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Eficiencia Energetica Rede Sarah K.TRANSCRIPT
Lelé: o mestre da arte de construir
17/04/2012
A vida deste carioca tomou rumo quando ele abraçou a missão de construir a superquadra
108, em 1957. Ali, o recém-formado arquiteto João Filgueiras Lima, o Lelé, conheceu os
primeiros desafios e iniciou a amizade com Oscar Niemeyer. “Foi uma experiência de vida
com sabor de aventura. Começamos erguendo infraestrutura para os operários. O prazo
apertado levou à industrialização e à pré-construção”, conta Lelé.
Em 1962, no Centro de Planejamento da Universidade de Brasília (UnB), iniciou a construção
dos prédios da instituição. Era responsável pelo curso de arquitetura e por desenvolver
projetos de Niemeyer. “Tínhamos que interpretar a intenção dele e executar.” Talvez por isso
Lucio Costa (1902-1998) tenha descrito Lelé como o construtor de Brasília, enquanto
Niemeyer era o criador. A amizade entre os dois perdura. “Oscar foi uma espécie de mentor
intelectual. É generoso, solidário e leal, coisas hoje raras, mas fundamentais”, diz Lelé.
Mas a contribuição de Lelé para a arquitetura vai além da parceria com Niemeyer. Pioneiro
em sistemas de pré-moldagem com concreto e argamassa armada, fez escolas e creches de
modo rápido e econômico. Por mais de 30 anos projetou para a rede pública de hospitais
Sarah Kubitschek. Foi onde suas pesquisas com tecnologia e o planejamento dos espaços
alcançaram a plenitude. “Lelé começou a empregar o aço, material mais barato, com
liberdade, espaços e curvas”, comenta Cláudio Queiroz, professor da Faculdade de
Arquitetura da UnB. Seu apuro construtivo garante o conforto ambiental e humaniza centros
de atendimento e reabilitação, com ventilação e iluminação naturais, enfermarias abertas e
painéis de Athos Bulcão. Hoje presidente do Instituto Brasileiro de Tecnologia do Habitat
(IBTH), em Salvador, Lelé pretende criar um centro de tecnologia. “A fábrica será suporte
para ensino, pesquisa e vai produzir todos os elementos para edificações de interesse
social”, conta.
O Sarah-Lago Norte, centro de neurociências e reabilitação, tem três blocos erguidos com
pré-fabricados de aço e argamassa, cobertos por sheds metálicos. “Gosto muito da área de
reabilitação infantil, a cobertura foi inspirada numa lona de circo. Dentro, num picadeiro
central, acontecem atividades coletivas, o pessoal de apoio se organiza em volta”, explica
Lelé, na foto diante do novo Sarah-Rio: “O melhor projeto é sempre o último!”
A obra de Lelé é uma conversa entre arquitetura, design e engenharia. No primeiro hospital
Sarah Kubitschek (1980), inovou nos pré-moldados de concreto. Na ampliação (1995 a 1997),
aparecem sheds – cobertura usada em fábricas para facilitar iluminação e ventilação –, que
ele redesenhou e adaptou. As estruturas saíam do CTRS, o Centro de Tecnologia da Rede
Sarah, em Salvador, coordenado pelo arquiteto.
Biografia
Biografia
João Filgueiras Lima (Rio de Janeiro RJ 1932). Arquiteto, urbanista, construtor. Forma-se em
1955 na Escola Nacional de Belas Artes – Enba, no Rio de Janeiro. Recém-formado, trabalha
como desenhista no Instituto dos Aposentados e Pensionistas – IAP, e em 1957 recebe a
incumbência de desenvolver e acompanhar a construção dos alojamentos de operários em
Brasília. Mudando-se para a futura capital do Brasil, em início de construção, Lelé envolve-se
na pesquisa de componentes industriais para obras em grande escala, estudo que o leva, em
seguida, a viagens para países do bloco socialista europeu. Entre meados dos anos 1960 e
início dos 1970, realiza seus primeiros projetos autorais: a residência para a embaixada da
África do Sul, 1965, e as sedes das montadoras Disbrave-Volkswagen, 1965, Planalto
Automóveis-Ford, 1972, e Codipe-Mercedes Benz, 1973, todos em Brasília. Usando os
sistemas pré-fabricados de construção em série, esses projetos demonstram sua capacidade
de especulação formal para componentes de concreto armado, consolidando uma linguagem
própria. Suas primeiras fábricas de pré-moldados são montadas em Salvador, em 1979, para
projetos urbanos criados pelo prefeito Mario Kertész (1945).
Procurando otimizar o transporte das peças e o trabalho nos canteiros de obras, desenvolve
estudos com um material mais leve: a argamassa armada. Esse trabalho tem
prosseguimento nas escolinhas de Abadiânia, 1982, no interior de Goiás, na “fábrica de
escolas” do Rio de Janeiro, em 1984, e na Fábrica de Equipamentos Comunitários – Faec,
1985, em Salvador, voltada para a produção de peças de equipamento urbano: escada,
arrimo, canaleta pluvial, banco, ponto de ônibus, passarela etc. As “fábricas de hospitais”,
montadas para a construção da rede Sarah Kubitschek, para tratamento de doenças do
aparelho locomotor, se iniciam concomitantemente a essas, abrindo um campo experimental
que ultrapassa a fabricação de elementos construtivos unicamente arquitetônicos, incluindo
objetos hospitalares. A maior conquista técnica desses projetos refere-se à qualidade do
sistema de ventilação e iluminação natural, que ajuda no processo de cura dos pacientes.
Vale observar que a relação de Lelé com o programa hospitalar, que se torna íntima, nasce
de um acontecimento fortuito: um acidente de automóvel com sua esposa, em 1963, que o
leva a conhecer Aloysio Campos da Paz (1934), médico que depois preside a Fundação das
Pioneiras Sociais dos Hospitais Sarah Kubitschek. Posteriormente, o mesmo sistema de
iluminação, ventilação e pré-fabricação de componentes é aplicado em projetos de tribunais
de contas e centros administrativos municipais em diversas capitais brasileiras. Seu
reconhecimento em âmbito internacional se consolida com o prêmio da Bienal Ibero-
Americana de Arquitetura e Urbanismo, em Madri, 1998; a Sala Especial na Bienal de Veneza
de 2000; e o Grande Prêmio Latino-Americano de Arquitetura da 9ª Bienal Internacional de
Arquitetura de Buenos Aires, em 2001.
Obra Destaque:
Hospital Sarah Kubitschek
Local Rio de Janeiro, RJ
Início do projeto 2001
Conclusão da obra 2008
Área do terreno 80.000 m2
Área construída 52.000 m2
Arquitetura João Filgueiras Lima (autor); Ana Amélia Monteiro e André Borém (equipe)
Superintendência administrativa Francisco A. N. Filho
Coordenação técnica Adriana Filgueiras Lima
Coordenação administrativa Walmir Bulhon
Paisagismo Beatriz Secco
Obras de arte Athos Bulcão
Instalações Kouzo Nishiguti
Estrutura Roberto Vitorino
Conforto térmico George Raulino
Metalurgia Waldir Silveira (pesada) e Hurandyr Matos (leve)
Marcenaria e plásticos Jurandir Amorim
Pré-moldados Tomaz Bacelar
Equipamentos Hurandyr Matos, Cláudio Blois Duarte e Antônio Carlos Correia
Fotos Celso Brando
Hospital Rede Sarah - Rio de Janeiro
Técnica e arte a serviço da cura09/10/2008 | Notícia | Revista AU - Arquitetura & Urbanismo - Outubro 2008
A essência da arquitetura desenvolvida por João Filgueiras Lima ao longo de mais de 30 anos
acaba de gerar um novo fruto, o Hospital Sarah Kubitschek do Rio de Janeiro. O complexo
impressiona não apenas por suas dimensões excepcionais, com 52 mil m² de área
construída, compatíveis com o amplo espectro do atendimento pretendido (toda a região sul
do País). Impressiona sobretudo pela riqueza e diversidade do tratamento plástico do
conjunto. Como marca do arquiteto, aqui também comparecem as grandes coberturas
onduladas, distintas das soluções convencionalmente adotadas em edificações do gênero e o
originalíssimo volume do auditório - uma calota esférica que ora lembra uma oca indígena,
ora evoca uma lona de circo, abrindo para o céu qual uma flor.
Elementos complementares, mas não menos importantes ganham desenho peculiar. É o caso
da cobertura sobre a ligação entre as duas edificações, que exibe uma graciosa ondulação, e
da plataforma do solário, uma elegante estrutura capaz de associar engenho e arte. O
extenso espelho d'água colocado à frente do hospital responde a funções paisagísticas,
climáticas e técnicas. No entanto, pelas sensações que evoca, constitui-se num primeiro e
fundamental recurso de humanização do ambiente construído.
Localizado em um terreno de 80 mil m² próximo à Lagoa de Jacarepaguá, o edifício mantém
premissas de há muito adotadas nos demais hospitais da rede, como, por exemplo, a solução
horizontal com áreas de tratamento e de internação integradas a espaços verdes; a
flexibilidade dos espaços internos, potencializada em função das dimensões do complexo; e
o sistema de iluminação natural para todas as áreas, com exceção do centro cirúrgico e das
salas de equipamentos, cuja necessidade imperiosa de assepsia, entre outras razões
técnicas, teve de receber luz artificial.
Foram criados sistemas alternativos de ventilação natural e de ar-condicionado, privilegiando
o primeiro de modo a permitir que os ambientes se mantenham abertos durante a maior
parte do ano. Para tanto, o arquiteto projetou grandes coberturas com pé-direito variável, o
mais baixo com 8 m, formando imensos sheds cuja disposição é totalmente desvinculada da
organização dos espaços internos. Os forros planos dos ambientes são constituídos de peças
basculantes de policarbonato guarnecidas por caixilhos metálicos. Os espaços
compreendidos entre os forros e as coberturas, com pé-direito sempre superior a 4 m,
compõem, num só tempo, um grande colchão de ar ventilado e um difusor da luz solar que
penetra pelos sheds.
Os apartamentos da internação se desenvolvem em dois níveis e suas respectivas
circulações se integram a um espaço central de convivência com pé-direito duplo, servido
por rampa com traçado ondulado. Um teto em arco cobre esse ambiente, assim como os
espaços contíguos destinados a fisioterapia e hidroterapia, guarnecidos por caixilhos de
policarbonato que se abrem por um sistema motorizado de correr, permitindo a ventilação
natural de todos os locais.
Solário e auditório
O solário é um espaço de fundamental importância no processo terapêutico dos pacientes,
razão de sua presença obrigatória nos hospitais da rede Sarah Kubitschek. Por estar
localizado sempre na área externa dos edifícios, permite variados e ricos exercícios formais
do arquiteto, como nos hospitais da rede em Fortaleza (1991) e Belo Horizonte (1993). No
presente caso, é composto por duas plataformas metálicas retangulares de 180 m², uma em
cada nível dos dois pavimentos da internação acessíveis por elevador hidráulico.
O auditório de 400 lugares ganha neste projeto do Sarah-Rio destaque especial por sua
forma plástica original e pela implantação, à frente do complexo. Tem base circular com 36
m de diâmetro e, no topo, uma semi-esfera com 13 m de diâmetro constituída de gomos
móveis executados em alumínio. Tal recurso permite, conforme a conveniência, tanto
escurecer quanto iluminar e ventilar naturalmente o auditório. O sistema de acionamento é
todo motorizado, dado o pé-direito de 18 m.
Essa forma geométrica tem sido adotada em outros projetos da rede Sarah, como o do Lago
Norte, em Brasília (2000), porquanto permite ser produzida industrialmente. No caso desse
hospital do Rio, no entanto, a abertura foi disposta em posição excêntrica, ou seja,
deslocada, de modo a incidir luz sobre o palco. Uma elegante marquise com deflexão no
trecho central permite a passagem de ônibus de grande altura e privilegia o uso do auditório
por outras instituições, enquanto a ligação com o hospital se dá pelo subsolo.
As possíveis inundações provocadas pela elevação do nível da Lagoa de Jacarepaguá levaram
os órgãos da prefeitura a desaconselhar a implantação de pavimentos abaixo daquela cota.
Assim, foi evitado o emprego de galerias semelhantes às dos demais hospitais da rede
porque implicaria aterros onerosos. Um grande lago com 300 m de extensão foi construído à
frente do edifício, no nível de seu piso técnico. Desempenha funções importantes de
ambientação e de redutor de temperatura, mas especialmente a de evitar os riscos de
inundação, ao captar as águas pluviais de todo o lote, lançando-as diretamente na Lagoa de
Jacarepaguá.
Sistema construtivo
A estrutura do auditório compreende vigamento radial de dupla curvatura engastado em anel
metálico superior e em anel de concreto inferior apoiado em pilares também de concreto.
As plataformas que compõem a estrutura do solário são engastadas em cada um dos lados
de um pilar de treliça metálica, rotulado ao nível do solo. O sistema estrutural é completado
por quatro tirantes ancorados no solo e no topo do mastro e que constituem também os
apoios laterais das plataformas.
A estrutura do piso técnico é constituída de vigamento metálico vencendo vãos de 2,50 m,
3,125 m, 3,75 m e 5 m, e apoiado em pilares também metálicos que recebem, por sua vez,
as cargas das lajes pré-fabricadas em argamassa armada com 0,625 m de largura e
comprimentos variáveis de 1,875 m, 2,50 m, 3,125 m ou 3,75 m. Essas lajes possuem
armação de incorporação ao contrapiso armado executado após sua montagem.
Com a implantação desse hospital, passam a ser duas as unidades da rede Sarah no Rio de
Janeiro. A primeira é um Centro de Reabilitação, também situado em Jacarepaguá. Em
ambas, bem como nos demais hospitais da rede, o arquiteto Lelé contou sempre com a
íntima colaboração do artista Athos Bulcão, recentemente falecido, que criou belíssimos
painéis que dão vida aos principais espaços hospitalares. Arte a serviço da cura.
DISCIPLINA E LIBERDADE
Passados mais de 30 anos desde que desenvolveu o projeto do hospital de Brasília (1976-
1980), seu primeiro encargo para a Rede Sarah Kubitschek, João Filgueiras Lima, o Lelé,
acompanha os instantes finais do canteiro de obras do Hospital Sarah no Rio de Janeiro.
Como era de se esperar, o projeto do Sarah-Rio desenvolve e aprofunda a agenda
arquitetural e política que caracteriza a trajetória em tudo excepcional de Lelé. No Rio,
ademais dos princípios gerais definidos já naquele primeiro projeto para a Rede Sarah, são
visíveis os desdobramentos dos estudos desenvolvidos, no final dos anos 1980, para três
hospitais em argamassa armada (Hospitais Sarah em Curitiba, São Luís e Salvador) e,
sobretudo, do seminal projeto para o Hospital Sarah de Salvador (1991), a primeira unidade
desenvolvida a partir da linha de produção industrial do Centro de Tecnologia da Rede Sarah
(CTRS), projetado e dirigido por Lelé.
Como no hospital de Brasília, o projeto do Sarah-Rio é pautado pelos princípios da
flexibilidade e expansibilidade da construção, da criação de espaços verdes, da flexibilidade
das instalações, da iluminação natural e do conforto térmico dos ambientes, e, finalmente, da
padronização dos elementos construtivos. Como no caso do hospital de Salvador, o Sarah Rio
é o desdobramento de um conjunto de metas firmadas no âmbito do contrato de gestão
estabelecido entre a Associação das Pioneiras Sociais (leia-se, Rede Sarah de hospitais) e o
Governo Federal - notadamente a de "projetar e executar as obras destinadas à implantação
da rede, com base em princípios de industrialização, visando economia, rapidez na
construção e criação de conveniente unidade construtiva entre todas as edificações da
associação", conforme o próprio arquiteto registrou na obra João Filgueiras Lima, Lelé
(Instituto Lina Bo e P.M. Bardi e Editora Blau).
Uma visita ao canteiro do Sarah Rio deixa claro, no entanto, que não é apenas, nem
sobretudo, a persistência ou a manutenção desse ou daquele princípio projetual, nem
tampouco a suposta obstinação de Lelé, aquilo que cumpre destacar. Pois o que salta aos
olhos - e emociona - é, antes, a constatação da potência de uma arquitetura que, a cada
projeto, reafirma sua inequívoca capacidade de atualização. E isso não obstante o
compromisso com a industrialização e a padronização.
Como demonstrou Ana Luiza Nobre em sua tese de doutorado pela PUC-Rio, intitulada Fios
cortantes. Projeto e produto, arquitetura e design no Rio de Janeiro (1950-1970), o intocado
prestígio da forma compositiva no contexto arquitetural brasileiro sempre implicou uma
enorme desconfiança vis-à-vis da forma, digamos, produtiva, vale dizer, a forma pensada do
ponto de vista de sua produção e reprodução segundo a lógica industrial. Donde um certo
consenso de que uma arquitetura pensada segundo os princípios da industrialização
(portanto "padronizada") tenderia a ser menos livre que aquela concebida pela mão que,
sem peias, especula sobre a folha de papel.
Ora, o que Lelé vem provando há décadas por meio de sua prática projetual é que tal
interpretação apenas revela nossa incapacidade de compreender e de explorar
produtivamente outros conceitos de forma - nomeadamente, aqueles regidos pela lógica
industrial. Despreparo, diga-se de passagem, muito bem ilustrado pela dificuldade que
nossos chefes de fileira modernos - Costa e Niemeyer - sempre tiveram de compreender a
arquitetura moderna que não fosse a lecorbusieriana.
No caso do hospital Sarah-Rio, fica patente que a lógica e a disciplina industriais em nada
limitaram o desenvolvimento e a complexificação dos aspectos não propriamente
compositivos, mas legitimamente formais do edifício. Por limitação de espaço, destaco
apenas um aspecto do projeto: a relação - e o conseqüente papel que desempenha para a
geração da forma do edifício - entre (1) padronização e repetição dos elementos construtivos
e (2) interpretação do programa de necessidades. A conjugação desses dois determinantes
certamente concorreu para a opção por um edifício térreo (vale lembrar, trata-se de um
hospital para pacientes com limitações de mobilidade), que se desenvolve horizontalmente a
partir da definição de uma seção padrão.
O que cumpre destacar na ocorrência é precisamente o aproveitamento que Lelé tira desses
constrangimentos. Pois sua seção padrão, aparentemente gestual e plástica, gera, na
prática, linhas horizontais de um rigor e de um potencial formal invulgares. Em certa medida,
toda a operação de Lelé no Sarah-Rio pode ser interpretada do ponto de vista desse gesto ao
mesmo tempo simples e radical: promover o deslocamento linear de uma seção padrão. E ele
o faz de maneira não menos radical. A prova disso é que, diferentemente de alguns projetos
de Reidy (que, não obstante, parece ser o arquiteto brasileiro com quem Lelé mais dialoga
aqui) e, mais ainda, de Artigas, não há, por regra, no Sarah-Rio, elementos estruturais
eloqüentes e expressivos, cuja função seria (como no caso de um e de outro predecessores)
ritmar ou pontuar o desenvolvimento espacial da seção padrão.
Ao contrário, o que sobressai, sobretudo externamente, é a repetição - no limite, infinita - de
elementos de dimensões modestas, como caixilhos, guarda-corpos, brise-soleils. Elementos
que, vistos à distância, perdem seu caráter singular e se dissolvem em uma grade linear
contínua.
Contrariando uma forte tendência da arquitetura moderna brasileira (originalmente
interpretada por Sophia S. Telles), não há aqui, portanto, necessidade de "fazer cantar os
pontos de apoio". Em conseqüência, o que resulta dessa operação não é a exaltação do peso,
ou, por outra, a glorificação de uma arquitetura que, com muito esforço, como que
heroicamente (bem ao gosto de nossa modernidade), suporta seu peso próprio.
É, sim, o aproveitamento arquitetônico máximo (leia-se, estético) do movimento linear e
horizontal (continuado, persistente, disciplinado) de uma seção padrão. Um movimento que,
não por acaso, remete ao homem e à mulher que se deslocam (com seus pés ou, na
impossibilidade de fazê-lo, em cadeiras de rodas ou macas móveis) sobre o chão, ao abrigo
do sol e da chuva. Coerentemente, a forma resultante não é (e não poderia ser), nem pura
abstração geométrica (mesmo que algumas fotos insistam no contrário), nem pura alegoria
da linha de montagem industrial. É, antes, a interpretação arquitetônica do movimento
mundano, ancestral, do homem que percorre e ocupa o território (e nesse ponto já parece
lícito falar na espacialidade de Wright).
E não surpreende que, desse gesto radical, surjam conseqüências marcantes do ponto de
vista da paisagem. Aqui, talvez, caiba falar de Brasília. Afinal, foi em Brasília, na aridez de um
sítio cuja paisagem ainda estava por redefinir, que Lelé formou-se, de fato, arquiteto. Na
Barra, no entanto, o arquiteto não encontrou uma paisagem por fazer (ou, como ocorreu com
Le Corbusier e, depois dele, com Lucio Costa, uma paisagem natural por revelar), mas sim
uma paisagem arrasada.
Pois nessa paisagem, caracterizada por torres bisonhas e galpões anódinos, em meio ao
pesadelo kitsch em que se transformou a Baixada de Jacarepaguá, as horizontais de Lelé
surgem como elementos redefinidores, capazes de instaurar, interna e externamente,
acontecimentos plásticos que, de algum modo, resgatam e redimem - sem revolta, sem
alarde - uma paisagem perdida.
O vazio existente entre o prédio principal (internação e ambulatório) e o bloco de serviço é,
nesse sentido, um dos pontos altos do projeto. Orientado no sentido norte-sul (seguindo a
orientação de todos os blocos projetados, implantados perpendicularmente à linha do mar),
faz ressurgir uma relação hoje perdida na Barra e que esteve na base da reflexão de Costa
para a definição de seu plano. Nesse espaço, entre linhas horizontais e superfícies brancas,
em um pátio-corredor que coloca entre parêntesis o pesadelo edificado que o cerca, restitui-
se, inesperadamente e por força da arquitetura de Lelé, o que o "mau destino" (palavras de
Lucio Costa) roubou dos cariocas: a relação muito especial entre a planície, a montanha, o
mar e o céu da Barra.
Em uma sociedade pautada pelo improviso, a operação - e a beleza! - radical, rigorosa,
didática e atualíssima do Sarah-Rio é também comovente nesse sentido: candidamente, nos
convence a todos de que disciplina é também liberdade.
Otavio Leonídio é arquiteto, doutor em história e professor da PUC-Rio (Pontifícia
Universidade Católica do Rio de Janeiro).
O autor agradece a atenção e a solicitude de Adriana R. Filgueiras Lima, arquiteta-chefe do
canteiro de obras do Sarah-Rio, a cuja competência tanto deve o sucesso do projeto.
Sistemas especiais de ventilação e conforto térmico
A ventilação e o conforto térmico dos ambientes são proporcionados pela seleção de três
alternativas distintas:
1 - ventilação natural, executada exclusivamente pelos basculantes dos tetos planos ou pelas
aberturas dos tetos em arco;
2 - ventilação natural forçada por meio de dutos visitáveis, que insuflam nos ambientes o ar
captado por unidades fan-coil no piso técnico. A extração do ar é feita através dos
basculantes do teto parcialmente abertos;
3 - ar refrigerado insuflado pelos mesmos dutos descritos acima, impulsionado pelas
unidades fan-coil, que passam a receber circulação de água gelada produzida na central
localizada no pátio de serviço. Nesse caso, os basculantes do teto plano e as aberturas dos
tetos em arco do salão central da internação, da fisioterapia e da hidroterapia serão fechados
por sistema motorizado acionado por interruptores ou por controle remoto.
No centro cirúrgico, salas de equipamentos do setor de imagem e em alguns ambientes
especiais, a iluminação é sempre artificial.
Nessas áreas, os basculantes de policarbonato são substituídos por forros metálicos.
FICHA TÉCNICA
Projeto e coordenação técnica: João Filgueiras Lima
Superintendência administrativa: Francisco A. N. Filho
Coordenação técnica: Adriana Filgueiras Lima
Coordenação administrativa: Walmir Bulhon
Equipe de projetos: Ana Amélia Monteiro, André Borém
Paisagismo: Beatriz Secco
Integração de obras de artes: Athos Bulcão
Instalações: Kouzo Nishiguti
Estrutura: Roberto Vitorino
Conforto térmico: George Raulino
Metalurgia pesada: Waldir Silveira
Metalurgia leve: Hurandy Matos
Marcenaria e plásticos: Jurandir Amorim
Pré-moldados: Tomaz Bacelar
Equipamentos: Hurandy Matos, Cláudio Blois Duarte, Antônio Carlos Correia
João Filgueiras Lima (Lelé) formou-se em 1955 pela Universidade do Brasil (atual UFRJ). Mudou-se para Brasília dois anos depois para trabalhar na implantação da nova capital do país, interessando-se pela construção industrializada, que o levou à argamassa armada. Entre outros projetos, desenvolveu diversas unidades da Rede Sarah
Duque Design
Interiores, Mobiliario, Paisagismo
15. 3266 1833 – 9124 0993 – 9124 0886
www.duque.arq.br
Carolina Lopes ABD 9724
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Sorocaba, Votorantim, Boituva, Iperó, Porto Feliz e Tatui
****TECNICAS E INTALAÇOES DOS BRISES
Cabana da memória18/05/2011 | Notícia | Revista AU - Arquitetura & Urbanismo - Maio 2011
Na UnB, Lelé projeta um memorial para seu amigo Darcy Ribeiro, com biblioteca e auditório.
De forma circular, o espaço garante o conforto térmico e a engenhosidade característicos das
obras de Lelé
Tanto pode lembrar um disco voador (o lado empreendedor de Darcy Ribeiro), quanto uma
maloca indígena (o lado antropólogo) - assim Lelé define o Memorial erguido na UnB, um
projeto que reflete a dicotomia entre o passado e o modo de ser de Darcy.
Foi o próprio Darcy Ribeiro quem incentivou Lelé a aprender como os índios construíam.
Partindo do princípio de que a concepção estrutural de um prédio é fundamental, Lelé
estudou a forma primitiva e intuitiva com que os índios Xinguanos construíam as suas
cabanas, desenvolvendo uma tecnologia passada de geração em geração. "A cabana dos
índios é uma coisa linda. Possui ventilação, até um shed como esses que utilizo em meus
trabalhos. Tem uma cumeeira por onde sai o ar quente", explica Lelé. "No projeto da
Fundação Darcy Ribeiro, a grande cobertura tem um sentido um pouco disso, pode-se
interpretar tanto como uma nave espacial quanto como uma cabana indígena. Depende da
sensibilidade de quem vê. Não que eu tenha pensado em fazer isso. O que queria resolver
realmente era a questão de um espaço que todo mundo dominasse, exatamente como Darcy
sempre foi: ele interagia com todo mundo. Nada como uma forma circular para criar esta
unidade espacial", conclui.
Do primeiro desenho às propostas futuras, houve pequenas adaptações, logo no começo do
projeto, Darcy Ribeiro pediu a criação de um beijódromo. "Um espaço ao ar livre, na grama,
nos degraus - um espaço bem a gosto de Brasília, em que podia fazer seresta, as pessoas
poderiam estar em volta se beijando, namorando. Para uso noturno, principalmente",
explicou Darcy Ribeiro. Lelé, então, situa o beijódromo do lado oposto ao acesso principal,
um anfiteatro ao ar livre distribuído na encosta de uma elevação ajardinada contornando
parcialmente o lago.
Em 1997, Darcy Ribeiro faleceu e o projeto ficou engavetado. Em 2008, a Fundação Darcy
Ribeiro contata novamente Lelé. O terreno escolhido por Darcy, localizado na Praça Maior da
UnB, estava livre. Mas contingências financeiras postergaram mais uma vez o projeto. Em
2009, o reitor da UnB, José Geraldo de Sousa Junior, apresenta o projeto à comunidade
acadêmica da UnB e à sociedade, em uma audiência pública. O Poder Executivo, pelo
Ministério da Cultura, assina um convênio de cooperação para a construção do espaço,
investindo 8,5 milhões de reais na obra.
A terceira versão apresentada por Lelé traz modificações aos projetos anteriores. O
beijódromo, que inicialmente seria descoberto, ganha uma cobertura em forma de concha
em telha metálica pré-pintada branca para dar maior flexibilidade ao espaço.
A área total coberta é de 2-454,92 m², ao custo de aproximadamente 2 mil reais o m² -
incluindo a área urbanizada de 3-235,94 m² com um lago de 1.028 m².
A escada retilínea, com guardacorpo de vidro, desloca-se para fora do círculo central,
evitando a interferência sonora na biblioteca, situada no pavimento superior. Lelé contorna o
problema do ruído excessivo com uma solução engenhosa: bloqueia a parte inferior com um
círculo de vidro delimitando o jardim central, que prossegue até o pavimento superior,
faceando a laje do primeiro piso e se transformando no guarda-corpo da biblioteca, a 1,10 m
de altura. Evita, desta forma, a descontinuidade do espaço, integrado visualmente pelo
jardim central. O elevador metálico, com fechamento de vidro, permanece na periferia do
círculo central ajardinado.
No térreo, uma porta, diametricamente oposta à entrada principal, conduz o usuário ao
beijódromo, que agora passa a ser um auditório com 200 lugares. Uma parede curva de
argamassa armada funciona como um anteparo, resguardando o acesso ao bloco principal e
servindo de fundo do palco elíptico elevado.
O edifício circular de dois pavimentos, com 32,20 m de diâmetro interno e 37 m de diâmetro
de cobertura, tal uma tenda de circo (ou uma maloca, como preferia Darcy Ribeiro), lança-se
para o alto em sua parte central, atingindo 14,80 m no topo da cúpula, que acolhe embaixo
um espaço circular ajardinado, de 12 m de diâmetro e pé-direito duplo.
A cobertura é composta de telhas especiais dobradas de chapa pré -pintada de aço
galvanizado branco, com proteção interna de bidim e forro obilongo metálico por baixo. Na
parte correspondente à projeção do jardim interno, uma grande claraboia garante a
luminosidade natural, e é formada por telhas de policarbonato transparente com 6 mm de
espessura, que se sobrepõem uma às outras até o anel de compressão da cúpula, e sobre
este uma veneziana metálica com cobertura também metálica. Na primeira versão do
projeto, Lelé chegou a cogitar revestir todo este espaço central com fibra de vidro, única
opção viável quando a produção de policarbonato ainda não havia se instalado no Brasil.
Enquanto isso, placas verticais metálicas fecham lateralmente o anfiteatro dos dois lados.
Desejando manter o caráter informal que Darcy Ribeiro tanto queria e resolver o problema do
escurecimento para projeção durante o dia, Lelé desenha grandes estruturas pivotantes
retilíneas, que chegam quase ao teto. Largas de 1 m possuem altura variável de acordo com
a cobertura, alcançando, a mais alta, 5,20 m. Estas placas, funcionando como brises, podem
ser fechadas ou abertas, controlando a incidência da luz e proporcionando maior conforto
sonoro.
Conforto ambiental
O espelho d'água forma um anel com diâmetro externo de 52 m em volta do edifício, e
nebulizadores de água no lago são acionados nos períodos secos, criando uma espécie de
névoa. Essas gotículas de água, por evaporação, resfriam o ar que penetra no ambiente.
O ar chega pelas janelas das salas que circundam o térreo e, na parte superior, por orifícios
de 2 mm do beiral do anel circular externo, fechado por uma chapa de ferro perfurada. O ar
fresco, penetrando pela periferia do prédio, circula por todo o ambiente antes de ser extraído
por cima.
Engenhoso, Lelé constrói seu próprio exaustor, de rotação baixa e silencioso, com diâmetro
aproximado de 2,5 m, acoplado na cúpula e dissimulado por uma rosácea em fita metálica -
idéia já aplicada no auditório do Tribunal de Contas da União de Salvador (1995).
Lelé não desenhou um memorial, menos ainda uma fundação, biblioteca ou beijódromo.
Desenhou o sonho do amigo Darcy Ribeiro, sua última morada, a casa que ficou lhe devendo
desde os anos 1960, quando, desbravando a imensidão do cerrado, impressionava-se com o
céu repleto de estrelas que se confundia com a linha do horizonte.
A estrutura
A estrutura da cobertura, composta de 32 vigas curvas radiais em perfil, "I" (com 40 cm de
altura e banzos inferior e superior de 20 cm). apoia-se internamente no anel de compressão
da cúpula, de 2.60 m de diâmetro, e, no outro extremo, está engastada na ponta do balanço
externo do pórtico do piso superior, composto também de 32 vigas radiais em perfil "I" de
alma cheia (com 45 cm de altura e banzos inferior e superior de 20 cm). Estas vigas, por sua
vez, são engastadas em 32 pilaretes metálicos, dispostos na periferia da construção, e nas
vigas transversinas que formam o anel circular interno. Distribuindo sua carga para 16
pilares metálicos tubulares, situados entre duas linhas de forças principais. Ao deslocar
lateralmente os pilares internos, Lelé simplifica o esquema estrutural, reduzindo-os. Todos os
pilares estão apoiados no solo.
O sistema, devido às cargas do vento, cria empuxos laterais, fazendo com que os pilares da
periferia absorvam momentos. A laje de concreto do primeiro piso é integrada à estrutura de
aço. O concreto, ao penetrar nas vigas transversinas, solidariza a laje de concreto com a
estrutura metálica, eliminando a ferragem negativa. Desta forma, ela absorve os empuxos e
participa do travamento de todo o sistema, dando o contraventamento necessário à
estrutura. Ao nervurar a laje, Lelé diminui sua espessura, evitando também a necessidade de
contrapiso.
A parede de alvenaria de concreto, que fecha internamente as salas do térreo, ajuda também
no contraventamento estrutural, uma vez que o pórtico metálico possui balanços
significativos dos dois lados - o balanço interno, próximo ao círculo central, é de 1.60 m, e o
externo, na periferia que acolhe as vigas radiais da cobertura, de 2,70 m.
Uma cobertura em forma de concha metálica branca fecha o espaço do beijódromo. Com
forro de chapa dobrada, apoia-se em dez vigas curvas de perfil "I". Trata-se de uma estrutura
independente, apoiada diretamente na fundação, pelo lado externo, e em cinco pilares
radiais tubulares, por onde desce a água pluvial, na parte interna.
Ficha técnica
Arquitetura: João Filgueiras Lima (Lelé)
Desenvolvimento da arquitetura: Vicente Munoz Dias e Annamaria Binazzi
Estrutura: Paulo Roberto de Almeida Freitas
Execução da obra: Adriana Rabelio Filgueiras Lima
Fornecedores
Corte e dobra de chapas: Irmãos Gravia
Aço da estrutura: Usiminas
Malhas de aço para concreto e argamassa e dramix: Belgo Mineira
EXTRA:
Zanettini e Panamericana lançam livro “A boa arquitetura de uma geração”27/08/2010 | Notícia | Met@lica - 27/07/2010
Foi lançado hoje, na Universidade Mackenzie, o livro “A boa arquitetura de uma geração”,
projeto idealizado pelo arquiteto Siegbert Zanettini, em conjunto com a Panamericana Escola
de Arte e Design, no ano de comemoração dos 50 anos história de atuação profissional e
acadêmica do arquiteto.
A obra é fruto da exposição homônima, inaugurada em outubro de 2009, na Panamericana
Escola de Arte e Design. A iniciativa reuniu 18 arquitetos brasileiros ícones no cenário
mundial: Aflalo&Gasperini Arquitetos, Botti Rubin Arquitetos, Candido Malta Campos Filho,
Carlos Bratke, Dácio Ottoni, Decio Tozzi, Eduardo de Almeida, João Filgueiras Lima – Lelé,
João Walter Toscano, Joaquim Guedes – in memoriam, Paulo Bruna, Paulo de Mello Bastos,
Paulo Mendes da Rocha, Reinaldo Pestana, Roberto Loeb, Ruy Ohtake, Sidonio Porto e
Siegbert Zanettini.
Agora, com o apoio do CBCA - Centro Brasileiro da Construção em Aço e da ABCEM –
Associação Brasileira da Construção Metálica, a mostra se transformou em uma publicação
especial com tiragem de 2.000 exemplares, que será enviada gratuitamente a todas as
universidades de arquitetura do Brasil. “O objetivo do livro é estimular o estudo e a difusão
de conhecimento na área de arquitetura, enriquecer os acervos das bibliotecas com uma
produção de excelente qualidade e valorizar a história de nosso país”, afirma Zanettini.
Além do lançamento, a Universidade Mackenzie recebeu a exposição itinerante “A boa
arquitetura de uma geração”. Os painéis criados pelo grupo dos 18 profissionais ficarão
expostos no prédio nove da universidade até o dia 3 de setembro. A visitação é aberta ao
público e a entrada é gratuita.