~ [ʃaʃaʔi natildenʌ]

sasan-tatilden-ta

[kejͻ ʔhe neʔt h o ɾeʔ] ~

[kejͻʔhe neʔto ɾeʔ]

keja w-haniʔ-s aw-te

[t datilde na ] ~ [t h datilde na ]

so-tatilden-na

[tʃamaj de] ~ [tamaj de] ~ [sama

de]

saman-te

[ʔʃamaʔdʌ ɾatildena]

saman-tah-tatilden-ta

[iʃatilde datilde na ]

isatilde n-tatilden-na

Estaacute arrastando Timboacute do mato Estaacute sujo Sol Estaacute mole Oacuteleo Eacute guarantatilde (espeacutecie de aacutervore) Tanajura Eacute tanajura

80

A africada eacute a mais utilizada pelos velhos enquanto a fricativa e a alveolar satildeo mais utilizadas

pelos jovens

140

[iʃu datildenʌ]

isu -tatilden-ta

[wasa h ɾe] - [wͻsa h ɾe]

wasah-te

Eacute folha Ele estaacute com frio Besouro

l- Lateral alveolar sonora

Lateral coronal + anterior

Forma siacutelaba em iniacutecio e meio de

palavras com as vogais i e a a o o

u

Fortifica-se em iniacutecio de palavras quando encontra-se na posiccedilatildeo de acento pode ser precedido por vogal aacutetona sem onset que tende a ser apagada

Diante do contexto acima realiza-se

[li tatilden]

lit-tatilden

[dale de]

tale-te

[giwla de]

kiwlah-te

[la ɾ e]

la h-te

[lo ɾatildena]

loh-tatilden-ta

[ko lo ko lo n de]

ko loʔ ko lo n-te

[toluʔ tatildena]

taluʔ-tatilden-ta

[ʔta e] ~ [da e]

la h-te

Ele saiu Embira Cobre cascavel Jacucaacuteca Estaacute comprido Pintado Ele tossiu

141

como alofones [ʔl] e [d]

Acompanhado por consoante nasal em onset silaacutebico pode assimilar progressivamente a nasalidade sendo realizado como [n]

Pode apresentar sobreposiccedilatildeo na maneira como se realizam

[t ~s ]

[t ~ n]

[n ~ l]

[t ~ l ]

[ʔlo tatilden] ~ [a tatilden]

atilde-loʔ-tatilden

[diʔ pa natildena] ~ [i iʔ pa natildena]

jaliʔ pan-tatilde-ta

[ naginila h ni ɾ atilden] ~

[ naginina h ni ɾatilden]

sapatilden-kinĩn-te

[kaas tatildena] ~ [kata tatildena]

kasaʔ-tatilden-ta

[tidit na j de] ~ [tidit ta de]

tatiʔ-najn-te

[nagatilde de] ~ [ agatilde n de]

nakatilden-te

[wota h ɾe] ~ [wola h ɾe]

wotah-te

Jacucaacuteca Ele estaacute afundado atolado Satildeo dois colares Eu natildeo sei se ele estaacute doente Taioba Estaacute grosso Mandioca mansa Lagarto do campo Pomba

142

j - Glide coronal - anterior

Eacute um glide palatal que ocupa a posiccedilatildeo de onset e de coda na siacutelaba

Em iniacutecio de siacutelaba j antecede as

vogais e e o a a atilde u u ũ

Quando em posiccedilatildeo inicial na siacutelaba e

acompanhado por e e em siacutelaba

acentuada ou seguido por a em siacutelaba aacutetona j pode se fortificar e se realizar

como [ʒ] sendo possiacutevel neste caso

ser seguido por um preacute glide [j] de fraca e raacutepida duraccedilatildeo

Quando seguido por a em siacutelaba aacutetona eacute opcional a fusatildeo entre o glide e a vogal derivando a vogal longa [i]

[je n datilden]

je n-tatilden

[ja te]

jaʔ-te

[ja te]

ja ʔ te

[jatildeʔ datilden] ~ [iɲatildeʔ datilden]

jatilden- n-tatilden

[jo ɾatilden]

joh-tatilden

[ju te]

ju-te

[ju te]

ju -rsquote

[j ginĩ de]

j n-kinĩn-te

[je natilden te] ~ [ʒe natilden te]

ja natilde-nu-te

[ j ʒe n datilden] ~ [ʒe n datilden] ~

[je n datilden]

je n-tatilden

[ʒɛge datilden] ~ [ʒɛga j datilden]

Estaacute sujo Maribondo espeacutecie Porco Vocecirc tem coragem Estaacute baixo Boca Peacute Pedra de gelo granizo Porco espinho Estaacute sujo

143

Se em posiccedilatildeo de onset e seguido de vogal nasal pode ocorrer uma consoante palatal seguindo o glide palatal e precedendo a vogal nuclear

Se for atilde a consoante intrusiva se realizaraacute com mais forccedila e separaraacute a sequecircncia jatilden em duas siacutelabas

Quando o glide vier antes da vogal ũ a consoante intrusiva poderaacute resultar no apagamento do glide podendo se realizar como consoante palatal ou preacute-glide

Em posiccedilatildeo final de siacutelabas

acompanha as vogais e e a a

jaka jn-tatilden

[inatilde de]

janatilde n-te

[jeda n de] ~ [ʒida n de] ~ [ida

n de]

jatan-te

[jatilde datilden] ~ [ iɲatildeʔ datilden]

jatilden- n-tatilden

[jatildew de] ~ [iɲatildew de] ~

[jatilde de]

jatildewn-te

[j ginĩ de] ~ [ j ɲ gibi de]

j n-kinĩn-te

[ ejdnirsquoɾatilde]

hejn-ten-ni-tatilde

[ e jtatilden]

e ʔ-tatilden

[wajkinĩ du]

wajʔ-kinĩn-tu

[na j de]

na j -te

[ natildejde]

natildejn-te

Eacute pica-pau pequeno espeacutecie Abelha do chatildeo espeacutecie veado espeacutecie Vocecirc tem coragem Larva espeacutecie Pedra de gelo granizo Eu vou lavar Ele fez fogo Amendoim

144

Maribondo espeacutecie Pacu espeacutecie de peixe

k- Plosiva dorsal - anterior

Eacute oclusiva velar surda Tem larga distribuiccedilatildeo e se realiza diante de todas as vogais do Latundecirc

Satildeo seus alofones [ʔk] [ɠ] [g] e [k]

Em iniacutecio de palavra se realiza preferencialmente como [k]

[kiliʔkinĩ de]

kiliʔ-kinĩn-te

[ki de]

ki -te

[ke ɾatildena]

keh-tatilden-ta

[ke ja ʔ n de]

ke ja jn-te

[ka ɾatildena]

kah-tatilde -ta

[ka

ka jn-te

[katilde natildena]

katilden-tatilden-ta

[ko h ɾe]

koh-te

[ko lo ʔko lo n datildeda]

ko lo ʔko lo n-tatilden-ta

Coco da palmeira inajaacute Macaco noturno Ele estaacute caccedilando Caititu Estaacute azedo Formiga Estaacute duro Tesoura

145

Em contexto de fala raacutepida em iniacutecio

de vocaacutebulos a velar preacute-glotal [ʔk]

pode ocorrer pode flutuar tambeacutem como velar plena [k]

Em mesmo contexto pode-se flutuar a velar sonora [g] ou a velar implosiva

[ɠ] ou a velar surda [k] ou a velar

surda preacute-glotalizada [ʔk]

Quando em meio de vocaacutebulo em contexto que envolve a consoante nasal lexical precedente a realizaccedilatildeo de [g] eacute categoacuterica

Entre vogais eacute possiacutevel que se encontre a variaccedilatildeo entre [k] e [g] sendo a surda a preferencial e em maior nuacutemero de realizaccedilotildees

[k n de]

k n-te

[ku n de]

ku n-te

[ʔkolo ɾe] ~ [kolo ɾe]

koloh-te

[ʔka laʔkala ɾe] ~ [ka laʔkala ɾe]

kalaʔkalaʔ-te

[golota taʔnatildena] ~

[kolota taʔ natildena]

kolon-sasan-tatilden-ta

[ gi natildena] ~ [ ɠi natildena]

ki n-tatilden-ta

[giʃaj n datildena] ~ [ɠiʃaj ndatildena] ~

[kiʃaj n datildena]

kisajn-tatilden-ta

[ atildega ɾe]

atilden-kaloh-te

[j ginĩ de]

j n-kinĩn-te

[waka de]

waka-te

Eacute pintado Timboacute do campo Algodatildeo Barata Galinha Estaacute maduro Estaacute coccedilando Estaacute pontudo Roupa

146

Em onset da siacutelaba acentuada em final de vocaacutebulo k pode se realizar [k h]

[lukaj de]

lukajn-te

[nakatilde n de] ~ [naga n de]

nakatilden-te

[ iwgula ɾatilden]

iwkulah-tatilden

[ i ʔga laʔga na ]

iʔka la n-ka-na

[ ɛtduʔ da jowi k h e ]

ajhtu ta-jaw-wi-ka

Pedra de gelo granizo Garccedila Flecha Lagarto Ele subiu Eles estatildeo brincando Pega (o banco) vamos sentar

- Plosiva glotal - anterior

Eacute uma oclusiva glotal surda com

realizaccedilatildeo [ʔ] que se restringe agrave

posiccedilatildeo de coda silaacutebica81

Tem seu comportamento condicionado pela presenccedila das consoantes adjacentes p t k

Pode se realizar como [ʔ] em fala

raacutepida preceder a oclusiva velar surda k

Como [j] quando a vogal nuclear for a meacutedia frontal e ou a baixa a

Como [w] quando a vogal nuclear for a meacutedia posterior o

[huʔ kaʔ datilden] ~ [ kaʔ datilden]

huʔ-kah-tatilden

[kidiʔka tatilden]

kitiʔ-kah-tatilden

[ atilde ʔ tatilden] ~ [ atilde tatilden] ~

[malo h tatildeni]

atilden-loʔ-tatilden

Eacute arco Eacute furador Ele queimou

81

A entre l e s natildeo foi observada na liacutengua Latundecirc

147

E favorecer a deleccedilatildeo de motivando um alongamento que compensa a vogal nuclear ou alongar ainda alongar esta vogal seguindo de leve aspiraccedilatildeo

A realizaccedilatildeo de [ʔ] nas alofonias

acima soacute eacute notada quando na siacutelaba na qual estaacute presente quando apenas a oclusiva estiver no travamento

silaacutebico (CVʔ)

Quando em posiccedilatildeo de coda pode assimilar o ponto da consoante seguinte e se realizar como [t] ou [d] diante de tnl e [p] ou [b] diante de m Neste caso as realizaccedilotildees homorgacircnicas surdas satildeo sempre preferenciais

[wolo te] ~ [woloʔ te]

woloʔ-te

[ej tatilden] ~ [e tatilden]

eʔ-tatilden

[wajkinĩ de]

wajʔ-kinĩn-te

[loʔ tatilden] ~ [ tatilden] ~ [ wtatilden]

loʔ-tatilden

[tidit na jdatilde na ]

tatiʔ-na jn-tatilden-na

[wa jtna de]

wa jh-na n-te

[at natilde da na]

a ʔnatilde n-tatilden-ta

[a p otildedatildena] ~ [a b otildedatildena]

a ʔ n-tatilden-ta

Espeacutecie de paacutessaro Ele ralou Amendoin Ele afogou Eacute raiz de mandioca Palha da palmeira accedilaiacute Ele estaacute chorando muito Ele estaacute muito bonito

h- Fricativa glotal - anterior

Eacute fricativa glotal surda que em iniacutecio de

siacutelaba ocorre com as vogais i e a a

o u

Quando em iniacutecio de palavra e em siacutelaba acentuada seguida de i realiza-

se como [ʒ]

Quando entre vogais realiza-se como

[hu te] ~ [hu h de]

huʔ-te

[hej de]

hejn-te

Arco Buriti

148

fricativa glotal sonora [ɦ]

Se vier em iniacutecio de palavra em fala raacutepida e em raiacutezes dissilaacutebicas na posiccedilatildeo de onset de siacutelaba natildeo acentuada poderaacute ser apagado

Quando em onset de siacutelaba acentuada acompanhada de consoante nasal assimila a nasalidade da consoante

adjacente sendo realizada como [n ]

Em final de siacutelaba eacute produzido com pouca fricccedilatildeo Em coda acentuada motiva o alongamento da vogal com frequecircncia como resultado teremos uma vogal com leve aspiraccedilatildeo

Demais realizaccedilotildees de h em coda tendem a seguir o comportamento da

oclusiva glotal ʔ

[hata tatilden]

hat-ta-tatilden]

[ha de]

ha n-te

[hoɦo h de]

hohoʔ-te

[hi ɾ e] ~ [ʒi ɾe]

hih-te

[hiwa n de] ~ [iwa n de]

hiwan-te

[ e ĩ n de] ~ [e ĩ n de]

e ĩ n-te

[ɛ hejdn a ]

ajhhejn-ha

[o h datildeda]

o hna-tatilden-ta

[ lo h tatilde na ]

loh-tatilden-na

[ʃi h ɾe]

sih- te

[ke h atilden] ~ [ke atilden]

Eu natildeo tenho Caraacute Espeacutecie de coruja Pau lenha Gambaacute Couro Vamos lavar (algo) Estaacute alto Eacute onccedila

149

keh-tatilden

[nakadʔnatilde na ]

naka natilde n-na

[ka ɾatilden]

kah-tatilden

[naw ɾe] ~ [nͻ e]

na wh-te

[wede e] ~ [wede ʔ ɾe]

wate h-te

[sej ɾatilde]

sih-tatilden

Casa Ele caccedilou Ela ainda estaacute chorando Estaacute azedo Lontra Espeacutecie de tamanduaacute Eacute largo

Quadro 13 Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos orais (Com base em Telles 2002)

i - vogal alta frontal e i - vogal alta

frontal laringal

Realiza-se como [i] e [i ] podem ser

nuacutecleo de siacutelaba e podem tambeacutem iniciam palavras

i segue qualquer consoante enquanto

i ocorre apenas apoacutes as consoantes

m k h

Quando a coda eacute apagada realiza-se como [i] compensando tal apagamento

[ iɾatilden]

i-tatilden

[i n datildenʌ]

i n-tatilden-ta

[giw lada ɾe] ~ [gi la de]

kiwlah-tah-te

Ele mordeu Estaacute quente Cobra cascavel espeacutecie de cobra

150

e - vogal meacutedia frontal e e - vogal

meacutedia frontal laringal

Realizam-se como [e] e [e ] e correm em

iniacutecio de palavras

Quando seguem consoantes natildeo se realizam apoacutes pmn

Tambeacutem natildeo foram detectadas diante de s l h

Ao serem seguidos pelo glide palatal j favorecem a fusatildeo entre as vogais e o

glide realizando-se como [i] e [i ]

O alongamento tambeacutem se daacute em casos de queda de coda

Em siacutelaba aacutetona de morfemas dissiacutelabos poderaacute ocorrer harmonizaccedilatildeo entre a vogal meacutedia frontal e a vogal tocircnica mais alta da siacutelaba seguinte

Pode ocorrer harmonizaccedilatildeo entre a vogal da raiz lexical e a vogal do sufixo classificatoacuterio

[e ɾatilden]

e-tatilden

[ etatilden]

e ʔ-tatilden

[ sejtatilden] ~ [sitatilden]

set-tatilden

[ weʔkinĩde] ~ [ wiʔkinĩde]

wet-kinĩn-te

[kenĩ de] ~ [kinĩ de]

kanĩn-te

Ele viu Ele fez fogo Ele falou Crianccedila Esquilo

a - vogal baixa central e a - vogal

baixa central laringal

A vogal baixa central a apresenta larga distribuiccedilatildeo e segue qualquer consoante e os dois glides

A vogal baixa central laringal segue quase todas as consoante e dos dois glides

Ambas iniciam palavras e apresentam

vaacuterias alofonias [a] [ʌ] [ͻ] [o] [u] [e]

[ɛ] [aelig] e [i] que podem ser ou natildeo

laringais dependendo da vogal subjacente e da condiccedilatildeo do tom e da harmonia vocaacutelica

Quando em siacutelaba tocircnica a se realiza como [a] [ͻ] e [ͻ]

[ͻ] pode ocorrer quando o nuacutecleo vocaacutelico a assimila o traccedilo labial da coda tautossilaacutebica de w

A segunda variaccedilatildeo [ͻ] resulta da fusatildeo

[a h ɾe]

ah-te

[awde] ~ [ͻ de] ~ [ͻʔ de]

awh-te

[ a wde] ~ [ ͻde] ~ [ ͻʔde]

a w-te

[a wm de] ~ [ ͻ m de] ~ [ͻ m de]

a wn-te

Espeacutecie de abelha Gaviatildeo Flecha Louro

151

entre o nuacutecleo a e a coda w

O alongamento da vogal nuclear ou da coda eacute necessaacuterio agrave preservaccedilatildeo do peso silaacutebico para a aposiccedilatildeo do acento

Em siacutelaba tocircnica se a a eacute seguida por j na coda (nuacutecleo do ditongo) pode se

realizar como [a] [ɛ] [ɛ] e [aelig]

Em siacutelaba aacutetona a realiza-se como [ʌ] preferencialmente

Quanto em posiccedilatildeo aacutetona a se harmoniza com a vogal tocircnica da siacutelaba seguinte quando esta for meacutedia ou alta

As realizaccedilotildees provenientes dessa harmonia vocaacutelica satildeo as vogais [ieou]

O processo de assimilaccedilatildeo pode ocorrer em iniacutecio de siacutelaba aacutetona fazendo com que a se realize como [ͻ] a partir de segmento adjacente seja tautossilaacutebico ou natildeo

[ ajɾatildena] ~ [ ɛatildena]

ajh-tatilden-ta

[a j ɾatilden] ~ [aelig ɾatilden] ~ [ɛ ɾatilden]

a jh-tatilden

[ a j atilde m datilden] ~ [ aelig ʔatildem datilden]

a jn atilde wn-tatilden

[ͻ ɾaʔͻɾaʔi datildenʌ] ~

[ͻ ɾɛʔͻɾɛʔi datildenʌ]

watajwatajn-tatilden-ta

[wͻdaʔ nde] ~ [wadaʔ nde]

watan-te

[i n dacircnʌ]

i n-tatilden-ta

[tʌlawm natildenʌ]

talawn-tatilden-ta

[kimi ɾatildena] ~ [kͻmi ɾatildena]

kamih-tatilden-ta

[walin de] ~ [weli de]

walin-te

[tʌlow natildena] ~ [tolow natildenʌ]

talown-tatilden-ta

[tunu ratildeni]

tanũh-tatilden

Eacute roccedila Ele foi Ele assou peixe Eacute fino Panela Estaacute quente Estaacute grosso Estaccedilatildeo seca Tamanduaacute

152

Devido agrave labializaccedilatildeo de a a realizaccedilatildeo resultante sofre assimilaccedilatildeo de palatalizaccedilatildeo altura de glide precedente ou se funde quando o glide eacute tautossilaacutebico e ocupa onset de siacutelaba em que a eacute a vogal nuclear

[kʌmaʔ matilde n de] ~

[kͻmaʔ matilde n de]

kama-matilden-te

[ͻ ɾaʔͻɾaʔĩ datildenʌ] ~

[ͻ ɾɛʔͻɾɛʔĩ datildenʌ]

watajwatajn-tatilden-ta

[wada n de] ~ [wͻda n de]

watan-te

[jeda n de] ~ [ʒida n de] ~

[ida n de]

Estaacute terminado Ele deu Borboleta Eacute fino Panela cabaccedila Espeacutecie de veado

o - vogal meacutedia fechada posterior e

o - vogal meacutedia fechada laringal

Realizam-se [o] e [o ] respectivamente

Natildeo se realizam apoacutes as consoantes nasais mn

o soacute foi realizada apoacutes as consoantes

t l k

Ambas podem ser realizadas em iniacutecio de vocaacutebulo

As realizaccedilotildees [o] e [o ] satildeo resultados

do alongamento compensatoacuterio que provem da delaccedilatildeo de coda

[o ɾatilden]

oh-tatilden

[o te]

o h-te

[ko n de] ~ [kow n de]

kon-te

Ele misturou massa Macuco Espeacutecie Jabuti

u - vogal alta posterior e u - vogal

alta posterior laringal

Apresentam larga frequecircncia nas realizaccedilotildees

u segue qualquer consoante

[ke ju ɾe]

kejuh-te

Macaco da noite

153

u ocorre apoacutes m n s k j

Ambas iniciam palavras

As realizaccedilotildees alongadas [u] e [u ] satildeo

provenientes de alongamento compensatoacuterio quando a coda eacute elidida

[ku n datildenʌ] ~ [ku datildenʌ]

ku n-tatilden-ta

Ele estaacute fumando

Quadro 14 Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos nasais (Com base em Telles 2002)

ĩ - vogal nasal alta anterior

Sua ocorrecircncia soacute fora verificada a partir do comportamento do morfema ĩ- que eacute uma raiz lexical semanticamente vazia prefixada a morfemas classificadores nominais para funcionar como nuacutecleo nominal

A subjacecircncia de ĩ- sem coda nasal pode ser evidenciada na sonorizaccedilatildeo opcional da oclusiva velar k e no natildeo alongamento da vogal ĩ

[ ĩkalo ɾe] ~ [ ĩgaloɾe]

ĩ-kaloh-te

Taacutebua

atilde - vogal nasal baixa

Eacute encontrada a partir do condicionamento morfoloacutegico no prefixo verbal atildel-

Este prefixo tem valor causativo resultativo

Quanto agrave subjacecircncia de atilde pode-se interpretar que a realizaccedilatildeo do morfema agentivo [atildel- atilde-] estaacute condicionada ao segmento inicial da raiz lexical a qual o prefixo se apotildee

[atildelͻwtatildenʌ] ~ [ a lͻtatildenʌ]

atildel-awt-tatilden-ta

[atilde laj n datildenʌ] ~ [a laj n datildenʌ]

atildel-ajn-tatilden-ta

[atildelo tatildenʌ] ~ [alo tatildenʌ]

atildel-loʔ-tatilden-ta

[atildemũmaj na ]

atildel-mumaʔ-na

[ũba tatildenʌ] ~ [atildeba tatildenʌ]

atildel-pat-tatilden-ta

[ natildej de] ~ [ naj n de]

natildejn-te

Estaacute foi quebrado (algo) Estaacute foi cortado (algo) Estaacute foi afundado (algo) Estaacute foi amansado (algo) Estaacute foi colocado (algo)

154

Quando a raiz verbal eacute iniciada por vogal a forma sobrejacente eacute [atilde-] quando a raiz verbal eacute iniciada por vogal a forma sobrejacente eacute [atildel-]

Outra forma de ocorrecircncia da vogal atilde eacute confirmada na base do contraste entre os ditongos orais aj aw e nasais atildej atildewmesmo quando seguidos por coda nasal formando as sequecircncias ajn awn atildejn atildewn

[ aj n datildeni] ~ [ aj n datildeni]

ajn-tatilden

[jatildewm de] ~ [jatildemde]

jatildewn-te

[wawm datildena] ~ [wͻwm datildena]

wawn-tatilden-ta

Pacu espeacutecie de peixe Ele cortou (algo) Espeacutecie de larva Estaacute vermelho amarelo

ũ - vogal nasal alta posterior

Observada a partir da construccedilatildeo interna e comportamento do morfema prefixal nũh - possessivo de 1pp e de seu homoacutefono nũh - verbo adjetival estar soacute

Quanto agrave subjacecircncia de u eacute observada quando a coda fricativa glotal eacute ressilibificada ao se afixar agrave raiz iniciada por vogal ou glide

[ nũhju te]

nũh-ju -te

[ nũhaj ɾatilden]

[nũhajh-oslash-tatilden

Nossos peacutes Ele vai sozinho

54 FONOLOGIA DO PORTUGUEcircS

Diferentemente do Latundecirc o sistema fonoloacutegico do portuguecircs eacute formado

conforme Cacircmara Jr (1970 p33 ndash 34) por sete vogais que se mantecircm na

mesma quantidade em posiccedilatildeo tocircnica que satildeo reduzidas a cinco quando em

posiccedilatildeo tocircnica diante de nasal em posiccedilatildeo pretocircnica em posiccedilatildeo postocircnica natildeo-

final e em postocircnica final

Quadro 15 Vogais no Portuguecircs (Cacircmara Jr 1970)

Natildeo-arredondadas Arredondadas

Altas i u

Meacutedias Altas e o 2ordm Grau

155

Meacutedias Baixas ɛ ɔ 1ordm Grau

Baixa a

Anterior Central Posterior

Quanto aos segmentos consonantais o portuguecircs dispotildee de acordo com Lopez

1979 p5482 de vinte e dois fonemas que ocupam as posiccedilotildees de onset e coda

Os segmentos consonantais satildeo classificados quanto ao modo e ao ponto de

articulaccedilatildeo

Os segmentos consonantais do portuguecircs ainda podem ser influenciados por

articulaccedilotildees secundaacuterias labializaccedilatildeo palatalizaccedilatildeo velarizaccedilatildeo e dentalizaccedilatildeo

Quadro 16 Consoantes no Portuguecircs (Silva 2002)

Articulaccedilatildeo

Bilabial Labiodental Dental ou alveolar

Alveopalatal Palatal Velar Glotal

Oclusiva p b t d k g Africada tʃ dʒ

Fricativa f v s z ʃ ʒ X Ɣ h ɦ

Nasal m n ɲ y

Tepe ɾ

Vibrante ř

Retroflexa ɹ

Lateral l ɫ ʎ l j

82

Apud Bisol 1996 p198

156

55 COMPARACcedilAtildeO ENTRE OS SISTEMAS FONEacuteTICOS DO PORTUGUEcircS E

DO LATUNDEcirc

Passemos entatildeo agrave comparaccedilatildeo ds sistemas fonoloacutegicos do Portuguecircs e do

Latundecirc para melhor compreensatildeo dos processos foneacuteticos oriundos desse

contato

Quadro 17 Sistemas consonantais x Sistemas vocaacutelicos

Consoantes Vogais

Portuguecircs p b m w t d s z l j n f v ɾ k g h ɹ ɲ ʎ X a ɛ e i ɔ o u

Latundecirc p m w t s l j n k h a atilde a a e e i i i i o o u u u u

Como podemos perceber as liacutenguas apresentam padrotildees distintos no que tange

agrave quantidade de segmentos consonantais e de segmentos vocaacutelicos O portuguecircs

eacute uma liacutengua com mais consoantes enquanto o Latundecirc eacute uma liacutengua

extremamente vocaacutelica

No que tange aos fonemas consonantais o Latundecirc natildeo apresenta muitos dos

fonemas vozeados que compotildeem os pares miacutenimos aleacutem das labiodentais [f v]

Tambeacutem natildeo apresenta as fricativas alvopalatais [ʃ ʒ] nem as palatais nasal e

lateral [ɲ ʎ]

O portuguecircs natildeo dispotildee de vogais laringais enquanto o Latundecirc tem o seu

inventaacuterio basicamente composto por elas

157

A disposiccedilatildeo e presenccedila desses elementos tecircm uma ligaccedilatildeo direta com os

processos fonoloacutegicos ocorrentes o portuguecircs resultante do contato do Portuguecircs

com o Latundecirc como veremos no capiacutetulo VI

158

6 PROCESSOS FONOLOacuteGICOS NO PORTUGUEcircS FALADO PELOS LATUNDEcirc

ldquoComo a liacutengua estaacute a todo momento se equilibrando entre

tendecircncias potencialmente conflitantes e ateacute mesmo opostas estaacute sujeita a sofrer mudanccedilas pois esse equiliacutebrio pode vir a ser alterado por qualquer tipo de fator interno ou

externordquo Chagas (2004 p 151)

61 INTRODUCcedilAtildeO

Eacute senso comum entre os estudiosos que as liacutenguas mudam em diversos

aspectos Certamente a variaccedilatildeo e a mudanccedila lhes satildeo inerentes conforme

Cezario amp Votre (2008 p 141)

Em face da mudanccedila a assertiva acima abarca um conjunto de motivaccedilotildees

internas a uma dada liacutengua bem como outras decorrentes de forccedilas externas em

que se inserem aquelas oriundas do contato linguiacutestico Isso nos chama a

atenccedilatildeo para o fato de que aleacutem do fator tempo outros aspectos podem estar

diretamente ligados agraves transformaccedilotildees pelas quais uma liacutengua passa

A forma como as mudanccedilas sonoras operam na liacutengua eacute tema de discussatildeo haacute

seacuteculos Sobre essa temaacutetica Labov (1981 p269) nos diz que

Sound change appears to be systematic in that a particular change affects all eligible words in a lexicon (McMahon 1994) It is not known however how this process takes place A group of 19th century German linguists called the Neogrammarians originally proposed that sound change occurs abruptly across the lexicon This view is still accepted by many linguists (eg Hock 1991 Labov 1994) In contrast others have argued that sound change spreads gradually across the lexicon (eg Chen amp Wang 1975 Krishnamurti 1978) The same language data is sometimes used to support each hypothesis For instance the

159

English Great Vowel Shift which brought about a series of vowel changes in Early Modern English is used as an example of gradual change (Ogura 1987 Aitchison 1991) as well as abrupt change (Hock 1991 Labov 1994) So the argument over whether sound change occurs abruptly or gradually presents a paradox ldquoboth (views) are right but both cannot be right 269)rdquo

A discussatildeo acerca da natureza da mudanccedila sonora no sentido das duas visotildees

pontuadas acima ainda alcanccedila uma dimensatildeo mais larga quando o contato

intersocietaacuterio eacute considerado As implicaccedilotildees que a variaccedilatildeo assume quando a

emergecircncia das escolhas linguiacutesticas envolve o impacto das interaccedilotildees entre

liacutenguas satildeo multifatoriais Devido agrave complexidade das transformaccedilotildees linguiacutesticas

natildeo podemos estabelecer um uacutenico molde para explicar estas modificaccedilotildees haja

vista que cada caso eacute particular quando tratamos de mudanccedila linguiacutestica

Como fora tratado no capiacutetulo sobre Contato linguiacutestico o encontro de duas ou

mais liacutenguas pode resultar ou natildeo em outras liacutenguas O niacutevel de interferecircncia

oriundo do contato pode fazer com que uma das liacutenguas desapareccedila o que

ocasionaria a sua morte e geralmente neste caso sobreviveria a liacutengua do

dominador ou a permanecircncia dos dois coacutedigos linguiacutesticos tal qual ocorre entre

os Latundecirc

A complexidade da fusatildeo de duas liacutenguas desencadeia por si soacute uma seacuterie de

processos que perpassa os diferentes niacuteveis da gramaacutetica No entanto eacute no niacutevel

foneacutetico fonoloacutegico que estes processos satildeo provavelmente mais evidentes e

mais frutiacuteferos Sendo assim podemos afirmar que os niacuteveis foneacuteticos e

fonoloacutegicos apresentam o maior iacutendice de mudanccedila e variaccedilatildeo de uma liacutengua Por

outro lado de acordo com Cavaliere (2005 p 56)

160

Os estudos desses processos nos auxiliam enquanto estudiosos da liacutengua a entender como se comporta a mudanccedila da liacutengua mediante verificaccedilatildeo dos fatos ocorridos no passado que se mantecircm no presente bem como os que natildeo mais se manifestam as mudanccedilas dos sons nos usos hodiernos

A anaacutelise realizada dos processos fonoloacutegicos do Portuguecircs falado pelos Latundecirc

teraacute como base a estrutura silaacutebica do Portuguecircs e do Latundecirc Para a anaacutelise

consideramos uacutetil adotar a classificaccedilatildeo tradicional dos processos focircnicos

encontrados na linguiacutestica histoacuterica (HOCK1991) por nomear em detalhe os

variados tipos de processos observados Aleacutem disso nos pautamos nos trabalhos

de Spencer (1996) e Lass (2000) que associam reflexotildees mais abstratas para

explicar as ocorrecircncias encontradas Esclarecemos que natildeo eacute nosso propoacutesito

realizar uma anaacutelise fonoloacutegica per si Neste trabalho partimos da descriccedilatildeo dos

processos fonoloacutegicos operantes a fim de refletir sobre o resultado do contato

linguiacutestico de uma liacutengua minoritaacuteria (o Latundecirc) com uma liacutengua

sociohistoricamente dominante o portuguecircs e avaliar o papel da marcaccedilatildeo

linguiacutestica no contexto da interferecircncia Os dados como jaacute afirmamos fazem

parte do acervo do NEI (Nuacutecleo de Estudos Indigenistas) da UFPE

Para uma melhor compreensatildeo a anaacutelise dos fenocircmenos observados segue

distribuiacuteda em quatro subgrupos que evolvem os processos foneacutetico-fonoloacutegicos

observados i) perda de elementos ii) ganho iii) alteraccedilatildeo (transposiccedilatildeo ou

permuta) que estatildeo diretamente ligados aos processos fonoloacutegicos de

assimilaccedilatildeo (progressiva e regressiva) fortalecimento leniccedilatildeo apagamento

inserccedilatildeo e coalescecircncia A classificaccedilatildeo desses processos nos remete agrave

termonoligia claacutessica da linguiacutestica de base

161

611 Perda de elementos

Seguindo a tendecircncia das liacutenguas do mundo os processos que envolvem perda

de elementos tambeacutem satildeo os mais recorrentes no portuguecircs falado pelos

Latundecirc Dessa feita estes processos satildeo os que tecircm uma relaccedilatildeo direta com a

estrutura silaacutebica do Portuguecircs que se vecirc obrigada a rearranjar os componentes

da siacutelaba para o padratildeo (CV)

Quanto agrave marcaccedilatildeo o portuguecircs assimilado pelos Latundecirc nem sempre tende a

preservar os padrotildees mais marcados de sua liacutengua conforme descriccedilatildeo nos

processos que se seguem

6111 Monotongaccedilatildeo

Assim como no Portuguecircs a monotongaccedilatildeo eacute um processo natural e bastante

atuante no Latundecirc que eacute uma liacutengua propensa a tal fenocircmeno Eacute uma tendecircncia

geral observada na produccedilatildeo da fala da comunidade Latundecirc verifica-se que os

ditongos crescentes e decrescentes estatildeo sendo frequentemente fusionados

realizando-se como monotongos (TELLES 2002 p100 - 102)

Quanto aos ditongos crescentes Telles (idem p 103) afirma que a tendecircncia ao

processo de monotongaccedilatildeo em ditongos crescentes eacute quase categoacuterica nas

siacutelabas aacutetonas de raiacutezes dissilaacutebicas quando a vogal nuclear eacute a central baixa a

Outros aspectos observados pela autora que fazem menccedilatildeo agrave monotongaccedilatildeo

apontam que a geraccedilatildeo poacutes-contato realizam sistematicamente e com frequecircncia

162

a fusatildeo entre os ditongos decrescentes Os ditongos aw a w aj a j satildeo os que

mais regularmente sofrem processo dos quais decorrem as realizaccedilotildees meacutedias

baixas [ɔ ɔ ɛ ɛ ] que natildeo fazem parte do inventaacuterio fonoloacutegico das vogais do

Latundecirc

Os ditongos iw ow que ocorrem em menor frequecircncia satildeo mais marcados

Nestes a monotongaccedilatildeo se daacute com a preservaccedilatildeo da vogal do nuacutecleo i o O

ditongo e j apresenta pouquiacutessimos casos de fusatildeo mantendo a qualidade do

glide diferentemente dos demais ditongos que satildeo constituiacutedos por vogais natildeo

baixas Sua realizaccedilatildeo seraacute a vogal alta anterior [i]

Apresentamos abaixo os dados apresentados por Telles (idem 101) onde os

resultados foneacuteticos do processo de monotongaccedilatildeo satildeo mais frequentes

Quadro 18 Resultado mais frequente do processo de monotongaccedilatildeo em Latundecirc

Em tritongos a fusatildeo eacute mais frequente quando o glide labial w preenche a

posiccedilatildeo da coda diferentemente da palatal j que pouco se fusiona Nos dois

casos a fusatildeo se daacute apenas com o apagamento do glide poacutes-nuclear

aw gt ɔ [lsquoɔɾe] rsquoawh-lsquote Gaviatildeo

a w gt ɔ [ɔ rsquode] a w-lsquote Fleche

aj gt ɛ [ɛrsquoɾatildena] ajh-lsquotatilden-ta eacute roccedila

aj gt ɛ [ɛ rsquoɾatildena] rsquoa jh-lsquotatilden-ta ele tem andado

iw gt i [lsquogilade] rsquokiwlah-lsquote cobra cascavel

ow gt o [torsquolodatildena] tarsquolown-lsquotatilden-ta ele tem terminado

163

No que se refere ao comportamento de ditongos decrescentes diante de

consoante nasal tautossilaacutebica podem ocorrer diferentes manifestaccedilotildees de

superfiacutecie a depender do ponto do glide Se os ditongos decrescentes terminarem

com glide laacutebio-dorsal w e seguidos por elemento nasal tautossilaacutebico awn a wn

atildewn own apagaratildeo o glide da coda e a vogal nuclear preservaraacute o ponto de

articulaccedilatildeo

Caso o ditongo seja oral a realizaccedilatildeo preferencial seraacute a da manutenccedilatildeo do

ditongo com o glide ocorrendo na superfiacutecie Se o ditongo for nasal o glide pode

ser nasalizado regressivamente Todavia a realizaccedilatildeo preferencial seraacute o glide

Em preferecircncia o glide j eacute mantido conservando sua palatalidade em ditongos

decrescentes que terminam com o glide j constituindo os ditongos ajn a jn atildejn

jn

Os glides wj na posiccedilatildeo de onset podem ser consonantizados O glide j natildeo se

apresenta como fator motivador para este processo Nos poucos casos

apresentados a vogal nuclear eacute a anterior e ou a central a

De acordo com a literatura existente para o Portuguecircs a monotongaccedilatildeo se aplica

a todos os ditongos Entretanto alguns contextos licenciam o processo enquanto

outros o bloqueiam No portuguecircs falado pelos Latundecirc os ditongos decrescentes

orais83 assim como no portuguecircs de longe foram os mais monotongados Aleacutem

destes o ditongo nasal decrescente [atildew] tanto em final de verbos quanto de

nomes mostrou-se recorrente na reduccedilatildeo

83

[aj][ aw] [ej] [ew] [ow] [oj]

164

Enquanto processo natural a monotongaccedilatildeo no portuguecircs falado por Latundecirc

visa simplificar os padrotildees silaacutebicos mais marcados sobretudo na posiccedilatildeo final de

vocaacutebulos jaacute que no Latundecirc natildeo haacute a ocorrecircncia deles

Esclarecemos que os processos observados na fala dos Latundecirc que tambeacutem

ocorrem no portuguecircs atual natildeo foram incluiacutedos nos dados discutidos neste

capiacutetulo ressalvando-se situaccedilotildees nas quais eram necessaacuterios agraves nossas

reflexotildees

De acordo com os exemplos

acima o processo de

monotongaccedilatildeo pode se dar de

duas formas i) apagamento

de um segmento geralmente

o glide ii) fusatildeo de elementos

Os ditongos mais propensos agrave

monotongaccedilatildeo satildeo os

decrescentes Quanto agraves classes de palavras os ditongos presentes nas formas

verbais satildeo mais frequentemente monotongados

No portuguecircs o processo de monotogaccedilatildeo eacute operante porem haacute restriccedilotildees que

natildeo coincidem com o observado na fala dos Latundecirc Bisol (2001 p 112) afirma

(1) [keme] queimei (2) [satildersquogɾaɾi] sangraram

[firsquokaɾi]

ficaram

(3) [fakotilde] facatildeo [motilde] matildeo [koɾasotilde] coraccedilatildeo

[gɾatildedotilde] grandatildeo

[tubaɾotilde]

tubaratildeo

(4) [kaze]

causa

(5) [note]

noite

(6) [lsquotaba] taacutebua (7) lsquomatildeoslash matildersquodava matildee mandava

165

que apenas os ditongos decrescentes satildeo verdadeiros Os crescentes de acordo

com ela seriam falsos pois podem ser realizados como hiato e tecircm variaccedilatildeo livre

Aleacutem disso com respeito aos ditongos decrescentes a autora ainda considera

que haacute dois diferentes tipos de ditongos um considerado pesado que natildeo sofre

reduccedilatildeo (leite) e outro leve passiacutevel de reduccedilatildeo (couro) Ela elenca alguns

ambientes que condicionam a monotongaccedilatildeo como a presenccedila da tepe ou da

palatal em posiccedilatildeo seguinte

Entretanto os dados de (1) a (7) acima nos mostram ocorrecircncias da

monotongaccedilatildeo em contextos muito distintos do que ocorre em Portuguecircs Sobre

estes avaliamos sua ocorrecircncia como segue

Quando em final de vocaacutebulos principalmente nas formas verbais do passado

simples conforme visto em (2) o que ocorre natildeo eacute um fenocircmeno de

monotongaccedilatildeo em que se espera o apagamento de um dos segmentos ou a

fusatildeo dos formadores do ditongo Nos dados em (2) entretanto encontra-se a

substituiccedilatildeo do ditongo por um segmento que articulatoriamente natildeo deriva da

estrutura lexical A vogal anterior com traccedilo de ponto coronal84 realizada em

[firsquokaɾi] ldquoficaramrdquo [satildersquogɾaɾi] ldquosangraramrdquo ocorre em posiccedilatildeo aacutetona final Essa

realizaccedilatildeo pode ser decorrente do espraiamento da coronalidade da consoante

precedente Outros aspectos de relevo para explicar esse fenocircmeno satildeo a

posiccedilatildeo final dos segmentos e a atonicidade Esses condicionantes favorecem a

substituiccedilatildeo total do ditongo nasal para a vogal anterior alta Essa produccedilatildeo eacute

84

Assumimos largamente neste trabalho a terminologia da fonologia claacutessica estrutural (GLEASON 1969) Entretanto termos mais teacutecnicos provenientes da teoria dos traccedilos distintivos (JAKOBSON 1952 CHOMSKY e HALE 1968) satildeo introduzidos quando favorecem a elucidaccedilatildeo dos fatos Da mesma forma ocasionalmente nos referimos a processos ancorados na fonologia poacutes-gerativa (CLEMENTS e HUME 1995)

166

restrita agrave fala dos indiacutegenas da geraccedilatildeo preacute-contato que adquiriram o portuguecircs

pelo menos no iniacutecio da idade adulta

A relevacircncia da tonicidade tambeacutem se evidencia nos dados em (3) Nesses casos

([fakotilde] ldquo facatildeordquo [lsquomotilde] ldquomatildeordquo [koɾasotilde] ldquocoraccedilatildeordquo) apesar de o ditongo nasal atildew

sofrer a fusatildeo passando a ser realizado [otilde] a posiccedilatildeo do acento preserva a

identidade de parte da estrutura nasalizaccedilatildeo e posteriorizaccedilatildeo com

arredondamento A tendecircncia aacute preservaccedilatildeo da estrutura tambeacutem eacute encontrada

no dado em (1) A monotongaccedilatildeo na siacutelaba tocircnica preserva a qualidade da vogal

nuclear em [kersquome] ldquoqueimeirdquo

O Latundecirc evita coda Esse comportamento se alinha agrave ideia de que The CV

syllable is a prototypical example widely considered to be the universally

unmarked syllable type (HUME 2004)

A monotongaccedilatildeo do ditongo nasal atildej em matildej gt matilde natildeo eacute encontrado

regularmente na fala latundecirc Esse fenocircmeno deve ter sido engatilhado pela

juntura externa na qual se observa que a siacutelaba da palavra seguinte conteacutem

sequecircncia focircnica semelhante agrave da siacutelaba que sofreu supressatildeo da semivogal

Um mesmo ditongo pode ou natildeo apresentar diferentes realizaccedilotildees em cada

liacutenguas Por exemplo os ditongos aw atildew aj atildej que existem tanto no Latundecirc

quanto no Portuguecircs se comportam da seguinte forma

Quadro 19 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Latundecirc

aw ɔ [lsquoɔɾe] ˈawh-te lsquogaviatildeorsquo

atildew atildew ~ AM [ˈjatildewmde] ~ [ˈjatildemde] ˈjatildewm-te lsquolarvarsquo

aj ɛ [єrsquoɾatildena] ˈajh-ˈtatilden-ta lsquoeacute roccedilarsquo

atildej atildej ~ atildej [ˌatildejˈdatildeni] ~ [atildejndatildeni] ˈatildejn-tatilden lsquoele cortoursquo

167

Quadro 20 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Latundecirc

aw aw [lsquopaw] pau lsquopaursquo atildew otilde [ˈsotilde] satildew lsquosatildeorsquo atildew i [satildeˈgɾaɾi] sangɾaɾatildew lsquosangraratildeorsquo

atildej atildej [ˈmatildej] matildej lsquomatildeersquo

aj aj [ˈpaj] pai lsquopairsquo

Os ditongos aw em posiccedilatildeo do acento resultam nas vogais meacutedias baixas ɔ e

ɛ no proacuteprio Latundecirc mesmo sendo essas vogais mais marcadas e natildeo

fonoloacutegicas na liacutengua Entretanto no portuguecircs esses ditongos natildeo sofrem

processo de fusatildeo quando ocorrem em siacutelaba tocircnica

A uacutenica vogal nasal constatada na reduccedilatildeo do ditongo eacute [otilde] resultante do ditongo

decrescente nasal atildew Neste caso eacute proacutepria vogal nasal que favorece a vogal

resultante da fusatildeo

Diferentemente do Portuguecircs em Latundecirc os ditongos natildeo se realizam em fim de

vocaacutebulos Desta forma o Portuguecircs falado por Latundecirc tende a seguir o que eacute

posto no Portuguecircs utilizando as vogais menos marcadas [satildegɾaɾɪ] ~ sangraram

[desaɾƱ] ~ deixaram

O que podemos verificar quanto agrave monotongaccedilatildeo eacute que em termos gerais o

Latundecirc natildeo transfere os traccedilos e caracteriacutesticas mais marcadas na liacutengua para o

Portuguecircs falado por eles

168

6112 Siacutencope em onset complexo de l e ɾ

A reduccedilatildeo do onset complexo em Portuguecircs falado pelos Latundecirc eacute um processo

muito comum que se daacute devido a natildeo aceitaccedilatildeo de um segundo elemento no

onset Como podemos observar eacute um processo variante que estaacute atrelado agrave

reorganizaccedilatildeo da siacutelaba e que eacute passiacutevel de sistematicidade

De acordo com Telles (2002 p105) a estrutura silaacutebica do Latundecirc permite a

composiccedilatildeo de seis padrotildees V VC VCC CV CVC CVCC que se

incluem na extensatildeo (C)V(C)(C) que podem ser representados de acordo com

estrutura silaacutebica descrita abaixo

Figura 17 Estrutura silaacutebica do Latundecirc

Os elementos que se encontram entre parecircnteses satildeo opcionais Em Latundecirc as

sequecircncias CV V VC CVC VCC e CVCC ocorrem com frequecircncia

169

sendo os dois primeiros padrotildees os mais frequentes Isso nos mostra o quanto o

Latundecirc evita onsets complexos e codas

A estrutura silaacutebica do portuguecircs de acordo com Mattoso Cacircmara (1969) define

o molde silaacutebico CCVCC conforme figura abaixo

Figura 18 Estrutura silaacutebica do Latundecirc (Cacircmara-Juacutenior)

Seguindo a proposta de Mattoso Cacircmara com respeito agrave distribuiccedilatildeo interna dos

constituintes da siacutelaba as uacutenicas consoantes que preenchem a segunda posiccedilatildeo

do onset satildeo as liacutequidas l e ɾ A coda pode ser preenchida pelas consoantes l

e pelos arquifonemas R S N

No Latundecirc o grupo consonantal no onset natildeo eacute fonoloacutegico Entretanto eacute

atestada a ocorrecircncia dos [tɾ dɾ kɾ gɾ] no plano foneacutetico como resultado da

reduccedilatildeo em siacutelaba pretocircnica de sufixo nominal e verbal A formaccedilatildeo de onset

complexo eacute estrutura marcada no Latundecirc como tambeacutem interlinguisticamente

A estrutura mais complexa e menos frequente (marcada) do encontro consonantal

no onset tende a ser simplificada no portuguecircs falado pelos Latundecirc Como

170

podemos observar em (8) e (9) os grupos consonantais satildeo pronunciados como

um soacute elemento Trata-se do apagamento da tepe e da lateral liacutequida Eacute um

processo em acomodaccedilatildeo que estaacute diretamente ligado agrave faixa etaacuteria dos falantes

Assim os mais novos seguem a tendecircncia de pronunciar o onset complexo

diferentemente dos mais velhos

(8) [bi ka nƱ] brincando

[de tƱ] dentro

[kɛbapƱ] quebraram

[otƱ] outro

(9) [buza] blusa [biciketɪ] bicicleta Embora a reduccedilatildeo do onset complexo seja um fenocircmeno variaacutevel para algumas

variedades do portuguecircs as realizaccedilotildees acima natildeo correspondem agrave fala de

adultos sendo resultantes no processo da aquisiccedilatildeo da liacutengua

Jaacute entre os Latundecirc satildeo os mais velhos que apresentam a realizaccedilatildeo do onset

simplificado como um fenocircmeno variaacutevel conforme observamos em (10)

(10) [b ɾ ĩkarƱ] brincaram [sotildebrasotilde] assombraccedilatildeo [pɾimeɾɪ] primeiro

[febrƱ] febre [fɾɛsa] flecha

O rotacismo (l gt ɾ) da lateral presente em lsquoflecharsquo acima que eacute muito frequente

no portuguecircs menos escolarizado tambeacutem ocorre na fala dos indiacutegenas

171

6113 Apagamento da coda

Em portuguecircs quatro elementos podem ocupar a posiccedilatildeo de coda RSlN aleacutem

dos glides wj85 Em Latundecirc a coda pode ser ramificada e satildeo seis os

segmentos que podem preencher o espaccedilo da coda os glides w j aleacutem das

consoantes t h n Ɂ Como a coda pode ter ateacute duas posiccedilotildees preenchidas os

primeiros elementos satildeo sempre neste caso os glides w j Embora a coda da

siacutelaba fonoloacutegica possa ser preenchida pelas consoantes acima o Latundecirc eacute uma

liacutengua que evita coda na superfiacutecie O fenocircmeno que decorre dessa tendecircncia eacute o

alongamento compensatoacuterio (Clements e Hume 1995)

(11) [ˌn ˈh te]

ˈn h-ˈ Ɂ -te

lsquonossos peacutesrsquo

No dado acima podemos observar a natildeo realizaccedilatildeo da coda fricativa glotal h na

marca de posse ˈnu h- e da coda oclusiva glotal Ɂ o item lexical ldquopeacuterdquo ˈju Ɂ

Nos dois casos o apagamento da coda eacute compensado pelo alongamento

vocaacutelico No caso do morfema de posse ocorre a ressilabaccedilatildeo da coda fricativa

Do ponto de vista da marcaccedilatildeo a siacutelaba menos marcada eacute a que apresenta o

padratildeo CV (Hume 2004 p 183) O Latundecirc tem a tendecircncia a seguir esse

padratildeo de forma que para a liacutengua a coda embora fonoloacutegica eacute mais marcada

A simplificaccedilatildeo da estrutura mais marcada (presenccedila de coda) eacute transferida para

o portuguecircs Conforme os dados descritos abaixo os segmentos que mais satildeo

apagados em posiccedilatildeo de coda satildeo os glides j w e as consoantes h s Como o

85

Mattoso Cacircmara (1969) considera que os glides pertencem ao nuacutecleo Neste caso trata-se de um nuacutecleo ramificado

172

Latundecirc natildeo tem na sua estrutura silaacutebica a coda fricativa alveolar s esse

segmento natildeo eacute licenciado no portuguecircs dos indiacutegenas (dados em 13) Esse

fenocircmeno eacute categoacuterico na fala dos mais velhos e eacute variaacutevel na fala dos indiacutegenas

da geraccedilatildeo poacutes-contato

(12) [m to] muito [koɾƱ] couro

[voto] voltou (13) [dumi] durmir [pig ta] pergunta [pota] porta [kota] corta [pɛtƱ] perto

[kotildekorsquodo] concordou [barsquobudƱ] barbudo (14) [hipotildersquodew] respondeu [gorsquotozƱ] gostoso [iˈtɛla] Stella ([isˈtɛla])

A coda eacute um elemento universalmente marcado No Latundecirc a sua realizaccedilatildeo eacute

em menor frequecircncia do que o Portuguecircs apesar de sua larga presenccedila na

subjacecircncia O que percebemos ademais eacute que o apagamento do R e do s em

coda contribui para a elevaccedilatildeo da vogal meacutedia pretocircnica tautossilaacutebica conforme

os dados ldquocorta e portardquo em (12)

A regra abaixo sintetiza o comportamento da coda no portuguecircs dos Latundecirc

C ou V [oslash] coda

173

Como vimos no Portuguecircs falado por Latundecirc qualquer consoante ou vogal

poderaacute ser apagada em posiccedilatildeo de coda Esta regra tem se mostrado menos

produtiva nas faixas etaacuterias mais novas Nessas geraccedilotildees o apagamento eacute mais

produtivo quando coincide com a realizaccedilatildeo encontrada por nativos em

portuguecircs ([ˈfosa] lsquoforccedilardquo)

6114 Reduccedilatildeo do geruacutendio ndash Anteriorizaccedilatildeo da vogal final

A reduccedilatildeo do geruacutendio eacute um processo comum em alguns dialetos brasileiros

sobretudo em registro menos tenso Esse eacute mais um processo que resulta no

apagamento de segmentos No portuguecircs falado pelos Latundecirc eacute praticamente

categoacuterica a ocorrecircncia da assimilaccedilatildeo da alveolar em geruacutendio

(15) [falatildenƱ] falando [b ɾ ĩgatildenƱ] brigando [kume nƱ] comendo

[bersquobe nƱ] bebendo

[sorsquo ɾ anƱ] chorando

[mersquosenƱ] mexendo [mi ti nƱ] mentindo

Por ser esse um fenocircmeno de larga frequecircncia no portuguecircs nativo entendemos

que a simplificaccedilatildeo segmental da estrutura gerundiva natildeo eacute surpreendente no

portuguecircs indiacutegena Entretanto na produccedilatildeo da geraccedilatildeo preacute-contato a

assimilaccedilatildeo total da oclusiva alveolar eacute acompanhada pela anteriorizaccedilatildeo da

vogal final conforme dados a seguir

174

(16) [dimuɾatildenɪ] demorando

[asinatildenɪ] ensinando [tiɾatildenɪ] tirando

[katildetatildenɪ] catando [kɾese nɪ] crescendo

Para anaacutelise das ocorrecircncias acima precisamos considerar a estrutura do

Latundecirc nessa liacutengua uma terminaccedilatildeo verbal altamente produtiva eacute o morfema

aspectual acentuado -ˈtatilden Esse morfema pode ser seguido pelo morfema de

modo neutro -i resultando nas sequecircncias -ˈtatildeni conforme exemplo abaixo

(17) [keˈja ˌdaˈɾatildeni]

keˈjat ˈta-tatilden-i milho deitar-imperfectivo-neutro

eacute milho deitado (espalhado no chatildeo)

Como no Latundecirc o verbo (e nome) natildeo termina em vogal posterior tal restriccedilatildeo

pode explicar a anteriorizaccedilatildeo do geruacutendio do portuguecircs

6115 Reduccedilatildeo das palatais nasal e lateral

A reduccedilatildeo das palatais nasal e lateral estaacute diretamente ligada agrave natildeo existecircncia

destes segmentos no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc No entanto Clements e

Hume (1995) em seus estudos apontam estes fonemas como complexos do ponto

de vista de seu comportamento

175

Os segmentos ɲ e ʎ satildeo consoantes mais marcadas A natildeo realizaccedilatildeo destas

consoantes no Latundecirc jaacute eacute um fator para a natildeo realizaccedilatildeo no Portuguecircs devido agrave

complexidade inerente de tais segmentos Enquanto segmentos mais complexos

as palatais satildeo sujeitas ao enfraquecimento atraveacutes da iotizaccedilatildeo (vocalizaccedilatildeo)

Mesmo no portuguecircs esse eacute um processo operante particularmente em

variedades populares Mattoso Cacircmara (1981 p 149) descreve que se trata de

ldquomudanccedila de uma vogal ou consoante para a vogal anterior alta i ou para a semivogal correspondente ou iode Nos falares crioulos portugueses haacute a iotizaccedilatildeo das consoantes molhadas ʎ e ɲ ex mulher gt muyeacute nhonho gt ioiocirc (africanismo)rdquo

Aleacutem da iotizaccedilatildeo o portuguecircs apresenta a despalatizaccedilatildeo da lateral em que ʎ

realiza-se [l] como em [muˈlɛ] lsquomulherrsquo

No portuguecircs dos Latundecirc o enfraquecimento se daacute mais frequentemente pela

iotizaccedilatildeo como em (18) Estas realizaccedilotildees ocorrem na fala dos mais velhos na

geraccedilatildeo anterior ao contato

18) [muˈjɛ] mulher

[baɾuj] barulho

[ojˈatildenƱ] olhando

[vimej] vermelho (19) [fila] filha [fola] folha

Weinreich (1953 p 18) explica que quando em sistemas foneacuteticos em contato

podem ocorrer os processos de reinterpretaccedilatildeo de fone que leva a substituiccedilatildeo

de segmento Eacute o que acontece nos exemplos acima

176

Em (20) e (21) o processo de despalatalizaccedilatildeo resulta no apagamento total da

palatal

(20) [miƱ] milho [fii] filho (21) [mia] minha A reduccedilatildeo tem menos restriccedilotildees se comparada com os fatos do portuguecircs falado

por nativo Em (20) as ocorrecircncias satildeo atestadas no portuguecircs enquanto primeira

liacutengua Diante da vogal posterior natildeo apenas o apagamento da palatal pode

ocorrer como tambeacutem o da siacutelaba inteira Em (21) observamos uma realizaccedilatildeo

particular dos Latundecirc em que a consoante palatal nasal eacute apagada plenamente

sem deixar vestiacutegio nasal na vogal que a precede Esse fato tem relaccedilatildeo com a

complexidade que envolve as nasais na liacutengua indiacutegena a qual natildeo coincide com

os processos existentes no portuguecircs

No caso de (22) ocorre o apagamento da siacutelaba em que se encontra a palatal

nasal do diminutivo eacute comum a variedades populares do portuguecircs

(22) [pikinĩnĩ ] pequenininho [faki ] faquinha

Como afirmamos no iniacutecio da seccedilatildeo os segmentos palatais natildeo existem em

Latundecirc o que torna sua produccedilatildeo no Portuguecircs falado pelos Latundecirc mais

marcada e de difiacutecil ocorrecircncia

177

6116 Afeacuterese

A afeacuterese eacute um processo foneacutetico que consiste na queda de elementos iniciais do

vocaacutebulo Este processo que fora responsaacutevel pelas modificaccedilotildees foneacuteticas do

Latim para o Portuguecircs ainda eacute atuante no estaacutegio atual da liacutengua

A queda da siacutelaba inicial es- em verbos como esperar e estar e do a- em

vocaacutebulos como aqui e acabar eacute muito comum em alguns dialetos brasileiros

Entretanto este tipo de delaccedilatildeo no portuguecircs falado pelos Latundecirc se expande

para outros vocaacutebulos da liacutengua conforme os exemplos abaixo

(23) [kutatildeni] escutando [kapa] escapa [kapo] escapou [peɾatildenƱ] esperando

[pi gada] espingarda

(24) [tupiw] entupiu [gatildeno] enganou [tehaɾƱ] enterraram

(25) [kɪ] aqui [lsquokelɪ] aquele [bɾasadƱ] abraccedilado

[meto] aumentou [korsquodadƱ] acordado [batildedono] abandonou [kaboʃe] acabou-se

(26) [fiɾe tɪ] diferente

[pitaw] hospital

178

Natildeo consta no inventaacuterio fonoloacutegico dessa liacutengua a presenccedila da fricativa alveolar

surda em posiccedilatildeo de coda Essa restriccedilatildeo eacute transferida para o portuguecircs falado

por Latundecirc conforme (23)

Outra razatildeo para esse fenocircmeno pode estar na estrutura prosoacutedica da palavra no

Latundecirc Nessa liacutengua as palavras satildeo monossilaacutebicas ou dissilaacutebicas Raiacutezes

com mais de duas siacutelabas satildeo raras (TELLES 2002) Associado a isso o acento

eacute morfoloacutegico em raiacutezes Nas dissilaacutebicas o acento recai na segunda siacutelaba

(27) [ˈmatilde ginĩde] ˈmatildejn-kiˈnĩn-te caju-redondo-Sufixo Nominal

lsquocastanha de cajursquo

No dado (27) encontramos exemplos de raiz monossilaacutebica e de raiz dissilaacutebica

Jaacute no portuguecircs haacute um nuacutemero relevante de palavras trissiacutelabas e polissiacutelabas

Diante disso a afeacuterese pode ser uma interferecircncia da estrutura do leacutexico da

liacutengua indiacutegena para simplificar a estrutura do portuguecircs - mais marcada no

Latundecirc Este fenocircmeno natildeo afeta o acento e eacute operante sobretudo quando a

siacutelaba inicial natildeo tem onset

6117 Apoacutecope

A apoacutecope eacute uma das formas de apagamento de segmentos que estaacute

relacionada assim como a afeacuterese a outros processos foneacuteticos

179

A queda de elementos finais eacute uma das formas de reduccedilatildeo ou reorganizaccedilatildeo

silaacutebica e de palavras Assim como nos demais processos a siacutelaba tocircnica eacute

preservada de qualquer alteraccedilatildeo

Embora alguns processos explicados aqui tratem da apoacutecope como a reduccedilatildeo do

geruacutendio e ditongo finais ou apagamento da nasal palatal a exemplo de (27)

estes exemplos jaacute foram mecionados nas seccedilotildees anteriores A presenccedila deles

aqui eacute para mostrar que os outros processos foneacuteticos resultam na apoacutecope

(28) [ ʒ rsquotaɾɪ] juntaram

[tursquodĩ] tudinho [ti ] tinha

[lsquovE ] velho [kabersquosĩ] cabecinha [lsquonatilde] natildeo [lsquomatilde] matildee (29) [lsquove] ver [lsquokɛ] quer (30) [nɔj] noacutes

[maj] mais [dirsquofisɪ] difiacutecil [dirsquofisƱ] difiacutecil [tatildersquome j] tambeacutem

(31) [virsquoa] viado [lsquoluɾɪ] Lurdes

[lsquote ] dele

Em (29) a apoacutecope do R final eacute processo muito comum no portuguecircs atual

Diante de tal explicaccedilatildeo natildeo nos cabe assegurar se o processo eacute proacuteprio do

180

Latundecirc ou se da variedade atraveacutes da qual os indiacutegenas adquiriram o portuguecircs

Os dados em (30) tambeacutem apontam para a interpretaccedilatildeo dos dados mostrados

em (29)

Em (31) os dados apresentam um apagamento incomum ao portuguecircs de

nativos A fala espontacircnea e natildeo tensa eacute uma possibilidade explicativa uma vez

que essas ocorrecircncias natildeo satildeo sistemaacuteticas

Os dados de apoacutecope natildeo evidenciam a transferecircncia de traccedilos mais marcados

do Latundecirc para o portuguecircs

6118 Siacutencope86

A forma mais comum deste processo se apresenta no portuguecircs nas

proparoxiacutetonas Em alguns dialetos a depender do contexto linguiacutestico eacute

categoacuterico a ocorrecircncia da reduccedilatildeo interna no vocaacutebulo

Nos exemplos elencados em (32) no caso das proparoxiacutetonas tal reduccedilatildeo eacute

motivada pelo padratildeo acentual do portuguecircs que permite com mais toleracircncia o

padratildeo paroxiacutetono ao proparoxiacutetono conforme Silva (2006 p78)

Quando ocorrente no Portuguecircs este processo estaacute relacionado ao apagamento

da vogal postocircnica medial Com a reduccedilatildeo vocaacutelica a consoante precedente

pode tomar dois caminhos i) eacute incorporado agrave siacutelaba tocircnica na posiccedilatildeo de coda ii)

86

Os exemplos apresentados demonstram que o processo ocorrente eacute muito mais motivado pelo

Portuguecircs do que pelo Latundecirc A nossa classificaccedilatildeo fica aqui a caraacuteter de registro

181

passa a onset da siacutelaba aacutetona seguinte o que afeta sua constituiccedilatildeo O

apagamento vocaacutelico resulta em uma palavra paroxiacutetona

(32) [lsquomuʒka] muacutesica [lsquohapƱ] raacutepido [lsquokOʃka] coacutecega [lsquoavɾɪ] aacutervore

Entendemos que muitas destas ocorrecircncias no Latundecirc se datildeo pelo portuguecircs de

contato Isso eacute confirmado pela produccedilatildeo de ldquomuacutesicardquo e ldquocoacutecegardquo que licencia

uma restriccedilatildeo forte no Latundecirc a fricativa sibilante em coda Aleacutem disso a

produccedilatildeo de ldquoraacutepidordquo ([ˈhapƱ]) tambeacutem coincide com a realizaccedilatildeo encontrada no

portuguecircs popular na qual a consoante em onset da siacutelaba apagada passa a

onset da siacutelaba seguinte devido agrave restriccedilatildeo no portuguecircs de onda oclusiva

612 Ganho de elementos (Inserccedilatildeo de elementos)

Embora em menor nuacutemero os processos que resultam em ganhos de elementos

tambeacutem ocorrem no Portuguecircs falado pelos Latundecirc Satildeo poucos os processos e

menores ainda os casos em que eles ocorrem Isso pode ser explicado como jaacute

fora dito devido ao fato de as liacutenguas em geral terem um dinamismo proacuteprio que

favorece mais agrave perda do que o ganho de elemento Em alguns casos a

motivaccedilatildeo para o ganho de material foneacutetico satildeo as restriccedilotildees fonotaacuteticas da

liacutengua e ou a tendecircncia agrave formaccedilatildeo de padratildeo silaacutebico menos marcado No caso

do portuguecircs de acordo com Collischonn (2004 p 67) um tipo de ganho de

material precisamente a epecircntese vocaacutelica

ocorre mais quando a consoante perdida estaacute em posiccedilatildeo pretocircnica como em objeto magneacutetico e opccedilatildeo ocorrendo em apenas 24 dos vocaacutebulos na posiccedilatildeo postocircnica em palavras como egiacutepcios eacutetnico ou ritmo Mais especificamente estes resultados mostram que a epecircntese que em outros contextos

182

ocorre numa taxa bastante alta eacute dramaticamente reduzida em posiccedilatildeo postocircnica

Exemplos do que a autora descreve seguem apresentados abaixo em (33) O

primeiro dado traz a inserccedilatildeo da vogal epenteacutetica default no portuguecircs a anterior

alta [i] e a segundo natildeo ocorrecircncia da inserccedilatildeo

(33) [lsquoabiˈsuhdƱ] absurdo [koˈlapisƱ] colapso

A epecircntese vocaacutelica nos dados examinados natildeo foi muito expressiva sobretudo

pelo fato de natildeo termos encontrado um nuacutemero significativo de palavras com

encontro consonantal no leacutexico dos indiacutegenas Entretanto alguns casos como em

(34) ilustram a ocorrecircncia no portuguecircs dos Latundecirc

(34) [ˈmɔgunƱ] mogno (35) [piˈnew] pneu

A estrutura que favorece a epecircntese no portuguecircs natildeo faz parte das regras

fonotaacuteticas do Latundecirc o que tambeacutem pode favorecer a vogal epenteacutetica nos

dados observados

(36) [haacutersquopazɪ] rapaz [haacutersquopazƱ] rapaz [parsquope sɪ] papeacuteis [dorsquose zɪ] de vocecircs [lsquonͻ zɪ] noacutes

183

Diferentemente do que ocorre em (34 - 35) os dados de (36) nos direcionam para

a paragoge processo que se caracteriza pela inserccedilatildeo de elemento(s) no final do

vocaacutebulo Este processo tambeacutem estaacute diretamente ligado agrave presenccedila da fricativa

alveolar desvozeada em coda sendo esse segmento proibido nessa posiccedilatildeo no

Latundecirc No caso citado a inserccedilatildeo pode ser da vogal alta posterior rapaz

[hapazƱ] mas a preferecircncia eacute pela vogal alta anterior que eacute a vogal menos

marcada [hapazɪ] rapaz noacutes [lsquonͻ zɪ]

Em (37) o processo de paragoge ocorre apoacutes o processo de monotongaccedilatildeo

ocorrendo no ditongo [atildew] que passa a ser realizado como a vogal nasal meacutedia

posterior conforme discutido em 5111 Apoacutes esse processo haacute a inserccedilatildeo do

consoante nasal seguida da vogal alta anterior A paragoge eacute variaacutevel com a

reduccedilatildeo do ditongo ([tubaˈɾotilde]) A inserccedilatildeo da siacutelaba final [-ni] pode decorrer da

existecircncia produtiva de terminaccedilatildeo sonora semelhante em vocaacutebulos (nominais e

verbais) no Latundecirc

(37) [tubarsquoɾotildenɪ] tubaratildeo

Em (38) o processo ocorrente eacute a proacutetese Se para o processo inverso - a afeacuterese

- os dados satildeo em maior quantidade para a proacutetese satildeo pouquiacutessimos os

contextos em que ela ocorre No caso deste exemplo a proacutetese se daacute a presenccedila

da vogal baixa diante do verbo Este tipo de proacutetese eacute bem recorrente no

Portuguecircs em dados como ([alemˈbra]) Entretanto o caraacuteter pontual da

ocorrecircncia do fenocircmeno natildeo favorece uma interpretaccedilatildeo mais segura

(38) [atorsquomaɾu] tomaram

184

Outra forma de ganho de elementos pode ser o prolongamento da vogal final O

exemplo de (39) nos mostra o prolongamento da vogal meacutedia anterior Essa

ocorrecircncia foi observada no contexto especiacutefico de ecircnfase

(39) [dese] desse [se] esse

613 Alteraccedilatildeo de elementos (Permuta ou transposiccedilatildeo)

A alteraccedilatildeo de elementos linguiacutesticos eacute considerada na literatura histoacuterica como o

terceiro tipo de alternacircncia focircnica inerente agraves liacutenguas Os contextos em que o

cacircmbio eacute permitido satildeo diversos e direcionados por distintas regras fonoloacutegicas

Muitos desses processos natildeo alteram a estrutura silaacutebica nem atinge a estrutura

lexical O que ocorre de fato eacute a acomodaccedilatildeo de alguns segmentos no dialeto

falado seja pela mudanccedila de traccedilo(s) ou seja pela de segmento(s)

6131 Despalatalizaccedilatildeo de [ʃ] e [ʒ]

Tratamos na seccedilatildeo 5115 do processo da reduccedilatildeo das palatais [ʎ] e [ɳ] que

tambeacutem se configura como um caso de despalatalizaccedilatildeo Todavia tal

classificaccedilatildeo se daacute devido ao fato de estaacute ligada agrave perda de elementos enquanto

a que trataremos agora se configura da permuta ou da reduccedilatildeo de traccedilos

185

Em Latundecirc a presenccedila das palatais [ʃ] e [tʃ] satildeo realizaccedilotildees de s Estas podem

vir em iniacutecio e em meio de palavras As realizaccedilotildees [ʃ] e [s] satildeo preferidas pelos

mais novos enquanto os mais velhos optam pela africada alveolo-palatal surda

Diferentemente no Portuguecircs falado por Latundecirc as realizaccedilotildees natildeo

palatalizadas satildeo preferidas Os Latundecirc natildeo transferem o segmento mais

marcado para o Portuguecircs Contudo conforme seccedilatildeo a seguir veremos que este

processo eacute variaacutevel e pode se dar em qualquer posiccedilatildeo do vocaacutebulo conforme

dados de (40)

(40) [sersquogo] chegou [sersquogamƱ] chegamos [sorsquoɾanƱ] chorando [sursquopaha] chupava [satildematildedƱ] chamando [dersquosaɾƱ] deixaram [casueɾƱ] cachoeira

[mersquosenƱ] mexendo [bisƱ] bicho [baso] baixo [debasƱ] debaixo [lsquopesƱ] peixe [dirsquoso] deixou

Natildeo consta no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc as consoantes z e ʒ de forma

que a liacutengua natildeo apresenta oposiccedilatildeo entre surda e sonora para as fricativas

sibilantes Em (41) o processo de despalatalizaccedilatildeo atinge a fricativa alveopalatal

vozeada que passa a se comportar como fricativa alveolar em iniacutecio de siacutelaba e

em meio de palavras

(41) [lizeɾƱ] ligeiro

186

[lsquolotildezɪ] longe [lsquosuzɪ] suja [lsquosuzu] sujo [azursquoda] ajudar [lsquozudia] judia [azersquota] ajeitar

A escolha do segmento menos marcado segue o que ocorreu com s a

realizaccedilatildeo desses segmentos satildeo adquiridos analogicamente e a presenccedila se daacute

no interior do vocaacutebulo Trata-se da reinterpretaccedilatildeo e acomodaccedilatildeo do segmento

Neste caso do menos marcado jaacute que ambos satildeo menos naturais em sua liacutengua

(WEINREICH 1953)

6132 Palatalizaccedilatildeo

A quantidade de sons palatais do Latundecirc natildeo corresponde aos do Portuguecircs

Em Latundecirc a palatalizaccedilatildeo eacute um processo foneacutetico que ocorre com o segmento

s e em incidecircncia extremamente escassa com t em ambientes que jaacute foram

postos no Capiacutetulo IV que trata deste sistema foneacutetico Eacute um processo bastante

variaacutevel tendo em vista a natildeo presenccedila desse segmento na subjacecircncia da

liacutengua Essa variaccedilatildeo ocorre marcadamente na fala dos mais velhos Os mais

jovens que adquiriram ambas as liacutenguas (Portuguecircs e Latundecirc)

simultaneamente produzem em menor proporccedilatildeo este processo

A africada [tʃ] eacute um segmento que tambeacutem apresenta uma realizaccedilatildeo altamente

variaacutevel provavelmente devido agrave histoacuteria interna da liacutengua conforme Telles

187

(2002 p85) No Latundecirc natildeo haacute diferenccedila entre a oposiccedilatildeo foneacutetica entre as

alveolares de um lado e as palatais e alveacuteolo-palatais de outro

Em (42) e (43) a palatalizaccedilatildeo atinge tanto a fricativa alveolar vozeada quanto a

desvozeada

(42) [ʃu rsquomiɾƱ] sumiram

[ lsquoʃi ma] cima

[ʃigursquoɾow] segurou

(43) [lsquoua] usa

[bursquoʒoɾƱ] Besouro

Em (44) e (45) a palatalizaccedilatildeo abrange as consoantes oclusivas alveolares que

se realizam como africadas alveolo-palatais podendo ocorrer em qualquer

posiccedilatildeo ou contexto da palavra

(44) [lsquoĩdƱ] iacutendio

[matildersquodɔga] mandioca

[ɛrsquoĩ] zezinho

[odʒɪ] hoje [tʃi rsquodʒeɾƱ] cinzeiro

Embora no Portuguecircs o processo de africativizaccedilatildeo de oclusivas alveolares [t d]

seja comum a alguns dialetos como o do Rio de Janeiro [lsquotʃia] e do portuguecircs

popular no Nordeste [lsquoojtʃƱ] sua ocorrecircncia eacute condicionada agrave contiguidade de uma

vogal anterior alta [i] Diferentemente em Latundecirc a palatalizaccedilatildeo e a

188

fricativizaccedilatildeo variam entre si e ocorrem tambeacutem com a fricativa alveolar s Este

processo pode ocorrer em qualquer lugar da palavra

(45) [tʃai] sair [tʃiɾi ga] seringa

[barsquotʃotilde] batom [tʃͻ] soacute [tʃumiɾƱ] sumiram

[tʃobɾo] sobrou

[arsquotʃi ] assim

[tʃubi nƱ] subindo

[pɔtʃa] porta

[rsquotʃua] suja

Os exemplos de (46) apontam para um processo secundaacuterio o fortalecimento

Neste caso a fricativa alveopalatal passa a ser pronunciada como africada

(46) [ tʃoɾatildenƱ] chorando [tʃama] chama [tʃega] chega [ tʃursquoveɾƱ] chuveiro [kaharsquopitʃƱ] carrapicho

No que tange agrave abordagem das palatais a variaccedilatildeo no processo de acomodaccedilatildeo

desses inventaacuterios fonoloacutegicos eacute muito grande A partir das incidecircncias

percebemos que no Portuguecircs resultante do contato a ocorrecircncia desses

segmentos complexos se mostra tambeacutem na mesma proporccedilatildeo

Diante da palatalizaccedilatildeo incluindo a africativizaccedilatildeo observamos que os dados

apresentam duas direccedilotildees quanto ao processo Nos mesmos contextos tanto

ocorre a despalatalizaccedilatildeo quanto a palatalizaccedilatildeo Essa variaccedilatildeo no portuguecircs dos

189

indiacutegenas eacute engatilhada pela ausecircncia do contraste szʃʒ em sua primeira

liacutengua

6133 Desvozeamento e vozeamento

Diferente do portuguecircs no Latundecirc natildeo haacute oposiccedilatildeo das oclusivas quanto agrave

sonoridade As consoantes oclusivas subjacentes satildeo as surdas bilabial alveolar

e velar p t e k respectivamente Sua realizaccedilatildeo sonora eacute condicionada pela

posiccedilatildeo na palavra pelo ambiente (contiguidade nasal) e pelo acento O

vozeamente obrigatoacuterio ocorre quando elas precedidas por consoante nasal na

coda da siacutelaba anterior O processo ocorre tanto no interior quanto em fronteiras

de morfemas (TELLES 2002 p135)

A ausecircncia do contraste surdo-sonoro nas consoantes oclusivas do Latundecirc afeta

a realizaccedilatildeo das consoantes no portuguecircs resultante do contato Na produccedilatildeo dos

indiacutegenas mais velhos (esse fenocircmeno natildeo foi observado na geraccedilatildeo mais

jovem) o processo de desvozeamento atinge as consoantes oclusivas sonoras g

d do portuguecircs conforme (47) e (48)

A realizaccedilatildeo sonora Latundecirc envolve o traccedilo laringal Foneticamente em fala

lenta haacute a realizaccedilatildeo de [d] como alofone de t Telles (2002 p 45) explica que

os falantes mais jovens da geraccedilatildeo poacutes-contato que adquiriram o Portuguecircs

simultaneamente ao Latundecirc neutralizaram o contraste entre sons realizando

preferencialmente o som menos marcado natildeo-implodido Diferentemente dos

mais novos os mais velhos preferem o som implosivo [ɗ]

190

Quanto ao segmento [g] o Latundecirc o tem enquanto alofone de [k] e pode ser

encontrado em iniacutecio de palavra quando em fala raacutepida Mostra-se categoacuterico em

meio de palavra quando diante de uma nasal lexical Em ambiente intervocaacutelico

pode-se encontrar a variaccedilatildeo entre [k] e [g] das quais eacute preferencial a realizaccedilatildeo

da vogal surda (idem p73) A falta do contraste no Latundecirc explica as

realizaccedilotildees de (47)

(47) [lsquobɾika] briga [lsquokoʃta] gosta [kɔviotilde] gaviatildeo

[katildersquoba] gambaacute

A ausecircncia do segmento [d] em Latundecirc eacute a responsaacutevel pela variaccedilatildeo e pela natildeo

realizaccedilatildeo dessa consoante que ocorre como oclusiva alveacuteolo-palatal t

(48) [tipoj] depois [se rsquotatu] sentado

(49) [hatildega] arranca

Em (49) diferentemente do processo de desvozeamento a oclusiva velar se

realiza como sonora A contiguidade nasal em posiccedilatildeo precedente condiciona o

vozeamente da oclusiva velar

Em todos os casos observados acima fica evidente a interferecircncia do Latundecirc no

portuguecircs indiacutegena As consoantes sonoras que satildeo mais marcadas

interliguisticamente por natildeo fonoloacutegicas no Latundecirc se tornam ainda mais

marcadas nessa liacutengua Na produccedilatildeo do portuguecircs os Latundecirc mais velhos

191

preservam a marcaccedilatildeo e apresentam uma realizaccedilatildeo com condicionamento

emprestado da liacutengua indiacutegena

6134 Abaixamento e Elevaccedilatildeo das Vogais Orais

No portuguecircs falado pelos Latundecirc os processos de abaixamento e elevaccedilatildeo

diferenciam-se dos contextos em que ocorrem no portuguecircs Os de elevaccedilatildeo satildeo

em maior nuacutemero que os de abaixamento fato este tambeacutem verificado no

portuguecircs falado pelos Latundecirc

No caso de (50) o uacutenico caso de abaixamento ocorre na vogal anterior nasal e

que passa a ser pronunciada como vogal baixa oral

(50) [asina] ensinar [asinatildenɪ] ensinando

Em (51) a elevaccedilatildeo ocorre com a vogal central baixa final que passa a alta

anterior

(51) [suzɪ] suja [kazɪ] causa [kazɪ] casa [li gɪ] liacutengua

[pɾersquogisɪ] preguiccedila

Assim como em (51) em (52) a elevaccedilatildeo da vogal final tambeacutem eacute realizada como

alta anterior No segundo caso natildeo se trata de elevaccedilatildeo mas de anteriorizaccedilatildeo

uma vez que a vogal meacutedia posterior que ocorre em nomes no portuguecircs eacute

realizada como alta posterior

192

(52) [li pɪ] limpo

[kotildemɪ] como [pɾeti] preto

[saɾatildepɪ] sarampo

[pɾimeɾɪ] primeiro

[morsquosegɪ] morcego [morsquohe dɪ] morrendo

[novɪ ] novo

[kursquoɳadɪ] cunhado [otɪ] outro [fikatildenɪ] ficando

A elevaccedilatildeo e posteriorizaccedilatildeo tambeacutem ocorrem no final dos vocaacutebulos como em

(53)

(53) [kabesƱ] cabeccedila [kanɛlƱ] canela

[mini nadƱ] mininada

[malaɾƱ] malaacuteria

[kursquoru Ʊ] coruja

Em (54) temos tambeacutem a posteriorizaccedilatildeo da alta anterior Assim como a meacutedia

posterior em (52) a meacutedia anterior no portuguecircs eacute amplamente produzida como

alta anterior de forma que o alccedilamento em si natildeo se configura como um

processo do portuguecircs do contato

(54) [hedƱ] rede [bastatildetƱ] bastante [pesƱ] peixe [notƱ] noite [febɾƱ] febre

193

Apesar de natildeo encontrarmos itens que mostrassem a sistematicidade do

condicionamento entre [i] e [u] em final de palavras os dados nos mostram que

haacute uma tendecircncia na base das realizaccedilotildees Os vocaacutebulos terminados em [Ʊ]

tendem a ser produzidos com [ɪ] e os terminados por [a] tendem a ser realizados

com [Ʊ]

Nos dados observados a variaccedilatildeo entre [i] e [Ʊ] soacute ocorre em final de vocaacutebulo

quando se trata da paragoge conforme visto nos exemplos (36) em 512

[harsquopazɪ] ~ [harsquopazʊ]

Os dados em (55) ilustram a falta de regularidade no alccedilamento das vogais

pretocircnicas Como vemos em [fuˈkatildemƱ] e [virsquome ] a tonicidade ou a contiguidade

segmental natildeo condiciona a elevaccedilatildeo da pretocircnica

(55) [pig ta] pergunta [piskosƱ] pescoccedilo [hirsquopotildedew] respondeu [pigu rsquotatildenɪ] perguntando

[dimorsquoɾo] demorou

[virsquome ] vermelho [dimursquoɾatildenɪ] demorando

[fuˈkatildemƱ] ficamos

[kuˈmiw] comeu

194

6135 Nasalizaccedilatildeo e Desnasalizaccedilatildeo

No Latundecirc a nasalidade vocaacutelica eacute contrastiva para a central baixa a anterior

alta e a posterior alta seguidas por consoante nasal tautossilaacutebica A nasalizaccedilatildeo

alofocircnica soacute ocorre com vogais aacutetonas Apesar de a organizaccedilatildeo do traccedilo nasal

na fonologia do Latundecirc ser distinta da do portuguecircs o status contrastivo do traccedilo

em ambas as liacutenguas favorece sua percepccedilatildeo e realizaccedilatildeo na produccedilatildeo na sala

no portuguecircs Entretanto a nasal depende tambeacutem de outros fenocircmenos

cooperantes

Os dados a seguir ilustram a ocorrecircncia da nasalizaccedilatildeo em vogais A

contiguidade da vogal com uma consoante nasal mesmo heterossilaacutebica pode

resultar na nasalizaccedilatildeo O primeiro dado abaixo foge do esperado em liacutengua

portuguesa e tampouco decorre de uma interferecircncia do Latundecirc

(56) [mersquoatilde] meia [bɾĩrsquogatildenƱ] brigando [ʃu miɾƱ] sumiram

[mi mƱ] mesmo

Em (57) ocorre a desnasalizaccedilatildeo em palavras funcionais Esses casos natildeo satildeo

frequentes no leacutexico e natildeo podem ser analisados como resultados de interferecircncia

direta O apagamento da nasal em coda ou em onset seguinte impede a

nasalizaccedilatildeo

(57) [nɪ] nem (natildeo) [mia] minha

195

6136 Fenocircmenos evolvendo os roacuteticos

O tratamento do roacutetico requer uma consideraccedilatildeo sobre o seu comportamento

interlinguiacutestico Retomando as palavras de Bonet e Mascaroacute (1997 p 103)

It is well know that the phonetic realization of rhotics varies considerably from language to language even from dialect to dialect Rhotics can be realized as flaps taps trills (uvular coronal ou bilabial) or as assibilated or fricative variants They ca alternate with a lateral liquid with glides and in some cases a flap can occur as the phonetic realization of a coronal stop in specific environments

Os roacuteticos satildeo segmentos que apresentam uma grande variaccedilatildeo no portuguecircs

Natildeo diferentemente estes elementos tambeacutem se mostraram como motivadores

de vaacuterios processos fonoloacutegicos do portuguecircs falado pelos Latundecirc

Os exemplos dispostos em (58) apontam para a aspiraccedilatildeo do R em coda

silaacutebica Processo este que eacute comum a variedades do portuguecircs e que tambeacutem

no caso em tela pode ser motivado pela preferecircncia de natildeo coda da liacutengua

Latundecirc que favorece o seu enfraquecimento atraveacutes de uma realizaccedilatildeo fricativa

glotal

(58) [duhmɪ] Dormi [mɛgursquola] mergulhar

[fosa] Forsa

O rotacismo eacute um fenocircmeno presente no portuguecircs dos Latundecirc especialmente

entre os mais velhos Fonemas distintos podem sofrer o processo Em (59) a

realizaccedilatildeo do flap tem na base uma sibilante uma lateral palatal e uma oclusiva

196

alveolar Em ldquotrabalhavardquo a lateral palatal inexistente no Latundecirc poderia ser

subtituida pela lateral alveolar constante do inventaacuterio da liacutengua indiacutegena

Entretanto o flap apesar de natildeo fonoloacutegico no Latundecirc eacute um segmento muito

frequente na liacutengua decorrente de processo de enfraquecimento Essa tendecircncia

do Latundecirc pode estar na base da realizaccedilatildeo do portuguecircs Dentre as ocorrecircncias

abaixo a uacuteltima se coloca como um processo frequente no proacuteprio Latundecirc no

qual uma oclusiva passa a flap em ambiente intervocaacutelico

(59) [karsquoboɾe] acabou-se

[tabaɾava] trabalhava

[poɾɪ] pode

Em Portuguecircs particularmente falado por sujeitos menos escolarizados o

fenocircmeno do rotacismo tambeacutem eacute frequente em encontros consonantais

tautossilaacutebicos em que a segunda consoante eacute a lateral alveolar l Dessa forma

produccedilatildeo encontrada em (60) pode ser devido ao contato com o Portuguecircs local

(60) [pɾatildeta] planta

[gɾɛba] gleba

[fɾɛsa] flecha

Em termos da organizaccedilatildeo da fonologia de ambas as liacutenguas os dados em (60)

assim como aqueles em (59) podem ser refletidos a partir da escala de

sonoridade proposta por Bonet e Mascaroacute (1997 p 109)

197

Quadro 21 Escala de Sonoridade adaptada de Bonet e Mascaroacute 1997 p 109)

0 1 2 3 4

Obstruintes

(oclusivas

fricativas trill)

nasais laterais glides

flap

vogais

Considerando a posiccedilatildeo do flap na escala de Bonet e Mascaroacute podemos

interpretar tanto o rotacimo no portuguecircs natildeo padratildeo quanto aquele presente no

Latundecirc como resultado de enfraquecimento de diferentes segmentos situados

mais agrave esquerda no ranking de sonoridade Entre esses segmentos como

observamos na escala acima encontra-se a proacutepria lateral alveolar que apesar

de tradicionalmente formar a classe das liacutequidas ao lado dos roacuteticos natildeo

apresenta a mesma sonoridade que o flap

6137 Labializaccedilatildeo e Deslabializaccedilatildeo

No Portuguecircs falado pelos Latundecirc os processos que envolvem articulaccedilatildeo

secundaacuteria especificamente a labializaccedilatildeo e a deslabializaccedilatildeo estatildeo

relacionados agraves consoantes oclusivas velares e se realizam praticamente nos

mesmos contextos Trata-se de um processo foneacutetico variaacutevel

(61) [kƱɪ] que [kƱelɪ] com ele (62) [kazɪ] quase [katildedƱ] quando

198

[karsquokƱɛ] qualquer

[li gɪ] liacutengua

No Latundecirc a labializaccedilatildeo pode ser derivada de processo mas eacute restrita em

ocorrecircncia Aleacutem disso a sequecircncia da olusiva seguida do glide formando

encontro consonantal tambeacutem natildeo faz parte da fonologia do Latundecirc Esses fatos

favorecem a produccedilatildeo irregular do portuguecircs em que observamos a

deslabializaccedilatildeo (ou o apagamento do glide) como em (62) e a labializaccedilatildeo (ou

inserccedilatildeo do glide) em (61)

6138 Metaacutetese

A alternacircncia de segmentos no portuguecircs falado pelos Latundecirc pode ocorrer

entres siacutelabas diferentes ou entre elementos da mesma siacutelaba Aleacutem disso

ocorre nas duas direccedilotildees (da esquerda para a direita e da direita para a

esquerda)

(63) [bahiƱ] bairro [fɾevenƱ] fervendo [parsquoguo] apagou

Como vemos acima no primeiro dado de (63) ocorre natildeo apenas a metaacutetese

como tambeacutem o avanccedilo do acento resultando numa palavra oxiacutetona Nos demais

dados a tranposiccedilatildeo segmental natildeo interfere na estrutura suprassegmental O

segundo dado de ldquofervendordquo eacute tiacutepico do portuguecircs e pode decorrer da variedade

de contato sobretudo pelo fato de o onset complexo natildeo fazer parte da liacutengua

indiacutegena Em ldquoapaguordquo a metaacutetese resulta na labializaccedilatildeo da oclusiva velar Essa

199

forma de palavra tem como realizaccedilatildeo foneacutetica frequente mesmo no portuguecircs

nativo a monotongaccedilatildeo Nesse caso a metaacutetese resulta de processo irregular e

pontual nos dados observados

Como vimos nas seccedilotildees anteriores os resultados da metaacutetese natildeo correspondem

a estruturas fonoloacutegicas no Latundecirc sendo sua ocorrecircncia derivada de processo

foneacutetico sem condicionamento prosoacutedico

6139 Siacutestole

Alguns casos de siacutestole em que ocorre o recuo do acento foram encontrados na

fala dos mais velhos Natildeo identificamos contexto linguiacutestico como o

sequenciamento focircnico do enunciado fonoloacutegico que justificasse essas

realizaccedilotildees Considerando o fato de a produccedilatildeo ter sido encontrada apenas na

fala da geraccedilatildeo mais velha e de o acento lexial no Latundecirc ser morfoloacutegico

ancorado em uma das duas promeiras siacutelabas da raiz da palavra (TELLES 2002)

eacute plausiacutevel supor uma interferecircncia do padratildeo acentual da liacutengua indiacutegena no

portuguecircs dos Latundecirc Os dados em (64) evidencia o recuo do acento

(64) [mɔhe] morrer

[kalo] calor [katɪ] quati [pega] pegar

Nos dados acima importa considerar tambeacutem o fato de se tratarem de itens

nominais (incluindo as formas nominais dos verbos) Diante disso uma analogia

possiacutevel dos Latundecirc seria a de considerar a raiz monossilaacutebica que eacute altamente

200

produtiva na liacutengua indiacutegena o que tambeacutem justificaria o acento na primeira

siacutelaba da palavra

61310 Fortalecimento

Casos de fortalecimento jaacute foram abordados nas seccedilotildees anteriores em que

tratamos da palatalizaccedilatildeo e da dessonorizaccedilatildeo Nesta seccedilatildeo outro fenocircmeno de

fortalecimento eacute apresentado no qual ocorre a oclusivizaccedilatildeo de fricativas

Salientamos entretanto que essas foram realizaccedilotildees mais esporaacutedicas e menos

recorrentes que as demais

(65) [istubidƱ] subindo [tiguɾa] segura

[torsquoteɾƱ] solteiro

[batitaɾƱ] batizaram

O processo ocorre no iniacutecio e em meio de palavra No primeiro dado em fato haacute

uma epecircntese da oclusiva alveolar surda [t] tendo em vista a preservaccedilatildeo de uma

sutil sibilaccedilatildeo do s em coda da siacutelaba precedente

Na fonologia do Latundecirc o fonema s tem como alofone o fone [t] que ocorre em

siacutelaba aacutetona (TELLES 2002) Embora essa natildeo seja a realizaccedilatildeo mais frequente

a interferecircncia do Latundecirc natildeo pode ser desconsiderada Em todos os dados de

(65) haacute a presenccedila de segmento oclusivo em siacutelaba contiacutegua que tambeacutem pode

ter motivado o fortalecimento do s

201

7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

No que concerne agraves poliacuteticas linguiacutesticas diante do glotociacutedio que tem se

instaurado no Brasil desde a chegada dos portugueses dado o estado em que se

encontram as liacutenguas indiacutegenas brasileiras eacute de grande valia qualquer estudo

que vise agrave contribuiccedilatildeo e que favoreccedila natildeo soacute a proteccedilatildeo como o conhecimento

cientiacutefico dessas liacutenguas

O Latundecirc como jaacute mencionamos eacute uma dessas liacutenguas minoritaacuterias Ela se

encontra em extinccedilatildeo uma vez que hoje dispotildee de menos de 20 falantes com

autonomia poliacutetica Devido agrave populaccedilatildeo restrita e agraves relaccedilotildees tradicionais de

parentesco os jovens Latundecirc natildeo podem coabitar entre si de forma que a

interaccedilatildeo com o mundo externo eacute a via de perpetuaccedilatildeo social e ao mesmo

tempo de crescente e natildeo planejado contato linguiacutestico Tais circunstacircncias

implicam a urgecircncia de mais estudos sobre a realidade desse povo

Entedemos que estudar as liacutenguas menos conhecidas eacute de grande valia para o

incremento da ciecircncia linguiacutestica A investigaccedilatildeo de cada nova liacutengua eacute uma

maneira de conceber a linguagem humana e de contribuir dessa forma com os

universais linguiacutesticos e com o entendimento da faculdade humana da linguagem

(CAcircMARA-JR 1977 p6)

Seja entre si ou em contato com outras estas liacutenguas natildeo estatildeo (ou natildeo

estiveram) suficientemente isoladas para evitar algum tipo de proximidade

Thurston (1987 p 165) propaga que toda liacutengua deve ter sofrido alguma

202

influecircncia de seus vizinhos em um determinado ponto e tempo Todos os idiomas

satildeo portanto liacutenguas mistas na medida em que todos copiaram formas lexicais e

outros recursos linguiacutesticos de liacutenguas vizinhas

Thomason (2001 p 17) afirma que o contato linguiacutestico estaacute em toda a parte

muitos paiacuteses tecircm mais do que uma liacutengua oficial e muito provavelmente a maior

parte da populaccedilatildeo mundial fala duas ou mais liacutenguas

Contudo mesmo em grande quantidade os estudos que se encarregam da

observaccedilatildeo do contato linguiacutestico se debruccedilam ainda timidamente nos aspectos

foneacuteticos Com base nesta assertiva este trabalho se propocircs a observar como se

daacute o comportamento entre o Portuguecircs e o Latundecirc a partir da verificaccedilatildeo dos

padrotildees mais e menos marcados nos processos foneacuteticos de acomodaccedilatildeo Eacute um

estudo descritivo em que o Portuguecircs eacute a segunda liacutengua mesmo em face de seu

caraacuteter nacional Essa pluralidade linguiacutestica ainda existente no paiacutes demanda a

concretizaccedilatildeo das poliacuteticas a favor da salvaguarda da diversidade no planeta

Posto que toda liacutengua sofra influecircncia das forccedilas internas e externas que agem

sobre ela partimos do pressuposto de que em qualquer pesquisa linguiacutestica natildeo

encontraremos nada de extraordinaacuterio nada que exceda a experiecircncia do

humano Dessa sorte vamos encontrar () uma estrutura linguiacutestica como

qualquer outra e em muita coisa ateacute possivelmente semelhante agrave nossa

(MATTOSO CAcircMARA-JR 1977 p7)

E quando sistemas entram em contado fenocircmenos emergentes podem ajudar a

esclarecer os princiacutepios e as restriccedilotildees que regem as liacutenguas particulares Com

base na complexidade e na riqueza que advecircm do contato linguiacutestico analisamos

203

estas forccedilas conflitantes com base nos princiacutepios de hierarquizaccedilatildeo e

regularidade que satildeo forccedilas motrizes da marcaccedilatildeo nos processos foneacuteticos Aleacutem

do fator tempo outros aspectos podem estar diretamente ligados agraves

transformaccedilotildees pelas quais uma liacutengua passa como relaccedilotildees de poder

influecircncias de outras liacutenguas subjetividade de seus falantes etc

A marcaccedilatildeo estaacute diretamente ligada agrave simetria frequecircncia e naturalidade

Entretanto Rice (2007) apresenta as caracteriacutesticas da marcaccedilatildeo agrupando-as

em dois conjuntos O primeiro envolve os termos relativos a uma marcaccedilatildeo

considerada natural ou pautada na frequecircncia e diz respeito em larga medida a

ldquophonetic basis of an oppositionrdquo Nele se encontram oposiccedilatildeo como ldquomais ou

menos naturalrdquo ldquomais ou menos complexordquo ldquomais ou menos estaacutevelrdquo ldquosujeito agrave

aquisiccedilatildeo mais ou menos tardiardquo etc (Rice 2007 p 81) O segundo grupo eacute

relativo a comportamentos de sistemas fonoloacutegicos como ser ldquosujeito ou

resultado de neutralizaccedilatildeordquo ldquoser gatilho ou alvo de assimilaccedilatildeordquo Esse grupo

portanto diz respeito agrave marcaccedilatildeo fonoloacutegica ou estrutural

No que diz respeito agrave anaacutelise dos dados quanto aos processos foneacuteticos

percebemos em nosso estudo que

Ainda que com algumas restriccedilotildees a tendecircncia agrave monotongaccedilatildeo eacute

transferida para o Portuguecircs falado por Latundecirc [satildersquogɾaɾi] ldquosangraramrdquo

[kaze] ldquocausardquo

Mesmo em variaccedilatildeo a reduccedilatildeo do onset complexo eacute transferida para o

Portuguecircs seguindo a tendecircncia que o Latundecirc tem de evitar esse tipo de

sequecircncia [bĩ katildenƱ] ldquobrincandordquo [kɛbaɾƱ] ldquoquebraramrdquo

204

O preenchimento da coda eacute evitado pelo Latundecirc processo esse que

tambeacutem eacute atestado no Portuguecircs falado por Latundecirc [pi gũta] ldquoperguntardquo

[gorsquotozƱ] ldquogostosordquo

As consoantes ɲ e ʎ mais marcadas interlinguisticamente tambeacutem o

satildeo no Latundecirc que natildeo os tecircm no seu inventaacuterio fonoloacutegico Como

resultado esses segmentos natildeo satildeo produzidos no Portuguecircs falado pelos

Latundecirc Alternativamente ocorre a substituiccedilatildeo desses fonemas por

segmentos articulatoriamente mais proacuteximos ou o seu apagamento [vimej]

ldquovermelhordquo [fila] ldquofilhardquo [farsquokĩ] ldquofaquinhardquo

A reduccedilatildeo silaacutebica eacute atuante tambeacutem atraveacutes da afeacuterese Como natildeo consta

no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc a presenccedila da fricativa alveolar surda

em posiccedilatildeo de coda essa restriccedilatildeo eacute transferida para o portuguecircs dos

Latundecirc que tambeacutem evita vocaacutebulos com mais de trecircs siacutelabas [kutatildeni]

ldquoescutandordquo [bɾa sadƱ] ldquoabraccediladordquo [fiɾ tɪ] ldquodiferenterdquo

O Latundecirc evita o onset em final de palavra adicionando uma vogal para

reorganizar o padratildeo silaacutebico A vogal mais frequente seraacute a alta anterior

[i] [harsquopazɪ] ldquorapazrdquo [dorsquosejzɪ] ldquode vocecircsrdquo

Os sons [ʃ] [ʒ] [tʃ] e [dʒ] satildeo evitados por natildeo fazerem parte do inventaacuterio

fonoloacutegico do Latundecirc de forma que a sua realizaccedilatildeo eacute mais marcada na

liacutengua O comportamento desses segmentos eacute muito variaacutevel Nos mais

jovens satildeo realizados com mais frequecircncia e nos mais velhos satildeo

reinterpretados envolvendo processos diversos [sersquogamƱ] ldquochegamosrdquo

205

[dersquosaɾƱ] ldquodeixaramrdquo [lizeɾƱ] ldquoligeirordquo [azersquota] ldquoajeitarrdquo [ʃũrsquomiɾƱ] ldquosumiramrdquo

[bursquoʒoɾƱ] ldquobesourordquo [tʃĩrsquodʒeɾƱ] ldquocinzeirordquo

A ausecircncia do contraste surdo-sonoro nas consoantes oclusivas t e k do

Latundecirc promove sua neutralizaccedilatildeo na realizaccedilatildeo das consoantes no

portuguecircs dos indiacutegenas [lsquobɾika] ~ [lsquobriga] ldquobrigardquo [s rsquotatu] ~ [se rsquotado]

ldquosentadordquo

No que tange ao comportamento das vogais meacutedias postocircnicas os

vocaacutebulos terminados em [Ʊ] tendem a ser produzidos com [ɪ] e os

terminados por [a] tendem a ser realizados com [Ʊ] que satildeo vogais menos

marcadas [kazɪ] ldquocausardquo [ lĩpɪ] ldquolimpordquo [ka besƱ] ldquocabeccedilardquo [bas tatildetƱ]

ldquobastanterdquo

A partir dos fenocircmenos observados buscamos responder agraves perguntas

norteadoras da nossa pesquisa abaixo retomadas

Fatores internos (linguiacutesticos) e externos (estruturais) interagem com os

princiacutepios da marcaccedilatildeo

Resposta Quanto aos fatores externos no que diz respeito agrave faixa etaacuteria

os mais jovens tendem a natildeo transferir os padrotildees mais marcados da sua

liacutengua para a liacutengua adquirida Em contrapartida os mais velhos

reproduzem com menor frequecircncia os padrotildees mais marcados do

Portuguecircs (liacutengua dominante)

Qual o papel da marcaccedilatildeo no contato linguiacutestico

206

Resposta A marcaccedilatildeo considerada natural responde pela escolha de

padrotildees mais ou menos marcados interlinguisticamente Por essa razatildeo

prevalece a tendecircncia agrave siacutelaba CV do que decorre o apagamento da coda e

a simplificaccedilatildeo de onset complexo De outro lado haacute o natildeo repasse da

laringalizaccedilatildeo vocaacutelica que mesmo fonoloacutegica no Latunecirc eacute menos natural

e mais marcada nas liacutenguas do mundo A marcaccedilatildeo fonoloacutegica eacute

observada na neutralizaccedilatildeo de oposiccedilotildees vaacutelidas no portuguecircs poreacutem

inexitentes na liacutengua indiacutegena como o contraste quanto agrave sonoridade nas

oclusivas e agrave escolha da vogal em posiccedilatildeo final de nomes

Efetivamente um aspecto da marcaccedilatildeo natural pode responder pelo

comportamento da marcaccedilatildeo fonoloacutegica de maneira que natildeo satildeo

caracteriacutesticas de marcaccedilatildeo oponentes entre si No caso em estudo as

duas marcaccedilotildees operam mas natildeo respondem por todos os fenocircmenos

observados Aleacutem disso o caraacuteter altamente variaacutevel das realizaccedilotildees e as

condicionantes sociais dos falantes datildeo chance para a emergecircncia de

processos mais decorrentes da falha na percepccedilatildeo do sinal sem que se

estabeleccedila a regularidade na sua produccedilatildeo

Os traccedilos mais marcados da liacutengua dominada passam para a dominante

Resposta Em alguns caso sim como a africativizaccedilatildeo do s Em outros

natildeo como o natildeo repasse da larinzalizaccedilatildeo vocaacutelica e a oposinccedilatildeo entre

vogais orais e nasais

Ademais em face dos fenocircmenos observados podemos pontuar algums

aspectos relevantes os processos que envolvem perda e permuta de segmentos

satildeo mais frequentes dos que os que envolvem ganho de segmento os segmentos

207

natildeo presentes no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc (liacutengua originaacuteria) tendem a

ser apagados ou reinterpretados pelo segmento mais proacuteximo do portuguecircs

sendo este uacuteltimo o mais frequente os traccedilos mais marcados do Latundecirc estatildeo

mais evidentes nas falas da geraccedilatildeo preacute-contato e a marcaccedilatildeo natildeo estaacute

condicionada apenas aos universais linguiacutesticos mas agraves especificidades das

liacutenguas

Por fim salientamos que o nosso propoacutesito neste estudo foi o de contribuir para a

descriccedilatildeo de liacutenguas incluindo as indiacutegenas e de abrir caminhos para o estudo

do contato linguiacutestico especialmente em niacutevel da foneacutetica e da fonologia

Ressaltamos que este trabalho natildeo encerra o estudo sobre o contato entre as

duas liacutenguas Reconhecemos que os nossos resultados representam um ponto de

partida para investigaccedilotildees posteriores as quais poderatildeo expandir o tema e

avanccedilar no campo da inter-relaccedilatildeo entre contato linguiacutestico e a marcaccedilatildeo

208

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ANEXOS

(Dados Transcritos)

parsquoguo Apagou marsquoma Mamar pegũrsquotatildenu Perguntando barsquoʃo Vassoura rsquokɔsa Coccedilar

marsquoduu Mais duro

rsquokati Quati

arsquoh ti A gente rsquootu Outro irsquoarsquov j E jaacute vem v rsquone ni Veneno pɛgũrsquoto Perguntou rsquofoʃ Foi pɾatildersquoto Plantou rsquosuzu Sujo karsquobeli Cabelo gursquoduɾu Gordura rsquootildemi Homem rsquogodu Gordo rsquopega Pegar dersquotadu Deitado

marsquotau Mataram

korsquokin Coquinho guɾirsquozĩ Gurizinho rsquotakorsquosotildenu Taacute com sono (manutenccedilatildeo) mũdi Mundo ʃursquov ni Chovendo pigũrsquota ni Perguntando sursquov ni Chovendo rsquopɔtʃa Porta kursquomigi Comigo kũversquosatildeni Conversando larsquovatildeni Lavando morsquoh di Morrendo ikursquotatildenu Escutando mursquohidu Morrido marsquohadu Amarrado irsquokutu Escuto

persquohu torsquose Pergunto a vocecirc

rsquoseja Cheia rsquoozi Hoje

rsquoʃuʊ Sujo

222

ursquozotursquopatildejrsquoagʊa Os outros apanham aacutegua

rsquotʃua Suja

bu rsquonitu Bonito

rsquokɛla Aquela

rsquomu tu Muito

vehrsquomejo Vermelho rsquomasu Manso marsquosatildedu Amansando arsquoɾisi Arisco hursquoo Avoou rsquoaga Aacutegua

rsquode tu Dentro

rsquomu tu Muito

rsquotud Tudo irsquopia Espirra isrsquopritu Espiacuterito

rsquofɔti Forte

timirsquotɛi Cemiteacuterio

tɛrsquoha Enterrar

ɔʊrsquoa Jogar (o bicho fora)

tersquoou Enterrou rsquoela Ela matildersquodatilden Mandando batorsquose Bater em vocecirc rsquotokursquotatildenu Tocirc escutando rsquobatildej Banho bɾab Brabo

rsquosɛtu Certo

Kabirsquosela Cabeceira (do rio)

karsquosi bu Cachimbo

tʃursquoveɾu Chuveiro (pau de) rsquoleti Leite rsquofutu Fruto karsquoɾoʃi Caroccedilo kaharsquopitʃu Carrapicho rsquokɾu Crua rsquomasu Massa

pe rsquoʃa Pensar

ojrsquoatildedu Olhando (idem)

pe rsquoʃatilden

Pensando

i te rsquode nu Entendendo

223

irsquokuta Escuta

kwatildedu ew piki nĩnĩ Quando eu era pequenininha

ew bĩrsquokava rorsquodeɾa cũ a lɔrsquoɾĩne

Eu brincava de roda com a Lorine

katildendu pi ĩ

Quando piin

ew tatildebȇĩ cũ a lorsquoɾine

Eu tambeacutem com a Lorine

i lsquoluɾi ku a marsquoɾi

E Lurdes com a Mariacute

mĩa matildey natildew deʃa bɾĩrsquoka

Minha matildee natildeo deixava brincar

eli bɾika corsquomigu

Ela brigava comigo

e koʃta brinrsquoka ni lsquoKotildepu E gostava de brincar no campo

mĩa matildej natildew deʃa bɾĩka Minha matildee natildeo deixava brincar

ersquoli tatildebe j diskuti Ela tambeacutem discutia

tatildebej kɾiatildesa natildew paɾa lsquonɛ Tambeacutem crianccedila natildeo para neacute

fika bahaka bɾĩkatildeni lsquonɛ Fica na barraca brincando neacute

fika gɾitatildeni Fica gritando

a mĩa matilde matildedava bɾĩka lotildeʒi A minha matildee mandava brincar longe

natildew kɛ ve baɾuj na bahaka natildew Natildeo quer ver barulho na barraca natildeo

ki falatildenu O que eu tocirc falando

ki lsquota bɾĩganu nu katildepu Que eu tava brincando no campo

a fruta kirsquoli cotildepi nɛ

A fruta que ele come neacute

kinotildemi di fɾuta Que nome de fruta

akeli iogrii nɛ

Aquele neacute

nɔy sursquopaha lsquo deli Noacutes chupava dele

so eli komenu fɾuta Soacute ali comendo fruta

noj fike mu arsquotɛ ʃersquoga meatilde note

sersquoga

Noacutes ficamos ateacute a meia noite chegar

mĩa matildej bɾiga kumigu Minha matildee brigava comigo

224

tava se ew levatildeta sedu se ew levatildeta sedu

Estava ʔ

va la nu katildepu bɾĩrsquoka Vaacute laacute no campo brincar

u katildepu lsquota satildematildedu orsquosejs O campo taacute chamando vocecircs

noj levatildersquota pɾa bɾĩrsquoka nu kotildepu Noacutes levantaacutevamos para brincar no campo

o katildepu ɛ u maj limpi O campo eacute o mais limpo

eli bɾĩkaru eli istubidu Eles brincaram eles subiram

ɛ ke katildepu num ɛ awto katildepu mũto

baso

Eacute que o campo natildeo eacute alto O campo eacute muito baixo

nɔj sersquogamu bersquobe nu i corsquome nu Noacutes chegamos bebendo e comendo

miu asadu batata e bebe nu

Milho assado batata e bebendo

ew nũm fikej ew bɾĩkava dinoti Eu natildeo fiquei eu brincava de noite

mĩa matildej natildew desa duhmi mĩa matildej bɾiga kumigo

Minha matildee natildeo deixa dormir minha matildee briga comigo

mĩa paj farsquolo sej dumi sedu se pikaɾu cobɾa Kotildemu ki darsquoi

Meu pai falou vocecircs durmam cedo se cobra picar e daiacute

vai sarsquoɾa ou vai a mɔhe Vai sarar ou vai morrer

mĩa paj bɾĩkow diskuti dele natildew Meu pai brigou porque eu natildeo escutava ele natildeo

dohmi amatildersquoɳatilde sedu vorsquose bɾĩrsquoka corsquome mũĩtu fɾuta

Dorme amanhatilde cedo vocecirc vai brincar comer muito fruto

mĩa paj natildew desa ew bɾĩka natildew Meu pai natildeo deixava eu brincar natildeo

natildew icuti dele natildew Natildeo escutei ele natildeo

cɾiatildesa icursquoto crianccedila escutou

iheni fala icursquoto ɛ A gente fala escutou eacute (a gente fala e ela ndash a crianccedila ndash escutou eacute

ni batia natilde mi batia na Natildeo batia natildeo me batia maj eli nũ sabe barsquotih Mas ele natildeo sabia bater

225

falava di bɾabu mihmu Falava bravo mesmo

matildeda agwa matildedƷɔga Mandava buscar aacutegua buscar mandioca

asa biƷu kome Assar beiju comer

nĩ tĩ aacutegua pɾa eli natildew Natildeo tinha aacutegua pra ele natildeo

mĩa matildej natildeo desa ew vĩrsquoga Minha matildee natildeo deixava eu brincar

mĩa povu

Meu povo

bĩ botilde natildew Bem bom natildeo

esi aki bisu bɾabu Esse aqui bicho brabo

mĩa povu matatildedu nosu tudo Meu povo matando o nosso tudo

e ki nomi dee ɛ E que o nome dele eacute

nũ pe rsquosa nisu aki la Natildeo pensar nisso aqui laacute

mĩa matildee falo natildew podi bɾĩka de tu

dagwa notilde

Minha matildee falou natildeo pode brincar dentro drsquoaacutegua natildeo

agwa e mũitu peɾigoso A aacutegua eacute muito perigoso

ĩdƷu vĩ i mata tudĩ nũ iscapa ũ notilde Iacutendio veio e matar tudinho natildeo escapa um natildeo

distotildena kohpu sɔ leva sɔ cabesu Destrona corpo soacute leva soacute a cabeccedila

isu aki nũ ɛ mĩa pare ti notilde Isso aqui natildeo eacute meu parente natildeo

io mimu Eu mesma

nĩge j notilde sabi Ningueacutem natildeo sabe

esi ki ĩdiu moɾava ki i uvi Esse aqui iacutendio morava aqui e ouvi

kɛbaɾu asĩ levo di Quebraram assim levou de Alternacircncia de coacutedigo

demorsquoɾo i ew sersquoge tame j Demorou e eu cheguei tambeacutem

Komi ki rapaɾi kebɾo

Como eacute que o rapaz morreu

226

ai fala pɾa eli nɛ isu ku hapazu Aiacute falou pra ele neacute Isso com o rapaz

eli moɾa debasu di paw nɛ Ele morava debaixo de pau neacute

ve tu dehubo caiw cima deli na

hedu

Vento derrubou caiu em cima dele na rede

sɔ o paj deli capow Soacute o pai dele escapou

vose da mujɛ notilde Vocecirc da mulher natildeo

akeli povu deli mĩ mata todo mĩa povu

Aquele povo dele mata todo meu povo

ĩ via pɾetu Em Veado Preto

paɾEsi kũ ƷEƷĩ Parece com Zezinho

ew moɾa hũtu aki Eu moro junto daqui

keli otɾu Aquele outro

patɾaj iɾe boɾa Para traz ir embora

ai dimorsquoɾo Aiacute demorou

sersquogo Chegou

keli cahĩ sersquogo Aquele Carlinhos chegou

sarsquoi hora orsquoʎa Saiacute fora pra olhar

arsquoi farsquolo dersquosaɾu Aiacute falou deixaram

ota lĩgwa difire ti Outra liacutengua diferente

ta sorsquoɾanu Taacute chorando

ta bĩbotilde natildew Taacute bem bom natildeo

fika tʃorsquoɾatildenu Fica chorando

mĩa pare ti desaɾu mĩa mursquoje Meus parentes deixaram minha mulher

te j bastatildeti Tem bastante

pigũta pa eli Pergunta pra ele

227

maselu kwidava Marcelo cuidava

oti tipu Outro tipo

kotildevɛsa deli nũte di notilde A conversa dele natildeo entendo natildeo

komu ki fala fire ti Como eacute que fala diferente (afeacuterese)

na kohpu uƷa No corpo usa

lizeɾu Ligeiro

tʃarsquoma eli Chamar ele

matildersquodo sabotilde pa eli Mandou sabatildeo pra ele

abɾiw pota Abriu a porta

lava motilde lava pɛ lava bɾasu Lavei a matildeo lavei o peacute lavei o braccedilo

ai ew fikej oiatildenu ai Aiacute eu fiquei olhando aiacute

fikej na pota oiatildenu cutatildeni Eu fiquei na porta olhando

nũ capa niũ Natildeo escapa nenhum

marsquoto cota piskosu Matou e cortou o pescoccedilo

kabesĩn Cabecinha

cusivi kimigu Inclusive comigo

batildeku busa sĩ Branco blusa assim

kursquomiɾu a karsquobesa da lsquoge ti Comeram a cabeccedila da gente

ũ nũ firsquokaɾi Um natildeo ficou

otirsquoĩdʒu Outro iacutendio

ʒũrsquotaɾu Juntaram

bɾirsquogamu pɾa eli Explicamos pra ele

ɔto dii ele vorsquoto dinovu Outro dia ele voltou de novo

ew sarsquoi hora Eu saiacute fora

otoɾapaj cursquoto Outro rapaz escutou

228

oʎa lotildezi Olhou longe

ew lsquoho

Eu vou

desa notilde Deixava natildeo

kuta baɾuj Escuta barulho

marsquoto tudi noɔɾa Matou tudo na hora

sɔ cabesu levo kumew Soacute a cabeccedila levou e comeu

mi a matildej cu tava Minha matildee contava

agwa tupiw tudo A aacutegua entupiu

agwa be j pɾeti mehmu Aacutegua bem preta mesmo

agwa suzi Aacutegua suja

pɾimiɾu kanɛlu Primeiro canela

i totilde paɾi Entatildeo eu parei

nu sarsquobi Natildeo sabia

pɾimeɾu u tigu Primeiro antigo

bastatildetu

Bastante

bastatildetu Bastante

todu tiɾatildenu levatildenu Tudo tirando levando

rsquokaze disu ficaɾu Por causa disso ficaram

tu kɾiatildesa Tudo crianccedila

lersquova todu mini nadu Levar toda meninada

eli mi tinu Ele mentindo

kotildemu orsquose pɾatildeta mu ito Como vocecirc planta muito (rotacismo)

nɔj kume nu aki Noacutes comendo aqui

nɔj seskɛse nu fukamu Noacutes nos esquecemos e ficamos

a noti marsquotaɾu tudu Agrave noite mataram tudo

229

eli sego gatildersquono Ele chegou enganou

kotildemiɾu Comeram

eli kotildersquoto soɾatildeni Ele contou chorando

ke j kwi kiɾo Quem que tirou

mi da mi a filu Me daacute meu filho

sɔ u ki karsquopo Soacute um que escapou

kɾirsquoa na kolu Criar no colo

vi de la u motildeti di he ti Veio de laacute um monte de gente

ew tatildebe j gotava

Eu tambeacutem gostava

na kɔba no basu

Na cobra no braccedilo

bisi u Bichinho

kabeseɾa pɛtu Cabeceira perto

mɔɾa pa basu Mora pra baixo

dirsquofisu marsquota Difiacutecil matar

sɔ bisotilde Soacute bichatildeo

ɛ h~undo Eacute fundo

pohku Porco

fɾɛsa Flecha

mi a matildej falaɾu Minha matildee falou

mi a matildej fikaɾu Minha matildee ficaram (ficou)

pɾimi mehmi Primo mesmo

tatɾa paj tambe j Trata pai tambeacutem

mi atilde ihmatilde maj vɛj Minha irmatilde mais velha

tu tia vɛj ta i Tua tia velha ta aiacute

tɾata gwau gwau ahe ti Trata igual igual a gente

230

halu hɛlarsquodo Ralo ralador

basoɾa ipi Vassoura espinho

fakotilde kotaɾu Facatildeo cortaram

hɛla matildersquodʒɔka Rala mandioca

ai dipoj Aiacute depois

ku faki pike nu Com faquinha pequena

hɛla tatildeme j Rela tambeacutem

mi a paj asirsquona Meu pai ensinar

kɔtaɾu kotilde a taba Cortaram com a taacutebua

disaɾu Deixaram

nu kotildepu No campo

la i basu Laacute embaixo

mi a paj nu hipotildedew natildew Meu pai natildeo respondeu natildeo

pesu Peixe

a notu toda A noite toda

baztatildeti poɹku la Bastante porco laacute

u digu vi Um dia que vim

mi atilde matildej kotildekorsquodo Minha matildee quando acordou

mi atilde matildej forsquola Minha matildee foi laacute

kazi gɾatildedi Quase grande

nɔj te j medu dosejzi Noacutes temos medo de vocecircs

bersquozu kumiw Beiju comeu

mohew saɾatildepi Morreu de sarampo

pigu tatildeni Perguntando

na katildepa No campo kahni asadu Carne assada

231

morsquohe tudi a Morrer tudinho

depoj ʃu miɾu Depois sumiram

dimorsquoɾo mujtu Demorou muito

mɔdi tehu Por causa da terra

ja vaj tʃarsquoi Jaacute vai sair

batildedorsquono Abandonou

fike mu arsquoi Ficamos aiacute

aʒe ti ojrsquoo A gente olhou

hatildeka karsquoɾa Arranca caraacute

tʃiɾi ga basi na Seringa para vacina

barsquotʃotilde Batom

nɔj peɾatildenu Noacutes esperando

mi asu rsquoto Me assustou

i odʒi E hoje

be j vimej Bem vermelho

otu di ʃi ma Outro de cima

sersquogo corsquohe Chegou correr

i te di be j Entende bem

mi asursquoto Me assustou

matatildenu nɔjzi Matando noacutes

mi a fila Minha filha

kumiɾu Comeram

azersquota korsquola pɾa eli Ajeitar colar pra ele

sarsquoma eli

Chamar ele

tʃega logu Chega logo

ʃiguɾow di novʊ Segurou de novo

232

dirsquoso firsquoko Deixou ficou

arsquotɛ dɛrsquozoɾa Ateacute dez horas

tʃɔ ɔjrsquoa Soacute olhar

pi gada Espingarda

pɛhtu casueɾu Perto da cachoeira

maj pɛtu Mais perto

ote la Outra laacute

pɛga pesi Pega peixe

oti kazi Outra casa

pɛga milu Pegar milho

depoj tʃumiɾu bɾatildeku Depois sumiu o branco

mi rsquode ɾu Me deram

satildegɾaɾi asi Sangraram assim

bastatildetu Bastante

atildersquoda karsquosatildedu

Andar caccedilando

mi atilde filu Meu filho

nɔj fikatildeni Noacutes ficamos

ki kursquoto Que escutou

sɔ sorsquoɾatildenu Soacute chorando

depoj deli mohidu Depois dele morrer

nu ta vɛj Natildeo taacute velho

ta noj i da Taacute novo ainda

mi atilde matildej ta bii noj i da Minha matildee ta bem nova ainda

pɛrsquoga baʒtatildetu Pegar bastante

ew persquoge Eu peguei

233

mi atilde lsquoho farsquolo Meu avocirc falou

dimuɾatildeni Demorando

tehaɾu la mehmu Enterraram laacute mesmo

mi atilde matildej soɾatildenu Minha matildee chorando

mi atilde imatilde Minha irmatilde

E cursquoɳadi deli Eacute cunhado dele

E fii deli Eacute filho dele

kursquoɳadi deli Cunhado dele

hɔba demaj Rouba demais

ta difisi Ta difiacutecil

eli tʃobɾo Ele sobrou

saɾatildepi persquogo Sarampo pegou

pɾimeɾi morsquohe Primeiro morreu

ew kutej Eu escutei

sarsquoma matildej Chamar matildee

ta dirsquovisi Taacute difiacutecil

mohew ve me nadu Morreu envenenado

ki kɾirsquoari Que criaram

mi atorsquomaɾu Me tomaram

i ew torsquoteɾu E eu solteiro

kazadu kotildersquose Casado com vocecirc

natildew firsquoka diɾetu Natildeo ficar direito

firsquoka kweli Ficar com ele

mersquosenu Mexendo

ta setu Ta certo

234

bɾabu persquoeli Bravo por ele

tasirsquooma komigu Tem ciuacutemes de mim

E gotozu Eacute gostoso

tipu bursquoʒohu Tipo besouro

tʃi rsquodʒeɾu Cinzeiro

na li gi Na liacutengua

bɾatildeku batirsquotaɾu Brancos batizaram

katildedu eɾa novi Quando era novinho

arsquoi tipoj Aiacute depois

karsquoboɾe Acabou-se

tiguɾa na matildew Segura na matildeo

rsquoɛ lsquopɾimɛ lsquodeli Eacute primo dele

asinatildeni Ensinando

ew kersquome Eu queimei

pɾatildersquota maj Plantar mais

ew vo lsquopɾatildeta Eu vou plantar

karsquokwɛ Qualquer

tabaɾava Trabalhava

tubaɾotildeni Tubaratildeo

poɾi pɛɾa Pode esperar

mi ti nu Mentindo

eli sersquogo Ele chegou

atildersquototilde Entatildeo

ta lsquosetu natildew Ta certo natildeo

mesew kotildersquomigu Mexeu comigo

235

ʃersquoga dinote Chegar de noite

lersquova pirsquotaw Levar pro hospital

ta suzu Ta sujo

rsquobahio Bairro

atildebɾarsquosada Abraccedilada

masɛlu babudo Marcelo barbudo

pɾatildeta milu Planta milho

na gɾɛba Na gleba

bɾasadu Abraccedilado

komi he tʃi Comi gente

kɛ azursquoda Quer ajudar

sotildebɾasotilde Assombraccedilatildeo

nu podi atildersquoda Natildeo pode andar

pɛga na tiheɾu Pega no terreiro

kɔviotilde Gaviatildeo

sɔ eli karsquopo Soacute ele escapou

me rsquoto Aumentou

levava uz vɛio Levava os velhos

matildenɛ desaɾu Maneacute deixaram

pusa no kabelu Puxa no cabelo

kabelu ge ti hatildega Cabelo de gente arranca

iɔga ge ti pɾa la Joga gente pra laacute

hu tu Junto

kɛma he ti queima a gente

ki sɔ a oti Que soacute haacute outro

bagas~i Bagacinho

236

tiɾatildeni katildetatildeni Tirando cantando

kɾese ni Crescendo

dirsquoɾetu Direito

febɾu marsquolaɾu Febre malaacuteria

maj sarsquobiw Mais sabia

tiɾaɾu Tiraram

batildei Banho

ipia deli Espirro dele

Korsquodadu mehmo Acordado mesmo di notu De noite

kasu Caccedila

baɾizadu otu Batizado outro

atʃi mi a ihmatilde fala Assim minha irmatilde fala

kotadu Encostado

nu zudia deli natildew Natildeo judia dele natildeo

gɔta maj deli Gosta mais dele

samatildedu otu Chamando outro

mi atilde subɾi Meu sobrinho

mi atilde pohu Meu povo

mi atilde matilde Minha irmatilde

mi atilde muʒka Minha muacutesica

sɔ bɾi ga Soacute brinca

tʃubi nu Subindo

kahega na koʃta Carrega nas costas dese Desse aiacute istu Isto katildersquoba Gambaacute

237

kursquotia Cutia kursquotʃia Cutia

marsquoɾɛlu Amarelo

versquomela versquomelo Vermelha vermelho rsquose Esse

te natildeʊ te natilde Tem natildeo

esersquoki Esse aqui

rsquoɛmarsquokakupɾersquogisi Eacute macaco preguiccedila

morsquosegi Morcego

defersquore ti Diferente

rsquopodƷi Pode

rsquosersquonatilde Sei natildeo

rsquosersquoviw Vocecirc viu

arsquoinrsquoɛgarsquoviatildew Aiacute eacute gaviatildeo

jabutʃi Jabuti

parsquoɾɛsirsquokele Parece aquele

ɛrsquokele Eacute aquele

rsquoessersquote Esse tem

be i natildeu Tambeacutem natildeo

kursquoruja Coruja

pike nu Pequeno

defersquore ti Diferente

rsquokelersquoɛrsquootro Aquele eacute outro

rsquoejarsquobutʃi E jabuti gɾatildersquodatilde grandatildeo rsquomesmu mesmo

rsquomemu Mesmo

ɔrsquoɾɔpa Europa

arsquobeja Abelha

iscɔhpiatildew escorpiatildeo

ewmɔrsquoʎa Eu molhar ~ Eu molho

pirsquodi pedir tasrsquocɾitu Ta escrito

pɛdƷi Pedi (a gente )

Kersquoma queimar

mode nu Mordendo

morsquodemas Mordeu mais rsquonoj rsquodoj Noacutes dois

aʃe ti A gente (noacutes)

rsquopadirsquoze Pra dizer

238

rsquokɔta Corta

ahatildejrsquoo Arranhou

mujrsquoɛ Mulher

ahajrsquoaelig Arranhou orsquosersquomehm Vocecirc mesmo

isrsquopi Espinho

sorsquome Somente

rsquokalo ~karsquolo Calor doi Dois

tatildebe Tambeacutem

ispi rsquogada Espingarda

persquode Perdeu

se rsquotatu Sentado

rsquohe ti Gente

arsquodidu Ardido rsquokoda Corda mərsquota Matar marsquotani matando

rsquoʃɔmarsquota Soacute matar

rsquobisu Bicho rsquoota Outra

patildersquota ~rsquopɾatildeta Plantar

atildersquodatildeni Andando

ve tatildeni Ventando

defersquore ti Diferente

hursquoatildenu Voando vorsquoto Voltou rsquopodirsquoze Pode dizer marsquotaforsquogatilden Matar afogando rsquodaga Da aacutegua (drsquoaacutegua) arsquoɾea Areia

rsquofu da Afunda

rsquokɛlaforsquogo Que ela afogou

mɛgursquola Mergulhar

eʃpɾersquome Espremer

hɛlatilden Ralando (verbo ralar)

mɔrsquolada Amolada

kwatildeni Quando arsquotia Ateia (verbo atear)

239

i pursquoha Empurrar

epursquohej Eu empurrei

pursquoha Empurrar rsquofoti Forte

rsquofosa Forccedila

rsquohapu Raacutepido

ku rsquopɛ Com o peacute

eki pursquohe Eu que empurrei

sirsquonɛlu Chinelo

i pursquohan Empurrando

sɔrsquose Soacute vocecirc

rsquotapursquohanu Taacute empurrando

sɔrsquozi Sozinho

rsquohatildeka Arrancar

rsquosɔhatildersquoka Soacute arrancar

jrsquoahatildersquoke Jaacute arranquei

arsquohatildekui rsquoʃada Arranco com a enxada

rsquopuʃa Puxar cabelo pursquoʃo Puxou pursquoʃe Puxei haʃrsquoto Arrastou haʃrsquote Arrastei

tʃirsquoa Tirar

buʃrsquoca Buscar buʃrsquoke Busquei (eu passado) rsquooto Outra rsquohopa Roupa rsquomemo Mesmo rsquodeʃa Deixa

tirsquoe Tirei

rsquosɛtu Certo

rsquohejtu Jeito iskujrsquoe Escolher rsquotakujrsquoenu Taacute escolhendo ojrsquoan Olhando

tʃumi Sumiu

dimursquoranu Demorando kersquoma Queimar ursquozotu Os outros kersquome Queimei

rsquonɔj Noacutes

rsquopejsi Peixe

Ku rsquome Comer

240

pɾicirsquoza Precisar pɾisirsquozanu Precisando korsquoseɾa Coceira mirsquoƷatilden Mijando atildersquodatildenu Andando

barsquote nu Batendo

i rsquoʃima Encima

rsquokatildem Cama atirsquoɾo Atirou

rsquohaʃarsquole Racha lenha

vɔrsquota Voltar

tursquomatilden Tomando

varsquoɾi Varinha

gɾitrsquoatilden Gritando

fɾɛrsquoga Esfregar

mirsquodi Medir

mi rsquotinu Mentindo

rsquokɔʃka Coacutecega

barsquosi u Baixinho

pɔdirsquoze Pode dizer

pe rsquota Pentear

rsquobatildej Banho rsquomaiƷrsquotadi Mais tarde rsquofoja Folha batildenarsquodo Abanador bursquonitu Bonito

rsquosersquokirsquode Vocecirc que deu

siparsquoradu Separado rsquosatildew Chatildeo

tursquodi Tudinho

karsquoe Cair kersquobɾe Quebrei arsquohatildejorsquose Arranho vocecirc rsquomuja Molha rsquosevi Serve rsquopaj Palha pirsquodi Pedir dersquosa Deixar rsquomoj Molho fɾersquovenu Fervendo pursquolo Pulou

norsquovi Novinho

241

firsquodido Fedido mursquolada Amolada

rsquonɔʃi Nosso

patildersquoneɾu Paneiro motildersquodeli Matildeo dele dursquozotu Dos outros

rsquonɔj Noacutes

rsquopodi Podre firsquodid Fedido dersquota Deitar dersquotadu Deitado cuʃtursquoɾa Costurar

barsquote m Batendo

dersquosa Deixar

rsquofɾɛʃa ~rsquofɾEʃ Flecha

iskersquosidu Esquecido

tatildersquome j Tambeacutem

abersquoli Abelhinha

me rsquodu i Amendoim

pɔrsquodirsquoze Pode dizer

rsquoavi Aacutervore

rsquopesi Peixe

tatursquozi Tatuzinho

rsquovɛja Velha

arsquodea Aldeia

rsquode tu Dentro

rsquohe ti Gente

rsquohadu Raacutedio rsquohejtu Jeito iʃtɾarsquogadu Estragado

rsquode tirsquokaza Dentro de casa

rsquopoku Porco

pihu rsquotatildenu Perguntando

gwahrsquode Guardei firsquogeɾa Figueira

kɔrsquota Cortar

ojrsquoa Olhar

pi dursquoɾa pendurar

mitʃursquoɾa Misturar

rsquofɔtʃi Forte

242

matildersquodƷɔka Mandioca

birsquoƷu Beiju

marsquoɾɛlu Amarelo

atildersquozɔ Anzol

rsquopɛda Pedra

Page 6: MARCAÇÃO NO CONTATO LINGUÍSTICO: O português falado … · Transcrição Transcrição fonética Transcrição fonológica [ ] / / Vogais Vogal médio-baixa anterior [ɛ] Vogal

A Abuecircndia Padilha e Gilda Lins (in memoriam) pela dedicaccedilatildeo e carinho

que demonstraram durante as aulas

Aos meus colegas do Doutorado Solange Carvalho Ana Cristina Cleber

Morgana Jaciara Carolina Pires Juliane Acircngela Socircnia Ismar Rinalda Ludimila

e Clara por me ajudarem nos momentos de dificuldades e de (muitas)

necessidades

Aos colegas da GER ndash Vale do Capibaribe pela ajuda sempre que

necessaacuterio em especial Marta Morgana Edjane e Janecleide

Aos colegas e alunos do IFAL (Instituto Federal de Alagoas) pela grande

ajuda e carinho que demonstraram durante a realizaccedilatildeo deste trabalho Pela

compreensatildeo das faltas e substituiccedilotildees que de mim foram demandadas

Aos membros da banca que tatildeo gentilmente aceitaram o convite

Aos meus amigos familiares entes queridos todos que direta ou

diretamente me ajudaram nesta caminhada Nenhum trabalho eacute feito sozinho

portanto os meacuteritos tambeacutem satildeo de vocecircs

RESUMO

O presente trabalho eacute o resultado de um estudo sobre a Marcaccedilatildeo no Contato

Linguiacutestico entre o Latundecirc e o Portuguecircs Trata-se de uma investigaccedilatildeo com

base na abordagem tipoloacutegica da linguiacutestica visando agrave elucidaccedilatildeo das unidades

mais e as menos marcadas que satildeo ou natildeo transferidas no processo de

acomodaccedilatildeo dos inventaacuterios foneacuteticos de ambas as liacutenguas Utilizamos como

base os pressupostos teoacutericos defendidos por CROFT (1990) JAKOBSON

(1953) BATTISTELLA (1996) MATRAS amp ELSIK (2006) e LACY (2006) para a

descriccedilatildeo dos universais linguiacutesticos e da marcaccedilatildeo No que tange ao contato

linguiacutestico nos respaldamos nas reflexotildees de ROMAINE (2000) THOMASON

(2001) AIKHENVALD (2007) e HYMES (1971) Para descriccedilatildeo linguiacutestica e

histoacuterica dos Latundecirc nos baseamos em TELLES (2002) ANOMBY (2009) e

PRICE (1977) No que tange ao aporte foneacutetico para descriccedilatildeo do contato entre

ambas as liacutenguas nos valemos dos escritos de WEINREICH (1953) BISOL

(1996) VAN COETSEM (1988) e MATRAS (2009) Quanto agraves anaacutelises nos

fundamentamos nas observaccedilotildees de SPENCER (1996) LASS (2000) e RICE

(2007) O nosso corpus eacute formado de trinta horas de fala transcritas

foneticamente de acordo com IPA de vinte informantes da comunidade Latundecirc

Os dados fazem parte do acervo do NEI (Nuacutecleo de Estudos Indigenistas) da

UFPE A partir da nossa pesquisa chegamos agrave conclusatildeo que os mais jovens

tendem a natildeo transferir os padrotildees mais marcados da sua liacutengua para a liacutengua

adquirida enquanto os mais velhos reproduzem com menor frequecircncia os

padrotildees mais marcados do Portuguecircs alguns contextos licenciam enquanto

outros bloqueiam a marcaccedilatildeo gerando um caraacuteter variaacutevel que demonstra o quatildeo

conflitante eacute a situaccedilatildeo do contato embora natildeo haja uma padronizaccedilatildeo no que

tange agrave estrutura silaacutebica o padratildeo CV eacute o mais recorrente e menos marcado

corroborando o que apregoa os pressupostos da tipologia linguiacutestica os

processos que envolvem perda e permuta de segmentos satildeo mais numerosos e

mais marcados dos que os que envolvem ganho de segmento os fonemas natildeo

presentes no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc tendem a ser apagados ou

reinterpretados pelo segmento mais proacuteximo do Portuguecircs quanto agrave manutenccedilatildeo

ou perda o comportamento dos traccedilos mais marcados do Latundecirc depende natildeo

categoricamente da fonologia do Portuguecircs a marcaccedilatildeo natildeo estaacute condicionada

apenas aos universais linguiacutesticos mas agraves especificidades da liacutengua

PALAVRAS-CHAVE Fonologia Liacutenguas em Contato Marcaccedilatildeo e Liacutenguas

Indiacutegenas

ABSTRACT

The present work describes phenomena of phonological transference of Latundecirc

a Brazilian indigenous language in Portuguese in language contact situation The

observed phenomena were examined under the light of the assumptions of

Linguistic Marking in its typological approach As basis we used CROFT (1990)

JAKOBSON (1953) BATTISTELLA (1996) MATRAS ELSIK (2006) and LACY

(2006) studies for the description of linguistic universals and marking About

language contact we were supported by the reflections of ROMAINE (2000)

THOMASON (2001) AIKHENVALD (2007) and HYMES (1971) For the linguistic

and historical description of Latundecirc we were based on TELLES (2002)

ANOMBY (2009) and PRICE (1977) About the phonology of Portuguese we were

supported by BISOL (1996) For description of the contact between both

languages we used the writings of WEINREICH (1953) VAN COETSEM (1988)

and MATRAS (2009) The one of phonological phenomena observed was backed

in SPENCER (1996) LASS (2000) and RICE (2007) Our corpus is formed of thirty

hours of talk phonetically transcribed according to IPA In the survey we used the

speech production of 20 individuals from the Ladundecirc people among these 8

belonging to the pre-contact generation with the non- indigenous society and 12

belonging to the post-contact generation The data are part of the acquis of NEI

(Nuacutecleo de Estudos Indiacutegenas) of UFPE With our research we came to the

following results post-contact generation tends not to transfer most marked

patterns of their language to the acquired language while the native of pre-contact

generation do in a lower frequency the more marked standards of Portuguese

The processes that involve loss and exchange of segments are more numerous

than those involving segment gain The phonemes of Portuguese that do not exist

in Latundecirc tend to be erased or reinterpreted by the closest segment to

Portuguese resulting in the loss of contrast and in the emergence of the

unmarked through the phonological neutralisation There are phenomena that

show a tendency towards the universal as the deletion of the coda in favor of CV

standard syllabic and others that are arising out of restrictions of Latundecirc as the

monophthongization of nasal diphthong and the change of vowel quality in word-

final position In the set of phenomena we noticed that the interference is variable

and not always motivated by phonological or natural marking

KEYWORDS Phonology Marking Languages in contact Portuguese and

Latundecirc

RESUMEN

El presente estudio describe los fenoacutemenos de la transferencia fonoloacutegica del

Latundeacute una lengua indiacutegena Brasilera en el portugueacutes en una situacioacuten de

contacto linguumliacutestico Los fenoacutemenos observados fueron examinados a la luz de los

presupuestos de marcacioacuten linguumliacutestica en su abordaje tipoloacutegico Como modelo

de fundamentacioacuten se han utilizado los estudios de CROFT (1990) JAKOBSON

(1953) BATTISTELLA (1996) MATRAS amp ELSIK (2006) y LACY (2006) para las

descripcioacuten de los universales linguumliacutesticos y de la marcacioacuten Sobre el contacto

linguumliacutestico fueron tomados como soporte cientiacutefico las reflexiones de ROMAINE

(2000) THOMASON (2001) AIKHENVALD (2007) y HYMES (1971) Para la

descripcioacuten linguumliacutestica de los Lantundeacute esta investigacioacuten se basoacute en TELLES

(2002) ANOMBY (2009)y PRICE (1977) Sobre la fonologiacutea del portugueacutes se

tuvieron en cuenta los estudios de BISOL (1996) Para la descripcioacuten del contacto

entre ambas lenguas fueron necesarios los escritos de WEINREICH (1053) VAN

COETSEM(1988) y MATRAS (2009) Finalmente el estudio de los fenoacutemenos

fonoloacutegicos observados fueron abordados en las investigaciones de SPENCER

(1996) LASS (2000) y RICE (2007) El corpus de este trabajo acadeacutemico estaacute

compuesto por treinta horas de diaacutelogos transcritos foneacuteticamente de acuerdo con

el IPA En la investigacioacuten se ha utilizado la produccioacuten del diaacutelogo de 20

individuos del pueblo Latundeacute dentro de ellos 8 pertenecientes a la generacioacuten

del pre contacto con la sociedad no indiacutegena y 12 pertenecientes a la generacioacuten

del post contacto Los datos hacen parte del acervo del Nuacutecleo de Estudios

Indigenistas (NEI) de la UFPE Con esta investigacioacuten se ha llegado a la siguiente

conclusioacuten La generacioacuten post contacto tiende a no transferir los patrones maacutes

acentuados de su lengua hacia la lengua adquirida mientras que los indiacutegenas de

la generacioacuten del pre contacto realizan con menor frecuencia los patrones maacutes

marcados del portugueacutes Los procesos que envuelven la peacuterdida y permuta de los

segmentos son maacutes numerosos de aquellos que involucran la ganancia del

segmento Los fonemas del portugueacutes que no existen en el Latundeacute tienden a ser

borrados o reinterpretados por el segmento maacutes proacuteximo al portugueacutes resultando

en una peacuterdida de contraste y en la emergencia del no marcado a traveacutes de la

neutralizacioacuten fonoloacutegica Hay fenoacutemenos que revelan una tendencia a lo

universal como desvanecimiento de la coda en a favor de patroacuten silaacutebico CV y

otros que son consecuencia de las restricciones del Latundeacute como la

monoptongacioacuten de diptongo nasal y la mudanza de la cualidad vocaacutelica en

posicioacuten final de la palabra El en conjunto de fenoacutemenos verificamos que la

interferencia es variable y no siempre estaacute motivada por la acentuacioacuten fonoloacutegica

o natural

Palabras Clave Fonologiacutea Acentuacioacuten Lenguas en Contacto Portugueacutes y

Latundeacute

LISTA DE SIacuteMBOLOS

Transcriccedilatildeo

Transcriccedilatildeo foneacutetica

Transcriccedilatildeo fonoloacutegica

[ ]

Vogais

Vogal meacutedio-baixa anterior [ɛ]

Vogal meacutedio-alta anterior [e]

Vogal alta anterior [i]

Vogal baixa central [a]

Vogal meacutedio-baixa posterior [ɔ]

Vogal meacutedio-alta posterior [o]

Vogal alta posterior [u]

Vogal alta anterior nasal [ i ]

Vogal meacutedio-alta anterior nasal [e ]

Vogal baixa central nasal [atilde]

Vogal meacutedio-alta posterior nasal [otilde]

Vogal alta posterior nasal [u ]

Consoantes

Oclusiva alveolar surda [t]

Oclusiva alveolar sonora [d]

Fricativa alveolar surda [s]

Fricativa alveolar sonora [z]

Nasal alveolar [n]

Lateral alveolar [l]

Africada alveopalatal surda [tʃ]

Africada alveopalatal sonora [dʒ]

Lateral palatal [ʎ]

Nasal palatal [ɳ]

Fricativa palatal surda [ʃ]

Fricativa palatal sonora [ʒ]

Oclusiva velar surda [k]

Oclusiva velar sonora [g]

Fricativa velar [x]

Oclusiva bilabial surda [p]

Oclusiva bilabial sonora [b]

Nasal bilabial [m]

Fricativa labiodental surda [f]

Fricativa labiodental sonora [v]

LISTA DE FIGURAS

FIGURA 1 Diagrama de Hall

67

FIGURA 2 Configuraccedilotildees da Mescla Linguiacutestica segundo Romaine (2000 p185)

71

FIGURA 3 Esquema de representaccedilatildeo do bilinguismo social segundo Appel e Muysken (1986 p 23)

74

FIGURA 4 Escolha de liacutengua e code-switching conforme Grosjean (1982 p127)

82

FIGURA 5 Classificaccedilatildeo das liacutenguas da Famiacutelia Nambikwaacutera de acordo com Rodrigues (1986 p 134)

87

FIGURA 6 Localizaccedilatildeo e aacuterea dos Nambikwaacutera de acordo com Roquete-Pinto (1919)

88

FIGURA 7 Territoacuterio Nambikwaacutera descrito por Price (1983)

89

FIGURA 8 Localizaccedilatildeo atual dos Nambikwaacutera

91

FIGURA 9

Localizaccedilatildeo da TI Tubaratildeo-Latundecirc

94

FIGURA 10

Primeiros contatos com os Latundecirc (Foto Price 1977)

97

FIGURA 11 Iacutendios Latundecirc na TI Tubaratildeo-Latundecirc

104

FIGURA 12

Ligaccedilotildees entre a intensidade do bilinguismo o tipo de processo de acomodaccedilatildeo e sobreposiccedilatildeo entre os sistemas fonoloacutegicos

118

FIGURA 13

Correspondecircncia entre liacutenguas e contato linguiacutestico

120

FIGURA 14 Agentividade da Liacutengua Recipiente de acordo Van Coetsem 1988 p10

122

FIGURA 15 Agentividade da Liacutengua de Origem de acordo Van Coetsem 1988 p11

122

FIGURA 16 Relaccedilatildeo de agentividade entre o Portuguecircs e o Latundecirc

123

FIGURA 17 Estrutura silaacutebica do Latundecirc

168

FIGURA 18 Estrutura silaacutebica do Portuguecircs (Cacircmara-Juacutenior)

169

LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Unidades e estruturas mais marcadas conforme

levantamento de Moreira da Silva (2011)

50

Quadro 2 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Leacutevi-Strauss (1948)

92

Quadro 3 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Price e Cook (1969)

93

Quadro 4 Distribuiccedilatildeo dos povos pertencentes a TI Tubaratildeo-Latundecirc

95

Quadro 5 Nuacutecleos familiares de acordo com a habitaccedilatildeo em 1999

98

Quadro 6 Situaccedilatildeo sociolinguiacutestica dos Latundecirc (dados de 1999)

101

Quadro 7 Quadro Comparativo dos Sistemas Foneacuteticos do Romansh e do Schweizerdeutsch de acordo com Weinreich (1953)

111

Quadro 8 Tipos de processos que conduzem a mudanccedila fonoloacutegica induzida por contato

116

Quadro 9 Fonemas consonantais do Latundecirc

125

Quadro 10 Fonemas vocaacutelicos do Latundecirc

125

Quadro 11 Ditongos do Latundecirc

126

Quadro 12 Descriccedilatildeo dos fonemas consonantais (Retirada de Telles 2002)

126

Quadro 13 Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos orais (Com base em Telles 2002)

149

Quadro 14

Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos nasais (Com base em Telles 2002)

153

Quadro 15

Vogais no Portuguecircs (Cacircmara Jr 1970)

154

Quadro 16

Consoantes no Portuguecircs (Silva 2002)

155

Quadro 17 Sistemas consonantais x Sistemas vocaacutelicos

156

Quadro 18 Resultado mais frequente do processo de monotongaccedilatildeo em Latundecirc

162

Quadro 19 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Latundecirc

166

Quadro 20 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Portuguecircs

167

Quadro 21 Escala de Sonoridade (Bonet e Mascaroacute 1997 p 109)

196

SUMAacuteRIO

1 SOBRE A PESQUISA 20

11 INTRODUCcedilAtildeO 20

12 JUSTIFICATIVA 24

13 OBJETIVOS 25

14 METODOLOGIA 26

15

DISPOSICcedilAtildeO DA TESE 27

2 MARCACcedilAtildeO LINGUIacuteSTICA 29

21 INTRODUCcedilAtildeO 29

22 MARCACcedilAtildeO 31

221 A concepccedilatildeo de Jakobson e Trubetzkoy 35

222 Abordagem Gerativa 37

223 Abordagem Tipoloacutegica (Interlinguiacutestica) 39

224 Abordagem Naturalista (Morfologia Natural) 41

23 CRITEacuteRIOS DE MARCACcedilAtildeO 42

24 MARCACcedilAtildeO MUDANCcedilA E CONTATO LINGUIacuteSTICO 45

25 JAKOBSON E A ABORDAGEM FONOLOacuteGICA DA

MARCACcedilAtildeO

48

3 O CONTATO LINGUIacuteSTICO 54

31 INTRODUCcedilAtildeO 54

32 SOBRE O CONTATO LINGUIacuteSTICO 57

33 MESCLAS DE CONTATO PIDGIN CRIOULO LIacuteNGUA

FRANCA E JARGAtildeO

60

331 Pidgin 63

332 Crioulo 65

333 Liacutengua Franca ou Sapir 69

334 Jargatildeo 71

34 IMPLICACcedilOtildeES DO CONTATO LINGUIacuteSTICO 72

341 Bilinguismo 72

342 Diglossia 78

343 Alternacircncia de coacutedigo 80

344 Morte da liacutengua

83

4 COMUNIDADE DE ESTUDO OS LATUNDEcirc 86

41 INTRODUCcedilAtildeO 86

42 A FAMIacuteLIA NAMBIKWARA 86

43 OS LATUNDEcirc

94

5 INTERFEREcircNCIA FONEacuteTICO-FONOLOacuteGICA DO LATUNDEcirc

NO PORTUGUEcircS

106

51 INTRODUCcedilAtildeO 106

52 INTERFEREcircNCIA FUSAtildeO COEXISTEcircNCIA E

TRANSFEREcircNCIA LINGUIacuteSTICA

107

53 FONOLOGIA DO LATUNDEcirc 124

54 FONOLOGIA DO PORTUGUEcircS 154

55 COMPARACcedilAtildeO ENTRE OS SISTEMAS FONEacuteTICOS DO

PORTUGUEcircS E DO LATUNDEcirc

156

6 PROCESSOS FONOLOacuteGICOS DO PORTUGUEcircS FALADO

PELOS LATUNDEcirc

158

61 Introduccedilatildeo 158

611 Perda de elementos 161

6111 Monotongaccedilatildeo 161

6112 Siacutencope em onset complexo de l e r 168

6113 Apagamento da coda 171

6114 Reduccedilatildeo do geruacutendio ndash Anteriorizaccedilatildeo da vogal final 173

6115 Reduccedilatildeo das palatais (nasal e lateral) 174

6116 Afeacuterese 177

6117 Apoacutecope 178

6118 Siacutencope 180

612 Ganho de elementos (Inserccedilatildeo de elementos) 181

613 Alteraccedilatildeo de elementos (permuta ou transposiccedilatildeo) 184

6131 Despalatalizaccedilatildeo de [ʃ] e [ʒ] 184

6132 Palatalizaccedilatildeo 186

6133 Vozeamento e desvozeamento 189

6134 Abaixamento e elevaccedilatildeo das vogais orais 191

6135 Nasalizaccedilatildeo e desnasalizaccedilatildeo 194

6136 Fenocircmenos envolvendo os roacuteticos 195

6137 Labializaccedilatildeo e deslabializaccedilatildeo 197

6138 Metaacutetese 198

6139 Siacutestole 199

61310 Fortalecimento

200

7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

201

REFEREcircNCIAS BIBLIOGRAacuteFICAS

208

ANEXOS 221

20

1 SOBRE A PESQUISA

O estudo dessas liacutenguas eacute evidentemente de grande importacircncia para o incremento dos conhecimentos linguiacutesticos Cada nova liacutengua que se investiga traz novas contribuiccedilotildees agrave linguiacutestica cada nova liacutengua eacute outra manifestaccedilatildeo de como se pode realizar a linguagem

humana Cacircmara Jr (1977 p 4)

11 INTRODUCcedilAtildeO

Neste capiacutetulo discorreremos sobre a diversidade e a situaccedilatildeo das liacutenguas

indiacutegenas brasileiras1 bem como a motivaccedilatildeo para o presente estudo Tambeacutem

faratildeo parte desta introduccedilatildeo a justificativa para a realizaccedilatildeo desta pesquisa os

objetivos almejados os procedimentos metodoloacutegicos e a descriccedilatildeo da estrutura

da tese

Por se tratar de um estudo que diz respeito agrave linguiacutestica indigenista brasileira vale

iniciar a discussatildeo situando aqueles que satildeo os sujeitos da nossa pesquisa os

iacutendios Sabe-se que os povos indiacutegenas satildeo vistos geralmente como personagens

passivos na da nossa histoacuteria Eacute um equiacutevoco concebecirc-los na nossa narrativa

dessa forma pois seja no papel de aliados ou de inimigos esses povos tiveram

um papel importante na formaccedilatildeo de sociedades coloniais e poacutes-coloniais

(ALMEIDA 2013 p9)

1 Aleacutem do portuguecircs haacute no Brasil aproximadamente 180 liacutenguas indiacutegenas faladas por 225 etnias

Dessas liacutenguas 110 satildeo consideradas em extinccedilatildeo pelo fato de serem faladas por menos de 500 pessoas Estima-se que em 1500 cerca de seis milhotildees de iacutendios falavam 1078 idiomas Hoje a populaccedilatildeo indiacutegena brasileira chega a no maacuteximo entre 440 mil e 500 mil indiviacuteduos Atribui-se o desaparecimento das liacutenguas indiacutegenas agraves pressotildees poliacuteticas do colonizador e posteriormente agraves necessidades de sobrevivecircncia das populaccedilotildees indiacutegenas Revista Liacutengua portuguesa n 26 p 57 2010

21

Embora natildeo seja amplamente divulgado no Brasil haacute cerca de 180 liacutenguas

indiacutegenas o que nos torna um paiacutes plurilinguiacutestico Esse percentual era de 1200

antes da chegada dos portugueses Durante esses cinco seacuteculos de colonizaccedilatildeo

um glotociacutedio foi visto intensificamente no nosso territoacuterio

Mesmo sendo viacutetimas de um processo de colonizaccedilatildeo desenfreado e

escravizador estes povos com o tempo passaram a ser reconhecidos como

agentes na sociedade Suas accedilotildees satildeo vistas a partir de um recente periacuteodo

histoacuterico como importantes para explicar a histoacuteria deles e consequentemente a

nossa Saindo de um quadro de contato onde eram vistos como coadjuvantes

passando a ser tambeacutem protagonistas

Hoje os estudos indigenistas satildeo mais frequentes uma vez que na antropologia

atual os povos que foram definidos como aculturados passaram a ser

coadjuvantes de um processo histoacuterico e participativo

A reportagem da Revista Continente Maio de 2009 sobre os Fulniocirc faz parte de

um arsenal que descreve o que jaacute eacute sabido pela comunidade cientiacutefica as liacutenguas

indiacutegenas brasileiras estatildeo desaparecendo em ritmo acelerado Posto dessa

forma podemos perceber que haacute urgecircncia em descrever como tais liacutenguas se

comportam em si e em contatos com outras

Cacircmara-Juacutenior (1977 p 7) postula que os estudos indigenistas mais

precisamente sobre os de suas liacutenguas constitui no Brasil uma tarefa natildeo

somente enorme mas tambeacutem urgente Hoje meio seacuteculo depois esta citaccedilatildeo se

faz atual Os estudos indigenistas ainda se monstram tiacutemidos e carentes de

recursos e pesquisadores

22

Em continuidade o autor afirma que

Jaacute desapareceram no Brasil muitas liacutenguas agora totalmente irrecuperaacuteveis para a ciecircncia Eacute muito difiacutecil avaliar hoje em dia quantas liacutenguas se teriam falado no Brasil haacute 400 anos na eacutepoca do descobrimento do paiacutes pelos europeus Mas a quantidade de liacutenguas que subsistem ainda hoje () eacute ainda um nuacutemero consideraacutevel ndash cento e tantas Todas elas entretanto estatildeo ameaccediladas de desaparecer dentro de muitos poucos anos

O fato eacute que precisamos catalogar essas liacutenguas e como elas agem durante o

contato linguiacutestico Esses estudos satildeo de grande valia porque podem mostrar

como se deu analogicamente o contato do portuguecircs com outras liacutenguas E as

evidecircncias aqui encontradas contribuiratildeo para a descriccedilatildeo linguiacutestica aleacutem de

proporcionar agraves geraccedilotildees futuras o conhecimento mais apurado sobre as liacutenguas

de contato

Sobre esta relaccedilatildeo Almeida (idem p 14) afirma que

[] As relaccedilotildees de contato com sociedades envolventes e vaacuterios processos de mudanccedila cultural vivenciados pelos grupos indiacutegenas eram considerados simples relaccedilotildees de dominaccedilatildeo impostas aos iacutendios de tal forma que natildeo lhes restava nenhuma margem de manobra a natildeo ser a submissatildeo passiva a um processo de mudanccedilas culturais que os levaria a serem assimilados e confundidos com a massa da populaccedilatildeo

A autora ainda reitera que ldquoas relaccedilotildees de contato eram entatildeo grosso modo

vistas como relaccedilotildees de dominaccedilatildeo submissatildeo na qual uma cultura se impunha

sobre a outra anulando-ardquo p16

23

O contato entre liacutenguas contribuiu para o leacutexico portuguecircs2 E eacute o contato

linguiacutestico um dos fatores que coloca o iacutendio em situaccedilatildeo ativa na histoacuteria do

Brasil mesmo apoacutes o decreto do Marquecircs de Pombal3

Todavia assim como ocorrera com os negros eacute possiacutevel que o contato com

iacutendios possa ter influenciado outros niacuteveis da nossa gramaacutetica 4

Seki (1995 p 33) ao discutir sobre a situaccedilatildeo das liacutenguas indiacutegenas brasileiras

diz que

Essas estimativas devem ser ainda consideradas com certa cautela pois as liacutenguas indiacutegenas encontram-se sob as mais diferentes pressotildees sofrendo o impacto do crescente contato com a populaccedilatildeo envolvente e a liacutengua majoritaacuteria Contudo natildeo haacute em geral levantamentos que permitam estabelecer com maior margem de exatidatildeo os reflexos do impacto do Portuguecircs nos distintos grupos em termos de deslocamento de liacutengua indiacutegena tanto no que se refere a graus de bilinguismo monolinguismo quanto no que se refere agrave interferecircncia do Portuguecircs nessas liacutenguas nem sempre claramente perceptiacutevel nas fases iniciais mas que vai aos poucos contribuindo para a perda da liacutengua minoritaacuteria

2 Citamos aqui como exemplos o caso dos grupos de palavras oriundos de outros povos que

foram acoplados ao nosso leacutexico como indianismos e africanismos 3 Para estabelecer uma comunicaccedilatildeo com os nativos os portugueses foram aprendendo os

dialetos e idiomas indiacutegenas A partir do tupinambaacute falado pelos grupos mais abertos ao contato com os colonizadores criou-se uma liacutengua geral comum a iacutendios e natildeo-iacutendios O crescente nuacutemero de falantes do portuguecircs comeccedila a tornar o bilinguumlismo das famiacutelias portuguesas no paiacutes cada vez menor Em 17 de agosto de 1758 a liacutengua portuguesa se torna idioma oficial do Brasil atraveacutes de um decreto do Marquecircs de Pombal que tambeacutem proiacutebe o uso da liacutengua geral Disponiacutevel em httpwwwcomcienciabrreportagenslinguagemling03htm em 18122014 4 Alguns estudiosos afirmam que as influecircncias natildeo se restringiram apenas ao vocabulaacuterio

Jacques Raimundo em O Elemento Afro-Negro na Liacutengua Portuguesa aponta algumas mudanccedilas foneacuteticas iniciadas na fala dos escravos que ainda se mantecircm em algumas variedades do portuguecircs do Brasil as vogais meacutedias pretocircnicas e e o passam a ser pronunciadas como vogais altas respectivamente i e u (mininu nuticcedila) as vogais tocircnicas de palavras oxiacutetonas terminadas em s mesmo as grafadas com z se tornam ditongos (atrais mecircis vecircis) a marca de terceira pessoa do plural nos verbos do preteacuterito perfeito se reduz a o (fizero caiacutero tocaro)Em 1822 Jeroacutenimo Soares Barbosa registrava em sua Grammatica Philosophica uma peculiaridade sintaacutetica originada na fala dos escravos que ateacute hoje eacute apontada como uma das distinccedilotildees entre o portuguecircs falado em Portugal e o que se fala no Brasil a colocaccedilatildeo de pronomes aacutetonos antes dos verbos (mi deu ti falocirc) Disponiacutevel em httpwwwcomcienciabrreportagenslinguagemling03htm em 18122014

24

Embora a preocupaccedilatildeo da maioria dos estudiosos de liacutenguas indiacutegenas seja com

as liacutenguas minoritaacuterias esta pesquisa trafega no sentido contraacuterio ao buscar

descrever a influecircncia dessas liacutenguas tidas como fraacutegeis no indioma nacional

Vale ressaltar que mesmo em territoacuterio nacional o portuguecircs aqui eacute tido como

segunda liacutengua

12 JUSTIFICATIVA

O contato linguiacutestico e suas consequecircncias se datildeo em todas as liacutenguas do

mundo No entanto no que tange ao desaparecimento de liacutenguas o prejuiacutezo eacute

maior uma vez que a natildeo catalogaccedilatildeo dessas liacutenguas geraria um deacuteficit linguiacutestico

que poderia prejudicar os estudos linguiacutesticos vigentes e futuros aleacutem dos

problemas humanos advindos do processo de aculturaccedilatildeo entre povos

Ao corroborar com esta acertiva Telles (2009 p25) afirma que

Quando um povo perde uma liacutengua tambeacutem perde diversidade humana perdem-se meios de compreensatildeo e explicaccedilatildeo do mundo perdem-se soluccedilotildees de adaptalidade do homem ao meio perde-se o conhecimento do potencial e do usufruto sustentaacutevel deste meio Enfim perdem-se conhecimentos fundamentais que venham a coloborar para a continuidade da sobrevivecircncia do homem no planeta

O estudo de uma liacutengua diferente da nossa pode nos dar a impressatildeo de que

vamos encontrar algo distante da nossa realidade O que natildeo eacute verdade visto

que as semelhanccedilas linguiacutesticas satildeo em maior nuacutemero Cacircmara-Juacutenior (1977

p18)

25

Antes da perda total de uma liacutengua que pode ser assim configurado ou natildeo o

processo inicial se daacute pelo contato entre elas Soacute depois de existirem lado a lado

eacute que tais liacutenguas podem a depender da dinacircmica se fundirem desaparecerem

ou conviverem entre si

No caso do relacionamento entre o Latundecirc e o Portuguecircs percebe-se que tal

contato caminha para o desparecimento do Latundecirc dado as circunstacircncias

histoacutericas e sociais pelas quais esta liacutengua tem passado Hoje este povo eacute

composto de 20 falantes dispersos Como os mais novos natildeo podem coabitar

entre si a continuidade da etnia estaacute com os dias marcados Logo torna-se

urgente as tentativas de descriccedilatildeo da liacutengua e de seu comportamento

Analisar e descrever o contato com base nos padrotildees de marcaccedilatildeo e simetria

contribuiraacute com o princiacutepio de naturalidade que eacute pre-requesito para a tipologia

linguiacutestica No mais as investigaccedilotildees sobre o contato linguiacutestico satildeo de grande

valia para o conhecimento mais apurado das liacutenguas do mundo e da nossa liacutengua

especificamente

13 OBJETIVOS

Esta pesquisa objetiva o estudo da interferecircncia foneacutetica do Latundecirc no

Portuguecircs levando em consideraccedilatildeo o papel da marcaccedilatildeo no contato linguiacutestico

entre estas liacutenguas Tambeacutem busca refletir sobre os processos foneacuteticos oriundos

do contato e como eles se evidenciam a partir das liacutenguas em xeque

26

No decorrer da tese aleacutem dos objetivos postos aqui buscaremos responder as

questotildees postuladas

Investigar se os fatores internos (linguiacutesticos) e externos (estruturais)

interagem com os princiacutepios da marcaccedilatildeo

Identificar qual o papel da marcaccedilatildeo no contato linguiacutestico

Verificar se e quais os traccedilos mais marcados da liacutengua dominada passam

para a dominante

Dessa forma ao refletirmos sobre as questotildees acima esperamos contribuir com

os estudos dos universais linguiacutesticos e da cogniccedilatildeo humana

14 METODOLOGIA

O corpus utilizado nesta pesquisa foi coletado pela professora Stella Virgiacutenia

Telles e faz parte do NEI ndash Nuacutecleo de Estudos Indigenistas ndash da Universidade

Federal de Pernambuco Os dados foram gravados em CDrsquos em formato wave e

estruturados em forma de perguntas e respostas DID ndash Diaacutelogo entre

entrevistador e entrevistado

Foram escutados aproximadamente 30 horas de gravaccedilatildeo de fala dos 20

informantes Latundecirc Incialmente analisamos de oitiva os dados que foram

depois transcritos foneticamente com base no Alfabeto Foneacutetico Internacional -

IPA e organizados em tabelas Apoacutes segunda anaacutelise em caso de duacutevidas os

dados foram submetidos ao programa PRAAT para melhor audiccedilatildeo No que tange

27

agrave anaacutelise os dados foram disponibilizados em tabelas e enumerados com os

respectivos comentaacuterios abaixo

15 DISPOSICcedilAtildeO DA TESE

Para este estudo utilizamos os pressupostos cientiacuteficos da tipolologia linguiacutestica

de base aleacutem de autores que foquem em seus estudos contato interferecircncia

foneacutetica marcaccedilatildeo e naturalidade

No capiacutetulo 1 discorremos sobre os elementos basilares da tese justificativa

objetivos perguntas norteadoras metodologia e disposiccedilatildeo da tese

No capiacutetulo 2 trataremos sobre a marcaccedilatildeo Nele abordaremos o conceito de

marcaccedilatildeo e sua relaccedilatildeo com os princiacutepios de simetria e naturalidade Veremos a

partir do panorama de Matras amp Elsik (2006) Battistella (1996) Lacy (2006) as

abordagens de marcaccedilatildeo estruturalista gerativa tipoloacutegica e naturalista

Na seccedilatildeo 23 discorreremos sobre os criteacuterios de marcaccedilatildeo e na seccedilatildeo 24

sobre a mudanccedila linguiacutestica contato e marcaccedilatildeo Nos deteremos aos estudos de

Jakobson na abordagem fonoloacutegica na seccedilatildeo 25 bem como os universais

linguiacutesticos para a marcaccedilatildeo observados por Moreira da Silva (2011) em

contraponto com os padrotildees mais marcados do Latundecirc

No Capiacutetulo 3 o contato linguiacutestico seraacute nosso escopo Nele discutiremos os tipos

de mesclas de contato pidgin crioulo liacutengua Franca e jargatildeo a partir dos

pressupostos de Tarallo e Alkimin (1987) Calvet (2004) Couto (2001) Hall

28

(1996) Hymes (1971) Romaine (2000) e AiKhenvald e Dixon (2006)

Abordaremos tambeacutem a diglossia conforme Ferguson (1991) a alternacircncia de

coacutedigo de acordo com Auer (1999) Morte de liacutengua segundo Mcmahon (1994)

Trask (2004) e Cristoacutefaro-Silva (2002)

No capiacutetulo 4 apresentaremos a comunidade de estudo os Latundecirc Inicialmente

com base em Rodrigues (1995) Roquete-Pinto (1919) Leacutevi-Strauss (1946) Price

e Cook (1969) Anomby (2009) e Telles (2002) faremos uma descriccedilatildeo dos povos

e famiacutelias indiacutegenas do Brasil e dos Latundecirc especificamente Recapitularemos o

contexto histoacuterico formaccedilatildeo contato com os outros povos indiacutegenas e com os

natildeo iacutendios limites geograacuteficos e situaccedilatildeo atual

No capiacutetulo 5 trataremos da interferecircncia e transferecircncia foneacutetica do Latundecirc

para o Portuguecircs Com base em Cristoacutefaro-Silva (2002) Bisol (1996) Weinreich

(1953) Van Coetesem (1988) e Matras (2009) discutiremos os processos de

interferecircncia fusatildeo coexistecircncia e transferecircncia linguiacutestica Apresentaremos os

aspectos mais relevantes da fonologia Latundecirc e do Portuguecircs

No capiacutetulo 6 faremos as anaacutelises dos processos foneacuteticos presentes no contato

do Latundecirc com o Portuguecircs A partir da perspectiva claacutessica de perda

manutenccedilatildeo ou ganho de elementos discutiremos sobre quais os processos

foneacuteticos mais marcados do Latundecirc permanecem ou natildeo atestados no

Portuguecircs falado por Latundecirc

Por fim chegaremos agraves divagaccedilotildees finais dos resultados configurados na

pesquisa e agrave perspectiva de continuidade do trabalho Nos anexos encontram-se

os dados analisados transcritos foneticamente e dispostos em tabelas

29

2 MARCACcedilAtildeO LINGUIacuteSTICA

A nossa vida eacute mesmo assim Crescemos uns qual aacutervore indivisa levados pela forccedila de um destino retiliacuteneo como as palmeiras crescem

outros com a vida ramificada pelos empuxos ambientes Pretendemos Tentamos Retrocedemos

Afinal caminhamos na diretriz primitivamente escolhida quando o tempo nos concede alcanccedilar crescemos como as lianas5

(ROQUETTE-PINTO 1919 p 37)

21 INTRODUCcedilAtildeO

Eacute fato que o universo eacute regido por leis naturais O que aparentemente demonstra

ser fruto da eventualidade eacute um conjunto de princiacutepios explicaacuteveis que agem de

forma complementar sob as forccedilas centriacutefugas e centriacutepetas Com a liacutengua(gem)

natildeo diferentemente enquanto sistema de relaccedilotildees ela reflete estas

caracteriacutesticas Para Croft (2003 p 25) ela reflete a tensatildeo entre duas tendecircncias

concorrentes - uma em direccedilatildeo agrave regularidade a outra em direccedilatildeo agrave

hierarquizaccedilatildeo

Com o objetivo de melhor compreensatildeo dos pressupostos da tese neste capiacutetulo

nos deteremos agrave compreensatildeo dos conceitos de marcaccedilatildeo assimetria e

naturalidade Oriundos da linguiacutestica de base estes termos estatildeo relacionados

aos universais linguiacutesticos A complexidade destes conceitos por outro lado

apontam para o que eacute individual e para o que eacute geral Tem a ver com o que jaacute

defendia Chomsky ao estabelecer a dicotomia Princiacutepios x Paracircmetros

Obviamente posta a complexidade da liacutengua esses ldquoagentesrdquo da linguagem

5 Espeacutecie de trepadeira que manteacutem sua raiz no solo mas necessita de um suporte para manter-

se ereta e crescer em direccedilatildeo agrave luz

30

estatildeo submetidos tambeacutem aos fatores internos e externos nas liacutenguas do mundo

Logo o que eacute marcado numa liacutengua pode natildeo ser em outra ou podem ocorrer

marcaccedilotildees mais globais

Matras e Elsik (2006 p12) discorrem que

A tarefa da teoria linguiacutestica eacute a nosso ver descrever como essas tendecircncias concorrentes satildeo responsaacuteveis pela formaccedilatildeo de estruturas linguiacutesticas Trata-se de um jogo a niacutevel local de vaacuterios fatores a estrutura e sua funccedilatildeo na comunicaccedilatildeo o membro e o valor que ela representa tanto dentro do paradigma e em um quadro conceitual mais universal a natureza do processo especiacutefico envolvido na formaccedilatildeo a estrutura e a motivaccedilatildeo para aplicar esse processo para o paradigma ou partes dele Esta complexa interaccedilatildeo de fatores nunca eacute preacute-determinada uma vez que diferentes combinaccedilotildees de fatores tornaratildeo resultados diferentes A este respeito tomamos uma visatildeo imparcial do que condiccedilatildeo marcada eacute e se eacute ou natildeo uma estrutura eacute marcado ldquoem comparaccedilatildeo com a outrardquo Em vez disso nosso interesse eacute em explorar padrotildees nos resultados de diferentes combinaccedilotildees de fatores em niacutevel local

A assimetria e a naturalidade efetivamente teriam uma relaccedilatildeo direta com a

marcaccedilatildeo O que eacute assimeacutetrico tende a ser mais marcado e menos natural Por

outro lado o que eacute mais natural tende a ser menos marcado e mais simeacutetrico

Esta eacute uma condiccedilatildeo elementar mas natildeo totalitaacuteria para as liacutenguas do mundo

Para Batistella (1996 p115) haacute um nuacutemero de pesquisadores que sugerem

formas especiacuteficas em que as condiccedilotildees de marcaccedilatildeo desempenham um papel

na descriccedilatildeo na alteraccedilatildeo ou na aquisiccedilatildeo da liacutengua(gem) exercendo uma

funccedilatildeo relevante na definiccedilatildeo da gramaacutetica oacutetima agravequela que eacute o resultado

satisfatoacuterio na teoria da otimalidade6

6 Mesmo natildeo trabalhando diretamente com a teoria da otimalidade nesta tese eacute vaacutelido ressaltar

que os princiacutepios de marcaccedilatildeo simetria e naturalidade fazem parte do arcabouccedilo teoacuterico de seu axioma

31

No que diz respeito agrave fonologia aacuterea da linguiacutestica sob a qual se debruccedila o objeto

de estudo desse trabalho Battistella (1966 p65) observa que condiccedilatildeo marcada

eacute uma propriedade da relaccedilatildeo entre os dois sinais de um paradigma diacriacutetico

que eacute em parte independente da substacircncia linguiacutestica articulaccedilatildeo e percepccedilatildeo e

deve ser definido principalmente como conceitual

No que se refere aos conceitos postos aqui utilizaremos os pressupostos teoacutericos

defendidos por CROFT (1996 2003) JAKOBSON (1953) BATTISTELLA (1996)

MATRAS amp ELSIK (2006) para descriccedilatildeo teoacuterica e abordagem histoacuterica e LACY

(2006) para a descriccedilatildeo dos universais marcados para tratarmos das elucidaccedilotildees

sobre Marcaccedilatildeo Tipoloacutegica (no contato linguiacutestico) e Naturalidade

22 MARCACcedilAtildeO

Battistella (1996 p7) afirma que em muitas aacutereas alguns conceitos apresentam

problemas quanto agrave sua complexidade axioloacutegica Natildeo diferentemente no campo

da linguiacutestica tais discussotildees emblemaacuteticas ainda hoje se fazem presentes Uma

dessas discussotildees gira em torno do conceito de marcaccedilatildeo pois segundo ele

A dicotomia natildeo-marcado versus marcado eacute um dos conceitos-chave tanto a teoria da gramaacutetica gerativa desenvolvida por Noam Chomsky e a teoria da linguiacutestica estrutural desenvolvida por Roman Jakobson Ela tem sido usada em aacutereas da linguiacutestica que vatildeo desde a descritiva e tipoloacutegica ateacute a aplicada e foi emprestado para campos tatildeo diversos como a antropologia arte muacutesica poesia e literatura

O termo que fora introduzido na linguiacutestica na deacutecada de 1920 pelos linguistas

europeus da Escola de Praga cujo significado da condiccedilatildeo marcada natildeo

32

permaneceu constante mesmo dentro de uma uacutenica estrutura intelectual hoje eacute

um marco central na linguiacutestica O conceito de marcaccedilatildeo estaacute relacionado agrave

frequecircncia daquilo que eacute menos comum na liacutengua Logo a relaccedilatildeo deste conceito

se coaduna agrave noccedilatildeo de naturalidade Se um elemento eacute mais natural ele seraacute

menos marcado Se o oposto seraacute mais marcado Deste modo as liacutenguas teriam

uma tendecircncia a optar por padrotildees natildeo marcados

Battistella (2006 p13) expotildee que

A possibilidade de relaccedilotildees universais marcado natildeo-marcado eacute atenuada por outros fatores Um deles eacute a observaccedilatildeo de que a assimetria eacute muitas vezes sensiacutevel ao contexto Isso faz com que uma condiccedilatildeo local marcada em vez de um fenocircmeno geral signifique que contexto deve sempre ser considerado ao determinar valores de condiccedilatildeo marcada Poderia ser eacute claro que o aspecto contextual da condiccedilatildeo marcada seja dado universalmente mas este natildeo eacute de modo algum faacutecil de mostrar aleacutem do niacutevel de fonologia Uma preocupaccedilatildeo relacionada sobre as implicaccedilotildees universais decorre do fato de que muitas assimetrias podem ser revertidas entre as diferentes comunidades de fala periacuteodos de tempo ou registradores

Para Trask (2004 p187) os vaacuterios criteacuterios para entender que uma forma ou

construccedilatildeo eacute marcada podem natildeo coincidir e os valores da alternativa marcado

natildeo-marcado podem tambeacutem mudar ao longo do tempo A complexidade posta na

interaccedilatildeo de fatores nunca eacute previamente estabelecida uma vez que as

diferentes combinaccedilotildees deles tornaratildeo consequentemente os resultados

diferentes

Em continuidade ele afirma que

Ser marcado eacute uma noccedilatildeo muito ampla que se aplica em todos os niacuteveis de anaacutelise Em termos gerais eacute marcada qualquer forma linguiacutestica que ndash sob qualquer ponto de vista ndash menos usual ou menos neutra do que alguma outra forma a forma natildeo-

33

marcada Uma forma marcada pode distinguir-se de outra tambeacutem marcada pela presenccedila de mais material de maior quantidade de matizes de significado por ser mais rara numa determinada liacutengua ou nas liacutenguas em geral ou de vaacuterios outros modos (idem p129)

Na e para a fonologia eacute sugerido que processos fonoloacutegicos estejam diretamente

sensiacuteveis agrave distinccedilatildeo entre os elementos marcados e os natildeo marcados Nesta

relaccedilatildeo a marcaccedilatildeo dos segmentos foneacuteticos estaacute relacionada a propriedades

linguiacutesticas como i) serem pouco comuns ii) serem pouco frequentes iii) serem

adquiridos tardiamente iv) serem pouco estaacuteveis quanto agrave mudanccedila sonora

(CRISTOacuteFARO-SILVA 2011 p148)

Segundo Battistella (2006 p 13) ldquoa condiccedilatildeo marcada na fonologia eacute uma

propriedade da relaccedilatildeo entre os dois sinais de um paradigma diacriacutetico que eacute em

parte independente da substacircncia linguiacutestica (articulaccedilatildeo e percepccedilatildeo) e deve ser

definida principalmente como conceitualrdquo

O conceito de marcaccedilatildeo estaacute diretamente relacionado ao de simetria propriedade

matemaacutetica que consiste na correspondecircncia e permuta de elementos dentro de

um conjunto onde mesmo com a troca de lugares eles continuam tendo o

mesmo valor Neste caso a marcaccedilatildeo estaria ligada ao conceito de assimetria

posto que esta seja a quebra da valoraccedilatildeo de correspondecircncia dos elementos

Trask 2007

Para Matras e Elsik (2006 p 8)

Assimetrias de paradigmas tecircm vindo a ser associado com a noccedilatildeo de condiccedilatildeo marcadardquo O conceito pressupotildee que a relaccedilatildeo estrutural entre os dois polos de um paradigma eacute previsiacutevel em certa medida Ele tambeacutem assume que um dos

34

polos marcado seraacute sempre exibir propriedades que o outro polo desmarcado natildeo tem

Os referidos autores tratam dos aspectos sobre assimetria afirmando que a

simetria eacute mais simples por ser explicada ldquoem termos formais ao niacutevel do

paradigma e em termos funcionais atraveacutes de regularidade na posiccedilatildeo e

formas das estruturas que executam operaccedilotildees lineares semelhantes na

organizaccedilatildeo de informaccedilatildeo de enunciadosrdquo Eles ainda afirmam que as ldquoas forccedilas

que provocam a assimetria satildeo muito mais opacasrdquo pois ldquoelas competem em

vaacuterios niacuteveis locais contra o poder aparentemente esmagador e sempre presente

da busca pela simetriardquo (idem p 10)

A noccedilatildeo de valores dos conceitos de marcados e natildeo marcados foi inicialmente

desenvolvido para sistemas fonoloacutegicos por Trubetzkoy (1931) e primeiro aplicado

a categorias morfossintaacuteticas e semacircnticas por Jakobson (1932) Croft (1990 p

87) afirma que Markedness has since been adopted by both the generative and

the typological approaches to linguistic theory not surprisingly in rather different

ways7 Por isso a depender da corrente teoacuterica adotada o conceito de marcaccedilatildeo

pode ser compreendido de forma distinta dadas as interpretaccedilotildees e as

abrangecircncias a que elas se propotildeem

Conforme Battistella (1996 p 12) O termo marcaccedilatildeo abrange uma seacuterie de

conceitos

algumas tentativas foram feitas para separar os conceitos subjacentes a este termo e distinguir entre diferentes tipos de condiccedilotildees marcadas Jakobson por exemplo manteacutem uma

7 O conceito de marcaccedilatildeo tem sido adotado nas abordagens gerativista e tipoloacutegica natildeo surpreendentemente de maneiras bastante diferentes

35

distinccedilatildeo entre condiccedilatildeo fonoloacutegica marcada que envolve categorias cujos significados satildeo meros diferenciadores e condiccedilatildeo marcada semacircntica que envolve categorias conceituais que sinalizam o que significa bem como distinguem os vocaacutebulos

Com os passar do tempo os modelos teoacutericos sobre marcaccedilatildeo tambeacutem foram

discutidos e repensados de acordo com a corrente a que se propunha Nos

paraacutegrafos que seguem discorremos seguindo o percurso histoacuterico descrito por

Battistella 2006 sobre estes modelos estruturalista gerativista tipoloacutegica e

naturalista

221 A concepccedilatildeo de Jakobson e Trubetzkoy

A abordagem estruturalista estaacute diretamente ligada agraves pessoas de Jakobson e

Trubetzkoy componentes do Ciacuterculo de Praga para quem as correlaccedilotildees

fonoloacutegicas satildeo compartilhadas em um elemento definidor comum A partir da

observaccedilatildeo do comportamento dos traccedilos fonoloacutegicos eles introduzem os termos

marcado e natildeo-marcado It was in the context of the search for correlations

among phonemes that the terms marked and unmarked were first proposed

Battistella (2006 p 19)

Na visatildeo semioacutetica estruturalista de acordo com Matras e Elsik (2006 p 15)

Trubetzkoy (1939) introduziu o conceito de condiccedilatildeo marcada no contexto de sua

pesquisa sobre correlaccedilotildees fonoloacutegicas com base nas relaccedilotildees entre a presenccedila

de alguma caracteriacutestica fonoloacutegica e sua ausecircncia na consciecircncia dos falantes

Mais adiante ele restringiu a aplicaccedilatildeo da condiccedilatildeo marcada agraves neutralizaacuteveis

36

oposiccedilotildees fonoloacutegicas A partir daiacute a neutralizaccedilatildeo tornou-se o criteacuterio de

marcaccedilatildeo

Por isso diz-se que a neutralizaccedilatildeo eacute um criteacuterio originalmente fonoloacutegico que foi

estendido (nem sempre bem) para a situaccedilatildeo em que algum contexto requer o

cancelamento do contraste entre os membros de uma oposiccedilatildeo Battistella (1996

p 11)

Batistella (idem p12) tambeacutem afirma que Jakobson aplicou o conceito de

marcaccedilatildeo em vaacuterias direccedilotildees e aleacutem da fonologia a outros niacuteveis linguiacutesticos e

domiacutenios da semioacutetica com base natildeo apenas nos atributos linguiacutesticos mas nas

categorias semacircnticas da gramaacutetica e da cultura Ele tambeacutem afirmou que a

condiccedilatildeo marcada pode ser vista como uma relaccedilatildeo binaacuteria

O autor em estudo ainda discorre que Jakobson observando aleacutem disso ldquouma

seacuterie de correlaccedilotildees de condiccedilatildeo marcada notou que os valores natildeo marcados

tendem a ser representado por zero formardquo sugerindo que existe uma

correspondecircncia entre as caracteriacutesticas semacircnticas e sua expressatildeo fonoloacutegica

ldquonatildeo apenas os valores marcados tendem a ser codificados por meio de

marcadores manifestados mas tambeacutem valores semanticamente proacuteximos de

uma categoria que tendem a ser expressos fonologicamente ou marcadores

fonotaticamente semelhantesrdquo Os valores marcados tambeacutem tendem a mostrar

diferenciaccedilatildeo menos formal do que os valores natildeo marcados

Jakobson tambeacutem teria evidenciado seus estudos com base nas observaccedilotildees

sobre a aquisiccedilatildeo de primeira liacutengua e sobre a afasia Em suas pesquisas ele

descobriu correlatos extralinguiacutesticos de condiccedilatildeo marcada propondo uma

37

hierarquia das caracteriacutesticas fonoloacutegicas universais ao coletar dados

corroboradores da tese de que as caracteriacutesticas ou segmentos marcados satildeo

mais difiacuteceis de serem adquiridos por crianccedilas e de serem apreendidos por

afaacutesicos Battistella (idem 16)

222 Abordagem Gerativa

Para Matras amp Elsik (2006 p10) a visatildeo de Chomsky de marcaccedilatildeo mostra uma

flexibilidade notaacutevel uma vez que o conceito natildeo foi desenvolvido de forma

sistemaacutetica e que eacute difiacutecil falar sobre a existecircncia de um trabalho mais bem

elaborado sobre marcaccedilatildeo em sua obra

Battistella afirma que na concepccedilatildeo gerativista o conceito de marcaccedilatildeo exposto

por Chomsky estaacute relacionado a duas ideias centrais i) a condiccedilatildeo marcada eacute

concebida como codificaccedilatildeo de uma estrutura de preferecircncia ou a estrutura

padratildeo para a aquisiccedilatildeo da linguagem e ii) a condiccedilatildeo marcada eacute vista como

aquela que reflete o custo de determinadas opccedilotildees analiacuteticas Em tal conceito as

duas ideias estatildeo interligadas na abordagem gerativa na medida em que uma

teoria formal eacute necessaacuteria para expor a adequaccedilatildeo explicativa no que diz respeito

agrave aquisiccedilatildeo da linguagem (1996 p18)

Ainda segundo o autor Chomsky tambeacutem distinguiu dois tipos de condiccedilatildeo

marcada a distinccedilatildeo entre uma gramaacutetica sem marcaccedilatildeo do nuacutecleo e uma

periferia marcada e as estruturas de preferecircncia dentro do nuacutecleo e dentro da

periferia

38

No que tange agrave fonologia para Moreira da Silva (2011 p 31)

No contexto da Gramaacutetica Gerativa Chomsky amp Halle (1968 p 402) propotildeem uma teoria de marcaccedilatildeo baseada num conjunto de convenccedilotildees de marcaccedilatildeo ou definiccedilotildees dos valores ldquomarcadordquo ldquonatildeo-marcadordquo para os traccedilos fonoloacutegicos em contextos particulares A marcaccedilatildeo concebe uma estrutura como preferida ou que surge por defeito omissatildeo Os elementos marcados e natildeo marcados satildeo compreendidos como os que apresentam maior ou menor custo Satildeo as regras da Gramaacutetica Universal que atribuem um valor natildeo marcado aos traccedilos Com efeito os valores por omissatildeo estatildeo codificados na Gramaacutetica Universal havendo um conjunto de regras que fazem emergir os valores marcados

Chomsky amp Halle (idem p 425) propotildeem uma marcaccedilatildeo universal e inata Os

segmentos marcados ou os valores dos traccedilos satildeo estabelecidos de acordo com

universais interlinguiacutesticos frequecircncia distribucional mudanccedila linguiacutestica e

aquisiccedilatildeo da liacutengua

Eacute no final dos anos 70 e durante a deacutecada de 80 que segundo Battistella (1996

p 10)

a condiccedilatildeo marcada comeccedilou a ser tratada como parte de uma teoria do nuacutecleo da gramaacutetica A Gramaacutetica nuclear consistia em alguns paracircmetros que deveriam ser corrigidos durante a aquisiccedilatildeo de uma linguagem real O conceito de condiccedilatildeo marcada foi aplicado duplamente neste quadro Em primeiro lugar todo o nuacutecleo da gramaacutetica foi considerado como natildeo marcado contra a periferia marcada A condiccedilatildeo marcada de uma construccedilatildeo foi determinada pela sua regularidade estabilidade e centralidade para o nuacutecleo de uma linguagem particular bem como por generalizaccedilotildees intralinguiacutesticas sobre os tipos de construccedilatildeo Em segundo lugar a condiccedilatildeo marcada seria tambeacutem aplicada aos valores de paracircmetros no interior do nuacutecleo e no interior da periferia Assim condiccedilatildeo marcada tambeacutem foi visto como uma estrutura de preferecircncia dentro dos dois componentes da gramaacutetica

Moreira da Silva (2011 p32) afirma que no que diz respeito agrave Teoria da

Otimidade formulada por Prince amp Smolensky (1993) a marcaccedilatildeo eacute vista como a

39

violaccedilatildeo de uma restriccedilatildeo ou princiacutepio da liacutengua Segundo esta teoria cada liacutengua

eacute definida como um conjunto de hierarquizaccedilotildees de princiacutepios universais As

restriccedilotildees numa posiccedilatildeo mais elevada e que satildeo raramente violadas indicam os

aspetos natildeo marcados enquanto as menos importantes e que satildeo violadas

frequentemente mostram os aspetos mais marcados

223 Abordagem Tipoloacutegica (Interlinguiacutestica)

Croft (1996 p4) afirma que a principal caracteriacutestica da tipologia linguiacutestica eacute

verificar as regras de comparaccedilatildeo nas liacutenguas do mundo A comparaccedilatildeo

Interlinguiacutestica coloca a explicaccedilatildeo dos fenocircmenos linguiacutesticos de uma uacutenica

liacutengua em uma nova e diferente perspectiva

A fim de distinguir o conceito de marcaccedilatildeo de outras escolas teoacutericas Croft

(1996) introduziu a concepccedilatildeo de marcaccedilatildeo tipoloacutegica Para ele

Marcaccedilatildeo tipoloacutegica eacute uma rede de relaccedilotildees causais aparentes entre um subtipo de assimetrias interlinguiacutesticas todas as quais tecircm a ver com a forma como a funccedilatildeo eacute codificada em forma gramatical O tema geral da assimetria tambeacutem sugere um link para os padrotildees assimeacutetricos na ordem das palavras e na fonologia que diferem de marcaccedilatildeo tipoloacutegica de forma significativa Marcaccedilatildeo tipoloacutegica eacute uma propriedade universal de uma categoria conceitual natildeo uma propriedade de uma linguagem especiacutefica ou de uma categoria gramatical de linguagem particular como eacute concebida em marcaccedilatildeo para a Escola de Praga (p87 - 88)8

8 Typological markedness is a network of apparent causal relationships among a subtype of cross-

linguistic asymmetries all of which have to do with how function is encoded into grammatical form The general theme of asymmetry also suggests a link to asymmetrical patterns in word order and phonology which differ from typological markedness in significant ways Typological markedness is a universal property of a conceptual category not a language-particular property of a language-particular grammatical category as it is in Prague School markedness

40

Quanto agrave marcaccedilatildeo na abordagem tipoloacutegica autores como Croft (1996) e Givoacuten

(1990) se utilizaram da perspectiva estruturalista para embasar a sua teoria Esta

concepccedilatildeo se vale dos fenocircmenos interlinguiacutesticos e universais que eacute a sua

caracteriacutestica definidora Battistella (2006 p19) A marcaccedilatildeo tipoloacutegica eacute

portanto uma ferramenta importante para o tipologista porque fornece um meio

para ligar diretamente propriedades linguiacutesticas (estruturais) formais em todos os

idiomas

A condiccedilatildeo marcada eacute assegurada por padrotildees interlinguiacutesticos que podem ser

formulados como restriccedilotildees sobre possiacuteveis combinaccedilotildees de propriedades

linguiacutesticas Na abordagem tipoloacutegica a marcaccedilatildeo eacute vista como uma rede de

relacionamentos que engloba uma seacuterie de padrotildees gerais logicamente

independentes Croft (1990 p87) reclassifica os criteacuterios utilizados pelos

estruturalistas em trecircs estruturais comportamentais e de frequecircncia de token

Na abordagem tipoloacutegica um valor de categoria eacute mais ou menos marcado em

vez de individualmente ou duplamente marcadas como na abordagem semioacutetica

De acordo com Croft (2003 p87) o fato de que a neutralizaccedilatildeo natildeo eacute um

conceito relativo explica por que eacute um criteacuterio vaacutelido de condiccedilatildeo marcada

tipoloacutegica

Para Matras e Elsik o reconhecimento do caraacuteter relativo (gradual ou escalar) da

condiccedilatildeo marcada permite que se desenhe em alguns conceitos fundamentais da

tipologia linguiacutestica o que diz respeito agrave condiccedilatildeo de marcada Aleacutem de simples

implicacionais universais hierarquias e protoacutetipos tambeacutem podem ser vistos como

padrotildees da condiccedilatildeo marcada (2006 p18)

41

224 Abordagem Naturalista9 (Morfologia Natural)

Na abordagem naturalista de acordo com Matras amp Elsik (2006 p13) a condiccedilatildeo

marcada foi desenvolvida na escola de Morfologia Natural que surgiu na Aacuteustria e

na Alemanha em meados dos anos 1970 Os estudos de Dressler et al (1987)

para quem ldquoa naturalidade universal corresponde agrave facilidade para o ceacuterebro

humano (Dressler et all 1987 p11) fazem parte desta corrente que se debruccedilou

sobre a morfologia natural para dar sustentaccedilatildeo a sua tese Ainda para estes

autores

Os proponentes da Morfologia Natural caracterizam sua abordagem como semioacutetica e ao mesmo tempo funcional A escola foi inspirada entre outros pela teoria da marcaccedilatildeo desenvolvida na Escola de Praga Por outro lado morfologistas naturais compartilham de uma seacuterie de pontos de vista teoacutericos com o paradigma funcionalista e principalmente com orientaccedilatildeo de funccedilatildeo tipoloacutegica como a assunccedilatildeo do caraacuteter relativo da condiccedilatildeo marcada a suposiccedilatildeo de protoacutetipos e a dependecircncia de motivaccedilotildees e evidecircncias extralinguiacutesticas e intralinguiacutesticas (Idem p12)

Ainda de acordo com Matras amp Elsik (idem p 14) a Teoria da Morfologia Natural

eacute concebida como uma teoria da Naturalidade onde satildeo reconhecidos vaacuterios

niacuteveis de anaacutelise linguiacutestica que satildeo organizados por outras subteorias

correspondentes

A Morfologia Natural objetiva nesse aspecto estabelecer conflitos entre os

princiacutepios de naturalidade Dois desses satildeo i) os conflitos entre princiacutepios de

naturalidade (o que eacute natural e o que eacute especiacutefico do idioma) e ii) os conflitos

entre os diferentes componentes do sistema de linguagem

9 The naturalness approach

42

Comumente a naturalidade eacute vista por ter fundamentos extralinguiacutesticos que

determinam ou proiacutebem favorecem ou desfavorecem as estruturas linguiacutesticas

restringindo as possibilidades e especificam as preferecircncias da faculdade da

linguagem universal No entanto embora a morfologia privilegie os fatores

extralinguiacutesticos (neurobioloacutegicos e sociocomunicativos) os fatores linguiacutesticos

natildeo satildeo redutiacuteveis aos extralinguiacutesticos (ibidem p14)

23 CRITEacuteRIOS DE MARCACcedilAtildeO

Matras amp Elsik (2006 p15) elencam quatro criteacuterios relevantes para a marcaccedilatildeo

Satildeo eles i) frequecircncia ii) complexidade conceitual iii) complexidade estrutural iv)

distribuiccedilatildeo

A frequecircncia tem ocupado uma posiccedilatildeo central na abordagem tipoloacutegica da

condiccedilatildeo marcada Embora acredite-se que os elementos natildeo marcados satildeo

mais frequentes que os marcados este criteacuterio eacute relativo e universalmente

aplicaacutevel sendo bastante questionaacutevel na abordagem tipoloacutegica chegando a ser

abandonado por Croft 1990 p84 ao afirmar que ldquoo criteacuterio de frequecircncia mostra

uma conexatildeo direta entre as propriedades de estrutura da linguagem e

propriedades de uso da linguagemrdquo

Ainda segundo Croft (idem p159) a condiccedilatildeo marcada eacute mais do que uma

manifestaccedilatildeo de motivaccedilatildeo econocircmica havendo a necessidade de olhar para

outras causas da frequecircncia de certos valores gramaticais na fala

43

Na abordagem estruturalista semioacutetica a complexidade conceitual eacute a

propriedade que define a condiccedilatildeo semanticamente marcada Para Jakobson a

marcaccedilatildeo eacute definida como uma relaccedilatildeo assimeacutetrica entre sinalizaccedilatildeo e natildeo-

sinalizaccedilatildeo de uma determinada propriedade Assim o membro marcado da

oposiccedilatildeo eacute por definiccedilatildeo mais complexo semanticamente que o membro natildeo

marcado como outros criteacuterios melhores correlatos da condiccedilatildeo marcada de

diagnoacutesticos de complexidade conceitual (Matras amp Elsik 2006 p 17)

Ainda segundo estes autores (Idem p 19) o reconhecimento da extensatildeo e da

complexidade de um marcador em termos fonoloacutegicos como um fator relevante

em vez de um morfoloacutegico eacute tido por outros autores que trabalham com a

tipologia linguiacutestica Como exemplo eles citam a codificaccedilatildeo morfossintaacutetica que

eacute chamada de codificaccedilatildeo zero onde natildeo existe evidente formal de marcaccedilatildeo de

um valor de categoria

Os criteacuterios de marcaccedilatildeo com base na distribuiccedilatildeo compreendem os criteacuterios

comportamentais e o criteacuterio de valor neutro Os criteacuterios comportamentais foram

desenvolvidos especificamente na abordagem tipoloacutegica e dizem respeito a

qualquer tipo de evidecircncia do comportamento linguiacutestico dos elementos que

demonstram que um valor de uma categoria conceitual eacute gramaticalmente mais

versaacutetil do que outro Croft (1990 p 93)

Jaacute o criteacuterio de valor neutro diz respeito agrave neutralizaccedilatildeo de contrastes

paradigmaacuteticos em determinados contextos O criteacuterio foi desenvolvido na Escola

de Praga e tomado por Greenberg (1966) No entanto o valor neutro eacute

descartado como um criteacuterio vaacutelido de marcaccedilatildeo tipoloacutegica visto que natildeo haacute

44

consistecircncia interlinguiacutestica Natildeo existe um padratildeo interlinguiacutestico consistente de

contextos neutros que podem ser ligados agrave codificaccedilatildeo estrutural ou potencial

comportamental (Croft idem p96)

A razatildeo para a introduccedilatildeo de criteacuterios dependentes do sistema em Morfologia

Natural segundo Matras amp Elsik (2006 p 19) eacute que o conceito de naturalidade

baseada exclusivamente em fatores independentes de sistema resulta em

prediccedilotildees incorretas especialmente na mudanccedila de linguagem Eles consideram

certos aspectos da normalidade dependente de idioma para ser parte de

naturalidade

Segundo Croft (1990 p 97) no que tange aos criteacuterios externos da marcaccedilatildeo os

proponentes da abordagem naturalista introduziram uma seacuterie de criteacuterios ou

correlatos extralinguiacutesticos da condiccedilatildeo marcada como

evoluccedilatildeo da linguagem (o mais tarde o mais marcado)

maturaccedilatildeo ontogeneacutetica (o mais tarde o mais marcado)

fala do bebecirc (menos elementos marcados preferidos pelos adultos no

maiecircs)

aquisiccedilatildeo da linguagem (menos marcado adquirido antes do mais

marcado)

distuacuterbios da linguagem e da fala (mais marcado afetado anteriormente

menos marcado)

testes de percepccedilatildeo (menos marcado mais facilmente percebida do que

mais marcado)

45

e erros linguiacutesticos (mais marcados evocam mais erros do que os menos

marcados)

Esses criteacuterios satildeo basilares e dariam conta de uma seacuterie de elementos

universais linguiacutesticos

24 MARCACcedilAtildeO MUDANCcedilA E CONTATO LINGUIacuteSTICO

Matras amp Elsik (2006 p 22) garantem que em muitas abordagens a

mudanccedila linguiacutestica eacute vista como cooperadora para compreensatildeo da marcaccedilatildeo

Logo a mudanccedila de idioma eacute tida como criteacuterio de marcaccedilatildeo Esta assertiva faz

sentido nesse trabalho visto que o objeto de anaacutelise o portuguecircs resultante do

contato entre o Portuguecircs e o Latundecirc trata de cacircmbio de materiais linguiacutesticos

Neste caso especificamente dos elementos foneacuteticos

Ainda de acordo com estes autores

A existecircncia de estruturas marcadas eacute um resultado inevitaacutevel da compartimentaccedilatildeo e da abertura do sistema de linguagem E uma vez que diferentes componentes da linguagem tecircm funccedilotildees divergentes e tendem a seguir diferentes princiacutepios de naturalidade o abandono das estruturas marcadas em um niacutevel implica em estruturas marcadas em outro niacutevel (Idem p

25)

Em outras palavras a mudanccedila linguiacutestica leva agrave condiccedilatildeo de marcaccedilatildeo na

mudanccedila de um componente da liacutengua para outro ao inveacutes de uma reduccedilatildeo

global de condiccedilatildeo marcada Tais estruturas marcadas satildeo obrigadas a existir em

qualquer momento na histoacuteria de uma liacutengua

46

Os estudiosos apontam para os dois tipos de forccedilas que agem no contato

linguiacutestico a interna e a externa Assim tais forccedilas podem simplificar ou complicar

a gramaacutetica de uma liacutengua Givoacuten (1979 p 123) diz que os falantes satildeo

propensos a recorrer a estruturas natildeo marcadas da Gramaacutetica Universal em

situaccedilotildees cujo contato estaacute ligado ao estresse comunicativo enquanto situaccedilotildees

de contato menos marcados aquelas que prosseguem de forma mais gradual

natildeo precisam

Givoacuten (idem 124) diz que nas situaccedilotildees de pidgin a condiccedilatildeo de marcaccedilatildeo eacute

reduzida e situaccedilotildees de contato entre liacutenguas podem resultar em aumento de

elementos marcados As categorias marcadas satildeo reduzidas em pidgins

enquanto as natildeo-marcadas satildeo as primeiras a serem inovadas durante o

processo de crioulizaccedilatildeo A marcaccedilatildeo sugere que em situaccedilotildees de contato

envolvendo a interferecircncia deve favorecer a reduccedilatildeo da condiccedilatildeo marcada

Na aquisiccedilatildeo de segunda liacutengua o grau relativo de dificuldade para o aprendiz

estaacute relacionado a fatores extralinguiacutesticos como idade Eacute fato que na aquisiccedilatildeo

de uma segunda liacutengua os adultos tendem a terem dificuldades com os padrotildees

mais marcados enquanto os mais novos natildeo a tem Estruturas marcadas da

liacutengua em aquisiccedilatildeo podem deixar de serem adquiridas durante a aprendizagem

caso sejam os adultos que a esteja adquirindo Por isso estruturas natildeo marcadas

satildeo mais propensas a surgir em grandes sociedades caracterizadas por um

intenso contato linguiacutestico levando agraves liacutenguas a simplificaccedilatildeo dos seus sistemas

linguiacutesticos Croft (2000 p 192-193)

47

Jakobson (1978 p 35-37) afirma que quanto maior a funccedilatildeo socioespacial de um

dialeto mais simples seraacute o seu sistema linguiacutestico Dialetos e liacutenguas

relativamente isoladas satildeo mais propensas a desenvolverem condiccedilotildees marcadas

e estruturas redundantes como conjunto de fonemas complexos com um elevado

nuacutemero de contrastes fonoloacutegicos complexidade alofocircnica e alomoacuterfica

irregularidade morfoloacutegica e padrotildees de concordacircncia complexos Por outro lado

os casos de alto contato dialeacutetico que satildeo caracterizadas por redes sociais

relativamente abertas satildeo susceptiacuteveis agrave produccedilatildeo de estruturas linguiacutesticas natildeo

marcadas pela diminuiccedilatildeo da irregularidade da redundacircncia e da complexidade

Apesar de os empreacutestimos serem um aspecto do aumento da condiccedilatildeo marcada

ela (a condiccedilatildeo) eacute operativamente especiacutefica de cada empreacutestimo Esta condiccedilatildeo

marcada do empreacutestimo coodetermina quais as formas e funccedilotildees satildeo mais

susceptiacuteveis de serem emprestadas do que outras Quanto mais transparente e

menos integrador for um elemento na liacutengua de origem torna-se mais provaacutevel de

ser emprestado A condiccedilatildeo marcada eacute relativa ao contexto agrave saliecircncia agrave

frequecircncia agrave ocorrecircncia e agrave distacircncia tipoloacutegica da situaccedilatildeo do contato Matras amp

Elsik (2006 p 26)

Croft (2000 p198) estende a noccedilatildeo de condiccedilatildeo marcada natildeo soacute para os

mecanismos de mudanccedila mas tambeacutem para as formas de contextos de difusatildeo

ou seja padrotildees de realizaccedilatildeo Ele afirma que enquanto na mudanccedila interna as

inovaccedilotildees entram nos pontos menos marcados e estendem a ambientes mais

acentuados em empreacutestimos e outras inovaccedilotildees mudanccedilas motivadas

externamente se espalham de pontos marcados para menos contextos marcados

48

25 JAKOBSON E A ABORDAGEM FONOLOacuteGICA DA MARCACcedilAtildeO

O termo marcaccedilatildeo recebeu o tratamento mais expansivo nos estudos de Roman

Jakobson a partir de 1930 Ele e Trubetzkoy difundiram a ideia de correlaccedilatildeo

fonoloacutegica como uma seacuterie de oposiccedilotildees binaacuterias que compartilham elementos

em comum Eacute Jakobson que afirma que a neutralizaccedilatildeo e o estaacutegio onde as

posiccedilotildees marcadas natildeo estatildeo em estado de marcaccedilatildeo

Eacute tambeacutem Jakobson quem introduz a concepccedilatildeo de niacuteveis de marcaccedilatildeo propondo

que a forma natildeo marcada tanto tem uma forma geral como uma parcial Ele

descobriu uma relaccedilatildeo entre a marcaccedilatildeo em uma hierarquia universal de traccedilos

fonoloacutegicos os traccedilos marcados implicam maior dificuldade de aprendizagem e

uma maior facilidade de perda por parte de pessoas com afasia Ele ainda diz

que

O padratildeo do desenvolvimento fonoloacutegico universal consiste numa progressatildeo de diferenciaccedilotildees cada vez mais finas entre traccedilos distintivos inicialmente distinccedilatildeo entre consoantes e vogais formando-se posteriormente oposiccedilotildees cada vez menos universais A dissoluccedilatildeo da competecircncia linguiacutestica individual nas patologias da linguagem eacute governada pela mesma regularidade a perda do valor primaacuterio pressupotildee a perda do valor secundaacuterio e eacute por isso que se fala da infantilidade da fala dos afaacutesicos A dissoluccedilatildeo do sistema de sons nos afaacutesicos fornece uma imagem de espelho do desenvolvimento fonoloacutegico da crianccedila ndash os sons a serem adquiridos mais tardiamente satildeo os primeiros a serem perdidos (1941 p 60-63)

No percurso da fonologia Jakobson (1941 p 84) viu a representaccedilatildeo fonecircmica

como um niacutevel sem redundacircncia de representaccedilatildeo que conteacutem apenas

informaccedilotildees distintivas A praacutetica descritiva da informaccedilatildeo teoacuterica de Jakobson

49

teve uma grande e importante influecircncia sobre a notaccedilatildeo livre da redundacircncia na

fonologia e na sintaxe gerativas

Com base na literatura meacutedica Jakobson examinou a aquisiccedilatildeo da linguagem e a

afasia da fala agrave luz dos universais linguiacutesticos propondo uma relaccedilatildeo entre uma

hierarquia universal dos traccedilos fonoloacutegicos a aquisiccedilatildeo da linguagem na infacircncia

e a perda dela durante a afasia A aquisiccedilatildeo fonoloacutegica da crianccedila e os distuacuterbios

dos afaacutesicos baseiam-se nas mesmas leis de solidariedade como o inventaacuterio

fonoloacutegico o percurso fonoloacutegico das liacutenguas do mundo

Os estudos de Jakobson e de Trubetzkoy sobre a tipologia fonoloacutegica levaram

Jakobson a propor que os sistemas de sons satildeo organizados hierarquicamente e

que certas oposiccedilotildees fonoloacutegicas fornecem o nuacutecleo do sistema de som de todas

as liacutenguas Estas satildeo as oposiccedilotildees que definem os sons mais prototiacutepicos mdash

vogais e consoantes que ocorreratildeo em todos os idiomas vogais cardeais a i

u consoantes plosivas p t k e as nasais m n Estes sons satildeo

encontrados em praticamente todas as liacutenguas do mundo

Jakobson propotildee novas leis implicativas entre estes sons e os sons fora do

inventaacuterio baacutesico Dessa forma as leis tipoloacutegicas preveem que em nenhuma

liacutengua haveraacute vogais nasais a menos que haja vogais orais nenhuma liacutengua teraacute

uma vogal arredondada posterior a menos que ela tambeacutem tenha uma vogal

anterior fechada natildeo arredondada nenhuma liacutengua teraacute uma vogal fechada natildeo

arredondada a menos que ela tambeacutem tenha uma arredondada nenhuma liacutengua

teraacute uma fricativa dental simples sem uma fricativa dental estridente (Idem 1941

p 86)

50

Jakobson tambeacutem observa que certos sons satildeo muito raros nas liacutenguas do

mundo por exemplo as fricativas laterais e o r tcheco estridente Ele propotildee que

esses sons satildeo mais afastados do nuacutecleo e portanto menor nesta hierarquia

A hierarquia de oposiccedilotildees fonoloacutegicas definida pela tipologia encontra-se tambeacutem

no desenvolvimento do sistema foneacutetico da crianccedila Com base em estudos diaacuterios

de aquisiccedilatildeo da linguagem ele confirma a hierarquia na aquisiccedilatildeo dos padrotildees e

os padrotildees mais marcados seriam adquiridos tardiamente

Moreira da Silva (2011 p36) elenca os criteacuterios de marcaccedilatildeo No entanto a

autora chama a atenccedilatildeo para o fato de que eles nem sempre funcionam do modo

esperado Satildeo eles frequecircncia distribuiccedilatildeo aquisiccedilatildeo da liacutengua patologias da

linguagem histoacuteria da liacutengua facilidade de produccedilatildeo e percepccedilatildeo universalidade

implicaccedilatildeo e processos fonoloacutegicos Ela tambeacutem apresenta algumas unidades e

estruturas consideradas mais marcadas como podemos ver a seguir

Quadro 1 Unidades e estruturas mais marcadas conforme levantamento de Moreira da

Silva (2011)

Segmentos e estruturas mais marcadas Autores

1 Vogais nasais Ferguson amp Chowdbury 1960

Greenberg 1966 14 Durand 1990

74 Kenstowicz 1994 63

2 Vogais longas Zipf 1935 1963 Greenberg 1966

14

3 Vogais meacutedias em comparaccedilatildeo com as

vogais altas

Kenstowicz 1994 65

4 Consoantes aspiradas Greenberg 1966 14

5 Consoantes glotalizadas Greenberg 1966 17

6 Obstruintes [+vozeadas] por oposiccedilatildeo agraves [- Greenberg 1966 14 24

51

vozeadas] Lass1984 155 Kenstowicz 1994

62

7 Consoantes fricativas por oposiccedilatildeo agraves

oclusivas

Kenstowicz 1994 65

8 Articulaccedilotildees secundaacuterias como labializaccedilatildeo

palatalizaccedilatildeo e velarizaccedilatildeo

Kenstowicz 1994 65

9 A regiatildeo dental alveolar eacute preferida com

exceccedilatildeo das africadas o que pode ser

observado pelo fato de este ser o ponto de

articulaccedilatildeo usado quando numa liacutengua

existe apenas uma obstruinte Nas nasais

esta tendecircncia ainda se faz notar mais

resultando na preferecircncia por n

Lass 1984 154-156

10 Segmentos com articulaccedilotildees muacuteltiplas e

complexas no geral satildeo mais marcados em

comparaccedilatildeo com segmentos com

articulaccedilotildees singulares

Kenstowicz 1994 65

11 Quanto agraves liacutequidas a lateral seraacute a menos

marcada jaacute que as liacutenguas que possuem

duas ou mais liacutequidas tecircm provavelmente

uma lateral e um contraste lateral natildeo

lateral

Lass 1984 158

12 Em termos de semivogais haacute uma

preferecircncia por j embora a maioria das

liacutenguas possua tambeacutem w as outras

semivogais satildeo raras

Lass 1984 158

13 Siacutelabas acentuadas ndash nem todas as liacutenguas

tecircm siacutelabas acentuadas embora estas

surjam cedo na aquisiccedilatildeo talvez devido agrave

sua saliecircncia perceptiva e no caso do inglecircs

devido ao fato de as palavras lexicais serem

iniciadas por siacutelaba toacutenica

Demuth 1996 121

14 Quanto agrave siacutelaba existe a preferecircncia pelo

formato natildeo marcado CV

Blevins 1995 213

15 De acordo com a TO a siacutelaba estaacute sujeita agraves Archangeli 1997 7 Hammond

52

seguintes restriccedilotildees universais

a) As siacutelabas comeccedilam com consoante -

Ataque

b) As siacutelabas tecircm uma vogal - Nuacutecleo

c) As siacutelabas acabam com uma vogal - Natildeo

Coda

d) As siacutelabas tecircm no maacuteximo uma consoante

numa margem - Complexo

(significa que os ataques complexos e codas

complexas satildeo inaceitaacuteveis)

e) As siacutelabas satildeo compostas por consoantes

e vogais - Ataque e Nuacutecleo

1997 36

As estruturas elencadas no quadro acima satildeo validadas interlinguisticamente

Com relaccedilatildeo agraves liacutenguas em contato objeto deste estudo podemos afirmar que o

portuguecircs apresenta menos estruturas marcadas do que o Latundecirc No caso do

portuguecircs as estruturas em 2 4 5 e 10 constantes do quadro acima natildeo satildeo

observadas

Jaacute no Latundecirc aleacutem de todas as estruturas apresentadas no quadro ainda satildeo

observadas as seguintes estruturas mais marcadas

estrutura silaacutebica bastante complexa

inventaacuterio vocaacutelico maior do que o consonantal

53

combinaccedilatildeo de dois traccedilos mais marcados em um segmento (vogais

nasais e laringais) e

acento e tom lexicais

Para refletirmos sobre a marcaccedilatildeo no processo de interferecircncia Latundecirc ndash

Portuguecircs trataremos no capiacutetulo seguinte de conceitos a cerca do contato

linguiacutestico

54

3 CONTATO LINGUIacuteSTICO

ldquoBilingualism is for me the fundamental problem of linguisticsrdquo Jakobson10

31 INTRODUCcedilAtildeO

A histoacuteria em grande parte gira em torno de lendas e mitos Um desses mitos eacute o

surgimento das liacutenguas do mundo Questionamentos de como e quando elas

sugiram permeiam ainda hoje as mentes dos filoacutesofos e cientistas Natildeo

diferentemente das demais aacutereas a perspectiva teoloacutegica descreve a narrativa da

construccedilatildeo da Torre de Babel como uma dessas tentativas de explicaccedilatildeo no que

tange agrave miscelacircnea de liacutenguas existentes Jackob Bohme teoacutelogo do seacuteculo XVII

afirma em seu De Signatura Rerum11 que a liacutengua divina original raiz ou matildee de

todas as liacutenguas do mundo eacute chave para um conhecimento verdadeiro e perfeito

de todas as coisas Eacute no ato da criaccedilatildeo que o primeiro homem Adatildeo

contemplando as obras do Criador de toda a natureza nomeara todas as

criaturas de acordo com suas proacuteprias qualidades essenciais usando a

linguagem humana como meio

A hipoacutetese defendida por Bohme tambeacutem fora amplamente sustentada pelos

filoacutelogos e comparatistas do final do seacuteculo XVIII Sem viacutenculo com a teologia

estes estudiosos buscavam atraveacutes da reconstruccedilatildeo da aacutervore linguiacutestica a

protoliacutengua a liacutengua-matildee geradora das demais liacutenguas

10

Apud Romaine 1995 p1 11

De Signatura Rerum (Desde o nascimento e o nome de todos os seres) 1622

55

Jacob Grimm filoacutelogo alematildeo com base nas descobertas de Rasmus Rask

aperfeiccediloou o meacutetodo comparatista sobretudo o que fora denominada de

ldquomudanccedila de somrdquo ou ldquoLei de Grimmrdquo12 com intuito de descrever as mudanccedilas

ocorridas na liacutengua-matildee o proto-indo-europeu (PIE) A Lei de Grimm estava na

base das discussotildees ocorridas mais tarde na Universidade de Leipzig

Alemanha no conhecido grupo dos neogramaacuteticos Os estudiosos desse ciacuterculo

questionaram os estudos de Grimm e seus compatriotas ao apontarem para o fato

de que os estudos comparatistas se basearem em dados de liacutengua escrita e natildeo

de liacutengua falada (GABAS JR 2008 p 80)

Humberto Eco em A busca da liacutengua perfeita13 nos relata sobre os projetos de

reconstruccedilatildeo em busca da liacutengua sagrada No seu livro o autor nos mostra que a

tentativa de procura de correlatos entre as liacutenguas do mundo eacute interesse antigo

das civilizaccedilotildees Ele afirma que na Europa no seacuteculo XIX houve 173 projetos de

reconstruccedilatildeo linguiacutestica

Dadas ateacute aqui as investigaccedilotildees eacute comum pensarmos que pelo prisma

teoloacutegico o surgimento das liacutenguas no planeta eacute fruto da desobediecircncia e

soberba humanas Eco idem nos mostra que haacute um equiacutevoco quanto a esta

interpretaccedilatildeo uma vez que no capiacutetulo XI v 1 do livro de Gecircnesis a Biacuteblia

12

A Lei de Grimm analisou sobre o vieacutes da fonologia as relaccedilotildees que havia entre as liacutenguas indo-

europeias As similaridades entre o alematildeo claacutessico grego e inglecircs antigo eram previstas a partir de leis foneacuteticas i) as consoantes oclusivas surdas (p t k kw) do PIE mudaram em fricativas surdas correspondentes (f θ h hw) nas liacutenguas germacircnicas ii) as consoantes oclusivas sonoras (bdggw) do PIE mudaram em oclusivas surdas correspondentes (p t k kw) nas liacutenguas germacircnicas iii) as consoantes aspiradas sonoras (bh dh gh gwh) do PIE mudaram em oclusivas natildeo-aspiradas sonoras correspondentes (bdggw) nas liacutenguas germacircnicas (GABAS JR 2008 p 78) 13

ECO Humberto A busca da liacutengua perfeita Traduccedilatildeo de Antonio Angonese Bauru Edusc

2001

56

discorre sobre a existecircncia de uma uacutenica genealogia de uma mesma liacutengua e de

uma mesma fala

Diferentemente no capiacutetulo que antecede a narrativa de Babel a proacutepria Biacuteblia

aponta para a existecircncia de famiacutelias linguiacutesticas distintas conforme Gecircnesis 11

v 5 Por estes foram repartidas as ilhas dos gentios nas suas

terras cada qual segundo a sua liacutengua segundo as suas

famiacutelias entre as suas naccedilotildees

v20 Estes satildeo os filhos de Catildeo segundo as suas famiacutelias

segundo as suas liacutenguas em suas terras em suas naccedilotildees

v 31 Estes satildeo os filhos de Sem segundo as suas famiacutelias

segundo as suas liacutenguas nas suas terras segundo as suas

naccedilotildees

Uma explicaccedilatildeo para tal passagem se daacute a partir da perspectiva dos filoacutesofos

gregos que concebiam os povos que falava de forma diferente como bagraverbaroi

seres que balbuciavam falando de forma incompreensiacutevel Logo acreditavam que

aqueles outros eram serem inferiores que natildeo falavam a liacutengua verdadeira da

razatildeo e do pensamento o logos

Tal conflito entre as liacutenguas existentes apontam para uma poliacutetica linguiacutestica que

muito explica a hierarquia (status) linguiacutestica ainda hoje atuante O status

linguiacutestico resultante das relaccedilotildees assimeacutetricas entre sociedades ou subgrupos de

uma sociedade decorre tambeacutem das circunstacircncias e condiccedilotildees que envolvem o

contato linguiacutestico Esse por sua vez evolue da dinacircmica proacutepria do processo em

que ocorrem conflitos e acomodaccedilotildees e que pode derivar pidgins crioulos e

mudanccedila linguiacutestica

57

No reconhecimento de um universo entrelaccedilado compartilhamos com o ponto de

vista de Eco (2001) e assumimos a ideia de que a existecircncia de cada liacutengua e de

sua historicidade eacute reveladora do entendimento do mundo

ldquoCada liacutengua constitui um determinado modelo de Universo um sistema semioacutetico de compreensatildeo do mundo e se temos quatro mil modos diferentes de descrever o mundo isto nos torna mais ricos Deveriacuteamos nos preocupar pela preservaccedilatildeo das liacutenguas tal como nos preocupamos com a ecologiardquo (ECO 2001 p234)

32 SOBRE O CONTATO LINGUIacuteSTICO

Pouco eacute sabido sobre o contato entre as liacutenguas do mundo quando diante da

imensidatildeo que eacute o universo linguiacutestico com o qual nos deparamos14 A

necessidade que os humanos tecircm de se comunicarem a partir do momento que a

interaccedilatildeo foi estabelecida eacute condiccedilatildeo imprescindiacutevel para o contato linguiacutestico

Trask (2004 p 66) afirma que poucas liacutenguas estatildeo - ou estiveram -

suficientemente isoladas para evitar todo tipo de proximidade e portanto toda

liacutengua mostra alguma prova de um contato antigo ou moderno entre liacutenguas

Thurston (1987 p 34) afirma que

toda liacutengua deve ter sofrido alguma influecircncia de seus vizinhos em um determinado ponto e tempo Para ele todos os idiomas satildeo liacutenguas mistas na medida em que todos copiaram formas lexicais e outros recursos linguumliacutesticos de liacutenguas vizinhas

Embora natildeo saibamos exatamente como se deu o contato entre as liacutenguas do

mundo as evidecircncias do contato podem ser observadas de forma objetiva

atraveacutes de empreacutestimos lexicais O contato linguiacutestico entretanto natildeo se reduz

14

Eacute estimado o nuacutemero de sete mil liacutenguas vivas atualmente ao redor do mundo (httpwwwethnologuecomworld Em 21 de janeiro de 2015)

58

apenas a itens lexicais oriundos dos empreacutestimos entre culturas distintas com

base na dominaccedilatildeo na expansatildeo do comeacutercio ou em qualquer circunstacircncia que

promova a necessidade de comunicaccedilatildeo entre culturas de liacutenguas diferentes

O contato a depender das liacutenguas envolvidas pode trazer consequecircncias muito

devastadoras Em casos extremos o impacto do contato pode ser avassalador

fazendo com que uma das liacutenguas seja extinta quer seja pelo deslocamento

linguiacutestico que seja pelo etnociacutedio Nestes casos ocorre a morte de uma das

liacutenguas em contato aspecto que discorremos na seccedilatildeo sobre as consequecircncias

do contato

No tocante aos efeitos do contato em relaccedilatildeo aos niacuteveis linguiacutesticos Trask Idem

afirma que o contato linguiacutestico pode ir mais longe que a interferecircncia lexical

afetando a gramaacutetica e a pronuacutencia

Concordando com o que afirma Trask Thomason postula que embora seja senso

comum que o resultado mais comum da mescla linguiacutestica seja o empreacutestimo de

palavras este eacute apenas a consequecircncia mais comum quando se trata da

intersecccedilatildeo linguiacutestica

When the agents of change are fluent speakers of the receiving language the first and redominant interference features are lexical items belonging to the nonbasic vocabulary later under increasingly intense contact conditions structural features and basic vocabulary may also be transferred from one language to the other (THOMASON 2001 p 36)

Natildeo obstante podem-se detectar exemplos de transferecircncias em todos os

aspectos linguiacutesticos uma vez que todos os niacuteveis da estrutura linguiacutestica satildeo

59

possiacuteveis de serem transferidos entre idiomas muacutetuos sem qualquer tipo de

restriccedilatildeo dadas as possibilidades de conjunturas sociais e estruturais

Quando as liacutenguas entram em contato as suas gramaacuteticas tambeacutem satildeo

intercruzadas Tal processo natildeo eacute algo simples e justo Diversos fatores externos

satildeo responsaacuteveis por esta miscelacircnea que devido a tais fatores nem sempre eacute

concebida de forma inocente

Em meio a condicionantes sociolinguiacutesticas assumimos que as gramaacuteticas

(sendo tambeacutem reflexo das relaccedilotildees intersocietaacuterias) entram num jogo em que

as peccedilas satildeo acomodadas de acordo com as necessidades comunicativas dos

interlocutores (GILES e CUPLAND 1991) Em meio a esse ldquojogordquo nos importa

refletir como os fenocircmenos que emergem do contato entre liacutenguas podem refletir

questotildees que envolvem a marcaccedilatildeo e universais linguiacutesticos

Para Aikhenvald (2007 p1)

As liacutenguas podem assemelhar-se umas as outras em categorias construccedilotildees e significados e nas formas reais usadas para expressaacute-las As categorias podem ser semelhantes porque satildeo universais e cada liacutengua tem alguma forma de fazer uma pergunta ou a elaboraccedilatildeo de um comando Ocasionalmente duas liacutenguas compartilham a forma por pura coincidecircncia

A literatura linguiacutestica atesta que a semelhanccedila interlinguiacutestica motiva estudos

tipoloacutegicos haacute deacutecadas (CROFT 1990 COMRIE 1989 WHALEY 1997) Embora

liacutenguas apresentem padrotildees regulares de desemelhanccedilas aquelas podem ser

agrupadas em tipos baacutesicos Essa realidade induz a reflexatildeo acerca da existecircncia

de universais linguiacutesticos

60

As liacutenguas individuais independentemente das semelhanccedilas tipoloacutegicas eou

geneacuteticas observadas entre elas satildeo sujeitas a mudanccedilas continuadas que

ocorrem tambeacutem devido ao contato linguiacutestico Para Thomason (2001 p14) as

influecircncias e consequecircncias do contato linguiacutestico satildeo descritas em trecircs niacuteveis i)

mudanccedila induzida pelo contato ii) mescla linguiacutestica extrema o que resulta em

pidgin crioulo e liacutenguas biliacutengues e iii) morte da liacutengua

A seguir abordaremos fenocircmenos decorrentes do contato linguiacutestico

33 MESCLAS DE CONTATO PIDGIN CRIOULO LIacuteNGUA FRANCA E JARGAtildeO

Um ponto saliente dos estudos sobre o contato linguiacutestio eacute o conceito de

ldquomescla15rdquo Este termo utilizado por Tarallo e Alkimin (1987 p7) descreve a

relaccedilatildeo entre as liacutenguas e seus resultados Inicialmente eles chamam a atenccedilatildeo

para o fato de a mescla ser interpretada como algo impuro definhamento

deterioraccedilatildeo Esta impureza linguiacutestica historicamente levou a sociedade a

alimentar a ideia de contaminaccedilatildeo e obviamente construir a discriminaccedilatildeo

linguiacutestica

Ao pensarmos sobre o processo de simbiose que as coisas e os elementos do

mundo estatildeo sujeitos em todo o tempo podemos ter uma ideia clara de que o

processo de amaacutelgama eacute proacuteprio natildeo apenas da natureza linguiacutestica mas de tudo

o que pode existir Apesar disso as mesclas com graus niacuteveis e saliecircncias

variadas nem sempre satildeo refletidas ou percebidas pelos usuaacuterios das liacutenguas do

15 Mescla eacute mistura contato amaacutelgama etc Tarallo e Alkimin (1987 p7)

61

mundo Focalizando a natureza da mescla o estudo das liacutenguas por seu turno

seja sincrocircnico ou diacrocircnico pode evidenciar os fenocircmenos do contato nos

diferentes niacuteveis linguiacutesticos

Tarallo e Alkimin (idem p9) salientam que o dinamismo linguiacutestico se daacute nas

ldquocomunidades de falardquo16 Eacute nelas e entre elas que se concretizam o contato

linguiacutestico que por sua vez produzem fenocircmenos de mescla ou de convivecircncia

coexistecircncia mecanismo ativado pelos indiviacuteduos que integram tais comunidades

Esse fato se alinha agrave perspectiva de que uma comunidade de fala natildeo eacute em

absoluto homogecircnea Nela podem coexistir processos de ordem interna e

externa assim como forccedilas centriacutefugas e centriacutepetas (BAKHTIN 2010)17

A dinacircmica social eacute tambeacutem pontuada por Tarallo e Alkimin (ibidem p9) Esses

autores mencionam que a mescla linguiacutestica resultante da dinacircmica pode ser

intracomunidade ou intercomunidade No primeiro caso as variantes convivem

eou se entrecruzam em uma mesma comunidade de fala em que apenas uma

liacutengua eacute falada No segundo liacutenguas distintas coexistem e se misturam em uma

mesma comunidade Como exemplo de mesclas intracomunidades podemos citar

o portuguecircs e suas variantes questotildees geograacuteficas histoacutericas e sociais Satildeo

variantes que convivem ldquopacificamenterdquo em territoacuterio nacional Jaacute para as mesclas

intercomunidades tomemos o exemplo do conviacutevio do portuguecircs e demais liacutenguas

16

Labov (1972) conceitua comunidade de fala como grupo de falantes que segue as mesmas normas relativas ao uso da liacutengua Para Romaine (2000) trata-se de um grupo de falantes que natildeo compartilham necessariamente a mesma liacutengua poreacutem compartilham um conjunto de normas

e regras no uso da liacutengua 17

Bakhtin aponta a luta entre classes as forccedilas que agem de dentro para fora do sujeito ou das instituiccedilotildees assim como as forccedilas que agem fazendo o movimento oposto Eacute imprescindiacutevel vislumbrar o poder poliacutetico que a liacutengua tem

62

(alematildeo polonecircs e italiano) na regiatildeo sul bem como a coexistecircncia espaccedilo-

temporal entre diferentes liacutenguas indiacutegenas e entre elas e a liacutengua portuguesa

Ao discutir a mescla linguiacutestica sob a eacutegide do contato linguiacutestico Calvet (2004

p35) considera que haacute aproximadamente na Terra cerca de 5000 liacutenguas e

cerca de 150 paiacuteses Com base nesses nuacutemeros o autor nos diz que cada paiacutes

poderia ter 30 liacutenguas Apesar de em termos reais a distribuiccedilatildeo das liacutenguas natildeo

corresponder a esse cenaacuterio o pesquisador aponta para o fato de

que o mundo eacute pluriliacutengue em cada um de seus pontos e que as comunidades linguiacutesticas se costeiam se superpotildeem continuamente O plurilinguismo faz com que as liacutenguas estejam constantemente em contato O lugar desses contatos pode ser o indiviacuteduo (biliacutengue ou em situaccedilatildeo de aquisiccedilatildeo) ou a comunidade Idem (2002 p 35)

Os dados de Calvet deixam claro que desde sempre o contato linguiacutestico eacute uma

realidade da vivecircncia do humano Os acontecimentos histoacutericos de guerra

expansatildeo e colonizaccedilatildeo apontam para a mescla linguiacutestica Diante deste

contexto vemos que o relacionamento entre as liacutenguas do mundo eacute um processo

feacutertil para a diversidade linguiacutestica Outro aspecto de interesse decorre do fato de

o contato permitir a emergecircncia de padrotildees estruturais os quais trazem luzes

para a compreensatildeo da faculdade da linguagem

A depender do contato podemos avaliar diferentes fenocircmenos resultantes A

intensidade o contato linguiacutestico pode derivar instrumentos mais ou menos

elaborados de comunicaccedilatildeo definidos como jargatildeo pidgin e crioulo

63

Os primeiros estudiosos a se aterem sobre o estudo das liacutenguas pidgins e

crioulas se utilizaram dos dados (relatos) de missionaacuterios e comerciantes que

viajaram e mantiveram contato com as aacutereas das mesclas18

331 Pidgin

O termo pidgin foi usado pela primeira vez em 1850 para conceituar o conviacutevio do

inglecircs e o chinecircs19 Mas outras duas hipoacuteteses tambeacutem satildeo colocadas quando

se trata de pidgin A segunda afirma que o termo fora transportado da Ameacuterica do

Sul no iniacutecio do seacuteculo XVII pelos marinheiros e comerciantes ingleses da colocircnia

de Leigh ao estabelecerem contato com os iacutendios Pidiam A terceira explicaccedilatildeo eacute

a origem a partir da palavra portuguesa ocupaccedilatildeo que teria sofrido algumas

mudanccedilas foneacuteticas ateacute resultar em pidgin (TARALLO e ALKMIN 1987 p80)20

Para Couto (2001 p 1) o pidgin eacute uma liacutengua com uma reduccedilatildeo draacutestica da

gramaacutetica Esta reduccedilatildeo se daacute sobre a morfologia e o leacutexico Natildeo eacute liacutengua

materna de ningueacutem pois entre si os povos dominados soacute falam suas respectivas

liacutenguas ao passo que os dominadores nunca se datildeo ao trabalho de falar outra

liacutengua que natildeo a sua proacutepria

Crystal (2008 p 201) afirma que aleacutem do processo de reduccedilatildeo para o

surgimento do pidgin as comunidades de falas envolvidas neste processo

18

Tarallo e Alkimin 1987 p 109-114 citam Francisco Adolfo Coelho Hugo Schuchardt e Dirk Christiaan Hesseling como os pioneiros neste campo de estudo Este uacuteltimo atribui aos escravos europeus a forccedila linguiacutestica Foram eles (os escravos) os responsaacuteveis pelas alteraccedilotildees sofridas pelas liacutenguas maternas 19

Neste caso o termo business ao ser empregada na expressatildeo do pidgin chinecircs de base inglesa

dɛacuteju pidzIn significando thatrsquos your business 20

Ocupaccedilatildeo gt parsquosaw ou pasaɳ

64

necessitam cada uma delas se aproximarem sucessivamente dos traccedilos mais

oacutebvios da outra liacutengua Trata-se de uma intersecccedilatildeo nem sempre consciente mas

motivada por aspectos econocircmicos como o comeacutercio Daiacute o grande surgimento de

pidgins em aacutereas de intenso comeacutercio e desenvolvimento econocircmico

Dubois et all (1998 p 469) discorre que o pidgin mesmo natildeo sendo uma liacutengua

em si mesma eacute um sistema mais completo que o sabir pois seu vocabulaacuterio

cobre numerosas atividades O sabir ou liacutengua franca21 por sua vez eacute um

sistema linguiacutestico reduzido a algumas regras de combinaccedilatildeo e ao vocabulaacuterio de

determinado campo lexical

Ainda de acordo com Tarallo e Alkmin (1987 p 88)

Fontes histoacutericas indicam que no tempo das cruzadas nas regiotildees de batalhas entre mulccedilumanos e cristatildeos teria florescido uma liacutengua de contato denominada Liacutengua Franca ou sabir Com documentaccedilatildeo precaacuteria a existecircncia dessa liacutengua eacute contestada por alguns estudiosos Originalmente usada entre aacuterabes e europeus essa liacutengua teria se expandido tendo sido usada ao longo da costa do Mediterracircneo especialmente na Aacutefrica do Norte

Em Trask (2004 p228) o conceito de liacutengua franca eacute mais explorado Para ele a

liacutengua franca se distingue do pidgin quando por ventura um dos grupos

ldquoaprenderdquo a liacutengua do outro Neste caso a gramaacutetica e o leacutexico de uma

21

Na atualidade conforme Tarallo e Alkmin 1987 p 90 a expressatildeo liacutengua franca refere-se a um

fenocircmeno mais amplo a mescla de contato para intercomunicaccedilatildeo em situaccedilotildees biliacutengues e pluriliacutengues Como exemplo os autores citam a liacutengua wolof no Senegal do swahili no Quecircnia na Tanzacircnia e em Comores do Tucano no Nordeste da Amazocircnia

65

sobressaem agrave outra O pidgin eacute compreendido entatildeo como uma colcha de

retalhos que permite uma forma bastante rudimentar de comunicaccedilatildeo22

Ainda de acordo com Trasky (p229) um pidgin pode seguir caminhos distintos i)

ele pode cair em desuso ii) ele pode continuar em uso por vaacuterias geraccedilotildees e

durar seacuteculos iii) ele pode sofre algumas alteraccedilotildees e se transformar em liacutengua

materna Neste uacuteltimo caso trata-se do processo de crioulizaccedilatildeo do qual

abordaremos mais agrave frente

Hall apud Tarallo e Alkmin (1987 p 86) ao tratar do caraacuteter reducionista que o

pidgin apresenta em sua estrutura e leacutexico aponta algumas caracteriacutesticas que

definem tais simplificaccedilotildees

Niacutevel fonoloacutegico ndash o nuacutemero de contrastes empregados eacute reduzido As vogais representadas satildeo em geral as chamadas vogais cardinais (a e i o u) enquanto os grupos consonantais satildeo caracteristicamente evitados

Niacutevel morfoloacutegico ndash ausecircncia de algumas categorias flexionadas como gecircnero nuacutemero e tempo verbal

Niacutevel sintaacutetico ndash as estruturas sentenciais satildeo simples as sequecircncias tendem a ser coordenadas evitando-se as estruturas complexas e subordinaccedilatildeo extensiva

Niacutevel lexical ndash nuacutemero reduzido de vocaacutebulos cuja accedilatildeo se norteia pela extensatildeo de significados e por polissemias significativas

332 Crioulo

O crioulo eacute um pidgin consolidado Quando os falantes crianccedilas oriundos dessa

mescla linguiacutestica utilizam o pidgin como uacutenica liacutengua ou a liacutengua que passa a

ganhar mais evidecircncia esta se consolida como liacutengua materna

22

Conforme Tarallo e Alkmin (idem p 8) algumas caracteriacutesticas do pidgin satildeo i) seu caraacuteter

auxiliar e secundaacuterio para os dois grupos cada um dos grupos manteacutem sua proacutepria liacutengua no conviacutevio social do cotidiano e do habitual ii) as liacutenguas pidgin preenchem funccedilotildees sociais limitadas sobretudo aquelas vinculadas a atividades comerciais mercantilistas

66

Para Couto (2001 p2)

Liacutengua crioula eacute um pidgin que foi adquirido como liacutengua nativa como preconiza a chamada teoria da nativizaccedilatildeo De acordo com essa concepccedilatildeo o crioulo eacute um ex-pidgin ou seja um pidgin que virou liacutengua materna de uma comunidade

Ainda para Tarallo e Alkmin (1987 p 95) as liacutenguas crioulas constituem um

conjunto de liacutenguas cuja histoacuteria conhecida eacute ligada a uma situaccedilatildeo de contato

entre populaccedilotildees linguiacutesticas cultural e etnicamente distintas Estas satildeo

distinguidas das liacutenguas pidgin por possuiacuterem uma comunidade de falantes

nativos e consequentemente por desempenharem funccedilotildees sociais amplas como

qualquer liacutengua natural

Em Dubois et all (1998 p 161) daacute-se o nome de crioulos a sabires pseudo-

sabires ou pidgins que por motivos diversos de ordem histoacuterica ou sociocultural

se tornaram liacutenguas maternas de toda uma comunidade

As liacutenguas tipo pidgin de acordo com autores como Tarallo e Alkimin (1987 p

96) aleacutem de serem as liacutenguas que daratildeo origem aos crioulos (pois todo crioulo se

origina de um pidgin embora nem todo pidgin se transforme em crioulo) satildeo

associadas a atividades de comeacutercio enquanto os crioulos satildeo marcados pela

relaccedilatildeo de escravidatildeo

Quanto ao aspecto funcional as liacutenguas crioulas datildeo conta das necessidades

comunicativas totais de seus falantes nativos e usuaacuterios uma vez que a

passagem do estaacutegio de pidgin a crioulo eacute marcada por uma ampliaccedilatildeo do leacutexico

67

e de estrutura Neste caso para os estudiosos os crioulos nada mais satildeo que

pidgins enriquecidos23

O processo de evoluccedilatildeo de um pidgin em crioulo eacute descrito por Hall (1996 p 4)

em um diagrama Nele podemos ver que inicialmente o pidgin eacute configurado a

partir de um jargatildeo uma espeacutecie de pidgin instaacutevel Depois o pidgin ganha

estabilidade se configurando como um preacute-crioulo Por fim jaacute estabilizado o

pidgin se transforma em crioulo

Figura 1 Diagrama de Hall

LL = Liacutengua lexificadora ou de superstrato LS = Liacutengua de Substrato

De acordo com Hall (idem p 5) a evoluccedilatildeo do jargatildeo para o pidgin estaacutevel eacute

chamada de pidginizaccedilatildeo A evoluccedilatildeo do pidgin estaacutevel para o crioulo eacute

23

Valdman apud Tarallo e Alkimin 1987 p 96 cita um conjunto de traccedilos negativos dos crioulos franceses do Haiti de Guadalupe Martinica Reuniatildeo Mauriacutecio Seychelles e Rodrigues como i) ausecircncia de distinccedilatildeo de gecircnero ii) natildeo-obrigatoriedade de marcador de plural iii) verbos natildeo-flexionados iv) relacionamento parataacutetico no interior do sintagma nominal v) ausecircncia de hipotaxe vi) construccedilotildees passivas vii) vogais arredondadas viii) certos grupos consonantais

I = LL + LS pidgin instaacutevel jargatildeo

crioulo = III II = pidgin estaacutevel

68

denominada crioulizaccedilatildeo A volta do crioulo para o jargatildeo processo tambeacutem

possiacutevel eacute conhecido como descrioulizaccedilatildeo

Obviamente o crioulo eacute consequecircncia natural de situaccedilotildees de contato No

entanto nem todo contato linguiacutestico gera automaticamente um pidgin ou um

crioulo Os contatos podem daacute origem a fenocircmenos de mesclas diversas que

podem ou natildeo desaparecer ou serem absorvidas pelas liacutenguas presentes na

alquimia (TARALLO e ALKMIN 1987 p 103)

Quanto ao processo de desenvolvimento e de formaccedilatildeo de um pidgin e de

crioulos Hymes (1971 p 93) afirma que

A pidginizaccedilatildeo e a crioulizaccedilatildeo da linguagem natildeo satildeo processos marginais ao contraacuterio satildeo processos que ocorrem nas liacutenguas em geral Tais processos de natureza bastante complexa compreendem a ocorrecircncia de outros subprocessos os de mudanccedila A incidecircncia desses processos ocorre principalmente 1) na forma interna das liacutenguas (fala-se assim em reduccedilatildeo ou expansatildeo) 2) na forma externa das liacutenguas (daiacute se falar em amplificaccedilatildeo e complicaccedilatildeo) 3) no escopo de uso (o domiacutenio) de uma variedade linguiacutestica (fala-se assim em restriccedilatildeo ou extensatildeo)

Hymes (idem p 94) ainda explica que diferentemente da posiccedilatildeo claacutessica onde

um crioulo era oriundo (ou natildeo) de um pidgin nesta segunda proposta a

evoluccedilatildeo de um pidgin natildeo produz necessariamente um crioulo mas um conjunto

de variedades concorrentes chamada de contiacutenuo preacute-pidgin24

24

Para Hymes o contiacutenuo preacute-pidgin poderia evoluir e gerar a cristalizaccedilatildeo de um pidgin e teria autonomia enquanto sistema de comunicaccedilatildeo Com base nesta assertiva um pidgin seria o resultado de um processo que ganharia autonomia Esse pidgin constituiacutedo poderia se transformar em crioulo Mas o contiacutenuo preacute-pidgin natildeo evolui para um pidgin Torna-se possiacutevel supor a cristalizaccedilatildeo de um crioulo sem a existecircncia de um pidgin anterior (TARALLO E ALKMIN 1987 p 105)

69

Na concepccedilatildeo final deste autor o contexto inicial em que fora estabelecido o

contiacutenuo preacute-pidgin poderia alccedilar trecircs resultados aceitaacuteveis i) a cristalizaccedilatildeo de

um pidigin ii) a cristalizaccedilatildeo de um pidgin que se criouliza iii) a cristalizaccedilatildeo de

um crioulo sem necessariamente ter sido oriundo de um pidgin anterior

Tarallo e Alkimin (1987 p 106) afirma que a cristalizaccedilatildeo de um crioulo eacute apenas

uma das trecircs possibilidades para a mescla de contato que pode ser descrita da

seguinte forma i) o crioulo pode submergir ii) o crioulo pode se estabilizar sem

muitas variaccedilotildees iii) o crioulo pode se mesclar com liacutengua padratildeo oficial

De acordo com o que vimos ateacute aqui podemos descrever o processo de

hibridizaccedilatildeo linguiacutestica com base na mescla a partir dos seguintes estaacutegios i)

contiacutenuo preacute-pidgin ii) pidgin cristalizado iii) pidgin em processo de

despidginizaccedilatildeo iv) pidgin em processo de crioulizaccedilatildeo v) crioulo cristalizado vi)

crioulo em processo de descrioulizaccedilatildeo (contiacutenuo poacutes-crioulo)

333 Liacutengua Franca ou Sapir

O termo liacutengua franca refere-se agrave liacutengua de contato entre grupos ou membros de

grupos de liacutenguas distintas com finalidade para o comeacutercio Durante o Impeacuterio

Romano o grego serviu como liacutengua franca no oriente e no milecircnio seguinte o

latim no ocidente Esta liacutengua (o sapir) tambeacutem eacute conhecida como liacutengua de

marinheiro No mundo moderno o inglecircs desempenha este papel ao ser

considerado como liacutengua do comeacutercio e das ciecircncias

70

Devido agrave natureza colonizadora dos falantes suas liacutenguas serviram de liacutengua

franca em certos momentos da histoacuteria Eacute o caso do portuguecircs e do espanhol

durante a expansatildeo mariacutetima e do francecircs durante o seacuteculo VII

Trask (2004 p 167) relata que a expressatildeo lingua franca fora originadamente

utilizada para as liacutenguas dos francos francocircnio mas teve o sentido modificado

assumindo o sentido de liacutengua europeia ou liacutengua cristatilde Ele ainda assegura que

a liacutengua franca

era uma variedade de italiano fortemente suplementada com palavras derivadas do francecircs do espanhol do grego do aacuterabe e do turco que se usava como liacutengua do comeacutercio no Mediterracircneo oriental no final da Idade Meacutedia Desde entatildeo a denominaccedilatildeo aplica-se a toda liacutengua que desfruta de um amplo entre falantes de um grande nuacutemero de liacutenguas numa dada regiatildeo

No presente o termo eacute utilizado para designar uma liacutengua estabelecida haacute algum

tempo tida como materna em um grupo influente e que serve de comunicaccedilatildeo

entre os falantes de outras liacutenguas como por exemplo o papel que o inglecircs

exerce em Cingapura

Atualmente aleacutem do inglecircs inuacutemeras liacutenguas servem de liacutengua franca para

comunicaccedilatildeo entre os povos como por exemplo o tupi No entanto um caso que

merece destaque eacute o do esperanto liacutengua que vem sendo incorporada no mundo

desde a deacutecada de 80 com a finalidade de ser a liacutengua franca universal Vale

ressaltar que neste caso os interesses para que tal liacutengua se propagasse

eficientemente eacute diferente das liacutenguas francas da Idade Meacutedia uma vez que se

trata de uma liacutengua artificial criada com ideologias poliacuteticas filosoacuteficas e

religiosas

71

334 Jargatildeo

O jargatildeo eacute um pidgin instaacutevel Sua concepccedilatildeo se aproxima do sabir ou liacutengua

franca Romaine (2000 p182) faz uso desse termo para exemplificar o processo

de criaccedilatildeo de um crioulo

A simplificaccedilatildeo e a instabilidade satildeo as marcas mais salientes de um jargatildeo No

pidgin as normas satildeo mais estaacuteveis enquanto que no jargatildeo as normas natildeo satildeo

afixadas Segundo esta autora eacute a partir do jargatildeo que a mescla linguiacutestica se

configura

Figura 2 Configuraccedilotildees da Mescla Linguiacutestica segundo Romaine (2000 p185)

Tipo 1 Jargatildeo

Tipo 2 Jargatildeo

Tipo 3 Jargatildeo

Pidgin estabilizado

Pidgin estabilizado

Pidgin expandido

Crioulo

Crioulo

Crioulo

No tipo 1 o jargatildeo deu origem diretamente a um crioulo De forma diferente no 2

o crioulo natildeo se originou diretamente de um jargatildeo Este deu origem a um pidgin

estabilizado para posteriormente chegar a um crioulo No tipo 3 o jargatildeo evolui

se transformando em um pidgin estabilizado depois em um pidgin expandido ateacute

chegar a um crioulo O fato eacute que a origem nos trecircs casos estaacute em um jargatildeo

72

34 IMPLICACcedilOtildeES DO CONTATO LINGUIacuteSTICO

Todo contato resulta em processos linguiacutesticos que alteram e dinamizam as

liacutenguas do mundo que passam por transformaccedilotildees que advecircm tanto da sua

motivaccedilatildeo interna quanto da externa No que tange agraves motivaccedilotildees externas

podemos afirmar que satildeo os contatos os grandes responsaacuteveis por muitas dessas

transformaccedilotildees podendo resultar enoutros processos orirundos ou que se

assentam no contato

341 Bilinguismo

Os estudos e as correntes linguiacutesticas na sua maioria tecircm como base liacutenguas

uacutenicas ou comunidades monoliacutengues Contudo o bilinguismo ocorre amplamente

atraveacutes do mundo e permanece apresentando um leque de questionamento para

a comunidade cientiacutefica atual Embora natildeo seja de hoje o questionamento em

torno do bilinguismo25 soacute agora podemos vislumbrar o descortinar desse tema

Estudiosos do passado jaacute reconheciam a relevacircncia do fenocircmeno Jakobson

(1953) por exemplo assumiu que ldquobilingualism is for me the fundamental problem

of linguiacutesticsrdquo

Romaine (1995 p6) elenca alguns questionamentos com base no que deve ser

observado ao estudar o contato linguiacutestico

O que eacute que o desempenho dos falantes diante do processo biliacutengue nos diz

sobre a competecircncia de pessoas e das comunidades multiliacutengues

25

Do inglecircs bilingualism

73

Eacute a troca de elementos linguiacutesticos por acaso comportamento linguiacutestico e o

cacircmbio linguiacutestico aleatoacuterio

Isto eacute indicativo de fluecircncia pobre e inabilidade em uma ou ambas as liacutenguas em

outras palavras o resultado de competecircncia imperfeita

Ao contraacuterio com qual criteacuterio medimos a competecircncia dos biliacutengues

Pode-se distinguir entre troca empreacutestimo e interferecircncia linguiacutestica

Satildeo a mudanccedila de coacutedigo e o bilinguismo generalizado em uma comunidade

sinais de atrito de uma liacutengua minoritaacuteria

Satildeo os sistemas de idiomas que estatildeo disponiacuteveis para um indiviacuteduo biliacutengue

fundidos ou separados

Aleacutem desses questionamentos outros de base sociofilosoacutefica tambeacutem estatildeo

inseridos nos estudos sobre o bilinguismo Para alguns pesquisadores muitas

liacutenguas minoritaacuterias foram exterminadas devido agrave forte influecircncia e agrave troca

linguiacutestica No entanto mesmo sendo acusado por estes como um passo para o

extermiacutenio das liacutenguas minoritaacuterias o bilinguismo natildeo deve ser visto como o

responsaacutevel pela extinccedilatildeo pelo contraacuterio o estudo dele aliado ao conhecimento

metacognitivo poderatildeo contribuir para o salvamento de muitas dessas liacutenguas

ainda que no plano escrito jaacute que na oralidade muitas natildeo gozam do status de

suas liacutenguas como oficiais nas atividades sociais sendo relegadas aos rituais de

suas sociedades

O comportamento linguiacutestico de uma determinada sociedade natildeo pode servir

unicamente de paracircmetro para outras Assim se algumas comunidades

apresentam mais facilidade em absorver outra forma linguiacutestica umas tecircm maior

resistecircncia enquanto que outras convivem por centenas de anos lado a lado com

determinadas liacutenguas

74

O bilinguismo tambeacutem pode ser classificado como social ou individual Segundo

Appel e Muysken (1986) o bilinguismo social ocorre quando em determinada

sociedade duas ou mais formas linguiacutesticas satildeo faladas quando cedo toda

sociedade se torna biliacutengue mas elas podem se tornar diferentes no que se

relaciona ao niacutevel ou forma de bilinguismo conforme figura abaixo

Figura 3 Esquema de representaccedilatildeo do bilinguismo social segundo Appel e Muysken

(1986)26

De acordo com a figura na comunidade I as duas liacutenguas satildeo faladas por dois

diferentes grupos monoliacutengues No entanto um grupo reduzido de falantes

biliacutengues seraacute necessaacuterio para fazer a comunicaccedilatildeo entre os grupos Esta forma

de bilinguismo social geralmente ocorre no periacuteodo colonial dos paiacuteses Pode-se

tomar por exemplo o Brasil quando os portugueses aqui chegaram

Em sociedades representadas pela forma II todos os falantes satildeo biliacutengues Em

paiacuteses como Aacutefrica Iacutendia e Brasil existem muitas sociedades totalmente

biliacutengues em que os falantes dominam as duas formas linguiacutesticas existentes

26

Apud Appel e Muysken (1986) p 2

75

Na forma III um grupo dessa comunidade eacute biliacutengue enquanto a outra eacute

monoliacutengue sendo este grupo na maioria das vezes a minoria Pois geralmente

o grupo biliacutengue eacute o dominante e o outro o dominado Tal circunstacircncia eacute tiacutepica

das assimetrias comuns nas relaccedilotildees entre os sujeitos do contato Situaccedilatildeo

como essa evidencia o papel da liacutengua para uma sociedade a qual pode ser

objeto de libertaccedilatildeo e tambeacutem de dominaccedilatildeo

Como dito anteriormente estas formas de bilinguismo social natildeo satildeo uniformes

nem tatildeo pouco refletem em detalhe de todas as existentes no interior das

sociedades Em muitas comunidades a situaccedilatildeo linguiacutestica eacute extremamente

complexa com mais de dois grupos e linguagens envolvidos

Com relaccedilatildeo aos aspectos linguiacutesticos o estudo do bilinguismo pode responder e

explicitar os fenocircmenos decorrentes da situaccedilatildeo do contato Fenocircmenos no

domiacutenio do leacutexico ou da sintaxe podem ser muito produtivos Entretanto podemos

considerar que eacute o niacutevel da foneacuteticafonologia que marcadamente sofre a

interferecircncia com o contato linguiacutestico

No contato duas ou mais formas linguiacutesticas podem perdurar por anos conforme

os quadros I e III na figura 3 No entanto alguns fenocircmenos linguiacutesticos podem

ocorrer paralelamente Um embate linguiacutestico pode surgir dentro dessas

comunidades linguiacutesticas e estas liacutenguas podem cambiar o leacutexico uma da outra

Sobre isso Bloomfield (1961 p 25) classifica esses empreacutestimos em iacutentimos

culturais e dialetais

76

O empreacutestimo externo ou cultural sempre eacute motivado por contatos poliacutetico sociais

e comerciais inclusive militares sempre com a dominaccedilatildeo de um dos povos Jaacute

os empreacutestimos dialetais se datildeo entre os contatos dentro de uma mesma liacutengua

satildeo as variantes regionais

O que particularmente nos interessa - o empreacutestimo iacutentimo - ocorre quando as

duas liacutenguas passam a conviverem no mesmo campo geograacutefico Dessa forma

se a liacutengua A domina a liacutengua B poderatildeo ocorrer trecircs hipoacuteteses i) B desaparece

e deixa um substrato em A ii) A desaparece e deixa um superstrato em B iii)

permanecem as duas trocando elementos na condiccedilatildeo de adstrato No entanto

natildeo devemos esquecer que as motivaccedilotildees pelas quais os falantes se apropriam

ou satildeo obrigados a se apropriarem para adquirem outra(s) liacutengua(s) extrapolam

os aspectos aqui vislumbrados

Os exemplos dados por Romaine (1995 p 2) demonstram como pode ocorrer o

cacircmbio linguiacutestico entre a liacutengua materna e a liacutengua adquirida posteriormente A

partir desses exemplos a estudiosa elenca os questionamentos mais relevantes

que deveratildeo ser observados em pesquisas que tratam da anaacutelise das

comunidades biliacutengues

(a) Kio Ke six sevem hours te school de vie spend karde ne they are speaking English all the time (Panjabi Inglecircs)

Because they spend six or seven hours a day at school they are speaking English all the time27

(b) Will you rubim off Ol man will come (Tok Pisin Inglecircs)

27

ldquoPorque eles passam seis ou sete horas por dia na escola eles estatildeo falando inglecircs o tempo todordquo

77

Will you rub [that off the blackboard] The men will come28

(c) Sano esttaacute tulla tanne ettaacute Iacutem very sick (Finlandecircs Inglecircs)

Tell them to come here that Iacutem very sick 29

(d) Kodomotachi liked it (Japonecircs Inglecircs)

The children liked it 30

(e) Won o arrest a single person (Yoruba Inglecircs)

They did not arrest a single person 31

(f) This morning I hantar my baby tu dekat babysitter tu lah (Malay Inglecircs)

This morning I took my baby to the babysitter 32

De acordo com AiKhenvald e Dixon (2006 p 2)

Se duas ou mais liacutenguas estatildeo em contato os falantes de uma tendo conhecimento da outra eles podem compartilhar traccedilos linguiacutesticos incluindo haacutebitos de pronuacutencia Historicamente todo idioma deve ter sofrido certa influecircncia de seus vizinhos O impacto do contato eacute mais forte e mais faacutecil de ser discernido em alguns idiomas enquanto em outros eacute mais fraco

O que fora dito acima pode ser comprovado em qualquer comunidade em que a

liacutengua do colonizador fora imposta durante o ato de conquista ou de contato Em

algumas comunidades a situaccedilatildeo de bilinguismo eacute motivada por outras

28

ldquoVocecirc esfregaraacute [o quadro-negro de fora] Os homens viratildeordquo 29

ldquoChame-os aqui que eu estou muito doenterdquo 30

ldquoAs crianccedilas gostam dissordquo 31

ldquoEles natildeo prenderam uma uacutenica pessoardquo 32

ldquoEsta manhatilde eu ocupei meu bebecirc agrave babaacuterdquo

78

necessidades que se fazem presente nessa sociedade O portuguecircs eacute a liacutengua de

contato que eacute utilizada por todos os membros em situaccedilotildees diaacuterias e em contatos

com a comunidade externa Enquanto a liacutengua interna eacute utilizada em seus rituais

e eacute utilizada em contexto familiar que exige mais aproximaccedilatildeo familiar entre os

membros 33

342 Diglossia

O processo de diglossia pode ser compreendido conforme Dubois et all (1998 p

190) como i) situaccedilatildeo de bilinguismo ii) situaccedilatildeo biliacutengue na qual uma das

liacutenguas eacute de status sociopoliacutetico inferior iii) aptidatildeo que tem um indiviacuteduo de

praticar corretamente outra liacutengua aleacutem da liacutengua materna

Embora seja entendida tambeacutem como uma competecircncia linguiacutestica em que o

falante de uma determinada liacutengua possa conhecer os niacuteveis formal e informal de

sua gramaacutetica para este trabalho o conceito que recorremos eacute o de diglossia

enquanto situaccedilatildeo de conviacutevio de duas ou mais liacutenguas em uma comunidade

Trata-se neste caso da utilizaccedilatildeo de uma das liacutenguas como liacutengua oficial

enquanto a outra fica a cabo das situaccedilotildees de conviacutevio Geralmente a liacutengua do

dominador eacute a liacutengua das relaccedilotildees comerciais a outra eacute utilizada nos rituais ou no

seio das famiacutelias (comunidade)

Devido agraves colonizaccedilotildees e agrave globalizaccedilatildeo a diglossia eacute muito comum no mundo

poacutes-moderno Em paiacuteses que foram colocircnias portuguesas como Moccedilambique e

33

Como exemplo podemos citar o que ocorre com o Fulni-ocirc Conforme COSTA1993 p 58

79

Timor Leste por exemplo o Portuguecircs eacute a liacutengua oficial enquanto as liacutenguas

nativas satildeo conservadas no acircmbito familiar e em ciclos informais Assim como

nas comunidades mais desenvolvidas o aprendizado de mais de uma segunda

liacutengua faz com que as comunidades se tornem pluriliacutengues

Por causa desta competecircncia linguiacutestica em que o sujeito passa a dominar dois

ou mais coacutedigos o conceito de diglossia fora ampliado agraves comunidades

monoliacutengues Neste caso entende-se que o sujeito pode ser bi- ou multiliacutengue

fora e dentro da sua proacutepria liacutengua34

Para Ferguson (1991 p 5) a diglossia eacute

Uma situaccedilatildeo linguiacutestica relativamente estaacutevel em que junto aos dialetos primaacuterios da liacutengua (que podem incluir a variante padratildeo ou as normas regionais) haacute um dialeto muito divergente altamente codificado (muitas vezes bastante complexo gramaticalmente) sobrepondo-se agrave variedade Eacute o veiacuteculo de um grande e respectivo corpo de literatura escrita tanto de periacuteodo anterior ou de outra comunidade de fala eacute aprendido atraveacutes da educaccedilatildeo formal usado na escrita e na fala em contextos formais mas natildeo eacute usado em qualquer uma das seccedilotildees de comunidade para conversaccedilatildeo coloquial

Fishman (1967 p 8) afirma que a diglossia eacute gradual e variaacutevel Para ele o

conceito de diglossia estaacute ligado ao aspecto social enquanto o bilinguismo ao

individual Dessa forma a relaccedilatildeo entre bilinguismo e diglossia na situaccedilatildeo do

contato pode se dar das seguintes formas i) diglossia e bilinguismo atuando

juntos ii) bilinguismo sem diglossia iii) diglossia sem bilinguismo e iv) nem

diglossia nem bilinguismo

34

Crystal (1985 p 82) discorre que em geral os sociolinguistas se referem a uma variedade alta (A) e outra baixa (B) correspondendo grosso modo a uma diferenccedila de formalidade A variedade alta eacute apreendida na escola costuma ser usada nos locais cuja formalidade eacute maior A variedade baixa eacute usada em outros ambientes relativamente informais

80

O referido autor complementa afirmando que

O bilinguismo sem a diglossia tende a ser transicional tanto em termos de repertoacuterios linguiacutesticos de comunidade de fala como em termos das variedades de fala envolvidas per si Sem separar no entanto as normas complementares e valores para estabelecer e manter a separaccedilatildeo funcional das variedades de fala aquela liacutengua ou variedade que seja o bastante favoraacutevel para ser associada ao movimento predominante das forccedilas sociais tende a substituir a(s) outra (s) (idem p7)

No caso dos Latundecirc a diglossia se configura como um processo em que os

falantes foram obrigados a aprender a liacutengua dos brancos utilizando-a nas

atividades em contexto de contato com o natildeo iacutendio No entanto o grupo conserva

a liacutengua original nos rituais e no reduto familiar como fora explicado

anteriormente 35

343 Alternacircncia de coacutedigo36

O processo de diglossia quando eacute configurado entre duas liacutenguas distintas resulta

em bilinguismo O bilinguismo abordado no item 231 pode ser analisado de

diversos pontos de vista mas um em especial que seraacute tratado neste toacutepico eacute a

alternacircncia de coacutedigo ou code-switching Trata-se de um processo linguiacutestico

inerente ao falante biliacutengue desenvolto ou natildeo na liacutengua que aprendera como

segunda liacutengua no caso do biliacutengue ou da terceira por diante como nos

pluriliacutengues

35

Vale ressaltar que atualmente devido agrave incorporaccedilatildeo da cultura do branco os Latundecirc estatildeo

falando mais frequentemente o Portuguecircs em diversas situaccedilotildees de comunicaccedilatildeo ateacute mesmos nas mais informais Isso se deve ao fato de as geraccedilotildees mais novas serem menos conservadoras e resistentes ao contato 36

Tratamos tambeacutem deste processo ao discorremos sobre o bilinguismo na seccedilatildeo 231

81

Dessa forma o falante biliacutengue ao se comunicar com outro falante que detenha

suas mesmas liacutenguas poderaacute fazer escolhas linguiacutesticas dentro de cada coacutedigo

ou alternando os coacutedigos Por isso os pesquisadores dizem que o falante biliacutengue

apresenta um comportamento proacuteprio em seu processo de interaccedilatildeo que eacute a

utilizaccedilatildeo do code-switching que se caracteriza por ser uma estrateacutegia de

adequaccedilatildeo interativa desejaacutevel e favoraacutevel do ponto de vista pragmaacutetico Este

processo constitui um processo de ativaccedilatildeo e desativaccedilatildeo de uma ou de outra

liacutengua

Para Auer (1999 p 46)

O termo code-switching reserva-se para os casos em que a justaposiccedilatildeo dos dois coacutedigos eacute percebida e interpretada como um ato localmente significativo pelos participantes Contrapotildee-se assim ao code-switching tambeacutem denominado language mixing (mistura de coacutedigo ou de liacutenguas) em que a justaposiccedilatildeo dos coacutedigos tem significaccedilatildeo para os participantes em sentido mais global sendo um padratildeo recorrente de comunicaccedilatildeo

Um falante biliacutengue decide primeiramente qual deveraacute ser a liacutengua de base para

ser utilizada com o outro falante que domina suas liacutenguas tambeacutem e a partir daiacute

decide se faraacute uso ou natildeo do code-switching eacute o que afirma Grosjean (1982 p

127) a partir do esquema abaixo

82

Figura 4 Escolha de liacutengua e code-switching conforme Grosjean (1982 p127)

Conforme o esquema acima o falante biliacutengue apresenta competecircncia linguiacutestica

para se comunicar tanto com um falante monoliacutengue quanto outro biliacutengue Ao se

comunicar com o falante monoliacutengue o referido falante biliacutengue faraacute a escolha de

uma liacutengua A ou a liacutengua B Neste caso natildeo poderaacute fazer uso das duas No

processo comunicativo com outro falante biliacutengue ele poderaacute utilizar a liacutengua A

com ou sem alternacircncia com a liacutengua B Ou utilizar a liacutengua B com ou sem

alternacircncia com a liacutengua A O que determina tais escolhas satildeo as vantagens e

desvantagens do cacircmbio linguiacutestico

Neste trabalho natildeo trataremos diretamente do code-switching por entendermos

que nos desviariacuteamos do objetivo basilar desta pesquisa que eacute o enfoque nos

segmentos foneacuteticos Outro aspecto seria o fato de os falantes latundecirc soacute

apresentarem a alternacircncia de coacutedigo durante as narrativas discorridas nas

83

entrevistas quando solicitados para que narrassem os acontecimentos e lendas

do seu povo

344 Morte da liacutengua

O contato linguiacutestico eacute um processo tambeacutem poliacutetico cujas consequecircncias podem

ser apenas o de mixagem ou mais intensamente a morte da liacutengua Muitas

vezes o contato eacute tatildeo devastador que extermina as liacutenguas minoritaacuterias trata-se

de um verdadeiro glotociacutedio37

Para Mcmahon (1994 p 228) a morte de uma liacutengua

Envolve essencialmente uma transferecircncia de obediecircncia de parte de uma populaccedilatildeo a partir de uma liacutengua que foi nativa na aacuterea para uma liacutengua mais recentemente introduzida na qual a populaccedilatildeo indiacutegena tornou-se biliacutengue A nova linguagem eacute geralmente falada nativamente por falantes mais potentes que podem tambeacutem ser mais numerosos e normalmente eacute associada pelos falantes da liacutengua minoritaacuteria com a riqueza prestiacutegio e progresso a liacutengua minoritaacuteria eacute entatildeo efetivamente abandonada por seus falantes tornando-se apropriada para uso em cada vez menor (e menor) contexto ateacute que seja inteiramente suplantada pela liacutengua que estaacute entrando

Dubois et all (1998 p 422) afirma que uma liacutengua morta eacute uma liacutengua que deixou

de ser falada mas cujo estatuto numa comunidade sociocultura eacute agraves vezes

desempenhar ainda um papel no ensino nas cerimocircnias rituais etc como o

latim

Para Trask (2004 p 200) a liacutengua eacute considerada moribunda ou estaacute prestes a

morrer quando o resultado de morte eacute praticamente inevitaacutevel Segundo o autor

37

Calcula-se que no iniacutecio da colonizaccedilatildeo portuguesa existiam aqui cerca de 1200 liacutenguas que

apoacutes anos de ocupaccedilatildeo de territoacuterio se resume a 180 Conforme Rodrigues 2002 p19 muitas delas estatildeo moribundas e carecem ser catalogadas

84

a cabo de uma ou duas geraccedilotildees ningueacutem mais seraacute capaz de falar esta liacutengua

pura e simplesmente Eacute a morte da liacutengua que resulta do processo denominado

substituiccedilatildeo da liacutengua

Ao dar continuidade ao seu argumento o referido autor assegura que a morte de

uma liacutengua eacute um processo gradual Assim exemplifica o pesquisador

em um dado lugar em um determinado momento algumas crianccedilas ainda estatildeo aprendendo - como sua liacutengua materna - a liacutengua que estaacute morrendo enquanto outras a estatildeo aprendendo apenas imperfeitamente e outras ainda natildeo estatildeo aprendendo de maneira nenhuma A liacutengua pode desaparecer por completo em certas aacutereas e sobreviver em outras Idem p 201

Ainda segundo Trask ibidem satildeo caracteriacutesticas da morte de uma liacutengua i) a

perda das irregularidades ii) a queda em desuso das formas e dos esquemas de

construccedilatildeo sentencial mais complexos ou menos frequente iii) a substituiccedilatildeo

maciccedila das palavras nativas por palavras tiradas da liacutengua de prestiacutegio iv) a

mudanccedila de pronuacutencia que se torna mais proacutexima da liacutengua de prestiacutegio v) a

perda da variaccedilatildeo estiliacutestica que leva agrave sobrevivecircncia de um uacutenico estilo

invariaacutevel

Nem sempre a morte de uma liacutengua estaacute diretamente ligada a aspectos

linguiacutesticos Cristoacutefaro-Silva (2002 p 56) elenca trecircs aspectos natildeo linguiacutesticos

que contribuem para a aniquilaccedilatildeo de uma liacutengua O primeiro diz respeito ao fato

de o pesquisador natildeo poder investigar o processo de morte devido agrave presenccedila de

uns poucos falantes da liacutengua O segundo trata da opressatildeo poliacutetica imposta aos

falantes que neste caso deixam de falar a liacutengua para natildeo serem perseguidos E

85

o terceiro ocorre quando a liacutengua eacute mantida apenas em rituais em que os falantes

natildeo sabem mais o teor semacircntico do que verbalizam

Natildeo diferente do aqui fora apresentado a situaccedilatildeo da liacutengua Latundecirc eacute bastante

delicada uma vez que a comunidade passou por diversos transtornos que

impactaram a forma como se organizavam socialmente O nuacutemero de nuacutemero de

falantes diminuiu e consequentemente a liacutengua se encontra altamente

ameaccedilada O portuguecircs sendo a liacutengua dominante de prestiacutegio e funcional para

a relaccedilatildeo com o mundo natildeo indiacutegena ganha espaccedilo crescente entre os Latundecirc

Esta eacute a situaccedilatildeo natildeo soacute do Latundecirc mas de vaacuterios grupos indiacutegenas

86

4 COMUNIDADE DE ESTUDO OS LATUNDEcirc

Que gente eacute essa que fala idioma tatildeo diferente das liacutenguas conhecidas tatildeo diferente da liacutengua dos seus mais proacuteximos vizinhos

que tem costumes tatildeo estranhos aos que vivem perto que natildeo conhece os objetos essenciais da vida dos seus companheiros de sertatildeo

De onde veio Por onde passou que natildeo deixou rastros Quando chegou agravequelas matas onde vive haacute tanto tempo

Que ligaccedilotildees tem com os outros filhos do Brasil Roquete-Pinto (1975 p121)

41 INTRODUCcedilAtildeO

Discorremos neste capiacutetulo sobre o povo Latundecirc e a sua comunidade descriccedilatildeo

contexto histoacuterico cultural e geograacutefico desta etnia Histoacuteria do contato conflitos

internos e externos dificuldades enfrentadas pelo grupo ao longo de sua

existecircncia denominaccedilatildeo acesso hierarquia social padratildeo e constituiccedilatildeo familiar

contatos intereacutetnico bilinguismo e ensino na aldeia

42 A FAMIacuteLIA NAMBIKWAacuteRA38 39 40

Os Nambikwaacutera41 satildeo conhecidos na etnologia brasileira por terem sido

oficialmente contatados pelo Marechal Rodom e por terem sido estudados por

Leacutevi-Strauss De origem Tupi o vocaacutebulo Nambikwaacutera eacute o resultado da fusatildeo dos

38

Os Nambikwara se auto denominam Anunsu Conforme Price amp Cook Jr The Nambikwara call

themselves aacute nu suacute people This name written anunzecirc has apereared throughout the literature but has been erroneously thought to be a band name (1969 p 690) 39

Os Nambikwra satildeo famosos na etnologia brasileira por terem sido oficialmente contatados pelo Marechal Rodom e por terem sido estudados por Leacutevi-Strauss 40

Os Nambikwara natildeo estatildeo ligados aos troncos Tupi e Macro-Jecirc Trata-se de uma famiacutelia linguiacutestica isolada com caracteriacutesticas especiacuteficas que natildeo se enquadra em nenhum desses dois grupos 41

Leacutevi-Strauss (1946 p 139) afirma que se trata de uma palavra Tupi e que deve ser escrita como Nhambikwara

87

termos ldquonambirdquo que significa ldquoorelhardquo e ldquokuarardquo cujo significado eacute ldquoburacordquo

Portanto Nambikwaacutera42 eacute ldquoburaco de orelhardquo

Coforme Leacutevi-Strauss (1946 p 48)

The name Nambikwra was mentioned for the first time and only by hearsay by Antonio Pires de Campos in the beginning of the 18th century Since then it appeared several times with reference to an unknown tribe located on the headwaters of Tapajoz There is a great discrepancy between the different spellings When General Candido Mariano da Silva Rondon began to explore the land between the Tapajoz and Gi-Parana in 1907 he met with unknown group of a unknown language and he did not hesitate to identify them with the tribe often mentioned in the early documents It was at that time that the name Nhambikwara was

definitely adopted its spelling fixed and that it was recognized as a Tupi nickname the meaning of which is big ears

A famiacutelia Nambikwara eacute dividida em dois grandes grupos aleacutem de outra

remanescente conforme figura abaixo

Figura 5 Classificaccedilatildeo das liacutenguas da Famiacutelia Nambikwaacutera de acordo com Rodrigues

(1986 p 134)

42

Seguimos neste trabalho a orientaccedilatildeo da Associaccedilatildeo de Antropologia Brasileira que em 1953

estabeleceu a fim de padronizar os nomes dos povos indiacutegenas do Brasil com o intuito de facilitar os estudos etnograacuteficos e Linguiacutesticos a nomenclatura padratildeo

88

Conforme figura acima o povo Latundecirc faz parte da famiacutelia Nambikwaacutera que se

divide em Nambikwaacutera do Norte Nambikwaacutera do Sul e Sabanecirc Os Latundecirc

juntamente com os Lakondecirc os Tawandecirc os Mamaindecirc e os Negarotecirc

pertencem ao grupo Nambikwaacutera do Norte Jaacute o Nambikwaacutera do Sul eacute composto

pelos povos Galera Kabixi Munduacuteka e Nambikwaacutera do Campo cada um

correspondendo a um complexo dialetal O Sabanecirc eacute uma liacutengua agrave parte por se

acreditar que natildeo haacute muitas semelhanccedilas entre as estruturas linguiacutesticas dessa

liacutengua e as demais liacutenguas desse grupo

Situado na aacuterea entre os rios Juruena e Comemoraccedilatildeo o territoacuterio consta do

registro de muitos autores Roquete-Pinto (1919) Leacutevi-Strauss (1946) Price e

Cook (1969) Price (1977) Mas eacute de Roquete-Pinto (1919) e Price (1983) a

exposiccedilatildeo mais aceita Em ambos os limites geograacuteficos desses povos satildeo

relatados da seguinte forma pelo Rio Papagaio (sul) pelo rio Gi-Paranaacute (norte)

pelo rio Tapajoacutes (leste) e pelo rio Guaporeacute (oeste)

Figura 6 Localizaccedilatildeo e aacuterea dos Nambikwaacutera de acordo com Roquete-Pinto (1919)

89

De acordo com a FUNAI43 os dados atuais indicam que os Nambikwaacutera hoje

com cerca de dois mil iacutendios estatildeo distribuiacutedos em seis Terras indiacutegenas (TI)

vivem no sudoeste do Mato Grosso e aacutereas proacuteximas de Rondocircnia entre a

floresta amazocircnica e o cerrado

Figura 7 Territoacuterio Nambikwaacutera descrito por Price (1983)

No que tange ao conhecimento desses povos eacute de meados do seacuteculo XVIII que

obtemos os primeiros contatos com os Nambikwaacutera Foi Luiz Pinto de Souza

Coutinho terceiro capitatildeo geral do Estado do Mato Grosso o organizador de uma

expediccedilatildeo pelas margens do Rio Guaporeacute com o propoacutesito de abrir caminhos

entre a capital de entatildeo Proviacutencia de Mato Grosso e o Forte Braganccedila

43

Fundaccedilatildeo Nacional do Iacutendio

90

Os relatos histoacutericos nos mostram que era prioridade do Governo Militar apoacutes a

Proclamaccedilatildeo da Repuacuteblica em 1889 a integraccedilatildeo de todas as terras brasileiras

Uma das accedilotildees dessa integraccedilatildeo foi a determinaccedilatildeo do governo em construir

linhas telegraacuteficas em terras indiacutegenas da Amazocircnia com o propoacutesito de interligar

o Rio de Janeiro a Cuiabaacute Agrave frente dessa empreitada estava o Major Antonio

Gomes Carneiro e entre a comitiva o seu aluno Cacircndido Mariano da Silva

Rondon

Eacute Rodon o principal agente de contato entre os iacutendios Nambikwaacutera e os natildeo

iacutendios Pois como eacute sabido dele partia o discurso de apaziguamento entre o

contato preferindo antes de qualquer coisa ser atingido a atingir os silviacutecolas

Aleacutem da motivaccedilatildeo de expansatildeo para a implantaccedilatildeo das linhas telegraacuteficas

Rondon era conduzido por um desejo ardente de respeito e proteccedilatildeo aos povos

daquela regiatildeo

Dessa forma os iacutendios Nambikwaacutera estavam entre os indiacutegenas que ajudaram a

comissatildeo do governo a alcanccedilar os lugares mais hostis Este encontro entre

indiacutegenas e brancos culminou em invasotildees e conflitos entre povos aleacutem das

doenccedilas que foram trazidas pelos natildeo indiacutegenas por isso a extinccedilatildeo de vaacuterias

tribos e povos aleacutem do prejuiacutezo linguiacutestico resultante da aculturaccedilatildeo dos

indiacutegenas frente agrave presenccedila do natildeo iacutendio uma vez que para que ocorresse o

processo de interaccedilatildeo os indiacutegenas se viram obrigados a aprender o portuguecircs

O contato entre os grupos Nambikwaacutera natildeo se deu de forma paciacutefica Os

Nambikwaacutera do Norte natildeo foram receptivos e os planos dos governos foram

frustrados De forma diferente o contato com os Nambikwaacutera do Sul se deu de

91

forma mais intensa Mesmo apoacutes os constantes conflitos o contato perdurou por

mais tempo que com os do Norte acarretando mudanccedilas culturais de costumes e

da liacutengua

Telles (2002 p 10) afirma que

Do grupo linguiacutestico do Norte hoje restam apenas remanescentes de cinco etnias Tawandecirc Lakondecirc Mamaindecirc Negarotecirc e Latundecirc Destes os trecircs uacuteltimos permanecem em aacutereas proacuteximas de seus territoacuterios tradicionais e se preservam enquanto grupos relativamente autocircnomos Estes povos natildeo habitavam tradicionalmente a regiatildeo norte do territoacuterio Nambikwaacutera e esse fato pode ter favorecido a sua independecircncia grupal ao longo do percurso histoacuterico

Figura 8 Localizaccedilatildeo atual dos Nambikwaacutera

Como consequecircncia do contato no final do seacuteculo XX a populaccedilatildeo desses povos

foi reduzida a mais ou menos 650 sendo 50 deles crianccedilas Price (1985 p 312)

92

chama a atenccedilatildeo para o processo de aculturaccedilatildeo pois para as crianccedilas ldquoseria

mais confortaacutevel falar portuguecircs que a liacutengua dos seus paisrdquo44

Ainda com relaccedilatildeo agrave classificaccedilatildeo linguiacutestica alguns estudiosos utilizam

classificaccedilotildees diferentes para organizar os povos Nambikwaacutera A divisatildeo claacutessica

de Leacutevi-Strauss (1948) distribui os Nambikwaacutera de acordo com a aproximaccedilatildeo

linguiacutestica que haacute entre eles Para ele haacute trecircs grupos principais que se subdividem

formando cinco unidades constituiacutedas por vaacuterios dialetos de uma mesma liacutengua

Price e Cook (1969) em trabalho posterior sugerem outra classificaccedilatildeo para a

famiacutelia Nambikwaacutera Para eles haacute dois grandes grupos os Sabanecirc e os

Nambikwaacutera Entretanto embora o Sabanecirc natildeo seja compreensiacutevel para os

outros grupos linguiacutesticos por razotildees estruturais Price (1972) com base num

estudo comparativo considera o Sabanecirc como integrante da famiacutelia linguiacutestica

Nambikwaacutera Para uma visualizaccedilatildeo das propostas de Leacutevi-Strauss e de Price e

Cook apresentamos as respectivas classificaccedilotildees nas tabelas a seguir

Quadro 2 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Leacutevi-Strauss (1948)

44

ldquofifty were children who are probably more comfortable speaking Portuguese than the languages of their parents

Grupo a

Grupo b

Grupo c

Subgrupo a1

Subgrupo a2

Subgrupo b1

Subgrupo b2

Oakleacutetosu

Haloacutetesu

Kiaaacuteru

Kuritsu

Soaacutelesu

Kodaacuteteli

Munuacutekoti

Nikedeacutetosu

Taruacutende

Maimatildende

Toatildende

Ioacutelola

Naseacutelate

Lakotildende

Sovaacuteinte

Sabaacutene

93

Quadro 3 Classificaccedilatildeo dos Nambikwaacutera segundo Price e Cook (1969)

Leacutevi-Strass natildeo aponta os Latundecirc como pertencente ao grupo Nambikwaacutera

devido ao natildeo contato com este povo que soacute fora inicialmente descobertos

(contatados) em 1975 pelos Aikanaacute conforme veremos a seguir

43 OS LATUNDEcirc

O povo Latundecirc pertencente ao Nambikwaacutera do Norte habita uma aacuterea de

116613671 hec no municiacutepio de Chupinguaia na regiatildeo sudoeste do estado de

Rondocircnia Com eles convivem outros dois grupos que natildeo possuem nenhum

Navaacuteite

Taiate

Nambikwaacutera

Sabanecirc

Do Norte

Do Sul

Latundecirc

Lakundecirc

Tawandecirc

Mamaindecirc

Negarotecirc

Vale do Jurema

Vale do Guaporeacute

Vale do Sarareacute

Haloteacutesu

Kithaulhu

Sawenteacutesu

Wakalitesu

Wasusu

Sarareacute

Alacircntesu

Waikisu

Hahatildetesu

94

grau de parentesco linguiacutestico Satildeo os Aikanaacute e os Kwazaacute que fazem parte da

Terra Indiacutegena (TI) Tubaratildeo-Latundecirc45

No mapa abaixo pode-se obervar a localizaccedilatildeo da TI Tubaratildeo-Latundecirc que se

situa entre a RO 370 e a BR 364

Figura 9 Localizaccedilatildeo da TI Tubaratildeo-Latundecirc46

A reserva estaacute localizada a oeste do municiacutepio de Vilhena Nela haacute trecircs vilas Rio

do Ouro Barroso e Gleba (tambeacutem conhecida como Tubaratildeo) Gleba eacute a que

conteacutem a maior populaccedilatildeo mista De faacutecil acesso pode ser adentrada pela cidade

de Chupinguaia que fica a 19 km da TI Rio do Ouro possui uma populaccedilatildeo

exclusivamente Aikanatilde e estaacute a 20 km da Gleba Barroso conteacutem a menor

populaccedilatildeo e corresponde a uma aacuterea de ocupaccedilatildeo esparsa em que se distribuem

45

Conforme Anonby the Tubaratildeo-Latundecirc Indian Reserve is inhabited by people from several tribes the tree main linguistically-unrelated Aikanatilde (also known as Tubaratildeo) Kwazaacute and Latundecirc 2009 p3 46

Inicialmente estes povos ocupavam uma aacuterea de ricas florestas no oeste do rio Pimenta Bueno

proacuteximo a uma pequena vila denominada de Satildeo Pedro

95

remanescentes Kwazaacute Aikanaacute e Latundecirc A meacutedia de distacircncia do Barroso para a

Gleba eacute de aproximadamente 25 km O acesso se daacute por uma estrada

parcialmente carroccedilaacutevel de difiacutecil locomoccedilatildeo

Com relaccedilatildeo agrave populaccedilatildeo de cada povo Anomby (2009 p5) afirma que o

quantitativo total de pessoas eacute de 219 iacutendios Deles 175 satildeo Aikanatilde 25 satildeo

Kwazaacute e 19 satildeo Latundecirc Haacute ainda 189 iacutendios distribuiacutedos por outras localidades

fora da TI 47

Quadro 4 Distribuiccedilatildeo dos povos pertencentes a TI Tubaratildeo-Latundecirc

TI Rio do Ouro 67

Gleba 48

Barroso 34

Outras localidades

Satildeo Pedro 18

Vilhena 15

Chupinguaia 7

Total 189

Durante muitos anos os Latundecirc os Kwazaacute e os Aikanatilde viveram em contato com

grupos vizinhos como os Kanoecirc Mekens Sakirap Tupariacute Salamatildei entre outros

povos que tecircm sido acolhidos pela populaccedilatildeo local da TI Mesmo com diferentes

liacutenguas eles se relacionavam com festivais e casamentos intergrupais A cultura

desses povos tornou-se muito similar devido ao contato intenso entre eles De

acordo com Anomby (2009 p 6) os traccedilos mais comuns entre este povos

incluem cestas de fibra de marico casas em forma de colmeia para

47

Em conversa com os professores desses povos Anomby Idem natildeo afirma os motivos pelos

quais tais iacutendios estatildeo afastados dos demais

96

aproximadamente dez famiacutelias bebida de milho fermentado canibalismo e

divisatildeo de clatildes

Quanto ao contato sabe-se que foram os iacutendios Aikanaacute os primeiros a contatarem

com os Latundecirc Price (1977 p 72 - 73) descreve que o entatildeo Capataz Rural

Jorge Falcatildeo fora informalmente designado encarregado da operaccedilatildeo de contato

No ano de 1976 acompanhado por cinco iacutendios Aikanaacute e um serigueiro apoacutes

cinco dias de intensa caminhada ocorreu o encontro com os Latundecirc Neste

primeiro momento o desconhecido povo tremia de medo mas se posicionaram

ainda que fragilmente na linha de defesa Apoacutes dormirem no campo o capataz e

demais membros da excursatildeo conseguiram no outro dia um contato comprovado

por poucas fotografias com o povo Latundecirc Jorge descreveu que tais iacutendios natildeo

conseguiram se comunicar com os Aikanaacute e que eram em nuacutemero de 10 homens

e 8 crianccedilas afora poucas crianccedilas que afirma natildeo tecirc-las visto

A FUNAI em 1977 com a ajuda do Capataz Rural realizou uma nova excursatildeo

aos iacutendios Latundecirc Desta vez aleacutem de Jorge juntos a ele estavam presentes

David Price e dois iacutendios Nambikwara do Norte (Lakondecirc) que conseguiram

identificar os Latundecirc como tambeacutem pertencentes agrave etnia Nambikwara do Norte

Foram mensurados como uma aldeia composta por oito casas e dezenove

habitantes 48

48

Para uma descriccedilatildeo mais detalhada ver Telles 2002 p17

97

Figura 10 Primeiros contatos com os Latundecirc (Foto Price 1977)

Em 1999 o povo era composto por vinte pessoas Entre 1999 e 2000 a grupo ficou

ainda menor com a saiacuteda de trecircs dos membros Faacutetima (irmatilde de Terezinha49)

Batataacute (a anciatilde do grupo) e Joatildeo (irmatildeo solteiro de Terezinha) As crianccedilas e os

jovens do grupo satildeo na sua maioria parentes consanguiacuteneos De acordo com as

relaccedilotildees de parentesco os mais novos natildeo poderatildeo coabitar entre si o que

implica a natildeo autonomia e a natildeo perpetuaccedilatildeo do grupo Latundecirc

49

Trata-se de a informante deste projeto de pesquisa

98

Quadro 5 Nuacutecleos familiares de acordo com a habitaccedilatildeo em 199950

Casa 1

Pais Filhos Agregados

Maneacute Torto (60) Terezinha (45)

Luiz (22) Antocircnio (20) Lorena (12) Catarino (10) Justino (8) Jaelson (4)

Joatildeo (26) Francisco (25) Irmatildeos de Terezinha

Maneacute Torto (60) Faacutetima (30)

Maria (13)

Casa 2

Joseacute (40) Lurdes (40)

Jair (13) Dido (11) Lourival (3) Lorimar (6 meses)

Cinzeiro (50) Irmatildeo de Lurdes

Casa 3 Batataacute (65)

Dados atuais51 noticiam que o grupo se enfraqueceu politicamente Tereza

mudou-se para uma aldeia de outro grupo Nambikwaacutera do Norte e Maria e Lorena

foram morar na Gleba

No que concerne agraves atividades econocircmicas a extraccedilatildeo de borracha foi a grande

atividade econocircmica na deacutecada de 30 do seacuteculo passado no sul de Rondocircnia

Durante o apogeu dessa atividade os Aikanatilde e os Kwazaacute trabalharam para

barotildees da borracha em troca de cafeacute accediluacutecar e armas de fogo

Consequentemente apoacutes aprenderem as estrateacutegias de negociaccedilatildeo na deacutecada

de 70 os proacuteprios iacutendios agora independentes passaram a vender a sua proacutepria

borracha nas cidades vizinhas (Van der Voort 1998)

50

Telles 2002 p 19 51

Informaccedilatildeo proveniente de comunicaccedilatildeo pessoal com Stella Telles janeiro de 2015

99

A comercializaccedilatildeo da borracha tambeacutem fora um pano de fundo para o processo

de bilinguismo ocorrente entre os povos dessa regiatildeo O portuguecircs se tornara

uma espeacutecie de liacutengua franca utilizada para a comercializaccedilatildeo do produto no

exterior e na interaccedilatildeo com os seringalistas Contudo as liacutenguas indiacutegenas

permaneciam sendo usadas mais provavelmente na retirada e no processamento

da borracha nas reservas52

A economia na aldeia diferentemente do que fora no passado representa a atual

situaccedilatildeo dos iacutendios Haacute pouca lavoura de subsistecircncia53 o que faz com que a

produccedilatildeo de comida seja escassa Os integrantes da aldeia quando precisam de

provimentos compram sua comida na cidade ou recebem-na dos parentes que

vivem em Rio do Ouro

Ainda de acordo com Anomby (2009 p7)

As principais fontes de dinheiro em ambas as aldeias como a maioria das aldeias no Brasil satildeo as remessas de aposentadoria para os idosos e da venda de artesanato indiacutegena aleacutem da venda de madeira e os pequenos serviccedilos prestados aos demais moradores e visitantes

No que diz respeito agrave religiatildeo atualmente a presenccedila do protestantismo eacute muito

forte na TI Tubaratildeo-Latundecirc Missionaacuterios UNIEDAS54 (iacutendios da tribo Terena)

comeccedilaram a trabalhar na aacuterea em 1980 e como resultado a maioria das

pessoas que vivem na reserva iacutendios Tubaratildeo-Latundecirc hoje se consideram

52

Neste contexto histoacuterico pode-se perceber claramente a hierarquizaccedilatildeo linguiacutestica no que tange agrave utilizaccedilatildeo da liacutengua materna Para os iacutendios jaacute ocorria o processo de contato oriundo do dominador Mesmo reconhecendo a necessidade advinda da dependecircncia econocircmica os iacutendios relutavam em manter a liacutengua matildee no interior da aldeia ou seja no seio familiar 53

Devido agrave cultura errocircnea da terra e a constante presenccedila das aposentadorias concedidas aos idosos e invaacutelidos a rotina desses povos estaacute sendo fortemente alterada 54

Uniatildeo das Igrejas Evangeacutelicas da Ameacuterica do Sul criada por missionaacuterios americanos em 1912 que eacute atualmente conduzida por lideranccedila indiacutegena

100

protestantes Os Terenas ministram suas pregaccedilotildees exclusivamente em

Portuguecircs

Uma outra famiacutelia missionaacuteria protestante pertencente agrave missatildeo ALEM55 vivem

na aldeia Rio do Ouro onde o marido Warrisson eacute um professor e sua esposa

Ana eacute uma liacuteder de igreja Eles trabalham na reserva haacute doze anos e soacute falam

Portuguecircs

Anomby (2009 p8) relata o fato de os iacutendios ainda hoje rejeitarem os esforccedilos

dos missionaacuterios da ALEM para usar o Aikanatilde na igreja

Quando Ana veio pela primeira vez a Gleba 12 anos atraacutes as pessoas disse-lhe que queria igreja em Portuguecircs e natildeo em Aikanatilde Eles especificamente disse-nos Noacutes natildeo quer um linguista Queremos algueacutem que vai fazer igreja em Portuguecircs Ana compocircs algumas canccedilotildees em Aikanatilde mas quando ela cantou para os iacutendios eles disseram que soava feio Ana pediu que as pessoas orassem em Aikanatilde mas eles sempre recusam Em um culto que participou no Rio do Ouro Ana escolheu cinco pessoas aleatoriamente para ler partes do Biacuteblia Todos foram fluentes Ana disse-nos que ateacute hoje os iacutendios nunca pediu nada em Aikanatilde - eles parecem sentir que igreja deve ser em Portuguecircs

Os Latundecirc em particular natildeo se converteram ao protestantismo Localizados

mais remotamente o difiacutecil acesso agraves igrejas existentes da Gleba e no Rio do

Ouro natildeo favoreceu ao longo de anos a frenquecircncia do Latundecirc nos cultos

A educaccedilatildeo escolar tambeacutem tem situaccedilatildeo similar entre os Latundecirc Nunca houve

escola no Barroso nas proximidades das casas dos Latundecirc Dessa forma

apenas com a ida mais sistemaacutetica dos mais jovens Latundecirc para as aldeias

Aikanaacute - sobretudo a partir do ano de 2000 - eacute que as crianccedilas Latundecirc passaram

55

Associaccedilatildeo Linguiacutestica Evangeacutelica Missionaacuteria eacute uma organizaccedilatildeo missionaacuteria fundada em 1982

sob a inspiraccedilatildeo da Wycliffe Bible Translators

101

a frequentar escola Sobre isso Anomby Idem nos relata que eacute ensinado ateacute

quarta seacuterie em todas as aldeias e a maioria dos Aikanatilde e Kwazaacute satildeo

alfabetizados em Portuguecircs Em Rio do Ouro haacute dois professores um brasileiro

que leciona em Portuguecircs e um professor biliacutengue que explica os assuntos em

Aikanatilde Trecircs moradores estatildeo terminando o ensino meacutedio dois da Gleba e um

do Rio do Ouro A liacutengua Latundecirc natildeo eacute objeto de conteuacutedo escolar

Com relaccedilatildeo agrave situaccedilatildeo linguiacutestica dos Latundecirc56 sabe-se que com exceccedilatildeo de

Maneacute Torto que eacute falante nativo de uma liacutengua Nabikwaacutera do Norte muito proacutexima

do Latundecirc o nuacutemero de falantes do Latundecirc eacute de dezenove pessoas O grupo

excetuando a Batataacute que natildeo fala portuguecircs apresenta bilinguismo em Latundecirc

Portuguecircs O bilinguismo resultante do contato que se deu em 1976 se firmou

com o contato crescente com os Aikanaacute com quem se comunicam em portuguecircs

A complexidade linguiacutestica que se instaurou entre os Latundecirc pode ser observada

na tabela seguinte

Quadro 6 Situaccedilatildeo sociolinguiacutestica dos Latundecirc (dados de 1999)

Membros

Situaccedilatildeo Social

Situaccedilatildeo Linguacuteiacutestica

Maneacute Torto (60) Liacuteder interno da tribo Natildeo Latundecirc

Cinzeiro (50)

Batataacute (65)

Membros mais velhos

da tribo

Satildeo monoliacutengues em Latundecirc

Lurdes (40) Matriarca da casa 2 Apresenta distuacuterbio de fala Eacute considerada

uma falante ruim pela proacutepria tribo Fala um

pidgin com seus filhos

Joseacute (40) Patriarca da casa 2 Fala um portuguecircs pouco claro

56

Anomby (2009 p 5) chama a atenccedilatildeo para o fato de os povos presentes na TI Tubaratildeo-Latundecirc

natildeo serem estudados extensivamente ainda Dos estudos realizados podem-se citar as pesquisas realizadas no acircmbito antropoloacutegico e no linguiacutestico Leacutevi-Strauss (1930) Lieuntenabt Zack (1942) Melatti e Price (1970) Carlson (1984) Vasconcelos (19931996) Van der Voort (19951998) e Telles (2002)

102

Jair (13)

Dido (11)

Filhos mais velhos da

casa 2

Devido ao desempenho dos pais

apresentam problemas de comunicaccedilatildeo em

ambas as liacutenguas

Lourival (3)

Lorimar (6 meses)

Filhos mais novos da

casa 2

Estatildeo em processo de aquisiccedilatildeo da

linguagem

Terezinha (45)

Matriarca da casa 1

uma das mulheres de

Maneacute Torto

Apresenta boa competecircncia comunicativa

Apesar de ser considerada biliacutengue

apresenta problemas com relaccedilatildeo agrave

compreensatildeo do Portuguecircs

Joatildeo (26)

Francisco (25)

Irmatildeos de Terezinha Falam Portuguecircs sem muita fluecircncia

Faacutetima (30)

Irmatilde de Terezinha Apresenta niacutevel de compreensatildeo muito

inferior ao da sua fala

Luiz (22)

Antocircnio (20)

Lorena (12)

Catarino (10)

Justino (8)

Jaelson (4)

Filhos de Terezinha e

Maneacute Torto

Falam um bom Portuguecircs

Maria (13) Tambeacutem fala um bom Portuguecircs

Entre 1995 e 2000 Telles (comunicaccedilatildeo pessoal em novembro de 2014) verificou

que o aprendizado do Latundecirc na comunidade eacute mais tardio do que o Portuguecircs

mesmo sendo as crianccedilas desde o nascimento expostas e estimuladas agraves duas

liacutenguas simultaneamente Na avaliaccedilatildeo subjetiva dos indiacutegenas o Latundecirc eacute uma

liacutengua mais difiacutecil sendo essa a razatildeo de as crianccedilas apresentarem melhor

desempenho no Portuguecircs Soacute em torno dos dez anos comeccedilam a utilizar com

fluecircncia o Latundecirc embora apresentem conhecimento passivo da liacutengua desde a

primeira infacircncia quando atendem com pertinecircncia aos comandos em Latundecirc

Outro fator que pode responder ao fato de a produccedilatildeo linguiacutestica ocorrer

103

primeiramente em Portuguecirc deve ser o prestiacutegio social que essa liacutengua alcanccedila

entre comunidades minoritaacuterias57

Essa situaccedilatildeo decorrente do contato linguiacutestico se daacute devido agrave mescla linguiacutestica

presente na TI e agraves necessidades de os indiacutegenas se ausentarem das terras da

TI Os povos que vivem em Rio do Ouro viajam a cidade pelo menos uma vez por

mecircs para fazer compras ou ir buscar assistecircncia meacutedica Os da Gleba se

deslocam para a cidade todos os dias quando precisam ir para a sede do

municiacutepio de Chupinguaia Dependendo da necessidade eles ficam hospedados

na casa de algueacutem conhecido ou na Casa do Iacutendio uma espeacutecie de guarita

para os iacutendios A Casa do Iacutendio mais proacutexima da TI se localiza em Vilhena

Ainda quanto ao contato linguiacutestico estudos mostram que os iacutendios do sul de

Rondocircnia tecircm o haacutebito de casar-se com iacutendios de tribos amigas Isto pode ser

comprovado com a presenccedila de palavras no leacutexico das liacutenguas em que foram

coadunadas

Conforme dados mais recentes na Gleba cerca de cinquenta por cento dos

casamentos satildeo mistos com iacutendios de outras etnias ou com natildeo iacutendios Embora

haja certa rivalidade entre os povos da Gleba e os do Rio dos Ouros o nuacutemero de

casamentos entre os iacutendios dessas duas aldeias satildeo muito frequentes

Quanto aos iacutendios Latundecirc Anomby (2009 p 9) discorre que

Os iacutendios da aldeia de Latundecirc Barroso tecircm o menor prestiacutegio e satildeo um pouco culturalmente e economicamente subjugados pelo Aikanatilde e Kwazaacute Devido agraves pequenas populaccedilotildees de Kwazaacute e Latundecirc eacute quase impossiacutevel para eles para se casar dentro de

57

Discorreremos com mais detalhes sobre o processo de bilinguismo no povo Latundecirc no trabalho proposto a ser desenvolvido

104

sua tribo Assim a sobrevivecircncia das liacutenguas e ateacute mesmo o povo como um grupo distinto eacute muito tecircnue

Devido agraves constantes necessidades de cuidado desses povos a OSCIP Creatio58

realizou estudos sobre os impactos soacutecio-antropoloacutegicos-ambientais na TI

Tubaratildeo-Latundecirc jaacute que toda regiatildeo estaacute sobre a influecircncia da PCH59 Cascata

que estaacute sendo construiacuteda no Rio Pimenta Bueno Tais estudos visam objetivar

informaccedilotildees que subsidiem a descriccedilatildeo dos possiacuteveis impactos oriundos da PCH

sobre esta TI

Figura 11 Iacutendios Latundecirc na TI Tubaratildeo-Latundecirc

Outro ponto que deve ser levado em conta ao considerar falantes biliacutengues e

monoliacutengues eacute que eles natildeo podem ser nitidamente diferenciados A avaliaccedilatildeo do

grau de bilinguismo eacute complexa dado que a sua medidade eacute escalar ou seja o

58

Organizaccedilatildeo da Sociedade Civil de Interesse Puacuteblico 59

Pequena Central Hidreleacutetrica

105

conhecimento de outra liacutengua eacute uma questatildeo de grau que vai desde 0 ateacute a

ldquoperfeiccedilatildeordquo (Van Coetesem 1988 p 9)

106

5 INTERFEREcircNCIA FONEacuteTICO-FONOLOacuteGICA DO LATUNDEcirc NO

PORTUGUEcircS

ldquoO contato linguiacutestico eacute apenas um aspecto do contato cultural e a interferecircncia linguiacutestica eacute uma face da difusatildeo lexical e aculturaccedilatildeordquo

Weinreich (1953 p 5)

51 INTRODUCcedilAtildeO

Para Thomason (2001 p 5) o contato entre liacutenguas estaacute em toda a parte muitos

paiacuteses tecircm mais do que uma liacutengua oficial e muito provavelmente a maior parte

da populaccedilatildeo mundial fala duas ou mais liacutenguas Posto dessa maneira

compreende-se que satildeo muitos os estudos que abordam sob formas aacutereas

concepccedilotildees diversas e interdisciplinares o contato linguiacutestico No que concerne agrave

linguiacutestica estes estudos satildeo de igual abundacircncia De acordo com Weinreich

(1953) grande ou pequena as diferenccedilas e similaridades entre as liacutenguas em

contato podem ser exaustivamente estabelecidas em muitos domiacutenios Todavia

quando se trata da investigaccedilatildeo do contato sob a eacutegide da fonologia e da foneacutetica

o nuacutemero destes estudos diminui consideravelmente Tal constataccedilatildeo corrobora

com a necessidade de estudos linguiacutesticos que tratem dos aspectos foneacuteticos

quando observados no contato entre liacutenguas

Por se tratar de uma sessatildeo importante para as elucidaccedilotildees dos processos

ocorridos no Portuguecircs falado pelos Latundecirc a serem discorridos no Capiacutetulo VI

descrevemos neta seccedilatildeo os segmentos das liacutenguas em anaacutelise e quais satildeos mais

suscetiacuteveis agrave influecircncia do contado linguiacutestico Devido agrave escassez de pesquisas

107

foneacuteticas fonoloacutegicas na aacuterea especificamente no Latundecirc e no Portuguecircs

Brasileiro seratildeo utilizadas como cabedal para esta anaacutelise as pesquisas de

TELLES (2002) e para a investigaccedilatildeo do inventaacuterio do sistema fonoloacutegico do

Portuguecircs a de BISOL (1996) e de SILVA (2002)

Dada a profundidade investigativa da natureza do contato cabe-nos ressaltar aqui

que o presente estudo natildeo se encarregaraacute de tratar de todas a suas nuances

visto que seu objeto estaacute delimitado quanto aos processos foneacuteticos resultantes

de tal contato

Quanto ao aporte teoacuterico seratildeo citados os trabalhos de WEINREICH (1953)

pioneiro a tratar das questotildees de interferecircncia foneacuteticas oriundas do contato entre

liacutenguas VAN COETSEM (1988) e MATRAS (2009) para elucidar os processos

ocorrentes no contato em questatildeo

52 INTERFEREcircNCIA FUSAtildeO COEXISTEcircNCIA E TRANSFEREcircNCIA

LINGUIacuteSTICA

Um dos precursores dos estudos sobre contatos linguiacutesticos Uriel Weinreich

descreve em seu livro Language in Contact (1953) os mecanismos foneacuteticos que

regem a intersecccedilatildeo existente no contato

No que concerne aos aspectos extralinguiacutesticos que regem os efeitos do contato

sobre a fala de determinado componente social Weinreich chama a atenccedilatildeo para

os fatores que estatildeo aleacutem das diferenccedilas estruturais bem como das

inadequaccedilotildees lexicais da liacutengua Segundo ele esses fatores natildeo estruturais satildeo

inerentes aos falantes que estatildeo expostos agrave situaccedilatildeo do contato por exemplo

108

a) A facilidade de o falante se expressar verbalmente e sua

debilidade de lidar coma as duas liacutenguas separadamente

b) Proficiecircncia relativa em cada liacutengua

c) Especializaccedilatildeo no uso de cada liacutengua por toacutepicos e

interlocutores

d) Forma de aprendizado em cada liacutengua

e) Atitudes para cada liacutengua se idiossincraacutetico ou estereotipado

f) A dimensatildeo do grupo biliacutengue e sua homogeneidade

sociocultural ou diferenciaccedilatildeo colapso entre subgrupos usando

uma ou outra liacutengua como sua liacutengua-matildee fatos demograacuteficos

sociais e as relaccedilotildees poliacuteticas entre esses subgrupos

g) Prevalecircncia individuais de bilinguismo com dadas caracteriacutesticas

de comportamento de fala em subgrupos em geral

h) Atitudes estereotipadas em relaccedilatildeo a cada liacutengua (prestiacutegio)

status indiacutegena ou imigrante da liacutengua em xeque

i) Atitudes em relaccedilatildeo agrave cultura de cada comunidade linguiacutestica

j) Atitudes em relaccedilatildeo ao bilinguismo como tal

k) Toleracircncia ou intoleracircncia com respeito agrave mistura linguiacutestica e

com a fala incorreta de cada um

l) Relaccedilatildeo entre o grupo biliacutengue e cada um das duas

comunidades em que ela eacute um segmento marginal (Weinreich

1953 p 4)

Um dos pressupostos baacutesicos agrave natureza do falante diz respeito ao fato de duas

ou mais liacutenguas soacute poderem estar em contato se usadas alternadamente pelas

mesmas pessoas O uso individual da liacutengua seraacute o locus do contato Quando isto

ocorre a transferecircncia de elementos foneacuteticos seraacute a motivadora pela

reorganizaccedilatildeo de todo o velho sistema de oposiccedilatildeo Ele assegura que the term

interference implies the rearrangement of patterns that result from the introduction

of foreign elements into the more highly structured domains of language such as

the bulk of the phonemic system a larger part of the morphology and syntax and

some areas of the vocabulary (p 1)60

60

O termo interferecircncia implica a reorganizaccedilatildeo de padrotildees que resultam na introduccedilatildeo de elementos no mais alto (profundo) domiacutenio de estruturas da linguagem tal como a maior parte do sistema fonecircmico uma larga parte da morfologia e sintaxe e algumas aacutereas do vocabulaacuterio

109

Quando dois sistemas satildeo confrontados no contato pode ocorrer o

reordenamento de padrotildees ou interferecircncia ou exclusatildeo Na interferecircncia

linguiacutestica o problema de maior interesse eacute a accedilatildeo reciacuteproca dos fatores

estruturais e dos natildeo estruturais ao promoverem estimularem ou impedirem cada

interferecircncia

Concernente aos ldquoMecanismos e causas estruturais de interferecircnciardquo Weinreich

idem p7 coloca que haacute um tipo de interferecircncia que eacute extremamente comum no

contato linguiacutestico trata-se da relaccedilatildeo de empreacutestimo na qual natildeo haacute uma total

transferecircncia de todos os elementos Logo percebe-se que eacute comum a

transferecircncia de parte de um sistema ou de traccedilos desse sistema fazendo com

que haja uma ldquocoexistecircncia de fusatildeo de sistemasrdquo

A coexistecircncia ou fusatildeo de sistemas linguiacutesticos pode de acordo com este

estudioso afetar a natureza de um signo linguiacutestico jaacute que esta eacute a combinaccedilatildeo

de uma unidade de expressatildeo e uma de conteuacutedo Neste niacutevel de bilinguismo ou

de interferecircncia de sistemas pode-se entendender que a relaccedilatildeo de significado e

significante natildeo se daacute de maneira uniacutevoca

Diante da complexidade que eacute a transferecircncia linguiacutestica a ilustraccedilatildeo por ele

adotada eacute a de que a interferecircncia eacute como areia carregada por um fluxo de aacutegua

Na liacutengua ela estaacute sedimentada no fundo de um lago E este fenocircmeno se daacute em

todos os niacuteveis da gramaacutetica p 11

Ao tratar dos tipos de interferecircncia nos sistemas foneacuteticos Weinreich afirma que

The problem of phonic interference concerns the manner in which a speaker perceives and reproduces the sounds of one

110

language which might be designated secondary in terms of another to be called primary Interference arises when a bilingual identifies a phoneme of the secondary system with one in the primary system and in reproducing it subjects it to the fonetic rules of the primary language (1953 p 15)61

Neste caso a interferecircncia resulta quando um falante identifica na segunda liacutengua

elementos foneacuteticos presentes na primeira liacutengua Ao reproduzir o segmento o

falante o sujeita agraves regras foneacuteticas da primeira liacutengua a liacutengua matildee

Ao prosseguir Weinreich tambeacutem aponta dois tipos de interferecircncia a partir do

quadro comparatoacuterio entre os sistemas linguiacutesticos do Romansh62 e do

Schweizerdeutsch63 liacutenguas coexistentes no Cantatildeo de Grisons na Suiacuteccedila No

primeiro caso o sistema foneacutetico do Romansh se configura como o sistema

primaacuterio e o Schweizerdeutsch como secundaacuterio No segundo caso os sistemas

satildeo alternados o sistema foneacutetico do Schweizerdeutsch assume o lugar do

sistema primaacuterio e o Romansh o secundaacuterio

61

O problema da interferecircncia foneacutetica consiste na maneira como o falante percebe (reconhece) e reproduz os sons de uma liacutengua que pode ser designado secundaacuterio em outros termos primaacuterio A interferecircncia surge quando um biliacutenguumle identifica um fonema do sistema secundaacuterio com um no sistema primaacuterio e em reproduzi-lo sujeitando-o agraves regras foneacuteticas da primeira liacutengua 62

Eacute uma das quatro liacutenguas nacionais da Suiacuteccedila juntamente com a liacutengua alematilde a liacutengua italiana e a liacutengua francesa Trata-se de uma liacutengua romacircnica do ramo ocidental que se acredita descender do latim vulgar falado pelos romanos que ocuparam a aacuterea na Antiguidade 63

Eacute qualquer um dos dialetos alemacircnicos falados na Suiacuteccedila no Liechtenstein e nas zonas fronteiriccedilas da Aacuteustria

111

Quadro 7 Quadro Comparativo dos Sistemas Foneacuteticos do Romansh e do

Schweizerdeutsch de acordo com Weinreich (1953)

Mais adiante seraacute observada a influecircncia do Latundecirc no Portuguecircs Desta forma

o Portuguecircs mesmo sendo a segunda liacutengua adquirida seraacute visto como o objeto

influenciado do contato linguiacutestico

112

Quando observou o contato entre os dois sistemas linguiacutesticos em voga

Weinreich (idem p 18 e 19) examinou o processo de interferecircncia representado

no segundo sistema fonecircmico Assim ele elencou quatro tipos de interferecircncias i)

subdiferenciaccedilatildeo de fonemas ii) superdiferenciaccedilatildeo de fonemas iii)

reinterpretaccedilatildeo de traccedilos relevantes iv) substituiccedilatildeo de fone atual

A subdiferenciaccedilatildeo de fonemas ocorre quando dois sons de um segundo sistema

cujos correspondentes que natildeo se distinguem no sistema primaacuterio natildeo satildeo bem

definidos Tal confusatildeo eacute evidenciada pela alternacircncia que o falante do Romansh

faz ao pronunciar os segmentos y e i do Schweizerdeutsch ou quando o falante

do Schweizerdeutsch faz ao pronunciar de forma insegura os segmentos i e

O processo de superdiferenciaccedilatildeo envolve a imposiccedilatildeo de distinccedilotildees fonecircmicas

do sistema primaacuterio sobre os sons do sistema secundaacuterio onde eles natildeo satildeo

necessaacuterios O processo pode ser inferido a partir de uma comparaccedilatildeo entre os

sistemas de som em contacto mesmo que nem sempre seja perceptiacutevel No

contanto entre os dois dialetos o vocaacutebulo rsquolada lsquoamplorsquo do Romansh eacute

pronunciado como acutelada no Schwyzertutsch

A reinterpretaccedilatildeo de traccedilos relevantes ocorre quando o falante biliacutengue distingue

fonemas do sistema secundaacuterio cujas caracteriacutesticas que nesse sistema satildeo

meramente concomitante ou redundante mas que satildeo relevantes no seu sistema

principal Por exemplo a palavra do dialeto Romansh [lsquomєsbullɐ] bagunccedila pode

ser interpretada quase como no Schwyzertutsch rsquomesa

Por fim o processo de substituiccedilatildeo de fone atual eacute aplicado aos fonemas que satildeo

definidos de forma idecircntica nos dois idiomas mas que se comportam de froma

113

distintas Na situaccedilatildeo descrita o segmento do Romanche e o do

Schwyzertatsch satildeo ambos definidos como vogais frontais de abertura

maacutexima mas o fonema do sistema Schwyzertfitsch eacute pronunciado mais aberto

Os fonemas b do Romansh e o B do Schwyzertfitsch satildeo ambos definidos por

suas oposiccedilotildees tensa (sem voz) consoante aspirante e nasal homorgacircnica mas

b eacute sempre vozeado B apenas ocasionalmente

Quando ao tratar dos fatores estruturais favorecedores ou inibidores da

interferecircncia foneacutetica o pesquisador em questatildeo afirma que a anaacutelise contrastiva

dos fonemas de duas liacutenguas e a forma como eles satildeo usados produz uma lista

de formas de interferecircncias focircnicas esperada em uma situaccedilatildeo de contato

particular Quando os sons satildeo vistos como parte de um sistema focircnico certos

fatores adicionais emergem favorecendo ou inibindo a reproduccedilatildeo de som

defeituoso (pg 23)

Em continuidade ele afirma que ldquoum fator que elimina certos ruiacutedos na fala em

liacutengua estrangeira eacute a existecircncia de vazios no padratildeo no sistema fonecircmico

primaacuterio em que fonemas estranhos do sistema secundaacuterio podem ser

recuperados (rotulados)rdquo Isso se daacute devido agrave semelhanccedila com o(s) segmento(s)

cujas caracteriacutesticas satildeo mais aproximadas

Sobre a difusatildeo dos fenocircmenos de interferecircncia foneacutetica Weinreich assegura que

no estudo da propagaccedilatildeo de sons oriundos do contato linguiacutestico sobretudo na

influecircncia da liacutengua estrangeira (liacutengua de contato) seria relevante que

investigasse se o resultado de muitos tipos de interferecircncia eacute difundido da mesma

forma ou com igual facilidade

114

Ao citar Sapir ele afirma que

Podemos supor que as variaccedilotildees individuais decorrentes em fronteiras linguiacutesticas tecircm sido gradualmente incorporadas ao desvio foneacutetico de uma liacutengua Isto mostra aliaacutes que um sistema de som que eacute conhecido por ter sido influenciada por um estrangeiro natildeo precisa esperar para representar uma reacuteplica exata do sistema influenciando (1949 p213)64

Para ele um dos motivos que contribuiria para a interferecircncia foneacutetica seria

agravequela desencadeada pelo status

Com base na reduplicaccedilatildeo de som de Weinreich Matra (2009 p 241) descreve

que a produccedilatildeo de segmentos foneacuteticos eacute vulneraacutevel No entanto

A replicaccedilatildeo fonoloacutegica (interferecircncia transferecircncia ou ldquoempreacutestimordquo) pode afetar qualquer niacutevel da estrutura de som a articulaccedilatildeo de fonemas individuais ou fonemas dentro das palavras o comprimento e a geminaccedilatildeo acento e tom prosoacutedia e entonaccedilatildeo Em fonologia os empreacutestimos foram muitas vezes considerados como estrateacutegias para preencher as chamadas lacunas estruturais no sistema destinataacuterio65

Matras ainda defende que a mudanccedila induzida pelo contato fonoloacutegico eacute o

resultado da incapacidade ou da relutacircncia dos falantes para manter a separaccedilatildeo

completa e consistente entre os sistemas fonoloacutegicos de duas liacutenguas Ele cita

como exemplo o fato de os falantes da liacutengua receptora lidarem com a pronuacutencia

de termos da liacutengua de origem66

64

We may suppose that individual variations arising at linguistic borderlands - whether by the unconscious suggestive influence of foreign speech or the actual transfer of foreign sounds into the speech of bilingual individuals - have been gradually incorporate into the phonetic drift of a language This shows incidentally that a sound system which is known to have been influenced by a foreign one need not be expected to represent an exact replica of the influencing system 66

Isso ocorre mais frequentemente quando uma palavra estrangeira eacute introduzida na liacutengua de

destino por apenas um pequeno grupo de biliacutengues ou semibiliacutengues e se espalha por toda fala da comunidade inclusive para os monoliacutengues natildeo estatildeo familiarizados com os sons originais da

115

Quando emprestado de uma liacutengua doadora um vocaacutebulo natildeo acarretaraacute

necessariamente em mudanccedila no sistema fonoloacutegico da liacutengua receptora O que

ocorre como jaacute fora colocado aqui eacute o processo de acomodaccedilatildeo fonoloacutegica O

vocaacutebulo emprestado passa a ser pronunciado com os segmentos foneacuteticos da

liacutengua receptora

Todavia Matra (2009 p 222-223) chama a atenccedilatildeo para um segundo tipo de

processo em que ldquoos sons que aparecem nos vocaacutebulos emprestados que satildeo

normalmente ausentes do sistema da liacutengua destinataacuteria podem ser replicados

juntamente com o proacuteprio vocaacutebulordquo fazendo com que haja um enriquecimento no

inventaacuterio foneacutetico na liacutengua receptora 67

Segundo o autor este tipo de processo ocorre com normalidade em situaccedilotildees

em que o bilinguismo eacute muito generalizado Logo ldquomembros biliacutengues de uma

comunidade que estatildeo cientes da forma original da pronuacutencia da liacutengua doadora

fazem um esforccedilo para autenticar o vocaacutebulo emprestado replicando sua forma

originalrdquo

Em continuidade ele afirma que

Uma vez que a liacutengua doadora goza de alguma forma de prestiacutegio muitas vezes devido a associaccedilotildees com comeacutercio tecnologia conhecimento e outros tipos de inovaccedilatildeo ou de poder a replicaccedilatildeo de pronuacutencias originais da liacutengua doadora satildeo imitadas por muitos monoliacutengues (natildeo falantes da liacutengua doadora) como tal levando agrave propagaccedilatildeo dentro da liacutengua destinataacuteria dos novos fonemas nos vocaacutebulos emprestados que satildeo relevantes Isso comprova o respeito dos falantes para a linguagem dos doadores e agrave sua flexibilidade no uso de sua liacutengua materna (a liacutengua do destinataacuterio) indicando que os

liacutengua doadora Em tais situaccedilotildees haacute uma forte lealdade para com a liacutengua de destino e geralmente apenas com superficial conhecimento com a liacutengua de origem (p 242) 67

Como exemplo eacute citado o caso da africada dʒ que em situaccedilatildeo de empreacutestimo pode ser

pronunciada como tʃ em palavras que oriundas do inglecircs

116

falantes se contentam em atribuir fonologicamente autenticidade agrave replicaccedilatildeo de empreacutestimos lexicais prioritaacuterios maiores do que para a preservaccedilatildeo das estruturas fonoloacutegicas coerentes de sua liacutengua nativa (idem p 224)

Em uma situaccedilatildeo onde o bilinguismo eacute estabelecido e prolongado os falantes (na

maioria de uma liacutengua minoritaacuteria como o caso dos Latundecirc) podem ajustar o

inventaacuterio de sons e as regras que regem a sua distribuiccedilatildeo para coincidir com as

do outro

Matras (2009 p 225) atraveacutes de um quadro descreve os quatro tipos de

mudanccedilas fonoloacutegicas oriundas do contato linguiacutestico com base nos perfis dos

falantes linguagem e atitudes

Quadro 8 Tipos de processos que conduzem a mudanccedila fonoloacutegica induzida por contato

117

Com base no quadro anterior depreende-se que

i) O tipo A eacute diferente na medida em que natildeo envolve nenhuma mudanccedila no

sistema fonoloacutegico mas apenas uma mudanccedila de palavras individuais

enquanto os tipos B-D todas envolvem algum grau de modificaccedilatildeo para o

sistema tal como utilizado por colunas numa base regular No entanto

existem semelhanccedilas entre os tipos de aspectos individuais

ii) Os tipos A e B satildeo semelhantes e giram em torno de palavras emprestadas

individualmente

iii) Os tipos A e C satildeo semelhantes em que ambos envolvem a transferecircncia

de recursos de liacutengua nativa para material diferente

iv) Os tipos B e D satildeo semelhantes em que ambos envolvem a adoccedilatildeo de

padrotildees sonoros estrangeiros e sua integraccedilatildeo na liacutengua nativa

v) Os tipos C e D mostram como mencionado acima o fato de que os

falantes tentam evitar que para selecionar os sons de dois conjuntos

distintos de inventaacuterio e ateacute generalize apenas um conjunto de sons para

serem usadas em ambas as liacutenguas isto eacute em toda a interaccedilatildeo contextos

Os falantes do portuguecircs falado por Latundecirc se estendem em duas direccedilotildees Em

tipos A e C onde os falantes reinterpretam os sons dos vocaacutebulos emprestados

da liacutengua doadora alinhando-os aos padrotildees e inventaacuterio da liacutengua receptora

(nativa) No tipo D os falantes modificam os segmentos foneacuteticos com base no

inventaacuterio externo A aplicaccedilatildeo de uma determinada regra fonoloacutegica pode

resultar na perda ou em ganho de fonemas p226

118

O contato linguiacutestico pode ser representado ainda como um contiacutenuo Nele

ocorrem forccedilas centriacutefugas e centriacutepetas que dinamizam os sistemas linguiacutesticos

Para Matras idem p 226 fatores como normas sociais lealdade e consciecircncia

de identidade podem interferir e ateacute mesmo neutralizar os fenocircmenos advindos do

contato O empreacutestimo sofreria portanto estas pressotildees

Figura 12 Ligaccedilotildees entre a intensidade do bilinguismo o tipo de processo de acomodaccedilatildeo e sobreposiccedilatildeo entre os sistemas fonoloacutegicos

Quanto menor for o bilinguismo maior seraacute a separaccedilatildeo de sistemas Por outro

lado quanto mais intenso for o bilinguismo maior seraacute a convergecircncia de

sistemas fonoloacutegicos

No que concerne agrave integraccedilatildeo fonoloacutegica Matras (2009 p 227) explica que a

substituiccedilatildeo de fonemas eacute uma das formas mais comuns posto que este

processo permite uma aproximaccedilatildeo de caracteriacutesticas entre o sistema interno e

externo Dessa forma a substituiccedilatildeo eacute mais comum uma vez que os fonemas

satildeo combinaccedilotildees de recursos articulatoacuterios e as caracteriacutesticas em comum satildeo

mantidas em detrimento agraves complexidades dos fonemas que natildeo compartilham de

traccedilos em comum

119

Ele tambeacutem chama a atenccedilatildeo para a estrutura silaacutebica dos sistemas fonoloacutegicos

que entram em contato afirmando que ldquoos estrangeirismos podem acomodar a

siacutelaba e a estrutura do acentordquo (idem p 228)

A aplicaccedilatildeo de regras sobre a distribuiccedilatildeo de fonemas oriundos do empreacutestimo

pode resultar na perda de um traccedilo ou de um fonema A integraccedilatildeo de fonemas

tambeacutem pode levar agrave omissatildeo de outros fonemas que natildeo fazem parte o

inventaacuterio fonoloacutegico da liacutengua receptora E a omissatildeo de certas caracteriacutesticas

durante a replicaccedilatildeo de fonemas pode ser prejudicial para o sistema como um

todo e isso pode resultar em uma reduccedilatildeo de pares miacutenimos

Sobre a convergecircncia dos sistemas fonoloacutegicos Matras (2009 p 229) assegura

que um fator que retarda o processo de substituiccedilatildeo de som eacute a presenccedila de

vaacuterios pares de vocaacutebulos que contam com o contraste Neste caso a

convergecircncia aumenta as semelhanccedilas entre os inventaacuterios fonoloacutegicos das duas

liacutenguas E a replicaccedilatildeo da variaccedilatildeo alofocircnica eacute uma via comum para a

convergecircncia

Quanto aos segmentos foneacuteticos ainda de acordo com o pesquisador em

questatildeo as consoantes satildeo as mais introduzidas nos estrangeirismos Uma vez

que nas liacutenguas do mundo o nuacutemero de segmentos consonantais eacute maior que o

das vogais Logo os vocaacutebulos emprestados satildeo mais propensos a introduzir

mais consoantes que vogais

No caso Portuguecircs falado por Latundecirc tal assertiva em parte se configura A

anaacutelise dos dados prova que satildeo as consoantes as mais favoraacuteveis para a

realizaccedilatildeo dos processos foneacuteticos Todavia o nuacutemero de consoantes nessa

120

liacutengua eacute menor que o de vogais conforme descriccedilatildeo de Telles 2002 a qual

veremos na proacutexima seccedilatildeo

Van Coetsem (1988 p7) tambeacutem aborda os processos e comportamentos

oriundos do contato linguiacutestico68 E para que este contato seja estabelecido eacute

necessaacuterio que se tenha uma liacutengua de origem (SL) e uma liacutengua destinataacuteria

(RL)

Figura 13 Correspondecircncia entre liacutenguas e contato linguiacutestico

Embora o modelo de Van Coetesem seja universal e demonstre que na maioria

dos contatos linguiacutesticos a liacutengua de origem seja uma liacutengua dominante

ressaltamos que neste trabalho a liacutengua de origem (SL) eacute a liacutengua minoritaacuteria o

Latundecirc E o substrato analisado eacute uma modalidade de portuguecircs falado pelos

Latundecirc

Em continuidade este estudioso afirma que

Um empreacutestimo fonoloacutegico eacute uma imitaccedilatildeo uma reacuteplica ou uma reproduccedilatildeo na liacutengua recipiente (RL) de um elemento estrangeiro ou uma pronuacutencia da liacutengua de origem (SL) Esse tipo de imitaccedilatildeo eacute muitas vezes apenas uma aproximaccedilatildeo Para o imitador a imitaccedilatildeo implica o uso de algo que ele natildeo tem na sua proacutepria liacutengua Um empreacutestimo fonoloacutegico como uma imitaccedilatildeo eacute portanto algo que o falante imitador da RL natildeo tem em sua fonologia integrada ou nativa ou seja algo

68

Para Van Coetsen o termo ldquoempreacutestimo fonoloacutegicordquo indica qualquer forma de empreacutestimo no acircmbito da fonologia segmentar ou suprassegmental independentemente se isto afeta a dimensatildeo paradigmaacutetica a dimensatildeo sintagmaacutetica ou ambas (p7)

121

fonoloacutegico ou subfonoloacutegico que deriva de seu sistema fonoloacutegico nativo (Idem p 8)69

A intenccedilatildeo do falante ao fazer uso do segmento emprestado eacute reproduzi-lo da

melhor forma possiacutevel Ao fazer isso ele obedece agraves consideraccedilotildees sociais O

proacuteprio fato de que o segmento natildeo esteja inserido em seu proacuteprio sistema faz

com que na pressatildeo de se adaptar a diferentes pronuacutencias ele (o falante) procure

o equivalente mais proacuteximo em seu sistema

Para que isso ocorra ldquoo falante faz uso de dois processos a imitaccedilatildeo e a

adaptaccedilatildeo p 9rdquo Ambos pressupotildeem a existecircncia de um conjunto organizado de

segmentos fonoloacutegicos e distribuiccedilatildeo de unidades inseridas pelo falante da liacutengua

recipiente por um lado e por outro o confronto das pronuacutencias estrangeiras com

que o falante tem que lidar

Aleacutem dos processos de imitaccedilatildeo e adaptaccedilatildeo Van Coetesem tambeacutem utiliza a

noccedilatildeo de integraccedilatildeo ldquoque eacute a incorporaccedilatildeo de elementos em uma dada liacutengua

advindos de outra(s) liacutengua(s)rdquo A imitaccedilatildeo seria portanto o preacute-requisito para a

integraccedilatildeo No caso do portuguecircs falado pelos Latundecirc natildeo haacute indiacutecios de

integraccedilatildeo de fonemas especiacuteficos da sua liacutengua de origem

Para que ocorra o processo de imitaccedilatildeo eacute necessaacuterio que haja uma agentividade

que eacute um tipo especiacutefico de transferecircncia onde o falante de uma dada liacutengua eacute

ativo e o outro passivo O inverso tambeacutem pode ocorrer

69

A phonological loan is an imitation replication or reproduction in the RL of a foreign or SL

pronunciation such an imitation is often only an approximation For the imitator imitation implies the use of something that he does not (yet) have of his own A phonological loan as an imitation is thus something that the imitating RL speaker does not have in his integrated or native phonology something phonemic or subphonemic that deviates from his native phonological system

122

Figura 14 Agentividade da Liacutengua Recipiente de acordo Van Coetsem 1988 p10

Na agentividade da liacutengua recipiente (RL)70 o segmento dominante na relaccedilatildeo

entre a liacutengua recipiente e a liacutengua de origem71 eacute o da liacutengua recipiente Logo o

domiacutenio linguiacutestico seraacute o da liacutengua recipiente

Figura 15 Agentividade da Liacutengua de Origem de acordo Van Coetsem (1988 p11)

Na agentividade da liacutengua de origem (SL) o segmento dominante na relaccedilatildeo

entre a liacutengua recipiente e a liacutengua de origem eacute o da liacutengua de origem Sendo

assim o domiacutenio linguiacutestico seraacute o da liacutengua de origem

Tomando como referencial os modelos apresentados podemos estabelecer um

contiacutenuo cronoloacutegico para compreender como se daacute a agentividade sobre o

contado do Portuguecircs com o Latundecirc

70

No caso em questatildeo a modalidade do portuguecircs falado pelos Latundecirc eacute a liacutengua recipiente 71

Consequentemente a liacutengua de origem (SL) eacute o Latundecirc

123

Figura 16 Relaccedilatildeo de agentividade entre o Portuguecircs e o Latundecirc

Historicamente devido aos fatores socioeconocircmicos o contato inicial se daacute entre

o Portuguecircs influenciando o Latundecirc Aquele como liacutengua majoritaacuteria e este como

minoritaacuteria

O Latundecirc por ser a liacutengua do povo dominado eacute submetido agraves interferecircncias da

liacutengua de domiacutenio Deste contato resulta uma modalidade especiacutefica do

Portuguecircs que eacute o falado por Latundecirc

Em suma podemos afirmar que embora seja o Portuguecircs a liacutengua dominante e

que inicialmente seja ele o agente sobre o Latundecirc a posteriori fora o Latundecirc o

agente pelas transformaccedilotildees ocorrentes no Portuguecircs de contato Posto dessa

forma a agentividade se daacute em ambos os contextos a partir do referencial que se

tenha uma vez que o Portuguecircs e o Latundecirc tanto influenciaram como foram

influenciados Mas vale ressalvar que para este recorte o Portuguecircs eacute a liacutengua

que sofre influecircncia Eacute este o fio condutor da nossa pesquisa

Portuguecircs Latundecirc Portuguecircs falado por Latundecirc

124

53 FONOLOGIA DO LATUNDEcirc

Para uma melhor compreensatildeo futura passaremos agora a descrever os

sistemas fonoloacutegicos das liacutenguas em estudo

Elencamos abaixo as principais caracteriacutesticas fonoloacutegicas do Latundecirc

Eacute uma liacutengua com maior quantidade de elementos vocaacutelicos (dezesseis)

em detrimento aos consonantais (onze) Eacute uma liacutengua vocaacutelica portanto

Apresenta dez vogais orais e seis nasais Dessas oito satildeo laringais72

As vogais nasais satildeo contrativas apenas na posiccedilatildeo do acento

Os glides w j quando em posiccedilatildeo de onset sofrem o processo de

consonantizaccedilatildeo

Apresenta seis tipos de siacutelabas fonoloacutegicas que satildeo derivadas da extensatildeo

(C)V(C)(C) V VC VCC VC CVC e CVCC

O nuacutecleo silaacutebico eacute sempre preenchido por uma vogal

Dos segmentos consonantais apenas a oclusiva glotal ʔ natildeo eacute observada

em posiccedilatildeo de onset

A coda pode ter desdobramento ramificado sendo a primeira posiccedilatildeo

preenchida sempre por um glide

Os padrotildees silaacutebicos VC e CVC satildeo os mais frequentes e ocorrem tanto

em siacutelaba tocircnica como aacutetona

Tem uma forte tendecircncia agrave monotongaccedilatildeo

O sistema acentual eacute misto que associa o acento lexical ao acento foneacutetico

72

Telles explica que as mais novas geraccedilotildees Latundecirc abaixo de 20 anos realizam o traccedilo laringal com menor frequecircncia e audibilidade

125

O acento eacute realizado foneticamente como tom (pitch) alto

Eacute uma liacutengua de caracteriacutestica de liacutenguas pitch accent

Apresenta processos fonoloacutegicos em niacutevel poacutes-lexical fundamentalmente

Estes processos satildeo agrupados em assimilaccedilatildeo (harmonia vocaacutelica e

vozeamento das oclusivas) dissimilaccedilatildeo reduccedilatildeo apagamento silaacutebico e

epecircntese

Quadro 9 Fonemas consonantais do Latundecirc

Fonemas Consonantais

Labiais Coronais Dorsal Glotais

+ anterior - anterior + anterior - anterior - anterior - anterior

Plosivas p t k

Nasais m n

Fricativas s h

Lateral l

Glide w j

Quadro 10 Fonemas vocaacutelicos do Latundecirc

Fonemas Vocaacutelicos

Vogais Vogais Laringais

Altas i u i u

Altas Nasais ĩ ũ i u

Meacutedias e o e o

Baixa a a

Baixa Nasal a a

126

Quadro 11 Ditongos do Latundecirc

Ditongos

Crescentes Decrescentes

w j w J

i wi iw

e e we we je je ej e j

a a a a wa wa ja ja ja aw a w a w aj a j atildej

o o wo jo ow

u u u ju ju ju

Quadro 12 Descriccedilatildeo dos fonemas consonantais (Retirada de Telles 2002)

Segmento - Descriccedilatildeo - Contexto de realizaccedilatildeo e especificidades

Exemplos

Traduccedilatildeo

p73 - Oclusiva bilabial surda

Eacute de extrema limitaccedilatildeo de realizaccedilatildeo na liacutengua

Ocorre em posiccedilatildeo de onset formando

siacutelabas com as vogais i a atilde o u

Pode se realizar como [p] oclusiva bilabial surda [b] oclusiva bilabial

sonora [ɓ] oclusiva bilabial sonora

implosiva

Em iniacutecio de palavras realiza-se [p]

diante da vogal coronal [i] e [b ɓ] e

diante da vogal baixa [a]

Em meio de palavra ou enunciado quando precedido por oclusiva glotal realiza-se [p]

[pite]

piʔ-te

[ιɓ

pan-tatilden

[diʔpa natildenʌ]

jaliʔ pan-tatilden-ta

[kotildebayte] ~ [kotildebayte]

kownpayt-te

[sabagnĩde]

Espeacutecie de paacutessaro chupito Satildeo dois Satildeo dois colares Tatu espeacutecie de

73

Outros estudos com liacutenguas proacuteximas tambeacutem indicam a baixa frequecircncia da realizaccedilatildeo do p

nas liacutenguas desse grupo Kingston 1970 para o Mamaindecirc e Lowe 1961 para o Nambikwaacutera do sul (Galera Kabixi Munduacuteka Nambikwaacutera do Campo)

127

Em meio de palavras ou enunciados em ambiente intervocaacutelico ou nasal adjacente realiza-se [b]

sapan-kinĩn-te

[tʃabatildeʔginĩde]

sapatilden-kin-te

Pente Taioba

m - Nasal labial + anterior

Oclusiva bilabial nasal com distribuiccedilatildeo mais larga do que a do p

Apresenta ocorrecircncia restrita quanto comparada agrave nasal alveolar n

Realiza-se [m]

Ocorre em iniacutecio de siacutelaba diante das

vogais i i i i a a a u u u u

Natildeo forma siacutelaba com as vogais

meacutedias frontais e e e com as

posteriores o o

Apoacutes pausa e seguida de a pode se realizar como oclusiva bilabial nasal

preacute-glotalizada - [ ʔm ]

[ miɾatildenʌ]

mih-tatilden-ta

[katilde ɾatildenʌ]

kami h-tatilden-ta

[ a ĩ de]

e ĩn-te

[ e ĩ de]

e ĩ -te]

[ ma hɾatilden]

mah-tatilden

[ atildega ɾe]

atilden-kaloh-te

[ka a ʔɾatildenʌ]

ka- a -tatilde-ta

[ datildena]

n-tatilden-ta

[tumuʔku ɾe]

tumuʔku-te

Estaacute chovendo Aacutegua estaacute suja Cobra espeacutecie de Couro Ele estaacute esperando Roupa Estaacute molhado Estaacute bonito Jacu

128

Em fronteira de morfema precedido pela fricativa glotal h teraacute a sua realizaccedilatildeo ensurdecida

[ a datildenʌ]

a n-tatilden-ta

[ʔ atilde ɳ datilden]~[ a n datilden]

atilden-tatilden

[ʔ atildeʔ n datilden] ~

[ atildeʔ ndatilden]

atilden- n-tatilden

[n h atildega tna ]

n - atilden-ka -tatilden-na

Estaacute inchado Estaacute queimando Vocecirc estaacute mandando Eacute nossa roupa

w - Glide labial - anterior

Glide laacutebio-velar sonoro

Ocupa as posiccedilotildees de onset e coda

Apresenta leve arredondamento nos laacutebios

Eacute o segmento mais frequente das labiais

Realiza-se como [w] em iniacutecio de

siacutelaba diante das vogais i e e a a o

tambeacutem podendo variar com [ʋ]

fricativa laacutebio-dental que eacute realizada com fraco grau de fricccedilatildeo

[ wi rsquoɾatilden] ~ [ ʋi ɾatilden]

wi -tatilden

[woda h de] ~ [ʋoda h de]

wotah-te

[na weʔrsquoa jrsquoɾe] ~ [na ʋeʔajrsquoɾe ]

na jn-weʔa jh-te

[ kowajna tatildenʌ]~ [koʋajna tatildenʌ]

hah-wa jn-ta-tatilden-ta

[daweʔgɾatilde ni]

taweʔ-ka-tatilden-ti

[ we jginĩdatildena]

we jn-kinĩn-tatilden-ta

[ wajkinĩ de]

wajʔ-kinĩn-te

Ele comeu Pomba Eacute para colocar na cabeccedila Satildeo poucos laacutepis Ele cozinhou Eacute fruto da bacaba

129

Em dissiacutelabos no onset de siacutelaba preacute-tocircnica aberta seguido de vogal a central baixa pode ocorrer a fusatildeo entre o w e a vogal a realizando-se como [ͻ o u]74

Na sequecircncia w + a o a pode sofrer harmonia vocaacutelica recebendo o ponto de articulaccedilatildeo da vogal acentuada sendo realizada [e]

Quando em final de siacutelaba segue as

vogais i o a a

E depois das vogais io pode alongar-se

Se a vogal precedente for a baixa a

a ocorreraacute a fusatildeo resultando as

posteriores ͻ ͻ

Quando em siacutelaba em siacutelaba

acentuada ͻ ͻ podem ser alongados

ou seguido de oclusatildeo glotal [ʔ] ou

ocorrer uma assimilaccedilatildeo regressiva

das baixas aa passando a [ͻ ͻ ]

Quanto agrave frequecircncia w se mais

ocorrente depois da vogal baixa a a

e baixiacutessima ocorrecircncia depois da vogal i o

Ao integrar uma siacutelaba (C)v wN onde a

vogal eacute nasalizada o glide pode ser nasalizado ou coalescer com a consoante nasal na coda

Em posiccedilatildeo de onset e pronunciada rapidamente eacute fortificada podendo ser realizada como [p] e [m]75

[ wa jkinĩ de]

wa jh-kinĩn-te

[waɾaɾwaɾaʔĩ datildenʌ] ~

[wͻɾaʔwͻɾaʔĩ datildenʌ] ~

[ͻɾaʔͻɾaʔĩ datildenʌ]

watajwatajn-tatilden-ta

[weli nde] ~ [uli n de]

wa ĩn-te

[weɾe ɾatildena] ~ [ ɾe ɾatildena] ~

[ rsquoɾe ɾa na]

wateh-tatilden-ta

[giw ladaɾe] ~ [gi la de]

kiwlah-tah-te

[kowa ɾe] ~ [koa ɾe]

kowah-te

[a wde] ~ [ ͻ de] ~ [ ͻ ʔde]

a w-te

[aw de] ~ [ͻ de] ~ [ͻʔ de]

awh-te

[na w du] ~ [nͻ du] ~ [nͻ w du]

na wh-tu

[a wm datilden] ~ [atilde w m datilden] ~

Amendoim Fruto do accedilaiacute Estaacute fino Tamanduaacute Estaacute sumido Cascavel Andorinha Flexa Gaviatildeo

74

Conforme Telles (2002 p 42) Estas alofonias variam de acordo com a qualidade da vogal

tocircnica da siacutelaba seguinte com a qual sua vogal aacutetona nuclear se harmoniza 75

Tal ocorrecircncia eacute mais frequentemente constatada em falantes monoliacutengues em Latundecirc

130

[atilde m datilden]

atilde wn-tatilden

[woloʔʔnatildenʌ] ~ [polo ʔnatildenʌ]

walon-tatilde-ta

[wʌnaʔkinĩ de] ~ [mʌnaʔkinĩ de]

~ [wanaʔkinĩ de]

wanaʔ-kinĩn-te

[wo nut ʔna ] ~ [mo nut ʔna ]

wo nuʔ-tatilden-na

[wʌ na jginĩ datildenʌ] ~

[mana jginĩ datildenʌ] ~

wa -na jn-kin-tatilden-ta

[wa ʃi de] ~ [maʔ ʃi de]

wa-sin-te

Lontra Estaacute assando no burralho Estaacute podre Castanha do caju Eacute corpo inteiro Eacute tua cabeccedila Espeacutecie de abelha

t - Plosiva coronal + anterior

Oclusiva alveolar surda

Ocorre com as vogais ie e a

a atilde o o u ũ

t realiza-se [d] em siacutelaba acentuada podendo ainda variar em posiccedilatildeo medial como [|]

Em iniacutecio de palavra o alofone [d] pode ser realizado como preacute-

[diko lo n de]

tiʔ-ko lo n-te

[ de he ɾaɾe]

te h-tah-te

Paacutessaro pintado espeacutecie de paacutessaro Ele cozinhou

131

glotalizado realizando-se como

[ɗ]

Em fala lenta pode ser realizado como [d]

Em contexto fora do acento ocorre [t] com raros exemplos de variaccedilatildeo entre os alofones [d] e [t]

[ de geɾatilden]

te h-ka-tatilden

[daʔjͻ ratildena]

ta-jaw-tatilden-ta

[da jginĩ de]

ta jn-kinĩn-te

[ doɾatilden] ~ [d ɾatilden]

toh-tatilden

[do h gratilden]

to h-ka-tatilden

[du ɾatilden]

tu-tatilden

[d hdatilden]

tu-tatilden

[kͻdͻ ɾe]

kataw-te

[kado ndatildenʌ]

katon-tatilden-ta

[teda de]

teta-te

[toʔdatilde n de]

toʔtatilden-te

[tigi ɾe]

tikih-te

Sucuri Ele estaacute sentado Pedra Ele morreu Ele procurou Ele pegou Ele chupou Patuaacute Estaacute cru Jaoacute Nambu

132

As possibilidades alofocircnicas de t entre segmentos depende do acento e do contexto adjacente Estas duas condiccedilotildees definem as alofonias76

Precedido de vogal em ambiente

intervocaacutelico realiza-se [tdɾ]

sendo [d] o preferencial

Quando t eacute precedido por h

realiza-se como [tdɾ] A

presenccedila da fricativa favorece o rotacismo de t tornando-o em

[ɾ]

Quando t eacute precedido de ʔ ou

de t a realizaccedilatildeo pode ser [t] mas [d] pode permanecer em raros casos

Em contexto de nasalizaccedilatildeo trecircs realizaccedilotildees satildeo possiacuteveis para t i) vozeamento da oclusiva alveolar ii) preacute-nasalizaccedilatildeo da oclusiva alveolar em iniacutecio de siacutelaba tocircnica e iii) assimilaccedilatildeo total da nasal adjacente

[tabawdnͻde]

tapawn-naw-te

[tala de] ~ [dala de]

tala-te

[tolowm datilde ]

talown-tatilden

[lodo ɾa ɾe] ~ [lo to ɾa ɾe] ~

[loto ɾa ɾe]

loto-tah-te

[doʔ daj de] ~ [toʔ ɾaj de]

to-tajn-te

[nu h ɾe] ~ [ nu h de]

nu h-te

[lo hrsquoɾe] ~ [lo h de] ~

[lo h te]

loh-te

[hu te] ~ [hu de]

huʔ-te

[keja te] ~ [kejaʔ te]

kejat-te

[ĩ datildena] ~ [i ndatildena] ~ [i natildena]

Macaco pequeno Ombro Tipoia Ele terminou Rato grande Abelha vermelha Lagarto grande Urubu

76

Dessas alofonias o flap [ɾ] tem sua ocorrecircncia ligada ao acento

133

Em siacutelaba natildeo acentuada t pode sofrer fricatizaccedilatildeo passando a se realizar como [s]

ou [ts] ou [ʔs]

Ainda neste contexto permanecem possiacuteveis as realizaccedilotildees [t] e [d] se o t sofrer fricatizaccedilatildeo a aspiraccedilatildeo glotal precedente do h natildeo se realiza

Em travamento silaacutebico t realiza-se de preferecircncia como

ʔ Pode ser deletado

ocasionando o prolongamento da vogal tautossilaacutebico

in-tatilden-ta

[katilde datildena] ~ [katilde ndatildena] ~

[katilde natildena]

katilden-tatilden-ta]

[kejaʔ n da ɾe] ~ [kejaʔ na e]

kejan-tah-te

[losa na ʔ] ~ [lostsa na ʔ] ~

[lo ʔ sa na ʔ] ~ [lo h ta na ʔ]

loh-ta-na

[kejate] ~ [kejaʔte]

kejat-te

[kejaʔtiʔjoho]

kejat-ti-jo-ho

[lote] ~ [loʔte]

lot-te

[acute tʃjͻna ]

lot-ti-jaw-na

Arco Milho Estaacute apimentado Estaacute duro Lambari grande Eacute urubu Milho Talvez seja milho Paca A paca estava aiacute

134

n - Nasal coronal - anterior

Oclusiva alveolar nasal

Suas alofonias satildeo condicionadas pelo contexto adjacente agrave sua posiccedilatildeo de ocorrecircncia e agrave estrutura silaacutebica

Em onset realiza-se como [n] com as

vogais i i ĩ ĩ a a atilde atilde u u ũ ũ

Tambeacutem pode apresentar flutuaccedilatildeo em

onset realizando-se [ʔn]77 alveolar

nasal preacute-glotalizada com preferecircncia quando seguido por a

Em posiccedilatildeo de onset e em fronteira de morfema dependendo do seguimento seguinte sofreraacute alteraccedilatildeo

Quando precedido por h sofreraacute ensurdecimento

Quando precedido por outro n na coda silaacutebica precedente poderaacute ser

preacute-glotalizada [ʔn]

[ni du]

ni-tu

[ni ʔkinĩnatildena]

ni ʔ-kinĩn-tatilden-ta

[nagatilde de]

nakatilden-te

[katildena ratilden]

kana h-tatilden

[natildejd ]

natildejn-tu]

[ʔnatilde natilde ʌ]

natilde n-tatilden-ta

[nu h e]

nuʔ-te

[lsquon h ɾe]

nu h-te

[n n de]

n n-te

[n h n atildega tatildena]

Tipo de lenha Eacute fruto Lagarto Estaacute escuro Pacu Estaacute chorando Braccedilo Lagarto Espeacutecie de Bicho

77

Tal qual ocorre com m a glotalizaccedilatildeo de n deve-se em alguns casos aacute reduccedilatildeo da siacutelaba

inicial da palavra

135

Em posiccedilatildeo de coda de siacutelaba acentuada gera processo de assimilaccedilatildeo de dissimilaccedilatildeo e de elisatildeo resultando numa seacuterie de alofonias

Ainda em siacutelaba acentuada se a vogal tautossilaacutebica for oral e entre a coda nasal existir um glide labial-velar constituindo uma siacutelaba com ditongos awn own n se realiza como [m] preferencialmente

w e n em posiccedilatildeo de coda pode sofrer coalescecircncia realizando-se como [m] ou [n]

Se o glide ocupante da primeira posiccedilatildeo da coda for j ou se a siacutelaba tiver a coda preenchida pela nasal n a realizaccedilatildeo desta nasal seraacute [n]

Os glides que seguem a vogal na primeira posiccedilatildeo de coda podem

n -natilden-kah-tatilden-ta

[udʔna]

un-na

[iwm de]

iwn-te

[tʌlawm natildenʌ] ~ [tʌlaw natildenʌ]

talawn-tatilden-ta

[wawm datildenʌ] ~ [wͻwm datildenʌ]

wawn-tatilden-ta

[tolowm datildenʌ]

talown-tatilden-ta

[jatildew de] ~ [iɲatildew de] ~

[jatilde de]

jatildewn-te

[a wm datilden] ~ [atilde m datilden]

atilde wn-tatilden

[iʃɛʔ ɾʌ m datilden]

isaj-tatildewn-tatilden

[toʔkotilde datilden] ~ [t ʔkʌ datilden]

toʔkatildewn-tatilden

Eacute nosso Estaacute vivo Larva Estaacute grosso Estaacute vermelho Estaacute pronto Larva Estaacute assando no burralho

136

assimilar a nasalidade da consoante precedente 78

Se a vogal for nasal na maioria das ocorrecircncias a consoante nasal na coda seraacute apagada deixando seu tempo na vogal precedente e na consoante seguinte

Quando a coda nasal n segue ditongo formado por vogal nasal subjacente mais glide palatal j n em posiccedilatildeo de coda pode espalhar nasalidade regressiva para o glide precedente e pode ser apagada

Quando em coda nasal iraacute participar de outros processos fonoloacutegicos aleacutem da vogal precedente

Na posiccedilatildeo de siacutelaba acentuada em meio de palavra seguida por k n promove a sonorizaccedilatildeo de k e passa

a se realizar como [ʔ] oclusiva glotal

[kotilde baj te] ~ [kotildebay te]

kownpajt-te

[a ʔ n de] ~ [a n de]

a n-te

[je n datilden]

je n-tatilden

[i n datilde na ]

in-tatilden-na

[ hej ndatilden] ~ [ hej n datilden]

hejn-tatilden]

[ natildej de] ~ [ naj n de]

natildejn-te

[ atildendatilden]

atilden-tatilden

[ atilde n datilden]

atilden tatilden]

[ mɔ de] ~ [ de]

n-te

[n n de]

n n-te

Eles estatildeo correndo Ele misturou Tatu Tatu galinha Estaacute sujo Ele estaacute mamando Ele lavou Pacu Ele atirou

78

Para uma descriccedilatildeo mais detalhada sobre o comportamento de n e os glides ver a tese de

Telles 2002 55-57

137

Ainda quanto ao contexto semelhantemente descrito acima n for seguida por uma oclusiva surda homorgacircnica t poderaacute ocorrer processos que possibilitem uma alofonia em variaccedilatildeo livre

n sonoriza t

n sofre desnasalizaccedilatildeo

Quando n sonoriza a consoante seguinte ocorre a elisatildeo podendo ocorrer ou natildeo o alongamento compensatoacuterio da vogal precedente ou a preacute-nasalizaccedilatildeo da consoante seguinte

Quando n sofre elisatildeo alonga a vogal precedente e a consoante seguinte se assimila progressivamente com o traccedilo nasal passando a se realizar como [n]

n se vocaliza e recebe os traccedilos da vogal central e realiza-se nasal

Se n for seguida em coda por uma consoante nasal idecircntica ocupando a posiccedilatildeo do onset da siacutelaba seguinte poderaacute haver duas possibilidades de comportamento da coda nasal dependendo de ser a sua vogal tautossilaacutebica assimilar ou natildeo

Se a vogal precedente for nasal a coda sofreraacute elisatildeo e a vogal se alongaraacute

Se a vogal central for oral a consoante nasal da coda que precede a nasal idecircntica no onset da siacutelaba seguinte sofreraacute dissimilaccedilatildeo do traccedilo nasal79

[ natildej de] ~ [ naj n de]

natildejn-te

[ku ʔginĩ de]

ku n-kinĩn-te

[ dega tatilden]

te n-kaloh-tatilden

[ atildega ɾe]

atilden-kaloh-te

[ ku ndatildenʌ]

ku n-tatilden-ta

[ ku ddatildenʌ]

ku n-tatilden-ta

[ ku n datildenʌ] ~ [ ku datildenʌ]

ku n-tatilde-ta

[ ku natildenʌ]

ku n-tatilden-ta

Estaacute branco Bom-dia espeacutecie de aacutervore Bicho Pacu Rolo de fio de algodatildeo Roupa velha Roupa Estaacute fumando

79

A liacutengua Latundecirc eacute caracterizada pelo OCP (Princiacutepio do Contorno Obrigatoacuterio)

138

[ku datildenʌ]

ku n-tatilden-ta

[katilde na ]

katilden-na

[lidnu ɾe]

lin-nu-te

[lid na j ɾe]

lin-na jh-te

Estaacute fumando Estaacute fumando Estaacute fumando Estaacute fumando Estaacute duro Beiju de mandioca Raiz de mandioca

s - Fricativa alveolar surda

Fricativacoronal+ anterior forma siacutelaba

com as vogais i ĩ e a a atilde o uu ũ

Realiza-se como [s] [ʃ] [tʃ] [ʔs]

Em menor frequecircncia pode ser realizada como [t] e [t h]

Em siacutelaba acentuada em iniacutecio de palavras a fricativa pode se realizar

[tʃi ɾatilden] ~ [ʔsi ɾatilden]

sih-tatilden

[ ʔsitatilden] ~ [ sitatilden]

set-tan

Estaacute liso Trovejou

139

como palatal africada preacute-glotal ou como alveolar 80

Quando s se fortifica e passa a se realizar como [t] e ou como [t h] apresentam restriccedilatildeo ao contexto de vogal baixa seguinte podendo ocorrer em iniacutecio ou em meio de palavra Nestes contextos tambeacutem permanecem possiacuteveis as demais alofonias

A fortificaccedilatildeo de s eacute frequente em siacutelaba natildeo acentuada em iniacutecio de palavra Embora as siacutelabas acentuadas contenham maiores iacutendices Em posiccedilatildeo natildeo acentuada a alveolar ocorre em maior nuacutemero

A palatalizaccedilatildeo da fricativa eacute obrigatoacuteria quando precedida por i Sua realizaccedilatildeo eacute alveolar em posiccedilatildeo intervocaacutelica

[ʔsĩ du ɾatilden]

sĩn-tu-tatilden

[ʃa h ɾe] ~ [sa h ɾe]

sa h-te

[ tʃoɾatildenʌ] ~ [ ʃoɾatildenʌ]

soh-tatilden-ta

[ʃ de] ~ [s n de]

s n-te

[thathaʔi natildenʌ] ~ [ʃaʃaʔi natildenʌ]

sasan-tatilden-ta

[kejͻ ʔhe neʔt h o ɾeʔ] ~

[kejͻʔhe neʔto ɾeʔ]

keja w-haniʔ-s aw-te

[t datilde na ] ~ [t h datilde na ]

so-tatilden-na

[tʃamaj de] ~ [tamaj de] ~ [sama

de]

saman-te

[ʔʃamaʔdʌ ɾatildena]

saman-tah-tatilden-ta

[iʃatilde datilde na ]

isatilde n-tatilden-na

Estaacute arrastando Timboacute do mato Estaacute sujo Sol Estaacute mole Oacuteleo Eacute guarantatilde (espeacutecie de aacutervore) Tanajura Eacute tanajura

80

A africada eacute a mais utilizada pelos velhos enquanto a fricativa e a alveolar satildeo mais utilizadas

pelos jovens

140

[iʃu datildenʌ]

isu -tatilden-ta

[wasa h ɾe] - [wͻsa h ɾe]

wasah-te

Eacute folha Ele estaacute com frio Besouro

l- Lateral alveolar sonora

Lateral coronal + anterior

Forma siacutelaba em iniacutecio e meio de

palavras com as vogais i e a a o o

u

Fortifica-se em iniacutecio de palavras quando encontra-se na posiccedilatildeo de acento pode ser precedido por vogal aacutetona sem onset que tende a ser apagada

Diante do contexto acima realiza-se

[li tatilden]

lit-tatilden

[dale de]

tale-te

[giwla de]

kiwlah-te

[la ɾ e]

la h-te

[lo ɾatildena]

loh-tatilden-ta

[ko lo ko lo n de]

ko loʔ ko lo n-te

[toluʔ tatildena]

taluʔ-tatilden-ta

[ʔta e] ~ [da e]

la h-te

Ele saiu Embira Cobre cascavel Jacucaacuteca Estaacute comprido Pintado Ele tossiu

141

como alofones [ʔl] e [d]

Acompanhado por consoante nasal em onset silaacutebico pode assimilar progressivamente a nasalidade sendo realizado como [n]

Pode apresentar sobreposiccedilatildeo na maneira como se realizam

[t ~s ]

[t ~ n]

[n ~ l]

[t ~ l ]

[ʔlo tatilden] ~ [a tatilden]

atilde-loʔ-tatilden

[diʔ pa natildena] ~ [i iʔ pa natildena]

jaliʔ pan-tatilde-ta

[ naginila h ni ɾ atilden] ~

[ naginina h ni ɾatilden]

sapatilden-kinĩn-te

[kaas tatildena] ~ [kata tatildena]

kasaʔ-tatilden-ta

[tidit na j de] ~ [tidit ta de]

tatiʔ-najn-te

[nagatilde de] ~ [ agatilde n de]

nakatilden-te

[wota h ɾe] ~ [wola h ɾe]

wotah-te

Jacucaacuteca Ele estaacute afundado atolado Satildeo dois colares Eu natildeo sei se ele estaacute doente Taioba Estaacute grosso Mandioca mansa Lagarto do campo Pomba

142

j - Glide coronal - anterior

Eacute um glide palatal que ocupa a posiccedilatildeo de onset e de coda na siacutelaba

Em iniacutecio de siacutelaba j antecede as

vogais e e o a a atilde u u ũ

Quando em posiccedilatildeo inicial na siacutelaba e

acompanhado por e e em siacutelaba

acentuada ou seguido por a em siacutelaba aacutetona j pode se fortificar e se realizar

como [ʒ] sendo possiacutevel neste caso

ser seguido por um preacute glide [j] de fraca e raacutepida duraccedilatildeo

Quando seguido por a em siacutelaba aacutetona eacute opcional a fusatildeo entre o glide e a vogal derivando a vogal longa [i]

[je n datilden]

je n-tatilden

[ja te]

jaʔ-te

[ja te]

ja ʔ te

[jatildeʔ datilden] ~ [iɲatildeʔ datilden]

jatilden- n-tatilden

[jo ɾatilden]

joh-tatilden

[ju te]

ju-te

[ju te]

ju -rsquote

[j ginĩ de]

j n-kinĩn-te

[je natilden te] ~ [ʒe natilden te]

ja natilde-nu-te

[ j ʒe n datilden] ~ [ʒe n datilden] ~

[je n datilden]

je n-tatilden

[ʒɛge datilden] ~ [ʒɛga j datilden]

Estaacute sujo Maribondo espeacutecie Porco Vocecirc tem coragem Estaacute baixo Boca Peacute Pedra de gelo granizo Porco espinho Estaacute sujo

143

Se em posiccedilatildeo de onset e seguido de vogal nasal pode ocorrer uma consoante palatal seguindo o glide palatal e precedendo a vogal nuclear

Se for atilde a consoante intrusiva se realizaraacute com mais forccedila e separaraacute a sequecircncia jatilden em duas siacutelabas

Quando o glide vier antes da vogal ũ a consoante intrusiva poderaacute resultar no apagamento do glide podendo se realizar como consoante palatal ou preacute-glide

Em posiccedilatildeo final de siacutelabas

acompanha as vogais e e a a

jaka jn-tatilden

[inatilde de]

janatilde n-te

[jeda n de] ~ [ʒida n de] ~ [ida

n de]

jatan-te

[jatilde datilden] ~ [ iɲatildeʔ datilden]

jatilden- n-tatilden

[jatildew de] ~ [iɲatildew de] ~

[jatilde de]

jatildewn-te

[j ginĩ de] ~ [ j ɲ gibi de]

j n-kinĩn-te

[ ejdnirsquoɾatilde]

hejn-ten-ni-tatilde

[ e jtatilden]

e ʔ-tatilden

[wajkinĩ du]

wajʔ-kinĩn-tu

[na j de]

na j -te

[ natildejde]

natildejn-te

Eacute pica-pau pequeno espeacutecie Abelha do chatildeo espeacutecie veado espeacutecie Vocecirc tem coragem Larva espeacutecie Pedra de gelo granizo Eu vou lavar Ele fez fogo Amendoim

144

Maribondo espeacutecie Pacu espeacutecie de peixe

k- Plosiva dorsal - anterior

Eacute oclusiva velar surda Tem larga distribuiccedilatildeo e se realiza diante de todas as vogais do Latundecirc

Satildeo seus alofones [ʔk] [ɠ] [g] e [k]

Em iniacutecio de palavra se realiza preferencialmente como [k]

[kiliʔkinĩ de]

kiliʔ-kinĩn-te

[ki de]

ki -te

[ke ɾatildena]

keh-tatilden-ta

[ke ja ʔ n de]

ke ja jn-te

[ka ɾatildena]

kah-tatilde -ta

[ka

ka jn-te

[katilde natildena]

katilden-tatilden-ta

[ko h ɾe]

koh-te

[ko lo ʔko lo n datildeda]

ko lo ʔko lo n-tatilden-ta

Coco da palmeira inajaacute Macaco noturno Ele estaacute caccedilando Caititu Estaacute azedo Formiga Estaacute duro Tesoura

145

Em contexto de fala raacutepida em iniacutecio

de vocaacutebulos a velar preacute-glotal [ʔk]

pode ocorrer pode flutuar tambeacutem como velar plena [k]

Em mesmo contexto pode-se flutuar a velar sonora [g] ou a velar implosiva

[ɠ] ou a velar surda [k] ou a velar

surda preacute-glotalizada [ʔk]

Quando em meio de vocaacutebulo em contexto que envolve a consoante nasal lexical precedente a realizaccedilatildeo de [g] eacute categoacuterica

Entre vogais eacute possiacutevel que se encontre a variaccedilatildeo entre [k] e [g] sendo a surda a preferencial e em maior nuacutemero de realizaccedilotildees

[k n de]

k n-te

[ku n de]

ku n-te

[ʔkolo ɾe] ~ [kolo ɾe]

koloh-te

[ʔka laʔkala ɾe] ~ [ka laʔkala ɾe]

kalaʔkalaʔ-te

[golota taʔnatildena] ~

[kolota taʔ natildena]

kolon-sasan-tatilden-ta

[ gi natildena] ~ [ ɠi natildena]

ki n-tatilden-ta

[giʃaj n datildena] ~ [ɠiʃaj ndatildena] ~

[kiʃaj n datildena]

kisajn-tatilden-ta

[ atildega ɾe]

atilden-kaloh-te

[j ginĩ de]

j n-kinĩn-te

[waka de]

waka-te

Eacute pintado Timboacute do campo Algodatildeo Barata Galinha Estaacute maduro Estaacute coccedilando Estaacute pontudo Roupa

146

Em onset da siacutelaba acentuada em final de vocaacutebulo k pode se realizar [k h]

[lukaj de]

lukajn-te

[nakatilde n de] ~ [naga n de]

nakatilden-te

[ iwgula ɾatilden]

iwkulah-tatilden

[ i ʔga laʔga na ]

iʔka la n-ka-na

[ ɛtduʔ da jowi k h e ]

ajhtu ta-jaw-wi-ka

Pedra de gelo granizo Garccedila Flecha Lagarto Ele subiu Eles estatildeo brincando Pega (o banco) vamos sentar

- Plosiva glotal - anterior

Eacute uma oclusiva glotal surda com

realizaccedilatildeo [ʔ] que se restringe agrave

posiccedilatildeo de coda silaacutebica81

Tem seu comportamento condicionado pela presenccedila das consoantes adjacentes p t k

Pode se realizar como [ʔ] em fala

raacutepida preceder a oclusiva velar surda k

Como [j] quando a vogal nuclear for a meacutedia frontal e ou a baixa a

Como [w] quando a vogal nuclear for a meacutedia posterior o

[huʔ kaʔ datilden] ~ [ kaʔ datilden]

huʔ-kah-tatilden

[kidiʔka tatilden]

kitiʔ-kah-tatilden

[ atilde ʔ tatilden] ~ [ atilde tatilden] ~

[malo h tatildeni]

atilden-loʔ-tatilden

Eacute arco Eacute furador Ele queimou

81

A entre l e s natildeo foi observada na liacutengua Latundecirc

147

E favorecer a deleccedilatildeo de motivando um alongamento que compensa a vogal nuclear ou alongar ainda alongar esta vogal seguindo de leve aspiraccedilatildeo

A realizaccedilatildeo de [ʔ] nas alofonias

acima soacute eacute notada quando na siacutelaba na qual estaacute presente quando apenas a oclusiva estiver no travamento

silaacutebico (CVʔ)

Quando em posiccedilatildeo de coda pode assimilar o ponto da consoante seguinte e se realizar como [t] ou [d] diante de tnl e [p] ou [b] diante de m Neste caso as realizaccedilotildees homorgacircnicas surdas satildeo sempre preferenciais

[wolo te] ~ [woloʔ te]

woloʔ-te

[ej tatilden] ~ [e tatilden]

eʔ-tatilden

[wajkinĩ de]

wajʔ-kinĩn-te

[loʔ tatilden] ~ [ tatilden] ~ [ wtatilden]

loʔ-tatilden

[tidit na jdatilde na ]

tatiʔ-na jn-tatilden-na

[wa jtna de]

wa jh-na n-te

[at natilde da na]

a ʔnatilde n-tatilden-ta

[a p otildedatildena] ~ [a b otildedatildena]

a ʔ n-tatilden-ta

Espeacutecie de paacutessaro Ele ralou Amendoin Ele afogou Eacute raiz de mandioca Palha da palmeira accedilaiacute Ele estaacute chorando muito Ele estaacute muito bonito

h- Fricativa glotal - anterior

Eacute fricativa glotal surda que em iniacutecio de

siacutelaba ocorre com as vogais i e a a

o u

Quando em iniacutecio de palavra e em siacutelaba acentuada seguida de i realiza-

se como [ʒ]

Quando entre vogais realiza-se como

[hu te] ~ [hu h de]

huʔ-te

[hej de]

hejn-te

Arco Buriti

148

fricativa glotal sonora [ɦ]

Se vier em iniacutecio de palavra em fala raacutepida e em raiacutezes dissilaacutebicas na posiccedilatildeo de onset de siacutelaba natildeo acentuada poderaacute ser apagado

Quando em onset de siacutelaba acentuada acompanhada de consoante nasal assimila a nasalidade da consoante

adjacente sendo realizada como [n ]

Em final de siacutelaba eacute produzido com pouca fricccedilatildeo Em coda acentuada motiva o alongamento da vogal com frequecircncia como resultado teremos uma vogal com leve aspiraccedilatildeo

Demais realizaccedilotildees de h em coda tendem a seguir o comportamento da

oclusiva glotal ʔ

[hata tatilden]

hat-ta-tatilden]

[ha de]

ha n-te

[hoɦo h de]

hohoʔ-te

[hi ɾ e] ~ [ʒi ɾe]

hih-te

[hiwa n de] ~ [iwa n de]

hiwan-te

[ e ĩ n de] ~ [e ĩ n de]

e ĩ n-te

[ɛ hejdn a ]

ajhhejn-ha

[o h datildeda]

o hna-tatilden-ta

[ lo h tatilde na ]

loh-tatilden-na

[ʃi h ɾe]

sih- te

[ke h atilden] ~ [ke atilden]

Eu natildeo tenho Caraacute Espeacutecie de coruja Pau lenha Gambaacute Couro Vamos lavar (algo) Estaacute alto Eacute onccedila

149

keh-tatilden

[nakadʔnatilde na ]

naka natilde n-na

[ka ɾatilden]

kah-tatilden

[naw ɾe] ~ [nͻ e]

na wh-te

[wede e] ~ [wede ʔ ɾe]

wate h-te

[sej ɾatilde]

sih-tatilden

Casa Ele caccedilou Ela ainda estaacute chorando Estaacute azedo Lontra Espeacutecie de tamanduaacute Eacute largo

Quadro 13 Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos orais (Com base em Telles 2002)

i - vogal alta frontal e i - vogal alta

frontal laringal

Realiza-se como [i] e [i ] podem ser

nuacutecleo de siacutelaba e podem tambeacutem iniciam palavras

i segue qualquer consoante enquanto

i ocorre apenas apoacutes as consoantes

m k h

Quando a coda eacute apagada realiza-se como [i] compensando tal apagamento

[ iɾatilden]

i-tatilden

[i n datildenʌ]

i n-tatilden-ta

[giw lada ɾe] ~ [gi la de]

kiwlah-tah-te

Ele mordeu Estaacute quente Cobra cascavel espeacutecie de cobra

150

e - vogal meacutedia frontal e e - vogal

meacutedia frontal laringal

Realizam-se como [e] e [e ] e correm em

iniacutecio de palavras

Quando seguem consoantes natildeo se realizam apoacutes pmn

Tambeacutem natildeo foram detectadas diante de s l h

Ao serem seguidos pelo glide palatal j favorecem a fusatildeo entre as vogais e o

glide realizando-se como [i] e [i ]

O alongamento tambeacutem se daacute em casos de queda de coda

Em siacutelaba aacutetona de morfemas dissiacutelabos poderaacute ocorrer harmonizaccedilatildeo entre a vogal meacutedia frontal e a vogal tocircnica mais alta da siacutelaba seguinte

Pode ocorrer harmonizaccedilatildeo entre a vogal da raiz lexical e a vogal do sufixo classificatoacuterio

[e ɾatilden]

e-tatilden

[ etatilden]

e ʔ-tatilden

[ sejtatilden] ~ [sitatilden]

set-tatilden

[ weʔkinĩde] ~ [ wiʔkinĩde]

wet-kinĩn-te

[kenĩ de] ~ [kinĩ de]

kanĩn-te

Ele viu Ele fez fogo Ele falou Crianccedila Esquilo

a - vogal baixa central e a - vogal

baixa central laringal

A vogal baixa central a apresenta larga distribuiccedilatildeo e segue qualquer consoante e os dois glides

A vogal baixa central laringal segue quase todas as consoante e dos dois glides

Ambas iniciam palavras e apresentam

vaacuterias alofonias [a] [ʌ] [ͻ] [o] [u] [e]

[ɛ] [aelig] e [i] que podem ser ou natildeo

laringais dependendo da vogal subjacente e da condiccedilatildeo do tom e da harmonia vocaacutelica

Quando em siacutelaba tocircnica a se realiza como [a] [ͻ] e [ͻ]

[ͻ] pode ocorrer quando o nuacutecleo vocaacutelico a assimila o traccedilo labial da coda tautossilaacutebica de w

A segunda variaccedilatildeo [ͻ] resulta da fusatildeo

[a h ɾe]

ah-te

[awde] ~ [ͻ de] ~ [ͻʔ de]

awh-te

[ a wde] ~ [ ͻde] ~ [ ͻʔde]

a w-te

[a wm de] ~ [ ͻ m de] ~ [ͻ m de]

a wn-te

Espeacutecie de abelha Gaviatildeo Flecha Louro

151

entre o nuacutecleo a e a coda w

O alongamento da vogal nuclear ou da coda eacute necessaacuterio agrave preservaccedilatildeo do peso silaacutebico para a aposiccedilatildeo do acento

Em siacutelaba tocircnica se a a eacute seguida por j na coda (nuacutecleo do ditongo) pode se

realizar como [a] [ɛ] [ɛ] e [aelig]

Em siacutelaba aacutetona a realiza-se como [ʌ] preferencialmente

Quanto em posiccedilatildeo aacutetona a se harmoniza com a vogal tocircnica da siacutelaba seguinte quando esta for meacutedia ou alta

As realizaccedilotildees provenientes dessa harmonia vocaacutelica satildeo as vogais [ieou]

O processo de assimilaccedilatildeo pode ocorrer em iniacutecio de siacutelaba aacutetona fazendo com que a se realize como [ͻ] a partir de segmento adjacente seja tautossilaacutebico ou natildeo

[ ajɾatildena] ~ [ ɛatildena]

ajh-tatilden-ta

[a j ɾatilden] ~ [aelig ɾatilden] ~ [ɛ ɾatilden]

a jh-tatilden

[ a j atilde m datilden] ~ [ aelig ʔatildem datilden]

a jn atilde wn-tatilden

[ͻ ɾaʔͻɾaʔi datildenʌ] ~

[ͻ ɾɛʔͻɾɛʔi datildenʌ]

watajwatajn-tatilden-ta

[wͻdaʔ nde] ~ [wadaʔ nde]

watan-te

[i n dacircnʌ]

i n-tatilden-ta

[tʌlawm natildenʌ]

talawn-tatilden-ta

[kimi ɾatildena] ~ [kͻmi ɾatildena]

kamih-tatilden-ta

[walin de] ~ [weli de]

walin-te

[tʌlow natildena] ~ [tolow natildenʌ]

talown-tatilden-ta

[tunu ratildeni]

tanũh-tatilden

Eacute roccedila Ele foi Ele assou peixe Eacute fino Panela Estaacute quente Estaacute grosso Estaccedilatildeo seca Tamanduaacute

152

Devido agrave labializaccedilatildeo de a a realizaccedilatildeo resultante sofre assimilaccedilatildeo de palatalizaccedilatildeo altura de glide precedente ou se funde quando o glide eacute tautossilaacutebico e ocupa onset de siacutelaba em que a eacute a vogal nuclear

[kʌmaʔ matilde n de] ~

[kͻmaʔ matilde n de]

kama-matilden-te

[ͻ ɾaʔͻɾaʔĩ datildenʌ] ~

[ͻ ɾɛʔͻɾɛʔĩ datildenʌ]

watajwatajn-tatilden-ta

[wada n de] ~ [wͻda n de]

watan-te

[jeda n de] ~ [ʒida n de] ~

[ida n de]

Estaacute terminado Ele deu Borboleta Eacute fino Panela cabaccedila Espeacutecie de veado

o - vogal meacutedia fechada posterior e

o - vogal meacutedia fechada laringal

Realizam-se [o] e [o ] respectivamente

Natildeo se realizam apoacutes as consoantes nasais mn

o soacute foi realizada apoacutes as consoantes

t l k

Ambas podem ser realizadas em iniacutecio de vocaacutebulo

As realizaccedilotildees [o] e [o ] satildeo resultados

do alongamento compensatoacuterio que provem da delaccedilatildeo de coda

[o ɾatilden]

oh-tatilden

[o te]

o h-te

[ko n de] ~ [kow n de]

kon-te

Ele misturou massa Macuco Espeacutecie Jabuti

u - vogal alta posterior e u - vogal

alta posterior laringal

Apresentam larga frequecircncia nas realizaccedilotildees

u segue qualquer consoante

[ke ju ɾe]

kejuh-te

Macaco da noite

153

u ocorre apoacutes m n s k j

Ambas iniciam palavras

As realizaccedilotildees alongadas [u] e [u ] satildeo

provenientes de alongamento compensatoacuterio quando a coda eacute elidida

[ku n datildenʌ] ~ [ku datildenʌ]

ku n-tatilden-ta

Ele estaacute fumando

Quadro 14 Descriccedilatildeo dos fonemas vocaacutelicos nasais (Com base em Telles 2002)

ĩ - vogal nasal alta anterior

Sua ocorrecircncia soacute fora verificada a partir do comportamento do morfema ĩ- que eacute uma raiz lexical semanticamente vazia prefixada a morfemas classificadores nominais para funcionar como nuacutecleo nominal

A subjacecircncia de ĩ- sem coda nasal pode ser evidenciada na sonorizaccedilatildeo opcional da oclusiva velar k e no natildeo alongamento da vogal ĩ

[ ĩkalo ɾe] ~ [ ĩgaloɾe]

ĩ-kaloh-te

Taacutebua

atilde - vogal nasal baixa

Eacute encontrada a partir do condicionamento morfoloacutegico no prefixo verbal atildel-

Este prefixo tem valor causativo resultativo

Quanto agrave subjacecircncia de atilde pode-se interpretar que a realizaccedilatildeo do morfema agentivo [atildel- atilde-] estaacute condicionada ao segmento inicial da raiz lexical a qual o prefixo se apotildee

[atildelͻwtatildenʌ] ~ [ a lͻtatildenʌ]

atildel-awt-tatilden-ta

[atilde laj n datildenʌ] ~ [a laj n datildenʌ]

atildel-ajn-tatilden-ta

[atildelo tatildenʌ] ~ [alo tatildenʌ]

atildel-loʔ-tatilden-ta

[atildemũmaj na ]

atildel-mumaʔ-na

[ũba tatildenʌ] ~ [atildeba tatildenʌ]

atildel-pat-tatilden-ta

[ natildej de] ~ [ naj n de]

natildejn-te

Estaacute foi quebrado (algo) Estaacute foi cortado (algo) Estaacute foi afundado (algo) Estaacute foi amansado (algo) Estaacute foi colocado (algo)

154

Quando a raiz verbal eacute iniciada por vogal a forma sobrejacente eacute [atilde-] quando a raiz verbal eacute iniciada por vogal a forma sobrejacente eacute [atildel-]

Outra forma de ocorrecircncia da vogal atilde eacute confirmada na base do contraste entre os ditongos orais aj aw e nasais atildej atildewmesmo quando seguidos por coda nasal formando as sequecircncias ajn awn atildejn atildewn

[ aj n datildeni] ~ [ aj n datildeni]

ajn-tatilden

[jatildewm de] ~ [jatildemde]

jatildewn-te

[wawm datildena] ~ [wͻwm datildena]

wawn-tatilden-ta

Pacu espeacutecie de peixe Ele cortou (algo) Espeacutecie de larva Estaacute vermelho amarelo

ũ - vogal nasal alta posterior

Observada a partir da construccedilatildeo interna e comportamento do morfema prefixal nũh - possessivo de 1pp e de seu homoacutefono nũh - verbo adjetival estar soacute

Quanto agrave subjacecircncia de u eacute observada quando a coda fricativa glotal eacute ressilibificada ao se afixar agrave raiz iniciada por vogal ou glide

[ nũhju te]

nũh-ju -te

[ nũhaj ɾatilden]

[nũhajh-oslash-tatilden

Nossos peacutes Ele vai sozinho

54 FONOLOGIA DO PORTUGUEcircS

Diferentemente do Latundecirc o sistema fonoloacutegico do portuguecircs eacute formado

conforme Cacircmara Jr (1970 p33 ndash 34) por sete vogais que se mantecircm na

mesma quantidade em posiccedilatildeo tocircnica que satildeo reduzidas a cinco quando em

posiccedilatildeo tocircnica diante de nasal em posiccedilatildeo pretocircnica em posiccedilatildeo postocircnica natildeo-

final e em postocircnica final

Quadro 15 Vogais no Portuguecircs (Cacircmara Jr 1970)

Natildeo-arredondadas Arredondadas

Altas i u

Meacutedias Altas e o 2ordm Grau

155

Meacutedias Baixas ɛ ɔ 1ordm Grau

Baixa a

Anterior Central Posterior

Quanto aos segmentos consonantais o portuguecircs dispotildee de acordo com Lopez

1979 p5482 de vinte e dois fonemas que ocupam as posiccedilotildees de onset e coda

Os segmentos consonantais satildeo classificados quanto ao modo e ao ponto de

articulaccedilatildeo

Os segmentos consonantais do portuguecircs ainda podem ser influenciados por

articulaccedilotildees secundaacuterias labializaccedilatildeo palatalizaccedilatildeo velarizaccedilatildeo e dentalizaccedilatildeo

Quadro 16 Consoantes no Portuguecircs (Silva 2002)

Articulaccedilatildeo

Bilabial Labiodental Dental ou alveolar

Alveopalatal Palatal Velar Glotal

Oclusiva p b t d k g Africada tʃ dʒ

Fricativa f v s z ʃ ʒ X Ɣ h ɦ

Nasal m n ɲ y

Tepe ɾ

Vibrante ř

Retroflexa ɹ

Lateral l ɫ ʎ l j

82

Apud Bisol 1996 p198

156

55 COMPARACcedilAtildeO ENTRE OS SISTEMAS FONEacuteTICOS DO PORTUGUEcircS E

DO LATUNDEcirc

Passemos entatildeo agrave comparaccedilatildeo ds sistemas fonoloacutegicos do Portuguecircs e do

Latundecirc para melhor compreensatildeo dos processos foneacuteticos oriundos desse

contato

Quadro 17 Sistemas consonantais x Sistemas vocaacutelicos

Consoantes Vogais

Portuguecircs p b m w t d s z l j n f v ɾ k g h ɹ ɲ ʎ X a ɛ e i ɔ o u

Latundecirc p m w t s l j n k h a atilde a a e e i i i i o o u u u u

Como podemos perceber as liacutenguas apresentam padrotildees distintos no que tange

agrave quantidade de segmentos consonantais e de segmentos vocaacutelicos O portuguecircs

eacute uma liacutengua com mais consoantes enquanto o Latundecirc eacute uma liacutengua

extremamente vocaacutelica

No que tange aos fonemas consonantais o Latundecirc natildeo apresenta muitos dos

fonemas vozeados que compotildeem os pares miacutenimos aleacutem das labiodentais [f v]

Tambeacutem natildeo apresenta as fricativas alvopalatais [ʃ ʒ] nem as palatais nasal e

lateral [ɲ ʎ]

O portuguecircs natildeo dispotildee de vogais laringais enquanto o Latundecirc tem o seu

inventaacuterio basicamente composto por elas

157

A disposiccedilatildeo e presenccedila desses elementos tecircm uma ligaccedilatildeo direta com os

processos fonoloacutegicos ocorrentes o portuguecircs resultante do contato do Portuguecircs

com o Latundecirc como veremos no capiacutetulo VI

158

6 PROCESSOS FONOLOacuteGICOS NO PORTUGUEcircS FALADO PELOS LATUNDEcirc

ldquoComo a liacutengua estaacute a todo momento se equilibrando entre

tendecircncias potencialmente conflitantes e ateacute mesmo opostas estaacute sujeita a sofrer mudanccedilas pois esse equiliacutebrio pode vir a ser alterado por qualquer tipo de fator interno ou

externordquo Chagas (2004 p 151)

61 INTRODUCcedilAtildeO

Eacute senso comum entre os estudiosos que as liacutenguas mudam em diversos

aspectos Certamente a variaccedilatildeo e a mudanccedila lhes satildeo inerentes conforme

Cezario amp Votre (2008 p 141)

Em face da mudanccedila a assertiva acima abarca um conjunto de motivaccedilotildees

internas a uma dada liacutengua bem como outras decorrentes de forccedilas externas em

que se inserem aquelas oriundas do contato linguiacutestico Isso nos chama a

atenccedilatildeo para o fato de que aleacutem do fator tempo outros aspectos podem estar

diretamente ligados agraves transformaccedilotildees pelas quais uma liacutengua passa

A forma como as mudanccedilas sonoras operam na liacutengua eacute tema de discussatildeo haacute

seacuteculos Sobre essa temaacutetica Labov (1981 p269) nos diz que

Sound change appears to be systematic in that a particular change affects all eligible words in a lexicon (McMahon 1994) It is not known however how this process takes place A group of 19th century German linguists called the Neogrammarians originally proposed that sound change occurs abruptly across the lexicon This view is still accepted by many linguists (eg Hock 1991 Labov 1994) In contrast others have argued that sound change spreads gradually across the lexicon (eg Chen amp Wang 1975 Krishnamurti 1978) The same language data is sometimes used to support each hypothesis For instance the

159

English Great Vowel Shift which brought about a series of vowel changes in Early Modern English is used as an example of gradual change (Ogura 1987 Aitchison 1991) as well as abrupt change (Hock 1991 Labov 1994) So the argument over whether sound change occurs abruptly or gradually presents a paradox ldquoboth (views) are right but both cannot be right 269)rdquo

A discussatildeo acerca da natureza da mudanccedila sonora no sentido das duas visotildees

pontuadas acima ainda alcanccedila uma dimensatildeo mais larga quando o contato

intersocietaacuterio eacute considerado As implicaccedilotildees que a variaccedilatildeo assume quando a

emergecircncia das escolhas linguiacutesticas envolve o impacto das interaccedilotildees entre

liacutenguas satildeo multifatoriais Devido agrave complexidade das transformaccedilotildees linguiacutesticas

natildeo podemos estabelecer um uacutenico molde para explicar estas modificaccedilotildees haja

vista que cada caso eacute particular quando tratamos de mudanccedila linguiacutestica

Como fora tratado no capiacutetulo sobre Contato linguiacutestico o encontro de duas ou

mais liacutenguas pode resultar ou natildeo em outras liacutenguas O niacutevel de interferecircncia

oriundo do contato pode fazer com que uma das liacutenguas desapareccedila o que

ocasionaria a sua morte e geralmente neste caso sobreviveria a liacutengua do

dominador ou a permanecircncia dos dois coacutedigos linguiacutesticos tal qual ocorre entre

os Latundecirc

A complexidade da fusatildeo de duas liacutenguas desencadeia por si soacute uma seacuterie de

processos que perpassa os diferentes niacuteveis da gramaacutetica No entanto eacute no niacutevel

foneacutetico fonoloacutegico que estes processos satildeo provavelmente mais evidentes e

mais frutiacuteferos Sendo assim podemos afirmar que os niacuteveis foneacuteticos e

fonoloacutegicos apresentam o maior iacutendice de mudanccedila e variaccedilatildeo de uma liacutengua Por

outro lado de acordo com Cavaliere (2005 p 56)

160

Os estudos desses processos nos auxiliam enquanto estudiosos da liacutengua a entender como se comporta a mudanccedila da liacutengua mediante verificaccedilatildeo dos fatos ocorridos no passado que se mantecircm no presente bem como os que natildeo mais se manifestam as mudanccedilas dos sons nos usos hodiernos

A anaacutelise realizada dos processos fonoloacutegicos do Portuguecircs falado pelos Latundecirc

teraacute como base a estrutura silaacutebica do Portuguecircs e do Latundecirc Para a anaacutelise

consideramos uacutetil adotar a classificaccedilatildeo tradicional dos processos focircnicos

encontrados na linguiacutestica histoacuterica (HOCK1991) por nomear em detalhe os

variados tipos de processos observados Aleacutem disso nos pautamos nos trabalhos

de Spencer (1996) e Lass (2000) que associam reflexotildees mais abstratas para

explicar as ocorrecircncias encontradas Esclarecemos que natildeo eacute nosso propoacutesito

realizar uma anaacutelise fonoloacutegica per si Neste trabalho partimos da descriccedilatildeo dos

processos fonoloacutegicos operantes a fim de refletir sobre o resultado do contato

linguiacutestico de uma liacutengua minoritaacuteria (o Latundecirc) com uma liacutengua

sociohistoricamente dominante o portuguecircs e avaliar o papel da marcaccedilatildeo

linguiacutestica no contexto da interferecircncia Os dados como jaacute afirmamos fazem

parte do acervo do NEI (Nuacutecleo de Estudos Indigenistas) da UFPE

Para uma melhor compreensatildeo a anaacutelise dos fenocircmenos observados segue

distribuiacuteda em quatro subgrupos que evolvem os processos foneacutetico-fonoloacutegicos

observados i) perda de elementos ii) ganho iii) alteraccedilatildeo (transposiccedilatildeo ou

permuta) que estatildeo diretamente ligados aos processos fonoloacutegicos de

assimilaccedilatildeo (progressiva e regressiva) fortalecimento leniccedilatildeo apagamento

inserccedilatildeo e coalescecircncia A classificaccedilatildeo desses processos nos remete agrave

termonoligia claacutessica da linguiacutestica de base

161

611 Perda de elementos

Seguindo a tendecircncia das liacutenguas do mundo os processos que envolvem perda

de elementos tambeacutem satildeo os mais recorrentes no portuguecircs falado pelos

Latundecirc Dessa feita estes processos satildeo os que tecircm uma relaccedilatildeo direta com a

estrutura silaacutebica do Portuguecircs que se vecirc obrigada a rearranjar os componentes

da siacutelaba para o padratildeo (CV)

Quanto agrave marcaccedilatildeo o portuguecircs assimilado pelos Latundecirc nem sempre tende a

preservar os padrotildees mais marcados de sua liacutengua conforme descriccedilatildeo nos

processos que se seguem

6111 Monotongaccedilatildeo

Assim como no Portuguecircs a monotongaccedilatildeo eacute um processo natural e bastante

atuante no Latundecirc que eacute uma liacutengua propensa a tal fenocircmeno Eacute uma tendecircncia

geral observada na produccedilatildeo da fala da comunidade Latundecirc verifica-se que os

ditongos crescentes e decrescentes estatildeo sendo frequentemente fusionados

realizando-se como monotongos (TELLES 2002 p100 - 102)

Quanto aos ditongos crescentes Telles (idem p 103) afirma que a tendecircncia ao

processo de monotongaccedilatildeo em ditongos crescentes eacute quase categoacuterica nas

siacutelabas aacutetonas de raiacutezes dissilaacutebicas quando a vogal nuclear eacute a central baixa a

Outros aspectos observados pela autora que fazem menccedilatildeo agrave monotongaccedilatildeo

apontam que a geraccedilatildeo poacutes-contato realizam sistematicamente e com frequecircncia

162

a fusatildeo entre os ditongos decrescentes Os ditongos aw a w aj a j satildeo os que

mais regularmente sofrem processo dos quais decorrem as realizaccedilotildees meacutedias

baixas [ɔ ɔ ɛ ɛ ] que natildeo fazem parte do inventaacuterio fonoloacutegico das vogais do

Latundecirc

Os ditongos iw ow que ocorrem em menor frequecircncia satildeo mais marcados

Nestes a monotongaccedilatildeo se daacute com a preservaccedilatildeo da vogal do nuacutecleo i o O

ditongo e j apresenta pouquiacutessimos casos de fusatildeo mantendo a qualidade do

glide diferentemente dos demais ditongos que satildeo constituiacutedos por vogais natildeo

baixas Sua realizaccedilatildeo seraacute a vogal alta anterior [i]

Apresentamos abaixo os dados apresentados por Telles (idem 101) onde os

resultados foneacuteticos do processo de monotongaccedilatildeo satildeo mais frequentes

Quadro 18 Resultado mais frequente do processo de monotongaccedilatildeo em Latundecirc

Em tritongos a fusatildeo eacute mais frequente quando o glide labial w preenche a

posiccedilatildeo da coda diferentemente da palatal j que pouco se fusiona Nos dois

casos a fusatildeo se daacute apenas com o apagamento do glide poacutes-nuclear

aw gt ɔ [lsquoɔɾe] rsquoawh-lsquote Gaviatildeo

a w gt ɔ [ɔ rsquode] a w-lsquote Fleche

aj gt ɛ [ɛrsquoɾatildena] ajh-lsquotatilden-ta eacute roccedila

aj gt ɛ [ɛ rsquoɾatildena] rsquoa jh-lsquotatilden-ta ele tem andado

iw gt i [lsquogilade] rsquokiwlah-lsquote cobra cascavel

ow gt o [torsquolodatildena] tarsquolown-lsquotatilden-ta ele tem terminado

163

No que se refere ao comportamento de ditongos decrescentes diante de

consoante nasal tautossilaacutebica podem ocorrer diferentes manifestaccedilotildees de

superfiacutecie a depender do ponto do glide Se os ditongos decrescentes terminarem

com glide laacutebio-dorsal w e seguidos por elemento nasal tautossilaacutebico awn a wn

atildewn own apagaratildeo o glide da coda e a vogal nuclear preservaraacute o ponto de

articulaccedilatildeo

Caso o ditongo seja oral a realizaccedilatildeo preferencial seraacute a da manutenccedilatildeo do

ditongo com o glide ocorrendo na superfiacutecie Se o ditongo for nasal o glide pode

ser nasalizado regressivamente Todavia a realizaccedilatildeo preferencial seraacute o glide

Em preferecircncia o glide j eacute mantido conservando sua palatalidade em ditongos

decrescentes que terminam com o glide j constituindo os ditongos ajn a jn atildejn

jn

Os glides wj na posiccedilatildeo de onset podem ser consonantizados O glide j natildeo se

apresenta como fator motivador para este processo Nos poucos casos

apresentados a vogal nuclear eacute a anterior e ou a central a

De acordo com a literatura existente para o Portuguecircs a monotongaccedilatildeo se aplica

a todos os ditongos Entretanto alguns contextos licenciam o processo enquanto

outros o bloqueiam No portuguecircs falado pelos Latundecirc os ditongos decrescentes

orais83 assim como no portuguecircs de longe foram os mais monotongados Aleacutem

destes o ditongo nasal decrescente [atildew] tanto em final de verbos quanto de

nomes mostrou-se recorrente na reduccedilatildeo

83

[aj][ aw] [ej] [ew] [ow] [oj]

164

Enquanto processo natural a monotongaccedilatildeo no portuguecircs falado por Latundecirc

visa simplificar os padrotildees silaacutebicos mais marcados sobretudo na posiccedilatildeo final de

vocaacutebulos jaacute que no Latundecirc natildeo haacute a ocorrecircncia deles

Esclarecemos que os processos observados na fala dos Latundecirc que tambeacutem

ocorrem no portuguecircs atual natildeo foram incluiacutedos nos dados discutidos neste

capiacutetulo ressalvando-se situaccedilotildees nas quais eram necessaacuterios agraves nossas

reflexotildees

De acordo com os exemplos

acima o processo de

monotongaccedilatildeo pode se dar de

duas formas i) apagamento

de um segmento geralmente

o glide ii) fusatildeo de elementos

Os ditongos mais propensos agrave

monotongaccedilatildeo satildeo os

decrescentes Quanto agraves classes de palavras os ditongos presentes nas formas

verbais satildeo mais frequentemente monotongados

No portuguecircs o processo de monotogaccedilatildeo eacute operante porem haacute restriccedilotildees que

natildeo coincidem com o observado na fala dos Latundecirc Bisol (2001 p 112) afirma

(1) [keme] queimei (2) [satildersquogɾaɾi] sangraram

[firsquokaɾi]

ficaram

(3) [fakotilde] facatildeo [motilde] matildeo [koɾasotilde] coraccedilatildeo

[gɾatildedotilde] grandatildeo

[tubaɾotilde]

tubaratildeo

(4) [kaze]

causa

(5) [note]

noite

(6) [lsquotaba] taacutebua (7) lsquomatildeoslash matildersquodava matildee mandava

165

que apenas os ditongos decrescentes satildeo verdadeiros Os crescentes de acordo

com ela seriam falsos pois podem ser realizados como hiato e tecircm variaccedilatildeo livre

Aleacutem disso com respeito aos ditongos decrescentes a autora ainda considera

que haacute dois diferentes tipos de ditongos um considerado pesado que natildeo sofre

reduccedilatildeo (leite) e outro leve passiacutevel de reduccedilatildeo (couro) Ela elenca alguns

ambientes que condicionam a monotongaccedilatildeo como a presenccedila da tepe ou da

palatal em posiccedilatildeo seguinte

Entretanto os dados de (1) a (7) acima nos mostram ocorrecircncias da

monotongaccedilatildeo em contextos muito distintos do que ocorre em Portuguecircs Sobre

estes avaliamos sua ocorrecircncia como segue

Quando em final de vocaacutebulos principalmente nas formas verbais do passado

simples conforme visto em (2) o que ocorre natildeo eacute um fenocircmeno de

monotongaccedilatildeo em que se espera o apagamento de um dos segmentos ou a

fusatildeo dos formadores do ditongo Nos dados em (2) entretanto encontra-se a

substituiccedilatildeo do ditongo por um segmento que articulatoriamente natildeo deriva da

estrutura lexical A vogal anterior com traccedilo de ponto coronal84 realizada em

[firsquokaɾi] ldquoficaramrdquo [satildersquogɾaɾi] ldquosangraramrdquo ocorre em posiccedilatildeo aacutetona final Essa

realizaccedilatildeo pode ser decorrente do espraiamento da coronalidade da consoante

precedente Outros aspectos de relevo para explicar esse fenocircmeno satildeo a

posiccedilatildeo final dos segmentos e a atonicidade Esses condicionantes favorecem a

substituiccedilatildeo total do ditongo nasal para a vogal anterior alta Essa produccedilatildeo eacute

84

Assumimos largamente neste trabalho a terminologia da fonologia claacutessica estrutural (GLEASON 1969) Entretanto termos mais teacutecnicos provenientes da teoria dos traccedilos distintivos (JAKOBSON 1952 CHOMSKY e HALE 1968) satildeo introduzidos quando favorecem a elucidaccedilatildeo dos fatos Da mesma forma ocasionalmente nos referimos a processos ancorados na fonologia poacutes-gerativa (CLEMENTS e HUME 1995)

166

restrita agrave fala dos indiacutegenas da geraccedilatildeo preacute-contato que adquiriram o portuguecircs

pelo menos no iniacutecio da idade adulta

A relevacircncia da tonicidade tambeacutem se evidencia nos dados em (3) Nesses casos

([fakotilde] ldquo facatildeordquo [lsquomotilde] ldquomatildeordquo [koɾasotilde] ldquocoraccedilatildeordquo) apesar de o ditongo nasal atildew

sofrer a fusatildeo passando a ser realizado [otilde] a posiccedilatildeo do acento preserva a

identidade de parte da estrutura nasalizaccedilatildeo e posteriorizaccedilatildeo com

arredondamento A tendecircncia aacute preservaccedilatildeo da estrutura tambeacutem eacute encontrada

no dado em (1) A monotongaccedilatildeo na siacutelaba tocircnica preserva a qualidade da vogal

nuclear em [kersquome] ldquoqueimeirdquo

O Latundecirc evita coda Esse comportamento se alinha agrave ideia de que The CV

syllable is a prototypical example widely considered to be the universally

unmarked syllable type (HUME 2004)

A monotongaccedilatildeo do ditongo nasal atildej em matildej gt matilde natildeo eacute encontrado

regularmente na fala latundecirc Esse fenocircmeno deve ter sido engatilhado pela

juntura externa na qual se observa que a siacutelaba da palavra seguinte conteacutem

sequecircncia focircnica semelhante agrave da siacutelaba que sofreu supressatildeo da semivogal

Um mesmo ditongo pode ou natildeo apresentar diferentes realizaccedilotildees em cada

liacutenguas Por exemplo os ditongos aw atildew aj atildej que existem tanto no Latundecirc

quanto no Portuguecircs se comportam da seguinte forma

Quadro 19 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Latundecirc

aw ɔ [lsquoɔɾe] ˈawh-te lsquogaviatildeorsquo

atildew atildew ~ AM [ˈjatildewmde] ~ [ˈjatildemde] ˈjatildewm-te lsquolarvarsquo

aj ɛ [єrsquoɾatildena] ˈajh-ˈtatilden-ta lsquoeacute roccedilarsquo

atildej atildej ~ atildej [ˌatildejˈdatildeni] ~ [atildejndatildeni] ˈatildejn-tatilden lsquoele cortoursquo

167

Quadro 20 Comportamento dos ditongos aw atildew aj atildej em Latundecirc

aw aw [lsquopaw] pau lsquopaursquo atildew otilde [ˈsotilde] satildew lsquosatildeorsquo atildew i [satildeˈgɾaɾi] sangɾaɾatildew lsquosangraratildeorsquo

atildej atildej [ˈmatildej] matildej lsquomatildeersquo

aj aj [ˈpaj] pai lsquopairsquo

Os ditongos aw em posiccedilatildeo do acento resultam nas vogais meacutedias baixas ɔ e

ɛ no proacuteprio Latundecirc mesmo sendo essas vogais mais marcadas e natildeo

fonoloacutegicas na liacutengua Entretanto no portuguecircs esses ditongos natildeo sofrem

processo de fusatildeo quando ocorrem em siacutelaba tocircnica

A uacutenica vogal nasal constatada na reduccedilatildeo do ditongo eacute [otilde] resultante do ditongo

decrescente nasal atildew Neste caso eacute proacutepria vogal nasal que favorece a vogal

resultante da fusatildeo

Diferentemente do Portuguecircs em Latundecirc os ditongos natildeo se realizam em fim de

vocaacutebulos Desta forma o Portuguecircs falado por Latundecirc tende a seguir o que eacute

posto no Portuguecircs utilizando as vogais menos marcadas [satildegɾaɾɪ] ~ sangraram

[desaɾƱ] ~ deixaram

O que podemos verificar quanto agrave monotongaccedilatildeo eacute que em termos gerais o

Latundecirc natildeo transfere os traccedilos e caracteriacutesticas mais marcadas na liacutengua para o

Portuguecircs falado por eles

168

6112 Siacutencope em onset complexo de l e ɾ

A reduccedilatildeo do onset complexo em Portuguecircs falado pelos Latundecirc eacute um processo

muito comum que se daacute devido a natildeo aceitaccedilatildeo de um segundo elemento no

onset Como podemos observar eacute um processo variante que estaacute atrelado agrave

reorganizaccedilatildeo da siacutelaba e que eacute passiacutevel de sistematicidade

De acordo com Telles (2002 p105) a estrutura silaacutebica do Latundecirc permite a

composiccedilatildeo de seis padrotildees V VC VCC CV CVC CVCC que se

incluem na extensatildeo (C)V(C)(C) que podem ser representados de acordo com

estrutura silaacutebica descrita abaixo

Figura 17 Estrutura silaacutebica do Latundecirc

Os elementos que se encontram entre parecircnteses satildeo opcionais Em Latundecirc as

sequecircncias CV V VC CVC VCC e CVCC ocorrem com frequecircncia

169

sendo os dois primeiros padrotildees os mais frequentes Isso nos mostra o quanto o

Latundecirc evita onsets complexos e codas

A estrutura silaacutebica do portuguecircs de acordo com Mattoso Cacircmara (1969) define

o molde silaacutebico CCVCC conforme figura abaixo

Figura 18 Estrutura silaacutebica do Latundecirc (Cacircmara-Juacutenior)

Seguindo a proposta de Mattoso Cacircmara com respeito agrave distribuiccedilatildeo interna dos

constituintes da siacutelaba as uacutenicas consoantes que preenchem a segunda posiccedilatildeo

do onset satildeo as liacutequidas l e ɾ A coda pode ser preenchida pelas consoantes l

e pelos arquifonemas R S N

No Latundecirc o grupo consonantal no onset natildeo eacute fonoloacutegico Entretanto eacute

atestada a ocorrecircncia dos [tɾ dɾ kɾ gɾ] no plano foneacutetico como resultado da

reduccedilatildeo em siacutelaba pretocircnica de sufixo nominal e verbal A formaccedilatildeo de onset

complexo eacute estrutura marcada no Latundecirc como tambeacutem interlinguisticamente

A estrutura mais complexa e menos frequente (marcada) do encontro consonantal

no onset tende a ser simplificada no portuguecircs falado pelos Latundecirc Como

170

podemos observar em (8) e (9) os grupos consonantais satildeo pronunciados como

um soacute elemento Trata-se do apagamento da tepe e da lateral liacutequida Eacute um

processo em acomodaccedilatildeo que estaacute diretamente ligado agrave faixa etaacuteria dos falantes

Assim os mais novos seguem a tendecircncia de pronunciar o onset complexo

diferentemente dos mais velhos

(8) [bi ka nƱ] brincando

[de tƱ] dentro

[kɛbapƱ] quebraram

[otƱ] outro

(9) [buza] blusa [biciketɪ] bicicleta Embora a reduccedilatildeo do onset complexo seja um fenocircmeno variaacutevel para algumas

variedades do portuguecircs as realizaccedilotildees acima natildeo correspondem agrave fala de

adultos sendo resultantes no processo da aquisiccedilatildeo da liacutengua

Jaacute entre os Latundecirc satildeo os mais velhos que apresentam a realizaccedilatildeo do onset

simplificado como um fenocircmeno variaacutevel conforme observamos em (10)

(10) [b ɾ ĩkarƱ] brincaram [sotildebrasotilde] assombraccedilatildeo [pɾimeɾɪ] primeiro

[febrƱ] febre [fɾɛsa] flecha

O rotacismo (l gt ɾ) da lateral presente em lsquoflecharsquo acima que eacute muito frequente

no portuguecircs menos escolarizado tambeacutem ocorre na fala dos indiacutegenas

171

6113 Apagamento da coda

Em portuguecircs quatro elementos podem ocupar a posiccedilatildeo de coda RSlN aleacutem

dos glides wj85 Em Latundecirc a coda pode ser ramificada e satildeo seis os

segmentos que podem preencher o espaccedilo da coda os glides w j aleacutem das

consoantes t h n Ɂ Como a coda pode ter ateacute duas posiccedilotildees preenchidas os

primeiros elementos satildeo sempre neste caso os glides w j Embora a coda da

siacutelaba fonoloacutegica possa ser preenchida pelas consoantes acima o Latundecirc eacute uma

liacutengua que evita coda na superfiacutecie O fenocircmeno que decorre dessa tendecircncia eacute o

alongamento compensatoacuterio (Clements e Hume 1995)

(11) [ˌn ˈh te]

ˈn h-ˈ Ɂ -te

lsquonossos peacutesrsquo

No dado acima podemos observar a natildeo realizaccedilatildeo da coda fricativa glotal h na

marca de posse ˈnu h- e da coda oclusiva glotal Ɂ o item lexical ldquopeacuterdquo ˈju Ɂ

Nos dois casos o apagamento da coda eacute compensado pelo alongamento

vocaacutelico No caso do morfema de posse ocorre a ressilabaccedilatildeo da coda fricativa

Do ponto de vista da marcaccedilatildeo a siacutelaba menos marcada eacute a que apresenta o

padratildeo CV (Hume 2004 p 183) O Latundecirc tem a tendecircncia a seguir esse

padratildeo de forma que para a liacutengua a coda embora fonoloacutegica eacute mais marcada

A simplificaccedilatildeo da estrutura mais marcada (presenccedila de coda) eacute transferida para

o portuguecircs Conforme os dados descritos abaixo os segmentos que mais satildeo

apagados em posiccedilatildeo de coda satildeo os glides j w e as consoantes h s Como o

85

Mattoso Cacircmara (1969) considera que os glides pertencem ao nuacutecleo Neste caso trata-se de um nuacutecleo ramificado

172

Latundecirc natildeo tem na sua estrutura silaacutebica a coda fricativa alveolar s esse

segmento natildeo eacute licenciado no portuguecircs dos indiacutegenas (dados em 13) Esse

fenocircmeno eacute categoacuterico na fala dos mais velhos e eacute variaacutevel na fala dos indiacutegenas

da geraccedilatildeo poacutes-contato

(12) [m to] muito [koɾƱ] couro

[voto] voltou (13) [dumi] durmir [pig ta] pergunta [pota] porta [kota] corta [pɛtƱ] perto

[kotildekorsquodo] concordou [barsquobudƱ] barbudo (14) [hipotildersquodew] respondeu [gorsquotozƱ] gostoso [iˈtɛla] Stella ([isˈtɛla])

A coda eacute um elemento universalmente marcado No Latundecirc a sua realizaccedilatildeo eacute

em menor frequecircncia do que o Portuguecircs apesar de sua larga presenccedila na

subjacecircncia O que percebemos ademais eacute que o apagamento do R e do s em

coda contribui para a elevaccedilatildeo da vogal meacutedia pretocircnica tautossilaacutebica conforme

os dados ldquocorta e portardquo em (12)

A regra abaixo sintetiza o comportamento da coda no portuguecircs dos Latundecirc

C ou V [oslash] coda

173

Como vimos no Portuguecircs falado por Latundecirc qualquer consoante ou vogal

poderaacute ser apagada em posiccedilatildeo de coda Esta regra tem se mostrado menos

produtiva nas faixas etaacuterias mais novas Nessas geraccedilotildees o apagamento eacute mais

produtivo quando coincide com a realizaccedilatildeo encontrada por nativos em

portuguecircs ([ˈfosa] lsquoforccedilardquo)

6114 Reduccedilatildeo do geruacutendio ndash Anteriorizaccedilatildeo da vogal final

A reduccedilatildeo do geruacutendio eacute um processo comum em alguns dialetos brasileiros

sobretudo em registro menos tenso Esse eacute mais um processo que resulta no

apagamento de segmentos No portuguecircs falado pelos Latundecirc eacute praticamente

categoacuterica a ocorrecircncia da assimilaccedilatildeo da alveolar em geruacutendio

(15) [falatildenƱ] falando [b ɾ ĩgatildenƱ] brigando [kume nƱ] comendo

[bersquobe nƱ] bebendo

[sorsquo ɾ anƱ] chorando

[mersquosenƱ] mexendo [mi ti nƱ] mentindo

Por ser esse um fenocircmeno de larga frequecircncia no portuguecircs nativo entendemos

que a simplificaccedilatildeo segmental da estrutura gerundiva natildeo eacute surpreendente no

portuguecircs indiacutegena Entretanto na produccedilatildeo da geraccedilatildeo preacute-contato a

assimilaccedilatildeo total da oclusiva alveolar eacute acompanhada pela anteriorizaccedilatildeo da

vogal final conforme dados a seguir

174

(16) [dimuɾatildenɪ] demorando

[asinatildenɪ] ensinando [tiɾatildenɪ] tirando

[katildetatildenɪ] catando [kɾese nɪ] crescendo

Para anaacutelise das ocorrecircncias acima precisamos considerar a estrutura do

Latundecirc nessa liacutengua uma terminaccedilatildeo verbal altamente produtiva eacute o morfema

aspectual acentuado -ˈtatilden Esse morfema pode ser seguido pelo morfema de

modo neutro -i resultando nas sequecircncias -ˈtatildeni conforme exemplo abaixo

(17) [keˈja ˌdaˈɾatildeni]

keˈjat ˈta-tatilden-i milho deitar-imperfectivo-neutro

eacute milho deitado (espalhado no chatildeo)

Como no Latundecirc o verbo (e nome) natildeo termina em vogal posterior tal restriccedilatildeo

pode explicar a anteriorizaccedilatildeo do geruacutendio do portuguecircs

6115 Reduccedilatildeo das palatais nasal e lateral

A reduccedilatildeo das palatais nasal e lateral estaacute diretamente ligada agrave natildeo existecircncia

destes segmentos no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc No entanto Clements e

Hume (1995) em seus estudos apontam estes fonemas como complexos do ponto

de vista de seu comportamento

175

Os segmentos ɲ e ʎ satildeo consoantes mais marcadas A natildeo realizaccedilatildeo destas

consoantes no Latundecirc jaacute eacute um fator para a natildeo realizaccedilatildeo no Portuguecircs devido agrave

complexidade inerente de tais segmentos Enquanto segmentos mais complexos

as palatais satildeo sujeitas ao enfraquecimento atraveacutes da iotizaccedilatildeo (vocalizaccedilatildeo)

Mesmo no portuguecircs esse eacute um processo operante particularmente em

variedades populares Mattoso Cacircmara (1981 p 149) descreve que se trata de

ldquomudanccedila de uma vogal ou consoante para a vogal anterior alta i ou para a semivogal correspondente ou iode Nos falares crioulos portugueses haacute a iotizaccedilatildeo das consoantes molhadas ʎ e ɲ ex mulher gt muyeacute nhonho gt ioiocirc (africanismo)rdquo

Aleacutem da iotizaccedilatildeo o portuguecircs apresenta a despalatizaccedilatildeo da lateral em que ʎ

realiza-se [l] como em [muˈlɛ] lsquomulherrsquo

No portuguecircs dos Latundecirc o enfraquecimento se daacute mais frequentemente pela

iotizaccedilatildeo como em (18) Estas realizaccedilotildees ocorrem na fala dos mais velhos na

geraccedilatildeo anterior ao contato

18) [muˈjɛ] mulher

[baɾuj] barulho

[ojˈatildenƱ] olhando

[vimej] vermelho (19) [fila] filha [fola] folha

Weinreich (1953 p 18) explica que quando em sistemas foneacuteticos em contato

podem ocorrer os processos de reinterpretaccedilatildeo de fone que leva a substituiccedilatildeo

de segmento Eacute o que acontece nos exemplos acima

176

Em (20) e (21) o processo de despalatalizaccedilatildeo resulta no apagamento total da

palatal

(20) [miƱ] milho [fii] filho (21) [mia] minha A reduccedilatildeo tem menos restriccedilotildees se comparada com os fatos do portuguecircs falado

por nativo Em (20) as ocorrecircncias satildeo atestadas no portuguecircs enquanto primeira

liacutengua Diante da vogal posterior natildeo apenas o apagamento da palatal pode

ocorrer como tambeacutem o da siacutelaba inteira Em (21) observamos uma realizaccedilatildeo

particular dos Latundecirc em que a consoante palatal nasal eacute apagada plenamente

sem deixar vestiacutegio nasal na vogal que a precede Esse fato tem relaccedilatildeo com a

complexidade que envolve as nasais na liacutengua indiacutegena a qual natildeo coincide com

os processos existentes no portuguecircs

No caso de (22) ocorre o apagamento da siacutelaba em que se encontra a palatal

nasal do diminutivo eacute comum a variedades populares do portuguecircs

(22) [pikinĩnĩ ] pequenininho [faki ] faquinha

Como afirmamos no iniacutecio da seccedilatildeo os segmentos palatais natildeo existem em

Latundecirc o que torna sua produccedilatildeo no Portuguecircs falado pelos Latundecirc mais

marcada e de difiacutecil ocorrecircncia

177

6116 Afeacuterese

A afeacuterese eacute um processo foneacutetico que consiste na queda de elementos iniciais do

vocaacutebulo Este processo que fora responsaacutevel pelas modificaccedilotildees foneacuteticas do

Latim para o Portuguecircs ainda eacute atuante no estaacutegio atual da liacutengua

A queda da siacutelaba inicial es- em verbos como esperar e estar e do a- em

vocaacutebulos como aqui e acabar eacute muito comum em alguns dialetos brasileiros

Entretanto este tipo de delaccedilatildeo no portuguecircs falado pelos Latundecirc se expande

para outros vocaacutebulos da liacutengua conforme os exemplos abaixo

(23) [kutatildeni] escutando [kapa] escapa [kapo] escapou [peɾatildenƱ] esperando

[pi gada] espingarda

(24) [tupiw] entupiu [gatildeno] enganou [tehaɾƱ] enterraram

(25) [kɪ] aqui [lsquokelɪ] aquele [bɾasadƱ] abraccedilado

[meto] aumentou [korsquodadƱ] acordado [batildedono] abandonou [kaboʃe] acabou-se

(26) [fiɾe tɪ] diferente

[pitaw] hospital

178

Natildeo consta no inventaacuterio fonoloacutegico dessa liacutengua a presenccedila da fricativa alveolar

surda em posiccedilatildeo de coda Essa restriccedilatildeo eacute transferida para o portuguecircs falado

por Latundecirc conforme (23)

Outra razatildeo para esse fenocircmeno pode estar na estrutura prosoacutedica da palavra no

Latundecirc Nessa liacutengua as palavras satildeo monossilaacutebicas ou dissilaacutebicas Raiacutezes

com mais de duas siacutelabas satildeo raras (TELLES 2002) Associado a isso o acento

eacute morfoloacutegico em raiacutezes Nas dissilaacutebicas o acento recai na segunda siacutelaba

(27) [ˈmatilde ginĩde] ˈmatildejn-kiˈnĩn-te caju-redondo-Sufixo Nominal

lsquocastanha de cajursquo

No dado (27) encontramos exemplos de raiz monossilaacutebica e de raiz dissilaacutebica

Jaacute no portuguecircs haacute um nuacutemero relevante de palavras trissiacutelabas e polissiacutelabas

Diante disso a afeacuterese pode ser uma interferecircncia da estrutura do leacutexico da

liacutengua indiacutegena para simplificar a estrutura do portuguecircs - mais marcada no

Latundecirc Este fenocircmeno natildeo afeta o acento e eacute operante sobretudo quando a

siacutelaba inicial natildeo tem onset

6117 Apoacutecope

A apoacutecope eacute uma das formas de apagamento de segmentos que estaacute

relacionada assim como a afeacuterese a outros processos foneacuteticos

179

A queda de elementos finais eacute uma das formas de reduccedilatildeo ou reorganizaccedilatildeo

silaacutebica e de palavras Assim como nos demais processos a siacutelaba tocircnica eacute

preservada de qualquer alteraccedilatildeo

Embora alguns processos explicados aqui tratem da apoacutecope como a reduccedilatildeo do

geruacutendio e ditongo finais ou apagamento da nasal palatal a exemplo de (27)

estes exemplos jaacute foram mecionados nas seccedilotildees anteriores A presenccedila deles

aqui eacute para mostrar que os outros processos foneacuteticos resultam na apoacutecope

(28) [ ʒ rsquotaɾɪ] juntaram

[tursquodĩ] tudinho [ti ] tinha

[lsquovE ] velho [kabersquosĩ] cabecinha [lsquonatilde] natildeo [lsquomatilde] matildee (29) [lsquove] ver [lsquokɛ] quer (30) [nɔj] noacutes

[maj] mais [dirsquofisɪ] difiacutecil [dirsquofisƱ] difiacutecil [tatildersquome j] tambeacutem

(31) [virsquoa] viado [lsquoluɾɪ] Lurdes

[lsquote ] dele

Em (29) a apoacutecope do R final eacute processo muito comum no portuguecircs atual

Diante de tal explicaccedilatildeo natildeo nos cabe assegurar se o processo eacute proacuteprio do

180

Latundecirc ou se da variedade atraveacutes da qual os indiacutegenas adquiriram o portuguecircs

Os dados em (30) tambeacutem apontam para a interpretaccedilatildeo dos dados mostrados

em (29)

Em (31) os dados apresentam um apagamento incomum ao portuguecircs de

nativos A fala espontacircnea e natildeo tensa eacute uma possibilidade explicativa uma vez

que essas ocorrecircncias natildeo satildeo sistemaacuteticas

Os dados de apoacutecope natildeo evidenciam a transferecircncia de traccedilos mais marcados

do Latundecirc para o portuguecircs

6118 Siacutencope86

A forma mais comum deste processo se apresenta no portuguecircs nas

proparoxiacutetonas Em alguns dialetos a depender do contexto linguiacutestico eacute

categoacuterico a ocorrecircncia da reduccedilatildeo interna no vocaacutebulo

Nos exemplos elencados em (32) no caso das proparoxiacutetonas tal reduccedilatildeo eacute

motivada pelo padratildeo acentual do portuguecircs que permite com mais toleracircncia o

padratildeo paroxiacutetono ao proparoxiacutetono conforme Silva (2006 p78)

Quando ocorrente no Portuguecircs este processo estaacute relacionado ao apagamento

da vogal postocircnica medial Com a reduccedilatildeo vocaacutelica a consoante precedente

pode tomar dois caminhos i) eacute incorporado agrave siacutelaba tocircnica na posiccedilatildeo de coda ii)

86

Os exemplos apresentados demonstram que o processo ocorrente eacute muito mais motivado pelo

Portuguecircs do que pelo Latundecirc A nossa classificaccedilatildeo fica aqui a caraacuteter de registro

181

passa a onset da siacutelaba aacutetona seguinte o que afeta sua constituiccedilatildeo O

apagamento vocaacutelico resulta em uma palavra paroxiacutetona

(32) [lsquomuʒka] muacutesica [lsquohapƱ] raacutepido [lsquokOʃka] coacutecega [lsquoavɾɪ] aacutervore

Entendemos que muitas destas ocorrecircncias no Latundecirc se datildeo pelo portuguecircs de

contato Isso eacute confirmado pela produccedilatildeo de ldquomuacutesicardquo e ldquocoacutecegardquo que licencia

uma restriccedilatildeo forte no Latundecirc a fricativa sibilante em coda Aleacutem disso a

produccedilatildeo de ldquoraacutepidordquo ([ˈhapƱ]) tambeacutem coincide com a realizaccedilatildeo encontrada no

portuguecircs popular na qual a consoante em onset da siacutelaba apagada passa a

onset da siacutelaba seguinte devido agrave restriccedilatildeo no portuguecircs de onda oclusiva

612 Ganho de elementos (Inserccedilatildeo de elementos)

Embora em menor nuacutemero os processos que resultam em ganhos de elementos

tambeacutem ocorrem no Portuguecircs falado pelos Latundecirc Satildeo poucos os processos e

menores ainda os casos em que eles ocorrem Isso pode ser explicado como jaacute

fora dito devido ao fato de as liacutenguas em geral terem um dinamismo proacuteprio que

favorece mais agrave perda do que o ganho de elemento Em alguns casos a

motivaccedilatildeo para o ganho de material foneacutetico satildeo as restriccedilotildees fonotaacuteticas da

liacutengua e ou a tendecircncia agrave formaccedilatildeo de padratildeo silaacutebico menos marcado No caso

do portuguecircs de acordo com Collischonn (2004 p 67) um tipo de ganho de

material precisamente a epecircntese vocaacutelica

ocorre mais quando a consoante perdida estaacute em posiccedilatildeo pretocircnica como em objeto magneacutetico e opccedilatildeo ocorrendo em apenas 24 dos vocaacutebulos na posiccedilatildeo postocircnica em palavras como egiacutepcios eacutetnico ou ritmo Mais especificamente estes resultados mostram que a epecircntese que em outros contextos

182

ocorre numa taxa bastante alta eacute dramaticamente reduzida em posiccedilatildeo postocircnica

Exemplos do que a autora descreve seguem apresentados abaixo em (33) O

primeiro dado traz a inserccedilatildeo da vogal epenteacutetica default no portuguecircs a anterior

alta [i] e a segundo natildeo ocorrecircncia da inserccedilatildeo

(33) [lsquoabiˈsuhdƱ] absurdo [koˈlapisƱ] colapso

A epecircntese vocaacutelica nos dados examinados natildeo foi muito expressiva sobretudo

pelo fato de natildeo termos encontrado um nuacutemero significativo de palavras com

encontro consonantal no leacutexico dos indiacutegenas Entretanto alguns casos como em

(34) ilustram a ocorrecircncia no portuguecircs dos Latundecirc

(34) [ˈmɔgunƱ] mogno (35) [piˈnew] pneu

A estrutura que favorece a epecircntese no portuguecircs natildeo faz parte das regras

fonotaacuteticas do Latundecirc o que tambeacutem pode favorecer a vogal epenteacutetica nos

dados observados

(36) [haacutersquopazɪ] rapaz [haacutersquopazƱ] rapaz [parsquope sɪ] papeacuteis [dorsquose zɪ] de vocecircs [lsquonͻ zɪ] noacutes

183

Diferentemente do que ocorre em (34 - 35) os dados de (36) nos direcionam para

a paragoge processo que se caracteriza pela inserccedilatildeo de elemento(s) no final do

vocaacutebulo Este processo tambeacutem estaacute diretamente ligado agrave presenccedila da fricativa

alveolar desvozeada em coda sendo esse segmento proibido nessa posiccedilatildeo no

Latundecirc No caso citado a inserccedilatildeo pode ser da vogal alta posterior rapaz

[hapazƱ] mas a preferecircncia eacute pela vogal alta anterior que eacute a vogal menos

marcada [hapazɪ] rapaz noacutes [lsquonͻ zɪ]

Em (37) o processo de paragoge ocorre apoacutes o processo de monotongaccedilatildeo

ocorrendo no ditongo [atildew] que passa a ser realizado como a vogal nasal meacutedia

posterior conforme discutido em 5111 Apoacutes esse processo haacute a inserccedilatildeo do

consoante nasal seguida da vogal alta anterior A paragoge eacute variaacutevel com a

reduccedilatildeo do ditongo ([tubaˈɾotilde]) A inserccedilatildeo da siacutelaba final [-ni] pode decorrer da

existecircncia produtiva de terminaccedilatildeo sonora semelhante em vocaacutebulos (nominais e

verbais) no Latundecirc

(37) [tubarsquoɾotildenɪ] tubaratildeo

Em (38) o processo ocorrente eacute a proacutetese Se para o processo inverso - a afeacuterese

- os dados satildeo em maior quantidade para a proacutetese satildeo pouquiacutessimos os

contextos em que ela ocorre No caso deste exemplo a proacutetese se daacute a presenccedila

da vogal baixa diante do verbo Este tipo de proacutetese eacute bem recorrente no

Portuguecircs em dados como ([alemˈbra]) Entretanto o caraacuteter pontual da

ocorrecircncia do fenocircmeno natildeo favorece uma interpretaccedilatildeo mais segura

(38) [atorsquomaɾu] tomaram

184

Outra forma de ganho de elementos pode ser o prolongamento da vogal final O

exemplo de (39) nos mostra o prolongamento da vogal meacutedia anterior Essa

ocorrecircncia foi observada no contexto especiacutefico de ecircnfase

(39) [dese] desse [se] esse

613 Alteraccedilatildeo de elementos (Permuta ou transposiccedilatildeo)

A alteraccedilatildeo de elementos linguiacutesticos eacute considerada na literatura histoacuterica como o

terceiro tipo de alternacircncia focircnica inerente agraves liacutenguas Os contextos em que o

cacircmbio eacute permitido satildeo diversos e direcionados por distintas regras fonoloacutegicas

Muitos desses processos natildeo alteram a estrutura silaacutebica nem atinge a estrutura

lexical O que ocorre de fato eacute a acomodaccedilatildeo de alguns segmentos no dialeto

falado seja pela mudanccedila de traccedilo(s) ou seja pela de segmento(s)

6131 Despalatalizaccedilatildeo de [ʃ] e [ʒ]

Tratamos na seccedilatildeo 5115 do processo da reduccedilatildeo das palatais [ʎ] e [ɳ] que

tambeacutem se configura como um caso de despalatalizaccedilatildeo Todavia tal

classificaccedilatildeo se daacute devido ao fato de estaacute ligada agrave perda de elementos enquanto

a que trataremos agora se configura da permuta ou da reduccedilatildeo de traccedilos

185

Em Latundecirc a presenccedila das palatais [ʃ] e [tʃ] satildeo realizaccedilotildees de s Estas podem

vir em iniacutecio e em meio de palavras As realizaccedilotildees [ʃ] e [s] satildeo preferidas pelos

mais novos enquanto os mais velhos optam pela africada alveolo-palatal surda

Diferentemente no Portuguecircs falado por Latundecirc as realizaccedilotildees natildeo

palatalizadas satildeo preferidas Os Latundecirc natildeo transferem o segmento mais

marcado para o Portuguecircs Contudo conforme seccedilatildeo a seguir veremos que este

processo eacute variaacutevel e pode se dar em qualquer posiccedilatildeo do vocaacutebulo conforme

dados de (40)

(40) [sersquogo] chegou [sersquogamƱ] chegamos [sorsquoɾanƱ] chorando [sursquopaha] chupava [satildematildedƱ] chamando [dersquosaɾƱ] deixaram [casueɾƱ] cachoeira

[mersquosenƱ] mexendo [bisƱ] bicho [baso] baixo [debasƱ] debaixo [lsquopesƱ] peixe [dirsquoso] deixou

Natildeo consta no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc as consoantes z e ʒ de forma

que a liacutengua natildeo apresenta oposiccedilatildeo entre surda e sonora para as fricativas

sibilantes Em (41) o processo de despalatalizaccedilatildeo atinge a fricativa alveopalatal

vozeada que passa a se comportar como fricativa alveolar em iniacutecio de siacutelaba e

em meio de palavras

(41) [lizeɾƱ] ligeiro

186

[lsquolotildezɪ] longe [lsquosuzɪ] suja [lsquosuzu] sujo [azursquoda] ajudar [lsquozudia] judia [azersquota] ajeitar

A escolha do segmento menos marcado segue o que ocorreu com s a

realizaccedilatildeo desses segmentos satildeo adquiridos analogicamente e a presenccedila se daacute

no interior do vocaacutebulo Trata-se da reinterpretaccedilatildeo e acomodaccedilatildeo do segmento

Neste caso do menos marcado jaacute que ambos satildeo menos naturais em sua liacutengua

(WEINREICH 1953)

6132 Palatalizaccedilatildeo

A quantidade de sons palatais do Latundecirc natildeo corresponde aos do Portuguecircs

Em Latundecirc a palatalizaccedilatildeo eacute um processo foneacutetico que ocorre com o segmento

s e em incidecircncia extremamente escassa com t em ambientes que jaacute foram

postos no Capiacutetulo IV que trata deste sistema foneacutetico Eacute um processo bastante

variaacutevel tendo em vista a natildeo presenccedila desse segmento na subjacecircncia da

liacutengua Essa variaccedilatildeo ocorre marcadamente na fala dos mais velhos Os mais

jovens que adquiriram ambas as liacutenguas (Portuguecircs e Latundecirc)

simultaneamente produzem em menor proporccedilatildeo este processo

A africada [tʃ] eacute um segmento que tambeacutem apresenta uma realizaccedilatildeo altamente

variaacutevel provavelmente devido agrave histoacuteria interna da liacutengua conforme Telles

187

(2002 p85) No Latundecirc natildeo haacute diferenccedila entre a oposiccedilatildeo foneacutetica entre as

alveolares de um lado e as palatais e alveacuteolo-palatais de outro

Em (42) e (43) a palatalizaccedilatildeo atinge tanto a fricativa alveolar vozeada quanto a

desvozeada

(42) [ʃu rsquomiɾƱ] sumiram

[ lsquoʃi ma] cima

[ʃigursquoɾow] segurou

(43) [lsquoua] usa

[bursquoʒoɾƱ] Besouro

Em (44) e (45) a palatalizaccedilatildeo abrange as consoantes oclusivas alveolares que

se realizam como africadas alveolo-palatais podendo ocorrer em qualquer

posiccedilatildeo ou contexto da palavra

(44) [lsquoĩdƱ] iacutendio

[matildersquodɔga] mandioca

[ɛrsquoĩ] zezinho

[odʒɪ] hoje [tʃi rsquodʒeɾƱ] cinzeiro

Embora no Portuguecircs o processo de africativizaccedilatildeo de oclusivas alveolares [t d]

seja comum a alguns dialetos como o do Rio de Janeiro [lsquotʃia] e do portuguecircs

popular no Nordeste [lsquoojtʃƱ] sua ocorrecircncia eacute condicionada agrave contiguidade de uma

vogal anterior alta [i] Diferentemente em Latundecirc a palatalizaccedilatildeo e a

188

fricativizaccedilatildeo variam entre si e ocorrem tambeacutem com a fricativa alveolar s Este

processo pode ocorrer em qualquer lugar da palavra

(45) [tʃai] sair [tʃiɾi ga] seringa

[barsquotʃotilde] batom [tʃͻ] soacute [tʃumiɾƱ] sumiram

[tʃobɾo] sobrou

[arsquotʃi ] assim

[tʃubi nƱ] subindo

[pɔtʃa] porta

[rsquotʃua] suja

Os exemplos de (46) apontam para um processo secundaacuterio o fortalecimento

Neste caso a fricativa alveopalatal passa a ser pronunciada como africada

(46) [ tʃoɾatildenƱ] chorando [tʃama] chama [tʃega] chega [ tʃursquoveɾƱ] chuveiro [kaharsquopitʃƱ] carrapicho

No que tange agrave abordagem das palatais a variaccedilatildeo no processo de acomodaccedilatildeo

desses inventaacuterios fonoloacutegicos eacute muito grande A partir das incidecircncias

percebemos que no Portuguecircs resultante do contato a ocorrecircncia desses

segmentos complexos se mostra tambeacutem na mesma proporccedilatildeo

Diante da palatalizaccedilatildeo incluindo a africativizaccedilatildeo observamos que os dados

apresentam duas direccedilotildees quanto ao processo Nos mesmos contextos tanto

ocorre a despalatalizaccedilatildeo quanto a palatalizaccedilatildeo Essa variaccedilatildeo no portuguecircs dos

189

indiacutegenas eacute engatilhada pela ausecircncia do contraste szʃʒ em sua primeira

liacutengua

6133 Desvozeamento e vozeamento

Diferente do portuguecircs no Latundecirc natildeo haacute oposiccedilatildeo das oclusivas quanto agrave

sonoridade As consoantes oclusivas subjacentes satildeo as surdas bilabial alveolar

e velar p t e k respectivamente Sua realizaccedilatildeo sonora eacute condicionada pela

posiccedilatildeo na palavra pelo ambiente (contiguidade nasal) e pelo acento O

vozeamente obrigatoacuterio ocorre quando elas precedidas por consoante nasal na

coda da siacutelaba anterior O processo ocorre tanto no interior quanto em fronteiras

de morfemas (TELLES 2002 p135)

A ausecircncia do contraste surdo-sonoro nas consoantes oclusivas do Latundecirc afeta

a realizaccedilatildeo das consoantes no portuguecircs resultante do contato Na produccedilatildeo dos

indiacutegenas mais velhos (esse fenocircmeno natildeo foi observado na geraccedilatildeo mais

jovem) o processo de desvozeamento atinge as consoantes oclusivas sonoras g

d do portuguecircs conforme (47) e (48)

A realizaccedilatildeo sonora Latundecirc envolve o traccedilo laringal Foneticamente em fala

lenta haacute a realizaccedilatildeo de [d] como alofone de t Telles (2002 p 45) explica que

os falantes mais jovens da geraccedilatildeo poacutes-contato que adquiriram o Portuguecircs

simultaneamente ao Latundecirc neutralizaram o contraste entre sons realizando

preferencialmente o som menos marcado natildeo-implodido Diferentemente dos

mais novos os mais velhos preferem o som implosivo [ɗ]

190

Quanto ao segmento [g] o Latundecirc o tem enquanto alofone de [k] e pode ser

encontrado em iniacutecio de palavra quando em fala raacutepida Mostra-se categoacuterico em

meio de palavra quando diante de uma nasal lexical Em ambiente intervocaacutelico

pode-se encontrar a variaccedilatildeo entre [k] e [g] das quais eacute preferencial a realizaccedilatildeo

da vogal surda (idem p73) A falta do contraste no Latundecirc explica as

realizaccedilotildees de (47)

(47) [lsquobɾika] briga [lsquokoʃta] gosta [kɔviotilde] gaviatildeo

[katildersquoba] gambaacute

A ausecircncia do segmento [d] em Latundecirc eacute a responsaacutevel pela variaccedilatildeo e pela natildeo

realizaccedilatildeo dessa consoante que ocorre como oclusiva alveacuteolo-palatal t

(48) [tipoj] depois [se rsquotatu] sentado

(49) [hatildega] arranca

Em (49) diferentemente do processo de desvozeamento a oclusiva velar se

realiza como sonora A contiguidade nasal em posiccedilatildeo precedente condiciona o

vozeamente da oclusiva velar

Em todos os casos observados acima fica evidente a interferecircncia do Latundecirc no

portuguecircs indiacutegena As consoantes sonoras que satildeo mais marcadas

interliguisticamente por natildeo fonoloacutegicas no Latundecirc se tornam ainda mais

marcadas nessa liacutengua Na produccedilatildeo do portuguecircs os Latundecirc mais velhos

191

preservam a marcaccedilatildeo e apresentam uma realizaccedilatildeo com condicionamento

emprestado da liacutengua indiacutegena

6134 Abaixamento e Elevaccedilatildeo das Vogais Orais

No portuguecircs falado pelos Latundecirc os processos de abaixamento e elevaccedilatildeo

diferenciam-se dos contextos em que ocorrem no portuguecircs Os de elevaccedilatildeo satildeo

em maior nuacutemero que os de abaixamento fato este tambeacutem verificado no

portuguecircs falado pelos Latundecirc

No caso de (50) o uacutenico caso de abaixamento ocorre na vogal anterior nasal e

que passa a ser pronunciada como vogal baixa oral

(50) [asina] ensinar [asinatildenɪ] ensinando

Em (51) a elevaccedilatildeo ocorre com a vogal central baixa final que passa a alta

anterior

(51) [suzɪ] suja [kazɪ] causa [kazɪ] casa [li gɪ] liacutengua

[pɾersquogisɪ] preguiccedila

Assim como em (51) em (52) a elevaccedilatildeo da vogal final tambeacutem eacute realizada como

alta anterior No segundo caso natildeo se trata de elevaccedilatildeo mas de anteriorizaccedilatildeo

uma vez que a vogal meacutedia posterior que ocorre em nomes no portuguecircs eacute

realizada como alta posterior

192

(52) [li pɪ] limpo

[kotildemɪ] como [pɾeti] preto

[saɾatildepɪ] sarampo

[pɾimeɾɪ] primeiro

[morsquosegɪ] morcego [morsquohe dɪ] morrendo

[novɪ ] novo

[kursquoɳadɪ] cunhado [otɪ] outro [fikatildenɪ] ficando

A elevaccedilatildeo e posteriorizaccedilatildeo tambeacutem ocorrem no final dos vocaacutebulos como em

(53)

(53) [kabesƱ] cabeccedila [kanɛlƱ] canela

[mini nadƱ] mininada

[malaɾƱ] malaacuteria

[kursquoru Ʊ] coruja

Em (54) temos tambeacutem a posteriorizaccedilatildeo da alta anterior Assim como a meacutedia

posterior em (52) a meacutedia anterior no portuguecircs eacute amplamente produzida como

alta anterior de forma que o alccedilamento em si natildeo se configura como um

processo do portuguecircs do contato

(54) [hedƱ] rede [bastatildetƱ] bastante [pesƱ] peixe [notƱ] noite [febɾƱ] febre

193

Apesar de natildeo encontrarmos itens que mostrassem a sistematicidade do

condicionamento entre [i] e [u] em final de palavras os dados nos mostram que

haacute uma tendecircncia na base das realizaccedilotildees Os vocaacutebulos terminados em [Ʊ]

tendem a ser produzidos com [ɪ] e os terminados por [a] tendem a ser realizados

com [Ʊ]

Nos dados observados a variaccedilatildeo entre [i] e [Ʊ] soacute ocorre em final de vocaacutebulo

quando se trata da paragoge conforme visto nos exemplos (36) em 512

[harsquopazɪ] ~ [harsquopazʊ]

Os dados em (55) ilustram a falta de regularidade no alccedilamento das vogais

pretocircnicas Como vemos em [fuˈkatildemƱ] e [virsquome ] a tonicidade ou a contiguidade

segmental natildeo condiciona a elevaccedilatildeo da pretocircnica

(55) [pig ta] pergunta [piskosƱ] pescoccedilo [hirsquopotildedew] respondeu [pigu rsquotatildenɪ] perguntando

[dimorsquoɾo] demorou

[virsquome ] vermelho [dimursquoɾatildenɪ] demorando

[fuˈkatildemƱ] ficamos

[kuˈmiw] comeu

194

6135 Nasalizaccedilatildeo e Desnasalizaccedilatildeo

No Latundecirc a nasalidade vocaacutelica eacute contrastiva para a central baixa a anterior

alta e a posterior alta seguidas por consoante nasal tautossilaacutebica A nasalizaccedilatildeo

alofocircnica soacute ocorre com vogais aacutetonas Apesar de a organizaccedilatildeo do traccedilo nasal

na fonologia do Latundecirc ser distinta da do portuguecircs o status contrastivo do traccedilo

em ambas as liacutenguas favorece sua percepccedilatildeo e realizaccedilatildeo na produccedilatildeo na sala

no portuguecircs Entretanto a nasal depende tambeacutem de outros fenocircmenos

cooperantes

Os dados a seguir ilustram a ocorrecircncia da nasalizaccedilatildeo em vogais A

contiguidade da vogal com uma consoante nasal mesmo heterossilaacutebica pode

resultar na nasalizaccedilatildeo O primeiro dado abaixo foge do esperado em liacutengua

portuguesa e tampouco decorre de uma interferecircncia do Latundecirc

(56) [mersquoatilde] meia [bɾĩrsquogatildenƱ] brigando [ʃu miɾƱ] sumiram

[mi mƱ] mesmo

Em (57) ocorre a desnasalizaccedilatildeo em palavras funcionais Esses casos natildeo satildeo

frequentes no leacutexico e natildeo podem ser analisados como resultados de interferecircncia

direta O apagamento da nasal em coda ou em onset seguinte impede a

nasalizaccedilatildeo

(57) [nɪ] nem (natildeo) [mia] minha

195

6136 Fenocircmenos evolvendo os roacuteticos

O tratamento do roacutetico requer uma consideraccedilatildeo sobre o seu comportamento

interlinguiacutestico Retomando as palavras de Bonet e Mascaroacute (1997 p 103)

It is well know that the phonetic realization of rhotics varies considerably from language to language even from dialect to dialect Rhotics can be realized as flaps taps trills (uvular coronal ou bilabial) or as assibilated or fricative variants They ca alternate with a lateral liquid with glides and in some cases a flap can occur as the phonetic realization of a coronal stop in specific environments

Os roacuteticos satildeo segmentos que apresentam uma grande variaccedilatildeo no portuguecircs

Natildeo diferentemente estes elementos tambeacutem se mostraram como motivadores

de vaacuterios processos fonoloacutegicos do portuguecircs falado pelos Latundecirc

Os exemplos dispostos em (58) apontam para a aspiraccedilatildeo do R em coda

silaacutebica Processo este que eacute comum a variedades do portuguecircs e que tambeacutem

no caso em tela pode ser motivado pela preferecircncia de natildeo coda da liacutengua

Latundecirc que favorece o seu enfraquecimento atraveacutes de uma realizaccedilatildeo fricativa

glotal

(58) [duhmɪ] Dormi [mɛgursquola] mergulhar

[fosa] Forsa

O rotacismo eacute um fenocircmeno presente no portuguecircs dos Latundecirc especialmente

entre os mais velhos Fonemas distintos podem sofrer o processo Em (59) a

realizaccedilatildeo do flap tem na base uma sibilante uma lateral palatal e uma oclusiva

196

alveolar Em ldquotrabalhavardquo a lateral palatal inexistente no Latundecirc poderia ser

subtituida pela lateral alveolar constante do inventaacuterio da liacutengua indiacutegena

Entretanto o flap apesar de natildeo fonoloacutegico no Latundecirc eacute um segmento muito

frequente na liacutengua decorrente de processo de enfraquecimento Essa tendecircncia

do Latundecirc pode estar na base da realizaccedilatildeo do portuguecircs Dentre as ocorrecircncias

abaixo a uacuteltima se coloca como um processo frequente no proacuteprio Latundecirc no

qual uma oclusiva passa a flap em ambiente intervocaacutelico

(59) [karsquoboɾe] acabou-se

[tabaɾava] trabalhava

[poɾɪ] pode

Em Portuguecircs particularmente falado por sujeitos menos escolarizados o

fenocircmeno do rotacismo tambeacutem eacute frequente em encontros consonantais

tautossilaacutebicos em que a segunda consoante eacute a lateral alveolar l Dessa forma

produccedilatildeo encontrada em (60) pode ser devido ao contato com o Portuguecircs local

(60) [pɾatildeta] planta

[gɾɛba] gleba

[fɾɛsa] flecha

Em termos da organizaccedilatildeo da fonologia de ambas as liacutenguas os dados em (60)

assim como aqueles em (59) podem ser refletidos a partir da escala de

sonoridade proposta por Bonet e Mascaroacute (1997 p 109)

197

Quadro 21 Escala de Sonoridade adaptada de Bonet e Mascaroacute 1997 p 109)

0 1 2 3 4

Obstruintes

(oclusivas

fricativas trill)

nasais laterais glides

flap

vogais

Considerando a posiccedilatildeo do flap na escala de Bonet e Mascaroacute podemos

interpretar tanto o rotacimo no portuguecircs natildeo padratildeo quanto aquele presente no

Latundecirc como resultado de enfraquecimento de diferentes segmentos situados

mais agrave esquerda no ranking de sonoridade Entre esses segmentos como

observamos na escala acima encontra-se a proacutepria lateral alveolar que apesar

de tradicionalmente formar a classe das liacutequidas ao lado dos roacuteticos natildeo

apresenta a mesma sonoridade que o flap

6137 Labializaccedilatildeo e Deslabializaccedilatildeo

No Portuguecircs falado pelos Latundecirc os processos que envolvem articulaccedilatildeo

secundaacuteria especificamente a labializaccedilatildeo e a deslabializaccedilatildeo estatildeo

relacionados agraves consoantes oclusivas velares e se realizam praticamente nos

mesmos contextos Trata-se de um processo foneacutetico variaacutevel

(61) [kƱɪ] que [kƱelɪ] com ele (62) [kazɪ] quase [katildedƱ] quando

198

[karsquokƱɛ] qualquer

[li gɪ] liacutengua

No Latundecirc a labializaccedilatildeo pode ser derivada de processo mas eacute restrita em

ocorrecircncia Aleacutem disso a sequecircncia da olusiva seguida do glide formando

encontro consonantal tambeacutem natildeo faz parte da fonologia do Latundecirc Esses fatos

favorecem a produccedilatildeo irregular do portuguecircs em que observamos a

deslabializaccedilatildeo (ou o apagamento do glide) como em (62) e a labializaccedilatildeo (ou

inserccedilatildeo do glide) em (61)

6138 Metaacutetese

A alternacircncia de segmentos no portuguecircs falado pelos Latundecirc pode ocorrer

entres siacutelabas diferentes ou entre elementos da mesma siacutelaba Aleacutem disso

ocorre nas duas direccedilotildees (da esquerda para a direita e da direita para a

esquerda)

(63) [bahiƱ] bairro [fɾevenƱ] fervendo [parsquoguo] apagou

Como vemos acima no primeiro dado de (63) ocorre natildeo apenas a metaacutetese

como tambeacutem o avanccedilo do acento resultando numa palavra oxiacutetona Nos demais

dados a tranposiccedilatildeo segmental natildeo interfere na estrutura suprassegmental O

segundo dado de ldquofervendordquo eacute tiacutepico do portuguecircs e pode decorrer da variedade

de contato sobretudo pelo fato de o onset complexo natildeo fazer parte da liacutengua

indiacutegena Em ldquoapaguordquo a metaacutetese resulta na labializaccedilatildeo da oclusiva velar Essa

199

forma de palavra tem como realizaccedilatildeo foneacutetica frequente mesmo no portuguecircs

nativo a monotongaccedilatildeo Nesse caso a metaacutetese resulta de processo irregular e

pontual nos dados observados

Como vimos nas seccedilotildees anteriores os resultados da metaacutetese natildeo correspondem

a estruturas fonoloacutegicas no Latundecirc sendo sua ocorrecircncia derivada de processo

foneacutetico sem condicionamento prosoacutedico

6139 Siacutestole

Alguns casos de siacutestole em que ocorre o recuo do acento foram encontrados na

fala dos mais velhos Natildeo identificamos contexto linguiacutestico como o

sequenciamento focircnico do enunciado fonoloacutegico que justificasse essas

realizaccedilotildees Considerando o fato de a produccedilatildeo ter sido encontrada apenas na

fala da geraccedilatildeo mais velha e de o acento lexial no Latundecirc ser morfoloacutegico

ancorado em uma das duas promeiras siacutelabas da raiz da palavra (TELLES 2002)

eacute plausiacutevel supor uma interferecircncia do padratildeo acentual da liacutengua indiacutegena no

portuguecircs dos Latundecirc Os dados em (64) evidencia o recuo do acento

(64) [mɔhe] morrer

[kalo] calor [katɪ] quati [pega] pegar

Nos dados acima importa considerar tambeacutem o fato de se tratarem de itens

nominais (incluindo as formas nominais dos verbos) Diante disso uma analogia

possiacutevel dos Latundecirc seria a de considerar a raiz monossilaacutebica que eacute altamente

200

produtiva na liacutengua indiacutegena o que tambeacutem justificaria o acento na primeira

siacutelaba da palavra

61310 Fortalecimento

Casos de fortalecimento jaacute foram abordados nas seccedilotildees anteriores em que

tratamos da palatalizaccedilatildeo e da dessonorizaccedilatildeo Nesta seccedilatildeo outro fenocircmeno de

fortalecimento eacute apresentado no qual ocorre a oclusivizaccedilatildeo de fricativas

Salientamos entretanto que essas foram realizaccedilotildees mais esporaacutedicas e menos

recorrentes que as demais

(65) [istubidƱ] subindo [tiguɾa] segura

[torsquoteɾƱ] solteiro

[batitaɾƱ] batizaram

O processo ocorre no iniacutecio e em meio de palavra No primeiro dado em fato haacute

uma epecircntese da oclusiva alveolar surda [t] tendo em vista a preservaccedilatildeo de uma

sutil sibilaccedilatildeo do s em coda da siacutelaba precedente

Na fonologia do Latundecirc o fonema s tem como alofone o fone [t] que ocorre em

siacutelaba aacutetona (TELLES 2002) Embora essa natildeo seja a realizaccedilatildeo mais frequente

a interferecircncia do Latundecirc natildeo pode ser desconsiderada Em todos os dados de

(65) haacute a presenccedila de segmento oclusivo em siacutelaba contiacutegua que tambeacutem pode

ter motivado o fortalecimento do s

201

7 CONSIDERACcedilOtildeES FINAIS

No que concerne agraves poliacuteticas linguiacutesticas diante do glotociacutedio que tem se

instaurado no Brasil desde a chegada dos portugueses dado o estado em que se

encontram as liacutenguas indiacutegenas brasileiras eacute de grande valia qualquer estudo

que vise agrave contribuiccedilatildeo e que favoreccedila natildeo soacute a proteccedilatildeo como o conhecimento

cientiacutefico dessas liacutenguas

O Latundecirc como jaacute mencionamos eacute uma dessas liacutenguas minoritaacuterias Ela se

encontra em extinccedilatildeo uma vez que hoje dispotildee de menos de 20 falantes com

autonomia poliacutetica Devido agrave populaccedilatildeo restrita e agraves relaccedilotildees tradicionais de

parentesco os jovens Latundecirc natildeo podem coabitar entre si de forma que a

interaccedilatildeo com o mundo externo eacute a via de perpetuaccedilatildeo social e ao mesmo

tempo de crescente e natildeo planejado contato linguiacutestico Tais circunstacircncias

implicam a urgecircncia de mais estudos sobre a realidade desse povo

Entedemos que estudar as liacutenguas menos conhecidas eacute de grande valia para o

incremento da ciecircncia linguiacutestica A investigaccedilatildeo de cada nova liacutengua eacute uma

maneira de conceber a linguagem humana e de contribuir dessa forma com os

universais linguiacutesticos e com o entendimento da faculdade humana da linguagem

(CAcircMARA-JR 1977 p6)

Seja entre si ou em contato com outras estas liacutenguas natildeo estatildeo (ou natildeo

estiveram) suficientemente isoladas para evitar algum tipo de proximidade

Thurston (1987 p 165) propaga que toda liacutengua deve ter sofrido alguma

202

influecircncia de seus vizinhos em um determinado ponto e tempo Todos os idiomas

satildeo portanto liacutenguas mistas na medida em que todos copiaram formas lexicais e

outros recursos linguiacutesticos de liacutenguas vizinhas

Thomason (2001 p 17) afirma que o contato linguiacutestico estaacute em toda a parte

muitos paiacuteses tecircm mais do que uma liacutengua oficial e muito provavelmente a maior

parte da populaccedilatildeo mundial fala duas ou mais liacutenguas

Contudo mesmo em grande quantidade os estudos que se encarregam da

observaccedilatildeo do contato linguiacutestico se debruccedilam ainda timidamente nos aspectos

foneacuteticos Com base nesta assertiva este trabalho se propocircs a observar como se

daacute o comportamento entre o Portuguecircs e o Latundecirc a partir da verificaccedilatildeo dos

padrotildees mais e menos marcados nos processos foneacuteticos de acomodaccedilatildeo Eacute um

estudo descritivo em que o Portuguecircs eacute a segunda liacutengua mesmo em face de seu

caraacuteter nacional Essa pluralidade linguiacutestica ainda existente no paiacutes demanda a

concretizaccedilatildeo das poliacuteticas a favor da salvaguarda da diversidade no planeta

Posto que toda liacutengua sofra influecircncia das forccedilas internas e externas que agem

sobre ela partimos do pressuposto de que em qualquer pesquisa linguiacutestica natildeo

encontraremos nada de extraordinaacuterio nada que exceda a experiecircncia do

humano Dessa sorte vamos encontrar () uma estrutura linguiacutestica como

qualquer outra e em muita coisa ateacute possivelmente semelhante agrave nossa

(MATTOSO CAcircMARA-JR 1977 p7)

E quando sistemas entram em contado fenocircmenos emergentes podem ajudar a

esclarecer os princiacutepios e as restriccedilotildees que regem as liacutenguas particulares Com

base na complexidade e na riqueza que advecircm do contato linguiacutestico analisamos

203

estas forccedilas conflitantes com base nos princiacutepios de hierarquizaccedilatildeo e

regularidade que satildeo forccedilas motrizes da marcaccedilatildeo nos processos foneacuteticos Aleacutem

do fator tempo outros aspectos podem estar diretamente ligados agraves

transformaccedilotildees pelas quais uma liacutengua passa como relaccedilotildees de poder

influecircncias de outras liacutenguas subjetividade de seus falantes etc

A marcaccedilatildeo estaacute diretamente ligada agrave simetria frequecircncia e naturalidade

Entretanto Rice (2007) apresenta as caracteriacutesticas da marcaccedilatildeo agrupando-as

em dois conjuntos O primeiro envolve os termos relativos a uma marcaccedilatildeo

considerada natural ou pautada na frequecircncia e diz respeito em larga medida a

ldquophonetic basis of an oppositionrdquo Nele se encontram oposiccedilatildeo como ldquomais ou

menos naturalrdquo ldquomais ou menos complexordquo ldquomais ou menos estaacutevelrdquo ldquosujeito agrave

aquisiccedilatildeo mais ou menos tardiardquo etc (Rice 2007 p 81) O segundo grupo eacute

relativo a comportamentos de sistemas fonoloacutegicos como ser ldquosujeito ou

resultado de neutralizaccedilatildeordquo ldquoser gatilho ou alvo de assimilaccedilatildeordquo Esse grupo

portanto diz respeito agrave marcaccedilatildeo fonoloacutegica ou estrutural

No que diz respeito agrave anaacutelise dos dados quanto aos processos foneacuteticos

percebemos em nosso estudo que

Ainda que com algumas restriccedilotildees a tendecircncia agrave monotongaccedilatildeo eacute

transferida para o Portuguecircs falado por Latundecirc [satildersquogɾaɾi] ldquosangraramrdquo

[kaze] ldquocausardquo

Mesmo em variaccedilatildeo a reduccedilatildeo do onset complexo eacute transferida para o

Portuguecircs seguindo a tendecircncia que o Latundecirc tem de evitar esse tipo de

sequecircncia [bĩ katildenƱ] ldquobrincandordquo [kɛbaɾƱ] ldquoquebraramrdquo

204

O preenchimento da coda eacute evitado pelo Latundecirc processo esse que

tambeacutem eacute atestado no Portuguecircs falado por Latundecirc [pi gũta] ldquoperguntardquo

[gorsquotozƱ] ldquogostosordquo

As consoantes ɲ e ʎ mais marcadas interlinguisticamente tambeacutem o

satildeo no Latundecirc que natildeo os tecircm no seu inventaacuterio fonoloacutegico Como

resultado esses segmentos natildeo satildeo produzidos no Portuguecircs falado pelos

Latundecirc Alternativamente ocorre a substituiccedilatildeo desses fonemas por

segmentos articulatoriamente mais proacuteximos ou o seu apagamento [vimej]

ldquovermelhordquo [fila] ldquofilhardquo [farsquokĩ] ldquofaquinhardquo

A reduccedilatildeo silaacutebica eacute atuante tambeacutem atraveacutes da afeacuterese Como natildeo consta

no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc a presenccedila da fricativa alveolar surda

em posiccedilatildeo de coda essa restriccedilatildeo eacute transferida para o portuguecircs dos

Latundecirc que tambeacutem evita vocaacutebulos com mais de trecircs siacutelabas [kutatildeni]

ldquoescutandordquo [bɾa sadƱ] ldquoabraccediladordquo [fiɾ tɪ] ldquodiferenterdquo

O Latundecirc evita o onset em final de palavra adicionando uma vogal para

reorganizar o padratildeo silaacutebico A vogal mais frequente seraacute a alta anterior

[i] [harsquopazɪ] ldquorapazrdquo [dorsquosejzɪ] ldquode vocecircsrdquo

Os sons [ʃ] [ʒ] [tʃ] e [dʒ] satildeo evitados por natildeo fazerem parte do inventaacuterio

fonoloacutegico do Latundecirc de forma que a sua realizaccedilatildeo eacute mais marcada na

liacutengua O comportamento desses segmentos eacute muito variaacutevel Nos mais

jovens satildeo realizados com mais frequecircncia e nos mais velhos satildeo

reinterpretados envolvendo processos diversos [sersquogamƱ] ldquochegamosrdquo

205

[dersquosaɾƱ] ldquodeixaramrdquo [lizeɾƱ] ldquoligeirordquo [azersquota] ldquoajeitarrdquo [ʃũrsquomiɾƱ] ldquosumiramrdquo

[bursquoʒoɾƱ] ldquobesourordquo [tʃĩrsquodʒeɾƱ] ldquocinzeirordquo

A ausecircncia do contraste surdo-sonoro nas consoantes oclusivas t e k do

Latundecirc promove sua neutralizaccedilatildeo na realizaccedilatildeo das consoantes no

portuguecircs dos indiacutegenas [lsquobɾika] ~ [lsquobriga] ldquobrigardquo [s rsquotatu] ~ [se rsquotado]

ldquosentadordquo

No que tange ao comportamento das vogais meacutedias postocircnicas os

vocaacutebulos terminados em [Ʊ] tendem a ser produzidos com [ɪ] e os

terminados por [a] tendem a ser realizados com [Ʊ] que satildeo vogais menos

marcadas [kazɪ] ldquocausardquo [ lĩpɪ] ldquolimpordquo [ka besƱ] ldquocabeccedilardquo [bas tatildetƱ]

ldquobastanterdquo

A partir dos fenocircmenos observados buscamos responder agraves perguntas

norteadoras da nossa pesquisa abaixo retomadas

Fatores internos (linguiacutesticos) e externos (estruturais) interagem com os

princiacutepios da marcaccedilatildeo

Resposta Quanto aos fatores externos no que diz respeito agrave faixa etaacuteria

os mais jovens tendem a natildeo transferir os padrotildees mais marcados da sua

liacutengua para a liacutengua adquirida Em contrapartida os mais velhos

reproduzem com menor frequecircncia os padrotildees mais marcados do

Portuguecircs (liacutengua dominante)

Qual o papel da marcaccedilatildeo no contato linguiacutestico

206

Resposta A marcaccedilatildeo considerada natural responde pela escolha de

padrotildees mais ou menos marcados interlinguisticamente Por essa razatildeo

prevalece a tendecircncia agrave siacutelaba CV do que decorre o apagamento da coda e

a simplificaccedilatildeo de onset complexo De outro lado haacute o natildeo repasse da

laringalizaccedilatildeo vocaacutelica que mesmo fonoloacutegica no Latunecirc eacute menos natural

e mais marcada nas liacutenguas do mundo A marcaccedilatildeo fonoloacutegica eacute

observada na neutralizaccedilatildeo de oposiccedilotildees vaacutelidas no portuguecircs poreacutem

inexitentes na liacutengua indiacutegena como o contraste quanto agrave sonoridade nas

oclusivas e agrave escolha da vogal em posiccedilatildeo final de nomes

Efetivamente um aspecto da marcaccedilatildeo natural pode responder pelo

comportamento da marcaccedilatildeo fonoloacutegica de maneira que natildeo satildeo

caracteriacutesticas de marcaccedilatildeo oponentes entre si No caso em estudo as

duas marcaccedilotildees operam mas natildeo respondem por todos os fenocircmenos

observados Aleacutem disso o caraacuteter altamente variaacutevel das realizaccedilotildees e as

condicionantes sociais dos falantes datildeo chance para a emergecircncia de

processos mais decorrentes da falha na percepccedilatildeo do sinal sem que se

estabeleccedila a regularidade na sua produccedilatildeo

Os traccedilos mais marcados da liacutengua dominada passam para a dominante

Resposta Em alguns caso sim como a africativizaccedilatildeo do s Em outros

natildeo como o natildeo repasse da larinzalizaccedilatildeo vocaacutelica e a oposinccedilatildeo entre

vogais orais e nasais

Ademais em face dos fenocircmenos observados podemos pontuar algums

aspectos relevantes os processos que envolvem perda e permuta de segmentos

satildeo mais frequentes dos que os que envolvem ganho de segmento os segmentos

207

natildeo presentes no inventaacuterio fonoloacutegico do Latundecirc (liacutengua originaacuteria) tendem a

ser apagados ou reinterpretados pelo segmento mais proacuteximo do portuguecircs

sendo este uacuteltimo o mais frequente os traccedilos mais marcados do Latundecirc estatildeo

mais evidentes nas falas da geraccedilatildeo preacute-contato e a marcaccedilatildeo natildeo estaacute

condicionada apenas aos universais linguiacutesticos mas agraves especificidades das

liacutenguas

Por fim salientamos que o nosso propoacutesito neste estudo foi o de contribuir para a

descriccedilatildeo de liacutenguas incluindo as indiacutegenas e de abrir caminhos para o estudo

do contato linguiacutestico especialmente em niacutevel da foneacutetica e da fonologia

Ressaltamos que este trabalho natildeo encerra o estudo sobre o contato entre as

duas liacutenguas Reconhecemos que os nossos resultados representam um ponto de

partida para investigaccedilotildees posteriores as quais poderatildeo expandir o tema e

avanccedilar no campo da inter-relaccedilatildeo entre contato linguiacutestico e a marcaccedilatildeo

208

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ANEXOS

(Dados Transcritos)

parsquoguo Apagou marsquoma Mamar pegũrsquotatildenu Perguntando barsquoʃo Vassoura rsquokɔsa Coccedilar

marsquoduu Mais duro

rsquokati Quati

arsquoh ti A gente rsquootu Outro irsquoarsquov j E jaacute vem v rsquone ni Veneno pɛgũrsquoto Perguntou rsquofoʃ Foi pɾatildersquoto Plantou rsquosuzu Sujo karsquobeli Cabelo gursquoduɾu Gordura rsquootildemi Homem rsquogodu Gordo rsquopega Pegar dersquotadu Deitado

marsquotau Mataram

korsquokin Coquinho guɾirsquozĩ Gurizinho rsquotakorsquosotildenu Taacute com sono (manutenccedilatildeo) mũdi Mundo ʃursquov ni Chovendo pigũrsquota ni Perguntando sursquov ni Chovendo rsquopɔtʃa Porta kursquomigi Comigo kũversquosatildeni Conversando larsquovatildeni Lavando morsquoh di Morrendo ikursquotatildenu Escutando mursquohidu Morrido marsquohadu Amarrado irsquokutu Escuto

persquohu torsquose Pergunto a vocecirc

rsquoseja Cheia rsquoozi Hoje

rsquoʃuʊ Sujo

222

ursquozotursquopatildejrsquoagʊa Os outros apanham aacutegua

rsquotʃua Suja

bu rsquonitu Bonito

rsquokɛla Aquela

rsquomu tu Muito

vehrsquomejo Vermelho rsquomasu Manso marsquosatildedu Amansando arsquoɾisi Arisco hursquoo Avoou rsquoaga Aacutegua

rsquode tu Dentro

rsquomu tu Muito

rsquotud Tudo irsquopia Espirra isrsquopritu Espiacuterito

rsquofɔti Forte

timirsquotɛi Cemiteacuterio

tɛrsquoha Enterrar

ɔʊrsquoa Jogar (o bicho fora)

tersquoou Enterrou rsquoela Ela matildersquodatilden Mandando batorsquose Bater em vocecirc rsquotokursquotatildenu Tocirc escutando rsquobatildej Banho bɾab Brabo

rsquosɛtu Certo

Kabirsquosela Cabeceira (do rio)

karsquosi bu Cachimbo

tʃursquoveɾu Chuveiro (pau de) rsquoleti Leite rsquofutu Fruto karsquoɾoʃi Caroccedilo kaharsquopitʃu Carrapicho rsquokɾu Crua rsquomasu Massa

pe rsquoʃa Pensar

ojrsquoatildedu Olhando (idem)

pe rsquoʃatilden

Pensando

i te rsquode nu Entendendo

223

irsquokuta Escuta

kwatildedu ew piki nĩnĩ Quando eu era pequenininha

ew bĩrsquokava rorsquodeɾa cũ a lɔrsquoɾĩne

Eu brincava de roda com a Lorine

katildendu pi ĩ

Quando piin

ew tatildebȇĩ cũ a lorsquoɾine

Eu tambeacutem com a Lorine

i lsquoluɾi ku a marsquoɾi

E Lurdes com a Mariacute

mĩa matildey natildew deʃa bɾĩrsquoka

Minha matildee natildeo deixava brincar

eli bɾika corsquomigu

Ela brigava comigo

e koʃta brinrsquoka ni lsquoKotildepu E gostava de brincar no campo

mĩa matildej natildew deʃa bɾĩka Minha matildee natildeo deixava brincar

ersquoli tatildebe j diskuti Ela tambeacutem discutia

tatildebej kɾiatildesa natildew paɾa lsquonɛ Tambeacutem crianccedila natildeo para neacute

fika bahaka bɾĩkatildeni lsquonɛ Fica na barraca brincando neacute

fika gɾitatildeni Fica gritando

a mĩa matilde matildedava bɾĩka lotildeʒi A minha matildee mandava brincar longe

natildew kɛ ve baɾuj na bahaka natildew Natildeo quer ver barulho na barraca natildeo

ki falatildenu O que eu tocirc falando

ki lsquota bɾĩganu nu katildepu Que eu tava brincando no campo

a fruta kirsquoli cotildepi nɛ

A fruta que ele come neacute

kinotildemi di fɾuta Que nome de fruta

akeli iogrii nɛ

Aquele neacute

nɔy sursquopaha lsquo deli Noacutes chupava dele

so eli komenu fɾuta Soacute ali comendo fruta

noj fike mu arsquotɛ ʃersquoga meatilde note

sersquoga

Noacutes ficamos ateacute a meia noite chegar

mĩa matildej bɾiga kumigu Minha matildee brigava comigo

224

tava se ew levatildeta sedu se ew levatildeta sedu

Estava ʔ

va la nu katildepu bɾĩrsquoka Vaacute laacute no campo brincar

u katildepu lsquota satildematildedu orsquosejs O campo taacute chamando vocecircs

noj levatildersquota pɾa bɾĩrsquoka nu kotildepu Noacutes levantaacutevamos para brincar no campo

o katildepu ɛ u maj limpi O campo eacute o mais limpo

eli bɾĩkaru eli istubidu Eles brincaram eles subiram

ɛ ke katildepu num ɛ awto katildepu mũto

baso

Eacute que o campo natildeo eacute alto O campo eacute muito baixo

nɔj sersquogamu bersquobe nu i corsquome nu Noacutes chegamos bebendo e comendo

miu asadu batata e bebe nu

Milho assado batata e bebendo

ew nũm fikej ew bɾĩkava dinoti Eu natildeo fiquei eu brincava de noite

mĩa matildej natildew desa duhmi mĩa matildej bɾiga kumigo

Minha matildee natildeo deixa dormir minha matildee briga comigo

mĩa paj farsquolo sej dumi sedu se pikaɾu cobɾa Kotildemu ki darsquoi

Meu pai falou vocecircs durmam cedo se cobra picar e daiacute

vai sarsquoɾa ou vai a mɔhe Vai sarar ou vai morrer

mĩa paj bɾĩkow diskuti dele natildew Meu pai brigou porque eu natildeo escutava ele natildeo

dohmi amatildersquoɳatilde sedu vorsquose bɾĩrsquoka corsquome mũĩtu fɾuta

Dorme amanhatilde cedo vocecirc vai brincar comer muito fruto

mĩa paj natildew desa ew bɾĩka natildew Meu pai natildeo deixava eu brincar natildeo

natildew icuti dele natildew Natildeo escutei ele natildeo

cɾiatildesa icursquoto crianccedila escutou

iheni fala icursquoto ɛ A gente fala escutou eacute (a gente fala e ela ndash a crianccedila ndash escutou eacute

ni batia natilde mi batia na Natildeo batia natildeo me batia maj eli nũ sabe barsquotih Mas ele natildeo sabia bater

225

falava di bɾabu mihmu Falava bravo mesmo

matildeda agwa matildedƷɔga Mandava buscar aacutegua buscar mandioca

asa biƷu kome Assar beiju comer

nĩ tĩ aacutegua pɾa eli natildew Natildeo tinha aacutegua pra ele natildeo

mĩa matildej natildeo desa ew vĩrsquoga Minha matildee natildeo deixava eu brincar

mĩa povu

Meu povo

bĩ botilde natildew Bem bom natildeo

esi aki bisu bɾabu Esse aqui bicho brabo

mĩa povu matatildedu nosu tudo Meu povo matando o nosso tudo

e ki nomi dee ɛ E que o nome dele eacute

nũ pe rsquosa nisu aki la Natildeo pensar nisso aqui laacute

mĩa matildee falo natildew podi bɾĩka de tu

dagwa notilde

Minha matildee falou natildeo pode brincar dentro drsquoaacutegua natildeo

agwa e mũitu peɾigoso A aacutegua eacute muito perigoso

ĩdƷu vĩ i mata tudĩ nũ iscapa ũ notilde Iacutendio veio e matar tudinho natildeo escapa um natildeo

distotildena kohpu sɔ leva sɔ cabesu Destrona corpo soacute leva soacute a cabeccedila

isu aki nũ ɛ mĩa pare ti notilde Isso aqui natildeo eacute meu parente natildeo

io mimu Eu mesma

nĩge j notilde sabi Ningueacutem natildeo sabe

esi ki ĩdiu moɾava ki i uvi Esse aqui iacutendio morava aqui e ouvi

kɛbaɾu asĩ levo di Quebraram assim levou de Alternacircncia de coacutedigo

demorsquoɾo i ew sersquoge tame j Demorou e eu cheguei tambeacutem

Komi ki rapaɾi kebɾo

Como eacute que o rapaz morreu

226

ai fala pɾa eli nɛ isu ku hapazu Aiacute falou pra ele neacute Isso com o rapaz

eli moɾa debasu di paw nɛ Ele morava debaixo de pau neacute

ve tu dehubo caiw cima deli na

hedu

Vento derrubou caiu em cima dele na rede

sɔ o paj deli capow Soacute o pai dele escapou

vose da mujɛ notilde Vocecirc da mulher natildeo

akeli povu deli mĩ mata todo mĩa povu

Aquele povo dele mata todo meu povo

ĩ via pɾetu Em Veado Preto

paɾEsi kũ ƷEƷĩ Parece com Zezinho

ew moɾa hũtu aki Eu moro junto daqui

keli otɾu Aquele outro

patɾaj iɾe boɾa Para traz ir embora

ai dimorsquoɾo Aiacute demorou

sersquogo Chegou

keli cahĩ sersquogo Aquele Carlinhos chegou

sarsquoi hora orsquoʎa Saiacute fora pra olhar

arsquoi farsquolo dersquosaɾu Aiacute falou deixaram

ota lĩgwa difire ti Outra liacutengua diferente

ta sorsquoɾanu Taacute chorando

ta bĩbotilde natildew Taacute bem bom natildeo

fika tʃorsquoɾatildenu Fica chorando

mĩa pare ti desaɾu mĩa mursquoje Meus parentes deixaram minha mulher

te j bastatildeti Tem bastante

pigũta pa eli Pergunta pra ele

227

maselu kwidava Marcelo cuidava

oti tipu Outro tipo

kotildevɛsa deli nũte di notilde A conversa dele natildeo entendo natildeo

komu ki fala fire ti Como eacute que fala diferente (afeacuterese)

na kohpu uƷa No corpo usa

lizeɾu Ligeiro

tʃarsquoma eli Chamar ele

matildersquodo sabotilde pa eli Mandou sabatildeo pra ele

abɾiw pota Abriu a porta

lava motilde lava pɛ lava bɾasu Lavei a matildeo lavei o peacute lavei o braccedilo

ai ew fikej oiatildenu ai Aiacute eu fiquei olhando aiacute

fikej na pota oiatildenu cutatildeni Eu fiquei na porta olhando

nũ capa niũ Natildeo escapa nenhum

marsquoto cota piskosu Matou e cortou o pescoccedilo

kabesĩn Cabecinha

cusivi kimigu Inclusive comigo

batildeku busa sĩ Branco blusa assim

kursquomiɾu a karsquobesa da lsquoge ti Comeram a cabeccedila da gente

ũ nũ firsquokaɾi Um natildeo ficou

otirsquoĩdʒu Outro iacutendio

ʒũrsquotaɾu Juntaram

bɾirsquogamu pɾa eli Explicamos pra ele

ɔto dii ele vorsquoto dinovu Outro dia ele voltou de novo

ew sarsquoi hora Eu saiacute fora

otoɾapaj cursquoto Outro rapaz escutou

228

oʎa lotildezi Olhou longe

ew lsquoho

Eu vou

desa notilde Deixava natildeo

kuta baɾuj Escuta barulho

marsquoto tudi noɔɾa Matou tudo na hora

sɔ cabesu levo kumew Soacute a cabeccedila levou e comeu

mi a matildej cu tava Minha matildee contava

agwa tupiw tudo A aacutegua entupiu

agwa be j pɾeti mehmu Aacutegua bem preta mesmo

agwa suzi Aacutegua suja

pɾimiɾu kanɛlu Primeiro canela

i totilde paɾi Entatildeo eu parei

nu sarsquobi Natildeo sabia

pɾimeɾu u tigu Primeiro antigo

bastatildetu

Bastante

bastatildetu Bastante

todu tiɾatildenu levatildenu Tudo tirando levando

rsquokaze disu ficaɾu Por causa disso ficaram

tu kɾiatildesa Tudo crianccedila

lersquova todu mini nadu Levar toda meninada

eli mi tinu Ele mentindo

kotildemu orsquose pɾatildeta mu ito Como vocecirc planta muito (rotacismo)

nɔj kume nu aki Noacutes comendo aqui

nɔj seskɛse nu fukamu Noacutes nos esquecemos e ficamos

a noti marsquotaɾu tudu Agrave noite mataram tudo

229

eli sego gatildersquono Ele chegou enganou

kotildemiɾu Comeram

eli kotildersquoto soɾatildeni Ele contou chorando

ke j kwi kiɾo Quem que tirou

mi da mi a filu Me daacute meu filho

sɔ u ki karsquopo Soacute um que escapou

kɾirsquoa na kolu Criar no colo

vi de la u motildeti di he ti Veio de laacute um monte de gente

ew tatildebe j gotava

Eu tambeacutem gostava

na kɔba no basu

Na cobra no braccedilo

bisi u Bichinho

kabeseɾa pɛtu Cabeceira perto

mɔɾa pa basu Mora pra baixo

dirsquofisu marsquota Difiacutecil matar

sɔ bisotilde Soacute bichatildeo

ɛ h~undo Eacute fundo

pohku Porco

fɾɛsa Flecha

mi a matildej falaɾu Minha matildee falou

mi a matildej fikaɾu Minha matildee ficaram (ficou)

pɾimi mehmi Primo mesmo

tatɾa paj tambe j Trata pai tambeacutem

mi atilde ihmatilde maj vɛj Minha irmatilde mais velha

tu tia vɛj ta i Tua tia velha ta aiacute

tɾata gwau gwau ahe ti Trata igual igual a gente

230

halu hɛlarsquodo Ralo ralador

basoɾa ipi Vassoura espinho

fakotilde kotaɾu Facatildeo cortaram

hɛla matildersquodʒɔka Rala mandioca

ai dipoj Aiacute depois

ku faki pike nu Com faquinha pequena

hɛla tatildeme j Rela tambeacutem

mi a paj asirsquona Meu pai ensinar

kɔtaɾu kotilde a taba Cortaram com a taacutebua

disaɾu Deixaram

nu kotildepu No campo

la i basu Laacute embaixo

mi a paj nu hipotildedew natildew Meu pai natildeo respondeu natildeo

pesu Peixe

a notu toda A noite toda

baztatildeti poɹku la Bastante porco laacute

u digu vi Um dia que vim

mi atilde matildej kotildekorsquodo Minha matildee quando acordou

mi atilde matildej forsquola Minha matildee foi laacute

kazi gɾatildedi Quase grande

nɔj te j medu dosejzi Noacutes temos medo de vocecircs

bersquozu kumiw Beiju comeu

mohew saɾatildepi Morreu de sarampo

pigu tatildeni Perguntando

na katildepa No campo kahni asadu Carne assada

231

morsquohe tudi a Morrer tudinho

depoj ʃu miɾu Depois sumiram

dimorsquoɾo mujtu Demorou muito

mɔdi tehu Por causa da terra

ja vaj tʃarsquoi Jaacute vai sair

batildedorsquono Abandonou

fike mu arsquoi Ficamos aiacute

aʒe ti ojrsquoo A gente olhou

hatildeka karsquoɾa Arranca caraacute

tʃiɾi ga basi na Seringa para vacina

barsquotʃotilde Batom

nɔj peɾatildenu Noacutes esperando

mi asu rsquoto Me assustou

i odʒi E hoje

be j vimej Bem vermelho

otu di ʃi ma Outro de cima

sersquogo corsquohe Chegou correr

i te di be j Entende bem

mi asursquoto Me assustou

matatildenu nɔjzi Matando noacutes

mi a fila Minha filha

kumiɾu Comeram

azersquota korsquola pɾa eli Ajeitar colar pra ele

sarsquoma eli

Chamar ele

tʃega logu Chega logo

ʃiguɾow di novʊ Segurou de novo

232

dirsquoso firsquoko Deixou ficou

arsquotɛ dɛrsquozoɾa Ateacute dez horas

tʃɔ ɔjrsquoa Soacute olhar

pi gada Espingarda

pɛhtu casueɾu Perto da cachoeira

maj pɛtu Mais perto

ote la Outra laacute

pɛga pesi Pega peixe

oti kazi Outra casa

pɛga milu Pegar milho

depoj tʃumiɾu bɾatildeku Depois sumiu o branco

mi rsquode ɾu Me deram

satildegɾaɾi asi Sangraram assim

bastatildetu Bastante

atildersquoda karsquosatildedu

Andar caccedilando

mi atilde filu Meu filho

nɔj fikatildeni Noacutes ficamos

ki kursquoto Que escutou

sɔ sorsquoɾatildenu Soacute chorando

depoj deli mohidu Depois dele morrer

nu ta vɛj Natildeo taacute velho

ta noj i da Taacute novo ainda

mi atilde matildej ta bii noj i da Minha matildee ta bem nova ainda

pɛrsquoga baʒtatildetu Pegar bastante

ew persquoge Eu peguei

233

mi atilde lsquoho farsquolo Meu avocirc falou

dimuɾatildeni Demorando

tehaɾu la mehmu Enterraram laacute mesmo

mi atilde matildej soɾatildenu Minha matildee chorando

mi atilde imatilde Minha irmatilde

E cursquoɳadi deli Eacute cunhado dele

E fii deli Eacute filho dele

kursquoɳadi deli Cunhado dele

hɔba demaj Rouba demais

ta difisi Ta difiacutecil

eli tʃobɾo Ele sobrou

saɾatildepi persquogo Sarampo pegou

pɾimeɾi morsquohe Primeiro morreu

ew kutej Eu escutei

sarsquoma matildej Chamar matildee

ta dirsquovisi Taacute difiacutecil

mohew ve me nadu Morreu envenenado

ki kɾirsquoari Que criaram

mi atorsquomaɾu Me tomaram

i ew torsquoteɾu E eu solteiro

kazadu kotildersquose Casado com vocecirc

natildew firsquoka diɾetu Natildeo ficar direito

firsquoka kweli Ficar com ele

mersquosenu Mexendo

ta setu Ta certo

234

bɾabu persquoeli Bravo por ele

tasirsquooma komigu Tem ciuacutemes de mim

E gotozu Eacute gostoso

tipu bursquoʒohu Tipo besouro

tʃi rsquodʒeɾu Cinzeiro

na li gi Na liacutengua

bɾatildeku batirsquotaɾu Brancos batizaram

katildedu eɾa novi Quando era novinho

arsquoi tipoj Aiacute depois

karsquoboɾe Acabou-se

tiguɾa na matildew Segura na matildeo

rsquoɛ lsquopɾimɛ lsquodeli Eacute primo dele

asinatildeni Ensinando

ew kersquome Eu queimei

pɾatildersquota maj Plantar mais

ew vo lsquopɾatildeta Eu vou plantar

karsquokwɛ Qualquer

tabaɾava Trabalhava

tubaɾotildeni Tubaratildeo

poɾi pɛɾa Pode esperar

mi ti nu Mentindo

eli sersquogo Ele chegou

atildersquototilde Entatildeo

ta lsquosetu natildew Ta certo natildeo

mesew kotildersquomigu Mexeu comigo

235

ʃersquoga dinote Chegar de noite

lersquova pirsquotaw Levar pro hospital

ta suzu Ta sujo

rsquobahio Bairro

atildebɾarsquosada Abraccedilada

masɛlu babudo Marcelo barbudo

pɾatildeta milu Planta milho

na gɾɛba Na gleba

bɾasadu Abraccedilado

komi he tʃi Comi gente

kɛ azursquoda Quer ajudar

sotildebɾasotilde Assombraccedilatildeo

nu podi atildersquoda Natildeo pode andar

pɛga na tiheɾu Pega no terreiro

kɔviotilde Gaviatildeo

sɔ eli karsquopo Soacute ele escapou

me rsquoto Aumentou

levava uz vɛio Levava os velhos

matildenɛ desaɾu Maneacute deixaram

pusa no kabelu Puxa no cabelo

kabelu ge ti hatildega Cabelo de gente arranca

iɔga ge ti pɾa la Joga gente pra laacute

hu tu Junto

kɛma he ti queima a gente

ki sɔ a oti Que soacute haacute outro

bagas~i Bagacinho

236

tiɾatildeni katildetatildeni Tirando cantando

kɾese ni Crescendo

dirsquoɾetu Direito

febɾu marsquolaɾu Febre malaacuteria

maj sarsquobiw Mais sabia

tiɾaɾu Tiraram

batildei Banho

ipia deli Espirro dele

Korsquodadu mehmo Acordado mesmo di notu De noite

kasu Caccedila

baɾizadu otu Batizado outro

atʃi mi a ihmatilde fala Assim minha irmatilde fala

kotadu Encostado

nu zudia deli natildew Natildeo judia dele natildeo

gɔta maj deli Gosta mais dele

samatildedu otu Chamando outro

mi atilde subɾi Meu sobrinho

mi atilde pohu Meu povo

mi atilde matilde Minha irmatilde

mi atilde muʒka Minha muacutesica

sɔ bɾi ga Soacute brinca

tʃubi nu Subindo

kahega na koʃta Carrega nas costas dese Desse aiacute istu Isto katildersquoba Gambaacute

237

kursquotia Cutia kursquotʃia Cutia

marsquoɾɛlu Amarelo

versquomela versquomelo Vermelha vermelho rsquose Esse

te natildeʊ te natilde Tem natildeo

esersquoki Esse aqui

rsquoɛmarsquokakupɾersquogisi Eacute macaco preguiccedila

morsquosegi Morcego

defersquore ti Diferente

rsquopodƷi Pode

rsquosersquonatilde Sei natildeo

rsquosersquoviw Vocecirc viu

arsquoinrsquoɛgarsquoviatildew Aiacute eacute gaviatildeo

jabutʃi Jabuti

parsquoɾɛsirsquokele Parece aquele

ɛrsquokele Eacute aquele

rsquoessersquote Esse tem

be i natildeu Tambeacutem natildeo

kursquoruja Coruja

pike nu Pequeno

defersquore ti Diferente

rsquokelersquoɛrsquootro Aquele eacute outro

rsquoejarsquobutʃi E jabuti gɾatildersquodatilde grandatildeo rsquomesmu mesmo

rsquomemu Mesmo

ɔrsquoɾɔpa Europa

arsquobeja Abelha

iscɔhpiatildew escorpiatildeo

ewmɔrsquoʎa Eu molhar ~ Eu molho

pirsquodi pedir tasrsquocɾitu Ta escrito

pɛdƷi Pedi (a gente )

Kersquoma queimar

mode nu Mordendo

morsquodemas Mordeu mais rsquonoj rsquodoj Noacutes dois

aʃe ti A gente (noacutes)

rsquopadirsquoze Pra dizer

238

rsquokɔta Corta

ahatildejrsquoo Arranhou

mujrsquoɛ Mulher

ahajrsquoaelig Arranhou orsquosersquomehm Vocecirc mesmo

isrsquopi Espinho

sorsquome Somente

rsquokalo ~karsquolo Calor doi Dois

tatildebe Tambeacutem

ispi rsquogada Espingarda

persquode Perdeu

se rsquotatu Sentado

rsquohe ti Gente

arsquodidu Ardido rsquokoda Corda mərsquota Matar marsquotani matando

rsquoʃɔmarsquota Soacute matar

rsquobisu Bicho rsquoota Outra

patildersquota ~rsquopɾatildeta Plantar

atildersquodatildeni Andando

ve tatildeni Ventando

defersquore ti Diferente

hursquoatildenu Voando vorsquoto Voltou rsquopodirsquoze Pode dizer marsquotaforsquogatilden Matar afogando rsquodaga Da aacutegua (drsquoaacutegua) arsquoɾea Areia

rsquofu da Afunda

rsquokɛlaforsquogo Que ela afogou

mɛgursquola Mergulhar

eʃpɾersquome Espremer

hɛlatilden Ralando (verbo ralar)

mɔrsquolada Amolada

kwatildeni Quando arsquotia Ateia (verbo atear)

239

i pursquoha Empurrar

epursquohej Eu empurrei

pursquoha Empurrar rsquofoti Forte

rsquofosa Forccedila

rsquohapu Raacutepido

ku rsquopɛ Com o peacute

eki pursquohe Eu que empurrei

sirsquonɛlu Chinelo

i pursquohan Empurrando

sɔrsquose Soacute vocecirc

rsquotapursquohanu Taacute empurrando

sɔrsquozi Sozinho

rsquohatildeka Arrancar

rsquosɔhatildersquoka Soacute arrancar

jrsquoahatildersquoke Jaacute arranquei

arsquohatildekui rsquoʃada Arranco com a enxada

rsquopuʃa Puxar cabelo pursquoʃo Puxou pursquoʃe Puxei haʃrsquoto Arrastou haʃrsquote Arrastei

tʃirsquoa Tirar

buʃrsquoca Buscar buʃrsquoke Busquei (eu passado) rsquooto Outra rsquohopa Roupa rsquomemo Mesmo rsquodeʃa Deixa

tirsquoe Tirei

rsquosɛtu Certo

rsquohejtu Jeito iskujrsquoe Escolher rsquotakujrsquoenu Taacute escolhendo ojrsquoan Olhando

tʃumi Sumiu

dimursquoranu Demorando kersquoma Queimar ursquozotu Os outros kersquome Queimei

rsquonɔj Noacutes

rsquopejsi Peixe

Ku rsquome Comer

240

pɾicirsquoza Precisar pɾisirsquozanu Precisando korsquoseɾa Coceira mirsquoƷatilden Mijando atildersquodatildenu Andando

barsquote nu Batendo

i rsquoʃima Encima

rsquokatildem Cama atirsquoɾo Atirou

rsquohaʃarsquole Racha lenha

vɔrsquota Voltar

tursquomatilden Tomando

varsquoɾi Varinha

gɾitrsquoatilden Gritando

fɾɛrsquoga Esfregar

mirsquodi Medir

mi rsquotinu Mentindo

rsquokɔʃka Coacutecega

barsquosi u Baixinho

pɔdirsquoze Pode dizer

pe rsquota Pentear

rsquobatildej Banho rsquomaiƷrsquotadi Mais tarde rsquofoja Folha batildenarsquodo Abanador bursquonitu Bonito

rsquosersquokirsquode Vocecirc que deu

siparsquoradu Separado rsquosatildew Chatildeo

tursquodi Tudinho

karsquoe Cair kersquobɾe Quebrei arsquohatildejorsquose Arranho vocecirc rsquomuja Molha rsquosevi Serve rsquopaj Palha pirsquodi Pedir dersquosa Deixar rsquomoj Molho fɾersquovenu Fervendo pursquolo Pulou

norsquovi Novinho

241

firsquodido Fedido mursquolada Amolada

rsquonɔʃi Nosso

patildersquoneɾu Paneiro motildersquodeli Matildeo dele dursquozotu Dos outros

rsquonɔj Noacutes

rsquopodi Podre firsquodid Fedido dersquota Deitar dersquotadu Deitado cuʃtursquoɾa Costurar

barsquote m Batendo

dersquosa Deixar

rsquofɾɛʃa ~rsquofɾEʃ Flecha

iskersquosidu Esquecido

tatildersquome j Tambeacutem

abersquoli Abelhinha

me rsquodu i Amendoim

pɔrsquodirsquoze Pode dizer

rsquoavi Aacutervore

rsquopesi Peixe

tatursquozi Tatuzinho

rsquovɛja Velha

arsquodea Aldeia

rsquode tu Dentro

rsquohe ti Gente

rsquohadu Raacutedio rsquohejtu Jeito iʃtɾarsquogadu Estragado

rsquode tirsquokaza Dentro de casa

rsquopoku Porco

pihu rsquotatildenu Perguntando

gwahrsquode Guardei firsquogeɾa Figueira

kɔrsquota Cortar

ojrsquoa Olhar

pi dursquoɾa pendurar

mitʃursquoɾa Misturar

rsquofɔtʃi Forte

242

matildersquodƷɔka Mandioca

birsquoƷu Beiju

marsquoɾɛlu Amarelo

atildersquozɔ Anzol

rsquopɛda Pedra

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