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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
A PENHORA DA PARTICIPAÇÃO SOCIETÁRIA DO
SÓCIO POR SUAS DÍVIDAS PARTICULARES
Por: Bianca Matta Obadia
Orientadora
Profª. Flávia Martins
Rio de Janeiro
2013
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
A PENHORA DA PARTICIPAÇÃO SOCIETÁRIA DO
SÓCIO POR SUAS DÍVIDAS PARTICULARES
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada como requisito parcial para obtenção do
grau de especialista em Direito Empresarial.
Por: Bianca Matta Obadia
5
RESUMO
Nosso objetivo é discorrer sobre as regras e a repercussão de ordem
teórica e prática que provocam no universo das sociedades limitadas, quanto à
possibilidade da penhora da participação societária do sócio por suas dívidas
particulares.
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METODOLOGIA
Os métodos utilizados para elaboração desta monografia foram leitura
de livros, legislação, pesquisa bibliográfica, pesquisa jurisprudencial e de
pareceres no âmbito da Procuradoria Regional da Junta Comercial do Estado
do Rio de Janeiro - JUCERJA.
Cada capítulo foi elaborado após o estudo dos aspectos importantes
para a formação do raciocínio jurídico para a solução ao problema proposto.
Importante citar a Procuradoria Regional da Junta Comercial do Estado
do Rio de Janeiro que cedeu grande parte do material, objeto de observação e
estudo, consoante os pronunciamentos proferidos por Procuradores do Estado
do Rio de Janeiro lotados na JUCERJA e transcritos ao longo desta
monografia.
7
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I - A pessoa jurídica para o ordenamento brasileiro 10
CAPÍTULO II - As principais características da sociedade empresária limitada 31
CAPÍTULO III – A penhora das cotas de sociedade empresária limitada 53
CONCLUSÃO 78
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 81
ANEXO 83
8
INTRODUÇÃO
O novo Código Civil estabelece algumas regras acerca do instituto
jurídico da sociedade limitada.
Destaca-se a previsão de fonte supletiva das regras atinentes à
sociedade limitada pelas normas da sociedade simples, facultando-se aos
sócios, contudo, instituírem, no contrato social, a regência, nas omissões, pelas
normas da sociedade anônima.
No que se refere especificamente à penhora de cotas da sociedade por
dívida particular de sócio, o Código Civil de 2002 trouxe o art. 1.026, caput e
parágrafo único, recurso de grande ambiguidade redacional e de complexidade
operacional, o que denota a insuficiência do dispositivo para garantir uma
definição da situação.
Nessa monografia, nosso escopo é discorrer sobre as regras do
Código Civil de 2002, as correntes doutrinárias e a jurisprudência relativas à
penhorabilidade de cotas, diante da repercussão de ordem teórica e prática
que provocaram no universo das sociedades limitadas.
No primeiro capítulo, cuidamos dos conceitos de pessoas, como
sujeitos da relação jurídica, distinguido as espécies: pessoa física (ou pessoa
natural, como dispõe o Código Civil de 2002) e pessoa jurídica (ou pessoa
moral, como prefere o direito francês).
No segundo capítulo, tratamos das principais características da
sociedade limitada, especialmente sobre sua origem e evolução e as suas
classificações pertinentes à solução do tema.
No terceiro, fazemos uma breve explanação sobre as quotas sociais e
a forma de cessão entre os sócios da sociedade limitada e terceiros, para
10
CAPÍTULO I
A PESSOA JURÍDICA PARA O ORDENAMENTO
BRASILEIRO
Podemos elencar inúmeras definições para pessoa jurídica. Uma delas,
de Carlos Ari Sundfeld1, é a seguinte: “pessoa jurídica é espécie do gênero
pessoa”. Outra, mais diretamente relacionada com a finalidade da pessoa
jurídica, conforme o civilista Carlos Roberto Gonçalves2 expõe:
“Consiste num conjunto de pessoas ou de bens, dotado
de personalidade jurídica própria e constituído na forma
da lei, para a consecução de fins comuns.” (...)
Para compreender o que seja uma pessoa jurídica, precisamos
primeiramente desvendar o conceito de pessoa para o Direito.
1.1 – As pessoas como sujeitos da relação jurídica
As pessoas, perante o Direito, são entes privativos do mundo jurídico,
sendo seres que residem nesta ordem jurídica, com sua existência circunscrita
à dimensão do Direito. Assim, segundo o ilustre autor Celso Antônio Bandeira
de Mello3:
“As personalidades ditas jurídicas ou morais, se se quiser,
são ‘ficções’, mas apenas no sentido de que
correspondem a uma construção do Direito e que, por
1 SundFeld, Carlos Ari. Fundamentos de Direito Público, 4ª. Ed. rev., atual e ampl. São Paulo:Malheiros Editores, 2009, pág. 59. 2 Gonçalves, Carlos Roberto. Direito Civil brasileiro, volume I: parte geral, 6ª Ed. Ver. E atual, São Paulo:Saraiva, 2008, pág. 182. 3 Bandeira de Mello, Celso Antônio. Natureza e Regime jurídico das Autarquias, São Paulo:Ed.RT, 1968, pág. 240/241.
11
conseguinte, só existem nesta dimensão. Entretanto,
cumpre notar que em face do Direito idêntica é a situação
das pessoas físicas cuja existência se resume em
qualificação procedida pelo Direito ao erigir ‘titularidades’,
‘sujeitos de direitos e obrigações.’”
Dessa forma, podemos concluir que, tanto a pessoa física como a
jurídica são pessoas porque o Ordenamento jurídico lhes confere
personalidade jurídica, fazendo delas centro de direitos e deveres.
1.1.1 – O mundo do ser e do dever-ser
O Direito não descreve a realidade (não diz como ela é): quer interferir
nela, dispondo como deve ser. Essas noções simples permitem visualizar a
existência de dois mundos diferentes: o mundo do ser (da natureza) e o mundo
do dever-ser (das normas jurídicas). O estudo do Direito se ocupa do mundo do
dever-ser, não do mundo do ser.
É o que ensina Hans Kelsen, o mais importante jurista deste século4:
“Ser pessoa ou ter personalidade jurídica é o mesmo que ter deveres jurídicos
e direitos subjetivos. A pessoa, como suporte de deveres jurídicos e direitos
subjetivos, não é algo diferente dos deveres jurídicos e direitos subjetivos dos
quais ela se apresenta como portadora – da mesma forma que uma árvore da
qual dizemos, numa linguagem substantivista, expressão de um pensamento
substancializador, que tem um tronco, braços, ramos, folhas e flores não é uma
substância diferente deste tronco, destes braços, ramos, folhas e flores mas
apenas o todo, a unidade destes elementos. A pessoa física ou jurídica que
tem – como sua portadora – deveres jurídicos e direitos subjetivos é estes
deveres e direitos subjetivos cuja unidade é figurativamente expressa no
conceito de pessoa. A pessoa é tão somente a personificação desta unidade
(Teoria Pura do Direito, pp. 242 e 243). ”
4 In: SundFeld, Carlos Ari. Fundamentos de Direito Público, cit., pág. 61.
12
Assim, pessoa, no sentido jurídico, é um centro, uma unidade, um
conjunto de direito e deveres, que confere personalidade jurídica, produzida
pelas normas jurídicas, a certo ente.
Pode-se verificar, de acordo com as lições de Carlos Ari Sundfeld, que
pessoa, para o ordenamento jurídico, é um conjunto de direitos e deveres.
Liga-se à pessoa a ideia de personalidade, que exprime a aptidão genérica
para adquirir direitos e contrair deveres.
1.1.2 – A pessoa natural e a pessoa jurídica
Agora que já temos uma visão sobre o conceito de pessoa, podemos
fazer referência a duas espécies: a pessoa física (ou pessoa natural, como
dispõe o Código Civil de 2002) e a pessoa jurídica (ou pessoa moral, como
prefere o direito francês).
É fácil distinguir uma e outra. Sendo a pessoa natural (ser humano)
sujeito das relações jurídicas e a personalidade a possibilidade de ser sujeito,
vale dizer, uma aptidão a ele reconhecida, toda pessoa é dotada de
personalidade. A personalidade é o conceito básico da ordem jurídica, que a
estende a todos os homens, consagrando-a na legislação civil e nos direitos
constitucionais de vida, liberdade e igualdade.
Não é demais lembrar que nem sempre foi assim. No direito romano, o
escravo era tratado como coisa, desprovido da faculdade de ser titular de
direitos e ocupava, na relação jurídica, a situação de objeto, e não de sujeito.
Segundo o jurista Carlos Roberto Gonçalves5, o reconhecimento atual
dessa qualidade a todo o ser humano representa, pois, uma conquista da
civilização jurídica. O Código Civil de 2002 reconhece os atributos da
personalidade com esse sentido de universalidade ao proclamar, em seu art.
1º, que toda pessoa é capaz de direitos e deveres.
5Ob. Cit. Pág. 71
13
O direito reconhece personalidade também a certas entidades morais,
denominadas pessoas jurídicas, compostas de pessoas físicas ou naturais, que
se agrupam, com observância dos requisitos legais, e se associam para melhor
atingir os seus objetivos econômicos ou sociais.
A razão de ser da pessoa jurídica está na necessidade ou conveniência
de os indivíduos unirem esforços e utilizarem recursos coletivos para a
realização de objetivos comuns, que transcendem as possibilidades individuais.
As associações, as sociedades, as fundações, as organizações
religiosas, os partidos políticos e etc., são exemplos de pessoas jurídicas, pois
o Direito brasileiro outorga a elas personalidade jurídica, ou seja, cria centro de
direitos e deveres.
Assim, a essencial individualização só se efetiva se a ordem jurídica
atribuir personalidade ao grupo, permitindo que atue em nome próprio, com
capacidade jurídica igual à das pessoas naturais. É necessário personalizar o
grupo, para que possa proceder como uma unidade, participando do comércio
jurídico com individualidade.
Conforme leciona Carlos Roberto Gonçalves6:
“O direito não podia ignorar essas unidades coletivas,
criadas pela evolução histórica ou pela vontade dos
homens, e passou então a discipliná-la, para que possam
participar da vida jurídica como sujeitos de direitos, a
exemplo das pessoas naturais, dotando-as, para esse fim,
de personalidade própria.”
Na mesma linha conceitua Maria Helena Diniz7:
6Ob. Cit. Pág. 181 7 Diniz, Maria Helena. Código Civil Anotado. 13ª. Ed. rev. aum. e atual. São Paulo:Saraiva, 2008, pág. 81.
14
”A pessoa jurídica é a unidade de pessoas naturais ou de
patrimônios que visa à obtenção de certas finalidades,
reconhecida pela ordem jurídica como sujeito de direitos e
obrigações.”
O Superior Tribunal de Justiça também já se manifestou sobre o tema,
em sede de Recurso Especial nº 1.189.273-SC, julgado em 1º/3/2011, tendo
sido Relator o Ministro Luis Felipe Salomão8, do qual se extrai o que é
pertinente:
“Trata-se de REsp em que se discute a legitimidade dos
centros acadêmicos universitários, no caso, centro
acadêmico de Direito, para propor ação civil pública (ACP)
em defesa de interesse dos estudantes do respectivo
curso. Inicialmente, ressaltou o Min. Relator que os
centros acadêmicos universitários se inserem na
categoria de associação civil, pessoa jurídica criada a
partir da união de pessoas cujos objetivos comuns de
natureza não econômica convergem. Assim, entendeu
que o centro acadêmico de Direito, ora recorrente, na
condição de associação civil, possui legitimidade para
ajuizar ACP na defesa dos interesses dos estudantes do
respectivo curso.” (...)
(Grifos apostos)
A pessoa jurídica consiste, portanto, em um conjunto de pessoas ou de
bens, dotada de personalidade própria, e constituída na forma da lei, para a
consecução de fins comuns. A sua principal característica é a de que atuam na
vida jurídica com personalidade diversa da dos indivíduos que as compõem.
8 http://www.stj.jus.br/SCON/infojur/toc.jsp?livre=natureza+pessoa+jur%EDdica+&b=INFJ&thesaurus=JURIDICO
15
1.2 – A natureza das pessoas jurídicas
No que concerne a natureza jurídica, podemos citar que, embora
subsistam teorias que negam a existência da pessoa jurídica (teorias
negativistas), não aceitando a possibilidade de uma associação formada por
um grupo de indivíduos possa ter personalidade própria, há, outras, em maior
número (teorias afirmativas), que procuram explicar o fenômeno pelo qual um
grupo de pessoas passa a constituir uma unidade orgânica, com
individualidade própria reconhecida pelo Estado e distinta das pessoas que a
compõem.
As várias teorias afirmativistas existentes podem ser reunidas em dois
grupos: o das teorias da ficção e o das teorias da realidade.
1.2.1 – Teorias da ficção
As concepções ficcionistas prevaleceram durante o século XIX e
podem ser divididas em dois segmentos: teoria da ficção legal e teoria da
ficção doutrinária.
Para a primeira, desenvolvida por Savigny, a pessoa jurídica consiste
em uma criação artificial da lei, um ente fictício, pois somente a pessoa física
pode ser sujeito da relação jurídica e titular de direitos subjetivos.
A pessoa jurídica, concebida dessa forma, não passa de simples
conceito, destinado a justificar a atribuição de certos direitos a um grupo de
pessoa físicas, construindo uma ficção jurídica, uma abstração que, diversa da
realidade, assim é considerada pelo ordenamento jurídico.
A teoria da ficção doutrinária é uma variação da anterior. Afirmam seus
seguidores, dentre eles Vareilles-Sommières, que a pessoa jurídica não tem
existência real, mas apenas intelectual, vale dizer, na inteligência dos juristas,
sendo assim uma mera ficção criada pela doutrina.
16
A crítica que se faz a essa corrente é a de que não explica a existência
do Estado como pessoa jurídica. Dizer que o Estado é uma ficção legal ou
doutrinária é o mesmo que dizer que o Direito, que dele emana, também o é.
Tudo quanto se encontre na esfera jurídica seria, portanto, uma ficção inclusive
a própria teoria da pessoa jurídica. Por tais razões, as teorias da ficção não são
aceitas atualmente.
1.2.2 – Teorias da realidade
Para os adeptos da teoria da realidade, que representa uma reação
contra a teoria da ficção, as pessoas jurídicas são realidades vivas e não mera
abstração, tendo existência própria como os indivíduos.
Sobre o assunto, o doutrinador José Edwaldo Tavares Borba9, em sua
obra, Direito Societário, expõe que:
“Há os que vêem na pessoa jurídica uma mera ficção,
enquanto outros a consideram um fenômeno real.
A posição realista é hoje dominante, uma vez que a
existência da sociedade como ente jurídico distinto dos
sócios e com vontade própria, às vezes diversa daqueles
isoladamente, afigura-se inquestionável.”
Discordam os seus seguidores somente no modo de avaliar essa
realidade, dando origem a várias concepções, dentre as quais vale ressaltar as
seguintes:
(I) Teoria da realidade objetiva ou orgânica – Alega que a pessoa
jurídica é uma realidade sociológica, ser com vida própria, que nasce por
imposição das forças sociais. Tem origem germânica e sustenta que a vontade,
pública ou privada, é capaz de dar vida a um organismo, que passa a ter
9 Borba, José Edwaldo Tavares, Direito Societário, 13ª ed. Ver., aum. E atual – Rio de Janeiro: Renovar 2012, pág. 32.
17
existência própria, distinta da de seus membros, capaz de tornar-se sujeito de
direito, real e verdadeiro.
De acordo com Carlos Roberto Gonçalves10, a crítica que se lhe faz é
que ela não esclarece como os grupos sociais, que não tem vida própria e
personalidade, que é característica do ser humano, podem adquiri-la e se
tronarem sujeitos de direito e obrigações. Além disso, limita o papel do Estado
a mero conhecedor de realidades já existentes, desprovido de maior poder
criador.
(II) Teoria da realidade jurídica ou institucionalista – Assemelha-se à
teoria anterior, pois também confere ênfase ao aspecto sociológico,
considerando as pessoas jurídicas como organizações sociais destinadas a um
serviço ou ofício, e por isso personificadas. Assim, analisa as relações sociais,
não a vontade humana.
Parece ser o entendimento de Maria Helena Diniz que, ao comentar o
artigo 40, do Código Civil de 2002, em sua obra Código Civil Anotado, cita:
“Natureza jurídica da pessoa jurídica. Pela Teoria da
realidade das instituições jurídicas da Hauriou, a pessoa
jurídica é uma instituição jurídica. A personalidade jurídica
é um atributo que a ordem jurídica estatal outorga a entes
que o merecem.”
Já Carlos Roberto Gonçalves entende que essa teoria merece a
mesma crítica feita à teoria objetiva, pois nada esclarece sobre as sociedades
que se organizam sem a finalidade de prestar um serviço ou de preencher um
ofício, como ocorre com as fundações, cuja constituição decorre da vontade do
instituidor.
10 Ob. Cit. Pág. 185
18
(III) Teoria da realidade técnica – Entendem seus adeptos,
notadamente Saleilles e Colin e Capitant, que a personificação dos grupos
sociais é expediente de ordem técnica, a forma encontrada pelo Direito para
reconhecer a existência de grupos de indivíduos, que se agrupam na busca de
fins determinados.
Assim, a personificação é atribuída a grupos em que a lei reconhece a
vontade e objetivos próprios. O Estado, reconhecendo a necessidade e a
conveniência de que tais grupos sejam dotados de personalidade própria, para
poder participar da vida jurídica nas mesmas condições das pessoas naturais,
outorga-lhes essa qualidade.
A personalidade jurídica é, portanto, um atributo que o Estado defere
certas entidades havidas como merecedoras dessa benesse. O Estado, porém,
não outorga esse benefício de maneira arbitrária, mas sim levando em conta
determinada situação, que já encontra devidamente concretizada, e desde que
se observem determinados requisitos por ele estabelecidos.
Embora a crítica que se lhe faz, de ser positivista, e assim,
desvinculada de pressupostos materiais, para Carlos Roberto Gonçalves11, é a
teoria que melhor explica o fenômeno pelo qual um grupo de pessoas, com
objetivos comuns, pode ter personalidade própria, que não se confunde com a
de cada um de seus membros. Alega ainda o referido civilista que é a Teoria
adotada pelo Direito brasileiro, indicando os artigos 45; 51; 54, VI; 61; 69 e
1.033 todos do Código Civil de 2002.
1.3 – As classificações das pessoas jurídicas
As pessoas jurídicas podem ser classificadas quanto à nacionalidade, à
sua estrutura interna e à função (ou âmbito de sua atuação).
11 Ob. Cit. Pág. 186.
19
A) Quanto à nacionalidade, dividem-se em nacional e estrangeira. É
nacional a sociedade organizada de conformidade com a lei brasileira e que
tenha no País a sede de sua administração (art. 1.126, do CC/02; arts. 176, §
1º, e 222 da Constituição Federal). A sociedade estrangeira, qualquer que seja
seu objeto, não pode, sem autorização do Poder Executivo, funcionar no País,
ainda que por estabelecimentos subordinados, podendo, todavia, ressalvados
os casos expressos em lei, ser acionista de sociedade anônima brasileira (art.
1.134, do CC/02).
B) Quanto à estrutura interna, a pessoa jurídica pode ser: corporação
(universitas personarum) e fundação (universitas bonorum). A corporação
caracteriza-se pelo seu aspecto eminentemente pessoal e consiste em um
conjunto de pessoas, reunidas para melhor consecução de seus objetivos. Na
fundação o aspecto dominante é o material: compõe-se de um patrimônio
personalizado, destinado a um determinado fim.
O que distingue uma e outra é que as corporações visam à realização
de fins internos, estabelecidos pelos sócios. Os seus objetivos são voltados
para o interesse e o bem-estar de seus membros, objetivando atingir, pois, fins
internos e comuns. As fundações, ao revés, têm objetivos externos (p. ex.
interesse público, cultural, etc.), estabelecido pelo instituidor. Nas corporações
também existe patrimônio, mas é elemento secundário, apenas para a
realização de um fim. Nas fundações, o patrimônio é elemento fundamental.
As fundações constituem um acervo de bens, que recebe
personalidade jurídica para a realização de fins determinados e compõem-se
de dois elementos: o patrimônio e o fim estabelecido pelo instituidor e não
lucrativo.
Já as corporações dividem-se em associações e sociedades. Estas
podem ser simples e empresárias, antigamente denominadas civis e
comerciais. Como no sistema do atual Código Civil todas as sociedades são
civis, optou o legislador pela nova designação supramencionada (art. 982, do
CC/02).
20
As sociedades simples têm fim econômico e visam lucro, que deve ser
distribuído entre os sócios. São constituídas, em geral, por profissionais de
uma mesma área (escritórios de advocacia, de engenharia, etc.) ou por
prestadores de serviços técnicos. As sociedades empresárias também visam
lucro. Distinguem–se das sociedades simples porque têm por objeto o exercício
de atividade própria de empresário sujeito ao registro previsto no artigo 967, do
Código Civil.
As associações não têm fins lucrativos, mas religiosos, morais,
culturais, assistenciais, desportivos ou recreativos.
C) Quanto à função ou órbita de sua atuação, o artigo 40 do CC/02,
que inaugura o capítulo I, referente às disposições gerais das pessoas
jurídicas, assim classifica:
“As pessoas jurídicas são de direito público, interno ou
externo, e de direito privado.”
Dessa forma, quanto às funções e âmbito de atuação, as pessoas
jurídicas são de direito público e de direito privado, sendo que as pessoas
jurídicas de direito público podem ser:
• de direito público externo (art. 42), regulamentadas pelo direito
internacional público, abrangendo: nações estrangeiras, uniões
aduaneiras (União Européia, MERCOSUL etc.), Santa Sé e
organismos internacionais (ONU, OEA, UNESCO, FAO etc.);
• de direito público interno de administração direta (art. 41, I a III):
União, Estados-Membros, Distrito Federal, Territórios e
Municípios legalmente constituídos; e
• de direito público interno de administração indireta (art. 41, IV a
V): órgãos descentralizados, criados por lei, com personalidade
jurídica própria para o exercício de atividades de interesse
público, como as autarquias, dentre elas podemos citar a titulo
21
de exemplo: INSS, INCRA, SUFRAMA (Superintendência da
Zona Franca de Manaus), CADE, etc.; as associações públicas;
as fundações públicas, dentre elas: FUNASA (Fundação
Nacional da Saúde); as agências executivas ou reguladoras,
dentre elas: (ANP, ANATEL, ANCINE, etc.).
As pessoas jurídicas de direito privado, instituídas por iniciativa de
particulares, conforme o art. 44, I a V, do CC/02, dividem-se em: associações,
inclusive as organizações religiosas, sociedades simples e empresárias,
fundações particulares e ainda partidos políticos.
1.4 – As pessoas jurídicas de direito privado
1.4.1 - O Código Civil de 2002
O Código Civil de 2002 disciplina as relações jurídicas privadas que
nascem da vida em sociedade e se formam entre pessoas. São as relações
sociais, de pessoa a pessoa, física ou jurídica, que produzem efeitos no âmbito
do Direito.
A Parte Geral contém três livros. O primeiro sobre as pessoas naturais
e jurídicas, como sujeitos da relação jurídica; o segundo, relativo aos bens,
como objeto do direito, em torno dos quais se formam as diversas relações
jurídicas; e o terceiro, a respeito dos fatos jurídicos, que estimulam o
relacionamento humano e permitem criar, modificar ou extinguir direitos.
O Livro I, da Parte Geral concernente às pessoas, cuida, em três
títulos, das pessoas naturais, das pessoas jurídicas e do domicílio. O título das
pessoas jurídicas se subdivide em três capítulos respectivamente sobre as
disposições gerais, as associações, e as fundações.
1.4.2 – Requisitos para constituição da pessoa jurídica de direito
privado
22
O fato que dá origem à pessoa jurídica de direito privado é
notadamente a vontade humana de suprir as necessidades e os interesses
sociais ou econômicos dos indivíduos que não podem ser atendidos sem a
participação e cooperação de outras pessoas, em razão das limitações
individuais.
Assim, o direito pátrio reconhece personalidade às entidades jurídicas,
compostas de pessoas físicas ou naturais, que se agrupam, e se associam
para melhor atingir os seus objetivos, porém a sua personalidade jurídica
permanece em estado potencial, adquirindo status jurídico quando preencher
as formalidades ou exigências legais.
Segundo Carlos Roberto Gonçalves12 a formação da pessoa jurídica
exige:
“uma pluralidade de pessoas ou de bens e uma finalidade
específica (elementos de ordem material), bem como um
ato constitutivo e respectivo registro no órgão competente
(elemento formal). Pode-se dizer que são quatro os
requisitos para a constituição da pessoa jurídica: a)
vontade humana criadora (intenção de criar uma entidade
distinta da de seus membros); b) elaboração do ato
constitutivo (estatuto social ou contrato social); c) registro
do ato constitutivo no órgão competente; e d) liceidade de
seu objetivo.”
Além disso, o civilista, esclarecendo cada requisito, afirma, em síntese,
que a vontade humana materializa-se no ato de constituição, sendo
necessárias duas ou mais pessoas com vontades convergentes, ligadas por
uma intenção comum (affectio societatis).
12 Ob. Cit. Pág. 186.
23
Sobre o tema, vale ressaltar que, a Lei nº 12.441, de 11 de julho de
2011, que trata sobre a constituição da empresa individual de responsabilidade
limitada, alterou o Código Civil de 2002, e incluiu no rol de pessoas jurídicas de
direito privado a referida sociedade, que será constituída por uma única pessoa
titular da totalidade do capital social.
O ato constitutivo é requisito formal exigido pela lei e se denomina
estatuto, em se tratando de associações, que não têm fins lucrativos; contrato
social, no caso de sociedades simples e empresárias; e escritura pública ou
testamento, em se tratando de fundações.
O ato constitutivo deve ser levado a registro para que comece, então, a
existência legal da pessoa jurídica de direito privado. Antes do registro, não
passará de mera “sociedade de fato” ou “sociedade não personificada”.
O Código Civil de 2002, em seu artigo 45, estabelece que a existência
legal das pessoas jurídicas de direito privado começa com a inscrição do seu
ato constitutivo no respectivo registro local. Este o seu teor:
“Art. 45. Começa a existência legal das pessoas jurídicas
de direito privado com a inscrição do ato constitutivo no
respectivo registro, precedida, quando necessário, de
autorização ou aprovação do Poder Executivo,
averbando-se no registro todas as alterações por que
passar o ato constitutivo.
Parágrafo único. Decai em três anos o direito de anular a
constituição das pessoas jurídicas de direito privado, por
defeito do ato respectivo, contado o prazo da publicação
de sua inscrição no registro.”
A liceidade de seu objetivo é indispensável para a formação da pessoa
jurídica. Deve ser ele, também, determinado e possível.
24
Nas sociedades, simples e empresárias, o objetivo é o lucro pelo
exercício da atividade. Nas fundações os fins só podem ser religiosos, morais,
culturais ou de assistência (art. 62, parágrafo único, do CC/02). E nas
associações, de fins não econômicos (art. 53, do CC/02), os objetivos
colimados são de natureza cultural, educacional, esportiva, religiosa,
filantrópica, recreativa, moral etc.
Não é demais lembrar que a existência das pessoas jurídicas de direito
público decorre, todavia, de outros fatores, com a lei e o ato administrativo,
bem como de fatos históricos, de previsão constitucional e de tratados
internacionais, sendo regidas pelo direito público e não pelo Código Civil.
1.5 – As sociedades
Seguindo a mesma direção adotada pelo legislador e pela doutrina
majoritária, o jurista Sérgio Campinho, assim define o conceito de sociedade13:
“As sociedades são pessoas jurídicas de direito privado.
São também albergadas nesse gênero as associações e
as fundações. (...) O traço característico das fundações
consiste na dotação especial, por ato volitivo do
instituidor, de bens livres, afetados ao fim por ele julgado
relevante (art. 62 do Código Civil). Não se perfaz da
conjugação de esforços pessoais para a consecução de
objetivos comuns, tenham eles ou não conteúdo
econômico. Revela-se na destinação de certos bens do
instituidor que estarão vinculados à realização dos fins por
ele determinados, que ficam circunscritos a atividades
religiosas, morais, culturais ou de assistência.
Já as sociedades e associações exigem concurso de
esforços pessoais de seus componentes para a
13 Campinho, Sérgio. O direito de empresa à luz do novo código civil – 8ª ed. Rev. Atual. de acordo com a Lei Complementar nº 123/2006 e com a Lei Ordinária nº 11.382/2006 – Rio de Janeiro: Renovar, 2007, pág. 33.
25
realização de fins que lhes são comuns. Ocorrerá a
combinação de esforços e/ou recursos de seus
integrantes para lograrem atingir um objetivo comum.
Distinguem as sociedades das associações, a finalidade
econômica que inspira essa comunhão de esforços
pessoais que mantém seus integrantes associados.”
Com efeito, a sociedade não deixa de ser uma modalidade de
associação, na qual pessoas se reúnem com a finalidade de explorar uma
atividade econômica. Mas na técnica jurídica adotada pelo Código Civil, as
expressões “associação” e “sociedade” querem impor definições autônomas de
espécies do gênero pessoa jurídica de direito privado.
A associação vem definida no artigo 53 e a sociedade no artigo 981, do
Código Civil, que assim determina:
“Art. 981. Celebram contrato de sociedade as pessoas
que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou
serviços, para o exercício de atividade econômica e a
partilha, entre si, dos resultados.
Parágrafo único. A atividade pode restringir-se à
realização de um ou mais negócios determinados.”
Nas sociedades, o ponto fundamental da união de seus membros é a
exploração de atividade com finalidade econômica, buscando a obtenção e
divisão dos ganhos havidos nessa exploração. Assim, o que motiva a
aproximação dos seus integrantes, chamados tecnicamente de sócios, é o
objetivo de partilhar lucros.
Em outras palavras, constituem uma sociedade, as pessoas que
mutuamente se obrigam a combinar esforços ou recursos para lograr fins
comuns, repartindo entre si os dividendos.
26
O conceito de sociedade sustentado por Sérgio Campinho assim se
delineia14:
“A par do que acima ficou estabelecido, podemos definir a
sociedade como o resultado da união de duas ou mais
pessoas, naturais ou jurídicas, que voluntariamente, se
obrigam a contribuir, de forma recíproca, com bens ou
serviços, para o exercício proficiente de atividade
econômica e a partilha, entre si, dos resultados auferidos
nessa exploração.”
Corrobora do mesmo entendimento Maria Helena Diniz, que conceitua
sociedade, da seguinte forma15:
“O contrato de sociedade é a convenção por via da qual
duas ou mais pessoas se obrigam a conjugar seus
serviços, esforços, bens ou recursos para a consecução
de fim comum e partilha, conforme o estipulado no
estatuto social, dos resultados entre si, obtidos com o
exercício de atividade econômica contínua, que pode
restringir-se à realização de um ou mais negócios
determinados. A atividade econômica poderá abranger
um ou mais negócios genéricos ou específicos.“
Na mesma linha, Carlos Roberto Gonçalves, entende que16:
“Celebram contrato de sociedade as pessoas que
reciprocamente ser obrigam a contribuir, com bens ou
serviços, para o exercício de atividade econômica e a
partilha, entre si, dos resultados. A atividade pode
14 Ob. Cit. Pág. 36. 15 Ob. Cit. Pág. 664 16 Ob. Cit. Pág. 205
27
restringir-se à realização de um ou mais negócios
determinados. (art. 981 e parágrafo único).”
Face ao exposto, conclui-se que a sociedade é uma entidade dotada
de personalidade jurídica própria, com patrimônio distinto de seus integrantes,
atividade negocial e fim lucrativo.
1.5.1 – Espécies de sociedades: simples e empresária
Em função do seu objeto ou da forma societária adotada, as
sociedades podem ser de duas espécies: empresária ou simples.
A sociedade empresária é aquela que tem por objeto a exploração
habitual de atividade econômica organizada para a produção ou circulação de
bens ou serviços, sempre com o escopo de lucro. Explora, assim, de forma
profissional a empresa, resultado da ordenação do trabalho, capital e, porque
não, tecnologia.
A sociedade simples também explora atividade econômica e seus
integrantes partilham, entre si, os resultados que venham a ser obtidos. Se
assim não o fosse, não seria sociedade. A exploração de atividade econômica
e a partilha de lucros são próprias do conceito de sociedade.
A sociedade simples, segundo o perfil legislativo que lhe foi destinado,
empreende atividades econômicas específicas. O ordenamento jurídico é quem
lhe determina o objeto.
Algumas das antigas sociedades civis com fins econômicos se
enquadram como sociedade simples, por força de reserva expressa do
ordenamento jurídico.
São exemplos de sociedade simples: as cooperativas (art. 982,
parágrafo único, do CC/02), certas sociedades dedicadas à atividade agrícola
ou pastoril (não se enquadrando aqui as indústrias agrícolas, pois a atividade
28
de transformação, própria da indústria, já lhes confere a condição de sociedade
empresária) e as sociedades de advogados (art. 966, parágrafo único, do
CC/02 c/c art. 15, da Lei nº 8.906/94).
As sociedades empresárias abrigam as antigas sociedades comerciais
e inúmeras das antigas sociedades civis de fim econômico. Assim, por
exemplo, são sociedades empresárias as agências de viagens, os hospitais, as
casas de saúde, as administradoras de imóveis e condomínios que no direito
anterior se enquadravam como sociedades civis.
Em síntese, simples serão as sociedades que adotarem forma de
cooperativa ou que exercerem objeto atinente à atividade própria de
empresário rural ou executarem atividades definidas por lei como não
empresariais, como as localizadas no parágrafo único, do artigo 966, do Código
Civil de 2002:
“Art. 966. Considera-se empresário quem exerce
profissionalmente atividade econômica organizada para a
produção ou a circulação de bens ou de serviços.
Parágrafo único. Não se considera empresário quem
exerce profissão intelectual, de natureza científica,
literária ou artística, ainda com o concurso de auxiliares
ou colaboradores, salvo se o exercício da profissão
constituir elemento de empresa.”
1.5.2 – As atividades elencadas no parágrafo único do artigo 966 e o
elemento empresa
O referido artigo 966, do CC/02, pautado no exercício individual da
empresa, define em seu caput a figura do empresário. Entretanto, no seu
parágrafo único, elencou algumas atividades cujo exercício, ainda que com fim
econômico, não qualificaria o seu agente como empresário.
29
Assim, os médicos, advogados, arquitetos, engenheiros, químicos,
farmacêuticos (profissão intelectual de natureza científica) escritores (natureza
literária), músicos, profissionais dedicados ao desenho artísticos ou de modas,
fotógrafos (natureza artística), por exemplo, não são contemplados
empresários.
No âmbito das sociedades, aquelas de caráter uniprofissional também
estariam à margem da qualidade de empresárias, sendo, pois, simples.
Mas tanto o profissional pessoa física, quanto a sociedade que exerce
profissão intelectual, de natureza cientifica, literária ou artística poderão vir a se
qualificar empresários, caso o exercício da profissão venha a constituir
elemento empresa.
Nesse passo, válido transcrever as lições de Sérgio Campinho, que
assim exemplifica:
“Tomemos a hipótese da sociedade de profissionais de
medicina. Se dois médicos constituem uma sociedade e
se limitam, sob o manto da pessoa jurídica a exercer as
suas respectivas especialidades médicas, a sociedade
será simples. O objeto vai se realizar e se limitar ao
exercício da atividade da profissão intelectual de cada
sócio, os quais, desse modo, serão os operadores diretos
dessa atividade, ainda que se valham do concurso de
auxiliares (atendentes e enfermeiras, por exemplo); e, na
maior parte dos casos, a partilha da receita far-se-à tendo
em conta o que cada um efetivamente produziu, ainda
que se destaquem certos valores comuns para as
despesas com manutenção e melhorias.
Diversamente é a situação das casas de saúde e
hospitais onde a execução da profissão intelectual se
apresenta como um dos elementos do exercício de
empresa. Nessas sociedades não há um mero e exclusivo
30
realizar da profissão a qual vai consistir em um dos
elementos da atividade econômica, que será explorada de
forma organizada.
Há o ordenamento da atividade, de forma a melhor
realizar a sua exploração econômica, com o concurso de
elementos materiais e imateriais sendo dispostos e
implementados para a busca de melhor perfeição da
organização.”
O exercício da profissão intelectual será, desse modo, elemento de
empresa, nele não se encerrando a própria atividade. Os serviços profissionais
consistem em instrumento de execução da empresa.
Conclui-se então que os conceitos estão sedimentados: quando o
exercício da profissão intelectual emergir como elemento empresa,
caracterizada está a sociedade empresária. E isto se verifica porque a empresa
constitui uma atividade organizada contendo diversos elementos.
31
CAPÍTULO II
AS PRINCIPAIS CARACTERÍSTICAS DA SOCIEDADE
EMPRESÁRIA LIMITADA
As sociedades empresárias podem revestir-se dos seguintes tipos
societários: a) sociedade em nome coletivo; b) sociedade em comandita
simples; c) sociedade limitada; d) sociedade anônima; e e) sociedade em
comandita por ações.
No que tange às sociedades simples, tem-se para elas reservadas
regras de tipo ou de forma que lhe são particulares (artigos 997 a 1.038, do
CC/02). Entretanto, permitiu o Código, em seu artigo 983, que elas se
constituam segundo um dos tipos reservados às sociedades empresárias,
passando, desse modo, após a opção e efetiva adoção, a ser reguladas pelas
normas próprias da forma adotada, mantendo, todavia, a sua condição própria
de sociedade simples.
Este, inclusive, é o posicionamento consolidado no Tribunal Superior
de Justiça, senão vejamos:
“AgRg no REsp 1202082 / PB
AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL Nº
2010/0135070-2
Relator Ministro HERMAN BENJAMIN
Órgão Julgador: T2 - SEGUNDA TURMA
Data do Julgamento: 28/09/2010
Data da Publicação DJe: 02/02/2011
TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. ISS.
RESPONSABILIDADE LIMITADA DOS
32
SÓCIOS. ART. 9º, § 3º, DO DL 406/1968.
INAPLICABILIDADE.
1. Incontroverso que a contribuinte constituiu-se
como limitada, o que é facultado às sociedades
simples, hipótese em que se subordina às
características próprias do tipo societário adotado,
nos termos do art. 983 do CC.
2. Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada
sócio é restrita ao valor de suas quotas (art. 1.052 do
CC).
3. A tributação fixa do ISS somente é deferida às
sociedades em que há responsabilidade pessoal do sócio,
nos termos do art. 9º, § 3º, do DL 406/1968, o que é
incompatível com o tipo societário das limitadas.
Precedentes do STJ.
4. Agravo Regimental não provido.”
(Grifos apostos)
Conforme a estrutura do Código, as normas particulares da sociedade
simples são aplicáveis subsidiariamente aos tipos societários por ele
contemplados, todavia. Isso quer dizer que tanto a sociedade empresária,
como a simples que adotar tipo societário daquela, serão reguladas pelas
regras especiais pertinentes ao tipo de que se revestem, sendo as normas
próprias da sociedade simples aplicáveis subsidiariamente.
Verifica-se tal situação, inclusive, não só nas sociedades contratuais
reguladas no Código (nome coletivo, limitada e comandita simples), mas
também em relação às sociedades por ações, que serão regidas por leis
especiais aplicando-se-lhes, nos casos omissos, as disposições das
sociedades simples que se apresentam, destarte, como regras gerais em
matéria de direito societário.
2.1 – Classificações das sociedades
33
2.1.1 – Sociedades de responsabilidade limitada, ilimitada e mista
As sociedades, elas próprias, respondem sempre ilimitadamente pelas
obrigações assumidas, envolvendo, notadamente, todo o seu patrimônio nos
negócios que realizam. Para atender a seus débitos, poderão ser levadas a
despender todos os seus bens.
Quando se menciona sociedade de responsabilidade limitada, a alusão
é, na verdade, a sociedade com sócios de responsabilidade limitada.
O núcleo central do conceito reside no modo de responsabilidade do
sócio pelas dívidas adquiridas pela sociedade. Destaca-se, inclusive, que a
definição dos próprios tipos societários, referidos acima, tem arrimo neste
princípio.
Assim, se posiciona José Edwaldo Tavares Borba17:
“O sócio é que responde limitada ou ilimitadamente pelas
obrigações sociais. A sociedade, tal como o empresário
individual, responde sempre ilimitadamente, não lhe
sendo dado excluir qualquer bem do giro de seus
negócios.
Insolvente a sociedade, os sócios que respondem
ilimitadamente pelas obrigações sociais serão chamados
a atender aos credores, Essa responsabilidade é
subsidiária, somente se colocando depois de
caracterizada a insolvência.
As sociedades em que todos os sócios respondem
ilimitadamente são consideradas sociedades de
responsabilidade ilimitada; são elas as sociedades em
nome coletivo e as sociedades irregulares.
17 Ob. Cit. Pág. 69.
34
Nas sociedades de responsabilidade limitada todos os
sócios respondem ilimitadamente, sendo este o caso da
sociedade anônima e da sociedade limitada.
As sociedades de responsabilidade mista apresentam
sócios de diferentes condições, de tal modo que apenas
alguns respondem ilimitadamente. Compõem esse grupo
a sociedade em comandita simples e a sociedade em
comandita por ações.
A sociedade simples coloca-se em situação atípica, tanto
que, segundo o contrato, poderá assumir a condição de
sociedade de responsabilidade limitada ou de sociedade
de responsabilidade ilimitada e, neste último caso, a
responsabilidade poderá ser proporcional ou solidária.”
Portanto, quando se fala em sociedades de responsabilidade limitada,
na realidade, esse aspecto da limitação se refere ao sócio e não à sociedade.
Como pessoa jurídica que é, a sociedade irá sempre assumir, seja qual for o
tipo de que venha a se revestir, de forma ilimitada as suas obrigações.
Dependendo do tipo societário, os sócios irão responder limitada ou
ilimitadamente pelas dividas contraídas pela sociedade no desenvolvimento de
sua atividade.
Com essas considerações, temos que as sociedades de
responsabilidade ilimitada são aquelas nas quais os sócios assumirão em
caráter subsidiário e ilimitado as dívidas sociais, podendo-se afirmar que os
sócios respondem de forma pessoal (patrimônio pessoal).
Por sua vez, sociedades de responsabilidade limitada são aquelas em
que a responsabilidade dos sócios fica restrita às suas contribuições para o
capital (sociedade anônima) ou à própria soma do capital (sociedade limitada).
2.1.2 – Sociedades de pessoa e de capital
35
A doutrina tradicional classifica as sociedades empresárias em (a)
sociedades de pessoas e (b) sociedades de capital, de acordo com o nível de
cooperação e colaboração que cada sociedade tem no seu cerne. Dependo da
sua estruturação econômica, na qual irá se verificar a influência maior ou
menor da condição pessoal do sócio, podem as sociedades ser divididas em
sociedades de pessoa e sociedades de capital.
Nas sociedades de pessoa, segundo Sérgio Campinho18, a figura do
sócio é o elemento fundamental da formação societária. A sociedade se
constitui tendo por referência a qualidade pessoal do sócio. Fica ela, assim,
subordinada à figura do sócio (conhecimento e confiança recíproca,
capacitação para o negocio, etc.). Nas segundas, o ponto de gravidade das
sociedades não reside na qualificação subjetiva do sócio, mas sim na sua
capacidade de investimento. A importância está na contribuição do sócio para a
formação do capital social, sendo relegada a um plano secundário a sua
qualidade pessoal. Para tais sociedades não importa quem é o titular da
condição de sócio, mas sim a contribuição material que ele é capaz de verter
para os fundos sociais.
Portanto, as sociedades de pessoas são aquelas cuja criação e
funcionamento decorrem do intuitus personae, ou seja, os sócios decidem criar
e administrar uma empresa em razão do bom relacionamento e da mútua
confiança.
Por outro lado, as sociedades de capital são aquelas nas quais o
intuitus pecuniae é o elemento característico. Nesse caso, a importância de
ordem pecuniária, que os sócios podem contribuir para o desenvolvimento de
determinado negócio, deverá preponderar sobre qualquer outro aspecto de
ordem pessoal existente.
Segundo essa classificação, o intuitus personae prepondera em
sociedades cujos sócios se escolhem mutuamente quando resolvem se
18 Ob. Cit., pág. 57/58.
36
associar, normalmente, por meio de um contrato. São os sócios que dirigem a
sociedade e os terceiros, ao negociarem com a sociedade, visualizam de fato a
sua figura.
Já o intuitus pecuniae é verificado nas sociedades de capitais,
principalmente naquelas cujo capital é representado por ações, subscritas
livremente, no momento da criação da sociedade e, após isso, transferíveis a
terceiros sem quaisquer restrições. Geralmente, não são todos os sócios que
dirigem a empresa. Os credores, nesse caso, estariam mais preocupados com
os números constantes do balanço patrimonial, do que propriamente com os
sócios que a constituem.
Para o jurista Jorge Lobo19, as sociedades podem ainda ser
classificadas em sociedades de pessoas; sociedades de capitais; e sociedades
mistas ou híbridas, da seguinte forma:
“1.1.4.1. Sociedades de pessoas
São de pessoas ou intuitu personae as sociedades
constituídas, mediante contrato complexo, por duas ou
mais pessoas, em geral com laços de parentesco ou de
amizade, vinculadas por confiança recíproca, em que se
prioriza, para a consecução do objeto social, mais o
talento e o esforço dos sócios, do que a contribuição de
recursos econômicos e/ou financeiros para a formação do
capital.
1.1.4.2. Sociedades de capitais
São de capitais as sociedades em que prevalece o aporte
de recursos dos sócios para a constituição do capital
social e é livre a cessão e transferência das ações.
(...)
1.1.4.3. Sociedades mistas ou híbridas
19 Lobo, Jorge Joaquim. Sociedades Limitadas, volume I. Rio de Janeiro:Forense, 2004. 1ª ed. Pág. 5/7.
37
São mistas ou híbridas as sociedades que reúnem
elementos tanto da sociedade de pessoas, quanto da de
capitais.”
Vale frisar que essa condição pessoal dos sócios a que se dá ênfase
nas sociedades de pessoa, acarreta situações de relevância prática para
equacionar certos interesses dos sócios.
A verificação do caráter intuitus personae da sociedade se apresenta
como fonte solucionadora de questões jurídicas relevantes como a penhora da
participação societária do sócio por suas dívidas particulares – o que será
desenvolvido no próximo capítulo – e a dissolução parcial da sociedade ante a
ruptura da affectio societatis, por iniciativa do sócio dissidente.
2.1.3 – Sociedades contratuais e institucionais
As sociedades põem classificar-se, ainda, em decorrência da natureza
de seu ato constitutivo, em sociedades contratuais ou institucionais.
Em ambos os tipos, a sociedade vai se formar em função da
manifestação da vontade dos seus sócios. Nas contratuais, essa manifestação
se define em um contrato firmado entre os seus membros. Constitui-se, pois,
por contrato entre os sócios. O vínculo é de natureza contratual. Nas
institucionais, o vínculo já não vem revestido da natureza de contrato. O seu
ato de criação não é um contrato, mas um ato complexo. Para a sua formação
são necessários vários atos, que se consubstanciam no seu ato constitutivo.
Decorrem, desse modo, de um conjunto de atos dos fundadores para criar uma
instituição.
São contratuais as sociedades limitadas, em nome coletivo e em
comandita simples. As sociedades simples também são constituídas por
contrato.
Institucionais são as sociedades anônima e a comandita por ações.
38
2.2 – Sociedade limitada: breve histórico
A sociedade limitada representa a mais recente das formas societárias
no direito brasileiro. Surgiu na Alemanha em 1892. Diferente dos demais tipos
societários surgiu de forma racionalmente orientada a atender as demandas do
desenvolvimento capitalista da época: procura conjugar a flexibilidade das
sociedades de pessoas com a limitação da responsabilidade, típica das
sociedades anônimas.
As sociedades limitadas surgiram no momento em que pequenos
comerciantes não queriam se associar sob a forma de sociedade anônima –
em razão da sua difícil constituição e de seu funcionamento oneroso e
burocrático -, nem sob a forma de sociedade em nome coletivo – essa pelo fato
de não haver limitação ao patrimônio pessoal dos sócios quanto às dividas
contraídas pela sociedade.
Restrições à circulação de quinhões societários, a separação entre os
patrimônios, voto segundo o valor da cota, a livre escolha dos sócios,
simplicidade de constituição, administração personalizada, maleabilidade
própria da sociedade de pessoas e estabilidade do quadro societário, com
limitação da responsabilidade própria da sociedade anônima, tornaram a
sociedade limitada o modelo societário ideal para pequenos e médios
empreendimentos, mas sem afastar a possibilidade de seu uso para aqueles
de grande porte.
Dessa forma, a sociedade limitada surge com uma estrutura
corporativa (estruturada em órgãos), mas não como instituição, com interesses
próprios a par daquele de obtenção de lucros pelo objeto social. Afastou-se a
possibilidade de inserção de interesses extrassocietários independentemente
da vontade dos sócios.
39
Sobre o assunto, Sérgio Campinho20 salienta:
“Em nosso País, em 1912, Herculano Inglês de Souza,
incumbido pelo governo brasileiro de elaborar a revisão
do Código Comercial, sob a inspiração da lei portuguesa,
consagrou, em seu projeto, o novo tipo de sociedade,
nominado-a de ‘sociedade limitada’”.
O novo Código Civil regula inteiramente a sociedade limitada, assim
revogando o Decreto nº 3.708/19.
A primeira mudança significativa concerne à própria designação da
sociedade, que deixa de chamar-se “sociedade por cotas de responsabilidade
limitada” para nomear-se simplesmente “sociedade limitada”.
O Decreto nº 3.708/19 era extremamente resumido (apenas 18 artigos)
e tinha na lei de sociedades anônimas, que invocava expressamente, uma
legislação supletiva das omissões do contrato social.
A nova regulação é muito mais abrangente. Além disso, reporta-se às
normas das sociedades simples, que exercerão o papel de legislação
subsidiária (art. 1.053, do CC/02), enquanto a legislação das sociedades
anônimas somente incidirá, supletivamente, quando o contrato social contiver
cláusula expressa nesse sentido (art. 1.053, § ú, do CC/02).
Nesse passo, acrescenta José Edwaldo Tavares Borba21:
“A sociedade limitada sofre, pois, um acentuado
deslocamento conceitual, transitando de uma posição de
identificação com a sociedade anônima para uma
aproximação com a sociedade simples.
(...)
20 Ob. Cit., pág. 137 21 Ob. Cit. Pág. 100.
40
A sociedade limitada, com o novo Código Civil, passa por
substanciais alterações, que afetam o seu funcionamento,
o processo de relações entre os sócios e destes para com
a sociedade, e ainda a administração social.
Hoje, quando muitos países adotam uma sociedade
anônima simplificada, a fim de flexibilizar os pequenos e
médios negócios, o novo Código Civil complica e
burocratiza um modelo societário consagrado pela
prática.”
O novo Código Civil, no Capítulo IV, do Subtítulo II, do Título II, do Livro
II, nos artigos 1.052 a 1.087, disciplina por inteiro a sociedade limitada, nova
nominação desse tipo societário, restando, pois, revogado, o Decreto nº
3.708/19. Prevaleceu, portanto, no Código Civil de 2002, a mesma
nomenclatura do Projeto de Inglês de Sousa.
Atualmente, na opinião do citado autor José Edwaldo Tavares Borba22,
o Código Civil, e as regras sobre a limitada, a tornam menos simples, menos
barata e menos flexível. De qualquer sorte, como mantém a responsabilidade
limitada, e não se sujeita a publicação obrigatória de balanços, continuará a
contar com forte aceitação no âmbito de empresas médias e médio-grandes,
que não se disponham a arcar com os custos e a exposição decorrentes da
publicação obrigatória de demonstrações financeiras completas.
Os empreendimentos de grande porte costumam optar pela sociedade
anônima, em atenção à sua estrutura organizacional complexa e ordenada
própria dos negócios que exigem regras e controles mais rígidos e mais
impessoais.
Há empresas pequenas e médias que adotam a forma anônima apenas
para apresentar uma imagem pública de grande porte.
22 Ob. Cit. Pág. 106/107.
41
As sociedades limitadas ao atingirem um certo grau de crescimento,
deliberam, de ordinário, transformar-se em anônimas, principalmente quando
pretendam abrir seu capital ao público investidor.
Muitas empresas de grande porte que não tem a intenção de se abrir
ao mercado, especialmente multinacionais, têm optado pela forma da
sociedade limitada, em função, precipuamente, da desnecessidade de
promover a publicação de suas demonstrações financeiras.
2.3 – Característica Fundamental
Inicialmente, importante registrar que, trata-se de sociedade contratual,
constituída por um contrato social, cujo capital social é dividido em cotas.
As cotas (ou quotas) são frações que serão subscritas pelos sócios.
Esses sócios, com a subscrição, comprometem-se à integralização do
montante correspondente às suas cotas, mediante o efetivo fornecimento de
dinheiro, bens ou créditos para a formação do capital social e a constituição do
primeiro patrimônio da sociedade, necessário ao início das atividades
empresariais.
A titularidade de cotas confere ao sócio uma série de direitos sobre a
sociedade. Como direitos patrimoniais estão o recebimento de parcela dos
lucros provenientes da atividade empresarial desenvolvida, bem como o da
partilha da massa patrimonial resultante da liquidação da sociedade. Dentre os
direitos pessoais podem ser elencadas a participação efetiva na administração
da empresa e a fiscalização constante de suas contas e negócios.
O capital social está dividido em cotas, iguais ou desiguais, cabendo
uma ou diversas a cada sócio, o que faz com que ele tenha maior ou menor
controle da sociedade, na proporção do número de cotas que possui (art.
1.055, do CC/02).
42
Assim, por exemplo, uma sociedade limitada pode dividir seu capital
social em 100 cotas, cada uma com valor igual a 01. São sócios: A, B, C e D. A
possui 30 cotas, B possui 40 cotas, C possui 20 cotas e D possui 10. As cotas
têm valores iguais. Diferente é a participação de cada um dos sócios no capital
social.
Essa participação diferenciada terá muita importância nas tomadas de
decisões da sociedade, na medida em que as deliberações são feitas, em
regra, pela maioria absoluta de votos, estes considerados de acordo com o
número de cotas, e não com o número de sócios. Assim, utilizando-se o
exemplo acima, os votos de A e B têm maior peso do que os de C e D.
O grande sucesso das sociedades limitadas deve-se à limitação da
responsabilidade subsidiária dos sócios quanto às obrigações sociais. A
limitada é a única sociedade do tipo contratual em que todos os sócios
possuem responsabilidade limitada.
Na mesma linha, Jorge Lobo23 define o conceito de sociedade limitada,
da seguinte forma:
“Sociedade limitada é a constituída por pessoas físicas
e/ou jurídicas, com igualdade de direitos, sob uma firma
social ou denominação, para o exercício de atividade
econômica de produção ou circulação de bens ou de
serviços, que tem o capital dividido em quotas, de igual ou
diferentes espécies, de igual ou desigual valor nominal,
obrigando-se os sócios pelo pagamento do valor das
quotas subscritas ou adquiridas, todos respondendo
solidariamente pela integralização do capital social.”
O perfil característico mais importante da sociedade limitada repousa
na responsabilidade do sócio perante a terceiros, credores da pessoa jurídica.
23 Ob. Cit. Pág. 56.
43
Em face da sociedade, cada sócio-cotista é obrigado a entrar apenas
com o valor de sua cota. Integralizado este valor, nada mais deve a sociedade.
Perante terceiros, todavia, todos os sócios responderão solidariamente pela
parte que faltar para completar o pagamento das cotas não inteiramente
integralizadas.
Desse modo, nessas sociedades, o limite da responsabilidade do
sócio, perante os credores é o valor do capital social. Os sócios respondem,
então, solidariamente pela integralização do capital social declarado da
sociedade. Obrigam-se, portanto, solidariamente pelo total do capital social, e
não apenas por suas cotas, no aspecto externo de suas responsabilidades.
Em outras palavras, a responsabilidade do sócio é restrita às cotas por
ele subscritas e não integralizadas, mas todos respondem solidariamente até o
montante do capital social subscrito e não integralizado, tendo direito de
regresso pelo que pagar por outro sócio.
É o comando que se extrai do artigo 1.052, do Código Civil de 2002:
“Na sociedade limitada, a responsabilidade de cada sócio
é restrita ao valor de suas quotas, mas todos respondem
solidariamente pela integralização do capital social.”
Se o patrimônio da sociedade for insuficiente para responder pelas
dívidas sociais, não estando completamente integralizado o capital social, os
credores da sociedade poderão executar o patrimônio pessoal dos sócios, até
o limite do valor por eles subscrito e ainda não integralizado. Assim, os
credores poderão executar qualquer um dos sócios pelo montante ainda não
integralizado.
Observe-se que a lei é clara: os sócios possuem responsabilidade
solidária limitada ao montante do capital subscrito e não integralizado. A
44
limitação da responsabilidade dos cotistas, portanto, está justamente nessa
quantia faltante.
Consoante as lições de Sergio Campinho24, do citado dispositivo
sobressaem duas órbitas de relação jurídicas: entre sócio e sociedade e entre
sócios e terceiros credores da pessoa jurídica. Perante a sociedade, cada sócio
é individualmente responsável pela integralização da cota subscrita; face aos
credores sociais todos os sócios respondem, solidariamente, pelo total do
capital social subscrito e não integralizado.
Interessante notar, que a responsabilidade dos sócios da limitada
esbarra em limite: o montante do capital social subscrito e não integralizado. Se
a dívida da sociedade for superior a esse montante, esgotado o patrimônio
social, os credores arcarão com os prejuízos já que não podem executar o
patrimônio pessoal dos sócios além daquele limite.
O jurista Tavares Borba25, em sua obra, Direito Societário, reforça esse
entendimento, exemplificando:
“Figure-se a hipótese de sociedade cujo capital, no valor
de R$100.000, encontre-se assim distribuído entre os
sócios: sócio A- R$ 80.000, sócio B – R$ 15.000 e sócio C
– R$ 5.000.
Se os sócios B e C integralizarem as suas cotas e o sócio
A não o fizer, vindo a sociedade a tornar-se insolvente, a
integralização das cotas subscritas por A poderá ser
exigida do próprio A ou de B e C, indistintamente. Os
credores escolherão para este efeito, certamente, aquele
cujos bens pessoais estiverem mais evidentes e mais
livres. O sócio que for levado a integralizar cotas de outro
sócio poderá, regressivamente, cobrar deste o montante
24 Ob. Cit. Pág. 140 25 Ob. Cit. Pág. 103
45
despendido ou, de cada dos demais sócios o respectivo
rateio.
A sociedade limitada envolve, pois, uma responsabilidade
superior à da sociedade anônima, na qual cada acionista
responde apenas pelo capital que subscreveu.”
Por outro lado, o perfil característico desse tipo societário revela-se na
regra, segundo a qual uma vez integralizado o capital social subscrito pelos
sócios, ficam eles liberados de qualquer responsabilidade, nada mais devendo
cada qual individualmente à sociedade, nem solidariamente aos credores da
pessoa jurídica.
Se o capital social está todo integralizado, os sócios não têm mais
nenhuma responsabilidade pelas obrigações sociais. Deverá ser exaurido o
patrimônio da empresa, uma vez que a responsabilidade desta é sempre
ilimitada, e, eventual saldo devedor será suportado pelos credores. Os bens
dos sócios não poderão mais ser atingidos. Daí o porquê de ser limitada a
responsabilidade, situação que se estende a todos os cotistas.
O Superior Tribunal de Justiça também já se manifestou sobre a
questão, em sede de Agravo Regimental no Recurso Especial nº 1.182817-RJ,
julgado em 22/08/2012, tendo sido Relator o Ministro MAURO CAMPBELL
MARQUES, que assim decidiu:
“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NOS
EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. TRIBUTÁRIO. ISS.
TRATAMENTO PRIVILEGIADO PREVISTO NO ART. 9º,
§§ 1º E 3º, DO DECRETO-LEI 406/68. SOCIEDADE
LIMITADA. ESPÉCIE SOCIETÁRIA EM QUE A
RESPONSABILIDADE DO SÓCIO É LIMITADA AO
CAPITAL SOCIAL.
1. A orientação da Primeira Seção/STJ pacificou-se no
sentido de que o tratamento privilegiado previsto no art.
9º, §§ 1º e 3º, do Decreto-Lei 406/68 somente é aplicável
46
às sociedades uniprofissionais que tenham por objeto a
prestação de serviço especializado, com responsabilidade
pessoal dos sócios e sem caráter empresarial. Por tais
razões, o benefício não se estende à sociedade limitada,
sobretudo porque nessa espécie societária a
responsabilidade do sócio é limitada ao capital social.
Nesse sentido: AgRg nos EREsp 941.870/RS, 1ª Seção,
Rel. Min. Hamilton Carvalhido, DJe de 25.11.2009.
2. "Não cabem embargos de divergência, quando a
jurisprudência do tribunal se firmou no mesmo sentido do
acórdão embargado" (Súmula 168/STJ).
3. Agravo regimental não provido.”
(Grifos apostos).
Vale notar, todavia, que essa limitação da responsabilidade acaba por
onerar os credores que correm o risco de sofrer prejuízos. Assim, para
resguardarem seus direitos, os credores embutem esse risco nos preços de
seus produtos ou serviços, como, por exemplo, os bancos que exigem altos
juros, fiança ou aval para a concessão de créditos às empresas. Essa é a
forma de ‘defesa’ dos credores, enquanto a limitação da responsabilidade é
instrumento de garantia para aqueles que desenvolvem uma atividade
empresarial que gerará empregos, tributos, consumo e movimentação à
economia.
A verificação se o capital subscrito está ou não integralizado se faz, em
princípio, através da consulta do capital social. Este pode refletir cláusula na
qual os sócios declaram restar o capital completamente integralizado. Se,
porém, foi previsto no contrato a integralização a prazo, dever-se-á observar se
esse prazo encontra-se ainda em aberto. Em assim o sendo, poderão os
credores pretender, na ausência de patrimônio da pessoa jurídica, a
responsabilização solidária dos sócios, pelas parcelas que faltarem à
integralização completa do capital por eles subscrito.
47
Contudo, não se pode deixar de advertir que, em certos episódios,
como o Código Civil, seguindo os passos da lei anterior, não estabelece
nenhum sistema do controle da realidade das entradas de capital, os sócios
podem ter afirmado no contrato estar o capital já totalmente integralizado sem,
entretanto, terem efetivamente realizado os aportes declarados. Nesses casos,
os credores poderão pretender, sem prejuízo da apuração eventual
responsabilidade criminal dos sócios, que eles venham a responder pela
integralização da parte faltante provando a fraude por meio de perícia na qual
devem ser confrontadas as contas e escrituração da sociedade e as
declarações de rendimentos dos sócios, a fim de verificar o casamento real das
operações. O mesmo poderá se dar nas integralizações a prazo, quando,
embora vencido o termo preconizado, suspeitarem os credores de que não
houve o efetivo aporte, como previsto no contrato que se realizasse.
2.3.1 – Natureza jurídica
Em virtude das peculiaridades que lhe assistem, muitos autores
questionam como classificar as sociedades limitadas.
Jorge Lobo26 chega a dizer que: “o tema, intrincado e complexo, gerou
encarniçada discussão.” Ato contínuo, o autor enumera os seguidores de cada
corrente, nos seguintes termos:
“a sociedade limitada é de pessoas, para WALDEMAR
FERREIRA, SPENCER VAMPRÉ, CUNHA PEIXOTO,
RUBENS REQUIÃO, ALFREDO DE ASSIS GONÇALVES
NETO; de capitais, para VILEMOR AMARAL, JOÃO
EUNÁPIO BORGES, NOREDINO SILVA; mista, híbrida,
intermediária, para WALDIRIO BULGARELLI, NELSON
ABRÃO, ISAAC HALPERIN; particularíssima em relação
às demais, para EGBERTO LACERDA TEIXEIRA e
SYLVIO MARCONDES, e, para FÁBIO ULHOA COELHO,
26 Ob. Cit. Pág. 54.
48
é o contrato social que ‘define a natureza de cada
limitada’, havendo FRAN MARTINS, em seu Curso de
Direito Comercial, a considerado de pessoas, enquanto,
em sua excelente obra Sociedade Limitada, intermediária
ou híbrida.”
Mais adiante sustenta que “a sociedade limitada não é de capitais, nem
mista, mas de pessoas.”
Sérgio Campinho27 também defende a classificação da sociedade
limitada como sendo uma sociedade de pessoas:
A sociedade limitada, como se aduziu, assenta seu ato de
criação no contrato social, não guardando, pois, feição
institucional, como as sociedades por ações.
(...)
Dentre essas cláusulas opcionais, eletivas ou acidentais,
reside aquela na qual os sócios podem realizar a previsão
da regência supletiva da sociedade limitada pelas normas
da sociedade anônima, em substituição à regra geral da
aplicação subsidiária das normas da sociedade simples
(artigo 1.053, caput e parágrafo único).
O novo Código Civil, nos artigos 1.052 a 1.087, estatui o
perfil do tipo societário específico. Quando na sua
disciplina verificar-se omissão, aplica-se, como fonte de
regência supletiva, o regramento próprio da sociedade
simples, que se estabelece como norma geral em matéria
de direito societário. Contudo, faculta-se aos sócios,
mediante expressa previsão contratual, a opção pela
regência subsidiária por meio das regras prescritas na lei
das sociedades anônimas.
27 Ob. Cit. Pág. 156/160
49
Em resumo, se o contrato social for silente, aplicar-se-ão
os preceitos da sociedade simples para disciplinar os
casos de omissão legal ou contratual; permite-se,
entretanto, a aplicação supletiva das normas da
sociedade anônima, com fim de regrar as omissões
eventualmente verificadas na lei ou no contrato social
para o tratamento de um determinado assunto, mas a
hipótese reclama previsão expressa em cláusula do
contrato de sociedade.
Havendo a previsão, a lei das sociedades anônimas será
supletiva da lei da limitada. Supre a lacuna da lei. É
supletiva da vontade do legislador e não apenas da
vontade das partes. Funciona como fonte subsidiária não
apenas do contrato, naquilo em que nele foi
insuficientemente esboçado, mas também da própria lei,
ante sua omissão total acerca do tema a ser disciplinado.
(...)
Mas há que se ter cuidado com a previsão especial –
aplicação supletiva da Lei das S/A - , porquanto ela não
se faz de modo geral e irrestrito, devendo, sempre,
respeitar a natureza de sociedade contratual da limitada.
Portanto, a regência supletiva de suas normas restringe-
se às situações em que não se venha a contrariar dita
natureza, podendo-se, assim, invocá-las somente na
parte aplicável.
Dessa feita, a utilização supletiva das regras da Lei nº
6.404/76 às sociedades limitadas está condicionada à
verificação das seguintes condições: a) omissão no
Capítulo pertinente do Código Civil – artigos 1.052 a
1.087; b) omissão no regramento da matéria pelo contrato
social; c) existência de cláusula no contrato determinando
expressamente a regência supletiva da limitada pelas
normas da sociedade anônima; d) não contrariar a
natureza contratualista da sociedade limitada.
50
As questões atinentes à formação, dissolução e
liquidação da sociedade limitada serão sempre regidas
pelas normas das sociedades simples, no caso de
omissão, e não pelas das S/A, em razão da evidente
natureza contratual da matéria. Não tendo a limitada
natureza institucional, não podem as regras da sociedade
anônima servir de respaldo à disciplina dos temas.
(...)
Tem-se, portanto, que algumas normas da sociedade
anônima podem, por analogia, ser utilizadas para reger
certas situações na sociedade limitada, quando as
normas da sociedade simples, que a esta servem de
regramento supletivo, forem omissas no trato da questão.
Mas, em qualquer caso, deve-se respeitar a natureza da
limitada, só se aplicando as normas da sociedade
anônima quando não violentarem sua essência e com as
devidas adaptações à sua tipologia.
Afora sua natureza contratual, a limitada apresenta-se,
também, como sociedade intuitu personae.
No seu âmago, a sociedade limitada é uma sociedade de
pessoa, sem descurar para o inconteste fato, como já se
tinha no direito anterior, de que a lei permite que os sócios
venham a ela conferir tonalidade tipicamente de capital,
como ocorre na permissão para a livre cessão de quotas,
o que, contudo, não lhe retira a essência personalista.”
Em regra, por serem sociedades contratuais, as sociedades limitadas
são também, no silêncio do contrato, sociedades de pessoas. Entretanto, se o
contrato social dispuser explicitamente, as sociedades limitadas poderão
assumir o caráter de sociedades de capital.
Assim, na essência, é uma sociedade de pessoa, mas a que os sócios
poderão, na confecção do contrato social, imprimir certos contornos e
características da sociedade de capital.
51
Independentemente de adotarem a forma de sociedade de pessoas ou
de capital, as limitadas seguirão sempre a disciplina legal que lhes é própria,
prevista nos artigos 1.052 a 1.087, do Código Civil. Se adotarem a forma de
sociedade de capital, poderão, supletivamente, seguir a legislação prevista
para as sociedades anônimas (Lei nº 6.404/76), se assim estiver
expressamente previsto no contrato social (art. 1.053 e parágrafo único, do
CC/02). Não dispondo o contrato nesse sentido e, havendo omissão sobre
certo assunto no capitulo específico das limitadas, elas seguirão,
supletivamente, as regras previstas no Código Civil para as sociedades
simples.
Certo é que: as limitadas, por serem sociedades contratuais, devem,
necessariamente, seguir o Código Civil no que tange às regras sobre sua
constituição e dissolução.
2.3.2 – Constituição da sociedade limitada
Constitui-se a sociedade limitada por meio de um contrato escrito, que
se estabelece por um instrumento público ou particular. Sua natureza é de
contrato plurilateral.
Com feição contratual, o seu ato constitutivo deve obedecer aos
elementos comuns a todos os contratos, pressupondo o livre consentimento, a
capacidade das partes, a idoneidade do objeto, a legitimação das partes para
realizá-lo e a forma legal.
Sendo um contrato de constituição de sociedade, reunirá, também,
elementos específicos: a pluralidade de sócios, a contribuição de todos os
sócios para a formação do capital social (vale lembrar que este tipo societário
não admite o sócio cuja contribuição consista em serviços), a participação nos
lucros (art. 1.008, do CC/02 fulmina com a nulidade a estipulação contratual na
qual se pactue que a totalidade dos lucros pertença a um só dos sócios ou se
exclua qualquer sócio de sua partilha) e a affectio societatis.
52
Para a sociedade ostentar a condição de regular, mister se faz
proceder ao registro de seu instrumento contratual no Registro Público de
Empresas Mercantis, a cargo das Juntas Comerciais de cada estado.
O contrato social da sociedade limitada deve obedecer a certos
requisitos impostos por lei. Estes requisitos encontram-se dispostos nos artigos
997 (com as devidas adaptações decorrentes do tipo societário), 1.054 e 1.072,
do CC/02, 35, III, da Lei nº 8.934/94 (na parte não revogada no novo Código),
53, III, do Decreto nº 1.800/96 e 56 da Lei nº 8.884/94.
Do exposto, conclui-se que a sociedade limitada constitui-se mediante
a celebração de contrato social, elaborado por instrumento público ou particular
e devidamente registrado na Junta Comercial. Deve ainda trazer, de acordo
com o artigo 1.054, do Código Civil, as cláusulas essenciais, previstas no artigo
997 do mesmo diploma legal. São elas:
1) identificação e qualificação dos sócios (nacionalidade, estado civil,
profissão, residência, número do RG e do CPF) se pessoas físicas
e, se pessoas jurídicas, firma ou denominação, nacionalidade e
sede;
2) nome empresarial, objeto, sede e prazo;
3) capital social, cota de cada sócio e modo de integralizá-la;
4) identificação e qualificação dos administradores, seus poderes e
atribuições; e
5) participação de cada sócio nos lucros e nas perdas.
Além disso, não se pode olvidar que o contrato social deve claramente
dispor sobre o tipo societário adotado (sociedade limitada) e, em razão dele,
sobre a responsabilidade subsidiária dos sócios, predeterminada em lei.
53
CAPÍTULO III
A PENHORA DAS COTAS DE SOCIEDADE
EMPRESÁRIA LIMITADA
Começa a existência legal das sociedades, como pessoas jurídicas de
direito privado, com o arquivamento dos seus atos constitutivos no respectivo
registro local. A partir de então, adquirem personalidade jurídica, distinta da de
seus sócios, tornando-se capazes de direitos e obrigações, com patrimônio
próprio, que não se confunde com aquele pertencente aos sócios.
A transferência de bens à sociedade, como integralização de capital, se
fará em dinheiro ou em qualquer outra espécie de bens suscetíveis de
avaliação em dinheiro.
Nesse diapasão, válido transcrever os ensinamentos de Maria Helena
Diniz28:
“Contribuição dos sócios. Os sócios apenas poderão
contribuir para a formação do capital social com bens
(móveis ou imóveis), dinheiro ou crédito, sendo-lhes
vedada qualquer prestação de serviços. Isto porque neste
tipo de sociedade não se poderá ter sócio que somente
contribua com seu trabalho, uma vez que há limitação de
responsabilidade e solidariedade pela integralização do
capital social.”
O capital social poderá ser integralizado desde a criação da sociedade,
ou, posteriormente, no prazo que for fixado, ou ainda de acordo com as
necessidades da sociedade.
28 Ob. Cit. Pág. 715
54
Assim, os sócios transferirão bens de seu patrimônio particular para o
patrimônio, próprio e autônomo, da sociedade.
Essa transferência observará a forma jurídica adequada. A transmissão
de bens imóveis, por exemplo, se fará através de escritura pública ou
instrumento particular. Em qualquer hipótese, o instrumento próprio será levado
a registro no Ofício de Registro de Imóveis, a fim de consumar a transmissão.
Não é demais lembrar que, por força do disposto nos arts. 36 e 37, do Código
Tributário Nacional, sobre essa incorporação não incide o imposto de
transmissão de bens imóveis, salvo quando se tratar de sociedade imobiliária.
Observa-se, que o capital social da sociedade limitada é fracionado em
cotas, as quais podem ser de idêntico valor ou de valor distinto, cabendo uma
ou diversas cotas a cada sócio (artigo 1.055, do Código Civil de 2002).
O valor da cota é fixado no contrato social, não sendo possível a
existência de cota sem valor nominal, como ocorre com as ações das
companhias.
Segundo opinião de Sergio Campinho29, a praxe empresarial, no
entanto, estabeleceu-se no sentido de implementar a pulverização do capital
em diversas quotas, de iguais valores, cabendo a cada sócio um determinado
número delas, proporcional à sua participação para a formação desse capital.
Ato contínuo, o autor diz que, essa técnica usualmente adotada pelos
sócios para a divisão do capital social em quotas, de iguais valores,
permanecerá a ser utilizada, dado a facilidade com que se apresenta não só
para a formação, aumento ou redução do capital, mas também para a
transferência ou partilha de quotas.
3.1 – A cota social
29 Ob. Cit. Pág. 164.
55
3.1.1 - Conceito
A cota social representa uma fração do capital social e, em
consequencia, uma posição de direitos e deveres dos sócios perante a
sociedade.
Em outras palavras, a cota significa a parte representativa da
contribuição individual de cada sócio, circundando uma reunião de direitos e
obrigações relativos ao ente empresarial.
Dessa forma, a cota social tem dupla característica: uma de direito
patrimonial e outra de direito pessoal. O direito patrimonial consiste no de
participar dos lucros sociais, sendo considerada nula a cláusula que exclua
algum sócio dessa participação (art. 1008, do CC/02), sendo certo que, no
silêncio do contrato, essa participação é proporcional ao capital de cada sócio
(art. 1007); e, ainda no direito a uma cota-parte do acervo social, no caso de
liquidação final.
Os direitos pessoais são os decorrentes do status de sócio, vale dizer,
o direito de voto nas deliberações sociais, o de participar da administração da
sociedade e o de fiscalizar os atos de administração.
Sobre a cota social, cabe destacar o conceito de Maria Helena Diniz30:
“Quotas. São parcelas em que está dividido o capital
social, que podem ter valores iguais ou desiguais,
cabendo uma ou várias delas a cada sócio, conforme a
contribuição que der ao ingressar na sociedade. O sócio
que tiver maior número de quotas será o majoritário. Cada
sócio, em razão de sua contribuição para a formação do
capital social, passa a ter direito de perceber rendimentos
30 Ob. Cit. pág 715.
56
líquidos advindos da atividade econômico-social, na
proporção de sua quota.”
Consoante entendimento de José Edwaldo Tavares Borba31, ainda que
controvertida a sua natureza, pode-se afirmar que a cota social é um bem
classificável, para os efeitos legais, como móvel, integrando a categoria dos
bens incorpóreos (art. 83, inciso III, do Código Civil de 2002).
As cotas, portanto, funcionam como objeto do direito de propriedade.
Os cotistas detêm a sua propriedade.
As cotas, todavia, não se materializam como as ações, que são
corpóreas e funcionam como valores mobiliários, com capacidade de
circulação autônoma. Quem transfere cotas aliena uma posição social (um
direito) a que as cotas correspondem. Quem transfere ações aliena um valor
mobiliário que é a ação, ela própria.
3.1.2 – Cessão de cotas
Primeiramente, vale frisar que, através da cessão ou transferência
voluntária de cotas, o sócio-cedente transfere espontaneamente ao sócio-
cessionário os direitos representativos do capital social da sociedade limitada,
mediante a transferência total, quando se retirará da entidade, ou transfere
parte deles, hipótese em que permanecerá no quadro societário com
participação inferior à detida anteriormente.
O cessionário, ao ingressar na sociedade, adquire a posição do
cedente em relação às cotas cedidas, passando a comprometer-se com todos
os direitos e obrigações correspondentes.
31 Ob.cit. pág. 40.
57
Sob o ponto de vista patrimonial da sociedade, não há modificação, vez
que a cessão afeta somente o sócio que aliena sua participação. Ou seja, a
cessão é um negócio do sócio, e não da sociedade.
O Código Civil de 2002 estabelece a liberdade contratual entre vivos,
facultando aos sócios a disciplina da cessão de cotas conforme o interesse, a
vontade e a conveniência dos indivíduos.
Para a hipótese de omissão do contrato, prevê o artigo 1.057, do
Código Civil, que o sócio pode ceder suas cotas, no todo ou em parte, a quem
já seja sócio, independentemente da anuência dos demais; para estranhos ao
corpo social, entretanto, a lei autoriza a transferência desde que não ocorra
oposição de titular ou titulares de mais de ¼ do capital social.
Há quem sustente32 ser a oposição à cessão da cota prevista no art.
1057 mero exercício do direito de preferência de ordem para a aquisição da
cota a ser cedida, pelo preço e condição estipulados entre sócio cedente e
terceiro pretendente.
A cessão, para ter eficácia perante a sociedade e terceiros, deverá ser
averbada no respectivo registro da pessoa jurídica na Junta Comercial33,
devendo estar subscrito o competente instrumento pelos sócios anuentes,
observando-se o que a respeito dispuser o contrato social, ou, na ausência de
32 Maria Helena Diniz, ob. Cit. Pág 717. 33 Enunciado JUCERJA nº 53 - Para registrar o instrumento, público ou particular, de cessão de quotas de uma sociedade limitada, é preciso verificar se o respectivo Contrato Social é, ou não, omisso sobre essa possibilidade.
§1º - Caso o Contrato Social seja omisso, o sócio pode ceder suas quotas, desde que o faça a outro sócio, devendo tal instrumento de cessão ser
averbado na Junta Comercial, observado o disposto no parágrafo seguinte.
§2º - Se o Contrato Social for omisso, mas o sócio pretender ceder suas quotas a quem não é sócio, deve haver reunião ou assembleia de sócios, uma
vez que, pelo caput do art.1.057 do Código Civil, a eventual oposição de titulares de mais de ¼ do Capital Social poderá inviabilizá-la.
§3º - A reunião ou assembleia de sócios mencionada no §2° acima pode ser suprida, se substituída pela expressa anuência escrita, no instrumento de
cessão ou em outro, de detentores de mais de 75% do capital social da limitada em questão.
§4º - O instrumento, público ou particular, de cessão de quotas deve ser devidamente reduzido a termo, dele constando a identificação, qualificação e
domicílio das partes, assim como deve expressar se a cessão é, ou não, onerosa, além de cumprir os demais requisitos para sua validade jurídica.
§5º - Sendo não-onerosa a cessão, deve ser apresentado, junto com o respectivo instrumento, o comprovante da devida quitação tributária.
§6º - O arquivamento do instrumento, público ou particular, de cessão de quotas será feito independentemente da alteração contratual, resultando na
devida alteração do cadastro da empresa.
§7º - Será obrigatória na primeira alteração contratual que sobrevier após a averbação da cessão, a consolidação do Contrato Social, com o novo quadro
societário.
58
cláusula regulamentar, respeitando o quorum legal de ¾ ou mais do capital
para a transferência a estranhos.
Caso o contrato permita a livre cessão não se exigirá a assinatura de
outros sócios para a regularidade da transferência, bastando que o instrumento
público ou particular, contenha a assinatura das partes, cedente e cessionário.
Enquanto não realizado o registro, a cessão só é eficaz entre as partes
contratantes, não sendo oponível à sociedade ou a terceiros.
Em síntese, não havendo disposição contratual a respeito, o art. 1.057,
do Código Civil dispõe que o cotista pode:
• ceder total ou parcialmente sua cota a outro sócio, sem a
exigência de audiência prévia dos demais, ou
• ceder total ou parcialmente sua cota a terceiro, se inexistir
oposição de sócios que representem mais de um quarto do
capital social.
Pode-se notar que a possibilidade, ou não, da cessão das quotas e as
condições de tal transferência, são aspectos essenciais para avaliar se a
sociedade empresária limitada se classifica dentre as sociedades de pessoas
ou de capital.
Se no contrato houver disposição referente à restrição ou impedimento
à cessão das participações sociais (como exemplo, decisão por maioria
absoluta, unanimidade, ou outro quorum), estaria se indicando que se trata de
sociedade fundada na pessoa dos sócios, na confiança entre eles. Não
havendo cláusulas nesse sentido, seria um forte indicativo de que se trata de
sociedade de capital, conforme examinado no capitulo anterior.
Por fim, a transferência das cotas na sociedade limitada é questão
reservada à vontade dos sócios, formalizada no contrato social. É ato negocial
que se submete ao regime do art. 1.057, do CC/02.
59
No entendimento de Sérgio Campinho34, é exatamente nesse aspecto
que o regime jurídico da cessão de cotas se distingue da penhora judicial, pois,
para ele, não há espaço, no regime da execução forçada, para os sócios
assentirem com a penhora ou com a venda judicial do bem, visto não ter ela
caráter convencional, sendo dirigida por regras de ordem pública.
3.2 – A PENHORABILIDADE DAS COTAS SOCIAIS DA
LIMITADA
O exame da possibilidade de se penhorar fração do capital do sócio de
sociedade limitada por dívidas particulares, deve ser detalhado, haja vista toda
polêmica que gravita em torno do tema.
3.2.1 – O instituto jurídico da penhora
A penhora pode ser definida como ato coercitivo realizado no curso do
processo de execução, preparatório da expropriação de bens do devedor. É a
penhora ato executivo por meio do qual o patrimônio do executado é vinculado
ao processo judicial de execução para eventual satisfação do exeqüente
credor.
O princípio da patrimonialidade da execução, fundamento de validade
da penhora, está previsto no art. 591 do Código de Processo Civil. Este é o seu
teor:
“O devedor responde, para o cumprimento de suas
obrigações, com todos os seus bens presentes e futuros,
salvo as restrições estabelecidas em lei.”
Observa-se que o Digesto processual seguiu o princípio geral de que a
responsabilidade patrimonial do devedor, no que diz respeito às suas
34 Ob. Cit. Pág. 189.
60
obrigações, engloba todos os bens de seu patrimônio, inclusive os que vierem
a adquirir no curso da ação executiva.
A penhora, então, é ato executivo (ato do processo de execução), cuja
finalidade é a individuação e preservação dos bens a serem submetidos ao
processo de execução. Trata-se do meio que se vale o Estado para fixar a
responsabilidade executiva sobre determinados bens do devedor.
Ultrapassando o plano processual, para Humberto Theodoro Júnior35, o
que define a essência e a natureza da penhora “é ser ela um ato que configura
declaração de vontade dos órgãos jurisdicionais, emitida no exercício do poder
jurisdicional de império, endereçada à realização coletiva do direito, e
pertencente à categoria das ordens positivas (mandados) ou negativas
(proibições).”
O escopo da penhora é individualizar o bem, ou os bens, sobre os
quais o ato executivo deverá atuar para dar satisfação ao credor e submetê-los
materialmente à transferência coativa.
Consoante a lição do citado autor Humberto Theodoro Júnior36:
“Diante do quadro aqui esboçado, pode-se, enfim,
reconhecer à penhora a tríplice função de:
a) individualizar e apreender efetivamente os bens
destinados ao fim da execução;
b) conservar ditos bens, evitando sua deterioração ou
desvio, e
c) criar a preferência para o exeqüente” ....
35Theodoro Júnior, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Processo de Execução e Cumprimento de Sentença, Processo Cautelar e Tutela de Urgência. Rio de Janeiro:Forense, 42ª Ed. 2008, pág 295. 36 Ob. Cit. Pág. 297
61
Caracteriza-se a penhora, então, por ser ato executório, isto é, ato do
processo de execução, que produz modificação jurídica, a fim de preparar a
desapropriação dos bens por ela afetados para pagamento dos credores.
3.2.2 - Breve histórico
A penhora de cotas por dívida particular do sócio, ao longo do tempo,
desafiou a tenacidade dos juristas, pois nem o Decreto nº 3.708/19, nem o
Código Comercial de 1850 dispuseram a respeito, pelo que as soluções foram
fruto de construção doutrinária e jurisprudencial.
Anteriormente à colocação da questão sob o enfoque do ordenamento
instaurado pelo novo Código Civil, identificava-se radical corrente que
sustentava não ser possível a penhora de cota, sob o argumento de pertencer
ao patrimônio da sociedade, que não se confundiria com a do sócio.
Legitimava, então, somente a penhora dos lucros líquidos deste na sociedade,
tal como permitia o dispositivo 292 do derrogado Código Comercial.
O Supremo Tribunal Federal, no entanto, em sede de julgamento de
Recurso Extraordinário, em 21/10/198037, passou a rejeitar tal posicionamento,
pronunciando boa doutrina, pelo que vale transcrever trechos da decisão:
“São elas, com efeito, bens de valor econômico que
representam os direitos do cotista sobre o patrimônio
líquido da sociedade, vale dizer, a diferença entre o ativo
e o passivo desta, neste compreendido o próprio capital.
Não vejo como devam deixar de responder pelas
obrigações de seu titular.
O argumento de que o capital social pertence à
sociedade, e não aos sócios, traduz apenas meia-
verdade. É ele pertencente à sociedade, sem dúvida, mas
37http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28RE%24%2ESCLA%2E+E+90910%2ENUME%2E%29+OU+%28RE%2EACMS%2E+ADJ2+90910%2EACMS%2E%29&base=baseAcordaos
62
não sendo fruto de geração espontânea, forma-se
necessariamente pelas contribuições dos sócios que o
integralizam. Por essas contribuições traduzidas pelas
cotas, a sociedade deve aos sócios, que junto a ela
possuem créditos correspondentes. Esses créditos são
direitos que compõem os patrimônios individuais dos
sócios, integrando-se na garantia geral com que contam
seus respectivos credores.”
Com isso, passou a se sustentar também que a participação do sócio
no capital social não é abstrata, mas, sim, determinada e individualizada, eis
que, nos casos de retirada do sócio, seus haveres são perfeitamente
caracterizados e determinados.
O posicionamento adotado pelo STF não foi totalmente seguido,
todavia. Na doutrina prevaleceu o entendimento de ser necessário, para
possibilitar ou não a penhora de cota por dívida do cotista, investigar ainda o
contrato social. Caso fosse convencionada a livre cessão das cotas, se
legitimaria a penhora; do contrário, havendo limitação à sua livre transferência,
se negaria a penhora.
O Superior Tribunal de Justiça38 também estabeleceu o mesmo
convencimento.
Para parte da doutrina e da jurisprudência a penhora de cota seria,
então, inviável caso a sociedade fosse fundada na pessoa dos sócios, pois
poderia se quebrar a affectio societatis, o que colocaria em risco a continuidade
da organização, na hipótese da entrada de terceiros estranhos ao quadro
societário. Entretanto, se houvesse no contrato social, ausência de restrição à
livre cessão das cotas, esse aspecto fechado da sociedade restaria afastado,
vale dizer, tal sociedade seria, senão de capital, ao menos um tipo de
38 Conforme decisão proferida no julgamento do Recurso Especial nº 34.882-5-RS
63
classificação mista, o que autorizaria a penhora da quota, sem qualquer
restrição, uma vez que o ingresso de estranho não alteraria o cotidiano social.
No entanto, ressalta Sérgio Campinho39 :
“Os dois posicionamentos afiguravam-se-nos
inconciliáveis com o sistema de execução forçada
consagrado, mesmo antes da reforma de 2006, pelo
Código de Processo Civil. Não se poderia condicionar
nem a penhora, nem a venda judicial da cota à anuência
dos demais sócios. Não havia, como não há, na lei
processual civil, espaço para essa conclusão.
(...)
Com efeito, de há muito vínhamos apregoando em nossas
aulas que a penhora das quotas por dívida de sócio,
promovida em favor de seu credor particular,
apresentava-se plausível, independentemente do que
pudessem vir os sócios a dispor no contrato social quanto
à cessão de quotas. Não havia vedação legal para a
efetivação dessa penhora. Se a lei não proibia, é porque
se tinha como permitida.”
Ademais, o autor adverte que esse raciocínio, se procedente, poderia
vir a estimular que os sócios convencionassem sempre nos contratos sociais
cláusulas restritivas da livre cessão, com o intencional objetivo de torná-las por
inalienáveis, e, consequentemente, impenhoráveis, dificultando, dessa forma, a
cobrança dos seus credores particulares.
Assim, importante destacar outro posicionamento no sentido de que,
como o art. 64940 do atual Código de Processo Civil não veda a penhora de
39 Ob. Cit. Pág. 184/185. 40 Art. 649. São absolutamente impenhoráveis:
I - os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução;
II - os móveis, pertences e utilidades domésticas que guarnecem a residência do executado, salvo os de elevado valor ou que ultrapassem as necessidades comuns
correspondentes a um médio padrão de vida; (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).
64
cotas, nem qualquer outra norma jurídica o faz, todo bem jurídico que seja
cessível e transferível pode ser objeto de penhora, porque a regra é a
penhorabilidade; já a impenhorabilidade é a exceção.
Afirma-se também que o Digesto Processual de 1973 admite,
expressamente, a penhora de direitos, e a cota pode ser definida como um
direito do sócio em relação à sociedade, representando um bem móvel
incorpóreo, dotado de conteúdo econômico, relativo à relação existente entre o
sócio e a sociedade.
Nesse sentido, relevante trazer à baila os ensinamentos de Jorge
Lobo41:
“Com o advento do Código de Processo Civil de 1973,
prevaleceu a corrente que defendia a penhora de quotas
em qualquer sociedade limitada, havendo LUCENA, com
maestria, sintetizado, de forma lapidar, os fundamentos
jurídicos e legais, que a inspiraram:
(a) o art. 720, do CPC, que possibilita a instituição de
usufruto sobre o quinhão do sócio na empresa;
(b) os arts. 649 e 650, do CPC, não discriminam, na lista
dos bens impenhoráveis, as quotas das sociedades
limitadas;
III - os vestuários, bem como os pertences de uso pessoal do executado, salvo se de elevado valor; (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).
IV - os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios; as quantias recebidas por liberalidade
de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, observado o disposto no §
3o deste artigo; (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).
V - os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão; (Redação
dada pela Lei nº 11.382, de 2006).
VI - o seguro de vida; (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).
VII - os materiais necessários para obras em andamento, salvo se essas forem penhoradas; (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).
VIII - a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família; (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).
IX - os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social; (Redação dada pela Lei nº
11.382, de 2006).
X - até o limite de 40 (quarenta) salários mínimos, a quantia depositada em caderneta de poupança. (Redação dada pela Lei nº 11.382, de 2006).
XI - os recursos públicos do fundo partidário recebidos, nos termos da lei, por partido político. (Incluído pela Lei nº 11.694, de 2008)
§ 1o A impenhorabilidade não é oponível à cobrança do crédito concedido para a aquisição do próprio bem. (Incluído pela Lei nº 11.382, de 2006).
§ 2o O disposto no inciso IV do caput deste artigo não se aplica no caso de penhora para pagamento de prestação alimentícia. (Incluído pela Lei nº 11.382, de
2006).
41 Ob. Cit. Pág. 158.
65
(c) o art. 591, do CPC, ao tratar da responsabilidade
patrimonial do devedor, sujeita a execução todos os bens,
presentes e futuros;
(d) eventual previsão contratual, restringindo a cessão de
cotas a estranho, apenas afetaria os rumos da execução.”
Assim, podemos notar a existência de três correntes acerca da
penhorabilidade de cotas de uma sociedade empresária limitada.
A primeira, no sentido da absoluta impossibilidade jurídica de se
penhorar a cota social, sob o argumento da separação patrimonial, operada
com a aquisição da personalidade jurídica da sociedade.
A segunda corrente julga possível a penhora da cota social,
sustentando que, de acordo com o Código de Processo Civil atual, a cota
representa um direito e, assim, pode ser penhorada, não havendo qualquer
restrição legal em posição contrária.
Por fim, a terceira é uma posição intermediária entre as duas opiniões
anteriores. Alega-se ser necessário, para possibilitar ou não a penhora de cota
por dívida do cotista, investigar ainda o contrato social. Não permitindo a
penhora da cota social, dado o caráter personalista da sociedade limitada, na
qual coexistem a affectio societatis e o caráter de relacionamento intuitu
personae, não se podendo desconsiderar os nefastos efeitos que arrematação
em hasta pública poderia vir a provocar, com o ingresso compulsório de
terceiro não sócio à sociedade.
3.2.3 – A penhora de cotas no Código Civil de 2002 e as posições
doutrinárias
O Código Civil de 2002 manteve-se silente sobre o assunto. Não veda,
nem, tampouco, permite, expressamente, a penhora de cotas de sociedade
limitada, mas admite-a, implicitamente, no art. 1.026, caput, e seu parágrafo
único.
66
É cediço que as sociedades limitadas podem estar sujeitas à disciplina
supletiva do regime da sociedade simples. Segundo o art. 1.053 e seu
parágrafo único, do CC/02, se o contrato social não eleger expressamente a
Lei das Sociedades Anônimas como o diploma de regência supletiva, submete-
se a limitada em questão às regras daquele tipo societário42.
E entre estas regras encontra-se a que autoriza o credor do sócio a
requerer a “liquidação da quota do devedor”, como incidente na execução:
“Art. 1.026. O credor particular de sócio pode, na
insuficiência de outros bens do devedor, fazer recair a
execução sobre o que a este couber nos lucros da
sociedade, ou na parte que lhe tocar em liquidação.
Parágrafo único. Se a sociedade não estiver dissolvida,
pode o credor requerer a liquidação da quota do devedor,
cujo valor, apurado na forma do art. 1.031, será
depositado em dinheiro, no juízo da execução, até
noventa dias após aquela liquidação.”
Este dispositivo estabelece a possibilidade da execução recair,
alternativamente, sobre: (I) os dividendos do devedor; ou (II) os haveres do
devedor, requerendo a liquidação da cota do sócio-devedor.
Seguindo a mesma linha, Maria Helena Diniz43, leciona:
“Credor particular de sócio. A sociedade tem
personalidade jurídica própria e patrimonial diverso do de
seus sócios. Em regra, o patrimônio social não arca com
débitos pessoais dos sócios. Mas o credor do sócio,
malograda a solução do crédito com os bens particulares
42 Destaque-se que, se a sociedade eleger a regência supletiva da lei do anonimato social, dúvidas não restam sobre a possibilidade de a penhora recair sobre as quotas sociais, haja vista serem as sociedades anônimas, por disposição legal, capitalistas. 43 Ob. Cit. Pág. 696.
67
do devedor, por serem insuficientes, poderá,
excepcionalmente, ante o fato de a quota social integrar o
patrimônio de seu titular, socorrer-se dos lucros que lhe
couberem na sociedade ou da parte que lhe for cabível na
liquidação, depois de quitados os débitos sociais. Para
tanto, será imprescindível comprovar, nos autos de
execução creditória, a inexistência de bens particulares
para saldar a dívida.”
Diante disso, a legislação adotou o posicionamento segundo o qual são
penhoráveis as cotas sociais por dívidas particulares dos sócios, uma vez que
o artigo 1.026, caput, e seu parágrafo único, implicitamente, autorizam “o
credor a requer a liquidação da quota do devedor”, o que só será possível com
a penhora da cota, “na insuficiência de outros bens do devedor”.
O artigo 655, do Código de Processo Civil, com a redação dada pela
Lei nº 11.418, de 2006, expressamente, contemplou, no inciso VI, que a
penhora pode ter por objeto “ações e quotas de sociedades empresárias”,
consagrando, pois, de forma explícita, a penhora de cotas.
Nesse sentido, Fábio Ulhoa Coelho44: “Na verdade, os interesses do
credor do sócio são e continuarão a ser inteiramente satisfeitos na penhora das
quotas sociais, instituto largamente admitido no direito brasileiro” (...)
No que se refere à penhorabilidade das cotas de sociedade limitada,
vale transcrever as lições de Sérgio Campinho45:
“Os dispositivos desafiam algumas reflexões
indispensáveis para se alcançar a norma que deles
resulta, fixando-lhes, assim, os limites ou contornos. Em
outras palavras, cumpre realizar operação de exegese
lógico-formal, visando a, preliminarmente, estabelecer a
44 Coelho, Fábio Ulhoa. A sociedade limitada no novo código civil. São Paulo:Saraiva. 2003. pág. 39. 45 Ob. Cit. Pág. 191/192
68
hipótese normativa, a partir do entendimento das palavras
empregadas em seu enunciado, sem descurar, no
entanto, dos fatos e circunstâncias da realidade social que
teve por escopo disciplinar.
O inciso VI, do artigo 655, antes reproduzido, menciona
ações e quotas de sociedades empresárias. A primeira
questão que se coloca é saber o seu real alcance:
estariam as sociedades simples da regra excluídas?
Pensamos que a solução para a indagação pressupõe a
separação entre a sociedade simples pura e aquela que
adote a forma de sociedade limitada, tal qual é permitido
pelo artigo 983 do Código Civil. Nesta última situação, não
vemos como deixar de concluir pelo tratamento linear
para o tipo societário eleito, porquanto a forma de
sociedade limitada, que se notabilizou por um capital
dividido em quotas (caput do artigo 1.055, do Código
Civil), deverá ter um regramento uniforme, resultante das
regras próprias do tipo, independentemente de a
sociedade se especializar como simples ou empresária.
Havendo a mesma estrutura societária formal, não há
como se admitir o tratamento diferenciado em função das
espécies, in casu. A espécie de sociedade simples, ao
adotar a forma de limitada, passa a ser prioritariamente
regulada pelas regras do tipo eleito, só lhe aplicando as
disposições próprias de sua forma, subsidiariamente. Ora,
como a penhora está diretamente ligada ao tipo societário
e não à espécie propriamente, eis que as quotas integram
a estrutura da sociedade limitada, como forma, impõe-se
entender que tanto a sociedade empresária quanto a
simples que adote a forma, o tipo de sociedade limitada,
estarão subordinadas ao preceito processual que
disciplina a penhora de cotas.”
69
Para o professor Ricardo Negrão, apesar do Código Civil não dispor
sobre a matéria “possibilidade de penhora das quotas” sociais por dívida
particular de sócio, a matéria é regulada no capítulo das sociedades simples
(art. 1.026, parágrafo único e art. 1.031), sendo aplicável, “em sua inteireza,
para a sociedade limitada, não somente em razão da omissão do legislador, ao
tratar da matéria no capítulo correspondente, mas também porque, admitida
expressamente pela lei a excussão de parcela do capital social em sociedade
intuitu personae – como é a sociedade simples –, não há qualquer óbice para
sua aplicação no campo societário tipicamente de capital ou misto, natureza a
que se subordina a sociedade limitada.”
Assim, pode-se dizer que, mesmo cuidando-se de sociedade cujo
contrato social estipule a intransferibilidade das cotas, a penhora tem
cabimento.
A propósito, José Edwaldo Tavares Borba, esclarece46:
“Se as cotas forem intransferíveis, resolver-se-á em
apuração de haveres; se houver direito de preferência,
esse se exercerá durante a praça.”
Com tal procededimento, não haverá o ingresso do credor na
sociedade e a característica intuito personae do contrato social permanecerá
intacta.
Por outro lado, na hipótese de o contrato social prever cláusula que
estabeleça a obrigatoriedade de se dar preferência para a aquisição das cotas
aos sócios, mesmo assim a penhora é possível, uma vez que o direito de
preferência poderá ser exercido quando da venda pública – praça ou leilão –
das cotas.
Por sua vez, Jorge Lobo47 aponta outra solução:
46 Ob. Cit. Pág. 119 47 Ob. Cit. Pág. 159
70
“Efetivada a penhora, o sócio mantém o direito de voto,
mas ‘perde’ os direitos patrimoniais, passando os frutos
das quotas a integrar a garantia.”
Vale registrar que o art. 1.026, do CC/02, criou um benefício de ordem,
em favor da sociedade. Ou seja, a cota só é penhorável na insuficiência de
outros bens, sendo somente viável a penhora das cotas sociais depois de
esvaziado todo o patrimônio particular do sócio.
Deve-se atentar também ao princípio da execução menos gravosa,
vale dizer, as cotas só serão penhoras na absoluta falta de outros bens
penhoráveis (art. 620, do CPC).
Os haveres deverão, então, ser apurados mediante o levantamento de
balanço especial que apurará o valor da cota em liquidação baseado na
situação patrimonial da sociedade, que envolve elementos incorpóreos e
imateriais do fundo de empresa, reservas sociais, etc.
Se, exemplificando, o balanço especial apurar como patrimônio líquido
da sociedade R$ 100.000,00, e o sócio devedor titularizar 30% da sociedade, o
valor da cota será de R$ 30.000,00. Esse valor deverá ser depositado em
dinheiro, no juízo da execução, até noventa dias após a liquidação (art. 1.031,
do CC/02).
Conforme entende Jorge Lobo48, é “lícito à sociedade pleitear a venda
das quotas em hasta pública pelo valor apurado, no mínimo; caso as quotas
não encontrem comprador, a sociedade será compelida a realizar o depósito
previsto no art. 1.031, do Código Civil.”
Realizado o pagamento, em princípio, deverá ser operada a redução
do capital social na proporção das cotas que ele possuía, pois não mais existe
48 Ob. Cit. Pág. 159
71
a contribuição que justificava a existência das cotas. Entretanto, os demais
sócios poderão adquirir ou alienar aquelas cotas, mantendo íntegro o capital
social.
A liquidação da cota implica, por força do disposto no art. 1.030,
parágrafo único, na exclusão, da sociedade, do sócio devedor, consoante se
extrai:
“Art. 1.030. Ressalvado o disposto no art. 1.004 e seu
parágrafo único, pode o sócio ser excluído judicialmente,
mediante iniciativa da maioria dos demais sócios, por falta
grave no cumprimento de suas obrigações, ou, ainda, por
incapacidade superveniente.
Parágrafo único. Será de pleno direito excluído da
sociedade o sócio declarado falido, ou aquele cuja quota
tenha sido liquidada nos termos do parágrafo único do art.
1.026.”
Nesse aspecto, vale transcrever a crítica feita por Fábio Ulhoa
Coelho49, no seguinte sentido:
“Para as questões normalmente enfrentadas pelo direito
comercial, a inovação – inspirada no Código Civil italiano
de 1942 (art. 2.270) – é, como dito de início,
preocupante. Fundamentalmente, porque ela é
inconciliável com o moderno princípio da preservação da
empresa. Se a sociedade - como é usual – não possui
em caixa disponibilidade para realizar o depósito previsto
em lei, só poderá obtê-la por meio de empréstimo
bancário ou venda de ativos; nas duas hipóteses, a
empresa é afetada, seja pelos encargos do mútuo
bancário, que deverá suportar, seja pelo desinvestimento.
49 Ob. Cit. Pág. 38
72
E quando se afeta a empresa, em geral, seus
empregados, consumidores, fornecedores, e todos que
gravitam em torno dela, podem também ser atingidos.”
Em suma, pode-se dizer que a doutrina vem apontando algumas
alternativas:
(a) a penhora de cotas por dívida particular do sócio é possível, tendo
em vista que não há empecilho legal para tanto, ao revés o art 655, VI, do
CPC, expressamente, contemplou, a penhora de “ações e quotas de
sociedades empresárias”;
(b) A sociedade pode remir a execução. Esta opção traria duas
conseqüências: ou a sociedade tão somente se sub-roga no crédito do
exeqüente, ou adquire, por si própria, as cotas (há boa parcela da doutrina,
inclusive a JUCERJA50, que entende possível, mesmo na omissão do Código
Civil, a aquisição de cotas pela sociedade limitada);
(c) Os demais sócios podem adquirir as cotas do executado, exercendo
direito de preferência (aplicação dos artigos 1117 a 1119 do CPC);
(d) A execução poderia recair sobre os lucros a que teria direito o
sócio-executado, até o montante da dívida (hipótese prevista no art. 1026 do
Código Civil) ;
(e) Poderia ocorrer uma dissolução parcial da sociedade, sendo
liquidadas as cotas do sócio-executado, e o respectivo valor depositado em
50 Enunciado JUCERJA nº 42: A sociedade limitada pode adquirir suas próprias quotas e mantê-las em tesouraria, desde que seus administradores declarem, conjuntamente com um profissional de contabilidade que, examinando o Balanço especialmente levantado, verificaram que ela possui reservas livres em valor suficiente para a aquisição das quotas. §1º - A declaração referida no caput pode ser clausulada no texto do Contrato Social, ou ser apresentada em anexo do mesmo, sob a forma de declaração em separado. §2º - Quando em tesouraria, as quotas não podem ser consideradas no cálculo para fins do quorum de instalação, nem do quorum de deliberação; da mesma forma, não lhes assiste o direito de participação na distribuição do lucro.
73
juízo (hipótese prevista no art. 1026, parágrafo único, do Código Civil). Essa
opção deve se adotada com cautela, de modo que não comprometa a
preservação da empresa; e
(f) Finalmente, na hipótese de a sociedade ou os sócios não exercerem
essas faculdades havendo restrição à livre cessão das cotas, o terceiro
ingressaria na sociedade, resguardando-se aos sócios, entretanto, o direito de
optar por promover sua exclusão, com o pagamento de seus haveres, se assim
for de sua conveniência, por efetivamente resultar rompida a affectio societatis.
Qualquer dessas alternativas, com as devidas ponderações e cautelas
na hipótese concreta, trará uma adequada conciliação entre interesses opostos
em jogo: o do credor, que faz jus ao recebimento do seu crédito; e o interesse
dos demais sócios, que não podem ser compelidos à aceitação de um terceiro
estranho, o que comprometeria a persecução dos objetivos comuns da
sociedade.
3.2.4 – O que esperar da jurisprudência?
Ratificando a possibilidade da penhora, o Superior Tribunal de Justiça,
no julgamento do AgRg no Ag 894161-SC, de 11 de setembro de 2007, assim
se posicionou:
"TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE
INSTRUMENTO. EXECUÇÃO FISCAL. INEXISTÊNCIA
DE OMISSÃO NO ACÓRDÃO A QUO. PENHORA DE
COTAS DE SOCIEDADE DE RESPONSABILIDADE.
POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. MATÉRIA DE
PROVA. PRINCÍPIO DA MENOR ONEROSIDADE.
SÚMULA 7/STJ.
1. Cuida-se de agravo regimental interposto por Indústria
e Comércio Arno Gartner Ltda. contra decisão com o
seguinte entendimento: a)não consta o vício da omissão
a ensejar a anulação do julgado por violação do art. 535,
74
II, do CPC; b) possibilidade de penhora de cotas de
responsabilidade limitada encontra-se em sintonia com o
entendimento deste STJ; c) questões de ordem fática não
podem ser revistas na via especial em face da vedação
sumular n. 7/STJ.
2. Entendimento do TRF da 4ª Região de que inexiste
óbice à penhorabilidade de cotas sociais em virtude de
dívida particular não concernente à empresa encontra
respaldo na jurisprudência deste STJ:"As cotas sociais
podem ser penhoradas, pouco importando a restrição
contratual, considerando que não há vedação legal para
tanto e que o contrato não pode impor vedação que a lei
não criou" (REsp 234.391/MG, DJ de 12/02/2001).
3. De igual modo: REsp 712.747/DF, Rel. Min. Castro
Filho, DJ de 10/04/2006, AgRg no Ag 475.591/RS, Rel.
Min. Carlos Alberto Menezes Direito, DJ de 23/06/2003,
AgRg no Ag 347.829/SP, Rel. Min. Ari Pargendler, DJ de
01/10/2001.
4. A alegação de que a execução não se processou em
obediência ao que dispõe o art. 620 do CPC (menor
onerosidade), porquanto existentes outros bens passíveis
de penhora enseja a análise de questões fáticas.
Incidência da Súmula n. 7/STJ.
5. Ausência de violação do art. 535 II, do CPC, já que o
Tribunal de origem, posto que com fundamento diverso
do pretendido pela recorrente, analisou de forma efetiva a
matéria posta em debate na lide.
6. Agravo regimental não-provido."
Na mesma linha, a decisão abaixo transcrita:
“1. As cotas sociais podem ser penhoradas, pouco
importando a restrição contratual, considerando que não
75
há vedação legal para tanto e que o contrato não pode
impor vedação que a lei não criou.
2. A penhora não acarreta a inclusão de novo sócio,
devendo ser “facultado à sociedade, na qualidade de
terceira interessada, remir a execução, remir o bem ou
conceder-se a ela e aos demais sócios a preferência na
aquisição das cotas, a tanto por tanto (CPC, arts.1.117,
1.118 e 1.119)”, como já acolhido em precedente da
Corte.
3. Recurso especial não conhecido.
(REsp 234.391/MG, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO
MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, julgado em
14.11.2000, DJ 12.02.2001 p. 113).”
Em sentido contrário:
“As quotas, em princípio, são penhoráveis. Havendo,
entretanto, cláusula impediente, cumpre respeitar a
vontade societária, preservando-se a afectio societatis,
que restaria comprometida com a participação de um
estranho não desejado. Recurso conhecido e provido.”
(REsp 148.947/MG, Rel. Ministro CARLOS ALBERTO
MENEZES DIREITO, TERCEIRA TURMA, julgado em
15.12.2000, DJ 29.04.2002 p. 241).
3.2.5 – A posição da Junta Comercial do Estado do Rio de Janeiro
A União, no exercício de sua função de legislar sobre registros
públicos51, editou a Lei nº 8.934/94, segundo a qual os serviços de Registro do
Comércio devem ser desempenhados pelo Sistema Nacional de Registro do
Comercio (SINREM), cabendo ao órgão federal (Departamento Nacional de 51 Art. 22 da CRFB: Compete privativamente à União legislar sobre: XXV - registros públicos;
76
Registro do Comércio – DNRC), supervisionar, orientar, coordenar e
normatizar as atividades de registro de empresas, ficando delegadas às
estruturas estaduais (Juntas Comerciais) apenas a execução do serviço de
registro52.
Transcreve-se, por esclarecedor, a lição de Fabio Ulhoa Coelho53:
“A vinculação hierárquica a que se submetem as Juntas é
de natureza híbrida. Em matéria de direito comercial e
atinente ao registro de comércio, ela se encontra sujeita
ao DNRC, órgão federal; nas demais matérias (assim, o
direito administrativo e financeiro), o vínculo de
subordinação se estabelece com o governo da unidade
federativa que integra.”
A Junta Comercial do Estado do Rio de Janeiro - JUCERJA é uma
Autarquia Estadual, instituída pela Lei n.º 1.289 de 12.04.88, que tem por
finalidade dar garantia, publicidade, autenticidade, segurança e eficácia aos
atos jurídicos das empresas mercantis, submetidos a registro; cadastrar as
empresas nacionais e estrangeiras em funcionamento no País e manter
atualizadas as informações pertinentes; e ainda proceder à matrícula dos
agentes auxiliares do comércio, bem como ao seu cancelamento.
Assim, a Lei nº 8.934/94 possui norma expressa no sentido de que
compete às Juntas Comerciais a análise das formalidades legais dos
instrumentos apresentados para arquivamento, in verbis:
52 Art. 3º Os serviços do Registro Público de Empresas Mercantis e Atividades Afins serão exercidos, em todo o território nacional, de maneira uniforme, harmônica e interdependente, pelo Sistema Nacional de Registro de Empresas Mercantis (Sinrem), composto pelos seguintes órgãos: I - o Departamento Nacional de Registro do Comércio, órgão central Sinrem, com funções supervisora, orientadora, coordenadora e normativa, no plano técnico; e supletiva, no plano administrativo; II - as Juntas Comerciais, como órgãos locais, com funções executora e administradora dos serviços de registro. 53 COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de Direito Comercial, vol. 1: direito de empresa. 12ª ed. Ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 69
77
“Art. 40. Todo ato, documento ou instrumento
apresentado a arquivamento será objeto de exame do
cumprimento das formalidades legais pela Junta
Comercial.
§ 1º Verificada a existência de vício insanável, o
requerimento será indeferido; quando for sanável, o
processo será colocado em exigência.”
Nas palavras de Sergio Campinho54, “eventuais irregularidades
encontradas ensejam notificação do requerente que, sendo possível, poderá
saná-las, observando as formalidades legais exigidas”.
Dessa forma, a JUCERJA, já teve a oportunidade de se manifestar
sobre o assunto e firmou entendimento55, segundo o qual “em qualquer caso
que envolva anotação prevendo a penhora de cotas, o que importa é que a
penhora das cotas não impede sua transferência, apenas esta se torna ineficaz
em relação ao processo de execução, de forma que as cotas continuariam
garantindo a execução, mesmo após a cessão. Assim, não há
incompatibilidade entre o arquivamento ora pretendido e a ordem determinada
no ofício.“
Diante disso, a JUCERJA segue a doutrina majoritária sobre o tema,
no sentido de que são penhoráveis as cotas sociais por dívidas particulares
dos sócios.
54O Direito de Empresa à luz do Novo Código Civil. 7ª ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2006. p. 346 55 Conforme pareceres juntados ao ANEXO I desta monografia proferidos por Procuradores do Estado do Rio de Janeiro, lotados na Procuradoria Regional da autarquia.
78
CONCLUSÃO
A regras acerca da penhora de cotas previstas no Código Civil de 2002
representam avanço legislativo com relação à Legislção anterior, pondo termo,
assim, à longa discussão sobre a possibilidade, ou não, de a excussão recair
sobre a cota pertencente ao sócio-executado.
O parágrafo único, do art. 1.026, admitiu, implicitamente, a penhora de
cotas de sociedade limitada, pois, a teor da regra, pode o credor requerer a
liquidação da cota do devedor, cujo valor, apurado na forma do art. 1.031
(levantamento de balanço especial), será depositado em dinheiro, no juízo da
execução, até noventa dias após aquela liquidação.
Apesar do Código Civil não dispor sobre a possibilidade de penhora
das cotas sociais da sociedade limitada por dívida particular de sócio, a matéria
é regulada no capítulo das sociedades simples, sendo aplicável, em sua
inteireza, para a sociedade limitada, não somente em razão da omissão do
legislador, ao tratar da matéria no capítulo correspondente, mas também
porque, admitida expressamente pela lei a excussão de parcela do capital
social em sociedade intuitu personae – como é a sociedade simples –, não há
qualquer óbice para sua aplicação no campo societário tipicamente de capital
ou misto, natureza a que se subordina a sociedade limitada.
Vale registrar que o art. 1.026, do CC/02, criou um benefício de ordem,
em favor da sociedade. Ou seja, a cota só é penhorável na insuficiência de
outros bens, sendo somente viável a penhora das cotas sociais depois de
esvaziado todo o patrimônio particular do sócio.
Deve-se atentar também ao princípio da execução menos gravosa,
vale dizer, as cotas só serão penhoras na absoluta falta de outros bens
particulares penhoráveis (art. 620, do CPC).
79
Acredita-se, entretanto, que a solução prevista na legislação não
invova nessa seara, eis que a jurisprudência já inclinava sua posição para
solucionar a questão dessa mesma forma, como exposto no subitem 3.2.2 -
Breve histórico.
Nesse cenário, parece importante avaliar as alternativas que a doutrina
vem apontando para a efetivação da penhora de cotas, notadamente quanto às
consequencias e aos efeitos na sociedade limitada.
Assim, com as devidas ponderações e cautelas na hipótese concreta,
será necessária uma adequada conciliação entre interesses opostos em jogo: o
do credor, que faz jus ao recebimento do seu crédito; e o interesse dos demais
sócios, que não podem ser compelidos à aceitação de um terceiro estranho, o
que comprometeria a persecução dos objetivos comuns da sociedade.
Nesse sentido, vale observar ainda a crítica feita pelo autor Fábio
Ulhoa Coelho, no sentido de ser inconciliável a penhora de cotas e o princípio
da preservação da empresa.
O Código Civil reconhece, no exercício da atividade empresarial, a
existência de interesses internos e externos que devem ser respeitados, e não
só os das pessoas que contribuem diretamente para o funcionamento da
empresa, como os capitalistas e trabalhadores, mas também os interesses da
comunidade em que ela atua.
É que na hipótese provável de a sociedade não possuir fundos para a
realização do depósito previsto em lei, somente reunirá condições de fazê-lo
mediante a contratação de empréstimo bancário ou pela venda de ativos. Em
qualquer dessas hipóteses, a empresa será fatalmente afetada, seja pelos
juros do mútuo contraído com instituição financeira que deverá arcar, seja pela
descapitalização. Essa crise não afetará somente a empresa, mas também
todos aqueles que dela dependem, é dizer, empregados, consumidores,
fornecedores, o fisco etc.
80
Face ao exposto, a normatização da penhora de cotas tem por principal
mérito trazer maior segurança para os operadores do direito, quanto à
possibilidade de a apreensão judicial recair sobre as cotas pertencentes ao
sócio-devedor, mesmo cuidando-se de sociedade cujo contrato social estipule
a intransferibilidade das cotas, tendo em vista algumas alternativas que a
jurisprudência e a doutrina vêm apontando, a fim de não permitir a entrada de
estranhos na sociedade.
81
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
Bandeira de Mello, Celso Antônio. Natureza e Regime jurídico das Autarquias,
São Paulo:Ed.RT, 1968.
Borba, José Edwaldo Tavares, Direito Societário, 13ª ed. Ver., aum. E atual –
Rio de Janeiro: Renovar 2012.
Campinho, Sérgio. O direito de empresa à luz do novo código civil – 8ª ed. Rev.
Atual. de acordo com a Lei Complementar nº 123/2006 e com a Lei Ordinária nº
11.382/2006 – Rio de Janeiro: Renovar, 2007.
Campinho, Sérgio. O Direito de Empresa à luz do Novo Código Civil. 7ª ed. Rio
de Janeiro: Renovar, 2006.
Coelho, Fábio Ulhoa. A sociedade limitada no novo código civil. São
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COELHO, Fabio Ulhoa. Curso de Direito Comercial, vol. 1: direito de empresa.
12ª ed. Ver. e atual. São Paulo: Saraiva, 2008.
Diniz, Maria Helena. Código Civil Anotado. 13ª. Ed. rev. aum. e atual. São
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Gonçalves, Carlos Roberto. Direito Civil brasileiro, volume I: parte geral, 6ª Ed.
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Lobo, Jorge Joaquim. Sociedades Limitadas, volume I. Rio de Janeiro:Forense,
1ª ed. 2004.
SundFeld, Carlos Ari. Fundamentos de Direito Público, 4ª. Ed. rev., atual e
ampl. São Paulo:Malheiros Editores, 2009.
82
Theodoro Júnior, Humberto. Curso de Direito Processual Civil – Processo de
Execução e Cumprimento de Sentença, Processo Cautelar e Tutela de
Urgência. Rio de Janeiro:Forense, 42ª Ed. 2008.
84
Proc.: 66-2012/337474-0
SERV WEST DE BANGU SERVIÇOS TECNICOS DE REVESTIMENTOS LTDA-ME.
NIRE: 3320675939-5
Sr. Julgador,
De acordo com autorização do Procurador Regional, informo que há
precedentes sobre o tema, conforme Pareceres nº. 328/2011; 545/2010 e
128/2010-GTB–PRJ-JUCERJA (cópias anexas), que concluíram pela possibilidade da
transferência da titularidade de cotas oneradas com penhora.
Caso remanesça alguma dúvida a ser dirimida, sugiro nova remessa
a esta Procuradoria.
Rio de Janeiro, 15 de outubro de 2012.
Bianca Obadia Profissional Superior de Registro de Empresa
Mat.: 0700117-5
85
Parecer n° _____/2012-HBR-JUCERJA
Proc.: 50-2012/383342-6
L. J. INDUSTRIA E COMERCIO DE LAJES LTDA ME
NIRE: 3320643142-0
Sr. Julgador,
Trata-se de pedido de arquivamento da 2ª Alteração Contratual da
sociedade L. J. INDUSTRIA E COMERCIO DE LAJES LTDA ME, datada de
01/11/2012, na qual foi deliberada a cessão e a transferência da totalidade de cotas do
sócio JOÃO CARLOS DE SOUZA OLIVEIRA ao sócio LUIS CLAUDIO DE SOUZA
OLIVEIRA e à nova sócia ANDRESSA DOS REIS OLIVEIRA, ora admitida na sociedade;
e o aumento do capital social.
O Julgador solicitou pronunciamento desta Procuradoria Regional, nos
seguintes termos (fl. 02v.):
“Dr. Procurador da JUCERJA, No presente procedimento de alteração contratual ocorre a deliberação de cessão de cotas e retirada da sociedade empresarial do sócio quotista João Carlos de Souza Oliveira, bem como aumento do capital social. Entretanto, consta da FIT, ofício do C. TRT da 1ª Região, 1ª Vara do Trabalho de Itaperuna, Processo nº 0069300-35.2006.5.01.0471, determinando o registro da indisponibilidade das quotas sociais pertencentes ao referido sócio, com data de ordem em 09/08/2011. Assim, solicito de V. Exa., orientação quanto à medida a ser tomada para a análise do presente processo, devendo haver pedido de cumprimento e exigência ou indeferimento de plano.”
Examinando o presente processo, verifica-se anotação no sistema
referente ao Ofício nº 1103/2011, de 23/08/2011, da 1ª Vara do Trabalho de
Itaperuna, comunicando que foi decretada “a indisponibilidade das quotas sociais
pertencentes a JOÃO CARLOS DE SOUZA OLIVEIRA, CPF Nº 903.144.177-53 referentes
à empresa L. J. INDUSTRIA E COMÉRCIO DE LAJES LTDA – ME, CNPJ Nº
03.600.229/001-55 – NIRE: 33.2.0643142-0, em razão da penhora realizada (...)”
(cópia anexa).
86
No caso concreto, a decisão judicial determinou a indisponibilidade das
quotas sociais, em razão de penhora.
Ademais, verifica-se do processo judicial, que foi designada data de
leilão para venda das cotas sociais (27/11/2012), sem se ter informação se houve
arrematante, sendo de ressaltar ainda que a alteração contratual apresentada a
registro é anterior à data do leilão judicial (cópias anexas).
Do exposto, opina-se pelo indeferimento do ato, visto haver
indisponibilidade das quotas decretada em sentença judicial, impedindo, portanto, o
arquivamento do ato.
Rio de Janeiro, 07 de janeiro de 2013.
Bianca Obadia Profissional Superior de Registro de Empresa
Mat.: 0700117-5
De acordo,
Henrique Bastos Rocha Procurador-Adjunto da JUCERJA
87
Proc.: 00-2006/074604-4
COTA BARROS AUTO PEÇAS LTDA ME
NIRE: 332.0678748-8
“Cotas penhoradas. Possibilidade de transferência. Erro material. Necessidade de retificação.”
Sr. Julgador,
Trata-se de pedido de reconsideração quanto à exigência
relativa ao arquivamento da 4ª alteração contratual da COTA BARROS AUTO
PEÇAS LTDA ME, em razão da penhora das cotas de Carlos Alberto dos
Santos Maia Junior.
Através dessa 4ª alteração contratual, os sócios Stallen
de Oliveira Batista e Marluce de Oliveira Nascimento se retiram da sociedade,
transferindo todas as suas cotas à nova sócia Viviane dos Santos de Macedo.
Inicialmente, cabe esclarecer que não há qualquer
impedimento quanto à cessão de cotas realizada no ato em tela, uma vez que
não se refere às cotas penhoradas, conforme se verifica no oficio do juízo (FIT
- fls. 02).
Além disso, ainda que se tratasse de cessão de cotas
penhoradas, não haveria qualquer impedimento para o arquivamento do ato,
pois, a penhora apenas cria um direito de preferência para o credor, não
impedindo, contudo, a alienação dos bens. É válida a alienação, mas o novo
proprietário continuará suportando o ônus incidente sobre o bem.
Cabe, contudo, observar a existência de erro material no
instrumento em questão, no que se refere a distribuição do capital social
(fls.04), uma vez que não há qualquer referência a transferência de cotas ao
88
sócio Carlos Alberto dos Santos Maia Junior, sendo certo que de acordo com o
último ato arquivado ele era detentor de 5.000 (cinco mil) cotas (5% do capital
social), enquanto que no ato que se pretende arquivar (fls. 04) sua participação
seria de 5 (cinco) cotas (10% do capital social), o que se afigura incongruente,
exigindo retificação.
Além disso, os sócios retirantes detinham, juntos, 49.000
cotas, razão pela qual a sócia ingressante, que adquiriu toda a participação dos
sócios retirantes, deveria necessariamente possuir 49.000 cotas, e não 45
cotas, como consta do contrato consolidado.
Do exposto, opina-se pela formulação de exigência para
retificação do número de cotas pertencentes ao sócio Carlos Alberto dos
Santos Maia Junior e à nova sócia Viviane dos Santos de Macedo.
Rio de Janeiro, 18 de junho de 2007.
Gustavo Tavares Borba
Procurador Regional da JUCERJA
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Proc.: 00-2007/184456-2
CLAPE – PARTICIPAÇÕES E EMPREENDIMENTOS LTDA.
NIRE: 3320146650-1
Alteração Contratual. Transferência de cotas. Registro que contém anotação, prevendo a penhora de cotas de sócio. Possibilidade de arquivamento.
Sr. Julgador,
Trata-se de pedido de arquivamento da 14ª alteração contratual da
sociedade CLAPE – PARTICIPAÇÕES E EMPREENDIMENTOS LTDA., deliberando
sobre a retirada da sócia MARIA TEREZA COUTO GONZALEZ que, por conseguinte,
cede suas 144.000 cotas aos sócios CLAUDIA COUTO GONZALEZ (72.000) e
KLEBER COUTO GONZALEZ (72.000).
Consulta-nos o julgador, em face da anotação contida na “FIT”, se a ordem
judicial representa algum óbice ao arquivamento do ato
A anotação consiste no ofício n.º 934/98, proveniente da 23ª Vara
Cível/RJ, referente ao processo nº 98001058984-2 (em que o sócio PEDRO
GONZALEZ MENDEZ, dentre outros, figura como réu) que solicita as providências
necessárias para que as penhoras que recaíram sobre as cotas das sociedades indicadas
em seu anexo sejam averbadas nos seus respectivos registros.
Inicialmente, esclareça-se que houve um equívoco no ofício quanto à
indicação, pela autora, dos bens a serem penhorados. Isso porque ela propõe a penhora
de “18.000 cotas do capital social da CLAPE – PARTICIPAÇÕES E
EMPREENDIMENTOS LTDA.” (fl.13), porém, referindo-se a ARTURO RECAREY
VILAR, o qual nunca teve participação na sociedade em questão. Na verdade, essas
18.000 cotas pertencem ao sócio PEDRO GONZALEZ MENDEZ, consoante a 11ª
alteração contratual, arquivada na JUCERJA sob o n.º 0885689, em 10/12/1997, sendo
90
certo que essas são as cotas que se encontram penhoradas, devendo, portanto, ser
considerado que a averbação a elas diz respeito.
Entretanto, em qualquer caso que envolva anotação prevendo a penhora de
cotas, o que importa é que a penhora das cotas não impede sua transferência, apenas
esta se torna ineficaz em relação ao processo de execução, de forma que as cotas
continuariam garantindo a execução, mesmo após a cessão. Assim, não há
incompatibilidade entre o arquivamento ora pretendido e a ordem determinada no
ofício.
Do exposto, opina-se no sentido de que a anotação constante do ofício n.º
934/98 não impede o arquivamento do ato.
Rio de Janeiro, 20 de dezembro de 2007.
Gustavo Tavares Borba Fernanda Kelly Marinho Lemberck
Procurador Regional da JUCERJA Estagiária da PGE
Matrícula: 00/138-14
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Proc: 00-2008/032990-0
ED 95 SERVIÇOS E PARTICIPAÇÕES LTDA.
NIRE: 332.0710911-4
Sr. Julgador,
A sociedade ED 95 SERVIÇOS E PARTICIPAÇÕES LTDA.
solicita o arquivamento de 04ª Alteração Contratual, na qual estipula-se a redução
do capital social, mediante o cancelamento de 1.000.000 (um milhão de quotas),
com valor nominal de R$ 1,00 (um real) cada, de titularidade do sócio OMAR
RESENDE PERES FILHO.
Ocorre que há decisão judicial, de 07/12/2007, determinando a
realização de penhora das cotas da empresa em questão, pertencentes ao sócio
OMAR RESENDE PERES FILHO, até o valor da execução de R$ 332.323,80
(trezentos e trinta e dois mil, trezentos e vinte e três reais e oitenta centavos)
atualizado até 30/06/2006.
O Sr. Julgador solicita o pronunciamento desta Procuradoria
quanto a questão.
Não se afigura possível a redução do capital social no que se
refere à participação de OMAR RESENDE PERES FILHO, pois tal redução
representaria a diminuição de valor das cotas penhoradas, o que esvaziaria a
garantia judicial, podendo configurar, até mesmo, fraude à execução em curso.
Além disso, deve ser ressaltado que a redução voluntária de
capital não se enquadra em nenhuma hipótese prevista no artigo 1.082 do CC,
posto que não foi especificada a razão para a redução.
Tampouco foram cumpridos os requisitos do art. 1.084 do Código
Civil para a redução de capital, por ser excessiva em relação ao objeto, o que, ao
que tudo indica, parece ser a hipótese em tela.
92
Dessa forma, face aos fundamentos expostos, opinamos pelo
indeferimento do pedido de arquivamento da 04ª alteração contratual da sociedade
ED 95 SERVIÇOS E PARTICIPAÇÕES LTDA.
Rio de Janeiro, 30 de abril de 2008.
56
Daniel Galliza Lorenzo Gonzalez Gustavo Tavares Borba
Estagiário da PGE Procurador Regional da JUCERJA
93
Parecer n° 197/2009-JVM-JUCERJA
Proc: 00-2009/180888-0 e 00-2009/180874-0
INTELIG TELECOMUNICAÇÕES LTDA.
NIRE: 332.0627589-4
Sra. Julgadora,
Trata-se de pedido de arquivamento de Ata de Reunião de Sócios
e de Aditamento a Contrato de Penhor de Cotas aprovado por aquela, datados
de 03/03/2009, da sociedade INTELIG TELECOMUNICAÇÕES LTDA.
O Sr. Julgador formulou consulta nos seguintes termos:
“À Procuradoria, Para que exare parecer a respeito da possibilidade da empresa “INTELIG TELECOMUNICAÇÕES LTDA.” arquivar os processos 00-2009/180888-0 e 00-2009/180874-0, tendo em vista as ordens judiciais de penhor de ações e anotações constantes na FIT (Ficha de Informação Técnica).”
Conforme se depreende da análise dos processos, bem como do
Ofício nº 2042/2008, da 38ª Vara Cível Central, da Comarca de São Paulo e do
Ofício JUCERJA VP/Co nº 2882/2009 (em anexo), os documentos ora
apresentados a arquivamento fazem referência a acordo homologado
judicialmente nos autos do processo nº 583.00.2008.202339-6, através do qual
os sócios da INTELIG TELECOMUNICAÇÕES LTDA. empenham suas cotas
em garantia ao pagamento da dívida executada.
Inicialmente, cumpre observar que as cotas sociais são bens que
integram o patrimônio dos sócios, não da sociedade. Dessa forma, os sócios,
ao constituírem penhor (espécie de garantia real) sobre suas cotas, estão
onerando o seu patrimônio, não o da sociedade. Se a dívida garantida não for
paga, o credor poderá promover a execução das cotas sociais para a
satisfação do seu crédito. Como se vê, o penhor das cotas e sua eventual
execução não repercutirão no capital social, não implicando qualquer redução
94
patrimonial.
Desta forma, as cotas podem ser dadas em penhor quando não
existir nenhum obstáculo quanto à sua disposição nem outras restrições que
impeçam sua transferência. Neste sentido, cabe esclarecer que a penhora
decorrente das demais ordens judiciais não constitui óbice à constituição da
garantia.
Não há restrição à disponibilidade de cotas constritas, pois, a teor
do que dispõe o artigo 61257, do Código de Processo Civil, a penhora apenas
cria um direito de preferência para o credor, ou seja, constitui um ônus sobre o
bem, que continuará a ser suportado pelo novo proprietário.
Também a doutrina e a jurisprudência pátrias consolidaram
entendimento no sentido de que a penhora não torna os bens indisponíveis ou
inalienáveis, conforme se depreende da lição de Humberto Theodoro Júnior:
“A apreensão judicial, decorrente da penhora, não retira os bens da posse (indireta) e do domínio do dono. Ditos bens ficam apenas vinculados à execução, sujeitando-se ao poder sancionatório do Estado. Não se verifica, porém, sua total indisponibilidade ou inalienabilidade. O efeito da penhora, como bem registrou Lopes da Costa, ‘é o de tornar ineficaz em relação ao exeqüente os atos de disposição praticados pelo executado sobre os bens penhorados’.
Por isso mesmo, já decidiu o Tribunal de Justiça de Minas Gerais, com inteiro acerto, que o fato de os bens acharem-se onerados com penhora não constitui obstáculo ao respectivo registro traslatício da propriedade, que, no domínio do novo proprietário, permanecerá suportando os gravames nela incidentes.”58
Além disso, à JUCERJA não compete o exame do mérito do acordo
57 “Art. 612. Ressalvado o caso de insolvência do devedor, em que tem lugar o concurso universal (art. 751, III), realiza-se a execução no interesse do credor, que adquire, pela penhora, o direito de preferência sobre os bens penhorados.” 58 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Curso de Direito Processual Civil. ed. 42. Rio de Janeiro: Forense, 2008. v. II. p. 297
95
aprovado judicialmente, mas apenas conferir adequada publicidade aos atos
arquivados, de forma a garantir informações adequadas às pessoas que
pretendem contratar com as empresas de cujos assentamentos é guardiã
(artigo 29, da Lei 8.934/94).
Assim, com todas as informações devidamente disponibilizadas,
cabe às empresas envolvidas no acordo decidir se aceitam ou não, como
garantia, cotas já penhoradas em outros processos judiciais, restando tal
situação completamente fora do campo de atuação deste ente registral.
Do exposto, opina-se pelo prosseguimento da análise do ato.
Rio de Janeiro, 30 de setembro de 2009.
JOSENETE VELOSO MONTEIRO
Procuradora-Adjunta da JUCERJA