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JURISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA

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JURISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA

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EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO RECURSO ESPECIAL NQ 150.079 - SP

(Registro n Q 97.0069589-1)

Relator: O Sr. Ministro Fernando Gonçalves

Embargante: Atacadão S/A Distribuição, Comércio e Indústria

Advogados: Drs. Fernando Eduardo Prison e outros

Embargados: V. Acórdão de fls. 1.031 e Estrutécnica S/A Indústria, Comércio e Construções

Advogado: Dr. Ruy Celso Legaspe

EMENTA: Embargos declaratórios. Omissão. Pedido recursal alternativo.

1. Quando o pedido recursal é formulado alternativamente, ou seja, o direito nele perseguido pode ser efetuado, na dicção de Moacyr Amaral Santos, "por mais de uma forma, cada uma suficien­te para satisfação da pretensão", atendido o primeiro, o segundo, em conseqüência, estará prejudicado. Não há, portanto, omissão no acórdão que, atendendo ao primeiro pleito, reputou prejudi­cados os demais.

2. Embargos rejeitados.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­tos e das notas taquigráficas a se­guir, por unanimidade, rejeitar os embargos de declaração. Participa­ram do julgamento os Ministros Vi­cente Leal e Luiz Vicente Cernic-

chiaro. Ausentes, por motivo de li­cença, o Ministro William Patterson e, justificadamente, o Ministro An­selmo Santiago.

Brasília, 05 de março de 1998 (data do julgamento).

Ministro VICENTE LEAL, Presi­dente. Ministro FERNANDO GON­ÇALVES, Relator.

Publicado no DJ de 30-03-98.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998. 315

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RELATÓRIO

O SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES: Versa a espécie so­bre embargos de declaração opostos por Atacadão S.A. - Distribuição, Comércio e Indústria contra acór­dão que, em matéria de locação, aco­lhendo parcialmente recurso espe­cial, decidiu:

"Locação. Acordo firmado ante­riormente à propositura de reno­vatória. Fixação de novo aluguel nesta última. Conciliação dos numerários. Inteligência do art. 19, da Lei n Q 8.245/91.

1 - Nos termos da jurisprudên­cia da Corte, o acordo firmado entre locador e locatário, elevan­do o aluguel, ainda que a valores abaixo daqueles praticados pelo mercado, interrompe o prazo para a propositura de revisional, ou seja, somente poderá ser fixa­do novo valor locatício após trans­corrido o prazo de 3 (três) anos previsto no art. 19, da Lei nº 8.245/91. O fato de ter sido pro­posta ação renovatória pelo re­corrente, e nela novo aluguel fi­xado, não elide o comando cogen­te do citado dispositivo legal, ra­zões pelas quais, vigora, confor­me preconizado no especial, den­tro de um determinado período do contrato renovado, aquele va­lor estipulado no acordo firmado entre o locatário-recorrente e a locadora -recorrida.

2 - Recurso especial conhecido em parte." (fls. í.031)

Aduz a embargante, no essen­cial, que, em se tratando de pedi­dos "alternativos por subsidiarieda­de", o acolhimento parcial do pri­meiro, torna necessário o exame da segunda postulação, mostrando-se, neste ponto, omisso o julgado, em relação ao período restante da loca­ção, subseqüente a 25 de agosto de 1995.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES (Relator): A embar­gante firmou acordo com sua loca­dora e o especial teve por objetivo único a prevalência da norma do art. 19 da Lei nº 8.245/91, aduzin­do, em síntese, o seguinte:

"a) ser reconhecida e decretada a impossibilidade de se fazer nova revisão judicial do aluguel antes do prazo de três anos, es­tabelecendo-se como locativo da renovação aquele acordado entre as partes na ação consignatória ou aquele fixado na ação revisio­nal, com reajustes semestrais, ou

b) em sucessão alternativa, ser arbitrado como aluguel nesta re­.1Ovatória aquele constante da contraproposta feita pela locado­ra na contestação desta ação re­novatória ($ 28.869,09 - moeda da época, equivalente a Cr$ 329.890,41, em maio de 1993, se­gundo atualização do Sr. Perito), ou

c) ainda alternativamente e em sucessão, pede seja anulado o V.

316 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998.

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Acórdão e determinada a volta dos autos ao Egrégio Tribunal a quo, para que seja proferida no­va decisão como se entender de direito e examinada em toda sua amplitude a causa de pedir recur­sal posta pela recorrente na ape­lação." (fls. 762)

Dentro dos limites traçados, o acórdão acolheu o primeiro pedido, ficando ipso facto, dada a alterna­tividade, prejudicados os demais. O fato foi destacado às fls. 1.027, ver­bis:

"Como se vê, inicialmente, pre­tende0 recorrente seja reconhe­cida a vulneração ao art. 19, da lei de locações e, caso assim não se entenda, em pedidos sucessi-

vos e alternativos, sejam analisa­das as demais fundamentações.

Assim é que, cinge-se o especial somente à fixação da correta exe­gese do referido art. 19, porquan­to, acerca do assunto, merece co­nhecimento a irresignação."

O pedido formulado no especial, como visto, é alternativo, ou seja, o direito nele perseguido pode ser efe­tuado, na dicção de Moacyr Ama­ral Santos, "por mais de uma for­ma, cada uma suficiente para satis­fação da pretensão". Atendido o pri­meiro, o segundo, em conseqüência, estará prejudicado.

Não cabia, na verdade, ao acór­dão avançar além do tempo previs­to no art. 19 da Lei n Q 8.245/91.

Assim sendo, rejeito os embargos.

HABEAS CORPUS NQ 3.299 - SP

(Registro n Q 95.0009742-7)

Relator: O Sr. Ministro Vicente Leal

Relator Designado: O Sr. Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro

Impetrantes: Cyro Kusano e outro

Impetrado: Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo

Paciente: Osvaldo Ribeiro de Mendonça - pensionista

EMENTA: HC - Direito Penal - Culpa inconsciente - Romo medius - Negligência representa não observância dos parâme­tros do dever de cautela, juridicamente impostos a qualquer pes­soa, no momento em que realiza a conduta. A antevisão do fato deve traduzir-se de modo concreto e não de modo abstrato. O Di­reito Penal da culpa é incompatível com o antigo homo medius. A investigação da conduta deve ser individual.

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ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­tos e das notas taquigráficas cons­tantes dos autos, por maioria, con­ceder a ordem de habeas corpus, vencido o Sr. Ministro-Relator. La­vrará o acórdão o Sr. Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro. Os Srs. Minis­tros Adhemar Maciel e Anselmo Santiago votaram com o Sr. Minis­tro Luiz Vicente Cernicchiaro.

Brasília, 29 de maio de 1995 (da­ta do julgamento).

Ministro LUIZ VICENTE CER­NICCHIARO, Presidente e Relator (designado).

Publicado no DJ de 22-06-98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO VICENTE LEAL: Trata-se de habeas corpus substitutivo de recurso ordinário impetrado contra acórdão do Tribu­nal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo, que denegou o writ requerido em favor de Osvaldo Ri­beiro de Mendonça, denunciado com outros co-réus como incursos nas penas do art. 121, § 3º (uma vez) e art. 129, § 6º c/c art. 70 (dez vezes), ambos do Código Penal, em razão de acidente envolvendo uma Pickup e um caminhão que transportava trabalhadores rurais.

Por via do presente habeas cor­pus pretende o denunciado o tran­camento da ação penal por ausên-

cia dejusta causa, alegando, em sín­tese, que a sua conduta é atípica, vez que não teria contribuído para a eclosão do resultado danoso, sen­do apenas o proprietário do cami­nhão que transportava os trabalha­dores. Sustenta que a sua respon­sabilidade deriva, tão-somente, da inobservância de norma regulamen­tar do Código. de Trânsito.

Ao prestar informações, o ilustre Juiz Hélio de Freitas, Presidente do TACRIM, esclareceu, in verbis:

"Por fatos ocorridos no dia 12 de setembro de 1992, foram o pa­ciente e outros co-réus denuncia­dos, perante o MM. Juízo da E. Vara Distrital de Colina, da Co­marca de Barretos, como incur­sos no art. 121, § 3º (uma vez) e art. 129, § 6º (por dez vezes), c.c. o art. 70, todos do Código Penal (doc. nº 1), com base nos elemen­tos colhidos na fase indiciária (doc. nº 2).

Recebida a denúncia (doc. nº 3), expediu-se carta precatória para citação pessoal do paciente, que, porém, restou infrutífera (doc. nº 4). Determinado o chama­mento por edital (doc. nº 5) e não comparecendo para o interroga­tório, decretou-se a revelia do pa­ciente, com a nomeação de defen­sor dativo, que ofereceu a defesa prévia (doc. nº 6).

Após a designação de audiên­cia para o início da instrução, fei­ta para o dia 22 de março transa­to, foram os autos remetidos a esta Corte em 9 de março último, atendendo à minha requisição, pa-

318 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998.

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ra a elaboração destas informa­ções (doc. n Q 7).

Esclareço, ainda, que o pacien­te impetrou, neste Tribunal, os Habeas Corpus nM 266.048/9 que a E. Oitava Câmara desta Corte, por votação unânime, de­negou (doc. n Q 8) e 272.960/0, e que se encontram em fase de re­messa à douta Procuradoria Ge­ral de Justiça (doc. n Q 9)".

A douta Subprocuradoria Geral da República, em parecer de fls. 242/246, opina pela denegação do writ.

É o relatório.

VOTO - VENCIDO

O SR. MINISTRO VICENTE LEAL (Relator): A pretensão con­densada no presente writ funda-se, essencialmente, na alegação de fal­ta dejusta causa para a ação penal, ao fundamento de que o paciente não participou do fato que deu en­sejo ao acidente de tráfego, sendo apenas proprietário do caminhão.

Todavia, é de se considerar que o paciente foi denunciado por homi­cídio culposo, merecendo destacar­se, a propósito de sua responsabili­dade em face do evento, as precisas informações do ilustre Juiz de Di­reito que preside o processo, verbis:

"N esse particular e ad argu­mentandum tantum, a argu­mentação trazida pelos impe­trantes, no sentido de que o pa­ciente não teve participação no evento, é matéria que demanda

prova e, portanto, foge às estrei­tas e específicas raias do remé­dio heróico. De fato, infere-se do conteúdo de sua peça inicial, que o paciente Oswaldo Ribeiro de Mendonça está sendo processado, pelo simples fato de ser o proprie­tário do veículo sinistrado. Entre­tanto, ao se proceder à leitura da peça inicial acusatória, nota-se que, na realidade, a situação não se afigura tão singela como ale­gada. Pelo ·que se depreende da­quela peça, a responsabilidade do paciente reside no fato de ser a pessoa de quem eram emanadas as ordens para que seus empre­gados fossem transportados em veículo que não oferecia a míni­ma condição de segurança, nem tampouco era destinado ao trans­porte de pessoas. Assim, nos ter­mos da denúncia, a responsabili­dade do paciente estaria situada na ausência do necessário dever de cautela, ao ordenar e consen­tir uma prática irregular, em to­tal desrespeito à condição huma­na dos empregados, cujos resul­tados lesivos, pelas próprias ca­racterísticas do caso em exame, eram plenamente previsíveis. Por­tanto, a denúncia não se fundou, apenas, na condição de proprie­tário, do paciente, mas, sim, na conduta de permitir (por ação ou omissão) a prática de um ato, cujo resultado danoso lhe era total­mente previsível, em face das condições e circunstâncias que o envolviam. Dessa forma, somen­te após a necessária e regular instrução do feito, é que se pode­rá valorar a conduta do paciente

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e concluir se foi ou não responsá­vel pelo evento." (fls. 238).

Constata-se, à vista dessas infor­mações, que a conduta imputada ao paciente adequa-se em princípio, à modalidade de culpa por negligên­cia, já que não teria examinado as condições do caminhão de sua pro­priedade que transportava seus empregados, trabalhadores rurais.

Como é sabido, a culpa caracte­riza-se pela inobservância do cuida­do objetivo necessário, este funda­do na previsibilidade aferida a par­tir da possibilidade de antevisão do resultado por um homem comum, prudente e de discernimento, colo­cado diante de situações concretas.

A culpa tem como modalidades a imperícia, imprudência e negligên­cia.

A propósito do conceito de negli­gência, merece registro o magisté­rio de Damásio de Jesus:

"A imprudência é a prática de um fato perigoso. Ex.: dirigir veí­culo em rua movimentada com excesso de velocidade.

A negligência é ausência de precaução ou indiferença em re­lação ao ato realizado. Ex.: dei­xar arma de fogo ao alcance de uma criança.

Enquanto na negligência o su­jeito deixa de fazer alguma coisa que a prudência impõe, na impru­dência ele realiza uma conduta que a cautela indica que não deve ser realizada. A doutrina ensina que a imprudência é positiva (o

sujeito realiza uma conduta) e a negligência, negativa (o sujeito deixa de fazer algo imposto pela ordem jurídica)". (in Direito Pe­nal- 1 Q volume - Parte Geral­ed. Saraiva - 16ª edição, 1992).

N o caso, não se trata de culpa in re ipsa ou presumida. De fato, quem emprega na sua atividade econômi­ca veículo sem segurança para trans­portar "bóiàs-frias" tem pelo menos a previsibilidade da ocorrência de evento danoso, não se podendo fa­lar em responsabilidade objetiva. Trata-se de infringência ao dever médio de cuidado na vida de rela­ção. É que o Direito exige que as pessoas direcionem com cuidado suas condutas no sentido de evitar danos aos outros, sob pena de res­ponder por negligência quem omite esses cuidados necessários que nas circunstâncias não era possível ig­norar.

Em tal contexto, a instauração de procedimento criminal para apura­ção de fatos que apresentam a fei­ção de crime culposo não pode ser, em seu nascedouro, trancado por habeas corpus, sem que se tenha uma precisa visão do tema.

Com efeito, o trancamento da ação penal em sede de habeas cor­pus só se viabiliza quando a ausên­cia de justa causa é evidenciada pela simples exposição dos fatos ou quando se constata que há imputa­ção de fato atípico ou ausência de qualquer elemento indiciário, con­figurador da autoria do delito.

N a hipótese, o trancamento da ação penal só seria possível se a ati-

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picidade da conduta do paciente fos­se evidenciada pela simples exposi­ção dos fatos, sem a necessidade de exame de matéria probatória, o que inocorre no caso sub examen.

Isto posto, denego a ordem.

É o voto.

VOTO- VOGAL

O SR. MINISTRO LUIZ VICEN­TE CERNICCHIARO: Srs. Minis­tros, a matéria posta a julgamento já foi apreciada por esta Egrégia Sexta Turma. Na ocasião, tive opor­tunidade de mencionar, negligência representa a não observância dos parâmetros do dever de cautela, ju­ridicamente imposto a qualquer pessoa no momento em que realiza a conduta.

Mencionei, também, a previsibi­lidade, elemento vinculado à moda­lidade de culpa inconsciente, há de se traduzir, hip.oteticamente, de modo concreto e não de modo abs­trato, a antevisão do fato. Necessá­rio que a pessoa, ao praticar a con­duta, sem guardar os limites do de­vido dever de cautela, mentalmen­te, antecipe que um caso "x", por­tanto, concreto, poderá acontecer. J amais, entretanto, extraia-se a conclusão de que, hipoteticamente naquele caso, seria possível alguém imaginar qualquer acontecimento.

Além disso, já é cediço no direito penal, não só brasileiro como de ou­tros países, ser imprescindível o agente, concretamente, dar causa

ao evento. Aliás, a expOSlçao de motivos de 1940, no item XIII, fo­caliza exatamente esta hipótese:

"No tocante à culpabilidade ou elemento subjetivo do tipo, o pro­jeto não conhece outras formas além do dolo e da culpa, stricto sensu, sem o pressuposto do dolo e da culpa stricto sensu, nenhu­ma pena será irrogada. Nulla pena sine culpa. Em nenhum caso haverá presunção de culpa. Assim, na definição da culpa strictu sensu é inteiramente abolido o dogmatismo da inobser­vância de alguma disposição re­gulamentar, pois nem sempre é culposo o evento subseqüente".

Efetivamente, assim ocorre. A ex­posição de motivos traduz aquilo que inicialmente eu dizia: é neces­sário projetar a possibilidade, haver a previsibilidade de fato concreto e não in abstracto.

Pedindo vênia, ainda, o eminen­te relator, de que se deve colocar a problemática no metro do dever médio, o homo medius, no direito penal da culpa, cedeu espaço à in­vestigação da conduta individual. Não posso ser responsabilizado, porque há ent~ndimento médio do dever de agir. E necessário, porque a pena é dirigida a uma pessoa, ao agente examinar as suas condições individuais.

Em razão dessas considerações, com o devido respeito, chego a uma conclusão diversa para conceder a ordem.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998. 321

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HABEAS CORPUS Nº 5.329 - DF

(Registro nº 96.0077788-8)

Relator: O Sr. Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro

Impetrante: José Cupertino da Luz Neto

Impetrado: Desembargador Relator do Habeas Corpus n Q 748696 da 1 ª Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Fe­deral

Paciente: Antônio João Correa Caldas

EMENTA: HC - Constitucional- Habeas corpus - Carta preca­tória - Competência - A Carta Precatória é modalidade de co­municação de atos processuais, como a Rogatória e a Carta de Ordem. Diferentes, revelam ponto comum: o juiz da causa é dis­tinto do juiz do cumprimento da decisão judicial. Na Carta Roga­tória, o juiz não tem jurisdição no local do cumprimento. Daí, a necessidade de exiqüibilidade do Estado em que será cumprida (no Brasil, expedida pelo Supremo Tribunal Federal). Na Carta Precatória, há derrogação da competência. Atua, pois, no exercí­cio de sua competência. Cumpre-lhe, ao acolher a solicitação, exa­minar tanto a forma como a matéria da comunicação lançada pelo deprecante. Exemplificativamente: prisão de menor de 18 anos de idade, incidente prescrição, abolitio criminis. O CÓdigo de Pro­cesso Civil de Portugal registra: "se a requisição for para ato que a lei proíba absolutamente (art. 184, nº 1, b). Se o deprecado man­dar cumprir solicitação do deprecante, caso ilícito, encampa a ilegalidade. Torna-se, por isso, também autoridade coatora.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­tos e das notas taquigráficas cons­tantes dos autos, por unanimidade, conceder a ordem de habeas cor­pus para que o Tribunal de Justiça do Distrito Federal prossiga no jul­gamento, nos termos do voto do Sr. Minitro-Relator. Participaram do

julgamento os Srs. Ministros Ansel­mo Santiago e William Patterson. Ausentes,justificadamente, os Srs. Ministros Vicente Leal e Fernando Gonçalves.

Brasília, 25 de março de 1997 (data do julgamento).

Ministro ANSELMO SANTIA­GO, Presidente. Ministro LUIZ VI­CENTE CERNICCHIARO, Relator.

Publicado no DJ de 22·06·98.

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RELATÓRIO

O SR. MINISTRO LUIZ VICEN­TE CERNICCHIARO: Habeas Corpus impetrado por José Cuper­tino da Luz Neto contra ato do Exmo. Sr. Des. Relator do Habeas Corpus n Q 748.696 da 1 ª Turma Criminal do Tribunal de Justiça do Distrito Federal.

Consiste o ato impetrado na de­negação de liminar requerida em favor do paciente, o qual teve sua prisão civil decretada em 05 (cinco) diferentes ações de depósito.

Entendeu a decisão ora atacada que, não tendo sido as decisões apon­tadas como ilegais prolatadas por nenhuma autoridade judiciária do Distrito Federal, não poderia a Jus­tiça local, através do MM. Juiz da Vara de Registros Públicos e Preca­tórios, figurar como autoridade co­atora, uma vez que apenas orde­nou o cumprimento que lhe fora re­quisitado, dentro dos devidos limi­tes.

O impetrante infirma a referida fundamentação:

"Em verdade ao dar cumpri­mento ao mandado de prisão que lhe fora encaminhado o MM. Juiz de Direito da Vara de Registros e Precatórios do Distrito Federal, assumiu a responsabilidade pelo ato coator, até mesmo porque o ato de constrangimento à liber­dade de locomoção do paciente é de ser cumprido em área de sua jurisdição, em virtude dos limi­tes territoriais impostos pelo su­pratranscrito art. 200 do C. de Processo Civil.

Mesmo porque o paciente tem domicílio em Brasília, DF, fato esse que atrai a competência do MM,·Juiz monocrático desta Ca­pital Federal" (fls. 5).

Sustenta, ainda, sofrer constran­gimento ilegal ao argumento de que a prisão administrativa por dívida é manifestamente ilegal, uma vez que não autorizada pelo texto cons­titucional (art. 5Q

, LXVII).

Aduz, também, que os advogados não estariam munidos de poderes para formular pedidos de prisão ci­vil, em flagrante ofensa ao art. 38 do CPC.

Acrescenta o impetrante que as decisões atacadas seriam nulas por absoluta falta de fundamentação do tempo de restrição da liberdade in­dividual do paciente.

Parecer do M.P.F. pela denegação da ordem (1.406/1.408).

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO LUIZ VICEN­TE CERNICCHIARO (Relator): Neste habeas corpus, embora o impetrante faça incursão ao méri­to, restringe-se em saber se o Juiz de Brasília é ou não autoridade co­atora e, conseqüentemente, se o Tri­bunal de Justiça pode apreciar o habeas corpus.

Este habeas corpus, anota o re­latório, reclama a competência do Juízo deprecado que determina o cumprimento da decisão proferida pelo Juízo deprecante.

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o venerando acórdão está erudi­tamente fundamentado. O argu­mento fundamental consiste em que autoridade judiciária deprecada, porque apenas determina o cumpri­mento de mandado de prisão expe­dido por juiz de outra comarca, não pode ser acoimado de autoridade coatora, dado lhe ser vedado o exa­me substancial do ato. Impõe-se definir a natureza jurídica da Car­ta Precatória, especialmente o des­pacho de cumprimento lançado pelo juízo deprecado. A carta precatória é modalidade de comunicação de atos processuais, como a carta ro­gatória e a carta de ordem. Não obs­tante, cada qual evidencia caracte­rísticas próprias, por isso inconfun­díveis. Essas cartas revelam um ponto comum: o juiz da causa é dis­tinto do juiz do cumprimento da decisão judicial; na carta rogatória, ojuiz não tem jurisdição no local do cumprimento, evidenciam-se países soberanos, coloca-se então, insista­se, problema de jurisdição. Daí a ne­cessidade de exiqüibilidade do Es­tado em que será cumprida, no Bra­sil, expedida pelo Supremo Tribu­nal Federal. No caso da carta pre­catória, o deprecante por ser incom­petente, na extensão da competên­cia do juízo deprecado, solicita a este o cumprimento da decisão pro­ferida. Em razão disso, há derroga­ção da competência. O juízo depre­cado, por isso, atua no exercício de sua competência. Cumpre-lhe, ao acolher a solicitação, examinar não só a forma como, ainda, a matéria da comunicação lançada pelo depre­cante. Evidente, também aqui, há limites. Aliás, o venerando acórdão,

depois de ilustrar com o disposto no art. 184, nº 1, letra b, do Código de Processo Civil Português, ao dispor que a carta pode ser recusada "se a requisição for para ato que a lei pro­íba absolutamente", exemplifica com solicitação de prisão de menor de dezoito anos de idade. Acrescen­to dois outros casos, da mesma for­ma eloqüentes: a prisão, embora caracterizada a prescrição, ou abo­lir-se o crime. Evidente, o juízo de­precado não reexamina a decisão do juízo deprecante. Todavia, em sen­do teratológica ou de evidência so­lar, tem obrigação de recusar o cum­primento a casos que não tenham cobertura manifesta normativa. Também o juiz não é obrigado a fa­zer ou deixar de fazer alguma coi­sa, senão em virtude de lei.

Se o deprecado mandar cumprir a solicitação do deprecante, se ilíci­ta, como se diz em Direito Proces­sual Penal, encampa a ilegalidade. Haverá, então, duas autoridades coatoras: o deprecante, porque emi­tiu a ordem, e o deprecado, porque a adotou, mandando cumpri-la.

O habeas corpus é a ação cons­titucional que visa fazer cessar ou impedir que ocorra ilegal constran­gimento ao exercício do direito de locomoção. Busca, evidentemente, fazer cessar a ilegalidade, emana­da do autor intelectual ou do exe­cutor do ato ilegal.

A conclusão se evidencia exata uma vez comparada a carta preca­tória com a carta de ordem: na pri­meira, não há hierarquia de juris­dição entre os respectivos juízos; na segunda, entretanto, há esse desní-

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vel. o juiz, por exemplo, não pode deixar de cumprir a determinação do Tribunal a que está submetido, modus in rebus. Ressalvem-se as hipóteses de decisão desarrazoa­da, como ilustração, o caso de de­terminação absurda, contrastante com todas as máximas das expe­riências.

o ato impugnado no habeas cor­pus foi emanado do juízo depreca­do, Vara de Registros Públicos e Precatórios da Circunscrição Judi­ciária de Brasília.

Em sendo assim, data venia, concedo a ordem para o Egrégio Tri­bunal de Justiça do Distrito Fede­ral prosseguir o julgamento.

RECURSO EM HABEAS CORPUS NQ 6.584 - PR

(Registro n Q 97.0045495-9)

Relator: O Sr. Ministro Fernando Gonçalves

Recorrentes: Saturnino Fernandes Netto e outro

Advogados: Dr. Saturnino Fernandes Netto e outro

Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado do Paraná

Pacientes: Benício de Almeida Neto, Dario Teraci Fregato, João Quin­tiliano de Oliveira, Miroel Oliveira Junqueira Parreira e Sérgio Tomio Hara

EMENTA: Criminal. Lei n!2 9.430/96. Art. 83. Condição de proce­dibilidade.

1. Na pendência de apuração fiscal no âmbito administrativo não há impedimento do oferecimento da denúncia, se na documenta­ção remetida ao Parquet pelo órgão tributário competente exis­tem notícias de crime a ser apurado.

2. RHC improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­tos e das notas taquigráficas a se-

guir, por unanimidade, negar provi­mento ao recurso. Participaram do julgamento os Ministros Anselmo Santiago e William Patterson. Au­sentes, justificadamente, o Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro e, ocasio­nalmente, o Ministro Vicente Leal.

R. Sup. Trib. Just., Brasliia, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998. 325

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Brasília, 11 de dezembro de 1997 (data do julgamento).

Ministro ANSELMO SANTIA­GO, Presidente. Ministro FERNAN­DO GONÇALVES, Relator.

Publicado no DJ de 02·02-98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES: Cuida-se de recurso ordinário interposto contra acórdão da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná denegatório de habeas cor­pus impetrado em favor de Benício de Almeida Neto, Dario Teraci Fre­gato, João Quintiliano de Oliveira, Miroel Oliveira Junqueira Parreira e Sérgio Tomio Rara visando o tran­camento de ação penal em curso perante o Juízo de Direito da 3ª Va­ra Criminal de Londrina para apu­ração de ocorrência de crime contra a ordem tributária (arts. 1Q

, II e 11 da Lei n Q 8.137/90).

Segundo as razões de fls. 661/690, os recorrentes são sócios e gerentes da empresa "Transportadora Rota 90 Ltda.", dedicada ao transporte de mercadorias e fretes em geral. En­tendeu a receita estadual existir em sua escrita contábil irregularidades que deram ensejo, após encaminha­mento de notitia criminis, a atua­ção do Ministério Público, através de denúncia, da qual, essencialmen­te, consta:

" ... cientes do atuar ilícito e com o fim de exonerá-la - como de fato exoneraram-na - da carga

tributária do ICMS incidente e resultante de suas operações mercantis, propiciando, com isso, maiores e indevidos lucros em prejuízo do fisco estadual, fize­ram uso de manobras enganosas e fraudulentas, tudo como segue e conforme os autos de infração lavrados pelos Senhores Agentes Fiscais da Secretaria de Estado da Fazenda:

No período compreendido entre 1 Q e 8 de abril de 1991, os denun­ciados Benício de Almeida Neto, Dario Teraci Fregato, João Quin­tiliano de Oliveira, Miroel Olivei­ra Junqueira Parreira e Sérgio Tomio Rara, na forma e para o fim preambularmente expostos, quando de cinqüenta (50) opera­ções mercantis de vendas, deixa­ram de proceder, deliberada e sis­tematicamente, ao registro das notas fiscais correspondentes na escrita fisco-contábil- Livro de Registro de Saídas de Mercado­rias, ensejando, assim, inclusão mensal do débito fiscal em valor a menor na conta gráfica e nas guias de apuração de ICMS, pro­piciando, de conseqüência e me­diante fraude contra a fiscaliza­ção tributária, recolhimento re­duzido da carga tributária do ICMS relativa, etc., etc .... " (fls. 663/664)

Sustentam - então - os recor­rentes que não houve qualquer omis­são, mas apenas falta de registro no Livro de Saída de alguns conheci­mentos de transportes, geradores apenas de receitas de intermedia­ção, fora do campo de incidência do

326 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998.

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ICMS e sujeitos apenas ao ISS. Des­te modo, patente a aplicabilidade da norma do art. 83, da Lei n Q 9.430, de 1996, porquanto os processos administrativos perante a Receita Estadual estão a carecer de decisão final, estabelecendo a exigibilidade, ou não, do crédito tributário. Acres­centam que o valor de pretenso dé­bito não é determinado e, portanto, nem mesmo pago poderá ser.

Sem contra-razões, ascenderam os autos a este Superior Tribunal de Justiça, opinando a il. Subprocura­dora-Geral da República Laurita Hilário Vaz pelo improvimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES (Relator): A tese cen­tral do recurso está ancorada na premissa de que a empresa autua­da não se sujeita ao pagamento do ICMS, visto sua atuação restringir­se à agenciação ou intermediação de serviços de transportes para tercei­ros, ou simples despachante de fre­tes. Uma vez reconhecida adminis­trativamente esta relevante parti­cularidade, excluída estará a exi­gência tributária e, por via de con­seqüência, a pretensa infração pe­nal, assumindo a matéria, como anota o ven. acórdão, "contornos in­discutíveis com a Lei n Q 9.430, de 27 de dezembro de 1996, que, em seu art. 83, prevê a questão da pro­cedibilidade, subordinando literal­mente a deflagração do processo-

crime ao encerramento da ação ad­ministrativa fiscal" (fls. 650).

O acórdão recorrido, da lavra do eminente Des. Tadeu Costa, com in­tegral propriedade, afastou a ques­tão relativa à sujeição, ou não, da empresa ao pagamento do ICMS, à consideração exata de não ser o habeas corpus meio adequado a semelhante deslinde. De outro lado, a ocorrência de não se conhecer o valor do tributo eventualmente so­negado nenhuma dificuldade ou re­levãncia traz à marcha da ação pe­nal, pois, ad exemplum, como re­latado na peça de acusação, a infra­ção estaria - também - relaciona­da com a falta de registro de notas fiscais de operações mercantis no Livro de Registro de Saídas de Mer­cadorias (fls. 17).

Volta-se, então, ao ponto de par­tida da inviabilidade de, nos estrei­tos limites da impetração, se ques­tionar e se conhecer da efetividade, ou não, da prática de operações mercantis pela empresa e de sua sujeição, ou não, ao ICMS. Apenas a instrução, com a faculdade ampla de produção de provas, poderá tra­zer luz a tão intrincada controvér­sia.

No mais, é patente que na pen­dência de apuração fiscal no âmbi­to administrativo não há impedi­mento do oferecimento de denúncia, "se nas peças informativas encami­nhadas ao Ministério Público pelo órgão de fiscalização tributária exis­tem notícias de crime ... a ser apu­rado", conforme anotado às fls. 699.

Quanto ao art. 83 da Lei nQ 9.430/ 96, não há como erigir o término da

R. Sup. Trib. Just., Brasilia, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998. 327

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apuração fiscal como condição de procedibilidade. Ajurisprudência do STJ é pacífica, como se vê do pare­cer ministerial, verbis:

"Recurso ordinário. Habeas cor­pus. Sonegação fiscaL Tranca­mento da ação penal no aguardo do desfecho do recurso adminis­trativo. Impossibilidade.

- Carreadas pela denúncia todas as condições para a apuração do crime em tese de sonegação fis­cal, não merece trancamento a ação penal por simples alegativa de aguardar-se o desfecho do re­curso administrativo interposto, até porque as esferas administra­tivas e judicial são independen­tes, como bem decidiu o acórdão impugnado.

- Recurso improvido." (RHC nº 6.051/SP, ReI. Exmo. Sr. Ministro

José Arnaldo, in DJ de 10103/97, pág. 5.981).

"RHC. Penal Tributário. Proces­sual Penal. Crime tributário. Ins­tância administrativa. Condição de procedibilidade. Lei nº 9.430196. O Ministério Público é titular de ação penal. A instân­cia administrativa não constitui condição de procedibilidade.

A Lei nº 9.430/96 tem outro sen­tido. Determina que, havendo in­dícios de crime, a autoridade ad· ministrativa deverá comunicar o fato ao Ministério Público." (RHC nº 6.162/SP, Relator Exmo. Sr. Ministro Luiz Vicente Cernic­chiaro, in DJ de 19/05/97, pág. 20.685).

N estas condições, nego provi­mento ao recurso.

RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 6.971 - RJ

(Registro nº 97.0080259-0)

Relator: O Sr. Ministro Fernando Gonçalves Recorrente: José Inácio Fortes de Moraes Paredes

Advogado: Dr. Ubiratan T. Guedes Recorrido: Tribunal de Alçada Criminal do Estado do Rio de Janeiro Paciente: José Inácio Fortes de Moraes Paredes

EMENTA: RHC. Calúnia e difamação. Não-ocorrência.

1 - A intenção de se defender em inquérito policial, arrolando fatos, cuja ocorrência pelos detalhes fornecidos, o acusado tem certeza ou fundada suspeita, exclui o delito de calúnia porque ausente o dolo imprescindível à sua configuração.

328 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998.

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2 - Da mesma forma, na difamação é exigida a presença do dolo consistente na atribuição de fato desonroso, circunstância que se exclui quando se atua com animus defendendi. Não havendo pro­pósito de ofender, não se caracteriza a figura da difamação.

3 - Precedentes.

4 - Recurso provido para trancar a ação penal.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­tos e das notas taquigráficas a se­guir, por unanimidade, dar provi­mento ao recurso. Participaram do julgamento os Ministros Anselmo Santiago e William Patterson. Au­sentes,justificadamente, o Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro e, ocasio­nalmente, o Ministro Vicente Leal.

Brasília, 11 de dezembro de 1997 (data do julgamento).

Ministro ANSELMO SANTIA­GO, Presidente. Ministro FERNAN­DO GONÇALVES, Relator.

Publicado no DJ de 02-02-98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES: Trata-se de recurso ordinário interposto contra acórdão da Terceira Câmara do Tribunal de Alçada Criminal do Estado do Rio de Janeiro denegatório de habeas corpus impetrado em favor de José Inácio Fortes de Moraes Paredes vi­sando o trancamento de ação penal privada que lhe é movida por Crase

- Sigma Empreendimentos Imobi­liários S/C Ltda.

Assinala o recorrente que sua conduta não tipifica crime contra honra, pois jamais teve por objeti­vo alcançar a honorabilidade dos di­retores da empresa. Sustenta ser inquestionável que suas declarações prestadas perante a autoridade po­licial foram simples decorrência de procedimento dos querelantes e não teve animus de ofender, mas, ape­nas, articular elementos em prol de sua defesa.

Sem contra-razões, ascenderam os autos a este Superior Tribunal de Justiça, opinando a Subprocurado­ria Geral da República pelo provi­mento do recurso, com trancamen­to da ação penal.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES (Relator): O recorren­te foi acusado de apropriação indé­bita de importâncias de proprieda­de de clientes da empresa "Crase­Sigma Empreendimentos Imobiliá­rios S/C Ltda.", de quem, por vários anos, foi empregado, na qualidade de corretor. Perante a autoridade policial, em razão da imputação es-

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998. 329

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clareceu "que os diretores da refe­rida empresa além de possuírem um "caixa dois", desviavam o dinheiro recebido de clientes, para compra de imóveis no Brasil e no exterior, ten­do inclusive fornecido o banco no exterior, no qual os referidos dire­tores são correntistas, além de apon­tar datas de viagens e imóveis que os mesmos adquiriram, inclusive, mencionando que os valores das es­crituras estavam abaixo do preço de mercado" - fls. 04.

Não houve, segundo relatam as razões, intento de caluniar ou ofen­der, mas apenas esclarecimento do destino dado às quantias entregues pelos clientes, "as quais eram repas­sadas aos diretores da empresa, sendo que, algumas vezes, deposi­tadas em suas contas correntes" (fls. 05).

Fixou, no entanto, a Terceira Câ­mara do Tribunal de Alçada Crimi­nal do Estado do Rio de Janeiro, conter a queixa os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, não havendo, pois, que se falar em falta de justa causa.

O órgão ministerial, por intermé­dio da Dra. Márcia Dometila Lima de Carvalho, por seu turno, opina no sentido do trancamento de ação penal, escudada nas seguintes pon­derações:

"O direito fundamental de defe­sa, circundado por seus caracte­res periféricos, encontra como li­mites os demais direitos, consti­tucionais ou não. Vale dizer, não pode haver conflituosidade entre os direitos dentro de um sistema

a fim de manter-se sua coerência e unidade. Logo, em nome do direi­to de defesa, ninguém pode extra­polar suas balizas e, com isso, particularmente na esfera penal, praticar ato típico, ilícito e cul­pável.

N o entanto, em sede dos direitos à honra, justamente para que não se configure o animus calunian­di ou injuriandi, ou seja, para que o exercício do direito de de­fesa não extravase seus limites e fique configurado crime contra honra, é que os supracitados ca­racteres periféricos produzem o chamado animus narrandi. Quer dizer, devem as declarações de defesa, sejam elas prestadas pe­rante a autoridade policial, sejam em juízo, ou em qualquer outro meio de comunicação, ser lança­das como narrativa, pena de en­sejar-se crime.

In casu, as alegações constantes do depoimento do Paciente (fls. 31134), não se subsumem, em tese, aos crimes previstos nos arts. 138 e 139 do Estatuto Re­pressivo. Cuidou o Recorrente, com veraz minúcia, acuidade e sem paixão, de demonstrar que não praticava crime algum; ape­nas narrou os procedimentos uti­lizados pela empresa da qual fora empregado, buscando defender­se das acusações que lhe eram imputadas. Tanto é que não ape­nas apresentou nomes ligados a operações da empresa, datas, números de telefone, mas tam­bém documentos que buscavam comprovar sua inocência e, via de

330 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998.

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conseqüência, vieram envolver os nomes dos sócios da empresa.

Assim, não poderia estar a quei­xa-crime em conformidade com os requisitos do artigo 41 do CPP, segundo fez consignar o v. acór­dão atacado, ou seja, não havia fato criminoso, mas apenas defe­sa narrativa quanto aos fatos imputados ao Querelado.

Certo que os fatos narrados, constituindo tipos penais, devem ser apurados pela autoridade po­licial que deles tomou conheci­mento. E, se falsos, pode o denun­ciante incorrer no tipo do artigo 339 do Código Penal, eis que es­taria dando causa a investigação policial indevida. Por enquanto, cumpre seja dado provimento ao presente recurso para trancar-se ação penal de iniciativa privada contra o Recorrente intentada." (fls. 104/106)

Efetivamente, a intenção de se defender, arrolando fatos, cuja ocor­rência, pelos detalhes fornecidos, o recorrente possui certeza ou funda­da suspeita, exclui a de caluniar, porquanto ausente o dolo impres­cindível à configuração do delito. Esta Corte, pelo voto do Ministro

Bueno de Souza, em julgado cola­cionado por Alberto Silva Fran­co, in Código Penal e sua interpre­tação jurisprudencial- 6ª edição -VoI. I - Tomo II - pág. 2.246, deci­diu:

"O dolo específico, requerido pela calúnia, não pode ser deduzido, simplesmente, do citado depoi­mento, único elemento trazido à colação pelo querelante. Em tal contingência há de presumir, como bem anotou a Corte de Cas­sação italiana, em aresto colhido por Nelson Hungria, que as in­formações, ainda que más, foram fornecidas para atender ao pedi­do, e, não com a intenção de ofen­der a outrem." (RSTJ 34/237).

Da mesma forma, na difamação (art. 139) é exigida a presença do dolo, consistente na atribuição de fato desonroso, circunstância que se exclui quando o agente atua com animus defendendi. Não haven­do propósito de ofender, não se ca­racteriza a figura da difamação (RSTJ 29/250).

Ante o exposto, dou provimento ao recurso para determinar o tran­camento da ação penal.

RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 7.165 - RO

(Registro nº 98.0000882-9)

Relator: O Sr. Ministro Anselmo Santiago

Recorrente: Alcilea Pinheiro de Medeiros

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998. 331

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Advogado: Dr. Alexandre Cardoso da Fonseca

Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia

Pacente: Alcilea Pinheiro de Medeiros

EMENTA: RHC - Dispensa de licitação - Paciente que, na qua­lidade de Procuradora de Estado, responde consulta que, em tese, indagava da possibilidade de dispensa de licitação - Denúncia C0111- base no art. 89, da Lei n!28.666/93-Acusação abusiva-Mero exercício de suas funções que requer independência técnica e pro­fissional.

1. Não comete crime algum quem, no exercício de seu cargo, emi­te parecer técnico sobre determinada matéria, ainda que pessoas inescrupulosas possam se locupletar às custas do Estado, utili­zando-se desse trabalho. Estas devem ser processadas criminal­mente, não aquele.

2. Recurso provido, para trancar a ação penal contra a paciente.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­tos e das notas taquigráficas a se­guir, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Vicente Leal, por maioria, em dar provimento ao recurso para conce­der a ordem. Vencido o Sr. Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro. Votaram com o Sr. Ministro-Relator os Srs. Ministros Vicente Leal e Fernando Gonçalves. Ausente, por motivo de licença, o Sr. Ministro William Pat­terson.

Brasília, 21 de maio de 1998 (da­ta do julgamento).

Ministro ANSELMO SANTIA­GO, Presidente e Relator.

Publicado no DJ de 22-06-98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO ANSELMO SANTIAGO: Trata-se de recurso or­dinário (fls. 154/165), formulado contra aresto da Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia (fls. 139/151), que consi­derou válida a denúncia ofertada pelo Ministério Público Estadual contra a paciente, pelo fato desta ter elaborado um parecer que, em tese, viabilizava a dispensa de licitação em determinado caso, enquadran­do-a nas disposições do art. 89 da Lei n Q 8.666/93.

• O Ministério Público Federal, em

parecer subscrito pelo ilustre Sub­procurador-Geral da República, Dr. José Flaubert Machado Araújo (fls. 191/195), opina pelo provimento do recurso.

É o relatório.

332 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998.

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VOTO

O SR. MINISTRO ANSELMO SANTIAGO (Relator): A paciente, Procuradora do Estado, responden­do a uma consulta formulada pelo Superintendente de Comunicação Governamental (fls. 44/51), opinou que, em tese, seria possível a dis­pensa de licitação, na hipótese for­mulada pelo consulente, recomen­dando, ainda, que se tomasse deter­minada cautela para evitar o super­faturamento, sendo o seu parecer referendado pelo ilustre Procurador­Geral do Estado Adjunto, Dr. Val­decir da Silva Maciel. Tal peça lhe valeu a denúncia por suposta infrin­gência ao art. 89, da Lei n Q 8.6661 93, que soa:

"Art. 89 - Dispensar ou inexigir licitação fora das hipóteses pre­vistas em lei, ou deixar de obser­var as formalidades pertinentes à dispensa ou inexigibilidade;

Parágrafo único: Na mesma pena incorre aquele que, tendo com­provadamente concorrido para a consumação da ilegalidade, bene­ficiou-se da dispensa ou in exigi­lidade ilegal, para celebrar con­trato com o Poder Público."

Fácil é de ver que a denúncia é despropositada, abusiva até. Não é plausível a persecutio criminis contra quem que simplesmente, no pleno exercício de suas funções, emite opinião sobre matéria teóri­ca, referendada por sua Chefia, pou­co importando que espertalhões ve­nham a usar seu trabalho para, em

etapa posterior, se locupletarem às custas do erário público.

N em por estar jungido ao Esta­do, o advogado perde a sua indepen­dência técnica, ficando amarrado à opinião oficial, como nos estados to­talitários. Processar um profissio­nal por externar, livremente, sua opinião, é uma condenável forma de censura a uma atividade que deve ser exercida com ampla liberdade, pois, como diz o art. 18 dos Estatu­tos dos Advogados, aplicável ao ca­so, a relação de emprego não retira do advogado (mesmo que do Esta­do, me permito acrescentar), a sua isenção técnica, nem reduz a sua in­dependência profissional.

Aqueles que usaram maio pare­cer que sejam, efetivamente, proces­sados e condenados. Jamais quem manifestou sua opinião, em tese, re­pita-se, sobre determinada matéria, no mero exercício de suas funções, parecer esse que, além do mais, não vinculava a Administração Pública, que dele poderia discordar, deixan­do de lhe dar efeitos concretos.

Assim, sem uma demonstração mais eloqüente de que a parecerista fizesse parte de um amplo esquema de corrupção no Estado, locupletan­do-se com essa atividade, não é pos­sível incluí-la na peça vestibular acusatória, cingindo-se sua ação tão-somente em opinar, livremente, sobre tema que lhe foi submetido, direito que lhe deve ser sempre as­segurado e que em hipótese alguma pode justificar uma vexaminosa ação penal.

Acolho, pois, o parecer ministe­rial e dou provimento ao recurso or-

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998. 333

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dinário, trancando a ação com refe­rência à paciente.

É o meu voto.

VOTO- VISTA

o SR. MINISTRO LUIZ VICEN­TE CERNICCHIARO: Data venia, nego provimento ao recurso.

A denúncia de fls. 15/32 não se restringe a afirmar a elaboração de parecer. Ao contrário, menciona ser meio para obtenção de vantagem ilí­cita.

A imputação descreve:

A conduta de todos entrelaça­se, é um sucedâneo de vínculos visando a dilapidação do patrimô­nio público, não podemos dizer que há condutas estanques, com­partimentadas, todos agiam vi­sando o locupletamento ilícito.

Quanto à moralidade adminis­trativa, isto é, o princípio de éti­ca na condução da coisa pública, que implica em sujeição a ser honesto e probo na direção da coisa pública, verga constitucio­nal, é rompido de forma como foi, no caso presente, a ordem públi­ca está lesada, nada mais justo que a prisão cautelar destes in­divíduos seja decretada pelo Po­der Judiciário, pois desrespeitar o patrimônio público, que impli­cou no desvio de quase hum mi­lhão de dólares e poderia, nesta oportunidade, já ter ocorrido a subtração de aproximadamente R$ 3.000.000,00, em apenas 90 dias, se não fosse a pronta inter-

venção do cidadão Eduardo Valverde do Juízo da Vara da Fa­zenda Pública desta Comarca." (fls. 29)

N ego provimento.

VOTO- VISTA

O SR. MINISTRO VICENTE LEAL: No presente recurso ordiná­rio, a recorrente - Procuradora do Estado de Rondônia - pugna pelo trancamento de ação penal na qual é acusada da prática do delito pre­visto no art. 89, da Lei n Q 8.666/93, que acrimina quem dispensa ou inexige licitação fora das hipóteses previstas em lei, ou deixa de obser­var formalidades pertinentes à dis­pensa ou à inexigibilidade, bem como aquele que, concorrendo para a consumação da ilegalidade, bene­ficiou-se do ato ilegal.

A sua conduta, conforme descre­ve a peça de acusação, consistiu em emitir parecer técnico em que, aten­dendo a consulta formulada por di-. rigente de órgão estatal, opina, em tese, pela dispensa de licitação, pa­recer este referendado pelo Procu­rador-Geral do Estado.

A douta Subprocuradoria Geral da República, em parecer da lavra do ilustre Dr. José Flaubert Macha­do Araújo, entende que não há jus­ta causa para a ação penal, pois a conduta é atípica, sendo certo que a paciente exarou manifestação so­bre hipótese em tese, pois sequer era conhecedora do processo de licita­ção, não sendo, de outra parte au­toridade administrativa responsá-

334 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998.

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vel pela contratação e, por isso, sem poderes para dispensar ou inexigir a licitação.

O ilustre Relator Ministro Ansel­mo Santiago, em seu ilustrado voto adotou o mesmo entendimento, ver­berando ser a denúncia desproposi­tada e abusiva, não sendo plausível acusar-se alguém da prática de cri­me por haver, no exercício de suas funções, emitido parecer teórico, de­vendo a ação punitiva recair sobre aqueles que mal se utilizaram do parecer para praticar atos de cor­rupção.

Dessa posição discordou o emi­nente Ministro Luiz Vicente Cernic­chiaro, que entendeu dever prosse­guir a ação penal, pois a denúncia indicou ser o parecer meio para a obtenção da vantagem ilícita.

Peço vênia a Sua Excelência para acompanhar o Relator.

Efetivamente, a conduta da re­corrente é penalmente atípica, não se enquadrando, sequer em tese, na moldura do art. 89, da Lei nQ 8.666/ 93.

Assim, acompanho o Relator, dando provimento ao recurso.

É o voto.

VOTO

O SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES: Acompanho o voto do Sr. Ministro-Relator para trancar a ação penal com a devida vênia do voto divergente do Sr. Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro.

RECURSO EM HABEAS CORPUS NQ 7.332 - RJ

(Registro nQ 98.0013180-9)

Relator: O Sr. Ministro Anselmo Santiago Recorrente: Anderson Reis Pessoa Advogado: Dr. Antonio Jorge de Souza Recorrido: Tribunal de Alçada Criminal do Estado do Rio de Janeiro Paciente: Anderson Reis da Silva Pessoa (preso)

EMENTA: RHC - Paciente denunciado por roubo qualificado - Alegação de que a polícia teria agido "à moda da casa", sem indicar o que, efetivamente, ocorrera - Motivo só apontado em grau de recurso - Análise inviável, pela supressão de instância -Morosidade do processo afastada - Súmula 52/STJ - Improvado tratamento desigual entre as partes - Prisão preventiva funda­mentada.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998. 335

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1. Não declinado, em primeiro grau, o motivo da alegada nulida­de, não se poderá conhecê-lo em segundo, quando o mesmo é re­velado, sob pena de supressão de instância.

2. Se o feito já se acha em alegações finais, finda, pois, a instru­ção, não mais há de se falar em excesso de prazo, aplicando-se, à hipótese, o verbete da Súmula n Q 52/STJ.

3. Não se reconhece tratamento desigual entre as partes, se a acu­sação tem mais requerimentos deferidos, do que a defesa. O im­portante não é o seu número, mas a substância deles.

4. Fundamentada a prisão preventiva e entendendo o magistrado processante que tais razões subsistem, não há que se revogá-la, ainda mais se o feito já se encontra em vias de solução definitiva, quando se reapreciará, sem dúvida, tal situação.

5. Recurso improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­tos e das notas taquigráficas a se­guir, por unanimidade, em negar provimento ao recurso. Votaram com o Sr. Ministro-Relator os Srs. Ministros Vicente Leal e Fernando Gonçalves. Ausentes, por motivo de licença, o Sr. Ministro William Pat­terson e, justificadamente, o Sr. Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro.

Brasília, 28 de abril de 1998 (data do julgamento).

Ministro ANSELMO SANTIA­GO, Presidente e Relator.

Publicado no DJ de 18-05-98.

RELATÓRIO

dinário em habeas corpus (fls. 42/ 44), contra aresto da 4ª Câmara do Tribunal de Alçada Criminal do Es­tado do Rio de Janeiro (fls. 38/39), que denegou a ordem ali impetra­da, onde se objetivava a nulidade do processo penal a que responde o paciente, por vício no inquérito po­licial e tratamento desigual entre a defesa e acusação, além da revoga­ção da prisão preventiva e da soltu­ra por excesso de prazo.

O Ministério Público Federal, em parecer da lavra da ilustre Subpro­curadora-Geral da República, Dra. Maria Eliane Menezes de Farias (fls. 53/56), opina pelo improvimen­to do recurso.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO ANSELMO O SR. MINISTRO ANSELMO SANTIAGO (Relator): O paciente

SANTIAGO: Trata-se de recurso or- está sendo processado perante a 1 ª

336 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998.

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Vara Criminal da Ilha do Governa­dor (RJ), por crime de roubo quali­ficado, sendo que, quando das infor­mações de fls. 21/23, de setembro do ano findo, os autos já se encontra­vam para alegações finais, acredi­tando-se que, a essa altura, já haja sentença.

N a peça vestibular alegou-se que o inquérito fora feito "à moda da casa", sem se declinar, no entanto, que moda seria essa, somente ago­ra revelada, de que, no interroga­tório policial, o paciente, menor, da primeira vez não teve um curador e da segunda, quando tal ato foi re­prisado, foi-lhe nomeado, para tais funções, um integrante da própria polícia.

Bem por isso tal alegação não foi examinada no juízo de origem, e fazê-lo agora, representaria a su­pressão de uma instância.

Quanto à morosidade do proces­so, tal alegação perdeu força com a informação judicial, de que o feito já se avizinhava de seu final, o que não foi desmentido pelo impetran­te, aplicando-se ao caso o verbete da Súmula nº 52/STJ.

Também ficou indemonstrado o tratamento desigual entre as par-

tes, só porque a acusação teve mais pleitos deferidos, do que a defesa, importando, de verdade, não a quantidade deles, mas a justeza do que pedido e isso não foi questiona­do.

Finalmente, não ficaram demons­trados os motivos para a revogação da prisão preventiva, que não se re­sumem à menoridade, primarieda­de, residência fixa e família consti­tuída, se outras, apontadas no de­creto confinante (fls. 32 e vº), ainda sobrevivem, sendo certo que a víti­ma, pelo depoimento juntado às fls. 34/35, não disse que o paciente não era a pessoa que a assaltara, como se pretende no recurso, mas sim que, por ser o local razoavelmente escuro, não tinha condições de re­conhecê-lo, o que é bem diferente, podendo a culpabilidade ser de­monstrada, seguramente, por ou­tras provas. Ademais, aproximando­se o feito de uma solução definiti­va, é certo aguardar que tal situa­ção seja devidamente reestudada.

Enfim, nada havendo que reme­diar, acolho o parecer do órgão mi­nisterial e nego provimento ao re­curso.

É o meu voto.

RECURSO EM HABEAS CORPUS Nº 7.366 - GO

(Registro nº 98.0016225-9)

Relator: O Sr. Ministro Anselmo Santiago

Recorrente: Henrique Barbacena Neto

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998. 337

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Advogado: Dr. Henrique Barbacena Neto

Recorrido: Tribunal de Justiça do Estado de Goiás

Paciente: Rubens de Oliveira Machado Junior

EMENTA: Recurso em habeas corpus - Tenente da Polícia Mili­tar que, em serviço, abandona seu posto, embriaga-se e espanca um civil - Crimes previstos na legislação militar - Incompetên­cia da justiça castrense, alegação quanto aos dois últimos crimes - Situação que depende do reexame de fatos e provas, o que não se permite na via estreita do writ.

1. Havendo a indicação de que o réu estava em serviço, o abando­no do posto não o retira dessa condição, mormente se os crimes posteriores que lhe são atribuídos,. previstos no Código Penal Militar, foram cometidos quando em uso de viatura da sua corpo­ração e possivelmente fardado, o que firmaria a competência da justiça castrense.

2. Para se concluir quanto à incompetência desta e competência da Justiça Comum Estadual, haver-se-ia de reexaminar fatos e provas, o que não se concilia com os estreitos limites de um man­damus.

3. Recurso improvido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­tos e das notas taquigráficas a se­guir, por unanimidade, em negar provimento ao recurso. Votaram com o Sr. Ministro-Relator os Srs. Ministros Luiz Vicente Cernicchia­ro e Vicente Leal. Ausentes, por motivo de licença, o Sr. Ministro William Patterson e, justificada­mente, o Sr. Ministro Fernando Gonçalves.

Brasília, 05 de maio de 1998 (da­ta do julgamento).

Ministro ANSELMO SANTIA­GO, Presidente e Relator.

Publicado no DJ de 25-05-98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO ANSELMO SAN­TIAGO: Trata-se de habeas corpus (fls. 34/41), contra acórdão da 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (fls. 251 30), que denegou o writ ali impetra­do, sobre o fundamento de que o paciente está sendo processado, ao menos em parte, por juízo incompe­tente.

O Ministério Público Federal, em parecer subscrito pela ilustre Sub-

338 R Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998.

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procuradora-Geral da República, Dra. Márcia Dometila Lima de Car­valho (fls. 54/57), opina pelo impro­vimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO ANSELMO SANTIAGO (Relator): O paciente, Tenente da Polícia Militar, quando de serviço, abandonou seu posto, embriagou-se e espancou um civil.

Todos esses delitos são previstos na legislação castrense, ao contrá­rio do exemplo fornecido pelo recor­rente, em que parte não o era, ra­zão pela qual não se poderia, a prio­ri afastar a competência da Justiça Militar para examiná-los, mormen­te na via estreita do mandamus, imune à apreciação de fatos e provas.

Ademais, não se observa, de for­ma clara e patente, essa acenada in­competência parcial, vez que, em-

bora tenha abandonado o seu pos­to, o militar estava devidamente escalado e em situação de serviço, devendo assim ser considerado para efeitos penais.

Além do mais, valeu-se de um veí­culo da PM para circular por diver­sos bares e uma casa de prostitui­ção, onde bebeu até à exaustão, sen­do que foi nessa mesma viatura que teria feito a abordagem do civil e, após revistá-lo, submeteu-o a um severo espancamento.

Tudo leva a crer que estivesse fardado, para que o particular se deixasse revistar, mais uma razão para firmar a competência dajusti­ça castrense e não da comum.

Enfim, é situação a depender da colheita de provas, o que não se per­mite na via eleita.

À vista do exposto, acolho o pa­recer ministerial e nego provimen­to ao recurso.

É o meu voto.

RECURSO EM HABEAS CORPUS NQ 7.514 - RJ

(Registro nQ 98.0026364-0)

Relator: O Sr. Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro

Recorrente: Werneksandro Pereira Lopes

Recorrido: Tribunal de Alçada Criminal do Estado do Rio de Janeiro

Paciente: Werneksandro Pereira Lopes (preso)

Advogado: Dr. Luiz Paulo Pereira Oviedo

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998. 339

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EMENTA: RHC - Processual Penal - Sentença condenatória - Réu preso - Regime semi-aberto - Princípio da proporcionali­dade - Réu preso, no curso do processo, em sendo condenatória a sentença, deve ser mantido na mesma situação jurídica. Toda­via, se o regime aplicado for o semi-aberto, outra, a solução. De­corrência do princípio da proporcionalidade. Caso contrário, con­ferir-se-ia tratamento igual para situações diferentes, ou seja, re­comendada quando o regime inicial fosse fechado.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­tos e das notas taquigráficas cons­tantes dos autos, por unanimidade, dar provimento ao recurso e orde­nar a expedição de alvará de soltu­ra se por aI não estiver o paciente preso, nos termos do voto do Sr. Mi­nistro-Relator. Votaram com o Sr. Ministro-Relator os Srs. Ministros Fernando Gonçalves e Anselmo Santiago. Ausentes, justificadamen­te, o Sr. Ministro Vicente Leal e, por motivo de licença, o Sr. Ministro William Patterson.

Brasília, 02 de junho de 1998 (data do julgamento).

Ministro ANSELMO SANTIA­GO, Presidente. Ministro LUIZ VI­CENTE CERNICCHIARO, Relator.

Publicado no DJ de 29-06-98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO LUIZ VICEN­TE CERNICCHIARO: Recurso Or­dinário interposto por Werneksan­dro Pereira Lopes, em seu favor, in-

conformado com v. acórdão do Tri­bunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, denegatório de habeas corpus impetrado objetivando ser concedido ao impetrante o direito de recorrer em liberdade.

O v. acórdão restou assim emen­tado:

"Habeas corpus. Primarieda­de e bons antecedentes.

Na esteira da Súmula n Q 9 do E. STJ e do vetusto ensinamento de nossa Corte Maior, "preso fica preso, solto fica solto", e de fato não teria sentido que o condena­do, após responder a todos os atos do processo preso preventiva­mente, malgrado primário e de bons antecedentes, agora que vi­esse a ser condenado, com um juízo de censura ainda que pro­visório, fosse solto para, caso con­firmada a sentença, novamente fosse recolhido.

Ordem denegada." (fls. 24)

Parecer do Ministério Público Fe­deral pelo não provimento do recur­so (fls. 40/44).

É o relatório.

340 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998.

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VOTO

O SR. MINISTRO LUIZ VICEN­TE CERNICCRIARO (Relator): A jurisprudência deste Tribunal, coin­cidindo com o entendimento do E. Supremo Tribunal Federal, conso­lidou-se, em atenção às caracterís­ticas da prisão cautelar, no sentido de ser mantida a situação jurídica encontrada pela sentença condena­tória. Assim, estando preso o réu, continuará detido; em contraparti­da, se responde o processo em liber­dade, assim continuará.

"RHC - Processual Penal- Ape­lação - Liberdade - O réu, como regra, aguarda o julgamen­to em liberdade. Em havendo pri­são processual cautelar, antes da sentença, manter-se-á a constri­ção ao exercício do direito de li­berdade." (RRC nº 6.574/SP)

O caso dos autos apresenta uma particularidade.

O paciente se encontrava preso quando foi condenado (fls. 25). O re-

gime inicial estabelecido pela sen­tença - semi-aberto - é particu­lar de relevo.

Em sendo confirmada a decisão, o réu não será submetido ao regime fechado, terá, então, tratamento menos rigoroso.

Cumpre pensar o princípio da proporcionalidade. Não se pode co­locar, na mesma esteira, o condena­do a regime fechado e a regime semi-aberto. A presunção de inocên­cia, a par do proporcional, da per­sonalidade do réu e características do delito devem ser invocados. Caso contrário, a decisão será meramen­te formal. Cumpre adotar a solução mais favorável.

No balanço da personalidade e da conduta, cumpre conferir maior atenção à primeira. Aqui, está o homem; ali, um acontecimento pro­vocado pelo homem. Pode, quem sabe, ser isolado, excepcional.

Dou provimento ao recurso.

Expeça-se mandado de soltura, se por aI não estiver preso.

RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 8.399 - RS

(Registro n Q 97.0019120-6)

Relator: O Sr. Ministro William Patterson

Recorrente: Isolde da Silva Gressler

Advogados: Drs. Mário Bernardo Sesta e outros

Tribunal de Origem: Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998. 341

Page 30: JURISPRUDÊNCIA DA SEXTA TURMA...lação." (fls. 762) Dentro dos limites traçados, o acórdão acolheu o primeiro pedido, ficando ipso facto, dada a alterna tividade, prejudicados

Impetrado: Desembargador Presidente do Tribunal de Justiça do Es­tado do Rio Grande do Sul

Recorrido: Estado do Rio Grande do Sul

Advogados: Drs. Adriana Maria Neumann e outros

EMENTA: Administrativo. Atos. Ilegalidade. Desfazimento. Tem­po de serviço. Contagem. Serventia não oficial.

- Ao considerar o tempo de serviço de natureza particular (ser­ventia), para fins de gratificações e vantagens junto ao serviço público, sem autorização legislativa válida, à Administração era, como é, lícito desfazer o ato, sem lugar para em oposição, alegar­se amparo com base no princípio do direito adquirido.

- Recurso desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­tos e das notas taquigráficas a se­guir, por unanimidade, negar pro­vimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Vota­ram com o Sr. Ministro-Relator os Srs. Ministros Luiz Vicente Cernic­chiaro, Fernando Gonçalves e Ansel­mo Santiago. Ausente, justificada­mente, o Sr. Ministro Vicente Leal.

Brasília, 18 de dezembro de 1997 (data do julgamento).

Ministro ANSELMO SANTIA­GO, Presidente. Ministro WILLIAM PATTERSON, Relator.

Publicado no DJ de 23-03·98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO WILLIAM PATTERSON: Adoto como relatório

a parte expositiva do parecer do Mi­nistério Público Federal (fls. 121/ 122):

"Isolde da Silva Gressler, aju­dante da serventia do registro ci­vil das pessoas naturais de Ca­choeira do Sul (RS), ajuizou man­dado de segurança contra o ato do Presidente do Tribunal de Jus­tiça do Estado do Rio Grande do Sul, publicado no Diário da Jus­tiça de 19/10/95, que tornou sem efeito atos anteriores, praticados respectivamente em 04/04/90 e 26/04/91, pelos quais se havia deferido à mesma a gratificação adicional de 25% e 09 (nove) Avanços Trienais, atos estes pra­ticados em 04/04/90 e 26/04/91, respectivamente, e qualificando­o como ilegal e ofensivo a direito líquido e certo, pede o restabele­cimento das vantagens suprimi­das.

A autoridade apontada como coatora, nas suas informações

342 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998.

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(fls. 23/24) sustentou a legitimi­dade do ato impugnado na medi­da em que a administração pode invalidar os seus próprios atos quando ilegais e, no caso, os be­nefícios suprimidos haviam sido indevidamente concedidos por­que se computou como tempo de serviço público, que era requisi­to necessário para os benefícios, tempo que na realidade era de serviço particular, que a impe­trante exerceu como empregada do titular do cartório.

O Tribunal a quo, em decisão tomada por maioria de votos, ao fundamento de que o tempo de serviço particular é imprestável para fins de gratificação e avan­ços junto ao serviço público, de­negou a segurança e reconheceu a legitimidade do ato impugnado (fls. 56/72).

No recurso ordinário de fls. 74/ 84 a recorrente pondera que o ato atacado fere o seu direito líquido e certo, relativamente à irredu­tibilidade da remuneração e à garantia do devido processo le­gal, porque lhe foi imposta uni­lateral redução na remuneração, sem oportunidade para manifes­tar defesa, razão pela qual pos­tula o provimento do recurso.

O órgão ministerial opinou no sentido do desprovimento do recur­so (fls. 124).

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO WILLIAM PATTERSON (Relator): Sob o ale-

gado manto do direito adquirido, pretende-se neste mandado de se­gurança preservar vantagem conce­dida ao arrepio da lei. O pleito está desvestido de irrefutável razoabili­dade, por isso que não se pode, como é sabido, conferir validade a ato ad­ministrativo que nasce sob o estig­ma do desamparo legislativo.

Direito líquido e certo é aquele que se constitui e se aperfeiçoa ao abrigo de expressa autorização le­gislativa. Se isso não ocorre, como no caso destes autos, improspera qualquer tentativa de superar o vÍ­cio. Demais disso, a Administração não é escrava dos seus próprios atos, quando expedidos sem ampa­ro na lei. Daí o enunciado da Súmu­la n Q 473 do STF.

Vale acrescentar, ainda, que igual orientação há de prevalecer quan­do existindo legislação disciplinado­ra, seu comando viola postulado constitucional, Federal ou Estadual, conforme o caso.

Valiosas as observações contidas no pronunciamento do ilustre Su­procurador-Geral da República, Dr. Antônio Fernando Barros e Silva de Souza, ao advertir (fls. 122/124):

"O princípio da legalidade (art. 37, CF/88) aplicado à Administra­ção Pública significa que a ela só é permitido fazer o que a lei au­toriza, conclusão que há de ser ainda mais enfática quando se trata do regime estatutário dos seus servidores. Se a legislação estadual, e esse é o caso dos au­tos, exige como requisito para que a Administração Pública conceda

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998. 343

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a gratificação adicional e os avan­ços trienais que o tempo de ser­viço a ser considerado seja públi­co, é evidente que os atos que deferiram as vantagens à recor­rente, sem a observância do re­quisito em referência, visto que foi considerado tempo de serviço privado, são nulos e, portanto, não geraram qualquer efeito.

Por outro lado, tenho reitera­damente afirmado que a conces­são ilegal de vantagem funcional não gera direito em favor do be­neficiário, muito menos direito adquirido à manutenção do ato ilegal e dos seus efeitos. O Supre­mo Tribunal Federal, mais de uma vez, já proclamou em hipó­tese assemelhada sob o enfoque jurídico - em todas elas trata­va-se de deliberação do Tribunal de Contas da União que excluiu, em processo de registro de apo­sentadoria de magistrado fede­ral, a contagem de tempo de ser­viço privado considerado para efeito de percepção do adicional por tempo de serviço -, que não se configura o direito adquirido quando o alegado reconhecimen­to administrativo da vantagem funcional resulta de ato ilegal:

"Mandado de segurança. Ma­gistrado do Distrito Federal. Decisão do Tribunal de Contas da União que, no processo de sua aposentadoria, excluiu, do cálculo dos proventos, o tem­po de serviço prestado a enti­dade particular e a vantagem prevista no art. 184, inc. lI, da Lei nº 1. 711/52.

Legitimidade do referido ato.

Inexistindo lei autorizadora de contagem de tempo de serviço em atividade particular, para efeito do cálculo de adicional por tempo de serviço, não há falar-se em direito adquirido ao cômputo da aludida vanta­gem nos proventos de aposen­tadoria. O deferimento dos adi­cionais, na atividade, foi ato nulo, insuscetível de gerar di­reito. Precedentes do STF (Repr. nº 1.490 - RTJ 128/43 e MS nº 21.606-DF, DJ de 14-5-93).

De outra parte, o cargo de De­sembargador é da última clas­se da carreira da Magistratu­ra do Distrito Federal, para o efeito do art. 250 da Lei nº 8.112/90.

Segurança denegada."

"Constitucional. Administrati­vo. Magistrado. Adicional por tempo de serviçà. Serviço pres­tado a pessoas jurídicas de di­reito privado.

I - Não se computa, para o fim de concessão de adicional por tempo de serviço, o tempo de serviço prestado a empresas de direito privado não integran­tes da administração pública indireta.

II - Representação 1.490-DF - representação de interpre­tação de lei em tese. RTJ 128/ 43.

III - Inocorrência de direito adquirido em razão de a aver-

344 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998.

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bação ter sido realizada ante­riormente à decisão proferida na Rp 1.490-DF.

V - Mandado de segurança in­deferido."

Porque beneficiária de atos ad­ministrativos ilegais, a recorren­te não está protegida pelo prin­cípio do direito adquirido, nem pelo da irredutibilidade de ven­cimentos, visto que nenhum dos dois protege o servidor público da anulação de ato ilegal. Nenhum dos mencionados princípios pode gerar à percepção de remunera­ção ilegalmente calculada.

Finalmente, tendo em vista que a invalidação do ato não de­correu de falta imputável à recor­rente, mas de ilegalidade, não procede o inconformismo quanto à ausência de processo adminis­trativo, onde lhe fossem assegu­rados o contraditório e a ampla defesa. Não procede, portanto, a alegada desconsideração à garan­tia do devido processo legal. O seu direito de questionar judicial­mente o ato praticado foi e está sendo legitimamente exercido."

Aliás, a jurisprudência pretoria­na, ao examinar casos semelhantes, já repeliu benefícios das espécies, consoante se infere desses acórdãos, respectivamente, do STF e do STJ.

"Servidor público. Tempo de serviço prestado como auxiliar de cartório sem vínculo com o Esta­do. Contagem para efeito de apo­sentadoria. Afronta aos arts. 108

e 200 da Constituição Federal precedente. Precedentes da Cor­te.

A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal está orientada no sentido de que não se concilia com a Constituição Federal de 1969 (arts. 108 e 200) a conta­gem, para todos os efeitos legais, do tempo de serviço prestado por auxiliar de cartório, sem qual­quer vínculo com o Estado.

Recurso extraordinário conhe­cido e provido." (RE n Q 140.897/ SP; Relator Ministro Ilmar Gal­vão).

"Ementa: Recurso especial. Administrativo. Serviço prestado junto a cartório não oficializado. Contagem de tempo de serviço. Serviço público. Impossibilidade. Precedentes.

A jurisprudência desta Corte, bem como do Excelso Pretório, é forte no sentido de que, desta for­ma, não tendo o servidor vínculo com o Estado, não sendo ele fun­cionário público, não faz jus a vantagens atribuídas para funcio­nários públicos" (REsp n Q 61.361/ SP; Relator Ministro José Arnal­do da Fonseca).

A mesma orientação prevalece no âmbito do Tribunal de Contas da União, conforme se vê da decisão per­tinente ao Processo n Q TC 700.219/ 85-4, ao acolher parecer do MP, nes­tes termos, no que interessa:

"O período prestado pelo ser­vidor, na condição de Datilógrafo

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998. 345

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contratado pelo Titular do Car­tório do Registro Civil das Pes­soas Naturais e Anexo de Pirangi (fls. 40), não é computável para efeito de gratificação adicional por tempo de serviço (Sessão de 25.07.1990, TC - 000.413/86-1, Anexo XXVIII da Ata n Q 37/90-Plenário), ainda que autorizado por lei estadual, uma vez que guarda similitude com julgados

desta corte (Decisões de 13.04.1978, TC - 000.691/77, Ata n Q 22/78; 02.02.1982, TC - 033.132/81, Anexo XI da Ata n Q 05/82; e 07.04.1988, TC's - 576.155/87-0 e 576.568/87-2, Anexo IV da Ata n Q 07/88 - 2ª Câmara)."

Ante o exposto, nego provimen­to.

RECURSO ESPECIAL NQ 90.458 - PE

(Registro n Q 96.0016413-4)

Relator: O Sr. Ministro Vicente Leal

Recorrente: Ministério Público Federal

Recorridos: Erotildes Salviano Alves e Ivanete de Andrade Souza

Advogados: Etiene Niete de Castro - defensor e Monica Maria Lins Maciel - defensora

EMENTA: Processual Penal. Apelação criminal. Ministério Pú­blico. Intervenção no processo. Omissão. Presença do Procurador da República na sessão de julgamento. Nulidade. Inexistência.

- Em tema de nulidade no processo penal, o princípio funda­mental que norteia o sistema preconiza que para o reconhecimen­to da nulidade do ato processual é necessário que se demonstre, de modo objetivo, os prejuízos conseqüentes, com influência na apuração da verdade substancial e reflexo na decisão da causa (CPP, art. 566).

- Embora haja disposição expressa no sentido de ser dado vis­ta ao Ministério Público com assento no Tribunal antes do julga­mento de apelação criminal (CPP, art. 610), tal omissão, que não consubstancia nulidade absoluta, foi sanada com a presença do Parquet na sessão de julgamento, momento em que não manifes­tou qualquer oposição.

- Recurso especial não conhecido.

346 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998.

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ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso especial, na conformidade dos votos e notas ta­quigráficas a seguir. Votaram os Srs. Ministros Fernando Gonçalves, Anselmo Santiago e Luiz Vicente Cernicchiaro. Ausente, por motivo de licença, o Sr. Ministro William Patterson.

Brasília, 26 de maio de 1998 (data do julgamento).

Ministro ANSELMO SANTIA­GO, Presidente. Ministro VICENTE LEAL, Relator.

Publicado no DJ de 22-06-98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO VICENTE LEAL: O ilustre Juiz Federal Ma­noel de Oliveira Erhardt, titular da 3ª Vara da SJ/PE, sentenciando nos autos da ação penal proposta con­tra Erotildes Salviano Alves e ou­tro sob a acusação de prática do cri­me de prevaricação absolveu os réus por falta de provas (fls. 745/748).

A sentença monocrática foi con­firmada por decisão unânime da Se­gunda Turma do Tribunal Regional Federal da Quinta Região, consoan­te acórdão da lavra do então Juiz José Delgado, hoje compondo esta Corte (fls. 775/783).

O Ministério Público Federal opôs embargos de declaração, alegando

que houve omissão no tocante à intervenção do Ministério Público Federal como fiscal da lei, com vio­lação aos arts. 37, I, e 68, da LC 751 93, e aos arts. 610 e 613, do CPP (fls. 786/789).

Ao rejeitar os embargos, a Egré­gia Turma, após acentuar que o re­presentante do Ministério Público Federal esteve presente à sessão de julgamento e não ofereceu qualquer oposição, sustentou que a ausência de ato processual sem repercussão na causa consubstancia nulidade à míngua de prejuízo (fls. 796).

Irresignado, o Ministério Públi­co Federal interpõe o presente re­curso especial com invocação da alí­nea a do permissivo constitucional, insistindo que o acórdão em tela negou vigência aos arts. 564, lU, d, e 610, do Código de Processo Penal (fls. 799/802).

Não oferecidas as contra-razões e admitido o recurso (fl. 807), ascen­deram os autos a esta Corte, ensejo em que a douta Subprocuradoria Geral da República, em parecer de fls. 812/816, opina pelo provimento do recurso.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO VICENTE LEAL (Relator): A questão posta em julgamento, embora não debatida no acórdão, foi objeto de prequestio­namento na via de embargos de de­claração, providência pertinente, de vez que a alegada violação de­correu do julgamento sem a prévia manifestação do Ministério Público.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998. 347

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Tenho, assim, como presentes os pressupostos de admissibilidade do recurso.

No mérito, não vejo por que pro­clamar a nulidade do acórdão pela única razão de não se ter dado vis­ta do processo à Procuradoria Re­gional da República antes do julga­mento da apelação.

É certo que o art. 610, do CPP, contém expressa disposição no sen­tido de ser dado vista ao Ministério Público com assento no Tribunal an­tes do julgamento da apelação.

Todavia, tal omissão não chega a configurar nulidade absoluta, pas­sível de contaminar irremediavel­mente o julgamento.

Ora, em tema de nulidade no pro­cesso penal, o princípio fundamen­tal que norteia o sistema preconiza que para o reconhecimento da nuli­dade do ato processual é necessário que se demonstre, de modo objeti­vo, os prejuízos conseqüentes com efetiva influência na apuração da verdade substancial e reflexo na decisão da causa. Tal princípio en­contra-se entronizado nos arts. 563 e 566, do Código de Processo Penal,

e foi objeto de especial destaque do mestre Francisco Campos, na Expo­sição de Motivos apresentadora do citado diploma legal, ensejo em que proclamou que 'nenhuma nulidade ocorre se não há prejuízo para a acusação ou para a defesa' (sic)."

No caso, consoante acentuado no acórdão proferido no julgamento dos embargos de declaração, o re­presentante do Ministério Público Federal esteve presente à sessão de julgamento da apelação e não ma­nifestou qualquer oposição. Ressal­te-se que a apelação fora interpos­ta pelo Ministério Público com atua­ção no primeiro grau, o que afasta qualquer idéia de que a falta de pré­via intervenção na segunda instân­cia poderia causar prejuízo para a acusação.

Assim, é de se reconhecer que a questionada omissão em nada re­percutiu no julgamento da apelação. E como já acentuado, sem prejuízo não há nulidade.

Isto posto, não conheço do recur­so especial.

É o voto.

RECURSO ESPECIAL Nº 132.539 - SC

(Registro nº 97.0034758-3)

Relator: O Sr. Ministro William Patterson Recorrente: Ministério Público do Estado de Santa Catarina Recorrido: Gerhard Bozler Advogado: Dr. Miguel Teixeira Filho

348 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998.

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EMENTA: Penal. Seqüestro de bens. Crime de sonegação fiscal. Decreto-Lei n 9 3.240, de 1941. Aplicação.

- A teor de orientação já firmada na Sexta Turma do STJ, não está revogado, pelo Código de Processo Penal, o Decreto-Lei nº 3.240, de 1941, no ponto em que disciplina o seqüestro de bens de pessoa indiciada por crime de que resulta prejuízo para a fazen­da pública.

- Recurso Especial conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos vo­tos e das notas taquigráficas a se­guir, prosseguindo no julgamento, após o voto-vista do Sr. Ministro Anselmo Santiago, por maioria, co­nhecer do recurso e dar-lhe provi­mento .. Vencido o Sr. Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro. Participaram do julgamento os Srs. Ministros William Patterson e Luiz Vicente Cernicchiaro. Não participaram do julgamento os Srs. Ministros Vicen­te Leal e Fernando Gonçalves.

Brasília, 01 de dezembro de 1997 (data do julgamento).

Ministro ANSELMO SANTIA­GO, Presidente. Ministro WILLIAM PATTERSON, Relator.

Publicado no DJ de 09·02·98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO WILLIAM PATTERSON: A matéria versada nestes autos foi assim sumariada no Tribunal de origem (fls. 62/64):

"Perante o Juízo de Direito da 1 ª Vara Criminal da Comarca de Joinville, o representante do Mi­nistério Público requereu limi­narmente medida cautelar asse­curatória de seqüestro de bens (devidamente identificados às fls. 3 e 4) de Gehard Bozler, denun­ciado como incurso nas sanções do artigo 2Q

, n, da Lei 8.137/90, porque supostamente teria pra­ticado delito contra a ordem tri­butária, fundamentando, o Dr. Promotor, a sua pretensão nos artigos 1 Q c/c o 2Q

, caput, do De­creto-Lei n Q 3.240, de 8/5/1941, e, por último, a especialização da hipoteca legal dos referidos bens, na forma preconizada no art. 135 e parágrafos, do Código de Pro­cesso Penal.

Decidindo liminarmente, o Dr. Juiz a quo indeferiu o pedido ini­cial, por entender que restou re­vogado o Decreto-lei n Q 3.240/41, embasador da pretensão, com a entrada em vigor do Código de Processo Penal, e também porque todos os imóveis descritos e indi­vidualizados, cujo seqüestro está a ser pleiteado, foram incorpora­dos ao acervo patrimonial do acu­sado não por atos inter vivos,

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998. 349

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mas sim em decorrência de suces­são causa mortis, através de auto de partilha datado de 21/05/ 91, não podendo presumir-se, as­sim, a proveniência ilícita de tais bens.

Inconformado com a decisão, o órgão do Ministério Público a quo interpôs recurso de apela­ção, forte no art. 593, inciso lI, do Código de Processo Penal, ob­jetivando a reforma da sentença, por entender não estar revogado o Diploma Legal supedaneador da pretensão, e, conseqüentemen­te, o acolhimento do pedido for­mulado.

O acusado, opportuno tem­pore, apresentou suas contra­razões de apelação, através de defensor constituído, versando sobre matéria constitucional, aduzindo que a bem lançada sen­tença não deve sofrer qualquer reparo, posto que o Decreto-lei 3.240/41 encontra-se revogado pela legislação processual vigen­te, pois, caso contrário, estaria em evidente confronto com os di­reitos e garantias do cidadão, ex­pressamente inscritos na Consti­tuição Federal de 1988, especifi­camente o art. 52, LIV e LV (de­vido processo legal e ampla defe­sa). Por fim, pleiteou que antes da apreciação do mérito, fossem os autos enviados ao Pleno desta Corte, para a apreciação da in­constitucionalidade argüida.

Prestadas as informações, nes­ta Jnstância a douta Procurado­ria Geral de Justiça manifestou­se, em parecer da lavra do Dr.

Agamenon Bento do Amaral, pelo desprovimento do recurso inter­posto."

O apelo foi desprovido, em acór­dão refletido na respectiva ementa, escrita nestes termos (fls. 62):

"Apelação criminal. Medida cautelar assecuratória de seqües­tro de bens, como garantia de dé­bito fiscal junto à fazenda públi­ca, motivada pelo disposto nos arts. 1 Q e 2Q

, do Dec.-Lei 3.240/ 41. Indeferimento do seqüestro cautelar no primeiro grau. Recur­so ministerial visando a reforma da decisão monocrática. Imóveis adquiridos em decorrência de su­cessão causa mortis (auto de partilha). Bens que não foram ob­tidos com o produto da sonega­ção fiscal denunciada. Impossibi­lidade do deferimento da medida cautelar. Revogação, ademais, do Decreto-Lei fundamentador do pedido, pela entrada em vigor do Código de Processo Penal. Sen­tença confirmada. Recurso des­provido."

Com fundamento nas alíneas a e c, do permissivo constitucional, o Ministério Público do Estado de Santa Catarina ofertou o presente recurso especial, alegando negativa de vigência do Decreto-Lei n 2 3.240, de 1941, além de divergênciajuris­prudencial.

Nesta Corte, o Ministério Públi­co Federal manifestou-se no senti­do do provimento do recurso (fls. 140).

É o relatório.

350 R. Sup. Trib. Just., Brasilia, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998.

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VOTO

O SR. MINISTRO WILLIAM PAT­TERSON (Relator): A discussão pos­ta neste recurso especial gira em torno da revogação ou não do De­creto-Lei n Q 3.240, de 1941, visto como o v. acórdão impugnado endos­sou a tese do juízo monocrático no sentido de que o referido ordena­mento perdeu eficácia com a pro­mulgação do Código de Processo Penal, diante dos termos das regras contidas nos seus arts. 125 e 126.

A propósito, vale lembrar as con­siderações contidas no voto condu­tor (fls. 64/65):

"Ora, o Decreto-Lei n Q 3.240, de 8.5.41, teve como finalidade precípua colocar sob sujeição a seqüestro os bens de pessoas indiciadas por crimes de que re­sultaram prejuízo para a Fazen­da Pública, estabelecendo, em seu artigo 1 Q e artigo 3Q

, três re­quisitos para a sua decretação, conforme se constata de simples leitura de texto legal. Entretan­to, tal Decreto-Lei teve vigência até 1 Q de janeiro de 1942, quan­do entrou em vigor o novo Códi­go de Processo Penal, que em seus arts. 125 e 126, assim dis­pôs, respectivamente:

"Art. 125. Caberá o seqües­tro dos bens imóveis, adquiri­dos pelo indiciado com os pro­ventos da infração, ainda que já tenham sido transferidos a terceiro."

"Art. 126. Para a decretação do seqüestro, bastará a exis-

tência de indícios veementes da proveniência ilícita dos bens."

Assim, independente de ter o apelado sonegado ou não impos­tos devidos à Fazenda Pública, questão esta que não cabe ser analisada nestes autos, o seqües­tro de bens visando garantir o respectivo débito de Gerhard Boz­ler com este ente recaiu sobre os imóveis descritos e individualiza­dos às fls. 03/04 dos autos, imó­veis estes que foram incorpora­dos ao patrimônio do apelado não por ato inter vivos, e sim em decorrência de sucessão causa mortis, fato documentado pelo auto de partilha datado de 21/05/ 91. Salienta-se, ainda, que a data da partilha dos bens foi anterior à da suposta sonegação denun­ciada (fls. 7).

Deste modo, não podia o refe­rido diploma legal ser aplicado e ter servido de sustentáculo para o seqüestro de bens, que indubi­tavelmente não tiveram origem ilícita."

Consoante comprovado na peça recursal a espécie já foi objeto de apreciação por esta Colenda 6ª Tur­ma, em acórdão lavrado pelo emi­nente Ministro Adhemar Maciel que recebeu o aval do ilustre Ministro Luiz Vicente Cernicchiaro, o único remanescente da composição do Colegiado, naquela oportunidade.

Extraio do voto do culto Ministro Maciel os seguintes lances (fls. 117/ 120):

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369; setembro 1998. 351

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"O Decreto-Lei n Q 3.240/41, ti­nha ou tem a seguinte rubrica: "Sujeita a seqüestro os bens de pessoas indiciadas por crimes de que resulta prejuízo para a fazen­da pública". Dizia ou diz:

"Art. 1 Q Ficam sujeitos a se­qüestro os bens de pessoa in­diciada por crime de que resul­ta prejuízo para a fazenda pú­blica, ou por crime definido no livro lI, Títulos V, VI e VII da Consolidação das Leis Penais desde que dele resulte locuple­tamento ilícito para o indicia­do.

"Art. 2Q O seqüestro é decre­tado pela autoridade judiciá­ria, sem audiência da parte, a requerimento do ministério público fundado em represen­tação da autoridade incumbi­da do processo administrativo ou do inquérito policial.

§ 1 Q A ação penal terá início dentro de noventa dias conta­dos da decretação do seqües­tro".

Senhor Presidente, os recor­rentes, que já encontraram res­sonância no voto do Ministro-Re­lator, afirmam que o Decreto-Lei n Q 3.240/41 já foi revogado há mais de meio século. O CPP re­gula a matéria.

Mandei fazer uma pesquisa em nosso serviço de jurisprudência. Em cerca de cinco acórdãos, to­dos do .antigo TFR, aparece o famigerado decreto-lei como uma das referências legislativas. São

eles: REO n Q 94.312/RJ (ReI. Min. Pádua Ribeiro), MS n Q 115.299/ SP (ReI. Min. Nilson Naves), AC n Q 60.844/RJ (ReI. Min. William Patterson), AG n Q 49.048/ES (ReI. Min. José Dantas) eAC n Q 58.634/ RJ)

Data venia dos recorrentes, tenho para mim que não se pode falar que o decreto-lei em ques­tão estej a revogado (melhor se­ria dizer ab-rogado). Pelo § 1 Q do art. 2Q da LICC, uma lei só revo­ga a anterior, quando expressa­mente o disser, quando com ela incompatível ou quando regular inteiramente a matéria de que tratava a lei velha. Ora, o CPP, quando cuida das "medidas asse­curatórias", normatiza coisa dife­rente: trata em seus arts. 125 e 132 de seqüestro de bens imóveis ou móveis .adquiridos com o pro­duto de crime. Já o Decreto-Lei n Q 3.240/41, como acabamos de ouvir, em seu art. 1 Q, primeira parte, cura de "seqüestro de bens de pessoa indiciada por crime de que resulta prejuízo para Fazen­da Pública". Como se vê, as leis regulam ássuntos diversos. Logo, têm existência compatíveis.

ReIy Lopes Meirelles, como foi mencionado pelo intervenien­te (Estado da Paraíba), diz em seu festejado "Direito Adminis­trativo Brasileiro", Malheiros, 19ª ed., pág. 423:

"O seqüestro dos bens adqui­ridos pelo indiciado com o pro­duto da infração penal está ge­nericamente disciplinadp no

352 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998.

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CPP, arts. 125 a 144. Todavia, quando a vítima é a Fazenda Pública, o procedimento é o previsto no Dec.-Lei 3.240, de 8.5.41, expressamente revigo­rado pelo Dec.-Lei 359/68 (art. 11). Nesse caso, é requerido pelo Ministério Público, por representação da autoridade policial ou da administrativa, dependendo sua subsistência da instauração da ação penal no prazo de noventa dias (arts. 6º, I, e 2º, § 1º)."

Por sua vez, o Decreto-Lei nº 359/68, que criou a "Comissão Geral de Investigações", reza:

"Art. 11 - Continuam em vi­gor o Decreto-Lei n Q 3.240, de 8 de maio de 1941, e as Leis n.!!.S. 3.164, de 1 º de junho de 1957, e 3.502, de 21 de dezem­bro de 1958, no que não colidi­rem com o disposto neste De­creto-Lei."

Carlos Alberto Álvaro de Oliveira e Galeno Lacerda, no "Comentários ao Código de Pro­cesso Civil", Forense, 2ª ed., voI. VIII, tomo lI, comentando sobre o instituto do seqüestro civil, ob­servam à pág. 66:

"Em alguns casos, a lei provê, explicitamente, quanto à legi­timação do Ministério Público: a) Decreto-Lei nº 3.240, de 08.05.41, art. 2º, quanto aos bens das pessoas indiciadas por crime de que resulte pre­juízo à Fazenda Pública; b)

Decreto-Lei n Q 3.415, de 10.07.41, art. 2Q

, relativamen­te aos bens apreendidos aos acusados de crime contra a Fazenda Nacional; c) Decreto­Lei n Q 3.931, de 11.12.41 (Có­digo de Processo Penal), art. 127, referindo-se ao seqüestro (penal) dos bens imóveis ad­quiridos pelo indiciado com proventos da infração, mesmo que transferidos a terceiro."

Assim, Senhor Presidente, em que pesem ao entendimento dos recorrentes, ou por fás ou por nefas, o Decreto-Lei n Q 3.240/41 está vivo em nosso ordenamento legal e é instrumento legal para coibir abusos de sonegadores e fraudadores da Fazenda Pública.

Na realidade, o Decreto-Lei nº 3.240/41 instituiu em favor da Fazenda Pública uma medida cautelar em como tal, dotada de presteza e provisoriedade. Como medida cautelar, ela pode e às ve­zes deve ser decretada inaudita.

Em princípio, não vejo na me­dida, drástica, reconheço, mas às vezes necessária, afronta ao de­vido processo legal, pois os recor­rentes, após o seqüestro, terão, evidentemente, a oportunidade de ampla defesa. Aí, sim, terão ensejo de se defenderem e joga­rem por terra o ato judicial e, mais, responsabilizarePl o órgão e a pessoa jurídica pelo abuso por acaso cometido."

Como visto, precedente de minha relatoria (AC n Q 60.844-RJ), citado

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998. 353

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no pronunciamento posto em desta­que, avaliza o mesmo entendimen­to ali expresso, ao conceber não re­vogado, pelo CPP, o Decreto-Lei n Q

3.240/41, no ponto em que discipli­na o seqüestro de bens de pessoa indiciada por crime que resulta pre­juízo para a Fazenda Pública.

Ante o exposto, conheço do recur­so especial, e, em conseqüência, dou-lhe provimento, para que o exa­me do pedido de seqüestro de bens seja feito como base no Decreto-Lei n Q 3.240/41.

VOTO-VISTA

O SR. MINISTRO LUIZ VICEN­TE CERNICCHIARO: O tema cen­tral deste Recurso Especial é a vi­gência do Decreto-Lei n. 3.240, de 8 de maio de 1941, anterior ao Códi­go de Processo Penal. Este diploma dedica o Título VI - Das Questões e Processos Incidentes, capítulo VI - Das Medidas Assecuratórias. Au­toriza o seqüestro de bens imóveis, adquiridos pelo indiciado com os proventos da infração, ainda quejá tenham sido transferidos a terceiro (art. 125). E acrescenta no art. 130:

"O seqüestro poderá ainda ser embargado:

I - pelo acusado, sob o funda­mento de não terem os bens sido adquiridos com os proventos da infração".

O Código de Processo Penal dis­ciplinou inteiramente a matéria do Decreto-Lei n. 3.240, de 8 de maio de 1941.

Em sendo assim, a lei posterior prefere à anterior. E, entre elas, há distinção importante. O Código en­seja o direito de defesa, mediante embargos. Coaduna-se, aliás, com a Constituição da República que pre­serva o direito adquirido. Entre es­te, sem dúvida, coloca-se a proprie­dade, também resguardada pela Carta Política.

O seqüestro, sabe-se, é instituto de interpretação restrita. Tanto as­sim, o Código de Processo Penal res­tringe-se aos "bens imóveis, adqui­ridos pelo indiciado com os provei­tos da infração".

O proprietário, assim, tem direi­to subjetivo de evidenciar que a impu­tação não se ajusta aos limites da lei.

Em decisão anterior, entendi:

"RMS - Constitucional- Pro­cessual Penal - Mandado de se­gurança - Infração penal- So­negação - Seqüestro de bens -O seqüestro de bens, ao funda­mento de prática de infração pe­nal, é admissível, em havendo indícios do delito e que a separa­ção judicial do casal se reveste de fraude, dado continuar a vida em comum. O fato reclama investi­gação probatória. Inadequação do mandado de segurança. Possibi­lidade jurídica dos Embargos de Terceiro". (RMS 6.645/RS)

O v. acórdão recorrido deixou ex­presso inexistir, nos autos, prova de os bens objeto do seqüestro haverem sido obtidos por meio ilícito (fls. 66).

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o Recurso Especial é infenso à produção de provas (Súmula 7, STJ).

Não conheço do Recurso Espe­cial.

VOTO- VISTA

o SR. MINISTRO ANSELMO SANTIAGO: Trata-se de discussão sobre a vigência, ou não, do Decre­to-Lei nQ 3.240/41, que o Eg. Soda­lício catarinense entendeu que, com a edição do Código de Processo Pe­nal, em especial os artigos 125 e 126, já não mais está em vigor.

O ilustre Relator, com o reforço de decisão anterior, entende que ainda continua vivo o diploma em comento.

De fato, a leitura dos escassos ensinamentos doutrinários e daju­risprudência leva a essa conclusão, dando-se à Fazenda Pública o tra­tamento privilegiado de poder se­qüestrar os bens de qualquer indi-

ciado em crime contra o Erário, mesmo que não tenham sido adqui­ridos com o produto do crime.

Trata-se, na verdade, de institu­to de pouco uso, daí a pobreza, an­tes anunciada, de lições de nossos processualistas, ou mesmo dos tri­bunais. É que a Fazenda Pública, desamarrada do aspecto penal, não fica na espera de que tais medidas acauteladoras sejam tomadas, pre­ferindo diretamente a execução da dívida, onde pode penhorar quais­quer bens do devedor, sejam ou não provenientes de delito. Pelo que se sabe, dificilmente representa ao Mi­nistério Público, como disposto no art. 2Q, do DL nQ 3.240/41, para que este proceda ao seqüestro ali pre­visto.

De qualquer forma, também en­tendo que o diploma em exame ain­da continua vigorando, acompa­nhando, nesse particular, o ilustre Relator.

É o meu voto.

RECURSO ESPECIAL NQ 147.850·- RJ

(Registro n Q 97.0064136-8)

Relator: O Sr. Ministro Vicente Leal

Recorrente: Roberto José Maia Serpa - espólio

Recorrido: Alexandre Guilherme Miguel Mayworm.

Representado por: Sylvia Salles Couto - inventariante

Advogados: Maria da Gloria P. Ponte Gomes e Valdir Pietre

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (!09): 313-369, setembro 1998. 355

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EMENTA: Processual Civil. Magistrado. Predicamentos. Impar­cialidade. Recebimento de dádiva para reforma do Fórum. Exce­ção de suspeição. Reconhecimento objetivo. CPC, art. 135, IV.

- As garantias constitucionais de vitaliciedade, inamovibili­dade e irredutibilidade de vencimentos têm por escopo colocar o magistrado em espaço superior aos interesses das partes em lití­gio, com efetivo resguardo do grande predicado da imparcialida­de.

- O nosso Código de Processo Civil no art. 135, qualifica de fundada a suspeição de parcialidade do Juiz com a simples cons­tatação de uma das situações de fatos arrolados nos seus incisos, independentemente de investigação subjetiva.

- Se o Juiz da causa, ao tempo em que exercia a função de Diretor do Foro, recebeu de uma das partes valores pecuniários para a realização de obras de manutenção do prédio onde funcio­na a Justiça local, fez nascer vínculo contratual a título gratuito, o que enseja, de modo objetivo, que sua imparcialidade seja pos­ta em questão, impondo-se o reconhecimento da suspeição.

- Recurso especial conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, prosseguindo-se no julga­mento, após voto-vista do Sr. Minis­tro Fernando Gonçalves, acordam os Ministros da Sexta Turma do Su­perior Tribunal de Justiça, por una­nimidade, conhecer do recurso e lhe dar provimento, na conformidade dos votos e notas taquigráficas a seguir. Participaram do julgamen­to os Srs. Ministros Fernando Gon­çalves e Anselmo Santiago. Ausen­tes, por motivo de licença, o Sr. Mi­nistro William Patterson e, justifi­cadamente, o Sr. Ministro Luiz Vi­cente Cernicchiaro.

Brasília, 28 de abril de 1998 (data do julgamento).

Ministro ANSELMO SANTIA­GO, Presidente. Ministro VICENTE LEAL, Relator.

Publicado no DJ de 01·06-98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO VICENTE LEAL: O espólio de Roberto José Maia Serpa, contra o qual foi ajui­zada ação de reintegração de posse por Alexandre Miguel Mayworm, argüiu exceção de suspeição em face do MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Teresópolis -RJ, com fulcro no inciso IV, do arti­go 135, do Código de Processo Ci­vil, que disciplina o recebimento de dádivas antes ou depois de iniciado o processo.

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Sustentou, em essência, que o magistrado, na qualidade de Dire­tor do Foro daquela Comarca, rece­beu de empresa da qual o autor é sócio quotista majoritário dádivas para a reforma parcial do Fórum e, além disso, atuara antes como ad­vogado em patrocínio de seus inte­resses, o que impõe óbice ao seu fun­cionamento no feito mencionado.

Aegrégia Segunda Câmara Cível do Tribunal de Alçada Cível do Es­tado do Rio de Janeiro, por unani­midade de votos, confirmando a de­cisão do R. Juiz que repeliu a ar­güição, julgou improcedente a exce­ção, ao entendimento de que as con­tribuições recebidas reverteram-se em benefício da comunidade, nas obras de reforma do prédio, e não em favor do magistrado responsá­vel pela direção do Fórum (fls. 481 51). O julgamento em tela foi con­solidado em ementa do seguinte teor:

"Exceção de suspeição. Magistra­do. Exercício anterior de advoca­cia. Patrocínio de interesses de empresa. Reintegração de posse. Autor que figura como sócio ma­joritário. Garantia constitucional de isenção e imparcialidade do Juiz. Teoria da desconsideração da pessoa jurídica. Suspeição ar­güida com base no inciso IV, do art. 135 do Código de Processo Civil. Prova não perfilada. Pre­sunçãojuris tantum em relação à retidão de caráter do Juiz que exerce cumulativamente a função de Diretor do Foro. Pretensão im­procedente". (fls. 48).

Opostos embargos de declaração, restaram os mesmos rejeitados.

Irresignado, o excipiente inter­põe o presente recurso especial (fls. 60/71), com fulcro na letra c do per­missivo constitucional, verberando ter o v. acórdão recorrido ensejado divergência com julgado da Segun­da Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Grosso que considerou o recebimento de importâncias para manutenção do Fórum como causa suficiente à ca­racterização da imparcialidade do Juiz (fls. 60171).

Não apresentadas contra-razões e admitido o recurso na origem, as­cenderam os autos a esta Colenda Corte.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO VICENTE LEAL (Relator): Ataca-se no presen­te recurso especial acórdão que jul­gou improcedente exceção de sus­peição argüida contra o MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Cível para fun­cionar nos autos de ação de reinte­gração de posse ajuizada por sócio de empresa da qual recebeu, quan­do desempenhava funções de dire­ção no Fórum daquela comarca, con­tribuições pecuniárias à rea:Iização de obras de melhoramento no prédio.

Proclamou o eminente colegiado julgador, nessa oportunidade, que, tendo sido as importâncias reverti­das em favor da comunidade pela reforma das instalações do prédio do Poder Judiciário local, e não em

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benefício dos interesses próprios e imediatos do magistrado, não há como se colocar em questão sua par­cialidade, cujo caráter e conduta de retidão estão ao abrigo da presun­ção iuris tantum.

A seguinte passagem da ementa reflete, com propriedade, os exatos termos da fundamentação contida no bojo do aresto impugnado, lit­teris:

"N o que toca propriamente ao pe­dido fundado nas disposições do inciso IV, do art. 135, do CPC, tem -se como não fundadas as ar­güições procedidas, visto que, de­monstrado, diante da prova e dos fatos, que as benesses referidas e ditas como recebidas pelo ma­gistrado não se reverteram em seu próprio favor, destinadas que foram para a reforma do fórum da comarca e em benefício de lar­ga parcela da comunidade, que se utilizam das dependências cente­nárias do prédio onde se acha ins­talado o poder judiciário local.

É de sabença geral que, não obs­tante consagra a lei maior quan­to à independência do poder ju­diciário dos demaiscerigidos, este se apresenta como o mais caren­te de recursos orçamentários, de­pendente do executivo para rea­lizações materiais mais urgentes e que, à míngua de interesses imediatos, porque sem retorno político, muitas vezes, vê-se obri­gado, para suas necessidades mais prementes, socorrer-se da própria sociedade, que, sempre alerta, aqui como alhures, tem,

pela sua melhor representação, contribuindo, em muito, para que prédios utilizados não desabem, instalações funcionem com o mí­nimo de conforto para as partes e os profissionais do direito, aí con­siderados corredores, escadas, sa­las, banheiros e etc ...

De norte a sul do estado, não é mais feliz a Comarca de Petrópo­lis. Sediado o Poder Judiciário local em prédio da época do im­pério, inclusive, tombado pelo patrimônio, seu desgaste no tem­po está sempre a exigir obras de vulto e que os cofres públicos tei­mam em não atendê-las segundo suas necessidades mais urgentes, capacitando, sem qualquer ilega­lidade, que seguimentos da socie­dade o substituam parcialmente para a realização de feitos e que, sem dúvida, revestem-se de be­nefícios coletivos". (fls. 50).

Pugna o excipiente, nas razões deduzidas no apelo nobre, pelo re­conhecimento da suspeição do juiz para funcionar no feito em que te­nha recebido da empresa, da qual a parte autora figura como sócio quo­tista majoritário, dádivas para rea­lização de obras, sob pena de viola­ção à garantia constitucional da im­parcialidade do juiz natural.

E para comprovar a alegada di­vergência jurisprudencial, trouxe­ram à colação julgado da egrégia Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Mato Gros­so que, analisando questão idênti­ca à do autos, concluiu pela suspei­ção do juiz da causa.

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E o referido julgamento foi con­solidado na seguinte ementa:

"Exceção de suspeição. Oferta de dádiva em dinheiro para manu­tenção do Fórum. Verificação ob­jetiva da inibição.

O recebimento da significativa importância, pelo juiz, ofertada por uma das partes, a título de donativo para a manutenção do forum, antes ou no curso da de­manda, retira a confiança em que se assenta o juízo de imparciali­dade, mesmo que se prove a apli­cação naquele fim". (fls. 68).

Tenho que o recurso especial ma­nifestado com esteio na alínea c do permissivo constitucional, reúne condições de admissibilidade, de modo a permitir a uniformidade dos julgados, missão constitucional do Superior Tribunal de Justiça.

Após demorada reflexão sobre o thema decidendum, tenho que o acórdão recorrido não conferiu ao assunto em debate a melhor exege­se.

Um dos predicados fundamentais que conferem grandeza, dignidade e autoridade à atuação do magistra­do é a absoluta imparcialidade em face dos interesses manifestados pelos litigantes do processo.

O Juiz, no exercício sagrado da função de distribuir justiça, é agen­te da soberania estatal e deve, por-. tanto, situar-se sempre em plano superior ao mundo dos interesses em conflito. Daí porque a nossa lei adjetiva enumera diversas hipóte­s'es de impedimento (art. 134) e sus-

peição (art. 135) do Juiz, definidoras de situações que possam conduzir à idéia de parcialidade em face da causa.

Dentre tais hipóteses merece des­taque aquela inscrita no art. 135, IV, do CPC, que reputa fundada a sus­peição de parcialidade do Juiz que houver recebido dádivas antes ou depois de iniciado o processo.

No caso, foi proclamado pelo Tri­bunal a quo que o ilustre Juiz de Direito da 3ª Vara Cível da Comar­ca de Petrópolis, quando exercia a função de Diretor do Foro, recebeu da empresa da qual a parte autora figura como sócio quotista majori­tário importâncias pecuniárias para a realização de obras de manuten­ção e conservação do prédio do Po­der Judiciário.

Assim, a toda evidência, não se pode desprezar o fato de que entre o juiz da causa e a parte estabele­ceu-se vínculo contratual a título gratuito, colocando em questão sua imparcialidade da condução do pro­cesso e na aplicação do Direito, ain­da que as dádivas tenham sido efe­tivamente convertidas em benefício para a comunidade.

O preceito do art. 135, do CPC, não exige que fique demonstrada a postura parcial do Juiz. A norma em apreço, de feliz elaboração, qualifi­ca de fundada a suspeição de parcia­lidade do Juiz com a simples cons­tatação de uma das situações de fato arroladas nos seus incisos.

Assim, tenho que o acórdão diver­gente, oriundo do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Mato Gros­so, conferiu ao tema a melhor exe­gese.

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No mencionado precedente, cuja situação de fato é idêntica, o ilus­tre Desembargador Leão Neto do Carmo fez consignar no voto condu­tor do julgamento a seguinte pas­sagem:

"Parece-me, pois, apesar do significado dos propósitos, que é prejudicial à imagem do Poder Judiciário estar o Juiz, de qual­quer grau, a receber dádivas ou angariar recursos junto a seus jurisdicionados, para qualquer fi­nalidade; mais ainda quando sub­vencionar serviço da justiça, ônus que cabe ao Estado; sobremanei­ra prejudicial, quando o fato ocor­re em comarcas de primeiro grau, onde a autoridade judicial é úni­ca e o contato com os jurisdicio­nados é maior" (fls. 74).

E, em seguida, cita lição de Cel­so Agrícola Barbi, de adequada pertinência:

"Importância da Imparcialida­de do Juiz: primeira e mais im­portante qualidade de um juiz é a imparcialidade. Investido da alta missão de decidir acerca dos mais relevantes interesses das partes, munido de amplos pode­res para esse fim, é indispensá­vel que o Juiz realmente julgue sem ser influenciado por quais­quer fatores que não o direito dos litigantes.

O despreparo cultural ou mo­rosidade do juiz pode preocupar o litigante. Mas o fator que é re­almente capaz de intranqüilizá­lo, de fazê-lo descrer na justiça

humana, é a falta de confiança na isenção do juiz.

Por isso, pode-se afirmar, sem receio de erro, que as garantias de vitaliciedade, de inamovibili­dade e de irredutibilidade de ven­cimentos, elevadas à culminância constitucional e destinadas a as­segurar a independência do Juiz, têm por finalidade última res­guardar a sua imparcialidade.

Ainda que o Juiz tenha todas as condições para correta atua­ção nas causas que, em princípio, podem ir ao seu exame, há po­rém, algumas em que a sua situ­ação pessoal, em relação às pes­soas que participam do processo ou ao interesse em litígio, pode influir no seu espírito, de modo a impedir um correto julgamento da demanda.

Por esse motivo, para dar tran­qüilidade aos litigantes e confi­ança na retidão dos julgamentos, a lei manda que o Juiz se afaste de determinadas causas e permi­te que a parte impugne sua pre­sença, quando ele não se afastou espontaneamente." (in Com. ao C.P.C., I vol., T. lI, págs. 546 e 547, For., 1971) (fls. 75)".

Tenho como pertinentes os co­mentários acima transcritos, o que reforça a tese da relevância do pre­dicamento da imparcialidade do magistrado em face dos interesses das partes em conflito.

Daí a prevalência da tese que re­comenda, em hipóteses dessa espé­cie, o reconhecimento objetivo da suspeição.

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Isto posto, conheço do recurso e dou provimento para julgar proce­dente o incidente de suspeição.

É o voto.

VOTO- VISTA

o SR. MINISTRO FERNANDO GONÇALVES: A matéria está rela­cionada com a suspeição do MM. Juiz de Direito da 3ª Vara Cível de Teresópolis para funcionar na ação de reintegração de posse ajuiza­da contra o espólio de Roberto José

Maia Serpa por Alexandre Miguel Mayworm.

A exemplo do que restou deci­dido no julgamento do REsp nº 83.732-RJ, acompanho o eminente Relator, Min. Vicente Leal.

VOTO (VOGAL)

O SR. MINISTRO ANSELMO SANTIAGO: Srs. Ministros, voto de acordo com o Sr. Ministro-Relator.

É o voto.

RECURSO ESPECIAL Nº 153.957 - RN

(Registro nº 97.0079347-8)

Relator: O Sr. Ministro William Patterson

Recorrentes: Ministério Público Federal e União Federal

Recorrida: Associação dos Sub tenentes e Sargentos do Exército em Na­tal-ASSEN

Advogados: Drs. Jayme Renato Pinto de Vargas e outro

EMENTA: Previdenciário. Reajuste de beneficio. URP fevereiro de 1989 (26,05%).

- Consoante a jurisprudência do STF, recepcionada neste Tribu­nal, inexiste direito adquirido ao percentual de 26,05% relativo a fevereiro de 1989.

- Recurso conhecido e provido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal

de Justiça, na conformidade dos vo­tos e das notas taquigráficas a se­guir, por unanimidade, conhecer do recurso e dar-lhe provimento, nos termos do voto do Sr. Ministro-Re-

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lator. Votaram com o Sr. Ministro­Relator os Srs. Ministros Luiz Vi­cente Cernicchiaro, Vicente Leal e Anselmo Santiago. Ausente, ocasio­nalmente, o Sr. Ministro Fernando Gonçalves.

Brasília, 02 de dezembro de 1997 (data do julgamento).

Ministro ANSELMO SANTIA­GO, Presidente. Ministro WILLIAM PATTERSON, Relator.

Publicado no DJ de 02-02-98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO WILLIAM PATTERSON: Com amparo nas alí­neas a e c da regra constitucional, a União Federal impugna o acórdão do Egrégio TRF da 5ª Região que, julgando ação rescisória onde plei­teada a anulação de julgado que concedeu reajuste de vencimentos pelo índice de 26,05% (URP de fev./ 89), entendeu não caracterizada a ofensa ao art. 485, V, do Código de Processo Civil, em razão de dissídio pretoriano, daí que concluiu pela improcedência da ação nos seguin­tes termos (fls. 100/101):

"Ação rescisória. Sentença que reconheceu direito adquirido ao reajuste de vencimentos, proven­tos e pensões pelo índice de 26,05% (URP de (ev. /89). Impossibilida­de de rescisão de julgados em ra­zão de dissídio pretoriano. Inter­pretação restritiva do art. 485 do CPC. Improcedência da ação.

1. Constitui numerus clau­sus o rol de hipóteses de cabi-

mento da ação rescisória (art. 485, I a IX do CPC), não sendo possível, por via interpretativa, elastecer os casos legais de ad­missão do pedido, para incluir entre eles a divergência pretoria­na.

2. "A estabilidade dos julgados é imprescindível à ordem jurídi­ca, que não pode ficar comprome­tida ao sabor de mera interpre­tação dos textos legais." (STF, AR 1. 167-DF, ReI. Min. Djaci Falcão, RTJ 115/61).

3. A Suprema Corte reconhece a autonomia jurisprudencial das instâncias inferiores ao inadmi­tir a ação rescisória fundada em ofensa a dispositivo legal de in­terpretação controvertida nos Tribunais (Súmula 343), "ainda que ajurisprudência do Supremo Tribunal Federal venha poste­riormente a firmar-se em senti­do contrário" (RE 88.328-SP, ReI. Min. Cunha Peixoto, RTJ 91/ 970).

4. Ação rescisória improceden­te."

Para tanto, assevera a violação ao art. 5Q

, da Lei n Q 7.730, de 31 de janeiro de 1989, que instituiu novas regras de reajuste de salários, além de divergência de jurisprudência. Coleciona acórdãos favoráveis à sua tese, no sentido de que não há di­reito adquirido ao reajuste concedi­do pelo acórdão rescindendo.

Ultrapassado o juízo prévio de admissibilidade, vieram os autos a este Tribunal, onde dispensei a au­diência do Ministério Público.

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É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO WILLIAM PATTERSON (Relator): Como vis­to, cuida-se de decisão em ação res­cisória visando desconstituir julga­do que reconheceu aos servidores públicos militares referidos na ini­cial, a diferença correspondente ao índice de 26,05%, que seria devido em razão de plano econômico.

De pronto, tenho que o acórdão rescindendo, ao reconhecer o direi­to adquirido ao reajuste dos benefí­cios na base de 26,05%, relativa­mente ao mês de fevereiro de 1989, destoa da orientação proclamada pelo Colendo Supremo Tribunal Federal nos autos da ADIN n Q 694/ DF, tal como invocada em inúmeros precedentes, dos quais destaco:

"Recurso extraordinário. Fun­cionário público. Vencimentos. URP - fevereiro de 1989. 2. No julgamento da ADIN n Q 694-DF, o Plenário do STF afirmou ser indevido, em fevereiro de 1989, o percentual de 26,05%, sobre ven­cimentos de servidores federais, com base na URP do período de setembro a novembro de 1988. Revogação do Decreto-Lei n Q

2.335/1987 pelo art. 38 da Lei n Q

7.730, de 31.01.1989, resultante da conversão da Medida Provisó­ria n Q 32, de 15 de janeiro de 1989. Precedentes. 3. Recurso extraor­dinário conhecido e provido." (RE n Q 157.395-3-DF, ReI. Min. Néri da Silveira, in DJ 27.10.94)

No tocante ao fundamento nucle­ar do acórdão recorrido, para repe­lir o cabimento da ação rescisória, por entender aplicável à espécie o enunciado da Súmula n Q 343 - STF, tenho por insubsistente a orienta­ção, inobstante as lúcidas conside­rações contidas no voto condutor. Assim afirmo com apoio em prece­dentes desta Colenda 6ª Turma.

O primeiro, da lavra do Ministro Fernando Gonçalves (REsp nQ 108.875-CE), onde assevera:

"Quanto à ausência de violação literal de lei que abonasse o aco­lhimento de rescisória e ainda di­vergência jurisprudencial refe­rente à interpretação controver­tida de outros tribunais, melhor sorte não está a amparar os re­correntes. Os julgados trazidos à colação não servem de paradig­mas e nem as Súmulas 343/STF, 134/TFR, 83/TST e 03/TASP (1 Q) já que, consoante assevera o Par­quet Federal, o STF e o STJ co­nhecem de recursos interpostos nas condições do presente.

Por fim, o próprio julgado do STF, ventilado na decisão recor­rida mostra a violação a texto le­gislativo a concessão do índice expurgado do IPC de março de 1990, verbis:

"A revogação da Lei n Q

7.830/89 pela Medida Provisó­ria n Q 154/90 que se converteu na Lei n Q 8.030/90 -verificou­se em momento anterior ao da consumação de fatos idôneos necessários à aquisição do di-

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reito ao reajuste de vencimen­tos previsto para 1 º de abril de 1991. Tendo-se antecipado, va­lidamente, à incorporação des­se direito ao patrimônio jurídi­co dos servidores, o ato ab­rogatório não ofende a cláusu­la constitucional que tutela a intangibilidade de situações definitivamente consolidadas (CF, art. 5º, XXXV!)." (RE 148.607-4-STF) (fls. 250).

Cumpre assinalar - ainda­que a errônea interpretação da lei, segundo o STF, in RTJ 101/ 50, "desde que capaz de anular os seus verdadeiros efeitos, pode propiciar o ajuizamento da ação rescisória fundada no inciso V do art. 485 do CPC. Ora, no caso, a MP 154, convertida na Lei nº 8.030/90, entrou em vigor no dia 16 de março e o reajuste apenas seria devido em 01 de abril. Hou­ve, portanto, de acordo com o en­tendimento do STF, violação à Lei nº 8.030/90, hipótese, inclusive, já firmada pela 3ª Seção do STJ, na AR 504/CE - ReI. Ministro José Dantas."

Também ao apreciar hipótese se­melhante, tive ensejo de fazer os s~­guintes registros (REsp nº 95.129-RS):

fundada no artigo 485, V, do CPC, teria o acórdão recorrido negado vigência a esse dispositivo?

Com atenção à orientação pre­dominante do Colendo STF, sobre não ser aplicável a máximajuris­prudencial quando em discussão os preceitos constitucionais, te­nho que a resposta deve ser posi­tiva. Ao entendimento do acórdão recorrido se contrapõe a lição la­pidar do eminente Ministro Mo­reira Alves nos autos do RE nº 89.108-GO:

"E não se há que invocar-se, no caso, o disposto na Súmula 343 ("Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescin­denda se tiver baseado em tex­to legal de interpretação con­trovertida nos tribunais"), uma vez que ela deflui de julgados que dizem respeito, apenas, a leis ordinárias. E, por se tra­tar de Súmula, está ela vincu­lada ao âmbito dos julgados de que é síntese, não podendo -como poderia se se tratasse de preceito legal - extravasar dele por via de interpretação extensiva. Aliás, ainda quan­do fosse isso possível, não me animaria a essa extensão, pois entendo que a Súmula nº 343 nada mais é do que a repercus-

"Assim delimitada a controvér- são, na esfera da ação rescisó-sia ao ataque do pressuposto da ria, da Súmula nº 400 - que rescisória, resta saber da ofensa não se aplica ao texto consti-à lei processual. Ao aplicar o tucional- no âmbito do recur-enunciado da Súmula 343 do Co- so extraordinário. Como se in-lendo STF e assim declarar a im- fere do artigo 119, III, a da procedência da ação rescisória, Emenda Constitucional nº 1/69,

364 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998.

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distinga a lei ordinária (para a qual é necessária a negativa de vigência) e a lei constitucio­nal (para a qual basta a con­trariedade)" (RTJ 101/207)."

o correspondente, no plano constitucional, à negativa de vigência de lei é a contrarie­dade à Constituição; e, em as­sim sendo, se a legislação or­dinária (no caso, o Código de Processo Civil) se limita a alu­dir como pressuposto da resci­sória a violação literal de dis­posição de lei, impõe-se que se

Ante o exposto, conheço do recur­so especial e, em conseqüência, dou­lhe provimento.

RECURSO ESPECIAL NQ 169.226 - SC

(Registro n Q 98.0022647-8)

Relator: O Sr. Ministro Vicente Leal

Recorrente: Estado de Santa Catarina

Recorrida: Thereza Grisolia Tang

Advogados: Osmar José Nora e outros, e Nilton José Machado

EMENTA: Processual Civil. Recurso especial. Indenização de períodos de férias e licença-prêmio não gozados. Deferimento ad­ministrativo. Mandado de segurança. Ação de cobrança. Inocor­rência. Embargos de declaração. Omissão. Inexistência.

- Tendo a ação mandamental como causa de pedir a restaura­ção de situação em razão da ilegalidade de ato administrativo, não tem pertinência a invocação de aplicação dos comandos das Súmulas n~ 269 e 271, do STF, que disciplinam as relações jurídi­cas oriundas de direito creditório, objetivando o pagamento de vencimentos e vantagens pecuniárias pretéritas.

- Os embargos de declaração, segundo a moldura do cânon ins­crito no art. 535, do CPC, consubstanciam instrumento proces­sual destinado a expungir do julgamento obscuridade ou contra­dição, ou ainda para suprir omissão sobre tema cujo pronuncia­mento se impunha pelo Tribunal, não se prestando para promo­ver a reapreciação do julgado.

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- Não há omissão no acórdão que concede parcialmente o writ impetrado por desembargadora aposentada, determinando a con­versão em pecúnia dos períodos de férias e licenças-prêmio não gozados por necessidade de serviço, anteriormente à vigência da LOMAN, já deferidos em processo administrativo interno e cassa­do por ato do Presidente do Tribunal.

- Recurso especial não conhecido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos es­tes autos, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso especial, na conformidade dos votos e notas ta­quigráficas a seguir. Participaram do julgamento os Srs. Ministros Fernando Gonçalves, Anselmo San­tiago e Luiz Vicente Cernicchiaro. Ausente, por motivo de licença, o Sr. Ministro William Patterson.

Brasília, 09 de junho de 1998 (data do julgamento).

Ministro ANSELMO SANTIA­GO, Presidente. Ministro VICENTE LEAL, Relator.

Publicado no DJ de 29-06-98.

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO VICENTE LEAL: Thereza Grisólia Tang, De­sembargadora aposentada do Tribu­nal de Justiça do Estado de Santa Catarina, impetrou mandado de se­gurança contra atos do Órgão Es­pecial daquele Tribunal, represen­tado por seu Presidente, postulan­do o pagamento em pecúnia dos pe­ríodos de licença-prêmio e férias não

gozados por necessidade de serviço, já deferidos através de regular pro­cesso administrativo.

O Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catari­na, por maioria, concedeu parcial­mente a segurança, determinando o pagamento dos meses de férias e licenças-prêmio não gozadas ante­riormente à vigência da Lei Orgâ­nica da Magistratura por necessi­dade de serviço. (fls. 97/103) O jul­gamento em tela foi condensado na seguinte ementa:

"Mandado de segurança. Interpo­sição contra ato do órgão especial que sustentou o pagamento de li­cenças-prêmio e do Presidente do Tribunal de Justiça que, sponte sua, determinou a sustação do pagamento das férias, não goza­das, à magistrada, já deferido através de regular processo admi­nistrativo. Direito líquido e certo da impetrante violado. Concessão parcial da ordem.

Mandado de segurança. Magis­trada. Férias e licenças-prêmio não gozadas, por necessidade do serviço público, conversão em pe­cúnia. Admissibilidade. Prece­dentes jurisprudenciais.

366 R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998.

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- "O direito às férias é preceito de ordem pública, como acontece com todos os preceitos da legis­lação social, tornando-se irre­nunciáveis. O exercício de sua fruição, bem como de licença-prê­mio, depende de ato da Adminis­tração Pública, que pode negá-lo em nome da conveniência do ser­viço, vale dizer, no interesse do serviço público" (in RT 606, págs. 89/90).

Férias é um direito do servidor, de acordo com a Constituição Fede­ral (art. 39, § 2Q

, c/c art. 7Q, XVII).

Licença-prêmio. Magistrada. LOMAN. Período anterior à vi­gência da Lei Orgânica da Ma­gistratura. Admissibilidade." (fls. 97).

Opostos embargos declaratórios, restaram os mesmos rejeitados.

Irresignado, o Estado de Santa Catarina interpõe o presente recur­so especial (fls. 257/268), com ful­cro na alínea a do permissivo cons­titucional, verberando ter o v. acór­dão violado os artigos 15 e 19, da Lei n Q 1.533/51 e o artigo 1Q

, da Lei n Q 5.021/66, bem como os artigos 47 e 535, do Código de Processo Civil.

Verbera, em essência, que o man­dado de segurança não é meio apto para a cobrança de vantagens pe­cuniárias pretéritas, não se consti­tuindo, ademais, em ação de cobrança.

Não oferecidas as contra-razões, o recurso foi inadmitido na origem, advindo agravo que, provido, ense­jou a subida dos autos a esta Corte.

É o relatório.

VOTO

O SR. MINISTRO VICENTE LEAL (Relàtor): Como patenteado no relatório, ataca-se no presente apelo nobre acórdão que concedeu parcialmente a ordem de seguran­ça impetrada por desemb,argadora aposentada contra ato do Orgão Es­pecial do Tribunal de Justiça do Esta­do de Santa Catarina, determinan­do a conversão em pecúnia dos me­ses de férias e licenças-prêmio não gozadas por necessidade de serviço anteriormente à vigência da Lei Orgânica da Magistratura, já defe­ridos em processo administrativo interno.

Sustenta o Estado de Santa Ca­tarina que o Órgão Colegiado do Tri­bunal a quo, ao conceder o paga­mento de vantagens pecuniárias pretéritas, restou por violar o arti­go 15, da Lei n:Q 1.533/51 e o artigo 1 Q, da Lei n Q 5.021, bem como os verbetes contidos das Súmulas n~ 272 e 269, do STF, que vedam a na­tureza de ação de cobrança ao man­damus.

Verbera, ainda, a ocorrência de omissão quanto a pontos de pronun­ciamento obrigatório, especifica­mente no que tange aos artigos 19, da Lei n Q 1.533/51 e 47, do CPC, no caso da obrigatoriedade da forma­ção de litisconsórcio, ao artigo 102, I, da CF/88 e ao artigo 267, V, do CPC, em decorrência da litispen­dência.

O Órgão Especial do Tribunal a quo concedeu os meses de férias e

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licenças-prêmio, não gozadas por necessidade de serviço, em período an­terior a superveniência da LOMAN, tendo em vista o fato de ter sido con­cedido administrativamente o paga­mento das vantagens postuladas.

É o que se extrai do excerto do voto a seguir transcrito:

"Conseqüentemente, as licenças­prêmio a que a impetrante tinha direito, anteriores à vigência da Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Lei Complementar n Q

35179), não podem ser suprimidas e a sua conversão em pecúnia é perfeitamente possível, conforme vasta jurisprudência e doutrina a respeito.

É de se realçar que o eminente Desembargador Ayres Gama Fer­reira de Melo requereu e obteve administrativamente o pagamen­to da conversão da licença-prêmio em dinheiro em 31/8/95, por par­te da Presidência deste Tribunal (fls. 46), o mesmo ocorrendo com a viúva do ex-magistrado Rena­to Antônio de Souza (fls. 58) e também consta que ao Des. Osny Caetano, em data de 4/9/91, foi concedido o direito de converter em pecúnia as licenças-prêmio não gozadas (fls. 38/39).

Ante todo o exposto, é de se con­ceder parcialmente a segurança, para assegurar à impetrante o di­reito de receber em pecúnia os 6 (seis) meses de férias não goza­das e as licenças-prêmio a que tinha direito, anteriores à vigên­cia da Lei Complementar n Q 35/ 79". (fls. 103).

Daí depreende-se que o acórdão recorrido concedeu o pleito indeni­zatório, proclamando a tese de que o direito de conversão em pecúnia das férias e dos períodos de licen­ças-prêmio não gozados não podem ser indeferidos quando já concedi­dos no âmbito administrativo.

Como visto, o thema sub judice envolve unicamente discussão sobre temas de natureza constitucional e de direito local.

Alega-se violação ao art. 535, do Código de Processo Civil.

Ora, os embargos de declaração, segundo a moldura do canon ins­crito no artigo 535, do CPC, con­substanciam instrumento proces­sual destinado a expungir do julga­mento obscuridade ou contradição, ou ainda para suprir omissão sobre tema cujo pronunciamento se impu­nha pelo Tribunal, não se prestan­do para promover a reapreciação do julgado, como pretende o ora recor­rente.

Quanto à alegação de violação aos dispositivos da Lei 5.021/66, que dispõe sobre o pagamento de v-enci­mentos e vantagens asseguradas em sentença concessiva de manda­do de segurança, bem como ao arti­go 15, da Lei n Q 1.533/51, tenho que não se encasam à controvérsia de­batida nos autos.

Ora, é pacífico o entendimento firmado no âmbito deste Tribunal no sentido de que em sede de man­dado de segurança em que se pos­tula o pagamento de vantagem de­vida a servidores públicos, a senten­ça concessiva somente produz efei­tos a partir do ajuizamento do writ,

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nos termos da Súmula n Q 271/STF e do art. 1 Q da Lei n Q 5.021/66.

Todavia, ainda que o mandado de segurança não se confunda com ação de cobrança, a hipótese sub judice não apl'esenta efeitos patrimoniais a título de cobrança, mas tem como causa de pedir a ilegalidade do ato administrativo que indeferiu a con­cessão da conversão em pecúnia de períodos de licenças-prêmio e férias já deferido por decisão administra­tiva à desembargadora impetrante.

E a jurisprudência assentada nesta Colenda Corte tem entendi­mento coincidente, no sentido de que, tendo o writ como causa de pe­dir a restauração da situação em razão da ilegalidade de ato adminis­trativo, não tem pertinência a invo­cação de aplicação do comando da Súmula n Q 269, do STF, que disci­plina as relações jurídicas oriundas de direito creditório, objetivando o pagamento de vencimentos e van­tagens pecuniárias.

A propósito, registre-se o seguin­te precedente, ip verbis:

"REsp - Constitucional- Pro­cessual Civil - Mandado de se­gurança - Ação de cobrança -Pagamento.

o mandado de segurança não se confunde com a ação de co­brança. Toda ação repousa na causa de pedir. Não se pode, em mandado de segurança, deduzir fato gerador de direito de crédito para reclamar pagamento. A Lei n Q 5.021/66 veda, no mandamus, pedir 'vencimentos e vantagens pecuniárias'. Diferente, entretan­to, se a causa de pedir for ilegali­dade da sanção administrativa aplicada. No caso, concedida a se­gurança, repõe-se a situação ju­rídica anterior, em conseqüência, o pagamento do que fora ilegal­mente suspenso. A prestação ju­risdicional cumpre ser exaustiva, no sentido de repor, às inteiras, quanto possível, o direito reco­nhecido" CREsp 29.950-4/SP, ReI. Min. Vicente Cernicchiaro, in D.J. de 01 de março de 1993).

Em face dessas considerações, te­nho que o acórdão recorrido não vio­lou os dispositivos legais destacados no apelo nobre.

Isto posto, não conheço do recur­so especial.

É o voto.

R. Sup. Trib. Just., Brasília, a. 10, (109): 313-369, setembro 1998. 369

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