PAPEL DA CAMA NA PRODUÇÃO E BEM ESTAR DE FRANGOS DE CORTE
Autores: Rodrigo Garófallo Garcia, Ibiara Correia de Lima Almeida Paz, Fabiana Ribeiro CaldaraUniversidade Federal da Grande Dourados – Faculdade de Ciências Agrá[email protected]; [email protected]; [email protected]
A cama do aviário tem como objetivos impedir o contato direto dos animais com o
piso, promover a absorção de água e incorporar fezes e penas. O material deve auxiliar na
redução das oscilações de temperatura do aviário, contribuindo para o conforto das aves e
permitir que estas tenham condições de expressar seu potencial genético e seu
comportamento natural. Desta forma, o material de cama deve ser escolhido criteriosamente,
já que o animal permanecerá sobre ele durante todo o período de alojamento. A escolha e
manejo adequados da cama podem reduzir a incidência de lesões em regiões como peito,
articulações e coxim plantar, bem como promover melhorias no desempenho das aves.
Para escolha do material de cama devem-se levar em consideração as características
físicas e químicas do material, além da viabilidade da criação de frangos de corte. Deve ser
proveniente de material seco e possuir elevada capacidade de absorção de umidade, ser livre
de fungos, mofo, não ser proveniente de madeira tratada com produtos químicos, ser macio,
com tamanho de partículas médias capazes de absorver o impacto do peso das aves, ser um
eficiente isolante térmico, ser apropriado para a utilização posterior como fertilizante de solo,
além de apresentar baixo custo, alta disponibilidade e facilidade de transporte.
No Brasil o material normalmente utilizado na criação intensiva de frangos de corte
tem sido a maravalha de madeira. Entretanto, periodicamente, este material torna-se escasso
no mercado, levando à elevação de seus preços e reduzindo sua viabilidade de utilização.
Sendo assim, é constante a procura e avaliação de materiais alternativos. Contudo, para que
tais produtos possam ser utilizados na criação de frangos é necessário que apresentem
características e eficiência semelhantes ou superiores aos materiais tradicionalmente
utilizados como a maravalha.
Como materiais alternativos considerados adequados para cama de frangos podem ser
utilizados casca de arroz, casca de amendoim, fenos de diversos capins, palhadas de várias
culturas, polpa de citrus e outros materiais.
Com a expansão da produção agrícola no Brasil, como por exemplo, a cana de açúcar,
aumentou-se de forma significativa a quantidade de resíduos gerados. Grande parte destes
resíduos pode apresentar potencial de utilização como cama de frango, contribuindo para
maior sustentabilidade da produção agropecuária.
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Materiais utilizados como cama de frango. 1 – bagaço de cana; 2 – capim napier; 3 –
maravalha; 4 – mistura de maravalha e bagaço de cana; 5 – mistura de casca de arroz e
bagaço de cana; 6 – casca de arroz.
No entanto, independente do material escolhido, as práticas de manejo adotadas
devem ser capazes de controlar o nível de umidade, a produção de pó e amônia, exposição a
agentes transmissores de doenças, prevenir a proliferação de insetos, reduzir a incidência de
problemas locomotores, lesões de carcaça, coxim plantar, promovendo o bem estar das aves.
Vários fatores podem afetar a qualidade da cama aviária, tais como tipo ou
composição da ração, natureza e quantidade do material de cobertura do piso do galpão,
período de permanência das aves sobre o material, número de aves por área, condições e
período de estocagem, temperatura ambiente e utilização de equipamentos de resfriamento,
como nebulizadores e ventiladores, entre outros.
A umidade e a concentração de excretas são os dois principais fatores que podem
influenciar significativamente a qualidade da cama e prejudicar o rendimento do lote de aves.
Como a produção de excretas é um fator que não pode ser controlado, o produtor deve se
esforçar para controlar o nível de umidade da cama.
Dentre os principais fatores que podem contribuir para o aumento na umidade da
cama temos a temperatura ambiente, ventilação inadequada, bebedouros e sistemas de
resfriamento evaporativo regulados inadequadamente.
Quando a cama apresenta uma umidade excessiva a incidência de lesões,
condenações e desclassificações de carcaça aumentam consideravelmente. Além disso, a
cama úmida também contribui para a redução da qualidade ambiental tanto para as aves
quanto para o produtor, uma vez que ocorre considerável aumento na produção de amônia a
partir do metabolismo microbiano sobre as excretas.
Para o produtor, a exposição contínua ao ambiente com amônia pode contribuir para
uma série de riscos à sua saúde como, por exemplo, a perda da sensibilidade olfativa, uma
vez que o olfato humano é capaz de detectar nível de amônia ao redor de 20 partes por
milhão (ppm). Para as aves, o nível de amônia de apenas 25 ppm já consegue reduzir o ganho
de peso e com isso piorar da conversão alimentar, além de elevar a incidência de
aerossaculite, infecções virais e condenações no abatedouro. A exposição contínua a um
ambiente saturado com amônia, mesmo em níveis baixos, já causa irritação da mucosa
respiratória das aves, aumentando a susceptibilidade a doenças respiratórias.
A adição de condicionadores químicos à cama, como o gesso agrícola e o sulfato de
alumínio, ajuda a manter o pH da cama baixo e inibir a volatilização da amônia, auxiliando
na melhoria de sua qualidade e favorecendo o desempenho zootécnico e sanitário das aves.
Além destes problemas, em cama úmida os quadros de coccidiose podem ser agravados, pois
os oocistos encontram ambiente favorável para a esporulação, aumentando assim o nível de
desafio.
Por outro lado, quando se tem uma cama muito seca e com formação de pó, também
podem ser observados problemas, tais como desidratação de pintos, doenças respiratórias e
maior taxa de condenação. Por isso, o ideal é que a umidade da cama encontre-se entre 20%
e 25%.
Para se estimar de forma bastante prática o teor de umidade da cama, basta espremer
nas mãos um pouco do material. Caso haja a aderência das partículas e formação de um bolo,
conclui-se que a cama está excessivamente úmida. O ideal é que ocorra apenas uma ligeira
aderência das partículas, revelando um teor de umidade próximo do ideal. Do contrário, caso
não haja nenhuma aderência, o material está seco demais.
A densidade populacional é outro aspecto a ser considerado na produção de frangos
de corte, pois o excesso de animais por área pode ocasionar deterioração acelerada da cama,
devido ao aumento de umidade da mesma, com consequentes problemas no bem estar,
sanidade e desempenho das aves. Como forma de amenizar esse problema, uma
recomendação muito observada é o aumento na espessura da cama. De acordo com a
recomendação de Macari e Campos (1997), para lotes criados durante o inverno, a cama deve
ter 10 ou mais centímetros de espessura enquanto que no verão, a espessura deve ser de pelo
menos 15 cm, quando utiliza-se lotações de 14 ou mais aves/m2.
O tamanho das partículas também tem grande importância sobre a absorção de
umidade e compactação da cama. Devido à umidade da cama, pisoteio das aves, gotejamento
ou escorrimento de água por problemas nos bebedouros, desperdício de ração dos
comedouros, dentre outros fatores, ocorre a compactação da cama, levando à formação de
blocos que podem prejudicar o lote, aumentando a incidência de lesões.
Assim como em outras culturas e criações, na avicultura também ocorrem ataques de
pragas e agentes patogênicos, como fungos, bactérias e vírus. O besouro Alphitobius
diaperinus Panzer, conhecido como cascudinho, é um dos grandes problemas da avicultura,
pois se adaptou às condições dos aviários, onde se alimenta de ração e excretas, sendo
transmissores de patógenos causadores de doenças nas aves. O manejo adequado da cama
reduz a incidência destes problemas sanitários.
Para a reutilização da cama, a primeira exigência é não terem ocorrido doenças
contagiosas no lote anterior. A segunda exigência é a retirada, lavagem desinfecção de todos
os equipamentos antes de recolocá-los no galpão, o qual já deverá estar devidamente limpo e
desinfetado. Para a eliminação dos agentes causadores de doenças contagiosas é necessária a
fermentação da cama por no mínimo 14 dias. A fermentação é um processo biológico de
decomposição da matéria orgânica em ambiente anaeróbico. O aumento da temperatura e a
diminuição do pH da cama, decorrentes da atividade microbiana, inviabilizam a
sobrevivência dos principais microorganismos patogênicos.
A presença de bactérias na cama de aviário é inerente à produção, não podendo ser
evitada, mas minimizada pela adoção de métodos eficientes para este fim. Quando se
contrasta o perfil bacteriológico para enterobactérias entre camas novas e reutilizadas em
vários lotes consecutivos, observa-se que a partir do terceiro lote, as camas apresentam carga
bacteriana igual ou inferior às camas novas, desde que o tratamento dado ao material seja
corretamente aplicado. Com isso, pode se concluir que a reutilização de cama de aviário,
desde que submetida a tratamento eficiente para redução de riscos micróbiógicos, é uma
prática segura e recomendável.
Entretanto, camas reutilizadas geralmente apresentam maior teor de amônia e pH
mais elevado, devido ao maior teor de ácido úrico que é um composto tóxico eliminado junto
com as fezes em forma de uma pasta esbranquiçada. Normalmente após o quarto lote criado
sobre a mesma cama, pode ocorrer redução no desempenho das aves e aumento da incidência
de calos nos pés, uma vez que camas reutilizadas tendem a absorver menos umidade.
Independente do material de cama utilizado na criação, o manejo adequado é
fundamental para o sucesso do lote. Em experimentos realizados na Universidade Federal da
Grande Dourados com o objetivo de avaliar diferentes materiais de cama e o bem estar de
frangos de corte de duas linhagens comerciais, foi possível verificar que o material novo
apresentou melhores resultados (Gráficos 1 a 7).
No entanto, os resultados encontrados para o material reutilizado não foram ruins,
mantendo-se dentro dos padrões desejados. Tais resultados podem estar relacionados ao
manejo adequado do material para reutilização, como tratamento do material, aeração e
densidade de criação. Além disso, observou-se que os machos da linhagem 2 apresentaram
melhores índices de bem estar na cama de casca de arroz reutilizada o que reforça a
importância do manejo adequado da cama (Gráfico 4).
Foram consideradas como características da cama a umidade, compactação,
temperatura e volatilização de amônia. Para condições ambientais considerou-se a
temperatura ambiente, umidade relativa, concentração de amônia e formação de poeira. As
características referentes às linhagens foram desempenho produtivo, lesões de carcaça e patas
e problemas locomotores (Gait score, discondroplasia tibial, degerneração femoral,
espondilolistese, Valgus e Varus).
Gráfico 1. Pesos dos critérios para avaliação do melhor material de cama de aviário
Gráfico 2. Comparação entre eficiência da maravalha e casca de arroz novas como material de cama para frangos de corte de diferentes linhagens e sexo.
Gráfico 3. Comparação entre eficiência da maravalha nova e reutilizada como material de cama para frangos de corte de diferentes linhagens e sexo.
Gráfico 4. Comparação entre eficiência da maravalha nova e casca de arroz reutilizada como material de cama para frangos de corte de diferentes linhagens e sexo.
Gráfico 5. Comparação entre eficiência da casca de arroz nova e reutilizada como material de cama para frangos de corte de diferentes linhagens e sexo.
Gráfico 6. Comparação entre eficiência da casca de arroz nova e maravalha reutilizada e como material de cama para frangos de corte de diferentes linhagens e sexo.
Gráfico 7. Comparação entre eficiência da maravalha reutilizada e casca de arroz nova como
material de cama para frangos de corte de diferentes linhagens e sexo.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Os avicultores e as empresas integradoras devem estar sempre atentos ao mercado
consumidor, adequando sua produção às exigências e adaptando-se aos métodos de controle
nacionais e internacionais. As condições de sanidade e bem estar animal devem ser
priorizadas, para que se tenha um produto de excelente qualidade. Dessa forma, qualquer
investimento realizado para manter a qualidade ambiental gera ao produtor bons resultados.
Nesse contexto, a cama de frango exerce papel de destaque, pois está diretamente
relacionada às condições de conforto e bem estar das aves e consequentemente ao
desempenho e qualidade da carcaça. Para que a utilização e reutilização da cama ocorra de
maneira eficaz é necessário que sejam levados em consideração uma série de fatores, com
destaque ao correto manejo.
A reutilização de cama de aviário é uma prática viável, segura e recomendável desde
que seja aplicado um método eficiente para a redução de patógenos e deve ser avaliada sob o
ponto de vista da sustentabilidade da produção, considerando-se os aspectos sanitários,
econômicos e ambientais pertinentes a esta prática.
Embora já existam na literatura alguns trabalhos sobre a utilização de materiais
alternativos para cama de frango, alguns aspectos ainda precisam ser melhor esclarecidos,
principalmente com relação ao bem estar animal.
BIBLIOGRAFIA
ALMEIDA PAZ, I.C.L. et al. Selecting Appropriate Bedding to Reduce Locomotion
Problems in Broilers. Revista Brasileira de Ciência Avícola / Brazilian Journal of Poultry
Science, v. 12, p. 189-195, 2010.
GARCIA, R.G. et al. Effect of the Litter Material on Drinking Water Quality in Broiler
Production. Revista Brasileira de Ciência Avícola / Brazilian Journal of Poultry Science, v.
12, p. 165-169, 2010.
MACARI, M.; CAMPOS, S.S. Respostas fisiológicas de frangos de corte criados em alta
densidade. In: Simpósio sobre Ambiência, Sanidade e Qualidade de Carcaças de frangos de
corte, 1997; Concórdia, Santa Catarina, p.1-13.