UNIVERSIDADE BANDEIRANTE DE SÃO PAULO (UNIBAN)
ILYDIO PEREIRA DE SÁ
A EDUCAÇÃO MATEMÁTICA CRÍTICA E A MATEMÁTICA FINANCEIRA NA
FORMAÇÃO DE PROFESSORES
São Paulo
2012
ILYDIO PEREIRA DE SÁ
A Educação Matemática Crítica e a Matemática Financeira na Formação de Professores
Tese apresentada ao Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Educação Matemática da Universidade Bandeirante de São Paulo, como requisito parcial à obtenção do título de Doutor em Educação Matemática.
Área de Concentração: Educação Matemática
Linha de Pesquisa: Formação de Professores que Ensinam Matemática
Orientador: Profº Drº Ubiratan D’Ambrosio
São Paulo
2012
S11e Sá, Ilydio Pereira de. A educação matemática crítica e a matemática financeira na formação
de professores / Ilydio Pereira de Sá. – São Paulo, 2012. 150 f., il.; 30 cm.
Orientador: Ubiratan D’Ambrosio. Tese (Doutorado em Educação Matemática) – Universidade
Bandeirante de São Paulo, São Paulo.
Bibliografia: f. 137-141.
1. Educação matemática crítica 2. Formação de professores 3. Matemática financeira. I. Sá, Ilydio. II. A educação matemática crítica e a matemática financeira na formação de professores.
CDD: 372.7
À minha querida mãe, Nilza, por sua sabedoria,
sinceridade e exemplo de sempre.
Ao meu pai, Lydio (in memorian), pelo exemplo
de paciência e honestidade.
À minha companheira, Ana Maria, pelo
incentivo, ajuda de sempre, exemplo e
compreensão.
A meus filhos, Vinícius, Lídia e Luciana, pela
amizade e incentivo.
Expresso o meu sincero agradecimento a todos os que,
direta ou indiretamente, contribuíram para a conclusão
deste trabalho, para mais este importante aprendizado
em minha vida.
Ao professor doutor orientador, amigo, exemplo e
referência maior de meu trabalho, Ubiratan
D’Ambrosio, por tudo o que me ensinou com as aulas,
com seus livros e, principalmente, com seu exemplo.
Às professoras Estela Kaufman Fainguelernt, Nielce
Lobo e Lilian Nasser, e ao professor Ruy César
Pietropaolo, pela boa vontade de integrarem a Banca
Examinadora e pelas críticas e benvindas sugestões.
À coordenação e professores do Programa Stricto Sensu
em Educação Matemática da UNIBAN, pelos
ensinamentos e pela excelência do trabalho que
desenvolvem.
Aos professores, alunos e ex-alunos das licenciaturas em
Matemática, que tiveram a gentileza de participar deste
estudo.
Ao meu filho Vinícius e à minha companheira Ana
Maria, pelas leituras críticas, revisões e boa vontade.
Aos colegas, doutorandos e mestrandos da UNIBAN, que
compartilharam saberes, dúvidas, sonhos, preocupações
e amizade.
À amiga Sueli, pela competente, cuidadosa e
fundamental revisão deste trabalho.
Talvez mais do que qualquer outra manifestação do conhecimento humano, a matemática seja universal. Assim sendo, permite uma análise crítica sobre seu papel na melhoria da qualidade de vida, com inúmeras interpretações sobre o que representa a ciência para o bem-estar do homem (D’AMBROSIO, 1986, p. 16).
RESUMO
Com o presente estudo, objetivou-se pesquisar a Matemática Financeira no contexto
dos cursos de Licenciatura em Matemática no Brasil. Assumindo-se a perspectiva de análise
crítica e reflexiva, questiona-se uma formação de professores com currículo formal, com
conteúdos e atividades distanciados da realidade, que pouco tem contribuído para gestar uma
nova identidade do profissional docente. Metodologicamente, o estudo teve uma abordagem
qualitativa de pesquisa que se aproxima das concepções da perspectiva histórico-dialética. Por
meio de um processo de triangulação, foram usadas distintas formas de coletas, visando à
verificação da convergência dos dados. Entrevistaram-se docentes e coordenadores de seis
instituições de ensino superior (públicas e privadas), que tiveram seus projetos político-
pedagógicos e matrizes curriculares dos cursos de Licenciatura em Matemática avaliados,
bem como se procedeu a uma análise criteriosa de documentos da legislação educacional
brasileira, relacionados à formação de professores de Matemática, e de livros didáticos para o
Ensino Médio. Como resultado, apresenta-se uma proposta de inserção da disciplina
Matemática Financeira, na perspectiva da Educação Matemática Crítica, nas matrizes
curriculares dos cursos de Licenciatura em Matemática.
Palavras-chave: Formação de Professores. Matemática Financeira. Educação Matemática Crítica. Cidadania.
ABSTRACT
This thesis investigates the Financial Mathematics tuition in undergraduate
Mathematics courses in Brazil. Under the perspective of critical and reflective analysis, we
look into teacher training courses with a formal curriculum, one whose contents and activities
seem unrealistic, contributing but poorly to the rise of a new professional identity among
Mathematics teachers. Based on a historical-dialectical perspective, our approach followed a
process of triangulation whereby different means of gathering data were used to verify their
overall convergence: we interviewed teachers and coordinators of six institutions (both public
and private) whose political-pedagogical projects and syllabuses on Mathematics courses
were evaluated, we thoroughly analyzed the Brazilian educational legislation towards
Mathematics teacher training and we scrutinized textbooks for secondary education. Along
with the drawn conclusions, we propose the teaching of Financial Mathematics – from the
perspective of Critical Mathematics Education – for undergraduate students of Mathematics in
Brazil.
Keywords: Teacher Training. Financial Mathematics. Critical Mathematics Education. Citizenship.
RÉSUMÉ
La présente étude vise étudier le contexte de l’enseignement de mathématiques
financières en tant que cours de premier cycle en mathématiques au Brésil. En adoptant une
perspective d’analyse critique et réfléchie, cette étude remet en cause la formation des
enseignants avec un programme formel, avec des contenus et des activités éloignés de la
réalité, qui n’a que peu contribué à la gestation d’une nouvelle identité professionnelle des
enseignants. Méthodologiquement, l’étude a une approche de recherche qualitative qui se
rapproche de la perspective historico-dialectique. Grâce à un processus de triangulation, nous
avons utilisé différents types de collectes de données afin de vérifier leur convergence. Nous
avons interviewé les enseignants et les coordinateurs des six établissements d’enseignement
supérieur (public et privé), qui ont eu leurs projets politico pédagogiques et la matrice
curriculaire de leur cours de licence de mathématiques évaluées. Une analyse approfondie des
documents de la législation éducationnelle brésilienne, liés à la formation des enseignants de
mathématiques, ainsi que de livres pédagogiques utilisés dans l’enseignement secondaire a
également été réalisée. En conséquence, nous proposons l’enseignement des mathématiques
financières dans la perspective de l’enseignement des mathématiques critiques pour les
étudiants de licence de mathématiques.
Mots-clés: Formation des Enseignants. Mathématiques Financières. Critique Mathematics Education. De la Citoyenneté.
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO 16
1.1 Trajetória Pessoal 16
1.2 A Pesquisa 19
2 EDUCAÇÃO CRÍTICA E ENSINO DE MATEMÁTICA 31
2.1 Educação Crítica 32
2.2 Matemática Financeira e Educação Matemática Crítica 37
2.2.1 Ambientes de aprendizagem e cenários de investigação 39
2.2.2 Breve histórico da matemática financeira 43
2.3 Formação de Professores de Matemática na Perspectiva da
Educação Matemática Crítica
49
2.3.1 Qual o papel do professor? 50
3 MATEMÁTICA FINANCEIRA NAS LICENCIATURAS EM 53
MATEMÁTICA
3.1 Matemática Financeira nas Licenciaturas: o Porquê de sua 53
Inclusão
3.2 Legislação Educacional Brasileira e Formação de Professores 56
3.2.1 Parecer CNE/CP 9/2001 56
3.2.2 Parecer CNE/CES 1302/2001 57
3.2.3 Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Fundamental 60
3.2.4 Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio 64
3.3 Produção na Área de Matemática Financeira/Educação 66
Matemática Crítica a Partir da Proposta Objeto Desta Pesquisa
3.4 Investigando as Licenciaturas em Matemática 67
3.4.1 Faculdade C 68
3.4.2 Centro Universitário N 70
3.4.3 Universidade U 72
3.4.4 Centro Universitário J 75
3.4.5 Universidade A 77
3.4.6 Universidade F 78
3.5 Considerações sobre a Pesquisa com as IESs 80
4 REFLEXOS DA AUSÊNCIA DA MATEMÁTICA 81
FINANCEIRA NAS LICENCIATURAS E NOS LIVROS
DIDÁTICOS
4.1 Atividades de Matemática Financeira em Livros Didáticos do 81
Ensino Médio
4.2 Juros e Progressão Geométrica: um Viés de Análise do 86
Conhecimento
5 UMA PROPOSTA DE ENSINO DE MATEMÁTICA 88
FINANCEIRA PARA AS LICENCIATURAS NO BRASIL
5.1 Principais Conceitos da Matemática Financeira 88
5.1.1 Fatores de correção 89
5.1.2 Valor do dinheiro no tempo 107
5.2 Juros Simples e Juros Compostos: Trabalhando com 124
Progressões, Funções e Logaritmos
5.2.1 Crescimento em progressão aritmética (juros simples) 124
5.2.2 Crescimento em progressão geométrica (juros compostos) 126
5.3 Sugestão de Ementa/Planejamento da Disciplina Matemática 129
Financeira para um Curso de Licenciatura em Matemática
6 CONCLUSÃO 132
REFERÊNCIAS 137
APÊNDICE A Produção Acadêmica na Área de Matemática Financeira/ 142
Educação Matemática Crítica a Partir da Proposta
Objeto da Pesquisa
APÊNDICE B Questões das Entrevistas Realizadas com os Coordenadores 146
das Licenciaturas em Matemática
APÊNDICE C Questões das Entrevistas Realizadas com os Professores 147
que Ministram Matemática Financeira nas Licenciaturas
em Matemática
ANEXO A Depoimentos 148
LISTA DE FIGURAS
Nº TÍTULO PÁGINA
1 Questão resolvida: progressão geométrica e juros compostos 83
2 Sumário de livro com conteúdos de matemática comercial e financeira 85
3 Questão resolvida: juros compostos 85
4 Inflação acumulada em alguns países no período 2009-2011 104
5 Interpolação linear 122
6 Gráfico da função afim: montante gerado a juros simples 125
7 Gráfico comparativo: juros simples x juros compostos 127
LISTA DE QUADROS
Nº TÍTULO PÁGINA
1 Modelos de práticas de sala de aula 40
2 Paradigmas de práticas da sala de aula 40
3 Algumas características das IESs avaliadas 67
4 Principais índices para o cálculo da inflação no Brasil 106
LISTA DE TABELAS
Nº TÍTULO PÁGINA
1 Montante gerado em um ano por um capital de $1000, sob uma taxa fixa 46
de 6% ao ano, submetido a distintos modos de capitalização
2 Montante gerado em um ano por um capital de $1, sob uma taxa fixa de
100% ao ano, submetido a distintos modos de capitalização
47
3 Tabela Price para as taxas 5%, 6% e 7%, até 24 prestações 118
4 Montante a juros simples, gerado por R$200,00, sob uma taxa fixa de 2% 125
ao mês, por seis meses
LISTA DE SIGLAS
CR
CNE
Coeficiente de Rendimento
Conselho Nacional de Educação
DCN Diretrizes Curriculares Nacionais
ENEF Estratégia Nacional de Educação Financeira
EMC Educação Matemática Crítica
FEBF Faculdade de Educação da Baixada Fluminense
FGV Fundação Getúlio Vargas
IES Instituição de Ensino Superior
IGP Índice Geral de Preços
IMPA Instituto de Matemática Pura e Aplicada
INCC Índice Nacional de Custos da Construção
INEP Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira
INPC Índice Nacional de Preços ao Consumidor
IPA Índice de Preços por Atacado
IPCA Índice de Preços ao Consumidor Amplo
IPC-FIPE Índice de Preços ao Consumidor-Fundação Instituto de
Pesquisas Econômicas
IPTU Imposto Predial Territorial e Urbano
LDBEN Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional
MEC Ministério da Educação
ONU Organização das Nações Unidas
PCN Parâmetros Curriculares Nacionais
PCNEF Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Fundamental
PCNEM Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino Médio
POF Pesquisa de Orçamentos Familiares
PPP Projeto Político-Pedagógico
PPPC Projeto Político-Pedagógico do Curso
SEESP Secretaria de Estado de Educação de São Paulo
SINAES Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior
SMECRJ Secretaria Municipal de Educação e Cultura da Cidade do Rio de Janeiro
UA Universidade de Aveiro (Portugal)
UEG Universidade do Estado da Guanabara
UERJ Universidade do Estado do Rio de Janeiro
UFF Universidade Federal Fluminense
UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro
UFRRJ Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro
UGF Universidade Gama Filho
ULBRA Universidade Luterana do Brasil
UNESP Universidade Estadual Paulista
UNIBAN Universidade Bandeirante de São Paulo
USS Universidade Severino Sombra
USU Universidade Santa Úrsula
1 INTRODUÇÃO
Iniciar este texto com reflexões sobre a minha trajetória pessoal foi a estratégia para
articular a história de vida de um professor de Matemática com o seu interesse pela
investigação sobre formação de professores de Matemática e, em particular, pelo ensino de
Matemática Financeira. Tal opção de escrita do texto demonstra que não se separa o “eu”
pessoal do “eu” profissional (NÓVOA, 1998).
1.1 Trajetória Pessoal
No ano de 1970, prestei vestibular para a então denominada Universidade do Estado
da Guanabara (UEG), atual Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Consegui
aprovação, conquistando o quinto lugar, dentre as 50 vagas oferecidas no concurso. A opção
única era o curso de Licenciatura em Matemática. Desde os 16 anos de idade, descobrira o
que era ser professor, ministrando aulas particulares para crianças e adolescentes que
cursavam o que hoje se denomina anos finais do Ensino Fundamental.
Nos dois primeiros anos da licenciatura – que era realizada em quatro anos –
estudávamos com os alunos do curso de Física. Só no terceiro ano do curso as turmas se
separavam e, infelizmente (o que não é diferente hoje), somente eu e mais oito colegas de
turma completamos a formação inicial, tornando-nos professores de Matemática (em 1974).
Posso afirmar, com muito orgulho, que me dediquei bastante ao curso, praticamente
sendo “aprovado direto” em todas as disciplinas dos quatro anos de curso. Como prêmio pelo
maior coeficiente de rendimento (CR) do curso, recebi o prêmio Haroldo Lisboa da Cunha.
Essa conquista me possibilitou contrato, na própria UERJ, para ministrar a disciplina Álgebra
em um curso de complementação para professores de Matemática. Na época, eu contava 22
anos de idade. Foi uma experiência muito boa, mesmo não tendo sido a primeira em sala de
aula, pois desde o segundo ano do curso trabalhava como “professor” de Matemática e de
Desenho Geométrico em vários cursinhos preparatórios para escolas técnicas e pré-
vestibulares. Tais atividades, entretanto, afastaram-me da vida acadêmica por muitos anos,
pois, por conta de um salário mais atrativo, declinei do contrato da UERJ, só retornando a
trabalhar no magistério superior em 1999, devido à aprovação em concurso público para a
UERJ, com lotação no Instituto de Aplicação Fernando Rodrigues da Silveira, conhecido
como “Colégio de Aplicação” da UERJ (CAp/UERJ).
17
Minha vida profissional sempre teve como foco maior de atuação a Escola Básica,
tendo trabalhado na rede estadual do Rio de Janeiro, no Colégio Naval e no tradicional
Colégio Pedro II, por onde me aposentei em 2007. Paralelamente às atividades na Escola
Básica, trabalhei em cursos preparatórios para vestibulares e concursos públicos, atuando com
Matemática e Estatística.
A questão é: quando a Matemática Financeira se insere em minha trajetória
profissional?
Na passagem dos anos de 1970 para 1980, comecei a trabalhar em alguns cursos
preparatórios para a área de concursos públicos e, devido às exigências dos programas e das
dúvidas trazidas pelos alunos, vi-me diante de algumas constatações. Uma delas era de que,
embora fosse considerado um bom professor, tivesse bons empregos e prestígio profissional,
em minha formação inicial não estudara Matemática Financeira, o que trazia complicações
para a vida pessoal (por não saber calcular a taxa de juros inserida no preço de uma
mercadoria anunciada por determinado estabelecimento comercial, via-me na dúvida sobre
qual seria a melhor opção de compra – aquela que me propiciaria pagar uma taxa menor de
juros) e profissional (sentia-me inseguro ao ministrar alguns conteúdos exigidos em concursos
públicos, pois não tivera formação adequada na área).
Na época, não eram comuns cursos de extensão ou mesmo de pós-graduação nessa
área e tive de estudar por conta própria ou frequentar cursos livres na Fundação Getúlio
Vargas (FGV), visando a complementar essa lacuna.
Em decorrência desse esforço e interesse por Matemática Financeira, recebi convite
para trabalhar com um professor da FGV, ministrando cursos dessa disciplina em empresas.
Dessa forma, fui aprendendo e me apaixonando por essa temática.
Entretanto, a preocupação com a Matemática Financeira acarretou-me dúvidas e
questões relacionadas à formação de professores, currículos e avaliação.
Ainda na década de 1970, frequentei alguns cursos livres, em nível de pós-graduação,
no Instituto de Matemática Pura e Aplicada (IMPA). Porém, mesmo tendo obtido boas notas,
verifiquei que não era aquele o meu caminho. Os meus interesses estavam voltados para uma
matemática mais atrelada ao social, ao cotidiano, à solução de problemas do dia a dia das
pessoas.
Somente em 1989, com o início do primeiro mestrado em Educação Matemática do
estado do Rio de Janeiro, na Universidade Santa Úrsula (USU), retornei aos bancos escolares.
Mesmo com alguns contratempos burocráticos referentes ao reconhecimento do curso,
conquistei o título de Mestre em Educação Matemática, tendo sido orientado pela professora
18
doutora Estela Kaufman Fainguelernt, coordenadora do curso, e, inicialmente, pela professora
Circe Navarro Vital Brasil. Infelizmente, a professora Circe veio a falecer antes da conclusão
do curso e, por sugestão e iniciativa da professora Estela, passei a ser orientado pelo professor
doutor Ubiratan D’Ambrosio, cuja firmeza e competência permitiram que eu concluísse com
êxito a dissertação.
A dissertação de mestrado já apontava, na época, para problemas de formação de
professores e para questões relacionadas à Matemática Financeira no Ensino Fundamental,
mesmo não sendo esse o meu foco principal de estudo. Na época da pesquisa, entrevistei
diversos professores da Educação Básica e do Ensino Superior, verificando que nenhum deles
havia cursado a disciplina de Matemática Financeira em suas licenciaturas.
Em uma das universidades onde exerço o magistério, ministro a disciplina Matemática
Financeira no último período do curso de Licenciatura em Matemática e como disciplina
optativa no Mestrado Profissional em Educação Matemática.
Ao longo de minha prática docente em três instituições de ensino superior, tenho
percebido um interesse cada vez maior para com os assuntos relacionados à Matemática
Financeira e à Educação Crítica. Tenho, inclusive, orientado alguns trabalhos monográficos
de conclusão de curso de graduação e dissertações de mestrado que abordam tais temáticas.
Em consequência dessa atuação profissional, publiquei três livros relacionados à
Matemática Financeira (SÁ, 2005, 2008a, 2011). Essa última publicação – “Matemática
financeira para educadores críticos” – tem como objetivo suprir uma lacuna na área de
formação de professores, pois os livros que abordam a Matemática Financeira e que são
usados nas licenciaturas são, geralmente, os mesmos adotados nos cursos de Economia,
Administração de Empresas, Contabilidade e áreas afins. Ou seja, o foco não é a formação de
professores para a Educação Básica, além de, normalmente, preocuparem-se apenas em
apresentar os conceitos de Matemática Financeira e suas aplicações no mercado financeiro.
Atualmente, muito se tem falado sobre Matemática Financeira, mais especificamente
sobre Educação Financeira. Será que a formação de professores modificou alguma coisa nesse
sentido? Será que já encontramos essa disciplina em uma parcela significativa dos cursos?
Como será que são focadas as questões sociais relacionadas ao tema? Será que essa disciplina,
na formação inicial, ajuda para uma formação profissional na linha da Educação Matemática
Crítica? Todas essas questões nortearam a presente pesquisa de doutorado, iniciada no
segundo semestre de 2008.
19
1.2 A Pesquisa
O tema de pesquisa da tese de doutoramento tem como objeto de estudo a Matemática
Financeira no contexto dos cursos de Licenciatura em Matemática no Brasil. Essa temática
articula-se à linha de pesquisa do Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu Doutorado em
Educação Matemática da Universidade Bandeirante de São Paulo (UNIBAN): Formação de
Professores que Ensinam Matemática.
Para delimitação do objeto de estudo, parti da experiência como professor de
Matemática na Educação Básica e na Educação Superior. Nesse nível da educação, exerci a
docência em curso de formação de professores, ministrando disciplinas identificadas com o
conteúdo da Matemática e as práticas de formação. É a partir da experiência, nos dois níveis
da educação, confrontada com a leitura teórica sobre formação de professores e ensino de
Matemática, que defini as questões de pesquisa, as hipóteses e os procedimentos
metodológicos que conduziram o processo de investigação durante o doutorado.
Em relação ao eixo de pesquisa identificado com Formação de Professores que
Ensinam Matemática, são estas as questões norteadoras da pesquisa:
• A disciplina Matemática Financeira consta das matrizes curriculares dos cursos de
Licenciatura em Matemática?
Por meio de investigação nas matrizes curriculares de cursos de Licenciatura em
Matemática de instituições de ensino superior (IES) públicas e particulares, de diversos
estados brasileiros, investigou-se se Matemática Financeira é uma das disciplinas dessas
matrizes.
• Como a disciplina Matemática Financeira é ministrada nos cursos de Licenciatura em
Matemática?
Nos cursos cuja resposta anterior foi positiva, foram investigados “os modos de
ensinar”: metodologias, conteúdos, processo de avaliação. Pretendia-se, dessa forma, refletir
sobre como professores de Matemática estão sendo formados para ensinar Matemática
Financeira. Estariam esses “modos de ensinar” adequados a cursos de graduação que
pretendem formar professores para atuar na Escola Básica? A disciplina está realmente focada
na questão da formação de professores? Objetivando identificar uma interface com a questão
das tecnologias, verificou-se se recursos como calculadora e computador estão inseridos no
cotidiano das aulas dessa disciplina, na formação de professores.
20
• Existe preocupação com a contextualização dos conteúdos de Matemática Financeira
nos cursos de Licenciatura em Matemática?
Essa questão é complementação da anterior. Visou-se a verificar se há preocupação
com um ensino de Matemática Financeira contextualizado, focado na Escola Básica, servindo
de fator de ligação e motivação para diversos assuntos da Matemática escolar.
O interesse pelo tema é consequência, principalmente, da atuação como professor da
Educação Básica (38 anos) e do Ensino Superior (14 anos), assim como de reflexões
decorrentes dessa prática, tais como:
• Os conhecimentos matemáticos são aplicados na interpretação de fenômenos, em
diferentes áreas da ciência, nas atividades tecnológicas e cotidianas. O cidadão
necessita da capacidade de leitura e interpretação de informações por meio de distintas
formas de linguagem matemática, de percepção da coerência ou não de uma
argumentação, bem como da competência para formular suas próprias ideias de forma
consistente, para uma inserção crítica e autônoma na sociedade contemporânea.
• O estudante/cidadão deve compreender os conceitos fundamentais da Matemática,
tratados na Educação Básica, de forma a saber aplicá-los em situações diversas,
relacionando-os entre si e com outras áreas do conhecimento humano. Nesse sentido, a
prática diária tem mostrado que a Matemática Financeira funciona como um elemento
positivo, que serve como importante “elo” e componente fundamental na construção
de uma cidadania crítica.
• A inserção da Matemática Financeira é importante na Educação Básica? O que se
observa é que, quando ocorre tal inclusão, ampliam-se as possibilidades de
contextualização, permitindo relacionar diversos conteúdos da Educação Básica, desde
as primeiras séries do Ensino Fundamental.
Mas... Por que isso não ocorre na prática? Por que tal temática está longe dos livros
didáticos, dos planejamentos curriculares e das salas de aula da Educação Básica?
Conversando com outros colegas professores, participando de congressos, encontros, palestras
diversas, chega-se à conclusão de que o grande foco do problema estava na “formação de
professores”, o que obrigou a uma investigação mais detalhada do tema, daí a sua escolha
para a pesquisa de doutorado em Educação Matemática.
Considerando as questões e hipóteses sobre o objeto de estudo, os procedimentos
metodológicos foram assim delimitados: (i) pesquisa documental e bibliográfica; (ii)
realização de entrevistas semiestruturadas; (iii) análise do conteúdo do corpus de entrevistas.
21
Os critérios de recorte para a escolha das instituições e cursos a serem investigados
foram:
Primeiro recorte – 90 IESs: 83 avaliadas pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (INEP) pós-2004 (públicas ou privadas), com cursos de
Licenciatura em Matemática, mais sete IESs federais do eixo Rio-São Paulo.
Para esse primeiro recorte, optou-se por um critério de escolha que fosse ao mesmo
tempo geral, representativo e aleatório. Como participante do banco de avaliadores de cursos
superiores do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES) (INEP/MEC),
a primeira escolha se deu por intermédio dos relatórios de avaliação de cursos do INEP no
período de 2004 (BRASIL, 2006), quando da implantação do SINAES, a 2008, ano de início
da pesquisa. Identificaram-se, nesse universo, 83 IESs, públicas ou privadas, que
apresentavam Licenciatura em Matemática dentre os cursos oferecidos por elas.
A inclusão de sete IESs federais do eixo Rio-São Paulo foi devida aos debates
ocorridos quando cursava a disciplina Formação de Professores no doutorado, por sugestão
dos professores do curso. Como as 83 IESs avaliadas pelo SINAES eram, em sua maioria,
instituições privadas, a amostra se tornaria mais representativa com a inclusão de outras
instituições federais.
Segundo recorte – IESs que apresentam a disciplina Matemática Financeira nos cursos de
Licenciatura em Matemática.
Analisadas as matrizes curriculares dos 90 cursos de Licenciatura em Matemática das
IESs do primeiro recorte, encontramos 26 IESs que apresentavam a disciplina Matemática
Financeira nessas matrizes, o que representa 28,8% da amostra inicial apontada no primeiro
recorte.
Terceiro recorte – Amostra a ser investigada.
A pesquisa foi realizada com seis IESs, de diversos estados brasileiros, que
concordaram, após consulta inicial às 26 IESs do segundo recorte, em participar da pesquisa,
fornecendo os documentos necessários para o estudo – projetos político-pedagógicos e
matrizes curriculares – e respondendo aos questionários elaborados para a coleta dos dados.
Como procedimentos metodológicos, inicialmente procedeu-se à leitura e análise das
legislações educacionais pertinentes, tais como: (i) Diretrizes curriculares nacionais para os
cursos de matemática, bacharelado e licenciatura (Parecer CNE/CES 1.302/2001); (ii)
Diretrizes curriculares nacionais para a formação de professores da educação básica, em nível
superior, curso de licenciatura, de graduação plena (Resolução CNE/CP 1/2002); (iii)
22
Diretrizes curriculares para os cursos de matemática (Resolução CNE/CES 3); (iv) Parâmetros
curriculares nacionais para o ensino fundamental e para o ensino médio.
Outras fontes de pesquisa foram os projetos político-pedagógicos e as matrizes
curriculares de licenciaturas em Matemática. Estes foram complementados por entrevistas
semiestruturadas com professores de Matemática e coordenadores de curso de instituições de
ensino superior (públicas e particulares) e análise de livros didáticos destinados ao ensino de
Matemática no Ensino Médio.
Quanto à legislação educacional brasileira, esta apresenta consideráveis avanços em
relação ao processo de ensino-aprendizagem e também aos temas transversais a todo esse
processo. No que diz respeito à formação de professores de Matemática e à proposta de
inserção da disciplina Matemática Financeira na formação inicial, escolheram-se fontes para
pesquisa documental que, além de referências para o foco da pesquisa, acenam com reflexões
que embasam a presente proposta. São elas: Parecer CNE/CES 1.302/2001, Resolução
CNE/CP 1/2002 e Resolução CNE/CES 3/2003.
Parecer CNE/CES 1.302/2001
Esse documento fundamenta as diretrizes curriculares nacionais para os cursos de
Matemática, Bacharelado e Licenciatura, definindo como objetivo principal dos cursos de
Licenciatura em Matemática a formação de professores para a Educação Básica (BRASIL,
2001).
Considerando essa formação, as DCNs teriam como objetivo “servir como orientação
para melhorias e transformações na formação do Bacharel e do Licenciado em Matemática”
(BRASIL, 2001, p. 1), a partir de competências e habilidades previstas nos currículos de
Matemática, como:
[...]
e) habilidade de identificar, formular e resolver problemas na sua área de aplicação, utilizando rigor lógico-científico na análise da situação-problema;
[...]
g) conhecimento de questões contemporâneas;
h) educação abrangente necessária ao entendimento do impacto das soluções encontradas num contexto global e social;
[...]
k) trabalhar na interface da Matemática com outros campos de saber (BRASIL, 2001, p. 3-4).
23
Uma das questões desta pesquisa se refere a identificar como os cursos de Licenciatura
em Matemática, que têm como principal objetivo a formação de professores, articulam
proposta curricular, projeto político-pedagógico e os conteúdos da Matemática Financeira.
Sobre essa questão, o Parecer CNE/CES 1.302/2001 também se pronuncia, ao afirmar
que o licenciado em Matemática, dentre outras, deverá ter a capacidade de “[...] trabalhar com
mais ênfase nos conceitos do que nas técnicas, fórmulas e algoritmos; [...] perceber a prática
docente de Matemática como [...] um espaço de criação e reflexão [...]” (BRASIL, 2001, p. 4).
Esse parecer, ao abordar o estágio na licenciatura, afirma que “o educador matemático
deve ser capaz de tomar decisões, refletir sobre sua prática e ser criativo na ação pedagógica,
reconhecendo a realidade em que se insere” (BRASIL, 2001, p. 6).
Resolução CNE/CP 1/2002
Outra fonte para a pesquisa são as diretrizes curriculares nacionais para a formação de
professores da Educação Básica, em nível superior, curso de licenciatura, de graduação plena,
consubstanciadas na Resolução CNE/CP 1/2002 (BRASIL, 2002a). A escolha por essa
legislação se justifica pelo fato de elas constituírem “[...] um conjunto de princípios,
fundamentos e procedimentos a serem observados na organização institucional e curricular de
cada estabelecimento de ensino e aplicam-se a todas as etapas e modalidades da educação
básica” (BRASIL, 2002a, p. 1).
Resolução CNE/CES 3/2003
No que se refere à leitura do texto de 18 de fevereiro de 2003, que estabelece as
diretrizes curriculares para os cursos de Matemática (BRASIL, 2003), identificamos que será
o projeto político-pedagógico do curso que explicitará o perfil dos formandos, as
competências e habilidades, assim como os conteúdos curriculares. Em seus três artigos, a
Resolução CNE/CES 3/2003 estabelece:
24
Art. 1º As Diretrizes Curriculares para os cursos de bacharelado e licenciatura em Matemática, integrantes do Parecer CNE/CES 1.302/2001, deverão orientar a formulação do projeto pedagógico do referido curso.
Art. 2° O projeto pedagógico de formação profissional a ser formulado pelo curso de Matemática deverá explicitar:
a) o perfil dos formandos; b) as competências e habilidades de caráter geral e comum e
aquelas de caráter específico; c) os conteúdos curriculares de formação geral e os conteúdos de
formação específica; d) o formato dos estágios; e) as características das atividades complementares; f) a estrutura do curso; g) as formas de avaliação.
Art. 3º A carga horária dos cursos de Matemática deverá obedecer ao disposto na Resolução que normatiza a oferta dessa modalidade e a carga horária da licenciatura deverá cumprir o estabelecido na Resolução CNE/CP 2/2002, resultante do Parecer CNE/CP 28/2001.
É a partir desses documentos que se propõe o estudo de projetos político-pedagógicos
de cursos de Matemática, após a implantação das diretrizes curriculares para a formação de
professores (BRASIL, 2002) e para os cursos de Matemática, Bacharelado e Licenciatura
(BRASIL, 2003), com um olhar atento sobre o atendimento ao estabelecido por essas
diretrizes.
As diretrizes curriculares nacionais para os cursos de graduação se constituem em
documento considerado como “item imprescindível”, de conhecimento dos docentes, pelo
Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES), durante processo de
avaliação dos cursos de graduação. Nesse sentido, considera-se que as fontes definidas para a
pesquisa possuem importância significativa, permitindo a articulação de dois eixos da
pesquisa: formação de professores e ensino de Matemática.
Como o tema “Formação de Professores que Ensinam Matemática” é muito amplo,
propõe-se, nesta pesquisa, um recorte de análise que permita pensar a disciplina Matemática
Financeira nos cursos de Licenciatura em Matemática no Brasil. Justifica-se o corte
epistemológico frente às transformações no modo de pensar sobre o ensino da Matemática e a
formação de professores.
Essas questões, abordadas por autores como António Nóvoa (1992, 2000), Donald
Schön (1992, 1998), João Pedro da Ponte (1992), Kenneth Zeickner (1992, 1998), Paulo
Freire (1996), Selma Garrido Pimenta (2000), Ubiratan D’Ambrosio (1999, 2006), dentre
outros, vêm contribuindo para rupturas na concepção do que é ensinar, do que é formar
25
professores, exigindo de cada um de nós a indispensável problematização da prática
pedagógica e dos cursos de formação inicial de professores de Matemática.
Assumindo-se a perspectiva de análise crítica e reflexiva, questiona-se uma formação
de professores com currículo formal, com conteúdos e atividades distanciados da realidade,
que pouco têm contribuído para gestar uma nova identidade do profissional docente
(PIMENTA, 2000).
Refletir sobre práticas pedagógicas exige colocar em questão a formação. Nesse
sentido, Paulo Freire (1996) considera que, na formação dos professores, o momento
fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. Para esse educador, formar é muito mais
que puramente treinar o educando no desempenho de destrezas.
Na perspectiva de Nóvoa (1992, 2000), não basta mudar o profissional; é preciso
mudar também os contextos em que ele intervém.
Para Zeichner (1992, 1998), a reflexão sobre a prática não é um conjunto de técnicas
que possam ser empacotadas e ensinadas aos professores, não consiste em um conjunto de
passos ou procedimentos específicos, mas exige a reflexão do professor, o que se constitui em
uma maneira de ser professor.
Já para Schön (1992, 1998), o processo de formação exige reflexão na ação; reflexão
sobre a ação produzida pelo profissional ao se defrontar com situações de incertezas e
singularidades.
São estas perspectivas de análise sobre formação de professores que nortearam a
presente pesquisa (FREIRE, 1996; NÓVOA, 1992, 2000; SCHÖN, 1992):
• Ela não se constrói por acumulação, pelo domínio de técnicas, mas por meio de
reflexão sobre as práticas.
• A questão da formação se articula com a reflexão sobre a prática, sobre a ação
docente.
• Nenhum professor conseguirá desenvolver “práticas pedagógicas” eficazes para a
aprendizagem e para o desenvolvimento dos alunos se não compreender os conteúdos,
os contextos e as temáticas transversais ao currículo escolar.
Ao abordar essas questões, no contexto da escolarização, observa-se que novas tarefas
são atribuídas à escola, não porque seja a única instância responsável pela educação, mas por
ser a instituição que desenvolve uma prática educativa planejada e sistemática, durante um
período contínuo e extenso do tempo na vida das pessoas.
26
Para acompanhar as transformações da sociedade e/ou ser a propulsora de
transformações, a escola precisa, portanto, reorientar constantemente as suas práticas. Novos
propósitos e novas tarefas, igualmente, apresentam-se aos professores: sem abandonar a
responsabilidade de ensinar, o professor pode trabalhar no sentido de associar conhecimentos
e transformações dos sujeitos envolvidos na prática pedagógica, considerando-se um
componente incisivo desse processo.
Convém lembrar, sempre, que o exercício responsável e livre da cidadania exige das
pessoas capacidade para tomada de decisões, baseando-se em informações sólidas. Sobre esse
fato, Alarcão (2008) comenta:
O empowerment pessoal, ou seja, a construção do poder pelo cidadão, não se resume meramente à obtenção de mais poder e mais direitos, mas traduz-se na capacidade real para exercer esse poder na construção de uma cidadania participativa (ALARCÃO, 2008, p. 19).
Ao concordar com Alarcão (op. cit.), acrescenta-se que de nada adiantaria uma mera
aquisição de direitos, se estes não se traduzissem em maior capacidade de exercício da
cidadania participante.
Confrontando tais reflexões com a realidade daqueles que os cursos de licenciatura
pretendem “tornar professores”, observa-se que os desafios se apresentam na definição dos
projetos político-pedagógicos de curso e da matriz e curricular dos cursos de Licenciatura em
Matemática. Nesses dois documentos, observa-se que as concepções sobre o que é formar um
professor (perfil, competências etc.), sobre conteúdos e procedimentos de avaliação e de
formação acabam por dar a identidade do curso. O ideal seria, para alcançar os objetivos de
formação de um professor educador matemático crítico, que tais referências apontassem
sempre para a formação de um docente mediador não linear, ou seja, que está sempre em
busca do conhecimento, não se considerando pronto nem tampouco o único detentor do saber.
Nessa concepção, a ideia da não linearidade se apresenta como contraposição à perspectiva de
equilíbrio e imutabilidade para a Matemática.
As estratégias de formação referenciadas, segundo Alarcão (2008), devem objetivar a
formação de professores competentes na análise de seu cotidiano, prontos para agirem, não se
detendo apenas na resolução dos problemas imediatos, mas situando-os em um horizonte mais
amplo que perspectiva a sua função e a da escola na sociedade em que vivemos.
27
Metodologicamente, o foco é a triangulação dos dados. Como se trata de pesquisa
qualitativa, em consonância com a perspectiva histórico-dialética, proceder-se-á à sua
validação por meio da diversificação das fontes e dados coletados, objetivando aferir a sua
convergência:
A educação, em particular, é vista como uma prática inserida no contexto das formações sociais que resulta de condicionamentos sociais, políticos e econômicos, reproduzindo, de um lado, as contradições sociais, mas, de outro, dinamizando e viabilizando as transformações ao garantir aos futuros cidadãos o efetivo acesso ao saber (FIORENTINI e LORENZATO, 2006, p. 66).
Nesta pesquisa, as sugestões apontam exatamente para essa vertente da Educação
Matemática Crítica, que procura trazer para a formação dos professores e, consequentemente,
para suas futuras salas de aula, discussões acerca dos problemas transversais à escola –
democracia, cidadania, trabalho e consumo –, dentre outros, sobre as possibilidades que a
Matemática Financeira oferece para ajuda na solução de questões atreladas a essas temáticas e
também para a construção de uma cidadania crítica. Por exemplo, em relação ao tema
“consumo”, um professor pode discutir e analisar com seus alunos sobre propagandas
enganosas, compras financiadas, cartões de crédito, endividamento, cheques especiais,
procurando apontar vantagens e desvantagens para os consumidores sob a luz da Matemática
subjacente a todas essas temáticas. Entretanto, para esse tipo de trabalho docente é necessário
haver uma formação de professores adequada e que a Matemática Financeira, com
características especiais, seja uma das disciplinas da matriz curricular.
Ponte (1992), ao refletir sobre concepções dos professores de Matemática e processos
de formação, afirma que as concepções estruturam o sentido que damos às coisas, sendo
influenciadas pelas experiências e representações sociais dominantes. Ele destaca que a
Matemática possui uma “imagem forte, suscitando medos e admirações”.
Se os professores de Matemática são os responsáveis pela organização das
experiências de aprendizagem dos alunos, como então formar professores de Matemática?
Quais disciplinas são fundamentais para sua formação? O que priorizar? O que deixar de
fora? Como proceder para minimizar a imagem da Matemática como causadora de medos,
frustrações, dificuldades?
Quando se pensa em formação de professores, colocam-se em pauta lógicas que
atravessam as práticas de professores, identificadas com a constituição da(s) identidade(s) e
dos saberes docentes. De certa forma, há reconhecimento de que, para saber ensinar, não
28
bastam experiência e conhecimentos específicos, mas se tornam necessários os saberes da
experiência, os saberes produzidos no cotidiano docente, por meio de reflexão sobre a prática.
O interesse pelo objeto de estudo encontra-se referendado por essa questão. Ao se
partir da observação e da reflexão sobre uma prática docente de mais de 38 anos nos espaços
públicos e privados da Escola Básica e do Ensino Superior, de que muita matemática é
“ensinada” apenas para ser devolvida nas provas e testes. Ao se deparar com uma situação do
cotidiano, como em uma compra financiada ou um empréstimo consignado, uma pessoa que
passou grande parte de sua vida estudando matemática, provavelmente, não conseguirá aferir,
por exemplo, qual a taxa de juros que estará pagando; não saberá discernir se a situação lhe é
favorável; não conseguirá usar a matemática para defender seus direitos de cidadania.
De certa forma, consonantes com as ideias de Paulo Freire, estamos sempre
questionando:
Por que não discutir com os alunos a realidade concreta a que se deva associar a disciplina cujo conteúdo se ensina, a realidade agressiva em que a violência é a constante e a convivência das pessoas é muito maior com a morte do que com a vida? Por que não estabelecer uma necessária “intimidade” entre os saberes curriculares fundamentais aos alunos e a experiência social que eles têm como indivíduos? Por que não discutir as implicações políticas e ideológicas de um tal descaso dos dominantes pelas áreas pobres da cidade? A ética de classe embutida neste descaso? Porque, dirá um educador reacionariamente pragmático, a escola não tem nada que ver com isso. A escola não é partido. Ela tem que ensinar os conteúdos, transferi-los aos alunos. Aprendidos, estes operam por si mesmos (FREIRE, 1996, p. 17, grifos nossos).
Acredita-se que a disciplina Matemática Financeira, na perspectiva da Educação
Matemática Crítica, pode ser o elo para que futuros professores encontrem o caminho de
relacionar o saber curricular, a experiência social vivenciada por eles e por seus alunos como
cidadãos e as constantes e velozes transformações do mundo em que vivemos.
É a partir dessas observações e reflexões sobre a prática que se definem as hipóteses
deste trabalho:
• A disciplina não consta de grande parte das matrizes curriculares das licenciaturas em
Matemática.
• Quando está presente na matriz curricular, o enfoque é meramente técnico, priorizando
algoritmos e fórmulas sem significado e bastante distante do que ocorre na vida das
pessoas e no mercado financeiro brasileiro.
29
Reconhece-se que diversas outras disciplinas são importantes para a formação do
cidadão, porém, o objetivo desta pesquisa é a Matemática Financeira. Justifica-se o interesse
por essa disciplina por se constatar que ela está presente na vida diária das pessoas e por ela
relacionar distintos temas da Matemática clássica tradicionalmente presentes nos currículos,
como progressões, proporções, funções, médias, equações polinomiais e logaritmos.
O licenciando em Matemática, futuro professor, precisa ter clareza sobre os objetivos
de seu ensino, assim como refletir sobre o significado da Matemática, para que possa ser um
profissional autônomo e socialmente solidário. A Matemática é fundamental para o
desenvolvimento da ciência e da tecnologia e esta é uma das justificativas para sua presença
obrigatória nos currículos da Escola Básica.
O licenciando, como cidadão e futuro professor, precisa não apenas dominar
conteúdos matemáticos, como também não se considerar “pronto” e desenvolver a
compreensão sobre as relações entre o homem, a matemática e a sociedade.
De acordo com essa concepção, precisa-se de uma escola colaborativa, cujos sujeitos
interagem e, mais do que ensinam, aprendem, constroem juntos o conhecimento:
[...] a Escola se caracteriza por ser um local não simplesmente de acesso à informação, mas de geração de conhecimento. A Escola, assim entendida, requer um professor que esteja disposto a aprender e ensinar. Insisto, é importante que ele seja um ávido aprendiz, tenha a capacidade de perceber as necessidades do contexto, domine os conteúdos de sua área específica e possa adaptá-los aos diversos tipos de alunos presentes nessa Escola, que é democratizada e voltada para todos (COSTA, 2010, p. 87).
Constata-se, assim, que a questão é muito mais ampla que simplesmente “ensinar
bem” a Matemática Financeira ou qualquer outro conteúdo. Vê-se isso com certa regularidade
– os professores “ensinam qualquer coisa”; os alunos “entendem”, devolvem nas provas e
“esquecem”. A questão principal está na relação entre a educação e as esferas econômicas,
políticas, culturais e sociais e, consequentemente, na formação de uma cidadania crítica.
O futuro professor precisa entender a educação matemática como uma prática
libertadora. Paulo Freire, em “Pedagogia do oprimido”, já indicava:
A educação que se impõe aos que verdadeiramente se comprometem com a libertação não pode fundar-se numa compreensão dos homens como seres “vazios” a quem o mundo “encha” de conteúdos; não pode basear-se numa consciência especializada, mecanicistamente compartimentada, mas nos homens como “corpos conscientes” e na consciência como uma consciência intencionada ao mundo. Não pode ser a do depósito de conteúdos, mas a da problematização dos homens em suas relações com o mundo (FREIRE, 1974, p. 38).
30
É nessa perspectiva que se justifica o objeto deste estudo, onde se defende a inserção
da Matemática Financeira como uma das disciplinas – com características específicas – das
matrizes curriculares dos cursos de Licenciatura em Matemática.
2 EDUCAÇÃO CRÍTICA E ENSINO DE MATEMÁTICA
A utilização do cotidiano das compras para ensinar matemática revela práticas apreendidas fora do ambiente escolar, uma verdadeira etnomatemática do comércio. Um importante componente da etnomatemática é possibilitar uma visão crítica da realidade, utilizando instrumentos de natureza matemática. Análise comparativa de preços, de contas, de orçamento, proporciona excelente material pedagógico (D’AMBROSIO, 2002, p. 23).
Existem, basicamente, duas grandes vertentes de ensino da Matemática. Para alguns,
ensinar Matemática é a busca do rigor, é o uso e a descrição de algoritmos e fórmulas e
problemas de aplicação. De acordo com essa concepção, normalmente, não há qualquer tipo
de discussão sobre por que e para que se aprende Matemática. Para outros, o ensino da
Matemática está preocupado com o desenvolvimento de conteúdos matemáticos
contextualizados, respeitando diversidades, estimulando a investigação e o espírito crítico do
aluno/cidadão. É nessa perspectiva que se justifica a ligação entre a Matemática Financeira e a
Educação Matemática Crítica.
De um dos textos do educador matemático português João Pedro da Ponte, da
Universidade de Lisboa, colhemos uma afirmação que retrata bem o confronto entre essas
duas concepções:
Para os professores, o cálculo e a manipulação simbólica tendem a ser vistos como a base de toda a aprendizagem – o que constitui reconhecidamente uma visão redutora da Matemática. A ideia básica é a de que quem não sabe calcular não pode fazer o menor raciocínio. Deste modo, os professores tendem a insistir numa abordagem formalizante que só afasta ainda mais os alunos da disciplina. Ignora-se de um modo geral a importância da diversificação das representações, a necessidade de tomar os conhecimentos dos alunos como ponto de partida das aprendizagens e a importância da interação social na criação dos novos saberes, persistindo-se numa tradição pedagógica que tende a perpetuar a imagem da Matemática como algo de misterioso e inacessível (PONTE, 1994, p. 24-26).
O enfoque desta pesquisa é totalmente concordante com as ideias de João Pedro da
Ponte, notadamente no que diz respeito à importância das interações sociais na construção do
conhecimento.
32
2.1 Educação Crítica
Para consecução da pesquisa, procedeu-se a uma revisão bibliográfica, com leitura de
artigos e livros dos principais teóricos da área de Educação Crítica. Mostraram-se
fundamentais, para os objetivos propostos, as influências da teoria crítica de Henry Giroux
(1986, 1989), da pedagogia crítica de Paulo Freire (1974, 1983, 1996, 2008), da
etnomatemática de Ubiratan D’Ambrosio (2002), do professor reflexivo de Zeichner (1992,
2003), Zeichner e Pereira (2008) e Schön (1992) e da educação matemática crítica de Ole
Skovsmose (2001, 2007, 2008).
No referencial da Educação Matemática Crítica, de acordo com pesquisadores como
Ole Skovsmose (1999, 2001), Marilyn Frankenstein (2005) e Ubiratan D’Ambrosio (1999,
2002), há destaque para a ideia de que a educação, necessariamente, tem de ter uma dimensão
de democratização.
Em nossa visão, os conteúdos, estratégias e discussões da Matemática Financeira são
fundamentais para o ensino da Matemática em uma dimensão crítica. Acredita-se, ainda, que
uma atitude crítica relativamente aos modos como a matemática é aplicada e usada na
sociedade tem de ser construída, observando-se os fenômenos de um ponto de vista social e
político.
A Matemática Financeira permite, com professores bem preparados e conscientes de
sua ação política, o desenvolvimento da “matemacia” dos estudantes, entendendo por esse
termo, segundo Ole Skovsmose (2001), uma forma de letramento matemático, provendo o
suporte matemático e lógico para o exercício de uma cidadania crítica.
Ubiratan D’Ambrosio (1999) utiliza o termo “materacia”, o qual, segundo ele, é um
conhecimento matemático que é muito mais que o desenvolvimento de habilidades de
cálculos e algoritmos – é um conhecimento que procura:
• Promover a participação crítica dos alunos/cidadãos na sociedade.
• Discutir questões políticas, econômicas, ambientais, nas quais a matemática serve
como suporte.
• Criticar a própria matemática e seu uso na sociedade, indo além do processo de
ensino/aprendizagem.
Muitas vezes, em reuniões, seminários ou encontros de professores, quando o tema da
Matemática Financeira é colocado em pauta, aparecem restrições do tipo:
33
• Ela não faz parte dos vestibulares, não aparece nos livros didáticos nem fomos
formados para isso.
• Ela não está no programa de minha escola... (Mas... Quem define esses programas?)
Ouvindo essas questões e considerando que partem de professores de Matemática com
alguns anos de experiência de sala de aula, pergunta-se:
• Será que estamos satisfeitos com o que ensinamos?
• Será que gostaríamos de assistir às nossas próprias aulas?
• Será que nos sentiríamos preparados para a vida com essa matemática aprendida?
Michael Apple, no livro “Ideologia e currículo” (1986), apresenta algumas questões
que vão ao encontro dessas preocupações e que, de certa forma, amparam a discussão que se
está propondo acerca do ensino de Matemática Financeira na Educação Básica, sob a ótica da
Educação Matemática Crítica:
Essas questões são importantes, pois as atividades desenvolvidas nas escolas não são neutras, o conhecimento trabalhado nas instituições escolares é uma escolha de um universo muito mais vasto de conhecimentos e princípios sociais possíveis e reflete também as relações sociais de poder na sociedade (APPLE, 1986, p. 200).
Acredita-se que sejam vários os motivos do abandono dos conteúdos da Matemática
Financeira e de suas relações com os demais conteúdos da Matemática na Educação Básica.
É senso comum, entre professores de Matemática, que se trata de uma matemática
difícil, que exige alto aparato tecnológico e que se destina apenas a um pequeno e seleto
grupo de especialistas. Sobre isso, apresentam-se as seguintes questões:
• Será que é isso mesmo? Será que os professores são devidamente preparados para
lidar com as temáticas e as questões inerentes à Matemática Financeira?
A Matemática Financeira, assim como a Educação Estatística, desempenha papel
fundamental dentro da Matemática básica, tanto por seu controle do conhecimento como pelo
significado formador de consciência crítica.
As pesquisas levadas a efeito para esta tese com a Matemática Financeira na formação
de professores pretendem relacionar educação, mudança social e metodologias que permitam
o desenvolvimento de consciência crítica e da cidadania.
Acrescente-se que a experiência como docente ao longo de quase quatro décadas, tanto
na Educação Básica como no Ensino Superior (lidando com crianças, jovens e adultos de
distintas classes sociais), apontou desafios para os quais o suporte da teoria da educação
crítica de Paulo Freire (1974) e, posteriormente, a da educação matemática crítica dos autores
34
supramencionados, mostrou-se positivo como fator de contribuição para as mudanças sociais
que a escola pretende.
Uma prática pedagógica crítica deve levar em consideração conteúdos e metodologia.
Marilyn Frankenstein (2005, p. 112), sobre esse fato, comenta:
Um conteúdo emancipador, se apresentado numa forma não libertadora, reduz insights críticos para despejar palavras que não podem desafiar a realidade tomada-por certa pelos estudantes e não pode inspirar compromisso para mudança social.
A busca de conhecimentos, sob uma visão crítica, é necessária enquanto metodologia,
pois, do contrário, as pessoas podem até aprender e se sentirem bem, mas, provavelmente, não
serão capazes de usar esse conhecimento na solução de seus problemas e na transformação da
sociedade.
Segundo Freire (1970, p. 118), “[...] os conteúdos e metodologias em uma educação de
concepção crítica precisam ser desenvolvidos na busca, com os estudantes, de ideias e
experiências que deem significados a suas vidas”.
Acredita-se que há, ainda, grande descompasso entre o que se preconiza como
democrático e fundamental para os estudantes e o que os futuros professores vivenciam ao
longo de sua formação inicial, ou seja, na graduação. Sobre esse aspecto, Zeichner (2002, p.
32) afirma:
Em geral, há uma grande defasagem entre a retórica da educação democrática e centrada no aluno e o modo pelo qual se conduz a educação de professores. Não é incomum os estudantes da área ficarem em anfiteatros, assistindo passivamente a aulas sobre quanto é importante envolver ativamente os alunos na instrução.
É fundamental a transformação de professores reprodutores em educadores autônomos
e críticos. A dúvida, em geral, se coloca em quais os melhores caminhos para a formação
inicial.
Nesta investigação, objetivou-se verificar até que ponto conteúdos e questões
relacionadas à Matemática Financeira podem assumir papel de significância na vida dos
estudantes de todos os níveis e, por conta disso, serem desenvolvidos com um enfoque crítico
e reflexivo na formação de professores de Matemática.
Donald Schön (1992) já nos alertava acerca das situações problemáticas concretas que
os professores precisam enfrentar e sobre a importância que o conhecimento prático, a
capacidade do docente em manejar a complexidade e solucionar problemas como sendo um
processo de reflexão-na-ação ou de diálogo reflexivo com a situação concreta que se pretende
35
resolver. Novamente, defende-se que as ferramentas oriundas da Matemática Financeira,
assim como suas relações com os conteúdos da Matemática da Escola Básica, podem
representar importante papel na solução de grande parte dessas questões.
O termo “crítica”, associado a “educação”, tem sido bastante usado em documentos
oficiais, projetos pedagógicos de instituições de ensino, artigos da área educacional,
dissertações e teses acadêmicas. Esse termo, que vem do grego kritiké, é entendido como a
arte de julgar e analisar. Entretanto, quais serão os significados considerados para esse termo
na ótica dos autores que nos servem de referência?
No “Dicionário Houaiss da língua portuguesa” (2009, p. 875), constam, dentre outras,
as seguintes acepções:
1 segundo a tradição, arte e habilidade de julgar a obra de um autor; 2 exame racional, indiferente a preconceitos, convenções ou dogmas, tendo em vista algum juízo de valor; [...] 5 capacidade de julgar, de criticar; juízo crítico.
No “iDicionário Aulete”1, há, dentre outros significados:
1. Análise para avaliação qualitativa de algo [...].
Henry Giroux, um dos mais importantes autores da Pedagogia Crítica, define o
pensamento crítico como aquele que relaciona a teoria aos fatos e que estabelece o
conhecimento como algo que não pode ser isolado dos interesses e valores humanos. Esse
autor, em 1989, já registrava em seu texto a ideia de que a escola precisa ser defendida como
um serviço que educa estudantes a serem cidadãos críticos que podem desafiar e acreditar que
suas ações farão diferença na sociedade.
Todo conhecimento, ao longo de seu processo de construção e maturação, sofre as
influências do contexto em que se insere. O período pós-segunda guerra mundial, marcado
por tensões políticas e militares e ameaças nucleares, tornou-se, também, uma época que
gerou diversas correntes de preocupação com a paz no planeta. Uma dessas manifestações
gerou a Organização das Nações Unidas (ONU) que, segundo D’Ambrosio (2007), tinha
como principal lema a “luta pela igualdade educacional para todos, independentemente da
classe econômica e social”.
Nesse contexto, ganhou força a Teoria Crítica, estruturada por alguns filósofos e
sociólogos alemães, notadamente os da cidade de Frankfurt, vinculados ao Instituto de
Pesquisa Social criado em 1923.
1 Disponível em: http://www.auletedigital.com.br>.
36
A repercussão da Teoria Crítica no âmbito da educação, assim como as discussões
geradas por essa corrente, determinou o surgimento de novos paradigmas educacionais.
No Brasil, no legado das ideias de Paulo Freire, há referências ao modelo educacional
crítico que, segundo esse educador, é visto como uma prática libertadora desenvolvida pelo
homem no processo histórico de humanização. Com essa concepção, Freire procura ressaltar
as relações entre educação, política e informação que devem ser construídas por educadores e
educandos.
Em “Educação como prática da liberdade” (1981), Paulo Freire, de certa forma,
sintetiza a sua concepção acerca de uma atitude crítica, ao afirmar que o homem deixa de ser
simples espectador de sua vida e preparando-se para interferir nela, com a força de seus
valores e de suas decisões.
Em “Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa” (1996, p. 17),
Freire aponta a distinção entre a curiosidade ingênua e a criticidade, destacando a
transformação da curiosidade ingênua em curiosidade epistemológica:
Não há para mim, na diferença e na “distância” entre a ingenuidade e a criticidade, entre o saber de pura experiência feito e o que resulta dos procedimentos metodicamente rigorosos, uma ruptura, mas uma superação. A superação e não a ruptura se dá na medida em que a curiosidade ingênua, sem deixar de ser curiosidade, pelo contrário, continuando a ser curiosidade, se criticiza. Ao criticizar-se, tornando-se então, permito-me repetir, curiosidade epistemológica, metodicamente “rigorizando-se” na sua aproximação ao objeto, conota seus achados de maior exatidão.
Paulo Freire (1996) trouxe à tona uma ampla discussão acerca do significado do termo
“alfabetização”, colocando em pauta uma dimensão política da educação a partir de um
significado muito mais amplo do que significaria alfabetização em uma dimensão crítica.
Giroux (1986, p. 148), ressaltando que alfabetizar é muito mais que propiciar ao
estudante capacidades de leitura e escrita, reforçava também a dimensão crítica desse
processo:
[...] a alfabetização, como construção social, teve de ser enraizada em um espírito de crítica e em um projeto de possibilidades que permitissem às pessoas participar no entendimento e na transformação de suas sociedades. Como ambos, a supremacia das habilidades específicas e de formas particulares de conhecimento, a alfabetização tinha que se tornar um pré-requisito para a emancipação social e cultural.
Nesta pesquisa, apropriar-nos-emos dessa concepção para o termo “alfabetização”, em
um sentido mais amplo e crítico, estendendo-a para a alfabetização financeira, que hoje vem
sendo denominada Educação Financeira.
37
2.2 Matemática Financeira e Educação Matemática Crítica
Ao longo dos textos de pesquisadores e educadores matemáticos, como Ole
Skovsmose (2001, 2007, 2008), percebe-se forte influência das ideias do educador brasileiro
Paulo Freire, assim como de outros teóricos da Educação Crítica, como Henry Giroux.
Skovsmose demonstra, todo o tempo, o seu foco político e o desejo de ver a educação
matemática como uma prática democrática e de libertação:
Eu estou interessado no possível papel da educação matemática como um porteiro, responsável pela entrada de pessoas, e como ela estratifica as pessoas. Eu estou preocupado com todo discurso que possa tentar eliminar os aspectos sociopolíticos da educação matemática e definir obstáculos de aprendizagem, politicamente determinados, como falhas pessoais. Eu estou preocupado a respeito de como o racismo, sexismo, elitismo poderiam operar na educação matemática. Eu estou preocupado com a relação entre a educação matemática e a democracia (SKOVSMOSE, 2007, p. 176).
Em uma de suas obras, Skovsmose procura caracterizar o que entende a respeito do
termo “crítica” e sobre a forte relação desse termo com os problemas sociais:
[...] podemos dizer que crítica tem a ver com: 1) uma investigação de condições para a obtenção de conhecimento; 2) uma identificação dos problemas sociais e sua avaliação; e 3) uma reação às situações sociais problemáticas. Em outras palavras, o conceito de crítica indica demanda sobre autorreflexões, reflexões e reações (SKOVSMOSE, 2001, p. 100-101).
Verifica-se que a palavra crítica gera muitas interpretações. Neste estudo, sempre que
ela for referida, estaremos adotando a concepção de Skovsmose (2001, 2008), ao afirmar que,
para sermos críticos, devemos analisar e buscar alternativas para solucionar conflitos ou crises
com os quais nos deparamos. Entretanto, para desenvolvermos essa competência crítica,
devemos saber como e onde buscar essas alternativas.
Um ensino de Matemática que valorize a Educação Matemática Crítica deve fornecer
aos estudantes instrumentos que os auxiliem tanto na análise de uma situação crítica quanto
na busca por alternativas para resolver a situação. Nesse sentido, deve-se não somente ensinar
aos alunos a usar modelos matemáticos, como também levá-los a questionar por que, como,
para que e quando utilizá-los.
Skovsmose (2007, 2008) nos alerta, também, para a ideologia da certeza na
Matemática. Segundo ele, essa ideologia é uma estrutura geral para a interpretação de
questões que transformaram a Matemática em uma “linguagem de poder”, ou seja, nessa visão
da Matemática como pura, de sistema irrefutável, perfeito, ferramenta infalível, que contribui
para o controle político.
38
Por outro lado, destaca que a Matemática deve servir para construir argumentos,
resolver problemas e refletir sobre eles. Afirma, ainda, que a Matemática pode nos apresentar
informações que refletem questões significativas na sociedade e que, na maioria das vezes,
não são aproveitadas pelo professor. Os problemas matemáticos devem ter significado para o
aluno e estarem relacionados a processos importantes da sociedade.
Skovsmose (2008) reflete também sobre a importância de perceber, por exemplo, as
questões econômicas, sociais e políticas por trás das fórmulas matemáticas. Assim, o aluno
teria um comprometimento social e político, identificando o que de fato é relevante em seu
meio cultural.
O modelo tradicional de ensino da Matemática pode ter, ao contrário da proposta da
Educação Crítica, um caráter apassivante, levando os alunos a perderem sua capacidade de
crítica. Mesmo metodologias consideradas “modernas” e “revolucionárias”, como, por
exemplo, o denominado método Kumon, possuem esse caráter perverso, que consiste em
ensinar determinada quantidade de algoritmos e regras para serem decorados, “treinados” e
“usados” na hora das avaliações.
Em seus livros, Skovsmose procura destacar que, na Educação Crítica, a relação
professor/aluno é fundamental para a questão democrática, fazendo, assim, conexão com a
“pedagogia emancipadora” de Paulo Freire (1974).
O professor dinamarquês Ole Skovsmose é um dos principais responsáveis por
divulgar o movimento da Educação Matemática Crítica ao redor do mundo. Com mestrado
em Filosofia e Matemática pela Universidade de Copenhague e doutorado em Educação
Matemática pela Royal Danish School of Education Studies, Skovsmose defende em seus
trabalhos o direito à democracia e o ensino de Matemática a partir de trabalho com projetos.
Skovsmose iniciou os estudos teóricos nesse campo por meio da participação em um
projeto intitulado “Educação Matemática e Democracia em Sociedades Altamente
Tecnológicas”, financiado pelo Conselho Dinamarquês de Pesquisa em Ciências Humanas em
1988, que lhe serviu como grande fonte de inspiração. O objetivo desse projeto era “[...]
discutir educação matemática como parte de um empreendimento democrático em uma
sociedade altamente tecnológica” (SKOVSMOSE, 2001, p. 103). Os trabalhos experimentais
desenvolvidos com o auxílio de outros professores o levaram a tentar desenvolver uma
filosofia da Educação Matemática Crítica.
Skovsmose sempre se preocupou com os países localizados fora dos centros de poder,
o que o levou a viajar pelo mundo orientando e desenvolvendo pesquisas. Está sempre em
contato com professores e pesquisadores da África do Sul, Colômbia e Brasil. Atualmente,
39
Skovsmose é professor do Departamento de Educação, Aprendizagem e Filosofia da
Universidade de Aalborg, na Dinamarca. Skovsmose tem livros publicados em português2,
alguns em coautoria com pesquisadores brasileiros, como Marcelo de Carvalho Borba e
Miriam Godoy Penteado, ambos da Universidade Estadual Paulista Júlio Mesquita Filho
(UNESP) de Rio Claro.
2.2.1 Ambientes de aprendizagem e cenários de investigação
Na maioria das vezes, os professores preferem formas consolidadas de trabalho,
pensamento e ação, refutando ideias que solicitem reflexão, planejamento e diálogo. Somos
nossos maiores inimigos, ao preferirmos a “zona de conforto” na qual, muitas vezes, estamos
inseridos (APPLE, 1989).
Ole Skovsmose propõe, em seus artigos, uma mudança de paradigmas por meio de
ambientes de aprendizagem formatados como cenário de investigação – aquele que convida
os alunos a formularem questões e procurarem explicações. O autor alerta que o que pode
servir perfeitamente como cenário para investigação a um grupo de alunos em dada situação
particular pode não representar um convite para outro grupo de alunos.
Se certo cenário pode ou não dar suporte a uma abordagem de investigação é uma
questão empírica, que pode ser respondida com a prática de professores e alunos envolvidos.
A aceitação do convite à investigação depende de fatores tais como:
• Natureza da investigação.
• Prioridades dos alunos na hora do convite.
• Modo como o convite é feito.
Skovsmose (2008) foca dois paradigmas para as práticas da sala de aula: na Educação
Matemática Tradicional, há, normalmente, a prática de exercícios, enquanto na Educação
Matemática Crítica, uma abordagem de investigação (Quadro 1).
2 Os livros publicados em português, até o momento, são: “Educação matemática crítica: a questão da
democracia” (Papirus, 2001), “Desafios da reflexão em educação matemática crítica” (Papirus, 2008), “Educação crítica: incerteza, matemática, responsabilidade” (Cortez, 2007) e “Diálogo e aprendizagem em educação matemática” (Autêntica, 2006), em parceria com Helle Alroe.
40
Exercício Oferece uma fundamentação baseada na
“tradição”
Cenários de Investigação Ambiente que pode dar suporte a um trabalho de
investigação
• Os alunos usam, basicamente, papel e lápis na resolução de exercícios.
• Os alunos são convidados pelo professor a formularem questões e procurarem justificativas.
• Os exercícios são formulados por autoridade exterior à sala de aula.
• Os alunos são corresponsáveis pelo processo de aprendizagem.
• A premissa central é que existe apenas uma resposta certa.
• Os alunos usam materiais manipuláveis e novas tecnologias nas atividades de aprendizagem.
• A justificativa da relevância dos exercícios não é contemplada.
• Os alunos envolvem-se em projetos que poderão servir de base a investigações.
Quadro 1 – Modelos de práticas de sala de aula.
Fonte: Skovsmose (2008).
Em estudos sobre cenários de investigação e ambientes de aprendizagem, Skovsmose
distingue seis modelos (Quadro 2), que são obtidos por meio da combinação das referências:
matemática pura, semirrealidade e realidade, com os paradigmas de práticas das salas de aula:
exercícios ou cenários de investigação.
Exercícios Cenários de Investigação
Ref
erên
cias
Matemática Pura Exercícios apresentados no contexto da matemática pura.
Investigações numéricas ou geométricas com papel e lápis ou computador.
Semirrealidade Situações artificiais. O único propósito é chegar à solução única.
Problema artificial, mas que permite explorações e justificativas. Podem gerar outras questões e estratégias de solução.
Realidade
Exercícios baseados na vida real, mas as questões que deles decorrem não são investigativas.
Atividades de investigação que podem usar recursos tecnológicos e materiais manipulativos. Os problemas são relacionados ao cotidiano dos alunos e podem ser propostos como projetos.
Quadro 2 – Paradigmas de práticas da sala de aula.
Fonte: Skovsmose (2008).
41
Na Dinamarca, o currículo oficial não é um obstáculo para alunos e professores
trabalharem no ambiente de aprendizagem com cenários de investigação vinculados à
realidade. Não há exames após cada ano escolar para decidir se os alunos são aprovados ou
não. Nesse país, a passagem de ano é automática. Somente após o nono ano, os alunos fazem
um exame nacional em Matemática, em que todos passarão, independentemente das notas
obtidas. Esse exame inclui uma abordagem de investigação, em sua parte escrita, que não
pressupõe qualquer conhecimento memorizado e, em sua parte oral, concentra-se sobre
grupos de alunos, fazendo investigações matemáticas. Apesar disso, o paradigma do exercício
também tem um forte apelo nesse país.
Skovsmose comenta que não ousaria afirmar que o abandono do paradigma do
exercício para explorar cenários de investigação forneceria uma resposta a todas as questões
nem que seja suficiente construir uma educação matemática baseada apenas em referências à
vida real.
Para Alro e Skovsmose (2006, p. 127-128):
Começar uma investigação em que pré-concepções foram momentaneamente deixadas de lado significa que algo imprevisto possa acontecer. Crenças e visões de mundo estabelecidas, ao serem confrontadas e desafiadas por uma investigação, deveriam ser passíveis de mudanças e aperfeiçoamentos. Um diálogo é algo imprevisível. Não há respostas prontas, conhecimentos de antemão, para os problemas. Elas surgem através de um processo compartilhado de curiosa investigação e reflexão coletiva, com o propósito de obter conhecimento. Imprevisibilidade significa o desafio de experimentar novas possibilidades [...].
Skovsmose afirma que os professores precisam ousar, realizando mudanças que
permitam a sua saída da “zona de conforto”, o que traz como consequência assumir uma
“zona de risco”. Assim, criam-se condições para geração de distintos ambientes de
aprendizagem, oferecendo recursos novos. Esse procedimento contribui para que alunos e
professores reflitam, incorporando as suas práticas à perspectiva de uma educação matemática
de dimensão crítica. Por outro lado, ousando um caminho por zonas de risco, vivenciando
situações novas com contextos econômico-financeiros, os professores estarão, também,
contribuindo para que seus alunos estejam preparados para as constantes mudanças do mundo
moderno.
Um conhecimento matemático rígido, imutável, pronto, memorizado, determinístico,
pouco adiantaria diante, por exemplo, de situações como a atual crise econômica da Europa.
Quem imaginaria, há alguns anos, o enfraquecimento de moedas, como o Euro? O
endividamento de países do chamado “primeiro mundo”? O Brasil deixando o papel
42
secundário de devedor para o de sexta economia mundial (dezembro de 2011)? Nossos
alunos, nas aulas de Matemática, devem vivenciar situações abertas, complexas, “de risco”,
onde nem docentes nem discentes tenham soluções prontas e simples. Situações que se
relacionem, na medida do possível, com os fatos que todos encontram em seu dia a dia.
Dessa forma, esses ambientes ricos de aprendizagem podem auxiliar na busca de um
dos grandes objetivos da Educação Matemática Crítica, que é mostrar uma Matemática rica
em relações com a realidade das pessoas. Sobre essas questões, Hans Freudenthal, em seu
livro “Perspectivas da matemática” (1975), afirmava que, quando se referia às ricas relações
da Matemática, procurava ressaltar relações com uma realidade já vivida, muito mais do que
uma falsa realidade inventada para servir de exemplo de aplicação. Enfatizava, ainda, que a
realidade já vivida deveria ser a espinha dorsal de todas as experiências matemáticas.
É nessa perspectiva que se procura alinhar a proposta de ensino de Matemática
Financeira na formação de professores. O enfoque central do curso deve ser nas relações com
a realidade vivenciada pelos alunos e não em falsas realidades criadas por livros didáticos ou
por avaliações a que são submetidos. A título de exemplo, citam-se os juros simples, que,
embora presentes nos livros didáticos de Matemática do Ensino Fundamental, não fazem parte
do cotidiano dos cidadãos brasileiros.
Com esta proposta, valoriza-se que os conteúdos de Matemática Financeira,
relacionados aos de Matemática da Escola Básica, sejam vivenciados por meio de propícios
cenários de investigação em situações contextualizadas.
Para refletir...
Nós, professores, como sujeitos do processo de ensino, temos algumas questões:
• De que forma nós preparamos os alunos, para que eles sejam cidadãos matematicamente
críticos, ativos e reflexivos?
• É possível ensinar Matemática estando permanentemente em ambiente de investigação?
• Estamos preparados para isso?
43
2.2.2 Breve histórico da matemática financeira
As primeiras manifestações da matemática em nossa civilização, verificadas por meio
de milhares de tábulas de argila, papiros ou pergaminhos encontrados em escavações
arqueológicas, denotam uma preocupação essencialmente prática e operacional, decorrente
muitas vezes de mensurações e situações do cotidiano. Muita matemática existia há mais de
1.500 anos antes de Cristo, com os babilônios, por exemplo, só que sem qualquer
preocupação com demonstrações ou generalizações. O que havia eram processos práticos,
como receitas, e aplicáveis a determinadas situações particulares.
As questões financeiras sempre estiveram no centro das preocupações humanas e um
dos aspectos mais comuns da natureza humana sempre foi o de acumular riqueza e conquistar
independência financeira.
Há muitos desses primeiros textos que registram a matemática envolvida nas
transações comerciais decorrentes da distribuição de produtos agrícolas. Algumas dessas
tábulas demonstram que os antigos sumérios estavam familiarizados com alguns tipos usuais
de contratos legais, como: faturas, recibos, hipotecas, crédito, juros simples e compostos. Os
cálculos envolvidos na solução desses problemas eram escorados em tabelas numéricas que,
por meio de técnicas específicas, como a regra da falsa posição ou dupla falsa posição
(interpolação linear), substituíam os cálculos que, muito mais tarde, passaram a ser feitos com
auxílio dos logaritmos.
É claro que em qualquer análise que façamos sobre questões financeiras
encontraremos o conceito de juros ou valor pago pelo empréstimo. Muito do que se escreveu
sobre a matemática ao longo dos tempos tem lidado com questões relacionadas a juros.
Existem relatos de sistemas financeiros desde a Antiguidade, quando os povos antigos
usavam diversas formas distintas para realização de pagamentos de documentos de crédito.
Segundo Boyer (2001), no início do século XIII, Leonardo de Pisa, mais conhecido
como Fibonacci (filho de Bonacci), foi um dos responsáveis pela introdução da Matemática
Árabe no Ocidente. Fibonacci, que era filho de um funcionário alfandegário, viveu grande
parte de sua juventude no norte da África, aprendendo árabe e estudando Matemática com
professores islâmicos. Depois, viajou ao longo do Mediterrâneo, provavelmente trabalhando
como comerciante com seu pai.
A sua obra mais importante, “Liber abbaci” (1202), é destinada, em grande parte, à
introdução dos algarismos indo-arábicos, sua notação posicional e seus algoritmos
operatórios. Nesse livro há também destaque para questões típicas das sociedades comerciais,
44
como as de conversão de moedas. Essas questões relacionadas ao comércio e às finanças
revelaram-se, já naquela época, muito úteis para a civilização ocidental.
Fibonacci, que hoje em dia é mais conhecido por sua famosa sequência numérica, teve
sua obra reconhecida ainda em vida, sendo que o imperador Frederico II, por conta disso,
estabeleceu uma remuneração anual como reconhecimento dos seus serviços.
No século XVII, os bancos começaram a se desenvolver e, em Estocolmo, ocorreu o
lançamento do primeiro dinheiro de papel (papel-moeda). Nessa mesma época, diversos
países também já estavam produzindo suas próprias moedas.
Atualmente, os bancos são regulados pelos bancos centrais de cada país, que possuem
a função de captar recursos financeiros e de regular os bancos comerciais e industriais. Além
disso, hoje já existem os chamados bancos internacionais, que concedem empréstimos aos
bancos centrais de países necessitados.
Um dos mais antigos registros de documentos matemáticos que existem é uma tábula
do acervo do Museu do Louvre (Paris), de cerca de 1700 a.C.:
A prática dos juros também está documentada nas tábulas das coleções de Berlim, Yale e do Louvre, que contêm problemas sobre juros compostos. Em uma tábula do Louvre, de cerca de 1700 a.C., há o seguinte problema: por quanto tempo deve-se aplicar uma certa soma de dinheiro a juros compostos anuais de 20%, para que ele dobre? (EVES, 2004, p. 77).
Interessante também é registrar que a prática do uso das taxas anuais, que ainda vigora
nos dias atuais, tem tradição milenar e era plenamente justificável na época, pois havia a
prática da troca e do escambo. Os tomadores do empréstimo, que pegavam sementes
emprestadas para a semeadura, por exemplo, precisavam de um ano de prazo para que se
concretizasse a nova colheita.
Em linguagem algébrica atual, podemos resolver a antiga questão constante na tábula
do Louvre. Vamos recair, para surpresa de muitos, em fatos matemáticos importantes,
estudados na Escola Básica ou no Ensino Superior, os quais, normalmente, não são
relacionados às questões financeiras. Analisemos, em detalhe, o problema apresentado na
tábula do Louvre:
Se o capital C está crescendo a juros compostos de 20% ao ano, temos que, no
primeiro ano, o capital C estará acrescido de 0,20 C, ou seja, valerá 1,2 C. No segundo ano, o
novo capital 1,2 C ficará acrescido de 0,2. 1,2 C, ou seja, 1,2 C + 0,24 C ou 1,44 C. Isso é o
mesmo que 1,22 C. Seguindo essa mesma linha de raciocínio, após t anos, teremos que o
45
capital inicial terá se transformado no montante 1,2t C e, como se deseja que esse capital
dobre de valor, temos a equação 1,2t C = 2 C, que recai na equação exponencial 1,2
t = 2.
Atualmente, resolveríamos essa equação aplicando logaritmos, recaindo em: t = log 2 /
log 1,2 ≡ 3,8018 anos. Os antigos babilônios, é claro, ainda não conheciam logaritmos, mas,
com suas tabelas, já sabiam que 1,23 = 1,728 e que 1,2
4 = 2,0736, logo, o valor de t que
procuravam estaria entre 3 e 4.
Para resolver esse tipo de equações, aplicavam o método aproximado da interpolação
linear, que nada mais é que determinar o valor de t que divide o intervalo entre 3 e 4 na
mesma proporção que 2 divide o intervalo entre 1,728 e 2,0736. Com esse método, chegaram
à resposta – 3,787 – que é notavelmente próximo da resposta correta.
Com as tabelas de potências criadas pelos babilônios em sua notação sexagesimal,
eles, de certa forma, já antecipavam o uso de logaritmos na resolução de diversos problemas
cotidianos e, principalmente, questões envolvendo juros compostos.
Se generalizarmos esse tipo de crescimento – a juros compostos –, teremos mais uma
importante revelação que nos faz recair em um número muito usado nas aulas de Cálculo e
que, na maioria das vezes, é passado aos alunos como o resultado de um limite quando a
variável tende ao infinito. Nesse caso, nossa experiência mostra que os alunos “aceitam” ou
mesmo “decoram” tal resultado, sem qualquer entendimento do que estava envolvido
inicialmente nesse limite. No desenvolvimento que faremos a seguir, veremos que se trata do
número e.
Sabemos, por exemplo, que se um capital inicial C está crescendo a juros compostos,
sob uma taxa fixa de 2% ao período, o montante acumulado a cada período fica multiplicado
por 1,02, ou seja, o capital C fica transformado no montante M = C.(1,02)t, após t períodos de
capitalização. É a clássica fórmula M = C . (1 + i)n, onde i é a taxa unitária do período, C é o
capital inicial ou principal e n é o número de períodos que encontramos nos livros de
Matemática Financeira e, algumas vezes, nos de Matemática da Educação Básica, sendo que,
geralmente, sem estar relacionado aos conteúdos de função exponencial ou progressão
geométrica.
Cabe ressaltar que as instituições financeiras, normalmente, trabalham com uma taxa
de referência anual i, que, dependendo do tipo de capitalização (diária, semestral, anual,
trimestral etc.), é dividida por n, onde n representa o número de “composições” necessárias
para alcançar um ano. Por exemplo, se a capitalização fosse trimestral, a taxa i seria dividida
por 4, pois são necessárias quatro capitalizações trimestrais para completar um ano. Podemos,
46
assim, generalizar que a taxa i ficará representada por i/n, onde n representa o número de
períodos necessários à composição anual. Convém ressaltar que o prazo da aplicação será
representado por nt períodos. Por exemplo, em uma capitalização trimestral por dois anos,
teríamos 2.4 = 8 trimestres.
Logo, respeitadas as considerações e notações feitas anteriormente, um capital inicial
C, após t anos, submetido a um crescimento sob taxa unitária anual i, em uma capitalização
que necessite de n composições para completar um ano, ficará transformado em um montante
M, dado por:
nt)n
i (1 . C M +=
Se a capitalização fosse anual, teríamos n = 1 e recairíamos na fórmula dos juros
compostos.
É importante observar que, ao contrário dos juros simples, em um investimento ou
financiamento qualquer feito no regime dos juros compostos (como ocorre tradicionalmente
no Brasil), não basta que o tempo e a taxa estejam expressos em uma mesma unidade. Nesse
caso, o mais importante é a forma como são capitalizados esses juros, ou seja, a periodicidade
da capitalização.
A título de exemplo, coloquemos em uma tabela os valores dos montantes M, gerados
por um capital inicial de $ 1000 unidades, sob uma taxa fixa anual de 6%, com diferentes
períodos de capitalização, aplicados por um ano (Tabela 1). Verificamos que a expressão
apresentada anteriormente ficará transformada em:
n)n
0,06 (1 . 1000 M +=
Período de Capitalização n i/n M
Anual 1 0,06 $1060,00
Semestral 2 0,03 $1060,90
Trimestral 4 0,015 $1061,36
Mensal 12 0,005 $1061,68
Semanal 52 0,00115 $1061,80
Diário 365 0,000164 $1061,83
Tabela 1 – Montante gerado em um ano por um capital de $1000, sob uma taxa fixa de 6% ao ano, submetido a distintos modos de capitalização.
47
Pela Tabela 1, notamos que o montante final será tão maior quanto maior a quantidade
de “capitalizações”. Nesse caso, o capital inicial submetido a um crescimento a juros
compostos e a uma mesma taxa fixa anual.
Um fato matemático ainda mais interessante surge quando analisamos essa mesma
situação em um caso hipotético de uma taxa de 100% ao ano, ou seja, i = 1 (na realidade, nos
dias de hoje, dificilmente encontraríamos essa taxa para algum investimento no Brasil),
aplicação por um ano de um capital inicial C =$ 1. A equação
nt)n
i (1 . C M +=
ficará transformada em:
n)n
1 (1 M +=
Repetindo a Tabela 1, com esses valores hipotéticos, teremos o constante na Tabela 2:
n 1/n M ($)
1 1 2
2 0,5 2,25
5 0,2 2,48832
50 0,02 2,69159
100 0,01 2,70481
1000 0,001 2,71692
10 000 0,0001 2,71815
100 000 0,00001 2,71827
1 000 000 0,000001 2,71828
10 000 000 0,0000001 2,71828
Tabela 2 – Montante gerado em um ano por um capital de $1, sob uma taxa fixa de 100% ao ano, submetido a distintos modos de capitalização.
Será que o padrão que obtivemos continua? Percebemos que há uma indicação de que
o valor do montante final ficará em torno de 2,71828 e que as modificações, conforme o
aumento de n, serão em dígitos cada vez menos significativos. Todos já conhecemos esse
número. Trata-se do número irracional e, que sabemos tem atormentado os alunos do Ensino
Médio nas aulas sobre logaritmos, quando elas são ministradas, e os alunos dos cursos
superiores nas aulas de Cálculo. Ainda é obscura a informação de quem teria inicialmente
percebido o comportamento da seguinte expressão, quando n tende ao infinito:
n)n
1 (1 +
48
Os livros de História da Matemática têm afirmado que, provavelmente, foi no início
do século XVII, por volta da época em que Napier inventou os logaritmos, que tal irracional
foi representado por e. Há, também, segundo Maor (2008), fortes indícios de que as
transações financeiras foram importantes para tal descoberta, pois foi uma época de grande
crescimento do comércio internacional e de proliferação de transações comerciais e
financeiras. Como muita atenção foi dada aos juros compostos, é provável que o número e
tenha sido reconhecido primeiramente nesse contexto.
Será que a relação do irracional e com as questões de juros compostos é trabalhada nas
aulas de Matemática da Educação Básica e dos cursos superiores? Será que, nas turmas de
formação de professores, discussões como a que relatamos costumam ser travadas,
aproveitando o uso metodológico da história da Matemática?
Temas importantes da Matemática escolar estão relacionados a questões financeiras e
ao cotidiano das pessoas. Na formação de professores, tais temáticas precisam ser abordadas,
fornecendo material importante e fecundo para as futuras aulas que esses professores
ministrarão.
No Brasil, a partir do início do século XIX, a introdução da Matemática Financeira
deve-se, principalmente, à fundação de Escolas de Comércio, Ciências Contábeis e
Administração e às Faculdades de Ciências Contábeis.
Antes do início dos anos de 1970, prevalecia um ensino de Matemática Financeira ou
Comercial amparado em tabelas financeiras ou em tábuas de logaritmos. Ainda hoje, nos
diversos concursos públicos existentes pelo país, cobra-se a manipulação e interpretação de
tabelas financeiras, já que o uso de calculadoras, normalmente, não é permitido.
Atualmente, com calculadoras, computadores, planilhas eletrônicas, a árida parte dos
cálculos é relegada a segundo plano e podemos focar o estudo nas interpretações e aplicações
da Matemática Financeira.
Nas pesquisas empreendidas, com o objetivo de verificar a existência da Matemática
Financeira nas matrizes curriculares dos cursos de Licenciatura em Matemática no Brasil,
assim como na experiência como professor de Matemática na Educação Básica e na Educação
Superior, verificou-se que essa matemática, em muitos casos, é relegada à condição de
matemática extraescolar e não costuma frequentar os bancos escolares, os livros didáticos
nem as matrizes dos cursos de Licenciatura em Matemática.
Outras questões importantes merecem destaque e, de certa forma, complementam a
preocupação com a Matemática Financeira e sua inserção nos currículos escolares e na
formação de professores:
49
• Qual o papel da Matemática na formação do aluno?
• Como motivá-los para o estudo da Matemática?
• Como a Matemática pode auxiliar na formação do cidadão?
Como referencial teórico para esta pesquisa e respectivas análises, sustenta-se a
proposta com os estudos, as análises e discussões oriundas de autores da Educação
Matemática Crítica.
2.3 Formação de Professores de Matemática na Perspectiva da Educação
Matemática Crítica
Convém que se tenha cuidado com o exagero de significado que, frequentemente,
atribui-se ao termo ‘professor reflexivo’, como se apenas isso resolvesse todos os problemas
educacionais, incluindo os relacionados à Matemática:
Muitas vezes se crê que, se os professores forem mais reflexivos sobre o que fazem, serão necessariamente melhores. Acredito que o esforço para preparar professores reflexivos, que se engajem na instrução centrada no aluno, tanto deve estimular o desenvolvimento genuíno do educador quanto apoiar a realização de mais equidade e justiça social na educação e na sociedade (ZEICHNER, 2003, p. 47).
Reitera-se que as ações pedagógicas dos educadores não têm como resolver, por si sós,
todos os problemas sociais, mas podem dar a sua importante parcela de contribuição para
construção de sociedades mais justas e felizes. Sabe-se que o ensino não é neutro e que os
educadores devem agir com clareza política e consciência de sua responsabilidade social.
É claro que essa ação docente estará sempre relacionada à formação do professor e tal
formação ocupará função destacada em todo esse processo:
A questão da formação dos profissionais da educação que vão atuar nos diversos níveis do sistema de ensino é objeto de permanente preocupação por parte de todos aqueles que se interessam pelos destinos da educação em qualquer sociedade. Não tem sido diferente no Brasil. Trata-se, sem nenhuma dúvida, de questão crucial para a área, uma vez que o cerne do processo educacional encontra-se, em última análise, nas relações concretas que se estabelecem entre educadores e educandos, nas quais a atuação participativa dos primeiros assume papel decisivo (SEVERINO, 2003, p. 71).
Sobre a formação de professores, no que tange ao conhecimento básico para a função,
Shulman (1986) destaca três categorias fundamentais: conhecimento da disciplina específica,
conhecimento curricular e conhecimento do conteúdo pedagógico. Acredita-se que tais
categorias são complementares e cada uma delas precisa da outra para o bom desempenho da
50
profissão. Nesta proposta, a preocupação não é só com “o que” ensinar, mas também com sua
integração com as demais disciplinas da matriz curricular e as metodologias adequadas para o
ensino.
A Matemática, em geral, é um instrumento importantíssimo para a tomada de decisões
(D’AMBROSIO, 2002) e se estas, para acontecerem, exigirem o acesso a conhecimentos que
possibilitem intervenção no mundo (FREIRE, 1996), então a Matemática Financeira pode ser
fundamental nesse processo de constituição de cidadãos críticos, éticos, solidários e
responsáveis, logo, defende-se que esteja sempre presente – e com características específicas
– na formação inicial de professores/educadores matemáticos.
2.3.1 Qual o papel do professor?
Será que o melhor professor é aquele que explica “tudo certinho”, sem dar tempo ou
chance ao seu aluno de perguntar, de ter dúvidas? A maioria dos professores, há cerca de 30
anos, com certeza, pensava dessa forma. Hoje, diante da complexidade e da velocidade das
mudanças que se processam no mundo, nas comunicações, nas relações de trabalho, nas
relações sociais e no conhecimento, acreditamos que – reconhecendo a importância da ação
do professor – o papel atribuído a ele deve ser o de mediador do processo de ampliação da
ação dos diferentes sujeitos sociais, contribuindo para torná-los protagonistas de suas próprias
histórias. Tal protagonismo deverá ser desenvolvido por meio de atividades significativas e
críticas.
Diante da liberdade de pensar e de agir, surge a necessidade do diálogo, do respeito ao
tempo de cada um, sem que isso signifique deixar o fraco como fraco, porque é o seu tempo,
mas partir do outro como uma pessoa que é um mundo de possibilidades e não um universo
de limitações. Isso exige do educador ir além de seu conteúdo específico, situando este em um
contexto mais amplo de questões identificadas com o aprender a aprender, aprender a ser,
aprender a fazer e aprender a conhecer.
Não há receitas nem fórmulas mágicas. Se existissem, tornariam homogêneo o que é
diferente, porque é fruto da relação dos homens entre si. Mas aí é que se instala o medo.
Todas essas colocações tornam o nosso papel muito complexo, remetendo-nos novamente à
condição de seres em processo contínuo de construção de seus saberes, lembrando-nos que
devemos estabelecer um diálogo contínuo com o conhecimento e com os sujeitos: educador-
pesquisador crítico reflexivo.
51
Essa forma de propor, organizar e coordenar o desenvolvimento das atividades dos
alunos substitui, com grande vantagem, a de “explicar a matéria”, escolhendo as famosas
listas de exercícios e realizando a avaliação por meio de um instrumento formal – a prova.
Consultando o dicionário “Novo Aurélio século XXI” (FERREIRA, 1999, p. 1656),
verifica-se que prova seria: “1 Aquilo que atesta a veracidade ou a autenticidade de alguma
coisa. [...]”. Que coisa seria essa? No senso comum de nossas escolas, a prova atestaria muitas
vezes a veracidade da limitação dos alunos, de seu fracasso, do pouco esforço, da falta de
interesse – o foco sempre nos alunos. Será que não poderíamos ampliar essa discussão e nela
inserir os sujeitos da prova, que, a nosso ver, não são somente os alunos que, “em princípio,
estariam ali para aprender”, mas também nos perguntarmos “por aquele que ensina”?
A questão é séria, porque, quando a iniciamos, em geral, ficam uns em posição de
ataque e outros em posição de defesa. Ora, não existem réus, o culpado não é o professor,
muito menos o aluno. São novos olhares para o conhecimento, para os saberes, para quem
ensina e quem aprende. São interrogações sobre os sentidos atribuídos à educação no mundo
de hoje.
Não se pode mais admitir a exclusão do direito à educação de todos os homens, porque
negar esse direito é negar outros direitos sociais intimamente relacionados ao capital cultural,
ao capital de informações, ao exercício da cidadania. Para que serve a escola? Para que serve
a educação ministrada em um espaço institucionalizado? Será que só consideramos os saberes
que se adquirem nos bancos escolares?
Não podemos desperdiçar a chance de, ao elaborar as situações de aprendizagem,
promover a reflexão dos alunos sobre as experiências e sobre os conhecimentos que forem
sendo construídos. Diante dessa perspectiva, o professor como “facilitador” (não no sentido
de entregar pronto, fácil) deverá buscar as melhores condições para que a aprendizagem
ocorra, já que são os alunos que devem aprender.
Quantas vezes já emitimos a famosa frase: “eu ensinei tudo, dei todo o programa”?
Como podemos afirmar isso, se, na maioria das vezes, os alunos não aprenderam, ou
aprenderam a responder apenas o que desejávamos que respondessem em uma prova ou teste,
sem conseguir verificar a importância, o significado ou mesmo fazer a transferência do que
foi “ensinado”?
Queremos, ainda, destacar que a função do professor sempre foi e continuará sendo
insubstituível, mesmo com tecnologias, métodos, manuais e programas supostamente
adequados. Só que tudo isso depende essencialmente da postura do professor, sem esquecer
que tal trabalho docente depende também da forma de gestão e de coordenação da escola,
52
bem como do uso adequado de todos os fóruns de discussão – como os conselhos de classe –
na busca de algo ainda não bem definido e para o qual não existem “receitas mágicas”.
É diante dessa perspectiva, do referencial aqui apresentado e sem deixar de considerar
as questões relacionadas à Educação Matemática Crítica, que norteamos esta pesquisa com a
Matemática Financeira na formação de professores, e que pautaremos a proposta para o
ensino dessa disciplina nos cursos de graduação em Licenciatura em Matemática.
3 MATEMÁTICA FINANCEIRA NAS LICENCIATURAS EM MATEMÁTICA
Com base nos teóricos da Educação Matemática Crítica e da Teoria Histórico-Cultural
da Atividade, objetiva-se justificar a proposta de inclusão da disciplina Matemática Financeira
nas Licenciaturas em Matemática. Também, neste capítulo, confrontaremos tal proposição
com propostas e sugestões constantes da legislação educacional brasileira que se relacionam,
de alguma forma, com a formação de professores.
3.1 Matemática Financeira nas Licenciaturas: o Porquê de sua Inclusão
Duas das hipóteses que conduziram esta pesquisa foram:
• Os cursos de formação de professores de Matemática não apresentam, na matriz
curricular, a disciplina Matemática Financeira.
• Quando essa disciplina está presente na matriz curricular, o enfoque é superficial ou
meramente técnico e da mesma forma como é ministrada para um profissional técnico
das áreas de Economia ou Administração de Empresas.
Ocorre que, mesmo tendo encontrado um percentual de 28,8% de presença da
disciplina nas matrizes investigadas, verifica-se que as hipóteses levantadas foram, de certa
forma, confirmadas com a pesquisa realizada por meio das entrevistas e da análise
documental relacionada a alguns cursos de Licenciatura em Matemática.
Sobre essa temática, Nasser (2010, p. 7) afirma:
[...] a maioria dos cursos de Licenciatura não inclui a Matemática Financeira em sua grade curricular. Como consequência, os professores não estão plenamente preparados para ensinar esse conteúdo, que não tem sido explorado nas salas de aula de modo adequado, evitando discutir situações financeiras reais e desafiadoras.
Skovsmose (2007) nos alerta para a ideologia da certeza na Matemática, destacando
que essa disciplina não pode ser nem ter a palavra final, mas que deve servir para construir
argumentos. Ela não serve apenas para resolver os problemas, mas também para criar
condições efetivas que favoreçam a reflexão e a compreensão das questões.
Segundo Borba e Skovsmose (1997), a ideologia da certeza é que sustenta o caráter de
neutralidade da Matemática, dando a ela um poder de palavra final e argumento definitivo em
diversas questões da sociedade. Segundo esses autores, essa neutralidade e infalibilidade
acabam sendo tomadas como lei nas decisões políticas, apontando sempre um provável
54
melhor caminho a ser seguido, não permitindo outras ideias, e definindo a Matemática como
soberana e linguagem do poder.
A Educação Matemática Crítica tem como um de seus objetivos o combate a essa
ideologia da certeza. Acredita-se que novas propostas nessa linha, como as ora apresentadas,
ajudem a combater a ideologia dominante e ofereçam novos caminhos e possibilidades,
ajudando a reflexão e o entendimento das questões.
A Matemática pode e deve apresentar informações que reflitam questões significativas
na e (da) sociedade, as quais, na maioria das vezes, não são aproveitadas pelos professores.
Essa forma de compreender a importância da Matemática na sociedade chama a atenção para
o fato de que os problemas matemáticos devem ter significado para o aluno, necessitam estar
ancorados em práticas sociais e articulados a dimensões da cultura individual e social.
Novos propósitos e novas tarefas, igualmente, apresentam-se aos professores: sem
abandonar a responsabilidade de ensinar, o professor pode trabalhar no sentido de associar
conhecimento, participação e transformação dos sujeitos envolvidos na prática pedagógica,
considerando-se um componente incisivo desse processo.
Acredita-se, igualmente, que a Matemática Financeira, associada aos acontecimentos
cotidianos, propicia ambientes de aprendizagem ricos e cenários propícios à investigação e
construção do conhecimento sob uma perspectiva crítica. A vida escolar, de certa forma,
precisa aproximar-se da vida fora da escola:
O problema, nesse caso, não é o do distanciamento entre as teorias sobre a escola e a realidade do dia a dia das escolas, mas sim o distanciamento entre a escola e o indivíduo enquanto um ser concreto. A atividade escolar é vista como algo que não faz parte da vida cotidiana do indivíduo, como algo estranho e até hostil a essa vida. O objetivo passa a ser, então, o de diminuir essa distância, aproximar a escola do cotidiano, fazer da educação escolar um processo de formação que prepare melhor o indivíduo para enfrentar os problemas do cotidiano (DUARTE, 2007, p. 37).
Tais reflexões nos remetem ao conceito de currículo e nas relações que ele tem com as
estruturas social e política nas quais docentes e discentes estão inseridos. Essas relações
apontam para o poder dessa sociedade na estruturação, definição e hierarquização de
conteúdos e metodologias. Isso é um indicador da influência das estruturas de poder
dominantes sobre a estruturação do currículo.
O aporte teórico para a presente proposta, além das já citadas Educação Matemática
Crítica e Etnomatemática, aponta também para importante área da Psicologia da Educação,
denominada Teoria da Atividade.
55
A Teoria Histórico-Cultural da Atividade (ou Teoria da Atividade) surgiu como um
desdobramento da Concepção Histórico-Cultural fundada por Lev Vygotsky e foi
desenvolvida por A.N. Leontiev (1903-1979) e seus seguidores.
Na Concepção Histórico-Cultural, a atividade é um conceito-chave, explicativo do
processo de mediação, que promove a mediação entre o homem e a realidade objetiva. O
homem não reage mecanicamente aos estímulos que se originam no meio – ao contrário, é
pela atividade que ele se põe em contato com os fenômenos do mundo, atuando sobre eles e,
de certa forma, transformando-os e sendo transformado por eles.
Uma das grandes premissas da Teoria da Atividade é que o desenvolvimento dos
processos psicológicos superiores no ser humano tem suas origens nas relações sociais do
indivíduo em seus contextos social e cultural.
Escorados nessa premissa, valorizaremos as atividades da área da Matemática
Financeira em um curso de Licenciatura em Matemática, como elementos de grande
importância para a formação de professores que atuarão na Educação Básica, sob uma
perspectiva crítica.
Vygotsky, Leontiev e seus seguidores ofereceram, de certa forma, um aporte teórico
com enfoque diferenciado para a didática. A Concepção Histórico-Cultural e a Teoria da
Atividade, no Brasil, refletem-se no trabalho dos professores em sala de aula. Daí, ser
importante filtramos quais dessas ideias estão contidas em propostas oficiais, publicações,
ementas, projetos pedagógicos e, principalmente, em abordagens teóricas e metodologias
utilizadas por docentes formadores de professores.
Resumidamente, a proposta de ensino ora apresentada para inclusão da Matemática
Financeira nos cursos de formação de professores de Matemática pretende contribuir para:
• Formar docentes que preparem seus alunos para que sejam cidadãos matematicamente
críticos, ativos e reflexivos.
• Formar docentes para um ensino de Matemática da Educação Básica que esteja, na
medida do possível, relacionado ao cotidiano das pessoas e que forneça aos educandos
a possibilidade de estarem em permanente estado de investigação crítica.
• Formar docentes para um ensino de Matemática na perspectiva da Educação
Matemática Crítica e com o aporte da Teoria da Atividade.
56
3.2 Legislação Educacional Brasileira e Formação de Professores
Desde 1996, com a promulgação da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº
9.394/96 (BRASIL, 1996), a discussão e formulação de propostas para as licenciaturas em
Matemática devem ter como referência, além de diretrizes, pareceres e resoluções específicas
para a licenciatura, os documentos discutidos e idealizados para a Educação Básica, que será
o campo maior de trabalho desses futuros professores de Matemática. É claro que todas as
propostas para as licenciaturas, além desse referencial oriundo da legislação, deve levar em
conta o quadro atual do ensino de Matemática na Escola Básica.
O objetivo é detectar indícios que reforcem nossas concepções acerca da disciplina
Matemática Financeira, sua relação com a Educação Matemática Crítica, sua inclusão nas
matrizes curriculares dos cursos de Licenciatura em Matemática e, consequentemente, sua
aplicabilidade como fator de contextualização, interdisciplinaridade e de construção de uma
cidadania crítica para a Escola básica.
3.2.1 Parecer CNE/CP 9/2001
Esse documento (BRASIL, 2002b), por contemplar a discussão sobre as diretrizes
curriculares nacionais para a formação de professores da educação básica, em nível superior,
curso de licenciatura, de graduação plena, mostra-se importante e complementar ao estudo da
Resolução CNE/CP 1, de 18 de fevereiro de 2002 (BRASIL, 2002a), sendo considerado peça
indispensável do conjunto das diretrizes curriculares nacionais instituídas pela citada
resolução.
Na “Apresentação” do parecer, em seu histórico e descrição, afirma-se que:
[...] O avanço e a disseminação das tecnologias da informação e da comunicação está impactando as formas de convivência social, de organização do trabalho e do exercício da cidadania. A internacionalização da economia confronta o Brasil com a necessidade indispensável de dispor de profissionais qualificados. Quanto mais o Brasil consolida as instituições políticas democráticas, fortalece os direitos da cidadania e participa da economia mundializada, mais se amplia o reconhecimento da importância da educação para a promoção do desenvolvimento sustentável e para a superação das desigualdades sociais. [...] (BRASIL, 2002b, p. 3).
O cenário tem sido, predominantemente, de grandes dificuldades para a educação,
independentemente de esforços isolados ou de legislações bem intencionadas. No Parecer
CNE/CP 9/2001, constam diversas referências às possíveis causas dessas dificuldades.
57
Dentre as referências que acreditamos mais se compatibilizam com a proposta ora
apresentada, no que se refere à formação de professores e, especificamente, sobre a
necessidade de mudanças curriculares e metodológicas, destacamos (BRASIL, 2002b, p. 4):
Entre as inúmeras dificuldades encontradas para essa implementação destaca-se o preparo inadequado dos professores cuja formação, de modo geral, manteve predominantemente um formato tradicional, que não contempla muitas das características consideradas, na atualidade, como inerentes à atividade docente, entre as quais se destacam:
• orientar e mediar o ensino para a aprendizagem dos alunos;
• comprometer-se com o sucesso da aprendizagem dos alunos;
• assumir e saber lidar com a diversidade existente entre os alunos;
• incentivar atividades de enriquecimento cultural;
• desenvolver práticas investigativas;
• elaborar e executar projetos para desenvolver conteúdos curriculares;
• utilizar novas metodologias, estratégias e materiais de apoio;
• desenvolver hábitos de colaboração e trabalho em equipe.
Consideramos que esse parecer deveria ser de conhecimento, análise e discussão de
todos os que trabalham com formação de professores, pois, além de apresentar possíveis
causas de entraves e falhas na formação de professores, sugere soluções para os problemas
existentes na formação inicial. Constam, ainda, nesse documento, várias referências à
necessidade de se priorizar a docência e relacionar teoria e prática.
3.2.2 Parecer CNE/CES 1302/2001
Esse parecer, aprovado em 6 de novembro de 2001 (BRASIL, 2001), definiu as
diretrizes curriculares nacionais para os cursos de matemática, bacharelado e licenciatura
(BRASIL, 2001).
A análise aqui levada a efeito se restringirá aos aspectos relacionados à licenciatura e
às convergências e sintonias com a proposta ora apresentada.
Os objetivos das diretrizes constantes nesse parecer são (BRASIL, 2001, p. 1):
- servir como orientação para melhorias e transformações na formação do Bacharel e do Licenciado em Matemática;
- assegurar que os egressos dos cursos credenciados de Bacharelado e Licenciatura em Matemática tenham sido adequadamente preparados para uma carreira na qual a Matemática seja utilizada de modo essencial, assim como para um processo contínuo de aprendizagem.
58
Acredita-se que a presente proposta se identifica com esses dois objetivos, pois o que
se pretende, de forma resumida, é a melhoria na formação do licenciado em Matemática e que
esta vise ao preparo adequado para a carreira docente.
Como principais características para o licenciado em Matemática, o Parecer CNE/CES
1302/2001 aponta (BRASIL, 2001, p. 3):
• visão de seu papel social de educador e capacidade de se inserir em diversas realidades com sensibilidade para interpretar as ações dos educandos;
• visão da contribuição que a aprendizagem da Matemática pode oferecer à formação dos indivíduos para o exercício de sua cidadania;
• visão de que o conhecimento matemático pode e deve ser acessível a todos, e consciência de seu papel na superação dos preconceitos, traduzidos pela angústia, inércia ou rejeição, que muitas vezes ainda estão presentes no ensino-aprendizagem da disciplina.
Novamente, verifica-se sintonia do constante nesse parecer e a proposta de inclusão da
disciplina Matemática Financeira nos cursos de Licenciatura em Matemática, na perspectiva
da Educação Matemática Crítica.
Também se observa sintonia da referida proposta com as competências e habilidades
requeridas para o educador matemático licenciado em Matemática, presentes nesse parecer
(BRASIL, 2001, p. 4):
a) elaborar propostas de ensino-aprendizagem de Matemática para a educação básica;
b) analisar, selecionar e produzir materiais didáticos;
c) analisar criticamente propostas curriculares de Matemática para a educação básica;
d) desenvolver estratégias de ensino que favoreçam a criatividade, a autonomia e a flexibilidade do pensamento matemático dos educandos, buscando trabalhar com mais ênfase nos conceitos do que nas técnicas, fórmulas e algoritmos;
e) perceber a prática docente de Matemática como um processo dinâmico, carregado de incertezas e conflitos, um espaço de criação e reflexão, onde novos conhecimentos são gerados e modificados continuamente;
f) contribuir para a realização de projetos coletivos dentro da escola básica.
No que diz respeito aos conteúdos curriculares para a licenciatura, o Parecer
CNE/CES 1302/2001 determina (BRASIL, 2001, p. 5):
59
Os currículos devem assegurar o desenvolvimento de conteúdos dos diferentes âmbitos do conhecimento profissional de um educador matemático, de acordo com o perfil, competências e habilidades anteriormente descritos, levando-se em consideração as orientações apresentadas para a estruturação do curso.
A organização dos currículos das IES deve contemplar os conteúdos comuns a todos os cursos de Matemática, complementados com disciplinas organizadas conforme o perfil escolhido do aluno.
Os conteúdos comuns a todos os cursos de licenciatura podem ser distribuídos ao
longo do curso, de acordo com o currículo proposto pela IES. Tais conteúdos são:
• Cálculo Diferencial e Integral
• Álgebra Linear
• Fundamentos de Análise
• Fundamentos de Álgebra
• Fundamentos de Geometria
• Geometria Analítica
Para os cursos de Licenciatura, o Parecer CNE/CES 1302/2001 (BRASIL, 2001, p. 8)
indica que a parte comum deve incluir:
a) conteúdos matemáticos presentes na educação básica nas áreas de Álgebra, Geometria e Análise;
b) conteúdos de áreas afins à Matemática, que são fontes originadoras de problemas e campos de aplicação de suas teorias;
c) conteúdos da Ciência da Educação, da História e Filosofia das Ciências e da Matemática.
Na realidade, o que se encontra, geralmente, é uma formação de professores que
valoriza o acúmulo de conteúdos. D’Ambrosio, em data anterior à promulgação dessa
legislação educacional, já alertava para esse fato:
O que se faz é acumular conteúdos e um jovem que entra num 1º ano universitário faz disciplinas que não diferem essencialmente do que se fazia há cem anos. Cálculo e Geometria Analítica feitos nos cursos universitários são praticamente os mesmos que se faziam no século passado, seguindo praticamente os mesmos passos e levando senão o mesmo, ainda mais tempo, com o argumento de que os estudantes que agora entram nas universidades são menos preparados do que os da geração anterior. [...] na realidade, o aluno passando por um currículo universitário de matemática não sentiu e não percebeu o impacto do mundo em que ele vive. Não sentiu quais são os problemas básicos que determinam a estrutura social à qual ele pertence (D’AMBROSIO, 1986, p. 22).
60
O futuro professor precisa reconhecer e conhecer também a Matemática existente no
cotidiano de seus alunos, procurando entender a forma como pensam e valorizando o seu
conhecimento, como preconiza a Etnomatemática, que apresenta muitos pontos de
convergência com a Educação Matemática Crítica.
Muzzi (2004), de certa forma, sintetiza isso quando afirma que no Programa
Etnomatemática busca-se uma ação não excludente e a inclusão da diversidade cultural.
Propõe, ainda, uma reorganização dos sistemas escolares, incluindo novas disciplinas que
visem a instrumentar para a construção do conhecimento e para facilitar a democratização e a
socialização.
Por outro lado, enquanto a Etnomatemática, ainda segundo Muzzi (2004), enfatiza
esse respeito à diversidade, a Educação Matemática Crítica destaca a questão política na
busca de uma educação democrática e cidadã.
A disciplina Matemática Financeira na formação de professores, por seu caráter de
aplicação na resolução de problemas cotidianos e por relacionar importantes conteúdos da
Matemática da Escola Básica, poderá contribuir positivamente para uma formação que discuta
criticamente, na busca de soluções, os problemas da estrutura social em que nossos alunos se
inserem.
3.2.3 Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Fundamental
Os Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs), cuja função é orientar os
planejamentos curriculares da Escola Básica, constituem-se em referências nacionais,
calcados nos conceitos de contextualização e interdisciplinaridade.
Baseando-se em leituras, nas respostas às questões das entrevistas e em conversas com
docentes de Matemática do Ensino Superior, constata-se, nesses profissionais, o hábito de
creditar as dificuldades detectadas nos alunos de cursos superiores à “falta de base” trazida da
Escola Básica. Entretanto, parece-nos que a abrangência desse tipo de problema é bem mais
ampla e envolve mais do que o conhecimento específico da disciplina Matemática ou suas
metodologias.
A esse respeito, Diniz e Smole (2002, p. 39) afirmam:
[...] no entanto, nos parece haver um equívoco em responsabilizar o fracasso dos alunos apenas pela falta do referencial matemática ou de uma base matemática bem estruturada, pois o que desejamos dos alunos vai além do conhecimento específico disciplinar, ou seja, dos conteúdos específicos.
61
Nossa primeira análise terá como foco os Parâmetros Curriculares Nacionais para o
Segundo Segmento do Ensino Fundamental (PCNEF), de 19983 (BRASIL, 1998).
Constatamos que muitas das ideias dos Parâmetros Curriculares Nacionais do Ensino
Fundamental, que dizem respeito à formação de professores de Matemática, estão, de alguma
forma, relacionadas às ideias centrais da Educação Matemática Crítica:
[...] pretende-se criar condições, nas escolas, que permitam aos nossos jovens ter acesso ao conjunto de conhecimentos socialmente elaborados e reconhecidos como necessários ao exercício da cidadania (BRASIL, 1998, p. 5).
Sobre os PCNs e a formação de professores de Matemática, Pietropaolo (2002, p. 34)
é de opinião que os referidos PCNs
[...] visam à construção de um referencial que oriente a prática escolar de forma que contribua para que toda criança e jovem brasileiros tenham acesso a um conhecimento matemático que lhes possibilite de fato sua inserção, como cidadãos, no mundo do trabalho, das relações sociais e da cultura. Como decorrência, os PCN de Matemática poderão nortear a formação inicial e continuada de professores, pois à medida que os fundamentos do currículo se tornam claros fica implícito o tipo de formação que se pretende para o professor [...].
Será que as matrizes curriculares e os projetos político-pedagógicos das licenciaturas
em Matemática no Brasil oferecem bases para que os futuros docentes sejam elementos ativos
na criação dessas condições?
Dentre os objetivos preconizados para o Ensino Fundamental, com este PCN
(BRASIL, 1998, p. 7-8) espera-se que os alunos sejam capazes de:
• compreender a cidadania como participação social e política, assim como exercício de direitos e deveres políticos, civis e sociais, adotando, no dia a dia, atitudes de solidariedade, cooperação e repúdio às injustiças, respeitando o outro e exigindo para si o mesmo respeito;
• posicionar-se de maneira crítica, responsável e construtiva nas diferentes situações sociais, utilizando o diálogo como forma de mediar conflitos e de tomar decisões coletivas;
[...]
• questionar a realidade formulando-se problemas e tratando de resolvê-los, utilizando para isso o pensamento lógico, a criatividade, a intuição, a capacidade de análise crítica, selecionando procedimentos e verificando sua adequação.
3 Em 1997, já haviam sido publicados os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Primeiro Segmento do
Ensino Fundamental, que não fazem parte deste estudo.
62
Ao proceder a uma análise crítica do conjunto das disciplinas que constituem a
maioria das matrizes para essas licenciaturas, verifica-se que nenhuma (ou quase nenhuma)
das disciplinas obrigatórias, ou mesmo optativas, fornece melhores condições para esse
questionamento crítico da realidade e para o preparo político e democrático dos
alunos/cidadãos que a Matemática Financeira, inserida em uma proposta de trabalho crítico e
com situações de investigação, análise e discussão.
Na Apresentação dos Parâmetros Curriculares Nacionais: Matemática (BRASIL, 2001,
p. 15), há um reforço dessas ideias, ao se afirmar que tais parâmetros:
Visam à construção de um referencial que oriente a prática escolar de forma a contribuir para que toda criança e jovem brasileiros tenham acesso a um conhecimento matemático que lhes possibilite de fato sua inserção, como cidadãos, no mundo do trabalho, das relações sociais e da cultura.
Complementando a ideia da inserção como cidadãos no mundo do trabalho, das
relações sociais e da cultura, os Parâmetros Curriculares Nacionais “adotam como critérios para
seleção dos conteúdos sua relevância social e sua contribuição para o desenvolvimento
intelectual do aluno, em cada ciclo” (BRASIL, 1998, p. 15-16).
Entretanto, perguntamos: Será que isso ocorre na prática? Será que os professores se
sentem realmente capacitados para tal seleção de conteúdos e metodologias ou simplesmente
se limitam a repetir o que lhes “ensinaram” na graduação, tendo como metodologia os
exemplos de aulas que frequentaram na Educação Básica e no Ensino Superior? Dessa forma,
o despreparo e a reprodução contribuem para fomentar mitos e crenças que se perpetuam em
relação à Matemática.
Ponte (1994, p. 25), sobre essa situação, comenta:
Reforçam-se assim as concepções sobre a Matemática dominantes na sociedade: é uma disciplina intrinsecamente difícil, sendo, em última análise, desculpável ter maus resultados. Para a maioria dos intervenientes – professores, alunos, pais, responsáveis da administração escolar – tudo isto resulta da própria natureza da Matemática. Há apenas que regular as coisas de modo a evitar excessos.
Os livros didáticos específicos para o Ensino Fundamental, em sua maioria, não
trazem muitas situações relacionadas ao cotidiano dos alunos e aquelas identificadas como
“contextualizadas” são, muitas vezes, forçadas e não encontradas no dia a dia – isso sem
comentar os erros cometidos quando se trata de conteúdos relacionados à Matemática
Financeira.
63
Tais publicações não levam em conta, também, fatores fundamentais na vida das
pessoas que convivem com a inflação, por exemplo, assim como não consideram o importante
conceito de “valor do dinheiro no tempo”. Quantas vezes já vimos nos tradicionais livros
adotados situações do tipo: “Pagou em 12 prestações de R$100,00; logo, pagou R$1.200,00”?
Será? Será que os R$100,00 da primeira prestação terão o mesmo poder de compra que os
R$100,00 da última prestação? Será que em uma economia com existência de inflação, 12
parcelas de R$100,00 correspondem a um valor total de R$1.200,00?
O que temos constatado é que há, de maneira geral, no Ensino Fundamental, um
ensino de Matemática com preocupação central na preparação para estudos posteriores, onde
não se costuma levar em conta apenas o desenvolvimento das competências básicas
necessárias ao cidadão e que tem como principal base de sustentação os livros didáticos.
Ao discutir o quadro atual do ensino de Matemática no Brasil, apontando a falta de
uma formação profissional qualificada, os Parâmetros Curriculares Nacionais denunciam tal
prática:
[...] A formação dos professores, por exemplo, tanto a inicial quanto a continuada, pouco tem contribuído para qualificá-los para o exercício da docência. Não tendo oportunidade e condições para aprimorar sua formação e não dispondo de outros recursos para desenvolver as práticas da sala de aula, os professores apoiam-se quase exclusivamente nos livros didáticos, que, muitas vezes, são de qualidade insatisfatória (BRASIL, 1998, p. 21-22, grifos nossos).
Com relação à construção da cidadania, os PCNs ressaltam a importância do papel da
Matemática como vetor de transformação:
[...] é importante que a Matemática desempenhe, no currículo, equilibrada e indissociavelmente, seu papel na formação de capacidades intelectuais, na estruturação do pensamento, na agilização do raciocínio do aluno, na sua aplicação a problemas, situações da vida cotidiana e atividades do mundo do trabalho e no apoio à construção de conhecimentos em outras áreas curriculares (BRASIL, 1998 p. 28).
Escola cidadã, na concepção de Paulo Freire (1998), é aquela que prepara os
estudantes para tomada de decisões. A ideia de escola cidadã entrou em evidência nos anos de
1990, relacionada a temáticas como: autonomia da escola; escola, cultura e trabalho; escola e
comunidade; interdisciplinaridade; formação continuada de professores.
Quanto aos objetivos específicos do ensino de Matemática para o Ensino
Fundamental, constantes nos PCNs (BRASIL, 2001), visando à construção da cidadania,
encontramos que o aluno deve ser levado a utilizar a Matemática como meio para
64
compreender e transformar o mundo a sua volta; interpretar esse mundo por meio de aspectos
quantitativos e qualitativos; produzir informações e interpretá-las criticamente; comunicar-se
matematicamente e resolver problemas com procedimentos próprios da área e de instrumentos
tecnológicos; interligar a Matemática a outras áreas do conhecimento; ter segurança de sua
capacidade de construir conhecimentos matemáticos; aprender a agir de forma cooperativa e
solidária.
Portanto, para uma boa compreensão e visão crítica do mundo, em seu contexto
sociopolítico, faz-se necessário o conhecimento de diversos conceitos e ferramentas
matemáticas. Para isso, é fundamental uma análise crítica acerca dos cursos de formação de
professores de Matemática, de suas matrizes curriculares e de seus projetos político-
pedagógicos.
Não se está desmerecendo a importância dos conteúdos específicos inerentes à
Matemática e que são ensinados no Ensino Fundamental, os quais os professores estão
habituados a ensinar e a aprender. As licenciaturas abordam técnicas, algoritmos, operações,
equações etc. Porém, será que somente com esses conhecimentos o professor da Escola
Básica cumprirá o importante papel de preparar o estudante para solucionar os problemas da
vida cotidiana? Será que apenas tendo decorados todos os casos de produtos notáveis e
fatoração, todas as regras de potenciação, todos os métodos de mínimo múltiplo comum
(MMC) e máximo divisor comum (MDC), todos os tipos de expressões algébricas, os alunos
estarão preparados para exercer a cidadania plena?
Como que em resposta a esses questionamentos, D’Ambrosio declara:
O que eu acho é que há algo de errado com a matemática que estamos ensinando. O conteúdo que tentamos passar adiante através dos sistemas escolares é obsoleto, desinteressante e inútil (D’AMBROSIO, 1991, p. 1).
3.2.4 Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio
De acordo com os Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio (BRASIL, 2000),
a Matemática está inserida na área das Ciências da Natureza e suas Tecnologias. A atenção
desse importante documento é para dois focos distintos: o caráter formativo e o aspecto
instrumental da Matemática:
A Matemática no Ensino Médio tem um valor formativo, que ajuda a estruturar o pensamento e o raciocínio dedutivo, porém também desempenha um papel instrumental, pois é uma ferramenta que serve para a vida cotidiana e para muitas tarefas específicas em quase todas as atividades humanas (BRASIL, 2000, p. 40).
65
Nesse documento (BRASIL, 2000, p. 42), são apontadas diversas finalidades para a
Matemática. Destacaremos alguns objetivos relacionados à temática da Matemática
Financeira, com os quais se propõe levar o aluno a:
• aplicar seus conhecimentos matemáticos a situações diversas, utilizando-os na interpretação da ciência, na atividade tecnológica e nas atividades cotidianas;
• analisar e valorizar informações provenientes de diferentes fontes, utilizando ferramentas matemáticas para formar uma opinião própria que lhe permita expressar-se criticamente sobre problemas da Matemática, das outras áreas do conhecimento e da atualidade;
• desenvolver as capacidades de raciocínio e resolução de problemas, de comunicação, bem como o espírito crítico e criativo;
• estabelecer conexões entre diferentes temas matemáticos e entre esses temas e o conhecimento de outras áreas do currículo;
• promover a realização pessoal mediante o sentimento de segurança em relação às suas capacidades matemáticas, o desenvolvimento de atitudes de autonomia e cooperação.
Os Parâmetros Curriculares Nacionais: Ensino Médio preceituam, ainda, que se
interpretem informações e seus significados (tabelas, gráficos e expressões). Defendem que
tais informações devam estar relacionadas a contextos socioeconômicos ou ao cotidiano e
formular questões a partir de situações da própria realidade e compreender aquelas já
enunciadas.
Acreditamos que nenhuma outra área da Matemática Aplicada seja mais adequada ao
atendimento dessas orientações que a Matemática Financeira. Ao mesmo tempo, temos
consciência de que nenhum documento, projeto, proposta, metodologia, por melhor que seja,
terá resultado eficaz se não tiver reflexos na formação dos professores. Tal preocupação
também se faz presente nos PCNEMs, onde constam diversas declarações que nos remetem à
formação de professores. No caso específico da Matemática, declara-se:
Entre os maiores desafios para a atualização pretendida no aprendizado de Ciência e Tecnologia, no Ensino Médio, está a formação adequada de professores, a elaboração de materiais instrucionais apropriados e até mesmo a modificação do posicionamento e da estrutura da própria escola, relativamente ao aprendizado individual e coletivo e a sua avaliação (BRASIL, 2000, p. 49).
66
Outro ponto de destaque diz respeito à contextualização no Ensino Médio. Os
PCNEMs consideram de fundamental importância o estabelecimento de conexões entre os
distintos temas da Matemática e entre esta e as outras áreas do conhecimento.
Diniz e Smole (2002, p. 40), sobre a contextualização sugerida nos PCNEMs
comentam:
[...] a contextualização do conhecimento sinaliza na direção de buscar conhecimentos próximos ao vivencial dos alunos, da escola e de sua comunidade, de modo a dar significado ao que se aprende e evidenciar que as aprendizagens escolares permite um novo olhar para o mundo à volta do aluno. [...] trabalhar a partir de contextos é quase sempre uma tarefa interdisciplinar, pois a realidade é, em geral, complexa e multifacetada.
Os argumentos apresentados, a partir de análise da legislação educacional brasileira,
objetivam reforçar a necessidade de que tais reflexões, análises e sugestões ocupem espaço
nas salas de aula dos cursos de formação de professores. Nossa defesa é que sejam feitas,
entre outras, por intermédio da disciplina Matemática Financeira.
3.3 Produção Acadêmica na Área de Matemática Financeira/Educação Matemática
Crítica a Partir da Proposta Objeto Desta Pesquisa
Em minha prática docente, tenho ministrado conteúdos relacionados à Matemática
Financeira desde o final dos anos de 1980. Inicialmente, essa prática se dava apenas com
alunos da Escola Básica e/ou por meio de oficinas realizadas em eventos da área de Educação
Matemática. No que diz respeito à Licenciatura em Matemática, a experiência começou em
2003, na Universidade Severino Sombra (USS), na cidade de Vassouras (Rio de Janeiro),
como disciplina obrigatória. Nos anos seguintes, surgiu a oportunidade de lecionar essa
disciplina em cursos de pós-graduação lato sensu em Educação Matemática e, a partir de
2010, no Mestrado Profissional em Educação Matemática da mesma instituição, como
disciplina optativa.
Ao trabalhar de forma contextualizada, relacionando a Matemática Financeira a
diversos conteúdos clássicos da Escola Básica, percebi que a disciplina se tornava bastante
atrativa para licenciandos e mestrandos, o que se comprovou, ao longo dos anos, com a
procura de estudantes interessados em pesquisar o tema, realizar trabalhos de conclusão de
curso, apresentar o assunto em eventos, publicar artigos em revistas da área etc.
67
A produção4 na área de Matemática Financeira/Educação Matemática Crítica, a partir
da proposta objeto desta pesquisa, constitui-se em trabalhos realizados de forma isolada ou
em parceria com colegas professores ou alunos, os quais são discriminados no Apêndice A.
3.4 Investigando as Licenciaturas em Matemática
Objetivando descrever algumas características das seis instituições de ensino superior
(IES) que constituíram a amostra desta pesquisa, apresenta-se o recorte levado a efeito em
suas matrizes curriculares e respectivos projetos político-pedagógicos das Licenciaturas em
Matemática, visando a investigar o posicionamento da disciplina Matemática Financeira
nessas IESs, assim como analisar ementas, cargas horárias e referências bibliográficas
constantes das matrizes curriculares (Quadro 3).
Instituição Rede Região Turno/Vagas
Anuais
Faculdade C Privada Sul Noturno / 100
Centro Universitário N Privada Norte Noturno / 100
Universidade U Privada Sul Noturno / 100
Centro Universitário J Privada Nordeste Matutino / 100
Noturno / 100
Universidade A Privada Sudeste Noturno / 100
Universidade F Pública / Federal Sudeste Noturno / 60
Quadro 3 – Algumas características das IESs avaliadas.
Simultaneamente, confrontou-se o projeto político-pedagógico do curso (PPPC) com
as respostas dadas nas entrevistas realizadas com coordenadores e professores dos cursos.
O objetivo, com esta pesquisa de caráter qualitativo, foi o de cruzar informações, em
um processo de triangulação, visando a aferir a convergência dos dados coletados.
Em uma primeira análise, observa-se que em todas as IESs o curso de Licenciatura em
Matemática é oferecido no período noturno; apenas em uma delas o curso é oferecido em dois
turnos – manhã e noite. Constata-se5 que tal característica é bastante comum na oferta de
licenciaturas no Brasil, o que, de certa forma, justifica-se pela procura dessa modalidade de
graduação por alunos trabalhadores.
4 Disponível em: < http://lattes.cnpq.br/4743520011111183)>. 5 Paralelamente a esta pesquisa, com a vivência de avaliação de cursos de Licenciatura em Matemática pelo
SINAES (INEP/MEC), tem-se verificado, in loco, a predominância das licenciaturas no período noturno.
68
3.4.1 Faculdade C
Essa IES é uma faculdade privada, da Região Sul do Brasil. Com 12 anos de
existência, oferece 13 cursos de graduação e nove cursos de pós-graduação lato sensu.
Nessa instituição, o curso é de Licenciatura em Matemática com ênfase em
Informática. Trata-se de um curso noturno, com 100 vagas anuais e regime semestral. A
integralização do curso tem duração mínima de oito semestres e, máxima, de 14 semestres.
A disciplina Matemática Financeira é ministrada no sexto período do curso, com 40
horas de carga horária.
Na introdução do projeto político-pedagógico do curso, observa-se preocupação com
as orientações da LDBEN nº 9394/96, no que diz respeito à formação para a atividade
docente, dentre as quais o preparo para:
– o ensino visando à aprendizagem do aluno;
– o acolhimento e o trato da diversidade;
– o exercício de atividades de enriquecimento cultural;
– o aprimoramento em práticas investigativas;
– a elaboração e a execução de projetos de desenvolvimento dos conteúdos curriculares;
– o uso de tecnologias da informação e da comunicação e de metodologias, estratégias e materiais de apoio inovadores;
– o desenvolvimento de hábitos de colaboração e de trabalho em equipe.
Além da preocupação de que os cursos de formação busquem competências
necessárias à atuação profissional, há o objetivo de formar docentes que tenham compreensão
de que (como também consta na LDBEN nº 9.394/96) a Matemática é essencial para o
cidadão agir como consumidor prudente ou tomar decisões em sua vida pessoal e profissional.
Na análise da matriz do curso e no planejamento da disciplina de Matemática
Financeira, será verificado se essa disciplina está de acordo com tal perspectiva e se pode
assumir, dentro da formação inicial, esse importante papel formador.
Em seu planejamento para o período 2009.2, são estes os objetivos listados:
69
• Resolver problemas que envolvam porcentagens, juros simples e compostos.
• Analisar e comparar situações que envolvam lucro sobre o custo com lucro sobre a venda.
• Diferenciar e aplicar as várias formas de amortizações; calcular – em cada uma delas – juros, prestações.
• Amortizações, saldo devedor e outros em um período qualquer.
• Desenvolver atividades que possibilitem a compreensão dos diferentes tipos de cálculos de depreciações.
• Construir tabelas.
• Identificar correções monetárias.
• Propor atividades para corrigir amortização de dívidas.
• Identificar problemas de análise de investimentos e resolvê-los.
Não se identifica, nessa listagem, qualquer objetivo que se relacione especificamente à
formação de professores de Matemática, assim como não se detecta qualquer relação dessas
temáticas com a Matemática da Escola Básica – local para onde os futuros professores estão
sendo preparados para o exercício da docência.
Como justificativa para a disciplina Matemática Financeira nesse curso, encontra-se
registrado em seu PPPC:
A disciplina possibilita ao aluno conhecer e aplicar as técnicas instrumentais da Matemática Financeira, a partir do estudo da aplicação de Porcentagem nas transações comerciais; Investimentos empresariais sob ótica de capitalização simples e capitalização composta; Desconto simples e composto quando na antecipação de pagamentos; Estudo da amortização e depreciação de bens, na aplicação de formulação de alternativas de investimentos de Capital e de Produção.
Não nos foi possível, também, identificar qualquer referência à formação de
professores e sobre as possibilidades da Matemática Financeira como elemento de
contextualização e construção da cidadania. De nada adianta o projeto político-pedagógico do
curso afirmar que as disciplinas devem propiciar condições para a formação de cidadãos
críticos, assim como relacionar as distintas áreas da Matemática a outras áreas do
conhecimento, se, na prática, as disciplinas do curso não explicitarem objetivos e
metodologias que favoreçam tais condições.
Os conteúdos listados são os clássicos da Matemática Financeira, os quais, geralmente,
são desenvolvidos na maioria dos cursos. Constitui-se em um elenco de tópicos e técnicas da
Matemática Financeira, nos quais não se percebe qualquer tipo de preocupação com o fato de
se tratar de uma Licenciatura em Matemática.
70
O que poderia ser considerado um diferencial desse curso está no item denominado
‘interdisciplinaridade’:
A interdisciplinaridade se dará por meio da Plataforma Moodle. Está aberto um Espaço Virtual em que todos os alunos e professores do curso estão cadastrados; haverá 5 seções, uma em que discutiremos questões gerais, e outras quatro, uma para o 2º semestre, uma para o 4º, uma para o 6º e a última para o 8º semestre.
Os professores de cada semestre se reunirão quinzenalmente para poderem levantar questões que abarcam mais de uma disciplina daquele semestre. Todos os professores assumiram o compromisso de se pronunciarem ao menos uma vez por semana para poder interagir com outros professores que trabalham no mesmo semestre e também com os alunos.
No que se refere à avaliação da disciplina Matemática Financeira, a nota bimestral é
composta por:
• Uma prova bimestral, com valor de cinco pontos.
• Duas avaliações formativas, com valor de 1,5 ponto cada.
• Dois trabalhos (totalizando dois pontos).
A bibliografia básica do curso é composta por dois livros da área de Matemática
Financeira (ambos publicados em 1998).
Já a bibliografia complementar é constituída por sete livros, sendo que apenas um
deles com edição pós-2000.
3.4.2 Centro Universitário N
Essa IES privada, localizada em uma capital brasileira da Região Norte, tem 23 anos
de existência. Ministra 42 cursos de graduação, cerca de 30 cursos de pós-graduação lato
sensu e três de pós-graduação stricto sensu (mestrado). A IES conta com mais de mil
colaboradores e aproximadamente 16 mil alunos.
O curso de Licenciatura em Matemática está implantado na IES desde 2002, tendo o
seu reconhecimento ocorrido em outubro de 2005. Trata-se de curso noturno, onde são
oferecidas 100 vagas anuais.
Nessa IES, a disciplina Matemática Financeira tem uma carga horária de 60 horas
semestrais.
Em entrevistas realizadas com a coordenação do curso de Licenciatura em Matemática
e o docente que ministra a disciplina, apurou-se que:
71
• A disciplina Matemática Financeira consta da matriz curricular desde a implantação
do curso na IES, ou seja, desde 2002.
• A inclusão da disciplina, assim como uma ampla discussão da matriz curricular, foi
realizada pela coordenação com toda a equipe de professores.
• Ao longo desses nove anos do curso, a disciplina Matemática Financeira tem mantido
uma taxa média de reprovação em torno de 20%.
• O docente e os alunos utilizam os recursos tecnológicos de planilhas eletrônicas e
calculadoras.
• Metodologicamente, a relação com o cotidiano das pessoas e a Matemática Financeira
é feita por meio de exemplos e aplicações.
• A disciplina é ministrada especificamente para o curso de Matemática, sem
compartilhamento com a mesma disciplina ministrada para outros cursos.
• O coordenador do curso tem mais de 40 anos de experiência no magistério superior e
cursou Matemática Financeira em sua graduação.
• O coordenador e o docente responsável pela disciplina não conhecem qualquer livro
didático específico, voltado para a Matemática Financeira na formação de professores.
• O docente responsável pela disciplina também cursou Matemática Financeira em sua
graduação e tem quatro anos de experiência no magistério superior.
Na introdução do projeto político-pedagógico do curso de Licenciatura em Matemática
do Centro Universitário N, encontramos em destaque e como descrição da proposta do curso:
O Curso de Licenciatura em Matemática do Centro Universitário N está estruturado para formar Professores de Matemática capazes de enfrentar, com êxito, os desafios do século XXI. O Licenciado terá oportunidade de receber sólida formação de conteúdos matemáticos e psicopedagógicos, de adquirir visão tanto de seu papel social de educador como do que representa a aprendizagem da Matemática para a formação da cidadania. Paralelamente ao desenvolvimento da prática docente de forma orientada trabalha-se a criatividade, a autonomia intelectual e a flexibilidade do pensamento matemático.
Na matriz curricular do curso não se identificou qualquer disciplina que apontasse para
o atendimento aos objetivos discriminados no PPPC.
Nos objetivos do curso, constata-se a mesma listagem clássica encontrada,
normalmente, nos cursos de Administração de Empresas ou Economia. Verifica-se aqui a
preocupação apenas com o conhecimento específico do conteúdo, não se contemplando as
demais dimensões do conhecimento profissional docente, como o conhecimento pedagógico
do conteúdo. A listagem de objetivos encontrada foi:
72
• Proporcionar aos discentes situações que permitam o uso de recursos da Matemática Financeira e suas aplicações e entender o mundo do mercado financeiro, objetivando apoiar o processo de tomada de decisão.
• Identificar problemas envolvendo juros simples e juros compostos.
• Diferenciar taxa efetiva de juros simples e composto em uma operação de desconto simples e composto com taxa nominal.
• Identificar problemas de rendas uniformes e em progressão aritmética: postecipadas, antecipadas e diferidas.
• Diferenciar os vários Sistemas de Amortização de Dívidas; calcular em cada um deles: saldo devedor, amortização, encargos financeiros e prestação em um período qualquer do financiamento ou empréstimo.
Não nos foi possível entender o quarto objetivo da lista, pois não há, no mercado
financeiro brasileiro, qualquer relação entre rendas uniformes e progressões aritméticas.
Como procedimentos metodológicos, o planejamento da disciplina indica:
• Aulas expositivas
• Utilização da lousa
• Aulas de exercícios
• Retroprojeção
• Estudo de casos
Nesse caso, considera-se ter havido mistura de metodologia com recursos didáticos.
O processo de avaliação do curso constitui-se em duas atividades por etapa do curso:
um trabalho escrito e uma prova institucional.
São indicados como referências bibliográficas seis livros, sendo três referências
básicas e três complementares. Além de as edições desses livros não serem recentes, nenhum
dos autores indicados demonstra preocupação com a formação de professores de Matemática,
já que os livros específicos da área de Matemática Financeira são os mesmos adotados em
cursos de Economia e Administração de Empresas.
3.4.3 Universidade U
A Universidade U, privada, possui características especiais por ter sido originada da
fusão de outras instituições da Região Sul do Brasil. Verifica-se forte participação
comunitária e realizações na área social. A IES, que tem mais de 40 anos de existência, tem
seis unidades com abrangência de cerca de 110 municípios. Totaliza mais de 16 mil alunos,
distribuídos em 43 cursos de graduação e 70 cursos de pós-graduação (lato sensu e stricto
sensu).
73
O curso de Licenciatura em Matemática tem regime semestral, com créditos de 15
horas. O curso é noturno, com 100 vagas anuais. Tem prazo mínimo de integralização de oito
semestres (quatro anos) e prazo máximo de 14 semestres (sete anos).
Em entrevista realizada com a coordenação do curso, verifica-se que a disciplina
Matemática Financeira tem sido mantida como obrigatória na matriz curricular há 12 anos,
apesar das diversas atualizações realizadas na referida matriz, e que a inclusão desta ou de
qualquer outra disciplina no curso deriva de amplas discussões realizadas no Colegiado de
Departamento.
Segundo a coordenação, essa disciplina apresenta pequena taxa de reprovação e, por
estar relacionada ao cotidiano das pessoas, tem gerado grande interesse nos licenciandos do
curso.
Outra informação obtida na entrevista (que não seria perceptível apenas pela análise
do PPPC ou do planejamento da disciplina) é que essa disciplina, na Licenciatura em
Matemática, não é compartilhada com outros cursos e que tem sido dada ênfase à Educação
Financeira e às contextualizações envolvendo conteúdos matemáticos da Escola Básica, como
funções, logaritmos, progressões etc., fato esse que se afina com a presente proposta e que se
considera de fundamental importância.
Ao longo desses 12 anos, a disciplina foi ministrada por docentes com formação
inicial em Licenciatura em Matemática, que cursaram Matemática Financeira em sua
graduação. Segundo a coordenadora, por conta do enfoque dado a esse curso, diversos
trabalhos de conclusão de curso têm focado temáticas relacionadas à Matemática Financeira e
à Educação Financeira.
Em entrevista com o docente que ministra a disciplina Matemática Financeira,
confirmaram-se as informações prestadas pela coordenação, além de se apurar que:
• O docente ministra a disciplina desde 2008; como as turmas são pequenas, até hoje já
cursaram com esse professor 50 alunos; destes, apenas um foi reprovado na disciplina.
• Como recursos didáticos, o docente tem utilizado calculadoras financeiras (ou
simuladores) e planilhas eletrônicas.
• O professor procura, sempre, relacionar os conteúdos da disciplina ao cotidiano das
pessoas; para isso, jornais diários e revistas semanais são usados como ponte para os
assuntos a serem trabalhados em cada aula.
• Pela análise de notícias e de livros didáticos da Educação Básica, os alunos são
induzidos a amplo debate sobre temáticas relacionadas à Educação Financeira.
74
• A disciplina tem sido ministrada sem compartilhamento, devido à sua especificidade
na Licenciatura em Matemática.
• O docente, com 12 anos de experiência no ensino superior e oito anos de experiência
na Escola Básica, tem licenciatura em Matemática e em Física, mestrado em
Matemática Aplicada e Doutorado em Engenharia Mecânica.
• Nas graduações ou pós-graduações, o docente não cursou qualquer disciplina
relacionada à Matemática Financeira.
• O docente alega não conhecer qualquer livro específico de Matemática Financeira para
a formação de professores de Matemática.
Como nessa instituição encontramos melhores condições de planejamento da
disciplina Matemática Financeira na Licenciatura em Matemática, é importante que se registre
a opinião da coordenação do curso sobre a importância da disciplina na formação de
professores:
Atualmente, já percebemos mais claramente o importante papel do professor de Matemática no que se refere à Educação Financeira em nível básico. A população adulta de nosso país não foi educada nos tempos escolares para tomar decisões que envolvem aspectos financeiros e facilmente encontramos casos de endividamentos que poderiam ter sido evitados por simples conhecimentos da área financeira. Hoje, precisamos proporcionar ao aluno uma educação financeira útil e aplicável à vida contemporânea e esta incumbência está fortemente relacionada ao trabalho do professor de Matemática; sendo assim, não há como se pensar/planejar a formação de professores de Matemática sem ao menos oferecer uma disciplina de Matemática Financeira.
Constata-se nesse curso um projeto político-pedagógico bem fundamentado, em que se
respeita a legislação específica, com carga horária adequada ao seu propósito. Em seus
Fundamentos Ético-Políticos consta:
[...] O Curso de Matemática tem em seus fundamentos ético-políticos a visão da necessidade da construção de uma sociedade que seja de fato democrática, na qual a participação dos cidadãos não fique restrita ao exercício do voto, mas que seja ampliada à conquista dos direitos e à defesa dos deveres de cada um, tornando-se, assim, um aprendizado constante. O resultado de tal prática espera-se que seja a formação de profissionais cuja consciência e prática social estejam voltadas para defesa e construção de uma sociedade mais justa e mais solidária, na qual aspectos como o conhecimento, e serviços como educação e saúde, sejam de acesso livre a todas as camadas sociais e não apenas a um pequeno número de privilegiados.
75
Analisando-se a matriz curricular dessa licenciatura, observa-se que na disposição da
disciplina Laboratório de Ensino de Matemática, dos estágios curriculares em Ensino de
Matemática, bem como das disciplinas pedagógicas (Didática, Metodologias, Planejamento e
Gestão Educacional, Política Educacional e Organização da Educação Brasileira) objetiva-se
propiciar uma integração do graduando com as escolas de educação básica, principais
entidades de atuação do professor de Matemática.
Nos objetivos do curso, constata-se a mesma listagem clássica existente em cursos de
Administração de Empresas e Economia, novamente priorizando-se o conhecimento
específico do conteúdo em detrimento a outras dimensões importantes para a formação de
professores. Os objetivos listados, são:
• Desenvolver os cálculos e as aplicações no sistema de capitalização composta e desconto composto, em situações que envolvam o contexto econômico atual.
• Desenvolver habilidades para aplicação e resolução de problemas sobre os vários tipos de renda e possibilitar a analise dos diversos sistemas de amortização, selecionando a melhor opção para cada tipo de investimento.
Na metodologia explicitada no planejamento do curso, verifica-se a indicação positiva
do uso de recursos, como: laboratório de informática e calculadora financeira HP 12C.
Indicam, ainda, o uso de aulas expositivo-dialogadas.
O processo de avaliação do curso constitui-se em trabalhos de avaliação individual e
em grupos.
Nas referências bibliográficas de Matemática Financeira, também sem qualquer
indicação específica para formação de professores, o livro mais recente entre os indicados tem
edição de 2002. Todos os demais são publicações das décadas de 1980 e 1990.
3.4.4 Centro Universitário J
O Centro Universitário J, privado, localizado na Região Nordeste do Brasil, tem 12
anos de existência e três campus. Na graduação, são oferecidos 45 cursos e, na pós-graduação
e extensão, 20 cursos. A Licenciatura em Matemática é oferecida nos turnos da manhã e da
noite, com 200 vagas anuais (100 em cada turno).
Nessa IES, a disciplina Matemática Financeira, na Licenciatura em Matemática, é
ministrada com carga horária semestral de 40 horas, com duração total de sete períodos
semestrais.
76
Na entrevista realizada com o coordenador do curso, detectou-se que a disciplina
Matemática Financeira tem sido mantida na matriz curricular desde 2003, quando o curso foi
implantado na instituição. Em 2007, por decisão do Colegiado do curso, a disciplina teve sua
denominação mudada para Matemática Financeira e Análise de Investimentos.
Segundo a coordenação, ao longo dos oito anos do curso, a disciplina Matemática
Financeira tem mantido aprovação média de 87% dos alunos.
Como recursos específicos ao curso, têm sido utilizados: máquina HP 12C; emulador
gratuito da máquina HP 12C instalado nos computadores do Laboratório de Matemática;
software MS Excel.
Embora no planejamento da disciplina não seja explicitado, as informações
disponibilizadas pela coordenação do curso apontam para o fato de que a disciplina tem sido
ministrada com a preocupação de relacionamento com a Educação Financeira e o cotidiano
das pessoas.
Repetem-se nessa instituição os objetivos clássicos dos cursos da área de
Administração de Empresas e Economia, sem preocupação específica com a formação de
professores. Destaca-se a relação que se faz à modelagem matemática e ao uso de tecnologias:
• Estudar e fundamentar os procedimentos financeiros atuais utilizados no cotidiano, destacando o papel dos modelos matemáticos e das tecnologias informáticas.
• Compreender os fundamentos da matemática financeira, aplicando as técnicas de valor futuro e valor presente sobre as operações de empréstimos, financiamentos e aplicações financeiras.
Observa-se uma preocupação (positiva) em se detalhar a metodologia do curso e
também com o uso de tecnologias:
O curso será apresentado através de exposição do conteúdo programático nas aulas teóricas, enfatizando o maior número possível de exercícios e aplicações importantes em diversas áreas do conhecimento. Para cada tópico será escolhida uma abordagem convergente, o que pode incluir:
• aula expositiva/dialogada;
• atividades contextualizadas;
• atividades de compreensão;
• uso de recursos computacionais (HP 12C e MS Excel).
Na matriz do curso atualizada, disponível no sítio da instituição, identifica-se outro
aspecto positivo – a inclusão da disciplina Educação Matemática, com carga horária de 80
horas, no segundo período do curso.
77
No que se refere à avaliação, somente há indicação de aspectos relacionados a medida.
Sobre os instrumentos usados na avaliação, consta, apenas, a indicação de que serão utilizados
verificações escritas e trabalhos práticos, sem qualquer referência a como serão realizados tais
trabalhos.
Com relação às referências bibliográficas, são indicados três livros como referências
básicas e quatro como referências complementares. Nessas últimas, um deles é relacionado à
Matemática do Ensino Médio (publicação do IMPA), o que se considera positivo, em se
tratando de formação de professores para a Escola Básica.
3.4.5 Universidade A
A Universidade A é uma instituição privada, com 18 anos de existência como
universidade e mais de 40 anos como instituição de ensino superior. Situada na Região
Sudeste do Brasil, ministra mais de 40 cursos na graduação e 13 cursos de pós-graduação. O
curso de Licenciatura em Matemática nessa IES é também noturno, com oferta de 100 vagas
anuais.
Nessa IES, a disciplina Matemática Financeira é ministrada com carga semestral de 40
horas. O curso de Licenciatura em Matemática tem duração total de seis semestres.
Apesar de se constatar, também nessa instituição, objetivos semelhantes aos relatados
em outras, verifica-se maior preocupação com o cotidiano, com “situações-problema” reais.
Dependendo do enfoque dado pelo docente da disciplina, poderá haver bons momentos
dedicados à Educação Crítica, contextualização e interdisciplinaridade.
Os objetivos listados são:
• Desenvolver no aluno a capacidade de analisar situações financeiras e calcular valores monetários, dando-lhe subsídios para tomar decisões mais vantajosas em questões como compras, vendas, aplicações, financiamentos, empréstimos etc.
• Desenvolver a habilidade de: resolver questões que envolvam proporcionalidade, conceituar e calcular juros simples e compostos; calcular os valores de descontos; calcular as taxas reais de juros; calcular a equivalência de capitais a juros compostos; reconhecer a aplicar as sequências de capitais; calcular a amortização de empréstimos; desenvolver aplicações práticas da matemática financeira.
78
Sobre a metodologia para o curso, destacam-se no planejamento analisado:
• Abordagem do conteúdo através de exemplos de aplicação e discussões.
• Listas de exercícios.
• Uso da calculadora científica e financeira.
• Uso de software.
Nesse curso, constata-se, também, preocupação com o uso de tecnologias.
Nas referências bibliográficas, consta a indicação de um livro de História da
Matemática, o que se considera positivo para a formação de professores. Por outro lado, os
livros específicos de Matemática Financeira indicados – três de referências básicas e quatro
complementares – não têm edições atualizadas, sendo o mais recente com data de publicação
de 2001.
3.4.6 Universidade F
A Universidade F é uma grande e centenária instituição federal do interior de um
estado da Região Sudeste.
A IES ministra 23 cursos presenciais de graduação (16 bacharelados e sete
licenciaturas) e três bacharelados na modalidade ensino à distância. Na pós-graduação
presencial, são oferecidos dois cursos de especialização, 20 mestrados e 19 doutorados. Na
pós-graduação à distância, são oferecidos 14 cursos de especialização. No total, são 15 mil
alunos em uma única sede.
Essa instituição de ensino superior apresenta 100 grupos de pesquisa e 400 linhas de
pesquisa. O campus universitário ocupa uma área de 600 ha, com uma área construída de 250
mil m2.
O curso de Licenciatura em Matemática tem duração total de nove semestres,
ministrados no curso noturno, onde são oferecidas 60 vagas anuais. A Matemática Financeira
é disciplina optativa e compartilhada com diversos outros cursos, sendo que, em alguns deles,
é disciplina obrigatória. A carga horária da disciplina é de 68 horas.
Verifica-se, em entrevista com a coordenação do curso, que a disciplina Matemática
Financeira consta na matriz curricular há apenas dois anos. A reforma ocorrida na matriz do
curso foi realizada por uma comissão de docentes e discentes do curso. O docente que
ministra a disciplina é do Departamento de Economia e Administração.
79
Em entrevista com o docente responsável pela disciplina, obtiveram-se as seguintes
informações relevantes:
• A taxa de reprovação tem se situado na faixa entre 20% e 30%.
• Há elevado índice de desistência na disciplina.
• Devido ao custo elevado de uma calculadora financeira, o professor exige, apenas para
suas aulas, que todos levem uma calculadora científica.
• No planejamento das aulas, as questões cotidianas se fazem presente, mas o professor
prioriza os fundamentos e o rigor matemático.
• Como a disciplina é eletiva e compartilhada com outros cursos, não há preocupação
específica com a formação de professores.
• O docente da disciplina tem graduação em Engenharia Civil, especialização em
Finanças e mestrado em Engenharia de Produção.
• O professor não cursou a disciplina de Matemática Financeira em sua graduação.
• Como recurso de apoio didático, as aulas são ministradas com apresentações em
PowerPoint no projetor multimídia (data show).
Como objetivo do curso, consta em seu planejamento:
• Fornecer ao graduando os fundamentos básicos de Matemática Financeira: noção de juros, conceitos de fluxo de caixa, da condição temporal do capital, além de capitalização e desconto em regimes simples e composto, séries de pagamentos, amortização e correção monetária. O domínio e a correta aplicação desses fundamentos são recursos necessários para o eficiente gerenciamento de uma organização empresarial.
Nesse caso, não se verifica também qualquer objetivo que indique necessidades
específicas de formação de professores.
Em seguida, encontramos a listagem clássica de conteúdos, sem qualquer indicação
metodológica ou referente à avaliação. Na análise do projeto político-pedagógico do curso
procuraremos verificar como tais itens são desenvolvidos.
Como referências bibliográficas, são indicados nove livros, sem distinção entre
referências básicas ou complementares. Observa-se que apenas duas dessas indicações são de
livros publicados há três anos ou menos.
80
3.5 Considerações sobre a Pesquisa com as IESs
Por meio da análise levada a efeito nos cursos de Matemática Financeira de algumas
IESs, públicas ou privadas, constatou-se que essa disciplina, em geral, não é ministrada de
forma específica para futuros professores de Matemática. Muitas vezes, as aulas são
compartilhadas com alunos de outros cursos; os livros adotados são os mesmos utilizados em
áreas como Economia ou Administração de Empresas; os ministrantes desses cursos não
possuem formação de Licenciatura em Matemática; não se identificou, também, preocupação
em relacionar a Matemática Financeira ao cotidiano das pessoas e com os conteúdos da
Matemática Básica, que o futuro professor está se preparando para ministrar.
Cabe ainda destacar que a amostra de estudo contém cinco IESs privadas, onde a
disciplina Matemática Financeira é obrigatória, e uma IES pública federal, na qual a disciplina
é optativa. As outras IESs públicas que poderiam compor essa amostra não apresentavam a
disciplina Matemática Financeira em suas matrizes e, por essa razão, não foram incluídas no
estudo, após o segundo critério de recorte.
4 REFLEXOS DA AUSÊNCIA DA MATEMÁTICA FINANCEIRA NAS
LICENCIATURAS E NOS LIVROS DIDÁTICOS
A não inclusão da disciplina Matemática Financeira nos cursos de Licenciatura em
Matemática produz reflexos indesejáveis na formação dos professores para a Escola Básica,
onde se identifica, com maior preocupação, a falta de preparo dos professores em Matemática
Financeira. Por meio da análise de algumas atividades propostas em livros didáticos para o
Ensino Médio e do desempenho de professores de Matemática em determinada avaliação,
visando à admissão em curso de pós-graduação stricto sensu, corroboram-se as hipóteses
levantadas nesta pesquisa relacionadas ao despreparo de professores e das pessoas em geral,
com relação à temática da Matemática Financeira.
4.1 Atividades de Matemática Financeira em Livros Didáticos do Ensino Médio
Os livros didáticos da Escola Básica, geralmente, não utilizam a Matemática
Financeira como elemento de contextualização dos conteúdos tradicionais. Quando tais
conteúdos estão presentes nesse tipo de publicação, quase sempre é de forma superficial, com
aplicação direta de fórmulas e em situações não muito comuns no cotidiano das pessoas.
Convenções, nomenclaturas e definições importantes, como capitalização, ganho real,
inflação, taxa nominal, taxa efetiva e perda salarial não compõem o elenco das poucas
situações exploradas nas atividades que envolvem essa disciplina.
Quando se trata de cálculo de juros, os autores consideram que, como ocorre nos juros
simples, nos juros compostos basta que a taxa e o tempo estejam referidos a uma mesma
unidade que o problema pode ser diretamente resolvido pela fórmula básica. Nesses casos,
não aproveitam para ressaltar um conceito fundamental para os juros compostos, que é o de
período de capitalização, pressupondo que, se nada foi comentado na situação-problema,
subentende-se que esse período é o mesmo definido na taxa e no tempo. Entretanto, não
consideramos dessa forma e acreditamos ser importante explicitar o período de capitalização
envolvido em cada situação.
A questão a seguir, bastante comum em nosso cotidiano, não é retratada nos livros
didáticos do Ensino Médio:
Um capital de R$5.000,00 foi investido, capitalizado trimestralmente, sob a taxa de 20%
ao ano. Obtenha o montante final dessa aplicação, sabendo-se que ela foi calculada para um prazo
de dois anos.
82
Nesse caso, a taxa e o tempo estão expressos na mesma unidade, mas, como a
capitalização é do tipo trimestral, a taxa, antes de qualquer aplicação de fórmula, teria de ser
transformada, pela convenção da taxa nominal, para taxa mensal.
Provavelmente, tais “omissões” derivam do fato de essas análises e discussões não
ocorrerem na formação de professores de Matemática.
Para consecução desta pesquisa, procedeu-se a uma análise em sete livros didáticos de
Matemática, objetivando colher diversos exemplos de épocas distintas, de forma a se verificar
se houve evolução na abordagem da Matemática Financeira no Ensino Médio.
O primeiro livro analisado (edição de 1993) destina apenas cinco folhas ao assunto, no
capítulo intitulado “Noções de Matemática Financeira”. Estranhamente, esse capítulo
antecede o capítulo “Progressões Aritméticas e Geométricas”. Considera-se que os autores
deixaram de aproveitar boa oportunidade de contextualização, relacionando juros simples a
progressões aritméticas e juros compostos a progressões geométricas. Praticamente, todas as
questões abordadas no capítulo das progressões são de manipulação algébrica e sem qualquer
relacionamento com a realidade das pessoas.
No segundo livro (publicado no ano de 2000), observa-se preocupação com os
conceitos de Matemática Financeira – foram destinadas 19 páginas ao desenvolvimento do
assunto. As questões apresentadas procuram a contextualização com o cotidiano das pessoas,
assim como há preocupação em relacionar os conteúdos da Matemática Financeira aos da
Matemática escolar tradicional. No cálculo do tempo da aplicação, os autores usaram os
logaritmos abordados em capítulos anteriores. Mostrou-se, também, a relação entre juros
simples e compostos com as funções polinomiais do primeiro grau e as funções exponenciais,
respectivamente. Só não fizeram qualquer relacionamento com progressões aritméticas ou
gemométricas, pelo fato de a Matemática Financeira ter sido trabalhada no livro da primeira
série, onde as progressões não são abordadas. O capítulo é bem ilustrado e apresenta recorte
de notícias para serem analisadas à luz dos conceitos estudados. As questões não informam o
tipo de periodicidade da capitalização, subentendendo-se que essa periodicidade é a mesma da
unidade em que expressaram a taxa e o tempo.
O terceiro livro (edição de 2004), de autor identificado com a linha da Educação
Matemática, dedica 10 páginas à Matemática Financeira. Como fator positivo, identificou-se
uma abordagem sobre fatores de correção, que é um dos dois mais importantes conceitos da
Matemática Financeira e que ajuda os alunos a se libertarem das fórmulas decoradas. O autor
faz também a relação entre os juros simples e as funções polinomiais do primeiro grau e os
juros compostos e funções exponenciais. Não se observou qualquer relacionamento entre os
83
juros e as progressões, mesmo com as progressões aritméticas e geométricas tendo sido
abordadas em capítulo anterior. Em uma das questões, resolvida como exemplo, o autor aplica
o conceito de logaritmo para o cálculo do tempo de uma aplicação.
Vejamos um exemplo desse livro:
Quanto receberá de juros, no fim de um semestre, uma pessoa que investiu, a
juros compostos, a quantia de R$6.000,00, à taxa de 1% ao mês?
Percebemos que a taxa é mensal e o prazo, de seis meses. Novamente, a questão foi
resolvida entendendo-se que a periodicidade da aplicação foi mensal.
O quarto livro (edição de 2005), também na linha da Educação Matemática, é bem
formulado, com exemplos interessantes, relacionados aos conteúdos do Ensino Médio.
Entretanto, não há praticamente referência à Matemática Financeira. Ao longo das 83 páginas
que englobam os temas “Progressões Aritméticas”, “Progressões Geométricas”, “Funções
Exponenciais” e “Funções Logarítmicas”, há, apenas, duas referências a situações comerciais
ou financeiras, na forma de exercícios – um resolvido (Figura 1) e outro proposto.
Figura 1 – Questão resolvida: progressão geométrica e juros compostos.
84
Nesse exemplo, como a taxa e o tempo estão expressos em anos, considerou-se que a
capitalização foi anual. Alertou-se, também, para o fato de que um crescimento constante, sob
a taxa fixa de 10% ao período, gera uma progressão geométrica de razão 1,1. Trata-se de um
ponto positivo importante, já que alguns livros didáticos não relacionam progressões
geométricas a juros compostos.
No quinto livro (edição de 2005), os autores tiveram a preocupação de elaborar um
capítulo específico para Matemática Comercial e Financeira, com 10 páginas. As questões
apresentadas são interessantes e com alguma contextualização. Há relação entre conteúdos
explorados em capítulos anteriores e a Matemática Financeira, onde se destaca questão
evolvendo equação exponencial e logaritmo. Os autores usam também o recurso de ilustrar as
questões com notícias de jornais e revistas, o que torna o assunto mais atrativo. Em uma das
questões, que envolvia crescimento populacional, os autores registraram que a taxa de
crescimento era anual, o que, de certa forma, informa ao leitor o tipo de periodicidade
envolvido na questão.
O sexto livro (edição de 2005) apresenta algumas vantagens relacionadas à
Matemática Financeira. A primeira é que a temática da Matemática Financeira, dentre outras,
como a da tecnologia, aparece ao longo de todo o livro, relacionada aos conteúdos do Ensino
Médio. Trata-se de um livro bem ilustrado, com uso da contextualização e da história da
Matemática. As progressões e as funções são estudadas simultaneamente aos juros simples e
compostos. Há uma interessante comparação dos gráficos representativos dos juros simples e
dos juros compostos. Os autores só não se preocuparam em informar que há situações em que
o crescimento em progressão algébrica pode gerar resultados maiores que o crescimento em
progressão geométrica. Seria um bom momento para comentar o porquê de os bancos
comerciais preferirem utilizar juros simples nos cálculos das antecipações, como nos
descontos, quando o prazo é inferior ao período de capitalização.
O sétimo livro (edição de 2004) destaca-se por ser totalmente destinado à Matemática
Comercial e Financeira e à Estatística Descritiva para o Ensino Médio, como se verifica em
seu sumário (Figura 2). Não se conhece outro livro para o Ensino Médio com essa
preocupação.
85
Figura 2 – Sumário de livro com conteúdos de matemática comercial e financeira.
Destaca-se, ainda, a preocupação dos autores em abordar temas importantes como
cálculo da inflação, sequência uniforme de pagamentos ou depósitos (Tabela Price).
Entretanto, mesmo nesse livro, ficou subentendido que o período de capitalização era o
mesmo do referido na taxa e no tempo. Analisemos uma das questões resolvidas (Figura 3):
Figura 3 – Questão resolvida: juros compostos.
86
4.2 Juros e Progressão Geométrica: um Viés de Análise do Conhecimento
No primeiro semestre de 2011, participei de uma banca de seleção para o Mestrado
Profissional em Educação Matemática de uma instituição de ensino superior privada do
estado do Rio de Janeiro. Como se considera que a temática da Matemática Financeira,
relacionada aos conteúdos da Matemática da Escola Básica, é de fundamental importância,
incluiu-se na prova escrita dessa seleção, com o aval de todos os componentes da banca, uma
questão bem simples, abordando tal conteúdo.
No que se refere ao perfil dos nove candidatos que realizaram a prova, nenhum é
recém-formado – em média, possuem experiência de 17 anos de atuação na Escola Básica e
três anos de docência no Ensino Superior. Cerca de 80% desses professores já possuíam pós-
graduação lato sensu em Matemática ou áreas afins.
A questão proposta aos candidatos apresentava o seguinte enunciado:
Vamos supor que uma pessoa tivesse conseguido descobrir um investimento que remunerasse o saldo credor com uma taxa fixa de 2% ao mês, com capitalização mensal. Essa pessoa se comprometeu com o banco de fazer 24 depósitos, também fixos, de R$500,00 por mês. Determinar o quanto essa pessoa terá acumulado imediatamente após o 24º depósito é uma questão comumente encontrada no cotidiano das pessoas (capitalização) e que nem sempre é abordada pelas Escolas.
a) Qual o principal conteúdo de Matemática do Ensino Médio que está envolvido na resolução dessa questão?
b) Usando essa temática da resposta anterior, determine o quanto essa pessoa terá acumulado ao final dos 24 meses de aplicação.
Solução:
a) Como se trata de juros sobre juros (sobre o saldo credor), é uma questão de juros
compostos que envolve, também, progressões geométricas.
b) 1º mês → 500,00
2º mês → 500,00 . 1,02 + 500,00
3º mês → 500,00 . 1,02 . 1,02 + 500,00 . 1,02 + 500 =
= 500,00 . 1,022 + 500 . 1,02 + 500,00
4º mês → 500,00 . 1,023 + 500,00 . 1,022 + 500,00 . 1,02 + 500,00
24º mês → 500,00 . 1,0223 + 500,00 . 1,0222 + ....500,00 =
= 500,00 . (1,0223 + 1,0222 + ... + 1) ou
= 500,00 (1 + .... + 1,0222 + 1,0223)
87
Observa-se que a expressão entre parênteses corresponde à soma dos termos de uma
progressão geométrica de razão igual a 1,02 (que nada mais é que o fator de correção para
uma taxa de aumento de 2% ao mês). Calculando essa soma, cuja fórmula é ��.����
���, teremos:
Montante final = 500,00 . (1,0223 . 1,021 – 1) / (1,02 – 1) =
= 500,00 . (1,0224 – 1) / 0,02 ≅≅≅≅ 15 210,93
É importante observar que a resolução dessa questão exigia apenas o conhecimento da
soma dos termos de uma progressão geométrica, conteúdo básico e normalmente estudado no
Ensino Médio. Se algum candidato tivesse conhecimentos maiores de Matemática Financeira,
ainda poderia aplicar uma fórmula para as capitalizações compostas imediatas e obter
diretamente o resultado da questão.
Entretanto, foi este o desempenho dos candidatos nessa questão:
• Apenas três dos nove candidatos conseguiram relacionar o problema proposto ao
conteúdo das progressões geométricas.
• Dois dos candidatos aplicaram a fórmula dos juros simples para resolver a questão.
• Três dos candidatos aplicaram a fórmula dos juros compostos para resolver a questão.
A solução que deram estaria correta, caso se tratasse de um único depósito de
R$500,00 e ele ficasse rendendo por 24 meses. O problema proposto envolve
depósitos periódicos mensais de R$500,00, o que constitui um plano de capitalização.
• Quatro dos candidatos tentaram resolver acompanhando o saldo credor ao longo dos
24 meses (exaustivamente) ou iniciando a questão e abandonando-a no meio do
caminho.
Conclusão: nenhum dos candidatos conseguiu resolver, corretamente, os dois
itens da questão.
Em contato posterior com esses candidatos, constatou-se que, dos nove candidatos,
apenas um cursara a disciplina Matemática Financeira em sua formação inicial para o
magistério e outro tivera essa disciplina em um curso de extensão que realizou.
Cabe destacar que três desses nove candidatos já lecionaram a disciplina Matemática
Financeira em cursos superiores das áreas de Contabilidade e Administração de Empresas.
5 UMA PROPOSTA DE ENSINO DE MATEMÁTICA FINANCEIRA PARA AS
LICENCIATURAS NO BRASIL
Uma criança passa nove anos no ensino fundamental, três anos no ensino médio e, durante esses doze anos de educação básica, é obrigada a memorizar nomes e datas de pouca utilidade na vida real. Em pouco tempo tudo, ou quase tudo, é esquecido. Nesses doze anos, o aluno não estuda noções de comércio, economia, finanças ou impostos. O sistema educacional ignora o assunto “dinheiro”, algo incompreensível, já que a alfabetização financeira é fundamental para ser bem-sucedido em um mundo complexo (MARTINS, 2004, p. 5).
Acrescentaria a essa afirmação de Martins que não basta o sistema se mostrar atento a
essas questões, como, aliás, já vem fazendo há algum tempo, por meio da legislação
educacional, se não investirmos na formação inicial dos professores de Matemática.
Por meio das entrevistas realizadas, assim como da análise em matrizes curriculares e
planejamentos das IESs avaliadas, constatou-se que, na maioria das vezes, nos cursos de
formação de professores, a Matemática Financeira não é ministrada. Já nas instituições de
ensino superior em que a disciplina é incluída nas matrizes curriculares e planejamentos, há
uma abordagem técnica desses conteúdos, com uso demasiado de fórmulas e algoritmos, sem
preocupação com o uso dessa temática pelos futuros professores em suas aulas da Educação
Básica, como subsídio para a construção de cidadãos críticos.
A proposta ora apresentada está respaldada em diversos anos de pesquisa e ensino em
classes de ensino fundamental, médio e superior, bem como em cursos de atualização de
professores, na Educação Matemática Crítica e na Teoria da Atividade.
Também se apresenta uma sugestão de planejamento de curso da disciplina
Matemática Financeira para as licenciaturas em Matemática, ilustrando, com alguns
exemplos, tópicos dessa disciplina relacionados a conteúdos tradicionais da Matemática da
Escola Básica e aos referenciais teóricos da pesquisa.
5.1 Principais Conceitos da Matemática Financeira
Nos cursos que tenho ministrado, incluindo os de pós-graduação e com licenciandos e
professores que já receberam algum estudo prévio de Matemática Financeira, costumo afirmar
que tudo o que precisam saber de Matemática Financeira está fundamentado em apenas dois
conceitos básicos: fatores de correção e valor de dinheiro no tempo. Praticamente sem uso de
fórmulas e com esses dois conceitos fundamentais, há condição de se resolver quase todas as
questões relacionadas à Matemática Financeira.
89
Logicamente, tais afirmações causam certo espanto, notadamente naqueles que já
tiveram alguma experiência negativa com essa disciplina. Entretanto, ao longo do curso, essa
visão é modificada e os que já são professores se sentem encorajados a tentar algo similar
com seus alunos. Os que ainda não são professores, na maioria das vezes, comentam que não
perderão a chance de utilizar a Matemática Financeira em suas futuras aulas de Matemática.
5.1.1 Fatores de correção
Inicialmente, gostaria de registrar que a melhor fonte de consulta e pesquisa para a
ação docente na Escola Básica com a Matemática Financeira constitui-se em jornais diários e
revistas de circulação semanal, em suas versões impressas ou virtuais. As páginas dessas
mídias estão repletas de assuntos presentes no cotidiano das pessoas. Assim, um estudo sobre
porcentagens e juros, por exemplo, pode e deve ser iniciado de forma provocativa e
contextualizada a partir de um texto, um gráfico ou uma manchete de um desses meios de
comunicação.
Trabalhando dessa forma, o educador matemático estará contribuindo para a formação
crítica do educando/cidadão, que aprenderá a interpretar notícias que envolvem conceitos da
Matemática Financeira, assim como saberá driblar as armadilhas existentes no noticiário e,
principalmente, nas propagandas.
Essa metodologia de trabalho propicia também aos educandos bons cenários de
investigação, para que os desafiemos a descobrir as respostas, para que sejam instigados a
uma análise crítica das notícias e, finalmente, possam construir o conhecimento matemático,
respaldados nos cenários de investigação da Educação Matemática Crítica e na Teoria
Histórico-Cultural da Atividade.
Acredito que o conceito de fatores de correção (aumento ou redução) se constitui na
mais importante noção da Matemática Financeira, podendo ser introduzido nas classes de
sexto ou sétimo ano do Ensino Fundamental, devendo sempre ser retomado, em uma
abordagem em espiral, nos anos posteriores.
Um bom cenário de investigação inicial seria uma notícia de jornal ou revista, como a
apresentada a seguir. A leitura da notícia e a tentativa de “decifrar” todos os termos e números
da tabela poderiam servir como excelente ponto de partida para a introdução do conceito dos
fatores de correção.
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Salário mínimo tem menor aumento real desde o início do governo Lula6
Senado confirmou salário de R$ 545, aumento real de 0,37% frente a 2010. Reajuste do mínimo de 2011 sofreu impacto da crise econômica de 2009.
O salário mínimo de R$ 545 aprovado na noite desta quarta-feira (23) pelo Senado registra o menor aumento real concedido desde 2003, início do governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, mostram dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
O reajuste de 0,37% frente ao valor de 2010, que era de R$ 510, começa a valer em 1º de março. Desde janeiro deste ano, o salário mínimo vem sendo pago no valor de R$ 540. Isso porque o governo federal concedeu aumento com base na estimativa da inflação. No entanto, verificou-se posteriormente que a inflação foi maior e o mínimo deveria ser R$ 543. O valor, então, foi arredondado para R$ 545.
Considerando a política aprovada, o reajuste em 2012 será favorável ao trabalhador e próximo de 13%, sendo 5% de correção da inflação e 7,5% de aumento real, que é a estimativa de crescimento do PIB para 2010. Com isso, o mínimo seria superior a R$ 615.
A política aprovada no Senado nesta quarta já havia sido aprovada na Câmara na semana passada. Agora, vai à sanção da presidente Dilma Rousseff.
Confira abaixo o que foi reposição e o que foi aumento real em todos os reajustes no salário mínimo desde 2003, a partir de quando os dados foram disponibilizados pelo Dieese na publicação “Política de Valorização do Salário Mínimo”, de janeiro deste ano.
6 OLIVEIRA, M. Salário mínimo tem menor aumento real desde o início do governo Lula. G1 Economia, São
Paulo, 23 fev. 2011. Disponível em: <http://g1.globo.com/economia/noticia/2011/02/salario-minimo-tem-menor-aumento-real-desde-o-inicio-do-governo-lula.html >. Acesso em: 04 maio 2011.
91
A seguir, o conceito dos fatores de correção será apresentado de forma análoga à
apresentada para alunos do sexto ou oitavo ano do Ensino Fundamental. Será usado o recurso
de pequenas histórias (flashes), que, gradativamente, poderão auxiliar os alunos na construção
do conceito.
Além disso, comentar-se-á uma aplicação inicial desses fatores de correção, que é a
noção de “aumento real”. Finalmente, voltaremos à notícia e à tabela apresentadas
anteriormente, para conferir todos os valores e dados que foram colocados.
Flash 1: Salário de Ana
O salário de Ana era, em maio de 2011, R$650,00; em junho de 2011, ela recebeu um
reajuste de 8% sobre o salário anterior. Qual o valor do salário que Ana passou a receber a partir
de junho de 2011?
Comentário: Existem diversas maneiras de resolver essa questão.
Solução a:
650,00 : 100 = 6,50 (cálculo de 1%)
6,50 x 8 = 52,00 (cálculo de 8%)
650,00 + 52,00 = 702,00 (cálculo do salário corrigido)
Solução b:
8/100 x 650,00 = 52,00 (cálculo dos 8%, na forma fracionária)
650,00 + 52,00 = 702,00 (cálculo do salário corrigido)
Solução c:
0,08 x 650,00 = 52,00 (cálculo dos 8% na forma decimal)
650,00 + 52,00 = 702,00 (cálculo do salário corrigido)
Solução d:
Em maio de 2011, Ana recebia 100% de seu salário. Em junho do mesmo ano, passou
a receber 8% a mais desse valor. No total, passou a receber 108% desse salário.
Para calcular 108% = 108/100 ou 1,08 de uma quantia, basta multiplicá-la por esse
valor. Multiplicando 1,08 x 650,00, obteremos a mesma resposta encontrada nas outras três
soluções.
Esse é um bom momento para provocarmos os alunos, pedindo-lhes que comparem as
respostas obtidas e as quatro possíveis soluções.
92
É provável que alguns alunos ou professores resolvam essa questão por um dos três
primeiros processos (a, b, c). O quarto processo, que não é o mais comum, poderá também ser
apresentado no contexto de uma aula, notadamente por alunos que já trabalhem no comércio
ou na área bancária. Entretanto, sugere-se apontar, também, a importância da última solução,
que será fundamental na abordagem proposta para o estudo da Matemática Financeira, sem
uso excessivo de fórmulas. Essa solução ressalta o uso dos chamados “fatores de aumento”.
Resumidamente, a solução apresentada pode ser explicitada como:
Salário de R$650,00, após receber um aumento de 8%:
1,08 x 650,00 = R$702,00
Em Matemática Financeira, em situações de aumento, como no flash 1, temos que:
• a taxa de aumento percentual do salário foi de 8%;
• a taxa unitária (i) desse aumento foi de 0,08;
• o fator de aumento (ou multiplicador) do salário foi de 1,08, ou seja (1 + i).
Flash 2: Liquidação em loja de roupas
Durante uma liquidação em uma loja de roupas, foi afixado um grande cartaz,
anunciando descontos de 15% para todas as mercadorias. Quanto passará a custar uma calça
jeans que, antes da promoção, custava R$120,00?
Esse flash, em sala de aula, deveria ser trabalhado após a realização de vários casos
análogos ao flash 1, que focalizava fatores de aumento. Assim, o professor já pode provocar a
turma, apresentando a solução:
0,85 x 120,00 = R$102,00
Junto com a turma, o professor deve mediar para que os alunos descubram o
significado do número 0,85. Comparando à situação anterior, é provável que concluam que,
nesse flash, subtraiu-se 100% (preço normal) - 15% (desconto) = 85% ou 85/100; ou, ainda,
0,85.
Concluindo, o professor mostrará que, nesse caso, tem-se:
• a taxa percentual do desconto foi de 15%;
93
• a taxa unitária do desconto é 0,15 (i);
• o fator de redução (ou multiplicador) para 15% foi 0,85, ou seja (1 - i).
Os dois fatores (ou multiplicadores) que usamos – o de aumento no flash 1 e o de
redução no flash 2 – são denominados fatores de correção. Todo fator de aumento será um
número maior que 1 e todo fator de redução será um número menor que 1.
Aumentos ou reduções sucessivos
No dia a dia, é comum encontrarmos situações de aumentos ou reduções sucessivos,
como na caderneta de poupança, nas liquidações, nos reajustes de impostos ou mesmo de
salários (nesse caso, os aumentos são menos comuns, infelizmente). Portanto, é importante
discutir com os alunos o que ocorre com os fatores de correção nesses casos. Verifica-se que
também é muito comum as pessoas somarem as taxas de aumentos ou reduções sucessivos.
Mas... É assim que realmente funciona? Vejamos um exemplo:
Uma mercadoria sofreu dois reajustes consecutivos: de 5% e de 6%. Qual o aumento
percentual acumulado, correspondente a essas duas correções?
Poderíamos usar um recurso, bastante válido, de supor um preço inicial para essa
mercadoria (normalmente, usa-se o valor de R$100,00, pois facilita os cálculos). Em seguida,
aumentaríamos esse preço em 5% e, depois, mais 6% sobre a primeira correção. Comparando
o preço final com os R$100,00, teremos a variação percentual procurada. Analisemos esse
tipo de solução.
• Preço inicial = R$100,00.
• Primeira correção (5%) = R$105,00.
• Segunda correção (6%) sobre R$105,00, ou seja, 0,06 x 105 = R$6,30.
Logo, o preço final será de R$105,00 + R$6,30 = R$111,30.
Se compararmos o preço final de R$111,30 com o preço inicial de R$100,00, temos
que o aumento foi de R$11,30.
Como esse acréscimo é sobre R$100,00, verificamos que o aumento percentual foi de
11,30%.
Cabe ressaltar que dois aumentos consecutivos de 5% e 6% não geram um aumento de
11%, como é comum algumas pessoas pensarem.
A essa altura, seria importante alertar os alunos sobre a agilidade adquirida ao se
trabalhar com os fatores de correção.
Analisemos outra possível solução.
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Denominemos o primeiro preço da mercadoria de P.
• Com um aumento de 5%, usando os fatores de correção, esse preço passará a ser de P
x 1,05.
• Com o segundo aumento de 6%, o preço passará a ser de P x 1,05 x 1,06, o que
corresponde a P x 1,1130, já que a multiplicação é associativa.
Como o fator 1,1130 corresponde a 111,30%, verifica-se que o aumento total
acumulado foi de 11,30%.
Conclusão:
Aumentos sucessivos (muito comuns em países como o Brasil) geram um aumento
acumulado que pode ser obtido pelo produto dos fatores de aumento correspondentes às
taxas desses aumentos. Analogamente, ocorre o mesmo quando se trata de reduções
sucessivas.
Alertamos para o fato de que a maioria dos livros didáticos do Ensino Fundamental só
aborda os chamados juros simples, dando ao aluno a falsa impressão de que os dois aumentos
sucessivos possam ser somados. Nos juros simples, todos os ganhos incidem apenas sobre o
capital inicial e não são acumulativos como nos juros compostos. Por que será que não
iniciamos o estudo dos juros compostos no Ensino Fundamental?
A nossa experiência tem constatado diversos casos de sucesso de ensino de juros
compostos a partir do sétimo ano (sexta série) do Ensino Fundamental em colégios do Rio de
Janeiro, como o Colégio Pedro II (da rede federal de ensino), o Colégio de Aplicação da
UERJ (da rede estadual do Rio de Janeiro) e a Escola Parque (da rede privada da cidade do
Rio de Janeiro).
Para refletir
• Por que será que os livros didáticos não costumam abordar questões desse tipo (aumentos ou reduções sucessivos)? Vivemos em uma economia de juros compostos e, paradoxalmente, estudamos situações de juros simples.
• Será que um aluno de sétimo ano, por exemplo, não teria capacidade de entender como funciona o cálculo de juros sobre juros, usando os fatores de correção? Não seria um ótimo momento para contextualizarmos as famosas operações com números decimais?
• Por que, em pleno século XXI, grande parte dos professores ainda teima em proibir, em sala de aula, o uso de calculadoras ou outros recursos tecnológicos?
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Flash 3: Aumento do preço de remédio
O remédio que o Sr. João toma, diariamente, para pressão alta, custava R$40,00. No mês
seguinte, passou a custar R$49,00.
Quais foram o fator de correção e o aumento percentual correspondentes?
Os alunos já sabem que, ao multiplicarmos o valor inicial pelo fator de correção,
teremos o valor final; no caso, o preço do remédio com a correção. Isso também significa que,
dividindo o valor final pelo valor inicial, obtém-se o fator de correção.
Valor final : valor inicial = fator de correção
Nesse caso, o fator de correção será igual a 49,00 : 40,00 = 1,225.
O fator de correção obtido (1,225) representa um aumento de 22,5% no preço do
remédio.
Flash 4: Quanto se está pagando de juros?
Uma loja anuncia a venda de um aparelho de som com duas possibilidades de pagamento:
à vista, por R$1.200,00, ou com entrada de 50%, com a segunda parcela, de R$700,00, paga 30
dias depois.
Quanto está pagando de juros a pessoa que escolher a segunda opção de pagamento?
Para essa questão, sugiro outra estratégia: que se apresente aos alunos uma possível
solução (muito utilizada pelas pessoas), solicitando que eles discutam se está correta ou
errada. Ao apresentar a solução correta, o professor deve alertar para um fato importante em
transações comerciais, que é a noção de saldo devedor.
Solução apresentada para análise:
• Preço à vista = R$1.200,00
• Preço pago em duas parcelas = R$600,00 + R$700,00 = R$1.300,00
• Valor pago a mais (juros) = R$1.300,00 - R$1.200,00 = R$100,00
• Percentual pago como juros (taxa) = 100 : 1.200 ≅ 0,0833 ≅ 8,33%
Está correta a solução apresentada?
Essa solução (que, aparentemente, não tem nada de errado) não está correta.
• Quando o cliente paga a entrada de 50% (R$600,00), ele assume uma dívida de
R$600,00.
96
• É sobre esse valor que nossos cálculos devem ser efetuados (é o que denominamos
saldo devedor). Logo, os juros cobrados devem ser calculados verificando-se o
aumento de R$600,00 para R$700,00.
• Devemos determinar o percentual de juros comparando-se os R$100,00 cobrados a
mais, com R$600,00, ou seja, R$100,00 : R$600,00 ≅ 0,1667 ou 16,67%.
• Se usarmos os fatores de correção, veremos que o fator de aumento corresponde a
700,00 : 600,00 ≅ 1,1667. O fator 1,1667 corresponde a um acréscimo de 1,1667 - 1 =
0,1667 = 16,67%.
Verificamos que a resposta obtida é bem diferente da encontrada na primeira solução.
Um cidadão, para reivindicar seus direitos, necessita de certos conhecimentos legais e,
por que não dizer, matemáticos. Em nosso cotidiano, muitas vezes, somos levados a pagar a
mais ou a receber de menos em transações bancárias, trabalhistas ou comerciais,
simplesmente por falta de conhecimento matemático adequado.
Com os flashes apresentados e as discussões geradas, apresenta-se um resumo do que
foi discutido acerca dos fatores de correção:
• Todo fator de aumento é um número superior a 1.
• O fator de aumento pode ser obtido pela soma (100% + taxa de aumento percentual),
cujo resultado deve ser posto na forma decimal. Exemplo: fator de aumento para um
acréscimo de 24% = 100% + 24% = 124% = 124 /100 = 1,24.
• Todo fator de redução é um número inferior a 1.
• O fator de redução pode ser obtido pela subtração (100% - taxa de redução
percentual), cujo resultado deve ser posto na forma decimal. Exemplo: fator de
redução para uma perda de 24% = 100% - 24% = 76% = 76 /100 = 0,76.
• Aumentos ou reduções (ou mistura dos dois) consecutivos devem ser calculados pelo
produto dos fatores de correção e não pela soma das taxas a eles correspondentes.
Sugere-se, ainda, que os professores aproveitem essas aulas sobre fatores de correção
para incitar os alunos a usar calculadoras, sem se esquecerem, é claro, de um trabalho prévio
sobre o uso correto das máquinas de calcular.
E a notícia sobre o salário mínimo? O que é ganho real? Como se calcula esse ganho
real?
97
Após essa introdução dos fatores de correção, com a análise dos casos apresentados e
suas conclusões, o professor poderá trabalhar com a noção de ganho real (o que supera a
inflação). Aqui, pela primeira vez, o professor estará falando sobre algo que os alunos, com
certeza, já ouviram diversas vezes – inflação.
Usando inicialmente as atividades (flashes), os alunos irão construindo os conceitos e,
por fim, podemos formalizar e conceituar os pontos que “surgiram” ao longo do processo; no
caso, o conceito de inflação.
Taxa nominal e taxa de ganho real
Em estudos e aplicações práticas envolvendo análise e comparação de valores
monetários em períodos de tempo distintos, é necessário que esses valores, antes da análise,
sejam corrigidos do efeito da inflação. É o que se denomina “transformação de valores
nominais em reais”. No cálculo desses valores reais de ganhos ou perdas, usaremos os fatores
de correção estudados anteriormente.
Dessa forma, podemos assumir que uma taxa de correção nominal é a que tem inserida
em seu cálculo a inflação do período, e uma taxa real de correção é aquela em que a inflação
do período foi “desencaixada”, ou seja, representa a variação (ganho ou perda) sobre a
inflação.
Flash 5: O salário do trabalhador e a inflação
No ano de 2010, o salário de um trabalhador era R$680,00, quando passou a R$750,00. O
período correspondente ao reajuste recebido correspondeu a uma inflação acumulada de 5%.
a) Qual a taxa nominal da correção que esse salário recebeu?
Solução:
Basta determinar o reajuste correspondente ao salário de R$680,00, que passou a ser
R$750,00. Usando os fatores de correção, teremos:
F = 750,00 : 680,00 ≅ 1,1029
Ou seja, corresponde a um reajuste nominal ou aparente de:
10,29% (1,1029 x 100 - 100)
98
b) Qual a correção “real” desse salário?
Solução:
O salário corrigido pela inflação seria de R$680,00 x 1,05 = R$714,00. Como o salário do
trabalhador passou a R$750,00, ele obteve algum “ganho real”, que corresponde ao ganho
“acima da inflação”, ou seja, que transformou R$714,00 em R$750,00. Calculando o novo
fator de correção, teremos:
F = 750,00 : 714,00 ≅ 1,0504
ou 5,04% de taxa de ganho real (1,0504 - 1) x 100
Podemos calcular essa taxa de ganho real diretamente do cálculo do fator de correção.
Basta ter o conceito de que a taxa nominal é obtida pela taxa de ganho real, calculada sobre a
taxa de inflação. Como esses acréscimos consecutivos geram o produto dos respectivos
fatores de correção, teremos:
Fn = Fi x Fr
• Fn = fator de correção nominal
• Fi = fator de correção da inflação
• Fr = fator de correção do “ganho real”
Analisemos como seria esse cálculo no exemplo dado:
• O fator correspondente à correção nominal do salário foi 1,1029.
• O fator correspondente à inflação foi 1,05.
• O fator de ganho real, usando a relação Fn = Fi x Fr, será Fr = 1,1029 : 1,05 ≅ 1,0504,
que corresponde a um ganho real de 5,04%.
Nesse ponto, o professor poderá voltar à notícia sobre os aumentos do salário mínimo
e verificar todas as informações publicadas.
Em um dos parágrafos da notícia, temos:
Considerando a política aprovada, o reajuste em 2012 será favorável ao trabalhador e próximo de 13%, sendo 5% de correção da inflação e 7,5% de aumento real, que é a estimativa de crescimento do PIB para 2010. Com isso, o mínimo seria superior a R$ 615.
Comentário: Se a correção da inflação está estimada em 5% e há uma expectativa de 7,5% de
ganho real, a taxa nominal esperada será:
Fn = Fi x Fr ou Fn = 1,05 x 1,075 ≅ 1,1288
99
O que acarreta um reajuste (nominal) de aproximadamente 12,88%. A notícia informa
(arredondando) que será próximo de 13%, no que está correta.
Com relação à tabela com os reajustes do salário mínimo 2003-2011, diversas análises
podem ser realizadas.
Como exemplo, usaremos o mês de abril de 2006, que indica a maior taxa de aumento
real, quando o salário mínimo passou de R$300,00 para R$350,00. Sem considerar a inflação,
podemos calcular a taxa nominal desse reajuste.
O fator de correção foi: 350,00 : 300,00 ≅ 1,1667, o que corresponde à taxa nominal
de 16,67%, aproximadamente, conforme a tabela apresentada.
Como a inflação divulgada para o período foi 3,21%, podemos determinar a taxa de
ganho real desse período, ou seja, a taxa de aumento que ultrapassa a inflação. Novamente,
recorremos à relação Fn = Fi x Fr e, como queremos obter Fr, teremos que Fr = Fn / Fi; logo,
teremos Fr = 1,1667 : 1,0321 ≅ 1,1304, que corresponde a uma taxa de ganho real de 13,04%,
aproximadamente, o que, novamente, confirma a notícia e a tabela apresentada.
Outra análise importante e que pode contrariar a intuição dos leitores da notícia é o
cálculo do ganho real dos salários no período apresentado na tabela. Para isso, verificamos a
informação de um percentual de reajuste (taxa nominal) de 172,5% e uma inflação acumulada
de 76,66% (última linha da tabela). Calculando o fator correspondente ao ganho real, teremos
de dividir 2,725 (100% + 172,5%) : 100, que é o fator nominal do reajuste, por 1,7666, que é
o fator da inflação acumulada no período. A divisão 2,725 : 1,7666 ≅ 1,5425 corresponde à
taxa de ganho real de 54,25% que está divulgada na tabela.
100
Comentário:
O professor poderia conferir todos os outros dados apresentados na notícia, calcular os
valores acumulados, as taxas de ganho real etc. Seria um interessante exercício de
contextualização, de análise crítica e, além disso, poderia provocar outras questões
fundamentais para discussão e pesquisa, como, por exemplo: O que é inflação? Como se
calcula a inflação? Quais os institutos responsáveis pelo cálculo da inflação? Quais os males
associados à existência da inflação? O que é perda salarial?
Complementando o estudo sobre fatores de correção, detalhemos um pouco mais a
inflação e suas metodologias de cálculo e os órgãos responsáveis por seu cálculo.
Acreditamos que, em sala de aula, tais assuntos gerariam excelente oportunidade de pesquisa
para os alunos de todos os anos da Escola Básica.
Inflação, deflação e desinflação: cálculo de índices
Resumidamente, podemos dizer que a inflação mede uma alta geral dos preços de
produtos e serviços. A determinação da taxa de inflação é feita mediante certos cálculos que
envolvem médias ponderadas e sobre uma lista de produtos que compõem o que chamamos
cesta básica. Trata-se de mais uma temática que está presente no cotidiano das pessoas e que
relaciona importantes conceitos da Matemática escolar, como razões e proporções, média
aritmética, média geométrica, média harmônica.
Já a deflação é o contrário de inflação. Significa queda do nível geral dos preços e não
de um ou outro produto isolado. Não se deve confundir deflação com desinflação, que é a
redução do ritmo de alta de preços em um processo inflacionário. Quando a inflação cai do
patamar, por exemplo, de 3% ao mês para o de 1% ao mês, diz-se que houve desinflação.
Deflação é quando os preços médios recuam, ou seja, a taxa torna-se negativa.
Os índices de inflação
Diariamente, seja em jornais, revistas, televisão etc., somos constantemente
bombardeados por notícias acerca da inflação. Ela afeta a vida de todas as pessoas, embora a
maioria não saiba bem o que ela significa, como se calculam as suas taxas e como se deve
proceder para minimizar a sua ação.
101
Paola Gentile7, da Fundação Victor Civita, comenta sobre a inflação no Brasil:
O Brasil detém o recorde de ser o país que durante mais tempo viveu com preços descontrolados. A inflação chegou a 1630% em 1989 e bateu em 2490% em 1993. Seis planos econômicos e cinco trocas de moeda em sete anos tentaram domar o monstro, que teve seu crescimento acelerado nos anos 1970, com o “milagre econômico”. A meta era crescer a qualquer custo. O poder público era o grande gerador de empregos, construindo estradas e hidrelétricas, gastos que não geravam riqueza. Para cobrir suas despesas, o governo emitia papel-moeda. Mais dinheiro em circulação dava sensação de alto poder aquisitivo, mas não havia bens para atender à demanda por consumo. Com isso os preços subiam. “Os salários se esfacelaram e a economia quase entrou em colapso”, recorda-se o economista José Dutra Sobrinho [...]. O Plano Real, em 1993, quebrou esse círculo vicioso e fez com que a inflação fosse mantida em patamares razoáveis. A Lei de Responsabilidade Fiscal, aprovada em 2000, prevê punições para os governantes que gastarem mais do que o arrecadado, o que inibe a volta da inflação causada pelo aumento dos gastos públicos.
Nesse texto, que informa sobre a inflação de 1993, de 2.490%, usando os fatores de
correção, para que os alunos compreendam o significado dessa taxa, podemos mostrar que,
em 1993, uma mercadoria que custasse, por exemplo, R$100,00 no início do ano, passaria a
custar 100,00 x 25,90 = R$2.590,00 no final desse mesmo ano, se seu valor fosse corrigido
apenas pela inflação.
Como se calcula a inflação?
Índices de Preços: Os “números-índice” são importantes instrumentos para sintetizar
modificações em variáveis econômicas durante um período de tempo. Esses índices, que nada
mais são que os fatores de correção, indicam a variação relativa no preço, na quantidade ou no
valor (preço x quantidade) entre um ponto anterior no tempo (período-base) e um período
qualquer, normalmente o atual. A taxa de inflação, tradicional e erroneamente chamada por
índice de inflação, expressa a variação de um número-índice e pode ser calculada com
metodologias diferentes.
Vejamos um exemplo elementar: suponhamos uma cesta composta de uma única
mercadoria, que custasse na data-base R$80,00 (p0) e passasse a custar, em outra data,
R$95,00 (pt). O número-índice relativo a indicar essa variação seria pt/p0 = 95 : 80 = 1,1875, o
que indicaria uma variação de 18,75% no período.
7 GENTILE, P. Inflação. 2003. Disponível em: <http://novaescola.abril.com.br/index.htm/ed/162_mai03/html/deolho>. Acesso em: 15 jun. 2009.
102
É claro que uma cesta de produtos e serviços, com centenas de itens e com pesos
diferentes no cálculo da inflação, não geraria um cálculo tão simples para a inflação. Esses
índices são calculados por meio de médias ponderadas (aritmética, geométrica ou harmônica).
O mais usado é o índice de Laspeyres.
Índice de Laspeyres
O índice de Laspeyres8 é calculado com base em uma cesta de produtos, que varia de
acordo com o instituto que faz o cálculo da inflação, e é definido como a “média aritmética
ponderada dos índices relativos de preços, ponderados aos valores do ano-base”.
Sabemos que a fórmula para o cálculo das médias aritméticas ponderadas para a
variável xi, e respectivos pesos fi, é:
∑∑
=
i
ii
f
fxMap
No caso em questão, temos que a variável xi é representada pelos relativos de preços
(pt / po) e os pesos fi são os valores do ano-base (poqo). De acordo com as condições
apresentadas, teremos a expressão, para o índice de Laspeyres, referente à variação de preços
de um ano-base (0) para um ano qualquer (t):
∑
∑=
00
000
t
t0, qp
qpx p
p
Lp ou, simplificando, ∑∑
=
00
0t
t0,qp
qpL
8 (Ernst Louis) Etienne Laspeyres (1834-1913), economista alemão e representante da Escola Historicista alemã,
foi professor ordinarius de Economia e Estatística ou Ciências do Estado e cameralística em Basileia, Riga, Dorpat, Karlsruhe e finalmente 26 anos em Giessen. Laspeyres é hoje conhecido, sobretudo, pelo índice de Laspeyres para determinar a inflação, que ele desenvolveu em 1871, e que ainda é usado hoje. Além disso, ele é considerado um dos pioneiros da administração de negócios como disciplina acadêmica na Alemanha. Disponível em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Etienne_Laspeyres>. Acesso em: 01 jan. 2012.
103
Exemplo: Considere a tabela a seguir e calcule o índice ponderado de preços de Laspeyres,
tomando 2009 como ano-base.
Bens 2009 2010
Preços Quantidades Preços Quantidades
A 200 4 210 3
B 400 3 460 3
C 150 8 170 12
Observe, antes de aplicarmos a fórmula de Laspeyres, que o numerador será calculado
pelo somatório dos produtos dos preços de 2010 pelas quantidades de 2009.
O denominador da fórmula será dado pela somatória dos preços de 2009 pelas
quantidades de 2009.
111,875ou 11875,1
12001200800
13601380840
8.1503.4004.200
8.1703.4604.21020102009
=
=
++
++=
++
++=Lp
Esse exemplo, bem simples, foi realizado sobre uma cesta de apenas três itens. Nesse
caso, estaria indicando uma inflação de 11,875% ao ano (2010, em relação a 2009).
As cestas atualmente usadas pela maioria dos institutos são muito complexas e
abrangem centenas de produtos, cujos pesos são estabelecidos segundo levantamentos
estatísticos cuidadosos. Cabe destacar que existem diversos outros fatores a serem
considerados para as medidas de inflação, como:
• A região e a faixa de renda da população cobertas.
• A Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF), que identifica a cesta de consumo da
população e da região considerada.
• A metodologia empregada no cálculo, de forma a contemplar em uma única medida
estatística a variação do preço do conjunto de bens e dos serviços pesquisados.
• A definição da periodicidade e das fontes para a coleta de preços.
Mais informações sobre esse tema podem ser acessadas diretamente no sítio do Banco
Central do Brasil (http://www.bcb.gov.br). Nesse endereço, as pessoas poderão obter textos,
gráficos, apresentações em PowerPoint, vídeos etc. relacionados a temas econômico-
financeiros como a inflação.
104
No sítio do Banco Central, recomenda-se aos professores uma especial atenção ao link
que direciona ao BC Jovem, o qual contém diversos textos, animações, pesquisas escolares
etc. relacionados à temática da Educação Financeira.
Como exemplo, apresenta-se um gráfico comparativo da inflação acumulada em
alguns países nos anos de 2009, 2010 e 2011.
Figura 4 – Inflação acumulada em alguns países no período 2009-2011.
Fonte: <http://www.bcb.gov.br>. Acesso em: 02 jun. de 2011.
Principais números-índices existentes no Brasil, usados para o cálculo da inflação
IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo): Índice calculado pelo Instituto Brasileiro
de Geografia e Estatística (IBGE), com o objetivo de corrigir os balanços e demonstrações
financeiras trimestrais e semestrais das companhias abertas. A partir de junho de 1999, passou
a ser o índice oficial do governo federal para balizamento das metas de inflação. Esse índice
considera gastos como alimentação e bebidas, artigos de residência, comunicação, despesas
pessoais, educação; habitação, saúde e cuidados pessoais.
O universo de pesquisa é composto de famílias que ganham de um a 40 salários
mínimos nas regiões metropolitanas do Rio de Janeiro, Porto Alegre, Belo Horizonte, Recife,
São Paulo, Belém, Fortaleza, Salvador e Curitiba, além do Distrito Federal e do município de
Goiânia.
105
O IPCA recebeu o adjetivo “amplo” para distingui-lo do Índice Nacional de Preços ao
Consumidor (INPC), criado em 1979, para representar as necessidades dos consumidores de
famílias com renda de um a seis salários mínimos e chefe assalariado.
INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor): Índice também calculado pelo IBGE,
com o objetivo de balizar os reajustes de salário. O universo de pesquisa é composto de
pessoas que ganham de um a seis salários mínimos nas regiões metropolitanas do Rio de
Janeiro, Porto Alegre, Belo Horizonte, Recife, São Paulo, Belém, Fortaleza, Salvador e
Curitiba, além do Distrito Federal e do município de Goiânia.
IPC-FIPE: Índice de preços ao consumidor medido na cidade de São Paulo, com o universo
de pessoas que ganham de dois a seis salários mínimos. A composição dos grupos de despesas
para o cálculo do índice é o seguinte: Alimentação (30,81%), Despesas Pessoais (12,52%),
Habitação (26,52%), Transportes (12,97%), Vestuário (8,65%), Saúde e Cuidados Pessoais
(4,58%) e Educação (3,95%). O índice, calculado pela Fundação Instituto de Pesquisas
Econômicas (FIPE), uma instituição de pesquisa ligada à Faculdade de Economia e
Administração da Universidade de São Paulo (USP), foi criado pela prefeitura do município
de São Paulo com o objetivo de reajustar os salários dos servidores municipais.
IGP (Índice Geral de Preços): Existem três tipos de IGP, calculados pela Fundação Getúlio
Vargas (FGV), usados em contratos de longo prazo, como nos aluguéis. Esses índices
registram a inflação de preços desde matérias-primas agrícolas e industriais até bens e
serviços finais.
O IGP é formado pela média aritmética ponderada de três outros índices econômicos:
IPA (Índice de Preços por Atacado, com peso de 60%); IPC (Índice de Preços ao
Consumidor), com peso de 30%; INCC (Índice Nacional de Custos da Construção), com peso
de 10%.
O IGP é divulgado em três versões: IGP-DI (Índice Geral de Preços – Disponibilidade
Interna), IGP-M (Índice Geral de Preços do Mercado) e IGP-10 (Índice Geral de Preços 10).
A diferença metodológica para o cálculo desses três índices é apenas com relação ao
período de cálculo de cada um deles. O IGP-DI faz medições no mês cheio, ou seja, do dia 1º
ao dia 30 ou 31 de cada mês. No IGP-M, o período vai do dia 21 do mês anterior ao dia 20 do
mês atual. O IGP-10 mede a evolução de preços no período compreendido entre o dia 11 do
mês anterior e o dia 10 do mês corrente.
106
Os diversos índices de preços foram sendo criados ao longo dos anos com finalidades
distintas. O IPC-FIPE, por exemplo, foi criado pela prefeitura de São Paulo com o objetivo de
reajustar os salários dos servidores municipais. O IGP-M foi criado para ser usado no reajuste
de operações financeiras de longo prazo. O IGP-DI tem a finalidade de balizar o
comportamento dos preços gerais da economia. O INPC tem a finalidade de ser o índice de
referência para reajustes de salários, enquanto o IPCA objetiva corrigir balanços e
demonstrações financeiras das companhias abertas; atualmente, é o medidor oficial da
inflação no Brasil.
Em dezembro de 2009, o IPCA alcançou um índice acumulado de 3017,59. Isso
significa que, tomando como referência a data-base dezembro de 1993, isto é, usando o valor
100 para representar o mês de dezembro de 1993, entre essas duas datas (dezembro de 1993 e
dezembro de 2009) a inflação acumulada foi de 301659%.
A seguir, apresentamos um quadro-resumo com algumas características dos principais
índices para o cálculo da inflação no Brasil (Quadro 4).
Instituto Índice Índices
Componentes Faixas de
Renda Abrangência Coleta Divulgação
Início da Série
IBGE
IPCA-15
Não há 1 a 40 SM 11 maiores
regiões metropolitanas
16º dia do mês anterior ao 15º dia do mês de
referência
Até o dia 25 do mês de
referência 2000
IPCA Do dia 1º ao dia 30 do mês de
referência
Até o dia 15 mês de
referência 1979
INPC 1 a 6 SM
FGV
IGP-10 IPA IPC
INCC 1 a 33 SM no IPC, calculado
juntamente com o IPA e o INCC
12 maiores regiões
metropolitanas
11º dia do mês anterior ao 10º dia do mês de
referência
Até o dia 20 do mês de
referência 1994
IGP-M IPA IPC
INCC
21º dia do mês anterior ao 20º dia do mês de
referência
Até o dia 30 do mês de
referência 1989
IGP-DI IPA IPC
INCC
Do dia 1º ao dia 30 do mês de
referência
Até o dia 10 do mês subsequente
1944
FIPE IPC-FIPE Não há 1 a 20 SM Município de
São Paulo
Do dia 1º ao dia 30 do mês de
referência
Até o dia 10 do mês subsequente
1939
Quadro 4 – Principais índices para o cálculo da inflação no Brasil.
Fonte: IBGE, FGV, FIPE.
107
5.1.2 Valor do dinheiro no tempo
O segundo grande conceito da Matemática Financeira é o que denominamos “valor do
dinheiro no tempo”. Um aluno do Ensino Médio, com conhecimento dos fatores de correção e
de progressões geométricas pode resolver, sem uso de quaisquer “fórmulas mirabolantes”, as
principais questões que se apresentam na matemática do dinheiro, ou seja: empréstimos,
investimentos, compras financiadas, capitalizações etc.
Um dos problemas mais comuns que encontramos no dia a dia refere-se à decisão de
comprar à vista ou a prazo determinada mercadoria. Somos sempre tentados pela propaganda,
com promoções do tipo “10% de desconto à vista ou em três vezes sem acréscimo”. A melhor
decisão dependerá de uma série de elementos, como taxas de juros, prazos e disponibilidade
financeira do comprador. A noção do valor do dinheiro no tempo auxiliará bastante para
análise da situação e consequente tomada de decisão, pois todas as decisões que envolvem
compras ou investimentos estão apoiadas no valor que o dinheiro terá ou teve em outra data,
levando-se em conta, claro, a taxa de juros vigente.
Por exemplo, supondo que a taxa vigente para as aplicações (taxa de atratividade do
mercado) for fixa, em determinado momento, de 2% ao mês, R$100,00 hoje valerão
R$102,00 em um mês; R$104,04 em dois meses (multiplicando 100 x (1,02)2); R$106,13
reais em três meses (multiplicando 100 x (1,02)3); assim como valerão 100 x (1,02)
n daqui a n
meses. Analogamente, se esse valor monetário retrocedesse na linha do tempo, em um
ambiente com a influência da inflação, esses valores seriam divididos por Fn, sendo F o fator
de correção correspondente à taxa considerada.
Em resumo, podemos afirmar que, no regime de juros compostos (ou de juros sobre
juros), todos os problemas recaem na questão do valor do dinheiro no tempo, ou seja, em uma
data futura o valor do dinheiro fica multiplicado por (1 + i)n (ou F
n) e, em uma data anterior,
fica dividido por (1 + i)n (ou F
n).
Nesse caso, estamos adotando para o fator (1 + i) a simbologia F (fator de correção),
visando a simplificar as notações.
108
Fluxo de caixa de uma operação
A noção de valor do dinheiro no tempo recai em outro conceito importante da
Matemática Financeira: fluxo de caixa de uma operação. Um fluxo de caixa de uma empresa
ou de uma pessoa é o conjunto de entradas e saídas de dinheiro, previstas para determinado
período. O valor atual, ou valor líquido de um fluxo de caixa, em determinada data, é a soma
algébrica dos valores atuais das entradas monetárias (positivas) e das saídas monetárias
(negativas), considerados todos nessa mesma data.
Em uma análise de investimentos, compras a prazo e na Matemática Financeira em
geral, o conceito de fluxo de caixa é de grande importância, pois, calculando-se o valor
líquido do fluxo, torna-se fácil determinar se é ou não compensador determinado
investimento.
O fluxo de caixa é sempre representado graficamente por meio de um eixo (do tempo)
e por setas para cima ou para baixo, que representam, respectivamente, valores monetários de
entradas ou saídas, ou seja, créditos ou débitos.
Como temos de levar todos os valores monetários de um fluxo para uma mesma data,
eles ficarão multiplicados ou divididos por um fator de correção, elevado ao número de
períodos desse “deslocamento”. Em uma operação de financiamento, quando estão inseridos
juros nas parcelas pagas, o saldo desse fluxo, quando os valores são colocados em uma
mesma data, terá de ser sempre igual a zero.
Constata-se isso em um exemplo simples de apenas um pagamento. Suponhamos que
uma mercadoria, à vista, custe R$100,00, e, com um cheque pré-datado para 30 dias, passe a
custar R$108,00. A taxa de juros cobrada nessa transação é de 8%. Nesse caso, temos o
seguinte fluxo de caixa:
109
Se levarmos os R$100,00 para a data 1, eles valerão R$100,00 x 1,08 = R$108,00.
Observa-se que o saldo do fluxo será zero nessa data (entrada de R$108,00 e saída também de
R$108,00).
Se levarmos os R$108,00 para a data zero, eles valerão R$108,00 : 1,08 = R$100,00.
Nota-se que o saldo do fluxo continuará sendo zero nessa nova data (entrada de R$100,00 e
saída de R$100,00).
Graficamente, o que fizemos pode ser representado da seguinte forma:
Levados todos os valores de um financiamento para uma mesma data do fluxo, o saldo
resultante, como em uma soma algébrica de vetores de mesmo módulo e sentidos contrários,
será igual a zero. Isso define uma regra também básica para financiamentos ou empréstimos:
o somatório de todas as entradas monetárias deve ser igual ao somatório de todas as saídas
monetárias, desde que considerados em uma mesma data do fluxo de caixa. A taxa que zera o
fluxo de caixa é denominada taxa interna de retorno (Tir).
Como aplicação, em classes do Ensino Médio, a determinação da taxa interna de
retorno recairá sempre na solução de uma equação polinomial, na incógnita i ou na incógnita
F (F = 1+ i), bastando levar todas as entradas e as saídas monetárias para uma mesma data,
igualando-se, em seguida, o somatório das entradas ao somatório das saídas.
110
Flash 6: Pagamento do empréstimo
Uma pessoa tomou um empréstimo de R$5.000,00, a juros mensais de 5%. Dois meses
depois, ela pagou R$2.500,00; um mês após esse pagamento, liquidou seu débito. Qual o
valor desse último pagamento?
A taxa de 5% ao mês é a taxa interna de retorno. Assim, sem uso de qualquer fórmula
específica, basta levar todos os valores monetários para uma mesma data (data 3, por
exemplo) e igualar o somatório das entradas ao das saídas. Dessa forma, construímos a
seguinte equação:
5000 . (1,05)3 = 2500 . 1,05 + x
5788,13 = 2625 + x
x = 3163,13
Conclusão: A pessoa teve de pagar, três meses após a compra, uma segunda parcela de
R$3.163,13.
Ocorre que, normalmente, não conhecemos a taxa de juros cobrada pelas lojas. Nesse
caso, como resolveríamos esse tipo de problema?
Da mesma forma que anteriormente. Apenas, como não temos a taxa, representaremos
o fator de correção por F, que será a nossa incógnita. Lembrando que esse fator é igual a 1 + i,
após a sua determinação basta subtrair 1 que teremos a taxa procurada.
Flash 7: Calculando a taxa de juros
Um aparelho de TV está sendo anunciado, à vista, por R$1.200,00, ou por três
pagamentos iguais de R$420,00, sendo um de entrada e os outros dois para 30 e 60 dias da
data da compra. Vejamos o fluxo de caixa da operação:
111
Como temos uma entrada e dois valores em uma mesma data, podemos subtrair essa
entrada do preço à vista, obter o saldo devedor e, dessa forma, recair em um fluxo de caixa
mais simples, com apenas duas parcelas de R$420,00. O saldo devedor será igual a
R$1.200,00 - R$420,00 ou R$780,00. O fluxo de caixa se transforma em:
Usando a variável F para representar o fator de correção e levando todos os valores
monetários para uma mesma data (data 2, por exemplo), teremos: 780 . F2 = 420 . F + 420.
Dividindo todos os termos por 60, teremos:
13F2 – 7F – 7 = 0
O fator de correção será a raiz positiva dessa equação. Resolvendo a equação, teremos:
F = 26
.7 13 . 4 49 7 ++
≅ 1,051
Logo, a taxa procurada será igual a 1,051 - 1 = 0,051 ou 5,1%.
112
Sugestões Didáticas
• Problemas cotidianos, como os vistos anteriormente, para compras financiadas ou
empréstimos, podem e devem ser aplicados já no nono ano do Ensino Fundamental. É
claro que, com mais de três parcelas, teremos equações polinomiais de grau superior a
três e que poderiam ser aplicadas no Ensino Médio.
• É interessante mostrar aos alunos que tais questões são rapidamente resolvidas com o
auxílio de uma calculadora financeira. Nesses casos, sugerimos que a equação do
fluxo de caixa seja montada, que a resposta seja obtida com a calculadora, e,
posteriormente, verifiquemos na equação a raiz encontrada.
De novo um questionamento...
• Por que os livros didáticos e as aulas de Matemática não costumam abordar essas questões na
Educação Básica?
• Por que equações costumam ser desvinculadas de qualquer situação real e são apenas um
conjunto de fórmulas que precisam ser decoradas?
113
Questões como essas seriam importantes para análise e discussão na formação inicial
dos professores de Matemática na disciplina Matemática Financeira.
As questões envolvendo fluxo de caixa e valor do dinheiro no tempo podem ainda ser
abordadas em uma classe do nono ano do Ensino Fundamental, com outro tipo de estratégia,
mais simples, para situações com até três parcelas fixas em um financiamento e sem
necessidade de usar termos técnicos, como taxa interna de retorno ou fluxo de caixa. Para
essas classes, sugerimos uma sequência análoga ao que explicitamos a seguir.
Flash 8: À vista ou a prazo?
Uma pessoa entrou em uma loja, para comprar uma geladeira. O vendedor lhe ofereceu as
seguintes opções de compra:
• Pagamento à vista: R$900,00.
• Pagamento em duas prestações mensais, sem entrada, de R$470,00.
Qual a taxa de juros que estará sendo paga, mensalmente, sobre o saldo devedor, pelo cliente
que optar pela segunda forma de pagamento?
Nossa incógnita será o fator de correção F, que representa 1 + i, onde i é a taxa unitária
mensal do financiamento. Sugerimos seguir o “passo a passo” do problema, até que a dívida
contraída seja zerada.
• Verificamos que o saldo devedor inicial é de R$900,00, pois não há entrada.
• Após um mês, antes do pagamento da primeira parcela, esse saldo devedor será
corrigido pela taxa cobrada pela loja e passará a 900F.
• Após um mês, após o pagamento da primeira parcela, esse saldo devedor passará a
(900F - 470).
• Após dois meses, antes do pagamento da primeira parcela, esse saldo devedor passará
a (900F - 470)F.
• Após dois meses, após o pagamento da segunda parcela, esse saldo devedor será (900F
- 470)F - 470.
• Finalizamos, igualando o saldo devedor final a zero:
(900F – 470)F – 470 = 0 ou 900F2 – 470F – 470 = 0
Resolvendo essa equação, a raiz positiva será, aproximadamente, igual a 1,0295, que
acarreta uma taxa mensal de juros de 2,95%.
114
Caberia, nesse momento, uma análise com a turma, sobre a validade de essa compra
ser financiada. É claro que temos envolvidas diversas variáveis, como: disponibilidade
financeira do comprador, taxa de atratividade do mercado financeiro (como a da caderneta de
poupança), inflação. Nesse exemplo, houve uma cobrança de juros de quase 3% ao mês, em
um momento de inflação mensal inferior a 1%.
Flash 9: Financiamento de veículos
Encontramos na Internet, em um desses fóruns de defesa do consumidor, a seguinte
pergunta feita por um cliente:
[...] comprei um carro pelo sistema CDC; solicito melhores esclarecimentos sobre as parcelas... Se eu pagar a primeira e a última, o valor das parcelas diminui mesmo? Ou tanto faz pagar desse jeito ou pagar as duas primeiras prestações?
Acredita-se que dúvidas desse tipo são comuns na vida da maioria das pessoas.
Entretanto, qualquer um, com algum conhecimento de Matemática Financeira, teria condições
de responder a essa questão.
Como exemplo, suponhamos um financiamento de R$10.000,00, sob uma taxa de 2%
ao mês, em 10 prestações fixas, sem entrada. Teríamos, nesse caso, o seguinte fluxo de caixa:
Suponhamos que o comprador queira, por exemplo, antecipar a segunda prestação e
pagá-la junto com a primeira. Como ele estará antecipando essa prestação em um mês, o valor
a ser pago será: 1113,27 : 1,02 ≅ 1091,44. Nesse caso, estaria pagando, pelas duas prestações,
um total de 1113,27 + 1091,44 = 2204,71 (hipótese A).
Imaginemos, agora, que o comprador deseje antecipar a décima e última prestação,
pagando-a junto com a primeira. Como ele estaria fazendo uma antecipação de nove meses, o
valor a ser pago seria: 1113,27 : (1,02)9 ≅ 931,53. Nessa segunda hipótese, o valor total a ser
pago pelas duas prestações seria: 1113,27 + 931,53 = 2044,80 (hipótese B).
115
Comparando as duas hipóteses de pagamento (A, B) ao pagamento sem antecipação
alguma, concluímos que obtivemos um desconto de R$159,91, se a escolha for a hipótese A,
em relação à forma de pagamento descrita na hipótese B.
Imaginemos, agora, um financiamento em 36 prestações, no qual o comprador
quisesse antecipar o pagamento da última prestação. É claro que a vantagem seria ainda muito
maior, pagando, antecipadamente, as prestações finais do financiamento.
Porém, como obter o valor da prestação fixa, como no flash 9? Esse é o caso mais
comum das compras financiadas no Brasil, ou seja, taxas fixas de juros, prestações fixas,
prazo determinado. Esse é um importante sistema internacional de pagamentos, denominado
Sistema Francês ou Price.
A análise desse tipo de financiamento é de fundamental importância na vida de todas
as pessoas e um conteúdo atrativo para o Ensino Médio, associado ao estudo das progressões
geométricas. Mostraremos como é possível essa análise com o uso apenas dos dois conceitos
fundamentais da Matemática Financeira: fatores de correção e valor do dinheiro no tempo.
Flash 10: Compras financiadas – Sistema Price
A seguir, temos um fluxo de caixa que representa o modelo básico de um
financiamento Price, de n prestações fixas no valor T reais, sob taxa mensal unitária i, também
fixa, cujo valor financiado será representado por A. Esse modelo recebe a denominação de
postecipado e os demais casos (com entrada, com carência etc.) recairão nesse modelo.
Retroagindo todas as parcelas do fluxo de caixa à data zero e igualando o somatório
das saídas monetárias com o das entradas, teremos:
T.F-1 + T.F-2 + T.F-3 + ....+ T.F-n = A
Colocando-se T em evidência, teremos:
T. (F-1 + F-2 + F-3 + ....+ F-n) = A
116
Percebemos que recaímos na soma dos termos de uma progressão geométrica de razão
igual a F-1. Calculando a soma, teremos:
Sq
q =
a - a
- 1n 1.
F).(1F
F1
F1
1F
1
F
1( . F
1 - F
F
1
1) - .(FF
1F
F.FFS
n
nn
nn1
1
11n
−
−=
−
−
=
−
=
−
=
−
−=
−−−
−
−−−
)11
Lembrando que 1 - F = 1 - (1+ i) = - i e multiplicando-se ambos os termos dessa fração
por (-1), teremos:
n
n
F . i
1 - FS =
A expressão obtida é o denominado fator de amortização composta Price.
Voltando à relação anterior, teremos:
AF . i
1 - FT.
n
n
=
Com essa expressão do Sistema Price, obteremos o valor a ser pago como prestação de
um financiamento a partir do conhecimento dos demais elementos envolvidos na transação. O
fator obtido encontra-se tabelado para diversas taxas e prazos e pode ser calculado pelos
alunos com auxílio de uma calculadora científica.
Tal fórmula não precisa ser memorizada, desde que os alunos saibam como determiná-
la, usando as progressões geométricas. Entretanto, como ela é muito importante e necessária
nas situações cotidianas, os alunos acabarão por memorizá-la. Cabe ainda observar que,
usando os fatores de correção e a noção de valor do dinheiro no tempo, esta é a primeira
fórmula que estamos usando em nosso trabalho com a Matemática Financeira. Ela constitui
outro exemplo de como podemos relacionar os fatos cotidianos da Matemática Financeira aos
conteúdos básicos da Matemática Escolar. Vejamos uma questão de aplicação:
117
Um computador está sendo vendido, à vista, por R$2.400,00, ou entrada de R$400,00 e o
saldo devedor financiado em 10 prestações mensais fixas, com juros de 5% ao mês, sobre o saldo
devedor.
Qual o valor de cada prestação?
Solução: O saldo devedor (A) é de R$2.000,00, o número de prestações (n) é 10, a taxa (i),
que é de 5%, em sua forma unitária será 0,05, o fator de correção (F) correspondente a essa
taxa de juros é 1,05; logo, poderemos obter o valor de cada prestação T.
AF . i
1 - FT.
n
n
=
20001,05 . 0,05
1 - 1T.
10
10
=05,
T . 7,721735 = 2000, logo, T = 2000 : 7,721735 ≅ 259,00
Cada prestação foi de R$259,00.
Comentário: Diversas vezes, jornais, programas jornalísticos, revistas etc. costumam
divulgar uma tabela para que as pessoas possam determinar o valor das prestações ou mesmo
da taxa de juros que estão pagando nos financiamentos. Ocorre que essa “milagrosa” tabela
nada mais é do que a Tabela Price. Em sala de aula, com os alunos, seria interessante mostrá-
la, ou partes dela, desde que os alunos já tenham estudado o processo e saibam o que
significam e como foram obtidos os números que constam na referida tabela.
Apresentamos um recorte da Tabela Price, para algumas taxas e até 24 prestações fixas
(Tabela 3).
118
5%
n
n
F . i
1 - F 6%
n
n
F . i
1 - F 7%
n
n
F . i
1 - F
n n n
1 0,952381 1 0,943396 1 0,934579 2 1,859410 2 1,833393 2 1,808018 3 2,723248 3 2,673012 3 2,624316 4 3,545951 4 3,465106 4 3,387211 5 4,329477 5 4,212364 5 4,100197 6 5,075692 6 4,917324 6 4,766540 7 5,786373 7 5,582381 7 5,389289 8 6,463213 8 6,209794 8 5,971299
9 7,107822 9 6,801692 9 6,515232
10 7,721735 10 7,360087 10 7,023582 11 8,306414 11 7,886875 11 7,498674 12 8,863252 12 8,383844 12 7,942686 13 9,393573 13 8,852683 13 8,357651 14 9,898641 14 9,294984 14 8,745468 15 10,379658 15 9,712249 15 9,107914 16 10,837770 16 10,105895 16 9,446649 17 11,274066 17 10,477260 17 9,763223 18 11,689587 18 10,827603 18 10,059087 19 12,085321 19 11,158116 19 10,335595 20 12,462210 20 11,469921 20 10,594014 21 12,821153 21 11,764077 21 10,835527 22 13,163003 22 12,041582 22 11,061240 23 13,488574 23 12,303379 23 11,272187 24 13,798642 24 12,550358 24 11,469334
Tabela 3 – Tabela Price para as taxas 5%, 6% e 7%, até 24 prestações.
Nos noticiários, quando essa tabela é apresentada, costuma-se solicitar que a pessoa
procure o número de prestações e a taxa do financiamento (conforme destacamos na tabela,
para 10 prestações, com taxa de 5% ao mês). Em seguida, pede-se que se divida o valor
financiado pelo número encontrado na tabela e o valor da prestação estará calculado. Verifica-
se, assim, que o número que aparece na tabela, para nosso exemplo, é exatamente o valor
7,721735, que encontramos com a fórmula utilizada.
Em um dos programas de TV que analisamos, um professor de Matemática ensinava
as pessoas a obterem a taxa do financiamento. A “receita” era a seguinte:
• Divida o valor financiado pelo valor da prestação.
• Procure o resultado obtido anteriormente na tabela dada, na linha referente ao número
de prestações.
• Ao encontrar o valor, terá a taxa na parte superior da coluna.
119
No exemplo dado, as pessoas iriam dividir 2000 por 259, obtendo 7,722, que é uma
aproximação a milésimos do número constante na tabela. Na linha referente às 10 prestações,
esse número (aproximado) estará na coluna correspondente aos 5%, que é a taxa procurada.
Em um curso de formação de professores, seria interessante solicitar que os alunos,
com auxílio de computadores e após algumas aulas sobre a programação de fórmulas na
planilha Excel, construíssem a Tabela Price para distintas taxas e número de prestações.
Flash 11 – A armadilha dos juros embutidos
É muito comum as lojas usarem a estratégia de dividirem o preço de tabela em partes
iguais (2, 3, ...12, ....20) e anunciarem a venda sem juros. No entanto, para quem comprar à
vista, há algum desconto sobre o preço de tabela. É uma forma de camuflar a cobrança de
juros.
Vejamos um exemplo de um anúncio de venda de um aparelho de DVD-ROM.
Número de Parcelas Valor da Parcela (R$)
À vista: 10% de desconto 341,10
1 vez: sem juros no cartão 379,00
2 vezes: sem juros no cartão 189,50
Esse anúncio, de uma grande rede de eletroeletrônicos do Brasil, indicava várias
opções de pagamento com parcelas iguais, sem juros. Entretanto, o anúncio informava que o
preço à vista tinha 10% de desconto. Um bom trabalho de análise crítica a ser feito com os
alunos é discutir a taxa mensal de juros que está sendo paga pelos compradores das duas
opções financiadas.
Opção 1: Pagamento para 30 dias, no cartão
341,10 1 379,00
Fator de correção: F = 379 : 341,10 ≅ 1,1111
Logo, para essa opção, incidem juros de 11,11% ao mês (embora a empresa
anunciasse que a transação era sem juros).
120
Opção 2: Pagamento em duas prestações (30 e 60 dias)
341,10
189,50 189,50
Trata-se de uma amortização composta Price, constituída de duas parcelas de
R$189,50 e preço à vista de R$341,10. Poderíamos determinar a taxa mensal de juros de
diversas formas, inclusive por meio de equações do segundo grau.
Calculemos essa taxa, usando o trecho da Tabela Price apresentada anteriormente
(Tabela 3). Cabe lembrar que, para esses casos, temos a fórmula:
AF . i
1 - FT.
n
n
=
Para obter o fator de amortização, basta dividir o valor financiado (A) pelo valor da
prestação mensal (T), ou seja, 341,10 : 189,50 = 1,8. Consultando novamente a Tabela 3, na
linha referente a n = 2 (2 pagamentos), procuremos um valor próximo a 1,8:
121
5%
n
n
F . i
1 - F 6%
n
n
F . i
1 - F 7%
n
n
F . i
1 - F
n n n
1 0,952381 1 0,943396 1 0,934579 2 1,859410 2 1,833393 2 1,808018 3 2,723248 3 2,673012 3 2,624316 4 3,545951 4 3,465106 4 3,387211 5 4,329477 5 4,212364 5 4,100197 6 5,075692 6 4,917324 6 4,766540 7 5,786373 7 5,582381 7 5,389289 8 6,463213 8 6,209794 8 5,971299
9 7,107822 9 6,801692 9 6,515232
10 7,721735 10 7,360087 10 7,023582 11 8,306414 11 7,886875 11 7,498674 12 8,863252 12 8,383844 12 7,942686 13 9,393573 13 8,852683 13 8,357651 14 9,898641 14 9,294984 14 8,745468 15 10,379658 15 9,712249 15 9,107914 16 10,837770 16 10,105895 16 9,446649 17 11,274066 17 10,477260 17 9,763223 18 11,689587 18 10,827603 18 10,059087 19 12,085321 19 11,158116 19 10,335595 20 12,462210 20 11,469921 20 10,594014 21 12,821153 21 11,764077 21 10,835527 22 13,163003 22 12,041582 22 11,061240 23 13,488574 23 12,303379 23 11,272187 24 13,798642 24 12,550358 24 11,469334
Como n = 2, consultada a tabela dos fatores de amortização, teremos que a taxa
mensal, nesse caso, é i = 7%, aproximadamente.
Vale registrar que, nos dois planos apresentados no anúncio, havia taxas altas de juros,
mesmo com a propaganda anunciando uma venda sem juros.
Flash 12: Pagamento do IPTU
A prefeitura da cidade do Rio de Janeiro ofereceu duas alternativas para o pagamento do
Imposto Predial Territorial e Urbano (IPTU) de 2009: em 10 parcelas iguais ou em cota única, esta
com desconto de 7%.
Determine os juros embutidos no parcelamento do IPTU e decida qual a forma de
pagamento mais vantajosa.
Essa atividade, extraída de Nasser (2010, p. 87), é outro exemplo de situação do
cotidiano e Matemática Financeira. No livro em questão, há proposta de uma solução, na
122
incógnita i (taxa de juros), e o pertinente comentário de que a solução recai em uma equação
do nono grau.
Com o uso da Tabela Price, essa mesma atividade pode servir de provocação de outro
interessante tema da Matemática escolar, que é a interpolação linear. Como o crescimento da
Tabela Price não é linear, a procura de uma taxa não inteira, que esteja compreendida entre
duas outras taxas inteiras da tabela pode ser feita, de forma aproximada, por meio do processo
da interpolação linear.
Os antigos babilônios, conforme alguns problemas encontrados no Papiro de Rhind, já
usavam esse tipo de aproximação quando aplicavam a denominada “regra da dupla falsa
posição”, inclusive em problemas de âmbito financeiro ou comercial. Essa regra de
interpolação, de forma resumida, pode assim ser enunciada:
Seja uma função f(x), de comportamento não linear e dois valores de seu domínio x1 e
x2, com imagens respectivas f(x1) e f(x2). Se procuramos um valor intermediário x, com
imagem f(x) = c, de forma que x1 < x < x2 e f(x1) < c < f(x2), podemos, através de uma
proporção, obter um valor aproximado de x:
fx� − fx�
x��x�=c − fx�
x − x�
Graficamente, verificamos que tal proporção, que aproxima uma curva por uma reta, é
aplicação de semelhança nos triângulos ABC e APQ.
Figura 5 – Interpolação linear.
Nesse ponto, com auxílio da interpolação linear e da tabela Price, voltamos à questão
dos juros no pagamento do IPTU.
123
Representemos por P o valor do imposto a ser pago e por P/10 o valor de cada uma das
parcelas iguais. O valor à vista, com desconto de 7%, será igual a 0,93P. Aplicando a relação
que obtivemos para os financiamentos Price, teremos:
0,93PF . i
1 - F.
10
P10
10
=
Procedendo às simplificações possíveis, teremos que, para 10 prestações (n = 10), o
fator de amortização Price 10
10
F . i
1 - F, que se encontra tabelado, será aproximadamente igual a
9,3.
Consultando a Tabela Price, verificamos que, se a taxa procurada fosse de 1%, o fator
de amortização Price seria igual a 9,471305 e, se fosse de 2%, esse mesmo fator valeria
8,982585.
Para detectar, através da interpolação linear, qual a taxa que está sendo cobrada nesse
parcelamento do IPTU, basta calcular o valor da taxa correspondente ao fator 9,3.
Temos, nesse caso, x1 = 1 e x2 = 2, com as imagens correspondentes f(x1) = 9,471305
e f(x2) = 8,982585.
O que procuramos é o valor de x, com imagem f(x) = 9,3.
1
1
12
12
xx
)f(x c
xx
)f(x )f(x
−
−=
−
−
1x
9,471305 9,3
12
9,471305 8,982585
−
−=
−
−
1x
0,171315
1
0,48872
−
−=
−
Tal proporção acarreta: 0,48872 x - 0,48872 = 0,171315, ou x = 0,660025 : 0,48872 ≅
1,35.
Logo, a taxa de juros mensal cobrada no parcelamento do IPTU, na localidade do
exemplo, em 2009, foi de aproximadamente 1,35%.
A decisão sobre a viabilidade de parcelar ou pagar à vista dependerá de diversos
outros fatores, como: disponibilidade financeira, taxas de investimento oferecidas pelo
mercado financeiro, taxa de inflação mensal etc.
Ou seja, como essa questão envolvia uma equação do nono grau, temos outras
alternativas para que um aluno do Ensino Médio possa determinar a taxa mensal de juros.
124
Nasser (2010) propõe o uso da tecnologia com a planilha Excel, que é uma excelente
proposta. Podemos, ainda, recorrer a calculadoras financeiras, como a HP 12C.
Com esse exemplo, objetivamos mostrar uma solução alternativa, usando os conceitos
de função, semelhança e proporção, que é a interpolação linear. Mais uma vez, estamos
usando os conceitos da Matemática Financeira, com atividades didáticas, como elemento de
contextualização e de relação entre as distintas partes da Matemática.
Para termos ideia do erro cometido pela aproximação realizada, usando os recursos
tecnológicos retromencionados, a taxa que obteríamos seria algo em torno de 1,34% ao mês.
Como sugestão de aprofundamento sobre o tema, recomendaríamos aos alunos ou
futuros professores a leitura do capítulo de “O homem que calculava”, de Malba Tahan
(2005), sobre o problema do joalheiro e a hospedagem, que trata exatamente da interpolação
linear9.
5.2 Juros Simples e Juros Compostos: Trabalhando com Progressões, Funções e
Logaritmos
Com a análise de mais alguns flashes, objetivamos relacionar a temática dos juros com
diversos conteúdos da Matemática da Escola Básica, como: proporções, funções polinomiais
do primeiro grau, função quadrática, logaritmos, função exponencial, função logarítmica,
progressões aritméticas e progressões geométricas.
5.2.1 Crescimento em progressão aritmética (juros simples)
Os juros simples se caracterizam pelo fato de que apenas o capital inicial C rende
juros. Ou seja, os juros não são acumulativos e o valor acrescido ao valor inicial a cada
período é sempre constante e determinado por i. C, onde i é a taxa fixa da operação. Assim, a
sequência dos montantes obtidos forma uma progressão aritmética, de razão igual a i. C. O
gráfico que representa esses montantes em função do tempo é uma reta, que caracteriza uma
função afim.
Como todos os acréscimos são fixos, há proporcionalidade entre a taxa de juros e o
tempo ou entre o valor dos juros obtidos e o tempo; logo, sem necessidade de qualquer
fórmula, os alunos podem trabalhar, dependendo do ano ou nível, proporções, fatores de
correção, funções etc.
9 No sítio pessoal na Internet, é divulgado um artigo publicado na revista “Pesquisas e Práticas em Educação
Matemática” (SÁ, 2008b), sobre o tema da regra da falsa posição e a interpolação linear. Disponível em: <http://www.magiadamatematica.com/diversos/artpub/regra.pdf>.
125
Flash 13: Montante a juros simples
Qual o valor do montante final de uma aplicação a juros simples, cujo capital inicial é
R$200,00, a taxa é 2% ao mês e o prazo é de seis meses?
Como há crescimento constante e a taxa é proporcional ao tempo, uma taxa de 2% ao
mês, em seis meses, nos juros simples, gerará um ganho total de 6 x 2%, que é de 12%.
Aplicando os fatores de correção, teremos:
M = 200 x 1,12 = 224,00
A sequência dos montantes obtidos formará uma progressão aritmética de razão igual
a 200,00 x 0,02 = 4,00 (Tabela 4 e Figura 6).
Prazo (Meses) Montante Final (R$)
0 200,00
1 204,00
2 208,00
3 212,00
4 216,00
5 220,00
6 224,00
n 200,00 + 4,00 n
Tabela 4 – Montante a juros simples, gerado por R$200,00, sob uma taxa fixa de 2% ao mês, por seis meses.
Figura 6 – Gráfico da função afim: montante gerado a juros simples.
Optou-se pela construção do gráfico através de uma reta, pois poderia haver interesse
no cálculo do montante em qualquer valor do tempo, entre dois instantes quaisquer inteiros,
por exemplo.
126
Com um simples exemplo, constata-se grande quantidade de conceitos e temas da
Matemática, de diversos anos e níveis. Não iremos nos deter em mais detalhes sobre juros
simples, pelo fato de praticamente não existirem situações reais no Brasil que recaiam nesse
tipo de juros.
5.2.2 Crescimento em progressão geométrica (juros compostos)
Nos juros compostos (com taxa fixa i), inicia-se o processo de crescimento com o
valor C. Ao final de um período, esse valor é corrigido pela taxa i, ficando determinado por C
. F, sendo F = (1 + i) o fator de correção correspondente a essa taxa. Assim, sucessivamente,
cada valor é obtido pelo anterior multiplicado pelo fator de correção F, o que caracteriza uma
progressão geométrica de razão F.
Dessa forma, podemos generalizar para n períodos, dizendo que o montante M de uma
aplicação a juros compostos com taxa fixa i, ao período, durante n períodos, pode ser obtido
por M = C . Fn. Verificamos que a sequência dos montantes de uma aplicação ou
financiamento a juros compostos forma uma progressão geométrica de razão igual a F.
De forma resumida, podemos dizer que um capital C está aplicado a juro composto,
em um prazo de n períodos, se, no final de cada período, o juro produzido é incorporado ao
capital, passando também a render novos juros. Nesse caso, dizemos que ocorreu uma
capitalização. Logo: juros compostos = juros capitalizados.
Nos casos envolvendo juros compostos, teremos uma função exponencial e uma
progressão geométrica.
Gráfico comparativo: juros simples x juros compostos
Suponhamos o crescimento dos juros (simples e compostos) relativos a um capital
inicial (principal) de R$10.000,00, sob uma taxa fixa de 30% ao mês. O mais comum é as
pessoas acharem que os juros compostos, por serem acumulativos, sempre superam os valores
calculados a juros simples. Se analisarmos com atenção o gráfico seguinte (Figura 7),
veremos que isso realmente ocorre a partir do segundo mês da data inicial. Observamos que
há igualdade entre os valores iniciais e os valores do montante após um mês do início do
investimento; mas não se pode dizer o mesmo para intervalos de tempo entre zero e um
período.
127
Figura 7 – Gráfico comparativo: juros simples x juros compostos.
Como confirmação, vejamos o cálculo dos juros obtidos pelos R$10.000,00, em 15
dias de aplicação (0,5 mês):
• Cálculo dos juros simples: j = 10.000 x 0,5 x 0,3 = R$1.500,00.
• Cálculo dos juros compostos: j = 10.000 x (1,3)0,5
- 10.000 = R$1.401,75,00.
Verifica-se que, como o prazo foi inferior a um período de capitalização (no caso,
mês), o valor do juro simples foi maior que o valor obtido a juro composto.
É por conta do que acabamos de mostrar que, quando queremos descontar um título ou
uma antecipação de imposto de renda, os bancos comerciais, se a antecipação do resgate for
inferior a um período, preferem adotar o cálculo dos juros sob regime de juros simples.
Trata-se do desconto bancário ou comercial ou por fora. Acredita-se ser essa a única situação
real, no mercado financeiro brasileiro, onde se usa o cálculo a juros simples.
Juros compostos e logaritmos
É bastante comum, em questões de juros compostos, recairmos em equações
exponenciais com bases diferentes. Isso costuma ocorrer nas situações em que a incógnita é o
tempo. É também uma excelente oportunidade, para um professor de Matemática do Ensino
Médio, aplicar logaritmos em questões do cotidiano dos alunos.
128
A maioria das questões que aparecem envolvendo equações exponenciais nos livros
didáticos recai em igualdades de potências com bases iguais ou diferentes, mas que podem
tornar-se iguais mediante aplicação de propriedades das potências. Quando isso não é possível
– o mais provável de acontecer no cotidiano –, temos de aplicar logaritmos.
Nesses casos, os alunos deverão usar a importante propriedade dos logaritmos:
logB An = n. logB A
Normalmente, aplicamos nessas equações os logaritmos de base 10 (decimais), que
são encontrados em tabelas ou nas máquinas de calcular.
Flash 14: Prazo da aplicação
Em uma aplicação de R$1.800,00, a juros compostos e sob uma taxa fixa de 3% ao mês,
com capitalização mensal, foi acumulado um montante final de R$2.213,77.
Qual foi o prazo necessário para que tal fato ocorresse?
Informação: log 1,03 ≅ 0,0128 e log 1,23 ≅ 0,0899
Solução:
Este é o tipo de equação que normalmente encontraremos:
1800 x (1,03)n = 2213,77
(1,03)n = 2213,77 : 1800
(1,03)n ≅ 1,23
Aplicando logaritmo decimal a ambos os membros da igualdade, teremos:
log (1,03)n ≅ log (1,23)
ou n x log (1,03) ≅ log (1,23)
Ou, ainda:
n = 7 0,0128
0,0899
(1,03) log
(1,23) log≅≅
Resposta: O prazo da aplicação foi de sete meses.
129
5.3 Sugestão de Ementa/Planejamento da Disciplina Matemática Financeira para um
Curso de Licenciatura em Matemática
Não se teve a pretensão de tornar esse capítulo um livro de Matemática Financeira
nem de esgotar o assunto. O objetivo foi o de apresentar, por meio de atividades
contextualizadas, que grande parte do que se estuda em Matemática Financeira pode estar
presente nos distintos anos da Educação Básica, relacionando-se com os conteúdos
tradicionais da Matemática escolar, sem necessidade do uso excessivo de fórmulas.
A preocupação primordial foi com os dois principais conceitos da Matemática
Financeira: fatores de correção e valor do dinheiro no tempo.
A proposta ora apresentada é que esse tipo de metodologia configure uma disciplina
da formação inicial de professores de Matemática. Para tanto, indica-se uma proposta de
ementa/planejamento, detalhada a seguir.
Ementa:
Estudo de Matemática Financeira voltado para a formação de professores da Educação
Básica, com enfoque na área de Educação Matemática Crítica e aporte da Teoria Histórico-
Cultural da Atividade. Preocupação com a correlação dos conteúdos clássicos da Matemática,
com uso de novas tecnologias de informação e comunicação e com a formação do cidadão
crítico.
Objetivos:
• Correlacionar os conceitos fundamentais da Matemática Financeira aos demais tópicos
da Matemática da Educação Básica, bem como ao cotidiano das pessoas e outras áreas
do conhecimento.
• Usar, adequadamente, as novas tecnologias, como calculadoras e planilhas eletrônicas,
como recurso auxiliar na interpretação dos problemas que se apresentam na
Matemática Financeira.
• Associar a Matemática Financeira ao referencial da Educação Matemática Crítica,
formando professores para a Educação Básica a partir dessa perspectiva.
130
Programa:
• Porcentagem e fatores de correção: a Matemática Financeira no Ensino Fundamental.
• As médias ponderadas e o cálculo da inflação.
• Os distintos tipos de taxas financeiras: taxa nominal, taxa efetiva, taxa de ganho real,
taxas equivalentes.
• Valor do dinheiro no tempo: fluxos de caixa.
• Juros e descontos simples: as progressões aritméticas e as funções polinomiais do
primeiro grau.
• Juros e descontos compostos: as progressões geométricas e as funções exponenciais e
logarítmicas.
• As taxas internas de retorno e as equações polinomiais.
• Rendas: capitalização e amortização compostas e progressões geométricas.
• Uso de calculadora financeira (HP 12C).
• Uso de planilha Excel na Matemática Financeira.
Estratégias de Ensino:
• Análise de textos sobre Educação Matemática, Educação Matemática Crítica e Teoria
Histórico-Cultural da Atividade.
• Seminários para apresentação de trabalhos e pesquisas dos alunos.
• Atividades de investigação em sala de aula.
• Pesquisas orientadas sobre temáticas correlatas ao curso.
• Uso de recursos tecnológicos (computadores, calculadoras e projetores multimída
(data show)).
• Utilização de noticiário de revistas, jornais, TV etc. como fonte de pesquisa.
Recursos Materiais:
• Computadores para trabalho com planilhas eletrônicas e pesquisas.
• Máquina financeira HP 12C ou emulador (free) dessa máquina para PCs.
• Projetores multimída (data show) e laptop.
• Jornais e revistas para análise de textos e propagandas, na busca de um olhar crítico
sobre a temática da Matemática Financeira na formação da cidadania.
• Livros didáticos e paradidáticos da área.
131
Processo de Avaliação:
A avaliação será realizada ao longo de todo o curso, considerando o empenho e a
produção dos alunos nas atividades propostas. Serão adotados os seguintes instrumentos e
critérios:
• Elaboração de resenhas e considerações relativas aos estudos desenvolvidos.
• Elaboração e apresentação de projetos propostos em equipes sobre temas relacionados
ao ensino da Matemática, à Educação Matemática Crítica e à Matemática Financeira.
• Portfólio individual de avaliação.
• Provas escritas.
6 CONCLUSÃO
No Brasil, a legislação educacional, os eventos acadêmico-científicos, os livros da área
de Educação Matemática e as revistas especializadas vêm acenando, há muito tempo, para a
necessidade de uma educação na Escola Básica que prepare para a cidadania. O ensino de
Matemática articula-se à cidadania pela via dos conteúdos e das estratégias metodológicas;
pela proposta curricular de formação de professores de Matemática; pela concepção de
educação e de ensino.
Nesse sentido, procedemos à leitura de projetos político-pedagógicos de cursos de
Licenciatura em Matemática; investigamos matrizes curriculares e planejamentos; refletimos
sobre legislações específicas para formação de professores e ensino de Matemática e
cotejamos todas essas fontes com o objeto de nosso estudo: a Matemática Financeira.
Esta investigação possibilitou observar licenciandos de Matemática aprendendo
“alguma” Matemática superior e reproduzindo em suas aulas uma postura metodológica
semelhante à que vivenciou com seus mestres do curso de graduação ou professores da Escola
Básica. Os conteúdos são repassados de acordo com a sequência de exercícios que estão no
livro didático, na apostila ou mesmo no caderno de um colega mais experiente.
As licenciaturas em Matemática já realizaram algum avanço e a legislação
educacional, em todos os níveis, influenciou positivamente. Tem-se, hoje, na maioria dos
cursos, disciplinas como Didática da Matemática, Matemática na Escola Básica, Laboratório
de Matemática etc.
No entanto, cabe refletir que não basta a simples existência de tais disciplinas para
interferir na formação do professor de Matemática. Há necessidade de se rever quem são os
formadores de professores de Matemática para atuarem na Escola Básica. Temos encontrado
astrônomos, astrofísicos, engenheiros, físicos e economistas ministrando disciplinas da área
de Educação Matemática para futuros professores da Escola Básica, sem terem, no entanto,
frequentado, como docentes, alguma sala de aula desse nível de ensino.
Acreditamos, como Paulo Freire (1998), que uma educação sem esperança não é
educação. Ao longo desta pesquisa de doutorado – analisando documentos, entrevistando,
lendo, estudando –, identificamos algumas pistas que fazem acreditar que a formação dos
professores de Matemática, foco maior desta tese, ainda tem esperança.
No que diz respeito à formação de professores, a esperança é de que, em um futuro
bem próximo, possamos formar professores de Matemática críticos, que, de alguma forma,
quebrem o mito da Matemática da certeza e preparem alunos também críticos, ao invés de
133
meros receptores e reprodutores de informação, que sejam sempre incentivados a avaliar e
criticar os modos como a Matemática permeia os fenômenos sociais. Convém ressaltar que os
estudos realizados foram de grande valia para a formação continuada deste pesquisador.
Não se pretendeu, em momento algum, esgotar o assunto da Matemática Financeira na
formação de professores nem tampouco, na parte específica de conteúdos e atividades,
abordar todos os temas da Matemática Financeira. O que se pretendeu foi apontar pistas,
indicar caminhos já trilhados com sucesso e incentivar leitores interessados a tentarem os seus
e se aprofundarem na temática e no desenvolvimento de pesquisas futuras.
No início desta pesquisa, tinha-se como uma das hipóteses que não encontraríamos, na
maioria dos cursos de formação de professores de Matemática, a disciplina Matemática
Financeira. Talvez essa hipótese tivesse sido influenciada pela própria formação e por
depoimentos de colegas da mesma geração e formação.
Essa disciplina foi encontrada em 28,8% das matrizes curriculares da amostra inicial
de 90 cursos avaliados, embora tal disciplina, pelo que se investigou, nem sempre estivesse
formatada com a preocupação da formação de professores para a Escola Básica. Identificamos
projetos político-pedagógicos de curso bem estruturados e bem escritos, os quais foram
discutidos pelos docentes ou representação destes junto à coordenação dos cursos de
licenciatura em Matemática. Embora possamos pensar que tais projetos tenham sido
realizados visando apenas a atender às exigências de legislações emanadas do INEP/MEC,
preferimos acreditar que já é um avanço e que em algum momento alcançarão as salas de aula
dessas graduações e, consequentemente, da Educação Básica.
Encontramos, também, diversos trabalhos de conclusão de curso de graduação,
dissertações de mestrado ou teses de doutorado, comunicações científicas e artigos em
periódicos cujo foco é a Educação Financeira ou a Matemática Financeira na Escola Básica. A
maioria desses trabalhos discute a importância dessa disciplina na formação de uma cidadania
crítica, na importância do uso da Matemática em atividades e contextos de trabalho. Os
relatos de colegas, alunos e ex-alunos têm apontado que os resultados são positivos e que
estão pesquisando e estudando sobre fatos, conteúdos, metodologias, que, direta ou
indiretamente, relacionam-se à Matemática Financeira, Formação de Professores e Educação
Crítica (Anexo A).
De nossa parte, há muitos anos temos pesquisado nessa área, produzindo artigos,
participando de eventos da área de Educação Matemática, publicando livros, orientando
trabalhos de conclusão de cursos de graduação, especialização e, mais recentemente,
dissertações de Mestrado Profissional em Educação Matemática.
134
Neste estudo, avaliamos projetos político-pedagógicos e matrizes curriculares de
cursos de Licenciatura em Matemática, assim como documentos da legislação educacional
brasileira, relacionados à formação de professores de Matemática. Entrevistamos docentes e
coordenadores de alguns desses cursos, analisamos livros didáticos e, finalmente,
apresentamos uma proposta para a disciplina Matemática Financeira na formação inicial de
professores de Matemática. Consideramos que essas matrizes curriculares, a legislação
educacional e os projetos político-pedagógicos dos cursos têm avançado bastante e
encontramos objetivos importantes na busca de uma melhor formação do professor de
Matemática. Constatamos, também, que tudo isso, na prática, ainda está bastante distante das
salas de aula dos cursos de Licenciatura em Matemática, conforme verificado pelas
entrevistas e análises documentais realizadas.
Temos presenciado, em diversos estados brasileiros, algumas boas, porém, isoladas
experiências envolvendo a Educação Financeira, o que nos deixa esperançosos. Projetos
governamentais ou em parceria com entidades privadas começam a ser desenvolvidos, como a
Estratégia Nacional de Educação Financeira (ENEF), a partir de novembro de 2007, proposta
pelo Comitê de Regulação e Fiscalização dos Mercados Financeiro, de Capitais, de Seguros,
de Previdência e Capitalização (COREMEC), objetivando fomentar a cultura da educação
financeira no país. Tal estratégia foi, finalmente, instituída por meio do Decreto n. 7397, da
Presidência da República, de 23 de dezembro de 2010, e está baseada no tripé: Educação
Financeira (dentro e fora do ambiente escolar para crianças, jovens e adultos), Proteção ao
Consumidor e Regulação das Instituições Financeiras10. Dentre outros, citamos alguns
exemplos de ações decorrentes, alinhadas com a ENEF:
• Cursos presenciais de Educação Financeira e programas de televisão, promovidos pela
BM&F Bovespa.
• Programa “Saúde Financeira Não Tem Preço”, do Banco do Brasil.
• Coleção Caixa de Educação Financeira, da Caixa Econômica Federal.
• Projeto “Criança e Consumo”, do Instituto Alana.
• Publicações para crianças e jovens no sítio do Banco Central do Brasil.
A ENEF é uma ação importante em sua função educativa, incluindo o combate a
hábitos que tiveram origem em períodos passados, onde reinava a hiperinflação e que não são
compatíveis com o momento atual brasileiro, de alguma estabilidade econômica e social,
mesmo com toda a turbulência vivida por outros países, notadamente os da Europa.
10 Mais informações em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2007-2010/2010/Decreto/D7397.htm>.
135
Nesta pesquisa, em que o foco central foi a formação de professores, procurou-se
verificar se todas essas iniciativas públicas ou privadas encontravam ações e preocupações
que se refletissem nas licenciaturas em Matemática e, para isso, investigou-se a disciplina
Matemática Financeira, objetivando aferir e inferir com que frequência e de que forma ela
estava presente nos cursos avaliados.
A amostra final desta pesquisa, de seis instituições de ensino superior, constituiu-se de
cinco instituições privadas e uma pública federal. Temos algumas hipóteses que não foram
objeto deste estudo, mas que são indicadas como desmembramentos para estudos posteriores.
Entre essas hipóteses, a indicação de que as IESs privadas, mais do que as públicas, tiveram
maior interesse de articular seus projetos político-pedagógicos dos cursos de Licenciatura em
Matemática com os Parâmetros Curriculares Nacionais da Educação Básica – Fundamental e
Médio. Acreditamos que tal preocupação derivou-se, principalmente, das avaliações externas
a que as IESs se submetem pelo INEP/MEC. Nos instrumentais usados para essas avaliações,
os membros das comissões de avaliação, entre outros, verificam se há coerência dos projetos
político-pedagógicos com a legislação, com os PCNs e se são previstas ações de
contextualização e interdisciplinaridade.
É nessa perspectiva que inferimos que ocorreram inclusões de disciplinas e
metodologias nos PPPCs das licenciaturas em Matemática e, nessa leva, a inclusão da
disciplina Matemática Financeira – o que justifica o percentual encontrado na pesquisa: cerca
de 30% dos cursos com essa disciplina em suas matrizes curriculares. Por outro lado, uma
análise desses mesmos PPPCs, confrontada com as matrizes curriculares desses cursos e com
as entrevistas realizadas, aponta que só a inclusão da disciplina não é suficiente. A disciplina
Matemática Financeira, para alcançar todos os objetivos apontados em neste estudo, precisa
ter um enfoque específico para formação de professores, na perspectiva da Educação
Matemática Crítica, e ministrada por docentes com vivência da Escola Básica e com preparo
específico para tal função.
Em termos gerais, a disciplina Matemática Financeira, com as características
apontadas, não faz parte das matrizes curriculares dos cursos de Licenciatura em Matemática
no Brasil.
Por essas razões é que se procurou apresentar uma proposta de curso, com o
referencial teórico da Educação Matemática Crítica, para a disciplina Matemática Financeira
na formação inicial dos professores de Matemática.
136
Nossa prática docente, embasada pelas pesquisas realizadas, leva-nos a crer que, com
professores bem preparados e conscientes de sua ação política, a Matemática Financeira pode
oferecer subsídios para o desenvolvimento do letramento matemático dos estudantes que
serão formados por tais professores, provendo o suporte matemático e lógico para o exercício
da cidadania.
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APÊNDICE A
Produção Acadêmica na Área de Matemática Financeira/Educação Matemática Crítica
a Partir da Proposta Objeto da Pesquisa
Aluno Título Local Ano Orientação*
Raphael Pereira dos Santos
Uma proposta de formação continuada sobre matemática financeira para professores de matemática do ensino médio
USS 2011 Janaina Carvalho e Ilydio Pereira
de Sá
Douglas Rosa Grijó
Práticas sociais e matemática: uma proposta transdisciplinar em uma escola rural de Paty do Alferes
USS 2011
Ana Maria Severiano de Paiva e Ilydio Pereira de Sá
Leandro Carvalho Vieira
A matemática financeira no ensino médio e sua articulação com a cidadania
USS 2010
Ana Maria Severiano de Paiva e Ilydio Pereira de Sá
Aluna Título Local Ano Orientação**
Sandra Cristina Lopes
Matemática financeira e contextualização: uma importante parceria na construção da cidadania critica
USS 2012 Ilydio Pereira
de Sá
Quadro A1 – Orientações em dissertações para o programa de pós-graduação stricto sensu mestrado profissional em educação matemática.
(*) Orientação concluída. (*) Orientação em andamento: qualificação realizada em outubro de 2011.
143
Aluna Título Local Ano Orientação
Sabrina D’Amato Gomes Paulo
Necessidade de incluir e aplicar o conteúdo de matemática financeira na 6ª série do ensino fundamental vinculado à prática cotidiana do aluno
USS 2004 Ilydio Pereira de
Sá
Quadro A2 – Orientação em monografia de conclusão de curso de pós-graduação lato sensu em educação matemática.
Aluno/a Título Local Ano Orientação
Cristiane Bahia Lima
Matemática financeira no ensino fundamental
USS 2009 Ilydio Pereira de
Sá
Gilsiane Almeida de Paula
Juros na vida x juros na escola
USS 2008 Ilydio Pereira de
Sá
Luciano Pecoraro Costa
Direitos do trabalhador brasileiro: um instrumento didático no ensino de matemática para jovens e adultos
USS 2006 Ilydio Pereira de
Sá
Rosângela Luiz Ferreira
Matemática financeira: presente no cotidiano das pessoas e ausente das escolas
USS 2005 Ilydio Pereira de
Sá
Luciana Brasil Sondermann
A outra face da matemática financeira
UERJ 2004 Ilydio Pereira de
Sá
Aline Corrêa Netto Gomes
A prática da matemática comercial e financeira nos terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental
USS 2004 Ilydio Pereira de
Sá
William Pereira de Macedo
Matemática comercial e financeira nos 3º e 4º ciclos do ensino fundamental
USS 2004 Ilydio Pereira de
Sá
Carlos Renato Seabra de Almeida Júnior
O ensino de matemática financeira para o nível fundamental e médio
UERJ 2004 Ilydio Pereira de
Sá
Quadro A3 – Orientação em trabalhos de conclusão de curso de graduação.
144
Autoria Título Local Ano Evento
Sandra Cristina Lopes e Ilydio Pereira de Sá
A educação financeira como elemento construtor da cidadania crítica (comunicação)
UFRJ 2011 32º Encontro do
Projeto Fundão/UFRJ
Ilydio Pereira de Sá
A matemática financeira como elemento de contextualização crítica no ensino fundamental
SMECRJ 2011
1º Seminário Internacional de
Educação Matemática da
Cidade do Rio de Janeiro
Ilydio Pereira de Sá
A educação matemática crítica e o currículo
SEESP 2010
Processos de Recuperação: Caminhos e
Desafios
Ilydio Pereira de Sá e Ana Maria Severiano de Paiva
Educação matemática crítica e matemática comercial e financeira na formação de professores
UA PT 2010
XXI Seminário de Investigação em Educação Matemática
Douglas Rosa Grijó, Ana Maria S. de Paiva, Ilydio Pereira de Sá, Lucimar A. de Nonno
Práticas sociais e matemática: uma perspectiva transdisciplinar em escola de área rural
ULBRA 2010
V Congresso Internacional de
Ensino de Matemática
Ilydio Pereira de Sá e Ruy César Pietropaolo
Educação matemática crítica e a disciplina matemática financeira nas licenciaturas no Brasil
UNIBAN 2009
II Seminário Internacional de
Educação Matemática
Ilydio Pereira de Sá
A matemática financeira na educação básica
UGF 2005
GAMAT 2005 – Encontro de
Matemática da Universidade Gama Filho
Ilydio Pereira de Sá
A matemática financeira na educação básica
ULBRA 2005
III Congresso Internacional de
Ensino de Matemática
Ilydio Pereira de Sá
Matemática financeira na educação básica
FEBF 2005
I Encontro de Educação
Matemática da FEBF
Ilydio Pereira de Sá
A matemática financeira: ideias básicas e aplicações
UFF 2004 2ª Semana da
Matemática da UFF
Ilydio Pereira de Sá
Os dois conceitos básicos da matemática financeira
UFRRJ 2002 Encontro de
Matemática da UFRRJ
Ilydio Pereira de Sá
A matemática financeira na escola básica
USU 1994
V Semana da Matemática da Universidade Santa Úrsula
Quadro A4 – Participação em eventos: comunicações, palestras e oficinas.
145
Autoria Título Periódico Ano
Ana Maria Severiano de Paiva e Ilydio Pereira de Sá
Educação Matemática Crítica e Práticas Pedagógicas
Revista Ibero Americana de Educación
2011
Cristiane Bahia Lima e Ilydio Pereira de Sá
Matemática Financeira no Ensino Fundamental
Revista TECCEN (USS) 2010
Ilydio Pereira de Sá e Vinícius Gusmão Pereira de Sá
Duas vezes 100 é igual a 200?
Revista do Professor de Matemática
(RPM 70 – SBM) 2009
Quadro A5 – Publicações em periódicos da área.
Autoria Título Editora Ano
Ilydio Pereira de Sá
Matemática financeira na educação básica (para educadores matemáticos)
SOTESE 2005
Ilydio Pereira de Sá
Curso básico de matemática comercial e financeira
Ciência Moderna 2008
Ilydio Pereira de Sá
Matemática financeira para educadores críticos
Ciência Moderna 2011
Quadro A6 – Livros publicados na área.
APÊNDICE B
Questões das Entrevistas Realizadas com os Coordenadores das Licenciaturas em
Matemática
1) Há quanto tempo consta da matriz do curso de Licenciatura em Matemática a
disciplina Matemática Financeira?
2) A inclusão dessa disciplina se deu por escolha da Coordenação ou houve alguma
discussão da equipe sobre reforma da matriz do curso?
3) Quais os dados estatísticos sobre reprovação nesta disciplina, desde a sua inclusão na
matriz do curso?
4) O professor que ministra a disciplina atualmente utiliza algum recurso tecnológico
(calculadoras científicas, planilhas eletrônicas etc.)?
5) A disciplina tem algum foco específico para licenciatura ou é ministrada de forma
similar ou mesmo conjugada com outros cursos da IES?
6) Há, no planejamento da disciplina, referência a questões cotidianas (perdas salariais,
financiamentos, compra de casa própria, imposto de renda, cartões de crédito,
cheques especiais etc.)?
7) O docente que ministra a disciplina teve em sua graduação alguma disciplina
específica de Matemática Financeira? Qual a formação dele?
8) Sua formação, tempo de magistério superior e tempo de magistério na Escola Básica.
9) Como é a participação dos docentes do curso na elaboração e atualização do Projeto
Político-Pedagógico do Curso?
10) O curso é oferecido em qual turno e para quantos alunos por período?
APÊNDICE C
Questões das Entrevistas Realizadas com os Professores que Ministram Matemática
Financeira nas Licenciaturas em Matemática
1) Quais os dados estatísticos sobre reprovação na disciplina de Matemática Financeira,
desde que você é o responsável por ela?
2) Você, em seu curso, utiliza algum recurso tecnológico (calculadoras científicas,
planilhas eletrônicas etc.)?
3) Há, no planejamento da disciplina, referência a questões cotidianas (perdas salariais,
financiamentos, inflação, compra de casa própria, imposto de renda, cartões de
crédito, cheques especiais etc.)?
4) Como se trata de um curso de Licenciatura, você costuma relacionar os conteúdos da
Matemática Financeira com aqueles específicos da Matemática da Educação Básica?
5) A disciplina é compartilhada com algum outro curso ou é ministrada especificamente
aos licenciandos de Matemática?
6) Sua formação, tempo de magistério superior e tempo de magistério na Escola Básica.
7) Você, em sua formação inicial ou na pós-graduação, teve alguma disciplina de
Matemática Financeira?
8) Adota algum livro ou apostila? Qual?
9) Conhece algum livro específico de Matemática Financeira ou Educação Financeira
que seja direcionado a Formação de Professores? Em caso afirmativo, qual?
10) Seus comentários sobre a importância da disciplina Matemática Financeira na
formação inicial de professores de Matemática.
ANEXO A – Depoimentos
Depoimento 1:
É incontestável a relevância da Educação Financeira no ambiente escolar para a
formação básica do cidadão. No Brasil, ainda se dá pouca ênfase ao trabalho da Matemática
com aplicações na parte financeira. É papel da escola preparar seus alunos para inserção na
sociedade como cidadãos críticos e conscientes de seus direitos e deveres. A falta de
informação nessa área acarreta problemas para o indivíduo enquanto ser social.
Oportunidades para esclarecimentos não faltam, já que conhecimentos financeiros podem ser
trabalhados vinculados à matemática trabalhada na escola.
Muitos de nós, professores, não estamos preparados; ou, por comodidade, não
queremos deixar o livro didático “de lado” um pouquinho e, ao invés de imensas coleções de
exercícios, trabalharmos aplicações da matemática na vida financeira de nossos alunos.
[...]
A Matemática Financeira a que estava habituada era um estudo que se resumia a um
emaranhado de fórmulas, que eram aplicadas mecanicamente, sem sequer pensar no que
estava fazendo.
Ao me inscrever na disciplina Matemática Financeira para Educadores Matemáticos,
eu já imaginava que seria dado outro enfoque, mas, confesso que superou minhas expectativas
e acrescentou muito aos meus conhecimentos e na prática em sala de aula. Minha visão crítica
diante de uma propaganda está muito mais apurada.
Ensinar Matemática Financeira perpassa a disciplina Matemática e abrange o ser
social que é o aluno. Deve ser ministrada em um ambiente de discussões acerca de fatos
próximos do cotidiano dos educandos, que estão inseridos em nosso dia a dia a todo
momento.
(Aluna S – Mestrado Profissional em Educação Matemática)
149
Depoimento 2:
“Professor, para que serve esse assunto no dia a dia? Onde vou aplicar tal disciplina?
Não vejo sentido algum no que “aprendo”. O senhor pode me explicar?”
Estas são perguntas que nunca vão surgir em uma aula de Matemática Financeira e
isso, por si só, já seria relevante para aprendê-la, pois todos a percebem em seu cotidiano.
Devido à dificuldade de encontrar um professor de Matemática que lecione esse
assunto, nós nos deparamos com professores de Administração lecionando Matemática
Financeira, por exemplo. Todavia, o problema é que pedem ao aluno para decorar fórmulas e
mais fórmulas e, desse modo, o aluno fica refém de só resolver problemas formatados, isto é,
igual a uma criança que, para resolver seus primeiros problemas de Matemática, pergunta à
professora se a conta é de “mais”, “menos”, “dividir” ou de “multiplicar”.
(Aluno R – Mestrado Profissional em Educação Matemática)
150
Depoimento 3:
Acredito que o fato de ter cursado, tanto na graduação quanto na especialização a
disciplina Matemática Financeira, tenha influenciado minha carreira como professor da
Escola Básica.
Acredito que a maior influência tenha ocorrido em minha prática docente na Educação
de Jovens e Adultos, pois tenho praticado aulas mais voltadas para a vivência dos estudantes,
em que são registrados não só conteúdos matemáticos, mas, concomitantemente, textos de
jornais e/ou revistas que contemplem a Matemática Financeira com viés crítico, em que um
estudante, por exemplo, consiga diferenciar os juros de uma compra a prazo em comparação a
um pagamento à vista.
A influência da Matemática Financeira está tão presente em minha vivência como
professor que acabei optando por realizar minha pesquisa de mestrado envolvendo essa
temática.
Os planejamentos das aulas sempre me trazem à mente as aulas que vivenciei, pois
penso, um dia, ser um excelente professor, tanto quanto tive nas minhas aulas da disciplina de
Matemática Financeira.
(Ex-aluno L – Licenciatura em Matemática e Pós-Graduação lato sensu em Educação
Matemática)