Simpósio Internacional sobre Interdisciplinaridade no Ensino,
na Pesquisa e na Extensão – Região Sul
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Educação ambiental e desenvolvimento comunitário: perspectiva interdisciplinar
Luciane Vanessa Mendes Horst Universidade Estadual do Centro-Oeste – [email protected]
Cristina Ide Fujinaga Universidade Estadual do Centro-Oeste – [email protected]
Alcir Humberto Rodrigues Sesi/Irati e Instituto Federal do Paraná – IFPR – [email protected]
RESUMO
O presente artigo é resultado de um debate teórico a cerca da relação entre a Educação Ambiental e o
desenvolvimento comunitário, baseado nos pressupostos da interdisciplinaridade. Os problemas decorrentes
do atual modelo de globalização hegemônica são inúmeros, afetando diretamente a qualidade de vida social
e ambiental das comunidades. Neste sentido, propomos a reflexão de que, a Educação Ambiental, a partir de
estímulos de organização e participação comunitária, pode contribuir para o seu desenvolvimento.
Consideramos a Educação Ambiental e o desenvolvimento comunitário passíveis de serem discutidos no
âmbito de diferentes áreas do conhecimento, haja vista a complexidade dos mesmos. Sua abordagem
interdisciplinar permite a apropriação de novas formas de relacionamento entre a comunidade e o meio
ambiente.
PALAVRAS-CHAVE: desenvolvimento comunitário, interdisciplinaridade, Educação Ambiental
ABSTRACT
This article is the result of a theoretical debate about the relationship between environmental education and
community development, based on the assumptions of interdisciplinary. The problems arising from the
current model of hegemonic globalization are many, directly affecting the quality of social life and
environmental communities. In this sense, we propose that reflexed, the Environmental Education from
stimuli community organization and participation, can contribute to its development. Consider
environmental education and community development that can be discussed within different areas of
knowledge, considering the complexity of the same. His interdisciplinary approach allows the appropriation
of new forms of relationships between the community and the environment.
1. INTRODUÇÃO
O mundo passa por uma crise social e ambiental. A racionalidade cientifica, a lógica
produtivista e o consumo exacerbado aos quais estamos condicionados (SANTOS, 1988) têm contribuído de
modo significativo à degradação do meio ambiente. Também preocupantes são os resultados apresentados
pelos Relatórios de Desenvolvimento Humano, os quais apontam a enorme desigualdade social presente
entre nações ou no interior destas.
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Esses fatos, abrangendo ainda outras dimensões, são temas de debate da Educação Ambiental,
sendo que, o Índice de Desenvolvimento Humano de alguns países, principalmente daqueles considerados
mais pobres, tendem a piorar caso não sejam tomadas medidas rápidas e eficazes perante a situação
ambiental do Planeta (PNUD, 2011)
Os meios de produção, principalmente, sofreram transformações, modificando as relações entre
a sociedade e a natureza, passando de técnicas produtivas simples e naturais para artificiais. Isto representa
a lógica global, sendo que a natureza e o trabalho humano perdem sua importância, são inferiorizados pela
tecnicização (SANTOS, 1996). A humanidade, nesta perspectiva, utiliza seu espaço numa intensa dinâmica
produtiva, transformando e sendo transformado por seu meio ao longo de um processo histórico, na medida
em que adquire técnicas, as quais aceleram essas mudanças.
A consequência é que a relação sociedade/meio passa por transformações, muita delas
resultando em prejuízos. Resultados negativos consequentes da ação antrópica sobre o meio são facilmente
observados em diversas comunidades. Problemas como o lixo, destruição da fauna e flora, violência,
depredação do patrimônio, fome e miséria, dentre outros aspectos tornam visíveis a desarmonia. E estas são
situações que concernem ao trabalho da Educação Ambiental, apesar de, ainda muitas pessoas associarem o
meio ambiente apenas aos aspectos naturais, excluindo os homens, as mulheres, as cidades, o campo, a
pobreza desse conceito.
Diante da necessidade de que, se não promovermos a sensibilização da humanidade quanto a
importância de valorizar o meio em que vivemos - a partir de ações que conduzam a um desenvolvimento
sustentável, de indivíduos com uma perspectiva política, compreendendo a sua realidade e lutando por
melhores espaços, percebendo-se como parte do meio - corremos o risco da própria destruição humana.
Reconhecemos a Educação Ambiental como prática a ser amplamente discutida e concretizada,
principalmente em comunidades que são afetadas por perturbações ambientais.
Contudo, o meio é complexo e seu entendimento deve fugir do reducionismo a que fomos
moldados. Fomentar uma visão ampla e integradora entre seres humanos e ambiente, aliando as dimensões
sociais, culturais, naturais, políticas e econômicas é relevante para que possamos refletir criticamente e
compreender as relações que formam a vida, instigando a construção de uma consciência ambiental e,
consequentemente, a mudança de atitudes e comportamentos. Isto pode, inclusive, levar ao desenvolvimento
comunitário, o que igualmente implica em intricadas reflexões e ações, uma vez que este deve ser pensado a
partir de uma concepção ampla e não apenas sob o viés do crescimento econômico.
Como acreditamos que problemas complexos exigem a percepção do fenômeno a partir de
distintas visões, a fim de (re)organizar o problema de estudo e propor saídas, indicamos a perspectiva
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interdisciplinar, relacionando-a à Educação Ambiental e às práticas comunitárias. Pretendemos discutir
teoricamente a importância da contribuição de pressupostos interdisciplinares na solução de problemas
ambientais e para o desenvolvimento comunitário, incentivando a população a buscar práticas que
transformem sua realidade, a partir do local, atingindo uma dimensão global.
2. DISCUSSÃO
2.1- Reflexões a cerca da Educação Ambiental: totalidade e interdisciplinaridade
O estado atual do mundo, marcado pela globalização hegemônica que visa cada vez mais a
produção e o lucro, caracterizado pela desigualdade social e degradação do meio ambiente é inaceitável. A
ciência, muitas vezes, acaba corroborando com este modelo dominante, a partir de uma racionalidade
ocidental, de compreensão limitada de mundo. A Revolução Industrial, o crescimento da população e
divisão do trabalho exigem técnicas que levam à maior produtividade e rapidez na transformação da
matéria-prima. É a lógica produtivista, a qual determina o trabalho humano e da natureza em benefício ao
crescimento econômico (SANTOS, 2002).
Maturana (2002) muito sabiamente explana a necessidade de aceitação e respeito por si e pelos
outros, aprendendo a valorizar o mundo onde vivemos e não negá-lo ou destruí-lo. Precisamos fomentar,
seja pela educação formal ou informal, uma relação de convivência harmônica e solidária com o meio, sem
negação e sem dominação. “Quero um mundo em que respeitemos o mundo natural que nos sustenta, um
mundo no qual se devolva o que se toma emprestado da natureza para viver” (MATURANA, 2002, p.34).
Neste sentido, a Educação Ambiental tem o intuito de fazer com que as comunidades percebam
os problemas ambientais que os cercam, sensibilizando-os e incentivando-os a buscar mudanças, de modo a
conciliar crescimento econômico e qualidade desse crescimento.
Há várias conceituações de EA, as quais passaram por reformulações. Uma delas, e que
julgamos bastante apropriada a este trabalho, foi preparada para a Conferência das Nações Unidas sobre
Meio Ambiente e Desenvolvimento, versão julho de 1991, que assim define:
A educação ambiental se caracteriza por incorporar as dimensões socioeconômica, política,
cultural e histórica, não podendo basear-se em pautas rígidas e de aplicação universal,
devendo considerar as condições e estágio de cada país região e comunidade sob uma
perspectiva histórica. Assim sendo, a educação ambiental deve permitir a compreensão da
natureza complexa do meio ambiente e interpretar a interdependência entre os diversos
elementos que conformam o ambiente, com vistas a utilizar racionalmente os recursos do
meio na satisfação material e espiritual da sociedade no presente e no futuro (...) O desafio
da educação ambiental, neste particular, é o de criar bases para a compreensão holística da
realidade. (DIAS, 1994, p. 27)
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No Capítulo 36 da Agenda 21 a Educação Ambiental é definida como o processo que busca:
“(...) desenvolver uma população que seja consciente e preocupada com o meio ambiente e com os problemas que lhes são associados. Uma população que tenha conhecimentos,
habilidades, atitudes, motivações e compromissos para trabalhar, individual e coletivamente,
na busca de soluções para os problemas existentes e para a prevenção dos novos (...)” (BRASIL, 1996)
Para que essas atividades sejam efetivadas de modo transformador e busquem alternativas de
melhor qualidade de vida - sustentável - aos habitantes do planeta, e com a maior harmonia possível entre as
outras espécies, é indispensável que promovamos práticas constantes de sensibilização ambiental, no intuito
de pensar e compreender o meio ambiente em sua totalidade.
Não podemos correr o risco de reduzi-lo a um simples caráter naturalista, ligado exclusivamente
a árvores, plantas, rios ou animais. Ao adotarmos essa caracterização, caímos nas premissas do
reducionismo e fragmentação. As crises ambientais não absolutizam apenas a dimensão ecológica, mas abre-
se a um amplo aspecto de debates, dentre eles as práticas sociais.
Deste modo, refletir e compreender o conceito de meio ambiente se torna uma das primeiras
abordagens no trato às questões ambientais.
(...) O meio não é apenas o conjunto de elementos naturais, que interferindo continuamente uns nos outros, configuram as paisagens geográficas. O meio é algo mais do que isso. As
formas das estruturas econômicas e das estruturas sociais dos grupos humanos que habitam
os diferentes espaços geográficos também são partes dele. Considerando globalmente, o meio tanto compreende fatores de ordem física ou material, quanto fatores de ordem
econômica e social. (RUA et.al., 1993, p. 286)
Essa apreensão de ambiente nos permite vê-lo com um novo olhar, uma nova dimensão
interacionista entre sociedade/meio. Há complexidade e dinâmica neste processo, a partir da qual se
compreende que nem natureza, nem a humanidade assumem o papel de dominador ou dominado.
CARVALHO (2004) também explana a respeito da leitura estritamente naturalista que se faz de
meio ambiente, defendendo que suas outras dimensões também sejam abordadas. Segundo ela, esse
reducionismo é bastante influenciado pela mídia, uma vez que apenas os problemas de ordem ecológica são
abordados como ambientais. Assim, defende que estas questões sejam tratadas a partir da perspectiva
socioambiental, valorizando o ser humano como parte do ambiente, influenciador e influenciado por ele.
As relações ambientais, portanto, devem ser consideradas e analisadas nas atividades de
Educação Ambiental, de modo a promover um novo pensar e um novo olhar, entendendo que fatores
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econômicos, políticos, sociais, culturais, históricos ou naturais podem interferir no meio como um todo. É
uma teia de relações, onde um desequilíbrio qualquer em parte do sistema reflete em outros componentes.
O meio ambiente, portanto, representa muito mais que a plantação de árvores num jardim, ele é
complexo, dinâmico, envolvendo questões de escala local, regional, nacional e global, carecendo de uma
melhor apreensão de seu significado para que então possamos discutí-lo com mais clareza, elaborando ações
transformadoras.
Consideramos que as ações voltadas à Educação Ambiental são responsabilidade de todas as
áreas do conhecimento. Para que esta unicidade de saberes torne-se possível, precisamos romper
epistemologicamente com o conhecimento racionalista, mecânico e positivista geralmente, arraigado em
nossa prática. Tais pressupostos, desenvolvidos principalmente por atores como Dèscartes, Newton e Comte
(LUCK, 1994) levam-nos à fragmentação e “fechamento do saber”, sendo importante, pois, que enfrentemos
o desafio de superarmos a atomização das fronteiras entre o conhecimento e o racionalismo extremado,
assumindo uma postura interdisciplinar.
As especializações disciplinares, ou a separação das ciências em disciplinas, tornam-nas
fechadas, impedindo o aprender do global e constituindo um verdadeiro quebra-cabeça do saber (MORIN,
2002). Nesses casos, as interações entre as disciplinas, são invisíveis, correspondendo a resquícios do
fordismo, que buscava a especialização e a setorização do trabalho.
Destacamos, contudo, que a efetivação de práticas interdisciplinares não se resume somente à
integração de ciências e conteúdos. Esta concepção compreende a ação de troca e de diálogo entre as
diferentes áreas do conhecimento, mas não significa apenas isto. Sua postura é muito mais ampla e
complexa do que esta simples junção das ciências. Implica em transformações, no resgate de autenticidade,
de confiança, numa atitude educacional humanística e de cooperação, convergindo em esforços para uma
concepção mais abrangente de educação, conhecimento e indivíduo, que se caracteriza pela:
ousadia da busca, da pesquisa, é a transformação da insegurança num exercício do
pensamento, num construir. A solidão dessa insegurança individual que vinca o pensar
interdisciplinar pode transmutar-se na troca, no diálogo, no aceitar o pensamento do outro. Exige a passagem da subjetividade para a intersubjetividade. (FAZENDA, 1991, p. 18)
Reiteramos, no entanto, que há muita confusão a respeito do significado da interdisciplinaridade
(SANTOMÉ, 1998). Esta não pode ser adotada sem reflexão, sem se compreender o que realmente se está
fazendo. Pois, muitas vezes, corre-se o risco de fazer algo que se denomina de interdisciplinaridade, mas que
não passam de ações multi ou pluridisciplinares.
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A compreensão superficial da prática interdisciplinar, quando não instrumentalizada a partir de
princípios de unidade e intensa reciprocidade, nos propõe ações que dificilmente rompem com as
concepções positivistas e decarto-newtonianas. O sentido, mais uma vez, constitui no estabelecimento de
um plano que possibilite a reflexão e superação destes, pois, se assim não se proceder, tal prática
possivelmente se limite a uma mera “justaposição arbitrária de disciplinas e conteúdos” (FRIGOTTO, 1993,
p. 71).
Dentre as terminologias sugeridas e comentadas por alguns autores (SANTOMÉ, 1998;
JAPIASSU, 1976), destacamos a mais divulgada, proposta por Erich Jantsch que, referindo-se às várias
formas de relações disciplinares, deste modo as assinalam:
Disciplina – Refere-se à ordem conveniente a um funcionamento regular. Significa também
matéria ou campo de conhecimento que se destaca para fins de estudo e aquisição de conhecimentos
específicos.
Multidisciplinaridade – promove-se o contato entre disciplinas - as quais não demonstram ter
relações visíveis entre si - mas somente numa perspectiva de justaposição. Neste caso não se promove a
condução nem promoção de vínculos e comunicação entre as mesmas. Ex.: Química + Literatura.
Pluridisciplinaridade – da mesma forma como descrevemos no enfoque anterior, há somente a
justaposição de disciplinas, mas desta vez elas são próximas, situadas num mesmo domínio do
conhecimento. Isto permite a troca de informações com as mesmas, facilitando a discussão de situações
semelhantes. Contudo, este tipo de relação ainda não é a desejável, apesar de hierarquicamente falando, estar
mais avançada que a multidisciplinaridade. Ex.: Biologia + Química.
Interdisciplinaridade propriamente dita - para Jantsh, implica uma inter-relação intrínseca entre
um grupo de disciplinas estabelecidas a partir da cooperação entre elas. Considera-se o caráter global como
influenciador da proposta, sendo que conceitos e metodologias são compartilhados. Ex.: Matemática +
História + Geografia...
Transdisciplinaridade - Nível mais elevado de relações, no qual a coordenação entre disciplinas
e interdisciplinas acontece de tal maneira que há a inovação de uma nova macrodisciplina, situada num nível
em que as limitações desaparecem. Ex.: Biofísica.
Ao estabelecermos a interdisciplinaridade perante um bom entendimento de seus pressupostos,
estaremos favorecendo o exercício da cidadania, a partir da interpretação e intervenção nos complexos
problemas sociais, “de modo a permitir ao mesmo tempo uma melhor compreensão da realidade e do
homem como ser determinante e determinado” (LUCK, 1994, p. 60).
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A maioria das questões de nosso cotidiano são interdisciplinares, exigem sua análise a partir de
diferentes perspectivas, direcionando a explicações conjuntas de diferentes áreas do conhecimento,
instigando um pensamento político e atuante do indivíduo. Assim, em 1972, durante a Conferência das
Nações Unidas Sobreo meio Ambiente, realizada em Estocolmo, foi indicado que a prática da Educação
Ambiental deve focar uma visão holística da realidade, buscando a prática interdisciplinar.
É proeminente, pois, que pensemos mais atentamente nas questões interdisciplinares,
principalmente as relacionadas à esfera ambiental, pois esta exige reflexão a partir de vários olhares, tendo
estes de serem, polivalentes na constatação e busca por problemas detectados. A filosofia, a História, A
Geografia, a Biologia, entre tantas outras disciplinas, podem se unir na construção de respostas e soluções
aos desafios ambientais. Afirma Dias ( 1994, pág. 83), que “O fator mais importante que contribui para a
especificidade da EA é, sem dúvida, sua ênfase na resolução de problemas práticos que afetam o meio
ambiente humano.” E ainda acrescenta: “disso deriva outra característica fundamental da EA, a abordagem
interdisciplinar, que considera a complexidade dos problemas ambientais e a multiplicidade dos fatores
ligados a eles”.
CARVALHO (2004) também defende sistematicamente a adoção de uma postura
interdisciplinar no trabalho de Educação Ambiental. Os resultados de desarranjos de processos ambientais
provenientes de impactos causados pela má interação sociedade/meio, não se resumem em conhecimentos
isolados. Ao contrário, eles podem e devem ilustrar o fato de que a vida humana depende de processos
complexos, interconectados, de larga escala, que não podem absorver uma quantidade ilimitada de abusos.
A interdisciplinaridade, nesse sentido e enquanto pressuposto da Educação Ambiental, não é
um princípio epistemológico para legitimar determinados saberes e relações de poder hierarquizadas entre ciências (...). É uma prática intersubjetiva que associa conhecimentos
científicos e não científicos o racional com o intuitivo, o cognitivo com o sensorial,
buscando a construção de objetos de conhecimento que se abram para novas concepções e compressões do mundo (natural estrito senso e histórico) e para construção do sujeito
integral. (LOUREIRO, 2004, p. 76)
Neste sentido direcionamos os estudos ambientais de forma interdisciplinar, trabalhando com a
concepção aglutinadora de realidade, conexa, na qual as situações estão interligadas, não sendo composta
apenas por partes isoladas.
Trabalhando interdisciplinarmente, os indivíduos podem compreender essa interligação, pois
percebem que o meio não constitui objeto de estudo de apenas uma área do conhecimento. Toda a
comunidade deve ter esse comprometimento.
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Não adianta apontar um meio ambiente dinâmico, complexo e conexo, quando não o refletimos a
partir da interação entre as ciências, pois, assim, acabamos caindo novamente num reducionismo
epistemológico.
2.2-Considerações sobre o Desenvolvimento e Desenvolvimento Comunitário
O desenvolvimento constitui um dos eixos de ação da Organização das Nações Unidas, junto a
assuntos como a manutenção da paz e dos direitos humanos. Este é medido a partir do Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH), o qual considera as dimensões do bem-estar humano como centro desse
processo, analisando três indicadores: renda, educação e longevidade. O objetivo da criação do IDH foi o de
oferecer um contraponto a outro indicador muito utilizado, o Produto Interno Bruto (PIB), que considera
apenas a dimensão econômica do desenvolvimento.
O conceito de desenvolvimento tem passado ao longo dos últimos cinquenta anos, por algumas
reformulações. Isto porque, durante muito tempo, havia um direcionamento deste apenas ao crescimento
econômico. O crescimento econômico é uma das dimensões necessárias para se chegar ao
desenvolvimento, mas não a única.
A idéia simplista de que o crescimento econômico por si só bastaria para assegurar o
desenvolvimento foi rapidamente abandonada em proveito de uma caracterização mais
complexa do conceito, expressa pelas adições sucessivas de epítetos: econômico, social, cultural, naturalmente político, depois viável [sustainable] , enfim, último e recente
acréscimo, humano, significando ter como objetivo o desenvolvimento dos homens e das
mulheres em lugar da multiplicação das coisas. (SACHS, I., 1998, p. 150)
Percebemos o quão complexo é o conceito de desenvolvimento, aliando uma série de dimensões
na sua efetivação. Refletindo sobre a situação atual do Planeta, é possível assegurar que ainda falta muito,
para que atinjamos o desenvolvimento pretendido. É nítido um rápido crescimento econômico, mas que não
assegura a prosperidade humana. Ao contrário, esta tem-se tornado geradora de problemas sociais e
ambientais.
Relatórios de Desenvolvimento humano produzidos pelo Programa de Desenvolvimento das
Nações Unidas (PNUD) deixam claro que, nem todos os países têm conseguido avanços a nível de
desenvolvimento. Ao contrário, em muitas nações a pobreza e a desigualdade na distribuição de renda
aumentam, mesmo em locais onde houve crescimento econômico. Isto comprova que, este último não
proporciona, muitas vezes, a melhora das condições humanas. Acaba beneficiando apenas os mais
abastados.
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Ao longo dos anos 90, um número sem precedente de países andou para trás em vários
aspectos do desenvolvimento humano: em 46 países as pessoas estão mais pobres hoje do que estavam em 1990, em 25 países há mais pessoas passando fome atualmente do que há
uma década. (PNUD, 2004, p. 02)
Concordamos com Sachs (2008), quando explana que a igualdade, a equidade e a solidariedade
devem estar inclusas no conceito de desenvolvimento. Desta forma, poderíamos ter uma sociedade menos
egoísta e menos competitiva, menos visante do lucro buscado a todo custo, o que tem implicado na
exploração humana e ambiental.
Cada vez mais as pessoas tem-se tornado altruístas, isoladas, desconsideram os sentimentos
perante seus semelhantes e o meio. Enquanto muitos são desprovidos de oportunidades de vida descente,
com o mínimo necessário, há aqueles que se beneficiam dessas condições, concentrando a riqueza em suas
mãos. Como descreve Maturana (2002), o caminho para uma transformação, para uma nova relação de
respeito entre os seres humanos e entre eles e o ambiente é o amor. Pois, enquanto estivermos atrelados ao
poder e à dominação, à competição com o meio que nos cerca, este entendimento será utópico. Seremos
pessoas mecânicas, frias, alienadas ao consumo.
Tomando por base as considerações de Hammarskjöld (1975), o desenvolvimento deve partir de
cada sociedade, de acordo com suas aspirações e anseios. A comunidade internacional tem a
responsabilidade de garantir condições para esta auto-suficiência. Contudo, através da cooperação e atuação
conjunta, cada comunidade deve buscar garantir os direitos básicos necessários ao desenvolvimento.
Historicamente, os seres humanos sempre fizeram parte de uma comunidade, englobando
práticas de interdependência e colaboração. É na comunidade que as pessoas se organizam e criam
mecanismos de cooperação, a fim de atingirem objetivos comuns. Contudo, a partir da própria crise da
modernidade, o individualismo fez com que muitos se isolassem deste lugar confortável e aconchegante
(BAUMAN, 2003).
A partir destes pressupostos, inserimos a discussão de desenvolvimento comunitário, cuja
efetivação teve inicio após a Segunda Guerra Mundial (FRAGOSO, 2005) e sofreu influência de várias
correntes ideológicas. Inicialmente este partia de soluções prontas para os problemas em questão, sendo até
1970 fortemente influenciado pela iniciativa estatal. Mais tarde, ganha uma nova roupagem, com a atuação
da própria comunidade na resolução de conflitos, instigando o autodesenvolvimento.
Baseados na conceituação de desenvolvimento anteriormente descrita, pressupomos que o
desenvolvimento comunitário deve instigar não apenas o crescimento econômico da comunidade, mas de
várias dimensões, sejam elas sociais, políticas, ambientais, culturais.
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Na execução de projetos deste tipo pode haver a cooperação de diferentes agentes, tais como a
sociedade, o Poder Público, e empresariado, organizações diversas. Contudo, todos devem levar à
comunidade a consciência de que o desenvolvimento é possível pelo esforço conjunto da comunidade e que
este deve acontecer como um todo, não apenas a partir de alguns de seus membros (SINGER, 2004),
beneficiando a todos.
Parece nítido que a adoção de um projeto de desenvolvimento comunitário já estabelecido,
pronto, dificilmente teria resultados satisfatórios. Isto porque cada comunidade apresenta relações
socioculturais diferenciadas, as quais devem ser reconhecidas e incorporadas ao projeto. Assim, é importante
que seja feito um estudo prévio da comunidade instigando a compreensão dos seus anseios, que recursos
humanos, culturais e materiais eles possuem e que podem auxiliar na melhoria da qualidade de vida, dentre
outras investigações. Deste modo é possível que se atinja o desenvolvimento pretendido, fortalecendo o
senso de identidade local e a qualificação para o exercício de novas práticas de gestão.
A enorme diversidade das configurações socioeconômicas e culturais, bem como das
dotações de recursos que prevalecem em diferentes micro e mesorregiões, excluem a
aplicação generalizada de estratégias uniformes de desenvolvimento. Para serem eficazes,
estas estratégias devem dar respostas aos problemas maus pungentes e às aspirações de cada comunidade(...) para tanto, deve-se garantir a participação de todos os atores envolvidos
(trabalhadores, empregadores, o Estado e a sociedade civil organizada) no processo de
desenvolvimento. Daí a importância do planejamento territorial nos níveis municipal, microrregional e mesorregional, de forma a reagrupar vários distritos unidos pela identidade
cultural e por interesses comuns. (SACHS, 2008, p. 61)
Reconhecemos, desta forma, a necessidade de incorporar os saberes locais e do senso comum na
construção de conhecimentos e práticas da comunidade no seu desenvolvimento, mais especificamente no
desenvolvimento da Educação Ambiental. Cabe a nós, captarmos e interagirmos com os fenômenos, numa
relação recíproca e contínua.
2.3- Relacionando Educação Ambiental e Desenvolvimento comunitário numa perspectiva
interdisciplinar
Pressupomos que nem a Educação Ambiental nem o desenvolvimento comunitário são assuntos
que tangem à responsabilidade de uma única área do conhecimento.
Não são, por exemplo, apenas os geógrafos ou os biólogos responsáveis pela degradação
ambiental, nem tão pouco apenas os economistas os culpados pela desigualdade social ou pela má
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distribuição de riquezas mundiais. Desta forma, parece-nos evidente que tais assuntos sejam abordados a
partir da perspectiva da interdisciplinaridade.
O desenvolvimento comunitário envolve uma grande quantidade de atores no seu planejamento
e execução, o que pode ser beneficiado a partir da adoção de uma postura interdisciplinar. Isto é amplamente
verificado, a partir da bibliografia consultada, na área da saúde, na qual segundo MATOS, PIRES E
SOUZA (2009) a interdisciplinaridade pode proporcionar um trabalho mais integrado, favorecendo a
qualidade do trabalho, do usuário e dos próprios trabalhadores.
Acreditamos ser possível direcionar essas colocações ao trabalho interdisciplinar no campo da
Educação Ambiental voltada ao desenvolvimento comunitário. Isto porque a interdisciplinaridade pode
abordar diferentes situações, articulando saberes e gerando uma ação comum, valorizando o conhecimento e
as atribuições de cada categoria profissional. Neste sentido, como defende), a interdisciplinaridade torna-se
uma filosofia de trabalho que entra em ação na hora de encarar problemas e questões que preocupam a
sociedade (SANTOMÉ, 1998)
Como fora explanado no decorrer deste trabalho, há inúmeras preocupações relacionadas à
degradação ambiental presentes nas comunidades locais. O esforço de diferentes profissionais, atuando na
organização comunitária, pode constituir a diferença para um trabalho efetivo, de promoção da cidadania e
luta pelos direitos ambientais, garantindo um desenvolvimento mais justo. Pode-se propor novas formas de
relacionamento entre comunidade e meio ambiente.
Não apenas a comunidade envolvida, mas os próprios profissionais engajados nesta prática
podem sentir a necessidade de buscar novos conhecimentos, além de sentirem mais segurança, pois na
execução de uma tarefa têm o respaldo de outros profissionais, buscando coletivamente os mesmos
objetivos.
Consideramos que a dinâmica de uma comunidade é fortemente influenciada por fatores
ambientais, haja vista a intensa relação entre eles. A comunidade precisa se perceber como parte integrante
do meio, sendo este decisivo no seu desenvolvimento. Em ações de desenvolvimento comunitário, neste
caso especificamente envolvendo ações de ordem ambiental, a interação interdisciplinar de seus atores pode
beneficiar desde a análise de uma situação, até a execução de um projeto que busca solucionar os
problemas, garantindo uma visão do todo, da complexidade e das potencialidades envolvidas na
comunidade.
A criticidade envolvida no processo de Educação Ambiental, abrangendo as dimensões sociais,
políticas, econômicas, naturais e culturais pode, inclusive, favorecer o aspecto democrático e participativo
da comunidade, o qual se percebe integrante do meio, tendo o dever e o direito de propor soluções,
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transformando sua realidade. Comunidade e meio ambiente podem ter um relacionamento mais justo, sem
precisar se destruir mutuamente. Pressupõe-se que, desta forma, há a busca por uma comunidade ética
(BAUMAN, 2003), a qual garante direitos, segurança, proteção.
Trata-se de valorizar o poder da comunidade local, a incorporação dos saberes locais e do sendo
comum (SANTOS, 2002), para que a comunidade perceba que a transformação está em suas próprias mãos,
onde o meio seja respeitado e utilizado com responsabilidade.
3.Considerações Finais
Nas últimas décadas a população mundial tem-se preocupado cada vez mais com o modelo atual
de desenvolvimento econômico, principalmente a partir dos impactos negativos que este tem causado na
qualidade de vida. A Educação Ambiental, neste processo, tem de modo ativo buscado estimular a
sensibilização da sociedade quanto aos problemas ambientais, estimulando a cooperação e a participação
popular na detecção, prevenção e superação destes fatos.
Destacamos, no entanto, a importância de uma ampla compreensão tanto de meio ambiente
como de Educação Ambiental, de modo que não caiamos no reducionismo e na fragmentação de saberes.
Muitas vezes a Educação Ambiental é tratada exclusivamente no âmbito natural, excluindo outras dimensões
relevantes e impedindo uma visão holística da realidade.
As comunidades são locais propícios para o desenvolvimento de ações em Educação Ambiental,
uma vez que estas são parte integrante do meio. Além disso, nesses locais são facilmente identificáveis
perturbações ambientais. Assim, seus atores podem se organizar cooperativamente, buscando de forma
crítica-transformadora a melhoria das condições de vida.
A partir dos referenciais estudados, percebemos que, tanto a Educação Ambiental como o
desenvolvimento comunitário são temas complexos e, por isso, melhor refletidos a partir dos pressupostos
da interdisciplinaridade. A interação entre diferentes áreas do conhecimento pode ser uma aliada à promoção
do desenvolvimento comunitário, principalmente quando este está atrelado a práticas de Educação
Ambiental.
O dialogo entre os saberes pode promover uma melhor analise dos problemas ambientais
detectados, buscando soluções mais eficientes e integradoras. De forma participativa e solidária, sociedade e
meio passam a se respeitar, despertando a população para a adoção de praticas mais justas e equitativas. A
população local em todas as fases do processo, da discussão do problema, do diagnóstico da situação local,
na identificação de possíveis soluções, até a implementação das alternativas e avaliação dos resultados.
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Consideramos que a participação comunitária e práticas de Educação Ambiental, dentro de uma
metodologia interdisciplinar, possam contribuir na construção de uma práxis que promova um repensar da
interação sociedade/ meio, para o desenvolvimento de relações mais harmoniosas entre esses atores,
favorecendo o desenvolvimento comunitário, com uma sociedade justa e ambientalmente saudável.
Consideramos, finalmente, que a resolução de conflitos ambientais emerge de maneira
participativa, integrando a população, valorizando os saberes locais e culturais e aproveitando os recursos
naturais disponíveis para base do desenvolvimento comunitário
Referências Bibliográficas
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O presente trabalho contou com o apoio financeiro da Fundação Araucária e SESI-PR.