UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS
DEPARTAMENTO DE SERVIÇO SOCIAL
TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO
MONYQUE VIEIRA RIBEIRO DE AZEVEDO
ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E
DEVERES DOS USUÁRIOS DO SUS: CONTRIBUIÇÕES DO SERVIÇO
SOCIAL NO ÂMBITO DO HOSPITAL MONSENHOR WALFREDO
GURGEL/PRONTO SOCORRO CLÓVIS SARINHO
NATAL – RN
2012
MONYQUE VIEIRA RIBEIRO DE AZEVEDO
ESCOLARIDADE VERSUS CONHECIMENTO DOS DIREITOS E DEVERES DOS
USUÁRIOS DO SUS: CONTRIBUIÇÕES DO SERVIÇO SOCIAL NO ÂMBITO DO
HOSPITAL MONSENHOR WALFREDO GURGEL/PRONTO SOCORRO CLÓVIS
SARINHO
Monografia apresentada à Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Serviço Social. Orientadora: Profª Ms. Jussara Nascimento
NATAL – RN
2012
AGRADECIMENTOS
Para a realização deste trabalho, agradeço primeiramente a Deus, que tanto
me deu força ao longo de todas as adversidades e dificuldades que surgiram
durante esse período, me proporcionando sempre calma, paciência e sabedoria para
lhe dar com todos estes problemas.
Agradeço também aos meus pais, que tanto contribuíram ao longo da minha
vida, para tivesse sempre as melhores oportunidades possíveis, não apenas no
âmbito da educação, em especial minha mãe, que sempre esteve ao meu lado,
entendendo e fazendo o possível para superar todas as minhas necessidades.
Aos meus amigos que sempre me apoiaram e compreenderam minhas
limitações quando tive que abdicar de muitos momentos de lazer para que todo este
trabalho se efetivasse.
E por último, mas não menos importante, agradeço à minha avó Aurinete, que
mesmo não estando mais entre nós há muito tempo, jamais, ao longo de sua curta
vida, deixou de pensar no meu bem, e no meu futuro. Sendo capaz de uma forma
muitas vezes até inexplicável, de parecer adivinhar tudo que viria a acontecer em
minha família.
RESUMO
Este trabalho deseja analisar a evolução das políticas de saúde no Brasil,
analisando sua historicidade para compreender as atuais dificuldades e deficiências
no âmbito da sua implementação. Tem como objetivo principal, relacionar de que
forma o déficit na educação contribui com o não conhecimento acerca dos direitos e
deveres dos usuários do SUS. E como objetivos específicos, compreender como tal
carência de conhecimentos reflete em procedimentos cotidianos não âmbito da
saúde; levantar os principais fatores responsáveis pelo abandono escolar, ou o não
ingresso na escola, e em casos de haver ingresso escolar, ressaltar os principais
motivos que impediram seu retorno; compreender de que forma o Serviço Social
pode intervir nessa problemática mediante ações de cunho socioeducativo no âmbito
do HMWG/PSCS. Como metodologia foi realizado um questionário semiestruturado
com pacientes de diversos setores do hospital, buscando compreender o que estes
entendem por saúde, direito à saúde, SUS etc, aliado à uma revisão de literatura e
coleta de dados, visando uma maior interação entre o pesquisador e o usuário.
Palavras-chave: Saúde Pública, Direitos e Deveres na Saúde, Déficit na Educação,
Escolaridade.
ABSTRACT
This paper aims to analyze the evolution of health policies in Brazil, analyzing
their history to understand the current difficulties and shortcomings in its
implementation. The main objectives relate how the deficit in education contributes to
the lack of knowledge about rights and duties of users of SUS. And as specific goals
such as lack of knowledge not reflected in daily procedures within health, raising the
main reasons for this dropout, or not going to school, and in cases of school
enrollment there to highlight the main reasons that prevented its return; understand
how Social Services can intervene in this issue by shares under the imprint childcare
HMWG / PSCS. The methodology used a semistructured questionnaire was
conducted with patients from diverse sectors of the hospital, trying to understand
what they mean by health, right to health, health services etc, together with a
literature review and data collection, aimed at increased interaction between the
researcher and user.
Keywords: Public Health, Rights and Duties in the Health Deficit in Education,
Education.
LISTA DE QUADROS
Quadro 1: Direitos dos Usuários do SUS
Quadro 2: Média de anos de estudo
Quadro 3: Estabelecimentos de ensino por níveis- 2003
Quadro 4: Eixos de Atuação dos Assistentes Sociais
LISTA DE SIGLAS
AIH – Autorização de Internação Hospitalar
BPC – Benefício de Prestação Continuada
CAP – Caixa de Aposentadoria e Pensão
CAP’S – Centro de Apoio Psicossocial
CF – Constituição Federal
CFESS – Conselho Federal de Serviço Social
CNCDO – RN – Central de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos do Rio
Grande do Norte
CNS – Conferência Nacional de Saúde
CNS – Conselho Nacional de Saúde
DUDH – Declaração Universal dos Direitos Humanos
HMWG – Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel
IAP – Instituto de Aposentadoria e Pensão
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
INAMPS – Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social
INPS – Instituto Nacional de Previdência Social
ITEP – Instituto Técnico-Científico de Polícia
LDB – Lei de Diretrizes e Bases
LOAS –Lei Orgânica da Assistência Social
LOPS – Lei Orgânica da Previdência Social
LOS – Lei Orgânica da Saúde
MEC – Ministério da Educação
MES – Ministério da Educação e Saúde
MESP – Ministério da Educação e da Saúde Pública
MS – Ministério da Saúde
NOAS – Norma Operacional de Assistência à Saúde
NOB – Norma Operacional Básica
ONG – Organização Não-Governamental
ONU – Organização das Nações Unidas
PBF – Programa Bolsa Família
PCB – Partido Comunista Brasileiro
PNAD – Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio
PNH – Política Nacional de Humanização
PNPS – Política Nacional de Promoção à Saúde
PSCS – Pronto Socorro Clóvis Sarinho
PSF – Programa Saúde da Família
SUAS – Sistema Único de Assistência Social
SUDS – Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde
SUS – Sistema Único de Saúde
USAID – United States Agency for Internacional Development
UTI – Unidade de Tratamento Intensivo
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 9
2. A SAÚDE COMO DIREITO DE TODOS E DEVER DO ESTADO ..................... 12
2.1 O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DA SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL ...... 12
2.2 O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS)............................................................ 23
2.3 OS DIREITOS E DEVERES DOS USUÁRIOS DO SUS ................................ 31
3. A EDUCAÇÃO COMO CONDIÇÃO PARA EXISTÊNCIA DA DIGNIDADE DA
PESSOA HUMANA................................................................................................... 35
3.1 DADOS DA EDUCAÇÃO NO BRASIL .................................................................. 35
3.2 A RELAÇÃO ENTRE SAÚDE E EDUCAÇÃO ..................................................... 41
4. SERVIÇO SOCIAL E SAÚDE: A EXPERIÊNCIA DO HOSPITAL MONSENHOR
WALFREDO GURGEL/PRONTO SOCORRO CLÓVIS SARINHO .......................... 45
4.1 O SERVIÇO SOCIAL E OS PARÂMETROS PARA ATUAÇÃO NA SAÚDE 47
4.2 AS ATIVIDADES DESENVOLVIDAS PELO SERVIÇO SOCIAL DO
HMWG/PSCS ................................................................................................................. 55
4.3 REFLEXOS DO (NÃO) ACESSO AO DIREITO À EDUCAÇÃO NOS
PACIENTES DO HMWG/PSCS ................................................................................... 58
4.4 AÇÕES SOCIOASSISTENCIAIS E SOCIOEDUCATIVAS DESENVOLVIDAS
PELO SERVIÇO SOCIAL ............................................................................................. 60
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................... 64
6. REFERÊNCIAS .................................................................................................. 67
APÊNDICES ............................................................................................................. 72
APÊNDICE A ................................................................................................................ 73
APÊNDICE B ................................................................................................................. 74
ANEXOS ................................................................................................................... 76
ANEXO 1 ........................................................................................................................ 77
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1. INTRODUÇÃO
O presente trabalho buscará analisar a forma com que as políticas de saúde
historicamente evoluíram no contexto da saúde pública brasileira, não deixando de
mencionar também as dificuldades e deficiências que a mesma possui para que sua
implementação acabe não ocorrendo da forma com que foi idealizada.
Tem como objetivo principal compreender de que forma o déficit de escolaridade
contribui com o não conhecimento acerca dos direitos e deveres dos usuários do
SUS. Já como objetivos específicos como tal carência de conhecimentos reflete em
procedimentos cotidianos, como marcação de consultas, exames, atendimentos,
entre outros; levantar os principais fatores responsáveis por esse abandono escolar,
ou o não ingresso na escola, e em casos de haver ingresso escolar, ressaltar os
principais motivos que impediram seu retorno; compreender de que forma o Serviço
Social pode intervir nessa problemática mediante ações de cunho socioeducativo no
âmbito do HMWG/PSCS.
Será tido como exemplo para tal análise, a realidade institucional do Hospital
Monsenhor Walfredo Gurgel/Pronto Socorro Clóvis Sarinho – HMWG/PSCS – que é
o maior hospital público do estado, com capacidade para atender casos de alta e
média complexidade no âmbito da urgência e emergência. Sendo assim, foi
realizado um questionário com pacientes de diversos setores do hospital, buscando
compreender o que estes entendem por saúde, direito à saúde, SUS etc. Esta
pesquisa foi realizada a partir de um questionário semiestruturado, aliada à uma
revisão de literatura e coleta de dados, visando uma maior interação entre o
pesquisador e o usuário, como também a observação para que seja feito um
levantamento sobre o histórico de vida e que fatores contribuíram para tal situação
Para tal compreensão, haverá a necessidade de um resgate histórico acerca
dos principais marcos da saúde pública no Brasil, em especial a Constituição
Federal de 1988. No decorrer do primeiro capítulo, serão relembrados fatos
históricos que contribuíram para que a saúde brasileira encontre-se no atual modelo,
passando desde a chegada da Família Real Portuguesa ao Brasil e o surgimento de
uma implantação de medidas de ordem sanitária voltadas para o combate de
epidemias, endemias e moléstias que assolavam a população de índios,
portugueses e diversas outras etnias que já encontravam-se instaladas no país. Ou
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seja, levantará fatos desde os primórdios das ações em saúde do país, passando
pelo período monárquico, passando posteriormente pelas ações desenvolvidas pela
República Velha, marcada pelo autoritarismo das oligarquias cafeeiras, como
também por surtos de varíola, febre amarela, febre tifoide, peste bubônica e cólera,
que ocasionaram uma maior atuação do Estado não só em períodos caóticos, mas
de uma forma contínua.
Abordará também a Era Vargas e a criação dos ministérios, caixas de
aposentadorias e institutos previdenciários, passando pelo período de regime militar
que até mesmo reduziu as verbas destinadas à saúde. No entanto, com o passar do
tempo isto mudou, já que o governo militar para se afirmar e diminuir as
manifestações populares acabou investindo em políticas sociais, e no âmbito da
saúde, esta ficou sob responsabilidade da Previdência Social.
Passará pelo Movimento Sanitário até a criação do Sistema Único de Saúde –
SUS – marcados pelo fim da ditadura militar, um período de total repressão a toda
forma de participação popular, migrando para um sistema de saúde, onde a
participação da população é uma das principais características que tornam esse
sistema que é vigente até hoje no Brasil, como um dos modelos mais participativos
já existente no âmbito de qualquer política social.
Com o decorrer da análise desse contexto, surgiu o questionamento sobre os
motivos que fazem com que este modelo encontre tantas dificuldades para executar
um atendimento de excelência, e seja marcado por longa espera em filas e por
vagas, consultas, exames, cirurgias etc. Diante disso, percebe-se que um dos
principais fatores é a falta de conhecimento da própria população acerca de seus
direitos, impossibilitando-os de exigir ou até mesmo questionar os motivos que os
fazem permanecer em tal situação.
Entende-se que a educação é um fator determinante para que este indivíduo
possa ver a realidade sob um olhar crítico, não aceitando tudo que lhe é imposto.
Para isto, o segundo capitulo tratará sobre a educação, não apenas a escolar, mas
também a educação voltada para uma promoção à saúde e a prevenção, ou seja,
não deixando que a saúde fique apenas no âmbito curativo, mas também
ressaltando a necessidade da saúde preventiva.
Por último, será analisado a atuação do Serviço Social no HMWG/PSCS,
fazendo uma ponte entre as demandas postas pela instituição, e se esta é tratada de
11
acordo com os Parâmetros de Atuação na Saúde, ressaltando também as
dificuldades que este setor tem que enfrentar para executar suas atividades com
sucesso e da forma idealizada pela divisão de Serviço Social do hospital, como
também as atividades que este desenvolve cotidianamente.
12
1. A SAÚDE COMO DIREITO DE TODOS E DEVER DO ESTADO
Este capítulo abordará a evolução das políticas de saúde no Brasil,
subsidiando a compreensão de fatores históricos que resultaram no atual sistema de
saúde, que muitas vezes não corresponde às necessidades da população, não
dando as respostas necessárias no que diz respeito ao enfrentamento dos seus
problemas de saúde.
Para tal análise histórica, haverá a necessidade de um resgate acerca da
trajetória de tais políticas até a promulgação da nova Carta Magna, a Constituição
Federal de 1988, envolvendo a aprovação da Lei Orgânica da Saúde e a
implantação e desenvolvimento do Sistema Único de Saúde (SUS) e a Política
Nacional de Humanização (PNH).
2.1 O PROCESSO DE CONSTRUÇÃO DA SAÚDE PÚBLICA NO BRASIL
Na chegada de Pedro Álvares Cabral ao Brasil, entendia-se que a saúde dos
índios, que desconheciam enfermidades que naquele período eram a causa de
morte de tantas vidas no continente europeu, era facilmente explicada pela riqueza
de alimentação que possuíam, além da pureza das águas e do clima ameno. No
entanto, logo essa visão de paraíso que antes era anunciada começou a modificar-
se, onde já no século XVII, as chances de sobrevivência dos colonizadores e
escravos na colônia eram muito pequenas, pois além dos constantes conflitos com
os indígenas, havia a existência de dificuldades materiais de vida juntamente com
diversas enfermidades.
De acordo com Bertolli, essas dificuldades ameaçavam o projeto europeu de
colonização e exploração econômica do Brasil, diante disso, no século XVI foram
criados os cargos de físico-mor e cirurgião-mor objetivando cuidar da saúde da
população, no entanto, esses cargos passaram muito tempo sem ocupantes, pois os
médicos, em sua maioria não aceitavam transferir-se para o país, desestimulados
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pelo baixo salário e receosos pelos perigos que aqui enfrentariam. Os que
finalmente se instalavam no Brasil enfrentavam dificuldades, levando em
consideração o grande território e a pobreza da população que não os permitia ter
dinheiro para pagar uma consulta, além do medo de se submeter a tratamentos que
eram baseados em purgantes e sangrias. Muitas vezes a população rica ou pobre,
recorria aos remédios feitos por curandeiros negros ou indígenas.
Quando a Corte Portuguesa chegou ao Brasil em 1808, foram determinadas
mudanças na área da administração pública, incluindo a área da saúde. O Rio de
Janeiro era o centro das ações sanitárias, já que era a sede provisória e principal
porto do país. Em 1813 foram fundadas as academias médico-cirúrgicas do Rio de
Janeiro, e em 1815 a da Bahia, que posteriormente foram transformadas nas
escolas de médicos do país, com o intuito de oferecer um atendimento constante e
organizado. Em 1829 foi criada a Imperial Academia de Medicina.
A maior parte das medidas sanitárias não surtiam grande efeito, fazendo com
que a população usasse seus próprios meios para lutar contra doenças e morte, os
ricos tinham a possibilidade de tratamento na Europa e clínicas particulares que
começavam a ser criadas, já os pobres continuavam recorrendo aos curandeiros.
Ainda com as tentativas de Dom Pedro II, incentivando pesquisas científicas acerca
das doenças da região tropical, estas não obtiveram o devido efeito, e o Império no
Brasil foi encerrado com os problemas de saúde coletiva perpassando para a
República, onde a essas alturas o país já era considerado um dos mais insalubres
do mundo.
A República Velha (1889-1930) foi marcada pelas oligarquias de São Paulo,
Rio de Janeiro e Minas Gerais, onde o setor da economia que mais se expandia era
a cafeicultura, voltava-se para a modernização do Brasil, expresso por exemplo, pelo
lema positivista da bandeira nacional “Ordem e Progresso”. Foi nesse período que a
mão-de-obra escrava foi substituída pela assalariada, composta em sua maioria de
imigrantes europeus que começavam a trabalhar na indústria que nascia no país,
resultante dos investimentos feitos do lucro do café, que ocasionou também uma
expansão das atividades comerciais e um aumento da população urbana. Enquanto
isso as epidemias espalhavam-se matando a população.
Como os serviços de saúde eram desorganizados, contribuiu para a
ocorrência de novas epidemias no país, onde entre 1890 e 1900 as principais
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cidades brasileiras foram atingidas por surtos de varíola, febre amarela, peste
bubônica, febre tifóide e cólera, matando milhares de pessoas. Buscando
estabelecer estratégias para resolução dessa situação, os médicos passaram a
ocupar importantes cargos na administração pública, onde suas principais ações
eram voltadas à retificação dos rios que causavam enchentes, drenagem de
pântanos, destruição de viveiros de ratos e insetos, divulgar regras básicas de
higiene e tornar obrigatório o isolamento de pessoas atingidas por doenças
infectocontagiosas, iniciando-se assim a hospitalização de vítimas de doenças
contagiosas e doentes mentais.
Com o Estado intervindo constantemente nas questões de saúde individual e
coletiva, ou seja, não agia apenas nos períodos de surtos epidêmicos, passando a
atuar todo o tempo e em todos os setores da sociedade, elaborando planos de
combate às doenças que reduziam a vida produtiva da população. Isso demonstra a
criação de uma política de saúde, que não pode ser eficaz isoladamente, mas sim
articulada com outros setores como educação, alimentação, habitação, trabalho etc,
que conjuntamente constituem a política social. Ainda que com promessas de
melhorias no padrão de vida da população, acabou-se privilegiando investimentos
na expansão da produção, beneficiando a elite econômica, mantendo assim, a
política da desigualdade.
O compromisso governamental com as necessidades básicas da população tem sido relegado sempre a segundo plano, perpetuando um círculo tristemente vicioso: desamparado e sem participação decisiva nas decisões do governo, o trabalhador recebe salários baixos e vive mal, adoecendo com facilidade. Doente e mal alimentado, ele tem a sua vida produtiva abreviada, tornando muito mais difícil a superação da pobreza nacional. (BERTOLLI FILHO, 2002, 15).
Era dado destaque à população urbana, definindo estratégias para melhorias
sanitárias das cidades e portos, nelas eram montados os primeiros laboratórios de
pesquisas médico-epidemiológicas. Enquanto isso, a população rural ficava em
segundo plano, só sendo vista quando os problemas sanitários interferiam na
produção agrícola ou extrativista que era destinada à exportação.
A maior intervenção foi feita em São Paulo, pelo Serviço Sanitário paulista,
criado em 1892, isto porque a oligarquia local destinou grandes verbas para a saúde
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pública, que até hoje foram as maiores investidas na área em relação ao total de
recursos anuais aplicados por um estado brasileiro. Nesse período, ficou
estabelecido que apenas os médicos formados em faculdades de medicina, seja no
Brasil ou exterior, poderiam tratar da saúde da população, ficando a cargo da polícia
localizar e punir os curadores que atendiam os doentes mais pobres. Para que estas
ações ocorressem de maneira mais simplificada, foram criados vários institutos de
pesquisas, em 1892 foram criados os laboratórios Bacteriológico, Vacinogênico e de
Análises Clínicas e Farmacêuticas, que logo depois foram ampliados tornando-se os
institutos Butantã, Biológico e Bacteriológico (mais tarde denominado Instituto Adolfo
Lutz).
Os brasileiros que viviam no interior eram os mais atingidos pelas endemias
(doenças constantes em determinada região, atacando um número de pessoas
previamente esperado). Estima-se que por volta de 1918 a população rural do Brasil
girava em torno de vinte milhões de pessoas, que sofriam com doenças como
malária, doença de Chagas, parasitas intestinais e tuberculose. Já nas cidades, a
situação era agravada pelo aumento descontrolado da população, resultante da
chegada dos imigrantes, fazendo com que o número de cortiços e favelas também
aumentasse.
Durante o governo de Rodrigues Alves (1902-1906), o Rio de Janeiro, a
capital da República, passou por uma reforma urbanística e sanitária, feita pelo
prefeito da cidade, Pereira Passos, e por Oswaldo Cruz, diretor-geral do
Departamento Nacional de Saúde Pública. Diversos trabalhadores que viviam, em
prédios antigos no centro da cidade, que eram transformados em cortiços foram
expulsos, pois considerava-se que estas construções ocasionavam a proliferação de
ratos e mosquitos transmissores de doenças. Posteriormente, foi feito um processo
de higienização da cidade, onde inspetores sanitários entravam nas residências à
procura de ninhos de ratos e mosquitos. A cidade de São Paulo passou por um
processo parecido, outras capitais estaduais e cidades do interior também, em maior
e menor escala. No entanto, os beneficiados eram geralmente a elite econômica, já
que essas reformas eram feitas nos bairros onde estas residiam.A população mais
pobre continuava a viver em péssimas condições de vida, sendo o maior alvo das
enfermidades.
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As leis que vigoravam durante a República Velha não garantiam aos
trabalhadores o direito a uma assistência médica de fato eficaz, e até mesmo a uma
indenização em dinheiro por doença ou acidente de trabalho, sendo assim, aqueles
que adoeciam eram obrigados a procurar hospitais filantrópicos. Somente o instituto
previdenciário dos trabalhadores das estradas de ferro de São Paulo, criado em
1923 através da aprovação da Lei Eloy Chaves1, assegurava o direito à
aposentadoria por tempo de serviço ou invalidez, tratamento médico e
medicamentos, auxílio funeral e direito à pensão aos herdeiros do segurado falecido.
Assim que chegou ao poder em 1930, Getúlio Vargas buscou acabar com o
poder que as oligarquias estaduais tinham sob o controle do Estado, e conseguiu
isso através de uma reforma política e administrativa que afastava os principais
líderes da República Velha. Vargas suspendeu a Constituição de 1891,governando
por decretos até1934,ano em que foi aprovada uma nova Constituição. Seu governo
foi fortemente marcado pela perseguição aos seus opositores e líderes sindicais,
especialmente a partir de 1937, quando foi instituída a ditadura do Estado Novo.
Em 1930 foram criados o Ministério da Educação e da Saúde Pública
(MESP), com isto, a área da saúde ficava a cargo do Estado, objetivando zelar pelo
bem-estar da população, em especial nas áreas onde ainda havia pouca ou
nenhuma assistência médico-hospitalar. A estratégia de Vargas era centralizar tais
serviços. Em 1937 o MESP foi reformado e passou a denominar-se de Ministério da
Educação e Saúde (MES), nessa reforma também foram instituídas as Conferências
Nacionais de Saúde (CNS). Na década de 1930 é perceptível como os avanços da
saúde estavam relacionados com os projetos políticos do Governo Vargas, em 1933
as Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAPs)2 se transformaram em Institutos de
1 Foi com a Lei Eloy Chaves, Decreto Legislativo n° 4.682, de 24/01/1923, que se implantou em nosso país a Previdência Social. Através deste, foram criadas as “caixas de aposentadorias e pensões” para os empregados das empresas ferroviárias, contemplando-os com benefícios de aposentadoria por invalidez, aposentadoria ordinária (seria atualmente a aposentadoria por tempo de contribuição), a pensão por morte e a assistência médica. Existia uma caixa de aposentadoria e pensão por empresa ferroviária. 2 As CAPs eram financiadas pela União, pelas empresas empregadoras e pelos empregados. Elas eram organizadas por empresas, de modo que só os grandes estabelecimentos tinham condições de mantê-las. O presidente das mesmas era nomeado pelo Presidente da República e os patrões e empregados participavam paritariamente da administração. Os benefícios eram proporcionais às contribuições e foram previstos: assistência médica-curativa e fornecimento de medicamentos; aposentadoria por tempo de serviço, velhice e invalidez, pensão para os dependentes e auxílio funeral. (BRAVO, 2006: 90)
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Aposentadorias e Pensões (IAPs)3. É nesta década que o Estado irá começar a
interferir efetivamente no setor saúde tendo é vista que é neste período que ela
emerge como questão social no Brasil, pois até o século XVIII a assistência médica
ocorria na filantropia e na prática liberal.
A conjuntura de 30, com suas características econômicas e políticas, possibilitou o surgimento de políticas sociais nacionais que respondessem às questões sociais de forma orgânica e sistemática. As questões sociais em geral, e as de saúde em particular, já colocadas na década de 20, precisavam ser enfrentadas de forma mais sofisticada. Necessitavam transformar-se em questão política, com a intervenção estatal e a criação de novos aparelhos que contemplassem, de algum modo, os assalariados urbanos, que se caracterizavam como sujeitos sociais importantes no cenário político nacional, em decorrência da nova dinâmica da acumulação. Este processo, sob domínio do capital industrial, teve como características principais a aceleração da urbanização e a ampliação da massa trabalhadora, em precárias condições de higiene, saúde e habitação. (BRAVO, 2006, 91)
Ainda na República Velha, movimentos de educação em saúde através de
cartazes e panfletos eram utilizados, objetivando ocasionar uma mudança de hábitos
anti-higiênicos da população que facilitavam a disseminação de doenças, em
especial infectocontagiosas. Como grande parte da população era analfabeta, tal
medida não surtia o efeito necessário, sendo assim, desde 1938 as mensagens
higienistas eram divulgadas em emissoras de rádio, e os cartazes e folhetos eram
coloridos, podendo ser entendidos até por aqueles que não sabiam ler. Havia as
enfermeiras sanitárias que atuavam nos bairros mais carentes, ensinando regras
básicas de higiene e encaminhando os doentes mais graves aos hospitais
filantrópicos ou públicos.
De toda forma, o governo Vargas representou um avanço com relação às
décadas anteriores no que diz respeito à saúde. A Constituição de 19344 incorporou
3 Eram modelos de pensões vinculadas a gênero ou categoria profissional, foram organizados a partir de 1933 de forma a abranger as mesmas categorias em todo o território nacional. Muitas Caixas de Aposentadorias e Pensões (CAPs) foram transformadas em IAPs. 4Foi a que menos durou em toda a História Brasileira, três anos, mas vigorou oficialmente apenas um. O cumprimento à risca de seus princípios, porém, nunca ocorreu. Ainda assim, ela foi importante por institucionalizar a reforma da organização político-social brasileira, não com a exclusão das oligarquias rurais, mas com a inclusão dos militares, classe média urbana e industriais no jogo de poder.
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garantias ao operariado como assistência médica, licença remunerada à gestante
trabalhadora e a jornada de trabalho de oito horas.
À medida em que havia um diminuição no número de mortes por epidemias,
por outro lado cresciam as doenças que atingiam milhares e até mesmo milhões de
pessoas, como a esquistossomose, doença de Chagas, tuberculose, doenças
gastrointestinais, doenças sexualmente transmissíveis e a hanseníase.
Nas décadas de 1930 e 1940 eram enfatizadas as campanhas sanitárias, e as
ações contra endemias foram interiorizadas para as áreas rurais, principalmente
devido o fluxo migratório do campo para as cidades. Diante disso foram criados
serviços de combate à endemias. A Política Nacional de Saúde esboçada nesse
período, só foi consolidada de 1945-1950. Em 1948 foi criado o Plano Salte,
envolvendo as áreas de Saúde, Alimentação, Transporte e Energia, onde a Saúde
era vista como uma de seus principais alvos, no entanto o plano não foi
implementado.
Em 1945 Getúlio Vargas é deposto em decorrência de manifestações
populares contra a ditadura, influenciadas pela vitória dos Estados Unidos e dos
Aliados na Segunda Guerra Mundial, no ano seguinte uma Constituição foi
elaborada. Deste então até 1964, essa fase ficou conhecida como Período de
Redemocratização, caracterizado pelas eleições diretas para principais cargos
políticos,pelo pluripartidarismo, liberdade de imprensa entre outros.
O modelo populista de governo que surgiu com Vargas foi mantido pelos
novos presidentes, utilizando medidas que não resolviam os principais problemas da
população, ocasionando diversos movimentos sociais que exigiam melhoras nas
condições de vida, saúde e trabalho. Nesse período havia grandes investimentos
financeiros vindos do exterior, com uma proposta desenvolvimentista que teve como
principal ator o presidente Juscelino Kubitstheck (1956-1964).
Em maio de 1953 foi criado o Ministério da Saúde, já no segundo período
presidencial de Getúlio Vargas. Logo após sua criação foi confirmado o descaso das
autoridades com a saúde do povo quando eram destinadas verbas irrisórias para a
mesma no decorrer da década de 50, impedindo assim que o Estado atuasse
eficazmente na situação da saúde coletiva, pois faltavam funcionários
especializados, equipamentos apropriados, postos de atendimento e até mesmo
ânimo aos servidores. O atendimento hospitalar privado já estava praticamente
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consolidado no Brasil e já caminhava para a formação de empresas médicas que
eram financiadas pelo Estado, demonstrando os interesses capitalistas na clara
defesa da privatização. Mesmo assim a assistência médica até 1964 foi fornecida
pelos IAP’s. Sendo assim, o MS pouco atuou para que fosse reduzidos índices de
mortalidade e morbidade das doenças, também não patrocinou reformas ou
organizou uma política de saúde eficiente, no entanto combateu muito as doenças
que atingiam a população do interior como a doença de Chagas, a malária, o
tracoma e a esquistossomose, além de tentar promover a educação sanitária da
população rural.
Em 1955 foi criada no Nordeste as Ligas Camponesas, com o objetivo de
lutar pelas melhorias das condições de vida do povo, contra a fome, a doença e a
exploração imposta pelos latifundiários da região. Em 1956 o MS teve que
desenvolver um novo e eficiente programa voltado para a assistência às crianças, já
que com o precário atendimento à infância o índice de mortalidade infantil era muito
alto principalmente nas capitais. Mesmo com as mudanças feitas pelo MS em 1956,
como a multiplicação dos serviços de higiene infantil, vacinação, tratamento de
crianças doentes e assistência às mães, a taxa de mortalidade continuou alta, pois a
população dos estados mais pobres continuaram a consumir águas poluídas e muito
pouco foi feito para a expansão dos sistemas de saneamento básico.
Diante disso, em 1956 foi criado o Departamento Nacional de Endemias
Rurais que procurou adotar um sistema administrativo dinâmico e prático, e entre
1958 e 1965 foram organizadas três campanhas nacionais contra a malária.
Nesse período, o Brasil mesmo com uma redução de casos de doenças
infectocontagiosas e parasitárias era uma das nações mais doentes do mundo
devido a interrupção de importantes obras de saneamento, por ainda haver áreas
totalmente sem assistência médico-hospitalar e diversas dificuldades decorrentes do
clientelismo (partidos e líderes políticos trocavam ambulâncias, leitos hospitalares,
profissionais da saúde e vacinas por votos e apoio nos períodos eleitorais), o MS se
responsabilizou quase exclusivamente pelas áreas rurais, já as regiões industrias e
povoadas eram atendidas pelos hospitais e clínicas próprios ou conveniados com os
institutos de pensões e aposentadorias mantidos pelos trabalhadores e patrões.
Desde o fim da década de 1940, a crescente agitação dos sindicatos fazia
com que o governo revesse a legislação previdenciária. Tendo em vista o aumento
20
do número de trabalhadores e dependentes com direito aos serviços de saúde,
aumento de salários e pensões pagas aos que estavam afastados temporariamente
do trabalho por motivos de doença e o crescente número de aposentados afastados
por tempo de serviço fazia com que a qualidade dos serviços caísse, foi então que
as longas filas nas portas dos hospitais, consultas rápidas e dificuldades para
conseguir internamentos para pacientes em estado mais grave tornaram-se comuns.
Diante disso o setor privado interferiu pressionando o governo federal e estadual
para que fosse restringida ou interrompida a construção de hospitais públicos na
tentativa de que o governo fizesse empréstimos e doações a juros baixos para que
os empresários criassem uma rede de clínicas e hospitais para vender seus serviços
à população, institutos de aposentadorias e pensões e ao governo.
Em 1960 foi sancionada a Lei Orgânica da Previdência Social (LOPS), em
decorrência das dificuldades existentes no gerenciamento dos institutos e pelo
descontentamento dos trabalhadores, como uma tentativa de reorganizar as
administrações e os serviços oferecidos pelas agências previdenciárias. Sua
principal medida foi a uniformização das contribuições pagas pelos trabalhadores
aos institutos que estivessem filiados, onde contribuíam 8% do seu salário para a
Previdência, juntamente com o governo e empregadores. Ainda assim não houve
melhorias dos serviços que os institutos prestavam.
Em decorrência do desconhecimento acerca de regras básicas de higiene e
da ausência de sistemas de tratamento e distribuição de água e coleta de esgoto, a
taxa de mortalidade infantil era altíssima. Sendo assim, em 1956, ficou a cargo do
MS desenvolver um programa voltado à assistência às crianças que multiplicava os
serviços de higiene infantil e os postos de puericultura que acompanhava e vacinava
as crianças e suas mães. No entanto, os sistemas de saneamento básico não foram
expandidos, e dessa forma grande parte da população continuava a consumir águas
poluídas
João Goulart comprometido com o programa de Reformas de Base não
conseguia atender as reclamações do povo e ao mesmo tempo garantir os
interesses dos grandes latifundiários e industriais, tal impasse colaborou para o
golpe militar de 1964, com ele houve uma redução das verbas destinadas à saúde
pública e isso decresceu até o final da ditadura.
21
A ditadura significou, para a totalidade da sociedade brasileira, a afirmação de uma tendência de desenvolvimento econômico-social e político que modelou um país novo. Os grandes problemas estruturais não foram resolvidos, mas aprofundados, tornando-se mais complexos e com uma dimensão mais ampla. (BRAVO, 2006, 93)
As verbas destinadas à saúde haviam sido aumentadas na primeira metade
da década de 1960, no entanto, com o golpe militar, estas foram reduzidas. Diante
das dificuldades das antigas caixas e institutos de aposentadorias e pensões, em
1966 o governo criou o Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), unificando
todos os órgãos previdenciários que funcionavam desde 1930, era dirigido por
técnicos e políticos vinculados ao regime, era subordinado ao Ministério do
Trabalho. O INPS tratava dos doentes individualmente, e o Ministério da Saúde
deveria elaborar e executar programas sanitários além de assistir a população
durante as epidemias. Acabou também firmando convênios com 2300 dos 2800
hospitais do país, utilizando o setor privado para atender a massa trabalhadora, mas
devido os baixos preços pelos serviços e a demora na transferência de verbas do
INPS para as entidades conveniadas deixaram esse sistema fragilizado.
Na tentativa de consolidar-se, o regime militar precisou modificar sua relação
com a sociedade civil, diante disso, a política social no período de 1974 a 1979
buscava ser mais efetiva no enfrentamento da questão social, para que dessa forma,
fossem diminuídas as manifestações populares. As políticas de saúde eram
caracterizadas pela intervenção da Previdência Social, através de ações curativas
comandadas pelo setor privado.
No início da década de 1970, a saúde no Brasil continuava a não atender
adequadamente a população. Foi nesse período que ocorreu epidemias como a
meningite, que se alastravam de forma silenciosa. E em 1971 começou a funcionar o
Programa de Assistência ao Trabalhador Rural (Funrural). Com a pressão social que
começou a acentuar-se nessa década os movimentos sociais e comunitários
passam a reorganizar-se, lutando pela redemocratização do país. Movimentos como
associações de moradores, de mulheres, sindicatos, correntes de oposição ao
governo, passaram a denunciar a situação caótica da política de saúde pública e dos
serviços previdenciários de atenção médica, reivindicado das autoridades soluções
para os problemas criados pelo modelo de saúde vigente.
22
Foi nesse período em que médicos residentes e movimentos internos
começaram a articular-se com outros movimentos sociais, buscando denunciar as
más qualidades nos atendimentos e serviços prestados à população.Os movimentos
de contestação em saúde cresceram em número e intensidade, de tal modo que,
entre o final da década de 70 e o início da de 80, sindicatos e partidos políticos
também iniciaram uma fase de discussão e mobilização, centrada na questão da
saúde. E em 1977 houve uma campanha de vacinação.
Nesse contexto, houve uma grande produção científica por intelectuais,
pesquisadores e professores, reforçando estudos anteriores com ênfase a uma
crítica ao modelo de saúde vigente, sugerindo alternativas para a construção de uma
nova política de saúde que fosse de fato democrática. Dessa forma, surgiu o
Movimento Sanitário, em contraposição ao governo ditatorial, caracterizado por uma
política de saúde voltada para um atendimento médico-assistencialista defasado,
contribuindo para problemas quem incidem até os dias atuais. Esse sistema era
ineficiente em relação às necessidades da população brasileira, que cada vez mais
reaprendia a reivindicar seus direitos.
A Reforma Sanitária foi um movimento que organizado por um grupo restrito
de intelectuais, médicos e lideranças políticas do setor da saúde, provenientes, na
sua maioria, do Partido Comunista Brasileiro (PCB), que exerceu um papel de
destaque na oposição ao regime militar. Este grupo foi o mentor desse processo de
reformulação, e em âmbito acadêmico ocorreram mudanças como a criação dos
Departamentos de Medicina Preventiva nas Faculdades de Medicina, surgindo
assim, um pensamento crítico na saúde.
Paralelamente, o Movimento Popular de Saúde ganha importância, embora
tenha sido iniciado desde a década de sessenta. Este passou de um processo de
apenas reivindicações, para um questionamento fundamentado acerca da qualidade
dos serviços, conquista de equipamentos e até mesmo relacionado à gestão e à
organização da política de saúde. O Movimento Popular de Saúde originou-se nos
bairros pobres das periferias das grandes cidades e/ou nas favelas localizadas
dentro dos grandes centros urbanos, principalmente nos Estados do Rio de Janeiro,
Minas Gerais e São Paulo. Compunha-se de médicos sanitaristas, estudantes,
religiosos, militantes católicos, integrantes de partidos políticos clandestinos e das
populações carentes. Enquanto o Movimento Sanitário e o Movimento Médico
23
voltavam-se para a ação institucional, o Movimento Popular privilegiava a
organização de redes locais, fazendo mobilizações no interior das Universidades e
nos aparelhos de Estado.
Ao fim da ditadura, a saúde brasileira encontrava-se em crise, onde os
hospitais funcionavam em situações precárias, havia dificuldades no atendimento, e
eram comuns mortes por falta de um socorro especializado. O Brasil continuava a
sofrer com epidemias, surtos de cólera e dengue, em decorrência da necessidade
de sistema de saneamento e de uma educação sanitária.
A partir das contestações acerca do modelo de saúde que vigorava no pais na
década de 1980, foram surgindo alternativas para a construção de uma política de
saúde que fosse de fato democrática, permeada com a participação popular, além
de uma universalização e descentralização dos serviços de saúde. Neste período
acentuou-se a crise da previdência, e paralelamente, intensificavam-se também os
movimentos de crítica à saúde.
2.2 O SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS)
A 8ª Conferência Nacional de Saúde, em 1986 foi um marco para a saúde no
Brasil, fazendo com que esta passasse a referir-se à toda a sociedade, nela foi
amplamente discutido os princípios da Reforma Sanitária – participação popular,
equidade, descentralização, universalidade e integralidade das ações de saúde.
Nela participaram cerca de quatro mil e quinhentas pessoas, mudando a história da
saúde pública no Brasil, levando em consideração que o debate acerca da temática
havia perpassado seus fóruns específicos e sido compartilhado também com
sindicatos de moradores, partidos políticos, associações de profissionais e
parlamento. Em 1987 o Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde (SUDS) e
depois o Sistema Único de Saúde (SUS) em 1988, no entanto tais medidas não
impactaram tanto pois não foram devidamente operacionalizadas.
24
Com a promulgação da Constituição Federal de 19885, fica evidente a busca
por uma garantia de direitos sociais e de cidadania na tentativa de expressar um
ideal mais igualitário. Podendo-se até mesmo afirmar que esta buscava amenizar e
corrigir injustiças sociais que jamais universalizava direitos, e que historicamente
assolava a população brasileira. Dentre tais direitos, está a garantia da saúde que
faz com que tal constituição seja um marco na saúde pública no Brasil, sendo
caracterizada também por prejudicar os interesses empresariais do setor hospitalar
que tradicionalmente buscava privatizar o setor.
Art. 196 A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.(CF,1988)
Em 1988, com a criação do SUS, princípios são afirmados, como a
universalidade, integralidade e equidade na saúde. Mesmo com os avanços
acumulados no que diz respeito aos princípios norteadores do SUS, à
descentralização da atenção e da gestão, o mesmo ainda enfrenta diversos
problemas, como são expressos na HumanizaSUS.
A Constituição Brasileira de 1988 inscreveu a saúde entre os direitos sociais, reconhecendo-a como um direito de cidadania estendido a todos o brasileiros. Em 1990, na sua regulamentação, através da Lei Orgânica da Saúde, foi instituído oSistema Único de Saúde - SUS. Iniciava-se então uma reforma sanitária de grande envergadura, definida a partir dos seguintes princípios: (1) universalidade de cobertura, ou seja, atendimento integral gratuito, e eqüidade; (2) descentralização dos serviços para os estados e municípios, que participarão do financiamento; (3) não-concorrência mas unidade e hierarquização entre as ações de saúde da União, dos estados e dos municípios; (4) participação complementar do setor privado na oferta de serviços; (5) prioridade para as atividades preventivas; e
5A Constituição de 1988, também conhecida como a Constituição Cidadã, é uma
aproximação com o modelo WelfareState, buscando garantir direitos sociais e de cidadania
na tentativa de expressar um ideal mais igualitário. Dentre tais direitos, está a garantia da saúde que faz com que tal constituição seja um marco na saúde pública no Brasil.
25
(6) controle social através dos Conselhos de Saúde e participação
da comunidade. (PEREIRA, 1995)
A Constituição Federal de 1988 coloca a saúde como um direito universal,
devendo ser garantido pelo Estado, que dessa forma, acabava com a distinção entre
segurado e não segurado ou urbano e rural, através de um sistema de saúde que
integralizava todos os serviços públicos de forma hierarquizada, descentralizada e
regionalizada. Dessa forma, a participação do setor privado seria apenas uma
complementação. O SUS foi implantado gradualmente e para isso era necessário a
formulação de leis, assim foi aprovada a Lei Orgânica de Saúde ou Lei 8.080 de 19
de setembro de 1990. Com a criação do SUS, que retira a assistência médica da
responsabilidade do Instituto Nacional de Assistência Médica da Previdência Social
(INAMPS)6, onde este ficou restrito aos contribuintes da Previdência Social, agora é
reconhecido o direito ao acesso de toda a população à saúde.
Nessa constituição a saúde passa a ser entendida como resultante de
condições como habitação, educação, alimentação, renda, transporte, lazer, trabalho
e liberdade, não somente sendo relacionada ao acesso aos serviços de saúde.
Fazendo com que a saúde perpasse a assistência médico-hospitalar relacionada a
uma prática curativa ou preventiva para o resultado de um conjunto articulado de
políticas sociais e econômicas.
A Lei 8.080/90 estabelece os princípios do SUS com base na Constituição de
1988, onde os princípios doutrinários são a universalidade, integralidade e equidade;
e os princípios organizacionais são a descentralização, regionalização e
hierarquização.
O SUS é considerado um sistema por ser formado por diversas instituições dos
três níveis de governo – União, Estados e Municípios – além do setor privado e
filantrópico, onde são feitos convênios e contratos que garantam a realização de
serviços e ações não podendo em sua pratica ser diferenciados, ou seja, devem ser
6O INAMPS foi criado em 1974 pelo regime militar com o desmembramento Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), que hoje é o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS), era uma autarquia filiada ao Ministério da Previdência e Assistência Social (hoje Ministério da Previdência Social), e tinha a finalidade de prestar atendimento médico aos que contribuíam com a previdência social, ou seja, aos empregados de carteira assinada. O INAMPS dispunha de estabelecimentos próprios,mas a maior parte do atendimento era realizado pela iniciativa privada; os convênios estabeleciam a remuneração por procedimento.
26
um mesmo corpo, atuando como se fosse público. No entanto, é vedada a
destinação de recursos públicos para a subvenção às instituições com fins
lucrativos. Os contratos feitos com as entidades prestadoras de serviço são feitos
mediante contrato de direito público, ou seja, o Estado pode intervir nesta quando os
termos contratuais não estiverem sendo devidamente seguidos.
É considerado único por possuir a mesma filosofia de atuação em todo o país,
além de ser organizado com a mesma lógica. É universal por ter o dever de atender
a todo e qualquer cidadão sem distinções, de acordo com suas necessidades e
gratuitamente em todos os níveis de assistência. Deve ainda garantir a equidade nos
atendimentos, sendo assim, busca tratar de forma diferenciada os desiguais,
oferecendo mais a quem mais precisa, para dessa forma, diminuir as desigualdades.
O atendimento integral, estabelecido pelo Artigo 198 da Constituição Federal7 como
também pela Lei 8.080/90 que somada à Lei 8.142/908, recebe a denominação de
Lei Orgânica da Saúde (LOS). Em seu artigo 7º, II da Lei 8.080/90 afirma que o
atendimento integral é definido como o conjunto articulado e contínuo das ações e
serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos, exigidos para cada caso em
todos os níveis de complexidade do sistema. Dessa forma, todos tem o direito de ser
atendido desde uma simples consulta, fratura, acesso a exames periódicos e
preservativos, até situações complexas como cirurgias e transplantes, partindo do
princípio em que a saúde deve ser tratada como um todo, não podendo ser dividida
e ainda executada de acordo com ações não apenas individuais, mas também
coletivas, para prevenção e tratamento.
A Constituição Federal de 1988 protegeu amplamente o direito à saúde,
tomando como exemplo disto os artigos 1º que elege como fundamento da
7 O Artigo 198 afirma que as ações e serviços públicos de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único, organizado de acordo com a descentralização, com direção única em cada esfera de governo; atendimento integral, com prioridade em ações preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais; participação da comunidade. 8 A Lei 8.142/90 complementa a Lei 8080/90 e define a participação da comunidade como condição necessária para o funcionamento do Sistema Único de Saúde (SUS) além de abranger sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na área da saúde. Nela há a inclusão de novos sujeitos sociais (usuários) que agora participam da gestão do SUS através das Conferências de Saúde (ocorrem em todos os níveis) a cada quatro anos, nos Conselhos de Saúde há a paridade, onde os usuários tem metade das vagas. Isso acontece em decorrência da universalização dos direitos sociais e do processo de luta pela democratização do país que acabara de sair do regime militar.
27
República Federativa do Brasil a dignidade da pessoa humana; o 3º que constitui
como objetivo da República a promoção do bem de todos; o 5º que é relativo aos
direitos e garantias fundamentais, assegura a inviolabilidade do direito à vida; e o
6º, onde o direto à saúde é qualificado como direito social.
O SUS integra a Política de Seguridade Social, regulamentado em 1990 pela
Lei Orgânica da Saúde (LOS), mesmo com sua real atuação sendo bem diferente do
que constitucionalmente é estabelecido, busca estar em consonância com o objetivo
constitucional de prover a saúde integral, hierarquizada e universalizada a todos os
brasileiros, desenvolvendo diversas políticas nos mais diversos âmbitos. Acabou se
consolidando como espaço destinado aos que não tem acesso aos sistemas
privados.
A Política de Seguridade Social é um conjunto de políticas públicas que visa
dar assistência em variadas situações. É dividida em previdência social, assistência
social e saúde. A previdência social dispõe de assistência àqueles que foram
contribuintes, provendo subsistência ao trabalhador, caso este esteja impossibilitado
de trabalhar; a assistência social é voltada para o atendimento das necessidades
básicas do indivíduo, onde pode-se destacar diversos auxílios, programas e medidas
voltadas para a família, maternidade, idoso, amparo à crianças e adolescentes,
inserção e integração ao mercado de trabalho, entre outros. Dessa forma, a
assistência social destina-se aqueles que não possuem condições de prover seu
próprio sustento, ou seja, deve ser assegurado mesmo que não contribua à
Previdência. Já a saúde é oferecida a todos que dela necessitem, é gratuita e assim
como a assistência, independe do usuário ter contribuído à Previdência Social.
A Lei Federal n.º 8.142 instituiu que, o Sistema Único de Saúde – SUS e
tornou-se, assim, o sistema integrado de assistência à saúde garantido pelo Estado
brasileiro. A responsabilidade pela administração do SUS foi atribuída ao Ministério
da Saúde, mas as secretarias de saúde a nível estadual e municipal, e os centros de
pesquisa sobre saúde também são parte integrante do sistema. O sistema de
financiamento não foi definido, embora ficasse clara a responsabilidade dos três
níveis de Estado, com ênfase na União.
Fica a cargo do Estado não apenas regulamentar, fiscalizar e planejar as ações
e serviços de saúde, mas também prestar serviços necessários no âmbito federal,
estadual e municipal.
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O Conselho de Saúde, ainda segundo a Lei, atua na formulação de
estratégias e no controle e execução da política de saúde na instância
correspondente, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros. Sendo a
representação dos usuários, nos Conselhos de Saúde e nas Conferências, paritária
ao conjunto dos demais segmentos.
No terreno das políticas públicas, a existência de órgãos colegiados setoriais
vinculados ao Executivo não é fenômeno novo no Brasil nem, tampouco, exclusivo
da área da saúde. Como já vimos anteriormente, desde a criação das CAPs., havia
a participação de setores da sociedade nos órgãos de gestão. Eram conselhos
mistos onde trabalhadores, patrões e burocratas concentravam interesses.
Não há na história do Brasil nada que se assemelhe aos Conselhos de Saúde
da atualidade, seja pela representatividade social que expressam, seja pela gama de
atribuições e poderes legais de que estão investidos, ou pela extensão em que estão
implantados por todo o país, nas três esferas de governo.
Ao que diz respeito os princípios organizacionais, o SUS é descentralizado
levando em consideração que o cidadão deve ser atendido no órgão mais próximo,
sendo assim, todas as ações e serviços que atendem a população de um município
devem ser municipais; as que atingem vários municípios devem ser estaduais e
aquelas que são relacionadas a todo o território nacional devem ser federais.
Deve ser regionalizado já que nem todos os municípios conseguem atender
toda a demanda de problemas na saúde, e ainda obedecer uma hierarquia que
estabelece que as questões menos complexas devem ser atendidas nas unidades
básicas de saúde, passando por unidades especializadas, hospital geral e
posteriormente o hospital especializado. É organizado de maneira racional, fazendo
com que cada região ofereça serviços e ações diferenciadas de acordo com a
realidade local e a disponibilidade de recursos, objetivando solucionar os problemas
mais freqüentes através de técnicas adequadas, eliminando o desperdício para que
os recursos públicos sejam aplicados da melhor maneira.
Com o SUS, a expectativa de vida da população brasileira aumentou, e foram
diminuídas a mortalidade e desnutrição infantil, doenças como varíola e poliomielite
foram eliminadas, a tuberculose foi controlada, e outras como tétano e sarampo já
podem ser prevenidas com vacinação. Também distribui preservativos, realiza
campanhas educativas e ações de vigilância sanitária de alimentos e medicamentos.
29
Buscando melhorar o atendimento, o SUS ampliou a atenção primária à saúde,
isto é expresso pelo Programa Saúde da Família (PSF) e pelas campanhas de
vacinação, não deixando de lado os de alta complexidade, como por exemplo, o
Programa de Combate à Aids que tido como modelo internacionalmente.
A Saúde da Família é entendida como uma estratégia de reorientação do modelo assistencial, operacionalizada mediante a implantação de equipes multiprofissionais em unidades básicas de saúde. Estas equipes são responsáveis pelo acompanhamento de um número definido de famílias, localizadas em uma área geográfica delimitada. As equipes atuam com ações de promoção da saúde, prevenção, recuperação, reabilitação de doenças e agravos mais freqüentes, e na manutenção da saúde desta comunidade (Ministério da Saúde)
Em 1988, com a criação do SUS, princípios são afirmados, como a
universalidade, integralidade e equidade na saúde. Mesmo com os avanços
acumulados no que diz respeito aos princípios norteadores do SUS, à
descentralização da atenção e da gestão, o mesmo ainda enfrenta diversos
problemas, como são expressos na HumanizaSUS. Um dos problemas mais comuns
é o fato do sistema público de saúde ser burocratizado e verticalizado; o baixo
investimento na qualificação dos trabalhadores, especialmente no que se refere à
gestão participativa e ao trabalho em equipe, dificultando uma qualidade no
atendimento que muitas vezes poderia ser melhor; desrespeito aos direitos dos
usuários, entre outros.
A Política Nacional de Humanização foi criada em 2003 para efetivar os
princípios do SUS no cotidiano das práticas de atenção e gestão. Teve como
princípios norteadores a valorização da dimensão subjetiva e social em todas as
práticas de atenção e gestão no SUS, fortalecendo o compromisso com os direitos
do cidadão, destacando-se o respeito às questões de gênero, etnia, raça, orientação
sexual e às populações específicas (índios, quilombolas, ribeirinhos, assentados,
etc.); também objetiva o fortalecimento do trabalho em equipe multiprofissional;
apoio à construção de redes cooperativas, solidárias e comprometidas com a
produção de saúde e com a produção de sujeitos, entre outros.
O que mais dificulta o atendimento em excelência no SUS, são problemas
conhecidos em toda a realidade da saúde brasileira, ou seja, as dificuldades de
acesso, como longas filas para consultas, exames e cirurgias; o déficit de vagas
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para internação, de médicos, medicação e até mesmo insumos básicos;
profissionais com uma rotina de trabalho excessiva e estressante, onde isto acaba
refletindo no atendimento à população. Acredita-se que tais deficiências são
resultantes de um baixo orçamento destinado ao SUS, onde este ainda por cima é
mal aplicado. Tal fato expressa notoriamente um grande embate atualmente,
Reforma Sanitária versus Privatização.
O modo neoliberal de organizar a produção e distribuição de ações de saúde é que não admite a “regionalização” e a “hierarquização”, posto que seu fundamento organizativo é o mercado é o mercado, a propriedade privada dos meios de trabalho e a ausência de Planejamento global, a não ser de forma muito indireta por meio de incentivos fiscais ou financeiros aos produtores. Podemos constatar com facilidade que no modo privado de produzir atenção à saúde a desigualdade e a exclusão tem caráter obrigatório, decorrentes dos próprios estímulos à concorrência e aos mecanismos de acesso típicos do mercado. O mesmo, no entanto, não é verificado diretamente em consequência da “prática clínica”. O Pronto-Atendimento (a consultação?) foi um artifício, criado e desenvolvido em grande escala no Brasil, com objetivo de viabilizar a extensão de cobertura sem o Estado ver-se obrigado a criar um Sistema Único e Público de Saúde, como aconteceu em quase toda a Europa Ocidental a partir dos anos trinta. (CAMPOS, 1999, 86)
Percebe-se a necessidade de uma maior descentralização dos atendimentos,
tendo em vista que muitas ações e serviços executados deveriam ficar a cargo dos
municípios, acarretando assim, a famosa superlotação nos principais hospitais. Até
mesmo a regionalização desses serviços já traria grandes benefícios, pois sabe-se
que as questões menos complexas devem ser atendidas nas unidades básicas de
saúde, passando pelas unidades especializadas, pelo hospital geral até chegar ao
hospital especializado. Ainda que com deficiências, o atendimento no SUS é sim
eficaz e eficiente, pois presta serviços de qualidade e apresenta soluções quando
procurado.
As Normas Operacionais Básicas (NOB) definem as estratégias e
movimentos táticos, que orientam a operacionalidade do SUS, visando aperfeiçoar
sua gestão viabilizando a implantação do mesmo. Elas surtiram efeitos positivos
como um crescimento da oferta de serviços municipais, da capacidade de estados e
municípios, e da transferência de recursos federais para os mesmos. Redefinia os
31
papéis de cada esfera do governo e tem como principal objetivo disciplinar o
processo de implementação do SUS, no entanto, houve problemas com relação à
gestão, a barreira imposta ao acesso aos usuários, à baixa qualidade dos serviços,
entre outros. Foram criadas a NOB 01/919, a NOB 01/9310, a NOB 01/9611. Para que
isso fosse superado foi instituída a NOB/2001, que é denominada Norma
Operacional de Assistência à Saúde (NOAS), no dia 26 de janeiro de 2001. Não é
uma norma operacional do SUS, mas de assistência à saúde que assegura o
comando único sobre o sistema, incorpora a micro regionalização, amplia a atenção
básica, instrumenta e regula a relação entre os gestores e permite maior visibilidade
aos processos de pactuação de referências.
2.3 OS DIREITOS E DEVERES DOS USUÁRIOS DO SUS
Sabe-se que de acordo com a Lei 8.080/90 a saúde passa a ter como
determinantes aspectos como alimentação, moradia, saneamento básico, renda
entre outros. Dessa forma, a saúde passa a necessitar não apenas de serviços que
estejam voltados ao tratamento de doenças, mas também depende de investimentos
voltados para ações e políticas que visem à promoção da saúde.
É notável que a promoção da saúde fica a cargo não só do Estado, mas
também do indivíduo e da sociedade civil organizada agindo conjuntamente. O
Estado desenvolve políticas e ações que objetivam o desenvolvimento econômico,
acesso ao trabalho, terra, educação, entre outros. Já a sociedade civil organizada
participa politicamente dos espaços de controle social (conferências e conselhos de
9 Criou a Autorização de internação hospitalar (AIH), o Sistema de Informação Hospitalar (SIH), o Fator de Estímulo à Municipalização (FEM), além de criar Conselhos Estaduais e Municipais. 10 Definiu procedimentos e instrumentos operacionais visando ampliar e aprimorar as condições de gestão, buscando efetivar um comando único nas três esferas do governo. Com ela houve avanços no processo de descentralização das ações e dos serviços de saúde. 11 Busca aperfeiçoar a gestão dos serviços de saúde no Brasil, fazendo o município passar a ser responsável pelo atendimento e necessidades da demanda em seu território. São duas as gestões municipais: Gestão Plena de Atenção Básica e Gestão Plena do Sistema Municipal, elas recebiam recursos de forma regular e automática para o atendimento básico.
32
saúde) além da realização de projetos voltados à promoção da saúde, geralmente
através de Organizações Não-Governamentais (ONG’s). No que diz respeito ao
indivíduo, este fica responsável por manter um modo de vida saudável através de
uma dieta equilibrada, evitar o consumo de substâncias que prejudiquem a saúde,
praticar exercícios físicos regularmente, entre outros.
No entanto, o fato de uma necessidade de organização vinda da sociedade
civil demonstra contrariedade ao que é idealizado pelo SUS, partindo do princípio de
que o Estado deve assegurar direitos à saúde a toda população, mas, já que na
prática isto não ocorre, a mesma vê-se obrigada a organizar-se em busca de
respostas às suas necessidades. Porém, a consciência dessa necessidade não está
em toda a população,
Toda a população brasileira é considerada usuária do SUS, acrescido dos
estrangeiros residentes de forma legal no Brasil. Aqueles que possuem planos e
seguros de saúde privados tem, as despesas pagas pelas empresas responsáveis,
no entanto, podem utilizar o SUS caso desejem ou necessitem.
Foi elaborada a Carta dos Direitos dos usuários do SUS em um consenso
entre os governos federal, estaduais e municipais e pelo Conselho Nacional de
Saúde, ela contém informações acerca dos direitos que os usuários possuem
quando procuram um atendimento na saúde, e é reunida em seis princípios básicos
de cidadania visando assegurar ao cidadão que este atendimento seja feito com
dignidade, seja no setor público ou privado, conforme mostra a tabela abaixo:
1° Princípio Estabelece que todo cidadão tem direito de ser atendido com ordem
e organização, para dessa forma assegurar que aquele que estiver
em estado mais grave ou maior sofrimento deve ser atendido
primeiro, devendo também ser garantido a todos o fácil acesso aos
postos de saúde, em especial para portadores de deficiência,
gestantes e idosos;
2º Princípio Afirma que todo cidadão tem o direito de ter um atendimento de
qualidade, recebendo informações de maneira clara acerca do seu
estado de saúde, assim como seus parentes além do direito à
anestesia e remédios;
3º Princípio Estabelece um atendimento humanizado e sem nenhuma
discriminação, seja de raça, cor, idade, sexo, nível social etc;
4º Princípio Afirma que todo cidadão deve ter respeitados seus direitos de
paciente, podendo ver seu prontuário sempre que quiser, também a
33
liberdade de permitir ou recusar qualquer procedimento médico,
assumindo a responsabilidade por isso e não pode ser submetido a
nenhum exame sem saber. Caso haja reclamações, o SUS possui
espaços que permitem sugestões e criticas – Ouvidorias e os
Conselhos de Gestores e Saúde;
5º Princípio O quinto afirma que além de direitos, o cidadão também tem deveres
quando busca o atendimento;
6° Princípio Estabelece que não apenas usuários, mas também profissionais e
gestores da saúde, devem cumprir o que esta estabelecido na Carta
de Direito aos Usuários da Saúde.
Quadro 1: Direitos dos Usuários do SUS Fonte: Carta dos Direitos dos Usuários da Saúde
De acordo com a legislação vigente, os usuários do SUS tem o direito de ter
acesso ser tratado pelos meios adequados à bens e serviços indispensáveis à
promoção, proteção e recuperação da saúde; de ser atendido gratuitamente; ter sua
autonomia preservada na defesa da integridade física e moral; ter igualdade da
assistência à saúde, sem preconceitos ou privilégios; ter acesso à informações
quanto ao potencial dos serviços de saúde; decidir receber ou não os cuidados
propostos; Ser tratado pelos meios adequados, humanamente e com presteza,
capacidade técnica, privacidade, respeito e educação; ter a confidencialidade de
seus dados pessoais preservada, entre outros; ser informado sobre a sua situação
de saúde, as alternativas possíveis de tratamento e a evolução provável de seu
estado; receber ou recusar assistência religiosa, psicológica e social, de acordo com
sua livre escolha e credo; reclamar sobre a forma como é tratado, aos setores
competentes; receber indenizações por prejuízos sofridos, se comprovados e
motivados por imprudência, negligência ou imperícia dos profissionais de saúde;
constituir entidades que representem e defendam os seus interesses, com relação à
saúde; ter emitida a Declaração de Nascido Vivo e a Declaração de Óbito, entre
outros.
Da mesma forma que possui direitos, o usuário também possui deveres,
onde ganha destaque a necessidade que este adote medidas que contribuam para a
promoção de sua saúde; cadastrar-se nos serviços de saúde e ações de vigilância
(pré-natal, acompanhamento do crescimento e desenvolvimento da criança, vacina
etc); manter seu domicílio livre de vetores (mosquitos, ratos etc); contribuir para a
limpeza urbana; respeitar áreas de preservação ambiental; preservar as unidades de
34
saúde; exercer o controle social, através da participação política no âmbito do SUS,
via Conferências e Conselhos de Saúde, entre outras instâncias; denunciar aos
órgãos competentes irregularidades identificadas no SUS; denunciar à Vigilância
Sanitária produtos alimentares, água, serviços e ambientes de trabalho que estão
fora das especificações legais.
Além disso, o usuário ainda deve ter conhecimento acerca dos seus direitos e
responsabilidades e funcionamento do SUS, participando da avaliação da qualidade
dos serviços e cuidados que lhe são prestados, denunciando irregularidades,
negligência ou maus tratos em qualquer serviço da rede. Deve também participar
das Conferências, Conselhos de Saúde12 ou movimentos populares.
12 É um espaço de representação e de participação social, que tem o objetivo de acompanhar a execução da política de saúde e de fiscalizá-la, inclusive quanto à aplicação dos recursos financeiros. O Conselho tem caráter permanente e poder de decisão. É composto por 50% de representantes de usuários; 50% de representantes de trabalhadores da saúde, do governo e prestadores de serviços ao SUS.
35
3. A EDUCAÇÃO COMO CONDIÇÃO PARA EXISTÊNCIA DA DIGNIDADE DA
PESSOA HUMANA
Inicialmente, há a necessidade de esclarecimento do que seria a dignidade da
pessoa humana, tendo em vista que este é um conceito de difícil compreensão, já
que é uma expressão que implica diversos valores. Entende-se que todo ser
humano é uma pessoa, dotado de personalidade, que possui tanto direitos quanto
deveres, membro de uma sociedade, merecedor de uma existência humana, e não
sub humana como muitas vezes ocorre.
Neste capítulo será vista a forma como o déficit na educação, não só a
escolar, pode afetar o usuário dos serviços da saúde no que diz respeito o
conhecimento que este deveria ter para posteriormente exigir seus direitos, já que
estes, na grande maioria das vezes não são assegurados da forma devida pelo
Estado, deixando assim, a sociedade civil no dever de exigi-los.
3.1 DADOS DA EDUCAÇÃO NO BRASIL
Todo ser humano deve ter condições mínimas para uma vida digna, humana.
Onde estas podem ser entendidas como condições mínimas para seu auto sustento
físico, como também de poder possuir uma vida social, se relacionando com as
pessoas a seu redor, para dessa forma, ser parte da sociedade em que vive.
Em Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas – ONU – foi
proclamada a Declaração Universal dos Direitos Humanos13 – DUDH – que
reconhece a educação como um direito assim como o direito à vida, à liberdade de
opinião e de expressão, ao trabalho, saúde etc. Os direitos humanos, devem ser
inerentes à todos, independente de sua nacionalidade, cor, raça, etnia, classe social,
religião, entre outros.
13Adotada pela ONU em 10 de dezembro de 1948, buscando construir um mundo sob novas
bases, isto se deu em decorrência do fim do período pós-guerra.
36
No Brasil, a educação só foi reconhecida como um direito na Constituição de
1988, onde o Estado passa a ser o responsável pela promoção da educação,
expressa em seu Artigo 205.
Art. 205 A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. (BRASIL, 1988)
A Constituição Federal de 1988, além de abarcar o princípio da dignidade
humana, ainda reconhece o mínimo existencial. O princípio da dignidade humana
constitui-se como uma norma jurídica, sendo assim, precisa ser respeitado, e caso
não seja, o transgressor estará sujeito a punições. A educação é componente para o
mínimo existencial, ou seja, o indivíduo necessita dela para viver em sociedade.
A Constituição de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases14 – LDB – sanciona o
direito de acesso ao ensino fundamental, obrigatório e gratuito. Esse é considerado
um direito público subjetivo, ou seja, judicialmente, só se pode reivindicar, questionar
a execução do acesso à educação que deveria ser garantida pelo Estado ou pelas
famílias apenas ao que compete o ensino fundamental. Sendo assim, nos
questionamos pelo fato que, como o acesso à educação é direito de todos e dever
do Estado, se este é restringido apenas à um nível de ensino?
Sabe-se que um direito proclamado não significa que este será devidamente
desfrutado. Para que isto ocorra, temos que ir muito além no que diz respeito à
garantia de acesso, permanência e ainda uma qualidade no ensino. Aquela que
entende-se por educação básica, voltada para todos os brasileiros, constitui-se por
ensino infantil, fundamental e médio. Esta ainda necessita de um significativo
aumento nos investimentos, como também em políticas públicas educacionais para
garantir tal acesso igualitário. O Estado deve não apenas garantir o direito à
educação, mas também prover meios para que esta possa ser usufruída.
Além disso, a educação expressa um agravo da exclusão social para aqueles
que não a possuem, tendo em vista que também ocasiona descriminação. Sendo
14Lei 9394/96, é a lei orgânica geral da educação brasileira, pois dita as diretrizes e bases
para a organização do sistema educacional com base na Constituição Federal de 1988.
37
assim, entende-se que a educação é determinante para que direitos sejam
resguardados, e isto não restringe-se apenas à ela, mas também à boas condições
de saúde, segurança, participação social etc.
Cristovam Buarque (2007) afirma que o modelo educacional brasileiro acaba
por dividir a população, pois não oferece chances iguais para todos, ocasionando
assim, uma sociedade dividida. De acordo com o autor, só a educação é capaz de
integrar socialmente as massas excluídas, partindo de uma educação de base.
Quando analisa-se a realidade educacional no Brasil, percebe-se que à
medida que a idade escolar aumenta, a frequência diminui gradativamente, onde,
cada vez mais, há uma redução na quantidade de pessoas frequentando a escola
quando ficam mais velhas, isto significa que, mais de 60% das crianças que iniciam
os estudos não concluem o ensino médio.
No decorrer dos últimos anos e das conquistas sociais, a educação deixou de
ser exclusividade de alguns, para ser necessidade de todos. A necessidade de uma
educação de qualidade passou fazer parte de uma consciência comum de toda a
população, deixando cada vez mais evidente as deficiências de um sistema escolar,
em sua maior parte inadequado para os problemas daqueles que dela necessitam.
Quando fala-se em educação pública, vem à mente escolas compostas por
filas para realização de matrícula, prédios superlotados, poucos professores para a
demanda imposta etc. Além de grande parte não possuir a qualidade necessária,
soma-se a isso não serem suficientes em termos de quantidade.
A educação não pode ficar restringida à um método meramente técnico-
operativo, ou seja, ler, escrever e contar, deve ir além e voltar-se também para
hábitos de sociabilidade, de pensamento, reflexão e de uma sensibilidade aplicada
tanto aos seus direitos, quanto aos coletivos. Não pode-se deixar de mencionar
também a deficiência da educação no que diz respeito o preparo dos professores e
demais profissionais da referida área, expressando-se em baixos salários,
dificuldade de acesso ao nível superior. Sendo esta última resultante tanto de uma
deficiência na formação como um todo, aliada a um déficit no número de vagas.
A igualdade dos indivíduos baseia-se em que devem ser dadas oportunidades
iguais de desenvolvimento e participação social, não baseia-se em uma igualdade
psicológica. Sendo o homem um ser social, faz-se necessário que este esteja
integrado à sociedade, quando isto não ocorre, significa que este pode estar vivendo
38
em situação desumana, ao menos socialmente, não necessariamente significa dizer
que ele não possui meios de suprir necessidades básicas como a alimentação e
moradia por exemplo.
(...) a educação serão processo pelo qual o indivíduo se formará para a sociedade plural e múltipla a que irá pertencer, temos de fazer as instituições educativas exemplos de instituições integradas, humanas e pessoais, nas quais iniciemos o educando na experiência de integração, graças a um meio que guarde as qualidades do meio ainda pequeno, mais simples e mais puro, em oposição ao grande meio complexo, tumultuoso e divergente em que ele irá viver e no qual ingressará com o viático de sua formação escolar. (TEIXEIRA, 1977, 171)
Historicamente, a educação brasileira é marcada por avanços e retrocessos.
Foi inicialmente realizada pelos jesuítas, voltava-se para a catequese dos índios, e
ensinava as primeiras letras aos filhos dos colonos, tendo em vista que esta era uma
colônia rural, não dava-se a devida importância para o aprendizado de fato. Os
jesuítas trouxeram não apenas a religião, a moral, os costumes, mas também,
métodos pedagógicos. Para as elites havia a possibilidade de estudar na Europa.
Quando os jesuítas foram expulsos do Brasil, não houve mudanças.
Com a chegada da família real ao país em 1808, a educação continuava a ser
um privilégio das camadas mais elitizadas, no entanto, foi nesse período que
criaram-se cursos considerados as primeiras faculdades, conforme já mencionado
no primeiro capítulo deste trabalho.
Quando os primeiros imigrantes chegaram ao Brasil em decorrência da
revolução industrial, houve a necessidade e uma maior preocupação com a escola,
embora esta só passe a ser aprimorada na década de 1960, resultante de
movimentos populares e sindicais. No entanto, estes foram combatidos e
exterminados com o Governo Militar em 1964. Foi no decorrer deste período que foi
sancionada a Lei de Diretrizes e Bases – LDB - 5.692/71 que normatizava o sistema
escolar, mas porém deixava a escola dependente do interesse norte-americano,
decorrente dos acordos MEC-Usaid15, iniciados a partir de 1964.
15 Acordo estabelecido entre o Ministério da Educação – MEC – e o United StatesAgency for Internacional Development – USAID – objetivando reformar o ensino brasileiro, tendo como
39
Quando a ditadura militar chegou ao fim, o ensino teve que ser reformulado, e
em 1996 foi promulgada uma nova LDB que rege a educação brasileira até os dias
atuais, caracterizada pelo direito à educação como conhecemos, ou seja, não como
um dever dos pais, estados e municípios, mas como obrigação do Estado de ofertar
condições de acesso e permanência na escola.
A educação formal figura como um direito universal reconhecido pelo Estado
brasileiro em atenção às lutas que compreenderam a educação como uma
estratégia de emancipação da pessoa como contribuidora fundamental para a
construção e formação social do sujeito.
Como já fora mencionado, sabe-se quem nem todos tem condições de ter
acesso e permanecer na escola, como também os três níveis de ensino
(fundamental, médio e superior) não fazem parte dos objetivos de grande parte dos
jovens em idade escolar. No tópico seguinte serão apresentados dados sobre a
educação brasileira.
De acordo com a Cartilha Direito à Educação (2009), a efetivação de tal
direito diminui para pobres, negros, com menos de 6 (seis) e mais de 14 (quatorze)
anos de idade, pessoas que moram na zona rural, portador de alguma deficiência,
que esteja preso, entre outros.
Conforme o relatório As Desigualdades na Escolarização no Brasil realizado
pelo Conselho de Desenvolvimento Social (2007) tem-se como macroproblema para
o melhoramento do sistema educacional brasileiro, o fato do nível de escolaridade
da população ser baixo e desigual, e isto ocorre em decorrência de problemas como
a persistência do analfabetismo, insuficiências e desigualdades nas etapas da
educação básica, na educação profissional e no ensino superior.
Este fato é expresso por dados fornecidos pela Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílio16 – PNAD – de 2006, onde é afirmado que a população
brasileira de 15 anos ou mais, tem em média 7,1 anos de estudo, ficando abaixo do
que é estabelecido pela Lei 5.962/71, que é 8 (oito) anos, no entanto, isto pode
principais mudanças a fusão entre o ensino primário e o ginasial, resultando no conhecido primeiro grau, fundindo também o curso científico com o básico, resultando no segundo grau. O ensino superior ficou conhecido como terceiro grau. Este regime retirava do currículo escolar disciplinas como filosofia, latim e educação política, além de diminuir a carga horária em diversas outras. 16É uma pesquisa feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE – que
investiga diversas características econômicas da sociedade, como educação, trabalho, previdência social, habitação, saúde, nutrição etc.
40
variar de acordo com as regiões, com os habitantes de zonas rurais e urbanas, entre
brancos e negros e pobres e ricos.
MÉDIA DE ANOS DE ESTUDO
20% mais pobres – 4,7 anos 20% mais ricos – 10,3 anos
Habitantes de áreas rurais – 4,3 anos Habitantes de áreas urbanas – 7,6 anos
Região Nordeste – 5,8 anos Região Sudeste – 7,8 anos
Pop. negra/parda – 6,4 anos Pop. branca - 8,1 anos Quadro 2: Média de anos de estudo
Fonte: PNAD, 2006
O estudo “Brasil em Números” (2004), publicado pelo IBGE, demonstra que
houve um aumento na taxa de alfabetização; crescimento do índice de alunos
matriculado no ensino médio e em faculdades; aumento da quantidade de alunos
que concluem o nível fundamental, médio e superior; criação de mais escolas de
ensino fundamental, médio e superior; queda nos índices de evasão escolar e
menos repetência.
Estabelecimentos de Ensino por Níveis - 2003
Estabelecimento de Ensino
Públicos Privados Total
Pré- Escolar 68.666 26.075 94.741
Fundamental 149.968 19.107 169.075
Médio 15.312 6.668 21.980
Superior 195 1.442 1.637
Quadro 3: Estabelecimentos de Ensino por Níveis – 2003 Fonte: Adaptado de “Brasil em Números 2004”, IBGE
Ainda que não devamos deixar de salientar a importância de uma melhor
qualidade da educação, no entanto, quando falamos de educação com finalidade em
um melhoramento na qualidade da participação social dos usuários da saúde ou até
mesmo em qualquer outra área voltada para direitos sociais, não podemos nos
restringir apenas à educação em âmbito escolar, já que esta, na atual realidade
brasileira, fica geralmente resumida à aspectos emergenciais, ou seja, muitas vezes
volta-se apenas a ler, escrever, calcular etc, deixando de lado a construção de um
sujeito com um olhar mais crítico acerca dos problemas inerentes à sociedade que o
cerca e o atinge de variadas formas. Sejam elas, a deficiência estrutural na própria
41
educação, saúde, previdência, trabalho, lazer, moradia, entre outros, fazendo com
que o indivíduo não tenha entendimento acerca da dinâmica que ocasiona tais
dificuldades nos mais variados âmbitos da vida social.
No tópico a seguir, será iniciada uma discussão que irá relacionar a saúde e a
educação, ressaltando como a educação pode contribuir tanto em aspectos
preventivos quanto aspectos resolutivos com relação a variados problemas que
possam surgir na saúde pública.
3.2 A RELAÇÃO ENTRE SAÚDE E EDUCAÇÃO
A educação deve ser considerada o mais importante dentre os direitos
sociais, partindo do princípio que ela é subsídio para compreensão de todos os
outros direitos, ou seja, além de ser um direito, é também elemento constitutivo do
ser humano, podendo ser imprescindível para sua realização enquanto sujeito.
A educação está intrinsecamente ligada à uma conscientização que permite a
construção de sujeitos sociais críticos, possibilitando assim, uma atuação efetiva na
sociedade para dessa forma, buscar alterar sua própria história.
Na saúde, esta deve ser uma ação que busque contribuir com a afirmação do
SUS enquanto política pública, como também ampliar o entendimento por direito à
saúde da população.
O Caderno de Participação Popular e Saúde (2007), afirma que seria de
grande importância caso a participação social fosse ampliada através de ações
educacionais que visassem uma emancipação do indivíduo, uma maior participação,
como também a consciência de que este é um sujeito de direitos, partindo do
princípio da integralidade do SUS que visa a atenção integral em todos os níveis do
sistema, ou seja, estão incluídos práticas, vivências, saberes, entre outros. Isto
ocorre através da criação de vínculos entre a ação socioassistencial e o pensar e
fazer da população.
(...) a Educação Popular tem significado um instrumento fundamental na construção histórica de atenção integral à saúde, na medi da em
42
que se dedica à ampliação da inter-relação entre as diversas profissões, especialidades, serviços, doentes, familiares, vizinhos e organizações sociais locais envolvidos num problema específico de saúde, fortalecendo e reorientando suas práticas, saberes e lutas. Esta redefinição da prática médica se dá, não a partir de uma nova tecnologia ou de um novo sistema de conhecimento, como as chama das medicinas alternativas pretendem ser, mas pela articulação de múltiplas, diferentes e até contraditórias iniciativas presentes em cada problema de saúde, em um processo que valoriza principalmente os saberes e as práticas dos sujeitos usualmente desconsiderados devido à sua origem popular. (MS, 2007).
Teoricamente a participação popular é defendida e assegurada legalmente,
sendo expressa por espaços como Conselhos e Conferências de Saúde, no entanto,
na prática, tal participação muitas vezes não se dá de maneira efetiva, já que essas
instâncias, em grande parte voltam-se para questões gerenciais, e acabam não
conseguindo implementar a mesma participação popular no âmbito cotidiano do
sistema. Como se não bastasse, as dificuldades já existentes, ainda somam-se ao
modelo biomédico tradicional que ao invés de questionar o modelo vigente, reforça
ainda mais a forma com que as deficiências no modelo de saúde estruturam-se.
(...) Educação Popular se refere não à característica de sua clientela, mas à perspectiva política desta concepção de educação: a construção de uma sociedade em que as classes populares deixem- se ser ato res subalternos e explorados para serem sujeitos altivos e importantes na definição de suas diretrizes culturais, políticas e econômicas. A experiência dos movimentos sociais tem mostra do que este modo de conduzir o processo educativo pode ser aplicado com sucesso na formação profissional. (MS, 2007).
Sendo assim, seria de grande importância também que os profissionais da
saúde passassem por uma educação voltada para uma perspectiva de ampliar a
gestão participativa do SUS.
No decorrer da história temos exemplos de como a educação em saúde
auxiliou na prevenção de doenças. Quando epidemias e endemias como a febre
amarela assolavam a cidade do Rio de Janeiro, foi elaborado um projeto que
buscava mostrar formas de higienização, em especial nos bairros mais pobres, havia
43
ainda, neste mesmo período, a polícia sanitária, que combatia a febre amarela e a
tuberculose.
A proposta da educação relaciona-se ao direito à saúde situando-se no
movimento acerca do direito, bem como a condições de compreensão da política
pública através da participação e do controle social.
A atenção em saúde não deve ser vista apenas sob uma percepção básica,
voltada para organização e manutenção dos serviços de saúde, devendo também
melhorar os serviços ofertados, democratizar conhecimentos, ampliar a participação
da população etc.
A promoção da saúde tem a capacidade de ocasionar mudanças
comportamentais de diversas camadas da sociedade, já que uma comunidade
organizada pode ajudar na implementação de ações e programas educativos que
contribuam com a melhoria nas condições de saúde. Já a prevenção em saúde,
pode anular uma doença antes que ela ocorra, como também, interromper ou
atrasar a progressão da mesma.
Em 2005 o Ministério da Saúde definiu a Agenda de Compromisso pela
Saúde que agregava três eixos: o Pacto em Defesa do SUS, o Pacto em Defesa da
Vida e o Pacto de Gestão. Destacando-se no contexto desse trabalho o Pacto em
Defesa da Vida que abrange um conjunto de compromissos sanitários que devem
tornar-se prioridades nos três níveis de governo, cada um com respectivas
responsabilidades. Dando também grande importância para o acesso e qualidade
dos serviços ofertados pelo SUS, enfatizando o fortalecimento e qualificação da
Saúde da Família, como também promover a informação, a educação em saúde
voltada para a promoção de atividades físicas, hábitos saudáveis, controle de
possíveis vícios como o tabagismo e álcool, e cuidados com o processo de
envelhecimento.
A promoção da saúde é considerada uma estratégia que busca a melhoria da
qualidade de vida da população, isto ocorre através de uma gestão compartilhada
entre usuários, movimentos sociais, trabalhadores de variados setores entre outros.
Em 30 de março de 2006 foi aprovada a Política Nacional de Promoção à Saúde –
PNPS – que dá diretrizes e aponta estratégias de organização das ações da
promoção da saúde nos três níveis do SUS.
44
A saúde, sendo uma esfera da vida de homens e mulheres em toda sua diversidade e singularidade, não permaneceu fora do desenrolar das mudanças da sociedade nesse período. O processo de transformação da sociedade é também o processo de transformação da saúde e dos problemas sanitários. Nas últimas décadas, tornou-se mais e mais importante cuidar da vida de modo que se reduzisse a vulnerabilidade ao adoecer e as chances de que ele seja produtor de incapacidade, de sofrimento crônico e de morte prematura de indivíduos e população. Além disso, a análise do processo saúde-adoecimento evidenciou que a saúde é resultado dos modos de organização da produção, do trabalho e da sociedade em determinado contexto histórico e o aparato biomédico não consegue modificar os condicionantes nem determinantes mais amplos desse processo, operando um modelo de atenção e cuidado marcado, na maior parte das vezes, pela centralidade dos sintomas. (MS, 2010)
Esse processo requer a participação da população visando sua vida cotidiana,
e não apenas aquelas que já correm risco de adoecer. Ampliando o entendimento de
saúde para uma busca de bem-estar em aspectos físicos, mentais, ambientais,
emocionais e sócio-ecológicos. Esta compreensão passa pela garantia do
desenvolvimento de condições educacionais para fazê-lo.
O reordenamento político da saúde no Brasil e no Rio Grande do Norte passa
pela gestão que os conselhos de saúde fazem da política pública. Neste sentido, a
educação formal e outras formas de acesso ao conhecimento, especialmente dos
direitos sociais, são imprescindíveis para que a classe trabalhadora e os usuários do
SUS exerçam com condições a participação e o controle social.
Para que a situação da saúde pública brasileira mudasse seria necessário
uma efetiva descentralização dos atendimentos visando evitar ou ao menos suavizar
a famosa superlotação tão comum não só no HMWG/PSCS, mas na maioria dos
hospitais da rede pública, e até mesmo privada. Até mesmo a regionalização desses
serviços já traria grandes benefícios, pois sabe-se que as questões menos
complexas devem ser atendidas nas unidades básicas de saúde, passando pelas
unidades especializadas, pelo hospital geral até chegar ao hospital especializado.
No capítulo a seguir será discorrida a atuação do Serviço Social no âmbito do
HMWG/PSCS frente os Parâmetros para Atuação na Saúde, dando destaque para
as atividades que este desenvolve nesta instituição.
45
4. SERVIÇO SOCIAL E SAÚDE: A EXPERIÊNCIA DO HOSPITAL
MONSENHOR WALFREDO GURGEL/PRONTO SOCORRO CLÓVIS
SARINHO
Neste capítulo será discorrida uma análise acerca da inserção e atuação do
Serviço Social no âmbito da saúde, mais especificamente, a experiência adquirida
em campo de estágio, realizado no Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel/Pronto
Socorro Clóvis Sarinho17, no entanto, antes de iniciarmos a apreciações acerca do
Serviço Social, é importante tecermos algumas considerações acerca do
HMWG/PSCS.
O Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel, foi inaugurado no dia 14 de março de
1971, mas suas atividades iniciaram-se apenas no dia 31 de março de 1973. O
Pronto Socorro Dr. Clóvis Sarinho foi inaugurado em 05 de setembro de 1977, onde
este conjunto passou a ser chamado de Complexo Hospitalar Monsenhor Walfredo
Gurgel, com a missão de prover atendimentos com ênfase na urgência e
emergência pelo SUS, “promovendo a dignidade da pessoa humana, preservando-
lhe e resgatando-lhe a saúde, oferecendo-lhe atendimento de boa qualidade,
universal e igualitário, nas áreas de trauma e emergência”.
O SUS no HMWG/PSCS tem como missão promover a descentralização para
os municípios dos serviços e das ações de saúde, bem como, acompanhar,
controlar e avaliar estas ações, proporcionando apoio técnico e financeiro,
coordenando o processo saúde-doença, na perspectiva da proteção e recuperação
da saúde individual e coletiva.
O HMWG/PSCS é a maior unidade em atendimento de urgência e
emergência do Rio Grande do Norte, este é o único hospital estadual da região
metropolitana de Natal a manter, com exclusividade, equipes para atendimento
Neurológico; Neurocirúrgico; Ortopédico; Cirurgia Plástica / Atendimento a
Queimados; Nefrologia; Urologia; Cirurgia Vascular; Buco-Maxilo-Facial;
Otorrinolaringologia; Oftalmologia; Cirurgia Torácica para retirada de corpo estranho
17 O Complexo Hospitalar Monsenhor Walfredo Gurgel, localiza-se na Avenida Senador Salgado Filho, S/N, no bairro de Tirol, Natal/RN. Com telefones para contato (84) 3232 7530 ou 3232 7532, e ainda pelo [email protected], ou pelo portal www.walfredogurgel.rn.gov.br.
46
e Hematologia. Oferece ainda serviços de Cirurgia geral; Cirurgia Pediátrica de
emergência; serviço de Anestesiologia; Enfermagem; Nutrição e Dietética;
Fisioterapia, Endocrinologia; Gatroenterologia; Fonaudiologia; Psicologia;
Dermatologia; Pneumologia; Cardiologia; Clínica Médica; Ginecologia; Serviço
Social e Pediatria. É o único hospital público da região metropolitana que conta com
serviços considerados referência para toda a rede pública de saúde.
Há cerca 310 leitos, onde todos estão cadastrados no SUS, faturando 804
Autorizações de Internações Hospitalares (AIHs) / mês, com taxa de ocupação
girando em torno de 100 %. No hospital são realizadas aproximadamente 1.300
internações mensais, com grande afluência de pacientes oriundos do interior (60%).
Dispõe ainda do Programa de Internação Domiciliar (PID), para dar suporte
aos idosos em suas residências.
Conta ainda com 19 leitos de UTI, assim divididos: 09 leitos na UTI Geral; 05
leitos na UTI Cardiológica e 05 na UTI Pediátrica; possui ainda 05 salas de Cirurgia;
CRO com nove leitos; Central de Material; Central de Esterilização Química; Sala de
Atendimento Clínico e Pediátrico; Sala de Atendimento ao Politraumatizado; Sala de
Observação Clínica; Unidade Intermediária; Sala de Reanimação; Sala de Vacinas;
Sala de Pequena Cirurgia; Farmácias Centrais; Farmácias Satélites; Laboratório;
Banco de Sangue; Unidade de Transferência; Setor de Queimados; Setor de
Radiologia; Setor de Endoscopia; Lavanderia Hospitalar; Central de Equipamentos;
Setor de Manutenção; três Geradores de Energia; Setor Administrativo; 06 Diretorias
(Geral; Médica; do P. Socorro; Técnica; Administrativa e de Enfermagem); Serviço
de Análise e Revisão de Prontuários; Central de Parecer; Lactário; 05 pavimentos
com Enfermarias Coletivas; CCIH; Serviço de Vigilância Epidemiológica; Setor de
Marcação de Consultas; Serviço de Hotelaria; NAST; Ambulatório para funcionários
e dependentes, Enfermaria Pediátrica e Necrotério.
Segundo dados fornecidos pelo site do hospital, em todo o complexo
hospitalar são realizados mensalmente cerca de 25.000 atendimentos, 450 cirurgias,
890 tomografias computadorizadas e 6.300 radiografias. Os leitos subdividem-se
em: 193 leitos Clínicos; 106 leitos Cirúrgicos; 18 Pediátricos; 30 leitos da Ortopedia;
08 leitos da Hematologia; 07 leitos da Nefrologia e 18 leitos para Queimados.
O complexo abriga ainda a Central de Notificação, Captação e Distribuição de
Órgãos do RN (CNCDO-RN), credenciada ao sistema nacional de transplante.
47
O hospital oferece ainda serviço de radiologia; Tomografia computadorizada;
Endoscopia, Ultra-sonografia convencional; Ultra-sonografia com Doppler; Ultra-
sonografia com eco; Colonoscopia; Laboratório de Microbiologia e Serviço de
remoção de pacientes com duas ambulâncias.
O hospital objetiva qualificar o atendimento aos pacientes de maior gravidade,
pois é este seu papel no SUS, porém também é dever deste garantir e assegurar o
direito de todos à saúde, isto faz com que pacientes que deveriam ser atendidos em
postos de saúde de bairro, hospitais municipais e regionais, também procurem o
HMWG/PSCS, tendo em vista que estes não prestaram tais serviços à população.
Diante das demandas postas pelo público do hospital ao Serviço Social frente
apolítica de saúde do Estado, o próximo capítulo trará a relação entre os Parâmetros
para Atuação de Assistentes Sociais na Saúde com as atividades desenvolvidas
pelo Serviço Social no complexo hospitalar.
4.1 O SERVIÇO SOCIAL E OS PARÂMETROS PARA ATUAÇÃO NA SAÚDE
A sociedade é historicamente marcada pelo autoritarismo, no entanto, com o
passar do tempo e de lutas acerca da cidadania, diversos direitos, tanto civis quanto
políticos foram alcançados. Não deixando de lado os direitos sociais, que podem ser
voltados às condições de vida, de trabalho, acesso à saúde, educação, trabalho,
lazer, segurança, previdência social, assistência social etc. Ao passo que tais
direitos são garantidos constitucionalmente, suas condições de efetivação para a
maior parte da população brasileira distancia-se daquilo almejado teoricamente.
Uma extensa parcela da população não tem acesso sequer à alimentação para a
manutenção de uma vida saudável, como também a dignas condições de habitação,
e de uma inserção a um trabalho que lhes garanta uma remuneração de fato
satisfatória. Sendo assim, conclui-se que está distante do exercício pleno da
cidadania e da dignidade humana.
O Serviço Social foi inserido na saúde por volta da década de 1930, pois foi
neste período que a política de saúde e outras políticas sociais passaram a ser
formuladas de uma maneira que atendesse melhor as demandas que geralmente
48
aumentavam. Surgia principalmente como necessidade de resposta às
reivindicações dos trabalhadores, sendo subdividida em saúde pública e saúde
previdenciária. Nesse período era conhecido como Serviço Social Médico, que
estava vinculado à assistência médico-previdenciária e ações de educação voltadas
em especial para hábitos de higiene da população. Suas ações eram executadas de
forma rotineira e burocratizada.
No Brasil, o Serviço Social entra no campo da saúde através de trabalhos
com a comunidade, em práticas educativas sobre procedimentos de higiene,
incentivando o controle de natalidade, de doenças infantis, de higiene bucal, de
saneamento para a criação das primeiras políticas urbanas de saúde, ou seja,
através de um trabalho educativo que visava proporcionar informação sobre a
higiene do próprio corpo. Embora a categoria ainda não tivesse um olhar crítico
frente às políticas públicas, este trabalho foi de grande importância para a época,
levando em consideração que este era uma país em grande parte sem escolaridade,
e ainda com parte significativa da população vivendo sob condições de miséria.
No desenvolvimento de sua criticidade, o Serviço Social contribuiu com as
lutas políticas pela construção do SUS, e no que diz respeito à atuação profissional,
Bravo (2009) destaca a importância de uma qualificação das ações profissionais,
para que possam contribuir para o efetivo controle democrático dos sujeitos
coletivos, buscando garantir-lhes os direitos sociais numa época de regressão
destes. Bem como os sujeitos, para uma intervenção qualificada precisam estar
organizados e capacitados, no sentido de saber reconhecer seus direitos para poder
exigi-los e pressionar o poder público, e somente conseguirão se tiverem os
instrumentos que lhes permitam uma efetiva análise da realidade.
Cabe ao profissional utilizar de sua autonomia, assegurada pela Lei
8.662/1993, que regulamenta a profissão, seja em órgãos públicos ou privados,
empresas ou entidades sem fins lucrativos, pois este é tanto um direito quanto um
dever do mesmo.
(...) a instituição e realização dos direitos sociais a que se vincula o exercício profissional, é portanto do interesse da democracia. Tornar eficazes estes direitos é o campo próprio dos assistentes sociais. Tanto que, no título sobre a Ordem Social, a Constituição, além de instituir o trabalho não somente como um direito, mas também um dever (art. 193), elegeu três deles – a saúde, a previdência social e a
49
assistência social – como prioritários e imprescindíveis à seguridade social. São instituições de interesse público por dois motivos: a) porque asseguram a estabilidade do sistema e, deste ponto de vista, têm natureza conservadora; mas b) porque são garantias de direitos subjetivos públicos a serem assegurados pelo Estado em sua plenitude e, deste ponto de vista, têm natureza progressista. Como vemos, sob os dois aspectos a atividade do assistente social é de interesse coletivo. E este, porque assumido pela ordem jurídica
constitucional, deve ser tornar eficaz. (SIMÓES, 2009, 417)
O Serviço Social atua em um contexto onde a luta pela afirmação de direitos
significa uma luta contra o capital, buscando uma afirmação dos direitos de
cidadania, para assegurar as necessidades e interesses dos sujeitos sociais. Sua
atuação é centrada nas formas mais latentes de manifestação da questão social,
expressa cotidianamente na vida da população.
(...) apreender a questão social é também apreender como os sujeitos a vivenciam. Ora, desvelar as condições de vida dos indivíduos, grupos e coletividades com as quais se trabalha é um dos requisitos para que se possa decifrar as diversas formas de luta, orgânicas ou não, que estão sendo gestadas e alimentadas, com inventividade, pela população. (...) Muitas vezes, o profissional move-se pela vontade de estar junto com a população atendida, mas objetivamente não está próximo de seus interesses como coletividade, sendo, de fato, um estranho para os indivíduos com que trabalha. (IAMAMOTTO, 2008, 76).
Iamamotto (2009) afirma que a forma como o profissional deve agir será
definida pelo espaço ocupacional em que está inserido, sejam o Estado, empresas
privadas, organizações não governamentais, movimentos sociais, entre outros.
Partindo do princípio que cada espaço possui racionalidades e funções distintas na
divisão social e técnica do trabalho, ocasionando ações de forma particular para
cada trabalho realizado, onde este, pode até mesmo ser voltado para a lucratividade
do capital, ou seja, a atuação do assistente social na sociedade depende de um
conjunto de relações e condições sociais.
O exercício da profissão exige um sujeito profissional que tenha competência para propor, para negociar com a instituição os seus projetos, para defender o seu campo de trabalho, suas qualificações
50
e atribuições profissionais. Requer ir além das rotinas institucionais para buscar apreender, no movimento da realidade, as tendências e possibilidades, ali presentes, passíveis de serem apropriadas pelo profissional, desenvolvidas e transformadas em projetos de trabalho. (IAMAMOTTO, 2009, 25)
O projeto ético-político do Serviço Social18 está vinculado a um projeto de
transformação da sociedade, levando em consideração a dimensão política da
intervenção profissional, pois atua em face ao movimento contraditório da sociedade
de classes. Tem como ponto central o reconhecimento da liberdade, expressando
um compromisso com a autonomia, emancipação e plena expansão dos indivíduos
sociais. Colocar este projeto profissional em prática configura uma das maiores
dificuldades enfrentadas pelos profissionais atualmente, pois, se por um lado a
igualdade é assegurada juridicamente a todos, por outro, a desigualdade econômica
age de uma maneira inversa a este princípio.
Com relação aos núcleos de objetivação do trabalho do assistente social na
área da saúde pode-se citar o levantamento de dados, que caracteriza e identifica as
condições socioeconômicas, familiares e sanitárias dos usuários; a interpretação de
normas e rotinas, que relaciona-se a procedimentos de natureza educativa;
agenciamento de medidas e iniciativas de caráter emergencial – assistencial,
constituem emergências sociais que interferem no processo saúde doença, são
atividades voltadas para agilização de internamentos/leitos, exames e consultas,
entre outros; procedimentos de natureza socioeducativa, informação e comunicação
em saúde, que relacionam-se com assegurar os usuários à obtenção de variadas
informações, como também ampliar a democracia institucional e a capacidade de
análise e de intervenção dos sujeitos e dos grupos; desenvolvimento de atividades
18 Para que um projeto profissional se defina, é necessária a apreensão da realidade como uma totalidade, e dessa forma apreender suas condições e disposições subjetivas, buscando modifica-la. O projeto profissional do Serviço Social tanto produziu quanto foi produto de conquistas históricas do final da década de 1970 (a partir do Congresso da Virada em 1979, que foi um símbolo no que diz respeito à insatisfação com a sociedade e com a própria profissão). Foi consolidado nas décadas de 1980 e 1990, tendo como uma de suas características, pensar a profissão em um contexto histórico, garantindo a análise de sua particularidade e relação com outros (sujeitos sociais e profissionais), buscando defender valores e princípios relacionados à emancipação humana. Tornou-se hegemônico na primeira metade da década de1990, sendo expressa em três níveis: a produção de conhecimento, nos marcos legais e na organização política. (RAMOS, 2009)
51
de apoio pedagógico e técnico-político, que é a realização de atividades junto aos
funcionários, representantes dos usuários no sistema, entre outros.
Nos Parâmetros de Atuação dos Assistentes Sociais na Saúde, orientadas
pelo CFESS, fica expressa a necessidade um profissional que atue de uma forma
diferenciada, afastando-se de abordagens tradicionais funcionalistas e pragmáticas
que tratam questões sociais como problemas pessoais devendo ser enfrentados de
forma singular, isto aplica-se também a todas as outras políticas públicas. Dessa
forma o assistente social deve atuar partindo de uma perspectiva totalizante.
A intervenção orientada por esta perspectiva teórico-política pressupõe: leitura crítica da realidade e capacidade de identificação das condições materiais de vida, identificação das respostas existentes no âmbito do Estado e da sociedade civil, reconhecimento e fortalecimento dos espaços e formas de luta e organização dos trabalhadores em defesa de seus direitos; formulação e construção coletiva, em conjunto com os trabalhadores, de estratégias políticas e técnicas para modificação da realidade e formulação de formas de pressão sobre o Estado, com vistas a garantir os recursos financeiros, materiais, técnicos e humanos necessários à garantia e à ampliação dos direitos. (CFESS, 2010)
Ainda de acordo com os Parâmetros de Atuação dos Assistentes Sociais na
Saúde, é estabelecido que, os assistentes sociais atuam de acordo com quatro
eixos, compreendidos de forma articulada em uma perspectiva de totalidade. Estes
serão explicitados na tabela abaixo:
ATENDIMENTO DIRETO AOS USUÁRIOS
O atendimento direto aos usuários se dá nos diversos espaços de atuação profissional na saúde, desde a atenção básica até os serviços que se organizam a partir de ações de média e alta complexidade, e ganham materialidade na estrutura da rede de serviços brasileira a partir das unidades da Estratégia de Saúde da Família, dos postos e centros de saúde, policlínicas, institutos, maternidades, Centros de Apoio Psicossocial (CAPs), hospitais gerais, de emergência e especializados, incluindo os universitários, independente
52
da instância a qual é vinculada seja federal, estadual ou municipal.
MOBILIZAÇÃO, PARTICIPAÇÃO E CONTROLE SOCIAL
Este eixo envolve um conjunto de ações voltadas para a mobilização e participação social de usuários, familiares, trabalhadores de saúde e movimentos sociais em espaços democráticos de controle social (conselhos, conferências, fóruns de saúde e de outras políticas públicas) e nas lutas em defesa da garantia do direito à saúde. As atividades realizadas têm por objetivo contribuir na organização da população e dos usuários enquanto sujeitos políticos, que possam inscrever suas reivindicações na agenda pública da saúde.
INVESTIGAÇÃO, PLANEJAMENTO E GESTÃO
Este eixo envolve um conjunto de ações que tem como perspectiva o fortalecimento da gestão democrática e participativa capaz de produzir, em equipe e intersetorialmente, propostas que viabilizem e potencializem a gestão em favor dos usuários e trabalhadores de saúde, na garantia dos direitos sociais.
ASSESSORIA, QUALIFICAÇÃO E FORMAÇÃO PROFISSIONAL
As atividades de qualificação e formação profissional visam ao aprimoramento profissional, tendo como objetivo a melhoria da qualidade dos serviços prestados aos usuários. Envolve a educação permanente dos trabalhadores de saúde, da gestão, dos conselheiros de saúde e representantes comunitários, bem como a formação de estudantes da área da saúde e residentes, como também a assessoria, que será explicitada posteriormente. Estão englobadas neste eixo as ações relacionadas especificamente com a equipe de Serviço Social, como também com os demais profissionais de saúde. Dessa forma, podem ser realizadas atividades para cada área profissional, como programações que visem à qualificação da equipe de saúde, na perspectiva de um trabalho interdisciplinar.
Quadro 4: Eixos de Atuação dos Assistentes Sociais Fonte: CFESS, 2010
53
Tendo em vista o conhecimento do assistente social no que diz respeito às
lutas sociais, é de se esperar que tal profissional contribua para a politização
também no campo da saúde. Ao mesmo tempo em que se comemora duas décadas
do Sistema Único de Saúde, também é comemorado trinta anos do Congresso da
Virada, e isso não é uma mera coincidência, pois o nascimento do SUS esteve
profundamente ligado e foi um produto de lutas sociais, onde os assistentes sociais
contribuíram e trouxeram para sua categoria a afirmação de um referencial teórico
voltado para uma teoria social crítica que se compromete com a formação de um
novo projeto de sociedade.
Diante disso, na saúde pública foram desenvolvidas abordagens individuais
sobre a saúde, tendo como destaque o Serviço Social de caso, representando a
necessidade de intervenção do assistente social nas políticas de reprodução social,
como um reconhecimento de que a saúde mesmo possuindo determinantes sociais,
também havia a necessidade de que muitos desses determinantes fossem tratados
isoladamente.
Sua formação possibilita que tal profissional possa atuar na saúde, tendo em
vista sua competência para esta e outras dimensões da questão social. De acordo
com a Resolução CNS n° 218 de 06 de março de 1997, o Conselho Nacional de
Saúde reconhece o assistente social, juntamente com outras categorias, como um
profissional da área da saúde.
Na saúde, assim como em qualquer outra área tem-se a necessidade de uma
interação entre o usuário e o profissional, sendo enfatizados a história de vida e
sofrimento do mesmo através de escutas, o assistente social atua juntamente com
profissionais de outras áreas, para poder também usar de novas tecnologias,
objetivando um atendimento humanizado aliado às necessidades individuas. Dessa
forma há tanto uma abordagem singular quanto em relação à realidade do mesmo.
As contradições que existem no processo de racionalização do SUS são o
principal vetor das demandas do Serviço Social, ou seja, as necessidades da
população se deparam com o conteúdo e a forma de organização dos serviços.
Dessa forma, quando o Serviço Social as atende, interfere e cria um conjunto de
mecanismos que refletem sobre as principais contradições do sistema de saúde
pública.
54
O trabalho do assistente social é importante para a consolidação do SUS, e
para realizar qualquer tipo de atendimento é necessário que o profissional conheça a
instituição ou a unidade em que trabalha, sendo assim, tal profissional se insere
dentro do processo de trabalho em saúde como um agente de interação ou como
uma ligação entre os variados níveis do SUS, assegurando a integralidade das
ações. Sua atuação também busca, de certa forma acabar ou amenizar a
burocratização das ações, seja nos níveis de prestação de serviços de saúde ou até
mesmo entre as políticas de saúde e as demais políticas sociais e setoriais.
O Serviço Social foi regulamentado como uma “profissão liberal” dela decorrente os estatutos legais e éticos que prescrevem uma autonomia teórico-metodológica, técnica e ético-política à condução do exercício profissional. Entretanto o exercício da profissão é tensionado pela compra e venda da força de trabalho especializada do assistente social, enquanto trabalhador assalariado, determinante
fundamental na autonomia do profissional. A condição assalariada – seja como funcionário público ou assalariado de empregados privados, empresariais ou não – envolve, necessariamente, a incorporação de parâmetros institucionais e trabalhistas que regulam relações de trabalho, consubstanciadas no contrato de trabalho. (IAMAMOTTO, 2009, 38).
Assim, o principal desafio da atualidade para o profissional de Serviço Social
na área da saúde é ter o seu trabalho reconhecido como tal. Mostrar e desmistificar
que o trabalho do assistente social não é voluntário, assistencialista, messiânico,
mas sim uma profissão que atua em diferentes áreas e exerce suas competências e
atribuições norteadas pelo Código de Ética e Lei de Regulamentação da Profissão.
O Código de Ética nos indica um rumo ético-político, um horizonte para o exercício profissional. O desafio é a materialização dos princípios éticos na cotidianidade do trabalho, evitando que se transformem em indicativos abstratos, descolados do processo social. Afirma, como valor ético central, o compromisso com a nossa parceira inseparável, a liberdade. Implica a autonomia, emancipação e a plena expansão dos indivíduos sociais, o que tem repercussões efetivas nas formas de realização do trabalho profissional e nos rumos a ele impressos. (IAMAMOTTO. 2008, 77)
No tópico seguinte veremos as atividades realizadas pela Divisão de Serviço
Social, tentando relacionar aos aspectos postos por Iamamotto, bem como,
55
posteriormente as dificuldades e desafios para a materialização dos respectivos
valores éticos no cotidiano profissional.
4.2 AS ATIVIDADES DESENVOLVIDAS PELO SERVIÇO SOCIAL DO
HMWG/PSCS
Quando o Serviço Social surge na divisão social do trabalho, possuía uma
dimensão técnica voltada para resultados imediatos a partir de sua ação profissional,
e isto garantia legitimidade e reconhecimento da sociedade acerca da profissão. O
Movimento de Reconceituação19 buscava romper com essa visão, para que o
Serviço Social possuísse uma visão científica. Na Intenção de Ruptura20,
denominada por Netto (2004), buscava que a profissão produzisse uma crítica
acerca da realidade social, para que a mesma construísse objetivos e objetos de sua
intervenção, e dessa forma responder às demandas sociais. Após isso, Iamamotto
(2004) aponta três dimensões que o assistente social deve dominar: a ético-política;
teórico-metodológica e técnico-operativa.
19 Teve como principais vertentes de análise: a Modernizadora, caracterizada por abordagens mais funcionalistas, estruturalistas e positivistas com uma perspectiva de integração social, que, no entanto, responsabilizavam o indivíduo em relação aos processos e disfunções da sociedade, como também a busca da eficiência e eficácia. A entrada dessas abordagens vieram como forma de enfrentamento da pobreza e marginalização com intuito de integrar os indivíduos na sociedade. A vertente fenomenológica trouxe uma abordagem mais pessoal e de comunidade, avaliando a situação segundo as vivências e buscava a transformação das pessoas, o que o autor José Paulo Netto, chamou de “Reatualização do Conservadorismo”. E a vertente Marxista, que levará a primeira aproximação do Serviço Social às teorias de Marx, mesmo que de forma enviezada. Trás uma postura mais crítica e de inserção nas classes sociais. É nessa primeira aproximação também que o serviço social questiona sua prática profissional, visto que, é essa a utilizada pela maioria dos profissionais atualmente, apesar de ainda conter traços das outras vertentes. 20 Trazia a imposição de um trabalho teórico-metodológico constituído por critica teórica ao tradicionalismo, busca de experimentação de propostas de ação e trabalho de pesquisa sem as exigências imediatas das demandas institucionais ou restrições políticas das mesmas. A Intenção de ruptura se expressa inicialmente como “experiências piloto” de ações de extensão e estágios. Assim consegue sair do isolamento intelectual e aproxima-se das comunidades.
56
Partindo da competência técnico-operativa que o profissional deve dominar
para, dessa forma criar um conjunto de habilidades quanto executa uma ação
profissional, e através de metodologias de ação utiliza instrumentos e técnicas de
intervenção social, que no âmbito do HMWG/PSCS, tem-se como destaque a Ficha
de Acompanhamento Social (Anexo 1), que ao mesmo tempo que traça o perfil
socioeconômico do paciente, também permite dar outras disposições acerca de sua
situação para posteriores ações e encaminhamentos, caso seja necessário.
Dentre as funções e atribuições do assistente social no Pronto Socorro Clóvis
Sarinho destacam-se o:
Atendimento ao paciente/família na observação médica,
politrauma e reanimação; Atendimento ao paciente interno da UTI Bernadete, UTI Geral,
UTI Pediátrica e CRO; Realizar entrevista social com a família do paciente no ato de
admissão ; Interpretar e informar normas e rotinas do hospital à
família/paciente; Orientar família/paciente sobre os seus direitos e deveres; Contatos com entidades de apoio e proteção à criança e
adolescente; Solicitar da família do paciente a documentação necessária para
a realização de exames em outras unidades de saúde; Assessoramento técnico à direção; Supervisionar estagiários (as) de Serviço Social; Agilizar a remoção do paciente para outras unidades de saúde; Comunicar à família sobre a alta do paciente; Comunicar à família quando do óbito do paciente; Dar apoio psico-social aos familiares no momento do óbito; Orientar à família quanto à remoção do cadáver; Orientar à família quanto ao registro da declaração de óbito em
cartório; Em caso de morte violenta, orientar às famílias das providências
necessárias para encaminhamento do cadáver ao ITEP;
Comunicar à Central de Transplantes quando da ocorrência de
óbitos. (Serviço Social do HMWG/PSCS, 2009)
(
No Hospital Monsenhor Walfredo Gurgel:
Visitar diariamente os pacientes internados nas enfermarias; Atender aos usuários que buscam a Divisão de Serviço Social
solicitando informações e/ou orientações sobre os serviços prestados pela unidade;
Informar os familiares sobre o estado de saúde do paciente;
57
Contato com outras unidades de saúde em caso de transferência de pacientes ou realização de exames inexistentes nesta unidade hospitalar;
Realizar reuniões com acompanhantes; Orientar quanto aos direitos trabalhistas, previdenciários e/ou
sobre seguro; Contatos com entidades de apoio e proteção à criança e
adolescente; Contato com familiares ou responsáveis, em caso de óbito; Assessoramento técnico à direção; Contato interprofissional e interinstitucional; Autorizar visita extra, quando se fizer necessário; Orientar a família e/ou paciente quando necessário amputar
membros ou intervenção cirúrgica de urgência; Supervisionar estagiárias de Serviço Social; Comunicar alta de pacientes às famílias; Contato com Prefeituras e Hospitais Municipais para agilizar o
retorno do paciente ao município; Encaminhar o usuário a outros serviços e/ou recursos existentes
na comunidade; Autorizar acompanhante para crianças, adolescentes menores de
18 anos e idosos com mais de 60 anos, conforme legislação vigente. (Serviço Social do HMWG/PSCS, 2009)
Considerando os Parâmetros para Atuação dos Assistentes Sociais na
Saúde, observa-se que, de acordo com as funções e atribuições do assistente social
no PSCS e HMWG, estas são quase que em sua totalidade de eixo 1 (um):
atendimento direto aos usuários, conforme mencionados em tabela anteriormente.
Observa-se também ações do eixo 4 (quatro): assessoria, qualificação e formação
profissional, através das atividades de supervisão de estágio e assessoramento
técnico à direção.
Nas referidas atribuições construídas pela divisão de Serviço Social, não se
verifica ações do eixo 2 (dois) e 3 (três). No entanto, durante o período de estágio
curricular obrigatório, através de observações participante, constatou-se que os
profissionais também realizam ações do eixo 3(três): investigação, planejamento e
gestão.
As ações de investigação se dão no levantamento estatístico de demandas,
situações de violências, sobretudo quando solicitadas pela direção do hospital. As
ações de planejamento ocorrem anualmente com participação dos profissionais e
nos demais momentos são realizadas pela chefia da divisão de Serviço Social.
Quanto ao eixo 2 (dois): mobilização, participação e controle social, não foram
observadas durante o período de estágio.
58
A não realização de ações deste eixo se dá, em parte, porque os profissionais
não são designados para as referidas representações pela direção do hospital. No
âmbito das possibilidades de participação em fóruns, comitês e conselhos enquanto
trabalhadores da saúde, observa-se que alguns profissionais não tem interesse,
algumas vezes tempo, frente à demanda de trabalho do hospital, e até mesmo
questões objetivas pessoais. Desta forma, perde-se uma grande possibilidade de
contribuições destes profissionais para o monitoramento da política dessaúde do
estado.
A administração da demanda reprimida é uma das principais atividades que o
assistente social desenvolve, e deve fazê-la em um cenário em que há o desafio da
execução de um bom trabalho, diante do crescimento da mesma, do déficit da oferta
de serviços, da efetividade dos mecanismos de controle e acompanhamento
requeridos pelo processo de reorganização do SUS.
4.3 REFLEXOS DO (NÃO) ACESSO AO DIREITO À EDUCAÇÃO NOS
PACIENTES DO HMWG/PSCS
Os usuários do Serviço Social são aqueles que requerem e necessitam dos
serviços de saúde, não é apenas um consumidor dos serviços, mas também um
coparticipante do processo de trabalho, tendo em vista que dele dependem as
informações acerca do seu estado de saúde, do cumprimento das prescrições
médicas e recomendações terapêuticas. Diante disso, o assistente social pode
executar ações de caráter emergencial assistencial, educação, informação e
comunicação em saúde, planejamento e assessoria e mobilização e participação
social.
No questionário semiestruturado realizado nos variados setores do hospital,
tanto em pacientes quanto acompanhantes do HMWG/PSCS pode-se perceber que
até aqueles que possuíam certo grau de escolaridade, ainda assim não sabia definir
ao certo o que era saúde por exemplo. Esta era umas das perguntas contidas no
referido questionário, em grande maioria, os entrevistados entendiam por saúde,
59
apenas o fato de não estar doente no referido momento; uma pequena minoria,
atribuiu saúde como qualidade de vida, incluindo alimentar-se bem.
Quando questionados sobre o que é ter direito à saúde, quase unanimemente
referiram-se que isto relacionava-se ao acesso aos serviços de saúde com
qualidade, melhor atendimento, sem longas esperas. Foi perceptível também, que
muitos queixavam-se da forma com que eram atendidos pelos profissionais do
hospitais (médicos, enfermeiros, técnicos etc).
No entanto, chama-se atenção para o fato de que, mesmo que estivessem
utilizando o SUS, uma maioria significativa não sabia o que era, alguns não tinham
ouvido falar e atribuíam esse sistema de saúde, ao cartão utilizado para realização
de serviços mais complexos (cartão SUS21). Já os que sabiam que este era gratuito,
direito de todos, pois pagavam impostos, afirmavam que preferiam pagar serviços a
hospitais privados, afirmando que a qualidade no atendimento e serviços destes era
melhor.
Em sua maioria, também ressaltavam as dificuldades para marcar
procedimentos de saúde como consultas, exames e cirurgias nos postos de saúde
mais próximos de suas residências, alegando que grande parte destes só ofereciam
o clínico-geral, e que não haviam médicos especialistas, percebeu-se que isto ocorre
geralmente nas cidades do interior do estado.
Este questionário também continha perguntas relacionadas ao Serviço Social,
e o que mais impressiona é que grande parte dos entrevistados tinham apoio deste
setor, com destaque para o Programa Bolsa Família22, ainda assim não sabiam
21O Cartão Nacional de Saúde é um instrumento que possibilita a vinculação dos procedimentos executados no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) ao usuário, ao profissional que os realizou e também à unidade de saúde onde foram realizados. Para tanto, é necessária a construção de cadastros de usuários, de profissionais de saúde e de unidades de saúde. A partir desses cadastros, os usuários do SUS e os profissionais de saúde recebem um número nacional de identificação. Disponível em http://portal.saude.gov.br/portal/saude/Gestor/area.cfm?id_area=944 22O Programa Bolsa Família (PBF) é um programa de transferência direta de renda que beneficia famílias em situação de pobreza e extrema pobreza em todo o País. O Bolsa Família integra o Plano Brasil Sem Miséria (BSM), que tem como foco de atuação os 16 milhões de brasileiros com renda familiar per capita inferior a R$ 70 mensais, e está
baseado na garantia de renda, inclusão produtiva e no acesso aos serviços públicos. O Bolsa Família possui três eixos principais focados na transferência de renda, condicionalidades e ações e programas complementares. A transferência de renda promove o alívio imediato da pobreza. As condicionalidades reforçam o acesso a direitos sociais básicos nas áreas de educação, saúde e assistência social. Já as ações e programascomplementares objetivam o desenvolvimento das famílias, de modo que os
60
definir as atividades realizadas por este setor, atribuindo ao Serviço Social uma
identidade voltada para a assistência, como um profissional facilitador de serviços
burocráticos, ou seja, desconheciam o fato de que o assistente social zela pela
defesa intransigente dos direitos humanos, direitos estes que lhes são
frequentemente negados nos mais variados âmbitos da vida social, ocasionando
episódios como este, que expressam a realidade da saúde pública brasileira.
Ao que diz respeito a educação, aqueles que não possuíam ao menos o
ensino médio completo, afirmaram que abandonaram os estudos, por necessidades
financeiras a família que os obrigavam a trabalhar ainda adolescentes para contribuir
na renda familiar, isto ocorria, geralmente com os homens. Quando o abandono
escolar era realizado por mulheres, todas afirmaram que o motivo foi o fato destas
engravidarem, e consequentemente abandonaram os estudos para cuidar dos filhos,
e posteriormente, quando estes já eram crescidos, não houve interesse ou tempo
para dar continuidade aos estudos.
Isto revela um problema muito complexo, não atribuído apenas à necessidade
de uma maior escolaridade, ou ações de cunho socioeducativo/socioassistencial,
mas também que visassem a educação sexual por exemplo, já que a gravidez
indesejada, ainda é um dos principais motivos que fazem com que muitas mulheres
abandonem os estudos.
4.4 AÇÕES SOCIOASSISTENCIAIS E SOCIOEDUCATIVAS
DESENVOLVIDAS PELO SERVIÇO SOCIAL
Quando nos referimos ao atendimento direto aos usuários ou qualquer outra
atividade desenvolvida, sabe-se que há variações de acordo com a realidade de
cada instituição em que o Serviço Social esteja inserido já que este se adequa às
necessidades historicamente definidas da população no âmbito da saúde.
A partir da implementação do SUS, novas reivindicações entram em pauta,
decorrentes dos princípios em que este foi concebido. Diante destas exigências,
beneficiários consigam superar a situação de vulnerabilidade. Disponível em http://www.mds.gov.br
61
surgem também, novas contradições, já que o SUS como fora idealizado de fato não
conseguiu ser executado. Isto se expressa nos problemas mais conhecidos
cotidianamente, tais como: burocratização; demora no atendimento, nas marcações
de consultas, exames, cirurgias, entre outros serviços; ênfase na assistência médica
curativa, quando deveria ser voltada da mesma forma para a preventiva; o
atendimento geralmente não é realizado com a qualidade adequada. Essas
deficiências ocasionam a visão que grande parte da população tem do setor público,
ou seja, que este não possui qualidade, quando na verdade, sabemos que estes
problemas são decorrentes principalmente de uma má aplicação da verba, que por
sinal é insuficiente, não deixando de mencionar também, que na maioria das vezes
ao atendimento não é realizado como deveria pela condições de trabalho dos
profissionais como baixa remuneração, aumento das atividades, carga horária
excessiva entre outros.
As ações a serem desenvolvidas pelos assistentes sociais devem transpor o caráter emergencial e burocrático, bem como ter uma direção socioeducativa por meio da reflexão com relação às condições sócio-históricas a que são submetidos os usuários e mobilização para a participação nas lutas em defesa da garantia do direito à Saúde. O profissional precisa ter clareza de suas atribuições e competências para estabelecer prioridades de ações e estratégias, a partir de demandas apresentadas pelos usuários, de dados epidemiológicos e da disponibilidade da equipe de saúde para ações conjuntas. As demandas emergenciais, se não forem reencaminhadas para os setores competentes por meio do planejamento coletivo elaborado na unidade, vão impossibilitar ao assistente social o enfoque nas suas ações profissionais. A elaboração de protocolos que definem o fluxo de encaminhamentos para os diversos serviços na instituição é fundamental. (CFESS, 2009)
.
Os parâmetros destacam ainda que estas observações cabem para pensar o
HMWG/PSCS pois durante a observações participante realizada durante o estágio,
as ações emergenciais, sobretudo no que diz respeito à lotação do hospital, de
ordem estrutural da política de saúde inviabilizam que os profissionais executem
com efetividade as ações planejadas que desafiam o setor.
Deve-se agir com cautela em assuntos relacionados à avaliação
socioeconômica da família, já que este instrumento não pode ser utilizado como um
62
meio para eleger ou selecionar o usuário, pois este busca garantir direitos ao invés
de impedi-lo de acessar determinados serviços, ainda que seja levado em
consideração as limitações institucionais. Isto aplica-se também às visitas
domiciliares, já que estas buscam uma melhor compreensão ao que diz respeito às
condições de vida dos usuários, e jamais como uma verificação ou fiscalização dos
dados fornecidos pelo usuário.
Não há como discutir a atuação do Serviço Social na saúde, sem mencionar
um fato que historicamente recai sobre os assistentes sociais: ações que não são
atribuições deste profissional. Ao passo que o trabalho coletivo é necessário, deve-
se ficar atento com o papel que cada profissional deve desempenhar, ou seja, suas
atribuições e competências.
Em experiência do estagio supervisionado obrigatório, foi observado o que
nos Parâmetros para Atuação dos Assistentes Sociais na Saúde já havia sido
ressaltado. É comum, e neste caso, já tornaram-se rotina do assistente social
realizar marcações de consultas e exames; identificação de vagas em outras
unidades hospitalares para possíveis transferências ou cirurgias; solicitação de
ambulâncias; comunicação de altas e óbitos etc, ou seja, atividades técnico-
administrativas. Isto demonstra a necessidade de uma maior informação de toda a
equipe hospitalar acerca das atribuições e competências do profissional.
Ficou explícito também o caráter socioeducativo da atuação do Serviço Social
do HMWG/PSCS, já que as ações são realizadas tanto individualmente quanto
coletivamente em momentos de informação acerca da rotina e normas hospitalares,
no entanto, foi perceptível que na maioria das vezes tal ação ficava restringida
apenas à fornecer informações e esclarecimentos aos pacientes e familiares, que de
certa forma, contribui com que estes não superem a situação em que se encontram.
Diante disso, a atuação do assistente social deve ultrapassar esse caráter,
buscando ao menos, o uso de artifícios que contribuam minimamente com o
conhecimento e compreensão crítica dos usuários acerca da sua realidade. Como
por exemplo, buscar superar a visão que muitos possuem da saúde, ou de qualquer
serviço público como um favor, mas sim como um direito que lhes é resguardado
constitucionalmente, ocasionando assim, uma participação consciente deste usuário.
Foi constatado que, no HMWG/PSCS os profissionais do Serviço Social
desenvolvem tanto ações socioassistenciais quanto socioeducativas no decorrer do
63
cotidiano hospitalar. Pode-se mencionar exemplos de ações socioassistenciais
desenvolvidas, quando o assistente social busca facilitar e possibilitar o acesso dos
usuários aos serviços, e a forma mais comum desta ação são os encaminhamentos
para serviços voltados para a garantia de direitos (esfera as seguridade social
quando são orientações relacionadas à saúde, educação e em especial previdência
nos casos de aposentadoria por invalidez ou até mesmo o benefício de
BPC/LOAS23). É necessário também, que o profissional conheça a rede de serviços
disponível para as mais variadas demandas, sejam elas para os casos de violência
contra a mulher, crianças e adolescentes, idosos, como também em casos de
abusos sexual, ou seja, de todo o rol de serviços que se fazem necessário para uma
atuação profissional de qualidade, objetivando viabilizar os direitos sociais dos
usuários. O assistente social deve ainda, democratizar as informações através de
orientações individuais ou coletivas, como também encaminhamentos ao que diz
respeito os direitos da população. Este momentos dá-se geralmente em encontros
com os acompanhantes e pacientes, realizados diariamente nos mais variados
setores do hospital.
No que diz respeito às ações socioeducativas são dadas orientações aos
usuários acerca de seus direitos, dos princípios e diretrizes do SUS, das normas e
rotinas hospitalares, entre outras necessidades que surgem de acordo com a
realidade de cada paciente/acompanhante. No entanto, foi notável a necessidade de
uma maior interação usuário/profissional ao que diz respeito ações que requisitariam
uma maior mobilização social, já que estamos diante de um cenário tão contraditório
e que expressa de forma fiel os aspectos latentes da questão social.
23 O Beneficio de Prestação Continuada da Assistência Social – BPC foi instituído pela Constituição Federal de 1988 e regulamentado pela Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS (...) O BPC é um benefício da Política de Assistência Social, que integra a Proteção Social Básica no âmbito do Sistema Único de Assistência Social – SUAS e para acessa-lo não é necessário ter contribuído com a Previdência Social. É um benefício individual, não-vitalício e intransferível, que assegura a transferência mensal de 1 (um) salário mínimo ao
idoso, com 65 (sessenta e cinco) anos ou mais, e à pessoa com deficiência, de qualquer idade, com impedimentos de longo prazo, de natureza física, mental intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdade de condições com as demais pessoas. Em ambos os casos, devem comprovar não possuir meios de garantir o próprio sustento, nem tê-lo provido por sua família. A renda mensal familiar per capita deve ser inferior a ¼ (um quarto) do
salário mínimo vigente. (Disponível em http://www.mds.gov.br/assistenciasocial/beneficiosassistenciais/bpc)
64
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Diante do exposto ao longo deste trabalho foi possível analisar como o
conceito sobre saúde historicamente foi alterado no Brasil. Marcos como a 8ª
Conferência Nacional de Saúde e a Constituição de 1988 foram significativas para a
afirmação de direitos tão importantes quando a saúde pública, marcados
especialmente pela participação popular, expressando a busca pela implantação da
cidadania de fato, além de um ideal mais igualitário.
Neste contexto, o SUS foi de grande importância, já que em seus princípios
(equidade, universalidade e integralidade) colocam a saúde como um direito
universal, devendo ser garantido pelo Estado através de serviços públicos de forma
hierarquizada, descentralizada e regionalizada, colocando um fim entre segurados e
não segurados. No entanto, mesmo tão bem planejado, o mesmo não se realiza
cotidianamente da forma com que foi idealizado, tendo em vista que é associado a
longas filas de espera por vagas, exames, cirurgias etc, além da carência de até
mesmo insumos básicos, ocasionados pela má administração, somada à falta de
investimentos..
A educação é geradora de desigualdade, no entanto, ela geralmente é
atribuída apenas a aspectos como a colocação dos indivíduos no mercado de
trabalho, qualidade do emprego, principalmente com relação ao salário e horas
trabalhadas. No entanto, a educação deve ser vista como parte das condições para
a existência da dignidade da pessoa humana a partir do momento que esta define
que todo ser-humano é uma pessoa, dotado de personalidade, com direitos e
deveres, membro de uma sociedade em que vive, e merecedor de uma existência
humana, e não sub-humana.
Ao longo da pesquisa e do estágio curricular supervisionado, observou-se que
os usuários com menos acesso à educação formal, possuem menos conhecimento
acerca do direito à saúde ou do SUS e do Serviço Social, mesmo com grande parte
deles recebendo apoio deste setor através de programas como o Bolsa Família.
Este contexto, exige do profissional, um maior detalhamento nas ações assistenciais
de orientação e nas ações socioeducativas.
Já que direitos como a saúde não são assegurados corretamente pelo Estado
diante do atual contexto brasileiro que tanto favorece a privatização de variados
65
serviços. Há a necessidade de que o próprio usuário, juntamente com toda a
sociedade civil exija seus direitos, no entanto, é perceptível como o déficit na
educação formal afeta diretamente tais usuários, impossibilitando-os de ter uma
visão crítica acerca da realidade que os cerca
Sendo assim, foi possível perceber a necessidade de um maior conhecimento
dos usuários ao que diz respeito seus direitos e deveres no SUS, considerando
também que a falta de tal conhecimento, está intimamente ligado à carência da
escolaridade, ou até a falta dela. Sabe-se que este fator não é determinante nesta
problemática, no entanto, deve-se levar em consideração que os benefícios de um
maior nível de escolaridade não resumem-se apenas ao âmbito econômico, mas
também, o fato de que uma população escolarizada e consciente exerce seus
direitos mais plenamente.
É necessário um trabalho na forma de ações bem pensadas, visando uma
melhoria nas condições de saúde da população, partindo do princípio que este é um
direito que assiste a todos, no entanto não se efetiva, a partir do momento em que
não há uma participação de todos. Sabe-se também, que esta prática educativa é
necessária para uma posterior participação em massa.
Dessa forma, não se pode deixar de mencionar a importância da inserção do
Serviço Social nas escolas visando a contribuição para a garantia ao direito à
educação, como também a aspectos que perpassam o cotidiano da escola, como
por exemplo o desinteresse, a evasão, o baixo rendimento escolar, muitas vezes
poderiam ser melhoradas caso houvesse uma maior participação da família no
contexto escolar.
Porém, toda e qualquer mudança relacionada às melhorias da qualidade de
vida, sejam elas voltadas à saúde, educação, transporte, moradia etc, demanda uma
mudança em vários âmbitos da sociedade, principalmente pelo fato de que
mudanças desse tipo, só são possíveis quando abandonarmos essa prática
individualista, e migrarmos para uma orientação mais humanista, para dessa forma
fazer com que serviços básicos como saúde e educação sejam suficientes e
eficientes para as necessidades reais dos seus usuários.
Diante disso, o Serviço Social pode executar ações de caráter emergencial
assistencial, educacional, de informação e comunicação em saúde, planejamento e
assessoria e mobilização e participação social. Com todo o conhecimento que este
66
profissional possui no que diz respeito às lutas sociais, deve contribuir para uma
politização também no campo da saúde e dessa forma interferir e criar um conjunto
de mecanismo que incidem sobre as principais contradições do sistema de saúde
pública do país.
É necessário a presença de ações voltadas para a educação, informação e
comunicação em todas as unidades de saúde, ao invés de resumir essa prática em
apenas orientações acerca da rotina hospitalar ou outros tipos de procedimentos,
deve-se também realizar atividades que assessorassem, organizassem e
realizassem cursos, debates, palestras, oficinas, folders, reuniões, entre outros, pois
estas são novas exigências no trabalho dos assistentes sociais para colaborar na
construção de estratégias de efetivação de direitos de cidadania através de uma
mobilização dos usuários. Ressaltando também, o fato de que a dinâmica idealizada
pelo SUS, efetiva-se principalmente através de processos de trabalho coletivo. As
ações socioeducativas são muito requisitadas em toda a política de assistência
social, pois propiciam oportunidades de aprendizagem, visando o desenvolvimento
de capacidades, da autoconfiança, autoestima, objetivando a construção de um
novo projeto de sociedade.
Cotidianamente, o Serviço Social é sobrecarregado com demandas
emergenciais, que impossibilitam o profissional de contribuir com a mobilização, a
participação e o controle social da política de saúde no Rio Grande do Norte. Criar
estratégias de participação do assistente social, junto aos usuários, se mostra um
desafio que a categoria tem que enfrentar.
67
6. REFERÊNCIAS
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APÊNDICES
73
APÊNDICEA
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APÊNDICE B
75
76
ANEXOS
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ANEXO1