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Reflexões sobre a formação de professores com vistas à educação inclusiva

lúciA De ArAúJo rAMos MArtins

Introdução

É importante, quando se estuda a formação de docentes no Brasil, retro-ceder um pouco na história, não desconsiderando o fato de que apenas em meados do século XX é que começa o processo de expansão da escolaridade básica no país, embora ainda de forma bastante lenta. No que tange à rede pública de ensino, esta expansão se processa, de maneira mais significativa, a partir das décadas de 1970 e 1980.

Tal situação decorre do fato de que a escolarização foi, por muito tempo, privilégio das elites, pois – apesar da existência de algumas propostas educa-cionais, segundo documentos e estudos realizados – não havia uma política inclusiva da população em geral, na escola. (GATTI; BARRETO, 2009)

No que diz respeito à educação de pessoas com necessidades educacio-nais especiais – principalmente aquelas que apresentavam algum tipo de deficiência – até a década de 1970 era, geralmente, realizada apenas em instituições especializadas, atingindo um quantitativo bastante restrito de educandos. Essa área é eleita como prioritária no Plano Setorial de Edu-cação e Cultura 1972/1974 e, em consequência, foram fixados objetivos e estratégias voltadas para esse campo educacional. (BRASIL, 1977)

Com a criação do Centro Nacional de Educação Especial (CENESP/ MEC), em julho de 1973, primeiro órgão responsável pela formulação e acompanhamento de uma política de Educação Especial, em âmbito nacio-

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nal, começa a ocorrer a criação de setores especializados nas Secretarias de Educação. Isto trouxe, como consequência, a implantação do atendimento educacional para alunos então considerado como “excepcionais”,1 também em escolas regulares estaduais e municipais. Surgiram, assim, as denomina-das classes especiais, bem como várias outras modalidades educacionais,2 inclusive, o atendimento desses educandos em classes comuns, sob a égide do paradigma da Integração. Predominava, porém, a visão de dois sistemas separados, estanques: o regular e o especial.

Em 1974, havia um quantitativo de 96.413 pessoas com tais condições atendidas educacionalmente, em todo país, centrando-se principalmente na faixa etária de 7 a 14 anos (70,66%). Na região Nordeste, o quantita-tivo de alunos tidos como excepcionais atendidos atingia um patamar de apenas 10.721 educandos, que estavam frequentando alguma modalidade educacional. (BRASIL, 1977)

Segundo dados do CENESP/MEC, nesse ano, existiam cerca de 13.970 docentes, no Brasil, em exercício no campo da Educação Especial. Destes, 56% apresentavam apenas o nível de 2º grau e 5% eram leigos, embora 46% possuíssem algum tipo de especialização.

Detendo o nosso olhar na região Nordeste, podemos salientar que, existiam 4.510 professores atuantes na área, sendo que destes apenas 768 (17,02%) tinham especialização para o exercício da função. (BRASIL, 1977)

Observamos, ainda, no que diz respeito ao quantitativo de alunos atendidos nesse campo educacional, no país, que – além de estar muito longe de corresponder à demanda em potencial existente – o atendimento ofertado estava ainda estava muito centrado nas instituições especializadas. Evidenciava-se, portanto, como conveniente “[...] incentivar-se a integração desses alunos no sistema regular de ensino, sempre que possível, e sem prejuízo da qualidade do atendimento”. (BRASIL, 1977, p. 12)

Isto mostra, entre outros aspectos,

[...] [a] necessidade de atuação em favor de padrões satisfatórios de desempenho a serem alcançados, caracterizando-se como

1 Como eram denominados os alunos com deficiência, superdotação e problemas de conduta.

2 Envolvendo desde a modalidade de classe comum, sem ou com apoio especializado, até o atendimento em hospitais e centros de tratamento. (REYNOLDS, 1962 apud PEREIRA, 1980)

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principais enfoques: melhorar a adequação de métodos; adotar procedimentos e instrumentos para identificação, diagnóstico e prescrição de atendimentos; aperfeiçoar currículos e programas; suprir material didático e escolar e equipamentos especializados; adequar instalações físicas e suprir de pessoal docente e técnico especializado o tratamento educacional de excepcionais. (BRASIL, 1977, p. 13)

Podemos afirmar, frente a isso, que havia uma grande premência quanto à capacitação de recursos humanos na área, com vistas à ampliação das oportunidades de atendimento educacional adequado, de maneira que um dos objetivos específicos propostos pelo CENESP/MEC, para o Plano Na-cional de Educação Especial no período de 1977/1979, foi o de “Capacitar recursos humanos, envolvendo pessoal docente e técnico especializado das equipes multidisciplinares para atendimento aos excepcionais, a partir da educação precoce até a formação profissional.” (BRASIL, 1977, 19)

Para tanto, várias ações foram programadas nessa área considerada prio-ritária, voltadas para preparação e atualização docentes e técnicos atuantes na Educação Especial, em todo país, assim como para a capacitação de docentes de universidades, objetivando a formação de agentes multiplica-dores, com vistas à implantação e manutenção de cursos de licenciatura em instituições de ensino superior. (BRASIL, 1985)

A preocupação com a ação pedagógica empreendida com educandos com excepcionalidade intensifica-se e, no período de 1979-1984. Conforme dados do CENESP/MEC, foram realizados no país 184 cursos de Educa-ção Especial, sendo que, desses, 35 foram de atualização, 34 de especia-lização, 01 de aperfeiçoamento, 19 de estudos adicionais, 61 de extensão universitária, 26 de licenciatura e 08 de mestrado, que foram executados pelas Secretarias de Educação e/ou pelas universidades de 24 estados da Federação, propiciando a preparação de 6.707 profissionais, voltados para diversas áreas de atendimento educacional. (BRASIL, 1985)

Podemos perceber, não apenas nesse período citado, mas em anos sub-sequentes, que a formação de professores para a Educação Especial, no país, assumiu diferentes formatos em vários estados brasileiros. Alguns empreenderam, de maneira mais sistemática, cursos de Estudos Adicionais (ou seja, o 4º ano do magistério) para professores do ensino regular que apresentavam apenas o nível médio, outros investiram na formação em

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nível de pós-graduação lato sensu e outros na formação inicial ou específica, em nível superior.

A partir de meados da década de 1990 inicia-se um novo movimento, que se prolonga até os dias atuais, em que se busca a inclusão plena de todos os educandos nas classes regulares, desde a Educação Infantil. Ou seja, reconhece-se que crianças, jovens e adultos com necessidades especiais devem aprender junto aos demais alunos, independentemente das suas diferenças.

Nesse sentido, por meio da sua ação educativa, os profissionais de ensino regular, nos diversos níveis, devem buscar atender de maneira adequada à diversidade do alunado. Essa ação, igualmente,

[...] deve se pautar no respeito e no convívio com as diferenças, preparando os educandos para uma sociedade mais justa e solidá-ria, contrária a todos os tipos de discriminação [...] Os professores precisam tratar das relações entre os alunos. Formar crianças para o convívio com as diferenças. (ZOÍA, 2006, p. 23)

Dentro de uma perspectiva de ampliação dos sistemas, com vistas não apenas ao crescimento quantitativo de matrícula, mas também à melhoria do sistema escolar, necessário se faz, entre outros aspectos, o aprimora-mento do sistema de gestão, da atuação dos profissionais e do processo de ensino e aprendizagem.

De maneira ampla, temos que reconhecer que tem sido realizado um esforço, nos últimos anos, por diversas instâncias, para preparar em nível superior professores e demais profissionais de ensino, considerando a exi-gência da legislação nacional. A este respeito, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – Lei nº 9.394/1996, no artigo 62, situa:

A formação de docentes para atuar na educação básica far-se-á em nível superior, em curso de licenciatura, de graduação plena, em universidades e institutos superiores de educação, admitida, como formação mínima para o exercício do magistério na educação infantil e nas quatro primeiras séries do ensino fundamental, a oferecida em nível médio, na modalidade Normal.

No entanto, segundo dados do MEC, a partir do Censo Escolar da Educação Básica, realizado em 2006, podemos constatar a existência de 2.629.694 docentes atuantes na Educação Básica, sendo que, destes,

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735.628 professores não têm nível superior e 20.339 são considerados leigos. Os docentes sem nível superior, segundo o referido censo, podem ser assim distribuídos: 230.518 estão atuando na Educação Infantil; 355.393 na 1ª à 4ª série e 125.991 na 5ª à 8ª série do Ensino Fundamental; 23.726 no Ensino Médio.

Na região Nordeste este quantitativo era bastante significativo, atin-gindo um total 355.910 docentes sem formação em nível superior (o que corresponde a 48,38% do total de docentes sem formação em nível supe-rior no país), centrando-se mais a sua atuação na primeira etapa do Ensi-no Fundamental (173.476 profissionais) e na Educação Infantil (95.581 pro fis sionais). Isto evidencia a necessidade de um investimento, cada vez maior, na formação dos profissionais de ensino, em todo país, e, de maneira especial, naqueles que atuam na região Nordeste.

Educação inclusiva e formação docente

No Brasil, a partir da Portaria Ministerial nº 1793, foi reconhecida a importância de complementar os currículos de formação de docentes e de outros profissionais que atuam em áreas afins, sendo recomendada a inclu-são de disciplina específica focalizando aspectos ético-político-educacionais relativos às pessoas com necessidades especiais, prioritariamente nos cursos de Pedagogia, Psicologia e em outras licenciaturas, assim como a inclusão de conteúdos específicos em cursos da área da Saúde e em outras áreas.

Na Resolução do Conselho Nacional de Educação (CNE), que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica, há referência à inclusão e à formação de professores:

A Educação Básica deve ser inclusiva, no sentido de atender a uma política de integração dos alunos com necessidades educacionais especiais nas classes comuns dos sistemas de ensino. Isso exige que a formação dos professores das diferentes etapas da Educação Básica inclua conhecimentos relativos à educação desses alunos. (BRASIL, 2001, p. 25-26)

Está previsto, assim, que na formação inicial, durante a graduação, todos os futuros professores da Educação Básica devem desenvolver competências para atuar também com alunos que apresentem necessidades especiais, em

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qualquer etapa ou modalidade de ensino, na perspectiva de se efetivar a educação inclusiva.

Especificamente voltada para a Educação Especial, foi aprovada a Reso-lução nº 02/2001, do CNE e da Câmara de Educação Básica, instituindo as Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica, que reforça necessidade de haver a capacitação tanto de profissionais do ensino regular, como de docentes de docentes especializados para atender, de maneira diferenciada, as necessidades dos educandos (art. 8, inciso I).

Evidencia-se, porém, que apesar da existência da Portaria nº 1.793/94 e das Resoluções do CNE, muitas instituições de ensino superior não se estruturaram no sentido de oferecer disciplinas e /ou conteúdos relativos ao tema nos seus cursos de licenciatura, enquanto que outras o fazem de maneira precária, através da oferta de disciplina eletiva, ou com carga horária reduzida, ministrada de maneira aligeirada, o que não favorece a aquisição de conhecimentos, o desenvolvimento de destrezas, habilidades e atitudes relativas ao processo de atendimento à diversidade dos educandos. (MARTINS, 2009)

A partir do sancionamento da Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002, reconhecendo a Língua Brasileira de Sinais (Libras) como meio legal de comunicação e expressão de natureza visual-motora, com estrutura gra-matical própria, de uso das comunidades de pessoas surdas, os sistemas educacionais federal, estadual e municipal e do Distrito Federal são obriga-dos a garantir a inclusão da disciplina de Libras nos cursos de formação de Educação Especial, de Fonoaudiologia, de Pedagogia e demais licenciaturas.

No que tange à Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), em relação ao campus central, no ano de 2009, existiam oito cursos de licenciatura que apresentavam, em sua estrutura curricular, uma disciplina obrigatória voltada para a educação de pessoas com necessidades especiais, enquanto que apenas quatro cursos apresentavam, além da disciplina obrigatória, alguma(s) em caráter eletivo. Este é o caso do curso de Peda-gogia, que ofertava, também, quatro disciplinas eletivas: Fundamentos de Educação Especial (90 h/a), Metodologia de Ensino em Educação Especial I (DV), II (DM) e III (DA), cada uma com 60 h/a.3

3 A partir de 2011, com a reformulação curricular, no Curso de Pedagogia existem 2 disciplinas obrigatórias: Educação Especial numa Perspectiva Inclusiva e Língua Brasileira de Sinais – Libras e 4 disciplinas eletivas: Metodologia de Ensino em Educação Especial

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Por sua vez, 14 licenciaturas apresentavam apenas um componente curricular optativo, geralmente denominado Introdução à Educação Espe-cial. A partir de 2010, passou-se a oferecer também a disciplina Libras, em todas as licenciaturas, em caráter obrigatório ou eletivo.

Com vistas a conhecer a visão que graduandos apresentam sobre as disciplinas que cursaram nessa área, realizamos, em 2009, uma pesquisa com alunos de cursos de licenciatura que, na sua estrutura curricular, têm componente(s) curricular(es) de formação em Educação Especial. Para tanto, centramos a nossa atenção em alguns cursos sediados no Campus Central, em Natal.

Foi empreendida, neste sentido, uma pesquisa de campo com 96 alunos matriculados em vários cursos de licenciatura, utilizando o questionário como instrumento para a construção dos dados. Tal investigação envolveu uma série de questões apresentadas por escrito aos acadêmicos, tendo por objetivo o conhecimento de suas opiniões a respeito: da formação inicial ministrada na área, na licenciatura cursada; da repercussão da disciplina na percepção que apresentam sobre as pessoas com necessidades educa-cionais especiais e sua educação; do aprimoramento da formação inicial de professores na área.

Mesmo que 87,5% dos pesquisados tenham analisado de maneira bastante positiva as disciplinas cursadas, em decorrência da metodologia utilizada e dos conteúdos que foram ministrados, para aprimoramento da sua formação inicial vários graduandos, que integram cursos de licenciatura na UFRN, sugerem:• inclusão de mais de uma disciplina voltada para a Educação Inclusiva,

em caráter obrigatório, em todas as licenciaturas;

• ampliação da carga horária das disciplinas que vêm sendo desenvol-vidas;

• desenvolvimento de atividades que proporcionem um maior contato com as pessoas com deficiência, altas habilidades/superdotação e transtornos globais do desenvolvimento, tais como visitas a escolas e

I (Deficiência Visual), II (Deficiência Mental) e III (Deficiência Auditiva), e Tecnologia Assistiva, sendo cada uma com 60 h/a, o que propicia aos alunos que participam do referido curso mais oportunidade de aprofundamento neste campo educacional.

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associações atuantes na área, entrevistas, palestras com profissionais convidados, aulas práticas;

• discussões sobre dificuldades comuns encontradas na sala de aula por docentes e como enfrentá-las, de maneira a realizar uma maior correlação entre teoria e prática educativa;

• inserção de conteúdos relativos às pessoas com necessidades educa-cionais especiais em outras disciplinas oferecidas nas licenciaturas: exs. Fundamentos da Psicologia Educacional, Fundamentos Histó rico-Filosóficos da Educação; História da Educação Brasileira; Estrutura e Funcionamento do Ensino;

• ampliação de atividades extracurriculares na área, no âmbito da UFRN, tais como seminários, cursos, oficinas, entre outros. (MAR-TINS, 2011)

Para tais graduandos, portanto, necessário se faz que haja ampliação de disciplinas e uma maior correlação entre a teoria e a prática, de maneira que possam ser incluídas de forma mais satisfatória, como bem situa Torres González (2002, p. 245), “[...] dimensões relativas aos conhecimentos, destrezas, habilidades e atitudes relacionadas ao processo de atenção à diversidade dos alunos”.

A formação dos profissionais de ensino, porém, de maneira geral, não se esgota na fase inicial, por melhor que essa tenha se processado. Para aprimorar a qualidade do ensino ministrado pelos profissionais de ensino em geral, nas escolas regulares, atenção especial deve ser atribuída tam-bém à sua formação continuada, de acordo com os princípios de atenção à diversidade.

Segundo afirmam Ramalho e Beltrán Núñez (2011, p. 73), este tipo de formação

[...] é mais que instrução ou aprendizagem de conhecimentos e formação de habilidades e de competências, pois inclui, entre ou-tras coisas, interesses, necessidades, intenções, motivações, caráter, capacidades, condutas, crenças, atitudes e valores. [...] é o tipo de atividade que o professor se apropria da cultura profissional e modifica [...] elementos chaves do seu agir profissional, de forma a influenciar no desenvolvimento profissional.

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Contribui, pois, para possibilitar condições para que os docentes pos-sam refletir sobre a sua prática, de forma a melhor atuar com as diferenças que se fazem presentes no alunado, entre as quais aquelas decorrentes de deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação.

Correia (2008, p. 28), com vistas a essa perspectiva formativa, destaca que

os educadores, os professores e os auxiliares de acção educativa necessitam de formação específica que lhes permita perceber mi-nimamente as problemáticas que seus alunos apresentam, que tipo de estratégia devem ser consideradas para lhes dar resposta e que papel devem desempenhar as novas tecnologias nestes contextos.

Dessa forma, realça que não apenas o professor precisa estar preparado para a atuação com a diversidade do alunado, no cotidiano da escola, mas todos os profissionais que ali atuam.

A formação permanente, pois, é um dos fatores imprescindíveis para que os profissionais de educação possam atuar, efetivamente, frente aos alunos sob sua responsabilidade em classe e no ambiente escolar, de maneira mais ampla, por mais diversificado que esse grupo se apresente, oferecendo--lhes condições de atendimento educacional que sejam adequadas às suas condições e necessidades e, não apenas, realizando a mera inserção física desses educandos no ambiente escolar.

Isto, infelizmente, ainda é feito em algumas realidades escolares, em especial no que diz respeito aos alunos com deficiência, sobre os quais deteremos mais o nosso olhar. Nesses casos, quando muito, a inclusão se reduz a um simples espaço de socialização. Necessário se faz que esta seja desenvolvida com mais responsabilidade, observando aspectos relacionados à escola, ao aluno – que é ímpar em suas características e necessidades – e também ao docente. A inclusão é um processo complexo e esta complexi-dade deve ser respeitada, atendida e não minimizada.

Se almejamos, pois, uma escola que possa garantir a efetiva participação e aprendizagem dos alunos em geral, necessário se faz a sua reestruturação, implicando na busca pela remoção de barreiras visíveis (de acessibilidade física, pedagógicas) e invisíveis, que são as mais sérias de serem removidas,

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pois envolvem atitudes, preconceitos, estigmas e mecanismos de defesa ainda existentes frente ao aluno tido como “diferente”.

Em face disso, várias ações vêm sendo empreendidas nos sistemas edu-cacionais, principalmente nos últimos anos, sob a “bandeira” da educação para todos, da inclusão de todos na escola regular. Muitos cursos e eventos vêm sendo realizados, porém, podemos observar que, muitas vezes, essas ações não se desvinculam da lógica tecnicista de transmissão, assimilação e reprodução do saber, não resultando em mudanças de percepções, posturas e práticas.

Para que ocorra essa desvinculação, o que nem sempre acontece, neces-sário se faz

[...] considerar os educadores e as educadoras nos seus contextos de sujeitos socioculturais, que trazem em suas trajetórias marcas e características próprias – particularidades que estarão presentes numa determinada forma de olhar o mundo, de se permitir analisar as lógicas da realidade e, claro, de conceber a educação. (DINIZ; RAHME, 2004, p. 130)

No tocante à formação de recursos humanos para atuação na escola regular com alunos com deficiência e outras necessidades educacionais especiais, o Ministério da Educação deu início, em 2003, ao Programa Educação Inclusiva: Direito à Diversidade, promovido pela Secretaria de Edu-cação Especial, visando: disseminar a política de Educação Inclusiva nos municípios, em todo país; apoiar a formação de gestores e educadores para efetivar a transformação dos sistemas educacionais inclusivos. Fundamenta--se no seguinte princípio: garantia do direito dos alunos com necessidades educacionais especiais de acesso e permanência, com qualidade, na escola regular de ensino. (BRASIL, 2006)

Em setembro de 2010, o referido programa atingia 168 municípios-polo, que atuavam como multiplicadores para vários outros municípios da região. Segundo dados do Ministério da Educação (MEC), ocorreu a formação de 133.167 professores e gestores, no período de 2004 a 2009.

O MEC, através da SEESP, também elaborou e distribuiu materiais bibliográficos que visavam servir como referencial para o programa em desenvolvimento, contemplando, inclusive, experiências inclusivas signifi-cativas, que vêm sendo empreendidas no país, em várias regiões.

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Na UFRN, com apoio financeiro do MEC, vem sendo empreendido o Projeto Continuum, desde 2011, que objetiva capacitar professores do ensino fundamental para o processo de inclusão de estudantes com necessidades educacionais especiais, tendo em vista seu ingresso, acesso e permanência, com qualidade, no ambiente escolar. O público-alvo é constituído de pro-fessores efetivos da rede pública estadual e municipal, com formação em nível superior, que atuam no Ensino Fundamental, de 1º ao 9º ano, em salas de aula regulares e em Salas de Recursos Multifuncionais.

O referido curso, possui uma carga horária de 180 horas/atividades, distribuídas em 144h presenciais e 36h vivenciais, que são destinadas às atividades desenvolvidas pelos professores/cursistas em sua própria escola.

No ano de 2011 foram empreendidos sete cursos, nos municípios de Natal (2), Mossoró (1), Currais Novos (1), Nova Cruz (1), Santa Cruz (1) e Macau (1), abrangendo um total de 269 cursistas.

Dada a repercussão positiva dos referidos cursos, em 2012 estão sendo previstos outros sete cursos destinados a docentes das redes públicas de Natal e municípios circunvizinhos (6) e de Mossoró (1).

Nesses cursos tem sido considerado de suma importância a problema-tização dos saberes presentes nas vivências cotidianas e os aspectos que fundamentam o saber-fazer dos docentes, de maneira a se constituírem em pontos de partida para novas experiências e vivências.

Algumas considerações, a título de conclusão

Nos tempos atuais, construir uma escola numa perspectiva inclusiva – que atenda adequadamente a estudantes com diferentes características, potencialidades e ritmos de aprendizagem – é um dos grandes desafios dos sistemas educacionais.

Não basta, porém, apenas oferecer aos alunos o acesso à escola. Ne-cessário se faz ministrar um ensino que seja de qualidade para todos, que atenda às reais necessidades dos educandos. Em outras palavras, deve existir abertura para um trabalho pedagógico efetivo com a diferença presente nos educandos, em geral. Para tanto, é imprescindível investir – dentre outros fatores – na formação inicial dos profissionais de educação para atuação com a diversidade do alunado, incluindo nesse contexto os educandos

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que apresentam deficiência, altas habilidades/ superdotação e transtornos globais do desenvolvimento.

Podemos perceber que avanços vêm ocorrendo, neste sentido, no Brasil, no tocante à legislação existente e aos documentos oriundos de órgãos edu-cacionais. Várias iniciativas foram empreendidas pelo MEC e por diversos órgãos em nível federal, estadual e municipal, no que diz respeito à formação de docentes para favorecer a inclusão de todos os alunos, na escola regular.

Neste sentido, embora reconheçamos que tem crescido o número de cursos de licenciatura que buscam oferecer disciplina(s) voltada(s) para a Educação Especial, numa perspectiva inclusiva – principalmente em decor-rência de resoluções e de algumas portarias ministeriais – vários estudos vêm evidenciando que ainda existe, da parte de docentes em formação, a necessidade de um aprimoramento deste processo, a partir da ampliação da carga horária das disciplinas ofertadas, assim como da oferta de outras disciplinas que oportunizem um maior aprofundamento teórico e prático, nesse campo educacional.

Há, também, o reconhecimento de que o processo formativo não se esgota no momento inicial, sendo a formação continuada percebida como um dos fatores imprescindíveis para que os profissionais de educação pos-sam atuar, efetivamente, com todos os alunos sob sua responsabilidade em classe regular e no ambiente escolar, de maneira mais ampla, por mais diversificado que esse grupo se apresente.

É importante que se entenda a escola como um lugar privilegiado de formação, como um espaço para discussão de questões que têm profunda correlação com a prática ali vivenciada e de busca de caminhos no tocante à tomada de decisões relativas às condições de trabalho, à aprendizagem vivenciada pelos alunos sob sua responsabilidade. A inclusão deve ser pensada, também, de maneira a extrapolar a dimensão da sala de aula, envolvendo toda a comunidade escolar.

É importante que a formação leve em consideração, portanto, o máximo possível, o ambiente profissional real dos profissionais de ensino, favorecen-do situações em que possam mobilizar seus recursos no contexto da ação

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profissional e, ao mesmo tempo, possa levá-los a fazer uma análise reflexiva e metódica de sua prática, na busca de superarem as suas dificuldades.

Esse critério deve ser levado em consideração quando da organização de cursos, voltados para a formação continuada de profissionais de educa-ção, em instituições de ensino superior e nos próprios sistemas estaduais e municipais de ensino.

Referências

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_______. Projeto Prioritário Capacitação de Recursos Humanos para a Educação Especial 1975/1979. Brasília: MEC/ CENESP, 1974.

_______. Resolução n. 02/2001. Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica. Brasília: CNE, 2001.

______. Relatório 1979-1985. Brasília: 1985.

______. Programa Educação Inclusiva: direito à diversidade, 2006. <http://portal.mec.gov.br/index.php>. Acesso em: 25 nov. 2011.

______. Lei n. 9.394, de 23 de dezembro de 1996. Fixa Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Brasília, 1996.

BRASIL. Lei n. 10.436, 24 de abril de 2002. Dispõe sobre a Língua Brasileira de Sinais - Libras e dá outras providências. Disponível em: < http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10436.htm>. Acesso em: 25 out. 2012.

CORREIA, L. M. Inclusão e necessidades educativas especiais: um guia para educadores e professores. 2. ed. Porto: Porto Editora, 2008.

DINIZ, M.; RAHME, M. Da educação especial à educação inclusiva. In: DINIZ, M.; VASCONCELOS, R. N. (Org.). Pluralidade cultural e inclusão na formação de professores e professoras. Belo Horizonte: Formato, 2004.

FERREIRA, J. R.; GLAT, R. Reformas educacionais pós-LDB: a inclusão do aluno com necessidades especiais no contexto da municipalização. In: SOUZA, D. B. S.; FARIA, L. C. M. (Org.) Desafios da educação municipal. Rio de Janeiro: DP &A, 2003. p. 372-390.

GATTI, B. A.; BARRETO, E. S. de S. Professores do Brasil: impasses e desafios. Brasília: UNESCO, 2009.

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