educaÇÃo e ensino mÉdio: a construÇÃo de sentido...

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UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO PROGRAMA DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO KÁTIA REGINA DOS SANTOS SILVA EDUCAÇÃO E ENSINO MÉDIO: A CONSTRUÇÃO DE SENTIDO PARA O TRABALHO DOCENTE EM UMA ESCOLA DE MACEIÓ/AL SÃO PAULO SP 2013

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UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO

PROGRAMA DE MESTRADO EM EDUCAÇÃO

KÁTIA REGINA DOS SANTOS SILVA

EDUCAÇÃO E ENSINO MÉDIO: A CONSTRUÇÃO DE

SENTIDO PARA O TRABALHO DOCENTE EM UMA

ESCOLA DE MACEIÓ/AL

SÃO PAULO – SP

2013

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KÁTIA REGINA DOS SANTOS SILVA

EDUCAÇÃO E ENSINO MÉDIO: a construção de sentido para o

trabalho docente em uma escola de Maceió/Al

Dissertação apresentada como exigência

parcial para obtenção do título de Mestre

em Educação, na Universidade Cidade

de São Paulo, sob a orientação do

professor Dr. Júlio Gomes Almeida.

SÃO PAULO – SP

2013

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KÁTIA REGINA DOS SANTOS SILVA

EDUCAÇÃO E ENSINO MÉDIO: a construção de sentido para o trabalho

docente em uma escola de Maceió/Al

Dissertação apresentada ao Programa de

Mestrado em Educação da Universidade

Cidade de São Paulo, como requisito

exigido para obtenção do título de

Mestre. .

Área de concentração: Educação

Data da defesa:___/___/___

Resultado: ____________________________

BANCA EXAMINADORA:

Prof. Dr. Júlio Gomes Almeida (Orientador) _______________________

Universidade Cidade de São Paulo

Profª. Dra. Maria Heloisa Aguiar da Silva _______________________

Universidade Cidade de São Paulo

Prof. Dr. Carlos Bauer _______________________

Universidade Uninove

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Autorizo, para fins acadêmicos ou científicos, a reprodução total ou parcial desta dissertação, por

processos fotocopiadores ou eletrônicos, desde que citada a fonte.

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Aos meus pais, pela incansável dedicação à nossa

família.

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AGRADECIMENTOS

Ao professor Dr. Júlio Gomes de Almeida, orientador desta pesquisa, pela competência,

paciência e compreensão.

À minha família, pelo apoio e incentivo.

Ao Centro Universitário Cesmac, pela oportunidade.

A todos os professores do Programa de Pós-graduação – Mestrado em Educação, exemplos de

sabedoria e dedicação.

Aos professores e funcionários da escola, na qual fiz a pesquisa, pela colaboração.

A todos os funcionários do Programa de Pós-graduação – Mestrado em Educação, pela

colaboração.

À Sheila Alves funcionária da secretaria do mestrado da Unicid, pela atenção dedicada.

Aos professores Liércio Pinheiro e Álvaro Queiroz, pelo apoio e colaboração.

À professora Tereza Vasco, pelo trabalho de revisão.

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RESUMO

Esta pesquisa teve como objetivo investigar o sentido do trabalho docente para

professores que atuam em uma escola de Ensino Médio da cidade de Maceió. Para realização

do estudo adotou-se a abordagem qualitativa e a coleta de dados foi realizada mediante

análise bibliográfica e documental, completada por entrevistas semiestruturadas. O trabalho

contribuiu para identificar as demandas concretas colocadas para os docentes que atuam nessa

etapa da Educação Básica e para compreensão, dentre outros aspectos, das práticas

institucionais que organizam o trabalho docente e os fatores que contribuem para atribuição

de significado ao próprio trabalho pelos professores.

Palavras-chaves: Ensino Médio. Trabalho docente. Escola.

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ABSTRACT

The research had objectived to investigate the teaching’s sense for those who teach at

a High School’s level in the city of Maceió. The Qualitative approach was used in it and de

data collection happened through bibliography and documental analyses, being completed

with semi-structured interviews. This research has been contributed to identify the concrete

demand requested for those workers whom act at this level of the Basic Level of Education

and also to the comprehension of so many aspects of the institutional practices which

organizes the teachers’ methodology and the factors that gives the meaning about their own

practice.

Key-word: High School. Teaching. School.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 11

1 – O PERCURSO HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA E O TRABALHO

DOCENTE .......................................................................................................................... 16

1.1 Educação no Brasil – breve histórico ............................................................................ 16

1.2 O trabalho docente – principais debates .......................................................................38

1.3 O trabalho docente no ensino médio ..............................................................................47

2. O ENSINO MÉDIO NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

...................................................................................................................................................52

2.1 Ensino Médio no Brasil e em Alagoas: uma breve retrospectiva ................................52

2.2 Ensino médio e educação profissional ............................................................................55

2.3 Breve relato histórico do ensino médio no estado de Alagoas.......................................55

2.4 As reformas educacionais e o Ensino Médio .................................................................57

2.5 O Ensino Médio e as Leis de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira ...................63

2.5.1 LDB nº 4.024/1961 .........................................................................................................63

2.5.2 LDB nº 5.692/1971..........................................................................................................64

2.5.3 – LDB nº 9.394/1996 .....................................................................................................65

2.6 Ensino Médio no Brasil e o debate sobre o dualismo ....................................................66

3. O SENTIDO ATRIBUÍDO PELOS PROFESSORES AO TRABALHO DOCENTE

...................................................................................................................................................73

3.1 O processo da pesquisa ....................................................................................................73

3.2 O local da pesquisa ..........................................................................................................78

3.3 Os sujeitos da pesquisa ....................................................................................................80

3.4 Função social do Ensino Médio .....................................................................................81

3.5 A função social da escola .................................................................................................84

3.6 O exercício da docência no Ensino Médio .....................................................................86

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3.7 Ações coletivas na escola ..................................................................................................89

3.8 Envolvimento da comunidade .........................................................................................92

3.9 Pobreza e analfabetismo ..................................................................................................93

CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................................98

REFERÊNCIAS ...................................................................................................................101

ANEXOS ...............................................................................................................................108

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INTRODUÇÃO

Com esta pesquisa, pretende-se discutir o sentido do trabalho docente para professores

que atuam em uma escola de ensino médio da cidade de Maceió e, também entender a relação

entre essa atribuição de sentido e os processos formativos dos quais participaram. A

motivação para a investigação surgiu em decorrência da minha prática como professora das

disciplinas Filosofia e Sociologia na escola onde a pesquisa foi realizada. Assim que passei a

fazer parte do corpo docente dessa escola, deparei-me com algumas situações cujo

entendimento emergiu como uma necessidade. Entre elas destaco: a falta de interesse dos

alunos pelos conteúdos ofertados; as formas como os professores lidam com a falta de

interesse dos alunos; a falta de ações coletivas por parte dos educadores no enfrentamento das

situações de falta de interesse; a dificuldade para envolvimento da comunidade nas questões

da escola; a falta de clareza sobre a função social da escola em um estado localizado em uma

região do país que apresenta um dos maiores índices de pobreza e analfabetismo, entre outros.

Nesse contexto, as deficiências no processo educativo são evidentes como bem informam os

dados do Instituto Nacional de Pesquisas Educacionais/Ministério da Educação que

apresentam o estado de Alagoas como detentor do pior Índice de Desenvolvimento do Ensino

Básico (IDEB) do país no ano de 2009 (FAJARDO, 2012).

Busca-se, com a realização da pesquisa, além de entender o sentido que os professores

da unidade atribuem ao seu trabalho, sistematizar conhecimentos sobre a realidade do ensino

médio com vistas a contribuir com outras pessoas interessadas em compreender o tema.

Busca-se ainda contribuir para o aprofundamento de conhecimentos acerca das relações entre

o trabalho desenvolvido por docentes no ensino médio e as condições em que se efetivam este

trabalho na cidade de Maceió, para apontar alternativas que possam entender as práticas

docentes à luz das teorias e da legislação que fundamentam as ações na Educação Básica.

Nesse sentido, a pesquisa apresenta relevância pessoal e social. Pessoal, na medida em

que poderá contribuir para compreender o contexto social em que realizo a minha prática

docente e viabilizar a construção de estratégias para o exercício da docência de forma mais

precisa quanto aos seus objetivos e fins; social, na medida em que possibilitará a

sistematização de conhecimento que ficará disponível para outros educadores, gestores

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educacionais e responsáveis pela formulação e implementação de políticas públicas de

educação.

No Brasil, a função docente está primeiramente atrelada a uma atividade não

especializada, como uma ocupação secundária dos religiosos que aqui se instalaram com a

função de evangelizar e de educar. Reconhece-se também que, em outra fase desse percurso,

houve a tentativa de substituição desse modelo evangelizador por uma educação exercida por

docentes laicos, o que não se efetivou, pois foi o Estado o primeiro a definir as normas para a

profissão. (LOYOLA; MOURA, 2006, p. 01)

No sentido de abordar as expectativas acerca do seu trabalho, Cunha (1997, p. 129)

refere que,

historicamente, o professor construiu para si, cumprindo a expectativa da

sociedade, a idéia de que sua função era ensinar um corpo de conhecimentos

estabelecidos e legitimados pela ciência e pela cultura, especialmente pelo valor

intrínseco que representava.

Serón (apud CUNHA, p. 131) indica que a formação do professor e o grau de ensino

influenciam no seu nível de autonomia. Reconhece que aqueles advindos das universidades se

fazem perceber como detentores de uma profissão científica, enquanto que aqueles do ensino

fundamental e secundário se organizam e se constituem como uma profissão prática, ou

semiprofissão por conta da duração mais curta do curso, que possuem um corpo de

conhecimentos menos especializados e de menor autonomia.

A função de professor como mero “reinterpretador” de conhecimentos pode ser

identificado quando aponta Marzola (1992), relacionando as políticas e as mudanças no

sistema de ensino e o processo de formação de professores, que esta serve como meio para

implementar transformações no sistema de ensino, propagando em seu conteúdo decisões

governamentais e teorias pedagógicas.

Os cursos de formação servem como locais para aquisição ou aperfeiçoamento de

capacidades consideradas necessárias para utilização de novos procedimentos de ensino. Para

a autora,

se ao professor não resta outra alternativa senão ajustar-se a essa lógica, a

eficácia deste modelo formativo é evidenciada, então, na mudança de

comportamento dos professores. E, com efeito, estes devem ser capazes, ao

final da reciclagem, de reproduzirem o conhecimento ou o savoir faire (saber

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fazer) adquirido. Tudo se passa como se o resultado – a capacidade de

reproduzir – fosse a prova mais cabal da mudança do professor (MARZOLA,

1992, p. 80).

O professor, segundo essa ótica, assume o papel de agente modernizador das escolas,

quando é conhecido que as formações são veículos de “inovações educacionais” presentes

principalmente nas metodologias de ensino.

Atualmente, a prática docente ainda se constitui em um dos temas fomentadores de

grandes debates. Em pesquisas com professores, Tardif & Lessard (2008) nos apontam que o

trabalho não se esgota apenas como um mero transmissor de saberes produzidos por outros

grupos, mas como produtores de conhecimento produzidos em seu cotidiano.

Pode-se dizer que a oferta do ensino médio no Brasil não surgiu fruto de políticas

públicas que pudessem beneficiar um maior contingente possível da população. Surge no

segundo Reinado com a finalidade de preparar os jovens da elite brasileira para o

prosseguimento em cursos do ensino superior e para assumir papéis importantes no comando

da Colônia (MENESES, 2003).

No sentido de questionar os fins sociais da escola, é comum perceber que há uma

associação de que esta pode servir de mola propulsora para ascensão social. No entanto,

Dowbor (ALMEIDA; NHOQUE, 2010) aponta que há hoje uma disseminação da idéia de que

esta deve se voltar para o desenvolvimento local de “que o papel principal da escola é

contribuir para a qualidade de vida humana coletiva, na comunidade onde está inserida” (p.

01). Outra função a ser desempenhada pela escola estaria na possibilidade de articular os

conhecimentos regionais por meio de estudos e pesquisas, em um território delimitado e

realizando a interação permanente entre outros segmentos sociais (ALMEIDA; NHOQUE,

2010).

Ainda sobre a escola básica, Silva (2003, p. 62) aponta que existem duas tendências

presentes no Ensino Básico atual, sendo uma delas ligada ao significado que os educandos

atribuem ao trabalho escolar e ao tempo em que vivem na escola, associando

um tempo instrumental a outras finalidades, tais como: ser aprovado no

vestibular, ingressar no mercado de trabalho, ter acesso à merenda, ter o

cuidado de adultos enquanto os pais trabalham fora de casa, entre outros.

Estas finalidades, que por si só não são más, competem, com o estudo

considerado como meio de conhecer, fazendo com que não haja atração pelo

ato de aprender em si mesmo.

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A outra tendência apontada pelo autor diz respeito à existência de uma diversidade

cultural presente entre os alunos e estes e os educadores que se materializa principalmente

entre o choque cultural e de gerações e consequentes dificuldades na comunicação e

efetivação de vínculos (SILVA, 2003).

De forma geral, pretende-se com a pesquisa identificar o sentido que os professores de

uma escola de ensino médio da cidade de Maceió atribuem ao seu trabalho; encontrar

elementos que contribuam para que o exercício da docência no ensino médio constitua-se em

experiência de realização profissional; identificar demandas concretas para essa etapa da

Educação Básica na cidade de Maceió e compreender a relação entre as práticas institucionais

que organizam o trabalho docente no ensino médio e a função social da escola.

Nesse contexto, pretende-se entender qual o significado que os professores que atuam

em uma escola de ensino médio atribuem ao seu trabalho. Foi escolhida a Escola Estadual

José da Paz (nome fictício). Trata-se de uma escola da rede pública do estado de Alagoas,

pertencente à 15ª Coordenadoria Regional de Ensino.

Será adotada para viabilização da pesquisa a abordagem qualitativa e como

procedimento de coleta de dados a análise bibliográfica e documental que será completada por

meio de entrevistas semiestruturadas.

O trabalho será organizado em três capítulos. No primeiro, será apresentado um breve

histórico da educação no Brasil procurando destacar, por um lado, o papel social que a escola

tem desempenhado ao longo do tempo e, por outro, como esse papel tem aparecido nos

discursos e nas teorias da educação. O segundo capítulo versará sobre o ensino médio, sua

natureza, fins e objetivos definidos na legislação e como ele vem sendo trabalhado na

realidade do estado de Alagoas. O terceiro capítulo se destinará a contextualizar a clientela

que atende. Para tanto, serão coletadas e expostas informações sobre a escola e o bairro no

qual se localiza. Serão apresentados e analisados os dados coletados junto aos professores por

meio das entrevistas semiestruturadas e interpretado à luz da contribuição teórica de

estudiosos que vêm se ocupando do assunto.

Com isso, pretende-se encontrar pistas que contribuam para identificar o sentido que

os professores atribuem ao seu trabalho e entender quais são as demandas concretas dos

docentes que atuam nessa etapa da Educação Básica na cidade de Maceió. Dessa forma, será

possível também compreender a relação entre as práticas institucionais que organizam o

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trabalho docente na escola de Ensino Médio e o sentido que os professores da escola

pesquisada atribuem para o seu trabalho para, então, buscar elementos que ajudem a

transformar o exercício da docência no ensino médio em uma experiência de realização

profissional.

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1 – O PERCURSO HISTÓRICO DA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

E O TRABALHO DOCENTE

O objetivo deste capítulo é apresentar um breve panorama sobre a educação brasileira,

buscando com isso encontrar elementos que permitam entender de que maneira a educação

vem sendo trabalhada historicamente, como vem exercendo influências sobre o entendimento

que os professores têm sobre o exercício da docência na educação básica, sobretudo no ensino

médio, objeto deste estudo. Esse panorama, embora breve, pareceu necessário no processo de

definição do problema de pesquisa que é investigar o sentido atribuído por professores

atuantes no ensino médio em uma escola de Maceió ao seu trabalho.

1.1 Educação no Brasil – breve histórico

Uma das poucas datas comemorativas que fazem referência à escola é o dia do

professor e esse registro se deve ao fato de que foi no período imperial, em 1826, que o Brasil

fez sua primeira tentativa para efetivar legalmente o sistema educativo com o projeto do

deputado Cunha Barbosa que detalhava as finalidades e os conteúdos de cada nível de ensino.

No entanto, o parlamento brasileiro se ateve a aprovar, em 15 de outubro de 1827, o projeto

que contemplava apenas o ensino elementar (SAVIANI, 2002). Pode-se ressaltar que, apesar

de distintas entidades públicas e particulares tentarem atribuir um sentido, a comemoração

realizada pioneiramente, em 1933, pelos representantes da Associação dos Professores

Católicos do Distrito Federal (APC-DF) evidenciou a luta por melhores salários e

reconhecimento da sociedade (VICENTINI, 2004). Mostra-nos também que a data nos lembra

que contingências externas ao processo educativo influenciaram desde o começo a trajetória

da educação no país, pois as ocorrências de ordem econômico-financeira na Europa

motivavam a organização e a oferta do ensino daquele continente a exemplo das forças

representativas do poder econômico na Itália que opinavam sobre o direito de instrução para

as classes menos favorecidas economicamente. As comemorações em uma das datas magnas

do ensino brasileiro (o dia do professor) foi assim motivada em função do decreto de D. Pedro

I que estabelecia, entre outros, salários e normas para contratação de professores e outras

ideias inovadoras que não foram concretizadas e lembram, talvez, que os obstáculos para

superação das dificuldades na organização do sistema público de ensino brasileiro não são tão

contemporâneos.

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No sentido de entender a trajetória histórica da educação brasileira, pode-se dizer que

os fatos originadores do processo de colonização e sua função para o governo português

foram baseados em uma relação que envolveu um centro de decisão (a metrópole), viabilizado

economicamente por um subordinado (a colônia).

Com um modelo agrário-exportador, ocorre o primeiro período da organização escolar

na história da educação brasileira, acontece entre os anos de 1549 e 1808, e engloba a fase da

educação sob os cuidados dos padres jesuítas e a fase em que o Marquês de Pombal foi o

principal articulador da educação no Brasil.

A organização escolar brasileira em sua fase inicial se liga diretamente à política

colonizadora, pois foi D. João III (1502-1557), rei de Portugal por 26 anos, que na proposição

de diretrizes básicas, se dispôs a intensificar as atividades da política interna e das suas

possessões territoriais. Tinha como meta alcançar os objetivos do Projeto Português de

colonização que consistia principalmente na conversão dos índios brasileiros à fé católica por

meio do ensino de catequese, leitura e escrita da língua portuguesa, designando a Companhia

de Jesus (SHIGUNOV NETO & MACIEL, 2008). Para cumprir esse projeto, chegaram ao

Brasil Tomé de Souza, quatro padres e dois irmãos jesuítas, estes últimos sob a chefia do

padre Manoel da Nóbrega (RIBEIRO, 1989).

A motivação para a catequização, segundo Paiva (2002), ocorreu pelo fato de que

Portugal, contrário a ordem vigente, voltada para a modernização, estava preocupado em

preservar as tradições medievais. Assim, com a vinda dos padres, a Companhia de Jesus

assumiu a responsabilidade pela educação brasileira por dois séculos e uma década.

Fundada em Paris por Ignácio de Loyola em 1534, a Ordem estava subordinada ao

Papa, buscava implantar um plano educacional missionário, além das ações da Contra-

Reforma (PAIVA, 2002). Foi considerada um dos principais instrumentos da Igreja Católica

contra a reforma protestante, utilizando a educação de homens e dos índios e a conversão à fé

católica dos povos habitantes das terras colonizadas.

Dentre as ações iniciais da Companhia, coube a construção do Colégio dos Meninos

de Jesus e da escola de São Vicente na Bahia de Todos os Santos, considerados marcos da

educação formal e escolarizada no Brasil. Para sobreviver sem o “redízima” (subsídio

governamental orçado em 10% dos impostos cobrados pela Coroa Portuguesa) concedido

durante um período curto de tempo, a Ordem organizou-se em uma estrutura com navios,

milhares de cabeças de gado, ouro, produtos agrícolas e artesanato cuja renda total (que

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chegou a representar 25% do Produto Interno Bruto brasileiro) subsidiava o funcionamento e

expansão de uma estrutura que, em 1600, possuía cerca de 8.000 membros (PAIVA, 2002).

Shigunov Neto e Maciel, precisam a estrutura material-físico-finaceira jesuítica em “36

missões, escolas de ler e escrever em quase todas as povoações e aldeias; 25 residências dos

jesuítas; 18 estabelecimentos de ensino secundário, entre colégios e seminários, nos principais

pontos do Brasil (...)” (2008, p. 186)

A breve contextualização histórica acima se propõe a ser apenas um elemento

introdutório para que se possa compreender os principais fatos ocorridos no começo da

história brasileira e suas relações com educação, pois não constitui objetivo deste estudo o

aprofundamento de tais questões.

Tratando especificamente da trajetória da educação no Brasil, pode-se dizer que a

educação ofertada pelos padres da Companhia de Jesus passou por dois momentos distintos:

A primeira parte da educação brasileira, a educação cristã, (...) idealizado e

concretizado por Padre Manuel da Nóbrega, com espírito democrático,

cristão e universalizador brasileiro, estendendo-se até cerca de 1580 e o

segundo período vivificado por uma filosofia da educação, derivada de

autoridades jesuíticas da Metrópole e segregadora do índio e do pobre

(TOBIAS, 1972, p. 54).

No primeiro momento da educação ofertada pelos jesuítas, o ensino era dividido em

duas etapas: a primeira composta pelo aprendizado do português, o ensino da doutrina cristã e

a escola de ler e escrever; a etapa subsequente era opcional e composta de aulas de ensino de

canto orfeônico e de música instrumental. Os alunos também poderiam optar pelo ensino

profissional agrícola ou aulas de gramática e a viagem de estudos à Europa (RIBEIRO, 1989).

O segundo momento obedecia a um plano de estudo, o Ratio Atque Studiorum Societates

Jesu, um documento em que estavam determinados os princípios, fundamentos e o

funcionamento da proposta educacional da escola jesuítica (PAIVA, 2002). Para Shegunov

Neto & Maciel (2008, p. 180), o Ratio Studiorum

não era um tratado sistematizado de pedagogia, mas sim uma coletânea de

regras e prescrições práticas e minuciosas a serem seguidas pelos padres

jesuítas em suas aulas. Portanto, era um manual prático e sistematizado que

apresentava ao professor a metodologia de ensino a ser utilizada em suas

aulas.

Apesar da chegada dos jesuítas em 1549, data de 1599 a publicação do documento

(cuja elaboração durou 15 anos). Era desenvolvido para todas as missões jesuíticas do mundo

e talvez tenha surgido como um projeto educacional que se transformou em um projeto de

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transformação social, pois “tinha como função propor e implementar mudanças na cultura

indígena brasileira” (SHIGUNOV NETO & MACIEL, 2008, p. 173).

Composto de duas partes, o Ratio Studiorum: studia inferiora enfatizava os estudos da

língua latina, as obras literárias greco-romanas; e a studia superiora em que se estudava

filosofia e teologia. O desenvolvimento das atividades acontecia sob um ambiente

hierarquizado, de austeridade e autoridade bem definidos e a metodologia de ensino consistia

principalmente na memorização de conteúdos (PAIVA, 2002).

A educação jesuítica surge numa perspectiva de educação influenciada pela

Universidade de Paris, pois Inácio de Loiola, que estudou na Universidade de Alcalá e

Salamanca, seguiu as inovações que brotaram da Universidade de Paris influenciado pelas

ideias de Santo Tomás de Aquino que também absorveu o modus pariensis contra o modus

italicus presente no Colégio de Messina de Viena e de Pádua (FRANÇA, s/d, apud TOBIAS,

1972, p. 65). A influência medieval e renascentista presentes na Universidade de Paris incide

na educação dos jesuítas através do Ratio Studiorum distribuídos em suas três fases: a

humanista, a filosófica e a teológica.

A pedagogia utilizada pelos jesuítas era a clássica: tanto utilizava elementos da

educação grega quanto da romana voltada para o adulto e tendo como objeto de conhecimento

a universalização e o abstrato e por isso o método era expositivo com sabatinas, tertúlias,

disputas semanais e anuais e com a presença das recapitulações. Para incrementar esse

processo,

os exemplos concretos, acessíveis à gente simples, eram utilizados. As

festas, o teatro, a música, os recreios constituíam meios para atrair e tornar a

cultura, os padres e a religião simpáticos. O método direto no estudo das

línguas portuguesa e tupi era usado, ainda que as escolas só se servissem do

antigo método de ensino da língua e gramática. Os métodos que exigiam

aparelhagem dispendiosa, tinham de ser proscritos. O método intuitivo-

empírico, acessível à imaginação, era parte do método jesuítico (TOBIAS,

1972, p. 87).

No Brasil, a educação ofertada pelos padres jesuítas sofreu inicialmente a influência

direta do Ratio Studiorum, mas, em virtude das condições adversas do ambiente e do modo de

vida de seus habitantes índios, foram forçados a adaptarem-se às condições encontradas e a

criar ou empregar outros métodos. Dentre as barreiras ao emprego literal do plano

educacional dos jesuítas, a dificuldade de comunicação interferiu porque os índios se

expressavam em tupi e os padres em português. Dessa forma, o ensino do português era

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essencialmente prioritário, pois precedia ao ensino do Evangelho. Contudo, o educador jesuíta

precisou aprender também tupi e simultaneamente também ensinava, era então mestre e

aprendiz ao mesmo tempo - o método direto. Foi assim que o tupi-guarani virou matéria do

currículo educacional dos jesuítas brasileiros e, como fruto de tal interação, Anchieta escreveu

uma gramática de tupi “Arte e Gramática da Língua mais usada na Costa do Brasil”.

Quando os pequenos índios brasileiros alcançavam o nível de entendimento do

português e avançavam no conhecimento e prática do Evangelho, começavam a frequentar a

“escola de ler e escrever” e conjuntamente aprendiam canto orfeônico ou algum instrumento

musical, pois estes serviam como recursos “pedagógicos para o bem-estar do estudante e para

entusiasmá-lo pela cultura e pela fé religiosa” (TOBIAS, 1972, p. 68).

O que podemos reconhecer como ensino médio atualmente pode ser reconhecido no

que, para Tobias (1972), era o ensino secundário ofertado em duas modalidades: para os

filhos de brasileiros que notadamente não poderiam mais estudar – a aprendizagem

profissional e agrícola; e Gramática Latina para aqueles que iriam para a viagem de estudos

na Europa.

Este modelo prosperou na época do padre Manoel da Nóbrega, porém, com a sua

morte em 1570, foi suprimida a educação profissional e, nos estudos médios, começou-se a

exigir o ensino da Gramática, Humanidades e Retórica e complementarmente o ensino de

erudição histórica, geográfica e artística.

O autor reconhece que as mudanças ocorridas após a morte de Nóbrega provocaram,

aos poucos, a perda

do espírito universalizador e cristão, notavelmente democrático e humano em

favor de uma aristocratização do ensino brasileiro, (...) uma exclusiva

preparação para os filhos dos senhores de engenho e de casa-grande, que iam

seguir o ensino superior, (...) realizada pelas mãos invisíveis mas marcantes da

educação do Marquês de Pombal (1972, p. 69).

Havia uma clara distinção entre o cotidiano da escola jesuítica antes e após a morte de

Nóbrega, e isso se faz notar pelo fato de que, no primeiro momento, as aulas aconteciam nos

períodos matutino e vespertino com duas horas de duração cada. Em função do calor e não

sendo o espaço escolar provido de muros e também pelo fato de não haver condições de

cuidar dos alunos nos horários de recreio, eles iam nadar, pescar ou catar frutas - o ensino

mantinha o educando em seu contexto. No segundo momento, a preocupação era preparar o

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aluno para os estudos na Europa e, para tal, começaram-se a separar os alunos das questões

cotidianas do ambiente brasileiro e prepará-los para o mundo das abstrações.

A metodologia de ensino era específica: os cursos inferiores (de humanidades)

consistiam na prática para atingir o estilo literário de autores clássicos e os cursos superiores

(filosofia e teologia) estavam voltados para o escolaticismo.

O fim da era jesuítica na educação brasileira aconteceu por força do Decreto-lei de 3

de setembro de 1759 promulgado pelo Rei D. José I e forçou ao exílio de Portugal e da sua

Colônia quatrocentos e dezessete membros da Companhia dos seiscentos e setenta que aqui

viviam. O documento marca também o fim do primeiro projeto de educação formal para os

habitantes do Brasil.

Os motivos pelos quais a atuação dos padres jesuítas na educação brasileira foi

interrompida estão diretamente ligados ao momento socioeconômico pelo qual Portugal vivia

naquela época. A metrópole governada por D. José I (1750 – 1777) sofria as consequências da

hegemonia política e econômica da Inglaterra, que sentia o impacto da relação estabelecida

entre a troca de produtos agrícolas por produtos manufaturados oriundos da nação inglesa.

Nas palavras de Basbaum (1957, p. 47) citado por Ribeiro (1989),

Como nação, continuava um país pobre, sem capitais, quase despovoado,

com uma lavoura decadente pela falta de braços que a trabalhassem, pelas

relações de caráter feudal ainda existentes, dirigido por um Rei absoluto,

uma nobreza arruinada, quase sem terras e sem fontes de renda, onde se

salientava uma burguesia mercantil rica mas politicamente débil, preocupada

apenas em importar e vender para o estrangeiro especiarias e escravos e

viver no luxo e na ostentação.

Era um país em que o feudalismo se desagregava por si mesmo, sem que se

consolidasse um capitalismo sobre os seus escombros.

No aspecto econômico, Portugal trazia os resultados que a força espanhola exerceu

sobre seus domínios:

(...) a sua marinha destruída, o seu império colonial esfacelado. (...) Estava

definitivamente perdido para Portugal o comércio asiático (...).

Efetivamente, só lhe sobraria o antigo império ultramarino, o Brasil e

algumas posses na África. Estas aliás valerão como fornecedoras de escravos

para o Brasil (PRADO JR., 1969, apud RIBEIRO, 1989, p. 31).

Ciente dessa realidade, em dois de agosto de 1750, Sebastião José de Carvalho e

Melo, Conde de Oeiras, o Marquês de Pombal, assumiu o cargo de ministro da Fazenda no

lugar de Azevedo Coutinho e empreendeu reformas nas áreas administrativas, econômicas,

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culturais e educacionais. Tais reformas precisavam neutralizar as forças que poderiam

ameaçar o poder absoluto do rei e, para tal, era necessário possuir o controle administrativo do

Estado (SHIGUNOV NETO & MACIEL; 2006).

Para afirmar essas medidas, as decisões se voltaram para o enfraquecimento do poder

do clero e da nobreza, além da modernização da cultura portuguesa. Voltou sua atenção para o

sistema de arrecadação, na dinâmica da economia portuguesa, incentivando o

desenvolvimento de indústrias e do comércio. As medidas que incidiram na colônia brasileira

estavam direcionadas principalmente para o combate à sonegação de impostos (SHIGUNOV

NETO & MACIEL, 2006).

No campo educacional, as reformas atingiram a oferta de ensino que estava há dois

séculos sob o controle da Companhia de Jesus tanto em Portugal quanto na Colônia e havia

uma queixa voltada para a acusação de que a Ordem dos padres jesuítas era responsável pela

decadência cultural e educacional na sociedade portuguesa, em função de que “os jesuítas

representavam um obstáculo e uma fonte de resistência às tentativas de implantação da nova

filosofia iluminista que se difundia rapidamente por toda a Europa” (SHIGUNOV NETO &

MACIEL, 2006, p. 469).

Seco e Amaral (2012) citando Maxwell, informam que entre os fatores motivadores da

expulsão dos jesuítas estava a pretensão do Marquês de Pombal em suprimir o poder que os

jesuítas exerciam na fronteira sul da colônia e que tinha implicações diretas com a disputa

entre espanhóis e portugueses pela região na qual hoje se situa o estado do Rio Grande do Sul,

que, em decorrência, extingue o Tratado de Tordesilhas e efetiva o acordo de Madri.

Especificamente sobre esta questão, interessava a Pombal

(...) que os índios fossem libertados da tutela religiosa e se miscigenassem

para assegurar um crescimento populacional que permitiria o controle do

interior, nas fronteiras. Na verdade, não acreditava em uma emigração

européia que pudesse cumprir com essa tarefa, era mais fácil europeizar,

digamos assim, a população local. Para ele, o afastamento dos jesuítas dessa

região significava tão somente, assegurar o futuro da América Portuguesa

através do povoamento estratégico. O interesse de Estado acabou entrando

em choque com a política protecionista dos jesuítas para com os índios e

melindrando as relações com Pombal, tendo este fato entrado para a história

como ‘uma grande rivalidade entre as ideias iluministas de Pombal e a

educação de base religiosa jesuítica’ (SECO & AMARAL, 2012, p. 4).

Assim, as ideias que forneceram as bases para as ações de Pombal, na verdade, surgem

a partir do movimento de um grupo de intelectuais portugueses que, motivados pelo

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pensamento iluminista presente no final do século XVII, percebem a necessidade de

modernização da educação portuguesa, pois a única universidade portuguesa, a de Coimbra,

funcionava segundo os padrões da Idade Média - “a filosofia moderna (Descartes), a ciência

físico-matemática, os novos métodos de estudo da língua latina eram desconhecidos em

Portugal. O ensino jesuítico, solidamente instalado, continuava formando elementos da corte

dentro dos moldes do Ratio Studiorum” (RIBEIRO, 1989, p. 32).

O Marquês de Pombal ao expulsar a Ordem dos Jesuítas em 1759, concretizou uma

ideia existente na época, porque era pensamento recorrente que ela consistia em um entrave

para a unidade cristã e da sociedade civil. Mas há que se considerar que contribuiu para isso o

fato de que os padres jesuítas detinham um poder econômico que deveria ser devolvido ao

Estado, e a educação que ofertavam estava voltada à ordem religiosa e não atendia aos

interesses do país.

As orientações da era pombalina contemplavam a formação da elite brasileira e

constituía entre as suas funções formar o homem nobre e

agora negociante; simplificar e abreviar os estudos fazendo com que um

maior número se interessasse pelos cursos superiores; propiciar o

aprimoramento da língua portuguesa; diversificar o conteúdo, incluindo o de

natureza científica; torná-los os mais práticos possíveis (RIBEIRO, 1989, p.

34).

O Estado então assume o controle financeiro na oferta do ensino. Prova disso se

constata no Alvará de 28 de junho de 1759 destinado a regulamentar a criação do cargo de

diretor geral dos estudos, a submissão dos professores a exames e a designação de comissários

para realizar levantamento do estado geral das escolas e dos professores. Instauração de

inquérito com o objetivo de averiguar se os professores exerciam suas atividades devidamente

regulamentadas e se estavam fazendo uso de livros proibidos (RIBEIRO, 1989, p. 34).

Outras mudanças ocorridas afetaram o ensino secundário em que a oferta vai acontecer

por meio de aulas régias de latim, grego, filosofia e retórica. A finalidade das aulas de latim

era para que o aluno o utilizasse para o domínio da cultura latina e para o auxílio da língua

portuguesa. O ensino do grego se destinava principalmente àqueles que almejam as carreiras

de teólogo, advogados, artistas e médicos. O ensino da retórica tinha como objetivo servir

como instrumento prático para o cotidiano.

Para Shigunov Neto & Maciel (2006), a era pombalina destruiu a organização da

educação jesuítica e a metodologia de ensino empregada no Brasil e em Portugal. Isso refletiu

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principalmente no fato de que, assim como em Portugal, no Brasil, em virtude da falta de

professores preparados, aqueles que assumiam as salas de aula exerciam baseados na

formação dos jesuítas. A outra consequência da mudança estava relacionada ao

financiamento do ensino que foi solucionado mediante cobrança do “subsídio literário”

(RIBEIRO, 1989, p. 35).

As modificações empreendidas na educação por Pombal espelham as ideias de três

pensadores Luís Antonio Verney, Ribeiro Sanches e António Genovesi, considerados

modernos, mas que apresentaram, em sua proposta pedagógica, resquícios do ensino

tradicional eclesiástico, o que demonstra que, mesmo com a ruptura com o ensino jesuítico,

não houve mudança no método educacional (SHIGUNOV NETO & MACIEL, 2006).

Luís Antonio Verney apresentou uma proposta pedagógica que pretendia fazer

oposição ao método jesuítico. Na obra “O verdadeiro método de estudar”, que consistia em

dezesseis cartas escritas em Roma, publicadas entre os anos de 1746 e 1747, Verney analisa o

ensino jesuítico ofertado em território português. Faz ainda inferências no sentido de adequar

e atualizar o ensino com a realidade da época.

Dentre as propostas inclusas em seu projeto pedagógico, propõe a redução do número

de anos para o ensino inferior, visando a aumentar o número de alunos no ensino superior;

apresenta ainda a proposta de um plano de estudos para todos os níveis de ensino, além de

reivindicar escolas públicas e gratuitas para a população portuguesa, como medida de

combate ao analfabetismo.

Apesar de existir formalmente a proposta de Verney, assim como outras, não foram

implantadas e geraram uma desorganização e decadência do ensino português durante o

período de 1759 a 1808. No Brasil, as consequências do desmantelamento da educação formal

e ausência de um novo plano educacional geraram dezessete anos de ausência de cursos

sistematizados.

Os reflexos dos acontecimentos decorrentes do processo de transformação da Europa

no século XIX, influenciaram sobremaneira a vida na Colônia. A invasão francesa a Portugal

obrigou a vinda, em 1808, da realeza para o Brasil ainda muito dependente das decisões

político-econômicas da Inglaterra, país que em muito se beneficiava da manufatura da

matéria-prima brasileira, entre outras vantagens estabelecidas na relação Portugal/Inglaterra.

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Oliveira (2004) nos informa que a presença da realeza estreia um movimento cultural

em que, entre as mudanças, se destacam a criação do Museu Real, do Jardim Botânico, da

Biblioteca Pública e a Imprensa Régia. Em 1820, a vinda da Missão Cultural Francesa

(formada por Grandjean de Montigny, arquiteto; Jean-Baptiste Debret, pintor de história;

Nicolas-Antoine Taunay, pintor de gênero e de paisagem; Auguste-Marie Taunay, escultor e

irmão do pintor; Charles-Simon Pradier, gravador em talha fina; François Ovide, professor de

Mecânica; François Bonrepos, ajudante de Taunay) motivou a criação da Real Academia de

Desenho, Pintura, Escultura e Arquitetura Civil.

Citando Xavier (1980), Oliveira (2004, p. 947) nos diz que a educação no período do

Brasil colônia foi reduzida apenas a algumas escolas e aulas régias. Ribeiro (1989) aponta que

a palavra “curso”, na prática, se referia apenas a aulas. A criação dos cursos, na verdade

atendia a objetivos imediatistas, destinados a prover a defesa militar do Reino. Afirma que,

sob um ponto de vista, a forma como eram ofertados poderia prejudicar o seu

desenvolvimento, porque não se constituía em uma organização isolada (não-universitária) e

que a preocupação, quando na criação de tais cursos era profissionalizante. Sob outro ponto

de vista, a criação, dos cursos atende às reais necessidades brasileiras da época, o que indica

uma ruptura com o ensino dos padres jesuítas, mesmo que não tenha acontecido em todos os

níveis essa ruptura (RIBEIRO, 1989).

Para Haidar & Marioto (2004), a instrução elementar não foi considerada prioridade

pela administração central. A educação do povo ficou fadada aos interesses pessoais e

políticos absolutistas do Rei.

A estrutura do ensino na época imperial era composta de três níveis. A sequência

desses indicava que o primário podia ser compreendido como lócus de instrumentalização

técnica (escola de ler e escrever), com número reduzido em sua oferta (mais de 60 cadeiras).

A relevância desse nível se tornou evidente para aqueles que o vislumbravam como

preparação para o nível secundário com vistas ao alcance de cargos burocráticos.

O ensino secundário se estruturava em aulas régias. Houve um incremento de 20

cadeiras de gramática latina, matemática superior em Pernambuco, de desenho e história em

Vila Rica e de retórica e filosofia em Paracatu, em Minas Gerais. Através de decreto, a Bahia

foi contemplada com uma escola de ensino profissional, quando foi instituída a cadeira de

Ciência Econômica. No ano de 1810, foi criada a Aula de Comércio, destinada a formar

guarda-livros. A relevância que a produção agrícola tinha para a cidade de Salvador, em

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virtude de que o porto da cidade abastecia outros mercados motivou a criação do curso de

Agricultura (BOAVENTURA, 2009).

Os primeiros cursos do ensino superior criados visavam formar engenheiros civis além

de que preparavam para atuação no campo militar. As instituições formadoras foram a

Academia Real da Marinha e a Academia Real Militar. No Rio de Janeiro e na Bahia foram

criados os cursos para formação de médicos cirurgiões.

A conjuntura na primeira metade do século XIX motivou a volta da corte portuguesa e

a autonomia política concedida a Colônia não apresentou efetivamente mudanças no campo

educacional.

A Carta Constitucional outorgada a partir da autonomia política alcançada em 1822,

como projeto, apontava para a construção de um sistema nacional de educação por meio da

graduação e distribuição racional de escolas por todo o território brasileiro. No entanto, o

texto de 1824, em sua versão definitiva, abandona a ideia de sistema nacional de educação e,

através do artigo 179 assegura a garantia dos direitos civis e políticos dos cidadãos espelhados

dentre outras formas, na garantia da “instrução” primária gratuita e na criação de Colégios e

Universidades (RIBEIRO, 1989).

Em 1826, o deputado Januário da Cunha Barbosa apresenta um projeto de lei em que

entre as propostas, sugere a oferta da educação como dever do Estado, a distribuição racional

das escolas por todo o território em diferentes graus e a graduação do processo educativo. A

lei publicada em 15 de outubro de 1827 apenas contemplou a oferta do ensino elementar

(escola de primeiras letras) distribuída de forma racional por todo o território nacional.

A oferta do ensino nas “Escolas de Primeiras Letras” na época mesmo garantida

constitucionalmente, se apresentava

(...) em número reduzido, como limitado é o seu objetivo, seu conteúdo e sua

metodologia. Elas enfrentavam problemas dos quais se tem notícia através

dos relatórios dos ministros da época: era difícil encontrar pessoal preparado

para o magistério; havia completa falta de amparo profissional, fazendo da

carreira algo desinteressante e não motivando um aprimoramento constante,

a população era mínima (RIBEIRO, 1989, p. 47).

Para que se possa entender esse movimento de propagação do ensino e as condições

em que acontecia a preparação dos professores antes da República, convém informar que,

para Tanuri (2000, p. 14), o motivo que ocasionou a criação de escolas para preparação de

professores

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está ligado à institucionalização da instrução pública no mundo moderno, ou

seja, à implementação das ideias liberais de secularização e extensão do

ensino primário a todas as camadas da população. É verdade que os

movimentos da Reforma e Contra-Reforma, ao darem os primeiros passos

para a posterior publicização da educação, também contemplaram iniciativas

pertinentes à formação de professores. Mas somente com a Revolução

Francesa concretiza-se a ideia de uma escola normal a cargo do Estado,

destinada a formar professores leigos, ideia essa que encontraria condições

favoráveis no século XIX quando, paralelamente à consolidação dos Estados

Nacionais e à implantação dos sistemas públicos de ensino, multiplicaram-se

as escolas normais.

Saviani (2009) nos informa que o quadro da educação brasileira assim se configurava

em virtude de que, em se tratando especificamente da formação de professores, durante todo o

período colonial, o tema não se constituiu objetivo prioritário para a monarquia. Diz-nos ainda

que, por ocasião da promulgação da Lei de Primeiras Letras, esta determinou que o método

mútuo deveria ser aplicado e aí foi feita alusão ao artigo 4º que tratava de estabelecer que os

professores precisavam ser submetidos a treinamento.

Tal como estava ocorrendo na Europa, no Brasil, as Escolas Normais se apresentaram

como solução para a formação docente. Foram criadas então várias em diversas regiões

brasileiras, tendo sido a da Província do Rio de Janeiro a pioneira fundada em 1835.

Posteriormente, outras surgiram na Bahia, no Ceará e em São Paulo.

Os cursos eram ofertados em nível secundário e com duração de, no máximo, dois

anos. Destinadas a preparar professores especificamente para o ensino primário, a formação

tomava como foco a questão curricular, centrada no aprendizado dos conteúdos a serem

transmitidos para os alunos das escolas de primeiras letras e pouco se preocupou com as

questões de ordem pedagógico-didáticas (SAVIANI, 2009). Era a reprodução do modelo

francês de ensino e, como nos diz, um projeto das elites brasileiras detentoras de ideias

conservadoras.

Para Tanuri (2000, p. 14), as escolas normais não se firmaram de imediato como

estabelecimentos de ensino em virtude de que

em todas as províncias as escolas normais tiveram uma trajetória incerta e

atribulada, submetidas a um processo contínuo de criação e extinção para só

lograrem algum êxito a partir de 1870, quando se consolidam as ideias

liberais de democratização e obrigatoriedade da instrução primária, bem

como de liberdade de ensino.

As inconstâncias que cercavam a existência das escolas normais trouxeram críticas tais

como a do presidente da Província do Paraná que, em 1876, as definia como “plantas

exóticas: nascem e morrem quase no mesmo dia” (MOACYR, 1940, p. 239 apud TANURI,

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2000). Para o presidente da Província do Rio de Janeiro, Couto Ferraz, elas eram “onerosas,

ineficientes qualitativamente e insignificantes quantitativamente pois era muito pequeno o

número de alunos formados” (SAVIANI, 2009, p. 14-15). Esse pensamento se efetivou com o

fechamento da escola normal da província a qual presidia e também pela substituição das

escolas pela adoção de professores adjuntos - aqueles preparados através da prática.

(SAVIANI, 2009)

Cabe ressaltar que a seleção de professores e a preparação realizada com as escolas

mútuas aconteceram antes mesmo da existência das escolas normais, assim como também

existiu de forma simultânea a estas (SAVIANI, 2009).

Tanuri (2000) nos informa que algumas evidências contribuem hoje para se

compreender as razões pelas quais as escolas normais tenham sofrido críticas relacionadas à

sua capacidade em termos de estrutura, e a organização didática eram reflexos e talvez, até

mesmo, a causa para os diminutos valores pagos aos professores, assim como a falta de

compreensão da relevância social do ensino para um país que, na época, vivia na dependência

da mão-de-obra escrava. Dessa forma, as escolas normais e os exames de seleção espelhavam

as intenções governamentais para a formação do quadro de professores.

Kulesza (1998) informa que em seu processo de institucionalização, o ensino normal

passou primeiro por um momento em que sua existência consistia como um anexo dos liceus,

acrescentavam-se ao currículo uma cadeira da Pedagogia e a prática acontecia em escolas

públicas de nível primário. Aponta ainda que dois motivos contribuíram significativamente

para o fracasso do modelo de ensino na época: um ligado para o fato de que o curso estava

voltado para a formação de dirigentes de escolas; o outro é que, para atuação no magistério,

não se fazia necessário o diploma do curso normal.

Por outras duas fases passou o ensino normal: numa, em que são extintos os liceus,

passando a existir exclusivamente as escolas normais; noutra, estas passam a se dedicarem ao

ensino de meninas órfãs (KULESZA, 1998).

Quanto à instrução secundária nessa época, era assistemática e ainda se apresentava

em forma de aulas avulsas destinadas aos meninos que aspiravam ao ensino superior ou que

optavam pela aquisição de cultura literária. A criação do Ateneu do Rio Grande do Norte, do

Liceu da Bahia e Paraíba e do Colégio Pedro II na Corte intencionava padronizar a oferta do

ensino secundário.

Quanto ao ensino superior, a época foi marcada pela criação de um curso jurídico

provisório na Corte, em 1825. Foi inaugurada a Escola de Belas Artes e do observatório

astronômico, foram apresentados vários projetos para o ensino médico. Entretanto, esse nível

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de ensino ainda se caracterizava como profissionalizante e era destinado à formação da

sociedade aristocrática brasileira.

Com o fim do tráfico de escravos e o incremento do café como produto de exportação,

em 1850, a economia brasileira alavancou e proporcionou a criação de instituições bancárias.

Foram inauguradas estradas de ferro e outros investimentos tais como alguns de caráter

industrial. O contato com grupos de intelectuais europeus da época proporcionou aos

articuladores (pertencentes à camada dominante e média) a iniciativa para esse processo de

modernização da sociedade brasileira.

Florescem, nesse período, propostas de reformas que tomam como modelo a realidade

europeia, fruto de um modelo importado baseado nos constructos do liberalismo e do

cientificismo (positivista).

No campo educacional, as luzes se voltam para um posicionamento crítico que

ressaltou as deficiências e a consequente apresentação de proposta para reforma Leôncio de

Carvalho que ocorre em 1879, mas que não foi aprovada pelo Poder Legislativo. O autor

defendia a liberdade de ensino, exercício do magistério desvinculado de cargos públicos e

administrativos e a liberdade de frequência para os alunos dos cursos secundário e superior.

Na prática, difundiu-se principalmente a ideia de liberdade no exercício do credo religioso e a

aplicação de outras tendências pedagógicas nas escolas.

É nesse período que surge, de forma sistematizada, o ensino feminino secundário,

antes limitado apenas à escola de primeiras letras e ao aprendizado das prendas domésticas.

Desvinculado da possibilidade de que as formandas pudessem ascender ao nível superior, há

uma maior organicidade e é dada atenção às línguas modernas, às ciências e às cadeiras

pedagógicas.

Assim, são criadas escolas primárias-modelos pela iniciativa privada de protestantes

norte-americanos e positivistas. A organização escolar e os processos didáticos desenvolvidos

pelos norte-americanos na escola primária irão influenciar a educação da Primeira República

que tem como referência a criança como um ser que merece ser respeitado em seu processo de

desenvolvimento e é ativo no meio em que vive.

Em termos da formação docente, pode-se dizer que esse novo clima favoreceu o

reconhecimento da relevância das escolas normais para a disseminação do ensino primário.

Chama a atenção que, diferentemente do período anterior, neste as províncias se dedicam à

construção de novos estabelecimentos, assim como também são valorizados critérios mais

acurados para o ingresso nos cursos e o cuidado no currículo das escolas para a formação dos

professores. Inusitado talvez seja admitir que as escolas normais desse novo período foram

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articuladas exclusivamente para preparação de professores do sexo masculino (TANURI,

2000). Acerca dessa questão, Almeida (1998) nos informa que, por décadas, o magistério foi

desempenhado exclusivamente por homens que lecionavam nas escolas normais atendendo a

clientela feminina e masculina.

Após a proclamação da República e sob a influência da corrente de pensamento

positivista, é decretada a Reforma Benjamin Constant com princípios orientadores à liberdade

e laicidade do ensino, assim como também à gratuidade do ensino primário.

De forma mais detalhada, a escola foi organizada em duas categorias: de 1º grau, que

atendia às crianças com idade entre 7 e 13 anos; e a escola de 2º grau, que atendia às crianças

com idade entre 13 e 15 anos, com duração de sete anos. Numa compreensão ampla da

situação, as medidas visavam desvincular a ideia de ensino nos níveis inferiores apenas como

preparação para o ensino superior, além também de conduzir o conhecimento para a formação

humana baseada na ciência. Há o impasse na adoção destas duas questões que põem em xeque

qual a finalidade da escola: formadora ou preparatória para o nível superior; ou direcionada

para a formação humana e literatura ou para formação humana e nas ciências. Esse impasse se

reproduz em diversas reformas que marcam a Primeira República.

De acordo com Palma Filho (2012), a Primeira República (1889 a 1930) foi o período

em que o governo federal empreendeu várias reformas no campo da educação do atual Ensino

Médio e Superior. Para Ribeiro (1989), as reformas que ocorreram nesse período

demarcavam alternativamente a vigência ora das ideias do humanismo clássico, ora da visão

realista ou científica. Afirma ainda que esse movimento na educação era, na época, reflexo da

dependência cultural fruto do contato de intelectuais da camada dominante e da classe média

brasileira com autores europeus, o que contribuiu para a necessidade do processo de

modernização da sociedade, apontando ainda que o manifesto liberal de 1868 foi um

movimento amplo que difundiu as ideias do liberalismo e do cientificismo.

No sentido de entender esse movimento, em suas palavras, Gondra (1997) nos indica

que a queda da monarquia em 1889 aconteceu em virtude da propagação das ideias

republicanas que, desde 1870, faziam alusão à revolução francesa e que esta espelhava para os

outros países um modelo de República. O novo regime necessitava de que fossem construídas

alternativas para os diversos setores da sociedade, inclusive para a educação defendida como

um sistema em que se pudesse atender a toda a população e a consequente oferta de escolas.

Para Ghiraldelli Jr (1992) o advento da República continuou sendo, tal qual na época do

Império, um sistema político elitista mas que proporcionou também a participação popular

nos processos políticos brasileiros. Para o autor, o clima da Primeira República foi

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influenciado por dois movimentos ideológicos intelectuais da época: o “entusiasmo pela

educação” e o “otimismo pedagógico”. Em suas palavras:

O entusiasmo pela educação teve um caráter quantitativo, ou seja, em última

instância resumiu-se na ideia de expansão da rede escolar e na tarefa de

desanalfabetização do povo. O otimismo pedagógico insistiu na otimização

do ensino, ou seja, na melhoria das condições didáticas e pedagógicas da

rede escolar (p. 15).

São movimentos que do ponto de vista cronológico acontecem de forma subsequente. O

entusiasmo teve seu auge no final do Império e começo da República (entre 1887 até os anos

20 do século seguinte). O otimismo pedagógico acontece entre as décadas de 20 e 30. Na

década de 20, há o encontro dos dois movimentos que se afinam em algumas ideias

defendidas pela sociedade civil, mas que se rivalizam nos momentos em que acontecem as

Conferências Brasileiras de Educação, promovidas pela Associação Brasileira de Educação

(ABE). A representação política da época por intermédio da proposição da política

educacional adotou as ideias do otimismo pedagógico e refutou o entusiasmo. A criação da

ABE pôs em xeque a exclusividade do Congresso Nacional em discutir as questões da

educação pois que a participação de renomados professores assim como de anônimos

colaborou para a acentuação das especificidades de cada movimento.

Ghiraldelli Jr (1992) aponta que o clima de modernização no qual estavam imersos os

intelectuais que provocaram a mudança do regime também contribuiu para a necessidade da

discussão de “grandes temas” nacionais como a democracia, a implantação da Federação, o

incentivo à industrialização e, por fim, a educação popular, evidenciada principalmente pela

vontade de desanalfabetizar a população brasileira. Foi então esse clima que proporcionou o

surgimento do movimento de entusiasmo pela educação: “insistindo na ideia de que os

problemas do país só poderiam ser resolvidos com a extensão da escola elementar ao povo”

(p. 16).

Após a Primeira Guerra Mundial, são os Estados Unidos e não mais a Inglaterra, que se

elevou como parâmetro, nas mais diversas áreas, para a classe de intelectuais do Brasil. O

movimento de otimismo pedagógico surge nesta época, baseado nas ideias do Movimento da

Escola Nova, tendo como referências John Dewey e William Kilpatrick que defendiam a

reorganização das questões intrínsecas à escola assim como a preocupação nas questões de

ordem didático-pedagógicas.

Enquanto o movimento de entusiasmo pela educação foi impulsionado por intelectuais,

o movimento de otimismo pedagógico foi vinculado pela representação política, materializado

pelo ciclo de reformas educacionais estaduais e abraçado posteriormente por um grupo de

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intelectuais que nos anos trinta era reconhecido como “profissionais da educação”

(GHIRALDELLI JR, 1992).

Quanto ao entusiasmo pela educação, Ribeiro (1989) destaca a fala de J. Nagle (1974, p.

99-100) ao dizer que o movimento foi

a crença de que, pela multiplicação das instituições escolares, pela

disseminação da educação escolar, será possível incorporar grandes camadas

da população na senda do progresso nacional e colocar o Brasil no caminho

das grandes nações do mundo (...)

E, referindo-se ao otimismo pedagógico cita ainda J. Nagle que define esse movimento

como “a crença de que determinadas formulações doutrinárias sobre a escolarização indicam

o caminho para a verdadeira formação do homem brasileiro” (1974, p. 99-100).

Para Ribeiro (1989), as reformas oficiais que aconteceram na década de 20, na verdade,

apenas significavam uma repetição do que havia acontecido no final do século anterior, no

entanto, em dimensões regionais. Ilustra essa ideia a proposta da implantação da “escola

primária integral”. Para os ensinos médio e superior, não foram apresentadas alterações que

tenham comprometido as ideias difundidas no período da Primeira República. A proposta

para o ensino médio estava vinculada ao desenvolvimento do caráter científico, a oferta de

vários tipos de cursos e a integração com o ensino primário e o superior.

Os acontecimentos políticos que marcaram a década de 30, na visão de Pereira (1970)

citado por Ribeiro (1989), a apontam como a época do “grande despertar” da sociedade

brasileira voltada para as causas do subdesenvolvimento em relação às outras nações.

Para Ghiraldelli Jr (1992, p. 39), entre os anos de 1930-1937,

o Brasil viveu um dos períodos de maior radicalização política de história.

Essa época de efervescência ideológica foi substancialmente rica na

diversidade de projetos distintos para a sociedade brasileira. Em cada um

desses projetos não faltou a elaboração de uma nova política educacional

para o país.

O autor identifica quatro tendências que se apresentavam como defensores de projetos

educacionais distintos: os liberais - defensores da Pedagogia Nova, incentivadores de

reformas acontecidas na década de 20 e conhecidos como os profissionais da educação. São

os signatários do “Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova”, movimento que propôs a

renovação e reformulação da política educacional brasileira.

Os católicos e os representantes da Ação Integralista Brasileira (AIB) também se

fizeram presentes nessa época, rivalizando com os liberais em relação às ideias

escolanovistas; há ainda que se identificar o grupo representante da Aliança Nacional

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Libertadora (ANL), participantes do Movimento Operário da Primeira República, defendia a

democratização do ensino. O poder público (tendo à frente Getúlio Vargas) também defendia

os seus propósitos para a política educacional e foi Francisco Campos – ministro da Educação

e Saúde Pública, na época, que implementou uma política educacional que não chegou a

atender ao projeto de uma educação alicerçada em princípios democráticos.

Para Ghiraldelli Jr (1992), a Carta Constitucional de 1934 apresenta em seu texto os

resultados da mediação entre os dois principais grupos defensores da educação – os católicos

e os liberais. Trata de questões não tidas nas Constituições anteriores (de 1824 e 1891), tais

quais: definição de que cabe à União fixar, coordenar e fiscalizar o Plano Nacional de

Educação para todos os níveis e especialidades; obrigatoriedade de concurso público para o

preenchimento de vagas do magistério; determinação de que cabe ao Estado a fiscalização e

regulamentação das instituições de ensino tanto no âmbito público quanto privado; e,

estabelecimento de que, no mínimo, 10% do orçamento anual dos municípios devem ser

destinados à Educação, enquanto que aos Estados da federação, 20%. Atendendo aos apelos

da representação católica, estabelece a oferta do ensino religioso e reconhece o papel da

família no processo educativo.

No segundo mandato de Getúlio Vargas, foi promulgada a Carta Constitucional de

1937 e algumas questões ligadas à educação são peculiares ao momento político pelo qual

passava o Brasil. Sob o comando de Francisco Campos, o texto indica a transferência da

responsabilidade da educação aos pais e a adoção de decretos-lei que tinham a intenção de

fazer vigorar as leis orgânicas do ensino.

Com a deposição de Getúlio Vargas do governo e o fim da Segunda Guerra

Mundial, o contexto brasileiro convergia para o mesmo clima europeu que estava voltado para

efetivação como países democráticos. Como nos diz Ghiraldelli Jr. (1992, p. 105),

Era impossível, portanto, contrariar esse processo mundial de

redemocratização. Entre 1945 e 1947 o movimento popular no Brasil

cresceu. Entre a formação de partidos, as eleições para a presidência da

República e a Constituinte, toda uma agitação ideológica ganhou as ruas e

revigorou a sociedade brasileira.

A União das Repúblicas Socialistas Soviéticas – URSS tornou real o socialismo e seus

princípios em muito influenciaram a ação política no Brasil. Nas eleições de 1927, foram

eleitos dois vereadores pelo Partido Comunista do Brasil. O crescimento do Partido com a

Aliança Nacional Libertadora proporcionou o debate teórico, sufocado pela derrota na

Intentona Comunista em 1935.

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O Partido Comunista existiu legalmente entre os anos de 1945 a 1947 e, nesse período,

se empenhou principalmente pela defesa do processo de redemocratização e das eleições para

a Assembleia Nacional Constituinte, incentivando a organização de “comitês populares

democráticos” que se multiplicaram por várias cidades e capitais brasileiras. As ideias do

Partido alcançaram a classe trabalhadora em diversos setores como fábricas, serviços,

comércio e os intelectuais que passaram a reivindicar melhorias sociais. As atividades dos

comitês se voltaram também para a área de educação por meio de cursos de alfabetização de

adultos e crianças e de “cursos técnicos populares” de química industrial, corte e costura,

eletrônica, taquigrafia, inglês prático-comercial, história, política, teatro infantil entre outros.

Os cursos eram gratuitos e muitos chegaram a acontecer em escolas públicas, contavam com o

apoio de lideranças comunitárias e de profissionais do magistério público.

Ghiraldelli Jr (1992) nos informa ainda que foi entre as décadas de 40 e 50 que os

intelectuais se engajaram nos movimentos de esquerda, baseados no socialismo, e esse

engajamento culminou com a apresentação de um manifesto-proposta que versava sobre uma

política democrática para a educação e a cultura brasileira, defendendo ensino público para

todos os níveis do ensino.

Durante treze anos, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) tramitou

e, em 1961, foi promulgada sob o número 4.024, tendo como destaque ainda o debate entre o

ensino público e particular. O documento não atendeu às reivindicações dos educadores que

se organizaram no movimento de desanalfabetização e da conscientização da população para

a compreensão da realidade brasileira na época.

A gestão de Juscelino Kubitschek à frente do país foi marcada principalmente pelo

projeto desenvolvimentista formatado para a infraestrutura básica da industrialização. A

educação, neste contexto, estava voltada para impulsionar tais ideias.

O governo do presidente João Goulart foi marcado pela proposta do Plano Trienal de

Desenvolvimento e, entre as medidas para a educação, estava contida a superação do quadro

de analfabetismo com a expansão da oferta do ensino primário. Foram apresentadas

alternativas quantitativas e qualitativas: intenção de matricular a população que tinha entre 7 e

11 anos de idade; aumento da quantidade de alunos no ensino médio e superior; qualificação

de professores para atender ao curso primário; escola em tempo integral, entre outras.

Sob o número 5.692, a Lei de Diretrizes e Bases de 31 de março de 1964 foi

promulgada no o governo militar e conjuntamente com a Lei 5.540/1968 (que ordenava o

ensino superior) foram marcadas principalmente para uma educação concebida para atender

ao mercado de trabalho e o ensino médio voltado para atender às classes trabalhadoras.

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De forma geral, a lei tratou do agrupamento entre o ensino primário e ginasial, o

Conselho Federal de Educação se incubia de definir as disciplinas que deveriam compor o

núcleo comum dos currículos. Talvez o ponto marcante dessa Lei foi a determinação da

profissionalização no ensino médio tanto para a iniciativa pública quanto particular. O curso

de formação de professores também foi enquadrado sob a mesma lógica da profissionalização.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional de 1996 (9.394) sofreu

principalmente a influência da época marcada pelo processo de transição democrática contida

na Carta Constitucional de 1988. A disposição dos níveis de ensino são então agrupados em

ensino básico, formado pela educação infantil, fundamental e médio, e educação superior.

Outras modalidades são incluídas tais quais: educação de jovens e adultos, educação

profissional e a educação especial.

É contemplada ainda a formação de professores que tal qual determina a Lei, devem

exercer suas atividades docentes aqueles que possuírem a formação superior. Os cursos de

pedagogia passam então a habilitar para a administração, planejamento, inspeção, orientação

educacional e docência na educação básica.

Transcorridos mais de dezesseis anos de promulgação da Lei 9394/1996, muitos de

seus artigos serviram à regulamentação através de medidas provisórias, resoluções, pareceres

e outros. Brzezinsk (2010) destaca as principais mudanças que se deram principalmente no

tocante à: a instituição do Sistema Nacional de Avaliação do Ensino Superior; implantação do

Programa Universidade para Todos (PROUNI) destinado a formalização de parceria com o

setor privado que busca diminuir o distanciamento das classes sociais menos favorecidas

economicamente mediante garantia de acesso e permanência nos cursos de nível superior.

Outra ação dirigida ao ensino foi a implantação do Sistema Universidade Aberta do Brasil

(UAB), que tem entre seus objetivos a oferta de ensino a distância de nível superior, a

formalização dos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (IFET) e o programa

de Apoio aos Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI),

destinados à ampliação das vagas no ensino universitário público.

Quanto às questões ligadas ao financiamento da educação pública, a autora assinala

que a lei nº 9.424/1996 a qual instituiu o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino

Fundamental e de Valorização do Magistério Nacional de Financiamento da Educação Básica

(FUNDEF) e a lei nº 11.494/2006 que criou o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da

Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (FUNDEB), interferiram

positivamente no ensino fundamental, no sentido de corrigir as distorções, ampliando a

destinação de recursos também para a educação infantil, educação de jovens e adultos (EJA) e

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do ensino médio, além de que repercutiram também na destinação de verbas para o

desenvolvimento de planos de carreira do magistério. Ainda referente às ações que envolvem

a prática docente, há que se ressaltar a homologação da lei nº 11.738/2008 que institui o piso

salarial profissional dos profissionais do magistério.

Carvalho (2001), em citação aos argumentos de Freitas (1992), quando faz referência à

expressão “profissionais da educação”, tal como posto na LDB, esclarece que esta diz respeito

aqueles que desempenham trabalho dentro ou fora da escola, não necessariamente relacionado

com a docência.

Brzezinsk (2010) aponta que ainda como efeito da regulamentação do artigo 9º, inciso

I que institui, sob a lei nº 10.172/2001, o Plano Nacional da Educação, que nas palavras da

autora,

de fato pretendeu dar certa organicidade ao sistema nacional de educação, à

medida que apresenta diagnóstico de cada nível e modalidade de ensino,

propõe metas e objetivos na esfera da União e atribui aos estados e

municípios a obrigatoriedade da elaboração de planos estaduais e municipais

(p. 200).

Na trajetória histórica da educação brasileira, este documento que pretende dar

organicidade ao sistema nacional de educação nem sempre teve esse nível de compreensão

quanto as suas finalidades e objetivos. Azanha (2004) defende que foi em sua história recente

que a educação brasileira foi reconhecida como um problema nacional. Para ele, como um

problema governamental, decorre da percepção coletiva, da consciência crítica da realidade.

Informa-nos que a educação só foi reconhecida com o advento da República, pois, até então,

sua função estava relacionada às questões limitadas à organização administrativa e à formação

das classes abastadas da sociedade tanto na época da Colônia quanto no período do Império.

A partir da década de 20, o debate nacional em torno da questão da educação se tornou

um problema que foi percebido como impreterivelmente relacionado com os rumos da nação.

Nagle informa que a educação teve visibilidade porque, a partir daí, seria necessário realizar

modificações nos padrões de ensino e cultura das instituições escolares, para as modalidades e

os níveis de ensino, em função de que

Os quadros social, político e econômico dessa década, com a continuidade

significativa das correntes migratórias, a urbanização, as insatisfações

políticas represadas desde a Proclamação da República e a intensificação das

tensões entre a industrialização nascente as crises do comércio cafeeiro

foram altamente propícios para que a questão educacional se impusesse

como de interesse coletivo e de salvação nacional. Aliás, foi nesses termos

que os diversos movimentos sociais que então apareceram – ligados ou não

aos partidos políticos – passaram a se preocupar com a escola popular, a sua

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reforma e a sua disseminação. Várias tentativas reformistas ocorreram em

diferentes estados; foi nesse período que se iniciou uma efetiva

profissionalização do magistério e que novos métodos e modelos

pedagógicos começaram a ser mais amplamente discutidos e introduzidos

nas escolas. Essa efervescência dos assuntos educacionais, esse ‘entusiasmo

pela educação’, conforme expressão usada por J. Nagle, gerou uma ‘atitude’

que se desenvolveu nas correntes de ideias e movimentos político-sociais e

que consistia em atribuir importância cada vez maior ao tema da instrução,

nos seus diversos níveis e tipos (2004, p. 71).

No sentido de compreender as relações entre as ações governamentais de

planejamento no setor educacional, Azanha (2004) atribui ao grupo de educadores que

participou do “Manifesto dos Pioneiros da Educação” como aquele que conseguiu vislumbrar,

no momento histórico pelo qual passava a sociedade brasileira, na década de 30, a relevância

da apresentação em documento de um diagnóstico e de propostas para a educação. Reconhece

que a proposição de um processo de planejamento envolve etapas de ordem política e técnica

e, a clareza quanto à necessidade de um plano para a educação decorre do movimento desses

intelectuais.

Oficialmente o governo brasileiro apresentou um projeto do Plano de Educação

Nacional elaborado pelo Conselho Nacional de Educação, prerrogativa da Constituição de

1934, mas que não chegou a vigorar em virtude da instalação do Estado Novo. Em 1937,

outro plano foi instituído, que em nada fazia valer as ideias defendidas pelos educadores.

Entretanto, entre os pontos inclusos, três são destaques e persistiram como concepção para

fundamentar as legislações educacionais subsequentes: a noção de que o Plano de Educação

Nacional deve identificar-se com as diretrizes para a educação da nação; a existência por

força de legislação; e a revisão após uma vigência de tempo em espaço prolongado.

Efetivamente, em 1962, no governo de Juscelino Kubistchek, foi instituído o primeiro

Plano de Educação, incluso no plano de metas governamental. Foi o primeiro elaborado já sob

a lei de Diretrizes e Bases da Educação. Pode-se dizer que era composto por um conjunto de

metas qualitativas e quantitativas a serem desenvolvidas em um período de oito anos.

Após as duas revisões pelas quais sofreu o Plano de 1962, Azanha (2004), citando

Roberto Moreira, informa que outros dez planos foram elaborados em um período de trinta

anos, e isso denota que a execução parcial, as sucessivas revisões e o abandono dos planos se

justificam pela especificidade das mazelas presentes na administração pública brasileira e em

virtude de que a educação nunca constituiu elemento prioritário para os governos brasileiros

que concebem o planejamento educacional como um esquema de repartição de recursos,

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diferentemente da intenção propagada pelos educadores signatários do Manifesto dos

Pioneiros.

Azanha (2004) discute que mesmo a ciência deve observar as peculiaridades

contextuais, assim como informa de que não existe uma ciência do planejamento. As questões

relacionadas com a gestão pública; os conceitos de eficácia e eficiência talvez não sejam tão

apropriados, pois a questão do planejamento das ações educativas deve ter como norte

orientador os agentes que fazem parte do cotidiano escolar. Defende ainda que haja clareza

quanto aos objetivos definidos no momento da elaboração de planos de educação e de

políticas educacionais.

Reconhece assim que a Emenda Constitucional nº 14, regulamentada pela Lei nº

9.424, que institui a necessidade de um Plano Nacional de Educação traz como efeito

imediato o Plano de 9 de janeiro de 2001, sob a lei nº 10.172. Entre os avanços conquistados,

prescreve como importante componente a autonomia da escola e a municipalização do ensino

fundamental (AZANHA, 2004).

1.2 – O trabalho docente – principais debates

Entender o trabalho docente no ensino médio nos dias atuais requer compreender os

vários fatores que incidem sobre ele e as correlações quanto ao seu papel no processo

educativo e o contexto social.

No início da década de 90, Zibas (2005) afirmou que, assim como outras questões, o

ensino secundário nos países da América Latina passa por situações semelhantes, por vezes

ligados à estrutura com desdobramentos sociais e/ou culturais: financiamento, duplicidade em

seus objetivos (propedêutico para os cursos superiores ou que representa um término de nível

de escolar), bem como a possibilidade de que este sirva como preparatório para o mundo do

trabalho.

Para Nóvoa (1995), a origem do magistério docente como profissão aconteceu em

virtude da ação do Estado que substituiu a Igreja responsável na época pela difusão do ensino.

A construção de uma rede escolar portuguesa territorialmente distribuída intencionava

propagar a ideologia do Estado. A profissão surge a partir do momento em que este a designa

como instrumento disseminador ideológico. A imagem construída a partir dessa ruptura surge

então como aquela que

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cruza as referências ao magistério docente, ao apostolado e ao sacerdócio,

com a humildade e a obediência devidas aos funcionários públicos, tudo isto

envolto numa auréola algo mística de valorização de qualidades de relação e

de compreensão da pessoa humana. Simultaneamente, a profissão docente

impregna-se de uma espécie de entre dois, que tem estigmatizado a história

contemporânea dos professores: não devem saber de mais, nem de menos;

não se devem misturar com o povo, nem com a burguesia; não devem ser

pobres, nem ricos; não são (bem) funcionários públicos, nem profissionais

liberais, etc. (p. 16)

Silva (2004b) confirma esse discurso, quando nos diz que, em análise aos documentos

que fornecem informações para a construção da memória da profissão, percebe a presença de

elementos como dom, missão e sacerdócio inerentes a ela.

De forma pormenorizada, entender como a profissão docente transitou de um trabalho

sacerdotal para o quadro atual, ligado à proletarização, ligado aos fins pelos quais a sociedade

portuguesa concebeu a educação. Como o Estado tratou o trabalho docente durante a sua

história variou nos diversos períodos históricos. Na República, a educação se propunha

atender aos objetivos vinculados ao progresso, a classe de professores então desempenhou um

papel charneira, cujo objetivo era especificamente o controle da categoria. As escolas normais

que surgem cumprem esse mandado, mas também funcionam como espaços de reflexão para

os professores acerca de seu trabalho (NÓVOA, 1995).

Para o autor, nesse mesmo período, alguns fatos históricos como a consolidação das

instituições de formação docente; a crescente feminização do corpo docente nas instituições; o

aumento do associativismo docente; e as mudanças no aspecto socioeconômico dos

professores irão influenciar a ação do docente no ensino primário e secundário e pode-se

afirmar, reforçaram o controle estatal, mas também contribuíram para a afirmação da

autonomia no trabalho docente.

A criação de cursos normais como espaços institucionais de formação docente vai

historicamente contribuir para que o Estado utilize a escola para disseminar a ideologia e,

posteriormente, servir ao controle administrativo – este último relacionado ao controle

burocrático do trabalho docente.

Convém frisar que os controles – burocrático e administrativo – aos quais é submetida

a atividade (aqui fazendo uma analogia com a atividade docente) podem ser compreendidos

de forma mais ampla, conceitualmente: o ideológico, assim como nos informa Chauí (1982, p.

3), pode estar vinculado

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(...) não apenas a representação imaginária do real para servir ao exercício da

dominação em uma sociedade fundada na luta de classes, como não é apenas

a inversão imaginária do processo histórico na qual as ideias ocupariam o

lugar dos agentes históricos reais. A ideologia, forma específica do

imaginário social moderno, é a maneira necessária pela qual os agentes

sociais representam para si mesmos o aparecer (que não devemos

simplesmente tomar como sinônimo de ilusão ou falsidade), por ser o modo

imediato e abstrato de manifestação do processo histórico, é o ocultamento

ou a dissimulação do real. Fundamentalmente, a ideologia é um corpo

sistemático de representações e de normas que nos “ensinam” a conhecer e a

agir.

A utilização da burocracia no trabalho docente pode ser compreendida a partir do

processo de Organização do trabalho. Pode ocorrer em qualquer nível, impõe um quadro

social não diversificado, age em alguns aspectos como a condição de estabilidade no

emprego; a existência da hierarquia salarial e das funções; a distribuição de responsabilidades,

além de que todos esses aspectos se voltam para a construção de um status socioeconômico

(CHAUÍ, 1982).

A participação como mediador dos processos que se estabelecem entre os indivíduos e

a sociedade civil nas situações da vida social fazem com que o Estado lance mão do discurso

da Organização como um recurso que serve para ocultar a sua participação nessas relações.

Chauí (1982) afirma ainda que há no discurso competente do Estado dois movimentos

difíceis de perceber: um que afirma e outro que nega o crescimento do poder pelo Estado. Não

existe esse movimento, trata-se de apenas um discurso “dotado de duas caras”, mas

enxergamos a dualidade entre discurso do poder e do conhecimento, ou mais precisamente o

discurso do burocrata e o do não-burocrata.

Não são todos que estão autorizados a proferir o discurso competente. Há valorização

do conhecimento científico, porque se apropria do conhecimento dito científico e institui

aquilo que deve ser reconhecido como verdadeiro ou autorizado já que trabalha para dissociar

a relação que existe entre o tempo e o lugar em que um dito conhecimento nasceu. Para

propalar o instituído, há que se realizar a demarcação, a separação e a circunscrição do

discurso para selecionar os interlocutores, o tempo, o lugar, a forma e o conteúdo (CHAUÍ,

1982).

Em épocas atuais, pode-se dizer, é mais compreensível enxergar as relações entre o

controle estatal e as condições em que se realizam as atividades dos professores. A

interferência de agências internacionais na área de educação acontece em muitos países do

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mundo. O discurso que embasa um projeto descentralizador e de participação, tal qual

proposto por estas, reforçam mais ainda o poder do Estado no controle do trabalho docente e o

espelho disso são as proposições avaliativas. O quadro atual demonstra que as reformas que

foram implantadas

(...) têm aprofundado o fosso que separa os actores dos decisores,

fomentando perspectivas sociais conformistas e orientações técnicas sobre o

papel dos professores. A tutela político-estatal tende a prolongar-se através

de uma tutela científico-curricular, verificando-se a instauração de novos

controlos, mais sutis, sobre a profissão docente (NÓVOA, 1995, p. 22-23).

Nóvoa (1995) utiliza as palavras de Ginsburg para informar que o impacto das

reformas contribuíram para constituição atual de um certo mal-estar docente assentado em

dois processos antagônicos: um relacionado com a profissionalização e o outro, com a

proletarização do corpo docente. O primeiro conduz à maximização do trabalho docente,

efetivado no aumento dos salários, no exercício autônomo de suas atividades. O segundo

processo diz respeito à proletarização, condição totalmente contrária à profissionalização. O

espelho da proletarização se reflete na separação entre a consecução e execução, na

padronização das tarefas, nos custos necessários para contratação da força de trabalho e na

crescente definição de critérios do trabalho docente.

Ainda para o autor (1995, p. 24), os dois processos e a tensão aos quais estão

submetidos os professores portugueses também atingem os professores de muitos outros

países. Ressalta que o controle e a interferência de especialistas caracterizam a separação

entre aquele que concebe e os executores da tarefa e como tal,

(...) trata-se de um fenômeno social que legitima a intervenção de

especialistas científicos e sublinha as características técnicas do trabalho dos

professores, provocando uma degradação do seu estatuto e retirando-lhes

margens importantes de autonomia profissional. Por outro lado, a tendência

no sentido da intensificação do trabalho dos professores, com uma inflação

de tarefas diárias e uma sobrecarga permanente de actividades.

As palavras de Apple & Jungek (1990) citadas por Nóvoa, ilustram o pensamento

anterior quando afirmam que a intensificação do trabalho conduz o professor a adotar atalhos,

economizar esforços, trabalhar realizando apenas as tarefas essenciais. Isso impreterivelmente

leva os professores a apoiarem-se em especialistas e, dependentes de suas orientações, resulta

em um processo de depreciação da experiência e das capacidades que adquiram ao longo do

exercício de seu trabalho.

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Mas, para o autor, atenção deve ser dada aos cursos de formação de professores, pois

estes devem se apresentar como alternativa para a construção de uma “nova”

profissionalidade docente impregnada da cultura específica dos professores e da cultura

organizacional da escola.

Esse movimento deve priorizar a formação do perfil de professor crítico-reflexivo, por

si, autônomo, que subsidia a autoformação. Explica Nóvoa (1995) que a formação não se

constitui em um mero acúmulo de conhecimentos, fruto de cursos ou de técnicas, mas através

da ação reflexiva crítica sobre as práticas; pela permanente construção/reconstrução da

identidade pessoal.

Como visto, no Brasil, o exercício da docência serviu originalmente para atender as

necessidades iniciais dos educandos no que se refere aos princípios morais e de letramento.

Para Nóvoa (1995), a docência no ensino secundário era campo e domínio de profissionais

que tinham a sua imagem associada à produção científica e à intelectualidade.

Arroyo (2009, p. 18) faz a defesa de que o exercício da docência deve ser considerado

“ofício de mestre” e justifica que a expressão está associada

(...) a um fazer qualificado, profissional. Os ofícios se referem a um coletivo

de trabalhadores qualificados, os mestres de um ofício que só eles sabem

fazer, que lhes pertence, porque aprenderam seus segredos, seus saberes e

suas artes. Uma identidade respeitada, reconhecida socialmente, de traços

bem definidos. Os mestres de ofício carregavam o orgulho de sua maestria.

Inquietações e vontades tão parecidas, tão manifestas no conjunto de lutas da

categoria docente.

“Ofício de mestre” é o saber específico, herdado, que não deve ser avaliado tomando

as medidas da administração gerencial, de operações racionais que balizam a organização e a

divisão do trabalho na gestão dos sistemas de ensino. Para o autor, existe uma cultura docente

com ainda algumas dimensões e traços da ação educativa que sustentam o ofício.

No sentido de abordar as funções do professor, Cunha (1999, p. 129) refere que,

historicamente, o professor construiu para si, cumprindo a expectativa da

sociedade, a ideia de que sua função era ensinar um corpo de conhecimentos

estabelecidos e legitimados pela ciência e pela cultura, especialmente pelo valor

intrínseco que representavam.

Serón apud Cunha (1999, p. 131) indica que a formação do professor e o grau de

ensino influenciam no seu nível de autonomia. Reconhece que aqueles advindos das

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universidades se fazem perceber como detentores de uma profissão científica, enquanto que

aqueles do ensino fundamental e secundário se organizam e se constituem como uma

profissão prática, ou semiprofissão. Por conta da duração mais curta do curso, possuem um

corpo de conhecimentos menos especializado e de menor autonomia.

Retificando esse ponto vista, Arroyo (2009) informa que a imagem social e o

reconhecimento social para cada nível de ensino são diferentes e nem sempre são

convergentes. Cita como exemplo a imagem dos professores da educação infantil e dos que

lecionam as primeiras séries do ensino fundamental. A docência está impregnada de uma

imagem social construída, o desencontro entre o que se espera da profissão, a imagem

pretendida pela categoria e a autoimagem gera um mal-estar que incide na identidade da

categoria.

Dessa forma, os professores que lecionam nas turmas das séries finais do ensino

fundamental e do ensino médio conquistaram uma certa imagem social em função de que se

apresentam como docentes e não como educadores. Arroyo (2009, p. 30) justifica que isso faz

com que se diferenciem dos outros níveis de ensino, porque,

Não incorporaram os traços reconhecidos da professora primária, nem a

confiança social. Não incorporaram a figura do educador, condutor da

adolescência e juventude como a professora incorporou o cuidado, a

dedicação e o acompanhamento da infância. Nem conseguiram incorporar,

ainda que licenciados, os traços da imagem de docente, professor de um

campo do conhecimento, reservado ao professor universitário, socialmente

definido com um estatuto de competente.

A função de professor, como mero “reinterpretador” de conhecimentos, pode ser

identificada, quando Marzola (1993), relacionando as políticas e as mudanças no sistema de

ensino e o processo de formação de professores, indica que esta serve como meio para

implementar transformações no sistema de ensino, propagando em seu conteúdo decisões

governamentais e teorias pedagógicas. Os cursos de formação servem como locais para

aquisição ou aperfeiçoamento de capacidades consideradas necessárias para utilização de

novos procedimentos de ensino. Para a autora,

se ao professor não resta outra alternativa senão ajustar-se a essa lógica, a

eficácia deste modelo formativo é evidenciada, então, na mudança de

comportamento dos professores. E, com efeito, estes devem ser capazes, ao

final da reciclagem, de reproduzirem o conhecimento ou o savoir faire (saber

fazer) adquirido. Tudo se passa como se o resultado – a capacidade de

reproduzir – fosse a prova mais cabal da mudança do professor (p. 80).

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O professor, segundo essa ótica, assume o papel de agente modernizador das escolas,

quando é conhecido que as formações são veículos de “inovações educacionais” presentes

principalmente nas metodologias de ensino.

Há ainda os discursos que desviam o debate da centralidade da ação docente. Para

Arroyo (2009), os ataques a que são expostos os profissionais da educação por gestões

tecnocratas em busca de ações “modernizantes” ou por gestores progressistas em torno da

participação da comunidade contribuem para a descaracterização do que é específico na ação

desses profissionais.

Em pesquisas com professores, Tardif & Lessard (2008) nos apontam que o trabalho

não se esgota apenas como um mero transmissor de saberes produzidos por outros grupos,

mas como produtores de conhecimento produzidos em seu cotidiano.

Para o desenvolvimento de tais ideias, compreendem como premissa, o trabalho

docente como um trabalho interativo. Para tal, apontam que cinco motivos dão suporte a esta

abordagem: o trabalho interativo na organização socioeconômica do trabalho; o trabalho

docente, componente nessa organização; os modelos de trabalho docente na organização

industrial; a questão da profissionalização do ensino e o trabalho docente e a análise da

interação humana e docência.

Para os autores, a transformação da matéria inerte como um trabalho foi importante

para as sociedades industriais modernas e representou a atividade humana em sua essência,

assim como influenciou o pensamento dos marxistas, funcionalistas e liberais. Apontam que a

sociologia do trabalho definiu que a participação nas relações sociais de produção configurava

verdadeiramente o trabalhador, o cidadão. Essa concepção alimenta as ideologias

desenvolvimentistas e neoliberais nos dias atuais. Assim, o trabalho docente nesta sociedade

se volta para a formação de trabalhadores para o mercado de trabalho.

Entretanto, ressaltam os autores que esta visão do trabalho não é válida para as

sociedades modernas avançadas: o trabalho docente é útil para compreensão do processo de

transformação porque vêm passando as sociedades do trabalho pois a categoria dos

trabalhadores de bens materiais tem decaído. Em seu lugar, a prestação de serviços tem

assumido essa posição, formada principalmente por grupos de profissionais, cientistas e

técnicos que produzem a sociedade do conhecimento. São essas novas atividades trabalhistas

que estão presentes e respondem às demandas pela gestão das questões econômicas e sociais.

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Simultaneamente a esse processo, cresce também o mercado para ocupação de cargos que

lidam com atividades burocráticas que se utilizam da racionalidade instrumental e planificada,

voltada para o alcance de êxito e da perfeita coordenação entre os meios e os fins.

O outro ponto levantado pelos autores diz respeito às profissões e ofícios que têm

seres humanos como “objeto de trabalho”, o trabalho interativo, que tem como função colocar

em relação, nos mais diversos tipos de organizações, um trabalhador e um ser humano que

usufrui de seus serviços. São atividades em que são estabelecidas relações de trabalho que

visam mudar, manter ou melhorar a situação humana das pessoas.

Do ponto de vista econômico, os agentes escolares influenciam sobremaneira a receita

dos países o que pode representar consideráveis percentuais do Produto Interno Bruto (PIB)

em relação aos outros setores da sociedade. Isso, então, descaracteriza o trabalho docente,

quando faz parte de grupos que podem ser considerados profissões periféricas ou secundárias

em relação ao processo econômico de produção de bens materiais, considerando a questão

financeira quanto a sua função nas sociedades modernas avançadas. Corrobora esse

pensamento o fato de que

o ensino está mais que nunca no coração do processo de renovação das

funções sociotécnicas, como também da distribuição e a partilha dos

conhecimentos e competências entre os membros da sociedade. A

importância econômica do ensino caminha a par de sua centralidade política

e cultural (p. 23).

Há muito, o contexto escolar tem sido o espaço institucional predominantemente

destinado à socialização e à educação. Sob a estrutura escolar, o processo de escolarização é

também lócus de interações entre professores e alunos que edificam o trabalho dos

professores sobre e com os alunos. Caracteriza-se então o trabalho docente por relações

sociais na escola, que também se presentificam como relações de trabalho – trabalhadores e

seu “objeto de trabalho”. O espaço escolar precisa então se constituir em um lugar onde os

agentes escolares lancem mão de conhecimentos profissionais e, com apoio de recursos

materiais e simbólicos, desempenhem suas atribuições, considerando os objetivos que se

impõem à escola, pois ela está diretamente ligada ao progresso da sociedade industrial e dos

Estados modernos.

Há que se considerar que a escola também pode ser um espaço onde são reproduzidas

relações próprias do Estado e da sociedade. Assim é que o trabalho escolar se constitui em

tarefas que sofrem controle e organização que, a cada dia, se torna mais burocrática. O

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trabalho do professor tem sofrido o controle quanto às tarefas e aos conteúdos escolares

porque há um crescente chamamento pelas medidas de eficiência e controle do tempo

(TARDIF; LESSARD, 2008).

No sentido de arrematar todos esses argumentos ao debate acerca da profissão docente

e de forma pontual, Cunha (1999) cita Garcia (1995) que faz uma reflexão sobre as categorias

que aparecem constantemente nos estudos sobre o tema. São elas: a “burocratização do

trabalho”, a “intensificação/proletarização”, a “colonização e controle”, a “feminização”, o

“isolamento/individualismo”, a “carreira plana” e os “riscos psicológicos”.

Não muito distante das outras percepções apresentadas, o autor também compreende

que a burocratização do trabalho docente faz parte de um projeto que incorpora a divisão

social do trabalho, marcador do controle da atividade docente. Aos especialistas cabe o

comando e aos professores a execução. Transparece como resultado desse controle a

sobrecarga de atividades complementares que nem sempre são efetivas ao trabalho docente e

a anulação das diferenças específicas a cada contexto.

Os efeitos da intensificação do trabalho expresso pela relação entre o aumento de

carga horária de trabalho dos professores e a produtividade são compreendidos como

corrosivos para a autonomia do docente. É a questão do tempo, da disponibilidade para

proposição de atividades, a partir da iniciativa própria que é prejudicada por aquelas impostas.

A relação entre intensificação do trabalho e proletarização é direta, pois quanto mais

controle do tempo, mais tarefas por fazer, mais se fragiliza a noção de profissionalização do

magistério. A intensificação do trabalho retrata o quadro em que

(...) o professor é levado principalmente a realizar tarefas predeterminadas

por estruturas superiores, a concepção de autonomia, tão necessária à

profissionalização, desaparece e se produz uma espécie de colonização. Esta

seria, especialmente, o controle das ações docentes por meio da

intensificação das atividades. Como não há tempo para pensar e produzir

seus próprios processos pedagógicos, fica mais fácil, ao professor, lançar

mão dos textos já prontos, manuais elaborados e livros didáticos

organizados. Assim, como consequência da perda da autonomia no uso do

tempo, o professor perde a autonomia nas decisões de seu campo de trabalho

(GARCIA, 1995, apud CUNHA, p. 138).

O outro tema em destaque nos estudos diz respeito à feminização do magistério. É um

fenômeno em que, para o autor, os resultados repercutem na profissionalização e na cultura

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profissional dos professores, pois profissões com maior contingente de profissionais

femininos são identificados como débeis em sua condição, de menor poder reivindicatório e

adaptáveis a uma cultura de colaboração. Conclui que as profissões eminentemente femininas

são consideradas de menor prestígio social.

A busca pela autonomia leva o professor a utilizar o espaço da sala de aula como

espaço de poder, produz o isolamento que pode funcionar como para proteção contra as suas

fragilidades, as suas dificuldades. As inovações provocadas por novos desafios propostos por

outros o fazem ainda mais proteger-se na sua zona de segurança – a sala de aula, o espaço

restrito a ele e a seus alunos.

Outros fatores que podem contribuir para o isolamento do professor dizem respeito à

intensificação do trabalho, à ausência da cultura de discussão coletiva do projeto pedagógico e

à lógica da avaliação externa. Quando há o excesso de atividades individuais e a oferta

reduzida de atividades coletivas, consequentemente há o distanciamento do convívio com os

colegas em ambientes interativos. O vácuo provocado pela falta de discussão do projeto

pedagógico também contribui para o isolamento, pois esta seria uma oportunidade para

interações entre os professores, mas isso não constitui rotina entre as escolas. Percebe-se que

a crescente formalização das avaliações externas, objetiva a ação de cada professor e também

o afasta da comunhão das ações coletivas.

As condições precárias em que acontece o trabalho, a falta de valorização social e a

crise de identidade profissional são elementos que contribuem para a geração do estresse ou

mal-estar docente, caracterizado principalmente pela sensação de frustração psicológica,

percebidas em sintomas como ansiedade, insegurança e instabilidade, provocados pela

intensificação do trabalho e pela ampliação de funções. Notadamente, isso pode provocar um

nível alto de insatisfação, o que provoca estresse considerável, resultando na condição de

risco psicológico.

1.3 – O trabalho docente no Ensino Médio

A preparação para o exercício docente para o ensino médio no Brasil, conforme nos

diz Loiola & Moura (2006) acontece quando ainda na época do Império, foi criada a Escola

Normal, a qual tinha como função original preparar professores para o ensino elementar e

complementar do país. Foi em 1896 que esta se voltou para a formação de professores para o

ensino secundário, no curso superior da Escola Normal da Capital.

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No entanto, com a fundação, em 1932, da Escola de Professores do Instituto de

Educação do Rio de Janeiro, ocorreu a institucionalização do nível superior como requisito

para a formação de professores para o ensino secundário e normal.

O panorama do ensino médio nos indica que este tem sofrido com os abalos

decorrentes da época atual: a utilização de tecnologias da informação, as mudanças que

ocasionaram a transferência das funções familiares para a escola e as questões ligadas à

produção de bens e a lógica de mercado que incidem sobre as políticas educacionais

(CUNHA, 1999, p. 127).

Em pesquisa recente, Costa & Oliveira (2011, p. 739) indicam que, em função da

universalização do ensino básico no Brasil, o docente do ensino médio tem mais aulas,

alunos, turmas e empregos comparados aos pares do ensino infantil e fundamental. A maioria

dos docentes do ensino médio pertence à rede pública estadual de ensino e deles são exigidos

requisitos similares quanto à formação e, apesar disso, assumem responsabilidades, salários e

condições de trabalho diferentes. Acerca dessa questão, pode-se dizer que

A baixa remuneração e a possibilidade de contratos temporários

contribuíram para que o professor da escola pública ampliasse sua jornada de

trabalho. (...) os professores da educação básica, particularmente os que

lecionam no ensino médio, possuem uma carga horária extensa, com ampla

utilização do turno noturno, haja vista que nele estão matriculados 2.875.834

alunos, ou seja, 34,4% das matrículas da última etapa da educação básica

(BRASIL, 2010). São muitas aulas e muitas turmas, considerando o pequeno

número de aulas de cada uma das 12 disciplinas distribuídas nas 25 aulas

semanais que compõem o currículo da educação geral. Menos aulas por

disciplina, mais turmas e turnos.

O perfil dos professores desse nível de ensino nos mostra que, em sua maioria,

pertencem ao gênero feminino, ressaltando que a presença de docentes do gênero masculino é

maior que nos outros níveis de ensino e cerca da metade têm mais de 40 anos de idade.

Em virtude da obrigatoriedade de oferta do ensino médio, houve uma clara ampliação

do número de escolas, a consequente ampliação do quadro docente e a percepção da

necessidade da formação de nível superior posta na LDB 9.394/1996, porém a pesquisa

aponta que existe um número significativo de professores sem a devida habilitação exigida e

muitos se encontram lecionando disciplinas as quais não poderiam legalmente ministrar,

principalmente as pertencentes ao currículo do ensino médio.

Outros fatores que influenciam diretamente no exercício do trabalho dos professores,

que são recorrentes em muitas escolas públicas brasileiras, dizem respeito às condições

estruturais, de equipamentos e instrumentos nas escolas públicas de ensino médio, quanto à

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ausência ou deficiência de quadras de esporte, bibliotecas, laboratórios de informática, acesso

à internet e laboratórios de ciências.

Mas, alguns anos anteriores a esse período, precisamente entre as décadas de 60 e 70,

marcaram o professorado do ensino médio brasileiro, pois foi nessa época em que, sob a

vivência do período desenvolvimentista, foram explícitas a busca pela especialização

profissional, a divisão das atividades acadêmicas por departamentos, o fomento à produção e

à pesquisa e a presença do mercado na definição de competências (ARROYO, 2009).

Passar por esse processo não trouxe uma definição profissional e pessoal para a

docência das etapas finais do ensino fundamental e do médio. Na verdade, para o autor

(ARROYO), colaborou para uma certa indefinição social alimentada pela concepção de

ginásio e ensino médio preparatórios, para a construção de saberes que os compreendem

como etapa intermediária. Alerta que não há menção desse nível de ensino voltada para a

formação na adolescência e juventude, específica do ciclo de desenvolvimento humano.

Assim, os professores licenciados não atualizaram a imagem social do ensino médio e esse

continua sendo intermediário, indefinido socialmente e, mesmo se posicionando

profissionalmente, não conseguem garantir a educação e a formação cognitiva, ética, estética,

cultural e outras, que são específicas da adolescência.

Segundo o autor, a adolescência e a juventude têm recentemente ocupado diversos

espaços sociais e geraram modos específicos de vida, entretanto não houve mobilização por

parte dos docentes como produtores de saberes pedagógicos, para atenderem especificamente

às consequentes transformações dessa clientela.

Para ele (p. 31),

A figura do docente, licenciado numa área, não se aproximou nem

aproveitou a configuração desse tempo educativo a exigir profissionais,

saberes e competências específicas. Os docentes continuaram fechados em

suas áreas, no domínio das competências próprias dos docentes das diversas

áreas do Ensino Superior. Esperando que seu estatuto social viesse por essa

aproximação, pela pesquisa em cada área, pela especialização em cada área,

pelo acompanhamento da renovação teórica de cada área. As associações de

áreas, seus congressos e sua produção buscaram o estatuto profissional de

docentes por aí. Passaram-se várias décadas e esse estatuto profissional e

social não se configurou por aí.

Nesse novo contexto, a questão primordial então seria atentar para entender o processo

de construção da identidade docente, as referências, a concepção e a especificidade da prática

na educação. Outras indagações devem vir à tona quando se questiona também a prática do

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professorado: deve se prender às concepções fragmentadas no exercício da docência ou deve

ser balizada a partir da fase da vida na qual os alunos se encontram (ARROYO, 2009).

O reconhecimento social também influenciou no processo de construção do perfil

profissional do professor. Arroyo (2009) alega que o reconhecimento social está atrelado aos

valores e às representações sociais. Logo, para que se possa ter clareza do reconhecimento

social dos professores, é necessário saber qual seria o reconhecimento social da infância,

adolescência e juventude.

Arroyo (2009, p. 32) arremata em seus argumentos que o reconhecimento social pode

se sobressair muito mais pela representação social que o trabalho docente possui para

determinadas etapas da vida humana do que pelo fazer técnico típico docente. Devemos,

como educadores, ser reconhecidos e, especificamente para aqueles do ensino médio se

afirmar a partir da consolidação do tempo cultural e social da adolescência e da juventude

como tempo de formação. Ou seja,

O que somos como docentes e educadores depende do reconhecimento

social dos tempos da vida humana que formamos. Do valor dado a esses

tempos. Como pedagogos nascemos historicamente colados à sorte da

infância, a um projeto de seu acompanhamento, condução e formação.

Temos os tempos da vida humana como nossos cúmplices. Nos afirmamos

profissionalmente no mesmo movimento em que essas temporalidades vão

se definindo social e culturalmente. É menos a sorte dos recortes dos

conhecimentos das ciências e das técnicas, o que nos conforma, do que a

sorte dos tempos-ciclos da formação humana. Estes são nossos cúmplices

identitários.

É relevante ressaltar o esforço que a categoria dispensa em busca de meios para o

domínio de novos saberes e de qualificação, para atualizar a sua função social em relação às

novidades tecnológicas. Ainda assim não há clareza do sentido do que representa ser mestre,

ser professor, ser professora (ARROYO, 2009).

Mas os debates que buscam identificar os valores, as representações que configuram o

constructo social sobre a imagem docente devem se voltar para a sua condição de coletivo

social. A forma como a categoria lida com os governos, com as questões salariais, com as

condições de trabalho estão atreladas à condição de coletivo em ser professor em diversos

níveis de ensino. E, para Arroyo (2009, p. 33), o perfil profissional está voltado ainda para a

ideia de vocação, de uma visão religiosa:

Por mais que tentemos apagar esse traço vocacional, de serviço e de ideal, a

figura de professor, aquele que professa uma arte, uma técnica ou ciência,

um conhecimento, continuará colada a ideia de profecia, professar ou

abraçar doutrinas, modos de vida, ideais, amor, dedicação. Professar por um

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modo de ser. Vocação, profissão nos situam em campos semânticos tão

próximos das representações sociais em que foram configurados

culturalmente. São difíceis de apagar no imaginário social e pessoal sobre o

ser professor, educador, docente. É a imagem do outro que carregamos em

nós.

O perfil atual resulta de vários fatores pois é uma construção social, cultural e política

que vai além da escola. Lembra o autor que, a partir do reconhecimento dessa imagem que

liga a professora às qualidades de mulher bondosa, tenra, cuidadosa, é que se deve partir para

a redefinição de outros valores e cultura do ser professor, ser professora. Essa redefinição

necessita do reconhecimento preciso das relações e estruturas formadas para composição de

novos perfis.

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2 – O ENSINO MÉDIO NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO

BRASILEIRA

Este capítulo versará sobre o ensino médio, sua natureza, fins e objetivos definidos na

legislação e como ele vem sendo trabalhado na realidade do estado de Alagoas. Objetiva,

também, discutir as principais questões relacionadas a esse ensino, definido hoje na Lei

9.394/1996 como última etapa da Educação Básica.

Inicialmente será realizada uma breve retrospectiva acerca do ensino médio no Brasil e

em Alagoas; as reformas educacionais que incidiram sobre esse nível de ensino com a

intenção de compreendermos como as questões contextuais podem ser determinantes para a

relação que se estabelece entre educação e sociedade. Especificamente voltaremos nosso olhar

sobre as edições da Lei de Diretrizes e Bases da educação brasileira a abordagem no ensino

médio, como recurso para verificar possíveis relações entre este e a prática do professor.

2.1 - Ensino Médio no Brasil e em Alagoas: uma breve retrospectiva

Desde os primórdios da educação brasileira, o ensino médio é motivo de discussões

acerca da sua identidade. No sentido de compreendermos quais os argumentos que

fundamentam essa questão, voltamos à história e identificamos que a origem se encontra no

século XIII e que se definia como um nível de estudo intermediário entre os estudos

paroquiais e os estudos de nível superior ligados à Teologia, ao Direito e à Matemática.

Quanto ao currículo, prevaleceram, entre os séculos XV e XVI, as ideias de cunho humanista

e, no século XVII, estava voltado para o estudo das línguas como instrumento para

compreensão da realidade (SILVA, 2010).

O currículo do ensino médio, com o passar dos tempos, suscitou modificações

decorrentes do processo de desenvolvimento tecnológico iniciado pela Revolução Industrial

no século XVIII. Incidiu sobre o referido currículo o enfoque direcionado para as ciências em

detrimento dos conteúdos voltados para as questões pedagógicas do humanismo (SILVA,

2010).

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O surgimento do ensino médio brasileiro (na época 2º grau) ocorreu por força do

decreto do Ministro do Império do Gabinete Paraná, Luiz Pedreira do Couto Ferraz, que tinha

como propósito reformar o ensino primário na capital do governo. Foi instituído pelo

Regulamento da Instrução Primária e Secundária do Município da Corte (HAIDAR &

TANURI, 2004).

Posto que o surgimento do ensino médio ocorreu em função das modificações

empreendidas no sistema de ensino brasileiro, pode-se dizer que este traz as marcas de fatos

definidores para cada época e necessariamente denotam a relação entre o poder público e a

oferta da educação para ricos e pobres.

No período colonial, a vinda da Companhia de Jesus e a sua consequente expulsão do

país ressaltaram que, no primeiro momento, a educação estava voltada à catequização e,

posteriormente, esperava-se dela que estivesse impregnada de outros princípios voltados para

a laicização e para o atendimento aos objetivos políticos e econômicos do governo português

(HAIDAR & TANURI, 2004).

No Império, a vinda da família real ao país trouxe ganhos para a implementação e

estruturação do ensino superior e pouco se pensou no ensino primário e secundário, pois a

educação popular não constituía interesse para os administradores da colônia portuguesa.

As autoras informam que os princípios liberais e democráticos, motivadores do regime

constitucional e do governo representativo que resultaram com a Independência,

influenciaram sobremaneira as intenções oficiais em relação à instrução popular. Após a

Independência, a iniciativa oficial se posicionou no sentido de pensar a oferta do ensino

público, motivado principalmente pelo peso dos encargos decorrentes do custeio da

centralização dos atos administrativos. Mesmo assegurada legalmente, pelo do Ato Adicional

de 1834, às províncias a possibilidade de legislar sobre seu sistema de ensino (excetuando o

ensino superior e aqueles criados por leis gerais), não houve grandes mudanças em função de

que essas não possuíam condições financeiras para arcar com os estudos primários e

secundários da população.

Mas a falta de recursos financeiros das províncias geraram também outras dificuldades

para a ampliação da rede. Como nos dizem Haidar & Tanuri (2004, p. 42), o quadro da

educação primária nas províncias se caracterizava pela

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dispersão da população, o número insuficiente de escolas, o despreparo e o

descontentamento dos professores mal remunerados, a ignorância dos pais

que se recusavam a mandar instruir os filhos – razão pela qual, das poucas

escolas existentes, muitas cerravam as portas por falta de frequência - faziam

com que a instrução primária, limitada aos rudimentos da leitura, da escrita e

do cálculo, apesar do enriquecimento previsto na legislação, beneficiasse

apenas uma parcela mínima da população.

Como se percebe, a finalidade do ensino secundário no país em sua origem está

voltada à superação da condição de pobreza em que vivia grande parte da população

brasileira. Mas, desarticulado que estava, o ensino secundário na época só servia como

oportunidade para aqueles poucos filhos de famílias abastadas que pretendiam se preparar

para o ensino superior. A reforma tentara direcionar o ensino secundário como um curso que

prepara para a vida, assim como para o curso de ensino superior.

Para Haidar e Tanuri (2004), o ensino secundário no Império e na República possuíam

características marcantes, tais quais: controlado e regulado pelo poder central acionado

principalmente pelo mecanismo de equiparação; competência para a oferta naqueles níveis e

modalidades que o poder central não legislasse; existência dos exames parcelados de

preparatórios para o ensino superior; estruturação do curso sem divisão em ciclos e com um

currículo comum com predominância dos estudos literários sobre os científicos. Por todos

estes aspectos, o curso secundário ainda se apresentava extremamente seletivo e que não

apresentava argumentos quanto a sua finalidade formativa.

A partir daí, várias discussões e avanços no ensino secundário brasileiro foram

realizadas e circulavam principalmente em torno da extinção dos exames parcelados, da

obrigatoriedade do bacharelado para admissão em cursos superiores e a equiparação com o

Colégio Pedro II, admitida como reconhecimento dos graus conferidos pelos liceus

provinciais que seguiam a estrutura e o plano pedagógico do Colégio da Corte. Outros

projetos reivindicavam auxílio no custeio das escolas pelo governo central e a concessão pelas

províncias de recursos financeiros para as escolas: expansão do curso normal; instituição do

ensino de 2º grau; o ensino técnico comercial, agrícola e industrial.

Para que se possam discutir as questões envolvidas com o ensino médio nas principais

reformas no campo educacional, é necessário reconhecer que, como nos diz Cury (1998), essa

modalidade de ensino é portador de três funções: clássica, propedêutica e profissionalizante.

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2.2 – Ensino médio e educação profissional

A configuração da educação profissional na Primeira República em relação aos cursos

de nível médio e elementar se apresentava ainda contaminada com a herança do período de

escravidão que distinguia, de forma dicotômica, o trabalho manual/intelectual e prejudicava o

incremento de ações para os cursos técnico-profissionais. O ensino agrícola foi criado

inicialmente em nível superior. Na década de 20, foram também criados cursos de

“aprendizados agrícolas” e os de nível médio. A pouca expansão desses cursos espelhava

talvez a realidade brasileira no setor agrícola na época, em virtude de que, em função do

estado de desenvolvimento em que se encontrava, a agricultura do país não requeria mão-de-

obra especializada.

Contudo, o ensino industrial foi favorecido pelo Decreto Federal nº 7.566 que instituiu

a criação nas capitais dos estados de escolas de nível profissional primário de aprendizes e

artífices subordinadas ao Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio que, além do ensino

profissional, proporcionavam também o ensino de primeiras letras.

O ensino comercial, em seu percurso na história da educação brasileira, teve uma

trajetória diferente dos outros cursos profissionais. Foi criado ainda na época do Império em

nível de pós-primário; era ofertado principalmente pela iniciativa privada e na República foi

regulamentado pelo poder público federal.

Haidar e Tanuri (2004), traçando um quadro da educação no período da República,

indicam que as questões de ordem pedagógica da administração pública, legais e econômico-

sociais, contribuíram para o funcionamento estanque das diversas modalidades de ensino. Não

havia articulações entre os ensinos primário, complementar, normal, os de formação de

técnicos e o secundário. As autoras apontam que essas modalidades se agregavam em dois

sistemas: um formado pelo ensino primário, normal e o técnico-profissional; o outro, formado

pelo ensino secundário e superior. Ressaltam que os dois sistemas eram voltados para o

atendimento a clientelas diferentes das camadas socioeconômicas da sociedade brasileira.

2.3 - Breve relato histórico do ensino médio no estado de Alagoas

A educação ofertada pela Companhia de Jesus, assim como nas outras regiões

brasileiras, foi também a pioneira no estado de Alagoas, mediante uma escola fundada no

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século XVII na atual cidade de Porto Real do Colégio, que fica às margens do rio São

Francisco. A educação alagoana também contou inicialmente com a presença dos religiosos

da ordem dos franciscanos menores que fundaram o convento de Santa Maria Madalena, em

Alagoas do Sul (hoje município de Marechal Deodoro) e Nossa Senhora dos Anjos em

Penedo (QUEIROZ, 2011).

No entanto o ensino público instituído oficialmente no estado em Alagoas aconteceu

muito após a saída dos jesuítas do cenário educacional brasileiro em 1799, com a nomeação

do professor José Vitorino da Rocha que ocupou a cadeira de Professor Régio de primeiras

letras da Vila Alagoas do Sul (QUEIROZ, 2011).

A implantação do ensino médio em Alagoas aconteceu em 1821, após a emancipação

política das terras pernambucanas em 1817, na cidade capital do estado na época – Alagoas

do Sul – onde o curso se constituía de aulas de filosofia e geometria. A primeira instituição

pública educativa instalada em Maceió foi o Lyceu Alagoano com a Lei 106, sancionada pelo

Presidente da Província, Antonio Nunes de Aguiar na data de 05 de maio de 1849

(QUEIROZ, 2011).

Outros dois segmentos do ensino secundário no estado de Alagoas também se fizeram

presentes. O ensino técnico instituído pela ação governamental no Colégio de Educando

Artífices “foi criado para ensinar as primeiras letras e as profissões de alfaiate, sapateiro e

músico às crianças pobres, teve curtíssima existência” (QUEIROZ, 2011, p. 181). A criação

do Colégio de Educandos Agrícolas, que tinha como objetivo a formação de jovens

educandos no campo, foi inaugurado na gestão do Presidente da Província Sá e Albuquerque.

No século XIX, com a proclamação da República, a situação da educação no estado de

Alagoas se apresentava

Dividida em primária, técnica e secundária, não estava na altura das

necessidades sociais e mal preenchia os seus fins. O ensino público secundário

era ministrado num Lyceu com as doze cadeiras seguintes: Filosofia, Retórica,

Geografia, História e Filosofia da História, Ciências Físicas e Naturais e

Fisiologia e Higiene, Geometria, Aritmética e Álgebra, Alemão, Português,

além das matérias que constituíam o curso normal em que se habilitavam os

candidatos ao magistério público. Havia mais duas cadeiras avulsas em

Penedo, sendo uma de latim e outra de língua francesa. O ensino primário

contava com 182 cadeiras. A instrução técnica era proporcionada em dois

estabelecimentos, o Lyceu de Artes e Ofícios e a Escola Central, destinada

exclusivamente ao ensino dos filhos dos ex-escravos (MORENO BRANDÃO,

2004, p. 205-206) apud Queiroz (2011, p. 183).

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Cavalcante (2006), citando Péricles (1982), aponta que a educação no estado de

Alagoas, após a proclamação da República, continuava apresentando-se deficiente, espelhada

em dados que apresentavam a população alagoana em 1900 com 649.273 habitantes, sendo

que destes apenas 129.563 eram analfabetos. Em 1920, dos 978.055 habitantes, 834.213 eram

analfabetos.

A autora também apresenta os dados desse mesmo autor que indicam o número de

escolas presentes no Estado nessa mesma década:

No ano de 1902, para uma população aproximada de 650.000 pessoas, havia

249 escolas onde estavam matriculados 4.020 alunos e 3.624 alunas. Em

1916, o Governador Batista Acioly emitia uma mensagem, sobre a realidade

do ensino no Estado onde afirmava que esta ‘reflete, infelizmente ainda os

efeitos de sua longa desorganização este importante ramo do serviço público.

Apesar dos louváveis esforços do governo passado em melhorar a instrução

pública no Estado, a sua situação é todavia precária’ (PÉRICLES, 1982, p.

279).

Na intenção de complementar o pensamento de Péricles, a autora apresenta os

argumentos de Vidinha & Silva (2002, p. 31-32) que, acerca das implicações decorrentes da

desorganização do processo educativo em Alagoas, nos diz:

Assim que a região alagoana atravessa mais de trezentos anos convivendo

com o analfabetismo, o mandonismo dos ditos donos da terra e com poucas

pessoas alfabetizadas, as quais viriam a ser os futuros donos da região,

herdando assim, junto com o poderio dos seus antecessores, também o

domínio do saber letrado. A educação naqueles tempos era uma espécie de

roda ou ciclo vicioso [...]

Pode-se dizer que o quadro atual da educação em Alagoas ainda se apresenta de forma

extremamente deficitário, visto que, nos dados apresentados pelo Ministério da Educação, o

estado possui, entre todos os federados, o pior Índice de Desenvolvimento da Educação

Básica - IDEB. (FAJARDO, 2012)

2.4 - As reformas educacionais e o Ensino Médio

Discutir as repercussões das reformas educacionais no ensino médio requer

compreender que historicamente o debate sobre esse nível de ensino por vezes esteve voltado

para as suas finalidades e objetivos, ora para uma formação humanista, ora científica, ou

mesmo destinada à preparação técnico-profissional.

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Rocha (2010) aponta, citando Fernando Azevedo, que a reafirmação dos fundamentos

que suportaram a educação brasileira entre o período do Império e da República, está

relacionada com a demora no reconhecimento da educação como um direito social. Para o

autor, esse reconhecimento insere o país no que ele denomina de modernidade educacional,

que aconteceu em outros países (inclusive da América Latina) a partir do surgimento de

preocupações educacionais contemporâneas, tais como o direito à educação, a inserção na

legislação de recursos públicos destinados ao financiamento da educação e a obrigatoriedade

de frequência à escola de crianças em idade escolarizável. Este último tópico foi, entre eles,

objeto de muitas discussões em função de que, até então, não havia precedentes na legislação

que davam conta dessa questão na organização da educação brasileira.

As mudanças, em face do processo de modernização da sociedade brasileira no

período final do Império, apontavam para um modelo econômico em que já se identificava a

presença da industrialização e da urbanização crescente. Alguns fatos ocorridos na época

como a abolição da escravatura, a intensificação da imigração estrangeira e da colonização de

terras, a instituição do trabalho assalariado, a destinação de recursos para financiamento de

lavouras, o casamento civil e a liberdade de credo são entre outros, fatos que retificavam o

pensamento moderno fundamentado nos princípios do liberalismo e do positivismo. Esses

também influenciaram diversos intelectuais brasileiros que os utilizaram para embasar as

reformas no setor educacional, ilustrados principalmente pela compreensão da liberdade de

ensino e da educação, mola propulsora para o desenvolvimento do país. Essa sociedade era a

que vislumbrara Leôncio de Carvalho e, portanto, a educação se destinava à formação e para a

vida (ROCHA, 2010).

Assim, a reforma empreendida por Carlos Leôncio de Carvalho, por meio do Decreto

de número 7.247 de 19 de abril de 1879, propôs a reformulação do ensino público nos níveis

primário e secundário no Município da Corte, além da proposta de reformulação do ensino

superior aplicado a todo o Império (ROCHA, 2010).

As modificações que incidiram diretamente no ensino médio se deram em seu

currículo, no sentido de que ele foi admitido como continuação das disciplinas do ensino

primário e incluiria os estudos de: Princípios elementares de álgebra e geometria; Noções de

física, química e história natural; Noções gerais dos deveres do homem e do cidadão; Noções

de lavoura e horticultura; Noções de economia social (para os alunos); Noções de economia

doméstica (para as alunas); Prática manual de ofícios (para os alunos) e Trabalhos de agulhas

(para as alunas) (CARVALHO, 1942, apud MELO & MACHADO, 2009).

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Para referendar as ideias republicanas para a educação, foi criada pelo decreto em

1890 - com estatuto de Ministério - a “Secretaria de Estado dos Negócios da Instrucção

Pública, Correios e Telegraphos”, ocupada inicialmente pelo então Marechal Benjamin

Botelho de Magalhães Constant que promoveu uma reforma no ensino primário e secundário

do Distrito Federal e na instrução superior, artística e técnica em todo o território brasileiro.

As premissas que orientavam essa reforma se encontravam principalmente na defesa da

laicidade, na liberdade de ensino, na gratuidade do ensino primário, além de que estabelecia

que a ciência seria o fundamento da organização curricular e do ensino (RIBEIRO, 1989).

A primeira reforma da era republicana estabelecia a escola primária organizada em

dois ciclos; a escola secundária com duração de sete anos e o ensino superior reestruturado em

cursos: politécnico, direito, medicina e o militar. Foi ainda sob essa reforma que se deu a

criação, por decreto, do Conselho de Instrução Superior que tinha, dentre as suas

competências, aprovar programas de ensino das escolas federais e das que lhe fossem

equiparadas; propor a inspeção de estabelecimentos federais de educação e das faculdades

livres, entre outras regras para o ensino superior.

A reforma Benjamin Constant propôs que o ensino secundário fosse constituído da

forma como já estava sendo ofertado com o estudo de latim e do grego, mas que também

fossem adicionados conteúdos das ciências fundamentais em um curso que totalizaria sete

anos em uma “ordem lógica de sua classificação estabelecida por Augusto Comte, um dos

mentores da filosofia positivista” (PALMA FILHO, 2012, p. 3).

O plano curricular desenvolvido na reforma de Constant incluía de forma

pormenorizada, no período de sete anos, o ensino de: aritmética, geometria preliminar,

geometria geral, mecânica geral, física geral e química geral, biologia, sociologia e moral,

noções de direito pátrio e de economia política. Ainda ofertados de forma paralela os estudos

de português, inglês, alemão, latim, francês, geografia, zoologia, botânica, meteorologia,

minerologia, geologia, história natural, história do Brasil e literatura nacional. A proposta não

foi executada “uma vez que o seu elevado intelectualismo e sua grandiosidade excediam a

capacidade de aprendizagem dos adolescentes” (PALMA FILHO, 2012, p. 3).

Esse mesmo autor acrescenta ainda que os

estudos propostos por B. Constant, além das razões expostas, não foi levado

a sério, pela falta de interesse que despertou nos alunos, por contrariar a

concepção preparatória do ensino secundário, além do que era totalmente

inexequível (2012, p. 3).

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Azanha (2010, p. 71) reafirma tal posição quando nos diz que “o positivismo de

Benjamin Constant, embora radical nas reformulações propostas, teve pouca duração em seus

efeitos”.

Outro momento na história do ensino republicano brasileiro aconteceu no governo de

Campos Sales (1809–1902). A reforma implementada em 1901 pelo então Ministro do

Interior (Justiça e Educação) Epitácio Pessoa implementou modificações curriculares no

sentido de que admitia que o curso secundário seria um mero preparatório para o ingresso no

ensino superior e o reduziu a seis anos de duração. Citando Bastos Silva, Palha Filho (2012)

acentua que essa reforma marca a presença de forma efetiva do governo federal, porque

estabelece o Colégio Pedro II como referência para uniformização do ensino secundário na

esfera pública e particular. Pretendia também dar a esse nível do ensino um caráter próprio e

não apenas um curso que servisse como preparatório para o ensino superior.

A reforma Rivadávia Corrêa, instituída em 1911, se constituiu um outro momento da

educação brasileira pois, por meio do decreto conhecido como a “Lei Orgânica do Ensino

Superior e Fundamental”, propôs em nome da liberdade de ensino a desoficialização do

ensino brasileiro, fruto da influência positivista e da presença de ideias do liberalismo que já

se fazia presente na história da educação brasileira desde a reforma de Leôncio de Carvalho,

em 1879, e que se juntaram nesse momento para rivalizar com o ensino de tradição religiosa

católica.

A reforma sustentava o argumento de que era necessário possibilitar à iniciativa de

ensino particular o direito de ensinar. Citando Cunha, Palma Filho (2012) nos diz que a

implantação de tal reforma nasceu ao sabor das críticas recorrentes à qualidade do ensino

secundário. Destacam-se como pontos principais da reforma: a frequência não obrigatória; a

abolição dos diplomas e a criação de exames de admissão para o ensino superior. Os

resultados decorrentes da implantação dessa reforma motivaram a criação de cursos sem

qualidade, entre outras e, para sustar essas medidas, foi então revogada e, em 1915, Carlos

Maximiliano apresentou novas propostas para o ensino brasileiro.

Carlos Maximiliano se preocupou efetivamente com a função do ensino secundário

preparatório para o ensino superior, perspectiva difundida amplamente na época. Maximiliano

manteve das reformas anteriores alguns itens como o exame de admissão para o ensino

superior; o ensino seriado e a redução do currículo; fundamentou, a partir das ideias da

reforma de Benjamin Constant, a não equiparação aos estabelecimentos estaduais e os exames

preparatórios. É nessa reforma que nasce a Universidade do Rio de Janeiro, a primeira do

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Brasil e que congregou a união em uma única instituição da Escola Politécnica, a Faculdade

de Medicina e a escola livre de Direito.

O ciclo de reformas na Primeira República se estende com as medidas adotadas pelos

ministros João Luiz Alves e Rocha Vaz que propõem, de modo definitivo, a implantação do

ensino secundário seriado, como um curso regular com proposta de preparar para a vida

(PALMA FILHO, 2012).

Ribeiro (1989) acredita que a série de reformas implantada não teve sucesso e

retrataram, de forma clara, ao que denominou de mecanismo de transplante cultural que

provocou a

falta de capacidade criativa e atraso constante e cada vez mais profundo em

relação ao centro criador que serve de modelo. Representa, ainda, (...) um

idealismo estreito e inoperante ao formar um pessoal sem a instrumentação

teórica adequada à transformação da realidade em benefício de interesses da

população como um todo e não de interesses de uma pequena parte dela e de

grupos estrangeiros, em detrimento da maioria (p. 74).

A autora defende ainda que as sobreposições seguidas de reformas aconteciam para

solucionar deficiências das reforma anteriores. No cotidiano escolar, professores e alunos se

valiam da improvisação e, dessa forma, tanto as teorias importadas (por serem distantes da

realidade) quanto o senso comum não davam a clareza necessária das razões da forma de agir

na educação naquela época.

Como visto no capítulo anterior, a era Vargas se constituiu em momentos definidores

para a história brasileira, porque foi nestes períodos de governo, a partir da década de 30, que

foi implantado o regime ditatorial, fato que ainda hoje repercute na sociedade brasileira.

Para Silva (2010), as demandas oriundas do período após a Segunda Guerra Mundial

estão relacionadas com o desenvolvimento industrial e a oferta de profissionais para

ocuparem os postos surgidos a partir do desenvolvimento da indústria nacional. Esse fato

desencadeia a necessidade de implantação de políticas na área de educação com vistas à oferta

de um ensino direcionado para a formação de mão de obra que atendesse às características

modernizadoras difundidas no país.

A Carta Constitucional de 1937, a segunda da era Vargas, em muito modificou os itens

apresentados no texto Constitucional de 1934: transfere aos pais a responsabilidade da

educação; o Estado assume o papel de agente subsidiário e colaborador em relação à educação

pública; isenta-se ainda de cuidar da manutenção e expansão e não apresenta nenhum item

que trata da dotação orçamentária para o ensino público do país.

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Outra característica presente no Estado Novo (1937 e 1945) foi o estabelecimento de

decretos-lei para fazer vigorar as leis orgânicas do ensino.

No total, seis decretos-lei compuseram a Reforma Capanema que estava destinada a

definir as regras para o ensino em suas várias modalidades e níveis. O ensino foi concebido de

tal forma que se voltou para atender principalmente às necessidades do desenvolvimento

industrial e do processo de urbanização crescente. O claro direcionamento das ideias

governamentais para formação de mão de obra para o mercado de trabalho oficializou o

dualismo educacional – a concepção do ensino secundário público destinado às elites e outro,

profissionalizante destinado à classe trabalhadora.

O ensino primário, definido em suas normas por meio do Decreto-lei nº 8.529 de janeiro

de 1946, estabelecia que o seu percurso se definiria em quatro anos com acréscimo de mais

um preparatório para o curso ginasial. A organização da rede se apresentava de acordo com o

número de turmas: escolas isoladas – aquelas compostas por apenas uma turma; escolas

reunidas – que possuíam até quatro turmas; grupo escolar – com mais de cinco turmas; e a

escola supletiva.

O ensino secundário também estabelecido por decreto da Lei Orgânica destinava-se,

nas palavras do então ministro da Educação e Saúde Pública Gustavo Capanema, à:

preparação das individualidades condutoras, isto é, dos homens que deverão

assumir as responsabilidades maiores dentro da sociedade e da nação, dos

homens portadores das concepções e atitudes espirituais que é preciso

infundir nas massas, que é preciso tornar habituais entre o povo

(GHIRALDELLI JR, 1990, p. 86).

Dessa forma, o curso secundário destinado às elites era composto por dois ciclos: o

ginásio (em quatro anos), o colégio (em três anos) com opções voltadas para o clássico e o

científico e a opção por qualquer curso superior posteriormente.

Por força de Lei Orgânica, assim também foram criados os cursos

profissionalizantes que se apresentavam em quatro modalidades (com duração de sete anos): o

ensino normal e a posterior conclusão em Faculdades de Filosofia; o curso industrial que

poderia se direcionar, no ensino superior, aos cursos da área técnica; o curso ensino comercial

e o curso agrícola.

Para atender aos interesses da industrialização, foi criado um sistema de ensino

profissionalizante em conjunto com a Federação Nacional das Indústrias e a Confederação

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Nacional do Comércio composto pelo Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI)

e o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC).

2.5 – O Ensino Médio e as Leis de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira

2.5.1 – LDB nº 4.024/1961

Sob os princípios da Constituição de 1946, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação

Nacional tramitou em forma de projeto durante treze anos oriundo ainda da gestão ministerial

de Gustavo Capanema no Estado Novo. Em seu texto, cabia então à União fixar as diretrizes e

bases da educação nacional e, com tal intento, foi instituída pelo ministro da Educação e

Saúde do Governo Dutra, Clemente Mariani, uma comissão de educadores encarregados de

formular o projeto da LDB.

O projeto original foi extraviado no Senado Federal em 1951 e a Comissão de

Educação e Cultura se organizou para reconstituir o documento. Outro fato que merece

atenção em relação ao processo do projeto da LDB em seu percurso diz respeito ao

substitutivo apresentado pelo deputado Carlos Lacerda em que adere as teses defendidas pelos

participantes do III Congresso Nacional de Estabelecimentos Particulares de Ensino, realizado

em 1948, e que levantou a discussão em defesa da escola pública.

O projeto da nova LDB, aprovado pelo Senado em 1961 e sancionado no dia 20 de

dezembro pelo presidente João Goulart, procurou conciliar a questão do debate

público/privado, assim como estabeleceu a igualdade no tratamento por parte do Poder

Público para com as escolas de ensino público e particulares e consequentemente a destinação

de verbas públicas direcionadas para a iniciativa particular de ensino.

Silva (2010) aponta a Lei 4.024/1961 como a maior de todas as leis, pois atribui para

as instâncias federal, estadual e municipal maior autonomia para atuarem em relação à

flexibilidade do currículo e dos métodos pedagógicos. Confirmam esse pensamento as

palavras de Haidar & Tanuri (2004, p. 65), quando nos dizem:

[...] dá-se um importante passo no sentido da unificação do sistema de ensino

e da eliminação do dualismo administrativo herdado do Império. Inicia-se,

pela primeira vez, uma relativa descentralização do sistema como um todo,

concedendo-se considerável margem de autonomia aos estados e

proporcionando-lhes as linhas gerais a serem seguidas na organização de

seus sistemas, linhas estas que deveriam responder por uma certa unidade

entre eles.

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Para o ensino secundário, a Lei permitiu aos estados a organização com liberdade em

termos administrativo, disciplinar e pedagógico. Fez a junção entre o ensino secundário e o

profissional em uma denominação comum de Ensino Médio, destinado à formação do

adolescente. Realizou-se a articulação entre os cursos de “ginásio” e “colégio” para designar o

primeiro e segundo ciclos de todos os ramos; consideraram-se equivalentes todos os cursos

médios como forma de permitir a continuação aos estudos visando à admissão no ensino

superior. Em relação à organização curricular, foi estabelecido um núcleo comum de matérias

obrigatórias, indicadas pelo Conselho Federal de Educação para todas as modalidades de

ensino médio, destinadas as duas primeiras séries do primeiro ciclo (HAIDAR & TANURI,

2004).

O exame de admissão foi utilizado como instrumento de seleção para aqueles que

pretendiam ingressar na primeira série do primeiro ciclo. Esse item posto na legislação se

impunha como um divisor entre a escola primária e secundária, tornando-a seletiva (SILVA,

2006).

Para o docência no ensino médio, a Lei estabelecia que a formação deveria ser

realizada em cursos superiores de Filosofia, Ciências e Letras, assim como para as disciplinas

específicas as quais deveriam ser realizadas em cursos técnicos voltados para a educação

técnica (SILVA, 2006).

De forma geral, a Lei 4024/1961 estava voltada para

o aprimoramento técnico e o incremento da eficiência. Priorizava a

maximização dos resultados e tinha como decorrência a adoção de um

ideário que se configurava na ênfase do aspecto quantitativo, dos meios e

técnicas educacionais, da formação profissional e da adaptação do ensino as

demandas da produção industrial (SILVA, 2006, p. 48).

2.5.2 – LDB nº 5.692/1971

A legislação educacional vigorou no período militar, expressa principalmente pela Lei

5.540/1968 que estabelece as reformas para o ensino superior, pela Lei 5.692/1971, que

discorre sobre as Diretrizes e Bases da Educação. Esta última incidiu principalmente no

primário e ensino médio e demonstra os objetivos e a finalidade da educação para o Regime.

Como bem aponta Ghiraldelli Jr (1992, p. 169), o ensino superior deveria atender aos

objetivos do mercado, enquanto que o ensino médio deveria atender às classes populares e o

ensino superior às elites.

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A Lei 5692/1971 voltou-se inteiramente à formação para o trabalho, mediante

profissionalização obrigatória para todos os estudantes, sendo eles de escolas públicas ou

particulares. Permitiu o acesso ao curso de Pedagogia de estudantes de qualquer modalidade

de ensino médio e não apenas os da escola normal. Estabeleceu a estrutura composta de oito

anos para o 1º Grau e para o 2º Grau, três anos.

A obrigatoriedade da profissionalização não era consenso na época e, como tal,

surgiram movimentos de contestação, resultando na instituição da Lei nº 7.044/1982 que

modificou a finalidade do ensino, impondo-lhe a conotação de que esse nível de ensino se

destinava à preparação para o trabalho (SILVA, 2006).

2.5.3 – LDB nº 9.394/1996

Sob uma conjuntura diferente, principalmente do ponto de vista político e econômico,

foi elaborada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional 9.394/1996 (LDB) que vigora

até os dias atuais. Nasce após vinte e um anos do regime militar, impregnada pelo clima da

transição democrática, vislumbrado após a eleição do primeiro presidente civil, acontecido em

1989 (MAZZANTE, 2004).

A organização da educação escolar na Lei 9.394/1996 é apresentada em níveis (dois):

ensino básico, constituído de três etapas (educação infantil, ensino fundamental e ensino

médio); e a educação superior. Além desses, são contempladas outras modalidades: educação

de jovens e adultos, educação profissional e educação especial.

Para Silva (2006), o ensino médio, nessa nova Lei, nasce sem o compromisso de

atender as expectativas de um curso voltado para a profissionalização ou meramente para o

ensino superior e assume as suas próprias finalidades. Dentre estas, deve atender à proposta

de ser a etapa final da educação básica, além de servir para:

I – a consolidação e o aprofundamento dos conhecimentos adquiridos e no

ensino fundamental, possibilitando o prosseguimento de estudos;

II – a preparação básica para o trabalho e a cidadania do educando, para

continuar aprendendo, de modo a ser capaz de se adaptar com flexibilidade a

novas condições de ocupação ou aperfeiçoamento posteriores;

III – o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a

formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento

crítico;

IV – a compreensão dos fundamentos científico-tecnológicos dos processos

produtivos, relacionado a teoria com a prática no ensino de cada disciplina

(LDB, 2004, p. 263).

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Dois outros itens são assegurados na nova Lei: um deles está voltado à formação para

a docência no ensino básico, disposto na Lei, no título que discorre sobre os profissionais da

educação e assim os apresenta como aqueles que, estando em efetivo exercício e tendo sido

formados em cursos reconhecidos, são:

I – professores habilitados em nível médio ou superior para a docência na

educação infantil e nos ensinos fundamental e médio;

II – trabalhadores em educação portadores de diploma de pedagogia, com

habilitação em administração, planejamento, supervisão, inspeção e

orientação educacional, bem como com títulos de mestrado ou doutorado nas

mesmas áreas;

III – trabalhadores em educação, portadores de diploma de curso técnico ou

superior em área pedagógica ou afim (LDB, 2004, p. 263).

E o outro são as diretrizes que orientam o currículo na Lei 9.394/1996. Estas estão

voltadas para o trabalho com grandes áreas temáticas propostas nos Parâmetros Curriculares

Nacionais (PCN’s) que propõem a organização dos conteúdos para o ensino básico em todo o

território brasileiro. São instituídos processos de avaliação de competência da esfera do

governo federal e que podem acontecer também nos estados.

2.6 - Ensino Médio no Brasil e o debate sobre o dualismo

Há muito, as discussões sobre o ensino médio no Brasil vêm sendo centradas na

questão de sua finalidade como um segmento educacional. Cury (1998), quando aponta a

nova LDB 9.394/1996, nos diz que o ensino médio possui um potencial formativo porque se

propõe a ser um aprofundamento e complemento para o ensino fundamental e, como tal,

objetiva a efetiva socialização, o que lhe dá condições de ter clareza acerca da cidadania.

Silva (2004a, p. 179), analisando as relações entre educação escolar e trabalho no

Brasil, e acerca da sua finalidade para a sociedade, expõe que

O antigo 2º grau, hoje denominado ensino médio, na Lei nº 9.394, de 20 de

dezembro de 1996, é sem dúvida um dos graus de ensino que mais padecem

de clara definição, entre os estudiosos da educação, no que se refere à sua

finalidade específica.

Nessa mesma Lei, na descrição das finalidades da educação básica, o ensino médio

deve contribuir para desenvolver o educando e assegurar-lhe uma formação que lhe garanta o

exercício da cidadania e que lhe sirva para a progressão no trabalho e em estudos posteriores.

Atender a contento a essas demandas legais requer compreender qual o papel social desse

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nível de ensino e as implicações que podem influenciar a prática docente a partir da

concepção que ele tem do ensino médio.

Assim como Cury (1998), Silva (2004a) debate as finalidades dos três níveis de ensino

e esclarece que o status do ensino fundamental é bem definido para os alunos. Os conteúdos

curriculares são estabelecidos de forma objetiva e, por assim dizer, não se pode duvidar do

caráter formativo do ensino fundamental. A percepção das finalidades do ensino superior

também é clara e está ligada à qualificação profissional, apesar de que o compreende restrito

em relação ao seu acesso em função da seletividade no processo de ingresso.

Quanto ao ensino médio, compreende-o como portador de três funções clássicas:

formativa, propedêutica e profissionalizante.

Para esse autor, questões típicas como as especificidades da idade em que se

encontram os estudantes, as perspectivas de mercado de trabalho e a proximidade da

maioridade civil disfarçam relações sociais que acentuam a dualidade e o caráter elitista do

ensino médio, justificado em discursos que o classificam como ligados às funções formativa,

propedêutica e profissionalizante.

Cury (1998), retrocedendo à história brasileira, identifica, desde o período da Colônia

e do Império, uma total desvalorização do trabalho produtivo, fruto de uma sociedade

hierarquizada e que não reconhecia os direitos civis. Nessa época,

Construíram-se sob o signo de uma empreitada religiosa contra-reformista,

baseada na fala, reforçando a desconsideração de uma organização escolar

básica (deslocada, na verdade, para o âmbito doméstico) e de iniciativas

abrangentes relativas ao ensino primário. O ensino primário reconhecido

como tarefa dos ‘poderes gerais’ e gratuito para os cidadãos sofria dos

severos limites impostos pela extensão territorial, pela demografia, pelo

desinteresse das elites e pela escravatura (1998, p. 76).

Cury (1998) aponta que não havia uma preocupação pelo ensino público em virtude de

que, na época da Colônia e do Império, o processo de escravização gerou historicamente uma

relação de desigualdade entre os envolvidos no processo produtivo em que se reconhecem

aqueles detentores de privilégios e os escravos, foreiros e mulheres que eram alijados de seus

direitos civis. Deduz que, desta forma, só ocupariam as vagas do ensino secundário aqueles

que estavam além desse estrato social, os privilegiados.

Para ratificar a ideia do ensino secundário propedêutico, o autor aponta que a falta de

oferta do ensino primário, a criação do Colégio Pedro II, oferecendo o ensino clássico, não

admitia outra clientela, produzia a seleção daqueles que deveriam se ocupar futuramente

como bacharéis e médicos. Quando as províncias começaram a ofertar, o ensino secundário,

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este servia como preparatório para a ocupação de cargos burocráticos, para os cursos de

humanidades e de medicina. Dessa forma,

Esse segmento do ensino secundário, voltado para a propedêutica de elites

cuja extração se dá nos estratos superiores de uma sociedade agrária e

hierarquizada, incontestavelmente deixou sequelas (talvez mais do que isso)

até hoje. A função propedêutica, dentro desse modelo, tem um nítido sentido

elitista e de privilégio, com destino social explícito (CURY, 1998, p. 76).

A correlação entre o ensino propedêutico no nível secundário e a formação da elite é

uma ideia que se formalizou na Constituição de 1937, na Reforma de Gustavo Capanema.

Mas, há também argumentos que confirmam à dualidade quanto a finalidade desse segmento

educacional quando, no decreto 7.566/1909, foram criadas as escolas de Aprendizes Artífices

nas unidades federativas para atender às classes operárias (CURY, 1998).

Informa-nos Cury (1998) que após a Primeira Guerra, o Brasil necessitou realizar

mudanças e implementar o seu modo de produção, substituindo as importações. O reflexo

desse dualismo social se transpôs ao espaço escolar, quando o país ofertou duas “redes”, uma

propedêutica e outra de ofícios e artes – a primeira para os segmentos privilegiados e a

segunda para os “os filhos dos outros”.

Em análise à Lei 9.394/1996, o autor levanta algumas considerações que incidem

diretamente sobre o significado social do ensino médio e a realidade brasileira. Considera

inicialmente que o clima democrático em que fez surgir a Constituição Federal de 1988,

reafirmou a relação entre educação e a afirmação dos direitos. Considera ainda que as

transformações de ordem econômica por que vem passando o mundo atualmente resvalam nas

questões sociais, políticas, jurídicas e culturais e, a partir daí, lembra que são questões

históricas as quais sustentam o dualismo, o elitismo e a seletividade e devemos considerar as

funções do ensino médio como fazendo parte de uma relação dialética. A reestruturação

capitalista pela qual também passa o Brasil produz impactos quando passamos a ver o passado

em relação ao ensino médio também.

A globalização da economia e o papel do Estado na elaboração de políticas públicas; o

desenvolvimento tecnológico como suporte para a economia internacional e as modificações

no processo de produção, fundamentado agora em um modelo de trabalho intelectual e o

conhecimento como um elemento estratégico são questões presentes quando se pensa a

compreensão da função social do ensino médio, conforme aponta o autor.

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Fala-nos, ainda, que a globalização da economia e suas respectivas consequências para

o processo de produção; a forma como o Estado desempenha seu papel na formulação de

políticas públicas na economia globalizada; e as modificações produzidas na dinâmica social

a partir do desenvolvimento de processos produtivos mais complexos têm influenciado

diretamente os sistemas educacionais.

Para Cury (1998, p. 81)

(...) tomando a máxima medieval de que ‘tudo o que é recebido é recebido

segundo a forma do recipiente’, logicamente, as exigências que os novos

processos pedem do sistema escolar trouxeram à tona as estruturas

anacrônicas e perversas inerentes à nossa formação social. E, ao lado das

exigências da superação do arcaico, há que se enfrentar e dar respostas às

novas situações. Temos que responder a esses dois desafios e, dadas as

novas circunstâncias, é preciso reinventar caminhos novos ao lado da

otimização das vias convencionais.

A partir dessa relação dialética, é possível compreender que historicamente o ensino

médio, participante do jogo de forças sociais de uma sociedade que se mostra densamente

estratificada, é fruto dos contextos e períodos pelos quais se dão a organização do trabalho

(CURY, 1998).

Sobre a questão do dualismo presente no ensino médio, Silva (2004a) discorre que este

é classificado por estudiosos da educação como um fenômeno em que convivem as “escolas

para os pobres e as escolas para os ricos”, ou, de uma forma mais concisa, “escolas para os

pobres e escolas para nossos filhos”. Respectivamente, uma prepara para a atividade

profissional específica, enquanto a outra serve como preparatória para o nível superior.

Esse mesmo autor levanta a questão de que, de acordo com a Lei de Diretrizes e

Bases, a função do ensino médio está direcionada para a formação do cidadão, do profissional

e para a preparação para o ensino superior. Discorre que o debate atual gira em torno da

ênfase da preponderância de uma em detrimento das outras e que não há consenso sobre o real

significado do que seria formar o cidadão.

Silva (2004a) levanta alguns pontos quando se propõe a questionar o ensino médio

como um segmento da organização escolar voltada para a preparação do trabalho: dizem

respeito a se a formação deve atender aos reclamos do mercado de trabalho ou deve se voltar

para o mundo do trabalho. Respectivamente, um está voltado exclusivamente para a formação

de mão-de-obra para o processo produtivo, enquanto o outro se volta para a convivência em

cooperação e útil na sociedade.

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Lembra ainda que a forma de produção na atualidade não recomenda a formação para

a ocupação de postos de trabalhos, mas que seja voltada para as áreas de atividades,

ocasionando maiores possibilidades de adaptação às constantes mudanças do processo

produtivo, lócus de constantes mudanças. Para o autor, é necessário discutir o significado do

trabalho para a sociedade e para a escola quando se deseja discutir a identidade do ensino

médio (SILVA, 2004a).

Face às desigualdades sociais presentes em nosso país o ensino médio ainda não é uma

realidade para a grande parte dos jovens; entretanto, a escola deve apresentar uma proposta

que ultrapasse a dicotomia entre a formação e a profissionalização. Para isso, é necessário que

se comprometa em oferecer uma educação que integre “a educação do homem e do cidadão

contemple a preparação para a vida em sociedade, que implica se preparar para o trabalho”

(SILVA, 2004a, p. 181).

Brandão (2011) debate a questão das finalidades do ensino médio, quando se propõe

analisá-lo sob os princípios do Plano Nacional de Educação 2001/2011. A Emenda

Constitucional nº 59/2009 substitui o artigo 208 da Constituição de 1988 e amplia a

obrigatoriedade da oferta da educação básica para todos aqueles com idade entre 4 e 17 anos,

incluso também para aqueles que não tiveram acesso a ela na idade própria. Para o autor, o

ensino médio se propõe a preparar para duas finalidades: para estudos posteriores e para o

mundo do trabalho (Brandão, 2011). Utiliza as palavras de Kuezen (1997) para afirmar que

essa dupla função estampa a questão pedagógica, mas acima de tudo uma questão política

diretamente ligada aos meios de produção e sua partilha na sociedade vigente e as relações

que se estabelecem entre sociedade e educação.

A reforma que sofreu o ensino médio no período do governo de Fernando Henrique

Cardoso (1995 – 2002) definiu, de forma clara, a separação (no aspecto estrutural) entre

ensino médio (de caráter eminentemente propedêutico) e educação profissional (de caráter

profissionalizante). No aspecto curricular, a mudança trouxe a ideia do desenvolvimento de

modelos de competências incutidas nas diretrizes curriculares e centralização das atividades

nos “métodos ativos”. O autor defende ainda que essa reforma tinha como pretensão

impulsionar o ensino profissional, deixando-o mais curto e de fácil conclusão. Acerca da

reforma, Frigotto (2005)

considera que, para voltarmos a ter um ensino médio entendido como parte

fundamental da educação básica e articulado com o mundo do trabalho, da

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ciência e da cultura, precisamos, inicialmente, desconstruir ‘o entulho

ideológico imposto pelas classes dominantes da teoria do capital, da

pedagogia das competências, da empregabilidade, do empreendedorismo e

da ideia que cursinhos cursos profissionalizantes, sem uma educação básica

de qualidade, os introduzem rápido ao emprego’ (p. 77).

Com o Decreto nº 5.154/2004, na gestão do então presidente Lula (2003 – 2010),

ressurgiu a possibilidade de reintegração do ensino médio e ensino profissional: “trouxe a

abertura e o estímulo à formação integrada, mas não trouxe a garantia de sua implementação”

(CIAVATTA, 2005, p. 102, apud BRANDÃO, 2011), sem, no entanto, incorporar os

princípios da integração (RAMOS, 2005, apud BRANDÃO, 2011).

O resultado da análise de que a universalização do ensino médio não se constitui em

uma tarefa fácil em virtude de que os dados mostram que apesar de ter havido aumento do

número de concluintes do nível fundamental, houve também diminuição no número de

matrículas para o nível médio e aumento no número de matrículas no Ensino de Jovens e

Adultos, o que indica a busca por oportunidade de ensino que garanta a formação em um

espaço de tempo curto sem questionar a qualidade deste. Ressalta que a pouca ocorrência de

matrículas no ensino médio pode estar vinculada ao crescimento das taxas de repetência e

evasão do ensino fundamental que trazem à tona questões ligadas à implementação de

políticas públicas e à submissão às ideias dos acumuladores de capital. Há também que se

considerar que contribuem também para o quadro as exigências de um nível crescente de

escolaridade para ocupação das vagas no mercado de trabalho.

Do ponto de vista pedagógico, Brandão (2011) elenca três questões: a primeira que

está voltada para a concepção de currículo para o ensino médio modificada principalmente

porque toma como base a elaboração pelo Ministério da Educação das Diretrizes Curriculares

Nacionais/Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio; a segunda que

compreende o desempenho dos estudantes nos exames nacionais de avaliação (SAEB, ENEM

etc) os quais, em seus resultados, apontam a vulnerabilidade do processo escolar e as

consequentes responsabilidades governamentais para o ensino médio pós-reforma; e,

finalmente a distorção entre idade/série no ensino médio que pode estar ligada à:

a uma organização didático-pedagógica que não contempla mais os anseios

dos jovens, especialmente daqueles que, nessa idade, já são trabalhadores.

Para Aguiar (2010, p. 720), este índice reflete, de maneira indireta, a

‘histórica falta de identidade do ensino médio’ brasileiro. Já para Kuenzer

(2010), esses dados também são reflexos

do discurso da democratização do acesso ao ensino médio para os jovens

trabalhadores. Porém, quando a educação geral – no caso, o ensino médio

propedêutico –, que antes era ofertada exclusivamente para as classes

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dominantes, passou a ser ‘disponibilizada aos trabalhadores, banalizou-se e

desqualificou-se’ (Kuenzer, 1997, p. 863 e 865) apud Brandão (2011, p. 8).

Assim como Cury, Brandão (2011) também acredita que as políticas públicas (e não

apenas políticas de governo) devem incentivar iniciativas que efetivamente despertem o

interesse dos jovens para o ensino médio, garantam o acesso, a permanência e a sua

conclusão. Defende então que a escola, ao ser socialmente inclusiva atende às expectativas

direcionadas tanto para o trabalho ou para os estudos posteriores.

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3 O SENTIDO ATRIBUÍDO PELOS PROFESSORES AO

TRABALHO DOCENTE

3.1 - O processo de pesquisa

Este capítulo tem como objetivo apresentar os resultados da pesquisa realizada junto à

escola pertencente à rede estadual de educação de Alagoas, por meio da qual se procurou

entender qual a percepção que os professores do ensino médio têm sobre o exercício da

docência nessa etapa da educação básica. Como anunciado inicialmente, entender essa

questão emergiu como uma necessidade pessoal e social na medida em que esse entendimento

pode melhorar a minha formação pessoal e também produzir conhecimento útil ao campo da

educação, particularmente à formação de professores.

Para realização do trabalho, adotou-se a abordagem qualitativa, por considerá-la a

mais adequada ao objeto de estudo e aos objetivos da pesquisa. Para Martins (2004) trabalhar

com as metodologias qualitativas requer admitir que elas estão voltadas para estudos que

privilegiam a análise de microprocessos que envolvem as pesquisas sobre ações sociais,

individuais e grupais.

Para Guimarães; Martins; Guimarães (2004, p. 79), a investigação qualitativa “postula

a existência de um vínculo dinâmico e indissociável entre o mundo objetivo e a subjetividade

do sujeito”. Esses sujeitos, para Chizzotti (2010), são pessoas que elaboram conhecimentos e

práticas necessárias para os problemas que identificam. Nesse sentido, Triviños (1987, p. 117)

distingue duas linhas de pesquisa como alternativa metodológica nas pesquisas qualitativas:

os enfoques subjetivistas e os críticos-participativos com visão histórico-estrutural. Optou-se

por esta última, pois busca-se compreender a “dialética da realidade social que parte da

necessidade de conhecer (através de percepções, reflexão e intuição) a realidade para

transformá-la em processos contextuais e dinâmicos complexos [...]”

Turato (2005) nos informa que a metodologia qualitativa tem como preocupação não

apenas estudar puramente o fenômeno, mas buscar a compreensão de seu significado

individual e coletivo para a vida das pessoas. Para ele, o termo significado tem função

estruturante, ou seja, tem relação direta com o significado das coisas para as pessoas e em

função desse, como organizam a sua vida. Citando Bogdan & Biklen, aponta que o

investigador qualitativo busca compreender o processo como as pessoas constroem e

descrevem o significado das coisas.

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Martins (2004) apresenta a heterodoxia na fase de análise de dados como uma das

características da metodologia qualitativa. Aponta que, nessa fase, é importante para o

pesquisador conseguir integrar e analisar o material recolhido, capacidades que depende de

seu poder criador e da intuição. Acerca dessa capacidade intuitiva, Turato (2005, p. 510),

citando Morse & Field, afirma que o raciocínio indutivo diz respeito à dedicação do

pesquisador aos dados de campo, considerando “as individualidades a fundo e colecionando

informações que, paulatinamente, desembocariam na construção de uma teoria densa e

plausível”.

Neves (1996) remete às palavras de Godoy (1995a) e nos diz que os estudos

qualitativos apresentam basicamente quatro características: o pesquisador constitui um dos

instrumentos para apreensão dos dados no ambiente em que ocorre o evento a ser pesquisado;

os estudos são essencialmente descritivos; o pesquisador está preocupado com o significado

que os sujeitos dão às questões pesquisadas e, a análise dos dados ocorre por meio da indução.

Acerca dessas características apontadas por Neves, André (1983, apud ALVES &

SILVA, 1992) entende que as pesquisas qualitativas se voltam para a apreensão das várias

dimensões dos fenômenos e para a compreensão da experiência dos indivíduos sem

desassociar de seu contexto.

Invocando Gomes (1990), Alves & Silva (1992) salientam que, mesmo que o

pesquisador não delimitando com antecedência os passos metodológicos, ele não deve se

guiar apenas pela sua intuição. O sujeito de seu estudo deve ser considerado em sua realidade,

e o pesquisador deve também aliar a essa questão os pressupostos teóricos que enlaçam a sua

pesquisa. Isso significa que o não atendimento aos critérios de rigidez não comprometerá o

rigor como um dos pressupostos para a concretização de um projeto científico.

Moreira & Caleffe (2008) reconhecem que os investigadores que se dedicam à

pesquisa qualitativa, pelas peculiaridades inerentes a cada um, possuem estilos diferentes que

se podem admitir, são motivados não apenas pelo compromisso e pelo talento que têm, mas

porque são provocados, principalmente, pelo problema a ser pesquisado, pela variedade dos

cenários sociais e pelas contingências encontradas. Dessa forma, acreditam que não há como

padronizar nesse tipo de pesquisa a forma como será realizada a coleta de dados e as

estratégias para a análise do material.

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Assim, pode-se dizer que a abordagem qualitativa admite diversos procedimentos de

coleta de dados. Dentre eles, optou-se pelos estudos teóricos de natureza bibliográfica e

documental, por meio dos quais foram elaborados o primeiro e o segundo capítulos e em que

foi realizada a interpretação dos dados coletados junto aos professores, enquanto que, em uma

das etapas da investigação, procuraram-se, junto às fontes bibliográficas, as contribuições dos

pesquisadores na área da educação, principalmente em forma de livros, artigos científicos,

dissertações e teses publicadas (GIL, 1999). A pesquisa documental se constituiu

principalmente na consulta à legislação educacional.

Para coleta desses dados, recorreu-se à entrevista semiestruturada que possibilitou o

levantamento de dados mais específicos sobre a maneira como os professores veem sua

atuação no cotidiano de trabalho.

Moreira e Caleffe (2008) citando Hitchcock e Hughes (1995), apontam que as

entrevistas podem ser consideradas “uma conversa com um propósito” e as classificam em

dois grandes grupos: entrevistas padronizadas e não-padronizadas. Dentre as padronizadas,

estão: as estruturadas ou de levantamento; as semiestruturadas e em grupos (estruturadas ou

semiestruturadas). Quanto às entrevistas não-padronizadas, apresentam-se: entrevistas em

grupo (não-estruturada), etnográfica (não estruturada), entrevista para a história oral e para a

história de vida e entrevista informal.

Nessa pesquisa, optou-se por trabalhar com entrevistas semiestruturadas, pois partem

de um roteiro com temas que serão discutidos e possibilita aos entrevistados desenvolverem

os temas de forma que seja melhor para eles (MOREIRA & CALEFFE, 2008). As entrevistas

foram gravadas na escola e transcritas.

Conceitualmente, para Alves; Silva (1992, p. 63) a análise qualitativa dos dados

coletados nas entrevistas

é um fenômeno recentemente retomado, que se caracteriza por ser um

processo indutivo que tem como foco a fidelidade ao universo de vida

cotidiano dos sujeitos, estando baseada nos mesmos pressupostos da

chamada pesquisa qualitativa.

As orientações apresentadas por Moreira & Caleffe (2008), para análise qualitativa de

entrevista, baseiam-se nas sugestões de Hitchcock e Hughes (1989). São elas: familiarização

com as transcrições; consideração à disponibilidade de tempo; descrição e análise dos dados;

isolamento de unidades gerais de significado; relacionamento das unidades de significado aos

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objetivos da pesquisa; a extração de padrões e temas; observância à natureza das tipificações e

percepções; preparação para reflexão sobre as revelações do entrevistado; e verificação da

validade, triangulação dos dados, entrevista e nova análise dos dados.

Assim, entre os passos principais para a análise das entrevistas, os autores informam

que, na etapa de descrição e análise dos dados, é relevante aplicar o que Glaser e Strauss

(1967) denominaram como “Teoria Fundamentada” que consiste em conceber a análise e a

explanação a partir dos dados coletados. Para eles,

Isso exige que o pesquisador conscientemente faça análise e explanações

emergentes a partir dos dados e, eventualmente, desenvolva teoria. O

pesquisador analisa continuamente os dados contidos nas entrevistas, nas

notas de campo ou nos relatos na tentativa de sintetizar o que já foi

encontrado. O pesquisador pode então retornar uma vez mais aos dados e às

descrições para obter mais evidências, exemplos ou esclarecimentos. (p.

189).

Em etapa seguinte, o pesquisador realiza o isolamento de unidades de significado, as

quais dizem respeito aos termos amplos e questões que são recorrentes nas entrevistas. A

partir desse isolamento, deve fazer a relação entre as unidades gerais de significado e os

objetivos, os temas e os tópicos da pesquisa com a intenção de verificar se os dados podem

contribuir para esclarecer os objetivos.

Moreira & Caleffe (2008) recomendam, como etapas subsequentes, o trabalho de

extrair padrões e temas da análise e relacioná-los aos objetivos e ao problema da pesquisa.

Duas etapas poderão ainda ser relevantes para análise: uma consiste em elaborar, desvelar e

explicar as tipificações que abrangem as expectativas e pressupostos feitos pelos sujeitos; a

outra está voltada para verificar a validação dos dados. Os autores apontam que duas

abordagens têm sido utilizadas no processo de validação: a triangulação e a reanálise. A

triangulação (ou método misto, multimétodo ou estratégias múltiplas) acontece mediante

aplicação de mais de um método para coleta de dados. Para Denzin (1970) apud Moreira &

Caleffe (2008, p. 192) existem duas propostas distintas de triangulação, uma

dentro dos métodos refere-se à replicação de um estudo, usando as mesmas

técnicas como forma de verificar a confiabilidade de um estudo e a natureza

das teorias geradas. (A outra acontece através da) triangulação entre os

métodos refere-se ao uso de mais de um método de coletar dados dentro do

mesmo estudo.

O pesquisador pode usar duas formas para validação dos dados: comparando-os com

outras fontes; ou pode também, após a transcrição, verificar com os entrevistados as respostas

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em relação aos principais temas e categorias emergentes e/ou até fazer uma reanálise do

material.

De forma abreviada, Moreira e Caleffe (2008, p. 193) apresentam as ideias de Tesh

(1990) sobre a análise de dados qualitativos. Destaca-se que, para ele,

A análise dos dados é uma atividade de reflexão que resulta em um

conjunto de notas analíticas que orientam o processo;

Os dados segmentados, isto é, divididos em unidades de significados

relevantes, embora seja mantida conexão com o todo. A análise sempre

começa com a leitura de todos os dados de modo a proporcionar um

contexto para as partes menores;

Os segmentos de dados são categorizados de acordo com o sistema

organizacional que é derivado predominantemente dos próprios dados;

A principal ferramenta intelectual é a comparação. O objetivo é discernir

similaridades conceituais, melhorar o poder discriminativo das categorias

e descobrir padrões;

As categorias para selecionar os segmentos são hipotéticas e no início

elas permanecem flexíveis;

A manipulação de dados qualitativos durante a análise é uma atividade

eclética; não existe uma maneira única;

Os procedimentos nem são científicos nem mecânicos; a análise

qualitativa é um artesanato intelectual;

O resultado da análise é um tipo de síntese de alto nível.

O universo a ser estudado foi composto por 06 professores que atuam no Ensino

Médio na escola onde a pesquisa foi realizada, sendo dois de cada área do conhecimento que

organiza o currículo da escola. Embora seja uma amostra pequena, foi considerada suficiente

para os objetivos da pesquisa, uma vez que envolve docentes das diferentes áreas em que o

ensino médio encontra-se organizado.

A partir desses procedimentos foi possível identificar elementos que permitem fazer

inferências sobre a maneira como os professores que atuam no ensino médio percebem o

próprio trabalho. Para isso, foram retomadas algumas categorias levantadas no início da

pesquisa e realizou-se o levantamento de outras a partir das falas por meio das quais se

buscou entender como os professores as percebem no seu cotidiano. Dessa forma, pretende-se

chegar à questão principal do trabalho. As categorias referidas são as seguintes: interesse dos

alunos, ações coletivas, envolvimento da comunidade, função social da escola, qualidade de

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educação, contexto social da escola, pobreza e analfabetismo, exercício da docência no ensino

médio, entre outras. Antes de passar à discussão das categorias levantadas junto aos

professores parece necessário falar um pouco da escola onde foi realizada a pesquisa e do

bairro em que se encontra inserida.

3.2 - O local da pesquisa

Para realização da pesquisa, foi escolhida a Escola Estadual José da Paz (nome

fictício). Trata-se de uma escola da rede pública do estado de Alagoas, pertencente à 15ª

Coordenadoria Regional de Ensino. Está situada em um bairro central da cidade de Maceió

voltado principalmente para atividades comerciais e moradias habitacionais de pessoas das

classes média e alta.

A escola é uma das componentes do Centro Educacional de Pesquisas Aplicadas

Antonio Gomes de Barros – CEPA, que agrega, em seu espaço territorial, além de 11

unidades escolares (Educação Infantil, Ensino Fundamental, Ensino Médio e Normal), o

Núcleo de Desenvolvimento e Desporto Profª Cleonice Barros, o Instituto de Línguas Profª

Noêmia Gama Ramalho, o Centro de Formação de Recursos Humanos da Educação Prof. Ib

Gatto Falcão (CENFOR), o Laboratório Pedagógico, a Biblioteca Jaime Lustosa de Altavila, a

Escolinha de Arte Prof. José Zumba, o Instituto de Formação Profissional (INEPRO), o

Conselho Estadual de Educação, o Conselho do FUNDEF, o Arquivo dos Aposentados da

Educação, o Instituto Zumbi dos Palmares – composto pela TV e Rádio Educativa, o Teatro

Linda Mascarenhas e a Rádio Difusora (CAVALCANTE, 2006).

A escola pertence a um complexo educacional na cidade de Maceió. A construção de

um complexo educacional em Alagoas surgiu como estratégia do professor Ib Gatto Falcão,

então secretário da pasta de Educação e Cultura do Estado, no governo de Arnon de Melo

(1951 – 1956) destinado a ampliar o número de vagas escolares na cidade. O projeto foi

aprovado e financiado pelo governo federal, por intermédio do Instituto Nacional de Estudos

Pedagógicos (INEP), na gestão do professor Anísio Spínola Teixeira (2006).

A proposta de educação, na época da fundação do CEPA, era condizente com o clima

desenvolvimentista que vigorava e, por tal, foi instituído em 31 de janeiro pelo Decreto 1.519,

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que reestruturou a Secretaria de Educação e Cultura e descrito no artigo 34 as suas

finalidades:

1) Manter em funcionamento os estabelecimentos de ensino e

treinamento de diversos níveis e modalidades, em especial para o fim de,

valendo-se deles como campo de pesquisa aplicada, experimentar, pesquisar

e analisar o conteúdo e os métodos de educação e de ensino, visando ao

aperfeiçoamento do sistema educacional pela propositura de resultados de

aplicação generalizável;

2) Manter as instalações, programas e atividades diversas, inclusive

biblioteca, artes, recreações e desportos a serviço do parque escolar em

geral, particularmente o da capital;

3) Realizar promoções e produzir publicações, instrumentos e material

técnico-pedagógico, objetivando divulgar estudos e pesquisa e propagar o

uso de técnicas e procedimentos didáticos em particular no que se relacione

com a melhoria do ensino das ciências.

§ Único – A programação de pesquisas e experiências pedagógicas do

Centro Educacional de Pesquisa Aplicada, gozará de liberdade e

flexibilidade, desde que assegurada sua articulação e harmonia com as

diretrizes e a programação da Assessoria de Programação e Orçamento da

Secretaria de Educação (CAVALCANTE, 2006, p. 122).

No projeto idealizado do complexo educacional, o professor Ib Gatto previu a oferta

de ensino em tempo integral, voltado para a formação técnica, profissional e artística no

sentido de atender à demanda de Maceió. Tinha como objetivo oferecer estágio remunerado

aos estudantes, assim como proporcionar condições para a formação docente de nível médio,

como espaço para treinamento e oferta de cursos de pós-graduação visando à melhoria de

desempenho dos professores do ensino básico (CAVALCANTE, 2006).

Em função da reestruturação administrativa do Estado, ocorrida em 2005, o CEPA

deixou de ser um programa vinculado à Secretaria Executiva de Educação e foi transformado

na 15ª Coordenadoria de Ensino, com a sua circunscrição abrangendo todas as escolas que

compõem a estrutura do CEPA (CAVALCANTE, 2006).

A escola em questão tem quarenta anos de existência, oferta turmas de ensino

fundamental (do 6º ao 9º ano), ensino médio e educação de jovens e adultos. Em sua maioria,

os alunos são oriundos dos bairros periféricos da cidade.

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3.3 - Os sujeitos da pesquisa

Costa & Oliveira (2011) informam que, entre os professores que lecionam no ensino

médio, a maioria é composta por mulheres e é nesse nível de ensino que se concentra o maior

percentual de homens entre os outros níveis. Possuem em média mais de quarenta anos de

idade e nem sempre a docência é a sua atividade principal.

Para que se possa ter uma melhor compreensão acerca das características intrínsecas a

cada sujeito participante, apresentamos os dados preliminares, conforme descrição abaixo (os

nomes foram substituídos para garantir o anonimato):

Joana – Licenciada em Biologia pela Universidade Federal de Alagoas. Atua

ministrando aulas no magistério há 22 anos (com aulas de reforço escolar) e no ensino

médio leciona Biologia há 11 anos. Atualmente é diretora adjunta da escola. Possui

também graduação em Farmácia, mas não exerce a profissão. É pós-graduada em

Tecnologia da Educação.

André – Possui licenciatura em História e atua ministrando aulas na área de História e

Geografia no ensino fundamental e médio há 11 anos. Informou que possui

experiência no magistério, lecionando aulas nos antigos cursinhos pré-vestibulares. É

pós-graduado em Docência do Ensino Superior.

Marlene – Licenciada e bacharel em Geografia. Informou que leciona desde o ano de

1997 (23 anos) e no ensino médio sua experiência já dura 8 anos. Ministra a disciplina

Geografia em turmas de ensino médio.

Ronaldo – Possui formação em Filosofia. Ministra aulas de Filosofia e Sociologia.

Informou que não atua em outra área de trabalho. Não referiu nenhum curso de pós-

graduação. Trabalha em regime de contrato temporário. Ministra aulas há 8 anos e há

5 no ensino médio.

Abgail – É licenciada em Biologia pela Universidade Federal de Alagoas. Leciona as

disciplinas de Ciências e Biologia no ensino fundamental e médio. Não possui outras

áreas de atuação. Não referiu cursos de pós-graduação.

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Renato - É graduado em Matemática e possui especialização na área de Matemática

em Estrutura e Funcionamento do 2º Grau. Leciona no ensino médio há 20 anos. Atua

também como bancário em uma instituição federal.

Os professores foram convidados a participarem da pesquisa de forma aleatória, o

critério principal era que estivessem lecionando disciplinas no ensino médio. Os professores

Ronaldo e Renato atualmente ministram aulas apenas no ensino médio, em virtude de arranjos

administrativos e pedagógicos.

3.4 – A função social do Ensino Médio

Como visto em capítulo anterior, as discussões em torno das finalidades do ensino

médio como uma etapa intermediária na educação datam ainda do século XVIII e foi então a

partir da Revolução Industrial que o currículo se voltou para atender as necessidades desse

novo modelo de desenvolvimento com disciplinas com conteúdos voltados para os

ensinamentos da ciência (SILVA, 2004a).

Esse mesmo autor afirma que a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em

sua edição mais recente, declara não atender à especificidade de preparar apenas para a

profissionalização, assim como para atender as exigências para ingresso no ensino superior.

Em análise ao Plano Nacional da Educação que vigorou até 2011, Brandão (2011)

recorda que a LDB 9.394/1996 dispõe o ensino médio como detentor de dupla função:

preparar para estudos posteriores e simultaneamente para o mundo do trabalho. Complementa

com o pensamento de Kuenzer (1997, p. 10) que “não é uma questão apenas pedagógica, mas

política, determinada pelas mudanças nas bases materiais de produção, a partir do que se

define a cada época, uma relação peculiar entre trabalho e educação”.

Para Cury (1998), nesse documento, o ensino médio se propõe a formar o cidadão e

deve se valer das bases lançadas no ensino fundamental para aprofundar e complementar o

processo educativo que visa à socialização e, a partir daí, à compreensão de cidadania. Em

análise às respostas dos professores em relação à função social do ensino médio, percebe-se

que há divergências quanto às finalidades de sua oferta.

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Como nos fala Silva (2004a), esse nível de ensino padece de uma clara definição

quando se refere a sua função. Mas, nas entrevistas, os discursos dos professores oscilam em

relação às funções do ensino médio. A professora Joana o considera uma etapa intermediária

para os estudos posteriores.

Ensino médio hoje é só um meio de acesso. É um degrau que eles precisam

ultrapassar para chegar ao fim, que não é final, é o começo que é a

universidade.

A fala do professor André, confirma inicialmente a possibilidade de o ensino médio

servir como uma etapa intermediária, mas, em outros momentos, admite as outras três funções

(para a vida, para o mercado de trabalho e para os estudos superiores). Pormenorizadamente,

ele nos diz que:

O papel social do ensino médio seria como eu disse, depois do adolescente

conseguir ter uma reeducação, ter fundamentado, deter a título de

conhecimento fundamental, o ensino médio teria justamente esse papel de

criar a possibilidade de preparar para o ensino superior, de consolidar o

conhecimento para a vida social do aluno, e também para a vida profissional

dele [...]

Eu acho que seriam as três coisas. O propedêutico é fundamental. Mas, ele

se torna propedêutico para um mundo acadêmico. Se você vai entrar na

universidade e tem uma base boa.

Também, para o professor Renato, o ensino médio se presta a várias finalidades e que

tem como papel formar

[...] o cidadão para atuar na comunidade, no mercado de trabalho, para saber

direitos e deveres deles para ele saber como aplicar a ciência. Na realidade é

a formação geral para a vida dele.

No discurso do professor Ronaldo, podem-se identificar duas finalidades para o ensino

médio. A primeira o considera uma etapa final nos estudos visto que o aluno já havia tido uma

sólida formação no ensino fundamental. A segunda revela o caráter propedêutico:

[...] uma das visões seria perceber o andamento do aluno, o avanço, o

processo pelo qual ele passou, chegou ali. O fim do ensino, a concretização

daquele conhecimento que foi feito no ensino fundamental e o

aperfeiçoamento para sair aqui da escola normal, tenho essa visão. [...]

[...] Tem que ser trabalhado de maneira bem proveitosa porque você tem que

visar uma faculdade, o aluno tem que se espelhar numa faculdade, numa

universidade [...]

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A princípio, a professora Marlene concebe o ensino médio voltado para o mercado de

trabalho e, em outro momento o compreende voltado à preparação para os estudos superiores.

Para ela, há intenção de que esse nível de ensino prepare os alunos para o Exame Nacional do

Ensino Médio (ENEM).

[...] eu tenho que ter mais empenho, mais cuidado, mais responsabilidade

principalmente com o terceiro ano que eu tenho, estou sabendo que eles vão

ser entregues ao mercado de trabalho [...]

[...] o ensino médio limita ao aluno a se submeter ao ENEM (Exame

Nacional do Ensino Médio) para ingressar na universidade ou na faculdade e

isso é pouco por conta da competitividade que o mundo está oferecendo,

uma vez que a gente percebe que as escolas particulares, não todas, que estão

mais bonitas, elas dão mais oportunidades que as escolas públicas [...]

[...] Então, eles têm que ter mais conhecimento, não só nas disciplinas exatas

como em disciplinas técnicas que preparem para o mercado de trabalho, o

que seria uns cursos técnicos que são oferecidos e que eles deviam ser

orientados para participarem em horário diferente da escola [...]

As entrevistas nos mostram também que algumas questões são recorrentes entre os

professores da pesquisa em relação ao trabalho que desenvolvem no ensino médio. Na defesa

de que a universalização do ensino básico no Brasil proporcionou melhores condições de

acesso e permanência dos alunos na escola, Costa & Oliveira (2011) nos informam que, no

ano de 2010, o número de matrículas no ensino básico ultrapassou o total de 51 milhões de

estudantes. Informam também que surgiu a demanda por professores que, em sua maioria,

está vinculado à dependência administrativa estadual.

Apesar da documentação oficial advogar que não há distinções em suas finalidades na

oferta do ensino público e privado, os professores acreditam que as escolas privadas se voltam

exclusivamente ao preparo para os estudos posteriores. Isso pode estar ligado às deficiências

encontradas em razão de que na maioria das vezes, o ensino fundamental ocorre de forma

precária, ou mesmo a crença de que a profissionalização seria prioritária em função das

condições socioeconômicas em que vivem os alunos das escolas públicas da atualidade. Pode-

se perceber, no discurso do professor André, quando fala do despreparo da sua clientela:

[...] o nível médio deveria ser no nível tal que se a população tivesse esse

aspecto adequado, o país estaria bem melhor. Mas como professor, noto de

um modo geral, os alunos de ensino médio não tem nível médio na prática,

são pessoas que vieram de atividades terríveis no ensino fundamental, ou

seja, chegaram ao ensino médio sem fundamento e tem dificuldade de

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interpretar, de transpor o que pensa para o papel e quando consegue isso, há

dificuldade de usar todo esse conhecimento para a vida prática [...]

[...] Mas, a escola privada, muitas vezes peca... ao invés de preparar para a

vida, prepara para entrar na universidade, para abrir a porta, mas não para

está preparando para estar na universidade de modo geral.

Muito próximo à concepção do professor André, a professora Abgail. Para ela há entre

os alunos das escolas públicas uma defasagem grande de conteúdos, pois

[...] hoje a gente pega um aluno com uma defasagem de conteúdos e você

precisa mostrar que o conteúdo que está trabalhando é relevante para o dia a

dia dele [...]

Joana compreende que os alunos têm o ensino médio como fase terminal dos estudos.

Na verdade, está alimentando um ciclo vicioso em que a baixa escolaridade dos pais se

repetirá com os filhos. Como bem diz:

[...] Alguns têm essa visão de vestibular, de universidade, mas a maioria não.

A maioria tem aquela visão assim, terminar o ensino médio, do arrumar um

emprego no comércio, ser doméstica como a mãe, como a tia. A gente

conversa muito com eles essa questão assim, que não é uma coisa

humilhante, mas que ele enquanto estudante, eles precisam olham acima do

muro. Ter outra visão do mundo, tentar ter outras oportunidades, até prá ver

se conseguem ter mais possibilidades do que a família deles. A visão da

maioria deles é o final. Eu converso muito com eles. Na época dos pais de

vocês, dos meus pais, o ensino médio era realmente o fim, hoje é o começo.

Hoje ter ensino médio não é favor, é obrigação. Então, vocês estão

começando a se acomodar, quando começam a conseguir esses

subempregos, sem carteira assinada, altamente explorados pelos patrões, uns

mesmo da noite chegam aqui suados, com fome, ‘nas carreiras’, porque a

patroa só liberou depois que arrumou a cozinha, que o patrão só liberou

depois que arrumou o estoque e muitos deles não ganham nem um salário

mínimo, não tem carteira assinada e são superexplorados.

3.5 – A função social da escola

Um tema que se mostra significativo no presente estudo e que repercute na

forma como os professores conduzem a sua prática diz respeito à finalidade social da escola e,

em suas concepções, não há muita distinção entre o que acreditam da finalidade do ensino

médio. Para eles, percebe-se, estaria voltado à preparação do aluno para o mercado de

trabalho, para estudos posteriores e/ou para a cidadania.

Formar o cidadão faz parte da concepção social da escola. Para os professores Joana,

Marlene, Abgail e Renato,

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[...] Formar cidadãos. Formar o crítico, agente de mudança que saiba ouvir,

saiba ter opinião e saiba discutir. [...] Então eu acho que a função principal

da escola é essa, é formar cidadão crítico, que esteja inserido na sociedade e

que contribua. (Joana)

[...] é preciso que no final do processo, durante o processo, se tenha uma

criança que seja questionadora, que ela consiga pensar que ela consiga

encontrar os próprios caminhos, que ele seja um cidadão. Cidadão é isso,

perceber onde está o problema, analisa e quer solução, você sabe se portar

diante da equipe, cobrar e vai ser participativo na resolução. (Abgail)

Formar cidadãos, esforçados, cientes do que esperam lá fora [...] (Marlene)

Que a escola forme o aluno, o cidadão para atuar na comunidade, no

mercado de trabalho, para saber os direitos e deveres deles para ele saber

como aplicar a ciência. Na verdade é formação geral para a vida dele [...]

O professor Ronaldo diz que a escola

Enquanto instituição ela proporciona [...] formação do ser humano [...]

Para o professor André, a função social da escola estaria voltada para a formação de

novas gerações e para a cidadania, mas vai mais além quando diz que

O papel social da escola é muito relevante e complexo porque ele tem um

papel de preparar as futuras gerações do país. Isso aí a coisa é notória, só que

isso aí é uma meta ao longo, preparar lá fora não só para melhorar seu nível,

aproveitar o conhecimento das gerações anteriores, aperfeiçoar e adaptar a

realidade de cada um. Mas, de forma mais prática, tirar as crianças das ruas,

despertar o conhecimento nas artes, nas ciências, de modo geral, descobrir os

potenciais, proteger em defesa própria [...] A escola tem um papel de dá

cidadania às pessoas. Então, isso seria de você não ser só agora propriedade

de uma família ou de um ente familiar, mas ser parte de uma sociedade

complexa que você vai ajudar a construir.

Em sua fala, o professor André acredita que o ensino médio não atende a algumas das

questões a que se propõe que seria dar uma formação que habilite o aluno para, a partir dos

conhecimentos do ensino fundamental, alicerçar as etapas seguintes ou para o mercado e,

também, porque acredita, que ele (o aluno) precisa ter uma compreensão da realidade a partir

dos conhecimentos das disciplinas para aplicar/reconhecer em seu cotidiano e no mundo:

Para mim, trabalhar no ensino médio é exigir o que é, o que está sendo com

o que deveria ser. Eu acho que deveria ser, você está trabalhando com alunos

que já tenham um conhecimento muito bom, científico, conhecimento da

língua, que daria condições pra que você dê um aprofundamento maior para

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que essa pessoa esteja preparada para ingressar na universidade ou então

tenha um suporte técnico para atuar profissionalmente. E outra coisa

importante, é ter um nível de conhecimento tal que você tenha condições de

aproveitar melhor os recursos da sua vida. Então, relacionar muito a

educação à vida profissional, mas, dentro da sua casa, por exemplo, o

conhecimento do ensino médio pode mudar seu relacionamento com sua

própria vida pessoal. O aproveitamento dos recursos da natureza.

Compreender a casa que você vive, a iluminação, sem ser arquiteto,

compreender melhor higiene, sem ser um infectologista, conhecer melhor a

economia doméstica, sem ser um economista. Então, o nível médio deveria

ser no nível tal que se a população tivesse esse aspecto adequado, o país

estaria bem melhor.

3.6– O exercício da docência no Ensino Médio

Madeira (2006) em referências as palavras de Martins (2000), enfoca que os eixos em

que se sustentam as reformas no ensino abordam propostas como a centralidade no

conhecimento, a aprendizagem e aquisição de competências e habilidades, sem que sejam

ofertadas condições reais para que sejam efetivadas. São reformas que sobrecarregam de

tarefas os professores, motivadas por concepções sobre a formação e atuação dos docentes,

orientadas por tendências mundiais, voltadas para os aspectos práticos da atuação dos

professores. Perde-se o aspecto político e enfatizam-se as qualidades individuais, a eficácia e

a competência para o exercício do trabalho docente.

Costa & Oliveira (2011) apontam que os professores do ensino médio assumem um

número maior de funções, o que marca um processo de intensificação crescente do trabalho

docente com maiores números de turmas, turnos, aulas, alunos e empregos e as consequências

que incidem principalmente sobre a remuneração, as condições concretas de trabalho e as

funções e tarefas que desempenham. O professor André explica que a sua prática em sala de

aula sofre em função da falta de tempo e disponibilidade para qualificação e preparação de

aulas:

Eu, por exemplo, tenho quarenta horas aqui na escola. O meu horário é

distribuído de tal forma que venho quatro manhãs. É praticamente ocupando

a cada cinco horas do meu dia, são vinte horas. Três tardes, aí, mesmo que

tenha prestes naquele meio, eu não posso dizer que não tenho aula. Se estou

na escola, não tenho como correr. Só aí você calcula quantas horas? Cinco

vezes quatro é igual a vinte mais quinze é igual a trinta e cinco. Ou seja,

estou cumprindo trinta e cinco horas. Só que acontece, às vezes, comigo tem

acontecido sempre, aulas aos sábado. Estou tendo quarenta aulas, quarenta

horas na escola, ou seja, que tempo sobra? Com turmas diferentes,

disciplinas diferentes, como EJA (Educação de Jovens e Adultos), com 1º

ano, 2º ano, 3º ano, com turmas de 8º ano, 9º ano, tudo misturado. Como vou

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ter tempo de cumprir uma carga horária integral, de quarenta horas na

escola, ter tempo extra para pesquisar, e para aperfeiçoar, me qualificar? E

mesmo que eu tivesse seria por conta própria porque a escola não fornece

isso. A escola fala que os professores deveriam dispor a participar da aula

departamental, mas a escola não tem condições de assumir isso e nem a rede

pública do Estado e nem quer porque alguém teria que trabalhar.

O discurso que centraliza as qualidades individuais e a prática docente (mesmo que

não sejam encontradas condições reais para o desempenho do trabalho) é incorporado pelos

professores, como bem deixa claro a professora Marlene em sua explanação, quando

reconhece que,

[...] ser professor do ensino médio é eu ter que ter mais empenho, mais

cuidado, mais responsabilidade principalmente com o 3º ano que eu tenho,

estou sabendo que eles vão ser entregues ao mercado de trabalho. O que foi

que eu fiz em prol disso? Uma vez que geografia quase todos os concursos

requer questões abertas e sobre conhecimentos gerais e geografia é uma das

que pode ajudar nisso e eu tenho que me empenhar o máximo, eu estou

constrangida de não poder está agindo assim.

Reconhece, ainda, a professora que não exerce as suas atividades sozinha, em virtude

de que não são garantidas as condições pela Secretaria de Educação de Estado como instância

administrativa para o apoio pedagógico:

Eu gostaria que o Estado propiciasse ao professor o que quando eu como

monitora da prefeitura conseguia para que eu pudesse entrar mais solta na

sala de aula, porque eu me sinto como uma pessoa sempre em fase de

alfabetização, sempre adequar ninguém. Quando lá na SEMED (Secretaria

Municipal de Educação de Maceió), eu como contratada, nós tínhamos a

liberdade de, não é a liberdade, a oportunidade de termos alguém para

esclarecer muita coisa quinzenalmente dentro da disciplina.

Garcia; Hypolito; Vieira (2005) defendem que a identidade docente vai além dos

discursos oficiais que os veem como meros responsáveis pela formação de cidadãos. Acredita

que a sua função extrapola esse objetivo e assume que há influência de outros determinantes

como a história familiar e pessoal, as condições de trabalhos e ocupacionais. Por isso, há nas

falas dos professores questões que são referidas e tratam especificamente da sua relação com

os alunos que interferem diretamente no processo educativo.

A professora Joana nos diz que os estudantes das escolas públicas têm dificuldades

em função da falta de oportunidade e de acesso aos materiais que os estudantes das escolas

particulares têm, assim como da discussão entre eles acerca da finalidade do ensino médio.

Informou:

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Possuem muita carência, (mais) dificuldades que aluno da escola particular, da

escola pública no caso. Ele tem que ter acesso a conteúdo, acesso a livros, tem

que ter acesso a vestibular, a faculdade. Mas a gente esbarra com muita coisa,

com todo tipo de carência, no caso da escola pública. E, principalmente com

as carências deles, as dificuldades que eles trazem.

O ensino médio, eles conversam na sala para não tirar o estímulo. Mas você

sabe é uma coisa que você não sabe qual é a função. Ele prepara para quê?

Hoje o ensino médio pra mim, você dá o conteúdo e ele serve como uma

peneira para o vestibular. Então, aquele que absorveu mais aqueles conteúdos

ali, ele vai ter mais acesso a faculdade. O que outros não vão ter.

O professor André acredita que o interesse do aluno deve ser despertado

principalmente quando este está cursando as séries do ensino fundamental – é necessário

utilizar recursos pois, no ensino médio, exige-se que este se coloque em uma posição de maior

concentração, apesar de que, nessa fase do ensino, os alunos se encontram na adolescência, na

fase dos questionamentos acerca da sociedade. Relata que o professor deve envolvê-lo em

discussões que suscitem questões políticas e do conhecimento, levá-lo a pensar sobre si é a

dimensão social e política do ensino.

O professor do ensino fundamental tem mais ou menos esse papel, de ter

habilidade técnica de envolver o aluno. Então, quando chega no ensino

médio, você de certa forma, já passou um pouco do seu limite. Você já cobra

do aluno uma maior concentração daquilo que deu. Mas mesmo assim, você

precisa de trabalho técnico. Agora no ensino médio, é uma fase que o aluno

já está começando a despertar para as questões, os questionamentos da

sociedade, o adolescente. Então, você vai despertar essas questões políticas,

então, tem o patamar mais de valor ativo da sociedade, você vai discutir com

eles. Como envolver o aluno? Essa questão desse envolvimento político com

o conhecimento, você criar um aluno justamente nessas necessidades e

pensar em torno dele próprio. Essa dimensão mais social e política do

ensino ela, de certa forma, é muito importante. Só que também não é fácil

despertar o envolvimento do aluno porque justamente, isso é uma questão de

história. O professor que não toca nesse assunto, ele não consegue envolver

a turma.

A professora Abgail, quando aborda a questão de ser professor do ensino médio relata

que ensinar nessa etapa é um desafio em virtude de que acredita que os alunos não

demonstram interesse pelo conteúdo trabalhado em sala de aula:

Hoje que a gente pega um aluno com uma defasagem de conteúdo e você

precisa mostrar que o conteúdo que está trabalhando é relevante no dia-a-dia

dele e muitas vezes eles não querem nem lhe ouvir e acham que aquilo é

para decorar e ter uma nota e ir embora acatar, mostrar que aquilo é

importante que ele usa a ciência e a Biologia em todos os momentos e não só

aspectos da vida dele mas como cidadão, então esse é o grande desafio eles

não querem mais parar para ouvir, ou para estudar ou para entender – o

professor tem o desafio é tentar, fazer tentativa, é fazer com que eles gostem

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ou queiram ouvir, entender, precisa ser um apaixonado tanto pela disciplina

e pela profissão.

Preocupado em discutir a imagem e o reconhecimento social de cada nível de ensino,

Arroyo (2009) informa que são diferentes e nem sempre convergem. Os professores das séries

finais do ensino fundamental e médio têm a sua imagem atrelada ao professor. Educadores

são os professores da educação infantil e das séries iniciais do ensino fundamental em função

de que se ocupam principalmente da formação moral de seus alunos. Há distinção entre ser

professor (aquele que professa uma arte, uma técnica ou ciência, um conhecimento) e ser

educador (aquele que abraça doutrinas, modos de vida, ideais, amor e dedicação).

A professora Marlene refere que, em sua prática, atua como professora e educadora,

dedicada a orientar os alunos, como bem nos diz:

Além da educação doméstica, essa educação doméstica é importante tem que

ter solidificada na escola. Então, eu como professora, eu sou professora e

educadora. Enquanto os pais e os responsáveis podem ser apenas

educadores. Eu tenho que ser professora e educadora, a partir do entrar na

sala de aula, porque estou mostrando a ele o horário que tem que ser

mantido, não exigindo. Qual é a hora que tem que chegar? Porque estou

querendo prepará-lo para o mundo, para o mercado de trabalho. Horário,

testes, tudo isso o professor pode orientá-lo. Em termo de conhecimento,

enquanto é ciência...

Em seu relato acerca do trabalho docente no ensino médio, o professor Ronaldo diz

que está relacionado com a experiência que os docentes tiveram quando eram alunos. A

reflexão faria com que pudesse

[...] dar sua contribuição para aqueles alunos, principalmente da rede

pública. Os alunos que não tem às vezes oportunidade de pagar uma escola

particular e eles se colocam nas mãos dos professores, no caso. Tem muito

professor que vem dá aula e enrola. E o ensino médio principalmente de

colégio público exige muito a questão da ética, da boa índole do professor.

Se ele passou por um ensino médio e a sua etapa de provação, foi colocado,

ele teve muitas provas negativas eu acho que muitos professores aí que

passaram por momentos negativos na escola pública, acham que eles vão

tentar fazer o diferencial. Acho que também é isso, é fazer o diferencial.

3.7 - Ações coletivas na Escola

Percebe-se também que os professores vivem isolados em sua rotina. Cunha (1998)

acredita que esse movimento está ligado à busca pela autonomia, que os levam a utilizar o

espaço da sala de aula como espaço de poder, produz o isolamento e pode funcionar como

elemento de proteção contra as suas fragilidades, as suas dificuldades. Junte-se a isso o fato de

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que, em análise, nas falas dos professores, percebe-se que os momentos de interação que

visem a discussão da prática educativa não são abundantes.

A identificação de ações coletivas é reconhecida principalmente quando os professores

relatam a existência de práticas pedagógicas desenvolvidas na escola.

As ações que envolvem a coletividade para a professora Joana estão presentes

principalmente quando da oferta de projetos e programas originados de instituições de ensino

superior (estagiários), projetos de extensão, de pesquisas, ações de organizações

governamentais e não-governamentais. Cabe observar que as atividades nem sempre

envolvem os professores da casa; são direcionadas aos alunos de algumas séries pontuais:

Do ano passado pra cá, a gente vem assim. Primeiro vem o pessoal da

psicologia do Cesmac (Centro Universitário Cesmac) trabalhando com eles a

questão da autoestima, mercado de trabalho, projeto de vida, o que vou fazer

depois da conclusão do ensino médio. Então, essas ações, é assim, a gente

tem que buscar foco. O que muitas coisas a gente não tem na escola. A

Patrícia (funcionária de uma instituição que trabalha o empreendedorismo)

também vem com esses projetos, o pessoal do segundo ano tá no projeto do

empreendedorismo, todo sábado eles vem pra fazer o curso. Então, a gente

vem buscando essas ações fora. O pessoal do IFAL (Instituto Federal de

Educação, Ciência e Tecnologia de Alagoas) tá para colocar o laboratório de

matemática para funcionar, trabalhar com eles a questão da lógica

matemática, dentro do laboratório. Ano passado conseguimos fazer a feira

das profissões, já visando essa questão. Este ano queremos fazer de novo.

Eles foram visitar algumas faculdades, feira de cursos, da Maurício de

Nassau (instituição privada de ensino superior), da Uncisal (Universidade de

Ciências da Saúde de Alagoas), para conhecer os cursos, pra ver se a gente

consegue abrir o olho.

O professor Renato informa que não existe apoio por parte da escola para o

desenvolvimento desta para ações de planejamento; as práticas estão voltadas para a

promoção de eventos

Na realidade, não tem uma prática pedagógica em escola pública que explore

o que o aluno necessita. Por exemplo, a gente considera a prática pedagógica

aquilo que se pode planejar no início para ser aplicado durante o ano. A

gente não tem esse apoio nem da escola. As práticas que temos usados são as

tradicionais. Praticamente o professor de escola pública é muito difícil ele

variar o que ele vem fazendo em sala de aula. Talvez a escola faça alguns

eventos para ver se é aplicável na melhora da maneira de passar isso para os

alunos.

O professor André relaciona que o desenvolvimento de práticas pedagógicas na escola

deveria estar relacionado com o projeto político pedagógico da escola o qual servia para

integrar as ações dos professores. Acredita que a equipe se ocupa com problemas relacionados

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com a ordem disciplinar na escola e com questões burocráticas. Acredita também que em seu

papel social, a escola contribui para a cidadania, porém falta a participação da família,

juntamente com os profissionais, a interação do Estado e toda a sociedade:

É, veja só, de pedagogia, usamos o termo prática e ação. A prática está

relacionada ao conjunto, ao trabalho da escola e ação seria uma atitude

isolada do professor. Então, nesse sentido, está uma coisa, quando uma

escola consegue apenas reunir uma vez a cada seis meses ou duas vezes os

professores para discutir algumas coisas com “ah, problema tal”, já é um

grande acontecimento. Se não houver isso, podemos dizer que não há prática

pedagógica planejada. Há, na verdade, uma política de ações isoladas de

professores, esse que é o problema. Justamente a falta da prática pedagógica,

da atuação teórica planejada levada a efetiva ação, seria até melhor dizer a

práxis. É isto que está faltando. Eu vejo isso como um dos grandes

problemas hoje. E quem estaria no centro de tudo isso? A coordenação da

escola. Tem um projeto, tem seu projeto a partir do PPP da escola (Projeto

Político Pedagógico), tem um projeto didático ou vários projetos didáticos

que integrassem as ações desses professores, causando uma... Aí eu

pergunto, qual coordenador que realmente consegue fazer isso? Muitos, por

pura incapacidade técnica, mas também aqueles que teriam preparo para

isso, estão ocupados com outras atividades porque a escola não tem

determinado funcionário que não tá se comportando, para controlar a

disciplina dos alunos nos corredores, ou muitas vezes a questão burocráticas

da escola mesmo. Listar a compra de merendas e tudo mais. Então, o que

está faltando é isso, a prática na escola que está faltando e é uma ação

conjunta de todos.

A professora Marlene acredita que não há colaboração da escola em relação ao

desenvolvimento de atividades pedagógicas para a sua disciplina, assim como para nenhuma

outra. Percebe que falta pessoal qualificado para tal e que a equipe se volta principalmente

para questões de ordem disciplinar em função da ausência de funcionários para ocuparem tal

função.

Eu não vejo diferença entre o trabalho que é feito para os alunos do ensino

fundamental e nem para com os alunos do ensino médio. É tanto que

percebo que tem que haver um melhor investimento enquanto acumular a

partir do 1º ano. Tudo isso para investimento da própria escola. O

investimento que eu vejo é mais assim, de projetos, não polos, mas no ensino

médio irem no final de semana, no sábado, para construir uma paródia. Mas,

a pedagogia usada para o fundamental passa mesmo o suporte técnico,

mesmo trabalho.

O professor Ronaldo informou que desconhece as práticas pedagógicas desenvolvidas

pela escola, referindo-se apenas às atividades desenvolvidas aos sábados, direcionadas para

interações entre as turmas.

As práticas que o colégio desenvolve, eu sei que tem alguns momentos,

digamos assim que o colégio, principalmente aos sábados, sempre aos

sábados, que seria uma questão de interação entre as turmas que se ajudam,

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mesmo conteúdo que é trabalhado, começa a ser trabalhado pelas duas

turmas. Acho que tem apresentação também de História, tem outras questões

aí. Estou um pouco por fora.

A professora Abgail informou que os momentos de práticas pedagógicas aconteceram

com projetos interdisciplinares. Informou que foram implementados durante um certo período

do ano, mas foram interrompidos. Acredita também que a interação enriquece os

conhecimentos dos participantes.

No primeiro semestre desse ano, nós começamos a trabalhar com projetos

pedagógicos interdisciplinares. Fizemos um sobre os símbolos cívicos, que

tem a ver com Sete de Setembro, resgatar o respeito à pátria, a questão da

nacionalidade, deu certo, os dois primeiros encontros foram muitos bons,

todos os professores independente de qualquer área, o professor do grupo de

geografia, história, filosofia eles trouxeram o projeto e estavam à frente mas

todos se engajavam, para mim era um sonho de escola. Mas depois de duas

tentativas que deram certo a escola abortou o trabalho porque dá trabalho e

isso me entristesse. Esse ano foi uma decepção muito grande porque na

prática a gente viu que dá certo os meninos vinham para cá aos sábado e

produziam coisas belíssimas, e você descobre artistas de todas as áreas e

descobre outros saberes que aquela criança tem e que não foi minimamente

valorizado. Poder trabalhar com projetos poder sentar com um colega e

planejar, a Biologia não é só minha, a História não é só do outro professor,

está tudo integrado e quando a gente tem essa visão o aluno também

interagem [...] Os projetos são muito importantes, eu gosto muito deles. Eu

trabalho com um projeto na área de educação sexual, é um projeto do

Estado, que fez a capacitação e manda o material é bom e que vejo

resultados, não gosto da forma como eles cobram os dados, é um trabalho

interdisciplinar e não é. Termina ficando só com a Biologia e a Ciência. Em

outras práticas pedagógicas da escola, existem tentativas de projetos de

leitura [...]

3.8 - Envolvimento da comunidade

Como visto em capítulos anteriores, a escola brasileira em suas decisões mais

significativas nem sempre contou com a participação da sociedade em geral. Martelli (2004)

argumenta que os condicionantes do sistema escolar brasileiro não proporcionaram o

desenvolvimento de programas de integração entre escola e comunidade. Os motivos para tal

podem estar associados a forma centralizada da gestão escolar; à falta de tradição de

participação da sociedade nas questões; e à falta de compreensão da função social do ensino

fundamental e médio.

Ao realizar uma análise dos itens dispostos nas Leis de Diretrizes e Bases da Educação

Brasileira, acredita que a atual (9.394/1996) supera as demais quando coloca em termos claros

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a união entre a gestão democrática do ensino público e a valorização das práticas extraescolar.

Cita o artigo 12 que propõe a articulação entre escola, família e a comunidade, no sentido de

envolvê-los para inclusive participar na execução da proposta pedagógica.

O professor Ronaldo acredita que o processo educativo deveria se voltar para superar

as condições de pobreza:

[...] É ajudar nesse processo de educação, ajudar nesse processo de sair

daquela condição social dele.

No entanto, o professor Renato referiu que a função da escola é moldar o aluno para

que ele possa aplicar o conhecimento adquirido na comunidade. Mas acredita que pode haver

dificuldades na aplicação desses conhecimentos em virtude das diferenças culturais.

Há que se considerar que as dificuldades encontradas pelos professores nas capitais e

grandes cidades brasileiras talvez tenham as suas raízes naquilo que é peculiar à dimensão em

que se encontram e a forma como se transformaram ao longo do tempo. São grandes centros

que, como nos diz Bauer (2013, s/p),

produzem problemas urbanos de reconhecida singularidade, próprios de seus

respectivos processos históricos e nos marcos em que se processou o

desenvolvimento da sociedade capitalista no Brasil, ou seja, de forma

desigual e combinada.

Ser professor na metrópole requer sentir o reflexo da histórica falta de participação

popular no planejamento e gestão das cidades e que o professor deve se posicionar

politicamente para compreender que algumas questões vão além da mera ação pedagógica.

3.9 – Pobreza e analfabetismo

Dados demonstram que o estado de Alagoas apresentou, no ano de 2009, o pior

Índice de Desenvolvimento do Ensino Básico (IDEB) do Brasil (FAJARDO, 2012). Nesse

contexto, as deficiências no processo educativo são evidentes e, dentre as consequências,

podemos relacionar a evasão, o abandono e distorção entre a série em que o aluno está

cursando e a idade que, como vimos anteriormente, pode estar vinculada à disposição

didático-pedagógica do ensino médio que não atende à especificidade da clientela

trabalhadora.

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Outros aspectos são apontados por Ladislau Dowbor (ALMEIDA; NHOQUE,

2010) que podem ser compreendidos quando se realiza uma análise do papel social da

educação básica, a partir da influência do pensamento moderno que tem colaborado para

proposição de um modelo que tem sido responsabilizado pela má qualidade da escola. Indica

que, para superação desse quadro, a escola deve estar inserida e funcionar como motor para o

desenvolvimento local. O papel social da escola se voltaria para a promoção da qualidade de

vida coletiva, da vida comunitária.

As desigualdades sociais, provocadas principalmente pela má distribuição das

riquezas do país, é o ponto nevrálgico da relação entre escola e a função que esta tem para a

sociedade. Para ele, a educação deve existir mais como elemento rearticulador da sociedade e

menos como reprodutor das desigualdades sociais. Deve servir como um instrumento de

inclusão social e começar pelo espaço da comunidade onde estão inseridas a escola e a sua

clientela – funcionários, pais, alunos. Os conteúdos trabalhados em sala, necessariamente,

partiriam da realidade do aluno, da realidade da comunidade e assumiriam a significância que

lhes são pertinentes, porque fazem parte da história da vida do aluno, da sua família, da sua

escola e da sua comunidade.

Algumas forças presentes na sociedade dão suporte para a permanência do

problema da desigualdade, a elite presente nas camadas sociais mais altas se utiliza de

mecanismos para retenção e não difusão dos conhecimentos produzidos pela humanidade.

Para Dowbor, o acesso ao conhecimento é um instrumento para que se efetivem

verdadeiramente as relações democráticas.

O problema da desigualdade é um fenômeno que historicamente se faz presente

no estado de Alagoas. O quadro socioeconômico e as repercussões no panorama educacional

em que se encontra o sistema público de ensino básico tem influenciado o trabalho dos

professores. Percebe-se que os entrevistados compreendem que a clientela a que atendem é

prejudicada em função das condições em que é ofertada a educação pela escola pública. A

relação entre a qualidade do ensino público e o da iniciativa privada em muito se distanciam,

assim como influenciam as suas práticas e as práticas pedagógicas da escola e efetivamente na

expectativa de professores e alunos acerca da educação. Isso está claro, por exemplo, nas

afirmações da professora Joana:

Eu tenho uma visão que o aluno de ensino médio tem que ter as mesmas

oportunidades que aluno da escola particular, da escola pública no caso. Ele

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tem que ter acesso a conteúdo, acesso a livros, tem que ter acesso a

vestibular, a faculdade [...]. Mas a gente esbarra com muita coisa, com todo

tipo de carência, no caso da escola pública. E, principalmente com as

carências deles, as dificuldades que eles trazem. Então é um trabalho

complicado, um trabalho difícil porque você quer tentar produzir o melhor

pra eles, quer ver o retorno [...]

O professor André percebe que as dificuldades dos alunos encontram as suas raízes na

oferta deficiente do ensino fundamental e o despreparo repercute no ensino médio, como bem

esclarece abaixo:

[...] Mas, como professor, noto de um modo geral, que os alunos de ensino

médio não têm nível médio na prática, são pessoas que vieram de atividades

terríveis no ensino fundamental, ou seja, chegaram ao ensino médio sem

fundamento e tem dificuldade de interpretar, de transpor o que pensa para o

papel e quando consegue isso, há dificuldade de usar todo esse

conhecimento para a vida prática [...]

Porém em sua fala, acredita que a escola privada não cumpre o papel de formar para a

vida, vincula a formação básica à preparação para o ensino superior:

Mas, a escola privada, muitas vezes peca... Ao invés de preparar para a vida,

prepara para entrar na universidade, para abrir a porta, mas não para está

preparado para estar na universidade de modo geral.

Ainda, em observação às relações oferecidas, às condições para a educação pública, à

percepção que os professores possuem da sua clientela, às repercussões do seu trabalho, nota-

se, na fala da professora Marlene, assim como nos outros, que há uma certa necessidade de

estabelecer um paralelismo entre o público e o privado, caracterizado principalmente pelo

despreparo, pela falta de estrutura, pelas ausências (dos pais/família):

.

[...] o ensino médio limita o aluno a se submeter ao ENEM (Exame Nacional

do Ensino Médio) para ingressar na universidade ou na faculdade e isso é

pouco por conta da competitividade que o mundo está oferecendo, uma vez

que a gente percebe que as escolas particulares, não todas, que estão mais

bonitas, elas dão mais oportunidades que as escolas publicas. Não

desmerecendo, mas são poucos da escola pública que tem o incentivo em

casa para prosseguir que o incentivo vem mais da escola. [...]

De forma clara, o professor Renato atrela à ingerência governamental a baixa

qualidade do ensino público, assim como Dowbor percebe que há necessidade do

reconhecimento, por parte do aluno, da constante atualização e de que os conhecimentos

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adquiridos na escola fora da comunidade em que reside dificultam a relação que este tem com

a escola. São duas as suas falas que ilustram as suas ideias:

Com as deficiências que tem o ensino público no país, principalmente

Alagoas que praticamente teve duas décadas (em) que foi esquecida, as duas

décadas anteriores, o que acontece é que o ensino foi sucateado e hoje como

o país está vivendo uma era de investimento, praticamente vai ser difícil essa

geração se enquadrar nesse perfil que o mercado de trabalho está exigindo e

haja vista que se está importando muitos técnicos para suprir essa carência,

por conta do sucateamento do ensino e do esquecimento dos poderes

públicos. Mas o mercado de trabalho hoje está exigindo que o aluno tenha

um certo conhecimento para poder entrar nele por conta do nível de

informação que ele está vivendo e do mundo tecnológico.

‘ A fala acima também aponta para reflexão acerca do papel do professor e o pouco

significado que pode ter o seu trabalho diante do desmonte da educação pública e a recente

importação de técnicos como um dos efeitos do desmantelamento do sistema educacional. Em

Alagoas, segundo relatório do Ministério Público Estadual (RIBEIRO, 2013), 6% das escolas

públicas estaduais não ofertaram aulas no ano letivo de 2012; 82% atrasaram o ano letivo;

destas, 51% não ofertaram a grade curricular completa e, em decorrência do atraso, 61 mil

alunos foram prejudicados.

A escola é um lugar em que vai formar o aluno, quer dizer, ele vem aqui

aprender comportamento. Cabe à escola moldar esse aluno. Para ele aplicar o

conhecimento dele na comunidade é uma coisa muito difícil, mesmo a escola

tendo canais na comunidade ela precisa (de) várias pessoas [...] porque o que

acontece é o seguinte: o aluno tem um perfil aqui na escola e onde mora

levar isso daqui prá lá porque primeiro ele vai ter uma segunda forma,

porque a maioria que está lá no meio dele não vai ter o mesmo, uma

educação que ele e vai existir um choque de comportamento. É muito difícil

aplicar o que aprende até mesmo dentro de casa por conta da educação do

pessoal que está no meio dele.

Mesmo expressando a ideia de que a escola se destina a moldar o aluno, de que ele

deve apreender o comportamento de uma sociedade com valores diferentes dos seus, o

professor rememora a ideia da escola em seus moldes tradicionais. Porém, o relato expressa as

dificuldades do exercício da docência com uma clientela que não consegue identificar o papel

da escola em sua vida e a sua função social. Queiramos entender o esforço que faz este

professor com o que nos diz Bauer (2009, p. 106) ao referir que educar é, na maioria das

vezes, “a forma mais significativa de inseri-los no universo da vida social, com o

compartilhamento de suas normas e valores espirituais, economia e política, cultura e

historicidade”. Mas que talvez não percebamos, como docentes, que questões muito mais

amplas a exemplo das relações estabelecidas atualmente entre o Estado, a sociedade e a escola

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trazem como implicação a baixa qualidade do ensino e, por consequência, a pouca efetividade

de seu trabalho.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo objetivou discutir o sentido do trabalho docente para os professores

que atuam em uma escola de ensino médio da rede estadual localizada na cidade de Maceió,

em Alagoas. Buscou-se também compreender a relação entre essa atribuição de sentido e os

processos formativos pelos quais os docentes participaram.

A abordagem qualitativa balizou o desenvolvimento do estudo. Fundamentou o

percurso da pesquisa composta pelo levantamento bibliográfico (recorreu-se aos livros,

artigos, teses e dissertações) e pela pesquisa documental. A coleta de dados foi

complementada com entrevistas semiestruturadas, realizadas com seis professores do ensino

médio de diferentes áreas do conhecimento. Em razão da minha experiência como professora

na instituição pesquisada, a escolhi como campo de investigação e isso facilitou o

desenvolvimento de estratégias para identificar as demandas do estudo.

A pesquisa revelou que entre os professores da escola não está clara a percepção

acerca das finalidades do ensino médio. Percebe-se que alguns apontam exatamente para o

texto da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/1996, a qual propaga que o

referido ensino deve ser destinado à formação do cidadão. Percebe-se que há ainda entre eles

os que acreditam que essa etapa de ensino serve à formação do cidadão, como preparatória

para a profissionalização e também como propedêutico.

Depreende-se que as precárias condições socioeconômicas em que vivem os alunos da

Escola constituem um dos motivos para que pensem o ensino médio como uma etapa que

serve para preparação de mão-de-obra para o mercado de trabalho. Percebem que, para os

estudantes de escolas particulares, o ensino médio se destina à preparação para os estudos

posteriores. Esse fato afirma a concepção de que há muito permeia as finalidades da educação

na nossa sociedade: escolas para os ricos e escola para os pobres. As condições em que é

ofertado o ensino nas escolas públicas contribui para essa divisão. A escola privada se volta

para a preparação para os estudos superiores (e para tal são equipadas com todos os recursos

materiais e humanos), enquanto nas escolas públicas há deficiências estruturais que impedem

a boa formação para a preparação para os estudos posteriores assim como para o mercado de

trabalho e até mesmo para a formação cidadã.

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Há dificuldades no desenvolvimento do trabalho docente no ensino médio em razão de

que os alunos apresentam baixas condições de aprendizagem que podem ser creditadas às

deficiências do ensino fundamental nas escolas públicas. Percebem que nem sempre está clara

para os alunos a relevância dos conhecimentos propagados pela escola e a finalidade destes

para a vida deles. Esse fato pode ser consequência de um modelo de educação da era moderna

e que, como nos diz Dowbor (ALMEIDA, NHOQUE, 2010), a escola em seus conteúdos e

estrutura está fora da realidade em que vivem os alunos. Em Maceió, o ensino médio é

ofertado prioritariamente pela rede estadual e isso provoca o deslocamento de um grande

contingente de alunos que saem de bairros periféricos onde moram – a escola pesquisada

possui cerca de 1.500 alunos e grande parte deles reside em bairros distantes.

Os professores desenvolvem as suas atividades de forma isolada pois não há

acompanhamento pedagógico por parte da escola em função de que os recursos humanos

disponíveis nas unidades se desviam para atividades geralmente ligadas à disciplina dos

alunos e ao trabalho burocrático. Identificam que as propostas de interação pedagógicas são

realizadas mediante proposição de projetos de caráter transversal realizados aos sábados e que

nem sempre são concluídos. Reconhecem que agentes externos ao processo pedagógico

fornecem suporte para as atividades desenvolvidas na escola. São organizações não-

governamentais, instituições de ensino superior, entre outras, que organizam momentos

pedagógicos para os alunos, mas nem sempre há participação dos docentes da casa.

Apesar de não ter ecoado em todas as falas dos professores entrevistados, a fala de um

deles vem ao encontro dos estudiosos da educação quando afirma que o isolamento no

desenvolvimento das atividades pedagógicas poderia ser minorado se houvesse efetivamente

uma articulação com o projeto político pedagógico por todos os professores. Para ele, a

prática não está articulada com o documento, o ensino médio deveria formar para a vida, para

que os alunos pudessem utilizar, no cotidiano, os ensinamentos apreendidos na escola, que

pudessem, a partir dos conhecimentos produzidos pela ciência e difundidos na escola, garantir

a eles a possibilidade de melhor compreender de forma crítica o mundo ao seu redor.

Pode-se dizer que a presente investigação poderá servir como elemento disparador

para outros estudos que desejem aprofundar a influência da participação dos agentes externos

nos processos educativos; os efeitos da crescente burocratização realizada por especialistas

nas questões de ordem pedagógica como uma forma de controle do trabalho docente; os

fatores que ocasionam a falta de compreensão do sentido de coletividade da profissão docente

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e os fatores que incidem diretamente no exercício da docência (isolamento, proletarização e

precarização) e, de forma mais ampla, a crescente influência de organismos internacionais que

ditam os rumos da educação e inibem o surgimento de outros modelos voltados para as

demandas locais e não apenas para o interesse do mundo exclusivamente econômico-

financeiro que atualmente obscurece a compreensão das finalidades e razão do ensino médio e

da educação para a sociedade.

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ANEXOS

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Roteiro das entrevistas

Nome

Formação inicial

Outras formações

Atua em que áreas?

Quando começou a atuar no magistério?

Há quanto tempo atua no Ensino Médio?

O que é trabalhar no Ensino Médio?

O que é ser professor no Ensino Médio?

O que o aluno da educação básica precisa aprender para o exercício adequado ao

mercado de trabalho? E para atuação como cidadão que contribui para a sua

comunidade?

Quais são as principais práticas pedagógicas desenvolvidas na escola?

Qual o papel social da escola?

Qual o papel social do Ensino Médio?

Gostaria de falar algo que não foi abordado nesta entrevista?

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PROFESSORA JOANA

Pesquisadora:

Qual sua formação inicial?

Professora:

Licenciatura em Biologia.

Pesquisadora:

Tem outras formações?

Professora:

Tenho em Farmácia. Tenho especialização em Tecnologia da Educação. Tecnologia da

educação é pós-graduação e Farmácia foi por equivalência e fiz lá no Cesmac (Centro

Universitário Cesmac) e Biologia foi minha primeira graduação na UFAL.

Pesquisadora:

Atuou em outras áreas?

Professora:

Não. Só na educação. Já trabalhei um tempo com ele (pai), na distribuidora

farmacêutica. Mas, não tinha nada a ver. Era só para ajudar, no começo quando ele (o pai)

começou a abrir. Não tinha ninguém e quem ajudava era a família mesmo.

Pesquisadora:

Quando começou a atuar no magistério?

Professora:

Antes de me formar.

Pesquisadora:

Quanto tempo?

Professora:

Quanto tempo tem que atuo no magistério? Misericórdia! Desde 90, 89 eu já dava aula

particular. Quando eu tava no 3º ano eu já dava aula particular, mas bote 90 que é quando

entrei na faculdade.

Pesquisadora:

Há quanto tempo atua no ensino médio?

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Professora:

Desde que entrei no Estado, em 2001.

Pesquisadora:

O que é ser professor no ensino médio?

Professora:

Ser professor no ensino médio é complicado. Eu tenho uma visão de que o aluno de

ensino médio tem que ter as mesmas oportunidades que aluno da escola particular, da escola

pública, no caso. Ele tem que ter acesso a conteúdo, acesso a livros, tem que ter acesso a

vestibular, à faculdade. Mas a gente esbarra com muita coisa, com todo tipo de carência, no

caso da escola pública. E, principalmente, com as carências deles, as dificuldades que eles

trazem. Então é um trabalho complicado, um trabalho difícil porque você quer tentar produzir

o melhor pra eles, quer ver o retorno deles. O retorno deles é o quê? É uma aprovação, uma

entrada na faculdade e a gente esbarra com esse monte de coisa. Mas, pra mim, na minha área

é o que prefiro. Eu trabalho com isso no ensino fundamental pra complementar a carga-

horária.

Pesquisadora:

Ser professor do ensino médio seria para?

Professora:

Para uma profissão, para uma faculdade, para uma formação, como se fosse um

degrau. Para que eles cheguem, aquela história do meio para atingir a meta.

Pesquisadora:

O que o aluno da educação básica precisa aprender para o exercício adequado do

mercado de trabalho?

Professora:

Tudo o que ele não aprende. Eles não sabem trabalhar em grupo, eles têm um péssimo

relacionamento interpessoal. Eles não sabem ler, interpretar, contextualizar, não têm noções

básicas da matemática, da lógica matemática, então, o que eles precisam no mercado de

trabalho é tudo o que não aprendem no ensino básico.

Pesquisadora:

E para atuação como cidadão, que contribui para sua comunidade? Quais são as

principais práticas pedagógicas desenvolvidas na escola para o ensino médio? O que é

que a escola faz especificamente para o ensino médio?

Professora:

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Do ano passado pra cá, a gente vem assim. Primeiro vem o pessoal da psicologia do

Cesmac (Centro Universitário Cesmac, instituição privada de ensino superior) trabalhando

com eles a questão da autoestima, mercado de trabalho, projeto de vida, o que vou fazer

depois da conclusão do ensino médio. Então, essas ações, é assim, a gente tem que buscar

foco. O que muitas coisas a gente não tem na escola. A Patrícia (funcionária de uma empresa

de fomento à empresas-júniores em escolas) também vêm com esses projetos, o pessoal do

segundo ano tá no projeto do empreendedorismo, todo sábado eles vem pra fazer o curso.

Então, a gente vem buscando essas ações fora. O pessoal do IFAL (Instituto Federal de

Ciência e Tecnologia de Alagoas) tá para colocar o laboratório de matemática para funcionar,

trabalhar com eles a questão da lógica matemática, dentro do laboratório. Ano passado,

conseguimos fazer a feira das profissões, já visado essa questão. Este ano queremos fazer de

novo. Eles foram visitar algumas faculdades, feira de cursos, da Maurício de Nassau

(instituição privada de ensino superior), da Uncisal (Universidade de Ciências da Saúde de

Alagoas, instituição de ensino superior do Estado), para conhecer os cursos, pra ver se a gente

consegue abrir o olho. Alguns têm essa visão de vestibular, de universidade, mas a maioria

não. A maioria tem aquela visão assim, terminar o ensino médio, do arrumar um emprego no

comércio, ser doméstica como a mãe, como a tia. A gente conversa muito com eles essa

questão assim, que não é uma coisa humilhante, mas que ele como estudante, eles precisam

olhar acima do muro. Ter outra visão do mundo, tentar ter outras oportunidades, até pra ver se

conseguem ter mais possibilidades do que a família deles. A visão da maioria deles é o final.

Eu converso muito com eles. Na época dos pais de vocês, dos meus pais, o ensino médio era

realmente o fim, hoje é o começo. Hoje ter ensino médio não é favor, é obrigação. Então,

vocês estão começando a partir do momento que concluir o terceiro ano. Muitos deles

começam a se acomodar, quando começam a conseguir esses subempregos, sem carteira

assinada, altamente explorados pelos patrões, uns mesmo da noite chegam aqui suados, com

fome, “nas carreiras”, porque a patroa só liberou depois que arrumou a cozinha, que o patrão

só liberou depois que arrumou o estoque e muitos deles não ganham nem um salário mínimo,

não têm carteira assinada e são superexplorados.

Pesquisadora:

Qual o papel social da escola?

Professora:

Social? Formar cidadãos. Formar o crítico, agente de mudança que saiba ouvir, saiba

ter opinião e saiba discutir. Quando você não forma o cidadão crítico, o que é que ele vai ser?

Baú, né. Ele vai ouvir, vai absorver e vai só reproduzir aquilo ali. Então, acho que a função

principal da escola é essa, é formar cidadão crítico, que esteja inserido na sociedade e que

contribua.

Pesquisadora:

Qual o papel do ensino médio?

Professora: Para o aluno?

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Pesquisadora:

Para a sociedade. Qual o papel social do ensino médio?

Professora:

É aquela história que disse no começo. Ensino médio hoje é só um meio de acesso. É

um degrau que eles precisam ultrapassar para chegar ao fim, que não é final, é o começo que é

a universidade. O ensino médio, eles conversam na sala para não tirar o estímulo. Mas, que é

uma coisa que você não sabe qual é a função. Ele prepara pra quê? Hoje o ensino médio pra

mim, você dá o conteúdo e ele serve como uma peneira para o vestibular. Então, aquele que

absorveu mais aqueles conteúdos ali, ele vai ter mais acesso a faculdade. O que outros não

vão ter. Ele tá servindo como um peneirão e os meninos vão pegando aquele monte de

conteúdo, sem saber exatamente com que função pra onde é que vai levar. Muitos deles

perguntam: professora, para que serve função? A gente tá endoidando. Eu vou usar função

aonde? Enquanto ele não tiver uma orientação melhor, enquanto os professores começarem a

trabalhar matérias e disciplinas pelas ideias que eles têm de universidade, fazer um ensino

médio mais direcionado, a função do ensino médio é essa.

Pesquisadora:

Você gostaria de falar algo que não foi abordado na entrevista?

Professora:

Não.

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PROFESSOR ANDRÉ

Pesquisadora:

Formação inicial?

Professor:

Minha formação inicial é licenciatura em História.

Pesquisadora:

Tem outras formações?

Professor:

Pós-graduação em Docência do Ensino Superior

Pesquisadora:

Atua em que área?

Professor:

Sou professor de História, na educação básica e, para completar o horário, ensino em

Geografia no ensino médio.

Pesquisadora:

Quando começou a atuar no magistério?

Professor:

Logo quando terminei a faculdade. Terminei em 99. Aliás, já quando era aluno, já

dava aula em cursinho. Comecei a dar umas aulas, mas não profissionalmente, só uma

experiência inicial. Como professor mesmo da rede pública comecei em 2001, quando fui

chamado pelo concurso.

Pesquisadora:

Há quanto tempo atua no ensino médio?

Professor:

Desde então, ou seja, tem 11 anos de experiência, vai completar.

Pesquisadora:

O que é trabalhar no ensino médio?

Professor:

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Para mim, trabalhar no ensino médio é exigir o que é, o que está sendo com o que

deveria ser. Eu acho que deveria ser, você está trabalhando com alunos que já tenham um

conhecimento muito bom, científico, conhecimento da língua, que daria condições pra que

você dê um aprofundamento maior para que essa pessoa esteja preparada para ingressar na

universidade ou então tenha um suporte técnico para atuar profissionalmente. E outra coisa

importante, é ter um nível de conhecimento tal que você tenha condições de aproveitar melhor

os recursos da sua vida. Então, relacionar muito a educação à vida profissional, mas, dentro da

sua casa, por exemplo, o conhecimento do ensino médio pode mudar seu relacionamento com

sua própria vida pessoal. O aproveitamento dos recursos da natureza. Compreender a casa que

você vive, a iluminação, sem ser arquiteto, compreender melhor higiene, sem ser um

infectologista, conhecer melhor a economia doméstica, sem ser um economista. Então, o nível

médio deveria ser no nível tal que, se a população tivesse esse aspecto adequado, o país

estaria bem melhor. Mas, como professor, noto, de um modo geral, que os alunos de ensino

médio não têm nível médio na prática, são pessoas que vieram de atividades terríveis no

ensino fundamental, ou seja, chegaram ao ensino médio sem fundamento e têm dificuldade de

interpretar, de transpor o que pensam para o papel e quando conseguem isso, a dificuldade de

usar todo esse conhecimento para a vida prática. A dificuldade existe muito nessa condição,

não saber exatamente como conseguir transformar isso porque sei que, na educação, nada se

consegue sozinho, porque a educação é um complexo e complexo já está dizendo, por mais

que eu seja um “às” em História eu não vou conseguir ser um aluno se não há uma sincronia

com meu trabalho com as outras disciplinas, com a coordenação da escola, com a família.

Então, hoje eu vejo assim, que o ensino médio deveria ser um nível muito elevado porque

conhecimento seria interessante para a sociedade e o que é algo como o aluno que deveria ter

um fundamento já garantido. Entendo o ensino médio como uma tentativa de garantir a

segunda luta. Não sei se eu satisfiz o “x” da questão.

Pesquisadora:

Você está querendo dizer é que o ensino médio é propedêutico, é

profissionalizante, ou é, na verdade, um nível de ensino que prepara em relação às

questões da vida?

Professor:

Eu acho que seriam as três coisas. O propedêutico é fundamental. Mas, ele se torna

propedêutico para um mundo acadêmico. Se você vai entrar na universidade e tem uma base

boa. Por exemplo, eu noto que eu pego um livro de Sociologia do ensino médio e um livro de

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Filosofia do ensino médio. O conhecimento que ele tem ali, se o aluno domina muito bem, ele

tem conhecimento propedêutico para tá fazendo o trabalho, por exemplo, na área de humanas

com uma base boa. Mas eu noto que, na universidade, os alunos da universidade, no máximo,

vão estudar o que já têm no ensino médio. Ele deveria ser propedêutico, mas ainda não

consegue ser, de certa forma, porque esse conhecimento ainda não se chega lá.

Pesquisadora:

Aquela história, com 3 anos não conhece tanto, nem prepara para a faculdade,

nem prepara para a vida, nem profissionaliza ....

Professor:

Mas cada pesquisa, especificamente no serviço público, a educação básica, porque,

por outro lado, a educação privada também não tem se mostrado tão eficiente.

Pesquisadora:

Quem está numa escola pública não é que vai, por exemplo, fazer um curso

profissionalizante.

Professor:

Exatamente. Mas, a escola privada, muitas vezes peca... ao invés de preparar para a

vida, prepara para entrar na universidade, para abrir a porta, mas não para está preparado para

estar na universidade de modo geral. Tanto é que a metodologia de trabalho dá aqueles

esquemas de esquemas que você sabe na prova, as opções que tem toques naquela palavra,

aquela palavra “x” lembra isso. Diferente de você entender com uma compreensão.

Pesquisadora:

O que é ser professor no ensino médio?

Professor:

Eu volto para aquela questão, o que deveria ser, o que está sendo. Eu acho assim, que,

no meu caso específico que trabalho com História, vem só uma coisa que me chama muita

atenção. Primeiro você tem que preparar a sua atuação na questão mais técnica, ou seja, você

tecnicamente falando, a sua didática no ensino fundamental está mais voltada para o lúdico.

Envolver o aluno de tal forma que, pelo planejamento, pelos recursos usados, pela forma

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como determina aquela aula, você consegue que mesmo aquele aluno desinteressado consiga

ser envolvido. Eu me lembro: “– Ah, não queria assistir ao filme”. Aí, quando diz: “- Senta na

cadeira, menino!”, por exemplo, naquele momento, quando passa uma cena interessante, ele

não esperava que teria aquilo. Então, o professor do ensino fundamental tem mais ou menos

esse papel, de ter habilidade técnica de envolver o aluno. Então, quando chega ao ensino

médio, você, de certa forma, já passou um pouco do seu limite. Você já cobra do aluno uma

maior concentração daquilo que deu. Mas, mesmo assim, você precisa de trabalho técnico.

Agora, no ensino médio, é uma fase que o aluno já está começando a despertar para as

questões, os questionamentos da sociedade, o adolescente. Então, você vai despertar para

essas questões políticas, então, tem o patamar mais de valor ativo da sociedade, você vai

discutir com eles. Como envolver o aluno? Essa questão desse envolvimento político com o

conhecimento, você criar um aluno justamente nessas necessidades e pensar em torno dele

próprio. Essa dimensão mais social e política do ensino, ela, de certa forma, é muito

importante. Só que também não é fácil despertar o envolvimento do aluno porque, justamente,

isso é uma questão de história. O professor que não toca nesse assunto, ele não consegue

envolver a turma. Porque a questão do momento justamente era pensar, era ser rebelde, ser

jovem. Hoje não, o jovem quer curtir. Isso aí é um problema, uma atividade a mais que

envolver o aluno a pensar politicamente e sociologicamente nesse trabalho histórico. Queria

falar outra definição, mas fugiu agora o raciocínio. Acontece que a... Como é mesmo a

pergunta inicial?

Pesquisadora:

O que é ser professor no ensino médio?

Professor:

Tenho um raciocínio que queria informar, me perdi. Era uma coisa importante. Sim,

vamos passar e depois volto. É importante principalmente para uma preparação para a vida e

trabalho. É uma formação mais técnica para o aluno enxergar a realidade. Ter a capacidade de

transformar o aluno em protagonista.

Pesquisadora:

O que o aluno da educação básica precisa aprender para o exercício adequado no

mercado de trabalho?

Professor:

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Sim, o ensino médio é esse patamar, você deve voltar o conhecimento que ele tem

básico, do ensino fundamental para já ligar com as questões das práticas. Agora, se você, no

caso, na minha disciplina, História, desse conhecimento voltado mais para a questão da

prática, seria você tentar fazer com que o aluno trabalhasse os conteúdos usando a chamada

âncora. O que seria âncora? Você vai desenvolver um trabalho sobre um tema, por exemplo, a

Idade Média, o trabalho. Você vai lembrar... Então, uma coisa muito importante que você tem

para, inclusive, despertar o interesse do aluno é você criar a chamada âncora. É você não

simplesmente falar “olha, naquela época a sociedade era dividida estadualmente,

determinados povos tem privilégios, outros obrigações com relação ao trabalho”. Se você se

perder naquele mundo, a Idade Média, você não consegue criar esse vínculo de conhecimento

atual com a realidade. Seria justamente interessante você conseguir criar âncora com o que é o

trabalho hoje. Qual a perspectiva do aluno? O que pode ser interessante para ele? Isso seria

ligar o aluno à realidade dele. Só que inclusive no parecer número 5, no ano passado, 2011, o

Conselho Nacional de Educação dá novas diretrizes para a educação básica, inclusive, trata

especificamente uma parte sobre o ensino médio. Traz essa preocupação com o trabalho

extraclasse. Um percentual, se não me engano 20%, não sei o percentual exato, não é que

seria bom se fosse fora da classe, mas obrigatoriamente desse... Então, seria muito bom a

escola e o professor tivesse condições de aproximar o aluno da realidade de trabalho, mas

aproximar bem próximo porque os alunos vivem numa sociedade, mas a diferença seria o

olhar dessa realidade. O professor criar atividades dentro daquele embasamento teórico com o

que fosse levado, juntamente com os colegas uma situação tal que ele começasse a pensar,

não dentro de uma visão, de uma perspectiva do senso comum, mas dentro de uma

perspectiva científica. Quando o aluno começasse a enxergar isso, não só na minha disciplina,

mas na outras disciplinas, ele teria uma facilidade a mais de relacionar o conhecimento teórico

dele com o mundo, no trabalho.

Pesquisadora:

Então, a questão do ensino médio também a ver principalmente com a questão

didática do professor?

Professor:

Com certeza, a didática, os recursos utilizados e, agora, para isso, tem que haver o

quê? Uma preparação do professor, teórico. Eu, como professor mesmo, a gente esbarra

naquele limite. Eu, por exemplo, tenho quarenta horas aqui na escola. O meu horário é

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distribuído de tal forma que venho quatro manhãs. É praticamente ocupando a cada cinco

horas do meu dia, são vinte horas. Três tardes, aí, mesmo que tenha prestes naquele meio, eu

não posso dizer que não tenho aula. Se estou na escola, não tem como correr. Só aí você

calcula quantas horas? Cinco vezes quatro é igual a vinte, mais quinze é igual a trinta e cinco.

Ou seja, estou cumprindo trinta e cinco horas. Só que acontece, às vezes, comigo tem

acontecido sempre, aulas aos sábado. Estou tendo quarenta aulas, quarenta horas na escola, ou

seja, que tempo sobra? Com turmas diferentes, disciplinas diferentes, como EJA (Educação de

Jovens e Adultos), com 1º ano, 2º ano, 3º ano, com turmas de 8º ano, 9º ano, tudo misturado.

Como vou ter tempo de cumprir uma carga horária integral, de quarenta horas na escola, ter

tempo extra para pesquisar, e para aperfeiçoar, me qualificar? E mesmo que eu tivesse seria

por conta própria, porque a escola não fornece isso. A escola fala que os professores deveriam

se dispor a participar da aula departamental, mas a escola não tem condições de assumir isso e

nem a rede pública do Estado e nem quer, porque alguém teria que trabalhar.

Pesquisadora: Então, mas a gente respondeu o que o aluno da educação básica precisa

aprender para o exercício do mercado de trabalho?

Professor: Sim. Seria isso. Essa experiência teórica com a análise da realidade prática, ou

seja, usando recursos didáticos que levasse o professor e a turma toda para começar a

compreender o mundo lá fora. Não que não deva para aprender a partir do senso comum, mas

com uma visão orientada cientificamente, tendo uma perspectiva nova para os alunos

conhecerem a realidade.

Pesquisadora:

Quais são as principais práticas pedagógicas desenvolvidas na escola?

Professor:

É, veja só, de pedagogia, usamos o termo prática e ação. A prática está relacionada ao

conjunto, ao trabalho da escola e ação seria uma atitude isolada do professor. Então, nesse

sentido, está uma coisa, quando uma escola consegue apenas reunir uma vez a cada seis meses

ou duas vezes os professores para discutir algumas coisas com “ah, problema tal”, já é um

grande acontecimento. Se não houver isso, podemos dizer que não há prática pedagógica

planejada. Há, na verdade, uma política de ações isoladas de professores, esse que é o

problema. Justamente a falta da prática pedagógica, da atuação teórica planejada levada à

efetiva ação, seria até melhor dizer à práxis. É isto que está faltando. Eu vejo isso como um

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dos grandes problemas hoje. E quem estaria no centro de tudo isso? A coordenação da escola.

Tem um projeto, tem seu projeto a partir do PPP da escola (Projeto Político Pedagógico), tem

um projeto didático ou vários projetos didáticos que integrassem as ações desses professores,

causando uma... Aí eu pergunto, qual coordenador que realmente consegue fazer isso?

Muitos, por pura incapacidade técnica, mas também aqueles que teriam preparo para isso,

estão ocupados com outras atividades, porque a escola não tem determinado funcionário que

não tá se comportando, para controlar a disciplina dos alunos nos corredores, ou muitas vezes

a questão burocrática da escola mesmo. Listar a compra de merendas e tudo mais. Então, o

que está faltando é isso, a prática na escola que está faltando e é uma ação conjunta de todos.

Pesquisadora:

Qual o papel social da escola?

Professor:

O papel social da escola é muito relevante e complexo, porque ele tem um papel de

preparar as futuras gerações do país. Isso aí a coisa é notória, só que isso aí é uma meta ao

longo, preparar lá fora não só para melhorar seu nível, aproveitar o conhecimento das

gerações anteriores, aperfeiçoar e adaptar a realidade de cada um. Mas, de forma mais prática,

tirar as crianças das ruas, despertar o conhecimento nas artes, nas ciências, de modo geral,

descobrir os potenciais, proteger em defesa própria, que às vezes a violência da criança ela

sofre em casa, diversos tipos de violência e, na escola, a forma de você ter um grupo social

que também fiscaliza abertamente. Se a criança chega com problemas de violência física,

arranhões, machucados ou uma tristeza profunda, a escola tem condições de começar a se

aproximar, de começar a discutir se há algum problema. Então, isso é um papel muito

importante porque aquela estrutura familiar do passado em que havia um patriarca que era o

proprietário daquela família, isso também já não existe teoricamente. A escola tem um papel

de dar cidadania às pessoas. Então, isso seria de você não ser só agora propriedade de uma

família ou de um ente familiar, mas ser parte de uma sociedade complexa que você vai ajudar

a construir. A escola tem um papel incrível, resta a participação da família, a situação do

Estado, a interação de toda a sociedade e o compromisso dos profissionais envolvidos para

você ter resultados radiantes.

Pesquisadora:

Qual o papel social do ensino médio?

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Professor:

O papel social do ensino médio seria como eu disse depois do adolescente conseguir

ter uma reeducação, ter fundamentado, deter a título de conhecimento fundamental, o ensino

médio teria justamente esse papel de criar essa possibilidade de preparar para o ensino

superior, de consolidar o conhecimento para a vida social do aluno, e também para a vida

profissional dele, porque, paralelamente ou posteriormente a educação do ensino médio, o

aluno poderia ter a preparação profissional que permite porque é aquela coisa, antigamente a

gente imaginava que tinha obrigação de fazer ensino superior, hoje chega à conclusão de que

não. Eu acho que conhecimento que alguém adquire até o ensino médio é um conhecimento

que, se fosse realmente compatível com o que é o ensino médio, é um conhecimento muito

elevado. E você pode desenvolver coisas incríveis e se realizar profissionalmente nesse nível.

Isso aí é uma coisa que eu já propus. Uma pessoa com nível médio, com boa formação e se

dedicar ao comércio, você tem condições de saber atender as pessoas e de organizar, usar os

recursos tecnológicos porque quantos foram gênios sem ter terminado a faculdade?

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PROFESSORA MARLENE

Pesquisadora:

Formação inicial?

Professora:

Geografia. Licenciatura e bacharelado.

Pesquisadora:

Não tem outras formações?

Professora:

Não. Só magistério, ensino médio.

Pesquisadora:

Só atua na área de ciências humanas?

Professora:

Só.

Pesquisadora:

Começou atuar no magistério quando?

Professora:

1997.

Pesquisadora:

No ensino médio, quando começou a atuar?

Professora:

Em 2003. Assim que iniciei, quando fui contratada monitora lá no Benedito Bentes, no

Dom Otávio, já foi com o ensino médio.

Pesquisadora:

O que é trabalhar no ensino médio?

Professora:

Condições financeiras que, no momento, não me é escasso, mas não me dá condições

de aqui agir. Então, ser professor do ensino médio é... eu tenho que ter mais empenho, mais

cuidado, mais responsabilidade principalmente com o 3º ano que eu tenho, estou sabendo que

eles vão ser entregues ao mercado de trabalho. O que foi que eu fiz em prol disso? Uma vez

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que em Geografia quase todos os concursos requer questões abertas e sobre conhecimentos

gerais e Geografia é uma das que pode ajudar nisso e eu tenho que me empenhar o máximo,

eu estou constrangida de não poder estar agindo assim. Porque eu posso até trazer a revista

que pareça ou copiar, eles não vão suportar.

Pesquisadora:

O que o aluno da educação básica precisa aprender para o exercício adequado

para o mercado de trabalho?

Professora:

Além da educação doméstica, essa educação doméstica é importante, tem que ter

solidificada na escola. Então, eu como professora, eu sou professora e educadora. Enquanto os

pais e os responsáveis podem ser apenas educadores. Eu tenho que ser professora e

educadora, a partir do entrar na sala de aula, porque estou mostrando a ele o horário que tem

que ser mantido, não exigindo. Qual é a hora que tem que chegar? Porque estou querendo

prepará-lo para o mundo, para o mercado de trabalho. Horário, testes, tudo isso o professor

pode orientá-lo. Em termo de conhecimento, enquanto é ciência.

Pesquisadora:

Retomando a pergunta: O que o aluno da educação básica precisa aprender para

o exercício adequado para o mercado de trabalho?

Professora:

Desde a formação de orientação, de quanto o teste, de quando chegar no horário, como

eu gosto das escolas, o modo, o enquanto... Em paralelo, disciplinas profissionalizantes,

porque o ensino médio limita o aluno a se submeter ao ENEM (Exame Nacional do Ensino

Médio) para ingressar na universidade ou na faculdade e isso é pouco por conta da

competitividade que o mundo está oferecendo, uma vez que a gente percebe que as escolas

particulares, não todas, que estão mais bonitas, elas dão mais oportunidades que as escolas

públicas. Não desmerecendo, mas são poucos da escola pública que têmm o incentivo em casa

para prosseguir que o incentivo vem mais da escola. Então, eles têm que ter mais

conhecimento, não só nas disciplinas exatas como em disciplinas técnicas que preparem para

o mercado de trabalho, o que seria uns cursos técnicos que são oferecidos e que eles deviam

serem orientados para participarem em horário diferente da escola.

Pesquisadora:

Quais as principais práticas pedagógicas desenvolvidas na escola?

Professora:

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Eu não vejo diferente entre o trabalho que é feito para os alunos do ensino

fundamental e nem para com os alunos do ensino médio. É tanto que percebo que tem que

haver um melhor investimento enquanto acumular a partir do 1º ano. Tudo isso para

investimento da própria escola. O investimento que eu vejo é mais assim, de projetos, não

polos, mas no ensino médio irem no final de semana, no sábado, para construir uma paródia.

Mas, a pedagogia usada para o fundamental passa mesmo o suporte técnico, mesmo trabalho.

Pesquisadora:

Qual o papel social da escola?

Professora:

Formar cidadãos, esforçados, cientes do que esperam lá fora e, por conta disso, eu

acho que há uma necessidade maior, não de pisar na sala da escola, mas de uma reunião pelo

menos a cada três meses com todo o ensino médio a partir do primeiro ano, para conscientizá-

los, o que eles esperam. Não eles acharem que o terceiro ano é o ponto de parada não é o

ponto de partida. Adultos estão lá atrás, sem estímulo algum, esperando a aprovação do

conselho de classe e, inclusive, ajudando a minha irmã no trabalho de conselho de classe,

trabalho de nível superior. Eu gostaria até de trazer para fazer mais para mostrar que conselho

de classe não é reunião de coordenador e professor para saber qual aluno está pendurado nesta

ou naquela disciplina não. Conselho de classe são estratégias para facilitar o trabalho do

ensino e aprendizagem.

Pesquisadora:

Qual o papel social do ensino médio?

Professora:

O papel social do ensino médio está deixando a desejar, porque ele está andando só.

Ele não está andando em paralelo com o curso técnico. Mesmo que esta disciplina técnica,

este curso técnico não venha ser em outro horário por conta de ser dispendioso, questão de

passagem ou porque não se empenhe, como se empenhe em mandar os transportes para eles

virem às escolas.

Pesquisadora:

Para que serve o ensino médio na sociedade?

Professora:

Ele serve apenas para o aluno concluir, tentar vestibular. Para a sociedade que você

fala, é para as autoridades?

Pesquisadora:

Não, serve para que o ensino médio?

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Pesquisadora:

Ele serve apenas para lhe dar a possibilidade, se você for tentar ingressar na

universidade, senão, por ali parou.

Pesquisadora:

Você queria falar alguma coisa?

Professora:

Eu gostaria de que o Estado propiciasse ao professor o que, quando eu como monitora

da prefeitura, conseguia para que eu pudesse entrar mais solta na sala de aula, porque eu me

sinto como uma pessoa sempre em fase de alfabetização, sempre a adequar ninguém. Quando

lá na SEMED (Secretaria Municipal de Educação de Maceió), eu, como contratada, nós

tínhamos a liberdade de, não é a liberdade, a oportunidade de termos alguém para esclarecer

muita coisa quinzenalmente dentro da disciplina.

Pesquisadora:

Então você acha que precisa de especialista?

Professora:

Tem, sem precisar de festa, de banquete, de coffee-break, porque isso vai acontecer e

que isso seja uma coisa normal, corriqueira. Um apoio pedagógico.

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PROFESSOR RONALDO

Pesquisadora:

Qual sua formação inicial?

Professor:

Filosofia.

Pesquisadora:

Tem outras formações além dessa?

Professor:

Não.

Pesquisadora:

Atua em que área?

Professor:

Sociologia e Filosofia.

Pesquisadora:

Quando começou a atuar no magistério?

Professor:

Acho que faz oito anos.

Pesquisadora:

Há quanto tempo você trabalha com ensino médio?

Professor:

Cinco anos.

Pesquisadora:

O que é trabalhar no ensino médio?

Professor:

Trabalhar no ensino médio? Seria uma das visões para perceber o andamento do aluno,

o avanço, o processo pelo qual ele passou, chegou ali. O fim do ensino, a concretização

daquele conhecimento que foi feito no ensino fundamental e o aperfeiçoamento para sair aqui

da escola normal, tenho essa visão. A única expressão de conhecimento produzido, às vezes é

a questão do ensino médio, sendo trabalhado. Tem que ser trabalhado de maneira bem

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proveitosa, porque você tem que visar a uma faculdade, o aluno tem que se espelhar numa

faculdade, numa universidade.

Pesquisadora:

O que é ser professor no ensino médio?

Professor:

Seria dar sua contribuição para aqueles alunos, principalmente da rede pública. Os

alunos que não tem às vezes oportunidade de pagar uma escola particular e eles se colocam

nas mãos dos professores, no caso. Tem muito professor que vem dar aula e enrola. E o

ensino médio, principalmente de colégio público, exige muito a questão da ética, da boa

índole do professor. Se ele passou por um ensino médio e a sua etapa de provação, foi

colocado, ele teve muito provas negativas eu acho que muitos professores aí que passaram por

momentos negativos na escola pública, acham que eles vão tentar fazer o diferencial. Acho

que também é isso, é fazer o diferencial.

Pesquisadora:

O que o aluno da educação básica, ensino fundamental e médio, precisa aprender

para o exercício adequado do mercado de trabalho? O que ensino básico pode oferecer

para esses meninos exercerem sua função no mercado de trabalho?

Professor:

Educação básica seria o quê?

Pesquisadora:

Seria o ensino fundamental e o médio.

Professor:

O ensino fundamental e o médio, né? Seria o conhecimento de mundo, proporcionado

pela escola, seria o quê? A interligação das disciplinas, matemática, química, física,

português, filosofia, sociologia, tudo junto. E, quando é proporcionado isso para o aluno, ele

acaba tendo um leque grande, por exemplo, numa seleção de uma empresa, o aluno que se

envolve bem, acredito eu que ele acaba tendo um êxito numa entrevista, um bom êxito

naquele trabalho, porque ele vai colocar na prática aquilo que aprendeu na escola. Acho que

seria esse o objetivo, seria essa a questão do ensino.

Pesquisadora:

Quais são as principais práticas pedagógicas desenvolvidas na escola?

Professor:

Caso, práticas utilização de vídeos, essas coisas. Utilização de trabalho, por exemplo,

peço para eles fazerem pesquisa em casa. Eu passo o nome de autores, de filósofos para eles

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pesquisarem e trazer, trabalhar com seminários também porque é útil para outros cursos. Eles

próprios pegam e vou pensar sobre algum pensador, algum filósofo, por exemplo, trazem e

vão fazer reflexão sobre aquele filósofo, vão colocar na sala de aula e daí vão gerar perguntas,

vão fazer pesquisa diferente e daí vai ajudar no conhecimento.

Pesquisadora:

Certo, isso aí no caso é você. E a escola?

Professor:

A escola, em que sentido, assim?

Pesquisadora:

Quais são as práticas que a escola desenvolve para esses alunos do ensino médio,

além da questão da aula? Proporcionar a aula, ela proporciona, mas é mais que isso.

Professor:

As práticas que o colégio desenvolve, eu sei que tem alguns momentos, digamos

assim que o colégio, principalmente aos sábados, sempre aos sábados, que seria uma questão

de interação entre as turmas que se ajudam, mesmo conteúdo que é trabalhado, começa a ser

trabalhado pelas duas turmas. Acho que tem apresentação também de ... de História, tem

outras questões aí. Estou um pouco por fora.

Pesquisadora:

Qual o papel social da escola?

Professor:

O papel social da escola, eu acho que é fundamental, acho que é tudo. Enquanto

instituição ela proporciona, digamos, mais da metade da formação do ser humano. Por

exemplo, professor hoje não é só aquele que passa conteúdo, mas é aquele educador, aquele

que vai além da condição de conteúdo. Seria o quê? Seria levar em conta o meio em que o

educando, o aluno se encontra, por exemplo, onde é que ele mora se mora lá no Tabuleiro, se

mora aqui numa grota. Ele tem que ter uma certa sensibilidade para perceber a educação além

da sala de aula, acho que é isso. E ajudar nesse processo de educação, ajudar nesse processo

de sair daquela condição social dele. Acho que a escola proporciona isso.

Pesquisadora:

Qual o papel social do ensino médio?

Professor:

Papel social do ensino médio? Acho que o ensino médio ele vai, até volto para aquela

visão antiga de pouco tempo. O ensino médio tem a função de preparar mesmo a pessoa para

o mercado de trabalho. Por exemplo, vou terminar o ensino médio para fazer uma faculdade.

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Digamos que o ensino médio está próximo desse mercado de trabalho e a faculdade vai estar

na concretização. O aluno que faz o ensino médio acha que tem essa visão de entrar no

mercado de trabalho, ser uma base para o mercado de trabalho, acha que é isso.

Pesquisadora:

Você gostaria de falar mais alguma coisa além do que a gente conversou aqui?

Professor:

Não.

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PROFESSORA ABGAIL

Pesquisadora:

Formação inicial

Professora:

Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Alagoas

Pesquisadora:

Outras formações?

Professora:

Não tenho.

Pesquisadora:

Atua em que áreas?

Professora:

Ciências e Biologia

Pesquisadora:

Quando começou a atuar no magistério?

Professora:

Desde 2001

Pesquisadora:

Há quanto tempo atua no Ensino Médio?

Professora:

Comecei com o Ensino Médio – há quase doze anos

Pesquisadora:

O que é trabalhar no Ensino Médio?

Professora:

Trabalhar no ensino médio hoje é um desafio, porque na escola pública ele perde um

pouquinho o seu objetivo, porque os meus alunos não almejam ir para a universidade. Aqui o

Ensino Médio nem é profissionalizante e está fazendo uma coisa que é preparar para a

universidade, coisa que a maioria não almeja, então perde o sentido desse Ensino Médio.

Pesquisadora:

O que é ser professor no Ensino Médio?

Professora:

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É um desafio. Principalmente hoje que a gente pega um aluno com uma defasagem de

conteúdo e você precisa mostrar que o conteúdo que está trabalhando é relevante no dia-a-dia

dele e, muitas vezes, eles não querem nem o ouvir e acham que aquilo é para decorar e ter

uma nota e ir embora acatar, mostrar que aquilo é importante que ele usa a ciência e a

Biologia em todos os momentos e não só aspectos da vida dele, mas como cidadão. Então,

esse é o grande desafio, eles não querem mais parar para ouvir, ou para estudar ou para

entender – o professor tem o desafio de tentar, fazer tentativa, é fazer com que eles gostem ou

queiram ouvir , entender, precisa ser um apaixonado tanto pela disciplina como pela

profissão.

Pesquisadora:

O que o aluno da educação básica precisa aprender para o exercício adequado ao

mercado de trabalho? E para atuação como cidadão que contribui para a sua

comunidade?

Professora:

Eu acho que, na Educação Básica, eu me prendo muito ao método científico, tem muito a

ver com ciência, porque você tem método científico, vai aplicar em qualquer área. Acho

muito importante ele aprender o valor do registro, da leitura, aquilo que você está observando,

não só ver mas observar, tentar entender, escrever, levantar hipóteses propor. Se o aluno tem

essa vivência em qualquer disciplina, não apenas em Biologia, vai servir para o resto da vida

dele porque ele vai aprender a problematizar e a pensar.

Pesquisadora:

Quais são as principais práticas pedagógicas desenvolvidas na escola?

Professora

No primeiro semestre desse ano, nós começamos a trabalhar com projetos pedagógicos

interdisciplinares. Fizemos um sobre os símbolos cívicos, que tem a ver com Sete de

Setembro, resgatar o respeito à pátria, a questão da nacionalidade. Deu certo, os dois

primeiros encontros foram muitos bons, todos os professores independente de qualquer área, o

professor do grupo de geografia, história, filosofia, eles trouxeram o projeto e estavam à

frente, mas todos se engajavam. Para mim era um sonho de escola. Mas depois de duas

tentativas que deram certo, a escola abortou o trabalho porque dá trabalho e isso me

entristesse. Esse ano foi uma decepção muito grande porque na prática a gente viu que dá

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certo. Os meninos vinham para cá aos sábados e produziam coisas belíssimas, e você

descobre artistas de todas as áreas e descobre outros saberes que aquela criança tem e que não

foi minimamente valorizado. Poder trabalhar com projetos, poder sentar com um colega e

planejar, a Biologia não é só minha, a História não é só do outro professor, está tudo integrado

e quando a gente tem essa visão o aluno também interage (...) Os projetos são muito

importantes, eu gosto muito deles. Eu trabalho com um projeto na área de educação sexual, é

um projeto do Estado, que fez a capacitação e manda o material. É bom e vejo resultados, não

gosto da forma como eles cobram os dados, é um trabalho interdisciplinar e não termina

ficando só com a Biologia e a Ciência. Outras práticas pedagógicas da escola são tentativas de

projetos de leitura. (...)

Pesquisadora:

Qual o papel social da escola?

Professora:

É justamente, é preciso que, no final do processo, durante o processo, se tenha uma

criança que seja questionadora, que ela consiga pensar, que ela consiga encontrar os próprios

caminhos, que ela seja um cidadão, Cidadão é isso, perceber onde está o problema, analisa e

quer solução, você sabe se portar diante da equipe, cobrar e vai ser participativo na resolução.

O nosso papel é de formador, formar para pensar, para questionar.

Pesquisadora:

Qual o papel social do Ensino Médio?

Professora:

Na escola pública, esse nosso papel – estou tentando redescobrir. Acho que é de

formação, de formar o cidadão, de sair pensante, de conseguir problematizar e buscar essas

soluções. O que me angustia é não saber o que o aluno do Ensino Médio hoje em dia o que

quer. Ele termina o ciclo sem saber o que quer: ele quer da vida dele. Não quer trabalhar, não

quer ingressar na universidade, ele quer consumir sem ter dinheiro – bolsa família, “bolsa

aquilo”.

Pesquisadora:

Gostaria de falar algo que não foi abordado nesta entrevista?

Professora:

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A mudança da família, a família mudou muito e a sociedade é uma sociedade do ter.

Eu não tenho o que me alimentar, mas tenho um celular de última geração. Essas escolhas que

são da família. É importante mostrar que é importante. O conhecimento científico, formal é

importante em alguma época da nossa vida. Repensar o caminho da escola com esse aluno

que só pensa em consumir.

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PROFESSOR RENATO

Pesquisadora:

Formação inicial?

Professor:

Graduado em Matemática

Pesquisadora:

Outras formações

Professor:

Especialização em Matemática em Estrutura e Funcionamento do 2º grau.

Pesquisadora:

Atua em que áreas?

Professor:

Professor de matemática e bancário

Pesquisadora:

Quando começou a atuar no magistério?

Professor:

Em 1992

Pesquisadora:

Há quanto tempo atua no Ensino Médio?

Professor:

Desde quando me graduei em Matemática

Pesquisadora:

O que é trabalhar no Ensino Médio?

Professor:

No princípio, o ensino médio era voltado somente para preparar o aluno para o

vestibular. Atualmente, os professores estão fazendo uma adaptação para se enquadrar no

ENEM. Na verdade, o que o governo está querendo é que a formação geral seja para a

aplicação no mercado de trabalho, só que até agora não tem estrutura para isso. Então o

ensino médio está voltado para prestar provas para o superior.

Pesquisadora:

O que é ser professor no Ensino Médio?

Professor:

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É fazer uma preparação para o mercado de trabalho, ou então para um estudo

posterior.

Pesquisadora:

O que o aluno da educação básica precisa aprender para o exercício adequado ao

mercado de trabalho? E para atuação como cidadão que contribui para a sua

comunidade?

Professor:

Com as deficiências que tem o ensino público no país, principalmente Alagoas que

praticamente teve duas décadas que foi esquecida, as duas décadas anteriores, o que acontece

é que o ensino foi sucateado e hoje como o país está vivendo uma era de investimento,

praticamente vai ser difícil essa geração se enquadrar nesse perfil que o mercado de trabalho

está exigindo e haja vista que se está importando muitos técnicos para suprir essa carência,

por conta do sucateamento do ensino e do esquecimento dos poderes públicos. Mas o mercado

de trabalho hoje está exigindo que o aluno tenha um certo conhecimento para poder entrar

nele por conta do nível de informação que ele está vivendo e do mundo tecnológico.

Pesquisadora:

E para a atuação como cidadão que contribui para a sua comunidade?

Professor:

A escola é um lugar que vai formar o aluno, quer dizer, ele vem aqui aprender

comportamento. Cabe à escola moldar esse aluno. Para ele aplicar o conhecimento dele na

comunidade, é uma coisa muito difícil. Mesmo a escola tendo canais na comunidade, ela

precisa várias pessoas para incutir sua (....) porque o que acontece é o seguinte: o aluno tem

um perfil aqui na escola e onde mora. Levar isso daqui prá lá porque primeiro ele vai ter uma

segunda forma, porque a maioria que está lá no meio dele não vai ter o mesmo uma educação

que ele e vai existir um choque de comportamento. É muito difícil aplicar o que aprende até

mesmo dentro de casa por conta da educação do pessoal que está no meio dele.

Pesquisadora:

Quais são as principais práticas pedagógicas desenvolvidas na escola?

Professor:

Na realidade, não tem uma prática pedagógica em escola pública que explore o que o

aluno necessita. Por exemplo, a gente considera a prática pedagógica aquilo que se pode

planejar no início para ser aplicado durante o ano. A gente não tem esse apoio nem da escola.

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As práticas que temos usado são as tradicionais. Praticamente o professor de escola pública é

muito difícil ele variar o que ele vem fazendo em sala de aula. Talvez a escola faça alguns

eventos para ver se é aplicável na melhora a maneira de passar isso para os alunos.

Pesquisadora:

Qual o papel social da escola?

Professor:

Que a escola forme o aluno, o cidadão para atuar na comunidade, no mercado de

trabalho, para saber os direitos e deveres deles para ele saber como aplicar a ciência. Na

realidade, é a formação geral para a vida dele. Acho que a escola não está fazendo isso direito,

talvez ela não tenha condições de fazer isso.

Pesquisadora:

Qual o papel social do Ensino Médio?

Professor:

O papel social da escola seria preparar o aluno para entrar ou no mercado de trabalho

ou ter condições para entrar no ensino superior. Na realidade, deixar o aluno preparado para

exercer qualquer uma dessas escolhas.

Pesquisadora:

Gostaria de falar algo que não foi abordado nesta entrevista?

Professor:

O que quero dizer é que certas entrevistas são feitas de maneira técnica e o meio onde

a gente vive ele. Na realidade, qualquer pessoa consegue ver que a escola não tá boa. A

pergunta está sendo formalizada, mas não é a primeira entrevista que dou. Tudo vai para o

papel, mas nada sai do papel para ser aplicado. Se você começar a ler esses teóricos que já

fizeram um monte de coisa, praticamente ele faz uma coisa numa época e vê o que está

acontecendo para a época, ele tem o remédio para agora, mas o remédio não serve para o

futuro. Ele só resolve o problema de uma certa época, uma certa geração e as demais gerações

ficam do mesmo jeito. O problema da escola eu acho que é a estrutura de cima. Começando

de cima, os poderes encararem a escola, um meio de transformação da sociedade. Se a pessoa

ficar só coletando informações, dados para colocar no papel e não ter efeito, fazer só

sondagem, nada disso vai adiantar porque eu acho a estrutura deficiente, porque apontar os

defeitos é fácil, difícil é sanar, curar esses defeitos para poder seguir em frente. A pergunta

que devia ser aplicada seria: Como é que vou aplicar isso para melhorar isso? Como vou

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resolver isso daí? Primeiro precisa resolver a parte de cima, o que acontece é que o poder de

cima quer só número. O que acontece é que está chegando uma maioria de alunos sem saber

de nada e a gente se desdobra para passar o mínimo para eles aí depois é questionado que não

sabe ensinar, não faz a parte dele, não sabe que a gente vive massacrado com carga horária

muito maior que ele que não pode, não tem tempo para se reciclar, salas muito cheias, alunos

rebeldes ele tem direitos, tudo isso aí é por conta das facilidades que deram para os novos e

principalmente para depois.