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FICHAMENTO
RELIGIÃO E ETNICIDADE NA CULTURA POPULAR
Dedival Brandão da Silva
O trabalho de pesquisa do autor Dedival Brandão da Silva, sobre a história da
Irmandade do Glorioso São Benedito de Bragança tem como objetivo o estudo e a
identificação da referida irmandade como campo de lutas, inserido em um universo de
estratégicas políticas com o intuito da construção e da edificação de uma identidade
dentro de um grupo social.“(...) Tem por objetivo retraçar a história da Irmandade do Glorioso São Benedito de Bragança, fundada em 1798, procurando perceber o seu espaço como um campo delimitado de lutas, de estratégias políticas, com vista à construção e a sustentação de uma identidade ética, que permeia a maior parte de sua história, (...)” (SILVA, p. 23.)
Nesse contexto, visasse identificar a possível existência de uma identidade
étnica entre os negros escravos da antiga Vila de Bragança, que desembocaria em um
princípio fundamental para a consolidação desse movimento social de cunho religioso,
desde sua criação ao passar dos anos.
Com o objetivo de se identificar princípios culturais atrelados às especificidades
dos indivíduos envolvidos em tal processo, no que se diz respeito à temporalidade e ao
local de estudo, faz-se necessário, segundo o autor, o desenvolvimento de um trabalho
de pesquisa e análise antropológica, instrumento tido como essencial para uma
interpretação ideal de uma realidade construída ao longo do tempo, que culminou na
definição intrínseca de uma identidade cultural nos dias atuais:
“(...) a prática antropológica exige uma descrição densa (...)”. O mesmo destaca que seu trabalho pretende: “(...) levantar o máximo de informações possíveis acerca das práticas sociais e cotidianas dos atores sociais integrantes na Irmandade. (...)”. Dessa forma tentará ser feita uma: “(...) espécie de decifragem, na tentativa de aproximarmo-nos desse ethos ‘por dentro’ (...)” (SILVA, p. 39)
A proposta de tal método, vislumbra o desenvolvimento de um novo olhar sobre
as irmandades leigas no Brasil, a partir da experiência de Bragança no Pará, sendo
que em muitos casos a noção prevalecente sobre as mesmas se encontra permeada
por concepções de serem instrumentos cooptados pelas classes dominantes.
Tal estudo, se dispõe a beneficiar não apenas a cidade de Bragança ou a região
bragantina, mais sobretudo o Estado do Pará, o possibilitando uma reflexão sobre o
processo de formação histórica da sociedade regional, que pode por sobre a
constituição de um grupo social, como uma irmandade, uma noção latente de elemento
de uma produção cultural.“(...) que a referida pesquisa, uma vez executada, venha trazer não apenas à cidade de Bragança e a região bragantina, mas também ao Estado do Pará (...), uma reflexão mais ampliada sobre a formação histórica da sociedade regional, através da religião e da produção cultural de um grupo social e sua articulação com a sociedade nacional. (...)” (SILVA, pp. 27-28.)
Com o objetivo de uma adequada identificação de uma essência no objeto
estudado, BRANDÃO DA SILVA se dispõe à utilização de noções estruturais quanto à
visualização da personificação de uma religiosidade em um meio popular, por isso, o
entendimento de conceitos como: identidade, etnicidade, cultura e catolicismo popular
são imprescindíveis para uma análise local e temporal de uma determinada realidade
de cunho político e sócio-cultural.
Nesse contexto, o surgimento de uma certa identidade configurada através de
um processo de diferenciação, segundo autor, pode caracterizar um dado grupo em
estudo.“(...), a existência de um grupo étnico, capaz de elaborar um discurso que se caracterize pela autodescrição e adscrição pelos outros no processo de relação social. Esse discurso pressuporia mesmo a existência de uma consciência étnica, de uma afirmação da diferença do ‘nós’ por oposição aos ‘outros’” ( SILVA, p. 33.)
Assim sendo, no que tange a edificação da Irmandade do Glorioso São Benedito
de Bragança no Pará algumas questões fundamentais devem ser enfocadas, como a
identificação de problemáticas que sobretudo recaem sobre os reais motivos que
levaram a organização dos negros locais com o intuito de construir essa irmandade.
Além disso, as suposições hipotéticas que tende a sugerir uma cumplicidade
emergida através da cor, do possível papel assistencial desenvolvido por tal
irmandade, além de suas reuniões e festejos configurarem-se como momentos de
determinação e conservação de uma dada afirmação social:
“Os negros se tornarem católicos, ingressando no catolicismo através de uma irmandade de cor, aproveitando esse espaço de forma duplamente articulada; A Irmandade estudada assumiria um papel assistencial, junto aos seus membros, sendo que a mesma prevalecia em uma sociedade marcada pela dominação econômica e política; Os negros não eram portadores de uma consciência étnica devido a estarem submetidos a uma intensa manipulação; e, a Festa de São Benedito se apresenta como um espaço de afirmação social” (SILVA, pp. 37-38.)
Para que tal estudo se desenvolva de forma ampla e na medida do possível
inequívoca sobre o local e os atores a serem estudados, BRANDÃO DA SILVA propõe
a utilização de uma etnografia densa e de um processo de pesquisa participante,
buscando uma espontânea aproximação entre pesquisador e pesquisados.
Buscando a identificação de diversos fatores e nuances que personificaram tal
realidade, o autor se propõe a pesquisar fontes (como: jornais antigos, códices e
relatos de cronistas e viajantes) e bibliografias não apenas na cidade de Bragança,
mas também em Belém do Pará e, se possível no exterior (em Portugal) a ser realizada
em diversas instituições, objetivando um conhecimento amplo e aprofundado de uma
situação de enfoque não apenas localista, mais principalmente de importância regional.
“(...) a Biblioteca Pública, o Instituto Histórico e Geográfico do Pará, os arquivos das paróquias da cidade de Bragança e de Belém bem como os arquivos da Irmandade, para o manuseio de fontes primárias e secundárias sobre o objeto de nossa pesquisa”. Há, a disposição (se possível) de uma viajem a Portugal objetivando-se realizar pesquisas no: “Arquivo Histórico Ultramarino, ao Arquivo Nacional da Torre do Tombo, à Academia das Ciências de Lisboa e à Biblioteca Nacional” (SILVA, pp. 41-42.)
Quanto à bibliografia utilizada por BRANDÃO DA SILVA, o mesmo faz uso de
teóricos clássicos que supõe um enfoque político sobre o papel social das irmandades
no Brasil como GALVÃO (1959), SCARANO (1978) e BRAGA (1987) além de utilizar
importantes nomes da antropologia internacional como LÉVI-STRAUSS (1977), p. 29,
ao abordar sobre a aproximação entre identidade e realidade afirma que é um
fenômeno que: “emerge da dialética entre indivíduo e sociedade”, também trabalha a
interpretação de cultura proposta por GEERTZ (1978) entre outros autores, visando a:
“leitura de textos históricos e literários clássicos em geral, e textos históricos mais
específicos acerca de nosso objeto (...)” (SILVA, p. 41).
3º) Organize e discuta a principais diferenças entre santos e encantados de acordo com Heraldo Maués.
Heraldo Maués em seu texto “Padres, Pajés, Santos e Festa”, traça uma
discussão acerca do catolicismo popular e das práticas de pajelança na região do
Salgado, no Estado do Pará, no século XX.
Para tanto, discute a sociedade amazônica a partir de diversas manifestações
místicas e religiosas que apresentam entre si suas diferenças e semelhanças, neste
contexto incluem-se santos e encantados, onde estes são buscados pela população
nos mais variados momentos, assumindo um papel significativo na vida cotidiana dos
amazonidas.
Contudo, os santos e encantados, apesar de apresentarem práticas religiosas
semelhantes em um mesmo contexto social e geográfico, se diferenciam em múltiplos
aspectos, sendo que estes estão diretamente ligados aos rituais, no que tange a sua
natureza, ao lugar de realização, finalidade do ritual, as atitudes dos participantes
dentre outras. E essa questão das diferenciações entre santos e encantados é que
será discutida ao longo do texto.
No que diz respeito às práticas ritualísticas podemos observar que “os rituais dos
santos são bem mais ricos e variados do que aqueles em que os encantados são
invocados” (MAUÉS, p. 202). Essa diferença característica entre ambos está
relacionada com os próprios locais de realização dos rituais, uma vez que estes, no
que se refere aos santos, podem ser realizados de formas variadas em casas, ruas,
praças, e igrejas enquanto que nos rituais da pajelança se restringe exclusivamente a
casa do pajé.
Com relação à natureza do ritual é possível percebermos que mesmo ambos
tendo um caráter invocativo se diferem, pois “a invocação dos santos é no sentido de
suplica, pedido de auxílio e proteção, aos encantados apenas se invoca pedindo auxilio
(sobretudo na doença), mas não se suplica e pede proteção” (MAUÉS, p. 202). Essa
assertiva pode ser entendia em decorrência da intimidade que se apresenta no
catolicismo popular com relação aos santos onde é possível alcançar sua proteção sem
a necessidade de intermediadores, em contrapartida na pajelança há uma proximidade
intensa entre a entidade e o individuo que se configura na pessoa do pajé o qual age
como intermediador.
No que tange a finalidade do ritual é importante ressaltarmos que no catolicismo
popular o benefício ocorre tanto no âmbito individual quanto no coletivo, o que o autor
denomina de “dimensão pública do ritual” em contrapartida na encantaria o benefício
ocorre apenas de maneira individual. Nessa mesma lógica são aplicados os castigos
pois, “o dos encantados dirigi-se somente aos indivíduos enquanto que os castigos dos
santos também se aplicam à coletividade” (MAUÉS, p. 209).
Outro aspecto que difere santos e encantados é no que diz respeito à atitude
dos participantes, onde nos rituais dos santos é evidente a contrição e a devoção o que
não se evidencia na pajelança, por ouro lado, a presença de bebidas alcoólicas nos
rituais de santos leva ao desrespeito por parte dos participantes. Na pajelança não há a
presença de bebidas alcoólicas, mas existem pessoas que descrêem no poder dos
rituais e na figura do pajé, levando a atitudes de desrespeito ainda mais significativo
que é a anarquia no momento em que ocorrem as sessões ou o próprio ritual, como
comprovamos abaixo:“Na pajelança teme-se a ‘anarquia’, uma forma de desrespeito que, às vezes surge, especialmente quando o pajé não é bem conceituado: grupos de rapazes que geralmente ficam do lado de fora da casa, fazendo barulho e perturbando a sessão, ou mesmo que se apresentam para assisti-la e, durante a mesma fingem que estão recebendo espíritos ou caruanas, para testar os conhecimentos e os poderes do pajé” (MAUÉS, p. 205)
Além disso, existem outras diferenças no tocante entre santo e encantados
principalmente no que se refere às representações, pois os santos podem ser
simbolizados de diversas formas como através de imagem, o que não se evidencia na
pajelança, uma vez que “os encantados não precisam ser representados através de
imagens e estampas, como acontece com os santos” (MAUÉS, p. 207). Isso é
decorrente da materialização da entidade por meio do pajé.
Assim apesar de santos e encantados apresentarem uma origem comum,
advinda do poder divino, possuem uma série de diferenças que os fazem expressões
significativas da cultura popular amazônica sendo de suma importância para a
compreensão da pluralidade religiosa existente na nossa região.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁCAMPUS UNIVERSITÁRIO DO TOCANTINS / CAMETÁ
INSTITUTO DE FILOSOFIA E CIÊNCIAS HUMANASFACULDADE DE HISTÓRIA
DISCIPLINA: TÓPICOS TEMÁTICOS IIPROFESSORA: MAGDA RICCI
FICHAMENTO:
RELIGIÃO E ETNICIDADE NA CULTURA POPULARDedival Brandão da Silva
ANÁLISE CRÍTICA:
AS CRENÇAS E REPRESENTAÇÕES NO CATOLICISMO POPULAR E DA PAJELANÇARaimundo Heraldo Maués
Equipe:
ANA BÁRBARA PANTOJA LUCIELMA LOBATO
LUIZ ANTÔNIO DA SILVA TATIANE TEIXEIRA
CAMETÁ – PARÁ
2008.