Com Ciência Ambientalnovembro 2010 Seções
8 Notas Ambientais
14 Entrevista
90 Teses
94 Livros
96 Agenda
98 Quadrinho ambiental
34
Geração plug and play
SUMÁRIO
18
Biodiversidade revelada
Lançamento de edital no
valor de R$ 51,7 milhões
fomenta pesquisas sobre
os biomas brasileiros,
ampliando o conhecimento e a
competência nacional na área
e atendendo aos anseios da
comunidade acadêmica no Ano
Internacional da Biodiversidade
Viúvas da silicose
Lavra de ouro no Polígono
das Secas expõe lado
insustentável da mineração
na Bahia. Em Jacobina, viúvas
dos garimpeiros vítimas da
silicose ainda lutam na Justiça
para receber indenizações,
enquanto área do entorno da
mina continua degradada pela
poluição ambiental
Riscos mapeados
Prefeitura de São Luís mapeia
áreas vulneráveis e identifica
176 residências em situação
de alto risco nos 18 bairros e
47 ruas visitadas pelas equipes
da Defesa Civil da capital
maranhense. Dados levantados
auxiliarão gestores públicos a
construir cidade mais resiliente,
avalia especialista
54 66
Eletrificação da frota mundial de veículos mobiliza indústria
automobilística, que lança e pesquisa cada vez mais a
tecnologia dos carros recarregáveis. Em 2011, haverá
uma enxurrada desses modelos no mercado, relata o
correspondente Jim Motavalli, dos EUA. Nos 50 anos do
Salão Internacional do Automóvel de São Paulo, 22 híbridos
e elétricos comprovaram essa revolução e seduziram o
público recorde que passou pela 26ª edição da mostra
Cidades Seguras – Sudeste
Governo paulista inaugura
Sistema de Previsão e Alerta
contra Enchentes. Em Minas
Gerais, Defesa Civil lança
o Plano de Emergência
Pluviométrico 2010/2011
para enfrentar os fenômenos
climáticos adversos
provocados pelo La Niña
Mapeamento de riscos
A atuação do poder público
no mapeamento das regiões
vulneráveis a desastres
é ponto de partida para
investimentos direcionados
às comunidades expostas,
avaliam os pesquisadores
Antonio Edésio Jungles e
Rafael Schadeck, do CEPED/
UFSC
76 82
DIRETORA DE REDAçãO: Cilene Victor
EDITOR-CHEFE: Paulo Fernando
SECRETÁRIA DE REDAçãO: Natalí Alencar
DIRETOR DE ARTE: Nilthon Fernandes
REVISãO: Sérgio Simões
TRADUçãO (Inglês/Espanhol): Luciana Ginezi
Redação
ConSelho editoRial
Carlos Celso do Amaral e Silva e
Rubens Born (Sudeste),
Taís Pitta Cotta (Centro-oeste),
Domingos Barretos Tucano (Norte),
Verônica Falcão (Nordeste), Cecy Oliveira (Sul),
Frederico Dava (África), Fá Stolenwerk (Alemanha)
e Horst Otterstetter (Estados Unidos)
ColaBoRadoReS
Reportagens e artigos: Antônio Edésio Jungles e Rafael
Schadeck (SANTA CATARINA); Efraim Neto (BRASÍLIA);
Fernando Rebouças (RIO DE JANEIRO); Gervásio Lima (BAHIA);
Jim Motavalli (EUA); Júlio César da Cruz Correia e Luiz Carlos
Magalhães (MARANHãO); Natalí Alencar e Paulo Fernando.
Fotografias: Moacir Prado
On-line: Anderson Santos e Francisco Freire
Agradecimento: Agência Reuters e fotógrafos Zuppani
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Fernando Fanelli
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a edição de maio, Com Ciência Ambiental publica o caderno especial Percebendo Riscos, Reduzindo Perdas – um espaço des-tinado à divulgação do conhecimento sobre as mais diversas questões rela-cionadas aos riscos de desastres.
O caderno, uma das ações do projeto PCRD (Promoção da Cultura de Riscos de Desastres), da Secretaria Nacional de Defesa Civil, em cooperação técnica com o Ceped (Centro Universi-tário de Estudos e Pesquisas sobre De-sastres) da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina) e em parceria com a revista Com Ciência Ambiental, tem o propósito de fomentar o diálogo e a troca de conhecimento, opiniões, ideias e im-pressões entre os diversos atores sociais sobre essa importante temática contem-porânea, vislumbrando promover, por meio de seu público formador de opi-nião, a cultura de riscos de desastres em detrimento à velha cultura de desastre.
Assim, desde a sua primeira edição, o caderno publica, mensalmente, um artigo sobre os riscos de desastres e suas implicações científicas, sociais, políticas, culturais, ambientais e econômicas.
Na edição anterior, publicamos no caderno o artigo Desafios do Mape-amento de Áreas de Riscos, assinado por Antônio Edésio Jungles e Rafael Scha-deck, respectivamente diretor e coorde-
nador de projetos do Ceped da UFSC, uma das mais importantes instituições produtoras de conhecimento da área.
Alguns erros no processo de edição e impressão, porém, fizeram com que a nossa equipe editorial tomasse a decisão de reimprimir o referido artigo, minimi-zando com isso quaisquer prejuízos aos nossos leitores e articulistas.
A decisão de publicar novamente o artigo nesta edição não poderia ser mais providencial, uma vez que brindaremos os leitores com duas abordagens sobre a mesma temática: o mapeamento de áreas de riscos. No primeiro artigo, o caderno traz as impressões de dois agentes públicos de Defesa Civil sobre a questão do mapeamento de áreas de riscos, porém, com foco em uma reali-dade: a de São Luís do Maranhão.
Assinado por Luiz Carlos Maga-lhães e Júlio César da Cruz Correia, o artigo é um brinde ao que gosto de chamar de “homens de boa vontade” e um exem-plo real de que é possível fazer, mesmo quando se tem pouco ou nenhum recurso.
Na sequência, o texto de Jungles e Schadeck faz uma discussão sob a luz do conhecimento científico, sem, no entanto, afastar-se da realidade social, política, econômica e cultural.
O erro e a decisão de republicar o segundo artigo aqui citado permitiram o encontro de duas abordagens na mesma seção. Por um, caminhamos pela estrada da ciência, pelo conhecimento sólido que, ainda, poucas cidades brasileiras têm por perto. Pelo outro, a estrada é sinuosa, mas necessária se quisermos construir cidades mais seguras frentes aos riscos de desastres.
Boa leitura!
Cilene VictorDiretora de Redação
Sobre um erro
providencial
www.comcienciaambiental.com.br
Desde
Amb entalCOM CIÊNCIA
EDITORIAL
Agro-nômico de Campinas desenvolveu um novo tipo de feijão para o mercado brasileiro. O grão, batizado como IAC Formoso, é 23% mais rico em prote-ínas e possui tempo de cozimento 20 minutos menor do que cultivares como Pérola Embrapa e IAC Alvorada.
Além dessas vantagens ao con-sumidor final e à dona de casa, a nova cultivar também beneficia os produto-res. Segundo o órgão ligado à Secretaria de Agricultura e Abastecimento do Estado de São Paulo, da germinação à colheita ele se desenvolve em apenas 75 dias, 20 a menos em relação às va-riedades mais comuns.
A experiência é resultado de sete anos de estudos feitos pela equipe do pesquisador Alisson Fernando Chiora-to, do Centro de Grãos e Fibras do IAC, e as sementes deverão estar disponíveis para comercialização a partir de feve-reiro de 2011.
“É um feijão resistente a doen-ças como antracnose, mancha angular, murcha de fusarium. Tem excelente qualidade e caldo grosso, devido à liberação de sólidos solúveis totais durante o cozimento dos grãos”, es-clarece. A tolerância à bacteriose ainda reduz em 30% seus custos de produção
e o IAC Formoso facilita a rotação de culturas com milho e soja, cujos ciclos respectivos são de 120 e 140 dias.
De acordo com o centro de pesquisa, o índice de produtividade medido em 25 regiões do estado aponta 34 sacas por hectare em lavouras irrigadas e plantações em sequeiro. A nova variedade foi desenvolvida pelo Programa de Melhoramento de Genética do Feijão, que desde a década de 1930 já lançou 40 cultivares, dos quais seis estão em uso, entre as quais, o feijão carioca.
Curso da Unesp populariza conhecimento
abertas aos estudantes do ensino médio e professores do nível básico as ins-crições para o curso gratuito “Difundindo e Popu-larizando a Ciência”, a ser ministrado entre 24 e 29 de janeiro de 2011, das 8h30 às 17h30, no campus de Botucatu da Universidade Estadual Paulista.
Realizado desde 2007, o projeto, que pro-move a difusão e a socialização do conhecimento usando como ferramenta avanços recentes nas áreas de biologia, ciências e tecnologias, envolve pesqui-sadores e alunos de graduação e pós do Instituto de Biociências da Unesp
Por meio do aperfeiçoamento de docentes e alunos de escolas de ensino fundamental e médio, especialmente da rede pública, a iniciativa visa en-curtar as distâncias entre o conhecimento produzido nos centros de pesquisa e a realidade das escolas e, consequentemente, da população em geral.
Além das aulas, serão oferecidas oficinas com os temas “Experimentando genética”, “Expe-rimentando a botânica, “Investigando a vida das plantas” e “Reprodução de A a Z”.
A metodologia do curso engloba a organi-zação e realização das oficinas, acompanhamento e implementação de ações educativas e seleção de alunos para a realização de estágios técnicos em laboratórios de pesquisa da universidade.
As inscrições poderão ser feitas no site ibb.unesp.br até 31 de dezembro por meio de um formulário que deve ser preenchido e enviado por e-mail ou correio. A Unesp oferecerá auxílio para alimentação e transporte aos participantes.
Estão O Instituto
IAC desenvolve feijão mais nutritivo
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Com Ciência ambiental 98Com Ciência ambiental
NOTAS • Ciência nas escolas NOTAS • Pesquisa agrícola
Tão nutritivo quanto o açaí
é um fruto típico do sertão nordestino, muito semelhante ao açaí e conhecido pelo sucesso que faz como suplemento alimentar saudável. O uso de produtos orgânicos, naturais e ecológicos entre os praticantes de esporte ou pessoas submetidas a rotinas em jornadas de trabalhos cansativos e estres-santes é uma tendência em todas as regiões do país.
De acordo com a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), os percentuais de minerais na composição da polpa do pericarpo dos coquinhos das duas espécies são característicos de um alimento saudável.
O pesquisador José Barbosa dos Anjos explica que no licuri são encontrados zinco, potássio e fósforo em quantidade maior até do que no açaí. No caso do cálcio e do ferro, os teores registrados no fruto da Ama-zônia são levemente superiores. “O efeito nutricional da ingestão de polpa de licuri ou de açaí é praticamente o mesmo”, garante o engenheiro agrônomo.
Ao contrário do açaí, o licuri ainda não foi des-coberto pela maioria da população, inclusive até mes-mo na sua área de ocorrência natural: norte de Minas Gerais, passando por toda a porção oriental e central da Bahia, até o sul de Pernambuco, abrangendo ainda os estados de Sergipe e de Alagoas. Nessas regiões, ainda predomina a exploração extrativa da palmeira por grande contingente de agricultores familiares.
“Seu cultivo tem muito campo para crescer, pois ao agregar valor ao fruto da espécie nativa, além de ter ampliada a sua valorização, fortalece e confere sustentabilidade a um negócio extrativista que se expande por extensa área do semiárido brasileiro, em especial o território baiano”, salienta.
O licuri d e Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo inaugurou, em parceria com a Abimaq (Associação Brasileira da In-dústria de Máquinas e Equipamentos), o Lasag (Laboratório de Sistemas de Ar Comprimido e Gases).
Com investimento de R$ 1,1 milhão, o local é pioneiro na análise de equipamentos e peças utilizadas nesses sistemas e transporte de gases, como compressores, filtros, válvulas e secadores, entre outros, e permite certificar a quali-dade de instalações do gênero em plantas industriais, comerciais e hospitalares.
“Esses segmentos precisavam de um órgão técnico que pudesse ca-racterizar, por meio de testes e ensaios confiáveis, equipamentos e sistemas de ar comprimido”, explica o diretor do CMF (Centro de Metrologia de Fluidos), Kazuto Kawakita.
Na indústria, diversos equipa-mentos e processos utilizam o ar com-primido e, atualmente, as verificações são realizadas por empresas especiali-zadas contratadas ou são feitas pelos próprios fabricantes.
“Nossos testes terão o diferen-cial de serem desenvolvidos por um instituto que tem credibilidade com-provada e reconhecimento pelo merca-
do”, revela o presidente da comissão de execução do projeto, Jayme Bydlowski.Segundo Kawakita, o trabalho do Lasag também dará subsídios para
que a ABNT (Associação Brasileira de Normas Técnicas) e a Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) regulamentem o assunto no país, produzindo normas de uso do ar comprimido nos diferentes setores da economia.
O novo laboratório tem área de 300 metros quadrados e está instalado no prédio 45 do campus do IPT, na Cidade Universitária, em São Paulo.
O Instituto
IPT e Abimaq inauguram laboratório de gases
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NOTAS • Sabores do Brasil NOTAS • Ciência & tecnologia
Com Ciência ambiental 1110Com Ciência ambiental
d a UEMS (Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul) lançou em outubro mais um livro de pano do Projeto Brincando com Letras, doado às escolas municipais de Dourados.
Os 40 exemplares do livro Somos o meio ambiente foram produzidos pelos professores da rede pública, por meio de cursos oferecidos pela instituição de ensino superior. “Esse livro parece algo simples, mas tem um significado muito grande, pois, além de estar disponível à comunidade, é fruto de parcerias que visam promover a tecnologia social”, salienta o vice-reitor da UEMS, Adilson Crepalde.
O projeto Brincando com Letras começou após o Iman (Instituto Municipal do Meio Am-biente) levar os conceitos de reciclagem às escolas do município. “O Imam nos procurou e apresentou a necessidade de mostrar às crianças a importância da preservação ambiental”, explica Graci Marlene Pavan, uma das coordenadoras do projeto.
Segundo a pesquisadora, é por meio da brinquedoteca da universidade que eles oferecem o curso de confecção de livros de pano, que pode ser trabalhado com diversos temas, mas por enquanto está focado no meio ambiente.
“Além do livro compor a biblioteca da escola, deve ser usado nas aulas das séries iniciais”, ressalta a diretora do departamento de Ensino da Secre-taria, Marinetes Nelvo Nunes, lembrando que os professores também estão capacitados para oferecer a oficina aos demais membros do corpo docente da escola onde lecionam.
A brinquedoteca
NOTAS • Literatura sustentável
12Com Ciência ambiental
Livro de pano chega às escolas públicas
Apesar do crescimen-to econômico e avanços sociais registrados nos úl-timos anos, grandes desa-fios aguardam a presidente eleita Dilma Rousseff. No tocante à agricultura e pecu-ária, as principais demandas a serem resolvidas pela ocu-pante da vaga a ser deixada por Luiz Inácio Lula da Silva no Palácio do Planalto estão relacionadas ao crédito, ga-rantia de renda ao produtor e defesa sanitária.
Segundo o engenheiro agrônomo Roberto Rodri-gues, professor titular do Departamento de Economia da Unesp (Universidade Es-tadual Paulista), campus de Jaboticabal, as cadeias pro-dutivas também estão preo-cupadas com a valorização do real e o apagão logístico que assombra o país.
“O PAC [Programa de Aceleração do Crescimento] é muito positivo, mas faltou ampliarmos as PPPs [Parce-rias Público-Privadas]”, avalia
o especialista, que coordena o Centro de Agronegócio da Fundação Getúlio Vargas.
Para consolidar a susten-tabilidade do setor e assegu-rar a expansão da atividade responsável por 25% do PIB (Produto Interno Bruto), 40% das exportações e 1/3 dos empregos do país, Rodrigues defende mais investimentos públicos em pesquisa, desen-volvimento e inovação.
“Temos a melhor tecno-logia tropical do planeta e somos líderes na produção de alimentos e agroenergia, o que atrai capitais para cá”, ressalta.
Na entrevista concedida à Com Ciência Ambiental durante o movimentado Con-gresso da Indústria 2010, o ex-ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento cri-ticou as mudanças do Código Florestal propostas pelo de-putado Aldo Rebelo (PCdoB--SP) e detalhou os seis pilares fundamentais que sustentarão o crescimento do agronegócio nos próximos anos.
Paulo FernandoDE SãO PAULO
Roberto Rodrigues
Inovação tecnológica garante
sustentabilidade do agronegócio
ENTREVISTA
Com Ciência ambiental 1514Com Ciência ambiental
pa
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Fe
rna
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o
Redução do volume de investimentos públicos em pesquisas e extensão rural pode, no entanto, comprometer a competitividade brasileira, alerta especialista
CCA – O que o futuro governo
precisa fazer para descentrali-
zar o escoamento da produção
agrícola nacional e fomentar
as exportações?
Roberto Rodrigues – Investir
em logística, infraestrutura e
portos – e também no trans-
porte para chegar-se ao porto.
Investimento na área portuária
seria uma solução muito plausí-
vel, mas se não houver ampliação
do acesso ao porto, o produtor
fica com uma taça na mão: o
volume é grande, mas o pé é pe-
queno. Por-
tanto, é pre-
ciso investir
na ferrovia
Norte-Sul,
n a s r o d o -
v i a s , i n -
c lusive na
Belém-Brasília, para que esses ca-
minhos facilitem as exportações.
No Espírito Santo e no Ceará,
também há uma série de portos
que demanda investimentos
maciços em revitalização e acesso.
CCA – Quais segmentos do
agronegócio são mais afetados
pela deficiente infraestrutura
logística do Brasil?
Rodrigues – Os agricultores
sofrem para introduzir insumos
no país. Nós importamos quase
60% do adubo empregado no
Brasil, que entra por Santos,
mas o consumo está no Mato
Grosso, no Tocantins, Mara-
nhão e em outros estados. A
pergunta tem as duas vertentes,
abrangendo nossas dificuldades
para importar e exportar. É
lógico que a resposta está nos
produtos com maior volume
de exportação. A soja, por
exemplo, é um produto que
exportamos mais da metade da
nossa produção. Então, a cadeia
produtiva do complexo soja é o
setor com maior demanda, so-
bretudo se considerarmos que
um estado competitivo nesse
segmento, Mato Grosso, tem
um apagão logístico e escoa a
produção a partir de Paranaguá.
Nunca vai dar para competir
com um produto americano
que sai pelo rio Mississipi, pelo
porto do México. Nossa soja sai
perdendo nessa competição, em
função do custo logístico.
CCA – O PAC não está solu-
cionando esse problema?
Rodrigues – Antes do governo
Lula não havia planejamen-
to estratégico da logística e
estrutura. Agora, temos um
projeto que, se devidamente
implementado com autoriza-
ção adequada, dará uma nova
malha logística para o país.
O PAC, assim como todo o
projeto logístico portuário por
trás desse programa, é muito
positivo, é um avanço. Quanto
aos investimentos, ainda não
foi feito o que se desejava.
Faltou ainda uma ampliação
das PPPs, faltou dinheiro de
fora para essa área, que agora
está querendo aportar por aqui.
Em resumo, os avanços nessa
área são menores na prática
de investimentos do que no
planejamento estratégico.
CCA – Mas houve avanços nos
últimos anos?
Rodrigues – Sim, entre os quais,
um muito importante. Só 4,8%
das fazendas dispunham de
sistemas de armazenagem em
2003. Hoje, esse número é de
11%. Isso significa que mais que
dobrou, inclusive em números
absolutos, porque a produção
aumentou também. Portanto, o
crescimento foi significativo, o
que é um dado interessante para
o produtor rural.
ENTREVISTA
Com Ciência ambiental 1716Com Ciência ambiental
Roberto Rodrigues
CCA – Que investimentos o
próximo governo deve priorizar
para fortalecer a sustentabilida-
de econômica e ambiental da
atividade agrícola brasileira?
Rodrigues – Nos últimos 20
anos, a área plantada com grãos
cresceu 25%, enquanto a produ-
ção registrou aumento de 127%.
Isso é sustentabilidade, porque
salvamos floresta e cerrado com
tecnologia sustentável. Agora, o
que precisamos é investir em seis
pilares fundamentais.
CCA – Quais seriam esses
pilares?
Rodrigues – O primeiro é uma
política de renda adequada.
Todos os países agrícolas têm
uma política nesse sentido e nós
precisamos de uma que funcione
adequadamente. Precisamos de
um crédito rural novo, nossa lei
tem 45 anos. Imagina o que não
aconteceu nesses anos? Enfim,
necessitamos de uma política de
renda consistente. O segundo
pilar é uma política de tecnologia
– você diz muito bem, nós temos
tecnologia sustentável no Brasil.
Contudo, a tecnologia é um pro-
cesso dinâmico; se você deixa de
investir, você perde velocidade,
sobretudo em relação aos seus
concorrentes. Então, o investi-
mento em ciência é fundamental
e estamos começando a viver
uma fase em que a indústria de
insumos agrícolas multinacional
começa a investir em tecnologia
no país, ocupando um espaço
relevante que antes era ocupado
pelas empresas agrícolas públi-
cas, como a Embrapa. É preciso
cuidado. Temos de colocar mais
dinheiro na pesquisa pública. O
terceiro pilar é o comércio. Não
adianta nada agregar valor ao
produto para mandar para fora,
se não houver acordos comerciais
privados para redistribuição. A
questão de comércio também
implica acordos em nível gover-
namental, além da promoção
comercial no exterior. O quarto
pilar é a defesa sanitária, que é
nosso calcanhar de Aquiles. Tem
de haver política de governo,
que deve tomar uma decisão e
impor uma regra que não seja
apenas optativa. O quinto ponto
fundamental é infraestrutura
logística, cuja ênfase é priorizar
os investimentos de acordo com
os volumes que entram ou saem
do país. Por fim, o sexto pilar é a
questão institucional, é a estra-
tégia do governo. O Ministério
da Agricultura tem uma estraté-
gia formidável, tem tudo pronto
lá, tem câmaras setoriais para
cada uma das cadeias produti-
vas, mas a implementação de
políticas depende do orçamento
e quem o faz é o Ministério do
Planejamento. Liberação de
recursos é com o Ministério da
Fazenda. Juros, Banco Central.
Investimento logístico, Ministé-
rio dos Transportes. Agroenergia,
Ministério de Minas e Energia.
Floresta, Ministério do Meio Am-
biente. Ou seja, há uma estratégia
de Estado com política pública
desenhada na teoria, mas que
na prática não funciona. Por-
tanto, a institucionalidade é
essencial, porque a estratégia se
desenha adequadamente.
CCA – E o polêmico texto do
novo Código Florestal?
Rodrigues – Ninguém gostou
da proposta do Aldo Rebelo. Isso
para mim tem um significado
muito importante, porque se
alguém tivesse gostado e alguém
não, uma parte seria prejudica-
da. Eu acredito que o assunto
ainda será muito discutido no
parlamento, não será esse rela-
tório final do deputado federal
que será aprovado, pois o texto
desagrada tanto os ambientalis-
tas quanto os produtores rurais.
CCA – E que propostas os re-
presentantes do agronegócio
brasileiro poderão levar à reunião
do clima em Cancún, no México?
Rodrigues – O agronegócio já
tem propostas muito interes-
santes ligadas ao sequestro de
carbono e à remuneração dos
serviços ambientais prestados
pela natureza. A nossa ideia é
avançar positiva e propositiva-
mente, criando vantagens para
quem poupar, e não castigos.
Temos de colocar mais dinheiro na pesquisa pública e
investir na infraestrutura
Em um dos municípios do
Polígono das Secas está a maior
reserva de ouro da América do Sul,
a Serra de Jacobina, com potencial
de 1,2 mil toneladas do metal pre-
cioso. Jacobina, localizada a 330
quilômetros de Salvador, é conheci-
da como Cidade do Ouro, terra de
alegrias, mas também de tristezas
e exemplo dos desafios que o setor
de mineração deve enfrentar para
alcançar a verdadeira responsabili-
dade socioambiental.
Um dos maiores fantasmas da
Cidade do Ouro e dos municípios
vizinhos é, sem dúvida, a silicose.
Não é difícil encontrar na região
alguém com a doença ou que tenha
sido impactada por ela, como as
chamadas “viúvas da silicose”.
Com Ciência ambiental 1918Com Ciência ambiental
Gervásio Lima
DA BAHIA
RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL
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desafia
Exploração de
OUROsUstentabilidade
Com Ciência ambiental 2120Com Ciência ambiental
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a
RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL
A silicose, doença pulmonar fibrótica crônica, progressiva, irreversível e incurável, é de origem tipicamente ocupacio-nal causada pela inalação da poeira da sílica (partículas cris-talinas do dióxido de silício). A exposição à sílica e ao silicato é comum em quase todas as ope-rações de mineração, de obras e túneis. Fábricas de vidro, corte de pedras, produção de abra-sivos e metais e o trabalho em fundições são outras ocupações com risco de exposição.
A manifestação da doença ocorre após uma média de oito a dez anos de exposição ao mine-
ral, considerado carcinogênico. Como a silicose é uma doen-
ça que causa graves transtornos à saúde do trabalhador, determi-nando incapacidade ao trabalho, invalidez ou morte, a OMS (Or-ganização Mundial de Saúde) e a OIT (Organização Internacio-nal do Trabalho) lançaram em 1995 um programa visando a sua erradicação. O risco de adquirir silicose depende basicamente de três fatores: concentração de po-eira respirável, porcentagem de sílica livre e cristalina na poeira e a duração da exposição.
Vários são os casos de ex-mineradores que contraíram
a doença durante o período que trabalharam nas galerias da JMC (Jacobina Mineração e Comércio), empresa que em 2006 passou a ser controlada pela canadense Yamana Gold Inc. Uma dessas vítimas é Ranulfo Pereira da Silva, de 59 anos de idade. Após trabalhar 10 anos no subsolo, operando um equi-pamento para perfurar rochas, conhecido como “martelo”, Buquira, como é chamado pelos amigos e familiares, descobriu que também passou a fazer parte da triste estatística dos doentes da silicose. Apesar de ter des-coberto a doença em 1991, ele
continuou trabalhando até 1994, quando se aposentou por tempo de serviço (15 anos de subsolo). Para complementar a renda da família, pois o salário mínimo que recebe da Previdência nunca foi o bastante para sustentar a es-posa e três filhos, Buquira abriu um comércio para vender lan-ches e bebidas. Depois de mais de dez anos, o pior aconteceu, a doença se agravou. Por conta da dispnéia, com hipoxemia crônica e hipercapnia, necessita de oxi-genoterapia domiciliar contínua.
O estado, o município e a Jacobina Mineração e Comér-cio, a pedido do Sindicato dos
Mineiros, ajudam nas despesas com viagens para tratamento em Salvador e com a troca dos cilindros de oxigênio. A Secre-taria de Saúde do Estado enviou um aparelho que transforma o ar ambiente em oxigênio, di-minuindo substancialmente os custos com os cilindros.
Buquira conta que à época em que trabalhava no subsolo, os trabalhadores não dispunham de equipamento de proteção individual. “A gente trabalhava de bermuda. A única coisa que recebíamos eram luvas”, contou, dizendo em seguida que nunca foi avisado do risco de contrair al-
gum tipo de doença ocupacional.Segundo os médicos, Ra-
nulfo Pereira só ficará livre dos cilindros de oxigênio com um transplante de pulmão. Apesar de grave, seu estado de saúde não tirou sua vontade de viver. Sua alegria e seu humor conti-nuam o mesmo. Buquira não esconde sua satisfação quando recebe a visita dos amigos. Com o sorriso no rosto, ele anuncia para todos que já faz parte da fila para transplante de pulmão. “Só depende agora de um pul-mão novo, para eu ficar novo de novo”, comentou esperançoso e alegre Buquira.
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Com Ciência ambiental 2322Com Ciência ambiental
RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL
Uma das “viúvas da silicose” é Etelvita Mesquita de Souza, que era esposa de Expe-dito Benício de Souza, falecido em 1993, com apenas 29 anos. Recém-casada, Etelvita diz que o sonho do casamento e a alegria do “emprego certo” duraram pouco tempo. “O trabalho que lhe rendeu a doença durou seis anos e a nossa felicidade foi encerrada depois de pouco mais de dois anos”, desabafa a viúva, relatando em seguida as dificuldades que passou após a morte do esposo. “Tive de trabalhar em casa de família (doméstica) para sustentar minha filha que tinha pouco mais de dois anos. Foi um baque em nossas vidas, pois ainda não tínhamos con-seguido uma estrutura”.
A dificuldade financeira de Etelvita não demorou muito para ser resolvida. Ao contrá-rio de várias outras mulheres que perderam seus maridos pela mesma causa, ela, orienta-da pelo Sindicato dos Mineiros de Jacobina, passou a ser pensionista e entrou com um processo na Justiça contra a empresa minera-dora, cobrando indenização por acidente de trabalho. Ela ganhou o processo e hoje, apesar de triste pela perda do ente querido, comemora a vitória que poucas até hoje conseguiram.
Tristeza para uns, alegria para outros, as-sim é vista a empresa mineradora de ouro de Jacobina. A atividade da mineração, incluindo tanto o garimpo quanto a mecanização, esteve associada ao discurso do desenvolvimento construído pela companhia e também adota-do por diversos segmentos da sociedade local. A instalação da mineradora sempre represen-tou a possibilidade de emprego e renda.
Viúvas da silicose
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RESPONSABILIDADE SOCIOAMBIENTAL
O diretor do sindicato dos Mineiros de Jacobina e Região, o aposentado em mineração José Primo dos Santos, de 70 anos, diz orgulhoso poder, ainda que in-diretamente, estar envolvido com a área. Ele que trabalhou durante 16 anos na JMC, como mecânico de manutenção, em beneficiamento de amianto, faz questão de salientar que sempre tomou cuidado com a sua proteção individual. Sem perder o sotaque da sua origem soteropolitana, Primo, como é conhecido, diz: “você acha que ia dá mole? Você me deixe viu”.
Sua preocupação com a saúde do trabalhador é tanta, que Primo é cadeira cativa em diversos conselhos dirigidos para prevenção de doenças ocupacionais. Ele faz parte do Conselho de Saúde do município de Jacobina, do Conselho Gestor do Cerest (Centro Regional de Referência em Saúde do Trabalhador) e da Cist (Comissão Intersetorial de Saúde do Trabalhador do Estado da Bahia).
Como membro do sindicato que representa a categoria, Primo é enfático ao comentar o atual comportamento da empresa Jacobina Mineração e Comér-cio, em relação à segurança do trabalho. “Reconhecemos que a atual empresa que explora a mina tem investido bastante em equipamentos de segurança”.
Além das mortes causadas por doenças ocu-pacionais como a silicose, outras vidas foram perdidas por conta de diversos acidentes de trabalho ocorridos desde a abertura das minas de ouro em Jacobina. Ó último caso de morte foi registrado recentemente, no dia 11 de outubro. O operário Gustavo Ferreira dos Santos, de 33 anos, morreu após ser esmagado por uma cor-reia transportadora quando trabalhava na bri-tagem da metalurgia. Gustavo, que era casado e pai de um casal de filhos, havia começado a trabalhar na Yamana Gold na área de fundição de ouro há quatro meses.
Em nota enviada à imprensa, a JMC la-mentou o fato ocorrido. Segundo a empresa, no momento do acidente, o funcionário estava supervisionando o transporte de minério por meio de correia transportadora. Imediatamente após o acidente, a mineradora movimentou sua equipe de segurança ao local para interromper as operações e prestar socorro ao acidentado que, infelizmente, não resistiu aos ferimentos.
A companhia informou que determinou uma investigação sobre as causas do acidente e a apli-cação de medidas corretivas, como parte de seu procedimento normal de segurança e prevenção de acidentes. Ainda em nota, a mineração afirma que seus funcionários são obrigados a participar do exercício Diálogos Diários de Segurança, que reforça de forma permanente os conceitos dessas práticas a toda sua equipe de trabalho.
Segurança do trabalho Palavra do Sindicato
Segundo Primo, recentemente o Ministério do Trabalho e Emprego, atendendo à proposta do Programa Nacional de Eliminação de Silicose, divulgou portaria, proibindo o jate-amento de areia, utilizado para lim-peza de peças metálicas, polimento de peças da indústria metalúrgica, fosqueamento de vidros e na constru-ção e manutenção de embarcações. “Espera-se que medidas semelhantes sejam adotadas na área de mineração, principalmente no que diz respeito à exigência da qualidade dos equi-pamentos de proteção individual”, cobra o sindicalista.
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Foi justamente com o objetivo de aprimorar a profissão e melhorar a renda, que o então estudante e aprendiz de soldador e torneiro me-cânico Sebastião Dário Oliveira do Nascimento, em 1973, decidiu pedir emprego na empresa Unigeo Geologia e Mineração S/A, que fazia os trabalhos de sondagens para a instalação da mina. Sua primeira ocupação foi de amostrador, chegando até a função de chefe de oficina. Fo-ram quase trinta anos dedicados à mineração. Funcionário responsável, Tiãozinho, como é conhecido pelos amigos, nunca faltou um dia de trabalho, não folgando nem nos períodos cedidos quando do nascimento dos quatro filhos que tem com sua esposa, Elzita Vieira Nascimento. Toda essa dedicação lhe valeu o Prêmio Operário Padrão, concedido, em 1983, pelo Sesi (Serviço Social da Indústria (hoje denominado de Prê-mio SESI Qualidade no Trabalho - PSQT), em reconhecimento às suas qualidades pessoais e profissionais. “Depois da minha família, a mina era tudo para mim. Praticamente tudo que tenho hoje foi adquirido com o salário que recebia da mineração”, conta com entusiasmo.
Mesmo com toda a preocupação com segu-rança, várias ocorrências ainda são registradas, na maioria dos casos acidentes que segundo técnicos em segurança do trabalho são provo-cados por imperícias do trabalhador.
Entre os acidentados, encontramos Josael Carmo da Silva, de 30 anos. Depois de um ano e dois meses trabalhando na instalação de tubulação em uma das galerias da mina, Silva se acidentou. Com fratura completa com frag-mento ósseo da clavícula (conforme relatório médico), o jovem mineiro está impossibilitado de retornar ao trabalho. Além de reclamar da falta de apoio da empresa para o seu problema, Silva diz que esse é o segundo dos males que o trabalho em mineração causou a sua família. Segundo ele, o seu pai, Daniel Josael Ferreira da Silva, morreu em 1998 vítima de consequências causadas pela silicose adquirida no período em que trabalhou também na mineração, mas o médico que expediu o atestado de óbito colocou como causa da morte ‘parada cardiorespiratória e enfisema pulmonar’. “Se o médico tivesse co-locado o real problema, minha mãe já poderia receber uma indenização como acidente de trabalho”, completa. Perguntado se deseja voltar a trabalhar na mina, ele responde: “Por causa da mina eu perdi meu pai e estou incapaz para o trabalho. Não quero voltar lá nunca mais”.
O número de pessoas contaminadas pela silicose, somando as que já faleceram, ultrapas-sa centenas. Em Jacobina e região, há dezenas de mulheres que perderam os seus maridos por causa da silicose, as chamadas “viúvas da silicose”. Sem os esposos, geralmente as viúvas passam necessidades financeiras até conseguir a pensão por morte, depois de passar pela bu-rocracia da Previdência Social.
Acidentes Operário Padrão
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O geólogo Luiz Frega-dolli, gerente da área de Segurança, Saúde, Meio Ambiente e Comunidade, reforça a participação do erro humano nos aciden-tes. Segundo ele, os avan-ços tecnológicos e o uso de equipamentos modernos, de última geração, permi-tiram a redução dos riscos de acidentes e de doenças ocupacionais. Fregadolli explica que antes o con-tato do trabalhador com o perigo era inevitável por conta dos equipamentos que eram utilizados e que hoje são obsoletos, como o martelo usado para fu-rar rochas. “Atualmente, utilizamos máquinas per-furativas que o operador manuseia de dentro de uma cabine, totalmente segura”, informou.
Quanto à barragem de rejeito, Fregadolli assegura que ela não oferece risco à saúde da população. O ge-ólogo confirma que a antiga barragem, motivo de várias denúncias, ainda não foi desativada totalmente. “Ela é muito antiga e já chegou ao seu limite. Estamos no processo de fechamento, usando uma nova tecno-logia”, relata, ressaltando que na nova barragem será
utilizada uma manta para isolamento, algo de última geração, capaz de evitar a emissão de poeiras.
Fregadolli garante que não existe risco de conta-minação dos rios e riachos, apesar de a barragem que abastece a cidade ficar a cerca de dois quilômetros de distância do rejeito. Quanto às denúncias dos moradores que residem no entorno da mina, o geólogo disse desconhecer qualquer caso registrado.
Para reforçar ainda mais o discurso de preocupação ambiental, o gerente da área lembra a missão da empresa que, segundo ele, é a “pro-dução de metais preciosos, criando valor aos acionistas e garantindo os princípios de saúde, de segurança e de meio ambiente, proporcio-nando aos colaboradores e comunidades o desenvol-vimento socioeconômico”.
“Nossa preocupação com políticas ambientais é tanta que fomos certifi-cados com o ISO 14001, norma internacional que avalia a gestão ambiental”, salientou, destacando entre os principais motivos para receber a qualificação, o PGRS (Programa de Ge-renciamento de Resíduos
Sólidos), que define como deve ser feita a coleta, a se-paração, o armazenamento e a destinação final dos resíduos e o PRAD (Plano de Recuperação de Áreas Degradadas).
Sobre as políticas so-ciais da JMC, o gerente administrativo e de recursos humanos, Henrique Ma-rins ressalta várias ações, como o Projeto Integrar, que disponibiliza à popula-ção da cidade treinamentos, cursos e apoios na área do associativismo, como cria-ção de cooperativa. A JMC também tem realizado nos últimos três anos o Dia Integrar, que consiste na oferta de serviços gratuitos nas áreas de cidadania, saúde, lazer e cultura.
Como programa de responsabilidade social, Marins destaca também o Seminário de Parcerias, criado para dar apoio a projetos de cunho social, ambiental e cultural às en-tidades ou organizações so-ciais da cidade. “Os projetos apresentados são avaliados e selecionados pela própria comunidade. Para este ano, disponibilizaremos recursos na ordem de R$ 120 mil aos projetos con-templados”, informou.
Responsabilidade da empresa
No entorno da mina a céu aberto de João Belo a área está extremamente impactada pela poluição ambiental (água, ar, solo, acústica e vi-sual), que destruiu toda beleza cênica da região.
Em audiência pública, realizada em março, na sede da Acija (Associação Comercial e In-dustrial de Jacobina), para discutir segurança do trabalho, saúde do trabalhador e da população e impactos ambientais provocados pela JMC, diver-sos pontos foram abordados, principalmente os que dizem respeito ao meio ambiente e à saúde.
Durante o evento, foram apresentadas diversas propostas para amenizar ou erradicar os efeitos nocivos causados pela prática da mi-neração no complexo industrial da JMC. Em relação ao meio ambiente, as propostas compen-satórias foram a recuperação das APPs (Áreas de Preservação Permanente) e desassoreamento do conjunto de rios do entorno da mina até a localidade do Pontilhão da Canavieira de Fora, monitoramento eletrônico dos lançamentos de efluentes e criação de comissão de fiscalização, produção e distribuição permanente de mudas nativas para campanhas escolares e sociais.
A professora Sara Oliveira Farias, em seu livro “Enredos e tramas nas minas de ouro de Jacobi-na”, resultado de sua tese de doutorado e lançado em 2009, faz uma denúncia política e social sobre as precárias condições de trabalho que levaram à morte dezenas de trabalhadores acometidos pela silicose (leia entrevista com a pesquisadora em comcienciaambiental.com.br).
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Impactos ambientais
Personagens históricos na formação de praticamente todas as cidades da Chapada Diamantina, na Bahia, os garimpeiros de Jacobina, responsáveis pelos primeiros achados de diamantes nas lavras da região em 1732 e depois o ouro, conforme conta o historiador Raphael Fontes Cloux, voltam a fazer história, com a conquista do ‘Título de Imissão de Posse’ do Morro do Cruzeiro, onde, depois de mais de 12 anos de uma verdadeira batalha burocrática e judicial, irão poder explorar legalmente o metal precioso responsável pela maior geração de emprego e renda da cidade.
O Título da Portaria de Lavra para a Cooperativa Mista de Extração de Miné-rios e Garimpeiros de Jacobina e Região foi publicado no Diário Oficial da União em 29 de agosto de 2008, sob o nº no DNPM 873435/2007. Serão 49 hectares a ser explora-dos, ficando toda essa área entre os bairros da Grotinha, Serrinha e o Morro do Cruzeiro.
Para o geólogo José Rafael, idealizador do projeto que culminou com a publicação da portaria e entrega do título de imissão de posse da área, a conquista dos garimpeiros de Jacobina “é uma proposta única no Brasil e talvez no mundo e que só foi possível por um somatório que envolveu várias pessoas”. Em nome do DNPM (Departamento Nacio-nal de Pesquisa Mineral), Rafael informou que todos os estudos indicaram viabilidade técnica, econômica e ambiental, fazendo desse tema inclusive objeto de uma mono-grafia apresentada na França.
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Decisão inédita no país
O coordenador jurídico da entidade, Emmanuel Gomes, não escondeu a emoção de quem acompa-nhou a luta da classe desde as prisões e apreensões dos materiais de trabalho dos garimpeiros, que eram considerados ilegais, à fundação da coopera-tiva há mais de uma década. “Essa conquista não foi somente a burocracia, mas a política, a ação dos garimpeiros”, destacou Gomes, referindo-se à mobilização e aos entraves vencidos. “A partir de agora o ouro irá ficar nas mãos dos trabalhadores, em Jacobina”, completando que “mesmo com as diferenças, todos precisam trabalhar juntos”.
Já Kurt Menchen, ex-diretor da Jacobina Mi-neração e Comércio, multinacional que explora o ouro e outros metais preciosos no município, os garimpeiros atingiram um grande passo, com a conquista da Portaria e da imissão de posse, “saem de uma situação ilegal para uma situação amplamente legal”, desejando aos envolvidos que “o espírito empresarial se implante”, pois esse é o primeiro exemplo, nesses moldes, no Brasil e no mundo, “o mundo inteiro está ob-servando o sucesso do negócio”.
O cooperado Jonas Reis Sampaio disse que o início dos trabalhos de extração pelos garimpeiros, por meio da cooperativa, é um sonho não só da classe, mas também de todos os moradores da região que sempre desejaram produzir emprego e renda, a partir da riqueza do seu próprio solo. “Não tenho dúvidas de que a partir do momento que se iniciar a produção do ouro pela cooperativa dos garimpeiros, Jacobina não será mais a mes-ma”, entusiasma-se Jonas ao prever melhoras na economia local com a comercialização do minério explorado pelos cooperados.
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