[ieee 2014 xvi symposium on virtual and augmented reality (svr) - piata salvador, bahia, brazil...

8
DOMUS: Cyber-Archeology in three-dimensional virtual environment DOMUS: Ciberarqueologia em ambiente virtual tridimensional Alex da Silva Martire LARP – Museu de Arqueologia e Etnologia Universidade de São Paulo Sao Paulo/SP, Brasil [email protected] Abstract—This article presents the development of the project elaborated by the Laboratory for Roman Provincial Archaeology (LARP-USP) named DOMUS: an online application that enables users to navigate in three-dimensional virtual environment that simulates an ancient house during the Roman Empire. Starting from the concept of simulation and cybernetics, the article details the main points of Cyber-Archaeology - area of study that relates Virtual Reality to Archaeology - and describes the steps involved in the development of DOMUS. Finally, we present the educational activities to be implemented based on DOMUS. Keywords—cyber-archaeology; cybernetics; simulation; virtual reality; application Resumo— Este artigo apresenta o desenvolvimento do projeto elaborado pelo Laboratório de Arqueologia Romana Provincial (LARP) da USP denominado DOMUS: aplicativo de acesso online que permite aos usuários a navegação em um ambiente virtual tridimensional que simula uma antiga casa existente durante o Império Romano. Partindo da conceituação de simulação e cibernética, o artigo pormenoriza os principais pontos da Ciberarqueologia – área de estudo que relaciona a Realidade Virtual com a Arqueologia – e descreve as etapas envolvidas no desenvolvimento do aplicativo DOMUS. Por fim, são apresentadas as atividades educativas que serão aplicadas tendo por base o DOMUS. Palavras-chave—ciberarqueologia; cibernética; simulação; realidade virtual; aplicativo I. INTRODUÇÃO O Laboratório de Arqueologia Romana Provincial (LARP) do Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE) da Universidade de São Paulo (USP) desenvolveu durante o segundo semestre de 2013 um dos primeiros simuladores brasileiros em realidade virtual baseado em vestígios arqueológicos da Roma Antiga, o DOMUS (www.larp.mae.usp.br/domus.html). Simulando uma casa romana do século I d.C. (denominada domus, no latim), o projeto tridimensional se enquadra no recente ramo que vem se desenvolvendo dentro da teoria e metodologia arqueológicas, a Ciberarqueologia, que se baseia no uso da Realidade Virtual para a análise de material arqueológico bem como a divulgação final de resultados. Este artigo, então, parte da conceituação de simulação, imersão e interatividade dentro do campo da Arqueologia, explanando, assim, os conceitos-chave da Ciberarqueologia, para depois apresentar as etapas de desenvolvimento do projeto DOMUS. Por fim, o artigo é concluído citando-se as atividades secundárias que serão baseadas no uso do DOMUS em salas de aula. II. SIMULAÇÃO E ARQUEOLOGIA: TITEREIROS PÓS- MODERNOS? Provavelmente, Gepeto é o titereiro mais famoso do mundo. A obra redigida por Carlo Collodi em 1883 nos mostrou como a marionete chamada Pinóquio foi construída por Gepeto (e que, depois de muitas aventuras, se tornou um menino de verdade). Pinóquio, em seus primeiros momentos, quando ainda um boneco sem vida, estava preso a fios que eram controlados por Gepeto. Os fios que ligavam Pinóquio a Gepeto são como os rizomas que foram conceituados pelo filósofo francês Gilles Deleuze e pelo psicanalista Félix Guattari [1]: “Os fios da marionete, considerados como rizoma ou multiplicidade, não remetem à vontade suposta una de um artista ou de um operador, mas à multiplicidade das fibras nervosas que formam por sua vez uma outra marionete seguindo outras dimensões conectadas às primeiras. ‘Os fios ou as hastes que movem as marionetes – chamemo-los a trama. Poder-se-ia objetar que sua multiplicidade reside na pessoa do ator que a projeta no texto. Seja, mas suas fibras nervosas formam por sua vez uma trama. E eles mergulham através de uma massa cinza, a grade, até o indiferenciado...”. Em outras palavras, há fatores dependentes (as mãos de Pinóquio são 2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality 978-1-4799-4261-9/14 $31.00 © 2014 IEEE DOI 10.1109/SVR.2014.15 147 2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality 978-1-4799-4261-9/14 $31.00 © 2014 IEEE DOI 10.1109/SVR.2014.15 147 2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality 978-1-4799-4261-9/14 $31.00 © 2014 IEEE DOI 10.1109/SVR.2014.15 148

Upload: alex-da-silva

Post on 17-Mar-2017

217 views

Category:

Documents


5 download

TRANSCRIPT

Page 1: [IEEE 2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality (SVR) - Piata Salvador, Bahia, Brazil (2014.5.12-2014.5.15)] 2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality - DOMUS:

DOMUS: Cyber-Archeology in three-dimensional virtual environment

DOMUS: Ciberarqueologia em ambiente virtual tridimensional

Alex da Silva Martire LARP – Museu de Arqueologia e Etnologia

Universidade de São Paulo Sao Paulo/SP, Brasil [email protected]

Abstract—This article presents the development of the project elaborated by the Laboratory for Roman Provincial Archaeology (LARP-USP) named DOMUS: an online application that enables users to navigate in three-dimensional virtual environment that simulates an ancient house during the Roman Empire. Starting from the concept of simulation and cybernetics, the article details the main points of Cyber-Archaeology - area of study that relates Virtual Reality to Archaeology - and describes the steps involved in the development of DOMUS. Finally, we present the educational activities to be implemented based on DOMUS.

Keywords—cyber-archaeology; cybernetics; simulation; virtual reality; application

Resumo— Este artigo apresenta o desenvolvimento do projeto elaborado pelo Laboratório de Arqueologia Romana Provincial (LARP) da USP denominado DOMUS: aplicativo de acesso online que permite aos usuários a navegação em um ambiente virtual tridimensional que simula uma antiga casa existente durante o Império Romano. Partindo da conceituação de simulação e cibernética, o artigo pormenoriza os principais pontos da Ciberarqueologia – área de estudo que relaciona a Realidade Virtual com a Arqueologia – e descreve as etapas envolvidas no desenvolvimento do aplicativo DOMUS. Por fim, são apresentadas as atividades educativas que serão aplicadas tendo por base o DOMUS.

Palavras-chave—ciberarqueologia; cibernética; simulação; realidade virtual; aplicativo

I. INTRODUÇÃO

O Laboratório de Arqueologia Romana Provincial (LARP) do Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE) da Universidade de São Paulo (USP) desenvolveu durante o segundo semestre de 2013 um dos primeiros simuladores brasileiros em realidade virtual baseado em vestígios arqueológicos da Roma Antiga, o DOMUS (www.larp.mae.usp.br/domus.html).

Simulando uma casa romana do século I d.C. (denominada domus, no latim), o projeto tridimensional se enquadra no recente ramo que vem se desenvolvendo dentro da teoria e metodologia arqueológicas, a Ciberarqueologia, que se baseia no uso da Realidade Virtual para a análise de material arqueológico bem como a divulgação final de resultados.

Este artigo, então, parte da conceituação de simulação, imersão e interatividade dentro do campo da Arqueologia, explanando, assim, os conceitos-chave da Ciberarqueologia, para depois apresentar as etapas de desenvolvimento do projeto DOMUS. Por fim, o artigo é concluído citando-se as atividades secundárias que serão baseadas no uso do DOMUS em salas de aula.

II. SIMULAÇÃO E ARQUEOLOGIA: TITEREIROS PÓS-MODERNOS?

Provavelmente, Gepeto é o titereiro mais famoso do mundo. A obra redigida por Carlo Collodi em 1883 nos mostrou como a marionete chamada Pinóquio foi construída por Gepeto (e que, depois de muitas aventuras, se tornou um menino de verdade). Pinóquio, em seus primeiros momentos, quando ainda um boneco sem vida, estava preso a fios que eram controlados por Gepeto. Os fios que ligavam Pinóquio a Gepeto são como os rizomas que foram conceituados pelo filósofo francês Gilles Deleuze e pelo psicanalista Félix Guattari [1]: “Os fios da marionete, considerados como rizoma ou multiplicidade, não remetem à vontade suposta una de um artista ou de um operador, mas à multiplicidade das fibras nervosas que formam por sua vez uma outra marionete seguindo outras dimensões conectadas às primeiras. ‘Os fios ou as hastes que movem as marionetes – chamemo-los a trama. Poder-se-ia objetar que sua multiplicidade reside na pessoa do ator que a projeta no texto. Seja, mas suas fibras nervosas formam por sua vez uma trama. E eles mergulham através de uma massa cinza, a grade, até o indiferenciado...”. Em outras palavras, há fatores dependentes (as mãos de Pinóquio são

2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality

978-1-4799-4261-9/14 $31.00 © 2014 IEEE

DOI 10.1109/SVR.2014.15

147

2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality

978-1-4799-4261-9/14 $31.00 © 2014 IEEE

DOI 10.1109/SVR.2014.15

147

2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality

978-1-4799-4261-9/14 $31.00 © 2014 IEEE

DOI 10.1109/SVR.2014.15

148

Page 2: [IEEE 2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality (SVR) - Piata Salvador, Bahia, Brazil (2014.5.12-2014.5.15)] 2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality - DOMUS:

movidas pela ação de Gepeto) e fatores independentes (a multiplicidade dos fios, por interações mútuas, geram outros movimentos imprevisíveis) na dinâmica das marionetes [2]. Desse modo, o exemplo de Pinóquio nos serve como metáfora para o que acontece no ambiente de simulação tridimensional: a interação de diferentes usuários com os modelos e dados é imprevisível, ao mesmo tempo em que a troca de informações ocorrida durante a simulação auxilia no processo dinâmico da interpretação. É sempre uma atividade recíproca.

A simulação é o cerne da Ciberarqueologia. Não existe uma única definição de simulação, porém, uma das mais famosas pertence ao filósofo francês Jean Baudrillard, que escreveu [3]: “Dissimular é fingir não ter ainda o que se tem. Simular é fingir ter o que não se tem. O primeiro refere-se a uma presença, o segundo a uma pura ausência. Mas é mais complicado pois simular não é fingir: ‘Aquele que finge uma doença pode simplesmente meter-se na cama e fazer crer que está doente. Aquele que simula uma doença determina em si próprio alguns dos respectivos sintomas’ (Littré). Logo, fingir ou dissimular deixam intacto o princípio da realidade: a diferença continua a ser clara, está apenas disfarçada, enquanto que a simulação põe em causa a diferença do ‘verdadeiro’ e do ‘falso’, do ‘real’ e do ‘imaginário’. O simulador está ou não doente, se produz ‘verdadeiros’ sintomas? Objetivamente não se pode tratá-lo nem como doente nem como não doente”.

Segundo a visão de Baudrillard, a simulação existe quando não temos mais algo real: ela é a substituição daquilo que existiu por algo que nunca existiu. O filósofo vai além, dizendo que: “Hoje a abstração já não é a do mapa, do duplo, do espelho e do conceito. A simulação não é já a simulação de um território, de um ser referencial, de uma substância. É a geração pelos modelos de um real sem origem nem realidade: hiper-real” [3]. A ciberarqueologia, então, trabalharia no campo do hiper-real (ou seja “mais real do que o real”) como sugere Maurizio Forte [4]? Se formos concordar que o hiper-real traz hiperinformações, ou seja, informações que estão fora daquilo considerado real, então a resposta é sim, a ciberarqueologia é uma simulação hiper-realista. Porém, se nos nortearmos a partir das ideias de Pierre Lévy [5] – que são opostas aos conceitos de real/simulação de Jean Baudrillard – e considerarmos que não existe a dicotomia real/virtual, pois tudo é real, então a ciberarqueologia é uma simulação que não pretende substituir algo que não existe, mas mostra-se como um desenvolvimento, uma outra maneira de se buscar informações a partir da realidade.

Se o intento da simulação é o da reprodução da vida (seja ela no presente ou no passado), então a sensação de pertencimento, de presença, é algo inerente a qualquer atividade que pretenda simular uma outra atividade [6] [7]. A presença, assim, é uma sensação que faz mais sentido dentro da proposta de realidade de Pierre Lévy do que na proposta de Jean Baudrillard – para quem a realidade já não é mais possível de ser alcançada, uma vez que percebemos o mundo somente por meio de simulações. Se nada é real, como podemos ter certeza de que estamos presentes (dentro de um simulador ou não)? A negação da realidade, em meu ponto de vista, pode, de fato, levar à validação das interessantes ideias propostas por Nick Bostrom [8], afirmando que toda a nossa realidade pode ser uma simulação, tal como no filme Matrix, de 1999.

O aplicativo DOMUS – objeto central de nosso artigo - foi desenvolvido para que o usuário se sinta presente no ambiente. Ele é uma simulação de um passado em potencial, de um passado que poderia vir a ser real, no sentido proposto por Pierre Lévy. Os vestígios de domus nos são contemporâneos: estão espalhados pelos territórios habitados pelos antigos romanos, principalmente em Pompeia e Herculano; essas casas não possuem mais pessoas vivendo nelas e, mesmo que isso fosse verdade, não seriam as mesmas pessoas de dois mil anos atrás. A realidade das domus, atualmente, é outra. No entanto, partindo de estudos arqueológicos e historiográficos, nos é possível estabelecer uma rede de informações que acabam por gerar outra realidade, a da simulação: temos a domus reconstituída tridimensionalmente em um ambiente virtual e qualquer pessoa pode experimentá-la tal como ela poderia ser no passado. É importante frisar que não existe uma possibilidade, mas várias, e que o DOMUS é apenas uma delas. A imersão e a interação estão na base da Realidade Virtual, e disso o DOMUS preenche os requisitos. Do mesmo modo, DOMUS é um projeto ciberarqueológico pois não é passivo como a Arqueologia Virtual: é multivocal e ativo.

III. CIBERNÉTICA E ARQUEOLOGIA: APRESENTANDO CONCEITOS E INTERAGINDO COM O PASSADO

Segundo o matemático Norbert Wiener, criador do termo na década de 1950, a cibernética é: “(…) um campo mais vasto que inclui não apenas o estudo da linguagem mas também o estudo das mensagens como meios de dirigir a maquinaria e a sociedade, o desenvolvimento de máquinas computadoras e outros autômatos (...), certas reflexões acerca da psicologia e do sistema nervoso, e uma nova teoria conjetural do método científico” [9]. O termo cybernetics (em inglês) deriva do grego kubernetes, “palavra utilizada para denominar o piloto do barco ou timoneiro, aquele que corrige constantemente o rumo do navio para compensar as influências do vento e do movimento da água. Além do sentido de controle, reforçado pela correspondência que kubernetikos tem com o latim gubernator, a máquina de leme utilizada em navios seria um dos mais antigos dispositivos a incorporar os princípios estudados pela cibernética” [10].

Os conceitos fundamentais da cibernética influenciaram estudos nas mais diversas áreas cognitivas. Uma delas é a Arqueologia, que vem dialogando com pesquisas de ciberneticistas desde a década de 1950, mas que somente há cerca de treze anos tem desenvolvido experimentos práticos nessa área. O maior expoente desse novo ramo denominado Ciberarqueologia (Cyber-Archaeology) é o arqueólogo e professor Maurizio Forte, que esteve envolvido intensamente em toda a evolução da área digital dentro do campo arqueológico.

Autor de uma obra extensa, Maurizio Forte [4] recentemente redigiu um artigo que explica o desenvolvimento dos métodos de trabalho que culminaram na ascensão da pesquisa ciberarqueológica. Segundo o autor, a ciberarqueologia é a evolução pós-moderna da Arqueologia Virtual (Virtual Archaeology) desenvolvida nos anos 1990. O surgimento e ápice da Arqueologia Virtual acompanhou o desenrolar do aperfeiçoamento na área da computação gráfica: nessa década, a qualidade de renderizações cresceu

148148149

Page 3: [IEEE 2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality (SVR) - Piata Salvador, Bahia, Brazil (2014.5.12-2014.5.15)] 2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality - DOMUS:

substancialmente, permitindo aos pesquisadores e artistas criarem imagens fotorrealistas antes nunca vistas (basta lembrar que nessa década foram lançados os longas-metragens Toy Story, em 1995, e o primeiro filme realizado inteiramente em computadores no mundo, o brasileiro Cassiopeia, em 1996). A Arqueologia Virtual assistiu ao surgimento de trabalhos focados inteiramente na reconstrução de réplicas arqueológicas: essas reconstruções virtuais, além de estarem completamente separadas do processo de interpretação arqueológico, não apresentavam quaisquer tentativas de simular a vida como ela poderia ser no passado. As maiores referências que temos para a Arqueologia Virtual são o artigo de Paul Reilly [11], considerado o primeiro trabalho sobre esse tema, e o livro organizado por Maurizio Forte [12], obra que apresentou o estado-da-arte do tema.

Desde os anos 2000, no entanto, a visualização passiva de renderizações e animações de reconstruções arqueológicas cedeu lugar ao diálogo com a cibernética (em grande parte, propiciado pelo avanço tecnológico computacional, reduzindo custos e aumentando a capacidade de processamento). Tendo a ciberarqueologia o prefixo “ciber”, isso aponta que existe, então, um ciclo de autorregulação e reflexividade; assim sendo, a metodologia empregada no contexto arqueológico consiste em: trabalho de campo; entrada de dados; processamento; interpretação; validação; interação; retroalimentação (feedback); transmissão cultural; comunidades virtuais e corporificação (avatar) [13]. Desse modo, ao contrário da Arqueologia Virtual – centrada em modelos 3D apenas –, a Ciberarqueologia está preocupada com a interação com os modelos e o ambiente; por exemplo: as hipóteses de iluminação diurna e artificial em oficinas de cerâmica da Grécia Antiga [14], ou a reconstrução digital de patrimônio histórico do parque arqueológico de Xian, na China [15].

Por estar inteiramente presente no domínio do digital (as capturas fotográficas e escaneamentos tridimensionais, por exemplo, não são analógicos), a ciberarqueologia eleva a interpretação dos dados a um novo patamar: o da simulação. A ciberarqueologia está baseada no papel ativo do usuário como ator principal do sistema e interação; do mesmo modo, o ciclo cibernético produz um processo de simulação que tem por objetivo a simulação do passado, não apenas a sua reconstrução. Igualar arqueologia virtual à reconstrução do mundo antigo parece ser, em alguns casos, redutivo e, em outros, utópico, como explica Maurizio Forte [13]: “Redutivo porque parece ter por objetivo métodos de recomposição estrutural e arquitetural, e não o estudo dos processos e relações entre ambientes arquiteturais e organismos. Utópico porque reconstruir o mundo antigo é interessante como método, mas não realizável em um processo único. Por fim, a transmissão de um modelo interativo e cibernético deve permitir também às futuras comunidades de cientistas continuarem nosso trabalho, corrigindo nossos erros e sugerindo novas interpretações arqueológicas”. O autor discorre sobre o foco central da ciberarqueologia: “Em um sentido epistemológico, o mundo antigo não pode ser reproduzido e reconstruído, mas, na tentativa de recompor o contexto, é possível codificar as relações/propiciamentos (affordances) as quais o espaço-tempo cancelou. Em resumo, poderíamos dizer que a ciberarqueologia está centrada na

construção de relações espaciais e temporais capazes de reconectar o território com o ‘mapa’, a paisagem arqueológica com a paisagem antiga, seguindo um caminho metodológico de validação e transparência” [13].

A ciberarqueologia, assim, vai de encontro à visão essencialmente metodológica da arqueologia digital. Essa visão, de acordo com Ezra Zubrow [16], transforma a arqueologia digital em uma ferramenta como qualquer outra que o arqueólogo possui, igualando-a a toda miríade de técnicas de datação ou reconstrução ambiental: desse modo, muitos podem ver a arqueologia digital como sendo “a-teórica” ou até mesmo “antiteórica” – uma vez que as técnicas podem ser usadas por qualquer escola de pensamento arqueológico obtendo os mesmos resultados. A ciberarqueologia, ao contrário, colabora para a discussão de que os desenvolvimentos digitais criam ou ajudam a influenciar a criação de teorias: as inovações digitais determinam o escopo da teoria em muitas maneiras. “O domínio digital enfatiza o que é muito grande e o que é muito pequeno, e torna possível reenfatizar tanto o individual como o ator primário. Na verdade, se se acredita que ele reconstrói processos mentais humanos, é porque ele pode ser um substituto para a teoria em si” [16].

IV. CIBERARQUEOLOGIA NA PRÁTICA: O APLICATIVO DOMUS DO LABORATÓRIO DE ARQUEOLOGIA ROMANA

PROVINCIAL DA USP A ciberarqueologia pode ser aplicada, principalmente, em

duas vertentes:

• Coleta de dados no campo (com dispositivos que transformam as informações em meio digital), e visualização científica tridimensional em laboratório a fim de se analisar o que está sendo escavado (e, posteriormente, todo o conjunto de dados obtidos). Por exemplo, trabalhos que são desenvolvidos em Çatalhöyük [17], na Turquia, onde cada etapa da escavação é registrada tridimensionalmente para servir como reconstituição do sítio (que, ainda hoje, é um processo bidimensional, centrado em relatórios de campo, desenhos de estratigrafias/vestígios, e fotografias).

• Divulgação de resultados e como recurso didático/educativo. O desenvolvimento de aplicativos que façam a interação entre usuário (seja ele arqueólogo ou público em geral) e ambientes virtuais tridimensionais é a etapa final da ciberarqueologia. Nela, são mostrados todos os resultados oriundos das pesquisas anteriores e ocorre a multivocalidade, onde todas as pessoas podem opinar e trabalhar juntas para melhorar a experiência imersiva digital realizada por meio de computadores.

O projeto do Laboratório de Arqueologia Romana Provincial (Museu de Arqueologia e Etnologia da Universidade de São Paulo) denominado DOMUS insere-se no segundo uso mais comum da ciberarqueologia: o de divulgação de resultados ao público final. Por ser um aplicativo tridimensional virtual, o DOMUS – embora não sendo um

149149150

Page 4: [IEEE 2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality (SVR) - Piata Salvador, Bahia, Brazil (2014.5.12-2014.5.15)] 2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality - DOMUS:

game ou um serious game – acaba por se enquadrar no processo de desenvolvimento de jogos eletrônicos. Segundo Machado et al. [18], todo game divide-se em dois caminhos distintos: 1) Criação artística – elementos usados para a montagem do jogo, tais como modelos 3D, texturas, sons, trilhas sonoras etc.; 2) Programação – utilização de um engine (motor gráfico) para a renderização gráfica e coordenação de tarefas, além da integração dos elementos artísticos: em outras palavras, o momento em que a interação é programada. Porém, tal como nos jogos eletrônicos, a ciberarqueologia requer um levantamento prévio de dados para a avaliação do que estará presente no aplicativo e como será apresentado. Sendo assim, a metodologia empregada no DOMUS – e que será descrita a seguir – consistiu em três etapas:

• Estudo arqueológico, bibliográfico e imagético sobre o assunto em questão (uma casa romana grande, ou seja, domus, no latim).

• Criação artística.

• Programação.

A. Etapa 1 Esta etapa é a responsável pelo resultado final, uma vez que

é o momento de se planejar cuidadosamente o que será feito nas etapas seguintes. Obviamente, é necessário haver diálogo entre todos os membros da equipe para futuras modificações que surjam no decorrer do processo de produção; no entanto, é na etapa inicial que tentamos estabelecer, com a maior precisão possível, todos os elementos que desejamos ter no aplicativo.

Temos de, primeiramente, escolher um objeto de estudo, ou seja, necessitamos responder à questão: O que fazer?

O DOMUS apareceu como a possibilidade de se apresentar ao público leigo (e aos arqueólogos da área também) uma casa pertencente às pessoas mais abastadas que viveram na Roma Antiga. Uma domus era uma representação em menor escala de uma parte significativa do mundo romano, onde vida pública e vida particular estavam mescladas. Nas domus também trabalhavam escravos, libertos e cidadãos assalariados: havia, em muitos casos, lojas que estavam fisicamente atreladas às casas, auxiliando a movimentação da economia no período romano. Dentro de uma domus, o chefe da casa recebia seus clientes em seu escritório (tablinum) para tratar de assuntos políticos que não tivessem sido terminados em praça pública, senado ou outra instituição de igual poder. Ao mesmo tempo, a domus era um feito de engenharia impressionante, com água da chuva captada por abertura no telhado e banheiras com água aquecida no subsolo. Desse modo, a escolha por desenvolver uma reconstrução-simulação de uma domus foi realizada pelo LARP a fim de se mostrar ao público a complexidade da sociedade romana a partir de um dos seus mais imponentes vestígios: as casas térreas.

Definido o objeto de trabalho, é necessário traçar seus objetivos. Essa parte de desenvolvimento é uma das mais trabalhosas e que consomem mais tempo, pois é nela que respondemos à questão: Por que fazer?

DOMUS foi pensado como um aplicativo educativo desde o seu início. Sendo assim, ele foi desenvolvido porque

desejávamos que escolas públicas e particulares (além de faculdades e pessoas interessadas) tivessem acesso a um conteúdo que não é muito trabalhado em salas de aula: a Antiguidade Romana. Sabemos que aulas sobre Antiguidade Clássica fazem parte do currículo das instituições básicas de ensino no país, contudo, é um tema que nem sempre é possível de ser aprofundado em sala de aula devido às particularidades do próprio programa que a escola adota. Outro tópico relevante para a definição de DOMUS como um aplicativo educativo é o fato de a arqueologia praticamente não ser estudada em salas de aula: nos livros de História geralmente a cultura material é relegada ao plano de coadjuvante dos textos, ilustrando aquilo que está escrito. A proposta de se ter um ambiente virtual tridimensional que simule uma domus produzido exclusivamente por arqueólogos especializados em Roma Antiga é o diferencial no aplicativo DOMUS: sem intermediadores, todo o conteúdo é feito por arqueólogos e chega diretamente aos professores e alunos, possibilitando novas abordagens de ensino que não fiquem atreladas aos livros didáticos (que, geralmente, são escritos por historiadores ou pedagogos, não arqueólogos).

Os objetivos do DOMUS, então, foram definidos do seguinte modo:

• Possuir navegação livre dentro da casa – permitir ao usuário ir para onde quiser sem um roteiro pré-estabelecido (embora saibamos que roteiros definidos também colaboram no aprendizado, a ideia principal por trás do DOMUS é o da experimentação, deixando a pessoa descobrir a casa como quiser).

• Oferecer textos que surjam na tela de acordo com o local em que o usuário se encontre – denominados textos-triggers pelo grupo de trabalho, essas pequenas informações servem de explicação sucinta para temas que são aprofundados nos textos de apoio.

• Oferecer textos de apoio – o aplicativo possui uma lista de textos redigidos pelos pesquisadores do LARP que versam sobre os seguintes assuntos: domus romana, impluvium, balneum e latrina (pesquisador Alex dos Santos Almeida); tablinum e taberna (pesquisadora Irmina Doneux Santos); lararium (pesquisadora Tatiana Bina); lamparinas (pesquisador Marcio Teixeira Bastos); afrescos (pesquisador Alessandro Mortaio Gregori); mosaicos (pesquisadora Silvana Trombetta); Vitrúvio e a arquitetura (pesquisador Anisio Cândido Pereira Filho); economia romana (Prof. Dr. Vagner Carvalheiro Porto); e cerâmica romana (Profa. Dra. Maria Isabel D’Agostino Fleming – coordenadora do LARP). Esses textos foram pensados e trabalhados de modo a oferecer aos professores material complementar para uso em sala de aula bem como a qualquer pessoa que deseje saber um pouco mais sobre o tema e use o texto de apoio como ponto de partida (uma vez que todos têm referências bibliográficas de autores que são reconhecidamente grandes especialistas na área).

• Estabelecer um comparativo entre o tridimensional modelado e os vestígios arqueológicos – por meio de uma Galeria de Imagens, é oferecida ao público a

150150151

Page 5: [IEEE 2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality (SVR) - Piata Salvador, Bahia, Brazil (2014.5.12-2014.5.15)] 2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality - DOMUS:

possibilidade de se comparar a reconstituição 3D do aplicativo com fotos de objetos encontrados em casas romanas e vestígios dessas casas.

• Ter acesso online gratuito e irrestrito – por pertencermos a uma instituição de ensino pública, a Universidade de São Paulo, é indiscutível que toda a sua produção deva ser retribuída à população sem qualquer custo. Do mesmo modo, o LARP é financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), órgão sustentado com verba pública: a melhor maneira, então, de se divulgar um trabalho nos dias de hoje é a internet, permitindo a todos terem a experiência de caminhar em uma domus interativa e aprofundar seus conhecimentos com material bibliográfico próprio.

A última questão a ser posta na Etapa 1 de desenvolvimento acaba sendo também a única pergunta das Etapas 2 e 3: Como fazer?

Primeiramente, é preciso estabelecer qual a região territorial que melhor fornece vestígios arqueológicos do objeto em questão. Em nosso caso, foi a cidade de Pompeia, na Itália. Soterrada pela erupção do Vesúvio em 79 d.C., o sítio arqueológico da cidade é um dos mais ímpares do mundo, contando com estruturas muito bem conservadas de todos os ambientes romanos da época. Naturalmente, para a construção 3D de um modelo de domus, Pompeia forneceu dados fotográficos e bibliográficos inigualáveis. Foram feitos levantamentos em livros, acervos pessoais de fotos, plantas e imagens na internet que formaram a base para o desenvolvimento artístico posterior. É imprescindível também deixar claro se a reconstrução 3D é baseada em um vestígio singular (por exemplo, uma domus em específico) ou se pertencerá a uma generalização: no caso do DOMUS, foi feita a opção por um modelo genérico de casa romana baseada em vestígios de diversas domus – essa escolha reflete o objetivo didático/educativo do aplicativo, pois assim tivemos a liberdade de modificar os ambientes internos a fim de se enquadrarem ao propósito explicativo dos textos-triggers (como no caso dos afrescos e mosaicos).

Figura 1. Planta da domus utilizada no aplicativo.

Após a consolidação do banco de dados sobre as domus, o trabalho de produção foi desenvolvido simultaneamente em duas frentes: 1) produção dos textos-triggers e textos de apoio – a partir do material bibliográfico; e 2) criação artística (etapa

2)/programação (etapa 3) – a partir do material imagético. Todos os textos de apoio, depois de revistos e corrigidos, foram formatados de acordo com o layout discutido em reuniões e salvos em formato PDF para livre impressão.

B. Etapa 2 Esta etapa é a responsável por quase tudo o que veremos na

tela do computador quando o aplicativo rodar. A criação artística é um processo em que o tempo empregado dependerá diretamente da pessoa (ou pessoas) responsável (eis) pela modelagem e texturização tridimensional. Como todo trabalho artístico nessa área, parte-se de esboços baseados em referenciais imagéticos e textuais e desenvolvem-se todos os pormenores para que os modelos fiquem o mais próximo possível da ideia inicial buscada pelo grupo de pesquisadores. É muito comum que os primeiros modelos não se enquadrem perfeitamente às necessidades, tendo, então, de ser modificados ou totalmente refeitos. A criação artística é uma etapa que requer paciência e atenção, pois a sua produção afetará tudo o que será realizado na Etapa 3.

O DOMUS foi totalmente modelado com o software Autodesk Maya (2013/2014). Uma das principais ferramentas disponíveis no mercado, o Autodesk Maya possui interface que facilita a rapidez da produção de modelos 3D e exporta arquivos já texturizados no formato .FBX – que é aceito sem problemas por engines. Os objetos tridimensionais do DOMUS foram modelados separadamente (casa e demais itens) e depois exportados – também separadamente – para o motor gráfico. Nossa domus foi produzida tendo por base os seguintes processos:

• Todo o material imagético – como fotos e plantas – foi reunido e discutido entre os pesquisadores a fim de se ter uma ideia geral de como a casa iria aparecer ao público. Estabelecidos os parâmetros básicos, o modelador (pesquisador Alex da Silva Martire) deu início aos trabalhos.

• A modelagem inorgânica partiu de uma planta de domus baseada na cidade de Pompeia e posta no Autodesk Maya como image plane. Foi realizado o processo denominado “blocagem” para se ter a noção de escala e depois as paredes e o teto foram modelados sem quaisquer detalhes.

• Com a estrutura básica pronta, foram realizadas as aberturas nos locais das portas dos cômodos bem como suas janelas.

• As colunas e batentes das portas foram modeladas e colocadas em seus lugares, além das vigas de sustentação do compluvium (abertura no teto do átrio) e do peristilo (jardim aberto).

• Estando finalizada a estrutura, foram realizadas as separações de polígonos que seriam as paredes, pisos, afrescos e mosaicos.

• Cada subdivisão da casa recebeu sua texturização: foram utilizadas fotografias de afrescos e mosaicos encontrados em Pompeia (principalmente) e no mundo romano (como em alguns casos de mosaicos). A

151151152

Page 6: [IEEE 2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality (SVR) - Piata Salvador, Bahia, Brazil (2014.5.12-2014.5.15)] 2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality - DOMUS:

recriação das texturas do Primeiro Estilo de Afresco e das paredes do átrio, tablinum e peristilo, foram produzidas inteiramente em Photoshop, uma vez que não havia imagens com qualidade suficiente para o que desejávamos.

• Com toda a casa finalizada (modelada e texturizada), o arquivo foi exportado com a extensão .FBX.

• Os quatro processos principais – estudo de referencial, modelagem, texturização e exportação – foram repetidos para todos os demais objetos observados no interior da domus.

Figura 2. Modelagem e início da texturização da domus no Autodesk Maya.

É importante fazer todo o planejamento prático do aplicativo nesta etapa: será decisivo para a qualidade final quando os modelos forem trabalhados dentro do engine. Assim sendo, é imprescindível ter em mente que um aplicativo em tempo real é diferente de uma animação 3D, pois há limite de número máximo de polígonos que podem aparecer na tela: vértices em demasia significam maior necessidade de processamento computacional e, consequentemente, lentidão na visualização (pois ocorre queda na taxa de quadros por segundo).

Como evitar esse problema?

• Utilizar o menor número de polígonos possível durante a modelagem.

• Resolver a questão de detalhes de objetos por meio de texturização ao invés de modelagem.

• Ter o maior número possível de objetos pertencentes a uma mesma textura no mesmo mapeamento UV.

Figura 3. Renderização com Mental Ray da domus finalizada (Autodesk Maya).

C. Etapa 3 A última etapa de desenvolvimento é aquela que

estabelecerá, de fato, a ligação entre o usuário e o ambiente virtual tridimensional. Nela, toda a interação é programada, bem como a adição de menus, sons e trilhas sonoras. É importante haver um planejamento prévio consistente de como o usuário vai navegar por esse ambiente a fim de que a interface seja intuitiva para pessoas de todas as idades.

Para o DOMUS, foi escolhido o motor gráfico (engine) Unity. O motor gráfico é uma biblioteca que possui funcionalidades pré-programadas a fim de se facilitar o desenvolvimento de um aplicativo (ou jogo) a partir do zero. Em nosso caso, o Unity foi a ferramenta que mais se mostrou apropriada para o uso, uma vez que possui amplo material disponível em livros e na internet, além de possuir uma curva de aprendizado relativamente curta para quem já tem conhecimentos de softwares 3D.

Figura 4. DOMUS sendo finalizado no Unity.

A produção do aplicativo DOMUS começou na versão gratuita do Unity. O desenvolvedor (pesquisador Alex da Silva Martire) importou todos os arquivos .FBX produzidos no Autodesk Maya para a área de trabalho do Unity e os distribuiu espacialmente. Com todos os modelos em cena, começou o processo de criação da interação. A saber:

• Para aumentar a sensação de imersão, foi escolhida a visão em Primeira Pessoa, fazendo com que a câmera dentro do Unity representasse os olhos do usuário. Para a movimentação fluida e mais parecida com a humana, foi utilizado o asset UFPS, encontrado na Asset Store do próprio Unity. Desse modo, utilizando as teclas W, A, S, D do teclado o usuário consegue se movimentar pelo ambiente e, com o mouse, estabelecer os lugares que deseja visualizar.

• Foram colocados em cena os box colliders nos objetos desejados, evitando que o usuário possa “atravessar” os modelos 3D.

• Luzes do tipo point foram dispostas sobre as lamparinas e animadas para emular chamas de velas, bem como o tipo directional para simular o sol presente no skybox.

• Com o plugin Playmaker, foram criados os triggers na cena que disparam os textos explicativos – todos como objeto GuiTexture.

152152153

Page 7: [IEEE 2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality (SVR) - Piata Salvador, Bahia, Brazil (2014.5.12-2014.5.15)] 2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality - DOMUS:

• Os sons de passos no ambiente foram criados com o asset UFPS, e a trilha sonora (recriação de música romana da época) foi adquirida no iTunes.

• Por fim, foram criados o menu (com os links para os Textos de Apoio) e a Galeria de Imagem em formato carrossel (com o asset La Galerie).

Figura 5. Galeria de Imagens do aplicativo DOMUS.

Com o projeto finalizado, alguns problemas foram observados dentro da versão gratuita do Unity: a ausência de sombras prejudicava o grau de realismo pretendido pelo aplicativo, bem como a textura estática aplicada para simular a água no impluvium e balneum; em diversos momentos havia queda na taxa de quadros por segundo (frames per second – fps), chegando, em alguns casos, a 9 fps (quando o ideal é 30 fps ou mais).

Para solucionar essas questões, foi adquirida a versão Pro do aplicativo Unity. A migração para esta versão trouxe melhorias significativas ao produto final:

• Com a utilização de Occlusion Culling, a renderização em tempo real da domus só ocorre nos lugares onde a câmera está posicionada, diminuindo o número de draw calls na tela ao ter a opção static batching selecionada e aumentando a quantidade de quadros por segundo (variando, agora, entre 25 e 90 fps).

• Com a utilização de Lightmapping, toda a iluminação deixou de ser feita em tempo real (consumindo recursos de processamento) e passou a fazer parte da texturização da casa, tornando o sombreamento suave e realista.

• A água presente no impluvium e no balneum foi substituída pelos prefabs de água próprios da versão Pro do Unity, tornando-se dinâmica e refletindo o ambiente ao redor.

• Foram aplicados efeitos especiais de câmera, trazendo luz ambiente etérea e agregando valor artístico ao aplicativo antes totalmente técnico.

Finalizando o desenvolvimento do DOMUS, o aplicativo foi exportado para plataforma Web, tornando-se passível de ser acessado online no website do LARP através de linguagem HTML. A opção por disponibilizá-lo na internet reflete a preocupação do laboratório em tornar sua produção acessível livre e gratuitamente. Contudo, deve-se levar em consideração

o quesito desempenho de hardware: sendo um aplicativo 3D, é necessário, para a utilização fluida e sem queda de FPS, um computador que contenha placa de aceleração gráfica de vídeo (GPU). Em computadores munidos apenas com placas de vídeo onboard, o desempenho é reduzido e necessita-se utilizar a qualidade “Baixa” oferecida pelo aplicativo, embora não impossibilitando totalmente a experiência por parte do usuário.

Figura 6. DOMUS rodando no browser Chrome.

V. CONCLUSÃO Sendo um dos projetos pioneiros em sua área, o DOMUS

oferece aos arqueólogos, historiadores, professores, alunos e público em geral a possibilidade de imersão em uma antiga casa romana. O processo de cognição recebe reforço quando o usuário consegue analisar o conjunto de um monumento ao invés de apenas estudar seus fragmentos (oferecidos por meios textuais ou materiais). A Realidade Virtual, desse modo, surge como uma fonte de recursos excepcionais para o aprendizado arqueológico, tornando a Ciberarqueologia uma área com grande potencial de desenvolvimento dentro de seu campo.

Graças ao poder de processamento computacional dos dias de hoje e seu preço acessível, a utilização de ambientes virtuais tridimensionais para o estudo e a divulgação de resultados de pesquisas arqueológicas tende a aumentar significativamente nos próximos anos. O DOMUS é um claro exemplo de trabalho realizado por pesquisadores especialistas em suas áreas que utilizou poucos recursos financeiros durante seu desenvolvimento, deixando claro que a Ciberarqueologia pode ser pesquisada no âmbito acadêmico nacional.

O DOMUS entrará na etapa de aplicação e avaliação durante o ano de 2014. Para tanto, vem sendo desenvolvido projeto em conjunto com o Setor Educativo do Museu de Arqueologia e Etnologia da USP que consistirá em duas etapas principais: 1) trabalho em sala de aula com os alunos de escolas públicas e particulares da cidade de São Paulo no qual serão apresentados ao DOMUS e poderão concluir pequenos objetivos ditados pelos professores; 2) visitação guiada ao acervo do MAE para reforçar o estabelecimento da relação entre aquilo observado no ambiente virtual e os vestígios arqueológicos. Para a avaliação do DOMUS, serão utilizados questionários respondidos pelos usuários (alunos e professores) a fim de se analisar os principais pontos fortes e fracos do aplicativo, bem como o potencial para futuros desenvolvimentos dentro do LARP e do MAE-USP.

153153154

Page 8: [IEEE 2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality (SVR) - Piata Salvador, Bahia, Brazil (2014.5.12-2014.5.15)] 2014 XVI Symposium on Virtual and Augmented Reality - DOMUS:

AGRADECIMENTOS O autor agradece à Fundação de Amparo à Pesquisa do

Estado de São Paulo (FAPESP) – Processo 2012/09004-6 – pelo apoio financeiro, aos Professores Doutores Romero Tori (Poli-USP), Fátima de Lourdes dos Santos Nunes (Poli-USP), Marcelo Knörich Zuffo (Poli-USP) e Maurizio Forte (Duke University), aos colegas pesquisadores do LARP e à orientadora, Professora Doutora Maria Isabel D’Agostino Fleming.

REFERÊNCIAS [1] G. Deleuze and F. Guattari, Mil platôs. Capitalismo e esquizofrenia, vol.

1. São Paulo: Editora 34, 2000. [2] M. Forte (ed.), Cyber-Archaeology. Oxford: Archaeopress, BAR (2177),

2010, pp. 9–13. [3] J. Baudrillard, Simulacros e Simulação. Lisboa: Relógio D’Água

Editores, 1991. [4] M. Forte, “Cyber-Archaeology: a post-virtual perspective”, in press,

2012. [5] P. Lévy, O que é o virtual?. São Paulo: Editora 34, 2007. [6] M. Slater; B. Spanlang and D. Corominas, “Simulating virtual

environments within virtual environments as the basis for a psychophysics of presence”, in: ACM Transactions on Graphics, vol. 29, n. 4, Article 92, 2010.

[7] K. Kilteni; R. Groten and M. Slater, “The sense of embodiment in Virtual Reality”, in: Presence, vol. 21, n. 4, 2012, pp. 373-387.

[8] N. Bostrom, “Are you living in a computer simulation?”, in: Philosophical Quarterly, vol. 53, n. 211, 2003, pp. 243-255.

[9] N. Wiener, Cibernética e sociedade: o uso humano de seres humanos. São Paulo: Cultrix, 1984.

[10] J. Ho Kim, “Cibernética, ciborgues e ciberespaço: notas sobre as origens da cibernética e sua reinvenção cultural”, in: Horizontes Antropológicos 10, n. 21, 2004, pp. 199-219.

[11] P. Reilly, “Towards a virtual archaeology”, in: Proceedings CAA90, 1990, pp. 133-139.

[12] M. Forte (ed), Virtual Archaeology: re-creating ancient worlds. New York: Harry N. Abrams, 1996.

[13] M. Forte, “Cyber-Archaeology: notes on the simulation of the past”, in: Virtual Archaeology Review (VAR), vol. 2, n. 4, Sevilla, 2011, pp. 7-18.

[14] C. Papadoupolos and Y. Sakellarakis, “Virtual windows to the past: reconstructing the ‘ceramics workshop’ at Zominthos, Crete”, in: Proceedings of the 38th Conference on computer applications and quantitative methods in archaeology, Granada, 2010.

[15] M. Forte, “Virtual worlds, Virtual Heritage and Immersive Reality: the case of the Daming Palace at Xi’an (China)", in: R. Rizzo; A. Mignosa (Eds.). Handbook on the Economics of Cultural Heritage. Edward Elgar Cheltenham, Fall, 2013, pp. 499-507.

[16] E. Zubrow, “Digital Archaeology: a historical context”, in: T. Evans and P. Daly (Eds.), Digital Archaeology. Bridging method and theory. London, New York: Routledge, 2006, pp. 10-31.

[17] M. Forte, “Cyber-Archaeology. How 3D modeling is unpeeling the Neolithic at Çatalhöyük”, in: Current World Archaeology, Issue 61, 2013, pp. 36-40.

[18] L. Machado; R. M. Moraes and F. L. S. Nunes, “Serious games para saúde e treinamento imersivo”, in: F. L. S. Nunes; L. S. Machado; M. S. Pinho; C. Kirner. (Orgs.). Abordagens Práticas de Realidade Virtual e Aumentada. Porto Alegre: SBC, 2009, pp. 31-60.

154154155