fragmentos de alverca - história e património
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Com este trabalho pretende-se contribuir não só para o conhecimento da História de Alverca, mas também para o fornecimento de pistas que permitam outras investigações, as quais possam complementar este estudo.TRANSCRIPT
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Fragmentos de Alverca
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Fragmentos de Alverca | 1
Junta de Freguesia de Alverca do Ribatejo
Anabela Ferreira
FRAGMENTOS DE ALVERCAHistória e Património
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Fragmentos de Alverca: História e Património
Edição e PropriedadeJunta de Freguesia de Alverca do Ribatejo
AutoraAnabela Ferreira
Capa e PaginaçãoCarla Félix
Créditos FotográficosAnabela Ferreira (AF)Marco Aurélio (MA)Museu Municipal de Vila Franca de Xira Núcleo de Alverca (MMVFX-NA)Oficinas Gerais de Material Aeronáutico (OGMA)
Impressão Gráfica Manuel Barbosa & Filhos, Lda.
Tiragem1000 exemplares
ISBN978-989-20-1706-8
Depósito legal299 825/09
ImpressãoSetembro de 2009
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ÍNDICE
Afonso CostaPresidente da Junta de Freguesia de Alverca do Ribatejo ................................................................................... 7
Biografia da autora .................................................... 9
Introdução ................................................................ 11
Breve História do Concelho de Alverca ...................... 13
Interpretação da Simbologia Presente no Pelourinho Quinhentista de Alverca ........................................... 19
A Construção da Estrada Real de D. Maria I e Marco de IV Légua em Alverca ............................... 23
Alverca no decorrer das Invasões Francesas ............. 27
Conhecer o Núcleo Histórico de Alverca ................... 31
Misericórdia de Alverca ............................................ 39
Memórias de Alverca na Epigrafia Local ................... 45
Elementos para a História da Morte em Alverca ....... 49
Núcleo de Alverca do Museu Municipal de Vila Franca de Xira ...................................................................... 53
Oficinas Gerais de Material Aeronáutico ................... 57
O Hangar de Balão das OGMA ................................. 61
Bibliografia .............................................................. 66
Anexos ..................................................................... 75
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Fragmentos de Alverca
Quando em 2005 assumi os destinos da freguesia
de Alverca do Ribatejo, uma das tarefas a que
me propus, foi a preservação e divulgação do
património histórico de Alverca. Uma preservação
não só física como do conhecimento.
Neste campo, deparámo-nos de imediato com uma
enorme falta de elementos, o que transformou
a minha intenção num desafio. Era essencial
compilar informações, investigar e apresentar aos
alverquenses uma obra rigorosa.
Este projecto contou desde o primeiro momento
com o apoio da Dra. Anabela Ferreira, actual
responsável pelo Núcleo Museológico de Alverca,
licenciada em História e cujo Mestrado incidiu em
Estudos do Património e Doutoranda em História
Moderna.
Senhora dum método de investigação rigoroso,
dotada dos conhecimentos necessários, deu corpo
à obra que agora vos apresento.
Ao longo destas páginas vamos encontrar o fruto
de um trabalho exaustivo de investigação profunda
que vai desde a atribuição (ou não) do foral, ao
brasão, a história do concelho de Alverca, o castelo,
a casa da câmara, a toponímia, lugares e quintas ou
a morte na freguesia, desvendando desta forma,
alguns elementos da nossa História, nunca antes
estudados a par de uma História recente, como é o
caso do estudo sobre as Oficinas Gerais de Material
Aeronáutico.
Espero que ler esta obra, vos dê o mesmo prazer que
nos deu editá-la e que a mesma sirva de incentivo, a
que outros se debrucem sobre o estudo de Alverca,
área onde há ainda um longo caminho a percorrer.
O Presidente da Junta de Freguesia
Afonso Costa
Fragmentos de Alverca: História e Património
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Bibliografia
Artigos de cariz científico “A Casa da Câmara de Alverca”, Alverca da Terra às Gen-tes, Catálogo da Exposição, Museu Municipal de Vila Franca de Xira – Núcleo de Alverca, Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, Novembro 2007, pp. 73-86.“Alverca no decorrer das Invasões Francesas”, Xirapress – Revista do Concelho de Vila Franca de Xira, Ano II, n.º 18, Outubro/Novembro 2007, pp. 10-12.“Breve História do Concelho de Alverca – Extinção”, Xira-press – Revista do Concelho de Vila Franca de Xira, Ano II, n.º 16, Junho/Julho 2007, pp. 15-17.“Breve História do Concelho de Alverca – Fundação”, Xirapress – Revista do Concelho de Vila Franca de Xira, Ano II, n.º 15, Abril/Maio 2007, pp. 10-12.“Conhecer o Núcleo Histórico de Alverca – As Casas Pop-ulares e reminiscências de uma Arquitectura Camarária”, Xirapress – Revista do Concelho de Vila Franca de Xira, Ano II, n.º 23, Julho/Agosto 2008, pp. 12-14.“Conhecer o Núcleo Histórico de Alverca – As Ruas”, Xira-press – Revista do Concelho de Vila Franca de Xira, Ano II, n.º 22, Maio/Junho 2008, pp. 12-14.“Conhecer o Núcleo Histórico de Alverca – Património Edificado”, Xirapress – Revista do Concelho de Vila Franca de Xira, Ano II, n.º 21, Março/Abril 2008, pp. 10-12.“Interpretação da simbologia presente no pelourinho quinhentista de Alverca”, Xirapress – Revista do Concelho de Vila Franca de Xira, Ano II, n.º 13, Janeiro/Fevereiro 2007, pp. 12-13.“Marco de IV Légua da estrada real e D. Maria I”, Xira-press – Revista do Concelho de Vila Franca de Xira, Ano II, n.º 14, Março 2007, pp. 12-13.“Memórias de Alverca na Epigrafia Loca!”, Xirapress – Revista do Concelho de Vila Franca de Xira, Ano II, n.º 24, Novembro/Dezembro 2008, pp. 11-12.“Núcleo de Alverca do Museu Municipal de Vila Franca de Xira”, Xirapress – Revista do Concelho de Vila Franca de Xira, Ano II, n.º 19, Dezembro 2007, pp. 10-12. “Projecto-Piloto em Vialonga: O Museu de Vila Franca de Xira e o trabalho com adultos”, em parceria com Clara Camacho e Inocêncio Casquinha, Boletim Cultural Cira 9, Vila Franca de Xira, Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, Maio 2005, pp. 63-71. “Quando o sol dá horas” – Notícias de Alverca [Jornal Regional do Concelho de Vila Franca de Xira - Mensal], Ano IX, nº 62, Setembro 1992, p. 4.
Publicações para a InfânciaHistórias do Palácio do Sobralinho, ilustrações de Paulo Monteiro, Vila Franca de Xira, Câmara Municipal de Vila Franca de Xira – Pelouro da Cultura – Museu Municipal em parceria com a Rede Portuguesa dos Museus, Maio de 2003.Lenda da Senhora do Bom Sucesso, ilustrações de Carla Félix, Alverca, Junta de Freguesia de Alverca do Ribatejo, Setembro 2009.Lenda da Fonte do Choupal, ilustrações de Carla Félix, Al-verca, Junta de Freguesia de Alverca do Ribatejo, Maio 2008.Lenda do Castelo de Alverca, ilustrações de Carla Félix, Alverca, Junta de Freguesia de Alverca do Ribatejo, Ou-tubro 2007.Lendas, Mitos e Histórias de Vila Franca de Xira, ilustra-ções de Paulo Monteiro, Vila Franca de Xira, Câmara Mu-nicipal de Vila Franca de Xira – Pelouro da Cultura – Mu-seu Municipal Maio de 2000.Mouras Encantadas e Outras Histórias, ilustrações de Paulo Monteiro, Vila Franca de Xira, Câmara Municipal de Vila Franca de Xira – Pelouro da Cultura – Museu Mu-nicipal Maio de 1999. Ploc e Outros Contos, Lisboa, DIFEL, Março de 1999.
Anabela FerreiraLicenciada em História, Mestre em Estudos do Património, Doutoranda em História Moderna. Integra o grupo de investigação Europa e o Mundo, do projecto europeu CLIOHnet 2 – Rede Temática Sócrates-Erasmus. Tutora da Universidade Aberta.Exerce funções no Museu Municipal de Vila Franca de Xira desde 1990, responsável pelo Núcleo de Alverca.
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Fragmentos de Alverca
INTRODUÇÃO
Fazer História é tarefa árdua. As fontes são
elementos indispensáveis. É necessário descobri-
las, analisá-las, seleccionar as que são relevantes
para o trabalho a realizar, cruzar informações. É só
o princípio. Nos estudos de História Local as fontes
podem ser um problema. Na maior parte das vezes
as fontes documentais são escassas, por vezes
encontram-se dispersas. Frequentemente temos
indicações da sua existência de forma indirecta,
quando referidas noutros documentos, tornando-
se um risco citá-las, afinal sabemos o quanto as
informações indirectas podem ser imprecisas.
Apesar de tudo isso a História Local, aos poucos
vai-se compondo.
Com este trabalho pretende-se contribuir não só
para o conhecimento dessa História, mas também
para o fornecimento de pistas que permitam outras
investigações, as quais possam complementar este
estudo.
Todos os textos presentes neste livro são fruto de
uma profunda investigação, levada a cabo ao longo
de vários anos, e todos eles dizem respeito à história
e património local. Apesar desses estudos há ainda
muito por investigar e por divulgar relativamente
à História de Alverca. O fundo do Concelho de
Alverca, guardado no Arquivo Histórico de Vila
Franca de Xira, e os livros dos Tombos das Capelas
de D. Afonso IV, que se podem encontrar na Torre
do Tombo, são apenas dois exemplos de conjuntos
de documentos, compostos por milhares de
páginas, respeitantes a essa História, que precisam
de análise mais profunda.
Embora a História de Alverca esteja, de facto,
ainda em construção, a investigação, que se tem
vindo a realizar, permite dar a conhecer uma série
de elementos para a sua compreensão. Muito se
avançou relativamente ao estudo do Concelho de
Alverca, hoje conhece-se a sua origem e os factores
que levaram à sua extinção. O património da cidade
tem vindo a ser valorizado como a antiga casa
da Câmara, o Pelourinho, o Marco de IV légua da
Estrada Real de D. Maria I. As memórias da antiga
povoação têm vindo a ser aprofundadas, como
aconteceu com a recente investigação relativa
ao convento de São Romão. A História recente
tem, também, sido alvo de atenção, aspecto
exemplificado com o estudo que incidiu sobre as
Oficinas Gerais de Material Aeronáutico.
A convite da Junta de Freguesia de Alverca,
juntam-se nesta edição, os artigos de investigação
que, desde 2007, têm vindo a ser editados pela
Xira Press (a revista do Concelho de Vila Franca de
Xira), e outros dentro do mesmo âmbito ainda não
editados, pois tornava-se pertinente uma edição
que desse a conhecer alguns dos estudos recentes,
de modo a que, de alguma forma, se pudesse
estimular futuras investigações, as quais possam
engrandecer, ainda mais, a História de Alverca.
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Fragmentos de Alverca
A história do Concelho de Alverca era, até há bem
pouco tempo, quase desconhecida, os dados
referenciados na bibliografia disponível, eram
escassos e imprecisos. O estudo das fontes levou
à conclusão que, muito do que se acreditava ser
a história de Alverca, não passava do fruto da
imaginação de autores do século XIX. É o caso
do foral que, ao contrário daquilo que afirmam
muitos autores, não se encontram vestígios de
alguma vez ter existido semelhante documento
outorgado a esta povoação.
O primeiro autor a afirmar a doação de foral a
Alverca foi Pinho Leal, em 1873. Na obra Portugal
Antigo e Moderno, indica que o foral foi doado por
D. Afonso Henriques em 11601. Depois dessa data,
esta informação foi repetida vezes sem conta,
sem que se procurasse averiguar a sua veracidade.
Outros autores indicaram a doação de um foral por
D. Afonso IV, ou por D. Manuel, algo que as fontes
negam. Nem na chancelaria de D. Afonso IV,
nem nos índices de forais da reforma manuelina,
1 Pinho Leal, Portugal Antigo e Moderno, Volume I, Lisboa, Livraria Editora Mattos Moreira & Companhia, 1873.
se encontrou qualquer referência a tal doação a
Alverca. Um estudo cuidado, permitiu perceber
que se algum dia esta povoação teve foral tal
documento foi perdido de modo definitivo. Não
há como saber quem o doou ou quando o fez,
provavelmente nunca existiu.
Sem dúvida o foral é uma fonte importante, para o
estudo da formação dos concelhos medievais, no
entanto não é este documento que faz o concelho.
Existem diversos exemplos de concelhos instituí-
dos sem foral que, na maioria dos casos, servia para
confirmar o poder estabelecido e, sobretudo, para
incutir, na comunidade, a existência de um poder
maior que aquele constituído pelos povos: o poder
do rei.
Alexandre Herculano refere que algumas
comunidades podiam constituir-se concelho,
através de revolução popular2 adquirindo, desse
modo, autonomia administrativa. José Mattoso
adianta: “[…] a investigação recente tem mostrado
2 Cf Alexandre Herculano, História de Portugal – Desde o Começo da Monarquia até ao Fim do Reinado de Afonso III, Tomo VII, 8ª edição, Lisboa, Livraria Bertrand, s/d., pp. 70-71.
BREVE HISTÓRIA DO CONCELHO DE ALVERCA
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cada vez mais a capacidade organizativa de
grupos humanos locais independentemente de
qualquer autoridade ou sancionamento superior.
É indispensável, portanto, conceber a formação
dos concelhos como um processo autónomo.”3
Era então necessário procurar descobrir a
origem do concelho de Alverca. Até ao presente
o documento mais antigo, com referência à
povoação, data de 1206. Trata-se de uma carta
de doação de uma herdade4. Supõe-se que a
povoação se deverá ter desenvolvido no alto da
colina do castelo, no espaço correspondente ao
Núcleo Histórico. A época é imprecisa, contudo
tem-se hoje a certeza que, no mesmo espaço,
existiu uma rica povoação romana, conforme
atestam os achados arqueológicos exumados das
escavações realizadas no local. O mesmo não é
possível garantir relativamente à existência de
uma povoação árabe, os achados desse período
são escassos e inconclusivos. Embora o topónimo
derive, de facto de uma palavra árabe - alborca,
ou albirca, terra pantanosa e alagadiça – tal deve-
se à situação geografia da povoação. Assim, a
única certeza é que, na Idade Média, começou a
florescer uma pequena povoação, cuja população
se havia de organizar em concelho, de modo a
gerir a administração e justiça local.
A primeira referência ao concelho surge na
Chancelaria de D. Afonso IV, num documento datado
de 13385. Este permite percepcionar a existência
de uma sociedade organizada com concelho
instituído, pois fazendo-se representar pelo seu
procurador, o Concelho de Alverca fez uma petição,
informando que as suas rendas e degredos haviam
sido usurpados por um tal João Afonso, senhor do
povoado. Adianta o procurador que as coimas eram
devidas ao Concelho desde tempos imemoriais, até
o referido Senhor os haver extorquido pela força. 3 José Mattoso, História de Portugal, Segundo Volume, A Monarquia Feudal (1096-1480), Lisboa, Circulo dos Leitores, 1993, p. 216.4 Cf. ANTT, Mosteiro de São Vicente de Fora, mç. 1 N.º 29.5 Chancelarias Portuguesas – D. Afonso IV – Volume II - (1336-1340), Lisboa, Instituto Na-cional de Investigação Científica, Centro de Estudos Históricos Universidade de Lisboa, 1992, pp.184-186.
Após um período de conflito que terminou com a
prisão de moradores, tendo ainda sido ordenado
ao meirinho do lugar “[…] que todos os outros
que na mãao colhesse que os decepasse […]”, o
medo das represálias acabou por travar a revolta,
continuando a população a ver-se despojada dos
direitos às rendas. Com a morte de João Afonso o
senhorio do lugar voltara à posse da coroa, tendo D.
Afonso IV continuado a cobrar para si os degredos e
rendas, da mesma forma que o havia feito o antigo
senhorio. Devido às razões expostas, o Concelho
de Alverca, lavrara a petição, procurando provar o
direito a esses emolumentos.
Este documento sugere, implicitamente, que
os acontecimentos relatados teriam tido início
no reinado de D. Dinis (1279-1325). Sendo assim
confirma-se a existência de um povoado, conhecido
com o topónimo de Aluerca, com concelho
instituído possivelmente antes do século XIII. Em
nenhuma parte do texto é referida a apresentação
de um foral, o que faria sentido tratando-se de
um documento comprovativo da antiguidade do
concelho. Por outro lado, a sua análise parece
confirmar a formação autónoma do Concelho de
Alverca, tendo em conta a capacidade organizativa
Demarcação do primitivo Núcleo habitacional de Alverca, CMVFX,demarcação da autora
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da população, revelada no modo como se uniram
contra os poder abusivo do Senhor, em defesa dos
seus direitos enquanto comunidade.
Para além desta petição de 1338 e, possivelmente
na sequência desta, conhecem-se, relacionadas
com Alverca, três cartas de confirmação do
Concelho, emitidas pela coroa. São elas a carta de
D. Pedro I confirmando os privilégios do concelho
em 24 de Agosto de 13576; a carta datada de 19
de Abril de 1434, de D. Duarte, confirmando “ao
concelho d aluerca todos os seus priujllegios foros
liberdades e boons costumes de que sempre
husarom [...].”7; e uma outra emitida em 23 de
Abril de 1439, onde D. Afonso V confirma à Vila de
Alverca todos os Privilégios, Graças e Mercês8.
Sabendo então, sem sombra de dúvidas, que
Alverca era Concelho, pelo menos desde o século
XIII, onde se localizava a Casa da Câmara? É
comum a localização desse edifício, num largo ou
praça, no centro da povoação e na proximidade
da Igreja Matriz. De facto os edifícios municipais
conhecidos seguem essa localização, justificada,
inequivocamente, pelo facto de estes serem o
centro da vivência administrativa e judicial de
qualquer Concelho.
Procurar localizar e/ou caracterizar edifícios, há
muito desaparecidos é sempre uma tarefa difícil,
mesmo quando se trata de um espaço que em
tempos foi fulcral na vivência de uma comunidade.
Existia o conhecimento da construção dos paços do
concelho, no actual largo João Mantas, no século
XVI, tendo em conta a data do pelourinho: 1530.
No entanto, até há pouco tempo desconhecia-se
onde se localizavam os paços primitivos.
Num testamento, datado de 1867, pertencente ao
espólio documental do Núcleo de Alverca do Museu
6 Cf. Chancelarias Portuguesas – D. Pedro I (1357-1367), Lisboa, Instituto Nacional de Investigação Científica, 1984.7 Chancelarias Portuguesas – D. Duarte, Volume I, Tomo 1, (1433-1435), Lisboa, Centro de Estudos Históricos – Universidade Nova de Lisboa, 1998, p. 131.8 Cf. ANTT, Chancelaria de D. Afonso V – Comuns, Livro 18 fl. 53, Microfilme 155.
Municipal de Vila Franca de Xira, encontrou-se uma
pista valiosa. O documento refere a propriedade
de umas casas ”[…] citas no largo do Pelourinho
desta villa d’Alverca […].”9 Esta referência nada
tem a ver com o pelourinho do largo João Mantas,
pois as referidas casas, tinham a porta voltada
para a antiga rua da Misericórdia, hoje conhecida
como rua Miguel Bombarda. De modo a esclarecer
qualquer dúvida, procurou-se o processo do
Registo Predial n.º 385, do Cartório de Vila Franca
de Xira, relativo à mesma propriedade, apresenta
a indicação de estar localizada junto ao largo do
Pelourinho Velho, actualmente conhecido como
largo Gregório Nunes. Sabendo que o pelourinho
era colocado em frente aos paços do concelho,
defende-se a possibilidade de, nesse largo, se ter
localizado, até ao século XVI, a Casa da Câmara de
Alverca.
Para além dos dados obtidos no testamento
citado, no Tombo das Capelas de D. Afonso IV, em
documentos datados da segunda metade do século
XVI, encontram-se referências à praça velha10,
dado acrescido mais adiante, num documento de
medição de uma casa, referindo a localização da
praça velha no “outeiro na rua onde está a câmara
desta vila”11. Estas referências permitem confirmar
9 MMVFX-NA, Testamento de Fortunata Augusta de Sousa, 1867/1868, doc. 2, fl 4v.10 Cf. ANTT, Núcleo Antigo, Tombo de Alverca, Livro XXIV, Parte I, Cx. 270,fl. 392.11 Idem, fl . 579. Idem, fl. 579.
Largo Gregório Nunes, AF
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Fragmentos de Alverca
a localização da antiga Casa da Câmara no actual
Largo Gregório Nunes.
Actualmente não restam vestígios nem dessa
antiga Casa da Câmara, nem do pelourinho velho,
contudo o estudo das fontes permitiram recuperar
parte da Memória e da História de Alverca.
Assim o largo Gregório Nunes, ganha uma nova
dimensão, pois agora há o conhecimento que
em tempos, naquele local, o povo se reunia para
ouvir o que os juízes e vereadores haviam decidido
relativamente, por exemplo, ao preço dos bens de
consumo. Ali se assistiam aos julgamentos, ali se
centralizavam todos os aspectos das vivências
concelhias.
No século XVI foram construídos os novos paços
do Concelho e edificado o novo pelourinho na
praça, actualmente, conhecida pelo topónimo
João Mantas. Deste edifício restam alguns
vestígios, descobertos na sequência das duas
intervenções arqueológicas, que antecederam as
obras de remodelação da antiga Casa da Câmara
de Alverca.
Dos vestígios arqueológicos encontrados nas
escavações de 2004 destaca-se a “presença de
restos de calçada com espinha e delimitada por
pedras maiores do lado Oeste.”12. Acredita-se
que esta calçada, identificada a Sudeste na antiga
casa da Câmara, pode ter constituído o pavimento
térreo do edifício quinhentista. Em 2005 a
descoberta acidental de uma sala subterrânea, a
Sudoeste do edifício, levou a uma nova intervenção
arqueológica. A observação do espaço revelou
tratar-se de uma construção distinta do edifício
setecentista, tanto relativamente às argamassas
utilizadas, como ao tipo de pedra da alvenaria,
facto que solidifica a hipótese de se tratar de um
elemento da construção do século XVI. O único
acesso ao compartimento era feito por uma
12 Nuno Ricardo de Oliveira Gamb�a, Nuno Ricardo de Oliveira Gamb�a, Relatório da Intervenção Arqueológica no Núcleo Museológico de Alverca, texto policopiado, 2004, p. 39.
pequena porta, cujo vão se localiza ao centro da
parede Sul13, actualmente inacessível.
Entre os materiais encontrados nesse compar-
timento – sobretudo cerâmicas e faianças –,
destaca-se uma tranca em ferro, bem como duas
chaves de dimensões consideráveis. Estes objectos
juntamente com o chão calcetado, exumados
pela intervenção na sala por cima desse espaço,
sugerindo uma utilização menos nobre, permitem
considerar que a sala, entulhada possivelmente
após Terramoto de 1755, poderia ser uma enxovia,
uma espécie de prisão dentro da prisão, um espaço
de isolamento. A falta de janelas, ou qualquer outro
meio de ventilação, parece apoiar esta hipótese.
Para além dos testemunhos arqueológicos nos
Tombos de Alverca das Capelas de D. Afonso
IV, num documento datado de 1575, é feita
referência a uma propriedade junto à Câmara
Nova 14. Com data de 1580, um outro documento
dá conta da medição de casas localizadas entre
a praça velha e a praça nova do pelourinho15. O
conjunto destes dados permitem, seguramente,
afirmar ter existido, no largo João Mantas, uma
Casa da Câmara construída na primeira metade
do século XVI, com prisão, de chão calcetado e
enxovia, de acordo com os modelos dos edifícios
camarários, comuns em todo o país e ao longo de
vários séculos. Este edifício terá funcionado como
centro da administração e justiça local até ao
dia 1 de Novembro de 1755, quando o Terramoto
abalou o reino de Portugal. Em Alverca, entre
outros edifícios civis e religiosos, a casa da
Câmara ficou arruinada, tornando-se necessária
a sua reconstrução de forma a regularizar a vida
administrativa e judicial da povoação. Uma vez
que Alverca fazia parte dos bens das Capelas de D.
Afonso IV competia, ao provedor dessa instituição,
providenciar a reconstrução do edifício.
13 Cf. Sandra Brazuna, Relatório dos Trabalhos Arqueológicos – Escavação Arqueológica Núcleo Museológico de Alverca – Intervenção Arqueológica no Compartimento Subterrâ-neo, texto policopiado, ERA-Arqueologia, S.A., 2005, embora seja referida que a porta ficava na parede Norte, na realidade está orientada a Sul.14 Cf. ANTT, Núcleo Antigo, Tombo das Capelas, Livro XXIV, Parte I, Cx. 270,fl. 104.15 Cf. Idem, fls. 392-393.
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Fragmentos de Alverca
Brasões e lápide na fachada da antiga casa da Câmara, AF
A única fonte encontrada, até ao momento,
relativa a este facto encontra-se na fachada Norte
da casa da Câmara, na lápide epigráfica embutida
na parede, onde se lê que o edifício foi reedificado
por ordem de Paulo de Carvalho e Mendonça,
irmão do então conde de Oeiras, Sebastião José
de Carvalho e Melo. Para além de outros cargos
eminentes, Paulo de Carvalho era provedor das
capelas instituídas por D. Afonso IV e pela Rainha
D. Beatriz em 1354, na Sé de Lisboa, de cujos bens
faziam parte os rendimentos de alguns concelhos,
entre os quais se encontrava Alverca.
O edifício reconstruído incluía uma sala de
sessões, uma sala de audiências e tribunal, no piso
superior. No rés-do-chão ficava a cadeia de tectos
abobadados, de chão lajeado, com quatro salas
de janelas gradeadas, uma das quais destinada
ao encarceramento de presos masculinos, outra
funcionando como prisão feminina. Uma terceira
divisão servia de enxovia e a última, possivelmente,
como área de recepção dos presos.
Na fachada da casa foram colocados os brasões
da rainha Mariana Victória e do provedor Paulo
de Carvalho e Mendonça, encimando a lápide
epigráfica já referenciada. No mesmo período foi
embutida, ao nível do rés-do-chão, uma estela
funerária romana, por cima de um pequeno
oratório, recentemente colocado à vista.
Ao longo da segunda metade do século XVIII o
concelho de Alverca, gerido por juízes e vereadores,
governava administrativa e judicialmente um
território que incluía, de acordo com as Memórias
Paroquiais, escritas pelo cura Manuel Henriques
em 1758, os lugares de Adarce, A-dos-Melros,
A-dos-Potes, Arcena Grande e Pequena, Brandoa,
Moinho de Vento, Ponte, Proverba, Vale de Ranas,
Verdelha16 e Sobral, o actual Sobralinho.
Neste período os concelhos subsistiam fechados
16Cf. ANTT, Memórias Paroquiais, volume 3, memória 43, fls. 329-330.
sobre si, sem grandes contactos com as
comunidades vizinhas e, em alguns casos, com
raros contactos com a administração central.
Administrativamente deviam subsistir das rendas
geradas pelo próprio Concelho o que, para os
pequenos concelhos como Alverca, se tornava,
por vezes, muito difícil. No final do século XVIII a
estrutura concelhia começou a sofrer alterações.
Em 21 de Abril de 1795 foi emitido o Alvará de
criação do lugar de Juiz de Fora de Alhandra e Alverca.
A partir desse momento o Concelho de Alverca,
que havia sido presidido por juízes ordinários,
eleitos entre os homens que compunham a elite
local, passa a estar sob a alçada de um juiz de fora
nomeado pela coroa.
Ao longo do século XIX várias mudanças políticas,
sociais e administrativas, ocorridas a nível
nacional, vão transformar de forma definitiva
e irreversível o poder local. Uma das iniciativas
das reformas liberais foi a criação de uma nova
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Fragmentos de Alverca
divisão administrativa do território português,
visando um maior controlo da realidade local por
parte do Estado. Em 1827 existiam 806 concelhos
espalhados pelo território português, a maioria
arreigada a velhas tradições, na maior parte dos
casos sem condições de subsistência.
O processo de modernização levado a cabo pelo
Liberalismo foi lento. Ao longo desse século
vários decretos visaram a redução dos concelhos,
integrando os mais pequenos em outros próximos,
com melhor capacidade de gestão. Por volta
de 1846 foi composta a Comissão Encarregada
de Propor o Plano da Nova Divisão Eclesiástica e
Administrativa17. O quadro Organização do Districto
Administrativo de Lisboa incluía o concelho de
Alverca, composto pelas freguesias Alverca/
Sobral e “S. Iria da Povoa”18, apresentado como
integrando os “Concelhos que fica existindo”.
Na lista dos trinta e cinco concelhos existentes
no distrito de Lisboa, contava-se, entre os quatro
mais pequenos, o de Alverca com um total de
803 fogos. Para além do factor populacional,
economicamente o concelho encontrava-se
em grandes dificuldades para obter receitas
suficientes de modo a suportar todas as despesas.
Esta realidade deverá ter contribuído para que o
Concelho de Alverca fosse suprimido pelo decreto
de 24 de Outubro de 185519.
Para além de Alverca foram extintos, os Concelhos
de Povos (1836), Castanheira (1837) e Alhandra
(1855). Todos estes territórios passaram a integrar
o Concelho de Vila Franca de Xira. Há que ter em
conta o facto de, entre todos os cinco concelhos
originais, Vila Franca ser o mais populoso e o que
apresentava maior desenvolvimento desde há
muitos anos.
17 AHMOP, AHMOP, Comissão Encarregada de Propor o Plano da Nova Divisão Eclesiástica e Administrativa – Quadros da Organização dos Distritos Administrativos do Continente do Reino e Seus Fogos, Ca. 1846, CEPPND 10.18 Idem, p. 54.19 Cf. José Máximo de Castro Neto Leite e Vasconcellos, Colecção Official da Legisla-ção Portugueza, Lisboa Imprensa Nacional, 1856, pp. 361 (Art. 2º), 388-389.
Deste modo em vez de cinco pequenos concelhos,
cuja subsistência se tornava cada vez mais difícil,
formou-se um Concelho maior e, sobretudo, mais
capaz de assegurar o desenvolvimento da sua
economia e população, o qual havia de contribuir,
também, para o crescimento do país.
Extinto o Concelho, Alverca tornava-se uma
freguesia, a qual ao longo de cerca de cento e
cinquenta anos, cresceu em termos de população
e economia, chegando à categoria de cidade.
Actualmente é das povoações mais bem sucedidas
do Concelho de Vila Franca de Xira sem, no
entanto, deixar cair no esquecimento a História e
o Património que a tornam singular.
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Fragmentos de Alverca
Os pelourinhos são símbolos da jurisdição e da
autonomia dos Concelhos. Era no pelourinho que
se executavam algumas das penas do direito e se
fixavam os decretos régios e municipais. Segundo
Lino de Macedo: “Não havia a mínima uniformidade
na construção dos pelourinhos, cada câmara
mandava fazer os seus, como queria, e segundo a
habilidade do pedreiro, ou a quantia que para isso era
aplicada.”1 A identificação de diversos pelourinhos,
datados do mesmo período, muito idênticos ao
de Alverca, permite depreender terem sido todos
construídos pelo mesmo canteiro, ou na mesma
oficina. A reforçar esta hipótese, é de acrescentar
localizarem-se todos esses pelourinhos em regiões
muito próximas. São exemplo os pelourinhos de
Azambuja, Colares, Povos e Vila Franca de Xira.
O pelourinho de Alverca datado de 1530 ergue-se
de uma plataforma de quatro degraus octogonais.
De base cilíndrica de forma oitavada c�ncava, de
secção estrelar. O fuste é cilíndrico helicoidal, de
1 Lino de Macedo, Antiguidades do Moderno Concelho de Vila Franca de Xira, [1893], Vila Franca de Xira, Museu Municipal de Vila Franca de Xira, 1992, p. 36.
estrias espiraladas, com dois registos que torcem
em sentidos opostos, separados por nó oitavado,
saliente, com anel central. O primeiro registo é
original e está decorado com rosetas. Quanto ao
segundo é desprovido de decoração, tratando-se de
uma reconstrução.
O capitel prismático octogonal é decorado com
quatro cabeças, cada uma agarrando na boca duas
alcachofras, intercaladas por quatro escudos: um
deles com esfera armilar; do lado oposto o brasão
real encimado por coroa, utilizado desde o reinado
de D. Manuel I; um outro apresentando um rosto
masculino, com cartela saindo-lhe da boca, onde se
vê a inscrição da data.
O quarto escudo encontra-se oposto à data,
tratando-se de um segundo brasão com três torres
e muralha durante muito tempo identificado
como sendo o brasão de Santarém2, contudo,
2 Cf. Luís Chaves, «Os Pelourinhos no actual concelho de Vila Franca de Xira, na pro-víncia da Estremadura e Distrito de Lisboa», 25º Aniversário da Biblioteca-Museu Munici-pal Dr. Vidal Baptista, Boletim Comemorativo, Vila Franca de Xira, Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, 1972, p. 166.
INTERPRETAÇÃO DA SIMBOLOGIA PRESENTE NO PELOURINHO
QUINHENTISTA DE ALVERCA
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Fragmentos de Alverca
investigações recentes revelam outra realidade. De
facto o brasão no pelourinho de Alverca apresenta
algumas semelhanças com o brasão de Santarém,
todavia a simbologia do castelo com três torres
é comum a outros brasões. Para além disso uma
observação atenta dos brasões quinhentistas de
Santarém permite descartar a hipótese daquele
estar representado no pelourinho de Alverca3. Por
outro lado, os pelourinhos eram erigidos às custas da
Câmara, e até finais da Idade Moderna, os concelhos
viviam encerrados em si mesmo. Assim, porque se
trata de um símbolo de autonomia, não é possível
que os edis alverquenses, no século XVI, tivessem
pretendido, no pelourinho do seu Concelho,
simbologia que o ligavam a um outro, bem maior
e, como se não bastasse, tão distante como seria o
de Santarém. Como argumento conclusivo há ainda
a referir que em nenhum pelourinho conhecido se
apresenta o brasão de outro concelho.
Nos pelourinhos são muitas vezes representados
brasões, nomeadamente o de Povos que apresenta, no
remate, o brasão dos Ataídes, Condes da Castanheira,
senhores desse concelho. Outros pelourinhos mostram
poder ser comum não só a inclusão do brasão dos
senhores da terra, como o do próprio concelho, como
é exemplo o de Azambuja,que inclui, na simbologia
heráldica do remate, dois brasões de armas reais e
dois do município. 3 Cf. Estrela Branco, A Heráldica do Município de Santarém, Santarém, Câmara Munici-pal de Santarém, Novembro 2001.
Em vista disto deve ponderar-se a hipótese do
brasão presente no pelourinho de Alverca ser o do
próprio concelho. Afinal tratava-se de povoação
acastelada no século XVI, como indicam as fontes
e testemunham as ruínas que restam do castelo
medieval. Citando José Mattoso: “[…] o concelho
procura e encontra símbolos que exprimem a sua
unidade, e os ostenta face ao exterior, nas suas
bandeiras, selos e escudos.”4 Mesmo os concelhos
mais modestos não dispensavam esta simbologia.
Deste modo o brasão do concelho, como “símbolo
de poder” local, era representado também na
arquitectura municipal. Assim, seria coerente
fazê-lo representar num dos símbolos maiores da
autonomia concelhia, como é o pelourinho.
Entre finais do século XIX, princípios do século XX,
grande parte destes elementos patrimoniais foram
derrubados, sob diversos pretextos, tendo alguns
deles acabado por desaparecer5. No actual concelho
de Vila Franca de Xira os pelourinhos não ficaram
incólumes ao tempo e ao vandalismo.
O pelourinho de Alverca é mencionado, em 1881,
no Relatório e mappas acerca dos edifícios que
devem ser classificados monumentos nacionaes,
apresentados ao governo pela real associação dos
architectos civis e archeologos portugueses6, onde se
refere tratar-se de um dos exemplares a necessitar
de salvaguarda. Este documento revela o facto dos
pelourinhos portugueses terem sido caracterizados
como monumentos, na legislação de salvaguarda do
património desde o século XIX, tendo sido alvo das
primeiras campanhas de classificação, como se pode
constatar no Relatório mencionado e no “decreto
nº 23122 de 11 de Outubro de 1933, logo à partida
classificados na categoria de monumento de quinta
classe, descritos como “[…] «imóveis de interêsse
público» todos aqueles que não estivessem àquela
4 José Mattoso, Obras Completas – Identificação de um País: Oposição, Volume 2, Rio de Mouro, Círculo de Leitores e Autor, Janeiro de 2001, p. 316.5 Cf. Mário Guedes Real, “Pelourinhos dos Extintos Concelhos Estremenhos – II Pelou-rinhos Demolidos”, Estremadura Boletim da Junta de Província, Série II, Números XXIX/XXX/XXXI, Janeiro/Dezembro 1952, pp. 8-10.6 Cf. Diário de Governo nº 62, 19 de Março de 1881.
Remate do pelourinho, pormenor, Carranca com data, AF
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Fragmentos de Alverca
Antiga Casa da Câmara e pelourinho, finais do séc.XIX, MMVFX-NA
Remate do pelourinho, pormenor,Brasão de Alverca, AF
data já classificados, e tomando providências para a
sua conservação e reconstituição.”7
Em finais do século XIX, o pelourinho de Alverca
terá sido derrubado8. Desconhecem-se até à
data os motivos da sua queda, o Coronel Edgar
Cardoso indica ter sido derrubado pelo “tempo e
as intempéries”9, embora esta seja uma informação
escassa é, até ao momento a única disponível. No
inicio do século XX Alberto Pimentel adianta “[…]
havia no meio da praça [João Mantas] um pelourinho,
symbolo da antiga autonomia municipal; foi apeado
e está guardado na cadêa.”10 Cerca de trinta anos
depois o Boletim da Junta de Provincia do Ribatejo
dá conta de restarem somente a base e o capitel11,
informação incompleta, pois existia também uma
parte da coluna original.
Segundo o IGESPAR12, este pelourinho foi
classificado como Imóvel de Interesse Público
pelo Decreto n.º 23.122, DG 231, de 11 de Outubro
de 1933, encontrando-se à data ainda derrubado.
Alguns elementos permaneceram junto ao edifício
da antiga Câmara, até 1988, quando – num esforço
7 Garcez Teixeira, “Inquérito Sobre Pelourinhos”, Revista de Arqueologia, Tomo III, 1936, p. 52.8 Cf. José do Carmo Pacheco, Op. Cit., p. 109.9 Edgar Pereira da Costa Cardoso, O Jubileu das Oficinas Gerais de Material Aeronáuti-co, Alverca, Oficinas Gerais de Material Aeronáutico, 1968, p. 22.10 Alberto Pimentel, Alberto Pimentel, Portugal Pittoresco e Illustrado – A Extremadura Portugueza – Primeira Parte – O Ribatejo, Lisboa, Empreza da Historia de Portugal, 1908, p. 146.11 “Freguesias do Concelho de Vila Franca de Xira - Freguesia de Alverca”, “Freguesias do Concelho de Vila Franca de Xira - Freguesia de Alverca”, Boletim da Junta de Provincia do Ribatejo, n.º 1, anos de 1937-1940, Lisboa, Oficinas Bertrand (Irmãos), L.da, 1940, p. 662.12 Cf.http://www.monumentos.pt/scripts/zope.pcgi/ipa/frameset?nome=ipa&upframe=upframe3&downframe=ipa.html
Pelourinho de Alverca, AF
conjunto entre a antiga DGEMN, Câmara Municipal
de Vila Franca de Xira e Junta de Freguesia de
Alverca – foi reconstruído e reimplantado no local
de origem13. A reconstrução foi possível devido ao
facto de existirem três elementos originais, para
além de uma fotografia, datada do século XIX,
indispensável para a reconstrução dos elementos
em falta excepto no respeitante ao remate. A pouca
nitidez da imagem, relativamente a esse elemento,
terá tornado impossível a sua reconstituição14.
O pelourinho de Alverca é um testemunho do
antigo Concelho, constitui memória das acções
administrativas e judiciais daquela Câmara até
1855. Actualmente é um dos mais belos elementos
patrimoniais da freguesia. Ao passar por ele é difícil
deixar de reflectir sobre a importância da História e
Patrimónios locais.
13 Cf. Paula Monteiro, “Os Pelourinhos do Concelho de Vila Franca de Xira”, catálogo da exposição Memórias de Pedra e Cal, Vila Franca de Xira, MMVFX, 2001, p. 87.14 Sobre o processo de recuperação do pelourinho de Alverca consultar documento Sobre o processo de recuperação do pelourinho de Alverca consultar documento on-line da DGEMN: http://www.monumentos.pt/Monumentos/forms/002_B1.aspx.
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Fragmentos de Alverca
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Fragmentos de Alverca
Modernizar as vias de comunicação do reino foi um
dos projectos relevantes no reinado de D. Maria I
[1777-1792]. Tratava-se de um importante factor
para o desenvolvimento económico de Portugal,
na verdade, a melhoria das estradas traduzia-
se num crescimento dos meios de transporte e
comunicação, estreitando laços entre os povos
e incrementando o comércio. A Estrada Real de
Lisboa a Santarém foi uma das obras realizadas
nesse âmbito.
Numa primeira disposição real, o troço que ia de
Sacavém a Alverca foi alargado e em ambos os
lados mandaram-se plantar oliveiras1. De modo a
assinalar o termo da cidade de Lisboa – localizado
no limite do ribeiro da Alfarrobeira, na Verdelha
– foram erguidos dois padrões, um em cada
lado da estrada, em cuja base está gravado um
texto comemorativo. A sua leitura permite saber
que, pelo menos até aos padrões, a estrada era
1 Cf. Luís de Oliveira Ramos, D. Maria I, Lisboa, Círculo dos Leitores e Centro de Estu-dos dos Povos e Culturas de Expressão Portuguesa, Janeiro/Fevereiro 2007, p. 273.
calcetada, confirma o plantio de oliveiras com a
justificação de “o frvcto das ditas oliveiras servir p.a
a Real Casa Pia e illvminaçaõ da cidade de Lisboa.”
O texto indica ainda que, aquele troço de obra,
com a data de 1782, estava a cargo do Intendente
Pina Manique. De acordo com Luís Vasconcelhos
“A extensão total das estradas do Intendente mal
atingirá os 25 km. Pina Manique deu execução
àquilo que estava dentro da sua competência
– o termo de Lisboa –, e em proporção com o
rendimentos de que dispunha.”2
2 Idem, p. 472.
Padrões do termo de Lisboa. AF
A CONSTRUÇÃO DA ESTRADA REAL DE D. MARIA I E O MARCO
DE IV LÉGUA EM ALVERCA
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Fragmentos de Alverca
Posteriormente procedeu-se à construção do
troço da Estrada Real de Lisboa a Santarém,
correspondente a 14 léguas. A construção daquele
troço da estrada, estava a cargo de D. José Luís de
Meneses e Abranches Castelo Branco, sexto Conde
de Valadares e inspector-geral do Terreiro Público
de Lisboa, o qual obedecia a um Aviso, datado de
7 de Maio de 1784, o qual “[…] mandava preparar
a estrada entre Alverca (sitio da Verdelha, limite
do termo de Lisboa) e Vila Franca de Xira, a fim
de por ela transitar a Soberana na sua jornada a
Salvaterra.”3 A obra terá sido construída, em parte,
com a contribuição monetária das Câmaras4, entre
as quais se encontrava a de Alverca. Dos mapas
de despesas destaca-se o de 1789/1790, o único
encontrado que apresenta referência, não só às
colunas dos marcos, como aos relógios de sol
que as rematam. A análise desses mapas permite
perceber que, para além da construção da estrada,
se procedeu ao arranjo de caminhos, de pontes, de
fontanários e ao plantio de árvores nas bermas da
nova estrada, como se pode verificar pelo extracto
em baixo5.
De acordo com a correspondência que deixou,
dirigida à rainha e ao governo, o Conde de Valadares
contou com a colaboração de alguns homens de
3 Luís Vasconcelos, “O Fomento de Estradas no reinado de D. Maria I”, Sven Sk�dsga- Luís Vasconcelos, “O Fomento de Estradas no reinado de D. Maria I”, Sven Sk�dsga-ard; John Kuhlmann Madsen, Hispanismen omkring Sven Skydsgaard: studier i spansk og portugisisk sprog, litteratur og kultur til minde om Sven Skydsgaard, Museum Tusculanum Press, 1981, p. 475.4 AMOP, Ministério do Reino – Correspondência Recebida do Conde de Valadares como Encarregado das Obras do Ribatejo, Carta de 29 de Maio de 1784, Bobine 41, Mr. 43, p. 91.5 AHMOP, Ministério do Reino – Correspondência Recebida do Conde de Valadares como Encarregado das Obras do Ribatejo, Bobine 41, Mr. 43, p. 624.
confiança, naturais das zonas próximas das obras
de construção. De acordo com palavras suas “Logo
que me foi dirigida a ordem de S. Majestade em
aviso de 7 de Maio de 1784 para mandar concertar
a estrada do fim do Termo de Lisboa até Vila Franca
de Xira, me foi necessário nomear um homem capaz
de dirigir aquela dita obra, pagar a despesa dela,
e receber do Cofre do Terreiro o dinheiro para isso
necessário.”6 Em Alverca escolheu para esse papel
José da Rocha, Capitão de uma das Companhias de
Ordenança7, por considerar tratar-se de uma “[…]
pessoa ágil, pratica, e fidedigna […]”8.
Devido ao bom desempenho nessas funções, por
diversas vezes o Conde de Valadares solicitou à
Rainha que recompensasse José da Rocha pois, tal
como afirma numa carta datada de 13 de Fevereiro
de 1786, “Este homem que até ao presente tem
trabalhado de dia e de noite, com incómodo de
sua casa e família, e despendendo da sua fazenda,
exposto a todo o rigor do tempo, com incansável
desvelo no Serviço do Público, e de Sua Majestade
[…]”9 merecia ser agraciado com um ofício ou
uma qualquer indemnização. Em 28 Agosto 1788
reforçava essa intenção indicando que o “[…]
Capitão José da Rocha, não só se empregou no
Pagamento dos Operários desde Julho de mil
setecentos, e oitenta e quatro, principiando no sitio
da Verdelha , primeiro Lugar depois do termo desta
Cidade, e continuando até Azambuja, Alenquer,
Caldas, Nazaré, Alcobaça, Batalha, Engenho dos
Vidros e Leiria, não só cumpriu com a sua obrigação
de pagador mas dirigiu e assistiu a todas as obras,
que nestes Lugares se tem feito, de noite e de dia,
com criados e cavalos a sua custa, os quais fazia
girar por muitas partes em beneficio das Obras e
da Condução dos dinheiros para satisfação delas.”10
Perante estes dados fica-nos a certeza que para o
6 AHMOP, Ministério do Reino – Correspondência Recebida do Conde de Valadares como Encarregado das Obras do Ribatejo, Bobine 41, Mr. 43, p. 154.7 Cf. Anabela Ferreira, CASA DA CÂMARA DE ALVERCA – Conhecer a sua História, Valorizar um Património (1755-1855), Volume de Anexos, Dissertação do Mestrado em Estudos do Património, texto policopiado, Centro de Documentação do Núcleo de Alverca do Museu Municipal de Vila Franca de Xira, 2007, p.112. 8 AHMOP, Ministério do Reino – Correspondência Recebida do Conde de Valadares como Encarregado das Obras do Ribatejo, Bobine 41, Mr. 43, p. 154.9 Idem, Ibidem10 Idem, p. 270.
EXTRACTO DO MAPA DE DESPESAS
DAS OBRAS DO RIBATEJO
1789 e 1790Dispendido na reforma das calçadas de Alverca.. 43$200 Idem de Vila Franca ....................................... 28$880Idem da Castanheira ....................................... 17$980Idem de Povos ............................................... 4$240Idem de Alhandra ........................................ 364$900Dispendido em pedestais e relógios................ 455$932Dispendido na reforma dos caminhos .......... 1.863$810Dispendido na fonte de Vila Franca ................ 374$280Dispendido em plantações nas estradas ....... 1.113$485Idem no cais de Povos ............................. 4.618$360
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Fragmentos de Alverca
sucesso das obras da Estrada Real muito contribuiu
o Capitão José da Rocha, excedendo aquilo que
se esperava dele, não se limitando a cuidar do
troço que passava por Alverca, mas cuidando de
toda a estrada, por certo por perceber que só a
obra concluída haveria de trazer benefícios ao,
então pequeno Concelho, onde exercia funções de
Capitão.
Ao longo da Estrada Real foram dispostos marcos
com indicação das léguas11. No Concelho de Vila
Franca de Xira conhecem-se três desses exemplares:
o marco de IV légua localizado em Alverca; o de
V em Vila Franca de Xira; o de VI na Castanheira.
De acordo com a inscrição da coluna deste último
marco – localizado no muro exterior da Quinta do
Fidalgo, a Norte da Castanheira – no ano de 1788,
D. Maria I ordenou a demarcação da estrada, com
padrões indicando as léguas de distância com a
capital do reino, correspondendo cada uma a “três
mil oitocentos e Quatro passos geométricos”.
Todos estes marcos são muito semelhantes,
esculpidos em calcário, compõem-se de: base
cúbica; corpo central, talhado num paralelepípedo
rectangular; remate constituído por duas peças,
sendo a inferior uma estrutura piramidal de
base quadrada, encimada por uma esfera,
onde se incorpora um relógio de Sol, de tipo
vertical-fixo, apresentando algumas diferenças
relativas ao traçado do mostrador entre os
vários marcos mencionados. As linhas de horas
e a numeração romana, que as indica, são
gravadas na pedra, possibilitando a leitura das
horas e meias horas. O gnómon – geralmente um
esquadro ou estilete, cuja sombra é projectada
no mostrador, pela luz do sol permitindo a leitura
da hora solar, também designada como hora
local – era de bronze, de acordo com vestígios
ainda persistentes no exemplar de Alverca.
11 � época a légua correspondia a 6179m � época a légua correspondia a 6179m Cf. Zeferino, “Estrada de Lisboa a Santarém – Demarcação”, Vida Ribatejana, Número Especial, 1964, p. 142.
Marco de VI Légua, Castanheira. AF
Relativamente ao estudo de impacto que terá tido
a obra de construção deste troço da estrada
real, ainda há muito por investigar, pois parte
da documentação ainda não está disponível ao
público, é possível que outros dados venham a ser
conhecidos relativamente à história de Alverca. Já
no que respeita à valorização do nosso património
os Marcos de Légua foram classificados, em 1943,
como Imóveis de Interesse Público12, deste modo
encontram-se protegidos contra qualquer tipo
de acção que vise a sua destruição ou deturpação
arquitectónica. Contudo, tal protecção não
impediu que os marcos de IV e de V légua fossem
derrubados.
O marco de IV légua encontrava-se, originalmente,
na berma norte da Estrada Nacional 10, ao
quilómetro 16.810, à saída de Alverca. Após um
acidente de viação, ocorrido em 1985, os vários
elementos foram desagregados. A coluna foi
guardada no armazém da Junta de Freguesia
12 Decreto n.º 32973, 18-8-1943. Decreto n.º 32973, 18-8-1943.
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Fragmentos de Alverca
de Alverca. O relógio de sol foi colocado numa
pequena área ajardinada, em frente ao Mercado
Municipal.
Em relação ao marco de V légua, localizava-se
originalmente na rua 5 de Outubro, junto da casa
do Sr. Dr. Clemente dos Santos. Desconhece-se o
motivo do seu derrube, embora se possa equacionar
a hipótese de se ter tratado de um acidente de
viação, tal como ocorreu com o marco de Alverca.
A base e o corpo central encontram-se guardados
num depósito da Câmara Municipal de Vila Franca
de Xira, o remate com relógio de sol foi colocado
no Jardim Municipal. Até há pouco tempo, o único
marco intacto e in situ, era o de VI légua, à saída da
Castanheira.
Tratando-se de elementos classificados, teste-
munhos da arquitectura civil do século XVIII, a sua
recuperação tornava-se imperativa. Em resultado
disso, numa iniciativa da Câmara Municipal de Vila
Franca de Xira, com apoio da Junta de Freguesia
de Alverca, em Fevereiro de 2007, foi restaurado o
marco de IV légua. A sua recuperação incluiu limpeza
da pedra, construção de um gnómon, de modo a
possibilitar a leitura da hora local, e a implantação a
cerca de oitenta metros do local de origem, decisão
que se prendeu com a sua valorização, permitindo
maior visibilidade e melhor acesso.
De novo erguido em toda a sua imponência,
o marco de IV légua recupera a sua dignidade
como elemento do património nacional. Para
além de recuperar um monumento do património
arquitectónico, resgatou-se a memória de um
elemento importante da História de Alverca,
pois a construção da Estrada Real terá por certo
contribuído para a evolução económica, ocorrida
a partir século XIX, traduzida num aumento de
produção e da população da localidade.
Marco de IV Légua, após a recuperação. AF.
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Fragmentos de Alverca
Relativamente às Invasões Francesas, episódio
marcante da nossa História, são inúmeros os
estudos publicados relativos a este assunto, de
facto a bibliografia é extensa, contudo, como
acontece em tantos outros casos, ainda há muito
por investigar no que concerne à História Local.
Por essa razão pretende-se lançar algumas
luzes relativas às consequências das Invasões
Francesas em Alverca, embora se mencionem os
acontecimentos gerais, a investigação centrou-se
nesta localidade.
A primeira invasão, sob o comandado do general
Junot, ocorreu em Novembro de 1807. Os relatos
conhecidos reflectem casos ocorridos em Vila
Franca de Xira1, embora se possam encontrar breves
referências a Alverca, uma vez que esta, como as
povoações vizinhas, se encontrava no percurso
de passagem das tropas invasoras a caminho de
Lisboa, de onde a corte havia fugido poucos dias
1 Cf. Lino de Macedo, Antiguidades do Moderno Concelho de Vila Franca de Xira, [1893], Vila Franca de Xira, Museu Municipal de Vila Franca de Xira, 1992, p. 94; e João José Miguel Ferreira da Silva Amaral, Ofertas Históricas Relativas à Povoação de Vila Franca de Xira para Instrução dos Vindouros [1856], I vol., Vila Franca de Xira, Museu Municipal de Vila Franca de Xira, 1991.
antes. Tomando posse do reino, de imediato Junot
começou a expedir ordens. Entre Dezembro de
1807 e Fevereiro de 1808 foram emitidos diversos
decretos obrigando a população à entrega de ouro
e prata oriundos das Confrarias. Os concelhos de
Alhandra, Alverca, Arruda, Castanheira, Povos e
Vila Franca de Xira depositaram os seus tesouros
na sede da Comarca do Ribatejo – localizada na
Castanheira – os quais foram, depois, remetidos
para Lisboa. Segundo João Amaral, desta comarca
saíram 30 arrobas – o equivalente grosso modo a
459 quilogramas – de prata2.
Para além do referido, uma das primeiras acções
de Junot, em Dezembro de 1807, foi a tentativa de,
progressivamente, destruir o exército português,
começando por ordenar a entrega de armamento
das milícias aos capitães-mores que as deviam
conduzir ao arsenal de Lisboa, ordem cumprida de
forma lenta e inconclusiva3. Em Alverca existiam,
2 Cf. João José Miguel Ferreira da Silva Amaral, Op. Cit., pp. 144-145.3 Cf. Pires Nunes, “As Milícias e as Ordenanças em Portugal durante a Guerra Penin-sular”, Guerra Peninsular – Novas Interpretações – Actas do Congresso Realizado em 28 e 29 de Outubro de 2002, Lisboa, Instituto da Defesa nacional, Tribuna, Setembro 2005, p. 230.
ALVERCA NO DECORRER DAS INVASÕES FRANCESAS
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Fragmentos de Alverca
à época três Companhias de Ordenança, sendo a
primeira localizada na vila, a segunda no termo e
a terceira na aldeia de São Fernando a qual, pelo
que foi possível apurar, se tratava de um reguengo
sujeito a este antigo concelho4. As Companhias de
Ordenança eram responsáveis pelo policiamento
da povoação e, sobretudo, pelo recrutamento
militar, constituindo uma das esferas de poder do
concelho5. Desconhece-se até que ponto as ordens
de Junot foram ou não cumpridas, o certo é que no
Livro de Registo de Mancebos Capazes de entrarem
no Concurso das Sortes6, onde se registavam a
acções das companhias, sobretudo no respeitante
à recruta, pode observar-se um interregno dos
registos entre 1807/1808. De acordo com o tenente-
coronel Pires Nunes, as Companhias de Ordenança
constituíram a terceira linha defensiva do exército
português, tendo tido um papel meramente
patriótico e clandestino, numa primeira fase, que
posteriormente havia de ocupar uma posição mais
relevante, tendo integrado o exército português7.
Em 30 de Agosto de 1808, após as batalhas da
Roliça e do Vimeiro, é assinada a convenção de
Sintra obrigando à retirada das tropas invasoras.
Em Março de 1809 dava-se a segunda invasão, a
qual assombrou o norte do país, apesar do curto
período em que o exército francês permaneceu
dentro das nossas fronteiras, antes de ser expulso
a 17 de Maio.
Entretanto, certos que haveria de ocorrer uma
terceira invasão francesa, o exército luso-britânico,
sob o comando do general Wellington, dava início
à construção das três linhas defensivas, que viriam
a ser conhecidas como Linhas de Torres Vedras, as
quais visavam impedir o acesso do inimigo a Lisboa.
A povoação de Alverca ficava localizada entre as
duas primeiras linhas defensivas, a primeira tinha
início em Alhandra, a segunda, mais a sul, iniciava-
4 Cf. Anabela Ferreira, Op. Cit., 2007, p. 147.5 Cf, Idem, pp. 145-148.6 AHVFX, Livro de Registo de Mancebos Capazes de entrarem no Concurso das Sortes, de 8 de Dezembro de 1764 a 8 de Fevereiro de 1814, Concelho de Alverca, H/006.7 Cf. Pires Nunes, Op. Cit., p. 231.
se na Quintela, na actual freguesia do Forte da
Casa. Embora não existam dados concretos,
relacionados com Alverca, sabe-se que o esforço de
defender o território de uma nova invasão exigiu da
população sacrifícios extremos, que se traduziram
no envolvimento da construção das fortificações
e no abandono de casas e terras, uma vez que
parte da estratégia militar consistia na política
de terra queimada, com o objectivo de impedir o
reabastecimento das forças invasoras8.
No trabalho de construção das fortalezas,
redutos e estradas militares estavam envolvidas
mulheres, velhos e crianças, sendo que a maior
parte dos homens válidos foram alistados nas
companhias de ordenança e reencaminhados
para os vários regimentos do exército9, embora 8 A.H. Norris, R.W. Bremner, As Linhas de Torres Vedras – As três primeiras linhas e as fortificações a Sul do Tejo, Torres Vedras, Câmara Municipal de Torres Vedras/Museu Municipal Leonel Trindade/British Historical Societ� de Portugal, 2001, p. 16 e 39.9 Cf. A.H. Norris, R.W. Bremner, As Linhas de Torres Vedras – As três primeiras linhas e
Reduto do Chão da Oliveira AF
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Fragmentos de Alverca
o já referido Livro das Sortes, do antigo Concelho
de Alverca, revelar que, entre 1809 e 1812, não
foram efectuados registos de qualquer actividade
por parte das companhias de ordenança. Contudo
tal facto pode não significar inactividade mas, pelo
contrário, um período de intenso envolvimento
não só na construção das fortificações defensivas
como também nas campanhas militares de um
modo geral. De facto num memorando do general
Wellington, datado de 6 Outubro de 1810, este dá
conta de que as tropas luso-britânicas, na região,
foram reunidas em seis distritos, sendo que o quarto
ia “[…] do Tejo, junto a Alverca, pelo caminho de
Bucelas inclusive [...]”10 com quartel-general nessa
segunda povoação, sendo composto por cinco
mil homens, dos quais quinhentos provinham das
ordenanças11. Faz todo o sentido que, entre esses
homens, estivessem o sargento-mor e mais oficiais
das companhias de ordenança de Alverca, embora
até ao momento não tenha sido possível confirmar
esse dado.
De concreto existe o conhecimento de que a antiga
Casa da Câmara terá sido arruinada neste período,
pois diversos documentos apontam esse facto.
Logo no início das Audiências de Capítulo ocorridas
em 1812, o escrivão dava conta que o corregedor, e
oficiais da Câmara, se haviam reunido numa casa,
onde o primeiro estava hospedado, “[...] por se
achar arruinadas as casas da Camera [...].”12 Mais há
frente, tendo sido questionados sobre a segurança
da cadeia, os oficiais “Responderaõ estar muito
a Ruinada [sic] por cauza das Tropas.”13 O texto,
parece sugerir a utilização da Casa da Câmara
como aquartelamento de tropas aliadas. Por um
lado porque, de modo algum é referida a presença
do “inimigo”, como geralmente são referenciadas
as tropas invasoras francesas nos textos coevos,
as fortificações a Sul do Tejo, Torres Vedras, Câmara Municipal de Torres Vedras/Museu Municipal Leonel Trindade/British Historical Societ� de Portugal, 2001, p. 16 e 39.10 Lieut Colonel Gurwood, Lieut Colonel Gurwood, The despatches of Field Marshal the Duke of Wellington, K. G. – During his various campains in India, Denmark, Portugal, Spain, the Low Countries, and France, from 1799 to 1818, vol. VI, London, John Murra� – Albemarle Street, 1836, p. 462.11 Cf. Idem, pp. 462-463.12 AHVFX, AHVFX, Livro de Registo das Audiências de Capítulos que os Corregedores das Comar-cas Fizeram na Vila de Alverca, 1810-1832, Concelho de Alverca, J/A 001.1, fl. 4.13 Idem, fl. 4v.
por outro lado há referências que permitem supor
a existência de um posto de aquartelamento em
Alverca. Um despacho de 11 de Outubro de 1810
refere o envio de duzentos voluntários da artilharia
de Bucelas para Alverca14.
Também numa obra de memórias da Guerra
Peninsular, editada por W. H. Maxwell em 1845,
existem indicações que, em 1813, um contingente
de tropas aliadas, estava estacionado em Alverca15.
Deste modo, embora as informações a esse respeito
sejam escassas, e não seja feita referência à casa da
Câmara, se de facto as tropas estavam aquarteladas
na localidade, aquele edifício podia ter sido utilizado
para as albergar. A verdade é que, de acordo com a
análise de outras fontes, se sabe que pelo menos
desde Janeiro de 1811 a Maio de 1816, devido à
ruína do edifício, não foi possível realizarem-se as
funções habituais na Casa da Câmara16.
14 Lieut Colonel Gurwood, Lieut Colonel Gurwood, Op. Cit., p. 487.15 Cf. W. H. Maxwell (ed.), Peninsular Sketches by Actors on the Scene, Volume II, East Sussex, The Naval & Militar� Press, Lda., 2002, p. 369. Esta obra teve a sua primeira edição em 1845.16 Cf. Anabela Ferreira, Op. Cit, 2007, p. 93.
Forte dos Sinais, AF
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Fragmentos de Alverca
Deste conturbado período da História nacional e
local permaneceram, até aos nossos dias, alguns
vestígios das fortificações que constituiriam
as linhas defensivas que impediram o general
Massena de chegar a Lisboa, no decorrer da
terceira invasão francesa, contribuindo para a
definitiva derrota das tropas de Napoleão. Estes
baluartes militares, constituem elementos do
nosso património, embora muitos já tenham sido
destruídos pelo tempo e pela incúria do Homem.
Dentro dos limites do antigo Concelho de Alverca
nos montes a nordeste da Calhandriz e de A-dos-
Melros, foram construídos: o Reduto Subida da
Serra, a Baterias dos Melros, ambos actualmente
destruídos, o Reduto do Chão da Oliveira, o Reduto
das Sarnadas, o Forte do Moinho Branco (conhecido
como “dos Sinais”) e o Reduto do Casal da Entrega
dos quais restam ainda vestígios, sendo possível a
sua conservação.
De modo a prover o inventário e consequente
classificação destes elementos patrimoniais
foi criada, há alguns anos, uma plataforma
intermunicipal, envolvendo os concelhos de
Arruda dos Vinhos, Loures, Mafra, Sobral de
Monte Agraço, Torres Vedras e Vila Franca de Xira.
Da acção conjunta destes concelhos, para além do
esforço dispendido na sensibilização e divulgação
deste património, alguns dos fortes estão em
vias de classificação e, no momento, procura
promover-se a classificação dos vestígios da linha
defensiva como um todo, de modo a garantir uma
protecção mais efectiva.
Em Alverca continua a promover-se a investigação,
de modo a permitir um conhecimento mais amplo
da nossa História e do nosso Património. Deste
modo foi possível reunir os dados agora expostos,
os quais permitem perceber a relação da localidade
e das suas gentes durante o período das Invasões
Francesas, revelando que a população do antigo
Concelho de Alverca fez parte do grupo de heróis
anónimos, que sacrificaram as suas casas e as suas
terras, dedicando-se à defesa do país. Embora
os seus nomes sejam desconhecidos, as suas
acções ainda hoje podem ser recordadas quando
se avistam, no cume dos montes, o que resta das
fortificações que ajudaram a construir.
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Fragmentos de Alverca
A TOPONÍMIA
O primitivo núcleo habitacional de Alverca localiza-
se numa das áreas mais elevadas da povoação.
O traçado sinuoso das ruas estreitas, calçadas
com paralelepípedos de calcário ou basalto1, os
topónimos, o tipo de construção, são memórias
da antiga vila. Tanto quanto é possível observar no
local, o povoado primitivo incluía as actuais Rua
do Castelo (Este-Norte), Largo Gregório Nunes
(Oeste), Calçada do Terreirinho (Sul), Rua do
Açougue Velho, Rua do Outeiro, as Travessas do
Traquite e da Cumeira. Fora da muralha ficavam
as actuais ruas João Mantas, Dr. Miguel Bombarda
e Boca Lara. Esta toponímia está intimamente
relacionada com as vivências e com o património
do antigo Concelho de Alverca, por essa razão o
seu conhecimento contribui para a valorização e
preservação do núcleo histórico.
1 Provavelmente originários da região. A área localizada a noroeste do concelho é de composição maioritariamente calcária, embora numa área próxima de Alverca – Pe-dreira da Moita Ladra – o terreno seja constituído por basalto.
Iniciemos a visita ao Núcleo Histórico subindo a
Escadinha do Adro a qual desemboca no adro
da Igreja Matriz. No sentido Norte encontra-se a
Rua do Castelo. No cimo dessa rua encontra-se
a travessa com mesmo nome, ao fundo da qual
aparece um portão de ferro, que dá acesso a uma
área com pequenas hortas, onde se localizam as
ruínas do castelo medieval, origem do topónimo.
CONHECER O NÚCLEO HISTÓRICO DE ALVERCA
Travessa do Castelo AF
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Fragmentos de Alverca
Toda a área da colina é conhecida como Colina
do Castelo. Da rua do Castelo pode seguir-se pela
Ladeira das Pias, que desce no sentido Oeste,
cujo nome tem origem nos lavadouros públicos
construídos ao fundo da ladeira, nos anos 50 do
século XX.
Em vez da Ladeira das Pias, pode antes optar-se por
seguir pela Rua da Cumeira, assim denominada
por ser a que se encontra mais acima na antiga
povoação. Esta rua é mencionada nos Tombos de
Alverca das Capelas de D. Afonso IV, em documentos
do último quartel do século XVI2.
Nas memórias paroquiais manuscritas em 1758 pelo
Padre Manuel Henriques lê-se “Dentro na villa havia
huma Irmida de Santo António Portuguez chamado
por antornomazia [sic] da Come�ra, por estar no
alto da villa com o mesmo nome inter muros da
quinta de Donna Josepha Caetana Barbosa de
Mello […]”3. Desta ermida só resta a memória, pois
foi derrubada pelo terramoto de 1755.
Um pouco mais abaixo encontramos o largo do
Açougue Velho, o qual desemboca na rua com o
mesmo topónimo. Os açougues eram estruturas
camarárias, controladas pela Câmara, ali se abatia
o gado e se comercializava a carne.
Segue-se, no sentido Sul, a Rua do Outeiro,
passando por cima do Largo Gregório Nunes. Nela
se destacam alguns edifícios bastante arruinados,
a necessitar de intervenção urgente, para além
do edifício onde actualmente funciona a sede da
União Columbófila de Alverca, fundada em 1947. O
largo, com escadaria, surge um pouco mais acima
a Sudoeste. Este topónimo era já conhecido no
século XVI, sendo diversas vezes referenciado nos,
já referidos, Tombos das Capelas4. Também num
dos livros de lançamento da décima, datado de 1762
2 Cf. Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT), Núcleo Antigo, Tombo de Alverca, Livro XXIV, Parte I, Cx. 270, fl. 231.3 ANTT, Memórias Paroquiais, Dicionário Geográfico, volume 3, memoria 43, pp. 329-342.4 Cf. ANTT, Núcleo Antigo, Tombo de Alverca, Livro XXIV, Parte I, Cx. 270, fls. 40, 47, 88 e 89.
surge referência a esta rua. A análise do documento
permite perceber que grande parte dos moradores,
ali registados, eram marítimos e pagavam décima
pela habitação e pela bateira5.
Um pouco mais adiante encontra-se a Travessa do
Traquite, da qual até ao momento não foi possível
averiguar a origem do topónimo. Já a calçada e o
largo do Terreirinho, um pouco mais em baixo,
têm o topónimo justificado pelo pequeno terreiro
ali localizado.
No Largo Gregório Nunes encontramos, numa
plataforma plana, um antigo fontanário, há muito
desactivado. De acordo com o Sr. Arnaldo Barros,
foi o primeiro fontanário com água canalizada da
povoação6. No século XIX o largo tinha o topónimo
de Pelourinho Velho7. Aqui terão estado localizados
os primitivos Paço do Concelho de Alverca.
Relativamente a Gregório Nunes (1786-1835/40),
era natural do Lugar do Moinho de Vento, em
Alverca, a tradição local recorda-o como herói da
Guerra Peninsular8.
5 Arquivo Histórico do Tribunal de Contas, V.ª de Alverca Prédios Maneyos, Juros do 4º Qtel de 1762 e anno de 1763, Décima da Estremadura, Mç. 358, n.º 10, fls. 23-26.6 Em entrevista efectuada em 2005.7 MMNA, Testamento de Fortunata Augusta de Sousa, 1867/1868, doc. 2, fl 4v.8 Cf. José do Carmo Pacheco, Monografia de Alverca, Alverca, Junta de Freguesia de Alverca, 1998, p. 98.
Largo do Outeiro AF
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Fragmentos de Alverca
Em baixo, no sentido Sul, localiza-se Rua da Boca
Lara. A origem do topónimo é, até ao momento,
desconhecida. Em tempos formava com a rua
Miguel Bombarda uma única artéria. A Oeste surge
a Rua do Moinho, numa zona onde o casario antigo
começa a desaparecer. A rua íngreme vai dar a um
aglomerado habitacional moderno. Do moinho só
resta o topónimo.
A Rua Miguel Bombarda foi, durante séculos, a
principal artéria de Alverca. A Estrada Real de D.
Maria I passava por ali. Aí se encontravam as casas
nobres, como o actual edifício da Junta de Freguesia,
os estabelecimentos comerciais, e a Misericórdia.
Nessa rua nos números 39 e 40 funciona a mercearia
tradicional do Sr. Luís Cipriano, proprietário desde
19669, a qual mantém os traços característicos
das mercearias dos anos 50/60, constituindo um
testemunho do comércio tradicional, já a rarear
neste país. Miguel Augusto Bombarda (1851-
1910), foi médico, escritor e político. Fundador da
Liga Nacional contra a Tuberculose. Republicano
empenhado, foi assassinado pouco antes da
revolução10.
À direita do edifício da Junta de Freguesia encontra-
se a Travessa do Guerreiro. É possível que este
topónimo esteja ligado a uma antiga família de
Alverca cujos membros, provavelmente com
residência na travessa, se ocuparam por diversas
vezes de importantes cargos da antiga Câmara.
Destacam-se Luís Guerreiro, que foi administrador
do Concelho de Alverca em 1836 11 e presidente em
185012, e Manuel Guerreiro que, em 1842, D. Maria I
nomeava “[...] Attendendo ao que me representou
[…], e aos serviços que prestara a favor da cauza
da Liberdade: Houve por bem fazer-lhe Mercê do
Officio d’escrivaõ, e tabelliaõ do Juizo Ordinário
9 Cf. Inocêncio Casquinha; Mariana R. Ortigão, “Lojas Tradicionais”, O Comércio em Vila Franca de Xira, catálogo, Museu Municipal de Vila Franca de Xira, Junho 1995, p.13310 Cf. Joel Serrão (Dir.), Dicionário de História de Portugal, Vol. I, Porto, Livraria Figuei-rinhas, s/d, p. 356.11 AHVFX, AHVFX, Livro de entráda e Sahida de Dinheiro do Coffre da Recibedoria dos rendimen-tos pertencentes às Reaes Cappelas do Senhor Rei D. Aff.º 4º, 1839, Concelho de Alverca, E/A.003, fl 1v12 AHVFX, Correspondência recebida das CM para a Administração do Concelho, 20 AHVFX, Correspondência recebida das CM para a Administração do Concelho, 20 Dezembro 1851, Concelho de Alverca, C/A 003.
[...]”13. Em 1855, ano da extinção do Concelho de
Alverca, o mesmo Manuel Guerreiro detinha o cargo
de vereador.A última rua ligada ao núcleo histórico
tem, actualmente o topónimo de João Mantas.
Na praça, conhecida no século XIX como Praça do
Pelourinho14, localiza-se o próprio pelourinho e a
antiga Casa da Câmara de Alverca, actualmente
dependências do Núcleo de Alverca do Museu
Municipal de Vila Franca de Xira. Na rua, podem
ver-se a Casa de São Pedro, actualmente um lar de
terceira idade, para além de alguns outros edifícios
do século XVIII. João Mantas terá sido natural de
Alverca, viveu aparentemente no século XIX, seria
proprietário da Quinta do Galvão e da Casa de São
Pedro15.
PATRIMÓNIO EDIFICADO
Após se ter caracterizado o Núcleo Histórico de
Alverca no que respeita à toponímia do lugar e
se haver referido que, parte dessa toponímia, se
encontra relacionada com o património existente,
vai procurar, agora, caracterizar-se esse mesmo
património, começando pelo elemento que se julga
ser o mais antigo na povoação:
Castelo
O castelo de Alverca encontra-se a Noroeste do
aglomerado urbano. Dele restam duas paredes e
uma lenda, pouco se conhece da sua origem. Há
quem afirme poder tratar-se de uma construção
ainda do período islâmico, embora só uma
intervenção arqueológica o possa confirmar. A
referência, mais antiga, encontrada até à data,
encontra-se na carta de D. Pedro I de confirmação
do Concelho de Alverca, emitida em 24 de
Agosto de 1357, onde se lê que “[…] o dito Senhor
confirmou e outorgou ao castelo e homens bons
de Alverca todos os seus privilégios […]”16. Outra
fonte importante, para o conhecimento do
13 ANTT, ANTT, Registo Geral de Mercês de D. Maria I, Livro 18, fl. 154.14 Cf. Conservatória do Registo Predial de Vila Franca de Xira – 2ª Repartição – Alverca, Descrição Predial n.º 2:175, fl. 59.15 Cf. José do Carmo Pacheco, Op. Cit., p. 99.16 Chancelaria de D. Pedro I – Comuns, Livro 1, fl. 11 v.
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Fragmentos de Alverca
castelo, encontra-se nos Tombos de Alverca das
Capelas de D. Afonso IV, em documento datado
de 20 Março 1588, lê-se: “[...] este castelo esta no
alto da Vila por sima da igreja [...] tem de comprido
pola banda do sul simquoenta e huã varas de canto
ha canto da qual banda temos serventias e janelas
principaes que caem sobre ho adro [...].”17 Durante
o tempo em que se realizou o Tombo das Capelas
de D. Afonso IV, serviu de pousada ao Juiz dessa
instituição18.
O alcaide do castelo de Alverca era o provedor das
mesmas Capelas de D. Afonso IV, como guardião
do castelo era responsável pela sua segurança e
manutenção. José do Carmo Pacheco recorda: “No
princípio deste século [na zona envolvente entre
o Castelo e a Igreja] ainda eram visíveis ruínas de
muros desmoronados, a que os antigos chamavam
“Praça de Armas do Castelo”.19 Alguns autores
afirmam que a decadência e ruína do castelo se deve
em muito à acção do Terramoto de 1755. Contudo
as Memórias Paroquiais não lhe fazem referência, o
que pode não ser prova de coisa alguma, visto que
nesse documento também não refere a ruína da
Casa da Câmara, nesse mesmo período. É possível
que, à época, o castelo já estivesse em decadência e
o terramoto tenha contribuído para a sua derrocada.
De qualquer modo num documento com referência
às propriedades ainda pertença das Capelas de D.
Afonso IV, datado de 1860, faz-se menção ao estado
de ruína em que se achava o castelo e à necessidade
de se providenciar a reedificação de casas que ali se
encontravam20.
Encostado às paredes da muralha foi construído
um conjunto de edifícios. Entre esses edifícios,
voltado para a Rua do Castelo, no nº 3, ficava um
dos lagares de azeite de Alverca. O azeite foi uma
das produções mais rentáveis da povoação e uma
17 ANTT, ANTT, Tombo de Alverca, Livro XXIV, Parte I, NA 270, fl. 663v18 Cf. Idem., fl. 385.19 José do Carmo Pacheco, José do Carmo Pacheco, Monografia de Alverca, Alverca, Junta de Freguesia de Al-verca, 1998, p. 108.20 Cf. AHVFX, Auto para avaliaçaõ de varias propriedades pertencentes às Capellas do Senhor Rei D. Affonso 4º …, 1860, Administração do Concelhor de Vila Franca de Xira, D.001.1.
das actividades referidas nas Memórias Paroquiais,
juntamente com a produção de sal, de árvores de
fruto e cereais.
Açougue Velho
Em frente ao antigo lagar ergue-se o templo
religioso da “Igreja de Jesus Cristo dos Santos
dos Últimos Dias”. Para possibilitar a construção
do templo foi demolido – em 1986 – um
conjunto de casas. Tratando-se de um conjunto
localizado no centro histórico, foi realizada uma
intervenção arqueológica de emergência, sob
a responsabilidade do arqueólogo Rui Parreira.
Segundo palavras suas, desse conjunto de edifícios
“[…] fazia parte precisamente o antigo açougue
da vila, onde António Coelho Gasco (v. ed. 1924)
localizava um miliário romano, provavelmente da
via Scalabis-Olisipo.”21 Embora fisicamente nada
reste do açougue velho, este faz parte da história
da localidade. Os açougues eram estruturas
ligadas à Câmara Municipal e situavam-se na sua
proximidade22. À Câmara competia gerir a matança
do gado e posterior venda e distribuição de carne.
A identificação do açougue velho, mencionado
nos Tombos das Capelas de D. Afonso IV23, vem
apoiar o facto dos primeiros Paços do Concelho
21 Rui Parreira, “Intervenção Arqueológica no Centro Histórico de Alverca do Ribatejo, Rui Parreira, “Intervenção Arqueológica no Centro Histórico de Alverca do Ribatejo, 1986 – Relatório sucinto dos trabalhos realizados.”, Boletim Cultural 3, Vila Franca de Xira, Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, 1987/8, p. 91. 22 Cf. Carlos Caetano No rasto de um monumento perdido do património do Faial: a antiga Casa da Câmara da Horta, texto policopiado, 2004, p. 12.23 Cf. ANTT, Núcleo Antigo, Tombo de Alverca, Livro XXIV, Parte I, Cx. 270, fl. 248v.
Ruínas do Castelo, AF.
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Fragmentos de Alverca
se encontrarem nas proximidades, um pouco
mais abaixo a Este, no antigo Largo do Pelourinho
Velho. A palavra Açougue caiu em desuso na língua
Portuguesa – como tantas outras – embora seja
utilizada no norte do país, no Brasil e noutros países
onde o português é lingua oficial.
Apesar de se ter conhecimento da data de demolição
do açougue, pouco se sabe relativamente ao período
de actividade, embora seja possível ter funcionado
no mesmo local pelo menos desde o século XVI,
tendo em conta um documento presente no Tombo
de Alverca, datado de 1586, referente à medição de
umas casas que “[...] estaõ nazinhagna Q uai da rua
Q uem do asougue para o ribeiro a qual azinhagna
deçe para a rua direita [...]”24 A rua direita, actual
Miguel Bombarda, é paralela à rua do Açougue
Velho, pelo que a descrição do Tombo das Capelas,
parece localizar o açougue existente no século
XVI no local conhecido, ainda hoje como Largo do
Açougue Velho.
As instalações do novo açougue foram licenciadas
em 188025 e construídas na actual Rua Miguel
Bombarda, em frente ao edifício onde funciona a
Junta de Freguesia. Em 1926 o espaço funcionava
como “arrecadação” da Câmara Municipal e foi
depois ocupado pela corporação dos Bombeiros
Voluntários de Alverca26. Actualmente serve de
apoio à Junta de Freguesia.
Igreja de São Pedro
A Igreja Matriz de Alverca tem como padroeiro o
Apóstolo São Pedro. Ignora-se a data da construção
primitiva, embora vários factores apontem para
a Idade Média27. Seja como for, três dias após a
batalha da Alfarrobeira, a 23 de Maio de 1449, o
corpo do Infante D. Pedro terá sido sepultado,
temporariamente, na Igreja de Alverca28.
24 ANTT, ANTT, Núcleo Antigo, Tombos de Alverca, Livro XXIV, Parte I, Cx. 270, fls. 248v. 25 Cf. AHVFX, Instalações da Câmara do Extinto Concelho de Alverca, CMVFX, M/A.001. 26 Cf. José do Carmo Pacheco, Op. Cit. p. 16927 Cf. Alfredo Marujo, Paróquia de S. Pedro de Alverca – Elementos para a sua História, Alverca, Paróquia de S. Pedro de Alverca, 1999, p. 21.28 Cf. Alberto Pimentel, Portugal Pittoresco e Illustrado – A Extremadura Portugueza – Primeira Parte – O Ribatejo, Lisboa, Empreza da Historia de Portugal, 1908, p. 147
Esta é, ao momento, a data mais antiga alusiva
à Igreja. Por cima da porta está inscrita a data de
1687, de uma das muitas reconstruções do templo.
Segundo as Memórias Paroquiais foi bastante
danificada pelo terramoto de 175529.
Actualmente, na Igreja, são visíveis elementos
arquitectónicos que marcam várias épocas.
Do século XVII temos, por exemplo, o portal
seiscentista; a pia baptismal; três pias de água
benta em mármore rosa; as duas telas, de autor
desconhecido, que ladeiam a capela-mor. Do século
XVIII, para além de outros elementos, encontramos,
os azulejos de albarradas e figurativos – alusivos à
vida de São Pedro e, na sacristia, pode ver-se um
lavabo em pedra mármore com embutidos30.
No largo da igreja realizam-se todos os anos
em Junho as festas de São Pedro. Numa lápide
originalmente colocada por baixo de uma janela
brasonada, do palácio da quinta do Galvão, hoje
desaparecido, a inscrição revela que D. Pedro II
e seus filhos estavam em Alverca por ocasião
das festas, em Julho de 1699. Na primeira metade
29 ANTT, ANTT, Memórias Paroquiais – Dicionário Geográfico de Portugal, volume 3, memória 43 [Alverca], fl. 331.30 Cf. Alfredo Marujo, Op. Cit., pp. 21-27, para uma descrição em pormenor da Igreja de São Pedro.
Igreja de São Pedro, AF.
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Fragmentos de Alverca
do século XIX, entre 23 e 25 de Junho de 184031 e de
novo de 23 a 26 de Junho de 184232 D. Maria II e D.
Fernando visitaram Alverca, coincidindo estas datas
com os festejos dedicados ao santo padroeiro.
Estas festas marcavam uma data de extrema
importância, envolvendo toda a comunidade de
Alverca e para a qual contribuíam, os diversos
poderes locais. No núcleo de Alverca do Museu
Municipal existe uma fotografia destas festas,
datada do início do século XX, onde se pode
observar a afluência de pessoas no adro da Igreja
e o coreto, construído para a ocasião. Actualmente
nesse mesmo adro existe um coreto fixo, edificado
em 1926 para a banda da Sociedade Filarmónica
de Recreio Alverquense, uma das mais antigas do
concelho de Vila Franca de Xira.
Misericórdia
Embora se vá abordar a história da Misericórdia
de Alverca, no próximo capítulo, por se tratar de
um elemento patrimonial integrado no Núcleo
Histórico, é necessário fazer-se-lhe referência,
embora breve. Como se verá em 8 de Setembro de
1583 foi lançada a primeira pedra para a edificação
da Misericórdia de Alverca. Na porta da Igreja,
encontra-se a data de 1597, pelo que se depreende
terem sido necessários mais de dez anos para
a construção de todo o complexo que incluía a
Igreja, um albergue para receber os peregrinos e
hospital.
AS CASAS POPULARES E REMINISCêNCIAS DE UMA ARQUITECTURA CAMARáRIA
Para além do património edificado de cariz
religioso ou camarário, é possível verificar-se no
Núcleo Histórico, um conjunto de casas populares,
construídas em diversas épocas, as quais constituem
31 Cf. AHVFX, Livro de Contas do Concelho nos annos de 1839 e 1840, Livros de Registo Diários de Receitas e Despesas, 1811/1849, Concelho de Alverca, E/A 039.3, fl. 64. 32 Cf. AHVFX, Livro de Contas do Concelho desde 1º de Janeiro de 1841 ate áo ultimo de Junho de 1842, Livros de Registo Diários de Receitas e Despesas, 1811/1849, Concelho de Alverca, E/A 039.3.
o mais antigo aglomerado da povoação de Alverca,
razão pela qual a sua abordagem é importante.
Por todo o país as casas eram construídas de acordo
com o clima, com a rocha e outras matérias-primas
próprias da região. O aglomerado populacional era
disperso ou denso, condicionado pela história e pela
geografia. Rocha Peixoto afirma que “A habitação
entre nós é “[…] uma consequência da adaptação
às várias circunstâncias naturais e sociais que a
condicionam […].”33 Assim se criaram tipologias
diferentes, sendo possível identificar padrões de
construção que caracterizam determinadas regiões
do país. Outras, no entanto, apresentam-se com
características indefinidas.
Na “vasta zona que se estende para o Sul e Norte do
Tejo, a casa ora se aproxima da alentejana, ora ganha
feição regional mais definida.”34As construções
populares em Alverca, não possuindo uma
arquitectura marcante ou inerente a uma tipologia
específica, enquadram-se, maioritariamente,
no tipo de casas da Estremadura e do Alentejo.
Constituindo um testemunho da nossa história e
património, torna-se importante caracterizá-las
dado o seu valor intrínseco.
33 Rocha Peixoto, Rocha Peixoto, Etnografia Portuguesa, Lisboa, Publicações D. Quixote, Fevereiro 1990, p. 160.34 Ernesto Veiga de Oliveira e Fernando Galhano, Ernesto Veiga de Oliveira e Fernando Galhano, Arquitectura Tradicional Portuguesa, Publicações D. Quixote, Fevereiro 2003, p. 177.
Edifício nº 5 do Largo do Terreirinho AF
| 39 |
Fragmentos de Alverca
Na sua maior parte as casas que se podem encontrar
no Núcleo Histórico de Alverca, apresentam
planta rectangular simples com piso térreo e eram
destinadas exclusivamente para habitação, como
são exemplos algumas casas localizadas na Rua da
Cumeira e do Outeiro. Existem também casas com
dois pisos, em que a habitação se situava no piso
superior e o comércio no piso térreo. Outras ainda,
possuindo igualmente dois pisos, eram propriedade
de famílias mais abastadas. Tanto as casas com
funções comerciais como as de habitação burguesa
podem ser encontradas na Rua Miguel Bombarda e
no Largo Gregório Nunes.
Alguns registos permitem localizar, temporal-
mente, a origem destas construções no século
XIX, princípios do XX, sendo contudo possível
encontrar-se alguns exemplos de construção
anteriores. O edifício nº5 da Calçada do Terreirinho
apresenta na fachada, ao nível do primeiro andar
um painel de azulejos, com a imagem de N. Sr.ª da
Conceição, datado do século XVII. Embora tenha
sido ampliado em época posterior, parte daquele
edifício terá resistido ao Terramoto de 1755. Podem
também encontrar-se edifícios datados do século
XVIII, como são exemplos o edifício actualmente
ocupado pela Junta de Freguesia e o número 35-37
da Rua Miguel Bombarda.
Algumas das casas mais antigas, devido ao
estado de degradação em que se encontram,
servem de testemunhos relativamente ao tipo
de materiais utilizados na construção As paredes
exteriores eram construídas em alvenaria, com
utilização de rocha calcária, abundante na
região. A pedra utilizada não era trabalhada,
apresentando tamanhos diversos e disposição
irregular. Por vezes misturavam-se fragmentos
de cerâmica, sobretudo de telha, embora tenham
sido identificados fragmentos de panças e asas de
pote, para além de tijolo compacto – vulgarmente
conhecido como tijolo de burro – de forma dispersa.
Estes vestígios indiciam a reutilização de pedra,
e outros materiais, aproveitados de construções
arruinadas.
A argamassa, utilizada na junção da pedra e no
reboco final, era constituída por partes de areia,
cal e água. A cal era também usada para caiar as
paredes, o que se fazia com regularidade, não só
por motivos estéticos, mas também porque este
material protege a casa da luz e do calor35. Os fornos
de cal eram abundantes na região36, sendo assim
um material bastante acessível. À semelhança das
casas alentejanas, em algumas eram pintadas uma
barra amarela ou azul no rodapé e nos cunhais.
As janelas e portas em madeira têm moldura em
cantaria. As varandas, das casas mais nobres, exibem
gradeamento de ferro forjado. Os telhados, de duas
a quatro águas, eram construídos com aplicação de
telha de canudo (também denominada portuguesa
ou meia-cana). No Adarce, junto ao moinho de
maré, num lugar conhecido por Charneca do Telhal
existia “[…] um prédio urbano e rústico composto
de um telhal para fabricar telhal […]”37material que,
eventualmente se utilizavam na construção das
habitações da região.
Em alguns dos telhados ainda se podem observar
chaminés tradicionais da Estremadura38 de
forma rectangular, terminando em três ou
quatro triângulos, dispostos verticalmente, umas
vezes abertos, outras fechados com argamassa.
Curiosamente, algumas casas foram construídas
utilizando como base a própria rocha, como se
pode encontrar numa das casas da Rua do Outeiro,
em que se percebe, ao longo da base da fachada
Norte, uma extensa rocha calcária onde, inclusive,
são visíveis inúmeros elementos fósseis de espécies
bivalves marinhas.
35 Cf. Ernesto Veiga de Oliveira e Fernando Galhano, Arquitectura Tradicional Portugue-sa, Lisboa, Publicações D. Quixote, 2003, pp. 151-152.36 Cf. Alberto Pimentel, Portugal Pittoresco e Illustrado – II – A Extremadura Portu-gueza – Primeira Parte – O Ribatejo, Lisboa, Sociedade Editora Empreza da Historia de Portugal, 1908, p. 146.37 Ministério da Marinha, Ministério da Marinha, Comissão do Domínio Público Marítimo, Processo nº 3554/77, parecer nº 4435, p. 538 Cf. J. Leite de Vasconcelos, Etnografia Portuguesa – Tentame de sistematização, Vol. VI, Lisboa, Imprensa Nacional da Casa da Moeda, s/d, p. 231.
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Fragmentos de Alverca
De acordo com Francisco Silva “A arquitectura
urbana […] diferencia-se [da construção rural] no
tratamento das fachadas, que assumem a função
de virar o edifício para o exterior, através de janelas
e varandins de ferro debruçados para a rua […]”39 o
que pode ser encontrado, sobretudo, nas habitações
da Rua Miguel Bombarda, possivelmente devido ao
facto daquela ter sido a principal artéria do antigo
concelho de Alverca.
Algumas casas merecem destaque por
apresentarem pormenores que as distinguem das
restantes. É o caso do n.º 5/5A da rua da Boca Lara,
a qual sobressai pela existência de um pórtico, no
qual existem duas portas de acesso a um pátio
interior e a uma casa modesta. O pórtico é caiado,
apresentando uma barra em rodapé, ombreiras das
portas e friso pintados de cinzento. No edifício nº
7 do largo Gregório Nunes, pode observar-se que o
telhado é rematado em cauda de andorinha, aspecto
comum a muitas casas da Estremadura. Na rua
Miguel Bombarda podem ver-se em alguns edifícios
a nível do piso térreo um revestimento exterior a
imitar blocos de pedra, pintados de cinzento com
39 Francisco Silva “A Importância da Arquitectura Vernacular na Preservação do Pa- Francisco Silva “A Importância da Arquitectura Vernacular na Preservação do Pa-trimónio” Memórias de Pedra e Cal, catálogo da exposição, Vila Franca de Xira, Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, Junho 2001, p. 143.
Chaminé estremenha, Largo do Outeiro, AF
recortes pintados a negro, a lembrar casas beirãs.
Note-se ainda a existência de trapeira na fachada
norte do edifício nº 3 da rua do Açougue Velho.
Destaque ainda para a mercearia localizada
nos números 39-41, na rua Miguel Bombarda,
propriedade de Luís Cipriano Carvalho, um dos
últimos testemunhos do comércio tradicional em
Alverca, a qual mantém os armários de madeira,
pintados de verde, o balcão em pedra e toda
a restante estrutura da mercearia construída
no século XIX. Este tipo de mercearias está em
extinção, sobretudo devido ao facto de dificilmente
poderem competir com os grandes hipermercados.
Lamentavelmente tendem a desaparecer. Esta é
um exemplo de um património sobre o qual há que
tomar medidas para a sua preservação.
Um outro aspecto a salientar no Núcleo Histórico é
a presença de vestígios da arquitectura concelhia,
reminiscências do concelho extinto em 1855. As ruas
calcetadas e as escadarias são testemunhos dessa
arquitectura. Nos livros de registos da Câmara de
Alverca podem encontrar-se referências ao arranjo
das ruas e de outras estruturas do concelho. Assim,
em 1829, “Despendeu-se de hum mandado para
concerto das Estradas interiores que se achavaõ
aruinadas a quantia de dois mil, e quinhentos
reis[...]”40 e em 1830 realizou-se “[…] o concerto da
Calçada que vai para a Igreja Matris [...].”41
As ruas estreitas, calcetadas com pedra basáltica
e calcária são, então, testemunhos do concelho
extinto, algo que deve ser preservado como parte
do património alverquense, assim como as casas
antigas do Núcleo Histórico, herança do nosso
passado que a todos compete defender.
40 AHVFX, AHVFX, Alverca – Receitas e Despesas do Concelho – Livro de Contas N.º 1, Concelho de Alverca, Livros de Registo Diários de Receitas e Despesas, 1811/1849, E/A 039.3, fl. 36.41 Idem, fl. 39.
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Fragmentos de Alverca
Nos anos 40 do século XX, Fernando Torres afirmava,
sobre as Misericórdias de Portugal, serem poucos os
estudos documentados e pormenorizados relativos
a esse assunto. “Impõe-se há muito o estudo
metódico de t�das elas. Sem isso é impossível
valorizá-las devidamente.”1 Ainda hoje, a grande
maioria desses estudos, estão por fazer. No actual
concelho de Vila Franca de Xira existem três
Misericórdias, cujo estudo necessita ser realizado
em profundidade: a Misericórdia de Vila Franca de
Xira, fundada em 15612; a Misericórdia de Alhandra
cuja fundação data de 15773; e a de Alverca, objecto
deste trabalho.
As Memórias Paroquiais, escritas pelo Padre Manuel
Henriques em 1758, é o único documento conhecido
onde se dá a saber a origem da Misericórdia de
Alverca de acordo com esta fonte “Pelo que se vê
dos seos Livros fundouçe esta caza no anno de mil
1 Fernando Correia, Estudos sôbre a História da Assistência – Origens e Formação das Misericórdias Portuguesas, Lisboa, Henriques Torres Editor, 19442 Cf. Lino de Macedo, Antiguidades do Moderno Concelho de Vila Franca de Xira [1856], Vila Franca de Xira, Museu Municipal de Vila Franca de Xira, 1992, p. 433 Cf. Pinho Leal, Portugal Antigo e Moderno, Vol. I, Lisboa, 1873, p. 131
quinhentos e oitenta e três e principal-mente do
livro com que está encadernado o Compromisso,
confirmado pelas suas reformaçõis pelos Re�s, que
governaraõ esta Monarchia”4.
O Compromisso aqui referido é, sem dúvida, o
Compromisso da Santa Casa da Misericórdia de
Lisboa.
O primeiro data de 1516, rapidamente adoptado
com modelo em todas as Misericórdias do país,
tendo sido alvo de várias reformas, a primeira
datada de 15775.
Voltando ao manuscrito das Memórias, e à fundação
da Misericórdia de Alverca, o autor transcreveu
o texto manuscrito, possivelmente anexo pela
irmandade ao volume do Compromisso, o qual
referia: “He de saber, que falecendo nesta Villa huma
Dona honrráda, que nella vivia natural da ilha da
Made�ra, por nome Sollana Te�xeira, cazada com
4 ANTT, Memórias Paroquiais – Dicionário Geográfico de Portugal, volume 3, memória 43 [Alverca], p. 333.5 Cf. André Ferrand de Almeida, «As Misericórdias», História de Portugal, Dir. José Mat-toso, 3º Vol., Circulo dos Leitores, Lisboa, Dezembro 1993, p. 189.
MISERICÓRDIA DE ALVERCA
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Fragmentos de Alverca
Vasco Martins não havia nunca nesta villa memoria
de se tratar se fazer caza da Mizericordia nem haver
pessoa que tal esperasse nem cuidasse, que tal
podia ser; ella fazendo seu tesstamentro [sic] disse
nelle por – huma Verba, que ella de�chava as suas
casas em que estavão os prezos para Mizericordia,
e dezo�to mil reis para huma Bande�ra, fazendosse
a obra em – dez annos; o que visto se entendeo
por inspiração do Espiritto Santo, e que era sua
vontade, que houvesse nesta Villa caza e Irmandade
da Santa Mizericordia, tomando os prezentes isto
por argumento, com este principio fundarão a Caza
da Mizericordia, não nas que a defunta para isso
deichou, mas em outras, que lhes déram por ellas,
mais acomodádas para additta obra, e se põz a
prime�ra pedra dia da Natividade de Nossa Senhora
do anno de mil quinhemtos e oitenta e tres, e dal�
em diante fo� em-crescimento como Deos quezera
que ja cadda vez mais.”6
Aqui termina a transcrição feita pelo Padre Manuel
Henriques. Dela salientamos o dia de lançamento
da primeira pedra da Misericórdia – 8 de Setembro
de 1583. Na porta principal da Igreja encontra-se
a data de 1597, tomada por alguns como sendo a
de término das obras de edificação da Igreja7. Para
além dos aspectos indicados no texto mais nada se
sabe sobre Solana Teixeira, ou sobre o seu marido,
o qual é possível ter sido natural de Alverca, onde
possuía algumas propriedades deixadas à sua viúva
e por ela legadas para a fundação da Misericórdia,
a qual foi construída voltada para a antiga Estrada
Real, actualmente conhecida como Rua Dr. Miguel
Bombarda, a mais importante artéria da antiga
povoação de Alverca.
Ainda com referência à Misericórdia, nas suas
Memórias o Padre Manuel Henriques descreve
a existência de “hum miracoloso Santuario de
sagradas Relíquias”8, o qual terá sido obra de um dos
6 ANTT, Memórias Paroquiais – Dicionário Geográfico de Portugal, volume 3, memória 43 [Alverca], pp. 333-334 7 Cf. José do Carmo Pacheco, Op. Cit. p. 1268 ANTT, Memórias Paroquiais – Dicionário Geográfico de Portugal, volume 3, memória 43 [Alverca], p. 334.
provedores da Misericórdia, Sebastião Barbosa de
Souza Pegado, natural e baptizado em Alverca, filho
de Paulo de Sousa Brandão, familiar do Santo Oficio,
que na primeira metade do século XVIII exercia o
cargo de sargento-mor de uma das Companhias de
ordenança de Alverca9.
O Santuário descrito pormenorizadamente, seria
de estimação da Irmandade, considerado como
prodigioso, saía em procissão “[...]em ocaziõis de
seccas rigurozas, ou de innundaçõis perjudiçiáis, e
sempre que se sahio com o santuario em proçissaõ a
de preccar chuva ou postullar serenidade se alcansou
do Ceo favoravelmente o que se-lhe pedio, de que há
testemunhas de vista dos tempos antigos, como se
esprimentou no anno de mil e sette centos e trinta e
sette, no qual sahindo a Irmandade da Mizericordia
com devotta, e decoroza proçiçaõ de preçes com
este Santuário, quando mais se careçia de chuva
logo ve�o muitto copioza como com individual
clareza […].”10
A referência às condicionantes ditadas pelo tempo
é curiosa, pois de facto Alverca encontrava-se numa
região frequentemente assolada por períodos de
seca e de enchentes, embora sejam mais frequentes
as notícias das cheias, talvez pela dimensão trágica a
elas associadas11. Uma carta do Prior Manoel Bento
Lopes, da vila de Alhandra, datada de 20 de Abril de
1889, é exemplo das acções religiosas, envolvendo
as Misericórdias, ocorridas por estas ocasiões. Nela
se pode ler que “As tempestuosas chuvas, que
continuam a prejudicar a agricultura a ponto de
nos proporcionarem a esterilidade na região, que
habitamos, levaram o nosso Em.mo e Ile.mo Prelado
a derigir a todos os parochos e fieis d’esta diocese
úma carta […] ordenando preces publicas, em todas
as egrejas conventuaes e procissoês de penitencia
nas terras onde seja possivel fazerem-se […]”12
9 Cf. ANTT, Habilitações da Ordem de Cristo, Letra J, Mç. 30, Doc. 5.10 ANTT, ANTT, Memórias Paroquiais – Dicionário Geográfico de Portugal, volume 3, memória 43 [Alverca], pp. 334-335. 11 Sobre as cheias no Tejo Sobre as cheias no Tejo Cf. José do Carmo Pacheco, Op. Cit., pp. 198-19912 AHVFX, AHVFX, Oficio do Prior Manoel Bento Lopes ao provedor da Misericórdia de Alhandra, 20 de Abril de 1889, fundo da Santa Casa da Misericórdia de Alhandra, Correspondência Recebida, C/A – 003.
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Fragmentos de Alverca
Fachada Oeste da Igreja da Misericórdia, MMVFX-NA, Sd
desse modo pedia-se ao provedor da Misericórdia
de Alhandra para “[…] dar as providencias, para
que a irmandade […] tome logar n’aquella solene
procissão, arvorando a cruz com o senhor das
Mesericordias, que é a sua principal insígnia […]”.
Mesmo tratando-se de um documento dirigido à
Misericórdia de Alhandra, acredita-se ser possível
algo semelhante ter acontecido em Alverca, mesmo
porque o documento faz referência ao facto da
carta pastoral ter sido enviada a todos os párocos
da diocese.
Voltando às relíquias do santuário, adianta o Padre
Manuel Henriques não se saber ao certo a sua origem,
ou data “[...]e só por tradição se cre, que as deu huma
virtuosa Dona Missia Pimenta, ou Pimentel, que
dizem ser oriunda desta villa de Alverca e que vindo
de Roma a H�erúzalem a onde fo� em pirigrinação
trouçéra aquellas Reliquias.”13 Do Santuário, e
respectivas relíquias, resta a descrição deixada nas
Memórias. Até ao momento foi impossível descobrir
qualquer outra informação sobre o seu paradeiro.
13 ANTT, ANTT, Memórias Paroquiais – Dicionário Geográfico de Portugal, volume 3, memória 43 [Alverca], p. 335.
Em relação à caracterização da Santa Casa da
Misericórdia de Alverca o mesmo documento
informa-nos que “Tem esta Villa Caza da
Mizericordia, com Hospital, que só serve de
albergaria aos peregrinos, e suposto que as rendas
da Mizericordia já foçem menores, contudo por
hora só-mente se favoreçem os viandantes de carta
de guia e se acode as indispensaveis despezas de
Andante, Cappellaës, e mais obrigaçois.”14 Sobre a
existência de um hospital, muito comum associado
às Misericórdias, as informações são escassas. É o
próprio Padre Manuel Henriques que nos informa
que o hospital só servia de albergaria, deixando
antever que a Irmandade, já então, sofria de
algumas carências económicas, não lhe permitindo
manter um hospital no verdadeiro sentido do
termo. Da albergaria temos notícias de se localizar
no edifício anexo à Igreja, a qual para “[…] além de
uma camarata bastante ampla, possuía também
quatro quartos bem providos e asseados.”15 Costa
Goodolphim numa tabela criada a partir de um
documento de 1859, indica não existir hospital
na Misericórdia de Alverca16. Testemunhos orais
referem a existência de um pequeno posto de
médico no primeiro andar do edifício anexo à Igreja
em pleno século XX.
Há ainda uma última referência à Misericórdia nas
Memórias, ao descrever os danos causados pelo
Terramoto de 1755 na Igreja de São Pedro, o padre
Manuel Henriques informa que “[...]as imagens
dos santos, como o santissimo sacramento se
transferirão p.a a Igreja da Mizericordioa, que desde
o ditto terramoto, ate o prexente serve a freguezia
inte�rmente, menos na sepultura dos defuntos
porque este settem enterrado nos covais da Igreja
Parochial [...]”17
O Terramoto de 1755 terá causado enormes
14 ANTT, ANTT, Memórias Paroquiais – Dicionário Geográfico de Portugal, volume 3, memória 43 [Alverca], p. 333. 15 José do Carmo Pacheco, José do Carmo Pacheco, Op. Cit., p. 16116 Costa Goodolphim, Costa Goodolphim, As Misericórdias, Lisboa, Livros Horizonte, 1998, p. 22917 ANTT, ANTT, Memórias Paroquiais – Dicionário Geográfico de Portugal, volume 3, memória 43 [Alverca], pp. 330-331.
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Fragmentos de Alverca
danos no então Concelho de Alverca. Entre os
edifícios danificados encontrava-se a Casa da
Câmara situada, na actual Praça João Mantas, a
cerca de quinhentos e cinquenta metros a sudoeste
da Misericórdia; e a Igreja Matriz a cerca de
quatrocentos metros, a oeste. Na Rua João Mantas,
à esquerda da fachada tardós da Misericórdia, existe
um edifício setecentista provavelmente construído
após o Terramoto, tal como a maioria dos edifícios
próximos, levando-nos a aventar a hipótese de, a
haver algum edifício anterior, também ele ter sido
derrubado quando do Terramoto. Curiosamente,
entre os escombros de Alverca arruinada, erguia-se
a Misericórdia, intacta18. As razões desse fenómeno
talvez se possam averiguar através de estudos
geomorfológicos, para o que seria necessária uma
intervenção arqueológica no local.
Um dos documentos mais interessantes do Arquivo
da Associação de Assistência e Beneficência da
Misericórdia de Alverca (AABMA), é o volume
composto por uma série de documentos diversos,
impressos e manuscritos, colados e encadernados
em conjunto, com uma capa de cor azul onde se lê,
numa etiqueta manuscrita: Compromisso da Santa
Caza.
Na folha de rosto, manuscrita, lê-se: “Compromisso
pelo qual se regula actualmente a Irmandade da
Meziricordia da Villa d’Alverca na que lhe pode ser
aplicavel, assim como varias Ordens e Regulamentos
do Governo para Orçamentos e prestaçaõ de contas
[…]”19 Um pouco mais abaixo foi acrescentado, em
época posterior, manuscrito a lápis: “Não se tem
seguido a doutrina deste compromisso por ser
impossivel na actualidade.”20
Segue-se, impresso, o Alvará, por que Vossa
Alteza Real Há por bem Determinar que as Casas
18 Cf. Alfredo Marujo, Paróquia de S. Pedro de Alverca – Elementos para a sua História, Alverca, Paróquia de S. Pedro de Alverca, 1999, p. 2919 AAABMA, AAABMA, Compromisso da Santa Casa, Villa d’Alverca, Irmandade da Misericór-dia, compromisso pelo qual se regula actualmente a irmandade da Misericórdia da Villa d’Alverca na que lhe pode ser aplicável, assim como várias ordens e regulamentos do Go-verno para acentos apresentados de contas, como se regem, 1836, Capa.20 Idem, Ibidem.
de Misericordias das Cidades, e Villas destes Reinos,
e seus Dominuis, se regulem pelo Compromisso da
Santa Casa da Misericordia de Lisboa. Este Alvará
do Príncipe Regente D. João datado de 18 de
Outubro de 1806, estipula “Que todas as Casas de
Misericordia das Cidades, e Villas destes Reinos, e
seus Dominios se regulem pelo compromisso da
Santa casa da Misericordia de Lisboa, no que for
accommodado ao estado das suas rendas, á natureza
da applicação dos seus Bens, e mais circunstancias
dignas de attenção [...].”21 Notoriamente, após a
leitura do Compromisso, entende-se que muitos dos
parágrafos dificilmente poderiam ser aplicados à
Misericórdia de Alverca, já para não referir aqueles
que só competem mesmo à Misericórdia de Lisboa,
como é o caso do Capitulo XL sobre a administração
e governo do Hospital de Todos os Santos.
Ainda no Alvará é feita referência à obrigatoriedade
de se realizarem registos: “[...] E em todas [as
Casas e Hospitais] haverá hum livro separado, em
que estejam descritos todos os Bens móveis, e de
raiz, direitos e acções pertencentes à mesma Santa
Casa [...].”22 A existir um tal livro na Misericórdia
de Alverca este desapareceu, como tantos outros.
No entanto é possível conhecer-se alguns dos seus
bens a partir do estudo de testamentos e, sobretudo
dos Mappas estatísticos dos Juristas Foreiros e
rendeiros da Irmandade da Misericórdia de Alverca
do Ribatejo. Embora esses dados abarquem uma
época muito curta desta instituição – século XVIII
a XIX, sensivelmente –, trata-se de um estudo que
será importante realizar.
Logo a seguir ao Alvará surge o Compromisso da
Misericordia de Lisboa. Impressa em Lisboa, na
Oficina de Joseph da Silva Natividade, em 1745.
Como já foi referido anteriormente, o primeiro
Compromisso data de 1516. O rápido crescimento
das Misericórdias por todo o reino e para além
21 AABMA, AABMA, Compromisso…, Alvará, p. 122 AABMA, AABMA, Compromisso…, Alvará, Cap. VI, p. 3
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Fragmentos de Alverca
Fachada Norte da Igreja da Misericórdia, MMVFX-NA, Sd
dele, assim como o aumento das suas acções e
responsabilidades levou à necessidade das reformas
de 1577 e 161823. A presente edição de 1745 procurava
abarcar toda e qualquer acção das Misericórdias,
substituindo inteiramente as anteriores. Fala-se
nos deveres das Irmandade, do modo como se
procedia à escolha dos seus membros, aos cuidados
a observar quando em qualquer missão específica. A
sua leitura transmite-nos uma imagem muito clara
das actividades das Misericórdias no século XVIII.
No Capitulo I fala-se «Do numero, e qualidades, que
hão de ter os Irmãos da Misericordia», refere-se na
existência de seiscentos irmãos «trezentos nobres,
e trezentos officiaes»24. É duvidoso que fosse esse
o número de irmãos na Irmandade de Alverca. Este
é um dos exemplos indicativos da necessidade
de cada Irmandade adaptar o Compromisso à sua
realidade específica.
No terceiro parágrafo traça-se o carácter e as
condições necessárias para alguém se tornar
Irmão da Misericórdia. Deviam ser “[...] homens
de boa consciencia, e fama, e tementes a Deos,
modestos, caritativos, e humildes [...]25. Para além
disso deviam reunir sete condições, bem definidas,
como ser limpo de sangue; encontrar-se livre de
toda a infâmia de feito, e de Direito; devia ter a
idade conveniente, maior de 25 anos; não podia
ser assalariado da Misericórdia, no caso de exercer
um ofício devia ser proprietário“[…] e izento de
trabalhar por suas mãos”; devia ser pessoa sensata
e, o mais importante devia ser abastado26.
A admissão na Irmandade era realizada sobre
rigoroso segredo, ficando os candidatos sujeitos
a cuidadas averiguações, no sentido de se apurar
serem possuidores de todas as condições exigidas.
A votação, realizada em Junta, fazia-se através de
um sistema de favas brancas e favas negras, não só
para os casos de admissão de novos membros na 23 Cf. André Ferrand de Almeida, Op. Cit., p. 18924 AABMA, AABMA, Compromisso…, Cap. I, § 1, fl.125 Idem, Cap. I, § 3, fl. 1 v.26 Cf. Idem, Cap. I, § 3 fl. 1 v.
irmandade, mas também para qualquer outro caso
em que a eleição por sufrágio fosse necessária27.
No Capitulo II: Das Obrigações dos Irmãos, refere-
se a obrigação dos membros da Irmandade de se
dirigirem à Misericórdia sempre que chamados, para
além da obrigação de se reunirem cinco vezes em
cada ano no “[…] dia da Visitação de nossa Senhora
à tarde, para escolherem os eleitores; Dia de S.
Lourenço à tarde, para elegerem os Definidores […]
dia de todos os Santos à tarde, para acompanharem
a Procissão com que se vão buscar as ossadas dos que
padecerão por Justiça […], dia de S. Martinho pela
manhã ao saimento que se faz por todos os Irmãos
defuntos […,] quinta feira de Endoenças à tarde
para acompanharem a Procissão dos penitentes [...]
e visitarem o Santo Sepiuchro em algumas Igrejas
que ficarem em commodidade.”28
No Capitulo IV fala-se da eleição dos Oficiais. No
parágrafo 2 lê-se. «Para este effeito se porá huma
mesa redonda na Igreja na nave do meyo debaixo
do Coro, e nella se assentará o Provedor, e mais
Irmãos [...].»29 De acordo com testemunhos orais30,
em meados do século XX, as reuniões da AABMA,
realizavam-se na nave da Igreja da Misericórdia. Os
membros da Associação acomodavam-se em redor
de uma mesa rectangular comprida, possivelmente
uma reminiscência do disposto no Compromisso.
27 Cf. Idem, Cap. I, § 7, fls. 2 e Cap. III, § 2 fl.5, por exemplo 28 Idem, Cap. II, p. 3 v.29 AAABMA, AAABMA, Compromisso…, Cap. IV, § 2, fl. 630 Entrevista realizada ao Sr. Arnaldo Barros, em 2005, aquando da investigação para Entrevista realizada ao Sr. Arnaldo Barros, em 2005, aquando da investigação para este trabalho.
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Fragmentos de Alverca
Um pouco mais à frente, nesse documento,
informa-se ser a Mesa da Irmandade composta
por treze cargos eleitos anualmente. Por ordem
de importância, eram o Provedor, o Escrivão, o
Recebedor de Esmolas, oito Conselheiros (quatro
nobres e quatro oficiais), o Mordomo da Bolsa e o
Mordomo da Capela31. Todas estas pessoas tinham
o compromisso de se reunir aos “Domingo à tarde,
para tratarem [...] o que pertence aos prezos, e
seus livramentos”, às “quarta feira pela manhã,
para darem esmola aos pobres que não forem da
visitação ordinaria, e despacharem as petições”
e à sexta-feira, de manhã para tratar de assuntos
vários32.
Sobre as características do Provedor, o cargo maior
da Irmandade, é referido que “[…] será sempre hum
homem fidalgo, de authoridade, prudencia, virtude,
reputação, e idade de maneira, que os outros Irmãos
o possão reconhecer por cabeça, e lhe obedeção
com mais facilidade [...] naõ poderá ser eleito de
menos idade de quarenta annos.”33 Já o escrivão
“[…] será huma pessoa nobre; de tal virtude,
prudencia, e condição, que possa dar expedição aos
negocios com certeza, e facilidade; será de quarenta
annos de idade [...].”34 Uma análise dos documentos
disponíveis pode indicar-nos o nome dos provedores
e escrivães da Misericórdia de Alverca, muitos
dos quais é possível associar a ofícios exercidos
na Câmara e nas Companhias de Ordenança. De
facto os “grandes da terra” dominavam o poder
local em mais que uma das suas manifestações.
Tome-se como membro Sebastião Barbosa de
Sousa Pegado, já mencionado. Para além do
seu nome foram encontrados, nos documentos
do Arquivo da Santa Casa da Misericórdia de
Lisboa35, documentos com a assinatura de José
de Sousa Pegado Serpa (1779), Miguel de Sousa
Barbosa Pegado Serpa (1788) e de Álvaro Xavier
de Sousa Pegado Serpa (1819), revelando que,
31 Idem, Cap. V, § 4, fl. 732 Cf. Idem, Cap. VII, § 7, fl. 933 Idem, Cap. VIII, § 1, fl. 1034 Idem, Cap. IX, § 1, fl. 11-1235 Cf. ASCML, Maço n.º 21 – Alverca – 1778/1826.
para além do papel desempenhado em diversos
ofícios camarários, e da ligação, de alguns
desses homens, às Companhias de Ordenanças,
esta família estendia a sua influência também à
Misericórdia.
Outro dos cargos referenciados no Compromisso era
o de Recebedor de Esmolas, ao qual competia, entre
outras funções, receber e fazer registo de qualquer
testamento que beneficiasse a Misericórdia. O
documento Escritura de Compozição e obrigação
do vinculo de huma capela, que fazem Matheus
Rodrigues, por poder vocal que tem de sue filho
Raimundo Rodrigues Roza, com o Provedor, e mais
Irmaons da Meza da Santa Caza da Mizericordia desta
vila de Alverca, datado de 14 de Abril de 1789 relata
que Jerónimo Correa Florim, morador no Brasil
deixou em testamento a quantia de novecentos mil
reis para que: “[…] se fizera per Sua alma e de dezer
defuntos huma missa cotidiana neste Reino de
Portugal, em alguma das cazas da Santa Mizericordia
delle que melhor paressesse a seu Testamenteiro[…
]”36 O testamenteiro, também a viver no Brasil,
terá incumbido o seu pai para providenciar as
disposições do defunto, o qual terá escolhido a
Misericórdia de Alverca como beneficiária. Outro
testamento, o de Maria da Glória da Silva Monteiro,
de 1866, é o exemplo, comum na época, de legado
às Misericórdias. Neste caso específico pode ler-se
“Deixo à Mesiricórdia da Villa d’Alverca por huma
só vez a quantia de doze mil reiz”37, sem qualquer
indicação de utilização especifica da verba38.
Relativamente às obrigações do Mordomo dos
Presos, cargo de extrema importância visto “[…] que
esta fo� a primeira obra, em que se enpregaraõ os
primeiros Irmão, que instituirão esta Irmandade”39,
é indicado que este devia estabelecer um rol de
36 AAABMA, Escritura de Compozição e obrigação do vinculo de huma capela, que AAABMA, Escritura de Compozição e obrigação do vinculo de huma capela, que fazem Matheus Rodrigues, por poder vocal que tem de sue filho Raimundo Rodrigues Roza, com o Provedor, e mais Irmaons da Meza da Santa Caza da Mizericordia desta vila de Alverca.37 MMNA, Testamento de Maria da Glória da Silva Monteiro, falecida a 22 de Novem- MMNA, Testamento de Maria da Glória da Silva Monteiro, falecida a 22 de Novem-bro de 1864, moradora da Villa d’Alverca, filha legítima de António Francisco Monteiro e dona Luiza Thereza Jose e Silva, Sentença Cível de 25 de Agosto de 1866, p. 638 O assunto dos Testamentos é retomado no Capitulo XXVIII, folhas 29 a 30, onde se O assunto dos Testamentos é retomado no Capitulo XXVIII, folhas 29 a 30, onde se especificam os modos de aceitação dos mesmos. 39 AAABMA, AAABMA, Compromisso…, Cap. XI, §1, fl. 14.
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Fragmentos de Alverca
presos necessitados, seguindo alguns preceitos
especificados, como seja ter-se em conta a pobreza
e desamparo da pessoa, a qualidade da causa
devido à qual estavam condenados – excluíam-se os
presos por dividas, fianças e os fugidos ao degredo
–, e a situação em que se encontram na prisão,
não podendo ser admitidos presos com menos de
trinta dias. Uma das funções do cargo de mordomo
seria a de tratar do “livramento” dos presos,
cuidar da sua espiritualidade, providenciando
confissões e comunhão em datas certas, cuidar da
sua alimentação e saúde, e fazer “[...] por alcançar
perdão das partes, que accusão os prezos, se os
casos forem de qualidade, que soffrão pedirem-lho
sem escandalo; e se for necessario, daráõ aviso à
Mesa, para que as mande chamar, na fórma que lhe
parecer conveniente.”40
No Arquivo da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa
existe uma carta da Misericórdia de Alverca, datada
de 1778, ilustrativa deste assunto. Nesse documento
a Irmandade de Alverca informava ter conseguido
que a “[…]Confraria do Gloriozo Mart�r S. Sebastião,
cuja Hermida he situada nos confins desta Villa
[…]”41 concedesse “[...] perdão do roubo que fez
Jeronimo Tavares dos adornos da mesma gloriosa
Imagem [...]”42, deste modo a Irmandade de Alverca
havia dado resposta à solicitação da Misericórdia
de Lisboa a qual “[…]caritativamente solicita em
beneficio do mizeravel Reo em cujo livramento se
interessa […]”43.
Para além das disposições relativamente aos
presos, também era importante que a Misericórdia
tomasse especiais actuações relativamente ao
sepultamento das pessoas falecidas na povoação,
sobretudo no que concerne àqueles que faziam
parte da irmandade. No Compromisso pode ler-se:
“[...] E por quanto em muitas das sobreditas Mise-
40 Idem, Cap. XI, §5, fl. 1541 ASCML, Carta dirigida ao Provedor e Irmão da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa ASCML, Carta dirigida ao Provedor e Irmão da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa de perdão do roubo que fez Jerónimo Tavares dos adornos das Hermida de S. Sebastião. Agosto de 1778, Alverca, Maço nº 21.42 Idem, Ibidem.43 Idem, Ibidem.
ricórdias está estabelecido o terem hum Campo
Santo para Cemiterio: Permitto que em todas ellas
o possão estabelecer do mesmo modo, o que farão,
sendo possivel, fóra das Povoações, requerendo
para esse effeito ás authoridades Ecclesiasticas a
que competir; e lhes Hei por facultada a licença
para a acquisição do Terreno, que para esse fim for
necessario.”44 Apesar desta disposição, o cemitério
de Alverca seria construído muito depois, segundo
uma ordem do Governador Civil do distrito, datada
de 4 de Novembro de 183545.
Ainda uma das missões da Misericórdia chama a
atenção, trata-se “Do Modo com que se hão de ir
buscar as ossadas do que padecerão por justiça”.
Sobre este assunto é estipulado o modo e o dia em
que se devia executar: “Dia de Todos os Santos,
acabada a Missa do dia, mandará o Mordomo da
Capella correr as Insignias da Irmandade, para se
ajuntarem os Irmãos, conforme a obrigação que
tem, para irem buscar à forca de Santa barbara as
ossadas dos que padecem por justiça, e com esta
demonstração de piedade Chistã obrigar aos mais
fieis a lembrarse dos defuntos, ainda que sejão tão
desamparados como estes parecem.”46 Descreve-
se, depois, o modo como os irmãos deviam seguir
em procissão e das tarefas de cada um. Esta
deveria ter sido uma das missões da Misericórdia de
Alverca, embora ainda não tenha sido encontrada
documentação que o comprove. O facto é ter
Alverca um local, situado à saída da povoação,
popularmente conhecido como Lugar da Forca, por
ali, de acordo com a tradição, ser construída a forca
de execução dos condenados à morte, pela justiça
do Concelho.
Muitas outras disposições podem ser encontradas
no Compromisso, embora não seja possível,
neste momento encontrar dados específicos
relativamente à Misericórdia de Alverca.
44 AAABMA, AAABMA, Compromisso…, Alvará, p. 645 Cf. PACHECO, José do Carmo, Op. Cit., p. 197. Este tema será retomado em capítulo próprio.46 AAABMA, AAABMA, Compromisso…, Cap. XXVII, § 1, fl. 38
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Fragmentos de Alverca
Relativamente às acções desta Irmandade, é
possível que futuras investigações revelem novos
dados. Quanto à sua história sabe-se que, com o
advento da República e a extinção de grande parte
destas instituições locais, os bens da Misericórdia
deveriam ser entregues ao Hospital de Vila Franca
de Xira, ainda a ser construído. De modo a manter
esses bens em Alverca, a Irmandade procurou criar
uma Associação a qual, em Alvará de 26 de Agosto de
1915, ganhava o nome de Associação de Assistência
e Beneficência da Misericórdia de Alverca47.
No arquivo da AABMA encontra-se o livro de actas,
com três entradas, datado de 1916/1748. A primeira
sessão, de Junho de 1916, refere a “[…] entrega de
todos os bens e valores da extinta Irmandade da
Misericórdia de Alverca.”49 Nele pode ler-se ter a
extinta Irmandade apresentado “[...] o inventario de
todos os bens e valores da referida Irmandade, bem
como livros de receita e despesa dos ultimos annos;
o que estes, se prestaram da melhor vontade [...]”50
Infelizmente não se encontrou qualquer relação do
inventário desses bens, impossibilitando conhecer,
com exactidão, qual a verdadeira extensão das
propriedades e bens da Irmandade da Misericórdia
à data da sua extinção.
O espaço da antiga Santa Casa da Misericórdia,
pertencente ainda à AABMA, tem servido para
vários fins. A Igreja serve de salão de ensaios de
47 Cf. Idem, Ibidem.48 AAABMA, AAABMA, Livro de actas, 1916/1749 Idem.50 Idem.
Aspecto do interior da Igreja da Misericórdia, AF, 2005.
um grupo coral, sala de reuniões e convívio. No
primeiro andar chegou a funcionar um posto de
saúde51, depois transformado, em 1980, em Centro
de Dia e Apoio à Terceira Idade. Actualmente não
tem qualquer função específica, servindo de apoio
às actividades da AABMA. O espaço da antiga
albergaria, no rés-do-chão, foi transformado numa
lavandaria nos anos 80, do século XX.
Na Igreja sobressaem os azulejos do século XVII,
sujeitos a uma recente intervenção de restauro
pelo IGESPAR, com acompanhamento do Gabinete
de Conservação e Restauro do Museu Municipal
de Vila Franca de Xira. O altar, entaipado por uma
estrutura de aparite, é acessível através de uma
porta geralmente trancada. O espaço estreito entre
a aparite e altar, serve de arrumação. Do altar vê-se
a pintura lateral e a moldura de estuque onde,
aparentemente, existiria um retábulo. Lateralmente
vêem-se espaços para quatro telas mais pequenas.
A igreja necessita de intervenção urgente,
nomeadamente no que se refere ao restauro no
altar e do tecto, o qual apresenta graves problemas,
ameaçando ruir. Uma intervenção profunda – só
possível com apoio conjunto entre Câmara, Junta de
Freguesia, Associação e IGESPAR – não só resolvia
os problemas eminentes, como poderia solucionar
alguma das dúvidas em relação à estrutura
arquitectónica, para além de poder fornecer novos
dados, após uma intervenção arqueológica.
Apesar disto aquele espaço emana ainda uma
aura de poder. No âmbito dos domínios locais, as
irmandades da Misericórdia eram promotoras de
acções de assistência social. Em Alverca, como
noutros concelhos, a Misericórdia consumava,
sobretudo no respeitante às questões de justiça,
as funções da própria Câmara. Deste modo tanto
histórica como patrimonialmente a Misericórdia é
um elemento que valoriza esta cidade, pelo que a
sua preservação é indispensável.
51 Cf. José do Carmo Pacheco, Op. Cit. p. 162 e ficha de entrevista nº 3, anexo p. 75
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Fragmentos de Alverca
Ao longo da história da humanidade o Homem
procurou sempre eternizar os seus feitos, utilizando
a pedra como meio privilegiado de transmissão de
memórias. Desde o tempo em que se gravava na
rocha símbolos e desenhos, cuja mensagem mal se
consegue interpretar e que hoje são testemunhos
do Homem do Paleolítico, passando – já com a
invenção da escrita – pelas primeiras civilizações,
verifica-se que todos os povos deixaram, inscritas na
pedra, memórias da sua passagem pela História.
Em Alverca, como em todo o lado, a História
inscreve-se também na pedra. Os vestígios mais
antigos de Alverca datam do período de ocupação
romana. Tudo indica ter existido nesse local uma
povoação com alguma importância, situada no
cruzamento de três vias de comunicação: uma via
terrestre que ligava Sacllabis (a actual Santarém) a
Olissipo (que hoje conhecemos como Lisboa); uma
outra via terrestre que seguia o percurso da várzea
saloia, que corresponde hoje às povoações entre
Vialonga e Lumiar; e a mais importante de todas
as vias o Tagus (Tejo), por onde transitavam as
embarcações romanas, carregadas com produtos
que eram comercializados por todo o vasto Império
Romano.
Testemunho da ocupação romana do território
que é hoje Alverca – para além de uma diversidade
de vestígios encontrados, nas escavações
arqueológicas realizadas na povoação – é a cupa
funerária romana, encontrada fora do seu contexto
original, no lugar de São Romão, datável entre o
século I e II, esculpida em calcário. De acordo com
os arqueólogos1, este tipo de cupas está, na maioria
dos casos estudados, associada a indivíduos que
ascenderam socialmente, tornando-se cidadãos
romanos. Este achado cimenta a hipótese de ter
existido, no local, uma povoação com alguma
importância.
Marcando uma época muito posterior conhece-se a
lápide que se encontrava, originalmente, por baixo
de uma janela brasonada, do palácio da quinta do
1 Informação gentilmente fornecida pelos arqueólogos João Pimenta e Henrique Men- Informação gentilmente fornecida pelos arqueólogos João Pimenta e Henrique Men-des.
MEMÓRIAS DE ALVERCA NA EPIGRAFIA LOCAL
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Fragmentos de Alverca
Galvão hoje desaparecido. O palácio datava do
século XI, bastante arruinado no século XX, terá
sido destruído na década de setenta. A lápide
partida foi guardada, durante anos, numa garagem.
Em 1990 foi doada ao Núcleo de Alverca do Museu
Municipal de Vila Franca de Xira, tornando-se
um dos objectos patentes na primeira exposição
permanente desse núcleo museológico. A sua
leitura revela a passagem por Alverca, em 1699, de
D. Pedro II, acompanhado por dois dos seus filhos.
Teriam vindo assistir às festas em honra do São
Pedro, padroeiro da vila – que ainda se realizam
actualmente. Outro dado revelado pela epígrafe
é o facto dos membros da realeza terem sido
acomodados no palácio do Galvão, possivelmente
o único na vila com condições dignas para receber o
rei. Não foi encontrado qualquer outro documento
que refira a presença de D. Pedro II em Alverca, a
lápide epigráfica é, até ao momento, a única fonte
disponível para o conhecimento desse facto.
Quando a 1 de Novembro de 1755 o grande
Terramoto atingiu Alverca, os Paços do Concelho
caíram por terra, assim como tantos outros
edifícios religiosos e civis. Alverca estava vinculada
às Capelas de D. Afonso IV, pelo que coube ao
provedor daquela instituição a edificação da nova
Casa da Câmara. Único testemunho do processo é a
lápide epigráfica da fachada do edifício. Encimada
por dois brasões – o da rainha Mariana Vitória,
esposa de D. José I e o do bispo Paulo Carvalho
de Mendonça – a lápide revela que o edifício terá
sido construído em 1764, à custa do fundo das
Capelas de D. Afonso IV e por indicação de Paulo
de Carvalho e Mendonça: Conselheiro dos reis
D. João V e D. José I, Conselheiro Geral do Santo
Ofício, Presidente e Vedor das Reais Fazendas e da
Casa da Rainha Mariana Vitória, Comissário Geral
Apostólico da Bula da Santa Cruzada, Prior da Real
Colegiada de Guimarães, Provedor e Administrador
das Capelas de D. Afonso IV e, algo que a lápide
não refere, irmão do ministro do reino Sebastião
José de Carvalho e Melo que, a partir de 1769, seria
Marquês de Pombal.
Na fachada do edifício pode ver-se, mais em baixo,
uma outra lápide epigráfica. Trata-se de uma
estela funerária romana, em mármore branco com
nódulos rosados. Actualmente fora do seu contexto
original, alguns autores defendem que terá sido
encontrada aquando da demolição da porta de ferro
da Cerca Moura do Castelo de São Jorge em Lisboa,
embora a análise das fontes permitam considerar
a hipótese de ser original de Alverca2. Embutida
no edifício da Câmara, como elemento decorativo,
parece enquadrar-se no espírito da época, pois
era costume evidenciar-se a epigrafia quando esta
servia de testemunho da antiguidade da povoação.
A lápide constitui a memória de Marco Lícinio
Quadrato, cidadão romano da tribo Galéria3.
2 Cf. Anabela Ferreira, CASA DA CÂMARA DE ALVERCA – Conhecer a sua História, Va-lorizar um Património (1755-1855), Dissertação do Mestrado em Estudos do Património, texto policopiado, Centro de Documentação do Núcleo de Alverca do Museu Municipal de Vila Franca de Xira, 2007, pp. 77-78.3 Cf. A. M. Dias Diogo, “Notícias de Dois Vestígios Romanos no Concelho de Vila Franca de Xira”, Boletim Cultural 1, Vila Franca de Xira, Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, 1986, p. 110.
Janela do Palácio do Galvão. MMVFX-NA
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Fragmentos de Alverca
Estela Funerária Romana AF
Ainda uma outra epígrafe, esta no velho cemitério
de São Sebastião em Alverca, é a lápide funerária
mais antiga actualmente existente no local. Recorda
a memória de José Evaristo da Silva. Nascido em
Alverca em 1784, aí terá aprendido o ofício de
barbeiro. Posteriormente ingressou os quadros do
Hospital Real de S. José, em Lisboa, como barbeiro
e praticante sangrador. Mais tarde havia de se
formar cirurgião. Foi cirurgião do exército durante
a Guerra Peninsular. É um dos nomes citados como
sendo um alverquense ilustre na Monografia de
Alverca de José do Carmo Pacheco. Faleceu em 17
de Dezembro de 1837, a família mandou gravar a
memória em pedra4.
Qual é, afinal, a importância destas memórias
em pedra? A História de Alverca agita-se, faz-se
presente no Núcleo do Museu Municipal, nas ruas
do Núcleo Histórico e, também, nessas lápides,
algumas das quais ainda no seu local original,
com séculos de existência, guardiãs das palavras
gravadas, fontes históricas com anseios de
eternidade.
4 Cf. José do Carmo Pacheco, Monografia de Alverca, Alverca, Junta de Freguesia de Alverca, 1998, p. 96.
Lápide de José Evaristo da Silva AF
Actualmente a informação corre célere. Tantos
meios escritos, falados, visionados. Multiplicam-se
arquivos. A informação é entendida como algo a
preservar. No entanto, é na pedra que se continua
a gravar a memória daqueles que morrem. Na
pedra se regista a inauguração de edifícios sociais
ou culturais. Também na pedra são ainda inscritos
os topónimos das ruas. Existem meios técnicos,
como jamais os antigos poderiam imaginar existir.
Actualmente os registos são realizados não só em
papel mas também em suportes digitais, no entanto
estes veículos de informação são falíveis e possuem
um curto período de vida. Por esse motivo a pedra
continua a servir de instrumento de escrita onde se
imprimirem as mensagens que queremos deixar às
gerações futuras.
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Fragmentos de Alverca
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Fragmentos de Alverca
Numa altura em que se processa a primeira fase da
desactivação do velho cemitério de São Sebastião,
considera-se importante dar a conhecer algumas
pistas que possibilitam a percepção do culto
da morte em Alverca, ao longo da História. Os
vestígios mais antigos de um culto aos mortos
neste território, datam do Campaniforme, um
dos períodos da Pré-história, como testemunha
o vaso, datado dessa época, encontrado no Alto
do Pinheiro e, actualmente, parte do espólio
arqueológico do Núcleo de Alverca do Museu
Municipal de Vila Franca de Xira. Desse espólio
faz parte, também, a cupa funerária romana,
encontrada no Bom-Sucesso, a qual, juntamente
com a estela funerária embutida na fachada
principal da antiga Casa da Câmara, testemunham
o culto aos mortos no período de ocupação
romana.
Na era cristã, desde a Idade Média o enterramento
no interior das igrejas estava reservado à nobreza,
que pagava somas avultadas por tal honra. A
restante população era sepultada nos adros ou
terreiros próximos, por vezes designados por cováis
conforme se pode ver nas Memórias Paroquiais,
datadas de 1758. Neste documento pode ler-se
que todos os rituais religiosos se realizavam na
Igreja da Misericórdia excepto o que dizia respeito
às “[…] sepulturas dos defuntos porque estes se
têm enterrado nos cováis da Igreja Parochial […]”1
a qual havia sido derrubada pelo terramoto de
1755. Na Igreja Matriz de São Pedro podem ainda
observar-se algumas pedras tumulares, junto ao
altar, cujas inscrições, quase sumidas, estão ainda
por investigar.
Também por investigar estão os registos paroquiais
de Alverca, os quais constituem um dos fundos
depositados na Torre do Tombo. Este fundo é
composto por 139 livros, datados de 1591 a 1897,
incluem os registos de baptismo, casamento e
óbitos. Embora constituam uma fonte privilegiada
para o conhecimento da população de Alverca
ainda não foram completamente estudados. A
1 Arquivo Nacional da Torre do Tombo (ANTT), Memórias Paroquiais – Dicionário Geo-gráfico de Portugal, volume 3, memória 43, [Alverca], fl. 331.
ELEMENTOS PARA A HISTÓRIA DA MORTE EM ALVERCA
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Fragmentos de Alverca
análise dos registos de óbitos deverá lançar novos
dados sobre o tema agora abordado.
Em finais do século XVIII o célebre intendente
José Inácio de Pina Manique seria dos primeiros
a lançar o alerta para os perigos de insalubridade
pública provocado pelos enterramentos nas
igrejas e a ordenar, num decreto datado de 5
de Abril de 1796, a procura de terrenos, fora
da povoação para a construção de cemitérios.
Contudo, só anos mais tarde se criaram medidas
para a efectivação dessa realidade. Em 10 de
Fevereiro de 1844, o governo emitia a carta de
lei proibindo o enterramento dentro das igrejas,
a qual provocou diversas contestações populares,
como a ocorrida no Minho, originando o célebre
levantamento popular conhecido como Maria da
Fonte, motivado pela resistência da população em
alterar os usos e costumes, que vinha perpetuando
ao longo de largos séculos. Há que recordar que
a população, maioritariamente analfabeta, não
entendia a questão de saúde pública, por outro
lado a própria Igreja resistia à mudança, pois uma
parte das rendas vinha não só das cerimónias
fúnebres, que se haviam de manter, mas também
dos próprios sepultamentos. Apesar da resistência,
aos poucos começavam a aparecer, por todo o
reino, os primeiros cemitérios.
Uma ordem, datada de 4 de Novembro de 1835,
emanada pelo Governador Civil do distrito, dava
início ao processo de construção do cemitério
do então concelho de Alverca, obra que ficava
a cargo da Câmara Municipal. A 30 de Agosto
de 1837, fazia-se o pagamento de dois mil e
quinhentos réis da escritura de aforamento do
“[...] chão para o Cemitério da Freguesia de S.
Pedro em virtude da deliberação da Câmara [...]”2, a
propriedade pertencia ao Conde de Farrobo o qual,
em finais do século anterior, havia adquirido, por
2 Arquivo Histórico de Vila Franca de Xira (AHVFX), Livro d’ Receitas, e Despeza do Con-celho d’ Alverca nos annos de 1837 e 1836, Concelho de Alverca, Livros de Registo Diários de Receitas e Despesas, 1811/1849, E/A 039.3, fl. 20
arrematação publica e compra directa a particulares,
uma grande quantidade de terras em Alverca3.
Na posse do terreno, de imediato se iniciaram as
obras, conforme se pode observar pelo pagamento
de diversas despesas relacionadas, como aquela
registada em 31 de Outubro de 1837, referindo que
o Concelho entregou “[...] a João Paulo Delgado
de Mattos a quantia de mil e duzentos para
pagamento da pedraria do Pórtico do Cemitério
de S. Sebastião[...].”4 Depois da obra concluída,
os livros de receitas e despesas da Câmara de
Alverca mostram que de 1838 até 1844, se pagava,
anualmente, ao Conde de Farrobo a quantia de dois
mil reis do foro do Cemitério, o qual vencia a 15 de
Agosto5. Esta quantia era o equivalente, na altura,
ao vencimento mensal do contínuo da Câmara6.
3 Cf. ANTT, Fundo do Morgado do Farrobo, Livros 7 e 8.4 AHVFX, Livro d’ Receitas, e Despeza do Concelho d’ Alverca nos annos de 1837 e 1836, Concelho de Alverca, Livros de Registo Diários de Receitas e Despesas, 1811/1849, E/A 039.3, fl. 37.5 AHVFX, Livro de Contas do Concelho (1842-1845), Concelho de Alverca, Livros de Re-gisto Diários de Receitas e Despesas, 1811/1849, E/A 039.3, fl. 16 e 90.6 Idem, fl. 35.
Carreta Funerária AF
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Fragmentos de Alverca
A Misericórdia de Alverca detinha também um
importante papel na sepultura dos mortos.
Esta instituição, criada em Alverca no ano de 1583,
tinha como uma das suas missões primordiais o
acompanhamento dos enterros dos pobres, dos
membros dessa instituição e seus familiares, tal como
vem inscrito no Compromisso. Nesse documento
o capítulo XXXV tem como título esclarecedor Do
modo, com que se hão de fazer os enterramentos. Entre
outras medidas, nele se estipulava que existissem
na Misericórdia três tumbas “Huma servirá para
enterrar os pobres, e pessoas ordinárias; a segunda
servirá para enterrar as pessoas de ma�or qualidade;
a terceira de enterrar os Irmãos, e mais pessoas, que
houverem de ser acompanhadas pela Irmandade […]
e todas estas tumbas teraõ sua cuberta de veludo
com huma Cruz no me�o e borcado, e hum pano
de veludo com o mesmo feitio”7, algumas pessoas
recordam-se de existir em Alverca este pano de
veludo a cobrir os esquifes.
Para além dos esquifes a Misericórdia de Alverca
possuía uma carreta funerária, destinada, em tempos
a transportar os defuntos, algo que aconteceu pelo
menos até aos anos 60 do século XX. Com o advento
do carro funerário automóvel deixou de se utilizar a
carreta. Esta foi sendo deixada em vários lugares,
até ser guardada no depósito da Junta de Freguesia
de Alverca. Em 2008, este importante elemento do
nosso património móvel, foi finalmente recuperado,
7 Compromisso da Misericórdia de Lisboa, Lisboa, Offic. de Joseph da Silva da Nativida-de, 1745,fl. 36.
Evocação à agricultura, AF
por iniciativa conjunta da Junta de Freguesia de
Alverca e da Divisão de Património e Museus da
Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, estando
agora visitável no cemitério novo.
Ainda relacionados com a Misericórdia, no cemitério
de São Sebastião podem ver-se dois jazigos a cargo
dessa instituição: o de Henrique Ferreira Ruivo e
esposa e o de António Guerreiro e sua mulher Maria
da Ressurreição, servindo de testemunho ao facto
que, por vezes, as pessoas deixavam em testamento
disposições para que fosse aquela instituição a
cuidar dos seus restos mortais, deixando generosas
quantias para esse efeito.
A sepultura, com a sua inscrição rodeada de ele-
mentos iconográficos, terá como objectivo primeiro
a sacralização do ente querido, individualizando o
túmulo inserindo elementos que o distinguem. O
estudo dessa iconografia possibilita o conhecimento
de dados etnográficos, nomeadamente relacionados
com as profissões, constituindo um importante
elemento para o estudo da população. Sobre este
aspecto no cemitério velho de Alverca pode ser
encontrada iconografia relacionada com a aviação,
com a música, com a agricultura e com a vinicultura.
Para além de elementos relacionados com as
actividades profissionais, podem ser observadas,
em algumas sepulturas, iconografia, relacionada
com a religião, com a política e com a imagética
simbólica. Da iconografia religiosa podem ver-se
diversas imagens de Nossa Senhora, Jesus Cristo,
anjos e crucifixos símbolos de pureza, redenção e
esperança.
A iconografia simbólica é vasta, pelo que se
seleccionaram os elementos mais significativos,
como as rosas, por vezes associadas à imagem da
Virgem, ambas as representações simbolizando
a pureza; as alcachofras símbolo da ressurreição,
num caso particular rodeada por uma serpente,
mordendo a própria cauda, símbolo de eternidade;
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Fragmentos de Alverca
o ramo de oliveira símbolo de paz, também
associado à árvore da vida que é a oliveira e o livro
ou carta abertos, simbolizando uma vida sem
segredos e sem culpas.
Estas manifestações simbólicas estão a desaparecer
um pouco por todo o mundo. Os túmulos mais
antigos constituem não só memória daquele que
partiu, mas também de uma época específica.
Lugar sagrado, espaço de ultimo repouso, elo
entre a vida e a morte, seja como for que se veja o
cemitério, ele é também a ligação com o passado,
logo um importante veículo para o conhecimento
da nossa História.
Evocação à vinicultura, AF
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Fragmentos de Alverca
Quando da extinção do concelho de Alverca, em
1855, a Casa da Câmara, perdeu a dignidade de sede
do município, deixando de poder exercer as funções
para a qual havia sido construída. Em pouco tempo
servia outras utilidades, mantendo um papel central
no seio da comunidade alverquense, continuando a
constituir um importante elemento do património
da freguesia1. Ali foi instalado o posto do telégrafo-
postal e correio, que funcionou entre 1901 e 19582.
Em salas anexas funcionava uma escola mista entre
1856 e 1900, depois unicamente feminina até 19053.
No dia 16 de Junho de 1963 foi inaugurado o novo
quartel da Guarda Nacional Republicana, ocupando
toda a antiga Casa da Câmara de Alverca4. Em 1976,
no primeiro andar, instala-se a Junta de Freguesia,
que ocupou o espaço até 19885. No piso térreo, de
1 Cf. Anabela Ferreira, CASA DA CÂMARA DE ALVERCA – Conhecer a sua História, Va-lorizar um Património (1755-1855), Dissertação do Mestrado em Estudos do Património, texto policopiado, Centro de Documentação do Núcleo de Alverca do Museu Municipal de Vila Franca de Xira, 2007, pp. 207-208.2 Cf. Idem, pp. 209-211.3 Cf. José do Carmo Pacheco, Monografia de Alverca, Alverca, Junta de Freguesia de Alverca, 1998, p. 179.4 Cf. Vida Ribatejana, [Jornal Regional], Número Especial, Ano de 1964, p. 8.5 José do Carmo Pacheco, Op. Cit., p. 114.
Antiga casa da Câmara, AF
NÚCLEO DE ALVERCA DO MUSEU MUNICIPAL
DE VILA FRANCA DE XIRA
Maio de 1978 até 1992, foi instalada a Biblioteca
Bento Jesus Caraça6. Finalmente, em 1989,
iniciaram-se as obras de adaptação do primeiro
andar para o Núcleo de Alverca do Museu Municipal
de Vila Franca de Xira7.
6 Cf. AHVFX, Divulgação do património Artístico e Cultural do Município, 4 de Junho de 1979, Biblioteca de Alverca, CAS-C/79-001 e José do Carmo Pacheco, Op. Cit., p. 183.7 Cf. AHVFX, Orçamento – Obra de Instalações do Núcleo Museológico de Alverca, 8 de Maio de 1990, Instalações da Câmara do Extinto Concelho de Alverca, CMVFX, M/A.001.
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Fragmentos de Alverca
Produto da politica de polio-nuclearização do
Museu Municipal de Vila Franca de Xira, o projecto
do Núcleo de Alverca, veio ao encontro do interesse
da comunidade e da autarquia local, como um meio
de preservar a memória da localidade8, embora
integrado no Concelho, valorizava a história e o
património de Alverca. Fruto da investigação da
equipa do Museu Municipal, a sua organização
teve a colaboração da população alverquense, que
se traduziu na recolha e doação de grande parte
do espólio etnográfico e fotográfico. O projecto
de adaptação do primeiro andar do edifício para
o Núcleo de Alverca do Museu Municipal teve a
autoria do designer Américo Ferreira da Silva, com
poucas alterações relativamente à estrutura do
edifício.
Em 17 de Maio de 1990 inaugurava a exposição de
longa duração “Do Quotidiano ao Museu – Alverca
– Séculos XVII a XX”9, ocupando grande parte do
primeiro andar. No sótão foi instalada a reserva,
onde se mantiveram conversados todos os objectos
do espólio. Ao longo de aproximadamente doze
anos, embora tenha mantido a mesma exposição,
o Núcleo de Alverca do Museu Municipal de Vila
Franca de Xira foi sendo inovado com projectos
de acção educativa, tornando-se uma referência,
sobretudo entre o público sénior e escolar, com
primazia do primeiro ciclo do ensino básico.
Em 2002 o espaço foi provisoriamente encerrado de
modo a dar início ao novo projecto da remodelação e
ampliação do museu, da autoria do arquitecto José
Cid, ficando a obra a cargo da empresa LNRibeiro.
Este projecto abrangia a área de um antigo edifício
entretanto adquirido pela Câmara Municipal, onde,
em tempos, funcionou uma oficina de ferrador,
tendo sido construído um novo edifício, com três
pisos, primeiro para recepção e sala de exposições,
8 Cf. Maria Clara de Fraião Camacho, A propósito do Núcleo de Alverca do Museu Munici-pal de Vila Franca de Xira: reflexões sobre uma experiência de Musealização e Intervenção na Comunidade, dissertação para o Curso de Pós-graduação em Museologia Social, texto policopiado, Centro de Documentação do Museu Municipal de Vila Franca de Xira, 1991, p. 7.9 Cf. Maria Clara de Fra�ão Camacho, Op. Cit., p. 24.
o segundo com outra sala de exposições de longa
duração e o terceiro funcionando como sala
polivalente. No edifício da antiga Casa da Câmara
ficaram instaladas no rés-do-chão uma sala de
Serviço Educativo e o Centro de Documentação; no
primeiro andar, para além dos gabinetes técnicos,
existe uma outra sala para exposições de curta
duração, no sótão mantêm-se a reserva e uma sala
de conservação preventiva.
Actualmente o espólio do Núcleo de Alverca do
Museu Municipal é, em parte, constituído por
objectos etnográficos e industriais, fotografia e
documentação, doados por instituições e pela
população alverquense, sendo a outra parte do
espólio constituído por materiais exumados nas
diversas intervenções arqueológicas realizadas
em Alverca. Todo o espólio tem vindo ao longo
dos anos a ser alvo de tratamento de conservação
preventiva e curativa (sempre que tal se justifique),
estando devidamente acondicionado em reserva.
Contudo, embora a colecção seja significativa,
ainda faltam muitos elementos que caracterizam a
vida e a história da povoação.
Deste modo, o Núcleo de Alverca continua a
necessitar do apoio da população. Os objectos
etnográficos podem ser doados em definitivo, ou
simplesmente depositados. Quando o objecto
é doado passa a fazer parte do espólio do Museu
de forma definitivo, onde será devidamente
conservado podendo figurar em exposições. O
depósito permite que o objecto seja conservado
devidamente, podendo ser exposto, continuando
contudo a pertencer ao proprietário. Já no caso
de documentos e fotografias, actualmente, com
a utilização de novas tecnologia já não se apela à
doação, uma vez que podem ser digitalizados com
qualidade. Este método permite um substancial
crescimento da colecção, possibilitando a
investigação, a qual constitui um dos objectivos
mais importantes do museu. Ao colaborar com o
Núcleo de Alverca a pessoa que doou, deixou em
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Fragmentos de Alverca
Aspecto da Exposição Alverca da Terra às Gentes
depósito, ou simplesmente emprestou um objecto
estará a ligar, permanentemente, o seu nome
àquele espaço.
O Núcleo de Alverca reabriu ao público no dia 24 de
Novembro de 2007, com uma exposição de longa
duração intitulada “ Alverca da Terra às Gentes”, a
qual se divide em dois momentos chave. O primeiro
momento, desenvolvido no piso térreo da antiga
Casa do Ferrador, apresenta a história do edifício,
que inclui a presença de um agulheiro, parte
da memória do espaço que, no século XVIII, foi
registado como sendo um prédio rústico com lagar
e adega. Faz também parte deste piso a exibição do
espólio exumado nas intervenções arqueológicas,
que precederam as obras. Num segundo momento,
no primeiro andar do mesmo edifício, desenvolve-
se o tema das actividades tradicionais, destacando-
se a produção do queijo de Alverca, a extracção de
sal, a produção de azeite e de vinho.
Para além dos espaços expositivos e de reserva o
público terá acesso ao Centro de Documentação,
o qual reúne uma série de obras bibliográficas
centradas em temática específicas como:
museografia, património e história local, para além
de obras de referência que permitirão aprofundar
as temáticas exploradas nas exposições. Neste
espaço poderá ainda encontrar-se um conjunto
de pastas de arquivo contendo o resultado de
diversas pesquisas, realizadas ao longo dos anos,
pelos técnicos do Museu Municipal de Vila Franca
de Xira.
Deste modo a população de Alverca tem, à sua
disposição, um espaço cultural que no fundo lhe
pertence, pois ali se reúne a História e a Memória
de Alverca, não só no que respeita à localidade,
mas também às suas gentes. Está nas mãos de
todos os alverquenses fazer deste Núcleo, do
Museu Municipal de Vila Franca de Xira, um espaço
privilegiado de cultura.
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Fragmentos de Alverca
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Fragmentos de Alverca
OFICINAS GERAIS DE MATERIAL AERONáUTICO
A partir de quando se pode falar da história
das OGMA? Sabemos as datas precisas da sua
instalação em Alverca, no entanto, como em
toda a História, há sempre uma causa, um efeito,
uma razão para ter sucedido dessa forma e não
de outra. Poderá considerar-se o ano de 1915,
como início da história das OGMA. Nessa data foi
aberto concurso “para seis oficiais do Exército ou
da Armada, serem enviados ao estrangeiro, a fim
de praticarem em escolas de aviação.”1 Entretanto
iniciavam-se, nesse mesmo ano, os trabalhos
de instalação na Quinta do Queimado, em Vila
Nova da Rainha, da Escola Aeronáutica Militar.
Aquele local havia sido escolhido em detrimento
de Alverca. Julgou-se então ser o lugar ideal para
fundar a escola “Pela sua situação permitia, como
se pretendia, dar instrução de hidroavião [...].”2
Entretanto eram escolhidos os homens para
formação no estrangeiro. Entre esses oficiais
destacam-se, pela sua ligação posterior às OGMA,
1 Coronel Edgar Cardoso, Escola de Aeronáutica Militar em Vila Nova da Rainha (1916-1920), Alverca, OGMA, 8 de Novembro de 1967, p. 52 Idem, p 11
os então Primeiro-Tenente da Marinha Sacadura
Cabral (1881-1924), o Tenente de Infantaria José
Barbosa dos Santos (1884 – 1928) e o Alferes de
Cavalaria Leite João Barata Salgueiro Valente
(1888 – 1928)3. Quatro oficiais seguiram para os
Estados Unidos onde frequentaram a Signal Corps
Aviation Scool, terminando a formação em França
no Centre d’Aviation Militaire de Chartres onde já
estavam dois dos oficiais admitidos no concurso.
Os diplomas de voo foram obtidos em Fevereiro
de 1917. Após a formação a maior parte daqueles
homens exerceram funções de instrutores em
Vila Nova da Rainha, actividade iniciada em 2 de
Novembro de 1917.
Pouco tempo passado a situação em Vila Nova da
Rainha tornava-se insustentável. “A insalubridade
na região, flagelada pelo anofeles e o paludismo
incubados nos sapais e nos terrenos pantanosos
dos arrozais das duas margens do Tejo, tornou im-
3 Sacadura Cabral visitava com alguma regularidade as OGMA, o seu avião foi ali repa- Sacadura Cabral visitava com alguma regularidade as OGMA, o seu avião foi ali repa-rado pelo menos uma vez. Salgueiro Valente e Barbosa dos Santos exerciam o cargo de experimentadores de aviões das OGMA. Faleceram ambos em 30 de Novembro de 1928, quando o avião embateu no cabo metálico do balão da Companhia de Aerosteiros.
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Fragmentos de Alverca
Entrada das OGMA, AF
periosa a mudança das instalações para paragens
mais salubres.”4 Em 1918 as oficinas começaram
a ser transferidas para Alverca. Em 1920 a Escola
de Aeronáutica Militar mudava-se para Sintra. “Ao
mudar-se para Sintra, a Escola, trouxe consigo
os hangares e Vila Nova da Rainha, deixou
de ser um aeródromo e foi esquecida quase
completamente.”5
Para instalação das oficinas foi escolhido o terreno
na propriedade do conde de Ribeira Nova, à época
arrendados a Augusto Câncio6. Eram terras de
cultivo sem qualquer habitação. A instalação, nesse
espaço, obedecia a vários factores: a proximidade
do rio Tejo e dos caminhos-de-ferro, com a estação
muito perto e, sobretudo a proximidade com
Lisboa.
Em Setembro de 1918 era criado o Parque
de Material Aeronáutico. Na construção dos
primeiros edifícios provisórios, para alojamento
de pessoal, foram utilizados caixotes de madeira,
vindos de Vila Nova da Rainha. O aspecto
abarracado das instalações terá sido responsável
por, popularmente, se começar a designar aquele
espaço por Feira do Major. O Major era Pedro Fava
Ribeiro de Almeida, director do Parque.
4 António Dias Lourenço, Vila Franca de Xira – Um Concelho no País, Vila Franca de Xira, Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, Abril de 1995, p. 905 Coronel Edgar Cardoso, Op. Cit., 8 de Novembro de 1967, p. 20.6 Cf. Coronel Edgar Pereira da Costa Cardoso, O Jubileu das Oficinas Gerais de Material Aeronáutico, Alverca, OGMA, 1968, p. 30.
Acompanhavam-no como adjuntos o tenente de
engenharia João de Almeida Meleças – natural de
Alverca – e o tenente Ernesto Videira. Estes eram
alguns dos oficiais designados para proceder à
instalação do Parque de Materiais Aeronáuticos,
inaugurado em Outubro de 1919.
A parte fabril seria dividida, neste primeiro ano,
em quatro secções, sendo a primeira composta
por oficina de carpintaria civil; de electricidade,
de pintura; de correeiro e depósito de madeiras;
a segunda por oficina de motores; de serralharia
mecânica; de forjas e de caldeireiros. A terceira
secção incluía o armazém de material de aviação,
tendo adstrito o depósito de ferramenta e material
de consumo. A quarta secção era composta pela
coluna automóvel e oficina de reparação auto.7
Para além da fábrica, foi instalada no Parque a
Companhia de Aerosteiros, responsável pela
aquisição e posterior manobra de balões suspensos,
como mais adiante se verá. Entretanto os trabalhos
no Parque de Material Aeronáutico progrediam.
Os primeiros aviões, modelo Caudron, começaram
a ser construídos em 1922. Nesse mesmo ano
começam a construir-se bombas “para exercícios
e de indutos”8. Por esta altura o Parque procurava
torna-se, tanto quanto possível, auto-suficiente. As
salinas foram mantidas em actividade. A produção
chegou a atingir os 700 moios de sal, com lucro de
18 mil escudos9. Era permitido o acesso a rebanhos
de ovelhas para limpeza de pistas, ajudando desse
modo a produção do Queijo de Alverca10. Foi
criado um forno de tijolo. Os campos de terra fértil
eram cultivados, “ [...] o Parque passou a organizar
a sua exploração agrícola, criando para o efeito
um edifício que comportava uma abegoaria,
um aviário e um pombal, o que numericamente
significava um benefício de cerca de 30 mil escudos
7 Coronel Edgar Cardoso, Op. Cit., 1968, p. 988 Coronel Edgar Cardoso, Op. Cit., 1968, p. 1049 Cf. Idem, p. 10510 Devido à proximidade do estuário do Tejo, as ervas eram salgadas, daí que na produ- Devido à proximidade do estuário do Tejo, as ervas eram salgadas, daí que na produ-ção do queijo não era necessária a adição de sal. Dizem os mais antigos dever-se a esse factor o sabor particular do Queijo de Alverca. Embora continue a ser produzido sobre-tudo nas terras altas de Arcena, em pequenas quantidades e para consumo dos próprios produtores - seguindo a forma tradicional, terá perdido sabor e fama.
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Fragmentos de Alverca
Edificio do Esquadrão de Aeroesteiros, AF.
anuais.”11 Foi, ainsa, construída “uma fábrica de
hidrogénio obtido por processos electrolíticos e
consequentemente quase puro, destinado aos
Serviços de Aerostação e Meteorologia.”12
Em 1928 o Parque passou a designar-se como
Oficinas Gerais de Material Aeronáutico, com
autonomia em relação ao Estado. O fabrico
de aviões requeria um significativo número de
operários, os quais foram chegando oriundos
de todo o país. Neste período as OGMA foram
responsáveis pela chegada de famílias, vindas de
todas as regiões do território nacional. Começava
a assistir-se ao rápido crescimento de Alverca.
Com o desenvolvimento da aviação durante a
segunda Guerra Mundial, houve a necessidade de
readaptar as OGMA, estabelecendo-se contactos
com o estrangeiro, nomeadamente com Inglaterra,
Estados Unidos e França de modo a adaptar a
indústria a novas tecnologia. Os contactos com
França terão sido privilegiados, numa primeira
fase de adaptação: “[...] a nossa indústria
aeronáutica foi influenciada pelas facilidades de
colaboração com a indústria francesa, devido aos
contactos na primeira guerra mundial, à facilidade
de língua, metrologia e outras.”13 Recorde-se que
a formação dos engenheiros e pilotos portugueses
foi realizada em França. Posteriormente, numa 11 Coronel Edgar Cardoso, Coronel Edgar Cardoso, Op. Cit., 1968, p. 105.12 Idem, ibidem. Idem, ibidem.13 OGMA, Ofi cinas Gerais de Material Aeronáutico – Alverca do Ribatejo – Portugal, Al- OGMA, Oficinas Gerais de Material Aeronáutico – Alverca do Ribatejo – Portugal, Al-verca, OGMA, Dezembro 1958. pp. 1-2.
segunda fase a influência britânica tornou-se
notória: “[...] com adaptação aos seus standards,
medidas e aproveitamento das suas publicações
técnicas.”14 Este contacto com os ingleses assim
como posteriormente com os americanos terá
levado à necessidade de formação de técnicos
na língua inglesa de modo a facilitar o acesso a
bibliografia especializada. De facto, a instrução e
formação é, até aos nossos dias, umas das missões
das OGMA.
Nas décadas seguintes o progresso das OGMA
seria notório. Nos anos 70 do século XX, assiste-
se a uma viragem. A conquista da liberdade
leva a alguns anos de menor desenvolvimento
económico, reveladores da conjuntura nacional.
Ao mesmo tempo assinala-se a participação da
empresa em exposições internacionais, aspecto
que contribuiria para uma gradual recuperação
económica.
Em 1994 as Oficinas Gerais de Material
Aeronáutico torna-se sociedade anónima.
Actualmente as actividades principais da empresa
traduzem-se na manutenção, reparação e revisão
geral de aeronaves, motores, aviónicos, acessórios
e equipamento de terra; na modernização,
modificação e integração de aeronaves, e na
fabricação e montagem de componentes e
estruturas de aeronaves15
A privatização da OGMA em 2005, resultou na
aquisição de 65% das acções pela Airholding SGPS,
consórcio composto pela EMBRAER – Empresa
Brasileira de Aeronáutica S.A. – fundada em
1969 é actualmente uma das maiores empresas
aeroespaciais16 – e EADS – European Aeronaitic
Defense and Space Compan�.
De povoação economicamente voltada para o
sector primário, Alverca tornou-se no século XX
14 OGMA, OGMA, Op. Cit., Dezembro 1958. p. 215 Cf. OGMA, OGMA, Indústria Aeronáutica de Portugal, S.A.- Apresentação Institucional, Alverca, OGMA, mod. 0808 2/05, 2005.16 Cf. www.embraer.com.br
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Fragmentos de Alverca
Hangar de aviões, AF
numa localidade industrial. Actualmente assiste-se
a uma viragem para o sector terciário. O comércio
e os serviços são dominantes. Desde a década de
90 do século XX têm-se assistido, em Alverca e por
todo o Concelho, ao encerramento de indústrias de
grande porte como a MAGUE – metalomecânica –
a Fábrica de Descasque de Arroz, em Vila Franca de
Xira e tantas outras. As Oficinas Gerais de Material
Aeronáutico têm vindo a contrariar essa tendência,
conseguindo encontrar modos de sobreviver e de
se expandir.
Sobre a história fica muito para relatar. Não cabia
neste trabalho uma abordagem mais exaustiva.
Contudo é importante sublinhar o facto da grande
maioria dos trabalhadores das OGMA serem,
naturais e/ou moradores de Alverca. A marca
da indústria sai do complexo dos edifícios para
o coração da cidade, de onde sobressai o bairro
operário construído nos anos 60, na Avenida
Infante Dom Pedro, e que subsiste apesar de
algumas tentativas para o demolir.
A memória das OGMA está também presente na
toponímia. O capitão João de Almeida Meleças
(1890-1921), já mencionado, dá o seu nome a uma
das principais avenidas da cidade. José Antunes
(1912-1966), foi chefe de secção das OGMA, onde
começou a trabalhar com onze anos. Tem o seu
nome numa das ruas de Alverca, embora isso se
deva mais ao seu desempenho como membro
do associativismo e da política local17. A Rua
Brigadeiro Fernando Alberto de Oliveira evoca
o director das Oficinas entre 1957 e 1967. Deste
modo, é notório que a história das Oficinas Gerais
de Material Aeronáutico é indissociável da história
de Alverca.
17 Cf. José do Carmo, Op. Cit., Alverca, Junta de Freguesia de Alverca, Julho de 1998, p. 100
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Fragmentos de Alverca
O Hangar de Balão das OGMA é o único exemplar a
existir, actualmente, no mundo tendo sido o único
construído em Portugal. A sua forma arquitectural
de construção geodésica é singular. Existe um
hangar com algumas semelhanças em Santa Cruz,
no Brasil, construído em 1935 – por iniciativa alemã
– de dimensões maiores, em relação ao das OGMA,
porque se destinava à manutenção de dirigíveis1.
O Hangar, construído nas OGMA em 1925, possui uma
altura máxima de 13,10 metros. Têm de largura 14,65
metros e de comprimento 40 metros. É revestido por
22.800 telhas de fibro-cimento. No interior existem
dois pisos superiores de onde se acedia à tela dos
balões. Toda a estrutura interna é composta por traves
de madeira dispostas diagonalmente, lembrando o
casco de um navio invertido, “ [...] era considerada
modelar na época. A disposição de elementos
diagonais evita o contravento, permitindo uma
grande economia de espaço, tal como era necessário
para o alojamento de balões.”2.
1 Cf. www.aerofans.com.br2 OGMA, Hangar de Balão, [programa do 80º aniversário], Alverca, OGMA, s/ data [1998].
Operações junto ao Hangar com balão cativo. S. d. OGMA
O HANGAR DO BALÃO DAS OGMA
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Fragmentos de Alverca
Este Hangar servia à manutenção de balões de
hidrogénio, suspensos. A sua construção naquele
espaço deve-se ao facto do primeiro batalhão de
aerosteiros estar estacionado no Parque. Para
além das leituras meteorológicas, os aerosteiros
usavam os balões para outros fins. Em 1922 os
comandantes da Companhia, capitão Costa França
e o tenente José Machado de Barros, lançaram-se,
com pára-quedas, de um balão cativo em ascensão,
de uma altura de 500 metros. Seria os primeiros
salto de pára-quedas realizado em solo nacional,
por portugueses3.
Em 1924 passaria a denominar-se Companhia de
Aerostação e Observação. De acordo com António
Dias Lourenço “A aerostação entre nós, apenas ao
nível dos balões cativos, destinava-se unicamente a
missões de observação e meteorologia.”4 Em 1926
a Companhia possuía “ [...] vários balões cativos
zodiac e um esférico para voos livres.”5
Até à data não foi possível determinar quando terão
cessado os trabalhos de recuperação de balões no
Hangar, ou quando terminaram as actividades da
Aerostação nas OGMA. O certo é que, de acordo com
a memória dos funcionários da empresa, durante
várias décadas o Hangar serviu como arrecadação
de “coisas velhas”. No andar superior guardavam-
se arquivos, em baixo acumulava-se lixo, os portões
deixaram de fechar em condições. Em 1993, no
âmbito das comemorações dos 75 anos das OGMA,
providenciou-se a sua recuperação, começando
pela limpeza do espaço. Alguma documentação
terá sido perdida nesta altura, confundida com
lixo.
Neste período recuperou-se o chão. Antes era de
madeira, para absorver qualquer tipo de líquidos,
sobretudo óleos. Por altura da recuperação do espaço
a madeira estava podre, razão porque foi retirada
3 Cf. Coronel Edgar Pereira da Costa Cardoso, O Jubileu das Oficinas Gerais de Material Aeronáutico, Alverca, OGMA, 1968., , pp. 33-34.4 António Dias Lourenço, Vila Franca de Xira – Um Concelho no País, Vila Franca de Xira, Câmara Municipal de Vila Franca de Xira, Abril de 1995, p. 94.5 Coronel Edgar Pereira da Costa Cardoso, Op. Cit, 1968, p. 33.
tendo-se cimentado o pavimento. Repararam
algumas telhas partidas e partes da estrutura de
madeira que se encontrava danificada. Apesar
das recuperações efectuadas mais de noventa por
cento da estrutura é de origem, não apresentando
até à data, qualquer problema de conservação.
A madeira da estrutura é resistente e de grande
qualidade, tendo sido alvo de um tratamento
anti-caruncho, pois na base de uma coluna, junto
à escada de acesso aos pisos superiores, foi
detectado indícios de ataque de xilófagos. Após o
tratamento nunca mais se detectou qualquer tipo
de ataque às madeiras. Foi aplicada uma camada
de tinta protectora, não havendo qualquer outra
intervenção.
Este hangar de balão testemunho único do
Património Industrial do país, e de Alverca em
particular, é utilizado pela empresa como espaço de
memórias, onde se encontram expostas fotografias
e objectos intimamente relacionados com a
história das OGMA. Pelo que foi possível apurar a
necessidade de expor a sua história e o seu trabalho,
parece ser uma constante nas OGMA. Em diversas
ocasiões, sobretudo por altura dos aniversários,
foram realizadas exposições comemorativas. Num
artigo publicado pela Revista do Ar, quando das
comemorações do 40º aniversário das OGMA em
1958, lê-se: “Um dos números das comemorações
tinha sido uma Exposição documental das
actividades levadas a cabo pelas O.G.M.A. durante
40 anos da sua laboração.”6. Em 1963 criava-se
6 “Oficinas Gerais de Material Aeronáutico”, Revista do Ar, n.º 242, Ano XXI, Dezembro de 1958, p. 93.
Estruturas de travamento laterais. AF
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Fragmentos de Alverca
uma exposição permanente com maquetas de
instalações, motores, modelos de aviões, entre
outros. Sobre esta exposição diz o Coronel Fernando
Alberto Oliveira: “Para preservar o que ainda resta,
para mostrar aos jovens de hoje que, antes deles,
outros labutaram e concretizaram ideias e sonhos
[...], se iniciou a colecção das Oficinas Gerais de
Material Aeronáutico onde cada peça exposta
recorda um facto da sua vida fabril.”7
Em 1969 era criado o Museu do Ar, em instalações
cedidas pelas OGMA. Muito do seu acervo foi
cedido por esta empresa: materiais (aviões e
réplicas construídos, uns e outros, na empresa)
e documentação (manuais de aeronaves,
publicações técnicas, documentação interna,
revistas, fotografias, entre outros)8. Apesar desse
facto, o Museu do Ar está desvinculado das OGMA.
É o Museu da Força Aérea Portuguesa e da História
da Aeronáutica em Portugal. Como organismo da
Força Aérea é um museu de Estado.
Embora o Museu do Ar, cumpra o seu papel como
espaço de memória da aviação portuguesa, sentia-
se a necessidade, por parte dos funcionários e
administradores das OGMA, da existência de um
espaço onde a história da empresa e dos seus
trabalhadores pudesse ser revelada. Deste modo,
em 1993, nascia a Comissão de Conservação do
Património Histórico-cultural das OGMA, composta
por cinco elementos: Brigadeiro Alberto Fernandes,
Engenheiro Lima Bastos, Couto dos Santos, João
Carvalho e Mário Ascensão9. Esta Comissão tinha
como objectivo principal recolher materiais,
dispersos pela empresa, para a instalação de um
Museu Industrial OGMA.
Uma das primeiras acções da Comissão pren-
deu-se com a recolha e selecção do espólio. Os
trabalhadores foram informados da iniciativa
7 Coronel Fernando Alberto Oliveira, Como Nasce um Avião, Alverca, OGMA, 1963, p. 19.8 Cf. OGMA, Museu Industrial da OGMA, folheto, Alverca, OGMA, s/ data.9 Destas cinco pessoas restam actualmente os dois últimos nomes citados, os outros foram sendo reformados, não fazendo actualmente parte dos efectivos da empresa.
e sensibilizados para a necessidade de recolha
de material. Em todas as secções estavam
armazenados materiais, que foram sendo entregues
à Comissão, tendo a maioria desses materiais sido
identificada pelos próprios trabalhadores. Para
além dos trabalhadores no activo, contaram com o
“ [...] valoroso apoio de pessoal […] na situação de
reforma, assim como da APOGMA - Associação de
Pessoal da OGMA.”10 O espólio é então composto por
documentação, fotografias e objectos relacionados
sobretudo com o fabrico de aviões, mas também
oriundos de outros sectores da empresa.
Para além das acções de recolha, alguns materiais
foram doados, como foi o caso do espólio de Augusto
Antunes Simões, antigo trabalhador da empresa,
inventor de alguns instrumentos patenteados e
galardoados com vários prémios internacionais.
Entre os inventos encontram-se uma Descravadora
e dois modelos de Descravadora-Chanfradora, os
quais serviam para retirar os rebites de ligação de
várias componentes dos aviões.
O local escolhido para a instalação do
museu foi o Hangar do Balão e, após a sua
recuperação, começou a preparar-se uma
exposição, inaugurada em 1993, no âmbito das
comemorações do 75º aniversário das OGMA. A
exposição estava direccionada tanto para o interior,
como para o exterior, com mostra de projectos
desenvolvidos pela empresa. Tratando-se de uma
grande campanha de marketing, com vista a dar a
conhecer o funcionamento das OGMA também ao
público exterior. Depois de inauguração do espaço,
o Hangar passou a ser utilizado periodicamente,
no decurso das festas da empresa.
Mais tarde, nas comemorações dos 80 anos de
actividade, em 1998, o Hangar voltou a abrir com
uma exposição diferente, ainda sem os aviões que
hoje se vêem, mas com alguns simuladores de voo.
Nesta nova exposição abordavam-se as origens,
10 Cf. OGMA, Museu Industrial da OGMA, folheto, Alverca, OGMA, s/ data.
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Fragmentos de Alverca
contava-se a História. Nesse ano foi estabelecido
um protocolo entre o Museu do Ar e as OGMA, para
a cedência temporária de materiais destinados à
exposição11.
Desde essa altura, à medida que as administrações
se vão sucedendo, assim é maior ou menor o
interesse pelo projecto. De qualquer forma,
sempre que se comemora o aniversário, ou há
um evento especial, uma visita de importância,
é realizada uma revisão da exposição, de modo
a permitir a reabertura do Hangar. A exposição
actual foi realizada para as comemorações do 86º
aniversário, em 2004.
Nesta exposição podem ver-se alguns aviões,
como o Chipmunk, avião de treino básico,
fabricado nas OGMA, sob licença britânica, na
década de 50 do século XX, período em que foram
fabricados cinquenta e seis desses aviões12, o
exemplar exposto foi o último a ser fabricado a
nível mundial. Ao longo das paredes vêem-se os
expositores, encimados por uma grande ampliação
fotográfica – quase todas datadas dos anos iniciais
da empresa – ladeadas por retratos de todos os
directores e administradores, até à privatização
em Março de 2005. Nos expositores são visíveis
diversos elementos relacionados com o trabalho
da empresa.
11 Cf. Idem12 Aero Club de Portugal, Aero Club de Portugal, Lisboa e o Tejo na Aeronáutica Nacional – Exposição Biblio-Iconográfica e de Propaganda da Aeronáutica Portuguesa, catálogo, Lisboa, Aero Club de Portugal, Dezembro de 1959, p. 84
Aspectos da exposição, AF
Embora seja um espaço importante para o
conhecimento da História de Alverca e do seu
Património Industrial, o facto é que o acesso ao
museu não é fácil, pois o Hangar do Balão encontra-
se dentro da área militar. Seja como for tem sido
aberto ao público em vários momentos, para além
das comemorações dos aniversários.
De um modo geral o Hangar é aberto a visitas
institucionais de órgãos ligados ao governo e
escolas, sobretudo, secundárias e universitárias,
tendo despertado o interesse junto de pessoas da
especialidade na área de fabrico e manutenção de
aviação e da aeronáutica em geral. Em relação ao
público geral, para além das dificuldades referidas,
acresce o facto deste projecto ser, em grande parte,
desconhecido.
A possibilidade de se abrir as portas do Hangar
para um público mais vasto, haveria de despertar
o interesse das pessoas, não só pela história que
encerra como pela própria estrutura do espaço,
cuja arquitectura impressionante é única. Mesmo
faltando uma série de requisitos para fazer do
Hangar do Balão um verdadeiro museu ele já
possui algo de essencial: pessoas interessadas e
empenhadas em fazê-lo progredir.
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Fragmentos de Alverca
BIBLIOGRAFIA
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Fragmentos de Alverca
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Irmandade da Misericórdia, compromisso
pelo qual se regula actualmente a irmandade
da Misericórdia da Villa d’Alverca na que lhe
pode ser aplicável, assim como várias ordens
e regulamentos do Governo para acentos
apresentados de contas, como se regem,
1836.
Declaração de todos os livros e mais papeis
pertencentes a esta irmandade feita no anno
de 1817 pelo escrivão da Meza.
Escritura de Compozição e obrigação do vinculo de
huma capela, que fazem Matheus Rodrigues,
por poder vocal que tem de sue filho
Raimundo Rodrigues Roza, com o Provedor,
e mais Irmaons da Meza da Santa Caza da
Mizericordia desta vila de Alverca, 14 de Abril
de 1789.
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Caldas da cidade de Lisboa à Santa Casa da
Misericórdia desta villa de Alverca de huma
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D. Affonso 4º …, 1860, Administração do
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e Despesas, 1811/1849, E/A 039.3.
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1764 a 8 de Fevereiro de 1814, Concelho de
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Oficio do Prior Manoel Bento Lopes ao provedor
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da Misericórdia de Lisboa de perdão do roubo que
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de Xira – 2ª Repartição – Alverca
Descrição Predial n.º 2:175.
Ministério da Marinha
Comissão do Domínio Público Marítimo, Processo
nº 3554/77, parecer nº 4435.
Museu Municipal de Vila Franca de Xira – Núcleo
de Alverca (MMNA)
Testamento de Maria da Glória da Silva Monteiro,
falecida a 22 de Novembro de 1864, moradora
da Villa d’Alverca, filha legítima de António
Francisco Monteiro e dona Luiza Thereza Jose
e Silva, Sentença Cível de 25 de Agosto de
1866.
Diz Fortunata Augusta herdeira habilitada por este
juizo, escrivão Roque, em os autos de inventario
dos bens da fallecida D. Maria da Gloria Silva
Monteiro, que para poder discrever no registro,
os dominios directos, e mais propriedades,
que da dita herança pertencem a suppta,
precisa que se lhe passe por certidão, as verbas
da descripção de todas as propriedades, e
dominios que herdou da dita fallecida, e como
para de lhe passar careça de despacho [...],5
de Abril de 1867.
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Fragmentos de Alverca
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VASCONCELOS, Luís, “O Fomento de Estradas
no reinado de D. Maria I”, Sven Sk�dsgaard;
John Kuhlmann Madsen, Hispanismen
omkring Sven Skydsgaard: studier i spansk og
portugisisk sprog, litteratur og kultur til minde
om Sven Skydsgaard, Museum Tusculanum
Press, 1981.
PERIÓDICOS•
Diário de Governo nº 62, 19 de Março de 1881.
“Freguesias do Concelho de Vila Franca de Xira -
Freguesia de Alverca”, Boletim da Junta de
Provincia do Ribatejo, n.º 1, anos de 1937-
1940, Lisboa, Oficinas Bertrand (Irmãos),
L.da, 1940
“Oficinas Gerais de Material Aeronáutico”, Revista
do Ar, n.º 242, Ano XXI, Dezembro de 1958,
pp. 93-97.
Vida Ribatejana, [Jornal Regional], Número
Especial, Ano de 1964.
SARMENTO, Zeferino, “Estrada de Lisboa a
Santarém – Demarcação”, Vida Ribatejana,
Número Especial, 1964, pp. 142-144.
TEIXEIRA, Garcez, “Inquérito Sobre Pelourinhos”,
Revista de Arqueologia, Tomo III, 1936.
DOCUMENTOS ON-LINE•
Aero Fans (www.siteaerofans.hpg.com.br)
Direcção Geral dos Edifícios e Monumentos
Nacionais (www.monumentos.pt)
Embrarer – Brasil (www.embraer.com.br)
Instituto Português do Património Arquitectónico
(www.ippar.pt)
Observatório Astronómico de Lisboa
(www.oal.ul.pt)
Oficinas Gerais de Material Aeronáutico
(www.ogma.pt)
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Fragmentos de Alverca
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Fragmentos de Alverca
ANEXOS
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Fragmentos de Alverca
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Fragmentos de Alverca
Topónimo Vizinhos
Vila dAlverqa 108
Aldea da Panasqueira 6
Aldea da Pêro Berba 6
Aldea de Ramas 5
Aldea das Arecenas 18
Aldea das Verdelhas grãde e pequena 13
Aldea do Adarço 19
Aldea do Moinho de Veto 3
Aldea do Soveral Grâde 43
Aldea do Soveral Pequeno 18
Aldea dos Potes 14
Casaes do Valle 5
Estalage da ponte dAlhãdra 1
TOTAL 259
Topónimo Fogos
Adarço 6
Alverca 167
Ponte d’Alhandra 12
Soboral 45
A dos Melros 8
Aresena 20
A dos Potes 16
Verdelha 8
Pêro Berba 10
Val de Vasias 10
TOTAL 302
Topónimo Designação Fogos
Adarçe Aldeia 24
Allverqua Vila 150
Arecenas (Grande e Piquena)
Aldeias 26
Dos Mellros Aldeia 16
Dos Potes Aldeia 23
Moinho de Vento Aldeia 10
Panasqueira Aldeia 5
Peroverba Aldeia 17
Ponte da Azanha Aldeia 9
Soltas Cazais quintas e moinhos 22
Soverais (Grande e Piqueno)
Aldeia 80
Vall de Rana Aldeia 10
Verdelha Aldeia 14
Total 406
Topónimo Designação Vizinhos Pessoas
Adarse Lugar 8 35
A-dos-Melros Lugar 28 108
A-dos-Potes Lugar 25 98
Alverca Freguesia 180 727
Arcena Grande Lugar 37 121
Arcena Pequena Lugar 9 35
Brandoa Lugar 11 29
Moinho de Vento Lugar 13 62
Ponte Lugar 31 127
Proverba Lugar 7 27
Vale de Ranas Lugar 6 25
Verdelha Lugar 6 15
TOTAIS 361 1409
POPULAÇÃO DA VILA E LUGARES
DE ALVERCA EM 15271
POPULAÇÃO DA VILA E LUGARES
DE ALVERCA EM 15882
POPULAÇÃO DA VILA E LUGARES
DE ALVERCA EM 16403
POPULAÇÃO DA VILA E LUGARES
DE ALVERCA EM 17584
___________
1 Cf. Bramcamp Freire, Archivo Histórico Portuguez, Vol. VI, Anno de 1908, p. 258.2 Cf. ANTT, Núcleo Antigo, Tombo de Alverca, Livro XXV, Parte II, Cx. 271, fls. 1139-1140
___________
3 Cf. ANTT, Tombo de Alverca, Lista das Comarcas do Reino, 1640, Manuscrito 1194, Livraria4 Cf. ANTT, Memórias Paroquiais - Dicionário Geográfico de Portugal, volume 3, memó-ria 43 (Alverca), fls. 329-330.
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“Aos quinze dias do mez de Novembro do anno
de mil oito centos cincoenta e cinco nesta Villa
d’Alverca e Paços do Concelho aonde se achava
reunida a Camara Municipal composta do seu
Prezidente e mais vereadores abaixo assignados,
ahi tratou de calcular o preço medio dos seguintes
generos relativo áo corrente anno a saber – Alhos
a restia cincoenta reis – Azeite o almude tres mil e
quatro centos reis – Azeitona o alqueire duzentos
e quarenta reis – Cabritos cada um cento e secenta
reis – Carneiro siscentos reis – Cordeiros duzentos
reis – Ceb�llos o cento cem reis – Centeio o alqueire
trezentos e vinte reis – Cevada o alqueire trezentos
reis – Chixaros duzentos reis – Damascos o cento
cento e quarenta reis – Fava o alqueire trezentos
e quarenta reis – Feijaõ seiscentos reis – Frangaõs
cada um oitenta reis – Galinhas duzentos e quarenta
reis – Graõ de bico o alqueire sete centos reis – Laã
a arrouba dois mil e cem reis – Laranja o cento
duzentos reis – Linha a carrada mil e duzentos reis
– Limaõ o cento oito centos reis – Macçaas [sic]
o cento cento e vinte reis – Ovos a duzia oitenta
reis – Palha pam de quatro arroubas duzentos e
secenta reis – palha de centeio o feixe quarenta reis
– Patos cada um duzentos reis – Pecêgos o cento
quinhentos e cincoenta reis – Pêras o cento cento
e cincoenta reis – Perus cada um sete centos reis –
Porcos a arrouba dois mil e quatrocentos reis – Sal
o moio dois mil reis – Tremocos o alqueire cento e
vinte reis – trigo seiscentos reis – Vinagre o alqueire
mil e duzentos reis – Vinho cozido o almude mil
e oitocentos reis – Vinho mosto naõ o houve por
isso se naõ calcula preço medio. E para cosntar se
lavrou a prezente acta que depois de lida todos
a assignaraõ eu Joze Peres Chaves Escrivaõ da
camara que escrevi.”
[assinatura]
1 AHVFX, Livro de Registos de Actas das Sessões – Acórdãos, Concelho de Alverca, B/A.002.
ÚLTIMA ACTA DE SESSÃO DA CÂMARA DE ALVERCA 1
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