educaÇÃo e ensino mÉdio: a construÇÃo de sentido...
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UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO
PROGRAMA DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO
KÁTIA REGINA DOS SANTOS SILVA
EDUCAÇÃO E ENSINO MÉDIO: A CONSTRUÇÃO DE
SENTIDO PARA O TRABALHO DOCENTE EM UMA
ESCOLA DE MACEIÓ/AL
SÃO PAULO – SP
2013
KÁTIA REGINA DOS SANTOS SILVA
EDUCAÇÃO E ENSINO MÉDIO: a construção de sentido para o
trabalho docente em uma escola de Maceió/Al
Dissertação apresentada como exigência
parcial para obtenção do título de Mestre
em Educação, na Universidade Cidade
de São Paulo, sob a orientação do
professor Dr. Júlio Gomes Almeida.
SÃO PAULO – SP
2013
KÁTIA REGINA DOS SANTOS SILVA
EDUCAÇÃO E ENSINO MÉDIO: a construção de sentido para o trabalho
docente em uma escola de Maceió/Al
Dissertação apresentada ao Programa de
Mestrado em Educação da Universidade
Cidade de São Paulo, como requisito
exigido para obtenção do título de
Mestre. .
Área de concentração: Educação
Data da defesa:___/___/___
Resultado: ____________________________
BANCA EXAMINADORA:
Prof. Dr. Júlio Gomes Almeida (Orientador) _______________________
Universidade Cidade de São Paulo
Profª. Dra. Maria Heloisa Aguiar da Silva _______________________
Universidade Cidade de São Paulo
Prof. Dr. Carlos Bauer _______________________
Universidade Uninove
Autorizo, para fins acadêmicos ou científicos, a reprodução total ou parcial desta dissertação, por
processos fotocopiadores ou eletrônicos, desde que citada a fonte.
Aos meus pais, pela incansável dedicação à nossa
família.
AGRADECIMENTOS
Ao professor Dr. Júlio Gomes de Almeida, orientador desta pesquisa, pela competência,
paciência e compreensão.
À minha família, pelo apoio e incentivo.
Ao Centro Universitário Cesmac, pela oportunidade.
A todos os professores do Programa de Pós-graduação – Mestrado em Educação, exemplos de
sabedoria e dedicação.
Aos professores e funcionários da escola, na qual fiz a pesquisa, pela colaboração.
A todos os funcionários do Programa de Pós-graduação – Mestrado em Educação, pela
colaboração.
À Sheila Alves funcionária da secretaria do mestrado da Unicid, pela atenção dedicada.
Aos professores Liércio Pinheiro e Álvaro Queiroz, pelo apoio e colaboração.
À professora Tereza Vasco, pelo trabalho de revisão.
RESUMO
Esta pesquisa teve como objetivo investigar o sentido do trabalho docente para
professores que atuam em uma escola de Ensino Médio da cidade de Maceió. Para realização
do estudo adotou-se a abordagem qualitativa e a coleta de dados foi realizada mediante
análise bibliográfica e documental, completada por entrevistas semiestruturadas. O trabalho
contribuiu para identificar as demandas concretas colocadas para os docentes que atuam nessa
etapa da Educação Básica e para compreensão, dentre outros aspectos, das práticas
institucionais que organizam o trabalho docente e os fatores que contribuem para atribuição
de significado ao próprio trabalho pelos professores.
Palavras-chaves: Ensino Médio. Trabalho docente. Escola.
ABSTRACT
The research had objectived to investigate the teaching’s sense for those who teach at
a High School’s level in the city of Maceió. The Qualitative approach was used in it and de
data collection happened through bibliography and documental analyses, being completed
with semi-structured interviews. This research has been contributed to identify the concrete
demand requested for those workers whom act at this level of the Basic Level of Education
and also to the comprehension of so many aspects of the institutional practices which
organizes the teachers’ methodology and the factors that gives the meaning about their own
practice.
Key-word: High School. Teaching. School.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 11
1 – O PERCURSO HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA E O TRABALHO
DOCENTE .......................................................................................................................... 16
1.1 Educação no Brasil – breve histórico ............................................................................ 16
1.2 O trabalho docente – principais debates .......................................................................38
1.3 O trabalho docente no ensino médio ..............................................................................47
2. O ENSINO MÉDIO NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA
...................................................................................................................................................52
2.1 Ensino Médio no Brasil e em Alagoas: uma breve retrospectiva ................................52
2.2 Ensino médio e educação profissional ............................................................................55
2.3 Breve relato histórico do ensino médio no estado de Alagoas.......................................55
2.4 As reformas educacionais e o Ensino Médio .................................................................57
2.5 O Ensino Médio e as Leis de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira ...................63
2.5.1 LDB nº 4.024/1961 .........................................................................................................63
2.5.2 LDB nº 5.692/1971..........................................................................................................64
2.5.3 – LDB nº 9.394/1996 .....................................................................................................65
2.6 Ensino Médio no Brasil e o debate sobre o dualismo ....................................................66
3. O SENTIDO ATRIBUÍDO PELOS PROFESSORES AO TRABALHO DOCENTE
...................................................................................................................................................73
3.1 O processo da pesquisa ....................................................................................................73
3.2 O local da pesquisa ..........................................................................................................78
3.3 Os sujeitos da pesquisa ....................................................................................................80
3.4 Função social do Ensino Médio .....................................................................................81
3.5 A função social da escola .................................................................................................84
3.6 O exercício da docência no Ensino Médio .....................................................................86
3.7 Ações coletivas na escola ..................................................................................................89
3.8 Envolvimento da comunidade .........................................................................................92
3.9 Pobreza e analfabetismo ..................................................................................................93
CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................98
REFERÊNCIAS ...................................................................................................................101
ANEXOS ...............................................................................................................................108
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INTRODUÇÃO
Com esta pesquisa, pretende-se discutir o sentido do trabalho docente para professores
que atuam em uma escola de ensino médio da cidade de Maceió e, também entender a relação
entre essa atribuição de sentido e os processos formativos dos quais participaram. A
motivação para a investigação surgiu em decorrência da minha prática como professora das
disciplinas Filosofia e Sociologia na escola onde a pesquisa foi realizada. Assim que passei a
fazer parte do corpo docente dessa escola, deparei-me com algumas situações cujo
entendimento emergiu como uma necessidade. Entre elas destaco: a falta de interesse dos
alunos pelos conteúdos ofertados; as formas como os professores lidam com a falta de
interesse dos alunos; a falta de ações coletivas por parte dos educadores no enfrentamento das
situações de falta de interesse; a dificuldade para envolvimento da comunidade nas questões
da escola; a falta de clareza sobre a função social da escola em um estado localizado em uma
região do país que apresenta um dos maiores índices de pobreza e analfabetismo, entre outros.
Nesse contexto, as deficiências no processo educativo são evidentes como bem informam os
dados do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais/Ministério da Educação que
apresentam o estado de Alagoas como detentor do pior Índice de Desenvolvimento do Ensino
Básico (IDEB) do país no ano de 2009 (FAJARDO, 2012).
Busca-se, com a realização da pesquisa, além de entender o sentido que os professores
da unidade atribuem ao seu trabalho, sistematizar conhecimentos sobre a realidade do ensino
médio com vistas a contribuir com outras pessoas interessadas em compreender o tema.
Busca-se ainda contribuir para o aprofundamento de conhecimentos acerca das relações entre
o trabalho desenvolvido por docentes no ensino médio e as condições em que se efetivam este
trabalho na cidade de Maceió, para apontar alternativas que possam entender as práticas
docentes à luz das teorias e da legislação que fundamentam as ações na Educação Básica.
Nesse sentido, a pesquisa apresenta relevância pessoal e social. Pessoal, na medida em
que poderá contribuir para compreender o contexto social em que realizo a minha prática
docente e viabilizar a construção de estratégias para o exercício da docência de forma mais
precisa quanto aos seus objetivos e fins; social, na medida em que possibilitará a
sistematização de conhecimento que ficará disponível para outros educadores, gestores
12
educacionais e responsáveis pela formulação e implementação de políticas públicas de
educação.
No Brasil, a função docente está primeiramente atrelada a uma atividade não
especializada, como uma ocupação secundária dos religiosos que aqui se instalaram com a
função de evangelizar e de educar. Reconhece-se também que, em outra fase desse percurso,
houve a tentativa de substituição desse modelo evangelizador por uma educação exercida por
docentes laicos, o que não se efetivou, pois foi o Estado o primeiro a definir as normas para a
profissão. (LOYOLA; MOURA, 2006, p. 01)
No sentido de abordar as expectativas acerca do seu trabalho, Cunha (1997, p. 129)
refere que,
historicamente, o professor construiu para si, cumprindo a expectativa da
sociedade, a idéia de que sua função era ensinar um corpo de conhecimentos
estabelecidos e legitimados pela ciência e pela cultura, especialmente pelo valor
intrínseco que representava.
Serón (apud CUNHA, p. 131) indica que a formação do professor e o grau de ensino
influenciam no seu nível de autonomia. Reconhece que aqueles advindos das universidades se
fazem perceber como detentores de uma profissão científica, enquanto que aqueles do ensino
fundamental e secundário se organizam e se constituem como uma profissão prática, ou
semiprofissão por conta da duração mais curta do curso, que possuem um corpo de
conhecimentos menos especializados e de menor autonomia.
A função de professor como mero “reinterpretador” de conhecimentos pode ser
identificado quando aponta Marzola (1992), relacionando as políticas e as mudanças no
sistema de ensino e o processo de formação de professores, que esta serve como meio para
implementar transformações no sistema de ensino, propagando em seu conteúdo decisões
governamentais e teorias pedagógicas.
Os cursos de formação servem como locais para aquisição ou aperfeiçoamento de
capacidades consideradas necessárias para utilização de novos procedimentos de ensino. Para
a autora,
se ao professor não resta outra alternativa senão ajustar-se a essa lógica, a
eficácia deste modelo formativo é evidenciada, então, na mudança de
comportamento dos professores. E, com efeito, estes devem ser capazes, ao
final da reciclagem, de reproduzirem o conhecimento ou o savoir faire (saber
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fazer) adquirido. Tudo se passa como se o resultado – a capacidade de
reproduzir – fosse a prova mais cabal da mudança do professor (MARZOLA,
1992, p. 80).
O professor, segundo essa ótica, assume o papel de agente modernizador das escolas,
quando é conhecido que as formações são veículos de “inovações educacionais” presentes
principalmente nas metodologias de ensino.
Atualmente, a prática docente ainda se constitui em um dos temas fomentadores de
grandes debates. Em pesquisas com professores, Tardif & Lessard (2008) nos apontam que o
trabalho não se esgota apenas como um mero transmissor de saberes produzidos por outros
grupos, mas como produtores de conhecimento produzidos em seu cotidiano.
Pode-se dizer que a oferta do ensino médio no Brasil não surgiu fruto de políticas
públicas que pudessem beneficiar um maior contingente possível da população. Surge no
segundo Reinado com a finalidade de preparar os jovens da elite brasileira para o
prosseguimento em cursos do ensino superior e para assumir papéis importantes no comando
da Colônia (MENESES, 2003).
No sentido de questionar os fins sociais da escola, é comum perceber que há uma
associação de que esta pode servir de mola propulsora para ascensão social. No entanto,
Dowbor (ALMEIDA; NHOQUE, 2010) aponta que há hoje uma disseminação da idéia de que
esta deve se voltar para o desenvolvimento local de “que o papel principal da escola é
contribuir para a qualidade de vida humana coletiva, na comunidade onde está inserida” (p.
01). Outra função a ser desempenhada pela escola estaria na possibilidade de articular os
conhecimentos regionais por meio de estudos e pesquisas, em um território delimitado e
realizando a interação permanente entre outros segmentos sociais (ALMEIDA; NHOQUE,
2010).
Ainda sobre a escola básica, Silva (2003, p. 62) aponta que existem duas tendências
presentes no Ensino Básico atual, sendo uma delas ligada ao significado que os educandos
atribuem ao trabalho escolar e ao tempo em que vivem na escola, associando
um tempo instrumental a outras finalidades, tais como: ser aprovado no
vestibular, ingressar no mercado de trabalho, ter acesso à merenda, ter o
cuidado de adultos enquanto os pais trabalham fora de casa, entre outros.
Estas finalidades, que por si só não são más, competem, com o estudo
considerado como meio de conhecer, fazendo com que não haja atração pelo
ato de aprender em si mesmo.
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A outra tendência apontada pelo autor diz respeito à existência de uma diversidade
cultural presente entre os alunos e estes e os educadores que se materializa principalmente
entre o choque cultural e de gerações e consequentes dificuldades na comunicação e
efetivação de vínculos (SILVA, 2003).
De forma geral, pretende-se com a pesquisa identificar o sentido que os professores de
uma escola de ensino médio da cidade de Maceió atribuem ao seu trabalho; encontrar
elementos que contribuam para que o exercício da docência no ensino médio constitua-se em
experiência de realização profissional; identificar demandas concretas para essa etapa da
Educação Básica na cidade de Maceió e compreender a relação entre as práticas institucionais
que organizam o trabalho docente no ensino médio e a função social da escola.
Nesse contexto, pretende-se entender qual o significado que os professores que atuam
em uma escola de ensino médio atribuem ao seu trabalho. Foi escolhida a Escola Estadual
José da Paz (nome fictício). Trata-se de uma escola da rede pública do estado de Alagoas,
pertencente à 15ª Coordenadoria Regional de Ensino.
Será adotada para viabilização da pesquisa a abordagem qualitativa e como
procedimento de coleta de dados a análise bibliográfica e documental que será completada por
meio de entrevistas semiestruturadas.
O trabalho será organizado em três capítulos. No primeiro, será apresentado um breve
histórico da educação no Brasil procurando destacar, por um lado, o papel social que a escola
tem desempenhado ao longo do tempo e, por outro, como esse papel tem aparecido nos
discursos e nas teorias da educação. O segundo capítulo versará sobre o ensino médio, sua
natureza, fins e objetivos definidos na legislação e como ele vem sendo trabalhado na
realidade do estado de Alagoas. O terceiro capítulo se destinará a contextualizar a clientela
que atende. Para tanto, serão coletadas e expostas informações sobre a escola e o bairro no
qual se localiza. Serão apresentados e analisados os dados coletados junto aos professores por
meio das entrevistas semiestruturadas e interpretado à luz da contribuição teórica de
estudiosos que vêm se ocupando do assunto.
Com isso, pretende-se encontrar pistas que contribuam para identificar o sentido que
os professores atribuem ao seu trabalho e entender quais são as demandas concretas dos
docentes que atuam nessa etapa da Educação Básica na cidade de Maceió. Dessa forma, será
possível também compreender a relação entre as práticas institucionais que organizam o
15
trabalho docente na escola de Ensino Médio e o sentido que os professores da escola
pesquisada atribuem para o seu trabalho para, então, buscar elementos que ajudem a
transformar o exercício da docência no ensino médio em uma experiência de realização
profissional.
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1 – O PERCURSO HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA
E O TRABALHO DOCENTE
O objetivo deste capítulo é apresentar um breve panorama sobre a educação brasileira,
buscando com isso encontrar elementos que permitam entender de que maneira a educação
vem sendo trabalhada historicamente, como vem exercendo influências sobre o entendimento
que os professores têm sobre o exercício da docência na educação básica, sobretudo no ensino
médio, objeto deste estudo. Esse panorama, embora breve, pareceu necessário no processo de
definição do problema de pesquisa que é investigar o sentido atribuído por professores
atuantes no ensino médio em uma escola de Maceió ao seu trabalho.
1.1 Educação no Brasil – breve histórico
Uma das poucas datas comemorativas que fazem referência à escola é o dia do
professor e esse registro se deve ao fato de que foi no período imperial, em 1826, que o Brasil
fez sua primeira tentativa para efetivar legalmente o sistema educativo com o projeto do
deputado Cunha Barbosa que detalhava as finalidades e os conteúdos de cada nível de ensino.
No entanto, o parlamento brasileiro se ateve a aprovar, em 15 de outubro de 1827, o projeto
que contemplava apenas o ensino elementar (SAVIANI, 2002). Pode-se ressaltar que, apesar
de distintas entidades públicas e particulares tentarem atribuir um sentido, a comemoração
realizada pioneiramente, em 1933, pelos representantes da Associação dos Professores
Católicos do Distrito Federal (APC-DF) evidenciou a luta por melhores salários e
reconhecimento da sociedade (VICENTINI, 2004). Mostra-nos também que a data nos lembra
que contingências externas ao processo educativo influenciaram desde o começo a trajetória
da educação no país, pois as ocorrências de ordem econômico-financeira na Europa
motivavam a organização e a oferta do ensino daquele continente a exemplo das forças
representativas do poder econômico na Itália que opinavam sobre o direito de instrução para
as classes menos favorecidas economicamente. As comemorações em uma das datas magnas
do ensino brasileiro (o dia do professor) foi assim motivada em função do decreto de D. Pedro
I que estabelecia, entre outros, salários e normas para contratação de professores e outras
ideias inovadoras que não foram concretizadas e lembram, talvez, que os obstáculos para
superação das dificuldades na organização do sistema público de ensino brasileiro não são tão
contemporâneos.
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No sentido de entender a trajetória histórica da educação brasileira, pode-se dizer que
os fatos originadores do processo de colonização e sua função para o governo português
foram baseados em uma relação que envolveu um centro de decisão (a metrópole), viabilizado
economicamente por um subordinado (a colônia).
Com um modelo agrário-exportador, ocorre o primeiro período da organização escolar
na história da educação brasileira, acontece entre os anos de 1549 e 1808, e engloba a fase da
educação sob os cuidados dos padres jesuítas e a fase em que o Marquês de Pombal foi o
principal articulador da educação no Brasil.
A organização escolar brasileira em sua fase inicial se liga diretamente à política
colonizadora, pois foi D. João III (1502-1557), rei de Portugal por 26 anos, que na proposição
de diretrizes básicas, se dispôs a intensificar as atividades da política interna e das suas
possessões territoriais. Tinha como meta alcançar os objetivos do Projeto Português de
colonização que consistia principalmente na conversão dos índios brasileiros à fé católica por
meio do ensino de catequese, leitura e escrita da língua portuguesa, designando a Companhia
de Jesus (SHIGUNOV NETO & MACIEL, 2008). Para cumprir esse projeto, chegaram ao
Brasil Tomé de Souza, quatro padres e dois irmãos jesuítas, estes últimos sob a chefia do
padre Manoel da Nóbrega (RIBEIRO, 1989).
A motivação para a catequização, segundo Paiva (2002), ocorreu pelo fato de que
Portugal, contrário a ordem vigente, voltada para a modernização, estava preocupado em
preservar as tradições medievais. Assim, com a vinda dos padres, a Companhia de Jesus
assumiu a responsabilidade pela educação brasileira por dois séculos e uma década.
Fundada em Paris por Ignácio de Loyola em 1534, a Ordem estava subordinada ao
Papa, buscava implantar um plano educacional missionário, além das ações da Contra-
Reforma (PAIVA, 2002). Foi considerada um dos principais instrumentos da Igreja Católica
contra a reforma protestante, utilizando a educação de homens e dos índios e a conversão à fé
católica dos povos habitantes das terras colonizadas.
Dentre as ações iniciais da Companhia, coube a construção do Colégio dos Meninos
de Jesus e da escola de São Vicente na Bahia de Todos os Santos, considerados marcos da
educação formal e escolarizada no Brasil. Para sobreviver sem o “redízima” (subsídio
governamental orçado em 10% dos impostos cobrados pela Coroa Portuguesa) concedido
durante um período curto de tempo, a Ordem organizou-se em uma estrutura com navios,
milhares de cabeças de gado, ouro, produtos agrícolas e artesanato cuja renda total (que
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chegou a representar 25% do Produto Interno Bruto brasileiro) subsidiava o funcionamento e
expansão de uma estrutura que, em 1600, possuía cerca de 8.000 membros (PAIVA, 2002).
Shigunov Neto e Maciel, precisam a estrutura material-físico-finaceira jesuítica em “36
missões, escolas de ler e escrever em quase todas as povoações e aldeias; 25 residências dos
jesuítas; 18 estabelecimentos de ensino secundário, entre colégios e seminários, nos principais
pontos do Brasil (...)” (2008, p. 186)
A breve contextualização histórica acima se propõe a ser apenas um elemento
introdutório para que se possa compreender os principais fatos ocorridos no começo da
história brasileira e suas relações com educação, pois não constitui objetivo deste estudo o
aprofundamento de tais questões.
Tratando especificamente da trajetória da educação no Brasil, pode-se dizer que a
educação ofertada pelos padres da Companhia de Jesus passou por dois momentos distintos:
A primeira parte da educação brasileira, a educação cristã, (...) idealizado e
concretizado por Padre Manuel da Nóbrega, com espírito democrático,
cristão e universalizador brasileiro, estendendo-se até cerca de 1580 e o
segundo período vivificado por uma filosofia da educação, derivada de
autoridades jesuíticas da Metrópole e segregadora do índio e do pobre
(TOBIAS, 1972, p. 54).
No primeiro momento da educação ofertada pelos jesuítas, o ensino era dividido em
duas etapas: a primeira composta pelo aprendizado do português, o ensino da doutrina cristã e
a escola de ler e escrever; a etapa subsequente era opcional e composta de aulas de ensino de
canto orfeônico e de música instrumental. Os alunos também poderiam optar pelo ensino
profissional agrícola ou aulas de gramática e a viagem de estudos à Europa (RIBEIRO, 1989).
O segundo momento obedecia a um plano de estudo, o Ratio Atque Studiorum Societates
Jesu, um documento em que estavam determinados os princípios, fundamentos e o
funcionamento da proposta educacional da escola jesuítica (PAIVA, 2002). Para Shegunov
Neto & Maciel (2008, p. 180), o Ratio Studiorum
não era um tratado sistematizado de pedagogia, mas sim uma coletânea de
regras e prescrições práticas e minuciosas a serem seguidas pelos padres
jesuítas em suas aulas. Portanto, era um manual prático e sistematizado que
apresentava ao professor a metodologia de ensino a ser utilizada em suas
aulas.
Apesar da chegada dos jesuítas em 1549, data de 1599 a publicação do documento
(cuja elaboração durou 15 anos). Era desenvolvido para todas as missões jesuíticas do mundo
e talvez tenha surgido como um projeto educacional que se transformou em um projeto de
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transformação social, pois “tinha como função propor e implementar mudanças na cultura
indígena brasileira” (SHIGUNOV NETO & MACIEL, 2008, p. 173).
Composto de duas partes, o Ratio Studiorum: studia inferiora enfatizava os estudos da
língua latina, as obras literárias greco-romanas; e a studia superiora em que se estudava
filosofia e teologia. O desenvolvimento das atividades acontecia sob um ambiente
hierarquizado, de austeridade e autoridade bem definidos e a metodologia de ensino consistia
principalmente na memorização de conteúdos (PAIVA, 2002).
A educação jesuítica surge numa perspectiva de educação influenciada pela
Universidade de Paris, pois Inácio de Loiola, que estudou na Universidade de Alcalá e
Salamanca, seguiu as inovações que brotaram da Universidade de Paris influenciado pelas
ideias de Santo Tomás de Aquino que também absorveu o modus pariensis contra o modus
italicus presente no Colégio de Messina de Viena e de Pádua (FRANÇA, s/d, apud TOBIAS,
1972, p. 65). A influência medieval e renascentista presentes na Universidade de Paris incide
na educação dos jesuítas através do Ratio Studiorum distribuídos em suas três fases: a
humanista, a filosófica e a teológica.
A pedagogia utilizada pelos jesuítas era a clássica: tanto utilizava elementos da
educação grega quanto da romana voltada para o adulto e tendo como objeto de conhecimento
a universalização e o abstrato e por isso o método era expositivo com sabatinas, tertúlias,
disputas semanais e anuais e com a presença das recapitulações. Para incrementar esse
processo,
os exemplos concretos, acessíveis à gente simples, eram utilizados. As
festas, o teatro, a música, os recreios constituíam meios para atrair e tornar a
cultura, os padres e a religião simpáticos. O método direto no estudo das
línguas portuguesa e tupi era usado, ainda que as escolas só se servissem do
antigo método de ensino da língua e gramática. Os métodos que exigiam
aparelhagem dispendiosa, tinham de ser proscritos. O método intuitivo-
empírico, acessível à imaginação, era parte do método jesuítico (TOBIAS,
1972, p. 87).
No Brasil, a educação ofertada pelos padres jesuítas sofreu inicialmente a influência
direta do Ratio Studiorum, mas, em virtude das condições adversas do ambiente e do modo de
vida de seus habitantes índios, foram forçados a adaptarem-se às condições encontradas e a
criar ou empregar outros métodos. Dentre as barreiras ao emprego literal do plano
educacional dos jesuítas, a dificuldade de comunicação interferiu porque os índios se
expressavam em tupi e os padres em português. Dessa forma, o ensino do português era
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essencialmente prioritário, pois precedia ao ensino do Evangelho. Contudo, o educador jesuíta
precisou aprender também tupi e simultaneamente também ensinava, era então mestre e
aprendiz ao mesmo tempo - o método direto. Foi assim que o tupi-guarani virou matéria do
currículo educacional dos jesuítas brasileiros e, como fruto de tal interação, Anchieta escreveu
uma gramática de tupi “Arte e Gramática da Língua mais usada na Costa do Brasil”.
Quando os pequenos índios brasileiros alcançavam o nível de entendimento do
português e avançavam no conhecimento e prática do Evangelho, começavam a frequentar a
“escola de ler e escrever” e conjuntamente aprendiam canto orfeônico ou algum instrumento
musical, pois estes serviam como recursos “pedagógicos para o bem-estar do estudante e para
entusiasmá-lo pela cultura e pela fé religiosa” (TOBIAS, 1972, p. 68).
O que podemos reconhecer como ensino médio atualmente pode ser reconhecido no
que, para Tobias (1972), era o ensino secundário ofertado em duas modalidades: para os
filhos de brasileiros que notadamente não poderiam mais estudar – a aprendizagem
profissional e agrícola; e Gramática Latina para aqueles que iriam para a viagem de estudos
na Europa.
Este modelo prosperou na época do padre Manoel da Nóbrega, porém, com a sua
morte em 1570, foi suprimida a educação profissional e, nos estudos médios, começou-se a
exigir o ensino da Gramática, Humanidades e Retórica e complementarmente o ensino de
erudição histórica, geográfica e artística.
O autor reconhece que as mudanças ocorridas após a morte de Nóbrega provocaram,
aos poucos, a perda
do espírito universalizador e cristão, notavelmente democrático e humano em
favor de uma aristocratização do ensino brasileiro, (...) uma exclusiva
preparação para os filhos dos senhores de engenho e de casa-grande, que iam
seguir o ensino superior, (...) realizada pelas mãos invisíveis mas marcantes da
educação do Marquês de Pombal (1972, p. 69).
Havia uma clara distinção entre o cotidiano da escola jesuítica antes e após a morte de
Nóbrega, e isso se faz notar pelo fato de que, no primeiro momento, as aulas aconteciam nos
períodos matutino e vespertino com duas horas de duração cada. Em função do calor e não
sendo o espaço escolar provido de muros e também pelo fato de não haver condições de
cuidar dos alunos nos horários de recreio, eles iam nadar, pescar ou catar frutas - o ensino
mantinha o educando em seu contexto. No segundo momento, a preocupação era preparar o
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aluno para os estudos na Europa e, para tal, começaram-se a separar os alunos das questões
cotidianas do ambiente brasileiro e prepará-los para o mundo das abstrações.
A metodologia de ensino era específica: os cursos inferiores (de humanidades)
consistiam na prática para atingir o estilo literário de autores clássicos e os cursos superiores
(filosofia e teologia) estavam voltados para o escolaticismo.
O fim da era jesuítica na educação brasileira aconteceu por força do Decreto-lei de 3
de setembro de 1759 promulgado pelo Rei D. José I e forçou ao exílio de Portugal e da sua
Colônia quatrocentos e dezessete membros da Companhia dos seiscentos e setenta que aqui
viviam. O documento marca também o fim do primeiro projeto de educação formal para os
habitantes do Brasil.
Os motivos pelos quais a atuação dos padres jesuítas na educação brasileira foi
interrompida estão diretamente ligados ao momento socioeconômico pelo qual Portugal vivia
naquela época. A metrópole governada por D. José I (1750 – 1777) sofria as consequências da
hegemonia política e econômica da Inglaterra, que sentia o impacto da relação estabelecida
entre a troca de produtos agrícolas por produtos manufaturados oriundos da nação inglesa.
Nas palavras de Basbaum (1957, p. 47) citado por Ribeiro (1989),
Como nação, continuava um país pobre, sem capitais, quase despovoado,
com uma lavoura decadente pela falta de braços que a trabalhassem, pelas
relações de caráter feudal ainda existentes, dirigido por um Rei absoluto,
uma nobreza arruinada, quase sem terras e sem fontes de renda, onde se
salientava uma burguesia mercantil rica mas politicamente débil, preocupada
apenas em importar e vender para o estrangeiro especiarias e escravos e
viver no luxo e na ostentação.
Era um país em que o feudalismo se desagregava por si mesmo, sem que se
consolidasse um capitalismo sobre os seus escombros.
No aspecto econômico, Portugal trazia os resultados que a força espanhola exerceu
sobre seus domínios:
(...) a sua marinha destruída, o seu império colonial esfacelado. (...) Estava
definitivamente perdido para Portugal o comércio asiático (...).
Efetivamente, só lhe sobraria o antigo império ultramarino, o Brasil e
algumas posses na África. Estas aliás valerão como fornecedoras de escravos
para o Brasil (PRADO JR., 1969, apud RIBEIRO, 1989, p. 31).
Ciente dessa realidade, em dois de agosto de 1750, Sebastião José de Carvalho e
Melo, Conde de Oeiras, o Marquês de Pombal, assumiu o cargo de ministro da Fazenda no
lugar de Azevedo Coutinho e empreendeu reformas nas áreas administrativas, econômicas,
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culturais e educacionais. Tais reformas precisavam neutralizar as forças que poderiam
ameaçar o poder absoluto do rei e, para tal, era necessário possuir o controle administrativo do
Estado (SHIGUNOV NETO & MACIEL; 2006).
Para afirmar essas medidas, as decisões se voltaram para o enfraquecimento do poder
do clero e da nobreza, além da modernização da cultura portuguesa. Voltou sua atenção para o
sistema de arrecadação, na dinâmica da economia portuguesa, incentivando o
desenvolvimento de indústrias e do comércio. As medidas que incidiram na colônia brasileira
estavam direcionadas principalmente para o combate à sonegação de impostos (SHIGUNOV
NETO & MACIEL, 2006).
No campo educacional, as reformas atingiram a oferta de ensino que estava há dois
séculos sob o controle da Companhia de Jesus tanto em Portugal quanto na Colônia e havia
uma queixa voltada para a acusação de que a Ordem dos padres jesuítas era responsável pela
decadência cultural e educacional na sociedade portuguesa, em função de que “os jesuítas
representavam um obstáculo e uma fonte de resistência às tentativas de implantação da nova
filosofia iluminista que se difundia rapidamente por toda a Europa” (SHIGUNOV NETO &
MACIEL, 2006, p. 469).
Seco e Amaral (2012) citando Maxwell, informam que entre os fatores motivadores da
expulsão dos jesuítas estava a pretensão do Marquês de Pombal em suprimir o poder que os
jesuítas exerciam na fronteira sul da colônia e que tinha implicações diretas com a disputa
entre espanhóis e portugueses pela região na qual hoje se situa o estado do Rio Grande do Sul,
que, em decorrência, extingue o Tratado de Tordesilhas e efetiva o acordo de Madri.
Especificamente sobre esta questão, interessava a Pombal
(...) que os índios fossem libertados da tutela religiosa e se miscigenassem
para assegurar um crescimento populacional que permitiria o controle do
interior, nas fronteiras. Na verdade, não acreditava em uma emigração
européia que pudesse cumprir com essa tarefa, era mais fácil europeizar,
digamos assim, a população local. Para ele, o afastamento dos jesuítas dessa
região significava tão somente, assegurar o futuro da América Portuguesa
através do povoamento estratégico. O interesse de Estado acabou entrando
em choque com a política protecionista dos jesuítas para com os índios e
melindrando as relações com Pombal, tendo este fato entrado para a história
como ‘uma grande rivalidade entre as ideias iluministas de Pombal e a
educação de base religiosa jesuítica’ (SECO & AMARAL, 2012, p. 4).
Assim, as ideias que forneceram as bases para as ações de Pombal, na verdade, surgem
a partir do movimento de um grupo de intelectuais portugueses que, motivados pelo
23
pensamento iluminista presente no final do século XVII, percebem a necessidade de
modernização da educação portuguesa, pois a única universidade portuguesa, a de Coimbra,
funcionava segundo os padrões da Idade Média - “a filosofia moderna (Descartes), a ciência
físico-matemática, os novos métodos de estudo da língua latina eram desconhecidos em
Portugal. O ensino jesuítico, solidamente instalado, continuava formando elementos da corte
dentro dos moldes do Ratio Studiorum” (RIBEIRO, 1989, p. 32).
O Marquês de Pombal ao expulsar a Ordem dos Jesuítas em 1759, concretizou uma
ideia existente na época, porque era pensamento recorrente que ela consistia em um entrave
para a unidade cristã e da sociedade civil. Mas há que se considerar que contribuiu para isso o
fato de que os padres jesuítas detinham um poder econômico que deveria ser devolvido ao
Estado, e a educação que ofertavam estava voltada à ordem religiosa e não atendia aos
interesses do país.
As orientações da era pombalina contemplavam a formação da elite brasileira e
constituía entre as suas funções formar o homem nobre e
agora negociante; simplificar e abreviar os estudos fazendo com que um
maior número se interessasse pelos cursos superiores; propiciar o
aprimoramento da língua portuguesa; diversificar o conteúdo, incluindo o de
natureza científica; torná-los os mais práticos possíveis (RIBEIRO, 1989, p.
34).
O Estado então assume o controle financeiro na oferta do ensino. Prova disso se
constata no Alvará de 28 de junho de 1759 destinado a regulamentar a criação do cargo de
diretor geral dos estudos, a submissão dos professores a exames e a designação de comissários
para realizar levantamento do estado geral das escolas e dos professores. Instauração de
inquérito com o objetivo de averiguar se os professores exerciam suas atividades devidamente
regulamentadas e se estavam fazendo uso de livros proibidos (RIBEIRO, 1989, p. 34).
Outras mudanças ocorridas afetaram o ensino secundário em que a oferta vai acontecer
por meio de aulas régias de latim, grego, filosofia e retórica. A finalidade das aulas de latim
era para que o aluno o utilizasse para o domínio da cultura latina e para o auxílio da língua
portuguesa. O ensino do grego se destinava principalmente àqueles que almejam as carreiras
de teólogo, advogados, artistas e médicos. O ensino da retórica tinha como objetivo servir
como instrumento prático para o cotidiano.
Para Shigunov Neto & Maciel (2006), a era pombalina destruiu a organização da
educação jesuítica e a metodologia de ensino empregada no Brasil e em Portugal. Isso refletiu
24
principalmente no fato de que, assim como em Portugal, no Brasil, em virtude da falta de
professores preparados, aqueles que assumiam as salas de aula exerciam baseados na
formação dos jesuítas. A outra consequência da mudança estava relacionada ao
financiamento do ensino que foi solucionado mediante cobrança do “subsídio literário”
(RIBEIRO, 1989, p. 35).
As modificações empreendidas na educação por Pombal espelham as ideias de três
pensadores Luís Antonio Verney, Ribeiro Sanches e António Genovesi, considerados
modernos, mas que apresentaram, em sua proposta pedagógica, resquícios do ensino
tradicional eclesiástico, o que demonstra que, mesmo com a ruptura com o ensino jesuítico,
não houve mudança no método educacional (SHIGUNOV NETO & MACIEL, 2006).
Luís Antonio Verney apresentou uma proposta pedagógica que pretendia fazer
oposição ao método jesuítico. Na obra “O verdadeiro método de estudar”, que consistia em
dezesseis cartas escritas em Roma, publicadas entre os anos de 1746 e 1747, Verney analisa o
ensino jesuítico ofertado em território português. Faz ainda inferências no sentido de adequar
e atualizar o ensino com a realidade da época.
Dentre as propostas inclusas em seu projeto pedagógico, propõe a redução do número
de anos para o ensino inferior, visando a aumentar o número de alunos no ensino superior;
apresenta ainda a proposta de um plano de estudos para todos os níveis de ensino, além de
reivindicar escolas públicas e gratuitas para a população portuguesa, como medida de
combate ao analfabetismo.
Apesar de existir formalmente a proposta de Verney, assim como outras, não foram
implantadas e geraram uma desorganização e decadência do ensino português durante o
período de 1759 a 1808. No Brasil, as consequências do desmantelamento da educação formal
e ausência de um novo plano educacional geraram dezessete anos de ausência de cursos
sistematizados.
Os reflexos dos acontecimentos decorrentes do processo de transformação da Europa
no século XIX, influenciaram sobremaneira a vida na Colônia. A invasão francesa a Portugal
obrigou a vinda, em 1808, da realeza para o Brasil ainda muito dependente das decisões
político-econômicas da Inglaterra, país que em muito se beneficiava da manufatura da
matéria-prima brasileira, entre outras vantagens estabelecidas na relação Portugal/Inglaterra.
25
Oliveira (2004) nos informa que a presença da realeza estreia um movimento cultural
em que, entre as mudanças, se destacam a criação do Museu Real, do Jardim Botânico, da
Biblioteca Pública e a Imprensa Régia. Em 1820, a vinda da Missão Cultural Francesa
(formada por Grandjean de Montigny, arquiteto; Jean-Baptiste Debret, pintor de história;
Nicolas-Antoine Taunay, pintor de gênero e de paisagem; Auguste-Marie Taunay, escultor e
irmão do pintor; Charles-Simon Pradier, gravador em talha fina; François Ovide, professor de
Mecânica; François Bonrepos, ajudante de Taunay) motivou a criação da Real Academia de
Desenho, Pintura, Escultura e Arquitetura Civil.
Citando Xavier (1980), Oliveira (2004, p. 947) nos diz que a educação no período do
Brasil colônia foi reduzida apenas a algumas escolas e aulas régias. Ribeiro (1989) aponta que
a palavra “curso”, na prática, se referia apenas a aulas. A criação dos cursos, na verdade
atendia a objetivos imediatistas, destinados a prover a defesa militar do Reino. Afirma que,
sob um ponto de vista, a forma como eram ofertados poderia prejudicar o seu
desenvolvimento, porque não se constituía em uma organização isolada (não-universitária) e
que a preocupação, quando na criação de tais cursos era profissionalizante. Sob outro ponto
de vista, a criação, dos cursos atende às reais necessidades brasileiras da época, o que indica
uma ruptura com o ensino dos padres jesuítas, mesmo que não tenha acontecido em todos os
níveis essa ruptura (RIBEIRO, 1989).
Para Haidar & Marioto (2004), a instrução elementar não foi considerada prioridade
pela administração central. A educação do povo ficou fadada aos interesses pessoais e
políticos absolutistas do Rei.
A estrutura do ensino na época imperial era composta de três níveis. A sequência
desses indicava que o primário podia ser compreendido como lócus de instrumentalização
técnica (escola de ler e escrever), com número reduzido em sua oferta (mais de 60 cadeiras).
A relevância desse nível se tornou evidente para aqueles que o vislumbravam como
preparação para o nível secundário com vistas ao alcance de cargos burocráticos.
O ensino secundário se estruturava em aulas régias. Houve um incremento de 20
cadeiras de gramática latina, matemática superior em Pernambuco, de desenho e história em
Vila Rica e de retórica e filosofia em Paracatu, em Minas Gerais. Através de decreto, a Bahia
foi contemplada com uma escola de ensino profissional, quando foi instituída a cadeira de
Ciência Econômica. No ano de 1810, foi criada a Aula de Comércio, destinada a formar
guarda-livros. A relevância que a produção agrícola tinha para a cidade de Salvador, em
26
virtude de que o porto da cidade abastecia outros mercados motivou a criação do curso de
Agricultura (BOAVENTURA, 2009).
Os primeiros cursos do ensino superior criados visavam formar engenheiros civis além
de que preparavam para atuação no campo militar. As instituições formadoras foram a
Academia Real da Marinha e a Academia Real Militar. No Rio de Janeiro e na Bahia foram
criados os cursos para formação de médicos cirurgiões.
A conjuntura na primeira metade do século XIX motivou a volta da corte portuguesa e
a autonomia política concedida a Colônia não apresentou efetivamente mudanças no campo
educacional.
A Carta Constitucional outorgada a partir da autonomia política alcançada em 1822,
como projeto, apontava para a construção de um sistema nacional de educação por meio da
graduação e distribuição racional de escolas por todo o território brasileiro. No entanto, o
texto de 1824, em sua versão definitiva, abandona a ideia de sistema nacional de educação e,
através do artigo 179 assegura a garantia dos direitos civis e políticos dos cidadãos espelhados
dentre outras formas, na garantia da “instrução” primária gratuita e na criação de Colégios e
Universidades (RIBEIRO, 1989).
Em 1826, o deputado Januário da Cunha Barbosa apresenta um projeto de lei em que
entre as propostas, sugere a oferta da educação como dever do Estado, a distribuição racional
das escolas por todo o território em diferentes graus e a graduação do processo educativo. A
lei publicada em 15 de outubro de 1827 apenas contemplou a oferta do ensino elementar
(escola de primeiras letras) distribuída de forma racional por todo o território nacional.
A oferta do ensino nas “Escolas de Primeiras Letras” na época mesmo garantida
constitucionalmente, se apresentava
(...) em número reduzido, como limitado é o seu objetivo, seu conteúdo e sua
metodologia. Elas enfrentavam problemas dos quais se tem notícia através
dos relatórios dos ministros da época: era difícil encontrar pessoal preparado
para o magistério; havia completa falta de amparo profissional, fazendo da
carreira algo desinteressante e não motivando um aprimoramento constante,
a população era mínima (RIBEIRO, 1989, p. 47).
Para que se possa entender esse movimento de propagação do ensino e as condições
em que acontecia a preparação dos professores antes da República, convém informar que,
para Tanuri (2000, p. 14), o motivo que ocasionou a criação de escolas para preparação de
professores
27
está ligado à institucionalização da instrução pública no mundo moderno, ou
seja, à implementação das ideias liberais de secularização e extensão do
ensino primário a todas as camadas da população. É verdade que os
movimentos da Reforma e Contra-Reforma, ao darem os primeiros passos
para a posterior publicização da educação, também contemplaram iniciativas
pertinentes à formação de professores. Mas somente com a Revolução
Francesa concretiza-se a ideia de uma escola normal a cargo do Estado,
destinada a formar professores leigos, ideia essa que encontraria condições
favoráveis no século XIX quando, paralelamente à consolidação dos Estados
Nacionais e à implantação dos sistemas públicos de ensino, multiplicaram-se
as escolas normais.
Saviani (2009) nos informa que o quadro da educação brasileira assim se configurava
em virtude de que, em se tratando especificamente da formação de professores, durante todo o
período colonial, o tema não se constituiu objetivo prioritário para a monarquia. Diz-nos ainda
que, por ocasião da promulgação da Lei de Primeiras Letras, esta determinou que o método
mútuo deveria ser aplicado e aí foi feita alusão ao artigo 4º que tratava de estabelecer que os
professores precisavam ser submetidos a treinamento.
Tal como estava ocorrendo na Europa, no Brasil, as Escolas Normais se apresentaram
como solução para a formação docente. Foram criadas então várias em diversas regiões
brasileiras, tendo sido a da Província do Rio de Janeiro a pioneira fundada em 1835.
Posteriormente, outras surgiram na Bahia, no Ceará e em São Paulo.
Os cursos eram ofertados em nível secundário e com duração de, no máximo, dois
anos. Destinadas a preparar professores especificamente para o ensino primário, a formação
tomava como foco a questão curricular, centrada no aprendizado dos conteúdos a serem
transmitidos para os alunos das escolas de primeiras letras e pouco se preocupou com as
questões de ordem pedagógico-didáticas (SAVIANI, 2009). Era a reprodução do modelo
francês de ensino e, como nos diz, um projeto das elites brasileiras detentoras de ideias
conservadoras.
Para Tanuri (2000, p. 14), as escolas normais não se firmaram de imediato como
estabelecimentos de ensino em virtude de que
em todas as províncias as escolas normais tiveram uma trajetória incerta e
atribulada, submetidas a um processo contínuo de criação e extinção para só
lograrem algum êxito a partir de 1870, quando se consolidam as ideias
liberais de democratização e obrigatoriedade da instrução primária, bem
como de liberdade de ensino.
As inconstâncias que cercavam a existência das escolas normais trouxeram críticas tais
como a do presidente da Província do Paraná que, em 1876, as definia como “plantas
exóticas: nascem e morrem quase no mesmo dia” (MOACYR, 1940, p. 239 apud TANURI,
28
2000). Para o presidente da Província do Rio de Janeiro, Couto Ferraz, elas eram “onerosas,
ineficientes qualitativamente e insignificantes quantitativamente pois era muito pequeno o
número de alunos formados” (SAVIANI, 2009, p. 14-15). Esse pensamento se efetivou com o
fechamento da escola normal da província a qual presidia e também pela substituição das
escolas pela adoção de professores adjuntos - aqueles preparados através da prática.
(SAVIANI, 2009)
Cabe ressaltar que a seleção de professores e a preparação realizada com as escolas
mútuas aconteceram antes mesmo da existência das escolas normais, assim como também
existiu de forma simultânea a estas (SAVIANI, 2009).
Tanuri (2000) nos informa que algumas evidências contribuem hoje para se
compreender as razões pelas quais as escolas normais tenham sofrido críticas relacionadas à
sua capacidade em termos de estrutura, e a organização didática eram reflexos e talvez, até
mesmo, a causa para os diminutos valores pagos aos professores, assim como a falta de
compreensão da relevância social do ensino para um país que, na época, vivia na dependência
da mão-de-obra escrava. Dessa forma, as escolas normais e os exames de seleção espelhavam
as intenções governamentais para a formação do quadro de professores.
Kulesza (1998) informa que em seu processo de institucionalização, o ensino normal
passou primeiro por um momento em que sua existência consistia como um anexo dos liceus,
acrescentavam-se ao currículo uma cadeira da Pedagogia e a prática acontecia em escolas
públicas de nível primário. Aponta ainda que dois motivos contribuíram significativamente
para o fracasso do modelo de ensino na época: um ligado para o fato de que o curso estava
voltado para a formação de dirigentes de escolas; o outro é que, para atuação no magistério,
não se fazia necessário o diploma do curso normal.
Por outras duas fases passou o ensino normal: numa, em que são extintos os liceus,
passando a existir exclusivamente as escolas normais; noutra, estas passam a se dedicarem ao
ensino de meninas órfãs (KULESZA, 1998).
Quanto à instrução secundária nessa época, era assistemática e ainda se apresentava
em forma de aulas avulsas destinadas aos meninos que aspiravam ao ensino superior ou que
optavam pela aquisição de cultura literária. A criação do Ateneu do Rio Grande do Norte, do
Liceu da Bahia e Paraíba e do Colégio Pedro II na Corte intencionava padronizar a oferta do
ensino secundário.
Quanto ao ensino superior, a época foi marcada pela criação de um curso jurídico
provisório na Corte, em 1825. Foi inaugurada a Escola de Belas Artes e do observatório
astronômico, foram apresentados vários projetos para o ensino médico. Entretanto, esse nível
29
de ensino ainda se caracterizava como profissionalizante e era destinado à formação da
sociedade aristocrática brasileira.
Com o fim do tráfico de escravos e o incremento do café como produto de exportação,
em 1850, a economia brasileira alavancou e proporcionou a criação de instituições bancárias.
Foram inauguradas estradas de ferro e outros investimentos tais como alguns de caráter
industrial. O contato com grupos de intelectuais europeus da época proporcionou aos
articuladores (pertencentes à camada dominante e média) a iniciativa para esse processo de
modernização da sociedade brasileira.
Florescem, nesse período, propostas de reformas que tomam como modelo a realidade
europeia, fruto de um modelo importado baseado nos constructos do liberalismo e do
cientificismo (positivista).
No campo educacional, as luzes se voltam para um posicionamento crítico que
ressaltou as deficiências e a consequente apresentação de proposta para reforma Leôncio de
Carvalho que ocorre em 1879, mas que não foi aprovada pelo Poder Legislativo. O autor
defendia a liberdade de ensino, exercício do magistério desvinculado de cargos públicos e
administrativos e a liberdade de frequência para os alunos dos cursos secundário e superior.
Na prática, difundiu-se principalmente a ideia de liberdade no exercício do credo religioso e a
aplicação de outras tendências pedagógicas nas escolas.
É nesse período que surge, de forma sistematizada, o ensino feminino secundário,
antes limitado apenas à escola de primeiras letras e ao aprendizado das prendas domésticas.
Desvinculado da possibilidade de que as formandas pudessem ascender ao nível superior, há
uma maior organicidade e é dada atenção às línguas modernas, às ciências e às cadeiras
pedagógicas.
Assim, são criadas escolas primárias-modelos pela iniciativa privada de protestantes
norte-americanos e positivistas. A organização escolar e os processos didáticos desenvolvidos
pelos norte-americanos na escola primária irão influenciar a educação da Primeira República
que tem como referência a criança como um ser que merece ser respeitado em seu processo de
desenvolvimento e é ativo no meio em que vive.
Em termos da formação docente, pode-se dizer que esse novo clima favoreceu o
reconhecimento da relevância das escolas normais para a disseminação do ensino primário.
Chama a atenção que, diferentemente do período anterior, neste as províncias se dedicam à
construção de novos estabelecimentos, assim como também são valorizados critérios mais
acurados para o ingresso nos cursos e o cuidado no currículo das escolas para a formação dos
professores. Inusitado talvez seja admitir que as escolas normais desse novo período foram
30
articuladas exclusivamente para preparação de professores do sexo masculino (TANURI,
2000). Acerca dessa questão, Almeida (1998) nos informa que, por décadas, o magistério foi
desempenhado exclusivamente por homens que lecionavam nas escolas normais atendendo a
clientela feminina e masculina.
Após a proclamação da República e sob a influência da corrente de pensamento
positivista, é decretada a Reforma Benjamin Constant com princípios orientadores à liberdade
e laicidade do ensino, assim como também à gratuidade do ensino primário.
De forma mais detalhada, a escola foi organizada em duas categorias: de 1º grau, que
atendia às crianças com idade entre 7 e 13 anos; e a escola de 2º grau, que atendia às crianças
com idade entre 13 e 15 anos, com duração de sete anos. Numa compreensão ampla da
situação, as medidas visavam desvincular a ideia de ensino nos níveis inferiores apenas como
preparação para o ensino superior, além também de conduzir o conhecimento para a formação
humana baseada na ciência. Há o impasse na adoção destas duas questões que põem em xeque
qual a finalidade da escola: formadora ou preparatória para o nível superior; ou direcionada
para a formação humana e literatura ou para formação humana e nas ciências. Esse impasse se
reproduz em diversas reformas que marcam a Primeira República.
De acordo com Palma Filho (2012), a Primeira República (1889 a 1930) foi o período
em que o governo federal empreendeu várias reformas no campo da educação do atual Ensino
Médio e Superior. Para Ribeiro (1989), as reformas que ocorreram nesse período
demarcavam alternativamente a vigência ora das ideias do humanismo clássico, ora da visão
realista ou científica. Afirma ainda que esse movimento na educação era, na época, reflexo da
dependência cultural fruto do contato de intelectuais da camada dominante e da classe média
brasileira com autores europeus, o que contribuiu para a necessidade do processo de
modernização da sociedade, apontando ainda que o manifesto liberal de 1868 foi um
movimento amplo que difundiu as ideias do liberalismo e do cientificismo.
No sentido de entender esse movimento, em suas palavras, Gondra (1997) nos indica
que a queda da monarquia em 1889 aconteceu em virtude da propagação das ideias
republicanas que, desde 1870, faziam alusão à revolução francesa e que esta espelhava para os
outros países um modelo de República. O novo regime necessitava de que fossem construídas
alternativas para os diversos setores da sociedade, inclusive para a educação defendida como
um sistema em que se pudesse atender a toda a população e a consequente oferta de escolas.
Para Ghiraldelli Jr (1992) o advento da República continuou sendo, tal qual na época do
Império, um sistema político elitista mas que proporcionou também a participação popular
nos processos políticos brasileiros. Para o autor, o clima da Primeira República foi
31
influenciado por dois movimentos ideológicos intelectuais da época: o “entusiasmo pela
educação” e o “otimismo pedagógico”. Em suas palavras:
O entusiasmo pela educação teve um caráter quantitativo, ou seja, em última
instância resumiu-se na ideia de expansão da rede escolar e na tarefa de
desanalfabetização do povo. O otimismo pedagógico insistiu na otimização
do ensino, ou seja, na melhoria das condições didáticas e pedagógicas da
rede escolar (p. 15).
São movimentos que do ponto de vista cronológico acontecem de forma subsequente. O
entusiasmo teve seu auge no final do Império e começo da República (entre 1887 até os anos
20 do século seguinte). O otimismo pedagógico acontece entre as décadas de 20 e 30. Na
década de 20, há o encontro dos dois movimentos que se afinam em algumas ideias
defendidas pela sociedade civil, mas que se rivalizam nos momentos em que acontecem as
Conferências Brasileiras de Educação, promovidas pela Associação Brasileira de Educação
(ABE). A representação política da época por intermédio da proposição da política
educacional adotou as ideias do otimismo pedagógico e refutou o entusiasmo. A criação da
ABE pôs em xeque a exclusividade do Congresso Nacional em discutir as questões da
educação pois que a participação de renomados professores assim como de anônimos
colaborou para a acentuação das especificidades de cada movimento.
Ghiraldelli Jr (1992) aponta que o clima de modernização no qual estavam imersos os
intelectuais que provocaram a mudança do regime também contribuiu para a necessidade da
discussão de “grandes temas” nacionais como a democracia, a implantação da Federação, o
incentivo à industrialização e, por fim, a educação popular, evidenciada principalmente pela
vontade de desanalfabetizar a população brasileira. Foi então esse clima que proporcionou o
surgimento do movimento de entusiasmo pela educação: “insistindo na ideia de que os
problemas do país só poderiam ser resolvidos com a extensão da escola elementar ao povo”
(p. 16).
Após a Primeira Guerra Mundial, são os Estados Unidos e não mais a Inglaterra, que se
elevou como parâmetro, nas mais diversas áreas, para a classe de intelectuais do Brasil. O
movimento de otimismo pedagógico surge nesta época, baseado nas ideias do Movimento da
Escola Nova, tendo como referências John Dewey e William Kilpatrick que defendiam a
reorganização das questões intrínsecas à escola assim como a preocupação nas questões de
ordem didático-pedagógicas.
Enquanto o movimento de entusiasmo pela educação foi impulsionado por intelectuais,
o movimento de otimismo pedagógico foi vinculado pela representação política, materializado
pelo ciclo de reformas educacionais estaduais e abraçado posteriormente por um grupo de
32
intelectuais que nos anos trinta era reconhecido como “profissionais da educação”
(GHIRALDELLI JR, 1992).
Quanto ao entusiasmo pela educação, Ribeiro (1989) destaca a fala de J. Nagle (1974, p.
99-100) ao dizer que o movimento foi
a crença de que, pela multiplicação das instituições escolares, pela
disseminação da educação escolar, será possível incorporar grandes camadas
da população na senda do progresso nacional e colocar o Brasil no caminho
das grandes nações do mundo (...)
E, referindo-se ao otimismo pedagógico cita ainda J. Nagle que define esse movimento
como “a crença de que determinadas formulações doutrinárias sobre a escolarização indicam
o caminho para a verdadeira formação do homem brasileiro” (1974, p. 99-100).
Para Ribeiro (1989), as reformas oficiais que aconteceram na década de 20, na verdade,
apenas significavam uma repetição do que havia acontecido no final do século anterior, no
entanto, em dimensões regionais. Ilustra essa ideia a proposta da implantação da “escola
primária integral”. Para os ensinos médio e superior, não foram apresentadas alterações que
tenham comprometido as ideias difundidas no período da Primeira República. A proposta
para o ensino médio estava vinculada ao desenvolvimento do caráter científico, a oferta de
vários tipos de cursos e a integração com o ensino primário e o superior.
Os acontecimentos políticos que marcaram a década de 30, na visão de Pereira (1970)
citado por Ribeiro (1989), a apontam como a época do “grande despertar” da sociedade
brasileira voltada para as causas do subdesenvolvimento em relação às outras nações.
Para Ghiraldelli Jr (1992, p. 39), entre os anos de 1930-1937,
o Brasil viveu um dos períodos de maior radicalização política de história.
Essa época de efervescência ideológica foi substancialmente rica na
diversidade de projetos distintos para a sociedade brasileira. Em cada um
desses projetos não faltou a elaboração de uma nova política educacional
para o país.
O autor identifica quatro tendências que se apresentavam como defensores de projetos
educacionais distintos: os liberais - defensores da Pedagogia Nova, incentivadores de
reformas acontecidas na década de 20 e conhecidos como os profissionais da educação. São
os signatários do “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova”, movimento que propôs a
renovação e reformulação da política educacional brasileira.
Os católicos e os representantes da Ação Integralista Brasileira (AIB) também se
fizeram presentes nessa época, rivalizando com os liberais em relação às ideias
escolanovistas; há ainda que se identificar o grupo representante da Aliança Nacional
33
Libertadora (ANL), participantes do Movimento Operário da Primeira República, defendia a
democratização do ensino. O poder público (tendo à frente Getúlio Vargas) também defendia
os seus propósitos para a política educacional e foi Francisco Campos – ministro da Educação
e Saúde Pública, na época, que implementou uma política educacional que não chegou a
atender ao projeto de uma educação alicerçada em princípios democráticos.
Para Ghiraldelli Jr (1992), a Carta Constitucional de 1934 apresenta em seu texto os
resultados da mediação entre os dois principais grupos defensores da educação – os católicos
e os liberais. Trata de questões não tidas nas Constituições anteriores (de 1824 e 1891), tais
quais: definição de que cabe à União fixar, coordenar e fiscalizar o Plano Nacional de
Educação para todos os níveis e especialidades; obrigatoriedade de concurso público para o
preenchimento de vagas do magistério; determinação de que cabe ao Estado a fiscalização e
regulamentação das instituições de ensino tanto no âmbito público quanto privado; e,
estabelecimento de que, no mínimo, 10% do orçamento anual dos municípios devem ser
destinados à Educação, enquanto que aos Estados da federação, 20%. Atendendo aos apelos
da representação católica, estabelece a oferta do ensino religioso e reconhece o papel da
família no processo educativo.
No segundo mandato de Getúlio Vargas, foi promulgada a Carta Constitucional de
1937 e algumas questões ligadas à educação são peculiares ao momento político pelo qual
passava o Brasil. Sob o comando de Francisco Campos, o texto indica a transferência da
responsabilidade da educação aos pais e a adoção de decretos-lei que tinham a intenção de
fazer vigorar as leis orgânicas do ensino.
Com a deposição de Getúlio Vargas do governo e o fim da Segunda Guerra
Mundial, o contexto brasileiro convergia para o mesmo clima europeu que estava voltado para
efetivação como países democráticos. Como nos diz Ghiraldelli Jr. (1992, p. 105),
Era impossível, portanto, contrariar esse processo mundial de
redemocratização. Entre 1945 e 1947 o movimento popular no Brasil
cresceu. Entre a formação de partidos, as eleições para a presidência da
República e a Constituinte, toda uma agitação ideológica ganhou as ruas e
revigorou a sociedade brasileira.
A União das Repúblicas Socialistas Soviéticas – URSS tornou real o socialismo e seus
princípios em muito influenciaram a ação política no Brasil. Nas eleições de 1927, foram
eleitos dois vereadores pelo Partido Comunista do Brasil. O crescimento do Partido com a
Aliança Nacional Libertadora proporcionou o debate teórico, sufocado pela derrota na
Intentona Comunista em 1935.
34
O Partido Comunista existiu legalmente entre os anos de 1945 a 1947 e, nesse período,
se empenhou principalmente pela defesa do processo de redemocratização e das eleições para
a Assembleia Nacional Constituinte, incentivando a organização de “comitês populares
democráticos” que se multiplicaram por várias cidades e capitais brasileiras. As ideias do
Partido alcançaram a classe trabalhadora em diversos setores como fábricas, serviços,
comércio e os intelectuais que passaram a reivindicar melhorias sociais. As atividades dos
comitês se voltaram também para a área de educação por meio de cursos de alfabetização de
adultos e crianças e de “cursos técnicos populares” de química industrial, corte e costura,
eletrônica, taquigrafia, inglês prático-comercial, história, política, teatro infantil entre outros.
Os cursos eram gratuitos e muitos chegaram a acontecer em escolas públicas, contavam com o
apoio de lideranças comunitárias e de profissionais do magistério público.
Ghiraldelli Jr (1992) nos informa ainda que foi entre as décadas de 40 e 50 que os
intelectuais se engajaram nos movimentos de esquerda, baseados no socialismo, e esse
engajamento culminou com a apresentação de um manifesto-proposta que versava sobre uma
política democrática para a educação e a cultura brasileira, defendendo ensino público para
todos os níveis do ensino.
Durante treze anos, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) tramitou
e, em 1961, foi promulgada sob o número 4.024, tendo como destaque ainda o debate entre o
ensino público e particular. O documento não atendeu às reivindicações dos educadores que
se organizaram no movimento de desanalfabetização e da conscientização da população para
a compreensão da realidade brasileira na época.
A gestão de Juscelino Kubitschek à frente do país foi marcada principalmente pelo
projeto desenvolvimentista formatado para a infraestrutura básica da industrialização. A
educação, neste contexto, estava voltada para impulsionar tais ideias.
O governo do presidente João Goulart foi marcado pela proposta do Plano Trienal de
Desenvolvimento e, entre as medidas para a educação, estava contida a superação do quadro
de analfabetismo com a expansão da oferta do ensino primário. Foram apresentadas
alternativas quantitativas e qualitativas: intenção de matricular a população que tinha entre 7 e
11 anos de idade; aumento da quantidade de alunos no ensino médio e superior; qualificação
de professores para atender ao curso primário; escola em tempo integral, entre outras.
Sob o número 5.692, a Lei de Diretrizes e Bases de 31 de março de 1964 foi
promulgada no o governo militar e conjuntamente com a Lei 5.540/1968 (que ordenava o
ensino superior) foram marcadas principalmente para uma educação concebida para atender
ao mercado de trabalho e o ensino médio voltado para atender às classes trabalhadoras.
35
De forma geral, a lei tratou do agrupamento entre o ensino primário e ginasial, o
Conselho Federal de Educação se incubia de definir as disciplinas que deveriam compor o
núcleo comum dos currículos. Talvez o ponto marcante dessa Lei foi a determinação da
profissionalização no ensino médio tanto para a iniciativa pública quanto particular. O curso
de formação de professores também foi enquadrado sob a mesma lógica da profissionalização.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 (9.394) sofreu
principalmente a influência da época marcada pelo processo de transição democrática contida
na Carta Constitucional de 1988. A disposição dos níveis de ensino são então agrupados em
ensino básico, formado pela educação infantil, fundamental e médio, e educação superior.
Outras modalidades são incluídas tais quais: educação de jovens e adultos, educação
profissional e a educação especial.
É contemplada ainda a formação de professores que tal qual determina a Lei, devem
exercer suas atividades docentes aqueles que possuírem a formação superior. Os cursos de
pedagogia passam então a habilitar para a administração, planejamento, inspeção, orientação
educacional e docência na educação básica.
Transcorridos mais de dezesseis anos de promulgação da Lei 9394/1996, muitos de
seus artigos serviram à regulamentação através de medidas provisórias, resoluções, pareceres
e outros. Brzezinsk (2010) destaca as principais mudanças que se deram principalmente no
tocante à: a instituição do Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior; implantação do
Programa Universidade para Todos (PROUNI) destinado a formalização de parceria com o
setor privado que busca diminuir o distanciamento das classes sociais menos favorecidas
economicamente mediante garantia de acesso e permanência nos cursos de nível superior.
Outra ação dirigida ao ensino foi a implantação do Sistema Universidade Aberta do Brasil
(UAB), que tem entre seus objetivos a oferta de ensino a distância de nível superior, a
formalização dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (IFET) e o programa
de Apoio aos Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI),
destinados à ampliação das vagas no ensino universitário público.
Quanto às questões ligadas ao financiamento da educação pública, a autora assinala
que a lei nº 9.424/1996 a qual instituiu o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino
Fundamental e de Valorização do Magistério Nacional de Financiamento da Educação Básica
(FUNDEF) e a lei nº 11.494/2006 que criou o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da
Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB), interferiram
positivamente no ensino fundamental, no sentido de corrigir as distorções, ampliando a
destinação de recursos também para a educação infantil, educação de jovens e adultos (EJA) e
36
do ensino médio, além de que repercutiram também na destinação de verbas para o
desenvolvimento de planos de carreira do magistério. Ainda referente às ações que envolvem
a prática docente, há que se ressaltar a homologação da lei nº 11.738/2008 que institui o piso
salarial profissional dos profissionais do magistério.
Carvalho (2001), em citação aos argumentos de Freitas (1992), quando faz referência à
expressão “profissionais da educação”, tal como posto na LDB, esclarece que esta diz respeito
aqueles que desempenham trabalho dentro ou fora da escola, não necessariamente relacionado
com a docência.
Brzezinsk (2010) aponta que ainda como efeito da regulamentação do artigo 9º, inciso
I que institui, sob a lei nº 10.172/2001, o Plano Nacional da Educação, que nas palavras da
autora,
de fato pretendeu dar certa organicidade ao sistema nacional de educação, à
medida que apresenta diagnóstico de cada nível e modalidade de ensino,
propõe metas e objetivos na esfera da União e atribui aos estados e
municípios a obrigatoriedade da elaboração de planos estaduais e municipais
(p. 200).
Na trajetória histórica da educação brasileira, este documento que pretende dar
organicidade ao sistema nacional de educação nem sempre teve esse nível de compreensão
quanto as suas finalidades e objetivos. Azanha (2004) defende que foi em sua história recente
que a educação brasileira foi reconhecida como um problema nacional. Para ele, como um
problema governamental, decorre da percepção coletiva, da consciência crítica da realidade.
Informa-nos que a educação só foi reconhecida com o advento da República, pois, até então,
sua função estava relacionada às questões limitadas à organização administrativa e à formação
das classes abastadas da sociedade tanto na época da Colônia quanto no período do Império.
A partir da década de 20, o debate nacional em torno da questão da educação se tornou
um problema que foi percebido como impreterivelmente relacionado com os rumos da nação.
Nagle informa que a educação teve visibilidade porque, a partir daí, seria necessário realizar
modificações nos padrões de ensino e cultura das instituições escolares, para as modalidades e
os níveis de ensino, em função de que
Os quadros social, político e econômico dessa década, com a continuidade
significativa das correntes migratórias, a urbanização, as insatisfações
políticas represadas desde a Proclamação da República e a intensificação das
tensões entre a industrialização nascente as crises do comércio cafeeiro
foram altamente propícios para que a questão educacional se impusesse
como de interesse coletivo e de salvação nacional. Aliás, foi nesses termos
que os diversos movimentos sociais que então apareceram – ligados ou não
aos partidos políticos – passaram a se preocupar com a escola popular, a sua
37
reforma e a sua disseminação. Várias tentativas reformistas ocorreram em
diferentes estados; foi nesse período que se iniciou uma efetiva
profissionalização do magistério e que novos métodos e modelos
pedagógicos começaram a ser mais amplamente discutidos e introduzidos
nas escolas. Essa efervescência dos assuntos educacionais, esse ‘entusiasmo
pela educação’, conforme expressão usada por J. Nagle, gerou uma ‘atitude’
que se desenvolveu nas correntes de ideias e movimentos político-sociais e
que consistia em atribuir importância cada vez maior ao tema da instrução,
nos seus diversos níveis e tipos (2004, p. 71).
No sentido de compreender as relações entre as ações governamentais de
planejamento no setor educacional, Azanha (2004) atribui ao grupo de educadores que
participou do “Manifesto dos Pioneiros da Educação” como aquele que conseguiu vislumbrar,
no momento histórico pelo qual passava a sociedade brasileira, na década de 30, a relevância
da apresentação em documento de um diagnóstico e de propostas para a educação. Reconhece
que a proposição de um processo de planejamento envolve etapas de ordem política e técnica
e, a clareza quanto à necessidade de um plano para a educação decorre do movimento desses
intelectuais.
Oficialmente o governo brasileiro apresentou um projeto do Plano de Educação
Nacional elaborado pelo Conselho Nacional de Educação, prerrogativa da Constituição de
1934, mas que não chegou a vigorar em virtude da instalação do Estado Novo. Em 1937,
outro plano foi instituído, que em nada fazia valer as ideias defendidas pelos educadores.
Entretanto, entre os pontos inclusos, três são destaques e persistiram como concepção para
fundamentar as legislações educacionais subsequentes: a noção de que o Plano de Educação
Nacional deve identificar-se com as diretrizes para a educação da nação; a existência por
força de legislação; e a revisão após uma vigência de tempo em espaço prolongado.
Efetivamente, em 1962, no governo de Juscelino Kubistchek, foi instituído o primeiro
Plano de Educação, incluso no plano de metas governamental. Foi o primeiro elaborado já sob
a lei de Diretrizes e Bases da Educação. Pode-se dizer que era composto por um conjunto de
metas qualitativas e quantitativas a serem desenvolvidas em um período de oito anos.
Após as duas revisões pelas quais sofreu o Plano de 1962, Azanha (2004), citando
Roberto Moreira, informa que outros dez planos foram elaborados em um período de trinta
anos, e isso denota que a execução parcial, as sucessivas revisões e o abandono dos planos se
justificam pela especificidade das mazelas presentes na administração pública brasileira e em
virtude de que a educação nunca constituiu elemento prioritário para os governos brasileiros
que concebem o planejamento educacional como um esquema de repartição de recursos,
38
diferentemente da intenção propagada pelos educadores signatários do Manifesto dos
Pioneiros.
Azanha (2004) discute que mesmo a ciência deve observar as peculiaridades
contextuais, assim como informa de que não existe uma ciência do planejamento. As questões
relacionadas com a gestão pública; os conceitos de eficácia e eficiência talvez não sejam tão
apropriados, pois a questão do planejamento das ações educativas deve ter como norte
orientador os agentes que fazem parte do cotidiano escolar. Defende ainda que haja clareza
quanto aos objetivos definidos no momento da elaboração de planos de educação e de
políticas educacionais.
Reconhece assim que a Emenda Constitucional nº 14, regulamentada pela Lei nº
9.424, que institui a necessidade de um Plano Nacional de Educação traz como efeito
imediato o Plano de 9 de janeiro de 2001, sob a lei nº 10.172. Entre os avanços conquistados,
prescreve como importante componente a autonomia da escola e a municipalização do ensino
fundamental (AZANHA, 2004).
1.2 – O trabalho docente – principais debates
Entender o trabalho docente no ensino médio nos dias atuais requer compreender os
vários fatores que incidem sobre ele e as correlações quanto ao seu papel no processo
educativo e o contexto social.
No início da década de 90, Zibas (2005) afirmou que, assim como outras questões, o
ensino secundário nos países da América Latina passa por situações semelhantes, por vezes
ligados à estrutura com desdobramentos sociais e/ou culturais: financiamento, duplicidade em
seus objetivos (propedêutico para os cursos superiores ou que representa um término de nível
de escolar), bem como a possibilidade de que este sirva como preparatório para o mundo do
trabalho.
Para Nóvoa (1995), a origem do magistério docente como profissão aconteceu em
virtude da ação do Estado que substituiu a Igreja responsável na época pela difusão do ensino.
A construção de uma rede escolar portuguesa territorialmente distribuída intencionava
propagar a ideologia do Estado. A profissão surge a partir do momento em que este a designa
como instrumento disseminador ideológico. A imagem construída a partir dessa ruptura surge
então como aquela que
39
cruza as referências ao magistério docente, ao apostolado e ao sacerdócio,
com a humildade e a obediência devidas aos funcionários públicos, tudo isto
envolto numa auréola algo mística de valorização de qualidades de relação e
de compreensão da pessoa humana. Simultaneamente, a profissão docente
impregna-se de uma espécie de entre dois, que tem estigmatizado a história
contemporânea dos professores: não devem saber de mais, nem de menos;
não se devem misturar com o povo, nem com a burguesia; não devem ser
pobres, nem ricos; não são (bem) funcionários públicos, nem profissionais
liberais, etc. (p. 16)
Silva (2004b) confirma esse discurso, quando nos diz que, em análise aos documentos
que fornecem informações para a construção da memória da profissão, percebe a presença de
elementos como dom, missão e sacerdócio inerentes a ela.
De forma pormenorizada, entender como a profissão docente transitou de um trabalho
sacerdotal para o quadro atual, ligado à proletarização, ligado aos fins pelos quais a sociedade
portuguesa concebeu a educação. Como o Estado tratou o trabalho docente durante a sua
história variou nos diversos períodos históricos. Na República, a educação se propunha
atender aos objetivos vinculados ao progresso, a classe de professores então desempenhou um
papel charneira, cujo objetivo era especificamente o controle da categoria. As escolas normais
que surgem cumprem esse mandado, mas também funcionam como espaços de reflexão para
os professores acerca de seu trabalho (NÓVOA, 1995).
Para o autor, nesse mesmo período, alguns fatos históricos como a consolidação das
instituições de formação docente; a crescente feminização do corpo docente nas instituições; o
aumento do associativismo docente; e as mudanças no aspecto socioeconômico dos
professores irão influenciar a ação do docente no ensino primário e secundário e pode-se
afirmar, reforçaram o controle estatal, mas também contribuíram para a afirmação da
autonomia no trabalho docente.
A criação de cursos normais como espaços institucionais de formação docente vai
historicamente contribuir para que o Estado utilize a escola para disseminar a ideologia e,
posteriormente, servir ao controle administrativo – este último relacionado ao controle
burocrático do trabalho docente.
Convém frisar que os controles – burocrático e administrativo – aos quais é submetida
a atividade (aqui fazendo uma analogia com a atividade docente) podem ser compreendidos
de forma mais ampla, conceitualmente: o ideológico, assim como nos informa Chauí (1982, p.
3), pode estar vinculado
40
(...) não apenas a representação imaginária do real para servir ao exercício da
dominação em uma sociedade fundada na luta de classes, como não é apenas
a inversão imaginária do processo histórico na qual as ideias ocupariam o
lugar dos agentes históricos reais. A ideologia, forma específica do
imaginário social moderno, é a maneira necessária pela qual os agentes
sociais representam para si mesmos o aparecer (que não devemos
simplesmente tomar como sinônimo de ilusão ou falsidade), por ser o modo
imediato e abstrato de manifestação do processo histórico, é o ocultamento
ou a dissimulação do real. Fundamentalmente, a ideologia é um corpo
sistemático de representações e de normas que nos “ensinam” a conhecer e a
agir.
A utilização da burocracia no trabalho docente pode ser compreendida a partir do
processo de Organização do trabalho. Pode ocorrer em qualquer nível, impõe um quadro
social não diversificado, age em alguns aspectos como a condição de estabilidade no
emprego; a existência da hierarquia salarial e das funções; a distribuição de responsabilidades,
além de que todos esses aspectos se voltam para a construção de um status socioeconômico
(CHAUÍ, 1982).
A participação como mediador dos processos que se estabelecem entre os indivíduos e
a sociedade civil nas situações da vida social fazem com que o Estado lance mão do discurso
da Organização como um recurso que serve para ocultar a sua participação nessas relações.
Chauí (1982) afirma ainda que há no discurso competente do Estado dois movimentos
difíceis de perceber: um que afirma e outro que nega o crescimento do poder pelo Estado. Não
existe esse movimento, trata-se de apenas um discurso “dotado de duas caras”, mas
enxergamos a dualidade entre discurso do poder e do conhecimento, ou mais precisamente o
discurso do burocrata e o do não-burocrata.
Não são todos que estão autorizados a proferir o discurso competente. Há valorização
do conhecimento científico, porque se apropria do conhecimento dito científico e institui
aquilo que deve ser reconhecido como verdadeiro ou autorizado já que trabalha para dissociar
a relação que existe entre o tempo e o lugar em que um dito conhecimento nasceu. Para
propalar o instituído, há que se realizar a demarcação, a separação e a circunscrição do
discurso para selecionar os interlocutores, o tempo, o lugar, a forma e o conteúdo (CHAUÍ,
1982).
Em épocas atuais, pode-se dizer, é mais compreensível enxergar as relações entre o
controle estatal e as condições em que se realizam as atividades dos professores. A
interferência de agências internacionais na área de educação acontece em muitos países do
41
mundo. O discurso que embasa um projeto descentralizador e de participação, tal qual
proposto por estas, reforçam mais ainda o poder do Estado no controle do trabalho docente e o
espelho disso são as proposições avaliativas. O quadro atual demonstra que as reformas que
foram implantadas
(...) têm aprofundado o fosso que separa os actores dos decisores,
fomentando perspectivas sociais conformistas e orientações técnicas sobre o
papel dos professores. A tutela político-estatal tende a prolongar-se através
de uma tutela científico-curricular, verificando-se a instauração de novos
controlos, mais sutis, sobre a profissão docente (NÓVOA, 1995, p. 22-23).
Nóvoa (1995) utiliza as palavras de Ginsburg para informar que o impacto das
reformas contribuíram para constituição atual de um certo mal-estar docente assentado em
dois processos antagônicos: um relacionado com a profissionalização e o outro, com a
proletarização do corpo docente. O primeiro conduz à maximização do trabalho docente,
efetivado no aumento dos salários, no exercício autônomo de suas atividades. O segundo
processo diz respeito à proletarização, condição totalmente contrária à profissionalização. O
espelho da proletarização se reflete na separação entre a consecução e execução, na
padronização das tarefas, nos custos necessários para contratação da força de trabalho e na
crescente definição de critérios do trabalho docente.
Ainda para o autor (1995, p. 24), os dois processos e a tensão aos quais estão
submetidos os professores portugueses também atingem os professores de muitos outros
países. Ressalta que o controle e a interferência de especialistas caracterizam a separação
entre aquele que concebe e os executores da tarefa e como tal,
(...) trata-se de um fenômeno social que legitima a intervenção de
especialistas científicos e sublinha as características técnicas do trabalho dos
professores, provocando uma degradação do seu estatuto e retirando-lhes
margens importantes de autonomia profissional. Por outro lado, a tendência
no sentido da intensificação do trabalho dos professores, com uma inflação
de tarefas diárias e uma sobrecarga permanente de actividades.
As palavras de Apple & Jungek (1990) citadas por Nóvoa, ilustram o pensamento
anterior quando afirmam que a intensificação do trabalho conduz o professor a adotar atalhos,
economizar esforços, trabalhar realizando apenas as tarefas essenciais. Isso impreterivelmente
leva os professores a apoiarem-se em especialistas e, dependentes de suas orientações, resulta
em um processo de depreciação da experiência e das capacidades que adquiram ao longo do
exercício de seu trabalho.
42
Mas, para o autor, atenção deve ser dada aos cursos de formação de professores, pois
estes devem se apresentar como alternativa para a construção de uma “nova”
profissionalidade docente impregnada da cultura específica dos professores e da cultura
organizacional da escola.
Esse movimento deve priorizar a formação do perfil de professor crítico-reflexivo, por
si, autônomo, que subsidia a autoformação. Explica Nóvoa (1995) que a formação não se
constitui em um mero acúmulo de conhecimentos, fruto de cursos ou de técnicas, mas através
da ação reflexiva crítica sobre as práticas; pela permanente construção/reconstrução da
identidade pessoal.
Como visto, no Brasil, o exercício da docência serviu originalmente para atender as
necessidades iniciais dos educandos no que se refere aos princípios morais e de letramento.
Para Nóvoa (1995), a docência no ensino secundário era campo e domínio de profissionais
que tinham a sua imagem associada à produção científica e à intelectualidade.
Arroyo (2009, p. 18) faz a defesa de que o exercício da docência deve ser considerado
“ofício de mestre” e justifica que a expressão está associada
(...) a um fazer qualificado, profissional. Os ofícios se referem a um coletivo
de trabalhadores qualificados, os mestres de um ofício que só eles sabem
fazer, que lhes pertence, porque aprenderam seus segredos, seus saberes e
suas artes. Uma identidade respeitada, reconhecida socialmente, de traços
bem definidos. Os mestres de ofício carregavam o orgulho de sua maestria.
Inquietações e vontades tão parecidas, tão manifestas no conjunto de lutas da
categoria docente.
“Ofício de mestre” é o saber específico, herdado, que não deve ser avaliado tomando
as medidas da administração gerencial, de operações racionais que balizam a organização e a
divisão do trabalho na gestão dos sistemas de ensino. Para o autor, existe uma cultura docente
com ainda algumas dimensões e traços da ação educativa que sustentam o ofício.
No sentido de abordar as funções do professor, Cunha (1999, p. 129) refere que,
historicamente, o professor construiu para si, cumprindo a expectativa da
sociedade, a ideia de que sua função era ensinar um corpo de conhecimentos
estabelecidos e legitimados pela ciência e pela cultura, especialmente pelo valor
intrínseco que representavam.
Serón apud Cunha (1999, p. 131) indica que a formação do professor e o grau de
ensino influenciam no seu nível de autonomia. Reconhece que aqueles advindos das
43
universidades se fazem perceber como detentores de uma profissão científica, enquanto que
aqueles do ensino fundamental e secundário se organizam e se constituem como uma
profissão prática, ou semiprofissão. Por conta da duração mais curta do curso, possuem um
corpo de conhecimentos menos especializado e de menor autonomia.
Retificando esse ponto vista, Arroyo (2009) informa que a imagem social e o
reconhecimento social para cada nível de ensino são diferentes e nem sempre são
convergentes. Cita como exemplo a imagem dos professores da educação infantil e dos que
lecionam as primeiras séries do ensino fundamental. A docência está impregnada de uma
imagem social construída, o desencontro entre o que se espera da profissão, a imagem
pretendida pela categoria e a autoimagem gera um mal-estar que incide na identidade da
categoria.
Dessa forma, os professores que lecionam nas turmas das séries finais do ensino
fundamental e do ensino médio conquistaram uma certa imagem social em função de que se
apresentam como docentes e não como educadores. Arroyo (2009, p. 30) justifica que isso faz
com que se diferenciem dos outros níveis de ensino, porque,
Não incorporaram os traços reconhecidos da professora primária, nem a
confiança social. Não incorporaram a figura do educador, condutor da
adolescência e juventude como a professora incorporou o cuidado, a
dedicação e o acompanhamento da infância. Nem conseguiram incorporar,
ainda que licenciados, os traços da imagem de docente, professor de um
campo do conhecimento, reservado ao professor universitário, socialmente
definido com um estatuto de competente.
A função de professor, como mero “reinterpretador” de conhecimentos, pode ser
identificada, quando Marzola (1993), relacionando as políticas e as mudanças no sistema de
ensino e o processo de formação de professores, indica que esta serve como meio para
implementar transformações no sistema de ensino, propagando em seu conteúdo decisões
governamentais e teorias pedagógicas. Os cursos de formação servem como locais para
aquisição ou aperfeiçoamento de capacidades consideradas necessárias para utilização de
novos procedimentos de ensino. Para a autora,
se ao professor não resta outra alternativa senão ajustar-se a essa lógica, a
eficácia deste modelo formativo é evidenciada, então, na mudança de
comportamento dos professores. E, com efeito, estes devem ser capazes, ao
final da reciclagem, de reproduzirem o conhecimento ou o savoir faire (saber
fazer) adquirido. Tudo se passa como se o resultado – a capacidade de
reproduzir – fosse a prova mais cabal da mudança do professor (p. 80).
44
O professor, segundo essa ótica, assume o papel de agente modernizador das escolas,
quando é conhecido que as formações são veículos de “inovações educacionais” presentes
principalmente nas metodologias de ensino.
Há ainda os discursos que desviam o debate da centralidade da ação docente. Para
Arroyo (2009), os ataques a que são expostos os profissionais da educação por gestões
tecnocratas em busca de ações “modernizantes” ou por gestores progressistas em torno da
participação da comunidade contribuem para a descaracterização do que é específico na ação
desses profissionais.
Em pesquisas com professores, Tardif & Lessard (2008) nos apontam que o trabalho
não se esgota apenas como um mero transmissor de saberes produzidos por outros grupos,
mas como produtores de conhecimento produzidos em seu cotidiano.
Para o desenvolvimento de tais ideias, compreendem como premissa, o trabalho
docente como um trabalho interativo. Para tal, apontam que cinco motivos dão suporte a esta
abordagem: o trabalho interativo na organização socioeconômica do trabalho; o trabalho
docente, componente nessa organização; os modelos de trabalho docente na organização
industrial; a questão da profissionalização do ensino e o trabalho docente e a análise da
interação humana e docência.
Para os autores, a transformação da matéria inerte como um trabalho foi importante
para as sociedades industriais modernas e representou a atividade humana em sua essência,
assim como influenciou o pensamento dos marxistas, funcionalistas e liberais. Apontam que a
sociologia do trabalho definiu que a participação nas relações sociais de produção configurava
verdadeiramente o trabalhador, o cidadão. Essa concepção alimenta as ideologias
desenvolvimentistas e neoliberais nos dias atuais. Assim, o trabalho docente nesta sociedade
se volta para a formação de trabalhadores para o mercado de trabalho.
Entretanto, ressaltam os autores que esta visão do trabalho não é válida para as
sociedades modernas avançadas: o trabalho docente é útil para compreensão do processo de
transformação porque vêm passando as sociedades do trabalho pois a categoria dos
trabalhadores de bens materiais tem decaído. Em seu lugar, a prestação de serviços tem
assumido essa posição, formada principalmente por grupos de profissionais, cientistas e
técnicos que produzem a sociedade do conhecimento. São essas novas atividades trabalhistas
que estão presentes e respondem às demandas pela gestão das questões econômicas e sociais.
45
Simultaneamente a esse processo, cresce também o mercado para ocupação de cargos que
lidam com atividades burocráticas que se utilizam da racionalidade instrumental e planificada,
voltada para o alcance de êxito e da perfeita coordenação entre os meios e os fins.
O outro ponto levantado pelos autores diz respeito às profissões e ofícios que têm
seres humanos como “objeto de trabalho”, o trabalho interativo, que tem como função colocar
em relação, nos mais diversos tipos de organizações, um trabalhador e um ser humano que
usufrui de seus serviços. São atividades em que são estabelecidas relações de trabalho que
visam mudar, manter ou melhorar a situação humana das pessoas.
Do ponto de vista econômico, os agentes escolares influenciam sobremaneira a receita
dos países o que pode representar consideráveis percentuais do Produto Interno Bruto (PIB)
em relação aos outros setores da sociedade. Isso, então, descaracteriza o trabalho docente,
quando faz parte de grupos que podem ser considerados profissões periféricas ou secundárias
em relação ao processo econômico de produção de bens materiais, considerando a questão
financeira quanto a sua função nas sociedades modernas avançadas. Corrobora esse
pensamento o fato de que
o ensino está mais que nunca no coração do processo de renovação das
funções sociotécnicas, como também da distribuição e a partilha dos
conhecimentos e competências entre os membros da sociedade. A
importância econômica do ensino caminha a par de sua centralidade política
e cultural (p. 23).
Há muito, o contexto escolar tem sido o espaço institucional predominantemente
destinado à socialização e à educação. Sob a estrutura escolar, o processo de escolarização é
também lócus de interações entre professores e alunos que edificam o trabalho dos
professores sobre e com os alunos. Caracteriza-se então o trabalho docente por relações
sociais na escola, que também se presentificam como relações de trabalho – trabalhadores e
seu “objeto de trabalho”. O espaço escolar precisa então se constituir em um lugar onde os
agentes escolares lancem mão de conhecimentos profissionais e, com apoio de recursos
materiais e simbólicos, desempenhem suas atribuições, considerando os objetivos que se
impõem à escola, pois ela está diretamente ligada ao progresso da sociedade industrial e dos
Estados modernos.
Há que se considerar que a escola também pode ser um espaço onde são reproduzidas
relações próprias do Estado e da sociedade. Assim é que o trabalho escolar se constitui em
tarefas que sofrem controle e organização que, a cada dia, se torna mais burocrática. O
46
trabalho do professor tem sofrido o controle quanto às tarefas e aos conteúdos escolares
porque há um crescente chamamento pelas medidas de eficiência e controle do tempo
(TARDIF; LESSARD, 2008).
No sentido de arrematar todos esses argumentos ao debate acerca da profissão docente
e de forma pontual, Cunha (1999) cita Garcia (1995) que faz uma reflexão sobre as categorias
que aparecem constantemente nos estudos sobre o tema. São elas: a “burocratização do
trabalho”, a “intensificação/proletarização”, a “colonização e controle”, a “feminização”, o
“isolamento/individualismo”, a “carreira plana” e os “riscos psicológicos”.
Não muito distante das outras percepções apresentadas, o autor também compreende
que a burocratização do trabalho docente faz parte de um projeto que incorpora a divisão
social do trabalho, marcador do controle da atividade docente. Aos especialistas cabe o
comando e aos professores a execução. Transparece como resultado desse controle a
sobrecarga de atividades complementares que nem sempre são efetivas ao trabalho docente e
a anulação das diferenças específicas a cada contexto.
Os efeitos da intensificação do trabalho expresso pela relação entre o aumento de
carga horária de trabalho dos professores e a produtividade são compreendidos como
corrosivos para a autonomia do docente. É a questão do tempo, da disponibilidade para
proposição de atividades, a partir da iniciativa própria que é prejudicada por aquelas impostas.
A relação entre intensificação do trabalho e proletarização é direta, pois quanto mais
controle do tempo, mais tarefas por fazer, mais se fragiliza a noção de profissionalização do
magistério. A intensificação do trabalho retrata o quadro em que
(...) o professor é levado principalmente a realizar tarefas predeterminadas
por estruturas superiores, a concepção de autonomia, tão necessária à
profissionalização, desaparece e se produz uma espécie de colonização. Esta
seria, especialmente, o controle das ações docentes por meio da
intensificação das atividades. Como não há tempo para pensar e produzir
seus próprios processos pedagógicos, fica mais fácil, ao professor, lançar
mão dos textos já prontos, manuais elaborados e livros didáticos
organizados. Assim, como consequência da perda da autonomia no uso do
tempo, o professor perde a autonomia nas decisões de seu campo de trabalho
(GARCIA, 1995, apud CUNHA, p. 138).
O outro tema em destaque nos estudos diz respeito à feminização do magistério. É um
fenômeno em que, para o autor, os resultados repercutem na profissionalização e na cultura
47
profissional dos professores, pois profissões com maior contingente de profissionais
femininos são identificados como débeis em sua condição, de menor poder reivindicatório e
adaptáveis a uma cultura de colaboração. Conclui que as profissões eminentemente femininas
são consideradas de menor prestígio social.
A busca pela autonomia leva o professor a utilizar o espaço da sala de aula como
espaço de poder, produz o isolamento que pode funcionar como para proteção contra as suas
fragilidades, as suas dificuldades. As inovações provocadas por novos desafios propostos por
outros o fazem ainda mais proteger-se na sua zona de segurança – a sala de aula, o espaço
restrito a ele e a seus alunos.
Outros fatores que podem contribuir para o isolamento do professor dizem respeito à
intensificação do trabalho, à ausência da cultura de discussão coletiva do projeto pedagógico e
à lógica da avaliação externa. Quando há o excesso de atividades individuais e a oferta
reduzida de atividades coletivas, consequentemente há o distanciamento do convívio com os
colegas em ambientes interativos. O vácuo provocado pela falta de discussão do projeto
pedagógico também contribui para o isolamento, pois esta seria uma oportunidade para
interações entre os professores, mas isso não constitui rotina entre as escolas. Percebe-se que
a crescente formalização das avaliações externas, objetiva a ação de cada professor e também
o afasta da comunhão das ações coletivas.
As condições precárias em que acontece o trabalho, a falta de valorização social e a
crise de identidade profissional são elementos que contribuem para a geração do estresse ou
mal-estar docente, caracterizado principalmente pela sensação de frustração psicológica,
percebidas em sintomas como ansiedade, insegurança e instabilidade, provocados pela
intensificação do trabalho e pela ampliação de funções. Notadamente, isso pode provocar um
nível alto de insatisfação, o que provoca estresse considerável, resultando na condição de
risco psicológico.
1.3 – O trabalho docente no Ensino Médio
A preparação para o exercício docente para o ensino médio no Brasil, conforme nos
diz Loiola & Moura (2006) acontece quando ainda na época do Império, foi criada a Escola
Normal, a qual tinha como função original preparar professores para o ensino elementar e
complementar do país. Foi em 1896 que esta se voltou para a formação de professores para o
ensino secundário, no curso superior da Escola Normal da Capital.
48
No entanto, com a fundação, em 1932, da Escola de Professores do Instituto de
Educação do Rio de Janeiro, ocorreu a institucionalização do nível superior como requisito
para a formação de professores para o ensino secundário e normal.
O panorama do ensino médio nos indica que este tem sofrido com os abalos
decorrentes da época atual: a utilização de tecnologias da informação, as mudanças que
ocasionaram a transferência das funções familiares para a escola e as questões ligadas à
produção de bens e a lógica de mercado que incidem sobre as políticas educacionais
(CUNHA, 1999, p. 127).
Em pesquisa recente, Costa & Oliveira (2011, p. 739) indicam que, em função da
universalização do ensino básico no Brasil, o docente do ensino médio tem mais aulas,
alunos, turmas e empregos comparados aos pares do ensino infantil e fundamental. A maioria
dos docentes do ensino médio pertence à rede pública estadual de ensino e deles são exigidos
requisitos similares quanto à formação e, apesar disso, assumem responsabilidades, salários e
condições de trabalho diferentes. Acerca dessa questão, pode-se dizer que
A baixa remuneração e a possibilidade de contratos temporários
contribuíram para que o professor da escola pública ampliasse sua jornada de
trabalho. (...) os professores da educação básica, particularmente os que
lecionam no ensino médio, possuem uma carga horária extensa, com ampla
utilização do turno noturno, haja vista que nele estão matriculados 2.875.834
alunos, ou seja, 34,4% das matrículas da última etapa da educação básica
(BRASIL, 2010). São muitas aulas e muitas turmas, considerando o pequeno
número de aulas de cada uma das 12 disciplinas distribuídas nas 25 aulas
semanais que compõem o currículo da educação geral. Menos aulas por
disciplina, mais turmas e turnos.
O perfil dos professores desse nível de ensino nos mostra que, em sua maioria,
pertencem ao gênero feminino, ressaltando que a presença de docentes do gênero masculino é
maior que nos outros níveis de ensino e cerca da metade têm mais de 40 anos de idade.
Em virtude da obrigatoriedade de oferta do ensino médio, houve uma clara ampliação
do número de escolas, a consequente ampliação do quadro docente e a percepção da
necessidade da formação de nível superior posta na LDB 9.394/1996, porém a pesquisa
aponta que existe um número significativo de professores sem a devida habilitação exigida e
muitos se encontram lecionando disciplinas as quais não poderiam legalmente ministrar,
principalmente as pertencentes ao currículo do ensino médio.
Outros fatores que influenciam diretamente no exercício do trabalho dos professores,
que são recorrentes em muitas escolas públicas brasileiras, dizem respeito às condições
estruturais, de equipamentos e instrumentos nas escolas públicas de ensino médio, quanto à
49
ausência ou deficiência de quadras de esporte, bibliotecas, laboratórios de informática, acesso
à internet e laboratórios de ciências.
Mas, alguns anos anteriores a esse período, precisamente entre as décadas de 60 e 70,
marcaram o professorado do ensino médio brasileiro, pois foi nessa época em que, sob a
vivência do período desenvolvimentista, foram explícitas a busca pela especialização
profissional, a divisão das atividades acadêmicas por departamentos, o fomento à produção e
à pesquisa e a presença do mercado na definição de competências (ARROYO, 2009).
Passar por esse processo não trouxe uma definição profissional e pessoal para a
docência das etapas finais do ensino fundamental e do médio. Na verdade, para o autor
(ARROYO), colaborou para uma certa indefinição social alimentada pela concepção de
ginásio e ensino médio preparatórios, para a construção de saberes que os compreendem
como etapa intermediária. Alerta que não há menção desse nível de ensino voltada para a
formação na adolescência e juventude, específica do ciclo de desenvolvimento humano.
Assim, os professores licenciados não atualizaram a imagem social do ensino médio e esse
continua sendo intermediário, indefinido socialmente e, mesmo se posicionando
profissionalmente, não conseguem garantir a educação e a formação cognitiva, ética, estética,
cultural e outras, que são específicas da adolescência.
Segundo o autor, a adolescência e a juventude têm recentemente ocupado diversos
espaços sociais e geraram modos específicos de vida, entretanto não houve mobilização por
parte dos docentes como produtores de saberes pedagógicos, para atenderem especificamente
às consequentes transformações dessa clientela.
Para ele (p. 31),
A figura do docente, licenciado numa área, não se aproximou nem
aproveitou a configuração desse tempo educativo a exigir profissionais,
saberes e competências específicas. Os docentes continuaram fechados em
suas áreas, no domínio das competências próprias dos docentes das diversas
áreas do Ensino Superior. Esperando que seu estatuto social viesse por essa
aproximação, pela pesquisa em cada área, pela especialização em cada área,
pelo acompanhamento da renovação teórica de cada área. As associações de
áreas, seus congressos e sua produção buscaram o estatuto profissional de
docentes por aí. Passaram-se várias décadas e esse estatuto profissional e
social não se configurou por aí.
Nesse novo contexto, a questão primordial então seria atentar para entender o processo
de construção da identidade docente, as referências, a concepção e a especificidade da prática
na educação. Outras indagações devem vir à tona quando se questiona também a prática do
50
professorado: deve se prender às concepções fragmentadas no exercício da docência ou deve
ser balizada a partir da fase da vida na qual os alunos se encontram (ARROYO, 2009).
O reconhecimento social também influenciou no processo de construção do perfil
profissional do professor. Arroyo (2009) alega que o reconhecimento social está atrelado aos
valores e às representações sociais. Logo, para que se possa ter clareza do reconhecimento
social dos professores, é necessário saber qual seria o reconhecimento social da infância,
adolescência e juventude.
Arroyo (2009, p. 32) arremata em seus argumentos que o reconhecimento social pode
se sobressair muito mais pela representação social que o trabalho docente possui para
determinadas etapas da vida humana do que pelo fazer técnico típico docente. Devemos,
como educadores, ser reconhecidos e, especificamente para aqueles do ensino médio se
afirmar a partir da consolidação do tempo cultural e social da adolescência e da juventude
como tempo de formação. Ou seja,
O que somos como docentes e educadores depende do reconhecimento
social dos tempos da vida humana que formamos. Do valor dado a esses
tempos. Como pedagogos nascemos historicamente colados à sorte da
infância, a um projeto de seu acompanhamento, condução e formação.
Temos os tempos da vida humana como nossos cúmplices. Nos afirmamos
profissionalmente no mesmo movimento em que essas temporalidades vão
se definindo social e culturalmente. É menos a sorte dos recortes dos
conhecimentos das ciências e das técnicas, o que nos conforma, do que a
sorte dos tempos-ciclos da formação humana. Estes são nossos cúmplices
identitários.
É relevante ressaltar o esforço que a categoria dispensa em busca de meios para o
domínio de novos saberes e de qualificação, para atualizar a sua função social em relação às
novidades tecnológicas. Ainda assim não há clareza do sentido do que representa ser mestre,
ser professor, ser professora (ARROYO, 2009).
Mas os debates que buscam identificar os valores, as representações que configuram o
constructo social sobre a imagem docente devem se voltar para a sua condição de coletivo
social. A forma como a categoria lida com os governos, com as questões salariais, com as
condições de trabalho estão atreladas à condição de coletivo em ser professor em diversos
níveis de ensino. E, para Arroyo (2009, p. 33), o perfil profissional está voltado ainda para a
ideia de vocação, de uma visão religiosa:
Por mais que tentemos apagar esse traço vocacional, de serviço e de ideal, a
figura de professor, aquele que professa uma arte, uma técnica ou ciência,
um conhecimento, continuará colada a ideia de profecia, professar ou
abraçar doutrinas, modos de vida, ideais, amor, dedicação. Professar por um
51
modo de ser. Vocação, profissão nos situam em campos semânticos tão
próximos das representações sociais em que foram configurados
culturalmente. São difíceis de apagar no imaginário social e pessoal sobre o
ser professor, educador, docente. É a imagem do outro que carregamos em
nós.
O perfil atual resulta de vários fatores pois é uma construção social, cultural e política
que vai além da escola. Lembra o autor que, a partir do reconhecimento dessa imagem que
liga a professora às qualidades de mulher bondosa, tenra, cuidadosa, é que se deve partir para
a redefinição de outros valores e cultura do ser professor, ser professora. Essa redefinição
necessita do reconhecimento preciso das relações e estruturas formadas para composição de
novos perfis.
52
2 – O ENSINO MÉDIO NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO
BRASILEIRA
Este capítulo versará sobre o ensino médio, sua natureza, fins e objetivos definidos na
legislação e como ele vem sendo trabalhado na realidade do estado de Alagoas. Objetiva,
também, discutir as principais questões relacionadas a esse ensino, definido hoje na Lei
9.394/1996 como última etapa da Educação Básica.
Inicialmente será realizada uma breve retrospectiva acerca do ensino médio no Brasil e
em Alagoas; as reformas educacionais que incidiram sobre esse nível de ensino com a
intenção de compreendermos como as questões contextuais podem ser determinantes para a
relação que se estabelece entre educação e sociedade. Especificamente voltaremos nosso olhar
sobre as edições da Lei de Diretrizes e Bases da educação brasileira a abordagem no ensino
médio, como recurso para verificar possíveis relações entre este e a prática do professor.
2.1 - Ensino Médio no Brasil e em Alagoas: uma breve retrospectiva
Desde os primórdios da educação brasileira, o ensino médio é motivo de discussões
acerca da sua identidade. No sentido de compreendermos quais os argumentos que
fundamentam essa questão, voltamos à história e identificamos que a origem se encontra no
século XIII e que se definia como um nível de estudo intermediário entre os estudos
paroquiais e os estudos de nível superior ligados à Teologia, ao Direito e à Matemática.
Quanto ao currículo, prevaleceram, entre os séculos XV e XVI, as ideias de cunho humanista
e, no século XVII, estava voltado para o estudo das línguas como instrumento para
compreensão da realidade (SILVA, 2010).
O currículo do ensino médio, com o passar dos tempos, suscitou modificações
decorrentes do processo de desenvolvimento tecnológico iniciado pela Revolução Industrial
no século XVIII. Incidiu sobre o referido currículo o enfoque direcionado para as ciências em
detrimento dos conteúdos voltados para as questões pedagógicas do humanismo (SILVA,
2010).
53
O surgimento do ensino médio brasileiro (na época 2º grau) ocorreu por força do
decreto do Ministro do Império do Gabinete Paraná, Luiz Pedreira do Couto Ferraz, que tinha
como propósito reformar o ensino primário na capital do governo. Foi instituído pelo
Regulamento da Instrução Primária e Secundária do Município da Corte (HAIDAR &
TANURI, 2004).
Posto que o surgimento do ensino médio ocorreu em função das modificações
empreendidas no sistema de ensino brasileiro, pode-se dizer que este traz as marcas de fatos
definidores para cada época e necessariamente denotam a relação entre o poder público e a
oferta da educação para ricos e pobres.
No período colonial, a vinda da Companhia de Jesus e a sua consequente expulsão do
país ressaltaram que, no primeiro momento, a educação estava voltada à catequização e,
posteriormente, esperava-se dela que estivesse impregnada de outros princípios voltados para
a laicização e para o atendimento aos objetivos políticos e econômicos do governo português
(HAIDAR & TANURI, 2004).
No Império, a vinda da família real ao país trouxe ganhos para a implementação e
estruturação do ensino superior e pouco se pensou no ensino primário e secundário, pois a
educação popular não constituía interesse para os administradores da colônia portuguesa.
As autoras informam que os princípios liberais e democráticos, motivadores do regime
constitucional e do governo representativo que resultaram com a Independência,
influenciaram sobremaneira as intenções oficiais em relação à instrução popular. Após a
Independência, a iniciativa oficial se posicionou no sentido de pensar a oferta do ensino
público, motivado principalmente pelo peso dos encargos decorrentes do custeio da
centralização dos atos administrativos. Mesmo assegurada legalmente, pelo do Ato Adicional
de 1834, às províncias a possibilidade de legislar sobre seu sistema de ensino (excetuando o
ensino superior e aqueles criados por leis gerais), não houve grandes mudanças em função de
que essas não possuíam condições financeiras para arcar com os estudos primários e
secundários da população.
Mas a falta de recursos financeiros das províncias geraram também outras dificuldades
para a ampliação da rede. Como nos dizem Haidar & Tanuri (2004, p. 42), o quadro da
educação primária nas províncias se caracterizava pela
54
dispersão da população, o número insuficiente de escolas, o despreparo e o
descontentamento dos professores mal remunerados, a ignorância dos pais
que se recusavam a mandar instruir os filhos – razão pela qual, das poucas
escolas existentes, muitas cerravam as portas por falta de frequência - faziam
com que a instrução primária, limitada aos rudimentos da leitura, da escrita e
do cálculo, apesar do enriquecimento previsto na legislação, beneficiasse
apenas uma parcela mínima da população.
Como se percebe, a finalidade do ensino secundário no país em sua origem está
voltada à superação da condição de pobreza em que vivia grande parte da população
brasileira. Mas, desarticulado que estava, o ensino secundário na época só servia como
oportunidade para aqueles poucos filhos de famílias abastadas que pretendiam se preparar
para o ensino superior. A reforma tentara direcionar o ensino secundário como um curso que
prepara para a vida, assim como para o curso de ensino superior.
Para Haidar e Tanuri (2004), o ensino secundário no Império e na República possuíam
características marcantes, tais quais: controlado e regulado pelo poder central acionado
principalmente pelo mecanismo de equiparação; competência para a oferta naqueles níveis e
modalidades que o poder central não legislasse; existência dos exames parcelados de
preparatórios para o ensino superior; estruturação do curso sem divisão em ciclos e com um
currículo comum com predominância dos estudos literários sobre os científicos. Por todos
estes aspectos, o curso secundário ainda se apresentava extremamente seletivo e que não
apresentava argumentos quanto a sua finalidade formativa.
A partir daí, várias discussões e avanços no ensino secundário brasileiro foram
realizadas e circulavam principalmente em torno da extinção dos exames parcelados, da
obrigatoriedade do bacharelado para admissão em cursos superiores e a equiparação com o
Colégio Pedro II, admitida como reconhecimento dos graus conferidos pelos liceus
provinciais que seguiam a estrutura e o plano pedagógico do Colégio da Corte. Outros
projetos reivindicavam auxílio no custeio das escolas pelo governo central e a concessão pelas
províncias de recursos financeiros para as escolas: expansão do curso normal; instituição do
ensino de 2º grau; o ensino técnico comercial, agrícola e industrial.
Para que se possam discutir as questões envolvidas com o ensino médio nas principais
reformas no campo educacional, é necessário reconhecer que, como nos diz Cury (1998), essa
modalidade de ensino é portador de três funções: clássica, propedêutica e profissionalizante.
55
2.2 – Ensino médio e educação profissional
A configuração da educação profissional na Primeira República em relação aos cursos
de nível médio e elementar se apresentava ainda contaminada com a herança do período de
escravidão que distinguia, de forma dicotômica, o trabalho manual/intelectual e prejudicava o
incremento de ações para os cursos técnico-profissionais. O ensino agrícola foi criado
inicialmente em nível superior. Na década de 20, foram também criados cursos de
“aprendizados agrícolas” e os de nível médio. A pouca expansão desses cursos espelhava
talvez a realidade brasileira no setor agrícola na época, em virtude de que, em função do
estado de desenvolvimento em que se encontrava, a agricultura do país não requeria mão-de-
obra especializada.
Contudo, o ensino industrial foi favorecido pelo Decreto Federal nº 7.566 que instituiu
a criação nas capitais dos estados de escolas de nível profissional primário de aprendizes e
artífices subordinadas ao Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio que, além do ensino
profissional, proporcionavam também o ensino de primeiras letras.
O ensino comercial, em seu percurso na história da educação brasileira, teve uma
trajetória diferente dos outros cursos profissionais. Foi criado ainda na época do Império em
nível de pós-primário; era ofertado principalmente pela iniciativa privada e na República foi
regulamentado pelo poder público federal.
Haidar e Tanuri (2004), traçando um quadro da educação no período da República,
indicam que as questões de ordem pedagógica da administração pública, legais e econômico-
sociais, contribuíram para o funcionamento estanque das diversas modalidades de ensino. Não
havia articulações entre os ensinos primário, complementar, normal, os de formação de
técnicos e o secundário. As autoras apontam que essas modalidades se agregavam em dois
sistemas: um formado pelo ensino primário, normal e o técnico-profissional; o outro, formado
pelo ensino secundário e superior. Ressaltam que os dois sistemas eram voltados para o
atendimento a clientelas diferentes das camadas socioeconômicas da sociedade brasileira.
2.3 - Breve relato histórico do ensino médio no estado de Alagoas
A educação ofertada pela Companhia de Jesus, assim como nas outras regiões
brasileiras, foi também a pioneira no estado de Alagoas, mediante uma escola fundada no
56
século XVII na atual cidade de Porto Real do Colégio, que fica às margens do rio São
Francisco. A educação alagoana também contou inicialmente com a presença dos religiosos
da ordem dos franciscanos menores que fundaram o convento de Santa Maria Madalena, em
Alagoas do Sul (hoje município de Marechal Deodoro) e Nossa Senhora dos Anjos em
Penedo (QUEIROZ, 2011).
No entanto o ensino público instituído oficialmente no estado em Alagoas aconteceu
muito após a saída dos jesuítas do cenário educacional brasileiro em 1799, com a nomeação
do professor José Vitorino da Rocha que ocupou a cadeira de Professor Régio de primeiras
letras da Vila Alagoas do Sul (QUEIROZ, 2011).
A implantação do ensino médio em Alagoas aconteceu em 1821, após a emancipação
política das terras pernambucanas em 1817, na cidade capital do estado na época – Alagoas
do Sul – onde o curso se constituía de aulas de filosofia e geometria. A primeira instituição
pública educativa instalada em Maceió foi o Lyceu Alagoano com a Lei 106, sancionada pelo
Presidente da Província, Antonio Nunes de Aguiar na data de 05 de maio de 1849
(QUEIROZ, 2011).
Outros dois segmentos do ensino secundário no estado de Alagoas também se fizeram
presentes. O ensino técnico instituído pela ação governamental no Colégio de Educando
Artífices “foi criado para ensinar as primeiras letras e as profissões de alfaiate, sapateiro e
músico às crianças pobres, teve curtíssima existência” (QUEIROZ, 2011, p. 181). A criação
do Colégio de Educandos Agrícolas, que tinha como objetivo a formação de jovens
educandos no campo, foi inaugurado na gestão do Presidente da Província Sá e Albuquerque.
No século XIX, com a proclamação da República, a situação da educação no estado de
Alagoas se apresentava
Dividida em primária, técnica e secundária, não estava na altura das
necessidades sociais e mal preenchia os seus fins. O ensino público secundário
era ministrado num Lyceu com as doze cadeiras seguintes: Filosofia, Retórica,
Geografia, História e Filosofia da História, Ciências Físicas e Naturais e
Fisiologia e Higiene, Geometria, Aritmética e Álgebra, Alemão, Português,
além das matérias que constituíam o curso normal em que se habilitavam os
candidatos ao magistério público. Havia mais duas cadeiras avulsas em
Penedo, sendo uma de latim e outra de língua francesa. O ensino primário
contava com 182 cadeiras. A instrução técnica era proporcionada em dois
estabelecimentos, o Lyceu de Artes e Ofícios e a Escola Central, destinada
exclusivamente ao ensino dos filhos dos ex-escravos (MORENO BRANDÃO,
2004, p. 205-206) apud Queiroz (2011, p. 183).
57
Cavalcante (2006), citando Péricles (1982), aponta que a educação no estado de
Alagoas, após a proclamação da República, continuava apresentando-se deficiente, espelhada
em dados que apresentavam a população alagoana em 1900 com 649.273 habitantes, sendo
que destes apenas 129.563 eram analfabetos. Em 1920, dos 978.055 habitantes, 834.213 eram
analfabetos.
A autora também apresenta os dados desse mesmo autor que indicam o número de
escolas presentes no Estado nessa mesma década:
No ano de 1902, para uma população aproximada de 650.000 pessoas, havia
249 escolas onde estavam matriculados 4.020 alunos e 3.624 alunas. Em
1916, o Governador Batista Acioly emitia uma mensagem, sobre a realidade
do ensino no Estado onde afirmava que esta ‘reflete, infelizmente ainda os
efeitos de sua longa desorganização este importante ramo do serviço público.
Apesar dos louváveis esforços do governo passado em melhorar a instrução
pública no Estado, a sua situação é todavia precária’ (PÉRICLES, 1982, p.
279).
Na intenção de complementar o pensamento de Péricles, a autora apresenta os
argumentos de Vidinha & Silva (2002, p. 31-32) que, acerca das implicações decorrentes da
desorganização do processo educativo em Alagoas, nos diz:
Assim que a região alagoana atravessa mais de trezentos anos convivendo
com o analfabetismo, o mandonismo dos ditos donos da terra e com poucas
pessoas alfabetizadas, as quais viriam a ser os futuros donos da região,
herdando assim, junto com o poderio dos seus antecessores, também o
domínio do saber letrado. A educação naqueles tempos era uma espécie de
roda ou ciclo vicioso [...]
Pode-se dizer que o quadro atual da educação em Alagoas ainda se apresenta de forma
extremamente deficitário, visto que, nos dados apresentados pelo Ministério da Educação, o
estado possui, entre todos os federados, o pior Índice de Desenvolvimento da Educação
Básica - IDEB. (FAJARDO, 2012)
2.4 - As reformas educacionais e o Ensino Médio
Discutir as repercussões das reformas educacionais no ensino médio requer
compreender que historicamente o debate sobre esse nível de ensino por vezes esteve voltado
para as suas finalidades e objetivos, ora para uma formação humanista, ora científica, ou
mesmo destinada à preparação técnico-profissional.
58
Rocha (2010) aponta, citando Fernando Azevedo, que a reafirmação dos fundamentos
que suportaram a educação brasileira entre o período do Império e da República, está
relacionada com a demora no reconhecimento da educação como um direito social. Para o
autor, esse reconhecimento insere o país no que ele denomina de modernidade educacional,
que aconteceu em outros países (inclusive da América Latina) a partir do surgimento de
preocupações educacionais contemporâneas, tais como o direito à educação, a inserção na
legislação de recursos públicos destinados ao financiamento da educação e a obrigatoriedade
de frequência à escola de crianças em idade escolarizável. Este último tópico foi, entre eles,
objeto de muitas discussões em função de que, até então, não havia precedentes na legislação
que davam conta dessa questão na organização da educação brasileira.
As mudanças, em face do processo de modernização da sociedade brasileira no
período final do Império, apontavam para um modelo econômico em que já se identificava a
presença da industrialização e da urbanização crescente. Alguns fatos ocorridos na época
como a abolição da escravatura, a intensificação da imigração estrangeira e da colonização de
terras, a instituição do trabalho assalariado, a destinação de recursos para financiamento de
lavouras, o casamento civil e a liberdade de credo são entre outros, fatos que retificavam o
pensamento moderno fundamentado nos princípios do liberalismo e do positivismo. Esses
também influenciaram diversos intelectuais brasileiros que os utilizaram para embasar as
reformas no setor educacional, ilustrados principalmente pela compreensão da liberdade de
ensino e da educação, mola propulsora para o desenvolvimento do país. Essa sociedade era a
que vislumbrara Leôncio de Carvalho e, portanto, a educação se destinava à formação e para a
vida (ROCHA, 2010).
Assim, a reforma empreendida por Carlos Leôncio de Carvalho, por meio do Decreto
de número 7.247 de 19 de abril de 1879, propôs a reformulação do ensino público nos níveis
primário e secundário no Município da Corte, além da proposta de reformulação do ensino
superior aplicado a todo o Império (ROCHA, 2010).
As modificações que incidiram diretamente no ensino médio se deram em seu
currículo, no sentido de que ele foi admitido como continuação das disciplinas do ensino
primário e incluiria os estudos de: Princípios elementares de álgebra e geometria; Noções de
física, química e história natural; Noções gerais dos deveres do homem e do cidadão; Noções
de lavoura e horticultura; Noções de economia social (para os alunos); Noções de economia
doméstica (para as alunas); Prática manual de ofícios (para os alunos) e Trabalhos de agulhas
(para as alunas) (CARVALHO, 1942, apud MELO & MACHADO, 2009).
59
Para referendar as ideias republicanas para a educação, foi criada pelo decreto em
1890 - com estatuto de Ministério - a “Secretaria de Estado dos Negócios da Instrucção
Pública, Correios e Telegraphos”, ocupada inicialmente pelo então Marechal Benjamin
Botelho de Magalhães Constant que promoveu uma reforma no ensino primário e secundário
do Distrito Federal e na instrução superior, artística e técnica em todo o território brasileiro.
As premissas que orientavam essa reforma se encontravam principalmente na defesa da
laicidade, na liberdade de ensino, na gratuidade do ensino primário, além de que estabelecia
que a ciência seria o fundamento da organização curricular e do ensino (RIBEIRO, 1989).
A primeira reforma da era republicana estabelecia a escola primária organizada em
dois ciclos; a escola secundária com duração de sete anos e o ensino superior reestruturado em
cursos: politécnico, direito, medicina e o militar. Foi ainda sob essa reforma que se deu a
criação, por decreto, do Conselho de Instrução Superior que tinha, dentre as suas
competências, aprovar programas de ensino das escolas federais e das que lhe fossem
equiparadas; propor a inspeção de estabelecimentos federais de educação e das faculdades
livres, entre outras regras para o ensino superior.
A reforma Benjamin Constant propôs que o ensino secundário fosse constituído da
forma como já estava sendo ofertado com o estudo de latim e do grego, mas que também
fossem adicionados conteúdos das ciências fundamentais em um curso que totalizaria sete
anos em uma “ordem lógica de sua classificação estabelecida por Augusto Comte, um dos
mentores da filosofia positivista” (PALMA FILHO, 2012, p. 3).
O plano curricular desenvolvido na reforma de Constant incluía de forma
pormenorizada, no período de sete anos, o ensino de: aritmética, geometria preliminar,
geometria geral, mecânica geral, física geral e química geral, biologia, sociologia e moral,
noções de direito pátrio e de economia política. Ainda ofertados de forma paralela os estudos
de português, inglês, alemão, latim, francês, geografia, zoologia, botânica, meteorologia,
minerologia, geologia, história natural, história do Brasil e literatura nacional. A proposta não
foi executada “uma vez que o seu elevado intelectualismo e sua grandiosidade excediam a
capacidade de aprendizagem dos adolescentes” (PALMA FILHO, 2012, p. 3).
Esse mesmo autor acrescenta ainda que os
estudos propostos por B. Constant, além das razões expostas, não foi levado
a sério, pela falta de interesse que despertou nos alunos, por contrariar a
concepção preparatória do ensino secundário, além do que era totalmente
inexequível (2012, p. 3).
60
Azanha (2010, p. 71) reafirma tal posição quando nos diz que “o positivismo de
Benjamin Constant, embora radical nas reformulações propostas, teve pouca duração em seus
efeitos”.
Outro momento na história do ensino republicano brasileiro aconteceu no governo de
Campos Sales (1809–1902). A reforma implementada em 1901 pelo então Ministro do
Interior (Justiça e Educação) Epitácio Pessoa implementou modificações curriculares no
sentido de que admitia que o curso secundário seria um mero preparatório para o ingresso no
ensino superior e o reduziu a seis anos de duração. Citando Bastos Silva, Palha Filho (2012)
acentua que essa reforma marca a presença de forma efetiva do governo federal, porque
estabelece o Colégio Pedro II como referência para uniformização do ensino secundário na
esfera pública e particular. Pretendia também dar a esse nível do ensino um caráter próprio e
não apenas um curso que servisse como preparatório para o ensino superior.
A reforma Rivadávia Corrêa, instituída em 1911, se constituiu um outro momento da
educação brasileira pois, por meio do decreto conhecido como a “Lei Orgânica do Ensino
Superior e Fundamental”, propôs em nome da liberdade de ensino a desoficialização do
ensino brasileiro, fruto da influência positivista e da presença de ideias do liberalismo que já
se fazia presente na história da educação brasileira desde a reforma de Leôncio de Carvalho,
em 1879, e que se juntaram nesse momento para rivalizar com o ensino de tradição religiosa
católica.
A reforma sustentava o argumento de que era necessário possibilitar à iniciativa de
ensino particular o direito de ensinar. Citando Cunha, Palma Filho (2012) nos diz que a
implantação de tal reforma nasceu ao sabor das críticas recorrentes à qualidade do ensino
secundário. Destacam-se como pontos principais da reforma: a frequência não obrigatória; a
abolição dos diplomas e a criação de exames de admissão para o ensino superior. Os
resultados decorrentes da implantação dessa reforma motivaram a criação de cursos sem
qualidade, entre outras e, para sustar essas medidas, foi então revogada e, em 1915, Carlos
Maximiliano apresentou novas propostas para o ensino brasileiro.
Carlos Maximiliano se preocupou efetivamente com a função do ensino secundário
preparatório para o ensino superior, perspectiva difundida amplamente na época. Maximiliano
manteve das reformas anteriores alguns itens como o exame de admissão para o ensino
superior; o ensino seriado e a redução do currículo; fundamentou, a partir das ideias da
reforma de Benjamin Constant, a não equiparação aos estabelecimentos estaduais e os exames
preparatórios. É nessa reforma que nasce a Universidade do Rio de Janeiro, a primeira do
61
Brasil e que congregou a união em uma única instituição da Escola Politécnica, a Faculdade
de Medicina e a escola livre de Direito.
O ciclo de reformas na Primeira República se estende com as medidas adotadas pelos
ministros João Luiz Alves e Rocha Vaz que propõem, de modo definitivo, a implantação do
ensino secundário seriado, como um curso regular com proposta de preparar para a vida
(PALMA FILHO, 2012).
Ribeiro (1989) acredita que a série de reformas implantada não teve sucesso e
retrataram, de forma clara, ao que denominou de mecanismo de transplante cultural que
provocou a
falta de capacidade criativa e atraso constante e cada vez mais profundo em
relação ao centro criador que serve de modelo. Representa, ainda, (...) um
idealismo estreito e inoperante ao formar um pessoal sem a instrumentação
teórica adequada à transformação da realidade em benefício de interesses da
população como um todo e não de interesses de uma pequena parte dela e de
grupos estrangeiros, em detrimento da maioria (p. 74).
A autora defende ainda que as sobreposições seguidas de reformas aconteciam para
solucionar deficiências das reforma anteriores. No cotidiano escolar, professores e alunos se
valiam da improvisação e, dessa forma, tanto as teorias importadas (por serem distantes da
realidade) quanto o senso comum não davam a clareza necessária das razões da forma de agir
na educação naquela época.
Como visto no capítulo anterior, a era Vargas se constituiu em momentos definidores
para a história brasileira, porque foi nestes períodos de governo, a partir da década de 30, que
foi implantado o regime ditatorial, fato que ainda hoje repercute na sociedade brasileira.
Para Silva (2010), as demandas oriundas do período após a Segunda Guerra Mundial
estão relacionadas com o desenvolvimento industrial e a oferta de profissionais para
ocuparem os postos surgidos a partir do desenvolvimento da indústria nacional. Esse fato
desencadeia a necessidade de implantação de políticas na área de educação com vistas à oferta
de um ensino direcionado para a formação de mão de obra que atendesse às características
modernizadoras difundidas no país.
A Carta Constitucional de 1937, a segunda da era Vargas, em muito modificou os itens
apresentados no texto Constitucional de 1934: transfere aos pais a responsabilidade da
educação; o Estado assume o papel de agente subsidiário e colaborador em relação à educação
pública; isenta-se ainda de cuidar da manutenção e expansão e não apresenta nenhum item
que trata da dotação orçamentária para o ensino público do país.
62
Outra característica presente no Estado Novo (1937 e 1945) foi o estabelecimento de
decretos-lei para fazer vigorar as leis orgânicas do ensino.
No total, seis decretos-lei compuseram a Reforma Capanema que estava destinada a
definir as regras para o ensino em suas várias modalidades e níveis. O ensino foi concebido de
tal forma que se voltou para atender principalmente às necessidades do desenvolvimento
industrial e do processo de urbanização crescente. O claro direcionamento das ideias
governamentais para formação de mão de obra para o mercado de trabalho oficializou o
dualismo educacional – a concepção do ensino secundário público destinado às elites e outro,
profissionalizante destinado à classe trabalhadora.
O ensino primário, definido em suas normas por meio do Decreto-lei nº 8.529 de janeiro
de 1946, estabelecia que o seu percurso se definiria em quatro anos com acréscimo de mais
um preparatório para o curso ginasial. A organização da rede se apresentava de acordo com o
número de turmas: escolas isoladas – aquelas compostas por apenas uma turma; escolas
reunidas – que possuíam até quatro turmas; grupo escolar – com mais de cinco turmas; e a
escola supletiva.
O ensino secundário também estabelecido por decreto da Lei Orgânica destinava-se,
nas palavras do então ministro da Educação e Saúde Pública Gustavo Capanema, à:
preparação das individualidades condutoras, isto é, dos homens que deverão
assumir as responsabilidades maiores dentro da sociedade e da nação, dos
homens portadores das concepções e atitudes espirituais que é preciso
infundir nas massas, que é preciso tornar habituais entre o povo
(GHIRALDELLI JR, 1990, p. 86).
Dessa forma, o curso secundário destinado às elites era composto por dois ciclos: o
ginásio (em quatro anos), o colégio (em três anos) com opções voltadas para o clássico e o
científico e a opção por qualquer curso superior posteriormente.
Por força de Lei Orgânica, assim também foram criados os cursos
profissionalizantes que se apresentavam em quatro modalidades (com duração de sete anos): o
ensino normal e a posterior conclusão em Faculdades de Filosofia; o curso industrial que
poderia se direcionar, no ensino superior, aos cursos da área técnica; o curso ensino comercial
e o curso agrícola.
Para atender aos interesses da industrialização, foi criado um sistema de ensino
profissionalizante em conjunto com a Federação Nacional das Indústrias e a Confederação
63
Nacional do Comércio composto pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI)
e o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC).
2.5 – O Ensino Médio e as Leis de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira
2.5.1 – LDB nº 4.024/1961
Sob os princípios da Constituição de 1946, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação
Nacional tramitou em forma de projeto durante treze anos oriundo ainda da gestão ministerial
de Gustavo Capanema no Estado Novo. Em seu texto, cabia então à União fixar as diretrizes e
bases da educação nacional e, com tal intento, foi instituída pelo ministro da Educação e
Saúde do Governo Dutra, Clemente Mariani, uma comissão de educadores encarregados de
formular o projeto da LDB.
O projeto original foi extraviado no Senado Federal em 1951 e a Comissão de
Educação e Cultura se organizou para reconstituir o documento. Outro fato que merece
atenção em relação ao processo do projeto da LDB em seu percurso diz respeito ao
substitutivo apresentado pelo deputado Carlos Lacerda em que adere as teses defendidas pelos
participantes do III Congresso Nacional de Estabelecimentos Particulares de Ensino, realizado
em 1948, e que levantou a discussão em defesa da escola pública.
O projeto da nova LDB, aprovado pelo Senado em 1961 e sancionado no dia 20 de
dezembro pelo presidente João Goulart, procurou conciliar a questão do debate
público/privado, assim como estabeleceu a igualdade no tratamento por parte do Poder
Público para com as escolas de ensino público e particulares e consequentemente a destinação
de verbas públicas direcionadas para a iniciativa particular de ensino.
Silva (2010) aponta a Lei 4.024/1961 como a maior de todas as leis, pois atribui para
as instâncias federal, estadual e municipal maior autonomia para atuarem em relação à
flexibilidade do currículo e dos métodos pedagógicos. Confirmam esse pensamento as
palavras de Haidar & Tanuri (2004, p. 65), quando nos dizem:
[...] dá-se um importante passo no sentido da unificação do sistema de ensino
e da eliminação do dualismo administrativo herdado do Império. Inicia-se,
pela primeira vez, uma relativa descentralização do sistema como um todo,
concedendo-se considerável margem de autonomia aos estados e
proporcionando-lhes as linhas gerais a serem seguidas na organização de
seus sistemas, linhas estas que deveriam responder por uma certa unidade
entre eles.
64
Para o ensino secundário, a Lei permitiu aos estados a organização com liberdade em
termos administrativo, disciplinar e pedagógico. Fez a junção entre o ensino secundário e o
profissional em uma denominação comum de Ensino Médio, destinado à formação do
adolescente. Realizou-se a articulação entre os cursos de “ginásio” e “colégio” para designar o
primeiro e segundo ciclos de todos os ramos; consideraram-se equivalentes todos os cursos
médios como forma de permitir a continuação aos estudos visando à admissão no ensino
superior. Em relação à organização curricular, foi estabelecido um núcleo comum de matérias
obrigatórias, indicadas pelo Conselho Federal de Educação para todas as modalidades de
ensino médio, destinadas as duas primeiras séries do primeiro ciclo (HAIDAR & TANURI,
2004).
O exame de admissão foi utilizado como instrumento de seleção para aqueles que
pretendiam ingressar na primeira série do primeiro ciclo. Esse item posto na legislação se
impunha como um divisor entre a escola primária e secundária, tornando-a seletiva (SILVA,
2006).
Para o docência no ensino médio, a Lei estabelecia que a formação deveria ser
realizada em cursos superiores de Filosofia, Ciências e Letras, assim como para as disciplinas
específicas as quais deveriam ser realizadas em cursos técnicos voltados para a educação
técnica (SILVA, 2006).
De forma geral, a Lei 4024/1961 estava voltada para
o aprimoramento técnico e o incremento da eficiência. Priorizava a
maximização dos resultados e tinha como decorrência a adoção de um
ideário que se configurava na ênfase do aspecto quantitativo, dos meios e
técnicas educacionais, da formação profissional e da adaptação do ensino as
demandas da produção industrial (SILVA, 2006, p. 48).
2.5.2 – LDB nº 5.692/1971
A legislação educacional vigorou no período militar, expressa principalmente pela Lei
5.540/1968 que estabelece as reformas para o ensino superior, pela Lei 5.692/1971, que
discorre sobre as Diretrizes e Bases da Educação. Esta última incidiu principalmente no
primário e ensino médio e demonstra os objetivos e a finalidade da educação para o Regime.
Como bem aponta Ghiraldelli Jr (1992, p. 169), o ensino superior deveria atender aos
objetivos do mercado, enquanto que o ensino médio deveria atender às classes populares e o
ensino superior às elites.
65
A Lei 5692/1971 voltou-se inteiramente à formação para o trabalho, mediante
profissionalização obrigatória para todos os estudantes, sendo eles de escolas públicas ou
particulares. Permitiu o acesso ao curso de Pedagogia de estudantes de qualquer modalidade
de ensino médio e não apenas os da escola normal. Estabeleceu a estrutura composta de oito
anos para o 1º Grau e para o 2º Grau, três anos.
A obrigatoriedade da profissionalização não era consenso na época e, como tal,
surgiram movimentos de contestação, resultando na instituição da Lei nº 7.044/1982 que
modificou a finalidade do ensino, impondo-lhe a conotação de que esse nível de ensino se
destinava à preparação para o trabalho (SILVA, 2006).
2.5.3 – LDB nº 9.394/1996
Sob uma conjuntura diferente, principalmente do ponto de vista político e econômico,
foi elaborada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9.394/1996 (LDB) que vigora
até os dias atuais. Nasce após vinte e um anos do regime militar, impregnada pelo clima da
transição democrática, vislumbrado após a eleição do primeiro presidente civil, acontecido em
1989 (MAZZANTE, 2004).
A organização da educação escolar na Lei 9.394/1996 é apresentada em níveis (dois):
ensino básico, constituído de três etapas (educação infantil, ensino fundamental e ensino
médio); e a educação superior. Além desses, são contempladas outras modalidades: educação
de jovens e adultos, educação profissional e educação especial.
Para Silva (2006), o ensino médio, nessa nova Lei, nasce sem o compromisso de
atender as expectativas de um curso voltado para a profissionalização ou meramente para o
ensino superior e assume as suas próprias finalidades. Dentre estas, deve atender à proposta
de ser a etapa final da educação básica, além de servir para:
I – a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos e no
ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos;
II – a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para
continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a
novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores;
III – o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a
formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento
crítico;
IV – a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos
produtivos, relacionado a teoria com a prática no ensino de cada disciplina
(LDB, 2004, p. 263).
66
Dois outros itens são assegurados na nova Lei: um deles está voltado à formação para
a docência no ensino básico, disposto na Lei, no título que discorre sobre os profissionais da
educação e assim os apresenta como aqueles que, estando em efetivo exercício e tendo sido
formados em cursos reconhecidos, são:
I – professores habilitados em nível médio ou superior para a docência na
educação infantil e nos ensinos fundamental e médio;
II – trabalhadores em educação portadores de diploma de pedagogia, com
habilitação em administração, planejamento, supervisão, inspeção e
orientação educacional, bem como com títulos de mestrado ou doutorado nas
mesmas áreas;
III – trabalhadores em educação, portadores de diploma de curso técnico ou
superior em área pedagógica ou afim (LDB, 2004, p. 263).
E o outro são as diretrizes que orientam o currículo na Lei 9.394/1996. Estas estão
voltadas para o trabalho com grandes áreas temáticas propostas nos Parâmetros Curriculares
Nacionais (PCN’s) que propõem a organização dos conteúdos para o ensino básico em todo o
território brasileiro. São instituídos processos de avaliação de competência da esfera do
governo federal e que podem acontecer também nos estados.
2.6 - Ensino Médio no Brasil e o debate sobre o dualismo
Há muito, as discussões sobre o ensino médio no Brasil vêm sendo centradas na
questão de sua finalidade como um segmento educacional. Cury (1998), quando aponta a
nova LDB 9.394/1996, nos diz que o ensino médio possui um potencial formativo porque se
propõe a ser um aprofundamento e complemento para o ensino fundamental e, como tal,
objetiva a efetiva socialização, o que lhe dá condições de ter clareza acerca da cidadania.
Silva (2004a, p. 179), analisando as relações entre educação escolar e trabalho no
Brasil, e acerca da sua finalidade para a sociedade, expõe que
O antigo 2º grau, hoje denominado ensino médio, na Lei nº 9.394, de 20 de
dezembro de 1996, é sem dúvida um dos graus de ensino que mais padecem
de clara definição, entre os estudiosos da educação, no que se refere à sua
finalidade específica.
Nessa mesma Lei, na descrição das finalidades da educação básica, o ensino médio
deve contribuir para desenvolver o educando e assegurar-lhe uma formação que lhe garanta o
exercício da cidadania e que lhe sirva para a progressão no trabalho e em estudos posteriores.
Atender a contento a essas demandas legais requer compreender qual o papel social desse
67
nível de ensino e as implicações que podem influenciar a prática docente a partir da
concepção que ele tem do ensino médio.
Assim como Cury (1998), Silva (2004a) debate as finalidades dos três níveis de ensino
e esclarece que o status do ensino fundamental é bem definido para os alunos. Os conteúdos
curriculares são estabelecidos de forma objetiva e, por assim dizer, não se pode duvidar do
caráter formativo do ensino fundamental. A percepção das finalidades do ensino superior
também é clara e está ligada à qualificação profissional, apesar de que o compreende restrito
em relação ao seu acesso em função da seletividade no processo de ingresso.
Quanto ao ensino médio, compreende-o como portador de três funções clássicas:
formativa, propedêutica e profissionalizante.
Para esse autor, questões típicas como as especificidades da idade em que se
encontram os estudantes, as perspectivas de mercado de trabalho e a proximidade da
maioridade civil disfarçam relações sociais que acentuam a dualidade e o caráter elitista do
ensino médio, justificado em discursos que o classificam como ligados às funções formativa,
propedêutica e profissionalizante.
Cury (1998), retrocedendo à história brasileira, identifica, desde o período da Colônia
e do Império, uma total desvalorização do trabalho produtivo, fruto de uma sociedade
hierarquizada e que não reconhecia os direitos civis. Nessa época,
Construíram-se sob o signo de uma empreitada religiosa contra-reformista,
baseada na fala, reforçando a desconsideração de uma organização escolar
básica (deslocada, na verdade, para o âmbito doméstico) e de iniciativas
abrangentes relativas ao ensino primário. O ensino primário reconhecido
como tarefa dos ‘poderes gerais’ e gratuito para os cidadãos sofria dos
severos limites impostos pela extensão territorial, pela demografia, pelo
desinteresse das elites e pela escravatura (1998, p. 76).
Cury (1998) aponta que não havia uma preocupação pelo ensino público em virtude de
que, na época da Colônia e do Império, o processo de escravização gerou historicamente uma
relação de desigualdade entre os envolvidos no processo produtivo em que se reconhecem
aqueles detentores de privilégios e os escravos, foreiros e mulheres que eram alijados de seus
direitos civis. Deduz que, desta forma, só ocupariam as vagas do ensino secundário aqueles
que estavam além desse estrato social, os privilegiados.
Para ratificar a ideia do ensino secundário propedêutico, o autor aponta que a falta de
oferta do ensino primário, a criação do Colégio Pedro II, oferecendo o ensino clássico, não
admitia outra clientela, produzia a seleção daqueles que deveriam se ocupar futuramente
como bacharéis e médicos. Quando as províncias começaram a ofertar, o ensino secundário,
68
este servia como preparatório para a ocupação de cargos burocráticos, para os cursos de
humanidades e de medicina. Dessa forma,
Esse segmento do ensino secundário, voltado para a propedêutica de elites
cuja extração se dá nos estratos superiores de uma sociedade agrária e
hierarquizada, incontestavelmente deixou sequelas (talvez mais do que isso)
até hoje. A função propedêutica, dentro desse modelo, tem um nítido sentido
elitista e de privilégio, com destino social explícito (CURY, 1998, p. 76).
A correlação entre o ensino propedêutico no nível secundário e a formação da elite é
uma ideia que se formalizou na Constituição de 1937, na Reforma de Gustavo Capanema.
Mas, há também argumentos que confirmam à dualidade quanto a finalidade desse segmento
educacional quando, no decreto 7.566/1909, foram criadas as escolas de Aprendizes Artífices
nas unidades federativas para atender às classes operárias (CURY, 1998).
Informa-nos Cury (1998) que após a Primeira Guerra, o Brasil necessitou realizar
mudanças e implementar o seu modo de produção, substituindo as importações. O reflexo
desse dualismo social se transpôs ao espaço escolar, quando o país ofertou duas “redes”, uma
propedêutica e outra de ofícios e artes – a primeira para os segmentos privilegiados e a
segunda para os “os filhos dos outros”.
Em análise à Lei 9.394/1996, o autor levanta algumas considerações que incidem
diretamente sobre o significado social do ensino médio e a realidade brasileira. Considera
inicialmente que o clima democrático em que fez surgir a Constituição Federal de 1988,
reafirmou a relação entre educação e a afirmação dos direitos. Considera ainda que as
transformações de ordem econômica por que vem passando o mundo atualmente resvalam nas
questões sociais, políticas, jurídicas e culturais e, a partir daí, lembra que são questões
históricas as quais sustentam o dualismo, o elitismo e a seletividade e devemos considerar as
funções do ensino médio como fazendo parte de uma relação dialética. A reestruturação
capitalista pela qual também passa o Brasil produz impactos quando passamos a ver o passado
em relação ao ensino médio também.
A globalização da economia e o papel do Estado na elaboração de políticas públicas; o
desenvolvimento tecnológico como suporte para a economia internacional e as modificações
no processo de produção, fundamentado agora em um modelo de trabalho intelectual e o
conhecimento como um elemento estratégico são questões presentes quando se pensa a
compreensão da função social do ensino médio, conforme aponta o autor.
69
Fala-nos, ainda, que a globalização da economia e suas respectivas consequências para
o processo de produção; a forma como o Estado desempenha seu papel na formulação de
políticas públicas na economia globalizada; e as modificações produzidas na dinâmica social
a partir do desenvolvimento de processos produtivos mais complexos têm influenciado
diretamente os sistemas educacionais.
Para Cury (1998, p. 81)
(...) tomando a máxima medieval de que ‘tudo o que é recebido é recebido
segundo a forma do recipiente’, logicamente, as exigências que os novos
processos pedem do sistema escolar trouxeram à tona as estruturas
anacrônicas e perversas inerentes à nossa formação social. E, ao lado das
exigências da superação do arcaico, há que se enfrentar e dar respostas às
novas situações. Temos que responder a esses dois desafios e, dadas as
novas circunstâncias, é preciso reinventar caminhos novos ao lado da
otimização das vias convencionais.
A partir dessa relação dialética, é possível compreender que historicamente o ensino
médio, participante do jogo de forças sociais de uma sociedade que se mostra densamente
estratificada, é fruto dos contextos e períodos pelos quais se dão a organização do trabalho
(CURY, 1998).
Sobre a questão do dualismo presente no ensino médio, Silva (2004a) discorre que este
é classificado por estudiosos da educação como um fenômeno em que convivem as “escolas
para os pobres e as escolas para os ricos”, ou, de uma forma mais concisa, “escolas para os
pobres e escolas para nossos filhos”. Respectivamente, uma prepara para a atividade
profissional específica, enquanto a outra serve como preparatória para o nível superior.
Esse mesmo autor levanta a questão de que, de acordo com a Lei de Diretrizes e
Bases, a função do ensino médio está direcionada para a formação do cidadão, do profissional
e para a preparação para o ensino superior. Discorre que o debate atual gira em torno da
ênfase da preponderância de uma em detrimento das outras e que não há consenso sobre o real
significado do que seria formar o cidadão.
Silva (2004a) levanta alguns pontos quando se propõe a questionar o ensino médio
como um segmento da organização escolar voltada para a preparação do trabalho: dizem
respeito a se a formação deve atender aos reclamos do mercado de trabalho ou deve se voltar
para o mundo do trabalho. Respectivamente, um está voltado exclusivamente para a formação
de mão-de-obra para o processo produtivo, enquanto o outro se volta para a convivência em
cooperação e útil na sociedade.
70
Lembra ainda que a forma de produção na atualidade não recomenda a formação para
a ocupação de postos de trabalhos, mas que seja voltada para as áreas de atividades,
ocasionando maiores possibilidades de adaptação às constantes mudanças do processo
produtivo, lócus de constantes mudanças. Para o autor, é necessário discutir o significado do
trabalho para a sociedade e para a escola quando se deseja discutir a identidade do ensino
médio (SILVA, 2004a).
Face às desigualdades sociais presentes em nosso país o ensino médio ainda não é uma
realidade para a grande parte dos jovens; entretanto, a escola deve apresentar uma proposta
que ultrapasse a dicotomia entre a formação e a profissionalização. Para isso, é necessário que
se comprometa em oferecer uma educação que integre “a educação do homem e do cidadão
contemple a preparação para a vida em sociedade, que implica se preparar para o trabalho”
(SILVA, 2004a, p. 181).
Brandão (2011) debate a questão das finalidades do ensino médio, quando se propõe
analisá-lo sob os princípios do Plano Nacional de Educação 2001/2011. A Emenda
Constitucional nº 59/2009 substitui o artigo 208 da Constituição de 1988 e amplia a
obrigatoriedade da oferta da educação básica para todos aqueles com idade entre 4 e 17 anos,
incluso também para aqueles que não tiveram acesso a ela na idade própria. Para o autor, o
ensino médio se propõe a preparar para duas finalidades: para estudos posteriores e para o
mundo do trabalho (Brandão, 2011). Utiliza as palavras de Kuezen (1997) para afirmar que
essa dupla função estampa a questão pedagógica, mas acima de tudo uma questão política
diretamente ligada aos meios de produção e sua partilha na sociedade vigente e as relações
que se estabelecem entre sociedade e educação.
A reforma que sofreu o ensino médio no período do governo de Fernando Henrique
Cardoso (1995 – 2002) definiu, de forma clara, a separação (no aspecto estrutural) entre
ensino médio (de caráter eminentemente propedêutico) e educação profissional (de caráter
profissionalizante). No aspecto curricular, a mudança trouxe a ideia do desenvolvimento de
modelos de competências incutidas nas diretrizes curriculares e centralização das atividades
nos “métodos ativos”. O autor defende ainda que essa reforma tinha como pretensão
impulsionar o ensino profissional, deixando-o mais curto e de fácil conclusão. Acerca da
reforma, Frigotto (2005)
considera que, para voltarmos a ter um ensino médio entendido como parte
fundamental da educação básica e articulado com o mundo do trabalho, da
71
ciência e da cultura, precisamos, inicialmente, desconstruir ‘o entulho
ideológico imposto pelas classes dominantes da teoria do capital, da
pedagogia das competências, da empregabilidade, do empreendedorismo e
da ideia que cursinhos cursos profissionalizantes, sem uma educação básica
de qualidade, os introduzem rápido ao emprego’ (p. 77).
Com o Decreto nº 5.154/2004, na gestão do então presidente Lula (2003 – 2010),
ressurgiu a possibilidade de reintegração do ensino médio e ensino profissional: “trouxe a
abertura e o estímulo à formação integrada, mas não trouxe a garantia de sua implementação”
(CIAVATTA, 2005, p. 102, apud BRANDÃO, 2011), sem, no entanto, incorporar os
princípios da integração (RAMOS, 2005, apud BRANDÃO, 2011).
O resultado da análise de que a universalização do ensino médio não se constitui em
uma tarefa fácil em virtude de que os dados mostram que apesar de ter havido aumento do
número de concluintes do nível fundamental, houve também diminuição no número de
matrículas para o nível médio e aumento no número de matrículas no Ensino de Jovens e
Adultos, o que indica a busca por oportunidade de ensino que garanta a formação em um
espaço de tempo curto sem questionar a qualidade deste. Ressalta que a pouca ocorrência de
matrículas no ensino médio pode estar vinculada ao crescimento das taxas de repetência e
evasão do ensino fundamental que trazem à tona questões ligadas à implementação de
políticas públicas e à submissão às ideias dos acumuladores de capital. Há também que se
considerar que contribuem também para o quadro as exigências de um nível crescente de
escolaridade para ocupação das vagas no mercado de trabalho.
Do ponto de vista pedagógico, Brandão (2011) elenca três questões: a primeira que
está voltada para a concepção de currículo para o ensino médio modificada principalmente
porque toma como base a elaboração pelo Ministério da Educação das Diretrizes Curriculares
Nacionais/Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio; a segunda que
compreende o desempenho dos estudantes nos exames nacionais de avaliação (SAEB, ENEM
etc) os quais, em seus resultados, apontam a vulnerabilidade do processo escolar e as
consequentes responsabilidades governamentais para o ensino médio pós-reforma; e,
finalmente a distorção entre idade/série no ensino médio que pode estar ligada à:
a uma organização didático-pedagógica que não contempla mais os anseios
dos jovens, especialmente daqueles que, nessa idade, já são trabalhadores.
Para Aguiar (2010, p. 720), este índice reflete, de maneira indireta, a
‘histórica falta de identidade do ensino médio’ brasileiro. Já para Kuenzer
(2010), esses dados também são reflexos
do discurso da democratização do acesso ao ensino médio para os jovens
trabalhadores. Porém, quando a educação geral – no caso, o ensino médio
propedêutico –, que antes era ofertada exclusivamente para as classes
72
dominantes, passou a ser ‘disponibilizada aos trabalhadores, banalizou-se e
desqualificou-se’ (Kuenzer, 1997, p. 863 e 865) apud Brandão (2011, p. 8).
Assim como Cury, Brandão (2011) também acredita que as políticas públicas (e não
apenas políticas de governo) devem incentivar iniciativas que efetivamente despertem o
interesse dos jovens para o ensino médio, garantam o acesso, a permanência e a sua
conclusão. Defende então que a escola, ao ser socialmente inclusiva atende às expectativas
direcionadas tanto para o trabalho ou para os estudos posteriores.
73
3 O SENTIDO ATRIBUÍDO PELOS PROFESSORES AO
TRABALHO DOCENTE
3.1 - O processo de pesquisa
Este capítulo tem como objetivo apresentar os resultados da pesquisa realizada junto à
escola pertencente à rede estadual de educação de Alagoas, por meio da qual se procurou
entender qual a percepção que os professores do ensino médio têm sobre o exercício da
docência nessa etapa da educação básica. Como anunciado inicialmente, entender essa
questão emergiu como uma necessidade pessoal e social na medida em que esse entendimento
pode melhorar a minha formação pessoal e também produzir conhecimento útil ao campo da
educação, particularmente à formação de professores.
Para realização do trabalho, adotou-se a abordagem qualitativa, por considerá-la a
mais adequada ao objeto de estudo e aos objetivos da pesquisa. Para Martins (2004) trabalhar
com as metodologias qualitativas requer admitir que elas estão voltadas para estudos que
privilegiam a análise de microprocessos que envolvem as pesquisas sobre ações sociais,
individuais e grupais.
Para Guimarães; Martins; Guimarães (2004, p. 79), a investigação qualitativa “postula
a existência de um vínculo dinâmico e indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade
do sujeito”. Esses sujeitos, para Chizzotti (2010), são pessoas que elaboram conhecimentos e
práticas necessárias para os problemas que identificam. Nesse sentido, Triviños (1987, p. 117)
distingue duas linhas de pesquisa como alternativa metodológica nas pesquisas qualitativas:
os enfoques subjetivistas e os críticos-participativos com visão histórico-estrutural. Optou-se
por esta última, pois busca-se compreender a “dialética da realidade social que parte da
necessidade de conhecer (através de percepções, reflexão e intuição) a realidade para
transformá-la em processos contextuais e dinâmicos complexos [...]”
Turato (2005) nos informa que a metodologia qualitativa tem como preocupação não
apenas estudar puramente o fenômeno, mas buscar a compreensão de seu significado
individual e coletivo para a vida das pessoas. Para ele, o termo significado tem função
estruturante, ou seja, tem relação direta com o significado das coisas para as pessoas e em
função desse, como organizam a sua vida. Citando Bogdan & Biklen, aponta que o
investigador qualitativo busca compreender o processo como as pessoas constroem e
descrevem o significado das coisas.
74
Martins (2004) apresenta a heterodoxia na fase de análise de dados como uma das
características da metodologia qualitativa. Aponta que, nessa fase, é importante para o
pesquisador conseguir integrar e analisar o material recolhido, capacidades que depende de
seu poder criador e da intuição. Acerca dessa capacidade intuitiva, Turato (2005, p. 510),
citando Morse & Field, afirma que o raciocínio indutivo diz respeito à dedicação do
pesquisador aos dados de campo, considerando “as individualidades a fundo e colecionando
informações que, paulatinamente, desembocariam na construção de uma teoria densa e
plausível”.
Neves (1996) remete às palavras de Godoy (1995a) e nos diz que os estudos
qualitativos apresentam basicamente quatro características: o pesquisador constitui um dos
instrumentos para apreensão dos dados no ambiente em que ocorre o evento a ser pesquisado;
os estudos são essencialmente descritivos; o pesquisador está preocupado com o significado
que os sujeitos dão às questões pesquisadas e, a análise dos dados ocorre por meio da indução.
Acerca dessas características apontadas por Neves, André (1983, apud ALVES &
SILVA, 1992) entende que as pesquisas qualitativas se voltam para a apreensão das várias
dimensões dos fenômenos e para a compreensão da experiência dos indivíduos sem
desassociar de seu contexto.
Invocando Gomes (1990), Alves & Silva (1992) salientam que, mesmo que o
pesquisador não delimitando com antecedência os passos metodológicos, ele não deve se
guiar apenas pela sua intuição. O sujeito de seu estudo deve ser considerado em sua realidade,
e o pesquisador deve também aliar a essa questão os pressupostos teóricos que enlaçam a sua
pesquisa. Isso significa que o não atendimento aos critérios de rigidez não comprometerá o
rigor como um dos pressupostos para a concretização de um projeto científico.
Moreira & Caleffe (2008) reconhecem que os investigadores que se dedicam à
pesquisa qualitativa, pelas peculiaridades inerentes a cada um, possuem estilos diferentes que
se podem admitir, são motivados não apenas pelo compromisso e pelo talento que têm, mas
porque são provocados, principalmente, pelo problema a ser pesquisado, pela variedade dos
cenários sociais e pelas contingências encontradas. Dessa forma, acreditam que não há como
padronizar nesse tipo de pesquisa a forma como será realizada a coleta de dados e as
estratégias para a análise do material.
75
Assim, pode-se dizer que a abordagem qualitativa admite diversos procedimentos de
coleta de dados. Dentre eles, optou-se pelos estudos teóricos de natureza bibliográfica e
documental, por meio dos quais foram elaborados o primeiro e o segundo capítulos e em que
foi realizada a interpretação dos dados coletados junto aos professores, enquanto que, em uma
das etapas da investigação, procuraram-se, junto às fontes bibliográficas, as contribuições dos
pesquisadores na área da educação, principalmente em forma de livros, artigos científicos,
dissertações e teses publicadas (GIL, 1999). A pesquisa documental se constituiu
principalmente na consulta à legislação educacional.
Para coleta desses dados, recorreu-se à entrevista semiestruturada que possibilitou o
levantamento de dados mais específicos sobre a maneira como os professores veem sua
atuação no cotidiano de trabalho.
Moreira e Caleffe (2008) citando Hitchcock e Hughes (1995), apontam que as
entrevistas podem ser consideradas “uma conversa com um propósito” e as classificam em
dois grandes grupos: entrevistas padronizadas e não-padronizadas. Dentre as padronizadas,
estão: as estruturadas ou de levantamento; as semiestruturadas e em grupos (estruturadas ou
semiestruturadas). Quanto às entrevistas não-padronizadas, apresentam-se: entrevistas em
grupo (não-estruturada), etnográfica (não estruturada), entrevista para a história oral e para a
história de vida e entrevista informal.
Nessa pesquisa, optou-se por trabalhar com entrevistas semiestruturadas, pois partem
de um roteiro com temas que serão discutidos e possibilita aos entrevistados desenvolverem
os temas de forma que seja melhor para eles (MOREIRA & CALEFFE, 2008). As entrevistas
foram gravadas na escola e transcritas.
Conceitualmente, para Alves; Silva (1992, p. 63) a análise qualitativa dos dados
coletados nas entrevistas
é um fenômeno recentemente retomado, que se caracteriza por ser um
processo indutivo que tem como foco a fidelidade ao universo de vida
cotidiano dos sujeitos, estando baseada nos mesmos pressupostos da
chamada pesquisa qualitativa.
As orientações apresentadas por Moreira & Caleffe (2008), para análise qualitativa de
entrevista, baseiam-se nas sugestões de Hitchcock e Hughes (1989). São elas: familiarização
com as transcrições; consideração à disponibilidade de tempo; descrição e análise dos dados;
isolamento de unidades gerais de significado; relacionamento das unidades de significado aos
76
objetivos da pesquisa; a extração de padrões e temas; observância à natureza das tipificações e
percepções; preparação para reflexão sobre as revelações do entrevistado; e verificação da
validade, triangulação dos dados, entrevista e nova análise dos dados.
Assim, entre os passos principais para a análise das entrevistas, os autores informam
que, na etapa de descrição e análise dos dados, é relevante aplicar o que Glaser e Strauss
(1967) denominaram como “Teoria Fundamentada” que consiste em conceber a análise e a
explanação a partir dos dados coletados. Para eles,
Isso exige que o pesquisador conscientemente faça análise e explanações
emergentes a partir dos dados e, eventualmente, desenvolva teoria. O
pesquisador analisa continuamente os dados contidos nas entrevistas, nas
notas de campo ou nos relatos na tentativa de sintetizar o que já foi
encontrado. O pesquisador pode então retornar uma vez mais aos dados e às
descrições para obter mais evidências, exemplos ou esclarecimentos. (p.
189).
Em etapa seguinte, o pesquisador realiza o isolamento de unidades de significado, as
quais dizem respeito aos termos amplos e questões que são recorrentes nas entrevistas. A
partir desse isolamento, deve fazer a relação entre as unidades gerais de significado e os
objetivos, os temas e os tópicos da pesquisa com a intenção de verificar se os dados podem
contribuir para esclarecer os objetivos.
Moreira & Caleffe (2008) recomendam, como etapas subsequentes, o trabalho de
extrair padrões e temas da análise e relacioná-los aos objetivos e ao problema da pesquisa.
Duas etapas poderão ainda ser relevantes para análise: uma consiste em elaborar, desvelar e
explicar as tipificações que abrangem as expectativas e pressupostos feitos pelos sujeitos; a
outra está voltada para verificar a validação dos dados. Os autores apontam que duas
abordagens têm sido utilizadas no processo de validação: a triangulação e a reanálise. A
triangulação (ou método misto, multimétodo ou estratégias múltiplas) acontece mediante
aplicação de mais de um método para coleta de dados. Para Denzin (1970) apud Moreira &
Caleffe (2008, p. 192) existem duas propostas distintas de triangulação, uma
dentro dos métodos refere-se à replicação de um estudo, usando as mesmas
técnicas como forma de verificar a confiabilidade de um estudo e a natureza
das teorias geradas. (A outra acontece através da) triangulação entre os
métodos refere-se ao uso de mais de um método de coletar dados dentro do
mesmo estudo.
O pesquisador pode usar duas formas para validação dos dados: comparando-os com
outras fontes; ou pode também, após a transcrição, verificar com os entrevistados as respostas
77
em relação aos principais temas e categorias emergentes e/ou até fazer uma reanálise do
material.
De forma abreviada, Moreira e Caleffe (2008, p. 193) apresentam as ideias de Tesh
(1990) sobre a análise de dados qualitativos. Destaca-se que, para ele,
A análise dos dados é uma atividade de reflexão que resulta em um
conjunto de notas analíticas que orientam o processo;
Os dados segmentados, isto é, divididos em unidades de significados
relevantes, embora seja mantida conexão com o todo. A análise sempre
começa com a leitura de todos os dados de modo a proporcionar um
contexto para as partes menores;
Os segmentos de dados são categorizados de acordo com o sistema
organizacional que é derivado predominantemente dos próprios dados;
A principal ferramenta intelectual é a comparação. O objetivo é discernir
similaridades conceituais, melhorar o poder discriminativo das categorias
e descobrir padrões;
As categorias para selecionar os segmentos são hipotéticas e no início
elas permanecem flexíveis;
A manipulação de dados qualitativos durante a análise é uma atividade
eclética; não existe uma maneira única;
Os procedimentos nem são científicos nem mecânicos; a análise
qualitativa é um artesanato intelectual;
O resultado da análise é um tipo de síntese de alto nível.
O universo a ser estudado foi composto por 06 professores que atuam no Ensino
Médio na escola onde a pesquisa foi realizada, sendo dois de cada área do conhecimento que
organiza o currículo da escola. Embora seja uma amostra pequena, foi considerada suficiente
para os objetivos da pesquisa, uma vez que envolve docentes das diferentes áreas em que o
ensino médio encontra-se organizado.
A partir desses procedimentos foi possível identificar elementos que permitem fazer
inferências sobre a maneira como os professores que atuam no ensino médio percebem o
próprio trabalho. Para isso, foram retomadas algumas categorias levantadas no início da
pesquisa e realizou-se o levantamento de outras a partir das falas por meio das quais se
buscou entender como os professores as percebem no seu cotidiano. Dessa forma, pretende-se
chegar à questão principal do trabalho. As categorias referidas são as seguintes: interesse dos
alunos, ações coletivas, envolvimento da comunidade, função social da escola, qualidade de
78
educação, contexto social da escola, pobreza e analfabetismo, exercício da docência no ensino
médio, entre outras. Antes de passar à discussão das categorias levantadas junto aos
professores parece necessário falar um pouco da escola onde foi realizada a pesquisa e do
bairro em que se encontra inserida.
3.2 - O local da pesquisa
Para realização da pesquisa, foi escolhida a Escola Estadual José da Paz (nome
fictício). Trata-se de uma escola da rede pública do estado de Alagoas, pertencente à 15ª
Coordenadoria Regional de Ensino. Está situada em um bairro central da cidade de Maceió
voltado principalmente para atividades comerciais e moradias habitacionais de pessoas das
classes média e alta.
A escola é uma das componentes do Centro Educacional de Pesquisas Aplicadas
Antonio Gomes de Barros – CEPA, que agrega, em seu espaço territorial, além de 11
unidades escolares (Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio e Normal), o
Núcleo de Desenvolvimento e Desporto Profª Cleonice Barros, o Instituto de Línguas Profª
Noêmia Gama Ramalho, o Centro de Formação de Recursos Humanos da Educação Prof. Ib
Gatto Falcão (CENFOR), o Laboratório Pedagógico, a Biblioteca Jaime Lustosa de Altavila, a
Escolinha de Arte Prof. José Zumba, o Instituto de Formação Profissional (INEPRO), o
Conselho Estadual de Educação, o Conselho do FUNDEF, o Arquivo dos Aposentados da
Educação, o Instituto Zumbi dos Palmares – composto pela TV e Rádio Educativa, o Teatro
Linda Mascarenhas e a Rádio Difusora (CAVALCANTE, 2006).
A escola pertence a um complexo educacional na cidade de Maceió. A construção de
um complexo educacional em Alagoas surgiu como estratégia do professor Ib Gatto Falcão,
então secretário da pasta de Educação e Cultura do Estado, no governo de Arnon de Melo
(1951 – 1956) destinado a ampliar o número de vagas escolares na cidade. O projeto foi
aprovado e financiado pelo governo federal, por intermédio do Instituto Nacional de Estudos
Pedagógicos (INEP), na gestão do professor Anísio Spínola Teixeira (2006).
A proposta de educação, na época da fundação do CEPA, era condizente com o clima
desenvolvimentista que vigorava e, por tal, foi instituído em 31 de janeiro pelo Decreto 1.519,
79
que reestruturou a Secretaria de Educação e Cultura e descrito no artigo 34 as suas
finalidades:
1) Manter em funcionamento os estabelecimentos de ensino e
treinamento de diversos níveis e modalidades, em especial para o fim de,
valendo-se deles como campo de pesquisa aplicada, experimentar, pesquisar
e analisar o conteúdo e os métodos de educação e de ensino, visando ao
aperfeiçoamento do sistema educacional pela propositura de resultados de
aplicação generalizável;
2) Manter as instalações, programas e atividades diversas, inclusive
biblioteca, artes, recreações e desportos a serviço do parque escolar em
geral, particularmente o da capital;
3) Realizar promoções e produzir publicações, instrumentos e material
técnico-pedagógico, objetivando divulgar estudos e pesquisa e propagar o
uso de técnicas e procedimentos didáticos em particular no que se relacione
com a melhoria do ensino das ciências.
§ Único – A programação de pesquisas e experiências pedagógicas do
Centro Educacional de Pesquisa Aplicada, gozará de liberdade e
flexibilidade, desde que assegurada sua articulação e harmonia com as
diretrizes e a programação da Assessoria de Programação e Orçamento da
Secretaria de Educação (CAVALCANTE, 2006, p. 122).
No projeto idealizado do complexo educacional, o professor Ib Gatto previu a oferta
de ensino em tempo integral, voltado para a formação técnica, profissional e artística no
sentido de atender à demanda de Maceió. Tinha como objetivo oferecer estágio remunerado
aos estudantes, assim como proporcionar condições para a formação docente de nível médio,
como espaço para treinamento e oferta de cursos de pós-graduação visando à melhoria de
desempenho dos professores do ensino básico (CAVALCANTE, 2006).
Em função da reestruturação administrativa do Estado, ocorrida em 2005, o CEPA
deixou de ser um programa vinculado à Secretaria Executiva de Educação e foi transformado
na 15ª Coordenadoria de Ensino, com a sua circunscrição abrangendo todas as escolas que
compõem a estrutura do CEPA (CAVALCANTE, 2006).
A escola em questão tem quarenta anos de existência, oferta turmas de ensino
fundamental (do 6º ao 9º ano), ensino médio e educação de jovens e adultos. Em sua maioria,
os alunos são oriundos dos bairros periféricos da cidade.
80
3.3 - Os sujeitos da pesquisa
Costa & Oliveira (2011) informam que, entre os professores que lecionam no ensino
médio, a maioria é composta por mulheres e é nesse nível de ensino que se concentra o maior
percentual de homens entre os outros níveis. Possuem em média mais de quarenta anos de
idade e nem sempre a docência é a sua atividade principal.
Para que se possa ter uma melhor compreensão acerca das características intrínsecas a
cada sujeito participante, apresentamos os dados preliminares, conforme descrição abaixo (os
nomes foram substituídos para garantir o anonimato):
Joana – Licenciada em Biologia pela Universidade Federal de Alagoas. Atua
ministrando aulas no magistério há 22 anos (com aulas de reforço escolar) e no ensino
médio leciona Biologia há 11 anos. Atualmente é diretora adjunta da escola. Possui
também graduação em Farmácia, mas não exerce a profissão. É pós-graduada em
Tecnologia da Educação.
André – Possui licenciatura em História e atua ministrando aulas na área de História e
Geografia no ensino fundamental e médio há 11 anos. Informou que possui
experiência no magistério, lecionando aulas nos antigos cursinhos pré-vestibulares. É
pós-graduado em Docência do Ensino Superior.
Marlene – Licenciada e bacharel em Geografia. Informou que leciona desde o ano de
1997 (23 anos) e no ensino médio sua experiência já dura 8 anos. Ministra a disciplina
Geografia em turmas de ensino médio.
Ronaldo – Possui formação em Filosofia. Ministra aulas de Filosofia e Sociologia.
Informou que não atua em outra área de trabalho. Não referiu nenhum curso de pós-
graduação. Trabalha em regime de contrato temporário. Ministra aulas há 8 anos e há
5 no ensino médio.
Abgail – É licenciada em Biologia pela Universidade Federal de Alagoas. Leciona as
disciplinas de Ciências e Biologia no ensino fundamental e médio. Não possui outras
áreas de atuação. Não referiu cursos de pós-graduação.
81
Renato - É graduado em Matemática e possui especialização na área de Matemática
em Estrutura e Funcionamento do 2º Grau. Leciona no ensino médio há 20 anos. Atua
também como bancário em uma instituição federal.
Os professores foram convidados a participarem da pesquisa de forma aleatória, o
critério principal era que estivessem lecionando disciplinas no ensino médio. Os professores
Ronaldo e Renato atualmente ministram aulas apenas no ensino médio, em virtude de arranjos
administrativos e pedagógicos.
3.4 – A função social do Ensino Médio
Como visto em capítulo anterior, as discussões em torno das finalidades do ensino
médio como uma etapa intermediária na educação datam ainda do século XVIII e foi então a
partir da Revolução Industrial que o currículo se voltou para atender as necessidades desse
novo modelo de desenvolvimento com disciplinas com conteúdos voltados para os
ensinamentos da ciência (SILVA, 2004a).
Esse mesmo autor afirma que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em
sua edição mais recente, declara não atender à especificidade de preparar apenas para a
profissionalização, assim como para atender as exigências para ingresso no ensino superior.
Em análise ao Plano Nacional da Educação que vigorou até 2011, Brandão (2011)
recorda que a LDB 9.394/1996 dispõe o ensino médio como detentor de dupla função:
preparar para estudos posteriores e simultaneamente para o mundo do trabalho. Complementa
com o pensamento de Kuenzer (1997, p. 10) que “não é uma questão apenas pedagógica, mas
política, determinada pelas mudanças nas bases materiais de produção, a partir do que se
define a cada época, uma relação peculiar entre trabalho e educação”.
Para Cury (1998), nesse documento, o ensino médio se propõe a formar o cidadão e
deve se valer das bases lançadas no ensino fundamental para aprofundar e complementar o
processo educativo que visa à socialização e, a partir daí, à compreensão de cidadania. Em
análise às respostas dos professores em relação à função social do ensino médio, percebe-se
que há divergências quanto às finalidades de sua oferta.
82
Como nos fala Silva (2004a), esse nível de ensino padece de uma clara definição
quando se refere a sua função. Mas, nas entrevistas, os discursos dos professores oscilam em
relação às funções do ensino médio. A professora Joana o considera uma etapa intermediária
para os estudos posteriores.
Ensino médio hoje é só um meio de acesso. É um degrau que eles precisam
ultrapassar para chegar ao fim, que não é final, é o começo que é a
universidade.
A fala do professor André, confirma inicialmente a possibilidade de o ensino médio
servir como uma etapa intermediária, mas, em outros momentos, admite as outras três funções
(para a vida, para o mercado de trabalho e para os estudos superiores). Pormenorizadamente,
ele nos diz que:
O papel social do ensino médio seria como eu disse, depois do adolescente
conseguir ter uma reeducação, ter fundamentado, deter a título de
conhecimento fundamental, o ensino médio teria justamente esse papel de
criar a possibilidade de preparar para o ensino superior, de consolidar o
conhecimento para a vida social do aluno, e também para a vida profissional
dele [...]
Eu acho que seriam as três coisas. O propedêutico é fundamental. Mas, ele
se torna propedêutico para um mundo acadêmico. Se você vai entrar na
universidade e tem uma base boa.
Também, para o professor Renato, o ensino médio se presta a várias finalidades e que
tem como papel formar
[...] o cidadão para atuar na comunidade, no mercado de trabalho, para saber
direitos e deveres deles para ele saber como aplicar a ciência. Na realidade é
a formação geral para a vida dele.
No discurso do professor Ronaldo, podem-se identificar duas finalidades para o ensino
médio. A primeira o considera uma etapa final nos estudos visto que o aluno já havia tido uma
sólida formação no ensino fundamental. A segunda revela o caráter propedêutico:
[...] uma das visões seria perceber o andamento do aluno, o avanço, o
processo pelo qual ele passou, chegou ali. O fim do ensino, a concretização
daquele conhecimento que foi feito no ensino fundamental e o
aperfeiçoamento para sair aqui da escola normal, tenho essa visão. [...]
[...] Tem que ser trabalhado de maneira bem proveitosa porque você tem que
visar uma faculdade, o aluno tem que se espelhar numa faculdade, numa
universidade [...]
83
A princípio, a professora Marlene concebe o ensino médio voltado para o mercado de
trabalho e, em outro momento o compreende voltado à preparação para os estudos superiores.
Para ela, há intenção de que esse nível de ensino prepare os alunos para o Exame Nacional do
Ensino Médio (ENEM).
[...] eu tenho que ter mais empenho, mais cuidado, mais responsabilidade
principalmente com o terceiro ano que eu tenho, estou sabendo que eles vão
ser entregues ao mercado de trabalho [...]
[...] o ensino médio limita ao aluno a se submeter ao ENEM (Exame
Nacional do Ensino Médio) para ingressar na universidade ou na faculdade e
isso é pouco por conta da competitividade que o mundo está oferecendo,
uma vez que a gente percebe que as escolas particulares, não todas, que estão
mais bonitas, elas dão mais oportunidades que as escolas públicas [...]
[...] Então, eles têm que ter mais conhecimento, não só nas disciplinas exatas
como em disciplinas técnicas que preparem para o mercado de trabalho, o
que seria uns cursos técnicos que são oferecidos e que eles deviam ser
orientados para participarem em horário diferente da escola [...]
As entrevistas nos mostram também que algumas questões são recorrentes entre os
professores da pesquisa em relação ao trabalho que desenvolvem no ensino médio. Na defesa
de que a universalização do ensino básico no Brasil proporcionou melhores condições de
acesso e permanência dos alunos na escola, Costa & Oliveira (2011) nos informam que, no
ano de 2010, o número de matrículas no ensino básico ultrapassou o total de 51 milhões de
estudantes. Informam também que surgiu a demanda por professores que, em sua maioria,
está vinculado à dependência administrativa estadual.
Apesar da documentação oficial advogar que não há distinções em suas finalidades na
oferta do ensino público e privado, os professores acreditam que as escolas privadas se voltam
exclusivamente ao preparo para os estudos posteriores. Isso pode estar ligado às deficiências
encontradas em razão de que na maioria das vezes, o ensino fundamental ocorre de forma
precária, ou mesmo a crença de que a profissionalização seria prioritária em função das
condições socioeconômicas em que vivem os alunos das escolas públicas da atualidade. Pode-
se perceber, no discurso do professor André, quando fala do despreparo da sua clientela:
[...] o nível médio deveria ser no nível tal que se a população tivesse esse
aspecto adequado, o país estaria bem melhor. Mas como professor, noto de
um modo geral, os alunos de ensino médio não tem nível médio na prática,
são pessoas que vieram de atividades terríveis no ensino fundamental, ou
seja, chegaram ao ensino médio sem fundamento e tem dificuldade de
84
interpretar, de transpor o que pensa para o papel e quando consegue isso, há
dificuldade de usar todo esse conhecimento para a vida prática [...]
[...] Mas, a escola privada, muitas vezes peca... ao invés de preparar para a
vida, prepara para entrar na universidade, para abrir a porta, mas não para
está preparando para estar na universidade de modo geral.
Muito próximo à concepção do professor André, a professora Abgail. Para ela há entre
os alunos das escolas públicas uma defasagem grande de conteúdos, pois
[...] hoje a gente pega um aluno com uma defasagem de conteúdos e você
precisa mostrar que o conteúdo que está trabalhando é relevante para o dia a
dia dele [...]
Joana compreende que os alunos têm o ensino médio como fase terminal dos estudos.
Na verdade, está alimentando um ciclo vicioso em que a baixa escolaridade dos pais se
repetirá com os filhos. Como bem diz:
[...] Alguns têm essa visão de vestibular, de universidade, mas a maioria não.
A maioria tem aquela visão assim, terminar o ensino médio, do arrumar um
emprego no comércio, ser doméstica como a mãe, como a tia. A gente
conversa muito com eles essa questão assim, que não é uma coisa
humilhante, mas que ele enquanto estudante, eles precisam olham acima do
muro. Ter outra visão do mundo, tentar ter outras oportunidades, até prá ver
se conseguem ter mais possibilidades do que a família deles. A visão da
maioria deles é o final. Eu converso muito com eles. Na época dos pais de
vocês, dos meus pais, o ensino médio era realmente o fim, hoje é o começo.
Hoje ter ensino médio não é favor, é obrigação. Então, vocês estão
começando a se acomodar, quando começam a conseguir esses
subempregos, sem carteira assinada, altamente explorados pelos patrões, uns
mesmo da noite chegam aqui suados, com fome, ‘nas carreiras’, porque a
patroa só liberou depois que arrumou a cozinha, que o patrão só liberou
depois que arrumou o estoque e muitos deles não ganham nem um salário
mínimo, não tem carteira assinada e são superexplorados.
3.5 – A função social da escola
Um tema que se mostra significativo no presente estudo e que repercute na
forma como os professores conduzem a sua prática diz respeito à finalidade social da escola e,
em suas concepções, não há muita distinção entre o que acreditam da finalidade do ensino
médio. Para eles, percebe-se, estaria voltado à preparação do aluno para o mercado de
trabalho, para estudos posteriores e/ou para a cidadania.
Formar o cidadão faz parte da concepção social da escola. Para os professores Joana,
Marlene, Abgail e Renato,
85
[...] Formar cidadãos. Formar o crítico, agente de mudança que saiba ouvir,
saiba ter opinião e saiba discutir. [...] Então eu acho que a função principal
da escola é essa, é formar cidadão crítico, que esteja inserido na sociedade e
que contribua. (Joana)
[...] é preciso que no final do processo, durante o processo, se tenha uma
criança que seja questionadora, que ela consiga pensar que ela consiga
encontrar os próprios caminhos, que ele seja um cidadão. Cidadão é isso,
perceber onde está o problema, analisa e quer solução, você sabe se portar
diante da equipe, cobrar e vai ser participativo na resolução. (Abgail)
Formar cidadãos, esforçados, cientes do que esperam lá fora [...] (Marlene)
Que a escola forme o aluno, o cidadão para atuar na comunidade, no
mercado de trabalho, para saber os direitos e deveres deles para ele saber
como aplicar a ciência. Na verdade é formação geral para a vida dele [...]
O professor Ronaldo diz que a escola
Enquanto instituição ela proporciona [...] formação do ser humano [...]
Para o professor André, a função social da escola estaria voltada para a formação de
novas gerações e para a cidadania, mas vai mais além quando diz que
O papel social da escola é muito relevante e complexo porque ele tem um
papel de preparar as futuras gerações do país. Isso aí a coisa é notória, só que
isso aí é uma meta ao longo, preparar lá fora não só para melhorar seu nível,
aproveitar o conhecimento das gerações anteriores, aperfeiçoar e adaptar a
realidade de cada um. Mas, de forma mais prática, tirar as crianças das ruas,
despertar o conhecimento nas artes, nas ciências, de modo geral, descobrir os
potenciais, proteger em defesa própria [...] A escola tem um papel de dá
cidadania às pessoas. Então, isso seria de você não ser só agora propriedade
de uma família ou de um ente familiar, mas ser parte de uma sociedade
complexa que você vai ajudar a construir.
Em sua fala, o professor André acredita que o ensino médio não atende a algumas das
questões a que se propõe que seria dar uma formação que habilite o aluno para, a partir dos
conhecimentos do ensino fundamental, alicerçar as etapas seguintes ou para o mercado e,
também, porque acredita, que ele (o aluno) precisa ter uma compreensão da realidade a partir
dos conhecimentos das disciplinas para aplicar/reconhecer em seu cotidiano e no mundo:
Para mim, trabalhar no ensino médio é exigir o que é, o que está sendo com
o que deveria ser. Eu acho que deveria ser, você está trabalhando com alunos
que já tenham um conhecimento muito bom, científico, conhecimento da
língua, que daria condições pra que você dê um aprofundamento maior para
86
que essa pessoa esteja preparada para ingressar na universidade ou então
tenha um suporte técnico para atuar profissionalmente. E outra coisa
importante, é ter um nível de conhecimento tal que você tenha condições de
aproveitar melhor os recursos da sua vida. Então, relacionar muito a
educação à vida profissional, mas, dentro da sua casa, por exemplo, o
conhecimento do ensino médio pode mudar seu relacionamento com sua
própria vida pessoal. O aproveitamento dos recursos da natureza.
Compreender a casa que você vive, a iluminação, sem ser arquiteto,
compreender melhor higiene, sem ser um infectologista, conhecer melhor a
economia doméstica, sem ser um economista. Então, o nível médio deveria
ser no nível tal que se a população tivesse esse aspecto adequado, o país
estaria bem melhor.
3.6– O exercício da docência no Ensino Médio
Madeira (2006) em referências as palavras de Martins (2000), enfoca que os eixos em
que se sustentam as reformas no ensino abordam propostas como a centralidade no
conhecimento, a aprendizagem e aquisição de competências e habilidades, sem que sejam
ofertadas condições reais para que sejam efetivadas. São reformas que sobrecarregam de
tarefas os professores, motivadas por concepções sobre a formação e atuação dos docentes,
orientadas por tendências mundiais, voltadas para os aspectos práticos da atuação dos
professores. Perde-se o aspecto político e enfatizam-se as qualidades individuais, a eficácia e
a competência para o exercício do trabalho docente.
Costa & Oliveira (2011) apontam que os professores do ensino médio assumem um
número maior de funções, o que marca um processo de intensificação crescente do trabalho
docente com maiores números de turmas, turnos, aulas, alunos e empregos e as consequências
que incidem principalmente sobre a remuneração, as condições concretas de trabalho e as
funções e tarefas que desempenham. O professor André explica que a sua prática em sala de
aula sofre em função da falta de tempo e disponibilidade para qualificação e preparação de
aulas:
Eu, por exemplo, tenho quarenta horas aqui na escola. O meu horário é
distribuído de tal forma que venho quatro manhãs. É praticamente ocupando
a cada cinco horas do meu dia, são vinte horas. Três tardes, aí, mesmo que
tenha prestes naquele meio, eu não posso dizer que não tenho aula. Se estou
na escola, não tenho como correr. Só aí você calcula quantas horas? Cinco
vezes quatro é igual a vinte mais quinze é igual a trinta e cinco. Ou seja,
estou cumprindo trinta e cinco horas. Só que acontece, às vezes, comigo tem
acontecido sempre, aulas aos sábado. Estou tendo quarenta aulas, quarenta
horas na escola, ou seja, que tempo sobra? Com turmas diferentes,
disciplinas diferentes, como EJA (Educação de Jovens e Adultos), com 1º
ano, 2º ano, 3º ano, com turmas de 8º ano, 9º ano, tudo misturado. Como vou
87
ter tempo de cumprir uma carga horária integral, de quarenta horas na
escola, ter tempo extra para pesquisar, e para aperfeiçoar, me qualificar? E
mesmo que eu tivesse seria por conta própria porque a escola não fornece
isso. A escola fala que os professores deveriam dispor a participar da aula
departamental, mas a escola não tem condições de assumir isso e nem a rede
pública do Estado e nem quer porque alguém teria que trabalhar.
O discurso que centraliza as qualidades individuais e a prática docente (mesmo que
não sejam encontradas condições reais para o desempenho do trabalho) é incorporado pelos
professores, como bem deixa claro a professora Marlene em sua explanação, quando
reconhece que,
[...] ser professor do ensino médio é eu ter que ter mais empenho, mais
cuidado, mais responsabilidade principalmente com o 3º ano que eu tenho,
estou sabendo que eles vão ser entregues ao mercado de trabalho. O que foi
que eu fiz em prol disso? Uma vez que geografia quase todos os concursos
requer questões abertas e sobre conhecimentos gerais e geografia é uma das
que pode ajudar nisso e eu tenho que me empenhar o máximo, eu estou
constrangida de não poder está agindo assim.
Reconhece, ainda, a professora que não exerce as suas atividades sozinha, em virtude
de que não são garantidas as condições pela Secretaria de Educação de Estado como instância
administrativa para o apoio pedagógico:
Eu gostaria que o Estado propiciasse ao professor o que quando eu como
monitora da prefeitura conseguia para que eu pudesse entrar mais solta na
sala de aula, porque eu me sinto como uma pessoa sempre em fase de
alfabetização, sempre adequar ninguém. Quando lá na SEMED (Secretaria
Municipal de Educação de Maceió), eu como contratada, nós tínhamos a
liberdade de, não é a liberdade, a oportunidade de termos alguém para
esclarecer muita coisa quinzenalmente dentro da disciplina.
Garcia; Hypolito; Vieira (2005) defendem que a identidade docente vai além dos
discursos oficiais que os veem como meros responsáveis pela formação de cidadãos. Acredita
que a sua função extrapola esse objetivo e assume que há influência de outros determinantes
como a história familiar e pessoal, as condições de trabalhos e ocupacionais. Por isso, há nas
falas dos professores questões que são referidas e tratam especificamente da sua relação com
os alunos que interferem diretamente no processo educativo.
A professora Joana nos diz que os estudantes das escolas públicas têm dificuldades
em função da falta de oportunidade e de acesso aos materiais que os estudantes das escolas
particulares têm, assim como da discussão entre eles acerca da finalidade do ensino médio.
Informou:
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Possuem muita carência, (mais) dificuldades que aluno da escola particular, da
escola pública no caso. Ele tem que ter acesso a conteúdo, acesso a livros, tem
que ter acesso a vestibular, a faculdade. Mas a gente esbarra com muita coisa,
com todo tipo de carência, no caso da escola pública. E, principalmente com
as carências deles, as dificuldades que eles trazem.
O ensino médio, eles conversam na sala para não tirar o estímulo. Mas você
sabe é uma coisa que você não sabe qual é a função. Ele prepara para quê?
Hoje o ensino médio pra mim, você dá o conteúdo e ele serve como uma
peneira para o vestibular. Então, aquele que absorveu mais aqueles conteúdos
ali, ele vai ter mais acesso a faculdade. O que outros não vão ter.
O professor André acredita que o interesse do aluno deve ser despertado
principalmente quando este está cursando as séries do ensino fundamental – é necessário
utilizar recursos pois, no ensino médio, exige-se que este se coloque em uma posição de maior
concentração, apesar de que, nessa fase do ensino, os alunos se encontram na adolescência, na
fase dos questionamentos acerca da sociedade. Relata que o professor deve envolvê-lo em
discussões que suscitem questões políticas e do conhecimento, levá-lo a pensar sobre si é a
dimensão social e política do ensino.
O professor do ensino fundamental tem mais ou menos esse papel, de ter
habilidade técnica de envolver o aluno. Então, quando chega no ensino
médio, você de certa forma, já passou um pouco do seu limite. Você já cobra
do aluno uma maior concentração daquilo que deu. Mas mesmo assim, você
precisa de trabalho técnico. Agora no ensino médio, é uma fase que o aluno
já está começando a despertar para as questões, os questionamentos da
sociedade, o adolescente. Então, você vai despertar essas questões políticas,
então, tem o patamar mais de valor ativo da sociedade, você vai discutir com
eles. Como envolver o aluno? Essa questão desse envolvimento político com
o conhecimento, você criar um aluno justamente nessas necessidades e
pensar em torno dele próprio. Essa dimensão mais social e política do
ensino ela, de certa forma, é muito importante. Só que também não é fácil
despertar o envolvimento do aluno porque justamente, isso é uma questão de
história. O professor que não toca nesse assunto, ele não consegue envolver
a turma.
A professora Abgail, quando aborda a questão de ser professor do ensino médio relata
que ensinar nessa etapa é um desafio em virtude de que acredita que os alunos não
demonstram interesse pelo conteúdo trabalhado em sala de aula:
Hoje que a gente pega um aluno com uma defasagem de conteúdo e você
precisa mostrar que o conteúdo que está trabalhando é relevante no dia-a-dia
dele e muitas vezes eles não querem nem lhe ouvir e acham que aquilo é
para decorar e ter uma nota e ir embora acatar, mostrar que aquilo é
importante que ele usa a ciência e a Biologia em todos os momentos e não só
aspectos da vida dele mas como cidadão, então esse é o grande desafio eles
não querem mais parar para ouvir, ou para estudar ou para entender – o
professor tem o desafio é tentar, fazer tentativa, é fazer com que eles gostem
89
ou queiram ouvir, entender, precisa ser um apaixonado tanto pela disciplina
e pela profissão.
Preocupado em discutir a imagem e o reconhecimento social de cada nível de ensino,
Arroyo (2009) informa que são diferentes e nem sempre convergem. Os professores das séries
finais do ensino fundamental e médio têm a sua imagem atrelada ao professor. Educadores
são os professores da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental em função
de que se ocupam principalmente da formação moral de seus alunos. Há distinção entre ser
professor (aquele que professa uma arte, uma técnica ou ciência, um conhecimento) e ser
educador (aquele que abraça doutrinas, modos de vida, ideais, amor e dedicação).
A professora Marlene refere que, em sua prática, atua como professora e educadora,
dedicada a orientar os alunos, como bem nos diz:
Além da educação doméstica, essa educação doméstica é importante tem que
ter solidificada na escola. Então, eu como professora, eu sou professora e
educadora. Enquanto os pais e os responsáveis podem ser apenas
educadores. Eu tenho que ser professora e educadora, a partir do entrar na
sala de aula, porque estou mostrando a ele o horário que tem que ser
mantido, não exigindo. Qual é a hora que tem que chegar? Porque estou
querendo prepará-lo para o mundo, para o mercado de trabalho. Horário,
testes, tudo isso o professor pode orientá-lo. Em termo de conhecimento,
enquanto é ciência...
Em seu relato acerca do trabalho docente no ensino médio, o professor Ronaldo diz
que está relacionado com a experiência que os docentes tiveram quando eram alunos. A
reflexão faria com que pudesse
[...] dar sua contribuição para aqueles alunos, principalmente da rede
pública. Os alunos que não tem às vezes oportunidade de pagar uma escola
particular e eles se colocam nas mãos dos professores, no caso. Tem muito
professor que vem dá aula e enrola. E o ensino médio principalmente de
colégio público exige muito a questão da ética, da boa índole do professor.
Se ele passou por um ensino médio e a sua etapa de provação, foi colocado,
ele teve muitas provas negativas eu acho que muitos professores aí que
passaram por momentos negativos na escola pública, acham que eles vão
tentar fazer o diferencial. Acho que também é isso, é fazer o diferencial.
3.7 - Ações coletivas na Escola
Percebe-se também que os professores vivem isolados em sua rotina. Cunha (1998)
acredita que esse movimento está ligado à busca pela autonomia, que os levam a utilizar o
espaço da sala de aula como espaço de poder, produz o isolamento e pode funcionar como
elemento de proteção contra as suas fragilidades, as suas dificuldades. Junte-se a isso o fato de
90
que, em análise, nas falas dos professores, percebe-se que os momentos de interação que
visem a discussão da prática educativa não são abundantes.
A identificação de ações coletivas é reconhecida principalmente quando os professores
relatam a existência de práticas pedagógicas desenvolvidas na escola.
As ações que envolvem a coletividade para a professora Joana estão presentes
principalmente quando da oferta de projetos e programas originados de instituições de ensino
superior (estagiários), projetos de extensão, de pesquisas, ações de organizações
governamentais e não-governamentais. Cabe observar que as atividades nem sempre
envolvem os professores da casa; são direcionadas aos alunos de algumas séries pontuais:
Do ano passado pra cá, a gente vem assim. Primeiro vem o pessoal da
psicologia do Cesmac (Centro Universitário Cesmac) trabalhando com eles a
questão da autoestima, mercado de trabalho, projeto de vida, o que vou fazer
depois da conclusão do ensino médio. Então, essas ações, é assim, a gente
tem que buscar foco. O que muitas coisas a gente não tem na escola. A
Patrícia (funcionária de uma instituição que trabalha o empreendedorismo)
também vem com esses projetos, o pessoal do segundo ano tá no projeto do
empreendedorismo, todo sábado eles vem pra fazer o curso. Então, a gente
vem buscando essas ações fora. O pessoal do IFAL (Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia de Alagoas) tá para colocar o laboratório de
matemática para funcionar, trabalhar com eles a questão da lógica
matemática, dentro do laboratório. Ano passado conseguimos fazer a feira
das profissões, já visando essa questão. Este ano queremos fazer de novo.
Eles foram visitar algumas faculdades, feira de cursos, da Maurício de
Nassau (instituição privada de ensino superior), da Uncisal (Universidade de
Ciências da Saúde de Alagoas), para conhecer os cursos, pra ver se a gente
consegue abrir o olho.
O professor Renato informa que não existe apoio por parte da escola para o
desenvolvimento desta para ações de planejamento; as práticas estão voltadas para a
promoção de eventos
Na realidade, não tem uma prática pedagógica em escola pública que explore
o que o aluno necessita. Por exemplo, a gente considera a prática pedagógica
aquilo que se pode planejar no início para ser aplicado durante o ano. A
gente não tem esse apoio nem da escola. As práticas que temos usados são as
tradicionais. Praticamente o professor de escola pública é muito difícil ele
variar o que ele vem fazendo em sala de aula. Talvez a escola faça alguns
eventos para ver se é aplicável na melhora da maneira de passar isso para os
alunos.
O professor André relaciona que o desenvolvimento de práticas pedagógicas na escola
deveria estar relacionado com o projeto político pedagógico da escola o qual servia para
integrar as ações dos professores. Acredita que a equipe se ocupa com problemas relacionados
91
com a ordem disciplinar na escola e com questões burocráticas. Acredita também que em seu
papel social, a escola contribui para a cidadania, porém falta a participação da família,
juntamente com os profissionais, a interação do Estado e toda a sociedade:
É, veja só, de pedagogia, usamos o termo prática e ação. A prática está
relacionada ao conjunto, ao trabalho da escola e ação seria uma atitude
isolada do professor. Então, nesse sentido, está uma coisa, quando uma
escola consegue apenas reunir uma vez a cada seis meses ou duas vezes os
professores para discutir algumas coisas com “ah, problema tal”, já é um
grande acontecimento. Se não houver isso, podemos dizer que não há prática
pedagógica planejada. Há, na verdade, uma política de ações isoladas de
professores, esse que é o problema. Justamente a falta da prática pedagógica,
da atuação teórica planejada levada a efetiva ação, seria até melhor dizer a
práxis. É isto que está faltando. Eu vejo isso como um dos grandes
problemas hoje. E quem estaria no centro de tudo isso? A coordenação da
escola. Tem um projeto, tem seu projeto a partir do PPP da escola (Projeto
Político Pedagógico), tem um projeto didático ou vários projetos didáticos
que integrassem as ações desses professores, causando uma... Aí eu
pergunto, qual coordenador que realmente consegue fazer isso? Muitos, por
pura incapacidade técnica, mas também aqueles que teriam preparo para
isso, estão ocupados com outras atividades porque a escola não tem
determinado funcionário que não tá se comportando, para controlar a
disciplina dos alunos nos corredores, ou muitas vezes a questão burocráticas
da escola mesmo. Listar a compra de merendas e tudo mais. Então, o que
está faltando é isso, a prática na escola que está faltando e é uma ação
conjunta de todos.
A professora Marlene acredita que não há colaboração da escola em relação ao
desenvolvimento de atividades pedagógicas para a sua disciplina, assim como para nenhuma
outra. Percebe que falta pessoal qualificado para tal e que a equipe se volta principalmente
para questões de ordem disciplinar em função da ausência de funcionários para ocuparem tal
função.
Eu não vejo diferença entre o trabalho que é feito para os alunos do ensino
fundamental e nem para com os alunos do ensino médio. É tanto que
percebo que tem que haver um melhor investimento enquanto acumular a
partir do 1º ano. Tudo isso para investimento da própria escola. O
investimento que eu vejo é mais assim, de projetos, não polos, mas no ensino
médio irem no final de semana, no sábado, para construir uma paródia. Mas,
a pedagogia usada para o fundamental passa mesmo o suporte técnico,
mesmo trabalho.
O professor Ronaldo informou que desconhece as práticas pedagógicas desenvolvidas
pela escola, referindo-se apenas às atividades desenvolvidas aos sábados, direcionadas para
interações entre as turmas.
As práticas que o colégio desenvolve, eu sei que tem alguns momentos,
digamos assim que o colégio, principalmente aos sábados, sempre aos
sábados, que seria uma questão de interação entre as turmas que se ajudam,
92
mesmo conteúdo que é trabalhado, começa a ser trabalhado pelas duas
turmas. Acho que tem apresentação também de História, tem outras questões
aí. Estou um pouco por fora.
A professora Abgail informou que os momentos de práticas pedagógicas aconteceram
com projetos interdisciplinares. Informou que foram implementados durante um certo período
do ano, mas foram interrompidos. Acredita também que a interação enriquece os
conhecimentos dos participantes.
No primeiro semestre desse ano, nós começamos a trabalhar com projetos
pedagógicos interdisciplinares. Fizemos um sobre os símbolos cívicos, que
tem a ver com Sete de Setembro, resgatar o respeito à pátria, a questão da
nacionalidade, deu certo, os dois primeiros encontros foram muitos bons,
todos os professores independente de qualquer área, o professor do grupo de
geografia, história, filosofia eles trouxeram o projeto e estavam à frente mas
todos se engajavam, para mim era um sonho de escola. Mas depois de duas
tentativas que deram certo a escola abortou o trabalho porque dá trabalho e
isso me entristesse. Esse ano foi uma decepção muito grande porque na
prática a gente viu que dá certo os meninos vinham para cá aos sábado e
produziam coisas belíssimas, e você descobre artistas de todas as áreas e
descobre outros saberes que aquela criança tem e que não foi minimamente
valorizado. Poder trabalhar com projetos poder sentar com um colega e
planejar, a Biologia não é só minha, a História não é só do outro professor,
está tudo integrado e quando a gente tem essa visão o aluno também
interagem [...] Os projetos são muito importantes, eu gosto muito deles. Eu
trabalho com um projeto na área de educação sexual, é um projeto do
Estado, que fez a capacitação e manda o material é bom e que vejo
resultados, não gosto da forma como eles cobram os dados, é um trabalho
interdisciplinar e não é. Termina ficando só com a Biologia e a Ciência. Em
outras práticas pedagógicas da escola, existem tentativas de projetos de
leitura [...]
3.8 - Envolvimento da comunidade
Como visto em capítulos anteriores, a escola brasileira em suas decisões mais
significativas nem sempre contou com a participação da sociedade em geral. Martelli (2004)
argumenta que os condicionantes do sistema escolar brasileiro não proporcionaram o
desenvolvimento de programas de integração entre escola e comunidade. Os motivos para tal
podem estar associados a forma centralizada da gestão escolar; à falta de tradição de
participação da sociedade nas questões; e à falta de compreensão da função social do ensino
fundamental e médio.
Ao realizar uma análise dos itens dispostos nas Leis de Diretrizes e Bases da Educação
Brasileira, acredita que a atual (9.394/1996) supera as demais quando coloca em termos claros
93
a união entre a gestão democrática do ensino público e a valorização das práticas extraescolar.
Cita o artigo 12 que propõe a articulação entre escola, família e a comunidade, no sentido de
envolvê-los para inclusive participar na execução da proposta pedagógica.
O professor Ronaldo acredita que o processo educativo deveria se voltar para superar
as condições de pobreza:
[...] É ajudar nesse processo de educação, ajudar nesse processo de sair
daquela condição social dele.
No entanto, o professor Renato referiu que a função da escola é moldar o aluno para
que ele possa aplicar o conhecimento adquirido na comunidade. Mas acredita que pode haver
dificuldades na aplicação desses conhecimentos em virtude das diferenças culturais.
Há que se considerar que as dificuldades encontradas pelos professores nas capitais e
grandes cidades brasileiras talvez tenham as suas raízes naquilo que é peculiar à dimensão em
que se encontram e a forma como se transformaram ao longo do tempo. São grandes centros
que, como nos diz Bauer (2013, s/p),
produzem problemas urbanos de reconhecida singularidade, próprios de seus
respectivos processos históricos e nos marcos em que se processou o
desenvolvimento da sociedade capitalista no Brasil, ou seja, de forma
desigual e combinada.
Ser professor na metrópole requer sentir o reflexo da histórica falta de participação
popular no planejamento e gestão das cidades e que o professor deve se posicionar
politicamente para compreender que algumas questões vão além da mera ação pedagógica.
3.9 – Pobreza e analfabetismo
Dados demonstram que o estado de Alagoas apresentou, no ano de 2009, o pior
Índice de Desenvolvimento do Ensino Básico (IDEB) do Brasil (FAJARDO, 2012). Nesse
contexto, as deficiências no processo educativo são evidentes e, dentre as consequências,
podemos relacionar a evasão, o abandono e distorção entre a série em que o aluno está
cursando e a idade que, como vimos anteriormente, pode estar vinculada à disposição
didático-pedagógica do ensino médio que não atende à especificidade da clientela
trabalhadora.
94
Outros aspectos são apontados por Ladislau Dowbor (ALMEIDA; NHOQUE,
2010) que podem ser compreendidos quando se realiza uma análise do papel social da
educação básica, a partir da influência do pensamento moderno que tem colaborado para
proposição de um modelo que tem sido responsabilizado pela má qualidade da escola. Indica
que, para superação desse quadro, a escola deve estar inserida e funcionar como motor para o
desenvolvimento local. O papel social da escola se voltaria para a promoção da qualidade de
vida coletiva, da vida comunitária.
As desigualdades sociais, provocadas principalmente pela má distribuição das
riquezas do país, é o ponto nevrálgico da relação entre escola e a função que esta tem para a
sociedade. Para ele, a educação deve existir mais como elemento rearticulador da sociedade e
menos como reprodutor das desigualdades sociais. Deve servir como um instrumento de
inclusão social e começar pelo espaço da comunidade onde estão inseridas a escola e a sua
clientela – funcionários, pais, alunos. Os conteúdos trabalhados em sala, necessariamente,
partiriam da realidade do aluno, da realidade da comunidade e assumiriam a significância que
lhes são pertinentes, porque fazem parte da história da vida do aluno, da sua família, da sua
escola e da sua comunidade.
Algumas forças presentes na sociedade dão suporte para a permanência do
problema da desigualdade, a elite presente nas camadas sociais mais altas se utiliza de
mecanismos para retenção e não difusão dos conhecimentos produzidos pela humanidade.
Para Dowbor, o acesso ao conhecimento é um instrumento para que se efetivem
verdadeiramente as relações democráticas.
O problema da desigualdade é um fenômeno que historicamente se faz presente
no estado de Alagoas. O quadro socioeconômico e as repercussões no panorama educacional
em que se encontra o sistema público de ensino básico tem influenciado o trabalho dos
professores. Percebe-se que os entrevistados compreendem que a clientela a que atendem é
prejudicada em função das condições em que é ofertada a educação pela escola pública. A
relação entre a qualidade do ensino público e o da iniciativa privada em muito se distanciam,
assim como influenciam as suas práticas e as práticas pedagógicas da escola e efetivamente na
expectativa de professores e alunos acerca da educação. Isso está claro, por exemplo, nas
afirmações da professora Joana:
Eu tenho uma visão que o aluno de ensino médio tem que ter as mesmas
oportunidades que aluno da escola particular, da escola pública no caso. Ele
95
tem que ter acesso a conteúdo, acesso a livros, tem que ter acesso a
vestibular, a faculdade [...]. Mas a gente esbarra com muita coisa, com todo
tipo de carência, no caso da escola pública. E, principalmente com as
carências deles, as dificuldades que eles trazem. Então é um trabalho
complicado, um trabalho difícil porque você quer tentar produzir o melhor
pra eles, quer ver o retorno [...]
O professor André percebe que as dificuldades dos alunos encontram as suas raízes na
oferta deficiente do ensino fundamental e o despreparo repercute no ensino médio, como bem
esclarece abaixo:
[...] Mas, como professor, noto de um modo geral, que os alunos de ensino
médio não têm nível médio na prática, são pessoas que vieram de atividades
terríveis no ensino fundamental, ou seja, chegaram ao ensino médio sem
fundamento e tem dificuldade de interpretar, de transpor o que pensa para o
papel e quando consegue isso, há dificuldade de usar todo esse
conhecimento para a vida prática [...]
Porém em sua fala, acredita que a escola privada não cumpre o papel de formar para a
vida, vincula a formação básica à preparação para o ensino superior:
Mas, a escola privada, muitas vezes peca... Ao invés de preparar para a vida,
prepara para entrar na universidade, para abrir a porta, mas não para está
preparado para estar na universidade de modo geral.
Ainda, em observação às relações oferecidas, às condições para a educação pública, à
percepção que os professores possuem da sua clientela, às repercussões do seu trabalho, nota-
se, na fala da professora Marlene, assim como nos outros, que há uma certa necessidade de
estabelecer um paralelismo entre o público e o privado, caracterizado principalmente pelo
despreparo, pela falta de estrutura, pelas ausências (dos pais/família):
.
[...] o ensino médio limita o aluno a se submeter ao ENEM (Exame Nacional
do Ensino Médio) para ingressar na universidade ou na faculdade e isso é
pouco por conta da competitividade que o mundo está oferecendo, uma vez
que a gente percebe que as escolas particulares, não todas, que estão mais
bonitas, elas dão mais oportunidades que as escolas publicas. Não
desmerecendo, mas são poucos da escola pública que tem o incentivo em
casa para prosseguir que o incentivo vem mais da escola. [...]
De forma clara, o professor Renato atrela à ingerência governamental a baixa
qualidade do ensino público, assim como Dowbor percebe que há necessidade do
reconhecimento, por parte do aluno, da constante atualização e de que os conhecimentos
96
adquiridos na escola fora da comunidade em que reside dificultam a relação que este tem com
a escola. São duas as suas falas que ilustram as suas ideias:
Com as deficiências que tem o ensino público no país, principalmente
Alagoas que praticamente teve duas décadas (em) que foi esquecida, as duas
décadas anteriores, o que acontece é que o ensino foi sucateado e hoje como
o país está vivendo uma era de investimento, praticamente vai ser difícil essa
geração se enquadrar nesse perfil que o mercado de trabalho está exigindo e
haja vista que se está importando muitos técnicos para suprir essa carência,
por conta do sucateamento do ensino e do esquecimento dos poderes
públicos. Mas o mercado de trabalho hoje está exigindo que o aluno tenha
um certo conhecimento para poder entrar nele por conta do nível de
informação que ele está vivendo e do mundo tecnológico.
‘ A fala acima também aponta para reflexão acerca do papel do professor e o pouco
significado que pode ter o seu trabalho diante do desmonte da educação pública e a recente
importação de técnicos como um dos efeitos do desmantelamento do sistema educacional. Em
Alagoas, segundo relatório do Ministério Público Estadual (RIBEIRO, 2013), 6% das escolas
públicas estaduais não ofertaram aulas no ano letivo de 2012; 82% atrasaram o ano letivo;
destas, 51% não ofertaram a grade curricular completa e, em decorrência do atraso, 61 mil
alunos foram prejudicados.
A escola é um lugar em que vai formar o aluno, quer dizer, ele vem aqui
aprender comportamento. Cabe à escola moldar esse aluno. Para ele aplicar o
conhecimento dele na comunidade é uma coisa muito difícil, mesmo a escola
tendo canais na comunidade ela precisa (de) várias pessoas [...] porque o que
acontece é o seguinte: o aluno tem um perfil aqui na escola e onde mora
levar isso daqui prá lá porque primeiro ele vai ter uma segunda forma,
porque a maioria que está lá no meio dele não vai ter o mesmo, uma
educação que ele e vai existir um choque de comportamento. É muito difícil
aplicar o que aprende até mesmo dentro de casa por conta da educação do
pessoal que está no meio dele.
Mesmo expressando a ideia de que a escola se destina a moldar o aluno, de que ele
deve apreender o comportamento de uma sociedade com valores diferentes dos seus, o
professor rememora a ideia da escola em seus moldes tradicionais. Porém, o relato expressa as
dificuldades do exercício da docência com uma clientela que não consegue identificar o papel
da escola em sua vida e a sua função social. Queiramos entender o esforço que faz este
professor com o que nos diz Bauer (2009, p. 106) ao referir que educar é, na maioria das
vezes, “a forma mais significativa de inseri-los no universo da vida social, com o
compartilhamento de suas normas e valores espirituais, economia e política, cultura e
historicidade”. Mas que talvez não percebamos, como docentes, que questões muito mais
amplas a exemplo das relações estabelecidas atualmente entre o Estado, a sociedade e a escola
97
trazem como implicação a baixa qualidade do ensino e, por consequência, a pouca efetividade
de seu trabalho.
98
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo objetivou discutir o sentido do trabalho docente para os professores
que atuam em uma escola de ensino médio da rede estadual localizada na cidade de Maceió,
em Alagoas. Buscou-se também compreender a relação entre essa atribuição de sentido e os
processos formativos pelos quais os docentes participaram.
A abordagem qualitativa balizou o desenvolvimento do estudo. Fundamentou o
percurso da pesquisa composta pelo levantamento bibliográfico (recorreu-se aos livros,
artigos, teses e dissertações) e pela pesquisa documental. A coleta de dados foi
complementada com entrevistas semiestruturadas, realizadas com seis professores do ensino
médio de diferentes áreas do conhecimento. Em razão da minha experiência como professora
na instituição pesquisada, a escolhi como campo de investigação e isso facilitou o
desenvolvimento de estratégias para identificar as demandas do estudo.
A pesquisa revelou que entre os professores da escola não está clara a percepção
acerca das finalidades do ensino médio. Percebe-se que alguns apontam exatamente para o
texto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/1996, a qual propaga que o
referido ensino deve ser destinado à formação do cidadão. Percebe-se que há ainda entre eles
os que acreditam que essa etapa de ensino serve à formação do cidadão, como preparatória
para a profissionalização e também como propedêutico.
Depreende-se que as precárias condições socioeconômicas em que vivem os alunos da
Escola constituem um dos motivos para que pensem o ensino médio como uma etapa que
serve para preparação de mão-de-obra para o mercado de trabalho. Percebem que, para os
estudantes de escolas particulares, o ensino médio se destina à preparação para os estudos
posteriores. Esse fato afirma a concepção de que há muito permeia as finalidades da educação
na nossa sociedade: escolas para os ricos e escola para os pobres. As condições em que é
ofertado o ensino nas escolas públicas contribui para essa divisão. A escola privada se volta
para a preparação para os estudos superiores (e para tal são equipadas com todos os recursos
materiais e humanos), enquanto nas escolas públicas há deficiências estruturais que impedem
a boa formação para a preparação para os estudos posteriores assim como para o mercado de
trabalho e até mesmo para a formação cidadã.
99
Há dificuldades no desenvolvimento do trabalho docente no ensino médio em razão de
que os alunos apresentam baixas condições de aprendizagem que podem ser creditadas às
deficiências do ensino fundamental nas escolas públicas. Percebem que nem sempre está clara
para os alunos a relevância dos conhecimentos propagados pela escola e a finalidade destes
para a vida deles. Esse fato pode ser consequência de um modelo de educação da era moderna
e que, como nos diz Dowbor (ALMEIDA, NHOQUE, 2010), a escola em seus conteúdos e
estrutura está fora da realidade em que vivem os alunos. Em Maceió, o ensino médio é
ofertado prioritariamente pela rede estadual e isso provoca o deslocamento de um grande
contingente de alunos que saem de bairros periféricos onde moram – a escola pesquisada
possui cerca de 1.500 alunos e grande parte deles reside em bairros distantes.
Os professores desenvolvem as suas atividades de forma isolada pois não há
acompanhamento pedagógico por parte da escola em função de que os recursos humanos
disponíveis nas unidades se desviam para atividades geralmente ligadas à disciplina dos
alunos e ao trabalho burocrático. Identificam que as propostas de interação pedagógicas são
realizadas mediante proposição de projetos de caráter transversal realizados aos sábados e que
nem sempre são concluídos. Reconhecem que agentes externos ao processo pedagógico
fornecem suporte para as atividades desenvolvidas na escola. São organizações não-
governamentais, instituições de ensino superior, entre outras, que organizam momentos
pedagógicos para os alunos, mas nem sempre há participação dos docentes da casa.
Apesar de não ter ecoado em todas as falas dos professores entrevistados, a fala de um
deles vem ao encontro dos estudiosos da educação quando afirma que o isolamento no
desenvolvimento das atividades pedagógicas poderia ser minorado se houvesse efetivamente
uma articulação com o projeto político pedagógico por todos os professores. Para ele, a
prática não está articulada com o documento, o ensino médio deveria formar para a vida, para
que os alunos pudessem utilizar, no cotidiano, os ensinamentos apreendidos na escola, que
pudessem, a partir dos conhecimentos produzidos pela ciência e difundidos na escola, garantir
a eles a possibilidade de melhor compreender de forma crítica o mundo ao seu redor.
Pode-se dizer que a presente investigação poderá servir como elemento disparador
para outros estudos que desejem aprofundar a influência da participação dos agentes externos
nos processos educativos; os efeitos da crescente burocratização realizada por especialistas
nas questões de ordem pedagógica como uma forma de controle do trabalho docente; os
fatores que ocasionam a falta de compreensão do sentido de coletividade da profissão docente
100
e os fatores que incidem diretamente no exercício da docência (isolamento, proletarização e
precarização) e, de forma mais ampla, a crescente influência de organismos internacionais que
ditam os rumos da educação e inibem o surgimento de outros modelos voltados para as
demandas locais e não apenas para o interesse do mundo exclusivamente econômico-
financeiro que atualmente obscurece a compreensão das finalidades e razão do ensino médio e
da educação para a sociedade.
101
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Jane Soares de. Mulher e Educação: a paixão pelo possível. São Paulo:
UNESP, 1998.
ALMEIDA, Júlio Gomes. Ser professor na metrópole: desafio de construir significado para o
trabalho na escola. In.: Sinergia, v. 9 (1), p 27-33, 2008.
_________; NHOQUE, Janete Ribeiro. Entrevista: Ladislau Dowbor. Revista
@mbienteeducação, São Paulo, v. 3, n.1, p. 166-173, jan./jun. 2010. Disponível em:
http://www.cidadesp.edu.br/old/revista_educacao/pdf/volume_3_1/julio.pdf. Data de acesso:
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108
ANEXOS
109
Roteiro das entrevistas
Nome
Formação inicial
Outras formações
Atua em que áreas?
Quando começou a atuar no magistério?
Há quanto tempo atua no Ensino Médio?
O que é trabalhar no Ensino Médio?
O que é ser professor no Ensino Médio?
O que o aluno da educação básica precisa aprender para o exercício adequado ao
mercado de trabalho? E para atuação como cidadão que contribui para a sua
comunidade?
Quais são as principais práticas pedagógicas desenvolvidas na escola?
Qual o papel social da escola?
Qual o papel social do Ensino Médio?
Gostaria de falar algo que não foi abordado nesta entrevista?
110
PROFESSORA JOANA
Pesquisadora:
Qual sua formação inicial?
Professora:
Licenciatura em Biologia.
Pesquisadora:
Tem outras formações?
Professora:
Tenho em Farmácia. Tenho especialização em Tecnologia da Educação. Tecnologia da
educação é pós-graduação e Farmácia foi por equivalência e fiz lá no Cesmac (Centro
Universitário Cesmac) e Biologia foi minha primeira graduação na UFAL.
Pesquisadora:
Atuou em outras áreas?
Professora:
Não. Só na educação. Já trabalhei um tempo com ele (pai), na distribuidora
farmacêutica. Mas, não tinha nada a ver. Era só para ajudar, no começo quando ele (o pai)
começou a abrir. Não tinha ninguém e quem ajudava era a família mesmo.
Pesquisadora:
Quando começou a atuar no magistério?
Professora:
Antes de me formar.
Pesquisadora:
Quanto tempo?
Professora:
Quanto tempo tem que atuo no magistério? Misericórdia! Desde 90, 89 eu já dava aula
particular. Quando eu tava no 3º ano eu já dava aula particular, mas bote 90 que é quando
entrei na faculdade.
Pesquisadora:
Há quanto tempo atua no ensino médio?
111
Professora:
Desde que entrei no Estado, em 2001.
Pesquisadora:
O que é ser professor no ensino médio?
Professora:
Ser professor no ensino médio é complicado. Eu tenho uma visão de que o aluno de
ensino médio tem que ter as mesmas oportunidades que aluno da escola particular, da escola
pública, no caso. Ele tem que ter acesso a conteúdo, acesso a livros, tem que ter acesso a
vestibular, à faculdade. Mas a gente esbarra com muita coisa, com todo tipo de carência, no
caso da escola pública. E, principalmente, com as carências deles, as dificuldades que eles
trazem. Então é um trabalho complicado, um trabalho difícil porque você quer tentar produzir
o melhor pra eles, quer ver o retorno deles. O retorno deles é o quê? É uma aprovação, uma
entrada na faculdade e a gente esbarra com esse monte de coisa. Mas, pra mim, na minha área
é o que prefiro. Eu trabalho com isso no ensino fundamental pra complementar a carga-
horária.
Pesquisadora:
Ser professor do ensino médio seria para?
Professora:
Para uma profissão, para uma faculdade, para uma formação, como se fosse um
degrau. Para que eles cheguem, aquela história do meio para atingir a meta.
Pesquisadora:
O que o aluno da educação básica precisa aprender para o exercício adequado do
mercado de trabalho?
Professora:
Tudo o que ele não aprende. Eles não sabem trabalhar em grupo, eles têm um péssimo
relacionamento interpessoal. Eles não sabem ler, interpretar, contextualizar, não têm noções
básicas da matemática, da lógica matemática, então, o que eles precisam no mercado de
trabalho é tudo o que não aprendem no ensino básico.
Pesquisadora:
E para atuação como cidadão, que contribui para sua comunidade? Quais são as
principais práticas pedagógicas desenvolvidas na escola para o ensino médio? O que é
que a escola faz especificamente para o ensino médio?
Professora:
112
Do ano passado pra cá, a gente vem assim. Primeiro vem o pessoal da psicologia do
Cesmac (Centro Universitário Cesmac, instituição privada de ensino superior) trabalhando
com eles a questão da autoestima, mercado de trabalho, projeto de vida, o que vou fazer
depois da conclusão do ensino médio. Então, essas ações, é assim, a gente tem que buscar
foco. O que muitas coisas a gente não tem na escola. A Patrícia (funcionária de uma empresa
de fomento à empresas-júniores em escolas) também vêm com esses projetos, o pessoal do
segundo ano tá no projeto do empreendedorismo, todo sábado eles vem pra fazer o curso.
Então, a gente vem buscando essas ações fora. O pessoal do IFAL (Instituto Federal de
Ciência e Tecnologia de Alagoas) tá para colocar o laboratório de matemática para funcionar,
trabalhar com eles a questão da lógica matemática, dentro do laboratório. Ano passado,
conseguimos fazer a feira das profissões, já visado essa questão. Este ano queremos fazer de
novo. Eles foram visitar algumas faculdades, feira de cursos, da Maurício de Nassau
(instituição privada de ensino superior), da Uncisal (Universidade de Ciências da Saúde de
Alagoas, instituição de ensino superior do Estado), para conhecer os cursos, pra ver se a gente
consegue abrir o olho. Alguns têm essa visão de vestibular, de universidade, mas a maioria
não. A maioria tem aquela visão assim, terminar o ensino médio, do arrumar um emprego no
comércio, ser doméstica como a mãe, como a tia. A gente conversa muito com eles essa
questão assim, que não é uma coisa humilhante, mas que ele como estudante, eles precisam
olhar acima do muro. Ter outra visão do mundo, tentar ter outras oportunidades, até pra ver se
conseguem ter mais possibilidades do que a família deles. A visão da maioria deles é o final.
Eu converso muito com eles. Na época dos pais de vocês, dos meus pais, o ensino médio era
realmente o fim, hoje é o começo. Hoje ter ensino médio não é favor, é obrigação. Então,
vocês estão começando a partir do momento que concluir o terceiro ano. Muitos deles
começam a se acomodar, quando começam a conseguir esses subempregos, sem carteira
assinada, altamente explorados pelos patrões, uns mesmo da noite chegam aqui suados, com
fome, “nas carreiras”, porque a patroa só liberou depois que arrumou a cozinha, que o patrão
só liberou depois que arrumou o estoque e muitos deles não ganham nem um salário mínimo,
não têm carteira assinada e são superexplorados.
Pesquisadora:
Qual o papel social da escola?
Professora:
Social? Formar cidadãos. Formar o crítico, agente de mudança que saiba ouvir, saiba
ter opinião e saiba discutir. Quando você não forma o cidadão crítico, o que é que ele vai ser?
Baú, né. Ele vai ouvir, vai absorver e vai só reproduzir aquilo ali. Então, acho que a função
principal da escola é essa, é formar cidadão crítico, que esteja inserido na sociedade e que
contribua.
Pesquisadora:
Qual o papel do ensino médio?
Professora: Para o aluno?
113
Pesquisadora:
Para a sociedade. Qual o papel social do ensino médio?
Professora:
É aquela história que disse no começo. Ensino médio hoje é só um meio de acesso. É
um degrau que eles precisam ultrapassar para chegar ao fim, que não é final, é o começo que é
a universidade. O ensino médio, eles conversam na sala para não tirar o estímulo. Mas, que é
uma coisa que você não sabe qual é a função. Ele prepara pra quê? Hoje o ensino médio pra
mim, você dá o conteúdo e ele serve como uma peneira para o vestibular. Então, aquele que
absorveu mais aqueles conteúdos ali, ele vai ter mais acesso a faculdade. O que outros não
vão ter. Ele tá servindo como um peneirão e os meninos vão pegando aquele monte de
conteúdo, sem saber exatamente com que função pra onde é que vai levar. Muitos deles
perguntam: professora, para que serve função? A gente tá endoidando. Eu vou usar função
aonde? Enquanto ele não tiver uma orientação melhor, enquanto os professores começarem a
trabalhar matérias e disciplinas pelas ideias que eles têm de universidade, fazer um ensino
médio mais direcionado, a função do ensino médio é essa.
Pesquisadora:
Você gostaria de falar algo que não foi abordado na entrevista?
Professora:
Não.
114
PROFESSOR ANDRÉ
Pesquisadora:
Formação inicial?
Professor:
Minha formação inicial é licenciatura em História.
Pesquisadora:
Tem outras formações?
Professor:
Pós-graduação em Docência do Ensino Superior
Pesquisadora:
Atua em que área?
Professor:
Sou professor de História, na educação básica e, para completar o horário, ensino em
Geografia no ensino médio.
Pesquisadora:
Quando começou a atuar no magistério?
Professor:
Logo quando terminei a faculdade. Terminei em 99. Aliás, já quando era aluno, já
dava aula em cursinho. Comecei a dar umas aulas, mas não profissionalmente, só uma
experiência inicial. Como professor mesmo da rede pública comecei em 2001, quando fui
chamado pelo concurso.
Pesquisadora:
Há quanto tempo atua no ensino médio?
Professor:
Desde então, ou seja, tem 11 anos de experiência, vai completar.
Pesquisadora:
O que é trabalhar no ensino médio?
Professor:
115
Para mim, trabalhar no ensino médio é exigir o que é, o que está sendo com o que
deveria ser. Eu acho que deveria ser, você está trabalhando com alunos que já tenham um
conhecimento muito bom, científico, conhecimento da língua, que daria condições pra que
você dê um aprofundamento maior para que essa pessoa esteja preparada para ingressar na
universidade ou então tenha um suporte técnico para atuar profissionalmente. E outra coisa
importante, é ter um nível de conhecimento tal que você tenha condições de aproveitar melhor
os recursos da sua vida. Então, relacionar muito a educação à vida profissional, mas, dentro da
sua casa, por exemplo, o conhecimento do ensino médio pode mudar seu relacionamento com
sua própria vida pessoal. O aproveitamento dos recursos da natureza. Compreender a casa que
você vive, a iluminação, sem ser arquiteto, compreender melhor higiene, sem ser um
infectologista, conhecer melhor a economia doméstica, sem ser um economista. Então, o nível
médio deveria ser no nível tal que, se a população tivesse esse aspecto adequado, o país
estaria bem melhor. Mas, como professor, noto, de um modo geral, que os alunos de ensino
médio não têm nível médio na prática, são pessoas que vieram de atividades terríveis no
ensino fundamental, ou seja, chegaram ao ensino médio sem fundamento e têm dificuldade de
interpretar, de transpor o que pensam para o papel e quando conseguem isso, a dificuldade de
usar todo esse conhecimento para a vida prática. A dificuldade existe muito nessa condição,
não saber exatamente como conseguir transformar isso porque sei que, na educação, nada se
consegue sozinho, porque a educação é um complexo e complexo já está dizendo, por mais
que eu seja um “às” em História eu não vou conseguir ser um aluno se não há uma sincronia
com meu trabalho com as outras disciplinas, com a coordenação da escola, com a família.
Então, hoje eu vejo assim, que o ensino médio deveria ser um nível muito elevado porque
conhecimento seria interessante para a sociedade e o que é algo como o aluno que deveria ter
um fundamento já garantido. Entendo o ensino médio como uma tentativa de garantir a
segunda luta. Não sei se eu satisfiz o “x” da questão.
Pesquisadora:
Você está querendo dizer é que o ensino médio é propedêutico, é
profissionalizante, ou é, na verdade, um nível de ensino que prepara em relação às
questões da vida?
Professor:
Eu acho que seriam as três coisas. O propedêutico é fundamental. Mas, ele se torna
propedêutico para um mundo acadêmico. Se você vai entrar na universidade e tem uma base
boa. Por exemplo, eu noto que eu pego um livro de Sociologia do ensino médio e um livro de
116
Filosofia do ensino médio. O conhecimento que ele tem ali, se o aluno domina muito bem, ele
tem conhecimento propedêutico para tá fazendo o trabalho, por exemplo, na área de humanas
com uma base boa. Mas eu noto que, na universidade, os alunos da universidade, no máximo,
vão estudar o que já têm no ensino médio. Ele deveria ser propedêutico, mas ainda não
consegue ser, de certa forma, porque esse conhecimento ainda não se chega lá.
Pesquisadora:
Aquela história, com 3 anos não conhece tanto, nem prepara para a faculdade,
nem prepara para a vida, nem profissionaliza ....
Professor:
Mas cada pesquisa, especificamente no serviço público, a educação básica, porque,
por outro lado, a educação privada também não tem se mostrado tão eficiente.
Pesquisadora:
Quem está numa escola pública não é que vai, por exemplo, fazer um curso
profissionalizante.
Professor:
Exatamente. Mas, a escola privada, muitas vezes peca... ao invés de preparar para a
vida, prepara para entrar na universidade, para abrir a porta, mas não para está preparado para
estar na universidade de modo geral. Tanto é que a metodologia de trabalho dá aqueles
esquemas de esquemas que você sabe na prova, as opções que tem toques naquela palavra,
aquela palavra “x” lembra isso. Diferente de você entender com uma compreensão.
Pesquisadora:
O que é ser professor no ensino médio?
Professor:
Eu volto para aquela questão, o que deveria ser, o que está sendo. Eu acho assim, que,
no meu caso específico que trabalho com História, vem só uma coisa que me chama muita
atenção. Primeiro você tem que preparar a sua atuação na questão mais técnica, ou seja, você
tecnicamente falando, a sua didática no ensino fundamental está mais voltada para o lúdico.
Envolver o aluno de tal forma que, pelo planejamento, pelos recursos usados, pela forma
117
como determina aquela aula, você consegue que mesmo aquele aluno desinteressado consiga
ser envolvido. Eu me lembro: “– Ah, não queria assistir ao filme”. Aí, quando diz: “- Senta na
cadeira, menino!”, por exemplo, naquele momento, quando passa uma cena interessante, ele
não esperava que teria aquilo. Então, o professor do ensino fundamental tem mais ou menos
esse papel, de ter habilidade técnica de envolver o aluno. Então, quando chega ao ensino
médio, você, de certa forma, já passou um pouco do seu limite. Você já cobra do aluno uma
maior concentração daquilo que deu. Mas, mesmo assim, você precisa de trabalho técnico.
Agora, no ensino médio, é uma fase que o aluno já está começando a despertar para as
questões, os questionamentos da sociedade, o adolescente. Então, você vai despertar para
essas questões políticas, então, tem o patamar mais de valor ativo da sociedade, você vai
discutir com eles. Como envolver o aluno? Essa questão desse envolvimento político com o
conhecimento, você criar um aluno justamente nessas necessidades e pensar em torno dele
próprio. Essa dimensão mais social e política do ensino, ela, de certa forma, é muito
importante. Só que também não é fácil despertar o envolvimento do aluno porque, justamente,
isso é uma questão de história. O professor que não toca nesse assunto, ele não consegue
envolver a turma. Porque a questão do momento justamente era pensar, era ser rebelde, ser
jovem. Hoje não, o jovem quer curtir. Isso aí é um problema, uma atividade a mais que
envolver o aluno a pensar politicamente e sociologicamente nesse trabalho histórico. Queria
falar outra definição, mas fugiu agora o raciocínio. Acontece que a... Como é mesmo a
pergunta inicial?
Pesquisadora:
O que é ser professor no ensino médio?
Professor:
Tenho um raciocínio que queria informar, me perdi. Era uma coisa importante. Sim,
vamos passar e depois volto. É importante principalmente para uma preparação para a vida e
trabalho. É uma formação mais técnica para o aluno enxergar a realidade. Ter a capacidade de
transformar o aluno em protagonista.
Pesquisadora:
O que o aluno da educação básica precisa aprender para o exercício adequado no
mercado de trabalho?
Professor:
118
Sim, o ensino médio é esse patamar, você deve voltar o conhecimento que ele tem
básico, do ensino fundamental para já ligar com as questões das práticas. Agora, se você, no
caso, na minha disciplina, História, desse conhecimento voltado mais para a questão da
prática, seria você tentar fazer com que o aluno trabalhasse os conteúdos usando a chamada
âncora. O que seria âncora? Você vai desenvolver um trabalho sobre um tema, por exemplo, a
Idade Média, o trabalho. Você vai lembrar... Então, uma coisa muito importante que você tem
para, inclusive, despertar o interesse do aluno é você criar a chamada âncora. É você não
simplesmente falar “olha, naquela época a sociedade era dividida estadualmente,
determinados povos tem privilégios, outros obrigações com relação ao trabalho”. Se você se
perder naquele mundo, a Idade Média, você não consegue criar esse vínculo de conhecimento
atual com a realidade. Seria justamente interessante você conseguir criar âncora com o que é o
trabalho hoje. Qual a perspectiva do aluno? O que pode ser interessante para ele? Isso seria
ligar o aluno à realidade dele. Só que inclusive no parecer número 5, no ano passado, 2011, o
Conselho Nacional de Educação dá novas diretrizes para a educação básica, inclusive, trata
especificamente uma parte sobre o ensino médio. Traz essa preocupação com o trabalho
extraclasse. Um percentual, se não me engano 20%, não sei o percentual exato, não é que
seria bom se fosse fora da classe, mas obrigatoriamente desse... Então, seria muito bom a
escola e o professor tivesse condições de aproximar o aluno da realidade de trabalho, mas
aproximar bem próximo porque os alunos vivem numa sociedade, mas a diferença seria o
olhar dessa realidade. O professor criar atividades dentro daquele embasamento teórico com o
que fosse levado, juntamente com os colegas uma situação tal que ele começasse a pensar,
não dentro de uma visão, de uma perspectiva do senso comum, mas dentro de uma
perspectiva científica. Quando o aluno começasse a enxergar isso, não só na minha disciplina,
mas na outras disciplinas, ele teria uma facilidade a mais de relacionar o conhecimento teórico
dele com o mundo, no trabalho.
Pesquisadora:
Então, a questão do ensino médio também a ver principalmente com a questão
didática do professor?
Professor:
Com certeza, a didática, os recursos utilizados e, agora, para isso, tem que haver o
quê? Uma preparação do professor, teórico. Eu, como professor mesmo, a gente esbarra
naquele limite. Eu, por exemplo, tenho quarenta horas aqui na escola. O meu horário é
119
distribuído de tal forma que venho quatro manhãs. É praticamente ocupando a cada cinco
horas do meu dia, são vinte horas. Três tardes, aí, mesmo que tenha prestes naquele meio, eu
não posso dizer que não tenho aula. Se estou na escola, não tem como correr. Só aí você
calcula quantas horas? Cinco vezes quatro é igual a vinte, mais quinze é igual a trinta e cinco.
Ou seja, estou cumprindo trinta e cinco horas. Só que acontece, às vezes, comigo tem
acontecido sempre, aulas aos sábado. Estou tendo quarenta aulas, quarenta horas na escola, ou
seja, que tempo sobra? Com turmas diferentes, disciplinas diferentes, como EJA (Educação de
Jovens e Adultos), com 1º ano, 2º ano, 3º ano, com turmas de 8º ano, 9º ano, tudo misturado.
Como vou ter tempo de cumprir uma carga horária integral, de quarenta horas na escola, ter
tempo extra para pesquisar, e para aperfeiçoar, me qualificar? E mesmo que eu tivesse seria
por conta própria, porque a escola não fornece isso. A escola fala que os professores deveriam
se dispor a participar da aula departamental, mas a escola não tem condições de assumir isso e
nem a rede pública do Estado e nem quer, porque alguém teria que trabalhar.
Pesquisadora: Então, mas a gente respondeu o que o aluno da educação básica precisa
aprender para o exercício do mercado de trabalho?
Professor: Sim. Seria isso. Essa experiência teórica com a análise da realidade prática, ou
seja, usando recursos didáticos que levasse o professor e a turma toda para começar a
compreender o mundo lá fora. Não que não deva para aprender a partir do senso comum, mas
com uma visão orientada cientificamente, tendo uma perspectiva nova para os alunos
conhecerem a realidade.
Pesquisadora:
Quais são as principais práticas pedagógicas desenvolvidas na escola?
Professor:
É, veja só, de pedagogia, usamos o termo prática e ação. A prática está relacionada ao
conjunto, ao trabalho da escola e ação seria uma atitude isolada do professor. Então, nesse
sentido, está uma coisa, quando uma escola consegue apenas reunir uma vez a cada seis meses
ou duas vezes os professores para discutir algumas coisas com “ah, problema tal”, já é um
grande acontecimento. Se não houver isso, podemos dizer que não há prática pedagógica
planejada. Há, na verdade, uma política de ações isoladas de professores, esse que é o
problema. Justamente a falta da prática pedagógica, da atuação teórica planejada levada à
efetiva ação, seria até melhor dizer à práxis. É isto que está faltando. Eu vejo isso como um
120
dos grandes problemas hoje. E quem estaria no centro de tudo isso? A coordenação da escola.
Tem um projeto, tem seu projeto a partir do PPP da escola (Projeto Político Pedagógico), tem
um projeto didático ou vários projetos didáticos que integrassem as ações desses professores,
causando uma... Aí eu pergunto, qual coordenador que realmente consegue fazer isso?
Muitos, por pura incapacidade técnica, mas também aqueles que teriam preparo para isso,
estão ocupados com outras atividades, porque a escola não tem determinado funcionário que
não tá se comportando, para controlar a disciplina dos alunos nos corredores, ou muitas vezes
a questão burocrática da escola mesmo. Listar a compra de merendas e tudo mais. Então, o
que está faltando é isso, a prática na escola que está faltando e é uma ação conjunta de todos.
Pesquisadora:
Qual o papel social da escola?
Professor:
O papel social da escola é muito relevante e complexo, porque ele tem um papel de
preparar as futuras gerações do país. Isso aí a coisa é notória, só que isso aí é uma meta ao
longo, preparar lá fora não só para melhorar seu nível, aproveitar o conhecimento das
gerações anteriores, aperfeiçoar e adaptar a realidade de cada um. Mas, de forma mais prática,
tirar as crianças das ruas, despertar o conhecimento nas artes, nas ciências, de modo geral,
descobrir os potenciais, proteger em defesa própria, que às vezes a violência da criança ela
sofre em casa, diversos tipos de violência e, na escola, a forma de você ter um grupo social
que também fiscaliza abertamente. Se a criança chega com problemas de violência física,
arranhões, machucados ou uma tristeza profunda, a escola tem condições de começar a se
aproximar, de começar a discutir se há algum problema. Então, isso é um papel muito
importante porque aquela estrutura familiar do passado em que havia um patriarca que era o
proprietário daquela família, isso também já não existe teoricamente. A escola tem um papel
de dar cidadania às pessoas. Então, isso seria de você não ser só agora propriedade de uma
família ou de um ente familiar, mas ser parte de uma sociedade complexa que você vai ajudar
a construir. A escola tem um papel incrível, resta a participação da família, a situação do
Estado, a interação de toda a sociedade e o compromisso dos profissionais envolvidos para
você ter resultados radiantes.
Pesquisadora:
Qual o papel social do ensino médio?
121
Professor:
O papel social do ensino médio seria como eu disse depois do adolescente conseguir
ter uma reeducação, ter fundamentado, deter a título de conhecimento fundamental, o ensino
médio teria justamente esse papel de criar essa possibilidade de preparar para o ensino
superior, de consolidar o conhecimento para a vida social do aluno, e também para a vida
profissional dele, porque, paralelamente ou posteriormente a educação do ensino médio, o
aluno poderia ter a preparação profissional que permite porque é aquela coisa, antigamente a
gente imaginava que tinha obrigação de fazer ensino superior, hoje chega à conclusão de que
não. Eu acho que conhecimento que alguém adquire até o ensino médio é um conhecimento
que, se fosse realmente compatível com o que é o ensino médio, é um conhecimento muito
elevado. E você pode desenvolver coisas incríveis e se realizar profissionalmente nesse nível.
Isso aí é uma coisa que eu já propus. Uma pessoa com nível médio, com boa formação e se
dedicar ao comércio, você tem condições de saber atender as pessoas e de organizar, usar os
recursos tecnológicos porque quantos foram gênios sem ter terminado a faculdade?
122
PROFESSORA MARLENE
Pesquisadora:
Formação inicial?
Professora:
Geografia. Licenciatura e bacharelado.
Pesquisadora:
Não tem outras formações?
Professora:
Não. Só magistério, ensino médio.
Pesquisadora:
Só atua na área de ciências humanas?
Professora:
Só.
Pesquisadora:
Começou atuar no magistério quando?
Professora:
1997.
Pesquisadora:
No ensino médio, quando começou a atuar?
Professora:
Em 2003. Assim que iniciei, quando fui contratada monitora lá no Benedito Bentes, no
Dom Otávio, já foi com o ensino médio.
Pesquisadora:
O que é trabalhar no ensino médio?
Professora:
Condições financeiras que, no momento, não me é escasso, mas não me dá condições
de aqui agir. Então, ser professor do ensino médio é... eu tenho que ter mais empenho, mais
cuidado, mais responsabilidade principalmente com o 3º ano que eu tenho, estou sabendo que
eles vão ser entregues ao mercado de trabalho. O que foi que eu fiz em prol disso? Uma vez
123
que em Geografia quase todos os concursos requer questões abertas e sobre conhecimentos
gerais e Geografia é uma das que pode ajudar nisso e eu tenho que me empenhar o máximo,
eu estou constrangida de não poder estar agindo assim. Porque eu posso até trazer a revista
que pareça ou copiar, eles não vão suportar.
Pesquisadora:
O que o aluno da educação básica precisa aprender para o exercício adequado
para o mercado de trabalho?
Professora:
Além da educação doméstica, essa educação doméstica é importante, tem que ter
solidificada na escola. Então, eu como professora, eu sou professora e educadora. Enquanto os
pais e os responsáveis podem ser apenas educadores. Eu tenho que ser professora e
educadora, a partir do entrar na sala de aula, porque estou mostrando a ele o horário que tem
que ser mantido, não exigindo. Qual é a hora que tem que chegar? Porque estou querendo
prepará-lo para o mundo, para o mercado de trabalho. Horário, testes, tudo isso o professor
pode orientá-lo. Em termo de conhecimento, enquanto é ciência.
Pesquisadora:
Retomando a pergunta: O que o aluno da educação básica precisa aprender para
o exercício adequado para o mercado de trabalho?
Professora:
Desde a formação de orientação, de quanto o teste, de quando chegar no horário, como
eu gosto das escolas, o modo, o enquanto... Em paralelo, disciplinas profissionalizantes,
porque o ensino médio limita o aluno a se submeter ao ENEM (Exame Nacional do Ensino
Médio) para ingressar na universidade ou na faculdade e isso é pouco por conta da
competitividade que o mundo está oferecendo, uma vez que a gente percebe que as escolas
particulares, não todas, que estão mais bonitas, elas dão mais oportunidades que as escolas
públicas. Não desmerecendo, mas são poucos da escola pública que têmm o incentivo em casa
para prosseguir que o incentivo vem mais da escola. Então, eles têm que ter mais
conhecimento, não só nas disciplinas exatas como em disciplinas técnicas que preparem para
o mercado de trabalho, o que seria uns cursos técnicos que são oferecidos e que eles deviam
serem orientados para participarem em horário diferente da escola.
Pesquisadora:
Quais as principais práticas pedagógicas desenvolvidas na escola?
Professora:
124
Eu não vejo diferente entre o trabalho que é feito para os alunos do ensino
fundamental e nem para com os alunos do ensino médio. É tanto que percebo que tem que
haver um melhor investimento enquanto acumular a partir do 1º ano. Tudo isso para
investimento da própria escola. O investimento que eu vejo é mais assim, de projetos, não
polos, mas no ensino médio irem no final de semana, no sábado, para construir uma paródia.
Mas, a pedagogia usada para o fundamental passa mesmo o suporte técnico, mesmo trabalho.
Pesquisadora:
Qual o papel social da escola?
Professora:
Formar cidadãos, esforçados, cientes do que esperam lá fora e, por conta disso, eu
acho que há uma necessidade maior, não de pisar na sala da escola, mas de uma reunião pelo
menos a cada três meses com todo o ensino médio a partir do primeiro ano, para conscientizá-
los, o que eles esperam. Não eles acharem que o terceiro ano é o ponto de parada não é o
ponto de partida. Adultos estão lá atrás, sem estímulo algum, esperando a aprovação do
conselho de classe e, inclusive, ajudando a minha irmã no trabalho de conselho de classe,
trabalho de nível superior. Eu gostaria até de trazer para fazer mais para mostrar que conselho
de classe não é reunião de coordenador e professor para saber qual aluno está pendurado nesta
ou naquela disciplina não. Conselho de classe são estratégias para facilitar o trabalho do
ensino e aprendizagem.
Pesquisadora:
Qual o papel social do ensino médio?
Professora:
O papel social do ensino médio está deixando a desejar, porque ele está andando só.
Ele não está andando em paralelo com o curso técnico. Mesmo que esta disciplina técnica,
este curso técnico não venha ser em outro horário por conta de ser dispendioso, questão de
passagem ou porque não se empenhe, como se empenhe em mandar os transportes para eles
virem às escolas.
Pesquisadora:
Para que serve o ensino médio na sociedade?
Professora:
Ele serve apenas para o aluno concluir, tentar vestibular. Para a sociedade que você
fala, é para as autoridades?
Pesquisadora:
Não, serve para que o ensino médio?
125
Pesquisadora:
Ele serve apenas para lhe dar a possibilidade, se você for tentar ingressar na
universidade, senão, por ali parou.
Pesquisadora:
Você queria falar alguma coisa?
Professora:
Eu gostaria de que o Estado propiciasse ao professor o que, quando eu como monitora
da prefeitura, conseguia para que eu pudesse entrar mais solta na sala de aula, porque eu me
sinto como uma pessoa sempre em fase de alfabetização, sempre a adequar ninguém. Quando
lá na SEMED (Secretaria Municipal de Educação de Maceió), eu, como contratada, nós
tínhamos a liberdade de, não é a liberdade, a oportunidade de termos alguém para esclarecer
muita coisa quinzenalmente dentro da disciplina.
Pesquisadora:
Então você acha que precisa de especialista?
Professora:
Tem, sem precisar de festa, de banquete, de coffee-break, porque isso vai acontecer e
que isso seja uma coisa normal, corriqueira. Um apoio pedagógico.
126
PROFESSOR RONALDO
Pesquisadora:
Qual sua formação inicial?
Professor:
Filosofia.
Pesquisadora:
Tem outras formações além dessa?
Professor:
Não.
Pesquisadora:
Atua em que área?
Professor:
Sociologia e Filosofia.
Pesquisadora:
Quando começou a atuar no magistério?
Professor:
Acho que faz oito anos.
Pesquisadora:
Há quanto tempo você trabalha com ensino médio?
Professor:
Cinco anos.
Pesquisadora:
O que é trabalhar no ensino médio?
Professor:
Trabalhar no ensino médio? Seria uma das visões para perceber o andamento do aluno,
o avanço, o processo pelo qual ele passou, chegou ali. O fim do ensino, a concretização
daquele conhecimento que foi feito no ensino fundamental e o aperfeiçoamento para sair aqui
da escola normal, tenho essa visão. A única expressão de conhecimento produzido, às vezes é
a questão do ensino médio, sendo trabalhado. Tem que ser trabalhado de maneira bem
127
proveitosa, porque você tem que visar a uma faculdade, o aluno tem que se espelhar numa
faculdade, numa universidade.
Pesquisadora:
O que é ser professor no ensino médio?
Professor:
Seria dar sua contribuição para aqueles alunos, principalmente da rede pública. Os
alunos que não tem às vezes oportunidade de pagar uma escola particular e eles se colocam
nas mãos dos professores, no caso. Tem muito professor que vem dar aula e enrola. E o
ensino médio, principalmente de colégio público, exige muito a questão da ética, da boa
índole do professor. Se ele passou por um ensino médio e a sua etapa de provação, foi
colocado, ele teve muito provas negativas eu acho que muitos professores aí que passaram por
momentos negativos na escola pública, acham que eles vão tentar fazer o diferencial. Acho
que também é isso, é fazer o diferencial.
Pesquisadora:
O que o aluno da educação básica, ensino fundamental e médio, precisa aprender
para o exercício adequado do mercado de trabalho? O que ensino básico pode oferecer
para esses meninos exercerem sua função no mercado de trabalho?
Professor:
Educação básica seria o quê?
Pesquisadora:
Seria o ensino fundamental e o médio.
Professor:
O ensino fundamental e o médio, né? Seria o conhecimento de mundo, proporcionado
pela escola, seria o quê? A interligação das disciplinas, matemática, química, física,
português, filosofia, sociologia, tudo junto. E, quando é proporcionado isso para o aluno, ele
acaba tendo um leque grande, por exemplo, numa seleção de uma empresa, o aluno que se
envolve bem, acredito eu que ele acaba tendo um êxito numa entrevista, um bom êxito
naquele trabalho, porque ele vai colocar na prática aquilo que aprendeu na escola. Acho que
seria esse o objetivo, seria essa a questão do ensino.
Pesquisadora:
Quais são as principais práticas pedagógicas desenvolvidas na escola?
Professor:
Caso, práticas utilização de vídeos, essas coisas. Utilização de trabalho, por exemplo,
peço para eles fazerem pesquisa em casa. Eu passo o nome de autores, de filósofos para eles
128
pesquisarem e trazer, trabalhar com seminários também porque é útil para outros cursos. Eles
próprios pegam e vou pensar sobre algum pensador, algum filósofo, por exemplo, trazem e
vão fazer reflexão sobre aquele filósofo, vão colocar na sala de aula e daí vão gerar perguntas,
vão fazer pesquisa diferente e daí vai ajudar no conhecimento.
Pesquisadora:
Certo, isso aí no caso é você. E a escola?
Professor:
A escola, em que sentido, assim?
Pesquisadora:
Quais são as práticas que a escola desenvolve para esses alunos do ensino médio,
além da questão da aula? Proporcionar a aula, ela proporciona, mas é mais que isso.
Professor:
As práticas que o colégio desenvolve, eu sei que tem alguns momentos, digamos
assim que o colégio, principalmente aos sábados, sempre aos sábados, que seria uma questão
de interação entre as turmas que se ajudam, mesmo conteúdo que é trabalhado, começa a ser
trabalhado pelas duas turmas. Acho que tem apresentação também de ... de História, tem
outras questões aí. Estou um pouco por fora.
Pesquisadora:
Qual o papel social da escola?
Professor:
O papel social da escola, eu acho que é fundamental, acho que é tudo. Enquanto
instituição ela proporciona, digamos, mais da metade da formação do ser humano. Por
exemplo, professor hoje não é só aquele que passa conteúdo, mas é aquele educador, aquele
que vai além da condição de conteúdo. Seria o quê? Seria levar em conta o meio em que o
educando, o aluno se encontra, por exemplo, onde é que ele mora se mora lá no Tabuleiro, se
mora aqui numa grota. Ele tem que ter uma certa sensibilidade para perceber a educação além
da sala de aula, acho que é isso. E ajudar nesse processo de educação, ajudar nesse processo
de sair daquela condição social dele. Acho que a escola proporciona isso.
Pesquisadora:
Qual o papel social do ensino médio?
Professor:
Papel social do ensino médio? Acho que o ensino médio ele vai, até volto para aquela
visão antiga de pouco tempo. O ensino médio tem a função de preparar mesmo a pessoa para
o mercado de trabalho. Por exemplo, vou terminar o ensino médio para fazer uma faculdade.
129
Digamos que o ensino médio está próximo desse mercado de trabalho e a faculdade vai estar
na concretização. O aluno que faz o ensino médio acha que tem essa visão de entrar no
mercado de trabalho, ser uma base para o mercado de trabalho, acha que é isso.
Pesquisadora:
Você gostaria de falar mais alguma coisa além do que a gente conversou aqui?
Professor:
Não.
130
PROFESSORA ABGAIL
Pesquisadora:
Formação inicial
Professora:
Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Alagoas
Pesquisadora:
Outras formações?
Professora:
Não tenho.
Pesquisadora:
Atua em que áreas?
Professora:
Ciências e Biologia
Pesquisadora:
Quando começou a atuar no magistério?
Professora:
Desde 2001
Pesquisadora:
Há quanto tempo atua no Ensino Médio?
Professora:
Comecei com o Ensino Médio – há quase doze anos
Pesquisadora:
O que é trabalhar no Ensino Médio?
Professora:
Trabalhar no ensino médio hoje é um desafio, porque na escola pública ele perde um
pouquinho o seu objetivo, porque os meus alunos não almejam ir para a universidade. Aqui o
Ensino Médio nem é profissionalizante e está fazendo uma coisa que é preparar para a
universidade, coisa que a maioria não almeja, então perde o sentido desse Ensino Médio.
Pesquisadora:
O que é ser professor no Ensino Médio?
Professora:
131
É um desafio. Principalmente hoje que a gente pega um aluno com uma defasagem de
conteúdo e você precisa mostrar que o conteúdo que está trabalhando é relevante no dia-a-dia
dele e, muitas vezes, eles não querem nem o ouvir e acham que aquilo é para decorar e ter
uma nota e ir embora acatar, mostrar que aquilo é importante que ele usa a ciência e a
Biologia em todos os momentos e não só aspectos da vida dele, mas como cidadão. Então,
esse é o grande desafio, eles não querem mais parar para ouvir, ou para estudar ou para
entender – o professor tem o desafio de tentar, fazer tentativa, é fazer com que eles gostem ou
queiram ouvir , entender, precisa ser um apaixonado tanto pela disciplina como pela
profissão.
Pesquisadora:
O que o aluno da educação básica precisa aprender para o exercício adequado ao
mercado de trabalho? E para atuação como cidadão que contribui para a sua
comunidade?
Professora:
Eu acho que, na Educação Básica, eu me prendo muito ao método científico, tem muito a
ver com ciência, porque você tem método científico, vai aplicar em qualquer área. Acho
muito importante ele aprender o valor do registro, da leitura, aquilo que você está observando,
não só ver mas observar, tentar entender, escrever, levantar hipóteses propor. Se o aluno tem
essa vivência em qualquer disciplina, não apenas em Biologia, vai servir para o resto da vida
dele porque ele vai aprender a problematizar e a pensar.
Pesquisadora:
Quais são as principais práticas pedagógicas desenvolvidas na escola?
Professora
No primeiro semestre desse ano, nós começamos a trabalhar com projetos pedagógicos
interdisciplinares. Fizemos um sobre os símbolos cívicos, que tem a ver com Sete de
Setembro, resgatar o respeito à pátria, a questão da nacionalidade. Deu certo, os dois
primeiros encontros foram muitos bons, todos os professores independente de qualquer área, o
professor do grupo de geografia, história, filosofia, eles trouxeram o projeto e estavam à
frente, mas todos se engajavam. Para mim era um sonho de escola. Mas depois de duas
tentativas que deram certo, a escola abortou o trabalho porque dá trabalho e isso me
entristesse. Esse ano foi uma decepção muito grande porque na prática a gente viu que dá
132
certo. Os meninos vinham para cá aos sábados e produziam coisas belíssimas, e você
descobre artistas de todas as áreas e descobre outros saberes que aquela criança tem e que não
foi minimamente valorizado. Poder trabalhar com projetos, poder sentar com um colega e
planejar, a Biologia não é só minha, a História não é só do outro professor, está tudo integrado
e quando a gente tem essa visão o aluno também interage (...) Os projetos são muito
importantes, eu gosto muito deles. Eu trabalho com um projeto na área de educação sexual, é
um projeto do Estado, que fez a capacitação e manda o material. É bom e vejo resultados, não
gosto da forma como eles cobram os dados, é um trabalho interdisciplinar e não termina
ficando só com a Biologia e a Ciência. Outras práticas pedagógicas da escola são tentativas de
projetos de leitura. (...)
Pesquisadora:
Qual o papel social da escola?
Professora:
É justamente, é preciso que, no final do processo, durante o processo, se tenha uma
criança que seja questionadora, que ela consiga pensar, que ela consiga encontrar os próprios
caminhos, que ela seja um cidadão, Cidadão é isso, perceber onde está o problema, analisa e
quer solução, você sabe se portar diante da equipe, cobrar e vai ser participativo na resolução.
O nosso papel é de formador, formar para pensar, para questionar.
Pesquisadora:
Qual o papel social do Ensino Médio?
Professora:
Na escola pública, esse nosso papel – estou tentando redescobrir. Acho que é de
formação, de formar o cidadão, de sair pensante, de conseguir problematizar e buscar essas
soluções. O que me angustia é não saber o que o aluno do Ensino Médio hoje em dia o que
quer. Ele termina o ciclo sem saber o que quer: ele quer da vida dele. Não quer trabalhar, não
quer ingressar na universidade, ele quer consumir sem ter dinheiro – bolsa família, “bolsa
aquilo”.
Pesquisadora:
Gostaria de falar algo que não foi abordado nesta entrevista?
Professora:
133
A mudança da família, a família mudou muito e a sociedade é uma sociedade do ter.
Eu não tenho o que me alimentar, mas tenho um celular de última geração. Essas escolhas que
são da família. É importante mostrar que é importante. O conhecimento científico, formal é
importante em alguma época da nossa vida. Repensar o caminho da escola com esse aluno
que só pensa em consumir.
134
PROFESSOR RENATO
Pesquisadora:
Formação inicial?
Professor:
Graduado em Matemática
Pesquisadora:
Outras formações
Professor:
Especialização em Matemática em Estrutura e Funcionamento do 2º grau.
Pesquisadora:
Atua em que áreas?
Professor:
Professor de matemática e bancário
Pesquisadora:
Quando começou a atuar no magistério?
Professor:
Em 1992
Pesquisadora:
Há quanto tempo atua no Ensino Médio?
Professor:
Desde quando me graduei em Matemática
Pesquisadora:
O que é trabalhar no Ensino Médio?
Professor:
No princípio, o ensino médio era voltado somente para preparar o aluno para o
vestibular. Atualmente, os professores estão fazendo uma adaptação para se enquadrar no
ENEM. Na verdade, o que o governo está querendo é que a formação geral seja para a
aplicação no mercado de trabalho, só que até agora não tem estrutura para isso. Então o
ensino médio está voltado para prestar provas para o superior.
Pesquisadora:
O que é ser professor no Ensino Médio?
Professor:
135
É fazer uma preparação para o mercado de trabalho, ou então para um estudo
posterior.
Pesquisadora:
O que o aluno da educação básica precisa aprender para o exercício adequado ao
mercado de trabalho? E para atuação como cidadão que contribui para a sua
comunidade?
Professor:
Com as deficiências que tem o ensino público no país, principalmente Alagoas que
praticamente teve duas décadas que foi esquecida, as duas décadas anteriores, o que acontece
é que o ensino foi sucateado e hoje como o país está vivendo uma era de investimento,
praticamente vai ser difícil essa geração se enquadrar nesse perfil que o mercado de trabalho
está exigindo e haja vista que se está importando muitos técnicos para suprir essa carência,
por conta do sucateamento do ensino e do esquecimento dos poderes públicos. Mas o mercado
de trabalho hoje está exigindo que o aluno tenha um certo conhecimento para poder entrar
nele por conta do nível de informação que ele está vivendo e do mundo tecnológico.
Pesquisadora:
E para a atuação como cidadão que contribui para a sua comunidade?
Professor:
A escola é um lugar que vai formar o aluno, quer dizer, ele vem aqui aprender
comportamento. Cabe à escola moldar esse aluno. Para ele aplicar o conhecimento dele na
comunidade, é uma coisa muito difícil. Mesmo a escola tendo canais na comunidade, ela
precisa várias pessoas para incutir sua (....) porque o que acontece é o seguinte: o aluno tem
um perfil aqui na escola e onde mora. Levar isso daqui prá lá porque primeiro ele vai ter uma
segunda forma, porque a maioria que está lá no meio dele não vai ter o mesmo uma educação
que ele e vai existir um choque de comportamento. É muito difícil aplicar o que aprende até
mesmo dentro de casa por conta da educação do pessoal que está no meio dele.
Pesquisadora:
Quais são as principais práticas pedagógicas desenvolvidas na escola?
Professor:
Na realidade, não tem uma prática pedagógica em escola pública que explore o que o
aluno necessita. Por exemplo, a gente considera a prática pedagógica aquilo que se pode
planejar no início para ser aplicado durante o ano. A gente não tem esse apoio nem da escola.
136
As práticas que temos usado são as tradicionais. Praticamente o professor de escola pública é
muito difícil ele variar o que ele vem fazendo em sala de aula. Talvez a escola faça alguns
eventos para ver se é aplicável na melhora a maneira de passar isso para os alunos.
Pesquisadora:
Qual o papel social da escola?
Professor:
Que a escola forme o aluno, o cidadão para atuar na comunidade, no mercado de
trabalho, para saber os direitos e deveres deles para ele saber como aplicar a ciência. Na
realidade, é a formação geral para a vida dele. Acho que a escola não está fazendo isso direito,
talvez ela não tenha condições de fazer isso.
Pesquisadora:
Qual o papel social do Ensino Médio?
Professor:
O papel social da escola seria preparar o aluno para entrar ou no mercado de trabalho
ou ter condições para entrar no ensino superior. Na realidade, deixar o aluno preparado para
exercer qualquer uma dessas escolhas.
Pesquisadora:
Gostaria de falar algo que não foi abordado nesta entrevista?
Professor:
O que quero dizer é que certas entrevistas são feitas de maneira técnica e o meio onde
a gente vive ele. Na realidade, qualquer pessoa consegue ver que a escola não tá boa. A
pergunta está sendo formalizada, mas não é a primeira entrevista que dou. Tudo vai para o
papel, mas nada sai do papel para ser aplicado. Se você começar a ler esses teóricos que já
fizeram um monte de coisa, praticamente ele faz uma coisa numa época e vê o que está
acontecendo para a época, ele tem o remédio para agora, mas o remédio não serve para o
futuro. Ele só resolve o problema de uma certa época, uma certa geração e as demais gerações
ficam do mesmo jeito. O problema da escola eu acho que é a estrutura de cima. Começando
de cima, os poderes encararem a escola, um meio de transformação da sociedade. Se a pessoa
ficar só coletando informações, dados para colocar no papel e não ter efeito, fazer só
sondagem, nada disso vai adiantar porque eu acho a estrutura deficiente, porque apontar os
defeitos é fácil, difícil é sanar, curar esses defeitos para poder seguir em frente. A pergunta
que devia ser aplicada seria: Como é que vou aplicar isso para melhorar isso? Como vou
137
resolver isso daí? Primeiro precisa resolver a parte de cima, o que acontece é que o poder de
cima quer só número. O que acontece é que está chegando uma maioria de alunos sem saber
de nada e a gente se desdobra para passar o mínimo para eles aí depois é questionado que não
sabe ensinar, não faz a parte dele, não sabe que a gente vive massacrado com carga horária
muito maior que ele que não pode, não tem tempo para se reciclar, salas muito cheias, alunos
rebeldes ele tem direitos, tudo isso aí é por conta das facilidades que deram para os novos e
principalmente para depois.