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·INSTITLtTO SOCIOAMBIENT~ Data I I Coo. "13R1)~4>.._,..9_ J ? DEZ 17 2 1 ~ í ?~~?-~ /;·.,-,)1·-·---=-~{çfo~~~io índío ;,(_~' ~'- - ~ ~~ÊRI~ DO INTFRIOR .. \__ /lA:\_.. .. ... - ! Exmo. Senhof Doutor Juíz Federal 1 f ust iça Feder:. 1 _- f.}. r. :!•. \".!ra , Ft~: ------~-- -.1 . ...• -~ .. .,.- .• , _ da Vara, Secção do EÊ .tado de Mato Grosso. Proc. nQ 17.624/86-V que apresenta FUNDAÇÃO NACIOMAL lNOlO - YUNAI, fund~ çao com personalidade de direito privado, instituída pela Lei nQ 5.371, de 05 de dezembro de 1.967, com sede e foro na Capital Federal, no setor Edifícios Públicos Sul, qu~ dra 702, bloco "A'1, Edifício Lex, 3Q Andar, com juris dição em todo território nacional, por seu procurador / (m.j.), aos termos da Aç~o de Desapropriação Indireta, que lhes propõem Thyrso Ferraz de Camargo Junior e sua mulher Karla M~neghel Ferraz de Camargo e Renato Ferraz de C_amargo, qualificado, aduzindo o quanto segue: \'' \ SFP Quadra 702 <sul Ec.l1fício l.ex , 3" andar CEP vo 3.'IO Bravítia D.I· " : } •, '-"

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·INSTITLtTO SOCIOAMBIENT~ Data I I Coo. "13R1)~4>.._,..9_

J ? DEZ 17 2 1 ~ í ?~~?-~ /;·.,-,)1·-·---=-~{çfo~~~io índío ;,(_~' ~'- - ~ ~~ÊRI~ DO INTFRIOR

.. \__ /lA:\_.. .. ... - !

Exmo. Senhof Doutor Juíz Federal

1 f ust iça Feder:. 1 _- f.}. r. :!•. \".!ra

, Ft~: ------~-- -.1 . ...• -~ .. .,.- .• , _

da 2ª Vara, Secção do EÊ

.tado de Mato Grosso.

Proc. nQ 17.624/86-V

que apresenta

FUNDAÇÃO NACIOMAL e© lNOlO - YUNAI, fund~

çao com personalidade de direito privado, instituída pela

Lei nQ 5.371, de 05 de dezembro de 1.967, com sede e foro

na Capital Federal, no setor Edifícios Públicos Sul, qu~

dra 702, bloco "A'1, Edifício Lex, 3Q Andar, com juris

dição em todo território nacional, por seu procurador /

(m.j.), aos termos da Aç~o de Desapropriação Indireta,

que lhes propõem Thyrso Ferraz de Camargo Junior e sua

mulher Karla M~neghel Ferraz de Camargo e Renato Ferraz

de C_amargo, já qualificado, aduzindo o quanto segue:

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SFP Quadra 702 <sul Ec.l1fício l.ex , 3" andar

CEP vo 3.'IO Bravítia D.I· " : } •, '-"

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/

FUNAI Fundação Nacional do Índio

MIMSTÊRIO DO INTERIOR

fls . 2

Os Bakairi são um grupo indígena da fami

lia linguística "Karib11, localizados hoje em dia em duas - - ..•.•.•. - .•.. ..• _ áreas, no Estado de Mato Grosso. Uma delas, onde está o

P.I. Santana, se localiza no Município de Nobres, aproxima

damente 300 Km de Cuiabá com uma área de 6.323 ha e 4.816

rn2• A outra, onde se localiza o P.I. Bakairi (antigo P.I.

Simões Lopes), tem uma área de 49.989 ha, no Município de

Chapada de Guimarães, ã cerca de 350Km de Cuiabá.

No entanto, sua ãrea tradicional era ~ muito mais abrangente. Os primeiros contatos e referênci­

as históricas sobre os Bakairi datam do início do século

XVIII quando se localizavam na região entEe o Rio Arinos / - --------i

(que deságua no Rio Juruena e para o qual perde o nome)

na Bacia do Rio Tapajós e o R~_? I_{u_J..i_s~J!.u, af Lue n t.e do Rio

Xingú. Ao norte essa região alcança a confluência dp Rio

_vergs:_ com_ o __ Rio Parana tinga ou Telles Pires e ao Sul ~hega ---··- - . -- --- ~-- - - va até as cabece il:-_ª-~-0.P .. Rto .. Ar í.no s e do Rio Paranatinga. ----------- .. -- --· ----------- Usavam ainda como área de caça e perambulação a região com

preendida entre a cabeceira do Paranatinga, ao norte, e o

Rio das Mortes, ao sul, onde foram encontrados no início

do século XIX pelo Pe. Manoel Aires Casal.

Nessa extensa região estabeleciam al­

deias num movimento de deslocamento que teria se iniciado

{segundo a tradição oral dos Índios), numa época não loca­

lizada históricamente ( tempo histórico mi to lógico), a pa_~ tir de um local existente ainda hoje: o Salto do Rio T~

lles Pires, perto do ponto em que ele recebe às águas do

Rio Verde.

Segundo tradição indígena, nesse local

concentravam-se umas perto das outras, as aldeias originais (i

dos Bakairi que, em função dos constantes ataques dos ínt

SEP Quadra 702 '.-.ui ~ E<.lifkio Ln .. 51' andar CEI' 70.:130 l\r;i~ília D F

' 1 '

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FUNAI Fundação Nacional do índio

MINISTÉRIO 00 INTERIOR

fls. 3

dios Kaiabi e, posteriormente, também de brancos armados

com armas de fogo, dispersaram-se em várias direções:

uma parte concentrou-se na região da ~abeceira do Rio ~

rinos (atualmente P.I. Santana), outro grupo se estabel~

ceu a margem do Rio Paranatinga,perto do Rio São Manuel'

(próximo do atual P.I. Bakairi) e o grupo maior estabele

ceu-se as margens do Rio Kulisehu e do Rio Tamitotoala /

Batovi, afluentes do Xingú.

Em 1719, com a descoberta de minas/

de ouro no Rio Coxipõ, forma-se urna frente de expansao

mineradora que atinge os Bakairi do Rio Arinos e, mais '

tarde, no inicio do século XIX, também os do Rio Parana­

tinga, engajando-os como mão de obra escrava.

Em meados do século XIX, com o decli

nio da mineração começa a se expandir a extração da bo~

racha na região do Arinos. Além disso, a atividade pa~

toril, de subsidiária passa a ser a principal, expandi~

do-se e alcançando os campos de pastagens naturais da ca

beceira do Rio Paranatinga.

Tanto os Bakairi do Arinos com os de

Paranatinga passam a servir de mão-de-obra nas fazendas

de criação de gado da região, são catequizadas e muitos,

por pressão armada dos fazendeiros, acabam morandode~ro

das fazendas.

B - Os BAKAIR! DO XINGO E OS DO PARANATINGA • P.I. BAXA 1RI.

Em 1884, acompanhado por vários Ba

kairi "mansos" da cabeceira do Paranatinga, Steinem faz.

o primeiro contato com os Bakairi do Xingü, onde locali-\\~

SEP Qu:ulra ~oi ~ui l'd,fítio t cx, 3" undar

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FUNAI Fundação Nacional do lndio

MINISTÉRIO 00 INTERIOR

fls. 4

za 7 aldeias ao longo do Rio Kulisehu e do Rio Tamitotoa-

la - Batovi. A partir daí os Bakairi "bravos" e outros

grupos do Xingú passam a receber visita dos Bakairi do P~ ranatinga e também a visitá-los para adquirir bens ca so

ciedade nacional.

No fim do século, o então governador'

do Estado de Mato Grosso fornece armas e estende o poder

do cacique Antoninho, do Paranatinga, a todos os Bakairi/

do Xingú. Alguns dentre eles já haviam mudado para o P~

ranatinga e os outros no início do século XX, premiados '

pelas constantes epidemias que passaram a grassar no Xi~

gu, pela pressão de Antoninho e pela crescentedependênc:ia

dos bens da sociedade nacional, passam a migrar maciçamen

te para o Paranatinga, abandonando suas aldeias.

_Por vol !=,a de 1915 quase todos os B~

kairi do Xingú já haviam se instalado nas proximidades da

cabeceira do Paranatinga, formando 3 aldeias: a doCapi€o

Antoninho, a do grupo de José Coroado e a do grupo de Kau

to, oriundo do Xing6.

Em 1918, a area que hoje ocupam foi

doada em usufruto aos Índios pelo governo do Estado, atra

vês da Revoluç~o Legislativa nQ 761, de 20 de junho.

Em 1.920 foi criado o Posto Indígena'

Simões Lopes (hoje P.I.Bakairi}, perto da aldeia de José

Coroado. E, em 1.922 migraram os Últimos Bakairi do Xi~

gu, liderados pelo cacique Pires. Nomesmo ano instalaram

-se na area um grupo de Bakairi da reserva de Santana, 11:_ derados por Roberto, fugindo à exploração e maus tratos/

dos fazendeiros.\

SEP Quadra 702 ~ui Edifício Lex. j'' andar

CEP '70.:UO Brasília D F

",,,

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l ,,~t.iça f•dua l '.!·. \'ara i/14 FI.: -- ~- '_ - ..

FUNAI Fundação Nacional do Índio

Mll\llSTl,RIO DO INTERIOR

fls. 5

Instalaram-se também, em 1.927, o pesso

al de South American Indian Mission, j~ em contato com os

Xinguanos desde sua pacificação no Rio Batovi, ficando na

~rea até 1970, quando se retiraram devido a s~rios desen­

tendimentos com os índios.

Em 1.930, o encarregado do Po~to, al~ gando dificuldades administrativas para garantir a educ~ ção escolar e tratamento de saúde para tantas aldeias espa

lhadas na reserva, ordenou que todos os grupos locais exi~

tentes se reunissem. Ao mesmo tempo, o P.I. foi mudado p~

ra onde se encontra hoje, perto da confluência do Parana -

tinga com o Rio Azul. Para este local se transferiram to

dos os Bakairi da reserva formando uma única aldeia, onde

a antiga organização circular e as casas amplas de famí

lias extensas foram substituidas por casas menores, adequ~

das para abrigar apenas famílias nucleares, distribuídas'

em ruas, obedecendo o planejamento do S.P.I.

So~re a orientaçãb de um mestre de obra~

os Bakairi construira~ as instalações da casa-sede, da es

cola, do hospital e d2 um galpão para estocagem. A mudan­

ça do posto (1930) marca a implantação de uma nova ordem:

ele passa a funcionar nos moldes de uma empresa, exploran-

do a força de trabalho Bakairi de forma mais organizada ' visando a. auto-suficiência e, ao mesmo tempo, objetivando

integrar os índios em prãticas econ6micas mais "civiliza -

das", com tecnologias mais produtivas. O rebanho bovino

chegou a ter 5.000 cabeças, distribuídas em vãriosretiros

Existiam também retiros para a criação de porcos e gali

nhas. Plantavam arroz, feijão, milho, cana-de-açucar (pa

ra o gado, para a produção de açucarem barra e rapadura),

além dos pomares e hortas, cujo excedente era comerciali -

zado em Cuiabá. Os índios eram pagos com bens da soc í eda \-'· SEP Quadra 702 Sul \\

Edifício Lcx, 3!' andar CEP 70 3W Brasília D.F.

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FUNAI Fundação Nacional do índio

MINISTÉRIO 00 INTERIOR

\Just7:; Fedn"l.

'.!". \'ar. é{jJ . 1 F !-: p.U.., - T.

fls. 6

de nacional, na medida de sua assiduidade ao serviço con

trolado num livro ''de ponto", onde se anotava as presen -

ças e faltas diárias.

Existia ainda uma serraria rústiça'

(manual), um hospital com vinte leitos onde trabalhavam/

fnfermeiros formados da South American Indian Mission

estação de rádio transmissor, motor gerador, luz elétrica

e água encanada nos prédios do Posto, constituindo-se no

local de mais recursos da região.

O P.I Simões Lopes criado como um /

Posto modelo destinado a atrair, além dos Bakairi, outros

grupos xinguanos, passa a fornecer gado, cereais e ele­

mentos humanos para atração dos xanvantes do rio Batovi /

(atual P.I Marechal Rondon). Com os Bakairi "mansos" do

Paranatinga, já utilizados para pacificar os Bakairi "br~

vos" do Xingu, foi formada uma equipe de várias famílias'

que, deslocada para o Batovi, participou da pacificação/

dos Xavantes, os quais, a partir de 1952 (quando foi con . - sumada a pacificação), passaram a frequentar o Posto. Um

grupo deles acabou por se estabelecer próximo à aldeia B~ kairi, sendo transferidos em 1962 para o P.I. Paraíso /

mais distante mas ainda dentro da reserva, onde ficaram

até 1974 quando

Rio Coluene.

migraram para as aldeias Xavantes do

Esses sistema vigorou até 1958. Com

sua decadência, os Bakairi passam gradativamente a trab~

lhar nas fazendas de gado da região, e seu gado foi sen

do transferido para outras reservas.

e - çi~ DAKAUlI DO IUO ARINO~ fl, I ~ANTANA \ ·,

~EP Quadra 702 Sul Edifício Lcx , 3!' andar CEP 70.330 Brasi lia D F

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r, '•'

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FUNAI Fundação Nacional do [ndío

MINISTÉRIO DO INTERIOR

fls. 7

Com o declinio da frente mineradora nos

meados do século XIX, espande-se a extração da borracha '

nos seringais nativos. Na primeira fase de extração da

borracha, os Bakairi são usados como g~ias, remeiros, ~

bridores de estradas e elementos de contatos com outros/

índios. Constantemente tem seus bens (gados, cavalos e roças) roubados ou destruídos pelos fazendeiros que ainda

lhes ameaçavam tomar as terras.

Já numa segunda fase, a partir de 1950

inicia-se a instalação de empresas colonizadoras e instau

ra-se a exploração mais racional da borracha com o plan -

tio de seringueiras e utilização de tecnicas mais mo der

nas. Uma dessas empresas, Rio Novo Ltda de propriedade

dos irmãos Spinelli, instalada em área contígua à reser­ va, contava em 1963 com 800 habitantes, casas de alvenari

a, piscina, igraja, escola, usina elétrica. Para sede I dessa fazenda transferiram-se várias famílias Bakairi, on

de passaram a trabalhar sob o sistema "barracão'', isto

é, recebiam do armazém da fazenda víveres e utensílios di

versos que jamais conseguiam pagar totalmente, ficando

sempre endividados e obrigados a continuar trabalhando .

A população que permaneceu na reserva

além de fazer roças de subsistência, explorava os serin -

gais, vendendo a borracha para o Rio Novo Ltda. Fazendei

ros vizinhos também usavam as pastagens naturais da reser

va para a criação de gado e, em troca, abatiam uma rês p~

ra a comunidade nos dias de festas religiosas.

Configurava-se uma tutela não oficial dos

fazendeiros que, na verdade, exploravam a mão de obra in

digena e usufruiam de suas terras. A sede da fazenda Rio

Novo passou a ser o ponto central de articulações da vida,

dos índios, que a visitavam pelo menos nos fins de semana,\.·

SEP Quadra ~,i2 Sul 1, Edtficio l.cx , 5" andar

CEP 70 ~:'-0 Brasília D I·

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.,J

!1--------- FUNAI

Fundação Nacional do Índio MINISTÉRIO DO INTERIOR

fls. 8

realizando trocas com os empregados e até mesmo suas fes -

tas.

SÓ em 1963 se instalou aí o Posto Indí

gena Santana trazendo a mediação entre a frente de expan

sao e a comunidade indígena. No entanto a ordem anterior'

nao foi alterada e continuavam até 1971 a serem explor~

dos pelos irmãos Spinelli, de acordo com as observações do

novo encarregado que assumiu o posto este ano. Segundo de

clarações desse encarregado,~ que ele teria encontrado os

limites violados e os Índios escravizados.

Entre 1973 a 1975 só ficou urna aten -

dente de enfermagem respondendo pelo posto. Neste ano ( 1.

9 7 5) , os Spinelli venderam a fazenda para novos donos, de

dicados à criação intensiva de gado, não necessitando das

famílias residentes na area, os quais foram expulsos de

volta para a reserva. Os homens passaram a se empregar

nas fazendas da região e agricultura de subsistência ficou

a cargo dos velhos, mulheres e crianças.

Linguisticamente os Bakairi pertenciam

ã familia Carib e estão estreitamente relacionados, cultu-

ralmente, com outras tribos da familia linguística

da Ba c i a do AltoXingú. (1953:69).

Carib

A terminologia de parentesco registra­

da por Barros (1977} ê c~rrespondente ã mesma apresentada

por Oberg (1953), conforme expressa a primeira, com ligei­

ras modificações que em nada afetam a sua estrutura.\ 1

SFP Quadra ·•02 Sul Edt!Íl:IO Lt:X, :s" andar

CEP 70.3,0 Bravíhu D F

~ . .),_

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·~

FUNAI Fundação Nacional do índio

MINISTÉRIO DO INTERIOR

fls. 9

Os Bakairi distinguem os primos cruza­

dos dos paralelos, sendo que estes são identificados pelos

mesmos termos aplicados aos irmãos (ãs). O termo referen­

te a mãe se estende ã irmã da mãe, e re~erente ao pai, ao

irmão do pai. O irmão da mãe e a irmã do pai (tios cruza

dos) recebem denominações especiais. Verificou-se pelo

sistema de parentesco que é vedado ao grupo o casamento /

consanguínio, e que não é permitido o casamento entre pri

mos paralelos. o casamento preferencial é entre primos

cruzados, a residência pós-casamento é junto a família de procriação da noiva. Se espera dos homens que venham a in

tegrar um grupo doméstico, por casamento, que passem a tra

balhar no grupo de sua mulher, de forma que os genros e o sogro constituam uma unidade de produção, e os bens resul­

tantes da caça e da pesca, além de outros bens adquiridos

através da venda de sua força de trabalho nas fazendas, se

ja também repartidos entre os elementos que compõem essa/

unidade.

A sucessao à liderança, na época ant~

rior ao contato, era hereditária, passava de pai para fi lho. Em 1898, aproximadamente, o cacique Bakairi Antoni

nho teve sua autoridade reconhecida pelo então Presidente

do Estado.

Ap6s a criação do P.I., o sistema em

vigor de sucessão de liderança mudou de hereditário para '

indicação (do encarregado do P.I), que por desentendimento

entre ambos, originou a mudança na escolha do cacique pa~

sando a ser por eleição.

Em~~, foi escolhido pela comunida-

de o caciquE. Antonio Rondon Neto. Das reuniões para elei

SEI' Quadra 7l)2 :-ui Edifícto Lex , 3" andar

CEP 70 3.~0 Brasffia D E

maio f 'I 2:~

1

çao do cacique partic.ipam romens, mulheres e rapazes

res de 13 anos. o per~odo de mandato do cacique n;o e

'

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J us t ir-a Frd~ra 1 \T.

FUNAI Fundação Nacional do índio

MINIST~RIO 00 INTERIOR

"fls. 10

xo; conforme o andamento de sua gestão, do interesse e r~

pidez com que resolve os problemas e da credibilidade fre~

te ao representante do órgão tutelar, qepende do êxito. A

substituição se dá de acordo com a vontade da comunidade.

Os Bakairi mant~m, todavia, traços '

de sua cultura tradicional, a Festa do Batizamento de mi lho - AJEITABEIJÁ - realizada no mês de janeiro e a perf~

raçao das orelhas dos rapazes - SADIRI, realizado no mês

de agasto.

Devido ao longo período de contat9 /

com a sociedade nacional, os Bakairi, dependem de instru­

mentos do tipo, enxadas, facões, espingardas,munição, além

de roupa, sal, sabão, Óleo, etc. Para obterem a renda ne

cessária ã aquisição desses produtos trabalham, geralrnent~ de empreitada nas fazendas vizinhas. Concomitantemente com

este sistema e apesar da má qualidade das terras da reser­

va, o solo é do tipo cerrado com matas ciliares que acorn

panham os ribeirões, os Bakairi possuem roça familiar de

subsistência as quais são abertas, cada dois anos, de plan

tio. Assim~ comum encontrar familias com duas roças as

quais denominam de roça nova e roça velha de acordo com o

tempo de existência de cada uma - Nelas plantam milh~ maQ dioca brava e mansa, arroz, feijão, batata doce, cará, al godão e cana de açucar. Frutos tais como, bananas, melan

cias e, esporadicamente, abacaxi, também são cultivados ca

qui, piqui, mangaba, bocaiuva são os frutos silvestres que

complementam a dieta.

A caça está começando escassear de~

tro da reserva tais como capivara, anta, veado, tatú, ema,\ ~-

SEI' Quadra ~02 :.ui , 1 Echfíno Lo •• 3" andar Cl:P ,o :F,O l\ra~íh;i D F.

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·r.

FUNAI fundação Nacional do Índio

MINISTÉRIO 00 INTERIOR

fls. 11

ciriema e paca outrora em abundância, hoje não o são mai~

Pescam no Pindoba, Azul, Paranatinga e Vermelho, peixes/

como matrinchã, pacú, jaú, piaba, peixe agulha, gubajo em

qualidades variãveis de acordo com a época do ano. Os

animais de criação são: galinha, porco, pato, angola;

pois, os animais de grande porte como cavalo, jumento e

gado vacum são criados nos retiros.

Na produção de artesanato encontra -

mos r c dc s ( de! algodão e f .i b r a de buri ti) , esteiras e bol

sas (buriti), arco e flecha. O artesanato tem por finali

dade aumentar a renda familiar.

Os Bakairi, conforme relat6rios dos

viajantes e concenso histõrico, ocupavam uma área muito'

mais extensa que aquela que lhes foi reservada. Os Bakai

ri do Xingú e os Bakairi do Paranatinga foram nucleados /

pelo S.P.I. na área do então Capitão Antoninho Kuikore,

abandonando suas aldeias e migraram para a área do Simões

Lopes.

A área de acréscimo da R.I Bakairi , }

denominada pela comunidade de pachola compreende os córr~,

gos Pindoba e o rio são Manoel (Paranatinga ou Telles P!\

res) e o córrego cabeceira do marco (ou C6rrego Vermelho} )

encon- / i

trou-se vários vestígios de posse dos índios Bakairi como\

na foz do Pindoba e São Mano \ \ i 1

situado entre os paralelos 54Q42' e 14Ql8', onde

um marco de aroeira antigo,

el, próximo a um marco de pedra semelhante aos usados na

época da demarcação; três vestígios de taperas dos Bakai­

ri e dois cemitérios antigos de épocas anteriores ao\ ~ \ SEP Qu,1dra 702 Sul

Edrfícto t.cx. ; " .mdar CEP 70.,330 Brasília D F

~ . ~'

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FUNAI Fundação Nacional do Índio

MINISTÉF\10 DO INTERIOR

fls. 12

S.P.I.; tapera velha de 1886 (aproximadamente) localizada

perto do córrego Pindoba, onde ainda há vestígio do Porto

e muitas outras taperas localizadas na.região.

Os Bakairi utilizava-as para colhei­

ta de palha de buriti, caça e pesca (com a palha do buri ti constroem teto para as habitações a artesanato), tanto

a palha como a proteína provenientes da caça e pescav são

obtidos na área Pachola, que após levantamento antropoló

gico constatou ser posse imemorial dos Bakairi, uma vez

que pela demarcação (1920) tinha ficado fora da area.

Assim, com base em estudos técnicos,

antropológicos, cartográficos e fundiários, levantamento

este realizado pelo Grupo de Trabalho instituído pela PoE

taria Interministerial nQ 002, de 17 de março de 1983, em

que o Parecer nQ 063/85, que a Área Indígena Bakairi, /

abrange uma superfície de 58.800 (cinquenta e oito mil e

oitocentos) hectares, com um perímetro de 125 (cento e

vinte e cinco) quilómetros, e, que essa área é formada de duas partes, sendo que, uma corresponde àquela destinada

pelo Governo de Mato Grosso aos Bakairi de Paranatinga,

com 49.989 ha, e, a outra, contígua à primeira é mais co­ nhecrlacomo Pachola ou Pindoba, com 8.811 ha.

Diante desses aspectos retro-aborda­

dos a de se convir que desde 1719 já se falava nos índios Bakairi com as descobertas das minas de ouro, ficando so

bejamente comprovado a posse permanente .daquela clã indí

gena, corno sendo, seu habitat imemorial.·'.,

•••••••• ti ••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••••

'-El' Quadra ~ol xul l:d1f1uo Lcx , -~~· and.ir

Cl:I' ~o ',.',O Brasíha D F.

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Justi,a feder:11 · J>\ •·

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FUNAI Fundação Nacional do Índio

MINISTÉRIO DO INTERIOR

· fls. 13

POSSE IMEMORIAL

~ Reveste-se de NULIDADE o título dos Autores,

pelo que deve recusar-lhe a ordem juridica os efeitos.

A que se ressaltar que inexiste na Ação de

Desapropriação Indireta o direito inerente a indenização

por serem detentores de título de propriedade expedido pelo

Estado de Mato Grosso, em área de habitat imemorial dos ín

dios Bakairi.

Cabe indagar: poderia o Estado alienar, da

forma como o fez, noticiadas terras? Claramente que não. /

Senão vejamos:

A soberania dos povos indígenas da América '

foi questão fundamental na discussão da legitimidade dos ti tulos espanhóis e portugueses sobre o novo mundo. Certas '

teses teriam tido, para os reis ibéricos, uma convivência i mediata. Henrique de Susa, cardeal-arcebispo de Ostia, cano

nista do século XIII e autor da Summa Aurea, substentava /

que os povos gentios só haviam gozado de soberania até o ad

vento de Cristo, que, tendo vindo ao mundo, havia desde en

tão sido investido de -todos os poderes espirituais e ternp2

rais. Por delegação de Cristo. Tanto o Império quanto o sacerdócio cabiam ao papa. Assim os infieis podiam serdes

pejados de seus reinos e bens pela autoridade papal.

Apesar de sua conveniência evidente para ju~

tificar os títulos que o papa distribuira a leste e a oeÊ

te de Tordesilhas, as teses do Ostiense (Henrique de Susa)

e as que sobre elas se apoiaram não prevaleceram. Trata-se

de urna ótica voltada para o bom seBSO, para o Óbvio, ao

tr~rio o que ocorre atualmente. Ao longo do século XVI

con

filt l

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f undacao Naconal do Índio MINISTERIO DO INTERIOR

f ls. 14

mou-se, ao contrário, na espanha e em Portugal a doutrina'

que negava o poder temporal do papa sobre os infieis e a

jurisdição europeia nas terras recém-descobertas. Afirma

va a plena soberania original das·nações indígenas.

Já naquela época do Ostiense, no se

culo XIII, o papa e canonista Inocêncio IV, sustentara que

o papado não podia despojar os infieis de seus domínios e

jurisdições. (Apparatur ad quinque libror Decretalium

III, 34,8), tese essa contrária a de Henrique Susa.

E são TÕmas de Aquino, distinguindo entre direito divino e direito humano, afirmava, contra o

ostiense, que a vinda de cristo não havia anulado os bens

e a soberania dos povos gentílicos (Secunda Secundae, 10,

10). Assim, no início do século XVI, o superior da ordem

dos Dominicanos de Roma, o cardeal Cayetano, sustento~ nos

seus Comentários à Secunda Secundae de São Tomás (Questão

66, art. 8), que os infieis podiam gozar de direitos e s~

berania. Introduziu também a distinção entre infieis ini

migas (tais como os mouros) e os que não os hostilizavam,

como era o caso dos Índios.

Em 1537, o Papa, por seu lado, na bu

la Veritas ipsa, pronuncia-se, afirmando:

"Os indios e todos as demais nações'

que daqui por diante forem descober­

tas pelos cristãos, por mais que e~

reçam de beneficio da f~, não estão

nem podem ser privados de sua liber­

dade e do domínio de seus bens ao

contrário, podem livre e solicitame~\; f

SEP Quadra 702 Sul Edifício l.ex, l!> andar CEP 70.330 Brasília D. F.

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FUNAI Fundação Nacional do Indío

MINISTÉRIO Dó INTERIOR

fls. 15

te usar, desfrutar e gozar desta li

berdade e domínio ... "

Até o fim do sécult> XVIII, ainda se

contestava em Portugal o fundamento do domínio sobre a Am~

rica. Um documento dessa época, de autoria prov~vel de

Philippe Jorge, lente da Universidade de Coimbra, declara

que o direito de ocupação é um erro:

li nao se encontra esses Direitos'

na jurisprudência Romana nem nos VQ

vos Estatutos de Coimbra. A aquis!

çao da América procedendo da ocupa -

çao se opoe a história primitiva. Pe

dro Alvares Cabral encontra povoado

res em Porto Seguro. O mesmo sucedeu

a Christovão Colombo nas primeiras'

ilhas que aportou. A lei de 6 de jun

ho de 1755 chama primitivos senhores

aos índios. Na Origem de Causa do dQ

mínio da América pelos europeus dan

çam os instrumentos como gatos por

brasas." (Memórias dos Erros e Con

tradições que servem na dedução e re

flexoes afim de não se atenderem.

Arquivo Nacional da Torre do Tombo,

Lisboa, Fundo Cadaval - Brasil - Avul

SOS - 3-18, art. 2).

Nas leis portuguesas para o Brasil ,

os que ocupam e frequentemente reconhecida:

a soberania indígena e o direito dos índios aos territóri- ~

trata-se, comof .•

SEI' Quadra 702 Sul Ecl1f1ci,) l.ex , ; " andar

CEP -·D j 30 Brasíha D F

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-·~

FUNAI í-undaçâo Nacional do Índio

M!NISTÊAIO 00 INTERIOR

fls.16

se sabe, de um reconhecimento "de jure11 que mil estratage­

mas tentam contornar na prática; mas tal reconhecimento 1~

gal mostra pelo menos a consciência da Côroa acerca dos di

reitos indígenas.

Assim, as Cartas Régias de 30 de ju lho de 1.609, e a de 10 de setembro de 1.611, promulgadas

por Felipe III, afirma o pleno domínio dos Índios sobre /

seus territórios e sobre as terras que lhe são alocadas

nos aldeamentos:

os gentios são senhores de suas

fazendas nas povoaçoes, como os sao

li

na Serra sem lhes poderem ser toma -

das, nem sobre ellas se lhes fazer

molestia ou injustiça alguma; nem po

<lerão ser mudados contra suas vonta

des das capitanias e lugares que lhes

forem ordenados, salvo quando elles

livremente o quizerem fazer

(Carta R~gia, 10.09.1611). 1

ti /

Ainda mais explíctto ê o Alvarã de

lQ de abril de 1680, que declara que as sesmarias concedi­

das pela Coroa Portuguesa não podiam afetar os direitoso1ª:_

ginais dos índios sobre suas terras. "Prim~rios e natura~

senhores" de suas terras, eram enquanto tais isentos de

qualquer foro ou tributo sobre elas.

" E para que os ditos gentios, /

que assim decerem, e os mais, que há

de presente, melhor se conservem nas

Aldeias hey por bem que senhores de

suas fazendas, como o sao no

sem lhe poderem ser tomadas,

sertão, (

nem s~ r 1

SLP Qu~dra 702 Sul Edifício i.ex, Y' andar CEP 70.:\W Brasília D.F.

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FUNAI Fundação Nacional do Índio

MINISTÉRIO DO INTERIOR

·fls.17

bre ellas se lhe fazer molestia. E

o Governador com parecer dos ditos '

Religiosos assina~á aos que descerem

do sertão, lugares convenientes para

neles lavrarem, e cultivarem, e nao

poderão ser mudados dos ditos luga -

res contra sua vontade, nem ser ao

obrigados a pagar foro, ou tributos'

algum dasditas terras, que ainda e~

tejão dadas em sesmarias e pessoas/

p~rticulares, porque na concessao

CE!stas se reserva sempre o prejuizo'

de terceiro, e mui~o mais se en~nd~

e quero se entenda ser reservado o

prejuízo, e direito os índios, primá

rios e naturais senhores dellas ...

(Alvará de 01-04-1680, parágrafo 4Q).

Paradoxalmente, a soberania das n~

çoes indígenas foi reconhecida no contesto das discussões

sobre escravização dos índios. Um dos títulos legítimos/

para escravizá-los era aprisioná-los em guerra justa. A

Carta Régia de 9 de abril de 1655 declarava que seriam es

cravos os prisioneiros tornados em guerra defensiva.

li entendo em guerra defensiva a que fizer qualquer cabeça ou comunid~

de, por que tem cabeça e soberania pa

ra vir fazer e cometer guerra ao Esta

do, porque faltando esta qualidade a

quem faz guerra, ainda que seja feita

com ajuntamento de

tomarem - - nao serao

pessoas, os <;!Ue

t . n (\_ cap lVOS ••• ;

J 1 1

se

SEI' Quadra 702 Sul Edifício Lcx, .3:' andar

CEI' 70. 330 Brasf lia D F

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FUNAI Fundação Nacional do índio

MINISTÉRIO 00 INTERIOR

fls. 18

Quase no mesmo sentido, há o Ãlvará /

de 28 de abril de 1688 para o Maranhão e Grão-Pará que se

riam escravos os prisioneiros tomados em guerra defensivo.

Sobre a justiça do cativeiro de indi

os no Maranhão, é o padre Antonio Vieira que manifesta:

" ... é que não são escravos, nem ainda vassalos. Escravos não, porque nao

sao tomados em guerra justa; e vassa

los também não, porque assim como o

espanhol ou o genovãs cativo em Argel

é contudo vassalo do seu rei ou da sua república, assim o não deixa de ser o

índio, pôsto que forçado e cativo, co mo membro que é do corpo, e cabeça p~ lítica da sua nação, importando igua!

mente para a soberania da liberdade,

tanto a coroa de penas, corno a de oiro

e tanto o arco como o cetro ... " (Hi~

tória da Companhia de Jesus noBrasiL

1945, T. VI, pp. 330 - 341).

No entanto, no período colonial, o Brasil viveu urna transformação muito sensível a causa das

terras indígenas com várias legislações às vezes favorável' e outr~s menos favoráveis, portanto, só no ano de 1718, e

que a Coroa declara explícitamente:

li (os índios) são livres, e isen -

tos de minha jurisdição, que os nao

pode obrigar a sahirem das suas ter -

ras, para tomarem um modo de vida de

que elles se não agradão ... (Carta 1 ~ SEP Quudra "'02 Sul

Ed,fido Lcx , Y' andar CEP 70 3.\0 Jlra,ílb D E

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J us r iça Fecfrra 1 .,. \' 6 - . ara

Fls: ..... - ..... ,.

FUNAI Fundação Nacional do Índio

MINISTÉRIO 00 INTERIOR

fls. 19

Régia de 09.30.1718).

O fato é que temos que reconhecer a

posse indígena sobre seu território, até D. João VI, o mais

antiindígena dos legisladores, reconheceu implícita e expli

citamente, tal fato, implícitamente, quando declara que as

terras conquistadas por guerra justa aos Índios são devolu -

tas (Carta Régia de 02-12.808), o que significa ao mesmo

tempo reconhecer os direitos anteriores dos índios sobre /

seus territórios e a permanência de tais direitos para os in

dias com quem não se guerreavam. Explicitamente, quando a

firma que as terras das aldeias são alienáveis e nulas as

concessões de sesmarias que pudessem ter sido feitas nessas

terras as quais não podiam ser consideradas devolutas (Carta

Régia de 26.03.1819 e duas provisões de 08-07-1819).

Isto posto, pelo que tudo ficou expos­

to no Brasil Colonial face as doutrinas e legislações exi~

tentes, nota-se que já se reconheciam a soberania e os direi

tos territoriais dos Índios do Brasil.

Em :/.850, o Goverr.o imperial promulgou'

uma lei fundamental que pretendia discip]inar o regime fundi

ário. Era a Lei das Terras (Lei nQ 601, de 18.09.1850), re

gulamentada em 1854 pelo Decreto 1318, de 30.01.1854.

Como bem entende João Mendes Jr., a

Lei das Terras preserva o reconhecimento da propriedade 1~

dígena dos territórios ocupados que não necessitam de legiti

mação de posse, já que seu título legítimo é o indigenato:\ '.\ V

SEI' Quadra 702 Sul Etl1fíuo l.cx , .F andar

CEI' 70 530 llra~íha D I·

~

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FUNAI Fundação Nacional do Índio

MIN1STÊRIO DO INTERIOR

fls. 20

"Quer da letra, quer do espírito da Lei

de 1850, se verifica que essa Lei nem /

mesmo considera devolutas as terras pos

suidas por hordas sel~agens estáveis: es

sas terras são tão particulares como as possuídas por ocupação legitimável, isto

é, originariamente reservadas de devolu­

çao, nos expressos termos do Alvará de

10 de abril de 1680, que as reservas até

na concessão das sesmarias; não há (Nes

te caso) posse a legitimas, há domínio/

a reconhecer ... " (J. Mendes Jr., Os IE

dígenas do Brasil, seus direitos indivi

duais e políticos).

Do mesmo entendimento e forma Alípio Ban

<leira e Manoel tavares da Costa Miranda, que em seu "Memori

al acerca da antiga e moderna legislação indígena", escre

vem:

"Certo é que a denominação de devolutas'

aplicada às terras que elas (Índios) h~

bitam é de todo o ponto imprópria, já

porque, conforme as palavras do Alvará/

de lQ de abril de 1680, são os índios

os naturais senhores delas, jã porque a

semelhante classificação opõe-se formal­

mente a própria significação gramatical

do termo" ( 1912) .

"Memorial acerca da antiga e moderna 1~

gislação indígena, contendo consider~

ções sobre a situação jurídica do índio

b r a si.Le i r o " (em Humberto de Oliveira ed,

Cole t.ania de Leis, htos e Memorias ref~K, -"

SEP Quadra 702 ~ul Edifício Lex, 3" andar

CEP "70 330 Brasj ha D F

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T.

FUNAI Fundação Nacional do Índio

MINISTÉRIO DO INTERIOR

fls. 21

rentes ao indigena brasileiro, Minist~

rio da Agricultura, CNPI, Publicação

94, Rio de Janeiro, Imprensa Nacional

pp. 55-86).

nQ

'

Já no Decreto nQ 1318, de 1854, que regu

lamentava a Lei das Terras, a mesma sobreposição das terras

de aldeamentos às imemoriais contínua se verificando:

Art. 72 - "Serão reservadas terras devo­

lutas para colonização e aldeamento de

indígenas nos distritos onde existem hor

das selvagens".

Estas terras deveram ser inalienáveis ' de usugruto exclusivo dos índios e destinadas a ser sua pro

priedade quando "o permitisse seu estado de civilização".

"Art. 7 5 - '' As terras reservadas para col!:?_

n í z a c ão de indígenas, e por e!Jes distribuí das, são destinadas ao seu uso fructo;

e não poderão ser alienadas, em quanto

o Governo Imperial, por pacto especial,

nao lhes conceder o pleno gozo dellas ,

por assim o permittir o seu estado de

civilização.n

dios. José Maria de Paula (in Terras dos in

Boletim nQ 1, SPI, Rio de Janeiro, 1944, pp. 42-45)

assim se expressa:

11 imprescritíveis os direitos e ana­

lienáveis os bens dos índios aldeados,

na sua qualidade de 6rg;os e beneficiãi. 1

SEP Quadra 702 Sul Edifícw I.cx , 3!' andar

CF.P -o 330 Braví ha D F

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~~

~ FUNAI

h111da,:10 N:11:1011.tl do Índm MltJISTERIO DO INTERIOR

fls. 22

rios das cautelas outorgadas pela lei

a essa espécie de tutelados ... não i~

porta que, por motiv9s independentes/

da sua vontade, os índios, seus possui

dores, nem sempre tenham estado na sua

posse; o domínio sobre as mesmas, como

expressao de um direito imperecível,

s err.p r é se conservou Integro e capaz de --~

de i)rbdvzir os seu); efeitos em qual-

que .r: t:empo ... 11

R. Teixeira Mendes, ainda os Indígenas

no Brasil e a Política Moderna, Rio de Janeiro, 1908, p.

8, já naquela época manifestava em face a razão e a moral

de um civilizado:

"Urge, segundo os ditames da moral e

da razão, ver nos povos selvagens na

ções independentes, que devem ser tra

tadas com as atenções com que tratamos

os povos mais fortes ... Perante os br~ . /

sileiros, as tribús selvagens devem

pois, constituir nações livres, cujos

territórios cumpre-nos escrupulozamen-

te respeitar e cuja amizade devemos

procurar com lealdade."

O mesmo R. Teixeira Mendes, em defesa

dos Selvagens Brasileiros, Rio de Janeiro, 1910, pp. 13-14

escreveu:

"A primeira medida consiste em dernar -

los

honestamente as terras ocupadas pe -~ selvagens e de ora avante respeíf

J ~-

car

SEI' Quadra 702 Sul Edifício Lex , 3º and.rr

C:EP 7ll .~50 Bra~íli~ D.E

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~~

~ FUNAI

Fundaçâo Nacional do Índio MIN!STÉíllO DO INTERIOR

,.i/

f_ls • 23

taras naçoes selvagens como a quais

quer outros independentes, visto que o

são meros usurpadores, conforme nobre

mente proclamou o veÍho José Bonifácio."

.-.... 1

A Constituição de 1891 não acolheu as

propostas do Apostolado Positivista. Na verdade, sequer

mencionou os índios em seu texto. Por outro lado, em seu

artigo 64, transferiu para os Estados federados as terras '

devolutas, resercando à União apenas as terras necessárias

para a defesa das fronteiras, fortificações e construções

militares e para a construção de estradas de ferro federais

Houve, de maneira geral, uma confusão que se disseminou a

partir de 1891, e, durante algum tempo, pensou-se que as

terras indígenas como um todo houvessem passado do domínio'

dos Estados. Na realidade, o que passou aos Estados foram

as terras devolutas, entre as quais, como vimos, se conta -

vam, desde 1887, as terras dos aldeamentos extintos. Mas

nem as terras dos aldeamentos não extintos, nem as terras

imemoriais indígenas podiam ser consideradas devolutas, corno

bem ensina João Mendes Jr.:

"Aos Estados ficaram as terras devolu

tas; ora, as terras do indigenato, sen

do terras congenitamente possuídas, /

nao são devolutas, isto é, são originá­

riamente reservadas, na forma do Alvarã

de 10 de abril de 1680 e por deducção'

da própria Lei de 1850 e do art. 24, §

lQ, do Decreto de 1854, as terras rese~

vadas para o colonato de indígenas pa~

saram a ser suspeitas as mesmas ~EI' Qu:tdra 702 Sul

Edrfício l.cx , ~~ andar CEI' :O 550 Hta,íli.1 D F

f regras}

-·-·-·---···-····-·------·. -------·----· ··---- ----- ··---- ---

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~ FUNAI

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! l,ut,,.~ 1:,.~nr3I . •ª •• ·-'"tf ..

T .

fls. 24

que as concedidas para o colonato dei~

m i q r an t e s , salvo es cautelas de orphana

to em que se achaffi os indios, as leis

estadoaes não t í.ve.ram , pois, necessisa­

de de reproduzir as regras dos arts. 72

a 75 do Decreto nQ 1318, de 30 de janei

rode 1854.11

Embora sem amparo legal, em muitos ca

sos começam-se a tratar nesse periodo as terras indígenas

como terras devolutas, prática que será reprovada com t~

das as letras no Decreto nQ 736, de 6 de abril de 1936, que

incumbe o Serviço de Proteção ao Índio de "impedir que as

terras habitadas pelos silvicolas sejam tratadas como se

devolutas fossem" ( art. JQ, "a") . A Constituição republi_

cana de 1891, escreve José Maria de Paula, em conclusão a

urna longa demonstração do que afirma:

"passado ao domínio privado dos Estados

as terras devolutas que recebera do G~

verno imperial, é claro, que somente /

transferiu a esse domínio as terras que

realmente eram devolutas; subsistindo '

em toda a sua plenitude os direitos 1~

galmente definidos ou adquiridos sobre

a propriedade territorial, nos regimes

anteriores. A incorporação por parte

dos estados, ao seu domínio privado, co

mo terras devolutas, das terras devol~

tas, das terras dos índios, que indis­

criminadamente tinham recebido da ün í âo, ex vi da Constituição Federal de 1891,

constituiu clamoroso esbulho do patrim6

nio indígena, sendo que deveriam tai;\/ ~

Sl:P Qu:alra -02 Sul f ' L<lifício l.cx 5" andar

CLP 70 .. ',.-IO Bra,íli:1 D F

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~ FUNAI

Furtll.1~.io N~c:1011:tl do Índio MINISTERIO DO INTERIOR

fnsti,·~~-,. ai

r. \ "' Fls: .... __ .... iJ ...

\T.

fls. 25

estados, desde logo, definir a situa -

ção dessas terras dos índios, afim de

as extremarem <laqueies que, corno dev~

lutas, lhe tinham sido cedidas pela /

União, ao ínvés de, sem nenhum exame,

passarem, corno fizeram, desde logo, a considerá-las corno suas e delas irem'

dispondo, mediante processos admini~

trativos estabelecidos pelas respecti­

vas legislações:

Embora não fosse, como escreve João /

Mendes Jr., necessário, alguns Estados, no entanto, reconh~

ceram explícitamente a vigência dos títulos indígenas. A~

sim o Estado do Amazonas promulgou em seu Regulamento de 21

de maio de 1892 (que se 1·efere ao Decretb nQ 4, de 16 de

março de 1892) o exato t~xt:o do Decreto 1318, de 30 de j~

neiro de 1854, no seu arti~o 75:

Art. 110 - "Quando se trata de Coloni-

saçao de indígenas as terras reserva

das e por elles distribuídas serão de~

tinadas ao seu uzofructo e não poderão

ser alienadas enquanto o Governo por

acto especial não lhes conceder o pleno

gozo d1ellas, por assim o permitir o

seu estado de civilização".

No Rio Grande do Sul, também, um Decre

to Estadual reconhece os títulos indígenas nos termos que

viriam a ser consagrados na Constituição de 1934.

"O Estado as considera tais (terras in -, dígenas) independente de qualquer título de domínio, como~ j.

SEI' Quadra 71)2 Sul Edifício Lcx , 5" andar

CEP 70.3.iO Br1~íli.1 D F

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~~

~ FUNAI

l u11d.1~:·10 N:1, 11>11:11 do indw MlfJISTtRIO DO INTERIOR

fls. 26

consequência da propriedade de ocupação por eles (Índios) "

(Decreto Estadual nQ 3.0004, de 10-08-1922).

João Mendes Jr. (in Os Indígenas do

Brasil seus Direitos Individuais e Políticos) afirma que

eram, portanto, titulas originários de propriedade;

"o das terras possuídas por hordas /

selvagens collectivamente organis~

das, cujas posses não estavam sujei

tas à legitimação, visto que o seu ti tulo não era a occupação mas o indige

nato (Alvará de lQ de abril de 1680);

.•• o das terras reservadas, quer p~

ra a colonisação de indígenas, que pa

ra fundação de povoações, estradas e

outras servidões e estabelecimentos '

públicos, quer para conservação naval

(Lei nQ 601, de 1850, art. 12)"

É na Assembléia Constitucional de /

1934 que, pela primeira vez, a questão da terra indígena

passa a ser matéria constitucional. Não constava dispositi

vo algum sobre índios nem no Projeto do Governo, o chamado

projeto do Itamaraty, nem no substitutivo da Comissão dos

26, composto de um membro da bancada de cada Estado, do Ois

trito Federal, do Acre, além dos representantes dos emprega

dos, empregadores, e das profiss6es liberais. A primeira '

emenda apresentada tem origem na bancada amazonense, e foi

apresentada a 21 de dezembro de 1933, pelo deputado Ãlvaro'

Dias. Vinha assim dirigida:

SEI' Quadra ~02 Sul [d1fício l.cx . ~-· .mdar U:P 70 :s ~o Bra,ílla D F

Page 27: J DEZ ?~~?-~ /;·.,-,)1·-·---=-~{çfo~~~io

~~

~ FUNAI

h1ml:1<;:i• 1 .\';1uonal do Índw MINISTÉfllO DO IN íERIOR

.,

fls. 27

"A União, os Estados, ou os Municípios '

respeitarão a posse dos indígenas sobre

..... as terras onde estiverem localiza­

dos, tudo nos termos·da legislação fede

ral sobre o assunto".

A justificação da emenda "provava que

ela se fundamentava nas leis referentes aos indígenas, cons~ -..1

bstânciadas desde o Império à República" (Annaes da Assem -

bléia Nacional Constitucional, 1933-1934, vol XIV, p. 395) e

acrescentava:

"Temos regiões habitadas por centenas '

de tribos a que pertencem milhares de in

dividuos. Não é admissível que sejam /

concedidos, retalhados os lotes, as v~

zes cultivados e expulsos para o interi

or das selvas. Dessas atitudes deshuma-

nas surgem lutas que redundam em dificu_!

dade à catequese. A emenda consubstan -

eia a legislação federal sobre o assunto,

colocando-a, porém, sob a segurança maior

de um dispositivo constitucional" (Anna­

es Vol. II, pp. 22-28, sessão de 21.12.

193J,

O fuhdamento, portanto, do dispositivo/

constitucional era o reconhecimento dos direitos originais 1

dos índios sobre suas terras , como "seus primitivos donos)

(Annaes, Vol. XVII, 1933-1934, p. 227).

Levi Carneiro, autor do Decreto que org~

nizava o Governo Provis6rio da Rep6blica Nova, presidente da

OAB em 1933 e eleito pelos advogados como um dos três repr~~ r ~ SEP Quadra ,02 Sul 1

Eúilício Lex. :'," andar CEP 70.:130 Hra,ília D.F.

- .•. --- .. ----- ,,_---4,,.....J,..-~

Page 28: J DEZ ?~~?-~ /;·.,-,)1·-·---=-~{çfo~~~io

~~

~ FUNAJ

l unda,;:·m Nac ional do Índio MINISTERIO DO INTERIOR

lu•t•~" F~d ai :t•. Vara F'la:. .

fls .28

sentantes das profissões liberais para a Assembléia Consti

tuinte, propôs uma nova redação a essa emenda (nQ 60), in

traduzindo a proibição de alienação das terras dos indios,

para protege-las de abusos. A nova formulação foi aceita

pela bancada amazonense, que a reapresentou sob o nQ 644 :

"Serã respeitada a posse da terra por

indígenas que nelas se acham permanen

temente localizados, sendo-lhes, no

entanto, vedado alienã-las".

esta emenda, aprovada, tornou-se o artigo 129 da Constitui

ção de 1. 934.

Com proficiência e mui ta finura Pontes

de Miranda assim comenta este artigo constitucional:

"No art. 129, ... respeita-se a "pos -

se" do silvícola, posse a que ainda

se exige a J.ocalização permanente. 9 Juíz gue conhecer de alguma questão '

de terras deve aplicar o art. 129, desde gue os pressupostos estejam pro

vados pelo silvícola, ou conste dos

autos, ainda que alguma das partes ou

terceiro exiba titulo de domínio. Des

de gue há a posse e_a localização per

0ar!~:...~!:e, a terra é_ do nativo, porque . r . . • - 1 a s s i.rn ~ __ gu1s a Con1,tLtu1çao, e qua -

~~- alienação de t.e r r a s por parte de

silvícolas ou em que se achem, perma­

nentemente localizados e com poss~ os

silvícolas, é nula. Aquelas mesmas '

que forem em virtude do artigo 129 re ' !

conhecidas como de posse de tais gen\ ~EP Quadra -1).! \ui j Edifício Ln .. :',!' andar

C:1.1' =u 5.~o Hr:1,íl!a D f·

.. ~

Page 29: J DEZ ?~~?-~ /;·.,-,)1·-·---=-~{çfo~~~io

~~

~ FUNAI

Funda~:io Nal'ional do Índio MINISTERIO DO INTERIOR

T.

fls. 29

tes não podem ser alienadas. Os Juí­

zes não podem expedir mandados contra

silvícolas que tenham posse e nas ter

ras, de que se tra~!f, se localizaram 1

com permanencia.

A proibição de alienação tem como con

sequências:

a) a nulidade absoluta de qualquer acto de disposição, in

cluidos os que s6 se referem a elementos do direito de

propriedade ou da posse (uso fruto), garantia real, lo

cação);

b) não há prescrição contra silvícola ainda que trintena!~

e) as sentenças que ad~11diquern tais terras a outrem são /

susciptíveis de resc~s~o, por infrii)girem texto consti­

tucional. (Comentários à Constituição da República dos

E.U. do Brasil, Rio de janeiro, Ed. Guanabara, 1937, to

mo II, pp. 348 - 349, Pontes de Miranda).

Outro progresso registrado na Constit~

ição de 1934 foi a aprovação da competência exclusiva da /

União para legislar sobre questões indígenas.

Para tornar essa competência exclusiva'

preceito constitucional, o deputado Pereira Lima, em nome '

da Subcomissão Constitucional, propôs a Emenda nQ 1417,que,

ligeiramente modificada e aprovada, veio a ser o artigo SQ.

item XIX, "m", com a seguinte redação:

"Compete privativamente à União:

XIX - Legislar sobre ( ... ) '

SEP Quadra 702 ~ui Edifícro l.cx. Y' andar

CEP 70 550 llr:1~íha D F

Page 30: J DEZ ?~~?-~ /;·.,-,)1·-·---=-~{çfo~~~io

~~

~ FlJNAI

l und.1~.i" N.1donal do lm!IO Mll-/15TÉ,ll0 DO INTERIOR

fls. 30

m) incorporação dos silvícolas a co

munhão nacional"

Um dos maiores batâlhadores a causa

indígena o General Rondon na oportunidade sentindo que a a~

sunto era de uma tamanha importância, escrevia ao deputado'

Pereira Lima, nos seguintes termos:

11Antes que seja tarde permitireis que

vos manifeste meus apláusos e caloro­ sos cumprimentos cívicos pela vossa

patriótica atitude perante a Assem­

bléia dos senhores Representantes, 1~

vantando do esquecimento a causa que

há 110 anos constituiu objeto de fe!

verosa ante a primeira Constituinte/

Brasileira por parte do glorioso P~

triarca de nossa independência políti

ca, José Bonifácio. Considerar na

Carta Magna a declaração terminante '

de que é da competência privativa da

União o legislar sobre a incorporação

do silvícola à comunhão nacional, já e vencer, presentemente, boa parte do

caminho a transpor para se colocar a

grande causa a salvo dos assaltos de

que se encontra ameaçada ... " (Annaes,

vol. XXI, p. 341).

ca" de Francisco Campos, ou seja, a Constituição do

A Carta Outorgada de 1.937, a ºPola - 1

EstadoY'

SI',, c2u:1dr:t .• 02 !'>ui l:t..hJh 1,1 lcx. 'iº andar ( !·I' "ll \ \O llr "iha 1) F

-- -- - •... -~ _._,.._ -'-----~"'

Page 31: J DEZ ?~~?-~ /;·.,-,)1·-·---=-~{çfo~~~io

~~

~ FUNAI

Fundaçâo Nac1t)ll.tl do Índio MH11STERIO DO INTEHIOR

·f ls. 31

Novo, conserva o reconhecimento dos direitos indígenas as

terras, rnodoficando levemente os termos da de 1934:

11Art. 154 - Será respeitada aos silví

colas a posse das terras em que se a

chem localizados em caráterpermanent~

sendo-lhes, no entanto, vedado aliená­

las".

Sobre esse dispositivo, comenta Antonio

Figueira Almeida:

"Os silvicolas são os primeiros ocupan

tes das terras em que se acham locali-

zados em caráter permanente: nao se

poderia turbar essa posse mansa e paci

fica, tradicionalmente mantida. Reco-

nhece-se-:lhe~ pois, esse direito, como

que em usufruto, desde que eles não /

possam alienar suas terras. Essa pro2:.

bição, porém, visa somente protegê-los,

porque impede que eles possam vir a

ser lesados pelos compradores." (in A

Constituição de 10 de novembro explic~

do ao povo, 1940, DIP, p. 122).

EU:_ consequência do ~rtigo 154, as Cons

tituições E.stadua.is do I:::J.0.._,_Amaz_onas, Maranhão e Mato Gros-

so passaram a assegurar_Eos índios,

suas terras.

e La s também, a posse de

~EP Qua<lr3 -·oz ~ul Edrfícro l.cx . :'," andar

( FI' 70 .'>.~o Braví lia D F

Page 32: J DEZ ?~~?-~ /;·.,-,)1·-·---=-~{çfo~~~io

~~ r~ FUNAI

Fund.l\:io .'i.1uon;II do Íntlto MINJSTEAIO DO INTERIOR

fls. 32

A Constituição de 1.946 conservou os

dois artigos da de 1934:

"Ar t.. 5Q - Compe t e Ià União

XV - Legislar sobre ( ... )

n) a incorporação dos silvícolas a comunhão nacional.

Art. 216 - Será respeitada aos silvi -

colas a posse das terras onde se acham

permanentemente localizados, com a con

dição de não a transferirem.

O artigo 216 proveio emenda apresenta­

da por Anthur Bernardes a Comissão Constitucional. Era fru

to do memorial do SPI ao Ministério da Agricultura, e endos~

sada, com outras palavras, pelo anteprojeto do Instituto de

Advogados e março de 1946.

Carlos Maximiliano comenta o artigo /

nos seguintes termos:

"Governos estaduais concedem titulo de

domínio de terras públicas ocupadas

por indígenas, espertalhões compraram­

nas por irrisórias quantias e expulsa-

rarn os ingênuos silvícolas. Providen

cialmente, portanto, o estatuto de

1946 assegurou a permanência da posse,

apenas, e assim mesmo com a vedação de

transferência." (Comentários à Consti

tuinte Brasileira, Freitas Bartos, vol.

III, p. 301).

\ Escreve Ale indo Pinto Falcão ( in A Con~ \ ' .. . ~l:J' ()Liadr:t -(1.'. ~lll l·.dlfÍ<..hJ l.cx , ~º undnr

< 1.1' 70.;\,ll llr~síli:t [) l·

Page 33: J DEZ ?~~?-~ /;·.,-,)1·-·---=-~{çfo~~~io

~~

~ FUNAI

rund.t<;:io :--adonal do Íudio MINISTERIO DO INTERIOR

f ls . 33

tituiçâo Ahotada, vol. III, p. 227):

"O artigo tem uma f_inalidade maioria

de impedir que entre nós ocorra oco~

flito constitucional de que já foram

palco os Estados Unidos, por causa das cobiçadas terras dos índios."

Por não faltar, Pontes de miranda (in

Comentários à Constituição de 1946) acrescenta aos coment~

rios que já fizera sobre o dispositivo na Constituição de

1934:

"A Constituição fala de condição de

não transferirem. Entenda-se: sendo,

porém, inalienáveis por atos inter vi

vos tais terras. Condição esta, aí,

em sentido não técnico. A posse dos

silvícolas é transmissível hereditari amente segundo a regra jurídica do di reito das coisas, entre os membros da

tribo, se de tribo ainda se trata. A

propriedade coletiva é respeitada, e

não se considera transferência a subs tituição automática dos membros da co munidade." (vol. IV, pp. 217-218).

Sobre o "cerne'' da questão, o "âmago"

de todas as discussões é Themistocles Cavalcanti deixa de

uma forma bastante límpida ao comentar o art. 216 da Cons­

tituição de 1946:

"A Constituição assegura aqui o ut~

possidetis das terras ocupadas pelos1\ r 1

~EI' ()u:1dr:1 ~02 ~ui E<l1fíuo Lcx , 1'.' andar

( U' 70 'dll llr:"íl1.1 D F

Page 34: J DEZ ?~~?-~ /;·.,-,)1·-·---=-~{çfo~~~io

~~

~ FUNAI

Fundação ,\i:11.·ional do Índio MINISTERIO 00 INTERIOR

~

·-~~ti,-.t

. Va ,i..·: --

fls. 34

Índios, com a condição de que nao a

transfiram. 8 o reconhecimento da po~

se imemorial dos do~os da terra, dos

sucessores daqueles que primeiro a p~

voaram ... O princípio é auto-executá

vel, reconhece um direito cuja medida

e extenção dependem apenas da prova /

quando contestada judicialmente". (A

Constituição Federal comentada, 1951).

7 - A CONSTITUIClO DE 1967 E A EMENDA CONSTITUCIONAL PE 1. ~~~.

Na Constituição de 24 de janeiro de 1.

967, a propriedade das terras indígenas é atribuída à União (art. 14). trata-se de uma medida de proteção adicional /

que visa, "impedir que os estados disponham dessas terras ,

alienando-as a civilizados em detrimento dos indígenas" (Ma

noel G. Ferreira Filho, Comentãrios ã Constituição Brasilei

ra, 1972, Vol. I, p. 65).

O artigo 14 da Constituição de 1967 t~

ve, portanto, origem no Ministério da Agricultura - Além / disso, funcionários do SPI procuram o senador Aurélio Vian­

na, pedindo-lhe que apresentasse emenda com o seguinte tex

to:

"Emenda 436 - t assegurada aos silvice

las a posse permanente das terras que

habitam, e reconhecido o seu direito '

ao usufruto exclusivo dos recursos na

turais e de todas as utilidades nelas

existentes, sendo considerados nulos ~ de pleno direito os atos que impliquem~

,U' <.>u,H.lra -02 ~ui Ldrf icro Le c. 3" andar

e 1:1' 70 . .:1:10 Brasrha D I·

·,

Page 35: J DEZ ?~~?-~ /;·.,-,)1·-·---=-~{çfo~~~io

~~

~ FUNAI

l unll.t<,:io '.\:.1uo11;tl do Í11di,> MINtSTERtO 00 ltffERIOR

f ls. 3 5

alienação, ônus ou gravames de qual

quer natureza, iniciando sobre essas

mesma s terras destí'nadas á subsistên­

cia de seus leg I t iI~·::>S possuidores. 11

A emenda conseguiu ser aprovada, mas

amputada de sua segunda parte.

a seguinte redação:

Veio a ser o artigo 186,com

"É assegurada aos silvícolas a posse'

permanente das terras que habitam, e

reconhecido o seu direito ao usufruto

exclusivo dos recursos naturais e de

todas as utilidades neles existentes."

Uma formilação semelhante ã da emenda

original Aurélio Vianna aparece afinal na Emenda Constituci

onal de 1969 (art. 198). A propriedade das terras continua

sendo da União (art. 4Q), a quem cabe legislar sobre a ques

tão indígena (art. 89, viii, o):

"Art. 4Q - Incluem-se entre os bens '

da União:

IV - As terras ocupadas pelos silvíco

las.

Art. 8Q - Compete à União:

XVIII - Legislar sobre :

O) Nacionalidade, cidadania e natura­

lização; incorporação dos silvíco

las à comunhão nacional.

~rt. 198 - As terras habitadas pelo~

~EI' Qtt.tdra ~02 ~ui l:ditkío Lcx. Y' andar

CEI' 'll 3 '>0 Br:1,ília D F

.~ .. - ..... -· ----------~---- ----- ---·------------··---.- .. ,~...-'---·\·

Page 36: J DEZ ?~~?-~ /;·.,-,)1·-·---=-~{çfo~~~io

--··-i--1;., d ri.,";_{" .,. 'fl~ \ ':.:·. \ .1r,1 é/,J 1 I"' - . - - ' ·l',. ····-· - ê FUNAI

Fundação Nacional do índio MINISTÉRIO 00 INTEmOR

fls. 36

silvícolas são inalienáveis nos termos

que a lei federal determinar, a eles ca

bendo a sua posse permanente e ficando

reconhecido o seu direito ao usufruto

exclusivo das riquezas naturais e de to

das as utilidades nelas existentes.

§ lQ - Ficam declaradas a nulidade e a

extinção dos efeitos jurídicos de qual

quer natureza que tenham por objetivo o

domínio, a posse ou a ocupação de terras

habitadas pelos silvícolas.

§ 2~ - A nulidade e a extinção de que 1

trata o parágrafo anterior não dão aos

ocupantes direito a qualquer ação ou iQ

denização contra a união e a Fundação/

Nacional do Índio."

Pontes de Miranda afirma claramente ao

comentar a Constituição de 1967, tomo VI, p. 457, que:

"O UAQfruto (do silvícola) ~ pleno, con ' 1

preendertdo o uso e a fruição, quer se

trate de minerais, de vegetais ou de a

nimais"

Continuando o festejado mestre Pontes de

Miranda, é ele que novamente afirma:

11São nenhuns quaisquer títulos, mesmo r~

gistrados, contra a posse dos silvícola~

ainda que anteriores a Constituição de

1.934, se à data da promulgação havia / \

tal posse. (ibidem, p. 457) .··. '/

SEI' Quadra 702 Sul ELlificio l.ex. 3" andar

CEP 70 330 Brasília D.E

Page 37: J DEZ ?~~?-~ /;·.,-,)1·-·---=-~{çfo~~~io

fustiç• \f8'" ral ~ .... Yar.i

t•ts· . ----:..·· . v. .. ,.-----···

T.

·- FUNAI

l'uncfaç:io Nacional do fndio MINISTÉRIO 00 INTERIOR

fls. 37

O Ministro Vitor Nunes Leal se reporta

quanto a posse indígena no sentido de um habitat de um p~

vo, em voto do R.E. nQ 44.585, Mato Grosso, S.T.F., 1961

da seguinte forma:

11Não está em jogo, propriamente, o co~

ceita de posse, nem de domínio, no se~

tido civilista dos vocábulos: trata-se

do habitat de um povo.11

Diante de tais fat,os, isto é, das dispo

sições constitucionais, ~ de uma clareza solar que jamais

poderá cogitar da proteçâo ao direito adquirido ou ao ato

jurídico perfeito.

Neste sentido, assevera Celso Bastos /

que:

110 inciso IV do art. 4Q da Constituição

há de ser entendido conjuntamente com o

art. 198 e seus parágrafos. A União

com efeito, fica deferido o domínio das

terras ocupadas pelos silvícolas, mas a

este cabe a sua posse permanente assim'

como fica reconhecido o seu direito ao

usufruto exclusivo das riquezas natu-

rais e de todas as utilidades nelas e

xistentes. Ficam extintos todos e quai..ê_

quer direitos que pudessem incidir s2 bre as referidas terras, sem que os le

sados possam pleitear indenização co~

tra a União, por força dos§§ lQ e 20

do art. 198. O princípio do direito ad

quirido, assegurado pelo§ 3Q do art ..

153, ficou excepcionado em face do con~

SEP Quadra 70! Sul l.drficro Lex , ;'.' andar

í.EP 70 330 Brasi lia 1) F.

Page 38: J DEZ ?~~?-~ /;·.,-,)1·-·---=-~{çfo~~~io

FUNAI Fundação Nacional do Índro

Ml"IISTÉRIO DO INTERIOR

fls. 38

teúdo dos referidos dispositivos. gri

fo nosso (in Curso de Direito Constitu

cional, 1982, pp. 109/110).

Carlos Maximiliano, também manifesta -

se ao comentar o art. 141, § 39 da Constituição de 1946 ao

examinar o conceito de direito adquirido (in Comentãrio a

Constituição Brasileira, 59 ed., vol. III, nQ 505, nota 7):

"Não há direito adquirido contra a

Constituição."

Dessarte, nao pode valer-se do direito

adquirido à propriedade de terras habitadas por indígenas ,.

em face da regra expressa no art. 198, da Lei maior; portan

to, ~ de nenhuma valia a invocação do principio do direito

adquirido contra norma constitucional.

Como já ficou sobejamente comprocado '

que os índios Bakairi mantém posse imemorial na referida /

Área Indígena Bakairi, e por tudo quanto ficou acima menc1

onado, ressalta aos olhos que os títulos dos Autores com

área de 2.500 ha. que se diz incidente na área indígena B~

kairi, é de ser declarado nulo e de nenhum efeito, eis que,

as concessões de títulos dorniniais em terras ocupadas pelos

indígenas após o advento da Constituição de 1934 é irrito,

de nenhum efeito.

Cabe ressaltar, a impossibilidade juri\,

SEP Quadra -02 Sul F.dtfído Lex , 3º andar

CEI' 70.'',30 Brasí ha O F

~

Page 39: J DEZ ?~~?-~ /;·.,-,)1·-·---=-~{çfo~~~io

FUNAI Fundação Nacional do Índio

MINISTÉRCO DO INTERIOR

fls. 39

dica do pedido e ilegitimidade "ad causam", mediante a 1~

teligência do artigo 198 e seus parágrafos da atual Consti

tuição Federal.

Sobre o assunto, a Procuradoria da

União por seu ilustre Procurador Dr. Gilmar Ferreira Mendes

assim se manifesta em seu precioso estudo, do qual pedimos

venia para transcrevê-lo:

"Por outro lado, o pleito formulado p~

lo autor parece encontrar obstáculo intransponível na r~

gra constitucional que afirma inalienabilidade das terras '

habitadas pelos silvícolas, declarando a nulidade e extin

ção dos efeitos de qualquer natureza que tenham por objeto

o domínio, a posse ou ocupação das aludidas terras, assim

como a inexistência de qualquer direito à indenização em f~ ceda União ou da FUNAI (C.F., art. 198, §§ lQ e 2Q). Em

escólio ao aludido dispositivo, observa Manoel Gonçalves /

Ferreira Filho, que

"a declaração de nulidade e da extin -

ção de efeitos jurídicos acima estab~

cida pode causar prejuízos a particul~

res. Tais prejuízos seriam ordínari~

mente indenizáveis. Entretanto, aCon~

tituição expressamente exclui que a mesma houvesse de ser paga pela Fun­

dação Nacional do Índio. Dessa forma,

eventual indenização devida por parti

cular não é excluída pelo preceito /

constitucional." (Comentário à Consti tuição Federal, 1983, pág. 732).

Portanto, a pretensão do autor ao pag~\V

'\ SEP Quadra -02 Sul

Fd1fl<.:w l.ex , :,º andar CEP '0 . .3.30 Bravíha f) E

Page 40: J DEZ ?~~?-~ /;·.,-,)1·-·---=-~{çfo~~~io

-~IJ.i,, li''' 'il~ TAI i:'t: 'l.l\l

Fund.1,;:1, 1 :::1oonal do fmho MINIS"lc:fllO DO INlERIOR

'l

fls. 40

menta de indenização por parte da União e da FUNAI nao e

tutelada pelo direito objetivo, sendo jqridicamente impos­

sível {CPC, art. 295, § único, III). Observe-se, outro~

sim, que, estando asco-rés, na espécie, desobrigadas de

indenizar, por força de disposição constitucional, inevit~

vel se afigura o reconhecimento, no caso dos autos, da ile

gitimidade passiva ad cau~ (CPC, art. 267, VI e§ 3Q).

Como já ressaltado, a Constituição Fe

deral, no seu art. 198, afirma a inalienabilidade das ter

ras habitadas pelos silvícolas "nos termos que a lei dete!:

minar", declarando a nulidade a extinção dos efeitos de

qualquer natureza que tenha por objeto o domínio, a posse

ou a ocupação das aludidas terras. Daí entender Pontes de

Miranda serem "nenhuns quaisquer títulos, mesmo registra -

dos, contra a posse dos silvícolas, ainda que anteriores a

Constituição de 1934, se~ data da promulgação havia tal

posse" (Comentários à Constituição de 1967, com a Emenda

nQ 1, de 1969, 1974, tomo VI, pág. 457). Idêntica posição

é perfilhada por Manoel Gonçalves Ferreira Filho (Comentá­

rios à Constituição Brasileira, 1983, pp. 731/732); Pulino

Jacques (A Constituição Explicada, 1970, p. 195), Rosah /

Russomano (Anatomia da Constituição, 1970, p. 346) e Celso

Bastos (Curso de Direito Constitucional, 1982, pp. 109/

110) .

E a Lei nQ 6.001/73 (Estatuto do fn -

dio), no artigo 19, estabelece que as terras ocupadas ou

habitadas pelos silvícolas a que se referem os artigos 4Q,

IV e 198, da Constituição, serão administrativamente demaE_

cadas, por iniciativa e sob orientação do órgão federal de

assist~ncia ao índio, de acordo com o processo estabeleci­

do em decreto do Poder Executivo, devendo-se proveder ao

registro em livro próprio do Serviço de Patrimônio d~

Sl:P Quadr.i "'02 xut l'J,fido Le x , 3" andar

CEP 7U 3.rn Bra-Iha D F . ' '

Page 41: J DEZ ?~~?-~ /;·.,-,)1·-·---=-~{çfo~~~io

)usLll'rl F~,1er: :!'. '.. .i r·1 Fi · · _ . . .. , .

FUNAI Fundação Nacional do lndio

MINISTÉRIO 00 INTERIOR

fls. 41

União e do registro imobiliário da Comarca da situação do

imóvel, após a homologação pelo Presidente da república.

Vê-se, pois, que o constituinte nao se

limitou a estatuir a nulidade dos títulos imobiliários por

ventura incidentes sobre as áreas de ocupação indígena, de

ferindo expressamente ao legislador ordinário a faculdade

de definir os procedimentos que deveriam ser adotados na

delimitação das referidas terras. Portanto, o legislador

ateve-se estritamente ao preceituado no dispositivo consti

tucional, ao determinar que tal delimitação fosse levada a

efeito mediante a realização de demarcação administrativa.

A matéria foi apreciada pelo Excelso'

Pretório no RE 97.867-MT, Rel. Moreira Alves, no qual se

discutiu a eventual violação do disposto no art. 198, da

Constituição e no art. ]9, § 2Q, da Lei nQ 6.001/73, tendo

o eminente Relator observado, a propósito, que:

"Desde que o aresto recorrido afirma a

existência de posse silvícola na area

interditada, o que é questão de fato/ insusceptível de reexame em recurso e~

traordinário, não se pode pretender

tenha havido violação do artigo 198 da

Carta Magna.

Quanto ã alegada violação do artigo 1~ § 2Q da Lei nQ 6.001/73, a interpreta­

ção a ela dada, e pela qual ele alcaE

çaria, também, os atos preparatórios '

da demarcação administrativa, atos es

ses a ela indispensãvel atã porque, no

cafo, e mister coricentrar o grupo Nam '

biguara então disperso, e a interdição'·~

Sfü' QuJdra 702 xul Edrfícro Lcx , 3'.' andar

CEP 70.3.~0 flra'>Íli~ D I'.

'

Page 42: J DEZ ?~~?-~ /;·.,-,)1·-·---=-~{çfo~~~io

··d

FUNAI Fundação Nacional do Índio

MINISTÉRIO 00 INTERIOR

fls. 42

visa a evitar conflitos comuns em ca

sos como o da espécie - é, pelo menos

razoável motivo por ~ue é de se lhe a plicar à Súmula nº 400. Ademais, como

se vê do acórdão prolatado nos embar

- a argumentação da legitimidade do proce~

gos de declaração, a referência ao

tigo 19, se faz a título de reforco

ar

so de interdição, se justifica pelo / simples fato - que o aresto recorrido

tem por certo - da existência de posse

de silvícola na área, considerando o

conceito de posse naquele diploma le

gal".

(RTJ 107/812)

Tendo a Constituição declarada a nuli

dade dos títulos dominiaís existentes sobre áreas habitadas

por indígenas, nos termos estabelecidos em lei federal, nao

se há de invocar a proteção constitucional aos direitos ad

quiridos (C.F., art. 153, § JQ) e ao direito de propriedade

(C.F. art. 153, § 22 e 5Q), para legitimar a propositura da

presente ação cível.

À evidencia, não pode haver direito aQ

quirido à propriedade de terras habitadas por indígenas, em

face da regra expressa no art. 198, da Lei Maior. Como se

sabe, ê de nenhuma valia a invocação do principio do direi­

to adquirid~ contra norma constitucional. Nesse sentido, é pacífica a j u r i s p r ude nc i 2, da Excelsa Corte, tal como se vê

no voto pro f,-.:rido pelo eru i.n.e n t e Ministro Moreira Alves, no

RE nQ 94.414, in verbis:

SI-!' ()t1:1dr:1 ,02 ~ui Edilíoo Lex, Y' andar

( ri' -o ~-~º Br.1,ih:1 !> r

Page 43: J DEZ ?~~?-~ /;·.,-,)1·-·---=-~{çfo~~~io

FUNAI Fundaçâ» \~acional do Índio

MINISTrnto DO IN.i ERIOR

'. 1· 1 ;.::' t.:.-:: .. "tj' ' 'li•

1 L. ·----~. . ... •.. -- -

fls. 43

"As normas constitucionais se aplicam

de imediato, sem que se possa invocar

contra elas a figura do direito adqui

rido. Mesmo nas constituições que ve

dam ao legislador ordinário a edição

de leis retroativas, declarando que a

lei nova não prejudicará o direito a~

quirido, o ato jurídico perfeito e a

coisa julgada, esse preceito se dirige

apenas ao legislador ordinário, e não, ao constituinte, seja ele ordinário, /

seja ele derivado. Por isso, Barbalh~

ao comentar o art. 11, 39, da ConstitE

ição de 1891 (dispositivo que vedava '

aos Estados e à União prescrever leis

retroativas), acentuava:

"Mas, porquanto a proibição de leis re

troativas é estabelecida por amor e ga

rantia dos direitos individuais, não há motivo para que ela prevaleça em ca

sos nos quais ofensa não lhe é feita e a retroação é proveitosa ao bem geral;

e eis por que têm pleno efeito com re

lação a fatos anteriores:

1. As leis constitucionais ou políti­

cas ( ... ) (Constituição Federal Brasi

leira - Comentários, Rio de Janeiro

1902, p. 42).

Igualmente, Carlos maximiliabo, ao e~

mentar o art. 141, § 3Q, da Constitui­

ção de 1946, escreve, ao examinar o

conceito de direito adquirido:. !'

~FP Quadra .,02 ~ui Edifício Lev, Y' andar

C:EP 7t) :no Brasf lia D F

. '

Page 44: J DEZ ?~~?-~ /;·.,-,)1·-·---=-~{çfo~~~io

T.

FUNAI Fundação Nacional do Índio

MltJISTÉRIO DO INTERIOR

fls. 4 4

"Não há direitbs adquiridos contra a conslLtuição" (Cornentãrios ã Constitui­ ção b1_·a.:3 iJ eira, SQ ed., Rio de Janeiro,

1954, v. 3, nc 505, nota 7).

No mesmo sentido, manifesta-se Pontes'

de Miranda, em mais de uma passagem de

seus comentários à Constituição de 1967

com a Emenda nQ 1, de 1969:

"Impõe ao legislador cogitar de lei que

de certo modo indenize as perda~ porque

não basta invocar-se a proteção dos di rei tos adquiridos (art. 150, § 3Q e 22), pois as constituições são retroeficazes"

( op. c i t. t. I, p. 5 3 8) ; ( ... )

No retirado art. 176, no art. 177 (hoje

art. 194) e nos retirados arts. 179 e

180, parágrafo único, a Constituição de

1967 abria exceção ao princípio da irne

diatividade eficacial das regras jurídi

cas constitucionais, porque, se não o

fizesse, os direitos adquiridos pelas

pessoas mencionadas estariam prejudic~

dos (op. cit. t. VI, p. 389);

As constituições têm incidência imedia­

ta, ou desde o momento em que ela mesmo

fixou como aquele em que começaria ai~

cidir. Para as constituições, o pass~

do só importa naquilo que ela aponta ou

menciona. Fora daí, não;" (op. cit. t.

VI, p. 3 9 2) .

SEI' Quadra -02 Sul l'difí,io Ln .. \" andar (TI' 70 ,.~O Bra,íli.1 D~

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MINISTÉRIO 00 INTERIOR

ri 11sli,a l'~r er~ 1

J ~·. Vara Ft,·: '- - -·-·;;_;·~

T.

fls. 45

Afirmações semelhantes - com larga cita -

ção de autores nacionais e estrangeiros

se encontram em obras dedicadas, em nosso

país, ao direito intertemporal. Assim,

em Carlos Maximiliano, Direito Intertempo

ralou Teoria da Retroativ~dade das Leis,

Rio de Janeiro, 1934, nQ 8, p. 25 e segs.

Essas assertivas se coadunam com a nature

za mesma das coisas. Se se elabora uma

norma Constitucional que veda situação an

teriormente admitida, quer isso dizer que

o poder constituinte, originário ou deri­

vado, entende ser essa vedação exigida p~

lo interesse comum, e, portanto aplicável

de imediato, salvo disposição expressa em

contrário."

(RDA 160/149).

E, manifestando-se, especificamente, so

bre a matéria, assevera Celso Bastos que:

110 inciso IV do art. 4g da Constituição '

há de ser entendido conjugadarnente como

o art. 198 e seus parágrafos. A União com efeito, fica deferido o domínio das

terras ocupadas pelos silvicolas, mas a

este cabe a sua posse permanente assim co

mo fica reconhecido o seu direito ao uso

fruto exclusivo das riquezas naturais e

de todas as utilidades nelas existentes .

Ficdram extintos todos e quaisquer direi­

tos que pudessem incidir sobre as referi.~

'>t·P <)u.1dr.1 -02 ~ui l'tlitic:10 l.cv, 5:' andar

CEI' 70.330 Bra~ília D.F.

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fls. 46

das terras, sem que os lesados possam /

pleitear indenização contra a União, por

força dos§§ lQ e 2Q do art. 198. O prin

cípio do direito adqui~ido, assegurado 1

pelo pelo§ 3Q do art. 153, ficou exceE

cionado em face do conteúdo dos referidos

dispositivos. (Curso de Direito Consti-

tucional, 1982, pp. 109/110).

De resto, vale notar que o princípio de

direito adquirido não subsiste diante de preceito que disc!

plina a existência ou a extinção de instituto jurídico, vi sando aos efeitos e ao conteúdo jurídico de determinada si

tuação (Roubier, Droit Transitoire, 1960, 2ª edition, pp.

210/213; Carlos Maximiliano, Direito Intertemporal, 1955

pp. 61/62; Eduardo Espínola e Eduardo Espindola Filho, Tra

tado de Direito Civil Brasileiro, 1932, V. II, pp. 187/188;

Pontes de Miranda, Comentários à Constituição de 1967, com

a Emenda nQ 1, de 1969, 1974, t. V, pp. 77/78; O.A. Bandei­

ra de Mello, Princípios Gerais de Direito Administrativo,~

19 6 9, pp. 276,287 e 2 8 8) .

Da mesma forma, a regra constante do a r t .

153, § 22, ou do art. SQ, da Constituição, não pode empre~

tar fundamento ã pretensão do litigante, porquanto ã a pr§

pria Lei Maior que consagua a insubsistência de qualquer tí ~ulo de propriedade sobre as áreas de posse permanente ' dos silvícolas (C.F., art. 4Q, IV e 198). Tenha-se presente

que as regras constantes dos arts. 198 e 49, IV, da Lei

Maior, contém, em verdade, uma declaração de extinção da

propriedade em terras habitadas em caráter permanente pelos

silvícolas. Não há, pois, como afastar a incidência imedi~

ta e geral, com a alegação de direito adquirido ou de situa

ção jurídica consolidada.'.

SFP Quad13 -·02 Sul E<.ldkw Lex, 3" andar

C.EI' 70 j:10 Bra,íli;t D F

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fls . 47

Assinale-se que a aludida orientação mo~

tra-se inteiramente consentânea com diversos precedentes da

excelsa Corte, que t~m reafirmado a inexistªncia de direito

adquirido a regime jurídico de um instituto de direito. A

propósito, vale ressaltar a seguinte passagem do voto prof~

rido pelo eminente Ministro Moreira Alves no R.E. nQ 94.020,

in verbis:

"( ... ) , em matéria de direito adquirido,

vigora o princípio - que este Tribunal/

tem assentado inumeráveis vezes - de que

nao há direito adquirido a regime jurídi

co de um instituto de direito. Quer is

so dizer que, se a lei nova modificar o

regime jurídico de determinado instituto

de dire\t0 (como é ~ropriedade, seja ela

de coisa móvel ou irr6vel, ou de marca)

essa modificação se aplica de imediato."

(RTJ 104/272)

Como se constata, é palmar o equívoco em

que laboraram eminentes juristas corno Carlos Medeiros e Cr~

tella Júnior, ao sustentarem que a disposição contida noart

198, da Constituição, não se aplicava aos títulos de propri~

dade outorgadas na vigência da Constituição de 1946, tendo'

em vista a proteção ao direito adquirido e ao ato jurídico

(cf. Pareceres, in RDA, 122/383 e RDA 128/641).

mental carreada nos

Ressalta, induvidosamente, da prova doeu

autos, a certeza de que o título domin~

1

SEP Quadra 702 Sul Edifício í.ex. 5" andar

CEP 70.3:,0 Brasíha D.E

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--·---~

FUNAI hind:t<,âo Nauonal Ju fndto

MINISr~RIO DO INTERIOA

f Ls • 48

al exibido pelos autores, expedido pelo axtinto D.I.C. do Estado de Mato Grosso, está incidente em terra indígena, i~

clusive, sobre a Área Indígena Bakairi, objeto em questão,

identificado o seu habitat imemorial Bakáiri, ~erra já abor

dado.

A Lei nQ 6001/73 menciona no Capitulo'

II sobre as terras ocupadas pelos índios ou silvícolas com

preendidos nos artigos 22 a 25:

Art. 22 - Cabe aos Índios silvícolas a

posse permanente das terras que habitam

e o direito ao usufruto exclusivo das

riquezas naturais e de todas as utili­

dades naquelas terras existentes.

Parágrafo únic~ - As terras ocupadas '

pelos Índios, nos termos deste artigo,

sao bens inalienáveis da União (art. /

4Q, IV, e 198, da Constituição Federal).

Art... __ ~l - Considera-se posse do índio

ou :-,LLv5 cola a ocupação efetiva da ter

ra que, de acordo com os usos, costu

mes e tradição tribais, detêm e onde '

habitam ou exerce atividade indispens!

veis à sua subsistência ou economica -

mente útil.

No mais, é feito indiscutível, hoje em

dia em todo o país, que o direito do índio à terra que ele

ocupa independe de estar essa terra medida e demarcada tal

como preceituado na Constituição Federal será assegurada p~

lo 6rgão federal de assist~ncia ao índio, consoante seu po

der de polícia objeto da delegação contida na Lei nQ 5.371Í\1 .. , .•

Sl:P Quadra 702 Sul : Edifício Lex , 3" andar

CEP 70.:\:\0 Bravi lin D F.

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fls. 49

67.

A presença indígena na área do mencio­

nado Vale do Guaporé, onde permanecem o g~upo Bakairi e inconteste e antecede aos prim6rdios do s~culo XVIII, onde

temos prova cabal, irrefrutãvel e inequívoca de que na r~

gião não ressente da presença de Índios, ressurge à toda

luz.

Destarte, hoje, com maior razao apos o

advento da Emenda Constitucional nQ 1/69, confirma-se aque

le sagr0do direito assegurado aos indígenas com referencia

as terras por eles ocupadas. A Constituição, com as alt~

raçoes introduzidas pela referida Emenda, determina no seu

artigo 198, in verbis:

Art. 198 - As terras habitadas pelos

silvícolas são inalienáveis nos termos

que a Lei Federal determinar, a ele e~

bendo a sua posse permanente e ficando

reconhecido o seu direito ao usufruto

exclusivo das riquezas naturais e de

todas as utilidades nelas existentes.

Ficam declaradas a nulidade e

a extinção dos efeitos jurídicos de /

qualquer que tenham por objeto o domi

nio, a posse ou a ocupação de

habitadas pelos silvícolas.

terras

§ 2Q A nulidade e extinção de que

trata o parágrafo anterior não dão aos

ocu0antes direito a qualquer indeniza­

ção contra a união e .Fundação Nacional

do I nd i o , ::iEP ()u.tdr.i •02 ~ui

EcJ1fi( 10 Lcx, 3" andar CEP 70.330 Brasília D F.

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f ls. 50

É de se acrescentar que as terras habita

das por silvícolas constituem bens dominiais da União Fede

ral, face ao que dispõe o artigo 4Q inciso IV, da Emenda Cons

titucional nº 1/69 daí a total impossibiLidade legal dessas

mesmas virem a ser objeto de transações comerciais e em COE

sequência, de passarem para o domínio privado. elas são in~

lienáveis e a sua posse é assegurada em caráter permanente '

aos Índios que nelas vivem e a mais ninguém. Todo e qual

quer negócio jurídico que os envolvam é considerado nulo e de nenhum efeito, não propiciando às partes direito à qual

quer ação ou indenização contra a União e a Fundação

nal do Índio.

Nacio

Assim, Pontes de Miranda, ao interpretar

o dispositivo Constitucional, declara:

"São nenhum quaisquer títulos, mesmo r~

gistrados, contra a posse dos silvícolas,

ainda que anteriores à Constituição de

1934, se a data da promulgação havia tal

posse. O registro anterior a proprieda-

de é titulo de propriedade sem uso e sem

fruição ... (in Comentários a Constitui -

ção de 1967, com a Emenda nQ 1, de 1969).

A proteção âs terras ocupadas pelos sil

vícolas encontra respaldo na jurisprudência dominante do Tri

bunal de Recursos, que reiteradamente, tem reconhecido a ina

lienabilidade dessas terras, fulminando como inconstitucio

nais as arquisições ou transferências para terceiros.

l "As terras habitadas pelos silvícolas I 1

~EP Quadra -02 xu] Fdificin l.cx. -~" andar

Cl:P -o 330 llra,ílta D F

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MINISTÉRIO 00 INTERIOR

fls. 51

sao inalienãveis. São nulos os atos /

que tenham por objeto domínio e posse

dessas terras, sem que seus ocupantes '

tenham direito a qualquer ação ou ind~

nização contra a União e a Fundação N~

cional do Índio.

art. 198."

Constituição Federal,

O objetivo da norma constitucional as áreas ocupadas pelos índios em terras

inalienáveis, foi o de preservar o habi

tat de uma gente, sem cogitar de defe~

der a sua posse, mas dentro do propósi

to de preservar um patrimônio territori

al, que é a razão de ser da própria e

xistência do índio.

São manifestamente inconstitucionais /

leis e convênios estaduais, que vizam

reduzir as terras reservadas, aos silví

colas ou transferí-las a terceiros.

(Ac. nQ 31.078-MT, TFR, Relator Minis -

tro Adhemar Raymundo, DJ em 21.05.81)

Assim, se o Estado de Mato Grosso ven

deu aos antecessores dos Autores te~ras que não eram do seu

domínio pleno porque habitada permanentemente por silvícolas.

Promoveu uma "VENDA A NONDOMINO" pelo que resulta eivada da

nulidade tal alienação a tornar ineficaz e de nenhum va -

lor jurídico aquela transação primeira que por sua vez, macu

la todas as demais subsequentes e dela originadas, nao re_§_

tando outra a L t.o r na tiva que não a dec La r a çáo de sua nulidade,

que textualmente, já é p re v.i s t o em lei.

~EP vu~dra ~02 ~ui Edifício I.ex. ~" ;1nd.tr

CEI' ~o 3Yl Bra,í!b D F

...,_,... .•.••....•..•.••.....•. ...,,.,.,_ .•..•. _. ... ~ -----

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ri·-

bl 11st,1~a F~~ \o ,tí,l /

' ~ -·-·- . . . .. - +· ....

fls. 52

Simplesmente argumentando quanto à 1n denização p1eitead3 no item 13 da ex?rdial referentes

3. Lc t r a C e em d í an t e . , cabe lembrar aos Autores que,

por estes, foi outorgada uma procuração nomeando o e~

gcnheiro agrônomo Dr. Paulo Roberto Rensi, dando pocl~ r c s para junto ?i FlJNJ\I a qu i Ré, estabelecesse acordos

q u.m t o aos objetos p l o i t c a do s no Ítem mencionado.

Ocorre que, em 20/02/86, às 14:30 hs,

na 5~ Delegacia Regional da Fundação Nacional do In - dio houve uma reunião entre as partes, sendo que, os

Autores estavam representados pelo outorgado Dr. Paulo

Roberto Rensi, sendo que este, fez comunicação à Fun

dação Nacional do Indio em 31/10/86.

Assim, em 27/02/86, os Autores por seu

rcprcscntantl' legal recebeu os ohjetos por ele recla­

mado, isto t ud o , conforme os documentos anexos (termo

de recchimento, ata <la reunião entre as partes e pr~

cur a cà o r •

Isto posto, face aos documentos trazi­

dos ii baila, referente ã indenização, tem, ainda, a

argumentar que quanto as 1etras "a" e "b" do Ítem 13

da cxortlial, esqueceram, os Autores, que contra a Un!

5o e a Fundaçjo Nacional do !ndio não h5 indenizaçio

um.: vez como ficou sobcj:irncntc p r o v a d o sendo u Ãrea

ln<lTgcnH Hakairi imincntcmentc habitut imemorial, co~

f o rmc ~ 29 do a r t , 1'.)8 da atual Constituição Federal.

e o N e L u s A o

~FP Qu:~dra -02 <.ui 1 d1fk10 Lt."X, 5'' .mdur

CEI' -o ~:10 Br:1'íli~ D ~

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MINISTÉRIO DO INTERIOR

fls. 53

e o x e L u s A o

Pelo que exaustivamente se expõe ao

longo desta c orrt e s t c c á o , requer a r~é - FUNDAÇ}í.O NACI

ONAL D0 fNDIO - nn:·',]:

n) - Seja conhecida e julgada procedente a prejudici­

;11 i n vo c a da , d o c l a r a nd o c s c , por sentença, a NUL.:!_ DADE d o título a qu i s i t i v o dos Autores r e f e r en te n "Estiinci:1 J:1 Ami z a d c" de c on fo rm i d a dc com o

artigo 59 do C6digo de Processo Civil;

b) - Caso assim não entenda o douto julgador, que s~

ja acolhida a PRELIMINAR levantada, com os seus

consect~rios <le direito;

c) - Uma vez adentrado no rn~rito da causa, que seja

declarada a improcedência da ação, ã luz do arti

go 198 e seus parigrafos da Emenda Constitucio - n.i l n ? 01/(19 e do disposto na Lei n ? ó.001/73 no que for aplic5vel, condcnundo-sc os Autores/

n:is cominações 1cgais.

J) - Protesta, finalmente a contestante pela produçio

d e t o d :1 :~ :i .s P r ova s P e r m i t ida s em d i r e i t o , e s p e e i almente pericial, na forma de "Perícia Histórico

- Antropológico" com nomeação <le um antropológo

para sua realização; bem como, a nomeação de um

perito agrimensor paro fazer o levantJmento topo -t gr~fico da propriedade dos Autores para demon~~

!si I' Qu.tdr.t ~o~ ~u! Edificro Lcx, 5" andar

CEP 70.;'>50 Brasi ha D F.

·---~ -~

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FUNAI Fundaçáo Nacional do fno.ho

MINISTÉRIO DO !NTr.AIOA

fls. 54

trar a total incidencia sobre a Área Indígena Bakairi, visto

rias, arbitra~ento, depoimento pessoal de todos os Autores,

inquiriçâo de testernunh~3 a serem oportunamente arroladas e

juntada de novos docume1~tos, se necess~rio ã elucidação da

espécie dos autos.

'1'ermos eIT\ que 1 ,J. esta aos autos com os

documentos anexos.,

P. Deferimento.

Cuiabá, 08 de dezembro de 1.987

1 ••• J .•••

Il~. , jociEtYN ~ALOMÃO OAJ •• M'r. Nt'I ~!!!

~FP ()11~dr;1 -o:! ~ui [<lifíu<' l.cx. :I" :1ndJr

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