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Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciárioe do Ministério Público da União no DF
Filiado à CUT/FENAJUFE
Ano XVIII - nº 64Fev-Mar/2010
2 Revista do Sindjus • Fev-Mar/2010
Tão ameaçado de extinção quanto o peixe-boi, o boi de carnaval de Alagoas criou alter-nativas de supervivência que hoje fazem par-
te da programação de pré-festejos de Maceió, comtorcidas e 28 bois em desfile. Um começo meio por baixo,
quase como pedintes de cachaça e tira-gostos, colocavam trapos nolugar do couro na armação de arame e bambu, e um arremedo de chifre. Ou
eram crianças batendo lata para brincar o carnaval. A coisa cresceu e em 2003 aLiga foi fundada. Impressiona o número de crianças nos dois dias de desfile naarena aberta do Multieventos da Prefeitura, na Pajuçara. O boi tem força na comu-nidade e atua em diversas campanhas; daí não gosta de ser chamado só “de carna-val”, por trabalhar o ano todo. Os bois, em si esculturas dançantes (cerca de 2,5m),mereciam uma expo de artes plásticas pela riqueza de leituras e temas. Fogem dorigor do bumba-meu-boi clássico e adotam enredos que podem ir desde o Chaves ea escolinha do Chico Anysio até a “fraternidade com a China” no Boi Dragão, Mon-teiro Lobato, Dicionário Aurélio, aniversário do Teatro Mal. Deodoro, a solidarieda-de, o sertão na santíssima trindade Lampião–Padim–Luis Gonzaga e uma óperacurta sobre o boi que deveria ser aposentado por bons serviços, mas acaba nomatadouro. É a diferença que o carnaval de Alagoas pode oferecer. As batidas sãomistas: tem uma levada afro, forte, toques funk com o maracatu mordendo. Excelen-tes instrumentistas, com destaque especial no balé-duelo entre boi e vaqueiro, egrande senso teatral para contar o tema em dramatizações rústicas de comoventeentrega do pessoal. Bem-vinda também a fusão com os Guerreiros na festa (esteano homenagearam Mestre Benom).
Bois deresistência
CONTINUA NA PÁGINA CENTRAL
TT CATALÃO
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não há orçamento para bancar a nossa revisão sa-larial. Vamos ter de enfrentar a Secretaria de Fi-nanças do Ministério do Planejamento novamente.Por isso, desde o início do ano temos articuladopara que o STF se reúna com o Planalto para resol-ver essa questão. Teremos também que estar pre-parados para novos ataques da mídia, que insisteem dizer que ganhamos muito. E ainda teremos detrabalhar o ano eleitoral a nosso favor.
Para sairmos vitoriosos de tantas batalhas énecessário, desde já, estarmos unidos. Recente-mente o Sindjus realizou uma reunião para defi-nir as estratégias desse combate e convidou to-das as associações tanto do Judiciário quanto doMPU para participar. Todos, independentementede posições políticas e ideologias, devem estarjuntos nesse momento. Só assim teremos chancede conquistar nosso objetivo: aprovar os dois pro-jetos ainda no primeiro semestre.
Portanto, prepare-se. Os próximos meses se-rão de muita pressão, de muita mobilização e demuito enfrentamento. Temos que ter consciênciade que os obstáculos são complicados, mas o so-nho é possível. O otimismo e a esperança devemvencer qualquer barreira. Em breve vamos precisarde força total nos corredores do Congresso. Cadaum de nós tem a missão de colaborar para que oprojeto caminhe o mais rápido possível. Se todosse mobilizarem, sem dúvida, chegaremos lá.
O ano de 2010 será atípico,ao menos no Congresso Na-cional. Um ano corrido, emrazão das eleições que seaproximam. Nós, servidoresdo Judiciário e do MPU, con-tinuamos firmes e imersos emuma luta constante, uma lutacontra o relógio e em prol daaprovação de nossos PCCRs.
Os projetos de lei que tra-tam do Plano de Cargos, Car-reira e Remuneração dos tra-balhadores do Judiciário e doMPU (PL 6613/09 e PL 6697/
09, respectivamente) estão em processo de trami-tação. Atualmente estão na Comissão de Traba-lho, Administração e Serviço Público na Câmarados Deputados. Ambos têm o mesmo relator, o de-putado Sabino Castelo Branco (PTB/AM).
O Sindjus tem mantido contato com o rela-tor e com outros parlamentares para acelerar atramitação, mas nós sabemos que essa não seráuma batalha fácil. Muito pelo contrário, temosuma série de dificuldades em nosso caminho.Devemos estar preparados para lutar contra afalta de vontade política que impera quando setrata de nossas lutas.
Também devemos vencer o discurso de que
“Vamos precisarde força totalnos corredoresdo Congresso.Cada um de nóstem a missão decolaborar paraque o projetocaminhe o maisrápido possível.Se todos semobilizarem,sem dúvida,chegaremos lá.”
AO LEITOR
Roberto PolicarpoCoordenador-geraldo Sindjus
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Os desafios de2010
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OPINIÃO
José Geraldo deSousa Junior
Reitor da Universidade deBrasília, professor da Faculdade
de Direito e coordenador doprojeto O Direito Achado na Rua
“A justiça de tran-sição é um esforço
para a construção dapaz sustentável após
um período deviolação de direitos
humanos. Implicarevelar a verdade,
processar perpetra-dores de crimes,
conceder reparaçõesàs vítimas e reformar
instituições respon-sáveis por abusos.”
Justiça detransição
O pró-labore de José Geraldopara este artigo é doado
mensalmente à campanha devoluntariado Eu Doo Talento
(veja em www.sindjusdf.org.br)
m seguida às comemorações do Dia Internacionaldos Direitos Humanos, em dezembro, o presiden-
te da República, em cerimônia no Itamaraty para en-trega do Prêmio Direitos Humanos 2009, editou o de-creto de aprovação do novo Programa Nacional deDireitos Humanos. Ao adotar, em 1996, o ProgramaNacional de Direitos Humanos, o Brasil foi um dos pri-meiros países do mundo a seguir a recomendação daConferência Mundial de Direitos Humanos (Viena,1993): atribuir aos direitos humanos a condição depolítica pública governamental. Desde então, impor-tantes revisões têm sido objeto de atenção dos prota-gonistas desse campo, no caso brasileiro por meio deuma interlocução construtiva entre governo, parlamen-to e sociedade civil, cujo instrumento eficiente é a sé-rie de Conferências Nacionais de Direitos Humanos.
Uma das mais significativas atualizações,levada ao PNDH 2 a partir de 2002, foi a inclusão dosdireitos econômicos, sociais e culturais, de forma coe-rente com o princípio de indivisibilidade e interdepen-dência de todos os direitos humanos, expresso na De-claração de Viena. O PNDH 2, orientado também pe-los parâmetros estabelecidos na Constituição de 1988,incorporou ações no campo da garantia do direito àeducação, saúde, previdência e assistência social, tra-balho, moradia, meio ambiente, alimentação, culturae lazer, de forma conjugada com estratégias de elabo-ração orçamentária e metas gerenciais de execução.Ao lado de mobilizações para desenvolver uma cultu-ra de respeito aos direitos humanos, a previsão de re-cursos orçamentários para assegurar a sustentabilida-de de programas e dos órgãos responsáveis.
A nova atualização (PNDH 3) chamou a atençãopela imediata e concertada objeção a algumas de suasdiretrizes, mobilizando segmentos conhecidamente re-fratários ao aprofundamento democrático provenien-te dos avanços da Constituição de 1988. Tive ensejode fazer crítica a essas reações em artigo no CorreioBraziliense (Desafio à Educação, p. 15, 20/01/2010).Aqui, quero por em relevo a nova proposta para a ques-tão, que cuida da instalação de uma comissão nacio-nal com amplos poderes para apurar crimes da dita-dura militar e responsabilizar os agentes culpados.
Trata-se da originalmente chamada Comis-são de Verdade e Justiça, que, seguindo modelo ado-tado em países com necessidade de apurar violaçõesde direitos durante regimes de exceção, acabou, por
conta de tensões vivenciadas no seio do governo, re-definida como Comissão Nacional de Verdade.
Resolução da OEA (2006) reconhece a impor-tância do direito à verdade para o fim da impunidadee a proteção aos direitos humanos. As divergênciasque precederam a aprovação do Programa opuseram,de um lado, o ministro Paulo Vannuchi, da SecretariaEspecial de Direitos Humanos, com a ideia de consti-tuir a comissão não só como resposta às expectativasde familiares de pessoas torturadas e mortas nos anosda ditadura (sem que, em muitos casos, sequer os cor-pos tenham sido localizados), mas também com po-deres para recuperar arquivos ainda em mãos de ór-gãos militares e de segurança, que permitam elucidarcasos de desaparecimentos e responsabilizar agentes,em face da natureza imprescritível das violações co-metidas. De outro lado, o ministro da Defesa NelsonJobim, apoiado em premissa, a meu ver errada, de quea Lei de Anistia e a interpretação de seu alcance duplo(aos militantes políticos e aos agentes de repressão)seria fruto do acordo político de 1979, com o objetivouma reconciliação nacional. Ele advogaria, portanto,uma comissão de reconciliação, mas não de justiça.
A reivindicação de incluir uma Comissão deVerdade e Justiça, mesmo na forma atual de Comis-são de Verdade, decorre da Conferência Nacional deDireitos Humanos realizada em dezembro de 2008 comcaráter deliberativo. Decorre também da natureza co-gente do direito internacional dos direitos humanos,expressa em decisões de tribunais internacionais queindicam ao Brasil a necessidade de concluir o proces-so de democratização com a verdade sobre os fatos,para evitar repetições de ciclos de violência.
Essa reivindicação inscreve-se nos fundamentos doque se denomina justiça de transição, que pode serdefinida como esforço para a construção da paz sus-tentável após um período de conflito, violência emmassa ou violação sistemática dos direitos humanos.Esse conceito é proposto por Paul Van Zyl, vice-presi-dente do International Center for Transitional Justice.Examinando os elementos-chave da justiça transicio-nal, o que não se pode perder de vista, à luz de seusenunciados, é que a justiça transicional admite simreconciliação, mas implica necessariamente processaros perpetradores dos crimes, revelar a verdade sobrecrimes, conceder reparações às vítimas e reformar asinstituições responsáveis pelos abusos.
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ARTE EM BRASÍLIA
EdiçãoUsha Velasco (DRT-DF 954/99)
ReportagemCarlos TavaresDaniel CamposFabíola GóisThais Assunção
ColaboradoresJosé Geraldo de Sousa JuniorTT Catalão
RevisãoAna Paula Barbosa Cusinato
Projeto gráfico e arteUsha Velasco
Tiragem15.000 exemplares
Revista do Sindjus
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Coordenadores-GeraisAna Paula Barbosa CusinatoBerilo José Leão NetoRoberto Policarpo Fagundes
Coordenadores de Administraçãoe FinançasCledo de Oliveira VieiraJailton Mangueira AssisRaimundo Nonato da Silva
Coordenadores de AssuntosJurídicos e TrabalhistasJosé Oliveira Silva
Marília Guedes de AlbuquerqueNewton José Cunha Brum
Coordenadores de Formaçãoe Relações SindicaisJosé Joventino Pereira de SousaAntônio José Oliveira SilvaEliane do Socorro Alves da Silva
Coordenadores deComunicação, Cultura e LazerSheila Tinoco Oliveira FonsecaMaria Angélica PortelaValdir Nunes Ferreira
Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário e do MPU no DFSDS, Ed. Venâncio V, s. 108 a 114, Brasília-DF, 70393-900 • (61) 3212-2613
www.sindjusdf.org.br
RINALDO MORELLI*
* Fotojornalista por sobrevivência material, artista por sobrevivência da alma. Fundador do grupo de fotógrafos Ladrões de Alma.Fundador e presidente da AFOTO – Associação de Fotógrafos de Brasília. E professor de fotografia (sempre).
A série Equivalências faz links entre texturas. Orgânicas e urbanas. É uma rima de detalhes que somente a luz revelae a fotografia aproxima. Na galeria elas são expostas em grandes paineis, que a meu ver pedem silêncio e reflexão.‘ ‘ ‘ ‘
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Thais Assunção
indignação com os escândalos decorrupção no DF, somada à muita
irreverência, levou cerca de dez mil pes-soas ao Pacotão, principal bloco carna-valesco de rua de Brasília, que comple-tou 32 anos. Os foliões lotaram a qua-dra 302 norte, local da concentração, eo tradicional percurso pela contramão daW3, nos dias 14 e 16 de fevereiro.
“Fora Arruda. Roriz nunca mais”. Afrase, estampada na camisa vermelha doBloco dos Trabalhadores na Rua, que seuniu ao Pacotão, contribuiu para forta-lecer o movimento da população revol-tada com os escândalos de corrupçãono GDF. O bloco foi organizado pela CUT-DF com apoio do Sindjus.
O governador afastado José Rober-to Arruda, preso pouco antes do carna-val, tornou-se o tema das marchinhas doPacotão – ao lado de outros persona-gens do escândalo, como os deputadosdistritais Leonardo Prudente e EuridesBrito. O sarcasmo e bom humor foramos elementos principais, e logo todos es-tavam com as letras na ponta da língua.Champanhe com Panetone, Arrombarama Caixa de Pandora, Faltou Panetone naPapuda e a campeã deste carnaval, amarchinha Bolsetão da Eurides, fizeramo maior sucesso entre o público.
O coordenador geral do Sindjus, Ro-berto Policarpo, acompanhou o bloco edisse que a mobilização da sociedade éfundamental para mudar o quadro de cor-rupção. “A população está cansada deescândalos e não pode ficar parada. Te-mos que nos unir para exigir punição aoscorruptos. O Bloco dos Trabalhadores naRua é uma ótima oportunidade para isso.
E para comemorar também,pois os últimos acontecimen-tos mostram que a justiçaestá cumprindo seu papel”,afirmou, referindo-se à pri-são do governador, ordena-da pelo Superior Tribunal deJustiça (STJ).
“O Pacotão é um blocotradicional e conhecido porseus protestos políticos,que congregam as pesso-as. Por isso nos juntamos aele com o Bloco dos Traba-lhadores na Rua, para mos-trar a nossa indignaçãocom tudo que está acontecendo no ce-nário político de Brasília”, disse a pre-sidente da CUT, Rejane Pitanga.
Panetone com dinheiro – “Vocêaceita um pedaço do panetone mais caroda história?” Assim o chefe de cozinhainternacional Tony Martins oferecia umadegustação do prato do dia aos foliões:panetone recheado de dinheiro. Vestidocom o uniforme de trabalho, Tony, commuito bom humor, usou a sua própriaprofissão para satirizar a esfarrapada ex-plicação do governador para o gasto dedinheiro público no escândalo.
O chefe de cozinha acredita que asituação de Arruda tende a piorar e elenão terá opções senão renunciar ao car-go. “Acho que vamos conseguir dar umbasta nessa situação. A população temque gritar, agitar e sair às ruas, por issoeu vim ao Pacotão”, reforça.
A presença de milhares de foliõesfantasiados indicava que Tony tem ra-zão. A fantasia mais popular foi a de pre-sidiário, ao lado do panetone, do dinhei-
ro nas meias e das diversas “Eurides”com sua famosa bolsa – alusão à filma-gem onde a deputada aparece guardan-do maços de dinheiro. Nem os cachor-ros escaparam: havia vários fantasiadosde panetone.
Já se passaram mais de três déca-das desde que o Pacotão saiu às ruaspela primeira vez. O jornalista paraiba-no Ivan Pimentel estava lá. E, neste car-naval de 2010, carregava com orgulhoa prova: o LP lançado em 1978 com asmarchinhas da época, com destaquepara Pacote de Abril, referência a medi-das do então presidente Ernesto Geiselno ano anterior.
Ivan afirma que o bloco é um impor-tante e irreverente espaço de manifes-tação dos brasilienses, que todos os anostraz à tona fatos marcantes da políticanacional. “O Pacotão é marcante pelasbandeiras que levanta. Acompanho to-dos os anos e acredito na força das mar-chinhas para denunciar injustiças e es-cândalos, como esse mensalão do DEMno DF”, ressalta.
cidadãFolia
Policarpo e Ana Paula: Sindjus marca presença na folia
Em carnaval histórico, milhares vãoàs ruas protestar contra as denúncias
de corrupção no governo do DF
MOBILIZAÇÃO
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Presidiários (acima):fantasia das maispopulares. Ao lado,o chef de verdadeprotestou com umaiguaria de mentiri-nha; folião juntadinheiro à camisado Bloco dos Traba-lhadores; e até cãesforam fantasiadosde panetone
RENATO ARAUJO/ABR
RODRIGO OLIVEIRA
RENATO ARAUJO/ABRRENATO ARAUJO/ABR
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origensFabíola Góis
momento do parto é sempre mo-tivo de preocupação para mães
de primeira viagem, ou mesmo paraas que já têm filhos. Afinal, é sempreangustiante a espera pelo bebê gera-do durante nove meses. A mulher sepreocupa com o pré-natal, com a saú-
de dela e do fi-lho, com os pro-fissionais que osatendem. Mas oexcesso de aten-ção provoca in-seguranças queinterferem atémesmo na esco-lha do tipo departo: normal oucesárea? E cadavez mais mulhe-res no país op-tam pela cirurgiana hora de parir– que contraria a
natureza do ser humano, o bom sensoe os cuidados com a segurança, já queesse tipo de parto aumenta em 25 ve-zes o risco de morte materna.
Segundo a Organização Mundialda Saúde (OMS), uma taxa de cesaria-na aceitável está na faixa de 10% a
15%. O Brasil está entre os países comas maiores taxas de cesarianas: o ín-dice de 40% é muito acima do reco-mendado. E se os dados de hospitaispúblicos e particulares forem compa-rados percebe-se que se faz mais ce-sáreas nos particulares, onde o ín-dice chega a 80%.
Seja por medo de sentir dor ou deter alguma complicação na hora donascimento, muitas mulheres preferemmarcar o dia da cirurgia. Nem sequeraguardam o início do trabalho de par-to, que sinaliza que o bebê está prontopara nascer. Armam-se de tecnologia eprofissionais para garantir que nenhumimprevisto ocorra. Mas será que essaprática é a mais saudável?
O pior é quando o profissionalpressiona ou indica cesariana para apaciente sem que haja a real necessi-dade. E isso tem sido cada vez maiscomum no Brasil. Foi o que aconteceucom Patrícia (nome fictício), que per-cebeu no médico a ansiedade por ter-minar logo o parto dela porque tinhauma série de grávidas para atender noconsultório. Resultado: a desconfian-ça de Patrícia se confirmou. Ela nãoconseguiu ter parto normal. “Tenhocerteza de que se ele tivesse esperadomais um pouco meu bebê poderia nas-cer sem a cirurgia.”
Adepta à teoria de que o parto nor-mal é melhor, a analista judiciária Patrí-cia Coelho Carvalho Falcão preferiu su-portar as contrações a ter que realizaruma cesariana. O primeiro parto, de suafilha Beatriz, hoje com três anos, foi com-plicado. Mesmo assim ela não desistiude ter o segundo filho de parto normal.A médica optou por induzi-lo porque na37ª semana o pequeno Davi já estava
Mães saudáveis
PERIGO
o risco de morte materna.Mesmo assim, nos hospitais
particulares brasileiros,
80%dos partos são cirúrgicos.
A OMS alerta: o índicemáximo aceitável é de
A cesariana aumenta em
25 vezes
15%
Volta às
Cesarianas desnecessárias ainda predominam,mas trabalhos de conscientização começam
a reforçar a opção pelo parto normal
SAÚDE
Patrícia fezquestão de terBeatriz (3 anos)e o recém-nascido Davi departo normal,depois de vera filmagem dacesariana deuma prima
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com 3,2 kg e 50 cm. “O parto normal ésempre melhor. Depois que eu vi a fil-magem da cesariana da minha prima,fiquei traumatizada”, contou Patrícia.
No Tribunal de Justiça do DF e Territó-rios (TJDFT), o Programa de AssistênciaMaterno-Infantil existe desde 2005 e foicriado para acompanhar e orientar a ges-tante e a mãe que amamenta, para ga-rantir melhor qualidade de vida nesseperíodo. O Grupo de Gestantes acompa-nha as magistradas e as servidoras nesse
período, preparando-as para um parto eum puerpério saudáveis. A futura mamãeassiste a palestras como Psicologia daGravidez, Tipos de Parto, Primeiros Cui-dados com o Bebê, Amamentação, Shan-tala, e faz atividades físicas orientadas.
No Superior Tribunal de Justiça (STJ)há um grupo de gestantes coordenadopela Secretaria de Serviços Integrados deSaúde. Além de reuniões periódicas comas futuras mães, há um manual com dicaspara uma gestação saudável, alimentação
natural e cuidados com o recém-nascido.O chefe da Seção de Assistência Nu-
tricional da Secretaria, Adelmir SoaresMangabeira Júnior, explica que cerca de30 a 40 grávidas são atendidas por anoe todas elas recebem orientações sobre oparto. “Muitas mães são sutilmente ori-entadas a fazer cesariana quando surgequalquer dúvida ou temor durante a gra-videz. Ainda há uma cultura de insegu-rança em relação ao parto e elas optampela cirurgia por medo”, observa.
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Se por um lado nem todos os obs-tetras acompanham todas as etapas doparto, nos últimos dez anos aumentouconsideravelmente o número de dou-las (mulheres que auxiliam as futurasmamães no momento do parto). Elassão mais do que parteiras: além da ex-periência, têm instrução sobre o assun-to e cuidam também do lado emocio-nal da mulher.
As doulas procuram se manter atu-alizadas participando de cursos e even-tos voltados para o nascimento. Como
em novembrodo ano passa-do, quando de-zenas de dou-las, mães eprofissionaisda saúde parti-ciparam doworkshop Blo-queios sexuaisno nascimentoe formas dedesbloqueá-los – preven-ção e atendi-
mento de complicações no parto domi-ciliar, ministrado pela parteira mexica-na Naolí Vinaver Lopez.
Foi uma oportunidade para trocarexperiências e saber quais as novidadesno mundo. Renata Beltrão, secretáriaexecutiva da ONG Casa da Luz e orga-nizadora do evento, defende o partonatural sem a intervenção de médicosou de alguém que possa interferir noenvolvimento entre mãe e filho. “Nósdefendemos o respeito à mulher e aobebê. O tipo de parto é consequência.Mas sabemos que as cesarianas salvamvidas e em alguns casos são necessári-as”, afirma.
Renata, que também é doula e for-madora de doulas, teve dois filhos emcasa e lamenta o número de partos ci-rúrgicos no Distrito Federal. “O tecnicis-mo está predominando entre essas mu-lheres. Elas esquecem que a formaçãomédica é intervencionista e que muitos
obstetras optam pela cesárea porque,além de poder marcar a hora, os planosde saúde pagam mais por ela do quepor um parto normal”, observa.
A ONG, que tinha sede em Alto Pa-raíso (GO) e agora está no DF, pretendedesenvolver campanhas de conscienti-zação sobre a importância do parto nor-mal e domiciliar. “A mulher tem abdica-do do poder dela de dar à luz e deixaesse momento maravilhoso nas mãos demédicos. Ela precisa se colocar na con-dição de mulher e ser dona desse pro-cesso”, defende Renata Beltrão.
Essa é a mesma opinião da partei-ra Naolí Vinaver Lopez. Desde 1987ela afirma ter atendido, no México,cerca de mil partos domiciliares e par-ticipado como conferencista em con-gressos de parteiras em mais de trin-ta países. Naolí teve três filhos empartos domiciliares.
O tema está na moda. O filme Or-gasmic Birth, uma produção de 2007com legendas em português, é exibidoem salas particulares do DF e tenta des-mistificar a crença de que o parto é do-loroso e perigoso por natureza, e quedeveria ser deixado totalmente nasmãos dos médicos. O filme mostra as po-tencialidades emocionais, espirituais efísicas do parto, com o acompanhamen-to do parto de onze mulheres que dão àluz do jeito mais natural possível (ge-mem, beijam e riem).
Naolí diz que no México o númerode cesáreas também é alto. “É um de-safio cultural: a cultura do medo impe-ra. Com o avanço da medicina, as mu-lheres começaram a achar que precisa-vam de ajuda para parir”, explica. Paraela, existe em todo o mundo um movi-mento de humanização do parto.
A nutricionista Lívia Penna, doulapor opção e amor ao trabalho, tevecinco filhos, todos com parto normal,quatro deles em casa. Ela começou aatender as mulheres após ter seu se-gundo filho, hoje com 25 anos. Duran-te a preparação para o nascimentodele, Lívia entrou em contato com o
movimento de humanização do partoque, futuramente, originou a Rede pelaHumanização do Parto e Nascimento(Rehuna), da qual é uma das funda-doras. Só o primeiro filho dela preci-sou nascer em um hospital, na Ingla-terra, porque estava sentado. Mesmoassim o parto foi normal.
Autora de dois livros sobre o tema,Lívia Penna forma doulas e integra aONG Casa da Luz. “Muitos médicosobstetras trabalham com doulas porqueo parto fica mais tranquilo. Outros des-conhecem e têm preconceito. Mas issoé uma questão de tempo; acho que otrabalho das doulas ainda é pouco co-nhecido”, comenta.
Para ela, os principais desafios dasdoulas são ter o trabalho valorizado ereconhecido, ser aceitas pelos profissio-nais de saúde como parceiras do traba-lho de parto e ter apoio oficial, por meiode inclusão nas políticas públicas deatenção ao parto e nascimento.
Existem duas categorias de doulas:as particulares (cujo preço de atendi-mento varia de R$ 500 a 3 mil por par-to) e as comunitárias, mulheres da co-munidade que fazem o curso promovi-do pelos hospitais públicos e atuam de-pois como voluntárias nas maternida-des, assistindo as mulheres.
Um desafio cultural
Muitos obstetrasoptam pela cesárea
porque, além de podermarcar a hora, os
planos de saúde pagammais por ela do que
por um parto normal.
Renata Beltrão, secretáriaexecutiva da Casa da Luz
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O que são as doulas?
A obstetra Carla Daher é adepta doparto natural e domiciliar. Mãe de trêsfilhos, sendo dois nascidos em casa, amédica começou a ser procurada pormulheres que também querem ter os fi-lhos nas próprias residências. Carla temum consultório, mas pretende em breverealizar todo o pré-natal nas casas daspacientes. Ela explica que há poucosprofissionais na área que fazem o mes-mo trabalho que ela, e há muita procu-ra. “Alguns partos demoram muito.Quando vejo que não há como a crian-ça nascer naturalmente, levo a mãe parao hospital”, afirma.
Carla Daher gosta de dizer que émais parteira do que obstetra, mas, setiver que fazer uma cesariana, faz comtranquilidade. “O parto normal é maissaudável. É o encontro da mulher comseu filho e com o seu próprio corpo.Houve uma medicalização do parto, mashoje há uma tendência a voltar às ori-gens e parir em casa”, opina. A médicaexplica que o índice de complicação émuito baixo nos partos em casa. “Dospartos que atendo, em gestações debaixo risco, o índice de cesáreas gira emtorno de 3%. É um bom índice, segun-do a OMS”, explica.
A palavra grega doula vemsendo utilizada desde as pesqui-sas de Marshall H. Klauss e JohnH. Kennel, no início da década de90, para designar as mulherescapacitadas a dar apoio continua-do a outras mulheres (e aos seuscompanheiros e familiares), pro-porcionando conforto físico, apoioemocional e suporte cognitivo,antes, durante e após o nascimen-to dos filhos.
Hoje, a Organização Mundial deSaúde e os ministérios da Saúde devários países, entre eles o Brasil
(Portaria 28, de maio de 2003),reconhecem, após uma década depesquisas científicas, a enormecontribuição da presença da doulano momento do parto. Ficou de-monstrado que o parto evolui commaior tranquilidade, mais rapidez,menos dor e menos complicaçõesmaternas e fetais. Na América doNorte estima-se que existam dedez mil a doze mil doulas. No Bra-sil, a demanda de mulheres e insti-tuições que solicitam esse serviçoainda é bem menor, mas tambémvem crescendo significativamente.
Parto em casaFonte: w
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.doulas.org.br
Carla Daher: atendência évoltar às origens.Renata Beltrão(abaixo):“Defendemos orespeito à mulhere ao bebê”
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Na Casa de Parto de São Sebasti-ão não há mesas de cirurgia. A mulherpode escolher como quer ter o filho:de cócoras, em cima da cama articula-da ou dentro da banheira. Desde 2001,a unidade, vinculada à Secretaria deSaúde do DF, faz pelo menos um partopor dia. Há nove anos, esse númeroera maior: dois por dia. Até hoje só foiregistrado um óbito, mas o bebê mor-reria em qualquer hospital: ele teveembolia aminiótica (quando o líquidoaminiótico e outros resíduos penetramna circulação sanguínea).
A enfermeira especializada em obs-tetrícia Euzi Adriana Bonifácio é umadas responsáveis pela Casa de Parto.Ela explica que a instituição segue omodelo do Sistema Único de Saúde(SUS) e se encaixa no perfil de Centro
de Parto Normal criado pelo Ministé-rio da Saúde em 1999. Em 2005 foieditada a Lei 11.108, que garante àmulher a presença de um acompa-nhante na hora do parto e pós-partonas maternidades públicas do país.
A Casa de Parto recebe mulheresde todas as regiões do DF e Entorno,
independentemente de pré-natal feitona rede pública. As exigências são deque a grávida tenha feito pelo menosseis consultas de pré-natal registradasno cartão de gestante, esteja com to-dos os exames normais e não tenhafeito cesarianas ou cirurgias pélvicas.“Aqui as mulheres escutam músicas,
Trabalho pioneiro em São Sebastião
Euzi, enfermeira obstetriz:mulheres podem optar por
ter o filho de cócoras, na camaarticulada ou na banheira
Recém-nascidona Casa deParto: processohumanizado
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O exemplo da bela
Tipos de parto
NORMAL:Não se pode decidir o momento donascimento do bebê. É preciso espe-rar as contrações e a dilatação docolo do útero.
As contrações (as famosas “dores doparto”) se assemelham a cólicas. Elascomeçam fracas e espaçadas, e vãoaumentando até chegar à fase deexpulsão. A dilatação do colo devechegar a dez centímetros para que obebê nasça.
O trabalho de parto dura, em média,12 horas, mas é apenas nas duasúltimas horas que as contrações setornam mais fortes.
Na maioria dos casos, é necessáriorealizar uma episiotomia (corte aolado da vagina) no momento da pas-sagem do bebê, para evitar rupturanos músculos do períneo. Os pontoscaem sozinhos, mas precisam ser bemlavados para evitar infecções.
A permanência da mãe nohospital após o parto é geralmentede 24 horas.
O custo para os pais e para ohospital é menor.
CESARIANA:A mãe pode decidir quandoserá o parto.
A mulher não sente as “dores doparto”. Geralmente a dor é maiordepois da cirurgia. Necessita de umamaior dose de analgésicos.
A cesárea não deixa de ser umacirurgia, com todos os riscos decomplicações.
O tempo de internação da mãe apósa cesariana é, em média, de 48 horas.
A mulher não deve pegar peso oufazer esforço físico por, pelo menos,dois meses após a cirurgia.
A modelo Gisele Bündchen, mãehá pouco mais de dois meses, deuexemplo a todo o mundo ao ter oparto dentro de sua casa nos Esta-dos Unidos. O bebê nasceu em umabanheira. “Queria um parto em casa,sempre achei muito importante por-que queria estar consciente na horado nascimento. Eu não queria estar
dopada e sim presente”, explicou Gisele em recente entrevista aoFantástico, onde contou que se preparou com yoga e meditação. Oparto durou oito horas, mas ela afirmou que não sofreu. “Não foinem um pouco dolorido. Durante todo o tempo eu estava muito fo-cada. Depois de cada contração eu pensava assim: o meu bebê estámais perto, ele está mais perto”, contou.
sentam nas bolas de pilates paraaliviar as dores lombares e podemficar com quem quiserem. Estamospreparadas para atender rapida-mente o recém-nascido que estiverem sofrimento. Temos incubadoraspara transporte até o hospital”, ex-plica a enfermeira.
A Casa de Parto foi ameaçadade fechamento no ano passadopor causa de uma divergência en-tre médicos, enfermeiros e o go-verno do DF. O Conselho Regionalde Medicina e o Sindicato dos Mé-dicos do DF alegaram que os en-fermeiros não estão aptos a reali-zar os procedimentos sozinhos epediram a presença de ginecolo-gistas no local. Até fevereiro de2009 os partos eram feitos porobstetras, mas os onze médicosque estavam lotados na unidadeforam transferidos para o Hospi-tal Regional do Paranoá. O Con-selho Regional de Enfermagementregou à Secretaria de Saúdetoda a fundamentação legal queampara o trabalho dos enfermei-ros obstetrizes nas casas de par-to. São catorze unidades de partoexistentes em todo o Brasil.
Estudos científicos apontamevidências de que os partos reali-zados com a presença de umacompanhante trazem benefíciose evitam problemas à saúde dagestante. O Ministério da Saúdetem promovido uma série de açõespara humanizar os partos no país.Cerca de catorze estudos científi-cos brasileiros e internacionais, re-alizados com mais de cinco milmulheres, mostram que as gestan-tes que contam com um acompa-nhante no parto e no pós-parto fi-cam mais tranquilas e seguras du-rante o processo.
O Ministério da Saúde promo-ve cursos nas maternidades vin-culadas ao SUS para conscienti-zar os profissionais sobre a ne-cessidade de mudar práticas e hu-manizar partos. Há campanhasem defesa do parto normal. Os se-minários chamados Qualificaçãona atenção obstétrica e neonatalhumanizados com base em evi-dências científicas foram criadoscom o apoio das secretarias esta-duais e municipais de Saúde, deorganizações profissionais e de or-ganismos internacionais.
Gisele e Benjamin em capade revista: “Queria estarconsciente no nascimento”
14 Revista do Sindjus • Fev-Mar/2010
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Cesariana ou parto normal? Você conhece os benefícios do parto normal para o bebê e amãe? Essas e outras perguntas povoam a mente das gestantes. A influência dos médicos eas opiniões alheias podem fazer a decisão pender para o método aparentemente mais fácil
– a cesariana –, mas isso não significa que ela seja a melhor opção. Preocupado com onúmero crescente de cesarianas no país, cinco vezes maior do que o recomendado pelaOMS, o Sindjus ouviu a opinião das servidoras que aguardam a chegada dos seus filhos.
partoA hora do
Este é o meu primeiro filho;estou com oito meses degravidez e pretendo fazer
cesariana. Eu quero a cirurgiapara fugir da dor. Eu sempredesmaio quando sinto muitador. Acho que querem mudara mentalidade das mulherespara decidir pelo parto nor-
mal, mas não me convencem.A maioria das minhas amigas
fizeram cesariana.
Caroline de Moura XavierEvaristo – TJDFT
Eu prefiro o parto normal.Ainda não conversei com o
obstetra sobre isso, masconheço a facilidade de
recuperação e os benefíciospara a mãe e o bebê.
Este será o meu primeirofilho; estou com cincomeses e uma semana.
Eu quero que o parto sejanormal porque acho que
será mais tranquilo.
Ana Caroline daMota Pazini – TJDFT
Conheço os benefícios doparto normal, mas acho queas condições da mãe e dobebê têm que ser ideiais.Meu primeiro filho nasceupor cesariana; segundo a
médica, eu não tenho estru-tura corporal para o partonormal. Sou ansiosa, tenhomedo da dor. Estou grávidade seis meses e minha filhadeverá nascer de cesariana.
Anne Araújo Comber –MPDFT
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Tenho um problema no ovárioque não permite o parto nor-mal, por isso não tive escolha.
Mas, caso não tivesse esseproblema, escolheria a cesari-
ana mesmo, porque tenhomuito medo da dor. Quandoeu nasci minha mãe deveria
fazer parto normal, masacabou sofrendo vinte horas e
no final fez cesariana. Issoinfluenciou a minha decisão.
Cristiane SilvaPiconcelli – MPDFT
15Revista do Sindjus • Fev-Mar/2010
Minha primeira filha tem umano e dois meses. Meu
médico decidiu sozinho pelacesariana, no primeiro parto.
Eu não tive escolha, e porisso me arrependo. Mas
ainda tenho medo do partonormal. Acho que há 90% dechance deste parto também
ser cesariana. Eu prefiro,porque deve ser muito mais
tranquilo que o parto normal.
Érica Pires Carneiro –MPDFT
Eu queria que o meuprimeiro filho nascesse departo normal, mas não foipossível. O normal é partonormal; cesariana, só senão tiver jeito mesmo.A maioria das minhas
amigas quer cesariana, nãosei o que se passa na
cabeça delas... Mas eu não,muito obrigada, prefiro
o parto normal.
Gabriela Galvão SilveiraMelo Ferrari – TJDFT
Meu filho de dois anos nasceude parto normal e foi tudomuito tranquilo. Espero que
este seja normal também. Nãogosto de ambiente hospitalarnem de cirurgia. Durante mi-
nha primeira gravidez procureime informar, fiz ioga para
gestante, conversei muito coma professora. Quando a gentetem informação, tem muito
mais tranquilidade.
Juliana Magalhães de PinhoCruz – MPDFT
Conheço os benefícios doparto normal, mas prefirocesariana. Estou com dois
meses de gravidez; é o meusegundo filho, e o primeiro
nasceu com cesariana. Tenhomedo da dor e conto com a
questão da programação, poisa médica vai entrar de fériasna época do parto. Ela ficoucontente quando falei que
preferia a cesariana.
Vanessa de SouzaDias – TJDFT
Este é meu primeiro filho equero fazer cesariana, porquestão de planejamento epara fugir da da dor. Prefiroter o meu filho da maneira
mais fácil. O médico meapoiou, mas disse que, se euquiser mudar para o partonormal, ele também aceita.Meu marido me apoia tam-bém, apesar de sabermos osbenefícios do parto normal.
Daniele Alves deSousa –MPDFT
Escolhi a cesarianaporque tenho muito
medo da dor e do des-conforto do parto normal.
Eu não sou adepta aoparto normal, embora
saiba das vantagens dopós-parto. Mas acho que
a cesariana é melhortambém por causa doplanejamento, dá paramarcar a data do parto.
Márcia Alves deOliveira – MPDFT
Na hora do parto, pretendoaguardar ver se há dilatação;se houver, faço parto normal.Se for demorar muito, façocesariana. Não quero ficarsofrendo durante muitashoras. Minha teve dois
partos normais e rápidos;acho isso perfeito. Mas
grande parte das minhasamigas prefere cesariana,por causa da comodidade.
Verônica Reis da RochaVerano – TJDFT
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Eu prefiro o parto normal.Estou com seis meses degestação e este é o meu
segundo filho. O meuprimeiro parto foi cesariana,
mas eu não gostei; arecuperação demorou e foimuito incômoda. O parto
normal é um métodonatural e saudável, e euacredito que será melhorpara mim e para o bebê.
Cátia Betânia Chagas –MPDFT
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16 Revista do Sindjus • Fev-Mar/2010
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SOCIEDADE
18 Revista do Sindjus • Fev-Mar/2010
Fabíola Góis
o lado do muro da Vara da In-fância e Juventude, na 910 Nor-
te, havia uma lona preta que abrigavadois homens maltrapilhos, sujos, pa-recidos com moradores de rua. Apa-rentemente inofensivos, eles passavamdesapercebidos por quem circulavapelo local. Mas só mesmo a partir deuma denúncia anônima, em janeirodeste ano, é que a polícia começou ainvestigar que naquele lugar havia cri-minosos travestidos de gente humil-de. Eram traficantes de crack, uma dro-ga avassaladora, subproduto da coca-ína, que já saiu da periferia e começaa atingir a classe média. Ninguém pas-sa incólume: advogados, enfermeiros,servidores do Judiciário. Gente escla-recida também passou a arruinar suasvidas pela dependência do crack.
Mas é na periferia que a droga fazo maior número de vítimas. Por serbarata – cada pedra custa de R$ 5 a
10 –, ela é consumida por moradoresde rua, jovens que já tiveram iniciaçãoem outras drogas e até mesmo curio-sos. Se necessário, eles vendem até aroupa caso seja para saciar a vontade– ou a “fissura”. São comuns casosde prostituição entre homens, mulhe-res e crianças que não conseguem lar-gar o vício e precisam de dinheiro paracomprar a droga.
No Centro de Assistência Psicosso-cial para Usuários de Álcool e OutrasDrogas (CAPSad), no Guará, são vári-os os casos de atendimento de usuá-rios de crack. As histórias comovem atémesmo quem está acostumado a lidarcom a droga. Sônia Machiutti, geren-te da unidade, conta que há casosonde o dependente chegou a gastartodo o salário do mês, em torno de R$3 mil, em um final de semana parasatisfazer o vício. “Como o efeito émuito rápido, o usuário quer ingerir adroga logo em seguida. Só para quan-do acabam as pedras”, disse.
O crack é fumado por ser uma formarápida (e barata) de chegar ao cérebro eproduzir efeitos. A pedra é quebrada e
fumada de diversas maneiras e emdiferentes recipientes, enrolada no cigarro
de tabaco ou misturada na maconha.O crack é também consumido em
cachimbos improvisados feitos com tubosde PVC ou latas de alumínio, muitas vezescoletados no lixo. O uso de latas favorece
a aspiração de grande quantidade defumaça pelo bocal, promovendo uma
intoxicação pulmonar intensa.
Efeito rápido eintoxicação intensa
Sônia Machiutti, gerente doCAPSad Guará, conta que um
dependente já chegou a gastarcom o crack, em um final de
semana, todo o salário de R$ 3 mil
Disseminada emBrasília há poucomais de um ano, adroga começa ainvadir o PlanoPiloto e atinge cadavez mais as classesmédia e alta
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FOTOS: ARTHUR MONTEIRO
19Revista do Sindjus • Fev-Mar/2010
20 Revista do Sindjus • Fev-Mar/2010
O crack não só atinge ousuário, mas também as fa-mílias. Quem conta é Joana,mãe de Jorge, 27 anos, usuá-rio da droga. O jovem come-çou com maconha. Depoispassou a usar merla. Ao ex-perimentar o crack, não con-seguiu mais largar o vício.Moradora do Riacho Fundo I,Joana* confessa não ter maisforças para lutar pela vida dofilho. Jorge* parou de estudarno 2º grau, deixou de traba-lhar e passa dias fora decasa. Quando volta, está comfome, sujo e magro. “A famí-lia toda adoece. Eu vivo àbase de antidepressivos. Meumarido está com câncer napróstata. E não aguento vermeus outros filhos sofrerempelo irmão. Não sei mais oque fazer”, admite.
Joana, merendeira da redepública, procurou o CAPSadGuará como a última tentati-va para livrar o filho das dro-gas. O rapaz diz que não con-segue mais se dominar e che-gou a dizer a ela: “Mãe, vocêacha que estou nessa vidadesgraçada porque eu que-ro?”. Joana já o internou dezvezes. O rapaz chegou a ficarem uma casa de repouso pornove meses. Saiu, passou doismeses sem usar droga e vol-tou para o crack. Perdeu amulher, que não aguentoumais conviver com ele. Jorgecostuma vender o que vê pelafrente para comprar a droga.Leva objetos de casa. Come-çou a praticar crimes, comoassaltos e roubo de carros.
“A famíliatoda adoece”
* Os nom
es são fictícios
Joana já inter-nou o filho dezvezes, mas elenão conseguiuvencer o vício:
“Não sei mais oque fazer”
SOCIEDADE
FOTOS: ARTHUR MONTEIRO
21Revista do Sindjus • Fev-Mar/2010
Consumo cresce entre “gente grã-fina”
Ação policial no Setor ComercialSul: local passou a ser cada vezmais procurado pelas classes médiae alta em busca de crack
A reportagem da Revista do Sind-jus percorreu algumas das áreas doPlano Piloto onde a droga desafia apolícia. No Setor Comercial Sul, no co-ração de Brasília, o crack é fumado diae noite, sob os olhos das autoridadespoliciais, que não conseguem impedira disseminação da droga. Bem pertodo posto da Polícia Militar há becos epassagens subterrâneas onde os vici-ados proliferam. Ali eles consomemesse subproduto da cocaína que levaà dependência já na segunda traga-da. “Esse é um problema social e nãode polícia. Só podemos atuar caso elesprovoquem dano ao patrimônio públi-co ou estejam envolvidos com algumtipo de crime, como tráfico ou furto”,afirma o cabo José Jorge, do 1º Bata-lhão da PMDF.
Acostumado a lidar com os depen-dentes, o policial conta que, nas ma-drugadas no SCS, são cada vez mais
comuns carros de “gente grã-fina” pa-rar em pontos estratégicos onde há ven-dedores da droga. Segundo José Jorge,é assustador o aumento do consumode crack nas classes média e alta. “Elesnão gostam de falar, mas quando ‘pu-xamos’ a placa do carro no registro doDetran podemos conferir quem são es-sas pessoas, onde moram e a profissão.Muita gente está estragando a vida porconta do crack”, observa o policial.
A área central de Brasília está to-mada por traficantes e usuários dadroga. Além do Setor Comercial, a in-cidência maior de consumo e tráfico éno Setor de Diversões Sul (Conic) e nasquadras finais da Asa Norte. Grandeparte dos policiais não vê o usuáriocomo criminoso, mas como um doen-te que precisa de tratamento. É por issoque nem todas as abordagens termi-nam nas delegacias.
A reportagem acompanhou algu-
mas ações de policiais militares. Os usu-ários não se escondem nem mesmoquando veem a farda de longe. É difícilconseguir identificar quem é moradorde rua e quem é usuário. Em geral, odependente de crack é arredio, arisco.E chegam a ser agressivos entre eles,quando dividem o mesmo cachimbo.
Flanelinha e pedreiro, José*, 36anos, mora em Planaltina e trabalhano Plano, mas antes de ir para casacostuma fumar umas pedras de crackno Setor Comercial. “Eu fumo porquegosto. O dinheiro é meu. Gosto debeber também”, revela. Para José, in-gerir álcool e fumar crack dá um “ba-rato” maior.
Depois de revistá-lo, policiais mili-tares o liberam. “Não tem o que levarpara a delegacia. Não encontramos apedra porque provavelmente ela já foifumada. Portanto, não há flagrante”,explica o cabo José Jorge.
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Em outra esquina do SCS, umaadolescente grávida, sentada no meio-fio, esconde a latinha que usa parafumar crack. Ela não admite o uso, masos soldados que por lá circulam con-tam que ela frequenta o local e se pros-titui para comprar a droga.
Perto dali, na Rodoviária e em vá-rias quadras do Plano Piloto – na 110,710, 314, 315, 316, 710 e 715 norte
e 109 sul), jovensde bermudas, ja-quetas e bonésdeixam os pilotisdos prédios esaem em busca deum cachimbo ouuma latinha im-provisada que sir-va para fumar cra-ck. Em algumascomerciais dasquadras é possível
ver pontos em brasas, bem caracterís-ticos da queima das pedras da droga.
O consumo acontece em ritmo fre-nético. A maioria dos usuários passadias sem comer, dormir ou voltar paracasa. Esquecem-se da higiene pessoale dos amigos. Os moradores das qua-dras próximas ficam incomodados,chamam a polícia, mas não conseguemse livrar de assistir as cenas deprimen-tes de uso da droga.
Uma das primeiras vítimas do trá-fico de crack no Distrito Federal era ummorador da 314 norte. No ano passa-do, o rapaz de 25 anos morreu brutal-mente assassinado. A polícia encon-trou o corpo dele 28 dias depois deser espancado, torturado e morto a ti-ros em uma área de cerrado, na alturada 912 norte.
O delegado-chefe da 2ª DP (AsaNorte), Antônio Romeiro, conta que foidifícil localizar o corpo dele, abando-
nado em um terreno baldio, no par-que Boulevard. As investigações apon-taram que o jovem perdeu a vida por-que roubou dinheiro de um traficante.Ele queria, segundo a polícia, pagardívidas acumuladas. Os chefes da“boca” o amarraram em uma árvore,deram socos, pontapés e coronhadase, por fim, atiraram cinco vezes.
Romeiro considera preocupante oavanço do crack no DF. “A polícia nãovai resolver o problema do crack. Sãonecessárias campanhas preventivas euma ação conjunta do governo locale federal”, afirma o delegado.
Em uma das primeiras apreensõesneste ano, ao lado do muro da Varada Infância e da Juventude, na 909norte, os policiais prenderam IromarRodrigues da Silva, 33 anos, e apreen-deram um adolescente de 15, com 35pedras grandes de crack, 23 pedras pe-quenas, fragmentos da droga e R$ 454em dinheiro. O flagrante foi às 11h dodia 27 de janeiro.
Nas comerciais e superquadras
Antônio Romeiro, delegado-chefe da 2ª DP, e pedras de crackapreendidas: “São necessáriascampanhas preventivas”
Danos à saúde
São vários os tipos de danos cau-sados pelo uso de crack. Alémdos problemas respiratórios pelainspiração de partículas sólidas,sua ação estimulante leva à per-da de apetite, falta de sono eagitação motora, além de dificul-dade de ingerir alimentos, quepode levar à desnutrição, desidra-tação e gastrite. Podem ser tam-bém observados sintomas físicoscomo rachadura nos lábios, pelafalta de ingestão de água e desalivação, cortes e queimadurasnos dedos das mãos e às vezesno nariz, provocados pelo ato dequebrar e acender a pedra. Alémdisso, o usuário fica mais expostoao risco social e de doenças.
Fonte: Ministério da Saúde
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O crack está disseminado em Bra-sília há pouco mais de um ano. Há vin-te anos, estava restrito a uma área nocentro da capital de São Paulo, conhe-cida como “cracolândia”. Nos últimosdois anos, proliferou em todo o país.
O Ministério da Saúde lançou umprograma de emergência para comba-ter o uso de crack, com investimentosde R$ 117,9 milhões até o fim de2010. Ao todo, 108 cidades devem seratingidas. A proposta é aumentar o nú-mero de leitos e de profissionais dedi-cados à saúde mental, instalar novosnúcleos de apoio à saúde da família emais centros de atenção psicossocial.Em todo o Distrito Federal e Entornohá apenas três unidades de atendi-mento para usuários de drogas, em So-bradinho II, Ceilândia e Guará. A pre-visão é que outros três sejam abertosainda este ano, em Santa Maria, Pla-naltina e Gama.
Mas o atendimento ainda é limita-do e a rede dispõe de poucos recursos
ONDE PROCURAR AJUDACAPsad (Guará): 3567-1967 • Capsad (Sobradinho): 3591-2779
Atendimento limitadopara um atendimento qualificado. Fal-tam profissionais e espaço físico. O ide-al seria a construção de CAPSad emcada região administrativa. Localida-des com mais de cem mil habitantestêm indicação para implantar pelo me-nos uma unidade de atendimento adependentes químicos. Assim, um usu-ário do Riacho Fundo não precisariase deslocar até o Guará para conse-guir atendimento. Essas unidades dãoapoio e encaminham os usuários à in-ternação em hospitais gerais, quandonecessário. No Guará, a unidade aten-de cerca de seis mil pacientes. De cadadez novos casos recebidos por dia noGuará, seis têm relação com o crack.
O tratamento para o usuário nemsempre surte efeito. Uma equipe mul-tidisciplinar faz a avaliação necessá-ria e indica quais recursos podem serempregados para os pacientes. Emgeral, ministram-se medicamentospara conter a ansiedade e a vontadede usar a droga.
É no início da adolescência que osjovens brasileiros experimentam álcoole maconha pela primeira vez. O con-sumo de outras drogas costuma ocor-rer um ano e meio depois da primeiratragada ou do primeiro copo – emmédia aos 14,9 anos, como mostramas pesquisas.
O uso de álcool entre adolescen-tes é controverso. Ao mesmo tempoem que a lei brasileira proibe a vendapara menores de 18 anos, é comum oconsumo pelos jovens – seja em casa,em festas ou mesmo em ambientespúblicos. Por não ser uma droga proi-bida, o álcool acaba fazendo parte darealidade dos jovens, até mesmo coma permissão ou a omissão dos pais.
Mesmo as drogas consideradas“menos agressivas”, como o álcool oua maconha, podem ser catastróficas.A maconha, por exemplo, pode cau-sar alterações na motivação e levar aum estado de apatia semelhante à de-pressão, cujo tratamento é difícil. Issosem contar com o efeito trampolim.As pesquisas afirmam que quem usaum tipo de droga rompe uma barreirapsíquica e tem maior propensão a uti-lizar outras.
Estudos realizados em Brighton,Inglaterra, pesquisaram os efeitos doecstasy – droga cada vez mais utiliza-da no DF – entre jovens para quanti-ficar alguns dos efeitos em um perío-do de nove dias. Apesar da documen-tação de efeitos nocivos, o estudo su-geriu que os efeitos em curto prazosão relativamente modestos. Essapode ser uma das razões pelas quaismuitos usuários não percebem a in-tensidade do risco. O ecstasy provocaalteração das células nervosas do cé-rebro, principalmente as que possu-em a substância serotonina, que podediminuir proporcionalmente à quan-tidade e ao tempo de uso.
Unidade pública no Guará:de cada dez novos casos
recebidos por dia, seis têmrelação com o crack
Jovens em risco
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Do alto dos seus 91 anos,o poeta Manoel de Barros
ensina que o ser humanoé incompleto, e que isso nãoé defeito; é qualidade.
Assim como ele, muitas outraspessoas precisam ser Outras.E são. Esta coluna publicará
mensalmente histórias de genteque concilia o serviço públicocom as mais diversas
atividades. São atletas, chefesde cozinha, professores,pintores, mágicos, mecânicos,
músicos... A lista não tem fim.
OUTROS EUS
A maior riqueza do homemé a sua incompletude.Nesse ponto sou abastado.Palavras que me aceitam comosou – eu não aceito.Não aguento ser apenas umsujeito que abreportas, que puxa válvulas,que olha o relógio, quecompra pão às 6 horas da tarde,que vai lá fora,que aponta lápis,que vê a uva etc. etc.PerdoaiMas eu preciso ser Outros.Eu penso renovar o homemusando borboletas.
Manoel de Barros
prêmio do autoconhecimento é oamor-próprio e autorrealização”, afir-
ma a técnica do STM Luciana Carla de Al-meida Lopes. Preocupada com esse temadesde a adolescência, ela conta que aos 17anos começou a sentir “sente sede de co-nhecimento – na verdade, de autoconheci-mento”. Os questionamentos existenciaisa fizeram procurar respostas em universosque iam além do mundo acadêmico. Masum dia, aos 19 anos, descobriu que tinhalúpus, doença autoimune que não tem curae pode trazer consequências graves.
O diagnóstico, entretanto, não a desen-corajou. Luciana partiu para o estudo dadoença, para que ela mesma pudesse se aju-dar. “Comecei a pesquisar para descobrircomo ter uma vida saudável”, recorda.
Entretanto, as provações não pararampor aí. Alguns anos depois Luciana engravi-dou, mas sua alegria não durou muito. Obebê viveu por apenas quinze dias. A pro-funda tristeza pela perda da criança, porém,não a afastou da caminhada rumo ao auto-conhecimento. Ela se agarrou à certeza deque a vida não era dor, de que havia algomaior. “Sempre senti que o sofrimento nãoera uma verdade absoluta; a minha formade atuar perante as circunstâncias da vidaera o que fazia a diferença”, explica.
Luciana engravidou novamente e deu àluz uma menina, que hoje está com trezeanos. Em 2002 tomou posse no STM e co-meçou um curso de Direito, influenciadapela família de advogados. Mas ainda nãose sentia realizada. Então, em 2004, fez umadescoberta que mudaria sua vida.
“Descobri uma técnica de autodesen-volvimento que abriu um leque de horizon-tes, expandiu a minha consciência e me per-mitiu conhecer um pouco mais sobre as in-terações sutis entre as pessoas”, relata. Atécnica, chamada Avatar (nada a ver com o
filme), é definida como a busca de realiza-ção por meio do autoconhecimento.
Apoiada pelo mestre holandês GuidoSleddens, Luciana trabalhou por três anoscom as técnicas, aplicando-as em sua pró-pria vida, e depois concluiu a graduação nosEstados Unidos. Ela explica que a metodo-logia Avatar trabalha o sistema de crençasdo ser humano: “São técnicas para a pes-soa melhorar sua vida de acordo com seuspróprios planos. O que você acredita temconsequência sobre o que você vivencia. Aschaves mentais que aprisionam o ser hu-mano são destrancadas”, sustenta.
O Avatar foi criado pelo pesquisador, am-bientalista e psicólogo educacional norte-americano Harry Palmer. Estudante discipli-nada, Luciana segue todas as suas lições.“No primeiro nível você trabalha o seu uni-verso. Depois que me familiarizei com a téc-nica, decidi me tornar master para ensinaroutras pessoas”, diz.
A servidora também é especialista emmassagem ayurvédica e em shantala (mas-sagem para bebês e crianças); ela participade uma ONG que oferece massagens em cre-ches e asilos. Luciana acredita que o Avatarmudou sua vida e que ajudou a garantir asua saúde. “Passei por grandes transforma-ções pessoais e profissionais. Hoje ministroworkshops Avatar em Brasília e o curso com-pleto em várias cidades do Brasil. Tambémlevei o Avatar para o Equador”, conta ela.
Na esteira das mudanças positivas, Lu-ciana trocou o curso de Direito pelo de Psi-cologia: “Estou feliz e realizada. Atualmen-te sou membro da Comissão de Qualidadede Vida do STM e estou comprometida coma promoção da saúde emocional das pes-soas”, comemora.
Para conhecer as técnicas ensinadas porLuciana, acesse www.avatarepc.com
menteOs caminhos da
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Servidora doSTM, Luciana éinstrutora deuma técnica deaudodesenvolvi-mento e participade uma ONGque oferece mas-sagens em cre-ches e asilos
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Carlos Tavares
m reduto de vegetação do cerra-do e de mata ciliar, pistas de cor-
rida sem buracos, telas de alambradosintactas, banheiros limpos, parque in-fantil seguro e conservado, circuito in-teligente de ginástica e caminhos lim-pos, sem um pedaço de papel no chão.Será que estamos mesmo falando deum parque de Brasília, uma cidade quenos últimos anos apenas desprezouseu patrimônio verde e os espaços pú-blicos de cultura e lazer?
Por incrível que pareça, estamos.Mas as perfeitas condições do parquenão se devem a decisões governamen-tais e sim à mobilização da comuni-dade. Durante anos, um grupo de mo-radores do final da Asa Norte lutoucontra os interesses da especulaçãoimobiliária – e muitas vezes contra ainércia do governo – para transformaras futuras quadras 413 e 414 norteno Parque Ecológico e de Uso Múlti-plo Olhos D’Água.
O lugar, antes abandonado, trans-formou-se num oásis. Um passeio porali dá a sensação de que não estamosem Brasília ou em qualquer outro meiourbano do mundo. Inaugurado em1994, o parque possui 21 hectares deárea verde, cortados por uma pista de
cooper de 2.100 metros e por váriastrilhas menores que percorrem o cer-rado e a mata, passando pela nascen-te, pela lagoa e por um circuito edu-cativo sobre o cerrado.
Encravada no meio do parque, nofundo de um pequeno vale ladeado deárvores imensas, a nascente foi recen-temente revitalizada e é um remansopara as pessoas, pássaros e outros pe-quenos animais, ornado por plantas tí-picas que se exibem, exuberantes, àsmargens de um pequeno córrego. “Játivemos muitos problemas com inva-sões, usuários de drogas e traficantes
que vinham se esconder aqui, mas issoé coisa do passado”, diz o administra-dor do parque, Ezechias Vasconcelos.
Se o visitante seguir a trilha daságuas vai parar na Lagoa do Sapo –referência à Sociedade dos Amigos doParque Olhos D’Água, mas também aoanfíbio que, curiosamente, pouco é vis-to no lugar. Esse é um dos espaçosmais procurados pelas crianças, que sedivertem apreciando patos, peixes etartarugas. É o caso da pequena Bian-ca, de três anos: “Quero ver a tartaru-ga”, suplica a garotinha enquanto pas-seia com a mãe.
Um dos melhores exemplos do pro-grama Adote uma Nascente, do Insti-tuto Brasília Ambiental (Ibram), estádentro do Parque Olhos D’Água. An-tes cercada por plantas invasoras, comseu córrego transformado em lixeira ealvo de depredações por visitantes pro-blemáticos, agora a nascente pareceum recanto extraído de um livro defábulas infantis. A empresa que ado-tou o olho d’água, encravado no cen-tro de uma pequena mata ciliar, a pou-
Nascentes: adote essa ideia
cos metros da Lagoa do Sapo, tratoude ornar o veio com uma miniatura deponte de madeira, colocou um bancopara descanso e contemplação do es-paço, construiu um jardim em volta dapassarela e deixou o ambiente irreco-nhecível, de tão agradável.
Isso tudo sem falar nos benefíciosque o gesto trouxe para a preserva-ção do manancial. Criado em 2002, oprograma Adote uma Nascente preten-de mudar a feição de todas as duzen-
paraísoComo criar um
União dos moradores e mobilizaçãoda sociedade fizeram do OlhosD’Água um modelo de parque
ecológico urbano – que infelizmentenão é seguido no resto do DF
MEIO AMBIENTE
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tas nascentes do Distrito Federal, amaioria exposta à depredação e malconservada. Outra vez o Parque OlhosD’ Água serve de exemplo.
Para participar do programa bastapreencher um cadastro e não ter pen-dências judiciais. O voluntário podeparticipar como adotante (responsá-vel direto pela proteção e recuperaçãodas nascentes) ou padrinho (que co-labora com os adotantes na execuçãodas ações). Segundo as normas doIbram, os adotantes em potencial es-colhem o olho d’ água a ser adotado,sob a orientação do instituto.
Oásis urba-no: mataciliar abriganascente elagoa
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O Olhos D’Água é um parque mo-delo. Mas, ironicamente, ele não se fazmodelo para outros do Distrito Federal,porque estes teriam que ofertar ao pú-blico uma razoável variedade de atri-butos ecológicos e educativos, em ter-mos de meio ambiente, além de contarcom uma estrutura de lazer e diversãopara pessoas de todas as idades.
Além desses aspectos, o parqueOlhos D’Água dá também uma liçãode convivência coletiva. Se, fora desuas cercas, todos reproduzissem o cli-ma do lugar, as ruas ficariam mais lim-pas, as pessoas mais educadas e qual-quer garoto seria capaz de dar aulasde cidadania e meio ambiente.
O Olhos D’Água é tido como umexemplo de parque ecológico urbanoaté por prefeituras de outros estados.
Com relação às outras dezenas de par-ques do Distrito Federal, administra-dos pelo Instituto Brasília Ambiental(Ibram), a realidade infelizmente nãoé essa. O Parque da Ermida Dom Bos-co está abandonado, assim como oBosque dos Pequizeiros em Planalti-na, o Parque Três Meninas em SantaMaria, o Ezechias Heringer, no Guará,e por aí vai. Os mais conservados, se-gundo o Instituto, são o de Águas Cla-ras, o de uso múltiplo do Lago Norte,o Parque Urbano do Paranoá e Jequi-tibás, em Sobradinho.
A organização da unidade da AsaNorte deve muito ao programa Abra-ce um Parque, que atraiu dezenas deempresas e de pessoas físicas, possi-bilitando a montagem da atual estru-tura e a sua manutenção. “Infelizmen-
Um oásis em meio ao abandonote isso não ocorre fora de Brasília. Aspessoas só querem colaborar quan-do se fala em Plano Piloto, mas nãose interessam pelas outras regiões ad-ministrativas”, admite a coordenado-ra de Parques do Ibram, RosatildeSantana Carvalho.
O instituto enfrenta problemas depessoal e de orçamento. Conta comapenas 0,2% do orçamento do GDF(equivalente a R$ 20 milhões por ano)para administrar, licenciar obras e fis-calizar agressões ao meio ambiente em72 parques distribuídos pelo DistritoFederal. Segundo o presidente doIbram, Gustavo Souto Maior, “não dápara depender somente de recursosoficiais. Por isso criamos o Abrace umParque, que conta com a iniciativa pri-vada e nos ajuda muito”, afirmou.
Os vários recantosdo parque: lição deconvivência coletiva
MEIO AMBIENTE
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Abrace um parque você também
O programa Abrace Um Parqueabrange pessoas físicas ou jurídicas. Ointeressado pode fazer doações de bensou apresentar propostas em duas mo-dalidades: espontânea (formuladas aqualquer momento) e induzida (previs-ta em edital). Há sete linhas de ação:
1) Serviços: segurança e limpeza; for-necimento de guias e brigadista.
2) Obras: instalação e manutenção deequipamentos de lazer, esporte e edu-cação; construção e reformas de edifi-cações, preferencialmente sustentáveis.
3) Conservação dos recursos na-turais: recuperação de rios, córregos,lagos etc; reconstituição da coberturavegetal; manutenção da biodiversida-de; produção, plantio, manutenção e
O programa, criado em agosto de2008, aprovou inicialmente nove pro-jetos para onze parques, entre eles oOlhos D’Água. De acordo com o Ibram,essas unidades ecológicas urbanas vãoreceber em 2010 investimentos de cer-ca de R$ 4 milhões, que serão utiliza-dos para instalar novos equipamentos,recuperar áreas degradadas, construire reformar edificações, plantar árvo-res e fazer estudos ambientais.
Os recursos, no entanto, não vi-rão dos cofres públicos. O Ibram apos-tou em parcerias com a comunidadepara propiciar aos brasilienses o privi-légio de ter um parque ao lado de casa.Mas ainda há muito a fazer em um anomarcado pelas eleições, Copa do Mun-do e escândalos. Sem falar nas dificul-dades políticas e administrativas emtodo o DF, após as denúncias do Men-salão de Arruda.
doação de sementes e mudas; recu-peração de áreas degradadas.
4) Paisagismo: criação, revitalizaçãoou adequação paisagística.
5) Educação ambiental: atividadescientíficas, didático-pedagógicas e delazer em harmonia com a natureza; pro-dução e divulgação de eventos cultu-rais e educativos.
6) Doação e manutenção de bens:equipamentos de informática, de trans-porte, pesquisa, fiscalização e outros.
7) Acervo técnico e científico: le-vantamento e monitoramento de espé-cies endêmicas e raras; elaboração epublicação de estudos técnico-científi-cos; elaboração de plano de manejo,plano de uso ou similar.
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Se fosse pela vontade dos empresári-os do setor de imóveis, o Parque OlhosD’Água não existiria. Não foi por falta depressão dos especuladores que as super-quadras 413 e 414 norte e as comerciais414 e 415 norte deixaram de ser constru-ídas, lembra Ezechias Vasconcelos. “O par-que só resistiu porque a pressão da socie-dade e a união dos moradores foi muitogrande”, explica, referindo-se ao grupoAmigos do Parque.
A legislação que hoje protege a áreaestabelece os objetivos de preservar asnascentes, olhos d’água, córrego, lagoa,mata de galeria e fauna; recuperar áreasdegradas; desenvolver programas de edu-cação ambiental e pesquisas sobre os ecos-sistemas locais; e proporcionar lazer à po-pulação. Uma simples visita mostra que oregulamento é seguido em praticamente
100%, segundo ambientalistas, morado-res e administração.
Ezechias credita esses resultados aoque chama de “gestão diferenciada”, ouadministração compartilhada: o cidadão,as empresas, as crianças, as escolas, to-dos participam e exigem a conservação dolocal. A organização é tão visível que to-dos se orgulham de participar da estrutu-ra de conservação, do frequentador ao em-presário, dos funcionários da limpeza aopresidente do Ibram, Gustavo Souto Mai-or: “O que vemos aqui é um exemplo quedeve incentivar empresários de outros lo-cais a investir nos nossos parques”, disse.
A consolidação do parque deve-se emgrande parte a duas mulheres obstinadas.Antigas moradoras das quadras vizinhas, asprofessoras Maria Celeste e Marisa de Góesfizeram os primeiros levantamentos do pa-
trimônio verde do lugar, mediram sua ex-tensão, seu potencial ecológico e levaramum documento às autoridades, ainda em1993. Elas se reuniram ao professor de Edu-cação Física Pedro Henrique Vinhal para criara Sociedade de Amigos e Protetores do Par-que Olhos D’Água, ONG que, com a ajudada entidade Patrulha Ecológica, conseguiuampliar o raio de proteção da área.
O trabalho feito por Celeste, Marisa eFernando está descrito em uma tese depós-graduação em Ecoturismo assinadapor Gustavo Henrique Amorim, em 2004.Aliás, esse é um dos principais objetivosde um parque ecológico e de uso múlti-plo: produção de atividades científicas epedagógicas. Professores e estudantes deoutros centros de ensino superior tambémse debruçam sobre o ecossistema do par-que para realizar suas pesquisas.
Estudantes de biologia e de engenha-ria florestal da UnB estão empenhados emencontrar uma solução para as leucenas eas braquiárias, duas espécies exóticas aocerrado. Elas são consideradas pragas emlugares como parques e reservas, porqueimpedem o crescimento de outras espéci-es e se alastram com facilidade. “Temosque substituir as leucenas aos poucos”,explica Ezechias Vasconcelos, referindo-seà leguminosa sertaneja predadora que jáformou um bosque, entre o parque infantile a sede da administração.
Conservação envolve toda a comunidade
Outros motivos de orgulho para os fre-quentadores são uma horta, um túnel de bar-ro e garrafas pet moldado por alunos da Es-cola Classe 415 Norte, o Bosque dos Ipês, plan-tado por estudantes há quinze anos, e a re-cente biblioteca comunitária. Entre os planospara o futuro próximo estão a construção deparedão de escalada e de um circuito de ar-
vorismo. Outra preocupação são as criançascom necessidades especiais, que vão contarcom um playground acessível a todo o públi-co infantil. Ezechias batalha ainda pela ilumi-nação da área até 21h – atualmente ela encer-ra às 20h. Também busca parceria para adotara nascente que fica na área da 213 norte. Porficar em parte fora da poligonal do parque, temsofrido agressões com o despejo de lixo pelapopulação e por moradores de rua.
Planos para o futuro
Ezechias: “Oparque sóresistiu porquea união dosmoradores foimuito grande”
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No final da L2 sul, o Parque Ecológicoe de Uso Múltiplo é o retrato do abando-no. Embora sendo do mesmo tamanho ecom fisionomia ecológica muito semelhan-te à do Olhos D’Água, ele vive sendo alvode vandalismo, invasões de usuários dedrogas e moradores de rua, que usam suasnascentes para lavar roupa e cozinhar.
Basta entrar em sua pequena e densamata de vegetação típica (também amea-çada pela braquiária e a leucena) para per-ceber vestígios dos intrusos: fogareiros depedras e madeira, pedaços de roupas noscórregos, latas de cerveja e garrafas pet –sem falar na área próxima à mata, que estávirando uma espécie de lixão da Asa Sul.
“Ali jogam de tudo: sofá velho, cadei-ras, entulho de construção, sacolas plásti-cas, tudo que não devia fazer parte do lu-gar”, reclama Rangel Moreira Viotti, mora-dor da 308 sul e especialista em sistemasde informações. “Em termos de segurançao que existe são apenas placas com proibi-
ção de jogar lixo e entulho”, acrescenta.Rangel utiliza o parque há algum tem-
po e diz que, mesmo com um programapara tornar o espaço frequentável, as coi-sas estão muito lentas. “Não se vê nadaacontecer, a não ser a construção da casada administração, feita com material bio-degradável”, reclama, enquanto se exer-cita num pequeno parque com equipamen-tos de ginástica – o único sinal de que oespaço deveria se destinar a lazer, cultura,educação ambiental, esporte e ecologia.“Se a sociedade não se mobilizar, comoocorreu na Asa Norte, não vejo soluçãopara este parque”, afirma.
Somente a partir de 2009 o lugar co-meçou a ser beneficiado, de forma muitolenta. “As benfeitorias são quase imper-ceptíveis, mas ainda é cedo para criticarcom veemência”, reconhece Rangel. O quese pode dizer é que o parque tem o mes-mo potencial ecológico e de uso múltiplodo Olhos D’Água, e que pode vir a ser im-portante para melhorar a qualidade devida dos moradores.
O Ibram atualmente concentra o tra-balho em duas comissões: a de Revitaliza-ção de Parques e a de Recategorização eRevisão de Poligonais (que são as áreasde um parque). “O plano de manejo doparque da Asa Sul está quase pronto e asparcerias com o Ipoema (Instituto de Per-macultura: Organização, Ecovilas e MeioAmbiente) e o Instituto Holístico estãodando certo”, acredita a coordenadora doIbram Rosatilde Santana Carvalho.
A solução para melhorar o estado dosparques problemáticos no Plano Piloto enas cidades satélites passa pelo programado Ibram, ampliando-se o apoio da socie-dade, pessoas físicas e jurídicas e ONGs.Passa também pela adoção de um novosistema de administração, que depende deum projeto à espera de votação na Câma-ra Legislativa. Ele deve dividir os parquesem ecológicos, urbanos e distritais, maspode permanecer por muito tempo nos es-caninhos dos parlamentares, devido aos es-cândalos que paralisaram a máquina le-gislativa e estatal no DF.
SOS Asa Sul
Parque no final da L2 sul: potencialecológico e de múltiplo usosemelhante ao do Olhos D’Água
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