UNIVERSIDADE CIDADE DE SÃO PAULO
PROGRAMA DE MESTRADO E DOUTORADO
EM FISIOTERAPIA
KAREN CRISTINE LEITE DE MORAES
REPERCUSSÃO DA NEFRECTOMIA NA FUNÇÃO
PULMONAR E FORÇA MUSCULAR RESPIRATÓRIA DE
DOADORES VIVOS: ESTUDO LONGITUDINAL
SÃO PAULO
2014
KAREN CRISTINE LEITE DE MORAES
REPERCUSSÃO DA NEFRECTOMIA NA FUNÇÃO
PULMONAR E FORÇA MUSCULAR RESPIRATÓRIA DE
DOADORES VIVOS: ESTUDO LONGITUDINAL
Dissertação apresentada ao Programa de
Mestrado e Doutorado em Fisioterapia
da Universidade Cidade de São Paulo,
como requisito exigido para obtenção do
título de Mestre sob orientação da
Profª.Drª. Luciana Dias Chiavegato.
SÃO PAULO
2014
KAREN CRISTINE LEITE DE MORAES
REPERCUSSÃO DA NEFRECTOMIA NA FUNÇÃO
PULMONAR E FORÇA MUSCULAR RESPIRATÓRIA DE
DOADORES VIVOS: ESTUDO LONGITUDINAL
Dissertação apresentada ao Programa de Mestrado e Doutorado em
Fisioterapia da Universidade Cidade de São Paulo,como requisito exigido
para obtenção do título de Mestre.
Área de concentração: Avaliação, Intervenção e Prevenção em Fisioterapia
Data da defesa: 31 de Outubro de 2014
Resultado: ____________________________
BANCA EXAMINADORA:
Profª. Dra. Luciana Dias Chiavegato________________________________________
Universidade Cidade de São Paulo
Prof. Dr. Dirceu Costa ___________________________________________________
Programa de Pós graduação de Ciências da Reabilitação da UNINOVE
Prof. Dra.Sandra Cristina Alouche__________________________________________
Universidade Cidade de São Paulo
AGRADECIMENTOS
Acima de tudo agradeço a Deus, por ter me dado o sopro da vida, uma nova história e tua
graça para chegar até aqui.
Aos meus pais Eliseu e Ignez, espelho de minha educação, formação pessoal e construção de
valores e princípios. Por todo o amor, incentivo e doação. Minha eterna gratidão e amor
Ao meu filho Murilo, filho amado, bendito, filho de uma promessa designada por Deus.
Obrigado meu príncipe por toda compreensão e carinho. Eterno amor
A minha orientadora, professora Dra. Luciana Dias Chiavegato, por toda confiança, paciência,
disponibilidade e incentivo. Obrigada por ir além do que seu papel profissional, tão humano e
sensível fazendo a diferença em nossa vida
A todos os professores do programa de mestrado, por todo aprendizado concedido, em
especial ao professor Dr. Leonardo Oliveira Pena Costa pela oportunidade, dedicação e
confiança
A professora Dra. Denise de Moraes Paisani, por toda contribuição, disponibilidade e parceria
Ao professor Dr. Marcelo Fernandes, por toda amizade, oportunidade, confiança, apoio e
troca de experiências em tantos momentos
Aos pacientes, familiares e funcionários que fizeram parte direta e indireta desta pesquisa,
pela confiança e esperança depositada.
A minha amiga, irmã, pastora Lígia Canellas por todo amor, amizade, incentivo, orações
desde o princípio. Obrigada por todos os momentos compartilhados e por ter me conduzido
sempre à Fonte de Água Viva, Cristo Jesus
Ao meu amigo, parceiro, companheiro Alexander Negreiros que tanto me ajudou e colaborou
durante todo esse processo. Obrigada por toda paciência e carinho
As minhas queridas Lis, Elaine, Celi, Vivi, a minha família e a todos que estiveram presentes
direta ou indiretamente na minha vida por todo amor, apoio e força
Meus sinceros agradecimentos
“Aquele que começou a boa obra é Fiel para
aperfeiçoá-la até o fim...” (Fl 1:6)
Toda Honra e Toda Glória a Ti meu Deus, Soberano
sobre todas as coisas...
LISTA DE TABELAS
Tabela 1. Características gerais dos 110 doadores renais .................................................. 32
Tabela 2. Variáveis da função pulmonar no pré, 1º. 2º. 3º e 5º dias de pós-operatório ..... 33
Tabela 3. Força muscular respiratória dos doadores no pré.1º. 2º. 3º e 5º dias de pós-
operatório ...........................................................................................................
33
Tabela 4. Qualidade de vida no pré e pós-operatório dos 110 doadores renais ................. 34
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
DRC: Doença renal crônica
PO: Pós-operatório
CPP: Complicações Pulmonares Pós-Operatórias
CAA: Cirurgia Abdominal Alta
CRF: Capacidade Residual Funcional
CVF: Capacidade Vital Forçada
VEF1: Volume Expirado Forçado no 1º segundo
PImáx: Pressão inspiratória máxima
PEmáx: Pressão expiratória máxima
SUMÁRIO
PREFÁCIO ............................................................................................................................ 09
RESUMO ............................................................................................................................... 10
ABSTRACT ........................................................................................................................... 11
CAPÍTULO 1
1.CONTEXTUALIZAÇÃO .............................................................................................. 12
1.1 Alterações na função pulmonar e força muscular respiratória no pós-operatório ... 13
1.2 Complicações pulmonares ....................................................................................... 15
1.3 Qualidade de vida .................................................................................................... 16
2. OBJETIVOS ................................................................................................................... 18
3. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................... 19
CAPÍTULO 2
RESUMO ................................................................................................................................ 24
ABSTRACT ............................................................................................................................ 25
INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 26
MÉTODOS .............................................................................................................................. 28
RESULTADOS ....................................................................................................................... 32
DISCUSSÃO ........................................................................................................................... 35
CONCLUSÃO ............................................................................................................... 38
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................... 39
CAPÍTULO 3
CONSIDERAÇÕES FINAIS .................................................................................................. 42
ANEXOS................................................................................................................................ 44
PREFÁCIO
Esta dissertação está apresentada no formato híbrido proposto pelo Programa de
Mestrado em Fisioterapia da Universidade Cidade de São Paulo (UNICID). No primeiro
capítulo consta uma contextualização que visa fornecer informações a respeito da doença
renal crônica, o transplante renal com doadores vivos e o seu pós-operatório. Compreende
também a justificativa do estudo e seus respectivos objetivos.
Nosso trabalho resultou no artigo “Repercussão da nefrectomia na função pulmonar e
força muscular respiratória: estudo longitudinal”, o qual se encontra no capítulo 2, contendo
introdução, métodos, resultados, discussão e referências bibliográficas. Este artigo foi
submetido para a revista Brazilian Journal of Physical Therapy, portanto, encontra-se escrito
aos moldes propostos pela mesma.
No capítulo 3 constam-se as considerações finais, apontando as principais implicações
dos achados deste estudo, limitações e sugestões para futuras pesquisas. Por fim, encontram-
se como anexos: Termo de Consentimento Livre e Esclarecido que foi assinado pelos
participantes da pesquisa; Ficha de avaliação fisioterapêutica; Questionário de Qualidade
vida SF-36 e a Escala Visual Analógica de Dor utilizada durante a coleta dos dados.
RESUMO
Contextualização: O transplante renal com doador vivo proporciona aumento na chance de
sobrevida e na qualidade de vida dos pacientes transplantados, tornando-se uma prática
comum nas últimas décadas, mas ainda pouco evidenciada quanto à repercussão e evolução
pós-operatória dos doadores renais. Objetivos: avaliar a função pulmonar, força muscular
respiratória, complicações pulmonares pós-operatórias (CPP) e qualidade de vida de doadores
renais no pós-operatório de nefrectomia. Métodos: Trata-se de uma coorte prospectiva, sendo
avaliados 110 doadores renais submetidos à nefrectomia, quanto a função pulmonar (CVF,
VEF1, VEF1/CVF) e força muscular respiratória (PImáx e PEmáx) no 1º, 2º, 3º e 5º dias PO e
qualidade de vida (SF-36) no 30º dia de PO. Todos os doadores receberam orientação e
acompanhamento da fisioterapia. Para a análise estatística utilizou-se a análise de variância de
medidas repetidas ANOVA para um fator (oneway), com análise posthocdeTukey, e nível de
significância de 5% (p<0,05).Resultados: Dos 110 doadores, 72 (65%) eram do sexo
feminino, com idade média de 42,21 ± 9,45 anos. Os doadores submetidos à nefrectomia
apresentaram diminuição de 27% da CVF no 1º PO, 58% da PImáxe 51% da PEmáx
(p<0,001), apresentando no 5º PO valores similares quando comparado aos valores de pré-
operatório (p>0,05). Quanto à qualidade de vida foi observado piora nos domínios da
capacidade funcional, limitação de aspectos físicos, dor, vitalidade e aspectos sociais
(p<0,05), entretanto o estado geral da saúde, aspectos emocionais e saúde mental
permaneceram inalterados (p>0,05). Conclusão: Doadores submetidos à nefrectomia
apresentam redução da função pulmonar e da força muscular respiratória no 1º PO, entretanto,
não apresentam CPP, possivelmente por terem sido submetidos a intervenção fisioterapêutica
durante todo período de internação. Além disso, apresentam redução da qualidade de vida em
relação aos aspectos funcionais no primeiro mês de pós-operatório.
Palavras chave: doador renal vivo, teste de função pulmonar, músculos da respiração,
complicações pós-operatórias, qualidade de vida, fisioterapia (técnicas)
ABSTRACT
Background: The transplant from a living donor provides increased chance of survival and
quality of life of the patients, becoming a common practice in recent decades, but still
somewhat evident as the impact and evolution regarding donors. Objectives: To evaluate
pulmonary function, respiratory muscle strength, the occurrence of pulmonary complications
and quality of life in kidney donors after nephrectomy. Methods: This is a prospective cohort
study that evaluated 110 kidney donors who underwent nephrectomy in relation to lung
function (FVC, FEV1, FEV1/FVC), muscle strength respiratory (MIP and MEP) in 1°, 2°, 3º
and 5° postoperative days and quality of life (SF-36) in the 30° postoperative day. All donors
received physiotherapy. Results: Donor nephrectomy showed 27% decrease in FVC in the 1°
postoperative day, 58% of MIP and MEP 51% (p<0.001), with similar values on the 5th
postoperative day compared to preoperative values (p>0.05). Quality of life was reduced in
the fields of functional capacity, limiting bodily pain, vitality and social aspects (p<0.05),
however the general state of health, emotional aspects and mental health remained unchanged
(p>0.05). Conclusion: Kidney donors exhibit reduction on lung function and respiratory
muscle strength in the 1° PO, however, PPC was not observed. Moreover, quality of life
demonstrates reduction on functional aspects during the first postoperative month.
Key words: kidney living donor, pulmonary function test, respiratory muscles, postoperative
complications, quality of life, physical therapy modalities.
1. CONTEXTUALIZAÇÃO
A doença renal crônica (DRC) é um problema de saúde pública mundial com aumento progressivo de
sua incidência, prevalência e significativa morbidade e mortalidade1-3
. A DRC caracteriza-se pela perda
da capacidade da homeostase dos rins e é definida como alteração da função renal ou filtração glomerular
(clearance de creatinina <60ml/minuto/1.73m2) por três meses ou mais, independente da causa
1,2. Tal
doença é uma condição patológica irreversível que necessita de terapia dialítica, como hemodiálise,
diálise peritoneal e/ou transplante renal2-4
. De acordo com o censo estimado da sociedade Brasileira de
Nefrologia de 2012, 97.586 pacientes fizeram tratamento dialítico5
.
O tratamento preferencial para a DRC em estágio final, independente da causa, é o transplante renal,
estabelecido como um procedimento seguro, que visa aumentar a expectativa e qualidade de vida dos
pacientes3, porém ainda há uma grande diferença entre a necessidade e a disponibilidade de órgãos para
transplante3,6
. A utilização de doadores vivos para os pacientes com DRC aumentou desde que isso se
tornou uma prática comum na década de 1960, e sua utilização vem proporcionando a diminuição no
número de pacientes na fila do transplante quando comparado ao doador falecido7,8
. O transplante com
doador vivo proporciona aumento na chance de sobrevida e na qualidade de vida dos pacientes
transplantados, repercutindo com baixo impacto, tanto físico como mentalmente, ao doador7,9
.
Os riscos de complicações pós-doação e mortalidade entre os doadores são considerados baixos6,7
e,
embora a nefrectomia para doação não promova nenhum benefício direto ao doador, os doadores relatam
satisfação emocional e raramente demonstram arrependimento de sua decisão7,10,11
. Para o
aconselhamento adequado de um potencial doador vivo de rim, diretrizes e consensos norteiam critérios a
serem estabelecidos, incluindo não só os riscos imediatos como também os possíveis efeitos em longo
prazo após a doação, além dos aspectos psicossociais e sócioeconômicos3,12,13
. Os doadores são
submetidos a uma extensa avaliação pré-doação para determinar o grau de histocompatibilidade entre
doador e receptor; realização de exames como angiotomografia computadorizada para avaliação da
qualidade e vasculatura renal; avaliação clínica, com objetivo de se excluir doenças clínicas pré-
existentes, como hipertensão arterial e diabetes mellitus, enfim, tudo o que possa interferir no sucesso do
transplante, assim como avaliação psicossocial e de qualidade de vida de forma contínua3,11,13
.
Visando um menor prejuízo ao doador, diferentes vias podem ser empregadas para a retirada do rim.
Incluem-se entre elas a lombotomia, via incisão subcostal e as realizadas por vias de acesso
laparoscópicas. Estudos mostraram não haver diferença para a evolução pós-operatória do doador ao
serem submetidos à lombotomia ou à incisão subcostal2,14
, embora a nefrectomia por via de acesso
subcostal seja mais indicada pela possibilidade de melhor visualização do campo cirúrgico com menor
incisão10,13,15
. O risco cirúrgico associado com o procedimento de doação e suas complicações demonstra
estar relacionado ao estado cardiopulmonar pré-operatório do paciente, duração da cirurgia (maior que
210 minutos), tempo anestésico16,17
. Fatores clínicos como o tabagismo, doenças respiratórias, obesidade,
hipertensão arterial sistêmica e diabetes mellitus também podem influenciar no aumento do risco
cirúrgico e pós-operatório16-18
.
1.1 Alterações na função pulmonar e força muscular respiratória no pós-operatório
A nefrectomia pode ser considerada uma cirurgia abdominal alta (CAA), pelo fato da incisão
cirúrgica ser realizada acima da cicatriz umbilical. Diversos estudos têm mostrado que pacientes
submetidos à CAA, evoluem com alterações na mecânica respiratória e função pulmonar, podendo levar a
ocorrência de complicações pulmonares pós-operatórias (CPP)19,20
. As principais mudanças que
acarretam essas complicações são a diminuição da mobilidade diafragmática; depressão no sistema
nervoso central; diminuição dos volumes e capacidades pulmonares; alteração da relação ventilação-
perfusão e diminuição da eficácia da tosse21-24
.
A diminuição dos volumes pulmonares, respiração superficial, disfunção diafragmática,
comprometimento do transporte mucociliar, dor e repouso prolongado no leito são os primeiros eventos
em cascata que podem levar às complicações pulmonares no período pós-operatório17,25
. A redução dos
volumes pulmonares e da capacidade residual funcional (CRF) pode determinar um padrão restritivo
devido às alterações da mecânica pulmonar e, provavelmente, este seja um dos principais fatores
determinantes das atelectasias seguidas por hipoxemia 16,17,19
.
Após o procedimento cirúrgico, há diminuição dos volumes e capacidade pulmonares de 40 a 50%
em relação aos seus valores pré-operatórios, situação que permanece de 7 a 14 dias após o ato cirúrgico26-
28. Tem sido demonstrado que a redução dos volumes pulmonares, está relacionada a uma disfunção da
mobilidade do músculo diafragma, que teria origem na manipulação de vísceras abdominais,
determinando uma inibição reflexa do nervo frênico, com consequente paresia diafragmática; além da
limitação pela dor29,30,31,32
.
Como em qualquer procedimento cirúrgico, a dor pode ser ponderada como consequência
decorrente no pós-operatório dos pacientes. É considerada como uma desagradável experiência sensorial
e emocional, podendo ser classificada quanto a sua localização, duração, intensidade e qualidade, entre
outras32-34
. Ao contrário do que se pensava, a dor possui uma contribuição parcial e secundária na
diminuição dos volumes pulmonares34
, entretanto, os volumes pulmonares não dependem exclusivamente
da atividade da musculatura respiratória, mas também das propriedades mecânicas dos pulmões. A
diminuição da complacência pulmonar, o aumento da resistência das vias aéreas e a abolição dos suspiros
encontrados após uma CAA, associados à diminuição da mobilidade diafragmática, implicam na
diminuição da CRF, redução da ventilação e expansibilidade das áreas inferiores do pulmão, levando à
ocorrência de atelectasias nas áreas dependentes do pulmão17,19,21
. Essas alterações são máximas nas
primeiras 48 a 72 horas do pós-operatório19,24,26
.
As alterações da mecânica respiratória também têm sido relacionadas à diminuição da força
muscular diafragmática, refletindo numa redução da pressão inspiratória máxima (PImáx) e da pressão
expiratória máxima (PEmáx) no primeiro pós-operatório22,28
. Nos pacientes submetidos à CAA,
evidencia-se diminuição da pressão transdiafragmática e mudança no padrão respiratório, tornando-se
predominantemente costal nas primeiras 48 horas após o procedimento14,22,28,35
.
Embora a literatura mostre as repercussões na função pulmonar no período pós-operatório de
CAA, nosso grupo de pesquisa desconhece estudos que avaliaram tanto a função pulmonar quanto a força
muscular respiratória e sua evolução após nefrectomias em doadores.
1.2 Complicações pulmonares
Conceitualmente, a CPP é definida como uma segunda doença inesperada, que ocorre até 30 dias
depois da intervenção cirúrgica, alterando o quadro clínico e necessitando de intervenção terapêutica,
medicamentosa ou não36
. A diferença da CPP do achado pós-operatório é que o achado não repercute em
alteração do quadro clínico36,37
.
As complicações clínicas mais comuns são atelectasia, hipoxemia e pneumonia, podendo afetar a
maioria dos pacientes, o que pode aumentar o tempo de internação e custos de tratamento, além de
contribuir para o aumento da mortalidade16,17,19, 26
. Também é visto que a ocorrência de CPP está
associada a outros fatores de risco, como tempos cirúrgico e anestésico prolongados, idade avançada do
paciente, história pregressa de tabagismo, presença de doenças respiratórias, obesidade e outras doenças
clínicas associadas19,20,38
.
A CPP é considerada como um dos fatores etiológicos mais importantes para o prolongamento dos
dias de internação hospitalar e mortalidade20,39,40
. Tem sido descrito na literatura que 5 a 10% dos doentes
submetidos a procedimentos operatórios gerais desenvolve CPP, sendo considerada a segunda causa mais
frequente de complicações pós-operatórias19,20,36,38
.
Apesar das complicações cardíacas serem mais reportadas nos estudos envolvendo cirurgias não
torácicas, as CPP são mais comuns, variando de 2 a 19% e seu impacto na morbidade, mortalidade e
custos gerais é superior ao das complicações cardíacas19,24,26,38,39
.
A incidência de CPP varia de 9 a 40% em procedimentos no andar superior do abdome16,38
. Tais
resultados, tão discrepantes, ocorrem porque muitos trabalhos são retrospectivos, mal controlados,
realizados em populações com características muito diferentes e, além disso, não utilizam definições ou
critérios bem definidos para o seu diagnóstico16,19,20,37
.
Embora a CPP seja relatada na literatura como consequência mais frequente das complicações
pós-operatórias no andar superior do abdome, com impacto na morbidade e mortalidade, ainda não há um
consenso sobre sua incidência e critérios.
1.3 Qualidade de vida
A escassez de órgãos e o crescente tempo de espera por um rim de doador falecido tem feito com
que o transplante renal com doador vivo seja cada vez mais procurado7. Com esse crescimento surge a
importância de que os impactos psicossociais e até financeiros devam ser considerados quanto à
informação aos potenciais doadores sobre o processo de doação e de acompanhamento após a
doação9,11,41
.
Lopes et al, 201311
, mostraram que há baixo risco para o doador, além do aumento na autoestima,
altruísmo, documentado como um fator de aumento da sensação de bem-estar e de melhora na qualidade
de vida dos doadores vivos. Os benefícios de se receber um rim de doador vivo incluem maior
comodidade, melhor resultado e melhora da qualidade de vida para o receptor41,42
. Mas é importante
mencionar que possíveis consequências psicossociais nocivas têm sido referenciadas11,41
. Uma pequena
proporção de doadores relata experiências negativas, principalmente quando a doação não é bem
sucedida, como na rejeição do transplante e/ou complicações pós-operatórias43,44
.
Apesar da imagem global da doação ser positiva, para o doador e para o receptor, ainda tem sido
uma questão a ser estudada. Mais estudos são necessários, principalmente os de seguimento em longo
prazo para se conhecer o real impacto da doação na qualidade de vida desta população.
Mediante tais informações, somados ao crescimento dos índices de transplantes renais entre
doadores vivos, torna-se importante conhecer a evolução pós-operatória desses sujeitos considerados
hígidos; quais as possíveis alterações e/ou complicações pulmonares nesses indivíduos e se estas se
comportam como qualquer outro procedimento realizado no abdome superior. E, ainda, o impacto de
todo o processo cirúrgico da doação na qualidade de vida dos doadores, para que dessa forma novas
propostas de manejo clínico possam ser instituídas e melhor indicadas pela equipe multidisciplinar a essa
população.
2. OBJETIVOS
2.1 Primário
Avaliar a função pulmonar e força muscular respiratória de doadores renais no pós-operatório de
nefrectomia para doação.
2.2 Secundário
Avaliar a ocorrência de complicações pulmonares e qualidade de vida no pós-operatório de
doadores renais submetidos à nefrectomia para doação.
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REPERCUSSÃO DA NEFRECTOMIA NA FUNÇÃO PULMONAR E FORÇA MUSCULAR
RESPIRATÓRIA: ESTUDO LONGITUDINAL
REPERCUSSÕES PULMONARES DA NEFRECTOMIA PARA DOAÇÃO
KAREN MORAES1, DENISE PAISANI
2, NATHÁLIA COSTA TOLEDO PACHECO
1, LUCIANA
DIAS CHIAVEGATO1,3
1Instituição: Programa de Mestrado e Doutorado em Fisioterapia, Universidade Cidade de São Paulo,
São Paulo, Brasil
2Instituição: Departamento de Fisioterapia, Escola de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo,
Brasil
3Instituição: Departamento de Pneumologia, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, Brasil
RESUMO
O transplante por doador vivo proporciona aumento na sobrevida e na qualidade de vida dos pacientes
transplantados, entretanto, o impacto na função pulmonar e força muscular respiratória no pós-operatório
em doadores de rim permanece desconhecido. Objetivos: Avaliar a função pulmonar, força muscular
respiratória, qualidade de vida e incidência de complicações pulmonares pós-operatórias (CPP) em
doadores renais submetidos à nefrectomia. Métodos: Trata-se de uma coorte prospectiva, que avaliou
consecutivamente 110 doadores submetidos à nefrectomia. Foram avaliados quanto à função pulmonar
(espirometria) e força muscular respiratória (manovacuometria) um dia antes da cirurgia e 1º, 2º, 3º e 5º
dias de pós-operatório. A qualidade de vida (SF-36) foi avaliada no pré e 30º dia de pós-operatório. A
CPP foi avaliada por um pesquisador cego às mensurações. Resultados: Houve queda de 27% da
capacidade vital forçada, 58% da pressão inspiratória máxima (PImáx) e 51% da pressão expiratória
máxima (PEmáx) no 1º dia pós-operatório (p<0,001) com retorno aos valores basais. A qualidade de vida
mostrou comprometimento da capacidade funcional, aspectos físicos, dor, vitalidade e função social
(p>0,05). Nenhum dos pacientes evoluiu com CPP. Conclusão: Doadores renais submetidos à
nefrectomia apresentaram redução da função pulmonar, força muscular respiratória com retorno aos
valores basais no 5º PO e redução qualidade de vida nos primeiros 30 dias de pós-operatório semelhante
à cirurgia abdominal alta.
Palavras chaves: doador renal vivo, teste de função pulmonar, músculos da respiração, complicações
pós-operatórias, qualidade de vida, fisioterapia (técnicas).
IMPACT NEPHRECTOMY IN LUNG FUNCTION AND RESPIRATORY MUSCLE
STRENGTH: LONGITUDINAL STUDY
EFFECTS OF PULMONARY NEPHRECTOMY FOR DONATION
KAREN MORAES1, DENISE PAISANI
2, NATHÁLIA COSTA TOLEDO PACHECO
1, LUCIANA
DIAS CHIAVEGATO1,3
1Instituição: Programa de Mestrado e Doutorado em Fisioterapia, Universidade Cidade de São Paulo,
São Paulo, Brasil
2Instituição: Departamento de Fisioterapia, Escola de Medicina, Universidade de São Paulo, São Paulo,
Brasil
3Instituição: Departamento de Pneumologia, Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, Brasil
ABSTRACT
Living donor transplant improving survival and quality of life of transplant patients, however, the impact
on postoperative lung function and respiratory muscular strength on kidney donors remains unknown.
Objective: Evaluate pulmonary function, respiratory muscle strength, quality of lifeand incidence of
postoperative pulmonary complications (PPC) in kidney donors undergoing nephrectomy. Methods: This
prospective cohort enrolled 110 consecutive kidney donors undergoing nephrectomy. Subjects performed
pulmonary function (Spirometry) and respiratory muscular strength (Manovacuometry) assessment in the
day prior to surgery, 1º, 2º, 3º and 5º postoperative days.Quality of life (SF-36) were evaluated in pre and
30 postoperative days. PPC were assessed daily by a blinded researcher. Results: There was a decrease of
27 % of forced vital capacity, 58 % of maximal inspiratory pressure (MIP) and 51 % of maximal
expiratory pressure (MEP) on the 1st postoperative day (p<0,001), returning to baseline values. The
quality of life was impaired functional capacity, bodily pain, vitality and social function (p>0,05). None
of the patients progressed to CPP. Conclusion: Kidney donor nephrectomy decreased lung function,
respiratory muscle strength with return to baseline at 5º PO and reduced quality of life in the first 30 days
after surgery similar to upper abdominal surgery.
Keywords: kidney living donor, pulmonary function test, respiratory muscles, postoperative
complications, quality of life, physical therapy modalities.
INTRODUÇÃO
O tratamento preferencial para a doença renal crônica (DRC) em estágio final é o transplante renal
considerado um procedimento seguro e viável1,2
. O transplante renal com doador vivo proporciona
redução da mortalidade e melhora da qualidade de vida dos receptores com baixo impacto, tanto físico
como mentalmente, ao doador1-4
. O risco do doador desenvolver complicações pós-operatórias é inerente
ao procedimento cirúrgico e, algumas vezes associado à comorbidades prévias5,6
.
A nefrectomia realizada para doação é considerada uma cirurgia abdominal alta (CAA) e diversos
estudos têm mostrado que pacientes submetidos a este tipo de cirurgia, evoluem com alterações na
mecânica respiratória e função pulmonar, podendo levar a ocorrência de complicações pulmonares7,8
.
Estudos que avaliaram a evolução tanto da função pulmonar quanto da força muscular respiratória após
CAA, mostram reduções em torno de 40 a 50% em valores da capacidade vital forçada (CVF), volume
expiratório forçado no primeiro segundo (VEF1) e força muscular respiratória9,10-12
. Todavia, nas
nefrectomias para doação, encontram-se lacunas destas informações devido à escassez de estudos nessa
população.
A complicação pulmonar pós-operatória (CPP) é considerada como um dos fatores etiológicos mais
importantes para o prolongamento dos dias de internação hospitalar e mortalidade e sua incidência varia
de 9 a 40% em CAA, dependendo do critério utilizado para o diagnóstico7,13
. Chiavegato et al5, em 2010,
mostrou baixa incidência de CPP ao avaliar dois tipos de incisão em nefrectomia, entretanto o período de
seguimento dos pacientes não foi suficiente para avaliar sua repercussão clínica.
Apesar do ato de doação ser positivo, para o doador e para o receptor, ainda tem sido uma questão a
ser estudada para se conhecer o real impacto da doação na força muscular respiratória e função pulmonar,
bem como na qualidade de vida dos doadores. A partir dessas informações, novas propostas de manejo
clínico podem ser instituídas e melhor indicadas pela equipe multidisciplinar destinados à esta população.
Portanto, o objetivo desse estudo foi avaliar a função pulmonar e a força muscular respiratória de
doadores renais no pós-operatório de nefrectomia, bem como a ocorrência de complicações pulmonares e
qualidade de vida no pós-operatório de doadores de rim submetidos à nefrectomia.
MÉTODOS
Participantes: Trata-se de uma coorte prospectiva, em que foram recrutados consecutivamente 124
doadores renais submetidos à nefrectomia para doação, independente da via de acesso (lombotomia ou via
subcostal), internados no Hospital do Rim e Hipertensão – Fundação Oswaldo Ramos. Oestudo foi
aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa desta instituição (1127/01) e todos os voluntários deram
consentimento livre e informado.
Critérios de inclusão e exclusão
Como critérios de inclusão foram considerados sujeitos com idade superior a 18 anos e ambos os
sexos; capacidade para realizar os testes propostos.
Os critérios de exclusão foram: indivíduos com presença de doença pulmonar prévia, comorbidades
como hipertensão arterial sistêmica; diabetes mellitus e cardiopatias não controladas clinicamente. Caso
houvesse pacientes com necessidade de ventilação mecânica por tempo superior a 24 horas no pós-
operatório; óbito nas primeiras 12 horas de pós-operatório; necessidade de intervenção em outro órgão
que não somente o rim e reintervenção cirúrgica, esses seriam reportados e analisados separadamente.
Procedimento
Habitualmente todos os doadores são avaliados por uma equipe multiprofissional: assistentes sociais,
psicólogos, nutricionistas, fisioterapeutas, enfermeiros e médicos. Para este estudo os doadores foram
avaliados pela Fisioterapia um dia antes do procedimento cirúrgico, no 1º, 2º, 3º e 5º dias de pós-
operatório. As avaliações incluíram dados antropométricos, exame físico, função pulmonar
(espirometria), força muscular respiratória (manovacuometria) e qualidade de vida (SF-36). O radiograma
torácico foi realizado no pré e no 2º dia de pós-operatório. Todos os doadores receberam orientações pré-
operatórias sobre o procedimento cirúrgico; conscientização da importância da tosse, da deambulação e
da fisioterapia respiratória. No período pós-operatório foram submetidos à fisioterapia, que incluiu 15
repetições de exercícios de respiração diafragmática e outras 15 repetições associadas à mobilização ativa
de membros superiores além da deambulação sob a supervisão do mesmo fisioterapeuta, em todos os dias
de internação, até o momento da alta hospitalar. Os atendimentos foram realizados uma vez ao dia com
um tempo médio de 15 minutos cada sessão. Antes da execução dos exercícios, a dor foi avaliada pela
escala visual analógica (EVA)14
e, caso a intensidade da dor fosse igual ou superior a cinco, os doadores
eram medicados de acordo com protocolo da instituição. Conforme protocolo institucional e na ausência
de intercorrências clínicas, os pacientes recebiam alta hospitalar no 3º PO e retornavam
ambulatorialmente para avaliação das últimas medidas no 5º PO. Vale ressaltar que todos os pacientes
desse estudo tiveram alta hospitalar conforme o protocolo. Após 30 dias de pós-operatório, os doadores
retornavam ambulatoriamente, sendo avaliada a presença de CPP pela averiguação em prontuário e
realizavam avaliação do questionário de qualidade de vida (questionário SF-36), aplicado pelo
pesquisador.
Métodos de avaliação
Função pulmonar: A espirometria (Spirobank®, Italy) foi realizada utilizando os critérios técnicos
propostos pelas diretrizes para testes de função pulmonar da American Thoracic Society15
.
Força muscular respiratória: Foi avaliada pela pressão inspiratória máxima (PImáx) e pressão expiratória
máxima (PEmáx), as quais foram obtidas com a utilização de um manovacuômetro (MTR). Foram
realizadas três medidas com o paciente na posição sentada, intervalo de 60 segundos entre elas, adotando-
se a maior. Ambas as medidas foram realizadas a partir da CRF16
. A PImáx foi obtida solicitando-se ao
paciente respirar tranquilamente e a seguir inspirar com a máxima força possível. Simultaneamente, a
parte inspiratória da válvula unidirecional foi ocluída. O registro da PEmáx foi feito solicitando-se ao
paciente respirar tranquilamente e a seguir expirar com a máxima força possível. Nesse momento,
efetuou-se a oclusão da válvula unidirecional. Os bocais utilizados para os registros da força muscular
respiratória continham um mínimo orifício (± 2mm) com o intuito de excluir a força dos músculos bucais
e tornar as medidas mais fidedignas16
. Estes resultados foram comparados aos valores previstos
utilizando as equações de Neder et al17
.
Complicações pulmonares pós-operatórias: Foram caracterizadas pelo radiograma torácico por um
pneumologista da instituição, realizado no 2º dia de pós-operatório, associado aos critérios para
diagnóstico de CPP de acordo com Pereira et al18
, como se segue:
- Pneumonia: Rx de tórax com infiltrado pulmonar associado a dois dos seguintes sinais: expectoração
purulenta; hipertermia superior a 38,3˚C; aumento superior a 25% no número de leucócitos basais.
- Traqueobronquite: Rx de tórax normal associado ao aumento da quantidade ou modificação do
aspecto da secreção.
- Atelectasia: Rx de tórax anormal associado a sintomas respiratórios agudos.
- Insuficiência Respiratória Aguda: Troca gasosa agudamente deficiente e necessidade de suporte
ventilatório invasivo ou não.
- Broncoespasmo: Sibilos à ausculta pulmonar associados a sintomoas respiratórios e necessidade de
medicamentos.
No 30º dia de pós-operatório a presença de CPP foi constatada mediante averiguação dos registros
médicos.
Qualidade de vida: Foi avaliada pelo questionário SF-36, aplicado pelo pesquisador responsável no
período pré-operatório e no 30º dia de pós-operatório. Esse questionário já validado19
, que pontua um
total de 100 pontos, inclui a investigação de oito domínios com 11 questões relacionadas à capacidade
funcional, limitações de aspectos físicos, dor, estado geral da saúde, vitalidade, aspectos sociais, aspectos
emocionais e saúde mental. Quanto maior a pontuação total melhor a qualidade de vida.
Análise estatística: A amostra foi selecionada por conveniência. A análise descritiva foi apresentada em
média, desvio padrão para as variáveis numéricas; e em frequência e porcentagem para as variáveis
categóricas. Após constatada distribuição normal dos dados, foram considerados todos os dias de pós-
operatório, porém utilizou-se a análise de variância de medidas repetidas ANOVA para um fator
(ONEWAY) para comparação das médias apenas entre o pré-operatório e os demais dias de pós-operatório
(1º e 5º PO), com análise posthoc de Tukey quando encontrada a diferença. Para todas as comparações foi
utilizado nível de significância de 5%. Os dados foram analisados usando o Sigma Stat 3.2 (San Jose,
EUA).
RESULTADOS
Foram avaliados 124 doadores, 110 (88%) foram incluídos no estudo e 14 (12%) não realizaram a
cirurgia por motivos relacionados ao receptor. As características gerais dos pacientes incluídos
encontram-se na Tabela 1.
Dos 110 doadores incluídos, 72 (65%) do sexo feminino, 25 (22,7%) eram fumantes; 22 (20%) já
tinham fumado, e oito (7,3%) eram etilistas. Entre os doadores, um (0,9%) apresentava insuficiência
coronariana tratada, um (0,9%) diabetes mellitus e nove (8,2%) hipertensão arterial. Todos se
apresentavam estáveis e controlados clinicamente (Tabela1).
Tabela 1. Características gerais dos 110 doadores renais
Média ± DP
Idade (anos) 42,21 ± 9,45
Peso (kg) 68,6 ± 13,60
Altura (cm) 161 ± 0,08
IMC (kg/m2) 26,23 ± 4,46
Tempo cirúrgico (min) 105,04 ± 21,24
Legenda: kg = quilogramas; cm = centímetros; kg/m2
= quilograma por metro quadrado; IMC = Índice de Massa Corpórea;
min = minutos.
Função Pulmonar
Na avaliação da função pulmonar, foi observado diminuição de 27% da CVF no 1º PO (p<0,001),
com recuperação progressiva, apresentando no 5º PO diminuição de aproximadamente 9% quando
comparada com os valores do pré-operatório (p>0,05; Tabela 2).
Quando avaliado o VEF1 observou-se diminuição de 31% e 12% no 1º PO e 5º PO (p<0,001),
respectivamente, sendo observado retorno progressivo aos valores de pré-operatório sem diferença
estatisticamente significante (Tabela 2).
A análise da relação VEF1/CVF, também apresentou diminuição de 6% no 1º PO (p<0,001),
retornando a valores muito próximos do pré-operatório no 5ºPO (p>0,05; Tabela 2).
Tabela 2. Variáveis da Função Pulmonar no pré, 1º, 2º, 3º e 5º dias de pós-operatório
PRÉ 1º PO 2º PO 3º PO 5º PO
CVF (L) 3,57 ± 0,81 2,64 ± 0,74* 2,90 ± 0,76 3,11 ± 0,81 3,24 ± 0,80
% previsto 103,19 ± 12,62 76,33 ± 15,93* 83,72 ± 4,43 89,71 ± 14,04 93,76 ± 15,57
VEF1 (L) 2,96 ± 0,83 2,04 ± 0,6*
2,27 ± 0,63 2,48 ± 0,69 2,60 ± 0,68$
% previsto 99,32 ± 12,97 69,76 ± 15,82* 76,25 ± 17,67 84,91± 15,23 89,17 ± 4,84
$
VEF1/CVF (L) 81,47 ± 7,47 77,17 ± 9,29*
78,59 ± 9,39 80,02 ± 8,96 80,68 ± 7,82
% previsto 100,03 ± 9,53 94,68 ± 11,72* 95,47 ± 14,89 98,37 ± 11,21 98,92 ± 9,94
Legenda: PRÉ = Pré-Operatório; PO = Pós-Operatório; CVF = Capacidade Vital Forçada; L = litros; VEF1 =
Volume Expiratório Forçado no 1º segundo; *p<0.05 comparação Pré vs 1º PO; $ p<0.05 comparação Pré vs 5º PO.
Força muscular respiratória
Na avaliação da força muscular respiratória foi observada queda média da PImáx de 58% no 1º PO
(p<0,001; Tabela 3) com recuperação progressiva, apresentando no 5º PO valores similares quando
comparado aos valores de pré-operatório (p>0,05; Tabela 3).
Ao avaliar a PEmáx, também foi observada diminuição de 51% e 81% no 1º e 5º PO,
respectivamente (p<0,001; Tabela 3).
Tabela 3. Força muscular respiratória dos doadores no pré, 1º, 2º, 3º e 5º dias de pós-operatório
PRÉ 1º PO 2º PO 3ºPO 5ºPO
PImáx (cm H20) 61,78 ± 18,95 36,15 ± 9,97* 41,60 ± 11,69 50,82 ± 16,99 59,62 ± 18,82
% do previsto 61,52 ± 16,93 36,15 ± 9,14* 41,56 ± 10,67 50,37 ± 14.64 59,04 ± 15,77
PEmáx (cm H20) 71,05 ± 20,73 36,59 ± 12,54*
43,65 ± 15,44 49,74 ± 15,25 58,00 ± 18,62$
% do previsto 68,73 ± 17,55 35,53 ± 10,66* 42,35 ± 13,20 48,38 ± 13,01 56,26 ± 15,41$
Legenda: PRÉ = Pré-Operatório; PO = Pós-Operatório; PImáx = Pressão Inspiratória máxima;
PEmáx = Pressão Expiratória Máxima; cm H2O = centímetros de água;
*p<0.05 comparação Pré vs 1º PO; $p<0.05 comparação Pré vs 5º PO.
Complicações pulmonares e dor
Analisando o radiograma torácico, observou-se que 35 (32%) pacientes apresentaram atelectasia
laminar basal, porém sem alteração clínica, não sendo considerado como complicações pulmonares.
Todos os pacientes, no pré-operatório, relataram não sentir qualquer dor, escore0 na escala visual
analógica (EVA). No 1º PO a dor foi em média de 4,88 ± 2,12 (p<0,001) com diminuição progressiva da
dor ao longo dos dias de pós-operatório, ficando no 5º PO com média de 2,55 ± 1,46 (p<0,001).
Qualidade de vida
Ao analisar os 110 doadores, foi observado diferença na maioria dos domínios do questionário
aplicado o SF-36, quando comparado os períodos pré e pós-operatório. Foi observado piora nos domínios
da capacidade funcional, limitação de aspectos físicos, dor, vitalidade e aspectos sociais (p<0,05; Tabela
4). Os domínios estado geral da saúde, aspectos emocionais e saúde mental foram similares aos valores
observados no período de pré-operatório (p>0,05; Tabela 4).
Tabela 4. Qualidade de vida no pré e pós-operatório dos 110 doadores renais
DOMÍNIOS PRÉ-
OPERATÓRIO
PÓS-
OPERATÓRIO
p
Capacidade Funcional 91,09 ± 10,03 77,32 ± 20,53 0.001*
Aspectos Físicos 92,07 ± 19,72 46.22 ± 43,57 0.001*
Dor 81,02 ± 17,54 64,29 ± 22,63 0.001*
Estado geral de Saúde 87,71 ± 14,21 90,27 ± 10,87 0.26
Vitalidade 74,63 ± 20,32 54,51 ± 12,69 0.003*
Aspectos Sociais 93,90 ± 11,20 77,74 ± 22,45 0.001*
Aspectos Emocionais 95,94 ± 13,32 89,53 ± 20,05 0.09
Saúde Mental 85,46 ± 11,69 80,29 ± 19,13 0.75
* p<0,05
DISCUSSÃO
O presente estudo mostrou que os pacientes submetidos à nefrectomia apresentam redução da função
pulmonar e da força muscular respiratória no 1º PO, comparado ao período pré-operatório com retorno
gradativo no 5º PO, e não apresentam complicações pulmonares. Quanto à qualidade de vida, não foi
observado diferença significativa em relação ao estado geral da saúde, aspectos emocionais e saúde
mental, entretanto houve piora da capacidade funcional, limitação de aspectos físicos, dor, vitalidade e
aspectos sociais.
Em nosso estudo, observamos menor comprometimento da função respiratória em doadores hígidos
submetidos à nefrectomia comparado à outras cirurgias abertas do abdome superior5,7,13,20
. Nossos
achados mostram que a CVF e VEF1 diminuem em torno de 30% no primeiro dia de pós-operatório,
dados estes que diferem dos encontrados em outras cirurgias do abdome superior, as quais estas variáveis
são geralmente reduzidas em aproximadamente 50%20,21
. Além disso, a CVF retornou aos valores pré-
operatórios no quinto dia de pós-operatório, o que normalmente ocorre em sete ou mais dias de após o ato
cirúrgico7,22
. Apesar da nefrectomia ter sido realizada por via convencional, nossos resultados são
similares aos encontrados em pacientes submetidos à procedimentos por via laparoscópica23,24
.
Corroborando estes dados, Lunardi et al25
, em 2013 observaram redução de 24% na capacidade
inspiratória máxima em pacientes submetidos à CAA por via laparoscópica.
Em relação à força muscular respiratória, verificamos diminuição de 58% PImáx e da 51% PEmáx no
1º PO de pós-operatório com tendência progressiva aos valores basais nos dias subsequentes de pós-
operatório, o que são dados similares aos previamente descritos na literatura12,21,26
.Várias possibilidades
têm sido sugeridas na literatura para justificar as alterações da função e força muscular respiratória no
período pós-operatório tais como dor, local da incisão operatória, tempos de anestesia e cirurgia, mas
principalmente a disfunção da mobilidade do diafragma devido a inibição reflexa do nervo frênico6,7,9
,
entretanto, o contínuo avanço e aprimoramento das técnicas cirúrgicas, além da presença de equipe
multidisciplinar voltada para o atendimento do paciente cirúrgico parecem contribuir para justificar a
menor repercussão pulmonar encontrada no presente estudo.
Curiosamente, em nosso estudo, não ocorreram CPP, entretanto, 35% dos pacientes apresentaram
achados radiológicos que poderiam desencadear tais complicações. Apesar da incidência de complicações
pulmonares nas CAA variar entre 9 a 40%, acreditamos que esta variabilidade ocorra pela divergência na
definição de critérios diagnósticos utilizados para definir CPP7,9
. No presente estudo foram utilizados
rigorosos critérios para definição de CPP, fato este que pode justificar nossos achados quando
comparados ao de estudos prévios7,10
. Interessantemente, estudos realizados na mesma instituição,
utilizando os mesmos critérios diagnósticos mostraram incidência entre 7 a 24%8,27
. Uma possível
hipótese para este achado é o fato da nossa amostra populacional ser constituída de sujeitos hígidos e
jovens associado aos avanços e melhorias nos cuidados perioperatórios ao longo dos anos, incluindo a
fisioterapia.
Embora nossa amostra tenha sido submetida à nefrectomia aberta, pudemos observar que nossos
resultados foram semelhantes aos encontrados em sujeitos submetidos à nefrectomia via laparoscópica23
.
Diversos estudos mostram que estes procedimentos estão associados à analgesia reduzida, menor tempo
de internação hospitalar e apresentam retorno precoce às condições pré-operatórias23,24,28
. Porém, recente
revisão sistemática23
mostrou que ao comparar cirurgias por vídeo e aberta, a incidência de complicações
gerais tais como, reoperação, perda precoce do enxerto e função retardada do enxerto, são similares em
ambos os procedimentos. Ferrario e colaboradores24
avaliaram 46 doadores submetidos à nefrectomia via
laparoscópica e, assim como em nosso estudo, não foram relatadas complicações pós-operatórias durante
o período hospitalar; entretanto, ao compararmos nossos achados aos dele, observamos que embora nossa
amostra populacional tenha sido submetida à nefrectomia aberta, apresentou menores tempos cirúrgico
(105,04 ± 21 vs 170 ± 45 minutos) e de internação hospitalar (3 vs 5 ± 1dias).
Ao avaliar a qualidade de vida, observamos diferenças na capacidade funcional, na limitação por
aspectos físicos, na dor, vitalidade e aspectos sociais após o ato operatório, corroborando com achados
prévios de outros autores29,30
. Entretanto, no presente estudo, não foram observadas alterações no estado
geral de saúde, aspectos emocionais e saúde mental, fato este pode significar que a satisfação pessoal e
emocional pelo ato de doação está realmente presente29.
Embora apresentem alterações na dor, na
capacidade física e funcional, estudos evidenciam que os doadores retornam aos níveis de suas atividades
de vida diária pré-doação em pouco tempo29,30
, porém, ainda não há consenso sobre o período exato em
que isso ocorre. Apesar de nosso estudo ter avaliado a qualidade de vida 30 dias após a doação, observa-
se que alterações em certos domínios podem ser decorrentes do efeito do ato cirúrgico similar a qualquer
outro procedimento desta magnitude.
Um importante diferencial do nosso estudo foi o fato de que todos os pacientes foram submetidos à
fisioterapia respiratória nos períodos pré e pós-operatório, realizada uma vez ao dia. No pré-operatório,
foram dadas orientações quanto à incisão cirúrgica, importância da tosse, deambulação precoce e
exercícios fisioterapêuticos e no pós-operatório foram realizados exercícios respiratórios sob supervisão.
Por se tratar de um hospital universitário, com crescentes dificuldades assistenciais e com cuidados pré e
pós-operatórios deficitários, poderíamos esperar encontrar maiores repercussões na função e muscular
respiratória associados a complicações pós-operatórias. Entretanto, diferentemente de outros pacientes
cirúrgicos12,20,21
, nossa amostra era constituída por sujeitos hígidos e associado a isto, a possível
conscientização prévia da importância da fisioterapia e sua realização com supervisão, possam justificar
nossos achados.
O presente estudo apresenta algumas limitações. Primeiro, não comparamos a repercussão na função
pulmonar e força muscular respiratória em nefrectomias por vídeo e aberta, entretanto não era o objetivo
deste estudo. Segundo, a qualidade de vida foi acompanhada por 30 dias devido às rotinas da instituição,
porém acreditamos que maior tempo possa ser necessário para observação da sua evolução.
CONCLUSÃO
Nossos resultados sugerem que doadores submetidos à nefrectomia apresentam redução da função
pulmonar e da força muscular respiratória no 1º PO, como qualquer outro procedimento cirúrgico, com
retorno gradativo aos valores de pré-operatório já no 5º PO e não apresentam complicações pulmonares,
possivelmente pelo fato de terem sidos acompanhados pela Fisioterapia durante toda internação
hospitalar. Após 30 dias, a qualidade de vida, o estado geral da saúde, aspectos emocionais e saúde
mental permanecem inalterados.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
O comprometimento da função respiratória observada em doadores hígidos submetidos à
nefrectomia parece ser menos pronunciado no período pós-operatório quando comparado a
outras CAA, porém essa população ainda tem sido pouco estudada. Visto o crescimento dos
índices de transplantes renais com doadores vivos, levantou-se o questionamento de quais
seriam as repercussões pós-operatórias desses pacientes, para que a partir dessas informações
novas propostas de manejo clínico pudessem ser instituídas e melhor indicadas pela equipe
multidisciplinar a essa população.
Nosso estudo foi inovador em nosso meio, uma vez que destinamos um foco específico
para a repercussão da nefrectomia no pós-operatório nos doadores renais hígidos. Além disso,
um importante diferencial do presente estudo foi o fato de que todos os doadores foram
submetidos à fisioterapia respiratória nos períodos pré e pós-operatório, realizada uma vez ao
dia. No pré-operatório, foram dadas orientações quanto à incisão cirúrgica, importância da
tosse, deambulação precoce e exercícios fisioterapêuticos. Dessa forma, todos já estavam
conscientes da importância da fisioterapia, antes mesmo da intervenção operatória, e
esclarecidos acerca dos riscos acentuados que poderiam apresentar no período pós-operatório
para a possível ocorrência de CPP. Por se tratar de um hospital universitário, com crescentes
dificuldades assistenciais e com cuidados pré e pós-operatórios deficitários, esperava-se
encontrar maior repercussão negativa na função pulmonar e força muscular respiratória
associadas à maior incidência de CPP. Entretanto, devemos ressaltar que nossa amostra era
constituída por sujeitos hígidos e, associado a isto, a possível conscientização prévia da
importância da fisioterapia e a atuação da mesma no período pós-operatório possam justificar
nossos achados.
Vale salientar que nosso estudo se preocupou em observar a qualidade de vida dos
voluntários antes e 30 dias após a doação. Não foram observadas alterações no estado geral de
saúde, aspectos emocionais e saúde mental, fato este muito relevante e possivelmente
significa que a satisfação pessoal e emocional pelo ato de doação está realmente presente.
Entretanto, foram observadas diferenças na capacidade funcional, limitação por aspectos
físicos, dor, vitalidade e aspectos sociais. Esses domínios estão naturalmente interligados,
corroborando com outros autores que também observaram limitação nos mesmos aspectos da
qualidade de vida após o ato operatório. Embora apresentem alterações na dor, capacidade
física e funcional, estudos evidenciam que os doadores retornam aos níveis de suas atividades
de vida diária pré-doação em pouco tempo, mas ainda não há consenso sobre o período exato
em que isso ocorre. Apesar de nosso estudo ter reavaliado a qualidade de vida 30 dias após a
doação, as alterações encontradas podem ser decorrentes do próprio ato cirúrgico similar a
qualquer outro procedimento desta magnitude.
Ainda que o objetivo inicial do estudo tenha sido avaliar a repercussão da nefrectomia na
função pulmonar, força respiratória e qualidade de vida, a comparação com um grupo controle
poderia ser benéfica para avaliar o real papel e a importância da fisioterapia nessa população.
Além disso, evidências prévias reforçam que a presença de comorbidades é um significante
fator de risco para o desenvolvimento de CPP e a exclusão desses pacientes em nosso estudo
pode ter influenciado os resultados encontrados. Dessa forma podemos reiterar a importância
de um manejo clínico destinado a essa população, assim como novos estudos para delinear a
repercussão da nefrectomia nos doadores, principalmente em longo prazo.