gestão de fronteiras: biodiversidades regionais nos espaços fisiográficos territorializados entre...
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A palavra fronteira é uma expressão polissêmica, portanto, de múltiplos significados. O presente ensaio trata das fronteiras políticas internacionais e a sua problemática, não só na administração dos bens naturais coletivos, como também na problematização dos conteúdos socioeconômicos e políticos. O principal objetivo é levantar algumas questões fisiográficas, compreendendo desde a biodiversidade natural, como também o seu conteúdo social inerente às distintas regiões do bioma amazônico.TRANSCRIPT
ISSN: 2362-3365
II SEMINARIO INTERNACIONAL DE LOS ESPACIOS DE FRONTERA (II GEOFRONTERA):
DIFERENCIAS E INTERCONEXIONES1
5 – Naturaleza y ambiente en la Frontera/ Natureza e ambiente na fronteira
GESTÃO DE FRONTEIRAS: BIODIVERSIDADES REGIONAIS NOS ESPAÇOS
FISIOGRÁFICOS TERRITORIALIZADOS ENTRE DISTINTAS CULTURAS
Yoshiya Nakagawara Ferreira
UFPR- Dir. Pesq. CNPq
Carlos Roberto Ballarotti
UNOPAR
Resumo: A palavra fronteira é uma expressão polissêmica, portanto, de múltiplos
significados. O presente ensaio trata das fronteiras políticas internacionais e a sua
problemática, não só na administração dos bens naturais coletivos, como também na
problematização dos conteúdos socioeconômicos e políticos. O principal objetivo é levantar
algumas questões fisiográficas, compreendendo desde a biodiversidade natural, como
também o seu conteúdo social inerente às distintas regiões do bioma amazônico. As
dimensões e os distintos aspectos da fronteira amazônica, compreendendo nove países,
objeto principal deste trabalho, retratam problemáticas de diferentes amplitudes políticas,
geopolíticas e culturais. Como metodologia de abordagem foi feita uma breve análise dos
aspectos locacionais e principais problemas fronteiriços atuais, na tentativa de procurar
caminhos para compreender melhor as questões vinculadas à gestão de áreas fronteiriças,
com muitos bens naturais envolvidos. Trata-se de uma pesquisa de caráter bibliográfico com
abordagem evolutiva e crítica, na tentativa de ilustrar o processo de ocupação e conflitos
existentes nas regiões fronteiriças amazônicas. Ainda em fase de elaboração final,
1 Editor: Facultad De Humanidades y Ciencias Sociales (FHyCS) Universidad Nacional de Misiones (UNaM). Direccion: Oficina de Relaciones Internacionales – 1er piso Biblioteca, Calle Tucuman 1946, Posadas, Misiones, CPA: N3300BSP, Correo electrónico: [email protected]
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apresenta-se a caracterização regional dos fenômenos estudados e a observação dos
primeiros resultados.
INTRODUÇÃO
No imaginário popular nacional a floresta amazônica, muitas vezes, é lembrada como
uma porção verde localizada no estado do Amazonas (remetendo à sua nomenclatura). No
entanto, o bioma da floresta amazônica não reconhece fronteiras estaduais, pois está
presente nos estados do Mato Grosso, Goiás, Maranhão, Pará, Rondônia, Amapá, Acre,
Roraima, Tocantins e no já citado Estado do Amazonas.
O mesmo fator ocorre quando imaginamos que o bioma da floresta amazônica
termina nos limites de nossas fronteiras internacionais. A floresta amazônica está presente
em nove países da América Latina: Brasil, Venezuela, Colômbia, Peru, Bolívia, Equador,
Guiana, Suriname e Guiana Francesa, totalizando 7.783.345 milhões de km2 (imagem 1). A
Amazônia se divide em florestas montanhosas andinas, florestas de terra firme e florestas
fluviais alagadas (RAISG, 2009).
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Imagem 1: Limites da Amazônia Sul-americana. Fonte: RAISG (2009).
No Brasil se encontra 64% deste bioma. Neste artigo será feita uma breve
exploração da situação das fronteiras do restante da floresta amazônica (36%), que se
encontra nos demais países da América Latina. Para isso, foi realizado um levantamento de
materiais disponíveis sobre cada país amazônico. Os motivos que levam à perda da área
florestal em todas essas nações são parecidos, como o avanço da fronteira agrícola,
contudo, alguns países apresentam singularidades. Serão verificadas também ações para
criação de organismos integradores e de cooperação entre os países sul-americanos
localizados no bioma amazônico.
Zientara (1989) afirma que a origem da fronteira reside no movimento: “A fronteira
poderá ser avançada se as condições vitais mudarem nesse sentido, ou então se o
movimento em sentido contrário enfraquecer [...]”, mesmo “[...] se algumas sociedades
humanas tendem a fixar definitivamente as suas próprias fronteiras”. (p. 306). Para o autor,
a linha fronteiriça é uma abstração, que não possui existência real fora do mapa geográfico
e possui valores desiguais, “[...] mudam segundo a diferente importância assumida no
decorrer da história pelos múltiplos caracteres distintivos entre os homens” (p. 310).
Para as Ciências Sociais o termo “fronteira natural” designa um espaço ou limite
político, administrativo e legal que separa dois povos, duas nações ou dois países. Sob o
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ponto de vista da gestão ambiental, as fronteiras ou limites administrativos podem dividir um
sistema biológico e físico único, que faz parte de um sistema maior, como um bioma, um rio,
um lago (ANDERSEN, 2008, p. 4). A autora expõe que:
Experiências de planejamento e administração ambiental em vários países vêm demonstrando que a melhor maneira de se implantar projetos de desenvolvimento sustentável é através da gestão integral [...] tanto em sentido mais estrito, visando atenuar desequilíbrios num ecossistema, quanto em sentido amplo, para garantir que os valores intrínsecos das áreas naturais não sejam alterados (ANDERSEN, 2008, p. 5).
Essa é uma questão importante levantada pela pesquisadora, pois, no caso de uma
bacia hidrográfica, qualquer intervenção provocada no local poderá repercutir nos países
situados em suas margens. O mesmo vale para a grande floresta amazônica que não pode
ser preservada somente por alguns dos nove países inseridos nesse bioma.
A RELAÇÃO NATUREZA E SOCIEDADE EM FRONTEIRAS INTERNACIONAIS
Há muitas discussões sobre as noções de fronteira, zona de fronteira, limite
internacional, limite territorial, etc. Entre os vários pesquisadores que discutiram sobre o
assunto retomemos rapidamente o sentido de fronteira que será usado neste trabalho.
No estudo sobre a gênese da noção de fronteira, uma das maiores estudiosas do
Brasil sobre o assunto, Lia Osório Machado (1998) relata que este conceito é muito mais
antigo do que a concepção de limite internacional. “A literatura considera o Império Romano
e o Império da China como casos paradigmáticos na investigação das origens da concepção
de fronteira e da evolução de seu significado no tempo” (p.5).
Prosseguindo na sua explanação, Machado (1998) ilustra que os romanos, por
exemplo, não tinham interesse em estabelecer limites aos seus domínios, no entanto
criaram um sistema administrativo e defensivo de fronteira [...] para dificultar a expansão dos
povos bárbaros nas fimbrias do Império.
Citando Stephen Jones (1959), Machado introduz a expressão Limes, nome dado a
essas fronteiras, que designavam originalmente o caminho ao longo do limite de uma
propriedade.
Na análise da relação entre limite e fronteira, tomamos como referência a
observação de Machado, que propôs considerar,
[...] o limite entre unidades territoriais como uma solução [...] para estabilizar os movimentos de contração/expansão dos sistemas de povoamento, dos sistemas de intercâmbio, e dos sistemas de organização social, todos eles sistemas abertos, [...], caracterizados por um forte potencial de instabilidade. De acordo com essas premissas, nos períodos em que pelo menos um desses sistemas atinge um patamar de estabilidade, limite e fronteira
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tendem a convergir, e inversamente, quando qualquer um desses sistemas chega a um limiar de instabilidade, a tendência é a de divergência entre limite e fronteira territorial (MACHADO, 1998, p. 8).
Pode-se inferir que pela sua origem histórica, a palavra fronteira não estava
associada a nenhum conceito legal, nascendo como um fenômeno da vida social
espontânea.
Transpondo essa ideia para a atualidade, principalmente em relação aos conflitos
ambientais que surgem em áreas fronteiriças, no processo de desenvolvimento econômico,
Vanconcelos et al. (2011, p. 136) observam que através da prática social de um grupo se
estabelece as relações sociais de poder, neste caso “[...] o modo de produção e de
organização social e política do espaço representam a percepção e as significações que o
grupo tem sobre o espaço utilizado”. Por outro lado, a organização cultural, segundo os
autores “[...] representa um complexo sistema de valores, ideologias, significados de vida
que se desenvolveram ao longo da história e se especificam em diferentes contextos”. (p.
137).
Sendo a Amazônia uma fronteira geopolítica da biodiversidade, uma grande
realidade social, econômica e política brasileira é motivo de constantes conflitos
internacionais e regionais. A sua importância estratégica tem motivado a necessidade de
uma governabilidade mais ampla e global, pois a expressão “megadiversidade” tem sido
muito utilizada pela sua primazia, sobretudo pela vantagem comparativa, como sendo um
bioma com “[...] ampla disponibilidade de recursos biogenéticos, energéticos, além do
acervo de conhecimentos tradicionais acumulados pelas populações locais [...]” (ALBAGLI,
2001, p. 6).
Em 1992, durante a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e
Desenvolvimento, realizado no Rio de Janeiro, foi firmada a Convenção sobre Diversidade
Biológica (CDB), vigorando a partir de 29 de dezembro de 1993. Atualmente a principal
referência internacional para o debate e as ações relativas à área é a CDB, porque
considera a biodiversidade, também no nível genético; trata a conservação associada ao
uso sustentável; condiciona o acesso aos recursos genéticos à transferência de tecnologias.
Além disso, reconhece os direitos e deveres dos estados nacionais sobre seus recursos
genéticos e biológicos e incorpora a preocupação com os interesses e benefício das
populações tradicionais (ALBAGLI, 2001, p. 8).
Há muita legislação nacional em curso para regular o acesso aos recursos
biogenéticos amazônicos, para que esses não sejam explorados indefinidamente sem
retorno à região ou à população brasileira.
No que se refere ao bioma amazônico, uma das grandes dificuldades é a questão
das definições e redefinições de escalas espaciais, pois ao mesmo tempo, é muito
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importante pensarmos na população local, tanto do ponto de vista social, econômico, como
de sobrevivência, existindo muitos grupos sociais de várias naturezas convivendo nesse
bioma. Foi feita uma importante pesquisa por Dias e Santos (2003), sobre as produções
científicas da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Planejamento Urbano
e Regional (Anpur), nas quais consta a temática das escalas espaciais, particularmente
referentes à região, o território e o meio ambiente.
No trabalho realizado por esses autores, cujo recorte foi analisar a produção de 1986
a 2001 (portanto, no período de 16 anos), foram apontadas algumas tendências abaixo
explicitadas:
A reflexão ambiental articulada à organização territorial, a emergência das
experiências cotidianas e o meio ambiente como campo de diferentes
representações sociais desdobraram-se como possibilidades teóricas e tomaram o
seu lugar nas reflexões da Anpur.
Outras tarefas de ordem teórica e metodológica se colocam, e nesse ponto
consideramos que o conceito meio ambiente ainda deve estar aberto à reflexão,
principalmente no que se refere a uma mediação entre escalas.
Muitos estudos trazem análises que se fixam numa descrição e explicação de base
local. Em outras palavras, há justaposição entre a escala da área de estudo e a
escala de análise: as análises se estendem até a dimensão da ocorrência do
fenômeno e os conflitos sociais são descritos e explicados nos limites territoriais
onde ocorrem.
Redefinir meio ambiente implica não só dar-lhes historicidade e trazê-lo para o
campo da política, mas desvendar a configuração da ação do poder, tanto interna
quanto externa ao local onde os conflitos visivelmente ocorrem.
ALGUMAS DIVERSIDADES DO BIOMA AMAZÔNICO, ALÉM DA BIODIVERSIDADE
No caso dos países que compõem a Amazônia, encontramos situações onde as
políticas desenvolvimentistas prejudicam a manutenção e a proteção dessas áreas, como no
caso da Venezuela. Outros países amazônicos já promovem uma política totalmente
preservacionista, como o Suriname, casos que veremos nas observações seguintes.
Ao Brasil pertence a maior parte desse bioma, com aproximadamente 5.006.316
milhões de quilômetros quadrados, ou seja, 64% da floresta amazônica estão dentro do
território brasileiro. O desmatamento estimado, segundo a British Broadcasting Corporation
(BBC, 2013) é de 700.000 km2 desde 1970.
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Na tabela 1 apresentamos a distribuição por km2 da área amazônica de nove países,
com um breve comentário sobre a situação da preservação ou devastação da floresta,
expansão da fronteira agrícola e pecuária, exploração petrolífera e mineira, conforme dados
obtidos recentemente pela British Broadcasting Corporation (BBC, 2013) e pela Rede
Amazônica de Informação Socioambiental (RAISG, 2009).
Tabela 1: Distribuição da área Amazônica por países em km2 - 2009 (Fonte: RAISG, 2009).
A Venezuela possui 453.915 km2 dentro da área amazônica (5,8% do total) (RAISG,
2009). Entretanto, somente 51.000 km2 são de área florestal preservada, possuindo a taxa
de desmatamento anual a média de 2.876 km2. Mais de 35% do país está oficialmente
protegido num sistema de parques e reservas, mas segundo a BBC (2013), muitas destas
áreas existem apenas no papel. Segundo Oliveira-Miranda; Zambrano (2009), as principais
causas da perda da vegetação amazônica no país ocorrem por causa da extração ilegal da
madeira, mineração (imagem 2), queimadas, turismo, pressão populacional, criação de
hidroelétricas, mudanças nos padrões agrícolas, além da exploração de produtos naturais e
mudanças climáticas.
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Imagem 2: Garimpo ilegal localizado no meio da floresta amazônica, na Venezuela. A imagem foi feita em 17 de novembro de 2012, durante sobrevoo sobre a região (Foto: Jorge Silva/Reuters).
A Colômbia possui 483.119 km2 da floresta amazônica (6,2%). Segundo a ONG
Amazonas 2030 (2011), a principal causa da perda florestal no país seria motivada pelas
plantações de coca, sendo que desde 1998 o país perdeu 20.000 km2 de mata nativa.
Atualmente tem perdido anualmente a média de 2.000 km2 de suas matas. Outro fator
apontado são os assentamentos permanentes que surgem ao longo dos grandes rios da
região. Os departamentos de Caquetá, Putumayo e Guaviare são responsáveis pela maioria
da área desmatada. (COLÔMBIA, 2011).
O Peru contém 782.820 km2 (60,6% da área total do país) de floresta amazônica, ou
seja, 10,1% do total continental. Onde a preservação da mata também ocasiona a
preservação das cabeceiras dos grandes rios da Bacia Amazônica. A média anual de
desmatamento se encontra em 2.240 km2. Segundo a BBC, o índice de desmatamento é
relativamente baixo comparado com outros países da região, que ocorre como resultado de
atividades como a exploração de madeira, a agricultura comercial e a construção de
estradas.
A Bolívia apresenta 475.278 km2 (6,1%) de floresta amazônica, sendo a média anual
de desmatamento entre 2.700 km2. Segundo a RAISG, entre as principais causas do
desmatamento no país estão a expansão da fronteira agrícola, a pecuária e a atividade
madeireira. Na década de 1990, a Bolívia registrou elevados índices de desmatamento, por
causa da distribuição de terras para companhias madeireiras, contudo na década passada
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tornou-se líder mundial na promoção da gestão sustentável da floresta por meio de
catalogação das madeiras extraídas de uma floresta gerida (BBC, 2013).
O Equador totaliza 116.604 km2 do território dentro da área amazônica (1,5%) e
apresenta uma média anual de 2.864 km2 de desmatamento, sendo que o total de cobertura
florestal se encontra em 45,7% do seu território. Entre os principais causadores do
desmatamento estão a exploração petrolífera e mineira, sendo esta acompanhada pela
colonização dessas áreas, somando-se a isso a crescente demanda de terras para o
monocultivo de Dendê. (RAISG, 2009).
Na Guiana encontramos 214.969 km2 de área amazônica (2,8%), contudo a área
total da floresta é de 151.040 km2, ou seja, 70,03% (BBC, 2013). A média anual de
desmatamento se encontra em 450 km2, sendo a extração de bauxita e ouro a principal
causadora da devastação florestal. Ainda soma-se a isso o aumento nas exportações de
madeira e o crescente interesse nos biocombustíveis.
A Guiana Francesa possui 86.504 km2 (1,1%) dentro da área amazônica e a
estimativa de desmatamento de acordo com a BBC (2013) foi de 2,6% da área florestal
entre 1990 e 2005, deixando a área florestal do Departamento Francês com 81.573 km2
(94,3% do total de sua área). A extração de ouro e a expansão da fronteira de colonização
têm degenerado a floresta.
No Suriname são encontrados 163.820 km2 de área amazônica (2,1%). Segundo a
BBC (2013) a média de desmatamento anual é de 325 km2, um dos índices mais baixos de
desmatamento do mundo, sendo que atualmente a área florestal do país é de 90,2%
(147.760 km2). A principal ameaça é a atividade mineradora de pequena escala que polui o
meio ambiente com mercúrio. Somente 5% da sua população vive na floresta tropical
(indígenas e seis comunidades de descendentes de escravos fugidos que vivem no interior
da floresta e mantém o estilo de vida tradicional do oeste africano).
Um estudo pan-amazônico, com resultados impactantes sobre a região foi efetuado
pela Rede Amazônica de Informação Socioambiental (RAISG), que congrega 11 ONGs e
institutos regionais. O fruto desse estudo foi o atlas “Amazônia Sob Pressão” que mediu com
base em imagens de satélite, o desmatamento entre 2000 e 2010, em todos os países que
abrigam a floresta amazônica, além de mapear as principais ameaças ao ambiente e à
população local. Segundo este documento a Amazônia perdeu 240.000 km2 de floresta, ou
seja, 3% de sua área total em apenas 10 anos, o que seria equivalente ao território da Grã-
Bretanha. Segundo a RAISG (2013), nesse período o Brasil foi responsável pelo
desmatamento de 80,4% da Amazônia, seguido pelo Peru, que desmatou 6,2% e depois a
Colômbia que desmatou 5%. A pesquisa mostra também que o ritmo de desflorestamento
no Brasil e na maioria dos países sul-americanos tem se reduzido desde 2005, contudo a
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taxa de desmatamento tem se mantido estável no Peru e aumentado na Colômbia e na
Guiana Francesa.
Nos estudos da RAISG as principais pressões sofridas pela floresta são ocasionadas
pela abertura de estradas, a exploração de petróleo e gás, a mineração, hidrelétricas, focos
de calor e o desmatamento. A presença de estradas na Amazônia estaria associada à
exploração ilegal da madeira, ao avanço de atividades agropastoris e aos grandes projetos
de infraestrutura e urbanização. A pressão exercida por essas estradas aumenta à medida
que avança a Iniciativa para a Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA),
que seria um empreendimento conjunto de governos da região. Como exemplo teríamos
uma rodovia ligando o Oceano Pacífico com as áreas habitadas da Amazônia brasileira,
facilitando o escoamento de produtos e abrindo caminho para exploração do interior da
floresta. Ainda, de acordo com a RAISG, a expansão da pecuária e da produção agrícola,
também está entre as maiores ameaças à floresta e aos seus habitantes. No caso do Brasil,
em 93% das terras exploradas pela agropecuária, não existe a utilização de técnicas
intensivas para elevar a proporção da criação de bois por hectare (RAISG, 2009).
Na Amazônia Andina o Petróleo e a mineração são atividades que ameaçam a
floresta, pois estão ligadas à poluição da água e do ar, a contaminação do solo e a
destruição de ecossistemas naturais. A organização estima que há 327 lotes com potencial
de exploração de petróleo e gás em toda a floresta, que ocupam 15% de sua área. Cerca de
80% dos lotes se encontram na Amazônia Andina, local onde vive metade dos 385 povos
indígenas da região. (RAISG, 2009).
Andersen (2008) aponta as dificuldades na gestão compartilhada de um grande
bioma: os diferentes interesses na exploração dos recursos, as diferentes políticas públicas
de gestão, diversidade nos assuntos jurídicos e administrativos, além dos diferentes padrões
de qualidade ambiental entre esses países. Contudo, trata-se de uma negociação entre os
países envolvidos na expectativa de um acordo ou tratado de cooperação. Nesse caso, os
nove países amazônicos começam a colher os primeiros frutos de uma experiência de
gestão em conjunto.
O tratado de Cooperação Amazônica (TCA) foi assinado em 1978, por Bolívia, Brasil,
Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela, sendo este o instrumento jurídico
que reconhece a natureza transfronteiriça da Amazônia. (OTCA, 2013).
A Organização do Tratado de Cooperação Amazônica (OTCA) é um organismo
internacional criado para ser um instrumento integrador e de cooperação nos países sul-
americanos na questão de suas políticas referentes à região amazônica, fortalecendo a
construção de sinergias com outros atores nacionais, organismos multilaterais, agências de
fomento, movimentos sociais, comunidade científica, setores produtivos e da sociedade civil.
Sua sede (Secretaria Permanente) se localiza em Brasília e possui oito países membros
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localizados na região amazônica, sendo que a Guiana Francesa ainda não foi incluída como
membro da organização (OTCA, 2013).
A cooperação entre os países amazônicos para preservação em conjunto de suas
florestas ocorre lentamente. Uma parceria de pesquisa entre o Instituto Nacional de
Pesquisas Espaciais (INPE) e a Organização do Tratado de Cooperação Amazônica
(OTCA) foi firmada para monitorar o desmatamento nesses países. Essa parceria também
recebeu o incentivo do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES),
que liberou fomento de 23 milhões de reais para a OTCA. Isso possibilitará a capacitação de
técnicos da Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana, Peru, Suriname e Venezuela, que
aprenderão no Centro Regional da Amazônia do INPE, na cidade de Belém (PA), a manejar
as ferramentas que se tornaram referência mundial no monitoramento por satélites.
(BRASIL, 2013).
O monitoramento por satélites é hoje imprescindível na contenção do desmatamento
para proteger a biodiversidade e frear alterações no clima, além de gerar as informações
necessárias à implantação de políticas voltadas ao desenvolvimento sustentável. Está
prevista também a instalação de “Salas de Observação” nos países membros da
organização, os quais poderão acompanhar em tempo quase real, as informações sobre a
extensão e a qualidade da cobertura florestal nessa região. (BRASIL, 2013).
Como considerações finais assinalamos que, apesar de muitos estudos realizados
pelos pesquisadores e amplamente difundidos nas Universidades, como pela imprensa,
tanto de antropólogos, historiadores, geógrafos, geólogos e cientistas sociais e da natureza
de um modo geral, os resultados apontam para a necessidade de uma consciência nacional
mais profunda sobre a Amazônia. Apesar dos tratados internacionais, binacionais ou
regionais já existentes, um bioma como a Amazônia ainda necessita de muitos estudos
aprofundados, tanto no âmbito das ciências naturais, como humanas. O caráter geopolítico
dessa região requer não só tratamentos internacionais, mas principalmente a participação
mais efetiva dos países e da população envolvidos. Já houve uma grande perda das nossas
raízes históricas e arqueológicas, como também perdas da fauna e flora que ainda
continuam desconhecidas pela sua grande biodiversidade e diversidade sociocultural.
Não se trata mais, no caso do bioma amazônico, de uma questão geopolítica, ou
socioeconômica fronteiriça, mas de uma questão de escala planetária, solidária, filosófica e
sociocultural. Sem essas reflexões, dificilmente avançaremos em todas as direções
necessárias. Pois, a ecologia e a antropologia filosóficas devem preceder qualquer
pensamento “fronteiriço”.
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