hojas para envolver alimentos_cocina tradicional colombiana

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16° Encontro Nacional da Associação Nacional de Pesquisadores de Artes Plásticas Dinâmicas Epistemológicas em Artes Visuais 24 a 28 de setembro de 2007 – Florianópolis Autopoiese: uma possível referência para compreender a arte como sistema Nara Cristina Santos - PPGART/UFSM Resumo Este artigo apresenta um estudo sobre uma possível referência para compreender a arte como sistema, a partir do conceito de autopoiese, no contexto dinâmico da arte, da tecnologia e das mídias digitais. Busca abordar o conceito inicialmente no campo da biologia e suas inter-relações com a arte e sua aproximação do campo cognitivo. Palavras-chave: arte, tecnologia, mídias digitais, sistema, autopoiese. Abstract This article presents a study on a possible reference to understand the art as system, starting from the autopoiese concept, in the dynamic context of the art, of the technology and of the digital media. Search to approach the concept initially in the field of the biology and their interrelations with the art and its approach of the cognitive field. Key words:art, technology, digital media, system, autopoiese. Este artigo apresenta algumas questões para pensarmos como o contexto dinâmico da arte pode abranger outros campos do conhecimento e gerar algum tipo de reflexão sobre a produção contemporânea, mais precisamente sobre os caminhos que a arte, a tecnologia e as mídias digitais podem traçar no percurso de uma história e de uma teoria da arte que continuam a interrogar-se sobre suas especificidades. Partimos de um questionamento inicial, sobre o conceito de autopoiese como possível referência para compreender a arte como sistema, que se mantém suspenso no decorrer deste artigo, pois ainda estamos em busca de respostas. Compreendemos a obra de arte pertencente a um sistema, auto- referente, dependente do artista e do interator para existir no entorno, em um contexto, através de um processo sinérgico. Consideramos a arte como sistema (GIANNETTI, 2002:163), concebida no seu conjunto ou na sua estrutura, formalizada no decorrer do processo de acontecimento da obra, enquanto projeto, cujo produto pode ser considerado como obra/projeto. Consideramos também o computador como um sistema, capaz de criar, produzir, visualizar, disponibilizar e manter imagens, cujo resultado no campo artístico não poderia ser outro, senão compreendermos a própria arte 433

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Hojas para envolver alimentos_Cocina tradicional Colombiana

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16° Encontro Nacional da Associação Nacional de Pesquisadores de Artes Plásticas Dinâmicas Epistemológicas em Artes Visuais – 24 a 28 de setembro de 2007 – Florianópolis

Autopoiese: uma possível referência para compreender a arte como sistema

Nara Cristina Santos - PPGART/UFSM

Resumo Este artigo apresenta um estudo sobre uma possível referência para compreender a arte como sistema, a partir do conceito de autopoiese, no contexto dinâmico da arte, da tecnologia e das mídias digitais. Busca abordar o conceito inicialmente no campo da biologia e suas inter-relações com a arte e sua aproximação do campo cognitivo. Palavras-chave: arte, tecnologia, mídias digitais, sistema, autopoiese. Abstract This article presents a study on a possible reference to understand the art as system, starting from the autopoiese concept, in the dynamic context of the art, of the technology and of the digital media. Search to approach the concept initially in the field of the biology and their interrelations with the art and its approach of the cognitive field. Key words:art, technology, digital media, system, autopoiese.

Este artigo apresenta algumas questões para pensarmos como o

contexto dinâmico da arte pode abranger outros campos do conhecimento e

gerar algum tipo de reflexão sobre a produção contemporânea, mais

precisamente sobre os caminhos que a arte, a tecnologia e as mídias digitais

podem traçar no percurso de uma história e de uma teoria da arte que

continuam a interrogar-se sobre suas especificidades. Partimos de um

questionamento inicial, sobre o conceito de autopoiese como possível

referência para compreender a arte como sistema, que se mantém suspenso

no decorrer deste artigo, pois ainda estamos em busca de respostas.

Compreendemos a obra de arte pertencente a um sistema, auto-

referente, dependente do artista e do interator para existir no entorno, em um

contexto, através de um processo sinérgico. Consideramos a arte como

sistema (GIANNETTI, 2002:163), concebida no seu conjunto ou na sua

estrutura, formalizada no decorrer do processo de acontecimento da obra,

enquanto projeto, cujo produto pode ser considerado como obra/projeto.

Consideramos também o computador como um sistema, capaz de criar,

produzir, visualizar, disponibilizar e manter imagens, cujo resultado no campo

artístico não poderia ser outro, senão compreendermos a própria arte

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16° Encontro Nacional da Associação Nacional de Pesquisadores de Artes Plásticas Dinâmicas Epistemológicas em Artes Visuais – 24 a 28 de setembro de 2007 – Florianópolis

produzida através da tecnologia e das mídias digitais a partir da concepção de

sistema, por toda organização e estrutura necessárias para sua existência

como obra em processo.

Passamos a entender que, para uma abordagem no campo da arte

também precisaríamos abranger o próprio processo a partir de uma ênfase não

apenas estética, o ponto de vista do observador e sua recepção, mas também

poética, o ponto de vista do artista, e sua produção; e o que chamaríamos de

ponto de vista engendrado da obra, estaria faltando. Para abordar a produção,

obra, projeto, em arte e mídias digitais como sistema, é preciso observar o

caráter híbrido de sua estrutura e o caráter sinérgico de sua organização, que

inclui o artista, o observador, o participante, agora interatores, e a própria obra,

interativa, em sensível emergência com o entorno. Tentando entender esta

abordagem como sistema e sua possível organização em um primeiro

momento, a noção de autopoiese a partir de Humberto Maturana e Francisco

Varela, surge como uma possível referência para discorrer sobre a arte como

sistema.

Entretanto, compreender apreender estas questões caberia ao

próprio interator, no papel do artista e/ou no papel do usuário. A obra arte,

enquanto processo de vir a ser, não poderia falar dela mesma senão a partir do

olhar do outro sobre ela. Um olhar, talvez pudesse envolver a geração de

autômatos, no campo da robótica ou da inteligência artificial, assim como a

produção vinculada à arte e as mídias digitais.

Neste sentido, convém ressaltar que não há, nesse momento, a

intenção de abordarmos a capacidade autogerativa de uma obra, em si

mesma, na sua autoprodução, auto-organização, através de algoritmos

genéticos, programas vinculados à inteligência artificial, ou às pesquisas na

área da robótica. Essa investigação está centrada no questionamento da

capacidade da obra/projeto de arte compreendida como sistema, perturbada

pela tecnologia digital, em reestruturar-se de modo a autogerar, nesse sistema,

condições de continuar existindo como arte, nesse momento de sua história.

Então, até que ponto a concepção de autopoiese seria pertinente ao

nosso estudo e não apenas uma adequação conceitual? A partir deste

momento, aproximamo-nos, de modo mais intenso, do conceito da autopoiese

na área da Biologia e seguimos o seu percurso na Sociologia, na Física e na

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Filosofia, buscando avaliar sua possível pertinência ao nosso campo de

investigação: a teoria da arte. Neste artigo nos limitaremos a apontar a

aproximação realizada no campo da biologia.

Autopoiese: a origem do termo e sua definição

A palavra autopoiese aparece da necessidade de usar um termo

mais evocador, como conta Humberto Maturana, para substituir a expressão

“organização circular”, que ele utilizava desde a metade da década de 60.i “(...)

eu concebi a palavra autopoiese justamente na tentativa de sintetizar ou

resumir em uma expressão simples e evocadora, o que me parecia o centro da

dinâmica constitutiva dos seres vivos” (MATURANA;VARELA, 1997:9). Na

compreensão do sistema biológico, as noções de informação e de

representação mostravam-se inadequadas para entender o cérebro e o

conhecimento. O sistema nervoso, descrito como um sistema fechado, e a

reflexão sobre a natureza circular dos processos neuronais e dos processos

metabólicos dos seres vivos, são os pontos dos quais se desenvolve a noção

de autopoiese.

Na literatura especializada, a noção de autopoiese foi introduzida

através do livro De Máquinas e Seres Vivos - Autopoiese: a organização do

vivo, de Humberto Maturana e Francisco Varela, editado, pela primeira vez, no

início dos anos de 1970. O termo designa o processo pelo qual os seres vivos,

considerados como sistemas, se autoproduzem continuamente e adquire

visibilidade além da área da Biologia, porque é um fenômeno que contém uma

“base de sensibilidades históricas”, delineada em retrospectiva, cuja idéia,

assim como a história, é uma possibilidade que se cultiva, segundo Francisco

Varela.

Se a autopoiese tem tido influência é porque soube

alinhar-se com outro projeto, cujo centro de interesse é a

capacidade interpretativa do ser vivo, que concebe o

homem não como um agente que ‘descobre’ o mundo,

mas que o constitui. (MATURANA;VARELA, 1997:35-36)

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O sistema autopoiético pode ser produtor e produto ao mesmo

tempo, pois existe uma relação generativa que dá origem a uma unidade

autopoiética, resultante de uma organização espontânea. Esta organização

mantém em si os processos componentes de sua produção autônoma, os

quais em interação, geram a mesma rede de processos que os produziram. Um

sistema autopoiético é, portanto, considerado fechado operacionalmente: um

processo que produz a si próprio e se mantém.

(...) esta rede de produções de componentes, resulta

fechada sobre si mesma, porque os componentes que

produz a constituem ao gerar as próprias dinâmicas de

produções que a produziu e ao determinar sua extensão

como um ente circunscrito, através do qual existe um

contínuo fluxo de elementos que se fazem e deixam de

ser componentes segundo participam ou deixam de

participar nessa rede. (MATURANA;VARELA, 1997:15)

O conceito de autopoiese de Maturana, autopoiese do ser vivo, parte

do princípio de que os seres vivos são unidades autônomas, diversas e

capazes de se reproduzir como um sistema autônomo, aquele que pode

especificar suas próprias leis, aquilo que lhe é próprio (MATURANA;VARELA,

1995:88-89). As especificidades da autopoiese são: - a autonomia do ser vivo

deve ser examinada na sua forma mínima, na caracterização da unidade

vivente; esta caracterização deve ser feita sobre a base de componentes

materiais e sobre o modelo de organização do vivo; esta organização é um

mecanismo de constituição de sua identidade material; o processo de

constituição da identidade é circular, a partir de uma rede de produções

metabólicas que produzem uma membrana que torna possível a existência da

rede, uma autoprodução única da unidade vivente no nível celular; a

autopoiese designa esta organização mínima do vivo; a interação da identidade

autopoiética acontece na estrutura físico-química e na unidade organizada, em

referência a sua identidade, e este ponto de referência nas interações faz surgir

o fenômeno interpretativo da constituição dos significados; a identidade

autopoiética possibilita a evolução através de séries reprodutivas, com variação

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estrutural, conservando a identidade; a constituição da identidade de um

indivíduo antecede o processo de evolução.

Essas especificidades da autopoiese do ser vivo concentram três

questões, que vêm sendo analisadas, entre outras, nos campos das ciências

cognitivas e da inteligência artificial, das ciências sociais e da comunicação.

São elas: propriedades emergentes existentes na natureza surgem de seus

componentes de base, mas não se reduzem a eles; o processo de

individualização contém capacidades emergentes ou de base interna, contém

propriedades intrínsecas da autonomia dos indivíduos que a constituem, de

modo que a série evolutiva não pode ser explicada somente sobre a base de

uma seleção externa; o fenômeno interpretativo é chave central dos fenômenos

cognitivos naturais, incluindo a vida social; surge a partir de uma identidade

bem definida, e não se explica por captação de informação do exterior.

Diante das especificidades da autopoiese e das questões

apresentadas, podemos considerar o conceito observando que um sistema

autônomo, detém capacidades emergentes de auto-organização, cuja interação

da identidade autopoiética se dá em referência a ela mesma, portanto auto-

referencial, gerando fenômeno interpretativo que ocorre a partir de seu interior.

Os elementos constituintes deste sistema, ou mesmo outros sistemas, podem,

em acoplamento estrutural, gerar fenômenos interpretativos interiores, que

mantenham a identidade do sistema. Nesse sentido, poderíamos pensar em

uma possibilidade de entender como elementos constituintes de um sistema, a

obra, o artista, o interator, o entorno e o contexto.

Autopoiese: uma referência para a arte como sistema

Tendo em vista que no universo sistêmico, temos os sistemas

alopoiéticos e autopoiéticos, cujo primeiro se estrutura a partir de relações

exteriores a ele, gerando algo distinto dele e cujo segundo se estrutura a partir

de inter-relações internas, se autoproduzindo, é preciso entender este último,

do qual nos aproximamos. O sistema autopoiético compreende originariamente

os sistemas vivos e por decorrência os sistemas de sentido. São os sistemas

de sentido que abrangem os sistemas psíquicos e, no âmbito da sociedade, os

sistemas comunicativos, enquanto sistemas sociais e suas realidades

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16° Encontro Nacional da Associação Nacional de Pesquisadores de Artes Plásticas Dinâmicas Epistemológicas em Artes Visuais – 24 a 28 de setembro de 2007 – Florianópolis

comunicativas. Como sistemas de sentido poderiam ser aproximados da área

das artes, ao concebermos a arte como sistema autopoiético, observando o

seu fechamento operacional e sua abertura cognitiva, sua determinação

estrutural e sua adaptação ambiental atualizando-se a cada instante.

Depois desse caminho percorrido, deparamo-nos com uma

possibilidade de compreender a arte e tecnologia sob uma abordagem a partir

da autopoiese, levando em conta os seguintes pontos: se existe o caráter

autopoiético no trabalho em arte e mídias digitais este não está apenas na sua

condição maquínica; a máquina não é responsável por uma “criação estética”,

mas é um elemento constituinte deste processo; todos os elementos

integrantes do processo, atuantes na estrutura da obra enquanto sistema,

podem determinar uma organização autopoiética; cada elemento interno da

obra contribui para sua existência, que se auto-organiza a cada instante e que

só pode ser compreendida pelos demais elementos que a constituem num

processo interativo; são elementos principais da obra: o artista interator, o

observador interator e a obra passível de interação; esses elementos em

acoplamento estrutural com seu entorno, permitem algumas perturbações no

sistema, e no seu contexto; não há como analisar um trabalho em arte e

tecnologia, senão no seio de seu acontecer e de seu autogerar-se, ou seja, a

partir do seu interior, participando de seu processo de existência. Não há um

observador, fora deste processo, que possa falar dele com propriedade, senão

numa “ação incorporada” (VARELA, 2003).

Neste ponto nos distanciamos da autopoiese do ser vivo para nos

aproximarmos da autopoiese do sentido; nos distanciamos da autoprodução e

nos aproximamos da auto-referencialidade. Portanto um processo autopoiético

se instaura não na obra maquínica, mas a partir dela e do que ela propõe, a

partir da proposição do artista e da ação do interator. É a estrutura constituída

pelos elementos, artista<>obra<>interator<>entorno<>contexto que se auto-

organiza sempre no acontecer da obra/projeto. Esta dinâmica sempre existiu

no universo da arte, mas o diferencial, agora, estaria na antiga estrutura,

artista-obra-observador, que se apresenta alterada agora nesta relação

interativa entre o artista, a obra e o interator num determinado entorno, num

dado contexto, em uma temporalidade distinta proposta pelas tecnologias

digitais.

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Provavelmente por isso, os artistas foram os primeiros, e ainda são,

aqueles que melhor definem a produção em arte e tecnologia. Um teórico da

área de arte é aquele que, apesar do olhar distanciado do observador

(WEIBEL, 2005), do “olhar de fora” que é próprio a qualquer observador precisa

aproximar-se do “olhar de dentro” para perceber a obra, a partir de seu caráter

interativo. Isto ocorre, quando, em algum momento, ele participa da sua

organização. Mas, como uma obra de arte vinculada às mídias digitais,

reconhecidamente com potencial interativo, e efetivamente aberta, pode deter

um caráter autopoiético, fechado operacionalmente mas aberto à troca de

energia? Observando o seu fechamento operacional e sua abertura cognitiva é

possível que obtenhamos uma resposta. Mas qual a possibilidade para uma

abordagem da arte, a partir desses referenciais.

No trabalho de Cláudia Giannetti (2002) sobre estética digital, ela

defende a necessidade deste olhar de dentro, interno, sobre a produção

vinculada às tecnologias digitais, questão que abordamos em artigo anterior.ii

No presente estudo esta questão surge como uma motivação a mais para

apresentar uma proposta de abordagem da arte como sistema a partir de sua

organização interna, deste olhar interior, a partir da autopoiese, compreendida

na sua auto-referencialidade.

Nesta investigação, nos questionamos sobre, até que ponto

trabalhar com o conceito de autopoiese, como auto-organização de um sistema

vivo, pode, de fato, engendrar outra coisa que não o vivo, mas um sistema de

sentido, como uma obra de arte em processo de acontecimento; não a obra em

si, mas o que ela envolve e o que a torna processo, obra, projeto de arte.

Considerações sobre autopoiese e cognição

Os estudos de Maturana e Varela aproximaram-se da neurofisiologia

e da percepção, mais precisamente sobre a noção de cognição que, por sua

vez, é um problema biológico. Eles desenvolveram uma explicação sistemática

de cognição e uma fenomenologia descritiva o que vem fundamentar a

aplicação da teoria da autopoiese, em outros campos do conhecimento.

Na teoria da autopoiese, a cognição é uma conseqüência de

circularidade e complexidade na forma de qualquer sistema, cuja conduta inclui

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a manutenção dessa forma mesma. A cognição é, nada mais, nada menos, do

que a conduta eficaz de um sistema vivente, dentro do seu domínio de

interações. Os sistemas viventes são sistemas cognitivos e em processo de

cognição.

As considerações de Randall Whitakeriii, sobre a pesquisa

experimental de Maturana e Varela no campo da neurofisiologia e da

percepção, levaram-no a questionar as noções de cognição, implicadas em

outros campos do conhecimento, como a Sociologia, o Direito, a Psicologia, a

Informática e a Comunicação. Como fenômeno biológico, a cognição é uma

conseqüência de circularidade e complexidade de qualquer sistema, cuja

conduta inclui a manutenção da forma mesma, o que geraria uma explicação

sistêmica da cognição e uma fenomenologia descritiva. Até que ponto uma

fenomenologia biológica poderia vir a ser uma biologia social? Nós nos

questionamos até que ponto esta biologia social/comunicacional poderia conter

elementos para uma fenomenologia artística.

Se a autopoiese pode ser relacionada ao campo da arte, existiria no

caso da arte e das mídias digitais uma determinação estrutural, em que a

interação acabaria sendo recorrente e determinantemente aberta ao fluxo de

energia, embora fechada na sua estrutura organizacional. Como poderia

ocorrer o processo de autopoiese na área da arte e tecnologia? Do ponto de

vista da autopoiese do ser vivo, inicialmente relacionado à máquina, e seus

programas, e à sua capacidade autopoiética; relacionado às linguagens

baseadas em algoritmos genéticos e a produção da obra, e à sua capacidade

autogerar-se; em relação a uma obra autônoma, robótica e resultante da

inteligência artificial; e, enfim, em relação aos elementos constitutivos da arte,

em seu processo, o artista, a obra, o interator, o entorno e o contexto. Este

processo poderia nos aproximar da autopoiese do sentido e talvez, se tornar

uma referência para compreender a arte na sua estrutura sistêmica. Referências Bibliográficas

COUCHOT, Edmond. La technologie dans l’art. Paris : Chambon, 1998.

GIANNETTI, Cláudia (org.). Ars telematica. Barcelona : L’Angelot, 1998.

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WEIBEL, Peter. In: El mundo como interfaz. EL PASEANTE. La revolución digital y sus

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Nara Cristina Santos. Doutora em Artes Visuais/História, Teoria e Crítica de

Arte, UFRGS, 2004. Doutorado Sanduíche na Université Paris VIII, 2001.

Professora do DAV/CAL/UFSM e coordenadora do PPGART/Mestrado em

Artes Visuais/UFSM. Pesquisadora na área de Arte Contemporânea, História e

Teoria da Arte e Tecnologia. Coordenadora do LABart/CAL/UFSM.

i A palavra surge e é proposta pelo biólogo a partir da conversa com o amigo José Maria Bulnes em 1971, que vinha trabalhando sobre as concepções de poiesis e práxis. Maturana esclarece no texto a origem do termo para não deixar dúvidas de que ele foi o mentor da palavra autopoiese. MATURANA, Humberto; VARELA, Francisco. De máquinas e seres vivos - autopoiese: a organização do vivo. 3ed. Porto Alegre : Artes Médicas, 1997, p. 17-18; MATURANA, Humberto. (MAGRO, Cristina et alii, org.). A ontologia da realidade. Belo Horizonte : Ed. UFMG, 2002, p. 32.ii Anais do 15º Encontro Nacional da ANPAP. Tomo1. Salvador, 2006. iii WHITAKER, RANDALL. Background for Maturana and Varela’s work. 1995. Disponível em: <http://www.acm.org/sigois/auto/Bib.html#MV1980>. Acesso em: 29 out. 2000.

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