fÍsica Átomosde ouro entram. nocircuito...2002/02/28  · nanofios de ouro é maior do que no...

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FÍSICA Átomosde ouro entram. no circuito Descobertas sobre nanofios impulsionam. a pesquisa de chips para computadores que operam em escala molecular 28 fEVEREIRODE2002 PESQUISA FAPESP

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  • FÍSICA

    Átomosdeouro entram.

    • •no circuitoDescobertas sobre nanofios impulsionam.a pesquisa de chips para computadoresque operam em escala molecular

    28 • fEVEREIRODE2002 • PESQUISA FAPESP

  • Raramente a teoria e a ex-

    periência se integraramtão bem. No dia 17 de de-zembro do ano passado,três físicos brasileiros as-

    sinaram o artigo de capa da PhysicalReview Letters, uma das mais impor-tantes revistas especializadas de físicano mundo. Em quatro páginas, des-crevem as descobertas sobre o com-portamento dos átomos de nanofiosde ouro, estruturas que medem bilio-nésimos do metro e representam ummaterial estratégico para a fabricaçãode componentes para a próxima gera-ção de computadores, que nas próxi-mas décadas devem ocupar o lugardos atuais, à base de silício. Os resul-tados se assentam sobre os dados acu-mulados desde o dia 20 de outubro de1999, quando pesquisadores do Labo-ratório Nacional de Luz Síncrotron,em Campinas, ajustaram o foco deum microscópio eletrônico de alta re-solução, com um poder de ampliaçãode 1,2 milhão de vezes, e observarampela primeira vez o rompimento denanofios de ouro.

    Muito provavelmente, é a primei-ra vez que a revista concede seu espa-ço de maior destaque a um trabalhode pesquisadores brasileiros. Nas qua-tro páginas do artigo, intitulado HowDo Gold Nanowires Break? (Como seRompem os Nanofios de Ouro?), Edi-son Zacarias da Silva, da Universidadede Campinas (Unicamp), e AdalbertoFazzio e Antônio José Roque da Silva,ambos da Universidade de São Paulo(USP), mostram, por meio de uma si-mulação em computador, a formaçãoe a evolução das estruturas que apare-cem no fio de ouro antes e depois daruptura. A seqüência, descrita passo apasso, exibe um detalhamento impos-sível de ser obtido no microscópio ele-trônico, dadas as proporções do próprioátomo, mesmo o de ouro, de porte in-

    termediário, com 79 elétrons aoredor do núcleo, e as limita-ções dos equipamentos."Queríamos contribuir paraa interpretação dos experi-mentos e entender os meca-

    nismos envolvidos no pro-cesso dinâmico que leva à

    formação da linha de átomos e final-mente à sua ruptura': diz Zacarias.

    Conhecer esses processos é impor-tante por uma razão básica: o ouro, de-vido a suas características - sobretudoa capacidade de não reagir com o oxigê-nio e de poder ser estirado longamentesem se partir, a chamada ductilidade -,é visto como o melhor material paraformar os contatos elétricos entre osnovos dispositivos a serem criadospara substituir os chips de silício, ho-je o material básico dos atuais compu-tadores. As perspectivas se apóiam nasdescobertas, feitas na década de 90, deque as moléculas conseguem conduzireletricidade do mesmo modo que osfios e os próprios semicondutores.

    As máquinas de hoje já são vistas co-mo seres em extinção. "A física do silí-cio, que provê todos os computadoresatuais, está com os dias contados': co-menta Fazzio. "Talvez a miniaturizaçãobaseada no silício perdure por mais 10ou 15 anos, mas dificilmente passarádisso:' Num artigo publicado tambémem dezembro na revista Nanotechno-logy, Ramón Campafió, diretor-geraldo programa europeu de desenvolvi-mento de nanocircuitos, pondera quea chamada Lei de Moore, segundo aqual a capacidade dos microprocessa-dores dobra em períodos de 18 a 24meses, foi válida durante 30.anos, masnão há mais como se manter.

    Rapidez e velocidade - Uma das for-mas mais adotadas de aumentar a ra-pidez e a velocidade dos computado-res tem sido diminuir o tamanho dostransistores, as unidades que proces-sam as informações. Hoje, cabem cer-ca de 40 milhões de transistores emum chip do tamanho de um selo. Ca-da um deles é 60 mil vezes maior queuma molécula - indicação de que nãoserá fácil passar da microeletrônicapara a nanoeletrônica, na qual a in-formação corre numa dimensão de bi-lionésimos do metro, de um átomo aoutro (um nanômetro corresponde aum bilionésimo do metro). Imagina-seque, quanto menor, melhor. Os chipsda próxima geração terão de ser cen-tenas de vezes menores que os atuais.Calcula-se que suas dimensões fiquem

    o

    na faixa de 10 a 1.000 angstrõns, no ~

  • CAPA

    Manipular átomos e construir molé-culas é a essência da nanotecnologia,uma área de fronteira que mobiliza omundo (ver quadro abaixo).

    Na física, uma das frentes princi-pais da nanotecnologia é justamente asubstituição do silício. Em seu lugar,de acordo com as pesquisas em anda-mento, podem ser usados nanotubosde carbono e moléculas orgânicascomo os fulerenos ou buckyballs, mo-léculas de forma geodésica formadapor 60 átomos de carbono. As desco-bertas se intensificam. Em agosto doano passado, pesquisadores da IBManunciaram um circuito semicondu-tor feito com nanotubos de carbono.Em novembro, a revista Science regis-trava o desenvolvimento de transisto-res montados com moléculas orgâni-cas unidas por pontas de ouro.

    artigo de dezembro so-bre os nanofios não foio único dos pesquisa-dores da USP e da Uni-camp na Physical Re-

    view Letters, embora tenha sido o demaior destaque. Em 2001, o grupo li-derado por Fazzio publicou outrosdois trabalhos nessa mesma revistasobre propriedades eletrônicas e es-truturais de materiais, além de quase20 em revistas internacionais, em co-laboração com pesquisadores da Uni-camp e das universidades federais deSanta Maria (UFSM), no Rio Grandedo Sul, e de Uberlândia (UFU).

    Outras descobertasbrasileiras sobre nano-fios de ouro - construí-dos em câmaras de vá-cuo ultra-alto - devemaparecer nos próximosmeses, novamente naPhysical Review Letters.Em um artigo já aceitopara publicação, On theOrigin ofAnomalous LongInteratomic Distances inSuspended Gold Chains(Origem das AnômalasDistâncias Interatõmi-cas Longas em CadeiasSuspensas de Ouro), Da-niel Ugarte e Varlei Ro-drigues, do LNLS, emcolaboração com SérgioLegoas e Douglas Gal-vão, da Unicamp, expli-cam por que a distânciaentre os átomos nosnanofios de ouro émaior do que no ouro, usado, porexemplo, para fazer jóias.

    De acordo com os cálculos dogrupo, nos nanofios podem existirátomos de carbono entre os de ouro,de modo que a distância seja maiorque no ouro comum. Os intrusos jus-tificariam até mesmo distâncias ex-tremamente longas, de 5 angstrôns,enquanto para distâncias de 3 a 3,6angstrõns podem coexistir situaçõescom e sem carbono, os nanofios con-taminados e os limpos. Nesse caso,

    I

    A partir do alto à esquerda, o rompimento donanofio de ouro no microscópio eletrônico (acima) ...

    tudo é resolvido matematicamenteporque não há como identificar o car-bono: por ter uma massa muito me-nor que a do ouro (tem apenas seiselétrons e, no núcleo, seis prótons), étransparente para o microscópio ele-trônico de transmissão.

    Buscava-se desde 1998 uma expli-cação para as distâncias interatômi-cas maiores do que o esperado. Foinesse ano que pesquisadores do Ja-pão descobriram que nos nanofios adistância entre os átomos de ouro,

    Os quatro centros da nanorrede brasileiraComeçam a operar este ano os

    quatro centros de pesquisa selecio-nados em dezembro pelo ProgramaNacional de Nanociências e Nano-tecnologia, criado pelo ConselhoNacional de Desenvolvimento Cien-tífico e Tecnológico (CNPq) e lança-do em novembro de 2000 para defi-nir os rumos de atuação do país numaárea considerada estratégica. O pri-meiro deles encontra-se na Universi-dade Federá! do Rio Grande do Sul

    (UFRGS), será coordenado por IsraelBaumvol e incorpora as propostas doLNLS e do grupo da Universidade Fe-deral de Minas Gerais; outro está cen-trado na Unicamp, liderado por Nél-son Durán; e os dois outros estão naUniversidade Federal de Pernambuco(UFPE), coordenados por EronidesFelisberto da Silva Junior e OscarLoureiro Malta.

    Os centros deverão funcionar emrede, em conjunto com cerca de 40

    instituições de pesquisa do Brasil eseis do exterior, além de duas empre-sas (France Telecom e PQSD - PontoQuântico Sensores e Densímetros), ematividades que incluem o desenvolvi-mento de nanotubos de carbono, ce-râmicas, materiais semicondutores,peneiras moleculares e medicamen-tos. São objetivos tão amplos quantoa própria nanotecnologia, uma áreaque prevê, por exemplo, a criação deadesivos que possam colar ponto a

    onSecuacL

    30 . FEVEREIRO DE 2002 • PESQUISA FAPESP

  • ...e na simulação por computador: a estrutura perde a simetria hexagonal e vaise afinando até formar uma linha com cinco átomos, quando ocorre a ruptura

    quando um se alinha ao lado do ou-tro, momentos antes de se soltarem,pode chegar a 3,6 angstr6ns - enquan-to no ouro normal, o das joalherias, éde 2,9 angstr6ns.

    No ano seguinte, a equipe do Cen-tro de Microscopia Eletrônica de AltaResolução do LNLS, que trabalhacom nanofios de ouro, prata e platinadesde 1995, conseguiu reproduzir oachado dos japoneses e foi além. Numartigo publicado em 2000 na PhysicalReview Letters, o grupo do LNLSmos-,

    trou pela primeira vez que, antes daruptura, os nanofios de ouro assu-mem somente três formas, cada umadelas com comportamentos mecâni-cos diferentes. Duas dessas formas sãodúcteis: os nanofios são facilmenteesticados, como goma de mascar. Euma é quebradiça: o nanofio se rom-pe facilmente quando esticado. "Essesresultados foram relacionados, comsucesso, com propriedades de resis-tência elétrica, não entendidas até en-tão", comenta Rodrigues.

    Os mistérios se desfazem, mas omundo nanométrico permanece in-trigante, inteiramente imprevisível.Nessa escala, os nanofios não obede-cem mais à clássica Lei de Ohm, umdos pilares básicos da microeletrôni-ca, segundo a qual a intensidade dacorrente elétrica varia linearmente,numa escala regular, de acordo com odiâmetro do fio. "No caso dos nano-fios",explica Ugarte, "a corrente apre-senta patamares separados por saltos,ou seja, enquanto variamos o diâme-tro do fio, a corrente fica em um va-lor fixo (patamar), e de repente dáum salto para outro patamar':

    Praça da Sé - Numa analogia, é comose os elétrons se convertessem em pes-soas que devem atravessar um espaçoe entregar um pacote, a corrente elé-trica. Num primeiro momento, queequivale à escala microeletrônica e, demodo mais amplo, a qualquer fio elé-trico, os elétrons-pessoas se movemcom dificuldade em meio a uma mul-tidão na Praça da Sé, centro de SãoPaulo. O número de elétrons-pessoasque consegue chegar do outro ladodepende do tamanho da praça: se formaior, o número de cargas trans-portadas também crescerá, de modocontínuo. A entrada de mais porta-dores de pacotes nem é percebida - esempre cabe mais um. No segundo, aescala nanométrica, os elétrons-pes-soas têm de atravessar corredores, nosquais podem avançar livremente. Mas

    ee-o

    m1-

    ponto urna superfície em outra e dro-gas que atuem no organismo comprecisão inimaginável.

    "Pelo menos não seremos espec-tadores", pondera Celso Pinto deMelo, coordenador do programa na-cional e pesquisador da UFPE. "Te-mos condições de entrar no jogo."Segundo ele, o Brasil deve investireste ano cerca de R$ 3 milhões (pou-co mais de US$ 1 milhão) e adotaruma estratégia similar à do modeloalemão, que, com um orçamento daordem de dezenas de milhões de dó-lares, resolveu criar ou consolidara

    centros de excelência nas principaisvertentes da nanotecnologia. Os Es-tados Unidos já buscam a liderança,com recursos crescentes para as pes-quisas em nanotecnologia: US$ 270milhões em 2000, US$ 422 milhõesem 2001 e US$ 520 milhões (aindasujeitos à aprovação) em 2002.

    Outra iniciativa brasileira é a im-plantação do Centro Nacional de Re-ferência em Nanotecnologia. CylonGonçalves da Silva, que até julho doano passado dirigia o LaboratórioNacional de Luz Síncrotron, mantidopelo Ministério da Ciência e Tecnolo-

    gia, é quem está cuidando do planeja-mento, que pretende concluir aindaeste semestre. Segundo ele, o centrovai atuar em poucas áreas, que pos-sam conectar as instituições de pes-quisa e as indústrias, de modo a bene-ficiar o desenvolvimento econômicodo país. "Temos habilidade em unirpesquisa teórica e experimental': diz."O desafio é fazer com que a pesquisafundamental e a inovação andem debraços dados." O centro, cuja monta-gem conta este ano com recursos daordem de U$ 3 milhões, deve come-çar a operar em 2003.

    PESQUISA FAPESP . FEVEREIRO DE 2002 • 31

  • CAPAem cada corredor só cabe um elétron-pessoa por vez. Primeiro segue um edepois outro, sucessivamente. Mais deum elétron-pessoa só pode avançarao mesmo tempo se houver maiscorredores - e só é possível perceberque se alterou a quantidade de cargastransportadas quando o espaço cresceexatamente na proporção de umcorredor. A quantidade de pacotes(corrente elétrica) aumenta de mododescontínuo, aos saltos, à medida queos elétrons-pessoas ganham os corre-dores. Os físicos chamam de quanti-zação esse avanço aos saltos, já obser-vado experimentalmente.

    Nos últimos anos, outros grupostentaram entender o comportamentodos átomos já dispostos em linha,momentos antes do rompimento,mas não foi gratificante. Os físicos daUSP e da Unicamp preferiram umaestratégia de mão cheia, se é que sepode dizer assim no caso de objetostão minúsculos. "Buscamos uma for-ma mais realista, o próprio nanofio,imaginando que os átomos, de algummodo, deveriam guardar a lembrançade uma estrutura a que pertenceram':diz Roque da Silva.

    Os átomos, que se mostram reais- na forma de pontos pretos - nosmicroscópios do LNLS, são repre-sentados por tabelas de números quesaem dos computadores e indicam suasposições relativas ao longo do tempo.Só depois de feitos todos os cálculos,no final do trabalho, é que assumem aforma, inegavelmente mais compreen-sível, de bolinhas coloridas.

    Nasimulação por com-

    putador, os físicos par-tiram de uma estrutu-ra análoga à do cristalde ouro, com um áto-

    mo em cada vértice de um hexágonoregular e outro no centro - é a confi-guração mais compacta possível, como maior número possível de elemen-tos por unidade de espaço. Cada he-xágono forma um plano. O empaco-tamento dessas figuras compõe ocristal, representado na simulação emcomputador por uma estrutura glo-bal de dez planos, com 70 átomos.

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    o desejo dos físicosTodo físico do mundo deseja ver

    sua pesquisa publicada na PhysicalReview Letters ou simplesmente PRL,uma das mais - se não a mais - im-portante revista científica nessa área.Mas não é nada fácil. O prestígio des-sa publicação, editada pela AmericanPhysical Society (APS), dos EstadosUnidos, assenta-se em uma rigorosaseleção dos artigos. ''A Physical ReviewLetters só aceita trabalhos que real-mente representem avanços relevan-tes",reitera José Roberto Leite,presidente da Sociedade Bra-sileira de Física (SBF). Desde1988, o índice de aceitação detrabalhos para publicação os-cila entre 37% e 41% ao ano.

    Espaço nobre: apenasquatro de cada dez artigos

    enviados pelos pesquisadoressão aceitos para publicação

    Em seguida, os pesquisadoresdeixaram a estrutura se recons-truir segundo as equações damecânica quântica, com os áto-mos buscando espontaneamenteas posições de menor energia. A •redistribuição dos átomos originao nanofio, uma estrutura tubularextremamente fina, cuja superfí-cie, densa e compacta, compostapelas células de sete átomos, constituia configuração de maior empacota-mento atômico possível- não há ou-tra forma geométrica que permita pôrmais átomos no mesmo espaço.

    Depois de darem as coordenadaspara a formação do cristal, a única or-dem que os pesquisadores deram aocomputador foi aplicar uma força detração às duas pontas, como se duasmãos puxassem o fio, a uma tempera-tura de aproximadamente 300°C. Si-mulou-se desse modo o esticamentodo nanofio, que no primeiro momen-to evita o rompimento imediato como sacrifício de seu próprio recheio: osátomos do centro pulam para a su-

    Em 2001, saíram 71 artigos de pes-quisadores de instituições brasileirasna PRL. Desse total, 30 eram de SãoPaulo.

    A revista começou a circular em1Q de julho de 1958, com o objetivode divulgar resultados de pesquisa deinteresse geral para os físicos de qual-quer área - da atomística à cosmolo-gia. Não parou mais de crescer, atin-giu em 1999 o recorde de artigospublicados em um ano (2.800, esco-

    17 December 200 1

    Volume 87. Numbcr 25

    ~1""l)C'rS\lb>rrlpdIHlC·P1·Ubnlryor OIhfr In.III"CkH •• 1UIIINIC'dUmU ND6

    ~ Published hy The Amerlclln J>h)"sical Society

    perfície. Como resultado, o compri-mento do fio aumenta. "Ninguémantes tinha visto o fio ficar oco", co-menta Roque da Silva.

    Simetria perdida - Quando todos osátomos de dentro se esgotam, o nano-fio se vê num beco sem saída: ou que-bra ou afina. Prefere afinar e deixa deser hexágono em um ponto não espe-cificado, embora ainda procure pre-servar estruturas triangulares entre osátomos. Nesse ponto, surge um novoplano, o décimo primeiro, com apenascinco átomos. Forma-se ali um defeito,uma região de instabilidade: é onde ofio vai afinar e, mais tarde, se romper.

  • lhidos entre os 7.650 recebidos) eprepara-se para se superar este ano,ao prever a publicação de 3.100 arti-gos e de 11.800 páginas ao longo desuas 52 edições. Seu índice de im-pacto - que dá a dimensão da im-portância da revista no meio cientí-fico, medida pelo número de citaçõesdividido pelo número de artigos pu-blicados - é de 6,10, um dos mais al-tos na área de física.

    Não se recomenda chamar a pu-blicação apenas de Physical Reviewpor causa das outras publicações daAmerican Physical Society, que pu-blica também as Physical Review A, B,C, D e E, destinadas à divulgação deresultados de pesquisas em áreasainda mais específicas, a Physical Re-view Special Topics e a Review of Mo-dern Physics.

    Na porção não-defeituosa do fio, asimetria fez com que, apesar de tracio-nada, a estrutura se mantenha. Já naregião de instabilidade, a deformaçãoprossegue. De acordo com as análisesrealizadas, a estrutura passa por di-versos estágios até chegar à configura-ção de um só átomo unindo duaspontas. Nesse estágio, fios de metaiscomo o sódio se romperiam, masnão o de ouro: a ductilidade do metalnobre confere ao fio uma sobrevida,com a região crítica incorporando,novos átomos, puxados das pontas,em seqüência linear.

    Essa linha atômica, cujos átomoschegam a ficar 15% mais distantes doque no cristal de ouro, sustenta-se atéincorporar apenas de quatro a cincoátomos - as distâncias entre eles tam-bém foram verificadas e, novamente,concordaram com os resultados ex-perimentais. Mas os átomos alinha-dos não se sustentam: as tensões setornam insuportáveis e o fio se rom-pe. Para os pesquisadores, uma daspreocupações foi entender justamen-te as estruturas que se formam nasimediações do ponto de ruptura -são elas que possibilitam o contatodo fio de ouro com os nanodispositi-vos e lhe conferem a perspectiva de

    aplicação tecnológica. É nesse mo-mento, logo após o fio se romper, queas duas pontas resultantes, com confi-gurações muito simétricas e estáveis,formam a estrutura chamada de cha-péu francês. Tamanha é a estabilidadedessa forma, segundo Roque da Silva,que nenhum átomo consegue maissair da ponta para entrar no fio queainda cresce. A constatação é sugesti-va. "Pode ser que toda vez que o fiofor puxado forme-se o chapéu francêsnas pontas", cogita ele.

    Alcance amplo - Embora enfatize atual-mente o estudo de fenômenos na es-cala atômica, a simulação em compu-tador tem, geralmente, aplicaçõesmais amplas. Em um dos artigos pu-blicados no ano passado, Roque daSilva, Fazzio, o doutorando GustavoDalpian e Anderson Ianotti, ex-dou-torando da USP, simulam um experi-mento realizado em microscópio detunelamento eletrônico, para enten-der como átomos de germânio se acu-mulam na superfície do silício - maisuma vez, apenas pela prática não ti-nha sido possível entender algumasestruturas que se formam após essadeposição. Os resultados a que che-garam beneficiam tanto a microele-

    OS PROJETOS

    Centro de Microscopia Eletrônicade Alta Resolução

    MODALIDADEPrograma de lnfra-Estrutura -Equipamento Multiusuário

    COORDENADORDANIELMÁRIO UGARTE- LaboratórioNacional de Luz 5íncrotron

    INVESTIMENTOR$ 5.075.635,07

    Estudos de Materiais: PropriedadesEletrônicas e Estruturais

    MODALIDADELinha regular de auxílio à pesquisa

    COORDENADORADALBERTOFAZZIO- Institutode Física da U5P

    INVESTIMENTOR$ 143.061,48

    trônica atual quanto o aperfeiçoa-mento de células solares, utilizadascomo fonte de energia elétrica.

    No momento, os pesquisadoresestudam o transporte de corrente elé-trica entre, por exemplo, os nanofiosde ouro e os nanotubos de carbono.Além, evidentemente, das descober-tas que possam fazer sobre o com-portamento dos átomos, de caráterpuramente científico, a aplicação dosresultados também os inquieta. "Te-mos algo ritmos para soluções deequações da mecânica quântica quenos dão confiança no desenho de no-vos materiais no computador e noplanejamento de experimentos maisbaratos, com resultados bastante con-fiáveis" comenta Fazzio. "A simulaçãocomputacional pode ser decisiva noestudo de nanomateriais, não só nananoeletrônica, mas também na na-noquímica e na nanobiologia. O Bra-sil perdeu a oportunidade de se tornarindependente na microeletrônica,quase não produz chips, mas ainda te-mos alguma chance na nanotecnolo-gia, porque ninguém sabe exatamentequal material vai substituir o silício.Esse é o momento da escolha."

    Evidentemente, não basta somen-te a ciência fundamental. Por essa ra-zão é que Fazzio considera indispen-sável o engajamento de engenheiros ede empresas no nanomundo, já que oenredo científico está pronto. Teori-camente, a partir do conhecimentodetalhado da geometria das pontasdos nanofios de ouro, pode-se pensarem aplicar uma diferença de poten-cial elétrico (cargas mais intensas deum lado e menos de outro) entre osfios. O dispositivo funciona como umtransistor de uma só molécula, noqual passa um único elétron (a cargaelétrica mínima) de cada vez. Se àpassagem do elétron for associado onúmero 1 e à não-passagem o núme-ro O, estarão criadas as condições mí-nimas para o sistema operar uma lin-guagem binária. Embora ainda seesteja longe de compreender toda afísica envolvida no processo, pode-seimaginar seu desdobramento prático:um conjunto desses dispositivos podecompor o futuro nanochip. •

    PESQUISA FAPESP . FEVEREIRODE2002 33