FACULDADE DOM BOSCO
Credenciada através da Portaria nº 2.387, D.O.U. em 12/08/2004Cornélio Procópio/Paraná
NATÃ TEODORO DA SILVA
AS PARTICULARIDADES DA NOTIFICAÇÃO INICIAL
TRABALHISTA
CORNÉLIO PROCÓPIO
2012
NATÃ TEODORO DA SILVA
AS PARTICULARIDADES DA NOTIFICAÇÃO INICIAL
TRABALHISTA
Trabalho de curso apresentado ao Curso
de Graduação em Direito, da Faculdade de
Ensino Superior Dom Bosco de Cornélio
Procópio-PR, como requisito parcial para a
obtenção do título de Bacharel em Direito.
Orientador: Prof. Lucas Franco de Paula
CORNÉLIO PROCÓPIO
2012
NATÃ TEODORO DA SILVA
AS PARTICULARIDADES DA NOTIFICAÇÃO INICIAL TRABALHISTA
Aprovada em: 3 de dezembro de 2012
COMISSÃO EXAMINADORA
Prof. Henrico Tamiozzo Faculdade de Ensino Superior Dom Bosco
Prof. Rodolfo Ciciliato Faculdade de Ensino Superior Dom Bosco
Prof. Lucas Franco de PaulaFaculdade de Ensino Superior Dom Bosco
AGRADECIMENTOS
Primeiramente, sou grato a Deus, por permitir minha existência e ter-me abençoado com grandes conquistas tão cedo. Obrigado por nunca me abandonar!
Agradeço a minha família por formar a essência do meu caráter, além de sempre me incentivar nos estudos e confortar nos momentos de esgotamento emocional. Mãe Edna, pai Valdir e irmãs Rebeca e Zara: Amo vocês!
Aos meus professores e orientadores, Luana Miranda de Mattos e Lucas Franco de Paula, e demais pessoas que também se disponibilizaram e contribuíram para a conclusão deste trabalho.
Também aos meus colegas de turma, com os quais durante o convívio diário compartilhei momentos agradáveis e também obstáculos encontrados no decorrer do curso. Tudo o que passamos construiu fortes amizades, jamais esquecerei vocês!
E aos meus bons e velhos amigos, os quais sempre conservarei, por me propiciarem momentos de alegria e distração nos momentos de prosperidade e também nos infortúnios, além de inesquecíveis recordações.
Por mais que eu escreva, palavras nunca expressarão a real gratidão que tenho por vocês!
DA SILVA, Natã Teodoro. As particularidades da notificação inicial trabalhista. 2012. 44 folhas. Trabalho de Curso de Direito – Faculdade de Ensino Superior Dom Bosco, Cornélio Procópio, 2012.
RESUMO
Este trabalho tem por objeto um breve estudo das particularidades da notificação inicial trabalhista, comparando-a com a citação do processo comum e examinando os princípios em conflito. O ramo trabalhista é considerado autônomo e, dentre suas peculiaridades, há acentuada exigência de celeridade e simplicidade. A desproporção no cumprimento destas ofende a qualidade da tutela jurisdicional, refletindo prejudicialmente na empresa e, consequentemente, na sociedade. Este estudo tem como objetivo propiciar uma reflexão sobre a eficácia dos meios processuais envolvidos e a possibilidade de mudanças. A partir de pesquisas jurídicas considerando doutrinas, jurisprudências, artigos e entrevistas que elucidam a questão. O magistrado deve agir com cautela, evitando abusos de privilégios processuais através de uma conduta de má-fé do trabalhador, preservando a aplicação da proteção constitucional e democraticamente adequada.
Palavras-chave: Citação. Processo do Trabalho. Informalidade. Celeridade. Preservação da empresa.
ABSTRACT
This work's purpose is a brief study of the particularities of the labor initial notification, comparing it with the citation of common process and examining the principles in conflict. The labor branch is considered autonomous and , among its peculiarities, there are accentuated requirement of speed and simplicity. The disproportion in fulfilling these offends the quality of jurisdictional protection, reflecting detrimentally in the company and consequently in society. This study aims to propitiate a reflection about the effectiveness of procedural means involved and the possibility of changes. As of juridical researches considering doctrines, jurisprudence, articles and interviews that elucidate the issue. The magistrate must act with caution, avoiding any abuse of privileges through a bad procedural faith conduct of the worker, preserving the application of constitutional protections and democratically appropriate.
Keywords: Citation. Labour Procedure. Informality. Celerity. Preservation Company
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.........................................................................................................7
2 ASPECTOS INICIAIS...............................................................................................8
2.1 VISÃO HISTÓRICA...............................................................................................8
2.2 PRINCÍPIOS........................................................................................................13
4 A NOTIFICAÇÃO INICIAL NO PROCESSO DO TRABALHO E SEUS
PRINCIPAIS ASPECTOS..........................................................................................22
4.1 ASPECTOS GERAIS SOBRE A APLICAÇÃO E INTERPRETAÇÃO DO DIREITO
PROCESSUAL DO TRABALHO................................................................................22
4.2 DA INFORMALIDADE E CELERIDADE DO PROCESSO DO TRABALHO........28
4.3 DA NOTIFICAÇÃO NO PROCESSO DO TRABALHO........................................28
4.3.1 Delimitação do termo “notificação inicial”...................................................29
4.3.2 Da impessoalidade na notificação inicial.....................................................31
4.3.3 A notificação inicial e a ponderação entre a proteção do trabalhador e a
preservação da empresa.........................................................................................35
4.3.4 A questão da revelia no processo do trabalho............................................38
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS...................................................................................42
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.........................................................................43
7
1 INTRODUÇÃO
Partimos da premissa da imensa sobrecarga e acúmulo de serviços que
assombram nossos tribunais, considerando que um dos elementos que não colabora
para a celeridade processual é a falha na comunicação da notificação inicial.
Para uma melhor compreensão do tema deste trabalho, é imprescindível
relembrar etapas de desenvolvimento que nossa civilização superou e contribuiu
para o estabelecimento e aperfeiçoamento dos mecanismos responsáveis por
tutelarem direitos.
Ao recorrer ao Judiciário em busca de justiça, é fundamental que o
magistrado determine a citação do réu, chamando-o para integrar a lide e exercer
seu direito de defesa. Na Justiça do Trabalho o instituto da notificação inicial
distingue-se do processo comum, tornando-o singular devido a suas
particularidades.
A criação de uma Justiça especializada competente para apurar e julgar
especificamente conflitos provenientes de relações de trabalho deve-se à situação
de hipossuficiência que geralmente atinge o trabalhador, necessitando de princípios
e normas diferenciados para estabelecer equilíbrio processual e compensar essa
desigualdade entre as partes.
Em virtude deste maior amparo processual ao obreiro, por vezes, havendo
má-fé da parte autora ou de seu advogado, acarretará em injustiça à empresa. Se a
notificação inicial não for eficaz e cumprir seu objetivo, indevidamente prejudicará o
empregador, podendo incidir em revelia e confissão, gerando graves consequências
ou até mesmo atraso à satisfação da pretensão.
É importante estabelecer equilíbrio entre a procura pela rápida solução do
conflito e a concreta oportunidade de defesa, não somente pretendendo proteger o
empregado, como também a empresa, esta responsável por circulação de riqueza e
geração de empregos.
Apresentar um conjunto de informações para compreender o assunto do
trabalho elucidará a importância de uma reflexão sobre a capacidade dos atuais
meios envolvidos e a possibilidades de mudanças.
8
2 ASPECTOS INICIAIS
2.1 VISÃO HISTÓRICA
Antes de abordar o tema do presente trabalho, principiamos recordando que a
própria natureza social e instintiva do homem coopera para que a coexistência com
outros de sua espécie seja imperativa, havendo assim, necessariamente, um
processo de interação e interdependência.
É o que Maria Helena Diniz explica:
O ser humano é gregário por natureza, não só pelo instinto sociável, mas também por força de sua inteligência, que lhe demonstra que é melhor viver em sociedade para atingir seus objetivos. O Homem é “essencialmente coexistência”, pois não existe apenas, mas coexiste, isto é, vive necessariamente em companhia de outros indivíduos. Com isso, espontânea e até inconscientemente, é levado a formar grupos sociais.1
A vivência do ser humano em sociedade subentende a necessidade de
interações. Os indivíduos estabelecem entre si relações sociais e políticas, e destas
surgem conflitos intersubjetivos e inerentes à convivência humana.
Ao considerar as oposições de interesses de indivíduos que convivem em
uma sociedade, o ideal seria que estes, em busca de uma condição humana
favorável à sociabilidade, administrassem e solucionassem tais oposições de forma
pacífica, buscando o justo. Porém, não é o que ocorre, vez que, diuturnamente,
necessitamos da intervenção do Estado para solucionar os impasses gerados
através da convivência.
Conforme as sábias palavras do professor Miguel Reale:
[...] o Direito corresponde à exigência essencial e indeclinável de uma convivência ordenada, pois nenhuma sociedade poderia subsistir sem um mínimo de ordem, de direção e solidariedade. É a razão pela qual um grande jurista contemporâneo, Santi Romano,
1 DINIZ, Maria Helena. Compêndio de Introdução à Ciência do Direito. 20ª ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009, página 242.
9
cansado de ver o Direito concebido apenas como regra ou comando, concebeu-o antes como “realização de convivência ordenada”.2
A sociedade está em constante modificação de acordo com as peculiaridades
de cada época. Houve tempos em que não havia a figura do Estado, e em outros,
mesmo havendo, este não era capaz de sujeitar os litigantes à sua decisão, ou seja,
não tinha poder impositivo e não exprimia autoridade, sendo o processo considerado
apenas negócio entre as partes.
No início da civilização, por exemplo, a autotutela era a única forma de
resolver divergências intersubjetivas. Atualmente a autodefesa não é mais tolerada,
podendo até configurar tipificação criminal.
Nas palavras de Humberto Theodoro Júnior:
[...] é impossível evitar conflitos de interesse entre os cidadãos a respeito da interpretação dos direitos subjetivos e da fiel aplicação do direito objetivo aos casos concretos. Para manter o império da ordem jurídica e assegurar a paz social, o Estado não tolera a justiça feita pelas próprias mãos dos interessados.3
O progresso e dinamismo no desenvolvimento das civilizações fizeram com
que a autotutela se tornasse imprópria. A solução para os conflitos passou a ser
apreciada pela arbitragem, a qual é considerada protagonista do início da justiça e
do sistema judiciário aprimorado e formal que subsiste até os dias atuais, resultando
na figura do Estado de Direito.
Bem observa os doutrinadores Antonio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini
Grinover e Cândido Rangel Dinamarco, quanto a este progresso:
É claro que essa evolução não se deu assim linearmente, de maneira límpida e nítida; a história das instituições faz-se através de marchas e contramarchas, entrecortada frequentemente de retrocessos e estagnações [...] da tendência no sentido de chegar ao Estado todo poder de dirimir conflitos e pacificar pessoas.4
2 REALE, Miguel. Licões Preliminares de Direito. 27ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009, página 2.
3 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil: Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 50ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, página 1.
4 GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido R., CINTRA, Antônio Carlos de Araújo. Teoria Geral do Processo. 25ª edição. São Paulo: Malheiros. 2009, página 29.
10
Nos dias atuais, com o desenvolvimento e consolidação do Estado e sua
atividade jurisdicional, os conflitos de interesses gerados pela complexa convivência
em sociedade, quando não há concórdia, são apreciados pelo Poder Judiciário ou
pelos mecanismos arbitrais, os quais detêm a função de solucionar litígios e,
consequentemente, evitar o caos na ordem jurídica.
No ensinamento dos doutrinadores Antonio Carlos de Araújo Cintra, Ada
Pellegrini Grinover e Cândido Rangel Dinamarco:
[...] é predominante o entendimento de que não há sociedade sem direito: ubi societas ibi jus. [...] E a resposta está na função que o direito exerce na sociedade: a função ordenadora, isto é, de coordenação dos interesses que se manifestam na vida social, de modo a organizar a cooperação entre pessoas e compor os conflitos que se verificarem entre os seus membros. A tarefa da ordem jurídica é exatamente a de harmonizar as relações sociais intersubjetivas, a fim de ensejar a máxima realização dos valores humanos com o mínimo de sacrifício e desgaste.5
Neste diapasão, salienta Amauri Mascaro Nascimento:
A jurisdição, vista no plano histórico, resulta da passagem da ação física (autodefesa) para a ação jurídica (processo judicial). Maiores são as possibilidades de um desfecho justo e pacífico do conflito, desde que, realmente, à fonte de decisão se atribuam a força e a independência necessárias. Por tal motivo a jurisdição é função do Estado, porque tem condições melhores para fazer cumprir as decisões que provêm de um órgão constituído para o fim específico de decidir, o Poder Judiciário.6
O processo é o instrumento que tutela direitos e caracteriza-se pela relação
do juiz e das partes, comprometendo-se principalmente com valores constitucionais.
Amauri Mascaro Nascimento sucintamente diz que o direito processual “tem por
finalidade principal evitar, portanto, a desordem e garantir aos litigantes um
pronunciamento do Estado para resolver a pendência e impor a decisão”7.
O art. 5º, LV, da Constituição Federal estabelece que “aos litigantes, em
processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o
5 GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido R., CINTRA, Antônio Carlos de Araújo. Teoria Geral do Processo. 25ª edição. São Paulo: Malheiros. 2009, página 25.
6 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito Processual do Trabalho. 24ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, página 23.
7 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito Processual do Trabalho. 24ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, página 59.
11
contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”8. Nesse
dispositivo a intenção do legislador constituinte é garantir ao réu a oportunidade de
se opor à ação demandada, pois obviamente deve haver um equilíbrio entre o direito
de ação e de defesa.
No pertinente esclarecimento de Luiz Guilherme Marinoni:
Porém, não é preciso esforço para concluir que a defesa ampla é a que não é limitada. A intenção da norma é evitar que a lei ou o juiz limitem a defesa, restringindo a possibilidade de o réu alegar, provar etc. Mas isso é verdade no sentido de que a defesa não pode ser limitada irracionalmente. Há situações em que a limitação da defesa é necessária para permitir a efetividade da tutela do direito.9
Neste contexto surge o principal instituto responsável por garantir o
contraditório e a ampla defesa da parte demandada: a citação. Definida pelo art. 213
do Código de Processo Civil como “o ato pelo qual se chama a juízo o réu ou o
interessado a fim de se defender” 10.
E na definição do doutrinador Luiz Guilherme Marinoni:
A citação é o nome técnico-jurídico que se dá à comunicação feita ao réu a respeito da propositura da ação, dando-se prazo para a sua defesa.11
Independente da natureza da ação, a citação assume essencial função, pois é
indispensável que o demandado seja informado do pleito contra ele imposto e tenha
a sua disposição os recursos capazes de lhe permitir o contraditório, oferecendo ao
julgador fundamentos do seu ponto de vista.
O entendimento jurídico majoritário define este princípio como o da dualidade
das partes, o qual declara imprescindível a presença da parte contrária para a
configuração e desenvolvimento de uma relação processual eficaz e válida.
8 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em: 25 out. 2012.
9 MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. 3ª ed. revista e atualizada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, página 310.
10 BRASIL. Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869compilada.htm>. Acesso em: 25 out. 2012.
11 MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. 3ª ed. revista e atualizada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, página 315.
12
Qualquer pessoa ao recorrer ao Judiciário, com a propositura da demanda,
inicia a formação de uma relação jurídica processual, a qual somente se aperfeiçoa
e efetivamente gera efeitos quando deixa de ser simples relação linear entre autor e
juiz, momento em que há presença do demandado, passando este a saber da
existência da ação.
Assim explana Ovídio Araújo Baptista sobre a relação processual:
[...] oferece esta peculiaridade fundamental: os destinatários do ato final do processo, aqueles a quem a sentença se dirige, como norma imperativa de comportamento, ou seja, as partes, contribuem com sua atividade para o desenvolvimento da relação processual e para formação da sentença.Daí a necessidade de que toda relação processual se angularize, depois de sua formação linear entre autor e Estado, mediante a convocação daquele que figura no outro pólo da relação jurídica litigiosa, para que venha integrá-la, na condição de demandado (réu). Não há relação processual sem a participação de, no mínimo, três pessoas, ou três sujeitos: autor, réu e juiz.12
No ensino de Luiz Rodrigues Wambier e Eduardo Talamini:
Trata-se do princípio da bilateralidade da audiência, ou seja, a impossibilidade de atuação jurisdicional sem que se assegure ao réu a oportunidade de se fazer ouvir.13
Em suma, embora anteriormente predominava o informalismo nas
comunicações dos atos processuais, o progresso da civilização e da tutela jurídica
demandou um significativo reconhecimento de um mecanismo inerente à
composição de uma lide: a citação. É necessário formalmente e efetivamente levar a
conhecimento do réu a ação contra ele proposta, principalmente em respeito ao
princípio do devido processo legal. Nas demandas trabalhistas há diferenças neste
instituto, tornando-o mais célere em benefício do obreiro hipossuficiente.
2.2 PRINCÍPIOS
12 SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. Curso de processo civil. vol. 1. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002, página 15.
13 WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Curso Avançado de Processo Civil, vol. 1, 10ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010, página 345.
13
Há uma acirrada discussão sobre a morosidade da justiça e a aplicação de
procedimentos mais rápidos à estrutura processual, gerando diversas reflexões e
buscas de soluções para a diminuição da espera pelas partes, sendo indispensável
estudar os princípios pertinentes.
Princípios, em seu sentido gramatical, exprimem a ideia de origem de algo;
começo, preceito, regra, lei; fonte básica ou primária que estabelece alguma coisa.
Já para o universo jurídico estabelecem diretrizes às normas de determinado
ordenamento, são proposições que operam com noções meta-jurídicas e reportam à
realidade social e cultural, vez que a linguagem normativa propicia demasiados
significados.
Marcus Vinicius Rios Gonçalves ensina:
Os princípios gerais erigem-se em verdadeiras premissas, pontos de partida, nos quais se apóia toda ciência. O conhecimento científico não prescinde de sua existência e exige que os estudiosos os respeitem e obedeçam.[...] Muitos deles têm estatura constitucional. Por isso mesmo, costuma-se falar em um direito constitucional processual, [...] um conjunto de normas e princípios processuais que adquirem particular importância, por terem sido tratados pelo legislador constitucional.14
Luiz Guilherme Marinoni explica a diferença de princípios e regras:
[...] Enquanto as regras se esgotam em si mesmas, na medida em que descrevem o que se deve, não se deve ou se pode fazer em determinadas situações, os princípios são constitutivos da ordem jurídica, revelando os valores ou critérios que devem orientar a compreensão e a aplicação das regras diante das situações concretas.[...] Os princípios apresentam razões que podem ser superadas por razões opostas. A realização dos princípios depende das possibilidades jurídicas e fáticas, que são condicionadas pelos princípios opostos, e assim exigem a consideração dos pesos dos princípios em colisão segundo as circunstâncias do caso concreto.15
Regras remetem à máxima “nula poena sine lege” que representa a não
aplicação de pena sem lei, enunciado na parte final do inciso XXXIX do art. 5º da
Constituição de 1988: “não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem
14 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil, volume 1: teoria geral e processo de conhecimento. 6ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009, página 25 e 26.
15 MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. 3ª ed. revista e atualizada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, página 49 e 50.
14
prévia cominação legal” 16. Ou a norma é aplicada ou não, são descritivas de
condutas e não há margem para conflitos entre elas, ao contrário dos princípios, que
são valorativos, havendo medidas e níveis diferenciados entre eles, de acordo com a
situação concreta.
Para proteger os cidadãos brasileiros e garantir-lhes uma existência digna,
juntamente com o progresso econômico nacional, o legislador constituinte, ao
elaborar nossa Constituição Cidadã, preocupou-se, justamente por temer o
individualismo econômico decorrente do capitalismo, em elencar como um dos
fundamentos constitucionais do Estado Democrático de Direito a dignidade da
pessoa humana, da qual decorrem os preceitos do devido processo legal e da
valorização do trabalho, atinentes ao tema do presente trabalho.
A redação da Constituição Federal prevê explicitamente a garantia do devido
processo legal no inciso LIV do art. 5.º e, de forma pleonástica, porém plausível,
inúmeros mecanismos para melhor garantir e efetivá-la, para não restar incertezas e
hesitação.
Marcus Vinicius Rios Gonçalves elucida:
Esse é o princípio que constitui a base de todos os demais. A Constituição Federal, no art. 5º, LIV, estabelece que “ninguém será privado de liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”. Bastaria que fosse acolhido o due process of law para que estivessem asseguradas aos litigantes todas as garantias e o direito a um processo e uma sentença justa. “É, por assim dizer, o gênero do qual todos os demais princípios constitucionais do processo são espécies” 17
Deste instituto protetor decorrem os princípios da razoável duração do
processo e da celeridade, previstos no art. 5º, LXXVIII, da Carta Magna, in verbis: “a
todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do
processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação” 18. Foram
implantados com a Emenda Constitucional nº 45/2004 (Reforma do Judiciário),
16 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em: 25 out. 2012.
17 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil, volume 1: teoria geral e processo de conhecimento. 6ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009, página 37.
18 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/ConstituicaoCompilado.htm>. Acesso em: 25 out. 2012.
15
embora já estivessem implicitamente consagrados na Constituição e explicitamente
em outros diplomas.
Humberto Theodoro Júnior esclarece:
O princípio da economia processual vincula-se diretamente com a garantia do devido processo legal, porquanto o desvio da atividade processual para os atos onerosos, inúteis e desnecessários gera embaraço à rápida solução do litígio, tornando demorada a prestação jurisdicional. Justiça tardia é, segundo a consciência geral, justiça denegada. Não é justo, portanto, uma causa que se arrasta penosamente pelo foro, desanimando a parte e desacreditando o aparelho judiciário perante a sociedade.É evidente que sem efetividade, no concernente ao resultado processual cotejado com o direito material ofendido, não se pode pensar em processo justo. E não sendo rápida a resposta do juízo para a pacificação do litígio a tutela não se revela efetiva. Ainda que afinal se reconheça e proteja o direito violado, o longo tempo em que o titular, no aguardo do provimento judicial, permaneceu privado de seu bem jurídico, sem razão plausível, somente pode ser visto como uma grande injustiça.19
Esse princípio constitucional reflete na concepção de que no processo não
deve haver dilações ou retardamentos indevidos, para não prolongar
excessivamente a realização da justiça e causar danos irreparáveis à parte
prejudicada, tanto intrínsecos (moral e emocional), quanto extrínsecos (patrimonial
e material). Ao contrário, deve existir otimização.
Havendo celeridade na prestação jurisdicional e razoável duração do
processo, ao invés de formalidade excessiva, alcançado estará a dignidade das
partes, pois neste contexto o exercício e garantia destes direitos fundamentais é
justamente o que edifica uma vida digna.
Alexandre de Moraes observa:
Os processos administrativos e judiciais devem garantir todos os direitos às partes, sem, contudo, esquecer a necessidade de desburocratização de seus procedimentos e na busca da qualidade e máxima eficácia de suas decisões.Na tentativa de alcançar esses objetivos, a EC nº 45/04 trouxe diversos mecanismos de celeridade, transparência e controle de qualidade da atividade jurisdicional.20
19 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil: Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 50ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, página 33.
20 MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 18ª ed. São Paulo: Atlas, 2005, página 94.
16
Embora mesmo antes da promulgação da referida Emenda Constitucional, a
jurisprudência do Supremo Tribunal Federal tentava consolidar tal intenção:
O JULGAMENTO SEM DILAÇÕES INDEVIDAS CONSTITUI PROJEÇÃO DO PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL.- O direito ao julgamento, sem dilações indevidas, qualifica-se como prerrogativa fundamental que decorre da garantia constitucional do 'due process of law'. O réu (...) tem o direito público subjetivo de ser julgado, pelo Poder Público, dentro de prazo razoável, sem demora excessiva nem dilações indevidas. Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Art. 7º, ns. 5 e 6). Doutrina. Jurisprudência .- O excesso de prazo, quando exclusivamente imputável ao aparelho judiciário (...), traduz situação anômala que compromete a efetividade do processo, pois, além de tornar evidente o desprezo estatal pela liberdade do cidadão, frustra um direito básico que assiste a qualquer pessoa: o direito à resolução do litígio, sem dilações indevidas e com todas as garantias reconhecidas pelo ordenamento constitucional.21
Por vez surge conflito entre dois valores antagônicos: o estrito devido
processo legal e a tempestividade. As partes buscam a efetiva satisfação de seus
direitos materiais consagrados no ordenamento o quanto antes, todavia não pode
haver desrespeito as indispensáveis garantias da defesa.
A morosidade gera abalo à crença dos cidadãos e diminuição no grau de
qualidade da prestação jurisdicional, enfraquecendo seu sentido reparador com a
delonga e, normalmente, beneficiando a parte mais forte, podendo esta suportar
tranquilamente a espera pela decisão.
Pedro Lenza leciona:
Em outro estudo observamos que, “em algumas situações, contudo, a demora, causada pela duração do processo e sistemática dos procedimentos, pode gerar total inutilidade ou ineficácia do provimento requerido. Conforme constatou Bedaque, ‘o tempo constitui um dos grandes óbices à efetividade da tutela jurisdicional, em especial no processo de conhecimento, pois para o desenvolvimento da atividade cognitiva do julgador é necessária a prática de vários atos, de natureza ordinatória e instrutória. Isso impede a imediata concessão do provimento requerido, o que pode gerar risco de inutilidade ou ineficácia, visto que muitas vezes a satisfação necessita ser imediata, sob pena de perecimento mesmo do direito reclamado”’ 22
21 RTJ 187/933-934, Rel. Min. CELSO DE MELLO22 LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 16ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo:
Saraiva, 2012, página 1033.
17
Interessante indagação surge ao tentar determinar o prazo que cumpre o
direito à razoável duração do processo. Há uma incógnita quanto ao
estabelecimento deste, por ser impossível regrar de modo generalizado, tendo em
vista que cada caso concreto e suas circunstâncias é que o definirão.
No âmbito processual trabalhista o propósito do Estado, assim como no
direito material, é realizar a justiça social, construir uma economia mais eficaz e
zelar pelo bem-estar da população, através de um processo que claramente previne,
guarda e protege o trabalhador, por ser a parte econômica, social e juridicamente
inferior da relação, pretendendo eliminar esta gritante desigualdade e/ou evitar a
acentuação desta desproporção.
Amauri Mascaro Nascimento observa:
Discute-se se o princípio protecionista do direito do trabalho é aplicável no direito processual do trabalho, e há respostas afirmativas. Trueba Urbina responde sim: “tanto as normas substantivas como as processuais são essencialmente protecionistas e tutelares dos trabalhadores”; igual é o entendimento de Radbruch, para quem o “direito processual social caracteriza-se pelo protecionismo”.23
Todos os ramos da ciência processual busca a celeridade, economia
processual, simplificação de procedimentos e razoabilidade da duração do processo.
Deste modo, mesmo não sendo princípios específicos do processo trabalhista, há
maior ênfase destes devido às próprias peculiaridades do ramo.
Sergio Pinto Martins explica:
Certos autores mencionam o princípio da rapidez, da celeridade existente na Justiça do Trabalho, em virtude da necessidade de o trabalhador receber o mais rápido possível os salários que lhe foram sonegados. Isso não quer dizer que a celeridade é princípio do processo do trabalho, mas da ciência processual, com efeitos mais intensos no processo laboral. 24
Amauri Mascaro Nascimento esclarece:
Relevo especial ganham, no direito processual do trabalho, entre outros aspectos, a celeridade, que deve ser mais acentuada para
23 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito Processual do Trabalho. 24ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, página 109, grifo meu.
24 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito Processual do Trabalho: Doutrina e prática forense. 29ª ed. São Paulo: Atlas, 2009, página 39, grifo meu.
18
que possa cumprir os seus fins; a maior concentração dos atos processuais, razão pela qual a audiência trabalhista assume importância especial; e com isso a oralidade; a gratuidade, elevada a preocupação maior, dada a situação econômica do trabalhador (...) 25
Não somente é aplicável às relações judiciais trabalhistas, como também se
faz extremamente necessário, pela importância do objeto que estas ações
controvertem. Nesta esfera, o bem tutelado e em litígio reflete diretamente na
sobrevivência do trabalhador, tendo as verbas trabalhistas caráter alimentar, motivo
da busca pela maior rapidez no processo laboral.
Advém e correlaciona-se com o princípio da informalidade ou simplicidade do
processo do trabalho, ambos têm o mesmo objetivo, viabilizar simplicidade e rapidez
e reduzir a rigidez excessiva, e devem ser aplicados conjuntamente.
Justamente pelo explicitado percebe-se a essencialidade destes princípios
para o tema do presente trabalho, tendo em vista que na própria comunicação do
ato da notificação inicial há peculiaridades que tendem a estabelecer equilíbrio na
relação processual, onde o obreiro não pode ficar em situação de desigualdade.
Maurício Godinho Delgado ensina:
À medida que a Democracia consiste na atribuição de poder a quem é destituído de riqueza - ao contrário das sociedades estritamente excludentes antes do século XIX, na História -, o trabalho assume o caráter de ser o mais relevante meio garantidor de um mínimo de poder social à grande massa da população, que é destituída de riqueza e de outros meios lícitos de que alcance. Percebeu desse modo, com sabedoria a Constituição a falácia de instituir a Democracia sem um correspondente sistema econômico-social valorizador do trabalho humano. 26
Renato Saraiva aponta:
Logo, o princípio da igualdade ou isonomia, previsto no art. 5º da CF/1988, determinando que todos são iguais perante a lei, é perfeitamente respeitado pelo processo do trabalho, pois é a própria lei instrumental trabalhista que cria alguns privilégios ao obreiro, para lhe garantir a isonomia em relação ao empregador.
25 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito Processual do Trabalho. 24ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, página 109, grifo meu.
26 DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 3ª ed. São Paulo: Ltr, 2004, página 34, grifo meu.
19
O princípio da igualdade, pois, consiste em tratar de maneira igual os que se encontram em situação equivalente e de maneira desigual os desiguais, na medida de suas desigualdades.27
Esta apreciação da celeridade pode envolver, em contrapartida, ameaça à
valores como segurança jurídica, justiça e preservação da empresa. Um processo
absurdamente célere provavelmente afetará o julgamento do magistrado e limitará a
participação das partes (defesa). Assim como muita lentidão também poderá
acarretar o mesmo.
Alice Monteiro de Barros observa:
O grande desafio que se enfrenta é determinar o ponto de equilíbrio entre uma flexibilização sensível às preocupações legítimas das empresas e uma legislação que impeça um retrocesso ao antigo arrendamento de serviços, norteado pela autonomia da vontade, que foge completamente dos ideais de justiça social.28
Nossa sociedade reclama da sobrecarga de processos nos tribunais e
consequente longa duração dos processos, sejam comuns ou trabalhistas. Eliminar
ou diminuir essa sobrecarga existente nos tribunais é competência não só do Poder
Judiciário e do Executivo, mas também no Legislativo, ao elaborar as normas
processuais adequadas às atuais circunstâncias.
Um possível auxílio para contribuir na mudança dessa condição está em
tramitação, trata-se da aprovação de um novo Código de Processo Civil, o qual
atendendo a sua função de mecanismo infraconstitucional responsável por construir
procedimentos que tutelem de forma eficaz os direitos, visa oferecer novas soluções
à tempestividade da jurisdição e simplificação do processo.
Tal projeto prevê a consagração da flexibilização procedimental, gerando
grande repercussão e discussões doutrinárias, pois outorgaria maior autoridade ao
juiz. Em contrapartida, os que defendem a ideia alegam que o processo
contemporâneo exige a ampliação da oportunidade de versatilidade pretendendo
uma maior segurança jurídica.
José Rogério Cruz e Tucci, professor titular da Faculdade de Direito da USP:
27 SARAIVA, Renato. Curso de Direito Processual do Trabalho. 6ª ed. São Paulo: Método, 2009, página 45.
28 BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 6ª ed. São Paulo: Ltr, 2010, página 184.
20
Diversos dispositivos concedem ao juiz o poder de controlar e reprimir o comportamento abusivo e/ou desleal das partes, que possa colocar em risco a celeridade processual.Trata-se, como se observa, da inserção do denominado case management, ou seja, de gerenciamento do iter procedimental por meio da atividade judicial.E esse “gerenciamento”, como bem explica Paulo Eduardo Alves da Silva, “pode ser compreendido como o planejamento da condução de demandas judiciais em direção à resolução mais adequada do conflito, com o menor dispêndio de tempo e custos. Depende de uma postura ativa do juiz no controle do andamento dos feitos e organização da unidade judiciária. Seus mecanismos básicos são o envolvimento imediato do juízo com as questões da lide, a abertura para a resolução alternativa do conflito e o planejamento do andamento e dos custos do processo”. 29
Pela aplicação subsidiária do Código de Processo Civil ao processo
trabalhista, futuramente poderá haver reflexos nos procedimentos desta esfera que
contribuirão para maior rapidez na satisfação da pretensão do trabalhador.
Em face do conteúdo acima abordado, nota-se o mérito de estudos sobre os
princípios citados, vez que geram e funcionam como diretrizes para compulsar suas
observâncias pelo Estado na criação e aprimoramento de leis, como também aos
magistrados ao aplicá-las, sempre com sensatez, proporcionalidade e razoabilidade
para não ofender garantias mínimas atinentes à prestação jurisdicional.
29 Garantias constitucionais da duração razoável e da economia processual no Projeto do Código de Processo Civil, Revista de Processo RePro, ano 36, nº 192, Fevereiro de 2011, pág. 204 e 205.
21
4 A NOTIFICAÇÃO INICIAL NO PROCESSO DO TRABALHO E SEUS
PRINCIPAIS ASPECTOS
4.1 ASPECTOS GERAIS SOBRE A APLICAÇÃO E INTERPRETAÇÃO DO DIREITO
PROCESSUAL DO TRABALHO
As normas visam alcançar controle e justiça social na resolução de conflitos
interpessoais, através da justa distribuição de direitos e deveres. Caracterizam-se
pela generalidade e imperatividade ao disciplinar regras gerais de conduta.
É a observação de Marcus Vinicius Rios Gonçalves quanto à imposição de
regras ao indivíduo:
[...] percebeu-se que não basta simplesmente estabelecer regras de conduta se não meios de impô-las coercitivamente. De nada vale a proibição se não há como impor o seu cumprimento.30
E para reger a adequada aplicação de tais regras são necessárias leis
processuais, responsáveis por associar os partícipes da relação com o próprio
procedimento. Nas palavras de Marcus Vinicius Rios Gonçalves:
É aquela que trata das relações que se estabelecem entre os que participam do processo e do procedimento, isto é, do modo pelo qual os atos processuais sucedem-se no tempo. A relação processual e o procedimento são inseparáveis e não existem isoladamente. Ambos compõem e integram o processo [...]31
Os doutrinadores Antonio Carlos de Araújo Cintra, Ada Pellegrini Grinover e
Cândido Rangel Dinamarco, explanam quanto às normas processuais:
[...] O objeto das normas processuais é a disciplina do modo processual de resolver os conflitos e controvérsias mediante a atribuição ao juiz dos poderes necessários para resolvê-los e, às partes, de faculdades e poderes destinados à eficiente defesa de
30 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil, volume 1: teoria geral e processo de conhecimento. 6ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009, página 2.
31 GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil, volume 1: teoria geral e processo de conhecimento. 6ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009, página 9.
22
seus direitos, além da correlativa sujeição à autoridade exercida pelo juiz.Realmente, a norma processual visa a disciplinar o poder jurisdicional de resolver os conflitos e controvérsias, inclusive o condicionamento do seu exercício à provocação externa, bem como o desenvolvimento das atividades contidas naquele poder; visa, ainda, a regular as atividades das partes litigantes, que estão sujeitas ao poder do juiz; e, finalmente, visa a reger a imposição do comando concreto formulado através daquelas atividades das partes e do juiz.32
O Direito Processual do Trabalho objetiva solucionar tão-somente conflitos
oriundos das relações de trabalho. Contem elementos característicos que o
distinguem dos demais ramos, como normas, institutos e princípios próprios, sendo
considerado uma disciplina autônoma pela doutrina predominante.
Para melhor elucidar, vale reportar alguns ensinos doutrinários.
Primeiramente a lição do Carlos Henrique Bezerra Leite:
Já a teoria geral do direito processual do trabalho tem objeto mais delimitado, porquanto investiga setores específicos do processo do trabalho, as suas estruturas peculiares, os conceitos próprios e os valores especiais almejados pelo direito material do trabalho. Sua finalidade primordial reside, portanto, na realização dos escopos social, político e jurídico do processo sob a perspectiva do direito material do trabalho [...]33
Sergio Pinto Martins sustenta que:
O Direito Processual é o gênero do qual são espécies o Direito Processual Penal, Direito Processual Civil e o ramo mais recente é o Direito Processual do Trabalho. Muitos conceitos como de ação, autor, réu, exceção, reconvenção, recurso, são trazidos do âmbito do Direito Processual e empregados no processo do trabalho, com suas devidas adaptações. Utiliza-se, assim, da teoria geral do processo no processo do trabalho.34
São notáveis as peculiaridades processuais no âmbito trabalhista quando
comparado ao comum. Para que alcance a eficácia necessária e sem morosidade,
32 GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido R., CINTRA, Antônio Carlos de Araújo. Teoria Geral do Processo. 25ª edição. São Paulo: Malheiros. 2009, página 95.
33 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho. 8ª ed. São Paulo: LTr, 2010, página 46.
34 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito Processual do Trabalho: Doutrina e prática forense. 29ª ed. São Paulo: Atlas, 2009, página 27
23
há menos formalismo e maior prevalência de algumas particularidades, das quais
algumas interessam o presente tema.
Nesta seara deve haver também ponderação e sabedoria do julgador no
momento de decidir quais fontes do direito serão aplicadas no caso em concreto,
assim como qual interpretação será mais adequada quando houver norma com mais
de um sentido.
Antes de prosseguir, definindo fontes do direito no ensino de Miguel Reale:
Por “fonte do direito” designamos os processos ou meios em virtude dos quais as regras jurídicas se positivam com legítima força obrigatória, isto é, com vigência e eficácia no contexto de uma estrutura normativa. O direito resulta de um complexo de fatores que a Filosofia e a Sociologia estudam, mas se manifesta, como ordenação vigente e eficaz, através de formas, diríamos mesmo de certas fôrmas, ou estruturas normativas, que são o processo legislativo, os usos e costumes jurídicos, a atividade jurisdicional e o ato negocial.35
Dentre várias, as principais fontes formais trabalhistas elencadas pelos
doutrinadores são a Constituição Federal de 1988, que disciplina de forma unitária e
harmônica as estruturas fundamentais; a Consolidação das Leis do Trabalho; o
Código de Processo Civil e a Lei de Execução Fiscal, aplicada principalmente na
fase de execução.
Quanto à Carta Magna, é pertinente lembrar a moderna teoria
neoconstitucionalista, a qual fortalece o poder normativo da Constituição, através do
pressuposto de que a hermenêutica deve ocorrer a partir dela, ou seja, observam-se
primeiro os direitos fundamentais para depois a norma trabalhista propriamente dita,
como se houvesse um filtro constitucional.
Teoria essa definida por Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino como princípio
da interpretação conforme a Constituição:
O princípio da interpretação conforme a Constituição impõe que, no caso de normas polissêmicas ou plurissignificativas (que admitem mais de uma interpretação), dê-se preferência à interpretação que lhes compatibilize o sentido com o conteúdo da Constituição. Como decorrência desse princípio temos que dentre as várias possibilidades de interpretação, deve-se escolher a que não seja contrária ao texto da Constituição.
35 REALE, Miguel. Licões Preliminares de Direito. 27ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009, página 140.
24
[...] só é admitida quando existe, de fato, um espaço de decisão (espaço de interpretação) em que sejam admissíveis várias propostas interpretativas, estando pelo menos uma delas em conformidade com a Constituição, que deve ser preferida às outras, em desconformidade com ela.36
O Código de Processo Civil é aplicado subsidiariamente quando houver
lacuna na legislação trabalhista e for eficaz para a efetiva proteção jurisdicional do
trabalhador, ou seja, quando compatível com os princípios trabalhistas. Deste modo
impõe o art. 769 da Consolidação das Leis do Trabalho: “Nos casos omissos, o
direito processual comum será fonte subsidiária do direito processual do trabalho,
exceto naquilo em que for incompatível com as normas deste Título” 37.
E de acordo com Renato Saraiva:
[...] o processo do trabalho é neófito, incompleto e assistemático, ainda utilizando, subsidiariamente, boa parte das normas do processo civil, carecendo de uma legislação mais abrangente e complexa que defina seus próprios princípios, o que acaba por fazer com que os autores transportem para o campo trabalhista os princípios gerais do processo civil, adequando-os às peculiaridades e particularidades do processo do trabalho.38
Bem observa e lecciona o professor Amauri Mascaro Nascimento ao fazer
uma interpretação mais profunda do art. 769 do diploma trabalhista e esclarecer que:
Não só o Código de Processo Civil pode ser aplicado complementarmente, porque a lei permite a utilização, pelo juiz do trabalho, das regras cabíveis do “direito comum”.[...] o Código de Defesa do Consumidor pode ser aplicado no processo trabalhista, observados os mesmos pressupostos já indicados.39
Por último, temos a aplicação subsidiária também da Lei de Execução Fiscal
(Lei nº 6.830/1980), aplicada principalmente da na execução. É decorrente do art.
889 da Consolidação Trabalhista:
36 PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2008, página 74.
37 BRASIL. Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>. Acesso em: 25 out. 2012.
38 SARAIVA, Renato. Curso de Direito Processual do Trabalho. 6ª ed. São Paulo: Método, 2009, página 31.
39 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito Processual do Trabalho. 24ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, página 88.
25
Aos trâmites e incidentes do processo da execução são aplicáveis, naquilo em que não contravierem ao presente Título, os preceitos que regem o processo dos executivos fiscais para a cobrança judicial da dívida ativa da Fazenda Pública Federal. 40
Eventualmente ocorre a existência de diferentes possibilidades de aplicação
e/ou interpretação de determinadas normas a um caso concreto. O que norteará tais
situações será sempre a ideia de proteção ao trabalhador, preservando os fins e
reflexos sociais. É justamente o propósito central do § 1º do art. 852-I da CLT: “O
juízo adotará em cada caso a decisão que reputar mais justa e equânime,
atendendo aos fins sociais da lei e as exigências do bem comum” 41.
Sergio Pinto Martins assim presta explicação quanto à forma de interpretação
sociológica de normas trabalhistas:
[...] em que se constata a realidade e a necessidade social na elaboração da lei e na sua aplicação. O juiz, ao aplicar a lei, deve ater-se aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum.42
No mesmo sentido, examina e disserta Cândido Rangel Dinamarco:
Como a todo intérprete, incumbe ao juiz postar-se como canal de comunicação entre a carga axiológica atual da sociedade em que vive e os textos, de modo que estes fiquem iluminados pelos valores reconhecidos e assim possam transparecer a realidade da norma que contêm no momento presente. O juiz que não assume essa postura perde a noção dos fins de sua própria atividade, a qual poderá ser exercida até de modo bem mais cômodo, mas não corresponderá às exigências de justiça.43
Alice Monteiro de Barros ressalva:
40 BRASIL. Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>. Acesso em: 25 out. 2012
41 BRASIL. Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>. Acesso em: 25 out. 2012.
42 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito Processual do Trabalho: Doutrina e prática forense. 29ª ed. São Paulo: Atlas, 2009, página 34.
43 DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo, 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990, página 421.
26
[...] é necessário considerar também o elemento sociológico, ao qual serão incorporados fatores de ordem política, econômica e moral que revelam os anseios da comunidade no momento da aplicação da lei. Lembre-se, entretanto, que esses fatores não autorizam o Juiz a modificar ou deixar de aplicar a norma vigente, mas a suavizá-la até onde o texto legal o permitir. A doutrina tem alertado para o fato de que a utilização desses fatores na função interpretativa exige prudência e habilidade, pois há risco de arbitrariedade ao se entregar a consciência moral de um povo à apreciação subjetiva do Juiz. Assim, é necessário que a tendência ou a ideia tenha penetrado de forma inequívoca na realidade social ao tempo da aplicação.44
Coerentes são estes entendimentos, sabe-se que o direito nasce da
necessidade da sociedade e deve corresponder ao desejo para qual foi criado. O
legislador trabalhista atua ativamente elaborando leis para assegurar conquistas em
proveito dos hipossuficientes, tendo estas cunho não só jurídico, mas também
político e social.
Luiz Guilherme Marinoni vai além e elucida que:
Portanto, ainda que se ignorasse a idéia de pluralismo, jamais se poderia concluir que o texto da lei é perfeito, e assim deve ser simplesmente proclamado pelo juiz, apenas por ser o resultado de um procedimento legislativo regular. De modo que se tornou necessário resgatar a substância da lei e, mais do que isso, encontrar instrumentos capazes de permitir a sua limitação e conformação aos princípios de justiça.45
Pelo exposto, entende-se a necessidade de menor formalismo nos processos
trabalhistas, pela própria natureza do objeto da pretensão em litígio, e utilização das
fontes de direito que melhor protejam o operário, para equilibrar sua situação
desvantajosa.
4.2 DA INFORMALIDADE E CELERIDADE DO PROCESSO DO TRABALHO
Vimos, no capítulo anterior sobre princípios, as exigências de rapidez e
simplicidade que o processo do trabalho requer devido à natureza alimentar da
44 BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 6ª ed. São Paulo: Ltr, 2010, página 194, grifo meu.
45 MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. 3ª ed. revista e atualizada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, página 46.
27
ação, buscando evitar que o trabalhador seja vítima da mora processual, e aguarde
por longos anos a satisfação de sua pretensão.
Na lição de Eduardo Gabriel Saad:
Assim, pensamos porque ele se destina a dirimir controvérsias individuais e coletivas em que se discutem, primordialmente, assuntos de caráter financeiro e indispensáveis à subsistência de boa parte da população.Qualquer delonga nesses processos põe em risco o direito natural à vida do trabalhador e de seus dependentes.Identificamos nesse fato o motivo que justifica normas legais inspiradas pela celeridade e pela simplicidade dos atos que compõem o processo do trabalho.46
O sistema processual comum não fornece a devida celeridade e simplicidade
que exigem as demandas trabalhistas, advindo daí a origem do processo laboral. A
Consolidação das Leis Trabalhistas estabelece várias particularidades que atenuam
a formalidade para obter um menor lapso temporal.
Todo esse amparo ao trabalhador se justifica na concepção de injustiça ao
enriquecer uma minoria por meio de prejuízo à dignidade humana dos
trabalhadores, dano este que o tornaria simples ferramenta e mercadoria, além de
acarretar aumento das desigualdades.
4.3 DA NOTIFICAÇÃO NO PROCESSO DO TRABALHO
4.3.1 Delimitação do termo “notificação inicial”
Depois dessas exposições, redirecionando o foco para o tema central do
presente trabalho, quais sejam as notificações trabalhistas, em especial a notificação
inicial. Quanto à nomenclatura diversa da processual civil Sergio Pinto Martins
explica que:
46 SAAD, Eduardo Gabriel. Curso de direito processual do trabalho. 5ª ed. rev., atual. e ampl. por José Eduardo D. Saad e Ana Maria Saad Castello Branco. São Paulo: LTr, 2007, página 41.
28
O legislador doutrinário, ao pretender justificar a autonomia do Direito Processual do Trabalho, utilizou-se da expressão notificação para todo e qualquer ato em que vai ser feita a comunicação dos atos processuais, tanto em relação à citação, como para a intimação. A palavra notificação vem da época em que a Justiça do Trabalho pertencia ao Poder Executivo.47
Na prática trabalhista não se faz distinção dos termos utilizados para
expressar a comunicação dos atos processuais, diferente do que ocorre no processo
civil. Assim ensina Renato Saraiva:
O legislador pátrio, entretanto, objetivando justificar a autonomia do processo do trabalho, utilizou na Consolidação das Leis do Trabalho, de forma indiscriminada, o termo notificação, como o meio adequado para comunicação de todo e qualquer ato processual realizado no âmbito da Justiça laboral (seja citação ou intimação). 48
Mesmo não havendo diferença terminológica, faz-se fundamental conceituar e
distinguir a citação e a intimação, para que se possa identificar qual o sentido do
emprego da palavra “notificação”, no texto legal trabalhista.
De acordo com o artigo 234 do Código de Processo Civil “a intimação é o ato
pelo qual se dá ciência a alguém dos atos ou termos do processo, para que se faça
ou deixe de fazer alguma coisa”. Já o art. 213 do mesmo diploma conceitua citação
como “o ato pelo qual se chama a juízo o réu ou o interessado a fim de se defender” 49.
No ensino de José Miguel Garcia Medina:
Enquanto a citação tem por finalidade dar notícia ao demandado acerca da existência da ação (art. 213), através da intimação realizam-se as demais comunicações do órgão judicial às partes e a terceiros (art. 234).[...] Diz-se, assim, que a citação é pressuposto processual de existência do processo em relação ao réu, já que, antes da citação, ainda que exista processo, a relação processual dar-se-á apenas entre demandante e juiz. 50
47 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito Processual do Trabalho: Doutrina e prática forense. 29ª ed. São Paulo: Atlas, 2009, página 158.
48 SARAIVA, Renato. Curso de Direito Processual do Trabalho. 9ª ed. São Paulo: Método, 2012, página 160.
49 BRASIL. Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869compilada.htm>. Acesso em: 25 out. 2012.
50 MEDINA, José Miguel Garcia. Código de Processo Civil Comentado – com remissões e notas comparativas ao projeto do novo CPC. 2ª tiragem. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011, páginas 219 e 207.
29
Enfocando na CLT, há previsão no artigo 841 da CLT, de que:
“Recebida e protocolada a reclamação, o escrivão ou chefes de secretaria, dentro de quarenta e oito horas, remeterá a segunda via da petição, ou do termo, ao reclamado, notificando-o ao mesmo tempo, para comparecer à audiência de julgamento, que será a primeira desimpedida, depois de cinco dias” 51.
Nota-se, através da parte final do dispositivo, a utilização do termo
“noticiando-o”, ou seja, a própria norma trabalhista diferencia a nomenclatura da
citação, a qual é usualmente denominada de “notificação ao reclamado”, sendo o
termo mais difundido na prática processual desta esfera.
A notificação ao reclamado também considerada pressuposto vital para o
desenvolvimento da relação processual. Tamanha é a preocupação com a
efetividade da citação, que o legislador, ao elaborar o art. 214 do CPC (Código de
Processo Civil), versou que para “a validade do processo, é indispensável a citação
inicial do réu”, assim como no art. 215 do mesmo diploma afirmou que “Far-se-á a
citação pessoalmente ao réu” 52.
Nas palavras de Humberto Theodoro Júnior:
Tão importante é a citação, como elemento instaurador do indispensável contraditório no processo, que sem ela todo o procedimento se contamina de irreparável nulidade, que impede a sentença de fazer coisa julgada.53
Compreende-se o indispensável pressuposto que a notificação ao reclamado
assume para a ação, assim como a citação, podendo até, em caso de não
cumprimento das determinações exigidas, ensejar nulidade de sentença. Em
compensação veremos adiante que na esfera trabalhista há peculiaridades que a
torna menos rígida.
51 BRASIL. Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>. Acesso em: 25 out. 2012.
52 BRASIL. Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869compilada.htm>. Acesso em: 25 out. 2012.
53 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil: Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 50ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, página 261.
30
4.3.2 Da impessoalidade na notificação inicial
Em contrapartida ao art. 215 do CPC, os institutos trabalhistas exigem um
conjunto de normas mais flexíveis, predominando, em especial, o sistema da
impessoalidade na notificação inicial, visando maior rapidez na comunicação do ato.
Renato Saraiva sinteticamente versa quanto à questão:
[...] não há previsão legal de pessoalidade na realização da comunicação, sendo a notificação considerada válida com a simples entrega do registro postal no endereço da parte.54
Seguindo o mesmo entendimento, o doutrinador Sergio Pinto Martins examina
a fundo a diferença:
Não há necessidade de a notificação ser feita pessoalmente, simplificando-se, assim, o procedimento da comunicação dos atos processuais do trabalho. A notificação é considerada realizada com a simples entrega do registro postal no endereço da parte. Pode-se também depositar a notificação na caixa postal da parte. Se a notificação for recebida pelo zelador ou outro empregado da administração do edifício, onde o destinatário tem residência ou domicílio, há a consumação do ato. Será, dessa forma, a notificação considerada válida desde que entregue no endereço correto do notificado, sem a devolução pelo correio, independentemente da pessoa que a receber. Se fosse exigida a citação pessoal, o réu poderia esquivar-se ou tentar frustrar a citação. Nem mesmo quando cumprida por oficial de justiça precisa a citação ser pessoal.55
É também a orientação majoritária que o Tribunal Superior do Trabalho adota
e aplica. Seguem jurisprudências atinentes:
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA CITAÇÃO – IMPESSOALIDADE. A citação, no processo do trabalho, não exige pessoalidade e, portanto, a notificação corretamente endereçada e entregue na sede da reclamada é regular, cabendo à parte, que a impugna, demonstrar sua irregularidade. Agravo de instrumento desprovido.56
54 SARAIVA, Renato. Curso de Direito Processual do Trabalho. 6ª ed. São Paulo: Método, 2009, página 198.
55 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito Processual do Trabalho: Doutrina e prática forense. 29ª ed. São Paulo: Atlas, 2009, página 159.
31
RECURSO DE REVISTA. NULIDADE DE CITAÇÃO – MUNICÍPIO – CITAÇÃO VIA POSTAL. Vigora nesta Justiça Especializada o sistema da impessoalidade da citação, que se procede mediante notificação postal, expedida automaticamente para o endereço do reclamado. Desta forma, não há necessidade de que a citação se faça pessoalmente, sendo bastante, para considerá-la válida, que seja entregue no correto endereço do reclamado. Note-se que não há nenhuma exceção quanto à aplicação do dispositivo ao Município. Recurso de revista conhecido e desprovido.57
Esta não obrigatoriedade da notificação ser pessoal e entregue em mãos
próprias, elimina a morosidade que pode gerar quando feita por oficial de justiça,
prestigiando-se, mais uma vez, a proteção ao trabalhador, através de um trâmite
processual mais rápido.
Ainda neste intuito de rapidez, a Súmula 16 do TST versa que “Presume-se
recebida a notificação 48 horas depois de sua postagem. O seu não-recebimento ou
a entrega após o decurso desse prazo constituem ônus da prova do destinatário” 58;
e o § único do art. 774 da CLT diz “Tratando-se de notificação postal, no caso de
não ser encontrado o destinatário ou no de recusa de recebimento, o Correio ficará
obrigado, sob pena de responsabilidade do servidor, a devolvê-la, no prazo de
quarenta e oito horas, ao Tribunal de origem” 59.
Ambas as normas objetivam facilitar a comunicação de tal ato criando uma
presunção relativa de efetivo recebimento pela simples entrega no endereço do
destinatário.
Interessante citar o teor do recente acórdão do Exmo. Des. Hugo Carlos
Scheuermann no processo n. 0102300-65.2005.5.04.0701 – AP (julgamento em
21/01/2010), no qual se discute a questão referente à citação pessoal:
Segundo o disposto no art. 841 da CLT, a notificação será feita em registro postal com franquia. Portanto, não há exigência da entrega pessoal da citação ao destinatário, na medida em que, realizada por via postal, esta poderá ser recebida por qualquer pessoa que se encontrar no local, a citação do executado, na forma procedida, é perfeitamente válida e eficaz, tal como concluído em primeiro grau.
56 TST, PROC. Nº TST-AIRR-179/2005-117-08-40.9, Rel. Min. VIEIRA DE MELLO FILHO, Pub. DJ-06/10/2006
57 TST, PROC. Nº RR 374004920075210016, Rel. Min. Renato de Lacerda Paiva, Pub. DEJT – 04/05/2012
58 Súmulas da Jurisprudência Uniforme do Tribunal Superior do Trabalho. Disponível em: <http://www.tst.gov.br/web/guest/sumulas>. Acesso em: 25 out. 2012.
59 BRASIL. Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>. Acesso em: 25 out. 2012.
32
Retomando a análise do art. 841 da CLT, a parte inicial deste dispositivo
demonstra outra diferença quanto ao rito da justiça comum ao versar que “Recebida
e protocolada a reclamação, o escrivão ou chefes de secretaria, dentro de quarenta
e oito horas, remeterá a segunda via da petição, ou do termo, ao reclamado” 60.
Na explicação de Carlos Henrique Bezerra Leite:
[...] o servidor público que receber a petição inicial da ação trabalhista notificará o réu, remetendo-lhe a segunda via da petição, para comparecer à audiência de conciliação, instrução e julgamento, que será a primeira desimpedida, depois de cinco dias. Na verdade, a notificação, que é feita por meio de registro postal, tem a função de citar o réu e, ao mesmo tempo, intimá-lo para comparecer à audiência.61
Sérgio Pinto Martins esclarece mais profundamente:
No processo do trabalho a citação do réu independe de requerimento do autor feito na petição inicial e também de qualquer ato do juiz. Não há necessidade do despacho “cite-se” dado pelo juiz. A notificação é expedida automaticamente pela secretaria da Vara ao receber a petição inicial, no prazo de 48 horas após seu recebimento.62
Refere-se à citação automática, onde há obrigação do próprio serventuário
em enviar a cópia da petição (contrafé) à parte demandada em 48 horas. A intenção
do legislador é utilizar estruturas normativas que resultem em um rápido provimento
jurisdicional.
Interessante observação faz o doutrinador Amauri Mascaro Nascimento
quanto aos reflexos em outros ramos das novas construções jurídicas presentes na
esfera laboral:
O direito processual do trabalho tem uma presença permanente e seu dinamismo constitui um importante espaço experimental para novas construções jurídicas aproveitadas pelo direito processual civil, como a citação por via postal, o alargamento da conciliação como
60 BRASIL. Decreto-lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm>. Acesso em: 25 out. 2012.
61 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho. 8ª ed. São Paulo: LTr, 2010, página 330.
62 MARTINS, Sérgio Pinto. Direito Processual do Trabalho: Doutrina e prática forense. 29ª ed. São Paulo: Atlas, 2009, página 159.
33
fase obrigatória processual, o procedimento sumário, a penhora online e a irrecorribilidade das decisões interlocutórias [...] 63
Os institutos processuais mencionados, da impessoalidade na realização da
comunicação da notificação inicial e de sua remessa automática, são fundamentais
na tentativa de conseguir maior celeridade no provimento jurisdicional trabalhista,
simplificando procedimentos.
4.3.3 A notificação inicial e a ponderação entre a proteção do trabalhador e a
preservação da empresa
Exposto todo esse conteúdo sobre a hipossuficiência do trabalhador e as
normas, princípios e meios utilizados para atenuá-la, é pertinente adiante apresentar
breves análises de eventual situação que a parte contrária, a empresa, pode ter que
tolerar.
Para esclarecer a questão suscitada, cabe a citação de alguns trechos da
entrevista concedida à TV Anamatra do Ministro do C. TST Antonio José de Barros
Levenhagen, quando indagado a respeito do equilíbrio entre o princípio da
hipossuficiência e o da igualdade processual:
Se traz agora à discussão um novo paradigma do Direito do Trabalho, que não é tão novo, mas vetusto como a CLT, que é a preservação da empresa. Que a CLT e o Direito do Trabalho são protecionistas ao hipossuficiente não há menor dúvida, só se explica a existência do Direito do Trabalho em razão dessa proteção jurídica para compensar a fragilidade econômica do empregado. Mas não se pode esquecer que cerca de 80% das empresas no Brasil que empregam são constituídas de micro, pequenas e médias empresas. Então o que se propõe hoje como um modelo para um equilíbrio das relações entre o capital e o trabalho é que, mantida a proteção que o deve ser, se observe também os interesses da empresa, não do empresário, mas da empresa como fonte geradora de renda e do próprio emprego. Tanto é assim que o art. 1º da Constituição se funda na livre iniciativa e na valorização social do trabalho. São dois valores constitucionais que devem ser observados pelo juiz do Trabalho. O juiz do Trabalho não pode priorizar um em detrimento do outro, porque ele desequilibra aquilo que o constituinte pretendeu.
63 NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito Processual do Trabalho. 24ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009, página 60.
34
Mas, sobretudo, um dos maiores desafios do judiciário trabalhista é saber o equilíbrio exatamente entre a proteção que deve ser dispensada ao empregado e o sentido de preservação da empresa. São dois valores que devem coexistir em harmonia. O juiz do Trabalho deve render homenagem a esses dois valores, não prestigiando um em detrimento do outro para não desequilibrar essa relação tão tênue da verdadeira justiça.64
O Ministro prestigia o princípio constitucional implícito da preservação da
empresa, o qual parte da concepção da manutenção da atividade empresarial, para
consequentemente resguardar os interesses da coletividade e garantir a tutela do
direito ao trabalho e a permanência do obreiro nele.
Logo, se vincula com o consagrado princípio trabalhista da continuidade da
relação de emprego, já que é justamente na empresa onde se centraliza e dispõe a
produção através de força humana.
Fran Martins opina quanto à questão:
Contrariamente ao que se propunha, a previsão da classe trabalhadora fomenta restrição e sacrifícios, mas se cogitarmos a continuidade dos negócios, os empregados seriam os mais privilegiados, porque de nada adianta querer receber e perder o emprego com fechamento da empresa.65
E seguindo a mesma interpretação, Carlos Aberto Farracha de Castro
explana que:
O uso adequado e responsável da técnica da ponderação, portanto, pode contribuir para a convivência harmônica entre o lucro e a dignidade da pessoa humana. Os pilares do Código Civil (eticidade, socialidade e operabilidade) e o princípio da preservação da empresa auxiliam nesse desiderato, inclusive caso venham a ser interpretados de modo a incentivar que o lucro seja visualizado não só como causa para a constituição das sociedades empresariais, mas também como incentivo da concretização da função social da empresa, caso parcela dele venha a ser destinada ou repartida a sujeitos não-proprietarios envolvidos naquela relação empresarial. Em assim sendo, a busca do lucro deixaria de se constituir objeto de rejeição por parcela da sociedade, tornando-se elemento que agrega os interesses dos empresários, trabalhadores e consumidores, propiciando aumento da produtividade daquela atividade empresarial, gerando, pois, benefícios coletivos, o que contribui para a redução
64 Entrevista concedia à TV Anamatra, pelo Ministro do C. TST, Antonio José de Barros Levenhagen. Informativo da Anamtra, ano XIII, nº 126, novembro/dezembro de 2009, fls. 5, grifo meu.
65 MARTINS, Fran. Curso de Direito Comercial. 30. ed. rev., atual. e amp. Rio de Janeiro: Forense, 2006, página 462.
35
das desigualdades de nossa sociedade.66 (Preservação da empresa no código civil, pág. 170)
É indiscutível a importância social que uma empresa ativa gera e, por formar
um sistema econômico complexo, o desencadear de reflexos que causa quando em
crise, repercutindo tanto em seus funcionários, como em outras empresas e também
na economia regional.
Um dos grandes obstáculos à Justiça é justamente sua morosidade,
desrespeitando a razoável duração do processo, sendo o exame deste óbice
abordado por vários especialistas da área, doutrinadores e palestrantes. Os
cidadãos sofrem os efeitos e veem o exercício de seus direitos distanciar cada vez
mais.
Em entrevista para a revista da Associação Nacional Dos Magistrados Da
Justiça Do Trabalho (Anamatra), O Ministro do Supremo Tribunal Federal Marco
Aurélio Mello, proveniente da área trabalhista e com mais de 20 anos de atuação na
mais alta corte do país, sabiamente expôs sua opinião quanto à celeridade
processual:
Desde que estou aqui, o STF é um Tribunal sobrecarregado de processos. Temos uma competência muito ampla e aí não sobra tempo. Vivemos uma angústia de conciliar a celeridade com o conteúdo.Nós podemos potencializar a celeridade em detrimento do conteúdo? Será que o ato judicante pode ser tarifado? Será que é possível colocá-lo como tarefa e dizer: “Olha, você tem até o final do ano para liquidar tais processos!”. É assim que ocorre em outros julgamentos? Não, não é assim.67
E Dierle José Coelho Nunes leciona:
É de se verificar que a quantidade média de processos que um juiz brasileiro possui sob sua “direção” impõe-lhe uma análise superficial dos casos que lhe são submetidos, uma vez que o sistema de “prestação jurisidicional” faz com que este atue como se o que importasse não fosse a aplicação de tutela constitucional e democraticamente adequada, mas sim a prestação de serviços rápidos e em larga escala.68
66 CASTRO, Carlos Alberto Farracha de. Preservação da empresa no código civil. Curitiba: Juruá, 2007, página 170.
67 Entrevista com o Ministro do STF, Marco Aurélio Mello. Revista da Anamatra, Ano XXI, nº 58, edição do 2º semestre de 2009.
68 NUNES, Dierle José Coelho. Direito Constitucional ao Recurso. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006, página 49.
36
Cita-se também excertos de um artigo, publicado na Revista LTr, da
Desembargadora Olga Aida Joaquim Gomieri, atuante no Tribunal Regional do
Trabalho da 15ª Região, que argumenta a complexidade para equilibrar a proteção
ao empregado e a preservação da empresa e do emprego :
[...] os tempos modernos prometem mais celeridade e, pensa-se, consequentemente haveria maior eficácia na definição dos processos. Entretanto, como exaustivamente já salientado e percebido por todos, essa celeridade processual não pode vir em diminuição da qualidade dos serviços prestados aos jurisdicionados, em prejuízo à plena realização da Justiça.Vemos, no entanto, que, com a nobre finalidade da rapidez na tramitação dos processos, outros valores de igual ou maior grandeza podem estar sendo sacrificados na Justiça do Trabalho. A própria eficiência, em seu sentido mais verdadeiro, pode estar sendo colocada em segundo plano.[...] uma instituição tão importante e complexa como é a Justiça do Trabalho de hoje, para que atinja a verdadeira eficiência, exige grandes desafios, pois vive no epicentro das mais frequentes discussões, aquelas pertinentes às relações do trabalho, que envolvem quase tudo que se possa pensar existente nesse mundo eminentemente social e globalizado, em que devem ser respeitados tanto os direitos do trabalhador como aqueles do empreendedor, posto que ambos são merecedores de toda a consideração.69
A preocupação da desembargadora acima citada é quanto à proteção de
outros valores, cuja grandeza é tamanha quanto o da celeridade processual, porém
estão sendo sacrificados na justiça trabalhista. Quando ocorre este detrimento de
um valor imprescindível, com certeza há consequente prejuízo para uma das partes,
que geralmente neste âmbito é a empresa demandada.
Antes de aduzir as próximas opiniões doutrinárias é preciso definir o instituto
da revelia e suas consequências, declarado pelo art. 319 do CPC como “se o réu
não contestar a ação, reputar-se-ão verdadeiros os fatos afirmados pelo autor” 70.
4.3.4 A questão da revelia no processo do trabalho
69 Relação capital e trabalho – complexidade – desafio do judiciário em estabelecer o equilíbrio entre a proteção ao empregado x a preservação da empresa e do emprego, Revista LTR, v. 75, n. 07, Julho de 2011, grifo meu.
70 BRASIL. Lei nº 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Institui o Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5869compilada.htm>. Acesso em: 25 out. 2012.
37
A análise da notificação inicial desdobra consequentemente também para
questões relacionadas à revelia. Analisar também este instituto e sua funcionalidade
nas demandas trabalhistas ajudará na elucidação das consequências práticas de
uma notificação ao reclamado eivado de vícios.
Trata-se de pena imposta a parte que, regularmente citada, deixa de
comparecer ou contestar. Nas palavras de Luiz Guilherme Marinoni e Daniel
Mitidiero “o efeito material da revelia está em que as alegações fáticas formuladas
pelo autor na petição inicial são consideradas verdadeiras diante do silêncio do réu” 71.
No âmbito trabalhista, situação semelhante ocorre com a revelia que, de
acordo com o art. 844 da Consolidação das Leis do Trabalho, traz como
consequência a contumácia, sendo o revel também considerado confesso ficto
quanto à matéria de fato. No comentário de Carlos Henrique Bezerra Leite sobre a
questão:
O principal efeito da revelia incide sobre a prova, uma vez que, se o réu não contestar a ação, serão considerados verdadeiros os fatos alegados pelo autor, dispensando-se a produção de outras provas sobre tais fatos.72
Fazendo um nexo entre a questão tema do trabalho e o instituto acima
mencionado, verificamos que a não obrigatoriedade de pessoalidade na realização
da notificação inicial, considerada válida com a simples entrega no endereço da
parte, pode em determinadas situações acarretar indevidamente a revelia da parte
reclamada.
Prosseguindo com este pensamento, Valentin Carrion assim leciona quanto à
nulidade de citação:
A nulidade de citação deve ser arguida pelo revel após a intimação da sentença que o condenou, mediante recurso ordinário ao Tribunal Regional. O meio mais célere e apropriado seria a declaração de inexistência da sentença por ausência da relação jurídica processual
71 MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, página 324.
72 LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho. 8ª ed. São Paulo: LTr, 2010, página 487.
38
anterior; [...] Revelias forjadas, pelo oferecimento de endereços incorretos ou por outros meios, fazem parte da patologia forense destinada a propiciar acordos vantajosos para o autor. Mas é acertada a declaração de inexistência jurídica da sentença, pelo próprio juiz que a prolatou, porque desprovida de elemento essencial; Barbosa Moreira, sem referir-se precisamente a essa hipótese, assim induz, quando analisa, no cível, os embargos de devedor, “fazendo cair a sentença com o processo” na primeira instância (Comentários ao CPC, Forense, v. 5). A provocação do réu e o contraditório são necessários.73
Na atual prática forense há advogados que utilizam meios antiéticos e imorais
para beneficiar seus clientes, como revelias forjadas, exposta pelo doutrinador
acima, o que é repudiável, sendo tais atitudes contrárias à atividade da Justiça.
Retomando os ensinamentos da Desembargadora Olga Aida Joaquim
Gomieri, a qual expõe e exemplifica situações vividas por ela no exercício de sua
função:
[...] o simples endereçamento pelo Correio, da notificação inicial, pode gerar para as empresas ou firmas individuais um risco muito grande de incidirem na terrível revelia, caso não compareçam à audiência inicial para a qual foram convocados pelo órgão judiciário.E, estranhamente, o que se constata é que, regra geral, na fase de execução, aquelas reclamadas que não foram localizadas, [...] invariavelmente são facilmente encontradas pelos oficiais de justiça, com base em novos endereços fornecidos pelo exequente e totalmente diversos daqueles informados pelo mesmo, em sua preambular.[...] ônus inúteis: para a administração do Judiciário trabalhista, que verificará, lá, mais na frente, na fase recursal (RO ou AI), ou na fase de execução, ou da ação rescisória, que a citação na verdade não se deu ou foi nula, tendo de cancelar todos os atos processuais desde seu início: como os consequentes prejuízos econômicos e financeiros, que necessária repetição de todos os atos processuais lhe trará, pois destruirá toda aquela inicial celeridade. Por outro lado, o custo do processo trabalhista também ficará mais alto não só para a administração da Justiça, mas especialmente para o reclamado que, desesperado, verá pender contra si uma sentença condenatória, geralmente de valores vultuosos, para o resultado da qual não concorreu, tendo restado totalmente indefeso. E, especialmente, se incorre no descrédito da Justiça. Enfim, todos perdem, quando isso acontece.74
73 CARRION, Valentin. Comentários à consolidação das leis do trabalho. 32ª ed. São Paulo, 2007, página 613 e 614, grifo meu.
74 Relação capital e trabalho – complexidade – desafio do judiciário em estabelecer o equilíbrio entre a proteção ao empregado x a preservação da empresa e do emprego, Revista LTR, v. 75, n. 07, Julho de 2011.
39
Compreende-se que o trabalhador não pode ser vítima da demora na
prestação judicial. Em contrapartida, temos situações em que a informalidade na
comunicação dos atos na Justiça do Trabalho gera prejuízo à parte contrária, a
empresa. O magistrado é responsável por diminuir a desigualdade existente entre as
partes, porém com cautela para não causar danos nesta tentativa.
Quanto ao prejuízo à celeridade, acarretado pela repetição de todos os atos
processuais considerados nulos, segue um recente julgado que exemplifica de forma
simples a situação acima exposta:
NULIDADE PROCESSUAL. POSTAGEM PARA ENDEREÇO ANTIGO. CITAÇÃO INEXISTENTE. A relação jurídica processual somente se forma com a existência de citação inicial regular e válida, tendo em vista a obrigatoriedade de se assegurar ao reclamado o exercício do direito de ampla defesa constitucionalmente garantido. Considerando-se que, no caso, a notificação-citatória foi encaminhada a endereço antigo e que não foram produzidas provas de que a pessoa que teria recebido a citação teria qualquer vinculação com a recorrente, tem-se que a mesma não foi validamente citada. Por conseqüência, impõe-se a declaração de nulidade do processado a partir da citação inicial. Recurso provido.75
A busca pela celeridade pode, além de ofender o devido processo legal,
tornar-se ilusória. Ao constatar vício na notificação inicial todo o processo recomeça,
ficando todos os envolvidos prejudicados: o reclamado como vítima de injustiça, o
trabalhador enfrenta a morosidade para recebimento das verbas trabalhistas e a
imagem da Justiça sofre depreciação.
Embora o excesso de tempo na prestação jurisdicional pode causar injustiça,
não se admite ofensa aos princípios supremos da democracia e do devido processo
legal em troca de velocidade ao procedimento benéfica a uma das partes. O julgador
deve buscar equilíbrio e harmonia para preservar todos direitos constitucionais,
assim como as garantias processuais decorrentes, sem considerar hierarquia entre
elas.
75 TRT 15ª R. 5ª Câmara. 3ª Turma. Proc. 0121700-62.2009.5.15.0008, Rel. Juiz Lorival Ferreira Dos Santos, em 18/01/11.
40
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho dedicou-se ao estudo do instituto da notificação inicial
trabalhista. É necessário refletir sobre normas, princípios, posicionamentos
doutrinários e jurisprudências pertinentes, além de comparar com a citação do
processo comum.
Levar efetivamente a conhecimento do empregador o pedido contra ele
postulado é o mínimo exigido para que exista oportunidade de defesa no processo.
Os princípios que norteiam a Justiça do Trabalho tornam este instituto mais flexível,
existindo a possibilidade de sua realização não pessoal e com a simples entrega no
endereço fornecido pelo autor.
A grande dificuldade encontrada é o fato de haver predominância de
informalidade na seara trabalhista e até mesmo na realização da notificação inicial, a
qual, dada sua imprescindibilidade, é vital para a ação e caso exista vício na sua
comunicação, todo o processo será anulado e o dissídio voltará ao início.
Como consequência surge uma ilusória celeridade em alguns casos
concretos. Após a decretação da revelia e realização da citação por edital, ao
ingressar na fase de execução o executado é localizado pelo Oficial de Justiça, que
o comunica pessoalmente através de diligências ou novo endereço fornecido pela
parte autora. Isto gera o ônus ao empregador de provar seu desconhecimento
quanto à demanda e requerer a nulidade da notificação inicial, juntamente com
invalidação da ação e de todos os atos realizados.
Tendo em vista a ampla liberdade para direção do processo que a
Consolidação das Leis Trabalhistas outorga aos juízes e tribunais, estes podem
determinar diligências no intuito de certificar o real motivo da ausência do
empregador na audiência. Dentre elas, pode o magistrado deliberar uma segunda
citação, a ser realizada por Oficial de Justiça, o qual certificará e colherá
informações, sendo certamente mais eficaz e instrutivo que a simples entrega postal.
Neste diapasão, o magistrado deve agir com cautela ao proteger o
trabalhador. Justamente por haver uma ação judicial trabalhista subentende-se que
não houve conciliação harmônica entre as partes. Ao contrário, há divergência entre
41
elas, resultando em motivação para uma conduta desleal, com má-fé e abuso de
privilégios processuais.
42
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BARROS, Alice Monteiro de. Curso de direito do trabalho. 6ª ed. São Paulo: Ltr, 2010.
CARRION, Valentin. Comentários à consolidação das leis do trabalho. 32ª ed. São Paulo, 2007.
CASTRO, Carlos Alberto Farracha de. Preservação da empresa no código civil. Curitiba: Juruá, 2007.
DELGADO, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 3ª ed. São Paulo: Ltr, 2004.
DINAMARCO, Cândido Rangel. A instrumentalidade do processo, 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1990.
DINIZ, Maria Helena. Compêndio de Introdução à Ciência do Direito. 20ª ed. ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2009.
GOMIERI, Olda Aida Joaquim. Relação capital e trabalho – complexidade – Desafio do Judiciário em estabelecer o equilíbrio entre a proteção ao empregado x a preservação da empresa e do emprego. Revistas LTr, São Paulo, v. 75, n. 07, jul. 2011.
GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Novo curso de direito processual civil, volume 1: teoria geral e processo de conhecimento. 6ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009.
GRINOVER, Ada Pellegrini; DINAMARCO, Cândido R., CINTRA, Antônio Carlos de Araújo. Teoria Geral do Processo. 25ª edição. São Paulo: Malheiros. 2009.
LEITE, Carlos Henrique Bezerra. Curso de Direito Processual do Trabalho. 8ª ed. São Paulo: LTr, 2010.
LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 16ª ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Saraiva, 2012.
MARINONI, Luiz Guilherme; MITIDIERO, Daniel. Código de Processo Civil Comentado artigo por artigo. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.
MARINONI, Luiz Guilherme. Teoria Geral do Processo. 3ª ed. revista e atualizada. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008.
MARTINS, Fran. Curso de Direito Comercial. 30. ed. rev., atual. e amp. Rio de Janeiro: Forense, 2006.
43
MARTINS, Sérgio Pinto. Direito Processual do Trabalho: Doutrina e prática forense. 29ª ed. São Paulo: Atlas, 2009.
MEDINA, José Miguel Garcia. Código de Processo Civil Comentado – com remissões e notas comparativas ao projeto do novo CPC. 2ª tiragem. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2011.
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 18ª ed. São Paulo: Atlas, 2005.
NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Curso de Direito Processual do Trabalho. 24ª ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
NUNES, Dierle José Coelho. Direito Constitucional ao Recurso. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2006.
PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora Impetus, 2008.
REALE, Miguel. Licões Preliminares de Direito. 27ª edição. São Paulo: Saraiva, 2009.
SAAD, Eduardo Gabriel. Curso de direito processual do trabalho. 5ª ed. rev., atual. e ampl. por José Eduardo D. Saad e Ana Maria Saad Castello Branco. São Paulo: LTr, 2007.
SARAIVA, Renato. Curso de Direito Processual do Trabalho. 6ª ed. São Paulo: Método, 2009.
SILVA, Ovídio Araújo Baptista da. Curso de processo civil. vol. 1. 6ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002.
THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil: Teoria geral do direito processual civil e processo de conhecimento. 50ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009.
WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Curso Avançado de Processo Civil, vol. 1, 10ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.