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CONSIDERAES SOBRE APSYKH NOS POEMAS HOMRICOS
Anselmo Carvalho de Oliveira*
Resumo: O presente trabalho trata da concepo de psykh, um tema com o qual o serhumano se ocupa a milnios. Aborda-se essa questo nos poemas homricos. SegundoHomero, a psykh uma sombra privada de suas caractersticas fsicas. Ela ganhasignificao no momento de morte e revela o no-estar-mais-vivo do homem. Homeroquando no valoriza a vida no alm-morte, valoriza a ao do homem neste mundo: nofazer cotidiano e na peleja da guerra.Palavras-chave: Homero,psykh, homem, vida.
Abstract: This article deals with the conception of psyche, which has been thematizedthroughout millennia. It explores this issue in Homeric poems. In accordance withHomer the psyche is a shadow with no physical characteristics. It gains meaning at themoment of death and shows the mans not being alive anymore. Homer does not givevalue for the live of the soul beyond the death, he gives value for the action of the manis this word.Key words: Homer, psyche, man, life.
Consideraes iniciais
Em poucos sculos, a Grcia passou por mudanas que transformaram
profundamente a vida social e espiritual do seu povo. Nesse perodo, surgiram as
cidades-Estado e, para govern-las, a prtica poltica; os primeiros filsofos,
posteriormente chamados de pr-socrticos, desenvolveram um pensamento racional
com a inteno de explicar o mundo sem recorrerem aos deuses; na arte, descobriram-se
novos mtodos de pintura na cermica, e, na arquitetura, construram-se grandes obras;
nas letras, surgiram a poesia lrica e a tragdia com alguns de seus mais importantes
representantes: Pndaro, Safo, squilo, Sfocles e Eurpides; surgiram tambm a
* Graduado em filosofia pela UFSJ e Ps-graduando em Biotica pela UFLA. Artigo vinculado pesquisaPsykh: a histria da alma na Grcia Arcaica, orientada pelo prof. Dr. Igncio Csar de Bulhes efinanciada pela FAPEMIG/FAUF/UFSJ. A pesquisa recebeu Meno Honrosa do comit externo deavaliao da FAPEMIG. Verso preliminar apresentada na XIV Congresso Nacional de Estudos
Clssicos, Araraquara 2007, sob o ttulo de Viso homrica da psykh.
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reflexo tica e o direito. No desenvolver dessas transformaes, a noo de "pessoa
ganhou novos significados.
Todas essas transformaes marcaram profundamente os desenvolvimentos
tcnicos, intelectuais e, principalmente, psicolgicos do homem grego e,
conseqentemente, do homem ocidental. Para Vernant (1990, p. 17), essas
inovaes ocorridas em todo o mbito da cultura e do pensamento grego marcaram
uma mudana de mentalidade to profunda que se pde ver nela o registro do
nascimento do homem ocidental, o surgimento verdadeiro do esprito, com os valores
que reconhecemos neste termo.
A principal categoria psicolgica descoberta pelo grego foi a psykh,
traduzida para o portugus pelo termo alma. Essa descoberta, no entanto, no foi
um acontecimento ocasional, mas ocorreu dentro do desenvolvimento histrico da
concepo de pessoa. A idia de psykh se fez presente em mbitos nucleares do
pensamento: a estrutura de referncia na filosofia, medicina, cincias e psicologia. As
transformaes desta idia entre os sculos VIII e IV a.C. foram fundamentais no
processo da descoberta do esprito1 e marcaram profundamente a compreenso do
homem de si mesmo e do cosmo na Hlade e, conseqentemente, em toda a histria da
humanidade.
Nos poemas homricos, Ilada e Odissia, no sculo VIII, atribua-se almahumana a condio de ser uma sombra destituda de qualquer caracterstica prpria, que
lembrasse o mundo sensvel dos vivos. Essa perspectiva comea a mudar na segunda
metade do sculo VI. Nos fragmentos considerados como rficos e em alguns poemas
de Pndaro, a alma aparece independente do corpo, mas presa a ele para expiar as culpas
cometidas em vidas passadas, com caractersticas prprias e, sobretudo, imortal. O
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homem, nesse contexto, adquiriu categorias psicolgicas particulares que transformaram
seus paradigmas frente ao mundo. Dentro dessa nova situao, a psykhdesempenhou
um papel muito importante passando a ser a caracterstica distintiva do homem. Esta
nova viso aparece em alguns poetas e teve seu desenvolvimento filosfico racional
com Plato, sobretudo no dilogo Fdono qual trata da origem e do destino dapsykh.
A viso platnica dualista que separa o homem em corpo e alma foi aceita
durante sculos na histria do pensamento humano e transformou-se em um paradigma
para a compreenso do homem. Mas como insinuamos anteriormente existia uma viso
completamente diferente sobre a psykhhumana e, por conseqncia, sobre o lugar do
homem no mundo. Esta viso esta presente na Grcia anteriormente ao surgimento do
movimento religioso rfico e a sua expresso mais clara est nos poemas homricos.
Neste artigo, buscamos clarificar a viso dos gregos sobre apsykhantes do surgimento
do movimento rfico atravs da anlise da palavrapsykhdentro de seus contextos nos
poemas homricos. A anlise buscar responder as seguintes questes: Como Homero
compreendia a psykh do homem? Nos poemas, como so tratados os processos
psquicos e sentimentais do homem? E como estas idias se relacionam com a moral
nestes poemas?
Na tentativa de interpretao existem, no entanto, complexos problemas
metodolgicos que preciso ser colocados.Primeiro, a terminologia usual para se falar da psykh nos livros
contemporneos fundamentada na interpretao socrtico-platnica dada idia. Ao
se adotar esta posio hermenutica no se leva em conta as transformaes histricas
sofridas pela lngua e mentalidade grega ao longo de trezentos anos2. Diferentemente
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destes, ater-nos-emos sobremaneira aos prprios poemas, suas relaes culturais com as
pocas representadas no texto e a partir da obter uma interpretao inovadora3.
Segundo, quando se falar que os homens em Homero no possuam uma
psykh, no se pretende dizer que eles no possuam sentimentos, no pensavam ou no
possuam uma personalidade. Mas que estes processos no eram concebidos como
atividades de uma alma unificada. Eles eram funes de outras partes do corpo, como
demonstraremos a frente.
Feitos estes esclarecimentos introdutrios convm precisar detalhadamente a
etimologia da palavrapsykhe ento analisar seus significados nos poemas.
Etimologicamente psykh (cux)4 derivado regressivo do verbo pskhein
(cxein) soprar, emitir um sopro. Pskho(cxv), verbo, eu sopro, deixo escapar o
ar, origina-se, provavelmente, da forma no sufixada pso (*cv), soprar, que
possu sua origem no indo-europeu. Esta composio assemelha-se a pskho (cxv),
eu sopro ou a outras parecidas como psgo (cgv), eu esfrio, refresco e seus
derivados psykhrs (cuxrw) e psykhos (cxow). Porm necessrio no confundi-
las5.
A palavra psykh tradicionalmente traduzida nas lnguas modernas pelo
equivalente em portugus de alma; em ingls, soul; francs, me; em alemo, seele; em
espanhol, alma; em italiano, anima. A traduo da palavra por alma a menos
inadequada e aceita amplamente pelos especialistas, mas os significados de alma nas
lnguas modernas no abarcam completamente a rea semntica do original grego.
Outro problema o uso constante de alma na esfera de pensamento cristo ligando-a a
uma dimenso espiritual. Deve-se ter em mente, tambm, que o significado de alma,
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aqui, difere do socrtico-platnico o qual a psykhidentifica-se com o eu intelectual e
moral do homem. Estas confuses levam aos equvocos.
Psykh: o duplo do homem
A idia da descendncia da alma de uma estirpe divina, a concepo dualista
do ser humano composto de corpo e alma, a representao da alma como entidade
imortal, o que permite pensar uma vida aps a morte, so completamente estranhas
mentalidade homrica.
Em Homero, a psykh no possua uma origem divina responsvel pela
natureza privilegiada do homem. Os poemas no retratam os heris como seres duais,
indivduos de corpo e alma e, tambm, no fazem referncia imortalidade pessoal no
alm-tmulo. A psykhno representa a vida consciente do homem, mas ela adquire
significao quando o heri est desmaiado, neste momento ela revela-se por um breve
espao de tempo, beira da morte com um ferimento grave ou morto, neste momento
com o ltimo suspiro vo-se-lhe alma e animo (Ilada, V, vv. 297)6. Reale (2002, p.
17) atribui a psykh a representao do no-estar-mais-vivo do homem, ou em
linguagem filosfica, na expresso de W. Otto, o ser do ter sido7. Os textos homricos
e os comentadores ajudam a esclarecerem estas informaes.
O grande erudito alemo Rohde, no final do sculo XIX, em sua instigante
obra Psyche, foi o primeiro a dedicar um estudo minucioso sobre a alma e a
imortalidade entre os gregos como o prprio subttulo sugere: Seelenkult und
Unsterblinkkeitsglaube der Griechen. O livro foi responsvel por elevar a questo ao
primeiro plano dos estudos filolgicos e apesar das diversas controvrsias surgidas
sobre ela, ainda hoje obra de referncia obrigatria.
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Rohde adota como referencial terico o animismo nos povos primitivos
estudados por Hebert Spencer e aplica-o aos poemas homricos. Segundo o estudioso
alemo, a psykh uma fora invisvel que escapa do homem no momento de sua
morte. Esta fora a prpria vida. Somente com a psykho corpo capaz de perceber,
sentir e querer, mas no ela a responsvel por estas caractersticas. Apsykh o outro
eu do homem, que permanece oculto quando o corpo est vivo: la psique es, para l
[Homero], casi siempre, um ente real, el outro yo del hombre (ROHDE, 1948, p. 33).
Homero, contudo, ainda no vai to longe a ponto de afirmar a existncia de uma alma
independente depois da morte. As concluses do estudioso:
Quien, se halle ya habituado a reconocer la existencia de fuerzas
incorpreas que actan en el interior del hombre, se ver fcilmente
llevado, en esta ltima ocasin en que se mueven las fuerzas que
daban vida al hombre, a la hiptesis de que lo que provoca la muerte
del hombre no es un ente corpreo que escapa de l, sino una fuerza,
una virtud que deja de obrar en este momento: esta fuerza, esta
virtud, no es otra que la vida. No se le ocurrir, naturalmente,
atribuir, a un concepto tan escueto como es el da la vida unaexistencia propia e independiente despus de la desintegracin del
cuerpo. . No va tan all el poeta homrico: la psique es, casi siempre,
un ente real, el otro yo del hombre. Pero ha comenzado, a pesar de
ello, a marchar por el peligroso camino por el que el alma amenaza
con tornarse en una abstraccin, con esfumarse en el concepto mismo
de la vida, como lo demuestra el hecho de que, a veces, sin darse
cuenta, hable de psique donde nos otros diramos, sencillamente,
vida (RODHE, 1948, p. 33-34).
Posteriormente, outro erudito alemo, W. Jaeger reformulou e contestou
algumas teses de Rohde. Jaeger no atribua apsykho significado do eu oculto, mas a
percebeu como a representao do morto. A esta concepo, contudo, atribuiu pouca
importncia, considerando o seu verdadeiro significado o de conceito impessoal de
vida (JAEGER, 1952, p. 78). Para o estudioso, a psykh possua em Homero dois
significados inconciliveis: o de conceito impessoal de vida, isto , a vida animal
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recorrente em todos os seres; e o de esprito do morto, concebido de forma individual.
Porm estes dois significados no se sustentam em uma mesma raiz conceitual:
Resulta mucho ms fcil de entender si el sentido original de cuxno
era simplemente vida, como supone Otto, y si esta transferencia no
se consum en Homero, para quien el sentido dominante de cuxera
ya vida, sino ms bien en una etapa anterior, cuando la palabra an
quera decir con toda literalidad el alma-aliento (JAEGER, 1952, p.85).
O sentido original da palavra no era somente vida, mas anteriormente a
Homero significava alma-alento. Esta escapava no momento da morte identificando-
se com a crena primitiva para qual a nica parte restante do morto que poderia tornar-
se novamente perceptvel ao homem era o esprito. Desta identificao surgiram os
dois significados da idia expostos acima. Para Jaeger, o significado predominante de
psykh era o de vida e em determinado momento histrico abarcou tambm o
significado de sombra e, posteriormente a Homero, abarcou o significado de thyms
(vontade, alma, esprito) e passou a representar os fenmenos da conscincia.
As passagens do poema, no entanto, reforam o sentido da psykh como o
no-estar-mais-vivo do homem e elucidam sua significao entre as vrias
controvrsias dos estudiosos.
Homero, j nos primeiros versos da Ilada, deixa transparecer claramente o
significado da palavra:
Canta-me a clera deusa! funesta de Aquiles Pelida,
causa que foi de os Aqueus sofrerem trabalhos sem conta
e de baixarem para o Hades as almas (psykh) de heris numerosos
e esclarecidos, ficando eles prprios aos ces atirados
e como pastos de aves (Ilada, I, vv. 1-5)8.
Aspsykhacom a morte dos heris baixam para o Hades, o mundo subterrneo
onde continuam uma existncia privada de sentido. Seus corpos permanecem sobre a
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terra, neste mundo, destitudos de cuidados: jogados aos ces, pssaros, animais de
rapina, sendo ultrajados, perdendo todas as suas caractersticas distintivas, propriamente
a sua forma.
Esta situao indicada pela contraposio entre proacen (enviar para)
referente alma e atow (aqui mesmo) referente aos corpos, como podemos ver nos
seguintes versos:
pollw d fifymouw cuxw Aidi proacenrvn, atow d lria texe xnessin
A mais significativa referncia a psykh ocorre no canto XXIII da Ilada.
Aquiles, cansado aps ter perseguido Heitor em volta das muralhas de Tria, adormece
em seu acampamento e recebe a inesperada visita da psykh de Ptroclo, em tudo
semelhante ao amigo querido quando ainda era vivo9. O edolon exorta Aquiles a
concluir as prticas funerrias o mais depressa possvel, pois somente assim poder
ingressar definitivamente no Hades:
Com toda a pressa sepulta-me, para que no Hades ingresse,
pois as imagens [edola] cansadas dos vivos, as almas [psycha] me
exortam,
no permitindo que o rio atravesse para a elas juntar-me.
Por isso, vago defronte das portas amplssima do Hades.
D-me tua mo; chorando que o peo, no mais tua frente
Conseguirei retornar, quando o fogo me houver consumido.
(Ilada, XXIII, vv. 72-77)10
Para compreender a passagem citada preciso considerar o funeral no perodo
homrico e suas acepes, ou melhor, a significao das situaes onde o rito fnebre
no acontece.
Ao privar o morto dos rituais, do tmulo, do fogo, recusa-se a ele a
transposio de sua condio: a completa destruio de seu corpo na cremao o ponto
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final de sua existncia11. nas prticas fnebres que o morto adquire seu singular
estatuto: a alteridade de sua forma privada de sensibilidade e seu exlio em outro
lugar12
. Ao deixar o corpo, abandon-lo aos animais para ser devorado, ele perde sua
individualidade, a unidade de sua forma e as caractersticas representativas do valor
para o homem homrico: beleza, fora, vigor, e coragem. Quando no se cumprem os
ritos fnebres, ele est condenado a vagar entre o mundo dos vivos e o mundo dos
mortos. Na continuao do poema, Aquiles ao tentar despedir-se com um ltimo toque,
um abrao, a psykh de Ptroclo esvai-se por entre seus braos destituda de suas
caractersticas fsicas e desaparece na terra rumo ao Hades13.
A psykh possua todos os traos figurativos do morto: seus olhos, sua
aparncia, sua voz, mas ela um vazio: no possu a phrnes. O sentido desta palavra,
na passagem abaixo e para a compreenso dos significados da psykhnestes poemas
emblemtico:
Ora a certeza adquiri de que no Hades, realmente, se encontramalmas [psykh] e imagens [edolon] dos vivos, privados, contudo, dealento [phrnes]. [Grifo nosso] (Ilada, XXIII, vv. 103-104).
Phrnes possui uma gama de significaes muito grande14. Os tradutores ao
verterem o termo para o vernculo observaram o contexto no qual est inserido. Em
algumas passagens o termo possui seu significado ligado aos sentimentos. Em outras,
exprime o que relacionado mente, disposio mental do indivduo15. Contudo, as
phrnes so rgos fsicos situados prximos ao corao e que so traduzidos
comumente por diafragma 16. Este significado compreendido com maior facilidade
se se leva em conta que para os gregos, antes do sculo V a.C., o intelecto era situado na
proximidade do corao, como explicaremos a frente.
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Aquiles, ao afirmar que as psycha so privadas de phrnes, afirma,
conseqentemente, que elas no possuem sentimentos, que no possuem as atividades
mentais ligadas asphrnes e no possuem, tambm, os rgos fsicos. A psykh uma
sombra inconsistente.
A semelhana fsica da psykhcom o homem quando ainda era vivo indica
apenas um duplo que se desfaz na simples tentativa de contato fsico. A psykhno
est no homem como outro eu oculto e tambm no representa a vida animal, como
afirmaram alguns estudiosos. Os homens, em Homero, no possuem uma psykhque
seja o seu carter distintivo: os homens no possuempsykh: eles se tornam, depois de
mortos,psykha, sombras inconsistentes que levam uma existncia diminuda nas trevas
subterrneas (VERNANT, 2002, p. 427). Ao morrerem tornam-se psykha, o reflexo
do vivo, sombras destitudas de suas caractersticas fsicas e psicolgicas.
Ao serem privados de suas principais caractersticas: tocar e ser tocado,
fundamentos mnimos da realidade (ASSUNO, 2003, p. 108), perde-se as noes
de sofrimento e prazer, condies necessrias da existncia para os gregos. Sem estas
caractersticas, a psykhinsere-se na categoria psicolgica do edolon17. Traduzido to
apropriadamente por duplo. Segundo Vernant (2002, p. 428), o duplo no uma
imagem, no natural, contudo, tambm, no o produto da mente ou uma iluso18. Ele
possui a capacidade de movimentar-se em dois planos diferentes, pois ao mesmo tempoem que pertence a um mundo inacessvel, o mundo subterrneo dos mortos, revela-se
aos vivos. O duplo uma realidade exterior ao sujeito, mas que, em sua prpria
aparncia, ope-se pelo seu carter inslito aos objetos familiares, ao cenrio comum da
vida. (VERNANT, 1990, p. 389).
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Relaes entrepsykh,thyms e vida
Existem, no entanto, ambigidades sobre o conceito de psykhque precisam
ser esclarecidas.
Primeiro, em algumas passagens dos poemas, os tradutores vertempsykhpara
o vernculo vida:
A vida (psykha) se lhe escapa do ntimo
e seus olhos se ofuscam. (Ilada, V, vv. 695-696)19
A minha vida (psykh), sem dvida, vale bem mais do que quanto
dizem que Tria possua, a cidadela de belo traado (Ilada, IX, vv.401-402)20
Estas tradues levam s interpretaes equivocadas ao sugerirem que apsykh
possui duplo sentido. Mas na leitura de outras passagens dos textos e ao se levar em
conta o original grego as ambigidades dissipam-se. Vejamos: Homero, naIlada (XVI,
vv. 453), deixa claro a dificuldade em relacionarpsykhcom a vida:
atar pn d tn ge lphi cux afin21
Com a morte, o indivduo deixa escapar a fonte de sua vida e,
conseqentemente, a psykhvoa em direo ao Hades. Em outra passagem na qual a
vida do heri no est por um fio, Homero no emprega a palavrapsykh:
efiw x'ntm n styessi mn xa moi fla gonat' orore22
Os fragmentos apresentados ajudam a corroborar a afirmao de que a psykh
no est ligada vida do homem, mas como j insinuamos, ela liga-se ao momento da
perda da vida. neste momento que ela revela-se. Podemos atribuir a psykh o
significado de sombra, ou aproximando-a do timo, sopro que deixa o corpo com a
morte.
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Homero afirma apenas, primeiro, que a psyche abandona o homem na
morte ou no desfalecimento; segundo, que o homem arrisca a sua
psyche no combate, que luta pela sua psyche, que anela salvar a sua
psyche, e quejando. No precisamos aqui supor dois significados
diversos de psyche, como se no segundo grupo de expresses psyche
significasse vida, embora aqui translademos psyche por vida.
Quando algum luta pela sua psyche, arrisca a sua psyche ou anela
salv-la, pensa-se assim na alma que abandona o homem na morte.(SNELL, 1992, p. 29)
Esclareamos: a psykh s se revela com a perda da vida, mas ela no a
prpria vida ou responsvel pela vida no homem. Ela um duplo (edolon) do morto.
Assim nas passagens citadas anteriormente (Ilada, V, vv. 695-696 e IX, vv. 401-402) e
outras semelhantes pode-se entender a psykh como uma expresso simblica da
mortalidade23.
Segundo, existem passagens em que thyms e psykh no se distinguem
claramente:
Sarpdon erra
o alvo [Ptroclo]; alanceia, porm, na p direita, Pdaso;este, nitrindo, cai no p, exala o flego
vital (yumn) e arqueja, enquanto o sopro-vida (yumw) evola-se(Ilada, XVI, vv. 466- 469)24.
Em Homero, o thyms no a alma ou uma parte dela, mas um rgo que
est ligado s atitudes sentimentais e ao movimento dos ossos e membros25. Quando o
thyms deixa os membros acontece a perda dos movimentos e sentimentos, a vida, mas
ao contrrio da perda da psykh, o thyms no voa para o Hades, ele simplesmente
perde-se no nada. Segundo Snell (1992, p. 32), a idia do thyms voar para o Hades
contrape-se as concepes homricas.
Consideraes sobre os processos psquicos e sentimentais em Homero
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Homero no representa o homem atravs de sua alma e no a pressupe como
o princpio da vida ou da conscincia. Se as capacidades espirituais, isto , intelectuais e
sentimentais, do homem no esto localizadas napsykh, como elas so tratadas?
Na potica homrica no existe uma diferenciao conceptual entre vida
corporal e vida espiritual. Quando se fala nestes termos comete-se um anacronismo. A
separao entre estas duas condies, o corporal e o espiritual, acontece somente nos
sculos VI e V a. C.
As atividades psquicas das personagens homricas so indicadas por palavras
que representam o que chamamos rgo26. Esta tese aparece em uma primeira
formulao ainda incompleta no estudo de Rohde (1948). Para ele ker, etr, phrn e
phrnes, responsveis pelo movimento do nimo e da vontade, localizam-se no corpo.
Porm outros termos que representam a vontade e a inteligncia, thyms e nos,
possuem caractersticas incorpreas. Em outro importante estudo, Snell (1992) atribui
ao thyms e nos a caracterstica de serem rgos, mas no atribua a importncia
devida aos demais termos e as funes representadas por eles.
Os dois estudiosos esto parcialmente corretos. As palavras mais importantes
para designar o que chamamos de vida espiritual so: kradie, ker, etr, thyms, phrn,
phrnes, nos. Todos so rgos situados em determinada parte do corpo, embora
muitas de suas funes sejam psquicas e sentimentais
27
. Esta correlao entre rgo eatividade psquica e sentimental estranha para a mentalidade ocidental e moderna.
Pohlenz, contudo, corretamente a explica no pensamento grego:
Na observao dos processos psquicos tambm os gregos, como
outros povos, partiram do corpo. Na realidade, toda a emoo forte
repercute sobre o corpo e tambm nos so familiares expresses como
salta-me o corao, aperta-me o corao [...]. Mas ouvindo o
lamento de Gretchen [no Fausto de Goethe] pesado meu corao,
no tenho paz, no cremos que o corao seja fisicamente acometido
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de dor, mas simplesmente que um processo psquico envolve o
corao no sofrimento. O homem homrico, ainda no conhece esta
distino. Para ele justamente o corao que sente dor e alegria,
espanto e piedade: os sentimentos so funes dos rgos [Grifo doauto].28
As palavras de Homero representam concretamente as experincias sentimentais,
sensveis e cognoscitivas do homem. Isso acontece porque o alto grau de abstrao da
lngua e do pensamento necessrios para a formao da representao conceitual destes
processos ainda no foi atingida. A linguagem homrica e, conseqentemente, seu
pensamento, possui um maior nmero de expresses ligadas ao concreto e ao sensvel.
Consequncias morais da idia de psykh nos poemas homricos
A concepo homrica depsykhreflete-se, por sua vez, na idia de homem e
do valor atribudo vida.
Para Homero, o homem um todo no qual suas partes se sobressaem em
determinados momentos. no conjunto bem articulado dos rgos, em seus usos
cotidianos, que se exprime, do melhor modo, a natureza do homem29. na ao que o
homem compreende e realiza a sua natureza. So nos feitos hericos que acontece a
realizao de sua virtude. A aretdos guerreiros consiste na fora, destreza, vigor e
beleza excelncias ligadas ao corpo. Ao bem falar, que ligado ao convencimento e
superao de seu igual, vincula-se a honra e o reconhecimento dos grandes feitos.
Assim, o trgico desenvolvimento da guerra, a partir da retirada de Aquiles do combate
at o seu retorno, acontece porque ele, o maior dos heris gregos e como tal merecedor
das grandes honras no foi reconhecido por Agamemnom30. no reconhecimento pelos
seus iguais que o homem conhece seu valor e o que ele .
Contrariamente ao que ocorre no sculo IV, a imortalidade para o homem
homrico alcanada neste mundo atravs dos seus feitos hericos e da fama e estima
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pblica decorrente deles31. Segundo Dodds (2002, p. 26): o sumo bem do homem
homrico no a fruio da conscincia tranqila, mas sim a fruio da time (estima
pblica) [...] alm disso, a mais potente fora moral que o homem homrico conhece
no o medo de um deus, mas o respeito opinio pblica, aidos. Jaeger, nesta mesma
linha de pensamento, afirma tambm: o elogio e a reprovao (epoinow e cogow) so
a fonte da honra a desonra32. A tim alcanada pelos feitos hericos transmitida
posteridade e a imortalidade do heri garantida pelo poeta cantor da sorte dos
homens (Ilada, VI, vv. 358-359).
A no valorizao de uma vida no alm-tmulo apresentada na emblemtica
resposta de Aquiles a Odisseu na Odissia XI, vv. 484-491:
Pois antes estando vivo, te honrvamos como aos deuses,
nos os argivos, por sua vez agora tens amplo poder sobre os mortos,
estando aqui; por isto no aflijas por estar morto, Aquiles.
Assim eu disse, e ele, de imediato retrucando, disse para mim:
No me consoles da morte, ilustra Ulisses!
Preferiria, sendo um lavrador, alugar meus servios a um outro,A um homem sem-lote, que no tem muitos recursos,
Do que reinar entre todos os mortos j perecidos33
Na Grcia, o trabalhador privado de terra, vivendo fora do oikos, apenas um
paria e o assalariado que empresta seus servios a ele igual ou inferior a um
escravo34. Aquiles, no entanto, prefere a srdida existncia do lavrador a ser rei entre os
mortos. Primeiro, porque o alm-tmulo homrico no apresenta nenhum atrativo ou
recompensa para o homem e a psykh era apenas uma sombra sem caractersticas
distintivas; segundo, porque uma caracterstica da cultura grega arcaica a
corporeidade, a forte ligao e valorizao do corpo. No Hades, os mortos so apenas
uma massa invisvel do que foram em vida, assim, perderam seus valores humanos e a
capacidade de realizarem seus ideais de aret.
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Consideraes finais
A exposio precedente ocupou-se em descrever e informar acerca de um tema
cuja importncia no pode ser desconsiderada no cenrio das pesquisas e preocupaes
sobre o estatuto da pessoa: rastrear vestgios da concepo de alma nas primeiras
manifestaes da cultura ocidental, ou seja, nos poemas Ilada e Odissia, do perodo
arcaico da civilizao grega. Este percurso investigativo demonstra a dificuldade deste
tipo de pesquisa, que se torna demasiadamente importante para a histria da psicologia
do homem, na medida em que, rastreando as dificuldades, e, para alm delas, consegue
resgatar informaes essenciais para oferecer subsdio terico para a problematizao
do tema.
No comeo da pesquisa sabamos das dificuldades que enfrentaramos: a
ausncia de textos do perodo que poderiam clarificar as passagens obscuras em
Homero, a precria bibliografia sobre o assunto e a dificuldade para ter acesso a ela,
sobretudo, no Brasil. As interpretaes, muitas vezes, so mediatizadas pela viso
platnica ou aristotlica da questo o que, em alguns casos, levam a uma exegese
errnea e a pr-conceitos, em outros, a profundas incompreenses.
Para alm desses problemas, foi possvel descortinar as vises que o homem
grego representado nos poemas possua de sua psykh(alma). Para aqueles homens a
suapsykh um duplo (edola) de homens mortos (komnton), sombras insensveis
(aphrades) privadas de suas caractersticas particulares35. A psykh um
edola xamntvn, fantasma do defunto (Ilada, XXIII, vv. 72). Esta viso
implicava na considerao de umpost-mortem sem atrativos onde as almas particulares
permaneciam desconhecidas em meio multido de sombras sem nome.
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A viso homrica no valorizava uma vida aps a morte onde homens que
passaram por ritos de purificao e seguiram preceitos especiais viveriam uma nova
vida. Esta viso s comea a surgir no mundo grego a partir do sculo VI a.C. Nos
poemas, valorizava-se o destino trgico dos heris e sua vida possua o centro de
gravidade neste mundo. O homem procurava alcanar o ideal de aret herica e
perpetrar grandes feitos para, assim, garantir a imortalidade no canto dos poetas, a nica
possvel.
Documentao Textual
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1 Cf. SNELL, 1992; VERNANT, 1990, p. 441-442.2 Sobre as importantes transformaes no cdigo da lngua grega e suas influncias sobre o pensamentoCf. HAVELOCK, 1996a; HAVELOCK, 1996b; VERNANT, 1990, p. 441-484; SNELL, 1992.3 REALE (2002, p. 47-57) alerta sobre a necessidade de cuidado na leitura de Homero para interpretaes
anacrnicoas e, sobretudo, as embasadas na obra platnica.
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4 As citaes em grego sero feitas em fonte athenian. O texto grego adotado aqui para a Ilada o daedio bilnge estabelecida por Haroldo de Campos, 2004 Comparamos este texto com o estabelecidopor Paul Mazon (1938). Para Odissia usamos o texto estabelecido por Anton Weiher, 1961. As traduesseguidas para a Ilada so as de Haroldo de Campos e Carlos Alberto Nunes para o portugs e de Samuel
Butler para o ingls. As tradues da Odissia so as de Carlos Alberto Nunes para o portugs, a AntonWeiher para o alemo e a de Samuel Butler para o ingls. Quando necessrio modificamos ou adotamostradues alternativas, que em nossa opinio, aproximam-se mais do original. Citaremos os textos daseguinte maneira: o nome do poema abreviado, o canto em nmeros romanos e os versos em nmerosarbicos. Os nomes dos tradutores constam nas notas de rodap.5 CHANTRAINE, 1990, p. 1294-1295; BRANDO, 1991, p. 335.6 Ilada. V, vv. 293-295; IX, vv. 408; XIII, vv. 518. Cf. DODDS, 2002, p. 75.7 W. OTTO. Theophania. Der Geist der Altgrienchischen Religion, Frankfurt a. M., 1975, apud, Reale,2002, p. 75.8 Trad. de Carlos Alberto Nunes.9 Ilada, XXIII, vv. 57-109.10 Trad. Carlos A. Nunes.11 A importncia do rito fnebre na sociedade homrica explicitada em vrias passagens. Ilada, XIII,
vv. 336, Aquiles vaticina o destino cruel do corpo de Heitor que ser jogado aos ces. A ltima splica domoribundo trico no pela sua vida, j condenada, mas para que seu corpo seja restitudo ao seu pai paraser queimado na pira, Ilada, XXII, vv. 339-344. interessante observar a extrema comoo de Pramocom os ultrajes do corpo de Heitor em Ilada, XXII, vv. 411-427 e sua tentativa de recuperar o corpo deseu filho, Ilada, XXIV. Outra importante referncia a este assunto encontra-se no canto XVII quando setrava uma grandiosa batalha pelo corpo de Ptroclo. A passagem da Odissia. XI, vv. 70-80 tambm serefere ao assunto e muito semelhante Ilada. XXIII, vv. 72-77. Tambm Odissia, XI, vv. 220-222.12 Cf. VERNANT, 2002, p. 430.13 Comparar com Odissia XI, vv. 205-222.14 CHANTREINE, 1990, 1227-1228.15 Haroldo de Campos traduz phrenes em Ilada XIII, vv. 631 por saber e por mente nos versos IV, vv.104; VI, vv. 447; XI, vv. 411 e por corao em XVII, vv. 84. Carlos Alberto Nunes traduzphrenes noverso XIII, vv. 631 por saber e por mente no verso IV, vv. 104, mas no verso XI, vv. 411 traduz por
corao.16 Segundo REALE (2002, p. 65)phrnes um termo de traduo difcil: em parte ligado a um rgofsico, em parte exprime sentimentos; porm, muito amide (precisamente, como observaram osestudiosos, cerca de setenta por cento das vezes em que usado), exprime o que ligado com a mente.[Grifado no original] (REALE, 2002, p. 65) a melhor traduo para o termo no sentido de rgo fsico precordial. Visto que diafragma o significado assumido para o termo a partir do sculo V a.C.17 Desse modo, tem-se o direito de falar a seu respeito de uma verdadeira categoria psicolgica, acategoria do duplo, que pressupe uma organizao mental diferente da nossa. [Grifo nosso](VERNANT, 1990, p. 389)18 VERNANT (2002, p. 427-431) demonstra a existncia de outras formas de duplo, o phsma eneiros e analisa suas caractersticas. O autor diferencia claramente duplo de imagem. Um duplo totalmente diferente de uma imagem. No se trata de um objeto natural, mas tambm no se trata de umproduto mental, nem uma imitao de um objeto real, nem uma iluso do esprito, inscrita no mundo
visvel, mas que at em conformidade com o que simula, singularizando-o devido ao carter inslito comrelao aos objetos familiares, ao cenrio comum da vida. (p. 428)19 Trad. Haroldo de Campos.20 Trad. Carlos A. Nunes.21 Assim que a psique e o en vital dele despeguem. Trad. Haroldo de Campos.22 Enquanto o alento [vital] permanecer no meu peito se se moverem os meus joelhos. Ilada, X, vv. 89.Trad. Bruno Snell, 1992, p. 29-30.23 E dizer que nele existe uma s psyche pode muito bem ser entendido, como Snell, nele existe s umapsyche, ou seja, tomar esta expresso como o exato equivalente expresso que segue, ou seja, que ele mortal, que ele tem s uma vida-que-se-vai. [Grifo do autor] (REALE, 2002, p. 78)24 Trad. Haroldo de Campos.25 Cf. SNELL, 1992, p. 30-33; DODDS, 2002, p. 24; REALE, 2002, p. 61-64.26 A definio de rgo em portugus parte do corpo que goza de certa autonomia e desempenhauma ou mais funes especiais (Dicionrio Aurlio, p. 1232). Quando se descreve funes especficas
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representadas na linguagem e pensamento homricos em conceitos de outras lnguas incorre-se em errosterminolgicos. Segundo SNELL (1992, p. 39-40), se eu digo: thymos um rgo da alma, o rgo dasemoes anmicas, mergulho em expresses que contm em contradictio in adiecto, pois conceitos dealma e de rgo no so, para a nossa conscincia [moderna e ocidental] mutuamente compatveis.
27 Cf. REALE, 2002, p. 58-69. FINLEY (1988, p. 117) afirma: os deuses [gregos] eramantropomorfizados, as emoes ou os sentimentos estavam localizados em rgos especficos do corpo, aalma era materializada. [Grifo nosso]28 M. POHLENZ.Luomo greco. La Nova Itlia, Florena, 1962, apud, Reale, 2002, p. 60-61.29 A natureza do homem homrico manifesta-se mediante cada um e em todos os seus rgos, e mediantetodas as atividades desses rgos, fsicas ou psquicas, como jogo caleidoscpio bem articulado. (Reale,2002, p. 84)30 Il. I, vv. 315-32 e vv. 503-510. Cf. Jaeger, 2003, p. 20, 30.31 Cf. Il. IX, vv. 315-319: Nem Agamemnom, certo, nem outro qualquer dos Aquivos, / conseguirconvencer-me, pois graa nenhuma me veio / de meu esforo incessante em lutar contra os nossosinimigos, / Tanto ao ocioso, que ao mais esforado, iguais prmios so dados; / as mesmas honrar seoutorgam ao fraco e ao heri mais galhardo. Veja tambm Il. XI, vv. 783-784.32 Cf. tambm Finley, 1988, p. 108.33 Trad. Teodoro R. Assuno.34 Cf. Assuno, 2003, p. 107.35Aphrades indica ausncia da capacidade de perceber (phrzestha) (Assuno, 2003, p. 108).