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Comenda Volta da Empreza 2012

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Raimundo Angelim VasconcelosPrefeito de Rio Branco

Juracy Melo NogueiraPresidente da Câmara Municipal de Vereadores de Rio Branco

Eurilinda Maria Gomes FigueiredoDiretora Presidente da Fundação Municipal de Cultura Garibaldi Brasil

Rio Branco - Acre-Dezembro de 2011

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Prólogo

Apresentação

A história de Rio Branco

Prêmiação 2008

Prêmiação 2009

Prêmiação 2010

Grau Fundador: Guajarina Lima Margarido

Grau Comandante: José Chalub Leite

Grau Chanceler: João Donato

Escrever é fácil: entrevista com José Chalub Leite

Prêmios

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Sumário

EXPEDIENTE

Edição e OrganizaçãoMarcos Vinícius Simplício Neves

Helder Cavalcante Jr.

RevisãoEurilinda Gomes Figueiredo

Projeto GráficoUlisses Lima Guimarães

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Essa Comenda foi instituída por meio da Lei Nº. 1706, aprovada pela Câmara de Vere-adores, em 16 de junho de 2008, com o objetivo de perpetuar as memórias de nossa tra-jetória como povo amazônico, valorizar nosso patrimônio sócio-cultural e homenagear

aqueles que se distinguiram por suas contribuições para o engrandecimento do município, nos mais diversos campos de atividades. O nome da Comenda é uma referência ao primeiro nome dado à cidade de Rio Branco, no período de sua transição de seringal à povoado e é constituída de três graus com distintos Patronos. A cada ano, essa comenda será concedida a uma pessoa, em cada um destes graus. O grau Fundador, cujo patrono é Neutel Newton Maia, destina-se a reconhecer os que se destacaram por sua significativa contribuição nos campos social, cultural, econômico, hu-manitário, desportivo, ou outros de notável importância para a cidade, bairro ou comunidade. O grau Comandante, com o patrono o Coronel José Plácido de Castro, destina-se a homenagear os que contribuíram, através de atos extraordinários com a comunidade, promov-endo a consolidação estadual ou regional da cidade. O grau Chanceler tem como patrono José Maria da Silva Paranhos Junior - Barão do Rio Branco. Trata-se da mais alta distinção da Ordem, que se destina a homenagear aqueles que tenham reconhecidamente prestado relevantes serviços ao município, ou que, no exercício da sua atividade, tenham destacado o nome do município de Rio Branco nos cenários nacional ou internacional. Nesta revista trazemos, além dos três primeiros anos de outorga da Comenda Volta da Empreza, os agraciados do ano de 2011 para que sejam reconhecidos por sua importante con-tribuição ao de-senvolvimento de Rio Branco como uma cidade mais fraterna e humana para todos os nossos cidadãos.

Prólogo

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ApresentaçãoA palavra memória procede do latim “memor-oris”, que se traduz como “o que se lembra”.

E recordação vem de “re-cordis”, que significa “voltar para o coração”. E assim a palavra memó-ria, etimologicamente, é um retorno ao coração. (...) Nem tudo o que perdura é memória; é memó-ria o que se convoca na presença total do existente. (Fernando Báez. A História da Destruição Cultural da América Latina: da conquista à globalização).

Instituída pela Lei N° 1706/2008, a Comenda Volta da Empreza tem como objetivo perpetuar nossas memórias e valorizar nosso patrimônio social e cultural. E concretiza esse objetivo prestando home-nagem a pessoas que, através de suas trajetórias, nos ajudam a lembrar de quem somos; convidam-

-nos a pensar naquilo que nos une e nos irmana como povo que vive e ama essas terras da Amazônia Sul Ocidental. Favorece, portanto, o processo de recordação, convida-nos a “voltar para o coração”.

Para compreendermos a importância de uma celebração como essa, é fundamental lembrar que vivemos tempos marcados por uma assustadora rapidez, por mudanças contínuas, pelo avanço dos processos de globa-lização que representam uma ameaça permanente às nossas identidades culturais.

Como ação voltada à valorização de pessoas, a Comenda Volta da Empreza ganha uma importância e um valor que traduzimos nos cuidados e no carinho com que a realizamos, todos os anos, desde que a instituímos, com o firme propósito de fortalecermos práticas culturais, sociais e políticas.

Essas práticas propiciam a construção de um mapa afetivo de Rio Branco, forjado na heterogeneidade de percursos e de vozes marcadas por sentidos, valores, projetos de vida, expectativas, sonhos. Vidas em mo-vimento, em construção permanente, em meio a incertezas, tensões, conflitos, mas também a conhecimentos e saberes produzidos nas experiências de mulheres e homens singulares que convivem na multiplicidade e na diversidade.

E fazem mais: fazem Rio Branco emergir cheia de vida, repleta de alma, pujante de possibilidades, com suas memórias políticas, suas memórias de trabalhos, suas paisagens, suas ruas, mercados, praças, parques e quintais; suas cores, cheiros, sons e sabores; suas serenatas das madrugadas, seus ruídos de cidade que cresce; suas tradições e sua modernidade.

Aqui estamos. E seguimos nos auto afirmando, abrindo espaço para outras percepções e sensibilidades, mas cientes de quem somos e do lugar a partir do qual falamos. Alimentamos nossos sonhos e nossas vidas com a força do sentimento de pertencimento a este lugar.

A Comenda Volta da Empreza responde a nossa necessidade (humana) de autoafirmação e reivindicação constantes, a favor do fortalecimento dos nossos modos de viver, ser e fazer nesse mundo. E sabemos que o que aqui se encontra é único e muito especial. Celebremos, pois.

Raimundo Angelim VasconcelosPREFEITO DE RIO BRANCO

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A história de

Rio Branco, não é uma cidade qualquer. Além de ser o mais antigo núcleo urbano de todo o Acre, logo se constituiu como

a maior e mais importante cidade acreana sendo por isso escolhida como a capital do antigo Território Federal e do Estado do Acre. Mas Rio Branco ainda aguarda a elaboração de pesquisas e a organização de sua história com a abrangência e importância que de fato possui para a configuração da sociedade acreana.

Devido ao caráter ordenador do espaço urbano e da dinâmica social do Plano Diretor, é imprescindível ao menos pensarmos a cidade de Rio Branco em relação a sua história territorial, ao seu processo de ocupação do espaço e configuração de uma malha urbana diferencia-da do meio florestal circundante.

1882 / 1908 – de seringal a cidade

Este primeiro período da história urbana de Rio Branco é marcado por três características centrais. A primeira diz respeito à transformação do seringal Volta da Empreza no povoado denominado Villa Rio Branco. A segunda característica é que foi exatamente nesta época que Rio Branco alcançou a condição de liderança política e econômica do Acre que lhe valeria posteriormente a condição de capital. Finalmente, a terceira característica fundamental da cidade nascente foi que neste período o povoado da Volta da Empre-za – Villa Rio Branco esteve restrito a uma estreita faixa de terras na margem direita do rio Acre (atual 2º Distrito).

O Seringal Volta da Empreza foi fundado na margem direita do rio Acre, em 28 de dezembro1882, pelo cearense Neutel Maia. Mas logo se diferenciou dos outros seringais da região ao se tornar um por-to muito freqüentado pelos vapores que transitavam pelo rio durante a época das cheias. Neutel Maia criou então, já em 1884, uma casa comercial denominada Nemaia e Cia. para atender aos vapores, pequenos se-ringais e realizar a intermediação de gado boliviano para o abastecimento da região. Espontaneamente, portanto, a Volta da Empreza deixou de ser um se-

ringal como todos os outros do Acre para se tornar um povoado, o que equivale dizer que muito cedo a Volta da Empreza deixou de ser um espaço privado (de domínio exclusivo do seringalista) para se tornar um espaço publico onde outros comerciantes ou indi-víduos podiam atuar ou se fixar.

Por isso, além de se tornar a principal referencia comercial do médio rio Acre, o povoado da Volta da Empreza foi palco preferencial de diversos movimen-tos da guerra entre acreanos e bolivianos que abalou a região no final do século XIX e principio do XX. Tornou-se assim a sede do Acre Setentrional durante a ocupação militar de 1903 e, logo após a anexação das terras acreanas através do Tratado de Petrópolis, foi alçada a condição de sede do Departamento do Alto Acre no regime territorial recém implantado. Passou então a ter o nome de Villa Rio Branco, em homenagem ao articulador dos Tratados de limites que tornaram o Acre parte do Brasil.

Temos, portanto, neste período de 1882 a 1908 pelo menos três fases distintas na história da cidade, a saber: 1ª Fase - 1882 / 1898 – durante a qual o seringal se torna um povoado e se consolida comercialmente na região; 2ª Fase – 1899 / 1903 – na qual os diversos acontecimentos da Revolução Acreana levam a Volta da Empreza a se tornar o centro do poder político no vale do rio Acre; 3ª Fase 1904 / 1908 – quando a agora denominada Villa Rio Branco consolida sua liderança política e econômica tornando-se a sede do Departamento do Alto Acre.

Em relação à configuração espacial de Rio Bran-co, durante todo este período a área urbana da cidade se restringiu a uma estreita faixa de terras na margem direita do rio Acre, que correspondia a uma parte da área pertencente a Neutel Maia. Inicialmente foi a Casa Nemaia e Cia., situada diante da enorme ga-meleira que assinalava o porto da Volta da Empreza, que serviu como referencia para a construção de uma série de outros prédios seguindo o traçado da mar-gem do rio. Formou-se assim um primeiro arruamen-to onde se estabeleceram hotéis, restaurantes, casas

Rio Branco

Casa Comercial da Villa Rio Branco, do Sr. N. Maia e Cia. Armazéns dos Srs. Apolinário, Floguel e outros. Fonte: FALCÃO, Emílio. “Álbum do Rio Acre”, pg.99 - Data: 1906 - 1907

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comerciais e residenciais construídos com a madeira que era abundante nos arredores desta primeira rua do povoado (atualmente chamada de Rua Eduardo Assmar).

Com a extensão e adensamento desta primeira rua organizaram-se três áreas distintas que se constituíram como os primeiros bairros do povoado. Uma pequena área residencial de trabalhadores que ocupava as terras da volta do rio Acre, acima da Gameleira, e que era denominada Canudos. O centro do povoado da Volta da Empreza propriamente dito que era consti-tuído pela rua ao longo da margem do rio no trecho entre a Gameleira e o local onde hoje está a cabeceira da Ponte Metálica. E, finalmente, formou--se outro pequeno bairro de trabalhadores que recebeu o sintomático nome de rua África por abrigar os negros habitantes da cidade. Este ultimo bairro era a extensão da única rua da cidade na direção do igarapé da judia e era formado quase que exclusivamente por precárias casas de palha.

Ainda surgiria um quarto “bairro” (para empregar um termo de época) no povoado da Volta da Empreza – Villa Rio Branco. Isto se deu durante a ocupação militar de 1903, quando diante da necessidade de aquartelar tropas na área, o comandante Gen. Olimpio da Silveira decidiu faze-lo dis-tante do centro do povoado escolhendo para tanto uma área periférica, rio acima, e ali acampou o 15º Batalhão de Infantaria do Exército. A presença de tropas atraiu pequenos comerciantes que constituíram um novo arrua-mento, também ao longo da margem do rio, para atender as necessidades dos soldados dando origem ao bairro Quinze, cuja denominação permane-ce até hoje.

Ou seja, ao longo deste primeiro período de formação da área urbana de Rio Branco, podemos identificar não só sua consolidação um espaço diferenciado em relação aos seringais da região como também a configu-ração de um primeiro ordenamento espacial que refletia a organização da própria sociedade com bairros diferenciados para os trabalhadores ou para os “negros” da cidade.

1909 / 1940 – Uma cidade dividida

Este período da história da cidade possui alguns marcos fundamentais de diferentes naturezas. Seja no que diz respeito aos seus aspectos econômi-cos devido ao fim do ciclo da borracha a partir de 1913, seja em relação ao seu papel político já que Rio Branco se tornou a capital de todo o território a partir de 1920, seja no que se refere a ampliação de sua malha urbana pela incorporação de uma grande área de terras da margem esquerda já a partir de 1909. Portanto, a definição de fases que unifiquem as diversas caracterís-ticas deste período é mais difícil que em relação ao período anterior.

Como já vimos, até 1908, a Villa Rio Branco, sede do Departamento do Alto Acre, estava totalmente localizada na margem direita do rio Acre. Uma área plana e favorável à abertura das primeiras ruas, entretanto, mui-to baixa e alagável na época das cheias do rio Acre. Além disso, por trás do alinhamento de casas do povoado a floresta foi gradativamente sendo substituída por uma área de pasto para abrigar o comércio de gado que, como já vimos, foi muito importante para Rio Branco. Essas características topográficas somadas a questões políticas relacionadas à luta autonomista que vinha sendo travada no Território Federal levaram ao questionamento

da condição de capital do Departamento desfrutada por Rio Branco e deu origem a diversas tentativas de mudança da sede departamental.

Em 1909, em meio a um conturbado contexto político, o Prefeito De-partamental do Alto Acre Cel. Gabino Besouro decidiu tomar uma parte das terras do Seringal Empreza situado na margem esquerda do rio Acre defronte à Villa Rio Branco. E nestas terras definiu um novo arruamento que começando na margem do rio seguia até o limite da atual avenida Ce-ará. Nestas terras altas da margem esquerda Gabino Besouro quis fundar uma nova cidade chamada Penápolis, em homenagem ao presidente Afon-so Pena, e que passaria a se constituir na nova sede da Prefeitura Departa-mental do Alto Acre.

Entretanto não havia como ignorar a Villa Rio Branco, do outro lado do rio, com toda sua pujança comercial e social, e pouco tempo depois os dois lados da cidade eram unificados e Penápolis passava a se constituir apenas como mais um novo bairro da agora “cidade” de Rio Branco situada em ambas as margens do rio Acre.

Desde então foi sendo estabelecida lentamente uma infra-estrutura oficial em Penápolis que logo passaria a ser denominado 1º Distrito, em contraposição ao lado velho da cidade que passou a ser conhecido como 2º Distrito. Ou, como já se escreveu, uma cidade dividida entre o lado oficial e o lado comercial.

Nem o acirramento dos movimentos autonomistas, nem a crise da borracha instalada a partir de 1913, foram suficientes para alterar significati-vamente o papel econômico e político de Rio Branco no contexto acreano. Pelo contrário, nesta época se consolidou o predomínio desta cidade frente às outras cidades acreanas que, com a exceção de Xapuri, eram bem mais novas. Tanto assim que na reforma administrativa de 1920, que extinguiu os departamentos, coube a Rio Branco a primazia de se tornar a capital de todo o Território Federal do Acre centralizado. Com isso, Rio Branco ga-rantiu maiores investimentos oficiais em relação aos outros povoados, cidades ou municípios acreanos, o que a levaria, entre outras coisas, até a atual condição na qual concentra metade de toda a população do Estado do Acre.

Tendo em vista que nosso principal interesse nesse texto é tentar com-preender a dinâmica da formação urbana, podemos vislumbrar duas fa-

Vista parcial do antigo centro comercial de Rio Branco, localizado no 2º Distrito da cidade. Onde a presença de Sírios e Libaneses era numerosa, com seus comércios e suas diversificadas mercadorias. Fonte: Fundação Oswaldo Cruz – 1912

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ses para este período da história de Rio Branco, a saber: 1ª Fase – 1909 / 1930 –consolidação de Penápolis pela ocupação da malha urbana planejada entre o rio Acre e a avenida Ceará; 2ª Fase – 1931 / 1940 – estagnação da expansão urbana tanto no 1º Distrito (ex-Penápolis), quanto no 2º distrito da cidade.

Ou seja, a partir de 1909, com a abertura de quatro ruas (Epaminondas Jácome, Benjamin Constant, Marechal Deodoro e a atual Getulio Vargas) começou um longo e lento processo de ocupação de lotes urbanos na mar-gem esquerda do rio Acre até o limite da atual avenida Ceará. Somada a essa estreita faixa urbana, entre 1909 e 1913 foram abertas três colônias agrícolas na região atualmente conhecida como baixada da Sobral.

Por outro lado, a área urbana da margem direita do rio Acre (2º dis-trito) não tinha como se expandir espacialmente pela presença de muitos terrenos baixos e alagadiços e de áreas particulares ocupadas por pastos. Ao mesmo tempo em que desfrutava de grande prosperidade econômica devido à pujança da economia da borracha e a vitalidade do comercio do-minado por portugueses, espanhóis e sírio-libaneses. Pelo menos até que a grave crise da borracha lançasse Rio Branco e o Acre num difícil período de estagnação econômica e social.

Só no final da 1ª Fase deste período, entre 1927 e 1930, a cidade de Rio Branco conheceria uma época de grandes mudanças urbanas com o Governo Hugo Carneiro. Esse paraense implementou um programa de construção de grandes prédios de alvenaria que mudou a paisagem da ci-dade. Sob o signo da modernização foram erguidos o Mercado Municipal na beira do rio, o Palácio Rio Branco, o Quartel da Polícia, a Penitenciária (atual prefeitura municipal) e o Stadium do Rio Branco no limite da cidade que acabava na atual avenida Ceará.

A partir de 1930, a organização espacial de Rio Branco permaneceria basi-camente a mesma por toda a década se restringindo a um relativo adensamento da área urbana já ocupada. Apesar de ser possível registrar um lento crescimen-to da área de influencia da cidade sobre as terras do antigo Seringal Empreza que não haviam sido desapropriadas em 1909 e que limitavam a expansão da cidade para além da atual avenida Ceará. Um crescimento que se dava sob a forma de arrendamento dessas terras para ex-seringueiros desencantados com a crise e que queriam tentar a sorte como agricultores.

1941 / 1970 – Colônias/bairros - uma cidade em expansão

A Segunda Guerra Mundial trouxe não só novas esperanças para a decadente economia extrativista como um novo alento para a sociedade acreana através dos milhares de imigrantes nordestinos que voltaram a vir para o Acre. Especialmente a partir de 1942 com o início da Batalha da Borracha os seringais voltaram a produzir, o comércio voltou a prosperar e as cidades acreanas ficaram muito mais agitadas.

No antigo bairro Quinze a já falida Usina de Castanha se tornou aloja-mento dos soldados da borracha em transito para os seringais, na rua 17 de novembro (ou Bairro Beirute) muitos comerciantes sírio-libaneses haviam enriquecido e se tornado seringalistas e no Palácio Rio Branco os planos governamentais voltaram a ser grandiosos.

E foi sob esse novo panorama que o Governador Oscar Passos efe-tivou em 1942 a compra das terras remanescentes do antigo Seringal Em-preza para a implantação de novas colônias agrícolas no entorno da cidade. Entretanto, até 1945 todos os desejos estavam firmemente direcionados para os seringais e pouca atenção e recursos sobravam paras cidades acre-anas. Por isso, o novo plano de colonização organizado pelo Engenheiro Pimentel Gomes teve que esperar um momento mais propicio para sua efetiva implementação, ficando restrito a apenas duas colônias instaladas em 1943: São Francisco e Apolônio Sales, sendo que a segunda esteve por alguns anos abandonada.

Só com o fim da Batalha da Borracha e o principio do Governo Guio-mard Santos em 1946 teve início a implantação das diversas colônias agrí-colas em terras do antigo Seringal Empreza, num processo que se estendeu durante toda a década de 50. Mas não só. Nesse mesmo período uma parte das terras do Seringal Empreza ao norte da atual avenida Ceará foi definida como “Zona Ampliada” e foi dividida em lotes urbanos para o futuro cres-cimento da área urbana da cidade.

Cabe ressaltar que com isso o governo do Território Federal do Acre tentava estancar a partida de trabalhadores com o fim da Batalha da Bor-

População prestigiando a inauguração do Mercado Municipal de Rio Branco, no segundo ano de administração do governador Hugo

Carneiro. Data: 15 de junho de 1929Fonte: Relatório de Governo de Hugo Carneiro - 1929/1930

Acervo: Museu da Borracha

Praça Eurico Dutra e fachada do Palácio Rio Branco.Data: década de 30

Acervo: CDIH

Serviços de terraplanagem das ruas Getúlio Vargas e Silvestre Coelho. Data: Década de 40Fonte: Relatório do governador Luís Silvestre G. Coelho

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racha e o retorno à crise do extrativismo. Para tanto em diversas colônias agrícolas foi instalada uma infra-estrutura mínima para dar suporte aos co-lonos e suas famílias, tais como escolas, núcleos mecanizados para benefi-ciamento da produção e postos de saúde.

Guiomard Santos foi responsável também por um grande programa de obras publicas que alterou mais uma vez a paisagem de Rio Branco, bem como de outras cidades acreanas. O Aeroporto Salgado Filho (Aeroporto Velho), a Maternidade Bárbara Heliodora, o colégio Eurico Dutra, foram algumas das novas construções de Guiomard Santos, além da conclusão das obras do Palácio Rio Branco e da reforma do prédio da antiga peniten-ciaria que foi transformado no Hotel Chuí.

A isso tudo se somava ainda a implantação de infra-estrutura voltada para a produção, como a Cerâmica oficial que produzia telhas, tijolos e pisos para a construção civil, a Estação Experimental que produzia mudas e repassava técnicas de cultivo, o Aviário que produzia e distribuía aves, suínos e até abelhas para os colonos.

Com isso, o governo Guiomard Santos transformou Rio Branco mui-to mais profundamente do que Gabino Besouro e Hugo Carneiro haviam conseguido anteriormente. Dois outros elementos, aparentemente meno-res e secundários são simbólicos para esta abordagem da história da cidade e provam essa afirmação. Foi na gestão de Guiomard Santos que foram erigidas a Fonte Luminosa e o Ipase, o primeiro conjunto residencial da ci-dade. Estes dois elementos passaram a ser marcantes para a história de Rio Branco por diferentes motivos. O primeiro porque desde então povoou a mente e os corações de todos os riobranquenses cujas infâncias, mocidades e velhices estão repletos do encanto proporcionado por suas águas colo-ridas. Enquanto que o segundo parece ter dado origem a um modelo de intervenção urbana pelo poder público através da construção de conjuntos residenciais que parece ter sido muito importante daí por diante.

Foi nesse período, portanto, que Rio Branco alcançou algumas das principais características que viria a desenvolver em décadas posteriores. Os equipamentos instalados pelo governo territorial e as colônias agrícolas serviram como novos pontos de atração e fixação urbana. A Cerâmica, o Aviário, a Estação Experimental, o Aeroporto Velho, a colônia São Fran-cisco, a Fazenda Sobral, a colônia Apolônio Sales, entre outros, deram ori-gem a alguns dos atuais bairros da cidade, revelando boa parte dos fluxos e processos sociais a que a cidade esteve submetida desde então. Ao mesmo tempo em que deixam claros os motivos que levaram o 2º distrito da cidade a neste período finalmente ser superado em importância pelo 1º distrito em relação à vida orgânica da cidade.

Devemos aguardar a realização de novos estudos, porém, para poder

definir fases que organizem melhor esse terceiro período do urbanismo de Rio Branco e sejam capazes de ajudar na compreensão dos elementos constituintes deste processo.

1970 / 1998 – Invasões/bairros uma cidade em explosão

No principio dos anos 70 a conjugação da infinita crise do extrati-vismo da borracha e dos anos de chumbo da Ditadura Militar teve efeito devastador sobre o Acre suas cidades. O governo Vanderlei Dantas decidi-do a modificar o eixo de desenvolvimento econômico regional estimulou a vinda de grandes empresas, fazendeiros e especuladores de terras para o Acre, em sintonia com a nova política proposta pelo regime militar. Os seringalistas falidos e sem crédito não tiveram como resistir e acabaram vendendo enormes seringais por preços muito baixos. Em poucos anos um terço de todas as terras acreanas mudaram de mãos.

Os novos donos da terra, conhecidos regionalmente como “paulis-tas”, faziam parte da frente de expansão da fronteira agrícola que atingiu os estados do centro-oeste antes de atingir Rondônia e Acre através do programa Polonoroeste e que previa, entre outras coisas, a abertura da Br-364. Esta frente foi composta não só por fazendeiros e grandes empresas, mas também por grileiros de terras, madeireiros e por trabalhadores rurais do sul do país.

Ao atingir o Acre essa frente de expansão causou uma verdadeira im-plosão da estrutura social acreana na área florestal. O desmatamento pro-movido pelas madeireiras e a transformação dos seringais em fazendas le-varam ao êxodo milhares de famílias que há décadas habitavam a floresta, dela dependendo para obter o seu sustento. Esse novo fluxo migratório campo-cidade promoveu uma verdadeira explosão das cidades acreanas, em especial de Rio Branco que por sua condição de capital atraia a maioria dos seringueiros, castanheiros e ribeirinhos expulsos de suas colocações em todo o estado do Acre.

Teve início então a pratica das “invasões”, nome regional usado para designar terrenos públicos ou privados que eram invadidos por trabalha-dores para construção de moradias, dando origem a novos bairros popu-lares sem nenhuma infra-estrutura básica. Mesmo as tentativas oficiais de reverter a política de atração dos investidores “paulistas” para o Acre se revelaram insuficientes para deter o processo de migração do campo e o in-chamento das cidades. Mesmo as políticas de habitação popular implemen-tadas nos anos 70 a 90 parecem não ter resultado em benefícios concretos para os segmentos sociais que não possuíam profissão definida e nem renda assegurada, mas atenderam sobretudo as camadas médias da população.

É necessário, entretanto, chamar atenção para o fato de que tanto o fenômeno das “invasões”, quanto as conseqüências das políticas publicas de habitação implementadas neste período precisam ser melhor estudadas para esclarecer esses processos e sua importância na formação da cidade.

Por outro lado duas características desse período, no que se refere a formação urbana da cidade, parecem bastante claras. A primeira é que ape-sar da “invasão” se constituir como um novo mecanismo espontâneo e desordenado de abertura de bairros, ele deve ter se orientado em linhas gerais pela localização das colônias agrícolas e dos bairros que já estavam em formação na época em que ocorreram. Ou seja, os bairros oriundos de colônias agrícolas ou equipamentos urbanos que surgiram no período ante-

Edifício do Instituto Getulio Vargas. Atual Colégio Acreano com sua construção concluída em 1948.

Fonte: Relatório fotográfico de obras terminadas no governo de José Guiomard Santos.

Acervo Digital: Memorial dos Autonomistas

Campo Experimental Agrícola José Guiomard Santos.Data: Década de 50

Acervo Digital: Memorial dos Autonomistas

Vista da Avenida Getúlio Vargas, Praça Eurico Dutra, Bar Municipal e ao fundo o Palácio Rio Branco.

Data: Década de 70

A Casa do Seringueiro foi inaugurada em 23 de março de 1990. Era um espaço cultural destinado a preserva-ção e divulgação do modo de vida dos seringueiros.Data: Década de 90Acervo: Secretaria de Comunicação

Praça do Seringueiro4- 1991

Vista aérea da Avenida Epaminondas Jácome, centro comercial de Rio Branco.

Data: Década de 70Acervo: José Leite

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rior continuaram atuando como focos de atração e fixação dos moradores da cidade.

A segunda característica diz respeito ao fato de que muitos dos fenô-menos sociais que estavam ocorrendo na área florestal do estado passaram a acontecer também em Rio Branco. É o caso, por exemplo, dos confrontos entre lideranças populares e grileiros de terras como os que levaram ao assassinato de João Eduardo em 1981, como já tinham levado a morte de Wilson Pinheiro em 1980 e ainda iria levar ao atentado a Chico Mendes em 1988, deixando claro que o nível de tensão social tanto nas florestas quanto nas cidades acreanas era extremamente alto então.

Diante desse contexto não é de estranhar que o quadro geral das ci-dades acreanas e de Rio Branco em especial tenha sido de degradação das condições de vida em todos os setores. Neste período Rio Branco não cres-ceu, explodiu. Se ao longo de 90 anos de sua história as dinâmicas geradas na cidade tinham dado origem a pouco mais de uma dezena de bairros, entre 1970 e 1999 esse número iria passar de 150 bairros.

Novos bairros originados de invasões desordenadas sem a mínima infra-estrutura de água, saneamento, luz, acesso, além de por vezes estar situados em locais alagáveis ou impróprios, como nas novas áreas ocupa-das no 2º Distrito (Cidade Nova, Taquari, Santa Terezinha/bostal, etc), ou mesmo a partir de loteamentos clandestinos e conjuntos residenciais mal projetados e/ou implantados. Uma realidade, enfim, que estabeleceu enor-mes desafios a serem enfrentados para a recuperação da qualidade de vida dos cidadãos de Rio Branco.

1999 / 2011 – O principio do reordenamento urbano

Desde 1999 estão sendo realizadas diversas intervenções na malha ur-bana de Rio Branco, especialmente nas vias estruturantes, que estão mo-dificando e melhorando os fluxos internos da cidade, bem como o acesso aos bairros mais distantes do centro. Além disso, obras de revitalização do centro mais antigo da cidade e de implantação de equipamentos como o Parque da Maternidade parecem apontar o início de um novo período da história da formação urbana de Rio Branco, o que só poderá se constatado mais corretamente no futuro.

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20 212008

2008

Conselho

Premiados

Representantes de Conselhos MunicipaisJoão Francisco Salomão

Raimunda Bezerra da Silva Klein

Representante da Fundação Municipal de Cultura Garibaldi Brasil Marcos Vinícius Simplício das Neves

Representante do Poder Legislativo do Município Leoneide Coelho do Amaral

Representante da Secretaria Municipal de Agricultura e FlorestaMário Jorge da Silva Fadell

Representante da Secretaria Municipal de GovernoJosé Fernandes do Rêgo

Representante do Gabinete do PrefeitoZelí Isabel Ambrós

Representante dos Servidores da Prefeitura MunicipalJoão Valdiro dos Santos

Padre André Ficarelli

Manoel José da Silva (Manoel da gameleira)

Jorge Viana

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22 232009

2009

Conselho

Premiados

Representantes de Conselhos MunicipaisJoão Francisco Salomão

Raimunda Bezerra da Silva Klein

Representante da Fundação Municipal de Cultura Garibaldi Brasil Marcos Vinícius Simplício das Neves

Representante do Poder Legislativo do Município Leoneide Coelho do Amaral

Representante da Secretaria Municipal de Agricultura e FlorestaMário Jorge da Silva Fadell

Representante da Secretaria Municipal de GovernoJosé Fernandes do Rêgo

Representante do Gabinete do PrefeitoZelí Isabel Ambrós

Representante dos Servidores da Prefeitura MunicipalJoão Valdiro dos Santos

Miriam Assis Felício

Nilda Dantas Pires

Dom Moacyr Grechi

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252010

2010

Conselho

Premiados

Representantes de Conselhos MunicipaisCarlos Takashi Sasai

Raimunda Bezerra da Silva Klein

Representante da Fundação Municipal de Cultura Garibaldi Brasil Marcos Vinícius Simplício das Neves

Representante do Poder Legislativo do Município Leoneide Coelho do Amaral

Representante da Secretaria Municipal de Agricultura e FlorestaJorge Souza Rebouças Costa

Representante da Secretaria Municipal de GovernoJosé Fernandes do Rêgo

Representante do Gabinete do PrefeitoZelí Isabel Ambrós

Representante dos Servidores da Prefeitura MunicipalJoão Valdiro dos Santos

Raimundo Gomes de Oliveira

Jorge Araken Faria da Silva

Francisco Augusto Vieira Nunes(BACURAU)

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26 272011

2011

Guajarina Lima Margarido

Guajarina Lima Margarido nasceu no Seringal São Luiz do Remanso, no dia 14 de outubro de 1935. Neta paterna e materna de soldados combatentes da Revolução Acreana, que lutaram ao lado de Plácido de Castro; e filha de João Pereira Lima e Elvira Sombra Pereira

Lima. Guajarina saiu do Seringal São Luiz do Remanso aos três anos de idade acompanhada de seus pais, vieram para Rio Branco, onde fixaram residência no Bairro 15, na Rua 16 de outubro, e onde Guajarina passou sua infância e adolescência.

Estudou na Escola 24 de Janeiro, que depois recebeu o nome de Escola Maria Angélica de Castro, onde concluiu seu ensino fundamental; fez seu Ginásio no Colégio Acreano e o Seg-undo Grau na Escola Técnica de Comercio Acreano, atual Colégio Estadual Barão de Rio Branco, cursando contabilidade. Em 1970 ingressou na primeira turma do Curso de Letras Português da Universidade Federal do Acre – UFAC e se especializou em Gramática da Língua Portuguesa. Aos 23 anos casou-se com Alberto Margarido Netto, com quem teve quatro filhos: Silvio Francisco Lima Margarido, Silvia Maria Lima Margarido, José Alberto Lima Margarido e Aldemira Maria Lima Margarido. Alberto e Guajarina casaram-se em 11 de abril de 1959; em 2009 completa-ram Bodas de Ouro e agora já se vão 52 anos completos de seu matrimônio!

No decorrer de sua trajetória profissional como professora, lecionou língua portuguesa e inglesa na Escola Normal Lourenço Filho, atual Colégio Estadual Barão de Rio Branco; no Instituto Imaculada Conceição; no Instituto São José; na Escola Maria Angélica de Castro; no Colégio Acreano, nas Escolas Rodrigues Leite, Reinaldo Pereira e João Aguiar, esta última, depois de aposentada, como amiga da escola. Seu interesse pela arte deu-se pouco antes de aposentar-se, quando trabalhou como coordenadora de arte do Instituto Imaculada Conceição e foi professora de Educação Artística no Colégio Estadual Barão de Rio Branco.

Depois que se aposentou como professora do estado, em união a algumas mulheres do 2º Distrito, Guajarina fundou a Associação Comunitária de Mulheres do Segundo Distrito, onde atua como secretária e desempenha uma série de atividades de maneira participativa. Por meio da Associação desenvolveu diversas atividades artísticas na comunidade; inclusive o resgate do grupo folclórico As Pastorinhas do segundo Distrito, tornando-se coordenadora do grupo e proponente do projeto aprovado pela Lei de Incentivo a Cultura do Município desde o ano de 2007.

No ano de 2009, aprovou o projeto “As Pastorinhas do Bairro Quinze; ainda motivada pelo trabalho desenvolvido, dirigi e produzi o espetáculo do Auto de Natal das Pastorinhas nos anos de 2008 e 2009 e 2010, com participações especiais de artistas locais: atores teatrais e músicos. Em 2010 ganhou o Prêmio de Cultura Popular Matias. Por meio do trabalho que executa com o Grupo Folclórico As Pastorinhas do Segundo Distrito, a proponente Guajarina tem se envolvido no meio cultural de Rio Branco, inserindo-se em ativa participação em Fóruns, Conferências, Seminários e Câmaras Temáticas de Cultura.

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José Chalub Leite

José Chalub Leite, acreano de Rio Branco, nasceu numa quarta-feira, dia 13 de dezembro de 1939, filho de Miguel de Freitas e Maria Chalub Leite. Foi casado com Francisca Pinheiro Leite, com quem teve Tereza, Arthur e Ary.

A vida de José Chalub Leite é a própria história do Acre, que ele conhecia como ninguém. Com seu estilo que mistura ironia com amor ao jeito rio-branquense de ser, Zé Leite fez o balanço da vida acreana passada.

O ridículo da política, a involução do jornalismo, a destruição da memória, nada lhe escapa. Nem a sua própria vida, da qual fala com a mesma intimidade com que trata a dos outros. Costumava repetir a lição para quem quer aprender a escrever: é fácil, ou é impossível.

Como jornalista fundou vários semanários (O Estudante, Folha Estudantil, A Vanguarda, Jornal do Acre, A Gazeta, O Imparcial, A Bola e A Bola em Revista), colaborou em outros (Tribuna do Povo, O Estado do Acre, O Estado).

Foi editor de esportes, diretor geral e depois editor do jornal “O Chute” (apenas quatro números), editou o semanário “O Jornal”, foi correspondente das Revistas, Esporte (Manaus), Veja, Placar, O Globo, O Cruzeiro, colaborou com os jornais O Povo (Ceará), Diário do Acre, Hora do Povo, O Repiquete, Gazeta do Acre, O Crime e A Gazeta. Em jornal fez de tudo.

Fundou com outros a Associação dos Cronistas Esportivos do Acre, A Associação Profissional dos Jornalistas do Acre e a Federação Acreana de Pugilismo. Morreu em 27 de março de 1998.

Também foi escritor de um dos livros que melhor retratou o humor acreano e alguns de seus per-sonagens através de deliciosas crônicas, cujo título era a expressão marcante do próprio jornalista: Tão Acre.

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João Donato de Oliveira Neto

Como nenhum outro músico do planeta – desde a década de 50, quando surgiu como pia-nista à frente de seu grupo instrumental no disco “Chá dançante”, até o século XXI, onde permanece a dialogar com os sons da (pós)modernidade -, o pianista, compositor e arran-

jador João Donato reverbera bossa-nova, samba, baião, bolero, jazz, música de concerto, canção popular, temas instrumentais, sons eletrônicos, até mesmo o funk, o hip hop, o rock. Apororoca musical de João atravessa meio século de música e deságua além dele.

Em referência aos dons naturais deste acreano, nascido em 17 de agosto de 1934, em Rio Branco, seu parceiro, Gilberto Gil, apelidou-o de João Dó Nato. É Gil quem explica: “Certa vez, eu fiz essa brincadeira com o nome do meu querido João Donato para expressar a nítida impressão que ele me dá de ter com a música uma ligação física. Na verdade não foi uma brincadeira partindo de quem, como eu, sabe que João forma com a música uma espécie de ovo mágico, ele e a música, gema e clara desse ovo. É o mesmo Donato de sempre, chocado e nascido nota musical”. Juntos, Donato e Gil compuseram algumas das mais permanentes canções da música brasileira, “A paz”, “Lugar comum”, “Terremoto”, “Emoriô”, entre elas.

De acordo com o jornalista Sergio Augusto, no livro “Cancioneiro Jobim”, quando perguntavam a João Gilberto de onde ele tirara a inspiração para criar a batida da bossa-nova, o baiano dizia “ter aprendido olhando João Donato tocar acordeon e piano”. Originalmente um homem da música instrumental, aos poucos João passou a ver seus temas transformados em canções, letradas por Gilberto Gil, Chico Buarque, Caetano Veloso, Lysias Ênio, Abel Silva, Martinho da Vila, Cazuza, João Gilberto e até Marcelo D2. Assim nasceram “A rã”, “Simples carinho”, “Gaiolas abertas”, “Amazonas”, “ Minha saudade”, “Nasci para bailar”, “Doralinda”, “Surpresa”, “Naquela estação”, “Balança”, “Até quem sabe”...

Nas palavras do crítico Zuza Homem de Melo, “sua obra foi sendo descoberta sem urgência, à medida que as letras foram incorporadas a seus temas. Deixou de ser o autor pré-bossa-nova idolatrado pelos músicos e vocalistas de conjuntos dos anos 50, ou o jazzista latino que tocava na Califórnia nos anos 60. Donato converteu-se de autor de temas em grande compositor”. O escritor americano Allen Thayer ressalta que “Na falta de um nome para seu estilo musical, o estilo de Donato tem um som distinto, imediatamente reconhecível desde os primeiros compassos de qualquer de suas músicas. Suas composições são aparentemente simples, enquanto seus arranjos são harmonicamente complexos, (...) revelam detalhes intrincados depois de ouvidas várias vezes”. Para escritor e letrista Nelson Motta, “João Donato é um dos grandes entre os grandes, que tinha Tom Jobim entre seus grandes fãs, um perfeito estilista da Bossa Nova, com seu suingue minimalista e suas melodias fluidas e fluentes como rios”. O jornalista Ruy Castro vê na músi-ca de Donato uma “permanente pororoca musical que incorporou a Bossa Nova clássica e ao devolvê-la, gerou uma química tão mais à frente que só agora, no novo milênio, é que estamos conseguindo percebê-la”.

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Entrevistadores: Toinho Alves, Simony D’Ávila e Franklin AndradeEntrevista extraída da Revista N’ativa, em 1995.

Zé Leite, de que podemos falar?José Chalub Leite: Não sei.

O Vieira dizia que a tua especialidade é a vida alheia.JCL: Nós todos. A gente trabalha em jornal pra isso. Qual é o jornal que não vive da vida alheia?

Então vamos falar da tua.JCL: A minha? (risos)

Quem te botou no jornalismo?JCL: Lourival Messias do Nascimento, o “Paca de Rabo”. Eu vim de Belém em 1962, aventurei por São Paulo e Rio, voltei no final de 62. O Lourival Messias editava um jornal estudantil, era estudante profissional, não se formava nunca em nada. Então eu entrei como desenhista e datiló-grafo. Funcionava ali onde hoje é a sede do Banacre. Eu fazia desenhos numa chapa, datilografava e comecei também a escrever. O Lourival teve essa virtude de me botar no jornalismo, caso contrário talvez hoje eu es-tivesse no clube dos pés inchados, porque eu farreava muito. Aí comecei essa trajetória. Tinha 22 anos.

ESCREVER É FÁCILEntrevista com José Chalub Leite

Mas isso não quer dizer que haja uma incompatibilidade entre jornalismo e alcoolismo, né?JCL: Não, não. Aliás, os melhores boêmios estão nessa profissão. Tudo é fase, não é? Não tinha o que fazer aqui no Acre. Ou casava cedo ou ia beber. Eu ainda peguei o tempo em que as melhores opções para uma moça casar era com um rapaz que fosse caxeiro da Per-nambucana, funcionário do Banco do Brasil ou integrante da Guarda Territorial. Era o máximo, um futuro grandioso, que nem nos contos de fadas.

Nessa época tinha uma imprensa bem agitada por aqui, não tinha?JCL: Tinha sim. Tinha o Foch Jardim com O Liberal, ainda peguei a Ren-ovação, O Estado, que era do PSD, a Tribuna do Povo, que era do PTB, e os outros semanários: O Estudante, a Folha Estudantil, A Vanguarda. Eram com esses jornais que a gente se divertia, sem esquecer O Acre, o jornal oficial, muito bem feito; foi uma escola, todos passaram por lá. O Rufino Vieira era o diretor da Imprensa Oficial, no governo do José Au-gusto de Araújo. Em seguida entrou o do Cerqueira.

O Cerqueira acabou com a festa...JCL: Sim, ele acabou com a festa e a “redentora” chegou cassando todo mun-do. Lourival Messias foi várias vezes responder inquérito. Fomos proibidos de imprimir o jornal na Imprensa Oficial, ele foi tirar em Porto Velho.

Quem escrevia nessa época?JCL: O Garibaldi Brasil, no jornal dele, o Correio do Oeste, Rufino Farias, Foch Jardim, Cláudio Rabelo, que foi o melhor cronista social que tive-mos aqui, sabia escrever muito bem, o Zé Eduardo, o Lourival Messias, Fernando Conde, Natal de Brito, Omar Sabino, Geraldo Brasil, Licênio, Geraldo Mesquita... muita gente.

A maioria desse pessoal não vivia de jornalismo, vivia de outras profissões...JCL: Eram advogados, comerciantes, professores, uma geração de grandes jornalistas, todos cultos. Voê pega qualquer texto antigo e se delicia, não vê um erro de português. Achei coisas maravilhosas no Instituto Históri-co e Geográfico do Acre. O Dr. Cronge da Silveira, mestre em Português e estatístico, cobriu um jogo de futebol na Bolívia, que coisa linda. En-contrei outro jornal, A Capital, que eu não conhecia, O Comércio, todos de Rio Branco, do tamanho d’A Gazeta e d’O Rio Branco, excelentes no conteúdo e na diagramação, com a descrição da inauguração da igrejinha de São Sebastião, o primeiro prédio em alvenaria construído no Acre, em 1920. Era uma coisa perfeita de reportagem, texto escorreitos, sem erros. A gente tem que se orgulhar de uma imprensa que teve Mário de Oliveira, Wilson Aguiar, Sérvulo do Amaral, Juvenal Antunes, Craveiro Costa em Cruzeiro do Sul, José Potyguara, Pedro Leite em Tarauacá. Interessante que todos os municípios do Acre possuíam jornais e hoje estamos reduzi-dos apenas à capital, com jornais que não circulam no interior e não são críticos, ao contrário, amorfos, neutros.

Levando em consideração que o José Chalub Leite foi um dos maiores cronistas da vida acreana, em espe-cial de Rio Branco, acrescentamos a esta publicação especial da Comenda Volta da Empreza, uma históri-ca entrevista concedida por ele para Toinho Alves, Simony D’Ávila e Franklin Andrade, seus aprendizes

de escrita, para a extinta Revista N’ativa, em 1995. Além de mestre na arte de escrever e descrever de Rio Branco, Chalub Leite foi o registrador das melhores e piores de nossas memórias. Outro mérito que se pode por na conta dele é o legado que seus ensinamentos deixaram, formando uma geração de ótimos jornalistas de Rio Branco. Parafraseando uma de suas expressões clássicas, podemos ficar orgulhosos pelo Acre ser a terra do já teve. Nesse caso, porque já teve e sempre terá José Chalub Leite.

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O que aconteceu?JCL: Hoje, com tudo avançado, cibernética, com redação informatizadas e a qualidade dos textos caiu. É difícil encontrar um texto com conteúdo. Vendo as besteiras que saem hoje, coloquei em minha coluna que Victor Hugo cada vez mais tem razão: “Escrever é fácil, ou é impossível.” Por que acontece isso? Todos não estudamos, não passamos por bancos de escola? O Toinho Alves, que herdou o talento do pai, Rufino Vieira, não teve também os seus mestres? A Simony, a Cristina minha filha, a Alex, que é, como diz por aí, uma “moça nova” (embora não tenha “velho idoso”) escrevem bem, como é que esse pessoal aprendeu e os outros não aprendem? Por quê? Acho que o defeito está na escola também. Ninguém lê nem bula de xarope.

Você acha que a decadência da imprensa também se deve à educação?JCL: Sim. Porque antigamente quando a escola era “risonha e franca” se aprendia. Vamos ver na área que interessa a todos nós, o Português: tínhamos dissertação, leitura, narração, ditado e composição. Era aquela diversidade de temas pra o aluno desenvolver. Todos líamos muito, dos clássicos às histórias em quadrinhos. Hoje menino nenhum lê, não conhece Monteiro Lobato. Que lê os clássicos? Quero saber quem lê “Os Lusíadas”. Nós lamentamos que Camões não tivesse morrido afogado, só para aperrear a gente nas aulas de gramática, que era o terror com análise léxica. E haja procurar o sujeito da oração, mas onde está o sujeito num verso de Camões? Tinha latim também. Com a aqueles professores que respeitávamos, éramos obrigados a es-tudar. Hoje há um desvirtuamento do ensino. O Português chama-se “Comunicação e Expressão” e ninguém se comunica e nem se expres-sa. Falta a leitura que dá uma base, falta a gramática, que é o baldrame da cultura da gente. Não vejo perspectiva para isso.

Quem eram os melhores editores? Quem tinha um jornal na cabeça?JCL: Garibaldi Brasil foi um. Como diretor e editor, não pedia nada que não soubesse fazer. Sílvio Martinello, Elson Martins, atualmente o Mário Emílio Malachias, esses foram grandes editores. E bons editores porque tinham na retaguarda uma equipe que correspondia. A imprensa é como futebol: cada um tem que fazer a sua parte. Quem sabe, sabe. Quem não sabe, vai bater palmas na arquibancada. O editor depende muito da quali-dade dos textos. Geralmente um bom editar vai fiscalizar os textos. Hoje é impossível, eu não teria coragem de fazer isso. Eu “penteava” textos. Via se tinha algum erro, porque às vezes o redator entrega sem fazer a revisão. A gente faz. Não que fosse, por exemplo, ajeitar um texto de um Édison Martins, que eram perfeitos. Um ou outro erro sempre escapa, mas eram textos escorreitos, claros, concisos, entendia-se o que estava escrito. Há que se entender o que está dizendo o texto. Se o ovo é oval, por que fazer circunlóquios? E há que ter conteúdo, não só obedecer as regras de or-tografia. A gente perdoa até os deslizes, mas não a falta de conteúdo, de essência, de estilo.

O que prevalece, o critério técnico ou o critério político?JCL: Quando fui editor, nunca me preocupei com a ideologia do sujeito, se era bonito ou feio, se estava bem ou mal vestido. O que me preocupou sempre e bato palmas quando vejo é um texto bem escrito. Os melhores jornalistas que tive eram todos do chamado PT, das esquerdas. O Aníbal Diniz escreve muito bem, Toinho Alves, Simony, Altino Machado, Antônio Manoel... Era uma turma que valia a pena ler. Também a turma de direita, escrevia bem: o Garibaldi Brasil, o Édison Martins, Nélson Pessoa, que também já morreu. Havia muitos profissionais bons: Édison Luís, Flamínio Araripe, Romerito Aquino, Saulo Petean, sem esquecer, é claro, Eduardo Mansour, Aloísio Maia, Chico Pop... Era uma qualidade tão elevada que com aquela equipe do jornal O Rio Branco dava gosto de trabalhar. Todo mundo escrevia bem e o editor “baru-tava”. Trabalhávamos “por música”.

Você puxou dois assunto que precisam ser detalhados. Primeiro, Garibaldi Brasil. Percebe-se que você considera o Garibaldi um cara central para a cultura no Acre.JCL: O Garibaldi foi aquele jornalista como elo do passado que veio até o presente, influenciar gerações. Me estimulou muito quando já estava no jornalismo, dizendo que ia ser meu mestre. Eu fazia caricaturas e ele fazia também. Cheguei a trabalhar com o Garibaldi. Ele nos dava lições de desprendimento. Às vezes brincava sugerindo que quando eu tivesse uma oportunidade no governo, “metesse a mão” pra não ser besta como ele. Dizia “não vá terminar sua vida como um Gari”. Eu respondia “Gari, não dá, não tenho vocação. Eu sei que esse negócio de reserva moral é pra ficar na reserva mesmo, não significa nada, mas eu não tenho vocação.” Ele ensinava pelo exemplo, embora certas coisas que dissesse... (risos) Mulheres, que ele gostava muito, por exemplo. Mas aí, também é impos-sível, né? Mas sabia escrever muito bem, aplaudia quem escrevia muito bem. Era muito franco mas geralmente com muita educação, ao contrário de mim, que mandava logo o candidato a jornalista ser modelo ou golei-ro do Juventus, porque tem gente que não dá pro troço mesmo. Mas o Garibaldi não, estimulava e também sabia dizer “desista, você não dá pra isso”. O Gari, pela cultura dele, pela influência que teve na comunidade, pelo respeito que impunha, influenciava muito e se tornou, pra mim, um dos maiores homens que o Acre já teve. Ele continuou quando os outros pararam, como o Rufino Vieira, o Édison Martins, o Natal de Brito, que raramente escreviam. O Foch Jardim e o Fernando Conde não escrevem mais, o Eduardo Mansour parou, o Elzo Rodrigues. Essa gente toda tinha uma ligação memorável com o aquele passado de grandes jornalistas que trouxeram para nós aquela influência, aquela vontade de viver e de dizer a verdade. Doía, maltratava, mas eram homens de coragem, muitas vezes capazes de superar os maus humores de quem está no poder.

Isso nos traz outro assunto: o jornal O Rio Branco. Ainda dói?JCL: Não, não dói. Doeu porque foi uma cria da gente. Era a extensão do lar. Até mais do que um lar. A primeira vez que saí d’O Rio Branco,

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em 1978, por divergências lá com o Tourinho, me senti apequenado. Dei a volta por cima. Mas quando voltei a segunda e houve o que houve, caí fora de cabeça erguida, sabendo que já era uma etapa vencida da minha vida. Não digo que vou quebrar a ponte do caminho porque eu não cos-tumo dizer isso, mas é uma folha virada. Senti muito, porque foram 19 anos, com ligeiros intervalos de um ou dois, sem me desvincular. Hoje não, estou completamente curado. Doeu mas passou.

O que te fez sair?JCL: Foi aquela mudança de senhores. O Luís Malheiros Tourinho, que era dono do jornal, vendeu para o grupo do Narciso Mendes. Fomos os últimos a saber dessa negociação. Com a venda, o novo dono colocou o irmão dele, o engenheiro Naildo, para ser o novo diretor. Esse rapaz não tinha relacionamento com jornalistas, era mais acostumado a lidar com peões de obras e com vaqueiros. Sem nenhuma noção de jornalismo, queria impor a sua vontade e chegou ao ponto de ordenar a demissão de um cronista que havia escrito sobre queimadas. Considerei a demissão uma afronta, um cerceamento à liberdade de expressão. Aí decidi sair. Se foi em solidariedade ao Antonio Alves? Foi, mas como disse ao pai dele, o Vieira, que veio me abraçar e dizer que poucos fariam isso: “qualquer um faria isso, porque no presente do Toinho eu vi o meu futuro.” Eu ia sair só, mas aí tive a comovente solidariedade de todos os companheiros. Saímos 16 de uma só vez, fato inédito na imprensa do Acre. O jornal fechou e depois, quando reabriu, gramou uma queda de qualidade. Até hoje os donos forcejam para ter aquele nível de qualidade, mas não con-seguem. Já levaram o Mário Emílio para lá, que é um jornalista experiente e capacitado mas enfrenta dificuldades. Porque um jornal, como um time de futebol, tem que ter craques. São esses que dão estrutura e nível para qualquer publicação. Os que freqüentavam O Rio Branco daquela época, até 1988, espalharam todos por aí. Poucos, muito poucos, continuaram ou voltaram. Eu mesmo recebi o convite, mas não aceitei. Chegou aquela hora da “página virada”.

Você trabalhou na assessoria de imprensa de vários governos. Qual é a diferença entre o “jornalismo de jornal” e a assessoria de imprensa?JCL: Millor Fernandez disse que imprensa é oposição, o resto é armazém de secos e molhados. Mas nunca encarei trabalha em assessorias de imprensa como uma anormalidade. Eu editei um jornal oficial, O Jornal, um semanário e nunca permiti aquele ranço oficialesco. Era um jornal aberto. Muitas vezes fiquei sabendo que havia pressões, mas governadores como Geraldo Mes-quita e Joaquim Macedo jamais me disseram “publica isso” ou “não pub-lica isso”. Nunca fui censurado, nem tive contratempos nem dissabores com a imprensa oficial. Como assessor de comunicação que fui do governo Cardaxo, tinha como atribuições divulgar a imagem e as ações do governador. Hoje estou como chefe de redação da Assecom. É difícil compor uma divulgação melhor pela deficiência “natural” dos profissionais que lá tra-balham. Os melhores profissionais estão nos jornais e ninguém vai atrair um bom profissional com um salário de 550 reais ou até menos, 300 reais.

Qual o maior castigo que você já deu a um repórter?JCL: a vida de jornal é como dizia o Mesquita: “vocês ganham pouco, mas se divertem muito”. Mas eu castigava os focas. Mandava entrevistar o Aluízio Bezerra, o Cel. Natalino de Brito, o Dr. Araken...

Ao contrário dos que estavam na imprensa quando você começou, que exerciam outras profissões, você é jornalista que vive mesmo desta profissão. Você foi o primeiro jornalista profissional do Acre?JCL: A gente não sabe como acontece. Não fui o primeiro profissional, nem o mais “jiriqueteiro”. Primeiro eu queria desenhar. Tentei muito com o papai e com a mamãe, mas eles não acreditaram que fosse de-senvolver o desenho e a pintura, acharam que era fogo de palha porque meus irmãos tinham estudado piano e nunca aprenderam. Mas, ainda em Belém, eu editava o jornal chamado O Azulino. Eu comprava terebintina e sabão em pó, fazia uma mistura, passava o ferro quente e, com aquilo, tirava desenhos e fotos de jornais e revistas. Até os 17 anos eu tirava esse jornalzinho. Eu mesmo datilografava, porque comecei a datilografar com 12 anos. Então eu sinalizava aquela vocação e uma coisa que eu sempre gostei muito foi de ler, isso me habilitou a chegar ao jornalismo. Sempre fui ruim de matemática, mas de português eu sei alguma coisa. Tive uma base cultural e sempre procurei ser curioso, porque o essencial na nossa profissão é a curiosidade, querer saber das coisas, questionar o quê, por quê, quando, quem, como, e isso nos levar a aprimorar o cabedal que a gente traz. Acho que a vocação está escrita nas estrelas. O que você tem que ser, será. Se eu não fosse jornalista queria ser jornalista. Sempre admirei e gostei muito. Em Belém cheguei a fazer um teste na PRC-5, a Rádio clube do Pará, pra ser locutor, acabei desistindo porque a voz não dava. Mas aqui me firmei e fui em frente. Fui um dos diretores de jornal mais novos do Brasil, tinha 29 anos quando fui dirigir O Rio Branco, em 1969. Antes disso, editei dezenas de jornais. Naquela época, toda semana tinha um título novo de semanário na praça. Eu conseguia es-crever para o PTB criticando o PSD no jornal do Fleming, A Tribuna do Povo, e no jornal do Aluízio Queiroz, eu escrevia criticando o PTB. Valia tudo, convidavam e a gente ia. Fui correspondente de Veja, O Globo, Placar e O Cruzeiro.

Você é considerado de direita. Mas votou no Lula. Qual é tua posição?JCL: Eu nunca tive ideologia política. Eu admiro as pessoas, não importa o partido em que ela esteja. O Lula, por exemplo. Porque não o Lula presidente? É um homem que veio de baixo, conhecei o lado amargo da vida, sabe o que é sofrer. Quem sofre e vence procura melhorar a vida de seus semelhantes. Daria certo ou não? O mandato dele iria deixar ex-posto isso. Por que só os mauricinhos podem governar o Brasil? Por que não um homem que sabe o que é faltar comida em casa? Que sabe o que é ter um sapato para calçar, um livro para estudar, uma casa para morar? Esse maniqueísmo, o bem do lado direito e o mal do lado esquerdo nunca foi o bicho-papão. Há que dar oportunidade pra todos. Agora eu nunca me considerei de direita, não. Até militei nessa parte chamada esquerda

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sem ser esquerdista. Toda injustiça me revolta, me leva a desejar que isso mude. Se isso é ser esquerda, então sou. Quem gosta de pobreza? Agente vê essas crianças nas ruas, sabe que tem mil e uma entidades cuidando de-las, mas quando vão tirar esses meninos daí? Eles chegam pedindo prato de comida e sabemos que estão com fome mesmo. Se estão cheirando cola é porque não tem outra opção, não há escola para eles, afeto, amor.

Em sua Página n’Tribuna você se intitula editor-seringueiro. Por quê?JCL: Os filhos da floreta somos todos nós acreanos, não só os que estão na mata. Todos somos seringueiros, moramos nesse seringal su-focante que é o Acre. Ou isso aqui não é um seringal? Diz o Edmir Gadelha que um dos maiores seringais do Acre é aquela ponte me-tálica. A outra, a do Dantinha, não dá pra pintar nem tirar ferrugem porque é de concreto. Já a metálica é um seringual rentável mesmo, ali se derrama um dinheiro bobo.

Você parece que vê a história do Acre pela ótica do humor. Isso é uma coisa da sua geração ou é um traço típico do acreano de todos os tempos?JCL: O acreano tem muito a ver com o carioca, não leva nada sério, ar-ruma logo uma piada até na desgraça. Então, nós temos aquele fatalismo do cearense, o humor do carioca, a ironia do gaúcho. Essa soma toda é que fez o acreano ser o que é: alegre, aberto e cético. Tem um grupa-mento que se reúne em frente ao Palácio das Secretárias todas as manhãs, chamado jocosamente de “Pau Mole” ou “Senadinho”. Ali se ouve dia a história do Acre. É fantástico o que aquele pessoal conta, de casos hilari-antes. O Acre sempre foi engraçado, irônico e azedo.

E dessa reunião que sai a tua página?JCL: Também, embora eu tenha muita coisa. Aquele pessoal mais antigo do Acre é gaiato. Há alguém mais engraçado que Garibaldi, Rufino Vieira, Foch Jardim ou Clóvis Fecury? Vá ao bar do João Papagaio, se você quer se divertir.

Esses lugares estão acabando, não é?JCL: Estão sim, estão muito restritos. O bar do Valmirá também era um ponto de referencia daqueles figurões que iam lá para conversar, contar “causos”. Hoje a televisão agregou tudo e desagregou também. Eu ainda fui do tempo em que se comia na mesa, com papai e mamãe. Hoje não tem hora para comer, é cada um com seu prato, grudado na televisão. A televisão não deixou mais ninguém ler, conversar, ficar á toa na vida.

No mundo moderno onde as tradições foram perdidas, é possível encontra o sentido de viver?JCL: É sim, nós temos que viver para algumas coisas. Viver para família, para o trabalho, para o estudo. Todos nós estamos predestinados a um caminho. Agora, a proporção que os anos avançam, a gente começa a se preocupar com uma coisa chamada morte. Eu não tenho medo de mor-

rer, só penso como é que vai ser. Será que a gente volta? Agora mesmo tem um rapaz que me deu uns materiais sobre disco voador, dizendo que eles vem para nos salvar, pra colocar paz, principalmente no Acre. Jura até que os discos voadores estão aqui no Acre e que os marcianos já estão incorporados no nosso meio. Dizem que ele é doido, mas não desacredito não, desse rapaz. Eu conheço cada marciano aqui... Vejo marciano no futebol, na política, na sociedade. Mas a preocupação que todos temos mesmo é com isso: como vai ser do outro lado? E a vida, vale a pena ser vivida? Tem sentido? Como diz Aloisío Maia, o sujeito passa a vida inteira se dedicando a família, ao trabalho, aturando os humores do patrão, pen-sando no dinheiro que tá faltando, onde conseguir, e esquece de gosta de si próprio. Eu acho que a gente tem que gosta da gente, amar e investir na gente também. Porque, de repente, tudo acaba. Um dia desses eu tinha 15 anos, hoje estou com 55. E estou mais pra lá do que pra cá. Como dizia o Garibaldi, a bicha começa a soprar no cangote, bate logo aquele medo. Às vezes fico pensando: puxa, ainda tem tanta coisa que quero fazer. Editar um livro, reeditar o primeiro, um álbum fotográfico sobre o Acre antigo, será que vai dar tempo?

Você acha que o tempo está passando muito rápido?JCL: Está sim. Esse ano já acabou.

Antigamente era mais lento? JCL: Incrível, era sim. Tão lento quanto o nosso rio Acre que ninguém aprecia mais. É tão bonito ver a água do rio Acre correr, amarela, bar-renta, escorrendo lentamente... De repente, passou, hoje não dá. O dia de 24horas acaba logo, não há mais tempo para nada.

Você ainda não acordou velho, não é?JCL: Não, não. É interessante. Pode o corpo ficar velho, mas a mente não.

Fora o Gari e você, é claro, quem é a personalidade mais “Tão Acre”?JCL: Galvez. Sabe o que é fazer um império em plena selva? Só um espanhol mesmo pra virar acreano. Juvenal Antunes, esse ensinou o acreano a ser imoral. Fascinante a vida daquele cara. Padre José, Ma-noel Machado, nos tempos de hoje. Tinha umas figuras folclóricas, tipos populares, alma de rua. Acabou. Cadê o “Camaleão Ovado”, o “Jó”? O “Preto Limão”, esse eu ainda conheci pouco. Tomé “man-teiga”, que era um grande poeta, precisa ter levantada a memória dele, as poesias espalhadas por aí reunidas em livro.

Uma perspectiva de futuro para o Acre.JCL: Eu ainda penso que o Acre tem jeito, vai depender de todos nós, na hora em que a gente empurra dentro de uma urna uma coisa chamada voto, que é a nossa arma. É ali que se pode mudar esse nosso Acre. O acreano está cético, está amargo, está triste, decepcionado. Mas tudo tem jeito porque temos muito acreano de valor, disposto a mudar essa situ-ação perversa reinante. O Acre não pode continuar a ser uma terra de

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ninguém, temos que fazer com que o Acre seja diferente, melhor para os nossos filhos, para o nosso povo. Temos condições para nos gover-nar. Quando Guiomard apresentou o projeto de Estado, no discurso que ele fez perante o presidente João Goulart, ele disse: “fiz o Acre para os acreanos”. Mas parece que os acreanos não compreendem isso. Quando acontece um certo avanço, como o que tivemos, por exemplo, no governo do Dantas, de repente pinta um retrocesso, caminhamos como caramujos para trás. Eu não sei o que é isso. O papai falava muito que era praga do Plácido de Castro, que morreu assassinado e jogou a maldição para o Acre na hora da morte. Do Neutel Maia, que foi posto praticamente a ferros dentro do navio, embarcado na marra pra ir pro Rio de Janeiro e sumiu dando banana para o Acre. E do Galvez, que também expulsamos do Acre. Então parece que essas maldições tem influenciado negativa-mente o Acre. Quando se pensa em dar passo pra frente, lá retroage. Mas vai depender dos políticos, dessa nova geração que tá surgindo aí. Nós tivemos o Edmundo Pinto uma esperança. Jorge Viana que tem se revelado um bom administrador e acredito que em 98 será governador. Com ele o Acre pode desenvolver porque tem mostrado condições de di-rigir a nossa terra com competência. Por que se insiste em trazer gente de fora quando temos os nossos talentos? Nossa Universidade não forma? Os bacharéis de Direito, os economistas, não estão servindo? Então, se temos uma fabrica de valores, temos que aproveitar esse potencial. Do contrario, vai ficar valendo aquela famosa frase do poeta doido e boêmio que era o Juvenal Antunes: “está na hora de entregar o Acre para a Bolívia e pedir desculpas pela demora”.

No âmbito pessoal qual o seu projeto?JCL: Espero viver mais. Acho que a cota de luto, dor e lágrimas da minha família se encerrou. Só eu e minha irmã Eleonor estamos vivos. Já disse para ela que vai ser difícil essas duas moringas velhas quebrarem, pelo menos ainda vou durar muito. Papai morreu com 82, penso que chego lá. Ainda vou ver muita coisa. Eu me sinto em plena forma física, com saúde, então creio que vou ser poupado sim. Espero chegar no ano 2.000, faltam só 5 anos, e prosseguir. Se bem que, quando começam essas histórias de depoimentos, entrevistas, contar essas histórias do passado, a gente fica já cabreiro de orelha em pé. Homenagens... Como dizia o Gari, tão dando muita homenagem pra mim, acho que estão querendo me botar para fora da terra. A gente já fica com medo. (risos)

Prêmios

Diploma em Madeira

Gameleira em Bronze

Este troféu foi produzido em bronze e simboliza a Gameleira, Marco de Fundação de Rio Branco. Foi confeccionado pela artista plástica Christina Motta, autora de várias esculturas que atualmente caracterizam as cidades acreanas, como as estátuas de Luíz Galvez, Juvenal An-tunes e de Chico Mendes. Cada escultura se caracteriza por ser uma peça única, exclusiva e com certificado de autenticidade que acompanha a obra.

Diploma confeccionado em madeiras nativas: Amanitê e Sucupira Preta.

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