investimento externo direto brasileiro: diagnóstico e ... · macroeconômico, de comércio...

17
Investimento externo direto brasileiro: diagnóstico e propostas de uma agenda de políticas públicas para o caso brasileiro Autoria: Milton de Abreu Campario, Marcello Muniz da Silva, Milton de Freitas Chagas Junior, Leonel Cesarino Pessôa Resumo Qual o contexto e a viabilidade da adoção de políticas para o fortalecimento do investimento externo direto brasileiro – IEDb? O artigo apresenta propostas para uma agenda no campo de políticas públicas direcionadas ao investimento externo direto brasileiro (IEDb). As propostas, calcadas na análise preliminar de dados estatísticos e na revisão da literatura nacional e internacional procuram dar conta do IEDb. Vale destacar que ainda não está consolidado o enquadramento teórico desse tema para países emergentes. Constata-se haver fortes indícios de que o influxo de capitais por meio de IED gere externalidades sob os seguintes domínios: macroeconômico, de comércio exterior e microeconômico (nesse caso específico, em temas mais alinhados a organização industrial). A hipótese aqui defendida está assentada na concepção de que políticas de fortalecimento dos fluxos de capital internacional são perfeitamente viáveis nos seguintes contextos: política monetária (onde em regime de cambio flutuante, a dinâmica de formação de preços, administração das reservas internacionais e cambio, por hora conduzidas pelo inflation target, pode contar com instrumentos, como Fundos Soberanos e outros instrumento de caráter anti-cíclico ligados ao IEDb, como meio de trazer maiores retornos no longo prazo à coletividade), política comercial (onde a ação do BNDES articulada com a criação dos Fundos de Exportação e Importação – Eximbank – pode fortalecer o setor produtivo também contribuindo para maior equilíbrio da inflação e cambio), políticas em organização industrial (onde a defesa econômica , foco na regulação de fusões e aquisições e incremento do uso de serviços na área metrologia, tecnologia industrial básica - TIB, entre outros serviços tecnológicos, podem aumentar a competitividade, inserção externa, etc., garantindo economias de escala em setores com vocação externa, gerando spin-offs de longo alcance em uma economia aberta). O fortalecimento da posição das empresas nacionais no plano internacional pode resultar do aumento do grau de parceria com empresas estrangeiras. Essas ações devem estar vinculadas ao estabelecimento de metas e política de atração de capital externo e promoção do IED brasileiro, sem prejudicar necessariamente a política macroecônomica e suas metas de estabilização monetária e cambial.Em suma, sustenta-se que o estímulo ao IEDb pode contribuir não só melhorar a competitividade de empresas brasileiras mas também garantir crescimento equilibrado e mudanças estruturais na economia. Palavras-chave: investimento, investimento externo direto, comércio exterior, políticas públicas, competitividade.

Upload: vodat

Post on 11-Nov-2018

213 views

Category:

Documents


0 download

TRANSCRIPT

Investimento externo direto brasileiro: diagnóstico e propostas de uma agenda de políticas públicas para o caso brasileiro

Autoria: Milton de Abreu Campario, Marcello Muniz da Silva, Milton de Freitas Chagas Junior,

Leonel Cesarino Pessôa

Resumo Qual o contexto e a viabilidade da adoção de políticas para o fortalecimento do investimento externo direto brasileiro – IEDb? O artigo apresenta propostas para uma agenda no campo de políticas públicas direcionadas ao investimento externo direto brasileiro (IEDb). As propostas, calcadas na análise preliminar de dados estatísticos e na revisão da literatura nacional e internacional procuram dar conta do IEDb. Vale destacar que ainda não está consolidado o enquadramento teórico desse tema para países emergentes. Constata-se haver fortes indícios de que o influxo de capitais por meio de IED gere externalidades sob os seguintes domínios: macroeconômico, de comércio exterior e microeconômico (nesse caso específico, em temas mais alinhados a organização industrial). A hipótese aqui defendida está assentada na concepção de que políticas de fortalecimento dos fluxos de capital internacional são perfeitamente viáveis nos seguintes contextos: política monetária (onde em regime de cambio flutuante, a dinâmica de formação de preços, administração das reservas internacionais e cambio, por hora conduzidas pelo inflation target, pode contar com instrumentos, como Fundos Soberanos e outros instrumento de caráter anti-cíclico ligados ao IEDb, como meio de trazer maiores retornos no longo prazo à coletividade), política comercial (onde a ação do BNDES articulada com a criação dos Fundos de Exportação e Importação – Eximbank – pode fortalecer o setor produtivo também contribuindo para maior equilíbrio da inflação e cambio), políticas em organização industrial (onde a defesa econômica , foco na regulação de fusões e aquisições e incremento do uso de serviços na área metrologia, tecnologia industrial básica - TIB, entre outros serviços tecnológicos, podem aumentar a competitividade, inserção externa, etc., garantindo economias de escala em setores com vocação externa, gerando spin-offs de longo alcance em uma economia aberta). O fortalecimento da posição das empresas nacionais no plano internacional pode resultar do aumento do grau de parceria com empresas estrangeiras. Essas ações devem estar vinculadas ao estabelecimento de metas e política de atração de capital externo e promoção do IED brasileiro, sem prejudicar necessariamente a política macroecônomica e suas metas de estabilização monetária e cambial.Em suma, sustenta-se que o estímulo ao IEDb pode contribuir não só melhorar a competitividade de empresas brasileiras mas também garantir crescimento equilibrado e mudanças estruturais na economia.

Palavras-chave: investimento, investimento externo direto, comércio exterior, políticas públicas, competitividade.

2

1. Introdução Entre as principais transformações econômicas que acompanharam o processo de globalização, ainda em curso (apesar dos retrocessos advindos da crise financeira difundida mundialmente a partir de setembro de 2008), destacam-se o forte incremento nas taxas de comércio externo e o avanço do processo de internacionalização da produção. De forma intrínseca, esses fenômenos foram concomitantes à ampliação na oferta e diversificação nos serviços financeiros e ao crescimento do fluxo de capitais internacionais – o qual incorpora o investimento externo direto (IED). O IED pode ser definido como a criação ou expansão da filial de uma empresa fora de seu país de origem por meio da aquisição de direitos patrimoniais por residentes de um país (de origem do capital) sobre ativos pertencentes a residentes de outro país (o de destino do capital ou país hospedeiro). Portanto, o IED envolve uma transação financeira estruturada, orientada ao controle de fatores de produção em um dado país hospedeiro. Por fim, sob a ótica da empresa, ao atender a objetivos previamente definidos, essa unidade de negócios passa a responder as diretrizes da estrutura organizacional da empresa que realiza o investimento.

Do ponto de vista estritamente financeiro e considerando a aquisição de uma empresa existente, esse tipo de operação compreende uma alternativa (em muitas situações, vantajosa) aos meios tradicionais de empréstimo ou financiamento. Em contraste e de forma análoga a transação de ativos financeiros, as empresas que realizam IED o fazem na expectativa de retorno (dado certo nível e grau de aversão ao risco) e ou de outras fontes de ganho como spin offs tecnológicos e ou acesso ativos estratégicos. Por muitas razões, o IED consubstancia mais que uma transação financeira. Em muitas situações, essas operações não contemplam meramente a obtenção do controle acionário de uma empresa ou negócio no exterior. Nesses casos e diferentemente de investimento em portfólio financeiro (transacionados em mercados organizados como bolsas de valores), o IED envolve operações de investimento feitas “sob medida”, orientadas a certas empresas e setores de atividade específicos, com perfil eminentemente direcionado ao longo prazo, visando a ganhos de difícil medição em termos de cálculo financeiro, cuja racionalidade perpassa essa esfera de ação empresarial. De fato, a aquisição de ativos reais absorve recursos para a obtenção de insumos (máquinas, equipamentos, instalações, etc.), emprego de capital de giro (necessário para iniciar e manter uma operação), entre outros gastos, expondo o investidor a uma série de fatores de risco (risco soberano, de taxa, etc.) em busca de ganhos. Devido à baixa liquidez e timing necessário para recuperação do capital alocado, os empreendimentos envolvem alto grau de incerteza. Adicionalmente, diversos estudos indicam que o IED possui importância e racionalidade que extrapola a dinâmica (financeira e econômica) do investimento privado. O que se tem observado é que, no agregado, tais operações implicam em profundos impactos macroeconômicos no lado real e monetário da economia, afetando profundamente o processo de crescimento e desenvolvimento econômico. Não por acaso, temas associados à dinâmica do Balanço de Pagamentos em Transações Correntes e Conta de Capital e seus impactos sobre o nível de atividade, investimento, volume de produção e preços, taxas de câmbio, juros e reservas internacionais, etc., têm sido objeto de acaloradas discussões políticas e econômicas ao longo dos últimos anos.

Tendo essas discussões em perspectiva, novas concepções de amplo alcance em políticas públicas são possíveis. A rigor, três dimensões de políticas balizam as prioridades aqui sugeridas: (i) macroeconômica; (ii) comércio exterior; e (iii) microeconômica (essa com ênfase na abordagem em organização industrial). A tese aqui defendida é a de que políticas de fortalecimento dos fluxos de capital internacional são perfeitamente viáveis nas condições atuais do Brasil. Elas melhorariam a competitividade de empresas multinacionais brasileiras e também contribuiriam para melhor regular as flutuações da taxa de cambio, atrair poupança

3

externa e tirar o melhor proveito do comércio exterior brasileiro (no mercado e na empresa). Para abordar esses temas, o estudo encontra-se dividido em 4 seções, além dessa introdução. A seção 2 apresenta uma síntese da revisão da literatura. Nela são exploradas abordagens que tem como foco a modelagem do investimento externo (notadamente as abordagens ownership, location and internalization – OLI e investment development path – IDPath) e o papel do IED no sistema de formação de poupança e investimento. Ambas dimensões encontram repercussões, em maior ou menor grau, na viabilidade de políticas macro, comercial e microeconômico em termos do IED. A seção 3, apresenta a concepção metodológica do estudo. Como o processo de internacionalização de empresas de países emergentes é novo, o fenômeno carece de tratamento teórico sistemático. Por essa razão, os fundamentos metodológicos maiores são a análise de estatísticas macroeconômicas e o survey da literatura, cujo objetivo central é resumir, relacionar orientar a construção de hipóteses – tal qual sugerido por Lakatos (1983) e Fourrez (1991) –, que possam vir a sustentar a ação pública na área de IED. Na seção 4 é apresentado um diagnóstico acerca da inserção de políticas ativas para o IEDb. A seção 5 apresenta um conjunto de propostas fundamentadas, contribuindo para construção de agenda ao IED brasileiro. Finalmente, a seção 6 tece as considerações finais, sistematizando as propostas de políticas públicas no campo do IEDb.

2. Síntese de modelos explicativos do IED Sob a ótica da teoria econômica, o fenômeno do investimento estrangeiro direto – IED vem sendo estudado desde a década de 1960, particularmente a partir das contribuições de Hymer (1976), na teoria de organização industrial, e Dunning (1977; 1979), que transita entre a macroeconomia e a microeconomia. Países buscam atrair investimentos externos, guiados por interesses variados, mas fundados, todos eles, na idéia de promoção do crescimento econômico por meio dos efeitos multiplicadores, gerando emprego e renda, trazendo ativos tangíveis, como capital físico e infra-estrutura, e intangíveis, como conhecimento, tecnologias, mercados, redes de fornecedores, cultura, entre outros (TEECE, 1982; CASSON, 1983; CAVES, 2007). Estudos econômicos também tratam os efeitos macroeconômicos da entrada dos recursos externos do ponto de vista do equilíbrio dos agregados macroeconômicos, afetando variáveis como a poupança, o investimento, a taxa de juros e o cambio, muito embora nenhuma afirmação mais conclusiva possa ser tratada com as teorias hoje disponíveis, bastando para isso comparar os resultados de curto e longo prazos, tal qual faz Helpman (2006) e Pain e Wesum (2003). Caves (2007) ressalta que a existência de IED estaria relacionada à diferenciação e inovação de produto, ao conhecimento patenteado e às barreiras a entrada de novas firmas. Esta abordagem também focaliza as questões do “trade off” entre o comércio internacional e os fluxos de investimentos entre os vários países, que é um dos temas tratados com destaque pelo Fundo Monetário Internacional (GHOSH, GORETTI et al., 2008). O objetivo desse trabalho é, a partir destas grandes abordagens, examinar as principais correntes teóricas, de modo a criar proposições sobre as especificidades do processo de investimento externo direto de países emergentes. Duas dessas correntes merecem destaque, pois dão conta diretamente (i) das motivações e impactos do IED sobre a ótica microeconômica (incluindo OI) e (ii) macroeconômica (sob a ótica da formação de poupança e investimentos, bem como movimentos de comércio), o que é feito a seguir.

2.1 Ownership, Location and Internalization e Investment Development Path O que motiva o IED? O paradigma de OLI (Ownership, Location & Internalization) e o IDPath (Investment Development Path ) são duas vertentes do pensamento teórico criado e desenvolvido por John Dunning, um dos autores mais citados na literatura acadêmica e de políticas públicas em internacionalização de capital, cujo intuito é dar conta dessa questão. Como ambos os enfoques estão intimamente relacionados, uma tentativa de síntese será aqui

4

realizada. Na fase 1 (quadro 1), do modelo OLI, o investimento externo é simplesmente oportunista, visando a explorar um ativo disponível no exterior, geralmente, um recurso natural. Na fase 2, há uma convergência incipiente de interesses entre a empresa e o país, sendo o mercado local o alvo preferido do capital investido. Para explorar mercados locais, é necessário que uma série de requisitos da cadeia produtiva sejam atendidos, como busca de menor custo de infra-instrutura e de transação (incluindo a área tributária), políticas mais estáveis, fornecedores e mercado de trabalho local minimamente organizado. A fase 3 já incorpora o fluxo de capital externo como uma prática mais freqüente dos mercados. Os fluxos externos de capital, para dentro e para fora, são mais intensos, mas, ainda, operando por critérios de vantagens comparativas. Isto é, eles aproveitam ativos tangíveis já existentes com ganhos de escala, sendo relevante a capacidade da empresa em operações de produção e de mercado, em larga escala, em diferentes países. Na fase 4, passa a ser mais relevante o processo de busca de competitividade e de ganhos de eficiência, com escala nas operações, mas com diferenciação de mercados, tecnologia inovadora para processos, produtos e mercadologia, fixação de marcas e aumento de sinergias na cadeia de suprimentos e distribuição e maior ênfase em ativos intangíveis. Na fase 5, o grau de investimento atinge a maturidade e passa a ser um dos elementos dominantes da economia. Ele supera, em relevância, a dinâmica de comércio exterior, sendo um elemento muito dinâmico capaz de reagir às mais diferentes situações macroeconômicas (juros e câmbio) e seus ciclos, tornando-se inclusive, como será sugerido posteriormente, um mecanismo de controle da estabilidade monetária e de integração de mercados em redes globais de suprimento e distribuição.

Quadro 1: Síntese do modelo IDPath integração com OLI. Fase do DIG

– OLI Propriedade Localização Internalização

Fase 1: Oportunista

Alto risco jurídico-institucional Contratos de exploração. Altos custos transação. Valor-Raridade/VBR

Ativos naturais com alta demanda. Escala de operação. Custos de produção baixos.

Exploração de vantagens comparativas estáticas (ativos tangíveis).

Fase 2: Incipiente

Políticas de incentivo e atração. Joint-ventures. Propriedade de ativos. Suprimento local.

Mercado nascente Infra-estrutura. Menor custo transação Mercado de trabalho.

Penetração de mercado local para segmento específico.

Fase 3: Praticante

Políticas adequadas Gestão de ativos tangíveis internacionais.

Mercado forte Competitividade Sistêmica.

Entrada de capital em segmentos abertos. Incipiente saída de capital em segmentos competitivos.

Fase 4: Competidora

Gestão de ativos tangíveis e intangíveis internacionais e estratégicos. Tecnologia e inovação globalizada. Escala e focos produtivos. Empresas de liderança global. VRIO/RBV.

Plataforma de exportação. Mercado de capitais. Qualificação de trabalho. Infra-estrutura diferenciada. Logística.

Maior fluxo de entrada e saída de capitais. Vantagens comparativas dinâmicas (ativos tangíveis e intangíveis).

Fase 5: Dominante

Grande mobilidade do capital. Suprimentos e projetos globais. Tecnologia de ponta na produção, organização e mercado. Eficiência e racionalidade na gestão internacional. Ativos criados: marcas, produtos, processos e conhecimento.

Mercados globais de capital. Recursos intangíveis. Maior sensibilidade a variáveis (juros e câmbio) e ciclos econômicos.

Economia aberta. Dependência recursos intangíveis criados. Complementaridade global com comércio exterior. Cadeias produtivas, de suprimentos e distribuição em redes globais.

Fonte: Formulado pelos autores com base no Investment Development Path – IDPath e no Paradigma de Ownership, Location and Internalization - OLI.

Ao apontar para vários fatores simultâneos que contribuem para o processo de investimentos no exterior, Dunning (1977; 2006) cria o que se convencionou chamar de “Paradigma OLI”, também conhecido como “Paradigma Eclético”. A sigla OLI expressa os fatores “Ownership, Location & Intenalization - OLI”. Estes fatores seriam responsáveis pela multinacionalização de empresas por meio de um movimento que concorre não só com o simples ato de servir os mercados externos, via exportação, mas também de substituir de forma eficiente as atividades exportadoras. Quando existem condições favoráveis de retorno, as empresas avançam no

5

sistema de propriedade (Ownership) dos mercados de ativos tangíveis e intangíveis (mercados de fatores, recursos naturais e de capital, tecnologia, etc.), dentro e fora do país. Este avanço tem a finalidade de utilizar os ativos em plantas produtivas industriais em múltiplas localizações (Location) ao redor do globo. Sobrepujam-se, assim, as “inseguranças de ser estrangeiro” (liabilities of foreignnness), que são constituídas por fatores variados dependendo da região ou do setor considerado, bastando verificar os contrastes entre empresas que operam no setor de petróleo e de alta tecnologia, em diferentes partes do mundo, conforme aponta Gray (2003). Esta conduta permite que a empresa compre ativos estratégicos e os utilize em diferentes regiões, fora de sua sede, ampliando sua capacidade de operação em escala ou escopo, dependendo da situação da cadeia produtiva onde está inserida. Esta utilização de ativos acaba por envolver a abertura de filiais e tem como conseqüência a internalização da produção em regiões as mais variadas (Internalization), fazendo, da atividade de produção local, um substituto para a exportação direta da matriz (integração horizontal) ou um mecanismo para aumentar a exportação da matriz com complementação local (integração vertical).

A influência do Paradigma de OLI e dos modelos U e I, além de outras contribuições mais específicas, geram uma classificação de fatores racionais atrativos para a internacionalização e que em muito facilitam as pesquisas de campo, como aquela levada a efeito por Tavares e Ferraz (2007) ou mesmo o levantamento da UNCTAD (2008). Uma síntese destas contribuições é tentativamente esquematizada no quadro 2.

Quadro 2: Síntese dos modelos OLI/IDPath, U e I Foco e variáveis críticas Fases do IDPath - Cumulativo

Foco em Recursos • Naturais únicos • Naturais complementares • Infra-estrutura • Logística

Oportunista • País receptor de capital especializado • Exploração de ativos tangíveis • Vantagens comparativas estáticas • Unidades de extração de recursos • Infra-estrutura setorial • Valor-raridade/RBV

Foco em Mercado (market-seeking) • Mercados abertos • Redes de distribuição • Liderança global ou regional • Faixa de renda compatível

Incipiente • País receptor: capitais diversificados • Políticas públicas • Estratégias de mercado • Renda local • Segmentos selecionados

Foco em Eficiência (efficience seeking) • Escala Manufatura • Operações e Logística • Gestão global e aprendizado • Busca por infra-estrutura eficiente • Suprimentos e distribuição • Amplo mercado de trabalho

Praticante • País receptor e fonte de capital • Gestão de ativos internacionais • Políticas públicas abertas • Competitividade setorial global • Criação de ativos intangíveis não imitáveis-

organização/RBV. • Mercado de trabalho. • Primeiros fluxos para fora

Foco em Ativos Criados (created asset) • Globalização de marca • Tecnologias, patentes e marcas • Formação de redes globais distribuição e

suprimento • Cadeias de Valor (market affiliates) • Imagem: marca e valores

Competidora • Fluxos intensos para dentro e para fora • Ampliação de ativos tangíveis • VRIO/RBV. • Vantagens comparativas dinâmicas • Mercado de trabalho qualificado • Infra-estrutura diferenciada

Salto de Barreiras • Redução de risco e incertezas • “Insegurança de Ser Estrangeiro.” • Superação de custos de transação • Mobilidade do capital para entrada e saída

Dominante • Quebra de fronteiras e sensibilidade a ciclos e políticas

econômicas de curto prazo. • Formação de redes para suprimento e distribuição

globais • Fluxo de capital complementar ao comércio mundial

Fonte: Elaborado pelos autores com base no Paradigma de OLI/IDP e Modelos U e I.

6

2.2 IED e o sistema de poupança e investimento O IED é uma rubrica, cada vez mais relevante, para explicar o dinamismo e a riqueza de muitos países e regiões, estando devidamente mensurada na Contabilidade Social. Conforme apontam Gruben e Mcleod (1998), as identidades contábeis nacionais incluem a geração de poupança e as demandas por gastos de investimento, inclusive externo. Numa economia cada vez mais aberta, como a brasileira, o investimento é financiado pela poupança privada e pública, com crescente participação da poupança externa. Nesse artigo, são usadas convenções contábeis internacionais, cujas funções básicas estão detalhadamente descritas por Feijó e Ramos (2004). O foco das análises, sumariamente apresentadas nessa seção, é a identidade macroeconômica: S – I = (G + R – T) + (X-M). i A rigor, a diferença entre poupança e investimento (S - I) é igual ao déficit orçamentário (G + R – T) mais o saldo da balança comercial (X-M). Esta é uma relação neutra sem, a priori, nenhuma implicação teórica comportamental . Ela indica simplesmente que existe uma relação entre as contas do setor privado (S – I), o orçamento do governo (G + R – T) e o setor externo (X-M). Em outros termos, dada a identidade entre S e I, decorre que qualquer déficit (superávit) do governo se traduz em déficit (superávit) na conta externa. Por exemplo, caso haja desequilíbrio nas contas do governo, haverá repercussões sobre a poupança privada e ou externa. É possível obter dessas relações contábeis a expressão T – R – G = (I – S) + (X – M). ii De acordo com esta identidade, o déficit de um setor é sempre associado ao superávit de outro, pelo simples fato de que o superávit (déficit) de uma entidade é o déficit (superávit) outra. Esta relação é mais complexa, devido à entrada e saída de capital do exterior. Assim, todas as transações da economia com outros países, além das importações e exportações (X-M), estão registradas no Balanço de Pagamentos (BOP), incorporando dois grandes fluxos de recursos: conta corrente ou transações corrente (TC) (formada pelo saldo da balança comercial, balança de serviços e transferências unilaterais), onde são registradas as transferências de bens e serviços e as doações recebidas ou dadas, sem que haja uma contrapartida; conta capital e financeira (CF) (que contabiliza os investimentos diretos do exterior - IED – tanto de brasileiros no exterior, quanto de estrangeiros no Brasil –, investimento em carteira – aplicações no mercado financeiro, ações e títulos – e outros investimentos).

Contas com resultado negativo significam que houve mais saída que entrada de recursos naquela rubrica contábil. Segundo dados mais recentes (BANCO CENTRAL DO BRASIL, 2009), as principais contas que apresentam resultados negativos são royalties, juros, as contas de serviços e rendas. As contas com resultado positivo são investimento direto, investimento em carteira e balança comercial. O resultado do BOP positivo (negativo) significa um aumento (diminuição) das reservas internacionais e este aumento (diminuição) pode significar uma pressão sobre o câmbio, sobre as reservas e na inflação. Mas, do ponto de vista contábil, estas reservas é que permitem sempre atestar que TC = CF. Na verdade, há uma diferença básica entre as duas contas. A TC, dominada pela dinâmica do comércio exterior, não gera um passivo futuro, pois a transação é encerrada quando uma venda de bens ou serviços (ou ainda pagamentos) é realizada. Na CF, dominada pelo fluxo de capital entre nações, se um ativo é comprado com capital estrangeiro, um passivo é gerado, pois os juros e mais o principal terá que ser pago em algum momento. O que se pode adiantar é que o câmbio afeta obviamente o preço relativo de todos os fluxos contidos no BOP e também os termos de troca entre as nações.

Uma forma de entender as implicações da dinâmica desses fluxos é por meio da relação entre fluxo de capitais e Balança de pagamento em conta corrente, que incorpora as transações comerciais de uma nação com o resto do mundo. Os casos apresentados na figura 1 e discutidos no quadro 3 mostram a dificuldade em tratar as doutrinas de crescimento somente por meio do binômio do crescimento “para fora” ou “para dentro”. A depender do

enquIED supercondde IEvolat

FigurPIB, 1

Fonte

IndícComexpliQuad

Case 1 (respondecorrente corrente.

Case 2 (responderendimenque esta

Case 3 (indicandconta cor

Case 4 (capital e

Case 5 (púnico cam

Font

Há ína partrajetnas ctantouma expoPasto

uadramento podem ser rávits, em t

dições sobreED são recotilidade cam

ra 1: Fluxo T1989-2007, pa

e: GHOSH e G

cios da relamercial, Form

icitados nosdro 3: Relaçõ(fluxos Líquidosendo de forma efseja positivo, a g

(fluxos de capitaer às demandas pntos, com caracteé a situação onde

(pressões pelo suo um domínio dorrente for positiva

(fuga de capital financeira do BO

pré-crise do BOminho, além da in

te: Elaborado

ndicos de qrtir de 1994tória dos sacontas correo público co

posição portações e iore, Pinotti

de uma nafeitas. A rigermos de fl

e a política momendadas,

mbial e maio

Total de Capiara 50 países

GORETTI et

ação entre mação Bruts gráficos 1,ões entre flux positivos de capficaz à demanda grande dependên

al em busca de por financiamentoerísticas oportunise os fluxos de cap

uperávit em cono superávit em coa, mas não excess

superior ao saldOP e um provável

OP) Há péssimos insolvência.

o a partir de G

que houve cr4. De fato, oldos nas conentes é a re

omo privadopositiva de importaçõeset al., (2008

ação em umgor, o Brasuxo de capimonetária, , aliviando aor rentabilid

ital (eixo verts em desenvol

al. (2008).

os movimeta de Capit, 2, 3 e 4, apxo de capitaispital financiam por poupança ex

ncia dos fluxos de

rendimentos): To da conta correstas, seja onde hápital são dominan

nta corrente): Neonta corrente e aisiva, então polític

do em conta corrl enfraquecimento

indicadores de sa

GHOSH e GO

rescimento os saldos nantas correntedução das o, o que per

poupança s) e poupa8) mostram

m dos casesil se enquaditais e no BOpolíticas dea pressão so

dade das res

tical) e Balanlvimento.

entos nas cal Fixo (FBpresentados e Balanço deo déficit em conxterna. No entante capital tornam

Trata-se do caso ente, claramente ná um déficit (a mantes, o que pode c

este caso o voluminda, em alguns ccas de encorajar a

rente): Neste caso do crescimento

aída de capital e t

ORETTI et a

da inserçãoas contas cotes dos demdívidas ex

rmite uma mexterna n

ança internam que existe

s, recomenddra no case OP em conte encorajamobre o câm

servas).

nço de Conta

ontas do BBKF) e Imp na figura 2e Pagamentosnta corrente): Ato, embora a somestas situações u

com maior númnesta situação a aior parte dos casolocar riscos em

me de observaçõcasos, uma somaa saída de capital

so há claramente no longo prazo.

também déficit em

al. (2008)

o econômicarrentes bras

mais mercadoxternas e a maior estabino BOP (sa é inversauma relaçã

dações de p3 possuind

ta corrente. mento da saímbio e reserv

a Corrente (e

BOP, relaçãportações e2 abaixo. s em cases esp premissa aqui é

ma do fluxo de cum risco calculad

mero de observaçgrande liquidez

sos) ou superávit momentos de fal

es não é tão signa positiva de entra

são recomendada

uma questão de

m conta corrente,

a brasileira sileiras têm os O signifidesdolariza

ilidade monsaldo positamente propo inversa en

política relado uma com

Dada a preda de capitavas (garanti

ixo horizonta

ão entre IEDm relação

pecíficos seguque os fluxos de

capital sobre o sado pelo peso nega

ões ou situaçõesde capital migraem conta corrent

lta de liquidez int

nificativo como nada de capital. Seas.

pressão negativa

, o que torna a dí

no exteriormostrado u

icado destesação de seunetária. A retivo na relporcional (ntre investim

7

acionada aombinação deessão dessasal por meioindo menor

al), em % do

D, Balançaao PIB são

undo FMI. e capital estão aldo em conta ativo da conta

s. Ao invés de a em busca de te. Observa-se ternacional.

nos anteriores, e a balança da

a sobre a conta

vida externa o

r, sobretudouma mesmas superávitsus passivos,elação entrelação entre(gráfico 3).mentos/PIB

7

o e s o r

o

a o

o a s , e e .

B

e expuma há o contado prdo IEinver

Gráfico 1: B

Gráfico 3: In

FigurFonte

A reexistcontaentrequocconfoaindaexterrigidacompúbli

portações lísubstituiçãoque contest

a corrente eresente estuED como qrsa entre as

Balanço de Paga

nvestimento Di

ra 2: Evoluçãe: Elaborado p

lação inverte uma subsa corrente ee a soma dociente entre forme Figura mais aderrna, e que o

dez institucimpanhar a dica não é fa

íquidas (supo plena de ptar. Mas, o

estão associaudo calcularquociente do

duas variáv

amentos do Bra

ireto /PIB e Bal

ão dos agregapelos autores a

rsa entre astituição tota

estão associo saldo da investimen

ra 5. A adiçrente à teorios déficits esional da poinâmica das

acilmente ve

perávit das poupanças erelevante é ados a maioram a relação PIB e o qveis, conform

asil. (US$ bilhõ

lança Comercia

dos macroecoa partir de dad

exportaçõeal, mas parciados a maioconta corre

nto e PIB, inção da curvia de que nstariam mui

oupança púbs contas corerificável, s

contas correxterna e inque Pastore

ores taxas dão entre a squociente enme o gráfic

ões)

al/PIB.

onômicos do dos obtidos no

es líquidas/cial, de pouores taxas dente com o ndica correlva de inves

não existe suito associadblica, derivrrentes, a evsobrando um

rentes)/PIB. nterna, mas ae e seus col

de investimesoma do salntre investio 4.

Gráfico 2: In

G

Balanço de p BACEN e IP

/PIB e inveupanças extede investimsaldo do I

ação inversstimento (Fubstituição dos ao movivada da fraventual subsma mais for

Isto demonapenas parclegas verificento. Da medo da contamento e PI

nvestimento (FB

Gráfico 4: FBK

pagamentos. PEADATA.

estimento/PIerna e intern

mento. Da mIED, como sa elevada eFBKF) e IE

perfeita entimento dos

agilidade dastituição da rte relação e

nstraria quecial. Neste qcam que os esma formaa corrente cIB, obtendo

BKF)/PIB e Bal

KF, Importações

IB demonstna e que os

mesma formaquociente d

entre as duaED implica tre poupançinvestimen

as políticas poupança e

entre poupan

8

e não existequesito, nãodéficits em, os autores

com o saldoo correlação

lança Comercia

s e Importação +

tra que nãodéficits ema, a relaçãodo PIB e o

as variáveis,uma curva

ça interna entos. Dada a

fiscais emexterna pelança externa

8

e o

m s o o

al/PIB

+ IDE

o m o o , a e a

m a a

9

e interna privada. Assim, o crescimento nas contas correntes será absorvido por uma retração dos investimentos, tal qual prevêem teoricamente Obstfeld e Rogoff (1996) Mas, há outra relação interessante, conforme mostram os dados na Figura 6, a seguir. Trata-se da relação entre poupança externa, conjuntamente com o saldo do IED e o comportamento dos investimentos. Nesse caso, vale a observação de que estes últimos trazem uma forte correlação com as importações, conforme mostram os dados do gráfico 4, fato este chamado atenção por Pastore et al. (2008). Também chama a atenção o fato de que, na soma dos Investimentos com o saldo do IED, uma correlação é similar, mostrando que as importações dependem muito dos investimentos e do IED estrangeiro, vindo ao Brasil. Ademais, é facilmente verificável que não há correlação significativa entre estas variáveis e o consumo interno, que classicamente depende da renda nacional (PIB) e não de elementos da demanda agregada (C, I, G, X e M). Portanto, a hipótese de Bresser (2009), de que a valorização cambial é prejudicial ao crescimento, pois esta valorização se reverteria primordialmente ao consumo, está falha. De fato, isto pode acontecer, mas a inércia do consumo é maior, frente ao crescimento da renda, do que às mudanças de um só agregado das contas nacionais, no caso, a balança comercial.

Há que se observar que a situação do BOP brasileiro é muito positiva a partir de 2001, quando dois fatores foram decisivos: aumento das exportações, particularmente, das commodities, e grande entrada de IED, o que provocou aumento de reservas internacionais, com a conseqüente queda do “risco país” Pastore e Pinotti (2006). No entanto, conforme aponta Rodrick (2007), esta situação de prosperidade pode sofrer fortes abalos. De fato, depois da crise econômica de 2008, o comércio internacional vai provavelmente crescer menos, com menor disponibilidade de financiamento externo e deve aumentar a propensão dos EUA e países ricos em reduzir seus déficits comerciais e seu consumo das famílias, o que pode provocar uma queda no comércio internacional e no fluxo de IED, revertendo a situação que ainda predomina no país. A questão agora é saber as condições para que o país mantenha o crescimento econômico com maior abertura e com o incremento do IED brasileiro, tendo em vista a criação de atores globais nacionais, capazes de competir e aumentar a produtividade de longo prazo da economia. iii

3. Metodologia O artigo se concentrou em duas questões: Qual o contexto e a viabilidade da adoção de políticas para o fortalecimento do investimento externos direto brasileiro – IEDb? Mais particularmente, que ações políticas e quais ganhos nos planos macroeconômico, comercial e microeconômico? Para da conta dessas questões, na fase inicial do estudo, foi desenvolvido o levantamento e tratamento de dados estatísticos de informações como meio de tecer um panorama do processo de adoção de políticas de extímulo ao IEDb. Esse material foi analisado à luz dos estudos de Pastore et al., (2008) e Ghosh et al. (2008) que discutem a relação entre IED e dinâmica da Balança de Pagamentos. Simultaneamente, foi feita a revisão acerca dos modelos que procuraram dar conta do IED, em especial as abordagens de Dunning (1970, 1977, 1979), Dunning e Narula (1996), Dunning e Rugman (2006), Vernon (1966, 1973, 1974, 1979), Hymer (1976) Kindleberger (1972), Teece (1982), Casson (1983), Caves (1971, 2007), Campos e Kinoshita (2003), entre outros explorados nesse relatório. Mais recentemente, há as coletâneas de trabalhos organizadas por Sauvant (2009) e Sauvant, Mendoza e Irmak (2008). Um esforço foi feito no sentido de enfatizar as “regras institucionais”, incluindo aí apoio de políticas públicas explícitas e implícitas, na origem e no destino do investimento. Com esses elementos, procurou-se identificar os padrões e concepções teóricas que dariam embasamento às fases posteriores do estudo. A revisão dessa literatura teve como prisma o contexto de internacionalização de empresas e, em particular, a internacionalização em países em desenvolvimento. Como conhecido e em contraste com

10

outros países, orientados aos mercados externos, promoção de grupos econômicos, integração entre comércio externo e investimento, etc. (quadro 4) que se diferenciaram em termos da forte orientação externa, o processo de internacionalização das empresas dos países latinos americanos remonta ao processo de reformas e abertura econômica que se seguiu ao esgotamento do processo de industrialização por substituição de importações.

Particularmente, o foco nos recursos, a significativa dimensão do mercado interno (que implicou em elevados níveis de absorção da produção interna e externa) e a abertura econômica, financeira e comercial tardia do Brasil, retardaram seu posicionamento como emissor de IED de destaque (embora tenha sido um dos países que mais atraiu capital e reservas e, nesse caso, após a passagem para o regime de cambio flutuante em janeiro de 1999). Isso permite sustentar que, se for relativizado o volume de absorção do mercado interno, os fatores de impulso geralmente estão associados ao grau de abertura, de vantagens comparativas em recursos e às características do mercado interno. Em contraste com outros países, como sugerido no quadro 4. Então, considerando o benchmarking internacional e o conjunto de contribuições explicativas acerca do IED, optou-se por um survey da literatura (aqui sumarizado acima) como meio de mapear paradigmas explicativos acerca do tema. Metodologicamente, essa visão se alinha à contribuição de Lakatos (1983), no sentido em que sustenta que a atividade de pesquisa deve iniciar-se pela teoria. A vantagem desse procedimento está relacionada à concepção que assume a teoria. Segundo Lakatos (1983), essa: (i) resume e explica os fatos; (ii) apresenta a relação entre esses; (iii) os classifica e sistematiza; (iv) orienta a seleção desses; (v) indica lacunas do conhecimento; (vi) resume e explica o que a ciência sabe sobre esses; (vii) prevê novos fatos e relações; (viii) orienta a construção de hipóteses para uma investigação. Ainda, segundo Fourrez (1991), sistemas teóricos compreendem interpretações sistematizadas, que organizam a percepção de fenômenos. QUADRO 4: Principais características dos modelos de industrialização em países selecionados: Coréia do Sul, China e Japão.

Características Implicações mais relevantes Industrialização e produção com foco no mercado externo

industria nascente se desenvolve em meio a busca de forte orientação externa contato com mercados externos e precoce exposição a padrões internacionais de competição em produto e

processos Grande participação dos fundos públicos de financiamento

transferência por meio de juros subsidiados, longos períodos de carência e prazos de amortização marcante atuação dos fundos de Eximbanks recursos gerados em certas atividades econômicas realizadas por grandes

Estímulos à formação de grandes grupos econômicos

presença de grande conglomerados tendência e incentivos à concentração integração vertical e horizontal criação de elos inter-setoriais, medidas orientadas para a criação de reserva de mercado conglomerados reforçam integração vertical gerando ganhos a escala

Integração entre padrões de comércio e de investimento

promoção do desenvolvimento com explícita atenção ao papel e nível de integração do sistema financeiro com modelo de desenvolvimento

Incentivos ao aporte de tecnologias

políticas tendiam ou orientavam ganhos de produtividade vinculados às políticas de incentivo, importação de projetos e plantas, ganhos por meio de processos de transferência de tecnologia e

aprendizado abertura para o desenvolvimento do Sistema Nacional de Inovação – em contraste com Sistema Nacional

de Ciência e Tecnologia Aspectos comportamentais

apóio e investimento na formação profissional nas áreas técnicas e de engenharia clara visão e comprometimento do empresariado com modelo de desenvolvimento aspectos políticos e culturais reforçavam modelo orientado pela integração inter e intra setorial

Fonte: Elaborado pelos autores.

Tendo em vista essas concepções, para atender aos objetivos do trabalho, foi estabelecido um processo de levantamento de estudos teóricos (incorporando também discussões imediatamente antes e após a crise de 2008) sobre os modelos de internacionalização do capital produtivo, com ênfase nas condicionantes de mercado. Essas culminaram no esquema metodológico apresentado na figura 2. Em suma, mantendo a visão que norteou os trabalhos até o presente e respaldado pela revisão da literatura, a pesquisa desembocou e apoiou-se em

11

três dimensões fundamentais: Macroeconômica: que abarca os condicionantes específicos da dinâmica dos agregados macroeconômicos da economia brasileira, que implicam e afetam o nível de produto, os preços relativos e, em conseqüência, o padrão de poupança e investimento, em meio ao processo de ajuste estrutural da economia ante ao ciclo econômico, processo de internacionalização e choques externos; Microeconômica/Organização Industrial: que abrange condicionantes particulares de mercado, organização industrial e setoriais que dão conta e ou estimulam a ação empresarial em torno de diretrizes, caráter, foco e resultados da atividade de produtiva e orientação comercial, por meio do investimento externo direto; Comercial/Modelo de Dunning: que engloba o mapeamento de condições favoráveis de retorno em termos das dotações e sistema de propriedade (ownership), localizações (location) e utilização de ativos por meio da abertura de filiais e internalização da produção em regiões as mais variadas (internalization). Complementar e oriundas dessas linhas de investigação, o aspecto institucional também foi abordado, no sentido de avaliar como as políticas públicas locais dinamizam o influxo de IED e aceleraram o processo de internacionalização das empresas brasileiras no contexto da crise. Essa e as demais dimensões são detalhadas abaixo. É com base nessas concepções metodológicas e dimensões que o diagnóstico, viabilidade de políticas públicas e as propostas feitas nas próximas seções foram concebidas. Figura 2: Síntese da estrutura metodológica adotada pela equipe de estudo do subprojeto.

Racionalidade econômica do investimento estrangeiro direto - IED

3. Dimensão comercial: Modelos

explicativos do comércio e Paradigmas de

Dunning

2. Dimensão Microeconômica:

Teoria da Organização Industrial

1. Dimensão Macro: Teoria Macroeconômica e de Desenvolvimento

I-model (Innovation-related

internationalization model)

Teoria e Política Macroeconômica e

Modelos de desenvolvimento

econômico

Elementos de Política Comercial

U-Model (Upsalla Model) OLI - Ownership, Location &

Internalization

Investment Development Path –

IDPath

Formulação de agenda de políticas públicas de apoio a internacionalização de empresas brasileiras

Fonte: Elaborado pelos autores.

4. Investimento externo direto brasileiro: diagnóstico de sua viabilidade (relacionar com revisão da literatura) O quadro 5 apresenta um panorama de inserção das políticas de incentivo ao Investimento Externo Direto Brasileiro – IEDb, tendo como foco as dimensões da política macroeconômica (monetária/cambial, fiscal tributária e em termos do Fundo Soberano), política de comércio exterior (papel dos Eximbanks, integração do Eximbank, com financiamento por meio de bancos de desenvolvimento - BD), e política microeconômica ou com foco em organização industrial (defesa econômica, regulação de fusões e aquisições inovação e tecnologia industrial básica – TIB). As ações de política pública são propostas, nesse estudo, no contexto dessas dimensões. Isso é feito na próxima seção. É, no contexto dessas dimensões, que as ações de política pública são, nesse estudo, propostas, o que é feito na próxima seção.

12

Quadro 5: Panorama realização e de inserção de incentivos ao IEDb. PLANO DA POLÍTICA MACROECONÔMICA

Política monetária e cambial Política fiscal/tributária Fundo Soberano do Brasil – FSB • Superávit na balança comercial, saldo positivo na conta capital e financeira do BOP; déficits nominais na conta fiscal: situação tem apreciado o real, com conseqüências negativas sobre exportações. • Déficit na conta fiscal eleva os juros e traz mais capital volátil o que provoca mais a apreciação do cambio. • Política de cambio flutuante: reservas tendem a reduzir o seu ritmo de acumulação, com o encarecimento relativo de ativos nacionais e redução das exportações.

• Afrouxamento fiscal (aumento de gastos) prejudica superávit em conta corrente, reduzindo a pressão sobre o balanço de pagamentos. • Essa política pode certamente trazer um aumento da taxa de juros, o que incentivaria a vinda de capital de curto prazo, pressionando ainda mais o cambio. • Os dois movimentos (pressão sobre a política fiscal e sobre a política monetária) impõem ações como aumento nos juros o que reduz o dinamismo e crescimento do produto e renda

• Novos atores financeiros têm entrado na cena do IED; private equity funds – PEF, fundos de venture capital – VC (estes mais presentes em seguimentos emergentes baseados em ciência e tecnologia) e Fundos Soberanos, (sovereign wealth funds – SWF). • Discussões e regulamentação da política de atuação do Fundo Soberano nacional ainda são controversas. • O uso de instrumentos como restrições aos FS estrangeiros e regulamentação do FS nacional ainda é incipiente.

PLANO DA POLÍTICA DE COMÉRCIO EXTERIOR Papel Eximbanks Banco de desenvolvimento/Eximbank Integração Eximbank/BD

• Verifica-se certas limitações na política de apóio ao exportador: instrumentos destinados a esse mercado são operados por vários ministérios. • Em 2009 o governo anunciou a criação do Eximbank o qual estará vinculado ao BNDES. • Suas operações ficarão centralizadas – o que deve contribuir para melhor organização do comércio exterior • Novo banco não deverá financiar investimentos em outros países; apenas conceder empréstimos a governos ou empresas estrangeiras que queiram comprar produtos brasileiros

• Promover debate em questões como: (i) Com o aumento da liquidez internacional e do fluxo de capital, em que medida o BNDES compatibiliza suas linhas de atuação? (ii) Tem o BNDES uma agenda clara neste tema, integrando-o às políticas bem definidas de investimento e • A postura do BNDES ainda é dúbia, abrangendo fusões e aquisições: estuda cada caso de M&A e tem deve avançar no processo de integração entre o estímulo à exportação e o fortalecimento das empresas nacionais no comércio externo?

• O comércio internacional, o IED e a concentração das atividades econômicas são irmãs siamesas na medida em que fazem parte do moderno padrão de acumulação de capital em nível internacional. • Países que abriram suas economias tiveram melhor desempenho, atraíram mais capitais e apresentaram significativos incrementos no comércio. Em suma, o desempenho comercial e influxos de investimento caminham juntos, mas o primeiro é tributário das ações do segundo

PLANO DE POLÍTICA MACROECONÔMICA Defesa econômica Fusões/Aquisições Inovação/TIB

• País conta com o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência - SBDC, que é constituído por um conjunto de órgãos governamentais responsáveis pela promoção de uma economia competitiva no Brasil, por meio da prevenção e da repressão de ações que possam limitar ou prejudicar a livre concorrência. • Há espaço para ações de eleger vencedores como meio de fortalecer seguimentos produtivos com vocação internacional.

• As condições de liquidez do comércio mundial reforçaram muito o acesso a financiamentos de longo prazo e as práticas de fusões e aquisições, o que está intimamente ligado às práticas de transnacionalização do capital. • Há que se adicionar as fusões e aquisições (M&A - Merger & Acquisitions), como elemento aglutinador da acomodação dos espaços de mercado no plano global por meio da IED.

• O sistema produtivo atua em um contexto de crescente necessidade e dispersa base laboratorial credenciada para prover ensaios, análises, calibrações, estudos de conformidade seja no campo voluntário ou compulsório.

• Muitas empresas não possuem cultura de uso de serviços tecnológicos desde a fase de concepção de propostas/projetos o que gera perdas de valor nessas atividades de recursos que poderiam ser evitadas.

Fonte: Elaborado pelos autores.

5. Propostas de uma agenda prioritária ao IED brasileiro

Tendo em vista os temas que circunscrevem as questões apresentadas na seção 3, Moran (2008) aponta que existem basicamente três estratégias lógicas de políticas para promover o IED para fora: promoção; inibição; e neutralidade. As perguntas por traz destas três alternativas são duas: (i) traz o IED para fora algum tipo de prejuízo para os fatores de origem, prejudicando o mercado de trabalho, os impostos e drenando recursos para outro país? ; (ii) traz este tipo de investimento para fora alguma perda de controle dos governos sobre a autonomia nacional e seus recursos? As propostas, apresentadas a seguir, sustentam que há espaço para políticas públicas e ganhos para as empresas, governo e aos mercados em termos de ação governamental mais ativa no plano do IEDb.

13

5.1 Política macroeconômica O processo de abertura e estabilização monetária, que hoje faz justificar a existência de um forte fluxo de capitais para dentro e para fora do país, teve início com uma primeira onda de redução tarifária nos anos 1990, mas foi encontrar a sua dinâmica mais consistente com o Plano Real, de 1994. Este não teria êxito, não fossem as reformas patrimonial, fiscal e de relativa ortodoxia na condução das políticas de juros e câmbio subseqüentes, o que manteve a memória inflacionária estancada, mas a custa de um crescimento relativamente lento, que ainda depende de poupança externa, conforme reconhecido por boa parte dos analistas brasileiros (BRESSER-PEREIRA, 2009; GIAMBIAGI e BARROS, 2009). O Brasil tem tido, nos últimos anos, uma situação de superávit na balança comercial, além de um saldo positivo na conta capital e financeira do BOP, mas ainda conta com déficit nominal na conta fiscal. Esta situação tem apreciado o real, o que traz conseqüências negativas para a exportação de manufaturados e, na seqüência, deverá atingir também a exportação de bens primários mais competitivos. O déficit na conta fiscal eleva os juros e traz mais capital volátil, o que provoca mais a apreciação do câmbio. Com a política de cambio flutuante, as reservas tendem a reduzir o seu ritmo de acumulação, com o encarecimento relativo de ativos nacionais e redução das exportações. A outra opção é a que a China persegue: mantém o cambio depreciado - contendo os ativos domésticos desvalorizados -, atrai mais IED, aprimora a agressividade nas exportações, aumenta as reservas e usa Fundos Soberanos como política para desovar dólares (e apreciá-los) em projetos de longo prazo. Em situação como a brasileira, é relevante indicar que, tanto o Banco Mundial como o Fundo Monetário Internacional (GHOSH et al., 2008), sugerem como política monetária o “afrouxamento” das restrições ao IED para o exterior, o que aliviaria a pressão sobre o cambio. Esta posição é muito ousada e interessante, pois o país poderia ter uma política de fortalecimento de sua presença em indústrias fora do país, com rendimentos maiores do que a remuneração de reservas (que rendem os juros básicos americanos equivalentes ao dos U.S Treasuries, que rendem menos que um por cento ao ano, com perda significativa no médio e longo prazos, dada a inflação em dólares) e ganhando empresas líderes globais, capazes de fazer aumentar as exportações, caso atuem de forma integrativa vertical; mesmo na forma horizontal, há ganhos substantivos, quando o mercado tender a ter um perfil de oligopólio. Quadro 6: Políticas públicas macroeconômicas e orientação ao investimento externo brasileiro – IEDb.

Política monetária e cambial Política Fiscal/Tributária Fundo Soberano do Brasil – FSB no contexto do IED

• Banco Mundial e Fundo Monetário Internacional sugerem como política monetária o “afrouxamento” das restrições ao IED para o exterior, o que aliviaria a pressão sobre o cambio em países com BOP e IED superavitários • Política de fortalecimento da presença em indústrias fora do país justificada pelos rendimentos maiores do que a remuneração de reservas (que rendem os juros básicos americanos equivalentes ao dos U.S Treasuries) ganhos com formação de empresas líderes globais, uso desse instrumento para regular volatilidade cambial.

• A questão tributária voltada ao IED não traz necessariamente prejuízos nas contas nacionais. • Eleição de políticas voltadas ao fortalecimento do IED brasileiro requer a mudança de paradigma, sendo mais recomendável modelo neutro (Capital Export Neutrality). • Sistema tem sido muito pouco utilizado para políticas econômicas de caráter alocativo em detrimento de uma lógica baseada no volume da arrecadação e combate a elisão fiscal

• Criação de um debate sistemático e tecnicamente competente na área econômica e da legislação para discernir o papel que o FSB teria como instrumento de estabilização monetária e cambial. • Instrumento traria a promoção de atividades voltadas para o IED brasileiro, além de outras finalidades estratégicas (como a promoção de empreendimentos de infra-estrutura e projetos de sustentabilidade, promoção de setores onde o país possui vocação como papel e celulose, siderurgia, petróleo e gás, biotecnologia, proteína animal).

Fonte: Elaborado pelos autores.

Os instrumentos para tanto poderiam ser o fortalecimento de condições de exportações, via a criação de um Eximbank e a efetiva implementação do Fundo Soberano do Brasil - FSB. Um aumento da taxa de juros para contenção da inflação simplesmente pode trazer mais influxo de capital, com o mesmo efeito apreciativo sobre o cambio, o que não é recomendável. Com alguma pressão inflacionária, o recurso que está à mão é a manutenção da taxa de cambio

14

moderadamente apreciada, a política fiscal responsável e o encorajamento do IED brasileiro no exterior. Como sugerido acima e no quadro 6, o estímulo ao IED brasileiro encontra espaço justificado como instrumentos auxiliar de política econômica.

5.2 Política de comércio exterior Como visto, os fluxos de capital sobre o PIB são relevantes, da mesma forma que os da conta corrente. Desta observação, deduz-se que o cambio é hoje fortemente influenciado pelo fluxo de mercadorias e movimentação financeira, com destaque crescente para o IED. De acordo com os dados acima examinados, há uma grande relação entre os fluxos de capital e a conta corrente, resultado da maior ou menor utilização de poupança externa. Há momentos em que os fluxos de capital são destinados a cobrir a demanda por financiamento dos déficits em conta corrente e outros momentos em que são mais especulativos e dependem de oportunidades de rendimento de curto prazo. Após a crise dos anos 1980, com pressões enormes do endividamento externo sobre o BOP, o Brasil gradativamente entrou em uma zona de conforto no médio prazo, particularmente quando há sinais positivos, tanto para o fluxo de capital entrante, como para a conta corrente. Mas, nem tudo é calmaria. Após a crise de 2008, com a reversão do preço das commodities e a apreciação cambial de 2009, a conta corrente poderá sentir fortes impactos negativos. Estatísticas indicam que há forte correlação entre o comércio e o investimento e que o estímulo ao comércio internacional gera inúmeros benefícios. Especificamente, o contato com os mercados externos expõe as empresas aos padrões internacionais de qualidade, preço e demais exigências dos mercados externos. A interação de empresas com mercados externos induz ao aumento da produtividade dos recursos e gera spillovers, garantindo maior eficiência na produção, divisas com as exportações, transferência de tecnologia e produtividade. Por fim, o comércio também gera ganhos na medida em que amplia as escalas operacionais, tornando as empresas menos dependentes do mercado interno e a economia menos suscetível a choques externos. Essas discussões são sintetizadas no quadro 7. Quadro 7: Políticas públicas no plano comercial e orientação ao investimento externo brasileiro - IEDb.

Papel dos Eximbanks Financiamento de exportações e papel dos Bancos de Desenvolvimento Integração do Eximbank e financiamento

• Os Eximbanks podem e devem co-financiar as ações do BD (no caso do BNDES) provendo financiamentos de curto, médio prazo e prazo associados a operações produtivas e comerciais, por meio de financiamento ao comprador, exportação de bens de capital e financiamento de projetos orientados incremento das atividades comerciais no estrangeiro. • Deve se discutir se a viabilidade de financiar investimentos em outros países; apenas conceder empréstimos a governos ou empresas estrangeiras que queiram comprar produtos brasileiros

• As agências e bancos de desenvolvimento de certos países estão na frente ao procurar integrar essas “novas” esferas de atuação das empresas no exterior de forma explícita – como nos casos do Japão, Coréia do Sul e Índia p. ex.. • Um avanço em termos da atuação deve se orientar no sentido de: (i) promover a sinergia natural entre ações no plano comercial e de estímulo ao investimento (ii) ampliar a escala de cooperação com os mercados estrangeiros e o influxo de capitais entre os parceiros comerciais.

• Países que abriram suas economias tiveram melhor desempenho, atraíram mais capitais e apresentaram significativos incrementos no comércio. • O comércio internacional, o IED e a concentração das atividades econômicas são irmãs siamesas na medida em que fazem parte do moderno padrão de acumulação de capital em nível internacional. • Em suma, o desempenho comercial e influxos de investimento caminham juntos e se realimentam, gerando ganhos á coletividade.

Fonte: Elaborado pelos autores.

5.3 Política no plano da organização industrial – OI No Brasil, a literatura sobre as políticas públicas na área de organização industrial é restrita. Trabalhos consagrados estão voltados particularmente para os países de industrialização avançada, com poucos casos para o IED dos países emergentes. A literatura revista neste estudo sobre como o sistema convergente-diferenciado, trata as questões dos fluxos de capital, frente às questões de políticas, como propriedade do capital e dos frutos do seu desempenho. No entanto, esta literatura está calcada na experiência de países de industrialização avançada, em tópicos como tecnologia, geração de spillovers, promoção de exportações e geração de

15

novos investimentos. Nesta seção, serão tratados tópicos focados na forma como indústrias podem adquirir uma nova organização, mais eficiente e produtiva, a partir de políticas públicas, particularmente, quanto aos novos fluxos de capital brasileiros ao exterior, o que, para o Brasil, representa um enorme desafio – conforme explicitado no quadro 8. Quadro 8: Políticas públicas no plano da organização industrial e orientação ao IEDb.

Defesa Econômica Regulação de fusões e aquisições Inovação e Tecnologia Industrial Básica – TIB

• Assegurar a defesa da concorrência e o combate a formação de cartéis mas promover a presença no país de empresas que se destacam em termos de economias de escala que garantam um alto nível de barreiras a entrada e externalidades se contrapondo aos rivais de outros países, como é o caso da empresa de telefonia brasileira OI.

• Minimização da dependência de empresas externas evitando a dependência de insumos estratégicos, como é o caso de empresas que utilizam tecnologias úteis para o sistema de energia, saúde e meio ambiente.

• Promover a busca de ativos estratégicos por meio do IEDb.

• Promover a formação de alianças estratégicas, criação de consórcios de P&D, contratos de licença tecnológica, subcontratação, com envolvimento de recursos menos tangíveis, para o que o país precisa agendar um amplo debate e incorporar estas questões na política industrial.

• Neste contexto mais complexo, M&A se constitui na forma mais comum de expansão do IED.

• Muito espaço para se organizar e crescer, particularmente quando da internacionalização da economia, que passa a ter mercados cada vez mais exigentes quanto à normas e certificação de conformidade de produtos e serviços por entidades credenciadas.

• Caso o país não se internacionalizar em termos de TIB, não há o reconhecimento mútuo dos sistemas de certificação e credenciamento nacionais, encarecendo o produto em cada teste de conformidade que cada país exigir.

• Uso políticas mais específicas que promovam o uso mais intensivo de serviços tecnológicos pelas empresas.

Fonte: Elaborado pelos autores.

6. Considerações finais Foi elaborada uma revisão da literatura sobre a internacionalização do capital por meio de empresas multinacionais, com ênfase na dimensão da teoria econômica. Três vertentes teóricas dominantes foram exploradas: o paradigma de OLI, desenvolvido a partir dos trabalhos de John Dunning, e os modelos de U e I, respectivamente da escola de Upsalla e de Inovação (Innovation-related internationalization model). Estas escolas permitem criar um mapeamento acerca da relação ente investimento estrangeiro direto e crescimento econômico, tarefa muito debatida na academia brasileira. Conclui-se que, o investimento das empresas multinacionais traz vantagens competitivas não só no plano das organizações, mas também do comércio internacional e do crescimento econômico, por meio do aumento de poupança externa. Tendo essas dimensões sob perspectiva, é sumarizada uma agenda de políticas públicas para o IDEb (quadro 10). Quando o investimento é de empresas nacionais no exterior, os ganhos do país de origem do capital são positivos em todas as situações estudadas, o que desfaz o mito de que, tanto na vinda como na ida, o fluxo de capital seria danoso aos interesses nacionais. Obviamente, este tema ainda traz controvérsias, mas a evidência empírica é muito forte a favor da abertura de capital, por motivos macro e microeconômicos. Reconhecendo um leque muito grande de políticas gerais e específicas, optou-se por selecionar aquelas que mais podem contribuir ao processo de internacionalização e seus ganhos. Num primeiro plano, as políticas macroeconômicas são destacadas. Essas abrem possibilidade teórica e prática de aumentar o IED brasileiro como ferramenta de controle de câmbio e fortalecimento do comércio externo, juntamente com a criação do Fundo Soberano do Brasil que, além de dar maior estabilidade monetária e cambial, podem promover projetos estratégicos de várias ordens. Reconhecendo a estreita relação entre IED e comércio exterior, são feitas propostas para fortalecer a abertura e segurança comercial brasileira, no que muito ainda pode ser feito. Finalmente, com base na experiência estrangeira, foram feitas considerações sobre políticas públicas para as empresas estrangeiras atuando no Brasil com a cadeia produtiva nacional, sempre tendo em conta que são as empresas, estatais ou privadas, e não o Estado que devem despontar como os agentes relevantes deste processo.

16

Quadro 10: Resumo da Agenda de Políticas Públicas Prioritárias ao IEDb.

Objetivos Estratégicos

Instrumentos de Prioritários

Macroeconômico a) Estabilidade Monetária e Cambial b) Modernização Legislação Tributária c) Instituição do Fundo Soberano do Brasil

• Acionar os fluxos de capital como instrumento de crescimento econômico. • Promover os fluxos de capital e o comércio exterior para alavancar a poupança

nacional. • Instituir o FSN e o IED como instrumentos adicionais da de estabilização

monetária e cambial. • Fazer dos tributos instrumentos de eficiência alocativa e distributiva. • Evitar a bitributação e facilitar o uso de créditos, particularmente para exportação

Comercio Exterior a) Promover abertura com comércio exterior e fluxos de IED b) Promover marco regulatório articulado de promoção e investimento ao comercio e ao IED

• Articular políticas oficiais do sistema de financiamento ao IED nacional e estrangeiro por meio do BNDES.

• Fortalecer o sistema de financiamento público (BNDES, BB, CEF) e privado com vistas ao aumento da capacidade produtiva das empresas locais em setores específicos.

• Criação do Exbanking do Brasil, incorporando não só financiamento, mas operando toda a cadeia de valores na exportação e importação, incluindo IED.

• Por meio dos recursos de fomento e financiamento, promover a formação de alianças, consórcios de P&D, contratos de licença tecnológica, sub-contratação, com envolvimento de recursos tangíveis e intangíveis para o IED.

Inovação a) Fortalecer o sistema de defesa econômica b) Regular fusões e aquisições (M&A) c) Apoio à Inovação

• Incorporar a IED como função do SBDE e facilitar o posicionamento de empresas líderes capazes de competir internacionalmente.

• Incorporar a IED como função do SBDE e facilitar o posicionamento de empresas líderes capazes de competir internacionalmente

• Estabelecer mecanismos de defesa econômica e aumentar o sistema de seguridade ao IED.

• Política de inovação, serviços tecnológicos (TIB, metrologia, etc.) e infra-estrutura de P&D&I atrelados a uma agenda de estímulo ao IED nacional.

• Criar sistema de barreiras técnicas em consonância com as práticas internacionais aceitas.

Fonte: Elaboração dos autores.

Referências BANCO CENTRAL DO BRASIL. Balanço de pagamentos. 2009. Disponível em:<http://www.bcb.gov.br/?SERIEBALPAG>. Acesso em 12/06/2009. BRESSER-PEREIRA, L. C. Globalização e competição: por que alguns países têm sucesso e outros não. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009. CAMPOS, N. F., KINOSHITA, Y. Why does FDI go where it goes? new evidence from the transition economies. Washington: International Monetary Fund Institute, 2003. 31p. (Working Paper; 03/228).CASSON 1983 CASSON, M. The growth of international business. London: Allen and Unwin, 1983. CAVES, R. E. International corporations: the industrial economics of foreign investment. Economica, v.38, n.149, p.1-27, Fev. 1971. ______. Multinational enterprise and economic analysis. Cambridge: Cambridge University Press, 2007. COUTINHO, M. M. S.; MELLO, M. R.; PEREIRA, F. V. A. The fiscal framework of brazilian OFDI. In: ALMEIDA, A. O. (Ed.). Internacionalização de empresas brasileiras: perspectivas e riscos. Rio de Janeiro: Campus, 2006. DUNNING, J. Studies in International Investment. London: George Allen and Unwin, 1970. ______. Trade, Location of Economic Activity, and the Multinational Enterprise: a Search for an Eclectic Approach. In: OHLIN, B.;P.O., H., et al (Ed.). The International Allocation of Economic Activity. London, 1977. ______. Explaining Changing Patterns of International Production: In Defense of the Eclectic Theory. Oxford Bulletin of Economics and Statistics, v. 41, p. 269-295, 1979. ______. Space, Location and distance in international business activities. Annual Meeting of the European Academy of International Business, (Anais), 2006. Fribourg, Switzerland. Dez. p.7-9 DUNNING, J.; NARULA, R. The investment Development Path Revisited: some emerging issues. In: (Ed.). Edge Studies in International Business and the World Economy. London: Routledge, 1996. DUNNING, J.; RUGMAN, A. The influence of Hymer´s dissertation on theories of foreign direct investment. 97th meeting of the American Economic Association, (Anais), 2006. May 1985. p.228-232. FEIJÓ, C. A.; RAMOS, R. L. A Contabilidade Social. São Paulo: Elsevier, 2004.

17

FOURREZ, G. A. Construção das ciências: introdução a filosofia e à ética das ciências. São Paulo: Unesp, 1991. FROUFE, C. Criação de um Eximbank brasileiro é necessária, diz Coutinho. O Estado de São Paulo. São Paulo 2009. GHOSH, A. et al. Capital Inflows and Balance of Payments Pressures: Tailoring Policy Responses in Emerging Market Economies. IMF Policy Discussion Papers, v. 8, n. 2, 2008. GIAMBIAGI, F.; BARROS, O. D. Brasil Pós-Crise. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009. GRAY, H. P. Extending the Ecletic Paradigm in International Business: essays in honor of John Dunning. Edward Elgar Publishing, 2003. GRUBEN, W. C. E.; MCLEOD, D. Capital Flows, Savings, and Growth in the 1990s. The Quarterly Review of Economics and Finance, v. 38, n. 8, p. 287-301, 1998. HELPMAN, E. Trade, FDI and the Organization of Firms. National Bureau of Economic Research (NBER), 2006. Disponível em:<http://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=912727>. Acesso em 23/10/2009. HYMER, S. The international operations of national firms: a study of FDI. Cambridge, MA: MIT Press, 1976. KINDELEBERGER, C. P. The Benefits of International Money. Journal of International Economics, p. 425-442, 1972. LAKATOS, E. Metodologia científica. São Paulo: Atlas, 1983. MORAN, T. H. American Multinationals and the American Interests. Washington: Brookings Institution Press, 2008. OBSTFELD, M.; ROGOFF, K. Foundations of International Macroeconomics. Cambridge: MIT Press, 1996. PAIN, N.; WELSUM, D. The Multiple links between exchange rates and FDI. Journal of Common Market Studies, v. 41, n. 5, p. 823-46, 2003. PASTORE, A. C.; PINOTTI, M. C.; ALMEIDA, L. P. Cambio e Crescimento: o que podemos aprender? In: BARROS, O. e GIAMBIAGI, F. (Ed.). Inserção internacional e amadurecimento macroeconômico: o desafio de transformar a bonança externa em investimento para o futuro: o Brasil globalizado. Rio de Janeiro: Campus, 2008. RODRICK, D. Impact of Globalization on Monetary Policy. Federal Reserve Bank of Kansas City, 2007. SAUVANT, K.; MENDOZA, K.; IRMAK, I. The Rise of Transnational Corporations From Emerging Markets: Threat Or Opportunity? Edward Elgar Pub., 2008. SAUVANT, K. P. Yearbook on International Investment Law & Policy 2008-2009. New York: Oxford University Press, 2009. ISBN 978-0-19-534157-7. TAVARES, M.; FERRAZ, J. C. Translatinas: quem são, por onde avançam e que desafios enfrentam. In: FLEURY, A. e FLEURY, M. T. L. (Ed.). Internacionalização e os países emergentes. São Paulo: Atlas, 2007. p.120-141. TEECE, D. A transaction cost theory of the multinational enterprise. Discussion Paper in International Investment and Business Studies, n. 66, 1982. UNCTAD. World Investment Report Series. World Investiment Report: Transnational Corporations and the Infrastructure Challenge. p. 24, 2008. Disponível em:<http://www.oecd.org/dataoecd/23/41/41881230.pdf>. Acesso em16/08/2009 VERNON, R. International investment and international trade in the product cycle. The Quarterly Journal of Economics, v. 80, n. 2, p. 190-207, 1966. ______. Sovereignty at Bay: The Multinational Spread of U.S. American Academy of Political and Social Science, (Anais), 1973. p.170-171. ______. Big Business and the state. Cambridge, MA: Harvard Universtiy Press, 1974. ______. La inversión internacional y el comercio internacional en el ciclo de productos. In: ROSENBERG, N. O. (Ed.). Economia Del Cambio tecnológico. Mexico: Fondo de Cultura Económica, 1979. p.408-427. iÉ útil apresentar a identidade básica dada pela igualdade entre produto produzido (Y) e produto vendido (Consumo das famílias; gasto de Investimento, gasto de Governo com compra de serviços e saldo de exportações e importações, X-M), tal qual se segue: Y = C + I + G + (X-M); ou Y+M=C+I+G+X; ou (X-M)=Y-(C+G+I) (a). Parte da renda é gasta ou dispendida em Tributos (R pagos ao governo) e Transferências (T do governo), o que fornece a renda disponível: Yd = Y + (R – T) (b). Esta renda disponível é alocada em Consumo e Poupança (S), sendo: Yd = C + S (c). De (b) e (c), se obtém como resultado: C + S = Yd = Y + (R – T) ou ainda C = Yd – S = Y + (R – T) – S (d). Com uma simples tratamento algébrico da identidade (d), têm-se: S – I = (G + R – T) + (X-M) (e). ii Manipulando a equação (d) apresentada na nota de rodapé anterior, é possível destacar o orçamento de governo: T – R – G = (I – S) + (X – M). Portanto, há uma estreita relação entre a poupança pública e a poupanças interna e a poupança externa. iii A rigor, a fim de testar essas hipóteses novas pesquisas de cunho econométrico devem ser realizadas no intuito de validar a hipótese de efetiva relação entre tais agregados ou verificar se não de tratam de correlações espúrias.