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Primeiro, o chamado à autonegação. O convite de Jesus é claro: "Se alguém quer vir após mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-me" (Marcos 8:34). Jesus acaba de predizer os seus sofrimentos e morte pela primeira vez. "Era necessário" que lhe acontecesse, diz ele (v. 31). Mas agora ele expressa implicitamente um "deve" aos seus seguidores também. Ele deve ir à cruz; eles devem tomar a sua cruz e segui-lo. Deveras, fazê-lo "diariamente". E, como a contraparte negativa, se alguém não toma a sua cruz e não o segue, não é digno dele e não pode ser seu discípulo.4 Dessa maneira, pode-se dizer, todo cristão é tanto um Simão de Cirene quanto um Barrabás. Como Barrabás, escapamos da cruz, pois Cristo morreu em nosso lugar. Como Simão de Cirene, carregamos a cruz, pois ele nos chama a tomá- la e segui-lo (Marcos 15:21). Os romanos haviam feito da cruz uma vista comum em todas as suas províncias colonizadas, e a Palestina não era exceção. Todo rebelde condenado à crucificação era forçado a levar a sua cruz, ou pelo menos o braço da cruz, para o local da execução. “Plutarco escreveu que ‘‘todo criminoso condenado à morte carrega nas costas a sua própria cruz”. De modo que João escreveu acerca de Jesus "carregando a sua cruz, saiu para o lugar chamado Calvário" (João 19:17). Tomar a cruz, portanto, e seguir a Jesus, é "colocar-se na posição de um condenado a caminho da execução". Pois se estamos seguindo a Jesus com uma cruz nos ombros, há somente um lugar para o qual nos dirigirmos: o local da crucificação. Como disse Bonhoeffer: "Quando Cristo chama uma pessoa, ele a chama para vir e morrer". Nossa "cruz", portanto, não é um marido irritadiço ou uma mulher rancorosa. É, antes, o símbolo da morte do eu. Embora Jesus possa ter tido a possibilidade de martírio em mente, a natureza universal de seu chamado ("se alguém.") sugere uma aplicação mais ampla. Certamente é a autonegação que, mediante essa imagem vivida, Jesus está descrevendo. Negar a nós mesmos é comportar-nos para com nós mesmos como Pedro o fez para com Jesus quando o negou três vezes. Ele o deserdou, repudiou, voltou-lhe as costas, A autonegação não é negar a nós mesmos certos luxos como bombons, bolos, cigarro e coquetéis (embora possa incluir essas coisas); é, em verdade, negar ou deserdar os nossos próprios seres, renunciando a nosso suposto direito de seguir o nosso próprio caminho. "Negar-se a si mesmo é. . . voltar-se da idolatria da centralidade do eu". Paulo deve estar-se referindo à mesma coisa quando escreveu que os que pertencem a Cristo "crucificaram a carne, com as suas paixões e concupiscências" (Gálatas 5:24). Quadro algum poderia ser mais gráfico do que esse: pegar um martelo e pregos a fim de pregar nossa natureza caída, e

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PRIMEIRA APOSTILO DE ESTUDO

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Primeiro, o chamado autonegao. O convite de Jesus claro: "Se algum quer vir aps mim, a si mesmo se negue, tome a sua cruz e siga-me" (Marcos 8:34). Jesus acaba de predizer os seus sofrimentos e morte pela primeira vez. "Era necessrio" que lhe acontecesse, diz ele (v. 31). Mas agora ele expressa implicitamente um "deve" aos seus seguidores tambm. Ele deve ir cruz; eles devem tomar a sua cruz e segui-lo. Deveras, faz-lo "diariamente". E, como a contraparte negativa, se algum no toma a sua cruz e no o segue, no digno dele e no pode ser seu discpulo.4 Dessa maneira, pode-se dizer, todo cristo tanto um Simo de Cirene quanto um Barrabs. Como Barrabs, escapamos da cruz, pois Cristo morreu em nosso lugar. Como Simo de Cirene, carregamos a cruz, pois ele nos chama a tom-la e segui-lo (Marcos 15:21).Os romanos haviam feito da cruz uma vista comum em todas as suas provncias colonizadas, e a Palestina no era exceo. Todo rebelde condenado crucificao era forado a levar a sua cruz, ou pelo menos o brao da cruz, para o local da execuo. Plutarco escreveu que todo criminoso condenado morte carrega nas costas a sua prpria cruz. De modo que Joo escreveu acerca de Jesus "carregando a sua cruz, saiu para o lugar chamado Calvrio" (Joo 19:17). Tomar a cruz, portanto, e seguir a Jesus, "colocar-se na posio de um condenado a caminho da execuo". Pois se estamos seguindo a Jesus com uma cruz nos ombros, h somente um lugar para o qual nos dirigirmos: o local da crucificao. Como disse Bonhoeffer: "Quando Cristo chama uma pessoa, ele a chama para vir e morrer". Nossa "cruz", portanto, no um marido irritadio ou uma mulher rancorosa. , antes, o smbolo da morte do eu.Embora Jesus possa ter tido a possibilidade de martrio em mente, a natureza universal de seu chamado ("se algum.") sugere uma aplicao mais ampla. Certamente a autonegao que, mediante essa imagem vivida, Jesus est descrevendo. Negar a ns mesmos comportar-nos para com ns mesmos como Pedro o fez para com Jesus quando o negou trs vezes. Ele o deserdou, repudiou, voltou-lhe as costas, A autonegao no negar a ns mesmos certos luxos como bombons, bolos, cigarro e coquetis (embora possa incluir essas coisas); , em verdade, negar ou deserdar os nossos prprios seres, renunciando a nosso suposto direito de seguir o nosso prprio caminho. "Negar-se a si mesmo . . . voltar-se da idolatria da centralidade do eu".Paulo deve estar-se referindo mesma coisa quando escreveu que os que pertencem a Cristo "crucificaram a carne, com as suas paixes e concupiscncias" (Glatas 5:24). Quadro algum poderia ser mais grfico do que esse: pegar um martelo e pregos a fim de pregar nossa natureza cada, e escorregadia na cruz, matando-a assim. A palavra tradicional para esse ato "mortificao"; a determinao contnua mediante o poder do Esprito Santo de mortificar "os feitos da carne", para que atravs dessa morte possamos viver em comunho com Deus.De fato, Paulo escreve em suas cartas acerca de trs diferentes tipos de morte e ressurreio, as quais so parte integrante de nossa experincia crist. Levanta-se muita confuso quando falhamos em diferen-las. A primeira (que j examinamos) a morte para o pecado e a subseqente vida para Deus, a qual acontece a todos os cristos mediante a virtude de nossa unio com Cristo em sua morte e ressurreio. Atravs dela partilhamos dos benefcios tanto da morte de Cristo (seu perdo) quanto da sua ressurreio (seu poder). Esse tipo de morte inerente nossa converso/batismo.A segunda a morte para o eu, a qual recebe vrios nomes, como tomar a cruz, ou negar, crucificar ou mortificar a ns mesmos. Como resultado, vivemos uma vida de comunho com Deus. Essa morte no algo que aconteceu a ns, e que agora se nos ordena que "consideremos" ou que recapitulemos dele, mas algo que ns mesmos deliberadamente devemos fazer, embora mediante o poder do Esprito, mortificando nossa antiga natureza. Deveras, todos os cristos o fizeram, no sentido de que um aspecto essencial de nosso arrependimento original e contnuo, e no podemos ser discpulos de Cristo sem ela. Mas temos de manter essa atitude, isto , tomar a nossa cruz diariamente.O terceiro tipo de morte e ressurreio o que mencionei no captulo 9. E o carregar em nosso corpo o morrer de Jesus, para que a vida dele seja revelada em nosso corpo (2 Corntios 4:9-10). Claramente, a arena dessa morte so os nossos corpos. Refere-se enfermidade, perseguio e mortalidade deles. nesse aspecto que Paulo podia dizer tanto "morro diariamente" (1 Corntios 15:30-31) quanto "enfrentamos a morte todo o dia" (Romanos 8:36). Pois uma fragilidade fsica contnua. Mas ento a "ressurreio", a vitalidade interior ou a renovao da vida de Jesus dentro de ns, tambm contnua (2 Corntios 4:16).Para resumir, a primeira morte legal; uma morte ao pecado mediante a unio com Cristo em sua morte ao pecado (levando a sua penalidade), e a ressurreio resultante com ele leva nova vida de liberdade a qual os pecadores justificados desfrutam. A segunda morte moral; uma morte para o ego medida que mortificamos a antiga natureza e os seus mpios desejos, e a ressurreio que se segue leva a uma nova vida de justia em comunho com Deus. A terceira morte fsica; uma morte para a segurana, um "ser entregue morte por amor de Jesus", e a ressurreio correspondente o poder de Cristo o qual ele aperfeioa em nossa fraqueza. A morte legal foi uma "morte para o pecado de uma vez por todas", mas as mortes moral e fsica so experincias dirias at mesmo contnuas para o discpulo cristo.Fico a imaginar a reao dos leitores at aqui, especialmente quanto nfase que dou ao morrer para o ego, ou, antes, mortific-lo, crucificando-o! Espero que voc se tenha sentido incomodado. Expressei uma atitude para com o ego to negativa que pode parecer que me pus ao lado dos burocratas e tecnocratas, dos etlogos e dos behavioristas, em diminuir o valor dos seres humanos. No que o que escrevi seja errado (pois foi Jesus quem ordenou que tomssemos a nossa cruz e o segussemos at morte), mas esse apenas um lado da verdade. Implica que nosso ser totalmente mau, e que, por causa dessa maldade, deve ser completamente repudiado, de fato, "crucificado".Afirmao prpriaAo lado do chamado explcito de Jesus autonegao encontra-se o seu chamado implcito auto-afirmao (o que no , de modo nenhum, a mesma coisa que amor prprio). Ningum que l os Evangelhos como um todo pode ter a impresso de que Jesus possui uma atitude negativa para com os seres humanos, nem que a tivesse estimulado nos outros. Acontece justamente o oposto.Considere primeiro, o ensino de Jesus acerca das pessoas. verdade que ele chamou a ateno para o mal e para as coisas feias que procedem do corao humano (Marcos 7:21-23). Entretanto, ele tambm falou do "valor" dos seres humanos aos olhos de Deus. So muito mais valiosos do que pssaros ou animais, disse ele. Qual era o fundamento desse juzo de valores? Deve ter sido a doutrina da criao, a qual Jesus tirou do Antigo Testamento, a saber, que os seres humanos so a coroa da atividade criadora de Deus, e que ele criou o homem sua prpria imagem. a imagem divina em ns que nos d o nosso valor distintivo. Em seu excelente livro Um Cristo Olha Para Si Mesmo o Dr. Anthony Hoekema cita um jovem negro norte-americano que, rebelando-se contra os sentimentos de inferioridade nele inculcados pelos brancos, pregou uma faixa na parede do seu quarto, a qual dizia: "Eu sou eu e sou bom, porque Deus no produz lixo".Segundo, temos de considerar a atitude de Jesus para com as pessoas. Ele no desprezou a ningum e a ningum rejeitou. Pelo contrrio, fez tudo o que podia para honrar queles a quem o mundo desonrava, e aceitar queles a quem o mundo abandonava. Ele foi corts com as mulheres em pblico. Convidou os pequenos que fossem a ele. Ele proferiu palavras de esperana aos samaritanos e aos gentios. Ele permitiu que leprosos se aproximassem e que uma meretriz o ungisse e lhe beijasse os ps. Ele fez amizade com os rejeitados da sociedade, e ministrou aos pobres e aos famintos. Em todo esse diversificado ministrio brilha o respeito compassivo que ele tinha para com os seres humanos. Ele reconheceu o valor dos homens e os amou, e, amando-os, aumentou-lhes ainda mais o valor.Terceiro, e em particular, devemos lembrar-nos da misso e morte de Jesus pelos seres humanos. Ele tinha vindo para servir, no para ser servido, dissera ele, e para dar a sua vida em resgate por muitos. Nada indica mais claramente o grande valor que Jesus atribua s pessoas do que a sua determinao de sofrer e morrer por elas.Ele era o Bom Pastor que foi ao deserto, enfrentando a dureza e arriscando-se ao perigo, a fim de procurar e salvar uma nica ovelha perdida. De fato, ele deu a sua vida pelas ovelhas. Somente quando olhamos para a cruz que vemos o verdadeiro valor dos seres humanos. Como se expressou William Temple: "O meu valor o valho para Deus; e esse grande e maravilhoso, pois Cristo morreu por mim".At aqui temos visto que a cruz de Cristo tanto uma prova do valor do ser humano quanto um quadro de como neg-lo ou crucific-lo. Como podemos resolver esse paradoxo bblico? Como possvel valorizar a ns mesmos e negar a ns mesmos ao mesmo tempo?Essa questo surge porque discutimos e desenvolvemos atitudes alternativas para com ns mesmos antes de termos definido o "ego" sobre o qual estamos falando. Nosso "ego" no uma entidade simples totalmente boa nem totalmente m, e, portanto, para ser totalmente avaliada ou totalmente negada. Pelo contrrio, nosso "ego" uma entidade complexa constituda de bem e mal, glria e vergonha, que por causa disso requer que desenvolvamos atitudes mais sutis para com ns mesmos.O que somos (nosso ego ou identidade pessoal) , em parte, resultado da criao (a imagem de Deus) e, em parte, resultado da Queda (a imagem estragada). O ego que devemos negar, rejeitar e crucificar o cado, tudo o que dentro de ns for incompatvel com Jesus Cristo {da os seus mandamentos: "negue-se a si mesmo" e ento "siga-me"). O ego que devemos afirmar e valorizar o criado, tudo o que em ns for compatvel com Jesus Cristo (da a sua afirmativa de que se perdermos a nossa vida mediante a negao prpria a encontraremos). A verdadeira autonegao (a negao de nosso ego falso e cado) no a estrada para a autodestruio, mas o caminho da autodescoberta.Assim, pois, devemos afirmar tudo o que somos mediante a criao: nossa racionalidade, nosso senso de obrigao moral, nossa sexualidade (quer masculina quer feminina), nossa vida familiar, nossos dons de apreciao esttica e criatividade artstica, nossa mordomia dos frutos da terra, nossa fome de amor e experincia de comunidade, nossa conscincia da majestade transcendental divina, e nosso impulso inato de nos prostrar e adorar a Deus. Tudo isso (e muito mais) faz parte de nossa humanidade criada. E verdade que essa natureza foi manchada e distorcida pelo pecado. Contudo, Cristo veio para redimi-la, no para destru-la. De modo que devemos, grata e positivamente, afirm-la.Entretanto, devemos negar ou repudiar tudo o que somos mediante a Queda: nossa irracionalidade, nossa perversidade moral, nosso obscurecimento das distines sexuais e nossa falta de domnio prprio sexual, nosso egosmo que deturpa a vida familiar, nossa fascinao pelo feio, nossa recusa indolente em desenvolver os dons de Deus, nossa poluio e o dano que causamos ao ambiente, nossas tendncias anti-sociais que inibem a verdadeira comunidade, nossa autonomia orgulhosa, e nossa recusa idolatra em adorar ao Deus vivo e verdadeiro. Tudo isso (e muito mais) faz parte de nossa humanidade decada. Cristo veio no a fim de redimi-la, mas para destru-la. De modo que devemos neg-la ou repudi-la.At aqui tenho deliberadamente simplificado o contraste entre a nossa criao e a nossa decadncia. Agora necessrio que modifiquemos o quadro, deveras o enriqueamos, de duas maneiras. Ambos os enriquecimentos so devidos introduo da redeno de Cristo no cenrio humano. Os cristos j no podem pensar em si mesmos somente como "criados e cados", mas, pelo contrrio, como "criados, cados e redimidos". E a injeo desse novo elemento nos d mais o que afirmar e mais o que negar.Primeiro, temos mais o que afirmar. Pois no somente fomos criados imagem de Deus, mas tambm recriados nela. A graciosa obra de Deus em ns, a qual de vrios modos retratada no Novo Testamento como "regenerao", "ressurreio", "redeno", etc, , em sua essncia, uma recriao. O nosso novo ser foi "criado para ser como Deus em verdadeira justia e santidade", e "est sendo renovado em conhecimento imagem do seu Criador". De fato, cada pessoa que est em Cristo "agora uma nova criatura". Isso significa que nossa mente, nosso carter e nossos relacionamentos esto sendo renovados. Somos filhos de Deus, discpulos de Cristo e santurio do Esprito Santo. Pertencemos nova comunidade que a famlia de Deus. O Esprito Santo nos enriquece com os seus frutos e dons. E somos herdeiros de Deus, antecipando com confiana a glria que um dia ser revelada. Tornar-se cristo uma experincia transformadora, a qual, ao nos transformar, transforma tambm nossa auto-imagem. Agora temos muito mais a afirmar, no por vanglria, mas por gratido. Pergunta o Dt. Hoekema como podemos declarar "sem valor" o que Jesus disse possuir grande valor? No possui valor ser filho de Deus, membro de Cristo e herdeiro do reino do cu? Assim, pois, uma parte vital de nossa afirmao prpria, a qual, na realidade, uma afirmao da graa de Deus nosso Criador e Redentor, o que nos tornamos em Cristo. "A base ltima da nossa imagem prpria positiva deve ser a aceitao de Deus de ns em Cristo".Segundo, os cristos tm mais a negar como tambm mais a afirmar. At aqui inclu somente nossa decadncia no que ela precisa ser negada. s vezes, contudo, Deus nos chama para que neguemos a ns mesmos em coisas que, embora em si mesmas no sejam erradas, nem possam ser atribudas queda, entretanto impedem que faamos a sua vontade particular. E por isso que Jesus, cuja humanidade foi perfeita e no cada, ainda teve de negar-se a si mesmo. Diz-nos a Escritura que "no julgou como usurpao o ser igual a Deus", isto , desfrutar egoisticamente dessa igualdade (Filipenses 2:6). A igualdade j lhe pertencia. Ele no se tornou igual a Deus como reclamaram seus crticos (Joo 5:18); ele era eternamente igual Deus, de modo que ele e seu Pai eram "um" (Joo 10:30). Contudo, ele no se apegou aos privilgios de sua situao, pelo contrrio, ele se esvaziou da sua glria. Mas o motivo pelo qual ele a colocou de lado no que lhe pertencesse por direito, mas que no a podia reter e ao mesmo tempo cumprir o seu destino de ser o Messias de Deus e o Mediador. Ele foi cruz em negao prpria, claro, no por que tivesse feito alguma coisa que merecesse a morte, mas porque era essa a vontade do Pai para ele segundo a Escritura, e se tinha entregue voluntariamente para fazer essa vontade. Durante toda a sua vida ele resistiu tentao de evitar a cruz. Nas palavras sucintas de Max Warren: "Todo o viver de Cristo foi um morrer". Ele negou-se a si mesmo a fim de se dar a si mesmo por ns.O mesmo princpio aplicvel aos seguidores de Cristo. "Tende a mesma mente", escreveu Paulo. Pois ele conhecia o chamado autonegao em sua prpria experincia apostlica. Ele possua direitos legtimos, por exemplo, de se casar e receber ajuda financeira, os quais deliberadamente rejeitou porque cria ser essa a vontade de Deus para ele. Ele tambm escreveu que cristos maduros devem estar dispostos a renunciar aos seus direitos e limitar as suas liberdades a fim de no fazer que irmos imaturos pequem. Ainda hoje alguns cristos so chamados a abrir mo da vida de casados, da segurana de um bom emprego, de uma promoo profissional ou de um lar confortvel, no porque essas coisas em si mesmas sejam erradas, mas por serem incompatveis com um chamado particular de Deus para irem ao alm-mar ou viverem nas reas mais pobres da cidade ou se identificarem mais intimamente com os destitudos e os famintos do mundo.H, portanto, uma grande necessidade de discernimento em nossa autocompreenso. Quem sou eu? O que o meu "ego"? A resposta que eu sou Jekyll e Hyde, um ser confuso, possuindo tanto dignidade porque sou criado e fui recriado imagem divina, quanto depravao porque ainda possuo uma natureza decada e rebelde. Sou ao mesmo tempo nobre e ignbil, lindo e feio, bom e mau, direito e retorcido, imagem e filho de Deus, e, contudo, s vezes concedo homenagem ao diabo de cujas garras Cristo me resgatou. O meu ser verdadeiro o que sou mediante a criao, o que Cristo veio a fim de redimir, e pelo chamado. Meu ser falso o que sou mediante a Queda, o que Cristo veio a fim de destruir.Somente quando discernirmos a ns mesmos, saberemos que atitude adotar para com os nossos egos. Devemos ser verdadeiros para com nosso ser verdadeiro e falsos para com nosso ser falso. Devemos ser corajosos em afirmar o que somos mediante a criao, redeno e chamado, e impiedosos em rejeitar tudo o que somos pela Queda.Alm do mais, a cruz de Cristo nos ensina as duas atitudes. Por um lado, a cruz a medida dada por Deus do valor de nosso ser verdadeiro, visto Cristo ter-nos amado e morrido por ns. Por outro lado, o modelo dado por Deus para a negao de nosso ego falso, visto que devemos preg-lo na cruz, mortificando-o. Ou, de modo mais simples, diante da cruz vemos simultaneamente o nosso valor e a nossa indignidade, j que percebemos tanto a grandeza do amor e da morte de Cristo quanto a grandeza de nosso pecado que lhe causou a morte.Amor auto-sacrificialNem a negao prpria (o repdio de nossos pecados) nem a afirmao prpria (a apreciao dos dons de Deus) um beco sem sada de absoro prpria. Pelo contrrio, as duas coisas so meios de auto sacrifcio. A compreenso prpria devia levar doao prpria. A comunidade da cruz , em essncia, uma comunidade do amor auto doador, expresso na adorao a Deus (o qual foi o nosso tema do captulo anterior) e no servio aos outros {que o nosso tema do final deste captulo). E para isso que a cruz coerente e insistentemente nos chama.Nem a negao prpria (o repdio de nossos pecados) nem a afirmao prpria (a apreciao dos dons de Deus) um beco sem sada de absoro prpria. Pelo contrrio, as duas coisas so meios de auto sacrifcio. A compreenso prpria devia levar doao prpria. A comunidade da cruz , em essncia, uma comunidade do amor autodoador, expresso na adorao a Deus (o qual foi o nosso tema do captulo anterior) e no servio aos outros {que o nosso tema do final deste captulo). E para isso que a cruz coerente e insistentemente nos chama.