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PAÍSES DO LESTE EUROPEU: AS REFORMAS PARA UMAECONOMIA DE MERCADO - O CASO DA HUNGRIA

Regina Salvador*

* Doutorada em “Espaço e Economia” pela Universidade Nova de Lisboa (1993) e em “Economic Development” pela University of London(1998).Professora associada com agregação da Universidade Nova de Lisboa, onde é responsável pelas cadeiras de “Teorias e Políticas de

Desenvolvimento” e “Geoeconomia da Europa” a nível de Licenciatura e “Organização Espacial das Sociedades” e “Políticas deDesenvolvimento”, nível de Mestrado. “Visiting Professor” da Universidade de São Paulo (Brasil) e da “Catholic University of San Diego”(EUA). Conferencista do Instituto Superior Técnico (IST) no Mestrado em “Engenharia e Gestão da Tecnologia” e no Programa IMPACT

(desenvolvido com a “University of Texas at Austin”, EUA). E-mail: [email protected]

I - IntroduçãoDesde a queda do Muro de Berlim (a 10

de Novembro de 1989) e a desintegração doCOMECOM (Maio de 1991) que os novos Estadosda Europa Central, do Báltico, a Rússia e outrosterritórios da ex-URSS têm desenvolvidoesforços hercúleos no sentido de orientarem assuas economias pelas leis do mercado e nãomais pelo planeamento centralizado que asregeu durante décadas.

Nos primeiros anos, esta transformaçãoeconómica foi acompanhada por uma profundainstabilidade nos preços e na produção. Porém,a implantação de programas de estabilizaçãoeconómica por parte do FMI e do Banco Mundialajudaram alguns países, criando um ambientepropício à introdução de profundas reformasestruturais.

Mas os desafios ainda se mantêmenormes como o testemunham a situaçãoeconómica e social de países como a Albânia, aBulgária ou a Roménia (entre 1996 e 1997) oua grave crise russa de 1998.

Desemprego, corrupção e criminalidadefazem ainda parte do dia-a-dia de grande partedestes “países em transição”. E, em algunsdeles, o nacionalismo descontrolado e axenofobia, fenómenos até então controladospelo comunismo, agravam ainda mais asprofundas crises económicas e sociais.

Assim, a nova ordem política e económicaainda continua frágil em alguns países queadoptaram o modelo ocidental de economia demercado, apesar de as reformas conducentesa este novo modelo estarem a serimplementadas, em menor ou menor grau, emtodos os países em transição.

II – As reformas para a transição económicaA transição económica dos países de

economia centralizada constitui um processohistórico que implica profundas mudanças emquase todos os aspectos da sociedade. O seuprincipal objectivo é a adesão dos países, atéentão de planeamento económico centralizado,ao capitalismo: é a despolitização da economia,a activação dos mercados, a privatização dapropriedade e dos meios de produção.

A maioria dos analistas da transiçãoeconómica, nomeadamente Jeffrey Sachs, daUniversidade de Harvard, propôs o “shocktherapy model”, uma receita para uma transiçãode sucesso que converge nos critériosobjectivos que têm sido “impostos” pelasinstituições de Bretton Woods:

1) Liberalização da actividade económica,dos preços e dos mercados, que permita aalocação dos recursos para a sua utilização maiseficiente;

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2) Estabilização proporcionada pelodesenvolvimento de instrumentosmacroeconómicos orientados para a economiade mercado;

3) Descentralização da propriedade eprivatização da actividade económica;

4) Desenvolvimento de um quadro legal einstitucional que defenda os direitos depropriedade privada, balizado por umareorientação do papel do Governo na economia.

Todos estes critérios objectivos, que sesintetizam na Figura 1, podem ser quantificados,

FIGURA 1 - Os “ingredientes” da transição económica

pelo que a questão essencial na análise dasvárias experiências de transição é saber a partirde que ponto se pode considerar que a tãoalmejada economia de mercado foi (ou não)alcançada.

Por outro lado, estes critérios ou“ingredientes” têm em conta o grau de aplicaçãode políticas sistemáticas de liberalização dospreços, do comércio, dos mercados financeiros(incentivo ao investimento privado), de reformasfiscais e monetárias e de criação e consolidaçãode fortes instituições de apoio 1 .

REFORMA POLÍTICA

REFORMA ECONÓMICATransição para economia de

Mercado - Liberalização

PROGRAMA DE ESTABILIZAÇÃOECONÓMICA

ENQUADRAMENTOINSTITUCIONAL

MACRO- Moeda-Orçamento- Rendimento-Taxa de câmbio

MICRO- Preços-Mercado trabalho- Tarifas- Seg. social Pr

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Europa Central, isto é, nos países com melhorperformance económica e índices decrescimento.

Alguns dos países em transição têmregistado êxito na abertura das suas economiase na reorientação das exportações para osmercados internacionais. As exportações e osserviços têm sido os motores do crescimentodas economias em transição. A produçãoaumentou mais nos países com maiorcrescimento médio das exportações, o quesugere que a abertura das economias e apromoção das exportações são importantesdeterminantes do crescimento.

Os países em transição têm registadoêxito na abertura das suas economias e nareorientação das exportações para mercadosinternacionais. Vários países diversificaramrapidamente as exportações e algunsinverteram a tendência de queda do valorunitário das exportações de máquinas, o queindica que a qualidade dos seus produtos estáa melhorar.

Alguns analistas defendem que seja qualfor o ritmo da liberalização, o comércio externoe as transacções cambiais devem serliberalizados mais lentamente do que osmercados internos, com o intuito de diminuir aqueda inicial do emprego e da produção.

A liberalização rápida do comércio podeser benéfica: a Estónia eliminou as barreiras àexportação, bem como as restriçõesquantitativas à importação, o que permitiu uma

II. 2. – A estabilização económicaA lição menos controversa e

surpreendente da transição económica é que aestabilização económica sustentada (baseadaentre outros factores no controlo da inflação,no incentivo à poupança e ao investimento) éfundamental.

As economias em transição enfrentam, emgeral, graves problemas com a implementaçãodos programas de estabilização impostos peloFMI. Um destes problemas consiste nadeterminação do tipo de taxa de câmbio (fixaou flexível) que se deve utilizar na redução dainflação e dos custos da transição.

As várias experiências de transiçãodemonstraram que, tanto as taxas de câmbiofixas (caso da Croácia, Estónia, Hungria ePolónia no início da transição) como as taxasde câmbio flexíveis (Albânia, Eslovénia, Letóniaou Moldávia) permitem reduzirconsideravelmente a inflação.

No início do processo de transição, astaxas de câmbio fixas constituem uminstrumento válido da política de estabilização.A troca automática de divisas por moeda local auma taxa de câmbio fixa permite que os agenteseconómicos reponham mais rápida e facilmenteos seus saldos reais. Todavia, com o avanço daliberalização, as taxas de câmbio flexíveisrevelam-se mais eficientes na redução dainflação e na estabilização económica.

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ausência de proprietários “fortes”. Tal situaçãotem conduzido a que alguns mutuários, perantea subida das taxas de juros, não reduzam ocrédito mas aumentem cada vez mais o seuendividamento. Este endividamento crescenteorigina juros reais muito altos, o que poderáoriginar graves crises financeiras.

Assim, um dos aspectos cruciais daestabilização é a necessidade de resolução doproblema da insolvência dos bancos e dasempresas, acompanhada da intensificação daeficiência e da concorrência dos mercadosfinanceiros e da intermediação financeira. Assimse justifica que em diversos países em transiçãose verifique a exclusão dos leilões de créditodas instituições bancárias mais instáveis.

Neste contexto, a reforma do sectorfinanceiro é fundamental para a promoção docrescimento, permitindo o reforço daintermediação financeira e o aumento daeficiência na alocação dos recursos financeiros.

Porém, na maior parte dos países emtransição a criação de um sistema bancáriocompetitivo e aberto às instituições financeirasestrangeiras encontra-se ainda numa fasemuito incipiente.

Outro aspecto da estabilização económicaé, como referimos, o incentivo à poupançainterna dos agentes económicos como forma deaumentar o investimento interno, essencial natransição, já que o investimento estrangeiro

Os países onde a transição é incipientetêm ainda pela frente a árdua tarefa de salvaras suas economias da instabilidade económicae do controlo estatal que continua a dificultar atransição.

É assim necessário encontrar e manterpolíticas macroeconómicas eficazes, de modo apermitir o crescimento económico sustentado,seja através de taxas de câmbio fixas ouflexíveis, de taxas de juros baixas e da solvênciadas instituições bancárias.

II.3 – A descentralização da propriedadee a privatização da actividade económica

A descentralização da propriedade e aprivatização da actividade económica foi/é umaoutra reforma necessária.

Diversos autores citam Adam Smith (nasua obra “An Enquiry into the Wealth of Nations”,publicada em 1776), para demonstrar que aideia de “privatização” estava já presente nopensamento económico clássico, embora sem aaplicação que viria a ter dois séculos mais tarde.

Para Adam Smith, a venda de terras daCoroa libertaria dinheiro que, ao ser utilizadono pagamento da dívida pública, aumentaria osrendimentos. Por outro lado, os terrenosagrícolas ao se tornarem propriedade privadapassariam a ser melhor explorados.

Vários estudos desenvolvidos, quer empaíses desenvolvidos com economias demercado consolidadas quer em países em

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públicas (em França, por exemplo) que serevelam mais produtivas do que muitasempresas que se renderam ao capitalismo“selvagem”.

Por outro lado, em todas as economiasem transição a privatização estimula a criaçãode instituições fundamentais: é o caso dosmercados de capitais, de sistemas jurídicosliberais ou de profissões relacionadas com aactividade empresarial. Como diz Lombardini,“the conditions must be created for both moreefficient markets and a more efficient state:privatisation is only one of the structural changesrequired” (1992:117).

Os direitos de propriedade constituemassim a alma da estrutura de incentivos daeconomia de mercado.

No modelo de planeamento centralizado,as empresas estavam protegidas daconcorrência e funcionavam segundo a“economia de escassez” onde tudo o queproduziam era rapidamente tragado pelosconsumidores.

Com a transição económica, passou-se deum regime baseado nas transferências e nossubsídios para um novo sistema, baseado norisco, na disciplina financeira e na procura dolucro.

A transição exige reformas eficazes quepermitam a disciplina fiscal e favoreçam aconcorrência, a entrada de novas empresas e oencerramento de empresas que não sejam

relações entre o Estado e as empresas. Porexemplo, na Rússia a maioria das quintas doEstado foi privatizada mediante a sua conversãoem grandes sociedades anónimas, apesar deesta não ser a forma de propriedade maiseficiente para a agricultura. Neste mesmo país,estima-se que cerca de 16 biliões de dólares (oequivalente a 80% do PIB), é desviado para omercado informal e continuam a constituirrendas para determinadas elites (rent seeking

Por outro lado, a privatização deempresas de pequena dimensão mostrou-semuito mais fácil que a das grandes empresas. Amaioria das empresas de pequena dimensãodedica-se ao comércio e aos serviços,actividades de tecnologia simples e de fácilacesso, enquanto que as de grande dimensãoenfrentam obstáculos relacionados com ogrande volume de capital, a necessidade de umareestruturação profunda e as deficiências nasáreas da regulamentação e da gestão.

Entre os sectores onde as privatizaçõestêm sido proteladas por mais tempo contam-se, evidentemente, os serviços públicos e infra-estruturas (electricidade, telecomunicações, gásnatural, oleodutos, abastecimento de água,portos e aeroportos). A privatização destessectores apresenta problemas específicos: asempresas são de grande porte, de grandeintensidade de capital e, muitas vezes, sãoconsideradas estratégicas do ponto de vista daDefesa Nacional.

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instituições necessitam de ser acompanhadaspor um Estado forte que assuma um novo papelestratégico na economia. O Estado éimprescindível na transição - “the efficiency ofmarkets depends to a large extent on theefficiency of certain services provided by thestate” (Lombardini, 1992: 118) – e acredibilidade do seu empenho reformador écrucial.

O Estado deve ditar as regras do jogo daeconomia de mercado, nomeadamente emsectores estratégicos como a segurança sociale o direito de concorrência. O papel do Estadona economia assume-se assim numa óptica decomplementaridade.

Por outro lado, a criação de um quadroinstitucional eficiente, onde impere a aberturaao exterior e a transparência, é a chave dosucesso para uma das reformas estruturais – aprivatização. De facto, “to perform their tasks,governments in market economies need somewell-developed institutions run by competentindividuals and guided by appropriateincentives” (Idem: 118).

O fim das regulamentaçõesdiscriminatórias do Estado e a criação deinstituições eficientes reduzem o risco, criam umambiente favorável ao investimento e fomentama iniciativa privada.

Por outras palavras, a criação de um“market-friendly environment” encoraja apoupança, o investimento privado, o crescimento

do respeito pela propriedade privada e apromoção de um enquadramento institucionalfavorável.

III – Balanço de uma década de transição paraa economia de mercado

III.1 – A heterogeneidade naadaptação às novas regras do jogo

A nova ordem (ou desordem?) é aindafrágil e incipiente em alguns países do LesteEuropeu.

A própria composição interna dosterritórios pós-comunistas representa um“puzzle” de difícil ordenação, com distintaspeças de natureza étnica, religiosa, social eeconómica.

Verificamos que os países mais próximosda Europa Ocidental e com maior experiênciade democracia política e económica (comdestaque para a Hungria e Polónia), têmrevelado uma maior capacidade de adaptaçãoàs novas “regras do jogo”. O mesmo nãopodemos dizer dos países geograficamentemais distantes da Europa Ocidental: nestes, osefeitos do planeamento centralizado são maisprofundos (para além de séculos de feudalismoou de “despotismo asiático”).

Segundo o Banco Europeu deReconstrução e Desenvolvimento (EBRD), em1999, o PIB da ex- URSS foi cerca de 65% do de1989.

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Reformas e crescimento económicoCiclo Vicioso

Existência de rent seekinge corrupção

Parciais reformas de mercado

Lenta transformação do mercado

Crescimento fraco ou recessãoInstabilidade financeira

Oposição à livre entrada no mercado,à competição e à total liberalização

Protecção dos interesses de elites

Fraca defesa do direito de propriedade

Desenvolvimento do mercado informal

Promoção da igualdade social e denovas oportunidades económicas

Reformas totais do mercado

Market-friendly environment

Novos investimentos, crescimento ecapacidade de atracção do investimento estrangeiro

Adaptadode:

Havrylyshyn(1999).

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maior parte dos casos, o que prospera é o“capitalismo selvagem”, em todo o seuesplendor: crime, corrupção, falta deestabilidade económica, crise social e rentseeking...

No início da transição, países como aAlbânia, a Bulgária ou a Roménia registaram umperíodo de crescimento, que durou entre 3 e 5anos, para mais tarde entrarem em profundarecessão, dada a ausência de importantesreformas estruturais. Países como a Rússia, a

FIGURA 3 - Crescimento nos países em transição (1991=100)

020406080

100120140

1989 1990 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997 1998

Europa Central Bálticos CEI

Fonte: EBRD (1999).

indicador económico atingiu já os 5%. Assim sejustifica que este país seja o favorito doProfessor Jeffrey Sachs, o famoso economistaneoliberal da New York University, querecomenda desde o início da transição uma“terapia de choque” para os países ex-comunistas.

Todavia, mesmo para os alunosexemplares da Europa Central – Polónia eHungria –, o percurso para uma transição bem

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registado nos países que conseguiram aestabilização económica, nomeadamenteatravés do controlo da inflação.

Alguns países não registam sucesso nasreformas da transição dadas as desfavoráveiscondições iniciais (caso do sistema industrial doperíodo de planeamento centralizado). Comefeito, são em parte as favoráveis condiçõesiniciais que explicam o bom caminho para atransição seguido pelos países da Europa

A transição económica tem sidoacompanhada por um rápido e profundoaumento das desigualdades sociais. Segundoestimativas da OCDE, a desigualdade social naEuropa de Leste, no Báltico, na Rússia e emoutros territórios da ex-URSS aumentouconsideravelmente: em menos de 10 anos, ocoeficiente de Gini aumentou de 25-28 para 35-385 .

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Europa Central Bálticos CEI

FIGURA 4 - Índice de Liberalização Económica (em 1997)

Fonte: Tanzi (1999).

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a) Estes indicadores variam de 1 a 4, com

o valor 1 a representar o mais baixo nível de progresso para a

transição económica. O

s valores não representam portanto a taxa de crescim

ento anual de cada indicador, mas

o progresso acumulado na transição de um

a economia de planeam

ento centralizado para uma econom

ia de

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O padrão de vida na maioria dos paísesem transição caiu nas etapes inicias da reforma:o emprego reduziu-se e o desempregoaumentou, sobretudo nos países pertencentesà CEI, onde o ajustamento do mercado detrabalho foi feito através de demissões e ondeas novas empresam privadas não foramcapazes de assimilar todos os activos oriundosdas empresas estatais.

Neste contexto, um aspecto importanteda transição é a tentativa de resposta àseguinte questão: no geral, as populaçõessujeitas a um processo de transição económicaestão ou não a viver melhor do que antes?

A forma em que os indivíduos foramenvolvidos no processo de transição e osbenefícios que daí podem retirar sãofundamentais para que se alcance o referidociclo virtuoso, logo uma transição bem sucedida.

O relatório do Banco Europeu para aReconstrução e Desenvolvimento (BERD) de2001 defende que o alívio da pobreza, o capitalhumano e a sua adaptação às necessidades dosmecanismos de mercado são fundamentais parao crescimento sustentado, o desempenhoeconómico e a promoção da sustentabilidadepolítica e da justiça social ou equidade.

Contudo, é óbvio que as etapas iniciaisda transição acarretam custos sociais elevados– é o princípio do “no pain no gain” da transição.

De facto, no início da transição, verifica-se um agravamento das disparidades em

novo papel na economia consiga reestruturaras redes de protecção social e aliviar a pobreza.

É decisiva a criação de um sistema maisjusto de distribuição dos rendimentos e dariqueza.

Apesar de a pobreza ter aumentado nosprimeiros momentos da transição, tende aestabilizar nos países que retomaram ocrescimento.

Se considerarmos a variedade muito maiorde produtos (sobretudo importados) e de bensde consumo duráveis de alta qualidade àdisposição das populações, com o fim daeconomia de escassez, podemos afirmar que obem-estar das populações sujeitas à transiçãoeconómica tem aumentado.

Por outro lado, através da liberalizaçãoeconómica e da descentralização dapropriedade, os indivíduos podem acumularriqueza pessoal através de cupons, acções deempresas, pequenas empresas, terras ouhabitações.

A maior parte dos analistas da transiçãoé portanto unânime em afirmar que, a longoprazo, a única forma de combater a pobreza éo fomento do crescimento económico atravésda introdução e consolidação de políticasfavoráveis às forças do mercado.

IV - O caminho que ainda falta percorrer...As experiências de transição para a

economia de mercado que duram, há mais de

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Todavia, pelo exposto conclui-se queainda resta um longo caminho a percorrer paraque o sucesso da transição seja efectivado namaior parte dos países de Leste.

Cinco obstáculos fundamentais continuama ameaçar a transição de alguns países,sobretudo os do antigo bloco soviético:

1) O falhanço na construção das novasNações, o que tem conduzido ao caos (exemplosda região do Cáucaso);

2) A dificuldade de acompanhamento, porparte de alguns países, da estabilizaçãoeconómica e consequentes ciclos de persistenteinflação e desemprego elevados;

3) A insuficiente liberalização e privatizaçãoe, consequentemente, a corrupção, o crime, orent seeking ou o crony capitalism;

4) O crescimento excepcional da economiainformal, que incentiva a corrupção e enfraquecea credibilidade do mercado formal e dasinstituições públicas, impedindo odesenvolvimento do sector privado aberto eformal;

5) O desaparecimento repentino dasinstituições do planeamento centralizado, semque antes tenham surgido instituições demercado (por exemplo, diversos paísesdesfizeram-se dos velhos sistemas de créditoagrícola e distribuição da produção sem criaremnovos sistemas baseados no mercado).

a República Checa. Depois, a Eslovénia, aLetónia e a Estónia.

Países como a Eslováquia, a Lituânia, aRoménia e a Bulgária precisam ainda de fazergrandes esforços para se possam inserir naschamadas economias de mercado funcionais.

Todavia, mesmo a Polónia, foi obrigada arealizar algumas reformas, nos sectores agrícolae mineiro, nomeadamente.

A aposta na superação dos obstáculos àtransição e a implementação das reformas quedescrevemos no início deste capítulo, ajudarãoos países em transição do Leste Europeu efuturos membros da União Europeia a corrigiras deficiências e desequilíbrios herdados doplaneamento centralizado e a encontrar ocaminho certo do crescimento seguro, rápido esustentado.

A escolha exacta deste caminho dependedos objectivos, do empenho e da consciênciadas limitações de cada país...

V – O Caso da HungriaV. 1. – Enquadramento Geográfico e

Breve Resenha HistóricaA Hungria é um país localizado na Europa

Central, sem ligação com o mar. Faz fronteiracom sete países: Eslováquia a norte, Ucrânia anordeste, Roménia a leste, Croácia e Jugoslávia(Sérvia e Montenegro) a sul, Eslovénia a

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Aproximadamente 20% da superfíciehúngara, correspondente a áreas montanhosas,é coberta por florestas de caducifólias. Norestante território predomina a actividadeagrícola e as pastagens.

crescimento com 66,6% da população a residirem aglomerados urbanos, em 1998. A capital,Budapeste, concentra cerca de 18,5% doshabitantes do país.

A Hungria é um país que apresenta uma

FIGURA 1 - CENTRO DE BUDAPESTE

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Em 1699, grande parte da Hungria éincorporada no império dos Habsburgos. Em1849, após a eclosão de uma revolta quepretendia alcançar a independência, o Impériodos Habsburgos torna-se numa monarquiadualista (Áustria-Hungria); em 1867, a Hungriaobtém um estatuto em tudo semelhante ao daÁustria.

A derrota na I Guerra Mundial leva àqueda do Império e à proclamação da Repúblicada Hungria, que perde cerca de dois terços doseu território e metade da população.

A Hungria entra na II Guerra Mundial aolado da Alemanha Nazi na tentativa derecuperar os territórios perdidos. Em 1945 éinvadida pelo Exército Vermelho e, em 1949, éinstalado um governo comunista.

Em 1989 as eleições livres estabelecemum governo democrático e inicia-se o processode transformação política e económica.

V.2 - A Transição EconómicaA Hungria é normalmente apontada como

o país que melhor efectuou a transição de umaeconomia de planeamento centralizado parauma economia de mercado.

Já em 1968 tinham sido adoptadasalgumas medidas orientadas para o mercado,que ficaram conhecidas por “Novo MecanismoEconómico”. Apesar da natural timidez de taismedidas, os anos 60 e 70 foram um período de

os serviços, em detrimento de incentivos àprodução agrícola e de bens de consumo.

Ainda que a Hungria tenha sido o primeiroPECO a realizar reformas viradas para omercado, o que é facto é que a economia semanteve controlada pelo Estado e pelascooperativas, até finais dos anos 80. Era o casodo estatuto da propriedade e das grandesdecisões económicas, como a afectação derecursos, a concessão de crédito e de subsídiosou a origem das importações, que semantiveram sob firme domínio estatal.

Apesar do crescente dinamismo do sectorprivado, apenas em Março de 1990, com aderrota dos comunistas nas eleições, é que aHungria conseguiu criar condições políticas paracaminhar definitivamente para uma economia demercado. Rapidamente foram tomadas medidasno sentido de liberalizar o comércio externo, ospreços, o investimento externo e iniciar oprocesso das privatizações.

No período compreendido entre 1990 e1994 a transição para o mercado foi marcadapelo crescimento negativo do Produto InternoBruto (PIB). Esta situação surgiu da combinaçãodas reformas económicas com o colapso doCOMECON4 ; contudo, a recessão económica foimenor do que na generalidade dos PECO. Estemelhor comportamento da economia húngaraface às suas congéneres do Leste europeudeveu-se, em grande parte, à já referidaintrodução de mecanismos de mercado (desde1968), que facilitaram a reestruturação dos

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O processo das privatizações, iniciado naprimeira metade da década de 90, estápraticamente terminado. O ritmo deprivatizações foi elevado, passando de 1858empresas estatais em 1990, para apenas 3 em1999. Foi transferido para o sector privadogrande parte da actividade económica doEstado, nomeadamente sectores estratégicoscomo a banca, as telecomunicações e a energia.

O diploma legal que dinamizou o processodas privatizações, pelo que ficou conhecido como“Lei das Privatizações”, data de 1992 e foimodificado em 1995. Este diploma foi aindasujeito a algumas alterações em Julho de 1997,entre as quais se destacam, a redução daparticipação máxima do Estado para 25% maisum voto ou para uma “golden share”, comdireitos preferenciais de voto.

Com esta medida, procurou-se estimulara reestruturação económica, modificar aorganização empresarial, desenvolver aaquisição de “saber-fazer” e a aprendizagemde novas técnicas de gestão e vendas,fomentar o mercado de capitais e reforçar opapel dos investidores estrangeiros nasempresas húngaras. De referir ainda aimportância do papel assumido pelo encaixefinanceiro decorrente das privatizações naredução da dívida externa.

Em 1995, foi recriada a Agência Húngarade Privatização e Gestão do Património e Gestãodo Estado (ÁPV Rt.), através da criação de umasociedade anónima responsável pela gestão,

representava 62,2% do Produto Nacional Bruto(PNB).

Dados de 2000 indicam um PIB per capitaem PPC (Paridades de Poder de Compra) que éo terceiro mais alto de entre os PECO, atrás daEslovénia e da República Checa.

Em 1996, a Hungria aderiu à OCDE e, emMarço de 1999 à NATO, prevendo- -se que, emMaio de 2004, se torne membro de pleno direitoda União Europeia. HUNGRIA

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eficiência produtiva).3 A descentralização da propriedade pode ser vista

como uma fonte de saneamento financeiro,através da entrada de dinheiro dos cofres doEstado.

4 O “capitalismo popular” relaciona-se com aimplementação de um sistema, dentro de umaeconomia de mercado livre, segundo o qual a

Bibliografia

URSS e pelos seus satélites da Europa Central eOriental, constituía um bloco económico que surgiacomo resposta ao Plano Marshall e à OECE. Oobjectivo desta instituição era, a prazo, conseguira integração total das economias dos Estados-Membros, nomeadamente recorrendo à Internacional do Trabalho (DIT). Foi extinto emJunho de 1991.

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