humor na publicidade uma discussão Ética

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  • 7/24/2019 Humor Na Publicidade Uma Discusso tica

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    IntercomSociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da ComunicaoXX Congresso de Cincias da Comunicao na Regio Sudeste - Uberlndia - MG 19 a 21/06/2015

    Humor na publicidade: uma discusso tica1

    Ana Carolina Silva Loureno2

    Camila Pontes Pereira Porto3

    Natlia Pereira Artemenko4

    Sara Alencar Dias5

    Ana Paula Bragaglia6

    Universidade Federal Fluminense, Niteri, RJ

    Resumo

    O humor um elemento que ajuda muito a publicidade a prender a ateno de inmerosconsumidores, e, praticamente, todos os meios utilizados para divulgar qualquer produto

    utilizam o riso como arma de penetrao na mente do consumidor. No entanto, se para tudoexistem limites, para o humor no seria diferente. Por diversas vezes, esse fator que visaajudar os publicitrios, pode acabar ajudando a banalizar os esteretipos depreciativos no dia-a-dia, bem como, propagar outros valores negativos para o bem estar individual e social.Portanto, nesse artigo, tratamos de refletir sobre quando a publicidade abandona o tico nessasua busca de arrancar algumas risadas.

    Palavras-chave:publicidade; humor; tica publicitria; esteretipos

    Introduo

    Com cada vez mais frequncia, o humor tem se tornado uma tcnica eficaz para a

    publicidade. No basta apenas ser uma forma de entretenimento, o humor pode ser uma arma

    poderosa para persuadir sutil e emocionalmente, dialogando com os mais diversos pblicos.

    Ao utilizar o humor na publicidade, as marcas conseguem uma linguagem mais informal,

    descontrada e consequentemente mais prxima de seus clientes. Porm, at onde o humor

    pode ser aplicado a favor de interesses publicitrios? Quando a relao entre humor e

    publicidade, desrespeita os aspectos ticos estabelecidos, no apenas no mbito publicitrio

    como da sociedade como um todo?

    Este artigo se prope a discutir as relaes entre tica e humor. Para isso, iniciaremos

    com uma anlise dos conceitos e definies de humor, sua presena na histria da sociedade e

    suas teorias de superioridade, incoerncia e alvio. Veremos os pontos a respeito do

    1Trabalho apresentado na Diviso Temtica Publicidade e Propaganda do Intercom Jnior, no XX Congresso de Cincias da

    Comunicao na Regio Sudeste, realizado em Uberlndia (MG), de 19 a 21 de junho de 2015, na Universidade Federal deUberlndia - UFU.2Estudante do quarto perodo de Publicidade e Propaganda da Universidade Federal Fluminense3Estudante do quarto perodo de Publicidade e Propaganda da Universidade Federal Fluminense4Estudante do quarto perodo de Publicidade e Propaganda da Universidade Federal Fluminense5Estudante do sexto perodo de Publicidade e Propaganda da Universidade Federal Fluminense6Orientadora do trabalho. Professora do Curso de Comunicao Social da Universidade Federal Fluminense

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    uso de esteretipos e depreciao de grupos minoritrios e entender os limites ticos

    necessrios para a construo de um anncio publicitrio com tom humorstico.

    Sero analisadas peas publicitrias denunciadas ao CONAR, rgo de

    regulamentao publicitria, que exemplificam o mau uso do humor reforando esteretipos,excluindo grupos sociais e que infringem a tica sob outro vis ao usar o humor. Possveis

    solues para a correo destas peas sero apresentadas ao longo do trabalho.

    At onde vai o humor na propaganda?

    Segundo Valls (1994, pg 7)

    Tradicionalmente ela [a tica] entendida como um estudo ou uma reflexo,

    cientfica ou filosfica, e eventualmente at teolgica, sobre os costumes ou sobre

    as aes humanas. Mas tambm chamamos de tica a prpria vida, quando

    conforme aos costumes considerados corretos. A tica pode ser o estudo das aes

    ou dos costumes, e pode ser a prpria realizao de um tipo de comportamento.

    Geralmente associa-se ao humor, o estado de nimo, bem-estar psicolgico e

    emocional, que provoca o riso, a euforia ou uma alegria momentnea. Segundo o artigo O

    Percurso Semntico das Acepes do Termo Humor (Anais doSIELP, v.2, 2012, pg. 4), apalavra humor surgiu na Grcia antiga, na medicina humoral, que representava os fluidos

    corporais (ou humores), que regulavam a sade fsica e emocional do homem.

    O humor tambm pode variar de acordo com as culturas, religies e costumes das

    sociedades, pois acompanha a tendncia sociocultural da histria de transformar as formas de

    pensamento, criando e derrubando paradigmas a todo momento.

    Como um aspecto cmico, ele tambm est relacionado ironia ou stira. Segundo

    Scrates, a ironia uma espcie de "docta ignorantia", ou seja, "ignorncia fingida" quequestiona sabendo a resposta e orientando-a para o que quer que esta seja, enquanto a stira

    pode ser considerada uma forma divertida de questionar costumes, defeitos ou situaes,

    podendo ser sutil ou no.

    As formas de expresso do humor podem ser variadas, controladas ou adaptadas, de

    acordo com a linguagem utilizada e com o pblico a quem se destina, para que no se torne

    imoral ou agressivo no contexto social. Para discutir a utilizao do humor na publicidade

    sob conceitos ticos, analisamos trs teorias fundamentais (BERGSON, 1993): a teoria da

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    incongruncia, do alvio, que baseia-se nos escritos de Freud (1995) e da superioridade,

    baseadas em estudos de Plato e Aristteles.

    A Teoria da Incoerncia surge do conceito de que atravs dos aspectos

    socioculturais do pblico se estabelece relaes inusitadas criadas de associaes de ideiasinicialmente distantes. A Teoria do Alvio, afirma que o humor provm da remoo da

    tenso gerada pela censura, destacando que o humor uma das formas de se enganar a

    censura, o proibido, rompendo o tabu em questo com o disfarce de uma piada. E, por fim, a

    Teoria da Superioridade, que parte do pressuposto que todo riso oriundo da sensao de

    superioridade de um indivduo frente a outro ou alguma situao.

    E uma vez, tal sensao de superioridade s existe em funo da inferiorizao de

    outrem, e que tal processo pode ser alcanado pela expresso de elementos de depreciaoem relao a este outrem, sugere-se, aqui, que na explicitao desta inferiorizao na

    publicidade, um dos contextos em que ela ultrapassa o limite do tico ao usar o humor.

    A utilizao do humor na comunicao uma prtica antiga e estava principalmente

    relacionada ao entretenimento, uma das principais foras da televiso, do cinema e da

    propaganda. Segundo SantAnna (2009), o humor uma ferramenta poderosa para fixar na

    mente e no corao. Porm, na publicidade o uso do humor possui um objetivo alm de fazer

    rir, o objetivo principal vender.

    O humor tambm frequentemente usado como ferramenta para diminuir o efeito

    zapping, que se refere mudana acelerada de canais nos intervalos comerciais. Ou seja, ao

    perceber um comercial com tom humorstico, engraado e divertido, o que percebemos que

    o telespectador/consumidor, tende a permanecer no canal e atrado pela marca ou produto.

    O grande problema, que h vezes em que esse humor ultrapassa limites ticos, seja ao

    apelar para zombarias e piadas de carter excludente, a serem explicados frente, utilizando-

    se de esteretipos depreciativos que atingem grupos minoritrios, seja ao transmitir uma

    mensagem que pode culminar em exagero.

    Um grande argumento de defesa, seja de comediantes ou de publicitrios/agncias que

    redigem uma pea humorstica, o de que piada piada. Em casos denunciados pelo

    CONAR por uso do humor reforando esteretipos/depreciando grupos minoritrios, por

    exemplo, no raras vezes as respostas de agncias e anunciantes costumam ser: s uma

    piada.

    Em uma entrevista ao programa Roberto Justus+, na TV Record, Danilo Gentili,

    apresentador e comediante fez uma afirmao que se repercutiu pelo universo humorstico,

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    dizendo que toda piada tem um alvo. Porm, at onde so respeitados os limites ticos da

    sociedade para atingir tais alvos?

    O documentrio O Riso dos Outros, dirigido por Pedro Arantes (2012) e que

    apresenta de forma imparcial diferentes opinies sobre o humor, reuniu diversos humoristasfamosos e defensores dos direitos humanos que discursam sobre o humor e suas vertentes

    perigosas, assim como a delimitao ou no de at onde a comdia pode ir e at onde vai o

    respeito ao outro.

    Diferente de um apresentador de stand up ou um comediante que responde por si, a

    relao entre marcas, televiso e pessoas muito maior porque tem o poder de massificar

    informaes, reforar conceitos e construir ideologias. Por isso, importante que a

    publicidade esteja envolvida e comprometida a produzir contedos a favor da tica, antesmesmo do objeto de venda.

    Os direitos humanos defendem no mbito da sociedade como um todo que, todos os

    homem nascem livres e iguais em dignidade e diretos. (DHU, 2014). Este e outros princpios

    ticos remetem, inclusive, ao combate de esteretipos/preconceito/discriminao. Na

    publicidade, encontram-se estes princpios, como por exemplo, um dos principais gerais do

    CBARP - Cdigo Brasileiro de Autorregulamentao Publicitria: Todo anncio deve ser

    preparado com o devido senso de responsabilidade social, evitando acentuar, de forma

    depreciativa, diferenciaes sociais decorrentes do maior ou menor poder aquisitivo dos

    grupos a que se destina ou que possa eventualmente atingir.

    Existem propostas contraestereotpicas para utilizar o humor respeitando os limites

    ticos da piada, da comdia e do discurso publicitrio, Leite (2008) prope algumas. O

    Politicamente Correto , muitas vezes, erroneamente visto de maneira negativa ou careta

    por um conceito equivocado, porm, pode ser utilizado na propaganda atravs da incluso de

    grupos de pouca visibilidade miditica que sejam alvos de esteretipos, preconceito ou

    discriminao em anncios e campanhas. Da mesma forma, a publicidade contraintuitiva

    pode contribuir no sentido de levar reflexo sobre os preconceitos e mostrar o

    constrangimento da postura preconceituosa. Ou seja, busca-se ir contra o esteretipo e os

    discursos depreciativos do outro, associando-os a papis positivos.

    O humor em exagero para persuaso publicitria

    Gerar risadas sempre algo bom quando se trata de publicidade. Um anncio mais

    engraado sempre penetra mais facilmente na mente dos consumidores, sem mencionar que

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    geralmente acaba sendo mais memorvel que todos os outros. No entanto, h uma linha tnue

    entre o que bem humorado ou engraado e o que exagero e passa a ser ofensivo.

    Gino Murta (2007, p. 129) fala de um anncio em que um mdico estava em uma

    concessionria adquirindo um carro, enquanto um paciente seu estava abandonado na mesade cirurgia, sob o pretexto de estar fazendo algo mais importante. Essa pea no somente

    trabalha de uma forma errnea o comportamento de consumo, mas tambm inferioriza uma

    vida humana perante um carro novo (MURTA, 2007). Tal anncio, de fato, atravessou a linha

    tnue entre o humor e o ofensivo, porque difunde um valor negativo para a vida individual e

    social: o materialismo.

    Alm disso, Ribeiro (2013) afirma tambm, em seu site intitulado Pequeno Guru, que

    a publicidade um investimento do qual se espera um retorno. E, nos dias de hoje, inegvelque as redes sociais tm conquistado cada vez mais destaque e importncia nas campanhas

    publicitrias e na vida dos consumidores. Logo, chamar a ateno dos clientes ou clientes em

    potencial nesses meios passa a ser um dos maiores objetivos das campanhas visto que

    grande a quantidade dos que se concentram nesses meios. Nesse processo, o uso do humor

    pode ser visto como ferramenta indispensvel.

    Uma mdia que acaba usando e dependendo muito do recurso do humor para chamar a

    ateno dos clientes imersos em campanhas semelhantes o rdio. Quando se fala em criar

    qualquer spot, sempre requerido algum tipo de som que surpreenda e prenda o ouvinte.

    O humor, por diversas vezes, exagerado propositalmente. O rdio uma mdia

    limitada, com menos recursos de interatividade, por no ter como prender o consumidor

    mostrando imagens espetaculares. Logo, por diversas vezes, so utilizados recursos mais

    arriscados e exageros humorsticos.

    Outro problema de humor excessivo a ofensa a algum ou a toda uma classe de

    pessoas, difundindo e criando mais esteretipos. A publicidade j tem como base uma viso

    estereotpica, a fim de facilitar a compreenso de anncios e evitar uma maior perda de tempo

    por meio da categorizao (JABLONSKI, 2010). Todavia, essas crenas amplamente

    compartilhadas sobre pessoas ou grupos de pessoas, como definiu Jablonski (2010), acabam

    sempre dificultando a vida em sociedade, por gerarem preconceitos e discriminao.

    Entretanto, existem sempre as marcas que conseguem se utilizar dos exageros em seu

    benefcio, sem precisar prejudicar a imagem de algum grupo ou tipo de indivduo nem

    reforar esteretipos. Um exemplo desse tipo de campanha que deu certo a do Twix,

    Gritos, feita pela AlmapBBDO. A marca se utilizou de recursos extremamente exagerados

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    - gritos repentinos, em momentos inesperados, dos personagens - e conseguiu chamar a

    ateno, de uma maneira bem positiva, dos consumidores.

    Marcas que sabem se utilizar dos recursos humorsticos disponveis acabam tendo

    uma maior visibilidade no meio miditico, ganham um diferencial muito positivo. Portanto, aquesto acaba sempre sendo o casamento entre o saber usar e o bom senso por parte dos

    envolvidos na criao dos anncios.

    Humor e excluso social

    Como afirma Murta (2007), a "propaganda tem contribudo para a gerao de

    consumidores eternamente insatisfeitos e frustrados com o que tem e so". Mas o que gera

    tamanho incmodo no consumidor? Uma das respostas talvez seja a que o consumidor sereconhece em um grupo inferiorizado, desvalorizado na pea.

    A comunicao publicitria atual valoriza nichos de grupos sociais especficos dentro

    de uma sociedade to ampla e diversa como a brasileira, e se o consumidor no se encaixa

    dentro de um desses nichos, ele esquecido e ignorado. O consumidor excludo vive

    querendo ou tentando participar de uma pseudo-massa que busca alcanar, assim como ele, o

    mesmo ideal de perfeio ou de padro de vida. Esse comportamento altamente nocivo e o

    prprio consumidor o despreza: foram dcadas de luta com publicidades sendo tiradas de

    circulao e reclamaes atravs da mdia ou rgos responsveis, e aps tanto rebolio,

    quando o consumidor senta em frente a sua televiso ou computador pensando que aquela

    publicidade que instiga e aumenta as diferenas sociais se cessou, ela volta vestindo um novo

    traje. Agora, ela est nas entrelinhas dos comerciais mais reproduzidos no horrio nobre, atrs

    da comdia, piadas e humor se esconde uma arma que nos atinge sem que percebamos.

    O humor na publicidade pode ser uma estratgia frtil, se bem usada, mas quando a

    risada vem a custo de outra pessoa ou grupo de pessoas, onde se esconde o problema. O

    apelo ao humor em si j um apelo emocional, o qual tem maiores chances de diminuir a

    reflexo racional sobre a mensagem que o consumidor est recebendo. Observando a

    publicidade que marcou dcadas, percebemos que, em sua maioria, usam o humor como

    estratgia. Contudo, a grande questo para alguns publicitrios parece ser sair da mesmice:

    como fazer um comercial de cerveja sem o esteretipo de loira burra ou superficial que

    entretenha o pblico com suas expresses vazias e frases sem nexo? Como promover

    produtos para emagrecimento sem oprimir e criar uma situao constrangedora mostrando

    uma pessoa acima do seu peso ideal? Como fazer um comercial de um carro sem dizer que

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    "seu bem causar inveja naqueles que no tem dinheiro para comprar os fazendo torcer o

    pescoo exageradamente, ou cair em um buraco na rua enquanto vislumbrava seu valioso

    veculo"?

    Acontece que escondido atrs das gargalhadas que os 30 segundos do VT nosproporcionam, h um grupo que ferido, que excludo socialmente ou humilhado. Para

    essas pessoas o humor na publicidade tem o efeito contrrio. Alm do aspecto de excluso do

    grupo, a prpria marca passa a ser mal vista por tal grupo.

    Em denncias feitas ao CONAR podemos observar que algumas propagandas com

    estratgia de humor passam despercebidas pela maioria dos consumidores, mas afetam uma

    pessoa ou um grupo.

    Imagem 1- Denncia de consumidores ao CONAR (Site do CONAR; abril/2014)

    Antes mesmos de tratarmos de casos especficos, um ponto interessante a se observar

    o posicionamento das marcas, agncias e rgos reguladores quanto a algumas reclamaes

    referentes temtica. Nos exemplos da imagem 1, o discurso destes comunicadores

    repetitivo e cansativo: "A denncia no tem nenhum fundamento, ns usamos esse elemento

    pelo qual o denunciante se sente ferido apenas em tom de humor. Era apenas uma

    brincadeira". Em nome de um capital maior, esses rgos e profissionais estimulam e

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    insistem em no olhar alm do seu lucro ou estudar a situao de um ponto de vista social,

    econmico e cultural analisando as consequncias que seu discurso de comunicao pode

    acarretar aqueles consumidores.

    Imagem 2- Denncia de consumidores ao CONAR (Site do CONAR; abril/2014)

    Na Imagem 2 do VT "Isabel" do Chester Perdigo7 realizado pela agncia de

    publicidade Talent Propaganda S/A e veiculado em dezembro/2013 , ao analisarmos a

    primeira questo a ser tocada na denncia ("Se no tem Chester, no tem a magia do Natal)no se pode afirmar que o humor apoiado atravs da histria da personagem, Isabel,

    compense a frustrao do pblico que est assistindo este comercial e no teria condies

    financeiras parar comprar um Chester para seu Natal: ser que esse pblico tambm riu?

    O mais provvel que tal consumidor tenha se sentido excludo de um ritual religioso

    e familiar por no ter condies para adquirir o produto. Uma marca conhecida como a

    Perdigo comunicando a ideia um pblico de milhes que "sem Chester, no h a magia do

    Natal", ou em uma interpretao mais profunda, que "voc no seria bem visto socialmentecaso no servisse Chester", gera um mal estar em um grupo minoritrio.

    Os clientes inferiorizados ou com uma imagem danificada por peas do cunho

    humorstico com apelo que gera excluso, provavelmente, no levaro consigo uma boa

    imagem da marca. E mesmo pequena, essa m publicidade pode gerar grandes consequncias

    para qualquer anuncianteprincipalmente no momento atual onde o consumidor tem voz e

    ouvido no s pela marca, mas como por seus semelhantes, consumidores em potencial.

    7Vdeo disponvel em https://www.youtube.com/watch?v=k-okbhioY7I

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    Imagem 3- Denncia de consumidores ao CONAR (Site do CONAR; maio/2014)

    Ainda na mesma linha de humor da publicidade da Perdigo, segue o VT "O

    chamado" da Old Spice8 (Imagem 3), da agncia de publicidade Grey Brasil, que procura

    deixar bem claro que seu produto feito para o "homens-homens" apresentando uma srie de

    esteretipos. As denncias feitas ao CONAR relatam machismo e homofobia no comercial, o

    que pode-se levar em conta pela ausncia de grupos diversificados de homens abrindo

    margem para a interpretao de que se o consumidor no se encaixa no perfil exibido no VT,

    no dever usar esse desodorante, e consequentemente no ser "homem-homem".

    Casos como estes dois citados se repetem em diversas denncias, algumas podem

    parecer exageradas, mas a questo da percepo da excluso social na publicidade um fator

    que varia conforme a vivncia de cada indivduo. A partir do momento em que h relatos de

    um grupo ou apenas uma pessoa que tenha se sentido coagida ou difamada de alguma forma

    vlido uma contestao se o humor da pea publicitria nos diverte ou nos diverge.

    Segundo Leite (2008), "a publicidade deve conectar suas linhas estratgicas e criativas

    aos esforos de discursos que orientam ao respeito diversidade identitria e multicultural".

    Ou seja, no basta fazer uma propaganda de sucesso com repercusso por seu lado

    humorstico quando o mesmo repercute com danos sociedade, quando um ou mais

    indivduos se sentem lesados. As risadas aos custos da marginalizao ou humilhao de um

    grupo de indivduos pode at gerar converso para uma marca, mas tambm pode corroborar

    com problemas sociais: pode-se fortalecer problemas como bullying, homofobia, racismo,

    classicismo, entre outros. Mas a quem culpar nesse jogo de risos que geram lgrimas? O

    8Vdeo disponvel em https://www.youtube.com/watch?v=Jx9MFSYExK0

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    publicitrio nem sempre consciente da intensidade de sua piada, de que o humor banal pode

    se tornar um humor negro, e deve, por isso mesmo, tal qual o cliente, estar sempre estar

    atento a essas questes.

    Uma possvel soluo para o problema aqui relatado pode ser a alternativa de usar ocontraintuitivo de Francisco Leite. Essa ideia permite o desenvolvimento de campanhas com

    humor e conscincia social. Em sua proposta do contraintuitivo, Leite (2008) sugere que um

    personagem representante de um grupo minoritrio exera uma funo principal na

    publicidade com um papel positivo, o que combinado ao humor poderia gerar surpresa e um

    alerta para questo da prpria excluso social na publicidade.

    Humor e esteretipo de gneroSegundo Jablonksi (2010), esteretipos remetem generalizao. Trata-se de crenas

    amplamente compartilhadas sobre uma pessoa ou um grupo de pessoas, que se referem no

    uma viso sobre elas em particular, mas ao que julgado mais similar ou repetido no grupo

    ao qual elas pertencem.

    Alm das propagandas que disfaram a excluso social com o humor, h tambm o

    esteretipo de gnero e a objetificao escondidos por trs da estratgia humorstica. Como

    em uma campanha da Hope, intitulada Hope ensina 9, com trs anncios veiculados em

    2011, que se mostrou problemtica e causou polmica. O vdeo consiste na modelo Gisele

    Bndchen dando uma notcia ruim ao marido, como por exemplo, que bateu o carro e

    estourou o limite do carto de crdito dele, mostrando, em seguida, o jeito errado e o

    certo de dar essa notcia. No jeito errado, a modelo est com um vestido e no certo

    somente de lingerie, incentivando as mulheres a usarem seu charme.

    Analisando essa propaganda, possvel constatar que ela claramente explora o corpo

    feminino, induz a objetificao da mulher, pejorativa e refora esteretipos de gnero. Essa

    campanha recebeu inmeras crticas e denncias, mas tambm houve um pequeno grupo

    defendendo que a mesma no ofendia nenhum grupo ou pessoa e que retratava com humor

    fatos da vida de um casal. Apesar das inmeras reclamaes, o caso foi arquivado pelo

    CONAR, mostrando mais uma vez que a forma engraadinha pode se sobrepor ao passar

    uma mensagem, mesmo quando enfrenta uma luta histrica, como a das mulheres por

    emancipao. (CONAR, 2014)

    9Vdeos disponveis em

    https://www.youtube.com/watch?v=Xb45-EC1Adk&list=UUfZcx375FzUx7bBXVzluGIw ;

    https://www.youtube.com/watch?v=8vyOpIHJzP4&list=UUfZcx375FzUx7bBXVzluGIw

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    Uma alternativa tica vivel para essa campanha seria o uso de homens no lugar da

    mulher como uma crtica a objetificao. E outra alternativa seria a proposta

    contraestereotpica, usando a prpria modelo num papel que questionasse o uso da

    sensualizao em um momento como esse, mostrando o quanto desnecessrio.

    Concluso

    A publicidade uma ferramenta poderosa para difundir ideias e reforar pontos de

    vista, sendo assim tambm tem a possibilidade de perpetuar discursos de dio, excluso e

    humilhao.

    Uma marca do povo brasileiro o bom humor e a publicidade brasileira no poderia

    escapar desse padro, sendo possvel ver inmeras propagandas que usam o humor comoestratgia de persuaso. Mas a discusso se forma em torno do limite do humor usado na

    publicidade, j que o exagero ou o tom da piada podem ofender uma pessoa ou grupo.

    J existem diversas propostas a fim de estabelecer um equilbrio entre o tico e o

    poder de venda, mas em contraponto, ainda h campanhas perpetuam algum tipo de discurso

    que ofende ou oprime. Podemos ver isso pelo nmero de denncias em rgos

    especializados, e nada mais bvio que esse discurso precisa imediatamente ser combatido.

    necessrio estudar o pblico e o produto, a fim de descobrir se o uso do humor em

    uma campanha seria interessante ou desagradvel. As redes sociais, um ambiente mais

    descontrado, so um excelente campo para usufruir dos resultados que uma estratgica de

    humor pode trazer, mas mesmo assim necessrio se colocar no lugar do espectador, que

    pode se sentir oprimido.

    A camada publicitria precisa ficar atenta a seu pblico e lembrar a responsabilidade

    social que a publicidade tem, cuidando para que a ideia genial no saia do papel como uma

    ofensa.

    Referncias:

    CONSELHO NACIONAL DE AUTORREGULAMENTAO PUBLICITRIA. Disponvel em:

    CARAMELO! BISCOITO! CHOCOLATE! - Twix e seu comercial muito engraado. Disponvel em:

    ENCARTA, Enciclopdia Microsoft. Teoria do humor.

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  • 7/24/2019 Humor Na Publicidade Uma Discusso tica

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