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30/12/2014 Folha de S.Paulo + memória: Mário Pedrosa e o olhar dos espiões 18/11/2001
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São Paulo, domingo, 18 de novembro de 2001 Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
+ memória
Mário Pedrosa e o olhar dos espiõesMário Magalhãesda Sucursal do Rio
Quando o militante socialista e crítico de arte Mário Pedrosamorreu, no dia 5 de novembro de 1981, seus amigosesboçaram um perfil biográfico que o consagrava como umdos mais brilhantes intelectuais da história do Brasil."[Foi] uma das inteligências mais ricas e criativas que nossopaís teve", escreveu o então correspondente da Folha emLondres, Cláudio Abramo. O teatrólogo Flávio Rangel, àépoca colunista do jornal, testemunhou: "Seu pensamentoera sempre original e profundo. Assistir a Máriodesenvolvendo suas idéias, num debate ou numa discussão,era um prazer permanente, uma espécie de síntese entrefilosofia e estética".Em abril passado, foi lançado o livrohomenagem "MárioPedrosa e o Brasil" (editora Perseu Abramo, organização deJosé Castilho Marques Neto).No volume, depoimentos da atriz Lélia Abramo, do críticoliterário Antonio Candido, do petista Luiz Inácio Lula daSilva, do sociólogo Luciano Martins e da professora deestética da USP Otília Arantes reforçam, com cores fortes, oretrato desenhado décadas antes.Agora, no mês em que a morte de Mário Pedrosa completa20 anos, uma investigação da Folha no Arquivo Público doEstado do Rio de Janeiro revela uma coincidência: para osagentes secretos que o espionaram da década de 1930 à de1980, Pedrosa, um dos pregadores originais do socialismodemocrático no Brasil, filiado número 1 do PT, primeirocrítico a reconhecer a condição de arte nas pinturas dospacientes da psiquiatra Nise da Silveira e amigo dorevolucionário Leon Trótski, do surrealista Benjamin Péret edo presidente Salvador Allende, não fugia muito à imagemde brilhantismo construída por seus companheiros."Muito inteligente, falando diversos idiomas, ativo edesembaraçado, age de preferência no meio inculto, onde suaação corruptosa [sic" é rápida e proveitosa." Assim odescreveu em relatório um agente secreto da Polícia Civil doDistrito Federal, caracterizandoo como "elementoperigosíssimo à ordem e à segurança públicas". Corria o anode 1938, o seguinte à instauração da ditadura do EstadoNovo (193745), na primeira passagem (193045) de GetúlioVargas pela Presidência da República.Numa resposta ao Consulado Geral dos Estados Unidos, que
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buscava a ficha de Pedrosa, a polícia política federal alertou:"[É um" agitador inteligente".No dia 3 de fevereiro de 1941, um espião identificado comoD15 assinou um relatório combinando elogio à inteligênciade Pedrosa e desdém por sua saúde. Citavao como fundadorde duas organizações políticas, a Liga Trotskista na verdadeLiga Comunista Internacionalista e o Partido OperárioLeninista.Descreviao: "Rapaz de seus 35 anos, alto e de tez doentia.Já esteve tuberculoso e tem pulmões fracos. Escritor degrande capacidade intelectual e um dos maioresconhecedores do marxismo na América do Sul (...). Segundoconsta, está presentemente no Rio de Janeiro. Sou amigo deMário Pedrosa e espero encontrarme com ele muitobrevemente".Ou seja: Pedrosa tinha, sem saber, em suas relações umagente inimigo que o monitorava para o Estado. Sobre asaúde, a impressão parece contraditória com os fatos. Omilitante tinha 40 anos de idade e aparentava 35. E só viriaa morrer octogenário.Em outro regime de força, o dos militares (19641985), aespionagem prosseguiu. Um informe do CIE (Centro deInformações do Exército) do 1º Exército sintetizou em 8 dejulho de 1970 um Inquérito Policial Militar no qual Pedrosae outros intelectuais e ativistas foram condenados pordivulgar no exterior, nas palavras do agente militar,"eventuais torturas e violência a presos políticos brasileiros".O relatório do órgão de inteligência do Exército afirma: ""Oepigrafado [Pedrosa" influiu na ação do grupo devido à suaascendência moral sobre os mais jovens, pois impunhasepelo seu conhecimento, idade e respeito ao "velho mestre".Vinte dias depois, foi decretada a prisão preventiva de MárioPedrosa, que se asilou na embaixada do Chile. Após doismeses, ele partiu para o exílio no país andino, onde tambémfoi observado por arapongas brasileiros.Além do tom temeroso e ironicamente um tanto venerandodas 192 páginas encontradas nos fundos documentaispolíticos do Arquivo Público do Rio, a maioria comcarimbos de "confidencial" ou "secreto", dois aspectos sedestacam no dossiê. Um é a longevidade do olhar do aparatode segurança sobre Mário Pedrosa, expressão da trajetóriapolítica de quem, aos 78 anos (nasceu em abril de 1900),escreveu para o ascendente líder sindical Lula, numa cartaem que se referia a Karl Marx como "meu mestre": "Nessaidade (...) não se é mais candidato a nada, a não ser acontinuar fiel às idéias da mocidade".O outro é, num aparente paradoxo com a espionagemininterrupta dos órgãos oficiais, a impressão de que osinformes não dão conta da relevância histórica de Pedrosa,gostese ou não dele.A explicação provável é a obsessão da arapongagem com avigilância dos movimentos armados contra o Estado.Opositor de Getúlio Vargas e dos militares, Pedrosa nãoparticipou, considerandoas ações destinadas ao fracasso, dachamada Intentona Comunista de 1935 e da guerrilha dosanos 60 e 70.Mário Pedrosa aderiu ao Partido Comunista em meados dosanos 20. Em 1928, rompeu com o stalinismo e se tornou oprecursor da oposição de esquerda, liderada por Trótski, noBrasil.Na década de 30, principiou o estudo sistemático da arte. Nofuturo, na opinião de muitos pesquisadores, se tornaria o
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maior crítico brasileiro, com larga projeção internacional.Na virada para os anos 40, irritado com o pacto HitlerStálin,se opôs à "defesa incondicional da União Soviética"apregoada por Trótski e abandonou o grupo trotskista, cujadireção mundial integrava. Ao morrer, mantinha sobre amesa de trabalho um portaretratos com a imagem dorevolucionário russo.No arquivo do Rio estão registradas as suas prisões de 1938e 1941, inclusive com as fotos de frente e perfil e as digitaisimpressas, além da decretação de prisão preventiva nãoconsumada de 1970.Em 1966, o Cenimar (Centro de Informações da Marinha)infiltrou um agente numa célebre assembléia de intelectuaisoposicionistas em Ipanema, com a presença de MárioPedrosa, Janio de Freitas, Carlos Heitor Cony, AntonioCallado, Flávio Rangel, Tonia Carrero, Paulo Francis e oadvogado José Gregori, atual ministro da Justiça.A temporada de três anos de Pedrosa no Chile, de onde eleescapou após o golpe de setembro de 1973, é reconstituídaem fragmentos por interrogatórios de dois militantes feitospelo DOI (Destacamento de Operações de Informações) do1º Exército. Um dos detidos havia se hospedado em Santiagona casa de Pedrosa, que se dedicou a amparar conterrâneosexilados e a organizar o Museu da Solidariedade para opresidente socialista Salvador Allende.Na inauguração do museu, em 1972, com obras de JoanMiró, Lygia Clark, Frans Krajcberg e artistas de todo omundo, Allende citou cinco vezes o amigo brasileiro em seudiscurso.Em 1977, quando voltou, doente, do exílio na França,Pedrosa foi interrogado pela Polícia Federal. Seu depoimentoficou registrado em três páginas.Num dos últimos informes em que é citado, foi visto por umespião do Exército em outubro de 1979, em Madureira,subúrbio carioca, numa reunião de lançamento do PT. Lula eo psicanalista Hélio Pellegrino, levado pelo amigo MárioPedrosa para o novo partido, estavam lá.Um século após o nascimento e duas décadas depois damorte de Pedrosa, sua história na política e nas artes vemsendo recuperada em reedições de seus escritos e estudosacadêmicos. Inexiste, contudo, uma biografia à altura dequem, em sua elegia, Cláudio Abramo chamou de "príncipedo espírito".
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