influência da densidade bacteriana na epistasia · a epistasia é um fenómeno de interacção...
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UNIVERSIDADE DE LISBOA
FACULDADE DE CIÊNCIAS
DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA ANIMAL
Influência da Densidade Bacteriana na Epistasia
Luís Manuel Figueira Leónidas Correia Cardoso
Dissertação
Mestrado em Biologia Evolutiva e do Desenvolvimento
2013
UNIVERSIDADE DE LISBOA
FACULDADE DE CIÊNCIAS
DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA ANIMAL
Influência da Densidade Bacteriana na Epistasia
Luís Manuel Figueira Leónidas Correia Cardoso
Dissertação
Mestrado em Biologia Evolutiva e do Desenvolvimento
Tese orientada por
Professor Doutor Francisco Dionísio
2013
I
AGRADECIMENTOS
Quero agradecer a todos os que me ajudaram ao longo da tese e a todos os que me
apoiaram, suportaram e torceram por mim ao longo da vida.
Começo por agradecer ao Professor Francisco Dionísio por ter apostado em mim e me ter
dado a oportunidade de realizar este trabalho, pela orientação, disponibilidade e paciência ao
longo da tese e pelo apoio e motivação constantes.
De seguida, agradeço a todos os elementos do grupo de Ecologia Evolutiva de
Microorganismos. Quero agradecer em particular ao Luís Carvalho pela ajuda valiosa na análise
estatística, nomeadamente na escolha dos testes adequados aos dados e às perguntas. À Sofia,
por me ter ensinado “tudo” sobre “o contacto”. Ao André, ao João e à Iolanda pelas ajudas,
pelo companheirismo e pelas gargalhadas.
Quero também agradecer aos meus colegas de mestrado, pelo ambiente descontraído e
pelo espírito de grupo e de equipa reinante durante as aulas que tivemos e os trabalhos que
fizemos em conjunto.
Quero agradecer à minha família, em particular aos meus pais, que me deram tudo, por
respeitarem e apoiarem as minhas decisões e por terem tido, ao longo deste ano de tese, uma
paciência e uma preocupação excepcionais. Aos meus avós paternos, pelos valores que me
passaram e pelo altruísmo e acompanhamento constantes, por estarem sempre presentes.
Aos meus avós maternos, ao tio Casimiro e à Têtê, por toda a atenção e dedicação que tiveram
para comigo e pelos exemplos que me deram em vida, através dos quais tiveram uma enorme
influência na pessoa que hoje sou.
Agradeço aos meus amigos, em especial ao Eduardo, meu “irmão” desde sempre, ao
Fradique, um autêntico poço de racionalidade e bom senso, e ao Barão, o meu grande
Padrinho. Agradeço também aos suppianos, por todos os momentos divertidos, pelo espírito
de solidariedade e pela boa disposição contagiante.
Deixo para o final um agradecimento especial. Agradeço à Margarida, minha namorada, por
ter sido para mim o maior suporte, a maior ajuda e a maior fonte de inspiração. Por Tudo.
A todos, Muito Obrigado.
II
III
RESUMO
A subsistência de bactérias multirresistentes a antibióticos pode ser devida a vários
factores, entre os quais a epistasia. Tem sido demonstrado que a epistasia pode variar com
mudanças ambientais. Descobriu-se recentemente que a bactéria Escherichia coli cresce mais
depressa em alta densidade bacteriana do que em baixa densidade, um fenómeno
denominado de vantagem no crescimento dependente do contacto (VDC). Este trabalho
demonstra que a VDC é capaz de alterar os perfis epistáticos entre mutações de resistência.
Reportamos aqui que a epistasia positiva, através da qual o efeito combinado de mutações
deletérias é menor do que o esperado na ausência de interacções genéticas, é mais prevalente
em alta densidade bacteriana. Também se demonstra que a epistasia de sinal, um tipo de
interacção genética na qual combinações deletérias podem em conjunto tornar-se benéficas, é
muito comum em combinações com epistasia positiva no início do crescimento exponencial.
No que diz respeito ao mecanismo de VDC, os nossos resultados sugerem que a magnitude
da vantagem em alta densidade não é dependente da taxa de crescimento dos mutantes,
beneficiando mais uma estirpe consoante quão menor é o seu fitness base.
Por último, é reportado que, em determinados contextos ecológicos, mutações de
resistência com um efeito deletério podem tornar-se benéficas e a multirresistência pode não
implicar custos.
Este trabalho demonstra que as interacções bióticas podem influenciar as relações
epistáticas entre mutações que conferem resistência a antibióticos. Deste modo, para as
bactérias, a presença ou ausência de uma desvantagem na multirresistência é dependente do
ambiente em que se encontram e de com que outras bactérias se encontram.
PALAVRAS-CHAVE: Densidade Bacteriana, Epistasia, Fitness, Resistência a Antibióticos.
IV
ABSTRACT
The subsistence of multidrug resistant bacteria may be due to many factors, including
epistasis. It has been shown that epistasis may vary with environmental changes. Recently, it
has been revealed that the bacteria Escherichia coli grows faster in high bacterial density than
in low bacterial density, a phenomena named as contact dependent growth advantage (CDA).
This work shows that CDA is capable of changing epistatic patterns between resistance
mutations.
Here, we report that positive epistasis, where combined effects of deleterious mutations
are lower than expected in the absence of genetic interactions, is more prevalent in high
bacterial density. It is also shown that in the early exponential growth phase sign epistasis, a
type of genetic interaction in which combined deleterious effects may together become
beneficial, is pervasive in combinations with positive epistasis.
Regarding the CDA mechanism, our results suggest that the magnitude of the growth
advantage is not dependent of the mutant growth rate, benefiting more a strain the lower its
base fitness is.
Finally it is reported that, in some ecological contexts, resistance mutations with a low
deleterious effect may become beneficial and multidrug resistance may not imply costs.
This work highlights that biotic interactions may influence epistatic relations between
antibiotic resistance-conferring mutations. Therefore, to bacteria, the presence or absence of a
disadvantage in multirresistance is dependent on the environment in which they are and on
which bacteria are they with.
KEYWORDS: Antibiotic Resistance, Bacterial Density, Epistasis, Fitness.
V
ÍNDICE
AGRADECIMENTOS......................................................................................................................... I
RESUMO ....................................................................................................................................... III
ABSTRACT ..................................................................................................................................... IV
I. INTRODUÇÃO ............................................................................................................................. 1
I. 1. Resistência a antibióticos, um problema grave e contemporâneo .................................... 1
I. 2. O papel da epistasia na manutenção das estirpes resistentes .......................................... 2
I. 3. Interacções bacterianas ..................................................................................................... 3
I. 3.1. Interacções dependentes do contacto ........................................................................ 4
I. 3.2. Interações bacterianas antagonistas dependentes do contacto ................................ 4
I. 3.3. VDC - Vantagem de crescimento dependente do contacto ........................................ 5
I. 4. Plasticidade fenotípica e fenómenos epistáticos ............................................................... 6
I. 4.1. VDC e Epistasia ............................................................................................................ 6
I. 5. Objectivos ........................................................................................................................... 7
II. MATERIAIS E MÉTODOS ............................................................................................................ 8
II. 1. Estirpes bacterianas utilizadas .......................................................................................... 8
II. 2. Condições de crescimento ................................................................................................ 9
II. 3. Ensaios de competição em baixa e em alta densidade bacteriana ................................... 9
II. 4. Estimativa do número de gerações ................................................................................. 10
II. 5. Cálculo do fitness e estimação dos valores de epistasia ................................................. 10
II. 6. Detecção de Epistasia de Sinal ........................................................................................ 12
II. 7. Tratamento estatístico .................................................................................................... 12
III. RESULTADOS .......................................................................................................................... 14
III. 1. Evidência da acção da densidade bacteriana na promoção do crescimento ................ 14
III. 2. Efeitos da densidade no fitness ...................................................................................... 16
III. 3. A distribuição dos valores de fitness evidencia mutações deletérias e sem custo ........ 17
III. 4. Evidência de epistasia positiva em alta densidade ........................................................ 20
III. 5. A densidade bacteriana influencia os perfis de epistasia .............................................. 21
III. 6. Os valores de epistasia variam com o custo das mutações ........................................... 25
III. 7. Epistasia positiva de sinal em baixa e em alta densidade bacteriana ............................ 28
IV. DISCUSSÃO ............................................................................................................................. 30
VI
IV. 1. A sensibilidade da epistasia à VDC ................................................................................. 30
IV. 1.1. A densidade bacteriana e a ocorrência de epistasia positiva ................................. 30
IV. 1.2. A prevalência da epistasia positiva de sinal em baixa e em alta densidade
bacteriana............................................................................................................................ 31
IV. 1.3. A relação entre a epistasia e o custo das mutações ............................................... 33
IV. 2. A ausência de custo das mutações e o melhoramento condicional do fitness ............. 34
IV. 3. O papel da VDC na manutenção da diversidade e da resistência a antibióticos ........... 35
IV. 4. Conclusões e perspectivas futuras ................................................................................. 37
V. BIBLIOGRAFIA .......................................................................................................................... 39
VI. ANEXOS .................................................................................................................................. 43
1
I. INTRODUÇÃO
I. 1. Resistência a antibióticos, um problema grave e contemporâneo
O desenvolvimento e a utilização de antibióticos é um dos principais marcos médicos do
século XX. A sua utilização permitiu o controlo e o combate de várias doenças de origem
bacteriana, muitas das quais fatais até à sua descoberta (Cohen, 1992), bem como a prevenção
de infecções oportunistas em práticas médicas que entretanto se tornaram comuns (Martinez
et al., 2009). No entanto, ao longo do tempo tornou-se evidente que a utilização de
antibióticos promove o aparecimento de casos de resistência (Cohen, 1992).
A situação agravou-se com o aparecimento de casos de resistência múltipla, que permitem
a uma bactéria patogénica acumular meios de sobrevivência a diferentes tratamentos (Cohen,
1992, Levy & Marshall, 2004). Estes casos levaram a uma resposta da indústria farmacêutica,
originando-se novos antibióticos, inclusive alguns com novos alvos. Esta acção limitou-se a
adiar ou até a agravar o problema, uma vez que os casos de resistência, inclusive a estes novos
agentes, continuaram a aparecer (Neu, 1992). Deste modo, o problema da resistência aos
antibióticos, originado devido ao uso extensivo e excessivo destes ao longo de várias décadas
(Andersson & Hughes, 2011), tornou-se num dos maiores problemas de saúde pública (Cohen,
1992, Martinez et al., 2009) e poderá culminar na ineficácia dos tratamentos das infecções por
quimioterapia (Andersson & Levin, 1999) e no alastramento, a níveis epidémicos, de infecções
por bactérias resistentes (Bonhoeffer et al., 1997).
A resistência envolve, geralmente mutações cromossómicas espontâneas, que afectam as
vias metabólicas e os processos fisiológicos das células, ou a transmissão da resistência por
transferência horizontal de genes (por exemplo, através de plasmídeos conjugativos),
implicando a síntese adicional de ácidos nucleicos e proteínas (Zund & Lebek, 1980, Dasilva &
Bailey, 1986) devido à replicação e expressão de novos genes. Como consequência de ambas
as situações, a resistência a antibióticos implica, na maioria dos casos, um custo de fitness
associado, funcional ou energético, na ausência da pressão selectiva (Lenski, 1998). Tendo isto
em conta, os procedimentos adoptados para eliminar a resistência têm passado pelo
banimento do uso de antibióticos ineficazes até à recuperação da sua eficácia. No entanto, os
resultados desta política têm variado, havendo inclusive casos em que os níveis de resistência
aumentaram mesmo na ausência de utilização do antibiótico banido (Enne et al., 2001). De
facto, estudos baseados em simulações sugerem que as correntes campanhas de redução do
2
consumo de antibióticos não irão necessariamente reduzir os casos de resistência (Kardas-
Sloma et al., 2013).
I. 2. O papel da epistasia na manutenção das estirpes resistentes
Como se pode então explicar a manutenção de estirpes resistentes se estas seriam, à
partida, piores competidoras quando comparadas com as suas estirpes wild-type?
A subsistência pode dever-se, em parte, a fenómenos intimamente ligados às mutações,
como o aparecimento de mutações de resistência com custo reduzido ou até mesmo sem
custo aparente (Andersson & Levin, 1999), o fenómeno raro de reversão (Bjorkman et al.,
2000), mutações compensatórias ((Schrag et al., 1997, Bjorkman et al., 2000, Gagneux et al.,
2006), que podem resultar quer de reversões secundárias (Schrag et al., 1997) quer de
compensações extra-génicas (Bjorkman et al., 2000) e possibilitam restaurar o fitness sem a
perda da resistência entretanto adquirida (Andersson & Hughes, 2011), e a epistasia (Jasnos &
Korona, 2007, Trindade et al., 2009).
A epistasia é um fenómeno de interacção genética através do qual o fenótipo de um alelo
num determinado locus é afectado pela presença de outro ou outros alelos em loci diferentes
(Zeyl, 2007). Pode ter consequências ao nível do fitness e influenciar a evolução. Considerando
mutações deletérias, a epistasia é designada como negativa se tiver um efeito sinergístico,
através do qual o efeito deletério de duas ou mais mutações em conjunto é superior ao que
seria esperado se as mutações fossem independentes, sendo o fitness menor.
Alternativamente, a epistasia é considerada positiva se tiver um efeito antagónico, devido ao
qual o custo das mutações em conjunto é inferior ao esperado, sendo o fitness maior.
Adicionalmente, a epistasia pode ser classificada como sendo de sinal se o efeito das mutações
é benéfico ou deletério consoante o background genético, sendo alternativamente classificada
como epistasia de magnitude se o seu efeito benéfico ou deletério se mantiver
independentemente do background genético (Weinreich et al., 2005).
Através de um estudo sobre a interacção entre mutações cromossómicas responsáveis pela
resistência aos antibióticos ácido nalidíxico, rifampicina e streptomicina, Trindade et al (2009)
demonstraram que em casos de resistência múltipla a antibióticos é frequente haver epistasia
positiva, havendo inclusive casos de epistasia positiva de sinal, nos quais o fitness do mutante
duplo é superior ao fitness de pelo menos um dos mutantes simples. Estes dados evidenciam
3
que a epistasia entre mutações simples de resistência poderá promover a manutenção das
estirpes multirresistentes (Trindade et al., 2009).
Entretanto, Silva et al. (2011) verificaram a existência de relações de epistasia positiva de
sinal entre mutações cromossómicas de resistência a antibióticos e plasmídeos conjugativos
transportadores de genes de resistência, tendo relatado inclusive um caso em que o fitness de
uma estirpe com ambos os determinantes de resistência é maior do que o fitness de ambas as
estirpes com apenas um dos determinantes, constituindo um caso de epistasia positiva de
sinal recíproca. Tendo em conta que muitos plasmídeos são capazes de se transferir entre
organismos filogeneticamente distantes (Ochman et al., 2000, Norman et al., 2009), estes
resultados ajudam a explicar a rápida disseminação de casos de multirresistência e a justificar
a ineficácia do banimento dos antibióticos em uso em casos de resistência envolvendo
elementos genéticos móveis (Silva et al., 2011).
I. 3. Interacções bacterianas
As comunidades bacterianas são complexas e envolvem, frequentemente, a co-existência
de várias estirpes e espécies, bem como uma competição constante por recursos (Hibbing et
al., 2010). Nestas comunidades, desenvolveram-se mecanismos capazes de favorecer a
capacidade competitiva das estirpes. Entre estes mecanismos encontram-se diversos tipos de
interacções bacterianas, quer cooperativas quer competitivas (Hibbing et al., 2010).
As interacções bacterianas podem fazer-se com ou sem contacto directo entre as células
(Bassler & Losick, 2006). Entre as interacções sem contacto destacam-se a produção de
bacteriocinas, a produção de antibióticos e a sinalização por quorum sensing, que possibilita às
bactérias avaliar a densidade populacional e controlar o seu comportamento consoante a
mesma (Bassler & Losick, 2006). É de referir que os antibióticos não têm uma função
necessariamente antagonista, podendo ter um papel de comunicação como moléculas sinal
em concentrações sub-inibitórias (Goh et al., 2002, Romero et al., 2011), e que o quorum
sensing não promove necessariamente uma comunicação com efeitos cooperativos, podendo
estar envolvido em conflitos intraespecíficos e interespecíficos (Keller & Surette, 2006).
4
I. 3.1. Interacções dependentes do contacto
Entre as interacções com contacto, conhece-se há já algum tempo algumas interacções não
antagonistas importantes, como o contacto mediado por pili na iniciação da transferência
horizontal de genes por conjugação (Perry et al., 2002), a sinalização C, necessária para a
formação do corpo frutificante em Myxococcus xanthus (Kim & Kaiser, 1990) ou a coagregação
(Rickard et al., 2003) e a coadesão na formação de biofilmes (Kolenbrander, 2000). Entretanto,
Wei et al demonstraram que a troca de lipoproteínas entre células de M. Xanthus requer
contacto célula a célula e que esta ligação só é estável em meio estruturado (Wei et al., 2011).
Por outro lado, Dubey e Ben-Yehuda (2011) descreveram uma forma de comunicação
bacteriana mediada por nanotubos, a qual permite a passagem de moléculas inclusive
plasmídeos não conjugativos, que possuem informação genética com transmissão usualmente
hereditária. Esta forma de comunicação possibilita ainda a estirpes susceptíveis adquirir
resistência transiente a antibióticos quando em contacto com estirpes resistentes se a
resistência for mediada através de proteínas citoplasmáticas (Dubey & Ben-Yehuda, 2011).
Estas descobertas juntam-se, assim, à crescente evidência do papel cooperativo que as
interacções directas entre células bacterianas podem assumir. No entanto, só recentemente se
descobriram interacções dependentes do contacto célula a célula com efeitos antagonistas.
I. 3.2. Interações bacterianas antagonistas dependentes do contacto
O primeiro mecanismo antagonista dependente do contacto entre células bacterianas a ser
descrito, o sistema CDI (contact dependent inhibition) foi descoberto por Aoki et al. (2005). O
sistema CDI permite que algumas estirpes de Escherichia coli, inclusive estirpes
uropatogénicas, inibam estirpes competidoras. A inibição é dependente da fase de
crescimento da estirpe inibidora, só ocorrendo quando este se encontra na fase exponencial,
mas afecta as células alvos independentemente da sua fase de crescimento. O mecanismo
consiste num sistema de secreção de dois componentes (Aoki et al., 2005), sendo classificado
como um sistema de secreção tipo V (Hayes et al., 2010). Mais recentemente, Hood et al
(2010) e Alteri et al (2013) demonstraram que os sistemas de secreção tipo VI também podem
estar envolvidos em interacções antagónicas dependentes do contacto entre bactérias (Hood
et al., 2010, Alteri et al., 2013). Já era sabido que várias espécies de bactérias didérmicas
(Gram negativas) patogénicas podem secretar agentes patogénicos para o interior de células
eucariotas, através de sistemas de secreção (Cornelis & Van Gijsegem, 2000, Cambronne &
5
Roy, 2006), mas estas descobertas recentes permitiram “extender” os alvos do antagonismo
por via de sistemas de secreção a procariotas.
Entretanto, Lemonier et al (2008) descreveram também a existência de um outro
fenómeno de regulação do crescimento dependente do contacto, demoninado de SCDI
(stationary phase contact-dependent inhibition) e originado em E. coli através de substituições
no gene glgC, envolvido na via de síntese do glicogénio, ou através do efeito pleiotrópico
destas mutações. Este mecanismo actua apenas durante a fase estacionária e permite inibir os
genótipos ancestrais das linhas mutadas, podendo, a par do sistema CDI, facilitar a invasão de
habitats por parte de estirpes próximas das que os ocupam na natureza e até eliminar este
conjunto de competidores (Lemonnier et al., 2008).
I. 3.3. VDC - Vantagem de crescimento dependente do contacto
Alves (2010) reportou que alguns mutantes de E. coli resistentes a antibióticos
apresentavam uma desvantagem em relação ao wild-type quando a competir num rácio de 1:1
ou em maioria, apresentando no entanto vantagem em raridade, verificando-se um caso de
selecção dependente da frequência (Alves, 2010). Entretanto, Nunes (2012) verificou que a
vantagem na raridade destes mutantes é devida a um mecanismo de regulação de crescimento
dependente de contacto directo célula a célula, designado por VDC – vantagem no
crescimento dependente do contacto, graças ao qual as bactérias apresentam uma taxa de
crescimento superior quando presentes numa população em elevada densidade bacteriana do
que quando presentes numa população em baixa densidade. Esta vantagem parece estar
ligada a um encurtamento da fase lag, permitindo uma entrada mais rápida na fase
exponencial do crescimento (Nunes, 2012).
Segundo Nunes (2012), este mecanismo está presente quer em E. coli, uma espécie
bacteriana didérmica, quer em Staphylococcus aureus, uma espécie bacteriana monodérmica
(Gram positiva), o que sugere uma distribuição abrangente entre as espécies bacterianas. Por
outro lado, já tinha sido descrita a existência de um fenómeno semelhante no eucariota
unicelular Dictyostelium discoideum (Franck et al., 2008). No entanto, este tipo de mecanismo
não está presente em Enterococcus faecalis (Nunes, 2012), o que indica que uma vantagem
dependente do contacto não é universal. Ainda assim, a VDC tem a particularidade de ser,
entre os mecanismos de regulação do crescimento dependentes do contacto entre procariotas
até à data descobertos, o único com um papel de promoção do crescimento.
6
I. 4. Plasticidade fenotípica e fenómenos epistáticos
Em estudos sobre a taxa de crescimento ou sobre o fitness bacteriano, é prática comum
testar o efeito de condições ambientais sobre um determinado genótipo. A possibilidade de
produção de fenótipos diferentes a partir do mesmo genótipo designa-se por plasticidade
fenotípica (Miner et al., 2005). Sabendo-se que o fenótipo de um gene pode estar sujeito a
plasticidade, é lógico pensar que o fenótipo da sua interacção genética também o possa estar.
Neste sentido, Remold e Lenski (2004) testaram o efeito conjunto do ambiente nutricional e da
epistasia entre mutações de inserção aleatória no fitness, tendo o cuidado de o fazer para 5
backgrounds genéticos distintos (para poder definir e excluir o seu efeito), e demonstraram
que algumas das mutações tinham efeitos epistáticos díspares consoante o ambiente
nutricional (Remold & Lenski, 2004). Este facto demonstra que epistasia não tem um impacto
fixo no fitness, podendo interagir com efeitos de plasticidade fenotípica e assim ter um
impacto variável consoante o ambiente.
Sabe-se que vários organismos expressam plasticidade em resposta a factores bióticos
(Miner et al., 2005). Deste modo, é expectável que os efeitos de interacções genéticas estejam
também sujeitos a plasticidade influenciada por factores bióticos como as interacções
bacterianas.
I. 4.1. VDC e Epistasia
Em bactérias, como em qualquer ser vivo, a selecção natural actua sobre a diversidade pré-
existente na população, pelo que o aparecimento de uma mutação que confere resistência é
independente do momento de aplicação da pressão de selecção (Luria & Delbruck, 1943,
Demerec, 1948). Desde modo, quando uma bactéria adquire uma resistência devido a uma
mutação, está inicialmente em baixa frequência em relação às restantes bactérias, mas
encontra-se em alta densidade, pelo menos até à utilização do antibiótico.
Sabe-se também que a densidade pode afectar o fitness de bactérias resistentes a
antibióticos através da vantagem dependente do contacto (Nunes, 2012) e, no caso particular
de Bacillus anthracis, através de quorum sensing (Jones et al., 2005).
Por outro lado, o efeito das mutações no fitness pode depender do ambiente, de
interacções genéticas ou de ambos (Remold & Lenski, 2004) pelo que a relação entre
densidade bacteriana e o fitness de bactérias que apresentam epistasia entre mutações pode
7
ser complexa. Os padrões de epistasia podem, de facto, variar consoante o ambiente (Remold
& Lenski, 2004), sendo que neste caso particular, poderão variar consoante a densidade. Nesta
perspectiva é expectável que a densidade bacteriana, para além da vantagem de fitness que
por si só oferece, possa influenciar os níveis de epistasia de bactérias com resistências
múltiplas epistáticas.
I. 5. Objectivos
Neste trabalho teve-se como objectivo estudar a relação entre a vantagem de crescimento
dependente do contacto (VDC) e a epistasia entre mutações cromossómicas de resistência a
antibióticos.
Pretendeu-se verificar, em particular, se o perfil de epistasia de mutantes com resistência
múltipla a antibióticos se altera com a variação entre alta e baixa densidade bacteriana e assim
determinar se a epistasia pode interagir com este factor biótico.
Pretendeu-se também analisar os padrões de epistasia obtidos e determinar a existência de
uma tendência das interacções epistáticas em relação à densidade.
Tencionou-se ainda estudar a resposta do fitness relativo dos mutantes à VDC e verificar
qual a incidência de epistasia de sinal em ambas as condições.
Quer a densidade bacteriana quer a epistasia podem ter um papel na manutenção de
estirpes multirresistentes. Por esta razão, o estudo da interacção entre estes dois fenómenos
pode contribuir para a compreensão da manutenção da multirresistência a antibióticos no
panorama actual.
8
II. MATERIAIS E MÉTODOS
II. 1. Estirpes bacterianas utilizadas
Foram utilizadas as estirpes E. coli K12 MG1655 e E. coli K12 MG1655 Δara, assim como
mutantes espontâneos derivados da estirpe ancestral E. coli K12 MG1655, resistentes aos
antibióticos ácido nalidíxico, rifampicina e streptomicina, bem como os respectivos duplos
mutantes.
Os mutantes foram previamente gerados e sequenciados para os genes gyrA, rpoB e rpsL
por Trindade et al. (2009). Estes genes estão envolvidos, respectivamente, na resistência ao
ácido nalidíxico, à rifampicina e à streptomicina.
Os mutantes simples foram obtidos após selecção com antibiótico em culturas derivadas da
estirpe ancestral. Os mutantes duplos resultaram da inserção do segundo gene de resistência
nos mutantes simples através da transdução com o fago P1. A transdução foi feita para
garantir que as mutações presentes no mutante duplo fossem as presentes nos mutantes
simples. Adicionalmente, a transdução poupou os mutantes duplos a uma segunda ronda de
selecção, o que poderia promover a aquisição de mutações compensatórias.
A estirpe E. coli K12 MG1655 Δara foi utilizada como estirpe de referência nos ensaios de
fitness. É isogénica à estirpe E. coli K12 MG1655, apresentando uma delecção no operão ara.
(Lenski et al., 1991). Esta delecção impede a metabolização e utilização da arabinose. Devido a
esta diferença, a estirpe E. coli K12 MG1655 e os mutantes resistentes, sendo ara+, formam
colónias brancas em agar com tetrazólio e arabinose (TA), enquanto que a estirpe E. coli K12
MG1655 Δara forma colónias vermelhas (Lenski et al., 1991).
A estirpe E. coli K12 MG1655 tem sido mantida em laboratório com o mínimo de
manipulação genética. Foi curada do fago lambda e do plasmídeo F e apresenta características
próximas da E. coli wild-type (Blattner et al., 1997).
9
II. 2. Condições de crescimento
As estirpes foram incubadas em tubos de 50 ml com 10 ml de meio Luria Bertani líquido
(LB), a uma temperatura de 37°C com uma agitação constante (170 rpm) aquando do pré-
crescimento e das competições. Antes das competições, os tubos com meio LB foram pré-
aquecidos a 37°C overnight, de modo a diminuir a influência da temperatura ambiente do
laboratório no início das competições e a controlar contaminações.
Para efeitos de contagem, as estirpes foram encubadas em meio LB suplementado com
agar (LA) ou em meio com tetrazólio e arabinose suplementado com agar (TA). O meio LA
utilizado contém 1,5% de agar e 2% de LB. O meio TA utilizado contém 1,5% de agar, 1% de
peptona, 0,5% de cloreto de sódio, 0,1% de extracto de levedura, 0,005% de cloreto de 2,3,5-
trifeniltetrazólio e 1% arabinose.
Os mutantes resistentes foram obtidos a partir de riscados em placas em placas de LA e
sujeitos ao isolamento de colónias (duas vezes) em LA suplementado com os antibióticos para
o qual têm resistência, de modo a assegurar que os mutantes são monoclonais. As
concentrações de antibiótico utilizadas foram de 40 µg/ml de ácido nalidíxico, 100 µg/ml de
rifampicina e 100 µg/ml de streptomicina.
Para efeito da formação dos stocks, todas as estirpes foram incubadas em LB a 37°C, com
agitação constante e armazenadas individualmente em glicerol a 15% (V/V) a -20°C e a -80°C,
de modo a poder ser reutilizado em experiências futuras.
Todas as diluições foram feitas numa solução tampão de MgSO4 10-2 M.
II. 3. Ensaios de competição em baixa e em alta densidade bacteriana
Foram realizadas competições entre cada um dos mutantes, simples e duplos, e a estirpe
de referência em baixa e em alta densidade bacteriana. Em cada ensaio, uma estirpe mutante
e a estirpe de referência foram inoculados separadamente em meio LB overnight (cerca de 16
horas). De seguida, foram colocados a competir num rácio aproximado do 1:1. No caso da
competição em baixa densidade, para cada estirpe mutante, foram colocadas a competir cerca
de 100 bactérias resistentes com cerca de 100 bactérias da estirpe de referência, sendo estes
números obtidos através de diluições do pré-crescimento. Na competição a alta densidade,
para cada estirpe mutante, colocou-se a competir cerca de 107 bactérias resistentes com 107
10
bactérias da estirpe de referência, sendo estes valores igualmente obtidos através de diluições
do pré-crescimento. A competição, em ambos os casos, foi feita em meio LB a 37°C com
agitação e teve a duração de 3 horas.
II. 4. Estimativa do número de gerações
De modo a se poder calcular o número de bactérias de ambas as estirpes no final da
competição foi feito um plaqueamento em TA. Este plaqueamento foi directo no caso da
competição em baixa densidade, tendo sido feito após as diluições apropriadas no caso das
competições a alta densidade.
O número de gerações para ambas as estirpes em competição foi então calculado através
da seguinte fórmula:
Em que Dm representa o número de gerações dos mutantes, Dr o número de gerações da
estirpe de referência, Nm(0) e Nm (t) correspondem respectivamente às unidades formadoras
de colónias (ufc) de bactérias resistentes no início e no final da competição e Nr (0) e Nr (t)
correspondem respectivamente às ufc da estirpe de referência no inicio e no final da
competição.
II. 5. Cálculo do fitness e estimação dos valores de epistasia
Após a contagem das ufc, o fitness relativo dos clones resistentes relativamente ao seu
competidor foi calculado segundo Lenski (1991):
11
Em termos práticos, o fitness relativo é um ratio entre o número de gerações do mutante
(Dm) e da estirpe de referência (Dr).
Através de competições idênticas às realizadas nos ensaios de fitness, em baixa e em alta
densidade, entre a estirpe de referência e a estirpe wild-type, calculou-se os valores de fitness
da primeira. Os valores do fitness relativo dos mutantes foram então transformados de modo
a serem relativos ao wild-type, multiplicando os valores de fitness relativo dos mutantes pelo
valor do fitness do competidor.
Após a obtenção dos valores do fitness, para cada mutante duplo foi calculado o valor da
epistasia (ε) entre as duas mutações através de um modelo multiplicativo:
A epistasia também pode ser calculada através de um modelo aditivo, no qual a epistasia é
igual à subtração da soma dos fitnesses dos mutantes simples ao fitness do mutante duplo
( ). Para custos de fitness pequenos, os modelos devolvem valores de
epistasia semelhantes.
O valor do erro foi estimado a partir do método da propagação do erro:
Nos casos em que o valor de epistasia obtido estava dentro do valor do erro ([-σε,σε])
considerou-se que os alelos a e b não tinham epistasia significativa, sendo estes casos
classificados como ausência de epistasia (ε ≈ 0). Nos casos em que o valor obtido se encontrou
fora do intervalo do erro, a epistasia foi considerada positiva quando ε>σε e negativa se ε<-σε.
12
II. 6. Detecção de Epistasia de Sinal
De modo a distinguir, entre os casos de epistasia positiva, os casos de epistasia de
magnitude dos de epistasia de sinal, comparou-se os valores de fitness dos mutantes duplos
com os valores dos respectivos mutantes simples. Quando o pressuposto da normalidade foi
cumprido utilizou-se o teste T de Student bilateral para amostras independentes para
determinar a presença de epistasia positiva de sinal, tendo sido utilizado o teste U de Mann-
Whitney para o mesmo efeito quando o pressuposto da normalidade não foi cumprido. Nos
casos em que o teste indicou um fitness do mutante duplo significativamente maior do que
apenas um dos respectivos mutantes simples, considerou-se a epistasia como positiva de sinal
parcial. Nos casos em que o teste indicou fitness significativamente superior a ambos os
mutantes simples, a epistasia foi considerada como sendo positiva de sinal recíproca. Nos
restantes casos de epistasia positiva, em que o fitness dos mutantes duplos não era
significativamente maior que o fitness de nenhum dos dois mutantes simples, classificou-se a
epistasia como positiva de magnitude.
II. 7. Tratamento estatístico
Todos os dados obtidos resultaram de experiências realizadas pelo menos em triplicado.
Após a sua obtenção realizaram-se testes para a normalidade dos resíduos (testes de Shapiro-
Wilk e de Kolmogorov-Smirnov), seguida das análises estatísticas adequadas. Nos casos em
que pelo menos um dos testes rejeitou a normalidade (p<0,05), tratou-se os dados com testes
estatísticos não paramétricos.
Utilizou-se o teste T de Student bicaudal para amostras emparelhadas para determinar se,
para cada mutante resistente a antibiótico, o número de gerações completado a competir em
baixa densidade bacteriana foi diferente do número de gerações a competir em alta
densidade. (Em dois casos, os dados não cumpriram o critério da normalidade dos resíduos,
tendo o resultado sido confirmado com o teste de Wilcoxon).
Utilizou-se o teste de Wilcoxon para amostras emparelhadas (Wilcoxon signed-rank test)
para determinar: (1) se para o conjunto dos mutantes, os números de gerações médios em
baixa densidade diferem dos números de gerações médios em alta densidade; (2) se há
diferenças entre o fitness do conjunto dos mutantes a baixa e a alta densidade. Estas análises
13
foram repetidas para o subconjunto constituído pelos mutantes simples e para o subconjunto
constituído pelos mutantes duplos.
Utilizou-se o teste T de Student bicaudal para amostras independentes para verificar: (1) se
a epistasia média para cada alelo difere entre baixa e alta densidade; (2) se a epistasia média
absoluta para cada alelo difere entre baixa e alta densidade.
Utilizou-se o teste T de Student bicaudal para uma amostra com um intervalo de confiança
de 95% para testar se o fitness de cada mutante era significativamente diferente de 1, ou seja,
do fitness do wild-type. Mutantes para os quais a hipótese nula foi rejeitada foram
considerados como tendo um fitness inferior ao wild-type se o seu valor de fitness médio fosse
inferior a 1 e como tendo um fitness superior ao wild-type se o seu valor de fitness médio fosse
superior a 1.
Realizaram-se regressões lineares para determinar a existência de correlação e modelar a
relação entre: (1) o número de gerações médio dos mutantes a competir em alta densidade e
a competir em baixa densidade; (2) o fitness dos mutantes a competir em baixa e em alta
densidade; (3) o custo dos alelos e a epistasia média dos mesmos, quer em baixa quer em alta
densidade; (4) o custo dos alelos e a epistasia média absoluta dos mesmos quer em baixa quer
em alta densidade. Nos pontos 1 e 2 a análise foi repetida para o subconjunto constituído
pelos mutantes simples e pelo subconjunto dos mutantes duplos. Nestes mesmos pontos,
recorreu-se a regressões para representar a tendência das correlações. Nos pontos 3 e 4, as
regressões foram utilizadas com o propósito estatístico de demonstrar a dependência da
variável dependente relativamente à variável independente.
Realizaram-se ainda análises de bootstrap com 10000 amostras e um intervalo de confiança
de 95% para as medianas das distribuições de epistasia em baixa e em alta densidade.
Os testes T de Student para amostras independentes, para amostras emparelhadas e para
uma amostra e as regressões lineares foram realizados no programa Microsoft Excel 2007. Os
testes de normalidade, os testes U de Mann-Whitney, os testes de Wilcoxon, as estatísticas
das regressões, as análises de bootstrap, e as análises descritivas dos dados foram feitas com o
programa IBM SPSS Statistics 20.
14
III. RESULTADOS
III. 1. Evidência da acção da densidade bacteriana na promoção do crescimento
Com esta tese pretendeu-se estudar a relação entre a densidade bacteriana e a epistasia
entre mutações que conferem resistência a antibióticos. Nesse sentido, começou-se por
determinar o número de gerações completado pelas estirpes de E. coli K12 resistentes a
antibióticos num ambiente de competição em baixa densidade (aproximadamente 100
bactérias mutantes contra 100 bactérias da estirpe de referência) e em alta densidade
(aproximadamente 107 contra 107). Ao fim de 3 horas, o conjunto dos mutantes simples e
duplos completou em média 5,04 (±0,42) gerações em baixa densidade e 5,80 (±0,44) gerações
em alta densidade, sendo a diferença estatisticamente significativa (p<0,001, teste de
Wilcoxon). Verifica-se que há uma correlação linear positiva entre o número de gerações dos
mutantes resistentes em alta densidade e o número de gerações em baixa densidade (r=0,92,
p=2,64 x 10-15, correlação de Pearson), o que indica que o número de gerações em alta
densidade varia de acordo com o número de gerações em baixa densidade. A equação da recta
da linha de tendência, y = 0,96x + 0,94, tem um declive muito próximo de 1, o que indica que a
vantagem em alta densidade tem uma acção semelhante para o conjunto dos mutantes,
promovendo o crescimento independentemente do seu número de gerações a baixa
densidade, o que é evidenciado na figura 1A.
Esta diferença no número de gerações é igualmente significativa se considerarmos quer
apenas os mutantes simples (p=0,011, teste de Wilcoxon) quer apenas os mutantes duplos
(p<0,001, teste de Wilcoxon). De facto, como se pode observar na figura 1B, a tendência é
semelhante para ambos os subconjuntos. Individualmente, 6 dos 9 mutantes simples e 19 dos
27 mutantes duplos apresentaram um aumento significativo do número de gerações quando
em alta densidade (testes T para amostras emparelhadas; em anexo, tabela S1).
Nenhum dos mutantes evidenciou um crescimento significativamente menor em alta
densidade do que em baixa densidade. Estes dados evidenciam a presença de uma vantagem
no crescimento a alta densidade, típica do efeito de VDC descrito por Nunes (2012).
15
A B
Figura 1 - Evidência do efeito VDC nos mutantes de E. coli K12 MG1655 resistentes a antibióticos.
(A) Relação entre o número de gerações em alta densidade e o número de gerações em baixa
densidade. A linha contínua representa a linha de tendência, enquanto que a recta tracejada representa
o número de gerações esperado na ausência do efeito da densidade. (B) Discriminação do subconjunto
dos mutantes simples (círculos cheios) e do subconjunto dos mutantes duplos (triângulos vazios). A linha
de tendência contínua é calculada a partir dos dados dos mutantes simples, enquanto que a linha de
tendência tracejada resulta dos dados dos mutantes duplos.
De acordo com Nunes (2012), é esperado que a estirpe de referência também complete um
número maior de gerações em alta densidade do que em baixa densidade. De facto, a estirpe
E. coli K12 Δara completou em média 6,30 (±0,18) gerações em baixa densidade e 6,83 (±0,18)
gerações em alta densidade, sendo a diferença estatisticamente significativa (p=3,28 x10-6,
teste t de Student para amostras emparelhadas). Estes valores foram obtidos, para as duas
condições, através da média dos valores médios do número de gerações em cada competição
com cada mutante.
Competindo a estirpe E. coli K12 Δara com a E. coli K12 wild-type, verifica-se que não há
diferenças significativas entre os números de gerações de ambas, tanto em baixa (p=0,164,
teste T para amostras independentes) como em alta densidade (p=0,384, teste T para
amostras independentes). O valor do número de gerações da estirpe E. coli K12 Δara foi
ligeiramente superior ao da estirpe E. coli K12, quer em baixa (5,69±0,16 contra 5,5±0,22
gerações) quer em alta densidade (6,76±0,18 contra 6,64±0,17), mas dado não haver
diferenças significativas, conclui-se que o marcador ara- não implica um custo ou vantagem
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Número de gerações baixa densidade
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Nú
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s al
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sid
ade
Número de gerações baixa densidade
16
nas condições experimentais utilizadas (crescimento de 3 horas em meio LB a 37°C, com
agitação).
III. 2. Efeitos da densidade no fitness
Tendo em conta que a VDC é observável quer nos mutantes quer na estirpe de referência,
torna-se importante saber até que ponto pode a VDC beneficiar os mutantes resistentes
relativamente aos seus competidores que também possuem o mecanismo. Para responder a
esta questão, calculou-se o fitness dos mutantes (ver secção II.5 dos Materiais e Métodos) e
comparou-se os valores deste em baixa e alta densidade bacteriana.
O fitness médio do conjunto total dos mutantes é de 0,83 ±0,07 em baixa densidade e 0,86
±0,06 em alta densidade, sendo que esta diferença entre o fitness em ambas as condições é
significativa (p=0,003, teste de Wilcoxon). Isto indica que a VDC confere ao conjunto dos
mutantes uma vantagem competitiva relativamente à estirpe de referência. Há uma clara
correlação positiva entre o fitness em baixa e em alta densidade (r=0,97, p=4,41x10-22,
correlação de Pearson), indicando que o fitness em alta densidade varia de acordo com o
fitness em baixa densidade. Tendo em conta a equação da regressão, y= 0,9135x + 0,101, é de
notar que a vantagem no fitness em alta densidade diminui à medida que valores de fitness em
baixa densidade aumentam, o que é representado na figura 2A. O subconjunto dos mutantes
simples não apresenta diferenças significativas no fitness com a variação da densidade (0,90
±0,12 a baixa densidade e 0,91 ±0,12 a alta densidade; p=0,678, teste de Wilcoxon). É no
subconjunto dos mutantes duplos que se concentram as maiores diferenças de fitness, sendo
estas significativas (0,81±0,08 a baixa densidade e 0,85±0,06 a alta densidade; p=0,002, teste
de Wilcoxon). Estes dados indicam que os mutantes duplos são mais beneficiados pela VDC do
que os mutantes simples. As linhas de tendência dos dois subconjuntos têm declives
semelhantes e não se intersectam no intervalo de valores de fitness observado (figura 2B), o
que indica que a tendência dos benefícios no fitness devido à VDC é semelhante para os dois
subconjuntos.
A A
17
A B
Figura 2 - Evidência do efeito da densidade bacteriana no fitness relativo. (A) Relação entre o fitness
dos mutantes com resistência em alta e em baixa densidade bacteriana. A linha contínua representa a
linha de tendência, enquanto que a recta tracejada representa o fitness esperado na ausência do efeito
da densidade. (B) Discriminação do subconjunto dos mutantes simples (círculos cheios) e do
subconjunto dos mutantes duplos (triângulos vazios). A linha de tendência contínua é calculada a partir
dos dados dos mutantes simples, enquanto que a linha de tendência tracejada resulta dos dados dos
mutantes duplos.
III. 3. A distribuição dos valores de fitness evidencia mutações deletérias e sem custo
A figura 3A e 3B apresentam a distribuição dos valores de fitness dos mutantes simples a
baixa e a alta densidade, onde é possível verificar que há dois alelos (rpsL K88E e rpoB R529H)
que se destacam dos restantes devido ao baixo fitness (de 0,50 e de 0,61, respectivamente, em
baixa densidade e de 0,60 e 0,57 em alta densidade). Os restantes mutantes simples têm um
custo mais atenuado, tendo todos um fitness superior a 0,90 em baixa densidade e a 0,95 em
alta densidade. De facto, devido ao custo residual ou inexistente, 5 dos 9 alelos em alta
densidade e 3 em baixa densidade não apresentam um fitness significativamente menor que o
do wild-type (p<0,05, teste T de Student de uma amostra), o que sugere que estes mutantes,
nestas condições, não sofrem um efeito deletério com estas mutações. Nenhuma das
mutações para o gene gyrA apresenta um fitness significativamente menor que 1 para ambas
as densidades bacterianas testadas, o que sugere que o custo de adquirir esta resistência é
muito baixo. Surpreendentemente, nestas competições de 3 horas o fitness dos mutantes gyrA
0
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0,6
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Fitn
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Fitness baixa densidade
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Fitn
ess
alt
a d
en
sid
ade
Fitness baixa densidade
18
S83L e rpoB D516V em ambas as densidades bacterianas e o fitness dos mutantes gyrA D87G e
rpsL K88R em alta densidade são marginalmente superiores (p<0,05, teste T de Student de
uma amostra) ao do wild-type, o que sugere que, nestas condições de competição, estes alelos
poderão conferir uma vantagem competitiva. O impacto individual das mutações no fitness
nas competições de 3 horas em baixa e em alta densidade pode ser consultado como material
suplementar (em anexo, tabela S2).
Relativamente à distribuição dos valores de fitness nos mutantes duplos (figuras 3C e 3D),
verifica-se que há valores de fitness díspares, sendo distinguível dois conjuntos de valores. Os
valores mais baixos, num intervalo entre 0,41 e 0,76 em baixa densidade e num intervalo entre
0,36 e 0,80 em alta densidade, correspondem aos mutantes derivados dos alelos rpsL K88E e
rpoB R529H (sendo o mutante duplo para estes alelos o mutante com maior custo) e ao
mutante rpsL K43R- rpoB H526D. Os restantes mutantes têm um fitness mais elevado, com
custos menores ou inexistentes, num intervalo de valores de fitness superior a 0,80 em baixa
densidade e a 0,87 em alta densidade. Estes dados evidenciam que é bastante improvável que
o efeito muito deletério de uma mutação seja compensado na totalidade com uma segunda
mutação.
Quer em baixa quer em alta densidade, verificaram-se 12 combinações em que o fitness
não é significativamente menor que 1 (p<0,05, teste T de Student para uma amostra), sendo
que 10 casos são comuns para as duas condições (em anexo, tabela S3). É interessante
verificar que, com a excepção dos alelos rpsL K88E e rpoB R529H (como referido acima, muito
deletérios), os restantes alelos possuem combinações sem custo em ambas as densidades, o
que indica que, nestas condições de competição, as combinações entre mutações com um
custo baixo ou inexistente podem, elas próprias, não implicar um custo.
19
A
B
C
D
Figura 3 - Distribuição dos valores de fitness dos mutantes simples em competições em baixa (A) e
em alta densidade bacteriana (B) e distribuição dos valores de fitness dos mutantes duplos em
competições em baixa (C) e em alta densidade bacteriana (D). Em (A) e (B) são distinguidas as
mutações que conferem resistência a streptomicina (preto), a rifampicina (cinzento escuro) e a ácido
nalidíxico (cinzento claro). Em (C) e (D) são distinguidas as combinações entre mutações
rifampicina/streptomicina (preto), rifampicina e ácido nalidíxico (cinzento escuro) e entre ácido
nalidíxico e streptomicina (cinzento claro).
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Fitness
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Fitness
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Fitness
Rif/Strep
Rif/Nal Nal/Strep
20
III. 4. Evidência de epistasia positiva em alta densidade
Na presença de epistasia positiva, o custo de duas mutações de resistência é menor do que
o previsto caso estas fossem independentes. Comparando os custos de fitness entre mutantes
simples e duplos, verifica-se que o custo médio dos duplos mutantes é praticamente igual a
duas vezes o custo médio dos mutantes simples em baixa densidade (0,188 contra 0,195), e
notavelmente menor em alta densidade bacteriana (0,152 contra 0,180). Este dado é um
primeiro indicador de uma tendência para a epistasia positiva em alta densidade. Os
resultados representados na figura 4 reforçam esta ideia. Em baixa densidade (figura 4A),
apenas 11 dos 27 mutantes duplos (41%) se encontram acima da linha que assume ausência
de epistasia. Em alta densidade (figura 4B), 17 dos 27 mutantes (63%) têm um valor de
epistasia positivo. É interessante verificar que, em ambas as densidades, um valor de epistasia
positivo parece ser mais frequente para valores de fitness mais baixos.
A B
Figura 4 - Relação entre o fitness observado para os mutantes duplos e o fitness que seria esperado na
ausência de epistasia em competições em baixa densidade (A) e em alta densidade bacteriana (B). Em
ambas as figuras, a recta a tracejado representa o fitness esperado. Em baixa densidade, 41% dos
valores observados são superiores ao esperado, enquanto que em alta densidade 63% dos valores são
superiores ao que seria esperado na ausência de epistasia.
A figura 5 representa a distribuição dos valores de epistasia para cada densidade
bacteriana. Em baixa densidade (figura 5A), a mediana é muito próxima de 0 (0,0015, intervalo
de confiança de 95% por bootstrap entre [-0,030;0,034]). Em alta densidade (figura 5B), a
mediana tem um valor superior (0,025, intervalo de confiança de 95% por bootstrap entre [-
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Fitness esperado baixa densidade
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Fitness esperado alta densidade
21
0,0025;0,054]). O valor mínimo do intervalo de confiança é praticamente 0, pelo que este teste
evidencia uma tendência marginal para a epistasia positiva em alta densidade. Comparando os
valores de epistasia em baixa e em alta densidade, observou-se que as diferenças entre as
médias não são estatisticamente significativas (p=0,238, teste T de Student para amostras
independentes). Este resultado é expectável, uma vez que as distribuições não denunciavam
um efeito forte e universal da densidade na epistasia. Nesta circunstância, o efeito da
densidade bacteriana deve ser analisado caso a caso.
A B
Figura 5 - Distribuição dos valores de epistasia em baixa (A) e em alta densidade bacteriana (B).
Apesar de a mediana dos valores das competições alta densidade ser mais elevada (0,025, intervalo de
confiança por bootstrap [-0,0025;0,054] contra 0,0015, intervalo de confiança por bootstrap
[0,030;0,034] para as competições em baixa densidade), as médias não são significativamente diferentes
(p=0,238, teste T de Student para amostras independentes).
III. 5. A densidade bacteriana influencia os perfis de epistasia
Através do método da propagação do erro (ver secção II.5 dos Materiais e Métodos),
determinou-se a presença ou ausência e o tipo de epistasia para cada par de alelos em cada
densidade bacteriana. Os perfis de epistasia obtidos, que podem ser consultados nas figuras
6A e 6B, variam entre baixa e alta densidade bacteriana num número razoável de combinações
alélicas (48% dos casos) (figura 6C). Este resultado é interessante, uma vez que indica que a
0
1
2
3
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Nú
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Epistasia baixa densidade
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3
4
5
6
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uta
nte
s d
up
los
Epistasia alta densidade
22
epistasia é sensível ao factor densidade. O quadro da figura 6D indica o número de casos de
cada tipo de epistasia para cada densidade bacteriana. Em baixa densidade observou-se um
maior número de casos de epistasia negativa (37%, para 26% em alta densidade), bem como
de ausência de epistasia (33%, contra 22%). Em alta densidade verificou-se um maior número
de casos de epistasia positiva (52%) do que em baixa densidade (30%). Tendo em conta apenas
os casos de epistasia significativa em baixa densidade, apenas 42% têm epistasia positiva. Em
alta densidade, este valor sobe para 64%.
Ao nível das combinações entre genes verifica-se que para a combinação gyrA rpsL, 6 dos 9
mutantes duplos (67%) mantiveram o seu perfil de epistasia. Para a combinação rpoB rpsL o
perfil manteve-se em 5 dos 9 mutantes duplos (56%). Para a combinação gyrA rpoB, apenas 3
dos 9 mutantes duplos mantiveram o perfil de epistasia (33%) com a variação da densidade.
De facto, apesar de esta combinação apresentar predominantemente casos de epistasia
negativa ou de ausência de epistasia em baixa densidade (89%), sendo o mutante rpoB H526D/
gyrA D87Y o único caso de epistasia significativamente positiva para estes dois genes, em alta
densidade este conjunto de genes apresenta uma ligeira predominância de casos de epistasia
positiva (56% dos casos).
O alelo rpoB R529H é o mais variável, uma vez que 5 dos 6 duplos mutantes envolvendo
este alelo variam de perfil de epistasia entre baixa e alta densidade. O alelo rpsL K88E parece
ser o mais constante ao nível da epistasia entre as condições, tendo mantido todos os perfis de
epistasia excepto na combinação com rpoB R529H. No entanto, a existência de alelos de rpsL e
gyrA mais variáveis como rpsL K88R e gyrA D87Y (com a manutenção dos perfis em apenas 2
dos 6 mutantes duplos) indica que a mudança do perfil de epistasia com a densidade não é
dependente do gene.
23
A
Baixa Densidade rpsL rpoB
K43R K88E K88R D516V R529H H526D
D87G +++ - - 0 0 0
gyrA S83L - ++ - - - 0
D87Y 0 ++ - - 0 +++
D516V 0 ++ -
rpoB R529H ++ + -
H526D - ++ 0
B
Alta Densidade rpsL rpoB
K43R K88E K88R D516V R529H H526D
D87G ++ - - - ++ 0
gyrA S83L ++ ++ - - ++ -
D87Y ++ ++ 0 ++ ++ +++
D516V 0 ++ 0
rpoB R529H ++ 0 +
H526D - + -
C
Perfis comuns rpsL rpoB
K43R K88E K88R D516V R529H H526D
D87G +++/++ - - 0
gyrA S83L ++ - -
D87Y ++ +++
D516V 0 ++
rpoB R529H ++
H526D - ++/+
D
Baixa
Densidade
Alta
Densidade
0 8 5
+ 1 2
++ 5 11
+++ 2 1
- 11 8
0 Ausência de epistasia
+ Epistasia positiva (magnitude)
++ Epistasia positiva de sinal parcial
+++ Epistasia positiva de sinal recíproca
- Epistasia negativa
Figura 6 – Perfis de epistasia de cada combinação alélica após as competições de 3 horas. (A) Perfis de
epistasia nas competições em baixa densidade. (B) Perfis de epistasia nas competições em alta
densidade. (C) Visualização das combinações alélicas com perfis comuns nas duas competições. (D)
Quadro resumo do tipo e número de interacções epistáticas verificadas em baixa e em alta densidade.
24
Na figura 6, verificou-se que algumas interacções epistáticas são específicas ao nível do
alelo, mantendo-se semelhantes em baixa e em alta densidade. Por exemplo, os mutantes com
o alelo rpsL K88E são, na sua maioria, casos de epistasia positiva em ambas as densidades,
enquanto que o alelo rpsL K88R tem predominância de epistasia negativa, não apresentando
nenhum caso de epistasia positiva em baixa densidade e tendo apenas um caso de epistasia
positiva em alta densidade. Na maioria dos casos, no entanto, os perfis não apresentam
interacções epistáticas específicas ao nível do alelo que sejam semelhantes nas duas
densidades. Dando um exemplo, os alelos gyrA D87Y e rpoB R529H têm uma alta proporção de
epistasia positiva em alta densidade (89%), o que poderia indica que as suas interacções têm
tendência para ser antagonistas, mas a proporção de epistasia positiva é, em ambos os casos,
metade em baixa densidade (44%). Deste modo, algumas interacções específicas do alelo em
alta densidade deixam de o ser a baixa densidade.
Esta situação também pode ser abordada ao nível dos valores de epistasia. Considerando-
se como valores médios positivos ou negativos aqueles que distam do valor 0 mais do que o
seu erro padrão, 5 dos 9 alelos (gyrA D87Y, rpsL K43R, rpsL K88E, rpoB R529H e rpoB D516V)
apresentam valores médios de epistasia positivos em alta densidade. No entanto, em baixa
densidade apenas o alelo K88E mantém níveis elevados de epistasia positiva. Os alelos gyrA
S83L e rpsL K88R apresentam valores médios de epistasia claramente negativos em baixa
densidade. Em alta densidade, ambos têm um valor médio de epistasia considerado como não
significativo (apesar de rpsL K88R apresentar um valor médio com sinal negativo). Estes dados,
expostos na figura 7, para além de corroborarem que um alelo pode ter tendência para um
determinado tipo de interacção epistática, indicam também que esta tendência pode ser
sensível a uma mudança de ambiente. Ainda assim, os altos valores do erro padrão indicam
que a epistasia tem uma variação considerável ao nível das combinações individuais de alelos.
Ao nível das combinações, os mutantes rpsL K43R/ gyrA S83L, rpoB R529H/ rpsL K88R, rpoB
R529H/ gyrA S83L e rpoB D516V/ gyrA D87Y destacam-se por serem casos de clara variação de
epistasia, uma vez que apresentaram epistasia negativa em baixa densidade e epistasia
positiva em alta densidade. Não se observou nenhum caso de epistasia positiva em baixa
densidade que apresentasse epistasia negativa em alta densidade. Curiosamente, verificou-se
que as 5 combinações em alta densidade e a única combinação em baixa densidade entre
mutações com fitness superior a 1 apresentaram epistasia negativa.
25
Figura 7 – Valores de epistasia média para cada alelo em baixa e em alta densidade bacteriana. As
barras de erro correspondem a ± o erro padrão. Verifica-se uma maior incidência de epistasia média
positiva em alta densidade. O alto valor do erro reflecte a variação da epistasia consoante as
combinações alélicas.
III. 6. Os valores de epistasia variam com o custo das mutações
Num estudo envolvendo a previsão de estruturas secundárias de ácidos ribonucleicos (em
inglês ribonucleic acid - RNA) e a utilização de organismos digitais replicantes in silico, Wilke e
Adami (2001) propuseram que a pressão selectiva para diminuir os custos de uma mutação
actua também de modo a diminuir interacções epistáticas antagonistas, havendo um trade-off
entre o decaimento do custo e a epistasia antagonista (Wilke & Adami, 2001). Em termos
práticos, este cenário implica uma correlação positiva entre o custo de uma mutação e a
epistasia positiva. De modo a verificar se esta relação entre a epistasia e o custo das mutações
se verifica nas competições efectuadas, fez-se a regressão linear dos valores de epistasia
média em função do custo dos mutantes simples para ambas as densidades bacterianas
(figuras 8A e 8B). Verificou-se que a epistasia tem tendência a aumentar com o custo dos
alelos, quer em baixa (r=0,71, p=0,032, correlação de Pearson) quer em alta densidade
(r=0,673, p=0,047, correlação de Pearson). Deste modo, estes dados corroboram o estudo
referido e indicam que a epistasia beneficia mais os mutantes com maior custo, contribuindo
para a sua sobrevivência. Por outro lado, indicam também que esta tendência ocorre, quer em
baixa, quer em alta densidade.
-0,15
-0,1
-0,05
0
0,05
0,1
0,15
Epis
tasi
a M
éd
ia
Alelo
Baixa Densidade
Alta Densidade
26
De seguida, para verificar se havia um efeito do custo de uma mutação sobre a magnitude
da epistasia, fez-se a regressão linear da epistasia média absoluta de cada mutação em função
do custo dos mutantes simples. Embora as regressões para ambas as densidades bacterianas
reflictam um crescimento da epistasia média absoluta a acompanhar o crescimento do custo, o
declive é significativo apenas na condição de alta densidade (r=0,77, p=0,015, correlação de
Pearson). O declive em baixa densidade é menos acentuado, o que, a par de uma maior
dispersão dos valores, poderá justificar a ausência de significância estatística (r=0,514,
p=0,157, correlação de Pearson). De notar também que em ambas as condições, os valores
absolutos de epistasia não intersectam a origem (p=2,9x10-6 para baixa densidade; p=1,5x10-7
para alta densidade), o que reflecte a existência de epistasia, mesmo que num menor grau, em
mutações com custo reduzido ou inexistente. Não há diferenças significativas entre a epistasia
média em baixa densidade relativamente a alta densidade (p=0,238, teste T variáveis
independentes) nem entre o módulo da epistasia média em baixa densidade relativamente a
alta densidade (p=0,432, teste T variáveis independentes).
27
A B
C D
Figura 8 – Evidência do efeito do custo de fitness das mutações sobre a epistasia. (A) Efeito do
custo sobre a epistasia média de cada alelo em baixa densidade bacteriana. (B) Efeito do custo
sobre a epistasia média em alta densidade. O valor de epistasia média aumenta com o custo da
mutação quer em baixa (p=0,032, correlação de Pearson) quer em alta densidade (p=0,047,
correlação de Pearson). (C) Relação entre o custo e a epistasia média absoluta em baixa densidade.
(D) Relação entre o custo e a epistasia média absoluta em alta densidade. Em ambas as
densidades, o módulo de epistasia média tem um valor superior a 0 na ausência de custos origem
(p=2,9x10-6
para baixa densidade; p=1,5x10-7
para alta densidade). Em alta densidade verifica-se
uma correlação positiva entre o módulo da epistasia média e o custo (p=0,015, correlação de
Pearson), algo que não se verifica de modo estatisticamente significativo em baixa densidade
(p=0,157, correlação de Pearson).
y = 0,1616x - 0,0143 R² = 0,5057
-0,1
-0,08
-0,06
-0,04
-0,02
0
0,02
0,04
0,06
0,08
0,1
-0,2 0 0,2 0,4 0,6
Epis
tasi
a M
éd
ia
Custo
y = 0,1441x + 0,0123 R² = 0,4535
-0,04
-0,02
0
0,02
0,04
0,06
0,08
0,1
-0,2 0 0,2 0,4 0,6
Epis
tasi
a M
éd
ia
Custo
y = 0,0382x + 0,0662 R² = 0,2643
0
0,02
0,04
0,06
0,08
0,1
0,12
-0,2 0 0,2 0,4 0,6
Epis
tasi
a M
éd
ia A
bso
luta
Custo
y = 0,0481x + 0,0608 R² = 0,5916
0
0,02
0,04
0,06
0,08
0,1
-0,2 0 0,2 0,4 0,6
Epis
tasi
a M
éd
ia A
bso
luta
Custo
28
III. 7. Epistasia positiva de sinal em baixa e em alta densidade bacteriana
A epistasia pode ser classificada como sendo de sinal se o efeito das mutações é benéfico
ou deletério consoante o background genético. No âmbito desta experiência, a epistasia de
sinal ocorre quando um mutante com duas mutações de resistência apresenta um fitness
maior que pelo menos um dos mutantes simples para as mesmas mutações de resistência.
Assim, compararam-se os valores de epistasia dos mutantes com epistasia significativamente
positiva com os valores de fitness dos mutantes simples respectivos. Os casos de epistasia
positiva de sinal verificados em baixa e em alta densidade encontram-se representados nas
figuras 9A e 9B, respectivamente.
Verificou-se um maior número de casos de epistasia positiva de sinal em alta densidade do
que em baixa densidade (12 contra 7). Curiosamente, entre os casos de epistasia positiva, a
incidência de epistasia de sinal é muito alta e muito semelhante para ambas as densidades –
88% (7/8) em baixa densidade, 86% (12/14) em alta densidade (figura 6A). Isto significa que
nestas competições de 3 horas, uma segunda mutação de resistência com efeitos antagónicos
tem uma probabilidade muito alta de ter um efeito positivo no fitness na presença de uma
primeira mutação. Esta situação pode promover a aquisição e manutenção de mutações de
resistência.
Entre os casos de epistasia positiva foram detectados 2 casos de epistasia positiva de sinal
recíproca em baixa densidade e 1 em alta densidade. Estas combinações epistáticas são as que
mais facilmente promovem resistência. Apesar de se registar a existência destes casos nestes
mutantes, a sua frequência é baixa, o que sugere que a sua ocorrência é rara.
29
A
B
Figura 9 – Casos de epistasia positiva de sinal entre alelos que conferem resistência em baixa (A) e em
alta densidade bacteriana (B). Na presença de epistasia de sinal, os mutantes duplos apresentam um
fitness superior a pelo menos um dos mutantes simples com os alelos respectivos. Caso apresentem um
fitness superior a ambos, são considerados um caso de epistasia positiva de sinal recíproca. As barras de
erro correspondem a 2 vezes ± o erro padrão.
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
0,9
1
1,1
Fitn
ess
ob
serv
ado
b
aixa
de
nsi
dad
e
Genótipo
Mutante Simples 1
Mutante Simples 2
Mutantes Duplos
0,4
0,5
0,6
0,7
0,8
0,9
1
1,1
Fitn
ess
ob
serv
ado
al
ta d
en
sid
ade
Genótipo
Mutante Simples 1
Mutante Simples 2
Mutantes Duplos
30
IV. DISCUSSÃO
IV. 1. A sensibilidade da epistasia à VDC
O objectivo desta tese foi verificar se a vantagem no crescimento dependente do contacto
(VDC) pode influenciar as relações epistáticas entre mutações que conferem resistência a
antibióticos e identificar tendências dessa variação. Estudos anteriores em E. coli, através da
manipulação do ambiente nutricional (Remold & Lenski, 2004) e em Pseudomonas aeruginosa,
através da presença ou ausência de antibióticos no meio (Ward et al., 2009) demonstraram a
dependência da epistasia da variação de condições ambientais em bactérias, evidenciando que
a epistasia está sujeita a plasticidade fenotípica. Foram observados diversos exemplos na
natureza de plasticidade fenotípica em resposta a factores bióticos, como a presença ou a
acção de predadores, competidores e conspecíficos (Miner et al., 2005) ou como a existência
de interacções mutualistas (Agrawal, 2001). Esta constatação levou à formulação da hipótese
de que as interacções genéticas poderiam exibir plasticidade relativamente a interacções
bióticas, como a VDC.
Os nossos resultados indicam que 48% das combinações sofreram variações no perfil de
epistasia com a variação da densidade. Estes resultados mostram que as interacções genéticas
são variáveis consoante o contexto em que o organismo se encontra, o que vai de encontro
com as observações feitas em vários estudos (Remold 2004, Ward 2009, Elena 2012).
Confirmam também que, em bactérias, a variação da epistasia pode depender de interacções
bióticas. Tendo em conta a diversidade verificada ao nível das interacções bióticas entre
bactérias e à multitude de funções que podem ter, esta constatação aponta para a
possibilidade de a epistasia poder estar sujeita a inúmeras situações ecológicas que afectem a
sua plasticidade, e assim, o seu efeito.
IV. 1.1. A densidade bacteriana e a ocorrência de epistasia positiva
Nas combinações estudadas observaram-se vários casos de epistasia positiva, tendo-se
verificado um número maior de casos de epistasia positiva em alta densidade (≈52%) do que
em baixa densidade (≈30%), tendo-se consequentemente observado um menor número de
combinações com ausência de epistasia e com epistasia negativa na primeira condição. Por
outro lado, a comparação de custos entre mutantes simples e duplos, o valor da mediana da
31
distribuição da epistasia e a comparação entre o fitness esperado e observado indicaram a
existência de uma tendência para a epistasia positiva em alta densidade, mas não em baixa
densidade. Estes dados em conjunto indicam que, para as combinações alélicas estudadas, no
início do crescimento, é mais frequente os custos serem compensados através das interacções
genéticas em alta densidade do que em baixa densidade, o que promove uma maior
capacidade competitiva por parte de mutantes multirresistentes na primeira condição.
Os genes estudados, gyrA, rpoB e rpsL estão envolvidos, respetivamente, nos processos de
replicação (Nollmann et al., 2007), de transcrição (Zhou et al., 2013) e de tradução (Toivonen
et al., 1999). Um estudo in silico sobre as redes metabólicas de E. coli e de Sacharomyces
cerevisiae indica que os genes envolvidos em reacções essenciais interagem de modo
antagonista (He et al., 2010). A maior presença de epistasia positiva entre estes genes em alta
densidade sugere que a sua importância para as bactérias é maior nesse contexto.
Com a devida ressalva de se estar a subestimar as suas funções, pode-se considerar os
processos de replicação, transcrição e tradução como fazendo parte do mesmo processo
metabólico de construção de macromoléculas tendo em vista a divisão celular. Nesta
perspectiva, os dados obtidos indicam que, em alta densidade, condição na qual este processo
é promovido mais cedo, mutações deletérias que interfiram com o seu funcionamento têm
uma tendência mais antagonista. Segrè et al (2005), através de um estudo de epistasia
envolvendo o knockout in silico de genes metabólicos, sugeriram que mutações que afectem a
mesma via metabólica de modo a limitar o seu rendimento podem ter efeitos deletérios
redundantes e, deste modo, tendência a ter epistasia positiva (Segre et al., 2005). Estes efeitos
deletérios fazem-se sentir mais quando a via está mais activa. Deste modo, uma possível
explicação para a tendência mais positiva das interacções epistáticas em alta densidade pode
ser a sua relevância no crescimento, que em alta densidade ocorre mais depressa. Este facto é
demonstrado pelo maior número de gerações dos mutantes em alta densidade relativamente
ao número de gerações em baixa densidade.
IV. 1.2. A prevalência da epistasia positiva de sinal em baixa e em alta densidade
bacteriana
Entre os eventos de epistasia positiva observados, 88% (7/8) dos casos em baixa densidade
e 86% (12/14) dos casos em alta densidade foram de epistasia de sinal. Esta incidência é muito
alta e indica que, na fase lag e no início da fase de crescimento exponencial, a epistasia com
32
efeitos antagónicos entre mutações deletérias tem uma tendência elevada para ter efeitos
benéficos para o fitness.
Este facto tem implicações importantes, porque nestes casos, o custo de ter duas mutações
que conferem resistência é menor do que o custo de ter uma destas mutações. Deste modo,
uma mutação de resistência deletéria tem uma probabilidade elevada de se tornar benéfica na
presença de outra mutação de resistência no contexto do início da fase de crescimento
exponencial. É de destacar que este efeito é independente da densidade bacteriana (uma vez
que, como foi visto, a elevada incidência de epistasia positiva de sinal acontece, quer em baixa,
quer em alta densidade), pelo que a compensação ou não de uma mutação deletéria não
depende de uma antecipação desta fase. Deste modo, este efeito benéfico ocorre, quer na
presença, quer na ausência de VDC.
Para além da vantagem imediata que confere a estirpes multirresistentes, a epistasia
positiva de sinal tem implicações evolutivas importantes para a sua manutenção. A epistasia
de sinal pode restringir a adaptação ao limitar o número de mutações capazes de aumentar o
fitness. (Weinreich et al., 2005, Carneiro & Hartl, 2010). Considerando um mutante
multirresistente, algumas reversões de mutações de resistência implicam uma diminuição do
fitness, pelo que a selecção não as favorece. Consequentemente, o mutante poderá aumentar
o seu fitness através de mutações compensatórias adicionais, mas não através destas
reversões, pelo que estas correspondem a “caminhos” evolutivos praticamente fechados.
Deste modo, a epistasia positiva de sinal promove a acumulação de mutações de resistência.
Por outro lado também restringe caminhos evolutivos que poderiam culminar num genótipo
com maior fitness do que a combinação multirresistente, sendo a principal solução para esta
situação a recombinação ((Weinreich et al., 2005).
Nos nossos dados verificou-se um maior número de casos de epistasia positiva de sinal em
alta densidade do que em baixa densidade. Isto indica que, através da variação da densidade,
mutantes com relações epistáticas benéficas entre as mutações podem, num contexto
ambiental diferente, ter um custo derivado da multirresistência. Esta constatação é
importante, porque indica que, pelo menos em alguns casos, o favorecimento da
multirresistência pela epistasia é reversível sem ser necessário recorrer à recombinação.
Num ambiente A para o qual uma combinação alélica seja vantajosa, a selecção actua no
sentido de manter essa combinação. Num ambiente B para o qual a combinação seja deletéria,
a selecção favorece reversões, pelo que os mutantes têm menos constrangimentos e podem
formar novas combinações alélicas. Entre estas, poderão estar combinações que sejam mais
33
vantajosas no ambiente A do que a combinação inicial, pelo que a reversibilidade da epistasia
de sinal abre “caminhos” evolutivos, favorecendo a evolução em direcção a genótipos de
maior fitness. Uma vez que pode promover reversões, a reversibilidade da epistasia positiva de
sinal é uma boa notícia para o problema da multirresistência a curto prazo. Por outro lado, a
longo prazo pode permitir a exploração de genótipos de maior fitness, entre os quais poderá
estar uma nova combinação entre alelos determinantes de resistência. Deste modo, a
reversibilidade da epistasia de sinal complexifica o seu papel na manutenção de estirpes
multirresistentes.
É ainda de notar a existência de dois casos de epistasia de sinal recíproca em baixa
densidade e um caso em alta densidade. Nestas situações, o custo de possuir dois
determinantes de resistência é menor do que o custo de possuir apenas um deles, pelo que o
constrangimento evolutivo é maior, e consequentemente, a promoção de estirpes
multirresistentes é ainda maior. No entanto, o reduzido número de casos observado indica
que a incidência de epistasia positiva de sinal recíproca na fase de crescimento é rara, o que
reflecte a sua baixa ocorrência observada noutros estudos (Carneiro & Hartl, 2010).
IV. 1.3. A relação entre a epistasia e o custo das mutações
Os nossos dados evidenciam uma maior incidência de epistasia positiva em mutantes com
maior custo e uma correlação positiva entre a epistasia média e o custo das mutações. Isto
indica que a epistasia tende a ser mais antagonista à medida que o custo aumenta. Estes dados
vão ao encontro da previsão de um trade-off entre o decaimento do custo e a epistasia
antagonista feita por Wilke e Adami (2001). Deste modo, mutações mais deletérias sofrem
compensações maiores, o que contribui para a sua manutenção na natureza.
Quer em alta quer em baixa densidade, o valor do módulo de epistasia previsto na ausência
de custo é positivo. A par do erro elevado observado na análise dos valores de epistasia média
de cada alelo, esta constatação indica que apesar da tendência da epistasia se aproximar da
neutralidade à medida que o custo diminui, continua a haver valores díspares de epistasia para
algumas das combinações de mutações, o que evidencia que, mesmo na ausência de custos, a
epistasia continua a depender das relações entre alelos individuais. Os nossos dados indicam
ainda que o módulo da epistasia média em alta densidade, mas não em baixa densidade, varia
com o custo das mutações. Esta variação em alta densidade poderá ser o reflexo da maior
34
força da epistasia antagonista para custos mais altos, que, devido a uma menor incidência em
baixa densidade, não tem um peso tão forte sobre a intensidade média da epistasia.
IV. 2. A ausência de custo das mutações e o melhoramento condicional do fitness
Nestas competições de 3 horas, vários alelos não implicam um fitness inferior ao wild-type,
e em alguns casos em ambas as densidades, apresentam mesmo um fitness superior. Tendo
em conta que em competições de 24 horas com uma densidade inicial intermédia nenhum
destes mutantes simples apresentou um fitness superior ao do wild-type (Trindade et al 2009),
este facto é surpreendente e indica que algumas mutações de resistência podem, em
competições de 3 horas, trazer um benefício em vez do custo observado em competições de
24 horas. De facto, é possível que os efeitos deletérios destas mutações apenas se façam sentir
na fase estacionária. Deste modo, trata-se de um caso de melhoramento condicional do fitness
(Weinreich et al., 2005), através do qual uma mutação de resistência é condicionalmente
benéfica quando a bactéria se encontra no início da fase exponencial.
Já foram descritos vários casos de melhoramento condicional do fitness (Weinreich et al.,
2005), entre os quais um caso em mutantes resistentes à streptomicina em Salmonella
typhymurium, que têm vantagem relativamente ao wild-type em ambiente pobres em fontes
de carbono por serem incapazes de induzir o factor sigma RpoS, regulador da fase estacionária
(Paulander et al, 2009). Estes casos indicam a importância de se medir os custos das mutações
de resistência em condições diferentes de modo a obter uma estimativa relevante do fitness
em cada situação e a definir em que situações os efeitos das mutações no fitness implicam,
efectivamente, uma desvantagem para a bactéria.
Em 12 das 27 combinações observadas, quer em baixa quer em alta densidade, 10 das
quais comuns nas duas condições, não se observou um fitness significativamente inferior ao
wild-type. Este facto é relevante, porque indica que para estas combinações, no início da fase
de crescimento, a multirresistência não implica um custo. Deste modo, em várias situações, o
custo baixo ou inexistente verificado entre os mutantes simples não implicou a presença de
um custo nos mutantes multirresistentes. O número de combinações sem custo é superior e
inclui, em ambas as densidades, as 3 combinações observadas por Trindade et al (2009) para
os mesmos mutantes. Isto sugere que, como no caso das mutantes simples, alguns custos
inerentes à resistência a antibióticos para os mutantes multirresistentes só se deveram
manifestar na fase estacionária.
35
Para as combinações entre mutações simples condicionalmente benéficas, uma questão
formal que se pode colocar é se alguns dos casos observados de epistasia não deveriam ser
considerados como casos de epistasia entre mutações benéficas. Apesar de, por um lado,
todas as mutações simples terem efeitos deletérios no prolongamento da competição e por
outro, as vantagens observadas não serem elevadas, formalmente e para estas competições
em concreto, aceita-se que possam ser interpretadas como tal. Curiosamente, todas as
combinações entre mutações com efeitos benéficos apresentaram epistasia negativa quando
tratadas como deletérias (e portanto, positiva quando tratadas como benéficas), pelo que,
para todos os casos observados, a tendência epistática entre mutações quando ambas dão um
benefício são no sentido de diminuir o fitness. Esta tendência foi igualmente observada em
mutações benéficas à adaptação noutros estudos, quer em P. aeruginosa (MacLean et al.,
2010) quer em Methylobacterium extorquens (Chou et al., 2011) quer mesmo em E. coli (Khan
et al., 2011), e indica que a epistasia pode ter uma acção de diminuição da taxa de adaptação.
No caso particular das mutações de resistência, este facto é positivo, porque indica que numa
estirpe multirresistente, o aparecimento de uma mutação muito benéfica não terá um impacto
tão grande na sua capacidade competitiva como seria de esperar na ausência de interacções
com o seu background genético.
Observou-se também que alelos que possuem mutações muito deletérias não são capazes
de compensar totalmente o seu custo com uma só mutação adicional, o que indica que a
maior vantagem de a epistasia ser mais positiva para os mutantes de maior custo pode ser
permitir que subsistam mais tempo, até que este custo possa ser compensado várias vezes.
Esta hipótese é reforçada por um estudo baseado na literatura disponível que estima que há,
em média, 11,8 mutações compensatórias por cada mutação deletéria ((Poon et al., 2005).
Tendo em conta que a epistasia depende da história evolutiva (Angst & Hall, 2013), é possível
que as mutações que não apresentaram efeitos deletérios estejam a ser compensadas pelo
background genético da estirpe E. coli K12.
IV. 3. O papel da VDC na manutenção da diversidade e da resistência a antibióticos
O fenómeno de VDC foi descoberto recentemente e pouco se sabe sobre o modo como
actua. Para além de depender da densidade, Nunes (2012) demonstrou que a VDC pode ser
activada através do contacto com células em estado de latência, que não se trata de quorum-
sensing, que o seu efeito no crescimento passa por antecipar a saída da fase lag para a fase
36
exponencial do crescimento. Apesar de ser claro que a VDC pode favorecer estirpes em
raridade quando estas se encontram em alta densidade e facilitar a invasão de certos habitats,
até agora não havia evidência de como poderia afectar as diferentes estirpes que a possuem
consoante a sua capacidade competitiva.
Este trabalho demonstra que a VDC promove de modo semelhante o número de gerações
de estirpes resistentes a antibióticos independentemente do seu número de gerações a baixa
densidade. Deste modo, qualquer estirpe que active a VDC pode receber um benefício sólido
no seu crescimento quando em alta densidade. Estando a vantagem presente, é intuitivo
pensar que tenha um papel mais importante na manutenção das estirpes com uma menor
capacidade competitiva.
De facto, os nossos resultados indicam que a VDC promove um maior fitness a alta
densidade e que a vantagem competitiva conferida relativamente à estirpe de referência vai
decrescendo à medida que o custo das mutações também decresce. Deste modo, como
esperado, a vantagem competitiva devida à VDC é maior para mutantes com fitness menor.
O fenómeno de VDC, ao conferir uma vantagem maior ao nível do fitness para os mutantes
com maior custo, torna-os mais difíceis de eliminar na natureza, actuando no sentido da
manutenção da diversidade. Deste modo, é igualmente capaz de promover a manutenção de
estirpes resistentes a antibióticos. Se a mutação cromossómica ou elemento móvel
responsável pela resistência implicar um custo, a estirpe em questão terá maiores
possibilidades de sobreviver até sofrer mutações compensatórias que diminuam ou eliminem
o custo ou até a comunidade bacteriana sofrer uma pressão selectiva para a qual os genes de
resistência sejam uma mais-valia.
Observou-se que a VDC teve um efeito no fitness significativo para os duplos mutantes mas
não para os mutantes simples. Este resultado é explicado pelo facto de os mutantes simples
terem um fitness médio mais alto do que os mutantes duplos, não conseguindo obter uma
vantagem competitiva tão alta quando a competir com a estirpe de referência. Este resultado
é importante porque demonstra empiricamente que a VDC pode ter um papel na manutenção
da multirresistência. Nos casos em que a multirresistência implique um custo, os mutantes
multirresistentes têm um benefício maior com a activação da VDC do que os competidores
susceptíveis que tenham maior fitness, permitindo a sua manutenção na população.
Cruzando os efeitos da VDC com os dados anteriormente expostos conclui-se que a
manutenção de estirpes multirresistentes em alta densidade pode resultar de vários factores.
37
Verificou-se que nas competições de 3 horas efectuadas, a multirresistência pode não ter um
custo. Neste caso, o mutante está apto para competir com o wild-type até que o ambiente
ecológico sofra alterações. Se um mutante multirresistente tiver dois ou mais determinantes
de resistência dos quais resulte um custo, a maior presença de epistasia positiva em alta
densidade, associada à elevada probabilidade de esta epistasia ser de sinal torna possível a
compensação do custo de multirresistência. Caso o mutante multirresistente tenha um custo
menor relativamente aos seus competidores, em alta densidade, o efeito da VDC poderá
diminuir a diferença entre a capacidade competitiva do mutante multirresistente
relativamente aos seus competidores mais fortes. Deste modo, a acção das mutações
condicionalmente sem custo ou condicionalmente benéficas, da epistasia positiva de sinal e da
VDC podem ser complementares na manutenção de estirpes resistentes.
IV. 4. Conclusões e perspectivas futuras
Este trabalho demonstrou que a densidade bacteriana pode influenciar, quer o fitness de
mutantes resistentes a antibióticos, quer as relações epistáticas entre combinações alélicas
que conferem resistência. Esta influência está associada a um fenómeno de vantagem de
crescimento em alta densidade devida ao mecanismo de VDC, recentemente descoberto
(Nunes, 2012). Para além disto, os nossos resultados indicam que na fase de crescimento
exponencial a manutenção da multirresistência pode ser promovida não só pela VDC como
também pela ocorrência de mutações condicionalmente sem custo e por uma alta prevalência
de epistasia positiva de sinal.
Não se sabe muito sobre o fenómeno de VDC. Apesar de se ter uma ideia concreta sobre o
seu efeito, a identificação dos seus mecanismos fisiológicos e moleculares seria essencial para
a compreensão do seu modo de activação e actuação, bem como da extensão das suas
consequências. Também seria importante fazer um screening mais aprofundado da sua
ocorrência no mundo microbiano de modo a se ter noção da sua verdadeira distribuição.
Para os genes estudados, verificou-se uma maior incidência de epistasia positiva entre as
mutações que conferem resistência em alta densidade. Os genes estudados têm papéis
essenciais em processos importantes para a fase de crescimento exponencial. Embora a
abordagem com antibióticos fosse limitada, seria interessante estudar a existência ou ausência
e qual a tendência da variação de interacções epistáticas em genes que não são fundamentais
38
para esta fase. Uma possibilidade seria a utilização de determinantes de resistência codificados
em elementos móveis, como plasmídeos.
Este estudo é subsequente e utiliza os mutantes gerados no estudo de Trindade et al
(2009), mas centrou-se na problemática do papel da densidade bacteriana na epistasia.
Comparar o fitness e os níveis de epistasia entre competições com a mesma densidade
bacteriana inicial e com duração diferente poderia indicar a existência da variação das relações
epistáticas entre as fases de crescimento. A comparação em vários time-points em particular,
exequível através de protocolos de curvas de crescimento, ajudaria a clarificar a dinâmica pela
qual as relações epistáticas se alteram consoante o ciclo de vida bacteriano.
Em suma, este trabalho demonstra que a variação ambiental, e em particular, a variação
mediada por interacções bióticas pode influenciar relações epistáticas entre mutações de
resistência a antibióticos. A existência de um custo e a relação entre mutações que conferem
resistência têm características complexas e variam facilmente com o contexto ecológico, pelo
que para as bactérias, a presença ou ausência de uma desvantagem na multirresistência
depende do ambiente onde se encontram e de com que outras bactérias se encontram.
39
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43
VI. ANEXOS
Tabela S1 - Número de gerações médio (±2 vezes o erro padrão) dos mutantes em baixa e em alta densidade, teste T de Student emparelhado para a diferença no número de gerações entre as condições e significância. (S – Significativo; NS – Não Significativo; p=0,05)
Mutante Baixa Densidade Alta Densidade Teste T Sig.
D87G 7,23±0,69 6,81±0,17 0,3 NS
S83L 6,69±0,14 8,12±0,08 1,63x10-8 S
D87Y 5,61±0,21 6,36±0,24 0,015 S
K43R 5,69±0,35 6,62±0,081 0,002 S
K88E 3,33±0,35 4,07±0,32 0,11 NS
K88R 6,33±0,23 7,57±0,094 1,1x10-5 S
D516V 6,79±0,18 7,21±0,22 9,35x10-3 S
R529H 3,8±0,53 4,36±0,28 0,19 NS
H526D 5,95±0,17 6,62±0,13 8,51x10-6 S
K88E-D87G 3,2±0,38 3,63±0,14 0,16 NS
R529H-D87G 3,58±0,55 5,26±0,33 8,4x10-3 S
K88E-R529H 2,46±0,26 2,52±0,45 0,75 NS
R529H-S83L 3,51±0,43 4,41±0,55 0,03 S
K43R-H526D 4,65±0,37 5,75±0,45 0,014 S
D516V-K43R 6,43±0,31 6,61±0,31 0,55 NS
K88R-D516V 5,13±0,38 6,63±0,19 5,8x10-3 S
K88R-H526D 6,22±0,27 6,58±0,11 0,047 S
K88R-D87Y 6,23±0,40 7,27±0,11 4,6x10-3 S
K43R-D87Y 6,02±0,62 7,15±0,42 0,054 NS
K88R-S83L 5,72±0,22 6,53±0,22 2,8x10-3 S
K88E-S87L 3,64±0,22 4,68±0,16 2,1x10-3 S
K88E-D87Y 3,53±0,34 4,67±0,40 0,18 NS
K43R-D87G 5,29±0,14 5,82±0,17 4,5x10-3 S
H526D-D87G 5,34±0,067 5,97±0,32 0,04 S
H526D-D87Y 6,22±0,22 6,54±0,40 0,015 S
H526D-S83L 4,9±0,23 6,11±0,18 8,4x10-3 S
R529H-K43R 4,67±0,50 4,61±0,16 0,806 NS
R529H-D87Y 3,51±0,28 4,26±0,22 0,031 S
D516V–D87G 6,16±0,14 7,07±0,15 1,6x10-3 S
D516V-S83L 5,17±0,33 5,82±0,26 0,032 S
D516V-D87Y 6,08±0,32 7,17±0,20 0,011 S
K88R-D87G 5,66±0,19 6,73±0,12 5,16x10-5 S
R529H-K88R 3,74±0,50 4,06±0,20 0,37 NS
K88E-D516V 4,79±0,25 5,38±0,21 0,025 S
K43R-S83L 5,67±0,11 5,83±0,60 0,56 NS
K88E-H526D 3,2±0,12 4,3±0,082 3,86x10-5 S
44
Tabela S2 – Genótipo das mutações simples de resistência e impacto no fitness em competições de 3 horas em baixa e em alta densidade bacteriana. Os valores positivos indicam que a mutação conferiu um custo para o fitness, enquanto que os valores negativos indicam que a mutação conferiu um benefício. É indicado entre parêntesis o valor de duas vezes o erro padrão. É indicado o gene, a substituição nucleotídica e a mudança de aminoácido correspondente.
Gene Genótipo - mudança de
aminoácido; substituição nucleotídicas
%(2x EP) Custo a baixa densidade
% (2x EP) Custo a alta densidade
gyrA D 87 G ; GAC para GGC 4,1 (3,1) -2,5(1,8)
gyrA S 83 L; TCG para TTG -4,0 (2,6) -2,8(1,4)
gyrA D 87 Y; GAC para TAC 0,19 (2,0) 1,8(2,9)
rpsL K 43 R; AAA para AGA 3,4 (1,1) 3,7(1,5)
rpsL K 88 E; AAA para GAA 48,0 (5,3) 39,0(5,0)
rpsL K 88 R; AAA para AGA -0,85 (3,6) -2,6(1,1)
rpoB D 516 V; GAC para GTC -5,2 (2,5) -1,8(1,1)
rpoB R 529 H; CGT para CAT 36,4 (5,7) 42,4(3,3)
rpoB H 526 D; CAC para GAC 6,2 (2,3) 4,0 (1,4)
Tabela S3 - Comparação do fitness dos mutantes relativamente ao wild-type. As células vazias correspondem a combinações com fitness significativamente menor que o wild-type em ambas as densidades. As células com uma barra ao centro apresentam à esquerda da barra a comparação da combinação em baixa densidade e à direita da barra a comparação da combinação em alta densidade. A ausência de um símbolo indica fitness significativamente inferior ao wild-type, “1” indica fitness não significativamente diferente e” +” indica fitness significativamente superior.
rpsL
rpoB
K43R K88E K88R D516V R529H H526D
D87G 1|+
1|1
gyrA S83L 1|1
|1 1|1
1|
D87Y 1|1
1|1 1|1
+|+
D516V 1|1
1|1
rpoB R529H
-
H526D |1
1|