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Literatura Brasileira II Prof. Dr. Jairo Nogueira Luna 2 a edição | Nead - UPE 2011

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Literatura Brasileira II

Prof. Dr. Jairo Nogueira Luna

2a edição | Nead - UPE 2011

Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)Núcleo de Educação à Distância - Universidade de Pernambuco - Recife

Luna, Jairo Nogueira

Letras: Literatura Brasileira II/ Jairo Nogueira Luna. - Recife: UPE/NEAD, 2011.

64 p. il.

ISBN - 978-85-7856-061-4

1. Literatura brasileira. 2. Literatura - História. 3. Período literário - Brasil. I. Universidade de Pernambuco - UPE. II. Título.

L961l

CDU 869.0(81)(091)

Reitor

Vice-Reitor

Pró-Reitor Administrativo

Pró-Reitor de Planejamento

Pró-Reitor de Graduação

Pró-Reitora de Pós-Graduação e Pesquisa

Pró-Reitor de Extensão e Cultura

Prof. Carlos Fernando de Araújo Calado

Prof. Rivaldo Mendes de Albuquerque

Prof. José Thomaz Medeiros Correia

Prof. Béda Barkokébas Jr.

Profa. Izabel Christina de Avelar Silva

Profa. Viviane Colares S. de Andrade Amorim

Prof. Rivaldo Mendes de Albuquerque

UNIVERsIDADE DE PERNAmbUCo - UPE

NEAD - NÚCLEo DE EDUCAÇÃo A DIsTÂNCIA

Coordenador Geral

Coordenador Adjunto

Assessora da Coordenação Geral

Coordenação de Curso

Coordenação Pedagógica

Coordenação de Revisão Gramatical

Gerente de Projetos

Administração do Ambiente

Coordenação de Design e Produção

Equipe de design

Coordenação de suporte

EDIÇÃo 2011

Prof. Renato Medeiros de Moraes

Prof. Walmir Soares da Silva Júnior

Profa. Waldete Arantes

Profa. Silvania Núbia Chagas

Profa. Maria Vitória Ribas de Oliveira Lima

Profa. Angela Maria Borges CavalcantiProfa. Eveline Mendes Costa LopesProfa. Geruza Viana da Silva.

Profa. Patrícia Lídia do Couto Soares Lopes

Igor Souza Lopes de Almeida

Prof. Marcos Leite Anita SousaGabriela CastroRafael Efrem Renata MoraesRodrigo Sotero

Afonso BioneProf. Jáuvaro Carneiro Leão

Impresso no Brasil - Tiragem 150 exemplaresAv. Agamenon Magalhães, s/n - Santo AmaroRecife - Pernambuco - CEP: 50103-010Fone: (81) 3183.3691 - Fax: (81) 3183.3664

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Literatura BrasiLeira ii

Prof. Dr. Jairo Nogueira LunaCarga Horária | 60 horas

ementa

Estudo da literatura brasileira: Realismo/Naturalismo, Parnasianismo, Simbolis-mo e Pré-modernismo. Análise de obras fundamentais, tendo em vista o aspecto formal, histórico e social. Prática de produção literária.

OBjetivO GeraL

Levar o aluno a compreender os conceitos de determinismo, positivismo em fun-ção da literatura realista e naturalista. Fornecer elementos teóricos e exemplos literários acerca das diferenças entre a literatura parnasiana e a literatura sim-bolista. Apresentar elementos que permitam uma discussão e problematização acerca do período conhecido como Pré-Modernismo.

apresentaçãO da discipLina

Nesta disciplina – Literatura Brasileira II – abordaremos a literatura produzida da segunda metade do século XIX até o início do século XX, esse período cro-nológico compreende as escolas do Realismo\Naturalismo, Simbolismo, Parna-sianismo e o período conhecido como Pré- Modernismo. É um período rico de autores e obras relevantes e de determinação de características importantes da Literatura Brasileira, haja vista a presença de nomes como Machado de Assis, Aluízio Azevedo, Lima Barreto, Euclides da Cunha, Olavo Bilac, Cruz e Sousa entre outros. Esperamos que façamos uma viagem de conhecimento acerca desse período da Literatura Brasileira de uma forma que, caros alunos, possam efetiva-mente levar mais do que características, nomes de autores e obras, mas sim, um dos pontos fulcrais da obra literária que é o conhecimento da condição humana no sentido social, filosófico e artístico.

7Capítulo 1 77Capítulo 1

OBjetivOs específicOs

• Garantiroconhecimentodascaracterísticasdaescolarealista,bemcomoàcompreensão das qualidades literárias da obra de Machado de Assis.

• CompreenderaimportânciadoRealismonocontextodaLiteraturaBrasilei-ra e tenha elementos para avaliação da obra de Machado de Assis.

• Desenvolverapráticadaanáliseedaleituracríticadeobrasliterárias,comdestaque para as características da obra machadiana.

intrOduçãO

Neste capítulo estudaremos o surgimento do Realismo e do Naturalismo na Lite-ratura Brasileira, abordar também como a crítica literária se desenvolveu no perí-odo,destacaraobradeMachadodeAssis,começandopelasuafaseromânticaeestudar a sua produção de contista.

1. O surGimentO dO reaLismO

Nesta unidade estudaremos o significado dos termos Realismo e Naturalismo, as condições históricas de seu surgimento e as características dessas escolas lite-rárias.

O reaLismO e a OBra de machadO (parte 1)

Prof. Dr. Jairo Nogueira LunaCarga Horária | 15 horas

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Gustave Courbet – Os Cortadores de Pedras

8 Capítulo 1

O Realismo e o Naturalismo surgiram inicialmen-te como uma reação aos excessos sentimentais do Romantismo, que já tinha saturado a cena artística européia desde meados do século XIX. Em Por-tugal , o marco histórico que introduziu as idéias realistas-naturalistas foi chamada “Questão Coim-brãque,em1865opôsrealistasaromânticos.NoBrasil, Realismo e Naturalismo tiveram trajetórias mais ou menos distintas: o primeiro iniciou-se com Memórias póstumas de Brás Cubas, de Macha-do de Assim, publicado em 1881, e o segundo, no mesmo ano, com O Mulato, de Aluísio Azevedo .

1.1 cOntextO históricO

A partir da segunda metade do século XIX , o am-biente sócio-cultural europeu apresenta significa-tivas mudanças. A civilização européia de caracte-rísticaburguesa, industrial emecânica, começaase firmar como a dominante no cenário político e econômico. As idéias de liberalismo e democracia ganham dimensões cada vez maiores. As ciências naturais desenvolvem-se e os métodos de experi-mentação e observação da realidade passam a ser encarados como os únicos capazes de explicar racio-nalmente o mundo físico. Neste período o método científico determinista e a absoluta confiança na ca-pacidade do progresso científico dominam a cena.

O desenvolvimento científico da época galvanizou a intelectualidade que, das cátedras universitárias aos bares boêmios, adere ao cientificismo e ao ma-terialismo, opondo-se àmetafísica, à religião e atudo escapasse dos limites da matéria. Algumas doutrinas científico-filosóficas da época deixaram marcas visíveis na produção literária. Hegel divulga a sua Dialética do Processo Racional, segundo a qual qualquer raciocínio pode ser lógico, desde que seja estruturado na trilogia seqüencial “tese- antítese - síntese”.

O Positivismo de Augusto Comte defendia a im-portância da Ciência para a sociedade humana.Ele concluía que a Teologia e a Metafísica pode-riam ser abandonadas, já que a realidade é concre-ta, objetiva e lógica, o que permitia a análise lógica e experimental; mais ainda: tudo poderia ser expli-cado e entendido por todos. Calcado nessa teoria, Proudhon lançou as bases do pensamento socialis-ta da igualdade .

A publicação de A Origem das Espécies de Charles Darwineliminouaauradeespiritualidadeemis-

ticismoqueoidealismoromânticoconferiaaoserhumano, encarando-o como parte de uma grande cadeia alimentar, nivelando-o com outros seres vi-vos. O livro, que contou com a forte oposição da Igreja, teve um extraordinário sucesso de público, comprovando a curiosidade geral em torno do tema e das novas idéias evolucionistas.

Mas a teoria filosófica que mais influência teve sobre as artes desse período foi o Determinismo de Hipólito Taine, que explicava todas as ocorrên-cias humanas e sociais pelo condicionamento do indivíduo aomeio, à raça ou fato histórico. Poressas idéias, o homem é presa do ambiente em que vive ou viveu, ao qual se soma a hereditariedade. A partir daí, dimensiona-se o pessimismo de Scho-penhauer, para quem o homem estava fadado àdor e ao sofrimento, já que a felicidade era sempre ilusória.

Quando os novos ideais chegaram ao Brasil, cria-ram um frêmito nos meios artísticos, filosóficos e universitários. Nesse momento, alguns fatos esta-vam acontecendo e gerando alteração de ordem so-cial, como a Abolição, a passagem da Monarquia àRepública, a chegada dos primeiros imigranteseuropeus e a descoberta da Ciência pela burgue-sia, até então refratária a novidades. Com isso, as idéias positivas e deterministas não demoraram em seduzir um grande número de intelectuais e autores brasileiros.

A realidade brasileira clamava por interpretações capazes de descobrir-lhes o funcionamento con-traditório de seus mecanismos fundadores. Sob uma capa de tranqüilidade político-institucional, na qual os partidos funcionavam regularmente, encontrava-se um grande vazio ideológico, que tor-nava esses partidos indistintos entre si. Ideologi-camente, as elites brasileiras conseguiam a proeza de fazer conviver o ideário liberal com a defesa da Escravidão. Isso tudo criava uma tensão entre a aparência e a essência da vida nacional, que será abordada, por vezes abertamente, por vezes alego-ricamente, pelos escritores do período.

Aguçando nossa percepção rumo ao conhecimen-to acerca de mais um estilo de época, que perfi-zeram o cenário da Literatura Brasileira, compre-enderemos, antes de tudo, que a segunda metade do século XIX foi o marco decisório para a imple-mentação de toda uma corrente ideológica deter-minante nas produções artísticas da era em pauta.

9Capítulo 1

A Revolução Industrial, já em sua segunda fase, abriu caminhos para uma concepção humana: a estreita relação estabelecida entre o ser humano e a sociedade na qual se insere. Era notoriamente contráriaàconcepçãoromântica,cujopressupostovoltava-se para a interiorização humana, levando-se em consideração seus aspectos subjetivos.

Os avanços técnicos oriundos da Revolução resul-taram, dentre outros fatores, no crescimento de-mográfico e, consequentemente, na “proliferação” de inúmeros problemas sociais, visto que tal classe contrapunha-se aos privilégios da burguesia, que desfrutava cada vez mais da ascensão econômica. Concomitante a isso, efervesciam as teorias cientí-ficas, nas quais a razão e a objetividade eram postas em primeiro plano, já não mais havia espaço para o sobrenatural ou a vontade subjetiva. A ciência, baseada em fatos concretos e experimentais, pare-cia revelar a explicação para todas as questões rela-cionadas ao cotidiano.

Dentretaiscorrentescientíficasemergiamimpor-tantes figuras, tais como: Augusto Comte (1789-1857) e sua teoria condicionada ao Positivismo, cuja concepção se voltava para a constatação real e observação dos fatos por meio do experimenta-lismo. Comte acreditava que a finalidade do saber científico era a previsão – “saber para poder”-, como também expunha sua concepção de que uma organização que fosse formada pelos interesses co-letivos poderia neutralizar os motivos de guerra e discórdia entre as nações.

Não deixando de mencionar Taine (1828-1893), que aplicou o método experimental ao compor-tamento do ser humano, sendo este considerado como produto da raça, do meio e do momento (con-textohistórico),oracaracterizadopeloDeterminis-mo. Charles Darwin comsua teoria evo-lucionista que enfatiza a com-petição entre as espécies, em que os organis-mos mais fra-cos tendem a serem elimina-dos pelos mais fortes e aptos. E, finalmente,

tem-se o Marxismo, representado por Karl Marx e Friedrich Engels, que propunham uma revolução que instaurasse o comunismo em detrimento ao sistema capitalista.

Mediante toda essa enumeração de fatos, resta-nos crer que a literatura não ficou aquém destes, uma vez que seus representantes partiram do pressupos-to de que o indivíduo não se desvincula do meio em que vive. Sendo assim, os personagens realis-tas, em oposição aos românticos, são retratadossegundo sua relação com o mundo que os cerca, convivendo em meio aos problemas cotidianos e rotineiros. Portanto, caracterizados conforme seu modo de ser e agir (alguns bons, corajosos, outros maus, covardes, e assimpordiante).Demodo aefetivarmos nossos conhecimentos em toda a sua plenitude, enfatizaremos sobre as características, os pressupostos ideológicos que nortearam toda a temática da era realista.

1.2 características dO reaLismO e dO naturaLismO

Características do Realismo: As características do Realismo estão intimamente ligadas ao momento histórico em que se insere esse movimento literá-rio, refletindo, dessa forma, a postura do Positi-vismo, do Socialismo e do Evolucionismo, com todas as suas variantes. Assim é que o objetivismo aparececomonegaçãodosubjetivismoromânticoe nos mostra o homem voltado para aquilo que está diante e fora dele, o não-eu; o personalismo cede terreno ao Universalismo. O Materialismo levaànegaçãodosentimentalismoedametafísica.O Nacionalismo e a volta ao passado histórico são deixados de lado; o Realismo só se preocupa com o presente, com o contemporâneo.

• Veracidade:Desprezaaimaginaçãoromântica.• Contemporaneidade: Descreve a realidade,

fala sobre o que está acontecendo de verdade.• Retrato fiel das personagens: Caráter, aspec-

tos negativos da natureza humana.• Gosto pelos detalhes: Lentidão na narrativa.• Materialismo do amor: Mulher objeto de pra-

zer/adultério.• Denúncia das injustiças sociais: mostra para

todos a realidade dos fatos.• Determinismo e relação entre causa e efeito:

O realista procurava uma explicação lógica para as atitudes das personagens, conside-rando a soma de fatores que justificasse suas Fo

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Auguste Comte

10 Capítulo 1

ações. Na literatura naturalista, dava-se ênfase aoinstinto,aomeioambienteeàhereditarie-dade como forças determinantes do comporta-mento dos indivíduos.

• Linguagem próxima à realidade: Simples, na-tural, clara e equilibrada.

1.2.1. Diferenças entre realismo e naturalismo

A aproximação dos termos Realismo e Naturalis-mo é muito comum na história da literatura. Em muitos casos eles são usados até como sinónimos. Isso ocorre porque existem muitos pontos em comum entre o romance Realista e o Naturalis-ta. Como exemplo pode-se citar o ataque à bur-guesia ao clero e àmonarquia. As proximidadesdessas estéticas são tantas, que, muitas vezes, é di-fícil classificar um autor e, até mesmo uma obra, comopertencenteaessaeàquelacorrenteliterária.Um bom exemplo é o escritor português Eça de Queirós, considerado por muitos críticos literários como sendo Realista e, por outros, como Natura-lista. Apesar de toda essa proximidade, é possível encontrar algumas diferenças entre a prosa Rea-lista e a Naturalista. O Naturalismo é fortemente influenciado pela teoria evolucionista de Charles Darwin.Por isso, vêohomemsemprepelo ladopatológico. Sob essa ótica o Homem comporta-se como um animal, ou seja, não usa a razão, pois os seus instintos naturais são mais fortes. Ainda sob esse ponto de vista, o comportamento huma-no nada mais é do que o reflexo do meio em que o homem vive (Esse meio é composto por educa-ção, pressão social, o próprio meio ambiente etc.). Esse homem, que ainda é subjugado (dominado moralmente, reprimido, amansado domesticado) pelo fator hereditariedade física, está preso a um destino que ele não consegue mudar.

O Naturalismo aprofunda a visão científica do Re-alismo, pois acredita no princípio de que somen-te as leis da ciência são válidas, renegando assim, qualquertipodevisãoespiritualista.Dessaforma,acredita que o comportamento do homem pode ser explicado cientificamente. Então, o escritor na-turalista observa o seu personagem muito de per-to, buscando conhecer as causas desse comporta-mento para chegar ao conhecimento objectivo dos fatos e das situações.

A temática também é um dos pontos em que há diferenças significativas entre o Naturalismo e

o Realismo. Os autores Naturalistas, sempre por meio de uma análise rigorosa do meio social e de aspectos patológicos, trazem para sua obra temas como a miséria, a criminalidade e os problemas relacionados ao sexo como o adultério e o homos-sexualismo, tanto feminino como masculino.

Esses temas são abordados sempre por meio de personagens que representam os grupos margina-lizados da sociedade.

Face a tudo o que foi exposto pode-se dizer que todo o Naturalista é Realista, porém, nem todo o Realista é Naturalista. Pode-se dizer ainda que o Naturalismo é um prolongamento do Realismo, só que mais intenso em determinadas características.

SAIBA MAIS!

Hippolyte Taine e o Determinismo

TAINE, HIPPOLYTE ADOLPHE (1823-1893)

Positivista francês. Historiador. Marcado pelo

Positivismo, distancia-se da filosofia eclética

de Victor Cousin que até 1857 dominava os

meios intelectuais franceses. Eleito para a

Academia Francesa em 1878. Criticando o

romantismo, inicia a postura positivista, em

nome da razão e das virtudes clássicas. Mar-

cado pelo determinismo geográfico, à seme-

lhança de Ratzel. Influenciado pelo darwinis-

mo social. Raça, meio, momento

Fundador do naturalismo, em nome da trilo-

gia race, milieu, moment (raça, meio, momen-

to). Porque há um conjunto de caracteres bio-

lógicos transmitidos hereditariamente porque

as tradições, as crenças, os hábitos mentais

e as instituições modelam os indivíduos; por-

que há sempre um conjunto de circunstâncias

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Hippolite Taine

11Capítulo 1

atividade | ObserveoquadrodeGustavaCourbet,pintorfrancês da escola realista, analise e comente por que ele é considerado um exemplo de pin-tura realista.

2. a crítica reaLista: síLviO rOmerO, jOsé veríssimO

Neste tópico estudaremos acerca de dois dos prin-cipais críticos da Literatura Brasileira do final do século XIX, começo do século XX: Sílvio Romero e José Veríssimo e por meio de suas obras teremos uma visão da época acerca da Literatura Brasileira.

2.1 síLviO rOmerO

Escritor, político, historiador e folclorista brasilei-ro, Sílvio Vasconcelos da Silveira Ramos Romero nasceu a 21 de Abril de 1851, em Lagarto, no Esta-do do Ceará (Brasil). Em 1863, partiu para o Rio de Janeiro, onde realizou os estudos preparatórios no Ateneu Fluminense. Em 1968, foi para Nor-deste,matriculando-senaFaculdadedeDireitodoRecife, onde foi colega de Tobias Barreto e de Ara-ripe Júnior. Nessa altura, para além de colaborar como ensaísta e poeta para jornais pernambucanos como A Crença, Americano, Correio de Pernambuco e Movimento, Sílvio Romero fundou um grupo de jovens intelectuais que procuravam renovar o pen-samento filosófico brasileiro. Licenciado em 1873, foipromotordacomarcadeEstância(emSergipe)e, um ano depois, a deputado pela Assembleia Provincial de Sergipe, renunciando logo ao cargo. Ainda, em 1873, defendeu a tese de doutoramento emDireito.

Em 1875, foi para o Rio de Janeiro e, em seguida, foi designado juiz municipal de Parati. Em 1979, estabeleceu-se no Rio de Janeiro, onde colaborou com vários jornais, como O Repórter, no qual cri-

que desencadeiam a acção. Fala nas grandes

pressions environnats, que la race faç onne

l’individu, que le pays faç onne la race. Ligado

a Renan. Colabora com Boutmy na fundação

da École Libre des Sciences Politiques. Tenta

transportar para o â mbito das ciências mo-

rais os métodos das ciências físicas, aceitando

o determinismo e o mecanicismo psicológico.

Porque existe uma espécie de predisposição

que dirige todas as ideias e todos os actos de

um povo.

Raça: Entende por raça, o conjunto das ca-

racterísticas hereditárias imprimidas pela

família às gerações seguintes. Neste sentido

distingue raças superiores e inferiores. Nas

primeiras, a raça ariana, o espírito inteiro, to-

mado pelo belo e pelo sublime que concebe

um modelo ideal capaz, por sua nobreza e sua

harmonia, de conquistar para si a ternura e o

entusiasmo do género humano. Já nas inferio-

res coloca os semitas, onde falta a metafísica,

porque o espírito é muito tenso e inteiro … o

homem reduz-se ao entusiasmo lírico, à pai-

xão irrefreável, à acção fanática e limitada.

Psicologia positiva: Prélot considera que Tai-

ne é marcado por uma psicologia positiva e

por uma sociologia não compreensiva, dado

contrariar a máxima de Dilthey, para quem a

natureza se explica, ao contrário da cultura

que apenas pode compreender-se. Para Tai-

ne, pelo contrário, a alma faz parte da pró-

pria da natureza.

TEXTOS COMPLEMENTARES

http://pt.wikipedia.org/wiki/Positivismo -

artigo da Wikipédia sobre o conceito de Po-

sitivismo, observe-se o tópico “Positivismo

no Brasil” em que se demonstra a origem

do lema “Ordem e Progresso” da bandeira

brasileira e sua ligação com o Positivismo

de Augusto Comte.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Realismo - in-

teressante verbete da Wikipédia sobre o

conceito de Realismo.

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Auguste Courbet – Moças Peneirando Trigo

12 Capítulo 1

ticou figuras políticas. No ano seguinte, obteve a cadeira de Filosofia no Colégio Pedro II com a tese Interpretação Filosófica dos Fatos Históricos e, em 1910, jubilou-se. Foi também docente na Faculda-deLivredeDireitoenaFaculdadedeCiênciasJu-rídicas e Sociais do Rio de Janeiro. Em 1898, foi eleito deputado federal por Sergipe. Evidenciou-se como relator do Projeto de Código Civil, defen-dendo, então, muitas das suas ideias filosóficas e, em1911,foiparaMinasGerais,exercendoocargode Juiz de Fora.

Sílvio Romero, membro fundador da Academia Brasileira de Letras, escreveu vários livros dos quais se destacam: Cantos do Fim do Século (1878), Intro-dução à História da Literatura Brasileira (1882), Con-tos Populares do Brasil (1885), Etnografia Brasileira (1888), Ensaios de Filosofia do Direito (1895), Ensaios de Sociologia e Literatura (1901), Provocações e Debates (1910), entre outros. O escritor foi também um pes-quisador bibliográfico sério e minucioso que con-tribuiu grandemente para a historiografia literária brasileira. Sílvio Romero, José Veríssimo e Araripe Júnior constituíram uma trindade crítica da épo-ca naturalista, marcada pelo evolucionismo e pela doutrina determinista de Taine. Para além disso, foi precursor da sociologia brasileira, ao adotar o método monográfico de Frédéric Le-Play (1806-1882), ao criticar o monocausalismo em ciências sociais e ao influenciar a sociologia de Francisco José de Oliveira Vianna (1883-1951). Sílvio Rome-ro faleceu a 18 de Julho de 1914, no Rio de Janeiro.

2.2 jOsé veríssimO

José Veríssimo (J. V. Dias de Matos), jornalista,professor, educador, crítico e historiador literário, nasceu em Óbidos, PA, em 8 de abril de 1857, e fa-leceu no Rio de Janeiro, RJ, em 2 de dezembro de 1916. Compareceu a todas as reuniões preparató-rias da instalação da Academia Brasileira de Letras. Escolheu por patrono João Francisco Lisboa, e é o fundador da Cadeira nº 18.

Em 1880, viajou pela Europa. Em Lisboa, toman-do parte de um Congresso Literário Internacional, defendeu brilhantemente os escritores brasilei-ros, que vinham sendo severamente censurados, vítimas de injúrias feitas pelos interessados na permanência do livro brasileiro na retaguarda da literatura no Brasil. Voltou à Europa em 1889,indo tomar parte, em Paris, no X Congresso de Antropologia e Arqueologia Pré-Histórica, quando

fez uma comunicação sobre o homem de Marajó e a antiga história da civilização amazônica. Sobre a rica Amazônia são também os ensaios sociológicos que escreveu nessa época, Cenas da vida amazônica (1886) e A Amazônia (1892).

DevoltaaoPará, foinomeadodiretorda Instru-ção Pública (1880-91). Em 1891, transferiu-se para o Rio de Janeiro, onde retornou ao magistério, tendo sido professor na Escola Normal (atual Ins-titutodaEducação)enoGinásioNacional(atualColégio Pedro II), dos quais foi também diretor. Interrompera os seus trabalhos de sociologia e de história, ainda no Pará, para fixar-se na crítica e na história literária, atividade a que ele se dedicou mais intensamente no Rio de Janeiro. Criada a pas-ta da educação pública, logo após a proclamação da República, o seu primeiro ministro, Benjamin Constant, procedeu a reforma do sistema geral de ensino público. José Veríssimo discutiu, no Jornal do Brasil no primeiro semestre de 1892, as reformas introduzidas, delas fazendo uma crítica magistral, que depois ele acresceu como Introdução da 2ª edi-ção (1906) de seu livro A educação nacional.

Referido sempre como o fundador da Revista Bra-sileira, José Veríssimo na verdade dirigiu a sua ter-ceira fase. A terceira Revista Brasileira começa em 1895 e vai até 1889, completando vinte volumes em cinco anos. Veríssimo teve o dom de agremiar toda a literatura nacional na Revista. Prestigiada pelos mais eminentes amigos de José Veríssimo: Machado de Assis, Joaquim Nabuco, Visconde de Taunay, Lúcio de Mendonça, entre outros.

Em 1912, tendo a Academia aceitado a candida-tura de Lauro Müller, ministro das Relações Ex-teriores, político e não homem de letras, e que foi eleito por 22 votos para a vaga do Barão do Rio Branco,derrotandoocondedeRamizGalvão,Ve-ríssimo sentiu desfazer-se a ilusão com que sonhara ao fundar-se uma instituição em que se recebessem exclusivamente expoentes da literatura e, desgosto-so, afastou-se da Academia. Nunca mais manteve qualquer relação com a casa que ajudara a fundar.

Como escritor, a sua obra é das mais notáveis, des-tacando-se os vários estudos sociológicos, históri-cos e econômicos sobre a Amazônia e as suas séries dehistóriaecríticaliterárias.NaIntroduçãoàsuaHistória da literatura brasileira tem-se uma primeira revelação de todas as vicissitudes por que havia de passar uma literatura que se nutriu por muito tem-

13Capítulo 1

po da tradição, do espírito e de fórmulas de outras literaturas, principalmente do que lhe vinha de Portugal e da França.

José Veríssimo constitui com Araripe Júnior e Síl-vio Romero a trindade crítica da era naturalista, influenciada pelo evolucionismo e pela doutrina determinista de Taine; mas seus pontos de vista e processos eram diferentes. Araripe Júnior, mais independente intelectualmente, com mais sensi-bilidade artística e mais estilo, mostrou até onde ia sua ligação com Taine, de cuja doutrina acei-tava mais o fator meio, diferentemente de Sílvio Romero, que enfatizou a raça e foi um metodiza-dor e um inovador, ao aplicar as suas doutrinas científicas a muitos dos fatos da nossa literatura, coordenando-os sobre uma base de doutrina social e demonstrando o que existia de mais ou menos organicamente ativo no desenvolvimento da nossa história literária. A crítica de José Veríssimo, por sua vez, é penetrada de um constante espírito de equilíbrio e de ordem, a que ele juntava, não raro, um pensamento filosófico e moral para enriquecê-la de uma autoridade maior, reforçando o crítico no educador.

Fazia do racionalismo lógico a sua força capital, achando que “criticar é compreender”, e não se enredar no cientificismo que tanto empolgou os outros críticos do seu tempo. Para ele, na crítica literária vê-se um pouco como na história: o livro, o “fato literário” em si, não é tudo para o crítico, e não basta realçar dele apenas o mais visível dos seus meios de expressão; é preciso alcançá-lo nas suas implicações menos aparentes de ordem filo-sófica, estética ou social, para bem situá-lo como razão de ser da literatura.

Acima de tudo ressalta da sua obra o cunho na-cionalista, que ele procurou rastrear desde o início da literatura brasileira, na obra de poetas e ficcio-nistas nos quais soube detectar o sentimento de brasilidade.Foi eleque, ao seu tempo, chegou àmais íntima comunicação com o espírito e a obra de Machado de Assis, notando o quanto ele trazia, pelo romance, pelo conto, pela própria poesia, de original e único para a literatura brasileira.

TEXTOS COMPLEMENTARES

http://www.ensayistas.org/filosofos/bra-

sil/romero/introd.htm - bom texto da auto-

ria de Ricardo Rodriguez em que se discute

as características do método crítico de Síl-

vio Romero.

http://pt.wikipedia.org/wiki/José_Veríssi-

mo - verbete da Wikipédia sobre José Ve-

ríssimo

Outro importante crítico do período foi Ara-

ripe Jr.

Tristão de Alencar Araripe Júnior (Fortaleza,

27 de junho de 1848 — Rio de Janeiro, 29 de

outubro de 1911) foi um advogado, crítico li-

terário e escritor brasileiro. Filho de Tristão de

Alencar Araripe, e de Argentina de Alencar

Lima. Sua família foi uma das mais importan-

tes do Ceará no século XIX, sendo seu pai fi-

lho de Tristão Gonçalves e neto de Bárbara de

Alencar, Araripe Júnior era primo legítimo de

José de Alencar.

Acompanhando o pai, que assumiu uma sé-

rie cargos públicos no Império, residiu por fim

em Recife, onde se matriculou no Colégio Bom

Conselho, dirigido pelo Dr. Barbosa Lima, e,

posteriormente, na Faculdade de Direito do

Recife, onde nasceu a amizade com Tobias

Barreto e Guimarães Júnior, bacharelando-se

em 1869.

Em 1871, assumiu uma secretaria de gover-

no em Santa Catarina e, entre 1872 e 1875,

foi Juiz em Maranguape, Ceará. No mesmo

Estado, foi deputado provincial em duas legis-

laturas.

Mudou-se para o Rio de Janeiro em 1880 e

exerceu, até 1886, a advocacia. Em 1893, foi

nomeado diretor geral da Instrução Pública e,

em 1903, Consultor Geral da República, car-

go que exerceu até a morte, tendo proferido

pareceres muito importantes. Sua obra lite-

rária, inicialmente, era mais ligada à ficção.

Porém, devido ao convívio com Rocha Lima,

Capistrano de Abreu e outros críticos cearen-

ses, passa a produzir no campo do ensaio e

então tornou-se célebre. Escreveu sobre José

de Alencar, Gregório de Matos, Tomás Antô-

nio Gonzaga, Raul Pompéia, Aluísio Azevedo,

e outros. Formou, com Sílvio Romero e José

Veríssimo, a trindade crítica da época positi-

vista e naturalista.

SAIBA MAIS!

14 Capítulo 1

atividade |Após ler e estudar sobre os principais críticos de literatura do período, comente qual a im-portância da crítica literária para a cultura epara a literatura em geral.

3. a OBra de machadO de assis

Nesta unidade estudaremos as-pectos da obra m a c h a d i a n a , destacando as características de suas obras e bus-cando entender aimportânciade

Machado de Assis no contexto da literatura do pe-ríodo e a posteriori, inclusive, a grande influência que exerceu.

3.1 machadO de assis

Joaquim Maria Machado de Assis, cronista, contis-ta, dramaturgo, jornalista, poeta, novelista, roman-cista, crítico e ensaísta, nasceu na cidade do Rio de Janeiro em 21 de junho de 1839. Filho de um ope-rário mestiço de negro e português, Francisco José deAssis, edeD.MariaLeopoldinaMachadodeAssis, aquele que viria a tornar-se o maior escritor do país e um mestre da língua, perde a mãe muito cedo e é criado pela madrasta, Maria Inês, também mulata, que se dedica ao menino e o matricula na escola pública, única que freqüentará o autodidata Machado de Assis.

Desaúde frágil, epilético,gago, sabe-sepoucodesuainfânciaeiníciodajuventude.Criadonomor-ro do Livramento, consta que ajudava a missa na igreja da Lampadosa. Com a morte do pai, em 1851,MariaInês,àépocamorandoemSãoCris-tóvão, emprega-se como doceira num colégio do bairro, e Machadinho, como era chamado, torna-se vendedor de doces. No colégio tem contato com professores e alunos e é até provável que assistisse àsaulasnasocasiõesemquenãoestavatrabalhan-do. Mesmo sem ter acesso a cursos regulares, empe-nhou-se em aprender. Consta que, em São Cristó-vão, conheceu uma senhora francesa, proprietária de uma padaria, cujo forneiro lhe deu as primeiras lições de Francês. Contava, também, com a prote-çãodamadrinhaD.MariaJosédeMendonçaBar-roso, viúva do Brigadeiro e Senador do Império Bento Barroso Pereira, proprietária da Quinta do Livramento, onde foram agregados seus pais. Aos 16 anos, publica em 12-01-1855 seu primeiro tra-balho literário, o poema “Ela”, na revista Marmota Fluminense, de Francisco de Paula Brito. A Livraria Paula Brito acolhia novos talentos da época, tendo publicado o citado poema e feito de Machado de Assis seu colaborador efetivo.

Com 17 anos, consegue emprego como aprendiz de tipógrafo na Imprensa Nacional, e começa a es-crever durante o tempo livre. Conhece o então diretor do órgão, Manuel Antônio de Almeida, autor de Memórias de um sargento de milícias, que se tornaseuprotetor.Em1858voltaàLivrariaPaulaBrito, como revisor e colaborador da Marmota, e aliintegra-seàsociedadelítero-humorísticaPetaló-

Sua obra crítica, dispersa pelos periódicos,

desde os tempos do Ceará, só em parte foi

publicada em livro, durante sua vida, tendo

sido reunida e organizada por Afrânio Cou-

tinho em Obra crítica de Araripe Júnior, em

cinco volumes, publicados entre 1958 e 1966.

Foi membro-fundador da Academia Brasilei-

ra de Letras e do Instituto do Ceará, tendo

sido, também, membro do Instituto Histórico

e Geográfico Brasileiro.

No último livro, Ibsen e o espírito da tragédia

(1911), sem abandonar a preocupação na-

cionalista, alçou-se a um plano de universa-

lidade, buscando a razão de ser da tragédia

humana, através da obra dos grandes trági-

cos, da Grécia ao século XIX. Como crítico,

era um conselheiro amável e cheio de com-

preensão, sobretudo pelos estreantes.

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Machado de Assis

15Capítulo 1

gica, fundada por Paula Brito. Lá constrói o seu círculo de amigos, do qual faziam parte Joaquim Manoel de Macedo, Manoel Antônio de Almeida, JosédeAlencareGonçalvesDias.

Começaapublicarobrasromânticase,em1859,era revisor e colaborava com o jornal Correio Mer-cantil. Em 1860, a convite de Quintino Bocaiúva, passa a fazer parte da redação do jornal Diário do Rio de Janeiro. Além desse, escrevia também para a revista O Espelho (como crítico teatral, inicial-mente), A Semana Ilustrada (onde, além do nome, usavaopseudônimodeDr.Semana)e Jornal das Famílias. Seu primeiro livro foi impresso em 1861, com o título Queda que as mulheres têm para os to-los, onde aparece como tradutor. No ano de 1862 era censor teatral, cargo que não rendia qualquer remuneração, mas o possibilitava a ter acesso livre aos teatros. Nessa época, passa a colaborar em O Futuro, órgão sob a direção do irmão de sua futu-ra esposa, Faustino Xavier de Novais. Publica seu primeiro livro de poesias em 1864, sob o título de Crisálidas. Em 1867, é nomeado ajudante do dire-tordepublicaçãodoDiárioOficial.

Agosto de 1869 marca a data da morte de seu ami-go Faustino Xavier de Novais, e, menos de três meses depois, em 12 de novembro de 1869, casa-se com Carolina Augusta Xavier de Novais. Nessa época, o escritor era um típico homem de letras brasileiro bem sucedido, confortavelmente ampa-rado por um cargo público e por um casamento fe-lizquedurou35anos.D.Carolina,mulherculta,apresenta Machado aos clássicos portugueses e a vários autores da língua inglesa. Sua união foi feliz, mas sem filhos. A morte de sua esposa, em 1904, éumasentidaperda,tendoomaridodedicadoàfalecida o soneto Carolina, que a celebrizou. Seu primeiro romance, Ressurreição, foi publicado em 1872. Com a nomeação para o cargo de primeiro oficial da Secretaria de Estado do Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, estabiliza-se na carreira burocrática que seria o seu principal meio de subsistência durante toda sua vida.

No O Globo de então (1874), jornal de Quintino Bocaiúva, começa a publicar em folhetins o ro-mance A mão e a luva. Escreveu crônicas, contos, poesias e romances para as revistas O Cruzeiro, A Estação e Revista Brasileira.

Sua primeira peça teatral é encenada no Imperial TeatroDomPedro II em junhode 1880, escrita

especialmente para a comemoração do tricentená-rio de Camões, em festividades programadas pelo RealGabinetePortuguêsdeLeitura.

Na Gazeta de Notícias, no período de 1881 a 1897, publica aquelas que foram consideradas suas me-lhores crônicas. Em 1881, com a posse como mi-nistro interino da Agricultura, Comércio Obras Públicas do poeta Pedro Luís Pereira de Sousa, Machado assume o cargo de oficial de gabinete. Publica, nesse ano, um livro extremamente origi-nal , pouco convencional para o estilo da época: Memórias Póstumas de Brás Cubas - que foi consi-derado, juntamente com O Mulato, de Aluísio de Azevedo, o marco do realismo na literatura brasi-leira. Extraordinário contista, publica Papéis Avul-sos em 1882, Histórias sem data (1884), Vária His-tórias (1896), Páginas Recolhidas (1889), e Relíquias da casa velha (1906).Torna-sediretordaDiretoriado Comércio no Ministério em que servia, no ano de1889.GrandeamigodoescritorparaenseJoséVeríssimo, que dirigia a Revista Brasileira, em sua redação promoviam reuniões os intelectuais que se identificaram com a idéia de Lúcio de Mendonça de criar uma Academia Brasileira de Letras. Ma-chado desde o princípio apoiou a idéia e compa-receuàsreuniõespreparatóriase,nodia28deja-neiro de 1897, quando se instalou a Academia, foi eleito presidente da instituição, cargo que ocupou até sua morte, ocorrida no Rio de Janeiro em 29 de setembro de 1908. Sua oração fúnebre foi pro-ferida pelo acadêmico Rui Barbosa. É o fundador da cadeira nº 23, e escolheu o nome de José de Alencar, seu grande amigo, para ser seu patrono.

Porsuaimportância,aAcademiaBrasileiradeLe-tras passou a ser chamada de Casa de Machado de Assis.DizemoscríticosqueMachadoera

“urbano, aristocrata, cosmopolita, reservado e cínico, ig-norou questões sociais como a independência do Brasil e a abolição da escravatura. Passou ao longe do naciona-lismo, tendo ambientado suas histórias sempre no Rio, como se não houvesse outro lugar. ... A galeria de tipos e personagens que criou revela o autor como um mestre da observação psicológica. ... Sua obra divide-se em duas fases,umaromânticaeoutraparnasiano-realista,quandodesenvolveu inconfundível estilo desiludido, sarcástico e amargo. O domínio da linguagem é sutil e o estilo é preciso, reticente. O humor pessimista e a complexidade do pensamento, além da desconfiança na razão (no seu sentido cartesiano e iluminista), fazem com que se afaste deseuscontemporâneos.”

16 Capítulo 1

3.2 machadO de assis - fase rOmântica

Em sua História da Literatura Brasileira, José Verís-simo dedica-se a um capítulo inteiro para tratar de Machado de Assis e lhe separa duas fases de sua obra:umaligadaàescolaromântica(ouaoscon-vencionalismos da época) e outra realista.

OsromancesromânticosdeMachadodeAssisse-guem praticamente a mesma trilha dos melhores romances urbanos de José de Alencar, porém já se delineavam neles a crítica e a análise psicológica que pontificaram na sua melhor fase, a Realista. No romance Iaiá Garcia, por exemplo, destaca-se a importânciadosocialnaformaçãodoindivíduoeesse procedimento foi um dos motivos condutores dos romances realistas de Machado de Assis.

• Primeirafase–romântica• Ressurreição(romance–1872)• Amãoealuva(romance–1874)• Helena(romance–1876)• IaiáGarcia(romance–1872)• Históriasdameia-noite(contos–1873)

No início de sua ficção, tratou de abrandar as cri-ses morais e sociais dos personagens, conforme exi-gia o gosto romântico, ainda predominante. Seuprimeiro livro de contos (Contos fluminenses) e seu primeiro romance (Ressurreição) sedimentaram a imagem de um escritor que utilizava com correção e propriedade a língua portuguesa e que preferia osrelatospsicológicosàstramasdeaçãoconstante.

Entre as várias singularidades de Machado de As-sis, encontra-se a surpreendente mutação ocorrida em sua narrativa. Após uma safra de romances e contos quase sempre medíocres, ele aceitou o con-vite de seu demônio interior, como bem observou Barreto Filho, e entregou-se a uma aventura lite-rária de genialidade insuperável. Entre 1878, ano da publicação de Iaiá Garcia, que encerrou a sua primeira fase, e l880, anoque veio à luz,na im-prensa, sob a forma de folhetim, o romance Me-mórias póstumas de Brás Cubas, algo se processou na subjetividade deste homem. Porque as mudanças em sua ficção foram tão profundas que parecem in-dicar algo mais que um amadurecimento intelectu-al. Em Machado houve uma verdadeira revolução.

Muitos historiadores literários tentam atenuar es-tas diferenças, vendo em suas obras-primas somen-te o desabrochar de características já latentes na

fase inicial. Entre Helena, por exemplo, e Quincas Borba haveria uma certa linha de continuidade e assim por diante. Entretanto, quem lê esses dois romances julga que foram produzidos por auto-res distintos, tamanho o abismo que os separa. Já aqueles que defendem a idéia de uma grande rup-tura na ficção machadiana têm dificuldades para explicá-la do ponto de vista biográfico.

Sabe-se pouco a respeito do que ocorreu com ele entre l878 a l880. A epilepsia que alguns apontam como causa dessa transformação não a explica, poisdehámuitojávinhasemanifestando.Duran-te este período, é verdade, o escritor esteve muito doente e a proximidade da morte deve ter coloca-do em xeque as suas certezas. Outros partem para a tese fantasiosa de que este mestre da dissimulação que conhecia tudo da hipocrisia humana, fingiu. Teria fingido durante toda a década de 1870, pro-duzindo obras convencionais para ganhar prestígio e estima do público. No entanto, ninguém está se-guro do que realmente aconteceu com este indiví-duo tímido e silencioso que mudou para sempre a nossa literatura.

3.3 iaiá Garcia - machadO de assis (1872)

Jorge e Estela amam-se, mas vários empecilhos contrariam esse amor, de que mesmo os dois ten-tamseresguardar.AmãedeJorge,ValériaGomes,viúva rica, não quer para seu filho uma esposa pobre e sem lustro social, a moça era filha de um ex-empregado de seu falecido pai. Estela, por sua vez, conhecendo os preconceitos da sociedade e da mãe do rapaz, sente-se inferiorizada e luta contra a idéia de casar-se com Jorge. O rapaz, impondo seus direitos de moço rico, força um beijo quando com Estela passeava, e isto a jovem jamais perdoa. Valéria, tentando afastar definitivamente a possi-bilidade de que seu filho e a moça possam se ca-sar, contando ainda com o auxílio do viúvo Luís Garcia, pretendente àmoça, convence Jorge a ircombater na guerra do Paraguai. Na ausência do filho,ValériaGomesdáumdoteaEstelaearranja-lheummarido,oviúvoLuísGarcia,degêniopa-cato, caseiro e arredio, que vive só para cuidar da filhaamada:IaiáGarcia.Porém,antesmesmodaviagem que fazia ao Paraguai, Jorge confidenciara aomesmoLuísGarcia,agoramaridodeEstela,asverdadeiras razões de sua ida para a guerra sem, contudo, revelar-lhe a identidade da mulher com que a mãe não queria o seu casamento.

17Capítulo 1

ValériaGomesmorre,Jorgevoltadaguerraereatasuaamizadecomoamigodamãe,LuísGarcia.Co-meça a freqüentar-lhe a casa, surgem várias situa-çõesembaraçosasparaeleeEstela.IaiáGarcia,queeramuito apegada àmadrasta - Estela - desgostapor instinto de Jorge. Procópio, amigo que Jorge conheceranoParaguai,apaixona-seporIaiáGarciae faz de Jorge seu confidente a aliado na tentativa de conquistar o amor da moça.

Luís Garcia remexendo em sua papelada acabapor encontrar uma carta em que Jorge lhe confes-sava seus amores proibidos, embora não revelasse a identidade damoça. LuísGarciamostra a car-taàEstela,eestaficaaremoeraslembrançasdapaixão do passado. Iaiá desconfiando da reação emotiva que Estela tem diante da carta, começa a supor que ambos - Jorge e Estela - foram ou ainda são amantes. Querendo resguardar o pai de uma grande decepção amorosa, Iaiá decide-se casar-se com Jorge e, para isto, tenta conquistá-lo, apesar do sentimento de repulsa que o rapaz lhe causava atéentão.IaiáGarciacontandocomseusdotesdeenvolvimento acaba por ficar noiva de Jorge. Po-rém, antes do casamento, ocorre a morte do pai de IaiáGarcia,ovelhoLuísGarcia.

Assim,oplanodeIaiáGarciaperdeoseusignifi-cado, não mais era necessário evitar o romance en-tre Jorge e Estela. Iaiá desmancha o noivado, mas revela-se que, de fato, ela sente estar apaixonada porJorge.ProcópioDias,opretendenterejeitado,fortalece as suspeitas da moça, insinuando relações amorosas entre Jorge e Estela. Estela descobrindo o que levou Iaiá a romper o noivado com Jorge, convence Iaiá Garcia de que suas suspeitas nãotêmfundamento,poisquetudoseresumiaàslem-branças do passado, consegue reaproximar os noi-vos e serve-lhes de madrinha no casamento. Após isso, muda-se para São Paulo, onde vai trabalhar na escola de uma amiga.

3.4 heLena (1876)

Divididoem28capítulos,aaçãodeHelenaavançade modo linear: começa com a morte do Conse-lheiro Vale a abertura de seu testamento e conclui com a morte da protagonista, o desespero de Es-tácio e o beijo de Camargo em Eugênia, sua filha. Entre um ponto e outro transcorrem os dez meses vividos por Helena no Andaraí, em companhia do irmão,datia,D.Úrsula,edosamigosqueosvisi-tam, entre os mais íntimos contando-se Camargo

e família, Mendonça, por um tempo noivo da he-roína, e o Padre Melchior, o conselheiro religioso e sentimental da maioria das personagens.

No espaço do Rio de Janeiro colonial, um homem importante e rico mantém caso amoroso com uma mulherquehaviamigradodoRioGrandedoSulese separara do marido, devido a dificuldades finan-ceiras. A mulher já possuía uma filha, que, mais tarde, foi perfilhada pelo amante rico. Esta filha é Helena. Mesmo sabendo de tudo, ela é recebida no seio da família do amante de sua mãe, já morto, e entra em posse de uma herança considerável. A convivência termina por gerar uma paixão recípro-ca entre Helena e seu suposto irmão Estácio. O dra-ma de incesto abala as estruturas da família de Es-tácio e tudo caminha para um final surpreendente.

Conselheiro vale era um homem rico, e tinha um caso amoroso com Ângela, uma mulher que havia migrado do RS, ela tinha uma filha, Helena. Con-selheiro Vale morre, e em seu testamento ele alega-va que Helena era sua filha e que ela devia tomar seu lugar na família, todos acreditam nisso, porém Helena sabe que não é verdadeiramente sua filha, mas na sua ânsia de ascender socialmente acabaaceitando isso.

Aprincípio,D.Úrsula reage comum certo pre-conceitoàchegadadeHelena,masnodecorrerdanarrativaelavaiganhandooamordeD.Úrsula,Estácio porém, era um bom filho, e faz a vontade dopaisemindagarnada.Dr.Camargoachaaquiloum absurdo, pois ele queria casar sua filha, Eugê-nia,comEstácioparaqueelessetornassemricosàscustas do dinheiro de Estácio, e mais um familiar só iria diminuir a parte da herança de Estácio. He-lena toma seu lugar na família como uma mulher de fibra, uma verdadeira dona de casa, cuida muito bem de sua nova família, dirige a casa melhor do queD.Úrsulaofazia,eimpressionanãosóafamí-lia como toda a sociedade em geral, porque além de ser uma mulher equilibrada como poucas que existiam, era linda, sensível e rica.

Ao decorrer da narrativa, Helena vai impressio-nando mais e mais Estácio, e nisso acaba se apaixo-nando por ela, e ela por ele. Eis aqui o problema central do conflito no livro, de um lado Estácio, se martirizando por se apaixonar por sua suposta irmã, o que era um pecado, e do outro Helena, também apaixonada por Estácio, esta sabia de toda verdade, mas não podia jogar tudo para o alto e fi-

18 Capítulo 1

car com ele, porém, pressionada por Camargo que ameaçava tornar público seus misteriosos passeios matutinos, se ela não empurrar Estácio na direção do enlace com Eugênia. Neste ponto então surge Mendonça, que se apaixona pela heroína e então pede Eugênia em casamento também para tentar esquecer Helena. O Padre Melchior é quem induz Helena a casar-se com Mendonça, cujo cerco àmoça era evidente a todos.

A família possuía uma chácara, e perto dessa chá-cara tinha uma casa simples, pobre, e Helena cos-tuma a visitar sempre essa chácara, um dia Estácio resolveu seguí-la, e lá conheceu Salvador, e foi tirar satisfações sobre as visitas de Helena, Salvador co-meçou a lhe contar uma grande história, e surpre-endeu Estácio ao lhe revelar que Helena era sua filha, não de Conselheiro vale, e toda a História da vida de Helena até ali. Nesse mesmo dia He-lenaapósumafortechuvaficadebilitada,àbeirada morte, Estácio, tomado por seu forte amor vai cuidar de Helena e lhe faz essa declaração. Helena, muito doente, morre. Estácio casa-se depois com Eugênia, porém, após a nova releitura do testa-mento e o casamento, o fato é que os personagens não serão mais os mesmos. Estácio desacreditando do amor e Eugênia casada mais por conveniência. O falecimento de Helena reconduz a ação ao es-tado inicial: não apenas porque o enredo começa com uma morte, mas também porque, com o desa-parecimentodela,tudoretornaàsituaçãoanterioràaberturadotestamentodoConselheiro.Estácioé de novo o filho único e pode casar com a prome-tidadeinfância,Eugênia.

TEXTO COMPLEMENTAR

http://pt.wikipedia.org/wiki/Machado_de_

Assis - Verbete da Wikipédia acerca de

Machado de Assis.

http://www.machadodeassis.org.br/ - pá-

gina sobre Machado de Assis idealizada

pela ABL – Academia Brasileira de Letras.

SCHWARZ, Roberto. Um Mestre na Perife-

ria do Capitalismo: Machado de Assis. São

Paulo: Duas Cidades, 1990. (3ª ed. São

Paulo: Duas Cidades / Ed. 34, 2001.)

SAIBA MAIS!

Helena e a Novela Brasileira

O romance Helena, de Machado de

Assis, pelo seu enredo romântico e

pelo mistério e as revelações que a

trama desenvolve caiu no gosto da

Novela Brasileira, recebendo nada

menos que três adaptações para a te-

levisão brasileira, a saber:

1952 – TV Paulista (extinta): Helena

foi a primeira telenovela baseada no

romance homônimo de Machado de

Assis. Escrita por Manoel Carlos, foi

exibida na TV Paulista. Seu elenco teve

Jane Batista, Paulo Goulart, Vera Nu-

nes e Hélio Souto.

1975 – TV Globo: Helena foi uma te-

lenovela brasileira produzida e exibi-

da no horário das 18 horas pela Rede

Globo em 1975. Foi escrita por Gilber-

to Braga. Foi produzida em preto-e-

branco e exibida entre 5 de Maio a 30

de Maio de 1975, e seu roteiro foi ba-

seado na obra homônima de Macha-

do de Assis, com Lúcia Alves (Helena),

Osmar Prado (Estácio), José Augusto

Branco (Dr. Mendonça), Rogério Fróes

(Dr. Camargo), Carlos Duval (Padre

Melchior), Ângela Valério (Eugênia).

1987 – TV Manchete (extinta): Helena

foi uma telenovela brasileira produzi-

da pela Rede Manchete e exibida de

4 de maio a 7 de novembro de 1987

às 19h30. Escrita por Mário Prata, Da-

gomir Marquezi e Reinaldo Moraes,

adaptação do romance homônimo de

Machado de Assis, dirigida por Denise

Sarraceni e Luiz Fernando Carvalho,

com supervisão de José Wilker.

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19Capítulo 1

atividade |Agora que você já tem bons elementos para compreensãodafaseromânticadaprosama-chadiana, pesquise acerca do romance A Mão e a Luva, de 1874, buscando entender o enre-do, as características e por que ele é considera-doumromancedafaseromântica.

3.5 estudO de um cOntO de machadO

de assis: a cartOmante

Neste unidade nos deteremos na leitura de um dos contos mais conhecidos de Machado de Assis, buscando tomar contato com as características de seu texto. E Comecemos pela leitura do conto, dis-ponível para leitura integral no site Orfeu Spam, digite o link abaixo no seu navegador de Internet e leia este conto de Machado de Assis:http://www.orfeuspam.com.br/Apostilas/LiteraturaBrasilei-ra/Realismo/Machado_de_Assis_A_cartoman-te_conto.htm

a Cartomante - análise Do Conto

uma análise psicológica das contradições humanas na criação de personagens imprevisíveis, jogando com insinuações em que se misturam a ingenui-dade e malícia, sinceridade e hipocrisia. Crítica humorada e irônica das situações humanas, das re-lações entre os personagens e seus padrões de com-portamento. Linguagem sóbria que, entretanto, não despreza os detalhes necessários a uma análise profunda da psicologia humana.

Envolvimento do leitor pela oralidade da lingua-gem. A historia é repleta de “conversas” que o narrador estabelece freqüentemente com o leitor, transformando-o em cúmplice e participante do enredo (metalinguagem).

Citação de um autor clássico (Shakespeare) inter-textualidade; reflexão sobre a mesquinhez huma-na e a precariedade da sorte humana. Os aspectos externos (tempo cronológico, espaço, paisagem) são apenas pontos de referência, sem merecerem maior destaque.

Estilo: A Cartomante é um conto onde podemos observar características marcantes do estilo de Ma-chado de Assis. O uso de metáforas constantes, o comportamento imprevisível dos personagens e seu valor filosófico, o uso de comparações superlativas, bem como a ambigüidade em seus personagens.

O autor usa intertextualizações literárias, e o recur-so da narrativa onisciente, para dinamizar o relato da história acentuando os momentos dramáticos do texto. Usa este recurso que eleva e prolonga o suspensa da história, mantendo o leitor atento du-rante todo o desenrolar do conto.

Sem estes ingredientes, sem dúvida o texto não teriaamesmadinâmicaeseuepílogonãoteriaamesma ênfase. Sem os pretextos machadianos facil-mente saberíamos o desfecho da história ao lermos suas primeiras linhas. O uso destes atributos faz com que a historia gire em torno de seu próprio eixo dramático sem que percebemos o uso desta técnica literária.

Foco narrativo: A historia é narrada em terceira pessoa. Existe a presença onisciente do autor, que usa desta onisciência na narração e descrição dos fatos. O uso constante de uma voz onisciente é im-portante para dinamizar o relato da historia acen-tuando os momentos dramáticos do texto e con-flitos internos dos personagens, fortalecendo seu

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O conto A Cartomante, de Machado de Assis, mos-tra a visão objetiva e pessimista da vida, do mundo e das pessoas (abolição do final feliz). A autor faz

20 Capítulo 1

epílogo. Sem essas características o texto tornar-se-ia monótono, pois a primeira leitura saberíamos de antemão seu desfecho. Também através deste recurso, o autor vai situando o leitor durante o cur-so da historia, ilustrando fatos e intertextualizando a narrativa.

Personagens: Embora a trama gire em torno de 4 personagens principais Vilela, Camilo, Rita e a car-tomante (incógnita), existem outros personagens que não participam diretamente na trama, mas suas participações são determinantes no enredo da história. A morte da mãe de Vilela, que é uma personagem secundária tem papel fundamental no envolvimento amoroso dos personagens Camilo e Rita. O autor analisa e enfatiza psicologicamente todos os personagens preconizando seus conflitos internos bem como seus temores.

Enredo:Estáo temado triângulo amoroso edoadultério, já presente nas Memórias (Brás Cubas, Virgília,LoboNeves).Osamigosde infânciaCa-miloeVilela,depoisdelongosanosdedistância,reencontram-se. Vilela casara-se com Rita, que mais tarde seria apresentada ao amigo. O resto é pai-xão, traição, adultério. A situação arriscada leva a jovem a consultar-se com uma cartomante, que lhe prevê toda a sorte de alegrias e bem-aventuranças.

O namorado, embora cético, na iminência de atender a um chamado urgente de seu amigo Vile-la, atormentado pala consciência, busca as palavras da mesma cartomante, que também lhe antecipa um futuro sorridente.

Dois tirosàqueima-roupaao ladodocadáverdeRita o esperavam. A vitória do ceticismo coroa o episódio. Conto que surpreende pela excelente es-trutura narrativa, dividida em três partes.

Na primeira, introdutória, fica-se sabendo que Rita, dotada de espírito ingênuo, havia consultado uma cartomante, achando que seu amante, Cami-lo, deixara de amá-la, já que não visitava mais sua casa.Desfeitoomal-entendido,faz-seum flashback que vai explicar como se montou tal relação. Ca-milo era amigo, desde longínqua data, de Vilela. Tempos depois, este se casa com Rita. A amizade estreita a intimidade entre Camilo e Rita, ainda mais depois da morte da mãe dele. Quando sente sua atração pela esposa do amigo, tenta evitar, mas, enfim, cai seduzido. Até que recebe uma carta anô-nima, que deixava clara a relativa notoriedade da

sua união com a esposa do seu amigo. Temeroso, resolve, pois, evitar contato com a casa de Vilela, o que deixa Rita preocupada.

Terminada essa recapitulação, vai-se para a parte crucial do conto. Camilo recebe um bilhete de Vilela apenas com a seguinte mensagem: “Vem já, já”. Seu raciocínio lógico já faz desconfiar que o amigo havia descoberto tudo. Parte de imediato, mas seu tílburi (espécie de carruagem de aluguel que equivaleria, hoje, a um táxi) fica preso no trá-fego por causa de um acidente. Nota uma estranha coincidência: está parado justamente ao lado da casadacartomante.Depoisdeumintensoconfli-to interior, decide consultá-la. Seu veredicto é dos mais animadores, prometendo felicidade no rela-cionamento e um futuro maravilhoso. Aliviado, assim como o tráfego, parte para a casa de Vilela. Assim que foi recebido, pôde ver, pela porta que lhe é aberta, além do rosto desfigurado de raiva de Vilela, o corpo de Rita sobre o sofá. Seria, por-tanto, a próxima vítima do marido traído. Note neste conto sua estrutura em anticlímax, pois tudo nele (já a partir da citação inicial da famosa frase de Hamlet: “há mais cousas no céu e na terra do que sonha a nossa filosofia”) nos prepara para um final em que o misticismo, o mistério imperaria. No entanto, seu final é o mais realista e lógico, já engendrado no próprio bojo do conto. Reforça esse aspecto o ritmo da narrativa, que é lento em sua maioria, contrastando com seu desfecho, por demais abrupto. E não se esqueça da presença de um quê de ironia nesse contraste entre corpo da narrativa e o seu final.

SAIBA MAIS!

A CARTOMANTE – NO CINEMA

Em 2004 houve uma produção cinemato-

gráfica baseada no conto de Machdo com

direção de Wagner de Assis, Pablo Uran-

ga e no elenco Deborah Secco, Luigi Barri-

celli, Christiane Alves, Sílvia Pfeiffer.

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21Capítulo 1

atividade |Já que você fez a leitura e leu estudos sobre o conto A Cartomante de Machado de Assis, convido-o a pesquisar na Internet sobre os contos O Espelho (esboço de uma nova teoria daalmahumana)eMissadoGalo,doisexce-lentes exemplos dos contos machadianos. Boa pesquisa e boa leitura!

Feito isso, pesquise sobre as duas imagens ao lado, identificando a que adaptações para o cinema cada uma se refere, quais os atores principais e de quem foi a direção para cada um dos dois contos

TEXTO COMPLEMENTAR

http://www.universohq.com/quadri-

nhos/2008/n29092008_05.cfm - comen-

tário e informações sobre a edição em

Quadrinhos (Hq) de A Cartomante, com

desenhos de Flávio Pessoa e Maurício O.

Dias.

http://www.machadodeassis.ufsc.br/ - site

da UFSC que dispõe toda a obra de Macha-

do de Assis para download.

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resumO • ORealismoeoNaturalismosurgemcomoreaçãoaoRomantismo.RealismoeNatu-ralismosãoescolasartísticaseliteráriascominfluênciadoDeterminismodeTaine,doPositivismodeComteedoDarwinismodeCharlesDarwin.

• AcríticaliteráriadeSílvioRomero,JoséVeríssimoeAraripeJúniorestavabaseadanosconceitosdePositivismo,Determinismo,DarwinismoedoMétodoMonográficodeLê-Play.SílvioRomero,JoséVeríssimoeAraripeJúniorescreveramimportantesobrasdehistóriada literaturae teoriada literatura,desenvolvendoaatividadedecríticaedeanáliseliterárianoBrasil.

• MachadodeAssisfoiomaisimportanteescritordoRealismobrasileiro,porém,emsuasprimeirasobrasaindaapresentavacaracterísticas românticas,entreasquais:Helena(1876)eIaiáGarcia(1872).EmHelena,temosaquestãodaherançaedarevelaçãoacercadaorigemdapersonagemprincipal,oqueresolveoimpasseacercadeseufu-turoamoroso.EmIaiáGarcia,aquestãodocasamentoseapresentacomplicadapelaquestãosocial–asdiferençasdeclasse–envolvendoatramanumasériedesuspeitasdetraiçãoedecasamentosarranjados.

• OscontosdeMachadodeAssisdestacam-seentreosmelhorescontosescritosnaLite-raturaBrasileira.NosseuscontosMachadosoubediscutirquestõesculturais,sociaisedoscostumesdasociedadedeseutempo,maspelomodouniversalcomquetratoutaistemas,sãohojeaindamuitoatuais.

22 Capítulo 1

GLOssáriO Darwinismo - éotermousadoparadesignarváriospro-cessos relacionados com as ideias de Charles Darwin,nomeadamenteideiasrelacionadascomaevoluçãoeaseleçãonatural.

Odarwinismoéutilizadoporbiólogos,filósofos,matemá-ticosecientistasparadescreverprocessosevolucionáriossemelhantesàevoluçãodavida,comoodesenvolvimentodesoftwarecomalgoritmosgenéticos.

Neste contextomais abstrato, o darwinismo é indepen-dentedosdetalhesdaevoluçãobiológica.Umprocessodarwinistarequerascondiçõesseguintes:

• Reprodução:osagentesdevemsercapazesdepro-duzircópiasdesipróprioseessascópiasdevemterigualmenteacapacidadedesereproduzirem;

• Hereditariedade:Ascópiasdevemherdarascaracte-rísticasdosoriginais;

• Variação:Ocasionalmente,ascópiastêmqueserim-perfeitas(diversidadenointeriordapopulação);

• SeleçãoNatural:Osindivíduossãoselecionadospeloambiente.A seleçãonatural destrói, e não cria.Oproblemadaexistênciadeumobjetivonãosurgedaeliminaçãodosinaptos,esimdaorigemdosaptos.

métoDo monográfico De fréDeric Le-PLay (1806-1882) - LePlaytemoméritodetersidoumdosprimei-rosaencararosocialdentrodeumaperspectivacientífi-ca.Fezescolaefoiumdosconstrutoresdametodologiasociológica.

Tratando das ciências sociais, não formulou conclusõesapressadas, pois reconhecidas que sódepois daobser-vação dos fatos se podem atingir resultados aceitáveis.Paraatingi-los,imaginouumatécnica–amonografia,daqualépioneiro.Estabelecendooelementomaissimplesdasociedade,osociólogodeveevitaroestabelecimentode conclusões logo após apressadas suas observações.Nãosedevelimitar-seaobservarseumeio.Devepreferirobservargrupossociaisquenãolhesãofamiliares,poisosquelheestãopróximaspodemservistosàluzdopris-madesuascrençasoupreferências.Deve-seafastardeseuhabitat,conhecerpovosdiferentes,enfim,viajar.

Acreditando que as viagens proporcionam observaçãodiretadecostumeseorganizações sociaisdiferentes, Le

Oconto“ACartomante”,p.ex.,apresenta-nosdiantedeumatramadetraiçãoamorosaqueacabasedecidindopeloslimitesdacrençaemmisticismo(representadapelaCar-tomante)contraarazão,tendocomoequilíbrionessarelaçãoaintuição.

Play percorreu a Europa, não como turista, mas comoestudioso de questões sociais: observando, anotando eanalisando.

SegundoLePlay,nãoseriaoindivíduoisoladooelemen-tofundamentalparaacompreensãodasociedade,massimaunidade familiar.Estudoudiversas famíliasde tra-balhadores sob a industrialização e pôde observar queelasestavammaisinstáveisdoqueanteriormente.LePlayacreditava que se os respectivos papéis tradicionais dohomemedamulherdentrodafamíliafossemresgatados,asfamíliaseaprópriasociedadepoderiamadquirirmaisequilíbrio.

OgrandeméritodeLePlayfoi ter introduzidonasciên-ciassociaisaobservaçãodireta,istoé,aobservaçãome-tódica,controláveleobjetiva.Escolheu,comopontodepartidadesuasobservações,comoformadevidasocialmaiselementaresimples,bemcomomaiscomumentreospovos,afamília.

REFERêNCIAS

COUTINHO,Afrânio.A literatura no Brasil:Erarealista,v.3.4.ed.SãoPaulo:Global,1997.

MOISÉS,Massaud.História da Literatura brasi-leira,v.3:Realismo.5.ed.SãoPaulo:Cultrix,2000.

SCHWARZ, Roberto. Um Mestre na Periferia do Capitalismo:MachadodeAssis.SãoPaulo:DuasCidades,1990.(3ªed.SãoPaulo:DuasCidades/Ed.34,2001).Comentário:AobradeAfrânioCoutinhoofere-ceumpanoramahistoriográficobemdelineadosobreoperíodorealista,ovolumedaHistóriada Literatura Brasileira deMassaudMoisés ébemcompletoemtermosdeapresentarasca-racterísticasdasobrasedeavaliá-lasem ter-mosdeimportânciacrítica.OlivrodeRobertoSchwarzéconsideradoumaobrafundamentalparaacompreensãodaobramachadiana.

23Capítulo 2Capítulo 2

OBjetivOs específicOs

• Garantiroconhecimentodascaracterísticasdaescolarealista,bemcomoacompreensão das qualidades literárias da obra de Machado de Assis.

• CompreenderaimportânciadoRealismonocontextodaLiteraturaBrasilei-ra e tenha elementos para avaliação das obras de Machado de Assis e Aluísio Azevedo.

• Desenvolverapráticadaanáliseedaleituracríticadeobrasliterárias,comdestaque para as características das obras realistas e naturalistas.

intrOduçãO

Neste segundo capítulo, estudaremos as principais obras da fase realista de Ma-chado de Assis e as obras de Aluísio Azevedo. Conheceremos as principais ca-racterísticasdessasobrasbemcomoosaspectosquedeterminamsuafiliaçãoàsescolas realista e naturalista.

1. memórias póstumas de Brás cuBas - machadO de assis

Com Memórias Póstumas de Brás Cubas, publicado em 1881, Machado de Assis inaugura o realis-mo nas letras brasileiras. Com essa obra, ele se re-vela um arguto observa-dor e analista psicológico das personagens.

O ritmo da obra é lento, com várias digressões e narrado de maneira irreverente e irônica por um “defunto-autor” (e não um “autor- defunto”, como podem pensar). Brás Cubas, por estar morto, se exime de qualquer compromisso com a sociedade, estando livre para criticá-la e revelar as hipocrisias e vaidades das pessoas com quem conviveu.

O reaLismO e a OBra de machadO de assis

(parte 2)Prof. Dr. Jairo Nogueira Luna

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24 Capítulo 2

Essa condição de autor-defunto permite ao nar-rador suspender a narrativa ou o tempo, dialogar com o leitor no momento e sugere estar escreven-do algum capítulo e até mesmo propor ao leitor a supressão de algum capítulo. O tempo para o nar-rador é suspenso e ele vai visitando seu passado, conhecedor que é dos segredos após a morte, sem revelar ao leitor tais mistérios, vai se mostrando um narrador irônico acerca das paixões humanas.

Brás Cubas vai contando a sua vida e contando os vários episódios vividos. Conta sobre a prostituta de luxo espanhola Marcela, que o amou “durante quinze meses e onze contos de réis”. Para livrar-se dela, os pais de Brás Cubas decidem mandá-lo para a Europa. Volta doutor, em tempo de ver a mãe antes de morrer. Mesmo na Europa, embora tives-se concluído os estudos e se diplomado, de fato, a boêmia e os amores fugazes direcionam sua vida.

DepoisdeumnamorobreveeinconsequentecomEugênia, uma moça simples e pobre, defeituosa de uma perna, Brás Cubas, por interferência de seu pai, começa um namoro com Virgília, cujo pai po-deria favorecer uma almejada carreira política.

Numa certa ocasião, no passeio público, Brás re-encontra Quincas Borba, um amigo de escola. Quincas é um mendigo e, num abraço, rouba-lhe o relógio. Pouco depois, Quincas Borba aparece rico e filósofo, herdeiro de uma grande fortuna e propagador do Humanitismo.

A filosofia do Humanitismo consumirá grande parte da vida da personagem Quincas Borba, fun-dada numa espécie de Humanismo com elementos deterministas, contraditoriamente ligados a ele-mentos de caráter orientalista. Tal filosofia é uma paródia das crenças filosóficas da época, baseando-se em máximas, dentre as quais a mais importante era:“AoVencedor,àsbatatas”,moraldeumapará-bola que tentava justificar a competição e a guerra na sociedade burguesa.

Noutro reencontro, Brás Cubas vê Marcela, velha e arruinada num subúrbio do Rio de Janeiro. Vir-gília lhe é roubada por Lobo Neves, jovem mais decidido e confiante. O pai de Brás Cubas morre, deixando, porém, claro o desgosto que tinha com o destino que as coisas tinham tomado para seu filho: nem casamento nem carreira política. Anos depois, Brás Cubas - um solteirão - e Virgília - espo-sa de Lobo Neves, se tornam amantes.

Lobo Neves é nomeado para presidente de uma província do norte do Brasil, Brás teme pela sepa-ração com Virgília. O próprio Lobo Neves, con-fiando no amigo, chega a convidar Brás Cubas para ser seu secretário na província. Porém, quan-dodapublicaçãodoeditaldenomeaçãonoDiárioOficial, Lobo Neves declina do cargo, pois fora pu-blicado no dia 13 e ele tinha uma superstição com esse número.

Virgília fica grávida de Brás Cubas; o desejo de ter um filho enche-o de esperanças quanto ao desfe-cho de sua situação amorosa, mas a criança morre antes de nascer, e os amantes se separam. Lobo Ne-ves é novamente nomeado para presidente de ou-tra província e desta feita os amantes se separam. Sabina, a irmã de Brás, arranja-lhe uma noiva, Eu-lália, que, no entanto, morre vítima de uma epide-mia. Sem conseguir ser político, Cubas, em bus-ca da celebridade, tenta lançar o emplastro Brás Cubas, o qual traria a glória buscada pela persona-gem, uma espécie de remédio para todos os males. Brás Cubas, porém, vem a falecer de pneumonia antes de realizar o seu intento.

“Este último capítulo é todo de negativas. Não alcancei a celebridade do emplasto, não fui ministro, não fui califa, não conheci o casamento. Verdade é que, ao lado dessas faltas, coube-me a boa fortuna de não comprar o pão com osuordomeurosto.Mais;nãopadeciamortedeDonaPlácida, nem a semidemência do Quincas Borba. Somadas umas coisas e outras, qualquer pessoa imaginará que não houve míngua nem sobra, e conseguintemente que sai qui-te com a vida. E imaginará mal; porque ao chegar a este outro lado do mistério, achei-me com um pequeno saldo, que é a derradeira negativa deste capítulo de negativas: Não tive filhos, não transmiti a nenhuma criatura o legado

da nossa miséria.”

O romance é constituído de 160 capítulos, em geral curtos, e alguns de grande inventividade formal, como o que sugere a relação sexual entre os amantes, constituído basicamente de sinais de pontuação (cap. LV) ou o que nos mostra o epi-

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25Capítulo 2

táfio de Eugênia (cap. CXXV) e o que explica o seu insucesso na carreira política (cap. CXXXIX). Outro elemento importante da obra é a grande quantidade de citações e referências intertextuais, principalmente da literatura inglesa e francesa.

1.1 aLGuma anáLise da OBra: memórias póstumas de Brás cuBas anáLise dO LivrO

Narrador-personagem intruso – característica do narradoronisciente.Deseja chamaratençãoparasi, por intermédio de artifícios como abuso deli-berado, desrespeito, gracinha e profanação, des-caramento (compara-se a Moisés). A composição do conjunto é de uma estrutura social em que o individualismo é característica usada para se com-preender o universal.

O narrador procura colocar-se de forma superior, é digressivo e ousado. Usa de sátira, apresenta inú-meras antíteses: “princípio e fim, nascimento e morte, vulgar e diferente, campa e berço etc”; usa também uma linguagem formal, culta, adicionada a um comportamento desprovido de valores éticos – um paradoxo, disfarçando sua desfaçatez. Man-tém a supremacia por meio de mudanças bruscas. Em todo o tempo mostra-se volúvel, mediante a vi-veza de movimentos e da frequência de contrastes, liberdade e desmando subjetivo.

Quando se diz um defunto-autor em vez de autor-defunto, tira sua credibilidade e demonstra a in-tenção de confundir o leitor, de manipular as apa-rências. Procura desnudar a sociedade.

Sua relação com o autor existe de fato, um procura rebaixar o outro, e a vitória é sempre do narrador. Obriga o leitor a fazer juízo moral, a julgar a socie-dade. Por ser um narrador morto, não possui pro-blemas em contar, não precisa se importar com as críticas. Apresenta desnível entre o esqueleto sin-tático muito armado e as irregularidades do real. Procura classificar, esquematizar e abstrair.

Demonstra um Brasil independente, entretanto,num contexto igual, escravidão representada de outra forma; mão de obra culturalmente segrega-da.Apresentaadissonânciaentreoidealeaação.A volubilidade contém o desrespeito que o mundo prático exerce. A norma representa a burguesia e a infração, o sistema escravocrata – uma socieda-de incoerente, que vive das aparências, não condiz com o que prega.

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SAIBA MAIS!

Adaptações para o cinema de Memórias Pós-

tumas de Brás Cubas:

1) Memórias

Póstumas

Título original:

(Memórias Pós-

tumas)Lançamento :

2001 (Brasil)Direção: André Klotzel

Atores: Reginaldo Fa-

ria, Petrônio Gontijo, Marcos Caruso, Stepan

Nercessian.Duração: 101 min. Gênero: Drama

Petrônio Gontijo (Brás Cubas - jovem); Mar-

cos Caruso (Quincas Borba); Stepan Nerces-

sian (Bento Cubas); Viétia Rocha (Virgília);

Débora Duboc (D. Eusébia); Otávio Muller

(Lôbo Neves); Walmor Chagas (Dr. Vilaça);

Sonia Braga (Marcela)

2) Brás Cubas

Título Original:

Brás CubasL a n ç a m e n t o :

1985Direção/Roteiro:

Júlio Bressane

Elenco: Luiz Fernando

Guimarães, Re-

gina Casé, Wil-

son GreyDuração: 92 minutos , Gênero: Drama, Na-

cional

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26 Capítulo 2

atividade |Veja e leia a página de HQ colocada a seguir, ela se refere a um episódio muito importante de Brás Cubas. Qual é esse episódio e por que ele é importante para o desenvolvimento da trama:

TEXTO COMPLEMENTAR

“O Humanitismo e a Parábola de Ao Ven-

cedor as Batatas” – no site Usina de Le-

tras (www.usinadeletras.com.br), artigo de

Jayro Luna, também inserido como capítulo

do livro Teoria do Neo-estruturalismo Se-

miótico (Vila Rica, 2006).

http://fredb.sites.uol.com.br/mpbc.html

- estudo de Frederico Barbosa sobre o ro-

mance de Machado de Assis.

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27Capítulo 2

2. dOm casmurrO

machadO de assis

DomCasmurrofoipublicadoem1900eéumdosromances mais conhecidos de Machado. Narra, em primeira pessoa, a história de Bentinho que, por circunstâncias várias, vai se fechando em simesmoepassa a ser conhecido comoDomCas-murro. Órfão de pai, criado com desvelo pela mãe, Dona Glória, protegido do mundo pelo círculodoméstico e familiar (tia Justina, tio Cosme, José Dias),Bentinhoédestinadoàvidaeclesiástica,emcumprimento a uma antiga promessa da mãe.

No capítulo CXIII, o narrador começa a direcionar suas suspeitas para Capitu, que não quis acompa-nhar o marido ao teatro em razão de uma indispo-sição. Bentinho vai só, mas volta para casa no final do primeiro ato e encontra Escobar no corredor de sua casa. O episódio eé tratado com fria ironia, le-vandooleitoràsmaisvariadasinterpretaçõessuge-ridas pela coincidência entre o mal-estar de Capitu e a visita não anunciada do amigo.

“Dúvida sobre dúvida” (cap.CXV) é o saldo davisita de Escobar. Na conversa que se segue, o as-sunto são as dúvidas e recomendaD.Casmurroque era ele um poço delas, coaxavam dentro dele como verdadeiras rãs.

Anecessidadedodelírio,associadaàperturbaçãodo sono, configura a fase que os psiquiatras cha-mam de epofenia.

A vida do seminário não o atrai, já de namoro com Capitu, filha dos vizinhos. Apesar de comprometi-dapelapromessa,tambémD.Glóriasofrecomaideia de separar-se do filho único, interno no se-minário.PorexpedientedeJoséDias,agregadodafamília, Bentinho abandona o seminário e, em seu lugar, ordena-se um escravo.

Correm os anos e, com eles, o amor de Bentinho e Capitu. Entre o namoro e o casamento, Bentinho seformaemDireitoeestreitasuaamizadecomumex-colega de seminário, Escobar, que acaba se ca-sando com Sancha, amiga de Capitu.

JoséDiaschamaEzequielde“filhodohomem”eisso irrita Capitu. Essa tenta corrigir o modo de an-dardofilhoqueimitaJoséDiaseomododeolharque imita E s c o b a r . B e n t i n h o acredita que as imitações de Ezequiel é uma prova de paternida-de e não de-corrente da convivência.

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A importância da imaginação na sua personali-dade influenciou-o por toda vida. Na puberdade, chega quase à obsessão sexual.Quando o ciúmecomeça a abrir em sua alma as primeiras feridas, sua reação é quase histérica.

O Bentinho, evocado por Dom Casmurro, temdois sinais: sexualidade tardia e predomínio da fantasia sobre a realidade. A presença dessa neuro-se foi o terreno onde medraram as flores doentias do ciúme.

Bentinho, fisgado de “puro ciúme” sequer procu-rava esclarecer as dúvidas quanto às atitudes deCapitu. A imaginação continuava a correr e, com ela, corre o ciúme. No capítulo LXXII, retoma-se a tragédia de Shakespeare, Otelo, para a proposição de uma reforma dramática, entretanto, na recons-trução do seu drama memorialista, preferia o cami-nho tradicional.

DomCasmurronãoousadeixarascoisas“empra-tos limpos”, quase a ansiedade, chega por vezes ao paroxismo de uma crise de nervos, com impulsos agressivos contra Capitu.

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28 Capítulo 2

Os dois casais, Bentinho e Capitu, Escobar e Sancha, planejam uma viagem para Europa, porém tal via-gem não ocorre, pois, Escobar morre tragicamente.

Nesse momento da obra, o ciúme se instaura para sempre no coração de Bentinho. O fato determi-nante surgiu nos momentos que precederam o en-terro, quando a viúva é amparada por Capitu, que parecia vencer a si mesma.

O olhar fixo de Capitu para o defunto, leva Benti-nho a uma interpretação exorbitante. Suas dúvidas tornam-se agora firmes e certas, já alimentando a sede de vingança.

Com a morte de Escobar, Bentinho anda aborre-cido, mergulha de vez na melancolia. E começa a fazer projetos de suicídio. A paranoia do ciúme se incorpora de tal forma que ele passa a tratar sua mulher com aspereza e toma o filho para transfor-má-lo em documento de traição.

Ezequiel é afastado para um colégio da Lapa, no entanto, esse afastamento não diminui de Benti-nho a ideia do suicídio. Certo dia, quando espera-vaocafé,D.Casmurropensouemmatar-se;chegaa derramar o veneno na xícara, tremendo , com “os olhosvagosàmemóriaemDesdêmonainocente”.A presença de Ezequiel corta-lhe o impulso suicida e surge com violência o desejo de liquidar o filho. Dom Casmurro, por um momento acreditou-sevítima de uma grande ilusão, a volta de Ezequiel lança-o novamente ao mundo de seus fantasmas.

Santiago isola Capitu e o filho na Suíça. Capitu morre. O primeiro e único amor estava morto e enterrado, mas o ciúme não: ressurgia na figura do filho que de volta de uma das viagens o visitara inesperadamente. Bentinho constata as semelhan-ças entre o filho e o antigo colega de seminário. Ezequiel volta a viajar e morre no estrangeiro. Ben-tinho, cada vez mais fechado em suas dúvidas, pas-saaserchamadodeD.Casmurropelosamigosevizinhos e põe-se a escrever a história de sua vida: o romance em questão.

2.1 estudO e anáLise

Conheça, a seguir, uma amostra da polêmica his-tória da recepção crítica de “DomCasmurro” esobretudo em relação ao ponto mais discutido do livro, a questão do adultério.

José Veríssimo -”(“DomCasmurro” tratade)umhomem inteligente, sem dúvida, mas simples, que desde rapazinho se deixa iludir pela moça que ainda menina amara, que o enfeitiçara com a sua faceirice calculada, com a sua profunda ciência congênita de dissimulação, a quem ele se dera com todo ardor compatível com o seu temperamento pacato.” (“História da Literatura Brasileira”).

Lucia-Miguel Pereira - “Capitu, se traiu o marido, foi culpada ou obedeceu a impulsos e heredita-riedade ingovernáveis? É a pergunta que resume o livro. (...) Há a ideia central de saber se Capi-tu foi uma hipócrita ou uma vítima de impul-sos instintivos. Em outras palavras, se pode ser responsabilizada.”(“M. de Assis”)

Antonio Candido -”Dentro do uni-verso machadiano, não importa muito que a convicção de Bento seja falsa ou verdadeira, porque a consequência é exatamente a mes-ma nos dois casos: imaginária ou real, ela destrói sua casa e a sua vida.” (“Esquema de Machado de Assis”, em ‘Vários Escritos”).

Silviano Santiago -”Os críticos estavam interessa-dos em buscar a verdade sobre Capitu, ou a impos-sibilidade de se ter a verdade sobre Capitu, quando a única verdade a ser buscada é a deDomCas-murro.” (“Retórica da Verossimilhança”, em “Uma Literatura nos Trópicos”)

Antônio Candido -”Respeite-nos um dos dogmas da nossa literatura, que é o da maculada concei-ção do filho de Capitu com Escobar. Cultuemos a sua infidelidade e não afastemos de nós a negra inveja que sentimos de Escobar” (Na Folha, em 12/10/1994).

Dalton Trevisan -”Até você, cara - o enigma de Capitu? Essa, não: Capitu inocente? Começa que enigma não há: o livro, de 1900, foi publicado em vida do autor - e até sua morte, oito anos depois, um único leitor ou critico negou o adultério?” (Na Folha, em 23/5/92).

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Antônio Candido

29Capítulo 2

2.2 as duas fases dO enredO

Deacordocomosfatosnarrados,oromanceapresentaduasfasesdistintas,quecorrespondemaosmo-mentos básicos na vida das personagens.

• FASE I - Período da adolescência (1857) - Capitu - 14 anos e Bentinho - 15 anos representa a fase mais poética, aqui Capitu se mostra uma pessoa dominadora, tomando toda iniciativa do jogo amoroso (“Como se vê, Capitu, aos catorze anos, tinha já ideias atrevidas”).

• FASE II - Corresponde ao período que começa com o casamento entre Bentinho e Capitu (1865). É uma fase mais realista e amargurada, cheia de conflitos gerados pela incompatibilidade de gêneros. Bento desempe-nhaopapeldehomempatriarcal,assumeocomandodorelacionamentoafetivo,levando-oàdestruição.

atividade |Pesquise na Internet ou em Livros acerca da questão se Capitu poderia ou não ter traído Bentinho. Observe nessa questão o ponto de vista do narrador.

TEXTO COMPLEMENTAR

http://pt.wikipedia.org/wiki/Dom_Casmur-

ro - verbete da Wikipédia sobre Dom Cas-

murro.

http://www.vestibular.brasilescola.com/re-

sumos-de-livros/dom-casmurro.htm - ver-

bete de Rebeca Cabral para o site Vestibular

Brasil Escola.

SAIBA MAIS!

DOMDom é um filme brasileiro de 2003, do gê-

nero drama, com roteiro e direção de Mo-

acyr Góes e é uma reimaginação da obra

Dom Casmurro, de Machado de Assis. Foi

o filme marca de estreia do diretor Moacyr

Góes no cinema.

Marcos Palmeira .... Bento; Maria Fer-

nanda Cândido ... Ana; Bruno Garcia ....

Miguel; Luciana Braga .... Daniela; Malu

Galli .... Heloísa; Leon Goes .... diretor

de teatro; Tonie Vermut .... Bento jovem;

Isabela Coimbra .... Ana jovem; Cláudia Ventura ... Frida; Walter Rosa .... ator; Nilvan Santos

.... enfermeiro; Gustavo Ottoni .... enfermeiro rodoviário; Ivan Gradin .... guarda rodoviário;

Ana Abott ... atriz

Capitu Capitu é uma minissérie da Globo base-

ada numa adaptação de Dom Casmurro.

Capitu é interpretada por Letícia Persiles

na primeira fase e por Maria Fernanda

Cândido em sua fase adulta. O diretor

da minissérie Capitu é Luiz Fernando

Carvalho, e no elenco ainda se destacam

os atores Eliane Giardini e Michel Mela-

med. Na história do escritor Machado

de Assis da obra Dom Casmurro, Eliane

vive D. Glória, mãe de Bentinho, vivido

por Melamed.

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30 Capítulo 2

3. Quincas BOrBa machadO de assis

A História gira em torno da vida de Rubião, amigo e enfermeiro particular do filósofo Quincas Borba (personagem de Memórias Póstumas de Brás Cubas -1881). Quincas Borba vivia em Barbacena, era muito rico e, ao morrer, deixa ao amigo toda a sua fortuna herdada de seu último parente. Trocando a pacata vida provinciana pela agitação da corte, Ru-bião muda-se para o Rio de Janeiro, após a morte de seu amigo, causada por infecção pul-monar.Leva consigo o cão, também chamado de Quincas Bor-ba, que per-tencera ao filósofo e do qual deveria cuidar sob a pena de per-der a herança.

DuranteaviagemdetremparaoRiodeJaneiro,Rubião conhece o casal Sofia e Cristiano Palha, que logo percebem estar diante de um rico e ingê-nuo provinciano. Atraído pela amabilidade do ca-sal e, sobretudo, pela beleza de Sofia, Rubião passa a frequentar a casa deles, confiando cegamente no novo amigo.

O casal acaba envolvendo Rubião, este se apaixo-na por Sofia. Cristiano Palha, ao saber da corte de Rubiãoàmulher,sente-sedivididoentredoissen-timentos: o ciúme que tem da mulher que chega a fazê-lo pensar em atitudes radicais, e, por outro lado, sua dependência econômica de Rubião. Sofia astuciosamente consegue manter intactos, tanto o interesse de Rubião, quanto a fidelidade conjugal.

Cristiano Palha se destaca como um esperto co-merciante e administra a fortuna de Rubião, ti-rando parte de seus lucros. Por outro lado, a in-genuidade de Rubião torna-o presa fácil de várias outras pessoas interessadas e oportunistas, que se aproximam dele para explorá-lo financeiramente.

Aos poucos, acompanhando a trajetória de Ru-bião, percebe-se como funciona a engrenagem so-

cial da época. Como ocorre a disputa entre as pes-soas, as lutas pelo poder político e pela ascensão econômica da época.Dessamaneira, o romanceprojeta um quadro também bastante crítico das re-lações sociais da época. A Corte era a capital, o Rio de Janeiro, cuja moda era ditada pela tendência francesa.

Depoisdealgumtempo,Rubiãocomeçaamani-festarsintomasdeloucura,queolevaráàmorte,amesma loucura de que fora vítima o seu amigo, o fi-lósofo Quincas Borba, de quem herdara a fortuna.

Arruinado, Rubião deixa de ser útil e é abandonado pela roda de parasitas que o cercava. Rubião acre-dita ser Napoleão III, num dado momento pede a um barbeiro que faça sua barba para que fique parecido com o busto de Napoleão III, que tem na sua sala. Fantasia a realidade, fala sozinho na rua e, pouco a pouco, perde toda sua fortuna e também a razão. Palha e Sofia afastam-se cada vez mais e ele acaba sendo internado num asilo de onde foge para voltaràMinas,Barbacena.Morreláemplenodelí-rio de grandeza, acompanhado de seu cão Quincas Borba e repetindo a máxima do Humanitismo. O relacionamento de Rubião com o cachorro Quin-casBorbaéambíguo,àsvezes,ocãoapareceparaele como a encarnação do próprio filósofo, outras vezes, simboliza a vida simples da qual Rubião se afastara cada vez mais em sua nova situação social. Por outro lado, a variedade de tratamento a que Rubião submete o animal - do carinho ao aborre-cimento - é também um símbolo da ambiguida-de com que Rubião se move no mundo urbano.

Loucoeexploradoatéficarreduzidoàmiséria,odestino trágico de Rubião exemplifica a tese do Humanitismo seguindo a trajetória do Humani-tismo, a filosofia inventada por Quincas Borba, de que a vida é um campo de batalha, em que só os mais fortes sobrevivem. Os fracos e ingênuos, como Rubião, são manipulados e aniquilados pe-los mais fortes e mais espertos, como Palha e Sofia, que, no final, estão vivos e ricos, tal como dizia a teoria do Humanitismo. Nesse princípio de Quin-cas Borba, nunca há morte, há encontro de duas expansões, ou expansão de duas formas.

“AovencedoràsBatatas!”,princípioestequemar-cou e é o enfoque principal do enredo.

“Supõe-se em um campo e duas tribos famintas. As batatas apenas chegam para alimentar somente

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31Capítulo 2

umadastribos,queassimadquireforçasparatransporamontanhaeiràoutravertente,emquehábatatasemabundância;masseasduastribosdividiremempazasbatatasdocampo,nãosenutrirãosuficientemen-te e morrerão de inanição. A paz, nesse caso, é a destruição; a guerra é a esperança. Uma das tribos extermi-na,aoutrarecolheosdespojos.Daíaalegriadavitória,oshinos,asaclamações.Seaguerranãofosseisso,tais demonstrações não chegariam a dar-se. Ao vencido, o ódio ou compaixão... Ao vencedor, as batatas !”

SAIBA MAIS!

PERSONAGENS PRINCIPAIS

RUBIÃO: É a personagem central, apesar do

título. Rubião é um produto do acaso, do que

resultam seu caráter indefinido e obscuro e sua

perplexidade diante da realidade. Não tendo

noção exata de como funciona o mundo, age

por impulsos e sem coordenação, deixando-

se levar pelos acontecimentos. Sua passagem

fulminante de professor de mínimos em Bar-

bacena, a capitalista, como ele próprio se de-

nomina, termina tragicamente, pois não tem

as mínimas condições necessárias para enfrentar o salto social, tornado possível pela riqueza

inesperada. Sua ingenuidade, adequada em Barbacena, transforma-se em algo como pretensão

descabida na Corte, sendo então envolvido e, finalmente, destruído pelo mundo que o cerca.

A incapacidade básica de Rubião entender o mundo transparece muito claramente no fato de nem

chegar a perceber exatamente o sentido do aforismo de seu mestre- “Ao vencedor, as batatas; ao

vencido, ódio ou compaixão”- e na sua tendência de sonhar com coisas inatingíveis, do que a

paixão por Sofia é o melhor exemplo.

QUINCAS BORBA: (Joaquim Borba dos Santos) Quincas Borba é o filósofo que ocupa reduzido es-

paço na narrativa, mas sua sombra se projeta continuamente sobre todo o romance. Personagem

que oscila entre a grandeza e o ridículo, não é afetado, talvez por já ser rico, é claro, pelo desejo de

ascensão social e procura explicar o mundo pela sua filosofia, baseada no princípio da Humanitas,

levando-a ao extremo, a ponto de tratar seu cachorro como se fosse uma pessoa e dar-lhe seu pró-

prio nome. Quem recebe a herança é o cachorro e não Rubião, seu depositário. Diante da morte,

não entra em pânico, aceitando-a naturalmente e, diante da incapacidade de Rubião compreender

suas teorias, também não se aflige, comportando-se como se sua verdade lhe bastasse.

SOFIA: Vista às vezes como uma mulher de grande maldade, capaz de manobrar Rubião e demais

pessoas que a cercam, no conjunto da obra, Sofia aparece antes como personagem frágil, contra-

ditória e incapaz de manter um comportamento coerente que não seja o de nova rica ansiosa por

aparecer socialmente. A idealização de que é alvo por parte de Rubião não tem nada a ver com

seu caráter arrivista deslumbrada, ansiosa pelo reconhecimento da opinião pública e pelo prestígio

daí decorrente. Rubião sonha com ela, que, por sua vez, sonha com Carlos Maria. Conhecendo

instintivamente as leis sociais, contudo, aceita ser guiada por Palha e, renunciando a qualquer

comportamento verdadeiramente autônomo em termos pessoais, chega a liderar a “Comissão das

Alagoas”, na qual, como “anjo de consolação” ao lado de “estrelas de primeira grandeza”, atinge

o ápice de sua trajetória social.

PALHA: É o perfeito homem de negócios. Administra seus bens com inteligência, nunca esquecen-

do que manter as aparências também é fundamental. Um pequeno capital inicial, um casamento

socialmente bem-sucedido e relações influentes são a base pela qual opera com sucesso seus ne-

gócios mais ou menos honestos. A rigor, não chega a enganar diretamente Rubião. A ingenuidade

e a total falta de controle deste é que favorecem inesperadamente seus planos de ascensão social,

permitindo que sejam executados muito rapidamente. Um dos traços mais curiosos de seu caráter

é o prazer que sente em exibir sua mulher publicamente, talvez como prova de posse, talvez como

sinal de um desvio de comportamento sexual, sutil mas claramente insinuado pelo narrador.

O CACHORRO: Possivelmente o animal mais famoso de toda a ficção brasileira, Quincas Borba

está presente ao longo de toda a obra. Para Rubião, ele representa uma espécie de encarnação do

filósofo falecido, o que torna sua presença incômoda. Por outro lado, o animal parece representar

os valores que os personagens humanos já perderam: a fidelidade e a constância. Do que é prova

sua morte, poucos dias após o falecimento de Rubião.

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32 Capítulo 2

atividade |Pesquise acerca do Humanitismo de Quincas Borba e argumente sobre essa filosofia criada pela personagem e se ela é válida para avaliar o mundocontemporâneo.

4. O aLienista - machadO de assis

ODoutorSimãoBacamarte,cientistadenomea-da, monta, em Itaguaí, um hospício, a Casa Verde, onde pretende executar seus projetos científicos. Pretende separar o reino da loucura do reino do perfeito juízo, mas a confusão em que ambos se misturamacabaaborrecendooDoutor,que,paralevar a efeito a seleção dos loucos, tem que saber o que é a normalidade. Assim, qualquer desvio do que era o comportamento médio, a aparência pú-blica, qualquer movimento interior, que diferisse da norma da maioria, era objeto de internação. O hospício é a Casa do Poder, e Machado de Assis sabia disso muito antes da antipsiquiatria de Lacan e das teses de Foucould.

na Casa Verde, pessoas em cuja loucura a popula-ção não acredita. O barbeiro Porfírio lidera uma rebelião contra o hospício, que é sufocada.

Numa primeira etapa, são internados os que, em-bora manifestassem hábitos ou atitudes discutíveis, eram tolerados pela sociedade: os politicamente volúveis, os sem opiniões próprias, os mentirosos, os falastrões, os poetas que viviam escrevendo ver-sos empolados, os vaidosos, etc. Para pasmo geral dos habitantes de ltaguaí, Simão Bacamarte, um dia, solta todos os recolhidos no hospício e adota critérios inversos para a caracterização da loucura: os loucos agora são os leais, os justos, os hones-tos etc. A terapêutica para esses casos de loucura consistia em fazer desaparecer de seus pacientes as “virtudes”, o que oDr. SimãoBacamarte conse-guecomcertafacilidade.Declaracuradostodososloucos e solta-os, reconhecendo-se como o único loucoirremediável.Depois,omédicosetrancanaCasa Verde, onde morre alguns meses depois.

TEXTO COMPLEMENTAR

http://www.superdownloads.com.br/

download/144/quincas-borba-joaquim-

maria-machado-de-assis/ - download do

romance Quincas Borba, completo para

leitura.

http://www.singularsantoandre.com.br/

portal/emd/ar/professores/ivani/Quin-

cas%20Borba.pdf – análise da obra Quin-

cas Borba.

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No início, o projeto do Dr. Simão Bacamarte ébem recebido pela população de Itaguaí, mas a aprovação cessa quando o médico passa a recolher,

SAIBA MAIS!

O Alienista é uma célebre obra literá-

ria do escritor brasileiro Machado de

Assis. Para alguns especialistas, trata-

se de uma novela, outros o consideram

um conto. A maioria dos críticos, porém,

considera a obra um conto mais longo,

por causa da sua estrutura narrativa.

O conto é publicado em 1882, quando

aparece incorporado ao volume Papéis

Avulsos, havia sido publicado previa-

mente em A Estação (Rio de Janeiro), de

15 de outubro de 1881 a 15 de março

de 1882. É a base para o tipo de conto

brasileiro que viria a seguir, assim como

peça fundamental do Realismo. Para

muitos, é considerado como o primeiro

romance brasileiro do movimento realis-

ta. Uma frase dita por Machado de Assis:

“Se você não é um homem, então, não

tem palavras o suficiente para falar a

respeito de outros homens...” A obra foi

adaptada para a televisão e o cinema.

(1993)

Elenco e equipe técnica

Marcos Nanini; Giulia Gam; Milton Gon-

çalves; Cláudio Corrêa e Castro; Antonio

Calloni (Deputado Galvão); Luis Fer-

nando Guimarães; Marisa Orth; Sérgio

Mamberte; Marcelo Tas. - Direção: Guel

Arraes

33Capítulo 2

atividade |Faça uma comparação entre os personagens Quincas Borba e Simão Bacamarte e argumen-te acerca dos limites da loucura e da razão en-tre ambos.

5. aLuísiO azevedO

Aluísio Tancredo Gonçalves de Aze-vedo (São Luís, 14 de abril de 1857 — Buenos Aires, 21 de janeiro de 1913) foi um romancista, con-tista, cronista, diplo-mata, caricaturista e jornalista brasileiro, além de bom desenhista e discreto pintor.

Em 1881, ano da crescente efervescência abolicio-nista, publica o romance O Mulato, obra que deixa a sociedade escandalizada pelo modo cru com que desnuda a questão racial. Nela, o autor já demons-tra ser abolicionista convicto. Diante da reaçãohostil da província, obtendo sucesso com a obra na Corte, onde era considerada como exemplo da escolanaturalista,voltaàcapitalimperialeaí,in-cessantemente, produz romances, contos, crônicas e peças de teatro.

Inaugurou Aluísio a estética do naturalista no Brasil com a publicação do romance “O Mulato” (1881). É também autor de outros romances de mesma estética, “Casa de Pensão” (1884), “O Cor-tiço” (1890) e outros.

Tendo por influência escritores naturalistas euro-peus, dentre eles Émile Zola, por tal ótica capta a mediocridade rotineira, a vida dos sestros, os pre-conceitos e mesmo taras individuais, opção contrá-riaàdosromânticosprecedentes.

Fazem-se veementemente presentes em sua obra certos traços fundamentais do Naturalismo, quais sejam a influência do meio social e da heredita-riedade na formação dos indivíduos, também o fatalismo. Em Aluísio “a natureza humana afigura-se-lhe uma certa selvageria onde os fortes comem os fracos”, afirma o crítico Alfredo Bosi.

5.1 O cOrtiçO de aLuísiO de azevedO

João Romão, um homem qualquer, trabalhador e muito sovina, adquire fortuna, amiga-se a uma negra, - Bertoleza - e sente cada vez mais sede de riqueza. Arranja confusões com um novo vizinho (Miranda) ao disputar palmos de terra. Chega a roubar para construir o que tanto almejava: um cortiço com casinhas e tinas para lavadeiras. Pros-perou em seu projeto. João invejava seu vizinho.

Veio morar na casa de Miranda, Henrique, acadê-mico de medicina, a fim de terminar os estudos. Nessa casa, além de escravos e sua família, morava um senhor parasita (Botelho, ex-empregado). D.Estela (esposa de Miranda) andava se “escovando” com o Henrique, porém acabaram sendo flagrados pelo velho Botelho.

O cotidiano da vida no cortiço ia de acordo com a rotina e a realidade de seus moradores, em que lavadeiras eram o tipo mais comum.

Jerônimo (português, alto, 35 a 40 anos), foi con-versar com João oferecendo-lhe serviços para a sua pedreira. Com custo, depois de prosearem bastan-te, João aceitou a proposta, com a condição de ele morar no cortiço e comprar em sua venda. A mu-dança de Jerônimo e Piedade se sucedeu sob co-mentários e cochichos das lavadeiras. Após alguns meses, eles foram conquistando a total confiança de todos por serem sinceros, sérios e respeitáveis. Tinham vida simples e sua filhinha estudava num internato.

No domingo, todos vestem a melhor roupa e se reúnem para jantar, dançar, festejar, tudo muito avontade.DepoisdetrêsmesesRitaBaianache-ga. Nessas reuniões sobressaía o “Choro”, muito bem representado pela baiana e seu amante Firmo. Toda aquela agilidade na dança deixara Jerônimo admirado a ponto de perder a noite em claro pen-sando na mulata. Pombinha tirava esses dias para escrever cartas. Henrique entretinha-se a olhar Le-ocádia, que, em troca de um coelho, satisfez sua

TEXTO COMPLEMENTAR

http://pt.wikipedia.org/wiki/O_Alienista

- verbete da Wikipédia sobre O Alienista.

http://www.baixaki.com.br/download/o-

alienista.htm - link para baixar a obra

completa para leitura.

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34 Capítulo 2

vontade física, quando foram pegos por Bruno, seu marido, que bateu nela e despejou-a de sua casadepoisdefazerumgrandeescândalo.

O forró no cortiço começou, porém uma briga feia se travou entre Jerônimo e Firmo. Barricada impe-dia a polícia entrar, o incêndio no 12 fez subir gran-

de desespero, era um corre-corre, polícia, aci-dentados (Jerônimo levou uma navalhada) e, para finalizar, caiu uma baita chuva. João foi chamado a depor, muitos do cortiço o segui-ram até a delegacia, como em mutirão. Rita incansavelmente cuidava do enfermo Jerôni-mo dia e noite. No cortiço, nada se dizia a respeito de culpados e vítimas. Piedade não se aguentava chorando muito, descontente e desesperada por seu marido acidentado. Fir-mo não mais entrava por lá, ameaçado por JoãoRomãodeserentregueàpolícia.

Pombinha amanheceu indisposta decorren-te da visita feita no dia anterior à Léonie.Esta, como era de seu costume, atacou Pom-binha em beijos e afagos, pois era além de prostituta, lésbica. Isso deixara a menina traumatizada, que, por força e insistência de sua mãe, saiu a dar voltas atrás do cortiço, onde cochilou, sonhou e ao acordar virou mulher.AfestasefezporD.Isabel,aosaberde tão esperada notícia.

Estava Pombinha prepararando seu enxoval quando Bruno chegou e lhe pediu que es-crevesse uma carta a Leocádia. Ele chorava...

Ela, ao ver a reação de submissão dele, desfrutava sua nova sensação de posse do domínio feminino. Imaginava furtivamente a vida de todos, pois sua escrivaninha servia de confessionário. Via em seu viver que tudo aquilo continuaria, pois não havia homens dignos que merecessem seu amor e res-peito. Pombinha, mesmo incerta, casa-se com o Costa, foi grande a comoção no cortiço. Surgiu umnovocortiçoaliperto,o“CabeçadeGato”.Arivalidade com o cortiço de João Romão foi criada. Firmo hospedou-se lá, tendo ainda mais motivos contra Jerônimo.

João, satisfeito com sua segurança sobre os hóspe-des, investia agora em seu visual e cultura, com rou-pas, danças, leituras e uma amizade com Miranda e o velho Botelho. Ele e o velho estavam tramando coisa com a filha do Barão. Fez-se um jantar no qual João foi todo arrumado. Naquele momento de auge em sua vida, via-se numa situação em que necessitava livrar-se da negra, chegou a pensar em sua morte.

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Jerônimo mudou seus costumes, brigava com sua mulher e, a cadadia,mais se afeiçoavaàmulataRita. Firmo sentia-se enciumado. Florinda engravi-doudeDomingos(caixeirodavendadeJoãoRo-mão), que foi obrigado a casar-se ou fornecer do-tes. Foi aquele rebuliço em todo o cortiço, de nada mais falavam além disso. Florinda viu-se obrigada a fugir de casa. Léonie, prostituta de alto nível, apa-rece emperiquitada com sua afilhada Juju, todos admiravam tanta riqueza, mas nem por isso deixa-ram sua amizade de lado. Léonie era muito amiga de Pombinha. Na casa de Miranda, era uma festa só! Ele havia sido agraciado com o título de Barão do Freixal pelo governo português. João indagava--se por não ter desfrutado os prazeres da vida, fi-candosóaeconomizar.Diantedetalinjúria,commuito mau-humor implicava com tudo e todos do cortiço. Fez despejar na rua todos os pertences de Marciana. Acusou-a de vagabunda, e ela acabou na cadeia. A festa do Miranda esquentava e João rece-beu convite para ir lá, o que o deixou ainda mais injuriado.

35Capítulo 2

Sem nem mesmo repousar após sua alta do hospi-tal, Jerônimo foi conversar com Zé Carlos e Pataca a respeito do extermínio do Firmo. O dia corria, João proseava com Zulmira na janela da casa de Miranda, sentindo-se familiarizado. Jerônimo foi realizar seu plano, encontrando-se com os outros dois no Garnisé (bar em frente ao cemitério).Pataca entrou no bar, encontrou por acaso com Florinda, que se ajeitara na vida e dera-lhe notícia que sua mãe parara num hospício. Firmo aparece e Pataca o faz sair até a praia com pretexto de Rita estar lá. Muito bêbado, seguiu-o. Lá os três tretei-ros espancaram-lhe e lançaram-lhe ao mar. Chovia muito e, ao ir para casa, Jerônimo desiste e se diri-geàcasadaRita.Oencontrofoiefervescenteporambas as partes. Tudo estava resolvido, fugiriam no dia seguinte.

Piedade, com o passar das horas, mais desespera-da ficava. Ao amanhecer, chorava aos prantos e no cortiço nada mais se ouvia senão comentários sobre o sumiço do Jerônimo. A morte de Firmo também já se espalhara por lá.

Rita encontrava-se com Jerônimo. Ele, sonhando começar vida nova, escreve logo ao vendeiro, des-pedindo-sedoemprego,eàmulhercontando-lheo acontecido e prometendo-lhe somente pagar o colégio da garota. Piedade e Rita se atracaram no momento em que a mulata saía de mudança, o cor-tiço todo e mais pessoas que surgiram, entraram na briga. Foi um tremendo alvoroço, acabara sendo uma disputa nacional (portugueses x brasileiros). Nem a polícia teve coragem de entrar sem reforço. OsCabeçasdeGato tambémentraramnabriga.Travou-se a guerra, a luta dos capoeiristas rivais aumentava progressivamente quando o incêndio no 88 desatou, ensanguentando o ar. A causa foi a mesma anterior, por um desejo maquiavélico, a velha, considerada bruxa, incendiou sua casa, onde morreu queimada e soterrada, rindo ébria de satisfação. Com toda aquela agitação, surgia água detodososladosesósepôsfimàsituaçãoquan-do os bombeiros, vistos como heróis, chegaram. O velho Libório (mendigo hospedado num canto do cortiço) ia fugindo em meio a confusão, mas João o seguiu. Estava o velho com oito garrafas cheias de notas de vários valores, essas que João roubou e fugiu, deixando-o arder em brasas.

Morrera naquele incêndio a Bruxa, o Libório e a filhinha da Augusta além de muitos feridos. Para João, o incêndio era visto como lucro, pois o cor-

tiço estava no seguro, fazendo ele planos de expan-são baseado no dinheiro do velho mendigo. Por consequência do incêndio, Bruno foi parar no hos-pital, onde Leocádia foi visitá-lo ocorrendo assim a reconciliação de ambos.

As reformas expandiram-se até o armazém e as mudanças no estilo de João também alcançavam umnívelsocialcadavezmaisalto.Deamizadefor-tificada com Miranda e sua família, pediu a mão de Zulmira em casamento. Bertoleza, acabada e arrasada com aquela vida, esperava dele somente abrigo em sua velhice, nada mais.

Jerônimo abrasileirou-se de vez. Com todos os costumes baianos, deleitava-se a viver feliz com a mulata Rita. Piedade, desolada de tristeza, habitu-ara-se a beber e começou a receber visitas aos do-mingos de sua filhinha (9 anos), que logo cativou todo o cortiço, crismada por todos como “Senhori-nha”. Acabados pela desgraça da vida, Jerônimo e Piedade não mais guardavam rancor um do outro, ambos se estimavam e em comum somente a filha para cuidar.

Jerônimo se arrependera, mas não voltaria atrás. Deu-se a beber também. O cortiço não pareciamais o mesmo, agora calçado, iluminado e arru-mado todo por igual. O sobrado do vendeiro tam-bém não ficara para trás nas reformas. Quem se destacou foi Albino (lavadeiro homossexual) com a arrumação de sua casa. A vida transcorria, no-vos moradores chegavam. Já não se lia sob a luz vermelha na porta do cortiço “Estalagem de São Romão”, mas sim “Avenida São Romão”. Já não se fazia o “Choradinho” e a “Cana-verde”, a moda agora era o forrobodó em casa, e justo num desses emcasadedasDores,PiedadebeberamuitoePa-taca é que lhe fizera companhia querendo agarrá-la depois de ouvir seus lamentos, mas a caninha sur-tiu efeito (vômito) e nada se sucedeu. João Romão não pregara os olhos a pensar no que fazer para dar um fim na crioula Bertoleza. Agostinho (filho da Augusta) sofrera acidente na pedreira, ficara totalmente estraçalhado. Foi aquele desespero no cortiço.

Botelho foi falar com João logo cedo. Bertoleza, ao ouvir, pôs-se respeito diante da situação e exigiu seus direitos, discutiram o assunto e nada resolve-ram. João se irritara e tivera a ideia de mandá-la de volta ao dono, propondo esse serviço ao velho Botelho, que, aliás, recebia dele remuneração por

36 Capítulo 2

tudo que lhe prestava. Em volta do desassossego e do mal-estar de João e Bertoleza, o armazém pros-perava bastante, aumentando o nível dos clientes e das mercadorias. Sua Avenida agora era frequen-tada por gente de porte mais fino como alfaiates, operários, artistas, etc. Florinda, ainda de luto por sua mãe Marciana, estava envolvida agora com um despachante. A Machona (Augusta) quebrara o gê-nio depois da morte de Agostinho. Neném arru-mara pretendente.

Alexandre fora promovido a sargento. Pombinha juntara-seàLéonieeatirara-seaomundo.Detan-todesgosto,D.Isabel(mãedePombinha)morre-ra em uma casa de saúde. Piedade recebia ajuda da Pombinha para sobreviver, pois esta estimava Senhorinha, apesar de saber que o fim da pobre garotinha seria como o seu. Mesmo assim, Piedade foidespejada,indorefugiar-senoCabeçadeGato,que se tornara claramente um verdadeiro cortiço fluminense.

Ocorreu um encontro em uma confeitaria na Rua do Ouvidor, entre a família do Miranda, o Botelho e o João Romão os quais se puseram a prosear. Na volta, seguindo em direção ao Largo São Francis-co, João e Botelho optaram em ficar na cidade para conversarsobreofimquesedariaàcrioula.Estavatudo certo, seu dono iria buscá-la juntamente com a polícia. Quando isso se sucedeu, ao ver-se sem saída, impetuosa, fugiu. Com a mesma faca que descamava e limpava peixes para o João, Bertoleza rasgou seu ventre de fora a fora.

Naquele mesmo instante, João Romão recebera um diploma de sócio benemérito da comissão abolicionista.

5.2 O muLatO - aLuísiO azevedO

Saindo criança de São Luís para Lisboa, Raimun-do viajava, órfão de pai, um ex-comerciante portu-guês,eafastadodamãe,Domingas,umaex-escravadopai.Depoisde anos na Europa, Rai-mundo volta formado para o Brasil. Passa um ano no Rio e decide regres-sar a São Luís para rever seu tutor e tio, Ma-nuel Pescada. Bem recebido pela família do

TEXTO COMPLEMENTAR

http://www.cce.ufsc.br/~nupill/literatu-

ra/cortico.html – página da UFSC com tex-

to integral para leitura de O Cortiço.

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?acao=resumo – resumo e breve análise

da obra.

FERREIRA, Luís Antônio. Roteiro de Leitura

de O Cortiço, de Aluísio Azevedo. São Pau-

lo, Ática, 1997. Uma das mais completas e

melhores análises da obra.

SAIBA MAIS!

O enredo de O cortiço serve como padrão da

obra de Aluísio Azevedo. O romance gira em

torno da vida de certo cortiço carioca, retratado

como local promíscuo, capaz de contaminar os

que dali se aproximam. Sobre esse pano de fun-

do, o leitor acompanha a ascensão econômica e

social do inescrupuloso João Romão. Partidário

do pessimismo e influenciado por teorias deter-

ministas, Azevedo submete seus personagens

ao poder do sexo e do dinheiro, de maneira que

os dramas individuais se tornam apêndices da

luta coletiva cujo centro é o cortiço. O próprio

estilo de Azevedo reforça essas características:

destacando-se pela descrição de grandes pai-

néis, o autor transmite a impressão de que as

principais personagens não são as pessoas, e

sim as forças da natureza ou da vida em socie-

dade.

Obra de severa crí-tica social, O cortiço denuncia os pre-conceitos raciais e a explora-ção do ho-mem pelo homem.

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Cândido Portinari – O Mulato

37Capítulo 2

tio, Raimundo desperta logo as atenções de sua prima Ana Rosa que, em dado momento, lhe de-clara seu amor.

Essa paixão correspondida encontra, todavia, três obstáculos: o do pai dela, que queria a filha casa-da com um dos caixeiros da loja; o da avó, Maria Bárbara, mulher racista e de mau humor; o do Cô-negoDiogo,comensaldacasaeadversárionaturalde Raimundo.

Todos três conheciam as origens negroides de Rai-mundo.EoCônegoDiogoeraomaisempenhadoem impedir a ligação, uma vez que fora responsável pela morte do pai do jovem.

DepoisqueRaimundonasceu,seupai,JoséPedroda Silva, casou-se com Quitéria Inocência de Frei-tas Santiago, mulher branca. Suspeitando da aten-ção particular que José Pedro dedicava ao pequeno RaimundoeàescravaDomingas,Quitériaordenaque açoitem a negra e lhe queimem as partes ge-nitais.Desesperado, José Pedro carrega o filho eleva-oparaacasadoirmão,emSãoLuís.Devoltaàfazenda,imaginandoQuitériaaindarefugiadanacasa da mãe, José Pedro ouve vozes em seu quarto. Invadindo-o, o fazendeiro surpreende Quitéria e o entãoPadreDiogoemplenoadultério.Desonra-do,opaideRaimundomataQuitéria,tendoDio-gocomotestemunha.Graçasàculpadoadultérioeàculpadohomicídio,forma-seumpactodecum-plicidadeentreambos.Diantedemaisessadesgra-ça, José Pedro abandona a fazenda, retira-se para a casa do irmão e adoece. Algum tempo depois, já restabelecido,JoséPedroresolvevoltaràfazenda,mas, no meio do caminho, é tocaiado e morto. Por outrolado,devagarzinho,oPadreDiogocomeçaraa insinuar-se também na casa de Manuel Pescada.

Raimundo ignorava tudo isso. Em São Luís, já adulto, sua preocupação básica é a de desvendar suas origens e, por isso, insiste com o tio em visitar afazendaondenascera.DuranteopercursoaSãoBrás, Raimundo começa a descobrir os primeiros dados sobre suas origens e insiste com o tio para quelheconcedaamãodeAnaRosa.Depoisdevá-rias recusas, Raimundo fica sabendo que o motivo daproibiçãodevia-seàcordesuapele.

Devolta aSãoLuís,Raimundomuda-seda casado tio, decide voltar para o Rio, confessa em car-ta a Ana Rosa seu amor, mas acaba não viajando. Apesar das proibições, Ana Rosa e ele acertam um

plano de fuga. No entanto, a carta principal fora interceptadaporumcúmplicedoCônegoDiogo,ocaixeiroDias,empregadodeManuelPescadaefortepretendente,semprerepelido,àmãodeAnaRosa.

Na hora da fuga, os namorados são surpreendidos. Arma-seoescândalo,doqualocônegoéogranderegente. Raimundo retira-se desolado e, ao abrir a porta de casa, um tiro acerta-o pelas costas. Com umaarmaquelheemprestaraoCônegoDiogo,ocaixeiroDiasassassinaorival.

Ana Rosa aborta. Entretanto, seis anos depois, vemo-la saindo de uma recepção oficial, de braço comoSr.Diasepreocupadacomos“trêsfilhinhosque ficaram em casa, a dormir”.

atividade |Faça uma comparação de O Cortiço com O Mulato, do ponto de vista das questões sociais tratadas nas duas obras.

resumO Nestaunidadedocapítulo,estudamosMemóriasPóstumasdeBrásCubas:re-sumo, enredo, características daobra.Esseromanceéumdosmaisinovado-resdaobramachadiana.

Atéaquiestudamosaobra realistadeMachadodeAssis.Destacamosos ro-mances Memórias Póstumas de BrásCubas,QuincasBorba,DomCasmurroeOAlienista.Estudamososseusprinci-paispersonagens,comdestaqueparaopersonagemQuincasBorbaeseucon-ceitofilosóficodoHumanitismo.

38 Capítulo 2

GLOssáriO

cientificismo ou cientismo-éadoutrinadosqueconsi-deramosconhecimentoscientíficoscomodefinitivos.Temarazãocomobaseepodesertomadocomoumadou-trinasemelhanteaoracionalismo.OCientismopodeserresumidonaseguinteafirmação:“TudoéexplicávelpelaCiência”.

Humanitismo-énomedafilosofiafictíciacriadaporJo-aquimBorbadosSantos,oQuincasBorba,umdosmaiscélebrespersonagensdeMachadodeAssis,queéexpos-ta fundamentalmente no romanceQuincas Borba e deformasecundáriaemMemórias Póstumas de Brás Cubas.O “Humanitismo” do filósofoQuincas Borba expõe asdúvidaseperguntasdodiscípuloeas respostas rápidaseprontasdomestre,emoposiçãoàmaiêuticasocrática.Surge,pelaprimeiraveznaprosamachadiana,noCapítu-lo157de Memórias Póstumas de Brás Cubas,recebendoumadendonoCapítulo141,paracomentarumabrigadecães.Comisso,as ideiashumanitistasacompanhamBrásCubasatéofinaldolivro.Aexposiçãoéretomadaparaumnovointerlocutoredeformamaisexplícita,noCapítulo6deQuincas Borba.Rubião,essenovointerlo-cutor,aocontráriodeCubas,queeraadeptodafilosofiaesempreprocuravaquestioná-la,nãocompreendiasuasconcepçõeseconsideravaBorbaumdoido-passandoaentendera fórmula“aovencedor,asbatatas”sódepoisdederrotadoporSofiaeCristiano.

Para os críticos, o “Humanitismo” constitui-se da ideia“doimpériodaleidomaisforte,domaisricoedomaisesperto”. AntônioCandido escreveu que a essência dopensamentomachadianoé“atransformaçãodohomememobjetodohomem,queéumadasmaldiçõesligadasàfaltadeliberdadeverdadeira,econômicaeespiritual.”Oscríticosnotamqueo“Humanitismo”deMachadonãopassadeumasátiraaopositivismodeAugusteComteeaocientificismodoséculoXIXeàteoriadeCharlesDa-rwinacercadaseleçãonatural.Dessaforma,ateoriado“aovencedor,asbatatas”seriaumaparódiadaciênciadaépocadeMachadoesuadivulgação,umaformadedesnudarironicamenteocaráterdesumanoeantiéticoda“leidomaisforte”.

AfilosofiadeQuincasBorbaafirmaqueasubstânciadaqualemanameparaaqualconvergemtodasascoisaséHumanitas,equeainvejanãopassado“nobresenti-mento”decontemplação,nosoutros,dasqualidadesdeHumanitas.O“Humanitismo”,talqualaseleçãonaturaldeDarwin,enxergaaguerracomoformadaseleçãodosmaisaptos.Humanitasseprojetapormeiodequatrofa-ses:aestática,anterioràcriação;aexpansiva,iníciodascoisas;adispersiva,surgimentodohomem,eacontrati-va,absorçãodohomemnasubstânciaoriginal.Afilosofiaexcluiosexoeosofrimento,considerandooCristianismouma“moraldefracos”,amulherumserinferior,etudonomundocomoalgobom,sendoaúnicacoisaruimonão

nascer.NoCapítulo157deMemórias Póstumas de Brás Cubas, o“Humanitismo”seproclama“aúnicaverdade”,negandoaverdadeessencialdoBudismo,Bramanismo,Islamismo,Cristianismoedetodosossistemasecrençasdahistóriadahumanidade.

naturaLismo-ONaturalismofoiummovimentoculturalrelacionadoàsartesplásticas, literaturae teatro.SurgiunaFrança,nasegundametadedoséculoXIX.Essemovi-mentofoiumaradicalizaçãodoRealismo.

Características do Naturalismo-Omundopodeserexpli-cadopelasforçasdanatureza.Oserhumanoestácon-dicionadoàssuascaracterísticasbiológicas (hereditarie-dade)eaomeiosocialemquevive.ForteinfluênciadoevolucionismodeCharlesDarwin.Arealidadeémostradamedianteumaformacientífica(influênciadopositivismo).Nas artes plásticas, por exemplo, os pintores enfatizamcenasdomundorealemsuasobras.Pintavamaquiloqueobservavam.Naliteratura,ocorremuitoousodedescri-çõesdeambientes edepessoas.Aindana literatura, alinguagemécoloquial. Osprincipais temasabordadosnas obras literárias naturalistas são: desejos humanos,instintos, loucura,violência, traição,miséria,exploraçãosocial,etc.

referÊncias BiBLiOGráficas

FERREIRA, LuisAntônio. Roteirode Leitura:O Cortiço.SãoPaulo,Ática,1997.

MOISÉS,Massaud.História da Literatura Brasi-leira:Romantismo\Realismo.SãoPaulo,Cul-trix,1992.

SANT’ANNA,AffonsoRomanode. Análise Es-trutural de Romances Brasileiros.RiodeJaneiro,Vozes,1989.

SCHWARTZ,Roberto.Um Mestre na Periferia do Capitalismo. SãoPaulo,CiadasLetras,2006.

________.Ao Vencedor as Batatas.SãoPaulo,DuasCidades,2005.

39Capítulo 3Capítulo 3

OBjetivOs específicOs

• ApresentarascaracterísticasliteráriaseocontextohistóricodoParnasianis-mo no Brasil.

• CompreenderascaracterísticasdaescolaSimbolistaesuaimportânciaparaa Literatura Brasileira.

• Desenvolverapráticadeanálisesdepoemasparnasianosesimbolistas.

intrOduçãO

Nestecapítuloestudaremosasescolasparnasianistasesimbolistas,aimportânciadas mesmas como escolas representativas do final do século XIX e, ainda, de-monstrar as sutis ligações destas escolas com a literatura do século XX.

1. O parnasianismO

A Parnasianismo foi um movimento literário que surgiu na França, na metade do século XIX e se desenvol-veu na literatura européia, chegando ao Brasil. Esta escola literária foi uma opo-sição ao romantismo, pois representou a valorização da ciência e do positivismo.

O nome parnasianismo sur-giu na França e deriva do termo “Parnaso”, que na mitologia grega era o mon-te do deus Apolo e das musas da poesia. Na França, os poetas parnasianos que mais sedestacaram foram:ThéophileGautier,LecontedeLisle,ThéodoredeBanville e José Maria de Heredia.

parnasianismO e simBOLismO

Prof. Dr. Jairo Nogueira LunaCarga Horária | 15 horas

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40 Capítulo 3

1.1 características dO parnasianismO

• Objetividade no tratamento dos temas abor-dados. O escritor parnasiano trata os temas baseando na realidade, deixando de lado o subjetivismo e a emoção;

• Impessoalidade:avisãodoescritornãointerfe-re na abordagem dos fatos;

• Valorização da estética e busca da perfeição.A poesia é valorizada por sua beleza em si e, portanto, deve ser perfeita do ponto de vista estético;

• Opoetaevitaautilizaçãodepalavrasdames-ma classe gramatical em suas poesias, buscan-do tornar as rimas esteticamente ricas;

• Usodelinguagemrebuscadaevocabulárioculto;

• Temasdamitologia grega e da cultura clássica são muito frequentes nas poesias parnasianas;

• Preferênciapelossonetos;

• Valorizaçãodametrificação:omesmonúmerode sílabas poéticas é usado em cada verso;

• Usoevalorizaçãodadescriçãodas cenaseobjetos.

1.2 parnasianismO nO BrasiL

No Brasil, o parnasianismo chegou na segunda me-tade do século XIX e teve força até o movimento modernista (Semana de Arte Moderna de 1922).

os PrinCiPais rePresentantes Do Parnasianismo Brasileiro foram:

• Alberto de Oliveira. Obras principais: Me-ridionais (1884), Versos e Rimas (1895), Poesias (1900), Céu, Terra e Mar (1914), O Culto da For-ma na Poesia Brasileira (1916).

• Raimundo Correia. Obras principais: Primei-ros Sonhos (1879), Sinfonias(1883), Versos e Ver-sões(1887), Aleluias(1891), Poesias(1898).

• Olavo Bilac. Obras principais: Poesias (1888), Crônicas e novelas (1894), Crítica e fantasia (1904), Conferências literárias (1906), Dicionário

de rimas (1913), Tratado de versificação (1910), Ironia e piedade, crônicas (1916), Tarde (1919).

• Francisca Júlia. Obras principais: Mármores (1895), Livro da Infância (1899), Esfínges (1903), Alma Infantil (1912).

• Vicente de Carvalho. Obras principais: Arden-tias (1885), Relicário (1888), Rosa, rosa de amor (1902), Poemas e canções, (1908), Versos da moci-dade (1909), Páginas soltas (1911), A voz dos sinos, (1916).

Olavo Bilac, Alberto de Oliveira e Raimundo Cor-reia formaram a chamada “Tríade Parnasiana”.

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Os aspectos históricos dos quais podemos destacar: a consolidação do poder burguês, o incremento das discussões em torno de conceitos como o Libe-ralismo,aDemocraciaeajustiçasocial;odesenvol-vimento das ciências naturais; as lutas imperiais.

Na passagem do século XIX para XX, o Brasil co-nheceu um razoável desenvolvimento cultural. A fundação da Academia Brasileira de Letras em 1897 aponta para um aspecto fundamental desse desenvolvimento: o prestígio social da atividade intelectual, em proporções até então jamais vistas em nosso país.

O escritor, quase sempre associado ao boêmio, vai encontrando possibilidades de profissionalização. A imagem do escritor marginalizado vai cedendo espaço para a figura do artista plenamente integra-doàsociedadedesuaépoca:umcidadão.

O ponto positivo de tudo isso foi o amadurecimen-to da vida cultural brasileira. Por outro lado, para firmar como cidadão, o escritor teve a tendência

41Capítulo 3

de privilegiar uma prática literária ao oficialismo e ao academicismo. Representou um domínio de um estilo elitista, excessivamente preocupado em expressar-se de forma a evidenciar o virtuosismo e o talento poético.

ComoeramaocontrárioaosRomânticos,oemo-cionalismo foi substituído por racionalismo, se paraosromânticosapoesiaeraoresultadodains-piração pura e simples, os parnasianos considerava a poesia como um fruto do trabalho do poeta - um trabalho árduo, difícil, conhecimento técnico e a aplicação incansável.

O trabalho do artesão das palavras era comparado ao do artífice de uma jóia : perseverança, delicade-za e dedicação para lidar com um material delica-do e frágil , isso resumia-se na imagem do “poeta joalheiro “

Para os parnasianismos, a poesia seria perfeita des-de que sua forma atendesse a alguns requisitos:

• Ovocabulárioera refinado,erudito,diciona-resco.

• Ousodepalavrasdifíceistornava-seapoesiauma atividade da elite.

• Asintaxepoéticadeveriatambémobedeceràs regras gramaticais, não apenas para de-monstrar conhecimento técnico, mas tam-bém para adequar-se a normas consagradas de escrita.

Ponto de honra da poesia parnasiana era a utili-zação de rimas. Eles preferiam as rimas raras, isto é, aquelas mais difíceis de serem encontradas, por vezes surpreendentes. Evidentemente, a métrica também seria um aspecto importante dentro do formalismo parnasianismo. Os versos de dez (de-cassílabo) e doze (alexandrinos) sílabas, conside-radas clássicos, eram utilizados com freqüência, principalmente em uma forma poética igualmente clássica: o soneto.

O Parnasianismo representou um retorno à EraClássica. Valores como a Razão, o Belo Absoluto, o Antropocentrismo, o Universalismo são novamen-te perseguidos, como partes constituintes da arte literária de todos os tempos. Os temas igualmente se voltam para imagens arrancadas da cultura e da história greco-latinas. Os títulos de alguns poemas

são significativos, nesse sentido: “A sesta de Nero”, “O sonho de Marco Antônio”, “O vaso grego”.

O exotismo e o orientalismo são dois aspectos fun-damentais.A tendência à tematizaçãodeobjetosantigos, como vasos, estátuas e quadros , bem como o apelo visual que esse tipo de tema implicava , per-mitem uma aproximação do Parnasianismo com as Artes Plásticas (pintura, escultura, arquitetura, etc.).

O Parnasianismo produziu uma poesia voltada para a forma dos objetos e dos lugares. Abando-nando uma visão mais interiorizada, acabou por realizar uma poesia marcadamente descritiva. Atra-vés da descrição, buscava fornecer do objeto focali-zado uma imagem exata e precisa.

O Parnasianismo combate a subjetividade típica do Romantismo, em nome de uma objetividade que fornecesse do mundo uma representação des-provida de qualquer contaminação lacrimejante ou sentimental.

A necessidade de uma visão objetiva fazia com que o poeta preferisse uma posição de impassibilidade diante do assunto tratado. A intenção era realizar uma poesia mais cerebral e menos sentimental.

O Parnasianismo e o Realismo foram contempo-râneos, apresentam comuns (anti-romântico, ra-cionalismo, formalismo, impassibilidade), distan-ciam-se em um ponto fundamental: O Realismo propõe a tematização da sociedade dos problemas mundanos. Se a vertente naturalista do Realismo, por exemplo, caracterizou-se pela pintura de qua-dros da vida cotidiana dos pobres e miseráveis, a poesia parnasiana jamais de dedicaria como mani-festação artística capaz de manter-se fora do con-tágio de marcas sociais. Assim sendo, não se pode confundir Parnasianismo com Realismo!

1.3 OLavO BiLac

Olavo Bilac (Rio de Janeiro RJ, 1865-1918) começou os cursos de Medici-na,noRio,eDirei-to, em São Paulo, mas não chegou a concluir nenhuma das faculdades. Em 1884 seu soneto Fo

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42 Capítulo 3

NerofoipublicadonaGazetadeNotícias,doRiode Janeiro. Em 1887 iniciou carreira de jornalista literário e, em 1888, teve publicado seu primei-ro livro, Poesias. Nos anos seguintes, publicaria crônicas, conferências literárias, discursos, livros infantis e didáticos, entre outros. Republicano e nacionalistaescreveua letradoHinoàBandeirae fez oposição ao governo de Floriano Peixoto. Foi membro-fundador da Academia Brasileira de Le-tras, em 1896. Em 1907, foi o primeiro a ser eleito “príncipe dos poetas brasileiros”, pela revista Fon--Fon.De1915a1917,fezcampanhacívicanacionalpelo serviço militar obrigatório e pela instrução primária.Destaca-se em sua obra poética o livropóstumo Tarde (1919). Parte das crônicas que escre-veu em mais de 20 anos de jornalismo está reunida em livros, entre os quais Vossa Insolência (1996). Bilac, autor de alguns dos mais populares poemas brasileiros, é considerado o mais importante de nossos poetas parnasianos. No entanto, para o crí-tico João Adolfo Hansen, “o mestre do passado, do livro de poesia escrito longe do estéril turbilhão da rua, não será o mesmo mestre do presente, do jor-nal, a cronicar assuntos cotidianos do Rio, pronti-nho para intervenções de Agache e a erradicação da plebe rude, expulsa do centro para os morros”.

um BeijO

Foste o beijo melhor da minha vida, ou talvez o pior...Glória e tormento, contigo à luz subi do firmamento, contigo fui pela infernal descida!

Morreste, e o meu desejo não te olvida: queimas-me o sangue, enches-me o pensamento, e do teu gosto amargo me alimento, e rolo-te na boca malferida.

Beijo extremo, meu prêmio e meu castigo, batismo e extrema-unção, naquele instante por que, feliz, eu não morri contigo?

Sinto-me o ardor, e o crepitar te escuto, beijo divino! e anseio delirante, na perpétua saudade de um minuto....

LínGua pOrtuGuesa

Ultima flor do Lácio, inculta e bela,És, a um tempo, esplendor e sepultura:Ouro nativo, que na ganga impuraA bruta mina entre os cascalhos vela...Amo-te assim, desconhecida e obscura,Tuba de alto clangor, lira singelaQue tens o trom e o silvo da procela,E o arrolo da saudade e da ternura!

Amo o teu viço agreste e o teu aroma De virgens selvas e de oceano largo! Amo-te, ó rude e doloroso idioma,Em que da voz materna ouvi: “meu filho!”,E em que Camões chorou, no exílio amargo,O gênio sem ventura e o amor sem brilho!

[pátria]

Ama, com fé e orgulho, a terra em que nasceste!Criança! Não verás nenhum país como este!Olha que céu! que mar! que rios! que floresta!A Natureza, aqui, perpetuamente em festa,É um seio de mãe a transbordar carinhos.

Vê que vida há no chão! Vê que vida há nos ninhos,Que se balançam no ar, entre os ramos inquietos!Vê que luz que calor, que multidão de insetos!Vê que grande extensão de matas, onde imperaFecunda e luminosa, a eterna primavera!

SAIBA MAIS!

Profissão de Fé - Olavo Bilac

Leia o poema “Profissão de Fé”, integralmente em:

http://www.orfeuspam.com.br/Apostilas/LiteraturaBrasileira/

Parnasianismo/Olavo_Bilac_PROFISSAO_DE_FE.htm

É possível perceber com clareza no poema de Bilac o princípio

básico que rege o Parnasianismo - o culto à forma. Esse prin-

cípio, que chega ao exagero das minúcias - o desprezo pelas

rimas pobres (termos cognatos) e a busca das ricas, o desprezo

também pelo emprego de hiatos e a busca por consoantes de

apoio, são anseios do autor parnasiano.

Embora a ‘Profissão de fé’ seja tida geralmente como a pregação de minucioso trabalho formal, um

trabalho delicado de ourives, e um culto do estilo, todavia não é alicerçada em nenhum programa

propriamente parnasiano, mostrando apenas a preocupação formal no trabalho dos versos. Aliás,

Bilac levou essa preocupação até o fim, defendendo sempre a correção da língua e do verso, como

podemos ver no soneto ‘A um poeta’ (de Tarde), onde reafirma que a beleza (e o valor) do poema

está, sobretudo, na simplicidade da Arte.

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43Capítulo 3

atividade |Leia com atenção o poema “Língua Portugue-sa” de Olavo Bilac, pesquise a respeito do po-ema, e responda qual a mensagem do poema.

1.4 raimundO cOrreia

Raimundo Cor-reia iniciou sua carreira poética com o livro “Pri-meiros sonhos”, revelando forte influência dos po-etas RomânticosFagundes Varela, Casimiro de Abreu e Castro Alves. Em 1883 com o livro “Sinfonias”, assume o Parnasia-nismo e passa formar, ao lado de Alberto Oliveira e Olavo Bilac, a famosa “Tríade Parnasiana”.

Os temas adotados por Raimundo Correia giram em torno da perfeição formal dos objetos. Ele se diferencia um pouco dos demais parnasianos por-que sua poesia é marcada por um forte pessimis-mo, chegando até a ser sombrio. Ao analisar a obra de Raimundo Correia percebe-se que há nela uma evolução.EleiniciousuacarreiracomoRomânti-co, depois adotou o Parnasianismo e, em alguns poemas aproximou-se da escola Simbolista.

A sua obra é composta por “Primeiros Sonhos”; “Sin-fonias”; “Versos e Versões”; “Aleluias” e “Poesias”

as pOmBas...

Vai-se a primeira pomba despertada ... Vai-se outra mais ... mais outra ... enfim dezenasDe pombas vão-se dos pombais, apenasRaia sanguínea e fresca a madrugada ...

E à tarde, quando a rígida nortada Sopra, aos pombais de novo elas, serenas,

Ruflando as asas, sacudindo as penas, Voltam todas em bando e em revoada...

Também dos corações onde abotoam, Os sonhos, um por um, céleres voam, Como voam as pombas dos pombais;

No azul da adolescência as asas soltam, Fogem... Mas aos pombais as pombas voltam, E eles aos corações não voltam mais...

TEXTO COMPLEMENTAR

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com/?p=2937 – Análise do poema “A Um

Poeta” de Olavo Bilac.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Olavo_Bilac

- Verbete da Wikipédia sobre Olavo Bilac.

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tristeza de mOmO

Pela primeira vez, ímpias risadas Susta em pranto o deus da zombaria; Chora; e vingam-se dele, nesse dia, Os silvanos e as ninfas ultrajadas; Trovejam bocas mil escancaradas, Rindo; arrombam-se os diques da alegria; E estoira descomposta vozeria Por toda a selva, e apupos e pedradas... Fauno, indigita; a Náiade o caçoa; Sátiros vis, da mais indigna laia, Zombam. Não há quem dele se condoa! E Eco propaga a formidável vaia, Que além por fundos boqueirões reboa E, como um largo mar, rola e se espraia...

1.5 aLBertO de OLiveira

Antônio Mariano Alberto de Oliveira nasceu na cidade de Palmital de Saquare-ma (RJ) a 28 de abril de 1857. Após cursar medicina até o tercei-ro ano, abandonou o curso e optou pela área de farmacêutica, formando-se em 1883. Alberto de Oliveira, além de professor de Literatu-

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44 Capítulo 3

raBrasileira,exerceuafunçãodeDiretorGeraldeinstrução do Rio de Janeiro e foi um dos fundado-res da Academia Brasileira de Letras.

Em 1924 foi eleito, em pleno Modernismo, o “Príncipe dos Poetas Brasileiros” ocupando o lu-gar deixado por Olavo Bilac. Em 19 de janeiro de 1937, Alberto de Oliveira faleceu na cidade de Niterói (RJ).

Considerado pela critica como sendo o mais Par-nasiano dos poetas brasileiros, Alberto de Oliveira, durante seus oitenta anos vida, presenciou várias transformações políticas e sociais, porém, isso não alterou o seu estilo literário, que permaneceu sem-pre fiel ao Parnasianismo. Sua poesia sempre se-guiuàsrígidasregrasdaescolaParnasiana,ouseja,perfeição formal e métrica rígida. A sua linguagem écuidadosamentetrabalhada,chegandoàsvezesaser rebuscada. Os temas giram em torno de bibe-lôs, como exemplo pode-se citar os sonetos “Vaso Grego”e“VasoChinês”.

A sua obra, dedicada exclusivamente à poesia, écompostapor:“CançõesRomânticas”;“SonetosePoemas”; “Versos e Rimas”; “Poesias”(em três sé-ries, a última póstuma).

vasO GreGO

Esta de áureos relevos, trabalhada De divas mãos, brilhante copa, um dia, Já de aos deuses servir como cansada, Vinda do Olimpo, a um novo deus servia.

Era o poeta de Teos que o suspendiaEntão, e, ora repleta ora esvasada, A taça amiga aos dedos seus tinia, Toda de roxas pétalas colmada.

Depois... Mas, o lavor da taça admira,Toca-a, e do ouvido aproximando-a, às bordasFinas hás de lhe ouvir, canora e doce,

Ignota voz, qual se da antiga liraFosse a encantada música das cordas, Qual se essa voz de Ana-creonte fosse.

vasO chinÊs

Estranho mimo aquele vaso! Vi-o, Casualmente, uma vez, de um perfumado Contador sobre o mármor luzidio, Entre um leque e o começo de um bordado.

Fino artista chinês, enamorado, Nele pusera o coração doentio Em rubras flores de um sutil lavrado, Na tinta ardente, de um calor sombrio.

Mas, talvez por contraste à desventura, Quem o sabe?... de um velho mandarim Também lá estava a singular figura.

Que arte em pintá-la! A gente acaso vendo-a, Sentia um não sei quê com aquele chim De olhos cortados à feição de amêndoa.

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SAIBA MAIS!

Alberto de Oliveira viveria em outro tempo.

Nasceu quando o Brasil autônomo comple-

tava 35 anos. Acentuavam-se as mudan-

ças, mas Alberto de Oliveira atravessou-as

todas com um firme propósito: a determi-

nação de ser poeta. Pode-se dizer que ele

só teve uma ideologia: a da forma perfei-

ta, a do verso de mármore, independente e

puro. Foi, nesse particular, mais parnasia-

no do que os outros dois líderes da escola,

Olavo Bilac e Raimundo Correia. Escolhia a

palavra pelo seu peso no verso e por todos

os escaninhos sonoros de seu ritmo, qua-

se que numa valorização exclusiva do som

puro sobre os significados. Ao entrevistar,

em 1950, o poeta Paul Eluard, em Paris,

dele ouvi esta definição:

Poesia é a linguagem que canta.

Isto dito por quem era, após a suposta mor-

te do parnasianismo, revela a permanência,

em secretos compartimentos da memória,

de técnicas antigas que um escritor pega,

às vezes séculos mais tarde, para renovar

a expressão literária de seu tempo. Não se

duvida haja Alberto de Oliveira atingido

um ápice da poética brasileira. Seu soneto

“Vaso grego”, em estilo diferente, pode ser

posto ao lado da famosa ode à urna grega

de Keats cujo verso “A thing of beauty is a

joy for ever” virou filosofia de vida. Eis o

primeiro quarteto de “Vaso grego”:

Essa, de áureos relevos, trabalhada

De divas mãos, brilhantes copa, um dia,

Já de aos deuses servir como cansada,

Vinda do Olimpo, a um novo deus servia.

45Capítulo 3

atividade | Compare o poema “VasoGrego” deAlbertode Oliveira com “Tristeza de Momo” de Rai-mundo Correia e encontre neles as caracterís-ticas que permitem delimitá-los como poemas parnasianos.

2. simBOLismO

Movimento essencialmente poético do fim do sé-culo XIX, o simbolismo representa uma ruptura artística radical com a mentalidade cultural do Re-alismo-Naturalismo, buscando fundamentalmente retomar o primado das dimensões não-racionais da existência.

Para tanto, o simbolismo redescobre e redimensio-na a subjetividade, o sentimento, a imaginação, a espiritualidade; busca desvendar o subconsciente e o inconsciente nas relações misteriosas e transcen-dentes do sujeito humano consigo próprio e com o mundo.

Numa visão mais ampla, tanto no campo da filo-sofia e das ciências da natureza quanto no campo das ciências humanas, a desconstrução das teorias racionalistas faz-se notar, seja por meio da física re-lativista de Einstein, da psicologia do inconsciente de Freud ou das tórias filosóficas de Schopenhauer e de Friedrich Nietzsche.

Assim, o surgimento do simbolismo por um lado reflete a grande crise dos valores racionalistas da ci-vilização burguesa, no contexto da virada do século XIX para o século XX, e por outro inicia a criação de novas propostas estéticas precursoras da arte da modernidade.

2.1 cOntextO históricO

Na época em que o simbolismo se desenvolveu no Brasil na Europa a Itália e a Alemanha buscavam a unificação e reinava uma paz que foi usada na pre-paraçãoparaaPrimeiraGuerraMundial.Laosim-bolismo era forte e o parnasianismo fraco. Aqui começava a República e o movimento foi abafado pelos parnasianistas que dominavam a produção literária da época.

2.2 OriGens dO simBOLismO

Ao longo da década de 1890, desenvolveu-se na França um movimento estético a princípio apelida-do de “decadentismo” e depois “Simbolismo”. Por muitos aspectos ligado ao Romantismo e tendo berço comum ao Parnasianismo (“Parnasse Con-temporain”, 1866), o Simbolismo gerou-se quando escritores passaram a considerar que o Positivismo de Augusto Comte e o demasiado uso da ciência e do ateísmo (procedimentos do Realismo) não con-seguiam expressar completamente o que acontecia com o homem e a Natureza.

A França foi o berço do Simbolismo, que se mani-festou no satanismo e no spleen de As Flores do Mal, do poeta Charles Baudelaire; no mistério e na destruição da linguagem linear de Um lance deDadosedeTardesdeumFaunodeStéphaneMallarmé; no marginalismo de Outrora e Agora,

Pertencente a uma família de 17 irmãos e

irmãs, em que todos faziam poesia, pou-

cos poetas nossos tiveram participação tão

viva na literatura de um tempo como Alber-

to de Oliveira, cujas palavras raras, confir-

mando sua adesão às normas parnasianas,

levavam, e ainda levam, muitos leitores ao

dicionário. Usava termos assim: úsnea (lí-

quen, penugem), lisins (veios da pedra), es-

consa (inclinada, oblíqua) ou punícea (ver-

melho, cor de romã).

TEXTO COMPLEMENTAR

http://pt.wikipedia.org/wiki/Raimundo_

Correia - verbete da Wikipédia sobre Rai-

mundo Correia.

http://www.academia.org.br/abl/cgi/cgi-

lua.exe/sys/start.htm?sid=135 – página

da Academia Brasileira de Letras sobre Al-

berto de Oliveira.

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46 Capítulo 3

de Paul Verlaine e ainda no amoralismo de Uma Temporada no Inferno, de Jean Nicolas Rimbaud. Segundo algumas fontes, Edgar Allan Poe é consi-derado o precursor desse movimento, por ter in-fluenciado nas obras de Baudelaire.}

2.3 características dO simBOLismO

Musicalidade e SinestesiaVisões,salmosecânticosserenos,surdinas de órgãos flébeis, soluçantes...Dormênciasdevolúpicosvenenossutis e suaves, mórbidos, radiantes...

vocábulo litúrgico e novamente a musicalidade e a sinestesia.Infinitos espíritos dispersos,Inefáveis, edênicos, aéreos,Fecundai o mistérios destes versosCom a chama ideal de todos os mistérios.

espiritualidade, mistérios, diafaneidade constan-temente presente nos poemas.Tudo! Vivo e nervoso e quente e forte,nos turbilhões quiméricos do Sonho,passe, cantando, ante o perfil medonhoe o tropel cabalístico da Morte!

Denovoasinestesia,presençadosonhoearefe-rência ao misticismo da Cabala.

Características na forma: Não se descreve um objeto; sugere-se a existência dele.Emprego de letras maiúsculas no verso.

Uso de um vocabulário bíblico, litúrgico, esotérico e arcaico no sentido de revitalizá-lo.

MusicalidadeA imprecisão no sentido de certos vocábulos para caracterizar o indefinível e o indizível.

Comopode-senotaremAntífona,dá-seimportân-ciaàsfrasesnominais.

Emboratenhamdadoimportânciaaoversolivre,os simbolistas ainda estavam presos a poemas bem elaborados formalmente, como os parnasianos.

Características no conteúdo:Religiosidade, misticismo, espiritualismo, esote-rismo. Expressão de estados da alma profundos e complexos. Sonho; não o sonho sentimental dos

Românticos,mas os sonhosmais escondidos doser humano. Presença do inconsciente e do sub-consciente.

2.4 O simBOLismO nO BrasiL

Iniciado oficialmente em 1893, com a publicação de Missal (prosa poética) e Broquéis, de Cruz e Souza, considerado o maior representante do mo-vimento no país, ao lado deAlphonsus deGui-marães, o Simbolismo brasileiro, segundo alguns autores, não foi tão relevante quanto o europeu. Em outras palavras, não conseguiu substituir os cânonesdaliteraturaoficial,predominantementerealista e parnasiana.

Esse fenômeno não é difícil de entender: a ênfase no primitivo e no inconsciente desta poesia, seu caráter universalizante e ao mesmo tempo intimis-ta,nãorespondiamàsquestõesnacionais.

Por outro lado, entretanto, pelas mesmas caracte-rísticas mencionadas, as manifestações simbolistas no Brasil, especialmente no Sul, terra de Cruz e Souza, possuem uma aura de “seita”, com verda-deiras sociedades secretas cujos ritos, jargões e no-mes sugerem os traços essenciais do movimento (por exemplo: “Romeiros da Estrada de São Tia-go”, “Magnificentes da palavra de escrita”, etc).

Movimento de cunho idealista, o Simbolismo teve que enfrentar no Brasil a atmosfera de oposição e hostilidade criada pelo Zeitgeist realista e positivista dominante desde 1870. O prestígio do parnasianis-mo não deixou margem para que se reconhecesse o movimento simbolista e avaliasse o seu valor e alcance, tão importantes que a sua repercussão e influênciaremotassãonotóriasemrelaçãoàlite-ratura modernista. O Simbolismo foi abafado pela ideologia dominante e os adeptos do simbolismo sofreram sob forte oposição.

2.5 cruz e sOusa

João da Cruz e Souza nasceu em 24 de novembro de 1861 em Desterro, hoje Florianópolis, SantaCatarina. Seu pai e sua mãe, negros puros, eram es-cravosalforriadospelomarechalGuilhermeXavierde Sousa. Ao que tudo indica o marechal gostava muito dessa família pois o menino João da Cruz recebeu, além de educação refinada, adquirida no Liceu Provincial de Santa Catarina, o sobrenome Sousa.

47Capítulo 3

Apesar de toda essa proteção, Cruz e Souza sofreu muitocomopreconceitoracial.Depoisdedirigirum jornal abolicionista, foi impedido de deixar sua terra natal por motivos de preconceito racial. Al-gum tempo depois é nomeado promotor público, porém, é impedido de assumir o cargo, novamente por causa do preconceito. Ao transferir-se para o Rio, sobreviveu trabalhando em pequenos empre-gos e continuou sendo vítima do preconceito.

Em1893casa-secomGravitaRosaGonçalves,quetambém era negra e que mais tarde enlouqueceu. O casal teve quatro filhos e todos faleceram pre-maturamente, o que teve vida mais longa morreu quando tinha apenas 17 anos. Cruz e Souza mor-reu em 19 de março de 1898 na cidade mineira de Sítio, vítima de tuberculose. Suas únicas obras publicadas em vida foram Missal e Broquéis.

Cruz e Souza é, sem sombra de dúvidas, o mais importante poeta Simbolista brasileiro, chegando a ser considerado também um dos maiores repre-sentantes dessa escola no mundo. Muitos críticos chegam a afirmar que se não fosse a sua presença, a estética Simbolista não teria existido no Brasil. Sua obra apresenta diversidade e riqueza.

Deumlado,encontram-seaspectosnoturnos,her-dados do Romantismo como por exemplo o culto da noite, certo satanismo, pessimismo, angústia morte etc. Já de outro, percebe-se uma certa preo-cupação formal, como o gosto pelo soneto, o uso de vocábulos refinados, a força das imagens etc. Em relação a sua obra, pode-se dizer ainda que ela tem um caráter evolutivo, pois trata de temas até certo ponto pessoais como por exemplo o sofrimento do negro e evolui para a angústia do ser humano.

sinfOnias dO OcasO

Musselinosas como brumas diurnas Descem do acaso as sombras harmoniosas,

Sombras veladas e musselinosas Para as profundas solidões noturnas. Sacrários virgens, sacrossantas urnas, Os céus resplendem de sidéreas rosas, Da lua e das Estrelas majestosas Iluminando a escuridão das furnas. Ah! por estes sinfônicos ocasos A terra exala aromas de áureos vasos, Incensos de turíbulos divinos. Os plenilúnios mórbidos vaporam... E como que no Azul plangem e choram Cítaras, harpas, bandolins, violinos...

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musica misteriOsa...

Tenda de Estrelas níveas, refulgentes, Que abris a doce luz de alampadários, As harmonias dos Estradivarius Erram da Lua nos clarões dormentes... Pelos raios fluídicos, diluentes Dos Astros, pelos trêmulos velários, Cantam Sonhos de místicos templários, De ermitões e de ascetas reverentes... Cânticos vagos, infinitos, aéreos Fluir parecem dos Azuis etéreos, Dentre os nevoeiros do luar fluindo... E vai, de Estrela a Estrela, a luz da Lua, Na láctea claridade que flutua, A surdina das lágrimas subindo...

2.6 aLphOnsus de Guimaraens

Poeta em que devoção e equilíbrio se dão as mãos desdeoinício,AlphonsusdeGuimaraensfoimes-tre de um lirismo místico, em que busca e sublima a amada entre o luar e as sombras, o amor e a mor-

48 Capítulo 3

te. Afonso Henriques da Costa Guimarães nas-ceuemOuroPretoMGem24dejulhode1870.Estudou engenharia e direito. Apaixonou-se por sua prima Cons-tança, que mor-reu logo depois. Em São Paulo, colaborou na imprensa e fre-qüentou a Vila Kyrial, de José de Freitas Vale, onde se reuniam os jovens simbo-listas. Em 1895, no Rio de Janei-ro, conheceu Cruz e Souza. Foi juiz e promotor emConceiçãodoSerroMG.Deseuslivros,ostrêsprimeiros foram publicados no mesmo ano (1899): Dona mística, Câmara ardente e o Setenário das dores de Nossa Senhora. Foi escrito antes, no entanto, o Kyriale (1902), suacoletâneamais representativa.Seguiram-se Pauvre lyre e Pastoral aos crentes do amor e da morte (1923). Um dos principais repre-sentantes do movimento simbolista no Brasil, sua obra, de influência francesa (Verlaine, Mallarmé -- que traduziu), adquire com freqüência acentos arcaizantes e de envolvente conteúdo lírico, uma vez que o exprime num misticismo enraizado no fundo da subjetividade e, desse modo, como uma compulsão do inconsciente. Em ritmo elegíaco e de solene musicalidade, multiplica a imagem da ama-da: são “Sete damas”, são “As onze mil virgens”, Es-ter, Celeste, Nossa Senhora (com quem identifica Constança), ou a célebre “Ismália”. Oscila, assim, entre os indícios materiais da morte e a expectati-va do sobrenatural, como se toda a sua poesia se fizesse em variações de um mesmo réquiem. Mas a evolução da linguagem é permanente e a tendência a um barroco discreto -- de Ouro Preto, Mariana -- se flexibiliza, se inova com acentos verlainianos, mallarmaicos, de que brotam imagens muitas ve-zes ousadas, não longe da invenção surrealista. Al-phonsusdeGuimaraensmorreuemMarianaMGem 15 de julho de 1921.

puLchra ut Luna

IICeleste... É assim, divina, que te chamas.Belo nome tu tens, Dona Celeste...Que outro terias entre humanas damas, Tu que embora na terra do céu vieste?

Celeste... E como tu és do céu não amas:Forma imortal que o espírito revesteDe luz, não temes sol, não temes chamas,Porque és sol, porque és luar, sendo celeste.

Incoercível como a melancolia, Andas em tudo: o sol no poente vastoPede-te a mágoa do findar do dia.

E a lua, em meio à noite constelada, Pede-te o luar indefinido e castoDa tua palidez de hóstia sagrada.

2.7 pedrO KiLKerry

(saLvadOr Ba, 1885-1917)

Formou-se bacha-rel em Ciências Jurídicas e Sociais na Faculdade de Direito da Bahia,em 1913. Na épo-ca, já atuava como colaborador das revistas Nova Cru-zada, Os Anais, Via Láctea, A Voz do Povo e de vários jornais, entre os quaisATarde,AGazetado Povo e Jornal Moderno, onde publicou a série de crônicas Quotidianas - Kodaks. Foi advogado e escriturário da Repartição de Contabilidade do Tribunal de Contas de Salvador. Poeta simbolis-ta, Kilkerry não publicou livro em vida. Apenas em 1971 ocorreria a publicação póstuma de 36 de seus poemas, no livro ReVisão de Kilkerry, de Augusto de Campos. Para Campos, “Kilkerry não só compreendeu mais conscientemente que outros simbolistas o papel desempenhado na criação pelo subconsciente - mais tarde supervalorizado pelo Surrealismo - como soube levar mais longe a liber-dade de associação imagética. Por outro lado, a ca-pacidade de síntese, assim como a consciência das limitações da sintaxe ordinária, são mais agudas em Kilkerry do que em qualquer outro poeta do nosso Simbolismo”.

cetáceO

Fuma. É cobre o zenite. E, chagosos do flanco,Fuga e pó, são corcéis de anca na atropelada.E tesos no horizonte, a muda cavalgada.Coalha bebendo o azul um largo vôo branco.

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49Capítulo 3

Quando e quando esbagoa ao longe uma enfiadaDe barcos em betume indo as proas de arranco.Perto uma janga embala um marujo no bancoBrunindo ao sol brunida a pele atijolada.

Tine em cobre o zenite e o vento arqueja e o oceanoLongo enfroca-se a vez e vez e arrufa,Como se a asa que o roce ao côncavo de um pano.

E na verde ironia ondulosa de espelhoÚmida raiva iriando a pedraria. BufaO cetáceo a escorrer d’água ou do sol vermelho.

GLOssáriO

Zeitgeist-éumtermoalemãocujatraduçãosignificaes-píritodeépoca,espíritodotempoousinaldostempos.OZeitgeistsignifica,emsuma,oconjuntodoclimaintelec-tualeculturaldomundo,numacertaépoca,ouascarac-terísticasgenéricasdeumdeterminadoperíododetempo.

OconceitodeespíritodeépocaremontaaJohannGot-tfried Herder e outros românticos alemães, mas ficoumelhorconhecidopelaobradeHegel,Filosofia da His-tória.Em1769,HerderescreveuumacríticaaotrabalhoGenius seculi dofilólogoChristianAdolphKlotz,introdu-zindoapalavraZeitgeistcomoumatraduçãodegenius seculi (Latim:genius-“espíritoguardião”esaeculi-“doséculo”).Osalemãesromânticos,tentadosnormalmenteà redução filosófica do passado às essências, trataramdeconstruiro “espíritodeépoca”comoumargumentohistóricodesuadefesaintelectual.

referÊncias

GOMES,ÁlvaroCardoso.A Estética Simbolis-ta:Textosdoutrinárioscomentados.SãoPaulo,Atlas,1994.

resumO OParnasianismo:umaescoladaformaclássica, da erudição, da valorizaçãoestéticadoidealdebelezaclássico.OSimbolismo:Umaescoladamusicalida-depoética,dasensibilidaderítmicaedasinestesia,comligaçõestemáticascomoesoterismoeumaposturadeoposi-çãoaoracionalismorealista.

TEXTO COMPLEMENTAR

http://pt.wikipedia.org/wiki/Simbolismo -

Verbete da Wikipédia sobre Simbolismo.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Charles_Bau-

delaire - Verbete da Wikipédia sobre

Charles Baudelaire.

SAIBA MAIS!

ANDRADE MURICY: Nascido em Curitiba

em 1895, Crítico de música e de literatu-

ra, José Cândido de Andrade Murici pôde

dar, nas duas

áreas, con-

tribuições in-

vulgares. Foi

dos primeiros

a aceitar as

inovações de

Villa-Lôbos e

a apontar nas

composições

desse mestre

os traços nos

quais mais se

espelhava toda a alma de um povo. Aluno

dos poetas simbolistas Emiliano Perneta e

Dario Veloso, quando estudante em Curi-

tiba, sua terra natal, conservou-se sempre

interessado no movimento do qual eles

participaram. Desse interesse resultou seu

monumental ‘Panorama do Movimento

Simbolista Brasileiro’, a obra mais completa

até hoje surgida sobre o assunto. No Rio de

Janeiro, onde se radicou ainda jovem, Mu-

rici participou, com Cecília Meireles, Adeli-

no Magalhães, Tasso da Silveira e outros,

do grupo da revista ‘Festa’, em torno da

qual se congregou uma expressiva vertente

do Modernismo brasileiro, marcada por um

lirismo mais subjetivo, mais espiritualista e

menos polêmico que o da vanguarda atu-

ante em 1922. Morreu no Rio de Janeiro em

1984.

obrasSonata Pagã (1913); Emiliano Perneta

(1919); O Suave Convívio (1922);

A Festa Inquieta (1926); Caminho de Mú-

sica (1ª série, 1946 - 2ª série, 1951); Pa-

norama do Movimento Simbolista Brasileiro

(1952); Partida para a Europa (1957); Villa-

-Lôbos, uma Interpretação (1961)

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50 Capítulo 3

LIMA, Alceu Amoroso.Olavo Bilac: ColeçãoNossosClássicos.RiodeJaneiro,Agir,1979.

LUNA, Jairo Nogueira (Jayro Luna). Orfeu Spam. (http://www.orfeuspam.com.br)

MOISÉS,Massaud.História da Literatura Bra-sileira:OSimbolismo.SãoPaulo,Cultrix, vol.3,1985.

MURICY, Andrade. Panorama do Simbolismo Brasileiro. São Paulo, Perspectiva, col. Textos,vol.6,2volumes,1987.

OLIVEIRA LIMA, João Alberto. Antologia da Poesia Parnasiana. São Paulo, Ed. Nacional,1994.

SILVEIRA,Tasso.Cruz e Souza:ColeçãoNossosClássicos.RiodeJaneiro,Agir,1979.

51Capítulo 4Capítulo 4

O pré-mOdernismO

Prof. Dr. Jairo Nogueira LunaCarga Horária | 15 horas

OBjetivOs específicOs

• Garantiroconhecimentodascaracterísticasdoperíodoliterárioconhecidocomo “Pré-Modernismo”, bem como a compreensão das qualidades literá-rias das obras dos principais autores do período.

• CompreenderaimportânciadoPré-ModernismonocontextodaLiteraturaBrasileira e tenha elementos para avaliação das obras de autores como Lima Barreto,GraçaAranha,EuclidesdaCunha,AugustodosAnjos,PéthiondeVillar, Monteiro Lobato.

• Desenvolverapráticadaanáliseedaleituracríticadeobrasliterárias,comdestaque para as características das obras do período pré-moderno.

intrOduçãO

Neste capítulo, estudaremos a produção literária finissecular do século XIX no período conhecido genericamente como Pré-Modernismo, destacando as obras consideradas as mais importantes bem como suas características e o entendimen-to do período dentro do contexto da História da Literatura Brasileira.

1. O pré-mOdernismO

O Pré-Modernismo não pode ser considerado uma escola literária, mas sim um períodoliteráriodetransiçãodoRealismo/NaturalismoparaoModernismo.Decaráter inovador, a maioria de seus membros não se enquadra como Modernis-tas por não terem sobrevivido o suficiente para participar ou terem criticado o movimento.

O Pré-Modernismo acontece anos antes da Semana da Arte Moderna, em 1922, e é o período de transição entre as tendências do final do Simbolismo ou Parna-sianismo, século XIX, e o Modernismo.

Neste período, alguns anos após a abolição da escravatura, muitos imigrantes, em sua maioria italianos, vêm ao Brasil substituir a mão de obra rural e escrava. A urbanização de São Paulo faz surgir uma nova classe social, a operária, ao mes-mo tempo em que os ex-escravos são marginalizados nos centros urbanos.

52 Capítulo 4

Os estados brasileiros passam por transformações na economia: a ascensão do café, no Sul e no Su-deste, e o declínio da cana-de-açúcar no Nordeste. O governo republicano não garantia esperanças e não promovia as tão esperadas mudanças sociais, pelo contrário, a sociedade se encontrava dividida entre a elite detentora do dinheiro, respeito e poder das oligarquias rurais e a classe trabalhadora rural, bem como dos marginalizados nos centros urbanos.

A desigualdade social culminou em diversos movi-mentos sociais pelo Brasil, como a Revolta de Ca-nudos, ocorrida no final do século XIX, no sertão da Bahia, sob liderança de Antônio Conselheiro, dentre outros movimentos de protesto às condi-ções de vida no Nordeste. Além disso, ocorreram também os movimentos protestantes no meio ur-bano, como a Revolta da Chibata, em 1910, contra omaltratodaMarinhaàcorporação,e,também,as greves de operários.

Já no começo do século XX, começam a surgir os primeiros indícios da crise cafeeira com a super-produção de café, a chamada crise da “República Café-com-Leite”.

É em meio a esse quadro na sociedade brasileira que começa no Brasil uma nova produção literá-ria, intitulada de Pré-Modernismo, pelo crítico literário Tristão de Ataíde. Trata-se das obras lite-rárias de um grupo de escritores que propunham as mesmas temáticas e formas, as quais seriam en-quadradas no futuro movimento literário, o Mo-dernismo. Destacam-se nesse período a obraOs sertões, de Euclides da Cunha, e Canaã,deGraçaAranha. Contudo, o Pré-Modernismo não é tido como uma “escola literária”, pois apresenta carac-terísticas individuais muito marcantes.

No entanto, há características comuns às obrasdesse período: a ruptura com a linguagem pom-posa parnasiana, a exposição da realidade social brasileira; o regionalismo, a marginalidade exposta nas personagens e a associação aos fatos políticos, econômicos e sociais.

2. eucLides da cunha

Euclides Rodrigues Pimenta da Cunha nasceu no dia 20 de janeiro de 1866, em Cantagalo (RJ). PassousuainfâncianaBahia,ondefoicriadoportias, pois era órfão. Após alguns anos, ingressou na

Escola Militar, da qual foi expulso por suas ideias republicanas, que o levaram a desacatar o Ministro deGuerra em 1888. Assim, com a proclamaçãoda República, o autor voltou à Escola SuperiordeGuerra e formou-se emEngenhariaMilitar eCiências Naturais. Euclides da Cunha começou, porém, a contestar as decisões republicanas e resol-veu desligar-se totalmente da carreira militar.

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Em 1897, quando se mudou do Rio para São Pau-lo, passou a fazer a cobertura da revolta de Canu-dos para o jornal O Estado de S. Paulo. A experi-ência como jornalista no nordeste resultou na obra mais conhecida do escritor: Os Sertões.

Pertencente ao Pré-Modernismo, o clássico Os Sertões tem como característica principal o regio-nalismo. A realidade do Nordeste brasileiro é re-tratada com fidelidade na obra, a qual descreve as condições precárias de vida da região e os motivos pelosquaisocorreuodramadaGuerradeCanu-dos. O sucesso da obra foi tamanho que resultou na eleição do autor para a Academia Brasileira de Letras em 1903. O livro Os Sertões é consagrado como referência na literatura e na sociologia para o estudo do sertanejo. Nele o autor retrata a terra nordestina, o homem sertanejo e a luta travada pe-losnordestinosnaGuerradeCanudos.

Euclides da Cunha foi assassinado em 1909, por questões familiares, em 15 de agosto, depois de umatrocadetiroscomoaspiranteDinoráeseuirmão,ocadeteDilermandodeAssis,quemanti-nha um romance com a esposa de Euclides. Em 1916, o segundo-tenente Dilermando de Assis,que havia sido absolvido da morte de Euclides da Cunha (legítima defesa), mata em um cartório de órfãos, no centro do Rio, o aspirante naval Eu-clides da Cunha Filho, o Quidinho, que tentou vingaramortedopai.Dilermandoénovamenteabsolvido.

53Capítulo 4

Vejamos a figura do homem nordestino em um trecho da obra Os Sertões:

“O sertanejo é, antes de tudo, um forte. Não tem o raquitismo exaustivo dos mestiços neurastênicos do litoral.

A sua aparência, entretanto, ao primeiro lance de vista, revela o contrário. Falta-lhe a plástica impecá-vel, o desempeno, a estrutura corretíssima das orga-nizações atléticas.

É desgracioso, desengonçado, torto. Hércules-Qua-símodo, reflete no aspecto a fealdade típica dos fra-cos. O andar sem firmeza, sem aprumo, quase gin-gante e sinuoso, aparenta a translação de membros desarticulados. Agrava-o a postura normalmente abatida, num manifestar de displicência que lhe dá um caráter de humildade deprimente. A pé, quan-do parado, recosta-se invariavelmente ao primeiro umbral ou parede que encontra; a cavalo, se sofreia o animal para trocar duas palavras com um conhe-cido, cai logo sobre um dos estribos, descansando sobre a espenda da sela. Caminhando, mesmo a passo rápido, não traça trajetória retilínea e firme. Avança celeremente, num bambolear característi-co, de que parecem ser o traço geométrico, os me-andros das trilhas sertanejas”. (...)

Obras: Os Sertões (1902); Peru versus Bolívia (1907); Contrastes e Confrontos (1907); À Margem da História (1909).

2.1 Os sertões

Esse livro é dividido em três partes: A Terra, O Homem e A Luta.

A Terra é uma descrição detalhada feita pelo cien-tista Euclides da Cunha, mostrando todas as carac-terísticas do lugar, o clima, as secas, a terra enfim. Nessadescriçãoelesegueosparâmetroscientíficosdeterministas e positivistas para retatar a região, as questões climáticas, o relevo, a fauna e a flora.

O Homem é uma descrição feita pelo sociólogo e antropólogo Euclides da Cunha, que mostra o habitante do lugar, sua relação com o meio, sua gênese etnológica, seu comportamento, crença e costume; mas depois se fixa na figura de Antônio Conselheiro, o líder de Canudos. Apresenta seu

caráter, seu passado e relatos de como eram a vida e os costumes de Canudos, como relatados por vi-sitantes e habitantes capturados. Essas duas partes são essencialmente descritivas, pois, na verdade “armam o palco” e “introduzem as personagens” paraaverdadeirahistória,aGuerradeCanudos,relatada na terceira parte,

A Luta é uma descrição feita pelo jornalista e ser humano Euclides da Cunha, relatando as quatro expedições a Canudos, criando o retrato real só possível pela testemunha ocular da fome, da pes-te, da miséria, da violência e da insanidade da guerra. Retratando minuciosamente movimento detropas,oautorconstantementeseprendeàin-dividualidade das ações e mostra casos isolados marcantes que demonstram bem o absurdo de um massacre que começou por um motivo tolo - Antônio Conselheiro reclamando um estoque de madeira não entregue - escalou para um con-flito em que havia paranoia nacional, pois havia suspeita de que os “monarquistas” de Canudos, liderados pelo “famigerado e bárbaro Bom Jesus Conselheiro” tinham apoio externo. No final, foi apenas um massacre violento em que todos esta-vam errados e o lado mais fraco resistiu até o fim com seus derradeiros defensores - um velho, dois adultos e uma criança.

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54 Capítulo 4

SAIBA MAIS!

A LUTA

Os caminhos e as montanhas que volteavam Canudos estavam fortificados. O Conselheiro rei-

nava naquela comunidade, dormindo sobre tábuas, pregando, alimentando-se com farinha...

Em outubro de 1896, o juiz de Juazeiro, BA, recusou-se a entregar a madeira encomendada para a

construção da igreja nova de Canudos. O Conselheiro ameaçou invadir a cidade. Foi pedido reforço

ao governo.

1ª Expedição. Em novembro de 1896, foi enviada uma pequena expedição, com cento e quatro sol-

dados, comandados pelo Ten. Pires Ferreira. Dia 21, os jagunços os encontraram em Uauá. A tropa

retrocedeu, atacada com facões, bacamartes e aguilhões de vaqueiro e apavorada com os gritos e

vivas dos conselheiristas.

Foi o prelúdio da guerra sertaneja.

2ª Expedição. O major Febrônio de Brito comandou essa expedição, com quinhentos e quarenta e

três soldados, catorze oficiais e três médicos, saindo de Monte Santo, em 12 de janeiro de 1897.

Sem conhecer a guerra naquela região, a tropa foi inesperadamente atacada na estrada que atra-

vessa a Serra do Cambaio. O sertanejo atraía os soldados para a caatinga, que os feria, exaurindo-

-os. A munição acabara, obrigando a tropa a voltar a Monte Santo. Apesar de quatrocentos e

quinze jagunços mortos, esse segundo insucesso militar provocou impacto nacional.

3ª Expedição. Partiu do Rio de Janeiro com mil e trezentos homens, em 3 de fevereiro de 1897,

comandada pelo Cel. Moreira César. Dia 2 de março, sem um plano tático, a tropa entrou e atacou

o arraial, perdendo-se naquele labirinto. Moreira César foi mortalmente ferido, com duas balas,

morrendo no dia seguinte. Foi substituído pelo Coronel Pedro Nunes Tamarindo. A tropa fragmen-

tou-se, dispersou-se, debandou em pânico, desfazendo-se de armas e munições, recolhidas pelos

jagunços. O corpo de Moreira César foi jogado no caminho. Quando atravessava o córrego de

Angico, querendo conter seus homens, o Cel. Tamarindo foi morto. Morreu também o comandante,

Cap. José Agostinho Salomão da Rocha. Comoção nacional. “A República estava em perigo”.

4ª Expedição. Sob o comando do General Artur Oscar, organizaram-se em 5 de abril de 1897, as

forças dessa expedição; quatro brigadas em duas colunas, com quatro mil, duzentos e oitenta e três

soldados. Com roteiros diferentes, as duas colunas se encontrariam em Canudos.

A 2ª coluna, comandada pelo general Cláudio do Amaral Savaget, com dois mil, trezentos e cin-

quenta homens, partiu de Jeremoabo (SE), em 16 de junho, chegando a Canudos pela Serra de

Cocorobó, ao norte, onde venceu os jagunços.

A 1ª coluna, comandada pelo general Artur Oscar Andrade Guimarães, seguiu pelas estradas de

sempre, partindo de Monte Santo (BA), em 19 de junho, com mil novecentos e trinta e três soldados.

Foi atacada no Morro da Favela e depois de insucessos e ataques, juntou-se à 2ª coluna.

Os sertanejos foram encurralados em Canudos, resistindo à superioridade de homens e arma-

mentos, sob os tiros da matadeira (canhão) e de dinamites. Faltaram víveres aos soldados. Para

alimentá-los, muitas rezes e cavalos foram mortos na região. Logo o Ministro da Guerra, Carlos

Machado Bittencourt, os abasteceu. Completou-se o cerco de Canudos, com jagunços enfrentando

fome e sede, bombardeios e incêndios.

Dia 22 de setembro de 1897, uma disenteria quase dizimou os fiéis, matando Antônio Conselhei-

ro. Os sobreviventes defendiam a Aldeia Sagrada. Caiu Canudos em 5 de outubro de 1897, “ao

entardecer, quando caíram seus últimos defensores, que todos morreram. Eram quatro apenas:

um velho, dois homens feitos e uma criança, na frente dos quais rugiam raivosamente cinco mil

soldados. (...) No dia 6 acabaram de destruir desmanchando-lhes as casas, 5.200, cuidadosamente

contadas. (...)”

“Antes, no amanhecer daquele dia, comissão adrede escolhida descobrira o cadáver de Antônio

Conselheiro. (...) Desenterraram-no cuidadosamente. Dádiva preciosa (...)! Fotografaram-no de-

pois. (...)”. Cortaram-lhe a cabeça. “Trouxeram depois para o litoral, onde deliravam multidões em

festa, aquele crânio. (...) Ali estavam (...) as linhas essenciais do crime e da loucura...”

55Capítulo 4

atividade |Pesquise na Internet acerca da obra Os Ser-tões, de Euclides da Cunha e comente no fó-rum qual o desenvolvimento teórico do autor, entre suas convicções deterministas e positi-vistas e o panorama encontrado em Canudos, notadamente sua posição acerca do sertanejo.

3. Lima BarretO

Afonso Henriques de Lima Barreto era mestiço, fi-lho de um tipógrafo e de uma professora, que mor-reu quando ele tinha apenas sete anos. Estudou no Colégio Pedro II e depois cursou engenharia na Escola Politécnica. Ainda estudante, começou a publicar seus textos em pequenos jornais e revistas estudantis.

cronista de costumes do Rio de Janeiro, Lima Bar-reto passou a colaborar para diversas revistas literá-rias como “Careta”, “Fon-Fon” e “O Malho”. Seu primeiro romance, “Recordações do Escrivão Isaías Caminha”, foi parcialmente publicado em 1907, na Revista Floreal,queelemesmohaviafundado.Doisanos depois, o romance foi editado pela Livraria Clássica Editora. Em 1911 Lima Barreto publicou um de seus melhores romances, “Triste Fim de Poli-carpo Quaresma” e em 1915 a sátira política “Numa e a Ninfa”. Militou na imprensa durante esse perí-odo, lutando contra as injustiças sociais e os pre-conceitos de raça, de que ele próprio era vítima. Em 1914 passou dois meses internado no Hospício Nacional, para tratamento do alcoolismo. Nesse mesmo ano, foi aposentado do serviço público por um decreto presidencial.

Em 1919 o escritor foi internado novamente num sanatório. As experiências desse período foram narradas por ele próprio no livro “Cemitério dos Vivos” e no mesmo ano, publicou a sátira “Vida e Morte de M. J. Gonzaga de Sá”, inspirada no Barão do Rio Branco e ambientada no Rio de Janeiro.

Lima Barreto candidatou-se em duas ocasiões àAcademia Brasileira de Letras. Não se elegeu, mas chegou a receber uma menção honrosa. Em 1922 o seu estado de saúde agravou-se rapidamente, cul-minando com um ataque cardíaco. O escritor mor-reu aos 41 anos, deixando uma obra de dezessete volumes, entre contos, crônicas e ensaios, além de crítica literária, memórias e uma vasta correspon-dência.Grandepartedeseusescritosfoipublicadapostumamente.

3.1 triste fim de pOLicarpO Quaresma

O funcionário público Policarpo Quaresma, nacio-nalista e patriota extremado, é conhecido por to-doscomomajorQuaresmanoArsenaldeGuerra,onde exerce a função de subsecretário. Sem muitos amigos,viveisoladocomsuairmã,DonaAdelaide,mantendo os mesmos hábitos há trinta anos. Seu fanatismo patriótico se reflete nos autores nacio-nais de sua vasta biblioteca e no modo de ver o Brasil. Para ele, tudo do país é superior, chegando até a “amputar alguns quilômetros ao Nilo” apenas para destacar a grandiosidade do Amazonas. Por isso, em casa ou na repartição, é sempre incompre-endido. Tal patriotismo leva-o a valorizar o violão, instrumento marginalizado na época, visto como sinônimo de malandragem. Atribuindo-lhe valores

TEXTO COMPLEMENTAR

http://www.orfeuspam.com.br/Apostilas/

LiteraturaBrasileira/PreModernismo/Eucli-

des_da_Cunha_Os_Sertoes_resumo.htm -

Bom resumo de todos os capítulos da obra.

http://www.dominiopublico.gov.br/

pesquisa/DetalheObraForm.do?select_

action=&co_obra=2163 – Link do site

Domínio Público para baixar a obra inte-

gralmente.

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Com o agravamento do estado de saúde de seu pai, que sofria de problemas mentais, abandonou a faculdade e passou a trabalhar na Secretaria de Guerra,ocupandoumcargoburocrático.Grande

56 Capítulo 4

nacionais, decide aprender a tocá-lo com o profes-sor Ricardo Coração dos Outros. Em busca de mo-dinhas do folclore brasileiro, para a festa do gene-ral Albernaz, seu vizinho, lê tudo sobre o assunto, descobrindo, com grande decepção, que um bom número de nossas tradições e canções vinha do estrangeiro. Sem desanimar, decide estudar algo tipicamente nacional, os costumes tupinambás. Alguns dias depois, o compadre, Vicente Coleoni eaafilhada,DonaOlga,sãorecebidosnomelhorestilo tupinambá: com choros, berros e descabela-mentos. Abandonando o violão, o major volta-se para o maracá e a inúbia, instrumentos indígenas tipicamente nacionais.

recebe a visita de Ricardo Coração dos Outros e da afilhada Olga, que não vê todo o progresso no cam-po, alardeado pelo padrinho, mas muita pobreza e desânimonaquelagentesimples.

Depoisdealgumtempo,oprojetoagrícoladeQua-resma cai por terra, derrotado por três inimigos terríveis. Primeiro, o clientelismo hipócrita dos po-líticos. Como Policarpo não quis compactuar com uma fraude da política local, passa a ser multado indevidamente. O segundo, a deficiente estrutura agrária brasileira que o impede de vender uma boa safra sem ter prejuízo. O terceiro, a voracidade dos imbatíveis exércitos de saúvas, que ferozmente de-voravam sua lavoura e reservas de milho e feijão. Desanimado,estende suadoràpobrepopulaçãorural, lamentando o abandono de terras improdu-tivas e a falta de solidariedade do governo, protetor dos grandes latifundiários do café. Para ele, era ne-cessária uma nova administração.

A Revolta da Armada - insurreição dos marinhei-ros da esquadra contra o continuísmo florianista - faz Quaresma abandonar a batalha campestre e, como bom patriota, segue para o Rio de Janeiro. Alistando-se na frente de combate em defesa do Marechal Floriano, torna-se comandante de um destacamento em que estuda artilharia, balística, mecânica.DuranteavisitadeFlorianoPeixotoaoquartel, que já o conhecia do arsenal, Policarpo fica sabendo que o marechal havia lido seu “proje-toagrícola”paraanação.Diantedoentusiasmoeobservações oníricas do comandante, o Presidente simplesmente responde: “Você, Quaresma é um visionário”.

Após quatro meses de revolta, a Armada ainda re-sistebravamente.DiantedaindiferençadeFloria-no para com seu “projeto”, Quaresma questiona-se se vale a pena deixar o sossego de casa e se arriscar, ou até morrer nas trincheiras por esse homem. Mas continua lutando e acaba ferido. Enquanto isso, sozinha, a irmã Adelaide pouco pode fazer pelo sí-tio do Sossego, que já demonstra sinais de comple-toabandono.EmumacartaàAdelaide,descreve--lhe as batalhas e fala de seu ferimento. Contudo, Quaresma se restabelece e, ao fim da revolta, que dura sete meses, é designado carcereiro da Ilha das Enxadas, prisão dos marinheiros insurgentes.

Numa madrugada, é visitado por um emissário do governo que, aleatoriamente escolhe doze prisio-neiros que são levados pela escolta para fuzilamen-

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Ainda nessa esteira nacionalista, propõe, em docu-mento enviado ao Congresso Nacional, a substitui-ção do português pelo tupi-guarani, a verdadeira língua do Brasil. Por isso, torna-se objeto de ridi-cularização, escárnio e ironia. Um ofício em tupi, enviadoaoMinistrodaGuerra,porengano,leva-oàsuspensãoe,comosuasmaniassugeremumclarodesvio comportamental, é aposentado por invali-dez, depois de passar alguns meses no hospício.

Após recuperar-se da insanidade, Quaresma deixa a casa de saúde e compra o Sossego, um sítio no interior do Rio de Janeiro, decidido a trabalhar na terra. Com Adelaide e o preto Anastácio, muda-se para o campo. Anima-o a ideia de tirar da fértil terra brasileira seu sustento e felicidade. Adquire vários instrumentos e livros sobre agricultura e logo aprende a manejar a enxada. Orgulhoso da terra brasileira que, de tão boa, dispensa adubos,

57Capítulo 4

to. Indignado, escreve a Floriano, denunciando esse tipo de atrocidade cometida pelo governo. Acaba sendo preso como traidor e conduzido àIlha das Cobras. Apesar de tanto empenho e fide-lidade,Quaresma é condenado àmorte. Preocu-pado com sua situação, Ricardo busca auxílio nas repartições com amigos do próprio Quaresma, que nada fazem, pois temem por seu emprego. Mesmo contrariando a vontade e a ambição do marido, sua afilhada Olga tenta ajudá-lo, buscando o apoio de Floriano, mas nada consegue. A morte será o triste fim de Policarpo Quaresma.

3.2 recOrdações dO escrivãO isaías caminha

O primeiro romance de Lima Barreto é uma forte críticaàsociedadehipócritaepreconceituosaeaimprensa (de que ele mesmo fez parte). É um livro pungente em todos os sentidos, de leitura obrigató-ria. O jovem Isaías Caminha, menino do interior, tomou gosto pelos estudos por causa da desigualda-de de nível mental entre seu pai, um ilustre vigário, e sua mãe. Admirava o pai que lhe contava histó-rias sobre grandes homens. Esforçou-se muito nas instruções e pouco brincava. Tinha ambições e, um dia, finalmente decide ir para o Rio fazer-se doutor.

“Ah! Seria doutor! Resgataria o pecado original do meu nascimento humilde, amaciaria o suplício premente, cru-ciante e omnímodo de minha cor... Nas dobras do perga-minho da carta, traria presa a consideração de toda a gente. Seguro do respeito à minha majestade de homem, andaria com ela mais firme pela vida a fora. Não titube-aria, não hesitaria, livremente poderia falar, dizer bem alto os pensamentos que se estorciam no meu cérebro. [...] Quantas prerrogativas, quantos direitos especiais, quantos privilégios esse título dava! Podia ter dois e mais empregos apesar da Constituição; teria direito à prisão especial e não precisava saber nada. Bastava o diploma. Pus-me a considerar que isso devia ser antigo... Newton, César, Platão e Miguel Ângelo deviam ter sido doutores!”

Aconselha-se com o tio Valentim. Este visita o Co-ronel Belmiro, chefe eleitoral local, que redige uma cartarecomendandoIsaíasparaoDoutorCastro,deputado. Segue para o Rio com algum dinheiro e essa carta. Instala-se no Hotel Jenikalé, na Praça da República e conhece o Senhor Laje da Silva - diz ser padeiro e é incrivelmente afável com todos, em especial com os jornalistas. Por meio do Sr Laje, conheceodoutorIvãGregoróvitchRostóloff,jor-nalistadeOGlobo,romeno,sentia-sesempátriae

falava 10 línguas. Vai assim conhecendo o Rio de Janeiro.DecideprocuraroDeputadoCastroparaconseguir seu emprego e poder cursar Medicina. Dirige-seaCâmera:“subipensandonoofíciodele-gislar que ia ver exercer pela primeira vez, em plena CâmeradosSenhoresDeputados-augustosedig-níssimos representantes da Nação Brasileira. Não foi sem espanto que descobri em mim um grande respeito por esse alto e venerável ofício [...] Foi com grande surpresa que não senti naquele doutor Cas-tro, quando certa vez estive junto dele, nada que denunciasse tão poderosa faculdade. Vi-o durante uma hora olhar tudo sem interesse e só houve um movimento vivo e próprio, profundo e diferencial, na sua pessoa, quando passou por perto uma for-nida rapariga de grandes ancas, ofuscante sensua-lidade.” Tenta falar com o doutor Castro, mas não consegue. Quando finalmente consegue, visitando a sua residência particular (casa da amante) este o recebe friamente, dizendo que era muito difícil ar-ranjar empregos e manda-o procurar no outro dia. Caminha depois descobre que o deputado estava de viagem para o mesmo dia e é tomado por um acesso de raiva: Patife! Patife! A minha indignação veio encontrar os palestradores no máximo de en-tusiasmo. O meu ódio, brotando naquele meio de satisfação,ganhoumaisforça[...]Gentemiserávelque dá sanção aos deputados, gente que os respeita e prestigia! Porque não lhes examinam as ações, o que fazem e para que servem. Se o fizessem... Ah! Se o fizessem! Com o dinheiro no fim, sem empre-go, recebe uma intimação para ir à delegacia.Ohotel havia sido roubado e prestava-se depoimen-tos. Ao ouvir as palavras do Capitão Viveiros: “E o caso do Jenikalé? Já apareceu o tal “mulatinho”?” Isaías reflete: Não tenho pejo em confessar hoje que, quando me ouvi tratado assim, as lágrimas me vieram aos olhos. Eu saíra do colégio, vivera sempre num ambiente artificial de consideração, de respeito, de atenções comigo [...] Hoje, agora, depois não sei de quantos pontapés deste e outros mais brutais, sou outro, insensível e cínico, mais forte talvez; aos meus olhos, porém, muito dimi-nuído de mim próprio, do meu primitivo ideal [...] Entretanto,issotudoéumaquestãodesemântica:amanhã, dentro de um século, não terá mais sig-nificação injuriosa. Essa reflexão, porém, não me confortava naquele tempo, porque sentia na bai-xeza de tratamento, todo o desconhecimento das minhas qualidades, o julgamento anterior da mi-nha personalidade que não queriam ouvir, sentir e examinar. Levado a presença do delegado, começa o interrogatório:

58 Capítulo 4

- Qual é a sua profissão?- Estudante.- Estudante?!- Sim, senhor, estudante, repeti com firmeza.- Qual estudante, qual nada!

A sua surpresa deixara-me atônito. Que havia nis-so de extraordinário, de impossível? Se havia tanta gente besta e bronca que o era, porque não o podia seu eu?Donde lhe vinha a admiração duvidosa?Quis-lhe dar uma resposta, mas as interrogações a mim mesmo me enleavam. Ele por sua vez, tomou o meu embaraço como prova de que mentia. Com ar de escarninho, perguntou:

- Então você é estudante?

Dessa vez tinha-o compreendido, cheio de ódio,cheio de um santo ódio que nunca mais vi che-gar em mim. Era mais uma variante daquelas tolas humilhações que eu já sofrera; era o sentimento geral da minha inferioridade, decretada a priori, que eu adivinhei na sua pergunta. O delegado con-tinua o interrogatório até arrebatar chamando Ca-minha de malandro e gatuno, que, sentindo num segundo todas as injustiças que vinha sofrendo, chama o delegado de imbecil. Foi para o xadrez. Passa pouco mais de 3 horas na cela e é chamado ao delegado. Este se mostra amável, tratando-o por “meu filho”, dando-lhe conselhos. Caminha sai da delegacia e decide mudar-se também do hotel. Pas-sa a procurar emprego, mas na primeira negação percebe que, devido a sua cor, seria muito difícil se ajustar na vida. Passa dias perambulando pelas ruas do Rio, passando fome, vendendo o que tinha para comer algo, até avistar Rostóloff que o convi-daparadarumpassadana redaçãodeOGlobo- onde passa a trabalhar como contínuo.

Nesta altura, a narrativa sofre um corte. A ação de Caminha é posta de lado para descrever minucio-samente os funcionamentos da imprensa carioca. Todas as características dos grandes jornalistas, desde o diretor de O Globo, Ricardo Loberantaos demais redatores e jornalistas são explicitadas de maneira cruel e mordaz. O diretor é retratado como ditador, temido por todos, com apetite de mulheres e prazer, visando somente ao aumento das vendas do seu jornal. Somos apresentados então a inúmeros jornalistas como Aires d’Avila, redator-chefe, Leporace, secretário, Adelermo Caxias, Oliveira, Menezes, Gregoróvitch. A tô-nicadeOGloboeraa críticaacerbaaogoverno

e seus “desmandos”, Loberant se considerava o moralizador da República. Isaías se admira com a falta de conhecimento e dificuldade para escrever desses homens que nas ruas eram tratados como semi-deuses e defensores do povo. Por esse tempo, Caminha havia perdido suas grandes ambições e acostumava-se com o trabalho de contínuo. É notá-vel o que se diz do crítico literário Floc (Frederico Lourenço do Couto) e do gramático Lobo - os dois mais altos ápices da intelectualidade do Globo.Loboeradefensordopurismo,deumcódigotirâ-nico, de uma língua sagrada. Acaba num hospício, sem falar, com medo que o falar errado o tenha impregnado e tapando os ouvidos para não ouvir. Floc “confundia arte, literatura, pensamento com distrações de salão; não lhes sentia o grande fundo natural, o que pode haver de grandioso na função da Arte. Para ele, arte era recitar versos nas salas, reqüestar atrizes e pintar umas aquarelas lambidas, falsamente melancólicas. [...] as suas regras esté-ticas eram as suas relações com o autor, as reco-mendações recebidas, os títulos universitários, o nascimento e a condição social.” Certa noite, vol-ta entusiasmado de uma apresentação de música e vai escrever a crônica para o dia seguinte. Após algum tempo, o paginador o apressa. Ele manda esperar. Floc tenta escrever o que viu e ouvira, mas seu poder criativo é nulo, sua capacidade é fraca. Ele se desespera. O que escreve rasga. Após novo pedido do paginador, ele se levanta, dirige-se a um compartimento próximo e se suicida com um tiro na cabeça. Estando a redação praticamente vazia, o redator de plantão chama Isaías e pede para que ele se dirija para o local onde Ricardo Loberant se encontra e jurasse que nunca diria o que viu. Isaías vai ao local indicado e surpreende Loberant e Ai-res d’Avila numa sessão de orgia e os chama apres-sadamente para o jornal. Loberant passa então a olhar com mais atenção a Isaías e o promove até repórter.Divideconfidênciasefarras.IsaíasganhaaproteçãoedinheirodeRicardoLoberant.Depoisda euforia inicial, Isaías se ressente. Lembrava-me de que deixara toda a minha vida ao acaso e que a não pusera ao estudo e ao trabalho com a força de que era capaz. Sentia-me repelente, repelente de fraqueza, de falta de decisão e mais amolecido agora com o álcool e com os prazeres... Sentia-me parasita, adulando o diretor para obter dinheiro... Em dado momento do livro, Lima Barreto escreve: “Não é o seu valor literário que me preocupa; é a sua utilidade para o fim que almejo.” Valor literá-rio entenda-se como o “valor” vigente naquela épo-ca, do escrever bonito e empolado, gramaticalmen-

59Capítulo 4

te correto, em busca de palavras desconhecidas em empoeirados dicionários, em busca da forma. Lite-ratura era tudo, menos comunicação e arte.

4. Graça aranha

Escritor e diplo-mata, José Pereira daGraçaAranhanasceu em São Luís, MA, em 1868 e morreu no Rio de Janei-ro em 1931. Em 1902, quando de sua publicação, ‘Canaã’, um dos raros romances simbolistas da história literária brasileira, teve um sucesso exem-plar. Levando-se em conta que, quatro anos antes, seu autor havia sido um dos membros fundadores da Academia Brasileira de Letras, instituição que buscavadarunidadeà literaturadopaís,pode-seavaliaroprestígiodeGraçaAranhanaelite inte-lectual da época. O que não se conseguia imaginar é que esse escritor fosse aderir ao movimento lide-rado pelos modernistas, oferecendo a eles o respal-do de uma seriedade intelectual da qual eles ainda não desfrutavam perante o público. Mas GraçaAranha, autor de um drama encenado em Paris, não apenas contribuiu com a semana, fazendo um discurso de apresentação no Teatro Municipal de São Paulo que investia contra as academias e es-colas que arbitravam as regras do bom gosto e do bom-senso: em 1924, em conferência na própria Academia Brasileira de Letras, desligou-se dessa instituição, alegando que sua criação fora um erro, já que ela não era capaz de admitir ‘‘as forças ocul-tas do nosso caos’’, referindo-se, certamente, aos ideários modernistas.

Obras: Canaã (1902); Malazarte (1911); A Estética da Vida (1921); A Viagem Maravilhosa (1930).

4.1 canaã

Canaã conta a história de Milkau e Lentz, dois jovens imigrantes alemães que se estabelecem em Porto do Cachoeiro, ES. Amigos e antagônicos ao mesmo tempo, Milkau é a integração e a paz, ad-mirando o Novo Mundo, Lentz é a conquista e a guerra, pensando no dia que a Alemanha invadirá e conquistará aquela terra. Ainda assim, ambos se unem e trabalham juntos na terra e prosperam. Mais tarde aparece Maria, filha de imigrantes po-bres, que é abandonada ao léu quando morre seu

TEXTO COMPLEMENTAR

http://pt.wikipedia.org/wiki/Triste_Fim_

de_Policarpo_Quaresma - artigo de Wiki-

pédia sobre a obra de Lima Barreto.

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watch?v=p1TcMS9CXXA – vídeo do Youtu-

be com trechos do filme servindo de base

para tratar do resumo da obra.

SAIBA MAIS!

Policarpo Quaresma, herói do Brasil

é um filme brasileiro de 1998 diri-

gido por Paulo Thiago, baseado na

obra Triste Fim de Policarpo Quares-

ma, de Lima Barreto, adaptado por

Alcione Araújo. Policarpo Quaresma

é um sonhador e um nacionalista

que atua no Congresso e quer que

o idioma tupi-guarani seja o oficial

no Brasil. Embora respeitando em

linhas gerais o enredo de Lima Bar-

reto, essa adaptação toma algumas

liberdades (como criar uma relação

amorosa entre Policarpo e Ismênia

e mostrar o fuzilamento final do

protagonista, que não é descrito no

livro) e satiriza aspectos da política

brasileira atual, como quando um

grupo de sem-terras invade o sítio

do Major Quaresma, “Sossego”.

Elenco: Paulo José .... Policarpo Qua-

resma; Giulia Gam .... Olga; Ilya São

Paulo .... Ricardo; Bete Coelho ....

Adelaide; Antônio Calloni .... Gene-

lício; Othon Bastos .... Floriano Pei-

xoto; Cláudio Mamberti .... Coleoni

atividade |Compare as características do personagem Policarpo Quaresma com os conceitos de Na-cionalismo, Utopia e de Xenofobia e comente no fórum qual a posição da personagem entre esses dois conceitos.

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60 Capítulo 4

protetor e lhe abandona o amante, que pensava ser seu futuro marido. Vagando, tomada como louca e prostituta, é rejeitada até na igreja antes de ser salva por Milkau, que conheceu uma vez em uma festa e vai morar numa fazenda. Lá continua a ser maltratada até que um dia seu filho é morto por porcos e ela é acusada de infanticídio. Na cadeia Milkau passa a visitá-la enquanto ela é repudiada pela cidade inteira. Por fim a salva com uma fuga no meio da noite. A história em si é apenas pano de fundo para as discussões ideológicas entre Milkau e Lentz, somando-se a isso retratos da imigração alemã e da corrupta administra-ção brasileira da época (notavelmente no capítulo VI).

atividades |Pesquise nos “textos complementares” acima indicados e em outras fontes que desejar e comente acerca das posições de pensamento opostas dos dois personagens principais: Mi-lkau e Lentz.

TEXTO COMPLEMENTAR

http://www.orfeuspam.com.br/Apostilas/

LiteraturaBrasileira/PreModernismo/Gra-

ca_Aranha_CANAA_resumo.htm - resumo

mais detalhado do livro do site Orfeu Spam.

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watch?v=U3tU9-lg2iM – vídeo do Youtu-

be, explicativo da obra.

SAIBA MAIS!

A obra é um romance que envolve a imigração de alemães e

conta o dia a dia das colônias, em particular, a vida do alemão

Milkau e da inditosa Maria, uma bela moça que entregou-se

ao filho dos seus patrões; prestava serviços de doméstica e

passou por outras vicissitudes até que conheceu Milkau, que

a levou para outra cidade onde ela foi trabalhar para patrões

ainda mais desprovidos de compaixão, enxotando-a. Deses-

perada, sentindo muitas dores, saiu pela floresta onde deu à

luz a uma criança que foi devorada pelos porcos selvagens

famintos. Acusada de infanticídio, foi presa e maltratada na

cadeia pública do lugarejo, onde foi encontrada por Milkau

que a confortou o quanto pode, mesmo sabendo que sua sen-

tença seria máxima, tendo em vista a convicção da acusação e

da Justiça quanto ao pseudo assassinato. Só Milkau acreditava

em sua inocência. Por isso tirou-a da cadeia e fugiu. O final do

romance é de pura ficção romântico-simbolista. A sua estrutura é de um romance social, realista,

que retrata a inferioridade do brasileiro em sua formação étnica, talvez pela própria vivência do

autor nas colônias e as observações dos colonos alemães sobre os brasileiros. O romance mostra

ainda a faceta obscura da justiça em tratar as questões sempre pendendo para o lado do mais

forte economicamente. Graça Aranha foi da Academia Brasileira de Letras e renunciou à cadeira

por motivos de muita intriga, inveja e outros atributos negativos que permeiam a vida dos inte-

lectuais a seu tempo.

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5. mOnteirO LOBatO

Contista, ensaísta e tradutor, esse grande nome da literatura brasileira nasceu na cidade de Taubaté, interior de São Paulo, no ano de 1882. Formado emDireito,atuoucomopromotorpúblicoatésetornar fazendeiro, após receber herança deixada pelo avô.Diante de umnovo estilo de vida, Lo-bato passou a publicar seus primeiros contos em jornais e revistas e, posteriormente, reuniu uma sé-rie deles em Urupês, sua obra prima. Numa época em que os livros brasileiros eram editados em Paris ou Lisboa, Monteiro Lobato tornou-se também editor, passando a editar livros também no Brasil. Assim, ele implantou uma série de renovações nos livros didáticos e infantis. Esse notável escritor é bastante conhecido entre as crianças, pois se dedi-cou a um estilo de escrita com linguagem simples cuja realidade e fantasia estão lado a lado. Pode-se dizer que ele foi o precursor da literatura infantil no Brasil.

61Capítulo 4

Suas personagens mais conhecidas são: Emília, uma boneca de pano com sentimento e ideias in-dependentes; Pedrinho, personagem que o autor se identifica quando criança; Visconde de Sabu-gosa, a sábia espiga de milho que tem atitudes de adulto; Cuca, vilã que aterroriza a todos do sítio, Saci Pererê e outras personagens que fazem parte da inesquecível obra, O Sítio do Pica-Pau Amarelo, que até hoje encanta muitas crianças e adultos. Escreveu ainda outras incríveis obras infantis, como A Menina do Nariz Arrebitado, O Saci, Fábulas do Marquês de Rabicó, Aventuras do Príncipe, Noiva-do de Narizinho, O Pó de Pirlimpimpim, Reinações de Narizinho, As Caçadas de Pedrinho, Emília no País da Gramática, Memórias da Emília, O Poço do Visconde, O Pica-Pau Amarelo e A Chave do Tamanho.

Fora os livros infantis, esse escritor brasileiro es-creveu outras obras literárias, tais como O Choque das Raças, Urupês, A Barca de Gleyre e o Escândalo do Petróleo. Nesse último livro, demonstra todo seu nacionalismo, posicionando-se totalmente favorá-velàexploraçãodopetróleoapenasporempresasbrasileiras.

Em 1948 o Brasil perdeu esse grande talento que tanto contribuiu com o desenvolvimento de nossa literatura.

5.1 sítiO dO pica-pau amareLO

o PiCaPau amarelo

O Picapau Amarelo teve uma segunda edição em 1939. Nele Lobato narra as aventuras dos perso-nagens do Sítio do Picapau Amarelo quando lá se instalamaspersonagensdomundodafábula.Deforma exemplar, esse livro mistura, na mitologia brasileira do sítio, personagens das mais variadas

origens fantásticas: de personagens da mitologia gregacomoaMedusaeNetunoaoliterárioDomQuixoteeaomoderníssimoCapitãoGancho,pas-sando pela tradição do conto de fadas com Cinde-rela e o Pequeno-Polegar e pelo oriental Codadade das Mil-e-Uma-Noites.

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memórias Da emília

Editado em 1936, Memórias da Emília é um dos li-vros que mais diretamente aborda questões relativas àescrita;asmemóriasdaEmíliasãoescritaspeloVisconde de Sabugosa, revistas e corrigidas pela bo-neca. O livro, em última análise, discute os limites da realidade e da ficção, da história e do romance.

Quanto a seu enredo, narra alguns episódios relati-vosàpermanênciadoanjinhoFlor-das-AlturasnoSítio do Pica-pau Amarelo: as visitas das crianças inglesas,afugadoanjinhodevoltaàViaLáctea,ahipotética viagem de Emília com o anjinho e o Vis-condeàHollywooddeShirleyTemple.Mas,maisque isso, o livro narra-se a si mesmo, isto é, narra o processo de escrita das Memórias.

Tanto na visita das crianças inglesas, que trazem de contrapesoPopeyeeoCapitãoGancho,comonapermanência de Emília emHollywood, ilustra-semagnificamente a expansão do universo fantástico de Lobato, que incorpora elementos de outras mi-tologias, de outros mundos fantásticos, podendo mesmo ser visto como uma “colagem”, tão ao gos-to modernista.

o saCi

Publicado pela primeira vez em 1921, O Saci, en-tão um livrinho de trinta e oito páginas, é um dos livros de Lobato que mais direta e ostensivamente incorpora elementos da cultura brasileira.

62 Capítulo 4

Seguindo conselhos de tio Barnabé, Pedrinho prende um saci numa garrafa e, por meio dele, se inicia nos mistérios das personagens folclóricos da mata brasileira. Posteriormente, a ajuda do saci é decisiva na libertação de Narizinho, capturada pelo Cuca. A história, conduzida linearmente, tem um forte lastro didático: várias conversas entre Pedrinho e o Saci funcionam como debates sobre assuntos relativos à superioridadedohomemnoreino da Natureza.

CaçaDas De PeDrinho

Publicado inicialmente em 1933 pela Cia. Editora Nacional, esse livro é o desenvolvimento de A Ca-çada da Onça, editado pela primeira vez em 1924 pela Editora Monteiro Lobato.

Em sua versão definitiva, o livro constitui-se de duas histórias: na primeira, a captura de uma onça provoca a invasão do sítio por onças, jaguatiricas, iraras e cachorros do mato. As personagens conse-guem escapar graças a uma ideia da Emília: pernas--de-pau e granada de vespas.

A segunda história narra a chegada ao sítio do ri-noceronte Quindim, fugido de um circo. Narra também as tentativas de captura do animal, por parte de forças do governo e não deixa dúvida quantoàvisãocríticadeLobatoemrelaçãoà(in)eficiência da burocracia estatal.

a Chave Do tamanho

Publicada em 1942, essa obra pode ser considera-da como uma alegoria: pretendendo acabar com a guerra, Emília, por engano, reduz a estatura dos seres humanos para alguns centímetros, obrigando a humanidade, assim, a criar uma nova civilização.As intenções revolucionárias da boneca, no en-tanto, tornam-se frustradas por um plebiscito, que vota pelo restabelecimento da estatura antiga. Tal-vez seja interessante estabelecer um paralelo entre o livro e A Reforma da Natureza (publicado um ano antes de A Chave do Tamanho) e este: no livro anterior, a repercussão dos atos “revolucionários” no mundo exterior ao sítio é bem menor, de con-sequências menos - digamos - vitais. A Chave do Tamanho, assim, pode constituir uma espécie de chegada da ficção de Lobato, que nunca abandona preocupações didáticas. Adapt. de texto de Marisa Lajolo

atividades |Algumas análises críticas e ideológicas discu-tem qual era a posição política e ideológica de Monteiro Lobato, alguns mesmo criticam Lobato por algumas posições preconceituosas. Pesquise sobre isso e faça a defesa do autor.

6. auGustO dOs anjOs

Augusto dos Anjos, poeta brasileiro pré-moder-nista, nasceu em 1884, cuja obra, “Eu e Outras Poesias”, só foi publicada dois anos antes de ele

TEXTO COMPLEMENTAR

http://pt.wikipedia.org/wiki/Montei-

ro_Lobato - verbete da Wikipédia sobre

Monteiro Lobato e sua obra.

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watch?v=KD9LdEbvp1I – entrevista de

Monteiro Lobato dada à Rádio Record, em

1948, disponível no site do Youtube.

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watch?v=MvT4KbO_boY – trecho do pro-

grama Sítio do Pica-pau Amarelo, da rede

Globo, disponível no Youtube. Nesse epi-

sódio, netos do Teudorico viram tartarugas.

SAIBA MAIS!

O Petróleo é nosso: “O petróleo é nosso!” é

uma frase que se tornou famosa ao ser pro-

nunciada, por ocasião da descoberta de re-

servas de petróleo na Bahia, pelo então pre-

sidente da república Getúlio Vargas. Mais

adiante, ela se tornou lema da Campanha do

Petróleo, patrocinada pelo Centro de Estudos

e Defesa do Petróleo, promovida por nacio-

nalistas, que culminou na criação da empresa

petrolífera nacional, a Petrobras. Após tornar-

-se famosa, historiadores descobriram que a

frase foi criada por Otacílio Raínho, professor

e diretor do Colégio Vasco da Gama, no Rio

de Janeiro, um marqueteiro casual. Entre a

primeira concessão para exploração de pe-

tróleo no Brasil e a criação da Petrobras, em

1953, decorreram oitenta e nove anos. O país

assistiu à polêmica entre o escritor Monteiro

Lobato e o governo Getúlio Vargas - resumida

na famosa Carta a Getúlio. O Brasil dividiu-se,

então, entre os nacionalistas e os defensores

do capital estrangeiro (apelidados pejorativa-

mente de entreguistas por seus opositores). A

Campanha do Petróleo resultou vitoriosa com

a criação da Petrobras.

63Capítulo 4

morrer. Suas poesias trazem marcantes sentimen-tosdepessimismoededesânimo,alémdeinclina-çãoparaamorte.Comrelaçãoàestrutura,pode-sedizer que suas poesias apresentam rigor na forma e rico conteúdo metafórico.

Assisto agora à morte de um inseto!... Ah! todos os fenômenos do solo Parecem realizar de pólo a pólo O ideal de Anaximandro de Mileto!

No hierático areopago heterogêneo Das idéas, percorro como um gênio Desde a alma de Haeckel à alma cenobial!...

Rasgo dos mundos o velário espesso; E em tudo, igual a Goethe, reconheço O império da substância universal!

7. péthiOn de viLLar

Pethion de Villar, pseudônimo de Egas Moniz Barreto de Aragão, nascido a 4 de setembro de 1870, no solar de seus pais e antepassados, no Lar-go S. Pedro Velho, 36 (hoje Avenida Sete, 64). Filho de Francis-co Moniz Barreto de Aragão (1846-1922 ) e Ana de Lacerda Mo-niz de Aragão (1850-1946). Faleceu no mesmo so-lar em 18 de Novembro de 1924. No ano de 1895 doutorou-se na mais antiga escola superior do Bra-sil, a célebre Faculdade de Medicina da Bahia, hoje integradaàUFBA,defendendoaTeseSíntesedaMedicina. Passou a vida lecionando e clinicando e acima de tudo sendo poeta. Foi um dos fundado-res da Academia de Letras da Bahia, ocupando a cadeira número treze, cujo patrono Francisco Mo-niz Barreto, repentista baiano do início do século XIX.Deixouextensabibliografiacientífica,literá-ria e filosófica, hoje relacionada num livro “Breve Introdução Sobre Pethion de Villar” editado pelo neto JoãoAugustoDidier, Juiz Federal, já faleci-do. Entretanto, de referência a ars poética, em vida publicou apenas um folheto com trinta e nove páginas sob o título “Suprema Epopeia”.

sOnetO para O sécuLO xx Dizem que a arte de Goethe é uma arte anacrônicaCoeva do mamute e das larvas primárias;Que Homero não passou de uma abantesma trágicaVislumbrada através de névoas milenárias;

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Morreu ainda jovem em 1914, por causa de uma enfermidade pulmonar, deixando para trás a car-reiradepromotorpúblico(formou-seemDireitoem 1906) e a de professor, além de sua única e mar-cante obra.

PrinCiPais oBras De augusto Dos anjos

Saudade (poema) – 1900; Eu e Outras Poesias (único livro de poemas) – 1912; Psicologia de um vencido (soneto); Versos Íntimos

O mOrceGO

Meia noite. Ao meu quarto me recolho.Meu Deus! E este morcego! E, agora, vêde:Na bruta ardência orgânica da sede,Morde-me a goela ígneo e escaldante molho.

“Vou mandar levantar outra parede...”— Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolhoE olho o tecto. E vejo-o ainda, igual a um olho,Circularmente sobre a minha rede!

Pego de um pau. Esforços faço. ChegoA tocá-lo. Minh’alma se concentra.Que ventre produziu tão feio parto?!

A Consciência Humana é este morcego!Por mais que a gente faça, à noite, ele entraImperceptivelmente em nosso quarto!

aGOnia de um fiLósOfO

Consulto o Phtah-Hotep. Leio o obsoleto Rig-Veda. E, ante obras tais, me não consolo... O Inconsciente me assombra e eu nêle tolo Com a eólica fúria do harmatã inquieto!

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64 Capítulo 4

Dizem que todos nós lembramos uns ridículosIdólatras senis de coisas funerárias,E andamos a colher - incuráveis maníacos -Em cinzas hibernais, flores imaginárias; Dizem que a Poesia há muito está cadáver;Que a Rima faz cismar num guiso de funâmbuloMonótono, a tinir no trampolim do Verso... Que importa? Se a bendita, essa loucura místicaEntorna em nossa Mágoa o leite do papáverE abre à nossa volúpia o azul de outro Universo?

a eterna incóGnita Donde venho? Quem sou? Que faço aqui no mun-do? Por que vivo na Terra e não em Sírio ou Marte? Talvez sou de algum deus a monstruosa parte? Ou o Antropóide vil, filho do lodo imundo? Sei tudo e nada sei; vazio o Céu profundo! - “Ama”; - pede Jesus; - “Pensa, ” manda Descarte Do formidável X tentando ver o fundo, Noite e dia a Ciência às descobertas parte!... Interrogo ansioso à Natureza inteira E indiferente e má, cala-se a Natureza... Nem um raio de luz dentro desta caveira!... Existência fatal que me abate e me eleva, Não passar de uma torva e estúpida surpresa, E da Treva sair para voltar à Treva!...

atividade |Compare o soneto “A Eterna Incógnita” de Pé-thion de Villar com “Agonia de Um Filósofo” de Augusto dos Anjos e aponte as semelhanças e diferenças no trato do tema.

GLOssáriO

nacionaLismo - ideologia segundo a qual o indivíduodevelealdadeedevoçãoaoEstadoNacional,compreen-didocomoumconjuntodepessoasunidasnummesmoterritório por tradições, língua, cultura, religiãoou inte-ressescomuns,queconstituiumaindividualidadepolíticacomdireitodeseautodeterminar.

Xenofobia -(dogregoξένος,translit.xénos:“estrangei-ro”;eφόβος,translit.phóbos:“medo.”)éomedoirracio-nal,aversãoouaprofundaantipatiaemrelaçãoaosestran-geiros,adesconfiançaemrelaçãoapessoasestranhasaomeiodaquelequeasjulgaouquevêmdeforadoseupaís.Axenofobiapodemanifestar-sedeváriasformas,envol-vendoasrelaçõesepercepçõesdoingroupouendogrupoemrelaçãoaooutgroupouexogrupo,incluindoomedodeperdadeidentidade,suspeiçãoacercadesuasativida-des,agressãoedesenhodeeliminarasuapresençaparaassegurarumasupostapureza.

utoPia - temcomo significadomais comuma ideiadecivilizaçãoideal, imaginária,fantástica.Podereferir-seaumacidadeouaummundo,sendopossíveltantonofu-turo,quantonopresente,masemumparalelo.Apalavrafoicunhadapelosradicaisgregosοὐ,“não”eτόπος,“lu-gar”,portanto,o“não-lugar”ou“lugarquenãoexiste”.UtopiaéumtermoinventadoporThomasMorequeserviudetítuloaumadesuasobrasescritasemlatimporvoltade1516.Segundoaversãodevárioshistoriadores,Morese fascinou pelas narrações extraordinárias de AméricoVespúciosobrearecém-avistadailhadeFernandodeNo-ronha,em1503.Moredecidiuentãoescreversobreumlugarnovoepuroondeexistiriaumasociedadeperfeita.

referÊncias

BELLEZI,Clenir.O Pré-Modernismo.SãoPaulo,Escala,2005.

BUENO,Alexei.O Pré-Modernismo. SãoPaulo,Global,2006.

MOISÉS,Massaud. História da Literatura Brasilei-ra:OSimbolismo[Notadamenteasegundapar-te:BélleÉpoque].SãoPaulo,Cultrix,vol.3,1985.

SEVCENKO,Nicolau.Literatura Como Missão. SãoPaulo,CiadasLetras,2003.

TEXTO COMPLEMENTAR

h t t p : / / p t . w i k i p e d i a . o r g / w i k i / A u -

gusto_dos_Anjos - verbete da Wi-

kipédia sobre Augusto dos Anjos

http://www.orfeuspam.com.br/Apos-

tilas/LiteraturaBrasileira/Simbolismo/

PETHION_DE_VILLAR.htm - página de

Orfeu Spam sobre Péthion de Villar.

h t t p : / / w w w . y o u t u b e . c o m /

watch?v=Bj8TLE4OqVc – interessante ví-

deo baseado no poema “O Morcego” de

Augusto dos Anjos.

SAIBA MAIS!

Um exemplar do Eu faz parte da biblio-

teca da Faculdade de Medicina do Rio de

Janeiro, por causa dos termos científicos

que Augusto dos Anjos utilizava em suas

composições.