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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO ARAGUAIA ___________________________________________________________________________ EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA COMARCA DE SÃO MIGUEL DO ARAGUAIA-GO “A corrupção dos governantes quase sempre começa com a corrupção dos seus princípios.” MONTESQUIEU O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, por intermédio do Órgão de Execução em exercício nas Promotorias de Justiça de São Miguel do Araguaia, com fulcro nos artigos 37, caput e § 4º, 127 e 129, inciso III, da Constituição da República, na Lei n.º 8.429/92, no art. 25, inciso IV, alíneas “a” e “b”, da Lei n.º 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público), na Lei n.º 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública) e no Código de Processo Civil, vem, respeitosamente, diante de Vossa Excelência, propor a presente AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA, cumulada com preceito cominatório de obrigação de não fazer, mediante antecipação de tutela, em desfavor de: ADEMIR CARDOSO DOS SANTOS, prefeito do Município de São Miguel do Araguaia/GO, brasileiro, casado, portador do CPF 136.760.161-49, podendo ser encontrado na Av. José Pereira do Nascimento, s/n° ou ainda na Av. Maranhão, 407, Centro, nesta cidade. I – DOS FATOS O Ministério Público do Estado de Goiás, com fincas no artigo 129, III, da Constituição da República, e no artigo 25, inciso IV, alínea “b”, da Lei n.° 8.625/93, instaurou, no âmbito da Promotoria de Justiça de São Miguel do Araguaia, o Inquérito Civil Público n.° 03/2009, com o escopo de investigar a redução do funcionamento das atividades do Poder Executivo do Município de São Miguel do Araguaia, em flagrante ilegalidade e com manifesto prejuízo para os administrados. ____________________________________________________________________________________________________ Av. Maranhão, esq. c/ Rua 10 – Setor Alto Alegre – Edifício do Fórum Fone: 0xx62 3364-1020 - E-mail: [email protected] São Miguel do Araguaia- Go. - 76.590-000 Lucas Danilo Vaz Costa Júnior Promotor de Justiça Substituto

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PROMOTORIA DE JUSTIÇA DE SÃO MIGUEL DO ARAGUAIA

___________________________________________________________________________EXCELENTÍSSIMO SENHOR JUIZ DE DIREITO DA COMARCA DE SÃO MIGUEL DO ARAGUAIA-GO

“A corrupção dos governantes quase sempre começa com a corrupção dos seus princípios.” MONTESQUIEU

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS, por intermédio do Órgão de Execução em exercício nas Promotorias de Justiça de São Miguel do Araguaia, com fulcro nos artigos 37, caput e § 4º, 127 e 129, inciso III, da Constituição da República, na Lei n.º 8.429/92, no art. 25, inciso IV, alíneas “a” e “b”, da Lei n.º 8.625/93 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público), na Lei n.º 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública) e no Código de Processo Civil, vem, respeitosamente, diante de Vossa Excelência, propor a presente

AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA, cumulada com preceito cominatório de obrigação de não fazer, mediante antecipação de tutela, em desfavor de:

ADEMIR CARDOSO DOS SANTOS, prefeito do Município de São Miguel do Araguaia/GO, brasileiro, casado, portador do CPF 136.760.161-49, podendo ser encontrado na Av. José Pereira do Nascimento, s/n° ou ainda na Av. Maranhão, 407, Centro, nesta cidade.

I – DOS FATOS

O Ministério Público do Estado de Goiás, com fincas no artigo 129, III, da Constituição da República, e no artigo 25, inciso IV, alínea “b”, da Lei n.° 8.625/93, instaurou, no âmbito da Promotoria de Justiça de São Miguel do Araguaia, o Inquérito Civil Público n.° 03/2009, com o escopo de investigar a redução do funcionamento das atividades do Poder Executivo do Município de São Miguel do Araguaia, em flagrante ilegalidade e com manifesto prejuízo para os administrados.____________________________________________________________________________________________________

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Com efeito, no início do mês de agosto de 2008, chegou ao conhecimento do Parquet que o então Prefeito de São Miguel do Araguaia, ADEMIR CARDOSO DOS SANTOS, por meio do Decreto 138/2008, de 04 de agosto de 2008, havia determinado o recesso das atividades vespertinas dos órgãos administrativos do Poder Executivo, no período compreendido entre 04 de julho a 31 de dezembro de 2008, causando graves prejuízos para a sociedade.

Pasme, Excelência, o referido decreto foi editado e publicado em 04.08.08. Todavia, consoante disposto no art. 1º, §2º, do malfadado ato normativo, a redução do expediente teve início no mês anterior, em 04.07.08. E o que é pior, no art. 3º, estabeleceu-se que o supracitado decreto entraria em vigor na data da publicação, ou seja, em 04.08.08.

Registrado esse disparate, certo é que, na tentativa de demover o alcaide de sua conduta ímproba, em pleno período eleitoral, o Ministério Público do Estado de Goiás e o Ministério Público Eleitoral expediram, em conjunto, a Recomendação n.º 08/2008 (doc. incluso), datada de 12.08.08, na qual se recomendou ao Prefeito ADEMIR CARDOSO DOS SANTOS que adotasse as providências necessárias para assegurar o adequado funcionamento dos órgãos públicos do Executivo Municipal, com estrita observância do horário integral de expediente.

Naquela oportunidade, tendo em relevo as eleições de 2008 que se avizinhavam, consignou-se que havia indícios de que a suspensão das atividades no período vespertino tinha a finalidade de possibilitar o engajamento político dos servidores públicos municipais no pleito, situação frontalmente agressiva aos postulados democráticos e republicanos.

Conforme também enfatizou a recomendação ministerial, a interrupção da prestação dos serviços públicos prestados pelos órgãos do Poder Executivo implica grave transgressão aos postulados da eficiência e da continuidade do serviço público, porquanto o funcionamento apenas no período matutino é absolutamente insuficiente para atender à demanda da população, gerando graves prejuízos para a cidadania.

Por meio de ofício, datado de 13.08.08, o alcaide, ora réu, comunicou ao Ministério Público o acolhimento integral da Recomendação 08/2008, ocasião em que apresentou o Decreto 141/08, datado de 13.08.08 (doc. incluso), que revogava o decreto anterior e retomava o expediente normal das atividades do Poder Executivo, para funcionamento das 08 às 11h e das 13 às 17h.

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___________________________________________________________________________Ocorre que, ultimado o pleito eleitoral e sagrando-se eleito, o réu, que

já não mais temia o ajuizamento de qualquer ação de investigação judicial eleitoral ou de impugnação ao registro de candidatura que lhe pudesse comprometer, editou, em 04.11.08, o Decreto n. 172/08 (doc. incluso), com idêntico teor do decreto revogado, determinando a redução do expediente nos órgãos do Poder Executivo no período compreendido entre 05.11.08 a 31.12.08.

Veja-se o despropósito. Passado o pleito eleitoral, mas ainda sob o fulgor da vitória nas urnas, o réu “repristinou” o primeiro decreto, aquele que havia revogado em acolhimento à recomendação ministerial, restabelecendo a redução de expediente até o final do ano de 2008, como se quisesse dar um prêmio para os servidores municipais como recompensa pelo êxito eleitoral.

Diante disso, mais uma vez, o Ministério Público, sob o viés dialógico que norteia suas ações, expediu a Recomendação n. 13/08 para que o alcaide revogasse incontinenti o Decreto n. 172/08, oportunidade em que se anotou, dentre outros considerandos, que:

“8. Considerando que o motivo declinado no Decreto nº 172 de 04 de novembro de 2008, do Poder executivo Municipal, relativo à contenção de gastos, não se justifica, porquanto a redução temporária da jornada de trabalho não acarretará a diminuição vencimental dos servidores, em atenção ao princípio constitucional da irredutibilidade de vencimentos; 9. Considerando, ainda, que a matéria alusiva à jornada de trabalho dos servidores públicos encontra-se inserida no âmbito do regime jurídico- administrativo, cuja disciplina incumbe à lei formal, não havendo campo normativo para alteração da referida matéria via decreto ou qualquer outro ato administrativo;10. Considerando que, no âmbito municipal, a jornada dos servidores públicos é de 8 (oito) horas, conforme estabelece o art. 33 da Lei Municipal n. 151/94, não havendo espaço para alteração via decreto executivo;11. Considerando que a redução do horário de funcionamento administrativo pode caracterizar ato de improbidade, previsto no art. 10, VII, e art. 11 da Lei 8.429/92, consistente em benefício administrativo concedido sem observância das disposições legais e constitucionais, além de ofensivo aos princípios da moralidade e eficiência que devem nortear a Administração Pública.”

Nada obstante a clareza solar da recomendação ministerial, o Prefeito ADEMIR CARDOSO DOS SANTOS, conquanto cientificado da ilegalidade do recesso, manteve o funcionamento da Prefeitura apenas no período matutino. Em resposta, encaminhou ao Ministério Público o ofício n.º 177/2008, argumentando, curiosamente, que “acatar a recomendação em comento é o mesmo que homicidiar (sic) qualificadamente o Estado Democrático de Direito”.

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Então, cabe indagar: se as Recomendações 08/08 e 13/08 tinham praticamente o mesmo conteúdo, por qual motivo o réu teria “assassinado o Estado Democrático de Direito” quando acolheu a recomendação na primeira oportunidade e revogou, por meio do Decreto 141/08, a estapafúrdia redução de expediente? Teria sido o temor de alguma impugnação judicial no período eleitoral?

Por óbvio, a redução na jornada de trabalho dos servidores públicos, por meio de decreto, gera graves transtornos para a população, que não dispõe dos serviços administrativos dos órgãos municipais pelo período assinalado na lei. Ademais, além do malferimento aos princípios da eficiência, moralidade e da continuidade do serviço público, a redução na jornada de trabalho gera danos ao erário, na dimensão material, pois os servidores, em atenção ao princípio da irredutibilidade vencimental, receberam a remuneração na íntegra, apesar de não terem trabalhado a carga horária completa, como previsto em lei municipal.

Além disso, em matéria de domínio normativo, a jornada dos servidores insere-se no âmbito reservado à lei formal, a saber, Lei Municipal 151/94 (art. 33 e seguintes), não se admitindo alteração por mero decreto executivo, porquanto este, dada a menor densidade normativa, vincula-se àquela.

Entrementes, os ataques mortíferos do réu à legalidade e à moralidade públicas não cessaram por aí. Em julho de 2009, o alcaide, recalcitrante e contumaz na prática de atos ímprobos, editou o Decreto n. 253/09, datado de 03.07.09, por meio do qual reduziu novamente as atividades administrativas do Poder Executivo em meio período, das 7 às 11 horas, durante todo o mês de julho de 2009. Desta feita, veja o desplante, o referido ato normativo não se esteou na Lei de Responsabilidade Fiscal, mas foi motivado da seguinte forma:

Considerando a Temporada de Férias Luiz Alves/2009 e o envolvimento da administração municipal naquele povoado

Portanto, registrado e confessado o despautério às escâncaras, no incompleto biênio 2008/2009, o réu ADEMIR CARDOSO DOS SANTOS, sem autorização legal e com clara ofensa aos princípios basilares do regime jurídico-administrativo, ceifou a população de São Miguel do Araguaia de 4 meses e meio de funcionamento total e pleno da máquina pública, a saber, em julho, agosto (13 dias), novembro e dezembro de 2008, bem como julho de 2009.

Por 4 meses e meio, ao longo do mandato do réu, os órgãos do Poder Executivo funcionaram pela metade, muito embora todos os servidores tenham

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___________________________________________________________________________recebido seus vencimentos na íntegra e os cidadãos tenham sido tributados sem exceção ou redução.

Os graves reflexos desta postura ímproba foram constatados pelas declarações prestadas na Promotoria de Justiça e também pelo ofício 287/08, datado de 02.12.08 (doc. incluso), da lavra do Presidente do Conselho Tutelar Local, Leandro Oliveira Santos, na qual este consignou os prejuízos ao regular funcionamento do Órgão de Defesa da Infância e Juventude, na medida em que:

(...) no período vespertino, o telefone é totalmente cortado, pois as ligações são feitas através de pedido na Prefeitura a qual está fechada. Diante destes fatos relatados, aguardando o mais breve possível vosso parecer para melhorarmos o nosso trabalho.

Além disso, o servidor ministerial Jorgam de Oliveira Soares certificou que no dia 08 de julho de 2009, por volta das 14h30min, o Paço Municipal e o CREAS (Centro de Referência e Assistência Social) estavam fechados.

No dia 21.07.09, a secretária auxiliar do Ministério Público, Danielle Sousa Tavares, compareceu no Paço Municipal, por volta das 16h30min, para protocolizar um ofício e verificou que não havia ninguém no protocolo, que estava funcionando apenas no período matutino. Além disso, verificou que havia apenas poucos servidores no local.

MARIA EVA NASCIMENTO MOREIRA, ao ser ouvida durante as investigações ministeriais, declarou que

“em meados do mês de julho de 2009, uma dessas pessoas, que trabalha na zona rural deste município, cujo nome a declarante não se recorda, a perguntou no encontro casual se a declarante sabia o motivo de a secretaria de saúde estar fechada; que a referida pessoa necessitava de um atendimento naquela secretaria; que tal fato se deu no período vespertino; que a declarante até então não sabia que os órgãos municipais estavam fechados à tarde, tendo sido informada de que o prefeito havia baixado um decreto reduzindo o expediente dos órgãos públicos municipais, ligados ao Executivo; que estranhando a legalidade dessa medida, a declarante então telefonou ao Ministério Público, ocasião em que soube que o órgão já estava ciente dos fatos e tomaria as providências cabíveis; que a declarante afirma que algumas pessoas comentaram que não haviam conseguido atendimento principalmente na Secretaria de saúde no período da tarde; que, pelo que sabe, os servidores da Câmara Municipal cumpriram a jornada integral de trabalho”.

MARCOS DOS SANTOS ALEIXO, também ouvido em sede inquisitorial, afirmou que

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___________________________________________________________________________“no mês de julho, seu tio Osvaldo Custório Martins, idoso, residente no assentamento São José, necessitava de uma intervenção cirúrgica nas vistas, e possuía um encaminhamento para o CEROF (Centro de Referência Oftalmológica do Hospital das Clínicas); que solicitou o apoio do declarante e, então, vieram na parte da tarde procurar a secretaria municipal de saúde a fim de entregar o encaminhamento para que fosse repassado para Goiânia; que, entretanto, ao chegarem na secretaria municipal de saúde, verificaram que o órgão se encontrava fechado e havia um comunicado informando que o expediente se daria das 7 às 11horas; que seu tio, por ser idoso e morar na zona rural, deixou os documentos com o declarante, o qual retornou na manhã do dia seguinte para a entrega da documentação; que soube posteriormente que o prefeito havia baixado um decreto reduzindo o expediente...”

MARIA DE FÁTIMA GONÇALVES DE SOUSA, servidora municipal efetiva, manifestando descontentamento com os privilégios concedidos aos comissionados, declarou que “durante o mês de julho de 2009 trabalhou durante dez dias em período integral, porém ficou informada que a Secretaria de Saúde, Secretaria de Ação Social e Prefeitura Municipal estiveram funcionando apenas no período matutino...”

ANTÔNIO DE FREITAS, policial militar lotado na 13ª CIPM, ouvido pelo Ministério Público, disse que “pelo que sabe, não é a primeira vez que a prefeitura trabalha em meio expediente e que, pela sua profissão, em constante contato com as pessoas, já ouviu diversos comentários no sentido de que trabalhar na prefeitura era vantajoso, pois havia reduções de jornada de trabalho e o salário permanecia o mesmo...”

A servidora ELSA MAGALHÃES DA CUNHA, detentora de cargo comissionado de Diretora do Departamento de Recursos Humanos, acompanhada do assessor jurídico do Município, verberou que, mesmo com 20 anos de funcionalismo, não sabia precisamente a jornada de trabalho dos servidores municipais, mas esclareceu que, afora os decretos de redução de expediente, o horário de funcionamento da prefeitura é das 8 às 11 e das 13 às 17 horas, o que totaliza 7 e não 8 horas diárias. Na ocasião, confirmou a prática da redução de expediente em outros exercícios.

De igual modo, a telefonista e recepcionista EDILEUSA RIOS DA SILVA, detentora de cargo comissionado, pasme, declarou que trabalha no período das 7 ás 13 horas, totalizando 6 horas diárias, em violação à jornada de 8 horas imposta pela Lei Municipal 151/94, além do regime de dedicação exclusiva ali previsto. E mais, disse que quando sai da Prefeitura às 13 horas, entra em seu lugar a servidora Geane que também cumpre a jornada de 6horas a partir das 13 horas; que a servidora Geane é efetiva na prefeitura e a declarante não sabe informar até que horas Geane fica na Prefeitura, esclarecendo que Geane deve cumprir jornada

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___________________________________________________________________________de 6 horas. Mais adiante, a referida servidora afirmou que o atendimento em geral é das 8 às 11horas e das 13 às 17horas. E a servidora Geane, após as 17 horas faz o quê para completar sua jornada, sendo que a prefeitura é fechada?

Importante consignar que ambas as servidoras, Elsa e Edileusa,

verberaram que, durante a vigência do decreto, a porta principal da prefeitura estava fechada no período vespertino e a porta dos fundos apenas encostada.

No estrito cumprimento de sua missão fiscalizatória e agindo na defesa do patrimônio público, consoante cânones do art. 129, II e III, da CR/88, o Ministério Público, no curso das investigações, com espeque no art. 47, inc. I, “c”, e inc. X, da Lei Complementar Estadual 25/98, determinou inspeção nos órgãos municipais, a fim de verificar, in loco, a transgressão aos postulados constitucionais que norteiam a administração pública.

Aliás, no regular cumprimento da medida que lhe foi determinada, o servidor ministerial Jorgam de Oliveira Soares, a despeito da costumeira cortesia e polidez no trato com os servidores municipais, foi alvejado com ataques verbais ameaçadores perpetrados pelo réu e pelo procurador jurídico do município no Paço Municipal, condutas que, muito longe de espelhar os princípios constitucionais aos quais os agentes públicos estão subordinados, amoldam-se aos crimes de ameaça e desacato. Sobre os fatos, em específico, as providências criminais correlatas já foram adotadas.

Assim é que, consoante termo de constatação anexo, decorrente de diligência ministerial empreendida no dia 30.07.09, o Diretor da Agência de Tributação, Sr. Wataru Matsui, informou que o servidor Domingos Gomes da Silva, lotado naquele órgão, encontrava-se nas Praias do Rio Crixás para o desempenho de suas atribuições. Nesse ponto, inescapável o absurdo, porquanto não se sabe de qualquer tributo incidente sobre a instalação de acampamentos nas praias ribeirinhas. Se o referido servidor fosse lotado na agência ambiental, nada de errado com a fiscalização. Mas atividade tributária nas praias do Rio Crixás é achincalhar a moralidade pública!

Mas não é só. O desfile da imoralidade tem pista quilométrica. No

mesmo dia 30.07.09, os servidores Rodiney Pedreti Tolentino e Rosimar Passos Tolentino, também lotados na Agência de Tributação, encontravam-se de folga. Com um detalhe: a conhecida família Tolentino, como é de sabença geral, estrutura famoso acampamento no Rio Crixás para deleite na temporada de julho.

À guisa de exemplo, no momento da vistoria realizada no dia 30.07.09, o servidor Íris Azevedo Martins não estava no protocolo do Paço Municipal, onde é lotado, e também não consta na relação dos servidores de férias no mês de julho. ____________________________________________________________________________________________________

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___________________________________________________________________________Idem em relação ao servidor Enio Alves de Souza, lotado na Secretaria Municipal de Educação.

Também se apurou que a servidora Soreyne Andrade Lima, contratada pelo Município como psicóloga do CREAS, estava ausente no momento da vistoria do dia 30.07.09, quinta-feira, seja no período da manhã, às 9h40, seja no período da tarde, às 15h. Segundo informações de Sueli Aparecida dos Santos Morelato, a coordenadora do CREAS e de Kassia Carolina Ferreira da Silva Campos, auxiliar administrativo do CREAS, a psicóloga Soreyne possui jornada diferenciada de trabalho, no total de 20 horas semanais, sendo que às segundas e quintas-feiras atende na parte da tarde e nos demais dias da semana atende no período matutino. Logo, como a inspeção ocorreu no dia 30.07.09, quinta-feira, a referida servidora deveria estar no órgão no período vespertino.

Apenas para contextualizar e sublinhar a ofensa ao princípio da igualdade, a psicóloga Soreyne Andrade Lima, ex-secretária da saúde, foi contratada pela gestão do réu para trabalhar uma jornada de 20 horas semanais no CREAS e perceber, como remuneração, o dobro das psicólogas efetivas do município que trabalham em período integral. Daí a insatisfação dos servidores efetivos com a política administrativa levada a cabo pelo réu, como declarou a psicóloga Maria de Fátima Gonçalves de Sousa.

Portanto, conforme apurou o Ministério Público, em nenhum dos dias houve atendimento ao público no período vespertino, sendo que, em alguns dias do final de julho de 2009, dada a notícia da fiscalização ostensiva pelo Parquet, poucos servidores municipais estavam trabalhando interinamente no período vespertino.

Não bastasse a ilegalidade e imoralidade dos decretos redutores de expediente, vale registrar que, conforme se apurou, mesmo durante o período “normal” de expediente também houve redução ilegal do expediente em uma hora, visto que o funcionamento regular dos órgãos do Poder Executivo, à exceção das Unidades de Saúde Familiar e da Secretaria Municipal de Educação (SEMEC), era das 8 às 11 e das 13 às 17h, portanto totalizando 7 horas e não as 8 horas preconizadas nos artigos 33 e 36 da Lei Municipal n. 151/94.

Diferente do que constou nos Decretos 138 e 172/08, não merece vingar o fundamento de que a redução do jornada de trabalho serviria para reduzir despesas, pois não é este o procedimento previsto na Constituição Federal. De acordo com o artigo 169 da CF, caso o ente federado desrespeite o limite de gastos com pessoal, deve ser reduzido o número de cargos comissionados e funções de confiança. Se esta medida não for suficiente, poderão ser exonerados servidores não estáveis e, frustrada essa medida, em caso extremo, poderão ser exonerados os servidores estáveis. Vejamos o inteiro teor do artigo 169 da Lei Fundamental:____________________________________________________________________________________________________

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“Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar.§ 1º A concessão de qualquer vantagem ou aumento de remuneração, a criação de cargos, empregos e funções ou alteração de estrutura de carreiras, bem como a admissão ou contratação de pessoal, a qualquer título, pelos órgãos e entidades da administração direta ou indireta, inclusive fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, só poderão ser feitas:I - se houver prévia dotação orçamentária suficiente para atender às projeções de despesa de pessoal e aos acréscimos dela decorrentes;II - se houver autorização específica na lei de diretrizes orçamentárias, ressalvadas as empresas públicas e as sociedades de economia mista.§ 2º Decorrido o prazo estabelecido na lei complementar referida neste artigo para a adaptação aos parâmetros ali previstos, serão imediatamente suspensos todos os repasses de verbas federais ou estaduais aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios que não observarem os referidos limites.§ 3º Para o cumprimento dos limites estabelecidos com base neste artigo, durante o prazo fixado na lei complementar referida no caput, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios adotarão as seguintes providências:I - redução de pelo menos vinte por cento das despesas com cargos em comissão e funções de confiança;II - exoneração dos servidores não estáveis.§ 4º Se as medidas adotadas com base no parágrafo anterior não forem suficientes para assegurar o cumprimento da determinação da lei complementar referida neste artigo, o servidor estável poderá perder o cargo, desde que ato normativo motivado de cada um dos Poderes especifique a atividade funcional, o órgão ou unidade administrativa objeto da redução de pessoal.§ 5º O servidor que perder o cargo na forma do parágrafo anterior fará jus a indenização correspondente a um mês de remuneração por ano de serviço.§ 6º O cargo objeto da redução prevista nos parágrafos anteriores será considerado extinto, vedada a criação de cargo, emprego ou função com atribuições iguais ou assemelhadas pelo prazo de quatro anos.§ 7º Lei federal disporá sobre as normas gerais a serem obedecidas na efetivação do disposto no § 4º”.

Conforme relatórios de gestão fiscal apresentados pelo próprio réu (doc. incluso), as despesas com pessoal representavam 51,42% da receita corrente líquida, no período compreendido entre janeiro a dezembro de 2008, e 58,30% no período compreendido entre julho de 2008 a junho de 2009, ao passo que o artigo 19, inciso III, da Lei Complementar n.º 101/2000 estabelece que o limite de gasto com pessoal para os municípios não pode ultrapassar o percentual de 60%.

Portanto, qualquer que seja o período de parâmetro, verifica-se claramente que o município não tinha excedido seu limite de gasto e nada justificava ____________________________________________________________________________________________________

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___________________________________________________________________________a alteração da jornada de trabalho dos servidores por decreto a não ser o amor ao ócio.

Mister consignar que a edição dos indigitados decretos pautada na necessidade de reduzir despesas de consumo diretas e indiretas não se justifica. É que, sob o prisma do princípio da proporcionalidade em sentido estrito, a suposta vantagem econômica da redução administrativa não suplanta o prejuízo decorrente da redução de atendimento aos administrados, notadamente considerando o fato de que boa parte deles reside na zona rural, em assentamentos e já possui inúmeras dificuldades para locomoção ao centro urbano.

Ademais disso, a decantada motivação contida nos Decretos 138/08 e 172/08, tangente ao contingenciamento de gastos e adequação com a Lei de Responsabilidade Fiscal, não se verificou. É que, consoante demonstrativo de evolução de despesas, oriundo do Centro de Apoio Operacional do Patrimônio Público, órgão auxiliar do Ministério Público, nos meses de novembro e dezembro, as despesas da Prefeitura de São Miguel do Araguaia com combustível foram as mais elevadas dos quatro últimos bimestres de 2008. Já as despesas com telefone, publicidade e locação de veículos mantiveram-se na média dos bimestres precedentes ou as ultrapassaram por pouco. Logo, inequívoca a ilação de que, com a redução do expediente administrativo, não houve a alardeada e escamoteada economia ao erário.

Aliás, se o réu, de fato, tivesse em mente concretizar o princípio da economicidade e eficiência, não teria promovido festa natalina para os servidores no final de 2007, em pleno período pré-eleitoral, regada a 80 caixas de cerveja e 500 unidades de refrigerante de 2litros, o que foi objeto de ação própria (autos n. 200803098175). Outrossim, não teria embolsado mais de R$40.000,00 em 115 diárias durante 270 dias de mandato, em esquema fraudulento de sangria dos cofres públicos, além de esbaldar-se em sofisticados restaurantes de Goiânia e Brasília com o dinheiro público, o que também foi objeto de ação própria (autos n. 200803099740)

Sobressai nítida a má-fé do réu que, enquanto candidato recém registrado à re-eleição, acolheu a primeira recomendação ministerial e, revogando o Decreto 138/08, retomou o expediente integral, por receio de alguma providência empreendida pelo Parquet que lhe embaraçasse a postulação eleitoral. Todavia, depois de eleito, restabeleceu a redução de jornada por meio da re-edição do decreto antes revogado. E, como se não bastasse a desídia com a Administração Pública, reduziu o expediente em julho de 2009, sob a motivação de envolvimento da Administração Municipal na Temporada de Praia no Porto Luiz Alves. Quanta balbúrdia!

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___________________________________________________________________________A propósito, no Decreto n. 253/09, a confissão da imoralidade pelo

réu, no próprio texto do ato normativo, não de forma latente, mas de forma patente, beirou o absurdo e o descalabro. Os servidores municipais, mesmo que não estivessem no gozo de férias, receberam de brinde metade do expediente para deleite nas praias do majestoso Rio Araguaia, animadas com atividades esportivas diversas, lazer e recreação, tudo custeado pelo erário (vide programação anexa).

Assim procedendo, o réu ADEMIR CARDOSO DOS SANTOS incorreu na odiosa prática de improbidade administrativa, na medida em que a finalidade nítida dos decretos de alteração dos horários de expediente é a burla aos princípios da Administração Pública, mandamentos axiológicos de extração constitucional, além de viabilizar o enriquecimento sem causa de servidores municipais e lesar o erário.

O descaso do réu com os vetores axiológicos da legalidade, da eficiência, da continuidade dos serviços públicos, da moralidade, impessoalidade e da economicidade configura ato de improbidade administrativa, razão pela qual o Parquet ajuíza a presente ação civil pública com esteio na Lei n.º 8.429/92, com o fito de restaurar a força normativa dos preceptivos constitucionais violados, ressarcir o erário dos danos materiais e imateriais causados (dano moral coletivo) e, ao final, responsabilizar o agente ímprobo nas sanções catalogadas na Lei de Improbidade Administrativa.

II – DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS

II.A) DA LETIGIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO

A Ação Civil Pública, ex vi do disposto no artigo 1º da Lei nº 7.347/85, como fator de mobilização social, é a via processual adequada para impedir a ocorrência ou reprimir danos ao patrimônio público, ao meio ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, protegendo, assim, os interesses difusos, coletivos e individuais homogêneos da sociedade, sendo que, diante de sua magnitude e excelência, mereceu assento constitucional, como se extrai do artigo 129, inciso III, da Constituição da República Federativa brasileira.

Não restam dúvidas, portanto, de que o patrimônio público é um interesse de dimensão difusa, o que autoriza sua tutela processual por intermédio da ação civil pública.

Nesse contexto, em razão de sua destacada atuação no ajuizamento de ações civis públicas, desde 1985, o Ministério Público aparece, hoje, como ____________________________________________________________________________________________________

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___________________________________________________________________________autêntico representante da sociedade brasileira na defesa de seus interesses transindividuais, dentre eles o de conservar o patrimônio público (histórico, cultural, paisagístico, ambiental, etc.), sob o ângulo material (perdas e danos) ou imaterial (lesão à moralidade) e o de impor aos agentes públicos o dever de probidade, de impessoalidade e de observância aos demais princípios que devem reger a Administração Pública.

Por isso, a Lei nº 8.429/92, em seus artigos 7º, 14, §2º, 15, 16, 17 e 22, acabou por consagrar definitivamente a legitimidade ativa do MINISTÉRIO PÚBLICO para a ação judicial perseguidora do ressarcimento do prejuízo causado ao patrimônio público (inclusive na acepção imaterial – lesão aos princípios administrativos) e imposição de demais sanções previstas no artigo 12 da mencionada lei, até para respeitar a norma constitucional (artigo 129, inciso III), já suficiente para tal finalidade1.

A fim de espancar qualquer dúvida sobre a legitimidade ministerial na defesa do patrimônio público, frente ao que dispõe o mandamento constitucional do artigo 37, § 4º, impende invocar-se o Enunciado da Súmula 329 do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, vazado nos seguintes termos:

“O MINISTÉRIO PÚBLICO TEM LEGITIMIDADE PARA PROPOR AÇÃO CIVIL PÚBLICA EM DEFESA DO PATRIMÔNIO PÚBLICO”.

Postas estas asserções, insta finalizar este item evidenciando que a conformação institucional do Ministério Público brasileiro, delineada pelo artigo 127 da Carta Republicana, indica que o Poder Constituinte Originário, expressão suprema da cidadania, engendrou uma instituição nos moldes do ombudsman dos países nórdicos, ao qual compete a “defesa do povo” contra as agressões à eficácia vertical dos direitos fundamentais, além de combater a improbidade, a corrupção e a criminalidade.

Patente, portanto, que o Ministério Público possui pertinência subjetiva para aforar ação civil pública em defesa do patrimônio público e da moralidade administrativa, além de ter legitimidade ativa para a promoção de ação de improbidade tendente a punir o agente ímprobo responsável por violações aos princípios estruturais do regime jurídico-administrativo, pela lesão ao erário público e enriquecimento ilícito às custas dos cofres públicos.

1 Princípio da máxima efetividade, enumerado por CANOTILHO, apud MORAES, Alexandre. Direito Constitucional. 8a ed. São Paulo: Atlas, 2000, p. 42.____________________________________________________________________________________________________

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___________________________________________________________________________II.B) DA LEGITIMIDADE PASSIVA

Urge destacar que a legitimidade passiva, no bojo da Ação Civil Pública por ato de improbidade administrativa, abrange precipuamente os agentes públicos que pratiquem atos de improbidade. Tais agentes são assim considerados ainda que exerçam transitoriamente ou sem remuneração a sua função, por eleição, nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura ou vínculo, mandato, cargo ou emprego, na forma do artigo 2º da Lei n.º 8.429/92.

O particular, do mesmo modo, pode ser sujeito ativo do ato de improbidade administrativa por extensão, desde que concorra para o ato ou dele se beneficie de qualquer forma direta ou indireta.

Nesse sentido é a dicção cristalina do artigo 3ª da Lei 8.429/92, verbis:

“Art. 3º. As disposições desta Lei são aplicáveis, no que couber, àquele que, mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta.”

No caso vertente, o réu ADEMIR CARDOSO DOS SANTOS, prefeito de São Miguel do Araguaia, desempenha, como chefe do Poder Executivo Municipal, função política prevista na Constituição Federal, sendo sua investidura realizada por meio de eleição. Nessa linha, amolda-se perfeitamente à definição trazida pelo artigo 2º da Lei de Improbidade, sendo sujeito ativo de ato de improbidade administrativa, na medida em que praticou atos agressivos aos princípios da Administração Pública, atentando contra a própria administração direta, além de lesar o erário e viabilizar o enriquecimento ilícito de terceiros.

Como o réu ADEMIR CARDOSO DOS SANTOS exerce o mandato de Prefeito de São Miguel do Araguaia, foi ele o agente político responsável pela alteração do horário de expediente, o que, de forma írrita e irresponsável, fere os princípios cardeais do regime jurídico-administrativo, em especial os princípios da legalidade, moralidade e eficiência, razão pela qual resta patente sua legitimidade para figurar no polo passivo desta ação de improbidade, nos moldes do artigo 37, § 4º, da Lei Fundamental.

Convém consignar, por oportuno, que o Parquet não buscará a responsabilização dos servidores municipais beneficiados, porquanto não agiram com dolo, mas o fizeram sob o amparo de um decreto ilegal editado pelo chefe maior do Poder Executivo Municipal. Assim, como o enriquecimento ilícito previsto no art. 9º da Lei 8.429/92 possui como elemento subjetivo o dolo e tal não se pode comprovar em relação à generalidade dos servidores municipais, em atenção ao

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___________________________________________________________________________princípio da culpabilidade e da vedação à responsabilidade objetiva, inviável a inclusão dos servidores no polo passivo da presente ação.

II.C) DA IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 37, § 4º, dispõe:

“Art. 37. A administração pública, direta, indireta ou fundacional, de qualquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência e, também, ao seguinte:§ 4º. Os atos de improbidade administrativa importarão a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação prevista em lei, sem prejuízo da ação penal cabível”.

Com o escopo de conferir densidade normativa ao indigitado preceito constitucional, foi editada a Lei n.º 8.429/92, que dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos, nos casos de improbidade no exercício de mandato, cargo, emprego ou função na administração pública direta, indireta ou fundacional.

O referido diploma normativo contempla, basicamente, três categorias de atos de improbidade administrativa, a saber: em seu artigo 9º, os atos de improbidade administrativa que importam enriquecimento ilícito do agente ou de terceiros; em seu artigo 10, os atos de improbidade administrativa que causam prejuízo ao erário; e no artigo 11, os atos de improbidade administrativa que atentam contra os princípios da administração pública.

No caso concreto, denota-se a ocorrência das três dimensões da improbidade administrativa, na medida em que houve o enriquecimento ilícito de centenas de servidores municipais, notadamente os ocupantes de cargos comissionados, que receberam seus vencimentos na íntegra sem a necessidade de observarem a jornada normal de trabalho (art. 9º, caput, da Lei n.º 8.429/92), o que, inexoravelmente causou grave prejuízo ao erário, incorrendo o Prefeito de São Miguel do Araguaia Ademir Cardoso nos atos descritos no artigo 10, incisos VII e XII, além da manifesta agressão aos princípios basilares do regime jurídico-administrativo, violando os deveres de honestidade, imparcialidade e lealdade (artigo 11, inciso I, da Lei n.º 8.429/92). Veja-se a transcrição das normas aplicáveis ao caso:

Art. 10. Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa, que enseje perda patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos bens ou haveres das entidades referidas no art. 1º desta lei, e notadamente:

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___________________________________________________________________________(...) VII - conceder benefício administrativo ou fiscal sem a observância das formalidades legais ou regulamentares aplicáveis à espécie;XII – permitir, facilitar ou concorrer para que terceiro se enriqueça ilicitamente.

Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:I – praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele previsto, na regra de competência;

Entrementes, convém frisar que a improbidade administrativa consistente em atos que atentam contra os princípios que regem a Administração Pública não pressupõe dano ao erário e tampouco o enriquecimento ilícito do agente ímprobo. Basta, para caracterizar a conduta ilegal, a sua subsunção à norma do artigo 11 da Lei n. 8.429/92, isto é, que se demonstre a ocorrência de lesão aos princípios da Administração Pública.

É exato rememorar-se, ainda, que o princípio da moralidade administrativa constitui mandamento de cunho hierárquico constitucional, distinguindo-se, em essência, da legalidade. Não se confunde, da mesma forma, com a lesão ao erário, consoante deixa claro o artigo 21, inciso II, da Lei n. 8.429/92, que afirma que “a aplicação das sanções previstas nesta lei independe da efetiva ocorrência de dano ao patrimônio público”.

Sem embargo de restar efetivamente comprovada a lesão ao erário e o enriquecimento ilícito no caso apresentado, insta salientar que, para a caracterização da improbidade, dispensável o dano material concreto ao erário, até porque vulnerar um princípio é a mais grave agressão dentro do sistema, e a imoralidade administrativa atenta contra os valores imateriais da Administração Pública.

Ademais, para a configuração do ato de improbidade administrativa nos moldes do artigo 11 da Lei n.° 8.429/92, não há necessidade de indicar o dolo enquanto finalidade específica, o que se admite apenas para fins de argumentação. De qualquer forma, no caso concreto, há farta argumentação e provas de que o réu agiu com má-fé, pois o Ministério Público recomendou, por mais de uma vez, que o recesso fosse imediatamente suspenso, preferindo o prefeito seguir de forma dolosa na senda da improbidade.

Nesse diapasão, considerando prescindível a demonstração de dolo ou culpa e a ocorrência de lesão patrimonial ao erário, é a remansosa jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça:____________________________________________________________________________________________________

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EMENTA: ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LESÃO A PRINCÍPIOS ADMINISTRATIVOS. ELEMENTO SUBJETIVO. COMPROVAÇÃO. DESNECESSIDADE.1. A lesão a princípios administrativos contida no art. 11 da Lei nº 8.429/92 não exige dolo ou culpa na conduta do agente, nem prova da lesão ao erário público. Basta a simples ilicitude ou imoralidade administrativa para restar configurado o ato de improbidade.2. Recurso especial improvido. (REsp 826.678/GO, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 05.10.2006, DJ 23.10.2006 p. 290).

Discorrendo sobre mandamento de otimização da eficiência, MARIA SYLVIA ZANELLA DI PIETRO2 leciona que:

“O princípio da eficiência apresenta, na realidade, dois aspectos: pode ser considerado em relação ao modo de atuação do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas atribuições, para lograr os melhores resultados; e em relação ao modo de organizar, estruturar, disciplinar a Administração Pública, também com o mesmo objetivo de alcançar os melhores resultados na prestação do serviço público” .

Portanto, o prefeito municipal, ao alterar, por meio de decreto, o horário do expediente na prefeitura, reduzindo-o apenas para o período matutino, sendo que ao longo de sua gestão foram mais de 4 meses de funcionamento parcial da administração, não agiu com a intenção de obter os melhores resultados possíveis, pelo contrário, sua intenção foi claramente a de lesar o erário e viabilizar o enriquecimento ilícito dos servidores, ferindo os princípios da eficiência, motivação e economicidade, incorrendo em improbidade administrativa, consoante previsão do artigo 11 da Lei n.º 8.429/92.

Tecidas estas considerações de cunho propedêutico, insta salientar que todo ato administrativo, de qualquer autoridade ou Poder, para ser legítimo e operante, há de ser praticado em conformidade com a norma legal pertinente (princípio da legalidade), com a norma da instituição (princípio da moralidade), observada a destinação pública própria (princípio da finalidade) e com a divulgação oficial necessária (princípio da publicidade). Faltando, contrariando ou desviando-se desses princípios básicos, a Administração Pública vicia o ato, expondo-o à

2 DI PIETRO, Maria Silvia Zanella. Direito Administrativo. 15ª edição. São Paulo: Atlas, 2003, p. 83.____________________________________________________________________________________________________

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___________________________________________________________________________anulação por ela mesma (autotutela) ou pelo Poder Judiciário, se requerida pelo interessado.

Indiscutível, pois, a possibilidade do controle da legalidade e mérito dos atos administrativos, bem como, da constitucionalidade, promovendo-se a vigília do sistema de valores resguardado pela Constituição.

Nesse sentido, a hodierna lição da professora TÊMIS LIMBERGER3:

"O controle judicial dos atos administrativos é uma forma de zelar pela obediência da administração ao ordenamento jurídico. Assim, em um Estado de Direito, tanto a seara pública quanto a privada subordinam-se ao princípio da legalidade"

Não se pode afastar da apreciação jurisdicional os atos da Administração Pública eivados de nulidade, conforme leciona a magistrada federal LÚCIA VALLE FIGUEIREDO4:

"A anulação é a forma pela qual o Judiciário retira os efeitos de ato incompatível com a ordem pública. Tais efeitos são retirados ex tunc, isto é, desde o momento da emanação do ato"."Não cabe dúvida, entretanto, de que o Judiciário pode anular atos administrativos desafinados do Direito. A sentença judicial declara, de conseguinte, a desconformidade do ato, anulando-o com efeitos ex tunc. Tem, pois, função declaratória, embora com efeito constitutivo".

MARCELO FIGUEIREDO5 comenta o conteúdo jurídico do princípio da legalidade na administração pública, com as seguintes colocações.

“O princípio da legalidade é, sem dúvida, um dos pilares do Estado Democrático de Direito. Ao lado dele convive o princípio da supremacia do interesse público ou princípio da finalidade pública. De fato, a administração pública, ao cumprir seus deveres constitucionais e legais, busca incessantemente o interesse público, verdadeira síntese dos poderes a ela atribuídos pelo sistema jurídico positivo, desequilibrando forçosamente a relação administração-administrado... A administração atua, age, como instrumento de realização ao ideário constitucional, norma jurídica superior do sistema jurídico brasileiro. Assim, o agente público deve atender aos interesses públicos, ao bem-estar da comunidade. Sob o rótulo “desvio de poder”, “desvio de finalidade”, “ausência de motivos”, revelam-se todas as formas de condutas contrárias ao Direito, prejudiciais ao administrado e

3 LIMBERGER, Têmis. Atos da Administração Lesivos ao Patrimônio Público - Os Princípios Constitucionais da Legalidade e Moralidade, pg. 107. Livraria do Advogado Ed.: Porto Alegre, 19984 FIGUEIREDO, Lucia Valle. Curso de Direito Administrativo. Ed. Malheiros, 3ª ed.5 FIGUEIREDO, Marcelo. Probidade Administrativa, Editora Malheiros, 2a edição, 1997, p. 61/62.____________________________________________________________________________________________________

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___________________________________________________________________________violadoras, às vezes, da própria Constituição. Há, em síntese, comportamento ilegal ou ilegítimo. Aliás, o STJ deixou assentado que “o desvio de poder pode ser aferido pela ilegalidade explícita (frontal ofensa ao texto da lei) ou por censurável comportamento do agente, valendo-se de competência própria para atingir finalidade alheia àquela abonada pelo interesse público, em seu maior grau de compreensão e amplitude. Análise da motivação do ato administrativo, revelando um mau uso da competência e finalidade despojada de superior interesse público, defluindo o vício constitutivo, o ato aflige a moralidade administrativa, merecendo inafastável desfazimento”. (Resp 21.156-0-SP, reg. 92.0009144-0, rel. Min. Milton Luiz Pereira, j. 19.9.94). A norma em foco autoriza a pesquisa do ato administrativo a fim de revelar se o mesmo está íntegro ou, ao contrário, apenas aparentemente atende à lei, se os motivos e seu objeto têm relação com o interesse público, se houve algum uso ou abuso do administrador, se a finalidade foi atendida de acordo com o sistema jurídico; e assim por diante”.

A conduta perpetrada pelo réu ofende, também, o princípio da moralidade administrativa, uma vez que, ao agir desta maneira, deixou de atender à finalidade pública, para, via decreto de redução de expediente, conceder benesses administrativas a servidores municipais à revelia da lei de regência.

Saliente-se que não se confunde moralidade com probidade, visto que a moralidade tem acepção genérica diante da boa-fé, lealdade e honestidade que todos os poderes e funções do Estado devem impor às suas atuações. Por outro tanto, a probidade está vinculada ao comportamento do administrador, referindo-se a uma moralidade qualificada, sob o aspecto pessoal-funcional.

Nesta ordem de idéias, a improbidade administrativa é uma improbidade qualificada, no momento em que o funcionário, no exercício de suas funções, aproveita dos poderes e facilidades decorrentes de seu cargo, em proveito próprio ou alheio.

Assim, o funcionário deve exercer suas funções com lisura, exação, retidão, sempre visando o interesse público e geral, nunca o individual (próprio ou alheio), o qual acarretará como no caso em pauta desvio de poder, quer dizer, do fim a que se destina o exercício da função pública, qual seja, o bem comum.

Por fim, não se pode olvidar, mais uma vez, o ensinamento da Professora Maria Sylvia Zanella di Pietro que faz considerações que guardam estreita relação com as ilicitudes aqui impugnadas.

"Não é preciso penetrar na intenção do agente, porque do próprio objeto resulta a imoralidade. Isto ocorre quando o conteúdo de determinado ato contrariar o senso comum de honestidade, retidão, equilíbrio, justiça, respeito à dignidade do ser humano, à boa fé, ao trabalho, à ética das

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___________________________________________________________________________instituições. A moralidade exige proporcionalidade entre os meios e os fins a atingir, entre os sacrifícios impostos à coletividade e os benefícios por ela auferidos; entre as vantagens usufruidas pelas autoridades públicas e os encargos impostos à maioria dos cidadãos”.

Novamente recorremos à lição do eminente mestre HELY LOPES MEIRELLES, in Direito Administrativo Brasileiro, que assim prescreve:

“A moralidade administrativa constitui, hoje em dia, pressuposto de validade de todo ato da Administração Pública (CF. art. 37, caput). Não se trata – diz Hauriou, o sistematizador de tal conceito – da moral comum, mas sim de uma moral jurídica, entendida como “o conjunto de regras de conduta tiradas da disciplina interior da Administração”. Desenvolvendo sua doutrina, explica o mesmo autor que o agente administrativo, como ser humano dotado de capacidade de atuar, deve, necessariamente, distinguir o Bem do Mal, o honesto do desonesto. E, ao atuar, não poderá desprezar o elemento ético de sua conduta. Assim, não terá que decidir somente entre o legal e o ilegal, o justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o inoportuno, mas também entre o honesto e o desonesto. Por considerações de Direito e de Moral, o ato administrativo não terá que obedecer somente à lei jurídica, mas também à lei ética da própria instituição, porque nem tudo que é legal é honesto, conforme já proclamavam os romanos: “non omne quod licet honestum est”. A moral comum, remata Hauriou, é imposta ao homem para sua conduta externa; a moral administrativa é imposta ao agente público para sua conduta interna, segundo as exigências da instituição a que serve e a finalidade de sua ação: o bem comum”.

Postas essas asserções legais, doutrinárias e jurisprudenciais, em síntese, a conduta do réu, ao reduzir, ao seu talante, o expediente administrativo:

a) violou o princípio da legalidade, porquanto o réu, mediante simples decreto, modificou a jornada dos servidores públicos, matéria reservada ao domínio normativo da lei formal, no caso, Lei Municipal n. 151/94 (Estatuto dos Servidores Municipais de São Miguel do Araguaia);

b) violou frontalmente o art. 169 da CR/88, pois se pretendia reduzir gastos, deveria ter exonerado servidores comissionados, e não prejudicado o atendimento ao público, com redução de expediente que não gerou, de fato, qualquer economia ao erário;

b) ofendeu também o princípio da moralidade, pois o funcionamento da administração pública em meio expediente, para assegurar envolvimento da administração na Temporada de Praia em Luiz Alves constitui verdadeiro desdouro no trato com a coisa pública;

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c) vulnerou o princípio da eficiência, porquanto incentivou o ócio dos servidores, em detrimento da necessidade premente dos serviços públicos a serem prestados aos administrados;

d) caracterizou dano ao erário, na medida em que concorreu para o enriquecimento ilícito dos servidores municipais, os quais, em atenção ao princípio da irredutibilidade de vencimentos, receberam a mesma remuneração, tendo, entretanto, trabalhado a metade da jornada legal nos meses de julho/08, agosto/08, novembro/08, dezembro/08, julho/09, e, nos demais meses, uma hora a menos;

e) caracterizou dano ao erário, na medida em que concedeu benefício administrativo aos servidores, a saber, jornada de trabalho reduzida, seja pela metade nos meses de temporada, seja com menos 1 hora nos demais meses, em plena inobservância ao disposto no regime jurídico-administrativo respectivo.

Portanto, a conclusão inarredável é a de que os atos minuciosamente descritos nesta vestibular são mais um triste capítulo da nefasta praga da improbidade administrativa que corrói o Estado brasileiro, merecendo do Poder Judiciário uma imediata e enérgica resposta, a fim de que seja restabelecida a ordem jurídica, em obséquio à força normativa da Constituição Federal, o que homenageará o Estado Democrático de Direito e a República.

III.D) DO DANO MORAL COLETIVO

Considerando que o réu violou os princípios basilares do Estado Democrático de Direito, praticando a famigerada improbidade administrativa, por utilizar a coisa pública em benefício de interesses particulares, prejudicando o acesso de incalculáveis cidadãos aos serviços da administração pública municipal sobressai patente a lesão aos valores imateriais da coletividade, o que, gera um dano moral com repercussão coletiva.

Nessa quadra, na medida em que o réu descumpriu ordens irradiantes da Constituição Federal, é indene de dúvidas que essa irritante postura frustrou a força normativa da Constituição, criando um inexorável dano coletivo, por viabilizar o enriquecimento ilícito dos servidores e causar lesão ao erário público, com eminente prejuízo aos administrados que se viram às voltas com o atendimento ao público reduzido ilegalmente.

Pela lesão causada a interesse ou direito difuso e coletivo, o sujeito passivo da ação civil pública poderá ser condenado ao pagamento de uma determinada quantia em dinheiro a título de indenização pelos danos coletivos causados, sem prejuízo da multa pelo eventual descumprimento.____________________________________________________________________________________________________

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Como ensina Carlos Alberto BITTAR FILHO:

“(...) o dano moral coletivo é a injusta lesão da esfera moral de uma dada comunidade, ou seja, é a violação antijurídica de um determinado círculo de valores coletivos. Quando se fala em dano moral coletivo, está-se fazendo menção ao fato de que o patrimônio valorativo de uma certa comunidade (maior ou menor), idealmente considerado, foi agredido de maneira absolutamente injustificável do ponto de vista jurídico: quer isso dizer, em última instância, que se feriu a própria cultura, em seu aspecto imaterial.”6

Em abalizado comentário, aduz Luis Gustavo Grandinetti CASTANHO DE CARVALHO7:

“O Direito se preocupou durante séculos com os conflitos intersubjetivos. A sociedade de massas, a complexidade das relações econômicas e sociais, a percepção da existência de outros bens jurídicos vitais para a existência humana, deslocaram a preocupação jurídica do setor privado para o setor público; do interesse individual para o interesse difuso ou coletivo; do dano individual para o dano difuso ou coletivo. Se o dano individual ocupou tanto e tão profundamente o Direito, o que dizer do dano que atinge um número considerável de pessoas? É natural que o Direito se volte, agora, para elucidar as intrincadas relações coletivas e difusas e especialmente à reparação de um dano que tenha esse caráter”.

Xisto Tiago de MEDEIROS NETO8, procurador do Ministério Público do Trabalho, leciona que

Assim, há de se ressaltar que, no tempo atual, tornou-se necessária e significativa para a ordem e a harmonia social, a reação do Direito em face de situações em que determinadas condutas vêm a configurar lesão a interesses: 1) juridicamente protegidos; 2) de caráter extrapatrimonial; 3) titularizados por

6BITTAR FILHO, Carlos Alberto. “Do dano moral coletivo no atual contexto jurídico brasileiro” in Direito do Consumidor, vol. 12- Ed. RT. Vale destacar, ainda, a manifestação de André de Carvalho Ramos que, ao analisar o dano moral coletivo, assim dissertou: “(...) é preciso sempre enfatizar o imenso dano moral coletivo causado pelas agressões aos interesses transindividuais. Afeta-se a boa-imagem da proteção legal a estes direitos e afeta-se a tranqüilidade do cidadão, que se vê em verdadeira selva, onde a lei do mais forte impera. (“A ação civil pública e o dano moral coletivo”, Revista de Direito do Consumidor, vol. 25- Ed. RT, p. 83). Continua o citado autor, dizendo: “Tal intranqüilidade e sentimento de desapreço gerado pelos danos coletivos, justamente por serem indivisíveis, acarretam lesão moral que também deve ser reparada coletivamente. Ou será que alguém duvida que o cidadão brasileiro, a cada notícia de lesão a seus direitos não se vê desprestigiado e ofendido no seu sentimento de pertencer a uma comunidade séria, onde as leis são cumpridas? A expressão popular ‘o Brasil é assim mesmo’ deveria sensibilizar todos os operadores do Direito sobre a urgência na reparação do dano moral coletivo” (idem, ibidem).7 CARVALHO, Luis Gustavo Grandinetti Castanho de. Responsabilidade por dano não-patrimonial a interesse difuso: dano moral coletivo, p. 29.8 In Revista do Ministério Público do Trabalho n.° 24, ano 2002, pág. 79____________________________________________________________________________________________________

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___________________________________________________________________________uma determinada coletividade. Ou seja: adquiriu relevo jurídico, no âmbito da responsabilidade civil, a reparação do dano moral coletivo (em sentido lato).

Mais adiante, o jurista arremata, de forma conclusiva:

Resta evidente, com efeito, que, toda vez em que se vislumbrar o ferimento a interesse moral (ressalte-se, extrapatrimonial) de uma coletividade, configurar-se-á dano passível de reparação, tendo em vista o abalo, o sentimento negativo, a desalentadora indignação, ou a diminuição da estima, infligida e apreendida em dimensão coletiva. Nesse passo, é imperioso que se apresente o dano como injusto, usurpando a esfera jurídica da coletividade em detrimento dos valores fundamentais do seu acervo”9

André de Carvalho Ramos10, captando esse aspecto, registra que o entendimento jurisprudencial de aceitação do dano moral em relação a pessoas jurídicas, “é o primeiro passo para que se aceite a reparabilidade do dano moral em face de uma coletividade”. E ainda acresce: “o ponto chave para a aceitação do chamado dano moral coletivo está na ampliação de seu conceito, deixando de ser o dano moral um equivalente da dor psíquica, que seria exclusividade de pessoas físicas”.

Elencam-se, por fim, os seguintes elementos que caracterizam o dano moral coletivo e revelam o seu conceito:

• a conduta antijurídica do agente, que poderá ser uma pessoa (física ou jurídica);

• a ofensa a valores extrapatrimoniais essenciais, identificados no caso concreto, reconhecidos e inequivocamente compartilhados por uma determinada coletividade (titular de interesses morais protegidos pela ordem jurídica);

• a certeza do dano causado, correspondente aos efeitos que, ipso facto, emergem coletivamente, traduzidos pela sensação de desvalor, de indignação, de menosprezo, de inferioridade, de descrédito, de desesperança, de aflição, de humilhação, de angústia ou respeitante a qualquer outro sentimento de apreciável conteúdo negativo;

• o nexo causal observado entre a conduta ofensiva e a lesão socialmente repudiada.

A partir da Constituição da República de 1988, descortinou-se um novo horizonte quanto à tutela dos danos morais (particularmente no que tange à sua feição coletiva), face à adoção do princípio basilar da reparação integral (art. 5º, V e X) e diante do direcionamento do amparo jurídico à esfera dos interesses transindividuais, valorizando-se, pois, destacadamente, os direitos de tal natureza (a 9 in Revista do Ministério Público do Trabalho, n.° 24, ano 2002, pág. 84.10 RAMOS, André de Carvalho. A ação civil pública e o dano moral coletivo. In: Revista de Direito do Consumidor, n. 25/98, p. 82.____________________________________________________________________________________________________

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___________________________________________________________________________exemplo dos artigos 6º, 7º, 194, 196, 205, 215, 220, 225 e 227) e os instrumentos para a sua proteção (art. 5º, LXX e LXXIII, e art. 129, III).

Com isso, a tutela do dano moral coletivo passou a ter, explícita e indiscutivelmente, fundamento de validade constitucional. Destaque-se, por oportuno, a ampliação do objeto da ação popular manejada pelo cidadão, que, em decorrência do referido artigo 5º, LXXIII, da Lei Maior, passou a visar a anulação de ato lesivo (e a consequente reparação por perdas e danos — art. 11 da Lei n. 4.717/65) ao patrimônio público e também à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural. Daí a pertinência dessa ação no campo do dano moral coletivo, conforme destacado por Carlos Alberto Bittar Filho, ao citar Hely Lopes Meirelles.

Embora os casos mais frequentes de lesão se refiram ao dano pecuniário, a lesividade a que alude o texto constitucional tanto abrange o patrimônio material quanto o moral, o estético, o espiritual, o histórico. Na verdade, tanto é lesiva ao patrimônio público a alienação de um imóvel por preço vil, realizada por favoritismo, quanto a destruição de um recanto ou de objetos sem valor econômico, mas de alto valor histórico, cultural, ecológico ou artístico para a coletividade local.

Ainda dentro do enfoque constitucional, vê-se que o artigo 129, inciso III, ao conferir legitimação qualificada ao Ministério Público para o manuseio da ação civil pública, também abriu o leque do seu objeto para qualquer interesse difuso e coletivo, além daqueles referentes ao patrimônio público e social e ao meio ambiente. Assim, a ação civil pública tornou-se instrumento de alçada constitucional apto a ser utilizado pelo Parquet na busca da proteção irrestrita de todo interesse de natureza transindividual, inclusive os de caráter moral. E por força do § 1º do mesmo artigo 129 da Lei Maior, também foram legitimados para este fim os entes arrolados no artigo 5º (caput e incisos I e II) da Lei da Ação Civil Pública (Lei n. 7.347/85).

Frise-se, também, que sob a égide do regime constitucional passado, quando do surgimento da Lei da Ação Civil Pública (Lei n. 7.347/85), o respectivo artigo 1º limitava o seu uso somente nas hipóteses de lesão ao meio ambiente, ao consumidor e ao patrimônio cultural, além de não fazer referência específica ao dano moral, utilizando o termo dano, sem qualificativo.

Todavia, o art. 88 da Lei 8.884/94 alterou a redação do art. 1º da Lei da Ação Civil Pública, consagrando-se, expressamente, a possibilidade jurídica do pedido de indenização por dano moral coletivo. Confira-se:

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___________________________________________________________________________Art. 1º. Regem-se pelas disposições desta Lei, sem prejuízo da ação popular, AS AÇÕES DE RESPONSABILIDADE POR DANOS MORAIS e patrimoniais causados (...) A QUALQUER outro INTERESSE DIFUSO OU COLETIVO.

Não bastasse isso, o próprio Código de Defesa do Consumidor, Lei 8.078/90, que, juntamente com a Lei 7.347/85, forma um microssistema de tutela jurisdicional coletiva, já havia previsto expressamente o dano moral coletivo, quatro anos antes. Veja-se:

Art. 6º São direitos básicos do consumidor:

VI - a efetiva prevenção e reparação de danos patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos;

X - a adequada e eficaz prestação dos serviços públicos em geral.

Art. 22. Os órgãos públicos, por si ou suas empresas, concessionárias, permissionárias ou sob qualquer outra forma de empreendimento, são obrigados a fornecer serviços adequados, eficientes, seguros e, quanto aos essenciais, contínuos.

Parágrafo único. Nos casos de descumprimento, total ou parcial, das obrigações referidas neste artigo, serão as pessoas jurídicas compelidas a cumpri-las e a reparar os danos causados, na forma prevista neste Código.

Xisto arremata a exposição da configuração do dano moral coletivo com as seguintes ponderações:

“Na atualidade, a ação impositiva, por meio dos mecanismos e órgãos competentes, objetivando a efetivação dos direitos, em prol dos indivíduos e da coletividade, é o que dá concretude à idéia de cidadania. Em muito maior dimensão isso ocorrerá quando tratar-se de valores fundamentais, status reconhecido constitucionalmente aos direitos ou interesses coletivos, materiais ou morais. Sem dúvida, a evolução do regime da responsabilidade civil, tendo por norte o equilíbrio e o desenvolvimento sociais, possibilitou a devida proteção em face de danos infligidos aos valores morais reconhecidos a coletividades de pessoas, fruto da ampla projeção que adquiriu o conceito de dignidade humana. A ordem jurídica, assim, considera ser a coletividade titular de direitos ou interesses extrapatrimoniais, os quais são passíveis de tutela por meio do sistema processual apto a essa finalidade, definidor da chamada jurisdição civil coletiva, cujos fundamentos principais encontram-se gizados na Carta Constitucional de 1988 (art. 5º, XXXV e LV, e art. 129, III e § 1º), ordenando-se instrumentalmente com a interação das normas da Lei da Ação Civil Pública (art. 21) e da parte processual do Código de Defesa do Consumidor (arts. 90 e 117). Não se há de duvidar, enfim, que, no tempo presente, o reconhecimento e a efetiva reparação dos danos morais coletivos

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___________________________________________________________________________— na medida em que sanciona o ofensor (desestimulando novas lesões) e compensa os efeitos negativos decorrentes do desrespeito aos bens mais elevados do agrupamento social — constitui uma das formas de alicerçar o ideal de um Estado Democrático de Direito.11

Ressalte-se que o dano moral coletivo, nesse caso, assume feição in re ipsa, ou seja, é suficiente a demonstração do fato que deu origem ao dano, o que já foi exaustivamente feito nesta inicial:

“Indenização de direito comum. Dano moral. Prova. Juros moratórios. Súmula n.º 54 desta Corte. 1 – Não há que falar em prova do dano moral, mas, sim, na prova do fato que gerou a dor, o sofrimento, sentimentos íntimos que o ensejam. Provado assim o fato, impõe-se a condenação, sob pena de violação ao art. 334 do Código de ProcessoCivil. 2 – Na forma da Súmula n.º 54 da Corte, os juros moratórios nestes casos contam-se da data do evento. 3 - Recurso especial conhecido e provido, em parte.”12

O valor devido a título de indenização pelos danos morais coletivos, observa BITTAR,

“(...) deve traduzir-se em MONTANTE QUE REPRESENTE ADVERTÊNCIA AO LESANTE E À SOCIEDADE DE QUE SE NÃO SE ACEITA O COMPORTAMENTO ASSUMIDO, OU O EVENTO LESIVO ADVINDO. Consubstancia-se, portanto, em IMPORTÂNCIA COMPATÍVEL COM O VULTO DOS INTERESSES EM CONFLITO, REFLETINDO-SE DE MODO EXPRESSIVO, NO PATRIMÔNIO DO LESANTE, A FIM DE QUE SINTA, EFETIVAMENTE, A RESPOSTA DA ORDEM JURÍDICA AOS EFEITOS DO RESULTADO LESIVO PRODUZIDO. DEVE, POIS, SER QUANTIA ECONOMICAMENTE SIGNIFICATIVA, EM RAZÃO DAS POTENCIALIDADES DO PATRIMÔNIO DO LESANTE. Coaduna-se essa postura, ademais, com a própria índole da teoria em debate, possibilitando que se realize com maior ênfase, a sua função inibidora de comportamentos. Com efeito, o peso do ônus financeiro é, em um mundo em que cintilam interesses econômicos, a resposta pecuniária mais adequada a lesionamentos de ordem moral.”13

Portanto, considerando a magnitude dos atos de improbidade administrativa investigados pelo Ministério Público deve o valor do dano moral coletivo ser fixado em patamares suficientes para reparar o dano causado contra a

11 ob. cit., pág. 10912 STJ - RESP n.º 86.271 – SP – 3ª Turma - Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito – DJ 09/12/97.

13 “Reparação Civil por Danos Morais” in RT, 1993, pp. 220-222.

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___________________________________________________________________________força normativa da Constituição, além de funcionar como fator de inibição de outras ilegalidades e punição das já consumadas.

Por essas razões, o Ministério Público do Estado de Goiás entende que é mais do que razoável a fixação de indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais).

O valor deverá ser revertido ao Conselho da Comunidade de São Miguel do Araguaia.

IV- DA TUTELA ANTECIPADA

A Lei da Ação Civil Pública, Lei 7.347/85, prevê em seu artigo 12 a possibilidade de concessão da medida liminar:

Artigo 12. Poderá o juiz conceder mandado liminar com ou sem justificação prévia, em decisão sujeita a agravo.

O Código de Processo Civil prevê, no artigo 273, a antecipação da

tutela nos termos seguintes.

Art. 273. O Juiz poderá, a requerimento da parte, antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial, desde que, existindo prova inequívoca, se convença da verossimilhança das alegações e:

I – haja fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação; ouII - omissis..

Vejamos a lição de José dos Santos Carvalho Filho:

“A tutela preventiva tem por escopo impedir que possam consumar-se os danos na solução dos litígios submetidos ao crivo do poder judiciário. Muito freqüentemente, tais danos são irreversíveis e irreparáveis, impossibilitando o titular do direito, de obter concretamente o benefício decorrente do reconhecimento de sua pretensão. De grande relevância, pois, para a tutela cautelar é o fator tempo, como averbamos anteriormente. A simples demora, em alguns casos, torna inócua a proteção judicial, razão porque as providências preventivas devem revestir-se da necessária presteza” 14

14 FILHO, José dos Santos Carvalho. Ação Civil Pública. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1995, p. 268.____________________________________________________________________________________________________

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O fumus bonis iuris, concebido como plausibilidade do direito, é mais do que contundente ante os fatos descritos e provados no Inquérito Civil 03/09, em anexo, ressaindo patente a afronta aos ditames constitucionais da legalidade, da moralidade e da eficiência, bem como ao cânone inserto no art. 169 da CR/88 e ao regime jurídico-administrativo dos servidores municipais, previsto na Lei Municipal n. 151/94.

A seu turno, o periculum in mora reside igualmente na possibilidade de o provimento judicial concedido apenas ao final da demanda possibilitar ao réu a adoção de semelhante expediente no final de ano que se avizinha, determinando a redução ilegal do expediente administrativo, por meio de decreto executivo, com risco de danos irreversíveis à moralidade e à probidade na Administração Pública, além de contribuir para o enriquecimento ilícito dos servidores municipais, em prejuízo ao já precário atendimento ao público prestado aos administrados em escala reduzida.

Assim, atendidos os pressupostos legais, a concessão da tutela de urgência ora reclamada revela-se extremamente necessária para se prevenir os sucessivos danos que vêm sendo causados ao patrimônio público deste município, sobretudo sob o prisma imaterial, em razão da desídia e sobretudo do desprezo que o demandado vem demonstrando pela lei e pela res publica.

V – DOS PEDIDOS

Diante de todo o exposto, conclui-se claramente que o réu agiu de forma dolosa com discrepância dos vetores constitucionais e legais que orientam a Administração Pública, afrontando o regime jurídico-administrativo, causando lesão ao erário. Esta conduta deliberada, livre e consciente, impõe sua sujeição às sanções previstas na Lei n.º 8.429/92, razão pela qual o MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE GOIÁS apresenta os seguintes pedidos e requerimentos:

a) a concessão da medida LIMINAR, inaudita altera parte, com base no art. 273 do CPC e artigos 4º e 12 da Lei 7.347/85, correspondente à tutela antecipada, para que o réu seja condenado na OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER, consistente em ABSTER-SE de editar decretos desse jaez redutores de expediente administrativo, sob pena de multa pessoal diária no valor correspondente a R$5.000,00 (cinco mil reais);

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___________________________________________________________________________b) seja esta petição inicial autuada juntamente com os documentos

que a acompanham, notificando-se o Réu para a apresentação de sua manifestação preliminar prevista no artigo 17, § 7º, da Lei n.º 8.429/92, no prazo de quinze dias;

c) a comunicação pessoal dos atos processuais, nos termos do artigo 236, § 2º, do Código de Processo Civil, e do artigo 41, inciso IV, da Lei n.º 8.625/93;

d) após o oferecimento de tal manifestação, ou transcorrido o prazo legal sem sua apresentação, seja recebida esta petição inicial, citando-se o réu para oferecimento de contestação sob pena de revelia, no prazo ordinário de quinze dias, conforme disposto no artigo 17, § 9º, da Lei n.º 8.429/92;

e) sejam impostas ao Réu as sanções previstas no artigo 12, incisos II e III, da Lei n.º 8.429/92, diante da evidente lesão ao erário e violação aos princípios básicos da Administração Pública;

f) a condenação do réu ADEMIR CARDOSO DOS SANTOS no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais) a título de DANOS MORAIS COLETIVOS;

g) a confirmação da liminar, em cognição verticalmente exauriente, condenando-se o réu, em definitivo, nas obrigações de não fazer aludidas na alínea “a”;

h) a condenação do réu ao pagamento de custas processuais e demais verbas de sucumbência;

i) no caso de serem julgados procedentes os pedidos aqui formulados, sejam oficiados o Tribunal Regional Eleitoral no caso de suspensão dos direitos políticos, o Banco Central do Brasil – para que este comunique às instituições financeiras oficiais a proibição de contratar com o poder público e receber incentivos e benefícios fiscais ou creditícios – e, para o mesmo fim, seja determinada a inclusão do nome dos Réus no Cadastro de Créditos Não Quitados de Órgãos e Entidades Federais – CADIN.

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___________________________________________________________________________Este Órgão Ministerial requer a produção de todas as provas

juridicamente admitidas – em especial o depoimento pessoal dos réus, a oitiva de testemunhas, a realização de perícia e a posterior juntada de documentos.

Atribui-se à presente causa o valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais) para fins de alçada.

Termos em que pede deferimento.

São Miguel do Araguaia-GO, aos 05 de outubro de 2009.

LUCAS DANILO VAZ COSTA JÚNIOR Promotor de Justiça Substituto

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