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1 Investigação de Acidentes Qual método adotar? Accident investigation Which should method be adopted? Resumo: Selecionar um método de investigação de acidente a partir de um grande número de métodos disponíveis não é um processo simples. Alguns fatores, entretanto, podem ajudar nesta seleção, como por exemplo, a facilidade de utilização, a adequabilidade ao sistema sócio- técnico onde ocorreu o acidente e ao tipo acidente que será investigado. O objetivo deste artigo é apresentar uma visão geral de alguns métodos desenvolvidos na literatura e sugerir critérios que podem ajudar a escolher um método que deve ser adotado em uma investigação de acidentes. Palavras-chave: prevenção, critérios, seleção, sistema Abstract: Accident investigation method selection from many available methods is not a simple process. Some factors, however, may help it, such as easy to apply, suitability to the socio-technical system where the accident occurred and the type of accident. The purpose of this article is to present an overview of some methods developed in the literature and to suggest criteria that may help investigator to choose an accident investigation method. Keywords: prevention, criteria, selection, system Resumen: La selección de un método de investigación de accidentes a partir de un gran número de métodos disponibles no es un proceso simple. Algunos factores, sin embargo, pueden ayudar en esta selección, como, por ejemplo, la facilidad de uso, la adecuación al sistema socio-técnico donde ocurrió el accidente y el tipo accidente que será investigado. El objetivo de este artículo es presentar una visión general de algunos métodos desarrollados en la literatura y sugerir criterios que pueden ayudar a elegir un método que se debe adoptar en una investigación de accidentes. Palabras clave: prevención, criterios, selección, sistema

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Investigação de Acidentes – Qual método adotar?

Accident investigation – Which should method be adopted?

Resumo: Selecionar um método de investigação de acidente a partir de um grande número de

métodos disponíveis não é um processo simples. Alguns fatores, entretanto, podem ajudar nesta

seleção, como por exemplo, a facilidade de utilização, a adequabilidade ao sistema sócio-

técnico onde ocorreu o acidente e ao tipo acidente que será investigado. O objetivo deste artigo

é apresentar uma visão geral de alguns métodos desenvolvidos na literatura e sugerir critérios

que podem ajudar a escolher um método que deve ser adotado em uma investigação de

acidentes.

Palavras-chave: prevenção, critérios, seleção, sistema

Abstract: Accident investigation method selection from many available methods is not a

simple process. Some factors, however, may help it, such as easy to apply, suitability to the

socio-technical system where the accident occurred and the type of accident. The purpose of

this article is to present an overview of some methods developed in the literature and to suggest

criteria that may help investigator to choose an accident investigation method.

Keywords: prevention, criteria, selection, system

Resumen: La selección de un método de investigación de accidentes a partir de un gran número

de métodos disponibles no es un proceso simple. Algunos factores, sin embargo, pueden ayudar

en esta selección, como, por ejemplo, la facilidad de uso, la adecuación al sistema socio-técnico

donde ocurrió el accidente y el tipo accidente que será investigado. El objetivo de este artículo

es presentar una visión general de algunos métodos desarrollados en la literatura y sugerir

criterios que pueden ayudar a elegir un método que se debe adoptar en una investigación de

accidentes.

Palabras clave: prevención, criterios, selección, sistema

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1 INTRODUÇÃO

Acidentes de trabalho se constituem um problema de saúde pública em todo o mundo,

por serem potencialmente fatais, incapacitantes e acometerem, em especial, pessoas jovens e

em idade produtiva, levando a grande impacto sobre a produtividade e a economia. No Brasil,

morrem em média 2.800 trabalhadores anualmente vítimas de acidentes, considerando apenas

o setor formal da economia (BRASIL, 2014). Mensurar as perdas com os acidentes envolve

uma equação complexa, pois uma parcela das perdas é invisível (como a perda da vida,

mudança na vida e na atividade de trabalho do acidentado, impactos na vida da família e

diminuição de sua qualidade de vida), que não é possível quantificar (WEIL, 2001). No entanto,

estas perdas devem e podem ser prevenidas. Neste contexto, a investigação de acidente é

importante meio para ajudar a entender como eles ocorrem, identificar os fatores contribuintes

que levaram ao sinistro e propor medidas apropriadas para prevenção de novos acidentes no

futuro (SALMON et al., 2012).

A investigação de acidentes deve seguir um método, pois este é essencial para o

entendimento de como o acidente ocorreu (HSE, 2004; LUNDBERG et al., 2009). Assim,

muitos métodos têm sido desenvolvidos e descrito na literatura nas últimas décadas, motivado

principalmente pela incapacidade de se estabelecer métodos que possam ser aplicados em todos

tipos de sistemas sócio-técnicos e em diferentes tipos de acidentes, além da ineficiência de

alguns deles de propor recomendações que tenham o efeito desejado (HOLLNAGEL e

SPEZIALI, 2008). Autores com Svedung e Rasmussen (2002), Hollnagel (2004) e Leveson

(2004) desenvolveram seus próprios métodos, enquanto Wagenaar e Schrier (1997), Benner

(1985), Sklet (2004) e Katsakiori et al. (2009) pesquisaram e analisaram diversos métodos.

Destarte, muitas organizações e autoridades desenvolveram seus métodos e manuais.

Cada método tem diferentes áreas de aplicação, qualidade e deficiências. Eles também

diferem entre si em relação a base teórica, tipo de representação dos fatores contribuintes e os

resultados que produzem (SKLET, 2004). Lundberg et al. (2009) argumenta que métodos

diferem como eles capturam a realidade do acidente. Um método pode focar sobre um fator X,

enquanto outro pode ressaltar o fator Y. Alguns métodos, devido a sua característica, podem

omitir fatores que para outros são importantes, ou seja, um método direcionará o investigador

para considerar certos aspectos e outros não. Para exemplificar, uns métodos podem enfatizar

aspectos técnicos, outros aspectos humanos e outros fatores legais. Estudos realizados por

Svenson et al. (1999) mostram que é evidente os efeitos nos resultados da investigação do

acidente pelo tipo de método utilizado.

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Selecionar um método de investigação de acidente a partir de um grande número de

métodos disponíveis não é um processo simples. Alguns fatores, entretanto, podem ajudar nesta

seleção, como por exemplo, a facilidade de utilização, a adequabilidade ao sistema sócio-

técnico onde ocorreu o acidente e ao tipo acidente que será investigado. (UNDERWOOD E

WATERSON, 2013).

O objetivo deste artigo é apresentar uma visão geral de alguns métodos desenvolvidos na

literatura e sugerir critérios que podem ajudar a escolher um método que deve ser adotado em

uma investigação de acidentes.

2 INVESTIGAÇÃO E ANÁLISE DE ACIDENTES

Segundo Hollnagel e Speziali (2008) a diferença entre investigação e análise de acidentes

está no escopo. Investigação de acidentes tem um escopo mais amplo, envolvendo o

planejamento da investigação, alocação de recursos, prazos, coleta e análise de dados e

informações, recomendações, implementação e avaliação dos efeitos das recomendações. A

análise de acidente, por sua vez, tem um escopo mais restrito, focando em entender como o

acidente ocorreu com base nos dados e informações disponíveis, ou seja, é uma fase ou parte

da investigação.

3 MODELOS DE ACIDENTE

Os modelos de acidentes proveem os princípios que podem explicar como os acidentes

ocorrem. Eles são uma forma de recorrer ao conjunto de axiomas, pressupostos, crenças e fatos

sobre acidentes, que formam as bases teórica para explicar e entender esses eventos

(HOLLNAGEL E SPEZIALI, 2008). Já os métodos descrevem como a investigação deve

realizada na prática, com a finalidade de produzir uma explicação para o acidente, é o passo-a-

passo da investigação, limitando as interpretações subjetivas. Alguns métodos podem estar

alinhado ou ser baseados em modelos de acidentes, como será descrito mais à frente.

Hollnagel (2004) classifica modelos de acidentes em três categorias: modelo sequencial,

modelo epidemiológico e modelo sistêmico. Outras classificações existem na literatura

(KATSAKIORI et al., 2009) e esta categorização não é obrigatória, mas ajuda a entender a

evolução dos diferentes tipos de modelos de acidentes e a sua influência no desenvolvimento

dos métodos de investigação. A seguir uma breve descrição sobre cada uma das categorias

citadas acima.

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3.1 MODELO DE ACIDENTE SEQUENCIAL

Este modelo assume que um indesejado evento, conhecido como causa raiz, inicia a

sequência de eventos que leva ao acidente e que a relação causa-efeito entre os eventos

consecutivos é linear e determinístico. Isto implica que resultado do acidente é uma causa raiz,

que se identificada e removida, o acidente não mais ocorrerá (QURESHI, 2007).

O primeiro modelo sequencial foi proposto por Heinrich (1941), o qual ele chamou de

teoria do dominó. Esta teoria representa o acidente por uma sequência de cinco pedras de

dominó posicionadas de modo que a queda de uma desencadeia a queda das subsequentes

(figura 1). Desta forma, um acidente pode ser prevenido se uma ou mais pedras do dominó for

removida ou parar de cair.

Figura 1 -Teoria do dominó de Heinrich

Fonte: Cooper (1998)

Os modelos classificados nessa categoria são atrativos por que eles estimulam a pensar o

acidente mais com uma serie causal do que uma rede de causas (HOLLNAGEL, 2004).

Ademais, são fáceis de representar graficamente, o que facilita a comunicação dos resultados.

Assim, esses modelos tornaram-se base para muito métodos de investigação de acidentes. No

entanto, eles foram adequados para explicar acidentes ocorridos em sistemas sócio-técnicos

simples até meados do século 20. A partir de então, sua capacidade tornou-se limitada para

explicar acidentes com o surgimento de sistemas sócio-técnicos mais complexos (exemplo:

petroquímicas, extração de óleo e gás, aviação civil), onde múltiplos fatores se inter-relacionan

de forma complexa, não linear, contribuindo para a falha no sistema (HOLLNAGEL, 2004;

QURESHI, 2007).

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3.2 MODELO DE ACIDENTE EPIDEMIOLÓGICO

Modelo epidemiológico ver o acidente como uma combinação de fatores latentes e falhas

ativas dentro do sistema sócio-técnico. Como o nome indica, os modelos desta categoria fazem

uma analogia do acidente com uma doença que se espalha no corpo do sistema. Fatores latentes

(exemplo: práticas gerencias, falta de manutenção) são “agentes patogênicos” que podem ficar

adormecidos dentro do sistema por longo período de tempo (REASON, 1998), mas criam as

condições no ambiente organizacional que influenciam negativamente na realização das tarefas,

induzindo o indivíduo a falhas ativas, como por exemplo, violações e erros. Portanto, as

consequências adversas dos fatores latentes somente se tornam evidentes quando combinadas

com as falhas ativas, para quebrar as defesas do sistema.

O mais conhecido exemplo de modelo epidemiológico apresentado na literatura é modelo

de Queixo Suíço desenvolvido por Reason (1998), o qual tem sido base conceitual para vários

métodos de investigação de acidentes. A figura 2 mostra uma representação deste modelo, onde

os queixos representam as defesas do sistema, os buracos nos queixos representam os fatores

latentes e as falhas ativas. Quando os buracos coincidem (combinação de fatores latentes e

falhas ativas), as barreiras do sistema são ultrapassadas e os acidentes acontecem.

Figura 2 -Modelo do queixo suíço

Fonte: Adaptado de Reason (1998)

Os modelos epidemiológicos superam as limitações dos modelos sequenciais, pois

apresentam melhor os fatores organizacionais como fatores contribuintes, indo além das causas

próximas aos acidentes, dando uma compreensão mais ampla do ocorrido (HOLLNAGEL,

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2004; UNDERWOOD E WATERSON, 2013). Entretanto, esses modelos ainda seguem o

princípio de causa-efeito, nos quais se baseiam os modelos sequenciais, isto é, descrevem uma

direção linear das causas do acidente, o que não consegue explicar os acidentes ocorridos em

sistema sócio-técnico complexos. Outra crítica aos modelos epidemiológicos é que eles têm

uma visão estática dos sistemas sócio-técnicos, que são dinâmicos (QURESHI, 2007). Por

essas razões, a partir do final da década de 1990, muitos pesquisadores, como Rasmussen

(1997) e Svedung e Rasmussen (2002), argumentam que os modelos epidemiológicos não têm

capacidade de explicar os acidentes ocorridos nos sistemas sócio-técnicos complexos. Os

modelos de acidente sistêmicos foram então propostos como uma solução.

3.3 MODELO DE ACIDENTE SISTÊMICO

Os modelos sistêmicos consideram o sistema como um todo e descrevem o acidente como

resultante de uma relação descontrolada de suas partes constituintes. Estes modelos surgiram

no final dos anos 1990 e refletem o aumento de complexidade dos sistema sócio-técnico, que

apresentam uma diversidade de fatores contribuintes para um acidente. Estes fatores estão

presentes em diferentes níveis do sistema e existe uma complexa interação entre esses fatores.

Fatores externos tais como político, cultural, econômico, financeiro e tecnológica também

contribuem para o acidente (BRANDFORD, 2011). A partir desta perspectiva, os acidentes não

acontecem pela combinação de fatores latentes e falhas ativas, e a simples remoção de causa

raiz na previne o acidente de ocorrer. Uma abordagem holística é requerida para que as

deficiências da segurança em todo sistema possam ser identificadas. Os modelos sistêmicos têm

sido base para desenvolvimento de muitos métodos de investigação de acidentes, como por

exemplo, Accimap (SVEDUNG E RASMUSSEN, 2002), FRAM (HOLLNAGEL, 2004) e

CAST (LEVESON, 2011).

Uns dos mais citados exemplos na literatura de modelo sistêmico é o chamado Conflicting

objectives (objetivos contraditórios numa tradução livre) desenvolvido por Rasmussen (1997).

Segundo este modelo, os objetivos contraditórios, como por exemplo: pressões financeiras e

sobrecarga de trabalho, fazem as organizações migrarem para fronteira do risco aceitável, com

a degradação das defesas do sistema. Se a fronteira do risco aceitável for ultrapassada ocorrerá

o acidente (figura 3).

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Figura 3 - Modelo Conflicting objectives

Fonte: Cambraia et al. (2008)

4 MÉTODOS DE INVESTIGAÇÃO DE ACIDENTE

Como mencionado acima, muitos métodos de investigação de acidentes foram

desenvolvidos e descrito na literatura nas últimas décadas, sendo impraticável descrever todos

eles aqui. No entanto, para atendimento dos objetivos deste artigo, apenas alguns deles serão

descritos sucintamente a seguir, os quais foram selecionados com base nos seguintes critérios:

são descritos na literatura, mostram a evolução dos métodos de investigação e são

frequentemente citados.

4.1 ÁRVORE DE FALHAS

Neste método, um indesejado evento é selecionado e todos possíveis causas que

contribuíram para o evento são colocadas em um diagrama (árvore), com a finalidade de

mostrar uma conexão lógica entre elas (figura 4). A análise começa com o evento indesejado,

que é relacionado com as condições e os eventos precedentes. O resultado da investigação é

uma lista de possíveis combinação de causas ambientais, humanas e falhas de componentes,

que levaram ao acidente. É um método analítico, usado em muitos tipos de acidentes não muito

complexos, que está associado com o modelo sequencial de acidente.

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Figura 4 - árvore de falhas

Fonte: internet (http://alsconsultoria.net.br/analise-quantitativa-de-risco-aqr/)

4.2 ÁRVORE DE CAUSAS

Leplat (1978) desenvolveu o método de árvore de causas no final dos anos 1970 para o

Instituto Nacional de Pesquisa e Segurança (INRS) da França, por isto, este método é

frequentemente chamado de INRS método. A ideia básica do método é que os acidentes

resultam de variações ou desvios. Existem quatro tipos de variações: relativos ao indivíduo (I),

a tarefa (T), material (M) e o método de trabalho (MT).

A árvore começa com o acidente e fatos relativos ao acidente são usados na construção

da árvore (figura 5). O investigador deve identificar uma lista de variações e então colocá-las

na árvore, mostrando a relação causal entre elas. Como o método de árvore de falhas, descrito

no item anterior, está associado com o modelo sequencial e pode ser usado em diferentes tipos

de acidentes não complexos.

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Figura 5 - árvore de causas

Fonte: internet (http://rogeriobpaiva.blogspot.com.br/2016/03/artigo-sobre-o-metodo-de-arvores-de.html)

4.3 ANÁLISE DE BARREIRA

O objetivo deste método é identificar os perigos associados com o acidente e as barreiras

que deveriam existir para evitá-lo. As barreiras são meios usados para controlar, prevenir ou

impedir que o perigo se propaga. Os seguintes passos são seguidos na análise de barreira: 1)

identificar os perigos relacionados ao acidente; 2) identificar cada barreira para controlar,

prevenir ou impedir a propagação do perigo; 3) identificar o desempenho de cada barreira; 4)

identificar as causas das falhas ou ausência das barreiras; 5) identificar as consequências das

falhas das barreiras. O método é usado em diferentes tipos de acidentes e não está associado a

nenhum modelo de acidente citado acima.

4.4 ANÁLISE DE MUDANÇA

Mudança é qualquer situação que perturba o equilíbrio do sistema, que estava operando

como planejado (SKLET, 2004). Em uma investigação na qual este método esteja sendo usado,

o investigador identifica as diferenças entre a situação livre de acidentes e a situação com o

acidente. As diferenças identificadas entre as duas situações são avaliadas, para determinar se

elas contribuíram para o sinistro. O método é usado em diferentes tipos de acidentes e não está

associado a nenhum modelo de acidente citado acima.

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4.5 WORK ACCIDENT INVESTIGATION TECHINQUE (WAIT)

WAIT, sigla em inglês de Work Accident Investigation Technique, foi desenvolvido em

Portugal por Jacinto e Aspinwall (2003), com a finalidade de investigação de acidentes no

trabalho. O método tem um questionário e prover um guia específico para coleta de

informações. Tem duas fases de investigação: A primeira permite a identificação de falhas

ativas, com sequência de eventos e consequências. Nesta fase, também são identificados fatores

associados com o ambiente de trabalho. A segunda fase, inclui a identificação de fatores do

indivíduo, gerenciais e organizacionais. Tem como base o modelo epidemiológico de acidente.

4.6 INVESTIGANDO ACIDENTE E INCIDENTE (HSE)

Health and Safety Executive da Inglaterra (HSE, 2004) desenvolveu este método com a

finalidade de prover um guia de investigação de acidentes para empregadores, sindicatos e

profissionais de segurança. É baseado no modelo epidemiológico Queixo Suiço desenvolvido

por Reason (1998). O objetivo do método é identificar as causas imediatas, subjacentes e causas

raízes, que levaram ao acidente. Uma lista com causas raízes e subjacentes mais comuns é

fornecida.

4.7 TRIPOD

Tripod foi desenvolvido nos meados dos anos 1990 (WAGENAAR et al., 1994), baseado

no modelo de acidente epidemiológico Queixo Suiço desenvolvido por Reason (1998), com a

finalidade de ser aplicado na indústria do petróleo. As causas organizacionais são o foco

principal deste método, pois são responsáveis pelas falhas ativas dos operadores, que levam ao

acidente. As causas organizacionais são latentes, existem na organização muito antes dos

acidentes, e quando contribuem para o acidente, são sempre seguidas de falhas humanas e

técnicas (figura 6).

Figura 6 – método Tripod

Fonte: Sklet (2004)

Falhas

latentes

Precondição Falhas

Ativas

Falhas de

controles e

barreiras

cid

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4.8 ACCIMAP

O método Accimap foi desenvolvido por Rasmussen (1997) e está associado com o

modelo sistêmico de acidente. Para aplicação do método, os seguintes níveis são analisados: 1.

Governo (inclui executivo, legislativo e judiciário), 2. Corpo regulatória (inclui órgãos do

governo responsáveis pela fiscalização), 3. Gestão da organização, 4. Gestão técnica e

operacional, 5. Processo físico e 6. Equipamentos e ambiente. São identificados fatores que

contribuíram para o acidente em cada um destes níveis, bem como a inter-relação entre eles. O

método é aplicado principalmente em sistema sócio-técnico e acidentes complexos.

4.9 CASUAL ANALYSIS BASED ON STAMP (CAST)

CAST é sigla em inglês que significa Causal Analysis based on STAMP, que, em uma

livre tradução, significa análise de causa baseado no STAMP (Systems-Theoritic Accident

Model and Process). CAST foi desenvolvido pela pesquisadora americana Levenson (2004). O

CAST tem nove passos que devem ser seguidos para a investigação do acidente (a descrição de

cada um deles foge do escopo deste artigo) e toda a estrutura de controle da segurança deve ser

construída (em todos os níveis, semelhante ao Accimap), para entender em qual nível houve

falhas e porquê. O método é aplicado principalmente em sistema sócio-técnico e acidentes

complexos.

4.10 FUNCTIONAL RESSONANCE ANALYSIS METHOD (FRAM)

FRAM foi desenvolvido por Hollnagel (2004) e descreve uma visão geral do sistema na

análise do acidente. O objetivo do método é entender as características das funções do sistema.

O método leva em consideração propagação não linear dos eventos que contribuem para o

acidente baseado no conceito de variabilidade normal da performance das funções do sistema

e a ressonância desta variabilidade. O método está associado modelo sistêmico de acidentes e

é aplicado principalmente em sistema sócio-técnico complexos.

O Quadro 1 mostra os métodos descritos acima com campo de aplicação e modelo ao

qual está alinhado.

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Quadro 1 – métodos de investigação de acidentes

Método Campo de aplicação Modelo de acidente associado

Árvore de falhas Diferentes tipos de acidentes Sequencial

Árvore de causas Diferentes tipos de acidentes Sequencial

Análise de Barreira Diferentes tipos de acidentes Nenhum

Análise de mudança Diferentes tipos de acidentes Nenhum

WAIT Acidentes ocupacionais Epidemiológico

HSE Acidentes ocupacionais Epidemiológico

Tripod Acidentes complexos Epidemiológico

Accimap Acidentes complexos Sistêmico

CAST Acidentes complexos Sistêmico

FRAM Acidentes complexos Sistêmico

Fonte: Autor

5 SELEÇÃO DE MÉTODOS DE INVESTIGAÇÃO DE ACIDENTE

O uso de um método para investigar acidente apoia o investigador durante o processo de

investigação, na apresentação dos resultados e na proposição de recomendações (SKLET,

2004). Assim, a seleção de um método, que atenda as expectativas do investigador (por

exemplo, facilidade de uso) e também seja adequado ao cenário do acidente (por exemplo, tipo

de acidente e complexidade do sistema sócio-técnico), é um importante passo para o êxito da

investigação, pois existem muitos diferentes métodos disponíveis. Para ajudar nesta escolha,

alguns critérios foram propostos na literatura (KATSAKIORI et al., 2009; HOLLNAGEL E

SPEZIALI, 2008; SKLET, 2004; UNDERWOOD E WATERSON, 2013), sendo descritos,

neste artigo, aqueles mais frequentemente citados.

5.1 REPRESENTAÇÃO GRÁFICA DA SEQUÊNCIA DE EVENTOS

Os métodos que oferecem uma representação gráfica do acidente podem ser úteis durante

o processo de investigação, porque dão um fácil entendimento dos eventos que levaram ao

acidente e a relação entre eles. Além disso, facilitam a comunicação entre os investigadores e

possibilitam identificar facilmente eventuais falta de informações ou ausência de link entre os

eventos. Tripod, árvore de falhas, método de árvore de causas, função de barreiras e Accimap

são exemplos de métodos que apresentam essa característica.

5.2 NÍVEL DE ABRANGÊNCIA

Os níveis de abrangência de uma investigação podem variar da seguinte forma: nível 1: a

atividade e o sistema tecnológico (equipamentos, máquinas, etc); nível 2: os empregados,

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incluindo a supervisão; nível 3: a gestão; nível 4: a organização; nível 5: os reguladores

(incluindo os órgãos de fiscalização) e nível 6: o governo. Método de investigação selecionado

influenciará na abrangência alcançada. Por exemplo, os métodos Accimap, CAST e FRAM

abrangem todos os seis níveis de análise, com o objetivo de identificar os fatores contribuíram

para o acidente em cada um deles. Já os métodos Tripod e análise de mudança são menos

abrangentes e investigam somente os níveis de 1 ao 4, enquanto os métodos árvore de falhas e

análise de barreira têm uma abrangência ainda menor, investigando apenas os níveis 1 e 2.

5.3 NECESSIDADE DE TREINAMENTO

Alguns métodos são práticos e fáceis de usar, dispensando a necessidade de experts

treinados para usá-los. Árvore de falhas, árvore de causas, Accimap, CAST e FRAM são

exemplos de métodos que necessitam de expert para utilizá-los. Análise de mudança e HSE são

de fácil uso e podem ser usados sem maiores necessidades de treinamento, apenas com uma

introdução ao método.

5.4 TIPO DE ACIDENTE E SISTEMA SÓCIO-TÉCNICO

A seleção do método deve levar em consideração o tipo de acidente que será investigado

e o tipo de sistema sócio-técnico onde ocorreu o sinistro. No caso de acidentes e sistema sócio-

técnico complexos, onde fatores contribuintes podem ser identificados em diferentes níveis,

como mencionado no item 5.2, e pode existir uma inter-relação complexa entre eles, é

recomendado um método que possibilite uma análise mais abrangente, como Accimap, CAST e

FRAM. Por outro lado, métodos menos abrangentes como o WAIT e HSE podem ser usados em

acidentes mais simples.

5.5 RECURSOS NECESSÁRIOS

A escolha do método deve levar em consideração os recursos necessários para utilizá-lo, tais

como a quantidade de pessoas, horas de trabalho, documentação e informações necessárias, uso

de software, etc. Cita-se como exemplo de um método que demanda muito recursos o CAST,

pois exige tempo para coleta de informações e de documentos necessários para sua utilização.

5.6 EXISTÊNCIA DE ACIDENTES SEMELHANTE ANTERIOR

A ocorrência anterior de acidentes semelhantes ao que será investigado deverá ser

considerada na escolha do método, pois se acidentes voltam a ocorrer, é interessante que a

investigação seja ampliada, com o objetivo de identificar fatores contribuintes em diferentes

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níveis do sistema. Para exemplificar, se foi usado um método com poucos níveis de abrangência

(exemplo, árvore de falhas) na investigação de um acidente que ocorreu em um sistema sócio-

técnico complexo, seria importante avaliar uso de método mais abrangente (exemplo,

Accimap).

O Quadro 2 mostra um resumo dos critérios descritos acima relacionando-os com cada

método apresentado anteriormente.

Quadro 2 – métodos de investigação e critérios de seleção

Método Representação gráfica Níveis de

abrangência

Treinamento Tipo de acidente e

sistema sócio-técnico

Recursos

Árvore de falhas Sim 1-2 Alto Simples Médio

Árvore de causas Sim 1-3 Alto Simples Médio

Análise de

Barreira

Não 1-2 Introdução Simples Baixo

Análise de

Mudança

Não 1-4 Introdução Simples Baixo

WAIT Não 1-4 Introdução Simples Baixo

HSE Não 1-4 Introdução Médio Baixo

Tripod Não 1-4 Médio Complexo Médio

Accimap Sim 1-6 Alto Complexo Alto

CAST Não 1-6 Alto Complexo Alto

FRAM Sim 1-6 Alto Complexo Alto

Fonte: Autor

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS E PROPOSTAS

Os acidentes quase nunca resultam de uma simples causa, muitos deles envolvem

múltiplos fatores complexos inter-relacionados, presentes em diferentes níveis do sistema, tais

como tais como governo, reguladores, organizacional e gerencial e suas interações com a

atividade do trabalho.

Essa complexidade deve refletir no processo de investigação, que deve ser realizado

utilizando um método que suporte o investigador a estruturar as informações e descreva a

realidade completa do acidente. Por conseguinte, a escolha do método pode ter um significante

impacto sobre a eficiência e efetividade de uma investigação. Assim, a seleção de método

requer atenção e deve ser baseada nas suas vantagens e limitações, considerando alguns

critérios, como os descritos acima e resumidos no Quadro 2.

Neste artigo foi abordado importância da escolha adequada do método e a influência deste

nos resultados da investigação. No entanto, outros fatores impactam nestes resultados, tais

como perfil do investigador (treinamento, experiencia, formação) e cenário (dados disponíveis,

tempo disponível, tipo de sistema sócio-técnico) (KATSAKIORI et al., 2009; SVENSON et al.,

1999), como ilustrado na figura 7.

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Figura 7 – fatores que influencia nos resultados da investigação

Fonte: Autor

Método de investigação

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