excelentÍssimo senhor doutor juiz federal da 1ª...
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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ FEDERAL DA 1ª VARA DA
SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DO PIAUÍ
RESPOSTA À ACUSAÇÃO – DEFESA CRIMINAL
Nova numeração:
________________________vem, espontâneamente, perante o
M.M. Juiz da 1ª Vara da Justiça Federal da Seção Teresina-Piauí, apresentar sua
DEFESA CRIMINAL na Ação Penal que lhe move MINISTÉRIO PÚBLICO
FEDERAL, representada judicialmente por mandato outorgado aos advogados citados
e qualificados no instrumento procuratório que segue em anexo, todos com escritório na
Rua Elizeu Martins, nº 1.294, salas 104/107, Edifício Oeiras, Centro, Teresina/PI
(requerendo, desde logo, seja todas as intimações/notificação em nome da
advogada titular, Audrey Martins Magalhães). Passa a seguir apresentar
resposta/defesa às acusações que lhes são imputadas.
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I. PREÂMBULO
a)Lapso temporal do suposto crime e ajuizamento da ação criminal
causaram grave prejuízo a defesa da acusada. Algumas explicações
pertinentes.
Antes de inicial às considerações de ordem técnica e legal sobre a
denúncia e ação penal por crime de peculato, é indispensável ressaltar alguns aspectos
importantes sobre a ré, ____________, que devem ser considerados quando da
apreciação da lide.
Em primeiro lugar, cumpre informar que, em 20/12/2000,
a________. Assim, na forma da lei civil somente teria responsabilidade dos atos
praticados pela empresa até 02 (dois) anos após sua saída, razão pela qual, hoje,
passados 10(dez) anos, não dispõe em arquivos quaisquer documentos em relação a
empresa _____________________
Quanto ao período em figurou como sócia da empresa de fato
apenas o fazia para compor o quadro societário, eis que em verdade o então marido,
Sr. __________(engenheiro civil), era quem conduzia a empresa. A ex-mulher (ora
acusada) apenas constava do quadro societário, muito pouco entendia dos negócios,
auxiliou o ex-marido em raras ocasiões, mas sempre com tarefas administrativas
(atividade meio), nunca diretamente com os contratos de construção (atividade
fim). De fato, a acusada, apesar de portadora de Curso Superior em Farmácia, com
artigos de pesquisas publicados, mulher inteligente e boa formação profissional, nunca
trabalhou efetivamente na empresa do ex-marido, nem em qualquer outra função
(conforme já mencionado, auxiliou o ex-marido em raras ocasiões em tarefas da
atividade meio da empresa). Após o casamento a ré dedicou o tempo à educação dos
03 (três) filhos do casal e afazeres domésticos. Depois dos filhos crescidos passou a
auxiliar a filha e a nora nas tarefas do dia-a-dia com os netos. Assim, a acusada pode ser
definida como “esposa”, “mãe” a “avó”.
Após do desligamento da sociedade (que se em no ano de 2000), a
Sra._____________, separou-se judicialmente do Sr._________________, fato de
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que ocorreu em 2007. Em anexo averbação constante da certidão de casamento em
anexo.Por fim, _______________faleceu.
Cumpre mencionar que nem no período de 1991 a 1996, quando
da execução do contrato objeto desta ação, nem em outra ocasião, ocupou de fato
funções técnicas (engenharia). Ou seja, não tinha e nem tem conhecimento técnico
para avaliar a formação dos preços praticados, nem preços unitários, nem do
preço global dos contratos de engenharia firmados pela empresa.
Mesmo sem conhecimentos técnicos no caso posto em questão
é possível observar que nenhuma irregularidade aparente que habilitasse o MP a
concluir pelo concurso doloso de agentes. A ___________participou regularmente
da Licitação Pública, sagrou-se vencedora, e os preços pagos e atualizados se
deram de acordo com o Contrato Licitado.
Feito este relato preliminar, é importante que fosse
dimensionado na denúncia a participação de cada sócio, ou seja, descrito
especificamente o elemento subjetivo do crime na conduta praticada por cada
acusado, sob pena de trazer ao acusado a obrigação de provar sua inocência
quando não há prova indiciária da autoria e materialidade.
Ora, o cenário internacional a respeito do tema “Crime,
Responsabilidade Penal e Pena” FERRAJOLI insere a culpabilidade como uma das
condições materiais requeridas por seu modelo "garantista". No "Sistema Garantista"
preconizado por Ferrajoli vige o axioma "nulla actio sine culpa", do qual derivam as
teses: "nulla poena, nullum crimen, nulla lex poenalis, nulla iniuria sine culpa". Por
exigir se exigir o “elemento subjetivo” ou “psicológico” do delito, nenhum fato ou
comportamento humano pode ser valorado como ação se não havido de uma
decisão; conseqüentemente, não pode ser punido criminalmente, se não é intencional,
isto é realizado com consciência e vontade por uma pessoa capaz de compreender
de querer.
No cenário nacional a Constituição da República prestigia o
Princípio da Reserva Legal ou Princípio da Legalidade, insculpido no inciso XXXIX
do art. 5º. Desse modo, vige no Direito Penal brasileiro, o caráter pessoal do ilícito
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penal, o princípio da culpabilidade, o princípio da personalidade da sanção penal e
sua individualização conforme nossa Constituição da República Federativa do
Brasil. Sendo assim, a questão das sanções impingidas à pessoa jurídica não deva ser
tratada no âmbito do Direito Penal, pois, há outros meios de reparação, sem desprezar
os postulados da responsabilidade subjetiva.
A legislação brasileira não acolheu a responsabilidade penal
das pessoas jurídicas, ou seja, a responsabilidade objetiva dos sócios. Analisando-se
o Código Penal Brasileiro percebe-se que não há alusão à sanção penal a
responsabilidade objetiva dos sócios participantes das pessoas jurídicas. Assim,
para responsabilização penal da acusada seria indispensável que o Ministério
Público tivesse informado como a acusada, de forma consciente, intencional, e de
forma pretender o resultado do Crime de Peculato teria praticado o crime.
Assim, ainda que nos termos da legislação civil “sociedade”
tivesse recebido pelo contrato preço superfaturado, mesmo assim, para
responsabilização penal seria indispensável que seja investigado a participação dos
sócios e seus haveres. Do contrário, ocorre a inversão do ônus da causa.
Cabia ao Ministério Público informar os motivos pelos quais
concluiu que os sócios que não participaram da gerência foram denunciados, ou
seja, quais os motivos que levaram a acusação crer que todos os sócios,
indistintamente, com intenção dolosa praticaram o crime de peculato, apropriando-se
de dinheiro público ou desviando.
É importante fazer notar que a denúncia aponta a decisão do
Tribunal de Contas da União como prova do ato supostamente criminoso, doloso e
intencional. Todavia, o TCU é claro ao afirmar o preço pago foi o preço do
contrato. O TCU afirma que em decorrência da mudança da moeda, fato
imprevisível, que em face disso o contrato deveria ter sido revisado, sendo a
ausência dessa revisão que implicou em preço superfaturado.
Ora, é evidente a ausência do elemento subjetivo dolo, quer
em relação ao sócio administrador, quer em relação aos demais. Se o
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superfaturamento teria ocorrido por fato imprevisível jamais poderia ser atribuído
aos sócios um ato intencional e criminoso. Sendo enfático, se o fato era imprevisível
como próprio afirma o TCU, se a realização da Licitação Pública foi regular, preço
correto, à sócia que não tinha tarefas gerenciais seria impossível supor qualquer
irregularidade.
Somado a isso, concluir que a sócio se locupletou ilicitamente
dos valores recebidos pela empresa é também laborar sob o prisma da
responsabilidade objetiva. Conforme já mencionado, a sócia saiu da empresa no de
2000, assim, não tem como provar como se deu a divisão de lucros . Ademais, para
a acusada tendo sido a licitação ganha e pago o preço contratado nada havia de
irregular nesta operação.
A ______________é empresa sólida, constituída há mais de 15
anos, sendo suas atividades voltadas para construção civil, assim, corrente a
participação da empresa em licitações públicas. A empresa não foi havida com objetivo
único o contrato objeto desta ação, este contrato era apenas mais um.
Conforme se infere pelo Parecer do Engenheiro Civil anexo,
parecer apresentado em sede do TCU, a ________ à época do contrato objeto desta ação
mantinha outras obras públicas, todas com preços similares, não tendo havido em
nenhuma delas a alegação de que o preço deveria ser revisado em função a mudança
monetária.
Assim, o conhecimento que tem a sócia acusada é das
informações prestadas pelo sócio administrador, informações essas
fundamentadas, razoáveis, não havendo razão para crer que a empresa,
dolosamente, estivesse se apropriando de dinheiro público ou desviando. As
atividades da empresa __________eram e são regulares, empresa no mercado
piauiense há longos anos.
Outro aspecto factual relevante a ser apontado é que, além do
lapso temporal do suposto fato ilícito com o conhecimento formal da acusada que
dificulta a produção de provas (de 1991 a 2010), dezenove anos, é que hoje a
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acusada tem 68 (sessenta e oito) anos de idade. Ora, não é razoável que se exija de
uma simples sócia, sem poderes gerenciais, que mantenha em arquivos documentos
por tanto tempo, como também, não é razoável que se conceba que a memória
humana continue intacta por tanto tempo.
Falta a acusada, portanto, não só condições materiais amplas
para defesa em razão do longo tempo na suposta formação da culpa e da perda de
registros escritos e documentais que poderiam estabelecer como se deu o contrato,
a divisão de lucros, despesas, e outras informações possivelmente relevantes, mas
também,acrescido a isso, a idade avançada lhe impede de reaver na memória fatos
que poderiam ser relevantes para sua defesa.
A acusada é primária, de bons antecedentes, senhora que vive de
afazeres domésticos, após a sua retirada da sociedade, por 02 (dois) anos, conforme
determina o art. 1.003, parágrafo único, do CC, não manteve consigo qualquer
registro eis que jamais imaginou que por ser sócia de uma empresa, e esta empresa
prestar um serviço contratado mediante licitação pública e pelo preço ajustado
jamais poderia supor fosse acusada de crime tão grave.
Em outros termos, a ré não tem mais como informar a distribuição
dos lucros, nem qual o patrimônio advindo desse contrato. Frise-se, a ré saiu da
sociedade em 20/12/2000.
O Estado quando promove uma ação penal desprovida de justa
causa, de definição firme da autoria, da materialidade, afronta o particular em seus
direitos fundamentais. Segundo o professor Roberto Lyra, na denúncia espera-se que
haja a proteção real à sociedade, do contrário “não justifica o desencadeamento de um
processo criminal, que representa, por si só, um dos maiores dramas para a pessoa
humana.”(Ac. Unânime, 2ª Câm., Rel. Juiz Amaral Salles, JUTA 67/225).
José Saramago, in Juízes para a Democracia, trata com maestria
sobre a JUSTIÇA e o que dela se espera:
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“A justiça continua a morrer todos os dias. Agora mesmo,
longe ou aqui ao lado, à porta da nossa casa, alguém a está
matando. De cada vez que morre, é como se afinal nunca
tivesse existido para aqueles que nela tinham confiado, para
aqueles que dela esperavam o que da justiça todos temos o
direito de esperar: justiça, simplesmente justiça. Não a que
se envolve em túnicas de teatro e nos confunde com flores
de vã retórica judicialista, não a que permitiu que lhe
vendassem os olhos e viciassem os pesos da balança, não a
da espada que sempre corta mais para um lado que para
outro, mas uma justiça pedestre, uma justiça companheira
quotidiana dos homens, uma justiça para quem o justo seria
o mais exato e rigoroso sinônimo do ético, uma justiça que
chegasse a ser tão indispensável à felicidade do espírito
como indispensável à vida é o alimento do corpo. Uma
justiça exercida pelos tribunais, sem dúvida, sempre que isso
os determinasse a lei, mas também, e sobretudo, uma justiça
que fosse a emanação espontânea da própria sociedade em
ação, uma justiça em que se manifestasse, como um
iniludível imperativo moral, o respeito pelo direito a ser que
a cada ser humano assiste”.
E é esse respeito que se pede agora!
A ré, senhora idosa, está sendo molestada da sua liberdade de ir e
vir, sob uma acusação que sequer individualiza sua participação. Nao há indícios de
autoria de crime de peculato pela ré, não foi demonstrado elemento subjetivo do ilícito o
dolo, a intenção consciente de apropriar-se e ou desviar dinheiro público. Os atos de
gestão praticados pelo sócio administrador tem aparência lícita, não justificando a
grave acusação do Ministério Público de que os demais sócios, sem nenhuma
função administrativa na empresa, pudesse supor dentre inúmeros contratos
licitados, um único teria que ser revisado.
Determina o CPP que o processamento sem justa causa
constitui constrangimento ilegal que autoriza o trancamento da ação penal, nos termos
do art. 648, podendo o juízo fazê-lo mesmo após o recebimento da denúncia.
Ante ao exposto, constata-se que a ______________ foi
denunciada apenas por ter sido sócia da____________., como se a composição do
quadro societário de uma empresa, por si só, caracterizasse ilícito penal
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(responsabilidade objetiva). O constrangimento ilegal está demonstrado,
desse modo, imperativo, que a ré deve ser retirada do pólo passivo da presente
ação, o que ora se requer, eis que nenhum resultado útil terá esta ação penal.
II. EXPOSIÇÃO FÁTICA
a)Considerações sobre dois Acórdãos da lavra do TCU (2004 e 2008.
Parecer do Delegado da Polícia Federal concluindo pela falta de provas
materiais. Parecer apresentado pelos réus de profissional habilitado
fazendo comparativo de preços do contrato objeto desta ação e outros
contratos com órgãos federais e estaduais.
O ilustre representante do Ministério Público Federal apresentou
denúncia contra os sócios proprietários da____________. e contra dois funcionários
públicos, pela suposta prática de crime de peculato.
Afirma a denúncia que no processo de Tomada de Contas
Especial apuraram as seguintes irregularidades: a) não houve a execução regular dos
serviços contratados, ante a inobservância do plano de trabalho e a execução de
serviços completamente distintos; e b) pagamento do preço acima do valor de
mercado. Assevera que os funcionários públicos concorreram para o crime de
peculato quando de forma negligente deixaram de fiscalizar a compatibilidade dos
serviços e os preços pagos. E que os sócios proprietários, tendo se beneficiado dos
valores pagos à_______________, são penalmente responsáveis pelo crime de
peculato na modalidade dolosa.
Importante transcrever trechos da denúncia onde o ilustre
representante do Ministério Público Federal narra a suposta prática delitiva e os
elementos de convicção para a imputação do crime de peculato contra os denunciados:
(...) “Denúncia acerca da existência de irregularidades na
execução do Convênio PG-863/1981, celebrado entre o
extinto DNER e o DER/PI, foi convertida em Tomada de
Contas Especial no âmbito do Tribunal de Contas da
União.” (...)
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“Destarte, o Acórdão nº 1653/2004 – TCU – 2ª Câmara (fls.
706/707), considerando tais constatações, concluiu pela
imputação do débito verificado solidariamente a Wilton Luís
Neiva de Moura Santos, João Carvalho de Sá e
à____________, da qual os demais denunciados são ou eram
sócios à época dos fatos.
Neste ponto, importante destacar que, Wilton Luís Neiva de
Moura Santos, dirigente do 18º Distrito Rodoviário federal à
época dos fatos, e João Carvalho de Sá, dirigente do
DER/PI, no exercício de suas atribuições, eram
responsáveis pela aferição da compatibilidade entre
os preços dos serviços executados e os preços
praticados no mercado, sendo que, em face de suas
condutas omissivas, claro está que poderiam ter
detectado o dano ao erário, evitando o pagamento a
maior efetuado a favor da_________. Por esta razão,
foram também responsabilizados solidariamente pelo débito
e condenados ao pagamento de multa, conforme referido
acórdão acostado às fls. 706/707.
Penalmente, típica é a conduta de ambos os servidores, que
incidiram na figura delitiva do peculato, por
concorrerem, para a consumação do desvio de recursos
público em favor da Construtora_____________.
Quanto a esta, evidente está nos autos que se beneficiou
com o pagamento referente a prestação de serviços com
preços excessivamente elevados, cerca de 175,2%
superiores aos da tabela SICRO do DNER, razão
pela qual, configurada está a conduta dolosa de seus
administradores à época, que utilizaram-se do contrato para
desviar recursos públicos.” (...) (Grifos nossos)
“A conduta atribuída aos Requeridos
________________sócios da _________subsume-se ao tipo
descrito no artigo 312, do Código Penal, na modalidade
peculato-desvio, ad litteram:” (...)
“Nesse ínterim, oportuno mencionar que os sócios
da_______________, ao representarem empresa
contratada pelo Poder Público para a execução de obras
públicas, atividade típica da Administração, atuaram na
qualidade de funcionários públicos, nos termos do
que dispõe o art. 327, § 1º do Código Penal, motivo pelo
qual devem responder pelas penas do delito de peculato.
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Por seu turno, a conduta atribuída aos denunciados
WILTON LUÍS NEIVA MOURA SANTOS e JOÃO
CARVALHO DE SÁ, subsume-se ao tipo descrito no artigo
312, § 1º, por terem, como acima relatado, concorrido
para o desvio e apropriação de verbas públicas, em
proveito dos sócios da____________, valendo-se, para
tanto, das facilidades de seus cargos, cujas atribuições, se
devidamente cumpridas à época, certamente teriam impedido
tais irregularidades.” (...) (Grifos nossos)
Dos trechos acima transcritos infere-se que a denúncia não
menciona de forma pormenorizada a suposta prática criminosa. Não informa
quando o crime teria acontecido. Não afirma em que circunstâncias. É importante
mencionar que o CONTRATO LICITADO não prevê como índice de aferição de preço
a TABELA SICRO, e que pela simples leitura do missivo instrumento pode-se
constatar isso.
A TABELA SICRO, utilizada pelo DNER, destinava-se aos
contratos firmados pelo órgão federal, mas o contrato em exame, além de ter sido
firmado anteriormente do surgimento desta tabela no âmbito do DNER. Além do mais,
em 1993, em ato formal, o DNER apreciou o CONTRATO firmado e nenhuma
ressalva fez sobre as regras de reajuste, nenhuma referência fez sobre a missiva
TABELA SICRO.
A esse respeito o Acórdão N° 6006/2008, lavra do TCU,
apreciando – exatamente - esses argumentos apresentados na Defesa Administrativa
pela ________LTDA (ou seja, sobre a impossibilidade jurídica da aplicação da tabela
SICRO), profere a Corte Administrativa decisão no sentido de a mencionada a
TABELA SICRO foi utilizada no procedimento de tomadas de contas para análise
do preço apenas como elemento comparativo:
“ARGUMENTOS DA EMPRESA.
18. Argumento: assere que os pagamentos dos itens de
serviços, com preços unitários acima da tabela SICRO
(composições do Sistema de Custos Rodoviários - DNER),
gerando um débito, em valor histórico, de R$
1.153.434,84, assim como os preços dos materiais
betuminosos e transportes acima dos constantes na tabela
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da Petrobrás, gerando uma diferença, em montante
original, de R$ 261.193,33, apontados no Acórdão
guerreado, não devem prosperar pelos seguintes motivos:
18.1. houve uma licitação regularmente processada em
dezembro de 1990, da qual resultou o contrato firmado
em 27/02/91, entre o DER/PI e a____, relativo ao lote do
qual esta última se sagrou vencedora, sendo que seus
preços propostos e cobrados estavam em conformidade
com a Tabela Unas, visto que a Sicro só vigorou,
posteriormente.
18.2. é irrelevante que o DNER tenha editado novas
Tabelas no curso da vigência deste Contrato, pois os
preços contratados e cobrados foram os constantes da
sua proposta vencedora, com as correções legais
supervenientes, feitas com base nos índices oficiais
aplicáveis ao caso. O DNER, em ato formal do seu
conselho Administrativo de 18/08/93, conheceu
do contrato e aprovou os preços propostos.
21. Quanto à afirmação de que é irrelevante que o DNER
tenha editado novas Tabelas, no curso da vigência deste
Contrato, tendo em vista que os preços contratados e
cobrados foram os constantes da sua proposta vencedora
e, ainda, de que o DNER, em ato formal do seu Conselho
Administrativo, de 18/08/93, conheceu do contrato e
aprovou os preços propostos, convém trazer à baila
excerto do Voto impulsionador do Acórdão n. 40/2003 -
Plenário:
. O Sicro é um sistema confiável e bem detalhado, cujos preços são extraídos por meio de composição de custos que, por sua vez, são calculados pela média dos preços praticados no mercado. O sistema pertence ao próprio DNER e tem sido utilizado pelo TCU como parâmetro comparativo de preços em fiscalizações de obras públicas, possibilitando a averiguação de indícios de superfaturamento e cálculo dos débitos a serem imputados aos responsáveis. Nesse sentido, podem-se citar, verbi gratia, as seguintes deliberações deste Plenário: Decisão n. 879/2001, Decisão n. 964/2001, Decisão n. 417/2002, Decisão n. 1.037/2002, Decisão n. 1.575/2002 e Decisão n. 1.577/2002.”(página 5 da
Acórdão 606/2008)
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Reconhece analisando a Defesa Administrativa da___________, o
Tribunal de Contas da União de que não havia obrigatoriedade contratual para o uso
da TABELA SICRO. No entendimento do TCU, o que deveria ter sido feito pelos
Gestores Públicos era examinar se os preços contratados ao longo do pacto estavam de
acordo com os preços de mercado, sendo a TABELA SICRO mero elemento de
comparação.
Observe-se, AINDA, no Acórdão Nº060/2008 o TCU analisando
a Defesa Administrativa apresentada pelo Servidor WILTON LUÍS NEIVA DE
MOURA SANTAOS, Chefe do 18º do DNER, que o contrato firmado não previa
reajuste de preços de acordo com a Tabela SICRO. Trecho:
“50. A respeito da alegação de que o ajuste debatido não
se enquadrava em nenhuma das hipóteses de rescisão
elencadas pelo contrato e pela lei de licitações sobreleva
notar que em nenhum momento esta Corte pronunciou-se
no sentido de que o recorrente deveria ter rescindido o
multicitado contrato, mas sim evitado os sobrepreços que
ocorrerem à custa do erário. Logicamente, se a
contratada não aceitasse a readequação da
equação financeira do ajuste, aí sim poderia
haver rescisão contratual, portanto em momento
posterior a ação do recorrente.” (página 10 da
decisão)
No VOTO do mencionado acórdão, o Ministro Benjamim
Zymler, deixa EXPRESSO que a suposta irregularidade detectada pelo TCU não reside
na manipulação de preço, ou na não observância da TABELA SICRO, mas no fato de,
no entendimento do Ministro Relator, havia necessidade de que a Administração
Pública fizesse a REVISÃO CONTRATUAL dos preços. Outro trecho:
“No que tange às reiteradas alegações da empresa no
sentido da impossibilidade da utilização do Sistema de
Custos Rodoviários - Sicro ao contrato em tela, por ter
sido este firmado antes da sua entrada em vigor, quando
se utilizava como referência a denominada Tabela Unas,
por ferir ato jurídico perfeito e o princípio da
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irretroatividade da lei, cumpre tecer as considerações
que seguem.
Em primeiro lugar, importa salientar que em
nenhum momento a decisão recorrida fez alusão
à obrigatoriedade da utilização do Sicro, quando
do reajuste dos preços do contrato em questão.
Referido sistema serviu apenas de parâmetro para
aferir os preços de mercado, à época do reajuste, no ano
de 1996, quando se sucedeu a maior parcela da execução
contratual.
Como já dito no relatório precedente, este Tribunal
considera o Sicro um sistema confiável e bem detalhado,
vez que seus preços são extraídos por meio de
composição de custos que, por sua vez, são calculados
pela média dos preços praticados no mercado.
Assim, o cerne da questão não é a obrigatoriedade ou não de sua utilização, mas a constatação de que, cotejando-se os preços contratuais com os do Sicro, representativos dos de mercado, aqueles mostraram-se demasiado superiores, fato que, como já dito, motivaria a necessidade de se proceder à revisão do contrato pela Administração. A esse respeito, vale repisar o entendimento exposto no relatório que subsidiou o Acórdão recorrido.”
O Tribunal de Contas da União, portanto, informa
EXPRESSAMENTE que a tabela SICRO serviu apenas como PARÂMETRO.
Entretanto, a DENÚNCIA informa que o fato típico praticado pelos sócios proprietários
da empresa foi o de ter-se beneficiado com o pagamento da prestação com preços
excessivamente elevados de serviço, cerca de 175% superiores aos da tabela SICRO.
Afirma o Ministério Público Federal que os sócios proprietários se utilizaram do
contrato para desviar recursos públicos.
Mas da simples leitura do Acórdão 606/2008 infere-se que o TCU
menciona expressamente que a falha foi da Administração Pública, mas que a
REVISÃO CONTRATUAL dependia da ANUÊNCIA da LTDA. Ora, uma vez que não
foi garantido à a opção de prestar serviços por outros preços e não pelos índices
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ajustados no contrato, não há como exigir a devolução do dinheiro pago, nem como
classificar o pagamento como ilícito.
Conclui-se, outrossim, com obviedade, que a _________não
impediu de qualquer forma os Gestores Públicos de adotar as providências de
adequação econômica, assim, não praticou nenhum ato doloso. Prestou o serviço na
forma contratada e recebeu o preço de acordo com o contrato. Não agiu com dolo,
nem seus sócios proprietários desviaram dinheiro público.
Mais, o fato mencionado pela denúncia, de que teriam recebido
pagamento por prestação de serviços com preços elevados, 175% superiores ao preço da
TABELA SICRO, também não constitui ilícito penal. A Administração Pública não
pode requerer a devolução do dinheiro pago, sob alegação de preço excessivo, uma vez
que não NOTIFICOU o particular para adequação/modificação dos índices contratuais
previstos, eis que ao particular é assegurado por lei o direito de aceitar ou não a
modificação/alteração/revisão do contrato licitado.
É importante mencionar que na DENÚNCIA o Ministério Público
Federal também afirma que os fatos narrados foram investigados em INQUÉRITO
POLICIAL. Isso não corresponde exatamente a verdade. O INQUÉRITO POLICIAL
solicitado pelo Ministério Público Federal concluiu que não havia evidências e nem
provas de conduta ilícita penal por parte dos acusados. Trecho final do Relatório
proferido em 22/03/2006 pelo Delegado da Polícia Federal:
“Da análise de tudo que foi trazido aos autos, conclui-se
que os únicos indicativos de irregularidades ocorridas
na execução do Contrato PJU-01/91 são aqueles
expostos nos documentos encaminhados pelo TCU,
mesmo porque, decorridos mais de dez anos da
execução da obra, impossível a realização de qualquer
perícia ou outra diligência. Todavia, o processo de
tomada de contas especial ainda se encontra pendente
de apreciação das razões de defesa oferecidas pelos
investigados, conforme extratos juntados às fls. 667/672.
Por isso, não foi possível carrear a estes autos indícios
suficientes da prática do crime investigado. Assim,
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encerro e relato este inquérito e o submeto à apreciação
da autoridade judiciária competente.”
Somado a AUSENCIA DE JUSTA CAUSA acima comentada,
a peça acusatória padece de outros vícios, por exemplo: NÃO há exposição precisa
e objetiva da participação da sócia proprietária Sra. ________________na suposta
prática do crime de peculato doloso. Diz o Ministério Público Federal apenas que
os sócios proprietários se beneficiaram dos valores recebidos, sem fazer nenhuma
menção às tarefas e atribuições de cada sócio dentro da empresa. Parte, portanto,
o MPF da tese da responsabilidade objetiva penal do sócio da empresa no crime de
peculato.
É importante mencionar que a denúncia, nos termos do art.
41 do CPP, deve descrever os fatos de modo a propiciar ao réu a dimensão exata
da acusação, porém, no presente caso, a peça acusatória não possui exposição
fática capaz de situar o ato ilícito imputado no tempo e no espaço, violando os
princípios constitucionalmente garantidos: do contraditório, da ampla defesa, da
dignidade da pessoa humana e do devido processo legal.
Conforme depoimentos prestados pelos sócios proprietários –
_________(fls. 377/378 do Volume III dos autos) e ________________(fls. 374/375 do
Volume III dos autos) – estes eram os únicos sócios gerentes da .
Assim, mesmo não tendo acompanhado a execução do contrato
PJU nº 01/91, a sra. _________________________acredita no depoimento do sócio
proprietário_________________, no sentido de que todos os serviços foram
corretamente executados e que os preços pagos observaram os termos e condições
constantes no objeto do contrato firmado entre a Administração Pública e a .
Em síntese: o MP afirma que dois foram os fatos criminosos,
quais sejam: a não execução correta dos serviços contratados e pagamento a maior.
Quanto ao primeiro fato, serviços pagos e não executados, o
próprio acórdão do Tribunal de Contas da União reconhece que a alteração no Plano de
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Trabalho original ocorreu por iniciativa da própria Administração Pública e que os
serviços executados foram os efetivamente pagos.
Quanto à outra alegação da acusação, preço a maior, também
não ocorreu. Apresenta a ré prova documental, parecer do Engenheiro Sandro
Salvador Sandroni, para provar que os preços praticados, além de terem sido
aqueles previstos no instrumento contratual, também eram compatíveis com os
preços de mercado. Trechos do parecer:
“5. O preço ofertado pela---------. foi de R$ 2.540.778,73,
referido a data base de dezembro de 1996, conforme Fl. 18
do processo do TCU (reproduzida no Anexo 1). Este valor
corresponde a preço médio de R$ 70.577,19/km.
6. Para verificar se o valor médio (R$/km) ofertado pela
Construtora____. está dentro da faixa de preços observados
nas restaurações de rodovias na região (Estados de Piauí e
de Ceará) foram estudados oito contratos de obras de
restauração de rodovias executados na região, obtidos pela -
----------O objeto de todos esses contratos é a restauração de
pavimento em rodovias Classe III (8 m de largura, sendo 1 m
de acostamento de cada lado),conforme informado pela ------
-.
7. Dos oito contratos levantados para estudo, seis são do
DER-PI, um do DERT-CE e um do antigo DNER no Estado
de Ceará. Esses contratos foram assinados em 1994, 1996,
1997 e 1998. Quatro dos contratos são da própria ----------L
e, os outros quatro são de outras construtoras.
8. Os valores desses contratos foram ajustados para
dezembro de 1996, para possibilitar a realização de
comparação de preços equalizados no tempo. Com esse fito,
a data inicial de referência de preço contratual, para
definição do índice I0, foi extraída de cada contrato.
9. O fator de ajustamento foi calculado como sendo I/ I0,
sendo I = 127,083 o índice de Pavimentação, de dezembro de
1996, publicado pela revista Conjuntura Econômica da
Fundação Getúlio Vargas. O índice I0 é o da data inicial de
referência de preço, definida em cada contrato.
10. O Quadro 1 anexo mostra número do contrato, data da
assinatura, empresa construtora, número do edital de
licitação que deu base para celebração do contrato, órgão
contratante, discriminação da rodovia, extensão do trecho,
Página 17 de 51
valor contratual, data de referência de preço contratual,
índices I0 para ajustamento, multiplicador para ajustamento
dos valores para dezembro de 1996, valor contratual
ajustado para dezembro de 1996 e valores de R$/km com
preço já ajustado para dezembro de 1996.
11. Verifica-se que os valores observados nos oito contratos
analisados variam de R$ 59.665,02/km a R$ 100.629,25/km,
sendo que o valor médio (ponderado conforme a extensão de
cada trecho) dos oito contratos é de R$ 78.266,73/km.
Calculando o desvio padrão chega-se a R$ 13.661,87/km, ou
seja, a faixa de preço para região é de:
Mínimo 78.226,73 – 13.661,87 = R$ 64.604,86/km
Máximo 78.226,73 + 13.661,87 = R$ 91.928,60/km
12. O valor ofertado pela Construtora. (R$ 70.557,19/km) é
inferior a valor médio da região (em aproximadamente
9,9%), está mais próximo do valor médio mínimo e, é cerca
de 23,2% inferior a valor médio máximo da região (no
âmbito dos 8 contratos analisados).
13. Realizando-se os mesmos cálculos, sem ponderar
segundo a extensão de cada trecho, verifica-se que o valor
médio dos oito contratos passa para R$ 80.304,47/km e o
desvio padrão para R$ 14.441,78/km que resulta em valores:
Mínimo 80.304,47 – 14.441,78 = R$ 65.862,69/km
Máximo 80.304,47 + 14.441,78 = R$ 94.746,25/km
14. Ou seja, verifica-se que também por critério não
ponderado, o valor ofertado pela -----------de R$
70.557,19/km se apresenta inferior a valor médio da região
(em aproximadamente 12,11%), está mais próximo do valor
médio mínimo e é 25,51% menor do que o valor médio
máximo.
15. Outra verificação, realizada na amostra de oito contratos
em foco, foi isolar as obras da --------das obras construídas
por outras empresas. Verificou-se que a média dos contratos
da ----------é igual a R$ 74.441,88/km, ao passo que a média
dos contratos das demais empresas é igual a R$
81.791,00/km.
16. Cabem dois comentários sobre a base de contratos
examinada. O primeiro refere-se ao tipo de pavimento: no
contrato sob escrutínio foi utilizado AAUQ (areia-asfalto
usinado a quente) enquanto que nos demais, foi utilizado
TSD (tratamento superficial duplo), que vem a ser um
produto de preço, em geral, um pouco inferior. O segundo
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comentário é sobre o contrato 100/94 do DERT-CE que
estabelece que o “material betuminoso será fornecido pelo
DERT” o que significa que, se o valor desse material
betuminoso for acrescentado, este contrato teria um preço
por km maior.
3 - CONCLUSÃO
17. Como resultado da análise dos oito contratos, pode-se
afirmar que o valor ofertado pela -------- está enquadrado
no nível de preços de restauração de obras rodoviárias
contemporâneas, executadas na região dos Estados de Piauí
e Ceará.” (Grifos nossos)
Conclui-se que, para a ---------------não havia qualquer
irregularidade com os preços, não era, como afirma o TCU, visível a discrepância
dos preços do contrato com os preços de mercado. Houve absoluta boa fé na
execução do contrato licitado. Os preços praticados em contratos similares
estavam compatíveis com outros contratos em andamento da mesma época, havia
aparência de total conformidade dos preços de outros contratos com o DER. Os
sócios que não administravam a empresa jamais poderiam supor que houvesse
qualquer irregularidade, demonstrada a ausência de dolo.
Afirma o TCU que os preços do contrato ficaram 175% acima
quando comparados com os da TABELA SICRO, desse modo, como NÃO
APARENTE a discrepância? Como a empresa não poderia perceber que os preços
estavam elevados mesmo sem nenhuma tabela?
Ocorre que, conforme DEFESA ADMINISTRATIVA
apresentada pela ----------, e que não foi analisada pelo Acórdão 606/2008, tendo sido
alvo de EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, face a omissão do julgador, esse cálculo
realizado não procede.
Em primeiro lugar, a TABELA SICRO utilizada como
comparativa é para OBRAS DE CONSERVAÇÃO E CONSTRUÇÃO, e não para de
OBRAS DE RESTAURAÇÃO. Prejudicado, por conseguinte, todo o cálculo
apresentado no quadro comparativo de preços apresentado pelo TCU.
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Além disso, no quadro comparativo apresentado pelo TCU foram
incluídos os serviços da parcela executada e paga em 1993, ou seja, incluída no
montante da 53ª medição. Ora, o próprio Acórdão reconheceu estarem seus preços
compatíveis com os do mercado, então vigentes (Fatura da 1ª Medição anexa por cópia).
Obviamente, esse valor jamais poderia estar no quadro comparativo.
Quanto ao material betuminoso de transportes, que também é
considerado pelo TCU como objeto do contrato e com preço acima do mercado, a
empresa apresentou Defesa Administrativa questionando qual a razão dos preços
estarem sendo comparados aos produtos asfálticos da Petrobrás, qual a regra legal,
norma legal que impõe esta obrigação. Sobre o transporte a tabela utilizada pelo TCU
não verifica a distância que realmente a ----------percorreu, a tabela é inteiramente
incompatível.
Em síntese: o quadro comparativo de preços que utilizou o
Tribunal de Contas da União para chegar à conclusão de que os preços foram
elevados em 175% aos preços praticados no mercado está eivado de diversos vícios.
O Ministério Público Federal não se utilizou de uma PERÍCIA CRIMINAL para
verificação dos números. A denúncia aceitou como PROVA MATERIAL um
quadro comparativo controverso, impugnado e cheio de vícios (!!!).
O processamento penal necessita da prova firme, robusta e não de
mera probabilidade (!!!). Da leitura do Acórdão 606/2008, lamentavelmente, se infere
que a Corte Administrativa milita com subjetivismo e probabilidades, o que não
habilita o acórdão como instrumento que justifique a deflagração do gravoso processo
penal. . TRECHO DO ACORDÃO -2008:
“O reajuste em questão foi formalizado mediante termo
aditivo datado de 16/5/1996, ou seja, decorridos mais de
5 anos da data da assinatura do contrato. Nessa ocasião,
o valor original do contrato, que era de Cr$
535.860.026,47 (em cruzeiros), foi convertido para o
equivalente em real, aplicando-se os índices de reajustes
adotados no âmbito do DNER, resultando o valor de R$
2.390.143,18.
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Observe-se que no período compreendido entre os anos
de 1991 e 1996 sucedeu-se uma alteração marcante na
conjuntura econômica do País, especialmente no que diz
respeito à contenção das taxas de inflação galopantes,
que passaram a ser mantidas sob controle, dentro de
certos limites, com o advento Plano Real, a partir de
julho de 1994.
Assim, é fato notório que o Plano Real - longe de se fazer
apologia à aludida medida governamental - representou o
início de uma era de maior estabilidade econômica, ao
menos com respeito à contenção das taxas de inflação.
Basta cotejar os diversos índices que mensuram a
variação de preços, antes e após a implementação do
Plano, para se chegar a essa conclusão.
Nessas circunstâncias, afigura-se altamente provável que
os preços constantes do contrato em tela, firmado no
início de 1991, época em que os índices inflacionários
eram extremamente elevados, submetidos aos reajustes
até o ano de 1996, já não mais refletissem a
realidade do mercado, como de fato restou
constatado nos autos.”
Em outros termos, o Tribunal de Contas da União afirma –
categoricamente – que a MUDANÇA DO PADRÃO MONETÁRIO foi o fato
determinante para que o preço dos serviços contratados fosse reajustado, mas em
desacordo com os preços de mercado.
Assim, a hipótese fática desenhada pelo TCU não configura crime
de peculato eis que ausente o dolo. Veja- se, ainda, trecho do mesmo acórdão em que
o TCU admite que suposto desequilíbrio contratual ocorreu por fato imprevisível e
estranho à vontade da empresa e dos servidores públicos:
“Saliente-se que, na situação vertente, o desequilíbrio
resultou de fato imprevisível e estranho à vontade
das partes. Nessas circunstâncias, vislumbra-se a
possibilidade de aplicação da teoria da imprevisão,
objetivando o restabelecimento da comutatividade das
prestações contratuais. No caso, o princípio da força
obrigatória (pacta sunt servanda), defendida de forma
acirrada pelos recorrentes, deixaria de ser absoluto, de
modo a proteger o equilíbrio contratual.”
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Reconhece o TCU que o preço licitado e ofertado
pela______________. no processo licitatório, objeto do contrato firmado, foi 11,99%
abaixo dos preços previstos no Edital da Concorrência, conforme comprova resposta
do DNER contida no acórdão de fls. 171/179 dos autos (Volume I).
(...) “3 – Os serviços, objeto da presente Licitação (Edital
nº 001, de 08/02/91), para execução das obras de
restauração da rodovia BR-135/PI, trecho: Elizeu
Martins – km 36, numa extensão de 36 km
aproximadamente (Lote I), foram adjudicados a
firma_________., com um valor global de Cr$
535.860.026,47 (quinhentos e trinta e cinco milhões,
oitocentos e sessenta mil, vinte e seis cruzeiros e quarenta
e sete centavos).” (...)
(...) “7 – Após exame dos preços unitários pela DCt.
Foram considerados aceitáveis em comparação com os
praticados pela tabela UNAS.”
Precioso REPRISAR que nos acórdãos colacionados nos autos o
Tribunal de Contas da União não informa que houve por parte da__________.
manipulação dos preços no curso do contrato. Ao contrário, admite que os preços
pagos foram os efetivamente contratados.
Labora o Ministério Público em extremo subjetivismo ao tentar
definir como crime de peculato, crime gravíssimo, o fato ATÉ controverso na seara
administrativa e cível, se teria a administração pública o direito de em tendo revisto no
tempo certo o contrato, em face de determinada tabela definida como padrão federal,
possa AGORA, rever e obrigar o particular a devolver valores por preços que este não
contratou.
Ora, um contrato foi firmado entre as partes. Se a administração
pública não notificou a empresa contratada para fosse renegociado os preços
contratuais, e a empresa simplesmente deu cumprimento ao contrato não há ato
criminoso por parte dos sócios da empresa. O contrato firmado foi ato lícito. A
empresa não impediu a Administração Pública de exercer a conferência dos
preços. Obviamente, a mudança do padrão monetário não implica em AUMENTO
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DE PREÇO, nem PROBABILIDADE DE AUMENTO DE PREÇO, a simples
conversão era ato comum, normal, corriqueiro nas relações comerciais.
Além disso, enfatize-se, mais uma vez, a Lei de Licitação não
determina que a empresa a praticar um serviço pelo preço que não ajustou
contratualmente. A REVISÃO dependia da anuência do particular. Agora, sem
que tenha NOTIFICADO o particular, a Administração Pública (por meio do
MPF) não pode exigir a devolução do dinheiro eis que implica em obrigar o
particular a aceitar executar o serviço pelo preço que AGORA a Administração
Pública acha que é o justo. Ora, onde estaria a segurança jurídica das relações
entre a Administração Pública e o particular?
O Tribunal de Contas da União admite que o valor pago
à______________. foi o valor efetivamente contratado por meio de processo
licitatório válido e que não ocorreu por parte da empresa prestadora de serviços
ardil e/ou manipulação dos preços pagos na forma do contrato licitado.
Assim, não há fato típico penal no relato do TCU. A
administração pública se pretendia rever o preço contratado, utilizando tabela não
prevista no contrato licitado, deveria ter notificado a empresa na forma legal.
É importante mencionar que nem a devolução civil deste
dinheiro a empresa está obrigada, eis que a lei lhe garante o direito de aceitar ou
não a negociação. É ato facultativo da empresa. Ora, se não estava obrigada a
prestar os serviços pelos preços não licitados, não está obrigada a devolvê-los, eis
que a administração pública estava obrigada por lei a notificar a empresa. É um
absurdo que isso seja considerado ilícito penal!
Em resumo: o ilícito administrativo cingiu-se, segundo
entendimento do Egrégio Tribunal de Constas da União, no fato de que a
Administração Pública deveria ter repactuado para menor os preços licitados após
a conversão da moeda. Assim, não imputa conduta típica na seara criminal à ré, eis
que ausente o dolo. Veja-se trecho do acórdão/2008 juntado aos autos às fls. 548/570
(Volume III):
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(...) “O reajuste em questão foi formalizado mediante termo
aditivo datado de 16/5/1996, ou seja, decorridos mais de 5
anos da data da assinatura do contrato. Nessa ocasião, o
valor original do contrato, que era de Cr$ 535.860.026,47
(em cruzeiros), foi convertido para o equivalente em real,
aplicando-se os índices de reajustes adotados no âmbito do
DNER, resultando o valor de R$ 2.390.143,48.” (...)
(...) “Saliente-se que, na situação vertente, o
desequilíbrio resultou de fato imprevisível e
estranho a vontade das partes. Nessas circunstâncias,
vislumbra-se a possibilidade de aplicação da teoria da
imprevisão, objetivando o restabelecimento da
comutatividade das prestações contratuais.” (...)
É de bom aviltre, especialmente considerando que o ilustre
representante do Ministério Público Federal imputa aos réus o crime grave de peculato
doloso, que os trechos do acórdão do Tribunal de Contas da União, único elemento de
prova citado pela acusação na exordial, afirmam que o preço pago foi efetivamente o
valor original do contrato convertido ao equivalente em real, aplicando-se os índices de
reajustes adotados no âmbito do DNER. E mais, afirmam que a mudança da moeda (de
cruzeiros para real) – fato imprevisível e estranho a vontade das partes – foi que
ocasionou um desequilíbrio no contrato e, portanto, tal contrato deveria ter sido
revisto ou readequado.
Falando de modo mais claro, o Egrégio Tribunal de Contas da
União afirma que o suposto pagamento feito a maior – acima da Tabela SICRO
adotada pelo DNER – à____________. foi ocasionado por fato imprevisível e
estranho a vontade das partes.
Argumente-se por oportuno, nem é compreensível que apenas
a mudança do padrão monetário, a simples mudança do valor da moeda tenha
ocasionado essa diferença. Em tese, a mudança monetária não aumenta e nem
diminui o valor e preços. Há uma simples conversão. Essa explicação do TCU
sequer está balizada em bom senso. É evidente que o Governo Federal adotou
outros preços após a conversão sem acompanhar a simples mudança, foi este quem
alterou o preço, e no caso, para menor.
Página 24 de 51
Aceitável que a qualquer momento o Governo Federal elabore
tabelas com preços menores aos contratados, mas processar as empresas civil e
criminalmente para sejam forçadas a adimplir a preços menores sob a inversa
alegação de que o preço seria superfaturado é aviltar o princípio da segurança
jurídica.
Na forma legal, acaso pretendesse a Administração Pública
readequar o contrato PJU nº 01/91 revisando os preços pactuados, deveria, nos
termos do art. 65, II, “d”, da Lei nº 8.666/93, notificar a______________. para
adequação dos preços em um patamar inferior àquele previsto no contrato
licitado. Se era da conveniência e oportunidade da Administração Pública praticar
preços inferiores aos estipulados no contrato, que agissem na forma que a lei
determina, notificando a_____________. para novos preços, inferiores aos licitados.
É precioso repetir que a lei não impõe à empresa contratada e
nem a seus sócios, qualquer obrigação de denunciar o contrato por evento
imprevisível que por ventura venha a beneficiar a missiva prestadora de serviços.
A obrigação é apenas do Administrador Público, conforme os termos dos arts. 58 e
65 da Lei nº 8.666/93. A Administração Pública pode, no exercício de seu poder de
gestão, em ato discricionário, rever os contratos, porém, está obrigada a ter o aceite do
prestador de serviços. Veja-se o texto da Lei nº 8.666/93:
Art. 58. O regime jurídico dos contratos administrativos
instituído por esta Lei confere à Administração, em relação a
eles, a prerrogativa de:
I - modificá-los, unilateralmente, para melhor adequação às
finalidades de interesse público, respeitados os direitos do
contratado;
§ 1o As cláusulas econômico-financeiras e monetárias dos
contratos administrativos não poderão ser alteradas sem
prévia concordância do contratado.
§ 2o Na hipótese do inciso I deste artigo, as cláusulas
econômico-financeiras do contrato deverão ser revistas
para que se mantenha o equilíbrio contratual.
Página 25 de 51
Art. 65. Os contratos regidos por esta Lei poderão ser
alterados, com as devidas justificativas, nos seguintes
casos:
II - por acordo das partes:
d) para restabelecer a relação que as partes pactuaram
inicialmente entre os encargos do contratado e a
retribuição da administração para a justa remuneração
da obra, serviço ou fornecimento, objetivando a
manutenção do equilíbrio econômico-financeiro inicial do
contrato, na hipótese de sobrevirem fatos imprevisíveis,
ou previsíveis porém de conseqüências incalculáveis,
retardadores ou impeditivos da execução do ajustado, ou,
ainda, em caso de força maior, caso fortuito ou fato do
príncipe, configurando álea econômica extraordinária e
extracontratual. (Redação dada pela Lei nº 8.883,
de 1994)
Em síntese, não cabia à____________. e nem a seus sócios
denunciar o contrato firmado com a Administração Pública, solicitando a
repactuação a preços inferiores aos ajustados no instrumento contratual,
especialmente quando o motivo da repactuação seria a aplicação de uma suposta
Tabela (SICRO) do DNER.
A prestadora de serviço não era obrigada por lei a conhecer
os supostos preços contidos na alegada Tabela SICRO e nem que tal tabela era a
praticada pelo DNER e que, portanto, deveria ser aplicada; eis que não se trata de
diploma legal. O tipo do Crime de Peculato traz como elemento subjetivo o DOLO, a
vontade livre e consciente de delinqüir, o que não se infere neste caso.
Sendo enfático, se a Administração Pública pretendia impor
preço menor que o firmado em contrato licitado, que notificasse a____________.
empresa para que esta manifestasse o seu direito de escolha. E não agora, em um
processo confuso, com um emaranhado de fatos mal relatados, venha imputar aos
sócios da Construtora a prática de crime de peculato doloso.
Página 26 de 51
É fundamental destacar que o Ministério Público Federal em
nenhum momento afirma que os funcionários públicos de forma premeditada, visando
beneficiar a empresa, deixaram de notificá-la para adequar os preços a patamares
inferiores ao contratado. Ou seja, os sócios da prestadora de serviço praticaram
qualquer ato no sentido de impedir a Administração Pública de revisar os
contratos pactuados.
Obviamente, se não está sendo acusada a Construtora
__________de não manipulação dos preços em conluio com os Gestores Públicos, e
não impediu, nem frustrou de qualquer forma a Administração Pública a adotar
providências de reajustar de acordo com a TABELA SICRO, para menor os
preços licitados legalmente, nenhum ato ilícito praticou a empresa.
Pretender o recebimento do dinheiro público pago malfere a Lei
de Licitação. A Lei garante ao contratado o direito de não aceitar a diminuição do preço
ajustado no contrato. Se a administração pública pretende realizar a obra por preço
menor a obrigação legal era de notificar antes do contratado. Esse dinheiro não é fruto
de ilícito civil, nem ilícito penal.
A simples hipótese de a administração ter possibilidade de
diminuir o valor de um contrato, não significa ilícito penal, até pelo fato do ato ser
bilateral, depender da vontade de ambas as partes. Da mesma forma que o particular
não estava obrigado a aceitar a diminuição, sem que tenha sido respeitado seu direito de
ser perguntado, seu direito de escolha, agora não pode, via transversa ser obrigado a
devolver, pior ser considerado criminoso.
O Tribunal de Contas da União é órgão responsável não apenas
para apreciar os atos administrativos não apenas no aspecto legal, mas na questão da
eficiência. Assim, ao decidir que outro preço poderia ter sido praticado no contrato fez
uma análise da eficiência do gestor público. O gestor poderia, ao ver do TCU, ter
economizado os recursos, já que os preços praticados pelo DNER, órgão federal, eram
inferiores aos preços corrigidos monetariamente, mas daí rasgar as regras legais que
garantem o direito do particular implica em malferir o Estado de Direito.
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A verba pública prevista foi gasta corretamente, conforme
planejada. A hipótese de que pudesse ou não haver economia do dinheiro público,
utilizando-se uma tabela com preços menores, depende também de outra hipótese,
a do particular para aceitar adimplir o contrato por preços menores.
O TCU afirma que até 1993 as contas prestadas no contrato
licitado foram corretas. Apenas após essa data, sob o argumento da conversão da
moeda, sob o argumento de havia a vigência de uma tabela do DNER com preços
menores, somente a partir daí questiona a gestão pública. Os acórdãos do Tribunal de
Contas da União (2004 e 2008) não imputam ardil e nem conchave entre os
funcionários públicos e a_____________. no intuito de desviarem dinheiro público.
A empresa não praticou nenhum ato ilícito.
Lembre-se, mais uma vez, a figura trazida no caput do art.
312 do CP tem como elemento subjetivo o dolo, ou seja, a vontade consciente de
desviar o dinheiro público em proveito próprio. Não ocorreu desvio, nem
apropriação, nem peculato, o dinheiro pago foi o contratado.
Não há na Lei de Licitação, ou qualquer outra norma legal,
que obrigue a empresa durante o curso da prestação de serviços denunciar o
contrato, ou notificar a administração para que baixe os preços em virtude de
preços supervenientes, sob pena de estar praticando ILÍCITO PENAL. No sistema
legal brasileiro não define essa obrigação, nem a lei penal. O Crime de Peculato
pressupõe a POSSE DO BEM, a retenção e apropriação indevida, livre consciente do
ato praticado. Esses fatos ora em exame não se subsumem a essa hipótese legal.
Extrapola, portanto, o Ministério Público Federal ao propor a
presente ação ofendendo o status dignitatis dos acusados.
Absurda a pretensão do Ministério Público, trazendo
insegurança às instituições democráticas, de que os sócios proprietários de uma
empresa, apenas por cumprirem o que foi pactuado, respondam criminalmente
pelo grave e desonroso crime de peculato.
Página 28 de 51
Outros argumentos de ordem formal também impedem a
formação válida desta ação.
III. PRELIMINARMENTE – DA INÉPCIA DA DENÚNCIA.
VIOLAÇÃO DO ART. 41 DO CPP. NULIDADE DA AÇÃO PENAL.
APLICAÇÃO DO ART. 564, III, “A”, DO CPP. VIOLAÇÃO DO
PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA.
INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA.
Sem adentrar ao mérito, permissa vênia, inobstante a r. decisão de
fl. 574, a denúncia deveria ter sido rejeitada de plano, eis que padece de defeito grave,
pois os fatos criminosos NÃO estão descritos em todas as suas circunstâncias,
desatendendo os termos do art. 41 do CPP.
A doutrina, na voz de Julio Fabbrini Mirabete, na sua obra Código
de Processo Penal Interpretado, nona edição, 2002, analisando os termos do art. 41 do
CPP, ensina quais as circunstâncias de fato que devem conter a peça acusatória:
“Qualquer fato criminoso é rodeado de circunstâncias (pessoa
do criminoso, meio de execução, causas, efeitos, local,
tempo, etc.). Algumas delas são de interesse na ação penal,
pois podem influir na classificação do crime, na existência de
qualificadoras, agravantes, atenuantes, causas de aumento ou
diminuição da pena etc. Dados relativos à época do crime
são decisivos no reconhecimento ou não da prescrição.
Outros, referentes ao local do fato, interferem na
competência etc. Assim, como se afirma na doutrina, na
denúncia devem estar esclarecidas tais questões, fundadas
nas seguintes indagações:
quis (o sujeito ativo do crime);
quibus auxiliis (os autores e meios empregados); quid (o
mal produzido);
ubi (o lugar do crime); cur (os motivos do crime);
quomodo (a maneira pela qual foi praticado)
e quando (o tempo do fato).”
“A análise de qualquer peça acusatória impõe que, nela, se
identifique, desde logo, a narração objetiva, individuada e precisa do fato delituoso,
que, além de estar concretamente vinculado ao comportamento de cada agente, deve
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ser especificado e descrito, em todos os seus elementos estruturais e circunstanciais,
pelo órgão estatal da acusação penal.” (Habeas Corpus 84.580-1 São Paulo, Min.
Relator Celso de Mello)
Porém, no caso dos autos, a peça acusatória não contém requisito
essencial exigido por lei para o seu recebimento, qual seja, a exposição do fato
criminoso com todas as suas circunstâncias, o que inviabiliza a própria instauração da
persecução penal.
Especificamente, na peça acusatória em questão, conforme será
minudenciado a seguir, inexiste:
a) indicação da data da suposta prática do ato ilícito
(delimitação do evento criminoso no tempo);
b) a descrição da conduta individualizada de cada
denunciado, ou seja, ausente a indicação de
comportamento típico que vincule os denunciados
diretamente à prática do crime de peculato doloso ora
imputado.
A seguir minudencia-se:
III. A) INÉPCIA DA DENÚNCIA. INEXISTÊNCIA DE DATA E
CIRCUNSTANCIAS DO COMETIMENTO DO SUPOSTO CRIME
PELOS DENUNCIADOS.
A peça acusatória afirma que o Tribunal de Contas da União,
apurou irregularidades no contrato firmado entre o DER/PI e a _______________da
qual a ora acusada foi sócia.
Na denúncia, entretanto, Parquet não informa quando os sócios
proprietários praticaram o Crime de Peculato, nem também quando os servidores
públicos concorreram para o Crime. A denúncia informa apenas o período contratual
foi de 1991 a 1996 .
Mas QUANDO– exatamente – ocorreu o suposto ato ilícito?
Página 30 de 51
Afirma a peça acusatória que ocorreram irregularidades no
período contratual de fevereiro de 1991 a 1996, mas, dentro desse lapso temporal
de 05 (cinco) anos, quando exatamente os atos foram supostamente praticados? A
denúncia quedou-se a indicar QUANDO o fato delituoso foi supostamente praticado
pelos funcionários públicos e pelos sócios da empresa.
Em que data, exatamente, deveriam ambos os Gestores
Públicos terem conferido os preços contratuais?
Onde estava o Recurso Federal? Havia sido entregue ao
DER? Quem, exatamente, liberou o Recurso Público? O Recurso foi pago após a
EXECUÇÃO da obra? Quem autorizou a execução da obra pelo preço licitado? O
DNER ou qualquer outro órgão federal comunicou ao DER que deveria os preços
deveriam ser revistos?As datas e circunstâncias de ocorrência do suposto ilícito são
indispensáveis para o reconhecimento da autoria, materialidade, e no caso,
principalmente da prescrição.
Sendo o delito de peculato doloso, apenado de 02 (dois) a 12
(doze) anos, prescreve, na forma do art. 109 do CP, em 04 (quatro) a 16 (dezesseis)
anos. Então, se contado o suposto ato ilícito de fevereiro de 1991 (celebração do
contrato), estaria prescrito em abstrato o crime de peculato doloso em fevereiro de
2007.
A lacuna existente na denúncia, que consiste na ausência de
delimitação do fato criminoso no tempo – a peça de acusação não indica a data
exata da suposta prática do ato ilícito que é imputado aos réus –, ocasiona grave
prejuízo a defesa dos acusados. Por exemplo, aos denunciados impossível a análise
da extinção da pretensão punitiva do Estado em relação a prescrição em abstrato
e, também, de forma concreta, quando da prolação de eventual sentença
condenatória.
Não se trata de preciosismo de dias ou horas, mas de definir
as supostas condutas criminosas que teriam supostamente acontecido no período
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de fevereiro de 1991 a 1996. A imprecisão quanto ao tempo é enorme, causando
grave prejuízo à ampla defesa dos denunciados, inverte o ônus probatório e,
como já mencionado, impossibilita o exame da extinção da pretensão punitiva.
A doutrina pátria reconhece que a delimitação do fato criminoso
no tempo (quando?) é requisito essencial da peça acusatória e, no caso de sua ausência,
reconhece a inépcia da denúncia e determina a nulidade da ação penal. Veja-se julgado
proferido em caso semelhante:
HABEAS CORPUS - DENÚNCIA INEPTA -
CONCESSÃO DA ORDEM PARA ANULAR O
PROCESSO A QUE SUBMETIDO O PACIENTE, A
PARTIR DO RECEBIMENTO DA DENÚNCIA,
INCLUSIVE - Tem-se dado ênfase, para validade da
denúncia, a necessária descrição de fato concreto,
localizado no tempo e no espaço, de modo a possibilitar a
defesa e poder-se avaliar eventual ocorrência de
prescrição ou outra causa extintiva da punibilidade. (TJRS - HC 699329504 - RS - 1ª C.Crim. - Rel. Des. Ranolfo
Vieira - J. 16.06.1999)
Ante o exposto, comprovada a inépcia da exordial acusatória
por não delimitar o suposto fato criminoso no tempo, o que, por si só, já
autorizaria o reconhecimento da nulidade da presente ação penal. Contudo, essa
não é a única falha que permeia a denúncia, além da imprecisão quanto ao tempo,
inexistente também a individualização das condutas dos denunciados, como será
demonstrado no item a seguir.
III. B) INÉPCIA DA DENÚNCIA. INEXISTÊNCIA DE EXPOSIÇÃO
DO FATO CRIMINOSO COM TODAS AS SUAS
CIRCUNSTÂNCIAS, ESPECIALMENTE NO QUE TANGE A
INDICAÇÃO DA CONDUTA (PARTICIPAÇÃO)
INDIVIDUALIZADA DOS FUNCIONÁRIOS PÚBLICOS E DE
CADA UM DOS SÓCIOS DA EMPRESA.
Quanto aos atos supostamente praticados pelos denunciados –
funcionários públicos e sócios da__________. – a denúncia restringe-se a afirmar
que:“eram responsáveis pela aferição da compatibilidade entre os preços dos serviços
Página 32 de 51
executados e os preços praticados no mercado, sendo que, em face de suas condutas
omissivas, claro está que poderiam ter detectado o dano ao erário, evitando o
pagamento a maior efetuado a favor da Construtora_________.”
A peça acusatória relata genericamente que os dois
funcionários públicos eram chefes do DER-PI e DNER, e nesta condição por serem
os responsáveis gerais pelos órgãos, cabia-lhes a fiscalização geral de todos os atos
administrativos. Havendo omissão/falha “nesta fiscalização geral” deviam
responder penalmente pelo desvio propiciado pela negligência.
A imputação de negligência como conduta penalmente punível,
contudo, é vaga, eis que não descreve como diretamente os dirigentes/chefes teriam
participado do ilícito.
Desse modo, admitir que um gravoso processo criminal tramite
contra os CHEFES de órgãos públicos, apenas por ocuparem os cargos e serem os
administradores públicos responsáveis de forma geral, sem indicar uma direta
participação da ação ou omissão de cada um, é o mesmo que instituir a
responsabilidade penal objetiva.
O simples fato de SER CHEFE de um órgão NÃO PODE
CONDUZIR a presunção de culpa ou dolo como pretende o MPF.
A este respeito, SOBRE A NECESSIDADE DE DESCRIÇÃO
DA CONDUTA PENAL, tome-se como empréstimo as palavras do MINISTRO
CELSO MELO, do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, HC 84.580-1:
“E M E N T A: "HABEAS CORPUS"
- CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO
NACIONAL
- RESPONSABILIDADE PENAL DOS
CONTROLADORES E ADMINISTRADORES DE
INSTITUIÇÃO FINANCEIRA - LEI Nº 7.492/86 (ART.
17)
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- DENÚNCIA QUE NÃO ATRIBUI
COMPORTAMENTO ESPECÍFICO E
INDIVIDUALIZADO AOS DIRETORES DA
INSTITUIÇÃO FINANCEIRA
- INEXISTÊNCIA, OUTROSSIM, DE DADOS
PROBATÓRIOS MÍNIMOS QUE VINCULEM OS
PACIENTES AO EVENTO DELITUOSO - INÉPCIA
DA DENÚNCIA
- PEDIDO DEFERIDO. PROCESSO PENAL
ACUSATÓRIO
- OBRIGAÇÃO DE O MINISTÉRIO PÚBLICO
FORMULAR DENÚNCIA JURIDICAMENTE APTA.
- O sistema jurídico vigente no Brasil - tendo presente a
natureza dialógica do processo penal acusatório, hoje
impregnado, em sua estrutura formal, de caráter
essencialmente democrático - impõe, ao Ministério
Público, notadamente no denominado "reato societario",
a obrigação de expor, na denúncia, de maneira
precisa, objetiva e individualizada, a participação de
cada acusado na suposta prática delituosa.
- O ordenamento positivo brasileiro - cujos fundamentos
repousam, dentre outros expressivos vetores
condicionantes da atividade de persecução estatal, no
postulado essencial do direito penal da culpa e no
princípio constitucional do "due process of law" (com
todos os consectários que dele resultam) - repudia as
imputações criminais genéricas e não tolera, porque
ineptas, as acusações que não individualizam nem
especificam, de maneira concreta, a conduta penal
atribuída ao denunciado. Precedentes. A PESSOA SOB
INVESTIGAÇÃO PENAL TEM O DIREITO DE NÃO
SER ACUSADA COM BASE EM DENÚNCIA
INEPTA.
- A denúncia deve conter a exposição do fato delituoso,
descrito em toda a sua essência e narrado com todas as
suas circunstâncias fundamentais. Essa narração, ainda
que sucinta, impõe-se ao acusador como exigência
derivada do postulado constitucional que assegura, ao réu,
o exercício, em plenitude, do direito de defesa. Denúncia
que deixa de estabelecer a necessária vinculação da
conduta individual de cada agente aos eventos
delituosos qualifica-se como denúncia inepta.
Precedentes. DELITOS CONTRA O SISTEMA
FINANCEIRO NACIONAL - PEÇA ACUSATÓRIA
QUE NÃO DESCREVE, QUANTO AOS DIRETORES
DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, QUALQUER
CONDUTA ESPECÍFICA QUE OS VINCULE,
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CONCRETAMENTE, AOS EVENTOS DELITUOSOS -
INÉPCIA DA DENÚNCIA.
- A mera invocação da condição de diretor ou de
administrador de instituição financeira, sem a
correspondente e objetiva descrição de determinado
comportamento típico que o vincule, concretamente, à
prática criminosa, não constitui fator suficiente apto a
legitimar a formulação de acusação estatal ou a
autorizar a prolação de decreto judicial condenatório.
- A circunstância objetiva de alguém meramente
exercer cargo de direção ou de administração em
instituição financeira não se revela suficiente, só por si,
para autorizar qualquer presunção de culpa
(inexistente em nosso sistema jurídico-penal) e, menos
ainda, para justificar, como efeito derivado dessa
particular qualificação formal, a correspondente
persecução criminal.
- Não existe, no ordenamento positivo brasileiro, ainda
que se trate de práticas configuradoras de
macrodelinqüência ou caracterizadoras de delinqüência
econômica, a possibilidade constitucional de incidência da
responsabilidade penal objetiva. Prevalece, sempre, em
sede criminal, como princípio dominante do sistema
normativo, o dogma da responsabilidade com culpa
("nullum crimen sine culpa"), absolutamente incompatível
com a velha concepção medieval do "versari in re
illicita", banida do domínio do direito penal da culpa.
Precedentes. AS ACUSAÇÕES PENAIS NÃO SE
PRESUMEM PROVADAS: O ÔNUS DA PROVA
INCUMBE, EXCLUSIVAMENTE, A QUEM ACUSA.
- Nenhuma acusação penal se presume provada. Não
compete, ao réu, demonstrar a sua inocência. Cabe, ao
contrário, ao Ministério Público, comprovar, de forma
inequívoca, para além de qualquer dúvida razoável, a
culpabilidade do acusado. Já não mais prevalece, em
nosso sistema de direito positivo, a regra, que, em dado
momento histórico do processo político brasileiro (Estado
Novo), criou, para o réu, com a falta de pudor que
caracteriza os regimes autoritários, a obrigação de o
acusado provar a sua própria inocência (Decreto-lei nº
88, de 20/12/37, art. 20, n. 5). Precedentes. - Para o
acusado exercer, em plenitude, a garantia do
contraditório, torna-se indispensável que o órgão da
acusação descreva, de modo preciso, os elementos
estruturais ("essentialia delicti") que compõem o tipo
penal, sob pena de se devolver, ilegitimamente, ao réu,
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o ônus (que sobre ele não incide) de provar que é
inocente.
- Em matéria de responsabilidade penal, não se registra,
no modelo constitucional brasileiro, qualquer
possibilidade de o Judiciário, por simples presunção ou
com fundamento em meras suspeitas, reconhecer a culpa
do réu. Os princípios democráticos que informam o
sistema jurídico nacional repelem qualquer ato estatal que
transgrida o dogma de que não haverá culpa penal por
presunção nem responsabilidade criminal por mera
suspeita.”
Bem diverso da linha de pensamento exposta pelo SUPREMO
TRIBUNAL a denúncia nesta Ação Penal responsabiliza objetivamente os
funcionários públicos. O MINISTRO CELSO MELO, relator do habeas corpus
paradigma, invocando os princípios basilares do Estado Democrático de Direito,
repudia a responsabilidade objetiva, determina o trancamento da ação penal. Trecho do
voto:
“A mera invocação da condição de diretor ou de
administrador de instituição financeira, sem a
correspondente e objetiva descrição de determinado
comportamento típico que o vincule, concretamente, à
prática criminosa, não constitui fator suficiente apto a
legitimar a formulação de acusação estatal ou a autorizar
a prolação de decreto judicial condenatório”
A denúncia atacada neste habeas corpus incide no equívoco de
responsabilizar penalmente os funcionários públicos apenas por serem dirigentes
dos órgãos públicos. Assim, inepta é a denúncia em relação aos supostos AUTORES
(funcionários públicos) do crime de peculato. Conseqüentemente, não havendo
funcionários públicos no pólo ativo do crime, não há como se conceber o
processamento do crime de peculato em relação a acusada.
Ora, a inépcia da inicial em relação aos funcionários públicos
também é de extrema importância a sócia da ________–, eis que é em função
daqueles e das condições elementares do crime próprio que a acusada deixa de ser
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processada por um crime comum e passa a responder por crime mais grave
(peculato doloso).
A inépcia da denúncia em relação aos funcionários públicos
condiciona o reconhecimento da inépcia também em relação aos sócios
proprietários da___________., pois estes últimos respondem pelo suposto crime de
peculato doloso apenas na condição de co-autores.
Falando de modo mais claro, ser dirigente de um órgão da
Administração Pública não é crime. Logo, a simples invocação dos cargos
ocupados pelos funcionários públicos, sem uma descrição de condutas específicas
que os vinculem individualmente e concretamente ao evento criminoso (peculato
doloso), não basta para autorizar a instauração da persecução penal. O exercício
de um cargo não autoriza a presunção de culpa e, muito menos, de dolo, como
pretende o Parquet, da prática de um crime supostamente ocorrido na sua gestão,
sob pena de, repita-se, admitir-se a responsabilidade penal objetiva.
As acusações não se presumem provadas e o ônus da prova
incumbe exclusivamente a quem acusa. Ou seja, é dever do Ministério Público
comprovar de forma inequívoca a culpabilidade dos acusados. Contudo, se não o
faz de forma suficiente, se não define com precisão a participação individual dos
denunciados, inverte de forma ilegal o ônus da prova, imputando ao réu a
demonstração de sua inocência, o que de certo não lhe compete.
Também quanto aos sócios proprietários da______________. não
há qualquer delimitação das condutas supostamente criminosas praticadas por
cada sócio.
Em nenhum momento a denúncia faz qualquer distinção
entre as atividades de cada sócio da empresa prestadora de serviço. A peça
acusatória limita a descrevê-los como sócios da __________Ltda., imputando de
forma conjunta e genérica a suposta prática do crime de peculato doloso por terem
supostamente se utilizado do contrato para desviar recursos públicos.
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Ou seja, a denúncia não descreve a conduta individualizada
de cada sócio e nem evidencia o nexo causal, a vinculação, dos supostos atos ilícitos
praticados por cada um dos sócios e o evento criminoso. O que – exatamente – cada
sócio fez que concorreu para a prática do crime de peculato doloso? Quais foram os
comportamentos típicos da ré_________________? A denúncia não possui
exposição fática suficiente que possibilite a ré conhecer os fatos típicos a ela
imputados.
Ausentes na denúncia os seguintes elementos fáticos
essenciais:
a) qual exatamente os atos praticados por cada um dos
funcionários públicos;
b) qual exatamente os atos praticados por cada um dos
sócios da______.;
c) quais as funções exercidas por cada um dos sócios
na______________________.;
d) se todos os sócios ou alguns deles firmaram o missivo
contrato;
e) se todos os sócios ou alguns deles eram os responsáveis
pela gerência do contrato,
f) se a gerência do contrato em questão estava dentre as
atribuições e/ou entre as áreas concernentes à atuação dos
denunciados na empresa prestadora de serviço;
g) qual o meio empregado ou a maneira utilizada pelos
funcionários públicos e pelos sócios
da__________________. para a prática do crime de
peculato doloso;
h) se o crime foi praticado em co-autoria com os sócios
proprietários da_______________________. como se deu
o acordo de vontade entre eles e os funcionários públicos;
Como já mencionado, o simples fato de ser sócio de uma
empresa, por si só, não possibilita a presunção de culpa e, muito menos de dolo. O
ônus de provar é da acusação. Jurisprudência:
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“Discriminar a participação de cada co-réu é de todo
necessário (...), porque, se em certos casos, a simples
associação pode constituir um delito per se, na maioria
deles a natureza da participação de cada um, na
produção do evento criminoso, é que determina a sua
responsabilidade, porque alguém pode pertencer ao
mesmo grupo, sem concorrer para o delito,
praticando, por exemplo, atos penalmente
irrelevantes, ou nenhum. Aliás, a necessidade de se
definir a participação de cada um resulta da própria
Constituição, porque a responsabilidade criminal é
pessoal, não transcende da pessoa do deliquente (...). É
preciso, portanto, que se comprove que alguém
concorreu com ato seu para o crime” (RTJ 35/517, 534,
Rel. Min. Victor Nunes Leal).
Em tese, ainda que se admita o locupletamento ilícito de dinheiro
público por parte da empresa prestadora de serviço, necessário descrever a conduta de
cada sócio, a participação exata de cada sócio, que concorreu para a suposta
prática do crime de peculato doloso.
A peça acusatória da maneira como está proposta revela
hipótese de responsabilidade penal objetiva dos sócios da empresa (sem descrição
da suposta conduta praticada, sem individualização da participação de cada sócio,
sem dolo e sem culpa), o que é inadmissível em nosso ordenamento jurídico.
O Ministério Público Federal imputa a prática do crime de
peculato à ré _____________ apenas por ter sido sócia da_____________., sem o
cuidado de individualizar os supostos comportamentos típicos, o que é
indiscutivelmente prejuízo ao exercício do contraditório e da ampla defesa.
Ante o exposto, comprovada a inépcia da exordial acusatória
por não individualizar o comportamento típico supostamente praticado por cada
um dos sócios. Tal defeito grave viola os princípios constitucionais do
contraditório, da ampla defesa, do devido processo legal e da dignidade da pessoa
humana; e autoriza o reconhecimento da nulidade da presente ação penal, como
será melhor demonstrado no tópico a seguir.
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III. C) CONCLUSÃO. NULIDADE DA AÇÃO PENAL. A
INEXISTÊNCIA DE EXPOSIÇÃO DO FATO CRIMINOSO COM
TODAS AS SUAS CIRCUNSTÂNCIAS NA PEÇA ACUSATÓRIA
OCASIONA A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA E A VIOLAÇÃO
DOS PRINCÍPIOS DO DEVIDO PROCESSO LEGAL, DA AMPLA
DEFESA, DO CONTRADITÓRIO E DA DIGNIDADE DA PESSOA
HUMANA.
Evidente o prejuízo para a defesa que não consegue situar a
imputação existente na denúncia no tempo e no espaço. A ex-sócia desconhece os
fatos criminosos imputados a ela, bem como os fatos criminosos imputados aos
funcionários públicos.
Pelo acima exposto, resta patente o defeito insanável que padece a
denúncia, prejudicando a defesa da denunciada e violando os princípios do devido
processo legal (art. 5º, LIV, da CF), da ampla defesa, do contraditório (art. 5º, LV, da
CF) e da dignidade da pessoa humana (art. 1º, III, da CF).
Ofende o status dignitatis da imputada o prosseguimento
defeituoso da ação penal destituída de respaldo mínimo fático que autorize a instauração
da persecutio criminis in iudicio.
A exordial acusatória apresenta uma narrativa genérica e
inconcreta dos fatos, sequer descrevendo, ao menos em tese, as condutas praticadas por
cada um dos denunciados (funcionários públicos e sócios da_________.), que
configurem o crime de peculato doloso. Na verdade, padece a denúncia de defeito
grave, merecendo a ação penal ser rejeitada. O constrangimento ilegal se mostra
patente, eis que está sendo imposta ação penal gravíssima à acusada, sem que
possa exercer seu direito mínimo de defesa, tendo em vista que a denúncia é inepta,
em visível violação ao art. 41 do CPP.
A jurisprudência pátria majoritária entende que a inépcia da
inicial conduz a nulidade da ação penal, senão veja-se:
PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. DECRETO-LEI
201/61, ART. 1.º, I. CONCURSO DE AGENTES.
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DENÚNCIA. INÉPCIA FORMAL. NECESSIDADE DE
INDIVIDUALIZAR MINIMAMENTE A CONDUTA
PRATICADA PELOS ACUSADOS.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL.
1. São uníssonos os precedentes do Superior Tribunal de
Justiça no sentido de que, embora não se exija a descrição
pormenorizada da conduta de cada denunciado nos casos
de crimes societários, é imprescindível que o órgão
acusatório estabeleça a mínima relação entre o
denunciado e o delito que lhe é imputado.
2. É formalmente inepta a denúncia que não demonstra,
sequer genericamente, a responsabilidade do denunciado
perante a empresa ou o nexo de causalidade entre a
conduta dele e o crime supostamente cometido, tampouco
aponta quais foram os meios empregados ou de que
maneira foi praticado o delito.
3. Ordem concedida para anular, com relação ao
paciente, a ação penal a partir da denúncia, inclusive, por
inépcia formal, sem prejuízo de que outra seja elaborada
com o cumprimento dos ditames legais. (STJ, Processo HC
93598/MT, HABEAS CORPUS 2007/0256431-1; Relator:
Ministra Maria Thereza de Assis Moura; Órgão Julgador: T6
- SEXTA TURMA; Data do Julgamento: 22/09/2009; Data
da Publicação/Fonte: DJe 13/10/2009).
No julgado (ementa) acima transcrito, que se aplica inteiramente
ao presente caso por total semelhança, a ação penal foi anulada em relação ao
paciente, por ausência de individuação da conduta do réu que configurasse o crime
imputado. O Superior Tribunal de Justiça entendeu que mesmo nos crimes
societários é imprescindível que o órgão acusatório estabeleça a mínima relação
entre o denunciado e o delito que lhe é imputado, sob pena de nulidade da ação
penal.
Assim como na presente ação penal, a exordial acusatória não
demonstrou a responsabilidade do denunciado perante a empresa ou o nexo de
causalidade entre a conduta dele e o crime supostamente cometido, tampouco
apontou quais foram os meios empregados ou de que maneira foi praticado o
delito; ocasionando o reconhecimento pelo C. Superior Tribunal de Justiça da
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inépcia da inicial e, por conseguinte, a concessão da ordem para anular a ação
penal a partir da denúncia.
Percebe-se que na presente ação penal, o Ministério Público
Federal, assim como no julgado acima, não demonstrou a responsabilidade da Sra.
________________perante a empresa ou o nexo de causalidade entre a conduta
dela e o crime de peculato doloso, tampouco apontou quais foram os meios
empregados ou de que maneira ela supostamente praticou o delito. Diante disso,
data vênia, a inépcia da exordial acusatória deve ser reconhecida e, por
conseguinte, deve ser declarada a nulidade da ação penal em relação à ré,
Sra.________________, a partir da denúncia.
Sobre ausência de individualização da conduta do acusado,
colaciona-se mais um julgado do C. Superior Tribunal de Justiça que determinou a
nulidade da ação penal:
CRIMINAL. HC. CRIMES DE RESPONSABILIDADE.
PREFEITO. INÉPCIA DA DENÚNCIA.
ENUMERAÇÃO GENÉRICA DOS
ACONTECIMENTOS CRIMINOSOS. INEXISTÊNCIA
DE INDIVIDUALIZAÇÃO DA CONDUTA.
NECESSIDADE DE DESCRIÇÃO MÍNIMA DA
RELAÇÃO DO PACIENTE COM OS FATOS
DELITUOSOS. OFENSA AO PRINCÍPIO DA AMPLA
DEFESA. ORDEM CONCEDIDA.
I. Hipótese na qual o paciente, ex-Prefeito do Município de
Gurinhém/PB, processado pela suposta prática de crimes de
responsabilidade, alega, em especial, a inépcia da exordial, a
qual teria atribuído ao réu meras irregularidades, que não
configurariam tipos penais, além de ter descrito
genericamente as condutas a ele imputadas, prejudicando
a ampla defesa.
II. Evidenciado que nada foi esclarecido na denúncia,
estando os fatos genericamente enumerados, de modo a
criar óbices à ciência do acusado acerca dos atos
concretos que ocasionaram a imputação a ele dos crimes
de responsabilidade, resta configurado o constrangimento
ilegal.
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III. Não se constata o atendimento dos requisitos do art.
41 do CPP, pois os fatos delituosos não se encontram
devidamente expostos, com suas circunstâncias, de modo
a permitir o exercício da ampla defesa.
IV. A despeito de não se exigir a descrição pormenorizada
da conduta do agente, isso não significa que o órgão
acusatório possa deixar de estabelecer qualquer vínculo
entre o denunciado e a empreitada criminosa a ele
atribuída.
V. O simples fato de o réu ser ex-Prefeito do Município
não autoriza a instauração de processo criminal por
crimes praticados durante seu mandato, se não restar
comprovado, ainda que com elementos a serem
aprofundados no decorrer da ação penal, a mínima
relação de causa e efeito entre as imputações e a sua
condição de gestor da municipalidade, sob pena de se
reconhecer a responsabilidade penal objetiva.
VI. A inexistência absoluta de elementos hábeis a
descrever a relação entre os fatos delituosos e a autoria
ofende o princípio constitucional da ampla defesa,
tornando inepta a denúncia. Precedentes.
VII. Deve ser anulada a ação penal instaurada contra o
paciente, por ser inepta a denúncia.
VIII. Ordem concedida, nos termos do voto do Relator.
(STJ, Processo HC 53466/PB, HABEAS CORPUS
2006/0019795-0; Relator: Ministro GILSON DIPP (1111);
Órgão Julgador: T5 – Quinta Turma; Data do Julgamento:
25/04/2006; Data da Publicação/Fonte: DJ 22/05/2006, pág.
234).
Do julgado (ementa) acima transcrito, constata-se que o órgão
acusador propôs ação penal contra ex-Prefeito pela suposta prática de crimes durante o
seu mandato, sem descrever de forma objetiva e concreta as condutas praticadas pelo
paciente e que configurariam o ilícito imputado; ou seja, sem indicar relação de causa e
efeito entre as imputações e a sua condição de gestor da municipalidade.
Falando de modo mais claro, o ilustre representante do Ministério
Público invocou a condição de gestor da municipalidade – sem a correspondente e
objetiva descrição de determinado comportamento típico que o vincule,
concretamente, à prática criminosa – como se tal fato, por si só, fosse apto a autorizar
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presunção de culpa e/ou legitimar a persecução penal. Contudo, o C. Superior
Tribunal de Justiça repudiou tal intento, anulou a ação penal, por reconhecer a
inépcia da exordial acusatória.
Permissa vênia, o julgado acima se aplica inteiramente a presente
ação penal, diante da semelhança entre os casos. Na ação penal em comento, o ilustre
representante do Ministério Público Federal imputa o crime de peculato doloso aos
funcionários públicos apenas invocando a condição de serem dirigentes do 18º
Distrito Rodoviário Federal e do DER/PI. Ou seja, não descreve de maneira
determinada, objetiva, concreta e individualizada, qual o comportamento típico
praticado pelos funcionários públicos que os vincule à prática do crime de peculato
doloso.
Também em relação a ré, Sra._________, não há qualquer
descrição de comportamento típico que a vincule ao crime de peculato doloso,
apenas a invocação da sua condição de ex-sócia
da____________________________. Ou seja, não há exposição objetiva, precisa e
individualizada da suposta participação da ré na suposta prática do crime de
peculato doloso.
Assim, conclui-se, que a exordial acusatória é inepta tanto em
relação aos funcionários públicos como em relação a ré, ______________, eis que
ausente exposição precisa, objetiva e individualizada da participação de cada acusado
(funcionários públicos e sócios da__________________.) na suposta prática do crime
de peculato doloso.
A inépcia da denúncia ocasiona a sua nulidade, diante da
impossibilidade de emenda da exordial acusatória para acrescer os fatos
criminosos com todas as suas circunstâncias. A denúncia padece de vício insanável,
viola o art. 41 do CPP, impossibilita a ampla defesa dos ora acusados e inverte o
ônus probatório.
Página 44 de 51
Patente, portanto, a falta do preenchimento dos requisitos
previstos no artigo 41 do CP, eis que a denúncia imputa fatos criminosos de maneira
genérica e não circunstanciada, impossibilitando a ora ré de exercer com amplitude sua
defesa sabendo do que é acusada. Tal vício insanável que acomete a peça acusatória
impõe a sua nulidade, conforme preceitua o artigo 564, incisos III, “a”, do Código
de Processo Penal:
“Art. 564. A Nulidade ocorrerá nos seguintes casos:
III – por falta das fórmulas ou dos termos seguintes:
a) A denúncia ou a queixa e a representação e, nos
processos de contravenções penais, a portaria ou o auto de
prisão em flagrante;
O respeitado doutrinador Guilherme de Souza Nucci, in Código
de Processo Penal Comentado, 9ª edição revista, atualizada e ampliada, pág. 913, ao
tecer comentários sobre as nulidades enumeradas no art. 564, I, “a”, do CPP, ensina:
“13. Denúncia ou queixa: a falta de denúncia ou de queixa
impossibilita o início da ação penal, razão pela qual este
inciso, na realidade, refere-se a ausência das fórmulas
legais previstas para essas peças processuais. Uma
denúncia ou queixa formulada sem os requisitos
indispensáveis (art. 41, CPP),certamente é nula. Entretanto,
a nulidade pode ser absoluta – quando a peça é insuficiente
para garantir a defesa do réu -, devendo ser refeita, ou
relativa – quando a peça proporciona a defesa, embora
precise de ajustes –, podendo ser convalidada.”
Assim, constata-se que a nulidade da exordial acusatória é
absoluta, pois é insuficiente para garantir a defesa da ora acusada. A nulidade
absoluta – inépcia da denúncia – não se convalida com o tempo, não se sujeita à
preclusão e pode ser reconhecida de ofício, já que em favor da acusada.
Ante o exposto, requer, desde logo – com fulcro no art. 41 do
CPP, art. 564, inciso III, “a”, do CPP, art. 5º, incisos LIV, LV, da CF, e art. 1º, III,
da CF –, que a presente denúncia seja rejeitada por ser inepta.
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IV. PRELIMINARMENTE – DA PRESCRIÇÃO NO CURSO DESTA
AÇÃO PENAL. INTELIGÊNCIA DO ART. 115 DO CP.
Como amplamente mencionado no tópico anterior, a exordial é
inepta, pois, dentre outros aspectos, não indica a data da suposta prática do crime de
peculato doloso.
No entanto, considerando o princípio da eventualidade, caso
Vossa Excelência decida por superar a preliminar de inépcia da inicial acusatória, o que
não se espera que aconteça e se admite apenas para melhor argumentar, passa-se a
analisar a prescrição do suposto crime de peculato no curso desta ação, tendo em vista a
idade avançada da ré, Sra____________.
Se é que esta prescrição não efetivamente já ocorreu, eis que o
Ministério Público não situa o fato no tempo.
Como já alegado alhures, a peça acusatória afirma que ocorreram
irregularidades quando do período contratual de fevereiro de 1991 a 1996, porém,
dentro desse lapso temporal de 05 (cinco) anos, o Parquet não indica qual a data da
prática do suposto crime de peculato doloso, previsto no art. 312 do CP e apenado de 02
(dois) a 12 (doze) anos de reclusão e multa.
Ocorre que, na forma preconizada pelo art. 109, II, do CP, o
crime de peculato doloso, ora imputado a ré, prescreve em 16 (dezesseis) anos:
Art. 109 - A prescrição, antes de transitar em julgado a
sentença final, salvo o disposto nos §§ 1º e 2º do Art. 110
deste Código, regula-se pelo máximo da pena privativa de
liberdade cominada ao crime, verificando-se:
II - em 16 (dezesseis) anos, se o máximo da pena é
superior a 8 (oito) anos e não excede a 12 (doze);
Assim, se considerarmos que a prática do ilícito supostamente
ocorreu na data da celebração do contrato, em 1991, o crime de peculato doloso já
estaria prescrito, eis que transcorrido mais de 16 (dezesseis) anos.
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Além disso, o art. 115 do CP reduz de metade os prazos de
prescrição quando o réu na data da sentença for maior de 70 (setenta) anos:
“Art. 115 - São reduzidos de metade os prazos de
prescrição quando o criminoso era, ao tempo do crime,
menor de 21 (vinte e um) anos, ou, na data da sentença,
maior de 70 (setenta) anos.”
Sob a ótica do dispositivo acima transcrito se, no caso de uma
eventual condenação, na data da sentença se a ré contar com mais de 70 (setenta) anos
de idade, a prescrição do ilícito ora imputado será reduzida para 08 (oito) anos. Ou seja,
no caso, mesmo que se considere o último ano de execução do contrato – 1996 – o
crime já estaria prescrito, pois transcorrido mais de 08 (oito) anos.
Ante o exposto – em homenagem ao princípio da ampla defesa,
ao princípio da eventualidade e, considerando que a ré, ___________________em
11/06/2010, terá 69 (sessenta e nove) anos de idade, conforme comprova documento de
fl. 371 dos autos –, caso a ré até a data de uma eventual sentença condenatória possuir
mais de 70 (setenta) anos de idade, requer, desde logo, a Vossa Excelência que, em
obediência aos termos do art. 115 do CP, reconheça, nessa oportunidade ou no curso
desta ação, a prescrição e extinção da punibilidade (art. 107, IV, do CP) em relação a
Sra. __________________
V. DO MÉRITO.
V. A) DA INEXISTÊNCIA DE PRÁTICA DE ATO ILÍCITO. DA
AUSÊNCIA DO ELEMENTO SUBJETIVO DO CRIME – DOLO.
TIPO PENAL: ART. 312 DO CP.
O crime imputado a denunciada, como já exaustivamente
mencionado, é o peculato doloso, tipo penal descrito no art. 312 do CP:
“Art. 312. Apropriar-se o funcionário público de dinheiro,
valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de
que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em
proveito próprio ou alheio:
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa.
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§ 1º Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público,
embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o
subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito
próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe
proporciona a qualidade de funcionário.”
Segundo o doutrinador Celso Delmanto e Outros, na obra Código
Penal Comentado, 6ª edição atualizada e ampliada, 2002, pág. 618, o tipo objetivo e o
tipo subjetivo do crime de peculato-desvio são:
“Tipo objetivo:” (...) “Na modalidade de peculato-desvio
(2ª parte do caput), o núcleo é desviar. Pune-se o
funcionário que dá ao objeto material destinação
diferente daquela para a qual o objeto lhe fora confiado.
O desvio deve ser, porém, em proveito próprio ou alheio.
(...)” (Grifos nossos)
“Tipo subjetivo: Na modalidade de peculato-apropriação, é
o dolo, consistente na vontade livre e consciente de apropriar-
se. Na modalidade de peculato-desvio, é também o dolo,
ou seja, a vontade livre e consciente de desviar. O
elemento subjetivo do tipo vem referido pelo especial fim
de agir (“em proveito próprio ou alheio”), expressamente
mencionado na segunda modalidade e implicitamente
contido na primeira modalidade. Na doutrina tradicional,
requer-se o “dolo genérico” para a primeira e o “dolo
específico” para a segunda ou para ambas.”
No presente caso, primeiramente, cabe ressaltar, conforme já
demonstrado na exposição fática (item II desta peça), que os sócios da
Construtora______________. não praticaram qualquer ato que possa ser
configurado como ilícito penal (nem peculato doloso e nem outro crime).
Para a configuração do crime de peculato doloso em relação aos
sócios da empresa prestadora de serviços exige-se a vontade livre e consciente de
desviar valores em proveito da______________. Ou seja, necessário a comprovação do
dolo específico, que seria a vontade de praticar o desvio de recursos públicos com a
especial finalidade de ser em proveito da_____________.
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Porém, nessa ótica, nem em tese, poderia haver a imputação da
suposta prática do crime de peculato doloso a ré –
__________________________________eis que, como já exaustivamente mencionado
o suposto pagamento a maior (suposto “desvio”) ocorreu por fato imprevisível e
estranho a vontade das partes.
Assim, por óbvio, se o que ocasionou o pagamento a maior
(“suposto desvio de recursos públicos”) foi a mudança da moeda – fato imprevisível e
estranho a vontade das partes – evidente a inexistência de dolo, que consiste na
vontade consciente de desviar recursos públicos.
No caso, a ré sequer tinha condições de perceber o suposto
desequilíbrio econômico do contrato, primeiramente, por não ter a administração
e/ou gerência do missivo pacto. Ademais, de acordo com o parecer do renomado
Engenheiro Sandro Salvador Sandroni, que analisou 08 (oito) contratos de obras
de restauração de rodovias executados na região – dentre eles 06 (seis) firmados
com o DER-PI –, os valores ofertados pela ________e pactuados no contrato em
comento estão enquadrados no nível de preços de restauração de obras rodoviárias
contemporâneas, executadas na região dos Estados do Piauí e Ceará.
Assim, como poderia perceber a suposta irregularidade?
Não houve ardil e nem dolo. A Tabela do DNER (SICRO) que
o Tribunal de Contas da União pretende aplicar ao contrato em questão não
constitui diploma legal e, portanto, a ré não tinha obrigação de conhecê-la e muito
menos saber que ela deveria ser aplicada ao contrato em questão. Não houve
qualquer conduta ilegal e nem amoral praticada pela ré.
Por fim, cumpre ressaltar, que conforme Relatório do Delegado
de Polícia Federal, juntado aos autos às fls. 456/460 (Volume III), não há indícios
suficientes da prática do crime investigado.
IV. B) CIRCUNSTÂNCIA ATENUANTE. ART. 65, I, DO CP.
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Considerando o princípio da eventualidade, no caso de uma
eventual condenação, o que não se espera e se admite apenas por zelo a defesa, passa-se
a analisar circunstância atenuante prevista no art. 65, I, do CP:
Ou seja, o fato do réu possuir mais de 70 (setenta) anos de idade
na data da sentença é circunstância atenuante.
Assim – em homenagem ao princípio da ampla defesa, ao
princípio da eventualidade e considerando que a ré, Sra._________, em 11/06/2010,
terá 69 (sessenta e nove) anos de idade, conforme comprova documento de fl. 371 dos
autos –, caso a ré na data de uma eventual sentença condenatória possuir mais de 70
(setenta) anos de idade, requer, desde logo, a Vossa Excelência que, em obediência ao
art. 65, I, do CP, reconheça a circunstância atenuante.
V. DO PEDIDO
Diante de todo o exposto, requer a Vossa Excelência:
a) PRELIMINARMENTE, com fulcro no art. 41 do CP e
demais argumentos acima minudenciados, que reconheça a
inépcia da exordial acusatória pelos seguintes motivos:
a.1) A denúncia não delimita o suposto fato criminoso no
tempo, ou seja, não relata a data (quando?) o crime de
peculato doloso foi supostamente praticado pelos
denunciados.
a.2) A denúncia não individualiza o comportamento típico
supostamente praticado por cada um dos denunciados
(funcionários públicos e sócios e ex-sócios da Construtora
a.3) Ao não descrever o fato criminoso no tempo
(quando?) e ao não individualizar as condutas dos
acusados, a exordial apresenta defeito grave e insanável,
que autoriza o reconhecimento da nulidade da ação penal
(art. 564, III, “a”, CPP; por violação frontal ao art. 41 do
CP e aos princípios constitucionais do contraditório,
ampla defesa, devido processo legal e da dignidade da
pessoa humana;
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b) PRELIMINARMENTE, em homenagem ao princípio da
ampla defesa e ao princípio da eventualidade, caso a ré na
data de uma eventual sentença condenatória possuir mais de
70 (setenta) anos de idade, requer a Vossa Excelência que,
em obediência aos termos do art. 115 do CP, reconheça a
prescrição e extinção da punibilidade (art. 107, IV, do CP)
em relação a ré, Sra___________.
c) NO MÉRITO, caso Vossa Excelência entenda por superar
a preliminar suscitada, o que não se espera que aconteça e se
admite apenas para melhor argumentar, requer que julgue a
presente ação improcedente, tendo em vista todos os
argumentos lançados na presente resposta à acusação.
d) Em homenagem ao princípio da ampla defesa e ao
princípio da eventualidade, caso a ré na data de uma eventual
sentença condenatória possuir mais de 70 (setenta) anos de
idade, requer a Vossa Excelência que, em obediência ao art.
65, I, do CP, reconheça a circunstância atenuante.
e) Protesta pela apresentação das seguintes PROVAS:
e.1) A oitiva do Engenheiro Ph.D Sandro Salvador Sandroni,
residente e domiciliado na Praça Pio X, 78, 11º andar,
Centro, Rio de Janeiro-RJ.
e.2) Que o contador judicial proceda a atualização dos preços
contratados pela________________. e a Administração
Pública, observando a conversão da moeda, a atualização
monetária e demais determinações legais.
Nestes termos, espera deferimento.
Teresina, 25 de maio de 2010.
Audrey Martins Magalhães
Advogada OAB/PI nº 1.829
DOCUMENTOS ANEXOS:
1- PROCURAÇÃO