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JE GAMPOPA O ORNAMENTO DA PRECIOSA LIBERAÇÃO

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Page 1: Gampopa - Ornamento da Preciosa Liberação - Thrangu Rinpoche

JE GAMPOPA

O ORNAMENTO DAPRECIOSA LIBERAÇÃO

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O Ornamento da Preciosa Liberação - Gampopa

KHENCHEN THRANGU RINPOCHE

Je Gampopa

O ORNAMENTO DA

PRECIOSA LIBERAÇÃO

A Jóia que Realiza Desejos Dos Nobres Ensinamentos

Comentário pelo

VENERÁVEL KHABJE KHENCHEN THRANGU RINPOCHE

CEBB-CM 2 / 40 Revisão: 03/10/08

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O Ornamento da Preciosa Liberação - Gampopa

Zhyisil Chokyi Ghatsal TrustPublications

Agradecimentos

Gostaríamos de agradecer às muitas pessoas que ajudaram a tornar este trabalho possível. Em primeiro lugar e de modo especial, a Khabje Khenchen Thrangu Rinpoche, por sua grande sabedoria e compaixão ao oferecer estes ensinamentos. Gostaríamos de agradecer a Ken e Kátia Holmes pela tradução deste trabalho, ao grupo de Samye Ling por disponibilizar as fitas destas palestras e a Gabrielle Hollmann pelo imenso trabalho de transcrição e edição. Também queremos agradecer a Keith Hale por revisar o texto e a Clark Johnson por sua constante e inestimável ajuda para tornar este texto disponível.

Também queremos agradecer à Snow Lion Publications e ao Khenpo Konchog Gyaltsen Rinpoche pela permissão de copiar e utilizar trechos de sua tradução de O Ornamento da Preciosa Liberação. O sumário do texto se originou em ensinamentos dados pelo Khenpo Tsultrim Gyamtso Rinpoche. Este trabalho também foi grandemente auxiliado pela tradução existente do texto por Ken e Kátia Holmes Gemas do Darma, Jóias da Liberdade.

Que este supremo, incomparável ensinamento,O precioso tesouro dos Vitoriosos,

Possa se espalhar e se estender por todo o mundoComo o sol brilhando no céu.

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O Ornamento da Preciosa Liberação - Gampopa

Conteúdo

Prefácio: Sua Santidade o Karmapa

Venerável Lama ShedrupBreve Biografia:

Biografia do Senhor do Darma Gampopa Biografia de Khenchen Thrangu Rinpoche

Prólogo

Introdução ao Texto O Nome do Texto

A Homenagem Os Seis Tópicos do Livro

TÓPICO 1: A CAUSA PRIMÁRIACAPÍTULO 1

A Natureza Búdica

Evidências nas EscriturasTrês Razões para os Seres Possuírem a Natureza BúdicaCinco Categorias de Potencial

I. O Potencial Cortado II. O Potencial Incerto Diferentes Motivações

III. O Potencial Shravaka IV. O Potencial Pratyekabuda

O Propósito destas Instruções V. O Potencial Mahayana

A. Classificação B. Definição

C. Sinônimos D. Razão da Superioridade

E. Características As Quatro Condições Desfavoráveis

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O Ornamento da Preciosa Liberação - Gampopa

As Quatro Condições Favoráveis F. Sinais

Sumário

TÓPICO 2: A BASE DE TRABALHOCAPÍTULO 2

A Vida Humana Preciosa

Dois Pontos sobre o Aspecto Físico I. As Oito Liberdades

II. Os Oito Dotes A. Os Cinco Dotes Pessoais B. Os Cinco Dotes Externos

Exemplos Mostrando a PreciosidadeTrês Pontos sobre o Aspecto Mental

III. Fé da Crença IV. Fé Esperançosa

V. Fé Clara Obstáculos à Fé

TÓPICO 3: A CONDIÇÃOCAPÍTULO 3

O Amigo Espiritual

I. Razão: Por que Precisamos de um Amigo Espiritual A. Escritura

B. Lógica C. Exemplos

II. Classificação: Os Tipos de Amigos Espirituais III. As Características de um Amigo Espiritual

IV. Como se Relacionar com um Amigo Espiritual A. Respeito

B. Veneração C. Prática

V. Os Benefícios de Seguir um Amigo Espiritual

TÓPICO 4: O MÉTODOOs Ensinamentos do Amigo Espiritual

Introdução ao Tópico 4 Quatro Obstáculos à Realização do Estado Búdico

Os Quatro Remédios

CAPÍTULO 4As Instruções sobre a Impermanência

O REMÉDIO PARA O APEGO A ESTA VIDA

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O Ornamento da Preciosa Liberação - Gampopa

I. As Classificações da Impermanência II. O Método para Meditar sobre a Impermanência

III. Os Benefícios que Resultam da Meditação sobre a Impermanência

CAPÍTULO 5A Meditação sobre o Sofrimento do Samsara

O PRIMEIRO REMÉDIO PARA O APEGO AOS PRAZERES DO SAMSARA

Os Três Tipos de Sofrimento I. O Sofrimento que Tudo Permeia

II. O Sofrimento da Mudança III. O Sofrimento do Sofrimento

CAPÍTULO 6O Karma e seu Resultado

O SEGUNDO REMÉDIO PARA O APEGO AOS PRAZERES DO SAMSARA

I. Classificação II. As Características Primárias de Cada Classificação

III. A Maturação da Ação para o Próprio Indivíduo IV. Resultado Definido

V. Grandes Resultados a partir de Pequenas Ações VI. A Inevitabilidade das Ações

CAPÍTULO 7As Instruções sobre a Meditação da Bondade Amorosa e da

CompaixãoO REMÉDIO PARA O APEGO AO PRAZER DA PAZ

I. A Prática da Bondade Amorosa A. Classificação

B. Objeto C. A Característica que a Define

D. Método de Prática Quatro Contemplações

E. Medida da Prática F. Os Benefícios

II. A Prática da Compaixão A. Classificação

B. Objeto: Todos os Seres Sencientes C. A Característica que a Define

D. Método de Prática E. Medida da Prática

F. Os Benefícios Oito Benefícios Imediatos

Desenvolvendo a Atitude de BodicitaO REMÉDIO PARA O DESCONHECIMENTO DO MÉTODO DE PRÁTICA

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O Ornamento da Preciosa Liberação - Gampopa

PARA ALCANÇAR O ESTADO BÚDICO

I. A Fundação para Desenvolver a Atitude de Bodicita A. Possuir o Potencial Mahayana

CAPÍTULO 8Refúgio e Preceitos

B. Tomando Refúgio nas Três Jóias 1 .A Classificação

2 .A Base de Trabalho 3 .Objeto 4 .Tempo

5 .A Motivação 6 .A Cerimônia

7 .A Função 8 .O Treinamento

a) Os Três Treinamentos Gerais b) Os Três Treinamentos Específicos

c) Os Três Treinamentos Comuns 9 .Os Efeitos Benéficos

C. Os Preceitos Pratimoksha 1 .Analogia

2 .Autoridade Escritural 3 .Raciocínio

CAPÍTULO 9O Cultivo de Bodicita

II. A Essência III. Classificação A. Comparações

B. Diferentes Níveis C. Características Bodicita Absoluta Bodicita Relativa

Desenvolvendo a Bodicita IV. Objetivos

V. A Causa VI. De Quem a Recebemos

VII. O Método (Cerimônia) VIII. Os Efeitos Benéficos

A. Os Benefícios Contáveis 1 .Os Efeitos Benéficos do Cultivo da Bodicita de

Aspiração 2 .Os Efeitos Benéficos do Cultivo da Bodicita de Ação

B. Os Benefícios Incontáveis IX. As Desvantagens de Perder a Bodicita

X. As Causas da Perda da Bodicita XI. Os Meios para Retomar a Bodicita Quando for Perdida

CAPÍTULO 10

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O Ornamento da Preciosa Liberação - Gampopa

Treinamento na Bodicita de Aspiração

XII. O Treinamento A. Treinamento na Bodicita de Aspiração

1 .Não Abandonar os Seres Sencientes de Nosso Coração

2 .Recordar os Efeitos Benéficos da Bodicita 3 .Reunir as Duas Acumulações

4 .Praticando a Bodicita 5 .Rejeitar as Quatro Ações não-Virtuosas e Aceitar as

Quatro Ações Virtuosas

CAPÍTULO 11Treinamento na Bodicita de Ação

B. Treinamento na Bodicita de Ação 1 .Número Definido

2 .Ordem Definida 3 .Características

4 .Definição 5 .Divisão

6 .Agrupamento

CAPÍTULO 12A Perfeição da Generosidade

I. Reflexões sobre as Virtudes e as Falhas II. Definição

III. Classificação IV. Características de Cada Classificação

A. Oferecendo Riquezas 1 .Oferendas Impuras

2 .Oferendas Puras B. Oferecendo Destemor

C. Oferecendo o Darma V. Ampliação VI. Perfeição

VII. Resultado

CAPÍTULO 13A Perfeição da Ética Moral

I. Reflexões sobre as Virtudes e as Falhas II. Definição

III. Classificação IV. Características de Cada Classificação

A. A Disciplina Moral das Restrições B. A Moralidade de Acumular Virtudes no Darma

C. A Moralidade de Beneficiar os Outros Seres V. Ampliação VI. Perfeição

VII. Resultado

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O Ornamento da Preciosa Liberação - Gampopa

CAPÍTULO 14A Perfeição da Paciência

I. Reflexões sobre as Virtudes e as Falhas II. Definição

III. Classificação IV. Características de Cada Classificação

A. A Paciência de não se Deixar Perturbar pelo Mal Causado por Outras

Pessoas B. A Paciência de Aceitar o Sofrimento

C. A Paciência na Compreensão do Darma V. Ampliação VI. Perfeição

VII. Resultado

CAPÍTULO 15A Perfeição da Diligência

I. Reflexões sobre as Virtudes e as Falhas II. Definição

A. A Preguiça da Apatia e da Indolência B. A Preguiça do Desencorajamento

C. A Preguiça Causada pelo Envolvimento com Objetivos Inferiores

III. Classificação IV. Características de Cada Classificação

A. A Diligência da Armadura B. A Diligência da Aplicação

C. A Diligência Insaciável V. Ampliação VI. Perfeição

VII. Resultado

CAPÍTULO 16A Perfeição da Concentração Meditativa

I. Reflexões sobre as Virtudes e as Falhas II. Definição

A. Deveríamos Evitar a Distração B. Isolando a Mente de Pensamentos Discursivos

C. Através do Isolamento de Corpo e Mente não Surgirão Distrações

Eliminando as Emoções Perturbadoras Transformando as Emoções Perturbadoras

As Instruções Especiais da Linhagem de Marpa III. Classificação

IV. Características de Cada Classificação A. A Concentração Meditativa que Traz Felicidade ao Ser

Praticada B. A Concentração Meditativa que Produz Todas as

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O Ornamento da Preciosa Liberação - Gampopa

Qualidade Positivas C. A Concentração Meditativa que Produz Benefícios para

os Seres Sencientes V. Ampliação VI. Perfeição

VII. ResultadoPerguntas

CAPÍTULO 17A Perfeição da Sabedoria Discriminativa

I. Reflexões sobre as Virtudes e as Falhas II. Definição

III. Classificação IV. Características de Cada Classificação A. A Sabedoria Discriminativa Mundana

B. A Sabedoria Discriminativa Supramundana Inferior C. A Sabedoria Discriminativa Supramundana Superior V. O Que Deve Ser Entendido: Sabedoria Discriminativa

A. A Refutação da Visão da Existência das Coisas A Não-Existência da Identidade Pessoal

O Método de Meditação A Não-Existência de Identidade dos Fenômenos

A Vacuidade dos Objetos Externos A Vacuidade da Mente Interna

B. A Refutação da Visão da Inexistência das Coisas C. O Caminho que Leva à Liberação

VI. O Que Deve Ser Praticado VII. Resultado

Perguntas

CAPÍTULO 18Os Aspectos dos Cinco Caminhos

I. O Caminho da Acumulação II. O Caminho da Conexão

III. O Caminho do Insight IV. O Caminho do Cultivo

V. O Caminho da Realização

CAPÍTULO 19Os Níveis do Caminho

Visão Geral dos Treze Níveis

TÓPICO 5: O RESULTADOO Resultado é o Corpo da Perfeita Iluminação

CAPÍTULO 20A Perfeita Iluminação

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O Ornamento da Preciosa Liberação - Gampopa

I. Natureza II. Significado do Nome

III. Classificação IV. Definição

V. Razões para o Número Definido de Três Kayas VII. Características Especiais

TÓPICO 6: AS ATIVIDADESAs Atividades São o Benefício dos Seres Sencientes sem

Pensamentos Conceituais CAPÍTULO 21

Atividades do Buda

I. Atividades Espontâneas de Corpo para Beneficiar os Seres II. Atividades Espontâneas de Fala para Beneficiar os Seres

III. Atividades Espontâneas de Mente para Beneficiar os Seres

Conclusão

Sumário do Texto Notas

Glossário de Termos Índice

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O Ornamento da Preciosa Liberação - Gampopa

O KARMAPA

Nossa linhagem é a do incomparável protetor dos seres sencientes, Sonam Rinchen, o fundador dos ensinamentos da incomparável escola Dakpo Kagyu, um nobre ser profetizado pelo Buda. Dentre suas instruções orais, que são como um oceano e que oferecem conselhos amorosos aos discípulos que são vasos adequados, existem A Guirlanda Preciosa do Caminho Supremo, o coração dos ensinamentos essenciais, e O Ornamento da Preciosa Liberação. Aqui são apresentadas instruções sobre o segundo texto, oferecidas durante quase quatro meses pelo inigualável amigo espiritual, Khenchen Thrangu Rinpoche, a estudantes do Darma na Escócia, para que eles possam atingir o completo despertar. Estas instruções são especialmente maravilhosas por apresentarem os ensinamentos de forma a serem facilmente compreendidos e para que seu significado seja realizado. Eu me regozijo pela publicação desta obra pelo Venerável Lama Shedrup Chokyi Senge e por outras pessoas que o ajudaram. Diz-se que se o profundo Darma aqui apresentado for praticado, será alcançada a verdadeira alegria, agora e no futuro.

Karmapa Ogyen Trinley Dorje

21 de fevereiro de 2003

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O Ornamento da Preciosa Liberação - Gampopa

Prefácio pelo Venerável Lama Karma Shedrup Cho Gyi Senge Kartung

Uma das brilhantes jóias da linhagem Kagyu é o Senhor do Darma Gampopa. Como uma manifestação do Buda suas qualidades são vastas e inexprimíveis. Ele ensinou e propagou os ensinamentos de acordo com as necessidades e capacidades dos seres de formas inconcebíveis, levando incontáveis seres à iluminação e estabelecendo os ensinamentos completos do Buda no Tibete. Um de seus discípulos, Dusum Khyenpa, o Primeiro Karmapa, dá continuidade hoje ao rosário dourado desta linhagem como o Décimo sétimo Karmapa, Orgyen Trinley Dorje.

Dentre suas muitas grandes realizações, Gampopa é particularmente renomado por ter canalizado em um único rio a linhagem Kadampa e o Mahamudra, recebido de seu professor-raiz Milarepa. O Ornamento da Preciosa Liberação, apesar de ser um texto do caminho gradual e pertencer à tradição dos sutras, representa a combinação destas duas tradições.

Muitos estudantes Kagyupa foram, provavelmente, instruídos a ler O Ornamento da Preciosa Liberação antes de quaisquer outras obras. Entretanto, este não é um texto apenas para iniciantes, mas um dos textos Kagyu básicos e de imensa relevância e benefício para todos os praticantes, independente do estágio em que se encontrem. Além de proporcionarem uma visão geral passo a passo do caminho para a iluminação, os ensinamentos sobre a natureza búdica podem trazer confiança a alguns estudantes para entrarem no caminho; ao passo que aqueles que já estão no caminho poderão encontrar em seus vinte e um capítulos muita inspiração para mantê-los na direção inequívoca rumo à liberação.

Freqüentemente textos como este, devido a sua vasta abrangência, são necessariamente bastante sintéticos. Portanto, tradicionalmente, para adquirir uma compreensão clara ouvem-se comentários completos sobre estes aspectos. Entretanto, devido a sua extensão, explicações detalhadas podem ser muito longas e, assim, é difícil de recebê-las. Aqui, porém, temos a grande bênção de receber um comentário completo do grande mestre Kagyu contemporâneo Khenchen Thrangu Rinpoche, no qual ele oferece explicações detalhadas sobre este texto, particularmente para o benefício de estudantes ocidentais.

Fala-se muito sobre ensinamentos essenciais tais como o Mahamudra, que levam à iluminação em apenas uma vida. Entretanto, tal realização depende da união de Mahamudra com bodicita, que é o tópico central deste texto. Tendo esta linhagem a obtenção de seus frutos baseada na prática, estes ensinamentos devem ser experimentados diretamente e não devem ficar dependentes somente da compreensão intelectual.

Gampopa disse que, no futuro, para quem quer que se depare com este texto, será o mesmo que encontrá-lo pessoalmente. Portanto, que todos aqueles que lerem este profundo texto possam desenvolver a mente do despertar e alcançar a iluminação para o benefício de todos os seres sencientes.

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O Ornamento da Preciosa Liberação - Gampopa

Lama Karma ShedrupJaneiro de 2003Auckland, Nova Zelândia

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O Ornamento da Preciosa Liberação - Gampopa

Uma Breve Biografia doSenhor do Darma Gampopa (1079 – 1153)

De modo geral, a história da vida de Gampopa e de sua liberação é tão profunda como o oceano e vasta como o espaço. Apenas um Buda poderia relatá-la completamente. O que se segue é apenas uma gota do grande oceano que foi a história de sua vida.

Ao interpretar um sonho de Milarepa o grande tradutor Marpa Lotsawa profetizou:

Uma galinha nascendo de um abutreÉ o sinal do surgimento de um discípulo sem igual.O espaço preenchido por pássarosÉ um sinal do florescimento da linhagem Kagyu.

Assim foi prevista a vinda do Senhor do Darma Gampopa, todos os seus discípulos e sua linhagem.

Durante o tempo do Buda Sakiamuni Gampopa manifestou-se como o bodisatva Candraprabhavakumara. Em resposta a seus pedidos o Buda deu os ensinamentos sobre a natureza absoluta da mente no Sutra Rei do Samadhi. O Buda, então, inquiriu os discípulos reunidos qual deles faria o voto de renascer no futuro para servir como guardião desta preciosa sabedoria, e o bodisatva Candraprabhavakumara se comprometeu a fazê-lo. Então o Buda profetizou o nascimento de Gampopa como o Bhikshu Médico no Tibete, tanto no Rei do Samadhi, quanto no Sutra do Lótus Branco.

Vajrayogini disse a Milarepa, o professor de Gampopa, que ele reuniria muitos discípulos como o sol, a lua e as estrelas. Dentre eles Gampopa seria como o sol. Por isso Gampopa é objeto de oferendas e refúgio para todos os seres.

Gampopa nasceu em Nyal, no sul do Tibete, e surgiram muitos sinais maravilhosos. Mesmo quando criança ele era calmo e de natureza compassiva, sem traço algum de raiva, e, rapidamente, destacou-se em muitas artes e jogos. Seu pai era um grande praticante, erudito e médico. Quando Gampopa tinha dezesseis anos ele já era um erudito dos ensinamentos tântricos renomado e um grande médico. Ele se tornou um curador tão eficiente que parecia que o Buda da Medicina havia ressurgido.

Casou-se aos vinte e dois anos e teve um filho e uma filha. Pouco tempo depois uma séria doença afligiu sua esposa e ela não pôde recuperar-se por meio algum. No final, com apego a ele, ela disse: “Não há felicidade na vida de chefe de família. Após minha morte, ó Médico, pratique o Darma de coração.” Ele respondeu: “Quer você viva ou morra eu prometo praticar o Darma.”

Este acontecimento gerou grande renúncia em Gampopa, e aos vinte e cinco anos ele tomou os votos de ordenação completos, recebendo o nome Sonam Rinchen (Mérito Precioso). Ele estudou profundamente o Vinaya e se tornou o melhor de todos os monges no cumprimento dos preceitos. Ele teve

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O Ornamento da Preciosa Liberação - Gampopa

muitos professores e recebeu os votos de bodisatva e outras instruções, bem como as práticas de Chakrasamvara e muitos outros ensinamentos e iniciações tântricos. Finalmente, ele enxergou todos os surgimentos dos fenômenos como um arco-íris e experimentou o grande pensamento não-conceitual no qual não há diferença entre dia e noite. Ele podia permanecer em absorção meditativa por muitos dias e ficar sem alimentos por cinco dias seguidos. Tinha pouca necessidade de dormir, mas quando dormia diversos sinais prevendo sua liberação surgiam em seus sonhos.

Além disso, ele estudou a disciplina monástica bem como o caminho da perfeição e assim por diante. Ele estudou o caminho gradual da tradição Kadampa detalhadamente e se tornou como um farol desta escola.

Nesta época apareceu em seus sonhos e durante a experiência comum um iogue alto de cor azul, vestindo uma roupa de algodão amarrada frouxamente sobre seu ombro e carregando um cajado. Esta imagem colocava sua mão sobre a cabeça de Gampopa, então assoprava sobre ela e desaparecia. Com isso a meditação de Gampopa se desenvolveu melhor do que nunca. Ao mencionar este fato a outro monge, este aconselhou: “Você é um bhikshu de moralidade muito pura. O aparecimento de tal yogue é um obstáculo criado por Pekar (um protetor do Darma). Você deveria meditar em Miyowa.” Gampopa praticou conforme instruído, mas o yogue continuou visitando-o ainda mais freqüentemente.

Enquanto isso, Milarepa o Senhor dos Yogues, que atingiu o estado de Vajradara em uma única vida, estava dando ensinamentos aos seus discípulos na Caverna da Pedra Vermelha. Os discípulos mais velhos disseram a ele: “Agora que você está envelhecendo, caso parta para outro campo búdico e precise de um regente, por favor aponte alguém em quem você confie e dê a ele os ensinamentos completos. De outra forma não haverá ninguém que possa guiar os discípulos.”

Milarepa disse: “Eu sou um yogue. Não terei um regente. Mas haverá um discípulo que é capaz de realizar todas as minhas atividades. Hoje à noite irei ver onde ele está. Voltem amanhã de manhã.”

Na manhã seguinte todos os seus discípulos se reuniram ansiosamente e Milarepa disse: “Logo chegará aquele que é chamado o Médico, que se tornou um monge na tradição Vinaya. Ele receberá meus ensinamentos completos como se um vaso fosse preenchido por outro. Este é capaz de realizar atividades em todas as dez direções. Na noite passada em meu sonho, ele veio com um vaso de cristal vazio e eu passei toda a ambrosia de meu vaso prateado para o dele.”

Ele continuou: “Um filho nasceu e o pai já está velho. Surgirá um grande ser para propagar o Darma como o sol nascente e beneficiará incontáveis seres.”

Neste momento, Gampopa estava caminhando e se deparou com três mendigos conversando sobre as qualidades milagrosas de Milarepa. Ao ouvi-los Gampopa desenvolveu, espontaneamente, tal devoção por Milarepa que lágrimas vieram a seus olhos e por um longo tempo ele não pôde nem mesmo andar.

Mais tarde ele convidou os três mendigos ao seu quarto e preparou para eles uma ótima refeição. Ele perguntou sobre o paradeiro do grande yogue

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sobre o qual eles estavam falando. Os mendigos responderam que eles não o conheciam, mas sabiam que ele permanecia nas montanhas de Drin e Nyenam. Eles contaram que muitas pessoas iam até lá para vê-lo, mas não o encontravam. Manifestando-se de muitas diferentes formas, alguns o vêem como uma estupa de cristal, outros o vêem como o Buda Sakiamuni.

Gampopa lançou-se no caminho para encontrar Milarepa, viajando como um homem possesso, às vezes desmaiando de exaustão e fraqueza. Finalmente, ele chegou aos pés de Milarepa, ofereceu uma mandala de ouro, prostrou-se e suplicou a Milarepa para aceitá-lo como discípulo. Milarepa então disse: “Eu não preciso do ouro que me ofereceu. O ouro não combina com este velho homem. Se você quiser praticar o Darma adequadamente, observe minha conduta e minha prática e faça como eu.” Assim, Milarepa devolveu o ouro para Gampopa adquirir provisões para sua meditação, e então concedeu todas as bênçãos da Linhagem Oral, incluindo as Seis Yogas de Naropa. Ele, então, enviou Gampopa para meditar em uma caverna desabitada e muitas experiências surgiram rapidamente. Em certa ocasião Gampopa teve uma visão dos Cinco Diani Budas, em outra ocasião ele viu todo o universo girando como uma roda. Em outro momento ele viu miríades de formas de Chenrezig sentadas sobre discos de lua, preenchendo todo o espaço. Também viu o Reino do Inferno da Linha Negra. Toda vez que ele descrevia estas experiências, Milarepa o orientava a não se apegar ao que surgia, dizendo: “Não é nem bom nem ruim. Continue a sua meditação.”

Ele continuou a seguir as práticas que Milarepa ensinou e todos os seus obstáculos foram dissipados, e ele progrediu rapidamente. Finalmente, Milarepa transmitiu a Gampopa todos os ensinamentos preciosos, iniciações e instruções essenciais que ele detinha, e o enviou ao Tibete Central para desenvolver sua prática.

Quando Gampopa estava partindo Milarepa o chamou de volta, dizendo que ele tinha uma última instrução essencial. Gampopa ficou muito feliz e perguntou: “Eu devo fazer uma oferenda de mandala?” Milarepa disse: “Não, não é necessário, mas não desperdice esta instrução.” Milarepa, então, levantou a parte de trás de suas roupas e mostrou suas nádegas, que estavam cheias de calos. “De todas as instruções essenciais, não há nenhuma mais profunda do que a prática de meditação. Eu meditei persistentemente até que minhas nádegas ficaram assim, e eu alcancei estas grandes qualidades. Por isso você deve, também, praticar meditação com perseverança.” Isto causou grande impressão na mente de Gampopa. Então, conforme o Lama predisse, ele viajou para o Tibete Central.

Após meditar em eremitérios e montanhas selvagens por muitos anos, Gampopa realizou a natureza básica da mente e o significado completo das palavras do lama. Compreendendo a grande bondade do lama, ele não teve mais aumentos ou diminuições em sua realização, nem qualquer aceitação, rejeição ou dúvida. Até mesmo seu sono se tornou uma experiência da clara luz.

Mais tarde Gampopa disse: “Eu levei um longo tempo para estabilizar a mente, e tive que trabalhar duro, mas para vocês isto será menos difícil porque vocês possuem as instruções do caminho do profundo método. A linhagem Kagyu possui bênçãos como nenhuma outra. Se meditarem diligentemente, muitos alcançarão o caminho. Para dissipar obstáculos, experimentar os

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O Ornamento da Preciosa Liberação - Gampopa

ensinamentos e aprofundar a prática de meditação, é o suficiente seguir a profunda Guru Yoga, a prática de Mahamudra e Tummo.”

Como Milarepa havia profetizado as deidades locais convidaram Gampopa para estabelecer um monastério e ensinar em Dagpo, onde um vasto número de discípulos se reuniu para receber os ensinamentos Kagyu que ele expunha. Neste período Gampopa freqüentemente demonstrava poderes sobrenaturais, manifestando-se como o Buda Sakiamuni e o bodisatva Chenrezig. Além disso, muitas pessoas relatavam tê-lo visto, simultaneamente, presidindo uma comemoração em um lugar, realizando uma consagração em outro e ensinando em ainda outro.

Certa vez, o Geshe Gyalwa Chungtsang Chen pensou: “O precioso lama não permite que os monges noviços façam qualquer outra coisa além de meditar, desta forma como eles irão adquirir conhecimento?” Naquela noite ele sonhou que toda a montanha Dagla Gampo se transformava em cavernas, e dentro de cada uma havia uma estupa preciosa esculpida com beleza e irradiando luz. Algumas estavam completamente pintadas e outras estavam ainda sendo pintadas. Muitas pessoas estavam fazendo prostrações diante delas, dizendo que elas eram o refúgio de todos os seres no samsara, incluindo os deuses.

Na manhã seguinte ele foi ao quarto de Gampopa para contar o sonho. Antes dele ter tempo de contá-lo, Gampopa disse: “De modo geral, aqueles que confiam no intelecto me odeiam e me desprezam, mas meus monges noviços são exatamente como as estupas em seu sonho. Estas crianças mendicantes são o refúgio para todos os seres dos seis reinos do samsara, incluindo os deuses. Eu posso abarcar as necessidades de todos, tanto os elevados quanto os inferiores. Alguns dizem que eu faço com que os ensinamentos do Buda declinem, mas se você observar cuidadosamente, aqueles que se beneficiam dos ensinamentos do Buda serão bem conhecidos nos anos vindouros.”

Gampopa guiou todos os seus discípulos através do caminho gradual, e para os praticantes avançados ele deu instruções sobre o Mahamudra e as Seis Yogas de Naropa. Assim, ele concedeu incontáveis ensinamentos, vastos e profundos, a muitos grandes discípulos. Este Senhor do Darma, que era a corporificação da compaixão, possuía habilidades excelentes para guiar discípulos à iluminação que é livre de toda confusão e das causas do sofrimento.

Apesar de ter transcendido os conceitos de nascimento e morte, ele decidiu demonstrar a impermanência de todos os fenômenos, e particularmente os conceitos de nascimento e morte, de forma a alertar todos aqueles que são preguiçosos. Próximo à morte, Gampopa disse: “Quando eu entrar no elemento não-dual, que tudo permeia, vocês não deveriam pensar, Agora o lama não mais existe. Minha mente é inseparável de todos os lamas preciosos e budas dos três tempos, permeando todos os tempos e todos os lugares. Meditem, supliquem, e pensem em mim, e minhas bênçãos chegarão a vocês, incessantemente.”

Além disso, ele disse: “No futuro, aqueles que pensarem, ‘Ai de mim, eu não o conheci’, deveriam apenas estudar e praticar os textos que eu compus: A Preciosa Guirlanda de Jóias do Caminho Supremo, O Ornamento da Preciosa Liberação e outros. Não há a menor diferença; é o mesmo que me encontrar.

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O Ornamento da Preciosa Liberação - Gampopa

Aqueles que estiverem em momentos difíceis para compreender e praticar o Darma pensem em mim e supliquem com devoção. As bênçãos surgirão naturalmente.”

Aos setenta e cinco anos, durante o sexto mês lunar no décimo quinto dia, vestindo os três mantos do Darma e sentado na posição de lótus completa numa postura ereta, seus olhos voltados na direção do céu, absorto na clara luz livre de todo surgimento e cessação, o modo de permanência de todos os fenômenos, o Senhor do Darma Gampopa faleceu.

Naquele momento o céu foi preenchido por incontáveis arco-íris, imagens de estupas brancas e uma chuva de flores, música e oferendas para marcar a passagem de um ser completamente iluminado.

Assim, Gampopa, um dos maiores professores, uma manifestação do Buda, surgiu espontaneamente no tempo certo e no lugar certo para estabelecer a forma completa dos ensinamentos do Buda. Apesar de os ensinamentos já terem sido introduzidos no Tibete e florescido em alguns lugares, ele fez com que os ensinamentos crescessem como o nascer do sol. Devido a ele, todos os ensinamentos dos sutras e tantras podem ser praticados por uma pessoa, sem contradições.

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Uma Breve Biografia de Khenchen Thrangu Rinpoche (1933 – )

A linhagem de encarnações dos Thrangu Rinpoches se iniciou no século quinze quando o sétimo Karmapa, Chodrak Gyatso visitou a região de Thrangu no Tibete. Neste momento, Sua Santidade o Karmapa estabeleceu o Monastério Thrangu e entronizou Sherap Gyaltsen como o Pimeiro Thrangu Rinpoche, reconhecendo-o como a emanação restabelecida de Shuwu Palgyi Senge, um dos vinte e cinco discípulos do Guru Padmasambava.

Khenchen Thrangu Rinpoche é a nona encarnação desta linhagem e nasceu em Kham, no Tibete, em 1933. Aos quatro anos foi reconhecido por Sua Santidade o Décimo sexto Gyalwa Karmapa e por Palpung Situ Rinpoche como a encarnação do Thrangu Rinpoche, a partir da profecia dos nomes de seus pais e local de nascimento.

Ao entrar no monastério Thrangu, dos sete aos dez anos estudou leitura, escrita, gramática, poesia e astrologia, memorizou textos rituais, e completou dois retiros preliminares. Aos dezesseis anos, sob a orientação do Khenpo Lodro Rabsel, iniciou o estudo dos três veículos do budismo enquanto permanecia em retiro.

Aos vinte e três anos recebeu ordenação completa do Karmapa. Aos vinte e sete anos Rinpoche deixou o Tibete partindo para a Índia na época da invasão comunista. Ele foi convidado para ficar em Rumtek, Sikkhim, onde o Karmapa mantinha seu trono no exílio. Aos trinta e cinco anos prestou os exames para geshe diante de 1500 monges no campo de refugiados monástico de Buxador, em Bengala, e recebeu o título de Geshe Lharampa. Ao retornar para Rumtek foi nomeado Abade do Monastério de Rumtek e do Instituto Nalanda para Estudos Budistas Superiores em Rumtek. Ele tem sido o professor pessoal dos quatro principais tulkus Kagyu: Shamar Rinpoche, Situ Rinpoche, Jamgon Kongtrul Rinpoche e Gyaltsab Rinpoche.

Thrangu Rinpoche tem viajado extensamente pela Europa, Extremo Oriente e pelos Estados Unidos. Ele é o abade da Abadia Gampo, Nova Escócia, e da Casa Thrangu, Oxford, no Reino Unido. Em 1984 passou alguns meses no Tibete onde ordenou mais de 100 monges e monjas, e visitou diversos monastérios. Ele também fundou o Monastério Thrangu Tashi Choling em Boudhnath, um centro de retiros e um colégio em Namo Buddha a leste do Vale de Katmandu, e estabeleceu uma escola em Boudhnath para a educação geral de crianças leigas e jovens monges. Ele também construiu a Abadia Tara em Katmandu. Em outubro de 1999 consagrou um colégio em Sarnath que aceitará estudantes de diferentes tradições do budismo e estará aberto a estudantes ocidentais também.

Thrangu Rinpoche, um mestre reconhecido da meditação Mahamudra, tem dado ensinamentos em mais de vinte e cinco países, e é especialmente conhecido por tornar ensinamentos complexos acessíveis aos estudantes ocidentais. Recentemente, devido ao seu vasto conhecimento do Darma, foi apontado por Sua Santidade o Dalai Lama para ser o tutor pessoal do Décimo sétimo Karmapa, que há pouco escapou do Tibete.

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Prefácio

Dois mil e quinhentos anos atrás o Buda iniciou a propagação de um memorável conjunto de ensinamentos. Ele ensinou que ao invés de confiarmos em um deus ou em buscas materialistas, poderíamos alcançar felicidade verdadeira e permanente examinando e trabalhando nossa própria mente. Então, ele ofereceu uma série de ensinamentos que preenchem mais de cinqüenta volumes do tamanho da Bíblia cristã, sobre como atingir este objetivo. Além de dar ensinamentos sobre como eliminar todos os milhões de obscurecimentos que acumulamos, ele ensinou como desenvolver o insight da realidade como é percebida apenas pelos seres iluminados.

Cerca de 1000 anos atrás um indivíduo extraordinário, Gampopa, alcançou a iluminação, seguindo seu lama Milarepa, e decidiu organizar todo o caminho budista em um único livro, intitulado O Ornamento da Preciosa Liberação. Neste texto clássico da linhagem Kagyu do budismo tibetano ele combinou uma explicação sobre o caminho da acumulação de méritos, o qual ele aprendeu com o famoso pandita Atisha, com o desenvolvimento da realização através da meditação Mahamudra, a qual ele recebeu de seu guru Milarepa. O resultado é um dos textos realmente clássicos do budismo.

O texto é bastante sucinto e difícil de acompanhar, como foi testemunhado pela tentativa de Herbert Guenther de traduzi-lo para o inglês na década de 1950. Por este motivo, quando Thrangu Rinpoche foi convidado a ensiná-lo no ocidente, após tê-lo ensinado a todos os principais regentes da linhagem Kagyu, ele decidiu oferecer um ensinamento de quatro meses sobre o texto para familiarizar os ocidentais com o Caminho.

Clark Johnson, Ph. D.

Gerente de Edição

Namo Buddha Publicações

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O Ornamento da Preciosa Liberação - Gampopa

Je Gampopa

O Ornamento da

Preciosa Liberação

A Jóia que Realiza Desejos

dos Nobres Ensinamentos

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O Ornamento da Preciosa Liberação - Gampopa

Homenagem

Prostro-me diante do nobre Manjushri, em sua forma jovial.

Presto homenagem aos Vitoriosos, aos seus herdeiros, ao Darma sagrado,

E aos lamas que são sua raiz.

Este nobre ensinamento, que é como uma jóia que realiza desejos,

Será escrito para o meu próprio benefício e de todos os outros

Com base na bondade do Senhor Mila.

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Introdução ao Texto

A base de todos os ensinamentos de Gampopa são as instruções de Milarepa sobre a vacuidade na prática do Mahamudra1. Estas instruções nos permitem realizar a verdadeira natureza da mente. Estas instruções nos proporcionam os meios para alcançar dois objetivos: a eliminação dos pensamentos que perturbam nossa mente e a habilidade de desenvolver as qualidades positivas que se encontram, naturalmente, presentes na mente. As falhas que devem ser eliminadas são todos os fatores negativos que perturbam a mente como ignorância, desejo, raiva, etc. A prática do Mahamudra pode dissolver todos estes fatores negativos completamente, de forma natural e automática. E todas as qualidades intrínsecas à mente serão desenvolvidas naturalmente até alcançarem sua completude.

Em O Ornamento da Preciosa Liberação Gampopa mesclou a corrente de instruções da escola Kadampa com as instruções do Mahamudra. Os ensinamentos Kadampa, do ponto de vista filosófico, não são os ensinamentos com a visão mais elevada, mas eles colocam grande ênfase na conduta adequada e na prática. Os ensinamentos Kadampa foram levados ao Tibete após a destruição do Darma pelo Rei Lang Dharma. Anteriormente, o Rei Trisong Deutsen (718 – 785 DC) havia introduzido o budismo no Tibete. Então houve o Rei Lang Dharma (863 – 906 DC) que perseguiu os budistas e suprimiu o Darma no Tibete, criando grandes dificuldades para o ensino do budismo. Neste período muitos ensinamentos foram perdidos e a prática degenerou. Apesar de a prática Vajrayana ter continuado, ela foi de certa forma corrompida. Algumas pessoas entendiam o Darma apenas em termos de palavras, por exemplo, elas diziam, “tudo é vazio” ou “tudo é a Grande Perfeição ou Mahamudra”. Elas não compreendiam isto corretamente por se apegarem à idéia de que tudo é vazio ou Mahamudra, e não enxergavam que no nível relativo2 há o karma e a bodicita, e todas as diversas qualidades que devem ser acumuladas. Para esclarecer esta interpretação errônea do Darma dois grandes reis do Tibete, Yeshe Ur e Chang Chup Ur, convidaram o grande mahapandita indiano Atisha para vir ao Tibete e dar ensinamentos. Eles solicitaram que ele ensinasse especificamente o refúgio, a determinação de alcançar a iluminação e as paramitas. Estas instruções se tornaram conhecidas como a linhagem Kadampa. O que Gampopa fez em O Ornamento da Preciosa Liberação foi mesclar estas instruções Kadampa com as instruções Mahamudra que ele recebeu de Milarepa.

O Nome do Texto

O nome abreviado deste livro é “Tak Chin3”, que significa “o ornamento da liberação”. O nome extenso deste livro é “Tak pa Rinpoche Chin”, que significa “o ornamento da preciosa liberação”. Explicando melhor: o propósito de nossa prática do Darma é a liberação. É a liberação de todos os nossos problemas, de todas as nossas complicações e de todo o sofrimento da existência condicionada no samsara. Nós meditamos e praticamos para

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alcançar a liberação do sofrimento. Mas o sofrimento é apenas o resultado de uma causa definida, e a causa deste sofrimento é a negatividade que perturba nossas mentes. Assim, temos que eliminar esta causa para nos livrarmos do efeito, o sofrimento.

Esta liberação recebe a denominação de “preciosa” ou “rinpoche” em tibetano, que é o termo usado para uma pedra preciosa ou jóia. Aqui a palavra “rinpoche” deve ser entendida como uma jóia que realiza desejos. A liberação é uma jóia que realiza desejos porque, quando a alcançamos, recebemos tudo aquilo que sempre quisemos.

O caminho para atingir a liberação está aqui como um ornamento. Isto pode parecer estranho, a princípio, porque quando falamos de um ornamento nos referimos, usualmente, a algo que colocamos para parecermos mais bonitos. Aqui, o ornamento deve ser entendido no sentido de algo que esclarece, como um espelho, que traz clareza. Este ensinamento, então, é o ornamento que nos fará enxergar o que é esta jóia que realiza desejos da liberação, como podemos consegui-la, quais são os benefícios de alcançá-la, e que pena seria se não a obtivéssemos. É por isto que este livro é denominado “O ornamento que torna possível enxergar a jóia que realiza desejos da grande liberação.”

A Homenagem

A homenagem diz: “Prostro-me diante do nobre Manjushri em sua forma jovial.” Esta é uma tradição do Tibete, de começar todo texto budista com uma homenagem para oferecer nosso respeito aos budas e bodisatvas. Esta frase muda, dependendo de a qual das três classes de ensinamentos o texto pertence, Vinaya, Sutra ou Abidarma. Assim, podemos saber de onde veio o texto apenas lendo a homenagem. Quando um texto provém do Abidarma, que é bastante difícil e de sutil entendimento, a homenagem é para Manjushri porque ele representa prajna, a mais elevada sabedoria. Portanto, o Ornamento da Liberação pertence ao Abidarma.

O nome de Manjushri em tibetano é “Jam pal”, onde “Jam” significa “suave”. Ou seja, Manjushri é completamente “suave”, e portanto totalmente livre de toda a rudeza ou grosseria da negatividade. A outra parte do nome de Manjushri é “pal”, significando “magnitude”, “totalidade”, ou “esplendor”. É o grande esplendor de possuir a melhor virtude possível. Desta forma, “Jampal” significa aquele que é esplêndido e suave. Na homenagem, prostramo-nos ao “jovem” Manjushri, ao qual se refere como jovem porque ele ainda não é totalmente maduro, mas também não é mais uma criança. Isto significa que Manjushri é visto como um bodisatva. Em termos de desenvolvimento espiritual um bodisatva não é uma criança, uma pessoa comum, mas também não é ainda uma pessoa madura, um buda completamente desenvolvido.

Gampopa também inclui uma homenagem para mostrar seu respeito pelas deidades e para dar aos estudantes um exemplo de humildade. Ao prestar homenagem aos outros, Gampopa reconhece as qualidades superiores de outros seres, o que demonstra que ele possui pureza de mente para reconhecê-los sem orgulho. Isto mostra aos estudantes como eles deveriam se

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portar, e como eles deveriam ter fé e devoção por aqueles com qualidades superiores.

Os Seis Tópicos deste Livro

O Ornamento da Liberação pode ser sintetizado em seis pontos principais que nos mostram como alcançar a iluminação insuperável. O primeiro ponto é denominado “a causa primária”. Nós queremos atingir a iluminação, o estado búdico, e a causa responde a esta questão: “Somos capazes de realizar isto?” A resposta é de que todos podem alcançar a iluminação porque todos possuem a semente da iluminação. Assim, qualquer um que tente atingir a iluminação da forma correta irá, finalmente, alcançá-la. Não é correto acreditar que algumas pessoas podem conseguir e outras não.

O segundo ponto é a necessidade de uma “base adequada” ou fundação para trabalharmos. Esta base significa o tipo adequado de existência. Por exemplo, um animal não tem a chance de atingir a iluminação. Um animal terá que esperar até se liberar do reino animal4 para poder trilhar o caminho da iluminação. Portanto, precisamos do tipo adequado de fundação para trilhar este caminho rumo à iluminação.

O terceiro ponto é a causa contributória, ou “a condição”. Podemos ter a semente da iluminação e a base adequada como seres humanos, mas ainda precisamos da forma correta da condição de uma pessoa que nos encoraje e nos motive para trilhar o caminho da iluminação. Esta condição é o amigo espiritual ou lama que pode nos guiar.

Podemos nos perguntar se possuir a causa adequada, a base correta e um amigo espiritual é o suficiente para alcançarmos a iluminação. Não, ainda não é o suficiente. O amigo espiritual pode nos guiar, mas não pode tirar toda nossa negatividade e simplesmente lavá-la. Precisamos dos “meios corretos”, ou método, para trilhar o caminho da iluminação. Este quarto ponto, então, são os meios adequados, que são as instruções do amigo espiritual como as ferramentas de que precisamos para trabalhar.

Uma vez que tenhamos os meios corretos, o que podemos alcançar? Isto é explicado no quinto ponto, que é a “fruição correta”, ou resultado, que é a iluminação.

O que podemos fazer ao alcançar a iluminação é explicado no sexto ponto, que são as “atividades corretas”, atividades espontâneas para beneficiar todos os outros seres. Ao atingirmos a iluminação também alcançamos a realização, mas também nos engajamos automaticamente em tentar ajudar todos os outros seres.

Este é um sumário dos temas deste livro.

Na seqüência cada um destes seis pontos básicos é desenvolvido em detalhes com explicações sobre seu significado.

No primeiro ponto “causa” significa a essência do estado búdico ou a essência dos sugatas. “Sugata” é uma palavra sânscrita que significa “aquele que se foi para a felicidade ou êxtase”, ou “dewa shepa” em tibetano. A pessoa descrita é o Buda, e este termo descreve o que acontece na iluminação: o

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sofrimento é abandonado e a felicidade é alcançada. Este termo (sugatagarba) não é apenas o nome do Buda, mas ele também descreve o que acontece neste estágio. A essência do sugata, do Buda, é a sabedoria pura do Buda que todos os seres possuem, e esta é a causa da iluminação, a semente da iluminação que está presente em todos os seres sem exceção.

O segundo ponto é a “base”, e ela é explicada em termos do corpo humano que é precioso, ou que é como uma jóia. A razão do corpo humano ser comparado a uma jóia não é que ele se assemelhe a uma jóia fisicamente, mas sim porque ele pode funcionar como uma jóia que realiza desejos, na medida em que ele nos permite atingir nosso objetivo último, e portanto ele é muito benéfico.

O terceiro ponto é a “condição”, e isto é explicado em termos de um amigo espiritual. Estes são aqueles que podem nos mostrar o caminho e nos levar à iluminação.

O quarto ponto é o “método”, e este é descrito em termos das instruções do amigo espiritual.

O quinto ponto é a “fruição”, e ela é descrita como sendo os kayas do Buda.

O sexto ponto são as “atividades”, e elas são explicadas em termos da atividade não-conceitual pelo benefício de todos os seres. Isto significa que, quando a iluminação é atingida, não precisamos fazer nenhum esforço para beneficiar os outros seres, porque estas atividades surgirão espontaneamente, sem qualquer necessidade de pensamentos e de esforços.

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TÓPICO 1: A CAUSA PRIMÁRIA

A Causa Primária é a Essência Búdica

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Capítulo 1

Natureza Búdica

O primeiro tópico em O Ornamento da Preciosa Liberação é a natureza búdica ou essência búdica5, que descreve o potencial búdico de todos os seres. O primeiro ponto diz: “A causa é a essência dos budas.” Quando praticamos o Darma precisamos de muito esforço e diligência para seguir com nossas práticas. Se praticarmos diligentemente não precisamos ter receio de que não alcançaremos a iluminação. Por exemplo, se batermos o leite obteremos manteiga. Mas se pegarmos água, mesmo que fiquemos muito tempo batendo não obteremos manteiga. Da mesma forma, se esmagarmos sementes de gergelim obteremos óleo de gergelim. Mas, por mais que esmaguemos a areia nunca iremos obter o óleo. Isto é assim porque é necessário existir a causa (ou condição causal) para que o resultado possa surgir. A razão pela qual obtemos manteiga a partir do leite é de que o potencial da manteiga está presente no leite. Igualmente, o óleo de gergelim se encontra potencialmente na semente de gergelim, e assim, quando esmagamos a semente obtemos o óleo. Entretanto, a água não possui o potencial da manteiga e igualmente a areia não tem o potencial do óleo de gergelim. Assim, ao agitarmos a água ou esmagarmos a areia não serão produzidos manteiga ou óleo de gergelim. Da mesma forma, para alcançar a iluminação, fazemos grandes esforços na meditação. Ao fazermos isso, não deveríamos ter quaisquer dúvidas porque todos possuem a essência da iluminação em suas mentes. Com esta essência possuímos a semente da iluminação e, assim, quando trabalhamos com base nesta semente da forma adequada, alcançaremos a iluminação.

Evidências nas Escrituras

Foi o próprio Buda quem afirmou tanto nos sutras quanto nos tantras que todos possuem a semente da iluminação. No segundo giro da roda do Darma6 o Buda explicou que todos os fenômenos são vazios, e que esta vacuidade permeia tudo e todos. Visto que tudo é vacuidade, todos os pensamentos e toda a negatividade podem ser abandonados por não possuírem uma natureza inerente própria, e, portanto, podemos atingir o resultado final, a realização última.

No terceiro giro da roda do Darma foi demonstrado que a natureza de todas as coisas não é apenas a vacuidade, como uma ausência total. Esta vacuidade possui a qualidade da luminosidade (Tib. salwa), que é a qualidade de uma inteligência muito vívida, e que é parte da própria natureza da mente. Esta luminosidade e inteligência estão presentes inerentemente em todos os seres. O que temos que fazer através da prática budista é permitir que esta luminosidade original se amplie. Então, todas as outras qualidades positivas da mente irão se desenvolver e se manifestar. Esta essência da iluminação, que é

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a luminosidade da mente, é algo que podemos desenvolver através do esforço e da prática correta, da mesma forma que desenvolvemos as qualidades do conhecimento no processo da educação. Assim, podemos alcançar a iluminação porque a semente se encontra dentro de nós. Nos ensinamentos Vajrayana a verdadeira natureza da mente é abordada como o Mahamudra. É isto que precisamos realizar e reconhecer para nos iluminarmos. A posição Vajrayana foi descrita a partir dos ensinamentos do Buda do terceiro giro da roda do Darma.

Os sutras e os tantras afirmam que todos os seres possuem esta semente da iluminação. Mas como sabemos que esta semente da iluminação se encontra em todos os seres? O Ornamento da Liberação nos oferece duas respostas: evidências nas escrituras e raciocínio lógico. A primeira resposta vem das escrituras através das afirmações do Buda e dos bodisatvas. Existem quatro diferentes textos mencionados em O Ornamento da Liberação que descrevem a essência búdica de todos os seres. Os primeiros três sutras citados são: o Sutra Rei da Meditação (Tib. Tingne Dzingyi Gyalpo Do),7 o Sutra do Grande Parinirvana (Tib. Do Nyanyenley Depa Chenpo), e o Pequeno Sutra do Parinirvana (Tib. Nyanyen De Chunggi Do). Estes dois últimos sutras foram explicados pelo Buda pouco antes de sua morte e contêm instruções muito profundas. Estes sutras claramente afirmam que a essência búdica está presente em todos os seres. O quarto texto, o Ornamento dos Sutras Mahayana (Tib. Dode Gyen), é uma das cinco obras do bodisatva Maitreya. Ele é um shastra, um texto escrito por alguém comentando uma obra do Buda, e ele também afirma que a essência búdica está presente em todos os seres.

Existem indivíduos que possuem grande fé no Buda, que acreditam no que o Buda disse e confiam na sua palavra. Estas pessoas simplesmente aceitam que a natureza de Buda ou a essência búdica se encontra em todos os seres porque o Buda assim falou. Entretanto, nem todos desenvolvem fé imediatamente e confiança nas escrituras. Para estas pessoas não basta algo ter sido afirmado nas escrituras; elas precisam de bons motivos. De fato, nas escrituras se diz que não deveríamos aceitar afirmações com base na fé, e assim elas demonstram razões válidas e provas lógicas.

Três Razões para os Seres Possuírem a Natureza Búdica

Existem três razões que explicam por que todos possuem a essência búdica. A primeira é de que o corpo do Buda, o darmakaya, permeia todos os seres, o que significa que os seres são capazes de, no futuro, manifestar a iluminação. Em outras palavras, a iluminação pode se manifestar em todos os seres porque eles já se encontram completamente permeados pelo darmakaya.

A segunda razão é de que, na natureza última de todas as coisas, o darmata, não há separação entre uma natureza positiva e uma negativa. Não existe uma natureza negativa dos seres comuns e uma natureza positiva dos seres iluminados na natureza absoluta dos fenômenos. Ela é completamente não-diferenciada. Pelo fato dos bodisatvas do passado terem alcançado o estado de realização, nós também podemos atingi-lo se praticarmos adequadamente.

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A terceira razão pela qual todos os seres possuem o potencial búdico em seu interior é de que isto é evidente em graus variados [categorizados como cinco tipos de potencial]; mas, possuindo esse potencial, todos eles podem alcançar a iluminação.

Estas são as três razões que demonstram a presença da essência búdica em todos os seres, e o motivo pelo qual o budismo acredita na presença da semente da iluminação em todos. O budismo não acredita que alguém possa alcançar a iluminação a partir de fatores externos. Por exemplo, a iluminação não pode ser concedida como um presente de um deus ou de outro ser. A iluminação deve surgir a partir do interior porque ela já se encontra lá, no interior da mente. Assim, ao desenvolvermos este potencial da forma adequada iremos manifestá-lo. A iluminação deve surgir a partir de nós mesmos e irá se manifestar apenas através de nossos esforços. Ninguém pode trazer a iluminação até nós e ninguém pode nos impedir de alcançar a iluminação. Se tivermos o desejo correto de alcançar a iluminação e de aplicar o esforço correto, então é certo que alcançaremos a iluminação. Também temos a escolha de não atingir a iluminação, portanto a escolha é completamente nossa.

O Buda Sakiamuni foi uma pessoa excepcional com todas as qualidades mais elevadas. Fisicamente ele possuía as trinta e duas marcas maravilhosas e as mais notáveis qualidades de fala, que o permitiam ensinar os três giros da roda do Darma, e mentalmente também possuía as mais perfeitas qualidades. Nós também possuímos todas estas qualidades excepcionais do Buda. Não precisamos pensar “Eu nunca alcançaria este estado”, porque possuímos a essência de todas as qualidades do Buda dentro de nós.

Às vezes, quando examinamos os exemplos de grandes praticantes como Marpa ou Milarepa, podemos nos desencorajar e pensar, “Bem, para eles isto tudo era fácil. Eles tinham a energia, a diligência e a coragem de praticar daquela forma, mas isto não serve para mim.” Podemos pensar “Eles possuíam 100% das condições causais para atingir a iluminação, enquanto que eu só tenho 50% destas condições.” Mas não deveríamos nos sentir desencorajados desta forma porque as condições causais que eles possuíam são exatamente as mesmas para nós e para todos os outros. Esta semente existe em todos os seres, sem nenhuma diferença.

Resumindo, existem três razões pelas quais todos os seres possuem a essência da iluminação. A primeira razão é de que o darmakaya permeia todos os seres e, portanto, a essência búdica se encontra em todos os seres. A segunda é de que a natureza absoluta de todos é a mesma sem qualquer distinção de bondade ou maldade. Terceiro, mesmo que o potencial seja o mesmo em todos, em momentos diferentes no desenvolvimento espiritual de uma pessoa haverá diferenças. Por exemplo, um ser pode nascer no reino humano enquanto outro ser nasce como cachorro no reino animal. Ambos têm o potencial búdico em seu interior, e assim, no sentido absoluto não há qualquer diferença no potencial dos dois. Mas no âmbito relativo, em termos da situação, das diferentes circunstâncias e do esforço colocado na prática – o ser humano terá maiores oportunidades de praticar que o animal – o potencial irá se manifestar de formas diferentes.

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Assim, não estamos dizendo aqui que o potencial é o mesmo em todos os aspectos. É o mesmo em termos da natureza absoluta, mas, superficialmente, em termos das diversas situações dos seres, existem claras diferenças.

Cinco Categorias de Potencial

Todos os seres podem ser classificados em cinco diferentes grupos com base neste potencial: o primeiro grupo apresenta sinais de potencial “cortado”. O segundo grupo possui o potencial “incerto”. O terceiro grupo é o dos shravakas, cujo potencial irá revelar um certo tipo de qualidades. O quarto grupo é o dos pratyekabudas, cujo potencial também apresenta qualidades específicas. O quinto grupo é daqueles com o potencial Mahayana. Entretanto, estas categorias não são estáticas porque podemos passar de uma categoria para outra. Se alguém possui, por exemplo, o potencial cortado, esta pessoa pode mudar esta condição e desenvolver um dos estados com maior potencial. Por outro lado, alguém que possui todos os sinais de um grande potencial tal como um pratyekabuda pode realizar certas ações que o levem a retroceder para um potencial cortado.

I. O Potencial Cortado. A primeira forma do potencial búdico é denominada “potencial cortado”. Este potencial impede a prática do Darma e, portanto, impede que a iluminação seja alcançada. Existem seis sinais específicos muito importantes que definem este potencial. Se localizarmos estes sinais em nós mesmos deveríamos eliminá-los para sairmos deste potencial limitado.

O primeiro sinal é não ter nenhum cuidado ou insatisfação com o sofrimento da existência condicionada. Por exemplo, quando estes indivíduos se defrontam com o sofrimento eles não sentem a necessidade de fazer algo; eles apenas agüentam o que está acontecendo. Isto, é claro, não traz benefícios porque eles apenas continuam da mesma forma. A atitude sensata diante de tais dificuldades e sofrimentos é estar motivado para fazer um esforço para eliminar o sofrimento, para sair desta situação difícil. Assim, se a pessoa não estiver insatisfeita com o sofrimento ela permanecerá passivamente neste estado e não buscará a liberação. É por isto que se deve eliminar este engano.

A segunda característica deste potencial é de que as pessoas não possuem nenhuma “confiança”, ou seja, aspiração ou motivação. Ao descobrirem que existe um estado de felicidade possível eles não se sentem motivados a alcançá-lo. Eles podem apenas pensar que tal estado é muito bom e, então, esquecê-lo. Assim, é importante eliminar o defeito de não ter qualquer aspiração em alcançar um estado melhor e tentar desenvolver esta aspiração.

O terceiro e o quarto sinais do potencial cortado são apresentados juntos porque eles descrevem um sentimento similar que é experimentado de duas formas diferentes: um com respeito a si mesmo e o outro com respeito aos outros. De modo geral tentamos agir da melhor forma possível com os outros e nos esforçamos para que nossas ações, pensamentos e palavras sejam benéficas e não prejudiquem os outros. Mas, às vezes, não conseguimos fazer

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assim e nossas ações, palavras e pensamentos se tornam bastante negativos. Quando isto acontece precisamos de duas qualidades que faltam naqueles que estão com o potencial cortado. A terceira qualidade é o pensamento “O que eu estou fazendo agora não está certo, eu não posso agir assim.” Esta é uma sensação de respeito por si próprio que faz com que você sinta que algo não está certo, que você não pode agir desta forma e deve agir de uma forma melhor. Esta sensação de respeito é direcionada a si mesmo. O outro aspecto, a quarta qualidade, é em relação aos outros. É a percepção de que se você agir de tal forma negativa os outros irão perceber e você não quer que os outros pensem negativamente sobre você; portanto, esta qualidade é uma sensação de vergonha. Assim, o terceiro sinal de respeito próprio se dá em relação a si mesmo e o quarto sinal da vergonha se dá em relação aos outros.

O quinto sinal do potencial cortado é a ausência de compaixão. Quando falamos de compaixão normalmente nos referimos a alguém que está sofrendo. Mas, de forma mais ampla, a compaixão se dá pelas pessoas que possuem em seu interior a causa do sofrimento. Isto significa que podemos sentir compaixão por alguém que não esteja sofrendo no momento porque a causa do sofrimento se encontra nesta pessoa, e assim o sofrimento surgirá, mais cedo ou mais tarde. Esta compaixão surge do reconhecimento através de nossa própria experiência de como é duro passar por este sofrimento e, então, entender que ele é tão insuportável para os outros quanto é para nós. Assim, desenvolvemos o desejo de abandonar o sofrimento. Algumas pessoas não possuem esta compaixão mesmo quando vêem outras pessoas sofrendo porque elas não percebem que o sofrimento dos outros é igual ao seu. E assim, estas pessoas não sentem a necessidade de ajudar os outros a saírem do sofrimento. Sem compaixão elas não serão capazes de praticar o altruísmo.

O sexto sinal é a ausência de arrependimento ou remorso. Normalmente tentamos agir da forma mais positiva possível, mas mesmo assim cometemos erros que causam sofrimento tanto para os outros quanto para nós. É importante sentir arrependimento pelas coisas negativas que fizemos. O remorso por si só não é positivo, pois o que foi feito está feito. Mas é importante para o futuro, porque se nos arrependemos do que fizemos iremos nos cuidar para que não aconteça novamente. Se não sentirmos remorso iremos achar que está bem em fazer as mesmas ações negativas novamente. Se há uma ausência de arrependimento, este é um sinal de que o potencial da pessoa é do tipo cortado.

Quando o potencial de alguém está cortado, esta pessoa ainda tem o potencial ou poder de alcançar a iluminação, mas, temporariamente, este potencial está represado devido às seis características negativas. Desta forma não será possível alcançar a fruição e, portanto, é como se o potencial estivesse cortado.

II. O Potencial Incerto. O segundo tipo de potencial é denominado “potencial incerto”, e é assim chamado porque não sabemos se este potencial irá se desenvolver de forma positiva ou negativa; dependendo das circunstâncias as coisas podem andar bem ou não. Se encontrarmos o tipo certo de pessoas e aprendermos as coisas certas poderemos andar bem. Mas, se encontrarmos o tipo errado de pessoas e aprendermos coisas erradas, então as coisas podem ficar muito mal. Assim, este potencial depende das pessoas

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com as quais nos associamos, do que lemos, de qual educação recebemos e do que treinamos. Aqui, falando em termos do caminho Mahayana, é importante evitar as motivações inferiores do caminho Hinayana. Devemos nos esforçar para desenvolver e seguir a motivação maior do Mahayana.

Diferentes Motivações

Os próximos três tipos de potencial se referem aos shravakas, pratyekabudas e aos seguidores do Mahayana. A diferença entre estes três tipos é o alcance de sua motivação, o grau de abertura e a forma como eles pensam; qual é seu objetivo na prática. A motivação mais elevada e mais ampla é a grande motivação do Mahayana, que trata todos os seres sem qualquer diferenciação. Uma pessoa com esta motivação quer ajudar não apenas as pessoas que ela ama ou de quem ela gosta, mas deseja ajudar todos os seres incluindo os seres não-humanos, porque ela percebeu que todos são iguais na busca da felicidade. Esta é a motivação mais aberta e pura.

O oposto é a “motivação impura” de buscar apenas a própria felicidade e satisfação sem qualquer consideração pela felicidade dos outros. Na verdade, focar apenas a própria felicidade e satisfação, freqüentemente implica em criar sofrimento para os outros de forma a alcançar os próprios objetivos. A motivação dos shravakas e pratyekabudas não é impura, mas é uma motivação estreita que leva à busca apenas da felicidade e liberação para si mesmo; o benefício próprio é o ponto principal. Assim, esta motivação é mais estreita do que a motivação Mahayana que foca todos os seres.8

III. O Potencial Shravaka. Existem três características que descrevem este terceiro potencial dos shravakas. A primeira é de que eles têm grande medo do samsara. A segunda é de que eles aspiram ao nirvana. A terceira é de que eles possuem muito pouca compaixão. Em geral é bom ter medo do samsara porque isto leva à motivação de querer se libertar do samsara. Isto nos traz a segunda característica, de aspirar pelo nirvana, que é a liberação final do samsara. Entretanto, o medo do samsara e a aspiração pelo nirvana podem nos levar somente até certo ponto, mas não à liberação final9 devido a uma falta de coragem e determinação. No Mahayana é essencial ter coragem e não se sentir deprimido ou desencorajado diante do tamanho do trabalho envolvido em liberar todos os outros seres do samsara. É isto que os shravakas não têm, a coragem de superar esta dificuldade. A motivação shravaka é de tentar escapar do samsara movidos pelo medo; fugimos do samsara e corremos para o nirvana. Assim, este medo e este desejo são falhos e surgem de uma falta de compaixão. Um praticante Mahayana não tem medo. Os shravakas estão conscientes de seu próprio sofrimento, mas não do sofrimento dos outros. Portanto, indivíduos que possuem esta motivação inferior seguirão este caminho e alcançarão os resultados correspondentes. Aqueles que seguem o caminho Mahayana e encontram estas características em si mesmos deveriam tentar abandoná-las.

IV. O Potencial Pratyekabuda. O quarto tipo de potencial é o dos pratyekabudas que possuem uma acumulação de virtudes muito superior à dos

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shravakas, mas que ainda é inferior à dos bodisatvas e budas pelo fato de eles não terem coragem suficiente e abertura para agir pelo benefício dos outros seres. Os pratyekabudas praticaram e geraram uma grande acumulação de virtudes durante muitas vidas, mas sua motivação foi a de alcançar o nirvana e a liberação apenas para si próprios. Quando eles fizeram estas práticas eles tiveram um professor ajudando-os. Mas, quando eles estão próximos de passar pelo seu último renascimento, no qual eles atingirão o nirvana, eles são capazes de encontrar o caminho correto sozinhos sem nenhum apoio de um professor. Usualmente, eles irão renascer em um local onde não há um buda, e onde os ensinamentos de um buda não mais existem ou estão disponíveis. Então, eles alcançarão a realização por si próprios, através do poder do que eles acumularam previamente. Eles não se sentem atraídos por atividades mundanas e não sentem nenhuma necessidade de ajudar os outros. Eles vivem em lugares remotos e solitários sentindo que devem realizar a verdade sobre todas as coisas. Eles permanecem, por exemplo, em cemitérios para entender o resultado final da vida no samsara. Eles meditam sobre cadáveres e refletem que tudo isto apenas causa sofrimento para si mesmos e para a família e os amigos. Eles pensam que a natureza dos fenômenos é o sofrimento e se dedicam a eliminar o sofrimento. Eles analisarão os “doze elos da originação interdependente”10 , aprendendo que para cessar a velhice e a morte deve-se eliminar o desejo e assim por diante, passando por tudo isto e, finalmente, alcançando a realização.

Os pratyekabudas apresentam seis características, sendo as três primeiras idênticas às dos shravakas: eles temem o samsara, eles acreditam no nirvana e possuem pequena compaixão. Além destas três eles possuem uma quarta característica de ter um professor secreto. Isto significa que não há um professor óbvio para eles. Quinto, eles possuem um grande orgulho porque estão convencidos de que podem alcançar a realização sozinhos. Em sexto lugar eles têm grande inclinação ao isolamento; eles gostam de permanecer em isolamento por terem uma grande aversão pela vida samsárica.

O Propósito destas Instruções

O propósito de dar ensinamentos sobre os diferentes tipos de potencial búdico é de que, se quisermos seguir o caminho Mahayana, devemos evitar as características dos outros grupos. Portanto, podemos eliminar as características dos potenciais cortado, incerto, shravaka e pratyekabuda quando elas surgirem. Devemos lembrar que estas características não são permanentes e que é possível passar de um grupo para outro. É como cozinhar uma boa comida; devemos experimentar diversos ingredientes para descobrir o que torna a comida gostosa. Se cozinharmos alguma coisa e ficar saboroso, então desejaremos saber por que ficou saboroso. Se ficou ruim, podemos achar que é porque foi colocado sal demais ou foi cozido demais, etc, e da próxima vez usaremos menos sal e cozinharemos com as quantidades corretas. Da mesma forma aprendemos sobre estes diversos sinais e características de forma que possamos eliminá-los e, assim, seremos capazes de seguir o verdadeiro caminho Mahayana.

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V. O Potencial Mahayana. O quinto tipo é o potencial Mahayana, que é ensinado para sabermos como adquirir o tipo correto de potencial e como desenvolvê-lo corretamente. No Ornamento da Liberação o Mahayana é descrito em seis pontos: classificação, definição, sinônimos, razão de sua superioridade em relação aos outros potenciais, características e os sinais.

A. Classificação. O primeiro ponto descreve os dois aspectos do potencial Mahayana. O primeiro aspecto: este potencial está naturalmente presente em todos os seres sem qualquer distinção. Se este potencial não estivesse presente não haveria como atingir a fruição final da iluminação. Isto significa que todos têm o poder e a habilidade de alcançar a iluminação, desde que todos os obscurecimentos a este potencial sejam removidos e que tudo que deve ser realizado seja realizado.

O segundo aspecto é o potencial que está no processo de desenvolvimento. Ele se refere às pessoas que estão, de fato, trabalhando no desenvolvimento deste potencial, que se encontram no caminho.

B. Definição. O segundo ponto se refere à natureza do potencial Mahayana. Existem dois aspectos. Em primeiro lugar, o potencial naturalmente presente que tem a habilidade de revelar todas as qualidades de um buda. Esta habilidade sempre esteve presente, desde o tempo sem início, o que significa que ela não foi criada por ninguém e não veio de lugar algum; faz parte da natureza da mente. Este é o primeiro aspecto do potencial Mahayana.

O segundo aspecto, a natureza do potencial sendo desenvolvido, é um pouco diferente por exigir um esforço, ao contrário do potencial inerente espontaneamente presente. Este potencial também pode produzir todas as qualidades da iluminação, mas ele se deve às práticas anteriores de virtude; a prática adequada da virtude fará surgir todas as qualidades do estado búdico.

Podemos, agora, entender a diferença: no primeiro aspecto está presente porque é a natureza da mente, no segundo aspecto temos que trabalhar o potencial que é a natureza da mente. Para esclarecer darei um exemplo: o potencial inato pode ser comparado a uma semente colocada em uma bolsa de couro. O potencial em desenvolvimento pode ser comparado a uma semente colocada no solo porque no solo ela poderá se desenvolver, enquanto que na bolsa não.

C. Sinônimos. O terceiro ponto do potencial Mahayana apresenta sinônimos para descrevê-lo. Ele é chamado de “potencial” no sentido de que é capaz de dar origem a todas as qualidades búdicas; ou pode ser chamado de “semente” no sentido de que pode dar nascimento a um fruto, ou seja, o estado búdico. Outra palavra é “natureza”, no sentido de que o desenvolvimento gradual desta natureza finalmente irá se manifestar como a natureza búdica, ou pode ser chamado de “essência” ou “natureza pura”, no sentido de que a natureza búdica é completamente não-fabricada e natural.

D. Razão de sua Superioridade. O quarto ponto do potencial Mahayana nos diz que ele é o melhor potencial; ele é superior a todos os

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outros potenciais. Ele é claramente superior aos potenciais cortado e incerto, que não nos permitirão nem mesmo entrar no caminho. Ele também é melhor que o potencial shravaka e pratyekabuda, que seguem um caminho adequado, mas não o melhor caminho. Isto pode ser demonstrado de diferentes formas. Em termos do grau de purificação que eles atingem os shravakas e pratyekabudas podem apenas eliminar seus obscurecimentos emocionais, mas não seus obscurecimentos cognitivos.11 Isto também é verdade em termos de sua realização: o caminho Mahayana é superior em termos de realização porque os shravakas e pratyekabudas podem apenas realizar a não-existência de uma identidade pessoal, mas eles não realizam a ausência de natureza própria de todos os fenômenos.12 No Mahayana a realização é a iluminação completa.

E. Características. O quinto ponto descreve as diferentes formas do potencial Mahayana, que são duas: desperto e não-desperto. Quando o potencial Mahayana está desperto isto significa que a pessoa que despertou este potencial apresentará todos os sinais de ter entrado no caminho correto e de estar seguindo corretamente o caminho. O potencial não-desperto significa que, apesar de possuir o potencial inato presente em todos os seres, não existem sinais que demonstrem claramente sua presença.

Como despertar o potencial Mahayana inato que está sempre presente? Eliminando as condições desfavoráveis que o impedem de despertar e cultivando as condições favoráveis que nos ajudam a despertá-lo.

As Quatro Condições Desfavoráveis.

Existem quatro condições desfavoráveis que impedem o despertar. A primeira é nascer nos reinos que impossibilitam a prática do Darma. A segunda condição desfavorável é não possuir inclinação natural à prática da virtude, que se origina de uma predisposição adquirida em vidas anteriores. Em nossas mentes temos condições subconscientes que se formam devido à nossa prática anterior de virtude. Se não tivermos estas condições, então não teremos uma inclinação à prática da virtude. A terceira condição desfavorável é seguir um caminho incorreto, agir de uma forma muito negativa. A quarta condição desfavorável é ter muitos obscurecimentos, ou seja, ignorância, raiva, ciúmes e assim por diante.

Quando se tem estas quatro condições desfavoráveis o potencial Mahayana não despertará. É por isto que é necessário eliminar as condições desfavoráveis, e a forma de fazer isto é usando as duas condições favoráveis.

As Duas Condições Favoráveis

A primeira condição favorável é uma condição externa e a segunda é interna. A primeira condição favorável é procurar a ajuda de um professor, um lama ou guru. Ao receber instruções podemos praticar adequadamente. A segunda condição favorável é uma condição interna, que é o desenvolvimento

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da atitude correta; devemos ter a atitude correta de realmente ter aspiração pelo Darma, de ter confiança e de querer praticar o Darma adequadamente. Com estas duas condições favoráveis podemos superar as quatro condições desfavoráveis e, assim, o potencial Mahayana, que se encontra adormecido, irá despertar.

F. Sinais. O sexto ponto na descrição do potencial Mahayana são os sinais do potencial Mahayana desperto. Estes sinais são indicações da presença do potencial desperto. É o mesmo que ao ver a fumaça inferir a presença do fogo, ou ao ver uma ave aquática inferir a presença da água. Os sinais são a ausência de hipocrisia e de malícia, e a presença de uma grande bondade amorosa e de compaixão. Se estes dois sinais estiverem ausentes podemos concluir que o potencial não está desperto.

Sumário

Resumindo, todos os seres possuem a essência búdica e o potencial de alcançar a iluminação. E é por isto que, se eles praticarem, poderão alcançar a iluminação. Existem três razões que mostram por que todos têm esta essência búdica em suas mentes. A primeira razão é de que o darmakaya permeia todas as coisas. Portanto, a vacuidade permeia todas as coisas e seres, e assim, todos possuem esta essência vazia, a essência da iluminação. Como a vacuidade tudo permeia podemos eliminar todas as aparências ilusórias e manifestar a iluminação.

A segunda razão é de que a essência, ou a natureza essencial de todas as coisas, é completamente não-diferenciada. Por exemplo, não deveríamos pensar que o Buda possui uma natureza positiva e os seres comuns possuem uma natureza inferior, de forma que eles não possam alcançar a iluminação. Na verdade, não há a menor diferença entre a natureza de um buda e nossa própria natureza. Portanto, visto que o Buda atingiu a iluminação, nós também podemos atingir a mesma iluminação.

A terceira razão que indica a presença da essência búdica em todos os seres é de que eles possuem o potencial para atingir a iluminação. Eu expliquei como este potencial pode se apresentar de cinco diferentes formas (cortado, incerto, shravaka, pratyekabuda e Mahayana), mas este não é o ponto principal, apenas os detalhes. O ponto principal é a forma como o potencial está presente nos bodisatvas, o potencial Mahayana. O potencial real é o mesmo e tudo que temos de fazer é mudar nossa motivação, nossa atitude. Então poderemos atingir o resultado, o qual se desenvolverá a partir do nosso potencial interior. O aspecto mais importante é o potencial inato presente em todos os seres; é isto que torna possível a todos tornarem-se budas.

Para dar um exemplo ilustrando este ponto da diferença entre ter o potencial ou não: se eu vejo o Príncipe Charles e começo a pensar que ele tem uma ótima vida, que ele é muito feliz e muito rico, então, eu começo a querer tornar-me como ele. Mas este é um desejo inútil porque não há a possibilidade de tornar-se real. Eu não tenho as condições necessárias para tornar-me o

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Príncipe Charles. Da mesma forma, se não tivéssemos o que é necessário para tornarmo-nos budas, este seria um desejo inútil. Mas, uma vez que temos este potencial, é possível alcançarmos o resultado.

Assim, o ponto principal é o potencial Mahayana. As cinco condições, com a exceção do potencial Mahayana, representam condições desfavoráveis que nos impedem de praticar adequadamente. Todas elas são impedimentos temporários. O potencial Mahayana representa a causa direta e próxima da realização da iluminação, e os potenciais shravaka e pratyekabuda representam causas mais distantes para atingir a iluminação.

Entretanto, é importante ter em mente que mesmo o potencial cortado não implica que para estas pessoas a liberação não é possível, que estas pessoas estão afastadas da possibilidade da iluminação para sempre. Isto apenas significa que as perspectivas de alcançar a iluminação são bastante remotas. No final, entretanto, eles também atingirão a iluminação porque a base, o potencial búdico, está presente em seu interior.

Isto é o que foi colocado para compreendermos os ensinamentos sobre o potencial búdico, que é o que torna possível a todos atingir a iluminação.

Isto conclui a explanação sobre o primeiro capítulo, a causa primária,

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