influência da temperatura e tempo de tratamento térmico no
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INFLUÊNCIA DA TEMPERATURA E TEMPO DE TRATAMENTO TÉRMICO NO CRESCIMENTO E TRANSIÇÃO DE FASE DE NANOCRISTAIS DE TITÂNIA
EMBEBIDOS EM MATRIZ DE SÍLICA AMORFA
T. Manfrim, E. Ono, E. Fujiwara, M. Santos, M. Boery, J. Santos, C. Suzuki
Universidade Estadual de Campinas - UNICAMP, Departamento de Materiais,
Laboratório de Materiais e Dispositivos Fotônicos
Foi estudada a estabilidade térmica de nanocristais de TiO2 (~15 nm) embebidos em
nanopartícula de sílica amorfa (matriz), visando sua aplicação na fotocatálise em
altas temperaturas. Amostras de SiO2/TiO2 foram sintetizadas por método hidrólise
em chama de H2-O2. A evolução estrutural dos nanocristais (transformação de fase
anatásio-rutilo e taxa de crescimento) foi investigada em função da temperatura
(500-1400ºC) e tempo de tratamento térmico (2-48 horas). Pós com e sem
tratamento térmico foram caracterizados por DRX, MEV e FRX. Nós observamos
que a matriz atuou como forte inibidora ao crescimento e transição de fase dos
nanocristais suportados, mesmo para longos períodos de tratamento em altas
temperaturas, sendo estimado o tamanho final e tempo necessário para a
estabilidade do crescimento dos nanocristais para dada temperatura e concentração
de TiO2. Foi observado que mesmo para temperaturas de ~1050ºC e t=48 horas,
nanocristais de TiO2 não ultrapassaram 30 nm, mantendo estável a fase anatásio.
Palavras-chave: sílica-titânia, transição de fase, nanopartículas de TiO2, hidrólise em
chama.
INTRODUÇÃO
O dióxido de titânio (titânia, TiO2) tem sido alvo de grande interesse científico e
tecnológico, sendo empregado em uma vasta gama de aplicações tecnológicas,
como células solares(1), sensores de umidade(2) e fotocatálise(3). Especificamente no
caso da fotocatálise, sabe-se que a estrutura anatásio apresenta maior atividade
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catalítica que as outras(4). Além disso, outro fator importante relacionado com o
poder catalítico da titânia é o tamanho do nanocristal, sendo que a eficiência é
melhorada quanto menor for o tamanho, isto devido ao aumento da área superficial
específica(5). Contudo, a exposição deste material a temperaturas elevadas induz o
crescimento dos nanocristais e sua transição de fase (anatásio→rutilo)(6),
prejudicando, assim, o seu potencial catalítico. Uma alternativa para estabilizar tanto
a fase anatásio quanto o tamanho dos nanocristais é a incorporação de “impurezas”
catiônicas(7,8) de valência maior ou igual a 4+, por exemplo o Si4+, as quais causam
um retardo no processo de transição e crescimento devido à formação intersticial de
cátions do tipo Ti3+, responsável por suprimir o transporte atômico na estrutura
anatásio(9). Neste contexto, o presente trabalho propõe o estudo do efeito da temperatura e
do tempo de tratamento térmico sobre a transição de fase anatásio-rutilo (a→r), taxa
de crescimento dos cristalitos de TiO2 e morfologia da matriz de sílica para amostras
do sistema binário SiO2-TiO2 sintetizadas através da técnica de hidrólise em chama.
MATERIAIS E MÉTODOS
Neste trabalho, foram preparadas amostras nanoestruturadas do sistema SiO2-
TiO2, contendo 15% (ST15) e 55% (ST55) em massa de TiO2, através da técnica de
hidrólise em chama. Neste método, nanopartículas de SiO2 e TiO2 são sintetizadas
simultaneamente através das reações de hidrólise e oxidação dos seus precursores
SiCl4(v) e TiCl4(v), respectivamente. O aparato experimental utilizado na síntese das
amostras é composto basicamente de um maçarico, conjunto de abastecimento de
gases e de um alvo de sílica para deposição da amostra(10). O maçarico utilizado
possui 6 vias paralelas e foi confeccionado em sílica vítrea. Na primeira via (central)
e segunda via foram injetados os precursores TiCl4(v) e SiCl4(v), respectivamente,
utilizando O2 seco como gás de arraste. Na terceira e quinta via, foi injetado N2(g)
seco para proteção do bocal do maçarico. Por fim, na quarta e sexta vias foram
injetados os gases responsáveis pela chama, H2 e O2, respectivamente. Para a
admissão dos gases foram utilizados controladores de fluxo de massa (MFC).
As amostras foram separadas em partes de 0,5 g e submetidas a diferentes
condições de tratamento térmico sob atmosfera ambiente utilizando um forno
elétrico. Primeiramente, as amostras foram expostas a um tratamento na faixa de
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temperatura entre 500 a 1400ºC por 2 horas (tratamento térmico isócrono).
Subseqüentemente, foram realizados tratamentos térmicos sob temperatura
constante (1050ºC) no intervalo de 2 a 48 horas (tratamento isotérmico).
Para caracterização da estrutura cristalina, tamanho de cristalitos e
quantificação de fases foi utilizada à técnica de Difração de Raios-X (DRX). As
medidas foram realizadas em um difratômetro Rigaku DMax 2200 com radiação de
CuKα e filtro de Ni. A fonte de raios-X foi operada em 40 kV e 20 mA, o ângulo de
difração 2θ foi medido no intervalo de 22-30º, passo angular de 0,01º e tempo por
passo de 4 s. O tamanho médio dos cristalitos foi estimado através da equação de
Scherrer(11) utilizando o alargamento dos picos 100/anatásio e 110/rutilo com
correção do efeito instrumental da largura a meia altura por um monocristal de
quartzo. O cálculo da quantidade percentual das fases cristalinas da titânia
(anatásio/rutilo) foi realizado através da equação proposta por Spurr e Myers(12). O
ajuste dos picos foi feito através do software PeakFit 4®.
Para estudo do efeito do tratamento térmico sobre a morfologia da matriz de
sílica foi empregada a técnica de Microscopia Eletrônica de Varredura (MEV). As
medidas foram conduzidas em um microscópio JEOL JXA-840A com tensão de
aceleração de 25 kV e distância da amostra de 8 mm. As amostras foram
metalizadas com uma fina camada de ouro com espessura da ordem de 30 nm.
Para obtenção da concentração de titânia presente na matriz de sílica foi
utilizada a técnica de Fluorescência de Raios-X (FRX). As medidas foram realizadas
em um espectrômetro Rigaku RIX3100 equipado com um tubo de ródio operando
em 50 kV e 80 mA, e cristal analisador LiF (200). A concentração de titânia foi obtida
através de uma curva de calibração utilizando a linha TiKα.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A Fig. 1 (a) e (b) apresenta os difratogramas de raios-X das amostras ST15 e
ST55, respectivamente, em função do tempo de tratamento térmico. Nas amostras
sem tratamento térmico, somente a fase cristalina anatásio, caracterizada pelo pico
de difração (100) em 2θ=25,7º, pôde ser observada. O tratamento térmico para
ambas as amostras induziu o aparecimento de um pico de baixa intensidade em
2θ=27,5º oriundo da difração dos planos (110), identificado como a fase cristalina
rutilo. Além disso, é possível observar um estreitamento sutil do pico (100) em
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função do tratamento térmico, o qual é atribuído à coalescência e crescimento dos
cristalitos da fase anatásio.
22 24 26 28 30
(110
)
as-cast
2h
4h
10h
32h
48h
Inte
nsid
ade
norm
aliz
ada
(u.a
.)
2θ (graus)
(100
)
22 24 26 28 30
as-cast
2h
4h
10h
16h
Inte
nsid
ade
norm
aliz
ada
(u.a
.)2θ (graus)
(100
)
(110
)
Fig. 1: Difratogramas de raios-X em função do tempo de tratamento térmico a
temperatura constante 1050 ºC para as amostras (a) ST15 e (b) ST55.
As quantidades percentuais da fase rutilo para as amostras em função do
tempo de tratamento isotérmico podem ser observadas na Fig. 2. Devido à baixa
intensidade do pico (110) na amostra ST15, o ajuste da Gaussiana somente foi
possível para tempos de tratamento isotérmico superiores a 16 horas. De acordo
com a literatura, a titânia pura sofre transição de fase completa a→r para tratamento
de 800ºC durante 1 h9. Contudo, em nossas amostras, apesar de observados traços
da fase rutilo, essa estrutura se encontra em baixa quantidade mesmo para longos
períodos de tratamento térmico (1050°C). Além disso, constata-se que menores
concentrações de titânia tendem a retardar a transição de fase a→r .
0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 50 55
0
1
2
3
4
5
6
7
% d
e R
utilo
Tempo (horas) Fig. 2: Fração percentual de transformação a→r em função do tempo de tratamento
térmico para as amostras (●) ST55 e (▲)ST15.
(a) (b)
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O tamanho dos cristalitos de titânia pôde ser estimado em função do tempo de
tratamento isotérmico (1050°C), conforme Fig. 3(a). O crescimento dos cristalitos da
fase anatásio ocorre de forma mais acentuada nas primeiras 10 horas de tratamento
térmico, havendo uma tendência de estabilização para períodos mais longos de
tratamento, na qual o tamanho máximo do cristalito é de aproximadamente 27 e 35
nm para as amostras ST15 e ST55, respectivamente. No entanto, os cristalitos de
rutilo, após sua formação, tendem a continuar o crescimento. No caso de tratamento
térmico isócrono (2 h), ilustrado na Fig. 3(b), o tamanho médio dos cristalitos
manteve-se aproximadamente constante para temperaturas próximas a 1050°C,
sofrendo um crescimento acelerado para temperaturas superiores.
0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 505
10
15
20
25
30
35
40
Tam
anho
do
cris
talit
o (n
m)
Tempo (horas) 400 600 800 1000 1200 1400
10
20
30
40
50
60
70
80
Tam
anho
do
cris
talit
o (n
m)
Temperatura (ºC) Fig. 3: (a) Tamanho médio dos cristalinos em função tempo de tratamento isotérmico
e (b) em função da temperatura de tratamento térmico isócrono. A amostra ST55 (●)
anatásio e (○) rutilo, e amostra ST15 (▲) anatásio, (∆) rutilo.
A Fig. 4 apresenta as micrografias de MEV para a amostra ST15 sob
tratamento isotérmico (1050ºC). De acordo com as micrografias (c) e (d), 16 e 48
horas, respectivamente, o efeito de coalescência e crescimento da matriz são mais
acentuados para tempos maiores de tratamento térmico, sendo que, neste caso o
crescimento da matriz se comporta de forma oposta ao crescimento dos cristalitos
de titânia, uma vez que estes tendem a crescer no estágio inicial do tratamento
térmico, conforme observado na Fig. 3(a). Em contrapartida, na Fig. 5 temos as
micrografias de MEV para a amostra ST15 sob tratamento térmico isócrono (2 h).
Neste caso, a matriz apresentou uma acelerada coalescência para temperatura da
ordem de 1200°C (c), tendo uma sinterização completa a 1400°C (d). O crescimento
da matriz, neste caso, se comporta de forma proporcional ao crescimento dos
cristalitos, conforme observado na Fig. 3(b).
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Fig. 4: Micrografias de MEV da amostra ST15 (a) sem tratamento térmico. E tratada
termicamente a 1050ºC durante (b) 2 (c) 16 e (d) 48 horas.
Fig. 5: Micrografias de MEV da amostra ST15 (a) sem tratamento térmico. E tratada
termicamente durante 2 horas a (b) 1050, (c) 1200 e (d) 1400ºC.
CONCLUSÕES
Nanopartículas do sistema binário SiO2-TiO2 foram sintetizadas
simultaneamente pelo método de hidrólise em chama, contendo inicialmente
somente a fase anatásio. Os materiais produzidos apresentaram comportamento
(a) (b)
(d)(c)
(c)
(a) (b)
(d)
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satisfatório quanto crescimento dos cristalitos e transição a→r para temperaturas de
até 1050°C, mesmo para longos períodos de tratamento térmico (48 h), o que torna
esse material um excelente candidato para aplicações no campo da fotocatálise em
altas temperaturas.
AGRADECIMENTOS Os autores agradecem ao Técnico Cláudio R. Silveira pela assistência na fabricação
das amostras e à Técnica Claudenete Leal pelas imagens de MEV. Os autores
também agradecem às agências CAPES, CNPq e FAPESP pelo suporte financeiro.
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INFLUENCE OF TEMPERATURE AND HEATING TIME ON GROWTH RATE AND
PHASE TRANSITION OF TITANIA NANOCRYSTALS EMBEDDED IN
AMORPHOUS SILICA
In this work we studied the thermal stability of TiO2 nanocrystals (~15 nm) embedded
and dispersed in an amorphous silica nanoparticle, aiming its application in
photocatalysis at high temperatures. The SiO2/TiO2 samples were made by the H2-O2
flame hydrolysis method. The nanostructural evolution of TiO2 nanocrystals, (phase
transformation anatase→rutile and the growth of nanocrystals) was investigated in
relation to the temperature (500 to 1400ºC) and heating time (2 to 48 hours). The as-
deposited and heat-treated powders were characterized by XRD, SEM and XRF. We
observed that the silica acted as a strong inhibitor of the nanocrystals growth and
phase transformation even for long periods at high temperatures treatment. The final
size and time required for the stability of nanocrystals for given temperature and
concentration of TiO2 were estimated. For a temperature of 1050°C and t=48 hours
the nanocrystals did not exceed 30 nm, while the anatase phase was maintained
stable.
Key-words: silica-titania, phase transition, TiO2 nanoparticles, flame hydrolysis.
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