linda barrick com john perry a menina que deus...

16
A Miracle for Jen Traduzido do inglês por Isabel Veríssimo LINDA BARRICK com JOHN PERRY A Menina que Deus Despertou Um trágico acidente, um pedido de ajuda e a resposta de Deus

Upload: vuque

Post on 09-Nov-2018

217 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

A Miracle for Jen

Traduzido do inglês por

Isabel Veríssimo

LINDA BARRICK com JOHN PERRY

A Menina que Deus DespertouUm trágico acidente, um pedido de ajuda e a resposta de Deus

11

Índice

PREFÁCIO: ANTES DE COMEÇAR... 3

CAPÍTULO 1 > QUASE PERFEITA 17

CAPÍTULO 2 > «ONDE ESTAMOS?» 29

CAPÍTULO 3 > ENTRE A VIDA E A MORTE 37

CAPÍTULO 4 > O SALÁRIO DO PECADO 51

CAPÍTULO 5 > COMO NÓS ÉRAMOS 63

CAPÍTULO 6 > RECUSANDO -SE A DUVIDAR 75

CAPÍTULO 7 > «NÃO VÃO ACREDITAR NISTO...» 91

CAPÍTULO 8 > OS ALTOS E BAIXOS DA FÉ 105

CAPÍTULO 9 > UM TESOURO DEBAIXO DA CAMA 121

CAPÍTULO 10 > COMEÇAR DO ZERO 141

CAPÍTULO 11 > BATER NO FUNDO 157

CAPÍTULO 12 > NAS MÃOS DE DEUS 177

CAPÍTULO 13 > SUSSURRA ESPERANÇA NO MEU OUVIDO 189

CAPÍTULO 14 > A CRIANÇA MILAGRE 201

CAPÍTULO 15 > AMARGA OU MELHOR 213

A MENINA QUE DEUS DESPERTOU

12

CAPÍTULO 16 > ESTENDER A MÃO 223

CAPÍTULO 17 > ALGUMA COISA É IGUAL? 239

CAPÍTULO 18 > O MELHOR AINDA ESTÁ PARA VIR 255

UMA PALAVRA DE JEN 263

AGRADECIMENTOS 265

NOTAS 267

SOBRE OS AUTORES 269

17

Capítulo 1Quase perfeita

Vossos olhos contemplaram -me em embrião, todos os dias se inscreviam no Vosso livro, até antes que um só deles existisse. SALMO 139 (138):16

Senhor, esta vida que vivo agora não é minha

mas Tua. É Tua para fazeres com ela o que quiseres.

[...] Fica com este ano e com a minha vida e

deixa a Tua glória brilhar! Fica com ela e usa-

-a no seu potencial máximo.

Diário de Jen, três meses antes do acidente

O meu telemóvel estava a tocar.O meu cérebro reagiu automaticamente. Eu sabia que tinha de esti-

car a mão até aos pés e tirar o telemóvel da carteira. Mas o meu corpo não se mexia. Eu não sentia nada, apenas uma sensação de estar presa, como se estivesse enrolada num cobertor de aço.

Abri os olhos. O meu rosto estava esmagado contra um para -brisas de vidro esmagado. Como vim aqui parar? Estou a sonhar? Eu não estava ainda agora com o meu marido e o meu filho a ver Jen, a nossa filha de 15 anos, a cantar no coro no concerto de outono da escola?

Baixei a mão direita para tocar na perna e quando a subi vi que estava cheia de sangue.

A MENINA QUE DEUS DESPERTOU

18

Isto não pode ser real. Senhor, por favor acorda -me!– Mãe? Mãe?!Ouvi Josh chamar -me do banco de trás. Não consegui virar -me para

vê -lo, mas respondi.– Josh! Josh!– Mãe!– Isto é real?! – perguntei. – É um sonho? – Não ouvi uma resposta,

por isso repeti. – Isto é real?– Sim, mãe, é real.Angustiada, exclamei:– Senhor Jesus, ajuda -nos, por favor! Vem em nosso auxílio! Salva -nos!Josh e eu começámos a rezar em voz alta. – Pai, por favor não deixes que a Jen e o Andy morram! Oh, Deus,

ajuda -nos! Por favor, não deixes que eles morram! Tu és todo -poderoso. Podes fazer tudo! Nós precisamos de um milagre!

Depois Andy, o meu marido, começou a mexer -se.– Onde estamos? – perguntou ele, hesitante. – Que está a acontecer?Ele estava em estado de choque e não respondeu a nenhuma das nos-

sas perguntas, mas pelo menos estava vivo. Jen continuava em silên-cio no banco, atrás de Andy.

Como mãe que sou, desejei com todas as moléculas do meu corpo abraçar Josh, tocar -lhe e fazê -lo sentir -se melhor. Queria pegar em Jen e dizer -lhe que a amava. Mas não conseguia mexer -me. O metal esmagado e o vidro partido prendiam o meu corpo como uma sinis-tra luva gigante.

A única coisa que podia fazer era rezar.

> > >

Apenas uma hora antes, estivera sentada no santuário da nossa igreja enquanto a música se espalhava em ondas pela audiência, inundando a sala com sons de louvor e com a energia pulsante de jovens corações a bater ardentemente por Cristo.

Nos dois primeiros versos, o coro manteve -se como acompanhamento enquanto a solista cantava sobre o amor fantástico e inexprimível de

LINDA BARRICK

19

Jesus. Depois, com um aumento do som das cordas e um impulso da bateria, o coro entrou na ribalta musical, cada cantor a mover -se ao ritmo da orquestra, a baloiçar ao som da música, alguns a erguer as mãos enquanto louvavam o seu incrível e todo -poderoso Salvador:

Maravilhoso, glorioso, santo e justo,Vitorioso conquistador, triunfante e poderoso,Curandeiro, salvador, escudo e defesa,Torre forte e meu melhor amigo,Omnipotente, omnipresente, Rei que virá em breve,Alfa, Ómega, Senhor de todas as coisas,Santo, santo, santo é o teu nome!1

De todos os cantores da Academia Cristã Liberty que estavam no palco naquela noite, uma destacava -se especialmente para mim: uma linda aluna do 11.O ano, de cabelo castanho -avermelhado, que parecia transformada pelas palavras e pela música que a rodeavam, completa-mente concentrada em transmitir a sua paixão por Cristo ao público. Talvez fosse porque os monitores de vídeo que flanqueavam o palco estavam sempre a mostrar o seu rosto, resplandecente de entusiasmo. Talvez fosse porque ela estava no fim de uma fila e tinha espaço para se mexer um pouco, enquanto a maioria dos alunos estavam ombro com ombro em degraus.

Ou talvez fosse porque sou mãe dela.Jennifer aguardava há semanas com ansiedade este concerto de

outono, pois queria ter o privilégio de cantar no serviço religioso de domingo à noite para mais de três mil pessoas. Seria o seu primeiro espetáculo com o coro do liceu e Jen adorava novas experiências. Fiquei um pouco surpreendida por ela querer fazer parte do grupo uma vez que, apesar de todos os seus muitos dons e talentos, Jen não tinha aquilo a que eu chamaria uma voz fabulosa. Deus abençoara -a de mui-tas outras formas – ela era aluna de quadro de honra, jogava na equipa principal de futebol e era um elemento da claque principal, premiada a nível nacional – e nunca tinha evidenciado um grande interesse

A MENINA QUE DEUS DESPERTOU

20

pelo coro. Porém, como é típico de Jen, aquilo que lhe faltava em capa-cidade natural foi compensado com entusiasmo e muito trabalho.

O 11.O ano estava a revelar -se o seu melhor ano até à data, parte de um incrível momento de transformação que estava a acontecer diante dos meus olhos. Parecia que apenas ontem Jen andava a correr de um lado para o outro com um boné de basebol e roupas manchadas de lama, a cuspir sementes de girassol. Muitas vezes, eu tinha de lhe implorar que penteasse o cabelo. Agora, estava a transformar -se numa linda jovem. O aparelho fora retirado ao fim de dois anos, revelando um novo sorriso deslumbrante. Há pouco tempo, ela comprara o seu primeiro vestido formal para usar no banquete dos caloiros -finalistas. Eu quase não reconhecera a mulher glamorosa e elegante que saíra do quarto de Jen quando o seu par chegou para vir buscá -la.

Apenas duas noites antes do concerto fui ao jogo de futebol ameri-cano para ver a sua atuação na claque. Ela foi muito exuberante e cheia de vida, dando tudo em todos os saltos como sempre fazia, com o rosto a brilhar de energia e entusiasmo. Agora ali estava ela no palco, tão decidida a dar o seu melhor no coro como fazia na equipa de futebol ou na claque. Não podia sentir mais orgulho da minha preciosa filha. A vida dela parecia quase perfeita!

A música era boa para Jen porque era uma forma nova de ela expres-sar a sua fé. Ela era uma menina simpática e popular, mas guardara sempre os seus pensamentos só para si. Em termos espirituais e emo-cionais, ela era uma pessoa muito discreta. Não falava muito comigo nem com outras pessoas acerca do que lhe ia na mente e no coração. Por muito comprometida que Jen estivesse com Cristo, e por muito que quisesse que os seus amigos conhecessem Cristo como ela conhecia, não era natural para ela dar testemunhos personalizados. Quando o seu grupo de jovens ia, de porta em porta, partilhar o amor de Deus com desconhecidos, ela ficava sempre discretamente atrás e nunca falava.

Na verdade, uma das minhas preces por Jen naquele ano era que ela fosse arrojada. Jen tinha -me pedido que rezasse para que ela encon-trasse uma forma de expressar a sua relação pessoal com Deus em voz alta. A música deu -lhe uma ferramenta para gritar o seu amor. É por isso que penso que ela cantou com um brilho especial naquela noite, na sua estreia musical.

LINDA BARRICK

21

A canção que ela estava a cantar aumentou ainda mais o seu entu-siasmo. «Senhor, Tu És Santo» era uma das suas preferidas, especial-mente a parte no meio, quando o coro assume o comando, descrevendo a inacreditável e incomensurável profundidade e riqueza do amor de Deus. Ela tinha passado a semana inteira a cantar aqueles versos em casa.

Na altura eu não sabia, mas naquela tarde Jen fizera uma referência ao concerto que se aproximava no seu diário. As páginas que escre-via todos os dias no seu diário eram o único lugar onde o espírito profundo e terno de Jennifer Barrick se revelava totalmente. Ali, em cadernos de espiral infantis e simpes, decorados com bolinhas ou per-sonagens de desenhos animados, ela escreveu cartas para Jesus como se Ele fosse o seu melhor amigo. Poucas horas antes, a antecipar este momento no palco, ela dissera -Lhe:

Senhor, só me sinto digna de cantar esta can-

ção estendida no chão a Teus pés! Esta canção

nem sequer consegue descrever -Te em toda a Tua

verdadeira plenitude! Simples palavras não con-

seguem expressar -Te! Senhor, adoro esta canção

pq ajuda a pôr as coisas em perspetiva! Eleva o

Teu nome até às alturas! Tu és digno de todo o

meu louvor! E o único que merece toda a minha

adoração!

A música teve um final grandioso. Antes de soar a última nota, o público composto por pais, amigos e membros da igreja ergueu -se em uníssono e os seus vivas e aplausos encheram o espaçoso santuário da Igreja Batista de Thomas Road, sede da Academia Cristã Liberty e par-ceira no ministério com a Universidade Liberty, onde o meu marido,

A MENINA QUE DEUS DESPERTOU

22

Andy, era diretor das relações com os alunos. Naquela noite ele estava ao meu lado no público, juntamente com o nosso filho Josh, de 11 anos. Tal como o pai, Josh adorava desporto e provavelmente não teria colo-cado o concerto do coro em primeiro lugar na sua lista de preferên-cias para uma saída em família. No entanto, gostou claramente de ver a irmã em palco.

Andy e Josh tinham chegado ao espetáculo pouco antes do início. Jen e eu tínhamos vindo para a igreja sozinhas nessa tarde porque os rapazes estavam a regressar a casa depois de um torneio de base-bol em que Josh participara durante o fim de semana. Estavam com o nosso amigo Dr. Tim Clinton e com Zach, o filho dele, que tam-bém participara no torneio. Megan, a filha de Tim, também cantava no concerto nessa noite, por isso os jogadores pararam em nossa casa para um duche rápido e em seguida vieram para a igreja no carro de Tim. Assim, Andy, os nossos filhos e eu poderíamos voltar para casa juntos. Seria ótimo aproveitar o tempo para ouvirmos as aven-turas uns dos outros. Além disso, Andy sabia que eu detestava con-duzir à noite.

Quando os aplausos pararam e a multidão se sentou, o orador da noite ocupou o seu lugar no púlpito. Naquela noite, o Dr. Ed Hin-dson, o meu pai, pregou sobre profecia. Já ouvi, desde pequena, o meu pai, um conceituado professor da Universidade Liberty, discur-sar milhares de vezes. Os seus conhecimentos, baseados em anos de estudo e ensino do Livro do Apocalipse, inspiraram números incal-culáveis de pessoas. Nesta noite específica, senti que a sua pregação estava especialmente inspirada. No final do sermão, todos os presen-tes pareciam comovidos. Mais de cem pessoas começaram a rezar.

Depois da oração final, a congregação levantou -se e dirigiu -se para as saídas, a murmurar com energia acumulada. Lá fora, a noite estava límpida como cristal, com um toque de outono no ar, invulgarmente fria para princípio de novembro na Virgínia. Josh usava apenas uma T -shirt e calças de ganga, mas dali a pouco estaríamos em casa, por isso não importava. Ao dirigirmo -nos para o parque de estaciona-mento, Andy e eu fizemos questão de recordar vários casais de que estavam convidados para virem a nossa casa, para um jantar improvi-sado depois do concerto e ver o jogo de futebol americano na televisão.

LINDA BARRICK

23

Vi Jen a conversar – sejamos francos, a namoriscar – com o seu namorado, Brandon. De cabelo encaracolado e olhos azuis, ele era um jovem muito atraente. Estava no 12.O ano e acabara de fazer 18 anos, o que tinha começado por colocar as minhas antenas maternas em alerta máximo. No entanto, ao longo dos meses de namoro ele revelara -se um cavalheiro cristão em todos os sentidos. Eu até abrandara a minha regra de «não andar de carro com condutores adolescentes» para dei-xar Jen andar de carro com ele. Como o resto da sua família viria a nossa casa dali a alguns minutos, decidi deixar que ele a levasse a casa.

– Trouxeste o carro esta noite? – perguntei -lhe.– Não, minha senhora – respondeu ele, com os seus impecáveis

modos sulistas. – Vim com os meus pais.Durante um segundo pensei deixar Jen ir com a família Knight.

Depois, apercebi -me de que com os jogos de basebol de Josh e os espe-táculos da claque de Jen, há três semanas que não estávamos todos no carro ao mesmo tempo. Por isso, não fiz a proposta. Seria bom estarmos os quatro juntos de novo, mesmo que a viagem para casa fosse curta.

Entrámos na nossa carrinha Toyota, de 2003, com Andy no volante, eu ao lado, Jen atrás de Andy e Josh atrás de mim. Provavelmente, alguns dos nossos amigos chegariam primeiro a nossa casa, mas não fazia mal; poderiam conversar no jardim durante cinco minutos até nós chegarmos. Estávamos à espera dos meus pais, da mãe e do pai de Andy, do irmão de Andy, John, e dos dois filhos dele, de Brandon e da família dele e dos nossos amigos Robb e Paula Egel. Sempre um marido atencioso, Andy sugeriu que passássemos pelo KFC para com-prar frango frito em vez de eu tentar improvisar alguma coisa tão tarde em casa. Os miúdos concordaram do banco de trás e eu não ia recu-sar um jantar duplamente descansado, sem loiça para lavar no fim.

Tivemos de nos desviar um pouco do caminho para comprar a comida, por isso não seguimos pelo percurso habitual da igreja para casa. Andy estacionou e foi buscar a nossa encomenda e nós esperámos na carrinha. Depois do que pareceu muito tempo, Josh perguntou -me se podia ir lá dentro para saber a que se devia a demora. Eu disse que sim e ele saiu rapidamente, ignorando o frio apesar da fina T -shirt, e entrou decididamente, como apenas um rapaz de 11 anos que vai pro-curar o pai consegue.

A MENINA QUE DEUS DESPERTOU

24

Passados cinco minutos, os meus dois homens saíram com a sua recompensa: quatro baldes grandes de frango KFC acabado de fritar. Andy pousou os dois baldes aos meus pés e Josh pousou os outros dois no banco entre ele e Jen. Ela estava ocupadíssima a enviar men-sagens de texto a Brandon, apesar de o ter visto há dez minutos e de voltar a vê -lo dali a outros cinco. Senti o calor das embalagens nos meus pés. A nossa refeição ainda estaria a escaldar quando chegás-semos a casa.

O telemóvel de Andy tocou. Era John, o irmão dele.– Onde é que vocês estão? – perguntou ele, três quartos a brincar e

um quarto aborrecido. – Estamos à vossa espera à porta, com o resto do grupo! Estão a caminho?

– Sim – descansou -o Andy. – O empregado do KFC teve de fritar mais frango para completar a nossa encomenda, mas chegamos den-tro de cinco minutos.

Andy virou para Waterlick Road, uma rua estreita com dois senti-dos que percorríamos ambos dúzias de vezes por semana e que ficava a cerca de um quilómetro e meio da nossa casa. Era uma estrada de campo antiga com valas de escoamento abertas dos dois lados, que mal deixavam a largura de um carro de espaço entre o alcatrão e a berma. Eu já tinha reparado naquelas valas – o bairro estava a tornar -se demasiado grande para as suas velhas estradas rurais –, mas naquele momento nem sequer pensei nelas. Naquele domingo, a noite estava tranquila e límpida e a lua brilhava no céu negro. Não havia muito trânsito.

Eu estava a antecipar uma casa cheia de amigos e boa camarada-gem apenas a algumas curvas de distância. Faria café e Andy acen-deria a lareira e ligaria a televisão no canal onde ia ser transmitido o jogo de futebol americano. Josh estava ansioso para nos contar as suas grandes jogadas no torneio de basebol e como tinham ganhado o jogo da final. Os meus pais e os pais de Andy estavam ansiosos para se ver e celebraríamos todos juntos um concerto maravilhoso e um sermão inspirado.

Porém, não foi o que aconteceu. Jen não viu Brandon, Josh não nos falou sobre o seu jogo de basebol, Andy e eu não estivemos com os nossos amigos e ninguém comeu frango.

LINDA BARRICK

25

Em vez disso, em apenas alguns segundos as nossas vidas muda-riam para sempre.

> > >

Enquanto estávamos todos sentados na igreja a ouvir Jen cantar, um homem a quem eu chamarei «Carl Johnson», embora esse não seja o seu verdadeiro nome, estava sentado num restaurante do outro lado da cidade a pedir bebidas atrás de bebidas. Carl tinha 26 anos e um longo historial de condução sob o efeito de álcool. A verdade é que naquela noite ele não tinha uma carta de condução válida nem seguro automóvel. Como Carl tinha mais de 20 multas, a sua carta de condução fora suspensa. Ele tinha sido condenado duas vezes por conduzir sob o efeito de álcool e fora detido uma terceira vez, o que depois de uma condenação judicial implicaria uma pena de prisão obrigatória. Essa acusação continuava pendente; caso contrá-rio, Carl estaria preso e fora da estrada naquela noite.

Carl pagou as suas bebidas e cambaleou até à sua pickup Chevy de 1979. Enfiou a chave na ignição, ligou o motor e querenou para Timberlake Road, evitando por pouco outros carros que buzinaram e se desviaram para sair da sua frente. Passados alguns segundos seguia a toda a velocidade pela estrada e embateu lateralmente num Ford Explorer que ia na mesma direção.

Felizmente, aquele condutor, a quem chamarei Don, tinha visto Carl pelo espelho retrovisor e preparou -se o melhor possível na fra-ção de segundo que antecedeu o impacto. Corrigiu a derrapagem e seguiu Carl, ligando para o 112 enquanto conduzia.

– Fomos atingidos por uma pickup... e o condutor não para! – comunicou Don. Continuou a seguir o veículo ondulante e a trans-mitir informações ao operador do 112. – Ele está a descer Waterlick Road em direcção à [autoestrada] 881.

– Este tipo só pode estar bêbedo – disse Don. – Está sempre a mudar de faixa e segue nos dois sentidos da estrada.

Mais tarde, soubemos pela polícia que o teor de álcool que Carl tinha no sangue era de 3,1 gramas por litro no local do acidente, muito

A MENINA QUE DEUS DESPERTOU

26

acima o limite legal para conduzir depois de beber. A mãe e a namo-rada de Don, que também viajavam no SUV, começaram a rezar para que Deus protegesse quem estivesse na estrada enquanto a pickup em mau estado seguia a grande velocidade. A próxima vítima pode-ria não ter tanta sorte.

Don seguiu Carl até uma rua residencial sem saída. Passado um minuto, Carl fez inversão do sentido de marcha e voltou para o cruza-mento da autoestrada 881 com a Waterlick Road. Adormeceu ao volante e ficou parado durante vários semáforos verdes. A pickup continuava a trabalhar e engatada, e apenas o pé de Carl no travão impedia o veí-culo de deslizar para o meio do cruzamento. Já tinham passado 20 minutos desde que Don ligara para o 112 e ele perguntava a si mesmo o que devia fazer.

Por fim, um agente da polícia chegou ao local e abriu rapidamente a porta da pickup. O polícia comunicou que encontrou um homem branco com a cabeça no volante e que havia um forte cheiro a álcool no veículo. O agente puxou o travão de mão e acordou Carl. Em seguida, ordenou -lhe que estacionasse o veículo, desligasse a ignição e lhe entre-gasse um documento de identificação.

Ainda em linha com o operador do 112, Don disse que o homem estava a sair do veículo.

– Então, agora ele está a falar com o agente? – perguntou o operador.– Sim – respondeu Don.Passados dois minutos, o agente da polícia mandou Carl voltar para

o veículo e ficar lá.Não se passa um dia sem que eu revisite aquele momento em pensa-

mento. Porque é que o polícia não algemou Carl e o prendeu no banco traseiro do seu carro? Ou, no mínimo, porque é que não lhe tirou as chaves? Obviamente, o suspeito estava completamente embriagado. Se o polícia o tivesse impedido de conduzir mais, o futuro da família Barrick teria sido muito diferente.

Depois de mandar o imprudente condutor ficar quieto, o agente da polícia dirigiu -se ao Explorer para ouvir o que Don tinha para dizer sobre o incidente. Parou junto ao vidro do lado do condutor enquanto Don começava o seu depoimento e depois recuou para acenar a um carro que ia a passar.

LINDA BARRICK

27

De repente, Carl ligou o motor da pickup e acelerou com um chiar de pneus e borracha queimada. Passou pelo semáforo da 811 e entrou na Waterlick Road – a 130 quilómetros por hora na noite escura.

Direito a nós.Se não tivéssemos ido ao concerto naquela noite, se não tivéssemos

decidido ir comprar frango ou se não tivéssemos de esperar mais tempo do que o habitual pela encomenda, não estaríamos a percor-rer a Waterlick Road naquele momento. Mas estávamos, e na direção contrária a Carl, a cerca de um quilómetro de casa. Poucos minutos antes, quando se dirigia para a nossa casa, John, o irmão de Andy, tinha visto a pickup de Carl, parada num semáforo verde com as luzes apagadas. Ele imaginou que um desgraçado qualquer tinha deixado cair alguma coisa no chão do carro e estava a tentar apanhá -la. Agora, John estava no nosso jardim com os filhos Amanda e Andrew e com os nossos outros convidados à espera que nós chegássemos com a chave de casa e o frango.

Andy abrandou a carrinha para fazer a conhecida curva imediata-mente antes do cruzamento da Waterlick com a 811, onde viraríamos à esquerda para entrar no nosso bairro.

Eu tinha -me voltado para trás e conversava com Jen, que estava um pouco nervosa porque toda a família de Brandon ia lá a casa pela pri-meira vez. Ela estava a telefonar a uma amiga que morava perto de nós para convidá -la para ir à festa.

– Ela não atende – disse Jen. – Achas que deixe uma mensagem?Não tive tempo para responder. De repente, Andy gritou:– Cuidado!Não ouvi um impacto, não senti uma colisão, não senti dor, nada.

O mundo ficou simplesmente preto.