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RENATA YURIE MOCHIZUKI DEDALEIRA Nome botânico: Digitalis purpurea L. Família: Scrophulariaceae Nomes vulgares: Digital, digitalina, dedaleira, abeloira, abeloura, erva-de-são- leonardo, erva-dedal, luvas-de-nossa-senhora, seiva-de-nossa-senhora, dedo-de-dama 3 . Parte utilizada: Folhas 2 *Histórico A Digitalis purpurea é empregada na medicina tradicional européia desde o século XVI, sendo considerada a mais bonita, importante, famosa e perigosa das plantas medicinais. Antes da descoberta de sua atividade cardiotônica pelo médico inglês William Withering em 1775, era empregada para o tratamento da hidropisia e vários outros males, como epilepsia e tuberculose. Depois disso suas folhas ou seu William Withering (médico inglês que descobriu a atividade cardiotônica da dedaleira) extrato estabilizado passaram a ser utilizados para o tratamento de doenças cardíacas, principalmente arritmia e insuficiência congestiva, sendo gradativamente substituídos pela digitalina, uma mistura de glicosídeos encontrados em suas folhas. Hoje se usa principalmente a digitoxina, medicamento estimulante do coração que ainda hoje é

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RENATA YURIE MOCHIZUKI

DEDALEIRA

Nome botânico: Digitalis purpurea L. Família: Scrophulariaceae Nomes vulgares: Digital, digitalina, dedaleira, abeloira, abeloura, erva-de-são-leonardo, erva-dedal, luvas-de-nossa-senhora, seiva-de-nossa-senhora, dedo-de-dama3. Parte utilizada: Folhas2

*Histórico A Digitalis purpurea é empregada na medicina tradicional européia desde o século XVI, sendo considerada a mais bonita, importante, famosa e perigosa das plantas medicinais. Antes da descoberta de sua atividade cardiotônica pelo médico inglês William Withering em 1775, era empregada para o tratamento da hidropisia e vários outros males, como epilepsia e tuberculose. Depois disso suas folhas ou seu William Withering (médico inglês que descobriu a atividade cardiotônica da dedaleira) extrato estabilizado passaram a ser utilizados para o tratamento de doenças cardíacas, principalmente arritmia e insuficiência congestiva, sendo gradativamente substituídos pela digitalina, uma mistura de glicosídeos encontrados em suas folhas. Hoje se usa principalmente a digitoxina, medicamento estimulante do coração que ainda hoje é

obtido de suas folhas, que depois de estabilizadas, secas e moídas servem para extração da digitoxina, da digoxina e outros glicosídeos cardioativos, em alto grau de pureza3. *Aspectos botânicos Planta herbácea bianual ou perene, ereta, pouco ramificada ou ramificada apenas na base, de 60-90 cm de altura, nativa da Europa e norte da África e, cultivada no sul do país e até naturalizada em algumas regiões de altitude do Sul e Sudeste. Descrição macroscópica: A folha é oval-oblonga ou lanceolada, séssil ou atenuada num pecíolo alado. O ápice foliar é agudo ou ligeiramente acuminado. Seu comprimento, em geral, é de 15 a 35 cm por 6 a 10 cm de largura. Sua margem é grosseira e desigualmente crenada ou crenado-denteada. A face superior é verde, quase glabra ou recoberta por uma pubescência mole, finamente rugosa e proeminente, entre as nervuras deprimidas. A face inferior é brancacenta, tomentosa e caracterizada pela trama bem aparente das nervuras salientes e esbranquiçadas, por entre a qual se observam redes mais finas. A nervura principal é fortemente desenvolvida e envia nervuras secundárias para a margem, sob ângulo agudo. As flores possuem um cálice quinquepartido, de segmentos agudos ou obtusos, soldados na base, pubescente; corola tubuloso-campanulada, sub-bilabiada, com o tubo ventrudo e de lóbulos desiguais, purpúrea-rosada, mais pálida interiormente, apresentando na face interna, sobre a linha média, manchas arredondadas mais escuras e esbranquiçadas à periferia e rodeada de cílios; estames didinâmicos; fruto capsular, bilocular, revestido de indumento de pêlos e glândulas pediceladas. Descrição microscópica: A epiderme superior, vista de face, mostra céluas de contorno poligonal com paredes ondeadas e a inferior com paredes sinuosas; ambas as epidermes apresentam pêlos de dois tipos: tectores e glandulares; os primeiros são cônicos pluricelulares (em geral com duas a seis células), unisseriados, com paredes não-espessadas, com uma ou outra célula colabada, evidenciando-se a célula terminal em forma de dedo de luva; os pêlos glandulares exibem, em geral, um pedículo de uma ou duas células e uma célula glandular ovóide, a qual, mais freqüentemente, está dividida por um septo vertical. O mesófilo consiste em uma fileira de células paliçádicas e de um tecido esponjoso formado de 3 a 4 fileiras de células arredondadas ou cilíndricas. A epiderme inferior mostra pequenos estômatos do tipo anomocítico, enquanto que a superior apresenta muito poucos, ou mesmo não os apresenta. A droga não contém cristais de oxalato de cálcio e as nervuras não contêm fibras. Os heterósidos cardiocinéticos localizam-se nas células epidérmicas, mas particularmente nas do mesófilo8.

*Aspectos agronômicos (manejo agrícola) A técnica de cultura pode assim resumir-se: sementeira em alfobres preparados; plantação definitiva na Primavera, em terrenos escolhidos, secos, insolados, não calcáreos, convenientemente adubados, em linhas distanciadas umas das outras. O estabelecimento da cultura fundamentou-se na seleção das variedades mais ricas de princípios ativos. Colheita: As folhas colhem-se habitualmente no segundo ano de vegetação, quando as plantas começam a florescer. Justifica-se esta regra para as plantas espontâneas, por as flores só aparecerem no segundo ano e constituírem a melhor característica para distinguir a Digitalis purpurea L. Verificou-se, ainda, que neste período as folhas possuem riqueza elevada de constituintes ativos. Efetuaram-se estudos circunstanciados, à custa de ensaios químicos e fisiológicos, sobre a parte da planta e a época do ano em que é maior a riqueza de heterósidos cardiocinéticos. Assim, verificou-se que as folhas do primeiro ano, no Estio, quando tendem já a amarelar, atingem a sua riqueza máxima e muito superior à notada em qualquer outro período da vida da planta. No segundo ano, antes do período da floração, as folhas contêm a quantidade máxima correspondente, nitidamente inferior à determinada nas folhas do primeiro ano e começa a decrescer logo no início da floração, acentuando-se depressa o declínio da atividade. Depois da floração encontram-se muito empobrecidas, cerca de um terço a um quarto do valor maior apresentado. Há dois motivos para preferir as folhas do segundo ano: o reconhecimento inequívoco da origem; o maior rendimento em peso das folhas por planta. As folhas caulinares revelaram riqueza de princípios ativos superior à das folhas da roseta basilar das plantas do segundo ano, mas aquelas são menores e menos distintas. A base da nervura central constitui uma característica valiosa das folhas radicais da dedaleira e por isso se condena a prática, já seguida, de a eliminar quando da colheita, a pretexto de não conter heterósidos ativos. As flores e os frutos por amadurecer contêm igualmente porções elevadas de princípios ativos, mas em conjunto representam uma quota-parte reduzida do peso da

planta; pelo contrário, os pecíolos, caules e raízes possuem quantidades medíocres daqueles constituintes. A colheita efetua-se em dias secos, à tarde, em pleno período da fotossíntese, correspondente à fase diária de maior conteúdo de heterósidos ativos. Procede-se depois a secagem, por um processo que evite ou contrarie a sua hidrólise. Acomodam-se em tabuleiros, em camadas leves e expõem-se ao ar, em secadores, até reduzir a umidade a 5% ou 8%. De uma maneira geral, as secagens prolongadas promovem a atividade dos fermentos hidrolisantes e, como conseqüência, o decréscimo da ação farmacológica da dedaleira. Utilizam-se processos de estabilização à 80ºC por um minuto em estufa, para a destruição da enzima “digipurpuridase”. As temperaturas inferiores, entre 40º e 60º, coincidem com as condições ótimas para atuação dos fermentos, portanto, promovem o empobrecimento do conteúdo de heterósidos cardiocinéticos. A secagem a temperaturas baixas, no vazio, conserva a riqueza dos heterósidos iniciais, mas os processos baseados nesta propriedade não são econômicos. As folhas não estabilizadas guardam-se ao abrigo da umidade e da luz, em recipientes bem fechados, de preferência em frascos de vidro rolhados. As provisões devem renovar-se anualmente. As folhas estabilizadas, pelo contrário, conservam-se ativas durante períodos dilatados de tempo8.

*Composição química Ácidos gordos (fórmico, acético, propiônico, butírico, isovalérico, cítrico e succínico, antes denominado digitálico) e aromáticos (p-cumárico, cafeico, clorogênico, felúrico); pigmentos flavônicos, a luteolina e o seu 7-D-glucósido conhecido por digitoflavonósido e outros heterósidos relacionados com aquela flavona,

também um flavonol denominado digicitrina; pigmentos autociânicos, os 3,5-diglucósidos da cianidina e da pelargonidina; vários compostos antraquinônicos, a digitoluteína (1-metoxi-2-hidroxi-3-metilantraquinona) e outros de estruturas análogas; fitosteróis sob a forma de lipídios e de heterósidos, identificados com a β-sitosterina, predominante, estigmasterina, campesterina, 24-metilenecolesterina. Reconheceram-se, ainda, taninos, açúcares (glucose, levulose, sacarose), mucilagens, lipídios, ácido ascórbico, inositol, colina, acetilcolina, sais minerais, etc. Contém diversos fermentos, oxidases e hidrolases, e destas distingue-se a digipurpuridase ou digipurpidase, enzima específicas dos compostos cardiocinéticos capaz de separar a glucose dos extremos das cadeias glucídicas dos heterósidos primários. Mencionaram-se, por fim, os heterósidos de núcleo esteróide assim agrupados: I-Heterósidos cardiocinéticos com o núcleo do cardenólido; II-Heterósidos do grupo do digitanol, destituídos de ação cardiocinética, III-Heterósidos saponínicos do grupo do espirostano.

I-Heterósidos cardiocinéticos Possuem o núcleo fundamental do cardenólido, com 23 átomos de carbono. Os heterósidos iniciais isolaram-se das folhas frescas por um processo de proteção que consiste em precipitá-los conjuntamente com os fermentos pelo sulfato de amônio, evitando-se assim a sua hidrólise; do precipitado segregaram-se, solubilizados num solvente o purpureaglucósido A (reconhecido como desacetil-lanatósido A), o purpureaglucósido B (desacetil-lanatósido B) e, depois, a glucogitaloxina. Possuem uma cadeia glucídica constituída por um radical da β-glucose e três de digitoxose.

Por hidrólise provocada pela digipurpuridase separa-se a β-glucose e formam-se os heterósidos secundários com cadeias constituídas somente de moléculas de digitoxose, respectivamente a digitoxina, gitoxina e gitaloxina. Finalmente, por hidrólise total promovida pelos ácidos obtêm-se as geninas digitoxigenina, gitoxigenina e gitaloxigenina. Salienta-se o fato da hidrólise da glucose dos extremos das cadeias apenas ser possível pela atividade de uma β-ase específica, a digipurpuridase, na época da colheita e secagem das folhas; as plantas vivas contêm particularmente heterósidos primários ou iniciais. As subseqüentes hidrólises dos heterósidos secundários realizam-se por intermédio dos ácidos, pois os fermentos naturais das folhas não os desdobram. As geninas não aparecem nas plantas verdes, só existirão nas secas em quantidades pequenas. Purpureaglucósido A Purpureaglucósido B Glucogitaloxina Digipurpuridase ↓ ↓ ↓ → 1 glucose + 1 glucose + 1 glucose + digitoxina gitoxina gitaloxina ↓ ↓ ↓ Hidrólise ácida 3-digitoxose + 3-digitoxose + 3-digitoxose + → digitoxigenina gitoxigenina gitaloxigenina Explica-se, assim, a formação da digitoxina ou digitalina cristalizada pela hidrólise parcial do purpureaglucósido A, por via enzimática; não existirá pré-formada ou talvez apenas em quantidades vestigiais nas plantas verdes (questão controversa). Nas folhas da dedaleira, por vezes nas sementes, e ainda em diferentes táxones congêneres aparecem novos heterósidos das mesmas geninas, distintos só pela natureza diversa das suas cadeias glucídicas, formadas por uma, duas, três, quatro e cinco oses, respectivamente: D-digitoxose, D-fucose, d-digitalose e D-glucose. Podem agrupar-se pelas respectivas geninas:

a) Da digitoxigenina:

Heterósidos da digitoxigenina: R = H

Natureza da cadeia glucídica: R =

Ocorrência

Purpureaglucósido A - 3 digitoxose + glucose Folhas recentes da dedaleira e sementes

Digitoxina - 3 digitoxose Folhas Purlanósido A - 2 digitoxose + 1 acetil-

digitoxose + glucose Folhas e sementes

Glucodigitoxigenina-bis-digitoxósido

- 2 digitoxose + glucose Folhas e sementes

Digitoxigenina-bis- -2 digitoxose Folhas

digitoxósido Gluco-evatromonósido - 1 digitoxose + glucose Folhas e sementes Digitoxigenina-monodigitoxósido ou evatromonósido

- 1 digitoxose Dedaleira e Evonymus atropurpurea

Odorobiósido G - 1 digitalose + 1 glucose Folhas e sementes Odorósido H - 1 digitalose Dedaleira, Stroph.

Gracilis, Nerium odorum, etc.

Digifuco-celobiósido - 1 fucose + 2 glucose Sementes da dedaleira Glucodigifucósido ou glucodigiprósido

- 1 fucose + 1 glucose Folhas e sementes

Digiprósido ou digitoxigenina-fucósido

- 1 fucose Folhas

Glucodigitoxigenina-glucometilósido

- 1 glucometilose + glucose

Folhas

Digitoxigenina-glucometilósido

- 1 glucometilose Folhas

A digitoxina ou digitoxósido, o heterósido intermediário predominante nas folhas sencas, é o constituinte mais tóxico da dedaleira: 0,33 mg por 1 kg, em unidades gato e 0,080 mg por 1 g de rã.

b) Da gitoxigenina Heterósidos da gitoxigenina: R = H

Natureza da cadeia glucídica: R =

Ocorrência

Purpureaglucósido B - 3 digitoxose + glucose Folhas recentes e sementes Gitoxinacelobiósido - 3 digitoxose + 2 glucose Sementes Purlanósido B - 2 digitoxose + 1 acetil-

digitoxose + glucose Folhas e sementes

Acetil-gitoxina - 2 digitoxose + 1 acetil-digitoxose

Folhas

Gitoxina - 3 digitoxose Folhas Glucogitoxigenina-bis-digitoxósido

- 2 digitoxose + glucose Folhas

Gitoxigenina-bis-digitoxósido

- 2 digitoxose id.

Gitoxigenina monodigitoxósido, gitorósido ou gitósido

- digitoxose Folhas

Glucogitorósido - digitoxose, + glucose Sementes Gitostina - digitalose + celobiose Sementes Neogitostina - digitalose + genciobiose id.

Digitalinum verum - digitalose + glucose Folhas e sementes Estrospesido ou desglucodigitalinum verum

- digitalose D. purpurea (folhas), D. lanata, Stroph. speciosus

Glucogitofucósido - fucose + glucose D. purpurea (sementes), D. lanata

Conhecem-se vários heterósidos intermediários resultantes do mesmo heterósido inicial: da gitostina ou gitoxigenina-β-celobiósido-β-D-digitalósido separa-se a glucose e digitalinum verum; e desta resulta o estrospesido, por perda de nova molélula de glucose.

c) Da gitaloxigenina ou 16-formil-gitoxigenina Heterósidos da gitaloxigenina: R = H

Natureza da cadeia glucídica: R =

Ocorrência

Glucogitaloxina ou 16-formil-purpureaglicósido B

- 3 digitoxose + glucose Folhas e sementes da dedaleira

Gitaloxina ou 16-formilgitoxina

- 3 digitoxose Folhas

Acetilgitaloxina - 2 digitoxose + acetildigitoxose

id.

Glucogitaloxigenina-bis-digitoxósido

- 2 digitoxose + glucose Folhas e sementes

Gitaloxigenina-bis-digitoxósido

- 2 digitoxose id.

Gitaloxigenina-monodigi- tósido ou lanodoxina

- digitoxose id.

Glucoverodoxina ou formil-digitalinum verum

- digitalose + glucose Folhas e sementes

Verodoxina ou 16-formilestrospesido

- digitalose id., id.

Esta série é constituída por ésteres fórmicos de alguns heterósidos do grupo anterior. II-Heterósidos destituídos de ação cardiocinética Estes heterósidos de núcleo esterólico não possuem o anel lactônico característico e por isso não são cardioativos. Devido ao número de átomos de carbono são chamados também de C21 ou digitanol-heterósidos. As cadeias glucídicas ligam-se ao carbono C(3) e são constituídas somente por metilpentoses: D-digitoxose, D-oleandrose, D-diginose e D-digitalose.

Heterósidos Geninas Cadeia

glucídica R1 R2 Ocorrência

Diginina (a) Diginigenina - diginose H Folhas dedaleira e D. lanata

Digitalonina (a)

> - digitalose H Folhas dedaleira

Digifoleína (a) Digifologenina - diginose OH id., D. lanata Lanafoleína (a) > -oleandrose OH id., id. Digipurpurina (b)

Digipurpurogenina - 3 digitoxose Folhas dedaleira

Digipronina (c)

Digiprogenina - digitalose id., D. lanata

Digacetinina (d)

Digacetigenina - 3 digitoxose + ác. acético

Folhas dedaleira

Purpnina (e) Purpnigenina - 3 digitoxose id., D. lanata Purpronina Purprogenina - 3 digitoxose id. III-Heterósideos saponínicos Estes heterósidos possuem, mais propriamente, o núcleo espirostano. Conhecem-se vários, isolados das folhas e sementes da dedaleira e de espécies congêneres. Acumulam-se nas folhas do primeiro ano, já na derradeira fase; mas no segundo ano, predomina a gitogenina nas folhas jovens e a digitogenina nas mais velhas. O conteúdo de heterósidos ativos. Análises efetuadas em dedaleiras de várias origens permitiram verificar a existência de raças fisiológicas, diversamente enriquecidas de determinados grupos de heterósidos, portanto com propriedades farmacológicas diferentes. As dedaleiras dos Vogos são notáveis pela atividade manifestada que resulta do predomínio de heterósidos do grupo da digitoxigenina, em particular da digitoxina. Os heterósidos do tipo do estrospesido, fisiologicamente menos ativos, encontram-se, predominantemente, nas dedaleiras das Ardenas (Bélgica) e possuem uma atividade média. As dedaleiras menos ativas revelam um conteúdo mais abundante de heterósidos do grupo do digitanol (estes considerados já sem atividade sobre o miocárdio) e com pequenas percentagens de digitoxina. A existência do radical formil em C(16) nos componentes da série da gitaloxigenina empresta-lhes maior atividade. A dosagem dos diversos heterósidos cardiocinéticos, através da técnica cromatográfica, revelou que as quantidades dos diferentes constituintes variam nas folhas das dedaleiras. O valor total de heterósidos caria de 0,292 a 0,488g%. O método de secagem tem influência sobre a composição química e a atividade da dedaleira. A conservação também exerce influência, pois a umidade favorece o desenvolvimento de microrganismos e de fermentações que hidrolisam e oxidam os

compostos cardiocinéticos. Aconselha-se, por isso, reduzir o conteúdo de água nas folhas (5 a 8%) e conservar ao abrigo de umidade, luz e calor, em frascos fechados. O fármaco reduzido a pó está em condições de sofrer alterações ainda mais depressa se não estiver bem seco (3 a 5% de umidade) e guardado em frascos bem vedados, de preferência numa atmosfera de um gás inerte, o azoto8. *Estudos etnofarmacológicos Por ser considerada como planta tóxica, o uso popular desta espécie é muito restringido1. *Atividades farmacológicas Os glicosídeos digitálicos exercem efeitos inotrópicos positivos e são largamente usados na insuficiência cardíaca. Sua ação inotrópica é o resultado do aumento de Ca2+ intracelular, que também forma a base para arritmias relacionadas com a intoxicação por digitálicos. Os glicosídeos digitálicos aumentam a inclinação da fase 4(i.e. aumentam a taxa de automaticidade), especialmente se a [k]o for baixa. Os glicosídeos digitálicos tambpem exercem ações vagotônicas proeminentes, resultando em inibição das correntes de Ca2+ no nódulo AV e ativação das correntes de K+ mediadas pela acetilcolina no átrio. Assim, os principais efeitos eletrofísicos “indiretos” dos glicosídeos digitálicos são a hiperpolarização, o encurtamento dos potenciais de ação atriais e aumentos na refratariedade nodal AV. A última ação é responsável pela utilidade dos digitálicos na terminação das arritmias de reentrada envolvendo o nódulo AV e no controle da resposta ventricular em pacientes com fibrilação atrial. As preparações com digitálicos podem ser especialmente úteis na última situação, já que muitos pacientes têm insuficiência cardíaca, que pode ser exacerbada por outros fármacos bloqueadores do nódulo AV como os bloqueadores do canal de Ca2+ ou os antagonistas do receptor β-adrenérgico. No entanto, em muitos pacientes com insuficiência cardíaca avançada, o propulsor simpático é acentuadamente aumentado, então o digitálico não é muito efetivo na diminuição da freqüência; no entanto, mesmo uma diminuição modesta na freqüência pode algumas vezes ajudar a melhorar a insuficiência cardíaca. De forma semelhante, em outras condições nas quais tônus simpático alto leva à rápida condução atrioventricular (p. ex. doença pulmonar crônica, tireotoxicose), a terapia com digitálicos pode ser apenas marginalmente eficaz na redução da taxa. Atividade simpática aumentada e hipóxia podem potencializar as alterações induzidas por digitálicos na automaticidade e DPT, aumentando portanto o risco de toxicidade dos digitálicos. Outra característica complicadora na tireotoxicose é a maior depuração da digoxina. Os principais efeitos dos glicosídeos cardíacos são o prolongamento do PR e uma alteração inespecífica na repolarização ventricular (o segmento ST) cujo mecanismo subjacente não é bem entendido1.

*Farmacocinética Os comprimidos de digoxina são incompletamente biodisponíveis (75%), mas as cápsulas apresentam biodisponibilidade > 90%. Em alguns pacientes, a flora intestinal pode metabolizar a digoxina, causando uma redução acentuada na biodisponibilidade do fármaco. Nestes pacientes, doses mais altas que as usuais são necessárias para obter eficácia clínica; a toxicidade é um risco sério se forem administrados antibióticos como a tetraciclina ou a eritrocimina, que destroem a flora intestinal. A inibição da glicoproteína P também pode desempenhar um papel. Vinte a 30% da digoxina se ligam à proteína. Os efeitos antiarrítmicos da digoxina podem ser atingidos com terapia oral ou intravenosa. Entretanto, a digoxina passa por uma distribuição relativamente lenta para o (a) local(is) efetor(s); portanto, mesmo com terapia intravenosa, há um espaço de várias horas entre a administração do fármaco e o surgimento de efeitos farmacológicos mensuráveis como o prolongamento do intervalo PR ou retardamento da freqüência ventricular na fibrilação atrial. Para evitar intoxicação por digitálicos, um regime de ataque de aproximadamente 1-1,5mg em 24h é administrado. A medição da concentração da digoxina sérica pós-distribuição e o ajuste da dosagem diária (0,125-0,375 mg) para manter contrações de 0,5-2ng/ml são úteis durante terapia crônica com digoxina. Alguns pacientes podem requerer e tolerar concentrações mais altas, mas com maior risco de efeitos adversos. A meia-vida da eliminação da digoxina normalmente é de cerca de 36h, então as doses de manutenção são administradas 1 x/dia. A eliminação renal do fármaco sem alterações é responsável por menos de 80% da eliminação de digoxina. As doses de digoxina devem ser reduzidas (ou o intervalo de dosagem aumentado) e as concentrações séricas criteriosamente monitoradas em pacientes com excreção prejudicada devido a insuficiência renal ou em pacientes hipotireóideos. A digitoxina passa primariamente por metabolismo hepático e pode ser útil em pacientes com disfunção renal avançada ou flutuante. O metabolismo da digitoxina é acelerado por fármacos como a fenitoína ou rifampicina que induzem o metabolismo hepático. A meia-vida da eliminação da digitoxina é ainda mais longa à proteína e sua faixa terapêutica é de 10-30 ng/ml.

A quinidina eleva as concentrações de digoxina sérica pela diminuição da depuração e do volume de distribuição; novas concentrações de digoxina em estdo de equilíbrio estável aproximam-se em 4-5 meias-vidas de eliminação da digoxina e, em cerca de uma semana. Um efeito semelhante foi relatado com a digitoxina quando as concentrações séricas foram monitoradas por períodos suficientemente longos. A toxicidade dos digitálicos ocorre tão frequentemente quando a quinidina está sendo administrada que é rotina diminuir a dose de digoxina se a quinidina é iniciada. Outros fármacos que aumentam a concentração da digoxina sérica incluem o verapimil, o diltiazém, a amiodarona, a ciclosporina, o intraconazol, a propafenona, a flecainida e a espirololactona. Nesses casos, o efeito é menos previsível e as concentrações de digoxina são regularmente medidas e a dose ajustada apenas se necessário. Um mecanismo comum subjacente à depuração da digoxina parece envolver o transporte mediado pela glicoproteína P. A inibição desse transporte foi implicada como o mecanismo pelo qual a quinidina e outros fármacos em interação diminuem a depuração da digoxina. A hipopotassemia, que pode ser causada por muitos fármacos, potencializará as arritmias induzidas por digitálicos1. *Experimentos e eficácia clínica Através de um estudo clínico controlado, foi possível verificar os efeitos clínicos da digoxina sobre a mortalidade (relação benefício/risco). Outros estudos congêneres se sucederam, limitando o espectro da indicação do uso dos digitálicos na insuficiência cardíaca e poucas circunstâncias clínicas. Por outro lado, medicamentos antiarrítmicos comumente usados na clínica tiveram seus usos clínicos questionados ao ser demonstrado no “Cardiac Arrhytmia Suppression Trial” que, em pacientes com infarto no miocárdio, estes medicamentos possuíam relação benefício/risco impeditiva, decorrente do aumento da mortalidade, quando comparado aos pacientes que fizeram uso do placebo1.

*Toxicidade A intoxicação por digitálicos é um problema clinico comum. Arritmias, náuseas, distúrbios da função cognitiva e visão amarelada ou borrada são manifestações usuais, em geral não reconhecidas imediatamente, já que costumam ocorrer em pacientes com doenças avançadas recebendo múltiplos fármacos. Concentrações séricas elevadas de digitálicos, hipóxia e hipotassemia, hipomagnesemia e hipercalcemia predispõem os pacientes a arritmias induzidas por digitálicos. Embora a intoxicação por digitálicos podem virtualmente causar qualquer arritmia, certos tipos de arritmia são característicos. Arritmias que deveriam levantar forte suspeita de intoxicação por digitálicos são aquelas em que as taquicardias relacionadas com DPT ocorrem juntamente com dano nodal sinusal ou da função nodal AV. A taquicardia atrial com bloqueio AV é “clássica”, mas bigeminismo ventricular (batimentos sinusais alternando com batimentos de origem ventricular), taquicardia juncionais AV e vários graus de bloqueio AV também podem ocorrer. Com intoxicação avançada, hiperpotassemia grave devido a envenenamento por Na+, K+-ATPase e bradiarritmias profundas, que podem ser não responsivas à terapia com marca-passo, são observadas. Em pacientes com níveis sanguíneos terapêuticos, a cardioversão DC pode ser usada de forma segura. Formas menores de intoxicação por digitálicos podem não requerer terapia especifica alem do monitoramento do ritmo cardíaco até que os sintomas e sinais de toxidade desapareçam. A bradicardia sinusal e o bloqueio AV frequentemente respondem à atropina intravenosa, mas o efeito é transitório. Mg2+ foi usado com sucesso em alguns casos de taquicardia induzida por digitálicos. Qualquer arritmia séria deve ser tratada com antidigoxina de fragmentos de Fab, que são altamente efetivas na ligação de digoxina e digitoxina, aumentando grandemente a excreção renal destes fármacos. As concentrações séricas de glicosídeos elevam-se acentuamente com anticorpos antidigitálicos, mas estes representam a substância ligada (não farmacologicamente ativa). O marca-passo cardíaco temporário pode ser necessário para nódulo sinusal avançado ou disfunção nodal AV. Outras formas de terapia antídoto usadas no passado mas largamente suplantadas pelo uso de fragmentos de Fab incluem lidocaína, fenitoína ou administração cautelosa de K+ para arritmias ventriculares; o K+ pode exarcebar o bloqueio AV. O digitálico exerce efeitos vasocontritores arteriais diretos, que podem ser especialmente deletérios em pacientes com aterosclerose avançada que recebem fármacos intravenosos; isquemia nos leitos coronário e intestinal foi relatada1,8. *Especialidades farmacêuticas: Digitoxina, Digitaline

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1 - ALONSO, J.R. Tratado de Fitomedicina – Bases Clínicas y Farmacológicas. Argentina: Indugraf, 1998. 2 - TESKE, M.; TRENTINI, A.M. M. Herbarium – Compêndio de Fitoterapia. 3ª ed. Curitiba: Ingra, 1997. 3 - LORENZI, H.; MATOS, F.I. Plantas medicinais no Brasil – nativas e exóticas. São Paulo: Instituto Plantarum de estudos da flora LTDA, 2002. 4 - MING, L.C.; SCHEFFER, M.C.; BARROS, I.B.I.; et al. Plantas medicinais Aromáticas e Condimentares – Avanços da pesquisa agronômica. Vol II. São Paulo: Universidade Estadual Paulista, 1998. 5 - OLIVEIRA, F.; AKISUE, G.; AKISUE, M.K. Farmacognosia. São Paulo: Atheneu, 1998. 6 - CASTRO, L.O.; CHEMALE, V.M. Plantas medicinais – Condimentares e Aromáticas. Guaíba: Agropecuária LTDA, 1995. 7 - SIMÕES, C.M.O.; MENTZ, L.A.; SCHENKEL, E.P. Plantas da medicina popular no Rio Grande do Sul. 4ª ed. Porto Alegre: Editora da Universidade, 1995. 8 - COSTA, A.F. Farmacognosia. Vol II. 4 ª ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1994.