Download - Juventud Rural MST Monografia_Gretti Pavani
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Cmpus de Presidente Prudente Curso de Graduao em Geografia (Licenciatura e Bacharelado)
Convnio UNESP/INCRA/Pronera
O JOVEM E SUA PERSPECTIVA DE VIVER NO CAMPO:
INTERIOR DE ABELARDO LUZ- SC
GRETI APARECIDA PAVANI
Monografia apresentado ao Curso Especial de Graduao em Geografia (Licenciatura e Bacharelado), do Convnio UNESP/INCRA/Pronera, para a obteno do ttulo de Licenciado e Bacharel em Geografia.
Orientador: Prof. Dr. Valria de Marcos
Monitor: Sidney Cssio Todescato Leal
Presidente Prudente
2011
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O JOVEM E SUA PERSPECTIVA DE VIVER NO CAMPO:
INTERIOR DE ABELARDO LUZ- SC
GRETI APARECIDA PAVANI
Trabalho de monografia apresentado ao Conselho do curso de Geografia da Faculdade de Cincias e Tecnologia, campus de Presidente Prudente da Universidade Estadual Paulista, para obteno do ttulo de Licenciado e Bacharel em Geografia.
Orientador: Prof. Dr. Valria de Marcos
Presidente Prudente SP
2011
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Greti Aparecida Pavani
O JOVEM E SUA PERSPECTIVA DE VIVER NO CAMPO:
INTERIOR DE ABELARDO LUZ- SC
Monografia apresentada como pr-requisito para obteno do ttulo de Bacharel em Geografia da Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho, submetida aprovao da banca examinadora composta pelos seguintes membros:
Prof. Dr. Valria de Marcos
Prof. Dr. Mirian Loureno Simonetti
Prof. Dr. Jlio Suzuki
Presidente Prudente, novembro de 2011
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DEDICATRIAPara todas as lutadoras e lutadores do povo.
Para Issan minha adorada filha, cujo existir, fonte de luz e persistncia.
Para Oribes e Madalena meus queridos pais, pelo apoio incondicional a todos os momentos difceis.
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AGRADECIMENTOS
Ao Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), pela oportunidade de estudo e de insero na luta cotidiana por um projeto de transformao social.
A Turma Milton Santos pelos incondicionais momentos de alegria e de aprendizado.
Aos meus pais, pelo afeto recebido em todos os momentos, por acreditar na importncia do estudo, e pelo apoio incondicional em todos os momentos de dificuldades encontrados por essa caminhada.
Ao meu querido irmo Gordo e toda sua famlia que incansavelmente dedicaram o seu tempo para me ajudar. Ao meu irmo Jos pelas longas conversas e aprendizado.
Ao meu grande amigo, compadre, companheiro de estudo, Gilberto de Biasi, pela amizade e apoio sempre que necessrio.
A querida Dr Valria de Marcos, por acreditar neste trabalho, pela dedicao e esforo e principalmente por acreditar que a educao fundamental para os lutadores do povo.
Ao Sidney, querido amigo e monitor, pela responsabilidade e comprometimento com sua tarefa, auxiliando-me sempre que necessrio.
Aos muitos amigos que me incentivaram, de forma carinhosa: Mrcia, Vilmar, Edilaine, Fernanda, Aidir entre tantos outros que com certeza lembrarei com carinho.
Agradecer de forma especial aos jovens dos Assentamentos 25 de Maio e Jos Maria , pela
ateno. comunidade Canhado pelo tempo dedicado as conversas e entrevista.
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RESUMO
Este trabalho visa analisar a perspectiva da juventude camponesa em permanecer no campo e como
esta concebe sua vivncia nesse espao. Atravs da anlise de realidades pontuais - dois
assentamentos da reforma agrria e uma comunidade tradicional camponesa - busca-se
compreender os processos sociais aos quais os jovens do campo esto inseridos, quais as relaes
sociais e econmicas estabelecidas com esse pblico, qual a representao da cidade em sua vida e
quais as perspectivas de vida no campo para os mesmos. Ser realizada tambm a anlise das
possibilidades existentes no campo que, de fato, atendam s necessidades sociais e econmicas
colocadas pela juventude camponesa, em especial daquela dos assentamentos do MST, buscando
compreender tambm sua insero no MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) e as
perspectivas futuras para o prprio movimento.
Palavras chave: jovem, campo, trabalho, assentamento de reforma agrria, Movimento dos
Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST).
RESUMEN
Este documento tiene como objetivo analizar las perspectivas de los jvenes rurales a permanecer
en el campo, ve esto como su experiencia en este espacio. A travs del anlisis de las realidades
especficas - dos asentamientos de reforma agraria y una comunidad campesina tradicional - que
tratamos de comprender los procesos sociales a los que los jvenes son parte del campo, que las
relaciones sociales y econmicas establecidas en esta poblacin, que representa a la ciudad en su
vida y cules son las perspectivas en el campo para ellos. Tambin se llevar a cabo para estudiar
las posibilidades en el campo que realmente satisfagan las necesidades sociales y econmicas
planteadas por los jvenes rurales, en especial la de los asentamientos del MST, tratando de
comprender tambin su inclusin en el MST (Movimiento de Trabajadores Rurales Sin Tierra) y las
perspectivas futuro para el movimiento en s.
Palabras clave: joven, trabajo, campo, asentamiento de la reforma agraria, Movimiento de
Trabajadores Rurales Sin Tierra (MST).
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Lista de Figuras
Figura 1 Estado de Santa Catarina: Regies das Primeiras ocupaes do MST 13Figura 2 Localizao do municpio de Abelardo Luz no estado de Santa Catarina 14Figura 3 Vista parcial da Vila 25 de Maio 18Figura 4 Educandos e educadores da turma de EJA-Mdio Florestan Fernandes, em
frente o antigo casaro 20
Figura 5 Educandos do curso tcnico no tempo trabalho no CPFP 21Figura 6 Salo comunitrio da Comunidade Canhado 24Figura 7 Igreja Catlica da Comunidade Canhado 24Figura 8 Vista parcial do frigorfico de peixes da COOPEAL 27Figura 9 Organograma da COOPEAL 28Figura 10 Vista parcial da sede da COOPEROESTE 30
Lista de Tabela
Tabela 1 Escolas no Municpio de Abelardo Luz 49
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SumrioSumrio...............................................................................................................................................9Introduo...........................................................................................................................................81.Histrico da ocupao de terras no oeste de Santa Catarina....................................................102.As relaes sociais e econmicas das realidades em questo.....................................................313. O campo e a juventude camponesa.............................................................................................37Consideraes Finais........................................................................................................................52Referencias Bibliogrficas ..............................................................................................................53Sites Consultados..............................................................................................................................54
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8Introduo
Este trabalho fruto de estudo de pesquisa e vivncia no interior do municpio de Abelardo
Luz-SC, tendo como rea de pesquisa emprica os assentamentos 25 de Maio e Jos Maria e a
comunidade Canhado. O presente estudo traz como foco a juventude e suas perspectivas de
permanncia no campo, compreendendo porm que o conceito de juventude abordado vai muito
alm da questo biolgica, mas sim parte da anlise de uma categoria social construda e
reconstruda por aspectos da sociedade que lhes moldam culturalmente, socialmente e
economicamente (Strapasolas 2006). Para tanto foi necessrio um resgate histrico da luta pela terra
e do MST no estado de Santa Catarina e no municpio de Abelardo Luz, bem como um resgate do
histrico das trs realidades em questo, feito atravs de conversas informais, entrevistas e anlises
de documentos como: atas de reunies, PPP das escolas e histrico construido pela direo do MST
no municipo para solicitao de projetos, como por exemplo a Rdio Comunitria, com o objetivo
de analisar quais as perspectivas de permanncia dos jovens no campo e o que o campo oferece
como perspectivas para os mesmos, foram realizadas entrevistas direcionadas para a compreenso
dessa questo.
Dos 350 jovens com idade entre 15 e 25 anos residentes nos trs locais estudados, foi retirado
uma amostra com 50 deles, sendo 10 da comunidade Canhado (que possui 50 jovens
aproximadamente), 25 do Assentamento Jos Maria, onde est o maior nmero de jovens (cerca de
230) e 15 do Assentamento 25 de Maio, onde moram aproximadamente 70 jovens. O nmero de
jovens entrevistados baseou-se na quantidade de jovens existentes em cada local. A faixa etria
entre 15 e 25 anos foi escolhida considerando a idade em que os jovens esto estudando ou j
saram da escola e passam a se inserir no mercado de trabalho. Alm das entrevistas, tambm a
minha atuao enquanto educadora das escolas de ensino mdio dos dois assentamentos em
questo, vivenciando as angustias e as perspectivas do cotidiano dos jovens educandos serviram
como fonte de dados e informaes para a realizao deste trabalho.
A presente pesquisa traz as diferenas existentes entre os dois assentamentos e entre os dois
assentamentos e a comunidade Canhado. Busca-se compreender quais so as possibilidades
apontadas para que os jovens possam permanecer no campo, as perspectivas oferecidas pelo MST
nos assentamentos, a oferta de servios pblicos na comunidade e nos assentamentos e a
importncia da Vila 25 de Maio no meio rural. Destaca-se para tal o nvel de insero dos jovens no
MST, bem como a anlise da educao, do lazer e das relaes de trabalho postas para a juventude
camponesa.
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9Para alcanar os nossos objetivos, estruturamos nosso trabalho em trs captulos. O primeiro,
intitulado Histrico da ocupao de terras no oeste de Santa Catarina, onde fazemos um pequeno
resgate da luta pela terra na regio, da atuao do MST na mesma e em especial da atuao do MST
no municpio de Abelardo Luz, e da conquista dos dois assentamentos em estudo. Buscamos
tambm neste captulo resgatar o processo de formao e estruturao da comunidade Canhado.
O segundo captulo, intitulado As relaes sociais e econmicas das realidades em questo,
visa uma breve anlise dos aspectos econmicos e sociais encontrados nas reas de estudo e qual a
relao e insero social e econmica dos jovens nessa dinmica. Neste captulo preocupamo-nos
em mostrar as semelhanas e contradies encontradas entre os dois assentamentos e a comunidade
Canhado.
No terceiro captulo, que tem como ttulo O campo e a juventude camponesa buscamos,
atravs da analise de como o jovem campons est inserido no campo, identificar o que o jovem
espera do mesmo e quais so as perspectivas desta parcela da sociedade que vive no campo em
permanecer no mesmo. Buscamos tambm analisar qual a insero dos jovens no MST, no caso dos
assentamentos, e o que o MST pensa para essa juventude. Visamos tambm anlise dos jovens que
se encontram na comunidade Canhado e nos Assentamentos 25 de Maio e Jos Maria, no que estes
se diferenciam e se assemelham, assim como os fatores que levam a essas semelhanas e diferenas.
Ainda neste captulo realizamos uma analise da relao dos jovens camponeses com o trabalho, a
educao e o lazer e como essa relao se d no interior das realidades estudadas.
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1. Histrico da ocupao de terras no oeste de Santa Catarina
Os movimentos e lutas sociais so grandes marcos do sculo XX no Brasil, principalmente as
mobilizaes sociais que surgem no campo brasileiro oriundos dos problemas agrrios que o Brasil
possui at hoje, em virtude da concentrao fundiria que ocasiona pobreza e misria para a maioria
dos camponeses. O processo de mercantilizao e expropriao fruto do sistema capitalista
atualmente em curso, expulsa o campons da terra, separando-o do seu meio de produo, a terra
(Martins, 1983).
De acordo com Fernandes e Stdile (2005), a ocupao de terra no Rio Grande do Sul em
1979, conhecida como Encruzilhada do Natalino, foi o estopim para que se pensasse numa forma de
luta organizada dos trabalhadores camponeses expropriados pelo capital, que buscavam alternativas
para continuar garantido sua existncia enquanto camponeses atravs da luta pela terra, tendo esta
como meio de produo. Para tanto, a luta deveria ser nica, ou melhor, um movimento
homogneo. A esse respeito, Fernandes e Stdile (2005, p. 21), lembram as palavras de Jos de
Souza Martins, ditas em uma reunio com a CPT entre os anos de 1981 ou 1982: a luta pela terra
no Brasil s ter futuro e somente se transformar em um agente poltico importante para mudar a
sociedade se conseguir adquirir um carter nacional e se conseguir organizar os nordestinos.
Nesse sentido, a contribuio e apoio de representantes da Igreja Catlica atravs da CPT
(Comisso Pastoral da Terra), criada em Goinia em 1975, assim como a da Igreja Luterana, foram
fundamentais para a existncia do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) criado
em 1984. Para Fernandes e Stdile (2005, p.21) A CPT foi uma fora que contribui para a
construo de um nico movimento, que teve seu marco inicial na regio Sul do pas e logo foi
expandida pelos estados de So Paulo e Mato Grosso do Sul. Hoje o MST est organizado em 25
estados do Brasil, realizando uma luta com carter nacional.
O Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra consolidou-se, assim, numa organizao
nacional com o 1 Congresso do MST realizado em Curitiba-PR, em janeiro de 1985, tendo como
grito de ordem Ocupao a nica soluo. O movimento traz como smbolo de luta as
ocupaes em fazendas improdutivas, atravs da organizao de acampamentos de lona preta com
forte carter organizativo. Questiona a propriedade privada da terra e coloca a Reforma Agrria
como uma medida urgente e necessria para o pas. Para Oliveira (2001, p. 15), o
[...] Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra tem feito da luta pela terra uma bandeira de defesa e de conquista da reforma agrria. Os acampamentos so verdadeiras escolas onde se discute a necessidade da produo coletiva dos assentados.
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Ao assim agir, ele cria uma imensa preocupao para os grandes latifundirios, empresrios e
para o prprio poder pblico, para os quais a organizao da classe trabalhadora uma ameaa ao
sistema capitalista que lhes garante muito poder econmico e poltico.
Em Santa Catarina, a primeira ao de ocupao de terras se deu com a ocupao da fazenda
Burro Branco, em Campo re, regio oeste do estado, em maio de 1980. Tal ocupao foi iniciada
primeiramente por cinco famlias que foram avisadas por tcnicos do INCRA que uma fazenda ali
prxima seria desapropriada. Ocorre que no se tratava da fazenda Burro Branco, havia sido um
engano, mas as famlias permaneceram no local e logo em questo de semanas chegaram mais e
mais famlias, totalizando 350, que contavam com o apoio da CPT e da diocese da Igreja Luterana
de Chapec. Em 12 de novembro de 1980 a fazenda foi desapropriada (Morissawa, 2001).
No que se refere consolidao do MST no estado, o marco principal foi dado no ms de
maio de 1985. Segundo Fernandes e Stdile (2005), as ocupaes de 1985 em Santa Catarina foram
extremamente expressivas para a consolidao do MST no estado. Tratou-se de uma grande ao,
com cerca de 1.659 famlias ocupando latifndios na regio oeste de Santa Catarina, nos municpios
de Quilombo, Abelardo Luz, Descanso, Romelndia, So Miguel do Oeste e Maravilha, em um
perodo de sete dias. O resultado dessas grandes ocupaes realizadas no estado foram cinco
assentamentos distribudos em cinco municpios de Santa Catarina com o nome 25 de Maio,
registrando a importncia dessa data para os camponeses assentados e para o MST no estado.
Ressalte-se que a maioria das famlias que foram assentadas nesses assentamentos participou das
ocupaes em maio de 1985.
Contudo importante destacar tambm que essa regio do estado a regio onde ocorreu a
Guerra do Contestado no incio do sculo XX, estendendo-se pelos anos de 1912 a 1916, ocasio
em que milhares de camponeses catarinenses e paranaenses, expropriados de suas terras, lutaram
contra o governo e contra a empresa norte-americana Brazil Railway Company que se instalara na
regio (Morissawa, 2001).
Desde ento, a luta pela terra no estado foi contnua, com destaque para o ano de 1987, com
vrias ocupaes distribuidas pelos municpios de Campo re, Irani, Campo Alegre, Ibirama, Palma
Sola e Garuva. Na dcada de 1990 o MST em Santa Catarina mostrou grande fora, como relata
Morissawa (2001, p.175-176)
O ano de 1990 foi farto em lutas dos sem-terra catarinenses: ocupao das fazendas Santa Rosa, em Abelardo Luz; Frigonese em Palma Sola; Caldato em Chapec; Despraiado e Ronda em Curitibanos; ocupao do Incra em Florianpolis, exigindo audincia com o governador, para reivindicar alimentos, escolas, estradas;
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ocupao na prefeitura de Abelardo Luz, para pressionar por energia eltrica, estradas, escolas, sementes. Em dezembro, o MST conquistou a imisso de posse das fazendas Igua, em Ponte Serrada, e Canhada Funda, em Fraiburgo.At 1990, o MST de Santa Catarina havia se expandido por trs regies do estado e conquistado 50 assentamentos para 2.031 famlias. Nos anos Collor, de intensa represso, o Movimento dedicou-se mais s negociaes, organizao interna e s aes pelo desenvolvimento dos assentamentos.A dcada de 1990 foi plena de lutas em Santa Catarina, comeando com a conquista de terras para 350 famlias, em 1991, em Fraiburgo e no Projeto Contestado. Ainda nesse ano, o MST promoveu atos em vrios pontos do estado. Uma caminhada, de Curitibanos a Florianpolis, iniciada com 100 pessoas, recebeu apoio popular no trajeto e chegou capital com 7 mil. Outras trs manifestaes foram realizadas ao mesmo tempo em Rio do Sul, Blumenau e Itaja. Outros assentamentos foram conquistados entre 1992 e 1994, em Joaaba, Matos Costa e Abelardo Luz.
De acordo com dados recolhidos da COOPTRASC (Cooperativa Central de Reforma Agrria
de Santa Catarina), hoje o estado de Santa Catarina conta com 133 assentamentos, 5.142 famlias
assentadas, 70 Escolas, distribudas em Educao Infantil, Sries Iniciais (1 a 4 Srie), Ensino
Fundamental (1 a 8 Srie), Ensino Mdio, Cursos Tcnicos em Agroecologia e Escolas Itinerantes.
Na produo, o estado conta com 13 cooperativas e 03 Associaes. Possui cerca de 40 produtos
com a marca Terra Viva. Participou do Programa de Aquisio de Alimentos (PAA), com mais de 5
milhes acessados em 2010. Possui 2.591 unidades de reforma de habitao j contratadas e tem
dado continuidade ao programa da Assessoria Tcnica Social e Ambiental (ATES).
A (figura 1) indica as regies das primeiras ocupaes do MST.
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Figura 01: Estado de Santa C
atarina: Regies das Prim
eiras ocupaes do MST.
Fonte: CO
OPTR
ASC
(2010)
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Em Abelardo Luz (figura 2) a primeira ocupao foi em 25 Maio de 1985, com cerca de 1500
pessoas, na sua maioria oriundas de outros municpios como Campo re, Quilombo, entre outros.
Tal ocupao transformou-se em marco da luta pela terra no municpio, que passou a ser campo de
grandes disputas por terras no estado.
Figura 02: Localizao do municpio de Abelardo Luz no estado de Santa Catarina
Fonte: mapainterativo.ciasc.gov.br
De acordo com relato de lideranas do MST da regio, as ocupaes em Abelardo Luz foram
palco de violentos despejos, mortes e intensa represso por parte do governo municipal. As aes
mais violentas partiam principalmente dos capatazes das fazendas que, obedecendo s ordens dos
seus patres, ameaavam e amedrontavam os acampados atravs de tiros e barreiras, como foi o
caso da ocupao de 25 de maio, quando atearam fogo na ponte que dava acesso rea a ser
ocupada na fazenda. Hoje Abelardo Luz o municpio com maior nmero de assentamentos em
Santa Catarina, tendo 22 assentamentos e aproximadamente 1500 famlias assentadas. O municpio
tem tambm forte representao em nvel estadual, com grandes aes na questo da educao e da
produo nas reas de assentamento.
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1.1-Histrico do Assentamento 25 de Maio e da Vila 25 de Maio
O Assentamento 25 de Maio est localizado no municpio de Abelardo LuzSC, na regio do
oeste catarinense, a 28 km da cidade de Abelardo Luz e possui 58 famlias assentadas, tendo sido o
primeiro assentamento do municpio de Abelardo Luz, fruto da luta do MST. De acordo com o
relato de assentados que participaram da ocupao, ele teve sua histria iniciada na madrugada fria
de 25 de Maio de 1985, quando chegaram nesse municpio caminhes carregados com mulheres,
homens e crianas, cerca de 2000 pessoas, vindas na maioria de outros municpios, como Campo
re, Quilombo e Santa Terezinha entre outros, localizados tambm na regio oeste de Santa
Catarina. Todos possuam um grande objetivo, a conquista da terra, para tirar dela o seu sustento.
Quando chegaram enfrentaram os jagunos da fazenda, pees que trabalhavam para a
proprietria da ento Fazenda Sandra que, com medo, atearam fogo na ponte que dava acesso
fazenda. No mesmo momento as mulheres que estavam nos caminhes da frente, em um ato de
muita coragem, comearam a apagar o fogo, sendo logo auxiliadas pelos demais que estavam nos
caminhes. Superada essa barreira, chegaram rea destinada ao acampamento. Segundo relato dos
assentados, muitos no sabiam nem sequer onde estavam, mas no se importavam. O importante era
que eles estavam na terra que futuramente ia lhes garantir uma mudana para melhor de suas vidas.
Segundo relato de ex-lideranas do MST que moram no assentamento, aps oito dias da
ocupao, chegou a primeira liminar de despejo, mas antes mesmo que a ao fosse executada, as
lideranas do MST do estado, junto com os acampados, decidiram mudar-se, dirigindo-se para uma
rea provisria, no municpio vizinho de Faxinal dos Guedes, local onde ficariam aguardando o
momento para uma nova ocupao. Tratava-se de um potreiro1 de uma fazenda cujo dono era um
ex-presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Abelardo Luz. Ali permaneceram cerca de
um ms, mudando-se novamente, ocupando duas reas que pertenciam ao mesmo proprietrio,
ambas com o nome de Santa rsula, uma localizada em Ara, distrito do municpio de Abelardo
Luz, para onde foram 150 famlias, e outra no municpio de Faxinal dos Guedes, para onde foram
600 famlias. Nesse perodo as negociaes se intensificaram e at mesmo o ento Governador do
estado Esperidio Amim- (Arena), recebeu os acampados em audincia em Florianpolis, a fim de
que uma soluo plausvel fosse tomada.
No mesmo ano, 58 daquelas famlias sem terra conseguiram seu objetivo: a conquista da
terra, ocorrida no ms de novembro, em carter emergencial, j que os lotes foram entregues no ms
de abril do ano subseqente. No total foram desapropriados 251ha divididos em 58 lotes que
1 Espao reservado para a criao de bovinos, com pastagem, geralmente cercado.
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variavam de 14 a 20ha, e uma rea comunitria de 13,3ha, hoje chamada de Vila. A diviso dos
lotes foi feita de acordo com o relevo: quanto mais plano e propcio ao cultivo agrcola, menor era o
lote. Ainda no acampamento e depois no assentamento, na terra, apareceram outras necessidades
como: sade; educao; transporte, financiamentos para produo etc., o que os fez perceber que a
luta no havia acabado, mas que ao contrrio, ela deve ser contnua.
Quando as famlias foram para seus lotes, debateu-se sobre a importncia de deixar a rea de
um lote para rea comunitria, onde seriam construdos os equipamentos de uso comum como
escola, igreja, salo de festas, cemitrio2, campo de futebol, enfim, toda a infra-estrutura necessria
a uma comunidade. A rea comunitria tambm serviria para que os assentados que tivessem
interesse em morar ali pudessem ali construir uma casa. O objetivo era o de oferecer maior
diverso e lazer s famlias para que estas pudessem viver mais prximas, facilitando assim a
socializao entre as mesmas, proporcionando a formao de uma Agrovila, denominada Vila pelos
assentados e demais pessoas do municpio - a Vila 25 de Maio denominao que ser mantida
nesse trabalho.
Nem todas as famlias aceitaram a proposta de morarem na rea comunitria (Vila), ficando
ento decidido que cada famlia poderia ir morar em seus lotes e que elas teriam tambm direito a
construir uma casa na Vila mais tarde. As famlias que ficaram com seus lotes prximos Vila,
cerca de 15 no total, construram suas casas ali mesmo, na vila. Com o passar do tempo a
comunidade foi ganhando estrutura, sendo construda a igreja catlica, o centro de esportes, a escola
e algumas casas de filhos de assentados que se casaram e foram ali morar.
Depois de cerca de 4 a 5 anos, foi se perdendo o controle da entrada de pessoas que iam morar
na Vila, pois estes acabavam vindo por intermdio de algum morador da vila, assentado que mora
na vila, filho de assentados, ou at mesmo alguns assentados que moram nos lotes. Os novos
moradores dirigiam-se ao local, escolhiam ou compravam um lote na Vila3 e tornavam-se assim
proprietrios do lote onde construam suas casas, tambm alguns professores que vieram dar aulas
nas escolas ali localizadas foram construindo suas casas e passaram a ser moradores da Vila 25 de
Maio. Os assentados relatam que no incio fizeram reunies para debater esse assunto, mas muitas
vezes as famlias que vinham morar na Vila tinham vnculo prximo com algum dos assentados e
outras vezes o morador da Vila no ouvia a deciso do assentamento de que deviam se retirar da
Vila. Lideranas do assentamentchegaram at a receber ameaas de morte na poca, sendo que estes
no tinham, e no tm em termos legais, como retirar esses moradores da rea. Solicitaram ento a
2 Na regio cultural as famlias enterrarem seus mortos na comunidade onde residem, ou prximo a ela. Desta forma, encontramos cemitrios em praticamente todas as comunidades do interior.3 Muitas vezes a famlia que obtinha a posse do pequeno lote na rea comunitria acabavam indo embora do assentamento, vendendo a parte que lhe pertencia.
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interveno do INCRA (Instituto Nacional de Colonizao e Reforma Agrria), que acabou por
deixar que o assentamento, junto com o MST, decidisse a situao, eximindo-se da responsabilidade
sobre a Vila. Dessa forma, diante de todas essas dificuldades, acabou-se por deixar a situao como
estava.
Hoje a Vila possui 45 casas, com 42 familias, sendo tres casa, uma ocupada pelos professores,
outra onde esta atualmente funcionando o PETI (Programa de Erradicao do Trabalho Infantil, e a
outra que pertence a um morador da vila mesmo e que atualmente esta vazia. Na Vila tem e uma
mdia de 200 pessoas que moram no espao destinado Vila e arredores (lotes que fazem divisa
com a rea). Isso provavelmente ocorreu - e ainda ocorre - devido a ausncia de uma entidade
regulatria, no caso o INCRA, e da no criao no assentamento de uma associao gestora da rea
da Vila. Tudo isso, ao longo dos anos, acabou acarretando uma srie de problemas como brigas
entre famlias por lotes na Vila; problemas com a entrada de drogas no assentamento fruto do
desconhecimento sobre a origem e o interesse das pessoas que moram e frequentam a Vila; vendas
de lotes ocasionados por brigas entre moradores da Vila e assentados.
Todos esses problemas, provavelmente, tambm foram ocasionados pela prpria inexperincia
dos assentados que no conseguiam administrar o espao destinado rea comunitria, uma vez que
no era para ser uma agrovila e tampouco uma Vila, porm era para ser uma rea comunitria, como
j citado acima. Ressalte-se tambm o fato de que o modelo de agrovila institudo pelo INCRA na
poca, final da dcada de 1970, ainda era um modelo novo, sem experincias antecedentesque,de
fato, trouxessem um mtodo de gesto das agrovilas dentro das reas de assentamentos rurais.
Nesse sentido, a Vila, como foi concebida no assentamento 25 de Maio, no fazia parte da cultura
daquelas famlias, sendo essa mais uma dificuldade apresentada para ger-la.
Ao longo dos anos novas ocupaes foram ocorrendo nas fazendas aos arredores do
assentamento 25 de Maio, aumentando o nmero de assentamentos na regio. Tal fato originou o
aumento do nmero de pessoas freqentando a escola de ensino fundamental localizada na Vila e,
conseqentemente, o fluxo de pessoas na Vila, o que estimulou tambm o comrcio. Diante do
aumento da movimentao no assentamento, primeiramente um assentado fez um abaixo assinado
tendo a permisso dos demais para abrir um pequeno mercadinho na vila, existente at hoje. Depois,
outro assentado fez o mesmo processo e abriu uma ferraria que funcionou por cerca de 10 anos.
De acordo com Valdomiro Baumgratz4, no inicio do assentamento foi fundada a Cooperativa
dos Assentados do Assentamento 25 de Maio, a COOPERJUS (Cooperativa de Comercializao
Justino Drachevisk), que tambm abriu um mercado na vila. A cooperativa durou cerca de 5 anos e,
4 Ex liderana do MST na regio, participante da ocupao de 25 de Maio de 1985 e assentado no Assentamento 25 de Maio.
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com o trmino da mesma, o mercado tambm cessou atividades. Desde 2007 a COOPEROESTE
(Cooperativa do Extremo Oeste Catarinense), com sede no municpio de So Miguel do Oeste-SC,
abriu sua filial numero seis na Vila 25 de Maio, onde estabeleceu um mercado e tambm passou a
realizar compra de leite dos assentados. Tambm alguns bares abriram, por cerca de um ou dois
anos, fechando em seguida, tendo hoje hoje trs bares com o da comunidade .
Hoje existe na Vila (figura 03) um mercado de um assentado como citado anteriormente, o
mercado da COOPEROESTE, uma loja de venda de roupas de uma assentada, uma entregadora de
gs e bebidas e trs bodegas (bares), sendo uma delas da comunidade e aberta somente nos finais de
semana. A bodega um espao tradicional dos camponeses, onde se encontram para conversar,
beber, jogar baralho e bocha, sendo geralmente frequentada pelos homens.
Figura 03: Vista parcial da Vila 25 de Maio
Fonte: http://maps.google.com.br
A bodega da comunidade gerida pelos prprios assentados, com a venda de bebidas
alcolicas, refrigerantes, cigarros e alguns doces. A comunidade se organiza para gerir o espao. A
cada dois meses um assentado fica responsvel por administr-la, ficando responsvel pelas
questes financeiras. Ao final dos dois meses, ou seja, quando passa para outra pessoa assumir o
comando, feita uma pequena prestao de contas para a Diretoria do assentamento.
Para facilitar o acesso de todos os assentados bodega feita uma espcie de credirio, o
chamado pagamento na safra, atravs do qual o assentado pode comprar para pagar somente com o
dinheiro da safra Isso possibilita um melhor acesso dos assentados na bodega e se estabelece uma
relao de confiana entre os mesmos.
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1.2 O Assentamento Jos Maria
De acordo com Valdemar Paz5, por volta das 3:00hs da madrugada do dia 23 de dezembro do
ano de 1996 cerca de 300 famlias j oriundas de outro acampamento situado no municpio de
Passos Maia, vizinho a Abelardo Luz, cortaram a cerca de um outro latifndio, cujo dono era o
capito Amilton. Essas terras tambm esto localizadas no municpio de Abelardo Luz-SC, a
aproximadamente 30 Km da cidade. Quando o dia amanheceu j se percebia uma nova comunidade
de lona sendo formada. O acampamento j nasceu com o nome do monge Jos Maria, figura mstica
da Guerra do Contestado, considerado um protetor das pessoas naquela regio.
Tendo em vista que o acampamento foi construdo prximo sede da fazenda, uma das
exigncias do fazendeiro nas negociaes foi a sada dos acampados da frente da sede. Atendendo
solicitao eles foram para uma rea prxima que pertencia mesma fazenda, mas que estava
arrendada para um arrendatrio que plantava soja. O arrendatrio aproveitou-se da ocasio e exigiu
que os acampados trabalhassem na limpeza da lavoura em troca do local para ficarem acampados.
No acampamento as coisas iam funcionando conforme as condies permitiam. Mesmo com
dificuldades o acampamento garantiu a escola para os educandos de 1 a 4 srie, oferecida dentro
do acampamento, enquanto os demais educandos das outras sries se deslocavam para a cidade.
Como os alunos acampados sofriam discriminao por parte de professores e demais colegas de
classe que residiam na cidade, as pessoas acampadas discutiram e optaram por mandar os alunos
para a escola do Assentamento 25 de Maio, distante 16Km do ento acampamento Jos Maria.
De acordo com relato de lideranas do MST no estado, as negociaes da rea foram
tranqilas, sem enfrentamentos diretos com o fazendeiro ou com a fora militar. O fazendeiro
porm custou a entregar a rea, pois tentou tirar o mximo de pinheiros e madeiras boas possveis.
Conta o senhor Valdemar Paz que aqui durante a fase de acampamento trabalhava dia e noite
cerca de 50 motosserras, tiravam tudo o que podiam (Informao verbal obtida em entrevista
concedida autora em 16/04/11)
Chegou ento o dia 12 de outubro de 1996, dia to aguardado pelos acampados, quando
finalmente houve a desapropriao de 5.000ha de terras e o assentamento de 272 famlias, cabendo
a cada famlia 13ha de terra. As famlias comearam a se organizar em comunidades e a organizar a
rea comunitria, sendo a primeira escola do assentamento instalada no antigo casaro da fazenda,
onde era oferecido o ensino de 1 a 8 srie. Foi deixada uma rea de 40ha de reserva ambiental do
assentamento, mais 17ha que correspondem rea de um grande aude (lago) pertencente ao
assentamento. Tambm foi deixada uma rea de 16ha destinada rea comunitria, onde seria
5 Ex liderana do MST na regio, participante da ocupao de 03 de dezembro de 1996 e assentado no Assentamento Jos Maria.
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construda futuramente a escola, o posto de sade, etc.
Atualmente, na rea comunitria do assentamento esto instaladas uma escola de ensino
fundamental e a escola de ensino mdio, as casas dos professores que precisam permanecer durante
a semana no assentamento, o posto de sade, o moinho de milho - que pertence a um pequeno grupo
de trs famlias assentadas -, um selecionador de sementes e uma mquina de extrao de leo
vegetal, pertencente COOPEAL (Cooperativa de Comercializao, Produo e Industrializao
Edson Ado Linz).
Em 2002 foram doados 8ha de terra da rea comunitria pelo assentamento para a construo
de um CPFP (Centro Popular de Formao e Produo), coordenado pelo MST, onde se
desenvolvem tcnicas de produo agroecolgica visando sempre o auto sustento do espao e das
pessoas que contribuem, para a manuteno deste espao. Nesse local est localizado o casaro
antigo da fazenda (Figura 4) que hoje abriga os moradores do CPFP, sendo eles os tcnicos e
estudantes do curso tcnico da Escola de Ensino Mdio Paulo Freire. Atualmente quatro pessoas -
moram no local.
Figura 4: Educandos e educadores da turma de EJA-Mdio Florestan Fernandes, em frente o antigo casaro.
Fonte: Arquivo do Centro de Formao (2010)
No casaro tambm so desenvolvidas atividades de formao feitas pelo MST. Hoje o espao
tambm serve como uma rea de experimentos para o Curso Tcnico Integrado de Agropecuria
com nfase em Agroecologia, oferecido na escola. O CPFP conta com uma boa estrutura, um
espao de estudo com salas, auditrio, cozinha e rea coberta. Est em processo de construo um
alojamento para abrigar 150 pessoas. Alm dessas estruturas, tem-se na rea do centro de formao
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uma estrebaria6, um chiqueiro, e um alojamento para professores.
O assentamento obteve grandes conquistas ao longo dos seus poucos anos, tais como:
transporte pblico, ginsio de esportes, escola de ensino fundamental com estrutura adequada para
ministrar as aulas, educadores, serventes e materiais didticos. O assentamento contava tambm
com a extenso do 2 grau da Escola Anacleto Damiani, de Abelardo Luz, onde as aulas do ensino
mdio eram ministradas, embora em espaos inadequados.
Em 2005, atravs de muita luta, a escola de 2 grau deixou de ser extenso e passou a ser uma
escola estadual, denominada Escola de Ensino Mdio Paulo Freire, que oferece o ensino mdio
completo aos jovens do Assentamento Jose Maria e demais cinco assentamentos situados nos
arredores. Em 2009 outra grande conquista: a escola de ensino mdio passou a oferecer o ensino
mdio integrado com nfase em agroecologia, dando origem ao Curso Tcnico Integrado em
Agropecuria com nfase em Agroecologia, que hoje conta com 40 jovens educandos dos
assentamentos localizados nos arredores do assentamento Jos Maria. A figura 5 mostra os
educandos durante as atividades prticas do curso.
Figura 5: Educandos do curso tcnico no tempo trabalho no CPFP.
Fonte: Arquivo Escola de Ensino Mdio Paulo Freire (2011)
O assentamento organizou-se em seis comunidades: Comunidade Sagrada Famlia; Santa
Luzia; Flor da Serra; Serra Alta; Dom Jos Gomes e Comunidade Planalto Alegre. O nmero de
famlias por comunidade varia de acordo com a localizao em relao a estrada geral que d acesso
ao municpio de Abelardo Luz e tambm ao municpio de Palmas-PR. Outro fator tambm da
diviso das comunidades foi a questo do relevo e nascentes de gua, sendo que os assentados
buscaram distribuir o acesso gua da forma o mais igualitria possvel para todos os assentados.
6 Lugar onde se ordenha as vacas, tambm conhecido como cural.
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Uma das prioridades do assentamento hoje a cooperao. Sendo que as cooperativas do
MST (COOPEAL e COOPEROESTE), atuam junto aos assentamentos na perspectiva de
melhoramento da produo, juntamente com a equipe tcnica da COOPTRASC.
Hoje existem nos assentamentos de Abelardo Luz duas cooperativas: a COOPEROESTE7 e a
COOPEAL8 em parceria com a COOPTRASC esta ltima responsvel pela assistncia tcnica e
acompanhamento da produo nos assentamentos.
A COOPEROESTE e COOPEAL so fruto da organizao social do MST. Estas englobam
todos os assentados da regio que desejam fazer parte da cooperativa. As duas cooperativas
interligam praticamente todos os assentados da regio do grande oeste catarinense, que compreende
o oeste e o extremo oeste de SC.
Em 2006 foram cedidos 2ha da rea comunitria para a COOPEROESTE para a instalao de
um tanque resfriador de leite, uma vez que o leite a principal produo dos assentamentos do
municpio. Dessa forma o leite produzido nos assentamentos coletado e centralizado no
assentamento Jos Maria para que possa ser armazenado e resfriado, sendo que todos os dias no
perodo da tarde o leite transportado em caminho com tanque refrigerado para o municpio de
So Miguel do Oeste. Nesse mesmo local esto tambm trs casas destinadas a motoristas, tcnicos
e s pessoas que trabalham no resfriador.
1.3- A Comunidade Canhado
A comunidade Canhado a comunidade mais antiga do municpio de Abelardo Luz, com 80
anos, mais velha at mesmo que o prprio municpio. Sua origem se deu com a vinda de
camponeses oriundos dos municpios de Getulio Vargas-RS e de Ararangua-SC, sendo que a
primeira famlia a chegar no local veio atravs de conhecidos que moravam prximos ao lugar e que
diziam que ali era uma terra sem dono. Na verdade parte daquelas terras pertenciam a um
proprietrio que havia ganhado de herana, porm tinha um caseiro que tomava conta das terras.
Segundo moradores da comunidade, a outra parte das terras pertenciam aos indgenas Tupi-
Guaranis que viviam na regio. Aos poucos foram chegando mais famlias, algumas para trabalhar
na fazenda, sendo arrendatrios, outras entraram em terras que pertenciam aos indgenas, mas que
mais tarde foram tituladas, separando o que pertencia aos indgenas e o que pertencia comunidade.
Algumas famlias conseguiram ao longo do tempo acumular uma renda maior que as possibilitou
comprar pequenos pedaos de terra do antigo dono.
As famlias foram desbravando as terras para o plantio. Da madeira retirada, parte era vendida
7 Ser tratada no item 1.48 Idem.
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em serrarias da regio e parte era utilizada para o auto consumo e tambm para fazer carvo. Com o
tempo comearam a chegar mais famlias,e a comunidade j era chamada de Canhado por causa do
relevo muito acidentado. No seu perodo ureo Canhado chegou a ter cerca de 180 famlias.
Segundo contam os moradores, as coisas por ali eram muito difceis, no existiam estradas,
escola, o transporte era basicamente feito atravs de carroa e cavalo. Mais tarde, no final da dcada
de 1940, abriu-se a primeira estrada que d acesso estrada geral que ia at Xanxer-SC. Em
meados de 1947 chegou comunidade a to esperada escola, que atendia educandos de 1 4
srie.
Os moradores relatam que naquela poca as salas de aula eram cheias e as pessoas da
comunidade que tinham mais estudo se tornavam os educadores dos demais. Assim foi-se
construindo uma grande e forte comunidade que, at 1958, era pertencente ao municpio de
Xanxere. Em julho de 1958, Abelardo Luz, at ento distrito de Xanxer, conquistou sua
emancipao poltica e a comunidade Canhado passou a pertencer a este novo municpio. Hoje a
comunidade faz divisa com a rea decretada reserva indgena, e tem cerca de 1200 alqueires de
terra.
A comunidade teve acesso rede de energia eltrica h cerca de 30 anos atrs, o que deu mais
nimo aos moradores. Porm, no incio da chegada da energia eltrica, somente teve acesso quem
conseguia pagar pela instalao. Cada um foi se virando como pode, sendo que nem todos tiveram
acesso energia eltrica no mesmo perodo.
Segundo o relato dos moradores, com passar dos tempos, j na dcada de 1970, a comunidade
comeou a diminuir, pois muitas pessoas comearam a ir embora, principalmente os filhos dos
camponeses que comearam a migrar para as cidades em busca de melhores condies de vida. Por
outro lado, aqueles camponeses que tinham mais posses comearam a comprar terras dos que no
tinham, as quais eram vendidas a baixo preo.
J com o nmero de pessoas muito reduzido e com o processo de nucleao9, em meados dos
anos 1990 a comunidade Canhado perdeu a escola. Assim, as crianas e adolescentes passaram a
estudar em uma comunidade vizinha, chamada de Alegre do Marco, que oferece somente as sries
que compe o atual ensino fundamental, tendo o municpio garantido o transporte escolar para que
os alunos ali se deslocassem para prosseguir seus estudos. Os jovens que desejam estudar mais
contam somente com o apoio da famlia e, na maioria das vezes, so obrigados a sair de casa e ir
trabalhar na cidade para poder dar continuidade aos estudos.
Hoje a comunidade conta com 72 famlias, uma estrutura comunitria como salo
9 Processo de fechamento das pequenas escolas rurais, transferindo os alunos para escolas plos, em comunidades maiores ou para a cidade, oferecendo-lhes o transporte escolar.
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comunitrio de festas e reunies (Figura 6), campo de futebol, um pequeno bar de propriedade
particular e a igreja catlica (Figura 7), sendo referncia no municpio por ser a comunidade mais
antiga. Segundo o presidente da comunidade, a ltima festa realizada pela comunidade contou com
a participao de aproximadamente mil pessoas, o que prova seu conhecimento nas redondezas.
Figura 6: Salo comunitrio da Comunidade Canhado
Fonte: Greti Aparecida Pavani
Figura 7: Igreja Catlica da Comunidade Canhado
Fonte: Greti Aparecida Pavani
A comunidade no conta com posto de sade, transporte coletivo para passageiros e comrcio.
A base da economia a produo de leite, fumo e avirios, mas este ltimo, devido ao seu auto
custo de construo, fica mais restrito s famlias com maior poder aquisitivo. Cultivam tambm
milho, feijo e soja, porm em pouca produo. Praticamente todas as famlias da comunidade tm
automveis.
A comunidade conta com um grupo de idosos e um grupo de mes organizados atravs do
municpio, e tambm com um grupo de jovens (com cerca de 12 participantes dos cerca de 50 que
residem na comunidade), organizado pela igreja. Contudo, nenhum grupo possui carter poltico.
Esses grupos so organizaes internas comuns a todas as comunidades, com o propsito de
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organizar as festas, os espaos comunitrios como salo de festas, campo de futebol, etc. Estes
grupos organizam encontros religiosos e tambm participam de excurses e atividades festivas no
municpio ou em municpios vizinhos. O clube de mes, atravs da prefeitura municipal, viabiliza
cursos de culinria e artesanato, ou outros de interesse, para as mes da comunidade.
1.4- Incentivo produo atravs das cooperativas
As duas cooperativas do MST (COOPEAL e COOPEROESTE) atuam nas reas de
assentamento de Abelardo Luz com grande respaldo e representatividade na regio. Uma delas a
COOPEAL, com sede na cidade do prprio municpio e criada por um grupo de assentados junto
com a direo estadual do MST, tendo iniciado suas atividades no ano de 2004. A outra a
COOPEROESTE, com sede em So Miguel do Oeste-SC, fundada em 1996, abrangendo toda a
regio do grande oeste catarinense, fruto da necessidade dos assentados de comercializar a produo
de leite, produto responsvel por grande parte da renda da maioria das famlias camponesas do sul
do pas.
De acordo com a direo da COOPEAL, a mesma responsvel pela organizao, produo,
industrializao e comercializao dos produtos cultivados nas reas de assentamentos de Abelardo
Luz e regio. Atua em duas linhas de produo, a agroindstria de doces e conservas e o
processamento industrial de peixes de gua doce. Ela foi criada a partir da necessidade de
organizao da produo dos assentamentos, a fim de proporcionar s famlias a oportunidade de
investir em outro ramo da produo, uma alternativa para evitar que elas ficassem merc do
monocultivo de soja, milho e fumo que, por muitas vezes, acaba endividando as famlias e no lhes
dando retorno financeiro para que pudessem garantir sua reproduo na terra. A cooperativa tem o
propsito de interao entre o desenvolvimento econmico, social e ambiental.
A unidade frigorfica pertencente cooperativa (Figura 8) responsvel pelo processamento
industrial de peixe (tilpia e carpas), produzindo hambrguer de peixe, fil de tilpia, empanado de
peixe e espetinho a base de peixe. O frigorfico situa-se no municpio de Abelardo Luz. Por
questes de localizao e do prprio funcionamento da cooperativa, na unidade frigorfica tambm
feita comercializao dos produtos, tanto para outras redes de comrcio, quanto no atacado e
varejo.
Atualmente trabalham no local cerca de 25 pessoas permanentes, com uma variao de mais
10 pessoas em pocas de maior produo. De acordo com o presidente do conselho fiscal da
cooperativa, mais de 50% dos funcionrios na unidade frigorfica no possuem ligao com os
assentamentos, pois o frigorfico est localizado na sede do municpio e os assentados tm
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dificuldade de deslocamento do assentamento at a cidade, j que a cooperativa no possui ainda
condies de oferecer transporte ao funcionrios . Os trabalhadores esto divididos nos setores de
produo, administrao e assistncia tcnica. A produo mdia varia de 1000 a 1500 kg/dia,
porm a unidade possui capacidade para operacionalizar 15ton/dia.
Figura 8: Vista parcial do frigorfico de peixes da COOPEAL
Fonte: Coopeal (2009).
A cooperativa conta ainda com uma agroindstria de conservas, localizada no Assentamento
Santa Rosa I, em Abelardo Luz. A agroindstria atualmente est com as atividades interrompidas,
pois est em reforma com o intuito de ampliar a tecnologia para melhorar o processamento dos
vidros de doces e conservas. A agroindstria conta com trs trabalhadores permanentes, dos quais
um tcnico ligado COOPTRASC que atende as famlias produtoras, sejam estas do prprio
municpio ou dos municpios vizinhos. Os outros dois funcionrios da cooperativa so um
assentado que coordena o trabalho, a compra e a venda de produtos, e um gestor da agroindstria,
ligado ao grupo gestor da cooperativa. Em relao produo, a agroindstria responsvel pela
industrializao de conservas de pepino, cebola, couve-flor, brcolis e milho, sendo a conserva de
pepino predominante. Segundo o coordenador de trabalho e venda da unidade, com menor
freqncia tambm so industrializados doces de abbora, morango e pssego, este ltimo feito
tambm em compota.
Quando a agroindstria de conservas est em funcionamento ela paga por dia, pessoas dos
prprios assentamentos, na sua maioria mulheres, que fazem todo o processo de industrializao. O
nmero de trabalhadores varia de 6 a 12 pessoas, dependendo da demanda de servio no dia, que
de acordo com a quantidade de produo recolhida.
Como foi citado acima, o Assentamento Jos Maria possui um processador de sementes com
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capacidade de armazenagem, batedouro de feijo e uma mquina de extrao de leo de sementes
oleaginosas, esta ltima atualmente parada. Esta estrutura tambm est ligada gesto da
COOPEAL, mas visa atender s necessidades dos assentados, sendo que essa unidade da
cooperativa atua tambm na compra e venda de sementes. Na sede do Assentamento Jos Maria h
um filho de assentado responsvel por um trator com Gobi10 que pertence COOPEAL. Ele presta
servios aos assentados da regio que no possuem esta mquina, em nome da cooperativa.
A Gesto poltica da cooperativa baseia-se de acordo com o organograma abaixo (Figura 9).
Essa gesto poltica nem sempre funciona como est posta no organograma, ocorrendo algumas
alteraes no processo organizativo de gesto que muitas vezes prejudicam o propsito inicial da
cooperativa, como citado acima, porm bastante relativo.
A cooperativa iniciou-se com poucos scios, cerca de 50 assentados, com a estratgia de com
o trabalho e o tempo ir ampliando o quadro social e se consolidando organicamente. Importante
destacar que o quadro de scios se ampliaria desde que as famlias desenvolvessem as atividades
agrcolas e agropecurias que viabilizassem a cooperativa. No entanto h algumas limitaes na
produo, principalmente de peixes, j que esta atualmente abrange um nmero de 122 scios,
sendo que das reas de assentamento de Abelardo Luz so apenas 60, todos eles com baixa
produo, tanto de matria-prima para o frigorfico quanto para a agroindstria. Os demais scios
so de outros assentamentos de municpios vizinhos, tendo tambm oito scios que so pequenos
produtores de comunidades rurais do prprio municpio e municpios vizinhos. Contudo, um
nmero bastante pequeno de scios assentados se comparado ao nmero de famlias assentadas no
municpio, que de 1500.
O nmero pequeno de scios e a baixa produo de peixes se refletem principalmente na
unidade frigorfica, comprometendo assim a rentabilidade da cooperativa pois a unidade frigorfica
a que mais retorno financeiro d mesma. Para suprir esta necessidade a cooperativa acaba por
comprar o restante da produo de outros produtores que no tm vnculo associativo com a
cooperativa e tampouco com as reas de Reforma Agrria. A ttulo de exemplo vale dizer que
somente 5% da produo de peixe oriunda dos assentamentos.
Diante da necessidade de aumentar a produo de matria-prima, a organizao poltica da
COOPEAL visa estruturar os ncleos de base11 nos assentamentos para discutir qual o papel dos
scios na cooperativa e politizar o quadro social. O objetivo dessa ao fazer com que os
assentados que ainda no so scios se tornem scios da cooperativa e os que j so scios
10 Pea adaptada ao trator para arar e mexer com a terra.11 Grupos de famlias formados nos assentamentos, acampamentos e cursos que tm finalidade organizativa e poltica de base no MST.
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continuem e se envolvam mais organicamente na gesto da cooperativa. Visa-se com isso fortalecer
a cooperao entre os mesmos, bem como garantir uma maior renda para as famlias.
Figura 09: Organograma da Cooperativa de Produo, Ind. Com. Edson Ado Lins
Fonte: TOMAZZI, SILVA e SCHNORR (2011).
Outra cooperativa ligada ao movimento a COOPEROESTE (Figura 10) que, como citado
acima, tem sede no municpio de So Miguel do Oeste. Possui representatividade nacional como
uma das cooperativas mais bem sucedidas das reas de Reforma Agrria, responsvel pela
dinamizao da marca Terra Viva, marca da Reforma Agrria que apresenta um dos mais
concretos resultados da capacidade de produo estabelecida nas reas de assentamentos.
Assemblia
Conselho Deliberativo NB
Conselho Fiscal
Direo Poltica
NB2
Peixe
NB3
NB 1
CoordenadorCoordenao Setores
Recria alevino
Produo
Frigorfico
Doces Conservas
Produo
Agroindstria
Cereais
ATES
Produo
Sementes
Beneficiamento
ATES
Ext. leo Vegetal
Parcerias
Planejamento
Comercial
Logstica
Marketing
ATES
Finanas
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Figura 10. Vista Parcial da Cooperoeste
Fonte: http://maps.google.com.br
Os resultados alcanados pela COOPEROESTE so prova de que, apesar de todos os
problemas ocasionados no campo brasileiro por causa do modelo agrcola imposto pelo sistema
capitalista baseado no agronegcio, os camponeses ainda conseguem dar sua resposta com uma
vasta produo de alimentos. Nessa perspectiva, a cooperao a melhor estratgia de
sobrevivncia do campons frente ao agronegcio. Dessa forma, concordamos com Fernandes
(1999, p. 219) que afirma que a
[...] cooperao tambm uma forma de organizao para a resistncia da luta camponesa. A cooperao em suas diferentes formas uma prtica histrica de diversos povos na organizao de seus modos de vida, como resistncia e viso prospectiva, objetivando transformar suas realidades.
A COOPEROESTE atua no ramo de laticnios, com produo, industrializao e
comercializao de leite e derivados. Atua tambm no setor de avicultura de corte, comercializando
com marca prpria frango abatido e congelado e ainda produz conservas de pepino e cebola. De
acordo com a direo estadual do MST, a COOPEROESTE hoje a maior cooperativa do oeste
catarinense e tambm a maior cooperativa dos assentamentos do Brasil.
No municpio de Abelardo Luz, porm, a COOPEROESTE enfrenta forte concorrncia de
outras empresas do ramo de laticnios que atuam na regio de forma muitas vezes desleal, pagando
centavos a mais no intuito de garantir mais produtores como fornecedores. No entanto, essas
empresas concorrentes no valorizam o produtor que entrega uma baixa quantidade de
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litros/leite/dia e tampouco os produtores que no so permanentes.
Com a necessidade de ampliar a produo de leite dos assentados e ainda garantir-lhes boas
condies de produo, a cooperativa conta com uma assistncia tcnica na unidade, composta por
um veterinrio e dois tcnicos que auxiliam o produtor. A assistncia tcnica atende a todos os
produtores de leite da COOPEROESTE nas reas de assentamentos de Abelardo Luz. Os assentados
pagam somente os medicamentos utilizados quando necessrio. Alm desse benefcio, para facilitar
o acesso do assentado aos produtos necessrios tanto para a prpria alimentao quanto de insumos
agrcolas para a lavoura e outros produtos, a cooperativa trabalha com um sistema de crdito, onde
os produtores de leite parcelam suas dvidas que vo sendo descontadas mensalmente do
rendimento da produo de leite.
Assim, estas duas cooperativas auxiliam no processo econmico e social dos assentamentos,
assunto que ser tratado no captulo 2. Assim como as demais cooperativas da Reforma Agrria
espalhadas pelo pas, elas tambm tm como principal objetivo a construo de um novo modelo de
cooperao que visa a incluso, baseando-se na cooperao efetiva e concreta dos camponeses, para
que estes, de forma organizada, possam produzir comida para o povo, de boa qualidade e com preo
acessvel, para que todos possam ter acesso e para que alimentos de qualidade no sejam apenas
privilgio de poucos na cidade.
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2. As relaes sociais e econmicas das realidades em questo
A discusso sobre o que campo e o que cidade est sempre presente quando se discutem as
novas caractersticas econmicas e sociais que permeiam o campo. No Brasil, segundo Marques,
(2002, p. 96) o
[...] projeto de desenvolvimento rural adotado ao longo de dcadas no pas tem como principal objetivo a expanso e consolidao do agronegcio, tendo alcanado resultados positivos sobretudo em relao ao aumento da produtividade e gerao de divisas para o pas via exportao. No entanto, esta opo tem implicado custos sociais e ambientais crescentes.
A autora continua considerando que:
[...] o avano dos movimentos sociais no campo e a intensificao das lutas, tem tornado cada vez mais evidente a necessidade de se elaborar uma estratgia de desenvolvimento para o campo que priorize as oportunidades de desenvolvimento social e no se restrinja a uma perspectiva estritamente econmica e setorial. (p.96)
Nesse contexto aparece nas entrevistas do trabalho de campo a preocupao dos jovens
com relao existncia de polticas que favoream a permanncia no campo, polticas essas que
viabilizem economicamente e socialmente a vivncia do campons no meio rural, proporcionando
aos mesmos acessos aos bens de servios pblicos que geralmente so ofertados no meio urbano,
bem como acesso a crditos que viabilizem a produo e garantam a renda familiar.
Primeiramente considero de extrema importncia nos atermos mais Vila 25 de Maio, onde
se misturam, de forma mais ntidas, atividades que, ao longo da histria, foram separadas em
urbanas e rurais. possvel observar ao longo do tempo a transformao que se teve dentro da
Vila, em seu aspecto fsico, com a construo de mais casas prximas umas s outras, a presena de
bares, lojas, mercado, rdio, escolas, internet e telefone pblico (orelho). Essas transformaes
modificaram aos poucos o relacionamento entre as pessoas, tanto dos moradores da Vila quanto dos
assentados, num sentido de aproximao maior com o mundo urbano. A Vila tornou-se um local
centralizador de vrios outros assentamentos que foram se formando nos arredores do Assentamento
25 de Maio12.
Nesse contexto temos um local que de fato traz elementos rurais e urbanos e que tem uma
relao campo-cidade muito prxima, que pode ser verificada tanto atravs das relaes de trabalho,
do modo de vida dos moradores, quanto da infra-estrutura ali presente, como lojas de roupas,
12 Conforme trabalhado no captulo 1
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cabeleireiro, entrega de gs e bebidas etc., atividades estas normalmente consideradas do meio
urbano. Estas atividades se intercalam entre campo e cidade, rural e urbano. Tm aspectos que de
fato so caractersticos do meio urbano, no entanto, prevalecem caractersticas do mundo rural,
como o sentido de vizinhana, as atividades de produo nos espaos prximos s casas e tambm o
prprio trabalho no campo que se d de diferentes formas, como o trabalho por parceria, o
arrendamento, o trabalho por dia e o trabalho assalariado. Trata-se, como pode ser visto, de uma
relao complexa e, nesse sentido, concordamos com Sobarzo (2006, p. 55), para quem a
[...] superao da diviso entre cidade e campo no deve ser confundida com a viso um tanto apocalptica do desaparecimento do campo e das atividades agrcolas e da urbanizao (no sentido estrito) total do planeta. Essa superao est ligada s relaes de produo. Assim, ela no consiste num processo em que o campo se perde no seio da cidade, nem a cidade absorvendo o campo se perde nele.
Assim, com relao aos dois assentamentos e comunidade em estudo, a gerao de renda no
meio rural no mais aquela oriunda somente da agricultura e da pecuria: temos tambm, nos
assentamentos, a oferta de outros servios, como o caso das escolas e, conseqentemente, dos
professores e demais funcionrios; comerciantes, principalmente na Vila 25 de Maio; profissionais
de sade, como mdicos, dentistas, pediatras, psiclogos e enfermeiras auxiliares; motoristas, entre
outras profisses, presentes nos assentamentos de Reforma Agrria.
Nesse sentido, os camponeses assentados no precisam se deslocar para a cidade para
trabalhar em outras atividades que no sejam propriamente aquelas agrcolas. Isso se observa nos
dois assentamentos, muito embora no assentamento 25 de Maio esse ndice seja maior por causa das
caractersticas j mencionadas da Vila. Contudo, ainda assim h jovens que tm seus familiares no
assentamento e que trabalham na cidade. Esta realidade nos leva a crer que as atividades urbanas
presentes no assentamento no so suficientes para empregar todos aqueles que desejariam.
Conforme a observao acima, h muitas pessoas que moram no assentamento ou na
comunidade e trabalham na cidade, principalmente os jovens que durante a semana vo para a
cidade trabalhar e no fim de semana retornam para a casa dos pais. Outra realidade um pouco mais
recente a de empresas, principalmente do ramo de frigorficos, que buscam pessoas que moram no
interior para trabalhar, fornecendo transporte para que os mesmos continuem morando no campo,
porm trabalhando na cidade. Dessa maneira os camponeses aceitam o baixo salrio pago pela
empresa, j que seu gasto mensal menor em relao a um trabalhador empregado que mora na
cidade.
Dessa forma diversifica-se a fonte de renda das famlias camponesas, garantindo aos jovens
sua prpria autonomia econmica. Mesmo que na maioria dos casos o ganho com empregos na
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cidade seja muito pequeno, capaz apenas de garantir as necessidades de consumo individual, o
desejo de ganhar seu prprio dinheiro, comprar suas prprias roupas, poder sair, ir s festas sem
precisar pedir dinheiro aos pais acaba impelindo-os a optar por esse caminho. Para os jovens isso
acaba sendo uma satisfao individual.
A sada durante a semana dos jovens da casa dos pais, se de um lado interfere no trabalho
familiar, significando menos gente para trabalhar, de outro significa para os pais uma garantia de
renda para o filho e, muitas vezes, uma contribuio na renda familiar, j que nem sempre a
produo do lote garante uma renda mensal capaz de atender s necessidades de bens materiais dos
jovens camponeses j inseridos no mundo do consumo. importante lembrar tambm que muitas
famlias ainda contam com a aposentadoria de um ou mais membros da famlia. Percebe-se ento
que a composio da renda familiar, em grande parte dos casos, vai alm das atividades
consideradas rurais. Nessa perspectiva, segundo Alentejano (2003, p. 05), a
[] precariedade dos dados estatsticos na identificao do peso das rendas no agrcolas no meio rural sustentam que a maioria das ocupaes no agrcolas podem ser categorizadas como emprego refugio, ou seja, condio econmica que garanta a permanncia no campo, j que na maioria dos casos, a renda retirada somente da agricultura no consegue suprir todas as necessidades das famlias.
Contudo, no se trata de um campo que no possibilite mais viver dele/nele, tirar a renda da
agricultura e da pecuria, mas sim de um campo que, por falta de polticas adequadas, acabou no
gerando alternativas de renda para os jovens. ressaltando que estou falando do campo onde vivem
os camponeses, onde vivem pessoas que ali moram que nele constroem e reconstroem suas histrias
no campo. o caso, por exemplo da comunidade Canhado que, em virtude dos vrios fatores j
citados no primeiro capitulo, viu sua populao diminuir, e com ela alguns servios pblicos que
antes eram oferecidos na comunidade, como o caso da escola. Tal reduo de pessoas e servios
talvez se deu pela falta de uma organizao maior que contribusse para auxiliar os camponeses a
garantir os meios necessrios que os possibilitassem viver no campo.
De fato, quando se fala em condies para viver no campo, os moradores da comunidade logo
falam na questo da renda, da no valorizao do campons, da falta de crditos, enfim, dos
problemas que assolam a maioria dos camponeses; em um segundo momento eles apontam a falta
de servios como sade, educao, transporte, lazer etc. No caso dos assentamentos, os jovens
ressaltam que sentem a necessidade de veterinrios, professores, mdicos, dentistas, tcnicos
agrcolas, etc, dentro dos assentamentos e falam que se ns conseguisse estudar e se formar no
precisaria vir gente de fora para trabalhar aqui, ns mesmo poderia trabalhar e continuar
morando aqui, por que eu gosto de morar aqui (Mrcio Amarate 09/10/10). Outro relato que vem
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a fortalecer esta idia o de uma jovem que est cursando o 1 ano da faculdade de pedagogia: eu
queria poder terminar a faculdade e continuar aqui, quero ser professora, mas tive que sair estudar
para depois voltar a trabalhar aqui (Tatiane Maia 08/10/10 ).
Assim como estes, outros jovens entrevistados relatam que gostam de morar no assentamento,
poucos deles sentem vontade de morar na cidade, mas parece-lhes que no h alternativa: ao mesmo
tempo em que estes relatam que gostam de morar no campo, almejam um futuro melhor que parece
poder ser encontrado somente na cidade. No entanto, o que nos parece preocupante que a minoria
dos jovens fala em continuar o trabalho na roa, tirando da agricultura seu sustento e sua renda. At
mesmo os jovens que cursam no Assentamento Jos Maria o Curso Integrado Tcnico Agrcola e
Pecuria com nfase em Agroecologia vem a possibilidade de estudo com fins empregatcios, sem
ver a possibilidade de melhorar a produo da famlia no prprio lote. Nessa lgica, parece a
princpio que os jovens vem o campo como um local bom para se viver, para morar, e a cidade
como o local capaz de oferecer bons empregos, capaz de lhes garantir uma renda mensal fixa.
Diante desses relatos possvel dizer que atividades consideradas urbanas passam a fazer
parte do cotidiano do rural. Assim, morar no campo hoje, diante do caos enfrentado pelas grandes
cidades, considerado muito melhor, mas viver do campo parece no fazer parte das perspectivas
dos jovens camponeses.
2.1 Assentamentos e comunidade: Semelhanas e contradies
Temos em questo trs realidades distintas que se completam e ao mesmo tempo diferem
entre si. De um lado temos dois assentamentos, ambos frutos da luta do Movimento Sem Terra pela
reforma agrria, com histrias e trajetrias que diferem quanto ao contexto histrico no qual se
inserem: o Assentamento 25 de Maio surge j no final da ditadura militar no Brasil, enquanto o
assentamento Jos Maria surge em plena dcada de 1990, no fervor do modelo neoliberal e das lutas
realizadas pelo MST para realizao da reforma agrria. Ambos, no entanto, abrigam sujeitos
camponeses que trazem como perspectiva de vida o trabalho no campo, vendo neste a prpria
garantia de reproduo. Tambm a organizao interna dos assentamentos 25 de Maio e Jos Maria
diferem entre si: o primeiro conta com uma rea de agrovila, com comrcio, com mais opes de
lazer para os jovens, enquanto o outro no possui agrovila e tampouco comrcio, porm possui
atividades de lazer.
Apesar das diferenas, os assentamentos apresentam semelhanas como: a existncia de posto
de sade, de escolas com ensino da pr-escola ao ensino mdio e ensino do CEJA (Centro
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Educacional para Jovens e Adultos). O Assentamento 25 de Maio possui uma extenso da APAE e
tambm uma extenso da Celer Faculdades distncia, que oferece ensino distncia de pedagogia
e gesto ambiental. A organizao do MST nos assentamentos possibilitou maior avano nas
questes sociais e econmicas, atravs do qual foi possvel reivindicar projetos de assentamentos do
INCRA, o que lhes garantiu toda a infra-estrutura presente hoje nos assentamentos.
J na comunidade Canhado as famlias foram entrando para a rea de forma individual, sem
interferncia de movimento social ou at mesmo do sindicato, que chegou comunidade h 30
anos. Mesmo assim a comunidade foi se desenvolvendo e contando com o que compe a estrutura
bsica das comunidades: a igreja, o centro comunitrio, o campo de futebol e a escola do antigo
primrio. Porm, diversamente do que acontece nos assentamentos, onde as conquistas de escolas e
de outros servios que beneficiam a comunidade so frutos da luta, na comunidade Canhado, na
ausncia desta forma de organizao e de ao, foi necessrio esperar a ao dos rgos pblicos
para o fornecimento dos servios a que tinham direito, nem sempre nos tempos desejados. Assim,
sem perspectiva de futuro, muitas famlias foram embora, principalmente a partir do momento em
que a agricultura deixou de ser principalmente para o auto-consumo e passou a ser para o mercado,
ocasio em que passaram a sentir os efeitos das oscilaes de mercado.
Aproveitando-se da necessidade dos agricultores de produzir para o mercado, empresas como
a Souza Cruz passaram a atuar diretamente com os camponeses, oferecendo-lhes recursos, sob a
forma de adiantamentos, para que construssem galpes para secar o fumo e tambm adquirissem as
mudas para plantar. Para aqueles que aderem proposta da Souza Cruz, e se tornam integrados, a
dvida contrada com a empresa vai sendo descontada a cada safra, independente das condies
climticas que ora favorecem a agricultura ora no, ou seja, qualquer que seja o apurado com a
safra, a parcela referente ao adiantamento para a construo dos galpes deve ser saldada. Dessa
forma, muitos camponeses, no s na comunidade Canhado mas tambm nos assentamentos, ficam
endividados e merc dessas grandes empresas. Assim como coloca Martins (1983)
aparentemente, por esse caminho seria possvel explicar como o grande capital se articula com a
pequena produo familiar de tipo campons ou com a produo agrcola em geral.
Ainda nesse contexto, tanto na comunidade Canhado como nos assentamentos existem outras
realidades, onde camponeses sem condies tcnicas e tambm financeiras de competir no mercado
que cada vez mais exigente e mais excludente, deixam suas terras, meio de produo que
possuem, e vo para a cidade vender sua fora de trabalho, ou continuam na terra, mas agora como
trabalhadores assalariados, trabalhando em rgos pblicos no prprio local, como no caso dos dois
assentamentos, ou morando no campo, mas trabalhando de forma assalariada na cidade, realidade
encontrada nos trs locais de estudo.
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A anlise dessas trs realidades, distintas e complementares ao mesmo tempo, distintas porque
se tratam de temporalidades diferentes de sujeitos que, ao mesmo tempo em que so iguais,
camponeses, se diferem na questo de organizao social e tambm pelo fato de que enquanto nos
assentamentos os problemas alm de serem enfrentados pelos assentados tambm so enfrentados
por uma organizao maior que o MST, na comunidade Canhado estes, na maioria dos casos, so
enfrentados no seio da famlia. A esse respeito, o mais importante a destacar que duas realidades
contam com uma organizao maior, o MST, capaz de responder por vrias questes polticas,
sociais e econmicas num mbito maior e com maior influncia a nvel nacional. Por outro lado,
essas realidades so complementares porque se tratam de sujeitos camponeses, jovens do campo e,
principalmente, porque se trata do campo em suas diversas dimenses, sociais, culturais e
econmicas.
Observamos tambm que os jovens de 15 a 25 anos tendem primeiramente a ter certa iluso
de ir para a cidade. Por outro lado, quando inseridos na comunidade, passam a se sentir parte da
mesma, passam a ver certo desenvolvimento social e econmico da comunidade. Eles pensam
somente em estudar e poder trabalhar no prprio assentamento, principalmente no assentamento 25
de Maio que possui uma maior necessidade de pessoas para trabalhar nas escolas, no comrcio, no
posto de sade etc. Percebe-se a necessidade de iniciativas que buscam, segundo STROPASOLAS
(2006, p. 26) a
[...] construo de uma identidade social - redefinida e ampliada de jovem, que integra valores urbanos sem deixar de ser rural e representa a possibilidade de filhos e filhas de agricultores familiares acessarem direitos de cidadania e bens culturais prprios da modernidade. Enfim, a possibilidade de moas e rapazes viverem com mais plenitude e qualidade de ser jovem.
Temos, assim, uma discusso bem maior, que vai alm do sujeito jovem, e perpassa pelos
conceitos de rural e de campo. Espaos estes que tanto nos trazem debates e discusses para as
quais no temos respostas, pois sofrem rpidas alteraes impostas pela necessidade de recriao do
capital (Oliveira 2001).
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3. O campo e a juventude camponesa
A argamassa fundamental de nossa obra a juventude, em
quem depositamos nossa esperana e quem preparamos para
tomar de nossas mos a bandeira.
Che Guevara
Ao falarmos de campo, estamos nos atendo mais s relaes sociais que se estabelecem nesse
espao, no qual vivem jovens (moas e rapazes) que parecem ser esquecidos, ainda que sejam eles,
os jovens, parafraseando Che, a argamassa da transformao social que visa a igualdade e justia
social, transformao essa que bandeira de luta dos movimentos sociais do campo, no caso
especfico, o MST.
Temos em nossos assentamentos, assim como a comunidade Canhado, jovens camponeses
que sonham e almejam uma vida melhor no campo, mas que ao mesmo tempo so bombardeados
diariamente pelos meios de comunicao fetichizando a vida na cidade, sobrepondo-a a vida no
campo. Atravs das entrevistas realizadas com os jovens nos assentamentos em estudo e na
comunidade Canhado, ficou ntido o conflito que eles vivem, divididos entre ficar ou sair do
campo, conflito esse que deve ser visto com ateno pelas polticas pblicas que envolvam os
jovens camponeses. Eles querem estudar e se divertir, no entanto nem sempre podem fazer isso no
local em que vivem, principalmente os jovens da comunidade Canhado, que nem sequer podem
estudar em sua prpria comunidade.
Atravs dos levantamentos feitos na pesquisa de campo, foi possvel observar, de forma ntida,
que o jovem do campo no v o cultivo da terra como trabalho. Para estes, o viver no campo est
atrelado a um trabalho assalariado, que lhe garanta renda mensal, sem depender do cultivo da terra.
Nesse caso, percebe-se nitidamente a desvalorizao do trabalho campons ao longo dos anos. Para
Oliveira (2001, p. 11),
[...] o capitalismo avanou em termos gerais por todo o territrio brasileiro, estabelecendo relaes de produo especificamente capitalistas, promovendo a expropriao total do trabalhador brasileiro no campo, colocando-o nu, ou seja, desprovido de todos os meios de produo; de outro, as relaes de produo no capitalistas, como o trabalho familiar praticado pelo pequeno lavrador campons, tambm avanaram mais. Essa contradio tem nos colocado frente a situaes em que h a fuso entre a pessoa do proprietrio da terra e do capitalista; e tambm frente a subordinao da produo camponesa, pelo capital, que sujeita e expropria a renda da terra. E, mais que isso, expropria praticamente todo excedente produzido, reduzindo o rendimento do campons ao mnimo necessrio sua reproduo fsica.
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Assim, o trabalho campons no mais visto como meio de produo, que produz vida, que
produz riqueza, que produz dignidade. Desta maneira, acreditamos que o estudo das relaes de
trabalho estabelecidas no campo merece ser aprofundado , pois o trabalho tema fundamental para
a juventude. Fica claro que esta demonstra grande interesse quando falamos em trabalho, porm da
forma como est posta a vida do jovem no campo, o que interessa de fato hoje para o jovem o
trabalho assalariado. Essa constatao vai de encontro com as consideraes de Guimares (2005,
p.159), para quem
[...] a hiptese de que a centralidade do trabalho para os jovens no advm dominantemente do seu significado tico (ainda que ele no deva ser de todo descartado), mas resulta de sua urgncia como problema; ou seja, o sentido do trabalho seria antes o de uma demanda a satisfazer que o de um valor a cultivar. Para argumentar melhor nessa direo, convm observar em maior detalhe que dimenses do trabalho colocam no centro da agenda de necessidades, interesses e urgncias, pessoais e sociais.
Nesse sentido, a discusso seria envolta da criao de mais empregos para os jovens.
Contudo, acreditamos que o verdadeiro tema para aprofundamento de estudo da juventude do
campo o das relaes de trabalho com a terra, que pode ser um precursor para compreender a
evaso do jovem campons para a cidade.
3.1-Os jovens e o MST nos assentamentos
A insero dos jovens dos assentamentos em questo, na organicidade do MST, ainda um
ponto de muito debate dentro das instncias organizativas do MST na regio. Contudo, este um
debate de grande relevncia e que de certo modo permeia o olhar sobre a juventude das diversas
regies nas quais o MST est organizado. Dessa forma, apontam-se questes levantadas por
Misnerovisk e Ferreira (2006, p. 5-6):
A forma de organizao geogrfica dos assentamentos, os lotes individuais que provocam o isolamento em conseqncia do parcelamento. A distncia da vila para os lotes, que o espao da produo agrcola. Por essa questo muitos jovens desistem da escola, para poderem garantir a produo junto famlia. Precisamos superar a lgica da ocupao do espao conquistado projetando-o em torno de aspectos culturais e sociais, isso significa repensar junto ao Plano de Desenvolvimento do Assentamento uma nova lgica de possibilitar infra-estrutura em cada rea. Isso implica em repensar o jeito de organizar os assentamentos, superando a diviso geogrfica.
A forma como est organizada a produo camponesa nos assentamentos, bem
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como a aquisio dos crditos e a implantao dos projetos no inserem os jovens no processo produtivo e organizativo, sendo assim no garante a independncia financeira do jovem.
No ncleo familiar campons ainda prevalece o sistema patriarcado, no qual os jovens so submissos s determinaes do pai, em todos os aspectos, principalmente no aspecto financeiro. Muitos jovens reclamam que trabalham, mas no obtm renda prpria, pois tudo vai para um caixa familiar administrado pelo pai. Muitas jovens (mulheres) so proibidas pelos pais de participarem de alguma atividade, principalmente se for preciso dormir fora de casa.
Falta de garantia de renda permanente, ou seja, pensar no trabalho agrcola que viabilize a vida econmica alm das safras anuais de produo e que seja administrado pelo prprio jovem. Nossas cooperativas e associaes no tm inserido a juventude no processo administrativo, no planejamento e no debate poltico e financeiro das entidades.
Dificuldade de deslocamento para participar das atividades de formao poltica, de lazer e convivncia social, bem como garantia de estrutura para lazer e entretenimento, especialmente para as jovens. As atividades recreativas e de lazer da juventude, em geral se resumem prtica de futebol, piqueniques, banhos dominicais em lagos, festas.
A falta de escolas que atendam o ensino fundamental e mdio, alm das dificuldades com transportes mal conservados e o desestmulo proporcionado pela ausncia de uma proposta poltica pedaggica que leve em considerao a realidade dos jovens, e que contribua para a sua formao crtica dentro de um contexto poltico histrico, pois temos como limite neste aspecto o fato de que a proposta pedaggica do MST no est presente em todas as escolas. Esses fatores levam sada dos jovens para estudarem na cidade, o que tem se constitudo em vrias situaes problemticas, pois as condies ideais tambm no so encontradas na cidade, e muitas vezes, os jovens vivenciam relaes conflituosas no espao escolar urbano.
A falta de infra-estruturas sociais coletivas que proporcionem espaos de cultura, lazer, esportes, teatro, msica, dana, cinema para os jovens vivenciarem momentos de maior ludicidade.
As coordenaes dos assentamentos/acampamentos, na sua maioria, no incentivam a participao da juventude, no acreditam no seu potencial criativo, no seu comprometimento e responsabilidades para com a organizao. Este comportamento reflete na organicidade do MST e est relacionado com a disputa de espao e poder. Dessa maneira, no h tarefas polticas definidas para a juventude na interior do Movimento.
Outra falta ainda o no acesso s tecnologias em nossas reas, como computador, Internet...
A insero intensiva e massiva da indstria cultural, com a divulgao de msicas e danas que estimulam nossa juventude a ter vergonha de suas expresses culturais regionais, afetando profundamente a auto-estima da juventude camponesa, que estimulada a adotar comportamentos urbanizados.
Todos os fatores acima levantados tm resultado diretamente na vida e no cotidiano da juventude camponesa, e em nossos acampamentos e assentamentos uma das facetas mais cruis deste processo a insero de nossos jovens no mundo das drogas e prostituio.
Esses limites apontados em relao participao e insero dos jovens nas diversas regies
onde h a atuao do MST condiz tambm com a realidade onde esto inseridos os assentamentos
estudados. Porm, como foi sendo relatado neste trabalho, muito embora muitos destes limites j
robinzonResaltado
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tenham sido superados, ainda h muitas linhas a serem percorridas e metas a serem alcanadas.
Misnerovicz e Ferreira (2006, p. 6-8), apontam alguns desafios em relao juventude nas reas de
atuao do MST, bem como diretrizes e medidas a serem tomadas pelo movimento, sendo elas:.
Na organicidade engajar a juventude nas atividades orgnicas nos acampamentos e assentamentos, ncleos de base, atividades culturais, nas mobilizaes, nos cursos de formao, na escola, nos setores do MST, nas coordenaes das brigadas, dos ncleos, das regionais, ou seja, em todas as instncias deliberativas do Movimento.
Inserir nas mobilizaes e pautas de negociaes em mbitos federal, estaduais e municipais, pois o que ocorre de pautar terra e crditos (sic), deixando de lado algumas iniciativas que esto acontecendo de maneiras pontuais, por isso importante garantir que nos assentamentos possam ter espaos/atividades para a juventude.
Organizar brigadas da juventude para fazer agitao e propaganda, organizando painis, pinturas em muros, paradas de nibus, panfletagem, grafitagem, embelezamentos dos diversos espaos sociais dentro do assentamento.
Organizar grupos de estudo com temticas voltadas para os interesses da juventude (afetividade, sexualidade, gerao de renda, cultura, mstica, insero da juventude na luta de classe).
Viabilizar e organizar brigadas de jovens que estudam na cidade para realizarem trabalho de formao poltica com a juventude urbana.
Realizar atividades formativas, para que a juventude domine o mtodo do trabalho de base e realizar o trabalho de base para as ocupaes, fortalecendo as atividades organizativas como: coordenar as reunies, assemblias, organizar a mstica, grupos de teatro, motivar o processo de participao de outros jovens nos bairros, contribuindo assim, com a massificao e radicalidade das aes.
Avanar no envolvimento da juventude dentro do processo produtivo, pensando a produo camponesa em toda sua dimenso produtiva como: marcenaria, artesanato, industrializao dos produtos agrcolas, confeces de roupas, serigrafias.
Apropriao do conhecimento, buscando a cincia para pensar o campo, indo alm das prticas rudimentares do trabalho na agricultura, construindo alternativas viveis que respeitem o meio ambiente e o ser humano.
Garantir para a juventude o acesso ao conhecimento, a democratizao do saber, garantindo a escolarizao. Possibilitar o ingresso da juventude nas escolas, [sendo que] para isso, devemos pensar em organizar nas grandes regionais escolas, a exemplo do Iterra, que escolarizem em forma de etapas e assim [ir] formando politicamente nossos jovens. Alm disso, poderamos pensar em uma universidade para atender as demandas de ensino superior que temos em nossa base, nos movimentos da Via Campesina e de outras organizaes sociais camponesas e urbanas. Esta questo pode nos remeter a discutir o papel do Estado para garantia de polticas pblicas e qual deve ser nossa relao com ele.
Seguindo a questo anterior, devemos implementar nas escolas existentes nos assentamentos a proposta pedaggica do Movimento, para que de fato atraia e forme politicamente a nossa juventude.
Criar nas escolas espaos de estudo e pesquisas voltadas para as tcnicas agrcolas, sistematizando o conhecimento das comunidades camponesas acumulados historicamente, a partir das experincias e experimentos.
Possibilitar a garantia de renda aos jovens, atravs do avano no processo de implementao de agroindstrias, mudana da matriz tecnolgica (implementao da agroecologia), assim como incentivar as potencialidades produtivas existentes, como artesanato, serigrafia, produo de doces, compotas, etc.
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Promover o redescobrir da cultura camponesa pela juventude, valorizando os elementos de construo da identidade camponesa. Torna-se necessrio trabalhar desde a infncia para que a juventude tenha pertena e identidade Sem Terra forjada na luta social do MST.
Envolver a juventude em atividades na construo e fortalecimento de formas alternativas dos meios de comunicao popular.
Organizar jornadas de lutas no ms de Outubro em homenagem ao Che, tendo como referncia o trabalho voluntrio e a vivncia de novos valores com a juventude.
Estas medidas citadas so linhas de atuao, pelas quais o MST da regio dos assentamentos
busca viabilizar a vivencia da juventude nas reas de Reforma Agrria. Dessa forma, ao procurar
compreender como os jovens esto inseridos nesse processo de lutas e conquistas que os
beneficiam, por vrios momentos, de acordo com algumas entrevistas, verificamos que tai