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RELAÇÕES DE TRABALHO E MEDIDAS SOCIOEDUCATIVAS EM MEIO ABERTO:
ESTADO DA ARTE
Talita Ketlyn Costa Cabral1
Lindamir Salete Casagrande 2
RESUMO: O objetivo deste artigo é apresentar o estado da arte elaborado como parte da pesquisa para a dissertação de
mestrado que tem como tema principal as medidas socioeducativas em meio aberto e as relações trabalho feminino na
adolescência. O tema foi escolhido com base na experiência profissional vivenciada enquanto assistente social do
Centro de Referência Especializado em Assistência Social - CREAS do município de Rio Branco Sul – Paraná, entre os
anos de 2014 e 2016. Para embasar a pesquisa e verificar sua relevância frente às produções já existentes, realizamos a
pesquisa bibliométrica com base no portal Capes, nos permitiu acessar inúmeras plataformas nacionais e internacionais.
De forma sistemática e confirmando a hipótese de escassez de trabalhos sobre o tema, encontramos apenas 27 obras,
sendo estas, 24 artigos e 3 teses que de alguma forma abordam o objeto de pesquisa. O estado da arte vem descrever a
grande e as sub-áreas do tema, trazendo o recorte teórico, as vantagens e deficiências das abordagens, assim como as
metodologias utilizadas. Buscamos ainda, apresentar o que o serviço social tem produzido sobre o tema e subsidiar a
dissertação.
Palavras-chave: Medidas Socioeducativas; Adolescência feminina; Serviço Social.
1 Introdução
O presente estudo vem retratar o que se tem produzido acerca do tema Medidas
Socioeducativas - MSE em Meio Aberto - MA e as relações de trabalho feminino na adolescência.
Como grande área se delimitou as MSE em MA, podendo ser de Liberdade Assistida – LA ou de
Prestação de Serviços à Comunidade - PSC e como sub-áreas as relações de gênero presentes nas
MSE, as relações de trabalho feminino na adolescência das meninas em cumprimento de MSE em
MA e as consequência das MSE na vida destas adolescentes.
O objetivo deste artigo é apresentar as deficiências e vantagens das abordagens já realizadas
sobre o tema, visando elaborar uma breve revisão bibliográfica que subsidie o desenvolvimento da
dissertação de mestrado e desperte novos interesses de produção na área. Este tema foi escolhido
com base na experiência profissional obtida durante os anos de 2014 e 2016, trabalhando como
assistente social do Centro de Referência Especializado em Assistência Social – CREAS no
1Mestranda em Tecnologia e Sociedade pelo Programa de Pós-Graduação em Tecnologia - PPGTE, da Universidade
Tecnológica Federal do Paraná - UTFPR, Especialista em Saúde Mental e Graduada em Serviço Social pela
Universidade Estadual de Londrina - UEL. Pesquisadora do Núcleo de Gênero e Tecnologia – GeTec. E-mail:
[email protected]. 2Pós-Doutora em Estudos Interdisciplinares Sobre Mulheres, Gênero e Feminismos pela Universidade Federal da Bahia;
Doutora e Mestra em Tecnologia pelo PPGTE. É Professora de matemática pela UTFPR desde 1994. Também faz parte
do corpo docente do PPGTE e da coordenação do GETEC, pela mesma universidade. E-mail para contato:
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Município de Rio Branco do Sul – Paraná, que mostrou a necessidade de se investigar a realidade
das adolescentes em cumprimento de MSE em meio aberto.
Ao observar as adolescentes que eram atendidas no CREAS, percebeu-se que em sua
maioria, não almejavam uma carreira profissional e que em alguns casos não viam o trabalho
doméstico como um trabalho, apesar de já o realizarem. Com isso surgiram algumas dúvidas:
Qual a concepção de trabalho destas adolescentes?
As relações de gênero estão ligadas as suas decisões profissionais?
A MSE influencia educacionalmente estas adolescentes?
Com base nestes questionamentos, delimitou-se como tema da pesquisa as MSE em meio
aberto e seus desdobramentos, sob o qual foi realizada a pesquisa bibliométrica que inicialmente
trouxe como resultado 124 referencias. Porém, após leitura dos títulos e resumos identificou-se que
apenas 27 destas obras respondiam ao tema e/ou suas sub-áreas, tornando-se este o universo do
estudo. Para uma melhor compreensão, traremos na sequência, o que os/as autores/as
selecionados/as falam sobre a grande e as sub-áreas do tema e apresentaremos uma breve reflexão
sobre os resultados encontrados.
2 Contextualização, abordagem e execução das MSE
Para iniciar a discussão sobre as MSE em suas mais diversas facetas, os/as autores/as
selecionados/as utilizaram-se da contextualização histórica. Em sua maioria, trouxeram dados sobre
o sistema de garantia dos direitos da criança e do adolescente apresentando a trajetória percorrida
até a formulação atual.
Dentre as inúmeras e recorrentes informações encontradas, Maria Cristina dos Santos e
Moisés Francisco Farah Junior (2012, p. 302) discorrem que:
O Estatuto (da criança e do adolescente – ECA) passou a adotar uma ordem jurídica
totalmente diversa da anterior – correcional e repressiva. Acolheu a Doutrina da proteção
integral, segundo a qual crianças e adolescentes são reconhecidos como pessoa em
condição peculiar de desenvolvimento, sujeitos de direito e destinatários de prioridade
absoluta.
Para Santos e Farah Jr. (2012) este olhar diferenciado passa a focar a totalidade das crianças
e adolescentes, incluindo os infratores, fazendo com que a sociedade, a família e as autoridades
públicas ocupem o papel de devedores, no que tange a garantia de direitos para estes sujeitos.
Um ponto levantado por Cristiano Costa de Carvalho (2013, p. 75) é a dificuldade
enfrentada na execução do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo – SINASE. Para o
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autor “não se tem uma bibliografia que norteie a atuação frente aos adolescentes que cumprem MSE
em MA, a não ser o ECA”, carecendo de novas pesquisas e estudos que auxiliem no direcionamento
da aplicação efetiva deste sistema.
Carvalho (2013, p. 78) faz destaque a MSE de LA, considerando que:
O programa de liberdade assistida é umas das políticas públicas da assistência social, que
tem como objetivo garantir o convívio social e conscientizar o adolescente do ato cometido,
porém como toda política social inserida na logica neoliberal, possui desafios devido ao seu
caráter fragmentado, não reconhecendo o sujeito como um todo, e minimizando o
atendimento perante as demandas dos adolescentes.
Dentre as bibliografias selecionadas, outros/as autores/as tais como Edenilza Gobbo e Crisna
Maria Muller (2009), Leila Maria Torraca de Brito (2007), Fabio Silvestre Silva, Francisco Helder
da Silva, Marcelo Arruda Piccione e Roberta Freitas Lemos (2008), Maria Emilia Passamani e
Edinete Maria Rosa (2009) abordam a MSE em MA com enfoque nas dificuldades e necessidades
da execução da LA, porém não realizam recorte de gênero e/ou relações de trabalho feminino na
adolescência.
Ainda sobre a aplicação das MSE e sua importância, destacamos as autoras Claudia Regina
Brandão Sampaio Fernandes da Costa e Simone Gonçalves de Assis (2006, p. 78) que apresentam
os fatores de proteção mais significativos ao desenvolvimento do adolescente em conflito com a lei,
sendo eles: “vínculos familiares fortes; êxito escolar; estabilidade; apoio mútuo; capacidade de
tomar decisões; rotinas organizadas; compartilhamento de sentimentos; responsabilidade; auto-
estima; competência; religiosidade”.
As autoras Costa e Assis (2006) aprofundaram o estudo sobre três fatores, os quais com base
nos limites de alcance das MSE consideram de maior relevância: Fortalecimento de vínculos,
autonomia e projeto de vida. Para as autoras (2006, p. 78), “a possibilidade de desenvolver
confiança básica em si mesmos e no meio demanda qualidade nos vínculos” dos/as adolescentes
para com a equipe técnica que executa as MSE e as pessoas de seu convívio diário. Segundo as
autoras, a promoção destes fatores:
pode resultar na aquisição de outros importantes recursos para que os adolescentes em
situação de risco social desenvolvam a capacidade de resistir à destruição e a capacidade
para se reconstruir, que constituem os dois componentes básicos da resiliência. (COSTA;
ASSIS, 2006, p. 80)
A abordagem e execução das MSE devem garantir a promoção dos fatores protetivos. Para
que isso seja possível é necessário que se compreenda o contexto no qual o adolescente está
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inserido e qual a composição da rede de assistência que deverá ser acionada para o atendimento de
forma integral. Com base em Lisélen de Freitas Avila (2013, p. 43):
as medidas socioeducativas em meio aberto de PSC e LA requerem das entidades e serviços
que as executam a articulação com os demais órgãos e serviços governamentais e não
governamentais responsáveis pela garantia dos direitos da criança e do adolescente onde a
família e a educação ocupam espaço fundamental. Dessa forma, o diálogo entre a escola e
os serviços de execução das medidas socioeducativas em meio aberto é essencial para o
sucesso da medida aplicada. As diferentes contribuições ampliam as possibilidades e
apontam novos caminhos para o rompimento da prática infracional.
Para que as MSE atinjam ao objetivo delineado no SINASE, é necessário compreender seu
papel pedagógico em detrimento ao caráter sancionatório. Para trabalhar as questões implicadas
neste recorte, buscamos as obras das autoras Cândida Costa (2015), Olga Maria Pimentel Jacobina e
Liana Fortunato Costa (2011), Gobbo e Muller (2011).
Costa (2015, p. 66) traz sua contribuição referente aos desafios encontrados na
implementação e efetivação da prática pedagógica:
O principal limite pedagógico é identificado quando os programas socioeducativos, a
pretexto de socializar o adolescente em conflito com a lei, se propõe, a “trata-lo”,
“transformá-lo”. Essas iniciativas tendem a despersonalizar o adolescente, a desconhecê-lo
em sua singularidade. Compreender o adolescente em sua singularidade significa recusar
uma denominação e características que deveriam ser comuns a todos os adolescentes, pois
não existe uma única forma de viver a adolescência, de vez que esta foi construída social e
historicamente. As aflições de classe, etnia, gênero, as vivências familiares, os momentos
históricos e contexto social em que se inserem são elementos significativos nas vivências
de cada adolescente. Daí, porque não se pode eleger técnicas seriadas pra tratar com os
adolescentes, sendo necessário compreender suas experiências de vida.
Ainda sobre a implementação e efetivação da prática pedagógica, Jacobina e Costa (2011)
ressaltam que é necessário sair do papel passivo e assumir o papel ativo no acompanhamento dos
adolescentes em conflito com a lei. As autoras ressaltam:
Entretanto, se avançamos quanto aos dispositivos legais que visam garantir a execução da
MSE pautada nos Direitos Humanos, ainda estamos longe do preconizado quando o assunto
é adolescente e criança em situação de vulnerabilidade e/ou risco social. (JACOBINA;
COSTA, 2011, p. 137)
Gobbo e Muller (2011, p.182) reforçam a importância do olhar pedagógico nas MSE. As
autoras afirmam que:
Assim, o espaço do aprender é o próprio ser do indivíduo, pois é ali que ocorre o embate
decisivo entre as diferentes influências, o que irá determinar o seu comportamento. Tal
entendimento exige que não se subestime a experiência do educando, pois ela é tudo no
processo educacional. Não que com isso o papel do mestre seja dispensável, pelo contrário.
Segundo as autoras, isso se deve a necessidade de aceitação e adaptação que o ser humano
tem em relação ao meio que vive, onde se considerando as subjetividades individuais, a prática
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pedagógica acontece. Ressaltam que “assim, no atendimento socioeducativo faz-se necessário, para
ser eficaz, voltar o olhar para a trajetória do adolescente em processo de desenvolvimento, suas
relações e interligações com a realidade social”. (GOBBO; MULLER, 2011, p. 183)
Trazemos aqui, mais duas autoras que discorrem sobre a tomada de decisão sobre a
aplicação das MSE e suas consequências na vida dos adolescentes em conflito com a lei. Maria
Cristina Marushi e Ruth Estevão Marina Rezende Bazon (2013, p. 454) afirmam que:
A correta identificação da medida socioeducativa que melhor se aplica ao adolescente e a
definição da amplitude da intervenção, fundamentada na avaliação que se puder fazer as
necessidades de acompanhamento do adolescente, são fundamentais para a interrupção da
prática de delitos e a promoção do desenvolvimento do adolescente.
Corroborando com este posicionamento, Claudia Regina Brandão Sampaio Fernandes da
Costa (2005) traz exemplos de experiências “bem sucedidas” para mostrar que novos caminhos de
abordagem são possíveis. Para a autora, é valido olhar para as experiências positivas para que:
Ainda que a tese de continuidade e estabilidade da conduta infracional esteja presente no
contexto socioeducativo, há que se considerar que outras trajetórias se delineiam enquanto
possíveis, constituindo experiências de descontinuidade e mudança, apontando para outras
direções, tornando factível a própria ideia que move o princípio socioeducativo: mudar é
possível. Promover mudança é o que deve, portanto, vislumbrar o sistema socioeducativo.
(COSTA, 2005, p. 85-86)
Trabalhando com as representações de adolescentes em LA, as autoras Bianca Izoton
Coelho e Edinete Maria Rosa (2013) analisaram as representações sociais do ato infracional e
medida socioeducativa. Com a referente pesquisa as autoras concluíram que:
o ato infracional ainda está condicionado ao crime adulto, sendo que, social e moralmente,
não estamos preparados para considerações acerca de direitos e deveres de adolescentes
como pessoas em desenvolvimento. Esse fato torna-se ainda mais preocupante, uma vez
que nem mesmo os adolescentes conseguem se considerar providos de direitos e deveres.
Assim, tem-se a impressão de que o ato infracional é mais um tipo de violência e, como
toda violência, deve ser punida utilizando-se para isso de qualquer meio. Não obstante, ai
também está inclusa a utilização de violência para o combate a violência. (COELHO;
ROSA, 2013, p. 171)
Toda essa discussão nos faz pensar no paradigma entre teoria e prática. Se na teoria temos
obtido um avanço considerável referente às MSE, na prática ainda temos um caminho longo e árduo
para trilhar. Caroline Santos de Viera (2009) destaca que a instrumentação teórica, que ocorre no
âmbito da ciência do direito, deve subsidiar as decisões judiciais frente ao processamento e
julgamento do adolescente que pratica o ato infracional. Porém, considera que:
o Direito não é capaz de dar conta do complexo problema da violência, sob pena de exceder
os limites de um Estado Democrático de Direito, o que denota a importância do estudo
crítico para a implementação do modelo garantista insculpido pelo paradigma da proteção
especial quando da prática de ato infracional por adolescente. O modelo garantista vai aqui
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defendido enquanto liame mínimo de legitimação do poder político do Estado. (VIERA,
2009, p. 110)
Segundo os/as autores/as até aqui apresentados/as, para que a execução das MSE, seja
realizada de acordo com as diretrizes estabelecidas pelo SINASE, que teve como base a doutrina da
proteção integral, devemos olhar para o adolescente que pratica o ato infracional como um sujeito
em situação peculiar de desenvolvimento, que tem suas subjetividades ligadas as particularidades de
seu cotidiano, necessitando assim de um planejamento individualizado para um atendimento eficaz.
Buscaremos a partir daqui resgatar as obras selecionadas que contribuíram na construção das
categorias de estudo.
3 O liame entre as produções e as especificidades do tema
Com base na delimitação do tema realizada previamente, buscaremos mostrar o que as
produções selecionadas através da pesquisa bibliométrica trazem de contribuição. Apontaremos se
as mesmas abordam todas as especificidades, quais as deficiências e vantagens encontradas e quais
as necessidades identificadas.
3.1 Relações de gênero presentes na MSE
Após a leitura dos 27 referenciais obtidos com a pesquisa bibliométrica, identificamos
apenas uma dissertação que abordava diretamente as relações de gênero nas MSE e um artigo que
trazia informações de gênero em seu conteúdo. Joana das Flores Duarte (2016), em sua dissertação
de mestrado intitulada: “Para além dos muros: As experiências sociais das adolescentes privadas de
liberdade”, ao falar sobre as unidades de internação relata que:
No que se refere á discussão de gênero, enquanto fenômeno legal, dentre os motivos que
justificam o atual modelo, a falta de parâmetros norteadores na legislação destinada às
adolescentes permite a manutenção do modelo reformador, evidenciado pela pesquisa do
CNJ ao afirmar que a falta de orientação e formação dos profissionais são um dos agravos
que acarretam violações de direitos humanos nas unidades socioeducativas em todo Brasil.
(DUARTE, 2016, p. 95)
Duarte (2016) aponta questões como a invisibilização das adolescentes em restrição de
liberdade, critica a perspectiva biologizante da normatização dos corpos, e faz considerações sobre
identidade de gênero tomando como base grandes autores/as como Michel Foucault (2014) e Judith
Butler (2015).
Com o enfoque nas percepções sobre as famílias dos/as adolescentes em conflito com a lei,
as autoras Fernanda Ludke Nardi e Débora Dalbosco Dell’Aglio (2012, p. 183) relataram que:
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Um estudo feito com 50 meninas infratoras, que possuíam idades entre 13 e 20 anos,
revelou a presença de violência intra e extra familiar no contexto em que as jovens viviam.
As adolescentes estavam expostas a um contexto social e familiar caracterizado por
agressões físicas, discussões verbais, ameaças, abuso sexual, envolvimento com o tráfico e
uso de drogas, bem como escolhas amorosas por companheiros violentos e também
envolvidos no mundo infracional.
Neste relato, as autoras não explicitam se as adolescentes do estudo em questão são de MSE
em MA ou em Meio Fechado (MF).
Ao finalizar a leitura das obras selecionadas, constatou-se que, apesar de trazerem
questões relacionadas a gênero, não abordaram a totalidade desta sub-área que se reporta
especificamente a meninas adolescentes em cumprimento de MSE em MA.
3.2 Relações de trabalho feminino na adolescência
Com o resultado obtido através da pesquisa bibliométrica, não foi possível localizar
nenhuma referência que trouxesse informações sobre as relações de trabalho na adolescência
feminina. Para que esta sub-área seja estudada serão necessários novos testes de aderência para a
criação de uma fórmula específica de busca.
Podemos considerar, com base no resultado apresentado, que existe uma carência de
produções que abordem a temática apesar de sua importância no contexto de formação das
adolescentes que se encontram como sujeitos em situação peculiar de desenvolvimento.
3.3 Consequências das MSE em MA na vida das adolescentes
Para trabalhar as consequências das MSE na vida das adolescentes, selecionamos dentre as
27 referências, oito obras que de alguma forma trouxeram informações que contribuíram para a
elaboração desta sub-área. Apesar do foco dos artigos escolhidos em sua maioria não abordarem as
MSE de PSC e tratarem somente a LA e a privação de liberdade, apontaram que a educação, a
família e o processo de (res)socialização interferem diretamente neste processo.
Com base em Ivani Ruela de Oliveira Silva e Leila Maria Ferreira Salles (2012), Aline
Fávaro Dias (2013) e Glaziela Cristiani Solfa Marques (2013), podemos afirmar que a educação
e/ou ação educativa pode acarretar em inúmeras consequências na vida dos/as adolescentes que
cometeram ato infracional. Isto porque a escola e as instituições executoras das MSE possuem papel
fundamental na formação de opinião e superação das situações de conflito.
Sobre o processo educativo, Marques (2013, p.201) afirma:
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Compreende-se a ressignificação como processo desenvolvido junto ao adolescente, em que
o mesmo possa refletir ao se deparar com suas limitações, suas ações, mas também com a
descoberta de potencialidades, com novas formas de agir e estar no mundo. Nesse sentido o
ato infracional é considerado como uma ocorrência na vida do adolescente, como uma
situação a ser transposta. Deverá refletir sobre a sua realização, suas responsabilidades e
implicações. Mas não ignora o contexto social em questão, nem tão pouco as situações de
vulnerabilidades em que estão implicados, buscando uma problematização sobre as mesmas
e alternativas ao seu sofrimento.
Para demonstrar como os problemas educacionais se incidem na vida dos/as adolescentes
que cumprem MSE, Dias (2013, p. 73) ressalta que “no que se refere a escola, pesquisas realizadas
em âmbito nacional indicam que a repetência, a dificuldade em conseguir vagas e a evasão escolar
são fenômenos comuns entre jovens que cometeram atos infracionais”. A autora ressalta ainda que:
apesar da garantia da educação como um direito do público infanto-juvenil, diante dos
dados apresentados, é possível perceber a dificuldade contrariando os direitos adquiridos e
a tendência de democratização do acesso à escola. Tal exclusão pode significar limitar o
desenvolvimento do indivíduo, impedindo-o, por exemplo, de construir novas significações
sociais e adquirir consciência de sua situação através da intervenção escolar. (DIAS, 2013,
p. 74)
A autora conclui que “faz-se importante discutir a escola a partir da visão dos jovens que
estão em conflito com a lei; essa discussão pode contribuir para o entendimento do significado da
escola para estes jovens”. (DIAS, 2013, p. 74)
Sobre a ressocialização, Magro e Gobbo (2007, p. 159) trazem considerações que mostram a
importância de olharmos cuidadosamente para as MSE:
Considerando as peculiaridades da medida de Liberdade Assistida, não restam dúvidas de
que ela seja uma medida de verdadeiro caráter pedagógico, porém necessita, para sua
concretude, de estrutura adequada e de um comprometimento maior da sociedade e Poder
Público para que, efetivamente, ofereça-se ao adolescente a possibilidade de reinserção
social, acompanhando seu convívio familiar, escolar e na sociedade, além de inclui-lo em
programas que auxiliem em sua formação pessoal.
Paulo Arthur Malvasi (2011, p. 168-169) argumenta:
Ao situar os adolescentes como sujeitos de direitos, o sistema socioeducativo passa a
representar a possibilidade de eles mudarem o comportamento desviante e assim tornarem-
se membros da sociedade. Dessa forma, o Estado faz a sua parte, cumpre suas funções
racionais de controle da criminalidade e, ao mesmo tempo, de promoção da cidadania. O
Estado garante o direito do adolescente se ressocializar, permite que ele, por meio de sua
razão individual, possa transpor a fronteira do “mundo do crime”. Se o adolescente não a
transpuser, isso será uma fraqueza individual ou da família. Cria-se uma noção de
diversidade entre jovens aptos a voltarem ao convívio social e jovens reincidentes.
Para o autor a questão familiar também causa implicações na vida dos/as adolescentes que
cumprem MSE. Nesta mesma linha, as autoras Ana Paula Motta Costa e Juliana Maia Goldani
(2015, p. 91) concluem que:
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a intervenção familiar é, portanto, um instrumento de controle social no qual a imposição
da normalidade familiar funciona como uma parte do processo de moralização controladora
dos grupos populares. Busca-se na fiscalização da família, um meio de controlar os estratos
sociais mais baixos.
Corroborando com esta ideia, Nardi e Dell’Aglio (2012, p. 183) justificam que “alguns
adolescentes autores de ato infracional apresentam um comportamento violento que pode ser
explicado pelo padrão de relações estabelecidas dentro de sua família”, reforçando assim a família
como um fator importante nas consequências geradas pelas MSE na vida dos/as adolescentes.
4 Considerações finais
Tomando como base de busca a pesquisa bibliométrica, após o teste de aderência das
fórmulas e análise das obras encontradas, podemos observar que o tema deste artigo não foi
contemplado em sua plenitude. Mesmo com busca sistemática, não localizamos referências que
abordassem as relações de trabalho e MSE em MA conjuntamente.
Ao focarmos a pesquisa no tema central MSE em MA, as abordagens encontradas em sua
maioria tratavam apenas da MSE de LA deixando uma lacuna sobre as MSE de PSC. Quando nos
referimos as questões de gênero, pouco encontramos, sendo que a única obra que tinha este enfoque
se referia a meninas em MSE de privação de liberdade.
Analisando o resultado da pesquisa, concluímos que existe a necessidade de investir em
pesquisas sobre as MSE em MA com enfoque de gênero, para que se possa subsidiar uma forma
mais eficaz de garantia dos direitos destas adolescentes e as mesmas saiam desta condição de
invisibilidade.
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Work Relationships and Social & Educational Measures in an Open Environment: State of
Art
ABSTRACT: The purpose of this article is to present the state of art elaborated as part of the
research for a master’s dissertation which main theme is the Social & Educational measures in an
open environment and the female working relationships during adolescence. The theme was chosen
based on the professional experience acquired while working as a Social Assistant of Centro de
Referência Especializado em Assistência Social – CREAS, in Rio Branco do Sul, Paraná, from 2014
to 2016. To base the research and verify its relevance compared to other existing productions, a
bibliometric research was performed at Capes portal, which enabled the access to innumerous
national and international platforms. In a systematic manner and confirming the hypothesis that
there was a shortage of works about the selected theme, only 27 works were found – 24 articles and
3 theses that approach the object of the research in a way or another. The state of the art describes
the major area and the sub areas of the theme, thus bringing a theoretical approach, its advantages
and disadvantages of the approach, as well as the methodologies utilized. Also, this work attempts
to show what social work has produced about the theme and subsidize the dissertation.
Key Words: Social & educational measures; female adolescence; social work