fernando da costa tourinho fil
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Capa de Sylvia Tourinho
Capa de Sylvia Tourinho
FERNANDO DA COSTA TOURINHO FILHO
m p f= -11 F R .00.1 #N 3
REGISTRO PATRIMONIAL N2 '469 Obs nao retire esta etiqi-teta
PROCESSO PENAL
WVOLUME
21.' edio
revista e atualizada
. 1999
Editora
Q0 Saraiva
ISBN 85-02-02184-2 obra completa ISBN 85-02-02183-4 volume 1
Dados Internacionais de Catalogao na Publicao (CIP)
(Cmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Tourinho Filho, Fernando da Costa, 1928-
Processo penal / Fernando da Costa Tourinho Filho. - 21. ed. rev. e atual. - So Paulo : Saraiva, 1999.
Obra em 4 v.
Bibliografia.
1. Processo penal 2. Processo penal - Brasil 1. Ttulo.
98-5620
i
1
CDU-343.1
ndice para catlogo sistemtico:
1. Processo penal : Direito penal343.1
5033
Editara
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0 AUTOR
1
1
Indice
CAPTULO 1
NOES PRELIMINARES
1. 0 litgio ............................................................................................
2. Formas compositivas do litgio ........................................................ 3. 0 monoplio da administrao da justia. 0 processo .................. 4. 0 processo absorveu as demais formas compositivas do litgio? .. 5. 0 jus puniendi
.................................................................................. 6. 0 processo como complexo de atos e como relao jurdica ......... 7. 0 Processo Civil e o Processo Penal ............................................... 8. 9. 10. li. 12. 13. 14. 15.
Unidade ou dualidade do Direito Processual? ...................... Conceito de Direito Processual Penal ............. Autonomia do Direito Processual Penal ................................ Instrumentalidade do Direito Processual
......................................... Nomenclatura ....................... Finalidade .................................................. Posio no quadro geral do Direito ................................................. Relao do Direito Processual Penal com outros ramos
do Direito e cincias auxiliares ........................................................ 16. Princpios que regem o Processo Penal ........................................... 17. Verdade real ......................................................................... 18. 0 princpio da
imparcialidade do Juiz ............................... 19. 20. 21.
Princpio da igualdade das partes ....................................................
0 princpio da persuaso racional ou do livre convencimento .......
Princpio da publicidade ................
11
12
18
35
40
40
43
45
46
Vil
i
1
i
22. Princpio do contraditrio 48
23. Princpio da iniciativa das partes 51
24. Ne eat judex ultra petita partium 53
25. Identidade fsica do Juiz 59
26. Princpio do devido processo legal 60
27. Princpio da inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilcitos61
28. Princpio da inocncia 64
29. Princpio do favor rei 74
30. Princpio do duplo grau de jurisdio 75
CAPTULo 2
DESENVOLVIMENTO HISTRICO
DO PROCESSO PENAL
1. 0 Processo Penal na Grcia 79
2. 0 Processo Penal em Roma 80
3. 0 Processo Penal entre os germnicos 83
4. 0 Processo Penal cannico 84
5. 0 sistema inquisitivo nas legislaes laicas 85
6. As inovaes aps a Revoluo Francesa 88
7. Tipos de Processo Penal 90
8. Direito ptrio 94
CANTULo 3
EFICACIA DA LEI NO TEMPO
1. Vacatio legis 97
2. Ab-rogao. Derrogao. Ab-rogao expressa e tcita 97
3. Princpio da retroatividade 98
4. Princpio da irretroatividade. Ultra-atividade 99
5. Eficcia da lei penal no tempo 101
6. Eficcia da lei processual penal no tempo 110
CAPTULo 4
EFICCIA DA LEI
PROCESSUAL PENAL NO ESPAO
1. Eficcia da lei penal no espao 121
VIII
2. 0 princpio da territorialidade. 0 da nacionalidade. 0 da prote-
o. 0 da Justia Penal universal ....................................................
3. Lugar do crime .................................................................................
4. Tempo do crime ................................................................................
5. Lei processual penal no espao .......................................................
6. Ressalvas ..........................................................................................
-9-
CAPTULo 5
INTERPRETAO
1. Noes ..............................................................................................
2. Interpretao autntica .....................................................................
3. Interpretao doutrinal .....................................................................
4. Interpretao judicial .......................................................................
5. Interpretao gramatical ..................................................................
6. Interpretao lgica .........................................................................
7. Interpretao sistemtica .................................................................
8. Interpretao histrica .....................................................................
9. Interpretao extensiva e restritiva .................................................
10. Interpretao progressiva .................................................................
11. Interpretao analgica ....................................................................
12. Analogia ...........................................................................................
CAPTULo 6
FONTES DO DIREITO PROCESSUAL PENAL
1 . Sentido da palavra "fonte" .............................................................. 2. As fontes formais e substanciais ..................................................... 3. Classificao das fontes formais ..................................................... 4.
Modalidades das fontes diretas ........................................................ 5. Fontes orgnicas ............................................................................... 6. Fontes indiretas ................................................................................ 7. Fontes
secundrias ........................................................................... 8.
122 130 136 137 141
165 166 166 167 167 168 169 169 170 171 172 173
179 179 180 180 181 181 183 186
1X
CAPTULo 7
V- DA PERSECUO
i
1.
2.
3.
4. Polcia de Segurana ........................................................................ 5. Polcia Civil ...................................................................................... 6. Do inqurito policial ........................................................................ 7.
Finalidade do inqurito .................................................................... 8. Inquritos extrapoliciais .................................................................. 9. 10. li. 12.
Da investigao preparatria ...........................................................
0 inqurito indispensvel? ...........................................................
Natureza do inqurito ......................................................................
Incomunicabilidade ..........................................................................
2." - DA PERSECUO
1. Notitia criminis ................................................................................ 2. Incio do inqurito ............................................................................
3. Instaurao "de ofcio" ....................................................................
4. Instaurao por meio de requisio .................................................
5. Instaurao por meio de requerimento ............................................
6. Contedo do requerimento ...............................................................
7. A Autoridade Policial tem o dever de instaurar inqurito? ............
S. Pode a Autoridade Policial indeferir requisio do Ministrio P-
blico? ................................................................................................
9. Providncia que o ofendido pode tomar ..........................................
10. A delatio criminis ............................................................................
11. Inqurito policial nos crimes de ao penal pblica condicionada
12. A hiptese de requisio do Ministro da Justia ............................
3."- DA PERSECUAO
1. 0 inqurito policial nos crimes de ao privada ............................
2. A mulher casada e o direito de queixa ............................................
3. Prazo para se requerer a instaurao de inqurito .........................
4. Contedo do requerimento ...............................................................
X
191 193 194 194 195 196 198 199 200 206 208 215
217 218 218 221 222 224 224
225 226 227 230 235
237 238 238 239
4."-1 DA PERSECUO
2. Apreenso de objetos e instrumentos do crime ...............................
3. Da busca e apreenso ....................................................................... 4. Da ouvida do ofendido ..................................................................... 5. Da ouvida do indiciado .................................................................... 6.
D99econhecimento ........................................................................... 7. Das acareaes ................................................................................. 8. Dos exames periciais ....................................................................... 9.
Reproduo simulada .......................................................................
10. A identificao .................................................................................
11. Tipos e subtipos ................................................................................
12. Pode o indiciado recusar-se a ser identificado? ..............................
13. Folha de antecedentes ......................................................................
5."- DA PERSECUO
1. Priso em flagrante .
2. 0 curador no auto de priso em flagrante .......................................
3. Concluso do inourito __
6. Arquivamento ........
7. Juizado de Instruo ........................................................................
CAPfTULo 8
DA ACO
1. Noes gerais ...................................................................................
2. Fundamento do direito de a . o e base constitucional ....................
3. Ao penal --***
4. Fundamento constitucional da ao penal .......................................
5. Natureza jurdica do direito de ao---.............................................
6. Windscheid e Muther .......................................................................
7. Adolph Wach e a autonomia do direito de ao .............................
8. PlszeDegenkolb
240 243 244 246 247 249 249 251 254 254 260 263 266
267 269 269 273 279 280 282
285 288 290 292 293 295 296 297
X1
9. A teoria do direito potestativo 298
10. 0 conceito de direito de ao 300
11. 0 direito de ao no plano estritamente processual 301
12. 0 conceito de ao penal 305
2." - DA AAO PENAL
1. Enquadramento da ao penal no sistema legal normativo ............
2. A influncia do Cdigo de Instruo Criminal da Frana ..............
3. A orientao do legislador ptrio de 1890 ......................................
4. A orientao nos trabalhos legislativos de 1940 ............................
5. A opinio de Jorge A. Romeiro e de Vicente de Azevedo .............
6. Crticas de Frederico Marques ........................................................
7. Normas penais e processuais ...........................................................
8. Classificao da ao penal .............................................................
9. Classificao subjetiva ....................................................................
10. Razo de ser da diviso da ao penal e da subdiviso da ao
penal pblica ....................................................................................
11. Subdiviso da ao penal pblica ...................................................
12. Ao penal pblica incondicionada .................................................
13. Classificao quanto pretenso ....................................................
3." - DA AO PENAL PBLICA CONDICIONADA
1. Ao penal pblica condicionada ....................................................
2. Ao penal pblica condicionada representao .........................
3. Razo de ser .....................................................................................
4. Crtica ...............................................................................................
5. Crimes cuja ao penal depende de representao .........................
6. Natureza jurdica da representao .................................................
4." - DA AAO PENAL PBLICA CONDICIONADA
308
309
309
309
309
310
310
311
316
317
320
322
331
332
332
333
334
335
336
1. Ao penal pblica condicionada 344
2. Representao 345
3. A quem dirigida a representao? 345
4. Quem pode fazer a representao? 347
5. 0 ofendido incapaz e sem representante legal 349
x11
6. Natureza jurdica do curadOr especial ............................................. 7. Cessao da atividade do curador ................................................... 8. Morte do ofendido ............................................................................ 9.
Retratao .........................................................................................
10. E possvel a retratao depois do oferecimento da denncia? .......
11. E possvel a retratao da retratao? ............................................
12. A Wssoa que faz a representao obrigada a definir juridica-
.46!5
mente o fato? .................................................................................... 13. Eficcia objetiva ..............................................................................
14.Prazo para a representao ..............................................................
15. possvel a representao se o representante legal veio a saber quem foi o autor do crime quando a ofendida, que j o sabia, estava com mais de 18 anos e 6 meses? ..........................................
16. Prazo para a representao na hiptese do 1.' do art. 24 do CPP
17. Prazo para a representao nos crimes de imprensa ......................
18. Como provar que o titular do direito de representao soube quem foi o autor do crime nesta ou naquela data? .........................
19.Como se conta o prazo para a representao? ................................
20. Ao penal nos crimes contra os costumes .....................................
21. Requisio do Ministro da Justia ..................................................
5." - INCIO DA AO PENAL PBLICA
1. Como se inicia a ao penal pblica condicionada ou incondicio-
2. Instante inicial da ao penal pblica .............................................
3. Contedo da denncia ......................................................................
4. Prazo para o oferecimento da denncia ..........................................
5. Denncia fora do prazo ....................................................................
6. Devoluo do inqurito ....................................................................
7. Extino da punibilidade .................................................................
8. Guarda em cartrio ..........................................................................
9. Inviabilidade da relao processual ................................................
10. Arquivamento do inqurito ..............................................................
350 350 350 352 353 354
355 355 356
359 361 362
362 363 366 373
380 381 382 391 395 396 399 399 399 400
XIII
6." - DA AO PENAL PRIVADA
1. Noes gerais .................................................................................... 2. Distino entre ao penal pblica e ao penal privada .............. 3. Crticas ao penal privada ........................................................... 4. Os crimes
de ao penal privada no Cdigo atual .......................... 5. Princpios ........................................................................................... 6. Quem pode promov-la? ................................................................... 7. A mulher casada
pode exercer o direito de queixa? ....................... 8. Pessoas jurdicas ................................................................................ 9. Prazo ................................................................................................... 10. li. 12. 13. 14.
0 prazo na hiptese do art. 31 ......................................................... Contagem do prazo ............................................................................ Diviso da ao penal privada ......................................................... * morte do
cnjuge ofendido na ao penal privada personalssima..
* ofendido incapaz e o direito de queixa na ao penal privada
personalssima. ...................................................................................
15. Despesas judiciais .........
7." - OUTROS TIPOS DE AO PENAL
1. Ao penal privada subsidiria da pblica ..................................... 2. Quando ocorre ...................................................................................
3. inovao do CPP de 1942? ...........................................................
4. Prazo para oferecimento da queixa ..................................................
5. Requerido o arquivamento dos autos do inqurito, poder, ainda
assim, o ofendido oferecer queixa substitutiva da denncia? ........ 6. Ao penal nos crimes falimentares .................................................
7. Ao penal popular ...........................................................................
8. Ao penal ex officio ........................................................................
9. Outras modalidades de ao penal ...................................................
8." - INCIO DA AO PENAL PRIVADA
416 417 418 421 423 428 430 433 436 439 440 442 443
443 445
450 451 451 452
455 458 462 470 477
1. Como se inicia a ao penal privada? 481
2. Ouvida do rgo do Ministrio Pblico 482
3. A queixa poder ser oferecida pelo prprio ofendido? 483
4. Prazo 485
XIV
5. Devoluo do inqurito 486
6, Arquivamento 486
1
9.* - CONDIOES DA AAO
1. Introduo ......................................................................................... 2. 0 policiamento do exerccio do direito de ao .............................
3. As pndies da ao .......................................................................
4. ~s-c-ondies da ao no Processo Penal ........................................
5. As condies genricas .................................................................... 6. As condies especficas .................................................................
10 - REJEIO DA DENNCIA OU QUEIXA
487 487 489 492 492 506
CANTULO 9
I."- DA EXTINO DA PUNIBILIDADE
1. A rejeio da denncia ou queixa e a extino da punibilidade .... 2. Que se entende por extino da punibilidade? ................................ 3. As causas extintivas da punibilidade .............................................. 4. 0 art. 107 do
CP esgota todas as causas extintivas da punibili-
5. Morte do agente ...............................................................................
6. Anistia, graa e indulto ....................................................................
7. Anistia ...............................................................................................
8. Graa e indulto .................................................................................
9. Abolifio criminis ..............................................................................
10. Prescrio, decadncia e perempo ...............................................
11. Prescrio .........................................................................................
12. Prescrio retroativa ........................................................................
13. Decadncia.......................................................................................
1. Rejeio da pea acusatria 513
2. Aspecto formal da denncia ou queixa 514
3. Viabilidade do direito de ao 516
4. Viabilidade da relao processual 520
5. Recurso 522
525 526 535 536 539 545 546 546 554 563
XV
2." - DA EXTINAO DA PUNIBILIDADE
i
Diviso
Quem pode conceder o perdo? ........................................................
Aceitao do perdo ..........................................................................
Aceitao processual e extraprocessual. ...........................................
Extenso do perdo ...........................................................................
Perdo e renncia ..............................................................................
Perempo ..........................................................................................
12. Quais as causas que determinam a perempo? ..............................
13. Perempo, renncia e perdo ..........................................................
14. Retratao ..........................................................................................
15. Subsequens matrimonium ................................................................
16. Subsequens matrimonium cum tertio ..............................................
17. 0 perdo judicial, nos casos previstos em
18.
1. Conceito de renncia ............
2. Renncia expressa e renncia tcita ................................................
3. Extenso ...................................
4. Perdo .................................................................................................
5.
6.
7.
8.
9.
10.
li.
0 pagamento do tributo no crime de sonegao fiscal ...................
APNDICE
567
568
572
573
574
575
576
577
578
579
580
580
588
588
593
597
600
602
Aditamento queixa 611
Arquivamento 627
BIBLIOGRAFIA
XVI
captulo 1
1. 0 litgio
NoOes Preliminares
SUMRIO: 1 - 0 litgio. 2. Formas compositivas do litgio. 3. 0 monoplio da administrao dajustia. 0 processo. 4. 0 processo absorveu as demais formas compositivas do litgio? 5. 0 jus puniendi. 6. 0 processo como complexo de atos e como re-
lao jurdica. 7. 0 Processo Civil e o Processo Penal. 8. Unidade ou dualidade do Direito Processual? 9. Conceito de Direito Processual Penal. 10. Autonomia do Direito Processual Penal. 11. Instrumentalidade do Direito Processual. 12. Nomenclatura.
13. Finalidade. 14. Posio no quadro geral do Direito. 15. Relao do Direito Processual Penal com outros ramos do Direito e cincias auxiliares. 16. Princpios que regem o Processo Penal. 17. Verdade real. 18. 0 princpio da imparcialidade do Juiz.
19. Princpio da igualdade das partes. 20. 0 princpio da persuaso racional ou do livre convencimento. 21. Princpio da publicidade. 22. Princpio do contraditrio. 23. Princpio da iniciativa das partes. 24. Ne eatjudex ultrapetitapartium. 25. Identidade
fsica do Juiz. 26. Princpio do devido processo legal. 27. Princpio da inadmissibilidade das provas obtidas por meios ilcitos. 28. Princpio da inocncia. 29. Princpio do favor rei. 30. Princpio do duplo grau de jurisdio.
0 homem no pode viver seno em sociedade. As sociedades so organizaes de pessoas para a obteno de fins comuns, em benefcio de cada qual. Mas, se no houvesse umpoder, nessas sociedades, restrin-
1
gindo as condutas humanas, elas jamais subsistiriam. Cada um faria o que bem quisesse e entendesse, invadindo a esfera de liberdade do outro, e, desse modo, qualquer agrupamento humano seria catico.
Da o surgimento do Estado, com os seus indefectveis elementos: povo, territrio e governo. Num determinado espao do globo terrestre, cada povo "exerce um poder, exclusivo e supremo, de
organizao da sua vida". Uma pequena minoria, escolhida segundo critrios varios, passa a dirigir os destinos do povo.
Visando continuidade da vida em sociedade, defesa das liberdades individuais, em suma, ao bem-estar geral, os homens organizaramse em Estado. Desde ento eles se submeteram s ordens dos
governantes, no mais fazendo o que bem queriam e entendiam, mas o que lhes era permitido ou no proibido.
E verdade que a origem do Estado quase to velha quanto a fome,
e, at hoje, os socilogos no chegaram a um acordo sobre o seu nascimento. Walter Bagehot, Spencer, Lowie, Suniner Maine, Gumplowics, Razenhofer, Oppenheimer, Conite, Jacques Novicow,
Giddings, Albion Small, Haeys e outros tantos socilogos e pensadores no chegaram a um denominador comum sobre o surgimento do Estado. Como surgiu? Que foras contriburam para a sua
formao? Ele se desenvolveu, gradualmente, a partir da famlia? Encontrou ele seu embrio na disciplina que havia na famlia patriarcal? Na luta entre as classes pela propriedade privada? Na conquista de
um grupo sedentrio por outro nmade? Teve origem na guerra, como queriam Machiavelli e Bodin?
Para o nosso estudo, no nos interessa saber como e quando surgiu o Estado. 0 certo e recerto que ele existe como uma realidade irreversvel. Evidentemente, nos seus primeiros anos, todos os
poderes se enfeixavam nas mos de uma s pessoa, como no regime tribal, na famlia de tipo patriarcal. Depois, com o crescimento do agrupamento humano, por certo houve necessidade de distribuio de
funes, e, finalmente, num estgio mais avanado, os rgos que desempenhavam as funes mais importantes, as funes bsicas, atingiram a posio de Poderes.
A transformao foi paulatina.
Para atingir os seus fins, as funes bsicas do Estado - legislativa, administrativa e jurisdicional - so entregues a rgos distintos: Legislativo, Executivo e Judicirio. Tal repartio, sobre ser
necessria, em virtude das vantagens que a diviso do trabalho proporciona, torna-
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se verdadeiro imperativo, para que se evitem as prepotncias, os desmandos, o aniquilamento, enfim, das liberdades individuais. Insuportvel seria viver num Estado em que a funo de legislar, a de
administrar e a de julgar estivessem enfeixadas nas mos de um so orgo.
Trs, pois, os rgos que se altearam a Poderes.
Essa tripartio, contudo, no conquista muito antiga. At h pouco tempo havia Estados que desconheciam essa trade de Poderes, embora recoalcessem e julgassem necessrias as funes que
lhes so afetas. Havia, ento, rgos exercendo funes jurisdicionais, legislativas e administrativas sob o comando de um s homem, como se o Estado fosse uma grande orquestra regida pela batuta de
um maestro. Montesquieu refere-se Turquia do seu tempo, onde os trs "Poderes" eram reunidos na cabea do "sulto", advindo da tremendo despotismo.
Em certos Estados em formao, legisla-se arbitrariamente, administra-se discricionariamente, e a justia feita segundo a vontade dos governantes. evidncia, no h a a menor segurana jurdica.
Da a necessidade da tripartio dos Poderes. No h nem deve haver um Chefe, como um Todo-Poderoso. A soberania nacional, isto , "o poder supremo, exclusivo e autodeterminante de dar ordens
incontrastveis, sancionadas pela fora", exercida pelos trs Poderes, ficando cada qual nos estreitos crculos de suas atribuies: um legislando, outro administrando e o terceiro julgando, aplicando a lei.
Eles devem ser independentes e harmnicos entre si. Nenhum deles pode sobrepor-se aos demais dentro nos seus crculos de atribuies. No h nem deve haver hierarquia entre eles. Cada qual atua
dentro nas suas respectivas esferas.
0 Legislativo no pode elaborar leis que afrontem a Constituio. Se o fizer, cabe ao Judicirio julg-las sem eficcia. 0 Executivo no pode cometer arbitrariedades e desmandos. Mas, se isso
acontecer, encontrar um basta partido do Judicirio, tal como ocorre com a concesso de habeas corpus, quando agentes do Executivo levam a efeito medidas
'irmalidades
restritivas da liberdade individual, sem a observncia das legais.
A funo do Legislativo legislar, elaborando leis que venham ao encontro dos reclamos da sociedade, sem ferir a Constituio. A do Executivo, administrar, observando os preceitos legais. A do
Judicirio, julgar, aplicando as leis aos casos concretos.
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E, assim, os trs Poderes, como emanao da soberania nacional, desempenham as funes estruturais e bsicas do Estado: legislao, administrao e jurisdio. Um legisla, outro administra e o
terceiro julga.
Quando o povo se organizou em Estado, a primeira preocupao foi a de dar-lhe a necessria estruturao. Essa estruturao orgnica do Estado outra coisa no seno a sua prpria Constituio, a
sua Lei Maior, a Carta Magna. Quem traa os princpios que devem disciplinar a vida do Estado? Quem delineia sua estrutura? Evidente que nas sociedades de antanho, de diminuta populao, era o
prprio povo que se guindava posio de "poder constituinte", para projetar a estrutura poltica do agrupamento humano respectivo.
Hoje, de modo geral, esse poder continua sendo do povo, exercido, contudo, em virtude da exploso demogrfica, por seus representantes, eleitos para tal fim. Eles se renem em Assemblia
Constituinte e elaboram a Constituio do Estado. Outras vezes surge um movimento poltico-jurdico no Estado, e o poder de delinear sua estrutura cabe ao Poder emergente daquele movimento. Ento, na
Magna Carta, distribuemse as funes bsicas do Estado (legislativa, executiva e judiciria) a rgos distintos que se alam categoria de Poder, porquanto as funes que cada um deles exerce constitui
uma delegao direta do povo. Assim, se o prprio povo, por meio dos seus representantes, delegou a determinado rgo a funo de legislar, de administrar e de julgar, evidente que cada um deles
soberano dentro no seu crculo de atribuies. A soberania, poder supremo do Estado, exercida por aqueles trs Poderes, sem que ela perca o sentido da sua unidade. Apenas cada Poder exerce as
atividades que lhe so prprias, exclusivamente no interesse e proteo das liberdades individuais e do bem-estar geral.
Por a se v que os Poderes no podem ser hierarquizados. Se fossem, os trs redundariam num s: o mais alto, o que estivesse na cumeada. Os demais seriam simples rgos incumbidos de
determinadas tarefas. No seriam Poderes, porquanto no poderiam opor-se e contrapor-se quele que estivesse no pncaro, isto , ao mais graduado. 0 elemento especfico do Poder, j se disse, " a
capacidade de opor-se a outro qualquer Poder quando um venha a invadir a esfera de atribuio do outro".
Para manter a harmonia no meio social e, enfim, para atingir os seus objetivos, um dos quais se ala posio de primordial - o bemestar geral -, o Estado elabora as leis, por meio das quais se
estabelecem normas de conduta, disciplinam-se as relaes entre os homens e
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regulam-se as relaes derivadas de certos fatos e acontecimentos que surgem na vida em sociedade. Essas normas, gerais e abstratas, dispoem, inclusive, sobre as conseqncias que podem advir do seu
descumprimento. Em face de um conflito de interesses, ds que juridicamente relevante, a norma dispe no s quanto relevncia de um deles, como tambm quanto s conseqncias da sua leso.
Tais normas so, pois, indispensveis, para que se saiba o que se pode jo-que no se pode fazer. 0 homem precisa, pois, contribuir para que a sociedade no se destrua, no se aniquile, porquanto sua
destruio implica seu prprio aniquilamento. Se ele precisa da sociedade, obviamente deve pautar seus atos de acordo com as normas de conduta que lhe so traadas pelo Estado, responsvel pelos
destinos, conservao, harmonia e bem-estar da sociedade.
Entretanto, conforme vimos, no isso e, que ocorre. Os conflitos de interesses, dos mais singelos aos mais complexos, verificam-se com freqncia. Por outro lado, quando "o sujeito de um dos
interesses em conflito encontra resistncia do sujeito do outro interesse", fala-se em lide. Esta , pois, na difundida lio de Carnelutti, um conflito de interesses qualificado por uma pretenso resistida ou
insatisfeita (cf. Sistema del diritto processuale civile, Padova, 1936, v. 1, p. 40).
Ainda segundo o ensinamento do mestre, denomina- se Pretenso a exigncia de subordinao de um interesse alheio ao interesse proprio. Na lide, h um interesse subordinante e um subordinado.
Um que deve prevalecer, por ser protegido pelo Direito, e outro que deve ser subordinado, por lhe faltar a tutela jurdica.
Se Caio deve a Tcio e no quer pagar, diz-se que Tcio tem uma pretenso, porquanto pode exigir que o interesse de Caio em no lhe pagar (interesse subordinado) se subordine ao seu (que
subordinante), que o de receber. Como, nesse exemplo, a pretenso de Tcio est encontrando resistncia, diz-se que h litgio ou lide.
Mas pouca importncia teria essa tarefa do Estado em estabelecer normas de conduta aos seus co-associados com a ameaa de uma sano, se, porventura, no conseguisse um modo razovel para
solucionar esses conflitos de interesses que surgem a todo instante na vida em sociedade. E os conflitos se resolvem e ficam solucionados fazendo-se prevalecer o interesse que realmente for tutelado pelo
direito objetivo.
Estabelecer as normas de conduta que devem ser observadas por todos tarefa do Estado-Legislao, isto , do Poder incumbido de ela-
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borar as leis reguladoras e disciplinadoras dos fatos e relaes emergentes da vida, como as relaes decorrentes do casamento, da propriedade, do comrcio etc. Ao Poder Legislativo cumpre, pois,
elaborar as normas disciplinadoras dessas relaes (normas civis, comerciais, trabalhistas, penais etc.), surgindo, assim, conforme pondera Manzini, uma relao de sujeio geral, pois todos quantos se
encontrem no territrio do Estado esto obrigados observncia de suas leis.
Mas de nada valeriam essas nor~ias se o legislador no cominasse sanes queles que, porventura, viessem a transgredi-Ias. Para as infraes mais graves, sanes mais severas; para os ilcitos menos
graves, sanes mais brandas.
Assim, por exemplo, estabelece o legislador ptrio, no art. 1.275 do CC, que "o depositrio, sem licena expressa do depositante, no
pode servir-se da coisa depositada". Esta a norma de comportamento. E se, por acaso, dela servir-se sem assentimento expresso do depositante? Ficar sujeito a uma sano prevista no mesmo corpo do
citado dispositivo legal: responder por perdas e danos. Sano branda, de natureza civil.
Se algum, numa rodovia, ultrapassa o limite legal, sujeita-se a multa. Sano branda, de natureza administrativa.
Entretanto, no meio social, praticam-se muitos atos que afetam sobremaneira a vida em sociedade, pondo em risco sua propria segurana. So as infraes penais, condutas contrrias ao direito e que,
por sua gravidade, so punidas severamente. Sua catalogao no fica ao belprazer do legislador. Este, obviamente, observa que determinadas condutas se desviam daquilo que, em geral, aceito pelo
grupo, e, dada a sua gravidade e natureza anti-social, exigem uma sano mais ou menos severa: a pena. Cabe, pois, ao legislador observar, no meio social, quais
as condutas anti-sociais, crigindo-as categoria de infraes penais. claro que esse conceito de anti-sociabil idade de determinada conduta varia no tempo e no espao. Em alguns pases orientais, a
poligamia um indiferente penal. Aqui, infrao penal. Entre ns, at h pouco tem-
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po, plantar maconha no constitua crime. Depois, observou o legislador que o uso de substncias capazes de determinar dependncia fsica ou psiquica grassou e se proliferou de tal forma, que outra opo
no teve seno estabelecer medidas severas para evitar a propagao do mal, punindo, tambm, aquele que plantasse a cannabis sativa L.
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0 aborto permitido em algumas legislaes e, em outras, no. Mas algumas condutas so de to grande teor de anti- sociabilidade que as legislaes dos povos civilizados as elevam categoria de
infraes penais. Homicdio, latrocnio, por exemplo.
0 Estado, ento, por meio do Poder Legislativo, procurou, inspirado no grau de civilizao do seu povo, proibir a prtica de determinados atos, de certas condutas humanas, cominando sanes severas
quele que v'a praticar o fato incriminado. A sano a pena, que tanto poder ser privativa de liberdade como patrimonial, dependendo da gravidade do fato punvel.
Dessa forma, dispe o CP que matar algum constitui infrao penal, e a sano esta: pena de recluso de 6 a 20 anos.
Se todos ns nos subordinssemos s ordens abstratas das leis que tutelam nossos interesses e bens, haveria uma "geral e espontnea submisso dos interesses ordem jurdica", e desnecessria seria
qualquer preocupao do Estado em restaur-la.
Entretanto, como sabemos, no isso o que ocorre. Freqentemente surgem no meio social numerosos conflitos de interesses em virtude de descumprimento da norma de comportamento inserta no
Praeceptum juris. Ora Caio que foi despedido injustamente, e o empregador no lhe quer pagar a indenizao devida; ora o inquilino que, a despeito de estar atrasado nos alugueres. no quer desocupar
o prdio locado; ora o depositrio que se serviu da coisa depositada, sem expressa autorizao do depositante, estragou-a e no quer ressarcir os prejuzos. E, assim como esses, muitos outros casos.
Tais situaes so denominadas conflitos de interesses e de interesses juridicamente protegidos (pois a lei os tutelou com a ameaa de uma sano).
A palavra interesse, no particular, expressa os desejos, as exigncias, os anseios, as aspiraes, a cobia, a ambio a respeito de um bem da vida. A razo entre o homem e os bens, ensina Moacyr
Atriaral Santos, ora maior, ora menor, o que se chama interesse. Muitas e muitas vezes, em face de dois bens, o homem tem interesse em ambos. Se puder satisfazer e realizar aqueles dois interesses,
melhor para ele. No o podendo, deve sacrificar o que no lhe trouxer uma utilidade imediata. s vezes, entretanto, h dois sujeitos pretendendo satisfazer e realizar o interesse quanto ao mesmo bem.
Fala-se, ento, em conflito de interesses.
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2. Formas compositivas do litgio
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0 emprego da fora maior devia ter sido a forma mais usual para a soluo do conflito. Era a "autodefesa". Mas, sobre ser uma soluo egosta, era por demais perigosa, pois, s vezes, como
preleciona AlcalZamora, o ofendido podia ser mais fraco que o autor do ataque e, assim, longe de obter a reparao do delito ou do dano sofrido, podia experimentar um novo e mais grave ataque. E se o
prejudicado no reagisse? E se por ele ningum assumisse a defesa-vingana? A justia privada se traduziria em impunidade (cf. Derecho procesal penal, v. 1, p. 10).
E at hoje, conforme observa Calamandrei, ante a ausncia de um poder supra-estatal capaz de impor com a fora as prprias decises aos Estados, a extrema ratio para resolver os conflitos a guerra.
Assim, tambm, na co-associao primitiva, o nico meio de defesa residia na fora. Evidente que a violncia armada, o emprego da fora, "como meio de defesa do direito, implica a negao de todo
o direito e de toda convivncia social pacfica". Mais: seria uma temeridade deixar aos prprios interessados a incumbncia de resolverem por si ss os prprios conflitos, porquanto ficaria "excluda a
possibilidade de uma deciso imparcial". Poderia haver excessos. E se um dos litigantes fosse mais fraco? Haveria ento impunidade. Acentue-se com Calmon de Passos: onde a deciso do conflito se
entrega fora dos competidores, o mais forte tem sempre razo.
Por isso mesmo dizia La Fontaine: "La raison du plus fort est toujours Ia meilleure"... Em vez do lema silent leges inter arma, o que deve prevalecer, na lio de Ccero, o cedant arma togae...
Outro meio para a soluo dos litgios era a "composio", ou, na linguagem de Carnelutti, a "autocomposio". Pela economia de despesas, de gastos, seria uma forma excelente. Todavia a
"autocomposio", embora vigente, ainda hoje, para numerosos casos, no pode ser estendida generalidade dos conflitos, uma vez que, com freqncia, "envolve uma capitulao do litigante de menor
resistncia". Ademais, e se um dos conflitantes no quisesse a composio?
3. 0 monoplio da administrao da justia. 0 processo
Era preciso, destarte, que a composio, a soluo do litgio (e por soluo de litgio se entende a aplicao da vontade concreta da lei, fa-
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zendo prevalecer o interesse tutelado pelo direito), se fizesse de maneira pacfica e justa. Era preciso, tambm, que tal funo (a de solucionar o litgio) ficasse a cargo de um terceiro. Mas quem, no meio
social, poderia desincumbir-se desse mister? No bastava ser um terceiro, um rbitro enfim. Era preciso, antes de mais nada, que se tratasse de um terceiro forte demais, de modo a tornar sua deciso
respeitada e obedecida por todos, principalmente pelos litigantes.
Cmo se percebe, somente o Estado que podia ser esse terceiro. Ento o Estado chamou a si, avocou a tarefa de administrar justia, isto e, a tarefa de aplicar o direito objetivo aos casos concretos,
dando a cada um o que seu. Os litgios afetavam e afetam sobremaneira a segurana da ordem jurdica, e, assim, para manter a ordem no meio social, para restaurar a ordem jurdica quando violada, a
justia - arte de dar a cada um o que e seu - passou a ser exercida, administrada pelo Estado.
Foi, pois, pela necessidade de pacificar o grupo e de "restabelecer, em benefcio dele, a ordem jurdica, ameaada ou violada, que o Estado interveio no campo da administrao da justia".
Essa interveno, entretanto, ocorreu paulatina e gradativamente. A princpio, o Estado disciplinou a "autodefesa". Mais tarde, despontou em algumas civilizaoes sua proibio quanto a certas
relaes, a certos conflitos. E, assim, aos poucos, foi-se acentuando a intervenao do Estado, culminando por ved-la. No de todo, como veremos adiante, mas vedando-a. No decreto de Marco Aurlio,
castigava-se com a perda de direito o credor que, sem recorrer ao Juiz, fizesse pagar a dvida para si com o emprego da fora (quisquis igiturprobatus mihi fuerit rem ullam debitoris vel pecuniam debitam
non ab ipso sibi sponte datam sine ullo judice temere possidere vel accepisso, isque sibi jus in eam dixisse: jus crediti non abebit). Esclarece Chiovenda que, nas leis de Hamurabi, notavam-se, tambm,
enrgicas sanes contra a violncia privada (cf. Instituies de direito processual civil, Saraiva, 1965, v. 1, p. 38).
Aquelas proibies de "autodefesa" para determinados litgios foram-se generalizando at chegar proibio total, "como uma das premissas fundamentais sobre que assenta o edifcio constitucional
do Estado".
Hoje, portanto, somente o Estado que pode dirimir os conflitos de interesses. Da dizer Graf Zu Dolma que o Estado detm o monoplio
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da administrao da justia. E tanto isso exato que em todas as legislaes existe norma semelhante quela do art. 345 do nosso CP: proibido fazer justia com as prprias mos, embora a pretenso seja
legtima. S o Estado, e exclusivamente o Estado, que pode administr-la. Da se infere que, detendo ele o monoplio da administrao dajustia, surge-lhe o dever de garanti-Ia.
Desse modo, se apenas o Estado que pode administrar justia, solucionando os litgios, e ele o faz por meio do Poder Judicirio, bvio que, se algum sofre uma leso em seu direito, estando
impossibilitado de faz-lo valer pelo uso da fora, pode dirigir-se ao Estado, representado pelo Poder Judicirio, e dele reclamar a prestao jurisdicional, isto , pode dirigir-se ao Estado-Juiz e exigir dele
se faa respeitado o seu direito. A esse direito de invocar a garantia jurisdicional chama-se direito de ao.
Por essas razes que o Estado pe, disposio de todos ns, os
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orgos prprios da administrao da justia (so os Juzes), a fim de solucionarem os litgios que os interessados levarem ao seu conhecimento. 0 direito de ao encontra, pois, seu fundamento na
proibio de se fazer justia com as prprias mos. S o Estado, por meio do Poder Judicirio, que pode fazer justia, dando a cada um o que seu. A est a ratio essendi do art. 5.', XXXV, da Magna
Carta, ao estabelecer que "a lei no excluir da apreciao do Poder Judicirio leso ou ameaa a direito".
Mas de que maneira o Estado procede composio da lide? De que maneira o Estado consegue dirimir os conflitos de interesses? Por meio do processo. Este nada mais seno forma de composio
de litgios. Em sua etimologia, a palavra processo traz a idia de ir para frente, de avanar. Ensina Fenech: o processo e, e outra coisa no pode ser, seno um fato com desenvolvimento temporal, um fato
que apresenta mais de um momento, um fato que no se esgota no instante mesmo da sua produo. Fato que se desenvolve no tempo equivale srie encadeada de fatos parciais, menores, que constituem
ou integram o fato total (cf. Derecho procesal penal, v. 1, p. 54). E acrescenta o mestre: esta dimenso temporal, este desenrolar-se ou desenvolver-se no tempo a nota essencial do processo, de todo
processo e de qualquer processo. No pode haver processo se no h um desenvolvimento no tempo, e, por outro lado, no pode haver nenhum fato que se desenvolva no tempo ao qual no se possa
corretamente aplicar a palavraprocesso (cf. Derecho, cit., p. 54).
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Podemos falar em processos patolgicos, em processos csmicos e assim por diante. 0 processo de que cuidamos, forma compositiva de litgios, est integrado por atos que se desenrolam, tambm,
em sua dimenso temporal. J no se fala ernfatos, mas em atos, porque o processo, como forma civilizada de soluo de lides, inicia-se, desenvolvese e termina pela vontade do homem. Ento o processo
uma sucesso de atos com os quais se procura dirimir o conflito de interesses. Nele se desenv
W1,ve uma srie de atos coordenados visando composio da lide, e Te compe, fica solucionada, quando o Estado, por meio do Juiz, depois de devidamente instrudo com as provas colhidas,
depois de sopesar as razes dos litigantes, dita a sua resoluo com fora obrigatria. Assim, quando o proprietrio deixa de receber os alugueres do imvel locado, porque o inquilino se recusa a pagar-lhe,
no podendo aquele fazer valer o seu direito fora (pois somente o Estado que administrajustia), poder dirigir-se ao Estado-Juiz (direito de ao), narrandolhe, por escrito, em que consistiu a leso do
seu direito e, ao mesmo tempo, solicitando-lhe a aplicao da vontade concreta da lei, fazendo com que o seu interesse, realmente tutelado pelo direito objetivo, prevalea em face da resistncia do
inquilino. 0 Juiz, ento, determina seja o inquilino cientificado da pretenso exposta em juzo, chamando-o para vir defender-se. 0 inquilino atende ao chamamento. Defende-se. Proprietrio e inquilino
procuram, com provas exibidas e dando as suas razes, convencer o Juiz de que o pedido deve ser julgado procedente ou improcedente, e, a final, o Magistrado, como rgo imparcial, aps estudo
meticuloso das provas e das alegaes das partes contendoras, vale dizer, aps reunido o material de cognio, aplica coativamente a norma jurdica adequada soluo da referida lide. Isso e processo, e
um complexo de atos que se sucedem, coordenadamente, com um objetivo comum, com uma causa finalis: a soluo, a composio da lide. Pode-se dizer, tambm, que processo aquela atividade que o
Juiz, encarregado que de solucionar os conflitos de interesses de maneira imparcial, secondo verit e secondo giustizia, desenvolve, visando dar a cada um o que e seu.
4. 0 processo absorveu as demais formas compositivas do litgio?
Insta acentuar que, embora a composio dos litgios se opere por meio do processo, este no absorveu totalmente as demais formas compositivas da lide. Caso se d uma vista Wolhos no nossojus
positum,
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constatar-se- que, excepcionalmente, permite a lei ao indivduo prover a conservao ou a obteno de um bem jurdico com a execuao de atos que regra geral lhe so defesos. A observao feita por
Chiovenda, e a acomodao ao direito ptrio levada a cabo por Liebman (cf. Instituies de direito processual civil, acompanhadas de notas do Prof. Liebman, Saraiva, 1965, v. 1, p. 38). Vejam-se, a
propsito, as normas que se contm nos arts. 502, 558 e 1.279 do CC. Trata-se de casos de verdadeira "autodefesa", consentida e moderada pelo Estado. Por outro lado, proclamam os arts. 160 do CC e 24
e 25 do CP serem lcitos os atos praticados em legtima defesa ou em estado de necessidade.
Quanto autocomposio, ainda se mantm, quando emjogo interesses disponveis. As transaes so muito comuns na esfera extrapenal. Atualmente, com a criao dos Juizados Especiais Criminais,
nas causas penais de menor potencial ofensivo, a -transao- no passa de verdadeira -autocomposio", mais ou menos maneira do que ocorre com o plea bargaining dos norte-americanos.
5. 0 Jus puniendi"
Dos bens ou interesses tutelados pelo Estado (por meio das normas), uns existem cuja violao afeta sobremodo as condies de vida em sociedade. 0 direito vida, honra, integridade fsica so
exemplos. Tais bens e muitos outros so tutelados pelas normas penais, e sua violao o que se chama ilcito penal ou infrao penal. 0 ilcito penal atenta, pois, contra os bens mais caros e importantes de
quantos possua o homem, e, por isso mesmo, os mais importantes da vida social.
Mas como esses bens ou interesses so tutelados em funo da vida social, como tais bens ou interesses so eminentemente pblicos, eminentemente sociais, o Estado, ento, ao contrrio do que
ocorre com outros bens ou interesses, no permite que a aplicao do preceito sancionador ao transgressor da norma de comportamento, inserta na lei penal, fique ao alvedrio do particular. Conforme
acentua Fenech, quando ocorre uma infrao penal, quem sofre a leso e o proprio Estado, como representante da comunidade perturbada pela inobservncia da norma jurdica, e, assim, corresponde ao
prprio Estado, por meio dos seus rgos, tomar a iniciativa motu proprio, para garantir, com sua atividade, a observncia da lei.
Por essa razo, quando se comete uma infrao penal, quem sofre a leso o prprio Estado, a par da leso sofrida pela vtima. Observe-
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se, como muito bem recorda Ambal Bruno, que muitos autores distinguem, no crime, um sujeito passivo geral, genrico ou constante, que o Estado, sob a alegao de que h sempre um interesse pblico
violado pelo crime e um sujeito passivo particular, que o titular do bem jurdico ofendido (cf. Direito penal, t. 2, p. 562).
Porque os bens tutelados pelas normas penais so eminentemente pblicos, eminentemente sociais, o jus puniendi, o direito de punir os infrat*es, o direito de poder impor a sanctio juris queles que
descumprirem o mandamento proibitivo que se contm na lei penal, corresponde sociedade. Ningum desconhece que a prtica de infraes penais transtorna a ordem pblica, e a sociedade e a principal
vtima e, por isso mesmo, tem o direito de prevenir e reprimir aqueles atos que so lesivos a sua existncia e conservao.
Nota muito bem Gonzales Bustamante que ojuspuniendi equivale legtima defesa que se reconhece aos particulares. A sociedade tem o direito de defender-se, adotando contra qualquer pessoa que
ponha em perigo sua tranqilidade as medidas preventivas e repressivas que sejam condizentes (cf. Principios de derecho procesal penal mexicano, Porra, p. 3).
Como a sociedade, assim entendida, uma entidade abstrata, a funo que lhe cabe, de reprimir as infraes penais, permanece em mos do Estado, que a realiza por meio dos seus rgaos
competentes.
0 jus puniendi pertence, pois, ao Estado, como uma das expresses mais caractersticas da sua soberania. Observe-se, contudo, que o jus puniendi existe in abstracto e in concreto. Com efeito.
Quando o Estado, por meio do Poder Legislativo, elabora as leis penais, cominando sanes queles que vierem a transgredir o mandamento proibitivo que se contm na norma penal, surge para ele o jus
puniendi num plano abstrato e, para o particular, surge o dever de abster-se de realizar a conduta punvel. Todavia, no instante em que algum realiza a conduta proibida pela norma penal, aquelejus
puniendi desce do plano abstrato para o concreto, pois, j agora, o Estado tem o dever de infligir a pena ao autor da conduta proibida. Surge, assim, com a prtica da infrao penal, a "pretenso punitiva".
Desse modo, o Estado pode exigir que o interesse do autor da conduta punvel em conservar a sua liberdade se subordine ao seu, que o de restringir ojus libertatis com a inflio da pena.
A pretenso punitiva surge, pois, no momento em que o'juspuniendi"
in abstracto se transfigura no "jus puniendi" in concreto.
iObserva-se, aqui, um fenmeno interessante: com o simples
surgimento da pretenso punitiva forma-se a lide penal. Mesmo que o
autor da conduta punvel no queira resistir pretenso estatal, dever
faz-lo, pois o Estado tambm tutela e ampara ojus libertatis do indigitado
autor do crime. Revela-se, assim, a lide penal, por meio do binmio:
direito de punir versus direito de liberdade. , pois, sui generis o litgio
penal.
E de que forma consegue o Estado tomar efetivo o seu direito de punir, infligindo a pena ao culpado? Tambm por meio do processo. Mas, se o Estado o titular nico e exclusivo do
direito de punir, por que razo necessita ele de recorrer s vias processuais para demonstrar o seu direito de punir, abdicando de sua soberania? No lhe seria mais fcil e mais cmodo
auto-executar o seu poder repressivo? E, assim procedendo, a represso ao criminoso no seria feita com mais rapidez e mais energia?
Da mesma forma que no haveria equilbrio estvel no meio social se se permitisse, no campo extraperial, s prprias partes litigantes decidirem, pelo uso da fora, seus litgios, tambm e
principalmente no campo penal, na esfera repressiva, os abusos indescritveis se multiplicariam em nmero sempre crescente, em virtude dos desmandos que o titular do direito de punir, cego e
desenfreado, passaria a cometer. Quem poderia viver num Estado em que a represso s infraes penais, a imposio da pena ao presumvel culpado ficasse a cargo exclusivo do prprio titular do direito
de punir?
Pondo os olhos nessa realidade incontrastvel, o Estado, ento, autolimitou o seu poder repressivo. 0 Direito Penal, pois, no um direito de coao direta. Embora o Estado detenha o direito de
punir, ele prprio no pode execut-lo. Ele se submete, assim, ao imprio da lei. Em suma: embora o Estado detenha o jus puniendi, no poder faz-lo atuar com o uso direto da fora. Pondera Eberhard
Schmidt: "hecha abstraccin de las empresas guerreras de los detentadores del poder, nada hay causado a la humanidad tantos sufrimientos, tormentos y lgrimas, como el poder del Estado que se realiza en
la actividad penal pblica. Es or esto que la gran idea del Estado del derecho, que se desconfa a si mismo y que por eso reprime y compromete su poder teniendo en cuenta las trgicas experiencias que la
historia del derecho penal nos
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proporciona, se impone en forma subyugante a cualquiera que se muestre sensible a las enseanzas de la historia" (cf. Derecho procesal penal, trad. esp. Jos M. Nuez, Ed. Argentina, 1957, p. 24).
Reconheceu, pois, o Estado que o processo, mesmo para as relaes jurdico-penais, fator indispensvel, porquanto visa a proteger os 'cidados contra os abusos do Poder Pblico, "porque
insensiblemente el uso ilimitado del poder se presta a abusos". E porque todo o manejo do poder #ivolve a possibilidade de abusos que o prprio Estado reconheceu a necessidade de que a pena se
aplique mediante um processo.
Assim, pelo respeito dignidade humana e liberdade individual que o Estado fixa a manifestao do seu poder repressivo no s em pressupostos jurdico-penais materiais (nullum crimen nulla
poena sine lege), como tambm assegura a aplicao da lei penal ao caso concreto, de acordo com as formalidades prescritas previamente em lei, e sempre por meio dos rgos jurisdicionais (nulla poena
sinejudice, nulla poena sine judicio). 0 princpio do nullum crimen nulla poena sine lege se complementa com os princpios nulla poena sine judice e nulla poena sinejudicio, o que significa que as leis
materiais, o processo e o rgo jurisdicional. so fatores indispensveis nas relaes jurdico-penais. As leis penais materiais descrevem as figuras tpicas e cominam as respectivas sanes. As leis
processuais estabelecem as regras, princpios e formalidades que devem ser observadas para se lograr a deciso do Juiz. Finalmente, o Juiz a pessoa investida do poder soberano do Estado, para, em cada
caso concreto, declarar o direito.
Da a elevao dos princpios nullum crimen nulla poena sine lege, nulla poena sinejudice e nullapoena sinejudicio categoria de dogmas constitucionais, como autolimitao da funo punitiva do
Estado. No h crime sem lei anterior que o defina; no h pena sem prvia cominaao legal.
como soa o inc. XXXIX do art. 5.' da Magna Carta, enfatizado no art. 1.' do CP, consagrando,'assim, o princpio da reserva legal.
Nulla poena sinejudice. Nenhuma pena poder ser imposta seno pelo Juiz. Com efeito, dispe o iric. XXXV do art. 5.' da Lei das Leis: "A lei no excluir da apreciao do Poder Judicirio leso ou
ameaa a direito". Ora, se a liberdade um direito individual, talvez at o mais importante de quantos possua o homem, e se a inflio de uma pena lesiona tal direito, no poder a lei, por mais importante
que seja, subtrair
dos Juzes a apreciao de tal leso. S o Juiz e exclusivamente o Juiz que poder dizer se o ru culpado, para poder impor a medida restritiva do jus libertatis.
Nulla poena sine judicio. Nenhuma pena poder ser imposta ao ru, seno com observncia do due process of law. Se a Lei Maior, no inc. LIV do art. 5.", proclama que "ningum ser privado da
liberdade ou de seus bens sem o devido processo legaV, conclui-se que a imposio de pena ao pretenso culpado precedida de um regular processo presidido pelo seu Juiz natural, ficando as partes,
acusadora e acusada, situadas em um mesmo plano processual de direitos e deveres, a fim de que ajustia no fique menoscabada em benefcio da parte mais bem situada processualmente. "A expresso
'devido processo legal', oriunda da Magna Carta de 1215, diz Ada Pellegrini Grinover, indica o conjunto de garantias processuais a serem asseguradas parte, para a tutela de situaes que acabam
legitimando o prprio processo" (cf. Rev. da PGES, 19/13). Quando a Suprema Corte dos EUA teve de estabelecer em que consistiam essas garantias do due process of law e law of the land proclamou:
"determinando o que o 'due process of law' nas Emendas V e XIV, a Corte deve referir-se aos usos estabelecidos, aos procedimentos consagrados antes da emigrao dos nossos antepassados". Em ltima
anlise, diz Couture, o due process of law consiste no direito de no ser privado da liberdade ou de seus bens, sem a garantia que supe a tramitao de um processo desenvolvido na forma que estabelece a
lei (cf. Fundamentos del derecho procesal civil, Depalma, 1972, p. 101).
Dessa igualdade entre as partes acusadora e acusada, veio a mxima: non debet actori licere quoti reu non permittitur (no lcito permitir ao autor o que no for permitido ao ru). E indispensvel
que o Estado, na qualidade de titular do direito de punir, e o ru, titular do direito de liberdade, na pugna judiciria, encontrem-se no mesmo p de igualdade. "Donde se conceda ms en esta lucha judicial a
la sociedad que al individuo, o viceversa, no se puede esperar la justicia de la sentencia, ya porque esto mismo es una injusticia, ya porque no se puede llegar al descubrimiento de la verdad entre dos
afirmaciones contrarias, si a una y otra parte no se dejase igual facultad de presentar lo que conduzca a sostener la afirmacin propia" (cf. E. J. Asenjo, Derecho procesal penal, v. 1, p. 104).
Desse modo, o Estado somente poder infligir pena ao violador da norma penal aps a comprovao de sua responsabilidade (por meio do processo) e mediante deciso do rgo jurisdicional.
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Da o acerto desse ensinamento de Frederico Marques: "uma vez que a regra do nulla poena sinejudicio foi acolhida pelo legislador constitucional quando estabeleceu a necessidade de processo e
sentenas judiciais para a condenao penal, bvio que o direito de punir no auto-executvel, dependendo sempre da apreciao jurisdicional" (cf. Curso de direito penal, v. 3, p. 333).
Assim, quando algum comete uma infrao penal, o Estado, como titular do direito de punir, impossibilitado, pelas razes expostas, de auto-executar seu direito, vai ajuzo (tal qual o particular que
teve seu interesse atingido pelo comportamento ilcito de outrem) por meio do rgo prprio (o Ministrio Pblico) e deduz a sua pretenso. 0 Juiz, ento, procura ouvir o pretenso culpado. Colhe as provas
que lhe foram apresentadas por ambas as partes (Ministrio Pblico e ru), recebe as suas razes e, aps o estudo do material de cognio recolhido, procura ver se prevaleceu o interesse do Estado em
punir o culpado, ou se o interesse do ru, em no sofrer restrio no seujus libertatis. Em suma: o Juiz dir qual dos dois tem razo. Se o Estado, aplica a sanctio juris ao culpado. Se o ru, absolve-o. Isso e
processo.
Tambm aqui (no campo penal), e com mais razo ainda, o Estado que administra justia por meio dos Juzes. No se poderia confiar tal funo "autodefesa" dos particulares. Segundo os dados da
experiencia, adverte Beling, da "autodefesa" no se pode esperar uma execuo adequada das penas (cf. Derecho procesal penal, trad. M. Fenech, Labor, 1945, p. 19).
Se o direito de punir pertence ao Estado, se a pena somente poder ser imposta pelo rgo jurisdicional por meio de regular processo, se este se instaura com a propositura da ao, bvio que o
Estado necessita de rgos para desenvolverem a necessria atividade, visando a obter a aplicao da sanctio juris ao culpado. Essa atividade denominada persecutio criminis. E tal direito persecuo
penal (investigar o fato infringente da norma e pedir o julgamento da pretenso punitiva) , como diz Manzini, uma obrigao funcional do Estado para lograr um dos fins essenciais para os quais o prprio
Estado foi constitudo (segurana e reintegrao da ordem jurdica).
Para que o Ministrio Pblico, como rgo do Estado, possa exercer o direito de ao penal, levando ao conhecimento do Juiz a notcia sobre um fato que se reveste de aparncia criminosa,
apontando-lhe,
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tambm, o autor, curial deva ele ter em mos os dados indispensveis. Tais informaes preliminares so colhidas, no primeiro momento da persecuo, pela Polcia Judiciria, ou civil, como diz a
Constituio, outro rgo do Estado incumbido de investigar o fato tpico e sua respectiva autoria, a fim de possibilitar a propositura da ao penal. Assim, a persecutio criminis apresenta dois momentos
distintos: o da investigao e o da ao penal. Esta consiste no pedido de julgamento da pretenso punitiva, enquanto a primeira atividade preparatria da ao penal, de carter preliminar e informativo.
6. 0 processo como complexo de atos e como relao jurdica
Vimos que, praticada a infrao penal, surge a pretenso punitiva (Strafanspruch), exigncia do Estado de subordinao do interesse do ru, em manter ntegro ojus libertatis, ao seu, que o de
puni-lo, a fim de conservar e resguardar a ordem jurdica e a segurana da coletividade. Formada a lide penal, o Estado, por meio dos rgos competentes, pe-se, inicialmente, a desenvolver intensa
atividade investigadora para tornar possvel conhecer o genuno autor da infrao penal, bem como para colher as primeiras informaes a respeito do fato infringente da norma, das circunstncias que o
motivaram e daquelas que o circurivolveram. Essa primeira fase da persecuo, embora no integre propriamente oprocesso, a ele se liga por uma necessidade lgica. Colhidas as primeiras notcias sobre a
infrao e identificado o seu autor, o Estado, j agora representado por outro rgo, o Ministrio Pblico, leva ao conhecimento do Juiz, em petio circunstanciada, a pretenso punitiva, instaurando-se,
assim, oprocesso. Vrios atos, com relevncia para o processo, sucedem-se, ento, de acordo com as regras e formalidades que devem ser observadas: recebimento da denncia, citao do ru,
interrogatrio, defesa prvia, ouvida de testemunhas, juntada de documentos, exames periciais (se for o caso) etc. Colhido todo o material probatrio, o acusador e o acusado se manifestam sobre tudo
quanto se apurou, e, finalmente, o Juiz, j devidamente instrudo, profere a sua deciso, dizendo se procede ou improcede a pretenso punitiva. Se procedente, impe ao culpado a sanctiojuris. Se
improcedente, absolve-o.
Visto dessa maneira, o processo no passa de uma srie de atos visando aplicao da lei ao caso concreto. Entre o ato inicial, exerccio
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do direito de ao, e a deciso final sobre o mrito, numerosos atos so realizados, de acordo com as regras e formalidades previamente traadas, e esses atos vo avanando at atingir o ponto culminante
do processo, que a deciso sobre o meritum causae, quando, ento, o Juiz dir se procede ou improcede a pretenso punitiva.
Mas o processo no apenas aquele conjunto de atos coordenados visando ao julgamento da pretenso punitiva. Essa seqncia de atos coordenados, dispostos segundo as regras e formalidades
previstas em lei, nada mais representa seno a exteriorizao de uma verdadeira relao jurdico-processual. 0 processo, tal como antevira o gnio de Oskar von Blow, no segundo quartel do sculo
passado, tem o carter de uma relao jurdica autnoma, eminentemente pblica, entre o Estado-Juiz e as partes. Realmente, quem procurar ver o processo intrinsecamente, pelo lado de dentro, h de
convir que ali se entretece um complexo de vnculos juridicamente relevantes e juridicamente regulados. Trata-se de uma relao jurdico-processual "unitria, complexa, progressiva e continuativa". Se de
um lado encontramos o Estado-Administrao, representado pelo Ministrio Pblico, como titular de um direito subjetivo (direito de ao), do outro vamos encontrar o Estado-Juiz, como titular de uma
obrigao jurdica, uma vez que a prestao jurisdicional tem, inegavelmente, o carter de obrigao jurdica. 0 Estado-Administrao, representado pelo Ministrio Pblico, tem o direito subjetivo pblico
de exigir a tutela jurisdicional, mesmo porque o prprio Estado autolimitou seu poder de punir. De outro lado, o Estado-Juiz tem a obrigao de proferir a deciso, tem a obrigao de se manifestar sobre a
procedncia ou a improcedncia da pretenso do Estado-Administrao. Trata-se, ademais, de relao jurdico-processual de natureza triangular, e no angular. A relao jurdico-processual no apenas
entre as partes acusadora e acusada. Essa relao existe como um dos aspectos da relao jurdico-processual, que de natureza complexa. Ao lado dessa relao entre as partes, baseada no princpio do
contraditrio, tendo por contedo poderes de iniciativa, aos quais corresponde, na parte contrria, uma sujeio jurdica (cf. Betti, Diritto processuale civile, p. 105 e 107), h a relao entre o Juiz e as
partes, relao que decorre da sujeio ao poder jurisdicional: as partes com o direito de exigir do rgo jurisdicional sua deciso sobre a lide, e o rgo jurisdicional com a obrigao de resolver o litgio. A
relao jurdico-processual unitria,
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progressiva e contnuativa. Constituda a relao processual, ela percorre vrias fases: postulatria, probatria, das alegaes, decisria. Mesmo havendo recurso, a relao processual continua com a sua
unidade e vai-se estendendo, sem perder seu objeto, at que o Estado-Juiz, em definitivo, entregue a prestao jurisdicional. , tambm, relao autnoma e complexa. Sua autonomia decorre da
circunstncia de que a relao jurdico-material, que surge com o antagonismo direito de punir versus direito de liberdade, no se confunde com a relao jurdico-processual. Seus objetos so diversos.
Como bem diz Tornaghi, a relao processual antes o lao que liga o direito do Estado-Administrao (no caso da relao processual penal) a pedir tutela jurisdicional e a obrigao dos rgos
jurisdicionais de prest-la (cf. A relao processual penal, p. 35). Trata-se de relao complexa, porquanto contm, dentro de si, uma srie de relaes jurdicas: entre autor e Juiz, entre autor e ru e entre
ru e Juiz. Tais relaes so entre si interdependentes e inseparaves, como afirma Betti (Diritto, cit., p. 107).
7. 0 Processo Civil e o Processo Penal
J sabemos, ento, que por meio doprocesso que se compem os litgios, e por composio do litgio ou lide se entende a aplicao da lei ao caso concreto, "atravs de operaes e de rgos
adequados". 0 processo consiste, assim, numa sucesso de atos (propositura da ao, citao, interrogatrio, defesa prvia, audincia de testemunhas etc.) que culminam com a deciso final do rgo
jurisdicional pondo fim ao litgio, dando a cada um o que seu.
Assim o processo, conforme ensina Moacyr Amaral Santos, como sistema de atos, rege-se por princpios e leis, constituindo um fenmeno
que se situa no campo do Direito. Ao sistema de princpios e normas que regulam o processo, disciplinando as atividades dos sujeitos interessados, do rgo jurisdicional e de seus auxiliares, d-se o nome
de Direito Processual.
Sendo o processo, como realmente o , forma de composio de litgio, conclui-se que, conceitualmente, o processo uno, pois, como
diz Couture, o direito de pedir ao Estado a garantia jurisdicional um substitutivo civilizado da vingana privada.
Sem embargo dessa unidade conceitual, o Direito Processual apresenta dois grandes ramos: o Direito Processual Civil e o Direito Proces-
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sual Penal. E essa diviso feita levando-se em conta o seu contedo ou objeto: se se trata de uma pretenso de natureza extrapenal, ou melhor, se a natureza da lide for extrapenal, a regulamentao
normativa do processo estabelecida pelo Direito Processual Civil. E tal regulamentao ser feita pelo Direito Processual Penal, se se tratar de "causas penais". Assim, as normas e princpios que regulam
a composio da lide extrapenal esto consubstanciadas no Direito Processual Civil, e aquelas concementes conifsio da lide penal, no Direito Processual Penal.
Por outro lado, como veremos detalhadamente mais adiante, tendo em vista o grande nmero e diversidade de questes que surgem no meio social, o Estado, atendendo s vantagens que a diviso do
trabalho proporciona, procurou agrup-las, distribuindo o poder de julg-las aos diversos orgos jurisdicionais, levando em considerao a natureza das questes de cada grupo. Da os Juzes eleitorais, os
Juzes militares, os Juzes trabalhistas, os Juzes federais, os Juzes estaduais, integrando a Justia Eleitoral, a Justia Militar, a Justia do Trabalho, a Justia Comum Federal e a Justia Comum Estadual. E,
como a regulamentao normativa dos processos respectivos feita atendendo a certas peculiaridades, o Direito Processual Civil se distingue em Direito Processual Civil Comum, Direito Processual
Trabalhista e Direito Processual Eleitoral. Por sua vez o Direito Processual Penal apresenta a seguinte diviso: Direito Processual Penal Comum, Direito Processual Penal Militar e Direito Processual Penal
Eleitoral.
8. Unidade ou dualidade do Direito Processual?
0 processo, como instrumento compositivo de litgio, um s. por meio do processo que o Estado desenvolve sua atividade juri sdicional. Assim, Direito Processual Civil e Direito Processual Penal
no passam de faces de um mesmo fenmeno, ramos de um mesmo tronco que cresceu por cissiparidade.
Observa Giovanni Leone (Trattato di diritto processuale penale, v. 1, p.16) que as pilastras do ordenamento processual so comuns aos dois tipos de processo: a) ambos tm a mesma finalidade
(atuao do Poder Jurisdicional); b) em ambos a interveno do Poder Jurisdicional. condicionada ao exerccio da ao; e, finalmente, c) ambos se iniciam, se desenvolvem e se concluem com a
participao de trs sujeitos: autor, ru e Juiz.
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Nas suas linhas estruturais, no divergem os Processos Civil e Penal. Muitos institutos de um e de outro so idnticos. Que a ao seno um direito pblico, subjetivo, qual o de provocar a atuao
dos rgos jurisdicionais? No tm razo, por acaso, Alcal-Zamora e Carnelutti, ao afirmarem que todas as aes de todos os ramos do Direito Processual tm um carter pblico, dado que se dirigem ao
Estado para obter a atuao de seus rgos jurisdicionais? (cf. Derecho, cit., v. 2, p. 69, e Sistema, cit., ri. 356).
Assim, quer no Processo Penal, quer no Processo Civil, o conceito de ao um s. No h um conceito de ao no Processo Penal e outro no Processo Civil. Apenas a natureza da pretenso que d,
quanto ao contedo, um colorido diferente ao penal e ao civil.
E quanto Jurisdio? Como funo soberana, como atividade precpua de um dos Poderes do Estado - o Judicirio -, nica, pouco importando a natureza do conflito por dirimir, se penal ou
extrapenal. Nem o prprio Florian, dualista que , nega a unidade da funo jurisdicional.
A distino que se faz entre jurisdio penal e jurisdio civil as-
senta, nica e exclusivamente, na diviso de trabalho. Determinados rgos Jurisdicionais so incumbidos de dirimir conflitos intersubjetivos de natureza civil, enquanto outros se encarregam de equacionar
os de natureza penal, sendo que, s vezes, exercem cumulativamente tais funes.
E Miguel Fenech, com razo, acrescenta que, a despeito da unidade da jurisdiQo, "puedan distinguirse en ella tantos aspectos como haya convenido a los fines del Estado para el cumplimiento de su
misin de justicia" (cf. Derecho, cit., p. 222).
E no que tange aos recursos? 0 fundamento filosfico dos recursos
em geral no assenta, como dizia o Marqus de So Vicente, na falibilidade humana? Haver diferena ontolgica entre os recursos da esfera penal e os da esfera civil?
E respeitante s excees processuais (rectius: objees processuais)? Haver alguma diferena substancial entre elas?
E as citaes, notificaes, intimaes, inclusive a prpria senten-
a? Por acaso tais institutos no so formalmente idnticos? Se diferenas houver, sero, quando muito, de grau, e no qualitativas.
E no concemente s provas? Do ponto de vista estrutural, no se pode negar a identidade da prova no campo civil e no penal. E Camelutti
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acrescenta: h identidade tambm sob o ponto de vista da funo (cf.
Studi, v. 1, p. 99 e s.). 1
E certo que, quando se fala em unidade do Direito Processual, no se pretende confundir o Direito Processual Penal com o Direito Processual Civil, ou que aquele seja reabsorvido por este. No se
pretende, enfim, estabelecer absoluta identidade entre ambos, mas apenas realar que as pilastras so comuns, que muitos institutos so idnticos e que por isst(se pode falar em uma Teoria Geral do
Processo.
Na Frana, em 1872, j se pretendeu "penalizar" o Processo Civil, segundo relato de Aramburu (v. J. Asenjo, Derecho, cit., p. 63). Observe-se que to grande a afinidade entre ambos, que entre ns,
ao tempo do "pluralismo processual", havia na Bahia, em Santa Catarina e no antigo Distrito Federal um Cdigo de Processo para os dois setores.
0 Retspleje lov (pronuncia-se "retsplailov") dinamarqus de 1919 continha normas comuns ao Processo Penal e ao Processo Civil. 0 Cdigo da Sucia, de 18-7-1942, exemplo frisante dessa unidade
(cf. G. Leone, Trattato, cit., p. 16).
0 anteprojeto do CPP de Frederico Marques praticamente manteve a mesma estrutura do CPC.
No dando tento dessa comunho, dessa semelhana, processualistas (rectius: doubls de penalistas e processualistas) da estatura de Florian e Manzini (Principii, p. 8, e Trattato di diritto processuale
penale, v. 1, p. 70) negam a unidade do Direito Processual. Mas por no haverem penetrado no mago da questo, que Alcal-Zamora, autoridade cujo valor seria impertinncia salientar, observou:
"... finalmente, el ms grave error en que incurren consiste en confundir unidad del Derecho Procesal con identidad de sus distintas ramas: la postura correcta no es, por tanto, la suya, sino esta otra: la
de que existiendo, sin duda, hondas diferencias entre el proceso civil y el penal, no bastan a destruir la unidad esencal de todo el Derecho Procesal, porque al proclamarla, nadie pretende sostener que el
Derecho Procesal Penal sea, se confunda o se reabsorba en el Derecho Procesal Civil, sino 'sencillamente' (un 'sencillamente' que, sin embargo, ha pasado inadvertido a los partidarios del dualismo) que el
Derecho Procesal Penal, como el civil, es, ante todo y sobre todo, Derecho Procesal" (cf. Derecho, cit., v. 1, p. 41).
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Quais os argumentos da corrente dualista? Manzini observa que ningum est obrigado, no Processo Civil, a iniciar ou a exercer a ao civil, salvo nos casos excepcionais, em que a iniciativa compete
ao Ministrio Pblico. Entretanto, em se tratando de ao penal, existe obrigao funcional do Ministrio Pblico (cf. Trattato, cit., p. 110). Nota-se, de logo, que a diferena tem apenas valor para o
Direito italiano. H numerosas legislaes, inclusive a nossa, em que existe a chamada "ao penal privada", regida, entre outros, pelo princpio da oportunidade. Nesses casos, como bvio, o ofendido ou
seu representante legal promover a ao penal se quiser... No se pode falar, assim, em obrigatoriedade da ao penal.
Da, de todo procedente a observao de Alcal-Zamora, no sentido de que a discusso deve situar-se em plano de maior perspectiva que a oferecida pelo Direito de um s pas, por muito importantes
que aquele e este sejam.
de se ponderar, entretanto, que, mesmo no Direito italiano, a atividade persecutria do Ministrio Pblico fica condicionada, s vezes, a uma manifestao de vontade; haja vista os institutos da
"querela" e os outros que lhe so afins, tais como a richiesta, do Direito comum e do Direito militar, Vistanza, l'autorizzazione a procedere, la disposizione del comandante nel diritto militare (cf. G.
Battaglini, La querela, 1958, p. 218).
Florian pondera que o Processo Penal instrumento indispensvel para a soluo das lides de natureza penal, enquanto o Processo Civil nem sempre necessrio para a composio das lides
extrapenais. Exata a observao. Mas essa particularidade deflui no da natureza do processo, e sim da prpria lide. 0 processo, forma compositiva de litgio, e coisa diferente do litgio, que lhe serve de
contedo. Por outro lado, se aceito for o ensinamento de Sans, nem mesmo quanto ao contedo existe diferena entre os dois ramos do Direito Processual: '11 contenuto del processo dato dalla serie
degl'atti di cui esso consta; e non gi - como se visto al punto precedente dalla 'lite' o dalla controversia, e neppure dall'azzione, dalla causa, o dal rapporto sostanziale" (cf. Luigi Sans, La correlazione tra
imputazione contestata e sentenza, 1953, p. 25). Assim tambm pensa Guglielmo Sabatini: "il contenuto del processo consta... degli atti processuali ......
Alega Floriari que, no campo processual-penal, o poder dispositivo das partes restringidssimo, ao contrrio do que ocorre no civil. Estamos
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que no pelo fato de haver maior ou menor restrio ao poder dispositivo das partes que se pode negar a unidade do Direito Processual. Por outro lado, essa maior ou menor disponibilidade ainda decorre
da natureza da lide. Tal argumento, assim, se contm no primeiro ou no passa de desdobramento dele. Cumpre assinalar, entretanto, que nas legislaes, como a nossa, que admitem a ao penal privada, o
poder dispositivo das partes bem grande. No Direito ptrio, por exemplo, esse poder dispositivo das partes bem intenso. to grande que o querelante pode perdoar o querelado, mesmo aps a prolao
da sentena condenatria (cf. CP, art. 106, 2.).
E bem verdade que com a instaurao dos Juizados Especiais Criminais admite-se, com a transao entre o Ministrio Pblico e o autor do fato, um certo poder dispositivo. Contudo, trata-se de
exceo.
Manzini (Trattato, cit., p. 110) anota que no Processo Penal vigora o principio da verdade real e, no Processo Civil, o da verdade ficta. Com vantagem obtempera o pranteado Frederico Marques que,
no Penal, o princpio da verdade real no vigora em toda a sua pureza. E esclarece: se um indivduo absolvido por no haver a mnima prova de que praticou o crime que se lhe imputa, a coisa julgada ir
impedir que nova ao penal se instaure contra ele, apesar de provas concludentes, inclusive sua confisso, surgirem aps veredictum absolutrio: "res judicata pro veritate habetur" (cf. Instituies de
direito Processual civil, v. 1, p. 52).
Essa mesma observao do saudoso mestre paulista pode ser estendida a quase todos os orderiarnentos jurdicos do mundo, porquanto pouqussimas so as legislaes que admitem a chamada reviso
pro societate, e, assim mesmo, com certa parcimnia, com certa modstia (cf. CPP alemo, atualizado em L'-5-1960, 362; o noruegus, de 1887; o portugus, de 1988, art. 449, notadamente o ri. 1; a Lei
Processual sueca em vigor a partir de L'- 1- 1948, Cap. 5 8, 3.; o Cdigo Processual Penal hngaro, de 195 1, e alterado em 1957, 213 e 214; o iugoslavo, de 1.0-1-1954, 379 ; o tchecoslovaco, de
19-12-1956, art. 300; o austraco, de 20-4-1960; e o russo, de 27-10-1960, arts. 373 e 380).
certo, por outro lado, que o princpio da verdade real, embora vigorando no Processo Penal com mais intensidade, no exclusivo nem peculiar a este setor do Direito. Haja vista a regra inserta no
art. 130 do CPC. Com muita propriedade observa Garcia-Velasco: "no podemos considerar su bsqueda (de Ia verdad material) misin privativa del proceso
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penal sin tachar al mismo tiempo a los dems procesos de aspirantes a falsarios, pues aunque en la generalidad de stos la posibilidad que tienen os interesados de disponer de sus derechos y la aportacin
de parte hagan posible que a su final surja como verdadero lo que slo lo s parcialmente, o no lo s en absoluto, ello no nos autoriza a afirmar que esos procesos estn destinados y previstos para la
creacin de resultados artificiosos e inexactos; por donde, a sensu contrario, este de verdad material no puede considerarse como principio y menos como cualificador del proceso penal, lo que no impide
que en l sea ms fcil alcanzar la verdad, como consecuencia de las caractersticas singulares del proceso penal y siempre con las reservas consecuentes a la limitacin yJalibilidad humana" (grifos
nossos) (cf. M. 1. Garcia-Velasco, Curso de derecho procesal penal, Universidad de Madrid, 1969, p. 16).
Desse modo, a despeito das crticas dos dualistas, pode-se falar em unidade do Direito Processual, e, repita-se, falando-se em unidade do Direito Processual, no se pretende confundir identidade dos
seus diversos setores.
Florian, aps sua obraDelleprove penale (1924) e aps o trabalho de Carnelutti, Prove civile e prove penale (1925), surgido em revide quele, reconheceu "que as novas diretrizes do Processo Civil,
em matria de prova, muito o avizinharam do processo penal" (cf. trabalho publicado in Scuola Positiva, 1937, p. 217).
Insta acentuar que a grande maioria defende a tese unitria. Entre ns, o insigne Prof. Frederico Marques e, sem contestao, paladino desse entendimento. Em suas inmeras obras, quer de Direito
Processual Civil, quer de Direito Processual Penal, proclama a necessidade da criao de uma Teoria Geral do Processo.
E que dizer do grande Carnelutti? No seu trabalho Prove civile e prove penale, manifestou-se defensor dessa unidade, inclusive nos ensinos universitrios. Suas estas palavras:
"... afinal de contas, o Direito Processual fundamentalmente uno.
Processo Civil e Processo Penal sem dvida se distinguem, no porque tenham razes distintas, e sim pelo fato de serem dois grandes ramos em que se bifurca, a uma boa altura, um tronco nico.
Mais cedo, ou mais tarde, chegar o tempo em que est verdade chegar ao ensino universitrio.
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Certamente, um dos mais graves contra-sensos desse ordenamento de nossos estudos jurdicos, que estamos agora pouco a pouco reform